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ECONOMIA POLÍTICA - PESSIMISTAS CLÁSSICOS 2009 ALTAMIRO RAJÃO - | DIREITO 1 PESSIMISTAS CLÁSSICOS INTRODUÇÃO As questões econômicas têm preocupado muitos intelectuais ao longo dos séculos. Na antiga Grécia, Aristóteles e Platão dissertaram sobre os problemas relativos à riqueza, à propriedade e ao comércio. Durante a Idade Média, predominaram as idéias da Igreja Católica Apostólica Romana e foi imposto o direito canônico, que condenava a usura (contrato de empréstimo com pagamento de juros) e considerava o comércio uma actividade inferior à agricultura. O mercantilismo e as especulações dos fisiocratas precederam a economia clássica. A ESCOLA CLÁSSICA E foi após este período que surgiu uma nova forma de ver a economia, sendo considerada a primeira escola moderna de pensamento económico. É geralmente aceito que o marco inaugural do pensamento económico clássico seja a obra “A Riqueza das Nações”, do escocês Adam Smith. Seus conceitos giram em torno da noção básica de que os mercados tendem a encontrar um equilíbrio económico a longo prazo, ajustando-se a determinadas mudanças no cenário económico. Essa parte dos escritos de Smith (A Riqueza das Nações, em 1776) é também desenvolvida na obra dos economistas do século XIX, como Thomas Robert Malthus e David Ricardo (Princípios de Economia Política e Tributação, de 1817), e culmina com a síntese de John Stuart Mill (Princípios de Economia Política, de 1848). Portanto, os principais representantes da escola clássica são Adam Smith, Thomas Malthus, David Ricardo e John Stuart Mill, entre outros. Com estes representantes da escola clássica, a económia adquiriu carácter científico integral quando passou a centralizar a abordagem teórica na questão do valor, cuja única fonte original era identificada no trabalho em geral. Além da teoria do valor-trabalho, do uso do método dedutivo, do materialismo e da preocupação em simplificar e generalizar as proposições económicas e de uma visão de conjunto da evolução económica, a escola clássica baseou-se nos preceitos filosóficos do liberalismo e do individualismo e firmou os princípios da livre-concorrência, que exerceram decisiva influência no pensamento revolucionário burguês.

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PESSIMISTAS CLÁSSICOS

INTRODUÇÃO

As questões econômicas têm preocupado muitos intelectuais ao longo dosséculos. Na antiga Grécia, Aristóteles e Platão dissertaram sobre os problemasrelativos à riqueza, à propriedade e ao comércio. Durante a Idade Média,predominaram as idéias da Igreja Católica Apostólica Romana e foi imposto o direitocanônico, que condenava a usura (contrato de empréstimo com pagamento dejuros) e considerava o comércio uma actividade inferior à agricultura. Omercantilismo e as especulações dos fisiocratas precederam a economia clássica.

A ESCOLA CLÁSSICA

E foi após este período que surgiu uma nova forma de ver a economia, sendoconsiderada a primeira escola moderna de pensamento económico.

É geralmente aceito que o marco inaugural do pensamento económicoclássico seja a obra “A Riqueza das Nações”, do escocês Adam Smith. Seus conceitosgiram em torno da noção básica de que os mercados tendem a encontrar umequilíbrio económico a longo prazo, ajustando-se a determinadas mudanças nocenário económico.

Essa parte dos escritos de Smith (A Riqueza das Nações, em 1776) é tambémdesenvolvida na obra dos economistas do século XIX, como Thomas Robert Malthuse David Ricardo (Princípios de Economia Política e Tributação, de 1817), e culminacom a síntese de John Stuart Mill (Princípios de Economia Política, de 1848).Portanto, os principais representantes da escola clássica são Adam Smith, ThomasMalthus, David Ricardo e John Stuart Mill, entre outros.

Com estes representantes da escola clássica, a económia adquiriu caráctercientífico integral quando passou a centralizar a abordagem teórica na questão dovalor, cuja única fonte original era identificada no trabalho em geral. Além da teoriado valor-trabalho, do uso do método dedutivo, do materialismo e da preocupaçãoem simplificar e generalizar as proposições económicas e de uma visão de conjuntoda evolução económica, a escola clássica baseou-se nos preceitos filosóficos doliberalismo e do individualismo e firmou os princípios da livre-concorrência, queexerceram decisiva influência no pensamento revolucionário burguês.

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OS PESSIMISTAS CLÁSSICOS

Como já dito, depois de Adam Smith desenvolveram-se duas correntesinspiradas na sua obra, ambas correspondendo à integração na escola clássica.

Ao contrário de Adam Smith e de seu grande intérprete francês Jean Baptiste Say,que tinham uma visão geralmente otimista quanto às perspectivas da humanidade,Ricardo e Malthus jamais foram considerados otimistas. "Foi graças à [ThomasRobert] Malthus e Ricardo que a economia se transformou numa ciência sombria",sentencia John Kenneth Galbraith em sua célebre obra - A era da incerteza'.

Foi nestas tendências, de otimismo e pessimismo, que se distinguiram osdois ramos da escola clássica – o da escola clássica inglesa e o da escola clássicafrancesa.

A francesa era considerada otimista, seguindo fielmente os preceitos deAdam Smith. No entanto, a escola inglesa não compactuou completamente comSmith, demonstrando a sua tendência pessimista.

Smith considerava a ordem natural não apenas inevitável como benéficatambém, aspecto esse que caracteriza o liberalismo otimista. Já os pessimistas,entendiam que não valeria a pena o Estado intervir na vida econômica, porque seriainútil. Mais cedo ou mais tarde, essa ordem natural havia de sobrepor-se a todas astentativas realizadas pelo poder político no sentido da condução dos fenômenoseconômicos. Para eles a ordem natural é inelutável. Segundo eles, essa ordemnatural, toda-poderosa, haveria de levar o gênero humano à sua completa ruína.

Portanto, os clássicos ingleses propõem um sistema de liberdade econômica,pois seria mediante o mecanismo impessoal do mercado que se conseguiriaharmonizar os interesses individuais. Entretanto, as revoluções que ocorreram naEuropa no período de 1830 a 1848 mostraram que a harmonia de uma “ordemnatural” e do não-intervencionismo preconizado pela escola clássica era remota. Oliberalismo e o individualismo começam então a sofrer várias críticas de pensadorespreocupados com os problemas econômicos e sociais.

Thomas Robert Malthus e David Ricardo são os representantes da escolaclássica pessimista com maior notoriedade. As construções fundamentais destesdois teóricos ingleses, que passaremos a conhecer.

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TEORIA DA POPULAÇÃO (MALTHUS)

VIDA

Thomas Robert Malthus nascido na Inglaterra em 14 de fevereiro de 1766.Filho de um culto e rico proprietário de terras (Seu pai, Daniel Malthus, era adeptodos ideais de Jean-Jacques Rousseau e amigo pessoal dos pensadores David Humee Godwin).

Aos dezoito anos de idade, em 1784, após receber em casa uma amplaeducação liberal, Malthus foi admitido no Colégio de Jesus, da Universidade deCambridge. Lá estudou Matemática, Latim e Grego, ao mesmo tempo em querecebia sua formação sacerdotal. Graduou-se em 1788 e recebeu o Master of ArtsDegree em 1791. Em 1793 foi aceito como membro pesquisador (fellow) dainstituição e, em 1797, recebeu as ordens eclesiásticas, tornando-se sacerdote daigreja Anglicana, fato que influenciaria decisivamente sua obra, mormente o EnsaioSobre a População.

Em 1799, inicia uma longa viagem de estudos pela Europa. Casou-se em 1804(aos 39 anos de idade com sua prima Harriet Eckersall, tendo posteriormente 3filhos) e, por isto, abandonou o posto de pastor.

Em 1805, foi nomeado professor de história e de economia política do EastIndia College. Provavelmente foi o primeiro professor de Economia Política de que setem noticia - pelo menos parece ter sido essa a primeira vez em que uma disciplinaacadêmica recebeu tal denominação.

Ao longo de sua vida, Malthus fundou ou foi aceito como membro dediversas sociedades culturais, tais como a Royal Society (1819), o Political EconomyClub (1821), que incluía nomes como o de Ricardo e o de James Mill, a Royal Societyof Literature (1824), a Académie Française des Sciences Morales et Politiques (1833),a Real Academia de Berlim (1833) e a Statistical Society of London (1834), da qual foium dos fundadores.

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Thomas Robert Malthus faleceu no dia 23 de dezembro de 1834, aos 68 anos,em Haileybury, no Condado de Hertford, na Inglaterra.

Na história do pensamento econômico, poucos economistas chegaram asuscitar tantas controvérsias como o economista inglês Thomas Robert Malthus,(até hoje, 243 anos após o seu nascimento na Inglaterra). Nenhum estudante,professor, economista ou leigos conseguem manter-se neutro, perante seus livros epanfletos publicados no final do século XVIII e principalmente no início do séculoXIX.

OBRAS

Em suas obras econômicas, Malthus demonstrou que o nível de actividadeem uma economia capitalista depende da demanda efectiva, o que constituía aosseus olhos, uma justificativa para os esbanjamentos praticados pelos ricos. A idéiada importância da demanda efectiva seria depois retomada por Keynes.

Seus dois ensaios estão permeados de conceitos cristãos, como os de mal,salvação e condenação.

Thomas Malthus representa o paradigma de uma visão que ignora ou rebaixaos benefícios da industrialização ou do progresso tecnológico. Ernest Gellner afirmaem Pós-modernismo, razão e religião: "Previamente, a Humanidade agrária vivianum mundo Malthusiano no qual a escassez de recursos em geral condenava oshomens a apertadas formas sociais autoritárias, à dominação por tiranos, primos ouambos".

Para o autor, a diferença entre as classes sociais era uma conseqüênciainevitável. A pobreza e o sofrimento eram o destino para a grande maioria daspessoas.

Eis as obras de Malthus:

1. Ensaio sobre o Princípio da População – “An Essay on the Principle ofPopulation” (1798);

2. Um ensaio sobre o princípio da população ou uma visão de seus efeitospassados e presentes na felicidade humana, com uma investigação dasnossas expectativas quanto à remoção ou mitigação futura dos males queocasiona (1803).

3. Investigação sobre a Natureza e o Progresso da Renda – “An Inquiry into theNature and Progress of Rent” (1815);

4. As Leis dos Pobres – “The Poor Law” (1817);

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5. Princípios de Economia Política Considerados com Vista a sua AplicaçãoPrática – “Principles of Political Economy Considered with a View to theirPratical Application” (1820); e,

6. Definições em economia política – “Definitions of Political Economy” (1827).

INFLUENCIA DE SUAS OBRAS

Exerceu Malthus, através da sua Teoria da População, profunda influênciasobre a orientação científica da escola Clássica, que antes dele foi, com Adam Smith,liberal e otimista, e se tornará, com ele e depois dele, pessimista e liberal, Malthus,Ricardo e John Stuart Mill entenderam que as leis naturais, deixadas sem controle,trariam conseqüências maléficas à humanidade. O Reverendo Malthus tambémexerceu influência sobre o cientista inglês Charles Darwin. No arquipélago deGalápagos em pleno Oceano Pacífico coletou amostras e observou ocomportamento dos animais, elaborando a sua teoria da evolução das espécies porseleção natural.

A tese de Malthus foi contestada, entre outros, por Fourier e Marx, porignorar a estrutura social da economia e as possibilidades criadas pela tecnologiaagrícola. Entretanto, “reciclada” para o terreno da evolução e das populações deinsetos e outras espécies animais, ela forneceu a chave decisiva para a teoria daseleção natural de Darwin e Wallace, como já dito. David Ricardo e outroseconomistas clássicos incorporaram o “princípio da população” às suas teorias,supondo que a oferta da força de trabalho era inexaurível, sendo limitada apenaspelo “fundo de salários”.

Portanto, Malthus foi capaz de influenciar os leitores do Velho Mundo, comotambém, do Novo Mundo e posteriormente os seus descendentes sobre os grandesproblemas sociais da humanidade. Segundo Malthus, a chave do desenvolvimentoeconômico residia no controle de natalidade. As previsões imperfeitas de Malthusgerou os pensamentos dos meomalthusianos. A explosão demográfica nos paísessubdesenvolvidos, acompanhado da escassez de alimentos e suas conseqüênciascatastróficas, provocaram uma tendência internacional do uso do planejamentofamiliar (distribuição gratuitas de pílulas anticoncepcionais, de preservativos etc.).

TEORIA DA POPULAÇÃO

A fama de Thomas Malthus decorre dos seus estudos sobre a população.Malthus defendeu uma teoria pessimista da economia, centrada na escassez de

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recursos e no crescimento da população. Para ele o excesso populacional era acausa de todos os males da sociedade (população cresce em progressão geométricae os alimentos em progressão aritmética), tudo isto estão contidos em dois livrosconhecidos como Primeiro ensaio e Segundo ensaio: "Um ensaio sobre o princípioda população na medida em que afeta o melhoramento futuro da sociedade, comnotas sobre as especulações de Mr. Godwin, M. Condorcet e outros escritores"(1798) e "Um ensaio sobre o princípio da população ou uma visão de seus efeitospassados e presentes na felicidade humana, com uma investigação das nossasexpectativas quanto à remoção ou mitigação futura dos males que ocasiona"(1803).

Tanto o primeiro ensaio - que apresenta uma crítica ao utopismo (otimismo) -quanto o segundo ensaio - onde há uma vasta elaboração de dados materiais - têmcomo princípio fundamental a hipótese de que as populações humanas crescem emprogressão geométrica. Malthus estudou possibilidades de restringir essecrescimento, pois os meios de subsistência poderiam crescer somente emprogressão aritmética. Segundo ele, esse crescimento populacional é limitado peloaumento da mortalidade e por todas as restrições ao nascimento, decorrentes damiséria e do vício.

De acordo com Malthus, eram dois tipos de obstáculos: Obstáculos positivos(A Fome, a Desnutrição, as Epidemias, Doenças, as Pragas, as Guerras etc.) nosentido de aumentar a taxa de mortalidade: Obstáculos preventivos (as PráticasAnticoncepcionais Voluntárias) no sentido de reduzir a taxa de natalidade. Ocrescimento da população, os meios de subsistência e as causas da pobreza emplena Revolução Industrial são os problemas centrais analisados pelo economistaclássico Thomas Robert Malthus. Segundo Malthus: ''Pode-se seguramente declararque, se não for à população contida por freio algum, irá ela dobrando de 25 em 25anos, ou crescerá em progressão geométrica (1, 2,4,8,16,32,64,128,256,512,...). Pode-seafirmar, dadas as atuais condições médias da terra, que os meios de subsistência, nasmais favoráveis circunstâncias, só poderiam aumentar, no máximo, em progressãoaritmética (1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9,10)'', portanto, com o passar do tempo, a escassezde alimentos levará a maioria da população à fome. Segundo o economista clássicoMalthus, ''o poder da população é tão superior ao poder do planeta de fornecersubsistência ao homem que, de uma maneira ou de outra, a morte prematura acabavisitando a raça humana. Os vícios humanos são os agentes ativos da desprovação;são eles os precursores do grande exército da destruição e em geral acabam fazendoo serviço macabro por si só. Mas, se não consegue vencer a guerra da exterminação,as epidemias, pestes e pragas avançam e ceifam a vida de milhares e dezenas demilhares de pessoas. Se o serviço ainda estiver incompleto, surge uma gigantesca einevitável onda de fome que, com um poderoso sopro, nivela novamente a

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população e os alimentos do planeta. ''A relação entre fome e população é analisadapor Malthus através da superpopulação que gera a fome.

Para Malthus, quando a desproporção chega a extremos, as pestes,epidemias e mesmo as guerras encarregam-se de reequilibrar (temporariamente) asituação. A única forma de evitar essas catástrofes seria negar toda e qualquerassistência às populações pobres e aconselhar-lhes a abstinência sexual, com o fimde diminuir a natalidade. Os assalariados deveriam ter consciência de que, “com onúmero de trabalhadores crescendo acima da proporção do aumento da oferta detrabalho no mercado, o preço do trabalho tende a cair, ao mesmo tempo em que, opreço dos alimentos tenderá a elevar-se”.

Portanto, a essência da Teoria da População era substituir os obstáculospositivos (guerras, pobreza, etc.) pela restrição moral, seu terceiro obstáculo épeculiar ao homem e resulta de suas faculdades superiores de raciocínio, que lhepermitem calcular as conseqüências. A ''queda progressiva do salário real da mão-de-obra reduz o bem-estar da população''. Para amenizar esse problema, Malthusrecomendava o controle de natalidade através da abstinência sexual, ou seja, ohomem não deve casar antes de possuir condições econômicas para sustentar a suafamília.

Conclui-se que a principal conseqüência dos seus ensaios foi destruir ootimismo exagerado de Willian Godwuin e do economista escocês Adam Smith.Devido a essas idéias, a economia adquiriu o nome de "a ciência lúgubre".

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TEORIA DA RENDA E SALÁRIO (DAVID RICARDO)

VIDA

David Ricardo, economista britânico, nasceu em Londres, no dia 18 de abrilde 1772. Foi o terceiro de 17 filhos de uma família holandesa de classe média,descendentes de judeus saídos de Portugal (sefarditas). Seu pai emigrou dos PaísesBaixos para a Inglaterra pouco antes de David nascer, onde prosperou negociandona Bolsa de valores. David viveria alguns anos na Holanda com outros elementos dafamília, tendo ali completado parte da sua instrução primária. Seguindo os passosdo pai, tornou-se operador da Bolsa de Valores de Londres (iniciou com 14 anos),onde acumulou fortuna, além de mover-se com familiaridade no mundo dosnegócios e das finanças do capitalismo mais avançado de sua época. Rompeu com afamília (e com a religião judaica) aos 21 anos e se casou com uma jovem "Quaker".

Prosseguiu suas actividades na bolsa e em poucos anos ficou rico o bastante,adquiriu uma propriedade rural e passou a se dedicar aos estudos (à literatura e àciência, especialmente matemática, química e geologia).

Em 1799, teve a oportunidade de ler a Riqueza das nações de Adam Smith queatraiu o seu interesse pela pesquisa sobre assuntos económicos.

Entre 1809 e 1815 publicou alguns panfletos sobre temas de economiamonetária, repartição da renda e comércio internacional. A partir de então sededicou a escrever um tratado teórico geral sobre a economia, os Princípios, que foipublicado em 1817 e se constituiria num marco teórico decisivo para odesenvolvimento da economia política clássica.

Em 1815, David Ricardo já era considerado o mais importante economista detoda a Grã-Bretanha, graças ao seu conhecimento prático sobre o funcionamentodo sistema capitalista, vindo da sua carreira como perito em finanças. Foi muitoinfluente na polêmica discussão sobre a questão das corn laws, isto é, da

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importação de trigo estrangeiro para Inglaterra. Ricardo, eterno defensor do livre-comércio internacional, era a favor da importação, mesmo com isso tendo severasdivergências com economistas mais conservadores, como Malthus, os quais temiamver o sustento dos trabalhadores britânicos sob o poder de países estrangeiros,potenciais inimigos. Neste mesmo ano, Ricardo publicou toda a sua tese liberal emseu “Ensaio sobre a Influência do Baixo Preço do Cereal sobre o Lucro do Capital”.

Mas sua grande obra-prima, sem dúvida, foi “Princípios de Economia Políticae Tributação”, publicado em 1817. Esse livro consagrou Ricardo como o grandenome da Economia Política Clássica, junto com Adam Smith, dominando a cenaeconômica não apenas da Inglaterra, mas de todo o mundo ocidental por muitasdécadas, até o surgimento do marxismo e do marginalismo (os quais foram muitoinfluenciados pela obra de Ricardo).

Ricardo também se envolveu com questões políticas, tendo sidorepresentante do distrito irlandês de Portalington na Câmara dos Comuns doparlamento do Reino Unido. Ali defendeu um conjunto de posições liberais tantoem matérias políticas (o voto secreto, o sufrágio universal) quanto em temaseconômicos (a liberdade de comércio).

Apontado como o mais legítimo sucessor de Adam Smith, Ricardo não foi umacadêmico como a maior parte dos outros grandes economistas. Descrito porGalbraith como "o único rival sério de Smith quanto ao título de fundador da teoriaeconômica, Ricardo era judeu, era um corretor da bolsa de valores, membro doParlamento, dono de soberba inteligência e de péssima oratória".

Morreu, prematuramente, em 11 de setembro de 1823, aos 51 anos de idade,deixando incompleta uma obra em que trabalhava.

OBRAS

Sem sombra de dúvidas, David Ricardo é considerado um dos maioreseconomistas de seu tempo, não só de seu tempo, mas ainda hoje também. Suasobras atingem vastas áreas da economia, tais como: política monetária, teoria doslucros, teoria da renda fundiária e da distribuição, teoria do valor e do comérciointernacional, sendo que muitos desses temas permanecem atuais até os dias dehoje.

Considerado como um dos fundadores da escola clássica inglesa daeconomia política, juntamente com Adam Smith e Thomas Malthus, as suas obrasmais destacadas incluem:

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• O alto preço do ouro, uma prova da depreciação das notas bancárias (Thehigh price of bullion, a proof of the depreciation of bank notes), em 1810;

• Ensaio sobre a influência de um baixo preço do cereal sobre os lucros docapital (Essay on the influência of a low price of corn on the profits of stock),em 1815;

• Princípios da economia política e tributação (Principles of political economyand taxation), em 1817 (reeditado em 1819 e 1821).

Em sua obra mais importante, Princípios de economia política e tributação(1817), estabelecia várias teorias baseadas em seus estudos sobre a distribuição dariqueza a longo prazo. Pensava que o crescimento da população provocaria umaescassez de terras produtivas; sua teoria da renda agrária é baseada naprodutividade da terra. Defendeu a teoria clássica do comércio internacional,diminuindo a importância da especialização internacional e a livre concorrência.

INFLUENCIA DE SUAS OBRAS

David Ricardo exerceu uma grande influência tanto sobre os economistasneoclássicos, como sobre os economistas marxistas, o que revela sua importânciapara o desenvolvimento da ciência económica.

TEORIA DA RENDA

Hoje em dia, ao falarmos de renda, vem a mente a remuneração obtida pelacessão do uso de qualquer tipo de propriedade. Entretanto, a denominada renda,tratada por David Ricardo é a diferença entre o preço obtido pelo produto da terra eo custo da produção. Vejamos o desenvolvimento de sua teoria abaixo:

No contexto pragmático da escola clássica, observemos a obra “Princípios deeconomia política e tributação”, de David Ricardo, em que analisou as leis quedeterminam a distribuição do produto social entre as "três classes da comunidade":proprietários de terras, trabalhadores e donos do capital. Entre os princípiosformulados por Ricardo nesta obra encontra-se a TEORIA DE RENDA DA TERRA que éexplicitamente pessimista, que estava relacionada ao aumento da população, o queexplicava a alta renda fundiária da Inglaterra. Pensava que o crescimento dapopulação provocaria uma escassez de terras produtivas; sua teoria da rendaagrária é baseada na produtividade da terra.

Segundo esta teoria, à medida que as populações crescem a procura deprodutos agrícolas (nomeadamente de trigo) torna-se mais acentuada. Para atenderesta demanda, poderá começar-se por tentar uma cultura intensiva das terras,

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empregando nelas mais elevados capitais. Mas o princípio do rendimento nãoproporcional impõe limites à cultura intensiva. Para alem desses limites, aoemprego de mais capital na exploração da terra já não corresponderá umaumento proporcional da produção. Por isso, atingindo os referidos limites, emvez de se explorar a terra intensivamente, torna-se preferível uma exploraçãoextensível. Seguindo este processo de alargamento de áreas cultiváveis, osagricultores - na opinião de RICARDO - começam por explorar as terras maisférteis, aquelas que lhes ofereciam mais elevado rendimento em relação aocapital empregado. Mas, à medida que a procura cresce, os agricultores sãoforçados a explorar terras menos férteis, cujo custo de produção será maiselevado.

Assim, os mesmos bens provêm de terras cuja fertilidade é diversa; e cujocusto de produção é, conseqüentemente, diversa também. Haverá no mercadoquantidades de trigo que provem de terras mais férteis e cujo custo de produção sesitua, por hipótese, ao nível de 10 unidades monetárias; outras quantidades domesmo trigo, produzido em terras de fertilidade media cujo custo será de 12; eainda quantidades de trigo provenientes de terras pouco férteis, cujo custo seráde 15. Sendo diversos os custos, põe-se a questão de saber como se fixará opreço. Responde RICARDO, de harmonia com as leis do custo de produção e daindiferença, que o preço há-de resultar do custo de produção mais elevado.

Porquanto, de outro modo, os agricultores cujos custos são mais altoshaviam de retirar-se do mercado. E, visando à procura a totalidade do trigoproduzido, é preciso que todos os agricultores encontrem no mercado umaremuneração minimamente compensatória. Assim, no exemplo apresentado, opreço seria de 15, situado ao nível do mais alto custo. Desse modo, osproprietários das terras mais férteis beneficiavam- se com a elevação dos custos deprodução em outras áreas, uma vez que os preços dos produtos seriam mantidospara cobrir os custos mais elevados em terras de baixa categoria.

Ora da fixação deste preço resultará um benefício para os proprietáriosdas terras de fertilidade elevada e média. Os que produziram ao custo de 10ganharão 5; os que produziram ao custo de 12 ganhando 3.

DAVID RICARDO designou por renda diferencial da terra esse beneficio (umamaior receita, independentemente do capital e do trabalho aplicados na produção)dos proprietários das terras mais férteis. E a referida renda, em conseqüência docrescimento da população e da procura, tenderia sempre a aumentar.

Por isso, só a classe dos proprietários rurais beneficiaria com a evoluçãonatural dos condicionalismos económicos. Com o crescimento dessa rendadiferencial, os proprietários rurais iriam se apropriar de um excedente econômico

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maior, em detrimento dos capitalistas, que teriam seus lucros reduzidos, a ponto decolocar em perigo a acumulação de capital, prejudicando o desenvolvimentoeconômico. Ou seja, todas as outras classes se achariam cada vez em piorsituação, pelo agravamento dos preços, proveniente da elevação da renda daterra.

Para superar esse problema, Ricardo propõe o livre-cambismo no comérciointernacional, que permitiria aproveitar as melhores terras em escala mundial.

Formula, assim, a teoria das vantagens comparativas, na qual demonstra asvantagens de um país importar determinados produtos, mesmo que pudesseproduzi-los por preço inferior, desde que suas vantagens comparativas em outrosprodutos fossem maiores. Contra a intervenção estatal, a escola clássica apóia-se noliberalismo e no individualismo.

TEORIA DO SALÁRIO

Outra questão levantada por Ricardo nessa obra (Princípios de economiapolítica e tributação) se trata da TEORIA DO SALÁRIO. Apelidada de "lei de ferro dossalários", segundo a qual são inúteis todas as tentativas de aumentar o ganho realdos trabalhadores porque os salários permanecerão, forçosamente, próximos aonível de subsistência, resume as doutrinas de livre mercado de David Ricard. Estateoria do Salário foi tão sinistra como sua teoria da renda, que influenciou a teoriado fundo de salários de Stuart Mill, assim como, as concepções de alguns socialistasalemães.

Porquanto, se a remuneração excedesse tal mínimo, os constituiriam famíliasmais numerosas e, passados anos, a oferta de mão de obra, pelo aumento dapopulação operária, seria superior. Conseqüentemente, os salários baixariam.Assim, qualquer acréscimo de remuneração dos trabalhadores determinaria,fatalmente, para a geração seguinte, uma redução do salário. Este estaria limitadopelo estritamente necessário à sustentação do operário e da sua família.

A teoria do salário de RICARDO, aproveitada pelo socialista alemão LASSALLE, que a tornou mais rígida ainda, ao formular a lei de bronze dos salários, foiamplamente desmentida pelas realidades. Além de a construção de RICARDO só seradmissível numa sociedade estagnada, onde nunca houvesse que recorrer a umamão-de-obra mais abundante, ou onde os trabalhadores fossem sempresubstituídos pelas máquinas, as bases demográficas da teoria não oferecem amenor consistência.

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Contrariamente ao pressuposto de RICARDO, à medida que têm aumentadoos salários, e conseqüentemente, o nível de bem-estar material dos operários, estesmostram, em muitos casos, tendência para constituir famílias menos numerosas, deharmonia com o princípio da capilaridade social. Esta tendência já era previsível notempo de Ricardo. Mas reconhece-se que só mais tarde se esboçou com nitidez,mercê de diversas alterações de ordem política, económica e social.

CONCLUSÃO

A Escola Clássica foi dividida por duas tendêncas: a Otimista e a Pessimista. Aprimeira, influenciada diretamente por Adam Smith, concentrou-se em França. Asegunda (pessimista) divergiam de posicionamentos da primeira, concentrando-sena Inglaterra.

Thomas Robert Malthus e David Ricardo são os representantes da escolaclássica pessimista com maior notoriedade.

Em relação às teorias de Malthus:

A Pobreza nas Grandes Cidades tem alarmado desde Malthus: "Sabe-se queas grandes cidades são desfavoráveis à saúde, e particularmente, à saúde dascrianças novas'' até os neomalthusianos (Charles Bradlaugh, Annie Besant,W.Friedrich etc.), como também, os ecomalthusianos. Os ecomalthusianosdefendem grandes investimentos em educação, saúde e infra-estrutura urbana pararesolver os problemas demográficos, ambientais e sociais, e, sobretudo, paramelhorar a qualidade de vida da população nas grandes cidades.

Enfim, a catástrofe malthusiana ocorreu na Irlanda com a fome provocadapela escassez de batatas no século XIX. E no século XX, novas catástrofesmalthusianas ocorreram na Etiópia e Somália. Felizmente, as profecias de Malthusainda estão longe de se concretizarem nos países desenvolvidos, houve umaumento populacional, mas também houve aumento da produção, devido osavanços na tecnologia e na medicina nos últimos dois séculos. Entretanto, o aspectomalthusiano ainda amedronta os países subdesenvolvidos da África (são 2.250.000mortos em guerras civis), da Ásia (71,4% da população vive abaixo da linha depobreza) e da América do Sul (estima-se mais de 349 milhões de habitantes no ano2000).

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ECONOMIA POLÍTICA - PESSIMISTAS CLÁSSICOS 2009

ALTAMIRO RAJÃO - | DIREITO 14

Em relação às teorias de Ricardo:

Segundo a teoria do salário, a remuneração dos operários acha-senaturalmente limitada ao mínimo indispensável à sobrevivência deles e das famílias.

Um dos erros de DAVID RICARDO, como de tantos outros economistas,consistiu na aceitação do pressuposto da permanência dos condicionalismos,sempre perigoso, porque nunca exacto.

Suas teorias são, em sua dimensão política, uma tomada de posição a favorda burguesia industrial contra a classe ruralista. Exerceu grande influência no séculoXIX tanto entre os defensores do liberalismo e do capitalismo quanto entre seusopositores, como Marx.

Actulamente, quase não há problemas teóricos proposto por Ricardo, quenão venha a ser debatido pelos economistas, como por exemplo: da teoria do valor,da repartição da renda, do comércio internacional, do sistema monetário, etc. Todasestas questões têm como ponto de partida as formulações expostas, no começo doséculo XIX, por David Ricardo.

BIBLIOGRAFIA

Livros:

LUSO SOARES, Teresa. Temas de Economia Política I. 1ª ed. Lisboa: UniversidadeLusófona, 2009.

MANKIW, N. Gregory. Introdução à Economia. Tradução da 3ª edição norte-americana. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2005.

MARTINEZ, Soares. Economia Política. 10ª Ed. Coimbra: Edições Almedina, 2005.Revista e Actualizada.

Material da Internet:

Wikipédia disponível em: « http://pt.wikipedia.org/ ».