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Universidade Metodista de São Paulo Cátedra UNESCO/UMESP de Comunicação para o Desenvolvimento Regional Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação PENSACOM BRASIL – São Bernardo do Campo, SP – 16 a 18 de novembro de 2015 1 Facebook e Jornalismo: uma discussão sobre a adequação da informação às características da plataforma digital 1 Clarissa Josgrilberg PEREIRA 2 Suelen de Aguiar SILVA 3 Resumo Partindo da observação do crescimento que a rede social Facebook tem tido, propusemo-nos a identificar como a informação tem sido lidada por meio desta plataforma. Partimos da defesa de que o Facebook é hoje a principal porta de entrada dos usuários ao site de notícias e, por isso, é necessário que a atualização seja contínua, que a linguagem seja adaptada à plataforma, que os internautas sejam respondidos, entre outras características que precisam ser levadas em consideração na atualização da página oficial dos jornais. Após pesquisa bibliográfica sobre o tema, trabalhamos com algumas exemplificações a partir da análise realizada no perfil do jornal O Globo com base em alguns dos pressupostos da netnografia. Para isso, examinamos, principalmente, as últimas dez postagens do dia 23 de outubro e a relação que as mesmas têm com o site do Jornal. Baptista (2014), Steganha (2010), Crucianelli (2014) e Kozinets (2014) estão entre os autores que sustentam nossa discussão. Palavras chave: Facebook; Jornalismo; Netnografia. Introdução Na primeira parte do trabalho trazemos uma discussão sobre o Facebook e seu contexto social a partir de pesquisas sobre a utilização da internet e redes sociais digitais pela população brasileira. Nesse cenário o Facebook se destaca por estar à frente de outras redes sociais e por crescer diariamente o número de pessoas que aderem ao serviço. Apesar de seu papel inicial ser promover o entretenimento e aproximar pessoas, ao menos virtualmente, hoje a rede desempenha outras funções como divulgação, venda de produtos, prestação de serviços etc. Já na segunda parte do trabalho discutimos com base nos autores Baptista (2014), Steganha (2010), Crucianelli (2014), Kozinets (2014), entre outros, como a informação jornalística tem sido tratada no Facebook. Partimos da 1 Trabalho apresentado no GT Comunicação digital e tecnologias, do PENSACOM BRASIL 2015. 2 Doutoranda em Comunicação Social pela Universidade Metodista de São Paulo (Umesp) e professora na Universidade Regional de Blumenau (Furb). E-mail: [email protected] 3 Doutoranda em Comunicação Social pela Universidade Metodista de São Paulo (Umesp). E-mail: [email protected]

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Facebook e Jornalismo: uma discussão sobre a adequação da informação às

características da plataforma digital1

Clarissa Josgrilberg PEREIRA2

Suelen de Aguiar SILVA3

Resumo Partindo da observação do crescimento que a rede social Facebook tem tido,

propusemo-nos a identificar como a informação tem sido lidada por meio desta

plataforma. Partimos da defesa de que o Facebook é hoje a principal porta de entrada

dos usuários ao site de notícias e, por isso, é necessário que a atualização seja contínua,

que a linguagem seja adaptada à plataforma, que os internautas sejam respondidos, entre

outras características que precisam ser levadas em consideração na atualização da

página oficial dos jornais. Após pesquisa bibliográfica sobre o tema, trabalhamos com

algumas exemplificações a partir da análise realizada no perfil do jornal O Globo com

base em alguns dos pressupostos da netnografia. Para isso, examinamos,

principalmente, as últimas dez postagens do dia 23 de outubro e a relação que as

mesmas têm com o site do Jornal. Baptista (2014), Steganha (2010), Crucianelli (2014)

e Kozinets (2014) estão entre os autores que sustentam nossa discussão.

Palavras chave: Facebook; Jornalismo; Netnografia.

Introdução

Na primeira parte do trabalho trazemos uma discussão sobre o Facebook e seu

contexto social a partir de pesquisas sobre a utilização da internet e redes sociais digitais

pela população brasileira. Nesse cenário o Facebook se destaca por estar à frente de

outras redes sociais e por crescer diariamente o número de pessoas que aderem ao

serviço. Apesar de seu papel inicial ser promover o entretenimento e aproximar pessoas,

ao menos virtualmente, hoje a rede desempenha outras funções como divulgação, venda

de produtos, prestação de serviços etc. Já na segunda parte do trabalho discutimos com

base nos autores Baptista (2014), Steganha (2010), Crucianelli (2014), Kozinets (2014),

entre outros, como a informação jornalística tem sido tratada no Facebook. Partimos da

1 Trabalho apresentado no GT Comunicação digital e tecnologias, do PENSACOM BRASIL 2015.

2 Doutoranda em Comunicação Social pela Universidade Metodista de São Paulo (Umesp) e professora

na Universidade Regional de Blumenau (Furb). E-mail: [email protected] 3 Doutoranda em Comunicação Social pela Universidade Metodista de São Paulo (Umesp). E-mail:

[email protected]

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defesa de que o Facebook é hoje a principal porta de entrada dos usuários ao site de

notícias e, por isso, é necessário que a atualização seja contínua, que a linguagem seja

adaptada à plataforma, que os internautas sejam respondidos, entre outras características

que precisam ser levadas em consideração na atualização da página oficial dos jornais.

Após pesquisa bibliográfica sobre o tema, na terceira parte do texto trabalhamos

com algumas exemplificações a partir da análise realizada no perfil do jornal O Globo

com base em alguns dos pressupostos da netnografia. Para isso, examinamos,

principalmente, as últimas dez postagens do dia 23 de outubro de 2015.

1 - Facebook e contexto social

O estudo da 13ª edição do F/Radar4 sobre o panorama do Brasil na internet,

realizada no ano de 2013, demonstra que 1 em cada 5 brasileiros costuma comentar,

divulgar ou compartilhar experiências pela internet no exato momento em que elas

acontecem. A pesquisa confirmou também a preeminência do compartilhamento via

Facebook com 71,4 milhões de brasileiros cadastrados na rede social. O número

representava 85% dos internautas brasileiros.

Já a pesquisa da 14ª edição do F/Radar revela que o Facebook detém preferência

entre redes sociais, em todas as idades e classes sociais. Segundo o levantamento, as

redes sociais são apontadas como fonte de informação recorrente e altamente confiável.

Atualmente 107 milhões de brasileiros acessam a internet, ou seja, 65% da

população com mais de 12 anos é o que revela o último estudo do F/Radar, realizado em

maio deste ano. Durante as três últimas edições do F/Radar o Facebook lidera entre as

redes sociais mais utilizadas.

Das atividades mais citadas realizadas na internet lidera o envio de mensagens

instantâneas, em seguida a própria participação em alguma rede e com 67%, o

compartilhamento de conteúdo como textos, imagens ou vídeos. É o que revela a

pesquisa TIC Domicílios5 realizada pelo Centro Regional de Estudos para o

4 A pesquisa F/Radar é realizada desde 2007 pela F/Nazca Saatchi & Saatchi em parceria com o

Datafolha e está na sua 15ª. Para saber mais acesse: <http://www.fnazca.com.br/> 5 O objetivo geral da pesquisa TIC Domicílios é medir o acesso e os usos da população brasileira em

relação às tecnologias de informação e comunicação. O período de realização da pesquisa foi de outubro

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Desenvolvimento da Sociedade da Informação – CETIC.br - com base no percentual de

usuários da internet no ano de 2014, com 94, 2 milhões.

A Pesquisa de Mídia deste ano também mostra que o Facebook é a rede com

maior adesão. “Entre os internautas, 92% estão conectados por meio de redes sociais,

sendo as mais utilizadas o Facebook (83%), o WhatsApp (58%) e o Youtube (17%)”

(BRASIL, 2015).

Todos esses dados acima mostram que o consumo e a interação com a mídia tem

mudado completamente. Conforme aponta Juliana Baptista (2014, p.21), “O século XXI

pode ser considerado como a era digital. As ferramentas da internet como blogs e redes

sociais, e as novas tecnologias da telefonia celular estão influenciando os rumos da

própria cultura”.

Assim sendo, a internet passa a ser onipresente e significa que qualquer um, em

qualquer lugar, pode explorar essa grade informacional móvel, com milhões de ideias se

disseminando de uma tela para outra (PENENBERG, p.74). A qualquer momento o

internauta interage. Ele quer ver sua foto postada nos veículos de comunicação, ele

comenta, curte, compartilha, critica, se posiciona. Sua relação com os veículos mudou

completamente, muito por causa do estímulo da convergência.

1.1 Convergência

Como a própria etimologia da palavra indica, convergência significa convergir, é

possibilitar que caminhos se encontrem. Pensando na convergência midiática, temos

então que as várias mídias, essencialmente de um único veículo, precisam afluir seus

conteúdos. Como aponta Henry Jenkins (2009, p.42) “a convergência envolve uma

transformação tanto na forma de produzir quanto na forma de consumir os meios de

comunicação”.

Convergência é um conceito amplo que envolve muitas vertentes, tem-se a

tecnológica, a midiática, a tecnológica, a da cultura. Não nos cabe aqui aprofundar o

assunto, contudo, cabe expor que hoje, momento em que seguimos uma lógica na qual

equipamentos diferentes se conectam e produtos comunicacionais se inter-relacionam,

de 2014 a março de 2014. Foram realizadas 19.211 entrevistas em 349 municípios brasileiros. Para saber

mais acesse: <http://cetic.br/media/analises/tic_domicilios_2014_coletiva_de_imprensa.pdf>

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passa-se a exigir que as produções midiáticas não sejam mais isoladas. Não basta mais

produzir para um único veículo, as produções precisam ser otimizadas, especialmente,

na esfera digital. Nesse sentido, Jenkins (2009, p.50-51, grifo nosso) aponta:

Estamos entrando numa era de longa transição e de transformação no

modo como os meios de comunicação operam. Não haverá nenhuma

caixa preta mágica que colocará tudo em ordem novamente.

Produtores de mídia só encontrarão a solução de seus problemas

atuais reordenando o relacionamento com seus consumidores. O

público, que ganhou poder com as novas tecnologias, que está

ocupando um espaço na intersecção entre os velhos e os novos meios

de comunicação, está exigindo o direito de participar intimamente da

cultura. Produtores que não conseguirem fazer as pazes com a nova

cultura participativa enfrentarão uma clientela declinante e a

diminuição dos lucros. As contendas e as conciliações resultantes irão

redefinir a cultura pública do futuro.

Para o autor, o sentido que a convergência carrega vai contra o processo

tecnológico que reúne várias funções dentro de um único aparelho. “A convergência

representa uma transformação cultural, à medida que os consumidores são incentivados

a procurar novas informações e fazer novas conexões em meio a conteúdos midiáticos

dispersos” (JENKINS, 2009, p.27-28).

Esse cenário impacta diretamente no desempenho dos veículos Jornalísticos,

muitas vezes, acostumados a escreverem o que queriam e para quem imaginavam, hoje,

o jornalista se vê obrigado a inserir diversos públicos em todo o processo jornalístico e,

ainda, a ficar à espera da reação de seus consumidores.

2. Jornalismo e Facebook

Para compreender a relação entre Facebook e jornalismo a partir da adequação

da informação na plataforma digital é importante que o tema seja visto do ponto de vista

da produção, mas também do consumo, particularmente, na perspectiva da participação

dos consumidores/leitores, pois eles são a razão de existir dos jornais. Jenkins (2009,

p.27) afirma que a circulação de conteúdos por meio de diferentes sistemas midiáticos

depende fortemente da participação dos consumidores.

O Facebook iniciou suas atividades em 04 de janeiro de 2004 e de lá pra cá mais

de um bilhão de pessoas ao redor do mundo se conectaram a rede. Mark Zuckerberg

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fundador e Chefe Executivo do Facebook há 11 anos criava uma das plataformas

digitais mais envolventes e atrativas da história. No início era um site simples, mas

eficiente. Bastava um endereço de correio eletrônico da Universidade de Harvard,

instituição onde Zuckerberg estudava, para que o registro no site fosse efetuado. Os

alunos criavam seus perfis e em seguida poderiam fazer amizade com outros alunos. O

Thefacebook.com decolou rapidamente, cerca de sete mil estudantes haviam se

registrado na rede ao fim do mês. E isso foi só o começo (PENENBERG, 2010, p.180-

183).

Talvez, nem mesmo Zuckerberg cogitava que a experiência do usuário por meio

do Facebook, já sem o “the” pudesse causar tantos impactos de ordem econômica,

social, cultural, política e comunicativa. A missão do Facebook “é dar às pessoas o

poder de compartilhar e tornar o mundo mais aberto e conectado” (FB, online, 20156).

Certamente, as pessoas estão a cada dia mais conectadas. Na rua, em casa, no

supermercado, no trabalho, no cinema, no restaurante e em qualquer lugar, basta um

dispositivo com conexão à internet.

Rede social é comumente utilizada como sinônimo para Facebook, Twitter,

Instagram etc, no entanto, o conceito de rede é amplo e antigo e não está

necessariamente atrelado à internet. Mas como nosso intento neste trabalho diz respeito

à “rede social Facebook”, faremos alguns apontamos. A plataforma Facebook não é

exatamente uma rede social digital. Ela é um site de rede social, que ao agregar pessoas

torna-se uma rede. Recuero (2010, online) corrobora com esse apontamento ao dizer

que rede social é uma metáfora para grupos sociais.

Para Kozinets (2014, p.52-53) uma rede é composta de “um conjunto de atores

ligados por um conjunto de laços relacionais. Os atores, os ‘nodos’, podem ser pessoas,

equipes, organizações, ideias, mensagens ou outros conceitos”. O fato é que ao se

conectar em redes as pessoas ganham visibilidade em seus grupos e exponham suas

identidades, como diz Baptista (2014, p.35) a “visibilidade na rede faz com que os

usuários se comuniquem e tenham impressões uns dos outros. No caso do Facebook o

6 Disponível em <https://www.facebook.com/FacebookBrasil/info/?tab=page_info> Acesso em: 01 de

out. de 2015.

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indivíduo constrói sua personalidade interagindo com páginas de seu gosto”. Assim,

sendo as empresas passam a ficar mais relacionadas com o perfil de seus usários,

partindo disso, utilizamos o próximo tópico para detalhar como alguns autores tem

projetado o uso do facebook para adequá-lo ao processo jornalístico.

2.1 Nem tudo que cai na rede é peixe

O Facebook não foi criado para que atividades jornalísticas fossem

desenvolvidas e otimizadas por meio dele, mas é fato que com o tempo as empresas

jornalísticas e seus funcionários perceberam que esta rede facilitava o processo

jornalístico em suas várias etapas, da produção à apuração, da recirculação à

ressignificação de conteúdos.

Dessa forma, por meio da plataforma do Facebook passa a ser possível encontrar

pautas e fontes, mensurar e propagar a produção jornalística. Alguns livros e pesquisas

já discutem a relevância das mídias sociais para as organizações. Contudo, não

encontramos produções específicas que relacionam detidamente o uso dessas mídias por

organizações que sejam jornalísticas, que possuem algumas particularidades frente aos

outros tipos de empresas. Assim sendo, com base em várias leituras que fizemos

levantamos algumas características que seriam necessárias ao bom uso da rede, as quais

auxiliaram na composição das categorias para a nossa análise que será explicitada mais

adiante.

Primeiro é preciso contextualizar que de fato o uso de redes sociais pelo

jornalismo é algo relativamente novo e que, por consequência, muitos profissionais não

possuem formação para lidar com esta ferramenta. Aliás os próprios cursos e

especializações em mídias digitais ainda são poucos e muito concentrados na região

sudeste. Para se ter uma melhor noção desse cenário, O Estado de São Paulo e a Folha

de São Paulo, dois importantes jornais impressos do país aderiram ao Facebook há cinco

anos atrás.

As páginas analisadas nesta pesquisa, Folha de São Paulo e Estadão,

criaram suas respectivas páginas no Facebook no ano de 2010, quando

um grande número de leitores já estava presente nas redes e tinham a

necessidade de consumir informações naquela plataforma. Já no

Twitter, a Folha aderiu a mesma época, em março do 2010, e o

Estadão em abril de 2009 (BAPTISTA, 2014, p.43).

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Até então o alcance e o aceite das produções jornalísticas eram mensuradas a

partir das assinaturas e das edições impressas vendidas e, hoje, como afirmam Zago e

Bastos (2013, p.117) “[...] novas métricas passam a ser consideradas: acesso às notícias

e o tempo de permanência no site do jornal”. Assim sendo, a quantidade de curtidas, de

compartilhamento e de comentários passam a fazer parte dos novos indicativos que

permitem mensurar o alcance das publicações.

Aliás, levar os comentários em considerações e não deixar os usuários sem

respostas é uma importante atuação dos jornalistas que lidam com as páginas dos jornais

no Facebook. Como explica Baptista (2014, p.13) “saber lidar com interações em tempo

real e usuários críticos que tem poder de opinar e ganhar visibilidade dentro de um

enorme grupo de pessoas”.

Ao lidar com usuários é preciso entender que rapidez e agilidade nas respostas

tornam-se essenciais. Nesta mesma perspectiva, apagar post criticados e excluir críticas

do perfil institucional é um grande erro, pois demonstra falta de transparência e de

aceite de erros por parte do veículo. Além disso, uma vez que algo entra na rede

dificilmente sairá de lá. Para exemplificarmos essa questão, traremos um post feito pela

Folha de São Paulo.

No dia 15 de outubro de 2015 o jornal publicou a notícia ocorrida nos Estados

Unidos intitulada como “Jovem é espancado até a morte pelos pais em Igreja nos EUA”

e como chamada para o conteúdo escreveu: “Coisas que só as igrejas fazem por você”,

conforme mostra a imagem a seguir.

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Como era de se imaginar a chamada para o post gerou muita repercussão e

muitas críticas. Contudo, a Folha nem respondeu aos comentários e nem se desculpou,

ela simplesmente “apagou” o post. Associamos ainda, que tal atitude errônea na rede

está relacionada a outra característica: a não compatibilidade do conteúdo com o perfil

editorial do veículo. Adequar o conteúdo às características da rede é algo importante,

contudo essa adaptação não pode desconsiderar o perfil do veículo, suas posturas e o

tipo de público que possui. Afinal, nem tudo o que cai na rede é peixe, é notícia, é

informação, é conteúdo. Uma vez postado na rede não pode simplesmente ser

silenciado, pois os públicos, já não podemos mais falar em público-alvo (BUENO,

2014) são exigentes e participativos.

Dessa forma, assim como qualquer mídia o Facebook precisa ter seus conteúdos

adaptados a ela, contudo, que sigam a linha editorial da empresa jornalística. No que

tange à adaptação outras duas questões são importantes: o ajuste da linguagem, que

deve ser mais informal, descontraída e está associada a textos mais curtos e o uso de

imagens. Conforme Zago e Bastos (2013, p.130) “o uso de imagens no Facebook, por

exemplo, tende a estar associado a um maior número de “curtidas”, o que pode ajudar a

explicar a quantidade de replicações nas postagens”. Exposto algumas condutas

necessárias para que o jornalista lide com a página institucional do Facebook, passamos

a analisar de que forma elas se fazem presentes em alguns dos posts do jornal O Globo.

3 - Aplicando os conceitos apreendidos em páginas do Facebook

3.1- Contexto metodológico

Por estarmos mergulhadas neste universo ubíquo e veloz buscamos apoio em

procedimentos metodológicos que nos ofertasse arcabouço teórico e prático para às

análises. Para tanto, apoiadas em alguns dos pressupostos da netnografia fizemos uma

observação e análise de dados no Facebook do jornal O Globo.

De forma geral, a netnografia adapta os procedimentos etnográficos comuns da

observação participante às particularidades da interação social mediada por computador.

Conforme aponta Robert Kozinets (2014, p.61-62),

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A netnografia é pesquisa observacional participante baseada em

trabalho de campo online. Ela usa comunicações mediada por

computador como fonte de dados para chegar à compreensão e à

representação etnográfica de um fenômeno cultural ou comunal.

Portanto, assim como praticamente toda etnografia, ela se estenderá,

quase que de forma natural e orgânica, de uma base na observação

participante para incluir outros elementos, como entrevistas,

estatísticas descritivas, coletas de dados arquivais, análise de caso

histórico estendida, videografia, técnicas projetivas como colagens,

análise semiótica e uma série de outras técnicas [...].

Vale frisar que nem todo o tipo de pesquisa que se realiza na internet pode ser

chamado de netnografia, tem-se outras modalidades como a análise de redes,

levantamento, métricas etc. A netnografia, contudo, pode ser mesclada a outros tipos de

pesquisa e requer um conjunto de diretrizes para a sua realização. Planejamento,

entrada, coleta e análise de dados, como veremos adiante, netnografia ética etc fazem

parte dos elementos que compõe este conjunto (Kozinets, 2014).

Durante a coleta e análise de dados três tipos de capturas são importantes: dados

arquivais, dados extraídos e dados de notas de campo (KOZINETS, 2014, p.92).

O primeiro tipo de captura consiste em copiar diretamente de comunicações

mediadas por computador preexistentes, tais como os dados da página, blog, site da

comunidade ou grupo observado, assim como fotografias, trabalhos de arte e arquivos

de som, dados cuja criação e estimulação o pesquisador não esteja diretamente

envolvido.

O segundo tipo refere-se aos dados extraídos que o pesquisador cria por meio da

interação com os membros, tais como: dados levantados por meio de entrevistas por

correio eletrônico, bate-papo, mensagens instantâneas etc.

O terceiro tipo de captura diz respeito às notas de campo extraídas pelo

pesquisador. É um tipo específico de coleta de dados sobre as práticas comunicacionais

dos membros das comunidades ou grupos, sobre as interações, e principalmente a

própria experiência do pesquisador.

No entanto, como temos ciência de que para a realização de netnografia faz-se

necessário uma imersão no universo a ser pesquisado, em nosso caso, a página do Jornal

O Globo no Facebook, optamos pela autonetnografia. Para Adriana Amaral (2009, p.15)

esta técnica é uma ferramenta reflexiva que “possibilita discutir os múltiplos papéis do

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pesquisador e de suas proximidades, subjetividades e sensibilidades na medida em que

se constitui como fator de interferência nos resultados e no próprio objeto pesquisado”.

Já Kozinets (2014, p.168) afirma que autonetnografia “é um estilo mais participativo e

autobiográfico de netnografia, que observa mais de perto a reflexão pessoal em primeira

mão como apreendida em notas de campo”.

Sendo assim, a autonetnografia (AMARAL, 2009, KOZINETS, 2014) pode ser

empreendida não como um tipo particular de netnografia, mas como forma de reflexão

advinda da própria experiência e observação do pesquisador. Indica um dos níveis de

proximidade na relação entre o pesquisador e o(s) grupo(s) online observado(s).

À primeira vista pode parecer limitado expormos nossas impressões,

observações e o resultado da análise dos dados extraídos. No entanto, é só à primeira

vista, pois os dados arquivais e as notas de campo foram coletados e analisados

conjuntamente, pois o processo de análise não está separado da coleta.

No entanto, para a autonetnografia na página do jornal O Globo no Facebook,

trabalhamos com os dados arquivais e com as notas de campo. E optamos por salvar os

dados como imagens de tela capturada, além de transcrever trechos dos comentários que

consideramos pertinentes. Organizamos as mensagens por categorias, dentre as quais

destacamos oito. São elas:

1) Uso de imagens

2) Curtidas

3) Compartilhamento

4) Comentário

5) Respostas aos comentários; Quais, negativos, positivos?

6) Adaptação de linguagem (usa o mesmo texto do site ou foi modificado)?

7) Conteúdo de cobertura real?

8) Conteúdo originado na própria rede?

3.2 Análise e breves considerações

Como exposto no início deste artigo, coletamos e analisamos os últimos dez

posts do dia 23 de outubro de 2015. Na verdade, se trata mais de um exercício de

aplicação das categorias discutidas teoricamente nos itens anteriores que nos permitem

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encontrar alguns indícios sobre a forma como a página oficial do Facebook do O Globo

é ministrada.

A página conta com 4.340.771 curtidas, ou seja, mais de 4 bilhões de pessoas

associam o Jornal ao seu perfil. Contudo, quando pegamos os posts para analisarmos

temos que o conteúdo mais curtido conteve apenas 5.655 curtidas, um número pífio se

comparado a quantidade de usuários que a página possui. O gráfico abaixo mostra a

quantidade de curtidas por postagens:

Se somarmos todas as curtidas temos um pouco mais de 16 mil, um número

ainda muito pequeno se comparado a quantidade de usuários da página. Se analisarmos

o número de compartilhamentos veremos também que os dados são poucos

representativos. O único conteúdo que ultrapassa mil compartilhamentos é o “Furacão

Patrícia chega ao México” que foi também o que obteve mais curtidas.

279 338 1289

5655

500 1381

2065

2180

1194

1713

Curtidas por post

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PENSACOM BRASIL – São Bernardo do Campo, SP – 16 a 18 de novembro de 2015

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De todos os dez posts analisados não encontramos respostas do veículo a

nenhum perfil que tenha realizado comentário. Tal postura é contraditória ao que o

veículo anuncia: “Olá! Este é um ponto de encontro, um espaço para a conversa em

torno de ideias e notícias. 'Curta' a nossa página e seja bem-vindo(@)”. Com o silêncio

que mantém em sua página, o veículo para não se incluir na conversa que ele próprio

propõe.

Ainda sobre a interatividade de seu público, o Jornal tenta estabelecer em seu

perfil algumas normas de conduta. Segundo seu perfil oficial:

Aqui, postamos notícias que podem nos fazer rir, chorar, inspirar e

indignar. Queremos a sua opinião, sempre. O debate é necessário e

saudável e nos ajuda a compreender o que vocês pensam e o que

desejam. Discordar faz parte, mas pedimos que as manifestações

sejam pautadas pelo respeito ao outro. Afinal, ninguém gosta de ler

ataques pessoais, palavras obscenas, textos comerciais e spam. Por

isso, comentários contendo insultos, difamações e links que não

estejam relacionados ao assunto discutido no post estão sujeitos à

avaliação da equipe de Mídias Sociais e podem ser deletados.

Notamos que esse cuidado de mediador a que o veículo se propõe, na verdade,

ele não consegue cumprir. Encontramos, além spam, várias palavras de baixo calão

como, por exemplo, “merda”, “caralho” e “fudedor de pepeka”, entre outras. Além

disso, há comentários que se dirigem diretamente a ao perfil e não são respondidos

como o de um usuário que pede autorização para a divulgação de um documentário feito

por ele:

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Há também vários comentários criticando os conteúdos postados, especialmente

o que aborda a novela das 9 da emissora, intitulado “Em A regra do Jogo, Orlando

entrará na mira de Dante”. Nele, há reações como: “com tanta notícia importante, vão

logo postar algo sobre novela”, “me poupem”, “essa notícia acrescentou tanto... Estão

brincando né?!”, “não tenho tempo a perder com porcaria”. Nenhum comentário foi

respondido.

Considerações

Sobre os conteúdos postados no período analisado, verificamos ainda que

nenhum teve origem na própria rede e nenhum deles era uma cobertura real de algum

fato. Por fim, sobre a linguagem não há nenhuma adequação com a da internet, não há o

uso de emoticons, nem de termos mais “leves” ou mais dialogados. Contudo, todas as

postagens seguem um padrão com links embedados e uma frase curta que complementa

o título do conteúdo postado, a qual geralmente compõe a notícia.

Todavia, a linha editorial do jornal segue um padrão, mas não adequa o uso da

rede às suas potencialidades. Serve, na verdade, apenas como repositório de conteúdo.

O que demonstra que nem todos os grandes conglomerados de comunicação estão

atentos as novas dinâmicas do mercado consumidor potencializados pelas tecnologias

de informação e informação. Não basta simplesmente estar na rede é preciso navegar de

acordo com a maré.

Referências

BAPTISTA, Juliana. Jornalismo nas redes sociais: o uso do Facebook pelos jornais

Estadão e Folha de São Paulo. Monografia. Bauru: Unesp, 2014. Disponível em:

http://repositorio.unesp.br/bitstream/handle/11449/118181/000810854.pdf?sequence=1.

Acesso em 30 de outubro de 2015.

BRASIL, Presidência da República. Pesquisa brasileira de mídia 2015: hábitos de

consumo de mídia pela população brasileira. Secretaria de Comunicação Social da

Presidência da República. Brasília: Secom, 2015.

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BUENO, Wilson. Comunicação empresarial: da Rádio Peão às Mídias Sociais. São

Bernardo do Campo: Universidade Metodista de São Paulo, 2014, 239p.

JENKINS, Henry. Cultura da convergência. 1ª reimpressão. São Paulo: Aleph, 2009,

379p.

KOZINETS, Robert. V. Netnografia: Realizando pesquisa etnográfica online. Porto

Alegre: Penso, 2014. 203p.

LÉVY, Pierre. Cibercultura. 3ª edição – 2ª reimpressão. São Paulo: Editora 34, 2014.

PENENBERG, Adam. Viral Loop: como o crescimento viral transformou o Youtube, o

Facebook e Twitter em gigantes e converteu audiência em receita. Rio de Janeiro:

Elsevier, 2010, 238p.

ZAGO, Gabriela da Silva; BASTOS, Marco Toledo. Visibilidade de notícias no Twitter

e no Facebook: análise comparativa das notícias mais repercutidas na Europa e nas

Américas. Brazilian Journalism Research - Volume 9 - Número 1 – 2013. Disponível

em http://tecjor.net/images/5/5f/Marcotoledobastosgabrielazago.pdf. Acesso em 30 de

outubro de 2015.