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PERIÓDICO DO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO DA UNIVERSIDADE DO ESTADO DE MATO GROSSO

PERIÓDICO DO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO … · Dra. Olga Vasquez del Pilar Cruz - Universidad Nacional de Colombia, Bogotá/Colômbia. Dr. Rui Eduardo Trindade Fernandes

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PERIÓDICO DO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO DA UNIVERSIDADE DO ESTADO DE MATO GROSSO

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Editor:Diagramação:Criação de Capa:Capa final:

Maria do Socorro de Sousa AraújoRangel Gomes SacramentoFlora Romanelli Assumpção Rangel Gomes Sacramento

Copyright © 2018 / Unemat EditoraImpresso no Brasil - 2018

UNEMAT EDITORAAv. Tancredo Neves, 1095 - Cavalhada - Cáceres - MT - Brasil - 78200000

Fone/Fax 65 3221 0077 - www.unemat.br/editora - [email protected]

Todos os Direitos Reservados. É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos de autor (Lei n° 5610/98) é crime estabelecido pelo artigo 184 do Código Penal.

Ficha catalográfica elaborada pelo bibliotecário Luiz Kenji Umeno Alencar - CRB1 2037.

Revista da Faculdade de Educação - Periódico do Programa de Pós-Graduaçãoem Educação da Universidade do Estado de Mato Groso/UNEMAT. Coordenação:Maria do Horto Salles Tiellet. Vol. 29, Ano 16, n.1 (jan./jun. 2018)-Cáceres-MT:Unemat Editora.

Semestral 208 p.

ISSN 2178-7476 - Publicação Eletrônica CDU – 37 (05)

CIP - CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO

Universidade do Estado de Mato Grosso - Unemat Editora

PresidenteMembros

Maria do Socorro de Sousa Araújo Ariel Lopes TorresGuilherme Angerames Rodrigues Gustavo Laet RodriguesJosé Ricardo M. T. de Oliveira CarvalhoLuiz Carlos ChieregattoMayra Aparecida CortesNeuza Benedita da Silva ZattarRoberto Vasconcelos PinheiroSandra Mara Alves Silva Neves Severino de Paiva SobrinhoTales Nereu Bogoni

Conselho Editorial

M961

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Indexada em:

LATINDEX - Sistema Regional de Información en Línea para Revistas Cientificas de América Latina, el Caribe, Espanã y Portugal - www.latindex.unam.mx

DRJI - Directory of Research Journals Indexing - http://www.drji.org

Diadorim - Diretório de Políticas de Acesso Aberto das Revistas Científicas Brasileiras - http://dia-dorim.ibict.br

BBE - Bibliografia Brasileira de Educação

Revistas de Livre Acesso - http://www.cnen.gov.br/centro-de-informacoes-nucleares/livre

Solicita-se permuta / Exchange is requested

ISSN 2178-7476 - Publicação Eletrônica

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Revista da Faculdade de Educação

EndereçoUniversidade do Estado de Mato Grosso - UNEMATPrograma de Pós-Graduação em Educação - PPGEduCidade Universitária (Bloco II)Cáceres/MT - Brasil CEP: 78.200-000Fone: + 55 (65) 3223-0728E-mail: [email protected]

Editora ResponsávelDra. Rosely Aparecida Romanelli - UNEMAT, Alto Araguaia/MT, Brasil.

Conselho Editorial Executivo – Executive Editorial board

Dra. Elizeth Gonzaga dos Santos Lima - UNEMAT, Cáceres/MT, Brasil.

Dra. Heloisa Salles Gentil - UNEMAT, Cáceres/MT, Brasil.

Dra. Ilma Ferreira Machado - UNEMAT, Cáceres/MT. Brasil.

Dr. Irton Milanesi - UNEMAT, Cáceres/MT, Brasil.

Dra. Loriége Pessoa Bitencout - UNEMAT, Cáceres/MT, Brasil.

Dra. Maria do Horto Salles Tiellet - UNEMAT, Cáce-res/MT, Brasil

Dra. Marilda de Oliveira Costa - UNEMAT, Cáceres/MT, Brasil.

Conselho Científico - Scientific Council

Dra. Ana Canen - UFRJ, Rio de Janeiro/RJ, Brasil.Dr. Antônio Sampaio da Nóvoa - Universidade de Lisboa, Lisboa/Portugal.Dra. Berenice Corsetti - UNISINOS, São Leopoldo/RS, Brasil. Dra. Celi NelzaZulke Taffarel - UFBA, Salvador/Bahia, Brasil.Dra. Claudia Mosquera Rosero-Labbé - Universidad Nacional de Colombia, Bogotá/Colômbia.Dr. Danilo Romeu Streck - UNISINOS, São Leopoldo/RS, Brasil.Dr. Elizeu Clementino de Souza - UNEB, Salvador/BA, Brasil.Dra. Filomena Maria de Arruda Monteiro - UFMT, Cuiabá/MT, Brasil.Dr. Jackson Ronie Sá da Silva - UEMA, São Luís/MA, Brasil.Dr. João Sebastião - Instituto Universitário de Lisboa, Lisboa/PortugalDr. José Carlos Libâneo -UCG, Goiânia/GO, Brasil.Dr. Lindomal dos Santos Ferreira - UFPA, Altamira/PA. Brasil.Dr. Luiz Carlos de Freitas - UNICAMP, Campinas/SP, Brasil.Dra. Melania Moroz - PUC/SP, São Paulo/SP, Brasil.Dra. Olga Vasquez del Pilar Cruz - Universidad Nacional de Colombia, Bogotá/Colômbia.Dr. Rui Eduardo Trindade Fernandes - Universidade do Porto, Porto/Portugal.Dra. Vera Maria N. de Souza Placco - PUC/SP, São Paulo/SP, Brasil.

Missão e Escopo

A Revista da Faculdade de Educação (Universidade do Estado de Mato Grosso) tem como principal objetivo servir de veículo para a divulgação do conhecimento proveniente de pesquisas e estudos relacionados ao campo da educação. O periódico reúne artigos de diferentes aportes teóricos em sintonia com os debates que ocorrem no meio acadêmico nacional e internacional. A revista é de periodicidade semestral e conta com duas versões, uma impressa (ISSN: 1679-4273) e outra eletrônica (ISSN 2178-7476).

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SUMÁRIO

EDITORIAL ............................................................................................................09

ARTIGOS

O PENSAMENTO CRÍTICO NA EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS:REVISÃO DE ESTUDOS NO ENSINO BÁSICO EM PORTUGAL...................................15Ana Sofia SousaRui Marques Vieira

QUALIDADE DO ENSINO FUNDAMENTAL PRETÉRITO NA PERCEPÇÃO DE ESTUDANTES UNIVERSITÁRIOS ....................................................................................................35Arno Rieder

TRABALHO, HISTÓRIA E SABERES TRADICIONAIS NO TERRITÓRIO CAIPIRA: FUNDA-MENTOS E POSSIBILIDADES NA PERSPECTIVA DA PEDAGOGIA HISTÓRICO-CRÍTICA...63Fábio Fernandes Villela

PERSPECTIVAS DA POLÍTICA DE COTAS COMO FORMA DE DEMOCRATIZAÇÃO PARA A EDUCAÇÃO SUPERIOR EM CAMPINA GRANDE – PB............................................81Juliana Nobrega de Almeida

PROGRAMA DE ASSISTÊNCIA ESTUDANTIL NA UNEMAT: POLÍTICA DE PERMANÊNCIA?......99Elizeth Gonzaga dos Santos LimaFernando Cézar Vieira MalangeValci Aparecida Barbosa

O TRABALHO VOLUNTÁRIO NO PROGRAMA MAIS EDUCAÇÃO E A ORGANIZAÇÃO ESCOLAR EM DUAS ESCOLAS DA REDE PÚBLICA ESTADUAL EM JUÍNA (MT)..........121Marilda de Oliveira CostaEveraldo Dias Matteus

SEXUALIDADE E EDUCAÇÃO: UMA COMPARAÇÃO ENTRE ALUNOS SURDOS E NÃO SURDOS ..............................................................................................................145Victor Hugo de Oliveira Henrique Edna Lopes Hardoim

COMUNICAÇÃO FAMÍLIA E ESCOLA: TENSÕES E DESAFIOS....................................159Rosina Forteski Glidden

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VIOLÊNCIA NA ESCOLA: QUANDO A VÍTIMA É O PROFESSOR................................175Simone Albuquerque da RochaVanderlei Bonoto Cante

RESENHA

PSICOLOGIA E SUAS CONTRIBUIÇÕES À EDUCAÇÃO..............................................197Aline Rejane Caxito Braga Marcos Ferreira Medeiros NORMAS PARA APRESENTAÇÃO DE PRODUÇÕES CIENTÍFICAS ...............................205

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CONTENTS

EEDITOR'S LETTER.................................................................................................09

ARTICLES/PAPERS

CRITICAL THINKING IN SCIENCE EDUCATION: A REVIEW OF STUDIES ON PORTUGAL’S BASIC EDUCATION...................................15Ana Sofia SousaRui Marques Vieira

QUALITY OF PAST FUNDAMENTAL EDUCATION IN THE PERCEPTION OF UNIVERSITY STUDENTS............................................................................................................35Arno Rieder

WORK, HISTORY AND TRADICIONAL KNOWLEDGE IN THE YOKEL TERRITORY: ELEMENTS AND POSSIBILITIES IN THE PERSPECTIVE OF HISTORICAL-CRITICAL PEDAGOGY.........63Fábio Fernandes Villela

QUOTA POLICY PERSPECTIVES AS A FORM OF DEMOCRATIZATION FOR HIGHER EDUCATION IN CAMPINA GRANDE – PB.................................................................81Juliana Nobrega de Almeida

UNEMAT STUDENT ASSISTANCE PROGRAM: PERMANENCE POLICY?...........................99Elizeth Gonzaga dos Santos LimaFernando Cézar Vieira MalangeValci Aparecida Barbosa

VOLUNTARY WORK IN THE MORE EDUCATION PROGRAM AND SCHOOL ORGANI-ZATION IN TWO SCHOOLS OF THE STATE NETWORK IN JUÍNA (MT).....................121Marilda de Oliveira CostaEveraldo Dias Matteus

SEXUALITY AND EDUCATION: A COMPARISON BETWEEN STUDENTS DEAF AND NON DEAF...................................................................................................................145Victor Hugo de Oliveira Henrique Edna Lopes Hardoim

FAMILY-SCHOOL COMMUNICATION: TENSIONS AND CHALLENGES...........................159Rosina Forteski Glidden

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VIOLENCE AT SCHOOL: WHEN THE VICTIM IS THE TEACHER................................175Simone Albuquerque da RochaVanderlei Bonoto Cante

REVIEW

PSYCHOLOGY AND ITS CONTRIBUTIONS TO EDUCATION............................................197Aline Rejane Caxito Braga Marcos Ferreira Medeiros

STANDARDS FOR PRESENTATION OF PAPERS..........................................................205

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EDITORIAL

EDITOR’S LETTER

Prezados leitores,

O Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Estado de Mato Grosso chega ao final do primeiro semestre de 2018, com a publicação do volume 29 do seu periódico – Revista da Faculdade de Educação –, correspondente ao período de janeiro a julho.

Com esta edição, inicia-se uma nova coordenação editorial de nossa revista, periódico do Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade do Estado de Mato Grosso, para o período de quatro anos (2017-2021). Neste número estamos publicando nove artigos e uma resenha que contam com o DOI - Digital Object Identifier, que confere a identificação da propriedade in-telectual dos trabalhos publicados., com a colaboração de sete doutores(as), seis mestres(as), duas doutorandas e um mestrando, vinculados a programas de pesquisa e pós-graduação e grupos de pesquisa, no Brasil e em Portugal.

O primeiro artigo, O Pensamento Crítico na Educação em Ciências: Revisão de Estudos no Ensino Básico em Portugal, traz uma “revisão biblio-gráfica integrativa da investigação sobre o contributo do pensamento crítico para a educação em ciências no ensino básico em Portugal” num recorte que analisa do 1.º ao 9.º ano de escolaridade, de autoria de Ana Sofia Souza e Rui Marques Vieira ambos da Universidade de Aveiro.

O segundo artigo intitula-se Qualidade do Ensino Fundamental Pretérito na Percepção dos Estudantes Universitários, de autoria professsor doutor Arno Rieder, pesquisador e extensionista da Universidade do Estado de Mato Grosso no câmpus de Cáceres, analisa a categoria Qualidade do En-sino Fundamental (QEF) na opinião de estudantes universitários de diversos cursos, sobre a educação recebida pelos mesmos durante sua formação no ensino fundamental.

O terceiro artigo é de autoria do professor doutor Fábio Fernandez Villela, do Departamento de Educação da UNESP/São José do rio Preto e Pro-grama de Pós-Graduação em Docencia da Educação Básica da UNESP/Bauru. Intitulado Trabalho, História e Saberes Tradicionais no Território Caipira: Fundamentos e possibilidades na perspectiva histórico crítica, este artigo aborda a reorganização do trabalho educativo, a partir do projeto de ensino--pesquisa-extensão intitulado: Cultura ambiental no território caipira: história e saberes tradicionais das mulheres do noroeste paulista, a partir da produção

Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 09-11, jan./jun., 2018

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e sistematização de metodologias inovadoras de educação de jovens e adultos (EJA) na educação do campo.

Estes três primeiros artigos foram também publicados na modalidade Ahead of print, ou publicação antecipada, que traz uma versão preliminar dos mesmos para despertar o interesse do leitor para publicações futuras.

O artigo de número quatro traz uma contribuição para o debate sobre as ações afirmativas por meio da efetivação da política de cotas, em Campina Grande - PB, cidade do interior do Nordeste brasileiro. De autoria de Juliana Nóbrega de Almeida, doutoranda em Geografia pela Universidade Federal de Pernambuco e professora da Secretaria de Educação do Estado da Paraíba e que também faz parte do Grupo de Pesquisa Educação Geográfica, Cultura Escolar e Inovação – GPECI e do Laboratório de Ensino de Geografia e Profissionalização Docente – LEGEP da UFPE.

O quinto artigo, Programa de Assistência Estudantil na UNEMAT: Política de Permanência? é de autoria de Elizeth Lima, doutora em Educação, Fernando Malange, doutor em Engenharia Elétrica, ambos docentes da insti-tuição, e Valci A. Barbosa, mestre em Educação e profissional técnica de ensino superior, também na Unemat. Trata-se do relato de pesquisa sobre a política de assistência estudantil e da discussão sobre sua possível configuração como ação que influencie a permanência e melhoria na apredizagem.

O Trabalho Voluntário no Programa mais Educação e a Organização Escolar em duas escolas da Rede Estadual em Juína (MT) é o sexto artigo desta edição, de autoria da professora doutora Marilda Costa e de Everaldo Dias, mestre em educação e profissional da SEDUC. O texto problematiza a atuação dos monitores voluntários desse programa, seu perfil e condições e relações de trabalho que se estabelecem na materialização da proposta. Trata-se de uma pesquisa desenvolvida no PPGEdu-UNEMAT.

Como sétimo artigo apresenta uma pesquisa na temática inclusiva: Sexualidade e Educaçõa: uma comparação entre alunos surdos e não surdos. De autoria do mestre Victor Hugo de Oliveira Enrique e da professora doutora Edna Lopes Hardoim, que objetivaram conhecer a concepção de sexualidade desses jovens, por meio de entrevistas semi-estruturadas aplicadas aos alunos de 3º ano do ensino médio

Em seguida, o artigo de número oito traz um debate sobre os en-contros e desencontros na relação família-escola. O texto de Rosina Forteski Glidden, mestra e doutoranda em Educação pelo PPGE-UFPR, psicóloga e professora do Departamento de Psicologia da Fameg Uniasselvi, vinculada à Universidade Federal do Paraná, intitula-se Comunicação Família e Escola: Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 09-11, jan./jun., 2018

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tensões e desafios e aponta caminhos para a articulação de uma relação menos verticalizada entre a escola e a família.

O nono e último artigo dessa edição, Violência na Escola: quando a vítima é o professor, escrito pela professora doutora Simone Albuquerque da Rocha, docente da UFMT e pelo mestre Vanderlei Bonoto Cante, corregedor geral do Corpo de Bombeiros de Mato Grosso, discute e busca a compreensão das várias formas de violência, em especial, aquela que vitimiza os professores no espaço escolar e seus reflexos na carreira docente.

Finalmente, na Seção Resenha, destaca-se o trabalho da doutora em Psicologia e docente de Faculdade do Pantanal Aline Rejane Caxito Braga e do Psicólogo e mestrando em Educação pelo PPGEdu-UNEMAT Marcos Ferreira Medeiros. Trata-se da resenha do livro Introdução à psicologia da educação: seis abordagens, organizado por Kester Carrara e publicado em São Paulo pela Avercamp, em 2004. A obra traz seis capítulos que descrevem seis diferentes abordagens da psicologia e como cada uma delas contribui para a prática docente.

Enfim, com essa apresentação sucinta do material publicado no Vol. 29, convidamos os leitores a lerem os escritos que tiverem despertado interesse e curiosidade. Agradecemos a todos os pareceristas dos textos ava-liados neste primeiro semestre de 2018, e, em especial, aos autores que nos confiaram seus escritos.

Desejamos a todos uma boa leitura.

Rosely Aparecida RomanelliEditora da Revista da FAED/UNEMAT

Cáceres-MT, jun. de 2018.

Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 09-11, jan./jun., 2018

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ARTIGOSARTICLES/PAPERS

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O PENSAMENTO CRÍTICO NA EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS: REVISÃO DE ESTUDOS NO ENSINO BÁSICO EM PORTUGAL

CRITICAL THINKING IN SCIENCE EDUCATION: A REVIEW OF STUDIES ON PORTUGAL’S BASIC EDUCATION

Ana Sofia Sousa1

Rui Marques Vieira2

RESUMO: O presente artigo apresenta uma revisão bibliográfica integrativa da investigação sobre o contributo do pensamento crítico para a educação em ciências no ensino básico em Portugal (1.º ao 9.º ano de escolaridade). Os obje-tivos definidos visam, por um lado, analisar as investigações realizadas sobre o desenvolvimento de capacidades de pensamento crítico nos alunos e, por outro, refletir sobre as necessárias mudanças nas práticas pedagógicas e didáticas para que a escola possa responder aos exigentes desafios das sociedades atuais. Os resultados e as conclusões evidenciam a eficácia da implementação de atividades intencionais e sistemáticas dirigidas à promoção do pensamento crítico para a formação integral dos alunos.

PALAVRAS-CHAVE: Pensamento Crítico. Educação em Ciências. Ensino Básico. Revisão integrativa da investigação em Portugal.

RESUME: En este trabajo se presenta una revisión integrativa de la literatura de la investigación sobre la contribución del pensamiento crítico a la educación científica en la enseñanza básica en Portugal (1.º al 9.º año de escolaridad). Los objetivos definidos persiguen, por un lado, analizar las investigaciones realizadas sobre el desarrollo de capacidades de pensamiento crítico en los alumnos y, por otro, reflexionar sobre los cambios necesarios en las prácticas pedagógicas y didácticas para que la escuela pueda responder a los exigentes desafíos de las sociedades actuales. Los resultados y las conclusiones evidencian la eficacia de la

1 Mestrado em Ensino do 1.º e 2.º ciclos do ensino básico, doutoranda no Programa Doutoral em Educação da Universidade de Aveiro, Aveiro, Portugal. [email protected] Doutoramento em Didática, docente na Universidade de Aveiro, Aveiro, Portugal. [email protected].

Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 15-33, jan./jun., 2018 (Epub Ahead of Print 15. abr., 2018)

DOI/10.30681/21787476.2018.29.1533

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implementación de actividades intencionales y sistemáticas dirigidas a la promo-ción del pensamiento crítico en la formación integral de los alumnos.

PALABRAS CLAVE: Pensamiento Crítico. Educación en Ciencias. Enseñanza Básica. Revisión integrativa de la investigación en Portugal.

ABSTRACT: The article presents an integrative bibliographical review of the research on the contribution of critical thinking to science education on basic education in Portugal. The objectives defined pretend to analyse the research carried out on the development of critical thinking skills in students and, on the other hand, reflect on the necessary changes in pedagogical practices so that school can respond to the demanding challenges of today’s societies. The results and conclusions sustain the effectiveness of the implementation of intentional and systematic activities directed to the promotion of critical thinking aiming the integral formation of the students.

KEYWORDS: Critical Thinking. Science Education. Basic Education. Integrative review of the scientific research in Portugal.

Introdução

A evolução da Ciência e o veloz desenvolvimento da Tecnologia al-teraram o mundo físico em que vivemos e a interação entre os cidadãos, mas também muitas das conceções existentes sobre o ser humano e das sociedades em que estes se inserem. Apesar da sua importância na realidade contempo-rânea face às novas questões que exigem soluções científicas e tecnológicas inovadoras, os resultados do último relatório “Public perceptions of science, research and innovation” (COMISSÃO EUROPEIA, 2014) refletem a indiferença generalizada dos cidadãos. Efetivamente, este documento indica que apenas 28% da população portuguesa se declara informada e interessada em Ciência e Tecnologia.

A Educação em Ciências assume-se como domínio central para a mudança deste panorama, tanto na construção de conhecimentos científicos úteis como no desenvolvimento de competências transversais que possibili-tem aos indivíduos responder, de modo crítico e informado, a estes reptos atuais. As orientações pedagógicas da organização curricular da Educação em Ciências, de que é exemplo o programa de Ciências Naturais do 2.º ciclo do ensino básico em vigor, indicam que a mesma deve promover “o conhecimen-Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 15-33, jan./jun., 2018 (Epub Ahead of Print 15. abr., 2018)

SOUSA, A. S.; VIEIRA, R. M.

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to e compreensão (…) da maneira científica de olhar o Mundo” e fomentar o desenvolvimento do aluno por meio de “um pensar criativo e de um espírito curioso e crítico (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, 1990, p. 185). De igual modo, a Lei de Bases do Sistema Educativo de Portugal remete para a relevância da promoção de capacidades de pensamento na consagração do direito a uma educação que viabilize “o desenvolvimento (…) de capacidades de raciocínio, memória e espírito crítico” (LEI N.º 46/86, art.º 7, p. 3069). Estas diretrizes impelem a escola a estimular o pensamento reflexivo e crítico dos estudantes, ao longo de todos os ciclos de ensino.

A ação educativa orientada para a promoção do pensamento crí-tico (PC) tem sido um foco de investigação e de discussão pública por parte de educadores e investigadores apreensivos quanto à aparente ausência de um ensino promotor do desenvolvimento de capacidades de pensamento. O presente estudo insere-se no enquadramento descrito e espera, em pri-meiro lugar, promover a reflexão sobre a importância do PC na Educação em Ciências (EC). Em simultâneo, pretende analisar os resultados obtidos pelos estudos desenvolvidos ao longo da última década e sintetizar o conhecimento emergente nesta área. Numa outra perspetiva, visa também contribuir para perspetivar os rumos da investigação futura e fomentar a divulgação do valor da EC e da relevância educacional da promoção do PC. Por fim, e em parti-cular, deseja encorajar a adoção, por professores, de estratégias e atividades promotoras do PC no âmbito da EC. Esta motivação deve-se ao facto de a EC contextualizada e significativa se revestir de um crescente reconhecimento nas sociedades atuais que cada vez mais valorizam o conhecimento. Outro aspeto importante diz respeito ao acesso exponencial à informação científica e tec-nológica nos dias de hoje que requer maiores capacidades cognitivas e novas competências de aprendizagem. A cultura científica e tecnológica apresenta-se, assim, como um princípio vetor da ação educativa, não apenas na formação de especialistas, mas também na de cidadãos cientificamente cultos que possam avaliar criticamente e intervir com consciência social e opiniões informadas (AFONSO, 2008; CACHAPUZ; PRAIA; JORGE, 2002; GALVÃO; REIS; FREIRE; OLI-VEIRA, 2006;). Nesta conformidade, parece existir hoje, um consenso acerca da necessidade de equacionar e de reformular a EC de modo a elevar a sua qualidade e possibilitar que os alunos se encontrem aptos a construir conheci-mentos científicos e tecnológicos úteis e funcionais. Deste modo, estimula-se a compreensão da ciência e do pensamento científico e incita-se ao desenvolvi-mento de capacidades de pensamento que lhes permitam contribuir, de modo crítico, esclarecido e produtivo, para a resolução de situações problemáticas

Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 15-33, jan./jun., 2018 (Epub Ahead of Print 15. abr., 2018)

SOUSA, A. S.; VIEIRA, R. M.

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sócio-científicas (HODSON, 2009; MARTINS et al., 2007; OSBORNE, 2010). No entanto, e para que tal se torne uma realidade, é necessário a implementação de estratégias de ensino/aprendizagem e de atividades contextualizadas nas vivências reais dos alunos de modo a torná-las apelativas e interessantes. Estas devem colocar em evidência os processos de construção do conhecimento e estimular a utilização e o desenvolvimento de capacidades de pensamento, particularmente as de PC (VIEIRA; TENREIRO-VIEIRA, 2016).

O pensamento crítico e a sua relevância educacional

Ao longo das últimas décadas têm surgido diversos referenciais teó-ricos sobre o Pensamento Crítico, com origem em diversos autores e áreas do conhecimento como a filosofia ou a psicologia. Sobressaem, entre estes refe-renciais, algumas conceções como a de Robert Ennis (2011, p.1) que o define como “(…) uma forma de pensamento racional e reflexivo, focado em decidir no que acreditar ou o que fazer”. Por sua vez, Lipman (1988, p.39), descreve o PC como “(…) skilful, responsible thinking” considerando que este facilita o julgamento por se apoiar em critérios com caráter autocorretivo e permeáveis à especificidade do contexto. Este autor acrescenta, assim, a possibilidade de ajuste e adaptação ao longo do processo de tomada de decisão face às condi-cionantes e influências a que a este se encontra sujeito. No ponto de vista de Fasko (2003), o PC consiste numa investigação cujo propósito é explorar um problema com o objetivo de se obter uma resposta devidamente justificada por se basear na análise lógica de toda a informação disponível. Outra postura, a de Halpern (2003), evidencia o uso de capacidades cognitivas como condição para a obtenção dos resultados desejáveis. Esta autora, que valoriza não só o resultado obtido como também o próprio processo, defende que são a inten-cionalidade e a racionalidade envolvidas que permitem o julgamento racional que conduz à resolução de problemas e/ou à tomada de decisão (idem, 2003).

Mais do que destacar uma definição de PC entre as demais, que aliás se complementam, importa considerar a suas valias educacionais em virtude de o pensamento racional e analítico em qualquer área do conhecimento constituir um objetivo primordial da Educação (BAILIN, 2002). Com base nas conceções apresentadas, depreende-se a emergência de ensinar os alunos a pensarem de forma mais questionadora e reflexiva. Deste modo, favorece-se o desenvolvimento de capacidades de pensamento cruciais que possibilitam o julgamento, a conceptualização e uma melhor compreensão do conhecimento e da sua utilidade social. Instigar o pensamento dos alunos com o objetivo de Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 15-33, jan./jun., 2018 (Epub Ahead of Print 15. abr., 2018)

SOUSA, A. S.; VIEIRA, R. M.

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promover discussões críticas e a tomada de posições esclarecidas e respon-sáveis sobre as implicações da Ciência e da Tecnologia na vida das sociedades contemporâneas é, pois, uma responsabilidade dos sistemas educativos (TEN-REIRO-VIEIRA; VIEIRA, 2013; TSAI et al., 2013). Por estas razões, assume-se como inadiável a implementação, desde cedo, de práticas didático-pedagógi-cas sistemáticas orientadas para a promoção de capacidades de pensamento nos alunos. Não obstante, a literatura revela que as estratégias e os recursos didáticos utilizados, na maior parte das salas de aula de Ciências, não fomen-tam, por norma, a construção de conhecimento científico significativo nem a formação para uma cidadania democrática, racional e crítica (AFONSO, 2008; BONITO, 2012; TENREIRO-VIEIRA, 2004; VIEIRA; MARTINS, 2004). De modo a contribuir para a mudança desta realidade, Swartz e McGuinness (2014) identificaram os princípios que devem ser adotados para promover o PC, com sucesso, nos alunos:

• Ensinar, de forma explícita, estratégias de pensamento e pro-cedimentos de transferência destas para outros contextos (ex. profissionais, sociais, …);

• Lançar desafios que estimulem o pensamento dos estudantes para questões e problemas que os envolvam, os levem a expor o seu raciocínio e, também, a assumirem a responsabilidade pelas suas ações e pelas consequências das mesmas;

• Incentivar os alunos a raciocinarem colaborativamente, com lógi-ca, no sentido de promover a formação conjunta de significados;

• Incitar a adoção de uma perspetiva metacognitiva forte que cla-rifique o pensamento dos alunos para melhorar a sua compreen-são sobre o mesmo e sobre a diversidade de ações e estratégias mentais passíveis de serem utilizadas.

Os princípios descritos são, no entanto, considerados de difícil exe-cução e como um verdadeiro desafio porque, na generalidade, os professores desconhecem o conceito e como este pode ser incitado e aferido (PAUL; ELDER; BARTELL, 1995; VIEIRA; TENREIRO-VIEIRA, 2003). Neste enquadramento, e sendo a prática uma condição necessária para o desenvolvimento de qualquer capacidade, é premente apoiar os docentes, não só na área da formação de professores, mas também na conceção de estratégias e recursos didáticos para os diferentes níveis de ensino. Como parte integrante dessa resposta, a investigação em Educação tem visado aprimorar as inter-relações entre estas dimensões, no intuito de divulgar os resultados obtidos e os benefícios do PC nas aprendizagens e na formação dos estudantes (TENREIRO-VIEIRA; VIEIRA,

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2014). Sendo a EC um contexto privilegiado para a promoção de capacidades de PC (TENREIRO-VIEIRA, 2014; TSAI et al., 2013), disponibilizou-se na página online da Universidade de Aveiro (http://redepensamentocritico.web.ua.pt) um conjunto de propostas para o ensino básico, com resultados comprovados pela investigação realizada em Portugal.

A investigação realizada ao longo das últimas décadas sobre os benefí-cios do PC na formação integral dos alunos, de que são exemplo os estudos alvo desta revisão bibliográfica integrativa, indicam inequivocamente a necessidade de se promover, desde cedo, o desenvolvimento destas capacidades. Com esta finalidade, urge tornar a promoção do PC parte integrante, consciente e sistemática da formação e das práticas didático-pedagógicas dos professores, dos métodos de trabalho dos estudantes e do dia-a-dia da população em geral, com vista à sua inserção racional e com sucesso numa sociedade tecnológica cada vez mais diversificada que se quer regida por princípios democráticos humanistas de respeito, justiça e igualdade.

Metodologia

Neste estudo, optámos por um desenho de investigação qualitativo num formato descritivo analítico do tipo revisão integrativa. Numa breve in-cursão pelo conceito e propósito da revisão integrativa da literatura, importa salientar que este é, por definição, um método que tem como finalidade re-sumir o passado da literatura empírica e sintetizar os resultados obtidos por pesquisas relevantes sobre um tema comum a vários estudos (COUTINHO, 2011) e, nesta situação concreta, suportar a tomada de decisão e contribuir para a melhoria das práticas pedagógico-didáticas.

A denominação desta revisão tem origem no propósito de integração de ideias, conceitos e opiniões provenientes das várias investigações, indepen-dentemente do paradigma metodológico ou do design de estudo adotados pelas mesmas (WHITTEMORE; KNAFL, 2005). Esta é, tal como as restantes categorias de revisões da literatura existentes, cada vez mais valorizada por responder à necessidade de se determinar o “estado de arte” nas diferentes áreas disciplinares. Este tipo de revisão desempenha também um papel impor-tante na compreensão mais abrangente do fenómeno particular estudado, no desenvolvimento de teorias com vista à construção de conhecimento científi-co e na definição da investigação e da prática futuras (SURI, 1999). A revisão integrativa permite ainda aos interessados um acesso rápido a um número

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considerável de investigações realizadas agilizando, deste modo, a divulgação do conhecimento científico.

Para este efeito, a elaboração de uma revisão integrativa relevante assenta, regra geral, no cumprimento de algumas etapas distintas: a definição da finalidade, dos objetivos e da estratégia de pesquisa; a compilação e a se-leção dos estudos segundo critérios definidos; a categorização e a síntese dos resultados de cada estudo; a análise crítica e a interpretação dos resultados dos estudos; e por fim, a apresentação dos resultados obtidos (COUTINHO, 2008; FILHO et al., 2014). Com base nas etapas de trabalho enumeradas, pri-meiramente, estabelecemos a finalidade deste estudo: sintetizar e definir o status atual da investigação sobre o contributo do PC na Educação, ao longo dos últimos dez anos em Portugal e determinámos os seus objetivos: i) retratar a investigação nacional; ii) compilar o conhecimento científico dela resultante; e iii) divulgar o mesmo de forma a impulsionar o reconhecimento da relevân-cia do PC na EC no Ensino Básico. Seguidamente, avançámos para a seleção documental recorrendo à estratégia de compilação dos estudos pertinentes para esta investigação ilustrada na Figura 1.

Figura 1 - Fluxograma do processo de identificação e seleção do corpus documental

Sele

ção

dos e

stud

os

Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (RCAAP) e repositórios digitais das instituições de ensino

superior que possuem centros de investigação em Educação: Escola Superior de Educação de Lisboa, Instituto Politécnico

de Bragança e Universidades (Católica, Aveiro, Évora, Lisboa, Trás os Montes e Alto Douro, Algarve, Minho, Porto

e Nova de Lisboa). Iden

tifica

ção

dos e

stud

os

48 estudos

inserção da palavra-chave

Bases de dados Pensamento Crítico

identificou

foram analisados segundo

Promoção explícita do PC na Educação em Ciências do Ensino Básico (1.º ao 9.º ano) Envolvimento ativo dos alunos Disponibilidade online Publicação entre 2007 e 2017

constituiu-se o

corpus documental para a revisão integrativa (20 estudos)

Critérios

Inclusão Exclusão

de

Duplicação nas bases de dados Outras áreas disciplinares (ex.

Matemática, Línguas, …) Outros níveis de ensino

(Secundário e Superior) Indisponibilidade de livre acesso

online

devido a

28 estudos excluídos

Fonte: Elaborada pelos autores, adaptação de “Prima 2009 Flow Diagram”3

3 Disponível em: <http://www.prisma-statement.org/PRISMAStatement/FlowDiagram>. Acesso em 27 mar. 2018.

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Relativamente ao estudo do corpus documental recorremos, essen-cialmente, à técnica de análise do conteúdo tendo a primeira aproximação consistido numa comparação da informação presente nos estudos com vista à sua organização e sistematização. Segundo procedimentos sistemáticos e objetivos, criámos as categorias e subcategorias de análise relacionadas com as dimensões identificadas, nomeadamente, o contexto, de que são exemplos o tipo de documento ou a instituição de origem dos estudos e as orientações metodológicas das investigações, tais como a finalidade, o design ou o quadro teórico de PC adotados, entre outras. Estas opções permitiram-nos sintetizar o conteúdo documental e rever integrativamente os dados recolhidos. Inserimos toda essa informação numa base de dados no programa informático Microsoft Access (MS Access 2016) com dois objetivos interdependentes: por um lado, identificar a autoria e o contexto em que foram desenvolvidos os estudos e, por outro lado, evidenciar e associar os dados metodológicos comuns que os caraterizavam, uma vez que constatámos uma aparente homogeneidade nos propósitos dos mesmos.

Resultados

De acordo com o procedimento metodológico descrito, verificámos que na distribuição dos estudos por instituição de origem das publicações, a Universidade de Aveiro, com 16 investigações, era a instituição de ensino supe-rior com maior representação. Duas das investigações foram desenvolvidas na Universidade de Lisboa e as restantes duas no Instituto Politécnico de Lisboa (Escola Superior de Educação). Relativamente à distribuição de documentos por ano, 2014, com 5 documentos, destacou-se como o ano com maior número de produções publicadas.

No que concerne à distribuição relativamente ao paradigma de investigação adotado, notámos uma prevalência significativa de estudos de paradigma de investigação sócio crítico (12 estudos). Por esse motivo, o design “Investigação-ação” sobressaiu em 65% do número de estudos analisados. O design do “tipo” Quase Experimental encontra-se representado por 15% das investigações enquanto que o de Investigação & Desenvolvimento e o de Estudo de Caso correspondem, cada um, a 10% do corpus documental.

Na análise à disposição das investigações pelos diferentes anos de escolaridade, aferimos que 24% dos estudos envolveu alunos do 6.º ano. Verificámos também a participação de igual percentagem de turmas dos 1.º e 3.º anos (19%). Apurámos, ainda, o envolvimento de turmas dos 2.º e 4.º Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 15-33, jan./jun., 2018 (Epub Ahead of Print 15. abr., 2018)

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anos em cada uma das quais incidem 14% dos estudos. Os restantes anos de escolaridade (5.º, 7.º e 8.º) foram foco de somente um estudo, cada. Não foi identificada nenhuma investigação pensada para o 9.º ano de escolaridade. Devido ao facto de as turmas serem mistas, 2 dos estudos abrangeram mais do que um ano de escolaridade, nomeadamente um 1.º e um 2.º ano e, numa outra investigação, um 1.º e um 3.º ano. A média de participantes por inves-tigação foi de aproximadamente 33 alunos.

Os estudos examinados recorreram a múltiplos instrumentos e fontes na recolha de dados surgindo a análise de conteúdo como o principal forma-to adotado por 16 dos 20 estudos. Seguiram-se o inquérito e os métodos de observação tendo cada um destes sido eleito por 14 investigações. De modo menos frequente (4 estudos), os autores recorreram, para além destes, a outros instrumentos e fontes de dados como registos vídeo e/ou de áudio ou a escalas e grelhas de avaliação. Reportamos o facto de todos os estudos analisados nesta revisão terem recorrido à definição operacional do PC de Ennis (1994) que se traduz na taxonomia com o seu nome. Esta unanimidade justifica-se, aparentemente, por ser uma concetualização que sustenta e garante o apelo às capacidades de PC nas intervenções realizadas, o que reforça a convicção de que os “referenciais utilizados com base no quadro concetual de PC, proposto por Ennis, têm-se revelado eficazes no desenvolvimento de recursos educativos, de atividades de aprendizagem e de estratégias de ensino incitativos do PC” (VIEIRA; TENREIRO-VIEIRA, 2014, p.52).

Apresentamos, agora, os resultados obtidos pelas investigações que integram este estudo e que representam indicadores vitais neste processo de revisão integrativa. É importante evidenciar que o caráter único na exposição dos resultados de cada estudo, em conjunto com a multidimensionalidade das diferentes finalidades apresentadas, dispersou e dificultou a análise e a apre-sentação dos efeitos obtidos. Nesta conformidade, optámos pela elaboração de um quadro síntese relativo às evidências, de mobilização/desenvolvimento de capacidades de PC e de construção de conhecimento científico pelos alunos, identificadas pelos investigadores dos estudos analisados.

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Quadro 1- Quadro síntese do planeamento principal adotado e dos resultados dos estudos analisados

Autoria (Ano de publicação) e

Instituição de origem do estudo

Planeamento principal adotado

Resultados dos estudos relativos às evidências de

desenvolvimento / mobilização de

capacidades de PC

construção de conhecimento

científicoAscenso, N. (2015)

Instituto Politécnico Lisboa

Investigação-ação • -

Brites, B. (2014)Universidade de

AveiroInvestigação-ação • •

Fulgêncio, A. (2012)Universidade de

AveiroInvestigação-ação • •

Pereira, C. (2012)Universidade de

AveiroInvestigação-ação • •

Moreira, L. (2008)Universidade de

Aveiro

Investigação & Desenvolvimento • -

Lemos, N. (2014)Universidade de

AveiroInvestigação-ação • •

Carneiro, F. (2014)Universidade de

AveiroInvestigação-ação • •

Castro, P. (2014)Universidade de

AveiroEstudo de caso • -

Costa, A. (2007)Universidade de

Aveiro

Quase-experimental • -

Fartura, S. (2007)Universidade de

AveiroEstudo de caso • -

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Gonçalves, E. (2013)Universidade de

AveiroInvestigação-ação • -

Martins, R. (2014)Universidade de

AveiroInvestigação-ação • -

Miranda, R. (2009)Universidade de

LisboaInvestigação-ação • -

Oliveira, M. (2011)Universidade de

Aveiro

Investigação & Desenvolvimento • •

Pinto, I. (2011)Instituto Politécnico

Lisboa

Quase-experimental • -

Sanches, M. (2009)Universidade de

Lisboa

Quase-experimental • -

Silva, M. (2013)Universidade de

AveiroInvestigação-ação • •

Teixeira, M. (2013)Universidade de

AveiroInvestigação-ação • •

Mendes, A. (2015)Universidade de

AveiroInvestigação-ação • •

Resende, V. (2015)Universidade de

AveiroInvestigação-ação • •

Fonte: Elaborada pelos autores a partir do corpus documental

Existem estudos, como, a título exemplificativo, o de Mendes (2017), que referem a existência de dificuldades, por alguns alunos, na realização das atividades propostas. É igualmente referido o facto de a mobilização de capa-cidades de PC não ter sido evidenciada de forma igual por todos os estudantes (RESENDE, 2017). Estas investigadoras sugerem que estes resultados poderão

Rev. Fac. Educ. (Univ. do Esta Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 15-33, jan./jun., 2018 (Epub

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ter sido condicionados pela heterogeneidade cognitiva dos alunos envolvidos e/ou pela diversidade de conhecimento científico destes relativo às temáticas abordadas.

No que diz respeito ao foco curricular das áreas disciplinares de Ci-ências, os estudos realizados no contexto do 1.º Ciclo do Ensino Básico (CEB) incidiram sobre as temáticas “Água”, “Ar”, “Seres vivos”, “Astros” “Luz”, “Mag-netismo”, “Mecânica”, “Meteorologia” e “Igualdade de género”. No 2.º CEB, as propostas promotoras do desenvolvimento de PC focaram-se nos domínios “Trocas nutricionais entre o organismo e o meio”, “Transmissão de vida” e “Agressões do meio e integridade do organismo”. As sugestões de atividades destinadas ao 3.º CEB reportaram-se a dois temas: “Terra em Transformação” e “Propriedades e aplicações da Luz”.

De forma a promover capacidades de PC ao longo do estudo das temáticas enumeradas, os investigadores recorreram a diversas estratégias e atividades didáticas como, a título ilustrativo, atividades experimentais (ex. prever e avaliar resultados), o que levou a que alguns investigadores conce-bessem guiões de trabalho para os alunos. Outras estratégias utilizadas dizem respeito à aprendizagem baseada em problemas de resolução aberta e ao questionamento focado na construção do conhecimento e orientado para a mobilização explícita de capacidades de pensamento (ex. solicitar o resumo de uma situação ou a sumarização de várias ideias veiculadas, pedir a clarificação de um ponto de vista). Também o debate, quando devidamente preparado em torno de questões controversas e quando baseado no apelo e no ensino explícito de estratégias de pensamento (ex. análise da fonte ou credibilidade de uma informação ou que argumentos poderiam apresentar com o intuito de mudar a opinião de um colega, …) e na tomada de posição fundamentada, é outro dos exemplos de estratégias de mobilização de capacidades de PC utilizados nestas investigações, de acordo com cada nível de ensino, que são indicadas pela literatura de referência (Nieto & Saiz, 2011; Phan, 2010; Swartz & McGuinness, 2014; Vieira & Tenreiro-Vieira, 2016). No entanto, importa sa-lientar que nenhuma estratégia/atividade poderá desenvolver o PC nos alunos se a sua implementação não for intencional, estruturada e sistemática, levada a cabo por professores devidamente formados para o efeito e se os alunos não forem encorajados a desenvolverem uma postura aberta, inquisidora e crítica em relação ao mundo em que vivem (Vieira & Tenreiro, 2016).

Em síntese, afigura-se-nos relevante e interessante perspetivar alguns aspetos destes resultados que se destacaram:

• A eficácia das estratégias de ensino/aprendizagem e das ativida-Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 15-33, jan./jun., 2018 (Epub Ahead of Print 15. abr., 2018)

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des e recursos didáticos especificamente utilizados para a pro-moção do nível de PC dos alunos envolvidos que se refletiu em ganhos, bastante significativos, em praticamente todas as inves-tigações. Estes resultados confirmam os estudos anteriormente realizados, tais como, a título ilustrativo, os de Tenreiro-Vieira e Vieira (2014) e os de Gonçalves e Vieira (2015).

• O contributo dos recursos pedagógicos promotores do PC para a construção do conhecimento científico e para a desejável for-mação integral do aluno. Os resultados apresentados espelham os obtidos por outros autores como Phan (2010), Nieto e Saiz (2011), Tsai et al. (2013), Tenreiro-Vieira (2014).

• A conceção e implementação de uma alargada diversidade de es-tratégias e atividades didáticas orientadas para a promoção do PC. Estes estudos disponibilizam propostas concretas de estratégias de ensino/aprendizagem e de recursos didáticos que contemplam alguns dos domínios presentes nas orientações curriculares das Ciências no Ensino Básico.

• O entusiasmo e o interesse geral revelado pelos alunos parti-cipantes face às propostas de atividades/recursos didáticos, já identificados por outros autores como, por exemplo, Tenreiro--Vieira e Vieira (2012).

• A necessidade de se conceberem manuais escolares com o pro-pósito de desenvolver as capacidades de pensamento nos alunos, devido à sua ainda manifesta influência na ação didática.

• O interesse crescente pela investigação com vista à promoção do PC na EC reflete a perspetiva do valor deste ideal de educação apresentado por autores, como Facione (2010), Phan (2010) ou Vieira e Tenreiro-Vieira (2016), entre outros.

• As dificuldades manifestadas pelos alunos na realização das ativi-dades, orientadas para a promoção do PC. Esta situação poderá, provavelmente, entre outros fatores, justificar-se pela ausência de ações sustentadas anteriores que apelassem ao desenvolvi-mento das mesmas.

Neste enquadramento, parece-nos possível afirmar que se verificam evidências significativas do desenvolvimento do PC e da construção de conhe-cimento científico relevante para os alunos quando se recorre a estratégias e atividades didáticas explicitamente concebidas para o efeito.

Em suma, este estudo sistemático permitiu-nos conhecer o estado Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 15-33, jan./jun., 2018 (Epub Ahead of Print 15. abr., 2018)

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atual da investigação acerca da promoção do PC na EC em Portugal e evidenciar os pressupostos e o conhecimento desenvolvidos pelos estudos anteriormente realizados. Numa primeira análise, e dada a autoria e a natureza das investiga-ções examinadas sobressaíram, de imediato, dois aspetos: i) a aparente inexis-tência de investigação sobre o PC na quase totalidade do território português, surgindo apenas estudos publicados e desenvolvidos em Aveiro e Lisboa; e ii) a provável influência dos currículos dos cursos de formação de professores na divulgação desta conceção pedagógica. Os investigadores optaram por um plano de investigação de “Investigação-ação”, em mais de metade dos estu-dos, e pela recolha de dados de natureza qualitativa. Estas opções poderão dever-se, na nossa opinião, ao facto de estes investigadores se encontrarem a realizar estágios como professores e aproveitarem esses contextos educativos para concretizarem a sua primeira experiência de investigação. Um aspeto final identificado reporta-se à aparente ausência de difusão dos resultados e do conhecimento existente sobre a promoção das capacidades do PC. Esta situação é agravada pelo facto de estes estudos, para além de escassos, se encontrarem agregados a trabalhos do foro académico, o que, regra geral, não promove a sua desejável repercussão nas atuais práticas e estratégias de ensino/aprendizagem.

Considerações Finais

Constatada a necessidade de mudança, assumimos também o pro-pósito de agregar os recursos educativos criados e adaptados à realidade pedagógica existente nas escolas portuguesas e de os disponibilizar numa base de dados digital de fácil acesso por todos os interessados nesta temática. Esta encontra-se disponível para consulta, como referido, na página online http://redepensamentocritico.web.ua.pt. Respondemos deste modo, a um dos objetivos definidos inicialmente, esperando que esta organização ajude a ultrapassar alguns dos constrangimentos mencionados por professores e crie oportunidades de utilização desse conjunto de ferramentas didáticas na promoção do PC.

Os argumentos e as proposições relativos à relevância do desenvol-vimento do PC na Educação em Ciências, apresentados na literatura de refe-rência, aparentam ser fortemente reforçados pela investigação mais recente representada pelos documentos que constituem o corpus do presente estudo. Pelo exposto, as conclusões desta revisão integrativa permitem-nos considerar o forte impacto do desenvolvimento das capacidades de PC na formação destes

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alunos, que serão, certamente, e se estas continuarem a ser intencionalmen-te promovidas, futuros cidadãos melhor preparados para uma vida ativa de aprendizagem contínua numa sociedade tecnológica em constante e rápida mudança. Para tal, o conhecimento científico resultante desta investigação deve constituir-se como objeto de reflexão não apenas para os professores, mas para todos os responsáveis pela elaboração de políticas educativas, dos currículos disciplinares e das entidades intervenientes na conceção de recursos didáticos envolvidos no processo ensino/aprendizagem. Consideramos, pois, que as estratégias de ensino/aprendizagem e os recursos disponibilizados pela investigação analisada neste estudo e aqui resumidamente apresentadas, constituem contributos relevantes para a consciencialização da comunidade educativa sobre os benefícios da implementação sistemática, consciente e intencional do ensino do PC na EC.

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Data de recebimento: 05.01.2018Data de aceite: 03.04.2018

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QUALIDADE DO ENSINO FUNDAMENTAL PRETÉRITO NA PERCEPÇÃO DE ESTUDANTES UNIVERSITÁRIOS

QUALITY OF PAST FUNDAMENTAL EDUCATION IN THE PERCEPTION OF UNIVERSITY STUDENTS

Arno Rieder1

RESUMO: O ensino de boa qualidade revela bom rendimento escolar para a maioria dos estudantes. Analisou-se a Qualidade do Ensino Fundamental (QEF) percebida por estudantes universitários. Os dados da pesquisa são de opinião sobre a QEF outrora recebida [fraca, média, boa e excelente] por alunos da UNEMAT de Agronomia, Biologia e Enfermagem, no período de 2013 a 2016. As respostas (%) são curso-dependentes (α=5%) apenas em 2013 e no total; e ano-dependen-tes só em Enfermagem. Nos cursos, as QEF diferenciaram-se: [média (41-54%) > boa (24-31%) ≥ fraca (17-32%) > excelente (<3,5%)]. Cada categoria foi similar entre os anos (fraca: 24,24%; média: 45,88%; boa: 27,16%; excelente: 2,70%). A QEF “insatisfatória” (fraca + média: 70,13%) foi distinta e 2,34 vezes maior que a “satisfatória” (bom + excelente: 29,86%), embora elas tenham sido similares entre cursos e entre anos. Não foi observada melhoria na QEF percebida pelos opinantes, nos cursos e no tempo.

PALAVRAS-CHAVE: Agronomia, Biologia, Enfermagem, categorias qualitativas.

ABSTRACT: Good quality teaching is indicative of good school performance for most students. The objective of the present study was to assess the “Quality of Primary Education” - (QPE) received by university students. The data of the survey consist of opinions about the QPE received (w-weak, a-average, g-good, e-excel-lent) by undergraduate students of Agronomy, Biology and Nursing at UNEMAT (State University of Mato Grosso), reported between 2013-2016. The results show course-dependent responses (%) [α=5%] only in 2013 and in total answers; and year-dependent only responses in Nursing. For the degree programs, QPE differed [a (41-54%)> g (24-31%) ≥ w (17-32%)> e (<3.5%)]. Each category was similar be-tween years (w: 24.24%, a: 45.88%, g: 27.16%, e: 2.70%). “Unsatisfactory” QPE

1 Dr./Pós.Doc, Professor-Pesquisador-Extensionísta, Universidade do Estado de Mato Grosso(UNEMAT), Campus Universitário de Cáceres, Mato Grosso, Brasil. [email protected]

DOI/10.30681/21787476.2018.29.3561

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(w + a: 70.13%) was distinct and 2.34 times higher than “satisfactory” QPE (g + e: 29.86%), although similar between degree programs and between years. There is no evidence of improvement in QPE as perceived by the respondents over time.

KEYWORDS: Agronomy, Biology, Nursing, qualitative categories.

Introdução

O tema da pesquisa aqui apresentado revela percepções de estu-dantes universitários sobre a qualidade do ensino fundamental que lhes foi proporcionado.

Uma das principais motivações para este estudo foi a necessidade de identificar e entender quais fatores interferem significativamente no de-sempenho acadêmico do estudante universitário, em especial nas disciplinas de estatística, bioestatística e afins. Supõe-se que um desses fatores seja a “qualidade de ensino prévio”.

O opinante foi estimulado a refletir e se manifestar sobre a qualidade do ensino que lhe foi ofertado, com base na função efetiva deste em atender às demandas dos níveis seguintes de escolaridade, com ênfase na educação matemática. As opções oferecidas para suas percepções estão apresentadas adiante.

As revelações deste estudo subsidiarão análises e discussões para revisão e aprimoramento de políticas educacionais, aprimoramento de projetos didático-pedagógicos e de realimentação de todo o sistema educacional, com o propósito de alcançar ganhos qualitativos efetivos progressivos.

Considerações básicas

Educação tem, conceitualmente, variadas definições, geralmente con-vergentes em sua essência. Conforme Calleja (2008), o indivíduo está no centro da ação educativa, cujo processo visa transformá-lo e capacitá-lo para que venha interagir (adequadamente nas relações que estabelecer) no ambiente.

A educação visa desenvolver as pessoas da sociedade de modo integral, consciente, eficiente e eficaz, valorizando conteúdos adquiridos, vinculando e aplicando-os com e no seu cotidiano (na sua vida), com base no processo educativo assimilado (CALLEJA, 2008).

Paulo Freire, conforme Costa (2015) apresenta duas definições de

RIEDER, A.

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educação: a geral, na qual a educação é uma concepção filosófico-científica que trata do conhecimento colocado em prática; e a específica, definida pela concepção freireana, em que conhecimento é um processo social gerado da ação-reflexão transformadora das pessoas sobre a realidade. A definição espe-cífica de educação é um processo constante de criação do conhecimento e de busca da transformação-reinvenção da realidade pela ação-reflexão humana; na visão freireana, existe a educação dominadora e a educação libertadora: a primeira apenas descreve a realidade e transfere conhecimento; e a segunda é o ato de criação do conhecimento e de métodos de ação-reflexão para a transformação da realidade.

Qualidade do ensino e suas percepções

Conforme Abramowicz (2016), a qualidade de ensino pode ser medi-da (visão tecnicista); vincula-se às finalidades e aos conteúdos (é política); e é criada pelo homem, qualitativamente analisada, com relevância e significado, sendo contextualizada por determinantes sociopolíticas, econômicas e cul-turais (dimensão histórica), cuja avaliação fornece subsídios à sua melhoria e aperfeiçoamento (formal e política). A avaliação, no espaço escolar, deseja a melhoria da qualidade de ensino em processo participativo, estimulando a formação crítica, criativa e dinâmica a partir de conteúdos significativos e inte-grados. Tudo isso em busca da arte de bem viver e da promoção do bem-estar humano, levando a uma sociedade mais democrática, solidária, livre e justa.

Conforme Ribeiro Neto (1981), o ensino de boa qualidade é aquele ca-paz de proporcionar elevado rendimento escolar para a maioria dos estudantes.

Em 1993, no Plano Decenal da Educação Brasileira, foi estabelecido que uma escola de qualidade deve promover a cidadania e assegurar a cada aluno a aquisição organizada de conhecimentos básicos demandados pelos avanços necessários na ciência e tecnologia do mundo contemporâneo (BRA-SIL, 1993).

Com relação à qualidade do ensino, é necessário estabelecer extremos presumíveis e a graduação entre estes, fazendo corresponder valores, catego-rias ou atributos que atendam às situações teoricamente possíveis. Entretanto, os conceitos de algo qualificado nominalmente desde excelente até péssimo são relativos. Assim, uma educação de boa qualidade pode ser concebida diferentemente entre pessoas, entre grupos ou instituições, conforme seus valores, crenças e interesses.

O ideal seria estabelecer procedimentos que pudessem representar

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objetivamente a realidade visada. Infelizmente não é uma tarefa fácil, a não ser quando os interesses são bem delimitados ou específicos. Essa dificuldade é decorrente dos múltiplos fatores ou variáveis envolvidas no processo de en-sino-aprendizagem, em seus resultados educativos e, ainda, com importâncias individualmente diferenciadas.

Contudo, há procedimentos mais subjetivos que podem ser usados quando retratam conceitos que reflitam a percepção do beneficiário da edu-cação em relação àquilo que este esperava dela para sua vida. Aí surgem pro-posições de o beneficiário enquadrar a qualidade do ensino que recebeu como “fraca”, “média”, “boa” e “excelente” ou, ainda, em “insatisfatória” (“fraca” + “média”) e “satisfatória” (“boa” + “excelente”). Desse modo, o beneficiário, individualmente, expressa sua avaliação real em relação ao ideal, ou seja, o que o ensino podia ter lhe proporcionado em relação àquilo que efetivamente lhe foi oferecido. Esse formato admite ser analisado coletivamente, permitindo verificar o grau de satisfação ou de frustração de um grupo ou de gerações humanas. Silva et al. (2013) apresentam uma métrica avaliativa em quatro categorias (Baixo, <40%; Razoável, 40-50%; Bom, 50-80%; Excelente, ≥ 80%), a qual se assemelha à comentada anteriormente.

Aoki (2016), objetivando obter a opinião do aluno sobre sua aplicação e trajetória escolar no Ensino Básico, oferece quatro alternativas de respostas fechadas: ( ) Insatisfatória; ( ) Razoável; ( ) Satisfatória; ( ) Plenamente Satis-fatória.

A qualidade de ensino pode variar no tempo e entre povos, culturas, países, assim como entre regiões e localidades de um mesmo país. Pode variar ainda entre escolas, entre cursos e entre turmas, em função da dinamicidade das condições interferentes e prévias do capital que impregnou o aluno.

Para diagnosticar a qualidade de ensino, suas oscilações e neces-sidade de aprimoramento, são necessárias avaliações periódicas. Uma das justificativas para o Exame Nacional de Cursos (ENC), referidas por Augusto (2007), enfatiza que a ausência de comparabilidade de provas ao longo do tempo compromete a capacidade de comparar cursos em suas evoluções, seja nos sucessos, insucessos e perspectivas.

A qualidade do ensino, em qualquer nível, deve ser a melhor possível e fazer parte das prioridades educacionais, pois produzirá nos alunos, em geral, efeitos qualitativamente equivalentes. Ensino medíocre oferecido a alunos, provavelmente, não desenvolverá os melhores potenciais dessas pessoas.

A Lei 9.394 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional − LDBEN), de 20 de novembro de 1996, apresenta cinco incisos no artigo 9º, que tratam

RIEDER, A.

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de avaliação e acreditação, em que propõe avaliar o rendimento escolar em todos os níveis, cujos resultados nortearão o estabelecimento de prioridades para a melhoria da qualidade do ensino (BRASIL, 1996).

A busca permanente da melhoria da qualidade de ensino deve ser meta nos propósitos das ações educacionais, pois disso depende a real pos-sibilidade da construção efetiva de um futuro melhor para o cidadão e para a coletividade com a qual tem compromissos e atua. Logo, a perspectiva de um futuro melhor para a sociedade é dependente da qualidade do ensino ofertado aos estudantes. Em concordância com Miranda (2017), o nível de desempenho atingido por estudantes universitários pode refletir sua história escolar.

De acordo com Mesquita (2009), faz-se necessária a aproximação de várias concepções para se entender o que é qualidade de ensino e como alcançar bons resultados, pois, se de um lado a escola necessita de insumos indispensáveis ao seu bom funcionamento, de outro, precisa de profissionais valorizados, motivados e engajados.

Conforme Paixão (2010), falar em qualidade de ensino superior gera embate entre as diversas correntes deste nível de ensino no Brasil. No entanto, essa qualidade pode ser mensurada por órgãos públicos, pela própria insti-tuição de ensino e, ainda, pela apreciação crítica dos egressos de seus cursos. A qualidade do ensino oferecida em determinado curso deve ser aferida em vários momentos e por vários instrumentos.

Para avaliar a qualidade, é necessário definir indicadores a serem usados. Segundo Mesquita (2009), estabelecida a função da escola e o que dela se espera de boa qualidade, definem-se os indicadores de qualidade do ensino.

Um desses indicadores pode ser a manifestação dos alunos ou de seus egressos sobre a qualidade de ensino que receberam em relação àquilo que esperavam.

A avaliação da qualidade do ensino pode utilizar-se de vários mode-los. Um deles pode partir do próprio aluno, diante de sua percepção e de seus fundamentos. É discutível, porém válido, e contribui para os que precisam de subsídios à promoção da melhoria ou manutenção de níveis altos de qualidade.

Fatores que afetam a qualidade de ensino

A qualidade do ensino é afetada por múltiplos fatores, englobando todos os atores, estruturas e condições envolvidas. Podem ser classificados em extraescolares e escolares. Conforme Mesquita (2009), alguns estudos indica-ram que fatores extraescolares, como diferenças socioeconômicas e culturais

RIEDER, A.

Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 35-61, jan./jun., 2018 (Epub Ahead of Print 29 ago., 2018)

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entre alunos, podem ser responsáveis por diferenças em seu desempenho escolar; nesses casos, pouco adiantaria melhorar a distribuição dos investimen-tos em educação. Contudo, outras pesquisas referidas por Mesquita (2009), com metodologias bem definidas para verificar o efeito de fatores internos, foram desenvolvidas e conseguiram revelar interferências múltiplas, como: lideranças, enfoque no aprendizado, cultura escolar positiva, expectativas altas, responsabilidades, direito dos estudantes, monitoramento de progres-sos, capacitação de pessoal na própria escola e envolvimento dos pais, etc. A lista dos fatores intraescolares que influenciam o sucesso da escola é longa, podendo ser diversa entre escolas e entre gerações e turmas.

O presente trabalho resulta de pesquisas desenvolvidas na Universida-de do Estado de Mato Grosso (UNEMAT), almejando saber como os estudantes universitários (1 campus; 3 cursos: Agronomia, Biologia, Enfermagem; 4 anos: 2013 a 2016; com 8 turmas) qualificam o Ensino Fundamental que receberam outrora. Os resultados subsidiam reflexões no sentido de propiciar aprimora-mento de políticas e ações nos vários níveis da educação escolar.

Objetivos

Geral: Conhecer as proporções de respostas dadas a uma pesquisa sobre a Qualidade do Ensino Fundamental (QEF) outrora ofertado e usufruído pelos respondentes universitários de três cursos do Campus de Cáceres, da Universidade do Estado de Mato Grosso (Agronomia, Biologia e Enfermagem; quadriênio 2013-16), segundo suas próprias percepções.

Específicos:

a. Verificar se as proporções da QEF são curso-dependentes ou ano-dependentes (tempo-dependentes).

b. Comparar as proporções na QEF apontadas pelos respondentes:b.1. No geral;b.2. Nos cursos e entre estes; eb.3. Nos anos de um quadriênio e entre estes.

c. Averiguar tendências de mudanças nas proporções da QEF no tempo e nos cursos aferidos.

RIEDER, A.

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Materiais e Métodos

O estudo foi realizado em três cursos superiores de graduação (Agro-nomia, Biologia e Enfermagem), no Campus Universitário “Jane Vanini”, da Universidade do Estado de Mato Grosso (UNEMAT), Cáceres, Mato Grosso, Brasil, junto a oito turmas de alunos matriculados nas disciplinas Estatística e Bioestatística, de oferta semestral, no quadriênio 2013, 2014, 2015 e 2016.

Para a coleta de dados, foi utilizado um formulário previamente elaborado, explicado para esclarecimentos e para livre adesão dos sujeitos da pesquisa: alunos presentes no seu primeiro dia de aula nas disciplinas Esta-tística (Agronomia) e Bioestatística (Biologia e Enfermagem), os quais foram denominados de respondentes. Definida essa fase, os instrumentos de coleta foram distribuídos entre os estudantes para responderem perguntas referentes à aplicação de conhecimentos de matemática próprios do ensino fundamental, como soma, subtração, multiplicação de números inteiros e de fracionários e regras de três (proporções e porcentagens). Foram orientados para respon-der aquelas das quais se sentiam seguros do domínio, e, para aquelas de que não se sentiam seguros, deveriam informar isso e anotar, para fins de revisão desses temas. Esta fase foi para criar um ambiente reflexivo mais adequado para responder à questão básica deste trabalho. Depois de tentarem respon-der às questões de verificação desses domínios, foi-lhes solicitado responder como havia sido a qualidade do Ensino Fundamental outrora ofertado a eles. A pergunta apresentada foi:

“Como consideras sua formação escolar no Ensino Fundamental: ( ) fraca, ( ) média, ( ) boa, ( ) excelente”?

Os alunos (respondentes) foram instruídos a marcar, com um x, a alternativa que melhor mostrasse, diante de sua percepção avaliativa atual, o que aquela fase da educação básica lhe proporcionou. Adicionalmente, fo-ram instruídos que podiam também optar por não responder às alternativas oferecidas. Aoki (2016) e Silva et al. (2013), em seus estudos educacionais, também adotam um modelo similar de questionamento e opções de resposta.

As qualificações dadas ao seu Ensino Fundamental (QEF) foram ana-lisadas segundo os cursos (Agronomia, Biologia e Enfermagem) e o quadriênio (2013, 2014, 2015 e 2016) dos respondentes.

Foram analisadas as distribuições da proporção das respostas para as alternativas oferecidas (QEF: “fraca”, “média”, “boa”, “excelente”). A fim de verificar hipóteses de nulidade e significâncias, aplicaram-se os testes de Qui-quadrado (comparação de frequências) e ANOVA, testes F e de Duncan

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(comparação de médias). O limite de significância considerado foi de p < 0,05 ou 5%, ao contrastar diferenças entre grupos analisados.

Para aplicação do teste Qui-quadrado, têm-se as frequências obser-vadas (Fo) nos grupos analíticos. Inicialmente estavam disponíveis 753 res-pondentes, mas 20 deles não responderam ao formulário aplicado, restando efetivamente, para fins analíticos, 730 respondentes, distribuídos conforme segue: por curso: Agronomia = 211, Biologia = 212, Enfermagem = 307; e por ano: 2013 = 250, 2014 = 185, 2015 = 154, 2016 = 141.

Para o teste de Duncan, efetuaram-se previamente a ANOVA (Análise de Variância e F), tendo-se, para fins analíticos, 730 respondentes, quatro QEFs, três cursos, quatro anos com oito turmas (semestrais: duas por ano).

Resultados e Discussões

Em conformidade com Miranda (2017), a qualidade do ensino fun-damental é um dos fatores principais para um satisfatório rendimento nas disciplinas universitárias.

Os resultados da pesquisa encontram-se nas tabelas 1 a 6, estando ilustrados resumidamente nas figuras 1 a 4.

RIEDER, A.

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Frequências de manifestações sobre a Qualidade do Ensino Fundamental

Anos versus cursos (Tab. 1)

Tabela 1 - Anos vs Cursos: Qualidade do Ensino Fundamental (f = fraco, m = médio, b = bom, e = excelente) preteritamente ofertado a atuais estudantes universitários respondentes, matriculados nas disciplinas Estatística e Bioestatística, nos cursos de Agronomia, Biologia e Enfermagem, Campus de Cáceres, Universidade do Estado de Mato Grosso (UNEMAT), no quadriênio 2013-2016.

Ano Questão Qualificações Tipos deFrequência

CursosTotal

Agronomia Biologia Enfermagem

2013

Q19

-a-Q

ualifi

caçã

o do

seu

ensin

o fu

ndam

enta

l

f-fraco

Observada em n° e

( % )16 (18,0%) 23 (29,1%) 11 (13,4%) 50 (20,0%)

Esperada 17,8 15,8 16,4 50,0

m-médio

Observada em n° e

( %)48 (53,9%) 32 (40,5%) 33 (40,2%) 113 (45,2%)

Esperada 40,2 35,7 37,1 113,0

b-bom

Observada em n° e

(% )21 (23,6%) 22 (27,8%) 37 (45,1%) 80 (32,0%)

Esperada 28,5 25,3 26,2 80,0

e-excelente

Observada em n° e

( % )4 (4,5%) 2 (2,5%) 1 (1,2%) 7 (2,8%)

Esperada 2,5 2,2 2,3 7,0

TotalObservada

em n° e ( % )

89 (35,6%) 79 (31,6%) 82 (32,8%) 250 (100,0%)

RIEDER, A.

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2014

Q19

-a-Q

ualifi

caçã

o do

seu

ensin

o fu

ndam

enta

l

f-fracoObservada

em n° e ( % )

5 (15,2%) 14 (27,5%) 31 (30,7%) 50 (27,0%)

Esperada 8,9 13,8 27,3 50,0

m-médio

Observada em n° e

( % )20 (60,6%) 22 (43,1%) 38 (37,6%) 80 (43,2%)

Esperada 14,3 22,1 43,7 80,0

b-bom

Observada em n° e

( % )8 (24,2% 12 (23,5%) 29 (28,7%) 49 (26,5%)

Esperada 8,7 13,5 26,8 49,0

e-excelente

Observada em n° e

( % )0 (0,0%) 3 (5,9%) 3 (3,0%) 6 (3,2%)

Esperada 1,1 1,7 3,3 6,0

TotalObservada

em n° e ( % )

33 (17,8%) 51 (27,6%) 101 (54,6%) 185 (100,0%)

2015

Q19

-a-Q

ualifi

caçã

o do

seu

ensin

o fu

ndam

enta

l

f-fracoObservada

em n° e ( % )

10 (23,3%) 13 (28,9%) 14 (21,2%) 37 (24,0%)

Esperada 10,3 10,8 15,9 37,0

m-médio

Observada em n° e

( % )23 (53,5%) 18 (40,0%) 34 (51,5%) 75 (48,7%)

Esperada 20,9 21,9 32,1 75,0

b-bom

Observada em n° e

( % )10 (23,3%) 12 (26,7%) 15 (22,7%) 37 (24,0%)

Esperada 10,3 10,8 15,9 37,0

e-excelente

Observada em n° e

( % )0 (0,0%) 2 (4,4%) 3 (4,5%) 5 (3,2%)

Esperada 1,4 1,5 2,1 5,0

TotalObservada

em n° e ( % )

43 (27,9%) 45 (29,2%) 66 42,9%) 154 (100,0%)

RIEDER, A.

Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 35-61, jan./jun., 2018 (Epub Ahead of Print 29 ago., 2018)

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45

2016

Q19

-a-Q

ualifi

caçã

o do

seu

ensin

o fu

ndam

enta

l f-fracoObservada

em n° e ( % )

8 (17,4%) 15 (40,5%) 18 (31,0%) 41 (29,1%)

Esperada 13,4 10,8 16,9 41,0

m-médio

Observada em n° e

( % )23 (50,0%) 13 (35,1%) 24 (41,4%) 60 (42,6%)

Esperada 19,6 15,7 24,7 60,0

b-bom

Observada em n° e

( % )13 (28,3%) 7 (18,9%) 15 (25,9%) 35 (24,8%)

Esperada 11,4 9,2 14,4 35,0

e-excelente

Observada em n° e

( % )2 (4,3%) 2 (5,4%) 1 (1,7%) 5 (3,5%)

Esperada 1,6 1,3 2,1 5,0

TotalObservada

em n° e ( % )

46 (32,6%) 37 (26,2%) 58 (41,1%) 141 (100,0%)

Total

Q19

-a-Q

ualifi

caçã

o do

seu

ensin

o fu

ndam

enta

l

f-fraco

Observada em n° e

( % )39 (18,5%) 65 (30,7%) 74 (24,1%) 178 (24,4%)

Esperado 51,4 51,7 74,9 178,0% sobre o

total 5,3% 8,9% 10,1% 24,4%

m-médio

Observada em n° e

( % )114 (54,0%) 85 (40,1%) 129 (42,0%) 328 (44,9%)

Esperado 94,8 95,3 137,9 328,0% sobre o

total 15,6% 11,6% 17,7% 44,9%

b-bom

Observada em n° e

( % )52 (24,6%) 53 (25,0%) 96 (31,3%) 201 (27,5%)

Esperado 58,1 58,4 84,5 201,0% sobre o

total 7,1% 7,3% 13,2% 27,5%

e-excelente

Observada em n° e

( % )6 (2,8%) 9 (4,2%) 8 (2,6%) 23 (3,2%)

Esperado 6,6 6,7 9,7 23,0% sobre o

total 0,8% 1,2% 1,1% 3,2%

TotalObservada

em n° e ( % )

211 (28,9%) 212 (29,0%) 307 (42,1%) 730 (100,0%)

Obs.: Significância para o teste Qui-quadrado independência: anos 2013 (n=250, GL=6; p ≤0,014), 2014 (n=185, GL=6; p≤0,247),

2015(n=154, GL=6; p ≤0,703), 2016(n=141, GL=6; p ≤0,344); Total (n=730, GL=6; p ≤0,014). Fonte: Elaborado por RIEDER, Arno.

RIEDER, A.

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Cursos versus Anos (Tab.2)

Tabela 2 - Cursos vs Anos: Qualidade do Ensino Básico Fundamental (f = fraco, m = médio, b = bom, e = excelente) preteritamente ofertado a atuais estudantes universitários respondentes, matriculados nas disciplinas Estatística e Bioestatística, nos cursos de Agronomia, Biologia e Enfermagem, Campus de Cáceres, Universidade do Estado de Mato Grosso (UNEMAT), no quadriênio 2013-2016.

RIEDER, A.

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Obs.: Significância para o teste Qui-quadrado independência: cursos de Agronomia (n=211, GL=9; p >0,845), Biologia (n=212,

GL=9; p>0,930), Enfermagem (n=307, GL=9; p =0,034), Total (n=730, GL=9; p >0,654). Fonte: Elaborado por RIEDER, Arno.

Cursos e anos-dependência das frequências nas qualificações atribuídas ao Ensino Fundamental (QEF)

Dependência QEF vs Cursos

As proporções das quatro QEFs vs três cursos mostraram-se curso-de-pendentes (p<0,05; GL=6)) apenas no ano 2013 e no total (Tabela 1), variando

RIEDER, A.

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significativamente com os cursos em 2013 e no total, mas não nos demais anos.Em 2013, as maiores diferenças entre frequências observadas (Fo) e

esperadas (Fe) foram verificadas no curso de Enfermagem na QEF “bom” [se esperava (Fe=26,2) bem menos que o observado (Fo=37)] e em Biologia na QEF “fraca” [se esperava (Fe=15,8) também menos que o observado (Fo=23)]. As explicações para essas diferenças podem ser múltiplas, porém uma delas pode ser atribuída ao grau de seletividade no ingresso na educação superior dos es-tudantes: na Enfermagem a concorrência foi maior que em Biologia. Supõe-se então que em cursos mais concorridos as vagas tenham sido preenchidas por mais alunos que tiveram um ensino fundamental de melhor qualidade que aqueles que ingressaram em cursos menos concorridos.

No total, na QEF “fraca” as maiores diferenças entre as frequências ocorreram na Agronomia (Fo=39; Fe=51,4) e Biologia (Fo=65; Fe=51,7) e, na QEF “média”, em Agronomia (Fo=114; Fe=94,8). A concorrência no ingresso dos estudantes pode ter exercido uma seletividade diferenciada naquela ocasião, com relação à QEF ofertada no passado aos respondentes. Embora o autoconceito nas QEFs possa se diferenciar devido a certas características do respondente, um estudo português de Magalhaes et al. (2003) sobre au-toconceito de competência encontrou diferenciações em função do gênero e dos níveis de escolaridade e socioeconômico.

Dependência QEF vs Anos

As proporções das quatro QEF vs anos mostraram-se ano-dependen-tes (p < 0,05; GL=9)) apenas no curso de Enfermagem (Tabela 2). Isso significa que as proporções nas QEFs variaram significativamente apenas nesse curso, mas não nos demais.

Em Enfermagem, as maiores diferenças entre frequências observadas (Fo) e esperadas (Fe) ocorreram no ano de 2013 na QEF “bom” [se esperava (Fe=25,6) bem menos que o observado (Fo=37)] e na QEF “fraca” [se espe-rava (Fe=19,8) mais que o observado (Fo=11)]. Essas diferenças entre QEFs, no mesmo ano, reforçam a hipótese do efeito do maior grau de seletividade no ingresso na educação superior dos estudantes: na Enfermagem havia mais respondentes que qualificaram seu Ensino Fundamental como “bom” que o esperado e menos com qualificação “fraca” que o esperado.

RIEDER, A.

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Médias das indicações (%) nas Qualificações atribuídas ao Ensino Fundamen-tal (QEF -“fraca”, “média”, “boa”, “excelente”)

As tabelas 3 e 4 apresentam resultados das porcentagens de indica-

ções nas QEFs que também estão ilustradas resumidamente na figura 1 e 2.As Quatro Qualificações nos Cursos (Tab. 3, Fig, 1)

Tabela 3 - Indicações (%) (média ± erro-padrão da média) nas Qualificações do Ensino Fundamental (QEF), manifestadas por estudantes de três cursos de graduação (Agronomia, Biologia e Enfermagem), Campus Jane Vanini de Cáceres, Universidade do Estado de Mato Grosso (UNEMAT), período 2013-2016.

QEFCursos

TotalAgronomia Biologia Enfermagem

% de indicações (média ± erro-padrão da média)

Fraca 17,89 ± 3,10 Bc

31,10 ± 3,70 Ab

23,74 ± 3,67 ABb 24,24 ± 2,23 b

Média 53,85 ± 2,72 Aa

41,02 ± 1,93 Ba

42,77 ± 2,21 Ba 45,88 ± 1,74 a

Boa 26,24 ± 3,37 Ab

24,37 ± 3,20 Ab

30,88 ± 3,48 Ab 27,16 ± 1,93 b

Excelente 2,01 ± 1,02 Ad

3,49 ± 3,27 Ac

2,59 ± 0,87 Ac 2,70 ± 0,57 c

Total (n° respondentes) 211 212 307 730

Fonte: Elaborado por RIEDER, Arno. Obs.: em cada QEF, letras maiúsculas comparam significância (5%) das diferenças entre médias dos cursos, e letras minúsculas comparam as diferenças das médias entre as QEFs de cada curso. Na mesma direção e sentido da comparação, letras iguais informam não haver diferenças significantes entre elas, enquanto as letras distintas confirmam haver diferenças significantes entre as

comparadas.

RIEDER, A.

Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 35-61, jan./jun., 2018 (Epub Ahead of Print 29 ago., 2018)

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Figura 1 - Indicações (% média), nas categorias de Qualidade do Ensino Fundamental (QEF), manifestadas por estudantes de três cursos de graduação (Agronomia, Biologia, Enfermagem), Campus Jane Vanini de Cáceres, Universidade do Estado de Mato Grosso (UNEMAT), Quadriênio 2013-2016

Fonte: Elaborado por RIEDER, Arno, 2018.

Indicações nos cursos

Conforme tabela 3, os estudantes, nos três cursos focados, apre-sentaram porcentagens distintas entre as respectivas QEFs. As QEFs “média”, “boa” e “excelente” foram, nesta mesma ordem, as que apresentaram a maior, a segunda maior e a menor porcentagem de indicação nos três cursos. Entre-tanto, a QEF “fraca”, na Biologia e na Enfermagem, apresentaram porcentagens similares às da QEF “boa”; enquanto na Agronomia, a QEF “fraca” foi distinta e menor que a QEF “boa”.

Os resultados indicam que é necessário, em geral, melhorar a qualida-de do Ensino Fundamental. Contudo, esses resultados podem ter discrepâncias nas concepções e/ou na efetiva qualidade do Ensino Fundamental outrora ofertado a respondentes destes cursos.

Indicações entre cursos e no total

As QEFs “média” e “excelente” foram, respectivamente, a mais e menos indicadas, nos três cursos e também no total (45,88% e 2,70%). O percentual mais elevado na QEF “fraca” ocorreu em Biologia (31,10% A) em comparação

RIEDER, A.

Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 35-61, jan./jun., 2018 (Epub Ahead of Print 29 ago., 2018)

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à Agronomia (17,89% B); o valor da Enfermagem (23,74% AB) foi intermediá-rio, não se diferenciando daqueles outros dois cursos. Os percentuais da QEF “média” foram os maiores, com valores semelhantes entre Biologia (41,02% B) e Enfermagem (42,77% B), porém estes foram menores que na Agronomia (53,85% A). A QEF “excelente” foi indicada poucas vezes (< 3,5%) e não se di-ferenciou entre cursos. A QEF “boa” também não se diferenciou entre cursos, mas foi a segunda mais referida (27,16%). Há muito a ser feito para melhorar o Ensino Fundamental, no sentido de alcançar mais excelência neste nível educacional. Efetivamente, há diferenças de concepções qualitativas, cujas causas necessitam de aprofundamento desses estudos. Para Palazzo e Gomes (2012), diferenças entre cursos podem refletir, em parte, a estratificação social.

As Quatro Qualificações no Tempo (2013 a 2016) (Tab. 4, Fig, 2)

Tabela 4 - Indicações (%) (média ± erro-padrão da média) nas Qualificações do Ensino Fundamental (QEF) dado outrora a atuais universitários matriculados nas disciplinas de Estatística e Bioestatística, dos cursos de Agronomia, Biologia e Enfermagem, Campus Jane Vanini de Cáceres, Universidade do Estado de Mato Grosso (UNEMAT), quadriênio 2013-2016.

QEF

Anos (Quadriênio)Total

2013 2014 2015 2016% de indicações (média ± erro-padrão da média)

Fraca 19,27 ± 3,06 Ac

24,88 ± 5,02 Ab

22,86 ± 4,28 Ab

29,97 ± 5,21 Ab 24,24 ± 2,23 b

Média 45,98 ± 3,34 Aa

46,98 ± 4,87 Aa

48,33 ± 2,73 Aa

42,23 ± 3,03 Aa 45,88 ± 1,74 a

Boa 32,11 ± 4,59 Ab

25,86 ± 1,63 Ab

25,82 ± 4,16 Ab

24,85 ± 4,61 Ab 27,16 ± 1,93 b

Excelente 2,62 ± 0,88 Ad

2,27 ± 1,44 Ac

2,97 ± 0,99 Ac

2,93 ± 1,49 Ac 2,70 ± 0,57 c

Total (n°respond.) 250 185 154 141 730

Fonte: Elaborado por RIEDER, Arno. Obs.: em cada QEF, letras maiúsculas comparam significância (5%) das diferenças entre médias dos anos, e letras minúsculas comparam as diferenças das médias entre as QEFs de cada ano. Na mesma direção e sentido da comparação, letras iguais informam não haver diferenças significantes entre elas, enquanto as letras distintas confirmam haver diferenças significantes entre as comparadas.

RIEDER, A.

Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 35-61, jan./jun., 2018 (Epub Ahead of Print 29 ago., 2018)

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Figura 2 - Indicações (% média) no tempo, nas categorias de Qualidade do Ensino Fundamental (QEF) ofertado outrora a atuais universitários nas disciplinas de Estatística e Bioestatística (cursos de Agronomia, Biologia, Enfermagem) Campus Jane Vanini de Cáceres, Universidade do Estado de Mato Grosso (UNEMAT), Quadriênio 2013-2017. Fonte: Elaborado por Rieder, Arno, 2018.

Fonte: Elaborado por RIEDER, Arno, 2018.

Indicações nos quatro anos avaliados

Os estudantes apresentaram porcentagens distintas entre as respec-tivas QEFs. Apenas no ano de 2013 (19,27% c) a QEF “fraca” ficou na penúl-tima posição de indicação; nos demais, ela foi a segunda mais citada, junto com a QEF “boa”, que assim se expressou em todos os quatro anos (27,16% b). Menções de Gonçalves (2013) salientam que é importante os alunos, ao mudarem de escola, levarem consigo uma percepção positiva de si e das suas experiências escolares. As QEFs “média”, “boa” e “excelente” foram, nesta mesma ordem, as que apresentaram a maior (45,88% a), a segunda maior (27,16%b) e a menor (<2,97%) indicação nos quatro anos. As diferenças en-tre as proporções de indicações nas QEFs se confirmaram em cada ano e no quadriênio, com predominância das situações “insatisfatórias” (= “fraca” + “média”), qualitativamente.

RIEDER, A.

Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 35-61, jan./jun., 2018 (Epub Ahead of Print 29 ago., 2018)

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Indicações entre anos e no total

As quatro Qualificações do Ensino Fundamental (QEF) tiveram indica-ção de percentuais distintos entre si, mas cada uma com valores semelhantes entre anos. As QEFs “fraca (24,24%), “média” (45,88%), “boa” (27,16%) e “excelente” (2,70%) não apresentaram, cada uma, valores distintos nos quatro anos analisados. As QEFs “média” e “excelente” foram, respectivamente, a mais e menos indicadas, nos quatro anos e também no total (45,88%; 2,70%). Essa situação mantém inalterada, no tempo, a distribuição qualitativa do Ensino Fundamental. No geral, o Ensino Fundamental, qualitativamente, se manteve estável no período outrora ofertado, tendo em vista as manifestações a respeito (2013, 2014, 2015 e 2016) dos universitários respondentes. Para possibilitar avaliação comparada no tempo e no espaço, o Brasil participa (como convidado, desde o ano 2000) do programa internacional Program for International Student Assessment (PISA), que avalia a cada três anos o desempenho de alunos na faixa dos 15 anos, cuja ação tem como uma das finalidades produzir indicadores sobre a efetividade dos sistemas educacionais (BRASIL, 2007). Os resultados históricos confirmam a manutenção de baixos níveis de desempenho, princi-palmente em Matemática, embora tenha havido aumento de 21 pontos entre 2003 e 2015 e queda de 11 pontos de 2012 para 2015 (OECD, 2016).

Satisfatoriedade: agrupamento, em pares, das Qualificações do Ensino Funda-mental (QEF): “fraca + média” (insatisfatória); “boa + excelente” (satisfatória).

Os resultados estão apresentados na Tabela 5 e 6 e, também ilustrados resumidamente nas figuras 3 e 4.

Satisfatoriedade nos Cursos (Tab. 5, Fig. 3)

Tabela 5 - Indicações (%) (média ± erro-padrão da média) de agrupamento em duas Qualificações do Ensino Fundamental (QEF) por estudantes de três cursos de graduação (Agronomia, Biologia e Enfermagem), Campus Jane Vanini de Cáceres, Universidade do Estado de Mato Grosso (UNEMAT), no período 2013-2016.

CursosTotal

QEF Agronomia Biologia Enfermagem% de indicações (média ± erro-padrão da média)

Fraca +Média (Insatisfatória)

71,74 ± 3,08 Aa

72,13 ± 3,52 Aa

66,52 ± 3,35 Aa 70,13 ± 1,91 a

RIEDER, A.

Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 35-61, jan./jun., 2018 (Epub Ahead of Print 29 ago., 2018)

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Boa + Excelente (Satisfatória)

28,25 ± 3,08 Ab

27,86 ± 3,52 Ab

33,47 ± 3,35 Ab 29,86 ± 1,91 b

Total (n° respondentes) 211 212 307 730

Fonte: Elaborado por RIEDER, Arno. Obs.: em cada agrupamento de QEF, letras maiúsculas comparam significância (5%) das diferenças entre médias dos cursos, e letras minúsculas comparam as diferenças das médias entre os agrupamentos de QEF de cada curso. Na direção e sentido da comparação, letras iguais informam não haver diferenças significantes entre elas, enquanto letras distintas confirmam haver diferenças significantes entre as comparadas.

Indicações nos cursos

Os estudantes, nos três cursos focados, apresentaram percentu-ais distintos entre as duplas de QEF “fraca + média” e “boa + excelente”. A primeira dupla (“fraca” + “média”), que representa domínio “insatisfatório”, predominou em cada curso: Agronomia (71,74% a), Biologia (72,13% a) e Enfermagem (66,52% a); e a segunda (“boa” + “excelente”), que representa domínio “satisfatório”, foi expressivamente menor também em cada um dos três cursos: Agronomia (28,25% b), Biologia (27,86% b) e Enfermagem (33,47% b). O problema da predominância de níveis “insatisfatórios” independe dos cursos. Esses resultados, incontestavelmente, provocam necessidade urgente de aplicação de medidas para a melhoria substancial da qualidade do Ensino Fundamental, e que seja de forma duradoura, diante da feição retratada neste estudo.

RIEDER, A.

Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 35-61, jan./jun., 2018 (Epub Ahead of Print 29 ago., 2018)

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FIGURA 3-Indicações (% média ) de satisfatoriedade com seu Ensino Fundamental (SEF: Insatisfatória:”Fraca+Média”; Satisfatória: “Boa+Excelente”) manifestado por estudantes de Agronomia, Biologia, Enfermagem, Campus Universitário “Jane Vanini” de Cáceres

Fonte: Elaborado por RIEDER, Arno, 2018

Indicações entre cursos e no total

A dupla de QEF “fraca + média”, que expressa situação “insatisfató-ria”, foi a mais pronunciada em cada um dos três cursos e no total também, porém apresentando valores similares entre cursos (70,13% a); já a dupla “boa + excelente”, que indica um estado “satisfatório”, apresentou valores bem me-nores em cada curso, mas também expressando valores similares entre cursos (29,86% b). Essa conjuntura explica fortemente as dificuldades, de considerável proporção, de alunos no Ensino Superior apresentarem falta de domínio de pré-requisitos, a exemplo dos necessários para facilitar estudos da disciplina de Estatística, entre outras.

As proporções de situações “insatisfatórias” (predominantes) ou “satisfatórias” independem dos cursos dos universitários respondentes.

Satisfatoriedade no Quadriênio (2013-2016) (Tab. 6, Fig. 4)

RIEDER, A.

Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 35-61, jan./jun., 2018 (Epub Ahead of Print 29 ago., 2018)

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Tabela 6 - Indicações (%) (média ± erro-padrão da média), no tempo, através de dois agrupamentos de Qualificações do Ensino Fundamental (QEF) dado outrora a universitários, matriculados nas disciplinas de Estatística e Bioestatística, dos cursos de Agronomia, Biologia e Enfermagem, Campus Jane Vanini de Cáceres, Universidade do Estado de Mato Grosso (UNEMAT), no período 2013-2016.

QEFAnos (Quadriênio)

Total2013 2014 2015 2016

% de indicações (média ± erro-padrão da média)Fraca +Média(Insatisfatória)

65,26 ± 4,02 Aa

71,86 ± 2,41 Aa

71,19 ± 4,27 Aa

72,20 ± 4,53 Aa

70,13 ± 1,91 a

Boa + Excelente

(Satisfatória)

34,73 ± 4,02 Ab

28,13 ± 2,41 Ab

28,80 ± 4,27 Ab

27,79 ± 4,53 Ab

29,86 ± 1,91 b

Total (n° respondentes) 250 185 154 141 730

Fonte: Elaborado por RIEDER, Arno. Obs.: em cada agrupamento de QEF, letras maiúsculas comparam significância (5%) das diferenças entre médias dos anos, e letras minúsculas comparam as diferenças das médias entre os agrupamentos de QEF de cada ano. Na direção e sentido da comparação, letras iguais informam não haver diferenças significantes entre

elas, enquanto as letras distintas confirmam haver diferenças significantes entre as comparadas.

FIGURA 4- Indicações (% média ) de satisfatoriedade com seu Ensino Fundamental (SEF: Insatisfatória:”Fraca+Média”; Satisfatória: “Boa+Excelente”) manifestado no tempo por várias turmas de estudantes de Agronomia, Biologia, Enfermagem, Campus Universitário

Fonte: Elaborado por Arno Rieder, 2018.

RIEDER, A.

Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 35-61, jan./jun., 2018 (Epub Ahead of Print 29 ago., 2018)

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Indicações nos anos

Os estudantes, nos quatro anos avaliados, apresentaram percentuais distintos entre as duplas de QEF “fraca + média” e “boa + excelente”. A primeira dupla (fraca + média), que representa domínio “insatisfatório”, predominou em cada ano: 2013 (65,26% a), 2014 (71,26% a), 2015 (71,19% a) e 2016 (72,20% a); e a segunda (boa + excelente), que representa domínio “satisfatório”, foi expressivamente menor também em cada ano: 2013 (34,73% b), 2014 (28,13% b), 2015 (28,80% b) e 2016 (27,79% b).

As proporções do agrupamento “satisfatório” foram baixas e as “insa-tisfatórias”, altas, em qualquer ano estudado. Os desafios continuam no tempo, sem sinais de melhoria. Mourão (2006) ouviu estudantes de ensino médio durante três anos e constatou que estes se mostraram bastante insatisfeitos com sua escola. Provavelmente, o período em que a maioria dos universitários respondentes, do presente trabalho, frequentou o Ensino Fundamental tenha sido na primeira década deste século (XXI).

Indicações entre anos e no total

A dupla de QEF “fraca + média”, que indica situação “insatisfatória”,

foi a mais destacada em cada ano e total, mas apresentou valores similares entre os anos (70,13% a); já a dupla “boa + excelente”, que indica situação “satisfatória”, apresentou valores bem menores em cada ano, mas também similares entre os anos (29,86% b). A predominância do nível “insatisfatório” é independente dos anos pesquisados e revela-se estável no período quadrienal (2013-2016). O nível minoritário “satisfatório” também segue estagnado nos quatro anos.

Considerações finais

Curso e ano-dependência

Predominantemente, as proporções das Qualificações do Ensino Fun-damental (QEF) independem dos cursos e dos anos, com as seguintes exceções:

− As proporções de QEF são ano-dependentes apenas no curso de Enfermagem; discrepâncias mais acentuadas entre frequências observadas (Fo) e esperadas (Fe) ocorreram nas QEFs “fraca” e “boa”, no ano de 2013.

− As proporções das QEFs mostraram-se curso-dependentes apenas

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no ano 2013 e no total; em 2013, as maiores diferenças entre Fo e Fe ocorreram no curso de Enfermagem, na QEF “bom”, e em Biologia, na QEF “fraca”; no total, na QEF “fraca” as maiores diferenças entre Fo e Fe ocorreram na Agronomia e Biologia e, em QEF “média”, somente na Agronomia.

Indicações em quatro QEFs: nos cursos, anos e entre estes

Em cada um dos três cursos, as QEFs “média”, “boa” e “excelente” foram, nesta mesma ordem, as que apresentaram a maior, a segunda maior e a menor porcentagem de indicação; a QEF “fraca”, na Biologia e na Enfermagem, apresentou porcentagens similares às da QEF “boa”, enquanto na Agronomia a QEF “fraca” foi distinta e menor que a QEF “boa”.

No total, as QEFs “média” e “excelente” foram, respectivamente, a mais e menos indicadas (45,88% e 2,70%); ambas se distinguem das QEFs “fraca” e “boa”, que, por sua vez, são similares.

Entre os três cursos, as QEFs “média” e “excelente” foram, respectiva-mente, a mais e menos indicadas; as QEFs “excelente” e “boa” não se diferen-ciaram entre cursos, mas a “fraca” e “média”, sim. O maior e o menor valor da QEF “média” foram observados, respectivamente, em Agronomia (53,85% A) e Biologia (41,02% B), sendo a deste último similar à da Enfermagem (42,77% B); na QEF “fraca”, o maior e o menor valor foram indicados, respectivamente, em Biologia (31,10% A) e Agronomia (17,89% B).

Nos anos, as indicações (%) de QEF foram distintas. Exceto em 2013 (terceira mais citada), a QEF “fraca” foi a segunda mais citada, junto com a QEF “boa”, em cada um dos quatro anos. As QEFs “média”, “boa” e “excelente” apresentaram a maior, a segunda maior e a menor indicações em cada um dos quatro anos.

Entre anos, as QEFs tiveram indicações (%) distintas entre si, mas cada uma com valores semelhantes entre os anos.

Duplas de QEF: “fraca + média” = “insatisfatória” e “boa + excelente” = “sa-tisfatória”

Nos três cursos, as indicações (%) foram distintas entre as duplas de QEF. A QEF “insatisfatória” predominou em cada curso: Agronomia (71,74% a), Biologia (72,13% a) e Enfermagem (66,52% a); e a “satisfatória” foi bem menor: Agronomia (28,25% b), Biologia (27,86% b) e Enfermagem (33,47% b).

No total, a situação “insatisfatória” (70,13% a) foi a mais pronunciada,

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enquanto a “satisfatória” apresentou valores bem menores (29,86% b). Entre cursos, a situação “insatisfatória” foi a mais pronunciada e simi-

lar entre cursos; já a “satisfatória” foi bem menor e também similar entre cursos. Em cada ano, as indicações (%) foram distintas entre as duplas de QEF

“insatisfatória” e “satisfatória”. A “insatisfatória” predominou em cada ano, e a “satisfatória” também foi bem menor em cada ano.

Entre os anos, a indicação “insatisfatória” foi a mais destacada em cada ano, mas com valores similares entre os anos (70,13% a); já a situação “satisfatória” apresentou valores bem menores em cada ano, mas também similares entre os anos (29,86% b).

A predominância do nível “insatisfatório” é independente dos anos pesquisados e revelou-se estável no quadriênio (2013-2016). O nível minoritário “satisfatório” também seguiu estagnado nos quatro anos.

Diante dessa situação não favorável à prosperação educacional em curto prazo, torna-se imperativo que as políticas educacionais sejam renovadas e contemplem metas, recursos e ações corretivas, visando melhorar a qualidade da educação, sobretudo o nível de Ensino Fundamental, do qual muito depende o bom êxito do cidadão nos graus seguintes de seu processo educativo.

Sugere-se que as universidades, imediatamente, encarem esse desafio no todo e frontalmente, a fim de interromper o ciclo vicioso vigente, de declínio qualitativo sistêmico, em expressiva parte da educação brasileira.

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Data de recebimento: 27.03.2018Data de aceite: 24.07.2018

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TRABALHO, HISTÓRIA E SABERES TRADICIONAIS NO TERRITÓRIO CAIPIRA: FUNDAMENTOS E POSSIBILIDADES NA PERSPECTIVA DA

PEDAGOGIA HISTÓRICO-CRÍTICA

WORK, HISTORY AND TRADICIONAL KNOWLEDGE IN THE YOKEL TERRITORY: ELEMENTS AND POSSIBILITIES IN THE PERSPECTIVE OF

HISTORICAL-CRITICAL PEDAGOGY

Fábio Fernandes Villela1

RESUMO: O texto Trabalho, história e saberes tradicionais no território caipira: fundamentos e possibilidades na perspectiva da pedagogia histórico-crítica aborda a reorganização do trabalho educativo, a partir do projeto de ensino-pesquisa--extensão intitulado: Cultura ambiental no território caipira: história e saberes tradicionais das mulheres do noroeste paulista. O objetivo geral do trabalho é a produção e sistematização de metodologias inovadoras de educação de jovens e adultos (EJA) na educação do campo. O projeto possui como objeto de estudo a história e os saberes tradicionais das mulheres do território caipira. O método de pesquisa utilizado é o qualitativo, apoiando-se na coleta de textos escritos dos participantes do projeto. Os resultados, apresentados neste artigo, são a elevação de escolaridade de jovens e adultos associada à qualificação social e profissional, possibilitando novas aprendizagens na região noroeste paulista.

PALAVRAS-CHAVE: trabalho e educação, território rural noroeste paulista (SP), educação de jovens e adultos (EJA).

ABTRACT: The text Work, history, and traditional knowledge in yokel territory: ele-ments and possibilities in the perspective of historical-critical pedagogy approach the reorganization of educational work, starting from the project of teaching-re-search-extension entitled: Environmental culture in the yokel territory: history and traditional knowledge of women in the northwestern region of São Paulo - Brazil. The general objective of the work is the production and systematization of

1 Professor do Departamento de Educação da UNESP/São José do Rio Preto e do Programa de Pós-Graduação em Docência para Educação Básica Docência/UNESP/Bauru. Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação de Jovens e Adultos (GEPEJA - UNESP). [email protected]

DOI/10.30681/21787476.2018.29.6380

Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 63-80, jan./jun., 2018 (Epub Ahead of Print 18. abr., 2018)

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innovative methodologies for youth and adult education (EJA) in rural education. The project has as object of study the history and the traditional knowledge of women in the yokel territory. The research method used is qualitative, based on the collection of written texts of the project participants. The results, presented in this article, are the increase of schooling of young people and adults associat-ed with social and professional qualification, in the northwestern region of São Paulo - Brazil.

KEYWORDS: work and education, northwestern region of São Paulo – Brazil, youth and adult education.

Introdução

Este texto aborda a reorganização do trabalho educativo na perspec-tiva da pedagogia histórico-crítica, a partir do projeto de ensino-pesquisa-ex-tensão intitulado: Cultura ambiental no território caipira: história e saberes tradicionais das mulheres do noroeste paulista. A pedagogia histórico-crítica, conforme aponta Saviani (2012), busca compreender a história a partir do seu desenvolvimento material, da determinação das condições materiais da existência humana. Esta teoria pedagógica toma posição na luta de classes, aliando-se aos interesses dos dominados, e surge em decorrência de necessi-dades postas pela prática dos educadores nas condições atuais. Para esse autor, a educação tem caráter específico e central na sociedade, o papel do profes-sor é fundamental no ensino, o currículo deve ser organizado com base nos conteúdos clássicos e a transmissão do conhecimento é basilar. Desta forma, busca-se a superação das pedagogias tradicional e do “aprender a aprender”. O ponto de virada da proposta metodológica da pedagogia histórico-crítica é que ela garante aos dominados aquilo que os dominantes dominam, de forma que contribui para a luta pela superação de sua condição de exploração (Cf. SAVIANI, 2008).

O objetivo geral do trabalho é a produção e sistematização de me-todologias inovadoras de educação de jovens e adultos (EJA) na educação do campo. O projeto possui como objeto de estudo a história e os saberes tra-dicionais das mulheres do território caipira. O método de pesquisa utilizado é o qualitativo, apoiando-se na coleta de textos escritos dos participantes do projeto. Os resultados do projeto, apresentados neste artigo, são a elevação de escolaridade de jovens e adultos associada à qualificação social e profissional, possibilitando novas aprendizagens na região noroeste paulista. O texto está

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organizado da seguinte maneira: (1) o trabalho das mulheres no território caipira; (2) projeto de trabalho na perspectiva da pedagogia histórico-crítica; (3) resultados; (4) considerações finais; e (5) referências.

O trabalho das mulheres no território caipira

A reorganização do trabalho educativo promovido pela pedagogia histórico-crítica, conforme aponta Saviani (2012), continua se desenvolvendo com a colaboração de diversos pesquisadores que vêm aprofundando teóri-co-metodologicamente as potencialidades dessa concepção pedagógica em campos como: didática (GASPARIN, 2013; GERALDO, 2009), psicopedagogia (SCALCON, 2002), ensino de ciências (SANTOS, 2005), educação infantil e ensino fundamental (MARSIGLIA, 2011), entre outros. Conforme Geraldo (2009, p. 72) argumenta, as atividades de ensino visam: “a apropriação-assimilação signi-ficativa, criativa e crítica dos conhecimentos sistematizados, das habilidades motoras e intelectuais e das atitudes [...] e o desenvolvimento da autonomia intelectual dos alunos”.

No projeto de ensino-pesquisa-extensão intitulado: “Cultura am-biental no território caipira: história e saberes tradicionais das mulheres do noroeste paulista” (Cf. VILLELA, 2016a) procuramos colaborar com a reorga-nização do trabalho educativo através do desenvolvimento de um projeto de trabalho docente-discente na perspectiva da pedagogia histórico-crítica, conforme Gasparin (2013). A questão principal é desenvolver, nos espaços de Educação de Jovens e Adultos (doravante, EJA), um “projeto de trabalho” (Cf. KASPCHAK; GASPARIN, 2013) sobre a “história e os saberes tradicionais” do noroeste paulista, tendo como categoria-chave o trabalho das mulheres.

O projeto teve como objetivos gerais a compreensão da história e dos saberes tradicionais das mulheres do “território caipira”, tendo como catego-ria-chave o trabalho das mulheres, e como objetivos específicos a educação de jovens e adultos (EJA), especialmente das mulheres do “território caipira”. As razões que justificaram esse projeto foram: a inclusão produtiva das mulheres e a consolidação de redes socioeconômicas da agricultura familiar no âmbito dos territórios rurais e as possibilidades de ações para a inclusão produtiva das mulheres do “território caipira”. Teve como resultados a articulação dos saberes com as diferentes áreas do conhecimento, possibilitando a vivência de novos valores, o desencadeamento de ações coletivas, bem como a elevação de escolaridade associada à qualificação social e profissional, possibilitando novas aprendizagens (Cf. VILLELA, 2016a).

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O objetivo deste trabalho é abordar a história e os saberes tradicionais do noroeste paulista – SP, tendo como categoria-chave o trabalho das mulheres. As culturas e os saberes tradicionais, conforme aponta Diegues (1999, p. 15), podem contribuir para a manutenção da biodiversidade dos ecossistemas. Em numerosas situações, esses saberes são o resultado de uma coevolução entre as sociedades e seus ambientes naturais, o que permite a conservação de um equilíbrio entre ambos. Isso nos conduziu ao interesse pela diversidade cultural, que também está ameaçada pela mundialização de modelos culturais dominantes.

As “comunidades tradicionais” e seus saberes são conceitos expli-citados na Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais (PNPCT), em seu terceiro artigo. “Comunidades tradicionais” são grupos culturalmente diferenciados que possuem formas próprias de organização social, que ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ances-tral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição (BRASIL, 2007).

Considerando os diferentes contextos geográficos e as peculiari-dades culturais que envolvem essas comunidades, Diegues (1999) listou 16 territórios com populações tradicionais “não indígenas” brasileiras, dentre elas, os “caipiras ou sitiantes”: comunidades, em grande parte de meeiros e parceiros, que sobrevivem em nichos entre as monoculturas do sudeste e do centro-oeste, desenvolvendo atividades agropecuárias em pequenas proprie-dades, destinadas à subsistência familiar e ao mercado. Diegues (1999, p. 40) distingue as seguintes populações tradicionais não indígenas: caiçaras, caipiras, babaçueiros, jangadeiros, pantaneiros, pastoreio, praieiros, quilombolas, cabo-clos/ribeirinhos amazônicos, ribeirinhos não amazônicos, varjeiros, sitiantes, pescadores, açorianos, sertanejos/vaqueiros.

O autor indica, em um mapa, a localização aproximada do território dessas populações, salientando que, no caso dos caipiras, restaram somente alguns enclaves onde elas subsistem. Diegues (1999, p. 40) ressalta que: “não existe uma linha muito definida que separe os territórios dessas populações, ocorrendo mesmo nichos de algumas delas espalhados em áreas fora de suas regiões originais”. A partir dessa peculiaridade cultural, foram selecionadas duas escolas parceiras que se encontram em uma região em que parte dos habitantes se identifica como “caipiras”.

O “Noroeste Paulista” é uma região do estado de São Paulo que abrange parte ou toda a mesorregião de São José do Rio Preto e, às vezes, Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 63-80, jan./jun., 2018 (Epub Ahead of Print 18. abr., 2018)

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também costuma-se incluir a mesorregião de Araçatuba e a microrregião de Lins. É formada pela união de 153 municípios distribuídos em doze microrre-giões. Possui uma área total de 50.025 quilômetros quadrados, cerca de 20% da área do estado e equivalente à área do estado brasileiro do Rio Grande do Norte. O município mais populoso é São José do Rio Preto, com 460 mil habi-tantes, seguido por Araçatuba (200 mil), Catanduva (114 mil), Birigui (111 mil), Votuporanga (84 mil), Lins (71 mil) e Fernandópolis (64 mil). Essas informações foram retiradas de Noroeste (2014).

Do ponto de vista do trabalho das mulheres inseridas nesses ter-ritórios, a dura realidade se estende para além dos afazeres domésticos cotidianos (Cf. DANTAS, 2013 e 2010). Todos os dias, elas precisam garantir a sobrevivência de sua família. O objetivo geral é compreender as histórias de vida dessas mulheres e seus saberes, procurando colocar em primeiro plano a visão que as mulheres têm do trabalho, do meio ambiente, da família, da sexualidade e de suas relações sociais, inseridas no “território”, em nosso caso, o noroeste paulista. Através de um “projeto de trabalho” e, utilizando métodos qualitativos e quantitativos, nos espaços de educação de jovens e adultos, foi possível conhecer um pouco mais do cotidiano dessas mulheres. Através dessa proposta, se dará visibilidade à condição humana dessas mu-lheres e será possível compreender e valorizar o conhecimento, a diversidade cultural e os saberes tradicionais construídos nesse território denominado de “caipira” por Diegues (1999).

A questão principal foi desenvolver, nos espaços de EJA, um “projeto de trabalho” (KASPCHAK; GASPARIN, 2013) sobre a “história e os saberes tra-dicionais”, tendo como categoria-chave o trabalho das mulheres. Para Diegues (1999, p. 30), conhecimento tradicional é definido como o conjunto de saberes e saber-fazer a respeito do mundo natural, sobrenatural, transmitido oralmente de geração em geração2.

Um exemplo de “saber tradicional” da “agricultura familiar” está presente nas cozinhas do “território caipira”. A cozinha é um microcosmo da sociedade, fonte inesgotável de saberes históricos, e suas produções podem ser consideradas como “patrimônio gustativo da sociedade”. Conforme demons-tra Santos (2011), esses “saberes” permitem destacar as identidades locais e regionais; certos pratos podem ser considerados como bens culturais, como lugares de memória, como patrimônio imaterial. Para o autor, uma síntese

2 Para muitas dessas sociedades, também incluídas as caipiras, existe uma interligação orgânica entre o mundo natural, o sobrenatural e a organização social. Nesse sentido, para estas, não existe uma classifi-cação dualista, uma linha divisória rígida entre o natural e o social, mas sim um continuum entre ambos.

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sobre as cozinhas brasileiras busca explicar influências de culturas alimentares a partir de duas realidades: a autêntica cultura alimentar local e regional e a cultura alimentar oriunda da civilização externa, influenciadora. Tais contatos e simbioses revelam relações e trocas complexas de diferenças, afirmadas e reafirmadas em fecunda assimilação, que redunda numa certa mestiçagem da comida brasileira. Dada essa visão do “saber tradicional” e nosso interesse em investigar o trabalho de mulheres no território caipira, avançamos por meio da pesquisa de alimentos e seus preparos feitos por mulheres caipiras.

O “território caipira” é marcado por “uma civilização do milho”, con-forme aponta Marins (2004, p. 1-3). Para o autor, na alimentação paulista, a permanência dos saberes dos nativos sempre foi característica marcante. A origem indígena das mães de grande parte das famílias pioneiras, bem como a onipresença de escravas vindas dos sertões fazia com que o cozinhar estivesse presente nas casas ou nas caminhadas pelos interiores selvagens, marcado pelo paladar dos nativos. Mandioca e milho dividiram o pódio no cotidiano das famílias do litoral e do sertão.

Ainda segundo Marins (2004, p. 2), iguarias de milho apiloado ou macerado nos monjolos, uma marca registrada das populações paulistas, eram marcantes nas vilas do planalto paulista, a ponto de Sérgio Buarque de Holanda denominar a sociedade local de “civilização do milho” (Cf. HOLANDA, 1995, p. 181-189). Canjicas, curaus e pamonhas são ainda muito presentes na culinária paulista, chegando mesmo a fazer parte das alegorias “caipiras” das festas juninas. O fubá moído, recusado por muitos que o consideravam “comida para cachorro”, acabou tendo reforço a partir do século XIX devido à sua grande popularidade entre os italianos (que usavam/usam o fubá para fazer polenta, um tipo de curau salgado).

A proposta foi utilizar os parceiros-agricultores do projeto de ex-tensão universitária como foco de intervenção pontual de uma “acupuntura territorial” e visa, em futuro próximo, propagar essa ação para as demais cidades que compõem o território rural “noroeste paulista – SP” (Cf. LERNER, 2003; GARCIA, 2012 e VILLELA, 2016a). O principal parceiro-agricultor nessa primeira etapa de desenvolvimento do projeto foi a Horta Mandalla de Ipiguá (SP), cidade distante 19 km de São José do Rio Preto. O que é a Horta Mandalla de Ipiguá? “Mandala” significa círculo mágico, concentração de energia, e é considerada universalmente, como o símbolo da integração e da harmonia. Inspirados nesse conceito, o casal de agricultores Ceci e Reinaldo criaram em Ipiguá uma horta orgânica em torno de um círculo côncavo de barro rodeado por outros nove círculos com produtos hortifrutigranjeiros, sendo que cada um Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 63-80, jan./jun., 2018 (Epub Ahead of Print 18. abr., 2018)

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deles representa um dos planetas do sistema solar3. O objetivo é a qualificação social e profissional, possibilitando novas aprendizagens na região noroeste paulista, fortalecendo a “agricultura familiar”, que consiste na exploração de uma parcela de terra, tendo como trabalho direto a mão de obra familiar. Passamos às considerações sobre a educação de jovens e adultos (doravante, EJA), especialmente das mulheres, da agricultura familiar no território caipira.

Projetos de trabalho na perspectiva da pedagogia histórico-crítica

Nos espaços criados de EJA, conforme aponta Dantas (2013), é rele-vante que se trabalhe os “saberes tradicionais” dessas populações. Segundo a autora, é primordial que as informações sobre as habilidades e competências dessa comunidade envolvam reflexão, tanto individual como coletiva, pois é esse exercício que permitirá às mulheres e aos homens se reconhecerem como sujeitos do seu contexto social e cultural, os quais, com essa certeza, poderão ser capazes de desenvolver novas relações de inclusão produtiva e a consolidação de redes socioeconômicas da agricultura familiar no âmbito dos territórios rurais.

Diante desse contexto, o trabalho em andamento procura integrar os saberes e analisar a complexidade desses saberes, especialmente das mulheres que constroem conhecimentos e os repassam de geração a geração. Para tanto, é utilizada a experiência de EJA desenvolvida no âmbito do “Projeto Unesp de Educação de Jovens e Adultos” (doravante, Peja - Unesp). O Peja - Unesp (criado na Unesp no ano de 2000, na época, vinculado ao Programa Unesp de Inte-gração Social Comunitária, da Pró-Reitoria de Extensão Universitária – PROEX) tem o objetivo de estabelecer uma política pública para a educação de jovens e adultos, buscando parcerias comunitárias locais e visando à contribuição de recursos para a formação de cidadãos/leitores críticos e participativos, bem como a de professores com a visão de “educadores populares”. (Cf. VILLELA, TENANI e SILVA, 2014; VILLELA et al., 2007 e VILLELA, 2016c)4.

Do ponto de vista da EJA, é utilizado um “projeto de trabalho” (Cf. KASPCHAK; GASPARIN, 2013). Optou-se pelas possibilidades metodológicas do trabalho com projetos, devido à riqueza de material acumulado sobre EJA em comunidades rurais. Dentre as diversas opções de trabalho com projetos,

3 Para maiores informações sobre uma horta orgânica do tipo mandalla, conferir Flores (2016).4 Atualmente o Peja é desenvolvido em oito campus da Unesp (Araçatuba, Araraquara, Assis, Bauru, Marília, Presidente Prudente, Rio Claro e São José do Rio Preto) contando com recursos financeiros da Pró-Reitoria de Extensão Universitária – PROEX para o desenvolvimento de seus trabalhos.

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destaca-se: “projetos de ensino”, “projetos de trabalho”, “projetos da apren-dizagem”, “temas geradores”, “metodologia do complexo temático”, entre outros (Cf. HERNÁNDEZ E RODRIGUES, 1998). Dessa forma, as metodologias de trabalho com projeto permitem maior flexibilidade de estratégias, viabili-zando uma aprendizagem que de fato corresponda às reais necessidades da comunidade. A metodologia do projeto de trabalho tem por fundamento a pedagogia proposta por Saviani (2008):

Uma pedagogia articulada com os interesses populares valori-zará, pois, a escola; não será indiferente ao que ocorre em seu interior; estará empenhada em que a escola funcione bem; portanto, estará interessada em métodos de ensino eficazes. Tais métodos situar-se-ão para além dos métodos tradicionais e novos, superando por incorporação as contribuições de uns e de outros. Serão métodos que estimularão a atividade e iniciativa dos alunos sem abrir mão, porém, da iniciativa do professor; favorecerão o diálogo dos alunos entre si e com o professor, mas sem deixar de valorizar o diálogo com a cultura acumulada historicamente; levarão em conta os interesses dos alunos, os ritmos de aprendizagem e o desenvolvimento psicológico, mas sem perder de vista a sistematização lógica dos conhecimentos, sua ordenação e gradação para efeitos do processo de trans-missão-assimilação dos conteúdos cognitivos (SAVIANI, 2008, p. 55-56).

Conforme descreve Marsiglia (2011, p. 25-27), a reflexão desenvol-vida pela pedagogia histórico-crítica busca propor novos caminhos, soluções e organização metodológica. Os momentos propostos por esta pedagogia estão explicitados a seguir: (1) ponto de partida da prática educativa (prática social): etapa na qual se deve levar em conta a realidade social do educando; (2) problematização: momento de levantar as questões postas pela prática social; (3) instrumentalização: momento de oferecer condições para que o aluno adquira o conhecimento; (4) catarse: momento culminante do processo educativo, quando o aluno apreende o fenômeno de forma mais complexa; (5) ponto de chegada da prática educativa (prática social modificada): o edu-cando, uma vez adquirido e sintetizado o conhecimento, tem entendimento e senso crítico para buscar seus objetivos de maneira transformadora. Saviani (2008, p. 56-58) organiza sua proposta metodológica na forma de momentos para compará-los e caracterizá-los em relação aos outros métodos (Herbart e Dewey, por exemplo). O Quadro 1 a seguir, indica as características da pro-posta organizativa de cada método, apoiado pela tendência pedagógica a qual Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 63-80, jan./jun., 2018 (Epub Ahead of Print 18. abr., 2018)

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pertence, segundo as indicações feitas por Saviani (2008, p. 56-58).

Quadro 1 - Momentos metodológicos das diferentes pedagogias

Momentos / Pedagogia

Características

Tradicional(Herbart)

Nova(Dewey)

Histórico-Crítica(Saviani)

1

Preparação do aluno:

iniciativa do professor.

Atividade: iniciativa de

alunos.

Ponto de partida da prática educati-va (prática social): comum a profes-sor e aluno, guardados os devidos

níveis de compreensão.

2

Apresentação de novos co-nhecimentos pelo profes-

sor.

Problema: como obs-táculo que

interrompe a atividade dos

alunos.

Identificação dos principais proble-mas colocados pela prática social

(problematização).

3

Assimilação de conteúdos transmitidos pelo profes-

sor.

Coleta de dados.

Apropriação dos instrumentos teóricos e práticos necessários ao

equacionamento dos problemas da prática social (instrumentalização).

4 Generaliza-ção. Hipótese.

Expressão elaborada da nova forma de entendimento da prática social a

que se ascendeu (catarse).

5 Aplicação. Experimenta-ção.

Ponto de chegada da prática edu-cativa (prática social modificada): passagem da síncrese à síntese - a compreensão torna-se mais orgâ-

nica.Fonte: Reelaborado a partir de Marsiglia (2011, p. 22-23).

Somado a essas duas experiências, do Peja - Unesp e dos Projetos de Trabalho, na perspectiva da Pedagogia Histórico-Crítica, doravante PHC, utilizamos o Centro Virtual de Estudos e Culturas do Mundo Rural (VILLELA, 2014). Esse projeto foi desenvolvido como recurso didático e ferramenta no ensino de sociologia para os alunos do curso de pedagogia da Unesp de São José do Rio Preto (SP), doravante Rio Preto, e estendido, posteriormente, para escolas que manifestaram interesse em desenvolver tópicos da área de Ciências

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Humanas e suas Tecnologias. Esse trabalho utiliza a metodologia de blog, um website frequentemente atualizado, por meio do qual os conteúdos aparecem em ordem cronológica inversa. Podem conter textos, imagens, áudios, vídeos e animações. Esta metodologia possibilita a disseminação do conhecimento produzido pela universidade na internet gratuitamente. Os conteúdos rela-cionados ao projeto de trabalho foram desenvolvidos no curso de extensão semipresencial intitulado: “Território caipira: uma civilização do milho” (Cf. VILLELA, 2016b). Vejamos, a seguir, alguns resultados.

Resultados

No final de 2016, realizamos o curso de extensão semipresencial intitulado: Território caipira: uma civilização do milho (Cf. VILLELA, 2016b), momento central do projeto de trabalho, conforme mencionado acima. O módulo presencial foi desenvolvido em sala de aula (Ibilce/Unesp) e na Horta Mandalla e o módulo de ensino à distancia (Ead) foi realizado no blog de aula: Centro Virtual de Estudos e Culturas do Mundo Rural e também por meio de lista WhatsApp Messenger criada para tal finalidade (Cf. VILLELA, 2016d). A justificativa é desenvolver ações para a inclusão produtiva das mulheres do “território caipira”, através da valorização de produtos locais. O curso teve diversos módulos: 1. Cultura Ambiental e Educação do Campo; 2. Manejo da Cultura do Milho; 3. Agricultura Familiar e Agroecologia e 4. Mulheres e Edu-cação do Campo (Cf. VILLELA, 2014).

Para cada um desses quatro módulos, foram desenvolvidos os mo-mentos da PHC, conforme descreve Marsiglia (2011, p. 23-27). No módulo “Manejo da Cultura do Milho” do curso, ministrado pelo engenheiro agrô-nomo Oliver Blanco, a ideia central foi a valorização de produtos territoriais com identidade cultural, isto é, o milho, especialmente o crioulo “Cunha”, melhorado a partir das experiências e aprendizado dos povos, que sempre o cultivaram para garantir a sobrevivência (Cf. BLANCO, 2013). Trata-se de alternativas para manter conhecimentos e sementes livres do patenteamento pelas grandes empresas da produção de sementes, relacionado aos “saberes tradicionais” (Cf. CAMPOS, 2007). As sementes crioulas podem ser adquiridas através de “feiras da troca” (Cf. VILLELA et al., 2013). A semente utilizada e distribuída aos parceiros deste trabalho é o milho crioulo “Cunha”, variedade preservada pelos produtores do município de Cunha (SP). Os agricultores de Cunha resgataram uma antiga tradição do milho na cidade, em contraposição à tecnologia transgênica do milho e promovem a cultura de “conhecer, com-Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 63-80, jan./jun., 2018 (Epub Ahead of Print 18. abr., 2018)

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partilhar, resistir, pesquisar e semear, a nossa real e absoluta independência” (Cf. BLANCO, 2013).

Neste texto, destacamos os momentos (4) e (5) (Cf. Quadro 2 abai-xo). O momento (4) catarse é o ponto culminante do processo educativo, quando o aluno apreende o fenômeno de forma mais complexa, onde há uma transformação, a aprendizagem acontece e ocorre a efetiva incorporação dos instrumentos culturais, transformados agora em elementos ativos da trans-formação social. O momento (5) é o ponto de chegada da prática educativa (prática social modificada): o educando, uma vez adquirido e sintetizado o conhecimento, tem entendimento e senso crítico para buscar seus objetivos de maneira transformadora. Segundo a autora, é quando o aluno problematiza a prática social e evolui da síncrese para a síntese, está no caminho da compre-ensão do fenômeno em sua totalidade. O momento (5) é prática social como o momento (1), porém deste difere porque se caracteriza como uma prática social resultante da prática educativa, que produz alterações na qualidade e no tipo de pensamento (do empírico ao teórico). O ponto de virada da proposta metodológica da pedagogia histórico-crítica é que ela garante aos dominados aquilo que os dominantes dominam, de forma que contribui para a luta pela superação de sua condição de exploração (Cf. SAVIANI, 2008).

Os momentos (4) e (5) da didática da PHC são expressos pela escrita das mulheres participantes do curso, que se apresenta no Quadro 2. Constata-se que a passagem de uma visão caótica da realidade ao conhecimento científico proporcionado pelo projeto, onde se infere a realidade através de novas formas de pensar Trata-se da manifestação do aperfeiçoamento intelectual dos partici-pantes, os quais, de forma contínua, se desafiam dialeticamente a transformar a contradição existente entre o velho (prática social inicial) e o novo (prática social final), conforme Gasparin (2013). Especificamente, a escrita presente nas postagens representam o momento (4): “Catarse” e o momento (5): “Prática Social Modificada”, isto é, o ponto de chegada do processo pedagógico do projeto, comprovando que o processo de contra-hegemonia abre espaços de luta e deslocamentos e possibilita a reversão das formas de domínio material e imaterial (Cf. MORAES, 2002). A seguir, apresentamos postagens seleciona-das de Villela (2014 e 2016b) redigidas por mulheres participantes do curso.

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Quadro 2 - Postagens sobre a história e saberes tradicionais das mulheres no território caipira

Momentos da PHC Postagens e fotos dos participantes do curso de extensão no Blog de Aula e na lista WhatsApp Messenger.

4

Participante B.

16/12/06 18:15

Ceci e Reinaldo nos receberam na horta Mandalla em Ipiguá, onde sob a sombra de uma árvore

Ceci nos contou toda a sua trajetória na agricultura tradicional até a decisão de produzir alimentos

orgânicos. Onde surgiu a horta Mandalla, que significa uma horta orgânica em torno de um círculo

côncavo de barro rodeado por outros nove círculos de produtos orgânicos, sendo que cada um deles

representa um dos planetas do sistema solar.

Ceci nos levou para um passeio pela horta e nos explicou a importância de comermos alimentos

orgânico e livres de agrotóxicos. Atualmente a nossa alimentação é baseada nos alimentos indus-

trializados e nos fast food, consideramos mais importante a praticidade do alimento do que sua

procedência e qualidade.

Ceci nos mostra que é possível produzir de maneira consciente e sustentável, tendo todos os ani-

mais e insetos como parte de uma totalidade e que cada um tem uma função importante no sistema.

Foi muito valiosa a visita à horta e poder conhecer a sábia Ceci e sua família!

Participante M.

16/12/24 01:15

Linda a história do milho contada pelo engenheiro agrônomo Oliver Blanco. A poesia no plantio dos

três grãos; um para a terra, um para o espírito e um para o homem.

Nós, humanos, vivemos a separação da natureza como se fosse natural. Dentro de bolhas, obser-

vamos nosso habitat como objeto externo a nós. Criamos cidades, espaços habitáveis, que passam

a falsa impressão de que estamos seguros, pra viver nossa cultura. Em nome dessa segurança fomos

inventando maneiras de ficarmos cada vez mais seguros. Quando, no curso, ouvindo falar da compo-

sição mineral da terra, dos alimentos e dos animais, foi como que uma antiga memória que estava lá,

escondida, começasse a emergir me tirando do automático. Dentro de nossas cidades, onde estão os

espaços pra terra respirar? Onde estão os espaços pra sobrevivência de todos os seres que dividem

o planeta conosco?

Nossa ligação com o solo vivo não é só uma questão de sobrevivência da espécie, mas nossa

conexão com o universo através da terra.

O ultimo encontro, que era pra fechar o curso, abriu tantas possibilidades, que fiquei querendo mais.

Participante J.

16/12/19 09:10

Mais um encontro inspirador, onde aprendemos muito mais do que técnicas focadas sobre a

cultura do milho, mas sim, estudos e experiências de Oliver Blanco e pesquisadores sobre manejos

na agricultura orgânica.

Apesar de ser produtora e profissional da área, fui surpreendida com várias “novidades” como: a

cromatografia aplicada à solos, plantas e compostagens; princípios 3 M e 4M; sideróforos, biochar,

peletização alternativa para sementes não convencionais, formulação de fosfito, dentre outras.

A experiência e a humildade de Oliver fez-me com que eu mergulhasse no passado histórico do

milho, passando por descobertas de técnicas, importância de um alimento orgânico para um organismo,

impactos dos transgênicos, teoria da trofobiose e tantas outras coisas fantásticas sobre nosso tema.

Precisamos com toda certeza de um tempo a mais com Oliver para tentar “sugar”, em todo bom

sentido, mais de suas experiências e trazer para mais perto da nossa região tão “carente” informações

imprescindíveis para a manutenção e ampliação da nossa agricultura familiar e orgânica.

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13/3 06:38] Parti cipante V. postou uma foto na lista WhatsApp Messenger do curso:

[13/3 06:40] Parti cipante M.: Que beleza, V.! São das sementes do Oliver?

[13/3 06:41] Oliver , resultado daquelas sementes que vc deu no dia do curso.

[13/3 06:46] M. daquelas sementes já rendeu 2 ltrs de semente, o resto fi z refogado, polenta salgada,

cozido etc... bom dia!!

[13/3 06:47] Parti cipante M.:

[13/3 08:17] Oliver Blanco: que bênção.

Fontes: Villela (2014) e Villela (2016d), com correções ortográfi cas do original.

Conforme podemos observar na escrita das parti cipantes acima, a opção teórico-metodológica pela perspecti va da pedagogia histórico-críti ca, contribui para a valorização dos conhecimentos cientí fi co-culturais, base para a transformação da realidade. Conforme aponta Saviani (2012), a apropriação dos conhecimentos historicamente produzidos pela humanidade deriva do processo de mediação, em decorrência das relações das pessoas entre si e com a cultura. A escrita das parti cipantes indica a superação do senso comum em direção à consciência fi losófi ca. A escrita deixa transparecer que o educando reconhece elementos de sua situação, apontando a necessidade de intervir na realidade, transformando-a no senti do de ampliação da liberdade, da co-municação e colaboração entre os homens.

O mérito da reorganização das práti cas sociais iniciais das parti ci-pantes do curso está no processo didáti co da pedagogia histórico-críti ca, cujo método de investi gação e de elaboração do conhecimento cientí fi co tem por base o desvendamento da teoria do valor-trabalho de Marx. Esse aporte te-órico-metodológico contribui para novas relações de ensino e aprendizagem e auxiliam tanto na formação dos alunos, quanto na dos professores. Um projeto de trabalho nessa perspecti va teórico-metodológica é um excelente instrumento didáti co, tendo em vista o processo dialéti co presente na sua metodologia de ensino e aprendizagem.

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Considerações finais

Podemos destacar como principais conquistas desse trabalho: (1) levantamento de material de pesquisa através de hipertextos produzidos, no ambiente do blog de aula, pelos participantes do projeto, de modo a propiciar dados qualitativos para pesquisas interessadas na descrição e compreensão da centralidade do valor-trabalho; (2) o desenvolvimento de possibilidades de ações, conforme demonstra a escrita das participantes, para a inclusão pro-dutiva das mulheres do território caipira, segundo um projeto de trabalho na perspectiva da pedagogia histórico-crítica; (3) a consolidação de redes socioeco-nômicas da agricultura familiar no âmbito dos territórios rurais, especialmente da região noroeste paulista, considerando as práticas da economia solidária; (4) o fortalecimento de organizações econômicas, contribuindo para a inclusão produtiva e para o desenvolvimento sustentável e solidário do território caipira.

Por fim, cabe destacar (5) a contribuição para a produção e sistema-tização de metodologias inovadoras de Educação de Jovens e Adultos (EJA), na educação do campo. O projeto foi desenvolvido em um espaço de EJA, conforme Brasil (2000), onde esse ambiente engloba todo o processo de aprendizagem, formal ou informal, no qual pessoas consideradas adultas pela sociedade desenvolvem suas habilidades, enriquecem seu conhecimento e aperfeiçoam suas qualificações técnicas e profissionais, direcionando-as para a satisfação de suas necessidades e as de sua sociedade. No ambiente de EJA, as situações reais devem constituir o núcleo da organização da proposta pedagógica a ser desenvolvida. Para tanto, o desafio da EJA é integrar em sua organização curricular o trabalho e a elevação de escolaridade. A partir dessas ideias, o “arco ocupacional” trabalhado foi a produção rural familiar e a qualificação social e profissional. O resultado desse trabalho é a articulação dos saberes dos educandos com as diferentes áreas do conhecimento, possibilitando a vivência de novos valores, o desencadeamento de ações coletivas, bem como a elevação de escolaridade associada à qualificação social e profissional, pos-sibilitando novas aprendizagens aos educandos, especialmente das mulheres do território caipira.

Referências

BLANCO, Oliver H. N. Milho crioulo “Cunha”. Blanco agricultura: consultoria e acompanhamento técnico para o envolvimento dialógico da agricultura or-gânica no Brasil. Net, Araçatuba-SP, 2013. Disponível em: < http://oextensio-Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 63-80, jan./jun., 2018 (Epub Ahead of Print 18. abr., 2018)

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BRASIL. MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE (MMA). Decreto nº 6.040, de 07 fev. Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunida-des Tradicionais. Diário Oficial da União, Brasília, 08 fev. 2007. Disponível em: < http://www.mma.gov.br/desenvolvimento-rural/terras-ind%C3%ADgenas,--povos-e-comunidades-tradicionais >. Acesso em: 15 mai 2013.

BRASIL. Conselho Nacional de Educação/Câmara de Educação Básica. Diretri-zes Curriculares Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos. Parecer nº 11 aprovado em 10 de maio de 2000.

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Data de recebimento: 15.04.2018Data de aceite: 02.05.2018

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PERSPECTIVAS DA POLÍTICA DE COTAS COMO FORMA DE DEMOCRATIZAÇÃO PARA A EDUCAÇÃO SUPERIOR EM CAMPINA

GRANDE – PB

QUOTA POLICY PERSPECTIVES AS A FORM OF DEMOCRATIZATION FOR HIGHER EDUCATION IN CAMPINA GRANDE – PB

Juliana Nobrega de Almeida1

RESUMO: Esta pesquisa tem intenção de contribuir com o debate sobre as ações afirmativas por meio da efetivação da política de cotas, em Campina Grande - PB, cidade do interior do Nordeste brasileiro. A política de cotas busca oportunizar a inserção à educação superior para os discentes com menor poder aquisitivo, contribuindo de maneira significativa na promoção da educação e da cidadania, democratizando o acesso e a permanência à universidade pública. A pesquisa ad-ota uma abordagem teórico-metodológica de natureza qualitativa. Nesta direção, são pertinentes alguns questionamentos, como: em relação a educação superior, o sistema de cotas se apresenta como o mais adequado para efetivar políticas educacionais e ações afirmativas? O que representam as políticas de cotas para os estudantes oriundos da escola pública? A política de cotas proporciona mudanças no perfil dos discentes, passando a construir novos espaços de vivências, educação e cidadania, democratizando o ensino superior.

PALAVRAS CHAVE: Educação, Ações afirmativas, Políticas educacionais, Sistema de cotas

ABSTRACT: This study aims to contribute to the affirmative action’s debate through the quota policy implementation in Campina Grande - PB, a city located in the Brazilian Northeast. The quota policy seeks to make easier for students with low-er purchasing power to enter higher education, contributing significantly to the education promotion and citizenship, thus, democratizing access to the public

1 Doutoranda em Geografia pela UFPE, Mestre em Geografia, Especialista em Análise e Gestão Ambiental e Graduada em Geografia. É membro do Grupo de Pesquisa Educação Geográfica, Cultura Escolar e Inovação – GPECI e do Laboratório de Ensino de Geografia e Profissionalização Docente – LEGEP da UFPE. Professora da Secretaria de Educação do Estado da Paraíba. Campina Grande – Paraíba - Brasil. [email protected]

DOI/10.30681/21787476.2018.29.8198

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university. To understand the objectives and consequent results, the research adopts a theoretical-methodological approach of a qualitative. In this direction, some questions are pertinent, such as: in relation to higher education, is the quo-ta system the most appropriate for educational policies and affirmative action? What do quota policies represent for public school students? The quota policy provides changes in the students’ profile, starting to construct and reconstruct new experiences spaces, education and citizenship, democratizing higher educa-tion in the country.

KEYWORDS: Education, Affirmative actions, Educational policies, Quota system

Introdução

Refletir sobre as ações afirmativas junto aos contextos das políticas educacionais requer um esforço no sentido de conhecer como elas estão sendo efetivadas e quais as relações constituídas junto à educação superior brasileira, a partir da inserção dos alunos da rede pública de ensino, as universidades.

Nesse sentindo, buscamos compreender os impactos das políticas de cotas e suas perspectivas na vida dos sujeitos que passaram a ter acesso à educação superior por meio dessa ação afirmativa. Assim vale ressaltar, que as políticas educacionais possuem um caráter social e dinâmico, pois existem uma diversidade de sujeitos que são destituídos dos direitos educacionais, inclusive para terem acesso e permanência à educação superior, principalmente, para os alunos de baixa renda, representantes das minorias sociais.

Dentro desse contexto, o sistema de cotas é apresentado como uma forma de ingresso dos discentes a educação superior, “isso é antes tudo, um desdobramento do reconhecimento por parte do Estado das medidas de ações afirmativas. Tais políticas, adotadas pelas universidades como procedimentos de admissão em seus cursos”. (DAFLON; FERES JÚNIOR; CAMPOS, 2013).

Contudo, os alunos que se enquadram como cotistas, especialmente aqueles vindos da rede pública de ensino, precisam vencer diversas barreira para ter acesso e permanência à universidade, tendo em vista que, a sua prepa-ração e formação escolar, muitas vezes são marcadas por diversas dificuldades, dentre elas: infraestrutura básica precária das escolas, escassez de recursos didáticos, desmotivação no processo de ensino e aprendizagem entre alunos e docentes, dentre outros problemas.

Logo, toda essa problemática afeta negativamente a preparação desses alunos junto a realização do exame que seleciona quem será inserido Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 81-98, jan./jun., 2018

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no mundo acadêmico, o Exame Nacional do Ensino Médio - ENEM (esse pro-cesso avalia os aptos a cursarem uma graduação nas instituições públicas de educação superior no Brasil).

Não podemos esquecer que o outro entrave para estes alunos terem acesso ao ensino superior, perpassa pelo cenário das grandes desigualdades socioeconômicas, tendo em vista que, uma parcela de estudantes enfrenta problemas sociais, culturais, econômicos e espaciais (espaço de vivência dos alunos). Esses sujeitos têm conhecimento de que os alunos oriundos da rede privada de ensino possuem maiores possibilidades de sucesso na realização do processo de seleção do ENEM, já que a sua estrutura escolar proporciona maiores subsídios formativos em relação à profundidade dos conteúdos junto as disciplinas escolares, tornando-os mais competitivo.

Entretanto é pertinente destacar que, mesmo com esse universo de desigualdades educacionais e sociais, uma parcela representativa de alunos da rede pública de ensino está tendo acesso à universidade, sobretudo, devido a efetivação das políticas de reservas de vagas. Com base nessas reflexões, investigamos a democratização do acesso à educação superior para os alunos da rede pública de ensino, por meio da efetivação do sistema de cotas, como ação afirmativa em Campina Grande-PB. Está é uma cidade que recebe o título de universitária, porém nem todos os seus moradores podem desfrutar desse título, especialmente, para os que vivem na periferia e estudam na escola pública.

Devido à complexidade do objeto, a pesquisa seguiu uma abordagem do tipo qualitativa, incorporando em seu fazer, o sujeito e sua subjetividade, valorizando a construção peculiar das práticas cotidianas. Esta permeia pelo campo da modalidade explicativa. Quanto aos procedimentos técnicos foram utilizados uma combinação e inter-relação de técnicas bibliográficas, documen-tais e campo, a partir de um estudo de caso. Durante a fase de campo foram realizadas coletas diretas, a partir da aplicação de questionário semiestrutu-rado, tendo como sujeitos um grupo representativo da Universidade Estadual da Paraíba, levando em consideração os aspectos sociais e econômicos dos alunos oriundos das escolas públicas de Campina Grande-PB.

Utilizamos para apreciação do questionário, a análise de conteúdo de Bardin (2011, p.50) o qual destaca ser esta análise “a procura em conhecer aquilo que está por trás das palavras. A análise do conteúdo é a busca de outras realidades por meio de mensagens”.

Metodologicamente as abordagens da pesquisa servem para ensejar a aproximação e a focalização do fenômeno que se pretende estudar, identifi-

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cando os métodos e tipos de pesquisa adequados ao objeto de estudo, siste-matizando a revisão bibliográfica, a coleta, a análise dos dados e a discussão dos resultados (MARCONI; LAKATOS, 2002).

A pesquisa de campo apresentou-se como um prisma refletindo as conquistas do acesso dos estudantes do ensino público junto a universidade, porém esse processo não ocorre de maneira simples, tendo em vistas as múl-tiplas dificuldades de permanência2 vivida pelos estudantes, apresentando subjetividades e um conjunto de problemáticas.

Em relação ao modelo metodológico, especialmente a técnica utiliza-da na pesquisa, tivemos como universo, os estudantes de Graduação oriundos da Escola Pública ingressantes na Universidade Estadual da Paraíba (UEPB). Seguimos uma amostra do tipo não - probabilística intencional, onde os seus elementos são selecionados de acordo com a intenção do pesquisador, assim o questionário foi aplicado com estudantes matriculados em diversos cursos da universidade. Para determinação da amostra com o universo desconhecido foi utilizada a fórmula encontrada em Samara & Barros (2002, p.75) que resultou uma amostra de 196 estudantes.

Dessa maneira, ao abordarmos os alunos, buscamos conhecer se eles eram oriundos da rede pública de ensino. Se a resposta fosse sim, apresentá-vamos a pesquisa e pedíamos a sua colaboração, convidando-os a responde--la. Todos os alunos convidados aceitaram participar da pesquisa. Não houve rejeição de nenhum aluno.

Um fato importante que precisamos mencionar é que de cada 30 alunos que abordamos, aproximadamente 20 deles eram egressos da escola pública, isso de certa forma nos animou, tendo em vista que, temos de ma-neira concreta uma representatividade relevante de alunos oriundos da escola pública estudando na UEPB em Campina Grande.

Desafios da efetivação das ações afirmativas no Brasil

A década de 1990 é o momento pelo qual a educação brasileira viven-ciou significativas transformações. Estas ações provocaram algumas mudanças no contexto dos processos educativos, principalmente, com a criação da Lei

2 A não permanência dos estudantes da UEPB são provocadas por vários fatores, dentre eles: dificuldades financeiras, assistência estudantil insuficiente, problema de aprendizagem, déficit de aprendizagem, pro-blemas do Ensino Médio, do Ensino Fundamental, problemas psicológicos, reprovação, falta de acolhimento na universidade por professores, funcionários e alunos, problemas metodológicos, dentre outros.

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de Diretrizes e Bases da Educação (LDB, 1996) e dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN’s,1998). Já no âmbito acadêmico, surgem discussões que buscavam a urgência da implantação de ações afirmativas para o acesso e permanência da população menos abastadas as universidades.

Assim, nesse período o debate sobre as ações afirmativas ganha fôlego, concretizando dessa forma, as reflexões sobre a importância dessa discussão junto a educação superior brasileira e as suas políticas educacionais. Primordialmente, as políticas educacionais situam-se no âmbito das políticas públicas e possuem um papel singular, junto aos processos de transformações sociais, principalmente, em relação à educação superior.

Segundo Bezerra e Gurgel (2012, p.96) “a educação superior no Brasil se conformava, até os anos 1990, com a condição de ser um patrimônio reservado aos estudantes provenientes das camadas mais altas da popula-ção”. Por isso Vieira (2009) destaca que, nesse período surgem os primeiros trabalhos produzidos, ainda muito incipientes diante do ineditismo do tema que se dispõem a estudar as ações afirmativas, juntamente, com a escassez de material empírico a ser analisado, que giravam em torno de algumas questões recorrentes acerca das possibilidades de adoção dessas medidas de educativas, em um país com profundos contrastes sociais e educacionais.

Nesse cenário, o século XXI, inicia a sua temporalidade com diversos desafios educacionais, dentre eles: superar as desigualdades de acesso à edu-cação superior, problema este que afeta de maneira profunda a população de menor poder aquisitivo no Brasil. Essa população por muito tempo possuía uma visão suplantada na dinâmica que colocava a universidade pública sob topo de uma hierarquia, ou seja, vendo-a como um espaço de prestigio e de poder, haja vista que, a sua apropriação era alvo de desejo de muitos brasilei-ros, porém conquistado por poucos pertencentes as classes subalternas. Este fato era perceptível junto a população mais pobre, tendo em vista que, muitos de seus membros viam como algo distante e até impossível o seu acesso ao meio acadêmico.

Um dos desafios postos para a universidade e a sociedade em geral é pensarmos sobre os papeis da educação superior brasileira e seus processos de inclusão, já que muitos brasileiros pertencentes às classes menos abastadas estiveram excluídos de usufruírem desse espaço educacional. Nesse sentido, as ações afirmativas buscam igualdade de oportunidades, incluindo mais e excluindo menos.

Partindo desse pressuposto, para reduzir as desigualdades das po-pulações menos abastadas no tocante ao acesso à educação superior, três

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universidades brasileiras se destacam, sendo as primeiras nesse momento histórico, a proporcionarem a inserção desses sujeitos a universidade, como traz Lima et al (2014).

Em 2001 foram dados os primeiros passos para a implementação de reserva de vagas em instituições públicas de ensino superior pelas Universidades Estaduais da Bahia, Rio de Janeiro e Mato Grosso do Sul. A primeira universidade federal a adotar cotas para negros e índios foi a Universidade de Brasília (UnB), em 2004. Em 2007, um levantamento feito pelo Laboratório de Po-líticas Públicas (LLP) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) indicou que 51 instituições de ensino já haviam adotado políticas de ação afirmativa, entre universidades estaduais e federais, faculdades, centros universitários e institutos federais superiores (IFS) (LPP/UERJ, 2009). (LIMA, 2014, p.08).

Na construção das políticas educacionais junto às ações afirmativas é importante ressaltar que os principais avanços do sistema de cotas ocorreram no ano de 2012, a partir da criação da Lei 12.711, de 29 de agosto, na qual a política de cotas assume um papel mais abrangente, juntamente, com o Decreto 7.284 e a portaria normativa, que visa garantir 50% das matrículas por curso para os alunos oriundos integralmente do ensino médio público. (BRASIL, 2012).

Santos (2013, p.06) destaca que,

A Lei 12.711 estabelecendo cotas de no mínimo 50% das vagas das instituições federais para estudantes que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas. No preenchi-mento dessas vagas, 50% deverão ser reservadas aos estudantes oriundos de famílias com renda igual ou inferior a um salário mínimo e meio per capita. O segundo artigo da Lei indica o preenchimento das vagas para os candidatos autodeclarados pretos, pardos e indígenas, em proporção igual à sua distribuição nas unidades da Federação onde estão localizadas as instituições federais do ensino superior, e de acordo com o último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Dessa forma, a política de cotas objetiva oportunizar a inserção educa-cional dos grupos marginalizados, seja pela condição social ou racial dando-lhes chances de terem acesso à universidade. Decerto, as ações afirmativas junto a esses sujeitos proporcionam conquistas ao direito educacional “negado”, haja vista que, suas origens estão enraizadas na desigualdade sociopolítica, Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 81-98, jan./jun., 2018

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o que tem alimentado um dos maiores problemas da sociedade brasileira: a desigualdade social e econômica, o que mutila o direito educacional das classes subalternas e exploradas pelo capital.

Nessa linha de pensamento, Mészáros (2012) reflete que:

No reino do capital a educação ela mesma é uma mercadoria. Daí a crise no sistema público de ensino, pressionado pelas demandas do capital e pelo esmagamento dos cortes dos or-çamentos público. Instaurando o universo neoliberal em que “tudo se vende, tudo se compra”, tudo tem preço, do que a mercantilização da educação. Uma sociedade que impede a emancipação só pode transformar os espaços educacionais em shopping centers, funcionais a sua lógica de consumo e de lucro (MÉSZÁROS, 2012, p.11).

Dessa maneira, é provocado um grave problema: a negação de uma educação, sobretudo a superior, para os brasileiros das classes de menor poder aquisitivo. Isso provoca uma situação de contrastes sem precedentes, pois a educação em muitos casos é tratada como mercadoria e representa um instrumento de poder.

Essa disputa ocasiona que muitas das vagas nas universidades passam a ser transformadas em um quinhão mercantil. Isso destituiu a real função social da universidade e contribui para a transformação das instituições de ensino superior em meros objetos de desejo e status. (CATÃO et al, 2013).

Desse modo, as políticas educacionais, consideram como um dos seus principais foco de expressão, a redução dos contrastes educacionais e a não reprodução de desigualdades socioeducacionais, por meio das ações afirmati-vas, tendo como intenção proporcionar educação e qualificação, levando esses sujeitos a lutarem por justiça e cidadania, elementos esses que lhes ajudarão a alcançar o direito de conquistarem o ensino superior, além de os inserirem no mundo do trabalho com uma maior qualificação, por consequentemente adquirirem um saber que lhes foi negado por muito tempo, devido a sua con-dição econômica, bem como, a falta de igualdade de oportunidade.

Para Santos (2013) a inclusão por meio das cotas nas universidades é um passo importante na luta por uma sociedade menos desigual. Mas, além disso, uma universidade menos elitizada, com uma composição de seu corpo docente, técnico administrativo e de estudantes semelhante à composição da nação, resulta também em uma universidade de maior qualidade. Isto porque a quase ausência de segmentos sociais da academia pode resultar na sua ausên-

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cia também como objeto da produção do conhecimento. Portanto, o desafio da construção de uma sociedade e de uma universidade menos desiguais se soma, como tarefa não apenas dos que precisam ser incluídos, mas de todos que almejam uma universidade de qualidade e uma sociedade mais justa.

Bezerra (2012) traz um ponto que merece destaque, referindo-se à temporariedade da política de cotas, pois, ao incrementar-se o investimento no ensino de base, como forma de garantir a igualdade de condições dos alunos provenientes de escolas da rede pública, tal política tornar-se-á desnecessária. É sempre bom lembrar que a política de cotas é uma política que se pretende conjuntural, portanto a ser substituída por políticas públicas estruturais ou pelo efeito positivo e corretivo de políticas públicas estruturais.

Por isso, a efetivação do sistema de cotas no Brasil, por meio das ações afirmativa, ocorre devido a diversos motivos, dentre eles, as fragilidades da educação escolar pública. Contudo, os primeiros passos foram dados, e sem dúvida essa ação afirmativa aponta para uma nova construção do fazer e viver a educação superior no país.

Impactos das políticas de cotas para os alunos da educação pública

Em relação aos impactos das políticas de cotas para os alunos da educação pública, Palácio (2012) afirma que, a maioria dos discentes que conseguem ter acesso à universidade pública, conquistaram esse espaço sob as atuais condições de fragilidade da Educação Básica. Por isso, enquanto o Ensino Básico público não tiver aparelhagem suficiente para qualificar o seu egresso, políticas públicas de acesso e permanência se farão necessárias.

Diante desse cenário, precisamos acompanhar o desenvolvimento das ações afirmativas e aprofundar a reflexão sobre esse campo de análise, no sentindo de pensarmos seus limites e potencialidades na configuração do acesso dos estudantes egressos do ensino público junto aos IES.

Na perspectiva de Caôn e Frizzo (2010) é necessário que a comunidade acadêmica reflita sobre isso, tendo em vista que o ensino superior tem sofrido grandes modificações, especialmente nas últimas décadas, provocadas pelas propostas mudanças nas políticas públicas educacionais, juntamente com a criação de programas específicos que contribuem para o acesso de estudante de baixa renda ao ensino superior.

A política de cotas promove impactos junto a educação superior, de-mocratizando o seu acesso para os alunos oriundos da educação pública. Isso

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proporciona mudanças no perfil dos discentes das universidades brasileiras e em Campina Grande-PB não é diferente. Essa ação acarreta a construção de novos espaços de vivências, educação e cidadania dentro das universidades e nos múltiplos espaços sociais desses alunos.

Nessa linha de pensamento, observamos que autores, como Catani et al. (2006) e Neves et al. (2013), discutem que as modificações nas políticas educacionais são realizadas com o intuito de democratizar a inserção dos estudantes de baixa renda na educação superior, porém só a política educacional não deve se restringir apenas à ampliação do acesso dos estudantes, tendo em vista que essa ação não será suficiente para proporcionar uma verdadeira democratização. Por isso, é preciso pensarmos em mecanismos que estimulem a permanência dos alunos e reduzam a evasão estudantil.

Ter acesso à educação superior representa a conquista da cidadania e um futuro menos excludente para esses alunos, trazendo mudanças positivas no cenário social, econômico e educacional. Por isso, o ingresso de estudantes junto as universidades em Campina Grande-PB, por meio do sistema de cotas, proporciona uma visibilidade socioeducaional a esses sujeitos.

Nesse sentido, para responder alguns questionamentos sobre a po-lítica de cotas e seus impactos na vida dos estudantes originários das escolas públicas de Campina Grande-PB, levantamos algumas indagações. Questio-namos se essa política é uma das formas de amenizar a real distância dos moradores das camadas populares das escolas públicas a terem acesso aos espaços educacionais. Segundo os discentes:

O sistema de cotas contribui para que os alunos possam ingressar na faculdade, no entanto se a educação pública tivesse a mesma qualidade do ensino privado não seria necessário ter cotas, pois haveria conhecimento igualitário independente de raça ou condições financeiras. (Aluno do curso de Administração, UEPB).

Sim! Sob a atual situação educacional das escolas públicas, as cotas foram uma das principais conquistas do século junto a educação. Foi o momento em que ficou notório que igualdade não significa justiça. (Aluno do curso de Ciências da Computa-ção, UEPB).

Sim, as desigualdades de ensino são alarmantes, é notório que os estudantes do ensino público não têm uma preparação es-colar para competir com estudantes do ensino particular, que são diariamente treinados para terem acesso à universidade, enquanto os alunos de escola pública devem se desdobrar para

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estudarem e dar conta de problemas financeiros. (Aluno do curso de Farmácia, UEPB).

Em relação a essa questão, podemos entender que os sujeitos da pesquisa concordam que o sistema de cotas é uma das formas de amenizar a real distância dos alunos das escolas públicas a terem acesso à universidade, porém é importante ressaltar, que não é apenas o acesso que deve ser propor-cionado ao aluno cotista, mas a sua permanência na universidade, pois muitos alunos beneficiados com políticas educacionais necessitam trabalhar para poder custear as despesas com seus estudos, o que de certa forma reduz as suas oportunidades de ingressar em grupos de estudos, projetos de extensão, projetos de iniciação científica e outras atividades acadêmicas.

Os discentes destacaram também que a política de cotas existem devido às fragilidades do ensino da escola pública, sendo extremamente im-portante melhorar a qualidade da educação pública escolar, proporcionando assim, para os alunos uma melhor formação básica escolar. Dessa maneira, as cotas representam, nas perspectivas dos sujeitos, uma conquista para os alunos de menor poder aquisitivo, caracterizada por ser uma luta pela igualdade do direito de se educar.

Catão et al (2013) enfatiza que ações afirmativas e política de cotas favoreceram:

O pluralismo acadêmico, muito embora a construção de uma sociedade plural seja prevista no próprio preâmbulo da Constitui-ção que, apesar de não ter função normativa, apresenta inegável função hermenêutica –as universidades ainda são sonho distante para diversos setores da sociedade, historicamente excluídas da academia (CATÃO et al, 2013, p.09)

Perguntamos aos discentes que aspectos dificultam o acesso dos jovens da periferia vindos das escolas públicas de Campina Grande a ingressar a universidade.

O contexto socioeconômico é difícil e desigual para os jovens das áreas periféricas, além de estarmos infelizmente lado a lado com a criminalidade, nossas escolas são as mais sucateadas, pois a educação é de baixa qualidade devido à problemática da violência, pois muitos professores não querem trabalhar em lugares perigosos. (Aluno do curso de Administração, UEPB).

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Muitas vezes não temos oportunidade de estudar de maneira mais densa, pois a partir do momento em que um jovem se ver sufocado e obrigado a trabalhar para ajudar em casa, observa-mos que a meritocracia é conotativa. (Aluno do curso de Ciência da Computação, UEPB).

São vários determinantes, mas o principal é a falta de apoio e a necessidade de ingressar no mercado de trabalho assim que se tem o ensino médio concluído, onde muitos jovens recebem um salário baixo e por não terem nenhuma expectativa, acabam se conformando e não buscam uma graduação que possa lhe ren-der melhores salários. (Aluno do curso de Odontologia, UEPB).

Em relação a essa questão, os sujeitos da pesquisa elencaram vários aspectos que dificultam o acesso dos jovens da periferia, vindos das escolas públicas de Campina Grande a ingressar na universidade, dentre eles: as condições precárias do ensino escolar público, a falta de recursos didáticos e a distância entre escola-universidade. Um problema relevante que também foi destacado pelos discentes é a necessidade de trabalhar para ajudarem na renda familiar. Mencionaram, também que falta apoio da família, da própria escola, provocando uma desmotivação dos estudantes, pois para muitos jovens da periferia, estudar em uma universidade, é algo distante para as suas vidas.

Um outro aspecto que foi questionado se pautou em conhecer se o sistema de cotas é o mais adequado para efetivar políticas educacionais, os alunos destacaram que:

O sistema de cotas ainda não é o mais adequado, o adequado verdadeiramente seria a melhoria na rede de ensino público, possibilitando a competição de igual para igual. (Aluno do curso de Administração).Não! Estabelecer medidas de padronização do ensino público e privado, igualando os seus cronogramas educacionais e oferecen-do as mesmas oportunidades de ascensão seria uma ótima forma de substituir o sistema de cotas. (Aluno do curso de Farmácia).O mais adequado não é, pois o correto seria uma melhora no ensino público para que os alunos da escola pública pudessem se igualar aos alunos das escolas particulares, mas como não é possível essa mudança em um curto prazo de tempo, o sistema de cota tem sido satisfatório para facilitar o ingresso no ensino superior de modo que alunos carentes conseguem pontuações

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relevantes e assim conquistam suas vagas. (Aluno do curso de Ciência da computação).

Ao perguntarmos se o sistema de cotas, se apresenta como o mais adequado para efetivar políticas educacionais, muitos alunos cotistas concorda-rem com o sistema de cotas para terem acesso ao ensino superior, entendendo que esta é uma política pública que busca equilibrar as grandes desigualdades socioeducacionais existentes entre os alunos da rede púbica e da rede privada do país, entretanto os alunos de maneira unânime destacaram que essa não seria a forma “mais adequada” para que os alunos da escola pública tenham acesso à universidade.

Perguntamos de que forma as cotas (raciais e/ou sociais) aumentam as chances de construir cidadania para os alunos oriundos de escolas públicas da periferia, inserindo-os na universidade.

As cotas sociais representam os motivos de sua própria exis-tência. O abismo existente entre escolas públicas e particulares fornecem, claramente, oportunidades distintas a estudantes de classes sociais diferentes. Sem as cotas para os estudantes de classes sociais menos favorecidas, as cadeiras nas melhores universidades continuariam sendo conquistadas por candidatos com melhor estabilidade financeira, por isso as cotas represen-tam cidadania. (Aluno do curso de Ciência da computação).

As cotas é uma forma de cidadania, tornando o ingresso a educação superior mais justo, uma vez que cada aluno vai em busca de sua vaga com outros alunos que tiveram as mesmas oportunidades, tornando a universidade um espaço mais de-mocrático. Trazendo oportunidades a muitos alunos cotistas de emergir da periferia social e alcançar horizontes onde muitos dos seus semelhantes não conseguiram chegar. (Aluno do curso de Farmácia).

As cotas contribui para que mais alunos da rede pública ingres-sem na universidade, possibilitando que o futuro profissional não seja apenas uma ‘mão de obra’ e sim um ser capaz de opi-nar e encontrar as melhores soluções em sua área, instigando a cada dia mais ter um caráter cidadão em si. (Aluno do curso de Odontologia).

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Antes de mais nada, podemos constatar que as ações afirmativas por meio da política de cotas estão criando novas oportunidades de promover educação e cidadania, construindo novos espaços para esses sujeitos, onde aos poucos estamos reduzindo as condições das profundas desigualdades sociais e educacionais, democratizando o acesso à educação, construindo princípios de justiça social, assim a política de cotas é uma das formas de amenizar a distância dos moradores das camadas populares aos espaços educacionais.

José Sobrinho (2013) destaca que, para democratizar o ensino su-perior é um passo para termos uma verdadeira democratização da sociedade e da promoção da justiça3; no entanto essa educação não deve se restringir apenas na ampliação do acesso, pois é preciso também qualidade, pertinência e relevância social do ensino superior, pois a educação é um bem público, impres-cindível e insubstituível, direito de todos e dever do Estado. É dever do Estado criar e oferecer condições efetivas para que isto se realize com a amplitude.

Buscamos identificar o que mudou na vida dos cotista, em relação às expectativas profissionais para o futuro, após a inserção na universidade.

Uma explosão de sentimentos diária por saber que a cada dia es-tarei mais perto do meu objetivo. (Aluno do curso de Farmácia).

A minha vida mudou a partir do momento que eu observei quais os caminhos trilhados pelos meus colegas de ensino fundamen-tal e médio. Sou uma das poucas que conseguiu ingressar no ensino superior, e vejo que muitos deles vivem sem nenhuma perspectiva. A minha visão de crescimento profissional está sendo ampliada de maneira inacreditável. (Aluno do curso de Odontologia, UEPB).

Desde muito nova sonhava em fazer um curso superior. Contudo, ao alcançar o primeiro objetivo percebi que quero ir além, mi-nhas expectativas com certeza aumentaram, hoje sonho com um intercâmbio, um doutorado e sempre buscando doar o melhor de mim. Percebi que verdadeiramente preciso aprender muito mais e crescer profissionalmente de forma a competir comigo mesma. (Aluna do curso de Ciência da Computação, UEPB).

Os estudantes da escola pública que se inseriram na universidade em Campina Grande-PB, na condição de cotistas, agarram-se a esta oportu-

3 Para Santos (2002) Como descobrir o que é justo ou injusto, em um mundo onde a verdade é tão reni-tentemente sonegada que reconhecê-la depende do oportuno aproveitamento das contradições em que a própria práxis nos mergulha?

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nidade como uma conquista e vitória pessoal, mesmo encontrando diversos desafios para construírem sua carreira profissional. Por isso é necessário que as políticas educacionais se preocupem em melhorar de maneira urgente a educação escolar, para desconstruímos os múltiplos preconceitos que estão sob os alunos da escola pública.

Dessa maneira, a partir das respostas dos alunos, observamos que a política de cotas representa relevantes conquistas junto às ações afirmativas, e sem dúvida por meio desse sistema a universidade pública passa a efetivar além da inclusão, a redução de uma dívida social com a classe menos abastada, tendo em vista que as universidades abrem as suas portas e estão construindo um novo espaço de diálogo entre a história e a sociedade brasileira.

Indubitavelmente, as universidades com essa postura irão proporcio-nar não apenas a formação de profissionais qualificados, mas irão promover justiça social e cidadania, ações relevantes para reduzirmos as desigualdades sociais do país, pois à universidade é um lugar de lutas para alcançarmos prin-cípios sociais e educacionais.

Segundo Chauí (2017), a universidade não pode ser apenas um lugar que reflete sobre a luta de classes. Ela tem que compreender que é parte dessa disputa, seja pelo seu alunado, pela divisão entre seus professores, pelo papel das administrações e burocracias, que operam muitas vezes a favor da classe dominante. Somos parte da luta de classes e somos obrigados, como instituição de ensino, a entender esse papel que desempenhamos na sociedade.

Em suma, a educação é um bem precioso e relevante para o sucesso individual e coletivo de uma nação, haja vista que, qualquer projeto social ou de país, só ocorrerá por meio da educação que promova a construção de consciência crítica e cidadã. Em relação aos estudantes da rede pública de ensino, estes necessitam mais do que nunca de uma educação de qualidade que traga novas perspectivas de libertá-los e qualificá-los para um mundo do trabalho dinâmico e competitivo, proporcionando subsídios para que esses sujeitos possam vencer as barreiras da exclusão social, do desemprego e da desumanização. Com esse pressuposto, precisamos compreender se esses impactos serão positivos e quais mudanças socias e educacionais ele provocará na nossa sociedade.

Considerações finais

As ações afirmativas por meio das políticas de cotas é uma das formas de promover o acesso dos alunos oriundo das escolas públicas e pertencen-Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 81-98, jan./jun., 2018

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tes as camadas populares de se inserirem no mundo acadêmico. Como foi apresentado na pesquisa, essa política de inclusão é uma conquista ao direito educacional “negado”, para os jovens da periferia, vindos da escola pública. Esta ação busca mostra-se como uma possibilidade para alcançarmos uma redução na desigualdade educacional existente no Brasil e democratizar a educação superior.

Dessa maneira, por meio das ações afirmativas é possível estimular a inserção dos sujeitos que antes estavam fora dos bancos da academia, a construírem uma nova identidade individual e coletiva. Assim, o acesso desses sujeitos a universidade perpassa por um caminho que está sendo trilhado em uma atmosfera de polêmica e dualidade de opiniões, pois inserir esses sujeitos por meio das cotas nas universidades altera uma estrutura patriarcal mergu-lhada numa visão elitista na qual, a educação brasileira possui suas origens, sobretudo a educação superior.

Para Dourado (2010) as ações afirmativas são justificadas porque devemos lutar por uma educação superior de qualidade, democrática e para todos, pautada pela defesa de um ethos político acadêmico e social que se contraponha a fragmentação e hierarquização da universidade e que se traduza na indissociabilidade do ensino, da pesquisa e da extensão. No caso brasileiro, o desafio é enorme, especialmente diante do cenário de privatização da edu-cação superior no país. Assim, para a democratização da educação superior pública e gratuita no país, deve-se garantir políticas e ações direcionadas à regulação e gestão do sistema que contribuam para a melhoria da qualidade dos princípios educativos.

Logo, a política de cotas estão construindo para a consolidação de um novo princípio educativo sobretudo, nesse tempo tão incerto vivido pela nação, especialmente em relação a gestão de políticas sociais e educacionais, principalmente, devido as drásticas medidas tomadas pelo governo, notada-mente, com os cortes no orçamento da educação, que afetam ainda mais quem depende da educação pública, colocando os estudantes dentro dos conflitos e interesses das políticas de governo, distanciando-os de possuírem uma edu-cação verdadeira. Isso proporciona segundo Mészáros (2012) o conformismo, para produzir subordinação e alienação, reduzindo assim o papel da educação junto a sociedade do capital.

As cotas estão longe de ser a solução para todos os problemas da sociedade ou da universidade brasileira. Contudo, a implantação delas abre diversas perspectivas que precisam ser conhecidas, para que se possa no futuro avaliar o seu real impacto no processo de democratização do ensino superior

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no país. (NEVES, 2013).As ações afirmativas se tornam relevante para construirmos uma prá-

xis educativa que tenha suas raízes consolidada, numa perspectiva democrática, construindo um diálogo entre universidades, escolas e sociedade. Para tanto, a implantação do sistema de reserva de vagas para alunos de escolas públicas impacta na transformação das universidades, da sociedade e da vida indivi-dual desses sujeitos, bem como nos seus lugares de vivência, especialmente, por que a política de cotas é uma das maneiras de reparar as desigualdades socioeducacionais do país e promover cidadania.

Portanto, esse é um momento de construção de uma práxis educati-va, sobretudo para os estudantes da escola pública terem acesso à educação superior, por isso é cedo para estruturarmos um pensamento definitivo sobre as ações afirmativas, tendo em vista que é necessário continuarmos com pes-quisas que se disponham a madurecer essa discussão.

Notas: Agradecimento a CAPES pelo apoio por meio da concessão de bolsa do doutorado.

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PROGRAMA DE ASSISTÊNCIA ESTUDANTIL NA UNEMAT: POLÍTICA DE PERMANÊNCIA?1

UNEMAT STUDENT ASSISTANCE PROGRAM: PERMANENCE POLICY?

Elizeth Gonzaga dos Santos Lima2 Fernando Cézar Vieira Malange3

Valci Aparecida Barbosa4

RESUMO: Este artigo apresenta os resultados de um estudo de caso realizado na Universidade do Estado de Mato Grosso – Unemat, com o objetivo de analisar a política de assistência estudantil da IES e verificar se esta se configura como política de permanência. Para tanto, analisamos a Resolução nº 019/2013–CONSUNI que cria o Programa de Assistência Estudantil e os editais de seleção de estudantes aos auxílios moradia e alimentação, de 2013 a 2015. Os resultados evidenciaram que o Programa tem o objetivo de propiciar aporte financeiro aos discentes dos cursos de graduação, com comprovada vulnerabilidade socioeconômica, no entanto, não encontramos nos documentos a intencionalidade de se garantir a permanência com retorno na melhoria da aprendizagem, assim como, não identificamos meca-nismos de acompanhamento do desempenho acadêmico. Concluímos apontando a necessidade de prever e implementar ações de permanência nos programas que são implantados como política de assistência estudantil.

PALAVRAS-CHAVE: Educação Superior, Permanência, Assistência Estudantil

ABSTRACT: This article presents the results of a case study carried out at the State University of Mato Grosso - Unemat with the objective of analyzing the student assistance policy of the IES and verifying whether it is a permanence policy. To do

1 Esta pesquisa é resultado dos estudos desenvolvidos pelo Grupo de Pesquisa GEPAPES, que integra o Eixo 5: Acesso e Permanência à Educação Superior da Rede Universitas-Br. Para tanto, foi apresentada no XXIV Seminário Nacional Universitas-Br, como forma de discussão com os pesquisadores da Rede e está sendo publicada em periódico para difusão e potencialização da temática para a comunidade científica da área. 2 Doutora e Pós-doutora em Educação. Docente permanente do Programa de Pós-Graduação em Educação e do Curso de Pedagogia da Unemat. Cáceres, Mato Grosso, Brasil. Integra a Rede Universitas-Br. [email protected]. ORCID http://orcid.org/0000-0002-3340-55873 Doutor em Engenharia Elétrica – Automação e mestre em Ciências da Computação. Professor da Unemat. Cáceres, Mato Grosso, Brasil. Integra a Rede Universitas-Br. [email protected]. ORCID https://orcid.org/0000-0002-2210-82454 Mestre em Educação. Técnico Universitário da Unemat na especialidade de Pedagoga. Cáceres, Mato Gros-so, Brasil. Integra a Rede Universitas-Br. [email protected]. ORCID https://orcid.org/0000-0002-7797-4634.

DOI/10.30681/21787476.2018.29.99119

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so, we analyzed Resolution No. 019/2013-CONSUNI, which created the Student Assistance Program and the student selection notice for housing and food aid, from 2013 to 2015. The results showed that the Program has the objective of providing financial support to undergraduate students with proven socioeconomic vulnerability. However, the documents don’t show the intention of guaranteeing permanence with a result in the improvement of learning and they also don’t identify mechanisms to monitor academic performance. We conclude by pointing out the need to predict and implement permanence actions in the programs that are implemented as student assistance policies.

KEY WORDS: Higher Education, Permanence, Student Assistance

Introdução: Dimensões conceituais e emergência do problema de pesquisa

A expansão da educação superior no Brasil tem sido temática de análise do grupo de pesquisa GEPAPES5 desde o ano de 2010 com foco no estudo de questões relacionadas ao acesso e a permanência na educação superior. Para tanto, estudamos a Política de Expansão da educação superior pós-LDB, o que possibilitou analisar Programas oficiais do Estado brasileiro como Prouni, FIES, Pnaes/Pnaest, Enem/Sisu, dentre outros. Evidenciamos que a preocupação do Estado brasileiro tem centrado na ampliação do acesso à educação superior como ingresso aos cursos de graduação. No entanto, em relação à permanência e conclusão a política está timidamente avançando na concessão de bolsas e/ou financiamento estudantil.

O final da década de 1980 e início da década de 1990 são marcados por profundas mudanças econômicas, tecnológicas, ideológicas e sociais. Nesse período, o neoliberalismo estava em plena ascensão na América Latina. No Brasil as questões econômicas, a desestatização e as privatizações passaram a compor a agenda também do sistema educacional e as orientações assumidas dos organismos internacionais determinaram profundas transformações no sistema de ensino. Essas mudanças influenciaram diretamente a expansão da educação superior com foco nas IES privadas, numa perspectiva de resultados e no tratamento empresarial da universidade, conforme afirma Luchmann (2007, p. 23), “essa visão de universidade como empresa se acentua ainda mais nos anos 1990 e tem interferência direta na relação professor-aluno, em que o aluno passa a ser um cliente”.

A grande expansão no número de IES privadas ocorreu principalmente 5 Grupo de Estudos e Pesquisa em Acesso e Permanência na Educação Superior/Unemat (GEPAPES)Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 99-119, jan./jun., 2018

LIMA, E. G.; MALANGE, F. C.; BARBOSA, V. A.

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na década de 1990 afetando às IES públicas com diminuição dos investimen-tos, esses passam por um processo de transferência de recursos públicos para instituições privadas, seja diretamente ou indiretamente, por meio de empréstimos a juros baixos, na concessão de créditos educacionais ou forne-cimento de subsídios financeiros ou fiscais. Para que isso acontecesse houve uma permissividade na legislação, fruto de uma concepção mais neoliberal que está presente desde a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº. 9.394/1996).

Estudar o processo de democratização da educação superior, por meio de sua expansão, ultrapassa pensar a mera ampliação da oferta de vagas. Democratizar é possibilitar maior participação das classes que ficam às “mar-gens” das políticas sociais. Nessa perspectiva, nossos estudos compreendem a democratização e a expansão da educação superior, utilizando o conceito de democracia participativa de Santos (2002) como sendo a participação ampliada dos diversos atores nas tomadas de decisões sociais, levando em consideração as decisões globais, porém a priorização deve ser pelas decisões locais e regio-nais. Sustentando esse conceito, entendemos que as políticas de expansão da educação superior não têm atendido aos grupos de menor representatividade política na esfera do estado, os grupos mais vulneráveis econômica e social-mente, os setores sociais menos favorecidos e as etnias minoritárias.

A ampliação do número de vagas na educação superior foi considerá-vel no período de 1996 à 2014. Segundo dados do Censo da Educação Superior/INEP/MEC passamos de 634.236 vagas ofertadas em 1996 para 3.545.294 em 2014. Ainda tivemos em 1996 um número de matrículas de 1.868.529 o que ampliou para 2014 chegando a 6.486.171. Esse aumento na quantidade de vagas e matrículas também se repete no Estado de Mato Grosso, no mesmo período passa de 8.396 para 67.073, enquanto que a o número de matrículas vai de 24.213 em 1996 para 128.419 em 2014.

Mas, essa ampliação não tem expressado na mesma proporção o crescimento no número de estudantes que concluem a graduação. O número de concluintes segundo dados do Censo/INEP em 1996 foi de 254.401 e em 2014 foi de 837.304. Se considerarmos, o número de vagas preenchidas e o número de concluintes, no Brasil, observamos um índice de “não conclusão” de 50,49% em 1996 e 60,33% em 2014. Já no Estado de Mato Grosso, esse índice atingiu 62,36% em 1996 e 67,91% em 2014. Verificamos que parte dos que ingressam nos cursos superiores acabam abandonando seus estudos, principalmente durante os primeiros semestres. A evasão se tornou um dos principais problemas enfrentados pelas IES. Para Baggi (2010, p. 13) “a evasão

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é um fenômeno social complexo, definido como a interrupção nos ciclos de estudos”. Ele complementa que a sua evolução “é um problema que vem preo-cupando as instituições de ensino em geral [...], pois a saída de alunos provoca graves consequências sociais, acadêmicas e econômicas”, ainda acrescentamos o desperdício de recursos públicos, as frustrações de estudantes e familiares e a perda de potencialidades pessoais, profissionais e sociais.

As pesquisas desse grupo são embasadas no entendimento do acesso como inclusão em todos os sentidos e, principalmente, possibilitar condições de pertencimento aos estudantes. Nesse sentido, o conceito de acesso que utilizamos está sustentado em Silva e Veloso (2013, p. 729) “[...] acesso significa “fazer parte”, por conseguinte, remete à inserção, participação, acolhimento”. Estudar o acesso à educação superior implica considerar as dimensões de in-gresso, permanência, conclusão e formação/qualidade desse nível de ensino.

Nesse contexto teórico entendemos que a democratização da educação superior não se efetiva apenas com a sua expansão por meio da ampliação de oferta de vagas, o ingresso na universidade é apenas o início de um percurso muito mais complexo, que são as dimensões da permanência, conclusão e qualidade.

As pesquisas que estamos realizando sobre as políticas de democra-tização e expansão da educação superior, estudando o caso da Unemat, dados e informações coletadas sobre o seu processo de expansão e estudos sobre o perfil dos ingressantes nessa IES, evidenciaram que, em relação ao ingresso, a instituição vem cumprindo sua missão de ter o ingresso democrático e nos levam a concluir que sua expansão teve um processo democratizado, mesmo que sem uma intencionalidade explícita em documentos. A democratização que permitiu o ingresso a populações tradicionais e diversificadas emergiu da realidade local, dos contextos regionais e das necessidades da comunidade onde a Unemat está inserida, ainda que em alguns momentos de forma não planejada e sem nenhuma intenção de implantar as políticas nacionais. As pesquisas demonstram que na Unemat houve uma democratização priorita-riamente pelo acesso concebido apenas como ingresso. Apesar de possibilitar ingresso a todas as classes, povos e raças indistintamente, o problema da permanência está cada vez mais evidente.

A partir dos resultados das pesquisas realizadas pelo grupo e ques-tionamentos levantados, emergiu esse estudo com o objetivo de conhecer a política de assistência estudantil da Universidade do Estado de Mato Grosso (Unemat) e analisar como esta se configura e/ou está sendo implementa-da como política de permanência. Para tanto, analisamos a Resolução nº Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 99-119, jan./jun., 2018

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019/2013–CONSUNI que cria o PAE - Programa de Assistência Estudantil, bem como, as Resoluções nº. 020/2013-CONSUNI e 021/2013-CONSUNI e os resul-tados dos editais de seleção de estudantes aos auxílios moradia e alimentação, no período de 2013-2014 e 2015.

Verificamos que o PAE-Unemat tem o objetivo de propiciar aporte financeiro aos discentes dos cursos de graduação, com comprovada vulnera-bilidade socioeconômica, a grande questão que se coloca para esse estudo diz respeito a: O Programa de Assistência Estudantil está sendo implementado como política de permanência?

Expansão, Ingresso e Permanência na Unemat

A Universidade do Estado de Mato Grosso (Unemat) teve o seu primei-ro ato de criação em 1978 como Instituto de Ensino Superior de Cáceres – IESC, o que se materializou no dia 20 de julho de 1978, por meio da Lei Municipal nº 703. Nesta mesma data a Câmara Municipal de Cáceres autorizou o poder executivo a criar o Instituto de Ensino Superior de Cáceres, vinculando-o, por meio do Decreto nº. 190, à Secretaria Municipal de Educação e de Assistência Social, com o objetivo de atender a qualificação de professores.

Em dezembro de 1993, através da Lei Complementar nº 30, passou a ser Universidade do Estado de Mato Grosso – Unemat. Desde a sua criação, a Unemat vem adotando diferentes e inovadoras formas de ofertar a graduação: cursos presenciais de oferta contínua, ofertado nos períodos diurno (matu-tino, vespertino e integral) e noturno; cursos semipresenciais (licenciaturas parceladas destinadas à formação de professores em serviço, programa mó-dulos temáticos); cursos à distância, cursos fora de sede, cursos para pessoas provenientes de movimentos sociais (curso de Pedagogia para professores da reforma agrária, CPERA e curso de Agronomia para os movimentos sociais do campo, CAMOSC - turmas únicas); cursos específicos visando à qualificação de professores das redes estadual e municipais de ensino e de outros profissionais em diferentes áreas de formação (plenificações/graduação em licenciatura plena para professores com formação em licenciatura curta), além de ações de inclusão de grupos sociais específicos como indígenas (Projeto 3º Grau Indígena, posteriormente transformado na Faculdade Intercultural Indígena), de negros (cotas por meio do Programa de Integração e de Inclusão étnico-racial) e de demais comunidades menos assistidas do interior de Mato Grosso.

A expansão da Unemat ocorreu com uma perspectiva de ser uma Universidade ‘do interior para o interior’ e com o objetivo de atender a uma

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população que está geograficamente sem acesso aos centros de educação superior. Nas palavras de Zattar (2008, apud Rieder 2011, p. 229), “a Unemat está consolidada”. Atualmente, a IES oferta, na graduação, 60 cursos na moda-lidade presencial de oferta contínua, 19 cursos de graduação na modalidade parceladas, 04 vinculados ao Parfor presencial6, 06 turmas fora de sede, 02 cursos vinculados à Faculdade Intercultural Indígena e 12 cursos à distância. Na pós-graduação Lato Sensu são 08 cursos ofertados à distância, 05 presenciais e 01 pela Faculdade Intercultural Indígena. Na pós-graduação Stricto Sensu temos 11 cursos de mestrado institucional, 03 cursos de mestrado profissional, 04 cursos de doutorado institucional, 03 doutorados em rede e 04 doutorados interinstitucionais. Em 2017, a Unemat possui 13 câmpus, 12 núcleos peda-gógicos, 24 polos de ensino à distância e atende uma demanda de cerca de 22.000 estudantes.

O ingresso aos cursos de graduação da Unemat, até 2012/2, sempre ocorreu via Concurso Vestibular, mesmo quando o processo de seleção des-tinava-se a atender uma clientela específica, como no caso dos cursos para formação de professores indígenas ou na modalidade de Licenciaturas Plenas Parceladas. As ações, programas e políticas de acesso à Unemat, descritas neste texto referem-se às formas de ingresso aos cursos de graduação da Instituição, privilegiando as políticas de ação afirmativa para negros e estudantes oriundos de escolas públicas.

A condução do processo seletivo para ingresso na Unemat é realizado pela Coordenadoria de Concursos e Vestibulares (COVEST), unidade vinculada administrativamente à Pró-reitoria de Ensino de Graduação (PROEG).

A partir de 2013/1, no primeiro semestre de cada ano, a IES passa a adotar como forma de ingresso o Sistema de Seleção Unificado – Sisu7 e, como critério de seleção, a pontuação obtida pelo candidato no Exame Nacional do Ensino Médio – ENEM. Para ingresso no segundo semestre letivo, é realizado o tradicional Concurso Vestibular.

Além destas formas de ingresso a Unemat também realiza processos seletivos por agendamento; chamadas presenciais e editais simplificados e ainda publica editais específicos para preenchimento de vagas remanescentes.

6 PARFOR – Plano Nacional de Formação de Professores da Educação Básica - Programa emergencial instituído para atender o disposto no artigo 11, inciso III do Decreto nº 6.755, de 29 de janeiro de 2009 e implantado em regime de colaboração entre a Capes, os estados, municípios o Distrito Federal e as Instituições de Edu-cação Superior – IES. Disponível em: http://www.capes.gov.br/educacao-basica/parfor Acesso em: Jul. 2017.7 O Sisu é o sistema informatizado do Ministério da Educação por meio do qual, instituições públicas de ensino superior oferecem vagas a candidatos participantes do Enem. Disponível em: http://sisu.mec.gov.br/inicial Acesso em: 25.mar.2016.Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 99-119, jan./jun., 2018

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Até o primeiro semestre de 2005, as vagas dos cursos de graduação da UNEMAT eram ofertadas, apenas em ampla concorrência. A partir do segundo semestre daquele ano, com a criação e implantação do PIIER, por meio da Re-solução n° 200/2014-CONEPE, 25% do total das vagas ofertadas em todos os cursos da IES passaram a ser destinadas a candidatos autodeclarados negros (de cor preta ou parda), de acordo com critérios adotados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE. Atualmente, do total de vagas ofertadas pela Unemat para ingresso nos cursos de graduação, 40% (quarenta por cento) são destinadas à ampla concorrência e 60% às cotas, sendo que nesta modalidade 30% (trinta por cento) das vagas são para estudantes de escolas públicas; 25% (vinte e cinco por cento) para estudantes negros (pretos ou pardos, conforme classificação do IBGE) e 5% (cinco por cento) para estudantes indígenas.

Assim como as demais universidades estaduais, a Unemat, não possui acesso direto a recursos federais. Em 2012, foi criada na estrutura organiza-cional da IES a Pró-reitoria de Assuntos Estudantis (PRAE), com o objetivo de impulsionar a implementação de políticas voltadas às necessidades dos estudantes, dentre estas destacamos a criação do Programa de Assistência Estudantil – PAE, aprovado pela Resolução nº. 019/2013- do Conselho Universi-tário - CONSUNI. O PAE é constituído por um conjunto de ações: bolsa apoio8; auxílio alimentação9; auxílio moradia10 e auxílio publicação/representação11. Neste artigo nos ateremos à análise dos denominados ‘auxílio alimentação’ e ‘auxílio moradia’, componentes do PAE e regulamentados, respectivamente, pelas Resoluções CONSUNI n°. 020/2013 e 021/2013.

Quanto à permanência, o levantamento realizado nas Pró-Reitorias e no site da Unemat demonstram que muitas ações estão sendo desenvolvidas com o objetivo de atendimento ao estudante, como exemplo destacamos a oferta de bolsas em diversas modalidades, o Programa PAE e outras como demonstra o quadro nº 01 que segue.8 Suporte financeiro ao discente de carência socioeconômica que realizará atividades que contribuam para a sua formação e desenvolvimento profissional, visando a permanência destes discentes nos cursos de gra-duação da Unemat, superando a carência de formação no ensino fundamental e médio, possibilitando-lhe melhor desempenho acadêmico e qualificação profissional.9 Suporte financeiro destinado a suprir as necessidades alimentares de discentes regularmente matricula-dos em cursos de graduação na Unemat, com comprovada vulnerabilidade socioeconômica devidamente aprovados em seleção específica.10 Suporte financeiro destinado a garantir moradia aos discentes, com comprovada vulnerabilidade socioeco-nômica, que residam fora do domicílio de seus pais, tutores ou equivalentes, para desenvolver seus estudos.11 Suporte financeiro para a participação de discentes da Unemat, que pretendem publicar e/ou apresentar trabalhos em eventos técnico-científicos, e de representantes de entidades estudantis dos cursos de gradu-ação presencial em eventos fora da Unemat, em atividades de intercâmbio didático-científico e político-a-cadêmico de abrangência regional e nacional, em localidades distintas do Campus de origem do seu curso.

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QUADRO 01- Demonstrativo (mapeamento) dos programas de permanência da unemat

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Fonte: Elaborado pelos autores a partir dos dados coletados nas Pró-Reitorias: PROEC, PROEG, PRPPG, PRAE, PRPTI da

Unemat.

As análises relacionadas ao mapeamento acima levantam questões que se colocam para os estudos no grupo de pesquisa: em que medida essas ações são implantadas visando a permanência? Em que medida tem efetiva-mente contribuído para a permanência? Nesse estudo destacamos para análise o Programas de Assistência Estudantil - PAE/Unemat, buscando analisar em que medida esse Programa foi formulado e implantado com característica de ser um Programa de Permanência.

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Programas de Assistência Estudantil - PAE/Unemat: Política de Permanência?

O Programa de Assistência Estudantil – PAE/Unemat, instituído por meio da Resolução nº. 019/2013-CONSUNI, tem como objetivo “propiciar aporte financeiro a discentes regulares dos cursos de graduação da Unemat, com comprovada vulnerabilidade socioeconômica, promovendo melhores condições para a conclusão de cursos”.

O PAE é coordenado pela Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis – PRAE com recursos previstos no orçamento anual da Instituição. O discente bene-ficiado por qualquer modalidade do Programa de Assistência Estudantil não pode possuir vínculo empregatício com a IES, contudo, é permitido ao discente selecionado, o acúmulo dos auxílios moradia e alimentação; auxílio moradia ou alimentação e uma bolsa ou ainda, auxílio publicação/representação e quaisquer outros tipos de auxílio ou bolsa, respeitadas resoluções específicas.

O auxílio alimentação, aprovado pela Resolução nº. 020/2013-CONSU-NI, constituiu-se de um aporte financeiro destinado a auxiliar nas necessidades alimentares de discentes regularmente matriculados em cursos de graduação na Unemat, com comprovada vulnerabilidade socioeconômica.

Já o auxílio moradia é o aporte financeiro destinado a auxiliar os custos com moradia aos discentes, com comprovada vulnerabilidade socioeconômi-ca, que residam fora do domicílio de seus pais, tutores ou equivalentes, para desenvolver seus estudos.

As resoluções que instituem os auxílios moradia e alimentação mencionam que estes visam a propiciar auxílio aos discentes, objetivando sua permanência na universidade, minimizando situações de vulnerabilidade socioeconômica que comprometam a integralização do curso de graduação em condições adequadas. (grifo nosso).

Para requerer o auxílio alimentação, o discente deve estar regular-mente matriculado em curso de graduação da Unemat, não pode ter concluído outra graduação, a renda per capita familiar total deve ser de até um salário mínimo e meio; não pode possuir vínculo empregatício e deve apresentar, no mínimo, 80% (oitenta por cento) de aproveitamento do número de créditos das disciplinas já cursadas, respeitando seu semestre letivo.

Já para ter acesso ao auxílio moradia, o discente deverá preencher o Formulário Socioeconômico disponível na página da PRAE e apresentar os documentos comprobatórios; ter matrícula regular em curso de graduação da UNEMAT; não ter concluído outro curso de graduação; residir em cidade distinta de seus pais, tutores ou equivalentes, para desenvolver seus estudos; Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 99-119, jan./jun., 2018

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pertencer à família com renda per capita total de até um salário mínimo e meio; não possuir vínculo empregatício e apresentar no mínimo 80% (oitenta por cento) de aproveitamento do número de créditos das disciplinas já cursadas, respeitando seu semestre letivo.

A seleção dos discentes para concessão dos auxílios alimentação e moradia é feita por meio de edital publicado pela PRAE e compreende três fases: preenchimento on-line de formulário socioeconômico, entrega de do-cumentos comprobatórios e entrevista.

Os auxílios alimentação e moradia são concedidos por semestre le-tivo, podendo ser renovados por igual período, se o discente não apresentar reprovação superior a 20% (vinte por cento) do total de disciplinas cursadas no período da concessão; não tiver solicitado trancamento de matrícula e ainda ter declarado que não possui vínculo empregatício.

O número de auxílios a ser concedido por semestre letivo é estabe-lecido no edital de seleção, publicado anualmente, em conformidade com a disponibilidade orçamentária da Universidade.

Analisando os dados disponibilizados pela PRAE sobre os auxílios ali-mentação e moradia verifica-se, que no período do estudo, houve a publicação de dois editais para a concessão desses auxílios. O primeiro, com a vigência dos auxílios para os meses de novembro de 2013 a outubro de 2014 e o segundo para os meses de maio a dezembro de 2015.

Em ambos os editais, o valor dos auxílios moradia e alimentação foram estabelecidos, respectivamente, em R$ 250,00 (duzentos e cinquenta reais) e R$ 180,00 (cento e oitenta reais), sendo que os candidatos podiam pleitear os dois tipos de auxílios desde que não possuíssem qualquer outra modalidade de bolsa ou estágio remunerado oferecido pela Unemat ou agências externas de fomento.

O edital nº 03/2013/PRAE, ofereceu 2.000 auxílios, sendo 1.000 auxílios moradia e 1.000 auxílios alimentação, sendo as vagas divididas, pro-porcionalmente tendo como parâmetro o número de cursos dos 10 campi que a instituição possuía na época.

Já o edital nº 001/2015/PRAE, ofereceu 960 auxílios, sendo 480 auxí-lios moradia e 480 auxílios alimentação, sendo as vagas ofertadas, utilizando-se o mesmo critério de divisão das vagas, no entanto, agora distribuídas entre os cursos de 12 campi da instituição.

Verificamos que não foram “utilizados” todos os auxílios concedidos em nenhum dos editais. Quanto ao auxílio moradia, houve a “utilização” de 78,4% dos auxílios ofertados no primeiro período (2013-2014) e de 67,5% no

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segundo (2015). Assim a quantidade de auxílios “ociosos” foi na ordem de 21,6% e 32,5%, respectivamente.

Dos 784 alunos que foram beneficiados com o auxílio moradia, 16 desistiram, ou seja, 2,04% das concessões não foram utilizadas no período total de vigência do primeiro edital. No segundo ano (2015), dos 324 alunos que foram beneficiados com o auxílio moradia, 41 deles não utilizaram o auxílio integralmente, totalizando 12,65% de desistência.

Podemos observar esses dados nos gráficos, a seguir. No Gráfico 1, observamos a quantidade de auxílios moradia que foram disponibilizados “ofertados”, quantidade de auxílios “utilizados”, auxílios que não foram apro-veitados “ociosos” e os que não foram utilizados integralmente “desistentes”.

Gráfico 1: Quantidade de auxílios moradia (ofertados, utilizados, ociosos e desistentes) referentes aos editais publicados em 2013/2014 e 2015.

Fonte: PRAE/Unemat

No Gráfico 2, observa-se a porcentagem de auxílios moradia que foram “ofertados”, “utilizados”, “ociosos” e “desistentes” nos dois períodos analisados.Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 99-119, jan./jun., 2018

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Gráfico 2: Percentual de auxílios moradia (utilizados, ociosos e desistentes) referentes aos editais publicados em 2013/2014 e 2015.

Fonte: PRAE/Unemat

Quanto ao auxílio alimentação, na primeira oferta (2013-2014), dos 855 alunos beneficiados, 38 desistiram, ou seja, as concessões também não foram utilizadas integralmente no período. No segundo edital (2015), dos 368 alunos que foram beneficiados, 54 desistiram e não utilizaram integralmente o auxílio, como pode ser observado no Gráfico 3.

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Gráfico 3: Quantidade de auxílios alimentação, (ofertados, utilizados, ociosos e desistentes) referentes aos editais publicados em 2013/2014 e 2015.

Fonte: PRAE/Unemat

Ao consideramos, percentualmente esses dados, nota-se a “utiliza-ção” de 85,5% e “desistência” de 4,44% dos auxílios alimentação ofertados no primeiro período (2013-2014) e de 76,67% de “utilização” e 14,67% de “desis-tência” na segunda oferta (2015). Assim, a quantidade de auxílios alimentação “ociosos” foi na ordem de 14,5% e 23,33%, respectivamente, conforme se observa no Gráfico 4.

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Gráfico 4: Percentual de auxílios alimentação (utilizados, ociosos e desistentes) referentes aos editais publicados em 2013/2014 e 2015.

Fonte: PRAE/Unemat

Os dados do Gráfico 4 revelam ainda, que do total dos auxílios ali-mentação disponibilizados, um total de 14,5% dos auxílios no primeiro período (2013/2014) e de 23,33% no período de 2015 ficaram ociosos. Existe a objetiva constatação que mesmo diminuindo a quantidade de auxílios disponibilizados entre as duas ofertas, percentualmente a quantidade “utilizada” diminuiu e a “desistência” aumentou.

Ao analisarmos os dados sobre os auxílios moradia e alimentação, podemos inferir que, ou os critérios de seleção são muito rígidos e abarcam uma parcela de estudantes menor do que o previsto pela quantidade de auxí-

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lios disponibilizados, ou o valor dos auxílios não são suficientemente atraentes levando os alunos a procurarem outras formas de subsídio.

Os valores concedidos por meio dos auxílios são ainda menores do que os estudantes podem perceber com trabalhos no comércio (lojas, padarias, supermercados) e no mercado formal em geral, o que os levam a encarar uma jornada de trabalho de até mais de 8 horas diárias, prejudicando e os afastando da vida acadêmica, em prol de uma remuneração de maior valor. Essa situação nos leva a afirmar que os auxílios moradia e alimentação não estão cumprindo com o objetivo de resolver o problema da vulnerabilidade econômica a que se propõe e nem está sendo um mecanismo eficaz que possibilite ao estudante sentir-se integrado à vida acadêmica.

As análises do Programa de Assistência Estudantil da Unemat (PAR) interrelacionadas com os conceitos de permanência nos levam a apontar que temos mais um programa que atende políticas focalizadas, o que não desca-racteriza a sua importância, no entanto, não atende a todos os estudantes a permanecerem e concluírem seu curso. Primão (2015, p. 55), em suas pesquisas sobre a permanência em uma IES federal afirma que:

No que se refere às políticas de permanência instituídas, podemos observar que tanto o Estado, por meio dos seus programas específicos, quanto às pesquisas realizadas no tocante à permanência, estão centradas na realidade dos estudantes carentes, expressando-se na defesa de uma assistência quase exclusivamente financeira, como se esse fosse o único fator ameaçador do discente em seu trajeto universitário(PRIMÃO,2015, p. 55).

Não desconsideramos o fator econômico como um dos fatores cau-

sadores da não permanência, mas não é o único e nem o mais preponderante. As políticas assistencialistas focais são fundamentais e essenciais ao público de baixa renda, mas não tem resolvido o problema da permanência.

Segundo a autora, o fator econômico inerente ao sistema capitalista cria a necessidade de políticas focais assistencialistas, e afirma que “a assistên-cia estudantil, de fato, possui uma natureza focal”. Ao se tratar do debate da permanência, mesmo reconhecendo os méritos de uma política assistencial, estrategicamente, almejamos uma política social de cunho universal, visto que se volta para ações mais abrangentes e que generalizam o atendimento, o que pode possibilitar uma participação ativa de todos os estudantes na vida acadêmica.

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Abrindo o debate para não concluir

As pesquisas realizadas apontam que as políticas de democratização da educação superior têm priorizado a expansão por meio da ampliação das vagas e esquecido que, pela mesma porta que os estudantes estão entrando, também estão saindo sem concluírem o curso. As políticas de permanência não têm acompanhado as políticas de ingresso.

As análises documental e dos dados apresentadas nesse estudo, de-monstram que ainda não existem na Unemat mecanismos de acompanhamento acadêmico dos estudantes que são beneficiados com os auxílios. Portanto, não existe ainda uma política de permanência instituída, mas sim um Programa de assistência a estudantes economicamente desfavorecidos, por meio da oferta dos auxílios. Evidenciou-se que nem o objetivo de uma política focalizada está sendo alcançado em sua totalidade; ineficiência que fica comprovada pelo não preenchimento das bolsas ofertadas e pelo alto número de desistência dos beneficiários. Enfatizamos que as políticas assistencialistas focais são fundamentais e essenciais ao público de baixa renda, mas não tem resolvido o problema da permanência.

Esse estudo levanta outras questões que devem ser aprofundadas na sua continuidade como: analisar, comparativamente, o desempenho e o fluxo acadêmico dos estudantes que se beneficiam dos auxílios e os que não desfrutam desses benefícios; os motivos que levam os estudantes beneficiados a desistirem dos auxílios; como a Unemat acompanha a trajetória estudantil dos estudantes beneficiados e, ainda, o que a PRAE concebe como política de permanência aos estudantes. Essas e outras problemáticas estão inseridas na continuidade desse estudo.

Estudar a permanência nos remete a pensar a dinâmica acadêmica, num conjunto que possa oportunizar a participação dos estudantes em ações qualificadoras do ensino, ligadas a qualquer um dos eixos que sustenta a universidade (ensino, pesquisa e extensão). A inserção dos estudantes nessas ações é de grande valia para a sua fixação nesse espaço e esse envolvimento poderá garantir a sua permanência.

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Data de recebimento: 29.07.2018Data de aceite: 26.09.2018

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O TRABALHO VOLUNTÁRIO NO PROGRAMA MAIS EDUCAÇÃO E A ORGANIZAÇÃO ESCOLAR EM DUAS ESCOLAS DA REDE PÚBLICA

ESTADUAL EM JUÍNA (MT)1

VOLUNTARY WORK IN THE MORE EDUCATION PROGRAM AND SCHOOL ORGANIZATION IN TWO SCHOOLS OF THE STATE NETWORK

IN JUÍNA (MT)

Marilda de Oliveira Costa2 Everaldo Dias Matteus3

RESUMO:Este artigo refere-se às implicações do trabalho voluntário no Programa Mais Educação (PME) na organização escolar em duas escolas da rede pública es-tadual de MT. Tem por objetivo problematizar a atuação dos monitores/voluntários do referido Programa. Dentre os referenciais teóricos que subsidiaram o estudo, encontram-se autores que discutem a crise estrutural do capital (MÈSZAROS, 2002), (HARVEY, 2008), o papel do Estado, reformas neoliberais e de terceira via (GIDDENS, 2001), (PERONI, 2003; 2007), o neodesenvolvimentismo (BRANCO, 2009), terceiro setor e voluntariado em educação (MONTÃNO, 2010), (SOUZA, 2013), (COSTA, 2014). É uma pesquisa de abordagem qualitativa, com análise documental e bibliográfica, com coleta de dados por meio de questionário e en-trevistas semiestruturadas aplicadas a sujeitos envolvidos com a implementação do PME. O estudo buscou compreender o perfil desses trabalhadores voluntários, bem como as condições e relações de trabalho estabelecidas na materialização do Programa.

PALAVRAS-CHAVE: educação integral, Programa Mais Educação, política educa-cional, trabalho voluntário.

ABSTRACT: This article and addresses the implications of voluntary work in the More Education Program (PME) on the school organization in two schools of the

1 Este texto é resultado de pesquisa realizada no Mestrado em Educação – PPGEDu/UNEMAT, com disser-tação defendida em fevereiro de 2018.2 Pós-doutora em Ciência da Educação na especialidade Administração e Organização Escolar. Professora na UNEMAT. Endereço: Cáceres-MT, Brasil. [email protected]. [email protected] Mestre em Educação. Profissional da Educação de Mato Grosso (SEDUC). Endereço: Juina-MT, Brasil. [email protected]

DOI/10.30681/21787476.2018.29.121143

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State public network of MT. It aims to problematize the performance of monitors and volunteers participating in the Program. Among the theoretical references that supported the study are authors who discuss the structural crisis of capital (MÈSZAROS, 2002), (HARVEY, 2008), the role of the State, neo-liberal and thir-d-way reforms (GIDDENS, 2001), (PERONI, 2003; 2007), neo-developmentalism (BRANCO, 2009), third sector and volunteering in education (MONTÃNO, 2010), (SOUZA, 2013), (COSTA, 2014). It is a qualitative research, with documental and bibliographic analysis, with data collection through questionnaire and semi-s-tructured interviews applied to subjects involved with the implementation of the PME. The study sought to understand the profile of these volunteer workers, as well as the conditions and working relationships established in the materialization of the Program.

KEYWORKS: integral education, More Education Program. education policy. vol-unteer work.

Introdução

Este texto é resultado de estudos realizado no Mestrado em Educa-ção-PPGEDu/UNEMAT/2018 cuja temática trabalho voluntário é analisada à luz da implementação do Programa Mais Educação em duas escolas da rede pública estadual em Juína – MT.

O debate em torno da relevância da educação integral no Brasil não é recente, inclusive é apontado em arcabouço jurídico da área educacional, no entanto, medidas mais palpáveis para sua efetivação em nível nacional só se concretizaram nos governos do Partido dos Trabalhadores, ainda que como uma estratégia governamental, e não como política educacional. (SCHIMONEK, 2017).

Instituído pela Portaria Interministerial n° 17, de 24 de abril de 2007, o Programa Mais Educação era considerado um indutor da educação integral no Brasil e tinha por finalidade melhorar a qualidade educacional. No início de sua implementação, estabeleceu-se como critério para adesão escolas com baixo Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), e, segundo o Manual Passo a Passo (2012), as que tivessem “índice igual ou superior a 50% de estudantes participantes do Programa Bolsa Família” (BRASIL, 2012, p. 7). Uma das características do Programa que chama a atenção é a utilização de trabalhadores voluntários na sua execução, já que esse tipo de trabalho está regulamentado na Lei do Voluntariado n.º 9.608/1998, fruto das políticas neo-Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 121-143, jan./jun., 2018

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liberais, conjugadas com aspectos de uma Terceira Via, que aponta o Terceiro Setor em substituição ao papel do Estado na execução de políticas sociais. Isso possibilita a abertura da escola a novos agentes educativos da comunidade escolar e a estudantes universitários para dinamizar e articular os saberes comunitários com os saberes escolares.

Este último aspecto foi objeto de pesquisa desenvolvida no Mestrado em Educação, concluído em 2018, que teve por objetivo analisar as implicações do trabalho voluntário no Programa Mais Educação (PME) na organização esco-lar em duas escolas da rede pública estadual localizadas no município de Juína (MT). Após análises dos documentos e formulários de prestação de contas do PDDE/ Integral da Escola Estadual Cecília Meireles4, foi constatado que, durante o funcionamento do PME na referida escola, 33 monitores prestaram serviços voluntários nas mais diversas oficinas, sendo 20 monitores no ano de 2013 e 13 monitores no ano de 2014. Na Escola Estadual Clarice Lispector, 14 monitores prestaram serviços em 2014 e 20 no ano de 2015.

Trata-se de um estudo de casos, de abordagem qualitativa, com análise documental e bibliográfica e coleta de dados por meio de questionário e entrevista semiestruturada aplicada aos 12 sujeitos que implementaram o Programa, sendo seis de cada escola. Esses sujeitos foram identificados para assumir monitoria com base em critérios previamente estabelecidos, previstos no Manual Operacional do PME (2012), que recomenda que o Programa seja executado, “preferencialmente, por estudantes universitários de formação específica nas áreas de desenvolvimento das atividades ou pessoas da comu-nidade com habilidades apropriadas” (BRASIL, 2012, p. 10).

As entrevistas foram transcritas, respeitando-se as interjeições da linguagem oral e vícios de linguagem dos sujeitos entrevistados, para depois serem sintetizadas as informações nelas contidas e serem analisados os diálogos mantidos com os sujeitos da pesquisa.

A partir de então, três eixos temáticos foram elaborados: Conhecen-do o perfil dos monitores voluntários que trabalharam no PME; As condições e formas de organização do trabalho voluntário dos monitores do PME e As relações de trabalho dos monitores e o envolvimento da comunidade nas ati-vidades do PME. As perguntas foram formuladas por eixo temático, para uma melhor compreensão da realização do trabalho voluntário no PME nas duas escolas pesquisadas.

Os dados foram concatenados e organizados em categorias – algu-mas previamente selecionadas e outras que emergiram das falas dos sujeitos 4 A fim de manter o anonimato, optamos por atribuir um nome fictício às duas escolas.

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–, sendo analisadas com base nos referenciais teóricos que abordam o papel do Estado (MONTANO, 2010; BRESSER-PEREIRA, 2004; VIEIRA, 2013; HARVEY, 2008, 2008ª; SICSÚ, 2009; SANTOMÉ, 2003); Educação Integral (TEIXEIRA, 1969; MOLL et al., 2012; GADOTTI, 2009; DEWEY, 1979; PARO, 1988); Terceira Via (GIDDENS, 2001); Terceiro Setor (COSTA, 2014; MONTANO, 1999; PERONI, 2007; GIDDENS, 2010); e trabalho voluntário (PARK et al., 2006; COSTA, 2011, 2014; SOUZA, 2013), a fim de responder ao objetivo proposto quanto às im-plicações do trabalho voluntário no Programa Mais Educação (PME) para a organização escolar em duas escolas da rede pública estadual localizadas no município de Juína (MT).

Reformas no papel do Estado e a transição pós-neoliberal: rupturas e con-tinuidades

A instituição do trabalho voluntário para execução de políticas sociais insere-se no contexto de ondas de reformas neoliberais e conservadoras e de Terceira Via que povoaram o imaginário, os discursos e a prática política de governos de todos os continentes após a década de 1980. Essas vertentes orientaram reformas e reconstrução do Estado em diferentes países do mundo, sob o argumento de crise do Estado. O neoliberalismo, ao advogar a tese do Estado mínimo, propôs a sua reforma, com a privatização de bens públicos, retirando do Estado o papel de regulador das relações entre capital e traba-lho, e lançou a desregulamentação, a flexibilização, a liberdade individual e a autorregulação do mercado, livre de qualquer forma de controle.

A crítica dos economistas neoliberais é que o Estado precisava ser reformado para superar a crise do capital, repassando para o mercado todos os serviços considerados não exclusivos, que oneram o Estado, defendendo-se que o mercado por si só seria capaz de autorregular-se, conduzindo a economia sem a interferência do Estado. Por meio de agências reguladoras, o mercado conseguiria autorregular-se por meio da livre concorrência, da lei da oferta e procura de mercadorias e serviços. As agências seriam incumbidas de resolver os conflitos de interesses, a fim de melhorar a qualidade das mercadorias e da prestação dos serviços sociais.

As principais obras que apontam a orientação político-ideológica neoliberal surgiram após a Segunda Guerra Mundial, a partir das ideias do economista austríaco Friedrich Von Hayek, com a publicação, em 1947, do livro O Caminho da Servidão. As ideias neoliberais ganham força em contraposição

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ao aumento do poder dos sindicatos, que na década de 1970 exerciam forte pressão sobre o Estado, levando ao aumento dos gastos sociais por parte deste e diminuição do lucro das empresas, o que elevava a taxa de inflação e impedia o crescimento econômico. (HARVEY, 2008), assim,

As políticas sociais, dentro da concepção neoliberal, não devem ser promovidas pelo Estado, já que isso significaria um desequi-líbrio nas condições dos indivíduos, um aumento de gastos que levaria novamente à crise fiscal e uma intervenção no âmbito das decisões privadas que afetaria a liberdade individual. (BIAN-CHETTI, 2005, p. 111).

Os neoliberais defendem um Estado mínimo para atuação em áreas sociais e um Estado máximo para assumir os riscos do mercado e contrapor o poder dos sindicatos, que lutam pela valorização do trabalho e preservação dos direitos sociais conquistados e almejam novos direitos para a classe tra-balhadora.

No Brasil, as ideias neoliberais foram mais incisivamente implantadas em 1995, durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, por meio do Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado, elaborado pelo então Ministro da Administração e Reforma do Estado, Luiz Carlos Bresser Pereira.

A guinada do neoliberalismo tem propiciado terreno fértil para a propagação do capital selvagem, pressionando o Estado a diminuir a atenção a políticas de bem-estar social, para atuar em favor da ampliação dos interesses do setor privado. Na crítica de Giddens (2001), a pressão da globalização econô-mica e os princípios de eficiência e eficácia do capital levam ao individualismo e têm provocado uma cisão dos conceitos morais da sociedade, destituindo os homens dos princípios de solidariedade para com seus semelhantes. Nessa perspectiva, a Terceira Via surge para solucionar conflitos de interesses da esquerda social democrática e do capital ocasionados pelo neoliberalismo.

Com a chegada do Partido Trabalhista ao governo da Grã-Bretanha, depois do final dos governos conservadores, como o primeiro-ministro Tony Blair, em 1997, vários outros governos social-democratas ao redor do mundo chegaram ao poder. Promoveram-se dois seminários internacionais, um em Florença e outro em Washington, reunindo as seguintes lideranças mundiais: Bill Clinton, presidente dos Estados Unidos; Fernando Henrique Cardoso, pre-sidente do Brasil; e vários intelectuais de centro-esquerda. (GIDDENS, 2001).

A partir de então, Tony Blair reuniu os intelectuais da época, forman-do um grupo de trabalho liderado pelo sociólogo britânico Anthony Giddens.

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Juntos, estabeleceram uma agenda positiva para conciliar interesses políticos antagônicos, diante da fragmentação do neoliberalismo e interesses de bem--estar social dos socialdemocratas, a fim de reposicionar a economia nos países europeus e nas Américas. (GIDDENS, 2001).

Na Grã-Bretanha, o efeito prático da Terceira Via durante o governo de Tony Blair, do Partido Trabalhista, segundo Vieira (2013), pode ser caracterizado pelas seguintes ações: a) incentivo à parceria público-privado, contestada pelos sindicatos; b) privatização e terceirização dos serviços públicos.

No entendimento de Giddens (2001), a criação da Terceira Via consis-tiu no esforço da esquerda socialdemocrata da Europa como alternativa para resolver problemas causados pelo neoliberalismo, principalmente no campo social. A ideia central consistia em prover abertura comercial e a desestatização das economias nacionais como estratégia de flexibilizar o trabalho para comba-ter o desemprego e promover a justiça social por meio de um assistencialismo com eficiência. O interesse da Terceira Via é articular interesse público-privado para diminuir as tensões causadas pelo capitalismo e “focalizar a miséria e a indigência sem renda para consumir, prestando auxílio aos focos de pobreza, sem universalizar a garantia à sociedade”. (VIEIRA, 2013, p. 200).

“Os neoliberais querem encolher o Estado; os socialdemocratas, historicamente, têm sido ávidos por expandi-lo. A Terceira Via afirma que o que é necessário reconstruí-lo” (GIDDENS, 2001, p. 80). Apresenta o Terceiro Setor como alternativa ao papel do Estado. É nesse contexto de reformas que o trabalho voluntário ganhou notoriedade, sendo apontado como uma alter-nativa ao trabalho fixo, regulamentado, remunerado, com todas as garantias asseguradas, com o aval do Estado.

A internacionalização do receituário neoliberal e de Terceira Via, en-contraram terreno fértil em quase todos os cantos do mundo, e não foi diferente na América Latina e no Brasil. Mesmo com a virada do país à esquerda, com a vitória de Luís Inácio Lula da Silva, do Partido dos Trabalhadores (PT), para a Presidência da República, em 2002, com as políticas do período denominado neodesenvolvimentista, entendido como “um programa de política econômica e social que busca o crescimento econômico do capitalismo brasileiro com al-guma transferência de renda, embora o faça sem romper com os limites dados pelo modelo econômico neoliberal ainda vigente no país”. (BOITO Jr, 2012, p.5), o país não ficou imune aos efeitos da reforma anteriormente executada nos governos de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), a partir de 1995.

Dentre as diversas políticas e programas implementados nos gover-nos Lula da Silva (2003-2006; 2007-2010) e Dilma Rousseff (2011-2014; 2015-Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 121-143, jan./jun., 2018

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maio de 2016), ambos do PT, encontra-se o Programa Mais Educação (PME), executado por monitores, ou seja, pelo trabalho voluntário, demonstrando a continuidade de aspectos das reformas do período anterior na educação.

Terceiro Setor e a emergência institucional do trabalho voluntário

Para promover as mudanças e inserção das ideias neoliberais no

cenário político e econômico no Brasil, além da Reforma do Estado, para o que não foi possível privatizar, foi criado o Terceiro Setor, que passam a atuar na área social. Na Reforma do Estado, os serviços deixaram de ser atividades exclusivas do Estado e passaram a ser realizados pelo Terceiro Setor. “Já a expressão Terceiro Setor foi traduzida do inglês third sector, dada sua origem norte-americana. Denomina-se Terceiro Setor o conjunto de instituições (Asso-ciações, fundações, institutos, OCIPs, ONGs, etc.).” (MARCIEL E BORDIN, 2014, p. 25). Montaño (2010, p. 53) percebe o termo Terceiro Setor construído a partir das esferas societárias, divididas em: “o Estado (‘primeiro setor’), o Mercado (‘segundo setor’) e a Sociedade civil (‘terceiro setor’)”.

De acordo com Costa:

Ao contrário dos neoliberais, que propõem a privatização e retira-da completa do Estado da oferta de políticas (sociais) públicas – o Estado mínimo –, a Terceira Via apela para a responsabilização de um novo ator – o Terceiro Setor – para substituir o papel do Estado na execução dessas políticas, dentre elas, a da educação, por meio de parcerias. (COSTA, 2011, p. 52).

O Terceiro Setor tem despertado debates apaixonados, dadas a com-plexidade e a ambiguidade envolvidas nas relações entre entidades deste setor e a esfera pública; encontra apoio na Terceira Via para atuar na promoção de serviços sociais antes executados pelo Estado.

Com a Reforma do Estado no Brasil em 1995, parte das políticas sociais começaram a perder o caráter de direito social como defendido pelo Estado de Bem-Estar Social. Nas ideologias neoliberais, os direitos sociais foram limitados a minorias sociais em risco de vulnerabilidade social, adquirindo um novo ca-ráter de caridade e benevolência. A crítica era que “o Estado do Bem-Estar se encarrega de muitas das necessidades básicas da pessoa, como a alimentação, a saúde, o acesso à cultura e ao trabalho.” (SANTOMÉ, 2003, p. 100).

As políticas sociais, ao serem providas pelo Terceiro Setor, ganham Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 121-143, jan./jun., 2018

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um caráter mercadológico de obtenção de lucros e passam a utilizar-se de dinheiro do Estado para executar as ações sociais, por meio de parcerias público-privadas ou de doação mediante a filantropia empresarial de isenção de impostos, para prestação de serviços assistenciais na área da saúde e edu-cação. O Terceiro Setor não tem condições de autofinanciamento e requer, particularmente, a transferência de fundos públicos para seu funcionamento mínimo. (MONTANO, 1999).

Com as reformas de Estados nacionais, o Terceiro Setor foi reestru-turado para executar políticas sociais, anteriormente desempenhadas pelo Estado, que não visava ao lucro, agora por meio de parcerias público-privadas. Desta feita, o Terceiro Setor, ao desempenhar ações sociais, contava com o setor privado na ótica do capital, não abrindo mão da prerrogativa do lucro para executar as políticas públicas; muitas vezes, desvalorizava ou precarizava o trabalhador, outras vezes, utilizava-se de trabalhadores voluntários, respon-sáveis pela prestação dos serviços.

No entendimento de Peroni, Oliveira e Fernandes (2009), o Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado (Brasil, 1995), com suas estratégias de privatização, descentralização e publicização (público não estatal), contribuiu para a materialização do Terceiro Setor ao estimular parcerias nos sistemas públicos de ensino. Os serviços não exclusivos do Estado são passados para instituições sociais; cria-se todo um nicho mercadológico, que carecia de am-paro jurídico, por meio de leis e decretos, que vêm regulamentar a atividade do Terceiro Setor.

Quanto ao marco legal do Terceiro Setor, no Brasil, foram instituídas três leis que o regulamentam:

1) A Lei n.o 9.637/1998, que trata das Organizações Sociais (OS), organizações administrativas dirigidas pela sociedade civil que recebem recursos do Estado e têm isenção fiscal, com a incum-bência de prestar serviços sociais ligados às áreas da pesquisa, tecnologia, meio ambiente, cultura e saúde. (BRASIL, 1998a). 2) Lei n.o 9.732/1998, referente às entidades filantrópicas que atuam nas áreas da assistência social, saúde e educação. Entida-des com esta certificação, após exigências e análises do Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS), passam a ser isentas de impostos e contribuição previdenciária. Em complemento à Lei n.o 10.845/2004, contemplou-se atendimento às Pessoas Portadoras de Deficiências com financiamento do Fundo de Desenvolvimento da Educação (FNDE). (BRASIL, 1998b)3) Lei n.o 9.790/1999, que regulamenta as organizações da

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sociedade civil de interesse público (OSCIP), que são entidades que prestam serviços de assistência social e não visam a lucros. (BRASIL, 1999).

As ações sociais, que antes da Reforma do Estado Brasileiro eram de responsabilidade do Estado, agora são de responsabilidade da sociedade civil. O Estado deixa de ser o executor das políticas sociais e, por meio de parcerias público-privadas, financia a sociedade civil para desempenhar assistência a pes-soas necessitadas. Nesse viés, a assistência social perde o caráter de direito do cidadão e de responsabilidade do Estado e passa a ser vista na lógica neoliberal como “caridade” a determinados grupos sociais em risco de vulnerabilidade.

Com a criação do Terceiro Setor, dois tipos de empresas terceirizadas emergiram. O primeiro, reestruturante, segue na linha empresarial, que busca a redução de custos por meio do uso das tecnologias, a fim de deixar as empre-sas mais modernas e competitivas, ocasionando a demissão de trabalhadores. O segundo tipo, denominado predatório, utilizando-se da adesão voluntária temporária, centra-se diretamente na exploração do trabalhador.

As empresas multinacionais partem do conceito de desterritoriali-zação, em que as plantas filiares das empresas migram para países periféricos onde a mão de obra é abundante e desprovida de leis trabalhistas e os gover-nos, carentes de investimentos, concedem incentivos fiscais para a instalação e o funcionamento de filiais. Dessa forma,

Pode-se compreender que o Terceiro Setor atua em uma com-binação de três categorias diferentes de trabalho: o voluntário, o assalariado e o remunerado precarizado (parcial, temporário, por Projetos, por produtividade, sem vínculo empregatício e sem direitos sociais). (SOUZA, 2013, p. 81).

Importante compreender quem é esse trabalhador voluntário do Ter-ceiro Setor, qual é a sua atuação profissional, quais suas garantias trabalhistas. Cabe saber se presta trabalhos voluntários por caridade e benevolência ou mais por necessidade de sustento da família e busca de ascensão no serviço formal. (SOUZA, 2013).

Park et al. (2006) inventariam o trabalho voluntário no Brasil e apon-tam que os primeiros registros desse tipo de trabalho têm origem em 1543, com a criação da Santa Casa de Misericórdia, na Vila de Santos, para cuidado de crianças abandonadas. Desde então, esta categoria passou por significati-vas mudanças para atender a uma variedade de questões sociais emergentes

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até chegar à década de 1990, com a Reforma do Estado. A partir do ano de 1990, o trabalho voluntário está ligado ao projeto político neoliberal, com o surgimento das organizações não governamentais (ONGs), formando uma nova filantropia para atuar em prestação de serviços sociais, o que antes era de responsabilidade do Estado.

O trabalhador voluntário arregimentado para trabalhar no PME, de que trata esta pesquisa, está amparado na Lei n.o 9608/1998, ligada ao Terceiro Setor. É um trabalhador desprovido de vínculo empregatício que recebe uma ajuda de custo para despesa com transporte e alimentação ao prestar servi-ços de assistência social a pessoas mais necessitadas por meio de entidades públicas e privadas.

No tocante à adesão do trabalhador voluntário para trabalhar no PME, o Governo Federal celebra uma parceria diretamente com a Unidade Executora da Escola, mediante termos de adesão da escola ao PME, que recebe esses recursos na conta da Unidade Executora da Escola o (CDCE). A partir de então, no último dia útil do mês, coincidindo com a data de recebimento dos salários dos educadores, fazem-se os ressarcimentos de despesas incorridas pelos trabalhadores voluntários, conforme horas trabalhadas. Na opinião de Costa,

O forte apelo ao trabalho voluntário e às parcerias, em especial nas escolas públicas brasileiras, não por acaso faz parte de um discurso de desqualificação e desconstrução do público, primeiro embalado pela ideologia neoliberal e, posteriormente, pelo ideário de Terceira Via. (COSTA, 2014, p. 116).

O setor público, por intermédio da Terceira Via e do Terceiro Setor, estabelece parcerias com o setor privado para desenvolver políticas so-ciais mediante lucro sobre os serviços prestados, aumentando a lucratividade dos empresários e diminuindo os direitos e as garantias trabalhistas ao utilizar trabalhadores voluntários. No caso do PME, os trabalhadores são obrigados a assinar um termo de adesão, abrindo mão de possíveis garantias trabalhistas e previdenciárias, com o mínimo de condições de trabalho, sem capacitação e baixo ressarcimento financeiro, vendo-se como responsáveis por melhorar a qualidade da educação pública. O poder público se desresponsabiliza pela oferta de serviços sociais de qualidade e ainda culpabiliza a comunidade local e o cidadão pelo sucesso ou fracasso das políticas e programas sociais.

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Estrutura de funcionamento do Programa Mais Educação

É no contexto de governos do Partido dos Trabalhadores que se insere a criação do Programa Mais Educação. Em sua proposta pedagógica, o PME traz em suas diretrizes os valores de territorialidade, intersetorialidade e articulação dos saberes comunitários com saberes escolares. Para (re)significar os tempos e espaços escolares, o PME utiliza-se da territorialidade, de modo a articular os espaços formais de aprendizagem da escola com outros espaços informais, como praças, repartições públicas, igrejas e associações comunitárias. É preciso que as crianças e adolescentes se apropriem desses espaços coletivos para aprender e brincar, fortalecendo as relações de amizade e obrigando o Estado a garantir segurança, a fim de diminuir as tensões sociais. (MOLL et al., 2012).

A implementação do PME é uma ação intersetorial entre diferentes Ministérios para promoção de políticas públicas educacionais e sociais.

O Artigo 4° da Portaria Normativa Interministerial n° 17/ 2007esta-belece:

Art. 4° Integram o Programa Mais Educação ações dos seguintes Ministérios:I - Ministério da Educação;II - Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome;III - Ministério da Cultura; eIV - Ministério do Esporte. (BRASIL, 2007a).

Partindo dos Ministérios envolvidos e das ações a serem desenvol-vidas, o PME apresenta as seguintes categorizações: ações socioeducativas, tempo escolar, espaço educativo, ações integradas, intersetorialidade, assis-tência social, diversidade e formação integral. A intersetorialidade consiste no esforço entre Ministérios e Secretarias para prover políticas sociais a partir da escola, convergindo para o duplo desafio de proteger e educar. Algebaile (2009) registra que a diminuição das políticas sociais no Estado neoliberal transforma a escola em um posto avançado do Estado de assistência social, com condi-ções formativas reduzidas e estruturas precárias, tornando tensas as relações profissionais. “A intersetorialidade é, porém, resultado de um processo ainda pouco claro e descoordenado de modelo de gestão de políticas públicas, cuja problematização impõe o desenvolvimento de modelos integrativos de gestão governamental”. (NAVARRO, 2011, p. 25).

O Programa Mais Educação e sua proposta pedagógica inserem os

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saberes comunitários no currículo escolar para que sejam articulados com os saberes científicos escolares. A proposta do PME, presente no Caderno 2: texto referência para o debate nacional avalia que toda escola está situada em uma comunidade com especificidades culturais, saberes, valores, práticas e crenças – o desafio é reconhecer a legitimidade das condições culturais da comunidade para estimular o diálogo constante com outras culturas. (BRASIL, 2009a, p.11). A inserção dos saberes comunitários tem o objetivo de ajudar na superação de preconceitos, muitos deles calcados em estereótipos de classe, raça/etnia, gênero, orientação sexual e geração, dentre outros.

Os saberes comunitários propagados no Programa Mais Educação são distribuídos em 11 grandes áreas:

Brincadeiras, alimentação, organização política, condições am-bientais, mundo do trabalho, curas e rezas, expressões artísticas, narrativas locais, corpo e vestuário, habitação e calendário local, tendo a ideia de comunidade como ponto de partida para cada um dos eixos. (SILVA; SILVA, 2012, p.112).

De outro lado, os saberes escolares estão agrupados em 16 habilida-des: “querer saber, questionar, observar, desenvolver hipóteses, descobrir, ex-perimentar, identificar, jogar, classificar, sistematizar, criar, relacionar, concluir, debater, comparar e rever” (SILVA; SILVA, 2012, p.112). Esses conhecimentos são agrupados em três áreas: Linguagem, Códigos e suas Tecnologias; Ciências da Natureza e Matemática; e Sociedade e Cidadania.

A proposta do Programa Mais Educação é ampliar oportunidades de aprendizagem nas escolas ao articular saberes comunitários com saberes escolares. Devem-se incluir, no contraturno escolar, atividades educacionais em artes, cultura, esporte e lazer, mobilizando os saberes para a melhoria do desempenho educacional e o cultivo de relações entre professores, alunos e suas comunidades escolares. O Programa tem por finalidade garantir também a proteção e assistência social para a formação da cidadania, com a inclusão de perspectivas temáticas dos direitos humanos, consciência ambiental, novas tecnologias, comunicação social, saúde e consciência corporal, compartilha-mento comunitário, segurança alimentar e nutricional, convivência e democra-cia, e dinâmica de redes. (BRASIL, 2007). A proposta pedagógica do Programa Mais Educação consiste em articular os saberes comunitários com os saberes escolares, organizados em sete Macrocampos com 60 oficinas, desenvolvidas por trabalhadores voluntários.Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 121-143, jan./jun., 2018

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O trabalho voluntário em duas escolas públicas da rede estadual localizadas no município de Juína (MT)

Para garantir a oferta da educação pública básica, o estado de Mato Grosso conta com a Secretaria de Estado de Educação (SEDUC), 101 assessorias pedagógicas e 15 Centros de Formação de Professores (CEFAPROs). Possui 756 escolas na rede estadual, conforme informações obtidas no site da SEDUC/MT (2018). Contribuem, ainda, para a discussão e elaboração das legislações das políticas públicas educacionais, o Conselho Estadual de Educação (CEE/MT), o Fórum Estadual de Educação (FEE). O Sindicado dos Trabalhadores no Ensino Público de Mato Grosso (SINTEP/MT), exerce também importante papel nesse processo dada a sua função de entidade representativa dos trabalhadores em educação.

A proposta de oferta do Ensino Fundamental do Estado de Mato Grosso está organizada em ciclos de formação humana; valoriza a interação do sujeito com o meio social e preza por uma formação humanística, engajando saberes éticos, científicos e artísticos, fugindo do tecnicismo. Para tanto, ini-ciou-se um projeto piloto em 1999, que culminou com a superação do sistema seriado e a implantação da organização escolar em ciclos de formação no ano 2000. (MATO GROSSO, 2000).

Desde então, têm-se entrecruzado políticas de cunho neoliberal gerencialista na rede estadual de ensino com políticas e estratégias gover-namentais mais progressistas, como o PME, a partir de 2007, evidenciando a ampliação do direito à educação e o apelo à qualidade educacional. É neste contexto que se insere o Programa Mais Educação, implementado nas escolas de redes públicas municipais e estaduais do país, com o principal objetivo de assegurar a qualidade educacional.

As duas escolas da rede pública estadual localizadas no município de Juína (MT), locus da pesquisa, também implementaram o PME. Os principais critérios para adesão foram ter baixo Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) e, segundo o Manual Passo a Passo (2012), um “índice igual ou superior a 50% de estudantes participantes do Programa Bolsa Família” (BRASIL, 2012, p. 7).

A seguir, apresentamos a pesquisa empírica realizada nas duas escolas estaduais, ambas localizadas no município de Juína (MT), abordando os três eixos de análise: o perfil dos monitores do PME; as condições de trabalho e formas de organização do trabalho voluntário; e as relações de trabalho entre docentes e monitores para desenvolvimento das atividades do PME.

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Quanto ao primeiro eixo temático, perfil dos monitores, os que pres-taram serviços voluntários nas escolas locus da pesquisa, durante os anos de 2013 a 2015, eram sujeitos situados na faixa etária de 20 a 30 anos de idade, do sexo masculino e feminino, cursando algum curso superior e auferindo, em média, R$ 350,00 (trezentos e cinquenta reais), mês. Os estudantes estavam em busca de uma renda extra para custear despesas com estudos, como paga-mento de mensalidades, pagamento de impressão de textos e despesas ligadas a transporte e alimentação. Estes trabalhadores voluntários encontraram no Programa Mais Educação uma oportunidade de vivência do ambiente escolar para adquirir experiências didático-pedagógicas, como uma extensão do es-tágio supervisionado para aplicação das práticas de conhecimentos teóricos adquiridos nas faculdades de licenciaturas que cursavam.

Constatamos que, 51% dos monitores entrevistados, já tinham desenvolvido algum tipo de trabalho voluntário, ligado a entidades religiosas ou a clubes de serviços, e que os motivos reais de sua inserção no Programa Mais Educação foram financeiros, aliados à experiências de qualificação/preparação para o desempenho de atividades dos profissionais do ensino. Destacamos o otimismo e as expectativas destas pessoas para tornarem-se educadores, o anseio por conquista de um trabalho formal ligado à área da educação. Nesse período em que estavam se formando, sentiam-se satisfeitos com os recursos recebidos. Identificamos que, atualmente, dos 12 entrevistados, 10 estão tra-balhando na área da educação e dois no comércio local da cidade.

Apesar de a proposta do Programa Mais Educação não prever con-tratação de professores e de incentivar a aproximação com os saberes popu-lares por meio de voluntários das comunidades onde se inserem a escola e universitários, ficamos impressionados ao evidenciar, na prática, os efeitos das Reformas do Estado Brasileiro orientado pelo neoliberalismo e Terceira Via, em meio a carências da oferta de infraestrutura adequada, ausência de formação continuada e baixo ressarcimento financeiro, aliados à ausência de direitos trabalhistas e previdenciários. Percebemos a preocupação e o sentimento de culpa dos trabalhadores voluntários pela efetivação das políticas sociais e desenvolvimento da comunidade local. Nessa conjuntura, o Estado neoliberal deixa de ser executor das políticas sociais para tornar-se provedor e transfere sua responsabilidade para o cidadão comum na comunidade local, de modo a desenvolver as políticas sociais com o mínimo de recursos. Evidenciamos que os monitores não atenderam à recomendação da proposta do Programa Mais Educação de articular saberes comunitários com saberes escolares, talvez pelo seu perfil e falta de formação adequada.Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 121-143, jan./jun., 2018

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No segundo eixo temático, das condições e formas de organização do trabalho voluntário dos monitores do PME, constatamos que a maioria dos espaços disponibilizados era de uso coletivo. Além disso, era preciso conciliar as atividades do Programa Mais Educação com as aulas normais conforme um cronograma, o que gerava reclamações. Consideramos que as reclamações por espaço advinham da ausência de compreensão da proposta do PME, pautada na (re)significação de espaços e tempos escolares. A intersetorialidade aponta que “tratar os sujeitos situados em um mesmo tempo e espaço de maneira integrada e convergente exige, no campo da concretude, articulação das ações”. (MOLL et al., 2012, p.119).

Contudo, a territorialidade pode também ser compreendida como uma artimanha do capital neoliberal na lógica do Estado gerencialista; ela cria artifícios, obrigando os educadores a ocuparem outros espaços de uso coletivos, externos à escola. Na prática, a territorialidade incumbe os monitores e gesto-res locais de procurarem espaços alternativos para estabelecerem parcerias, podendo implicar a negação do Estado quanto à ampliação das estruturas físicas das escolas. Nesse sentido, Silva (2011) afirma:

Nas escolas das redes públicas, tais práticas se revelam nos mecanismos adotados no modelo de gestão gerencial, no qual as comunidades locais passam a compartilhar com algumas des-pesas escolares sem se dar conta que contribuem com a perda de direitos e com a desobrigação do Estado na prestação de serviços públicos de qualidade à população (SILVA, 2011, p. 158).

Esse tipo de governo desobriga o Estado da responsabilidade com investimento em educação e empurra para terceiros a tarefa de estabelecer parcerias, mesmo ciente de que os monitores e gestores das escolas não têm como apresentar garantias legais nem como custear a manutenção e ressarcir eventuais danos em prédios de terceiros, como um barracão de uma associação ou igreja. (SILVA; SILVA, 2012).

Detectamos que os recursos financeiros do Programa Mais Educação eram suficientes para a aquisição de materiais pedagógicos necessários à re-alização das oficinas e que, nas escolas, havia equipamentos em quantidade razoável para contribuir com o desenvolvimento das atividades do PME. Como estratégias de utilização, os equipamentos tecnológicos eram organizados por agendamento ou cronograma para servir tanto às aulas normais quanto às necessidades das oficinas do PME.

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Outro fator importante na execução do Programa, mas ausente, foi a formação dos executores da proposta. A leitura dos orientativos ou a formação continuada aos monitores deveria ser condição sine quo non para a adesão a trabalhos voluntários. Sem isso, os monitores desenvolveram as oficinas com base no achismo e continuaram a reforçar o status quo do currículo escolar das aulas normais, ampliando, assim, o tempo de escola, e não a oferta de uma educação integral, capaz de inovar, de modo a afetar saberes diferenciados, articular saberes escolares e saberes comunitários e (re)significar o conheci-mento. De acordo com os entrevistados, se houvesse formação continuada, grande parte dos problemas relacionados à organização do tempo, espaço, materiais e equipamentos poderia ser amenizada.

No terceiro eixo temático, ao investigarmos as relações de trabalho dos monitores e o envolvimento da comunidade nas atividades do PME, cons-tatamos, em ambas as escolas, certa dissociação entre as aulas normais e as oficinas do Programa. Parecia haver duas escolas funcionando paralelamente no mesmo espaço escolar. Houve poucas iniciativas para estimular o trabalho coletivo relacionado ao planejamento curricular entre professores e monito-res; houve relatos de iniciativas isoladas de alguns monitores de aproximação com os professores regentes. Um dos meios de aproximação dos monitores e professores eram as reuniões pedagógicas, nas quais os monitores eram convidados a participar apenas para discutir questões da rotina escolar, sem maior profundidade para discutir o processo ensino-aprendizagem dos alunos.

Nas atividades do Programa Mais Educação, as avaliações eram rea-lizadas pelos monitores de forma concomitante e diária, com anotações em fichas descritivas. Na oficina envolvendo apoio pedagógico, percebemos difi-culdades dos monitores em inovar, incentivar e ofertar um ensino diferenciado do já disponível nas aulas normais, o que acarretava o desinteresse dos alunos, apesar de estes gostarem de permanecer no ambiente escolar. Por outro lado, aquelas oficinas que envolviam conhecimentos diferenciados, mais lúdicos, como rádio escolar, horta, fotografia e atividades esportivas, despertavam maior interesse nos alunos em relação ao aprendizado, demonstrando, desse modo, a necessidade de (re)significar o conhecimento, ofertando-se oficinas práticas mais atrativas.

Com o Programa Mais Educação, a escola cumpre o papel social de propiciar à criança um ambiente seguro, longe da violência e, consequente-mente, de melhor aprendizagem e interação, fortalecendo, assim, os laços de amizade e melhorando o convívio social. Outro ponto apresentado pelos monitores é a quebra de barreiras entre discente e docente, o que facilita a Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 121-143, jan./jun., 2018

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relação pedagógica marcada pelo diálogo. Quanto à pouca participação da comunidade escolar, detectamos

que, quando eram promovidas ações culturais, a comunidade comparecia. Isso demonstra a necessidade de criar estratégias para despertar nos pais o interesse em participar da vida escolar dos filhos, já que eles têm a escola no bairro como um ambiente seguro de proteção e convívio social. Pode ser uma estratégia para inserir os pais no processo de ensino aprendizagem, por meio de atividades lúdicas, recreativas, que vão muito além de sua presença na escola para receber críticas sobre os resultados de avaliações dos filhos.

Considerações finais

Nesta pesquisa, analisamos as implicações do trabalho voluntário no Programa Mais Educação para a organização escolar na Escola Estadual Cecília Meireles e na Escola Estadual Clarice Lispector, no município de Juína (MT), no período de 2011 a 2015, a partir da problemática: quais as impli-cações do trabalho dos monitores voluntários do Programa Mais Educação para a organização escolar? Para responder esse questionamento, procu-ramos analisar os dados empíricos à luz do referencial teórico que aborda o papel do Estado e as reformas neoliberais e de Terceira Via, assim como o Terceiro Setor e o trabalho voluntário como uma alternativa ao papel do Estado na execução das políticas sociais (PERONI, 2005).

A partir de 2007, com a implantação do novo desenvolvimentismo, durante o segundo mandato do presidente Lula da Silva (PT), promoveu-se uma contrarreforma da educação, sendo uma das ações a ampliação da jornada escolar para a educação básica, com a criação do Programa Mais Educação. Apesar do caráter progressista, este Programa não ficou imune à onda de re-formas gerenciais, e o trabalho voluntário ganhou relevância na execução do PME, como detectado na pesquisa. Adotamos três eixos temáticos para análise: Conhecendo o perfil dos monitores voluntários que trabalharam no PME; As condições e formas de organização do trabalho voluntário dos monitores do PME e As relações de trabalho dos monitores e o envolvimento da comunidade nas atividades do PME.

No primeiro eixo, constatou-se que o Programa tem sido executado por trabalhadores voluntários jovens, em formação, que encontraram a opor-tunidade para complementar renda e concluir os estudos em licenciaturas, ao mesmo tempo em que adquirem experiência, almejando um serviço de

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formação de professor. Observamos que, em 2017, dos sujeitos da pesquisa entrevistados, 83 % estavam atuando como professores nas suas áreas de formação. Esses trabalhadores voluntários experimentaram dificuldades e possibilidades envolvendo as condições de trabalho, a reorganização do es-paço e tempo escolar e a conciliação no uso de equipamentos tecnológicos. Por estarem na parte de baixo da pirâmide da hierarquia escolar e não terem recebido formação adequada, esses trabalhadores voluntários tiveram que encontrar formas de aproximação dos professores para estabelecerem relações de trabalho e desenvolverem estratégias para envolver-se com a comunidade escolar nas atividades do Programa Mais Educação. A utilização de monitores/trabalho voluntário na execução do Programa parece coadunar-se com as es-tratégias neoliberais de “aliviar” o Estado de sua obrigação de executor direto de políticas sociais, entre elas, as de educação integral e de tempo integral, tal como prevê todo o arcabouço jurídico para a área.

No segundo eixo temático, As condições e formas de organização do trabalho voluntário dos monitores do PME, ficou evidenciado que as recla-mações por espaço advinham da falta de compreensão da proposta político--pedagógica do PME, já que esta é pautada na (re) significação de espaços e tempos escolares.

Constatamos que a indução à educação integral dentro da escola mediante o Programa Mais Educação acarretou o aumento significativo de alunos dividindo o mesmo espaço com as aulas regulares. Se, por um lado, com o aproveitamento de espaços na própria comunidade, o Programa inova ao propor uma maior articulação entre os saberes comunitários e os saberes escolares, tão propalada em discursos pedagógicos progressistas, por outro, a educação integral de tempo integral só pode ser desenvolvida com maior aporte de recursos financeiros, estruturas físicas e materiais adequadas e pro-fissionais qualificados por área do conhecimento, valorizados, e não a partir de trabalho voluntário, entre outros, indicadores de qualidade educacional.

No terceiro eixo temático, ao investigarmos As relações de traba-lho dos monitores e o envolvimento da comunidade nas atividades do PME, constatamos que, em ambas as escolas, havia certa dissociação entre as aulas normais, as oficinas do PME e o envolvimento da comunidade na escola. Per-cebemos duas escolas funcionando paralelamente, no mesmo espaço escolar. Houve poucas iniciativas para estimular o trabalho coletivo relacionado ao planejamento curricular entre professores e monitores com a participação das famílias, como prevê a Lei 7.040/98, de gestão democrática. Poucos foram os relatos de iniciativas isoladas de aproximação de alguns monitores Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 121-143, jan./jun., 2018

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com os professores regentes. Um dos meios de aproximação dos monitores e professores eram as reuniões pedagógicas, para as quais os monitores eram convidados a participar apenas para discutir questões da rotina escolar, sem maior profundidade para debater o processo ensino-aprendizagem dos alunos. Ficou evidenciado na pesquisa que a participação das famílias na vida escolar dos filhos é muito reduzida, elevando-se somente em momentos de atividades lúdicas, recreativas.

Os resultados da pesquisa evidenciam contradições entre as orien-tações dos manuais e orientativos do Programa Mais Educação e a execução do Programa. Percebemos uma (re)significação do termo “voluntariado”, pois, na verdade, as pessoas voluntárias estavam na escola em busca de um trabalho, mesmo que precarizado, almejando no futuro fazer parte do quadro de profissionais da educação. Por isso, podemos concluir que elas estavam em busca não de voluntariar-se, mas de satisfazer às suas condições básicas e objetivas de vida.

Por fim, considerando as características principais e o formato de materialização do PME em inúmeras escolas e sistemas públicos de ensino do pais e, por mais que apresente aspectos da lógica neoliberal, como o traba-lho voluntário, o PME pode ser considerado um indutor da escola de tempo integral no Brasil.

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Data de recebimento: 01.08.2018Data de aceite: 11.10.2018

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SEXUALIDADE E EDUCAÇÃO: UMA COMPARAÇÃO ENTRE ALUNOS SURDOS E NÃO SURDOS

SEXUALITY AND EDUCATION: A COMPARISON BETWEEN STUDENTS DEAF AND NON DEAF

Victor Hugo de Oliveira Henrique¹Edna Lopes Hardoim²

RESUMO: Objetivando conhecer a concepção de sexualidade de alunos surdos (AS) e não surdos (NS) e como a expressam, realizou-se uma entrevista semi-estrutura-da, empregando recursos visuais, com os alunos do 3º Ano do Ensino Médio. Os dados revelaram que o preservativo é o método contraceptivo mais utilizado por ambos os grupos entrevistados. Entre os AS não há um diálogo muito amplo sobre sexualidade com a família, diferindo dos demais. Quanto a realização de atividades relativas ao tema na escola, entre os AS foi unânime a necessidade de aulas de educação sexual, e uma minoria foi contrária à ideia entre os NS. Para a maioria dos AS a sexualidade está relacionada ao ato da prática do sexo, evidenciando a importância de discussão sobre a temática. Os resultados da pesquisa evidenciaram que os AS conseguem vivenciar sua sexualidade como qualquer indivíduo NS, não tendo sido identificada diferença significativa entre suas concepções.

PALAVRAS-CHAVE: Sexualidade, educação, alunos surdos.

ABSTRACT: Aiming to know the conception of sexuality of deaf and non-deaf stu-dents and how they express it, a semi-structured interview was carried out, using visual aids, with the students of the 3rd Year of High School. The data revealed that condoms are the contraceptive method most used by both groups. Among AS there is not a very broad dialogue about sexuality with the family, differing from the others. Regarding the accomplishment of activities related to the theme in the school, among the AS was unanimous the need for sex education classes, and a minority was against the idea among the NS. For most AS, sexuality is related to the act of sex, evidencing the importance of discussing the issue. The results of the research evidenced that the AS are able to experience their sexuality as any NS

DOI/10.30681/21787476.2018.29.145158

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individual, and no significant difference between their conceptions was identified

KEYWORDS: Sexuality, education, deaf students

Introdução

O processo de ensino-aprendizagem inicia-se quando há uma apropriação dos alunos referente a um determinado assunto abordado pelo docente, que possui um papel importante nesta relação. O professor deve proporcionar algumas condições necessárias neste processo, especialmente no que diz respeito às estratégias que utilizará para efetivar a transposição didática do tema, ou seja, estratégias metodológicas que irão facilitar o entendimento do conhecimento científico, associando-o ao cotidiano do aluno. O saber aca-dêmico serve de base para legitimar o saber ensinado, cuja mediação é feita pelo professor (RODRIGUES; SCHEID, 2008).

Abordar a temática da sexualidade não é uma tarefa fácil, pois, em muitos casos, a família simplesmente se silencia sobre o tema por medo ou por não terem as informações necessárias, como se isso fosse estimular ex-cessivamente a sexualidade dos filhos, fazendo com que as dúvidas referentes ao tema sejam trabalhadas na escola. A escola, na maioria das vezes, não está preparada, embora esse seja um dos temas transversais propostos pelas Dire-trizes Nacionais a ser trabalhado na educação básica. Ainda hoje, o que se vê, são propostas não bem elaboradas, com professores trabalhando a sexualidade apenas quando surge algum “problema”, como gravidez na adolescência ou algum estudante com Infecção Sexualmente Transmissíveis- IST (RODRIGUES; SCHEID, 2008).

No decorrer dos anos, percebeu-se que a Educação Sexual obteve um inegável avanço no âmbito escolar, tornando-se uma medida muito sig-nificativa para desconstruir diversos mitos e preconceitos que foram sendo, e ainda são, produzidos na escola. Desse modo, os/as docentes precisam se preparar para abordar e discutir estes e outros temas de extrema relevância social (SOUZA; SANTOS, 2012).

A Educação Sexual já era estimulada desde os Parâmetros Curricula-res Nacionais (BRASIL, 1997). De acordo com os PCN, os trabalhos referentes a educação sexual devem ser realizados em três eixos norteadores, são eles “corpo: matriz da sexualidade”, “prevenção de doenças sexualmente transmis-síveis” e “relações de gênero”.

Dentro da Educação Sexual, aborda-se a sexualidade que está pre-

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sente em todas as faixas etárias, podendo ser compreendida por meio de as-pectos biológicos, psicológicos e socioculturais e corresponde um conjunto de concepções e valores que envolvem a intencionalidade humana e a expressão afetiva de cunho sócio histórico.

A sexualidade envolve, então, uma amplitude de condutas humanas, para além de sua genitalidade, e não deve ser entendida, exclusivamente, como sinônimo de sexo, relação sexual, orgasmo, órgãos sexuais, mas sim, na sua dimensão ampla e cultural, que abrange diferentes sentidos, como o amor, relacionamentos afetivos e sexuais, a sensualidade, o erotismo e o prazer, a expressão da identidade e dos papéis sexuais. Ela inicia-se a partir das primeiras experiências afetivas do bebê com os pais ou com qualquer outra pessoa que esteja em constante contato com ele (MAIA; ARANHA, 2005).

A sexualidade envolve não apenas a conduta sexual do indivíduo, o ato sexual e a reprodução, mas também, tudo aquilo que remete às situações que nos proporcionam prazer, como os afetos, desejos, a nossa relação com o próprio corpo, as relações interpessoais, bem como o papel sexual que a pessoa exerce (SCHLIEMANN, 2005)

Percebe-se, então, que a sexualidade faz parte sociedade, e pode ser considerada uma questão de cidadania. Neste sentido, seu entendimento deve proporcionar uma reflexão voltada para as múltiplas formas de manifestação humana e o lugar que estas ocupam em nossa sociedade, como o sexo, o desejo, o medo, o amor, o corpo biológico e os papéis sociais/sexuais.

No passado falar de sexualidade dentro do contexto da escola com os alunos era um afronto para a sociedade e o(a) professor(a) era punido de alguma forma. Com isso, questões sobre sexualidade do aluno era omitida dentro da instituição escolar. Segundo Tiba (1994),

Durante muito tempo, a sexualidade foi solenemente ignorada pelas escolas. Os professores agiam como se seus alunos fossem seres assexuados, mesmo quando chegavam à adolescência. Não podia ser diferente; afinal, toda sociedade tratava o tema sexo entre quatro paredes. O melhor método, portanto era não tocar no assunto e deixar que a natureza se encarregasse de ensinar os alunos o que estava se passando. E como a ordem era reprimir a sexualidade, melhor seria não tocar no assunto para não despertá-la (TIBA, 1994, p.4).

Notadamente observa-se que durante anos o tabu, o preconceito, o medo, o despreparo e os mitos tomavam conta do tema sexualidade, e que a

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escola, especificamente, os professores camuflavam o assunto com as censuras sublimadas. A sociedade, em geral, repudiava qualquer tentativa de aborda-gem do assunto, que deveria ser reprimido para não corromper ou induzir os adolescentes. Assim, essa cultura atravessou gerações.

Atualmente vivemos em uma época de excessos de estímulos sexual em que a mídia promove certo incentivo para o ato sexual sem alertar para a necessária segurança. A questão moral está hoje obscurecida por inquietações sobre o impacto do sexo na qualidade de vida do indivíduo. A televisão, o cine-ma, a imprensa, a propaganda inundando o cotidiano dos jovens com apelos sexuais jamais vistos por outra geração. E é daí que nasce a fantasia de que toda relação sexual é maravilhosa; visto que o adolescente se deixa influenciar por excesso de estímulos. Por este princípio, percebe-se que o espaço da escola deve ser valorizado para se discutir questões em torno da sexualidade, não como controladora da vontade do sujeito, mas, como instância propiciadora de reflexão sobre a temática.

O professor como um agente importante no processo de ensino--aprendizagem, precisa desenvolver estratégias metodológicas para trabalhar diferentes temas dentro de sala de aula, e para isso ele precisa conhecer a concepção dos alunos sobre esses temas, suas representações mentais. Des-sa forma, a pesquisa objetivou compreender a concepção de sexualidade de alunos surdos e não surdos e saber como a expressam, contribuindo, a partir dos resultados, com os professores para que possam elaborar estratégias metodológicas para trabalhar essa temática nas escolas.

Sexualidade e o estudante surdo: implicações para educação inclusiva

Discutir a temática sexualidade dentro da escola, muitas vezes é delegada ao professor de Ciências e/ou de Biologia, que passa a ter o papel de orientador sexual, trabalho que deveria ser de toda a comunidade escolar, conforme previam os temas transversais dos PCNs (BRASIL, 1997).

Como os conteúdos a serem trabalhados são muitos e as escolas, em sua maioria, não têm um projeto multidisciplinar para trabalhar essa temática, a sexualidade acaba sendo abordada nas aulas de Biologia e/ou de Ciências, que trabalham apenas os aspectos biológicos, tais como aparelho reprodutor masculino e feminino, os órgãos sexuais, as DST’s e os métodos contraceptivos, sem trabalhar os aspectos psicológicos e socioculturais (RODRIGUES; SCHEID, 2008).

Diferente da sexualidade dos adolescentes tidos como normais, a Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 145-158, jan./jun., 2018

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sexualidade dos deficientes não é um tema considerado pelos professores e nem é comumente tido como assunto de debates ou palestras.

Quando se trata de sua expressão por pessoas surdas, normalmen-te, o que acontece é a desconsideração. Professores e profissionais de saúde não têm desenvolvido competência para lidar com essa temática, sobretudo, quando se refere às pessoas com necessidades especiais.

A história da humanidade, assim como a história dos deficientes, varia de cultura para cultura, refletindo crenças, valores e ideologias que, materializa-das em práticas sociais, estabelecem modos diferenciados de relacionamentos entre deficientes e não-deficientes. Em uma visão histórico-cultural, a família tende a imprimir, geralmente, às pessoas com deficiências, a ideia de que são incapazes, inábeis, inseguros e assim vão sendo “educados” para serem indefesos, dependentes e, até, considerados por alguns como assexuados e desinteressantes, interferindo no modo de expressar e vivenciar sua sexuali-dade (MACEDO et al. 2009).

A capacidade de manifestar e sentir amor constitui a essência básica da sexualidade. Demonstrações de ternura, simpatia e atração exprimem amor e afeto e revelam a natureza do indivíduo com ser sexuado.

Em geral, pessoas com deficiência são privadas de orientação sexual e é essa desinformação geral que estimula o preconceito e restringe o direito dessas pessoas ao exercício de uma vida sexual livre, plena e satisfatória. Na adolescência, as pessoas com deficiência anseiam pelo estabelecimento de uma relação amorosa, afetiva e sexual, uma vez que estão expostas às mesmas normas sociais que as não-deficientes (MAIA;ARANHA, 2005).

Diversos autores têm defendido que toda pessoa com deficiência é uma pessoa íntegra na sua sexualidade. Isto é, independentemente das pos-síveis limitações e complicações que possam ocorrer na manifestação sexual, ninguém se torna assexuado em função de uma incapacidade física, sensorial ou mental (MAIA; ARANHA, 2005; BUSCAGLIA, 1997). Sendo assim, uma pes-soa não pode ser considerada assexuada, pois a sexualidade é inerente ao ser social. Há duas décadas, a literatura vem apontando a sexualidade do deficiente como angelical, infantil ou como agressiva e incontrolável. Nesse sentido os deficientes são vistos sob duas premissas: os de anjos, quando a sexualidade é reprimida e não manifesta e os de feras, quando é expressa explícita e ina-dequadamente. Porém nesses dois casos há uma percepção distorcida sobre a vida afetiva e sexual dessas pessoas (PINHEIRO; LEAL, 2005).

Ao falar sobre o tema sexualidade e deficiências, o mais importante é lembrar que ter vontades e desejos são coisas comuns a todo o ser humano,

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bem como suas necessidades de satisfação, seja sexual ou não. A atividade sexual pode ser vista como uma forma de busca por segurança e proteção (MACEDO et al. 2009).

Metodologia

No desenvolvimento da presente pesquisa, foi realizada uma en-trevista semi-estruturada com quinze alunos surdos (AS), utilizando a Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) e filmadora para registro da comunicação. Os alunos eram do 3º Ano do Ensino Médio do Programa Educação para Jovens e Adultos (EJA) no Centro Estadual de Atendimento e Apoio ao Deficiente Auditivo (CEAADA) e a 15 alunos não surdos (NS), da mesma série escolar, de uma Escola Municipal de ensino regular.

O Centro de Educação de Jovens e Adultos (CEJA) é um estabelecimen-to de ensino que integra uma das quatro categorias de Escolas que compõem a estrutura organizacional da Secretaria da Educação do Estado e tem como finalidade a oferta de escolarização, em nível de ensino fundamental - anos finais e de ensino médio para os jovens e adultos que não concluíram a educa-ção básica na idade própria que desejam retornar a escola para dar continui-dade a seus estudos. Inserido no CEJA, temos a EJA, que se caracteriza como uma modalidade de educação inclusiva, ou seja, que tem a preocupação e o objetivo de proporcionar condições para que o jovem e o adulto que por uma infinidade de motivos (dentre eles, o ingresso precoce no mundo do trabalho) se evadiram da escola ou até mesmo não chegaram a frequentá-la, possam a ela retornar ou adentrá-la pela primeira vez, e usufruírem dos inúmeros benefícios que ela pode lhes proporcionar.

Optou-se pela entrevista semi-estruturada que, de acordo com Lüdke e André, (1986, p.34), é considerada uma ótima ferramenta para a coleta de dados em trabalhos de pesquisa em educação, pois podem dar uma liberda-de maior ao entrevistador, já que é aplicada “a partir de um esquema básico, porém não aplicado rigidamente, permitindo que o entrevistador faça as necessárias adaptações”.

Os entrevistados foram questionados sobre diferentes aspectos da temática sexualidade, tais como, idade para começar um relacionamento, para ter a primeira relação sexual, personalidade dos alunos, uso de métodos contraceptivos, interferência da família na expressão da sexualidade, meios de buscar informações sobre o tema e atividades que gostariam que fossem desenvolvidas nas escolas.Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 145-158, jan./jun., 2018

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Todos os estudantes que participaram da pesquisa preencheram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para participação na pesquisa, uso da imagem, voz e textos com fins de divulgação científica.

Resultados e discussão

A maior quantidade de alunos não surdos (NS) possui menos de 18 anos, já entre os alunos surdos (AS) a faixa etária se concentra acima dos 30 anos de idade (Tabela 1), evidenciando que o AS, entra na escola mais tardiamente. Talvez por uma pseudoproteção da família, que interfere, assim, no processo dinâmico de participação das pessoas no contexto relacional, legitimando sua interação nos grupos sociais, possibilitando a ampliação de sua percepção de mundo e permitindo sua expressão.

O desejo e as descobertas da sexualidade são sinais de saúde. Mas quando o adolescente com deficiência começa a sair, a conhecer pessoas, namorar e buscar uma vida sexual ativa, a família perde o controle sobre suas atividades, o que pode gerar medo de que ele seja rejeitado ou até mesmo abusado sexualmente. Com o intuito de proteger os filhos com deficiência, os pais costumam tratá-los como eternas crianças, negando assim o seu direito de expressar sua sexualidade (MACEDO et al. 2009).

A sensação da mudança do corpo de criança para adolescente traz conflitos para o jovem, que antes tinha controle sobre seu corpo e, é preciso aprender a lidar não apenas com ele, mas também com o desejo e a nova sexualidade que desponta, desencadeia pensamentos, sensações e, consequentemente, comportamentos que provocam um turbilhão de dúvidas e de emoções até então desconhecidas (HARDOIM; MIYAZAKI, 2012).

Com relação ao sexo dos sujeitos da pesquisa, tanto entre os alunos NS quanto entre os AS, houve uma predominância do sexo masculino - 9 do grupo NS e 8 AS; um ouvinte não respondeu. Os respondentes de ambas as categorias, em sua maioria, se auto afirmam heterossexual (Tabela 2).

Quando perguntados sobre qual a idade ideal para se iniciar um na-moro, entre os alunos NS houve uma predominância (60%) entre 15-18 anos de idade, enquanto que no grupo dos AS a melhor idade ficou na faixa de 19-20 anos (33,33%). Já com relação à idade adequada para a primeira relação sexual a faixa etária de escolha da maioria dos alunos NS foi coincidente com

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a do início do namoro, ou seja, consideram possível ter relações sexuais desde os prelúdios do namoro. Todavia, 46.66% dos AS entrevistados pensam que a idade ideal para a primeira relação sexual é acima dos 25 anos de idade e os demais ficaram distribuídos em quatro outras faixas etárias (Tabela 3).

Generalizar a intencionalidade das pessoas para iniciar a prática sexual é abrir um campo para equívocos e até preconceitos, cerceando a liberdade individual de manifestar suas diferenças. Para uma pessoa com deficiência, a descoberta do corpo e do prazer em manipulá-lo pode ocorrer tardiamente. Na puberdade quando o corpo já está desenvolvido, os deficien-tes podem manifestar inadequadamente as condutas sobre seu corpo e como manipulá-lo por falta de aprendizado, o que pode levá-los à ansiedade e a sofrer repressões sociais. Com o avanço da idade, a socialização e a interação com outras pessoas podem ficar ainda mais restritas e limitadas ao ambiente familiar. Há, até mesmo, relatos de casos de abuso no ambiente domiciliar.

Para Macedo et al. (2009) tal situação evidencia a importância de trabalhar a temática sexualidade nas escolas, mas para isso, é necessário um preparo de toda a comunidade escolar. Talvez uma forma seja por meio da comunicação total, defendida por Ciccone (1990), que implica em uma com-pleta liberdade na prática de quaisquer estratégias, que permitam o resgate da comunicação, total ou parcialmente, com a pessoa surda. Seja pela linguagem oral, língua de sinais, datilologia, pela expressão corporal e facial, ou ainda, pela combinação dessas possibilidades, o que importa é aproximar as pessoas e permitir contatos.

Acreditamos, assim como Flores (2004), que a educação para uma saúde sexual e livre expressão da sexualidade, é uma das instâncias que poderão responder à necessidade de transformação social, dado seu papel da educação como de transmissora do conhecimento, formadora do pensar e responsável pela mudança de comportamentos.

Conversas sobre sexualidade ocorre mais entre amigos no grupo dos AS enquanto que entre os NS existe um diálogo maior com o parceiro/a, e uma minoria conversa com os pais sobre o tema, evidenciando um distanciamento da família na discussão do assunto (Tabela 4). Dentre a comunidade surda, os pais acham que seus filhos deficientes são incapazes de expressar a sua sexu-alidade, negligenciando diálogo com os mesmos sobre sexualidade, fazendo com eles recorram aos seus amigos (MACEDO et al. 2009).

Quando questionados sobre a personalidade, a maioria dos alunos NS se intitula tímida (60%), calmos (20%), com relação à liderança e atirados (6,66%). A maioria dos AS se disse calma e tímida (33,33%), seguido dos atirado Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 145-158, jan./jun., 2018

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e líder (20%) e, por último, nervoso/ansioso (6,66%). Esses dados ajudam a interpretar os dados da Tabela 04, o fato de a maioria dos alunos, tanto surdos, se considerarem tímidos, faz com que eles se interrelacionem melhor com seus amigos, já que a família não orienta muito seus filhos nesta temática. Todavia essa atitude não tem sido exclusiva do surdo, mas também de ouvintes. Dada a relevância do tema, acreditamos que deva haver clara discussão sobre a temática entre adultos e adolescentes inexperientes.

A maioria dos alunos surdos (11) e dos não surdos (12 alunos) está satisfeita com o corpo que possuem. Dentre as atividades que mais gosta-riam que tivesse na escola, para a maioria dos alunos NS, gostaria de palestras sobre sexualidade (sete alunos), seguido de filme com debates e aulas de educação sexual (quatro alunos cada). Com os AS houve um empate entre as opções palestras e filmes com debates (seis alunos cada), seguido de aula sobre educação sexual (3 alunos). Referente as aulas de educação sexual na escola, a grande maioria dos AS (80%) concorda e apenas 3 alunos discordam. Já entre os alunos NS, foi unânime, todos concordam que deve ter aulas de educação sexual na escola. A pequena resistência de alguns AS em não ter aulas de educação sexual na escola pode se dar pela idade, pois a maioria possui mais de 25 anos de idade e alguns ainda conservam certos valores arraigados e acham que o assunto não ser tratado na escola. (Tabela 4) .

Tentar compreender as relações humanas e a expressão de sua sexualidade por meio de filmes, sejam eles quais forem, desde que abordem o assunto, não é algo simples, dada a dimensão da temática e grande falta de informação que afeta muitas pessoas. É importante, e necessário, o en-tendimento da dimensão do tema, e que os assuntos abordados dentro da sexualidade estão ficando cada vez mais diversificados.

Pensando nisso, o cinema entra como uma alternativa simples, todavia sem deixar de ser sério e crítico, de abordar aspectos pontuais relacionados às diversas manifestações da sexualidade (CHASKO;PREVIATO, 2013). No caso do uso do cinema para a formação e informação acerca das questões da se-xualidade, diversidade sexual e de gênero, os participantes “são capazes de se identificar com o drama, sofrer com o personagem (...), pois o sofrimento e as alegrias no filme representado dizem respeito à condição humana.” (ARAUJO; VOSS, 2009). Para os NS as palestras são importantes e os AS se dividiram entre as opções apresentadas na Tabela 5.

Apesar da maioria dos AS não discutir sobre sexualidade com a fa-mília, vários deles (46.66%) concordam que há forte influência da família na forma de viver sua sexualidade, pelo fato de ainda conservarem certos valores.

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Valores morais são as coisas aprendidas como direitas ou erradas, desejáveis ou indesejáveis, de acordo com os costumes da cultura em que estamos inse-ridos. Os valores morais são reforçados pelo exemplo de pais, parentes, e, em alguns exemplos, pela lei. Para Pozza (2010) podem surgir tabus, inseguranças, medos, etc. que surgem da relação dos valores distorcidos relacionados as questões sexuais.

É importante mencionar a importância da família na educação dos jovens surdos. A família é a primeira instancia social da qual a criança faz parte, ela é o ponto de apoio e sustentação do ser humano. Por isso quanto melhor a parceria entre família e escola, mais positivos e significativos serão os resultados na formação do sujeito. A família necessita acreditar que o surdo, se for trabalhado desde cedo, e se houver uma estimulação correta e intensa, será capaz de integrar-se perfeitamente no grupo dos ouvintes, já que, intelectualmente, não tem nenhum comprometimento que o impeça de aprender, desenvolver-se, de expressar sua sexualidade e, consequentemente, apresentar um desempenho semelhante ao do indivíduo de audição normal.

A consciência do uso de métodos contraceptivos é bem forte, tanto entre os alunos surdos quanto entre os ouvintes. Os AS quando questionados sobre esse tema, sempre citavam o cuidado para não engravidar antes do tempo e sua preocupação com a AIDs, a maioria faz uso do preservativo (oito alunos) seguido da pílula anticoncepcional (cinco alunos) e dois alunos são virgens, ou seja, nunca tiveram relações sexuais e, consequentemente, não fazem uso de métodos contraceptivos. A maioria dos alunos ouvintes também faz uso do preservativo (60%), seguido da pílula, dois de cada grupo de sujeitos não fazem uso de método algum e dois alunos não responderam.

A fonte de informações mais usada pelos AS sobre sexualidade é a TV (53,33%), seguido do professor (20%) e depois revistas e amigos (13,33%), com os alunos NS a maior fonte de pesquisa é a internet (33,33%), depois amigos (26,66%), revistas (26,66%) e a família (13,33%).

As ideias defendidas por Vygotski (1989) refutam a teoria de que crianças com alguma deficiência ou cujo desenvolvimento foi impedido por um “defeito” não possam ter oportunidades semelhantes às de outros indivíduos. O surdo não é simplesmente uma pessoa menos desenvolvida do que seus pares, mas alguém que se desenvolve de modo diferente, o que não implica numa percepção de mundo ou de si mesmo diferente. O autor afirma que os problemas dos sujeitos com deficiência não são de cunho biológico, mas, so-bretudo, social. Assim, também, a natureza dos processos compensatórios para o desenvolvimento do aluno com deficiência deve ser social e não biológico.Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 145-158, jan./jun., 2018

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É importante que o professor expanda seus conhecimentos acerca do assunto, objetivando auxiliar os alunos que não possuem informações adequadas, respondendo às dúvidas de forma esclarecedora, respeitando a opinião de cada educando. Se o educador não for preparado e não possuir informações adequadas, poderá transportar seus valores, crenças e opiniões como verdades absolutas, não permitindo aos alunos a autonomia para de-senvolver seu conhecimento (RODRIGUES; WECHSLER, 2014).

É preciso que os (as) docentes assumam o desafio de garantir a todos os alunos o direito a uma educação de qualidade, que não pode ser prejudicada seja pela cor da pele, orientação sexual, identidade de gênero, ou seja, é necessário que trabalhe com a diversidade que há na sala de aula. Para o professor, tratar esta temática abordada - a sexualidade, pode se tornar ainda mais difícil quando o público alvo de nossa orientação está composto de pessoas surdas, visto que se somam duas dificuldades: a abordagem do tema que, em geral, está revestido de mitos e tabus, além do fato das dificuldades de comunicação existentes entre surdos e ouvintes.

Considerações finais

Do que foi pesquisado e com os resultados obtidos, pudemos concluir que muitos dos alunos surdos, sujeitos desse estudo, não sabem diferenciar sexualidade de relação sexual. Quando questionados sobre aulas de educação sexual e sexualidade na escola, a maioria foi contra, mas quando se especificava sobre ISTs e preservativos, eles mudavam de ideia.

A pesquisa foi importante para saber o conhecimento prévio dos alunos surdos (AS) e não surdos (NS) para contribuir com a desmistificação de alguns tabus quanto a sexualidade de deficientes. Todavia, é necessário desenvolver métodos específicos para trabalhar a temática sexualidade com os alunos, independentemente de haver deficiência sensorial ou não. Outra questão que se impôs durante esse trabalho foi a necessidade de pesquisar se os professores estão, ou não, abordando esse tema na sala de aula e a quais estratégias pedagógicas têm sido empregadas.

Entendemos que nossa caminhada na busca de um modelo educa-tivo, que diminua as dificuldades de compreensão dos surdos quanto a esta temática ainda será longa, mas certamente um grande passo para resgatar para este grupo o direito à liberdade de pensar livremente e assumir ideias de acordo com sua própria convicção. A base para esses trabalhos, sem dúvida,

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é a pesquisa. Embora muito mais mudanças sejam necessárias para incluir o surdo na sociedade, espera-se que a educação sexual possa ser uma chave para reduzir o risco de rupturas nas famílias, o aumento da autoconfiança, e o encorajamento nos relacionamentos.

Agradecimentos: À Profa. MSc Tatianne Fernanda Lopes Hardoim, professora de Libras da UFMT, pelo apoio na interpretação e tradução durante as entre-vistas dos alunos surdos.

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Data de recebimento: 18.01.2018Data de aceite: 06.10.2018

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COMUNICAÇÃO FAMÍLIA E ESCOLA: TENSÕES E DESAFIOS

FAMILY-SCHOOL COMMUNICATION: TENSIONS AND CHALLENGES

Rosina Forteski Glidden1

RESUMO: O debate em torno dos encontros e desencontros na relação família e escola tem merecido uma atenção especial, pois urge que a escola seja, também para os pais e responsáveis, um espaço agradável, no do qual estes atores sintam-se inclinados a exercer uma participação ativa e desenvolvam um sentimento de pertença e corresponsabilização. Diante desta questão, o presente estudo obje-tivou apresentar as tensões e os desafios que permeiam a comunicação família e escola apontados na literatura científica. Para tanto foi feita uma revisão seletiva não sistemática de artigos nacionais e internacionais. Conclui-se pela existência de agruras na comunicação família e escola, sendo que os fatores de risco pre-dominam nos resultados, em detrimento dos fatores de proteção. Parece haver uma posição defensiva e territorial da escola que fragmenta e isola este espaço, privando-o das férteis contribuições que resultam de uma articulação menos verticalizada com a família e a comunidade.

PALAVRAS-CHAVE: família, comunicação família-escola, relação família-escola, envolvimento parental.

ABSTRACT: The debate around the agreements and disagreements in the relation-ship between family and school has received special attention, since it is urgent that the school also be for parents and guardians a pleasant space in which these actors feel inclined to actively participate and develop a sense of belonging and co-responsibility. Faced with this question, the present study aimed to present the tensions and challenges that permeate the family- school communication as pointed out in the scientific literature. A selective non-systematic review of na-tional and international articles was done. In conclusion, it was found that family

1 Mestra e Doutoranda em Educação (UFPR), psicóloga e professora do Departamento de Psicologia da Fameg Uniasselvi, vinculada à UFPR - Curitiba, PR, Brasil. E a Fameg Uniasselvi - Guaramirim, SC, Brasil. [email protected]

DOI/10.30681/21787476.2018.29.159174

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and school communication difficulties exist, and risk factors predominate to the detriment of protection factors. There seems to be a defensive and territorial posture of the school that fragments and isolates this institution, depriving it of the fertile contributions that result from a less vertical articulation with the family and the community.

KEYWORDS: family, family-school communication, family-school relationship, parental involvement.

Introdução

Hoje observa-se uma preocupação crescente em fazer da escola um ambiente mais atrativo para os alunos. Porém, atrelado a esta demanda, o debate entorno dos encontros e desencontros na relação família e escola tem merecido uma atenção especial, pois urge que a escola seja também para os pais e responsáveis um espaço agradável, no do qual estes atores sintam-se inclinados a exercer uma participação ativa e desenvolvam um sentimento de pertença e corresponsabilização. Diante disso, o presente estudo objetivou apresentar as tensões e os desafios que permeiam a comunicação família e escola apontados na literatura científica. Trata-se de um estudo reflexivo crítico, para o qual foi feita uma revisão seletiva não sistemática de artigos brasileiros e estrangeiros, visando dois eixos centrais de discussão em relação à comuni-cação entre família e escola: características da relação e aspectos relevantes. O critério de seleção dos artigos foi, portanto, a adequação temática dentro destes eixos principais.

Família e escola são instituições formativas com responsabilidades específicas, mas que apresentam demandas convergentes. A criança se desen-volve em um processo multifatorial permeado pelas particularidades destes contextos (DESSEN; POLONIA, 2007). Atualmente, não há dúvidas de que a família e a escola constituem espaços privilegiados de desenvolvimento da criança e do adolescente (MARCONDES; SIGOLO, 2012; SOUZA, 2017).

A relação família-escola é considerada um preditor do desenvolvimen-to positivo da criança (EPSTEIN, 2011;SOUZA, 2017). O envolvimento parental se dá nas vicissitudes desta relação. Esta prática tem sido amplamente apontada em pesquisas, especialmente em Psicologia e Educação, como favorável ao desempenho acadêmico (CIA, PAMPLIN; WILLIAMS, 2008; SALVADOR, 2007) e sua ausência é entendida como um fator de risco (GRANETTO, 2008; SALVADOR; WEBER, 2005). Pais envolvidos se mostram presentes no dia a dia dos filhos, Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 159-174, jan./jun., 2018

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provendo suporte e sendo responsivos às suas opiniões (WEBER; SALVADOR; BRANDENBURG, 2009). No ambiente escolar Soares, Souza e Marinho (2004) sinalizam que o envolvimento dos pais pressupõe visitas e participação em encontros e nos processos de decisão da escola.

O envolvimento parental na vida acadêmica dos filhos favorece o processo escolar e também as interações familiares, ao proporcionar uma me-lhor compreensão de como a criança cresce e aprende (DÍAZ, 2016; BHERING; SIRAJ-BLATCHROD, 1999). Sobre a perspectiva docente acerca do envolvimento parental na escola, Dor e Rucker-Naidu (2012) e Gubbins, Tirado e Marchant (2017) pontuam que os professores e demais profissionais da equipe escolar entendem essa prática como favorável. Há estudos que apontam, porém, po-sicionamentos ambivalentes por parte das escolas (ADDI-RACCAH; AINHOREN, 2009; BEHRING, 2003; SILVEIRA; BRITTES, 2017; SOUZA, 2017), que contribuem para o estabelecimento de polaridades de perspectivas entre pais e equipe escolar.

As expectativas que pais e professores mantêm sobre o envolvimento parental são cruciais na determinação de que tipo de relação será estabelecida entre os contextos familiar e escolar. Assim, posturas favoráveis surgirão de expectativas positivas nutridas, enquanto tensões e conflitos são esperados quando há expectativas negativas sobre a prática (SOUZA, 2017). Quando as expectativas da família e da escola não são atendidas, a relação entre estas instituições enfrenta desarmonia, ficando os atores envolvidos pouco satisfeitos com a interação. As crianças, por sua vez, podem experienciar frustração diante deste relacionamento (OLIVEIRA; MARINHO-ARAÚJO, 2010).

Cabe à escola a responsabilidade de promover meios de envolver os pais (EPSTEIN, 1992; REIS, 2008). Essa atribuição, e a importância de seu cumprimento, é reconhecida em documentos oficiais que regem a Educação Pública. Nas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) para a formação inicial do ensino superior e para a formação continuada, o art. 8º, inciso 6 (BRASIL, 2015), especifica que os egressos deverão estar aptos a promover e facilitar relações de cooperação entre as instituições educativas, a família e a comunidade. Nas DCN para a Educação Básica, art. 57º, inciso 2 (BRASIL, 2010), é explicitado que os programas de formação dos educadores devem desenvolver competências para a integração com a comunidade e para o relacionamento com as famílias. Neste sentido a comunicação, entendida como uma dimensão do envolvimento parental (EPSTEIN, 1992), é uma habilidade importante a ser desenvolvida por estes profissionais, para promoção do envolvimento parental.

Por sua vez, a comunicação é um fenômeno que promove interações Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 159-174, jan./jun., 2018

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entre as pessoas. Nas escolas, ela é o elo principal na manutenção de relações produtivas e eficientes (REPPA, et al., 2010) e pode ser compreendida como mediadora de outras práticas (BHERING, 2003; BHERING; NEZ, 2002; BHERING; SIRAJ-BLATCHROD, 1999; GLIDDEN, 2015), podendo potencializar seus bene-fícios ou fragilizá-los.

Como principal mecanismo de troca entre os contextos família e escola (MARCONDES; SIGOLO, 2012), a comunicação tem papel crítico no envolvimento parental (BHERING 2003; BHERING; SIRAJ-BLATCHROD, 1999; SARAIVA; WAGNER, 2013) e, quando efetiva, tem sido relacionada ao sucesso acadêmico (EPSTEIN, 2011; FARREL; COLLIER, 2010) e percebida como fator de proteção para o desenvolvimento infantil (DITRANO; SILVERTEIN, 2006; JOHNSONS; PUGACH; HAWKINS, 2004; ROCHA, 2006).

Apesar de haver um relativo consenso entre pais e professores de que uma comunicação positiva entre eles resultará em benefícios para os alunos (KRAFT; ROGERS, 2015), atritos e fragilidades ainda são identificados neste processo, ocasionados por uma ampla diversidade de fatores, dentre os quais pode-se citar a hierarquização e a unidirecionalidade das falas por parte da escola e a supervalorização do saber acadêmico (BHERING, 2003; FEVORINI; LOMÔNACO, 2009; MARCONDES; SIGOLO, 2012; SILVEIRA; BRITTES, 2017; SILVEIRA; WAGNER, 2009), negatividade no posicionamento da escola, superficialidade das informações repassadas (MARCONDES; SIGOLO, 2012; SARAIVA; WAGNER, 2013) e posturas carregadas de descrédito e preconceito com relação às famílias (SARAIVA; WAGNER, 2013).

Farrell e Collier (2010), em seu trabalho com professores alemães, pontuaram que a falta de um programa de treinamento para professores sobre habilidades relacionadas à comunicação com os pais precisa ser observada como uma deficiência. Ereş (2016), em sua pesquisa que investigou diretores de escolas públicas da Turquia, também recomendou a implantação de programas de treinamento com foco no aprimoramento da comunicação e cooperação entre família e escola. No mesmo sentido, a pesquisa com professores chilenos de Gubbins, Tirado e Marchant (2017) ressaltou a importância de o trabalho com as famílias ser tema abordado já na formação docente. Estes estudos no contexto internacional ilustram preocupação com formar os professores dentro da perspectiva de que envolver a família é função da escola e programas nesta direção são fundamentais neste processo. Compreender escola e família como uma unidade que cultiva metas similares em relação ao desenvolvimento das crianças é uma preocupação mundial.

No âmbito nacional, Saraiva-Junges e Wagner (2016) realizaram Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 159-174, jan./jun., 2018

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um estudo com o objetivo de conhecer o estado da arte do tema “Relação Família-Escola” no Brasil, por meio de uma revisão sistemática da literatura. Os resultados apontaram lacunas no que concerne a trabalhos que propõem alternativas de intervenção para otimização da relação entre estes contextos. Ainda, foi observada uma predominância de estudos que abordavam as difi-culdades da interação, ficando em segundo plano aqueles que investigavam os fatores potencialmente favoráveis. Polonia e Dessen (2005) complementam que é preciso promover a relação família-escola pela implantação de projetos com as especificidades do contexto cultural do Brasil, levando em conta dife-renças regionais e sociais.

A escola percebida como território coletivo de constante transforma-ção traduz-se na democratização dos processos decisórios. A parceria que se busca entre pais e equipe pedagógica, com fins de aproximação da comunidade, implica no reconhecimento de que o saber da família é um aspecto facilitador das práticas pedagógicas, e não uma afronta ao conhecimento acadêmico dos profissionais. A educação formal escolar é fortalecida quando a escola se permite conhecer a realidade que guia o cotidiano das famílias.

Família-escola: características da relação

No decorrer da história, a relação entre família e escola tem aconte-cido por motivações calcadas em problemas. Em função disso, às vezes a cons-trução de parcerias com foco em aspectos positivos se torna pouco provável (OLIVEIRA; MARINHO-ARAÚJO, 2010). Adicionalmente, atritos ocorrem por um embate de expectativas e percepções. Saraiva e Wagner (2013) pontuam que os professores têm noção da relevância das expectativas mantidas pelas famílias a respeito do desempenho de seus filhos na escola, porém, falham em perceber as implicações de suas próprias expectativas em relação às famílias. Para as autoras, as famílias anseiam pelo atendimento da escola às demandas diversas de seus filhos, enquanto os professores mantêm expectativas negativas sobre os pais, percebendo as famílias como incompetentes nas funções que lhe competem, revelando uma postura de descrédito que fragiliza a relação.

O acolhimento às famílias pela escola, de acordo com Silveira e Brittes (2017), precisa ser aperfeiçoado. Conhecer os valores das famílias e empre-ender atitudes empáticas, livres de julgamentos e preconceitos, é quesito essencial para o estabelecimento de uma parceria produtiva. Quando a escola percebe a família como desestruturada e pouco capaz de educar seus filhos, ela fortalece uma dinâmica excludente que mantém os pais como participan-

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tes esporádicos e passivos no processo educativo de seus filhos. Este tipo de envolvimento parental tem pouco efeito na qualidade da educação dos alunos e é responsável por altos índices de evasão escolar. Para as autoras, a inclusão eficiente destas famílias é um desafio a ser aceito pelas escolas.

Em pesquisa com o objetivo de analisar as relações entre escola e família de crianças com baixo rendimento escolar, Marcondes e Sigolo (2012), realizaram entrevistas e observações com seis crianças, seus respectivos responsáveis e suas professoras. As autoras encontraram no relato das mães posturas passivas nas reuniões. As mães demonstraram-se insatisfeitas com este tipo de encontro por representar um momento de ouvir críticas sobre seus filhos, as quais não vinham acompanhadas de orientações para sanar o problema. Para as professoras, as mães das crianças que emitiam mais compor-tamentos problemas não compareciam à escola, e, apesar de compreenderem que a realização de reuniões em horário de trabalho tornava pouco provável a presença de vários pais, mantiveram posturas de rotulação em direção às famílias, caracterizando os pais como desinteressados e negligentes. As pro-fessoras justificaram o desinteresse das famílias pela sua ‘desestruturação’.

Bhering e Nez (2002) investigaram as possibilidades e dificuldades na parceria entre pais e profissionais de uma creche. As autoras concluíram que, de maneira geral, havia interesse parental na educação dos filhos. Porém, esse interesse coexistia com uma demanda por orientações. Essa demanda tornava os pais tímidos na tomada de iniciativas, eles temiam expor suas fragilidades para quem lhes era desconhecido, ou considerado pouco confiável. As autoras pontuaram que pesquisas têm mostrado uma relação entre a falta de infor-mação dos pais sobre o funcionamento geral das instituições e a desconfiança das famílias que, por sua vez, assumem posturas distantes. Nestas condições, falsas crenças e julgamentos superficiais de ambas as partes têm solo fértil.

Discrepâncias de percepção também podem ser vistas nos resultados do trabalho de Lima e Chapadeiro (2015), com três professoras e cinco famílias de crianças classificadas como tendo dificuldades de aprendizagem. Na fala das professoras ficou evidente o distanciamento da responsabilização pelos problemas de aprendizagem das crianças, não foram feitas menções às suas próprias limitações em trabalhar as questões pertinentes. De outro lado, os pais mencionaram a falta de preparo das professoras frente às demandas das crianças. Todas as professoras relacionaram os problemas na aprendizagem das crianças com questões problemáticas oriundas da família. Para as autoras, o desencontro das percepções gera disfuncionalidade na relação.

Sobre aspectos que aproximam os pais do ambiente escolar, Rocha Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 159-174, jan./jun., 2018

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(2006) ressalta o papel fundamental do processo de identificação. Há, por parte dos pais, uma demanda natural de compreensão, aceitação e valorização pela escola. Estas posturas tendem a levar à identificação e, por conseguinte, a uma maior participação parental. A autora adverte que se o envolvimento parental for percebido pela escola como intrusão e tratado com desconfiança, e se as interações ficarem relegadas a questões burocráticas, um processo inverso à identificação se estabelece. Tornar a relação família-escola mais pessoal e menos distante e burocratizada aumenta as chances de um envolvimento pa-rental mais ativo e promissor. Do mesmo modo, para Wee (2011), ser amigável, comprometido, respeitável, transparente, valorativo e honesto é o modo mais eficiente de construir uma parceria significativa entre família e escola.

Sumarizando, as contribuições teóricas sobre as características da relação família-escola apontam a rigidez, a falta de pessoalidade e a postura julgadora da equipe escolar como fatores de risco para a efetivação do envol-vimento parental. Estes fatores podem estar na gênese das tensões entre estes núcleos formativos, contribuindo para seu distanciamento e tornando frágil e aversiva a comunicação entre eles. De outro lado, ações de acolhimento e aceitação por parte da escola emergem como fatores de proteção, favorecendo a implantação de práticas de envolvimento parental mais significativas.

Aspectos relevantes da comunicação família-escola

A conexão família-escola pode ocorrer em uma diversidade de situa-ções, podendo a escola lançar mão de meios diversos para engajar os pais. Sobre os meios de comunicação utilizados pela escola, Díaz (2016), em sua pesquisa com professores chilenos, elencou: reuniões, entradas de aulas, viagens e ativi-dades extraescolares e os eventos comemorativos. Lima e Chapadeiro (2015), em estudo brasileiro, levantaram como meios bilhetes e encontros pessoais, quando os pais visitavam a escola, ligações telefônicas esporádicas também foram mencionadas. Na pesquisa de Polonia e Dessen (2005) foram relatados jornais, livretos, mensagens, convites, boletins e observações na agenda do aluno. Na pesquisa de Marcondes e Sigolo (2012), os tipos de comunicação relatados foram bilhetes em cadernos, conversas pontuais na entrada e saída da escola e reuniões de pais.

No momento atual cumpre ressaltar o papel transformador das novas tecnologias. Beasley (2015) advoga que o seu uso é uma estratégia importante para os administradores da escola na construção de parcerias com as famílias. Silva e França (2015) verificaram as possibilidades do uso das Tecnologias de

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Informação e Comunicação (TIC), especialmente o e-mail, na construção de melhores relações entre professores, alunos e suas famílias. A pesquisa anali-sou os dados obtidos a partir de uma experiência com pais de três turmas de alunos do Ensino Fundamental de uma escola pública do Paraná. Foi criada uma lista de e-mail por meio da qual os pais eram informados sobre questões escolares relativas aos seus filhos. Os resultados classificaram como positiva a estratégia de comunicação via TIC, que se mostrou uma ferramenta poten-cialmente favorável na melhoria da comunicação família-escola.

Maia (2010) pesquisou o impacto das TIC, mais especificamente da Web 2.0, o blogue, na interação da escola com famílias de alunos com Necessidades Educativas Especiais (NEE), em Aveiro, Portugal. Os resultados mostraram que, como implicação de seu uso, houve aumento nas interações da escola com a família e do envolvimento parental na educação. Lunts (2003) pontua que cada vez mais os professores estão optando por websites, tanto para o ensino, quanto para desenvolver comunicações unidirecionais com as famílias. O desafio está em, porém, fazer estes sítios atrativos para os pais. Gilleece e Eivers (2018), em seu estudo sobre websites na Irlanda e como eles são usados para informar e envolver os pais, concluíram que ainda há lacunas importantes, as informações postadas nos sites eram pouco abrangentes às necessidades dos pais. Os estudos aqui descritos que abordaram o uso de TCI pelas escolas como ferramenta de auxílio na comunicação com os pais apontam que a prática é promissora, mas ainda está em desenvolvimento. Porém, estes aspectos são amplos e discutí-los extensivamente não é proposta deste artigo.

Em relação aos conteúdos e motivações das comunicações, Novo e Prada (2016) realizaram um estudo sobres os tipos de informação transmi-tidas entre a escola e a família, em Portugal. Os achados apontaram que os recados enviados pela escola focavam em problemas de comportamentos em primeiro lugar, seguidos de agendamento de encontros pessoais e permissões para atividades e outros documentos a serem assinados. Do lado da família, os recados eram enviados para explicar ausências, a não realização de lição de casa e orientações para supervisão ou administração de medicamentos aos alunos, havia ainda pedidos para contato pessoal e de orientação sobre lição de casa. A pesquisa brasileira de Marcondes e Sigolo (2012) apresentou o conteúdo das reuniões bimestrais realizadas na escola em três categorias: rendimento escolar, o comportamento e ajuda à escola. Segundo as autoras, o foco era sempre os ‘erros’ que a família comete.

Um estudo sobre as atitudes do professor em relação ao envolvimento dos pais na escola, comparando 56 professores dos EUA e de Israel, foi reali-Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 159-174, jan./jun., 2018

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zado por Dor e Rucker-Naidu (2012). Os autores encontraram o dado de que mais da metade dos participantes dos dois países alegaram serem capazes de construir uma relação de confiança e cooperação com os pais, mantendo-os informados sobre o progresso de seus filhos. Os professores creditaram a si mesmos a responsabilidade de nutrir boa comunicação entre pais e escola. A falta de comunicação foi referida como dificuldade de manter um diálogo aberto e frequente, especialmente com os pais cujos filhos precisavam de uma atenção constante e consistente.

Schaedel et al. (2012) examinaram os pontos de vista dos educado-res sobre o envolvimento dos pais em Israel. Foram entrevistados 799 pro-fessores de 52 escolas primárias judaicas e árabes. Os resultados indicaram pouca inclinação dos professores, em ambos os tipos de escolas, em relação ao envolvimento parental. Os maiores obstáculos para o engajamento dos professores nesse processo relacionaram-se a sentimentos de desrespeito e desvalorização percebidos por eles na conduta dos pais. A comunicação mos-trou-se unidirecional e os pais eram frequentemente obrigados a aceitar este fato. Os pais eram convidados a ir à escola apenas quando havia problemas de comportamento ou aprendizagem dos alunos. Para os autores, este tipo de comunicação tem potencial de levar à frustração e ressentimento dos pais para com os professores.

O estudo de Ereş (2016) em uma escola da Turquia apontou que algumas mães mostraram ter uma comunicação mais próxima com a escola porque seus filhos eram mais novos. A tradição de levar e buscar os filhos na escola deixava as mães mais presentes neste contexto. Esse fator pode ser um facilitador da comunicação de professores primários com os pais. De outro lado, professores que passavam menos tempo na escola presenciavam menos as visitas parentais, estes podem ser afetados negativamente na sua interface comunicativa com as famílias. Estes resultados apontam para a necessidade de entender a relação e a comunicação família-escola considerando as parti-cularidades de cada período de formação e de desenvolvimento da criança ou do adolescente. Pais, alunos e profissionais da equipe escolar envolvem-se de maneiras distintas dependendo do ano escolar e dos níveis de autonomia dos filhos, estabelecendo dinâmicas específicas de envolvimento.

A pesquisa portuguesa de Rocha (2006) levantou aspectos positivos e negativos sobre a relação família-escola. Na opinião dos pais o intercâmbio de informações e ideias é útil e a boa comunicação torna mais fácil a aquisição de conhecimento pelos alunos. Do lado negativo, a autora apontou certos níveis de desconfiança e de distanciamento, de caráter mútuo, na comuni-

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cação entre os contextos. A autora ressalta que quando a comunicação tem uma unidirecionalidade, no sentido escola-família, o resultado é a informação ser privilegiada, em detrimento da relação. No mesmo sentido, Gartmeier, Gebhardt e Dotger (2016) defendem que estratégias mais empáticas podem auxiliar a comunicação entre família e escola.

No contexto brasileiro, as mães da pesquisa de Marcondes e Sigolo (2012) defendem ser necessário um equilíbrio maior nas falas, abrindo espaço para as famílias se expressarem e saírem de um papel passivo nas reuniões, o que só pode ocorrer em um clima de confiança e de respeito às perspectivas das famílias. Saraiva e Wagner (2013) apresentaram a perspectiva de pais e professores sobre seu relacionamento, em pesquisa feita por meio de grupos focais. A comunicação emergiu como tema de ampla discussão pelas mães, que revelaram perceberem-na como insuficiente e ineficaz, além de incapaz de promover esclarecimento de dúvidas. Estas mães relataram encontrar dificuldades de conversar com professores e coordenadores sobre as avalia-ções. Segundo elas, quando finalmente conseguiam falar com o professor, a fala deste profissional era extremamente institucionalizada, se igualando ao discurso dos outros profissionais. A falta de flexibilidade era compreendida pelas participantes com um ponto negativo.

A rigidez no processo comunicativo é também abordada por Rocha (2006), que aponta a burocratização como fator capaz de dificultar as relações, enquanto a personalização tende a promover melhores resultados. Farell e Collier (2010) também defendem que para uma comunicação ser efetiva entre pais e professores é preciso individualizá-la. Só é possível individualizar, porém, após conhecer. A escola precisa, dentro das limitações do seu cotidiano, ter conhecimento e sensibilidade sobre os valores e as realidades das famílias (SILVEIRA; BRITTES, 2017).

Em termos de resultados positivos, a pesquisa de Briton e Síveres (2015) analisou em uma escola da rede pública do Distrito Federal (Brasil), que recebeu o Prêmio Nacional de Referência em Gestão Escolar, quais eram as características da participação da comunidade escolar em um modelo de gestão compartilhada. Os resultados mostraram que a comunidade participava intensamente no cotidiano escolar. A escola utilizava-se de recados enviados pelos alunos ou por telefone e até visitas nas casas do aluno, para envolver-se com as famílias. A comunicação constante e recíproca entre a equipe escolar e a comunidade foi uma característica apontada como marcante nesta escola. As autoras concluíram pela importância de as escolas incluírem as famílias de maneira não pejorativa.Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 159-174, jan./jun., 2018

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Em termos gerais, em uma análise sobre os aspectos da relação famí-lia-escola e suas práticas comunicativas observou-se descontentamentos nos dois núcleos formativos. Do lado dos pais há insatisfação com uma comunicação fechada, inflexível e verticalizada. No discurso da escola há desapontamento pelo distanciamento e pouca presença das famílias no contexto escolar. Cumpre pontuar que nos estudos é predominante a crítica à instituição escolar como pouco facilitadora da comunicação e do envolvimento parental, pouco é dito sobre o papel parental nestes processos. Ainda que se admita a responsabili-dade da escola, enquanto instituição formal, em criar meios para aproximar e manter os pais como participantes ativos, sugere-se que a ampliação de estu-dos que levantem fatores de proteção produzidos pela família para fortalecer a comunicação com a escola forneceria uma compreensão menos partidária e mais integrativa das tensões e dos desafios existentes.

Considerações finais

A escola atual demanda, de todos os seus atores, um repertório de habilidades muito além das acadêmicas. A noção contemporânea de que este espaço traz consigo as potencialidades e as fragilidades inerentes às relações humanas proporciona importantes nichos de aprimoramento pessoal, da equipe escolar, da família e dos alunos. De forma contrária ao que postula o senso comum, ao apregoar que “escola ensina, família educa”, a expansão da compreensão sobre os fenômenos passíveis de intervenção no ambiente escolar parece apontar para um ideal educacional no qual a escola estaria mais próxima da comunidade. Mesmo sendo a instituição escolar a responsável pelo ensino dos saberes oficiais, as suas funções socializadoras e a existência neste ambiente de importantes modelos denunciam a urgência de quebrar binômios que desfavorecem a educação integral dos alunos e prejudicam as relações entre família e escola.

Nos meandros desta discussão está a comunicação como prática que permeia e entrelaça a escola e a família, aproximando ou distanciando estas instâncias. Assim, foi objetivo deste estudo apresentar as tensões e os desafios que permeiam a comunicação família e escola apontados na literatura científica. De modo geral, o que os estudos explicitam é uma posição defensiva e territorial na fala da escola, que fragmenta e isola este espaço, privando-o das férteis contribuições que resultam de uma articulação menos verticalizada com a família e a comunidade. As tensões se encontram em um embate de expectativas e posturas discrepantes que engessam o diálogo, gerando decep-

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ções e desconfiança de ambos os lados. O desafio está em aproximar a família da escola, mantendo as especificidades de cada núcleo, sem deslegitimar a voz da família, integrando assim objetivos menos compartimentados no que concerne à educação das crianças.

Por fim, as pesquisas apontam para agruras na comunicação fa-mília-escola e fatores de risco predominam nos resultados, em detrimento dos fatores de proteção. Neste sentido, cabe interrogar a existência de um possível viés no direcionamento dos estudos, que tendem a investigar com mais frequência os aspectos que prejudicam esta relação e, ainda, os déficits da escola na sua função de integrar os pais no dia a dia escolar. A literatura carece de um aprofundamento maior nas investigações sobre as deficiências e potencialidades da família neste processo que sofre influências de ambas as instâncias. Do mesmo modo, há um vácuo considerável em relação a estudos que investiguem a perspectiva dos alunos em relação ao tema. Porém, estas considerações precisam ser compreendidas com cautelas, dadas as limitações da característica assistemática deste estudo.

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Data de recebimento: 29.01.2018Data de aceite: 19.09.2018

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VIOLÊNCIA NA ESCOLA: QUANDO A VÍTIMA É O PROFESSOR

VIOLENCE AT SCHOOL: WHEN THE VICTIM IS THE TEACHER

Simone Albuquerque da Rocha1

Vanderlei Bonoto Cante2

RESUMO: O texto apresenta resultados de pesquisa que objetivou aprofundar a discussão e compreender as várias formas de violência, em especial, aquela que vitimiza os professores no espaço escolar e seus reflexos na carreira docente. Adotou-se abordagem qualitativa e estudo de caso. A coleta de dados deu-se em escolas públicas de Rondonópolis/MT, no período de 2002 a 2012, analisando-se, neste artigo, as narrativas de quatro professoras. As questões propostas foram: Qual a natureza das agressões sofridas pelo professor no espaço escolar? Que sensações e sentimentos, manifestam os professores sobre as agressões? O que é necessário para o enfrentamento da violência no espaço escolar? Os resultados apontaram que a falta de conhecimento dos professores em relação aos seus direitos motivou a inércia quanto à tomada de iniciativa para agir nos casos de ocorrências de atos infracionais, ocasionando-lhes doenças e elevadas situações de estresse.

PALAVRAS-CHAVE: agressão ao professor, ato infracional, violência na escola.

ABSTRACT: The research aimed at discussing and understanding how forms of violence, especially those that victimize teachers in the school space and their reflections on the teaching career. We adopted a qualitative and case study. The data collection took place in public schools in Rondonópolis/ MT from 2001 to 2012 analyzing in this article as narratives of four teachers. The nature of the ag-gressions suffered by the teacher in the school space? What feelings and feelings are manifested about aggression? What is needed to combat violence in school?

1 Doutora em educação. Professora do programa de mestrado em educação da Universidade Federal de Mato Grosso/Campus Rondonópolis. Pesquisa sobre formação de professores em diferentes níveis e modalidades. É líder do grupo de pesquisa investigação-CNPq.Rondonópolis-MT. [email protected] Mestre em educação. Corregedor Geral do corpo de bombeiros militar do estado de Mato Grosso. Pesquisa sobre jovens em situação de vulnerabilidade, violência.....É membro do grupo de pesquisa investigação-cnpq.email: [email protected]

DOI/10.30681/21787476.2018.29.175195

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The results showed that the lack of knowledge of the teachers in relation to their authorizations motivated the decision to act in cases of infraction actions, causing the occurrence of stress situations.

KEYWORDS: aggression to the teacher, infraction act, violence in school.

Introdução

A violência está reproduzida na sociedade sob várias formas e é um fenômeno social que cada vez mais atinge as pessoas, trazendo consequências para governos e populações, exigindo um esforço de todos os atores sociais. Assim, a presente pesquisa busca aprofundar a discussão e compreender essas várias formas de violência, em especial, aquela que vitimiza os professores no espaço escolar e seus reflexos na carreira docente, em particular, quando alunos agridem professores nesse ambiente, considerando o período de 2002 a 2012.

Afirmamos que a escola constitui-se em um espaço de encontros, de confrontos, de afirmações e de contradições e esses comportamentos, sen-timentos e vivências refletem-se em grupos e pessoas que convivem em um mesmo recinto – o ambiente escolar, cujas diferenças poderão gerar conflitos.

Optamos por discutir a violência no espaço escolar, onde os profes-sores sofrem agressões físicas praticadas por alunos, reforçando que esse local reproduz e produz, internamente, as relações de poder existentes na socieda-de e, muitas vezes, reforça-as pelo exercício de imposição de uma cultura de dominação, em cujo contexto o professor se torna uma vítima em potencial.

O professor está sujeito a inúmeros tipos de agressões, causadas por diversos sujeitos que convivem no ambiente escolar. Porém importam, para a pesquisa, aqueles casos mais evidentes de agressões a professores, a partir de seus próprios alunos.

O desrespeito às normas, quando não apuradas as responsabilidades e não tomadas medidas e encaminhamentos definidos pelo regimento inter-no da própria escola ou na legislação vigente, leva à sensação de que tudo é permitido e que não há controle na instituição, sendo esse o primeiro passo para o surgimento de casos de violência no espaço escolar.

Os motivos que nos levaram ao interesse em investigar o tema pro-posto estão relacionados à necessidade de compreender os níveis de violência no espaço escolar, os tipos de violências a que está exposto o professor e as consequências dessas agressões para o agredido.

Essa forma de violência, em que o docente é agredido por alunos,

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crianças/adolescentes, está definida como ato infracional, uma conduta tipi-ficada no Estatuto da Criança e do Adolescente, tendo, como o órgão respon-sável pelo atendimento, o Conselho Tutelar ou a Delegacia da Criança e do Adolescente, com encaminhamento à Promotoria da Infância e Adolescência, para possível aplicação de medidas socioeducativas aos adolescentes de 12 a 18 anos incompletos.

Procurando entender a situação de violência a que os professores estão expostos, questiona-se: Qual a natureza das agressões sofridas pelo professor no espaço escolar? Que sensações e sentimentos manifestam os professores sobre as agressões? O que é necessário para o enfrentamento da violência no espaço escolar?

A violência na escola e os reflexos das agressões na carreira docente

Para estudar o fenômeno da violência na escola, é importante des-tacar que há uma complexidade para a análise, pois passa pela intolerância dos diferentes os quais se encontram no espaço escolar e remete a discussões que ultrapassam o campo da norma positivada.

A violência está reproduzida na sociedade sob várias formas e, sobre a etimologia do termo, ensina-nos Michaud (1989) que violência provém do latim violentia, significando violência, caráter violento ou bravio, força. O verbo violare significa tratar com violência, profanar, transgredir. Tais termos devem ser referidos a vis, que quer dizer: força, vigor, potência, violência, emprego de força física, mas, também, quantidade, abundância, essência ou caráter essencial de uma coisa. Mais profundamente, a palavra vis expressa a força em ação, o recurso de um corpo para exercer sua força e, portanto, a potência, o valor, a força vital.

A violência está incorporada a um fenômeno social, como ensina Abramovay (2002, p. 13): “[...] a violência é, cada vez mais, um fenômeno social que atinge governos e populações, tanto global quanto localmente, no público e no privado, estando seu conceito em constante mutação”. Ocorre a agressão de duas formas, direta ou indireta, conforme nos explica Marra (2007, p. 34-35): “Direta, quando atinge imediatamente o corpo da pessoa que sofre; ou indireta, quando opera através da alteração do ambiente físico na qual a pessoa se encontra; ou também quando se subtraem, se destroem ou se danificam os recursos materiais”. Existem outras formas de violência, como as psicológicas e as digitais. A violência psicológica, por exemplo, é caracterizada pela tentativa de degradar ou controlar outra pessoa por meio

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de condutas de intimidação, manipulação, ameaça, humilhação e isolamento ou qualquer conduta que prejudique a saúde psicológica, autodeterminação ou desenvolvimento de uma pessoa. Porém, neste momento, buscamos discutir a violência simbólica na carreira docente, em particular, as agressões físicas sofridas pelos professores no espaço escolar.

Assim, optamos por abordar esse tipo de violência, onde os profes-sores sofrem agressões físicas praticadas por alunos, reforçando que a escola reproduz e produz, internamente, as relações de poder existentes na socie-dade e, muitas vezes, reforça-as pelo exercício de imposição de uma cultura de dominação.

Neste sentido, ao reproduzir e produzir uma das relações de domina-ção existentes na sociedade, confirma um dos estudos retratados por Bourdieu: a reprodução. Miceli (1982, p.26) aponta que, para Bourdieu, “a organização do mundo e a fixação de um consenso a seu respeito constitui uma função lógica necessária que permite à cultura dominante numa dada formação social cumprir sua função político-ideológica [...]”.

A escola, nesse contexto, traz uma reprodução/produção da cultura de dominação pela força, oprimindo o dominado para que consiga alcançar, com plenitude, sua reprodução. Assim, reforça Bourdieu (1989) que os ins-trumentos estruturados e estruturantes de comunicação e de conhecimento são sistemas simbólicos a cumprirem sua função política de instrumentos de imposição ou de legitimação de dominação, os quais contribuem para assegurar a dominação de uma classe sobre outra (violência simbólica), dando o reforço da sua própria força às relações de potência que a fundamentam, contribuindo, assim, segundo a expressão de Weber, para a domesticação dos dominados.

Nesse espaço de dominação e intolerância com as diferenças, rece-bendo cada vez mais encargos que extrapolam as atividades pedagógicas, está o professor, que passa a ser o “culpado” pelo fracasso nas relações sociais.

Violência na escola é aquela que se produz dentro do espaço escolar, sem estar ligada à natureza e às atividades da instituição escolar. Ocorre quando um bando entra na escola para acertar contas das disputas ocorridas no bairro, sendo que essa agressividade poderia ter acontecido em qualquer outro local.

Em relação à violência no espaço escolar, Charlot (2002) traz um siste-ma de classificação, no qual a divide em três categorias: a violência na escola, a violência da escola e a violência contra a escola. Assim, a violência da escola está ligada à natureza e às atividades da instituição escolar: quando os alunos provocam incêndios, batem nos professores ou os insultam, eles se entregam a violência que visam diretamente à instituição e aqueles que a representam.

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Essa violência contra a escola deve ser analisada com a violência da escola: uma violência institucional, simbólica, que os próprios jovens suportam através da maneira como a instituição e seus agentes os tratam, como os modos de composição das classes, de atribuição de notas, de orientação, palavras desde-nhosas dos adultos e atos considerados pelos alunos como injustos ou racistas.

O desrespeito às normas, quando não apuradas as responsabilidades e não tomados os encaminhamentos definidos pelo regimento interno da própria escola e na legislação vigente, leva à sensação de que tudo é permi-tido e que não há controle na instituição, sendo esse o primeiro passo para o surgimento de casos de violência no espaço escolar. Para Tiellet (2008) os problemas de indisciplina, incivilidade e violência são comportamentos trata-dos como questões policiais, psicológicas ou familiares e não como questões educacionais.

Assim, é necessário trazer a discussão da violência para uma perspec-tiva educacional, a qual apresenta inúmeras possibilidades de ocorrência de casos concretos, como enfatiza Rodrigues (2011), ao evidenciar as diferentes formas de violência que ocorrem na escola, como a violência física, verbal, ofensas, desobediência e desacato ao professor. Além disso, destaca as atitu-des de discriminação, as ameaças, a violência simbólica, os baixos salários e as más condições de trabalho.

Além da definição das formas de violência nas escolas, a pesquisa revela como os professores tratam das causas e das consequências dessa violência, problemas de saúde e abandono da escola, mas não abordam as consequências da violência para a prática pedagógica, tampouco suas sequelas para a construção da subjetividade dos alunos, aspecto no qual nossa pesquisa avança consideravelmente. Discordamos de que se trate a violência como inata ao aluno, pois esta é adquirida na sociedade, na família, através da mídia e na relação com as pessoas.

O ato de delinquência praticado por jovens pode ser a reprodução dos atos utilizados pelos representantes do poder, como enfatiza Leviski (1997):

Através da violência existente no ato delinquencial, o jovem ou o grupo ao qual ele pertence pode buscar se diferenciar do “stablishment” usando elementos similares aos utilizados pelos representantes do poder (político, econômico, artístico), que por serem públicos, tornam-se modelos de identificação. A delinqüência pode ser a resultante de uma construção social cuja raiz está na própria violência familiar e social (LEVISKI,

ROCHA, S. A.; CANTE, V. B.

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1997, pp 31-32)

Essa forma de violência, em que o professor é agredido por alunos (crianças ou adolescentes), está definida como ato infracional, uma conduta tipificada no Estatuto da Criança e do Adolescente. Para o caso desse ato co-metido por criança (até 12 anos incompletos), aplicam-se as medidas protetivas e, nessa situação, o órgão responsável pelo atendimento é o Conselho Tutelar. Em relação ao ato infracional perpetrado por adolescentes (12 a 18 anos in-completos), deve ser apurado pela Delegacia Especializada do Adolescente, que encaminhará o caso à Promotoria da Infância e Juventude, para possível aplicação de medidas socioeducativas.

O ato infracional e a indisciplina estão muito presentes nas escolas. Assim, faz-se necessário um estudo minucioso desse tema complexo e sobre os reflexos desses atos na vida dos professores, apontando quais ações são legitimadas pela legislação vigente.

Em relação à indisciplina, define LaTaile (1996, p.23) que: “Se enten-dermos por disciplina comportamentos regidos por um conjunto de normas, a indisciplina poderá se traduzir de duas formas: 1) a revolta contra essas normas; 2) o desconhecimento delas”. No caso de ato de indisciplina, este deve estar previsto no regimento interno da escola e ser apurado pela própria escola, respeitando o Art. 5º, inciso LV da Constituição Federal (1988, p.10) que define: “- aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral, são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”.

Os atos infracionais praticados por jovens estão relacionados, segun-do Assis (1999, p.12), “a impulsividade, inabilidade em lidar com o outro e de aprender com a própria experiência de vida, ausência de culpa ou remorso por seus atos, insensibilidade à dor dos outros e transgressões”.

No tocante ao ato infracional cometido por alunos na escola, eles ficarão sujeitos às medidas de proteção previstas no artigo 101, do Estatuto da Criança e do Adolescente (1990):

Art. 101 - Verificada qualquer das hipóteses previstas no art. 98, a autoridade competente poderá determinar, dentre outras, as seguintes medidas: I - encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de responsabilidade; II - orientação, apoio e acompanhamento temporários; III - matrícula e frequência obrigatórias em estabelecimento oficial de ensino fundamental;

ROCHA, S. A.; CANTE, V. B.

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IV - inclusão em programa comunitário ou oficial de auxílio à família, à criança e ao adolescente; V - requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial; VI - inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos; V II - acolhimento institucional; VIII - inclusão em programa de acolhimento familiarIX - colocação em família substituta (ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE, 1990, p. 13-14).

Em relação à prática do ato infracional, o Estatuto da Criança e do Adolescente (1990, p.15) define: “Art.112: I-advertência; II-obrigação de re-parar o dano; III-prestação de serviços à comunidade; IV-liberdade assistida; V-inserção em regime de semiliberdade; VI-internação em estabelecimento educacional; VII-qualquer uma das previstas no art.101”.

O Estatuto da Criança e do Adolescente (1990) traz, ainda, no Art. 115, a forma de advertência ao adolescente, definindo tratar-se de uma ad-moestação verbal, que será reduzida a termo e assinada.

Assim, a apuração do ato infracional seguirá as normas do Estatuto da Criança e Adolescente (1990, p.22) que, ainda, define: “Art. 194 - O proce-dimento [...] terá início por representação do Ministério Público, ou do Conse-lho Tutelar, ou auto de infração elaborado por servidor efetivo ou voluntário credenciado [...]”.

O professor está sujeito a inúmeros tipos de agressões, podendo ser causadas por diversos sujeitos que convivem no espaço escolar. Porém impor-tam, para a pesquisa, aqueles casos mais evidentes de agressões a professores, a partir de alunos que frequentam a escola.

Essas agressões são praticadas, na maioria dos casos, por alunos, em atos de indisciplina e atos infracionais, mas interessa-nos, particularmente, in-vestigar os casos de atos infracionais praticados por alunos contra professores, já que há um número crescente de ocorrências e faltam informações sobre como o professor deve agir, segundo a legislação vigente.

Assim, a escola constitui-se em um espaço de encontros, de confron-tos, de afirmações e de contradições e esses comportamentos, sentimentos e vivências se refletem em grupos e pessoas que convivem em um mesmo espaço - a escola, cujas diferenças, no mesmo ambiente, podem gerar conflitos. Reconhecemos que o conflito e as divergências de ideias são importantes para o crescimento das pessoas que frequentam a escola, mas o que nos chama a atenção para a pesquisa são os casos de violência ocorridos nesse espaço.

ROCHA, S. A.; CANTE, V. B.

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Devido às agressões sofridas, os professores lidam com as consequên-cias da violência que enfrentam, entre elas a doença de Burnout, definida por Jesus (2002) como o conjunto de sintomas que o professor apresenta, devido à dificuldade em agir diante uma situação, face às exigências que lhe são co-locadas pela sua profissão, em que se podem distinguir três etapas: primeiro, as exigências profissionais excedem os recursos adaptativos do professor, provocando estresse (alerta); em segundo, o professor tenta corresponder a essas exigências, aumentando o seu esforço (resistência) e, por fim, aparecem os sintomas que caracterizam o mal-estar propriamente dito (exaustão).

Quando ocorrem casos de alunos (crianças ou adolescentes) que agredirem professores, são os adultos que devem ter a sensibilidade para impedir que a agressão fuja do controle, pois a criança deve reconhecer a autoridade desse adulto, como ensina Winnicott (1939):

É tarefa de pais e professores cuidar para que as crianças nunca se vejam diante de uma autoridade tão fraca a ponto de fica-rem livres de qualquer controle ou, por medo, assumirem elas próprias a autoridade. A assunção de autoridade provocada por ansiedade significa ditadura, e aqueles que tiveram a experiência de deixar as crianças controlarem seus próprios destinos sabem que o adulto tranqüilo é menos cruel, enquanto autoridade, do que uma criança poderá se tornar se for sobrecarregada com responsabilidades (WINNICOTT, 1939, p. 95).

Outro ponto relevante a ser abordado, além do enfraquecimento da autoridade do professor no espaço escolar, é a compreensão do gesto antissocial desse aluno que se rebela, pois, segundo Winnicott (1987), nessa atitude, está o último grito de esperança para o sujeito que reivindica, da sociedade, aquilo que lhe foi prometido. Isso não deixa de ser a denúncia de uma impostura, na busca de um mundo bom que foi perdido, rompido abruptamente, já que a sociedade contemporânea promete que, para ser al-guém, é necessário ter sempre mais e, para ser possível tornar-se Homem, é imprescindível “respeitar e amar o próximo” embora acene sempre com mais uma exigência, uma promessa, um produto a ser consumido.

Assim, após trazer os referenciais teóricos sobre a violência no espaço escolar, em particular, quando os alunos agridem os professores, passaremos a expor os dados coletados com as entrevistas dos sujeitos da pesquisa, pois, ao buscar sistematizar as informações, procuramos entrevistar os professores agredidos.

Assim, apresentaremos os dados das entrevistas realizadas com pro-

ROCHA, S. A.; CANTE, V. B.

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fessores agredidos que, voluntariamente, aceitaram dar seus depoimentos.

Professores agredidos... o que revelam os sujeitos da pesquisa

Para as análises sobre as agressões aos professores, são trazidos os dados coletados nas entrevistas, nas vozes dos sujeitos agredidos, já que foi possível abordar este tema, , bem como as evidências das violências sofridas pelos docentes, no período de 2002 a 2012, quando procuramos dados sobre a natureza das agressões e o impacto na vida desses profissionais, se há inte-riorização do sofrimento ou problemas psicológicos, entre outros.

Para a coleta dos dados, foram pesquisados, nas escolas públicas Estaduais de Rondonópolis-MT, professores que ensinam no terceiro ciclo do Ensino Fundamental e que tenham sido agredidos fisicamente por alunos, sendo que apenas quatro concordaram em socializar seus dados, desde que não fossem identificadas as pessoas e as escolas, cujo pedido foi respeitado.

Os dados serão analisados em eixos, quais sejam: eixo 1: A natureza das agressões sofridas pelo professor no espaço escolar e as sensações e sen-timentos manifestados pelos professores sobre as agressões, representados no Quadro 2; eixo 2: O que é necessário para o enfrentamento da violência no espaço escolar na visão dos professores agredidos, representado no Quadro 3.

Os resultados, organizados em eixos, serão apresentados, na sequên-cia, sob a forma de quadros, apontando as respostas das quatro professoras, com seus respectivos nomes fictícios.

É importante ressaltar que os professores agredidos interiorizam seus sofrimentos e tendem a não exteriorizar sobre as agressões sofridas ou sobre o sofrimento que sentem por terem sido vítimas de agressões, esse silêncio é tão revelador como as entrevistas que serão apresentadas, que serão apresentadas na forma de quadros.

Assim, passamos a apresentar os eixos da pesquisa:

Quadro 1 - Professoras entrevistadasNº Nome Situação funcional Tempo de magistério01 Adriana Concursada 11 anos02 Helena Concursada 24 anos03 Laura Concursada 05 anos04 Sofia Concursada 12 anos

Fonte: Elaborado pelos autores a partir dos dados da pesquisa/2013.

A seguir, explorando os dados dos sujeitos acima citados, expomos o

quadro com o primeiro eixo de análise.

ROCHA, S. A.; CANTE, V. B.

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Quadro 2 - A natureza das agressões sofridas pelo professor no espaço escolar e as sensações e sentimentos manifestados pelos professores sobre as agressões

ADRIANA: Na minha vida docente tenho enfrentado muitas agressões de alunos, essas agressões geralmente são agressões físicas, também recebi beliscões e até torção nos braços, por um aluno que estava insatisfeito com a nota que tinha recebido. As agressões que sofri me causaram muita revolta porque, como professora, tenho inúmeros deveres, sofri calada com medo de falar porque todo mundo sabe das agressões, ninguém faz nada e quando alguém se manifesta, é discriminado pelos próprios colegas, que muitas vezes também já foram agredidos e agem como se nada tivesse acontecido. Em relação aos alunos, eles só têm direito, direito e direito. (grifo nosso)

HELENA: Ao longo de minha carreira profissional, totalizando 24 anos na educação pública, já sofri diversas agressões por parte de alunos; agressões físicas e verbais. Dentre as inúmeras agressões que já sofri, posso citar duas que marcaram mais minha vida. Na primeira, recebi ameaça de morte de um aluno com idade entre 18 a 20 anos. O motivo foi o fato dele não ter conseguido média na disciplina que eu ministrava. A equipe diretiva solicitou que eu aplicasse uma segunda avaliação. Não concordei por “N” razões. Já havia enfrentado diversas situações conflituosas com este aluno em sala de aula. O fato é que ele escreveu uma carta, identificada, inclusive, fazendo diversos tipos de ameaças, caso permanecesse naquela escola. A situação só foi “resolvida” porque aceitei o que ele impôs: aplicar uma segunda avaliação e não comentar nada com a equipe da escola. Na segunda agressão, tive minha gravidez de três meses e meio interrompida, de forma brutal, por um chute que levei de um aluno, um adolescente de 15 anos. (devo dizer que, mesmo depois de um longo tratamento psicológico, não me sinto bem falar, em detalhes, sobre o ocorrido). Muito forte... O impacto se deu tanto na minha vida pessoal como profissional, de maneira que vivenciei as piores sensações: depressão; revolta; indignação; desencantamento total pela profissão; um misto de medo e ódio pelos alunos, (mesmo por aqueles que nada tinham a ver com agressões), sentimento de impotência, insônia... e confesso... até vontade de morrer. (grifo nosso)

LAURA: Sim, fui agredida com fortes tapas no rosto, empurrões, agressões verbais e chutes nas pernas. As agressões me causaram muita revolta, pois, como professora, só tenho deveres a cumprir enquanto o aluno só direitos e mais direitos. Pensei na desvalorização, no quanto tive que estudar para passar por isso, minha vida se transformou depois das agressões, pensei em desistir da profissão. (grifo nosso)

SOFIA: Já sofri muitas agressões de várias formas, agressões verbais, xingamentos, ameaças e agressão física. Os alunos descarregam nos professores toda sua revolta, sua ira, a gente percebe que eles não têm respeito por ninguém, durante meus 12 anos de professora já vi de tudo na escola, acho que não tem mais conserto. Não gosto de falar das agressões que já sofri. Na minha vida pessoal até que as agressões não tiveram muito impacto, mas na minha vida profissional teve um grande impacto, principalmente porque não consegui mais ensinar no ensino fundamental, tive que mudar para a educação infantil porque não me senti mais em condições psicológicas e emocionais de ensinar no ensino fundamental e porque na educação infantil os riscos de agressões físicas são menores.(grifo nosso)

Fonte: Elaborado pelos autores a partir dos dados das entrevistas/2013.

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As marcas da violência sofrida pelos professores são assustadoras, porque, mesmo sabendo que a escola produz e reproduz a realidade da sociedade, é evidente que o nível de agressões aos professores extrapolou qualquer limite “aceitável”.

Adriana, durante sua vida docente, enfrenta uma realidade de agres-sões, geralmente, agressões físicas, como beliscões e até torção nos braços cujas violências trouxeram, à entrevistada, um sentimento de revolta.

Como disse Helena, “tive minha gravidez de três meses e meio inter-rompida, de forma brutal, por um chute que levei de um aluno, um adolescente de 15 anos”.

Nesta entrevista, Helena não está falando de um insulto ou de um desrespeito, está citando uma agressão violenta que, à luz da legislação vigente, viola direitos, como o direito de personalidade, um direito indisponível, previsto na Constituição Federal, cabendo, a qualquer pessoa, inclusive, ao professor, ao ter esse direito violado, buscar a proteção legal para exigir a reparação por dano moral e/ou material.

Assim, sobrou, à Helena, o silêncio, a introspecção e a negação em falar sobre um fato que ceifou a vida de um futuro e esperado filho e que, até hoje, está sem qualquer reparação do dano por parte do agressor, de seus pais ou responsáveis e pelo Estado, que têm responsabilidade objetiva.

A entrevistada Laura afirma que foi agredida com fortes tapas no ros-to, empurrões, agressões verbais e chutes nas pernas. Esses abusos causaram sentimento de muita revolta à professora, que pensou em desistir da profissão.

Sofia também relata as violências sofridas, afirmando ter sido agre-dida de várias formas, como agressões verbais, xingamentos, ameaças e até fisicamente.

Das entrevistas trazidas ao texto, percebemos que as professoras, nos relatos, tipificaram as agressões sofridas e evidenciaram sentimentos, em particular, os sentimentos de revolta, indignação e impotência, que as levaram à depressão, decepção a respeito da profissão e à vontade de desistir. No entanto, é fundamental ressaltar que as professoras entrevistadas estavam protegidas pela legislação vigente, mas demonstram não ter qualquer conhecimento sobre esses direitos, porque, após sofrerem as agressões, apenas internalizaram e absorveram o sofrimento, convivendo em silêncio com suas dores.

A Constituição Federal, no artigo 5º, inciso X (1988, p.8), define: “São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, asse-gurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”. Desta forma, não há dúvidas de que a violência (psicológica ou física)

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atinge a intimidade, a privacidade, a honra e a imagem do professor agredido. Em decorrência dessa agressão e do desrespeito ao direito de per-

sonalidade, ocorre o ato ilícito e deveria haver punição prevista nos artigos 186 e 187 do código civil vigente (2010):

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes (CÓDIGO CIVIL, 2010, p. 163).

Assim, ao agressor que praticou, por ação, o ato ilícito, cabe o dever de indenizar o professor agredido, por meio de processo contra seus pais ou responsáveis e, ainda, há a responsabilidade das instituições de ensino e do Estado (União, Estados ou Municípios).

As instituições de ensino devem preservar a integridade física e psíquica de seus alunos e profissionais da educação, as quais deverão reparar o dano causado por seus alunos, conforme previsto nos artigos 932, IV e 933 do código civil vigente:

Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil:[...] IV - os donos de hotéis, hospedarias, casas ou estabelecimen-tos onde se albergue por dinheiro, mesmo para fins de educação, pelos seus hóspedes, moradores e educandos;Art. 933. As pessoas indicadas nos incisos I a V do artigo ante-cedente, ainda que não haja culpa de sua parte, responderão pelos atos praticados pelos terceiros ali referidos (CÓDIGO CIVIL, 2010, p. 214).

Ao Estado, neste caso, permanece a responsabilidade civil pela omissão administrativa, como decidiu, no ano de 2009, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), no Recurso Especial nº 1.142.245 - DF (2009/0100510-2), que teve como relator o Ministro Castro Meira, decidindo sobre a responsabilidade do Distrito Federal em indenizar uma professora que fora agredida por um aluno dentro da escola. Em seu voto, o ministro relator Castro Meira decidiu que, pela demonstração do dano sofrido pela professora, conforme relatórios médicos, laudo de exame de corpo de delito, relatório psicológico e relatório do procedimento sindicante, o Distrito Federal, no que tange ao dever de agir,

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em relação à vigilância e proteção aos alunos, enquanto mantidos no âmbito escolar, devendo também se estender aos professores que ali exercem as suas atividades, houve inequívoco descumprimento do dever legal na prestação efetiva do serviço de segurança, uma vez que a atuação diligente impediria a ocorrência da agressão física perpetrada pelo aluno. Ainda, segundo o Mi-nistro relator, a falta do serviço decorre do não funcionamento ou, então, do funcionamento insuficiente, inadequado ou tardio do serviço público que o Estado deve prestar. Nessa hipótese, mesmo tendo, no estabelecimento de ensino, um policial militar, não é afastada a responsabilidade do Estado, pois, no caso concreto, evidenciou-se a má atuação, consubstanciada na prestação precária e tardia, o que resultou na agressão à professora. Assim, resta claro que, se o Poder Público tivesse agido, no sentido de prestar a segurança ade-quada e satisfatória dentro do ambiente escolar, a ação que provocou o dano, à professora, não teria ocorrido. Por fim, entendeu o Ministro relator que, diante da presença dos elementos essenciais que caracterizam a responsabi-lização subjetiva do Estado, quais sejam, o dano, a omissão, consubstanciada na falha na prestação do serviço, a culpa e o nexo causal, está presente o dever da Administração, Distrito Federal, de indenizar o dano moral sofrido pela professora agredida.

Além das proteções previstas na Constituição Federal vigente e do dever de indenizar, previsto no código civil, o professor tem, ainda, neste caso, a proteção do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), já que esse ado-lescente deverá ser encaminhado ao Ministério Público e ao Juiz da Infância e Adolescência para receber medida socioeducativa, caso tenha idade entre 12 e 18 anos incompletos.

Em relação ao impacto das agressões na vida dos professores, é possível observar que o docente sofre consequências físicas e psicológicas após as violências praticadas por alunos. Neste sentido, afirma Codo (1999, p. 49): “o trabalho do educador tem tudo para ser o melhor e ao mesmo tempo é um tipo de trabalho dos mais delicados em termos psicológicos”.

O desequilíbrio que a agressão causa ao professor pode levá-lo ao stress e à doença de Burnout, compreendida, por Maslach, Schaufeli e Marek (1993), em três dimensões: a exaustão emocional, caracterizada pela falta ou carência de energia, entusiasmo e um sentimento de esgotamento de recursos, a despersonalização, marcada por tratar os clientes, colegas e a organização como objetos e a diminuição da realização pessoal no trabalho, que é a tendên-cia de o trabalhador se autoavaliar de forma negativa. As pessoas sentem-se infelizes consigo próprias e insatisfeitas com seu desenvolvimento profissional.

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Assim sendo, o professor vive um mal-estar no dia a dia da escola. Neste sentido, menciona Nóvoa (2011, p. 20) que: “As consequências

da situação de mal-estar que atinge o professorado estão à vista de todos: desmotivação pessoal e elevados índices de absentismo e de abandono”.

Por isso, apresentamos as possibilidades apontadas pelos agredidos para o enfrentamento da violência no espaço escolar.

Quadro 3 - O que é necessário para o enfrentamento da violência no espaço escolarADRIANA: Olha... (suspiro) não sei o que pode ser feito, mas acho que além de preparar os profissionais também teria que preparar a família e mudar um pouco dos direitos da criança, pois eles fazem o que fazem e nada acontece. (grifo nosso)

HELENA: Infelizmente a violência cresce e impera em nossas escolas. A correria do dia a dia, os trabalhos extraclasse e a dura realidade dos professores que possuem mais de um vínculo empregatício fortalecem o individualismo e as pessoas se fecham com seus problemas. Como disse anteriormente, muitas vezes o professor sofre pela falta de conhecimento em geral, mas especialmente pela falta da formação voltada para o que prevê a legislação. Por ser um problema latente na maioria das instituições, penso que seja fundamental o investimento em programas específicos para o enfretamento da violência no espaço escolar. Acredito que, no decorrer do ano letivo, a escolas poderiam proporcionar espaços para um bom debate que contribuísse com a reflexão e esclarecimentos sobre o assunto. Mas acho que a chave para amenizar o problema da violência está na capacidade de envolver toda a comunidade escolar: pais, alunos, professores, demais funcionários da escola e a própria sociedade civil organizada. A escola como um todo deve ser mais preparada para lidar com essa questão (grifo nosso).

LAURA: Programas e projetos que sejam verdadeiros e efetivos nas escolas para pais, alunos e professores. É preciso fazer um trabalho de conscientização com os pais, para que os mesmos participem mais da vida escolar de seus filhos. Saber o que acontece na escola. Participar de palestras mensalmente, com a presença de pais e professores, abordando o tema violência, como fazer para reverter a violência em paz no convívio familiar. (grifo nosso)

SOFIA: Não, poderia haver um acompanhamento psicológico dos professores, de modo que desenvolvam mecanismos de defesa para proteção psicológica, bem como conteúdos voltados para os direitos dos professores diante das agressões e como eles devem agir nestes casos. A questão da violência é algo que também tem que ser trabalhado na família, pois nenhum professor tem condições de lidar com os alunos violentos, sem um mínimo de educação, pois a mesma vem dos pais. (grifo nosso)

Fonte: Elaborado pelos autores a partir dos dados das entrevistas/2013.

A formação inicial e continuada é fundamental na preparação dos

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professores para o enfrentamento dos desafios vividos na escola, inclusive, a violência escolar. Salienta Freire (2001, p. 42) que: “A prática docente crítica, implica no pensar certo, envolve o movimento dinâmico, dialético, entre o fazer e o pensar sobre o fazer”. Demonstra, assim, que é necessário, às instituições, prepararem os educadores para a prática reflexiva, a fim de aparelhá-los para enfrentar os desafios da profissão na escola.

O professor passa pela formação e, imediatamente, defronta-se com a realidade da sala de aula e, nesse momento, vive o dilema de como relacionar-se nesse novo ambiente. Em relação à formação do professor para os dilemas da prática, afirma Zabalza (2003, p.24) que: “Um dos aspectos mais importantes dos dilemas é o seu poder como recurso de formação dos professores. Sobretudo na formação permanente, quando os professores já têm a experiência de quais são os dilemas que mais os preocupam e de como vão enfrentá-los”.

Entendemos ser necessário investir na formação dos professores, proporcionando-lhes conhecimento teórico que atenda às necessidades pro-fissionais de forma ampla, que lhes dê segurança para as tomadas de decisões, de acordo com as realidades encontradas nas escolas.

Ao analisar os sujeitos da pesquisa, percebemos haver completa falta de esclarecimento que se revela na ausência de (in)formação para o enfrenta-mento da violência escolar, dado este que os auxiliaria a melhor compreender e como reagir nos casos de agressão de alunos no exercício da profissão. A esse respeito, orienta Alkimin (2008, p.50) que: “Nesse compasso, quando o aluno xinga o professor, [...] estará em cheio atingindo os direitos da personalidade do professor, ou seja, aqueles que [...] constituem direitos inerentes à pessoa humana e integram o rol dos direitos fundamentais de todo cidadão”.

Desse modo, o professor acaba sofrendo o mal-estar já destacado por alguns autores e também citado por Nóvoa (1999), causando desmotivação pessoal com a docência, abandono, insatisfação, indisposição, desinvestimento e ausência de reflexão crítica, entre outros sintomas que demonstram a auto-depreciação do professor. Esta situação abarca a crise da profissão docente, que vem sendo bastante analisada e discutida pelos teóricos contemporâneos.

Esse profissional, na formação, precisa receber as informações refe-rentes aos seus direitos, inclusive, os de personalidade, previstos na Constitui-ção Federal, além das definições legais do Estatuto da Criança e do Adolescente e do código civil vigente, entre outros.

Fica evidente o grave quadro de agressões ao professor na escola, lugar em que as diferenças se encontram e, quando isso acontece, surge o

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conflito, o qual só poderá ser solucionado se houver formação adequada do professor à realidade da escola.

Ainda em relação à agressão ao professor, é importante reforçar que há a possibilidade de responsabilizar as instituições de ensino e o Estado, com as previsões legais supracitadas, devendo o professor agredido ser indenizado, o Estado e os pais ou responsáveis pelo aluno agressor responsabilizados e o aluno, com idade entre 12 e 18 anos incompletos, deverá receber as medidas socioeducativas, definidas no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

Assim, para enfrentar a violência no espaço escolar, é preciso mudar as relações no ambiente, a fim de que os jovens não se sintam incompreen-didos, deixando de ver a escola como um ambiente hostil, onde o professor, muitas vezes, passa a ser a materialização das incompreensões e da falta de diálogo e, por isso, acaba recebendo toda a descarga da revolta, da insatisfação e indignação produzida pela desconexão entre seus anseios de alunos e o que lhes é imposto na escola.

Outro fator importante é que o professor necessita ter restaurada sua autoridade para ter a possibilidade de controlar os impulsos agressivos dos alunos, sem, contudo, chegar aos níveis de agressões revelados na pesquisa.

Além disso, fica claro que as discussões acerca dos conflitos ocor-ridos onde os diferentes se encontram, neste caso, o espaço escolar, passam, obrigatoriamente, pelos debates em conselhos escolares com a participação de todos os envolvidos, inclusive, das famílias dos alunos.

A fraternidade deve ser uma busca constante nas relações, já que exprime uma relação de igualdade e de dignidade entre todos os homens, além de estar expressa no primeiro artigo da Declaração Universal dos Direitos do Homem, ao afirmar que todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos, são dotados de razão e de consciência e devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade, que na concepção de Pozzoli (2013), é

afinal, uma nova possibilidade de integração, a partir da família, entre os povos e as nações. Uma fraternidade fundamental-mente no cosmopolitismo em que as necessidades vitais serão suprimidas pela amizade, pelo pacto jurado conjuntamente [..]. A fraternidade na família poderá proporcionar à sociedade uma igualdade efetiva entre as pessoas, considerando a diver-sidade intrínseca presente no meio social, eliminando o direito à igualdade baseada em um poder soberano, ao qual estão subordinados (POZZOLI, 2013, p.110).

Para Pozzoli (2013), a fraternidade possibilita uma integração a partir

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da família porque o núcleo familiar é o primeiro grupo social em que se per-cebe a herança moral:

O núcleo familiar é o primeiro grupo social do qual se percebe e recebe não somente herança genética ou material, mas espe-cialmente moral. A formação de caráter depende, fundamental-mente, do exemplo ou modelo familiar que se tem na formação da personalidade da pessoa, que ocorre predominantemente em fase infantil (POZZOLI, 2013, p.111).

A ideia de fraternidade estabelece que o homem, como animal políti-

co, fez uma escolha consciente pela vida em sociedade e, para tal, estabelece, com seus semelhantes, uma relação de igualdade, visto que, em essência, não há nada que hierarquicamente os diferencie: são como irmãos (fraternos). Este conceito é a peça-chave para a plena configuração da cidadania entre os homens, pois, por princípio, todos são iguais. De certa forma, a fraternidade não é independente da liberdade e da igualdade já que, para cada uma efetivamente se manifestar, é preciso que as demais sejam válidas.

Essa ideia de fraternidade transcende a norma positivada e não deve estar restrita à escola, já que não é possível trabalhar a formação das crianças e dos adolescentes sem o envolvimento das famílias, pois é no núcleo familiar que se inicia a formação do caráter e da personalidade, além de o modelo familiar ser, em regra, o modelo adotado pelos jovens que chegam às escolas. A participação de todos, especialmente da família, na formação dos jovens é essencial e, para isso, há de se estabelecerem estratégias que tragam a família para a escola, porque, só assim, será possível enfrentar, com efetividade, essa violência , já que as relações entre os diferentes no espaço escolar transcendem a norma positivada.

Considerações Finais

Ao iniciar o arremate da investigação, é necessário enfatizar o aumen-to dos níveis de violência que se solidifica e naturaliza a cada dia no espaço escolar, vitimizando a comunidade acadêmica em geral. Esse fenômeno nos enche de angústia, pois, durante a pesquisa, ficaram evidentes os índices elevados de violência, em particular, as agressões físicas a professores, objeto desta pesquisa.

O presente trabalho teve, como pesquisa, a violência, particularmen-

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te, a que ocorre no espaço escolar, tendo, como objeto de estudo, a natureza das agressões sofridas pelo professor no espaço escolar e as possibilidades apontadas pelos docentes agredidos para o enfrentamento da violência nesse ambiente.

Para isso, utilizamos como instrumento, junto aos professores da rede pública, a entrevista, por meio de uma pesquisa do tipo qualitativa, quando foi possível levantar os elementos para o desenvolvimento da mesma. Como primeiros dados, foram expostos os sentimentos dos professores após serem agredidos e a percepção desse docente sobre as formas de enfrentamento à violência no espaço escolar.

As análises dos dados resultantes das entrevistas evidenciaram que os professores se sentem impotentes e desprotegidos após serem agredidos por alunos. Anunciaram, ainda, que não há, na formação inicial/continuada, preparação mínima a fim de que se qualifiquem para enfrentarem a violência à qual estarão sujeitos ao adentrarem as salas de aula. Analisamos a legislação vigente para apresentar as leis que os protegem, como a Constituição Federal, o Estatuto da Criança e do Adolescente, o Código Penal e o Código Civil, as quais trazem amparo legal para considerar sobre tais casos.

Os dados apontaram que os professores entrevistados sofrem agres-sões na escola e padecem com a síndrome de Burnout, com depressão, baixa autoestima, doenças psicossomáticas, sendo obrigados a permanecer em sala de aula, convivendo com os alunos agressores. Além disso, por não conhecerem a lei que os protege, por não receberem essa referência na formação, acabam interiorizando o sofrimento, como se “apanhar”, (na voz das professoras em entrevista) fizesse parte da profissão docente.

Um fato relevante que dá veracidade à pesquisa são os dados te-rem partido dos próprios professores agredidos, os quais demonstram, em suas respostas, total desconhecimento de suas prerrogativas na esfera do direito administrativo, civil e penal. Tal realidade, dessa forma legitimada, dá relevância ao que apontam os professores. Trata-se, pois, do olhar e do sentimento de quem passa por dentro do processo, cujos medos, agressões, sofrimentos físicos e psicológicos precisam ser analisados, apontando a ne-cessidade de empreender ações, propostas e metodologias para inserir novos conhecimentos à sua formação, a fim de mudar essa realidade revelada pela investigação. Isso porque se demonstrou que a formação está em desconexão com a realidade enfrentada pelo professor no espaço escolar, sendo essencial investir-se nos Conselhos Escolares para constituírem o ambiente escolar em espaço de diálogo.

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Outro ponto relevante está relacionado ao ato delinquencial, que também pode ser avaliado como consequência de manifestações dos alunos, que são jovens reproduzindo comportamentos similares aos utilizados pelos representantes do poder público eu transforma-se em modelo. Esse comporta-mento definido como ato de delinquência pela legislação vigente alia-se ao do enfraquecimento da autoridade do professor no espaço escolar, que somados afetam diretamente o professor, que passa a ser visto como a representação de toda a estrutura de poder a qual o aluno está se rebelando.

Além disso, ficou claro que a sociedade precisa rever conceitos para a diminuição dos conflitos e essa mudança necessita alcançar o espaço escolar, pois, já que a escola reproduz as relações da sociedade, para que haja paz nas escolas, assim como na sociedade, urge permitir que os diferentes se encon-trem e convivam ali de forma harmônica e pacífica.

Para enfrentar a violência no espaço escolar, ficou evidenciado que a norma é importante, mas, por si só, não consegue resolver o problema pesquisado, porque a agressividade remete a uma dimensão além da capa-cidade prevista na lei. Assim, resta, antes de aplicá-la, levar a sociedade a uma reflexão sobre a realidade vivenciada e as formas de encontrar soluções conjuntas que atuem na causa dos conflitos.

Desta maneira, a norma positivada seria utilizada e aplicada para resolver os casos extremos que surgissem e cada caso seria concretamente analisado, pois é preciso desenvolver ações para trazer a família à escola com o objetivo de participar da formação dos jovens. Assim, será possível enfrentar, com efetividade, a violência na escola, já que as relações entre os diferentes no espaço escolar transcendem a norma positivada, passando, inclusive, pelo campo da fraternidade que exprime uma relação de igualdade e de dignidade entre todos os homens, sem estar baseada no poder soberano.

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MICELI, S. Introdução: a força do sentido. In: BOURDIEU, Pierre. A economia das trocas simbólicas. 5. ed. São Paulo: Perspectiva, 1982.

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Data de recebimento: 06.02.2018Data de aceite: 19.08.2018

Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 175-195, jan./jun., 2018

ROCHA, S. A.; CANTE, V. B.

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RESENHAREVIEW

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PSICOLOGIA E SUAS CONTRIBUIÇÕES À EDUCAÇÃO

PSYCHOLOGY AND ITS CONTRIBUTIONS TO EDUCATION

Aline Rejane Caxito Braga1

Marcos Ferreira Medeiros 2

CARRARA, K. (Org.) Introdução à psicologia da educação: seis abordagens. São Paulo: Avercamp, 2004.

O livro proporciona uma leitura introdutória e didática sobre a psi-cologia da educação à luz de diferentes abordagens. Toma como pressuposto que nenhuma delas intenta ser melhor ou pior, e sim caminhos que podem levar à educação emancipadora. Para tanto, o profissional ao se subsidiar de uma abordagem psicológica não pode prescindir da compreensão da complexa natureza ético-política das práticas educacionais.

Capítulo I - A Contribuição da Psicanálise à Educação de Elena Etsuko Shirange e Marília Matsku Higa. A Psicanálise elaborada por Sigmund Freud, a partir do atendimento aos pacientes conjectura a importância do inconscien-te para compreender o comportamento do ser humano. Segundo a teoria, o conteúdo da mente pode ser: inconsciente, consciente ou pré-consciente e a personalidade é composta de três sistemas – id, ego e superego – sendo o comportamento o resultante da interação entre eles. A energia psíquica que os sistemas utilizam para realizar seu trabalho provém das pulsões. Estas são representantes psíquicos dos estímulos que se originam dentro do corpo e alcançam a mente, tem como objetivo primordial reduzir a excitação sentida como satisfação. A teoria diferencia a pulsão de vida e a pulsão de morte. Freud atribuiu grande importância à sexualidade e teorizou o desenvolvimento da sexualidade nas fases: oral, anal, fálica, período de latência (que não é uma fase, mas um período) e genital. A fase fálica é de importância crucial para o psiquismo pois abrange o Complexo de Édipo e de castração que fundamentam psicologicamente as diferenças sexuais e o desenvolvimento do superego. Os

1 Doutora em Psicologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, psicóloga da Secretaria Municipal de Educação, docente da Faculdade do Pantanal. Cáceres, Mato Grosso, Brasil, [email protected] Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Estado de Mato Grosso (UNEMAT). Psicologo, Cáceres, Mato Grosso, Brasil. [email protected]

DOI/10.30681/21787476.2018.29.199204

Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 199-204, jan./jun., 2018

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impulsos das fases iniciais (oral, anal e fálica) se fundem e se sintetizam nos impulsos genitais. A reprodução é a principal função biológica da fase genital.

Contribuições à Educação: (1) A transferência presente na relação professor-aluno nos permite refletir sobre o que possibilita ao aluno acreditar no professor e chegar a aprender. (2) O impulso sexual pode ser direcionado para fins não propriamente sexuais, mas sim socialmente úteis como a cultu-ra e a arte via sublimação. (3) O professor deve: - buscar com o educando o justo equilíbrio: entre o prazer individual e as necessidades coletivas e entre a permissão e a proibição, isto é, sacrificar o mínimo de prazer sem entrar em choque com as exigências da sociedade;- compreender que não tem acesso às repercussões inconscientes de tudo que ensina; - reavaliar suas atitudes, suas práticas do na sala de aula e sua concepção acerca da aprendizagem (4) Freud defendeu a educação sexual da criança respondendo a todas as perguntas, sem ocultar a realidade e amedrontá-la com argumentos religiosos. (5) O aluno é um ser que tem subjetividade e desejo, assim, o não aprender, não necessa-riamente se configura como oposto do aprender (6) A educação envolve um encontro do desejo de ensinar do professor com o desejo de aprender do aluno.

No capítulo II – A criança concreta, Completa e Contextualizada: a Psicologia de Henri Wallon de Maria Letícia B. P. Nascimento. A psicologia de Henri Wallon, tomando a dialética como fundamento epistemológico, busca compreender o desenvolvimento infantil por meio das relações estabelecidas entre a criança e seu ambiente, privilegiando a pessoa em sua totalidade. Wallon define o ser humano como geneticamente social. Ao nascer, não existe um sujeito a princípio e sim uma indiferenciação entre o recém-nascido e o meio social (a mãe) e físico que o acolhe. A criança nasce para a vida psíquica pela emoção, que, ao lado do movimento, alimenta a simbiose inicial. Para Wallon as condutas cognitivas surgem das afetivas; estas se subordinarão àquelas, alternando-se em fases centrípetas, voltadas para si mesmas, e centrífugas, de interesse pelo mundo humano ou pelo mundo físico. Nas etapas dos do desenvolvimento: impulsivo-emocional, sensório-motor e projetivo, perso-nalismo, etapa categorial, adolescência evidencia-se os princípios funcionais - integração, preponderância e alternância, - que definem o desenvolvimento como um processo descontínuo, marcado por rupturas e crises.

Contribuições à educação: (1) Wallon: - elaborou o “Projeto Langevin--Wallon e analisou os sistemas pedagógicos da “escola ativa” reconhecendo o valor de suas contribuições, mas evidenciando a não superação da contradição entre indivíduo e sociedade; - criticou o modelo escolar tradicional pois tem objetivo de disciplinar, homogeneizar, apresenta caráter universal e a-histó-Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 199-204, jan./jun., 2018

BRAGA, A. R.; MEDEIROS, M. F.

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rico, desconsiderando o contexto e a singularidade de cada criança e, ainda, predomina uma visão adultocêntrica da infância. (2) O professor deve: - com-preender a criança completa, aspectos intelectual, afetivo e motor integrados, sem privilegiar o cognitivo; - observar atentamente as crianças para reconhecer as mudanças de objetivos de sua conduta, em diferentes idades e situações; promover relações entre a criança e o meio humano e físico, (4) A educação deve compreender que o processo de humanização se concretiza nos meios e nos grupos que a criança frequenta.

No capítulo III – A psicanálise Lacaniana e a Educação, José Sterza Justo apresenta a teoria de Lacan, discípulo de Freud, que propôs uma relei-tura as obras de seu mestre marcada pela Linguística, substituindo o clássico modelo biológico pelo antropológico-cultural. Assim, o inconsciente passa a ser estruturado pela linguagem e na relação do sujeito com o “Outro”, consti-tuído fundamentalmente por significantes. O nascimento do “Eu” começará a se formar a partir de uma imagem criada pelo “Outro”, conforme a teorização sobre o estádio do espelho. Imaginemos que o espelho principal é o olhar da mãe através do qual o bebê começa a se ver e se reconhecer. Esse olhar da mãe constituído dos seus desejos projetados na criança, serão tomados como sendo os próprios desejos da criança. A condição para a superação do espelhismo é o acesso ao plano simbólico, no qual a imagem refletida será reconhecida como sendo um simples reflexo do próprio sujeito. A partir disso, o “Eu” e o “Outro” passam a ser reconhecidos como campos distintos e, mais ainda, existindo entre eles a presença de um terceiro, o pai que intercede e barra a simbiose entre mãe e criança, instaurando o lugar da lei na estrutura psíquica. A instauração do relacionamento triádico é fundamental para a constituição do sujeito, na sua condição de faltante.

Contribuições à Educação: (1) O professor representa o espelho no qual o aluno se mira para reconhecer ou rejeitar as imagens de si e de seu mundo ali refletidas. Esse fenômeno de espelhamento é estruturante da relação professor e aluno. (2) Na relação triádica entre o aluno, o conhecimento (objeto do desejo) e o professor, este funcionará como elemento de regulação do aces-so a esse objeto (3) O Professor deve: - sair desse lugar inicial, confundido com o objeto do desejo do aluno para se colocar no lugar de mediador; - saber que lugar destinar ao aluno pois este deve permitir a sua expressão, e ainda, deve existir lugares vazios para a circulação do sujeito e do conhecimento; - conhecer e encontrar seu lugar na relação com o aluno exercendo com autoridade as suas funções especialmente a de provedor e interditor. (4) A figura do professor deve ser construída no simbólico para que o sujeito consiga representar o real

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BRAGA, A. R.; MEDEIROS, M. F.

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e o imaginário e finalmente vislumbrar seus desejos, suas faltas e alternativas para preenchimento (5) Entender a educação como um fenômeno que surge da condição humana de movimentar-se pela busca do saber que pode auxiliar o sujeito no conhecimento e na conquista do mundo ou subtrair-lhe a condição de sujeito aprisionando-o em lugares psicossociais fechados ou impedindo que construa seu próprio lugar no enfrentamento com o “Outro”.

Capítulo IV – Behaviorismo, Análise do Comportamento e Educação de Kester Carrara. A Análise Comportamental e a filosofia de ciência que lhe é subjacente, o Behaviorismo Radical, têm constituído objeto de frequentes críticas, especialmente na área da educação. De forma geral, essas críticas estão atreladas a forte ligação que essa abordagem possui com o positivismo lógico. O movimento behaviorista surgiu em 1913, com Watson, a partir de um artigo que propunha o comportamento enquanto objeto de estudo, ao mesmo tempo, em que sugeria o uso da observação como instrumento de acesso às atividades humanas. Nessa perspectiva, o behaviorismo metodológico proposto por Watson compreendia o homem através do paradigma estimulo-resposta, sendo este passivo aos estímulos do meio. Posteriormente, Skinner com o Behaviorismo Radical, entende que o homem opera sobre o mundo através de seu comportamento. Este, ao mesmo tempo, em que é alterado pelas condições ambientais também altera o ambiente. Tais relações indivíduo-ambiente são controladas pelas consequências, assim, se estabelece a tríplice contingência.

Contribuições à educação: (1) Clareza na especificação de objetivos comportamentais. (2) Reforçamento sempre dirigido aos comportamentos alvos. (3) Evitar o uso de punição, quer pelos subprodutos negativos que ela gera para o indivíduo, quer pelo fato de que seus efeitos tendem a ser tem-porários. (4) Professor deve: - assegurar oportunidades, em sala de aula, para que o aluno tenha condições de emitir os comportamentos selecionados em função dos objetivos; - utilizar, preferencialmente, situações de aprendizagem que apresentem maior probabilidade de gerar reforçadores naturais; - Fazer uso do princípio de progressão gradual que visa proporcionar aprendizagens do mais simples ao mais complexo, conforme o progresso o professor vai di-minuindo o acompanhamento; - Empregar o princípio dos pequenos passos e especificar com muita clareza o que se espera do aluno a fim de reduzir a probabilidade do erro produzindo frustrações que inibem a motivação para novas tentativas de aprendizagem.

Capítulo V – A escola de Vygotsky de Suely Amaral de Mello. A Escola de Vygotsky ou teoria histórico-cultural, constituiu-se como uma vertente da psicologia que retomou os estudos de Karl Marx, compreende que ser humano Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 199-204, jan./jun., 2018

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não nasce humano, mas aprende a ser humano com as outras pessoas e com a sociedade, sendo então, um ser social. É também histórico-cultural porque apropria-se das qualidades humanas e materiais disponíveis e necessárias para viver em sua época. O homem, na relação com a cultura desenvolve, as funções psíquicas humanas, como linguagem, pensamento, memória. Essas antes de se tornarem internas precisam ser vivenciadas nas relações entre as pessoas sob a forma de atividade interpsíquica para depois assumirem a forma de atividade intrapsíquica. Esse processo de aprendizagem da cultura e da reprodução das aptidões humanas é socialmente mediado. Assim, Vygotsky considera que o processo de desenvolvimento resulta do processo de aprendizagem.

Contribuições à Educação: (1) O papel da educação é: - garantir a criação de aptidões que são inicialmente externas aos indivíduos e que estão dadas como possibilidades nos objetos materiais e intelectuais da cultura; - criar novas necessidades humanizadoras nas crianças; - e conceber a criança como capaz, de interagir com o adulto desde os primeiros dias de vida e desenvolver. (2) Aprendizagem ocorre quando o ensino incide na zona de desenvolvimento próximo. (3) O professor é o mediador da relação da criança com o mundo. Ele deve: - impulsionar novos conhecimentos e conquistas a partir do nível real do desenvolvimento e das especificidades do desenvolvimento da criança; - intervir intencionalmente, planejar e proporcionar atividades com grupos de crianças de diferentes idades e níveis de desenvolvimento, nas quais quem sabe ensina quem não sabe; - conhecer as práticas sociais em que as crianças se inserem; - conhecer os períodos sensitivos, de cada idade, pois o ensino influencia principalmente naquelas qualidades que estão em processo de for-mação; - perceber qual é a atividade principal para a criança; (4) O processo de aprendizagem é colaborativo e ativo do ponto de vista do sujeito que aprende.

Capítulo VI - Contribuições da Psicologia e Epistemologia Genéticas para a Educação - Adrián Oscar Dongo Montoya. A Epistemologia Genética, inaugurada por Piaget, objetiva revelar os processos que constituem as es-truturas do conhecimento. Desse modo, exige, além da formalização lógica e matemática, a pesquisa histórica das ideias científicas e pré-científicas e a pesquisa psicogenética. A Epistemologia e a Psicologia Genética concebem o conhecimento como ato de assimilação aos esquemas de ação e caracterizam o processo de desenvolvimento psicológico do conhecimento (e da afetividade) por reconstruções das conquistas anteriores e não rupturas radicais ou simples prolongamentos. A inteligência e/ou o conhecimento possui os aspectos fun-cional e estrutural. O aspecto funcional diz respeito aos processos adaptativos e organizativos. Nesses verifica-se que no exercício de um mesmo esquema,

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encontra-se a dimensão assimiladora e a acomodadora, e todo esquema de ação funciona como um todo organizado. A reorganização interna é chamada de equilibração majorante. O resultado do processo adaptativo e organizativo define o aspecto estrutural da inteligência; reciprocamente, o processo adap-tativo não funcionará sem uma estrutura prévia.

Contribuições à Educação: (1) O professor: - precisa conhecer tanto o conteúdo acabado quanto os processos e mecanismos intelectuais envolvidos na sua aprendizagem e na formação das diferentes explicações do mundo real; - possibilitar a problematização dos fenômenos, interpretação dos dados por parte dos alunos; - constituir-se num pesquisador e propor pesquisa atenta à realidade; - possibilitar a discussão e a colaboração entre os pares; - não restringir-se a transmissão de conteúdos acabados; - fazer uso da narrativa, enquanto reconstituição das ações executadas e vividas por parte da criança. (2) O aluno é o agente central e ativo da aprendizagem; (3) A educação deve contribuir na formação de indivíduos autônomos pelo favorecimento de experiências morais de coação, mas também, e sobretudo, de cooperação, considerando também a influência da cultura.

Data de recebimento: 11.09.2018Data de aceite: 11.10.2018

Rev. Fac. Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 29, Ano 16, Nº 1 p. 199-204, jan./jun., 2018

BRAGA, A. R.; MEDEIROS, M. F.

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NORMAS PARA APRESENTAÇÃO DE PRODUÇÕES CIENTÍFICAS

STANDARDS FOR PRESENTATION OF PAPERS

As produções científicas devem ser enviadas exclusivamente por meio do correio eletrônico no endereço: [email protected]ão ser enviados em uma folha de rosto, em separado, o título do artigo e os seguintes dados sobre o(s) autor(es): nome(s) completo(s) na ordem di-reta do nome e na segunda linha abaixo do título, com alinhamento à direita, indicando, a titulação, cargo que ocupa, instituição a que pertence, cidade, estado, país e endereço eletrônico. Serão aceitos artigos submetidos no má-ximo com três autores.Os trabalhos enviados para avaliação devem ser da seguinte natureza: artigos e resenhas, sendo que os artigos devem ter no mínimo doze e no máximo vinte laudas, as resenhas até seis laudas.Serão publicados trabalhos nacionais e internacionais inéditos, resultantes de estudos e pesquisas, que contribuam para a formação, desenvolvimento, atualização e produção do conhecimento no campo da Educação e em áreas a ela relacionadas.Os trabalhos serão submetidos à avaliação: a) quanto à forma, destacando--se a adequação aos requisitos da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) e as instruções editorias; b) quanto ao conteúdo, quando será avaliado o mérito dos trabalhos.Todos os trabalhos serão apreciados por dois pareceristas e, caso haja discor-dância entre eles, será encaminhado a um terceiro. De modo algum o nome do autor figurará no texto a ser enviado aos avaliadores. Os autores receberão cópia dos pareceres, mantendo-se em sigilo o nome dos avaliadores ad hoc e, para a publicação, deverão ajustar os artigos às sugestões dos avaliadores. Semestralmente será publicada a relação dos pareceristas ad hoc que contri-buíram com a Revista.

Formatação:

Configuração da página: tamanho do papel (A4-21 cm X 29,7 cm); margens esquerda e superior 3 cm, margens direita e inferior 2 cm; todas as páginas deverão ser numeradas com algarismos arábicos no canto direito superior. Tipo de Letra: O texto deverá ser digitado em fonte Times New Roman , corpo

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12. As citações longas, notas de rodapé, resumo, palavras-chave, abstract e ke-ywords , corpo 11 e espaço simples.Adentramento: os parágrafos deverão ter adentramento de 1,5cm e citações com mais de três linhas com recuo de 4 cm da margem esquerda.Espaçamento entre linhas: 1,5 no corpo do texto, e espaço simples nas citações longas, nas notas, no resumo e no abstract. Os títulos das seções (se houver) e as citações longas devem ser separados do texto que os precedem e/ou sucedem por espaço duplo.Quadros, tabelas, gráficos, figuras, mapas: devem atender as normas da ABNT e serem apresentados em folhas separadas do texto (os quais devem indicar os locais em que serão inseridos). Sempre que possível, deverão estar confeccionados para sua reprodução direta.

Disposição do texto:

Título: centralizado, em maiúsculo e negrito, com asterisco indicando sua origem (se houver) no rodapé. Subtítulos em minúsculo e negrito, com alinha-mento à esquerda. A um espaço abaixo o título deve ser reproduzido também em língua estrangeira (inglês): title.Resumo: deverá ter entre 100 e 150 palavras e iniciar a um espaço duplo, abaixo do title sem adentramento em letra maiúscula, seguida de dois pontos.Palavras-chave: A expressão PALAVRAS-CHAVE em maiúscula, seguida de dois pontos, a um espaço duplo abaixo do resumo e dois espaços duplos acima do início do abstract , sem adentramento. Utilizar no máximo cinco palavras-cha-ve, escritas em letras minúsculas, exceto quando as palavras requererem letra maiúscula, separadas por vírgula. As palavras-chave devem ser reproduzidas em língua estrangeira (inglês): Keywords.Abstract: a expressão ABSTRACT, em maiúscula, a um espaço duplo abaixo das palavras-chave, seguindo as mesmas orientações do resumo.Keywords: a expressão KEYWORDS, em maiúscula, a um espaço duplo do abstract , sem adentramento e dois espaços duplos acima do início do texto.Palavras estrangeiras devem ser grafadas em itálico .Citações: devem conter o sobrenome do autor e, entre parênteses, ano de publicação da obra, seguido de vírgula e número da página.Notas de rodapé: devem ser inseridas ao final de cada folha em que elas aparecem, de maneira personalizada , em ordem crescente (1, 2, 3...).Referências: a palavra Referências, com inicial maiúscula, sem adentramento, a um espaço duplo após o final do texto. A primeira obra deve vir a um espaço

Normas para a apresentação de produções científicas

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duplo abaixo da palavra Referências. As obras utilizadas devem seguir as normas da ABNT.Exemplos:

Um autor: QUEIROZ, E. O crime do padre amaro . 25. ed. Rio de Janeiro: Ediouro, 2000.

Dois ou três autores: VIGOTSKY, L. S.; LURIA, A. R. Estudos sobre a história do comportamento. Porto Alegre: Artes Médicas, 1996.

Mais de três autores: CASTORINA, J. A. (et. al.). Piaget-Vigotsky: novas contribuições para o debate. São Paulo: Ática, 1995.

A instituição e/ou qualquer dos organismos editoriais não se responsabilizam pelas opiniões, ideias e conceitos emitidos nos textos, por serem de inteira responsabilidade de seu(s) autor(es). A Revista não se obriga a devolver os originais das colaborações. Será fornecido gratuitamente ao(s) autor(es) de cada artigo um exemplar do número da Revista da Faculdade de Educação em que seu artigo foi publicado.

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Concedo a Revista da Faculdade de Educação - Unemat o direito de primeira publicação da versão revisada do meu artigo. Afirmo ainda que meu artigo não está sendo submetido a outra publicação e não foi publicado na íntegra em outro periódico e assumo total responsabilidade por sua originalidade,podendo incidir sobre mim eventuais encargos decorrentes de reivindicação,por parte de terceiros, em relação à autoria do mesmo. Também aceito submeter o tra-balho às normas de publicação da Revista. A Revista não se obriga a devolver os originais das colaborações. Normas de publicação disponíveis também na página http://www2.unemat.br/revistafaed/

Normas para a apresentação de produções científicas

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Universidade do Estado de Mato Grosso - UNEMATPrograma de Pós-Graduação em Educação - PPGEduCidade Universitária (Bloco II)Tel/Fax: + 55 (65) 3223-0728Cáceres/MT - Brasil (CEP: 78200-000)http://www2.unemat.br/revistafaed/e-mail: [email protected]

Normas para a apresentação de produções científicas

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