154
1 PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP CLAUDINEIDE LIMA IRMÃ SANTOS PROFESSOR INICIANTE APRENDER A ENSINAR: SENTIMENTOS E EMOÇÕES NO INÍCIO DA DOCÊNCIA MESTRADO EM EDUCAÇÃO: PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO SÃO PAULO 2014

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

  • Upload
    dotuyen

  • View
    212

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

1

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

CLAUDINEIDE LIMA IRMÃ SANTOS

PROFESSOR INICIANTE

APRENDER A ENSINAR: SENTIMENTOS E EMOÇÕES NO INÍCIO

DA DOCÊNCIA

MESTRADO EM EDUCAÇÃO: PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO

SÃO PAULO

2014

Page 2: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

2

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

CLAUDINEIDE LIMA IRMÃ SANTOS

PROFESSOR INICIANTE

APRENDER A ENSINAR: SENTIMENTOS E EMOÇÕES NO INÍCIO

DA DOCÊNCIA

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,

como exigência parcial para a obtenção do título

de Mestre em Educação: Psicologia da Educação,

sob orientação da Profa. Dra. Laurinda Ramalho

de Almeida.

SÃO PAULO

2014

Page 3: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

3

Banca Examinadora

____________________________________________________

Profa. Dra. Laurinda Ramalho de Almeida

Presidente e Orientadora

PUC/SP

____________________________________________________

Profa. Dra. Vera Lúcia Trevissan de Souza

Examinadora Titular

PUC/CAMPINAS

____________________________________________________

Profa. Dra. Vera Maria Nigro de Souza Placco

Examinadora Titular

PUC/SP

Page 4: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

4

“Lenha verde mal acende, quem muito dorme pouco aprende!” (Autor Desconhecido)

A você...

Page 5: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

5

AGRADECIMENTOS

Vejo-me à frete desta folha em branco e me pego a pensar, por onde começar a

agradecer? Então busco a origem da palavra, para enfim ser possível materializar o que passa

dentro de mim.

Gratidão vem do latim gratia que significa literalmente graça, ou gratus que se traduz

como agradável que por extensão, significa reconhecimento agradável por tudo quanto se

recebe. É possível dizer que a gratidão surge como a mais elevada expressão do

amadurecimento psicológico do indivíduo, que nos arremessa à vivência do sentimento

superior, enobrecido. Sendo assim abro espaço na minha trajetória para agradecer a pessoas

diferentes, em diferentes tempos e espaços que foram determinantes na minha caminhada em

busca de mais esta conquista.

Recorro a dezembro de 1969, momento da minha concepção para agradecer aquela

que acreditou, aceitou e me trouxe a vida. Que mesmo frente a possibilidade/necessidade de

abrir mão desta vida, lutou bravamente , desafiando os diferentes meios no qual se encontra

inserida inclusive a medicina da época. Mulher guerreira, determinada e forte, que me

acalentou em seus braços e confiou... Trago muito de ti, nesta conquista . Você mãe!

Neste momento a memória dá um salto quantitativo e me coloca à frente da primeira e

mais preciosa instituição social: a Família. Gostaria de externar meu mais profundo e sincero

agradecimento a cada um dos membros da minha família, que junto com minha mãe,

conduziram-me nos princípios elementares éticos e morais da integridade, ensinando-me a

superar obstáculos, vencer desafios e cumprir metas.

Envolvida pela emoção que passa a tomar conta do meu ser, relembrando os diferentes

papéis assumidos ao longo da minha trajetória de vida, me vem à memória o momento da

maternidade e as transformações que passaram a ocorrer em mim. Período da vida que iguala

todas as mulheres, onde passamos a vivenciar sentimentos de generosidade, bondade e

doçura, total sincretismo, que alude a formação de uma nova personalidade, a formação da

pessoa humana. Agradeço a você, filho, pelo apoio e incentivo, exigindo ânimo e

determinação. Por entender a minha ausência, por me ensinar, tornando-me uma pessoa

melhor.

Neste entremeado de lembranças, coloco-me à frente de pessoas que, ao longo de

quase meio século de existência, fizeram-se presentes, estabelecendo profundas

transformações na pessoa que sou, através de relações permeadas por sentimentos de

Page 6: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

6

diferentes tonalidades, num entrelaçamento de interesses individuais e coletivos numa

regulação constante de ação.

É preciso agradecer aos diferentes grupos, com suas diferentes dinâmicas e formas de

funcionamento, que exigiram o cumprimento de diferentes papéis. Nesse contexto volto ao

ano de 2003, momento em que a emoção predominava e o sentimento me fazia triste. Falo de

uma pessoa simples, que na sua simplicidade me fez voltar à vida, pois tudo havia perdido o

sentido. Maria Cristina, minha segunda diretora na rede pública. Você passou com um

“foguete”, com uma força avassaladora mostrando porque eu não podia parar.

Mulheres fortes e determinadas sempre se fizeram presentes em toda minha vida. É

preciso agradecer a três mulheres que marcaram profundamente minha história. Inicio

agradecendo a Professora Doutora Laurinda Ramalho de Almeida, orientadora desta pesquisa.

Sem ela seria impossível concretizar este trabalho. Obrigada por ter me aceitado como sua

orientanda. Também pela sua compreensão, carinho, cuidado e paciência.

A professora Vera Maria Nigro de Souza Placco, que muitas contribuições trouxe à

minha pesquisa, redirecionando o meu olhar para o caminho a ser percorrido, fazendo-me

vislumbrar novos horizontes no campo da pesquisa e a professora Vera Lúcia Trevissan de

Souza, que com muita sensibilidade permitiu afetar-se pela minha trajetória profissional,

compreendendo meus anseios, meios desejos e colaborando com seus conhecimentos a fim de

tornar cientifico a história de tantas "Clau” existentes por esse mundo afora. Obrigada pelo

carinho com qual se dedicou a leitura do meu projeto e pelas valiosas sugestões no Exame de

Qualificação.

Também às demais professoras das diferentes disciplinas que a todo o momento

colocavam meus saberes em “xeque”, mostravam-me novas possibilidades e novos desafios,

permitindo o acesso ao mundo da pesquisa acadêmica. Aos colegas de sala, cada um com sua

história, seus sonhos, objetivos e perspectivas. Em especial a Milena e a Ana Paula, que se

tornaram parceiras inseparáveis, compartilhando ideais, momentos de alegria e angústia no

decorrer dos nossos estudos.

Ainda nesse contexto de pesquisa acadêmica, não posso deixar de citar as duas

professoras que emprestaram suas trajetórias profissionais e histórias de vida como elemento

constitutivo desta pesquisa. “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome

fictício, representam tantas outras professoras iniciantes. Vocês fazem parte de um momento

histórico, pois sobreviveram brilhantemente às tensões e às contradições que se encontram

presentes no início da profissão docente, elementos que dão a este tema grande relevância

social e científica

Page 7: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

7

Não posso deixar de citar outro grupo, que também se fez presente durante este

percurso, que entenderam minha ausência e apoiaram minhas saídas. Que sempre tiveram um

sorriso amigo e uma palavra de incentivo, quando diante das dificuldades pensei em desistir.

Também à Secretaria de Educação do Estado de São Paulo - Diretoria de Ensino Região de

Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria Aparecida do Nascimento Barretos, Dirigente

Regional de Ensino, agradeço imensamente a oportunidade de prosseguir nos meus estudos e

Juliane Custódio, da Diretoria de Ensino Região Guarulhos Norte, responsável pela liberação

do incentivo financeiro para minha bolsa mestrado, que mesmo sem me conhecer se fez

presente via telefone, e-mail, etc.

E ainda existem pessoas especiais que merecem destaque nesse texto de

agradecimento. Você, Edson, que, com cuidado, presteza e paciência sempre tinha resposta às

minhas dúvidas. A todas as demais pessoas que fazem parte da família PUC/SP. Vocês são

responsáveis pela organização e sucesso desta instituição.

A minha irmã “Selma”, que me ajudou com o transporte, com a organização das

tarefas de casa, com o lanchinho de todas as segundas e terças-feiras. Que acreditou e se

emocionou no dia da qualificação, pois também como professora, sentiu-se representada na

minha pesquisa. Que sabiamente, em seu silêncio de mulher, aguentou minhas crises

existenciais.

E a você, que acreditou no meu potencial e confirmou o resultado do processo de

seleção, pois o medo de não ter sido aprovada gelava-me a alma e obnubilava meus olhos.

Você que se fez presente durante todo o percurso, um braço sempre estendido, apoiando-me

nas decisões, na leitura dos textos, nos processos de entrevistas, no resultado indesejado no

primeiro exame de proficiência, no momento da qualificação e posterior a ele, quando foi

preciso retomar todo o processo e que ainda hoje se faz presente na minha vida. Meu mais

singelo obrigado.

A gratidão pode também ser explicada como um ato de cognição abrangente pelas

situações de dádivas que a vida proporcionou e ainda proporciona. É um ato de total emoção,

envolve sentimento de dívida emotiva em direção a outras pessoas. Embutido neste ato

encontra-se o desejo de reciprocar. Deus, a fazer-nos sua imagem e semelhança, tinha como

propósito para cada um de nós a felicidade. Sou grata a ELE, por permitir alçar voos,

retomando sempre a simplicidade da vida, a gênesis, o principio de tudo, a essência de cada

um.

Page 8: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

8

A todos que fizeram parte deste momento histórico, deixo essa poesia que diz muito

de mim...

Traduzir-se

Ferreira Gullar

Uma parte de mim

é todo mundo;

outra parte é ninguém:

fundo sem fundo.

Uma parte de mim

é multidão;

outra parte estranheza

e solidão.

Uma parte de mim

pesa, pondera;

outra parte

delira.

Uma parte de mim

almoça e janta;

outra parte

se espanta.

Uma parte de mim

é permanente;

outra parte

se sabe de repente.

Uma parte de mim

é só vertigem;

outra parte,

linguagem

Page 9: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

9

Traduzir uma parte

na outra parte

- que é uma questão

de vida ou morte -

será arte?

Voz: Adriana Calcanhoto

Page 10: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

10

RESUMO

Ao se considerar o professor iniciante como pessoa completa que desempenha um papel ativo

no seu processo de constituição e na atuação como educador, este estudo teve como problema

central entender quem ele é o professor iniciante nos dias atuais, como tem adentrado no

espaço escolar, buscando saber quais as emoções e sentimentos envolvem o início da carreira

deste profissional, tecendo considerações sobre como o coordenador pedagógico ou os pares

(professores experientes) podem contribuir nesse inicio da docência. A partir de uma

abordagem qualitativa, com aplicação de questionários de caracterização e entrevista

semiestruturada procurou-se analisar experiências, emoções, sentimentos e o processo de

constituição docente de duas professoras no início da profissão por meio de seus relatos.

Sínteses, quadros, eixos e/ou categorias foram elaborados para auxiliar nas discussões das

informações. Por considerar a afetividade elemento crucial na constituição da pessoa,

trabalhou-se com a Psicogenética de Henri Wallon. Os resultados desta pesquisa trazem

respostas que permitem oferecer sugestões para diretrizes de políticas educacionais dentre as

quais se destacam: planejar o processo de formação continuada que considere o perfil dos

professores iniciantes, suas experiências, expectativas, anseios e os conhecimentos já

construídos mesmo que de forma fragmentada. Dado que na constituição da pessoa do

professor encontram-se imbricadas cognição, afetividade e motricidade, é importante que

políticas públicas apostem nesta tríade, como elemento norteador e por último, mas não

menos importante, faz-se necessário considerar que a atuação do professor iniciante perpassa

pela necessidade do apoio da equipe escolar e do esforço próprio em busca de um ação

docente mais significativa.

Palavras-chave: professor iniciante, formação docente, afetividade, psicogenética walloniana.

Page 11: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

11

ABSTRACT

Considering a beginner teacher as a person who plays an active role in the process of

constitution and in the action of being an educator, this study aims to understand who is the

beginner teacher nowadays and how he is situated in the school context, trying to understand

which emotions and feelings surround the beginning of the career of this professional doing

considerations on how the pedagogical coordinator or their peers (experienced teachers) can

contribute to this beginning of teaching. From a qualitative approach, with the application of

questionnaires of characterization and semi-structured interviews was tried to analyze

experiences, emotions, feelings and the process of teacher formation of two teachers at the

beginning of their professional life through their reports. Summaries, frames, axles and/or

categories have been developed to assist in the discussions about the information. Because we

are considering the affection as a crucial element in the constitution of the person, Henri

Wallon’s psychogenetics studies were used. The results of this research bring answers that

enable to offer suggestions for educational policies, pointing out: to plan the process of

continuing education that consider the profile of the beginner teacher, their experiences,

expectations, desires and knowledge already acquired even in a fragmented way. Given that in

the constitution of the teacher is imbricated cognition, affection and movement, it is important

that public policies bet in this triad as a guiding element, and last but not least, it is necessary

to consider that the performance of the new teacher goes through the necessity of the school

staff support and of their own effort in searching a more meaningful teacher actions.

Keywords: beginner teacher, teacher training, affectivity, wallonian psychogenetics.

Page 12: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

12

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 13 2 PROFESSOR INICIANTE: CONSIDERAÇÕES SOBRE PESQUISAS

REALIZADAS, REFERENTES TEÓRICOS SOBRE A FORMAÇÃO DE

PROFESSORES E CONTEXTO LEGAL ........................................................................... 16 2.1 O cenário das pesquisas .................................................................................................. 16 2.2. Professor iniciante: pressupostos legais ....................................................................... 21 2.3 Princípios e conceitos ..................................................................................................... 23 2.4 Ingresso e atuação na docência ....................................................................................... 25

2.5 Saberes docentes ............................................................................................................. 26 2.6 O ciclo de vida profissional dos professores .................................................................. 27

3 PROFESSOR INICIANTE: A AFETIVIDADE COMO MEDIADORA DA

CONSTITUIÇÃO DA DOCÊNCIA ..................................................................................... 31 4. PERCURSO METODOLÓGICO .................................................................................... 47

4.1. Delimitação do problema............................................................................................... 47 4.1.1. Caminho percorrido para a escolha dos participantes: novas descobertas ................. 48

4.1.2. Escolha dos participantes............................................................................................ 49 4.1.3. Produção de informações ........................................................................................... 51

4.1.4 Técnica empregada: entrevista .................................................................................... 51 4.1.5 Considerações sobre as entrevistas ............................................................................. 53 4.2. Síntese das entrevistas .................................................................................................. 54

4.2.1. Primeira entrevista (professora Lu) – 10/06/13 .......................................................... 54 4.2.2. Segunda entrevista (com a professora Cris) – 26/06/13 ............................................. 55

4.2.3 Fragmentos da trajetória do pesquisador .................................................................... 57 4.3. Considerações sobre as entrevistas ................................................................................ 58

4.4. Discutindo as informações a partir dos eixos norteadores ............................................ 61

5. ANÁLISE E DISCUSSÃO DAS INFORMAÇÕES ........................................................ 64 5.1. Discutindo as informações a partir dos eixos norteadores ............................................ 64

5.2. Considerações sobre o professor coordenador - Formador em formação ..................... 85

CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................. 88 REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 93 APÊNDICES ........................................................................................................................... 96

Page 13: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

13

1 INTRODUÇÃO

Tenho passado a maior parte da minha vida em escolas. Tenho vivido as alegrias e

agruras do aprender e do ensinar. Já tive lágrimas correndo pelas faces, ora por conseguir

decifrar o que me parecia oculto, impossível de perceber, ora por receber reprimendas por não

conseguir alcançar o que esperavam de mim.

Ser professor é assim. É professar a Fé e a certeza de que tudo terá valido a pena. É

apontar caminhos, mas deixar que se caminhe com os seus próprios pés. É sair de cena sem

sair do espetáculo. É romper com o medo, as angústias, as desilusões, as perdas e descobertas.

É comungar ideais. É deixar brotar a vida enquanto existência exterior e interior.

“Viver é muito perigoso” já afirmou o personagem Riobaldo, de Guimarães Rosa, em

Grande Sertão: Veredas (2001, p. 41) e hoje ao término desta dissertação, percebo que vivi

perigosamente algumas fases da minha vida de aluno e de professor iniciante.

Mas tive muitos que me apoiaram, ajudando-me a ir em frente.

Por entender que a construção da identidade profissional docente perpassa pelos

saberes pedagógicos, experienciais, oriundos da ciência da educação e ainda por perceber

aspectos convergentes do meu percurso profissional em muitas das ideias defendidas por

diferentes autores sobre o professor iniciante, senti-me impelida a apresentar as inquietações

vivenciadas ao longo dos meus vinte anos de docência. Estas derivam desde a insegurança da

formação inicial, do anseio do contato com a sala de aula, passando pela percepção dos

diferentes atores do contexto escolar, entre eles o coordenador pedagógico e professores

experientes.

Tenho pensado muito sobre quem é o professor iniciante nos dias de hoje. Como este

tem adentrado no espaço escolar, suas necessidades, emoções, sentimentos e anseios. Seria a

afetividade um instrumento capaz de minimizar as fragilidades desse início de carreira?

Estando presente, como a afetividade pode contribuir no processo de constituição deste

profissional? Estas questões serão objeto central das discussões e análise deste trabalho.

Obviamente não se pretende responder a todas as inquietações apresentadas, mas é

preciso considerar que a partir delas cheguei à delimitação do problema desta pesquisa, que

busca saber quais as emoções e sentimentos presentes no início da docência, tecendo

considerações sobre como o coordenador pedagógico e/ou pares (professores) podem

contribuir na entrada da profissão.

Page 14: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

14

Assim, com o intuito de melhor situar o leitor, a apresentação deste trabalho dar-se-á

de acordo com a seguinte estrutura de organização:

O Capítulo 2 apresenta um breve cenário das pesquisas em relação ao professor

iniciante, com uma apresentação dos pressupostos que norteiam as ações de formação no

início da carreira docente a partir da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e ainda

alguns princípios e conceitos descritos por teóricos que discutem o início da docência e a

profissão docente, buscando entender a complexidade e magnitude deste período que é

fortemente marcado pela transição aluno/professor.

O Capítulo 3 destina-se a um resgate do meu percurso profissional, onde escrevo sobre

a experiência vivida, a prática profissional, as dúvidas, os conflitos, os dilemas, as

expectativas, as alegrias e as conquistas; enfim, minha trajetória pessoal e profissional. Para

tanto, recorro ao Registro Reflexivo, uma estratégia metodológica vivenciada no curso de

formação continuada para professores alfabetizadores Letra e Vida1, que valorizava a reflexão

por escrito, como recurso para resgatar as memórias do tempo em que fui alfabetizada, a

escolha pela profissão, passando por diferentes tempos históricos e sociais na tentativa de

entender sobre quem somos nós – pessoal e profissionalmente.

Tendo em vista que se pretende nesta pesquisa entender o professor iniciante como

pessoa completa que desempenha um papel ativo no seu processo de constituição e na atuação

como educador, também acrescento a este capítulo o papel dos meios e dos grupos na

constituição da pessoa a partir da perspectiva de Henri Wallon. A escolha por este autor

decorre da valorização do papel da afetividade (sentimentos, emoção e paixão) defendido pelo

autor, como elemento constitutivo da pessoa, junto as dimensões cognitivas e motoras,

portanto indispensável para compreender o psiquismo humano. Trata-se de uma escolha

intencional, pois em toda a minha trajetória estive cercada pelos elementos sociais, na

fronteira entre o eu e o outro, entre a ação pessoal e coletiva.

Outros autores também se fazem presentes durante a descrição deste capítulo. A

leitura do mesmo apresenta um entrelaçamento de diferentes vozes que dialogam entre si, pois

são estudos que demonstram as inquietudes vivenciadas no início da docência.

1 Letra e Vida: Programa de Formação de Professores Alfabetizadores é um curso destinado a

professores que ensinam a ler e escrever no Ensino Fundamental, envolvendo crianças, jovens ou

adultos, oferecido pelo Ministério da Educação, 2001. 2 Afetividade no Processo de Constituição e na Atuação do Educador, disciplina ministrada pela

professora doutora Laurinda Ramalho de Almeida, do Programa de Estudos Pós-graduandos em

Educação: Psicologia da Educação, da PUC-SP.

Page 15: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

15

O Capítulo 4 explicita o percurso metodológico que se inicia com a delimitação do

problema, e a opção pela técnica da entrevista para produção de informação, a caracterização

dos envolvidos na pesquisa, também o processo de análise dos dados coletados

O Capítulo 5 engloba a análise e discussão dos resultados.

O Capítulo 6 refere-se às considerações finais e, mais uma vez, retomo a Psicogenética

de Henri Wallon, na tentativa de elucidar a importância da relação eu-outro, dos meios e dos

grupos, na busca por compreender a pessoa numa perspectiva integradora.

Page 16: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

16

2 PROFESSOR INICIANTE: CONSIDERAÇÕES SOBRE PESQUISAS

REALIZADAS, REFERENTES TEÓRICOS SOBRE A FORMAÇÃO DE

PROFESSORES E CONTEXTO LEGAL

[...] falar da carreira docente não é mais do que reconhecer que os

professores, do ponto de vista do “aprender a ensinar”, passam por diferentes

etapas, as quais representam exigências pessoais, profissionais,

organizacionais, contextuais, psicológicas, etc., específicas e diferenciadas.

(GARCIA, 1999, p. 112)

2.1 O cenário das pesquisas

Adentrar no universo da pesquisa científica é percorrer um processo em busca de

respostas, é explorar novas formas de explicar a realidade buscando compreender as possíveis

lacunas nas teorias existentes. Cabe ao pesquisador encontrar um tema que contribua com a

Academia, seja relevante em um determinado momento histórico e que represente as suas

inquietações.

Sendo assim, a escolha do tema desta pesquisa pautou-se numa discussão sobre o

professor iniciante e o início da docência. Estes dois aspectos alimentaram as discussões na

tentativa de pensar sobre quem é esse profissional.

Invadida pelas inquietações decorrentes das aulas da disciplina “Afetividade no

Processo de Constituição e na Atuação do Educador”2 e pensando em minha trajetória

profissional fomos vislumbrando o meu tema de pesquisa.

O primeiro passo foi descobrir a quantas andavam a discussões sobre o tema,

reafirmando o grau de relevância deste estudo frente às contradições inerentes à realidade

vivida nesta etapa de iniciação à docência. Fomos3 buscar pesquisas anteriores para melhor

vislumbrar o cenário brasileiro. Partimos então do trabalho de Mariano (2006) que tratava

desta temática a partir da análise da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em

Educação (ANPED) e do Encontro Nacional de Didática e Prática de Ensino (ENDIPE), sob o

título “A construção do inicio da docência: um olhar a partir das produções da ANPED e do

2 Afetividade no Processo de Constituição e na Atuação do Educador, disciplina ministrada pela

professora doutora Laurinda Ramalho de Almeida, do Programa de Estudos Pós-graduandos em

Educação: Psicologia da Educação, da PUC-SP. 3 Adoto a linguagem no plural, pois se trata do início do processo de pesquisa desenvolvido

juntamente com a orientadora.

Page 17: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

17

ENDIPE”, eventos importantes da área da Educação. O trabalho apresenta uma análise das

pesquisas realizadas durante uma década, sendo o foco central das discussões o processo de

iniciação a carreira docente independente do nível de ensino. O autor conclui que entre os

aspectos relevantes que permeiam esse período encontram-se questões voltadas à socialização

profissional, os saberes docentes e os sentimentos de sobrevivência. Ainda, como aspecto

relevante à temática, aparecem questões em torno da formação profissional, citando também

os aspectos que muitas vezes são silenciados pelos docentes neste início, entre estes pode-se

citar questões voltada as políticas de formação, a pluralidade cultural e a relação entre o

professor iniciante e seus modelos de atuação profissional.

Outras fontes de pesquisas vieram permear os estudos entre os quais podemos citar

Lima (2006), com o título “Aprendizagem da Docência: dilemas profissionais dos professores

iniciantes”, que abordava a temática tendo como foco o processo de transição de estudantes

para professores e vice-versa, sendo esta uma fase de tensões, conflitos e dilemas, partindo do

pressuposto de que a prática que leva o professor à apropriação de seu saber e seu fazer é

aquela que vai além das demandas imediatas. A autora busca identificar os dilemas

profissionais tentando compreender como os conflitos/dificuldades existentes nas práticas dos

professores podem ser convertidos em saberes para a aprendizagem da docência.

Exploramos ainda o trabalho de Nono (2006), com o título “Processos de Formação

de Professores Iniciantes”, que traz um panorama de estudos realizados por Garcia (1999),

Huberman (1993), Tardif e Raymond (2000), Shulman (1992) e outros que sustentam a

importância de investigações relativas à etapa de iniciação na carreira docente. O trabalho

analisou o processo formativo de quatro professoras iniciantes na Educação Infantil e das

séries iniciais do Ensino Fundamental4, todas com média de cinco anos de docência.

Apresentou uma análise dos processos vividos no começo da carreira, apontando aspectos que

facilitam ou dificultam a iniciação profissional, a partir da construção e reconstrução

constante do perfil profissional, mostrando que, apesar das peculiaridades deste início, cada

um vivencia esse momento de forma particular, com os registros e impressões que

estabelecem com os diferentes grupos que forma a instituição escolar.

Outro trabalho encontrado foi de Rocha (2005), sob o título “Por uma política

institucional comprometida com o inicio da carreira docente enquanto um projeto coletivo”. O

4 Ensino Fundamental: destinado a crianças e adolescentes com idade entre seis e 14 anos. Em 1996,

assumiu o lugar do chamado Primeiro Grau, que era composto do curso primário (com duração de

quatro a cinco anos) e do curso ginasial (com quatro anos de duração). O Ensino Fundamental é

dividido em duas fases: a primeira vai da primeira a quinta série, incluindo a alfabetização e a

consolidação dos conteúdos básicos. A segunda vai da sexta a nona série.

Page 18: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

18

autor descreve a experiência de uma professora pedagoga, mestre e doutora em Educação,

iniciando os seus trabalhos na carreira docente. O estudo foi realizado a partir de entrevistas e

relatos orais no qual a depoente explicita as dificuldades enfrentadas em relação à gestão do

tempo, controle das situações, as necessidades específicas dos alunos, um início marcado por

uma aprendizagem intensiva e complexa, que sugere uma política institucional comprometida

com o início da docência como um projeto coletivo.

Também analisamos a pesquisa realizada por Papi (2008), sob o tema “O

desenvolvimento profissional de professores iniciantes e as pesquisas brasileiras”. Neste

trabalho, foi possível revisitar os resultados das pesquisas em relação à temática do professor

iniciante, a partir dos dados da ANPED e do ENDIPE e ainda entrar em contato com o

levantamento bibliográfico realizado nos Programa de Doutorado e Mestrado do Banco de

Teses da CAPES, durante os anos de 2000 a 2007. Tal levantamento permitiu a autora

organizar em linhas gerais os trabalhos encontrados em torno de três grandes grupos, sendo

que o primeiro grupo apresenta questões relacionadas à prática pedagógica do professor

iniciante e à iniciação em outras áreas profissionais, o segundo trata especificamente da

formação inicial e o terceiro grupo refere-se a trabalhos que discutem de forma mais profunda

a formação do professor em período de iniciação. Todo esse aporte teórico serve como

substrato para o desenvolvimento da pesquisa da autora, que privilegia o estudo de

professores iniciantes bem-sucedidos na tentativa de propor reflexões sobre as possíveis

intervenções nesta etapa da docência.

Outro trabalho que fez parte de nossos estudos e discussões refere-se a Freire (2011),

“Perspectivas e estilos do professor experiente e iniciante na formação: Questões teórico-

metodológicas”. Esta pesquisa contou com a participação de duas professoras de Língua

Portuguesa. Uma com 20 anos de carreira e outra com apenas um ano de atuação, ambas da

Rede Estadual de Ensino. O foco principal deste trabalho é verificar o procedimento de

instrução ao sósia, a fim de analisar suas contribuições ao futuro professor, partindo de suas

representações, perspectivas e estilos, sobre o ser professor num procedimento dialógico que

permite o debate acerca do ensino como trabalho.

Ainda usando como referência o levantamento de pesquisa do Banco de Teses da

CAPES, encontramos o trabalho de Santos (2012): “As investigações sobre a própria prática

de um professor sob o olhar da teoria da recontextualização” que apresenta de forma singular

uma reflexão em torno do papel do professor-pesquisador, que busca, a partir dos

conhecimentos empíricos e dos diferentes instrumentos disponibilizados por órgãos oficiais,

recontextualizar sua ação em sala de aula. O autor aposta no que ele chama de capacidade

Page 19: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

19

interna própria do professor, que permite ao mesmo reproduzir, adaptar, modificar os diversos

discursos aos quais está exposto, sem abrir mão do rigor, dos valores e das exigências entre os

dois papéis vividos.

Como parte deste cenário de pesquisa, encontramos ainda, o trabalho de Nogueira

(2011), com o tema “Trabalho docente e formação de professores: Os professores iniciantes e

suas práticas”. Priorizando como campo de pesquisa a Educação Infantil, seu texto apresenta

uma abordagem inovadora de pesquisa, que recebe o nome de pesquisa-formação. A proposta

está pautada na produção do conhecimento a partir de uma abordagem biográfica, onde as

narrativas dos professores iniciantes são aporte do processo reflexivo na construção do

trabalho docente. Seus resultados nos impulsionam a refletir sobre um processo de formação

que considera e coloca o professor frente à realidade em que atua, espaço propício a definir

estratégias metodológicas a partir da realidade na qual se encontra, sendo este o aspecto

disparador para a tomada de consciência do seu fazer pedagógico.

No trabalho de Costa (2011), “Pesquisas sobre professores iniciantes: o estado do

conhecimento no programa de pós-graduação em educação da Universidade Federal de São

Carlos”, encontramos um levantamento bibliográfico das dissertações e teses produzidas por

esta universidade reafirma a importância da relação entre a teoria e a prática, como também a

importância de um trabalho docente numa perspectiva colaborativa, a fim de minimizar o

sentimento de isolamento vivenciado pelo professor iniciante o que torna esse período ainda

mais complexo. Aponta ainda para a necessidade de se configurar as bases para a construção

da carreira docente.

Também citamos o trabalho realizado por Correa (2012), “As pesquisas sobre

professores iniciantes no Brasil: Uma revisão”, no qual, a partir da síntese de Papi e Martins

(2010) retoma os estudos realizados nos anos de 2008 a 2011 registrados nas reuniões anuais

de ANPED, os trabalhos registrados nos anos de 2008 a 2010 no Banco de Teses da CAPES,

também aponta dados internacionais. Em sua conclusão, elenca algumas das iniciativas

brasileiras de apoio a esta etapa da profissionalização, trazendo ainda um elemento inovador

para fazer partes das discussões: as fragilidades existentes também no âmbito das instituições

privadas. A autora reafirma, então, a relevância da temática e, portanto, a necessidade de se

garantir projetos e políticas públicas de apoio ao início da docência.

E para finalizar este levantamento, citamos o trabalho de André (2012), cujo tema é

“Políticas e programas de apoio aos professores iniciantes no Brasil”, que faz a análise dos

dados de quinze estudos de caso, buscando identificar políticas voltadas aos professores

iniciantes no Brasil. Este trabalho parte de uma pesquisa anterior coordenada por Gatti (2009),

Page 20: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

20

apoiado pela Organização das Nações Unidas para à Educação, a Ciência e a Cultura,

(UNESCO) e da Organização Internacional do Trabalho (OTI), que traz em seu bojo um

estudo sobre a formação inicial e continuada, documento de referência sobre a questão da

profissão docente no Brasil. Trata-se de uma pesquisa ampla onde os dados foram coletados a

partir de entrevistas, depoimentos, análises de documentos em diferentes estados e

municípios. A análise dos dados desta pesquisa apresenta programas de apoio ao professor

iniciante já existentes, dentre os quais é possível citar iniciativas como a do Estado do Espírito

Santo, do Estado do Ceará, bem como a criação do PIBID (Programa Institucional de Bolsa

de Iniciação a Docência) e o Programa Bolsa Alfabetização no estado de São Paulo em

parceria com instituições de ensino superior, busca aproximar a Universidade da escola.

Considerando toda essa trajetória que tinha por objetivo delinear o cenário das

pesquisas sobre a temática do professor iniciante, foi possível perceber que autores como

Veenman (1988), Huberman (1989), Garcia (2005), Imbernón ( 2004), Nóvoa (2007), Tardif

(2010), entre outros, que se dedicam à pesquisa de professores iniciantes, permeiam as

pesquisas aqui descritas. É possível afirmar que todas as pesquisas buscam melhor definir os

princípios envolvidos nesta temática, na tentativa de construir conceitos que definem o que é

ser um professor iniciante.

Entre os autores citados, percebe-se o seguinte consenso: os primeiros cinco anos de

docência são fundamentais para assegurar a compreensão sobre o processo de aprender a ser

professor. Processo que prevê o estabelecendo de uma forte relação entre a formação inicial, o

início da carreira e a formação continuada.

Esses autores também comungam a ideia que o início da carreira docente é marcado

pelo chamado choque da realidade, que representa o distanciamento entre o que é idealizado

e o que de fato existe. O sentimento de sobrevivência, que denota a sensação de impotência

diante das dificuldades que gera inclusive o desejo de abandonar a profissão e, ainda, o

sentimento de descoberta, quando o mesmo se percebe profissional.

A leitura de todos esses textos nos levou a entender que a fase de iniciação à docência

acontece de forma complexa, vivenciada de forma única. É marcada por diferentes etapas,

segundo Garcia:

Conceber a formação de professores como um processo contínuo, sistemático

e organizado, significa entender que a formação de professores abarca toda a

carreira docente. Falar da carreira docente não é mais do que reconhecer que

os professores, do ponto de vista do “aprender a ensinar”, passam por várias

etapas (pré-formação, formação inicial e formação permanente, de acordo com

Feimam, 1983) as quais representam exigências pessoais, profissionais,

Page 21: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

21

organizacionais, cotextuais, psicológicas, etc., especificas e diferenciadas.

(Garcia, 1999, p. 112).

Como vimos, estas etapas podem variar de acordo com as diferentes experiências

socioculturais nas quais este profissional encontra-se inserido.

2.2. Professor iniciante: pressupostos legais

É sabido que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN 9394/1996)

emerge num cenário de debates e discussões em busca de um novo conceito de

profissionalização de professores que se baseia numa perspectiva de um continuum de

formação. Este documento básico prevê inúmeras transformações no processo de formação

inicial (professor iniciante) e na formação continuada (professor em atuação). A mesma

estabelece mudanças significativas, dentre as quais podemos citar o previsto nos artigos que

seguem:

Art. 62. A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em

nível superior, em cursos de licenciatura, de graduação plena, em universidade e

institutos superiores de educação admitida como formação mínima para o exercício

do magistério na educação infantil e nas quatro primeiras séries do ensino

fundamental, a oferecida em nível médio na modalidade Normal.

Art. 63. Os Institutos Superiores de Educação manterão:

I. Cursos formadores de profissionais para a educação básica, inclusive o curso

normal superior destinado à formação de docentes para as primeiras séries do ensino

fundamental.

II. Programas de formação pedagógica para portadores de diplomas de educação

superior que queiram se dedicar a educação básica.

III. Programas de educação continuada para os profissionais das diversas áreas.

Esses pressupostos legais implicam uma mudança de paradigmas. Para alcançá-las, a

legislação definiu que os sistemas de ensino teriam dez anos para as devidas adequações,

tendo em vista que até então os professores que atendiam ao ensino fundamental (anos

iniciais) tinham formação no magistério em nível médio. Assim, impulsionados pelos

resultados das sucessivas avaliações no âmbito nacional e internacional, o Governo Federal,

Estados, Municípios e o Distrito Federal unem esforços buscando entender a magnitude, a

complexidade e importância da formulação e condução de uma política de valorização da

docência.

Outro marco legal que sustenta a importância de refletir sobre a complexidade desta

valorização encontra-se descrito nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de

Page 22: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

22

Professores para a Educação Básica (2002), que apresentam um conjunto de competências

pessoais, sociais e profissionais dos professores. Tratam-se de princípios que buscam garantir

a compreensão do processo de conhecimento, onde ensino e a aprendizagem são mediados

pela ação-reflexão-ação a partir de situações problemas, como descreve a seguir o parágrafo

3º do artigo 6º:

§ 3º A definição dos conhecimentos exigidos para a constituição de

competências exigidas, além da formação específica relacionada às

diferentes etapas da educação básica, propiciar a inserção no debate

contemporâneo mais amplo, envolvendo questões culturais, sociais,

econômicas e o conhecimento sobre o desenvolvimento humano e a própria

docência contemplado:

I. Cultural geral e profissional;

II. Conhecimento sobre as crianças, adolescentes, jovens e adultos, aí

incluídas as especificidades dos alunos com necessidades educacionais

especiais e as das comunidades indígenas;

III. Conhecimento sobre dimensão cultural, social, política e econômica da

educação;

IV. Conteúdos das áreas de conhecimento que serão objeto de ensino;

V. Conhecimento pedagógico;

VI. Conhecimento advindo da experiência.

Sabemos que o século XX é o momento de ampliação das discussões das questões

educacionais no Brasil. Se em meados da década de 70 e 80 temos a expansão da

escolarização da educação básica no país, na década de 90 surge uma nova explosão sobre tais

discussões que agora se preocupa com a qualidade da gestão escolar, com a atuação do

docente e com as aprendizagens pelas quais este profissional é responsável.

Este contexto político educacional coloca desafios a Estados e Municípios, que

buscam por meio de projetos e Políticas Públicas concretizar ações de apoio e preparo aos

futuros professores no âmbito de suas secretarias. Em São Paulo, por exemplo, a Secretaria de

Estado de Educação, através do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência,

proposto pelo Ministério da Educação e a Coordenadoria de Pessoal do Ensino Superior

(CAPES), instituiu o programa Bolsa Alfabetização, oferecido a alunos do curso de

Pedagogia e Licenciatura, que podem atuar como professor auxiliar nas classes de 2º anos.

Segundo Gatti, Barreto e André:

O programa Bolsa Formação: Escola Pública e Universidade articulam-se

com o Programa Ler e Escrever da SEE, que tem o objetivo ode garantir que

os alunos do Ciclo I do ensino fundamental desenvolvam o domínio da

leitura e da escrita até os 8 anos de idade. Alunos universitários, oriundos do

curso de pedagogia e letras (alunos-pesquisadores) auxiliam professores

Page 23: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

23

regentes na alfabetização e, além disso, transformam a experiência em

temário de análise e discussões nas Instituições de Ensino Superir (IES),

onde são acompanhados por seus professores orientadores. Um dos eixos do

programa Bolsa Formação (Bolsa Alfabetização) é a importância dada a

realização de uma pesquisa. Busca-se construir uma ponte entre o ambiente

da universidade e o contexto da sala de aula, além de contribuir para a

formação de futuros professores para o ensino fundamental. (GATTI;

BARRETO; ANDRÉ, 2011, p.134)

A partir do detalhamento destes pressupostos legais, é possível perceber a relevância

das pesquisas em relação ao professor iniciante. Com base na literatura, na legislação

relacionada e no pressuposto de que a produção do conhecimento científico é um processo de

construção, do qual fazem parte os conhecimentos anteriormente formulados, sabendo-se

ainda que o desenvolvimento de investigações e pesquisas são decorrentes das necessidades

econômicas, culturais, sociais e políticas, há de se considerar a relevância desta pesquisa.

É no contexto destas análises que surge o problema de pesquisa, que será detalhado ao longo

deste trabalho.

2.3 Princípios e conceitos

Muito se tem discutido sobre a profissão docente, porém buscar entendê-la em sua

complexidade nos impõe retomar alguns princípios e conceitos básicos sobre o processo de

formação. Para iniciarmos nossa discussão, tomamos como base o conceito de formação

defendido por Garcia:

A formação de Professores é a área de conhecimentos, investigação e de

propostas teóricas e práticas que, no âmbito de Didática e da Organização

Escolar, estuda os processos através dos quais os professores – em formação

ou em exercício – se implicam individualmente ou em equipe, em

experiências de aprendizagem através das quais adquirem, melhoram os seus

conhecimentos, competências e disposições, e que lhes permite intervir

profissionalmente no desenvolvimento do seu ensino, do seu currículo e da

escola, com o objetivo de melhorar a qualidade da educação que os alunos

recebem. (GARCIA, 1999, p.26)

A partir deste conceito o autor apresenta sete princípios que balizam a formação de

professores. O primeiro princípio diz respeito à necessidade de considerar a formação de

professores como um contínuo, no qual precisam estar presentes princípios éticos, didáticos e

pedagógicos. Este princípio é marcado pela ligação entre a formação inicial e a formação

Page 24: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

24

permanente do professor, o que implica dizer que a formação inicial não apresentará

“produtos acabados”.

O segundo princípio refere-se à necessidade de pensar a formação de professores e o

processo de mudança como aspectos que devem estar intimamente correlacionados. Neste

processo de simbiose, é o professor agente ativo, onde a formação e a mudança precisam ser

pensadas em conjunto, concomitantemente, impulsionando o sujeito a reaprender,

transformando assim a pratica docente, o que irá facilitar o processo de ensino e de

aprendizagem. O terceiro princípio complementa a ideia do anterior, refere-se ao locus de

trabalho docente como mola propulsora de transformação.

O quarto princípio retoma a importância da integração entre os conhecimentos

acadêmicos e os pedagógicos, como aporte para o desenvolvimento e estruturação do

conhecimento didático do conteúdo. Em quinto lugar, temos a importância da integração entre

a teoria e a prática; esta relação entre o conhecimento teórico e o conhecimento prático deve

permear o currículo e orientar a ação.

O sexto princípio refere-se ao isomorfismo que, segundo o autor, diz respeito ao tipo

de formação oferecida durante a formação inicial deste profissional e o que de fato lhe será

exigido, o que sugere que a formação considere a construção do conhecimento didático do

conteúdo, bem como, a forma como esse conhecimento será transmitido. O sétimo e último

princípio é caracterizado pela necessidade de individualização no processo de formação, pois

aprender a ensinar não é um processo homogêneo, o mesmo acontece de forma para os

diferentes sujeitos. Este princípio considera as características pessoais, cognitivas, contextuais

e relacionais do professor (idiossincrasia) como indivíduo, bem como do grupo de

professores. Retomamos aqui as ideias do autor para reafirmar que:

É necessário adotar uma perspectiva que salienta a importância da indagação

e o desenvolvimento do conhecimento a partir do trabalho e reflexão dos

próprios professores. Isso implica que os docentes sejam entendidos não

como consumidores de conhecimento, mas como sujeitos capazes de gerar

conhecimentos e de valorizar o conhecimento desenvolvido por outros. (...)

A formação de professores deve promover o contexto para o

desenvolvimento intelectual, social e emocional dos professores”.

(GARCIA, 1999, p. 30)

Tamanha complexidade exige romper com a anestesia reprodutora, dominante e

contraditória à atuação de uma docência crítica como ferramenta para transformação da

realidade social.

Page 25: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

25

2.4 Ingresso e atuação na docência

Ainda na perspectiva de Garcia (1999), faz-se necessário abrir espaço neste temário de

pesquisa para refletir sobre o momento de ingresso e o início da atuação na docência.

Entendemos aqui o termo ingresso como a melhor forma de adentrar no mundo de uma

profissão.

Após o processo de formação inicial, o docente passa a percorrer a etapa de iniciação à

docência. Este período deve ser entendido como parte de um contínuo, de um processo mais

amplo, que irá desembocar no desenvolvimento profissional do professor. Este período

contempla os primeiros anos de atuação, momento em que o professor encontra-se num

processo de transição, de socializa-se com um sistema, onde realiza seu trabalho, mediante a

uma prática de ensaio/erro.

Defrontar-se com problemas que podem ser determinantes em sua constituição. Tais

conflitos podem se caracterizar por um processo de imitação de modelos e condutas de outros

professores. O isolamento, provocado em muitos casos pelos pares, pode acarretar em uma

dificuldade para transferir os conhecimentos construídos ao longo da etapa de formação

inicial e ainda questões vivenciadas no cotidiano, podem levar o professor iniciante a uma

apropriação de condutas meramente técnicas de ensino.

Em seus estudos, Garcia (1999, p. 118-119) aponta para um levantamento feito por

Zimpher (1988) que demonstra a importância de programas de apoio ao professor iniciante, a

partir da observação dos seguintes aspectos:

1. Frequentemente, são atribuídos aos professores principiantes cargos

de docência com grandes problemas em relação à gestão da classe;

2. De modo geral, existe a falta de colaboração entre os professores e é

dado pouco apoio aos professores principiantes;

3. Os professores lutam contra o caos e o estresse durante os primeiros

anos de docência, salientando sobretudo o calor prático;

4. A instituição escolar tem, relativamente aos professores principiantes,

as mesmas expectativas que tem face aos veteranos;

5. O Ensino Superior assume pouca responsabilidade na fase da

iniciação;

6. Os professores principiantes têm poucas oportunidades de contato

com modelos de ensinos variados e eficazes.

Page 26: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

26

Podemos então afirmar que o ingresso e o início da atuação do professor iniciante

dependem das diferentes experiências, dos modelos, da estrutura burocrática do grupo ao qual

faz parte, dos colegas como elemento primordial. Daí a importância de garantir os “programas

de iniciação” (Garcia, 1999), como recurso para unir a formação inicial ao desenvolvimento

ao longo trajetória do professor como garantia de integração e adaptação do novato à cultura

escolar.

2.5 Saberes docentes

Em relação aos conceitos e princípios da formação de professores, pretendemos aqui, à

luz dos pressupostos de Tardif (2002), suscitar discussões em torno dos saberes docentes. Ao

perceber o docente como sujeito do conhecimento, o autor sugere uma mudança de paradigma

no que diz respeito ao processo de formação, pois entende que o docente possui saberes

específicos em relação ao seu ofício e, sobretudo, defende a ideia de que seu locus de trabalho

não pode ser reduzido apenas a um espaço de aplicação de saberes produzido por pesquisas,

mas um local de produção e construção do conhecimento mobilizadas a partir dos saberes e da

realidade do trabalho docente. Segundo o autor:

“se a pesquisa universitária vê nos professores sujeitos do conhecimento, ela

deve levar em consideração seus interesses, seus pontos de vista, suas

necessidades e suas linguagens, e assumir isso através de discursos e práticas

acessíveis, úteis e significativas para os práticos.” (TARDIF, 2002, p. 11)

O autor nos convida a pensar em uma nova concepção de formação. Afirma que o

saber está a serviço do trabalho. Com esta afirmação, entende-se que o saber do professor traz

as marcas do seu trabalho, que é produzido e modelado no e pelo trabalho e, a partir daí,

busca-se explicar a diversidade do saber no qual estão presentes o processo de formação, o

currículo, os diferentes instrumentos de trabalho etc.

Afirma ainda que o saber docente é plural e heterogêneo, pois o mesmo se constitui a

partir de uma história de vida e de uma trajetória profissional, o que prevê um aprender a

ensinar a partir da socialização, da consolidação, onde se faz presente continuidade e rupturas

que marcam a carreira profissional. Os saberes docentes considerados neste trabalho são:

- Os saberes da formação profissional (das ciências da Educação e da ideologia

pedagógica), caracterizados pelo que é transmitido nas instituições de Educação que

pressupõem a formação inicial ou contínua dos professores. O autor chama a atenção para o

Page 27: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

27

tipo de relação estabelecida entre esses dois aspectos, pois é muito comum a lógica da divisão,

onde se constitui um grupo de produtores do saber e outro de meros executores ou técnicos.

- Os saberes disciplinares que estão totalmente voltados para os saberes construídos na

instituição universitária e se incorporam à identidade do professor através dos processos de

formação (inicial e contínua). Pode-se dizer que recebem esse nome pois correspondem às

diferentes áreas do conhecimento destas instituições e que são organizados a partir de

determinados grupos sociais.

- Os saberes curriculares, aqueles dos quais os professores se apropriam ao longo da

carreira. Nestes estão presentes a definição dos objetivos, conteúdos e métodos que os

professores aprendem e aplicam.

- Os saberes experiências, que colocam os professores no exercício da sua função e na

prática de sua profissão. São oriundos das experiências individual e coletiva. Estes são

constituídos entre os pares, isto é, saem da subjetividade e adquirem objetividade a partir das

experiências coletivas que são partilhadas, sendo a partir daí possíveis dispositivos capazes de

informar e formar, podendo inclusive fornecer respostas a problemas na prática docente.

Reiteramos aqui as ideias de Tardif sobre o professor iniciante e os saberes da

profissão:

O relacionamento dos jovens professores com os professores experientes, os

colegas com os quais trabalhamos diariamente ou no contexto dos projetos

pedagógicos de duração mais longa, o treinamento e a formação de

estagiários e de professores iniciantes, todas essas são situações que

permitem objetivar os saberes da experiência. Em tais situações, os

professores são levados a tomar consciência de seus próprios saberes

experiências, uma vez que devem transmiti-los e, portanto, objetivá-los em

parte, seja para si mesmos, seja para seus colegas. Neste sentido, o docente é

não apenas um prático, mas também um formador. (TARDIF, 2002, p. 52)

Estes pressupostos nos levam a refletir sobre as competências e habilidades das quais

os professores, sejam iniciantes ou os experientes na profissão, precisam ter se apropriado,

como garantia de posteriormente poder mobilizá-las e integrá-las, como condição à sua

prática.

2.6 O ciclo de vida profissional dos professores

Ainda na tentativa de contextualizar o cenário de discussão em relação ao professor

iniciante, elencamos as contribuições de autores sobre o ciclo de vida dos professores. Neste

Page 28: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

28

sentido, recorremos a ideias de Huberman que, em seus estudos, traz uma reflexão em torno

da entrada na carreira docente. Este autor sugere algumas fases pelas quais perpassa o

professor iniciante.

Explicitamos a princípio o conceito de carreira por ele utilizado para sustentar suas

ideias. Segundo o autor, “carreira” sugere “estudar o percurso de uma pessoa numa

organização (ou numa série de organizações) para compreender como as características dessa

pessoa exercem influência sobre a organização e são, ao mesmo tempo, influenciadas por ela”

(HUBERMAN, 1992, p. 38).

Neste contexto, o autor sugere algumas etapas que constituem a carreira docente,

classificando a primeira fase que se configura como o início da escolha da carreira como a

“fase de estabilização”. Num segundo momento da carreira, o docente vivencia a “fase de

diversificação”, passando posteriormente pela fase que recebe o nome de “pôr-se em

questão”, seguida da “fase de serenidade e distanciamento afetivo”. Ainda se encontra

prevista neste percurso a “fase do conservantismo e lamentações” e, encerrando esse

processo, a fase que recebe o nome de “desinvestimento”.

Neste trabalho, considerando a problemática em questão, que busca saber quais as

emoções e sentimentos presentes no início da docência, tecendo considerações sobre como o

coordenador pedagógico e/ou pares (professores), podem contribuir na entrada da profissão,

daremos visibilidade às duas primeiras fases de entrada na carreira docente que se referem à

fase da estabilidade e à fase da diversificação. Para tanto acredito ser necessário um maior

delineamento de como estas duas fases estão caracterizadas.

- Fase da estabilização docente

Caracteriza-se pelo momento de exploração e decisões provisórias. Neste período estão

presentes sentimentos de comprometimento definitivo, tomada de responsabilidade, decisivo

na construção da identidade deste profissional. Trata-se de um momento de transição entre

uma escolha subjetiva e uma nomeação oficial, marcado pelo desejo de pertencer a um corpo

profissional e pela busca da independência (libertação), tendo em vista os pares, ou seja,

colegas de trabalho e as autoridades (equipe gestora). Em relação aos aspectos pedagógicos,

precede um sentimento de “competência pedagógica” que está intimamente ligado à confiança

em sua atuação o que emerge na busca do seu próprio estilo.

- Fase da diversificação

Page 29: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

29

Esta fase pode ser entendida como um período de experimentação, onde o profissional

lança mão de suas experiências pessoais e sente-se seguro para diversificar, analisar

criticamente o material didático, o processo de avaliação, apresentando maior domínio no

gerenciamento pedagógico da sala de aula, bem como dos seus alunos,

É também nesta fase que muitos profissionais movidos por esse sentimento de

diversificação apresentam outras ambições profissionais, sentindo-se seguros para ir à busca

de novos desafios.

Durante esta fase, o professor busca novos estímulos, novas ideias, novos

compromissos. Sente a necessidade de se comprometer com projetos de

algum significado e envergadura; procura mobilizar esse sentimento,

acabado de adquirir, de eficácia e competência. (COOPER, 1982, apud

HUBERMAN, 1995, p. 42).

A incessante busca por novos rumos na profissão demonstra o quanto este profissional

encontra-se motivado, sente-se seguro quanto a sua carreira e comprometido com o coletivo, o

que garante maior entusiasmo pela profissão. Conhecer as fases que determinam o ciclo de

vida docente traz inúmeras contribuições que permitem minimizar agruras da profissão,

presentes tanto no início da docência quanto ao final dela.

Estes autores nos fornecem elementos importantes para a reflexão em torno dos

diferentes conceitos sobre o professor no inicio da docência. No entanto, a busca pelos

sujeitos desta pesquisa levou-me a resignificar o conceito de professor iniciante. Minha

proposta inicial era buscar sujeitos que estivessem vivenciando o período de iniciação, ou

seja, que se encontravam no primeiro ano de atuação, pois como sabemos:

(...) a iniciação ao ensino é o período de tempo que abarca os primeiros anos,

nos quais os professores fazem a transição de estudantes para professores. É

um período de tensões e aprendizagens intensivas em contextos geralmente

desconhecidos, e durante o qual os professores principiantes devem adquirir

conhecimento profissional além de conseguirem manter um certo equilíbrio

pessoal. (BORKO, 1986 in GARCIA, 1999, p. 113)

Se a pesquisa acadêmica e os referenciais teóricos aqui apresentados definem como

professor iniciante aquele que adentrou a docência depois de ter passado por um processo de

formação inicial, que por muitas vezes tem pouca ou nenhuma experiência com o espaço da

sala de aula, na prática, foi possível perceber que ser professor iniciante na rede pública do

estado de São Paulo apresenta desdobramentos que vão além das questões conceituais.

Page 30: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

30

Implica, pois, conhecer o estatuto do magistério paulista, pensar no plano de carreira,

entender o processo de atribuição de aulas e principalmente ouvir aqueles que todos os anos

percorrem os corredores de muitas escolas, aprisionados às incertezas de um sistema

educacional carente de ações sistematizadas. Ações que possam minimizar as lacunas

existentes entre os pressupostos filosóficos e metodológicos, com os seus fins e a sua

realidade concreta, na busca da formação de um cidadão completo, humanista e

transformador.

Para melhor entender esse paradoxo, o detalhamento deste processo será especificado

no capítulo que se destina ao percurso metodológico.

Page 31: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

31

3 PROFESSOR INICIANTE: A AFETIVIDADE COMO MEDIADORA DA

CONSTITUIÇÃO DA DOCÊNCIA

Escrever é procurar entender, é procurar reproduzir o

irreproduzível, é sentir até o último fim o sentimento que

permaneceria apenas sufocado. Escrever é também

abençoar uma vida que não foi abençoada.

Clarice Lispector (2011), p. 195

Como me tornei professora? De onde vem esse desejo de ensinar? Recorro a estas e

outras perguntas para tentar explicar a escolha do tema para o meu projeto de pesquisa.

Faço parte de uma família de doze filhos, sendo oito mulheres e quatro homens, dos

quais quatro são professoras. Meus pais – pessoas simples, mas de muita influência na

pequena cidade de Boquim, no menor estado da Federação brasileira, Sergipe – viveram em

uma época em que o ensino era o bem mais precioso a se deixar para um filho. Aliás, era a

casa em que viveram todos os meus irmãos era o reduto de professores que vinham de outra

cidade para lecionar na chamada escola rural.

Esses eram acolhidos em nossa casa, sendo meu pai o “administrador de bens alheios”,

nome dado a um tipo de feitor ou pessoa responsável pela ordenação de despesas desses

profissionais. Assim vivemos mergulhados num contexto escolar. Minha mãe nunca foi à

escola, mas trazia em seu discurso a importância do aprender e, com sua sensibilidade e

determinação, encaminhou todos à escola. Deixava claro em seu provérbio a importância de

aprender e como esse conhecimento poderia transformar a vida das pessoas. Era com ele que

todo o dia nos tirava da cama para nos colocar a caminho da escola.

Filha mais nova desta lista de herdeiros, educados seguindo valores como integridade,

união, incentivo, amor, justiça, respeito e muita, muita determinação, recebo meu primeiro

diploma da família do curso de Magistério.

Estávamos na década de 1980. Na época, o Magistério era um curso que fazia parte do

Ensino Médio. Mal terminei a Educação Básica e já sabia que queria ser professora. Mas de

onde vinha essa certeza pela profissão? É impossível não identificar em minha vida a

influência de toda essa história familiar em minha escolha profissional.

Retrocedendo no tempo, tenho gravadas em minha memória várias lembranças das

diferentes escolas por onde passei. Morando já em São Paulo, desde muito cedo fui inserida

no contexto escolar. Nesta época, sem a presença do meu pai, que havia falecido devido a

uma doença com a qual conviveu durante muitos anos, a escola era para mim não somente o

lugar para aprender, mas também onde era cuidada. Lembro-me da primeira escola de

Page 32: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

32

Educação Infantil, ficava ao lado de um Parque, bem no centro de São Paulo. Recordo-me do

medo e de como era difícil deixar os braços da minha mãe e ficar com a tia, que prontamente

me acolhia. Chorava muito e, depois de algum tempo, o que para mim, uma criança com

apenas quatro anos e meio era uma eternidade, ia brincar.

Era muito tímida e tinha poucos amiguinhos, então corria para perto das grades que

cercavam a escola e ia colher hibiscos com os quais adorava brincar. As tias gostavam muito

de mim. Minha mãe contava que ficava escondida entre as árvores até que eu parasse de

chorar e só depois ia trabalhar.

Ainda nesse período, lembro-me de uma festa da Páscoa, já em outra escola, ainda na

Educação Infantil, agora mais perto de casa no município de Guarulhos. As crianças vestidas

de coelhinho e minha mãe chegando exausta no final da festa, depois de um dia de trabalho.

Ela dava muita importância aos acontecimentos da escola, não faltava a uma reunião de pais,

era sempre a última a chegar e ali ficava.

Depois que todos os outros pais iam embora, sentava-se perto da professora e

conversava tranquilamente sobre meu rendimento, comportamento, etc. Neste momento, eu

não podia estar por perto. Ao finalizar a conversa, me chamava para junto dela e da

professora, dizia o quanto a professora era boa, o quanto confiava em seu trabalho e

aproveitava para afirmar a importância de ser uma boa aluna, respeitar os coleguinhas,

respeitar a professora e fazer as tarefas.

No começo da Educação Básica, meu primeiro ano foi em uma escola na região nobre

de São Paulo, escola para elite. Lembro-me de sermos duas, as crianças carentes, negras da

escola. Éramos filhas de empregadas domésticas. Nossos uniformes estavam sempre

impecáveis, a disciplina era rigorosa e o comportamento tinha que ser exemplar.

Qualquer falha e os pais eram chamados a responder pelos seus filhos e, no nosso

caso, corríamos o risco de perder a vaga, que era uma concessão cedida por pessoas de

influência. Neste ano, tomei minha primeira suspensão e minha primeira surra, por causa de

uma briga na escola.

Menti para minha mãe, sabia o quanto ela ia ficar triste se soubesse do acontecido,

tinha medo de eu não ser mais aceita na escola. Lembro que ela chorou muito, dizia o quanto

foi difícil conseguir aquela vaga, o quanto a escola era boa, tentava mostrar-me a importância

dos estudos. Mas também não deixou por menos, durante aquela semana de suspensão

passava todos os dias na escola e trazia as lições para que eu fizesse em casa. Esta é a única

lembrança que tenho do primeiro ano de escola.

Page 33: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

33

Aprendi a ter responsabilidade com os estudos desde muito cedo. Lembro-me de

cuidar de dois sobrinhos que iam para escola comigo. Época difícil essa. Pegávamos ônibus e

quando voltávamos, era responsável por ajudar os dois nos deveres de casa. O diretor dessa

escola era um senhor simpático, chamava-se professor João, a quem encontrei anos atrás e o

qual foi responsável pelo processo de aprovação do recurso para custear meu curso do

Mestrado.

Lembro-me também da caseira da escola que cuidava de mim a pedido da minha mãe.

Já na sala de aula os problemas eram só meus. Cometia um mesmo erro ortográfico

constantemente e de nada adiantava aquelas repetidas listas de palavras para copiar.

Nessa época quase perdi o ano, éramos duas, eu e minha amiga Claudia, a sofrer com

a perseguição da professora sobre nossas fragilidades em Língua Portuguesa. Em matemática,

nem se fala, castigo não nos faltava.

Estava na segunda etapa da Educação Básica quando tomei meu primeiro zero.

Recebia prova de matemática corrigida, ou melhor, totalmente rabiscada e logo nas linhas

iniciais um “zero” escrito em vermelho, que ocupava grande parte da folha. Esperei a

professora se afastar um pouco, peguei a prova, amassei e enfiei debaixo da carteira.

Pensei que a professora não tivesse visto, mas me enganei, não só viu como mandou

chamar minha mãe. Chegar a casa naquele dia não foi fácil, lembrava do ocorrido anos antes.

Dessa vez não apanhei, mas no dia seguinte estava eu, a pedir desculpas à professora na frente

da minha mãe, que mais uma vez deixou muito claro o valor da escola e a importância do

aprender. Durante esta conversa da minha mãe com a professora ficava pensando: Será que,

se tivesse tirado dez, a professora teria sido tão enfática na escrita da nota?

Assim fui caminhando nos estudos, sempre uma aluna regular, “nota C” mesmo,

sempre ouvindo o provérbio da minha mãe: “Lenha verde mal acende, quem muito dorme

pouco aprende.” Não entendia ao certo o que queria dizer, mas sabia exatamente que era lá na

escola que estaria à chave para o meu futuro, ela acreditava nisso e eu também. Sabia que a

escola podia mudar a minha vida.

Já nas séries de final de ciclo, continuava sem entender o objetivo de tantas cópias em

Estudos Sociais, com a professora Eunice. Nessa época, na sala de aula chegou uma aluna

com deficiência visual chamada Paula. Fui colocada ao seu lado como leitora oficial durante

as aulas. Minha função era ditar os inúmeros textos colocados na lousa, e foi assim durante

todo a segunda etapa da Educação Básica. Lembro que por muitas vezes éramos as últimas a

sair da sala de aula.

Page 34: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

34

Nesse período já comecei a trabalhar, cuidava de uma criança e era responsável

inclusive por acompanhá-la em suas lições. Anos depois, para o ingresso no Ensino Médio,

escola técnica muito concorrida, era preciso fazer o tal vestibulinho. Embora tenha sido

aprovada para o curso do Magistério, não pude efetuar matrícula porque estava trabalhando.

Conclusão, foi preciso mudar os planos, fiz matrícula em uma instituição de ensino

particular que tinha o curso do Magistério à noite e foi aí que encontrei uma professora que

muito me influenciou. Ela dava aula de didática e era apaixonada pelo magistério. Não perdia

uma aula, estranhamente não lembro seu nome, mas tenho sua fisionomia em minha memória.

Os inúmeros trabalhos dedicados à aprendizagem do ofício de professor

colocam em evidência a importância das experiências familiares e escolares

anteriores à formação inicial na aquisição do saber-ensinar. Antes mesmo de

ensinarem, os futuros professores vivem em salas de aulas e nas escolas – e,

portanto, em seu futuro local de trabalho. [...] Ora, tal imersão é

necessariamente formadora, pois leva os futuros professores a adquirirem

crenças, representações e certezas sobre a prática do ofício de professor, bem

como sobre o que é ser aluno. Em suma, antes mesmo de começarem a

ensinar oficialmente, os professores já sabem de muitas maneiras, o que é o

ensino por causa de toda a sua historia escolar anterior. (TARDIF, 2010, p.

20)

Cansada do trabalho como babá, fui ser secretária em um consultório de advocacia,

não tinha muita escolha, precisava trabalhar, foi um período de frustração. Eram três

advogados, de áreas diferentes, odiava aquelas correspondências judiciais, agendamento de

audiências, controle de agendas etc. Sentia-me entediada, aprisionada. O serviço não rendia e

o tempo não passava. Minha mãe me incentivava e dizia para eu não abandonar meu sonho,

que acredito também era o dela: ser professora.

Nesse mesmo período recebi um convite para dar aula numa escola de Educação

Infantil, a diferença de salário era enorme, mas não me importei, larguei o escritório e aceitei

o convite.

Lá faltava tudo: diretora, funcionários, material didático, parque para as crianças. Era

preciso improvisar. Sobrava o sonho de ensinar, de ser professora. Comecei como professora

auxiliar e torcia para que a professora regente faltasse, para poder dar aula. Adorava estar

diante do quadro negro, preparar as aulas. Na verdade, reproduzir as aulas, pois tínhamos um

caderninho com tudo pronto para cada turminha, era só copiar.

Não gostava muito daquele caderno, era o modelo que tínhamos, mas isso não mudava

meu desejo de ensinar. Foi assim que descobrir a relação que existia entre aquele caderno e

muito do que fazíamos nas aulas do magistério. Aquelas atividades lembravam uma linha de

Page 35: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

35

produção, onde tudo tinha um padrão. Isso me incomodava, queria inovar, criar minhas

próprias atividades. Juntas eu e minha amiga Conceição, a que me ofereceu o emprego,

tínhamos ideias revolucionárias para a época, mesmo com pouca experiência já acreditávamos

numa escola onde o conhecimento não é algo pronto e acabado, pois:

Ele se constitui pela interação do indivíduo com o meio físico e social, com

o simbolismo humano, com o mundo das relações sociais; e se constitui por

força de sua ação e não por qualquer dotação prévia, na bagagem hereditária

ou no meio, de tal modo que podemos afirmar que antes da ação não há

psiquismo nem consciência e, muito menos, pensamento. (BECKER, 2009,

p. 2)

Defendíamos a ideia da interação no processo de aprendizagem e do lúdico como

forma de a criança comunicar-se com o mundo, percebendo a existência do outro,

estabelecendo relações sociais, o que contribui para o seu desenvolvimento integral. Assim

organizávamos atividades que envolviam diferentes linguagens. Numa festa nessa escola da

qual minha mãe participou, ouvi-a dizer o quanto se orgulhava de ter uma filha professora. Eu

era a primeira a me formar na família!

Cinco anos mais tarde, mudança de percurso: casei e fui morar em outro município,

deixei a Educação Infantil e fiz um concurso para ajudante do desenvolvimento infantil.

Passei em segundo lugar e logo fui chamada a assumir a função. Durante a entrevista, Soraya,

a psicóloga e assistente social, ficou surpresa ao examinar meu pequeno currículo e estranhou

o fato de ter feito tal concurso, pois ali não poderia atuar na minha profissão: “Você é

professora, precisa dar aula, não cuidar de bebês”, dizia ela.

Precisava trabalhar, era o sonho da estabilidade. Estava numa creche da prefeitura,

onde tudo era extremamente organizado, tinha espaço para diversas atividades, área de lazer,

farto material didático e pedagógico. Inconformada, a psicóloga encontrou uma atividade

exclusiva para mim. Fui indicada para assumir uma sala de atividades direcionadas.

Tratava-se de um espaço em que as crianças iam uma vez por dia fazer atividades

lúdicas. Possuía diferentes materiais, entre eles os didáticos para o ensino da Língua

Portuguesa e da Matemática. Respeitando a idade de cada turma e o grau de interesse, ia

proporcionando contato com o mundo das letras e dos números para aquelas crianças. Fiquei

neste emprego por apenas um ano e, mais uma vez movida pelo desejo de ser professora,

abandonei a estabilidade do cargo na prefeitura e resolvi aventurar-me como estagiária na

rede pública estadual.

Page 36: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

36

Era 1992, fui participar de uma atribuição de classe/aulas, tudo aquilo era novo e

assustador. Depois de algumas horas de espera, finalmente me fora atribuída uma escola na

periferia de Guarulhos, município vizinho ao que morava. Fiquei muito feliz e, seguindo as

instruções, fui rapidamente me apresentar à escola. Durante o percurso ficava pensando em

como seria recebida. Lembrava dos estágios ao longo do curso do Magistério, em que sempre

permanecia no fundo da sala observando o professor realizar sua aula. Lembrava-me de Dona

Áurea, professora que abriu as portas de sua sala para eu cumprir minhas horas de estágio.

Junto a essa lembrança vinha também à da sala de aula, onde os alunos eram divididos por

fileiras, classificados por seu nível de aprendizagem, em forte, média e fraca em sua maioria.

Afastava essa ideia da cabeça e logo pensava: Vou fazer diferente! Era minha primeira

experiência como professora de Educação Básica, atual Anos Iniciais, ou seja, professora

iniciante. Finalmente estava dando entrada na carreira, vivendo o momento da descoberta.

Neste contexto afirma Hubermam:

(...) o aspecto da “descoberta” traduz o entusiasmo inicial, a experimentação,

a exaltação por estar, finalmente, em situação de responsabilidade (ter a sala

de aula, os seus alunos, o seu programa), por se sentir colega num

determinado corpo profissional. (Hubermam, 1989, p. 39)

Na escola, fui recebida pela secretaria que formalizou as questões burocráticas e me

encaminhou à sala dos professores. Fui informada que a diretoria chegaria mais tarde.

Lembro-me de ter recebido uma rápida orientação sobre questões organizacionais e mais

nada. Nos meses que se seguiam, ficava na sala dos professores e só ia pra sala de aula

quando faltava um professor, o que acontecia muito raramente. Cumpria metade da carga

horária do professor e tinha uma ajuda de custo, em dando aula, ganhava por horas adicionais.

A escola era precária, espaços mal acabados, pessoas mal humoradas e de pouca

conversa. Na sala dos professores o assunto eram políticas partidárias e direitos sindicais. O

pedagógico nem passava por perto. Na hora do intervalo, as queixas eram a respeito dos

alunos, do quanto eram indisciplinados, desinteressados e não aprendiam.

As reuniões de professores giravam em torno dos mais variados assuntos e sempre

terminavam com nada decidido. Nesta época ouvi de uma professora chamada Escolástica,

uma das professoras mais velhas da escola, que tinha a liderança no grupo, que influenciava

nas decisões da administração e que nunca tinha dirigido a palavra a mim – aliás, fato este

muito comum entre todos os professores –, a seguinte frase: “No magistério é assim, enquanto

Page 37: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

37

uns choram, outros riem”. Estava ali tendo contato com o que diz Tardif, quando cita as três

fases que constituem o início da carreira docente referindo-se ao coletivo da escola.

O grupo informal de professores inicia os novatos na cultura e no folclore da

escola. Diz-se claramente aos novatos que devem interiorizar esse sistema de

normas. Os novatos são também inteirados a respeito do sistema informal de

hierarquia entre os professores. Embora não sendo reconhecido pela

administração, esse grupo, em particular aqueles que estão no topo dessa

hierarquia, exerce uma profunda influência sobre o funcionamento cotidiano

da escola. Os novos professores, principalmente os mais jovens,

compreendem rapidamente que estão na parte mais baixa da hierarquia,

sujeitos ao controle de diversos subgrupos acima deles. Em contato com

esses grupos, eles ficam por dentro de elementos como a roupa apropriada,

assuntos aceitáveis nas conversas e qual o comportamento adequado. Essas

regras informais, que tratam essencialmente de assuntos não acadêmicos,

representam um segundo choque com a realidade para os novos professores.

É na famosa (ou infame) sala dos professores que essas normas são

inculcadas e mantidas. (EDDY, 1971, p. 186, apud TARDIF, 2002)

Meses depois fui informada que assumiria uma sala de aula, cuja professora tinha

tirado licença por tempo indeterminado e motivo não informado. Fiquei muito feliz, pois

estava diante de mim a possibilidade de torna-me então professora em uma escola estadual,

ter uma sala de aula minha e alunos meus. Fui encaminhada para a sala.

Era uma turma considerada a “escória” da escola. Alunos repetentes, fora da

idade/série, marginalizados, rotulados por uma história de fracasso escolar, desacreditados da

família, da escola e da sociedade. Tinha terminado o Magistério havia exatamente dois anos,

estava iniciando na profissão, diante de uma realidade cruel e solitária. Vivi neste momento o

chamado “choque da realidade” (TARDIF, 2002), pois tinha diante de mim alunos que em

nada lembravam o aluno ideal, almejado durante o curso do Magistério.

Estava diante da minha falta de experiência, sentia-me sozinha, não conseguia

estabelecer o diálogo na sala de aula, envolver os alunos em atividades. Muitas vezes ficava

por horas observando todos aqueles meninos e meninas, sentados nas últimas fileiras da sala

de aula, com instrumentos de percussão nas mãos que eles mesmos traziam, cantando,

batucando. Meninos que tinham o meu tamanho e resolviam seus problemas muitas vezes na

base da violência.

Havia também os mais novos, era a minoria e sentavam sempre nas primeiras fileiras.

Esses conversavam comigo e diziam que queriam aprender coisas que os outros alunos

aprendiam, sentiam-se acuados e intimidados pelos mais velhos. Sentia-me frente ao que dizia

Wallon em relação aos grupos:

Page 38: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

38

O grupo é indispensável à criança, não somente para a sua aprendizagem

social, como também para o desenvolvimento de sua personalidade e para a

consciência que ela terá desta última. O grupo a coloca entre duas exigências

opostas. Por um lado, há a afiliação ao grupo como conjunto, senão o grupo

Perse sua qualidade de grupo. A criança deverá assimilar seu caso a de todos

os outros participantes; deverá identificar-se com o grupo em sua totalidade,

ou seja, com indivíduos, interesses e aspirações. Por outro lado, só poderá

agregar-se verdadeiramente ao grupo se entrar em sua estrutura, ou seja,

assumindo um lugar e um papel determinado, diferenciando-se dos outros,

aceitando-os como árbitros de suas façanhas e fraquezas. Em resumo,

assumindo entre os outros membros a postura de indivíduo distinto que tem

sua autoestima e suja autonomia, consequentemente, não pode ser ignorada.

(WALLON, 1986, p. 176)

Chegava à escola e o medo me assolava. Tentava conversar com os professores mais

velhos, mas isso era impossível, não havia um coordenador pedagógico que pudesse me

apoiar. O jeito era encarar a turma e os desafios. Recorro aqui aos pressupostos wallonianos

que afirmam ser “o conjunto afetividade a disposição do indivíduo de ser afetado pelo mundo

interno/externo por meio de sensações de tonalidades agradáveis e desagradáveis.”

(ALMEIDA, 2012, p. 87)

A ordem da diretora era a de manter o aluno na sala de aula e garantir o silêncio para

não atrapalhar os demais professores. Na hora do intervalo era constantemente chamada para

resolver problemas de agressão contra alunos menores, de outras salas. Lembro-me de que

ficamos uma semana sem partilhar o tempo do recreio por conta da indisciplina. Saíamos

antes, a merenda era servida, havia cinco minutos para banheiro e voltávamos para a sala de

aula.

Foi nesse contexto que percebi que tudo que havia aprendido durante o curso do

Magistério, os estágios dos quais participara, nada ou pouco me ajudavam a resolver os

conflitos desta profissão.

“Essa fase crítica e de distanciamento dos conhecimentos acadêmicos

anteriores provoca também um reajuste nas expectativas e nas percepções

anteriores. É necessário rever a concepção anterior de “professor ideal”.

Com o passar do tempo, os professores aprendem a compreender melhor os

alunos, suas necessidades, suas carências, etc. Com efeito, o “choque com a

realidade” força a questionar essa visão idealista partilhada pelos professores

novatos, visão essa que, por uma questão de sobrevivência precisa ser

apagada.” (TARDIF, 2010, p. 87)

Page 39: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

39

Se por um lado sentia-me feliz por ter uma sala de aula, por outro havia a dúvida e a

incerteza sobre o que fazer diante de tal cenário. Foi durante esse período que consegui

estabelecer um contato mais próximo com os alunos.

Despi-me de todos os meus conhecimentos didáticos e me permiti uma aproximação

àquela turma, propus ouvi-los, deixei-me afetar por suas expectativas e fui afetando-os com

meu desejo de ensiná-los.

“Um componente emocional manifesta-se inevitavelmente, quando se trata

de seres humanos. Quando se ensina, certos alunos parecem simpáticos,

outros não. Com certos grupos, tudo caminha perfeitamente bem; com outros

tudo fica bloqueado. Uma boa parte do trabalho docente é de cunho afetivo,

emocional. Baseia-se em emoções, em afetos, na capacidade não somente de

pensar nos alunos, mas igualmente de perceber e de sentir suas emoções,

seus temores, suas alegrias, seus próprios bloqueios afetivos.” (TARDIF,

2010, p. 130)

Não sei se fiz da forma correta. Não segui nenhum currículo prescrito, não havia um

planejamento feito pela escola. Então fechava minha porta e lá procurava estabelecer uma

relação harmoniosa, em que muitas vezes agi intuitivamente, outras intencionalmente. Adotei

aqueles meninos como se fossem meus, estabeleci combinados, fiz acordos, puni e sofri várias

punições. Assim sobrevivi aquele ano de trabalho.

No ano seguinte perdi minha sala de aula. Momento de decepção e muita frustração.

Sabia que tinha feito um bom trabalho durante o ano, mas a professora que estava depois de

mim na escala para atribuição da aula tinha tido problemas com a direção da escola. Para

resolver este problema, salas foram suprimidas e eu estava no ano seguinte sem aula. Lembro-

me de ali ter perdido o gosto pela profissão docente, não entendia como isso podia acontecer.

Sentia-me ultrajada, desrespeitada como profissional. Tomada pelo sentimento, “expressão

representacional da emoção por meio da linguagem, dos gestos e da mímica” (MAHONEY;

ALMEIDA, 2005, p. 121), resolvi desistir do magistério e ser mãe.

Estava com vinte e quatro anos, iniciando a profissão como professora, as chances de

conseguir aulas eram mínimas. Participei de algumas atribuições e nada, não podia mais ser

estagiária. Meu contrato era válido somente por um ano. Mesmo assim não queria desistir da

profissão. A opção era fazer inscrição para professora eventual. Tratava-se de um professor

que ficava à disposição da escola e, caso faltasse professor, o eventual seria chamado a

assumir a sala. Era preciso estar na escola todos os dias, aguardar o início da primeira aula e

muitas vezes voltar pra casa sem entrar em sala de aula.

Page 40: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

40

Muitos professores se inscreviam para essa função, mas acabavam desistindo diante da

falta de aulas, era pagar para trabalhar, mas era também a única forma de não perder o vínculo

com a Secretaria do Estado da Educação. Eu ia todos os dias. No fundo sabia que era a única

chance que continuar sendo professora. Chegava cedo, ajudava na entrada e ali ficava, quando

percebia que não faltava professor, ia embora.

Fiz isso um mês, dois meses, o dinheiro foi acabando, a esperança também. Continuei

neste calvário durante mais alguns meses até que surgiu uma sala livre.

Agarrei-me a esta nova possibilidade e, acreditando no meu sonho maior, dediquei-me

àqueles alunos.

Não tinha muitos saberes, apoiava minha ação didática nas diferentes experiências até

então vivenciadas. Lembrava-me das minhas experiências como aluna, dos professores

inesquecíveis, de outros professores que via atuando e tentava a cada dia ir modelando meu

trabalho. Mais uma vez me encontro frente ao que dizem as pesquisas, pois os saberes

profissionais dos professores são plurais e heterogêneos.

Como havia decidido, neste período queria ser mãe. Ainda nesse ano engravidei. No

ano seguinte fui para uma escola rural, dava aula para os filhos dos funcionários da Pedreira

Vicente Mateus, foi uma experiência ímpar.

Ali pude reviver o sentido da escola. Era como uma volta ao passado. Via mães

instruindo seus filhos sobre a importância do estudo, sobre o respeito à professora, o cuidado

com os materiais. A escola era vista como mola propulsora para mudança de vida. Era um

discurso muito familiar. Por mais de uma vez ouvi o tal ditado popular: “Lenha verde mal

acende, quem muito dorme pouco aprende.” Era preciso acordar cedo para não perder o

horário do ônibus que levava as crianças à escola.

Passei a entender por que para aquelas pessoas a escola era tão importante. Tratava-se

de pessoas sem o mínimo de escolaridade, como a minha mãe, que acreditava ser o ensino o

maior bem a deixar para um filho. Aqui recorro à teoria que enfatiza:

(...) a pessoa com as dimensões cognitiva, afetiva e motora integradas e se

nutrindo mutuamente, o professor deve basear sua ação fundamentado no

pressuposto de que o que o aluno conquista no plano afetivo é um lastro

para o desenvolvimento cognitivo, e vice-versa. (ALMEIDA, 2012, p. 95)

Nessa época, com um pouco mais de experiência e devido à falta de professor, assumi

aulas em caráter excepcional para alunos do Ciclo II, que atualmente recebe o nome de Anos

Finais do Ensino Fundamental. Adorei essa experiência e, a partir dela, decidi fazer minha

Page 41: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

41

primeira graduação. Era grande a carência de professores especialistas. Via nesse indicador a

possibilidade de uma especialização como forma de assegurar-me no magistério. Foi com esse

propósito que anos mais tarde fiz Biologia.

Aí já tinha dois períodos: pela manhã na escola rural e, à tarde, com alunos do Ciclo

II, atual Anos Iniciais, do Ensino Fundamental.

Nesse ano tive como modelo uma excelente professora alfabetizadora. A professora

Iraci. Era época do Ciclo Básico, ela só dava aula para os primeiros anos. Os pais adoravam a

professora Iraci, todos os alunos terminavam o ano sabendo ler e escrever. Ela era brava,

muito séria, mas cuidava dos alunos como se fossem filhos. Suas aulas eram sempre muito

bem planejadas. Ela não trabalhava com a silabação, usava uma cartilha diferente, com

histórias para cada letra.

Sua sala de aula era bem organizada: tinha quadro de pregas com crachás de nomes,

lista com os nomes dos alunos, caixa com livros de histórias, cartazes com cantigas de rodas,

alfabeto móvel, caixas com diferentes materiais para montar, cantos de atividades

diversificadas, entre outras coisas. Tudo preparado com muito cuidado. As crianças sentavam-

se em duplas e muitas vezes as aulas aconteciam fora da sala. Os alunos estavam sempre

organizados e em algumas atividades podiam escolher o que e com quem queriam trabalhar.

Tudo isso para mim era um sonho. Lembro-me de um dia ficar observando o trabalho

dela pela janela da minha sala de aula. Ficava encantada com tudo aquilo e pensava comigo:

um dia vou ser assim! A esse respeito Wallon esclarece:

“As pessoas do meio nada mais são, em suma, do que ocasiões ou motivos

para o sujeito exprimir-se e realizar-se. Mas, e se ele pode dar-lhes vida e

consciência fora de si, é porque realizou, em si, a distinção do seu eu e do

que lhe é complemento indispensável: esse estranho essencial que é o outro.”

(WALLON, 1946/1986, p.164)

Logo fiz amizade com ela, fui me apaixonando por aquela forma de trabalhar. Sentia

que ela também gostava de ensinar-me. Foi com ela que aprendi a fazer registro dos saberes

dos alunos, a preencher as tais fichas individuais, os relatórios de final do ano, a gerenciar a

sala de aula, acompanhar e organizar rotina de trabalho, entre outras coisas. Como salienta

Paulo Freire:

Quem forma se forma, e re-forma ao formar e quem é formado forma-se e se

forma ao ser formado. É nesse sentido que ensinar não é transferir

conhecimentos, conteúdos, nem formar é ação pela qual um sujeito criador

dá forma, estilo ou alma a um corpo indeciso e acomodado. Não há docência

Page 42: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

42

sem decência, as duas se explicam e seus sujeitos, apesar das diferenças que

os conotam, não se reduzem à condição de objeto, um do outro. Quem

ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender. (FREIRE,

1996, p. 25)

Hoje ainda encontro com a professora Iraci, meu modelo de professor, e relembramos

do pouco mais precioso tempo que trabalhamos juntas. E, como tudo na educação é um

processo em construção, continuei minha caminhada.

Agora me sentia mais segura, passando pelo que chama Tardif de período de

estabilização e de consolidação.

Chego ao final da década de 1990, e nova escola passa a fazer parte da minha vida.

Estávamos frente a uma nova política educacional, à Progressão Continuada, foram muitos os

acontecimentos nesse período.

Encontrava-me em uma situação mais confortável, conseguia escolher o período no

qual queria trabalhar, não me faltavam aulas. Pegava as séries iniciais, sempre primeiros e

segundos anos. Aqui também encontrei excelentes professoras alfabetizadoras. Lembro-me da

professora Eunice que, apesar de ter o mesmo nome, em nada lembrava a minha professora da

quinta série.

A professora Eunice também não usava a silabação, trabalhava com listas, cantigas,

poesias desde o início da alfabetização. Dizia: “estes textos ajudavam as crianças a

aprenderem a ler e escrever com mais facilidade”. A sala dela era a primeira a ter as vagas

preenchidas. Fazia um excelente trabalho. Ninguém ficava sem ser alfabetizado com ela.

Lembrava muito a professora Iraci.

Logo descobri que ela tinha participado de um curso de formação para professores,

oferecido somente para professores efetivos pela Secretaria do Estado da Educação, chamado

Programa de Educação Continuada (PEC), que “(...) abriam espaço para a inserção do

professor como sujeito ativo e para uma capacitação centrada na articulação entre a teoria e os

desafios do professor”. (GATTI, 2009, p. 206).

Como também trabalhava com alfabetização, sempre que tinha dúvida ou precisava

de ajuda, procurava a professora Eunice, que me dava excelentes dicas para o trabalho em sala

de aula. Sentia-me acolhida e em sua assistência percebia a importância do acompanhamento

e da intervenção do outro para dar forma as atitudes conscientes do eu.

Três anos depois, nesta mesma escola, fui indicada a ser professora coordenadora. Um

novo desafio colocava-se diante de mim.

Page 43: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

43

Na época, a escolha do professor coordenador era realizada entre os pares, com o

parecer do diretor e do supervisor após entrevista. Lembro-me de ter concorrido com mais

duas professoras e ter sido escolhida com a maioria dos votos.

Aceitei prontamente essa nova tarefa e fui informada das funções de um coordenador e

das expectativas do grupo em relação ao trabalho que deveria realizar. Não tinha nenhum tipo

de formação voltada para esse profissional, o jeito era ir fazendo intuitivamente o papel de

mediador dos saberes docente e das aprendizagens dos alunos. Sentia-me novamente insegura,

vivendo mais uma vez os sentimentos do início da carreira pois,

(...) as características dificultosas do início do carreira também podem

acontecer quando se muda de função ou cargo. O docente pode trabalhar em

um momento como alfabetizador, como professor de ensino fundamental ou

do médio, como orientador, como coordenador em outros momentos etc.

Desse modo, em sua trajetória, ele pode ter vários inícios nas carreia. Ainda

que já tenha experiência profissional na área do ensino, ao mudar sua

atuação é iniciante em uma determinada função ou cargo. (MOLLICA, 2012,

p. 61)

Cheia de muitas dúvidas, voltei a estudar. Já tinha uma graduação na área de humanas

e resolvi então procurar o curso de Psicopedagogia. Era uma época em que este curso estava

em alta, diziam ser a fórmula mágica para resolver os problemas de aprendizagens dos alunos.

Já no primeiro semestre, percebi que o mesmo, sozinho, não daria conta das questões

de aprendizagem, pois a ideia que se construía era de que os problemas da não aprendizagem

estavam no aluno e que este, na psicopedagogia clínica, teria seus problemas resolvidos. Doce

engano, para mim o problema dos alunos não aprenderem estava na forma como nós

professores ensinávamos. Principalmente nas relações que estabelecíamos com nossos alunos

e com alguns conteúdos que precisávamos ensinar.

Sentia-me ainda em sala de aula. Lembrava-me das dificuldades que tinha em ensinar

alguns conteúdos. Como fazia a diferença ter o domínio da sala de aula, planejar a aula,

conhecer os saberes dos alunos e principalmente ter apoio e poder trocar experiências.

No ano 2000 muitas reformas educacionais estabeleceram-se, muitas delas voltadas

para a importância da formação em serviço. Fui participar do curso de Formação para

Professores Alfabetizadores – Letra e Vida, organizado pela Secretaria de Estado da

Educação. Era um curso longo, com cento e oitenta horas de formação. Nele, era possível

observar discussões sobre a prática didática e como estas influenciavam nas aprendizagens

dos alunos. O curso mostrava momentos de reunião de um grupo chamado Referência,

coordenado pela professora doutora Telma Weisz, especialista em alfabetização.

Page 44: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

44

No curso ficava evidente a relevância do trabalho coletivo, das reuniões para o

planejamento da prática, do apoio dos parceiros mais experientes em busca de soluções para o

problema de aprendizagem, a importância de conhecer os saberes dos alunos, bem como de

acolher os saberes dos professores e assim propor a reflexão da ação didática. “(...) Este foi

um dos programas de formação continuada mais bem avaliado pelos professores, pela

concepção do processo formativo, pela qualidade do material produzido e por alguns

procedimentos de implementação.” (GATTI, 2009, p. 211).

No entanto Rigolon (apud Gatti, 2009, p. 211 - 212), em sua análise “in locus”

constatou que os professores, apesar de avaliar positivamente o programa, encontravam

dúvidas sobre aliar os princípios estudados ao fazer em seu cotidiano.

Neste período, após quinze anos, surge o concurso para professores da Educação

Básica I, na rede estadual. Alegrias para uns, tristeza para outros. Muitos colegas de trabalho

não conseguiram ser aprovados nesse concurso. Lembro-me de não poder comemorar minha

aprovação na escola, pois, dos dezessete professores que haviam prestado o concurso, eu fui a

única a ser aprovada.

Isso gerou desconforto no grupo e uma preocupação muito grande entre nós

professores. O risco de termos nossos colegas substituídos por outros já no ano seguinte era

grande. Profecia realizada!

A escola tinha pelo menos cinco professores novos, iniciantes na profissão, no ano

seguinte. Lembro-me particularmente da professora Fernanda, que acabava de sair do curso

de Pedagogia e só tinha como experiência a Educação Infantil. Era preciso considerar o que

diz Garcia:

Os professores principiantes são profissionais que se preocupam com o seu

aperfeiçoamento como docentes, mas com consciência de que sua formação

de que sua formação é incompleta. (...) Constatamos que os primeiros anos

de ensino são difíceis quer pessoal, quer profissionalmente. Verificamos

também que os professores principiantes se diferenciam entre si em função

do contexto que ensinam. (GARCIA, 1999, p. 113)

Mais uma vez, revivi um período da minha vida profissional, desta vez com certo

distanciamento, mas muito responsável por esse processo. Eu, professora coordenadora da

escola, diante de um grupo de professores iniciantes, ou seja, professores que tinham saído do

curso de Pedagogia e estavam entrando na sala de aula, e eu pela primeira vez também

aprendendo ser formadora de professores.

Page 45: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

45

Foi preciso lidar com o choque do real, com a complexa realidade do exercício da

profissão, com a transição da vida de estudante para professor e ainda garantir sua integração

no ambiente de trabalho. Contexto semelhante ao vivenciado por mim quando assumi ser

professora. Lembro-me aqui das palavras de Tardif:

Os cursos de formação para o magistério são globalmente idealizados

segundo um modelo aplicacionista do conhecimento: os alunos passam certo

número de anos a assistir as aulas baseadas em disciplinas constituídas de

conhecimento proposicionais. Em seguida, ou durante essas aulas, vão

estagiar para “aplicarem” esses conhecimentos. Enfim, quando a formação

termina, eles começam a trabalhar sozinhos, aprendendo seu ofício na

prática e constatando, na maioria das vezes, que esses conhecimentos

proposicionais não se aplicam bem na ação cotidiana.” (TARDIF, 2002, p.

270)

A partir daí aumentam minhas inquietações sobre a profissão docente, o professor

iniciante e o coordenador pedagógico. Vivia o conflito de investir na minha própria formação

e formar. Recordava dos dilemas enfrentados no início da carreira, que almejava realizar um

trabalho que garantisse a aprendizagem dos alunos.

Sentia a necessidade dos professores recém-chegados na escola e inúmeras incertezas

que permeavam seu fazer didático. Emergia nos professores a necessidade de se constituírem

como grupo. Ficava a pergunta: por onde começar? Sabemos que a carreira docente, em fase

inicial, é um momento de buscas, tentativas, erros e acertos que se constituem em uma

experiência vivida solitariamente, pois muitas vezes inexiste o diálogo e a reflexão junto aos

parceiros mais experientes.

Considerando as ideias de Huberman (1989) ao descrever o ciclo de vida profissional

dos professores, sentia-me vivenciado o que o autor chama de “a fase de diversificação”.

Segundo o autor,

Os professores nesta fase das suas carreiras, seriam, assim, os mais

motivados, os mais dinâmicos, os mais empenhados nas equipes pedagógicas

ou nas comissões de reformas (oficiais ou “selvagens”) que surgem em

várias em várias escolas. [...] Esta motivação traduz-se igualmente em

ambição pessoal ( a procura por mais autoridade, responsabilidade, prestígio)

através do acesso aos postos administrativos. (HUBERMAM, 1989, p. 42)

Assim, em busca de novos desafios pretendo, a partir do caminho por mim percorrido,

nos capítulos que se seguem, retomar o diálogo sobre o professor iniciante, colocando no

centro dessas discussões este profissional, mobilizando esforços pessoais e institucionais para,

Page 46: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

46

a partir do que somos, viabilizar condições que permitam produzir mudanças no cenário atual,

impulsionando-nos à formação de um sujeito que conhece seu meio, se reconhece nele e

identifica possibilidades de assumir-se como coresponsável pela construção de “uma

educação mais justa para uma sociedade mais justa e igualitária” 5.

5 A perspectiva de uma sociedade mais justa e igualitária surge como diretriz norteadora do Plano

Langevin-Wallon. Mais detalhes sobre o Plano Langevin-Wallon podem ser encontrados nos livros

Henri Wallon. Psicologia e educação; A constituição da pessoa na proposta de Henry Wallon, também

em artigos de Laurinda Ramalho de Almeida, professora doutora do Programa de Estudos em

Educação: Psicologia de Educação, da PUC-SP.

Page 47: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

47

4. PERCURSO METODOLÓGICO

O homem se constrói e se recria quando se opõe para

romper com o domínio do outro. Na tentativa de busca de

si. Mas ainda assim, e contrariamente, o homem não

escapa de trazer consigo o outro – o grupo e o meio –

com parte de sua interioridade, da sua dinâmica interna e

de sua humanidade. (MAHONEY e ALMEIDA, 2004, p.

98)

4.1. Delimitação do problema

Como vimos nos capítulos anteriores, vários são os elementos que constituem o

processo de início na profissão docente. Os estudos até aqui apresentados impuseram o

desafio de retomar e ampliar as discussões em torno deste tema por considerar sua magnitude

e complexidade e também por partilhar da ideia defendida por diversos autores que afirmam

ser esse um momento determinante na vida deste profissional. Após o estudo empírico de

diversos materiais que se encontram em consonância com as inquietações vivenciadas pelo

pesquisador, também sujeito desta pesquisa, busco entender quem é o professor iniciante nos

dias de hoje, como este tem adentrado no espaço escolar, bem como saber, quais as emoções

e sentimentos envolve o início da docência, tecendo considerações sobre como o coordenador

pedagógico e/ou pares (professores experientes), podem contribuir no início da profissão.

Neste sentido, o caminho pelo qual se construiu as discussões e o início desta pesquisa

fez-me optar por uma abordagem qualitativa, buscando assim, apoio em Chizzotti que sugere:

O termo qualitativo implica uma partilha densa com pessoas, fatos e locais

que constituem objeto de pesquisa, para extrair desse convívio significados

vivíveis e latentes que somente são perceptíveis a uma atenção sensível e,

após esse tirocínio, o autor interpreta e traduz em um texto, zelosamente

escrito, com perspicácia e competência científicas, os significados patentes

ou ocultos do seu objeto de pesquisa. (CHIZZOTHI, 2003, p. 221, apud

MOLLICA, 2010)

Trata-se de uma escolha intencional, pois acreditamos no caráter da interação social,

como elemento fundamental das relações humanas. Neste contexto, fazem-se presentes

diferentes percepções do outro e de si, expectativas, emoções e as diferentes formas de

interpretações colocam os envolvidos num processo de cooperação e resignificação dos

fenômenos pesquisados, reafirmando a importância de se considerar o momento histórico e

contexto em que a mesma encontra-se inserida.

Page 48: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

48

4.1.1. Caminho percorrido para a escolha dos participantes: novas descobertas

O levantamento bibliográfico utilizado para este estudo demonstrou o consenso de que

o período de iniciação profissional varia entre os três primeiros anos de atuação. Um período

crítico de aprendizagem intensa da profissão, que suscita expectativas e sentimentos fortes, às

vezes contraditórios, aos novos professores (TARDIF, 2002, p. 84). Assim, com objetivo de

entender este consenso, buscamos professores com este perfil.

Para a execução deste objetivo, o trabalho foi organizado em duas etapas distintas,

sendo a primeira a análise do referencial bibliográfico que permeia as discussões aqui

apresentadas e a segunda a análise das entrevistas detalhadas nos tópicos a seguir.

A pesquisa iniciou-se com a aplicação de um questionário de caracterização do sujeito

de pesquisa (Apêndice 1), aplicados em cinco Diretorias de Ensino da Rede Estadual da

Grande São Paulo, distribuiu-se cinquenta questionários nos meses de março e abril do ano

de 2013. Em posse do material coletado e de uma análise inicial, constatou-se que todos os

participantes envolvidos apresentavam em média 10 a 15 anos de profissão, ou seja, não havia

professores iniciantes para esta pesquisa.

Esta constatação implicou em um novo desafio, ou seja, entender como se constitui o

processo de contratação de professores que atuam nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental.

Foi preciso revisitar o Estatuto do Magistério Paulista, para melhor entender como se

estrutura o início da docência.

Retomamos a Lei Complementar de nº 444, de 27 de dezembro 1985, que dispõe

sobre o Estatuto do Magistério Paulista e a organiza o quadro do magistério. Tal documento

permitiu perceber que este quadro encontra-se dividido em dois subquadros.

O Primeiro subquadro refere-se ao grupo de professores que ocupam cargos públicos

Subquadro de Cargos Públicos (SQC). Estes podem projetar sua carreira, pois a aprovação no

concurso público garante evolução e estabilidade ao longo de sua trajetória profissional.

O Segundo subquadro refere-se aos professores contratados, Subquadro de Funções

Atividades (SQF), que exercem funções-atividades. Estes, ano após ano, atuam após passar

por um processo seletivo e de atribuição de classes.

Esta etapa de trabalho colocou-me frente a outras estâncias do sistema educacional, a

Diretoria de Ensino, junto à supervisão e o Centro de Formação e Acompanhamento dos Anos

Iniciais (CEFAI), da Secretaria Estadual da Educação que me permitiu encontrar duas

professoras dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental em início da docência, que se

dispuseram a fazer parte deste estudo: Luana e Cristina (nomes fictícios).

Page 49: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

49

Partiu-se então para a elaboração das entrevistas, que foram realizadas

individualmente e em momentos distintos durante o segundo semestre de 2013.

4.1.2. Escolha dos participantes

Tendo em vista o referencial teórico que fundamenta esta pesquisa, que entende a

pessoa como um sujeito que se constitui a partir dos domínios dos conjuntos funcionais

afetivo, cognitivo e motor de forma integrada onde cada um é parte constitutiva do outro, o

que o torna um sujeito indissociavelmente biológico e social (MAHONEY 2008, p. 15), a

escolha dos entrevistados considerou também a instituição na qual o sujeito da pesquisa

encontrava-se inserido, pois o meio é elemento fundamental nessa constituição profissional.

Nesse sentido, considera-se importante apresentar, mesmo que de forma superficial, os

envolvidos neste processo, para melhor compreender sua história de vida, possíveis motivos

que os impulsionaram na escolha pela profissão e assim conhecê-los um pouco mais.

Professora Luana, 36 anos, casada, formada em Pedagogia. Lembra-se de um

momento marcante em sua vida, quando a professora pediu para ler na frente da sala e ela não

conseguiu, foi chamada de burra e chorou muito. Foi reprovada na 5ª série. Sua primeira

atuação no magistério aconteceu numa escola de Educação Infantil. Participou do concurso

público para professora de Educação Básica I, pela Secretaria de Estado de Educação do

Estado de São Paulo, não atingindo a média necessária para aprovação. Está atuando em uma

sala de 1º ano, na primeira etapa da Educação Básica do Ensino Fundamental em uma escola

da rede estadual localizada na periferia da grande São Paulo que atende a aproximadamente

seiscentos e oitenta alunos distribuídos no período da manhã e tarde. A escola atende apenas

os Anos Iniciais do Ensino Fundamental e apresenta um alto índice de vulnerabilidade social.

A equipe gestora é formada por um diretor, um vice-diretor e um professor coordenador.

Diz ter sido muito bem recebida pelas gestoras da escola em que atua. Acredita estar

vivendo um novo processo de construção profissional. Algumas questões ainda a afligem

muito. Estas dizem respeito a sua preocupação em poder desenvolver, incentivar e influenciar

os seus alunos de maneira positiva, estimulando o desenvolvimento, a autonomia e a

criatividade.

Professora Cristina, 24 anos, solteira. Sua primeira opção profissional deu-se logo

após o término do Ensino Médio, quando decidiu pelo curso de enfermagem. Na área da

Educação, sua primeira experiência aconteceu numa escola de Educação Infantil. Encantada

pelo magistério, decidiu fazer o curso de Pedagogia.

Page 50: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

50

Foi aprovada em nono lugar no concurso público para professora de Educação Básica

I, pela Prefeitura do Município onde mora. Isso lhe rendeu muitos elogios e orgulho da

família. Está atuando em uma sala de 2º ano, na primeira etapa da Educação Básica do Ensino

Fundamental, em uma escola da rede municipal de ensino localizada na periferia da Grande

São Paulo, que atende a aproximadamente quatrocentos oitenta alunos distribuídos no período

da manhã e tarde. Além dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, a escola conta também

com a modalidade Educação de Jovens e Adultos. A equipe gestora é formada por um diretor,

um vice-diretor e um professor coordenador.

Sua maior expectativa em relação à educação é especializar-se na área da inclusão

escolar no trabalho com alunos com necessidades educacionais especiais.

Uma de suas inquietações é não ter certeza de estar no caminho certo em relação a sua

prática em sala de aula, tendo em vista que não tem muito respaldo dos gestores de sua escola.

Por sugestão da banca no momento da qualificação, foi proposto, como parte deste

estudo, que a experiência do pesquisador estivesse envolvida neste processo de investigação,

por considerar sua trajetória significativa, com características que acabam sendo as mesmas

do objeto de pesquisa.

Para tanto, é preciso salientar que no entremeado deste estudo sujeito e pesquisador

ocupam dois papéis significativos, ora está presente como sujeito (lugar do pesquisado) ora

com sujeito pesquisador (no papel de investigador). Esse desdobramento de papéis torna ainda

mais complexo o processo de pesquisa, dando ao mesmo uma tessitura textual personalizada e

dinâmica. A seguir, encontra-se breve relato do sujeito/pesquisador.

Professora Claudineide, 43 anos, formação inicial em Ciências Físicas e Biológicas,

Pedagoga e Psicopedagoga. Ao final do Ensino Médio, decidiu pela Educação. Desde então se

dedica ao magistério como profissão que lhe confere alegrias, realizações e conquistas há 20

anos.

Lembra-se das inúmeras dificuldades vivenciadas nos anos iniciais, dentre as quais

não se esquece dos problemas enfrentados com relação ao seu nome, (questões de gênero),

devido a equívocos, não a forma com o escreviam.

Deu início ao trabalho docente em escolas de Educação Infantil. Participou do

concurso público para professora de Educação Básica I, pela Secretaria de Estado de

Educação do Estado de São Paulo no ano de 2005, sendo aprovada, assumindo seu cargo um

ano depois, assumindo sala em uma região da periférica do município de São Paulo.

Alfabetizadora, a cada ano, ao assumir sua sala de aula, buscou sempre o objetivo

maior deste período de iniciação ao ensino: alfabetizar todos os alunos.

Page 51: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

51

Diante das dificuldades do início da profissão docente adotou o seguinte pensamento:

Sozinha, ansiosa e sem ter com quem contar, o jeito é arriscar!

Apesar do tempo no magistério, tem o desejo de se aventurar na Educação de Jovens e

Adultos, pois acredita ser esse um grupo no qual poderá aprender e crescer com profissional e

como pessoa.

4.1.3. Produção de informações

Na tentativa de garantir a valorização da trajetória profissional e a construção do

significado na narrativa dos envolvidos nesta pesquisa, optei pela entrevista face a face por ter

“a vantagem de envolver uma relação pessoal entre pesquisador/sujeito,o que facilita maior

esclarecimento de pontos obscuros (...)” (MOROZ; GIANFALDONI, 2006, p. 79)

Neste contexto o tipo de entrevista utilizada foi a semi-estruturada, apoiada na

modalidade reflexiva. A escolha por esta modalidade encontra-se pautada nos estudos de

Szymanski, Almeida e Prandini (2010):

Foi na consideração da entrevista como encontro interpessoal no qual é

incluída a subjetividade dos protagonistas, podendo se constituir um

momento de construção de um novo conhecimento, nos limites da

representatividade da fala e na busca de uma horizontalidade nas relações de

poder, que se delineou esta proposta de entrevista, a qual chamamos de

reflexiva, tanto porque leva em conta a recorrência de significados durante

qualquer ato significativo quanto a base de horizontalidade. (SZYMANSKI,

2010, p. 14-15)

4.1.4 Técnica empregada: entrevista

Considerando a entrevista como um processo de conversação entre duas pessoas (o

entrevistador e o entrevistado) com um fim determinado (obter informação por parte do

entrevistado), optei então pela entrevista semidirigida, apoiada na modalidade reflexiva, pois

acredito ser importante ouvir os docentes na tentativa de melhor entender as questões

vivenciadas no início da profissão docente. Recorro aqui ao que diz Szymanki:

(...) a entrevista face a face é fundamentalmente uma situação de interação

humana, em que estão em jogo as percepções do outro e de si, expectativas,

sentimentos, preconceitos e interpretações para os protagonistas:

entrevistador e entrevistado. Quem entrevista tem informações e procura

outras, assim como aquele que é entrevistado também processa um conjunto

de conhecimentos e pré-conceitos sobre o entrevistador, organizando suas

Page 52: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

52

respostas para aquela situação. A intencionalidade do pesquisador vai além

da mera busca de informações: pretende criar uma situação de confiabilidade

para que o entrevistado se abra. (SZYMANSKI, 2010, p. 12)

Quanto às entrevistas um dos critérios definidos para o contato com o entrevistado

dizia respeito ao sigilo das informações e a garantia do anonimato, através da Carta de

Informação ao Sujeito da Pesquisa (Apêndice 2) bem como os procedimentos relativos às

exigências do Comitê de Ética, isto é, o conhecimento pelo entrevistado do Termo de

Consentimento e Livre e Esclarecido (Apêndice 3).

Em seguida, foi sinalizado o momento do primeiro contato com o entrevistado, feito

via endereço eletrônico. Nesse momento, definiu-se data, local e horário para a entrevista,

buscando atender as possibilidades do entrevistado.

A primeira entrevista foi realizada com a professora Lu, no dia 10/06/2013, na escola,

após o término do seu período de aula, em um espaço reservado, chamado sala de leitura.

Numa breve apresentação à entrevistada, relatei partes de minha trajetória como docente,

falando em seguida sobre a pesquisa que estava realizando, agradecendo sua participação.

A entrevista encontrava-se organizada em dois momentos. No momento inicial,

lançou-se uma pergunta desencadeadora cuidadosamente formulada como ponto de partida,

para que o entrevistado pudesse inclusive escolher por onde gostaria de começar seu relato

versando livremente, a fim de resgatar o caminho percorrido até a escolha pelo magistério,

de onde partiu o interesse pela profissão de professor, as pessoas que poderiam ter

influenciado nesta escolha, bem como resgatar as lembranças do percurso inicial da

profissão.

No segundo momento, com base em um roteiro de entrevista previamente elaborado,

de forma discreta, suscitei questões focalizadoras, com o objetivo de manter o

encaminhamento desejado à pesquisa.

A entrevista foi entremeada por sínteses e encaminhamentos que propiciaram a

construção de um panorama geral das reflexões da entrevistada, permitindo-me aprofundar

questões que julguei pertinente, evitando possíveis digressões.

A segunda entrevista foi realizada com a professora Cris, no dia 26/06/2013, na escola

na qual esta ministrava aula, em uma de sala de reunião, após o término da Hora Atividade.

As falas das entrevistadas foram coletadas pelo uso de um gravador. Posteriormente,

com o apoio do roteiro da entrevista previamente construído e usando o mesmo recurso de

gravação, foi possível retomar aspectos de interesse da pesquisa que não foram abordados

Page 53: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

53

pelo entrevistado. Isso exigiu clareza dos objetivos, bem como a garantia da compreensão das

informações colhidas para posterior direcionamento.

4.1.5 Considerações sobre as entrevistas

Retomando a ideia de uma pesquisa qualitativa, e considerando a situação de

entrevista como um momento repleto de diferentes sentidos, interpretações, lembranças,

expectativas e ainda por tratar-se de uma entrevista semidirigida algumas considerações se

fazem necessárias para melhor entendimento da mesma.

- Primeiro contato: O contato inicial com as professoras foi realizado antes das entrevistas

através do questionário/pesquisa e após seleção via endereço eletrônico, permitindo às

mesmas que definissem data, local e horário para o encontro.

- Local das entrevistas: As duas ocorreram em local disponibilizado pela instituição na qual

cada professora encontrava-se locada. Toda a entrevista aconteceu na presença da

pesquisadora e da entrevistada, sem a presença de outras pessoas, garantindo maior

tranquilidade em todo o processo.

- Abordagem inicial: a entrevista iniciou-se a partir de uma breve apresentação da

entrevistadora, sua trajetória profissional e o objetivo da pesquisa, na tentativa de deixar a

entrevistada mais à vontade para expor suas lembranças e experiências.

- Entrevista semidirigida: considerando a perspectiva da reflexividade, permiti à

entrevistada a possibilidade de voltar o seu relato, reorganizando-o, durante o

desenvolvimento da entrevista.

No tocante às entrevistas, é importante ressaltar que as mesmas se constituem num

procedimento em que o conhecimento é construído a partir da subjetividade dos participantes

(entrevistador/entrevistado), que exige um movimento metodológico reflexivo, comprometido

com a ética, a imparcialidade e a lisura da narrativa dos participantes.

Ao finalizar o processo de entrevista, ainda como parte do percurso metodológico,

iniciou-se o processo de transcrição das falas dos entrevistados. Vale ressaltar que o processo

de transcrição ocorreu nos três dias seguintes à segunda entrevista. Este procedimento fez-se

necessário na tentativa de manter o mais vívido possível os sentimentos e emoções presentes

nos relatos dos entrevistados.

Page 54: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

54

Na tentativa de melhor organizar as informações coletadas, partimos para a etapa

análise das mesmas. Este momento pautou-se no princípio defendido por Almeida (1992),

citado por Szymanski, Almeida e Prandini (2010).

Com base nesses princípios, li as entrevistas, com o intuito de familiarizar-me com o

discurso do entrevistado. Cabe ressaltar que a busca pela essência maior da entrevista exigiu

várias leituras, num movimento de analisar o todo para melhor sintetizar as partes. A seguir

apresentamos a síntese das entrevistas, para que o leitor possa conhecer os aspectos mais

significativos dos relatos.

4.2. Síntese das entrevistas

4.2.1. Primeira entrevista (professora Lu) – 10/06/13

Lú fez parte da última turma de Magistério do CEFAM. Participou do concurso de

professores de Educação Básica de 2005, da rede Estadual de Ensino, porém não foi

aprovada. Durante a realização da prova, uma professora passou muito mal, precisando ser

socorrida pelo resgate. Esse episódio deixou-a muito ansiosa e na dúvida se deveria continuar

no magistério. Acredita que este episódio também contribuiu para o resultado final: a não

aprovação.

Sobre a escolha pela docência, reconhece que a família tenha contribuído na escolha

da profissão. Dez anos depois de ter encerrado os estudos (CEFAM), decidiu fazer o curso de

Pedagogia, até então não havia dado aula. Sempre teve o desejo de trabalhar na rede estadual

de ensino.

Lembra com certa aflição o momento de escolha e atribuição de aula, bem como a

chegada à escola, marcada pelo acolhimento da equipe gestora, que considerou sua

experiência ou a falta dela, propondo uma semana de adaptação junto aos alunos e professores

do mesmo ano.

Vivenciou os medos, angústias e incertezas de ser um professor iniciante. Refere-se ao

professor coordenador como um parceiro mais experiente, sempre disposto a ajudar e atento

às suas necessidades. Mostra-se preocupada com o processo de aprendizagem dos alunos,

acredita que todos são capazes de aprender e esta sempre disposta a buscar novos

conhecimentos acreditando no processo de formação continuada.

Page 55: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

55

4.2.2. Segunda entrevista (com a professora Cris) – 26/06/13

Cris é formada há três anos em pedagogia. Sua primeira formação e experiência

profissional foram com enfermeira em uma escola de Educação Infantil da rede particular.

Participou de dois concursos públicos para provimento de cargo de professora, sendo um para

a Educação Infantil e o outro para Ensino Fundamental - Anos Iniciais. Foi aprovada nos dois,

sendo que no último foi aprovada em 9º lugar, o que gerou a ela muitos elogios e orgulho por

parte dos professores de curso de Pedagogia. Diz que abrir o diário oficial e encontrar seu

nome na lista dos aprovados foi o melhor momento de sua vida.

Sobre o seu tempo de escola, relata ter estudado em uma pequena escola particular,

onde foi chamada a trabalhar como enfermeira após graduação nesta área. Em busca de

aperfeiçoamento, realizou um curso de berçarista, o que a trouxe para mais perto do trabalho

pedagógico. Esta experiência e incentivo do professor coordenador da escola contribuiram

para sua escolha pela docência. Durante o curso de Pedagogia passou a ministrar aulas na

nesta escola.

Lembra com certa angústia e aflição o momento de escolha e atribuição da sala de

aula, bem como sua chegada a escola marcada pela total indiferença por parte da equipe

gestora. Vivenciou as agruras de ser iniciante na função e na escola. Recorda que precisou

aprender muitas coisas na raça. Questiona a estrutura da rede que não proporciona um contato

com o professor que está se afastando da sala de aula com o professor novato, aquele que irá

assumir os alunos. Refere-se à docência como uma profissão solitária, individual, sentido-se

muitas vezes angustiada por sentir-se sozinha.

Acredita num trabalho de formação continuada que considere a realidade da sala de

aula, que discuta sobre o aluno, que respeite o professor como profissional, pois não partilha

da ideia de que ser professor é fácil.

Ainda tendo com base os princípios defendidos por Almeida (1992), citado por

Szymanski, Almeida e Prandini (2010), após inúmeras leituras, o texto foi fracionado em

partes, buscando elementos relevantes, considerando o objetivo desta pesquisa. Esse

movimento de fracionar partes do todo, culminou na seleção de trechos específicos das

entrevistas. Trechos que passaram, então, a serem organizados de acordo com o núcleo central

da pesquisa, formando pequenas unidades de significados, que se relacionam entre si,

considerando a importância dada pelos entrevistados em seus relatos.

A cada leitura e releitura das entrevistas completas, percebeu-se a presença de

elementos comuns nas falas dos entrevistados. Nesta perspectiva, organizou-se um quadro

Page 56: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

56

(Apêndice 10) para registrar essas pequenas sínteses, ou seja, as pequenas unidades de

significados para posterior análise.

Estes quadros contêm as seguintes organizações: título, que indica a origem da

entrevista o nome do entrevistado, e quatro colunas, organizadas na seguinte ordem:

depoimentos do entrevistado, explicitação dos significados, sentimentos nomeados e captados

pelo entrevistador e apoio à teoria. As colunas ficaram então organizadas da seguinte forma:

1ª Coluna – Depoimento do entrevistado. Nesta coluna, encontram-se transcritas as

falas de entrevistados. Serão apresentados fragmentos das narrativas que ilustram o

núcleo da pesquisa

2ª Coluna – Explicitação dos Significados (captados pelo entrevistador). Nesta

coluna, após a transcrição da entrevista e de sucessivas leituras, o pesquisador busca

na fala do entrevistado elementos significativos da trajetória profissional. Trata-se,

pois, da interpretação do pesquisador à fala do entrevistado.

3ª Coluna – Encontram-se descritos os sentimentos. Esta foi subdividida e apresenta

os sentimentos nomeados pelo entrevistado (docente) e os sentimentos captados pelo

pesquisador durante o momento da entrevista

4ª Coluna - Estão descritos fragmentos do referencial teórico, chamado aqui de apoio

da teoria, que sustentam e reafirmam o que dizem as pesquisas em torno do professor

iniciante.

Cumpre lembrar que o ato de transcrever um texto exige por parte do pesquisador

habilidade para registrar o discurso oral em discurso escrito, mantendo o mais fiel possível o

relato do entrevistado. De igual modo, a explicitação dos significados procura manter

fidelidade fala registrada do depoente.

Por indicação da banca no processo de qualificação, fará parte da análise deste percurso

metodológico a trajetória profissional do pesquisador. Retomamos aqui as palavras de André:

Se na década de 60 e 70 o interesse se localiza, nas situações controladas de

experimentação do tipo laboratório, nas décadas de 80 e 90 o exame de

situações “reais” do cotidiano da escola e da sala de aula é que constitui uma

das principais preocupações do pesquisador. Se o papel do pesquisador era

de sobremaneira o de um sujeito “fora”, nos últimos dez anos tem havido

uma grande valorização do olhar “de dentro”, fazendo surgir muitos

trabalhos em que se analisa a experiência do próprio pesquisador ou em que

este desenvolve a pesquisa com a colaboração dos participantes. Essas novas

modalidades de investigação suscitam o questionamento dos instrumentos

teórico-metodológicos disponíveis dos parâmetros usuais para o julgamento

Page 57: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

57

da qualidade do trabalho científico. Extrapolando o campo da educação,

encorajando o diálogo entre especialistas de diferentes áreas do

conhecimento, com diferentes bagagens de experiências e diferentes graus

de inserção na prática profissional. (ANDRÉ 2001, p. 53)

Trata-se de um movimento que pretende contribuir para o entendimento das possíveis

implicações vivenciadas em diferentes tempos históricos. A presença de questões subjacentes

nos três relatos traz à luz formas singulares de experiências articuladas, que dão sentido as

dimensões do passado, presente e futuro, colocando o sujeito como ser histórico.

4.2.3 Fragmentos da trajetória do pesquisador

Para a pesquisadora, desde muito cedo a docência fez parte de seus planos

profissionais. Desde muito pequena viveu inserida no contexto escolar. Aluna de escola

pública, optou pelo magistério já no término da Educação Básica. Formada na década de 90,

teve sua primeira experiência como docente na Educação Infantil. Trabalhou em uma creche

como berçarista, experiência esta, que, também por incentivo da psicóloga do local, a fez

decidir-se por aventura-se no ensino da Educação Básica, optando assim pela rede Estadual.

Na época como estagiária, vivenciou as angústias do processo de atribuição de aulas e

a certeza da instabilidade provida da contratação inicial, pois fora contratada como estagiária.

Lembra-se da sua chegada à escola a qual foi designada, onde foi recebida pela secretária da

mesma e conduzida a sala dos professores, onde por muito tempo permaneceu sem ser

percebida pelo grupo de professores, local onde se conversava sobre tudo, menos sobre as

questões pedagógicas. Conseguiu estabelecer um diálogo com apenas duas professoras, sendo

uma mais experiente, mas de pouca ou quase nenhuma influência no grupo e uma também

iniciante na profissão.

Em seu primeiro dia com os alunos, viveu o choque do real, pois se tratava de uma

sala de aceleração, com alunos com em média 10 a 16 anos de idade, com um histórico de

fracasso escolar, desacreditados da família, da escola e da sociedade. Frente a essa realidade,

os sentimentos vivenciados pela pesquisadora eram de medo, abandono, tristeza, frustração e

solidão. Novas experiências e a mesma sensação de começar de novo, a expectativa de ser

iniciante em um novo espaço, com novo grupo de professores, gestores e alunos.

Experimentou também em sua trajetória profissional a importância de ter bons professores

modelos, porém, se o diálogo não era possível, a observação era a forma de apropriar-se de

um fazer didático significativo.

Page 58: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

58

Aprovada em concurso público para provimentos de cargo na Educação Básica da

Rede Estadual, deparou-se novamente com o sentimento de incerteza em saber para onde ir,

quem seria seu novo grupo de trabalho, seus alunos. Mas uma vez experimentou a dúvida, o

medo e o desconforto do novo. A escola a qual deveria assumir seu cargo ficava localizada

em uma região periférica do município onde mora. Foi recebida na escola com certa apatia

pelo grupo e gestores, pois seu ingresso indicava a saída de outro professor. Já com os alunos,

o clima foi de harmonia e descontração. Início das aulas, expectativa da nova professora, dos

colegas, da escola. Na turma, 40 alunos da 1ª série, atual 1º ano, todos ávidos a aprender.

Afirma ter sido afetada por esta atmosfera o que permitiu um dia de trabalho feliz. Viveu uma

época em que não existia a função do coordenador pedagógico para apoiar ou intervir na fazer

didático, não havia proposta de formação continuada e o diálogo resumia-se a queixas e

conversas superficiais sobre projeto pedagógico, planejamento e plano de aula. Sozinha,

ansiosa e sem ter com quem contar, o jeito era arriscar.

4.3. Considerações sobre as entrevistas

Ainda no tocante às entrevistas, é importante ressaltar que as mesmas se constituem

num procedimento em que o conhecimento é construído a partir da subjetividade dos

participantes (entrevistador/entrevistado), que exige um movimento metodológico reflexivo,

comprometido com a ética, a imparcialidade e a lisura da narrativa dos participantes. Sendo

assim, transcorridos um semestre, senti a necessidade de retomar a conversa com os

envolvidos, para captar aspectos que dessem condições de melhor entender os anseios destes

profissionais frente a questões específicas do início da profissão. Realizamos entrevistas

recorrentes (Apêndice 7), nas quais abordamos aspectos que se relacionavam ao processo de

atribuição de aulas, a chegada à escola, o envolvimento do professor coordenador, dos pares,

buscando entender os sentimentos vivenciados durante esse momento.

O processo de transcrição de entrevista é também um momento de análise,

quando realizado pelo próprio pesquisador. Ao transcrever, revive-se a cena

da entrevista, e aspectos de interação são relembrados. Cada encontro com a

fala é um novo momento de reviver e refletir (...). (SZYMANSKI;

ALMEIDA; PRANDINI, 2010, p. 74)

Como forma de garantir a ideia de uma pesquisa qualitativa e considerando a situação

de entrevista como um momento repleto de diferentes sentidos, interpretações, lembranças,

expectativas e ainda por tratar-se de uma entrevista semidirigida mais uma vez, foi preciso

Page 59: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

59

vivenciar os passos para a aplicação da técnica da entrevista. Segue abaixo a síntese das

entrevistas recorrentes.

ENTREVISTA RECORRENTE (com a professora Cris) - 11/01/14

Cris reafirma sentir-se uma professora iniciante. Sua turma de 2º ano, é composta por

35 alunos, com em média 8 anos de idade, oriundos de uma região periférica do município

onde mora.

Todos estão alfabetizados. Sua chegada à escola deixou-a um pouco frustrada.

Esperava ser recebida por alguém que pudesse lhe dar orientações sobre o trabalho que

pretendia realizar.

No primeiro dia de aula, Cris encontrava-se muito ansiosa, insegura, pois não tinha

conseguido antecipar muitas informações sobre seus alunos, a escola e trabalho realizado pela

professora anterior. Já os alunos também pareciam apreensivos, pois vivenciaram ao longo do

semestre a troca de muitos professores, todos tinham curiosidade em saber se teriam uma

professora definitiva. O dia terminou com muitas interrogações e com o desejo de retornar

para aqueles alunos. Em relação ao grupo de professoras logo percebeu que teria dificuldade

de comunicar-se, pois cada uma fazia o seu trabalho de acordo com suas crenças, costumes

didáticos e metodológicos. Esta constatação acarretou uma enorme preocupação, tristeza e

frustração. Não conseguiu estabelecer uma relação de cumplicidade com nenhuma professora,

a que ela atribui um sentimento de profunda decepção.

Quanto aos demais gestores, não se sentia apoiada. As informações eram sempre

superficiais. Havia uma excessiva preocupação com as questões burocráticas e pouco, ou

quase nenhuma, preocupação com o pedagógico. Esta realidade incomodou-a muito. Ela

considera importante o trabalho de formação continuada proposto pela rede municipal, mas

percebe um distanciamento do que é proposto, com as necessidades da sala de aula. A falta do

trabalho em parceria e as discussões coletivas sobre os alunos gera em Cris um sentimento de

isolamento, tristeza e insegurança. Ela acredita que os parceiros mais experientes e a teoria

estudada no curso de Pedagogia poderiam contribuir no seu trabalho.

Apesar de ser professora efetiva, titular de cargo, o início da profissão lhe reservou

momentos de incerteza, pois encontrava-se como professora “volante” (termo usado para

definir o professor que foi aprovado em concurso público e fica no aguardo de uma sala livre

para assumir), o que há faz sentir-se uma professora iniciante a cada novo grupo, cada nova

experiência. Sentiu falta de um planejamento que direcionasse seu trabalho.

Page 60: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

60

Diz que a coordenadora não é autoritária e os professores fazem o que julgam ser

correto para cada turma de alunos. Questiona o papel assistencialista assumido pela escola na

sociedade. Tem o desejo de ser assistida pela coordenação das escolas. Ainda assim, acredita

no que faz e não pretende deixar a docência.

ENTREVISTA RECORRENTE (com a professora Lu) - 27/01/14

Lu diz sentir-se uma professora iniciante. Sua experiência anterior era na Educação

Infantil. Sempre sonhou em dar aula na Rede Estadual de Ensino. Seu caminho para entrar na

rede começou pelo processo de inscrição a professores novos para concorrer a aulas durante

todo o ano letivo. Para tanto foi preciso realizar uma prova para obter uma classificação e

concorrer com professores que já se encontravam na rede, mas que não tinha aulas atribuídas,

os chamados professores contratados, “categoria O”.

Após o resultado da avaliação e tendo sido aprovada, passou a participar do processo

de atribuição de aulas. Relata que participou de quatro atribuições, tendo aulas atribuídas

somente na quinta vez. Recorda-se que este foi um processo marcado por muita ansiedade,

insegurança e expectativas. Diz que no momento da atribuição poucas são as informações

sobre a escola ou turma que irá trabalhar.

Na escola foi muito bem recebida e passou por uma entrevista que durou

aproximadamente quarenta minutos com a equipe gestora, que sugeriu um período de

adaptação junto aos professores das salas já existentes.

No seu primeiro dia de aula, tinha medo de não ser aceita pelos alunos, mas estava

confiante e sabia como deveria trabalhar com eles. Havia preparado sua aula com muito

cuidado.

Diz ter recebido ajuda dos colegas, contou com a compreensão dos pais e o apoio do

coordenador pedagógico que atual fortemente no trabalho de formação dos professores nas

Aula de Trabalho Pedagógico Coletiva (ATPC).

Cabe ressaltar que não foi possível construir um padrão rígido e estático na condução

das entrevistas, esta constatação pauta-se nas trocas interpessoais, no contexto singular de

cada entrevista e na forma como cada entrevistado se apropriava dos questionamentos.

Em todas as entrevistas foi preciso tomar cuidado para não deixar que meus

sentimentos, emoções, valores e percepções das experiências aqui relatadas interferissem de

maneira a prejudicar o andamento do trabalho.

Page 61: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

61

Na sequência, partimos para análise individual das entrevistas. Tal procedimento

constitui-se de três etapas:

Primeira etapa: ouvir várias vezes os relatos gravados e ler suas transcrições;

Segunda etapa: leitura das transcrições com destaque as falas que explicitavam

significados de acordo com o foco da pesquisa;

Terceira etapa: agrupamento das falas em unidades de significação e/ou categorias

para definição dos eixos e posterior análise dos dados.

Recorre-se aqui às ideias de Franco (2005), que diz que as categorias são criadas

conforme as respostas e depois são interpretadas à luz das teorias.

Mesmo quando o problema está claramente definido e as hipóteses

(explicitas ou implícitas) satisfatoriamente delineadas, a criação das

categorias de análise exige grande dose de esforço por parte do pesquisador.

Não existem “formulas mágicas” que possam orientá-lo nem é aconselhável

o estabelecimento de passos apressados ou rígidos. Em geral o pesquisador

segue seu próprio caminho baseado em seus conhecimentos e guiados por

sua competência, sensibilidade e intuição. (FRANCO, 2005, p. 52)

O autor afirma que não há receitas prontas em uma análise, o essencial e necessário é

uma significativa orientação teórica, discernimento, bom senso e sensibilidade por parte do

pesquisador.

4.4. Discutindo as informações a partir dos eixos norteadores

Considerando que o foco desta pesquisa é entender quem é o professor iniciante nos

dias de hoje, como este tem adentrado no espaço escolar, quais as emoções e sentimentos

envolve o início da docência, tecendo considerações sobre como o professor coordenador e/ou

pares (professores experientes), podem contribuir no inicio da profissão, a partir das

transcrições das entrevistas, as informações coletadas passaram a ser agrupadas em pequenas

unidades de significados que deram origem aos eixos norteadores para as discussões dos

dados. São eixos que sustentam as discussões:

EIXO 1: O INGRESSO E INÍCIO DA ATUAÇÃO

Page 62: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

62

Este eixo explicita as diferentes formas de adentrar na docência, considerando o

processo de atribuição de aulas realizada todo início de ano nas Diretorias e/ou Secretarias de

Ensino, considerando o Estatuto do Magistério Paulista de 1985, em sua Lei Complementar

de número 444/85 que prevê a organização do quadro do magistério em dois subquadros: O

subquadro de Cargos Públicos (SQC) e o subquadro de Funções Atividades (SQF).

EIXO 2: A AFETIVIDADE NA CONSTITUIÇÃO DA PESSOA DO PROFESSOR

INICIANTE

Este eixo traz à reflexão a teoria de Henri Wallon, especificamente no que diz respeito

ao conjunto afetivo. Aqui, afetividade refere-se à capacidade, ou seja, à disposição do ser

humano de ser afetado pelo mundo externo e por sensações ligadas a diferentes tonalidades,

sendo assim, encontra-se subdividido em dois aspectos:

- Afetividade na tonalidade positiva

- Afetividade na tonalidade negativa

EIXO 3: O PAPEL DO COORDENADOR PEDAGÓGICO E/OU PARES

(PROFESSORES EXPERIENTES ) NA ATUAÇÃO DO PROFESSOR INICIANTE

Ainda tomando como base à psicogenética walloniana, que sugere ser através dos

meios e dos grupos que ocorre o processo de humanização das pessoas pois permite o

conhecimento de si e do outro por meio de normas, condutas, regras, etc. Este eixo demonstra

como as relações interpessoais podem contribuir no processo de formação e no início da

docência.

Abre-se aqui um parêntese para esclarecer que, na tentativa de melhor compreender os

fenômenos que estão por trás das diferentes situações analisadas, fez-se necessária a divisão

por eixos norteadores, mas é certo afirmar que os temas dialogam entre si.

Sabemos também que a organização de uma pesquisa científica exige do pesquisador

um trabalho sistemático e cuidadoso. Outro aspecto importante que se encontra por traz desta

pesquisa diz respeito ao fato de estar se pesquisando pessoas, suas relações com outras

pessoas, com o meio e consigo mesmo, o que acarreta um grau de subjetividade na tentativa

de melhor interpretar as informações. A consciência de tais elementos implica cuidado ao

lidar com as informações na tentativa de garantir o rigor científico.

Page 63: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

63

Realizar o percurso metodológico descrito neste trabalho permitiu-me colocar o

professor iniciante, suas emoções e sentimentos vivenciados início da docência como pano de

fundo para retomar as discussões que dizem respeito a formação inicial e/ou continuada,

considerando essencialmente situações que são vivenciadas no decorrer de todo o processo

(formação inicial, ingresso na profissão, início da atuação e formação continuada) buscando

conhecer os entraves presentes a fim transpor as situações conflituosas. O detalhamento desta

análise e as discussões das informações encontram-se expostas no capítulo a seguir.

Page 64: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

64

5. ANÁLISE E DISCUSSÃO DAS INFORMAÇÕES

Não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino. Esses

fazeres se encontram um no corpo do outro. Enquanto

ensino continuo buscando, reprocurando. Ensino por que

busco, porque indaguei, porque indago e me indago.

Pesquiso para constatar, constatando, intervenho educo e

me educo. Pesquiso para conhecer o que ainda não

conheço e comunicar anunciar a novidade [...]. (Freire,

1997, p.32)

Este estudo realizado em uma abordagem qualitativa procurou analisar experiências,

emoções, sentimentos e o processo de constituição docente de duas professoras no início da

docência por meio de seus relatos. Sob esta perspectiva, foi preciso cuidar para não dissociar a

fase de coleta de dados do percurso realizado pela pesquisa, pois a mesma propôs um

entrelaçamento de nossas histórias, ou seja, histórias de pessoas com começo, meio e fim que

em muito dialogaram.

Não se espera nesta proposta apenas trazer à luz os aspectos acima citados mas, além

disso, evidenciar as necessidades dos professores iniciantes frente a sua profissão, buscando

apontar pistas para posteriores reflexões que possam subsidiar os cursos de formação inicial,

bem como futuras pesquisas.

A análise dos dados foi realizada por meio de transcrições das entrevistas como já foi

mencionado. As transcrições das entrevistas na íntegra, os quadros sínteses das entrevistas

iniciais e das recorrentes podem ser visualizados nos apêndices.

5.1. Discutindo as informações a partir dos eixos norteadores

O homem se constrói e se recria quando se opõe para

romper com o domínio do outro, na tentativa de busca de

si. Mas ainda assim, e contrariamente, o homem não

escapa de trazer consigo o outro – o grupo e o meio –

como parte de sua interioridade, da sua dinâmica interna

e de sua humanidade. (MAHONEY; ALMEIDA, 2004, p.

98)

Esta afirmação busca explicar as relações que se estabelecem entre o meio e os

diferentes grupos no qual está inserido o ser humano como indispensáveis para o

desenvolvimento de suas potencialidades, são partes constitutivas da pessoa. Um meio social

Page 65: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

65

constituído de construções simbólicas e culturais, que diz respeito ao contexto em que

estamos inseridos e as pessoas com quem estabelecemos relações. Este contribui para a

construção e desenvolvimento da personalidade, através valores, atitudes, normas. A

construção de padrões de relacionamentos com os outros determinam as condutas sociais da

pessoa humana.

Os grupos são caracterizados por um sistema de relações pessoais e interpessoais.

Nele, encontram-se um grupo de pessoas cujas relações estabelecidas determinam o papel e o

lugar de cada. É no grupo que construímos a consciência de nós mesmos e dos outros, onde

aprendemos a desempenhar as práticas sociais e os diferentes papéis construídos de acordo

com os diferentes contextos. É onde se aprende a cooperar e competir, sendo também espaço

de humanização.

O grupo está inserido no meio e ao longo da vida, as pessoas vão participar de

diferentes grupos, por conta dos papéis vivenciados e os comportamentos esperados, que

variam de acordo os objetivos, a idade dos participantes, habilidades físicas, intelectuais e

sociais, etc. Também é no grupo, através da comparação, que se apresenta a possibilidade de

conhecer a si e o outro. Nos grupos existem as condutas que são determinadas a partir de

normas, costumes, rituais, considerando sempre as necessidades do grupo em detrimento das

necessidades individuais.

Cabe aqui uma pausa para retomarmos o foco principal deste trabalho que alude sobre

quem é o professor iniciante nos dias de hoje e como este tem adentrado no espaço escolar,

esta pesquisa buscou saber quais as emoções e sentimentos envolvem o início da docência,

tecendo considerações sobre como o coordenador pedagógico e/ou pares (professores

experientes) podem contribuir no começo da profissão. Como explica Wallon, no processo de

desenvolvimento o movimento é sempre do sincretismo para a diferenciação. Para chegar à

diferenciação, a criança precisa reunir todas as informações para tentar explicar o mundo ao

seu redor até então visto de maneira global.

Também, o professor iniciante em contato com a realidade da profissão, inserido em

um novo contexto que se apresenta de forma global e sincrética, precisa organizar as novas

experiências e informações. Como sabemos, esta busca se constitui na presença do outro. “(...)

Como adulto, tem consciência mais clara de sua identidade, de seus valores, de suas

possibilidades, de seus limites, inclusive do tempo.” (MAHONEY, ALMEIDA, 2004. p 23).

Isso facilita passar de um estado de sincretismo da nova situação para a apreensão da

realidade e ajustamento a ela.

Page 66: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

66

Assim recorremos à Psicogenética walloniana, para entendermos os processos nos

quais se encontra envolvido o professor iniciante. Para Wallon, a afetividade está intimamente

ligada à capacidade do ser humano ser afetado e deixar-se afetar pelo mundo. As emoções, os

sentimentos e as paixões afetam o indivíduo no seu processo de desenvolvimento. Em todas

as entrevistas foi possível identificar uma variedade de emoções e sentimentos presentes no

ofício da profissão docente. Este movimentos são consequência da interação com o meio e

com outro, refletindo-se diretamente no trabalho.

Apesar dos relatos dos entrevistados estarem separados por mais de uma década, é

possível perceber semelhanças vivenciadas no início da trajetória profissional destes sujeitos,

o que nos impõe uma reflexão sobre a experiência docente compreendendo um pouco mais o

processo de ser e fazer-se professor, de aprender a ensinar, ajudando no amadurecimento

vivenciado por cada um dos mesmos.

Os eixos escolhidos para discutir a informações encontram-se detalhados a seguir.

Falas dos entrevistados serão reproduzidas ao longo deste capítulo, com o objetivo de ilustrar

as considerações. Porém, vale resaltar que chegar a essa considerações exigiu por parte do

pesquisador um procedimento metodológico que busca resignificar os próprios saberes e

experiências, construindo sentido e preservando a identidade pessoal dos envolvidos.

EIXO 1 - O INGRESSO E INÍCIO DA ATUAÇÃO

A entrada na docência é marcada por influências de diversas ordens. Perpassa pelas

questões de formação acadêmica inicial, questões de políticas públicas, relações interpessoais,

entre outras. Neste eixo, explicitamos as diferentes formas de adentrar na profissão,

considerando os diferentes caminhos a serem percorridos.

O Estatuto do Magistério Paulista, em sua Lei Complementar de número 444/85 prevê

a organização do quadro do magistério em dois subquadros, o Subquadro de Cargos Públicos

(SQC) e o Subquadro de Funções Atividades (SQF).

No primeiro subquadro - SQC, esse acesso poderá ocorrer via concurso público, onde

se concorre a uma vaga para o cargo público. Esta forma de acesso implica na estabilidade na

profissão e permite ao professor vislumbrar evolução na carreira. Sobre o profissional nesta

condição incide alguns benefícios, dentre o quais podemos citar o processo de Evolução

Funcional, que é a passagem do integrante do Quadro do Magistério para nível retribuitório

superior da respectiva classe, mediante à avaliação de indicadores de crescimento da

capacidade potencial do trabalho do profissional do Ensino.

Page 67: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

67

O segundo subquadro - SQF, prevê acesso via a inscrição do docente num processo

seletivo com vistas à aprovação para participar do processo de atribuição de aulas. Trata-se de

uma contratação bastante precária. Nesse caso em específico, na rede estadual de ensino, o

professor chamado contratado não consegue programar os estágios da sua carreira, não tem

nenhum tipo de benefício e pode percorrer várias escolas ao longo de um ano. Este modelo

encontra-se presente também na rede municipal de ensino, onde mesmo o professor sendo

aprovado em concurso público, na situação de professor volante, fica disponível a cumprir as

necessidades da rede.

Sendo assim, este início representa uma realidade vivida por muitos professores da

rede oficial de ensino, o que pode ser fator decisivo para o acesso e permanência na docência.

Diferentes sentimentos são vivenciados nesse momento.

Para a professora Lu, que apesar de ter vivido uma experiência anterior, nunca havia

passado pelo processo de atribuição de aulas em uma rede oficial de ensino, mesmo tendo

sido aprovada no processo seletivo e ter ido muito bem na prova, faltava ainda concorrer com

muitas outras professoras a uma sala livre, pois, como não havia sido aprovada em concurso

público, encontrava-se no Subquadro de Funções Atividades, conhecido como classe de

professores contradados. Sobre este momento a mesma se reporta da seguinte forma:

[...] Eu tive que fazer uma provinha e ter uma nota boa, para então participar do processo de

atribuição de aulas. Minha experiência anterior era na educação infantil. Era iniciante na

educação básica e na Rede Estadual. Eu fui pelo menos em quatro atribuições em dias

diferentes, isso me deixava ansiosa e apreensiva. Pensei em desistir, eu achava que não ia

conseguir, não tinha pontuação nenhuma. Na quinta vez eu fui chamada. Lembro que no dia,

eu era o número 36 da chamada, na banca de atribuição eles falam por códigos. Eu fiquei

muito feliz.

É possível perceber relatos semelhantes na trajetória profissional da pesquisadora. A mesma

ao optar pela docência passou pelo processo de atribuição de aulas. Na época, após decidir-se

sobre o desejo de trabalhar na Educação Básica, foi contratada como estagiária, sobre esse

momento relata:

[...] Era 1992, fui participar de uma atribuição de classe/aulas, tudo aquilo era novo e

assustador. Depois de algumas horas de espera, finalmente me fora atribuída uma escola na

Page 68: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

68

periferia de Guarulhos, município vizinho ao que morava. Fiquei muito feliz e, seguindo as

instruções, fui rapidamente me apresentar à escola.

No caso da professora Cris, novata na carreira e no trabalho com Educação Básica,

aprovada em concurso público e fazendo parte do Subquadro de Cargos Públicos, ou seja,

titular de classe, ainda assim é possível perceber claramente sua ansiedade no momento de

adentrar no magistério e escolher sua sede:

[...] Eu já estava na rede era só transferência e eis que já sabia esse negócio de chegar

primeiro. Lá eles disseram que a gente não ia poder escolher muito mesmo, porque eles iam

encaminhar a gente para lugares de emergência que estava precisando mais. Quando chegou

a minha vez, apresentaram as vagas, só que todos os lugares eram para professor volante.

De acordo com o referencial teórico walloniano, a afetividade diz respeito à

capacidade do ser humano afetar-se e ser afetado pelo mundo. Os relatos evidenciam uma

enorme variedade de emoções e sentimentos presentes no momento de adentrar a docência,

seja para quem se encontra numa situação mais confortável, no caso do titular de cargo, mas

principalmente para o novato que faz parte apenas do quadro de contratação.

Este momento, permeado por inúmeras sensações, onde sentimentos de solidão,

abandono, dúvida e indecisão, pode provocar impactos que variam de acordo com a estrutura

emocional de cada um, mas que certamente irão afetar para sempre a vida deste profissional.

Nesse sentido, Mahoney e Almeida (2005) apresentam dois pontos sobre Wallon:

(...) o início de qualquer aprendizagem nova caracteriza pelo sincretismo,

passando gradativamente para a diferenciação; o período do sincretismo

caracteriza-se pela imperícia, que será substituída gradativamente pela

competência ao acompanhar o processo de diferenciação” (MAHONEY:

ALMEIDA, 2005, p. 15 -28)

Os sentimentos que permearam as situações vividas pelos nossos atores, referiram-se à

confrontação inicial com a complexidade da atuação profissional, que pode apresentar

diferentes patamares, becos sem saída, tomada de consciência, mudanças de interesses e

valores frente ao processo de constituição profissional.

Huberman (1995), ao propor uma divisão da trajetória profissional do professor em

fases, caracteriza a primeira delas (que se refere ao professor iniciante) em termos de

Page 69: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

69

sentimento. Sugere que o início de carreira se trata de uma fase que apresenta características

próprias e muito específicas, marcada por sentimentos de “sobrevivência” e de “descoberta”.

O sentimento de “sobrevivência” se traduz no que outros autores denominam “choque

do real”, ou seja, o momento em que o docente se depara com a complexidade da situação

profissional real, podendo ocorrer o desfacelamento da realidade idealizada. Já o sentimento

de “descoberta” se apresenta no entusiasmo inicial, na possibilidade de experimentar, de fazer

parte de um grupo em situação de responsabilidade, ou seja, ter sua sala de aula, seus alunos e

um programa a seguir.

(...) Com muita frequência, a literatura empírica indica que os dois aspectos,

o da sobrevivência e o da descoberta, são vividos em paralelo e é o segundo

aspecto que permite aguentar o primeiro. Mas verifica-se, igualmente, a

existência de perfis com um só destes componentes (a sobrevivência ou a

descoberta) impondo-se como dominante, ou de perfis com outras

características: a indiferença ou o quanto-pior-melhor (aqueles que escolhem

a profissão a contragosto ou provisoriamente, a serenidade (aqueles que tem

já muita experiência) a frustração (aqueles que se apresentam com um

caderno de encargos ingrato ou inadequado, tendo em atenção a formação ou

a motivação iniciais). (HUBERMAN, 1995, p. 39)

Em um levantamento das dissertações e teses feito por Gama (2001), demonstram que

problemas como a contratação temporária (professores eventuais), ou do professor volante,

que são expostos a práticas descontinuadas em muitas escolas e turmas, a atribuição de turmas

problemáticas e escolas de difícil acesso com alto índice de vulnerabilidade social, são

elementos que se fazem presentes no início da carreira e podem favorecer ao abandono da

profissão:

[...] Sim eu me considero uma professora iniciante, principalmente porque a cada momento

você está em uma escola, com uma série diferente. Então cada momento é um desafio novo.

Sempre tem esse sentimento do novo, de estar começando agora. Isso acontece também em

relação à escola, ao grupo de professores. A cada chegada em uma escola diferente você é

invadida pelo sentimento de um professor que esta começando, que está no iniciando como

professor, tem sempre aquela expectativa de como será o grupo, como serão os alunos, a

escola. Eles não confiam no professor substituto (Cris).

[...] Eu fui de ônibus e lembro que o ônibus se chamava Sítio São Francisco. Isso me deixou

um pouco apreensiva. Ficava pensando que talvez fosse dar aula numa escola de sítio, escola

Page 70: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

70

rural. Percebi logo ao chegar ao local que se tratava de uma região de periferia mesmo e de

alta vulnerabilidade social, mas não de sítio. (Lu).

[...] Era uma turma considerada a “escória” da escola. Alunos repetentes, fora da

idade/série, marginalizados, rotulados por uma história de fracasso escolar, desacreditados

da família, da escola e da sociedade. Tinha terminado o Magistério havia exatamente dois

anos, estava iniciando na profissão, diante de uma realidade cruel e solitária (Pesquisadora).

Através destes relatos, é possível constatar que as crises e etapas que caracterizam o

início da carreira se fazem presentes independentemente da “geração” a que pertencem, ou

seja, não há diferenças entre o percurso histórico no início da carreira. Trata-se de uma

realidade ainda presente, que implica no ciclo de vida dos docentes.

EIXO 2: A AFETIVIDADE NA CONSTITUIÇÃO DA PESSOA DO PROFESSOR

INICIANTE

Sabendo-se que este eixo propõe uma discussão em torno da afetividade sob a

perspectiva de Henri Wallon, que a mesma diz respeito a capacidade do ser humano ser

afetado e afetar-se, o que provoca sensações ligadas a diferentes tonalidades (sensações

agradáveis e desagradáveis) o mesmo trará à discussão a afetividade na tonalidade positiva e

a afetividade da tonalidade negativa, sendo essas, responsáveis por sensações de prazer ou

desprazer, conforto ou desconforto, tensão ou alívio que podem se manifestar de acordo com

o meio em que se esta inserido e as relações sociais que se estabelecem nesse meio.

A fim de situar o leitor, julgo necessário um breve resgate sobre conjuntos e/ou

domínios funcionais. Vale lembrar que, para este trabalho, me dedico a descrever

sucintamente a afetividade e os três momentos que caracterizam a evolução da mesma, pois

como se sabe, a afetividade é vista como um constructo da teoria de Henri Wallon, para

explicar o psiquismo humano. Outro aspecto que é importante lembrar é que ao estudar os

conjuntos e/ou domínios funcionais, opta-se por uma divisão entre os mesmos, porém,

ressaltamos que não se trata de uma cisão entre esses conjuntos, mas um recurso didático

para melhor compreender o que é inseparável, ou seja, a pessoa. Este aspecto pode ser

confirmado nas palavras de Wallon:

Page 71: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

71

As exigências de descrição obrigam a tratar de forma distinta alguns grandes

conjuntos funcionais, o que certamente não pode ser feito sem certa

artificialidade, sobretudo no ponto de partida, quando as atividades ainda são

pouco diferenciada. que não deixa de ser um artifício... Os domínios

funcionais entre os quais se dividirão o estudo das etapas que a criança

percorre serão, portanto, os da afetividade, do ato motor, do conhecimento e

da pessoa. (WALLON, 1941/2007, p. 1117 e 1135)

Sabemos que o conjunto afetivo é responsável pelas emoções, pelos sentimentos e pela

paixão. Nele estão presentes algumas características do processo de desenvolvimento que vão

do sincretismo para a diferenciação e da alternância (funcional e predominância) dos

conjuntos.

Pretende-se a partir da psicogenética walloniana, trazer à luz, fragmentos dos relatos

dos entrevistados que dialogam com a teoria, na tentativa de elucidar e tornar observável

como esses elementos se fazem presentes na formação da pessoa e também na trajetória dos

nossos docentes.

Emoção

Pode se dizer que é o substrato orgânico da afetividade, uma forma de exteriorização da

mesma, da forma corporal e motora. Trata-se de um recurso de ligação entre o orgânico e o

social, ou seja, a primeira forma do ser humano estabelecer contato com o mundo humano e a

partir dele com o mundo físico e cultural.

É determinante no processo de evolução mental, é ela que dá rapidez as respostas de como

agir em cada situação; é também a forma concreta de participação mútua, é comunhão, isto é,

um instrumento de sociabilidade que une os indivíduos entre si. Estimula o desenvolvimento

cognitivo, que continuamente vai sendo refinado, sofisticado, o que denota um salto

qualitativo na vida psíquica do indivíduo. Gradativamente deixa de ser um ato involuntário,

adquirindo uma perspectiva intencional, a vista de um resultado especifico. O poder da

emoção é grande, pelo contágio que produz:

Devido a seu poder de contágio, as emoções propiciam relações

interindividuais nas quais se diluem os contornos da personalidade de cada

um. Essa tendência de fusão própria às emoções explica o estado de

simbiose com o meio em que a criança se encontra no início do

desenvolvimento. E explica também a facilidade pela qual a atmosfera

emocional domina eventos que reúnem grande concentração de pessoas,

como comícios, concertos de músicas, rituais religiosos , situações nas quais

Page 72: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

72

apagam-se, em cada um, a noção de sua individualidade.” (GALVÃO, 1995,

p. 65)

Como pesquisadora, ao ouvir as duas entrevistas, percebi em alguns momentos uma

mudança sensível no nível de tensão muscular, expressando emoções relembradas na sua

trajetória. Por exemplo, Lu relata que participou do concurso de 2005 e não passou e isso foi

um trauma, ficou como a voz embargada, agitou-se na cadeira e parou de falar e ainda relata a

emoção de uma professora que passou mal, porque foi tal o sentimento na hora da prova que

foi preciso chamar uma ambulância.

Clau, ao relembrar que seus alunos eram considerados a escória da escola, voltou a

sentir muita raiva da diretora.

Cris, por sua vez, ao relatar o momento em que ficou sabendo da sua aprovação no

concurso para professora de Educação Básica, ficou com o rosto muito corado, mexia-se na

cadeira e balançava as mãos na tentativa de expressar o que sentia.

Emocionar-se neste contexto está diretamente ligado ao desenvolvimento de atitudes que

variam de acordo com as diferentes situações e diferentes formas de representações. Durante

as entrevistas, ao relatar alguns momentos, foi possível perceber mudanças significativas no

tom de voz, na postura do corpo do entrevistado, nos cruzar as mãos, partes os pés, baixar a

cabeça e fixar o olhar em ponto estratégico, muitas vezes como forma de desvencilhar-se de

sensações ligadas a tonalidades desagradáveis.

Sentimento e paixão

Diz-se que quando a emoção é representada, atingiu-se o plano dos sentimentos. Pode-

se afirmar então que sentimentos são elaborados no plano mental, expressos nas ações que

permeia toda e qualquer relação social.

Wallon se refere às representações objetivas como traduções da emoção que

podem ser elaboradas pelo indivíduo de forma variável, ou seja, utilizando-

se da linguagem, da gestualidade de compreensão social, da arte, da

literatura... A representação é sempre elaborada no plano mental, é modulada

mentalmente e pode ou não ser objetivada, ou seja, torna-se conhecida... No

cotidiano das diferentes sociedades é possível identificar os sentimentos

presentes em diversas áreas, como é o caso da poesia, por exemplo, uma vez

que esta tem como traço característico a expressão de emoções vivenciadas e

sonhadas. (PESSOA, 2010, p. 54)

Page 73: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

73

O adulto, diferentemente da criança, ao expressar sentimento observa, reflete antes de

agir, escolhe diferentes formas para se expressar que variam de acordo com o local e o

momento, considerando inclusive os motivos ou circunstâncias que o definem as formas de

expressão.

Lu vivenciou sentimentos de tonalidade negativa e tonalidade positiva quando se

dirigiu a escola. Afetada pela expectativa de conhecer seu novo local de trabalho e as pessoas

que fariam parte desse grupo, expressa uma de suas características, ansiedade com a

satisfação de conseguir reprimir uma emoção, recorda desse momento dizendo:

[...] Eu sou um pouco ansiosa, isso acaba atrapalhando um pouco. Eu quero que ele aprenda

logo, quero meu aluno lendo. Quando eu dito uma palavrinha e o aluno escreve eu penso:

eu sei que ele é capaz de escrever. Você vai vendo que com o seu trabalho aos poucos ele vai

conseguir.

Cris também pode vivenciar a presença do sentimento na perspectiva da teoria

walloniana. O sentimento como representação da afetividade e ao recordar, reafirma seu

compromisso com a profissão, num sentimento de responsabilidade.

[...] Com os alunos eu não me senti muito perdida, eu sempre me preparei antes, pra mim é

inaceitável chegar à sala de aula e deixar os alunos perceberem que estou com medo,

insegura ou que não sabe o que vai fazer. Eu não suportaria saber que eles estão perdidos

porque eu estou perdida. Isso foge totalmente ao que entendo como compromisso com a

profissão. Tenho certeza que influenciaria na aprendizagem deles e no trabalho com a sala.

Então a angustia, a ansiedade por tudo que estava vivendo eu tentava não passar para eles.

Eu ficava me perguntando o tempo todo: “será que eu estou no caminho certo”?

“A responsabilidade é, na verdade, tomar a seu cargo o êxito de uma ação,

que é executada em colaboração com o outro ou em proveito de uma

coletividade.” (WALLON, 1952/1975, p. 222)

Também ao longo da trajetória do pesquisador é possível perceber momentos em que

o sentimento de diferentes tonalidades foi fonte inesgotável de aprendizagem e

desenvolvimento cognitivo e ainda o como esse processo apresenta um crescente refinamento

da emoção:

Page 74: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

74

[...] Chegava à escola e o medo me assolava. Tentava conversar com os professores mais

velhos mas isso era impossível, não havia um coordenador pedagógico que pudesse me

apoiar. O jeito era encarar a turma e os desafios.

Ou ainda quando relata:

[...] Estava diante da minha falta de experiência, sentia-me sozinha, não conseguia

estabelecer o diálogo na sala de aula, envolver os alunos em atividades. Muitas vezes ficava

por horas observando todos aqueles meninos e meninas, sentados nas últimas fileiras da sala

de aula, com instrumentos de percussão nas mãos que eles mesmos traziam, cantando,

batucando.

Sendo a emoção perceptível, pelo nível de tensão muscular (tônus) e a intenção que se

encontra associada a uma determinada situação, a paixão, segundo Wallon, expressa o

aparecimento do autocontrole do indivíduo em uma determinada situação. Trata-se de um ato

intencional, onde a emoção é silenciada. Podemos afirmar que a paixão é marcada por ciúmes,

exigências, exclusividade, definindo inclusive o grau de tolerância, intenção e disposição em

relação ao outro e ao meio.

A paixão pode ser intensa e profunda na criança. Mas com ela aparece a

capacidade de tornar a emoção silenciosa. Portanto, para se desenvolver,

pressupõe o autocontrole da pessoa e não pode vir antes da oposição

claramente sentida entre si e o outro, cuja consciência não se dá antes dos 3

anos. Então a criança se torna capaz de alimentar secretamente frenéticos

ciúmes, apegos exclusivos, ambições talvez vagas, mas nem por isso menos

exigentes. (WALLON, 1941/2007, p. 126)

Lu exemplifica em seu depoimento o autocontrole em busca de seu objetivo:

[...] Eu fui pelo menos em quatro atribuições em dias diferentes, isso me deixava ansiosa. Na

atribuição geral os professores eram separados por categorias, por pontuação. Eu ouvia as

pessoas comentando que nunca sabiam a que horas iam sair dali e se pegariam aulas. Os

professores ficam no pátio esperando ser chamados. A cada chamada você vai ficando ainda

mais apreensiva. E eu fui ficando. Fiz isso repetidas vezes.

Page 75: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

75

Ela silenciou seu desespero por não receber sua classe, não reclamou do sistema e

espera, pois tem um objetivo bem claro.

Cris também precisou alcançar o grau máximo da emoção em busca de seu objetivo

maior, relembra que ao logo que chegou a escola foi imensamente criticada por sua escolha:

[...] As professoras mais antigas diziam: “Ah, você é tão novinha, você não tem outra coisa

que gostaria fazer?” Eu tento entender que não é por mal, que não é inveja. Acho que elas

estavam sendo sinceras. E elas diziam: “eu só não troco por só faltam cinco anos para eu me

aposentar” ou “eu só não troco por que eu já estou a tanto tempo na rede e você tão novinha,

tem tanta professora ficando louca”. Eu dizia: “Não gente eu ainda acredito e gosto do que

faço!”. Eu nunca vivi o sentimento de desistir porque eu acredito no que faço.

[...] Não sei se fiz da forma correta. Não segui nenhum currículo prescrito, não havia um

planejamento feito pela escola. Então fechava minha porta e lá procurava estabelecer uma

relação harmoniosa, em que muitas vezes agi intuitivamente, outras intencionalmente. Adotei

aqueles meninos como se fossem meus, estabeleci combinados, fiz acordos, puni e sofri várias

punições. Assim sobrevivi àquele ano de trabalho.

Este depoimento, presente na trajetória do pesquisador, como os demais relatos, nos

permite dizer que a paixão na perspectiva deste referencial teórico transgride ao tempo e ao

espaço, fazendo-se presente em diferentes épocas ocupando a mesma tônica. Na paixão, como

compreende Wallon, a razão é regida pela emoção que, silencia, conduz a situação. É possível

afirmar que a razão esta a serviço da emoção (PESSÔA, 2010, p. 54).

Considerando o pensamento walloniano, a afetividade refere-se à capacidade do ser

humano ser afetado pelo mundo interno e externo. Os relatos até então apresentados, tornam

observáveis a diversidade de emoções, sentimentos e paixões que permeiam o início da

docência. É possível dizer que o professor iniciante tem que sobreviver a emoções e

sentimentos, que acabam por refletir diretamente na forma como este profissional irá

desenvolver seu fazer didático. Os depoimentos a seguir ilustram esta afirmação.

Professora Lú

[...] No primeiro dia com os alunos, tive medo, pois eles já estavam adaptados a outra

professora. Tinha medo ficassem pensando: “por que eu não posso mais ficar com aquela

Page 76: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

76

professora? Vivia muitos conflitos, muitas dúvidas e insegurança. Mas, ao contrário do que

pensei, os alunos foram receptivos, me receberam super bem, eles falavam: Prô, foi você que

ficou com a minha professora aquele dia? Criança tem um encantamento e uma forma de ver

a vida diferente dos adultos. Lembro que comecei minha aula cantando uma música que eles

conheciam dali em diante foi tudo muito tranquilo.

Professora Cris

[...] Nesse mesmo ano, prestei outra prova, na rede. Desta vez, eu prestei para PEB

(Professor de Educação Básica). Lembro que eu passei em nono lugar, aí eu fiquei super

feliz. Mas naquele momento não havia vagas disponíveis na rede. Então eu fui chamada só

esse ano.

Professora Clau

[...] Lembrava dos estágios ao longo do curso do Magistério, em que sempre permanecia no

fundo da sala observando o professor realizar sua aula. Lembrava-me de Dona Áurea,

professora que abriu as portas de sua sala para eu cumprir minhas horas de estágio. Junto a

essa lembrança vinha também à da sala de aula, onde os alunos eram divididos por fileiras,

classificados por seu nível de aprendizagem, em forte, média e fraca em sua maioria.

Afastava essa ideia da cabeça e logo pensava: Vou fazer diferente! Era minha primeira

experiência como professora de Educação Básica, atual Anos Iniciais, ou seja, professora

iniciante.

Os elementos teóricos walloniamos abordados até aqui permitem inferir a necessidade

de superar a dicotomia razão-emoção. Propõe ressignificar sensivelmente o nosso olhar para a

pessoa (quarto conjunto funcional), pois prevê a integração afetiva-cognitiva-motora, tendo

em vista o papel da afetividade no processo do desenvolvimento cognitivo e como este

influencia e pode estar a serviço do processo de aprendizagem e consequente do ato de

aprender a ensinar.

Eixo 3: O papel do coordenador pedagógico e/ou pares (professores experientes ) na

atuação do professor iniciante.

Page 77: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

77

Considerando os objetivos deste estudo que se propõe entender quem é o professor

iniciante nos dias de hoje, como este tem adentrado no espaço escolar, buscando saber quais

as emoções e sentimentos envolvem o início da carreira deste profissional, tecendo

considerações sobre como o coordenador pedagógico ou os pares (professores experientes),

podem contribuir nesse começo da docência, recorro a Wallon, que diz:

O homem se constrói e se recria quando se opõe para romper com o domínio

do outro, na tentativa da busca de si. Mas ainda assim, e contrariamente, o

homem não escapa de trazer consigo o outro – o grupo e o meio – como

parte de sua interioridade, da sua dinâmica interna e de sua humanidade.

(MAHONEY e ALMEIDA, 2004, p. 98)

Esta afirmação explica as relações que se estabelecem entre o meio e os diferentes

grupos nos quais está inserido o ser humano como indispensáveis para o desenvolvimento de

suas potencialidades, são partes constitutivas da pessoa.

Entendem-se então meio como as circunstâncias nas quais se desenvolvem as

existências individuais, ou seja, as formas como estruturas se inter-relacionam possibilitando

transformações físicas e naturais que são determinadas por técnicas ou por meio do uso dos

grupos humanos.

Werebe (1986, p.169), argumenta que na obra walloniana aparecem tipos de meio:

O meio químico-fisico, o primeiro e o mais básico para o ser vivo, que corresponde à

presença dos fatores bióticos e abióticos;

O meio biológico, em que várias espécies convivem e exercem ações recíprocas de

desenvolvimento harmonioso com o ambiente, ajustando sua sobrevivência em um

determinado local;

O meio social, constituído de construções simbólicas e culturais, que dizem respeito

ao contexto em que estamos inseridos e às pessoas com quem estabelecemos relações.

Conhecer esses fundamentos teóricos levou-me a compreensão de que a definição de

meios, proposta pelo autor, em muito se aproxima a definição de grupos.

O meio social contribui para a construção e desenvolvimento da personalidade, através de

valores, atitudes e normas que determinam as condutas sociais da pessoa humana. “O meio

com toda a sua complexidade, com seus grupos e redes de relações, é interiorizado pelo

sujeito, constituindo o sócius. O sócius faz parte da consciência individual” (MAHONEY;

ALMEIDA, 2004, p. 100). Os relatos abaixo explicitam tais preceitos:

Page 78: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

78

Professora Lu

[...] Sempre tinha um lápis em casa, porque a minha família toda tem essa formação. Então

sempre tinha alguém em casa que tinha alguma dúvida, algum vizinho aquilo me deixava

deslumbrada. Eu cresci falando “eu vou ser professora”.

Ou,

[...] Sempre tive a minha família que me apoiava, a minha irmã que tinha bastante

conhecimento, ela me passava o que eu poderia dar, quais as atividades seriam mais

específicas para cada aluno. Isso me deixava mais segura.

[...] Eu cheguei na escola, elas (equipe gestora) se importaram em perguntar qual era a

minha experiência profissional, onde eu já tinha trabalhado.

Professora Cris

[...] Fui fazer enfermagem, técnico em enfermagem. O primeiro emprego que eu consegui foi

na escola que estudava, como técnica de enfermagem, eu gostava desse ambiente escolar.

Fui trabalhar lá e me encantei. Eu ficava mais na área pedagógica, ajudava mais a

coordenadora. Ficava mais do lado dela nesse do que fazendo a minha área. Eu fui me

identificando e ela também me estimulando muito. Ela achava que eu também dava para a

coisa e eu também comecei a querer mudar, despertar esse gosto pela área da educação.

Considerar que os grupos encontram-se organizados em dois aspectos fundamentais do

desenvolvimento humano, ou seja, o individual, que procura atender os interesses pessoais e o

coletivo que preocupa-se com os objetivos do grupo, garantindo a integridade de sua

composição, sendo assim caracterizado por um conjunto de pessoas, onde encontra-se

estabelecida uma hierarquia, onde os papéis são definidos segundo à objetivos a serem

alcançados, nos quais os indivíduos envolvidos podem ou não se sentir parte integrante, fui

buscar elementos nas trajetórias de nossas docentes que reafirmassem tais propósitos.

Relatos de Cris reafirma tais preceitos:

Page 79: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

79

1) [...] Prestei outra prova, na rede. Desta vez, eu prestei para PEB (Professor de

Educação Básica) . Lembro que eu passei em nono lugar, aí eu fiquei super feliz. Eu

vi o resultado pela internet e quase não acreditei. Todos me davam os parabéns. Os

professores da faculdade ficaram felizes. Foi emocionante!

Cris sente a alegria e aprovação dos seus professores pelo seu feito. Sentiu-se parte de

um grupo.

2) [...] Detalhe, horário de café, horário de almoço, você aprende ali na raça com o

professor do lado. Você sai comigo nesse horário! Você vai aprendendo na raça ali.

Aqui Cris fala do seu grupo profissional e do quanto aprendeu com os professores

mais experientes, na hora do café, do almoço e saída.

Contudo é preciso considerar que as diferentes possibilidades que o meio proporciona,

as escolhas pessoais podem alterar as condições naturais de uma pessoa.

Na trajetória do pesquisador, esses elementos também se fizeram presentes e foram

fatores determinantes no início da docência.

[...] Fui encaminhada à sala. Era uma turma considerada a “escória” da escola. Alunos

repetentes, fora da idade/série, marginalizados, rotulados por uma história de fracasso

escolar, desacreditados da família, da escola e da sociedade. Tinha terminado o Magistério

havia exatamente dois anos, estava iniciando na profissão, diante de uma realidade cruel e

solitária.

Professora Clau

[...] Se por um lado sentia-me feliz por ter uma sala de aula, por outro havia a dúvida e a

incerteza sobre o que fazer diante de tal cenário.

Professora Clau

[...] Despi-me de todos os meus conhecimentos didáticos e me permiti uma aproximação

àquela turma, propus ouvi-los, deixei-me afetar por suas expectativas e fui afetando-os com

meu desejo de ensiná-los.

Page 80: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

80

Professora Clau

Outro elemento constitutivo da teoria de Henri Wallon, diz respeito aos grupos. Os

grupos são caracterizados por um sistema de relações pessoais e interpessoais, nele

encontram-se pessoas cujas relações estabelecidas determinam o papel e o lugar de cada um

no conjunto.

[...] Na sala dos professores, falavam sobre outras coisas, não falavam do contexto da

escola. Eu que comecei a procurar saber, vi quem eram as professoras do 2º ano e comecei a

perguntar sobre o que elas estavam trabalhando, sobre o planejamento que elas também não

tinham. Conversando com algumas professoras durante a Hora Atividade, eu percebi que

cada uma trabalhava do seu jeito. Ai eu fui vendo que mais do que nunca eu mesma precisava

buscar formas de dar “cara” para o meu trabalho. Ficava preocupada em saber o que dá

para os meus alunos, ai decidi que faria do meu jeito.

Professora Cris

[...] Eu tinha esse medo, por que não queria que ficasse a impressão de que eu queria me

aparecer. Eu não queria que elas pensando: “Só porque ela é novinha que trazer uma coisa

nova, diferente.” Não era nada disso. às vezes nas reuniões de ATPCs, eu ficava pensando

será que eu falo? Será que é um pergunta muito boba? Será que elas vão gostar, ou não, se

vão entender as minhas dificuldades. Eu tinha esse medo, é claro que elas estavam me

observando.

Professora Lu

[...] A ordem da diretora era a de manter o aluno na sala de aula e garantir o silêncio para

não atrapalhar os demais professores. Na hora do intervalo era constantemente chamada

para resolver problemas de agressão contra alunos menores, de outras salas. Lembro-me de

que ficamos uma semana sem partilhar o tempo do recreio por conta da indisciplina.

Professora Clau

Page 81: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

81

É no grupo que construímos a consciência de nós mesmos e dos outros, onde

aprendemos a desempenhar as práticas sociais e os diferentes papéis construídos de acordo

com os diferentes contextos. Ele coloca aos indivíduos duas exigências que, apesar de

opostas, se complementam. Trata-se do desejo de identificar-se com o grupo, a fim de fazer

parte dele e o desejo de oposição, ou seja, a necessidade de diferenciar-se dos outros.

Daí a importância dos grupos no contexto escolar para a atuação do professor

iniciante. Assim como a criança, que no início do seu de desenvolvimento, encontra-se num

processo de nebulosa, onde o sincretismo, movimento em que a criança precisa reunir todas as

informações para tentar entender o mundo ao seu redor até então visto de maneira global,

também o professor iniciante, em contato com a realidade da profissão encontra-se inserido

em um novo contexto que se apresenta de forma global e precisa organizar as novas

experiências e informações em busca da consciência de si.

Como sabemos, esta busca se constitui na presença do outro, conforme afirma Wallon.

A elaboração do Eu e do Outro por parte da consciência faz-se simultaneamente. São dois

termos conexos cujas variações são complementares e as diferenciações são recíprocas.

(WALLON, 1946/1986, p. 159, p. 74)

O caminho do sincretismo à diferenciação, percorrido pelo professor iniciante

encontra-se fortemente marcado nas trajetórias dos nossos sujeitos.

O relato de Lu, seguido do relato de Cris e de Clau, respectivamente, demonstram

claramente esta relação Eu/Outro.

[...] A maioria dos professores da escola tem muito tempo na profissão, mas elas foram muito

carinhosas, muito atenciosas. Eu colei nas duas professoras de primeiro aninho. A professora

Elaine era mais construtivista, as atividades que ela fazia para os alunos eram diferenciadas,

ela já tinha vinte e dois anos de estado.

[...] Detalhe, horário de café, horário de almoço, você aprende ali na raça com o professor

do lado. Você sai comigo nesse horário! Você vai aprendendo na raça ali.

[...] Nesse ano tive como modelo uma excelente professora alfabetizadora. A professora

Iraci. Era época do Ciclo Básico, ela só dava aula para os primeiros anos. Os pais adoravam

a professora Iraci, todos os alunos terminavam o ano sabendo ler e escrever. Ela era brava,

muito séria, mas cuidava dos alunos como se fossem filhos. Suas aulas eram sempre muito

Page 82: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

82

bem planejadas. Ela não trabalhava com a silabação, usava uma cartilha diferente, com

histórias para cada letra.

Ainda na perspectiva da relação eu e outro, abrimos parênteses para tecer comentários

sobre as personagens que fizeram parte dos bastidores deste estudo, que permitiram entender

os diferentes ir e vir do início da docência. Falo do professor coordenador pedagógico e dos

professores experientes, aqui denominados “pares”.

Trata-se de uma relação que norteia a constituição psíquica do indivíduo de modo

sincrético. Onde o caminho para encontra-se consigo faz-se por meio da diferenciação, ambos

ocorrem de maneira simultânea.

Um adulto pode ter momentos, em que se sente mais deliberadamente ele

mesmo e outros em que se sente sujeito a um destino menos pessoal e mais

submetido às influências, vontades, fantasias dos outros ou às necessidades

que fazem recair sobre ele as situações em que está empenhado perante aos

homens. (WALLON, 1975, p. 77)

Recorro a esta citação para trazer novamente as discussões os relatos dos nossos

entrevistados em que se confirmam os aspectos abordados pela teoria. Veja o que nos diz Lu:

[...] Eu achei muito importante o fato da coordenadora ter considerado a minha experiência

ou falta dela, porque se eu tivesse ido direto para sala de aula sem conhecer os professores,

sem saber o andamento desses alunos, de conhecer a própria escola, como é que eu ia

trabalhar?

[...] A coordenadora, por sua vez, sempre teve um carinho muito grande comigo, desde que

eu cheguei à escola ela sempre foi muito atenciosa com o meu trabalho. Ela vinha até a

minha sala e observava a atividade que estava dando, se observava algo errado me mostrava,

fazia comentário também quando eu estava fazendo certinha. Ela ajudava mesmo. Sempre

dizia: “Olha eu to aqui para te ajudar, o que você precisar pode perguntar. Eu não sei tudo,

mas a gente aprende junto”.

Cris, relembra

Page 83: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

83

[...] Eu pedi o projeto, o planejamento tudo para dar uma olhada, ela disse que estava

tudo uma bagunça que naquela hora não dava, mas que na segunda-feira a gente ia se falar

ela ia passar tudo pra mim.

Para Clau a ausência do professor coordenador foi traumatizante,

[...] Chegava à escola e o medo me assolava. Tentava conversar com os professores mais

velhos, mas isso era impossível, não havia um coordenador pedagógico que pudesse me

apoiar. O jeito era encarar a turma e os desafios.

As evidências mostram que o professor coordenador pode ser o elemento chave para

minimizar os entraves existentes no início da docência. É ele o parceiro mais experiente que

pode auxiliar o professor iniciante na tarefa de encontrar-se a si mesmo.

Os professores experientes também são personagens que podem viabilizar e minimizar

as agruras do início da docência. Durante o processo de entrevista, ao longo do processo de

transcrição das mesmas, foi possível perceber a presença marcante de professores que, com

sua experiência, bom senso e sensibilidade acolheram os saberes e os não saberes dos

professores iniciantes e que certamente influenciaram na pessoa do professor que temos hoje.

Para Cris, esse envolvimento parece não ter ocorrido de forma tão tranquila e positiva.

Veja o que diz sobre esse parceiro.

[...]Conversando com algumas professoras durante a hora atividade eu percebi que cada uma

trabalhava do seu jeito. Algumas usavam mais livros, outras mais o caderno. Só tinha livros

de Português e de Matemática as outras áreas pouco era trabalhado. Aí eu fui vendo que

mais do que nunca eu mesma precisava buscar formas de dar “cara” para o meu trabalho.

No caso de Clau, o encontro com foi harmonioso e deixou marcas positivas o que a faz

lembrar com carinho dos modelos:

[...] Nesse ano tive como modelo uma excelente professora alfabetizadora. A professora Iraci.

Ela não trabalhava com a silabação, usava uma cartilha diferente, com histórias para cada

letra. Sua sala de aula era bem organizada: tinha quadro de pregas com crachás de nomes,

lista com os nomes dos alunos, caixa com livros de histórias, cartazes com cantigas de rodas,

alfabeto móvel, caixas com diferentes materiais para montar, cantos de atividades

Page 84: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

84

diversificadas. Tudo isso para mim era um sonho. Lembro-me de um dia ficar observando o

trabalho dela pela janela da minha sala de aula. Ficava encantada com tudo aquilo e

pensava comigo: um dia vou ser assim!

[...] A professora Eunice também não usava a silabação, trabalhava com listas, cantigas,

poesias desde o início da alfabetização. Dizia: “estes textos ajudavam as crianças a

aprenderem a ler e escrever com mais facilidade”. A sala dela era a primeira a ter as vagas

preenchidas. Fazia um excelente trabalho. Ninguém ficava sem ser alfabetizado com ela.

Cris, por sua vez, acredita na importância e na possibilidade de um trabalho pautada na

troca e na parceria entre os pares, porém traz em seus relatos que havia pouca integração no

grupo que iniciou. A busca por essa integração e parceria sempre partiu dela, mesmo estando

a pouquíssimo tempo naquela escola. Quando questionada sobre o apoio que recebeu ou de

quem recebeu logo que chegou à escola, responde:

[...] A equipe gestora, com certeza não. Já as professoras, eu não acho que é por mal, porque

elas tem a rotina delas de chegar e lidar com os seus alunos, então era muito assim eu tinha

que procurar, ir atrás, mas elas me recebiam bem. Elas diziam pouco sobre o trabalho da

outra professora, acho que também não sabiam muito. Não tinha uma interação entre os

professores mesmo os do segundo ano, nem do segundo com primeiro ano. Acho que cada

uma trabalhava de uma maneira e não sabe como a outra trabalhava, isso era muito

complicado.

E reafirma:

[...] Conversando com algumas professoras durante a hora atividade eu percebi que cada

uma trabalhava do seu jeito. Algumas usavam mais livros, outras mais o caderno. Só tinha

livros de Português e de Matemática as outras áreas pouco era trabalhado. Aí eu fui vendo

que mais do que nunca eu mesma precisava buscar formas de dar “cara” para o meu

trabalho.

Todos os relatos convergem para a importância destes personagens como propositores

de mudanças. À medida que o indivíduo vai reconhecendo a si como eu, também passar a

perceber o outro (PESSOA, 2010,p. 74). Este é o passo inicial na caminhada para definir

Page 85: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

85

enfim o quarto conjunto funcional, definido por Wallon, ou seja, a pessoa. Para Prandini

(2004), “Pessoa é o todo diante do qual cada um dos outros domínios deve ser visto, pois para

Wallon cada parte deve ser considerada diante do todo do qual é parte constituitiva, sob a

pena, de, ao contrário perder seu significado essencial”. (PRANDINI, 2004, p. 30).

Para fechar as reflexões em torno deste eixo, vale lembrar o conceito de integração dos

domínios funcionais definidos por Mahoney (2007):

O motor, o afetivo, o cognitivo, a pessoa embora cada um desses aspectos

tenha identidade estrutural e funcional diferenciada, estão tão integrados que

cada um é parte constitutiva dos outros. Sua separação se faz somente para

descrição do processo. Uma das consequências dessa interpretação é de que

qualquer atividade humana sempre interfere em todos eles. Qualquer

atividade motora tem ressonâncias afetivas e cognitivas; toda operação

mental tem ressonâncias afetivas e motoras. E todas elas têm um impacto no

quarto conjunto: a pessoa. E todas elas têm um impacto no quarto conjunto:

a pessoa, que, ao mesmo tempo em que garante essa integração, é resultado

dela. (MAHONEY, 2007, p. 15)

5.2. Considerações sobre o professor coordenador - Formador em formação

Desde a Lei 114/74, do Estatuto do Magistério, se prevê a presença do coordenador

pedagógico na rede pública de ensino, um especialista com formação em pedagogia. A partir

de 1990, considerando as necessidades de implementação do currículo oficial, a Secretaria de

Estado da Educação confere a esse profissional a missão de divulgar e implementar o

currículo desta Secretaria, através do Programa São Paulo Faz escola que visava atender os

anos finais da Educação Básica e o Ensino Médio e o Programa Ler e Escrever proposta

direcionada aos anos iniciais da Educação Básica.

Neste contexto histórico, social e político muitas foram as mudanças ocorridas nos

bastidores da educação. Com as exigências das metas estabelecidas no Plano Político

Educacional do Governo do Estado de São Paulo, sob o discurso da melhoria da qualidade de

ensino, a função do coordenador pedagógico passa a ser vista como um dos pilares para

divulgação e implementação desta proposta. Neste cenário, a organização administrativa das

escolas passa a ser formada pelo trio gestor: supervisor, diretor e coordenador pedagógico. A

função de coordenador pedagógico passa a ser estendida para todas as escolas da rede oficial

de ensino.

Muitas foram as mudanças que colocam em desequilíbrio o trabalho deste

profissional. Entre elas podemos citar alterações substanciais em relação ao processo de

credenciamento, forma de seleção, tempo de trabalho e área de atuação e atribuições, não

Page 86: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

86

sendo mais exigido a formação em Pedagogia. Vale lembrar que função aqui é entendida

como posto de trabalho temporário, o que implica dizer que a atribuição deste profissional

fica a cargo do diretor e do supervisor da escola, situação esta que por muitas vezes não

garante a continuidade dos projetos e principalmente a construção da identidade deste

profissional.

Sabendo-se que a função do coordenador pedagógico é coordenar, organizar, orientar,

assessorar, subsidiar, promover momentos de integração do trabalho pedagógico entre as

diferentes disciplinas, numa mesma série, ou uma mesma disciplina, em diferentes séries e

considerando que a educação passou a ser do interesse do setor produtivo devido as novas

demandas das áreas tecnológicas o que desemboca na produção de mão de obra,

responsabilizando a escola a assumir seus resultados nas avaliações externas, fica na função

do coordenador o compromisso de auxiliar nas práticas de implementação do currículo. Mas,

pensar um trabalho de formação docente tendo em vista sua própria formação, exige

considerar este um

(...) processo complexo e multideterminado, que ganha materialidade em

múltiplos espaços/atividades, não se restringindo a curso e/ou treinamentos, e

que favorece a apropriação de conhecimentos, estimula a busca de outros

saberes e introduz uma fecunda inquietação contínua como o já conhecido,

motivando viver a docência em toda a sua imponderabilidade, surpresa e

dialética com o novo. (PLACCO, 2012, p. 41 - 42)

Deste modo, é preciso considerar a escola como espaço essencial para a formação de

todos os sujeitos que dela participam, assim sendo o diálogo, a interação, a troca de saberes

deve ser a base na qual o coordenador pedagógico precisa apoiar sua ação formativa que

atenda à diversidade.

Faz parte do desenvolvimento social do individuo aprender a conviver e a

trabalhar com o outro, aprender a ouvir e a se fazer ouvir, expressar ideias e

opiniões próprias e acolher pensamentos e opiniões divergentes. Ora, essas

habilidades e comportamentos só poderão vir a ser desenvolvidos ou

aperfeiçoados na media em que existirem situações concretas para o seu

exercício. (ANDRÉ, 2012, p. 71)

Apostar num processo de formação que precede esta concepção requer metodologias

pautadas na investigação, formulação de hipóteses, seleção de dados e instrumentos que

permita a publicação de seus achados e, sobretudo, acreditar que o processo de aprender a

ensinar não é constituído meramente pela transmissão de conteúdos, mas sim na e pela

Page 87: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

87

formação de sujeitos autônomos que são capazes de compreender a realidade que o cerca,

transformando-a. Atender esses objetivos requer trabalho coletivo com espaços para as trocas

visando à construção de saberes.

Page 88: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

88

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Alguns estudos mostram que aproximadamente 30% dos professores da Rede Pública

Estadual de Ensino que atendem a primeira etapa da Educação Básica, ou seja, os Anos

Iniciais do Ensino Fundamental, encontram-se às vésperas de completarem seu tempo de

trabalho por idade e/ou tempo de contribuição. A constatação desta informação há dois anos

colocou-me inquietações em torno de uma realidade aparentemente próxima. Com vistas a

este possível panorama, passei a idealizar os aspectos que poderiam ser elementos norteadores

desta discussão, chegando à minha questão maior da pesquisa: o professor iniciante.

Definir este personagem colocou-me outra questão que se tornou problema central

desta pesquisa: entender quem é o professor iniciante nos dias de hoje. A partir de então,

outros elementos passaram a fazer parte das minhas inquietações iniciais, o que me levou ao

seguinte problema de pesquisa: entender quem é o professor iniciante nos dias de hoje, como

este tem adentrado no espaço escolar, buscando saber quais as emoções e sentimentos

envolvem o início da carreira deste profissional, tecendo considerações sobre como o

coordenador pedagógico ou os pares (professores experientes), podem contribuir nesse início

da docência.

Por entender que o professor se constitui no meio social, o que ocorre ao longo da sua

trajetória pessoal e profissional, pode-se afirmar que sua atuação traz marcas dessa trajetória

das representações que tem sobre o magistério, das memórias afetivas do ser aluno, da entrada

na profissão, das expectativas suas e dos outros, das suas realizações e frustrações. São estas

as apropriações simbólicas e culturais que dão ele um “jeito de ser professor”.

Para chegar a essas considerações trilhei caminhos antes percorridos na busca de

autores que já se dedicaram a compreender o que esta por traz deste período de início na

docência suas implicações futuras na formação e constituição deste profissional.

Assim por acreditar ser a docência uma profissão constituída por pessoas, para

pessoas, decidi ouvir profissionais do ensino, os quais me emprestaram suas histórias de vida

como elementos norteadores para análise. Este aspecto humano da investigação justifica a

intenção e a busca por entender a afetividade como elemento importante para a elaboração

deste trabalho científico. Foi este componente da pessoa, a afetividade, que priorizei ao longo

de todos estes capítulos, considerando elementos inseparável da dimensão cognitiva no

processo ensino-aprendizagem. Além disso, a afetividade assume igual importância nas

relações que estão estabelecidas no espaço escolar, sendo ela também constitutiva das pessoas

que se encontram ali inseridas. Estes aspectos encontram-se pautadas na Psicogenética de

Page 89: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

89

Henri Wallon, psicólogo do desenvolvimento (1879-1962) que já discutia essa importante

relação para reforma educativa que propôs para o sistema escolar Frances, sendo a escola o

locus ideal para execução.

As respostas encontradas possivelmente não resolverão os problemas aqui

evidenciados, mas certamente minimizaram minhas inquietações frente ao dilema enfrentado

no início da profissão docente, como também apresentaram perspectivas para novas reflexões.

Apesar de tratar-se de experiências vivenciadas em diferentes tempos históricos, foi

possível perceber a forte relação existente nos relatos coletados. De forma muito parecida,

entrevistados e pesquisador experimentaram as dificuldades de adentrar uma profissão que

prevê a coletividade, mas em sua funcionalidade prioriza a individualidade.

Foi recorrente nos relatos referência feita ao trabalho em parceria, à necessidade das

trocas de experiências com os colegas. Nos momento desses relatos era possível perceber

sensações e sentimentos de tonalidade agradáveis mais também sentimentos de tonalidades

desagradáveis. A presença de sentimentos de tonalidades desagradáveis decorria das

situações onde havia a ausência de um parceiro mais experiente: coordenador e/ou pares.

Esses sentimentos foram nomeados por nossos entrevistados como: insegurança, medo,

tristeza, incerteza e solidão. Outros foram captados e ampliaram a lista, podendo ser citados

os sentimentos de ansiedade, apreensão, exaustão e pessimismo.

Alguns relatos vieram embutidos de muito entusiasmo, confiança, tranquilidade e

sensação de acolhimento. Nestes era perceptível a presença do coordenador e/ou pares, como

agentes mediadores do processo de reflexão e transformação da ação didática.

Essas primeiras impressões trazem uma resposta interessante para o âmbito da

pesquisa acadêmica, pois mesmo diante de tantos desafios não existe em nenhum dos relatos o

desejo pela desistência da docência.

Em relação aos eixos aqui definidos cabem algumas sugestões em termo de políticas

públicas educacionais:

No que diz respeito ao processo de ingresso e início da docência é unanime a

necessidade de se repensar ações institucionais que minimizem os sentimentos de

insegurança, impotência, instabilidade que permeiam esse início na profissão. Outro aspecto

que diz respeito a esse momento nos remete a resignificar e/ou ampliar o conceito de

“professor iniciante”. As trajetórias dos envolvidos nesta pesquisa mostram que os nossos

professores iniciantes fazem parte de um grupo que muitas vezes ficam a margem de um

sistema de ensino perverso, que não considera o profissional, pois lhe nega a mínima

condição de ser reconhecido como profissional da docência.

Page 90: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

90

Trata-se de um grupo de profissionais que a todo ano percorre os corredores das

diferentes instituições sem a garantia do seu direito como trabalhador. São os professores

contratados, chamados “categoria O”, neste grupo de profissionais encontram-se os

professores auxiliares, professores eventuais, professores substitutos. São profissionais que

passaram por um processo de formação inicial e ao longo de sua trajetória profissional

perpassam por diferentes escolas, diferentes salas de aulas, diferentes modalidades de ensino

sem terem muitas vezes o conhecimento do currículo a ser seguido, sem um plano de trabalho

previamente definido e orientado, sem material didático disponível para atender as

necessidades de uma rede de ensino que por sua vez não consegue garantir a presença dos

profissionais sejam os titulares de cargo ou daqueles que conquistaram a estabilidade devido

ao tempo de trabalho, os chamados “categoria F”. Estes adentram a sala de aula ao longo do

ano, tendo ao seu lado a incerteza do dia seguinte.

Esta instabilidade no início da profissão em muito descaracteriza o que os referenciais

teóricos determinam como professor iniciante. Este estudo evidenciou que o professor ao

adentrar a sala de aula, já vivenciou, experimentou vários anos de trabalho desfacelado e sem

continuidade. Tal constatação nos coloca frente ao desafio de pensar um processo de

formação continuada que considere o perfil destes profissionais, suas experiências,

expectativas, anseios e os conhecimentos já construídos, mesmo que de forma fragmentada.

No que diz respeito à questão da afetividade muito já foi dito nos capítulos e

parágrafos anteriores, porém vale ressaltar que tomamos aqui o conceito de afetividade como

um constructo que faz parte do desenvolvimento humano. Ser afetivo no contexto desta

pesquisa diz respeito à capacidade do indivíduo de, ao interagir com o meio ser por ele

afetado, o que nos leva a pensar que o processo formativo prevê uma relação de confiança e

respeito, para afetar positivamente o formador e o formando.

Ao iniciar este trabalho, encontrava-me diretamente afetada por questões referentes a

formação de professores. Participar de um momento de formação era para mim um exercício

em busca do autocontrole, para não tornar observáveis minhas inquietações. Às vezes tinha a

sensação de que a informação vinha direto para mim, colocava-me ainda mais dúvidas e

incerteza, anseios e frustrações. Nesses momentos recorria ao lápis e papel que sempre tinha

por perto e registrava todas as minhas inquietudes. Precisava naquele momento de um olhar,

sensível, atento. Alguém que notasse o quanto aquelas informações me inflamavam e

estivesse disposto a simplesmente me ouvir.

Este estudo demonstrou que essa condição se estendia aos entrevistados. Vários foram

os relatos que trouxeram esta necessidade de uma escuta sensível, de um olhar que vai além

Page 91: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

91

da contemplação. É preciso atentar-se para o que o outro tem a nos dizer. E muitas vezes esta

informação não é expressa por meio da linguagem.

No processo de construção, conhecimento e afetividade encontram-se imbricados. Os

programas de formação inicial, continuada e as Políticas Públicas voltadas para a formação do

professor iniciante precisam apostar neste como elemento norteador de ações. Não se trata de

pensar em uma afetividade permissiva, mas sim uma afetividade que se dispõe a ouvir o outro

e captar seus anseios e frustrações, mas também alegrias e conquistas, para propor uma ação

didática baseada nos princípios de respeito à diversidade.

Em relação ao papel do coordenador pedagógico e/os pares (professores experientes)

na atuação do professor iniciante, este sentir-se acolhido no início da profissão é algo que faz

toda a diferença, reduzindo os anseios da passagem de aluno a professor, o choque com a

realidade, o sentimento de solidão, citados pelos diferentes autores e reafirmado nos

depoimentos dos envolvidos nesta pesquisa.

Umas das perguntas colocadas como problema da pesquisa referia-se ao papel que o

coordenador pedagógico e/ou os pares podem ter na entrada da profissão de professores

iniciantes. Os relatos dos entrevistados demonstram que o professor iniciante espera encontrar

no professor coordenador aquele com quem poderá compartilhar seus anseios, dúvidas, erros

e acertos.

No tocante aos professores experientes, pouca ênfase foi dada ao seu papel, porém,

quando citado, é possível perceber que este em muito pode ajudar o professor iniciante na

reflexão e no planejamento de atividades docentes e conteúdos a serem ensinados. Outro

aspecto abordado, como possibilidade de contribuição do professor experiente ao professor

iniciante diz respeito à gestão e gerenciamento da sala de aula e no autoconhecimento da

estrutura e funcionamento da instituição.

Vale lembrar que no processo de interação, o professor experiente pode tornar-se

“modelo” de atuação e constituição profissional. Este movimento de imitação pode também

gerar a reprodução de uma prática pouco inovadora. O olhar atento do professor coordenador

poderá minimizar esta possibilidade, pois é nele que se encontram ancoradas a possibilidades

e expectativas de vislumbrar a carreira como um projeto de formação em serviço.

Ao longo do percurso desta pesquisa, muitas reflexões foram colocadas na busca por

um maior entendimento das manifestações e possíveis eventos que envolvem o entendimento

do outro, sobre o meio em que se encontram inseridos e atuam. Os relatos das duas

professoras entrevistadas, além de confirmarem minhas observações iniciais revelaram o

como e o porquê das coisas acontecerem. Além disso, permitiram trazer novos elementos para

Page 92: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

92

a discussão deste tema o que nos impulsiona à continuidade da reflexão sobre a educação

especificamente sobre o início da profissão.

Esses novos elementos referem-se em princípio a considerar a necessidade de uma

mudança já nos cursos de formação inicial, perpassa pela necessidade do apoio da equipe

escolar e do esforço próprio em busca de uma atuação docente significativa.

Apontam ainda para a necessidade de não perder de vista o perfil e a prática mais

democrática do início da carreira, pois o professor iniciante adentra seu locus de trabalho com

expectativas de mudança que podem ir se perdendo quando não consegue gerenciar os

dilemas do início da profissão.

Outro aspecto apontado por este estudo diz respeito à necessidade de não somente

garantir momentos de formação continuada como já se faz previsto nos diretrizes

institucionais, mas em potencializar as já existentes considerando o professor não como mero

executor de políticas educacionais pautadas em modismos e na fugacidade de programas de

governos, que não considera os diferentes ciclos de vida do docente, nem como réu chamado

a juízo sem direito a uma defesa prévia, mas como elemento crucial para qualquer mudança

que se queira alcançar.

Chego ao final deste estudo com o sentimento de dever cumprido. Revelei o que os

professores iniciantes puros e os iniciantes já maduros, porque tiveram que esperar muito

conseguir seu cargo, vivenciaram em sua trajetória.

Denunciei situações que comprometem a imagem de alguns profissionais e ressaltei

características de professores que, a despeito das dificuldades fizeram a diferença para seus

alunos. E como afirma Paulo Freire, não basta denunciar, é preciso anunciar. Anunciei

algumas pequenas medidas que podem facilitar a entrada na carreira docente e a permanência

nela.

Page 93: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

93

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, L. (Org). Afetividade, aprendizagem e Educação de Jovens e Adultos: relatos de

pesquisa na perspectiva de Henri Wallon. São Paulo: Loyola, 2012.

ALMEIDA, L. R.; MAHONEY A. A. (orgs.). A Constituição da Pessoa na Proposta de

Henri Wallon. São Paulo: Loyola, 2004.

______. Henri Wallon: Psicologia e Educação. São Paulo: Loyola, 2008.

______. A. Afetividade e processo ensino-aprendizagem: contribuições de Henri Wallon.

Psicologia da educação [on line]. 2005, n.20, p. 11-30. ISSN 2175-3520.

ALMEIDA, O. A.; MELIN, A. P. G.; NOGUEIRA, G. D. (org). Trabalho docente e

formação de professores: os professores iniciantes e suas práticas. Revista do Programa de

Pós-Graduação e Educação CEDU-UFAL, Debate em Educação, v. 3, nº 6, 2011.

ALMEIDA. L. R.; PLACCO, V. M. N. de S. O coordenador Pedagógico: provocações e

possibilidades de atuação. São Paulo: Loyola, 2012.

ANDRÉ, M. E. D. A; BARRETO, E. S. S.; GATTI, B. A. Políticas docentes no Brasil: um

estado da arte. Brasília: UNESCO, 2011.

BARRETO, E. S.; GATTI, B. A. Professores do Brasil: impasses e desafios. Brasília:

UNESCO, 2009.

BECKER, F. O que é construtivismo? 2009. Trabalho apresentado na disciplina

desenvolvimento e Aprendizagem sob o enfoque da Psicologia, Universidade Federal do Rio

Grande do Sul, 2009.

______. O que é construtivismo? Revista de educação AEC, Brasília, v. 21, n. 83, p. 7-15,

abr./jun. 1992.

BRASIL. Lei Complementar nº 444, de 27 de dezembro de 1985. Dispõe sobre o Estatuto do

Magistério Paulista e dá providências correlatas. Diário Oficial da União, Brasília: DF, 28

dez. 1985.

______. Lei nº 9.394 de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as Leis de Diretrizes e Bases da

Educação Nacional. Diário Oficial da União, Brasília: DF, 09 jan. 2001.

FRANCO, M. L. Análise do Conteúdo. Brasília: Liber Livro, 2005.

FREIRE, P. Pedagogia da Autonomia. 25. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

______. Pedagogia da Autonomia. São Paulo: Paz e Terra 1997.

GALVÃO, I. Henri Wallon: Uma concepção dialética do desenvolvimento infantil. 12. ed.

Petrópolis, RJ: Vozes, 1995.

Page 94: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

94

GAMA, R. P.; GURGEL, C. M. A. 2001. Sentimentos e dilemas de professores de

Matemática em inicio de carreira. Trabalho apresentado na 24ª Reunião Anual da ANPED,

Caxambu – MG, 2001.

GARCIA, M. C. Formação de professores: para uma mudança educativa. Porto: Porto

Editora, 2005.

______. C. Formação de professores: para uma mudança educativa. Porto: Porto Editora,

1999.

GIANFALDONI, M. H. T. A.; MOROZ, M. O processo de Pesquisa-iniciação. 2º Ed. São

Paulo: Liber, 2006.

GOTLIB, N. B. Clarice: uma vida que se conta. 6ª Ed. São Paulo: Editora da Universidade de

São Paulo, 2011.

HUBERMAN, M. O ciclo de Vida Profissional dos professores. In: NÓVOA, António (Org.).

Vida de Professores. 2ª Ed. Porto: Porto Editora, 2007.

LIMA, A. C. R. E. 2005. Dilemas Profissionais dos Professores Iniciantes. Trabalho

apresentado na 28ª Reunião da ANPED. Caxambu – MG.

MAHONEY, A. A. A constituição da pessoa: desenvolvimento e aprendizagem. In:

ALMEIDA, L. R.; MAHONEY A. A. (orgs.). A Constituição da Pessoa na Proposta de

Henri Wallon. São Paulo: Loyola, 2004.

______. Introdução. In: ALMEIDA, L. R. e MAHONEY A. A. Henri Wallon: Psicologia e

Educação. São Paulo: Loyola, 2008.

MAHONEY, A. A.; ALMEIDA, L. R. A constituição da pessoa na proposta de Henri

Wallon. São Paulo: Loyola, 2012

______. Afetividade e processo de ensino-aprendizagem: contribuições de Henri Wallon. In:

Psicologia da Educação: revista do programa de estudos de pós-graduados PUV/SP, v. 20,

2005, p. 15-28.

MANUAL do Professor. Disponínel em:

http://www.apeoesp.org.br/publicacoes/professor/manual-do-professor-2013/#aposentadoria .

Acesso em 20 maio 2014.

MARIANO, A. L. S. A construção do início da docência: um olhar a partir das

produções da ANPED e do ENDIPE. 2005. Dissertação (Mestrado em Educação).

Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2005.

______. A Pesquisa sobre o professor iniciante e o processo de aprendizagem profissional:

algumas características. In: REUNIÃO ANUAL DA ANPED (Associação Nacional de Pós-

Graduação e Pesquisa em Educação), 15 a 18 de outubro, Caxambu, 2006.

MOLLICA, A. J. P. Torna-se professor da EJA: um estudo priorizando a dimensão afetiva.

Dissertação (Mestrado em Educação: Psicologia da Educação). Pontifícia Universidade

Católica de São Paulo, São Paulo, 2010.

Page 95: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

95

NONO, M.A. Processos de Formação de Professoras Iniciantes. Revista Brasileira de

Estudos Pedagógicos, v. 87, nº 217, 2006.

NÓVOA, A. Os Professores e as histórias da sua vida. In: ________. (Org.). Vidas de

Professores. Portugal: Porto Editora, 1992.

______. Vidas de Professores. 2. ed. Ed. Porto, 2007.

PESSÔA, L. C. O papel do outro na atuação do Professor Coordenador. Dissertação

(Mestrado em Educação: Psicologia da Educação). Pontifícia Universidade Católica de Asão

Paulo, São Paulo, 2010.

PRANDINI, R.C. A. R. A constituição da pessoa: integração funcional. In: MANHONEY, A.

A, e ALMEIDA, L. R. (Org). A Constituição da Pessoa na proposta de Henri Wallon, São

Paulo: Loyola, 2004.

RESOLUÇÃO CNE/CP Nº 1, de 18 de Fevereiro de 2002. Diretrizes Curriculares Nacionais

para a Formação de Professores da Educação Básica, em nível superior, curso de licenciatura,

de GRADUAÇÃO plena.

ROCHA, Gisele Antunes (2006). Por uma política institucional comprometida com o inicio

da carreira docente enquanto projeto coletivo. Trabalho apresentado na 29ª Reunião da

ANPED. Caxambu – MG.

RUSSO, M. H.; SILVA, V. A. Coordenação Pedagógica na Gestão da Escola Pública:

Fundamentos e Obstáculos a sua Consolidação na Prática Escolar. Revista Educação e

Políticas em Debates. Vol. 2, n. 2, jul./dez. 2012.

SZYMANKI, H.; ALMEIDA L. R.; PRANDINI, R. C. A. R. A entrevista na Pesquisa em

Educação: a prática reflexiva. 3. ed. São Paulo: Liber, 2010.

TARDIF, M. Saberes docentes e formação profissional. Petrópolis: Vozes, 2010.

______. Saberes docentes e formação profissional. Tradução de Francisco Pereira. 2. ed.

Petrópolis: Vozes, 2002.

WALLON, H. A. Evolução Psicológica da Criança. São Paulo: Martins Fontes, 1941/2007.

WEREBE, M. J. G.; NADEL-BRULFERT, J (org.). Henri Wallon. São Paulo: Editora

Ática, 1986.

Page 96: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

96

APÊNDICE 1

QUESTIONÁRIO DE CARACTERIZAÇÃO DO SUJEITO DA PESQUISA

Nome:

Idade:

Tel.contato:

e-mail:

Tempo de magistério:

Há quanto tempo atua como professor:

1. Formação Institucional

Magistério

Ensino Médio - Magistério ( ) ( ) Magistério CEFAM

Ano de conclusão:

2. Curso universitário

Fez pedagogia? Sim ( ) Não ( )

Ano de conclusão:

3. Situação funcional

Professor Estável ( )

Professor Efetivo ( )

4. Rede oficial de ensino em que atua

Municipal ( ) Guarulhos São Paulo ( )

Se Municipal, avance para o item 4.1

Estadual ( ) Diretoria:

Participou do Concurso para professores da Educação Básica I no ano de 2005 da rede

Estadual

Sim ( ) Não ( )

Foi aprovado? Sim ( ) Não ( )

Data de posse? (efetivação)

4.1 Ano do Concurso Público para Professores de Educação Básica I em que foi

efetivada?

Data da posse? (efetivação)

Page 97: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

97

APÊNDICE 2

CARTA DE INFORMAÇÃO AO SUJEITO DA PESQUISA

O presente trabalho se propõe a entender quem é o professor iniciante nos dias de hoje, como

este tem adentrado no espaço escolar, buscando saber quais as emoções e sentimentos

envolvem o início da carreira deste profissional, tecendo considerações sobre como o

coordenador pedagógico ou os pares (professores experientes), podem contribuir nesse início

da docência. Os dados para o estudo serão coletados por meio de entrevistas (gravadas) com

docentes que possuem esse perfil (professor iniciante) e se dispuserem a participar da

pesquisa. Esse material será posteriormente analisado sendo resguardado o nome dos

participantes, bem como a identificação do local da coleta de dados. A divulgação do trabalho

tem finalidade acadêmica, esperando contribuir para um maior conhecimento do tema

estudado.

Aos participantes cabe o direito de retirar-se do estudo a qualquer momento sem prejuízo

algum. Os dados coletados serão utilizados na dissertação do mestrado da pesquisadora

Claudineide Lima Irmã Santos, aluna do Programa de Estudos Pós- Graduados em Educação:

Psicologia da Educação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

___________________________________________

CLAUDINEIDE LIMA IRMÃ SANTOS

Pesquisadora

Page 98: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

98

APÊNDICE 3

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Pelo presente instrumento que atende as exigências legais, o (a) senhor (a)

______________________________________________________, após a leitura da CARTA

DE INFORMAÇÃO AO SUJEITO DA PESQUISA, ciente aos procedimentos aos quais será

submetido (a), não restando quaisquer dúvidas a respeito do lido e explicado, firma seu

CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO de concordância na pesquisa proposta.

Fica claro que o sujeito da pesquisa pode a qualquer momento retirar seu

CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO e deixar de participar do estudo e fica ciente

que todo o trabalho realizado torna-se informação confidencial, guardada por força de sigilo

profissional.

_______________________________________________

Local e Data

Page 99: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

99

APÊNDICE 4

Roteiro da Entrevista Inicial

1ª abordagem

Estamos realizando uma pesquisa com o objetivo de entender quem é o professor iniciante

nos dias de hoje, como este tem adentrado no espaço escolar, buscando saber quais as

emoções e sentimentos envolvem o inicio da carreira deste profissional, tecendo

considerações sobre como o coordenador pedagógico ou os pares (professores experientes),

podem contribuir nesse início da docência. Para isso, consideramos fundamental ouvi-la.

2ª abordagem

O que você pensou/sentiu ....

Quando se tornou efetivo, ou seja, quando viu seu nome publicado no Diário Oficial,

na lista de aprovados?

E no momento da escolha?

Quando você foi conhecer a escola...

Como você foi recebido?

Quais as informações que recebeu da escola?

Qual informação recebeu sobre a sua classe?

Quem passou essas informações? Onde?

Descreva seu primeiro dia de aula como professor efetivo.

De quem você recebeu maior apoio?

Page 100: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

100

A escola tinha/tem Professor Coordenador?

Como foi/é a atuação do Professor Coordenador junto a você?

O que esperava que o Professor Coordenador fizesse quando você chegou e o que

realmente aconteceu?

Em que momento de sua atuação você sentiu mais segurança?

Qual o papel do Professor Coordenador no início de sua trajetória profissional?

Descreva uma orientação dada pelo professor coordenador que você julgou/julga

significativa?

Em que essa orientação contribuiu/contribui para sua atuação em sala de aula?

Page 101: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

101

APÊNDICE 5

Transcrição da Entrevista Inicial – Professora Lu

Caracterização do entrevistado

Nome: Luana

Idade: 36 anos

Formação: Pedagoga

Ano de conclusão: 2010

Tempo de exercício no magistério: 2 anos

Nível/Série/Ano em que já trabalhou: Educação Infantil e Ensino Fundamental

Ano em que atua: 1º ano

Entrevistador: Olá Luana, bom dia, fico muito feliz em você ter aceitado o convite para

participar desta entrevista. Para começar gostaria que você ficasse à vontade, será com certeza

uma conversa bem tranquila, tudo bem? Só para situar gostaria de dizer que esta entrevista é

parte de um projeto de pesquisa que busca saber quais as emoções e sentimentos presentes no

início da docência, tecendo considerações sobre como o coordenador pedagógico e/ou pares

(professores) podem contribuir na entrada da profissão. Podemos começar? Neste primeiro

momento, gostaria que você resgatasse um pouco este caminho percorrido até a sua escolha

pelo magistério. De onde partiu seu interesse pela profissão de professor. Se houve pessoas

que influenciaram nesta decisão: professores, familiares. Se você concordar, acho que

poderíamos começar pela sua infância. Você pode falar um pouquinho deste período?

Entrevistado: Bom, eu sempre gostei, acho que desde pequenininha. Eu gostava de brincar

com os meus irmãos de ficar riscando, não era nem em lousa era na porta do armário. A gente

fazia e brincava na porta do guarda-roupa, sabe? E sempre tinha um lápis em casa, por que a

minha família toda são de professoras, diretores de escola. Minhas tias todas tem essa

formação. Então acho que por você conviver num ambiente assim, eu ficava fascinada em ver

minhas tias as minhas irmãs trabalhando e elas sempre foram alfabetizadoras. Então sempre

tinha alguém em casa que tinha alguma dúvida, algum vizinho, alguém... Aquilo me deixava

deslumbrada. Eu achava aquilo muito bonito. Então eu cresci falando “eu vou ser professora.”

E aí quando eu estava com dezenove anos fiz o primeiro ano normal e fui para magistério,

foi ai que eu fui aprender a ver como era essa aprendizagem tudo. Aí por um lado você fica

com aquela ideia, por que a teoria é muito bonita, aí na hora da prática. Eu comecei a ver nos

Page 102: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

102

estágios como era essa formação. Então por um lado assim eu fiquei meia assustada. E

pensava assim: “Nossa! como um professor numa sala de aula, com trinta e cinco alunos, a

responsabilidade de cuidar de cada um.” Então, eu sempre procurei pesquisar, sempre

procurei observar e tirar aquilo que eu pudesse aproveitar de todos aqueles estágios que eu fiz.

E ai quando eu terminei foi naquela fase que iam tirar o magistério que não ia ter mais

validade.

Entrevistador: Então você fez CEFAN?

Entrevistado: Isso mesmo, mas demorei a começar dar aula. Aí eu ficava pensando mais será

que agora eu vou para o magistério ou não? Não por que se eu tivesse que continuar eu teria

que fazer uma faculdade. Mas aí a minha família, todo mundo aconselhou, não vai. Aí eu

comecei a trabalhar em outras coisas mas pensava: “Vou arranjar um serviço nessa área e

depois eu vejo se eu vou fazer a pedagogia.” E aí eu fui pras escolas de educação infantil.

Aí eu conheci na creche, eu fiquei sete anos trabalhando. Depois eu tive a oportunidade de

trabalhar na prefeitura de Arujá, com turma de terceiro ano, era um contrato por um ano. Eles

tinham dificuldades na aprendizagem eu tive que estudar para saber como era essa iniciação,

esses alunos que não eram alfabetizados. Como que eu ia trabalhar. Minha família me

apoiava. A minha irmã que tinha bastante conhecimento, me passava o que eu poderia dar,

quais as atividades seriam mais especificas para cada aluno.

Entrevistador: Você traz na sua fala que você sempre procurou estudar, para tentar entender

as necessidades desses alunos, tentar compreender como é essa dinâmica de ser professor.

Você chegou a participar do último concurso da rede estadual?

Entrevistado: Sim eu participei, mas foi um trauma muito grande no dia, porque eu me

lembro que na sala onde eu fiquei teve uma professora que passou mal na hora da prova. Aí

ficou aquela tensão. A gente estava com aprova na mão e a mulher começou a passar mal e a

gente não sabia se parava a prova ou se atendia a professora. Ela estava bem próxima de mim,

chamaram a ambulância e a gente com a prova. Uma parte do pessoal dizia que a prova ia ser

cancelada, outra parte dizia que não.

Decidiram que ia continuar a prova, mas aí todo mundo estava nervoso, sabe aquela tensão

assim e aí eu fiquei naquela angústia, eu era novinha na época e ai eu fiquei pensando: “Ai

meu Deus, será que vale a pena?” porque eu via aquela professora ali. Professoras de vinte,

quinze anos de carreira e aquela angústia, todo mundo preocupada se ia passar ou não. E você

Page 103: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

103

ouve muito comentário da rede estadual. Quando eu estava na creche, eu sempre falava eu

vou para a rede estadual, pra ver como é. As pessoas diziam assim: “ah, você pensa bem, se

você vai para a rede estadual, não vai ser fácil.”

Aí na hora da prova eu fiquei muito nervosa, não consegui desenvolver. Eu fiz a primeira

parte e tive que retonar depois porque a prova eram duas partes. A tarde nós tínhamos que

voltar pra fazer a redação, eu fiz, mas meio que sem muito interesse, sabe? Eu pensava: “eu

não quero passar por isso, eu não quero!” Sabe? Ver a professora ali passando mal porque ela

estava tão angustiada na questão do serviço dela, o cargo, ela precisava muito passar, não

aguentou, passou mal mesmo. O resgate precisou vir busca-lá. Eu fiquei muito nervosa e não

consegui desenvolver a parte da redação, aí eu acabei saindo sem terminar. Então a minha

redação não foi muito boa, eu não elaborei muito bem o tema e acabei não tendo uma nota

boa, acabei não pegando uma classificação.

Entrevistador: E diante deste incidente que você presenciou e que com certeza deve ter

contribuído no seu resultado o que te fez mudar de ideia e continuar na educação?

Entrevistado: Acho que é você pensar, evitar escutar só os comentários e realmente ir lá e

conhecer e saber o que está rede oferece para você. Quem trabalha na rede estadual reclama

muito. Você tem que conhecer. Você tem que saber se realmente o estado é tudo isso que

falam. Só tinha um jeito de saber. Eu sempre quis ser professora, então eu falei: “só vou saber

o que é ser professora se eu estiver dentro da rede, conhecer mesmo.” E eu me surpreendi, eu

tô gostando muito. Eu escutei muitas coisas assim sabe contra, não, mas não vale a pena, eu

posso dizer pra você, tá valendo a pena. Eu tô gostando muito de estar aqui.

Entrevistador: Luana, conta um pouquinho como foi que você chegou nesta escola, pelo que

você falou esta é sua primeira experiência com ensino fundamental, ate então você trabalhou

com creche. Conta um pouquinho como foi essa chegada aqui.

Entrevistado: Eu passei no processo seletivo, uma prova que tem no final do ano, que dá

condição a você concorrer a aula no ano seguinte. Eu fiquei até surpresa, porque quando fui

fazer a prova não sabia que os demais professores da rede estavam fazendo junto comigo,

achava que era só para professores novos, então haviam vários professores com muitos anos

de experiência. Quando eu tive um terceiro ano, como eu falei das crianças que tinham muitas

dificuldades, eu comecei dar uma lida no material oferecido pela rede estadual aos professores

Page 104: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

104

chamado o Guia de orientações do Programa Ler e Escrever. Quando eu fui fazer a prova vi

que muitas coisas que caiu na prova batiam com que eu tinha estudado, então assim valeu a

pena, eu fui bem, mas porquê? Porque eu peguei o material e estudei.

Entrevistador: Aí você foi aprovada nesse processo seletivo, era a primeira vez que você ia

escolher uma sala. Como foi esse processo de escolha? Você foi chamada logo no começo,

como é que isso aconteceu?

Entrevistado: Eu fui em três atribuições ate conseguir a vaga, quando eu fui nas primeiras

atribuições tinham professores da categoria F e categoria O. É um processo desumano. Na

quarta atribuição que eu fui, eles iam pegar quem tinha sido aprovado no processo seletivo de

2012, os que eram novos na rede.

Entrevistador: Luana, retomando um pouquinho sua fala, você disse ter vivenciado um

processo desumano. Pode falar sobre isso?

Entrevistado: Posso sim. Acho desumano porque você passa horas num lugar pequeno, cheio

de professores, muitos com filhos pequenos, sem a mínima condição para esperar o momento

de ter o seu nome chamado. Nunca começa no horário previsto, há problemas de várias

ordens. As pessoas estão ansiosas, acabam sendo grosseiras. É muito duro.

Entrevistador: Ok. Então aí nesse momento você conseguiu pegar sua sala?

Entrevistado: Isso, foi nesse momento. Na quarta atribuição.

Entrevistador: Bem, você já estava com a sala. Conta como foi a sua chegada aqui na escola.

Entrevistado: Eu fui muito bem recebida. A sala que me foi atribuída foi desmembrada. Os

alunos já estavam em sala de aula com professores. Tinha o primeiro A e o primeiro B,

montaram a salinha do primeiro C. Assim que eu cheguei elas acharam melhor que os alunos

se mantivessem (a coordenadora e a diretora) na sala de aula e que eu conhecesse o trabalho

de cada professor.

Então a primeira semana eu fiquei cada dia com um professora para saber qual era o ritmo das

crianças. As professoras deram apoio muito grande. Elas me falavam como era cada aluno,

Page 105: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

105

qual a hipótese de escrita dos alunos, quais alunos iriam para minha sala. Elas me passaram

algumas dicas de como eu podia trabalhar e de como ia ser. Nos primeiros dias eu fiquei no

primeiro B com a professora Antonia e fiquei três dias no primeiro A, com a professora

Elaine, depois eles me passaram os nomes dos alunos, só na semana seguinte é que eu

comecei pegar todas as crianças para ir pra minha sala.

Eu já tinha um conhecimento de como eram os alunos, observava um a um. A professora

também já tinha me falado da aprendizagem de cada um. Foi importante ter essa semana,

porque eu acho que eu conheci um pouco mais o trabalho de cada professor, a forma como a

escola estava organizada, foi muito bom.

Entrevistador: Podemos dizer que foi uma semana de adaptação para o professor em relação

aos alunos? Essa sala foi desmembrada por quê?

Entrevistado: Pelo número de alunos. As duas salas estavam com trinta e quatro alunos cada

e por ser uma sala de alfabetização eu não sei se é uma lei que só pode ter vinte e cinco alunos

por sala. Acho que sim, foi uma semana de adaptação. Foi diferente, mas valeu muito a pena.

Entrevistador: Você se lembra de ter recebido alguma informação bem específica em relação

a este trabalho, algo relevante tendo em vista que você estava chegando na rede, chegando na

escola, pegando uma sala que ainda ia ser desmembrada. Você lembra-se de alguma

orientação por parte da diretora ou da coordenadora que considera que ajudou no seu

trabalho?

Entrevistado: Sim, por parte da diretora e da coordenadora. Assim que eu cheguei, elas se

importaram em perguntar qual era a minha experiência profissional, onde eu já teria

trabalhado. Aí elas conversaram entre elas e optaram por não separar a sala e me deixar uma

semana para eu conhecer o trabalho. Era a minha primeira vez com alfabetização e elas

tiveram essa preocupação de dar esse apoio para eu conhecer um pouquinho melhor, logo no

início separar as crianças, seria complicado para o meu trabalho e para crianças também.

Entrevistador: Você poderia descrever como foi o seu primeiro dia de aula com esses alunos.

Entrevistado: Foi tranquilo, porque como eu já estava tendo contato com eles desde os

primeiros dias de aula, as professoras tiveram assim o carinho de conversar com cada criança

Page 106: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

106

e explicar porque elas estavam saindo da sala. Então assim que eu entrava na sala de aula elas

explicavam, “essa é a nova professora” e passava para eles, “tais alunos vão ficar com essa

professora porque a nossa sala está com muitos alunos, vocês irão para outra sala, mas a prô

vai continuar aqui na escola”. Então foi tranquilo. No começo, acho que no primeiro ou no

segundo dia, os pais queriam saber os motivos das trocas, se era porque os alunos estavam

mais fracos, se aluno estava mais forte e tinha alguma espécie de classificação. Então eles

ficaram muito preocupados quanto a isso. Aí logo na nessa semana teve uma reunião de pais,

eu pude conhecer cada um dos pais e explicar que as salas estavam muito cheias e por isso foi

criada uma nova sala.

Foi um bom contato, as crianças ficavam ansiosas também, porque eles viam as professoras,

os colegas ao lado e não podiam ir também. Então eles tinham que ficar comigo e por mais

que tenha ficado na sala cada e conhecido o trabalho das professoras, cada professor segue

uma linha, cada um tem o seu jeito de trabalhar então até eles se adaptarem ao meu jeito, a

forma que trabalhava, na primeira semana eles ficaram meio ansiosos, acho que eles

pensavam como será essa professora.

Entrevistador: Você recebeu apoio de alguém? Algum professor ou mesmo a equipe gestora

que você considera que recebeu um apoio relevante que possa ter te ajudado.

Entrevistado: Olha, todos me receberam muito bem as professoras dos primeiros anos as

duas, tanto a do primeiro A como a do primeiro B sempre me apoiaram, perguntavam se eu

tinha dúvida. Quando eu tinha elas me ajudavam. Elas perguntavam se precisasse trazer

algum material elas traziam, até mesmo a professora do segundo ano, às vezes ela vê alguma

coisa assim de fora e me mostra, é feito uma troca.

E a coordenadora me deu muito apoio, me ajuda muito, está sempre perguntando se preciso de

algo. Às vezes a gente está em hora de estudo do EMAI (Ensino da Matemática nos Anos

Iniciais), que é de terça-feira, são duas horas, eu estou adorando e ela pergunta se tenho

dúvida. Pergunta como estou trabalhando, se os alunos estão gostando.

Esta sendo muito proveitoso, eu gosto muito de participar e ela sempre que tem uma questão

que ela vê que eu fico em dúvida ela já olha pra e diz: eu acho que você ficou com dúvida,

você entendeu? Ai ela para, se tiver que fazer uma revisão também ela faz, Eu estou tendo

um apoio muito grande

Page 107: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

107

Entrevistador: Sobre a atuação do coordenador que você começou a falar, pensando um

pouquinho nisso, você disse que ela perguntou, considerou a sua realidade, de onde você

estava vindo, a sua primeira experiência, tem algum aspecto que julgue que tenha sido

determinante neste diálogo com o coordenador para o seu trabalho aqui na escola? Algo que

tenha sido um facilitador, alguma dica que a coordenadora possa ter dado?

Entrevistado: Eu achei muito importante o fato da coordenadora ter considerado a minha

experiência ou falta dela, porque talvez se eu tivesse ido direto para sala de aula sem conhecer

os professores, sem saber o andamento desses alunos, de conhecer a própria escola, como é

que eu ia trabalhar? Se eu tivesse ido direto pra minha sala de aula, talvez eu não tivesse,

assim... Esses poucos dias as horas que fiquei com as professoras, já comecei a aprender

bastante coisa. Você já começa a aproveitar dali e talvez se ela não tivesse dado essa

importância ou se ela falasse: “não eu, ela vai chegar e já vou jogar os alunos pra sala dela e

ela que se vire, afinal ela esta aqui porque ela é professora”. Porque às vezes elas pensam

assim: “ela passou, ela pegou a vaga então a sala é dela, ela que se vire”. Ela não teve isso.

Quando a coordenadora foi organizar a minha sala ela ainda perguntou: “você quer ficar mais

um tempo de experiência? Você já consegue trabalhar, você viu como são os alunos, deu pra

você conhecer?” Eu disse que sim e depois ela sempre me perguntava “como é que está?”.

Na semana seguinte na ATPC (Aula de trabalho Coletivo), ela perguntou: “como estão os

alunos? Como foi? Você gostou? Se tem alguma dúvida, você precisa de alguma ajuda? tá

precisando de alguma coisa?” Eu vejo que ela dá um apoio assim que me ajuda bastante e não

é só a mim, aos outros professores também. Ela sabe tudo sobre os alunos e a escola.

Entrevistador: Pensando nesse tempo de atuação, você lembra de algum momento em que

você sentiu mais segurança para fazer o seu trabalho?

Entrevistador: Nas primeiras semanas quando você pega a turminha, você começa a fazer a

sondagem, você começa ver cada um, os momentos de cada aluno e assim o carinho que eles

me receberam , por eles já estarem em outra sala, você fica pensando como é que vai ser, tem

aluno que chora, eles são muito pequenininhos, queria acompanhar a outra professora, mas

com eles não, eles me receberam bem, os pais também vieram conversar comigo e aí você vê

aqueles olhinhos brilhando para você e aí você começa dar as atividades eles tem interesse,

isso me deixou muito segura realmente vale a pena tá aqui com essas crianças.

Page 108: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

108

Entrevistador: Você falou bastante sobre o coordenador. Você acha que ele foi uma

importante referência para você para o início do seu trabalho?

Entrevistado: Ela está sendo, porque, por mais que eu tenha pouca experiência, porque na

alfabetização é a primeira vez, ela sempre me dá o apoio. Se eu tiver em dúvida em alguma

coisa ela tenta me ajudar, tanto ela como as professoras do primeiro ano.

Entrevistador: Você pode relatar alguma orientação dada pelo coordenador que tenha sido

importante, que ajudou na sua prática em sala de aula?

Entrevistado: Acho que em relação aos cartazes que eu estava colocando nas paredes. Eu

comecei colocar muita coisa na sala de aula e aí ela me mostrou de que forma eu precisava

trabalhar com os cartazes, de como eu iria colocar, como eu iria trabalhar com as crianças,

mesmo na matemática, como usa e montar os quadros de números, como fazer a chamada

usando as tarjetas com os nomes dos alunos. Ela aproveitou um momento em ATPC e passou

para todos os professores como expor e usar esse material eu achei muito importante.

Entrevistador: Como essa orientação contribuiu para o seu trabalho?

Entrevistado: Ah, pude explorar e fazer usos desses recursos de forma correta, porque não é

colocar por colocar, porque precisa estar ali e ser usado de forma significativa, só colocar e

falar, “ah, tá lindo, tá bonito” e não ter utilização, não adianta. Então para mim foi muito

importante, acho que eu estava usando assim.

Entrevistador: Bom Luana, a gente tá chegando ao final da entrevista eu agradeço muito

toda sua boa vontade em participar desta pesquisa e gostaria que você ficasse a vontade pra

você dizer o que julgar importante ou que possa contribuir tanto para a pesquisa como pra

outros estudos sobre o professor iniciante e seu início de carreira. O que você já percebe nesse

percurso que você fez. Eu gostaria que você ficasse à vontade pra gente finalizar se você não

tivesse mais nada pra dizer.

Entrevistado: Bom eu achei muito interessante e agradeço este momento, por você estar

aqui, pois eu acho muito importante você ter um bom desenvolvimento, a gente esta sempre

aprendendo e aqui estou desde março, mas esta é a minha primeira vez na rede estadual. Eu

Page 109: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

109

não tenho muita experiência, está sendo muito importante o papel da coordenadora de me

apoiar e dos professores também. Eu quero aprender cada vez mais, então assim tudo que

puderem me passar para eu desenvolver melhor o meu trabalho é valido.

Eu fico meio receosa, porque eu não quero que os alunos não tenham uma boa aprendizagem

e eu acho que a primeira série é fundamental pra eles. Tudo que eu tô dando para eles agora

eu fico preocupada, eu penso que eu quero que, como eu posso te dizer, eu gostaria que se

desenvolvam bem sabe, eu quero que eles aprendam e eu fico naquela angustia, quando eu

pego um aluno que é pré-silábico em sua hipótese de escrita, e fico pensando como eu vou

fazer pra ele chegar até a fase alfabética.

As professoras dizem para eu ficar calma porque é um trabalho de formiguinha alfabetização

e aos poucos vou dando um tipo de atividade, e começo a ver que realmente vai, a criança já

saiu de uma fase já esta com valor sonoro nas letras e aos pouco a gente vai chegar.

Eu sou um pouco ansiosa, isso acaba atrapalhando um pouco. Eu quero que ele aprenda logo,

quero meu aluno lendo. Quando você dita uma palavrinha e aí o aluno escreve eu penso: “eu

sei que ele é capaz de escrever”. Você vai vendo que com o seu trabalho aos poucos ele vai

conseguir, mas isso depende também das atividades que está propondo para seu aluno e do

próprio ambiente em que ele esta, que vai fazer com ele evolua cada dia mais. Então eu fico

assim, aberta. O que puderem me passar, no que puderem me ajudar, para que eu possa

aprender, estou aberta.

Entrevistador: Você se sente apoiada nesse sentido?

Entrvistado: Sinto-me. Todas as dúvidas que eu tenho eu sempre tenho alguém pra me

apoiar.

Entrevistador: Luana, eu agradeço, espero que também tenha sido bacana para você. Se você

não tiver mais nada a dizer a gente encerra aqui.

Entrevistado: Acho que eu disse tudo. Muito obrigado.

Page 110: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

110

APÊNDICE 6

Transcrição da Entrevista Inicial – Professora Cris

Caracterização do entrevistado

Nome: Cristina

Idade: 24

Formação: Pedagoga

Ano de conclusão: 2011

Tempo de exercício do magistério: 6 meses

Nivel/Série/Ano em que já trabalhou:

Ano em que atua: 2º ano

Entrevistador: Olá Cris, bom dia, fico muito feliz em você ter aceitado o convite para

participar desta entrevista. Para começar gostaria que você ficasse à vontade, será com certeza

uma conversa bem tranquila, tudo bem? Só para situar, gostaria de dizer que esta entrevista é

parte de um projeto pesquisa que busca saber quais as emoções e sentimentos presentes no

início da docência, tecendo considerações sobre como o coordenador pedagógico e/ou pares

(professores) podem contribuir na entrada da profissão. Podemos começar? Neste primeiro

momento gostaria que você resgatasse um pouco este caminho percorrido até a sua escolha

pelo magistério. De onde partiu seu interesse pela profissão de professor. Se houve pessoas

que influenciaram nesta decisão: professores, familiares. Se você concordar, acho que

poderíamos começar pela sua infância. Você pode falar um pouquinho deste período?

Entrevistado: Bom, na minha infância, eu sempre gostei de escola, sempre gostei de

professores, de estar com alguns, mas não que eu desde pequena pensei em ser professora,

não era essa a área que eu queria, era mais a área da saúde que eu queria optar. Fui fazer

enfermagem, técnico em enfermagem. Meu primeiro emprego como técnica de enfermagem

foi na escola que eu estudava. A escola em que terminei o Ensino Médio. Eu gostei porque eu

gostava desse ambiente escolar, fui trabalhar lá e me encantei. Eu ficava mais na área

pedagógica, ajudava a coordenadora, ficava mais do lado dela do que fazendo a minha área.

É que era uma escola particular que tinha berçário e precisava de uma enfermeira. Aí nisso eu

fui me identificando e ela também me estimulando muito é que ela achava eu dava para coisa.

Page 111: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

111

Acho que acreditei nisso e também comecei a querer mudar, despertar esse gosto pela área da

educação. Aí eu fiz um curso de berçarista em ADI e gostei, mas era mais para eu me

aperfeiçoar, por estar na área da educação mesmo como técnica de enfermagem. No ano

seguinte resolvi fazer a pedagogia. Pesquisei bastante sobre a área e aí decidi “vou seguir esse

caminho”. Fiz e fui me encantando por isso, eu estava numa escola particular então em acabei

pegando sala antes de terminar o curso de Pedagogia. Eu peguei a sala, a coordenadora me

apoio muito na época me orientou bastante.

Era uma sala de maternal, nível baby, aí eu prestei o concurso para a rede pública municipal

em 2011. Passei e fui chamada, aí eu terminei a faculdade e logo fui chamada a assumir o

cargo, que é professora de educação infantil, aí eu peguei uma turma de berçário 1, no Cora

Coralina, no Cabuçú.

Consegui ficar um ano lá, no outro ano eu peguei de novo lá no período da manhã, aí depois

eu troquei, porque eu fui chamada pra outro concurso que prestei também em 2012, este para

PEB I (Professor de Educação Básica I).

Entrevistador: Deixa só eu entender. Você disse então que fez um primeiro concurso onde

você foi chamada na prefeitura para trabalhar na modalidade que você já trabalhava que era

na educação infantil, depois você fez um novo concurso em 2012 e ai sim para Ensino

Fundamental e neste você também processo de 2012

Entrevistada: exatamente, eu prestei em 2012 e fui chamada, nesse concurso eu lembro que

eu passei em nono lugar ai eu fiquei super feliz, mas eu só fui chamada só esse ano, 2013.

Entrevistador: Ah então você tá me dizendo uma coisa bacana de lembrar. Como é que foi

essa coisa de abrir o diário oficial e ver seu nome na lista dos aprovados, qual foi o

sentimento, qual a sensação, pode falar um pouquinho sobre isso?

Entrevistado: Nossa desde a primeira vez foi muito bom, a minha ansiedade nesse primeiro

concurso, era por eu ainda não ter terminado a faculdade ainda, e eu ter conseguido passar

antes de ter terminado porque eu tinha medo de me chamarem eu não poder assumir, mas

nossa, os professores da faculdade ficaram muito felizes, por que, nossa, ele colocava você no

céu, quem conseguiu passar né, eles estimulavam bem.

Mas consegui, fiz o outro concurso e ter passado em nono foi maravilhoso. Era uma resposta

ao meu desejo de ser professora e ter deixado a enfermagem. Eu fiquei um pouco insegura

Page 112: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

112

assim tudo, estava mudando de área, saindo da saúde para entrar na educação. Eu sempre fui

muito assim, ansiosa. Ver o olhar do outro para você, admirando o resultado do concurso. Eu

sempre chegava em casa era muito legal ouvir falar: ah que bacana que você fez isso, eu

enxerguei isso bacana, que legal, acho que é uma resposta de fora. Você sabe do seu

trabalho, você sabe a vontade que você tem e tudo mais e que fazer da melhor forma, mas

quando você enxerga isso, por exemplo, de um pai de um aluno ou de um coordenador que te

fala: puxa que bacana que você fez, é a mesma coisa quando você abre o diário e vê seu

nome na lista dos aprovados. Que legal eu estudei não sabia mas que legal eu consegui. Acho

que te estimula, foi um estimulo pra mim.

Entrevistador: Cristina, conta um pouquinho como foi que você chegou à escola, pelo que

você falou esta era sua primeira experiência com ensino fundamental, ate então você

trabalhou com Educação Infantil. Conta um pouquinho como foi essa chegada.

Entrevistado: Eu fui chamada na Secretaria da Educação, era em fevereiro. Eles te dão

poucas opções. Eles consideram proximidade. Lá a responsável pela escolha, falou assim:

eu tinha um lugar no seu bairro mas pegaram. Porque é assim escolha, quem chega primeiro

escolhe o há de melhor. Ela continuou: mas tem no Cabuçú e no Recreio são Jorge, que são

dois bairros próximos a minha casa. Só que você não sabe o endereço, você não conhece

escola, não conhece nada por que acaba de entrar na rede . Então eu falei eu pego o Cabuçú,

sabia que ficava perto, mas o lugar era muito ruim.

Aí você vai descobrir aonde é a escola, na época eu não nada sabia, nem de “difícil acesso”,

que ganhava mais, que ganhava menos eu não era muito informada nessa parte, fui

descobrindo lá o que tinha o que não tinha isso tudo para PEI (Professora de Educação

Infantil), onde fiquei por menos de um ano.

Para PEB I (Professora de Educação Básica I), foi mais difícil porque foi só transferência.

Assim que me chamaram, eu não tinha opção de ir de manhã junto com todo mundo que

tinha sido chamada no diário, porque eu já trabalhava de manhã. Eu já estava na rede era só

transferência e eis que já sabia esse negocio de chegar primeiro. Lá eles disseram que a gente

não ia poder escolher muito mesmo, porque eles iam encaminhar a gente para lugares de

emergência que estava precisando mais.

Quando chegou a minha vez, apresentaram as vagas, só que todos os lugares eram para

professor volante. Eu ficava pensando, onde tem essa emergência, tinha opção de volantes

mais eram umas cinco escolas mais ou menos e aí você fica naquele desespero por que você

Page 113: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

113

não sabe onde é, o que está perto o que não, enfim, eu escolhi e consegui um pegar num

período da manha que é o que todo mundo opta, para poder conseguir dobrar o período.

Eu consegui pegar o período da manhã como volante mesmo, havia a possibilidade de ficar

com a sala até o final do ano e continuar lá no ano seguinte.

Entrevistador: Cristina, só para eu entender, nesse momento você ainda não tinha uma sala

de aula sua?

Entrevistado: Isso, era volante. Cheguei lá do nada. Cheguei num dia que tinha oficina de

pais, porque era semana do brincar , isso foi bom, eu consegui conversar mais com a equipe

porque nesse dia não tinha muita coisa, a gente ficou em reunião na sala dos professores então

deu pra conhecer mais a equipe. Eu não sabia o que eu ia fazer ali por que toda a equipe

estava completa. Eu acabei ficando, como teve algumas licenças dois dias para médico,

questão de saúde, fui ficando, dei aula todos os dias. No último dia que eu fiquei lá me

ligaram da secretaria falando que tava precisando de uma professora para assumir sala em

duas escola. Eu tinha que escolher na hora, aí eu fiquei muito ansiosa. Eu dizia que eu

precisava pesquisar, pedia para ligar depois, me deram apenas vinte minutos para eu decidir

onde iria trabalhar.

Aí eu desliguei e fui pesquisar com as professoras antigas, fui perguntando onde eram as

escolas. Elas me falavam: ah, tal escola é boa mais fica muito longe, mas a escola é boa e a

equipe. Nisso, enquanto eu estava perguntando, a secretaria ligou de volta já falando que eu

tinha que dar a resposta, sem muito conhecimento assumi nesse tal de Pimentas que o nome

do bairro. Era um segundo ano e foi assim. Acho que eu acabei fugindo da sua pergunta, por

que eu fui falando tantas coisas, mais foi isso.

Entrevistador: Pelo que você esta me contando, conversar com os colegas foi muito

importante para você escolher a escola para onde ia. Bom mas e aí como é que foi quando

você chegou à escola, porque você foi recebida, me conta um pouco esse momento.

Entrevistado: Quando eu escolhi a escola, era de manhã ainda, eu tinha que assumi no outro

dia na sexta-feira, aí eu resolvi ir na escola naquele dia mesmo, à tarde. Sabia que ia ter gente

lá e poderia conversar com a coordenadora. Queria conhecer, porque eu sou ansiosa mesmo.

Eu queria conhecer, não queria chegar no dia de assumir a turma sem saber de nada, isso eu

não queria. Então fui para a escola. Lembro que fiz meu pai me levar. Quando cheguei lá a

Page 114: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

114

secretária me apresentou um pouco da escola, estava tendo aula. Sabia que a rotina deles e o

quanto era complicado receberem alguém.

Eu naquela ansiedade, ela me mostrou mais ou menos ali até onde era a sala não dava para

abrir as portas porque estava tendo aula. Voltamos, ela me apresentou o diretor e o

coordenador, mas assim sentados mesmo e de longe.

Eu disse que eu era a nova professora que ia assumir a sala de segundo ano, que era uma

licença maternidade, e essa professora tinha acabado de sair e eu entraria no outro dia. A

coordenadora estava almoçando e só me falou um oi assim muito rápido, até amanhã. Eu

queria ter conversado sobre as crianças, a sala, os projetos, dado uma olhadinha nos

materiais, infelizmente não consegui e voltei um pouco frustrada. Eu pensava “ah fui antes

pra conversar e não deu”.

No outro dia já cheguei com a sala lá me esperando, claro que eu me planejei, eu preparei

umas atividades, mas por mim mesmo.

Entrevistador: Você se lembra de ter recebido alguma informação bem especifica em relação

a este trabalho, algo relevante tendo em vista que você estava chegando na escola, pegando

uma sala que já tinha um trabalho começado. Você lembra-se de alguma orientação por parte

da diretora ou da coordenadora que considera que ajudou no início do seu trabalho?

Entrevistado: Nada, exatamente nada. Para escolher a escola eu perguntei a outras

professoras. Pelo que eu fico sabendo, nós que somos novos, assim que você entra você não

pega sede, você fica em cargo exercício, onde você pega as vagas de licença, INSS, enfim e aí

fica essa correria. Todo mundo sai com uma listinha com os nomes para escolher a escola.

Então você fica ouvindo o comentários dos outros, essa escolha falaram que é ruim, essa o

diretor não sei, não. Todo mundo fica conferindo a listinha. Na hora eles não falaram nada

não.

Entrevistador: Retomando então, lá na escola você saiu um pouco frustrada porque o que

de fato você tinha ido fazer lá, ou seja, buscar algumas informações para não chegar no dia

seguinte e de repente cair já de cara com os alunos, não aconteceu, nem por parte do diretor

nem da coordenadora.

Entrevistado: Não, eles me receberam bem, foram educados, mas não nesse sentido, nada.

Page 115: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

115

Entrevistador: Você, saiu determinada a conhecer a escola, será que conseguiu explicitar

esse seu desejo?

Entrevistador: Não sei eles continuaram sentados. Eu ainda tentei falar que tinha vindo antes

para conhecer a escola, a minha nova sala. Ela falou seja bem vinda. Eu ainda insisti, disse

que tinha ido para conversar, saber sobre as crianças. Ela respondeu: “Amanhã a gente

conversa. Vai ter aula atividade a gente conversa.” Foi assim.

Entrevistador: Fala um pouquinho desse amanhã, esse primeiro dia, como é que foi?

Entrevistado: Ah esse amanhã, eu entrei já direto para sala, depois que já estava dando aula,

ah detalhe é horário de café, horário de almoço você aprende ali na raça com o professor do

lado, coisa do tipo ela sai comigo, você sai comigo nesse horário e aí você vai aprendendo na

raça ali, porque até então a coordenadora não tinha chegado ela entra em horário diferente

enfim. Aí nessa troca eu encontrei o diretor que me falou bom dia, mas não disse nada, eu

estava com as crianças.

A coordenadora chegou logo depois, entrou para me falar oi, seja bem vinda de novo assim na

sala no momento em que eu estava com eles, mais só isso. Nesse momento eu perguntei para

ela sobre a sala, o material dos alunos, tudo que era importante saber, ela pediu para eu

esperar a hora atividade, hora da saída, alguma coisa assim, eu não me lembro direito, não me

recordo.

Aí quando eu estava indo para a sala dos professores, eu descobri que não tinha hora

atividade naquele dia. A hora atividade é depois do período de aula, dois dias na semana nós

temos hora atividade.

A escola também estava sendo reformada, eles estavam mexendo com a sala dos professores,

a sala da direção, enfim, quando eu estava indo embora, eu perguntei para ela novamente

sobre a sala, ela disse que tinha umas coisas para me entregar. Eu pedi o projeto, o

planejamento tudo para dar uma olhada, ela disse que estava tudo uma bagunça que naquela

hora não dava, mas que na segunda-feira a gente ia se falar ela ia passar tudo pra mim. Ela

dizia na segunda eu te mostro, eu te entrego. Eu pensava: era mais um final de semana e eu

não ia poder me planejar, porque eu não tinha o planejamento da sala.

Aí na segunda-feira ela foi me entregando tudo à prestação, primeiro uma pasta com as

sondagens, por que eles tem um trabalho de registrar, são as sondagens iniciais e uma de cada

bimestre, o registro síntese das crianças, as avaliações Foi me entregando tudo. Tinha

provinha Brasil, eu fui pedindo para as professoras. O planejamento mesmo eu só recebi esta

Page 116: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

116

semana porque nem as outras. Eu fui cobrando, fiquei a coordenadora direto, acho que ela se

cansou de mim, devia me achar um pouco chata.

Entrevistador: Ainda sobre o seu primeiro dia, fala um pouquinho como foi a sua entrada

com os alunos. Era sua primeira experiência com o fundamental, você não conseguir antecipar

nenhuma informação com a coordenadora, nem com o diretor, então como foi chegar na sala

de enfrentar os alunos?

Entrevistado: Eu fiz uma dinâmica de apresentação, mais brincadeira com eles se sentirem

mais acolhidos, não terem aquele susto, porque eles estavam com outra professora até o inicio

de junho, eu fiquei sabendo aos poucos que essa professora estava pegando muita licença,

então eles tinham cada dia uma professora. Eles me perguntavam se iria voltar no dia

seguinte. Diziam que a substituta era chata. Tinha medo que eu não voltasse no dia seguinte.

Eu procurei acalmá-los dizendo que ia ficar até dezembro, dizia que quando fosse faltar

avisaria antes. Eu imagino que eles sofreram um pouco com isso. Até os pais viviam

perguntando, porque eles são pequenos não vão embora sozinhos. As mães ficam preocupadas

de deixar lá no portão, eles entram, mas elas não sabem se o professor chegou ou não. Como

eles entram no período da manhã então as professoras chegam muito em cima da hora aí elas

deixam eles, daqui a pouco elas recebiam ligação de que não tem aula, ou eles vão ser

remanejados, elas não gostam quando os alunos são distribuídos, ninguém gosta.

Bem, mas voltando ai eu fiz a apresentação com eles, fiz atividades para sentir mais como

eles estavam, leitura, fui mais para o lúdico assim porque eu percebi que eles não tinham

muito isso, era muito só cópia. No primeiro dia os deixei bem à vontade.

Depois fui pegando os cadernos pra ver como é que estava o andamento, e fiquei um pouco

perdida. Vi que a prô trabalhava muito o livros de matérias, mas eu não enxergava muitas

coisas eu via que algumas coisas estavam faltando ali, enfim.

Eu acho que quando você entra assim, quando você pega uma licença, eu vou falar, eu nem

sei se devo, ou se você vai me perguntar, pode ser que esteja fora do contexto , mas eu vou

falar. Eu acho que quando você entra, você tem que ter contato de pelo menos um dia com a

professora anterior. Quando você pega o aluno no meio do ano, a turma já esta acostumada

com uma professora. Você tem que ter essa receptividade da coordenação. Eu sei que ela não

estava ali na sala de aula, mas ela precisa saber o que estava acontecendo. Tem que ter o

parecer do professor, pelo menos um dia para quem vai assumir a sala.

Page 117: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

117

A secretaria já sabia que ia ter uma licença maternidade, sabem que o professor vai se afastar.

Eu já estava em outra escola como volante há quinze dias por que não chamar um dia antes

para você ter esse contato, nem que seja uma hora de reunião com a coordenadora, com a

professora anterior, acho que falta um pouco isso. Você fica perdida, aí você tem que ficar

correndo atrás de informações. Fiquei perdida, fiquei sozinha, sozinha. A sala fica com o

perfil da outra professora que você não sabe qual é e que você vai conhecendo aos poucos,

então por isso acho complicado assumir no meio do ano.

Entrevistador: Ok. Pensando em todo esse movimento, de quem você julga ter recebido

maior apoio?

Entrevistado: Não lembro de ninguém em especial. A equipe gestora, com certeza não. Já as

professoras, eu não acho que é por mal porque elas têm a rotina delas de chegar e lidar com os

seus alunos, então era muito assim eu tinha que procurar, ir atrás, mas elas me recebiam

bem. Elas diziam pouco sobre o trabalho da outra professora, acho que também não sabiam

muito. Não tinha uma interação entre os professores mesmo os do segundo ano, nem do

segundo com primeiro ano. Acho que cada uma trabalhava de uma maneira e não sabe como a

outra trabalha, isso era muito complicado.

Entrevistador: Qual era sua expectativa em relação ao coordenador?

Entrevistado: Com certeza que me chamasse, passasse o planejamento, falasse como a outra

professora trabalhava , mas eu acho que nem isso sabia , eu não to falando mal mas acho que

não sabe. Eu acho que o professor trabalha muito sozinho. Ele fica ali na sua sala e a gestão

fica muito focada no burocrático. Se você entrega seu registro síntese, se entrega a sondagem,

se na hora do conselho você fala como é que esta seu aluno e se está tudo bem. Você atende o

pai que tá ali dando trabalho então está bem.

Eu acho que o dia a dia ali mesmo, ninguém se preocupa. Saber como o professor está

fazendo, que material está, como esta usando o caderno, o livro, como você está fazendo as

avaliações, que atividades esta propondo e como, não. Não tem esse acompanhamento. Foi o

que eu enxerguei a princípio,

Eu esperava isso para a eu saber como eu ia trabalhar dali pra frente, eu queria saber como a

anterior trabalhava, como essa turma estava, então é complicado, de qualquer maneira eles

iam sentir um pouco porque cada profissional tem um jeito de lidar com a turma, um jeito de

Page 118: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

118

ensinar mas, enfim, a sensação é que eu parei um pouco tudo para eu dar uma revisada, para

eu sentir como a sala estava e então continuar. Isso é complicado, já é segundo semestre, eu

queria esse parecer de como eles estavam, de como a anterior trabalhava , eu não tive isso.

Entrevistador: Quanto tempo mesmo você está com essa turma?

Entrevistado: Há quatro semanas, quatro semanas e meia.

Entrevistador: Nesse curtíssimo período você já teve algum momento em que você se sentiu

segura na sala de aula fazendo o seu trabalho?

Entrevistado: Não ainda não, estou me planejando, buscando isso, mas eu ainda tô sentido

insegura, eu me cobro muito sabe, mas acho que o dia que eu me senti mais segura, que eu

acreditei que podia fazer a diferença na vida dessas crianças foi quando trabalhei com o

material dourado com eles. Foi trabalhando o material dourado que nunca tinha sido usado,

que eu percebi que podia ensinar de forma diferente, que planejar a aula faz toda a diferença.

Ver os alunos trabalhando em grupo, fazendo trocas com o material, trocando informações

para resolver problemas do jogo proposto, me deixou muito feliz e segura, sabia que estava no

caminho correto.

Eu quero fazer a diferença na vida desses alunos e quando você não sabe que você tá indo no

caminho certo é complicado. É muito começo, acho que depois do segundo mês vou me

tranquilizando. Agora eu ainda estou pegando meu jeito de trabalhar, tentando sobreviver a

tudo isso.

Entrevistador: Você lembra-se de alguma orientação que o coordenador tenha dado que

tenha contribuído para o seu trabalho na sala de aula nesse período?

Entrevistado: Eu não tive, não tive, sinceramente eu não tive orientação nenhuma, somente

as que eu busquei. Eu perguntava se os meninos tinham cadernos, como era trabalhado esse

caderno, se tinha livro, como podia saber onde eles estavam. Nos cadernos dos alunos ou só

tinha matemática ou só português todas as informações eu fiquei sabendo tudo, foi porque eu

perguntei, ninguém me disse faz isso ou me orientou, não faz. Não tive orientação nenhuma.

Entrevistador: Bem Cris, posso te chamar assim?

Page 119: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

119

Entrevistado: Claro, fique à vontade

Entrevistador: OK. Cris, eu já fiz todas as perguntas que eu queria, quero saber se tem mais

alguma coisa que você gostaria de falar dessa sua pequena e tão profunda experiência como

professora iniciante no Ensino Fundamental. Se você tiver alguma coisa gostaria de

acrescentar, por favor fique a vontade.

Entrevistado: Eu acho que eu falei tudo, quando você me falou do seu tema de pesquisa, eu

fiquei pensando muito nisso, eu acho que o coordenador tem que ter esse trabalho eu acho que

ele acaba ficando muito com a parte burocrática, com os problemas de disciplina, atendimento

aos pais, não com a parte pedagógica, de atender o professor, de saber como é que está

acontecendo, perguntar do que precisamos, propor discussões sobre as dificuldades dos

alunos. Você escuta muito isso na faculdade, você escuta isso em toda as formações, mas na

prática não tem isso, é o coletivo ali, você precisa disso. Eu sinto muito falta, às vezes até

dos professores com mais experiência mesmo, eles podem contribuir, tanto o coordenador

como os professores ele podem contribuir no nosso trabalho. Quando você me falou do tema

da pesquisa, eu acho que tá precisando mesmo discutir sobre como fazer na sala de aula. Nas

formações você tem muito isso, esse discurso gestão democrática, trabalho coletivo, mas na

pratica, ainda não acontece.

Entrevistador: Perfeito, Cris, eu agradeço sua participação podemos encerrar?

Entrevistado: Sim. Desculpe o desabafo final e muito obrigada.

Page 120: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

120

APÊNDICE 7

ROTEIRO DA ENTREVISTA RECORRENTE

1. Você se sente uma professora iniciante?

2. Você passou por várias atribuições de aula, até o momento em que de fato conseguiu

sua sala. Você pode falar um pouco sobre como foi vivenciar esse processo de

atribuição de aulas? Como você se sentiu vivenciando esse momento?

3. Como foi a sua chegada à escola? Como foi recebida?

4. O que sentiu ao entrar na sala dos professores? E ao permanecer nela?

5. Como foi recebida pelos alunos na sala de aula? O que sentiu?

6. Ao final deste dia, como você se sentia?

7. Pode dizer qual tem sido a contribuição do coordenador e dos pares (professores) para

a sua atuação?

8. Em algum momento você pensou em desistir da docência?

Page 121: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

121

APÊNDICE 8

Transcrição da Entrevista Recorrente – Professora Lu

Entrevistador: Olá Lu, tudo bem? Desde já agradeço sua disponibilidade. Como

conversamos no nosso primeiro contato, poderia ser necessário esse novo encontro. A

intenção deste segundo momento da entrevista é tentar buscar novos elementos que irão

alimentar e complementar os dados já coletados. Assim que estiver pronta podemos começar.

Entrevistado: Olá, Clau, é um prazer poder ajudar, será que vou saber responder o que

precisa? Desculpa pelo imprevisto de ontem, mas não tinha como prever o ocorrido.

Entrevistador: Tudo bem, imprevistos acontecem, ainda mais aqui em São Paulo. Vai dar

tudo certo. Podemos começar?

Entrevistado: Sim.

Entrevistador: Ok. Só para resgatar um pouco, o foco da pesquisa é o professor iniciante e

sua entrada na profissão, lembra? Na nossa primeira conversa você trouxe informações

importantes sobre sua escolha pela profissão, sua formação inicial, pessoas que fizeram parte

do seu percurso como aluna, suas experiências anteriores como professora na Educação

Infantil, sua expectativa por entrar no Estado, etc., certo? Hoje a ideia é tentar adentrar um

pouco mais sobre esse início na docência, focar algumas questões mais pontuas, mais

especificas. Para começar minha primeira pergunta é: Você se sente uma professora

iniciante?

Entrevistado: Sim.

Entrevistador: Certo. Você pode falar um pouco mais sobre isso?

Entrevistado: A experiência que eu tive era em educação infantil. Então eu tinha expectativa

muito grande de ser professora na rede estadual de ensino, conhecer e saber como era, porque

até então eu só ouvia as pessoas falando. Eu não tinha esse conhecimento. E foi uma

oportunidade que apareceu. Eu sabia que tinha que começar pela atribuição e eu tinha uma

Page 122: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

122

expectativa muito grande, porque era uma coisa nova para mim. Poder entrar na rede, saber

como acontece esse processo todo, era um sonho que eu queria muito.

Entrevistador: Entendo, mas o que faz você sentir-se um professor iniciante de fato?

Entrevistado: O processo de atribuição em si, a incerteza de não saber para onde você vai,

com quem vai trabalhar, as pessoas, os alunos e até o será preciso ensinar. Eram essas coisas

que passavam pela minha cabeça.

Entrevistador: Lu, você disse que até você pegar a sua sala, foi preciso ir para a atribuição de

aulas. Você passou por várias atribuições , até o momento em que de fato conseguiu sua sala.

Você pode falar um pouquinho sobre como foi vivenciar esse processo de atribuição de aulas.

Entrevistado: Foi muito difícil e até cansativo. Eu sempre quis pegar aula na rede estadual,

então falei com a minha irmã que me disse que eu teria que fazer uma provinha e ter uma nota

boa, para então eu participar do processo de atribuição de aulas. Ela dizia que dependo da

média da prova você passa a ter uma pontuação e fica classificada, ou seja, a classificação vai

de acordo com a média que você tirar na prova. Eu fui bem na prova.

Eu fui pelo menos em quatro atribuições em dias diferentes, isso me deixava ansiosa. Na

atribuição geral os professores eram separados por categorias, por pontuação. Eu ouvia as

pessoas comentando que nunca sabiam a que horas iam sair dali e se pegariam aulas. Os

professores ficam no pátio esperando ser chamado. A cada chamada você vai ficando ainda

mais apreensiva. E eu fui ficando. Fiz isso repetidas vezes. Como já havia acontecido a

atribuição geral, tinha poucas salas e muitos professores concorrendo.

Nesse momento eu pensei em desistir, eu achava que eu não ia conseguir, eu não tinha

pontuação nenhuma. Não tinha esperança de conseguir. Achava que não ia chegar ao meu

número de classificação. Na quinta vez eu fui chamada. Lembro que no dia, eu era o número

36 da chamada.

Quando começou a atribuição eles chamaram a lista desde o início. Nesse dia não tinha

nenhum professor antes de mim, eu fui à primeira escolher. Foi uma sorte muito grande. Era

a última sala livre, a outra era uma licença médica por três meses. Foi interessante também

porque você não sabe de nada, na banca de atribuição eles falam por códigos, eu fiquei na

dúvida, aí uma pessoa que estava do lado esperando a vez disse pra mim que o código que

eles estavam falando significava uma licença. Então eu peguei a sala livre, que também ficava

Page 123: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

123

perto da minha casa. Na verdade depois eu fiquei sabendo que se tratava de uma sala que

havia sido montada a partir de duas outras salas já existentes na escola.

Eu fiquei muito feliz, muito grata e com a expectativa de como seria meu primeiro ano na

rede, como seria a escola, porque eu não conhecia, não sabia nem como funcionava. Lá eles

também não dizem muita coisa. Eles entregam um requerimento de atribuição e diz que você

deve se apresentar à escola o mais rápido possível. Saí de lá e fui falar com a minha irmã,

porque ela trabalha no estado há algum tempo. Aí eu fui ver onde a escola ficava localizada e

fui conhecer a escola.

Entrevistador: Bem, então você estava de posse da sua sala e foi à escola. Vamos tentar

resgatar como foi esse momento de chegada à escola. Quais os sentimentos que te envolviam

nesta ida à escola, quando você chegou lá. Por quem você foi recebida? Como foi vivenciar

este momento?

Entrevistado: Eu fui de ônibus e lembro que o ônibus se chamava Sítio São Francisco. Isso

me deixou um pouco apreensiva. Ficava pensando que talvez fosse dar aula numa escola de

sítio, escola rural. Percebi logo ao chegar ao local que se tratava de uma região de periferia

mesmo e de alta vulnerabilidade social, mas não de sítio. Eu estava muito preocupada em

saber o que falar, mas assim que eu cheguei, fui recebida pela secretária da escola, que foi

muito simpática. Ela pediu para que eu esperasse que ia falar com a diretora.

Aí eu achei muito interessante que a diretora assim que meu viu, foi logo me levando para

sala e fez uma entrevista comigo. Eu me apresentei, entreguei o requerimento de atribuição.

Ela pediu para eu falar um pouco sobre mim, sobre a minha experiência, da onde eu estava

vindo, se eu já tinha experiência no estado. Eu fiquei uns quarenta minutos falando, ela

escutava atentamente. Eu percebi que ela ficou preocupada com a minha falta de experiência.

Eu acho que ela tinha um pouco de receio. Acho que ela devia pensar: “Puxa vida vou dar

uma sala livre, de primeiro aninho para uma pessoa que não tem experiência alguma?”, talvez

isso tenha sido preocupante pra ela.

E eu entendi o que ela estava pensando. Mas a coisa que mais me surpreendeu na atitude dela,

foi quando ela disse que a sala que eu ia pegar tratava-se de alunos de duas outras salas que

estavam muito numerosas, ela disse que gostaria que eu ficasse acompanhando o trabalho das

duas professoras para que eu conhecesse os alunos e a rotina da escola. Disse que deveria

estar atento ao horário de entrada, o intervalo, a saída dos alunos, ao trabalho das professoras,

a sondagem inicial dos alunos. Tudo que eu precisava mesmo conhecer. Propôs que eu ficasse

Page 124: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

124

cada dia em uma sala, por uma semana. Eu achei ótimo, foi uma forma de eu conhecer a

rotina da escola, do professor, dos alunos.

Essa atitude me surpreendeu muito. Porque eu entendo que ela, considerando que eu não tinha

muita experiência, me deu esse tempo para eu observar toda essa dinâmica. Aí ela mesmo me

deu a lista dos alunos das duas salas, a lista dos alunos que ficariam comigo. Ela me disse que

as professoras já tinham sido orientadas de que os últimos doze alunos das listas de cada sala

ficariam comigo. E eu tive esse tempo para conhecer quem seriam os meus futuros alunos,

como era o trabalho do professor, a dinâmica de cada salda de aula. Essa atitude da Dona

Rose, fez me sentir mais segura, para iniciar o meu trabalho.

Eu me senti valorizada, senti que deram atenção para mim e um tempo para preparar as

coisas. Isso permitiu iniciar o meu trabalho sabendo de onde eu deveria começar. Foi muito

importante.

Entrevistador: Conta-me então depois dessa entrevista, como foi chegar à sala dos

professores? Quem estava lá? Com quem você conversou? Como é que você foi recebida?

Entrevistado: Eu fui bem recebida. Era hora do intervalo dos alunos maiores. A diretora foi

comigo até a sala dos professores. Apresentou-me aquele grupo e pediu que eu esperasse o

intervalo dos alunos do primeiro ano e saiu. Os olhares estavam todos voltados para mim.

Lembro que uma professora falou: “Nossa como você é novinha, você tem experiência em dar

aula?” outra disse assim: “Você nunca trabalhou na rede, eu não te conheço?”. Aí eu falei que

eu não era da rede, que eu não conhecia nada. Por uma lado ficou a observação de que eu era

nova, mas o que será que essa menina vai trazer sentia isso no ar. Aí terminou este intervalo, o

próximo grupo era das professoras com as quais eu iria trabalhar. A diretora voltou orientou

as professoras sobre quem eu era. Disse que a coordenadora não estava na escola, pois era dia

de formação para ela e que eu deveria acompanhar uma das professoras à sala de aula. Não sei

se as professoras sabiam da proposta da diretora.

Entrevistador: Então você não foi direto para a sua sala de aula? Explique um pouquinho

esse início.

Entrevistado: Eu só fui para minha sala oito dias depois. Durante uma semana eu fique dois

dias em cada sala. Era fechamento do primeiro bimestre, na outra semana teve reunião do

conselho de classe, depois reunião de pais e só depois da reunião com os pais é que eu peguei

Page 125: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

125

os alunos. Eu participei de tudo isso com as professoras. Eu lembro que nessa reunião, a

diretora e a coordenadora estavam presentes eu fui apresentada aos pais dos alunos.

Entrevistador: Então finalmente você tinha a sua sala. Como foi esse primeiro dia de aula? O

que você sentiu? Como foi chegar à sala de aula?

Entrevistado: Eu tive um pouco de medo, pois eles já estavam adaptados à outra professora.

Eu tinha a preocupação de estarem junto com as outras professoras, eles iam conviver com

elas, as professoras estariam ali. Então eu ficava pensando nas dúvidas na cabeça das criança.

Tinha medo que elas ficassem pensando: “por que eu não posso mais ficar com aquela

professora? por que aquela professora não me quer mais na sala dela?” Porque eles eram

alunos de primeiro ano, para muitos, era a primeira experiência, elas eram a primeira

professora. Eu me preocupei em recebê-los bem, queria que eles gostassem de mim.

Tinham algumas mães que acham que aquela era uma sala de alunos fracos, a reunião de pais

ajudou a elas entenderem que não era nada disso, que a preocupação da escola era diminuir a

quantidade de alunos por sala, para melhor atende-los. Mesmo assim vivia muitos conflitos,

muitas dúvidas e insegurança. Mas ao contrario do que pensei os alunos foram receptivos, me

receberam super bem, eles falavam: “ai prô, foi você que ficou com a minha professora aquele

dia?” Criança tem um encantamento e uma forma de ver a vida diferente dos olhos dos

adultos. Lembro que comecei minha aula cantando uma música que eles conheciam dali em

diante foi tudo muito tranquilo, suave mesmo. Ah, lembro que preparei uma leitura para os

alunos, as professoras contavam histórias todos os dias logo que chegavam na sala.

Entrevistador: Como terminou esse dia?

Entrevistado: Que bom que perguntou isso, ia mesmo falar. Terminei o dia muito feliz,

percebi que podia dar conta da sala de aula, que podia ensinar aqueles alunos. Isso tudo foi

confirmado quando, na saída, ao entregar os alunos aos pais no portão da escola uma aluna

disse para mãe: “a prô é boazinha, eu gostei dela.” Isso me deixou muito comovida e feliz

mesmo. E nos demais dias eu percebia que as mães estavam sempre de olho e foram ficando

mais calmas, vendo que o meu trabalho estava dando certo. Uma coisa que facilitou muito foi

ter o contato antes com os alunos. Lembro que cheguei na sala dos professores e elas queriam

saber como foi, a coordenadora também estava lá, perguntou se tinha corrido tudo bem. Foi

gratificante. Eu não tive nenhum problema, nenhum aluno querendo ir com a outra professora.

Page 126: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

126

Com certeza eu estava muito mais ansiosa que os alunos. Na verdade eu tinha medo dos

alunos dizerem que queriam a outra professora e não eu, ou dizer que não gostou de mim,

porque você sabe, eles são muito sinceros, se eles gostam de você, eles gostam, se não gostar

também eles falam. Mas, deu tudo certo.

Entrevistador: Pequenininhos eles falam mais ainda, seis aninhos!

Entrevistado: Falam mesmo! Mais foi tudo tranquilo, deu tudo certo.

Entrevistador: Bom então vamos retomar, nós conversamos um pouquinho sobre o processo

de atribuição, sobre sua chegada à escola, a recepção dos alunos. Agora vamos pensar um

pouquinho na escola no coordenador e nos pares, nos professores. Você acredita ou em que

medida o professor coordenador ou professores contribuíram na sua chegada à escola ou ainda

durante este processo de iniciação na docência?

Entrevistado: Sim, bastante.

Entrevistador: Você pode falar como foi essa contribuição? Primeiro sobre um, depois sobre

o outro. Quais as contribuições? Como eram as reuniões em ATPCs, você ali, novata. Teve

um professor especifico, alguém que te acolheu mais ou menos? Você tinha alguma

expectativa sobre isso ou não. Fala um pouquinho.

Entrevistado: A maioria dos professores da escola já tinha um tempo na profissão, grande

experiência no estado, mas elas foram muito carinhosas, muito atenciosas. Sempre

perguntavam se estava precisando de alguma coisa, alguma ajuda. E eu colei nas duas

professoras de primeiro aninho. A professora Elaine era mais construtivista, as atividades que

ela fazia para os alunos eram diferenciadas, ela já tinha vinte e dois anos de estado. A

professora da segunda sala também trabalhava de forma diferente com os alunos. Então, eu

resolvi juntar aquilo que eu via nas duas e tentava aproveitar o que cada uma tinha de melhor,

elas foram meus modelos de professoras, um exemplo, sempre que ia dar uma atividade eu

procurava por elas, a opinião delas era muito importante para mim, naquele momento. Porque

eu pensava: “bem como eu não tenho experiência eu tenho que perguntar.” Então sempre que

surgia alguma dúvida alguma coisa que precisa fazer eu ia atrás das professoras do primeiro

Page 127: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

127

aninho e elas sempre foram muito atenciosas, sempre que surgia alguma dúvida, alguma coisa

elas estavam disponíveis.

Quando eu tive que fazer a sondagem dos alunos, eu tinha algumas dúvidas de como aplicar,

como avaliar e até no preenchimento das planilhas, assim que elas perceberam vieram me

ajudar. Quando ainda assim eu não conseguia elas diziam para eu pedir ajudar para a

coordenadora.

A coordenadora por sua vez sempre teve um carinho muito grande comigo, desde que eu

cheguei a escola ela sempre foi muito atenciosa com o meu trabalho. Ela vinha até a minha

sala, observa a atividade que estava dando, se observava algo errado me mostrava, fazia

comentário também quando eu estava fazendo certinha. Ela ajudava mesmo. Sempre dizia:

“Olha eu tô aqui para te ajudar, o que você precisar pode perguntar. Eu não sei tudo, mas a

gente aprende junto”.

Neste momento nós escrevemos um projeto que eu estou trabalhando na sala para um

seminário, eu e outra professora do segundo ano, eu vejo ela super empenhada e nos ajudar.

Ela se mostrava feliz e muito orgulhosa disso e não era só comigo.

Na reunião das ATPCs ela incentivava os professores a participarem, falava da nossa

participação valorizando a escola e o nosso trabalho. Sempre tinha uma dica, uma sugestão,

isso me deixava estimulada, confiante e segura, com vontade de participar de outros projetos.

É muito bacana você poder compartilhar seu trabalho, ver que os outros gostavam e

respeitava.

A diretora também incentivava, dava apoio, falava para a coordenadora estar atenta ao que

nos precisássemos. Esta sendo uma experiência muito gratificante. Saber que acabei de chegar

e poder mostrar meu trabalho. Não que o que eu estou fazendo seja algo inédito. Eu tinha esse

medo, por que não queria que ficasse a impressão de que eu queria me aparecer. Eu não

queria que elas sentissem assim, ou pensando: “Só porque ela é novinha que trazer uma coisa

nova, diferente.” Não era nada disso.

Às vezes, nas reuniões de ATPCs, eu ficava pensando será que eu falo, será que é um

pergunta muito boba. Será que elas vão gostar, ou não, se vão entender as minhas

dificuldades. Eu tinha esse medo, é claro que elas estavam me observando. Às vezes, quando

surgia algum boato do que eu estava fazendo na sala de aula, elas perguntavam, iam na minha

sala ver, gostavam.

Mas eu acho que elas ficavam pensando: “Faz isso só para se aparecer”. Eu não sei se elas

falavam, mas eu tinha medo disso, eu não queria chamar a atenção pro meu trabalho. Eu

queria fazer o meu trabalho, não esperava que fosse reconhecido. Eu tinha medo de ser taxada

Page 128: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

128

como aquela que está chegando, querendo mostrar trabalho. Por algumas vezes eu ouvi coisa

do tipo: “Ah, tá querendo mostrar trabalho porque é novinha, quando tiver com quinze, vinte

anos, vai ver, acabou o encanto. Tem que fazer agora mesmo minha filha, daqui alguns anos,

vai ver.” Porque, às vezes, aparecia algum convite, alguma coisa para ser desenvolvida com

os alunos a pedido da diretoria de ensino, um projeto novo, algum trabalho, um curso novo,

qualquer coisa que aparecesse elas justificam: “Ah não vou fazer não, já tenho muitos anos de

magistério, vou fazer para quê?” E eu pensava: “puxa isso é bacana, quero fazer com meus

alunos.”

Eu perguntava para a coordenadora se podia fazer e ela sempre me apoiava. E elas diziam que

eu tinha esse animo todo, esse gás todo porque eu estava começando, por que sou novinha. Já

eu pensava que não, pensava que seria bom para eu aprender coisas novas, a gente sempre

pode renovar, transformar. E nessa de você querer transformar, de mudar tem sempre os

olhares de crítica e desaprovação.

Entrevistador: Pensando nisso que você acabou de relatar, sobre o olhar do outro sobre seu

trabalho, em algum momento você pensou em desistir da docência?

Entrevistado: Desistir?

Entrevistador: É, desistir do seu trabalho, desistir da docência, por medo, ou aquilo que você

ouvia das professoras?

Entrevistado: É, o meu medo era de pensar: “será que daqui a dez, quinze anos vou estar

pensando assim.” Será que tudo acaba mesmo virando um rotina e você acaba sendo engolida

por esses pensamentos e se apropriando desses sentimentos. Eu fico preocupada com isso,

sim.

Entrevistador: Mas nesses momentos, quando você ouve essas falas, você não se sente

invadida pelo desejo de desistir.

Entrevistado: Não, não sinto isso, tudo ainda é muito novo, recente. Sinto-me encantada pelo

meu trabalho, pelos meus alunos, pela minha sala. Eu esperei muito tempo para vir para a rede

estadual. Eu sempre adiei minha vinda para cá, uma hora era uma coisa, outra hora outra, era

Page 129: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

129

a prova, a falta de pontos, a reprovação no concurso de 2005. Sempre tinha um motivo para

deixar para depois. A minha irmã sempre me incentivando.

Quando eu decidi vir, sabia o que estava fazendo, acreditava que era o meu momento. Lembro

que logo que entrei fui a uma formação na diretoria, logo que começou a formadora

justificava que para muitos ali o que ela iria falar não era nada novo, mas que era preciso se

aproximar sempre dos conteúdos de ensino, etc., para mim não, é tudo novo. Eu ficava

surpresa, acha legal e já pensava nos meus alunos em como poderia trazer aquilo para dentro

da minha sala de aula.

Quando eu chegava empolgada, a coordenadora pedia para eu partilhar com as colegas, elas

diziam: “ah, mas isso a gente já faz há muito tempo.” Eu pensava que mesmo que já fizesse

parte do nosso trabalho tinha sempre algo que podia ser melhorado. Eu ficava entusiasmada,

queria usar aquilo que já fazia parte da rotina, que é usual, que faz parte do trabalho do

professor, mas de forma diferente. Porque eu pensava que as crianças hoje são diferentes e

não adianta a gente fazer tudo do mesmo jeito, ou do jeito que nossos professores faziam.

Não adianta eu pensar que a dez, vinte anos eu dava aula de um jeito e querer continuar do

mesmo jeito. Porque tudo se renova, porque só na educação as coisas tem que continuar do

mesmo jeito. Pensar que aquele plano de aula que eu trabalhei a três, quatro anos atrás não

pode ser mudado, é um absurdo! Eu sempre pergunto muito, às vezes é uma pergunta que

pode parecer óbvia para os outros, mas se eu tenho dúvida eu pergunto sim e a coordenadora

esta sempre disposta a me ouvir e me ajudar, a me dá um suporte.

Entrevistador: Ok, Lu, tem mais alguma coisa que você gostaria de acrescentar a essa nossa

conversa?

Entrevistado: Acho que não.

Entrevistador: Certo, eu te agradeço mais uma vez. Foi muito rica e tranquila nossa

conversa.

Entrevistado: Eu também gostei muito de poder colaborar para o seu trabalho, essa entrevista

serviu para eu perceber o quanto eu já me sinto segura no meu início como profissional.

Falando, dá a impressão que já se passou muito tempo, mas tudo é muito novo ainda para

mim.

Page 130: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

130

Entrevistador: Obrigado então.

Page 131: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

131

APÊNDICE 9

Transcrição da Entrevista Recorrente – Professora Cris

Entrevistador: Olá Cris, tudo bem? Desde já agradeço sua disponibilidade. Como

conversamos no nosso primeiro contato, poderia ser necessário esse novo encontro. A

intenção deste segundo momento da entrevista é tentar buscar novos elementos que irão

alimentar e complementar os dados já coletados. Assim que estiver pronta podemos começar.

Entrevistado: Olá, Clau, é um prazer poder ajudar, será que vou saber responder o que

precisa? Vai ser difícil?

Entrevistador: Obrigado. Vai ser tranquilo. Podemos começar?

Entrevistado: Sim.

Entrevistador: Ok. Só para resgatar um pouco o nosso primeiro encontro, o foco da pesquisa

é o professor iniciante, lembra? Inicialmente você me trouxe informações importantes sobre

sua escolha pela profissão, sua formação inicial, pessoas que fizeram parte do seu percurso

como aluna, suas expectativas em relação a sua nomeação, etc. Hoje a ideia é tentar adentrar

um pouco mais sobre esse início da docência. Para começar minha primeira pergunta é: você

se sente uma professora iniciante?

Entrevistado: Sim eu me considero uma professora iniciante, principalmente porque nesse

início na prefeitura, a cada momento você está em uma escola, cada momento com uma série

diferente. Então cada momento é um desafio novo e você se sente um novo professor. Por que

você tem que pesquisar, você está com uma série nova que você nunca pegou, você vai

novamente ter que estudar aquilo, a forma que você vai passar o conhecimento para aquele

grupo de alunos, como você vai desenvolver o conhecimento, saber o que os alunos precisam.

Sempre tem esse sentimento do novo, de estar começando agora. Isso acontece também em

relação à escola, ao grupo de professores. A cada chegada em uma escola diferente você é

invadida pelo sentimento de um professor que está começando, que está iniciando como

professor, tem sempre aquela expectativa de como será o grupo, como serão os alunos, a

escola. Eu me preocupo sempre com os pais, sabe. Eles não confiam no professor substituto.

Page 132: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

132

Entrevistador: Certo, Cris. Resgatando um pouquinho o que disse sobre a chegada à escola.

Você pode dizer como foi o seu primeiro dia na escola? Como foi recebida?

Entrevistado: Então, a princípio como eu disse na outra entrevista eu tinha ido um dia antes,

pra conhecer o caminho, a escola e a forma de trabalho, queria me preparar, por que eu tinha

certa ansiedade. Então eu fui ver como era, mas o máximo que aconteceu nesse dia foi ser

levada pela moça da secretaria até a sala. Tudo estava fechado. Eu só vi onde era a sala e

voltei e ela me mostrou de longe a coordenadora.

Entrevistador: Certo. E no dia seguinte o que sentiu ao entrar na sala dos professores? E ao

permanecer nela?

Entrevistado: No primeiro dia mesmo de aula, eu cheguei um pouco mais cedo. Tinha alguns

professores na sala dos professores, eu fiquei um tempinho lá, mas ninguém falou comigo. Eu

fiquei um pouco perdida. A coordenadora não estava. Lembro-me de ter perguntado para uma

professora como era organizada a entrada dos alunos. Ela estava organizando material,

mexendo no armário, respondeu de forma educada, mas só. Aí o diretor veio se apresentou e

já me encaminhou para a minha turma.

Entrevistador: Como foi recebida pelos alunos na sala de aula? O que sentiu?

Entrevistado: Na sala de aula tinham poucos alunos, porque a professora anterior estava

faltando muito devido à gravidez, então os pais muitas vezes nem trazia os alunos porque

acham que não ia ter professora, não gostam que os alunos sejam distribuídos em outras salas

ou ainda fique com um professor substituto. Eu já tinha preparado as atividades, uma

dinâmica para conhecer o grupo, para eu sentir como era a turma. Eu fiz o trabalho que tinha

pensado e fui tirando dali às primeiras informações do que estava acontecendo. Você

descobre mais pelos alunos do que pela equipe mesmo.

Eu não sei também se isso é porque também eles não me conheciam, não sabia se eu seria

receptiva ou não, não sei ao certo. Na hora do intervalo das crianças, lembro que conversei

com uma professora ou outra. Estas chegaram a falar que se eu precisasse de alguma coisa

podia perguntar, eram as professoras dos 4º anos e dividiam o intervalo comigo. Minha turma

era um 2º ano, mas elas falavam: tal professora é do 2º ano também, você pergunta pra ela. Aí

você vai conhecendo o grupo, mas tudo de forma muito impessoal. Com os alunos eu não me

Page 133: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

133

senti muito perdida, eu sempre me preparei antes, para mim é inaceitável chegar à sala de aula

e deixar os alunos perceberem que estou com medo, insegura ou que não sabe o que vai fazer.

Eu não suportaria saber que eles estão perdidos porque eu estou perdida. Isso foge totalmente

ao que entendo como compromisso com a profissão. Tenho certeza que influenciaria na

aprendizagem deles e no trabalho com a sala. Então a angústia, a ansiedade por tudo que

estava vivendo eu tentava não passar para eles. Porque a gente fica assim, eu ficava me

perguntando o tempo todo: “Será que eu estou no caminho certo”?

Nesse dia teve hora atividade, então, de volta a sala dos professores, elas foram receptivas,

puxavam assuntos mais sobre outras coisas, não falavam do contexto da escola, dos alunos,

quem tinha dificuldade. Eu que comecei a procurar saber, vi quem eram as professoras do 2º

ano e comecei a perguntar sobre o que elas estavam trabalhando, sobre o planejamento que

elas também não tinham.

Diziam que tinham que pedir para a coordenadora. Eu fiquei surpresa por que já estávamos no

segundo semestre. Ah, a coordenadora pedagógica não estava na escola nessa hora atividade.

Dias depois quando eu peguei o planejamento eu fui percebendo algumas outras coisas. As

professoras que já estavam desde o início do ano pegaram o gancho comigo e receberam o

planejamento, até então ninguém tinha.

Entrevistador: Ao final do primeiro dia, como você se sentia?

Entrevistado: Conversando com algumas professoras durante a hora atividade eu percebi que

cada uma trabalhava do seu jeito. Algumas usavam mais livros, outras mais o caderno. Só

tinha livros de Português e de Matemática as outras áreas pouco era trabalhado. Aí eu fui

vendo que mais do que nunca eu mesma precisava buscar formas de dar “cara” para o meu

trabalho. Ficava preocupada em saber o que dá para os meus alunos, ai decidi que faria do

meu jeito, ainda que fosse muito difícil por ter pegado a sala no meio do ano. Eu me

preocupava, porque os alunos já tinham sofrido o começo do ano com uma professora, ela

faltava muito, então eles sempre tinham professor substituto e ai chega outro professor. Tudo

isso era muito difícil, me causava medo e uma responsabilidade maior com o meu trabalho,

porque não queria errar com eles. Não queria fazer errado.

Ah, lembro que quando entrei na sala de aula a primeira pergunta de um dos alunos foi: “Prô,

você vai ser a nossa nova professora?” Esta mesma aluna, a Estefany, ao final da aula também

perguntou: “Prô, você vai voltar a amanhã!?” Ali firmei um compromisso com aqueles

alunos. Eles também estavam perdidos.

Page 134: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

134

Entrevistador: Cris, retomando um pouquinho. Você me disse que se considerada uma

professora iniciante porque a cada contato com uma nova escola, uma nova turma você

precisa retomar os estudos, conhecer uma nova equipe, novos alunos, enfim... Me fala, como

acontece esse processo de escolha da escola, da turma e como você se sentiu sabendo que

agora teria uma turma sua.

Entrevistado: No início, apesar de sido aprovada no concurso, até que surgisse uma sala

livre, fiquei como professora volante, cobria várias licenças. Então eu estava aliviada em ter

uma sala, agora eu ia pensar somente naquela turma, conhecer aqueles alunos e ver quais as

necessidades daquela turma, 2º ano ponto, porque até então você fica como volante. Cada dia

você está substituindo em uma sala é muito mais difícil, você esta pensando em grupos que

você fica apenas um dia. Você pensa em alguma atividade, alguma coisa para dar para os

alunos naquele dia, não sabe quando verá aqueles alunos novamente. Não constrói vínculo,

nada, apena passa. Isso não é bom nem pra eles nem para você.

Você não tem um planejamento, não tem um livro didático, você vai fazendo... Então isso foi

um alívio, mas ainda assim você se sente ansiosa, querendo, buscando alguém que te fale:

“Olha, a professora da sala que você assumiu trabalhava de tal maneira, os alunos tinham

dificuldades em tais coisas. Se você precisar, ou sentir dificuldades em alguma coisa pode me

procurar. Mas, e você, como você pretende trabalhar?” Eu sempre tive vontade de sentar e de

falar. Eu queria muito que a outra professora tivesse ficado comigo um dia antes de sair. Seria

excelente você ter um dia com aquela professora que você vai substituir. E isso seria possível,

porque como volante, você fica a disposição das escolas. Senti falta disso.

Acho que a equipe gestora falhou nesse sentido. Acho que quando ela voltar também vai se

sentir perdida, vai chegar faltando alguns dias para terminar o ano. E os alunos coitados,

ninguém pensa nos alunos. Ela já tinha um trabalho, trabalhava de um jeito, eu não tive

contato com ela. Então você tenta adivinhar como ela fazia e tenta colocar sua “cara” ali no

trabalho.

Outras professoras que assumiram licenças também falavam: “quando a gente entra tenta dar

continuidade ao trabalho da professora que saiu, mas elas voltam não continuam aquilo que

você fez. Elas querem continuar o trabalho lá do começo.” Mas eu acho que isso elas não

fazem por mal, você tem pouco ou quase nenhum contato com elas. Precisava haver uma

integração, uma forma de diálogo entre os professores e isso seria o papel do coordenador, se

ele souber também a forma como cada professor trabalha. Eu acho que lá na escola o

Page 135: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

135

coordenador não sabe. O coordenador vai te mostrar no máximo o planejamento. Ela não

sabia o jeito, a didática de cada professor. Eles muitas vezes desconhecem. Senti falta disso.

Entrevistador: Em algum momento você procurou ajuda ou conversou com alguém sobre

suas dúvidas, sobre o momento que estava vivendo?

Entrevistado: Às vezes eu conversava com outras professoras de outras escolas e perguntava

como elas estavam trabalhando, o que estavam dando aos alunos. Tem professora que falava

assim: “ o ba, be,bi, bo, bu, eu passo fora, mas não pode colocar no caderno, porque se não

alguém vai ver!” Eu ficava pensando, estamos enganando quem? Eu ficava com muito medo,

o que posso e o que não posso fazer? Eu me sentia perdida, cada professora trabalha de um

jeito. Algumas que faziam isso se sentiam super seguras, porque trabalham há anos e não

eram questionadas. A sensação era de que estas podiam, mas quem está chegando não. Eu

ficava incomodada, mas procurava não deixar transparecer essa insegurança aos alunos, pois

sabia que isso podia comprometer o meu trabalho e a aprendizagem deles. E sempre

perguntava. Via como as outras trabalhavam e tentava dar o meu melhor, o que eu acreditava

que fosse correto.

Entrevistador: Bom, então vamos retomar. Nós conversamos um pouquinho sobre o

processo de atribuição, sobre sua chegada à escola, a recepção dos alunos. Você sempre

perguntava, procurava ajuda e observava com as demais faziam, certo? Agora vamos pensar

um pouquinho na escola no coordenador e nos pares, nos professores. Você acredita ou em

que medida o professor coordenador ou professores contribuíram na sua chegada à escola ou

ainda durante este processo de iniciação e atuação à docência?

Entrevistado: É assim, tem gente que por tempo de carreira se sente seguro e faz. Eu estou

sempre me perguntando “será que é assim?” Quando eu perguntava eles diziam: “fulana

trabalha de tal jeito, mas eu trabalho assim.” Então a contribuição que os colegas me deram é

no sentido de que eu fui pegando um pouquinho de cada um, fui pegando para mim o que eu

achava que era melhor e podia me ajudar. Comparava o que elas faziam, o que eu achava que

precisa acrescentar, acrescentava. Pedia material, por exemplo, tinha uma professora que tinha

livros que não tinha na minha sala, eu pedia emprestado. Fiquei sabendo que uma professora

levava os alunos na biblioteca, isso era uma coisa que eu não sabia, descobri na prática.

Perguntando, sempre perguntado no dia a dia. Eles contribuíram nisso.

Page 136: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

136

A coordenadora muito receptiva também, mas não, não sei se devo falar, mas... ela não sabia

o que os professores dela faziam. Ela estava sempre preocupada com o resultado, ela e a

direção, claro. A preocupação maior é com o 4º e o 5º ano que seria avaliado pela Prova

Brasil.

Em uma reunião pedagógica uma das questões que foi colocada é que os projeto não focassem

apenas os anos que fariam a avaliação externa, mas que se estendessem também aos outros

alunos. Os projetos de leitura a gente faz sozinha na sala, sugerimos mais integração nos

projetos, que envolvessem sim a direção, a coordenação, já que o resultado com as outras

séries deu certo. Por que não fazer com os menores, só porque não são avaliados, não

precisam participar?

A coordenadora não é autoritária, mas deixa cada um por si. Eu não acho correto. Não é que

eu esperasse um trabalho unificado, mas esperava que o coordenador me apontasse o

caminho, me orientasse no como fazer ou me falasse que estava fazendo certo. Ela não faz

isso, às vezes tenho a impressão que ela tem as mesmas dúvidas que eu tenho. Mas ela tem

mais experiência, já foi professora. A verdade é que me sinto pouco apoiada. Eu me sinto

sozinha, principalmente com a parte burocrática, até porque só é cobrado do professor aquilo

que não dá certo, ou quando a escola inteira fica paralisada com a presença do supervisor, que

aparece também só para dizer o que você não fez. Fica aquela atmosfera de medo.

Não deveria estar todo mundo pensando no aluno? Mas não é isso. A preocupação é com os

documentos, com as faltas. Puxa, quando a gente precisa, tem um aluno com dificuldade,

ninguém se preocupa. Então, eu sinto sozinha.

Também, eu estou descobrindo as coisas ainda. Talvez eu não tenha esta pessoa com quem

contar. Seja problema do sistema de ensino, não sei. Em relação à formação, os professores

estão cansados dessas formações que não ajudam com os problemas da sala de aula. Fica no

mesmo, a proposta é refletir sobre a prática, eles mostram algumas práticas que julgam ser

boas e você volta pra escola do mesmo jeito. E aí, quando você fala com a coordenadora você

percebe que ela não consegue te ajudar porque também tem as mesmas dúvidas, por que tudo

fica sempre nas discussões, ninguém sabe nada. Com todo mundo que você conversa a dúvida

é a mesma.

Entrevistador: Em algum momento você pensou em desistir da docência?

Entrevistado: Desistir não, mas algumas vezes eu me sentia intimidada por ouvir umas falas

que você encontra em professoras antigas do tipo: “a educação não vai”, “os alunos não

Page 137: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

137

querem nada”. Falas de quem já está cansado, para se aposentar. Outra coisa que me

incomoda é o fato de muitos alunos não saberem por que estão lá. Acho que a escola perdeu

seu papel na sociedade. Os pais falam na frente das crianças que eles não podem faltar se não

perdem o bolsa família, o vale do leite.

Eu me sinto atropelada por outras funções assistencialistas que a escola assumiu. Esse

discurso não é velado, professores são cobrados sobre este papel, você tem cuidar das faltas

dos alunos, tem que fazer relatórios. O papel do professor é anotar e muitas vezes são

culpadas se o aluno perde a bolsa família. Os pais, o coordenador vai à porta do professor, na

frente dos alunos para cobrar a presença do aluno usando como recurso esses artifícios.

Me perdoa, é que essas coisas me revoltam, mas faz parte da sua pergunta. Uma outra coisa

que me revoltava muito e a gente sempre discutia na época da faculdade.

Ah outra coisa triste, as professoras mais antigas diziam: “Ah Cris você é tão novinha, não

tem outra coisa que você queira fazer?” Eu tento entender que não é por mal, que não é

inveja. Acho que elas estavam sendo sinceras. E elas diziam: “eu só não troco por só faltam

cinco anos para eu me aposentar” ou “eu só não troco por que eu já estou há tanto tempo na

rede e você tão novinha, tem tanta professora ficando louca”. Eu dizia: “Não gente eu ainda

acredito e gosto do que faço!”.

Então assim eu nunca vivi o sentimento de desistir porque eu acredito no que faço. Essas

falas não me afetaram nesse sentindo, nem ver professores pegando licença no INSS, porque

ficou louca. Não! Eu quero isso. Eu acredito, mas as conversas são desanimadoras. Eu volto a

dizer, o professor é cobrado de muitas outras coisas e o seu trabalho com o aluno mesmo, para

quê ele está ali não aparece nem eles sabem.

Os alunos também não sabem porque estão ali. Isso me deixa muito angustiada, às vezes até

entristecida, mas não me faz pensar em desistir. Eu tento mostrar para os meus alunos o

porque eles estão aqui, acredito que isso tem que ser feito desde o primeiro contato com a

escola. Não dá pra esperar os alunos chegarem no 5º ano para descobrir a importância da

escola. Não é para receber bolsa, material, uniforme, leite, tudo isso que a prefeitura usa para

chamar a atenção dos pais.

Entrevistador: Cris, você comentou anteriormente sobre o processo de formação que

acontece na rede. Qual é a sua expectativa sobre esta formação?

Entrevistado: Isso mesmo, acho que a formação precisa acontecer pensando na prática,

pensando não, porque isso eles dizem que fazem, precisa discutir a prática. Precisa sim da

Page 138: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

138

teoria, claro, mas cada um ir lá à frente e falar do que faz na escola não basta, precisa ser

discutido como se faz mais de perto, definido o que cada escola vai fazer junto como grupo

que atende há uma comunidade que é diferentes da outra. Sei lá.

Você aprende nessas formações, há sempre aprendizado, mas quando voltamos para a escola

fica tudo do mesmo jeito. Isso é sentido por todos os professores, tanto as mais antigas como

as novas. Isso é discutido na sala dos professores. Ninguém sabe. Ai fica um sentimento de,

não sei nomear, um sentimento de, sei lá, cada um acaba fazendo o que acha que é certo. Mas

será que é certo?

Entrevistador: Como você nomearia esse sentimento?

Entrevistado: Nossa que pergunta difícil. Frustração. É essa a sensação. Total frustração.

Para algumas professoras tudo bem não saber o que fazer, para onde ir. Mas para mim, eu

preciso que alguém me diga você esta no caminho. Eu preciso disso. Eu consigo avaliar o

meu trabalho e saber o que estou fazendo, mas e com aqueles que não conseguem? Isso para

alguns professores é tranquilo. Eu não, eu quero acertar. Eu fico incomodada, fico frustrada

com as coisas que não dão certo. E esperava isso do coordenador, mas entendo que ela

também tem muitas dúvidas. E escola age sempre no que é imediato, casos isolados, não olha

as coisas que acontecem com cada professor, com cada sala de aula. É isso.

Entrevistador: Cris, tem mais alguma coisa que você gostaria de acrescentar a essa nossa

conversa?

Entrevistado: Acho que não.

Entrevistador: Ok, eu te agradeço mais uma vez. Foi muito rica e tranquila nossa conversa.

Entrevistado: Eu também gostei muito de poder colaborar para o seu trabalho. Estou a

disposição. E quero ver depois todo esse trabalho pronto, você me mostra?

Entrevistador: Com certeza.

Page 139: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

139

APÊNDICE 10

QUADROS DE ANÁLISE DAS ENTREVISTAS INICIAIS

QUADRO 1: DEPOIMENTO DA PROFESSORA LU SOBRE SEU INÍCIO NA PROFISSÃO

Depoimento Explicitação dos

significados

Sentimentos Apoio da Teoria

Nomeados Captados

- (...) A gente brincava na porta do guarda-roupa, sabe, e sempre

tinha um lápis em casa, porque a minha família toda são de

professoras, diretores de escola. Minhas tias todas tem essa

formação.

Eu cresci falando “eu vou ser professora”.

Desde pequena

brincava com lápis, pois

a família é formada por

professores e diretores

de escolas.

Orgulho

Wallon: O papel do

meio

- Fui para o magistério, foi aí que eu fui aprender que a teoria é

muito bonita, aí na hora da prática... Eu comecei a ver nos estágios

como era essa formação, eu fiquei um pouco assustada.

Foi para o magistério e

nos estágios percebeu a

diferença entre a teoria

e a prática.

Assustada

Insegurança

Tardif: Saberes

experienciais

- Tive a oportunidade de trabalhar com turma de terceiro ano. Eles

tinham muitas dificuldades na aprendizagem e tive que estudar um

pouquinho mais para saber como trabalhar.

Sua primeira

experiência com alunos

com dificuldades exigiu

estudo.

Ansiedade

Tardif: Saberes

curriculares

Page 140: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

140

Depoimento Explicitação dos

significados

Sentimentos Apoio da Teoria

Nomeados Captados

- (...) Eu participei do concurso para professores da rede estadual

em 2005. Foi um trauma. Uma professora passou mal na hora da

prova, ficou aquela tensão, chamaram a ambulância. Eu fiquei

pensando: “ai meu Deus, será que vale a pena?”

Participar do concurso

colocou dúvidas sobre a

escolha pela profissão.

Tensão Insegurança

Nervosismo

Wallon: afetividade

- A tarde nós tínhamos que voltar pra fazer a redação, eu fiz, mas,

sem muito interesse. Eu pensava: “não quero passar por isso, eu

não quero”. Eu fiquei muito nervosa e não consegui desenvolver a

minha redação acabei não tendo uma nota boa, não pegando uma

classificação.

No período da tarde

voltou para fazer a

redação, estava muito

nervosa, não conseguiu

resolver bem a redação.

Nervosismo

Medo

Decepção

Wallon: Grupos

afetividade

- (...) Eu cheguei na escola, elas se importaram em perguntar qual

era a minha experiência profissional, onde eu já tinha trabalhado.

Optaram por não separar os alunos da sala naquele momento.

Na escola falou sobre

sua experiência o que

fez com que equipe

gestora não separasse

os alunos.

Tranquilidade

Segurança

Expectativa

Garcia: Formação

inicial

Page 141: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

139

Depoimento Explicitação dos

significados

Sentimentos Apoio da Teoria

Nomeados Captados

- A primeira semana eu fiquei cada dia com um professora para

saber qual era o ritmo das crianças. As professoras deram um

apoio muito grande.

Durante a primeira

semana ficou cada dia

com uma professora

para conhecer os

alunos.

Alegria

Contentamento

Segurança

Garcia: Programas

de formação

- As professoras dos primeiros anos, as duas, sempre me apoiam.

Perguntavam se eu tinha alguma dúvida, me ajudam, se precisava

de algum material, traziam sugestões, até mesmo a professora do

segundo ano. Era feito uma troca.

As professoras estavam

sempre dispostas a

ajudar.

Entusiasmo

Satisfação

Wallon: o papel do

outro

- (...) a coordenadora me ajudava muito, ela sempre estava

me perguntando: Tá tudo bem? Precisa de alguma coisa? Se eu

tinha alguma dúvida ia até a minha sala, ou me explicava ali

mesmo na reunião e as colegas respeitavam isso.

A coordenadora

ajudava, tirando

dúvidas. Sentia-se

respeitada pelos

colegas.

Respeito Gratidão

Respeito

Segurança

Wallon: o papel do

outro

Page 142: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

140

Depoimento Explicitação dos

significados

Sentimentos Apoio da Teoria

Nomeados Captados

- Eu achei muito importante o fato dela ter considerado a minha

experiência ou falta dela. Quando ela foi trocar os alunos de sala,

ela ainda perguntou: você ainda quer ficar mais um tempo de

experiência.

Achou importante que a

coordenadora tenha

considerando sua

trajetória anterior.

Respeito

Garcia: Formação

inicial

- (...) Eu comecei colocar muita coisas na sala de aula (cartazes de

números, alfabeto, lista de nomes, etc.), um monte de coisas que

eu achava importante.

Ela me passou de que forma eu precisava trabalhar a utilização

daqueles cartazes. Disse que precisa estar aí de forma significativa,

para mim foi muito importante. Fiquei surpresa, pois pensei que ia

levar uma bronca.

Começou a colocar

muitos cartazes pela

sala, coisas que achava

importante. A

coordenadora orientou

como deveria usar

aqueles materiais.

Ansiedade

Surpresa

.

Tardif: Saberes

curriculares

André: Diversidade

e a formação de

professores

Page 143: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

141

QUADRO 2: DEPOIMENTO DA PROFESSORA CRIS SOBRE SEU INÍCIO NA PROFISSÃO

Depoimento Explicitação dos

significados

Sentimentos Apoio da Teoria

Nomeados Captados

- (...) Eu sempre gostei de escola, de professores, mas não que eu

desde pequena pensei em ser professora, não era essa a área que eu

queria, era mais a área da saúde que eu queria optar.

Gostava do ambiente

escolar, mas não queria

ficar na educação.

Ambivalência

Wallon: afetividade

- Fui fazer enfermagem. O primeiro emprego que eu consegui,

como enfermeira, foi na escola que eu estudei. Eu conhecia todo

mundo lá e ficava mais na área pedagógica, eu ajudava mais a

coordenadora.

Atuava com enfermeira

na escola em que foi

aluna e ajudava a

coordenadora.

Entusiasmo

Wallon: os grupos

- Aí eu fui experimentando e a coordenadora também me

estimulando muito. Ela achava que eu dava para a coisa.

Eu também comecei a querer mudar. Fui fazer um curso de

berçarista em ADI.

No ano seguinte, eu resolvi fazer a Pedagogia. Antes pesquisei

bastante sobre a área e aí decidi, vou seguir esse caminho.

Coordenadora

estimulava a mudar,

fez curso de

aperfeiçoamento.

Decidiu pela pedagogia

depois de muito

pesquisar.

Curiosidade

Determinação

Decisão

Wallon: o papel do

outro

Afetividade

Page 144: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

142

Depoimento Explicitação dos

significados

Sentimentos Apoio da Teoria

Nomeados Captados

- Nesse mesmo ano, prestei outra prova, na rede. Desta vez, eu

prestei para PEB (Professor de Educação Básica).

Lembro que eu passei em nono lugar, aí eu fiquei super feliz. Mas

naquele momento não havia vagadas disponíveis na rede. Então eu

fui chamada só esse ano.

Projetou a carreira, fez

novo concurso sendo

aprovada em nono lugar

Felicidade Realização

Segurança

Determinação

Wallon: afetividade

- (...) Eu vi o resultado pela internet e quase não acreditei. Todos

me davam os parabéns. Os professores da faculdade ficaram

muito felizes. Foi emocionante.

Aprovada no concurso

quase não acreditou no

resultado. Recebeu

elogios dos professores

da faculdade.

Entusiasmo

Euforia

Orgulho

Wallon:

conhecimento

afetividade

- (...) Eu tinha que escolher na hora, aí eu fiquei ansiosa. Eu dizia

que eu precisava pesquisar e fui fazer isso, com as professoras

antigas, da escola em que eu estava.

Precisava escolher uma

escola mas não

conhecia a rede,

precisou pedir ajuda as

professoras mais

antigas.

Angústia

Medo

Tardif: Professores

em situação

precária

Page 145: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

143

Depoimento Explicitação dos

significados

Sentimentos Apoio da Teoria

Nomeados Captados

- Quando eu cheguei lá, a moça da secretaria me atendeu e

apresentou um pouco da escola, estava tendo aula. Apresentou-me

o diretor e a coordenadora.

Eles estavam sentados e assim eles ficaram. Eu disse que eu era a

nova professora que ia assumir a sala do 2º ano, que era uma

licença maternidade. A coordenadora estava almoçando e só me

falou um oi, muito rápido.

Eu queria ter conversado sobre as crianças, a sala, os projetos,

infelizmente não consegui. Voltei um pouco frustrada, porque eu

pensava: ah fui antes pra conversar e não deu.

Na escola foi recebida

pela secretaria.

Apresentou-se dizendo

que iria assumir a sala

do 2º ano, uma licença

maternidade. A

coordenadora

cumprimentou

rapidamente.

Queria ter conversado

sobre o trabalho que iria

começar, mas não

conseguiu o que a

deixou frustrada.

Expectativa

Frustração

Desanimo

Decepção

Wallon: emoção

Tardif: Professores

em situação

precária

Wallon: sentimento

- Detalhe, horário de café, horário de almoço, você aprende ali na

raça com o professor do lado. Você sai comigo nesse horário!

Você vai aprendendo na raça ali.

Precisou aprender na

raça a organização da

escola.

Decepção Persistência

Tardif: Professores

em situação

precária.

Page 146: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

144

Depoimento Explicitação dos

significados

Sentimentos Apoio da Teoria

Nomeados Captados

- Era final de semana e eu não ia poder me planejar, porque eu não

tinha o planejamento da sala, fiquei decepcionada, enfim. Aí na

segunda-feira ela foi me entregando à prestação.

Era final de semana

queria planejar a aula.

Decepção Irritação

Perplexidade

Tristeza

Tardif: Professores

em situação

precária

Placco e Trevisan:

as diferentes

aprendizagens do

coordenador

- Quando você entra você tem que ter um contato de pelo menos

um dia com a professora anterior, você tem que ter um parecer do

professor, pelo menos um dia.

Nem que fosse uma hora de reunião com a coordenadora, com a

professora anterior, acho que falta um pouco isso, senão você fica

perdida. Eu fiquei sozinha, sozinha.

Acredita ser importante

uma reunião com a

coordenadora e a

professora da sala que

iria assumir para não

ficar sozinha e sentir-se

perdida.

Solidão Decepção

Irritação

Garcia:

abordagens e

interpretações –

cultura escolar

Wallon: papel do

outro

Page 147: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

145

Depoimento Explicitação dos

significados

Sentimentos Apoio da Teoria

Nomeados Captados

- Às vezes até os professores com mais experiência mesmo,

poderiam contribuir com o coordenador e também com quem

chega novo na escola. Queria fazer junto, poder partilhar, saber

que estou no caminho certo.

Os professores mais

experientes poderiam

ajudar o coordenador

pedagógico a orientar o

professor novo que

chaga a escola.

Cumplicidade

Ternura

Garcia:

componente dos

programas de

iniciação.

Wallon:o papel do

outro

- (...) Você sabe do seu trabalho, você sabe a vontade que você tem

e quer fazer da melhor forma. Mas que quando você enxerga isso,

por exemplo, de um pai de um aluno ou de um coordenador, é a

mesma sensação de abrir o diário e vê seu nome na lista de

aprovados. Nossa, que legal, eu consegui. Acho que te estimula.

Preocupa-se com a

forma que esta

realizando seu trabalho

e precisa do olhar do

outro para sentir-se

estimulada.

Alegria

Constatação

Wallon:o papel do

outro

Page 148: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

146

QUADROS DE ANÁLISE DAS ENTREVISTAS RECORRENTES

QUADRO 3: DEPOIMENTO DA PROFESSORA LU SOBRE SEU INÍCIO NA PROFISSÃO

Depoimento Explicitação dos

significados

Sentimentos Apoio da Teoria

Nomeados Captados

- Eu fui pelo menos em quatro atribuições em dias diferentes, isso

me deixava ansiosa e apreensiva. Pensei em desistir, eu achava

que não ia consegui. Eu fui bem na prova, mas não tinha

pontuação nenhuma. Não tinha esperança de conseguir.

Foi a várias atribuições,

teve boa nota, mas não

tinha pontuação, achou

que não ia conseguir,

pois não tinha

pontuação.

Apreensiva

Ansiosa

Frustração

Desesperança

Tardif: Professores

em situação

precária

- Na quinta vez eu fui chamada. Lembro que no dia, eu era o

número 36 da chamada, na banca de atribuição eles falam por

códigos. Eu fiquei muito feliz.

Somente no quinto

processo de atribuição

teve sua sala atribuída.

as orientações não são

muito claras no

momento da atribuição.

Feliz Vibração

Vivacidade

Tardif: Professores

em situação

precária.

Page 149: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

147

Depoimento Explicitação dos

significados

Sentimentos Apoio da Teoria

Nomeados Captados

- Eu fui de ônibus, lembro que o ônibus se chamava Sítio São

Francisco, a escola era muito longe, uma região de periferia e de

alta vulnerabilidade social, mas não de sítio.

Eram apenas duas

escolas, foi orientada a

pegar a sala livre.

Ansiedade

Contentamento

Tardif: choque com

a realidade

- Na sala dos professores, os olhares estavam todos voltados para

mim. Lembro que uma professora falou: “Nossa como você é

novinha, você tem experiência em dar aula?” e ainda “Você nunca

trabalhou na rede, eu não te conheço?”.

Na sala dos professores

todos ficavam olhando.

Medo

Insegurança

Wallon: meio

- No meu primeiro dia com os alunos, tive medo, pois eles já

estavam adaptados a outra professora. Tinha medo ficassem

pensando: “por que eu não posso mais ficar com aquela

professora?” Vivia muitos conflitos, muitas dúvidas e insegurança.

Sentiu medo que os

alunos não se

adaptassem a nova sala.

Medo Dúvida

Insegurança

Wallon: meios e

grupos.

Afetividade

- Terminei o dia muito feliz, percebi que podia ensinar aqueles

alunos. Isso tudo foi confirmado, quando na saída ao entregar os

alunos aos pais no portão da escola uma aluna disse para mãe: “a

prô é boazinha, eu gostei dela.” Isso me deixou muito comovida e

feliz mesmo.

Percebeu que podia

ensinar as crianças e os

pais passaram a confiar

no trabalho que estava

sendo realizado.

Felicidade Comoção

Emoção

Wallon:

Afetividade

Page 150: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

148

Depoimento Explicitação dos

significados

Sentimentos Apoio da Teoria

Nomeados Captados

- (...) A maioria dos professores da escola tem muito tempo na

profissão, mas elas foram muito carinhosas, muito atenciosas. Eu

colei nas duas professoras de primeiro aninho.

Experiência das colegas

servia como referencia

para o seu trabalho.

Confiança

Sinergia

Garcia:

componente dos

programas de

iniciação.

- A coordenadora por sua vez sempre teve um carinho muito

grande comigo. Ela te ajuda mesmo, ela sempre dizia: “Olha eu to

aqui pra te ajudar, o que você precisar pode perguntar. Eu não sei

tudo, mas a gente aprende junto”.

A coordenadora

ajudava em suas

dúvidas.

Carinho Ternura

Gratidão

Placco e Souza: os

coordenadores na

visão dos

professores

Wallon: o papel do

outro

Page 151: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

149

QUADRO 4: DEPOIMENTO DA PROFESSORA CRIS SOBRE SEU INÍCIO NA PROFISSÃO

Depoimento Explicitação dos

significados

Sentimentos Apoio da Teoria

Nomeados Captados

- Sim, eu me considero uma professora iniciante, principalmente

porque nesse início na prefeitura, a cada momento você está em

uma escola, cada momento com uma série diferente.

Se considera professora

iniciante.

Constatação Garcia: período de

iniciação

A cada chegada em uma escola diferente você é invadida pelo

sentimento de um professor que está começando, que está se

iniciando como professor, tem sempre aquela expectativa de como

será o grupo, como serão os alunos, a escola. Eu me preocupo

sempre com os pais, sabe. Eles não confiam no professor

substituto.

A cada chegada na

escola , vivia uma

situação diferente.

Preocupa-se com os

pais.

Preocupação Prudência

Atenção

Tardif: choque com

a realidade

Wallon: os grupos

- Cada dia você está substituindo em uma sala é muito mais difícil,

você está pensando em grupos que você fica apenas um dia. Então

você pensa em alguma atividade, alguma coisa para dar para os

alunos, naquele dia, não sabe quando verá aqueles alunos

novamente. Não constrói vínculo, nada, apena passa. Isso não é

bom nem pra eles nem pra você. Você não tem um planejamento,

não tem um livro didático, você vai fazendo...

Ficar cada dia numa

sala é muito difícil, é

precisava pensar em a

uma atividade que não

tem planejamento. Não

constrói vínculo.

Decepção

Frustração

Wallon: afetividade

Tardif: Professores

em situação

precária.

Page 152: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

150

Depoimento Explicitação dos

significados

Sentimentos Apoio da Teoria

Nomeados Captados

- Eu fiz o trabalho que tinha pensado e fui tirando dali às primeiras

informações do que estava acontecendo. Você descobre mais pelos

alunos do que pela equipe mesmo.

Realizava o trabalho

que tinha pensado e foi

descobrindo as coisas.

Curiosidade

Proatividade

Gonçalves: a

careira do

professor

- Eu que comecei a procurar saber, vi quem eram as professoras do

2º ano e comecei a perguntar sobre o que elas estavam

trabalhando, sobre o planejamento que elas também não tinham.

Diziam que tinham que pedir para a coordenadora. Eu fiquei

surpresa por que já estávamos no segundo semestre.

Começou a pedir

informações aos

colegas, ninguém tinha

o planejamento.

Perplexidade Gonçalves: a

careira do

professor

Garcia:

componentes dos

programas de

iniciação

- Eu sempre tive vontade de sentar e de falar. Eu queria muito que

a outra professora tivesse ficado comigo um dia antes de sair.

Seria excelente você ter um dia com aquela professora que você

vai substituir. E isso seria possível, porque como volante, você

fica à disposição das escolas. Senti falta disso.

Sentia vontade de falar.

Queria ter conversado

com a outra professora.

Como professora

volante ficava a

disposição das escolas.

Ansiedade

Desespero

Tristeza

Tardif: Professores

em situação

precária.

Page 153: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

151

Depoimento Explicitação dos

significados

Sentimentos Apoio da Teoria

Nomeados Captados

- Os professores estão cansados dessas formações que não ajudam

com os seus problemas da sala de aula.

E aí, quando você fala com a coordenadora, você percebe que ela

não consegue te ajudar porque também tem as mesmas dúvidas,

por que tudo fica sempre nas discussões, ninguém sabe nada.

As formações não

atendiam os problemas

da sala de aula.

O coordenador não

consegue ajudar, pois

também tem as mesmas

dúvidas.

Garcia:

componente dos

programas de

iniciação

Tardif: choque com

a realidade

Wallon: os grupos

Acho que a formação precisa acontecer pensando na prática,

pensando não, porque isso eles dizem que fazem, precisa discutir a

prática.

A formação precisa

discutir a prática.

Constatação

Ressentimento

André: Diversidade

e formação de

professores

Garcia:

componentes dos

programas de

iniciação.

Page 154: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Lima... · “Lu” e “Cris”. Vocês, meninas que aqui atendem com nome ... Guarulhos Sul, na pessoas da Professora Maria

152

Depoimento Explicitação dos

significados

Sentimentos Apoio da Teoria

Nomeados Captados

- Eu me sinto atropelada por outras funções assistencialistas que a

escola assumiu. Esse discurso não é velado, professores são

cobrados sobre este papel, você tem cuidar das faltas dos alunos,

tem que fazer relatórios.

O papel do professor é anotar e muitas vezes são culpadas se o

aluno perde a bolsa família.

Os pais, o coordenador vai à porta do professor, na frente dos

alunos para cobrar a presença do aluno usando como recurso esses

artifícios.

Sente-se atropelada pela

função assistencialista

assumida pela escola.

O professor é culpado

quando o aluno perde o

bolsa família.

Os pais e a coordenação

cobram a presença dos

alunos através destes

artifícios.

Decepção

Frustração

Resentimento

Dúvida

Lamento

Tardif: choque com

a realidade

Wallon: o papel do

outro, meios

Afetividade

Placco e Souza: os

coordenadores na

visão dos

professores