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1 UCAM - UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES AVM - A VEZ DO MESTRE CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” (ESPECIALIZAÇÃO) EM DIREITO NAS RELAÇÕES DE CONSUMO PLANO DE SAÚDE X DIREITO DO CONSUMIDOR: DESVIO DE FINALIDADE Felipe Thomaz Biondi Angra dos Reis/RJ 2009

PLANO DE SAÚDE X DIREITO DO CONSUMIDOR: DESVIO DE … · O CDC, lei n.º 8078 de 1990, se baseia em normas para as relações privadas, o produtor, o fabricante e o intermediário

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UCAM - UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES AVM - A VEZ DO MESTRE

CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” (ESPECIALIZAÇÃO) EM DIREITO NAS RELAÇÕES DE CONSUMO

PLANO DE SAÚDE X DIREITO DO CONSUMIDOR: DESVIO DE

FINALIDADE

Felipe Thomaz Biondi

Angra dos Reis/RJ 2009

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UCAM - UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES AVM - A VEZ DO MESTRE

CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” (ESPECIALIZAÇÃO) EM DIREITO NAS RELAÇÕES DE CONSUMO

PLANO DE SAÚDE X DIREITO DO CONSUMIDOR: DESVIO DE

FINALIDADE

Felipe Thomaz Biondi

Angra dos Reis/RJ 2009

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A Deus que sempre me guiou me dando força e inspiração nesta estrada da vida, derrubando os obstáculos na busca constante de um ideal, que nem sempre julguei capaz de alcançar, mas que hoje, como uma dádiva, acaba por se concretizar.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus por me dar saúde, coragem e principalmente força para

vencer todos os obstáculos do meu caminho.

A minha família que souberam entender meu comprometimento com esse

Curso.

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“Justiça atrasada não é justiça, senão injustiça qualificada e manifesta.”

Rui Barbosa

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RESUMO

Mostrar que a nova lei nº. 9.656/98 apresenta descrédito dos seus usuários, relatar que atualmente a lei dos planos de saúde desrespeita dignidade do ser humano e expor que diversas vezes o Código de Defesa do Consumidor-CDC tem sido invocado para dirimir os conflitos entre as operadoras de saúde e os cidadãos, foram os objetivos deste estudo. Seus resultados apontaram que desvio de finalidade tem sido a cada dia motivo de ações judiciais e constrangimento para os usuários no momento de sua utilização, onde entra o CDC com o objetivo de dirimir os conflitos entre as operadoras de saúde e os cidadãos. Diante deste contexto é notório que o que se busca é o respeito à vidas humanas, que cada vez mais estão sendo colocadas a mercê da própria sorte, essas pessoas correm riscos de vida e se sentem prejudicadas pelas operadores de planos de saúde . Chegou a hora dessas operadoras não mais visar lucro tão somente e sim se preocuparem com o bem estar dos cidadãos.

Palavras-chave: Plano de Saúde. Desvio de finalidade. CDC.

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ABSTRACT

To show that the new law nº. 9.656/98 present discredit of its users, to tell that currently the law of the health plans disrespects dignity of the human being and to display that diverse times the Code of Defense of Consumer has been invoked to nullify the conflicts between the operators of health and the citizens, they had been the objectives of this study. Its results had pointed that purpose shunting line has been to each day reason of legal actions and constaint for the users at the moment of its use, where enter the CDC with the objective to nullify the conflicts between the operators of health and the citizens. Ahead of this context he is well-known that what searchs is the respect to the lives human beings, who each time more are being placed the grace of the proper luck, these people run life risks and if they feel harmed by the operators of health plans. The hour of these operators arrived more not to aim at profit and yes if so only to worry about the welfare of the citizens. Word-key: Plan of Health. Shunting line of purpose. CDC.

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LISTA DE ABREVIATURAS

CDC - Código de Defesa do Consumidor

ANS - Agência Nacional de Saúde Suplementar

CONSU - Conselho de Saúde Suplementar

SUS - Sistema Único de Saúde

CDI - Código Internacional de Doenças

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO...................................................................................................... 10

2 CÓDIGO DE DEFESA DE CONSUMIDOR.......................................................... 12

2.1 CONTRATOS.................................................................................................... 14

2.1.1 Conceito, evolução e caracteres do contrato............................................ 16

2.2 CLÁUSULAS CONTRATUAIS GERAIS............................................................ 18

2.2.1 Cláusulas Abusivas...................................................................................... 18

3 PLANOS DE SAÚDE........................................................................................... 22

3.1 A FUNÇÃO SOCIAL DAS EMPRESAS E DO CONTRATO À ASSISTÊNCIA

À SAÚDE..................................................................................................................

4 PLANO DE SAÚDE X DIREITO DO CONSUMIDOR: DESVIO DE FINALIDADE..........................................................................................................

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5 CONCLUSÃO...................................................................................................... 30

BIBLIOGRAFIA....................................................................................................... 31

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1 INTRODUÇÃO

Grandes mudanças vêm ocorrendo no mercado dos planos de saúde, que ao

invés de ter como prioridade a comodidade e a tranquilidade dos cidadãos traz

transtornos a estes. A Lei nº 9.656/98 devido seu desvio de finalidade causa

prejuízos e riscos aos seus usuários.

Os contratos de planos de saúde são contratos de longa duração, estes

implicam numa obrigação de resultado, o que cria no consumidor a sensação de

estar protegido.

Tendo permissão para a assistência a saúde privada, os planos de saúde têm

certamente o objetivo de lucro, mas, a contrapartida desta relação seria um serviço

de qualidade, que assegure a saúde do contratante, acima de tudo respeitando os

moldes constitucionais.

Os planos de saúde foram criados para facilitar a vida dos cidadãos, já que a

saúde pública no Brasil se apresenta de forma precária. Diante do contexto, cabe

acrescentar que a partir da Lei nº. 9.656/98 as operadoras de plano de saúde

passaram a agir de forma arbitrária, desrespeitando os cidadãos e visando somente

a lucratividade.

A nova lei dos planos de saúde trouxe consigo para seus usuários aumento

abusivos, exclusões de coberturas, a falta entre outras.

Dispor a respeito das cláusulas abusivas advindas na nova lei dos planos de

saúde, mostrar que a nova lei Lei nº. 9.656/98 apresenta descrédito dos seus

usuários, relatar que atualmente a lei dos planos de saúde desrespeita dignidade do

ser humano e expor que diversas vezes o Código de Defesa do Consumidor-CDC

tem sido invocado para dirimir os conflitos entre as operadoras de saúde e os

cidadãos, são os objetivos deste estudo.

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Sendo a saúde de ordem pública, surge o interesse descrever a respeito das

cláusulas contratuais abusivas impostas pelos planos de saúde no momento de sua

contratação, onde os consumidores são pegos de surpresa mais adiante, ou seja, no

momento de sua utilização.

A saúde brasileira já é precária, como se não bastasse os cidadãos sê vê

obrigados a pagar por um atendimento, mas justo e digno, no entanto se depara

com outro problema: o desvio de finalidade dos planos de saúde.

O estudo em questão será realizado através de pesquisa bibliográfica e

telematizada. O estudo e a coleta de dados foram desenvolvidos através da internet

por meio de artigos relacionados ao tema, sem prejuízo da pesquisa bibliográfica

tradicional. Revisão da literatura em livros, revistas, periódicos, dissertações e

legislações.

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2 CÓDIGO DE DEFESA DE CONSUMIDOR

A necessidade de proteção de normas ao consumidor surgiu no Brasil nos

meados da década de 70. Essa necessidade surgiu da deficiência por parte das

intervenções estatais nas relações de consumo.

Foi baseado na importante contribuição dada pelas associações específicas de

consumidores, em seguida pela Constituição de 1988, posteriormente, com o CDC.

A preparação do CDC – Lei nº 8.078/1990 se deu graças a manifestações de

um Conselho de Defesa do Consumidor, com uma comissão de juristas

capitaneados pela competente Ada Pellegrini Grinover.

O CDC, lei n.º 8078 de 1990, se baseia em normas para as relações privadas,

o produtor, o fabricante e o intermediário e os adquirentes, pessoas físicas ou

jurídicas, que se servem dos bens ou serviços. Essas relações são chamadas de

relações de consumo, o qual protege o consumidor, uma vez que este se encontra

muitas vezes em desvantagem face aos complexos empresariais.

Código significa um conjunto sistemático e logicamente ordenado de normas

jurídicas, guiadas por uma idéia básica; no caso do CDC, é a defesa de um grupo

específico de pessoas, os consumidores1.

O CDC é considerado como uma lei de função social que consiste em um

conjunto sistemático e logicamente ordenado de normas jurídicas e princípios com

objetivo de proteger um grupo específico e especial de indivíduos denominados de

consumidores e estabelece os fundamentos sobre os quais se edifica a relação

jurídica de consumo, de modo que toda e qualquer relação de consumo deve

submeter-se à principiologia nele disposta.

As leis de função social caracterizam-se por impor noções valorativas, com

objetivo de orientar a sociedade, positivando uma série de direitos assegurados ao

grupo tutelado e impondo uma série de novos deveres imputados a outros agentes 1 MARQUES, Cláudia Lima et al. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor: arts. 1º à 74: aspectos materiais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 53.

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da sociedade, os quais, por sua profissão ou pelas benesses que recebem,

considera o legislador que possam e devam suportar estes riscos.

Segundo Nunes:

A lei 8.078/90 que deu origem ao Código de Defesa do Consumidor ingressou no sistema jurídico de forma horizontal, atingindo toda e qualquer relação jurídica na qual se possa identificar num pólo o consumidor e em outro o fornecedor transacionando serviços2.

O objeto de regulamentação pelo CDC é a relação de consumo, assim

entendida a relação jurídica que possui como sujeitos um consumidor e um

fornecedor, tendo como objeto a aquisição de um produto ou a utilização de um

serviço e buscando-se uma finalidade que seja a compra de um produto ou a

prestação de serviços, como destinatário final.

O intuito da Lei n. 8.078/90, a qual instituiu o CDC foi equilibrar a relação

contratual firmada entre fornecedores e consumidores, onde estes se encontram

hiposuficientes em relação àqueles. Essa tem fundamento na Constituição Federal

de 1988.

Neste contexto delimita-se afirmando que cabe este estudo mostrar a relação

entre do CDC e os usuários de plano de saúde. Sendo este ultimo um dos direitos

previstos no CDC (Lei 8.078, de 11 de setembro de 1.990)3.

Conforme assevera o próprio CDC:

Isso decorre da combinação dos artigos 2º e 3º do CDC, posto que o usuário é pessoa física que adquire e utiliza serviço como destinatário final (art. 2º do CDC), e o plano de saúde é pessoa jurídica de direito privado que desenvolve atividade de comercialização e de prestação de serviço (art. 3º do CDC).

A própria legislação específica da saúde suplementar prevê a aplicação do

CDC aos contratos de plano de saúde, de forma subsidiária.

2 NUNES, Rizzatto. O Código de Defesa do Consumidor e os planos de saúde: o que importa saber. Revista de Direito do Consumidor, São Paulo, v. 12, n. 48, p. 85-88, out./dez. 2003. 3 SANTOS, Rodrigo. Os contratos de planos de saúde à luz do Código de Defesa do Consumidor. Disponível em: http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/4254/Os-contratos-de-planos-de-saude-a-luz-do-Codigo-de-Defesa-do-Consumidor.

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Segundo Maranhão:

Muito embora os planos de saúde estejam regulados por normas específicas (...), a própria Lei 9656/98 indica no art. 35-G que se aplicam subsidiariamente aos contratos entre usuários e operadoras de planos privados de saúde as disposições do CDC4.

Nas palavras do autor acima citado por se tratarem de normas protetivas do

consumidor, a subsidiariedade consiste na agregação dos direitos garantidos pelo

CDC aos já previstos na legislação específica.

2.1 A RELAÇÃO DE CONSUMO

A relação de consumo é o objeto no qual se baseia o Direito do Consumidor. É

no âmbito daquela que o consumidor e o fornecedor obterão direitos e deveres entre

si. Porém, ela não corresponde somente a um contrato de consumo. Vai muito além,

pois os direitos do consumidor atingem uma margem ampla, que vai desde uma fase

pré-contratual (fabricação, produção, divulgação etc.) até uma fase pós-contratual

(reparação de danos), requerendo certas condutas em relação ao fornecedor, que

correspondem a deveres para com os consumidores.

Esta visão de relação de consumo corresponde "a uma acepção muito ampla,

visto que diz respeito a uma relação obrigacional complexa, pois que é vista na

perspectiva da pluralidade de direitos, deveres, poderes, ônus e faculdades que nela

se entrelaçam” (NORONHA)5. Isto significa ser a relação de consumo,

correspondente a toda relação jurídica interpessoal advinda do fornecimento de

produtos ou prestação de serviços, incluindo deste modo, os deveres e direitos

decorrentes da publicidade comercial (arts. 36 a 38, CDC); as relações contratuais

(cap. VI, CDC); a obrigação pós-contratual de ressarcir devido a produtos viciados

4 MARANHÃO, Clayton. Tutela jurisdicional do direito à saúde. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p.226. 5 NORONHA, Fernando. Textos de Direito do Consumidor. Capítulos I, II, IV e IX. São Paulo: Ática, 1997, p.15.

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(arts. 18 a 22), e ainda, a obrigação de indenizar (independentemente de vínculo

contratual) danos ocasionados por acidentes de consumo.

A relação de consumo é sempre uma relação obrigacional. Assim sendo, no

tocante ao aperfeiçoamento da relação jurídica, à validade, eficácia e existência do

negócio jurídico, ainda é o Código Civil o documento hábil para tanto.

No que tange à relação obrigacional, esta pode ser entendida de uma forma

restrita, meramente contratual, em que os dois pólos da relação jurídica têm

obrigações para com o outro. Deste ponto de vista, a relação de consumo diz

respeito a prestações, a serem exigidas reciprocamente pelos sujeitos da relação

jurídica, ou seja, a relação é comutativa: o consumidor paga o preço e o fornecedor

entrega o bem ou realiza o serviço. É uma visão de relação de consumo como

relação contratual, caracterizada por sujeitos e objeto expressamente determinados

e caracterizados na legislação específica (consumidor, fornecedor, bem de

consumo). É uma caracterização que, embora não esteja incorreta, é incompleta,

posto que a relação de consumo deve ser entendida de uma maneira, no mínimo,

um pouco mais ampla, que não envolva somente os contratos. Nascimento (1991)

admite ter a relação de consumo uma nuance especial, a qual consiste em que:

Para haver a obrigação de um fornecedor na relação de consumo, a relação jurídica subjacente entre consumidor e fornecedor não precisa estar devidamente formalizada, ou pactuada. A publicidade veiculada pelo fornecedor é ato unilateral. No entanto, pode gerar obrigações para quem veiculou a mensagem publicitária, antes mesmo da relação jurídica ter se realizado [...] pode-se dizer – mas a hipótese deve ser examinada caso a caso – que se integram em tais relações de consumo, por determinação legal, aquelas situações e comportamentos que, embora ainda não caracterizados como relações jurídicas, finalisticamente tendem à sua formação6.

No entanto, acredita-se ser a relação de consumo uma relação obrigacional

complexa, na qual incidem três categorias de deveres: primários, secundários e

laterais ou anexos. Os primários caracterizam a obrigação, os secundários são

prestações que estão diretamente ligadas com a obrigação e os anexos,

6 NASCIMENTO, Tupinambá Castro do. Responsabilidade Civil no Código do Consumidor. Rio de Janeiro: Aide, 1991, p.14.

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correspondem a deveres de conduta, obrigações que se traduzem em deveres de

cooperação com a contraparte.

Desta maneira, todos estes deveres estão envolvidos na relação de consumo,

pois, “a obrigação simples é apenas um dos vínculos que se podem distinguir no

âmbito do complexo unitário constituído pela relação obrigacional sistêmica7”.

2.1.1 Consumidor

Como visto anteriormente a relação de consumo envolve duas ou mais

pessoas, ou seja, é intersubjetiva. Porém não diz respeito a qualquer pessoa, mas

sim a pessoas com uma qualificação especial, que consiste em ser consumidor e

fornecedor.

O termo consumidor corresponde a “toda pessoa física ou jurídica que adquire

ou utiliza produto ou serviço como destinatário final”, conforme o art. 2º do CDC, o

que se entende ser a expressão “destinatário final” crucial para a definição de

consumidor, que vez que exclui do conceito quem não se enquadra em seu

significado. Tal expressão significa dizer que a pessoa que adquire um bem, para

que seja considerado consumidor, deverá utilizá-lo para satisfazer uma necessidade

privada, sua ou de sua família, ou seja, finalisticamente, posto que retira o bem do

mercado de consumo, isto é, das etapas da produção.

Outro dado fundamental do conceito é o “ato de consumir”, pois no conceito de

consumidor, constante do texto da lei, observa-se a expressão “.... que adquire ou

utiliza produto ou serviço ...”.

Consumir seria o ato de “gastar, abrupta ou lentamente, a substância de determinada coisa ou produto. Este consumo pode ser classificado em absoluto (destrói-se a coisa na primeira utilização. Ex. sanduíche) ou paulatino (desgasta-se a coisa pelo uso continuado. Ex. imóvel, carro etc.). Para efeitos desta classificação, deve-se ter em vista a finalidade real da coisa, independentemente do uso que queira ser dado a ela. A definição constante do art. 51, do Código Civil, refere-se ao consumo absoluto: 'são consumíveis os bens móveis, cujo uso importa destruição imediata da

7 NORONHA, Fernando. Op.Cit, p.93.

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própria substância, sendo também considerados tais os destinados a alienação8'.

Essa é a visão essencialmente física que se relaciona ao conceito de

consumidor, uma visão gramatical, literal, pode-se dizer. Tem sua razão de ser se

atentar ao fato de que uma pessoa que adquire algo como destinatário final,

pressupõe uma finalidade para tal coisa, e no caso, essa finalidade corresponde a

um desgaste paulatino ou abrupto do bem em questão.

Outro aspecto do conceito de consumidor, diz respeito a este ser relacionado à

característica da vulnerabilidade. Acerca desta expressão relacionada ao

consumidor, entende-se:

"A vulnerabilidade dos consumidores consiste na possibilidade de serem

afetados jurídica e economicamente, nos contratos por eles celebrados, em

conseqüência de diversos fatores, sempre ligados à desigualdade de forças entre

eles e os fornecedores"9. A consideração da vulnerabilidade do consumidor consiste

em um aspecto subjetivo do conceito, posto que o aspecto objetivo, de natureza

econômica, é o de ser destinatário final. Quando o entendimento é acerca da pessoa

física, não há maiores complicações para a reunião das duas características, isto é,

a pessoa física que é destinatária final, já é subentendida como vulnerável. Porém,

quando se trata de pessoa jurídica (conforme art. 2º, CDC: “... toda pessoa física ou

jurídica ...”), como por exemplo, uma empresa, é que surge o impasse.

No entanto, o CDC, quando do seu art. 2º, vislumbrou somente o termo

destinatário final, ressaltando deste modo, o aspecto objetivo no conceito. Sendo

assim, para avaliar se uma pessoa jurídica é consumidora, deve ser preenchido o

requisito da destinação final, ficando assim a vulnerabilidade relegada às ocasiões

de aplicações analógicas quando da “equiparação de certas entidades aos

consumidores”, conforme o art. 29, CDC. Atentando-se ao parágrafo único do art. 2º,

percebe-se que ao consumidor equipara-se a coletividade de pessoas, ainda que

indetermináveis. Este é mais um detalhe no tangente à proteção que o CDC conferiu

ao consumidor. Consiste em que, de acordo com o preceito, a tutela aos 8 NASCIMENTO, Tupinambá Castro do. Responsabilidade Civil no Código do Consumidor. Rio de Janeiro: Aide, 1991, p.18. 9 NORONHA, Fernando. Op.Cit, p.101.

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consumidores individuais poderá ser pleiteada de forma coletiva, sendo que esta

tutela coletiva subdivide-se em: tutela de direitos essencialmente coletivos (coletivos

e difusos) e de direitos individuais homogêneos (de natureza coletiva em virtude da

forma como são tratados). O que ocorre é uma espécie de equiparação entre a

coletividade e o indivíduo.

2.2 CONTRATOS

A humanidade evolui e com ela as suas estruturas de organização, e assim

acontece com os contratos que modifica ou extingue obrigações. Suas condições

gerais são previstas pelo Estado e não pela autonomia privada.

Assim adverte Lôbo (1986, p.19):

O contrato deixa de ser apenas instrumento de exercício de direitos para ser também instrumento de política econômica. E se estabelece uma situação aparentemente paradoxal: um recrudescimento de sua importância na medida de seu declínio, quando a autonomia da vontade vai perdendo seu predomínio.

O processo econômico, caracterizado então pelo desenvolvimento das forças

produtivas, exigia a generalização das relações de troca, levando ao surgimento do

contrato como uma categoria que serve a todos os tipos de relações entre sujeitos

de direito.

2.3 CLÁUSULAS CONTRATUAIS GERAIS

Os contratos e suas cláusulas surgem motivados por diversos fatores, como a

explosão demográfica, a urbanização e a consequente demanda de bens e serviços

acelerada. Cabe salientar que fatores importantes na necessidade de se elaborar

contratos é a concentração de capital, do consumo de massa e da impossibilidade

de tratamento individual entre o grande fornecedor e o consumidor final, além da

consciência jurídica no processo de tutela ao consumidor.

A respeito das condições gerais dos contratos Lôbo se manifesta:

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As condições gerais são fruto da fase pós-industrial, da passagem do sistema de economia concorrencial para o sistema predominantemente monopolista ou oligopolista (privado ou estatal) e da massificação das relações sociais. (LÔBO, 1991, p. 12).

Ao comentar o que foi exposto acima cabe salientar que as condições gerais

são predispostas prévia e unilateralmente, dando origem à uniformização, utilizando-

se espaços para serem posteriormente preenchidos com a individualização do

contratante destinatário, sendo muito comum seu emprego no mercado.

A eficácia jurídica das condições gerais verifica-se, na prática, com sua

integração ao contrato individual, anteriormente existe apenas uma eficácia geral,

semelhante à eficácia da norma jurídica, consumando-se essa eficácia pela adesão

do contratante, ou seja, quando o contrato estiver concluído. Neste, pode haver

outras cláusulas negociadas entre as partes contratantes10.

2.3.1 Cláusulas abusivas

O contrato predefine cláusulas e ingressa como proposta para negociação.

Neste contexto o CDC tem como objetivo e estabelecer o equilíbrio contratual. E,

ainda, manter a função social do contrato. Com a existência das cláusulas abusivas

os contratos de adesão o CDC prevê um regime de proteção a qual a Administração

pública e a privada possam equilibrar as relações de consumo.

A necessidade econômico-social, os reflexos da globalização e os contratos de

adesão apresentam vantagens e desvantagens, a primeira se exemplifica pela

uniformidade, a redução dos custos, a racionalização contratual sua desvantagem

são as diversas cláusulas abusivas, motivo pelo qual é o contrato mais criticado, pois

coloca o consumidor em posição incompatível com a boa fé.

E, quando isso ocorre cabe ao Estado a serviço da proteção dos

consumidores, seja por via legislativa, administrativa ou jurisprudencial, tornando

nulas essas cláusulas dotadas de abusividade.

10 GARMS, Ana Maria Zauhy. Cláusulas abusivas nos contratos de adesão à luz do Código de Defesa do Consumidor. www.jus.com.br/doutrina/clabusi.htm. Acesso em: 19 jan. 2010.

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No artigo 51 do CDC está previsto a nulidade das cláusulas abusivas. Segundo

GARMS (2010):

Abusiva é a previsão da irresponsabilidade por vícios e defeitos de qualidade,

isto é o produtor ou fornecedor não pode se eximir de sua responsabilidade em

havendo quaisquer vícios ou defeitos de qualidade11.

A respeito da cláusula abusiva do contrato e adesão existe em decorrência de

seu caráter econômico, em virtude de criar maior peso, maior ônus para o contraente

fraco. O motivo pelo qual leva o surgimento de cláusulas abusivas no contrato de

adesão é que o fornecedor tende sempre a querer assegurar sua posição,

colocando condições que romperão com a boa fé ou romperão o equilíbrio entre as

prestações de cada parte.

Para a proteção do consumidor deve o contrato de adesão ser escrito de forma

clara, acessível ao leitor, de modo que não crie embaraços à rápida compreensão

das respectivas cláusulas12.

Diante da atual situação, da previdência e da saúde pública no Brasil, os

consumidores se vêem compelidos a assinar planos de saúde que lhes impõe

cláusulas contratuais abusivas, e só no momento de sua utilização é que se

deparam com as inúmeras dificuldades tanto em relação ao atendimento quanto aos

reajustes exorbitantes, não atendendo as necessidades econômicas do nosso país.

Cabe abaixo mencionar o pensamento de GOUVEIA, citando essas palavras

em seu artigo a respeito do tema:

Um exemplo clássico de cláusula abusiva refere-se aos reajustes por mudança

de faixa etária, compelindo aos mais idosos a pagar uma prestação maior em

relação aos mais jovens, tendo como preceito, que com o passar da idade utilizarão

com mais freqüência os serviços médico-hospitalares, mas que na verdade não

espelha a nossa realidade, pois seria provável a utilização desses usuários pela

11 GARMS, Ana Maria Zauhy. Cláusulas abusivas nos contratos de adesão à luz do Código de Defesa do Consumidor. www.jus.com.br/doutrina/clabusi.htm. Acesso em: 19 jan. 2010. 12 GOMES, Orlando. Contratos. 16.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995. p.04.

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faixa etária, acontece que existem casos de idosos que raramente adoecem e,

portanto, não utilizam esses serviços, ao contrário de jovens, crianças, que

necessitam de constante acompanhamento médico para um crescimento e um futuro

saudável e tranquilo13.

Operadoras de planos de saúde, em virtude de seus próprios interesses, após

autorizarem certos procedimentos cirúrgicos, negam-se a cobrir a utilização de

equipamentos que são imprescindíveis à sua execução, acarretando no aumento

das despesas hospitalares aos seus respectivos usuários.

Uma vez autorizado esses procedimentos, as operadoras de saúde deveriam

oferecer cobertura total aos mesmos, e não se aproveitar da fragilidade e desgaste

de seus usuários e familiares, para obterem um retorno abusivo, alegando abranger

certos equipamentos e outros não, que na verdade, num contexto geral, são

necessários para se contemplar o fim colimado14.

Essas cláusulas abusivas, a que são submetidos os consumidores, geram um

reflexo no bem estar dos cidadãos, submetendo seus usuários a inúmeros

constrangimentos de ordem pessoal, pois nas situações em que mais necessitam,

além de serem excluídas certas doenças de seus planos de saúde, passam por

restrições em seu internamento, tornando-se objeto de várias ações judiciais, no

intuito de dirimir estes conflitos de interesses, visto que esses usuários, muitas

vezes, não possuem recursos suficientes para arcarem com as suas despesas

hospitalares15.

13 GOUVEIA, Ricardo Pestana. Problemáticas da nova lei dos planos de saúde e o seu desvio de finalidade. Disponível em: http://www.escritorioonline.com/webnews/noticia.php?id_noticia=6108&. Acesso em 15 de jan. 2010. 14 GOUVEIA, Ricardo Pestana. Problemáticas da nova lei dos planos de saúde e o seu desvio de finalidade. Disponível em: http://www.escritorioonline.com/webnews/noticia.php?id_noticia=6108&. Acesso em 15 de jan. 2010. 15 GOUVEIA, Ricardo Pestana. Problemáticas da nova lei dos planos de saúde e o seu desvio de finalidade. Disponível em: http://www.escritorioonline.com/webnews/noticia.php?id_noticia=6108&. Acesso em 15 de jan. 2010.

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3 PLANOS DE SAÚDE

A saúde é um direito fundamental que está consagrado na Constituição

Federal de 1998 nos artigos arts. 6º e 196º. O jurista Figueiredo conceitua o direito

de saúde suplementar como:

[...] o sub-ramo do direito econômico que disciplina, tanto em caráter técnico quanto em caráter financeiro, a atividade de prestação de assistência privada à saúde, bem como as relações jurídicas entre todos os segmentos sociais envolvidos no respectivo setor: Poder Público, operadores de mercado, prestadores de serviços médicos e consumidores (2006. p. 29).

A regulamentação do mercado de saúde suplementar depende de

implementação entre os segmentos: poder público, operadores de mercado,

médicos, prestadores de serviços e consumidores. Conforme indica o art. 197

daquela que:

Art. 197. São de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado.

Ora, a regulamentação, fiscalização e controle das ações e serviços de saúde

são considerados pela Constituição como de relevância pública. Neste sentido, as

disposições contidas na Lei n° 9.961/2000, encontram-se respaldadas, na medida

em que se por um lado é legítima a oferta de planos privados de assistência à saúde

por parte das operadoras do ramo, esta comercialização - ou precisamente a forma

como a mesma vai ocorrer - deve se submeter à disciplina estabelecida pelo Poder

Público16.

Assim, cabe às operadoras de planos privados de assistência à saúde

disciplinar as condições às quais submeterão para atuar no mercado da saúde, uma

16 VENTURA. Johnny dos Santos. A constitucionalidade da base de cálculo da taxa de saúde suplementar. Disponível em: http://www.mundojuridico.adv.br. Acesso em de jan. 2010.

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vez que a Carta Magna considera a saúde relevância pública, deve às operadoras

operar de acordo as normas pertinentes, em especial à Lei nº 9.656/1998.

A regulação incumbe institucionalmente à Agência Nacional de Saúde

Suplementar - ANS e a competência ao estabelecimento dos condicionamentos aos

quais estarão vinculados às operadoras para atuarem neste mercado, conforme

albergado nos artigos 1° e 3° da Lei n° 9.961/2000:

Art. 1o É criada a Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS, autarquia sob o regime especial, vinculada ao Ministério da Saúde, com sede e foro na cidade do Rio de Janeiro - RJ, prazo de duração indeterminado e atuação em todo o território nacional, como órgão de regulação, normatização, controle e fiscalização das atividades que garantam a assistência suplementar à saúde. Parágrafo único. A natureza de autarquia especial conferida à ANS é caracterizada por autonomia administrativa, financeira, patrimonial e de gestão de recursos humanos, autonomia nas suas decisões técnicas e mandato fixo de seus dirigentes. [...] Art. 3o. A ANS terá por finalidade institucional promover a defesa do interesse público na assistência suplementar à saúde, regulando as operadoras setoriais, inclusive quanto às suas relações com prestadores e consumidores, contribuindo para o desenvolvimento das ações de saúde no País.

Os planos de saúde são regulados pela Constituição Federal, que garante

direito a saúde, pela Lei Federal nº 9.656, aprovada em junho de 1998, por medidas

provisórias que são editadas, pelo CDC em caráter subsidiário, e pelo Conselho de

Saúde Suplementar - CONSU, órgão criado pela nova legislação, editando normas

"complementares" às leis e às medidas provisórias.

Cumpre ressaltar que estas missões institucionais da ANS, delineadas nos

trinta e oito incisos do art. 4° da Lei n° 9.961, de 2000 vêm sendo devidamente

cumpridas, seja por meio da edição de atos normativos, seja pela fiscalização direta

das operadoras de planos de saúde.

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3.1 A FUNÇÃO SOCIAL DAS EMPRESAS E DO CONTRATO À ASSISTÊNCIA À

SAÚDE

Foi quase uma década que o mercado de saúde suplementar ficou sem

disciplinamento jurídico ficando livre a iniciativa das entidades privadas que nele

desejavam operar, essa realidade só mudou com o advento da Constituição Federal

de 1988.

Sua prestação suplementar de serviços de saúde era prestada somente com

base e orientação na concepção individualista do Código de 1916. Os consumidores

sofriam os abusos comuns desse mercado, pois, essa relação assistência à saúde e

consumidores não possuía legislação própria.

Neste contexto o consumidor sofria com uma série de abusos e arbitrariedade

por parte mais forte da relação contratual, neste caso, os serviços de assistência a

saúde. Com a necessidade de resguardar o consumidor contra esses abusos surgiu

a Lei nº 9.656/1988, que disciplinou, trouxe regras próprias e específicas às

operadores dos referidos planos, resguardando e garantindo o cumprimento de sua

função social.

Sob esse prisma o Direito Privado brasileiro também passou por mudanças,

abandonou a concepção individualista e adotou uma postura que objetiva a eticidade

e a socialidade nas relações jurídicas particulares. A função social do contrato foi

positivada no ordenamento jurídico brasileiro através da Lei nº 10.406 de 2002 – o

Código Civil.

Para Ventura:

Por função social, entende-se a garantia legal de que o instituto de direito alcance, efetivamente, seus objetivos maiores, impedindo-se que o mesmo tenha sua aplicabilidade desvirtuada, articulada com o objetivo de destruir sua devida e correta hermenêutica. Em outras palavras, trata-se de se efetivar a socialidade do direito17.

17 VENTURA. Johnny dos Santos. A constitucionalidade da base de cálculo da taxa de saúde suplementar. Disponível em: http://www.mundojuridico.adv.br. Acesso em de jan. 2010.

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Assim, conforme expressamente positivado no art. 421: “a liberdade de

contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato”.

Ressalte-se, por oportuno, que o contrato de plano privado de assistência à

saúde tem sua definição legal positivada no art. 1º, inciso I, da Lei nº 9.656, de 1998,

que o caracteriza como:

[...] a prestação continuada de serviços ou cobertura de custos assistenciais a preço pré ou pós estabelecido, por prazo indeterminado, com a finalidade de garantir, sem limite financeiro, a assistência à saúde, pela faculdade de acesso e atendimento por profissionais ou serviços de saúde, livremente escolhidos, integrantes ou não de rede credenciada, contratada ou referenciada, visando a assistência médica, hospitalar e odontológica, a ser paga integral ou parcialmente a expensas da operadora contratada, mediante reembolso ou pagamento direto ao prestador, por conta e ordem do consumidor.

O mercado de plano de saúde vem a cada dia sofrendo transformações

incluindo a nova lei, Lei n. 9.656/98 uma problemática que ao invés de primar pela

saúde do cidadão, essa traz o desvio de finalidade, causando transtornos para o

cidadão sem qualquer forma de respeito.

Plano de saúde trata-se de um contrato específico de prestação de serviços de

saúde pela iniciativa privada, em que o consumidor paga uma prestação, tendo a

operadora o encargo de prestar os devidos serviços por meio de rede própria e/ou

credenciada, sem ônus financeiro para o consumidor, somente a sua respectiva

mensalidade18.

E, assim, expõe Ventura:

O comentário do texto legal acima transcrito nos remete que a função social do contrato de plano de assistência à saúde está em garantir ao usuário, o qual contribui periodicamente para a formação e manutenção de fundo de massa do plano, o direito ao atendimento médico, nos casos de sinistralidade contratualmente coberta, assegurando, ainda, que o custo financeiro pelo procedimento prestado corra por conta da respectiva operadora, a qual administra o referido fundo pecuniário para tanto.

E, por fim, cabe salientar que somente com a norma de ordem pública a Lei nº

9.656, de 1998 a função social do contrato passou a ser devidamente garantida.

18 VENTURA. Johnny dos Santos. A constitucionalidade da base de cálculo da taxa de saúde suplementar. Disponível em: http://www.mundojuridico.adv.br. Acesso em de jan. 2010.

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Destarte, resta claro que a ANS, concebida como entidade de regulação deste

relevante mercado, deve atuar de forma incisiva para assegurar a estrita

observância da Lei nº 9.656, de 1998, assegurando o fiel cumprimento da função

social do contrato de plano privado de assistência à saúde19.

19 Idem.

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4 PLANO DE SAÚDE X DIREITO DO CONSUMIDOR: DESVIO DE FINALIDADE

A nova legislação sobre os planos de saúde é considerada uma vitória para os

consumidores, pelo fato de aumentar a cobertura de doenças como AIDS, doenças

mentais e fixar limites de diferenças de preços de planos calculados pela faixa etária,

mas não garante a segurança de todos os direitos dos consumidores, sendo,

portanto, invocado o CDC para dirimir os conflitos entre os cidadãos e as operadoras

de saúde20.

Essa nova lei serviu, essencialmente, para acabar com o caos existente entre a

relação dos cidadãos com o Sistema Único de Saúde - SUS aumentando-se o valor

de suas mensalidades, tendo o SUS uma enorme diminuição de seus custos e

estimulando novas adesões de consumidores21.

A quem discorda na nova Lei, conforme pode ser visto abaixo:

A nova legislação não atende a nossa realidade, pois ao passo que traz série

de benefícios, permite que as administradoras aumentem o valor de suas

mensalidades de acordo com as funções de suas obrigações, demonstrando de

forma clara que os planos de saúde são negócios empresariais, visando lucro,

interessando-se somente com o retorno de capital, conforme afirma Amaral22:

Ainda o mesmo autor:

"A saúde privada, hoje, infelizmente está em xeque e necessita ser

reexaminada urgentemente. A visão puramente mercantilista de certas operadoras é

20 GOUVEIA, Ricardo Pestana. Problemáticas da nova lei dos planos de saúde e o seu desvio de finalidade. Disponível em: http://www.escritorioonline.com/webnews/noticia.php?id_noticia=6108&. Acesso em 15 de jan. 2010. 21 Idem. 22 AMARAL, José Luiz Gomes. Saúde privada em cheque. Disponível em: http://www.cremesp.com.br. Acesso em 15 de jan. 2010.

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um atentado contra o livre exercício da Medicina e os direitos fundamentais dos

pacientes23."

O desacordo está exatamente na questão que se aumentar os serviços

prestados, aumentará também o valor das mensalidades, tirando a tranqüilidade do

consumidor gerando assim, despesas levando-os muitas vezes a abandonar seus

planos de saúde.

No que tange a contratação de planos de saúde sob a égide da nova

legislação, o usuário deverá preencher uma declaração de saúde, para se contatar

se existe doença preexistente, não tendo cobertura durante os 2 (dois) primeiros

anos do contrato, salvo com o pagamento de uma taxa para utilização do serviço no

período de carência, o AGRAVO. Nesse preenchimento deve-se prestar muita

atenção, para não acarretar problemas futuros, pois caso se comprove que o

contratante omitiu ou negou alguma doença preexistente, poderá ser acusado de

fraude e ter o contrato suspenso, e se o consumidor apresentar uma doença que

não se encontre no formulário, nos dois primeiros anos, poderá a operadora

averiguar se a doença era preexistente, sendo confirmada tal situação, o consumidor

terá que arcar com os gastos da administradora durante o tratamento, conforme

estabelece o art. 11 da Lei 9.656/98.

Conforme Amaral:

Os planos antigos (individuais ou familiares), firmados antes da vigência da nova lei, não têm registro na ANS estando proibidos de serem comercializados, mas possuem uma garantia fixada em lei, de renovação automática do contrato, não podendo a operadora cobrar qualquer taxa ou outro valor no ato da renovação, nem exigir a recontagem de carência, conforme estabelece o art. 13 da Lei 9.656/98, já os assinados após janeiro de 1999, estão amparados pela nova legislação, devendo os contratos oferecer todos os benefícios previstos na nova legislação24.

O objetivo das operadoras de plano de saúde seria o bem estar e qualidade de

vida dos cidadãos, mas, ao invés disso atuam de forma arbitrária depois da nova lei

dos planos de saúde.

23 AMARAL, José Luiz Gomes. Saúde privada em cheque. Disponível em: http://www.cremesp.com.br. Acesso em 15 de jan. 2010. 24 AMARAL, José Luiz Gomes. Saúde privada em cheque. Disponível em: http://www.cremesp.com.br. Acesso em 15 de jan. 2010.

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Nas palavras de PESTANA:

Com o objetivo de fraudar os usuários de planos de saúde muitas operadoras colocam no mercado cartões de desconto ou cartões de saúde, induzindo erroneamente os consumidores a aderirem a um plano de saúde, mas que na verdade não se enquadram no que é definido no art. 1º da Lei 9.656/98de, não cobrindo integralmente as doenças previstas no Código Internacional de Doenças - CDI25.

Acrescenta ainda o mesmo autor em seu artigo a respeito do tema:

As situações de urgência e de emergência, também, não têm sido respeitadas em face da nova legislação, pois o prazo de carência para atendimento de situações de urgência e de emergência é de 24 horas, conforme previsto na lei dos planos de saúde, em seu art. 12, V, "c", devendo a operadora responder pelas despesas Médico-Hospitalares, sem limitação temporal, mas diversas operadoras não respeitam esta disposição, configurando uma cláusula limitativa abusiva, conforme dispõe o art. 51, IV, do CDC26.

Temos outros dois fatores, que são afetados pelo desvio de finalidade da nova

lei dos planos de saúde. O primeiro refere-se aos aumentos anuais anunciados pela

ANS mesmo estando de acordo com os índices de inflação, não utilizam critérios

claros para os devidos cálculos, não se tendo a noção exata se os reajustes

equivalem a realidade brasileira.

25 GOUVEIA, Ricardo Pestana. Problemáticas da nova lei dos planos de saúde e o seu desvio de finalidade. Disponível em: http://www.escritorioonline.com/webnews/noticia.php?id_noticia=6108&. Acesso em 15 de jan. 2010. 26 GOUVEIA, Ricardo Pestana. Problemáticas da nova lei dos planos de saúde e o seu desvio de finalidade. Disponível em: http://www.escritorioonline.com/webnews/noticia.php?id_noticia=6108&. Acesso em 15 de jan. 2010.

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5 CONCLUSÃO

Sendo o desvio de finalidade da lei dos planos de saúde um desrespeito a

dignidade do ser humano, cabe concluir que está prática deixa de preocupar-se com

os interesses de uma sociedade para visar somente a lucratividade das operadoras

de saúde, ao passo que permite aumento e clausulas abusivas aos seus

consumidores.

Mesmo que a nova lei traga benefícios para seus usuários, como o aumento da

cobertura para certas doenças, ainda falta muito para sua eficácia no que diz

respeito ao atendimento das necessidades do ser humano. As pessoas precisam de

segurança para garantir seu futuro, muitas vezes incerto e instável.

O desvio de finalidade tem sido a cada dia motivo de ações judiciais e

constrangimento para os usuários no momento de sua utilização, onde entra o CDC

com o objetivo de dirimir os conflitos entre as operadoras de saúde e os cidadãos.

Diante deste contexto é notório que o que se busca é o respeito à vidas

humanas, que cada vez mais estão sendo colocadas a mercê da própria sorte,

essas pessoas correm riscos de vida e se sentem prejudicadas pelas operadores de

planos de saúde . Chegou a hora dessas operadoras não mais visar lucro tão

somente e sim se preocuparem com o bem estar dos cidadãos.

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BIBLIOGRAFIA

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