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PLANEJAMENTO E GESTÃO SUSTENTÁVEL DO TURISMO: CONTEXTO SOCIAL, MÉTODOS E ENFOQUES Francisco Antonio dos Anjos, Dr 1 Sara Joana Gadotti dos Anjos, Dra 2 Gregório Jean Varvakis Rados, Ph D. 3 1. INTRODUÇÃO O turismo apresenta-se neste início de século como uma importante atividade social e econômica, não apenas no Brasil, mas em diversos países do mundo, se colocando entre os fenômenos sócio-econômicos da atualidade mais representativos destes novos tempos (PEARCE, 2002). A importância e a abrangência de tal fenômeno estão ligadas diretamente às condições impetradas pela nova ordem emergente, que passou a ser conhecida como revolução pós-industrial, resultante de uma nova conjuntura internacional, de mudanças culturais e de crescimento econômico de setores ligados à informática, serviços e meio ambiente (TRIGO, 1999). O segmento vem ganhando importância mundial devido ao grande impacto que exerce na vida das pessoas e nos seus locais de vivência. A busca pela sustentabilidade e a participação da comunidade local se apresentam como novos desafios para o desenvolvimento de propostas para o planejamento do turismo. Tal desafio está ligado ao princípio de que o desenvolvimento turístico deve se basear no equilíbrio entre a conservação ambiental e cultural, a viabilidade econômica e a justiça social. A discussão sobre turismo responsável ligado a um desenvolvimento sócio- ambiental sustentável vem emergindo tanto junto às comunidades receptoras como também no meio acadêmico, gerando a necessidade de pensar esta temática sob o olhar interdisciplinar em virtude de sua complexidade. 1 Professor e Pesquisador da Universidade do Vale do Itajaí - UNIVALI. 2 Professora e Pesquisadora da Universidade do Vale do Itajaí - UNIVALI. 3 Professor e Pesquisador da Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC

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Page 1: PLANEJAMENTO E GESTÃO SUSTENTÁVEL DO TURISMO

PLANEJAMENTO E GESTÃO SUSTENTÁVEL DO TURISMO:

CONTEXTO SOCIAL, MÉTODOS E ENFOQUES

Francisco Antonio dos Anjos, Dr1

Sara Joana Gadotti dos Anjos, Dra2

Gregório Jean Varvakis Rados, Ph D.3

1. INTRODUÇÃO

O turismo apresenta-se neste início de século como uma importante atividade social

e econômica, não apenas no Brasil, mas em diversos países do mundo, se

colocando entre os fenômenos sócio-econômicos da atualidade mais representativos

destes novos tempos (PEARCE, 2002). A importância e a abrangência de tal

fenômeno estão ligadas diretamente às condições impetradas pela nova ordem

emergente, que passou a ser conhecida como revolução pós-industrial, resultante de

uma nova conjuntura internacional, de mudanças culturais e de crescimento

econômico de setores ligados à informática, serviços e meio ambiente (TRIGO,

1999).

O segmento vem ganhando importância mundial devido ao grande impacto que

exerce na vida das pessoas e nos seus locais de vivência. A busca pela

sustentabilidade e a participação da comunidade local se apresentam como novos

desafios para o desenvolvimento de propostas para o planejamento do turismo. Tal

desafio está ligado ao princípio de que o desenvolvimento turístico deve se basear

no equilíbrio entre a conservação ambiental e cultural, a viabilidade econômica e a

justiça social.

A discussão sobre turismo responsável ligado a um desenvolvimento sócio-

ambiental sustentável vem emergindo tanto junto às comunidades receptoras como

também no meio acadêmico, gerando a necessidade de pensar esta temática sob o

olhar interdisciplinar em virtude de sua complexidade.

1 Professor e Pesquisador da Universidade do Vale do Itajaí - UNIVALI.

2 Professora e Pesquisadora da Universidade do Vale do Itajaí - UNIVALI.

3 Professor e Pesquisador da Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC

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O planejamento turístico integra-se a outros processos de planejamento amplos,

visando promover melhoria econômica, social e ambiental para o local, região ou

país envolvido através do desenvolvimento adequado da atividade turística. Tal

processo está baseado na pesquisa e avaliação, que busca otimizar o potencial de

contribuição ao bem estar do ser humano e ao meio ambiente, minimizando os

impactos ambientais e sociais (HALL, 2001; OMT, 2003). Neste sentido, no

planejamento e gestão do turismo é preciso se ater a todas essas relações para que

se tenha o efeito desejado.

O turismo vem incrementando a economia dos mais diversos destinos, e ao mesmo

tempo promovendo conseqüências sócio-espaciais marcantes para tais localidades

receptoras, particularmente em áreas de maior fragilidade ambiental (litoral,

encostas, complexos vegetais especiais – mangues, pantanal, e outros) ou cultural

(comunidades isoladas, grupos remanescentes, entre outros), sendo que, alguns

locais apresentam dupla fragilidade (ambiental e cultural).

A Organização Mundial do Turismo – OMT (2003) considera como sustentável e

seguro, o turismo que possui entorno humano e institucional envolvendo aspectos

físicos e ambientais capazes de influenciar diretamente nas condições de saúde,

qualidade de vida e segurança das pessoas e comunidades. Isto significa observar

de uma forma ímpar a relação entre os seres humanos, suas atividades e o uso que

fazem do espaço que os envolve.

A complexidade inerente às discussões sobre sustentabilidade desenvolveu várias

tentativas de marcar as suas dimensões. Uma abordagem que tem por mérito

sintetizar as várias dimensões da sustentabilidade foi apresentada por Sachs (2000).

Uma síntese de tais dimensões é apresentada no quadro 1, buscando inclusive

integrar os conceitos para a área do turismo.

A ampliação da discussão sobre sustentabilidade se aproxima da complexidade

inerente ao discurso do turismo sustentável, pois seus princípios devem ir além das

questões ecológicas, pois compreende também a melhoria das condições

econômicas e sociais das populações locais, além da satisfação dos visitantes do

destino.

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DIMENSÃO CONCEITO GERAL CONCEITO NO TURISMO

ECOLÓGICA Proteção e mitigação dos danos

aos elementos naturais

Capacidade de carga do

ecossistema para uso turístico

SOCIAL Equidade Social

Acesso a bens e direitos

Equidade na distribuição dos

benefícios trazidos pelo turismo

CULTURAL Identidade Local

Valorização cultural

Respeito as diferenças

Valorização das minorias

Integração cultural

POLÍTICA Democratização e participação Participação da comunidade local e

dos visitantes nas decisões

ECONÔMICA Equilíbrio no crescimento

econômico

Desenvolvimento econômico dos

destinos turísticos

ESPACIAL Distribuição equilibrada do uso

do território

Uso adequado dos territórios

turísticos

Quadro 1: Dimensões da sustentabilidade e reflexos no Turismo

Quando a sociedade como um todo, e particularmente os governos e a iniciativa

privada, percebem os impactos que o turismo exerce nas comunidades receptoras

(positivos e negativos e de ordem social, econômica a ambiental), gera-se uma

preocupação efetiva da forma como esta atividade vem sendo desenvolvida.

Diversas ações são desenvolvidas em direção ao planejamento do turismo, como

alternativa para reduzir tais impactos, e ao mesmo tempo, potencializar os lucros

obtidos com a atividade turística.

2. MÉTODOS E ENFOQUES DO PLANEJAMENTO E GESTÃO DO

TURISMO.

A partir dos vários métodos de planejamento e gestão foram desenvolvidos e

aplicados em diversas partes do mundo. GÓMEZ (1990, p. 87) considera que tais

modelos podem ser classificados utilizando três critérios:

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a) Espacial: neste critério, o planejamento turístico pode ser dividido em

local, regional, nacional ou internacional. O local é um planejamento em micro

escala, em uma parte limitada do território nacional. O planejamento regional

tem como âmbito uma ou mais regiões de uma nação. E o planejamento

nacional utiliza o âmbito espacial total de um país, com toda a sua

complexidade. No nível de planejamento internacional usa-se como

referência as zonas de fronteiras pertencentes a países vizinhos e a

comunidades internacionais.

b) Temporal: no critério do tempo, o planejamento pode ser dividido em

curto (1 a 2 anos), médio (3 a 6 anos) e longo prazo (6 a 15 anos), sendo que

o planejamento em prazo médio é o mais freqüente.

c) Setorial: sob a perspectiva dos setores de atuação, existem quatro

tipos fundamentais de planejamento turístico: o de litoral, o de áreas de

montanhas, o de espaço rural (interior) e o planejamento turístico de outros

setores.Ainda pode-se identificar outros tipos de planejamento turístico

setorial, como por exemplo, o planejamento temático ou outros subsetores

turísticos (alojamento, formação profissional, etc.)

Tal classificação representa uma aproximação e focalização nas propostas de

planejamento visando dar melhor operacionalidade ao processo.

Uma das classificações mais completas dos diversos métodos do planejamento do

turismo foi apresentada por Hall (2001). A autora identificou quatro abordagens:

fomento, econômica, físico-espacial e comunitária.

a) O fomento: tradicionalmente não envolve os residentes de destinos

turísticos na tomada de decisões e nos processos de planejamento. Baseia-

se na previsão de demanda turística e parte do simples princípio de que o

desenvolvimento turístico é inerentemente bom e promove vantagens para o

anfitrião. Não se atém aos impactos econômicos, sociais e ambientais

potencialmente negativos do turismo e consideram recursos naturais e

culturais como objetos a serem explorados.

b) Abordagem econômica: vê o turismo como uma indústria, que pode ser

usada como ferramenta pelos governos para atingir determinadas metas de

reestruturação e crescimento econômico, de geração de empregos e de

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desenvolvimento regional, por meio de provisão de incentivos financeiros, de

pesquisa, de marketing e de auxílio na divulgação. Normalmente, dá atenção

limitada aos impactos negativos exercidos pelo turismo.

c) Abordagem físico-espacial: refere-se particularmente ao uso do solo e

enfatiza questões relacionadas à capacidade de saturação física e social, aos

pontos de saturação ambiental e aos limites ou índices aceitáveis de

mudança. Por possuir múltiplos objetivos e dimensões, o planejamento

espacial do turismo, muitas vezes parte de padrões que minimizam impactos

negativos do turismo em ambiente físico. Devido à tendência dos destinos

evoluírem e declinarem em relação ao mercado, economicamente e

fisicamente, a abordagem espacial enfatiza a produção de planos de

desenvolvimento de turismo com base nos recursos naturais de uma região e

na capacidade ou limitações de sítios para suportar infra-estrutura turística.

d) Abordagem Comunitária: é uma forma de planejamento que busca

desenvolver a infra-estrutura, assim como oferecer instalações recreativas

para residentes e visitantes por meio dos benefícios econômicos gerados pelo

turismo, envolvendo a comunidade no processo de tomada de decisão. Nesta

direção criam-se programas de desenvolvimento coerentes com as filosofias

culturais, sociais e econômicas do governo e das pessoas que vivem na

região visitada, otimizando a satisfação dos visitantes. Entretanto, os maiores

problemas para a implementação desta abordagem estão ligados à política do

processo de planejamento e das divergências que podem surgir na estrutura

governamental.

Além dos procedimentos apresentados por Hall (2001), pode-se identificar uma

quinta abordagem metodológica que vem sendo aplicada atualmente: a abordagem

sistêmica. Entende-se que embora o planejamento comunitário proporcione a base

para o desenvolvimento, ele precisa ser ampliado, para incorporar aspectos

coordenativos, interativos, integrativos e estratégicos. Uma das formas de

desenvolver a sustentabilidade da atividade turística é convencer o governo e a

indústria do turismo da importância de incorporar princípios de desenvolvimento

sustentável aos planejamentos e ás operações. Para medir o êxito do

desenvolvimento do turismo em uma localidade deve-se utilizar um conjunto de

indicadores de sustentabilidade eficazes que ajudem a determinar em que ponto o

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desenvolvimento turístico se encontra, para onde vai e quanto falta para atingir as

metas definidas. Para escolher os indicadores, deve-se compreender primeiramente,

as metas políticas e de planejamento. Existem várias tipologias de indicadores, e

dentre eles citam-se: os indicadores econômicos, os ambientais e os sociais, que

medem mudanças na economia, no ambiente e na sociedade.

3. PROPOSTAS DE PLANEJAMENTO NUMA ABORDAGEM

SISTÊMICA

Algumas propostas de planejamento e gestão do turismo apresentam uma visão

integrada, sistêmica e complexa em relação ao atual cenário de mudanças. Tais

propostas têm como características comuns o enfoque sistêmico, pois todas têm

uma relação intensa com a visão sistêmica e processual, e são pertinentes aos

referenciais que vem se trabalhando nesta pesquisa e se pretende aprofundar.

Destas propostas foram apresentadas: Planejamento Estratégico de Turismo

(Acerenza, 1987), Processo Integrado de Planejamento do Turismo (Hall, 2001) e

Planejamento e Gestão do Desenvolvimento do Turismo Sustentável (Rebollo et al,

2001). Cada uma em sua especificidade contribui para o avanço epistemológico e

operacional do planejamento e gestão sistêmica do turismo.

3.1. Planejamento Estratégico do Turismo

A proposta se Acerenza (1987) representou um marco inovador dos modelos de

planejamento do turismo, apresentando na obra Administración del Turismo em

meados da década de oitenta, novas concepções que buscavam agregar a visão

sistêmica aos avanços da época na área de estratégia.

Acerenza (1987) afirma que os enfoques anteriores a sua proposta contribuíram

sensivelmente para o conhecimento da atividade turística, mas analisavam o turismo

sob aspecto parcial, focavam somente os interesses das disciplinas. Nas décadas de

sessenta e setenta, momento em que a atividade turística torna-se expressiva no

cenário econômico mundial, o planejamento tinha como finalidade dar respostas e

soluções aos problemas relacionados ao ordenamento do território para fins

turísticos e para as dificuldades econômicas dos países. Devido às limitações dos

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planos turísticos, o desenvolvimento da atividade começou a mostrar efeitos

negativos, por não ter levado em conta fatores sociais, culturais e ecológicos, pois

notadamente dava-se maior ênfase ao desenvolvimento físico. Os problemas iniciais

do planejamento em alcançar os objetivos propostos estavam nos enfoques

simplificadores para resolver os problemas complexos, levando o planejamento a

atingir parcialmente suas metas.

As deficiências dos enfoques tradicionais de planejamento turístico exigiram o

surgimento de novos enfoques, que buscavam abordar o processo de planejamento

turístico de forma integral, através de um desenvolvimento mais harmônico da

atividade turística.

Para Acerenza (1987) o enfoque sistêmico possibilita a compreensão da estrutura e

do funcionamento do fenômeno turístico, pois exige a integração dos conhecimentos

interdisciplinares, que facilitam a identificação, as relações e a interação dos

elementos componentes e interatuantes no sistema com o seu meio, e a influência

que cada elemento tem sobre o outro. Seus estudos foram fortemente influenciados

pela Teoria Geral dos Sistemas, desenvolvidas por Bertallanffy (1975).

A partir destes pressupostos, o autor sugere um modelo que denominou de

Planejamento Estratégico do Turismo. Concebe o Planejamento Estratégico como

aquele que se ocupa das decisões sobre desenvolvimento do turismo, a partir das

altas esferas do poder público, e nas suas palavras é um processo “destinado a

determinar los objetivos generales del dessarollo, las políticas y las estratégias que

guiarán los aspectos relativos a las inversiones, el uso y el ordenamiento de los

recursos utilizables com este fin” (ACERENZA, 1987, p. 73). Esta proposta de

planejamento opta pela ação em longo prazo, ditando as principais diretrizes que

devem ser tomados para o desenvolvimento do turismo.

Acerenza (1992) entende o sistema turístico como um conjunto integrado de

elementos interatuantes destinados a realizar cooperativamente uma função

determinada. O turismo pode ser analisado, como um sistema aberto composto de

cinco elemento.

Destes elementos, um é dinâmico, o turista; três são geográficos: a região geradora,

a rota de trânsito e a região de destino; e um elemento é econômico, a indústria

turística. Esses elementos são ordenados em conexão funcional e espacial, e

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interagem com os fatores físicos, econômicos, sociais, culturais, políticos e

tecnológicos do ambiente onde se desenvolvendo a atividade.

Pode-se observar que os organismos oficiais de turismo não fazem parte do sistema

turístico, desempenham, porém o papel de administrador do desenvolvimento da

atividade turística, oferecendo os fundamentos básicos nos quais se sustenta o

funcionamento do sistema.

De acordo com Acerenza (1987), o sistema turístico é colocado em movimento por

meio do turista pelo deslocamento que realiza entre a sua região de origem - região

emissora e a região de destino – receptora. Para o funcionamento do sistema,

primeiramente há a decisão do turista em viajar. A escolha depende de diversos

fatores, tais como as motivações que levaram o turista a viajar, a imagem que o

turista tem do lugar e as vantagens comparativas existentes entre os diferentes

destinos alternativos. A partir da decisão o turista é requerido um conjunto de

serviços (seja de transporte, alojamento, alimentação, entre outras atividades pública

ou privada.), que são oferecidos em espaços geográficos bem definidos, necessários

para efetivação da viagem.

No sistema turístico o fator deslocamento é um requisito básico, para que o turista

chegue até a região de destino, no qual se localizam a atrações turísticas que

motivaram a viagem. Desta forma, o transporte se torna uma das ferramentas

essenciais para o funcionamento do sistema. Outros elementos constituintes são os

serviços de alojamentos e alimentação que estão altamente condicionados ao

mercado potencial, e também a tudo que diz respeito ao desenvolvimento da

atividade turística.

Todavia, o papel dos organizadores e agentes de viagens no funcionamento do

sistema é também indispensável, devido ao caráter intermediário que eles exercem

entre os prestadores de serviços e o turista, estimulando a atividade do sistema em

seu conjunto.

Os equipamentos de animação turística (facilidades e instalações destinadas ás

atividades recreativas, lazer e diversão), embora não estejam integrados aos

serviços turísticos, estão estreitamente ligados ao sistema turístico, localizados na

região de destino.

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Como o início do funcionamento do sistema turístico depende exclusivamente do

turista Acerenza (1992) entende que há a necessidade de realizar ações que

estimulem o turista a viajar. A principal ferramenta que o sistema turístico dispões

para estimular seu funcionamento é o marketing. O êxito ou o fracasso dos planos

turísticos de desenvolvimento depende de sua eficácia, e, destarte, é essencial que

o destino utilize a adequadamente tal ferramenta, que tem como principal função

estimular o funcionamento do sistema turístico e, por conseguinte, aumentar os fluxo

das correntes turísticas para regiões receptoras. Dialeticamente, a eficácia de tais

ações de marketing depende diretamente do êxito ou fracasso de outras ações do

gerenciamento dos planos turísticos, como o próprio planejamento.

Acerenza (1992) identifica o marketing turístico como todas as ações destinadas á

promoção e venda da oferta turística, com propósito de estimular e influenciar os

visitantes a um determinado destino. É uma série de atividades, que integram em

seu conjunto, um processo que torna possível a transferência de produtos ou

serviços do prestador ao consumidor final (o turista).

Sob o ponto de vista administrativo, Acerenza (1987) descreve o planejamento

turístico como um processo dividido em: planejamento estratégico, relacionado a

tomadas de decisões e o planejamento operacional, ligado à execução do processo

de planejamento através de fases distintas. Para Acerenza (1987, p.73) “ la

planificación estratégica establece los grandes ejes del desarrollo turístico y se

puede definir el proceso destinado a determinar los objetivos generales del

desarrollo, las políticas y las estrategias que guiarán los aspectos relativos a las

inversiones, el uso y el ordenamiento de los recursos utilizables con este fin.” O

planejamento turístico em nível nacional e regional é administrado pelo poder

público, e deve incluir em seu processo, além de uma política geral de

desenvolvimento, a ação conjunta do turismo nacional e internacional, visando o

desenvolvimento da atividade em conjunto. Quanto maior o benefício que as

instâncias de poder instituídas obtenham com o desenvolvimento do turismo, maior

será seu comprometimento. O planejamento em nível estratégico consiste em

adaptar para o momento atual, medidas e decisões que resultaram em efeitos

futuros.

Diante de tais pressupostos o autor desenhou um esquema metodológico destinado

a demonstrar sua proposta de Planejamento Estratégico do Turismo. Cada uma das

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fases se constitui em um processo dividido em sub-processos bastante detalhados

(figura 1). O esquema metodológico de Acerenza (1987) é composto por uma

seqüência de etapas integradas que são:

Figura 1: Esquema do Processo de Planejamento Estratégico em Turismo

Fonte: Adaptado de Acerenza,1987..

a) Análise da gestão: é a análise dos planos e programas turísticos

executados pelo estado (organismo nacional de turismo). Essa análise irá

subsidiar o controle e avaliação da gestão.

b) Avaliação da situação do turismo: o objetivo dessa fase é avaliação do

turismo partindo das prioridades nacionais de desenvolvimento econômico e

social, do impacto da atividade turística sobre a comunidade e a expectativa

do sistema turística quanto ao desenvolvimento do turismo. Verifica-se a

situação do ponto de vista do apoio econômico e social que o setor turístico

tem recebido por parte do governo para impulsionar os planos de

desenvolvimento. Finalmente, identificam-se e avaliam-se os problemas e as

oportunidades existentes para o desenvolvimento do turismo.

c) Formulação da política do turismo: esta fase é destinada a determinar

os objetivos gerais do desenvolvimento turístico e formular uma política para

orientar as ações a serem executadas no decorrer no plano de

desenvolvimento.

d) Determinação das estratégias de desenvolvimento: O primeiro passo é

identificar o produto/ mercado para cada tipo de turismo que pretende

desenvolver, depois se deve analisar o potencial do mercado em longo prazo,

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e estudar a concorrência finalizando, com a avaliação da capacidade

competitiva dos produtos. Após esses passos se analisam os recursos

econômicos, humanos e tecnológicos exigidos para o desenvolvimento e a

possibilidade de exploração de cada oportunidade do produto em busca de

estratégias alternativas, procurando determinar as estratégias mais

adequadas para o desenvolvimento dos objetivos específicos nos quais se

encontram os distintos programas de ações.

e) Especificação dos programas de ação: essa etapa é o ponto de partida

para a planificação operacional, e se constitui em linhas de ações baseadas

em cinco campos básicos de desenvolvimento turístico:

• Organização institucional;

• Fomento e desenvolvimento;

• Marketing e promoção turística;

• Formação de recursos humanos; e

• Programação financeira.

Enquanto o planejamento estratégico é realizado em longo prazo ou período dentro

do qual se pretende obter os resultados desejados, o planejamento operacional está

ligado aos aspectos operacionais do desenvolvimento e conseqüentemente aos

níveis de execução de distintos programas destinados ao fomento e

desenvolvimento do turismo que se encontra ligado aos aspectos do setor público.

O controle e a gestão da atividade turística são necessários para que a mesma

consiga atingir seus objetivos. Através de programas de ações orientados para o

cumprimento das metas e objetivos propostos. Por este motivo é necessário criar um

sistema de informação e controle de gestão que permita avaliar a gestão nos mais

distintos níveis de direção, antes de uma tomada de decisão. Acerenza (1987, p.

147) descreve o sistema de informação e controle como “una continua e

interactuante estructura de personas, equipos y procedimientos diseñados para

reunir, clasificar, analizar, evaluar y distribuir información exacta y a tiempo, con el

fin de que la utilicen quienes toman decisiones en los campos de la planificación, la

ejecución y el control”.

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Devido à complexidade das informações do setor turístico o sistema é dividido em

três subsistemas: as informações internas, a investigação do mercado e a

inteligência de mercado.

O subsistema de informações internas é o conjunto de procedimentos destinados a

proporcionar dados em forma periódica e resultados atualizados sobre as ações que

estão sendo executadas. O subsistema de investigação de mercados dentro do

enfoque de sistema é definido como a análise e divulgação de dados relativos a uma

situação específica de comercialização, composta de informações relativas ao

mercado. E o subsistema de inteligência de mercados tem como finalidade alertar a

administração, sobre acontecimentos relacionados a ações dos mercados

concorrentes no campo da comercialização, para que a administração possa reagir

de forma oportuna e adequada.

O segundo elemento do sistema de informação e controle está ligado ao controle e

avaliação da gestão em desenvolvimento. O terceiro elemento está relacionado à

tomada de decisão final e, portanto, à medida que se observa o processo de

desenvolvimento, é necessário realimentar o sistema.

A proposta de Acerenza (1987) contribui significativamente para as formas de se

entender o planejamento num cenário mais complexo das relações sociais e

econômicas locais e globais. Apresenta para isso, uma proposta com maior grau de

complexidade, numa perspectiva integrada e com uma visão estratégica. Além de

ver o planejamento num enfoque administrativo, a sua divisão das ênfases do

planejamento na estratégia e operação, cria a possibilidade de melhor controle e

avaliação do processo de planejamento.

Para contribuir nesta direção, o autor desenha um sistema de informações que

busca garantir a sustentação informacional e a dinamicidade de todo o processo. No

entanto, talvez a riqueza de detalhes e a sua complexidade dificultam a

aplicabilidade de tal proposta, porém considera-se extremamente válida, não apenas

pelas reflexões metodológicas e teóricas para a área do turismo, mas

particularmente um divisor de águas entre as propostas simplificadoras e positivas,

para as propostas integradas e complexas.

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3.2. Processo Integrado de Planejamento do Turismo

Hall (2001) desenvolve uma proposta de planejamento baseada no paradigma, com

forte interferência das questões políticas e ecológicas, que considera essenciais

para o ato de planejar. Entende que o planejamento exige que se dê ênfase às

metas, as informações contínuas, a simulação e a projeção de futuros alternativos, a

avaliação, a seleção e monitoramento contínuo. O planejamento do desenvolvimento

precisa conceber o turismo como um processo complexo, e só entendido na sua

totalidade a partir de uma visão integradora, multidisciplinar e sistêmica.

Tradicionalmente, preocupava-se com a descrição detalhada da situação em função

dos padrões dos usos a serem desenvolvidos. Nos cenários atuais tais ações

concentram-se nos objetivos dos planos e nas estratégias que contribuem para

atingir tais objetivos. Com isso, Hall (2001) reitera a concepção de que a gestão do

desenvolvimento do turismo continua se apresentando como uma ação importante

pelos seus efeitos potencialmente duradouros e marcadamente significativos para os

espaços turísticos.

Hall (2001) entende que o turismo quando analisado como processo sistêmico, pode

tornar a realidade mais compreensível. A estrutura de um sistema é formada por

elementos, que é sua unidade básica, e os relacionamentos entre eles. Para Hall

(2001, p.71) “sistema é um objeto de estudo que abrange: um conjunto de

elementos; um conjunto de relacionamentos entre os elementos; e um conjunto de

relacionamentos entre esses elementos e o meio ambiente”. Um dos maiores

entraves na compreensão dos elementos pertencentes a um sistema é a escala de

atuação. Outra questão fundamental é a definição clara dos limites deste sistema. A

clareza nas escalas e limites dos sistemas são fundamentais, pois, geralmente, os

problemas de planejamento surgem quando diferentes limites em variadas escalas

de diferentes sistemas se sobrepõem.

Nesta direção cabe ao planejamento fornecer recursos para uma tomada de decisão

democrática e com base no conhecimento efetivo do sistema, assim como a

compreensão do processo, do fluxo e da mudança é fundamental para uma visão do

mundo voltada para sistemas.

Na atividade turística, um sistema pode ser entendido como uma reunião ou

combinação de fatos ou partes que formam uma operação complexa ou unitária.

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Existem pelo menos duas formas de se analisar o sistema turístico. Em termos

geográficos, pode-se identificar o sistema turístico a partir de três elementos básicos

que o compõe. Esta visão também é apresentada no modelo de Acerenza (1992) e

suas três componentes são: a região geradora, a rota ou região de trânsito e a

região de destino. A globalização através de suas grandes mudanças no sistema

econômico e cultural e os grandes avanços na área de tecnologia da informação e

da comunicação trouxe imensas implicações para setor de planejamento turístico,

manifestadas numa nova forma de relacionamento dos lugares, e destes, com os

sistemas do qual fazem parte.

Além da visão geográfica, o sistema turístico pode ser visto através do prisma

comercial, segundo a orientação apresentada por Mil e Morrison (apud Hall, 2001).

Nesta visão, o sistema turístico consiste de quatro partes:

• o mercado, que se refere à decisão do indivíduo de viajar e se tornar turista;

• a viagem, que descreve e analisa, quando e como se comporta o turista

individual;

• o destino, que consiste em um estudo do mix de destino, as atrações e

serviços usados pelo turista;

• o marketing, que ressalta a importância de encontrar pessoas para viajar.

Para se compreender o sistema do turismo e seu planejamento também é

necessário considerarmos outros aspectos além da visão geográfica e comercial,

como a questão da escala de análise turística e o ponto de vista do espectador ou

participante no processo de planejamento. Também é preciso levar em conta à

complexidade existente entre os múltiplos grupos de relacionamentos horizontais e

verticais e o ambiente da política e do planejamento turístico.

No planejamento turístico, as escalas podem ser em níveis nacionais, estaduais,

regionais e locais e, portanto, o processo de planejamento deve acomodar diferentes

escalas e as ligações e relacionamentos que ocorrem entre elas.

Os planejadores agem sobre processos sociais, físicos, econômicos e políticos,

procurando conduzir a sociedade aos objetivos desejados. Todavia, para o

desenvolvimento de um planejamento sustentável na área turística é essencial que

se desenvolva um planejamento estratégico. Este, por sua vez, é o resultado de um

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plano de orientação para futuros rumos, atividades e ações que devem ser avaliadas

num período que varia de curto ao longo prazo.

Hall (2001) entende que o planejamento estratégico deve ser holístico, integrado e

abrangente, pois o turismo é um sistema de variáveis sociais, econômicas, físicas e

políticas inter-relacionadas. Devem levar em conta o fluxo de informações, as

influências e os desejos a partir de uma esfera local para uma global. Tal

planejamento requer a participação de vários níveis da organização ou unidade do

governo e entre a organização responsável e as partes interessadas no processo de

planejamento, de forma interativa ou colaborativa. Esse processo deve promover o

bem coletivo entre as partes interessadas no desenvolvimento turístico em busca de

resultados comuns. Esta ação pode ser realizada através de auditorias, que auxiliam

o planejador na identificação de interesses e valores de grupos e indivíduos,

interessados no processo. As auditorias e os monitoramentos constantes são tarefas

essenciais na avaliação de um planejamento estratégico. Para melhor avaliação é

necessária à utilização de indicadores, que ajudem no cumprimento das metas e dos

objetivos.

É essencial que os planejadores se envolvem com os lugares que pretendem

planejar, uma combinação de teorias formais e informais. A maior dificuldade para

um planejador é em relação à diversidade de valores e interesses existentes, que

podem fornecer fontes de flexibilidade, resistência e inovação em tempos de

mudança. Nesta direção, o planejamento turístico se coloca como um processo em

constante mudança e sendo necessário à compreensão dos rumos dessas

mudanças para tentar influenciá-las e adaptá-las adequadamente a atividade

turística em desenvolvimento. Para Hall (2001) o planejamento turístico deve ter

natureza colaborativa e estratégica e tem suas bases colocadas no desenvolvimento

sustentável, sob uma visão sistêmica da realidade.

Esta perspectiva promove o entendimento de que o planejamento não é uma

atividade racional e sim altamente política. Portanto segundo tal análise, deve ser

compreendido como um estilo de governo. Para melhor entendimento do fenômeno

turístico em especial na área política, é necessário à utilização da análise dialética,

para compreensão de processo, relações e fluxos sobre os elementos e estruturas

do sistema turístico.

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A ação do Estado no planejamento do turismo tem grande significado, pois

desempenha o papel de coordenador e planejador no desenvolvimento público da

atividade turística, dentro de diferentes esferas e entre as muitas organizações

turísticas governamentais, e ainda, com o setor privado. Todavia o governo também

pode exercer o papel de empresário no turismo, pois além de fornecer infra-estrutura

básica, acesso e saneamento, pode ser proprietário e dirigir empreendimentos

turísticos como hotéis e empresas de viagens. Muitas vezes, também incentiva o

desenvolvimento turístico: através de patrocínio ou como incentivador do marketing

e divulgação. Desempenha também o papel de defensor público, buscando

equilibrar vários interesses e valores, mediando às relações entre os interesses

públicos ou privados, locais, regionais e nacionais. O principal obstáculo do

planejamento turístico no âmbito político é a coordenação das diferentes

organizações e órgãos públicos e privados, envolvidos no processo de

planejamento, pois é necessário um trabalho que busque objetivos políticos comuns

para o desenvolvimento de estratégias eficientes.

Portanto, o planejamento turístico baseado numa ação relacional entre a diferentes

níveis e diferentes elementos do sistema, de natureza mais colaborativa, e da

análise sistêmica oferece ao planejador os recursos relacionais necessários para

realizar adaptações e mudanças adequadas num ambiente global. A partir dessas

considerações Hall (2001) sugere que o processo de Planejamento estratégico do

Turismo precisa seguir algumas fases (Figura 2). Esse processo é apresentado em

três fases:

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Figura 2: Planejamento Estratégico (Processos)

Fonte: Elaborado a partir de Hall, 2001.

1a. Fase - Onde queremos chegar? Primeiramente nos processos de

planejamento precisa-se identificar as metas que se pretende alcançar,

ordenar por importância e buscar a adequação entre tais metas. Hall

(2001) indica que a seleção destas metas precisa ser acompanhada de

uma visão estratégica, e devem estar de acordo com a missão e filosofia

do turismo pretendido. Esta fase, em especial, terá um caráter interativo

ou colaborativo, envolvendo todas as partes interessadas no processo.

2a. Fase – Como chegar lá? Nesta fase, Hall identifica problemas de

sintonia entre os órgãos públicos e os setores privados. A própria

estrutura governamental dificulta a coordenação dos elementos do

processo. Tais situações problemas podem ser reduzidas ou minimizadas

com uma coordenação colaborativa e interativa. Essa ação pode ao

mesmo tempo criar maior colaboração e cooperação entre os diversos

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grupos integrantes, como garantir o desenvolvimento de melhores

condições de suportar o ambiente de mudança que envolve o processo

de planejamento. Hall (2001) dá ênfase ao uso da auditoria como

ferramenta administrativa, assim como a partilha de poder como bases

sólidas para a sustentabilidade.

3a. Fase – Como saber que chegamos lá? Essa fase passa pela avaliação

e monitoramento do desempenho, visando determinar se as metas e os

objetivos foram cumpridos. A avaliação se constitui em um processo

contínuo, assim como um elemento chave do pensamento estratégico.

Retorna-se nesta fase a idéia de auditoria como ferramenta de

monitoramento. Para isso, os indicadores representam papel crucial na

avaliação de desempenho. Indicadores eficazes, enquanto unidades ou

conjuntos, garantem a mensuração da eficácia do processo de

planejamento.

A proposta de Hall (2001) apresenta de forma simples a ação do processo de

planejamento. Suas maiores contribuições estão ligadas à emergência da questão

política no planejamento, buscando registrar as principais limitações fora do cenário

racionalista-tecnicista. Desta forma, vê que as grandes problemáticas enfrentadas

pelo planejamento são de ordem social (econômica, política e cultural) do que

técnica, como comumente era alegada no fracasso de inúmeras propostas. Também

convém salientar, as visões estratégicas e sistêmicas que tal proposta incorpora,

corporificando a proposta e colocando no cenário de outras mais abrangentes e

integradores, pertinentes as discussões e realidades do mundo atual.

3.3. Planejamento e Gestão do Desenvolvimento Turístico

Sustentável

A proposta de planejamento e gestão do desenvolvimento turístico sustentável,

conhecido como projeto METASIG, foi desenvolvida por um grupo de pesquisadores

de universidades espanholas, coordenado pelo Instituto Universitário de Geografia

da Universidade de Alicante (Espanha). Sua proposta está estruturada em um

sistema de indicadores de sustentabilidade nos processos de desenvolvimento

turístico com o emprego de um Sistema de Informações Geográficas (SIG). Sua

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análise e planejamento requerem a investigação de distintos componentes e fatores

territoriais, econômicos, sociais e ambientais. O principal aspecto deste processo

metodológico é a utilização de uma visão global e inter-relacionada destes

componentes e fatores relativos ao planejamento sustentável do turismo.

O modelo de relações entre turismo e desenvolvimento sustentável foi adaptado

pelo projeto METASIG do modelo DPSIR (driving forces - pressure- state – impact –

response) criado pela Agência Européia de Meio Ambiente.

De forma geral oferece um esquema de interpretação geral das relações entre o

turismo e o desenvolvimento. A estrutura do modelo DPSIR incorpora as causas de

pressão, de impactos e conseqüências das modificações das condições ambientais

do meio ambiente e da saúde humana.

O esquema DPSIR aplicado à atividade turística possibilita a interpretação geral das

relações entre o turismo e o desenvolvimento sustentável, e em virtude da

complexidade do paradigma da sustentabilidade e dos próprios processos e

modelos de planejamento turístico, exigem a criação de sistemas de indicadores

adaptados as diferentes realidades locais.

A proposta está baseada nos princípios da sustentabilidade, e requer a realização

de análises e atualizações em diversas escalas, compreendendo problemas globais,

regionais e locais, buscando uma forma de tratar o fenômeno turístico numa

dimensão global. Como a própria dinâmica da atividade turística requer a visão

espacial do turismo em diversas escalas, gera-se a possibilidade de conhecer os

impactos econômicos, ambientais e sócio-culturais do turismo, bem com os

interesses e as aspirações da sociedade local, possibilitando também a melhor

avaliação do comportamento da demanda turística e seu nível da satisfação.

Desta forma é indispensável que os sistemas locais de indicadores de

desenvolvimento turístico sustentável contemplem outras escalas, que permitam

uma melhor aproximação aos efeitos globais e regionais do turismo numa

perspectiva territorial.

A sustentabilidade do desenvolvimento turístico exige a elaboração de metodologias

integradas, abrangendo questões ecológicas, econômicas e sócio-culturais, e a

formulação de estratégias em longo prazo, que insiram o turismo dentro de uma

perspectiva de desenvolvimento com objetivos de continuidade.

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A aplicação dos princípios e conceitos de sustentabilidade no campo do turismo é o

ponto de partida para o desenvolvimento operativo. A noção entre o equilíbrio dos

objetivos sociais, econômicos e ambientais do desenvolvimento sustentável,

conforme se refere Hall (2001) é o argumento central do modelo de turismo

sustentável. Deste modo, identifica-se o desenvolvimento turístico sustentável como

um processo de mudanças qualitativas, produto da vontade política juntamente com

a participação da população local.

A participação da população social no planejamento e gestão do desenvolvimento

turístico é o ponto de equilíbrio entre a preservação do patrimônio natural e cultural,

a viabilidade econômica do turismo e a igualdade social do processo de

desenvolvimento.

O planejamento que vise o desenvolvimento sustentável exige a criação de

indicadores que se adapte de forma integrada e multidimensional aos processos de

desenvolvimento. Os indicadores usados no METASIG, basicamente são de ordem

econômica, sócio-cultural e ambiental, objetivando a manter a prosperidade da

população local e sua identidade cultural, assim como a preservação dos atrativos

turísticos e o mínimo impacto ao meio ambiente. Através do uso dos indicadores é

possível compreender a situação atual do desenvolvimento turístico, prever, prevenir

e até mesmo antecipar e solucionar problemas sobre determinados aspectos do

desenvolvimento sustentável.

A proposta cria um sistema de indicadores para o processo de planejamento, que

possibilitará um adequado diagnóstico territorial e turístico do ponto de vista da

sustentabilidade, fundamentadas em propostas de atuação, e que permite

periodicamente avaliar a eficiência das medidas adotadas.

A criação do sistema de indicadores implica em uma construção técnico-científica,

amparada em uma valorização social, com parâmetros de valores representativos

sobre os processos relacionados ao desenvolvimento sustentável. A chave para

criação de um sistema de indicadores está na capacidade da obtenção de

informações significativas sobre os distintos componentes da sustentabilidade, de

acordo com os objetivos a serem alcançados. Estes indicadores são selecionados

de acordo com uma série de requisitos e critérios, criados no próprio processo de

planejamento.

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Para criação de um bom sistema de indicadores é necessário que o conjunto de

informações disponíveis seja de qualidade, objetivas e constantemente atualizadas

de acordo com as características de cada variável em estudo. Os indicadores

demográficos, sociais, culturais, econômicos, institucionais e setoriais, necessitam

da integração de informações de diversas naturezas, devido ao seu caráter territorial

e multisetorial.

Os sistemas básicos de indicadores apresentados pela Agência Européia de Meio

Ambiente tem um caráter territorial. Estes indicadores permitem distinguir entre os

distintos tipos de espaços turísticos, o grau de desenvolvimento, e outras

características que influenciam na evolução da atividade turística. A aplicação de

critérios de classificação de indicadores favorece a criação de sistemas de

indicadores adaptados aos distintos modelos de turísticos e ajudam na comparação

e intercâmbio de experiências. O modelo DPSIR possibilitou a criação de sistemas

de indicadores que permitem reconhecer a variabilidade dos sistemas de

planejamento territoriais e turísticos e a influência direta das pressões da atividade

turística e os impactos que provocam as políticas de resposta.

Os sistemas de indicadores se organizam em quatro conjuntos que se inter-

relacionam: modelo territorial-turístico, de pressão, estado/qualidade e resposta

política e social (Figura 3).

Figura 3: Organização do sistema de indicadores para o planejamento e gestão do turismo.

Fonte: Adaptado de Rebollo et al (2001)

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Este esquema representa uma síntese de uma proposta de indicadores para o

desenvolvimento turístico sustentável, que tem como objetivo tornar-se um marco de

referência aos processos de planejamento e gestão dos espaços turísticos.

Os conjuntos de indicadores que compõem cada uma destas áreas contêm níveis de

concretização variáveis, sendo que isto possibilita a adaptação destes sistemas, em

processos de planejamento turístico nas mais diversificadas regiões.

A proposta de sistema de indicadores, modelo apresentado no projeto METASIG,

compreende não só a utilização de tal sistema aplicado à atividade turística, mas o

planejamento e a gestão do turismo agregando a visão sistêmica e tendo como base

o paradigma da sustentabilidade (Rebollo et al, 2001).

4. Contribuições das Propostas Sistêmicas Apresentadas

As propostas sistêmicas apresentadas possuem, além da perspectiva sistêmica,

pontos em comum e certa divergência em termos de operacionalização do

planejamento e gestão do turismo.

Acerenza (1987, 1992) desenvolve uma proposta percebendo o sistema turístico

como um fato dinâmico, notadamente ligado pelo elemento turista. Como no sistema

os elementos se inter-relacionam, todo o sistema se caracteriza pela dinamicidade.

Além disso, vê o processo de planejamento e gestão do turismo em dois níveis

gerenciais: o estratégico e o operacional. Cada nível tem objetivos e momentos

diferentes, salientando as ações políticas e técnicas que envolvem o planejamento.

Também se destaca que tal proposta salienta a necessidade de controle do

processo, exigindo a criação de um sistema de informação e controle do

planejamento e da gestão.

Hall (2001) destaca a estratégia e a colaboração no processo de planejamento como

ações que podem contribuir decisivamente para dar um caráter sustentável.

Concebe o planejamento e a gestão como ações relacionadas, que buscam

minimizar os conflitos através da colaboração e interação. Também salienta a

necessidade de controle do processo, elegendo a auditoria como ferramenta de

monitoramento. O controle é feito através de um conjunto de indicadores que

buscam garantir a eficiência e a eficácia do planejamento e da gestão.

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O projeto METASIG foca as bases do processo de planejamento e gestão em um

sistema de indicadores integrados. A caracterização deste sistema está na sua

valoração cultural, garantindo a eficiência através de requisitos e critérios de

avaliação com base em um sistema de informações atualizado, de qualidade e

objetivo representando ao máximo a complexidade social, econômica e ecológica.

Devido ao caráter territorial deste tipo de planejamento e gestão, o sistema deve ser

multi-escalar e multi-setorial.

Enfim, mesmo com enfoques diferentes: na economia, na política, na estratégia e na

sustentabilidade, as propostas têm muitas convergências onde se salienta:

• planejamento e gestão estratégicos;

• necessidade de desenvolvimento de um sistema de informações

pertinentes aos objetivos;

• sistema de indicadores amplo e integrado;

• processo colaborativo com viés altamente político;

• caráter sistêmico e processual.

Com base nestas convergências é necessário que se delineie uma proposta que

incorpore as contribuições dos diversos modelos, num modelo sistêmico, que

incorpore as novas evoluções das áreas gerenciais, os aprofundamentos das

abordagens metodologias e os avanços da tecnologia.

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