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1 PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP Joana Maria Gouveia Franco Duarte DILEMAS E DESAFIOS DA PROTEÇÃO SOCIAL ESPECIAL NO ÂMBITO DO SUAS: uma contribuição ao debate Mestrado em Serviço Social SÃO PAULO 2012

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

Joana Maria Gouveia Franco Duarte

DILEMAS E DESAFIOS DA PROTEÇÃO SOCIAL ESPECIAL NO ÂMBITO DO

SUAS: uma contribuição ao debate

Mestrado em Serviço Social

SÃO PAULO

2012

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

Joana Maria Gouveia Franco Duarte

DILEMAS E DESAFIOS DA PROTEÇÃO SOCIAL ESPECIAL NO ÂMBITO DO

SUAS: uma contribuição ao debate

Mestrado em Serviço Social

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Serviço Social sob a orientação da Profª. Dra. Maria Lúcia Martinelli

SÃO PAULO

2012

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Banca Examinadora

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A Ziza (in memorian) que me garantiu a

maior das proteções: o afeto.

Ao meu filho Arthur,

a quem afeto nunca faltará.

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AGRADECIMENTOS

Nomear é sempre uma tarefa arriscada, pois podemos cair na armadinha de

abreviar a importância de alguém. Por outro lado, na mesma medida, não enaltecer

a minha profunda gratidão aos citados seria deixar de ressaltar sujeitos

fundamentais na minha história e nesse processo do mestrado.

Ao meu companheiro Rogério, meu amor, que compartilha comigo as dores e

delícias do cotidiano de um casal que traz em sua história muita luta para ficar

juntos. Obrigada por me incentivar a escrever desde sempre, pela atenção às

minhas elaborações e angústias deste processo nos momentos mais inapropriados,

pela solidariedade em abdicar da minha companhia, e mesmo sofrendo com a minha

ausência, não deixou de me apoiar neste projeto. Você esteve de mãos dadas

comigo em todo o trajeto para que eu chegasse ao final desta etapa que é muito

mais que um título para mim. Esse momento é nosso.

À professora doutora Maria Lucia Martinelli pela acolhida, o conhecimento, o rigor

teórico, a disponibilidade e pelo amparo respeitoso e atencioso aos meus anseios

acadêmicos, me conduzindo de forma tão generosa e afetiva no meio de um clarão

de idéias. Martinelli mostra na prática o que é viver em uma sociedade sob a égide

do respeito e da igualdade e por quem eu passei a nutrir um profundo respeito e

admiração.

À minha família, com seus contornos contemporâneos, que me ensinou na prática

que os laços de afeto valem muito mais do que os de sangue. Em particular, ao meu

pai, Ivone, Glô, Gui, Bruno e Rodriguinho.

Aos meus avós, Tereza e Nenê, que vibram comigo a cada conquista.

Aos meus padrinhos tão amados, Marcia e Paulo, por botar força nessa coisa, como

diz Chico Buarque. E ao Gabi que mesmo de longe, me deu uma super força.

A todos os meus amigos, e aos sempre próximos: Lolô, Carina, Giselle, Italo,

Silvana, Rachel, Xande, que compartilham comigo, cada um a sua maneira, o sonho

de uma sociedade mais justa e igualitária.

À família de Rogério e, sobretudo, ao meu cunhado Gelson Guibu meu amigo e

colega da PUC-SP, grande incentivador deste projeto.

Ao Otto, meu enteado, que acordou mais cedo, muitas vezes, para que eu pudesse

usar o computador no quarto dele e, sentindo a minha ausência, tentava interagir de

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maneira muito interessada, no alto dos seus 9 para 10 anos, para entender o que eu

tanto escrevia, e, ao meu lado, lia seus gibis e livros infantis e dizia que também era

um intelectual.

A Zuleica, que me acolheu na cidade vermelha e me indicou para coordenação da

Proteção Social Especial, obrigada pela oportunidade.

Aos amigos que fiz na Secretaria de Assistência Social e Cidadania. Sintetizo meus

agradecimentos na figura do secretário da pasta da Assistência Social e Cidadania,

Pedro Soares, que prontamente me liberou para a concretização deste sonho.

Aos companheiros que trabalham na Proteção Social Especial (PSE) da prefeitura e

das entidades, que vivenciam comigo os dilemas e desafios da PSE e por me

impulsionarem ao estudo para buscar respostas mais consistentes como

coordenação para as demandas cotidianas, principalmente no que diz respeito à

qualidade dos serviços prestados e às condições de trabalho.

A Valquíria Longo, Sueli Luzo e Jana Leslão, coordenadoras, respectivamente, do

Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas), Creas POP e

Casa Beth Lobo, por segurar comigo as agruras do cotidiano e vestir a camisa da

PSE.

Aos sujeitos de minha pesquisa, pela disponibilidade e afetividade com que me

receberam.

Aos colegas do Programa e a todas as pessoas tão queridas que conheci e

reencontrei nesta etapa da minha vida.

Aos professores do Programa de Pós-graduação em Serviço Social, especialmente

os que estiveram mais próximos: Maria Lucia Barroco, Rachel Raichelis, Maria

Beatriz Abramides, José Paulo Netto.

À professora doutora Maria Carmelita Yazbek, que fez parte de minha banca de

qualificação e de maneira muito afetiva me trouxe imprescindíveis contribuições.

À professora doutora Aldaíza Sposati, agradeço ter aceitado fazer parte da minha

banca examinadora e pelas provocações que me fizeram mergulhar mais fundo na

Assistência Social. Com essa imersão, examinei meus fundamentos: aprendi, revi e

fixei conceitos e sinto o reflexo, no meu cotidiano profissional, no desenvolvimento

de meu estudo sobre a proteção especial e na defesa intransigente da assistência

social enquanto política pública.

A Neiri Bruno, que prontamente aceitou o convite de fazer parte de minha banca e

se dispôs a contribuir num momento tão importante.

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Aos super gentis José Carlos e Vânia, que tiraram pacientemente todas as minhas

dúvidas.

À Capes que financiou a realização do mestrado.

Aos usuários da Proteção Especial da Assistência Social, que tem seus direitos

violados, esse trabalho é para e por vocês.

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“No sinal fechado Ele vende chiclete Capricha na flanela E se chama Pelé Pinta na janela

Batalha algum trocado Aponta um canivete

E até Dobra a Carioca, olerê

Desce a Frei Caneca, olará Se manda pra Tijuca

Sobe o Borel Meio se maloca Agita numa boca

Descola uma mutuca E um papel

Sonha aquela mina, olerê Prancha, parafina, olará

Dorme gente fina Acorda pinel

Zanza na sarjeta Fatura uma besteira

E tem as pernas tortas E se chama Mané

Arromba uma porta Faz ligação direta

Engata uma primeira E até

Dobra a Carioca, olerê Desce a Frei Caneca, olará

Se manda pra Tijuca Na contramão

Dança pára-lama Já era pára-choque Agora ele se chama

Emersão Sobe no passeio, olerê Pega no Recreio, olará

Não se liga em freio Nem direção

No sinal fechado Ele transa chiclete E se chama pivete E pinta na janela

Capricha na flanela Descola uma bereta Batalha na sarjeta

E tem as pernas tortas”

Pivete (Chico Buarque)

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RESUMO

A presente dissertação tem como objeto de estudo a Proteção Social Especial (PSE) e alguns dos seus dilemas e desafios contemporâneos na reconfiguração da política de assistência social brasileira. O objetivo geral visou um aprofundamento teórico sobre as questões que envolvem a PSE bem como oferecer subsídios para a reflexão, os debates e as estratégias de ação aos trabalhadores do Sistema Único de Assistência Social (Suas) para sua efetivação, contribuindo para a concretização da perspectiva crítica do Serviço Social posta no projeto ético-político contemporâneo. Formulou-se, como pergunta norteadora, quais os dilemas e desafios hoje postos à PSE e como se pode avançar na qualidade da atenção à violação de direitos e do risco previstos na Política Nacional de Assistência Social (PNAS). As principais referências conceituais foram fundamentadas em obras e autores que privilegiam a perspectiva crítica. A metodologia abrangeu pesquisa bibliográfica, pesquisa documental e aproximação empírica com os sujeitos da pesquisa, além da observação participante, uma vez que a pesquisadora coordena a Proteção Social Especial no Município de Diadema. Centrou-se em delimitar o lugar da PSE e a ambiência da violação de direitos na PNAS, o que a caracteriza, trilhando o percurso de como se chegou na PSE, e trazendo à baila questões contemporâneas como: as exigências de se pensar o novo na PSE, as múltiplas determinações do Proteção e Atendimento Especializado à Famílias e Indivíduos (Paefi), as atuais exigências profissionais para os trabalhadores da PSE, a Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais, a interface com o direito e a expressão de idéias conservadoras na atenção prestada por alguns profissionais da PSE. Os sujeitos da pesquisa foram: assistentes sociais, psicólogos e educadores, todos trabalhadores do Suas. As referências conceituais principais foram: Política Social, Assistência Social, Proteção Social no Brasil e Direitos Sociais, Direitos Socioassistenciais, Seguranças Sociais. A pesquisa corroborou a hipótese da necessidade de aprofundamento das questões que envolvem a PSE por processos de qualificações mais duradouros para entender e conduzir esse processo de reordenamento da PSE.

Palavras-chaves: Assistência Social, Proteção Social Especial, Reordenamento da

PSE.

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ABSTRACT

This dissertation object of study is the Special Social Protection (PSE) and some of its dilemmas and challenges in the contemporary reconfiguration of social assistance policy in Brazil. The general objective aimed to deepen theory on issues surrounding the PSE and to offer subsidies for reflection, discussion and action strategies to employees of the SUAS to put in effect, in order to achieve the critical perspective of Social Service in the contemporary ethnical project. The driving question of such study was the definition of what are the current dilemmas and challenges to PSE and how one can improve quality of attention to violation of rights and risks observed in the National Social Police Plan (PNAS). The main conceptual references were based on works and authors that emphasize critical perspective. The methodology included a literature review, documental research and empirical approach to the research subjects, and participant observation, since the author of this dissertation coordinates a Special Social Protection in the city of Diadema. The study focused on defining the PSE area of action and the ambience of PNAS rights violation that characterizes it, defining the path that led to PSE and shedding light contemporary issues such as: requirements for the new thinking in PSE; the multiple determinants of Specialized Care and Protection of Families and Individuals (PAEFI); current requirements for PSE professionals; the National Grading of Social Services; the interface with Law and the expression of conservative ideas by some PSE care providers The subjects of this study were: social service workers, psychologists and educators, all employees of SUAS. The main conceptualreferences were: Social Policy, Social Assistance, Social Protection in Brazil and Social Rights, Social Aid Rights, Social Security. The research confirmed the hypothesis of the need to go deeper on issues related to PSE through durable qualification processes in order to understand and lead this process of reordering PSE.

Keywords: Social Assistance, Special Social Protection, PSE Reorganization.

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LISTA DE TABELAS

TABELA 1: Nome dos Funcionários e Local de Trabalho.................................

TABELA 2: Funções dos Sujeitos de Pesquisa................................................

TABELA 3: Nome dos Funcionários E Local de Trabalho................................

TABELA 4: Funções dos Sujeitos de Pesquisa................................................

TABELA 5: RH Creas........................................................................................

TABELA 6: RH Creas POP...............................................................................

TABELA 7: RH Casa Beth Lobo .......................................................................

TABELA 8: Tempo de Trabalho na PAS...........................................................

TABELA 9: Qualificação Profissional ...............................................................

TABELA 10: Caracterização da Violação..........................................................

TABELA 11: Domínio do Conjunto de Defesa................................................

TABELA 12: Identeficação de Expressões Conservadoras..............................

TABELA 13: Tipificação....................................................................................

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LISTA DE GRÁFICOS

GRÁFICO 1: Funções dos Sujeitos de Pesquisa...............................................

GRÁFICO 2: Funções dos Sujeitos de Pesquisa...............................................

GRÁFICO 3: Tempo de Trabalho na PAS.........................................................

GRÁFICO 4: Qualificação Profissional...............................................................

GRÁFICO 5: Caracterização da Violação..........................................................

GRÁFICO 6: Domínio do Conjunto de Defesas.................................................

GRÁFICO 7: Identificação de Expressões Conservadoras................................

GRÁFICO 8: Tipificação.....................................................................................

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LISTA DE MAPAS

MAPA 1: Mapa da Exclusão /Inclusão Social Diadema.................................... 67

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LISTA DE SIGLAS

BPC – Benefício de Prestação Continuada

CAPS-AD_ Centro de Apoio Psicossocial-Álcool e Drogas

CEDEST- Centro de Estudos de Desigualdades Sócio-Territoriais

CLT- Consolidação das Leis do Trabalho

CMAS – Conselho Municipal de Assistência Social

CMDCA – Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente

CMI – Conselho Municipal do Idoso

CNAS – Conselho Nacional de Assistência Social

CNPq - Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

CR – Centro de Referência

Cras – Centro de Referência de Assistência Social

Creas – Centro de Referência Especializado de Assistência Social

CRI – Centro de Referência do Idoso

CT – Conselho Tutelar

Eca – Estatuto da Criança e do Adolescente

IAPs-Instituto de Aposentadorias e Pensões

IBGE – Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IEE Instituto de Estudos Especiais

LA-Liberdade Assistida

LBA - Legião Brasileira de Assistência

LGBT – Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais

Loas – Lei Orgânica da Assistência Social

MDS – Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome

Nepssas - Núcleo de Estudos de Seguridade Social e Assistência Social

NOB – Norma Operacional Básica

NOB/SUAS – Norma Operacional Básica/ Sistema Único de Assistência Social

NOB/RH – Norma Operacional Básica/ Recursos Humanos

ONG – Organização Não Governamental

OG – Organização Governamental

Paif – Proteção e Atendimento Integral à Família

Paefi – Proteção e Atendimento Especializado às Famílias e Indivíduos

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PAS- Política de Assistência Social

PAF- Plano Atendimento a Família

PBF – Programa Bolsa-Família

PIA- Plano Individual de Atendimento

Peti – Programa para Erradicação do Trabalho Infantil

PMD – Prefeitura Municipal de Diadema

PNAS - Política Nacional de Assistência Social

PNCFC – Plano Nacional de Convivência Familiar e Comunitária

PSB – Proteção Social Básica

PSC Prestação de Serviço a Comunidade

PSE – Proteção Social Especial

PUC-SP – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

SGD – Sistema de Garantia de Direitos.

Sasc – Secretaria Municipal de Assistência Social e Cidadania

Senai – Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial

Sesc – Serviço Social do Comércio

Sesi – Serviço Social da Indústria

Suas – Sistema Único de Assistência Social

TNSS - Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais

VIJ – Vara da Infância e Juventude

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO....................................................................................................

CAPÍTULO I – REFERÊNCIAS HISTÓRICO-CONCEITUAIS...........................

1.1 Política Social e Proteção SocialZZZZZZZZZZZZZZZZZ.

1.2 Direitos Sociais, Pobreza, Vulnerabilidade e Risco .................................

CAPÍTULO II – A POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL NO BRASIL............

2.1 Assistência Social como Direito...............................................................

2.2 Seguranças Sociais, Direitos Socioassistenciais e Serviços

Socioassistenciais...............................................................................................

CAPÍTULO III – A AMBIÊNCIA DA VIOLAÇÃO DE DIREITOS NA POLÍTICA

NACIONAL DE ASSISTÊNCIA SOCIAL: PROTEÇÃO SOCIAL ESPECIAL...

3.1 Caracterização da Proteção Social Especial............................................

3.2 Alguns Desafios Postos à Proteção Social Especial................................

CAPÍTULO IV – DILEMAS E DESAFIOS DA PROTEÇÃO SOCIAL

ESPECIAL: APROXIMAÇÃO EMPÍRICA AOS SUJEITOS DE PESQUISA.....

4.1 A pesquisa................................................................................................

4.2 Breve Caracterização de Diadema e da Estrutura da Proteção Social

Especial...............................................................................................................

4.3 As Exigências de se Pensar o Novo na PSE: As Novas Formas de

Atendimento e as Novas Exigências aos Profissionais......................................

4.4 Expressões de Ideias Conservadoras na Atuação dos Profissionais da

PSE.....................................................................................................................

4.5 Tipificação como Caminho Concreto para Avançar na Política...............

CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................

REFERÊNCIAS ..................................................................................................

ANEXO................................................................................................................

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INTRODUÇÃO

“A Proteção Social Especial e sua estrutura

ainda carecem de maturação e compreensão”

(Couto et. al., 2010, p. 252)

Estar à frente da coordenação da Proteção Social Especial (PSE), na

Secretaria de Assistência Social e Cidadania, na Prefeitura do Município de Diadema

(PMD), num momento histórico da Assistência Social, em que se faz necessário o

reordenamento estatal dos níveis de média e alta complexidade, exigidos para

operacionalização do Sistema Único de Assistência Social (Suas), suscitou nosso

interesse em ter como objeto de estudo os desafios e dilemas da PSE enfrentados

neste processo dialético de efetivação da assistência social enquanto política pública

para afiançar as seguranças sociais aos sujeitos que tem seus direitos violados, em

pleno século XXI.

O Suas hierarquizou as proteções em dois níveis de atenção: Proteção Social

Básica e Proteção Social Especial, em média e alta complexidade. Porém, os

estudos sobre a Proteção Social Básica apresentam-se em grande quantidade 1,

enquanto a Proteção Social Especial não possui esse aporte teórico e se apresenta

de forma segmentada em temáticas como violência, população de rua, adolescente

em cumprimento de medidas, abrigamento, entre outras.

A questão problematizada sobre a segmentação ainda é tão latente que,

quando se buscou referências para amparar os estudos sobre violação de direitos,

na época do ingresso no mestrado, encontrou-se apenas uma dissertação de

mestrado2 sobre a Proteção Social Especial, mas nenhum estudo apreendendo-a

como um nível de segurança que abrange a média e a alta complexidade.

Esta lacuna mobiliza-nos a contribuir com sistematizações sobre a temática

em questão.

Construir estratégias para encarar os desafios enfrentados no reordenamento

dos serviços dentro da PSE parece ser questão desafiante do Suas, demandando

1 Em pesquisa na plataforma lattes, localizamos 242 pesquisas de produtividade pelo CNPQ atualmente vigente com o assunto Proteção Social Básica. 2 Sertório, Leniter.Um estudo sobre a implantação da proteção social especial de média complexidade: contribuição à efetividade do Suas. 2002/2010. Tese (Mestrado)- PUC-SP, Campinas/SP, 2010.

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competências da administração pública e dos trabalhadores do SUAS, concursados

e/ou de entidades sociais, para que estejam preparados teórica e tecnicamente para

os novos rumos trazidos pela Política Nacional de Assistência Social (PNAS), pelo

Suas, e na recente Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais (TNSS).

Outra questão, que parece ser original e relevante, é pensar o impacto das

práticas conservadoras ainda hoje encontradas na PSE e investigar se as

dificuldades do reordenamento residem nessa herança da assistência social que

tratava quem demandava de sua função protetiva como figuras historicamente

estereotipadas negando-lhes as condições de sujeitos de direitos e tendo como

lócus os orfanatos, asilos e educandários.

Iamamoto (2009, p. 17) aponta para a necessidade de competência crítica,:

Os rumos e estratégias de ação são estabelecidos a partir da elucidação das tendências presentes no movimento da própria realidade, decifrando suas manifestações particulares no campo sobre o qual incide a ação profissional. Uma vez decifradas, essas tendências podem ser acionadas pela vontade política dos sujeitos, de modo a extrair estratégias de ação reconciliadas com a realidade objetiva, de maneira a preservar a sua viabilidade, reduzindo assim a distância entre o desejável e o possível.

Partir da elucidação dessas questões, é o que se pretende com esta

pesquisa, estudando toda essa complexidade e diversidade da PSE como forma de

aprofundar a reflexão, ampliando as possibilidades de debate e intervenção, para

romper de vez com práticas conservadoras, ultrapassando os velhos modelos de

assistência social com a radicalidade necessária, para o modelo de assistência

social atual.

Ainda se quer mostrar que a problemática não tem sido contemplada na

produção acadêmica e chamar a atenção para a ambiência do risco e violação de

direitos.

O objetivo é aprofundar as questões que envolvem a PSE como lócus

essencial para afiançar as seguranças sociais a quem tem direitos violados,

desenvolvendo reflexões sobre alguns dos desafios e dilemas enfrentados nesse

processo dialético de reordenamento exigidos para operacionalização do Suas;

oferecer subsídios para a reflexão, os debates e as estratégias de ação aos

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trabalhadores do Suas, contribuindo para a concretização da perspectiva crítica do

Serviço Social posta no projeto ético-político contemporâneo3.

Percebe-se a necessidade de aprofundar a reflexão sobre o lugar da PSE no

Suas e da ambiência da violação de direitos e risco na PNAS, as exigências de se

pensar o novo em relação ao serviços tipificados, as questões suscitadas pela

implantação da Proteção e Atendimento Especializado às Famílias e Indivíduos

(Paefi) e como se dá a incorporação dos diferentes segmentos na política de

assistência social.

É importante conhecer também as novas exigências postas aos profissionais

da PSE num serviço especializado, como o Creas, e até que ponto o profissional

tem domínio de quais aspectos caracterizam a violação e o conjunto de defesas, a

interface com o Judiciário, a expressão de ideias conservadoras na atuação de

alguns profissionais do Creas e quais as mediações necessárias para ultrapassar

com a radicalidade necessária o velho modelo de assistência social, ainda

introjetado em algumas práticas que estão em desacordo com a PNAS e com a

construção do momento histórico contemporâneo.

Destaca-se a relevância da pesquisa sobre o tema para a PSE,

especialmente para a Assistência Social, como uma forma de contribuir para o

debate das questões elencadas acima, para as quais não se encontra bibliografia.

Trata-se de um estudo acadêmico que procura trazer contribuições efetivas e

inovadoras, por ser um estudo inédito, que trata das múltiplas determinações da

PSE no sentido de elucidar os dilemas e desafios por meio das experiências

concretas dos sujeitos e da pesquisadora.

A pesquisa rege-se pela pergunta norteadora: Quais os dilemas e desafios

hoje postos à PSE e como se pode avançar na qualidade da atenção da violação de

direitos e do risco na PNAS?

Tal pergunta permitiu definir como hipótese que, para se avançar na

efetivação do Suas, deve-se garantir o aprofundamento sobre as questões da PSE,

principalmente com o aprimoramento das equipes interdisciplinares por meio de

capacitações e outros processos de qualificação mais duradouros.

3 O projeto ético-político materializa-se no Código de Ética de 1993 e fundamenta a ação profissional dos assistente sociais. Os códigos profissionais anteriores (1947/65/75), tinham perspectivas conservadoras, que pregavam harmonia, neutralidade, e foram deixados para trás pelas mudanças no interior da profissão. Essas mudanças foram expressas no Código de 1986, simbolizando a virada. E com o amadurecimento dos debates, culminou no código atual.

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Privilegia-se a tradição marxista e a possibilidade de uma leitura critica da

assistência sem desqualificá-la enquanto política pública, articulando a análise

ideológica com questões concretas do cotidiano, na direção da práxis.

Trabalha-se com referências histórico-conceituais como: Política Social,

Assistência Social, Proteção Social, Seguridade Social , Direitos Humanos, Direitos

Sociais, Conservadorismo, privilegiando autores inseridos na tradição marxista, que

trabalham com a dimensão da totalidade histórica sob a multiplicidade de

determinações da constituição dos sujeitos sociais.

Para aproximar-se desse objeto de estudo, entende-se que é preciso

estabelecer mediações necessárias, como, prioritariamente, direitos

socioassistenciais, serviços socioassistenciais, risco, vulnerabilidade, exclusão e

seguranças sociais.

Para trabalhar as referências conceituais e as mediações com o objeto, assim

como no estudo da política de assistência social, a presente pesquisa partiu de

estudos dos marcos legais e de autores que trabalham a construção de um

momento histórico contemporâneo, como Aldaíza Sposati, Carmelita Yazbek,

Berenice Couto, Raquel Raichelis, Maria Lúcia Martinelli e dos textos trabalhados no

Programa de Pós-graduados em Serviço Social da PUC-SP, na disciplina Assistência

Social: Política e Gestão e no Núcleo de Estudos de Seguridade Social e Assistência

Social (Nepssas) ambos conduzidos pela professora doutora Aldaíza Sposati.

Quanto à leitura do conservadorismo, utilizou-se como referencial a obra de

Leila Escorssim Netto4, que trabalha a origem do conservadorismo clássico. Em sua

interface com o Serviço Social, utilizam-se Iamamoto5 e Netto6.

Na aproximação da assistência social ao conservadorismo, utiliza-se a obra

de Maria Luiza Mestriner7, que retoma a forte presença da filantropia, como irmã

siamesa da assistência social.

Para a análise dos direitos humanos e construção da ambiência do trato à

violação de direitos, parte-se de José Damião Trindade8.

A intenção é mostrar que, a partir desse arcabouço teórico e conceitual, é

possível estabelecer mediações necessárias, bebendo na fonte do materialismo

4 O conservadorismo clássico - Elementos para caracterização e crítica. Cortez, 2011. 5 Renovação e conservadorismo no serviço social – ensaios críticos. Cortez, 2000. 6 Ditadura e serviço social. Cortez, 2001. 7 O estado entre a filantropia e a assistência social. Cortez, 2011. 8 História social dos direitos humanos. Petrópolis, 2011.

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dialético e fazer avançar a assistência social a serviço da classe trabalhadora, como

posto no projeto ético-político contemporâneo e em direção à emancipação humana,

carregando em si a proposta marxista.

A metodologia adotada é a pesquisa bibliográfica, pesquisa documental,

aproximação empírica aos sujeitos de pesquisa, além da observação participante,

uma vez que atuamos como profissional na área da Assistência Social.

A estrutura da dissertação compõe-se de quatro capítulos, que se articulam.

No primeiro capítulo, expressa-se a base histórico-conceitual, como chão da

pesquisa. No segundo capítulo, abordam-se os marcos da Assistência Social no

Brasil até sua institucionalização como direito, passando pela Lei Orgânica da

Assistência Social (Loas), PNAS e construção do desenho, pela primeira vez na

história do País, de um Sistema Único de Assistência Social (Suas) que hierarquizou

as proteções e garantiu seguranças sociais, direitos socioassistenciais e serviços

socioassistenciais.

O terceiro capítulo trata da ambiência da violação de direitos e risco na PNAS

- a PSE -, trazendo questões importantes, como sua caracterização; os níveis de

complexidade; a necessidade de compreensão e maturação da PSE; a discussão

dos serviços socioassistenciais em face dos benefícios; o ocultamento do usuário da

PSE; a articulação em rede e a intersetorialidade; as múltiplas determinações do

Paefi, especialmente sobre como este incorpora os segmentos.

O quarto capítulo elucida o processo de pesquisa; fornece breve

caracterização de Diadema e da estrutura da PSE; aborda as considerações críticas

dos sujeitos de pesquisa e da pesquisadora sobre alguns dilemas e desafios da

PSE, sendo eles: a exigência de pensar o novo na PSE pelas novas formas de

atenção e exigências profissionais, as expressões de ideias conservadoras na

atuação dos profissionais da PSE e sobre a Tipificação Nacional dos Serviços

Socioassistenciais. Nas Considerações Finais, destacam-se os principais resultados

da pesquisa.

Norteia-nos para o estudo uma pesquisa bibliográfica, iniciada antes mesmo

da inserção no curso de mestrado, que assegura o rigor científico requerido pela

pesquisa, e que tem sido central para estabelecer as mediações necessárias para o

objeto, bem como a sustentação teórico-acadêmica para o estudo. Assim como o

envolvimento profissional no processo de reordenamento institucional, vivenciando o

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impacto dos novos modelos e das práticas conservadoras ainda identificados no

cotidiano da proteção social especial.

A pesquisa documental foi importante, para o presente estudo, exigindo da

pesquisadora conhecer a política de Assistência Social, os documentos oficiais do

Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), como a

PNAS/2004, Suas/2005, a Norma Operacional Básica (NOB)/2005, NOB/RH, Guias

Técnicos, especialmente a Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais e as

orientações técnicas para os serviços para a PSE.

A dificuldade encontrada para a realização da pesquisa relaciona-se com a

escassa bibliografia sobre a PSE e suas questões atuais, sobre a dificuldade de

implantação de novos modelos que de fato garantam as seguranças sociais

necessárias para garantir direitos, principalmente através dos serviços desse nível

de complexidade.

Neste sentido, seguindo a tradição de pesquisa do programa, através do

Nepssas9, a nossa proposta consiste em uma aproximação empírica com o uso de

questionários com alternativas.

A pesquisa de campo envolveu doze profissionais técnicos e coordenadores

do Creas, do Centro de Referência da Mulher - Casa Beth Lobo e Creas POP.

Os sujeitos da pesquisa foram escolhidos pelos seguintes critérios:

1. Abarcar técnicos de todas as áreas (assistentes sociais, psicólogos e

educadores) de todos os serviços vinculados à PSE de Média Complexidade e Alta

Complexidade (Tab. 1).

2. Profissionais com funções diversificadas em exercício na PSE.

9 Núcleo de Estudos de Seguridade Social e Assistência Social da PUC–SP.

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Tabela 1 - Nome dos funcionários e local de trabalho

Nome

Setor de Trabalho/Segmento em que

Atua

Maria Helena da Silva de Lima Abordagem Social

Valkiria Martins de Oliveira Idoso e Deficiente

Edina Aparecida Mendes Peti

Janaina Braga Domingues Correa Fecher Abordagem Social

Ivone Aparecida de Freitas Caetano Alta Complexidade

Tania Machado Aires MSC/LA

Janaina Leslao Garcia

Centro de Referência à Mulher em

Situação de Violência

Renata Palombo Paefi

Maria de Lourdes Merenda Peti

Eloisa Gabriel dos Santos Creas POP

Maria Cristina de Oliveira Idoso e Deficiente

Sueli Luzo Costa Garcia Creas POP

Do universo de doze entrevistados, com relação à profissão e natureza das

funções, 58% atuam como assistentes sociais, 25% são educadores, 8%

educadores e 8% têm cargo de coordenador (Tab. 2 e Gráfico 1).

Tabela 2 - Funções dos sujeitos de pesquisa

3. Função (assinale apenas uma alternativa) ABS %

Assistente social 7 58%

Psicólogo 1 8%

Educador 3 25%

Coordenação 1 8%

Outros 0%

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Gráfico 1 - Funções dos sujeitos de pesquisa

Após a realização da pesquisa, as respostas aos questionários foram

sistematizadas. Posteriormente, lançadas em planilhas e transformadas em tabelas,

tendo em vista a construção da análise. Os dados coletados foram organizados e

tabulados, possibilitando a análise das considerações dos sujeitos e a construção de

eixos analíticos básicos.

Outra técnica foi a da observação participante tanto no espaço institucional

quanto no acadêmico, e os registros feitos de forma sistemática, em caderno de

campo. A receptividade dos sujeitos da pesquisa para com a pesquisadora se deu

de forma acolhedora. A realização da pesquisa ocorreu entre setembro e outubro de

2012.

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CAPÍTULO I - REFERÊNCIAS HISTÓRICO-CONCEITUAIS

1.1 Política Social e Proteção Social

A origem das políticas sociais emana da luta dos trabalhadores por proteção

social do Estado aos operários que compunham o contingente de desempregados

criado pela concorrência na Revolução Industrial.

A Revolução Industrial inicia-se em meados do século XVIII, caracterizada

pela introdução do maquinário no processo produtivo impactando sobremaneira a

vida dos trabalhadores daquela época e pelo liberalismo econômico, que

conformava um processo no qual havia liberdade total para o capital, sem nenhuma

intervenção do Estado, mas aprisionava os trabalhadores em condições cada vez

piores: os ambientes de trabalho eram péssimos, as jornadas mais do que abusivas,

havia exploração de mão de obra infantil, entre outros.

A partir do século XIX, há um crescimento do movimento operário

reivindicando melhores condições de trabalho, principalmente na Inglaterra.

Nesse momento histórico do capitalismo industrial, era marcado ainda pelo

desemprego e, por consequência, o não acesso às necessidades básicas que fazia

com que os trabalhadores demandassem a intervenção do Estado.

As políticas sociais, como resposta do Estado, operam sempre no bojo das

contradições oriundas da relação entre capital e trabalho.

Ao mesmo tempo em que a política social se constitui numa “modalidade de

intervenção do Estado no âmbito do atendimento das necessidades sociais básicas

dos cidadãos” (YAZBEK, 2008, p. 82), cumpre a função de amenizar os possíveis

conflitos sociais que poderiam se acirrar contra a ordem vigente.

No âmbito de um espaço contraditório, no qual podem se reforçar tanto os

interesses do capital, mantendo a acumulação e reproduzindo a força de trabalho,

quanto os processos organizativos da população, é que a política social se localiza.

Desde as poor laws (Lei dos Pobres) na Inglaterra, o Estado tentou amenizar

a pobreza percebendo que a caridade e filantropia seriam insuficientes. Para a

população pauperizada que perambulava em busca de ocupações, encontram-se as

Poor houses (1576) e as Workhouses, no modelo de instituições totais,a primeira

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para a população pauperizada apta e a segunda para os inaptos ao trabalho. Desde

então, é possível verificar modelos de proteção calcados no trabalho.

No começo do século XVII, ocorre a primeira experiência em assistência com

a Irmandade de Misericórdia em São Paulo10, que instala pequena enfermaria,

denominada de hospital, mas que funcionava como uma instituição de

acolhimento,os antigos albergues.Posteriormente, são implantadas as Hospedarias

do Imigrante (1888) que era responsável pela vacinação e quarentena dos

imigrantes que chegavam.

Já no século XIX, em Salvador, para o acolhimento de crianças que não

tinham como ter os cuidados providos, estas eram deixadas na Roda dos Expostos

(1825), peça cilíndrica presa a parede, onde era possível colocar a criança e girar ,

fazendo com que ela chegasse ao outro lado sem identificar quem o fez.Esse

mecanismo foi extinto somente pelo Código de Menores.

O Estado passa a ter legitimidade para regular a economia e o social com o

Welfare State, potencializando as políticas sociais, até idos dos anos 1970.

O Estado de Bem-Estar Social caracterizava-se por sua fundamentação no

keynesianismo, ou seja, num modelo de capitalismo regulado, que era alicerçado

pela social-democracia, e pelo fordismo.

Esse periodo é marcado também pela introdução do modelo bismarkiano de

direitos mediados pelo trabalho, que hoje algumas formas estão postas na

Seguridade Social.

Historicamente, há uma diferença nas respostas dadas pelo Estado entre os

países que adotaram o Welfare State, ou em países, como é o caso do Brasil, que

nunca alçaram, sequer, esse patamar, mesmo não sendo exatamente o modelo

almejado, mas apenas um parâmetro melhor do que os estabelecidos no País.

No Brasil, o período da República Velha, que antecede os anos 30, é

marcado por uma incipiente legislação trabalhista. Embora as condições de

trabalhos fossem absolutamente precárias, as expressões da questão social eram

tratadas como caso de polícia e como disfunção individual.

Os cidadãos pressionaram o governo por medidas de proteção através da

organização de partidos políticos e sindicatos, organizações estas apreendidas a

partir da vivência com os imigrantes chegados na década de 1920. Assim, o sistema

10 Para aprofundar :Sposati, Aldaíza. “História da pobreza assistida em São Paulo” Tese de Doutorado defendida na Pontíficia Universidade Católica – PUC-SP -1996

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de proteção social brasileiro foi se constituindo a partir da década de 1920-30, a Lei

Eloi Chaves (1923) que cria as Caixas de Aposentadorias e Pensões (CAPs), mais

tarde transformadas em Instituto de Aposentadorias e Pensões( IAPs) e de práticas

assistencialistas.

Nesse contexto, se dá a origem do Serviço Social, no interior do bloco

católico, para operar nas sequelas do capitalismo industrial e amenizar os conflitos

entre as classes.

No período do Estado Novo, no governo Vargas, para os trabalhadores com

carteira assinada, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) entra em vigor,

respondendo aos anseios de forma legalista, nos moldes do modelo bismarkiano,

em que os benefícios sociais têm caráter seletivo, que, como o próprio nome já diz,

não se constituem em direitos.

As respostas para os trabalhadores sem vínculo formal são calcadas em

formas populistas representadas por obras sociais e filantrópicas.

Nos idos dos anos 40 e 50, para atender ao processo de industrialização, os

trabalhadores migram do campo para a cidade e, com isso, surge a necessidade de

qualificação dessa mão de obra que anteriormente era rural, e adequação à ordem

vigente. São criadas escolas de formação profissional e orientação social, ligadas ao

empresariado nacional, como o Serviço Social da Indústria (Sesi), Serviço Nacional

de Aprendizagem Industrial (Senai), Serviço Social do Comércio (Sesc).

No ano de 1942, é fundada, pela primeira-dama Darcy Vargas, a Legião

Brasileira de Assistência (LBA), com o objetivo de atender às famílias dos soldados

enviados às batalhas na Segunda Guerra Mundial.

Com o fim da guerra, a LBA passa a atender às famílias em situação de

miserabilidade, com foco nas áreas de maternidade e infância.

A LBA marca a história das práticas de assistência social no Brasil como a

primeira instituição social do País de âmbito nacional, pelas suas características

paternalistas, de auxílio emergencial e compensatório e pela relação público-

privada, por meio de convênios com instituições sociais. Viabilizou, ainda, o

surgimento de várias escolas de serviço social pelo País.

A LBA, historicamente, foi presidida pelas primeiras-damas, cultuando suas

figuras como operadoras de assistência social, e foi extinta somente em 1995.

Assim, surge com força o primeiro-damismo no Brasil, assegurando em seu

estatuto a obrigatoriedade da presidência ser exercida pela primeira-dama do País,

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reforçando assim a ligação estreita entre as ações públicas na área da assistência

social com a caridade e a benemerência. Sposati et. al (2010, , p. 45) afirmam que:

Representa a simbiose entre a iniciativa privada e a pública, a presença da classe dominante enquanto poder civil e a relação benefício/caridade X beneficiário/pedinte, conformando a relação básica entre Estado e classes subalternizadas.

Vargas foi destituído em 1945, mas o período que se sucedeu possuía

características semelhantes em relação à orientação trabalhista e à populista. Pode-

se dizer que, nesse período, o grande marco é a promulgação da Constituição de

1946, que regulamenta o direito à greve e a liberdade de associação sindical.

Como sistematizado por Vieira (1995), posteriormente, constiui-se a política

social o Brasil, traduzindo-se ora em interesse do capital, através do controle, ora

em interesse do povo, por meio da conquista de direitos, apresentando-se como

espaço contraditório.

1951-64 – estratégias de mobilização e controle das populações carentes;

1957-64 – representação do conjunto de direitos da população perante o

Estado;

1957-64 – Espaço de representação de interesses populares.

Em tempos de “geração 68” e suas bandeiras, num contexto de dívida pública

e crise fiscal, alta do petróleo e severas críticas ao modelo de Welfare State, o

neoliberalismo constitui-se, privilegiando todos os interesses do capital e antagônico

às políticas sociais.

O neoliberalismo tem suas bases doutrinárias no Consenso de Washington e

constitui-se em um processo de reestruturação do capital, ajustando-os as suas

necessidades, por mudanças, não só no capital financeiro, mas no mundo do

trabalho e na reconfiguração do Estado.

Contraditoriamente, o Brasil, com a chegada tardia do neoliberalismo11,

conseguiu avançar na universalização dos direitos sociais, num contexto histórico

em que o neoliberalismo já avassalava os direitos sociais pelo mundo.

11 Para saber mais recomendamos o texto de Sposati “Regulação Tardia:característica das políticas sociais latino americanas na passagem entre o segundo e o terceiro milênio.”

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Esse avanço no campo dos direitos sociais tem início com o processo de

abertura democrática e se consolida pós ditadura na progressista Constituição

Federal de 1988, que estabelece os Direitos Sociais para garantir o conjunto de

necessidades sociais, como a educação, saúde, o trabalho, lazer, a segurança,

previdência social, proteção à maternidade e à infância, assistência aos

desamparados, que devem ser garantidos pelo Estado.

Por garantir condições de vida, a Assistência Social integra o sistema de

proteção social brasileiro previsto na Constituição de 1988.

Uma política de proteção social compõe o conjunto de direitos de civilização de uma sociedade e/ou o elenco das manifestações e das decisões de solidariedade de uma sociedade para com todos os seus membros. Ela é uma política estabelecida para a preservação, a segurança e respeito à dignidade de todos os cidadãos. (SPOSATI, 2009, p.11).12

Como Política Pública de Proteção Social, num conjunto de iniciativas para

proteger os riscos inerentes às condições humanas, institui-se, a seguridade social,

sobre três pilares: Previdência Social, Saúde e Assistência Social, sendo a

Assistência Social e a Saúde não contributivas.

Em estudo de Sposati13, é apresentado que, para a assistência social se

constituir como política pública, é necessário assumir a socialização dos riscos

sociais e que isso depende do padrão de civilidade e solidariedade da sociedade,

implica também retirar as diretrizes do campo privado, o que não significa estatizar,

mas operar em parceria, assegurando o dever do Estado e a responsabilidade

pública.

A assistência na política social brasileira, como direito, não por acaso, é a

última a ser regulamentada:

O exame da política de assistência social, como de outras políticas sociais, significa tratar de uma mediação estatal na relação de classes em uma sociedade de mercado que tem por objetivo construir novos parâmetros e alcances na luta pela efetivação de direitos sociais e ampliação do alcance do dever de Estado com o

12 Modelo brasileiro de proteção social não contributiva: concepções fundantes. In: Concepção e gestão da política social não contributiva no Brasil. Brasília, Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) e Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). Brasília-DF, 2009. p.13-56. Disponível em: aplicações. mds.gov.br/sagi 13 Assistência Social como Seguridade Social, texto trabalhado em sala de aula na disciplina ministrada pela professora doutora Aldaíza Sposati.

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social. Tem-se à frente a possibilidade de fazer avançar, em alguns aspectos, um processo constituinte ainda inconcluso, mesmo que sua completude seja, muitas vezes, mais desejo do que possibilidade. Trata-se do campo da dívida social brasileira, face às exclusões sociais, onde os serviços de assistência social são importantes, quer para suprir demandas de proteção e reprodução social, quer para a desconstrução/reconstrução da sociabilidade cotidiana de várias camadas da população sob uma nova relação de igualdade/eqüidade de direitos perante a sociedade e o Estado brasileiro e perante a ética sócio-política fundada na dignidade humana. (SPOSATI, 2007, p. 440).

1.2 Direitos Sociais, Pobreza, Vulnerabilidade e Risco

No campo dos direitos, onde a assistência social se localiza, destacam-se

dois documentos que os preanunciam: Declaração dos Direitos do Homem e do

Cidadão, de 1789, e a Declaração Universal dos Direitos Humanos, em 1948, que

incorporou direitos sociais, econômicos e culturais aos direitos civis e políticos.

O campo de lutas por direitos humanos(DH) vem se constituindo

historicamente e encampando lutas contra suas violações:

Na década de 60, os movimentos de luta e de defesa de DH alcançaram várias conquistas no âmbito dos direitos civis e políticos: os chamados movimentos das minorias, de mulheres, negros, homossexuais, o movimento estudantil, desencadearam uma série de lutas específicas, dando visibilidade a diferentes aspectos da violência e da exclusão social. (BARROCO, 2008, p. 5).14

Bandeiras importantes, nesse campo, vão se objetivando em marcos legais e

constituindo-se em referências no conjunto de defesas para o campo das políticas

sociais, principalmente em segmentos específicos, como criança e adolescentes,

gênero, orientação sexual, discriminação etária, entre outras.

Alguns autores, como Barroco (2008) e Trindade (2011), alertam para

insuficiência das declarações e para as contradições entre a realização dos DH e as

condições adversas do capitalismo:

14 O Significado Sócio-histórico dos Direitos Humanos e o Serviço Social. Palestra apresentada na mesa sobre Conflitos Globais e a Violação dos Direitos Humanos: A Ação do Serviço Social em 18/8/2008. CONFERÊNCIA MUNDIAL DE SERVIÇO SOCIAL DA FEDERAÇÃO INTERNACIONAL DE TRABALHO. Salvador (BA).

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Uma das maiores dificuldades de objetivação do conjunto dos DH reside na realização dos direitos sociais econômicos e culturais, pois, como já assinalamos, eles exigem maior enfrentamento da contradição entre os direitos e os limites da realidade burguesa. (BARROCO, 2008, p.11).

Os direitos sociais somente são consagrados pela Constituição de 1988,

passando a ocupar lugar central como elemento fundante da relação pública entre

os cidadãos e o Estado, como aponta Martinelli (2011, p. 5)15:

Na esteira das conquistas democráticas que vão se instituindo após a Constituição Federal de 1988, e que vão alargando o campo dos direitos sociais no Brasil, sem dúvida temos de mencionar o SUS (1990), o ECA (1990), a Loas (1993), o Estatuto do Idoso (1994), a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (1996), e mais recentemente, já nos anos 2000, a Política Nacional de Assistência, em 2004, a Norma Operacional Básica, em 2005, com vistas à implantação do Sistema Único de Assistência Social, daí a sua denominação NOB/Suas, enfim, todo um conjunto de leis regulamentadoras de cada política, num esforço concentrado de implantar um Sistema de Proteção Social no Brasil.

Mediados por políticas públicas, os direitos sociais têm caráter redistributivo

de acesso e decorrem do reconhecimento das desigualdades sociais oriundas na

ordem vigente.

A concretização dos direitos sociais depende da intervenção do Estado, estando atrelada às condições econômicas e à base fiscal estatal para ser garantida. Sua materialidade dá-se por meio de políticas públicas, executadas na órbita do Estado. Essa vinculação tem de dependência tem sido a principal causa dos problemas de viabilização de direitos sociais, que, não raro, são entendidos como produto de um processo político, sem expressão no terreno da materialidade das políticas sociais. (COUTO, 2010, p.48).

Sob a égide neoliberal, nos domínios do capital, a ausência da materialidade

dos direitos sociais, com a retração e desconfiguração de políticas sociais, que

supostamente deveriam ser universalizantes, acarretam dificuldade de objetivação

dos direitos humanos:

[...] a brutal defasagem entre os princípios igualitários da lei e a realidade das desigualdades e exclusões - e nesse caso, falar dos direitos sociais seria falar de sua impotência em alterar a ordem do

15 O serviço social e a consolidação de direitos: desafios contemporâneos. Revista Serviço Social e Saúde, n. 12, 2011

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mundo, impotência que se arma no descompasso entre a grandiosidade dos ideais e a realidade bruta das discriminações, exclusões e violências que atingem maiorias. Além disso, e talvez o mais importante, não poderíamos ir muito além do que constatar – e lamentar - os efeitos devastadores das mudanças em curso no mundo contemporâneo, demolindo direitos que, em que pesem todos os seus limites, mal ou bem garantem prerrogativas que compensam a assimetria de posições nas relações de trabalho e poder, e fornecem proteções contra as incertezas da economia e os azares da vida. (TELES,1997, p. 2).

Nesse contexto, a assistência social localiza-se na luta pelos direitos

humanos e contra suas violações; por direitos sociais, por dignidade. Dentro dessa

magnitude é que a assistência social se constitui na possibilidade de um avanço

civilizatório16:

A assistência social ingressa no campo dos direitos pelo direito humano à dignidade. A questão é transformar direitos humanos no que for compatível a acessos sociais e, portanto, em direitos sociais, isto é, direito a determinados acessos que a assistência social deva prover e garantir. (SPOSATI, 2009, p. 14).

A política de assistência social está inserida no combate às circunstâncias

que aviltem a dignidade e que não se reduzem à pobreza. Embora a pobreza, nesse

sentido, constitua-se numa violação de direitos humanos, a política de assistência

não se restringe ao seu combate. Adotaremos o conceito de pobreza de Yazbek

(2001, p. 63).

A pobreza brasi leira const itui-se de um conjunto heterogêneo, cuja unidade buscamos encontrar na renda l imitada, na exclusão e na subalternidade. Do ponto de vista da renda, o que se evidencia é que para a grande maior ia dos trabalhadores, com registro em carteira ou não, com contrato ou por conta própr ia, predominam os baixos rendimentos e a conseqüente privação mater ia l daí advinda. Do ponto de vista da exclusão e da subalternidade, a experiência da pobreza constrói referências e def ine um lugar no mundo, onde a ausência de poder de mando e decisão, a pr ivação de bens materiais e do próprio conhecimento dos processos sociais que explicam essa condição ocorrem simultaneamente a prát icas de resistência e luta.

16 Horizontes da e para a Política de Assistência Social no Brasil de 2009: elementos para discussão. Pobreza, Vulnerabilidade, Desigualdade/Risco e Exclusão.

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Partir da pobreza como acesso à assistência social aviltaria direitos sociais

universais e renega-se a dívida histórica com uma camada da população:

O conceito de pobreza não é o mais adequado quando se quer superar o caráter neoliberal da política social. Categorizar carente ou pobre esconde, avilta e impede uma linguagem plena dos direitos do cidadão, do acesso universal a estes direitos, que devem ser garantidos pelo Estado. Da mesma forma discriminatória a política de assistência social é designada como compensatória a partir de concepção tributária do pensamento liberal. O sentido de compensatória é vinculado ao não ingresso no mercado de trabalho e conflita com a concepção de direitos sociais universais. (SPOSATI, 2010, p. 5).17

Cabe à assistência social objetivar seu campo de ação, alinhada à luta por

direitos humanos e contra sua violações, e prover determinados acessos com ações

preventivas e protetivas, em face da vulnerabilidade e do risco.

A política de assistência social adota então a noção de vulnerabilidade 18que

traz outros elementos anteriores à questão econômica, e vão muito além do que ela

determina:

[...] para além das condições socioeconômicas, as vulnerabilidades devem ser entendidas como um somatório de situações de precariedade entre as quais se incluem a composição demográfica da família, os agravos à saúde, a gravidez precoce, a exposição à morte violenta e as próprias condições cotidianas de vida.

Compondo com o que o risco19 traz em outras dimensões para a política de

assistência social :

O risco, como grave ameaça ou perigo iminente constitui-se num evento que traz consequências diretas para as condições e circunstâncias da vida dos indivíduos e de suas famílias, rompendo laços de sociabilidade e comprometendo sua capacidade de assegurar por si mesmo sua independência social. Nessa perspectiva, remete à ruptura de pertencimento, do vínculo societal,

17 SPOSATI, Aldaíza. O desafio da universalização In: GUIMARÃES, Juarez. (Org.). As novas bases da cidadania: políticas sociais, trabalho e previdência social. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2010. p. 35-41. 18 Conceito de vulnerabilidade trabalhado em Mapa de Vulnerabilidade Social da Cidade de São Paulo (SÃO PAULO, 2004, p.12), no texto O Conceito de Serviços Socioassistenciais: uma Contribuição para o Debate, trabalhado na VI CONFERÊNCIA NACIONAL DE ASSISTÊNCIA SOCIAL. 19 Conceito de risco trabalhado no texto O Conceito de Serviços Socioassistenciais: Uma Contribuição para o Debate. VI CONFERÊNCIA NACIONAL DE ASSISTÊNCIA SOCIAL.

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da participação social e do usufruto da riqueza socialmente construída (YAZBEK, 2001) ocasionando, portanto, a violação de direitos e de dignidade humana.

O âmbito de ação em que a assistência social se move como campo de

desproteção social,é o que está fora do alcance da “rede de segurança” com

fundamentação na defesa dos direitos sociais e humanos, como contextualiza

Raichelis (2008, p. 56)20:

Trata-se de riscos a que estão expostos indivíduos, famílias, coletividades quase encontram fora do alcance da “rede de segurança” propiciada pela proteção social pública e que, por isso, se encontram em situações de vulnerabilidade e risco social gerados por uma cadeia complexa de fatores: a ausência ou precariedade da renda, o trabalho informal, precário e o desemprego; o frágil ou inexistente acesso aos serviços sociais públicos; a perda ou fragilização de vínculos de pertencimento e de relações sociais e familiares;as discriminações e estigmas sociais, o não direito, que engendram múltiplas situações de desproteção social

Sobre esse chão, a assistência social se materializa como política pública,

como se tratará no capítulo que segue.

20 RAICHELIS, R. (Coord.); MESTRINER, M. L.; PAZ, R. D. O. da; NERY, V. Planos de assistência social: diretrizes para elaboração. Brasília: MDS, 2008.

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CAPITULO II – A POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL NO BRASIL

2.1 Assistência Social como Direito

O avanço da Assistência Social enquanto política pública, integrante da

seguridade social, de responsabilidade do Estado e direito do cidadão, responde a

demandas históricas de luta de movimentos sociais organizados, setores críticos das

categorias profissionais e dos trabalhadores da política de assistência social.

Historicamente, a Assistência Social foi se maturando do contexto da não-

política, às voltas com o clientelismo, benevolência e primeiro- damismo, ao campo

público da seguridade social e da proteção social pública, de caráter não

contributivo, através da Constituição de 88 e da Loas, como sintetiza Yazbek (apud

COUTO et.al, 2010, p. 33):

[...] campo dos direitos, da universalização dos acessos e da responsabilidade estatal, iniciando um processo que tem como horizonte torna-la visível como política pública e direitos dos que dela necessitarem. Sem dúvida um avanço, ao permitir que a assistência, assim posta transite do assistencialismo clientelista para o campo da Política Social .

A Loas, Lei 8.742/1993, institui a assistência como política pública, não

contributiva, em todo o território nacional:

[...] a assistência social, direito do cidadão e dever do Estado, é Política de Seguridade Social não contributiva, que provê os mínimos sociais, realizada através de um conjunto integrado de ações de iniciativa pública e da sociedade, para garantir o atendimento às necessidades básicas (art. 1o).

A Loas institui o Benefício de Prestação Continuada (BPC), destinado aos

idosos e às pessoas com deficiência, no valor de um salário-mínimo, e, ainda, os

benefícios eventuais. O BPC é implantado com limitações e os benefícios eventuais,

de caráter provisório, em virtude de morte, nascimento, calamidade pública e

vulnerabilidade temporária, até hoje não ganharam a devida concretude.

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Outra questão relevante é o controle social na formulação, gestão e execução

da política de assistência social pela Loas, embora nos anos que a sucederam ela

não ganhe a materialidade necessária.

Surge a primeira Política Nacional da Assistência Social (PNAS), em 1998,

mas que se mostra insuficiente e confrontando o preconizado pela Loas. No governo

FHC, em paralelo, é instituída a Comunidade Solidária21, que, longe de ser política

pública, reitera um processo de refilantropização das políticas sociais.

Num processo acentuado, desde os anos 90, com as políticas sociais

subordinadas à ordem econômica, o desmonte de políticas públicas, a

reestruturação produtiva22, o enxugamento da força de trabalho, a terceirização, a

baixa remuneração e as condições de trabalho precárias, as políticas sociais se

constituem cada vez mais como possibilidade concreta de construção de direitos23.

O aumento da pobreza e da desigualdade e a nova face da questão social no

País, intensifica-se o processo de aviltamento de direitos e privações para a classe

que vive do trabalho e passa a gerar novas demandas e requisições para a política

de assistência social, através de serviços e benefícios:

As necessidades e possibilidades humanas que se colocam para a operação das políticas de assistência social são, sem dúvida, marcadas pelas profundas desigualdades socioeconômicas e políticas agravadas pela miserabilidade. A assistência social como política pública deve ofertar a provisão de necessidades fora do mercado, isto é, sustentadas pelo orçamento público na qualidade de garantia social. Para tanto, aqui se entende a assistência social como: - política de garantias de direitos de prevenção e proteção social através de serviços, benefícios, programas, projetos, monitoramento e trabalhos sociais que: - previnem/reduzem situações de risco social e pessoal; - protegem pessoas e famílias vulneráveis e vitimizadas, independente de idade, sexo, raça, etnia, renda; - criam medidas e possibilidades de ressocialização, reinserção e inclusão social; - monitoram exclusões, vitimizações, vulnerabilidades e riscos sociais da população. (SPOSATI, 2007, p. 450).

Como resposta política à agenda neoliberal e seus desmontes, frente à

retração dos direitos sociais, a nova PNAS entra em cena, fruto de intenso processo

de lutas e debate nacional.

21 Medida Provisória 813, de 1o de janeiro de 1995. 22 Para saber mais, Antunes(2005) 23 YAZBEK. Carmelita. Fundamentos históricos e metodológicos do serviço social. In: Direitos sociais e competências profissionais. Coletânea Cfess.

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A PNAS é aprovada pelo Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS),

em 15 de outubro de 2004, expressando a materialidade das diretrizes da Loas.

Como se vê nos princípios da PNAS:

I – Supremacia do atendimento às necessidades sociais sobre as exigências de rentabilidade econômica; II – Universalização dos direitos sociais, a fim de tornar o destinatário da ação assistencial alcançável pelas demais políticas públicas; III – Respeito à dignidade do cidadão, à sua autonomia e ao seu direito a benefícios e serviços de qualidade, bem como à convivência familiar e comunitária, vedando-se qualquer comprovação vexatória de necessidade; IV – Igualdade de direitos no acesso ao atendimento, sem discriminação de qualquer natureza, garantindo-se equivalência às populações urbanas e rurais; V – divulgação ampla dos benefícios, serviços, programas e projetos assistências, bem como dos recursos oferecidos pelo Poder Público e dos critérios para sua concessão. (MDS, 2004, p.25).

Assim como nas diretrizes:

I –- Descentralização político-administrativa para os Estados, o Distrito Federal e os Municípios e comando único das ações em cada esfera de governo, respeitando-se as diferenças e características socioterritoriais locais; II – Participação da população, por meio de organizações representativas, na formulação das políticas e no controle das ações em todos os níveis; III – Primazia da responsabilidade do Estado na condução da política de assistência social em cada esfera de governo; IV – Centralidade na família para concepção e implementação dos benefícios, serviços, programas e projetos. (MDS, 2004, p. 26).

Um ano após a aprovação da PNAS, a Norma Operacional Básica do Sistema

Único da Assistência Social (NOB/Suas) é aprovada pela Resolução 130, de 15 de

julho de 2005, do mesmo Conselho – para a implementação do Suas, modelo de

organização da Assistência Social determinado pela PNAS, pela primeira vez na

história do País.

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As ações da Política de Assistência Social são organizadas por meio do Suas. O Suas constitui-se na regulação e organização em todo território nacional dos serviços, programas, projetos e benefícios socioassistenciais, de caráter continuado ou eventual, executados e providos por pessoas jurídicas de direito público sob critério universal e lógica de ação em rede hierarquizada e em articulação com iniciativas da sociedade civil. Define e organiza os elementos essenciais e imprescindíveis à execução desta Política, possibilitando a normatização dos padrões nos serviços, qualidade no atendimento aos usuários, indicadores de avaliação e resultado, nomenclatura dos serviços e da rede prestadora de serviços socioassistenciais. Trata-se de um sistema público não contributivo, descentralizado e participativo que tem por função a gestão do conteúdo específico da assistência social no campo da proteção social brasileira. (MDS,PNAS, 2004).

A PNAS e implementação do Suas situam o papel da assistência social

dentro do sistema de proteção social, delimitando sua matéria-prima na ambiência

da vulnerabilidade, dos riscos sociais e das violações, seja pelo ciclo de vida,

fragilização dos vínculos ou pelas circunstâncias da vida, e os caminhos para sua

efetivação como política pública, via de acesso aos diretos sociais:

A polít ica de assistência social assume a cobertura de determinadas necessidades sociais, cumprindo o dever constitucional de compor o sistema público de seguridade social, const ituído para segurança social dos cidadãos, sendo o Estado o provedor de proteções colet ivas e redutor de r iscos. Opera na proteção às vulnerabi l idades próprias do cic lo de vida, proteção às f ragil idades da convivência famil iar, proteção à dignidade humana e combate às suas violações (MUNIZ et al, 2007, p. 38).

Para se constituir efetivamente como direito de cidadania e responsabilidade

do Estado, e garantidores de políticas universalizantes, no campo da seguridade

social, a PNAS e o Suas trazem profundas alterações em seu bojo, no que diz

respeito às matrizes conceituais e à lógica de gestão.

Sob essa perspectiva, a PNAS objetiva:

• prover serviços, programas, projetos e benefícios de proteção social básica e, ou, especial para famílias, indivíduos e grupos que deles necessitar;

• contribuir com a inclusão e a eqüidade dos usuários e grupos específicos, ampliando o acesso aos bens e serviços sócio - assistências básicos e especiais, em áreas urbana e rural;

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• assegurar que as ações no âmbito da assistência social tenham centralidade na família, e que garantam a convivência familiar e comunitária. (MDS/PNAS, 2004, p. 27).

A PNAS materializa o conteúdo da assistência social como política pública,

explicitando seus princípios, diretrizes, objetivos, hierarquizando as proteções,

trazendo conceitos como vigilância social, de defesa de direitos socioassistenciais e

eixos protetivos.

Os eixos protetivos vão demonstrar onde se particulariza a atenção que deve

ser provida pela assistência social, a partir da realidade e necessidade de proteção:

O paradigma de proteção social (básica e especial) rompe com a noção dos cidadãos como massa abstrata e os reconstrói a partir da realidade de suas vidas. Opera a partir de potencialidades, talentos, desejos, capacidades de cada um dos grupos e segmentos sociais. A proteção social da assistência social opera sob três situações: proteção às vulnerabilidades próprias ao ciclo de vida; proteção às fragilidades da convivência familiar; proteção à dignidade humana e combate às suas violações. A proteção social da assistência social tem por primeiro eixo protetivo a proteção ao ciclo da vida do cidadão, isto é, a oferta de apoios às fragilidades dos diversos momentos da vida humana, como também de apoios aos impactos dos eventos humanos que provocam rupturas e vulnerabilidades sociais. A assistência social, ao ter por eixo protetivo as fragilidades e vulnerabilidades etárias próprias ao ciclo da vida, as coloca em diálogo com os direitos de crianças, adolescentes, jovens e idosos. Opera sob as matrizes dos direitos ao desenvolvimento humano e a experiência humana. O segundo eixo protetivo da assistência social decorre do direito à dignidade humana, expresso pela conquista da eqüidade, isto é, o respeito à heterogeneidade e à diferença sem discriminação e apartações. No caso, a ruptura com as discriminações para com mulheres, índios, afrodescendente, entre outros, é central na dinâmica dessa política. (SPOSATI, 2007, p. 450).

O Suas, para operacionalizar a gestão da política, consolidou-se como

proteção social, em dois níveis de atenção: Proteção Social Básica (PSB) e

Proteção Social Especial (PSE). Tais funções guardam estreita conexão e

complementaridade entre si, embora cada uma delas se organize a partir de um

conjunto de ações e serviços.

O Suas, pela primeira vez, hierarquiza as proteções sociais. Deixa de entender assistência social somente como uma área que atua depois de ocorrida uma situação de risco, uma violência. Introduz-se o

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conceito preventivo de um trabalho social nessas áreas, polarizadas pelo Cras por meio de um serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família (Paif). (SPOSATI, 2010, p.7).

A PSB tem caráter preventivo de situações de risco e de processamento de

inclusão social por meio do desenvolvimento de potencialidades e aquisições, e o

fortalecimento de vínculos familiares e comunitários.

Prevê o desenvolvimento de serviços, programas e projetos locais de acolhimento, convivência e socialização de famílias e de indivíduos, conforme identificação da situação de vulnerabilidade apresentada. Deverão incluir as pessoas com deficiência e ser organizados em rede, de modo a inseri-las nas diversas ações ofertadas. Os benefícios, tanto de prestação continuada como os eventuais compõem a proteção social básica, dada a natureza de sua realização. (MDS, 2004).

Os serviços de PSB são realizados sob forma de execução direta, em Centros

de Referência da Assistência Social (Cras), ou de forma indireta, nas entidades e

organizações de Assistência Social, sob a coordenação do órgão gestor.

A PSE volta-se a famílias e indivíduos em situação de risco pessoal ou social,

cujos direitos tenham sido violados ou ameaçados, enfrentando situações de

violência, abuso ou exploração sexual; abandono, rompimento ou fragilização de

vínculos ou afastamento do convívio familiar, entre outras.

Além de privações e diferenciais de acesso a bens e serviços, a pobreza associada à desigualdade social e a perversa concentração de renda, revela-se numa dimensão mais complexa: a exclusão social. O termo exclusão social confunde-se, comumente, como desigualdade, miséria, indigência, pobreza (relativa ou absoluta), apartação social, dentre outras. Naturalmente existem diferenças e semelhanças entre alguns desses conceitos, embora não exista consenso entre os diversos autores que se dedicam ao tema. Entretanto, diferentemente de pobreza, miséria, desigualdade e indigência que são situações, a exclusão social é um processo que pode levar ao acirramento da desigualdade e da pobreza e, enquanto tal, apresenta-se heterogênea no tempo e no espaço. (MDS, PNAS, 2004)

A PNAS reforça que o escopo da violação de direitos é oriundo de um

contexto de privação, já “riscos e vulnerabil idades não decorrem de

responsabil idade individual, mas de um conjunto de desigualdades

estruturais, socioeconômicas e polít icas e da ausência de proteções

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sociais” (CEM, 2004, p.12), que acabam, por vezes, induzindo à violação de

direitos de seus membros, e que passam a requerer uma atenção especializada da

política de assistência social.

Esse novo desenho, que articula níveis de complexidade, com escopo de

atuação especificada pela PNAS, provê um conjunto de seguranças, colocando-se

em campos antagônicos a qualquer prática assistencialista ou de tutela, alçando um

patamar de efetiva proteção aos seus usuários da assistência social :

Estar protegido significa ter forças próprias ou de terceiros, que impeçam que alguma agressão/precarização/privação venha a ocorrer, deteriorando uma dada condição. Porém, estar protegido não é uma condição inata, ela é adquirida não como mera mercadoria, mas pelo desenvolvimento de capacidades e possibilidades. No caso ter proteção e/ou estar protegido não significa meramente portar algo, mas ter uma capacidade de enfrentamento e resistência. Dois campos de forças se apresentam: um é o campo da agressão, precarização, privação e outro é o campo da resistência e do enfrentamento. E a política de assistência social se faz - ou pode se fazer - presente em suas medidas, dispositivos, atividades, serviços, em ambos os campos de ação, sem que com isso, seja a única que penetre tais campos. (SPOSATI, 2007, p.17). 24

2.3 Seguranças Sociais, Direitos Socioassistenciais e Serviços

Socioassistenciais.

“É preciso um conjunto de ações para garantir um conjunto de

seguranças que se contraponha às incertezas sociais.”

(SPOSATI, 2007, p. 453)

Sob a égide da PNAS, para estar protegido, é preciso que se afiancem

seguranças sociais que iram cubrir, reduzir ou prevenir riscos e vulnerabilidade

(SPOSATI apud COUTO, p.43)25 São elas: segurança de acolhida, da segurança do

24Texto apresentado por Sposati na VI Conferência Nacional de Assistência Social: Proteção e Desproteção Social na Perspectiva dos Direitos Socioassistenciais(2007). 25 Utiliza-se aqui o referencial construído no Nepsass/PUC-SP, que inclui segurança na travessia, excluído pela PNAS.

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convívio social, da segurança de autonomia/rendimento, da segurança da equidade

e da segurança da travessia.

A segurança da acolhida vai além da provisão habitacional incluindo a

produção de serviços de recuperação, reabilitação e retorno à normalidade do

habitar... oferta de condições que impeçam as pessoas de não ter referência,

endereço, paradeiro e localização, além, é claro, do próprio abrigo.

A segurança de convivência familiar e societária supõe políticas de incentivo e

de criação de recursos, como centros de convivência onde as pessoas com

situações comuns ou diversificadas possam criar laços, encontrar saídas para sua

situação de vida e resguardo para os riscos que têm pela frente.

A segurança de sobrevivência, como explicitado pela PNAS-2004, supõe a

garantia de renda mínima ou de renda cidadã como política de seguridade social,

A defesa da segurança de equidade para apoio às questões discriminatórias

relacionadas a gênero, raça e etnia.

A segurança de travessia visa destacar com a autonomia um “conjunto de

capacitações básicas para que o cidadão possa ter potencializadas suas

capacidades, seu empowerment para confrontar-se com as exigências que lhe são

feitas na vida em sociedade”. (SPOSATI, 2007, p. 455).

A concretude dessas seguranças sociais e seu processamento dar-se-á

através dos direitos socioassistenciais que conformam benefícios e serviços

compondo as provisões ofertadas pelo Suas, reclamáveis ao Estado.

Utiliza-se como referência a definição que Sertório26 (2010) adota em sua

dissertação de mestrado apresentada a PUC-SP,para direitos socioassistenciais:

[...] é a proteção social afiançada pelo Estado ao indivíduo e sua família em situação de vulnerabilidade e risco social, através da Política Pública de Assistência Social operacionalizada pelo Suas (Sistema Único da Assistência Social), por meio dos serviços socioassistenciais, especialmente os Cras e Creas, com assentamento legal na CF/88 (art.203 e 204) e na Loas.

Os direitos socioassistenciais foram aprovados na V Conferência Nacional de

Assistência Social, realizada em dezembro de 2005:

26 Um estudo sobre a implantação da proteção social especial de média complexidade: contribuição a efetividade do Suas. 2002/2010.Dissertação (Mestrado)- Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP), Campinas/SP, 2010.

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1. Todos os direitos de proteção social de assistência social consagrados em lei para todos: Direito, de todos e todas, a usufruir os direitos assegurados pelo ordenamento jurídico brasileiro à proteção social não contributiva de assistência social efetiva com dignidade e respeito.

2. Direito à eqüidade rural-urbana na proteção social não contributiva: direito, do cidadão e cidadã, ao acesso às proteções básica e especial da política de assistência social, operadas de modo articulado para garantir completude de atenção no meio rural e no urbano.

3. Direito à equidade social e de manifestação pública: direito, do cidadão e da cidadã, de manifestar-se, exercer protagonismo e controle social na política de assistência social, sem sofrer discriminações, restrições ou atitudes vexatórias derivadas do nível pessoal de instrução formal, etnia, raça, cultura, credo, idade, gênero, limitações pessoais.

4. Direito à igualdade, do cidadão e cidadã, de acesso à rede socioassistencial: direito à igualdade e completude de acesso nas atenções da rede socioassistencial, direta e conveniada, sem discriminação ou tutela, com oportunidades para a construção da autonomia pessoal dentro das possibilidades e limites de cada um.

5. Direito do usuário à acessibilidade, qualidade e continuidade: direito, do usuário e usuária, à rede socioassistencial, à escuta, ao acolhimento e de ser protagonista na construção de respostas dignas, claras e elucidativas, ofertadas por serviços de ação continuada, localizados próximos à sua moradia, operados por profissionais qualificados, capacitados e permanentes, em espaços com infra-estrutura adequada e acessibilidade, que garantam atendimento privativo, inclusive para os usuários com deficiência e para os idosos.

6. Direito de ter garantida à convivência familiar, comunitária e social: direito, do usuário e usuária, em todas as etapas do ciclo da vida, a ter valorizada a possibilidade de se manter sob convívio familiar, quer seja na família biológica ou construída, e à precedência do convívio social e comunitário às soluções institucionalizadas.

7. Direito à proteção social por meio da intersetorialidade das políticas públicas: direito, do cidadão e cidadã, à melhor qualidade de vida garantida pela articulação intersetorial da política de assistência social com outras políticas públicas, para que alcancem moradia digna, trabalho, cuidados de saúde, acesso à educação, à cultura, ao

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esporte e lazer, à segurança alimentar, à segurança pública, à preservação do meio ambiente, à infra-estrutura urbana e rural, ao crédito bancário, à documentação civil e ao desenvolvimento sustentável.

8. Direito à renda: direito, do cidadão e cidadã e do povo indígena, à renda individual e familiar, assegurada através de programas e projetos intersetoriais de inclusão produtiva, associativismo e cooperativismo, que assegurem a inserção ou reinserção no mercado de trabalho, no meio rural e urbano.

9. Direito ao co-financiamento da proteção social não contributiva: direito, do usuário e usuária da rede socioassistencial, a ter garantido o co-financiamento estatal, federal, estadual, municipal e do Distrito Federal para operação integral, profissional, contínua e sistêmica da rede sócio-assistencial no meio urbano e rural.

10. Direito ao controle social e defesa dos direitos socioassistenciais: direito, do cidadão e cidadã, a ser informado de forma pública, individual e coletiva, sobre as ofertas da rede socioassistencial, seu modo de gestão e financiamento e sobre os direitos socioassistenciais, os modos e instâncias para defendê-los e exercer o controle social, respeitados os aspectos da individualidade humana, como a intimidade e a privacidade.

A garantia de acesso aos direitos socioassistenciais pode se dar pelos

serviços socioassistenciais, que devem oferecer respostas de responsabilidade do

Estado, por ente público ou privado, através de um conjunto de atividades de caráter

continuado. Não devem ser também confundidos com programas, de caráter

completar, ou projetos, com duração determinada.

O serviço compreende um conjunto de atividades que, por sua vez, se desdobram em atos profissionais - que agregam competências técnicas e especialidades - e que são organizados para atingir um fim. Assim, a atividade é uma unidade menor, mais específica do que o serviço e nele está contida. Os serviços socioassistenciais ofertam apoios, atenções e cuidados que garantem aquisições ao cidadão, não apenas materiais e institucionais como também sociais e socioeducativas. (MUNIZ et al, 2007, p.40).

Os serviços devem oferecer um padrão de atenção e, para tal, em 2009,

foram normatizados pela Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais,

demarcando o campo de atuação da assistência social.

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Essa padronização não se reduz a mera homegeinização, mas diz respeito à

qualidade da oferta dos serviços em todo o território nacional, para transformar um

conjunto disperso de ações em serviços socioassistenciais.

Nesse sentido, é preciso pensar em estratégias de consolidação desses

direitos e sua processualidade. Para Sposati (2009, p. 42)27, “os direitos

socioassistenciais ainda permanecem no campo das ideias, sem uma legislação que

abrigue sua aplicação e a instauração de uma processualidade jurídica quando de

sua infringência”.

Deste modo, os frutos mais recentes da assistência como política pública,

advindos da aprovação da PNAS, em 2004, o Suas, em 2005, a Tipificação

Nacional de Serviços Socioassistenciais em 2009, e a Lei 12.465, em 2011,

trazem em seu bojo grandes desafios para sua processualidade: “[...] os novos

marcos regulatórios da assistência social [...] introduziram significativas inflexões

neste campo, entre elas a exigência de novos modos de organização e gestão do

trabalho [...]”. (COUTO, YAZBEK, SILVA e SILVA e RAICHELIS, 2010, p. 57).

Como se vê, esses desafios dizem respeito a novos conceitos, novas formas

de organização e de arquitetura da política, que subverteram a lógica da filantropia e

da caridade, demandando um processo de ressignificação da assistência social e

das competências perante as novas exigências profissionais dos trabalhadores

nesse campo.

Diante do reconhecimento da extensão dos avanços históricos colocados não

só na PNAS mas nos marcos regulatórios que a sucederam, entende-se que só

saindo do campo de operação para o campo da práxis com direção social da

política de assistência social como direito que ela se efetivará como tal.

No capítulo a seguir, trata-se especificamente de alguns dos desafios

colocados para a PSE.

27 SPOSATI, Aldaíza. Modelo brasileiro de proteção social não contributiva - concepções fundantes.

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CAPÍTULO III – A AMBIÊNCIA DA VIOLAÇÃO DE DIREITOS NA PNAS – PSE

3.1 Caracterização da Proteção Social Especial

Como visto, a PSE volta-se a famílias e indivíduos em situação de risco

pessoal ou social, cujos direitos tenham sido violados ou ameaçados, enfrentando

situações de violência física ou psicológica, abuso ou exploração sexual;

negligência, tráfico de pessoas, abandono, situação de rua, trabalho infantil,

rompimento ou fragilização de vínculos ou afastamento do convívio familiar, entre

outras.

Para a atenção a essas situações, os serviços de PSE são diferenciados

entre média e alta complexidade, sendo que ambos com vistas à violação de

direitos. Contudo, a alta complexidade caracteriza-se pelo atendimento de situações

em que haja o rompimento dos laços familiares e comunitários.

O Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS, 2011)

distingue os níveis de complexidade e detalha a competência de cada um deles:

Diferentemente da Proteção Social Básica que tem um caráter preventivo, a PSE atua com natureza protetiva. São ações que requerem o acompanhamento familiar e individual e maior flexibilidade nas soluções. Comportam encaminhamentos efetivos e monitorados, apoios e processos que assegurem qualidade na atenção...( Disponível em: <www.mds.gov.br>

A PSE de Média Complexidade:

[...] oferta atendimento especializado a famílias e indivíduos que vivenciam situações de vulnerabilidade, com direitos violados, geralmente inseridos no núcleo familiar. A convivência familiar está mantida, embora os vínculos possam estar fragilizados ou até mesmo ameaçados. Estes serviços demandam maior especialização no acompanhamento familiar e maior flexibilidade nas soluções protetivas. Requerem, ainda, intensa articulação em rede para assegurar efetividade no atendimento às demandas da família e sua inserção em uma rede de proteção necessária para a potencialização das possibilidades de superação da situação vivida. (MDS, 2011. Disponível em: <www.mds.gov.br>.

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Para os serviços de PSE de Alta Complexidade,

[...] oferecem atendimento às famílias e indivíduos que se encontram em situação de abandono, ameaça ou violação de direitos, necessitando de acolhimento provisório, fora de seu núcleo familiar de origem. Esses serviços visam a garantir proteção integral a indivíduos ou famílias em situação de risco pessoal e social, com vínculos familiares rompidos ou extremamente fragilizados, por meio de serviços que garantam o acolhimento em ambiente com estrutura física adequada, oferecendo condições de moradia, higiene, salubridade, segurança, acessibilidade e privacidade. Os serviços também devem assegurar o fortalecimento dos vínculos familiares e/ou comunitários e o desenvolvimento da autonomia dos usuários. (MDS, 2011, Disponível em: <www.mds.gov.br>.

A PSE constitui-se de serviços, programas e projetos especializados, nesses

níveis de complexidade, que demandam uma estrutura técnico-operativa e

competências compatíveis com a complexidade da demanda, tanto por parte dos

técnicos quanto dos gestores, para atenção no âmbito do risco e da violação de

direitos:

A Proteção Social Especial (PSE) organiza a oferta de serviços, programas e projetos de caráter especializado, que tem por objetivo contribuir para a reconstrução de vínculos familiares e comunitários, o fortalecimento de potencialidades e aquisições e a proteção de famílias e indivíduos para o enfrentamento das situações de risco pessoal e social, por violação de direitos. Na organização das ações de PSE é preciso entender que o contexto socioeconômico, político, histórico e cultural pode incidir sobre as relações familiares, comunitárias e sociais, gerando conflitos, tensões e rupturas, demandando, assim, trabalho social especializado. (CREAS, 2011, p.18).

Os serviços de PSE devem ser ofertados no Creas:

[...] é a unidade pública estatal que oferta serviços da proteção especial, especializados e continuados, gratuitamente a famílias e indivíduos em situação de ameaça ou violação de direitos. Além da oferta de atenção especializada, o Creas tem o papel de coordenar e fortalecer a articulação dos serviços com a rede de assistência social e as demais políticas públicas. (CREAS, 2011, p.18).

Segundo as orientações técnicas para o Creas:

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Alguns grupos são particularmente vulneráveis à vivência destas situações, tais como crianças, adolescentes, idosos, pessoas com deficiência, populações LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais), mulheres e suas famílias. (MDS, 2011. Disponível em: <www.mds.gov.br>.

No Creas, está previsto, pela Tipificação Nacional dos Serviços

Socioassistenciais (2009), os serviços de proteção especializada aos indivíduos e

famílias (Paefi), de proteção social a adolescentes em cumprimento de medida

socioeducativa de Liberdade Assistida (LA) e de Prestação de Serviços à

Comunidade (PSC), Serviço de Proteção Social Especial para Pessoas com

Deficiência, Idosas e suas Famílias; Serviço Especializado para Pessoas em

Situação de Rua.

O papel do Creas no Suas define suas competências que, de modo geral, compreendem:continuado para famílias e indivíduos em situação de risco pessoal e social, por violação de direitos, conforme dispõe a Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais;coordenação técnica e administrativa da equipe, o planejamento,monitoramento e avaliação das ações, a organização e execução direta do trabalho social no âmbito dos serviços ofertados, o relacionamento cotidiano com a rede e o registro de informações, sem prejuízo das competências do órgão gestor de assistência social em relação à Unidade. (ORIENTAÇÕES TÉCNICAS: CREAS, 2011, p. 23).

Já nos serviços de PSE de Alta Complexidade estão previstos: Serviço de

Acolhimento Institucional nas modalidades abrigo institucional; Casa-Lar; Casa de

Passagem; Residência Inclusiva, Serviço de Acolhimento em República; Serviço de

Acolhimento em Família Acolhedora; Serviço de Proteção em Situações de

Calamidades Públicas e de Emergências.

A Proteção Social Especial de Alta Complexidade, por sua vez, tem como o objetivo ofertar serviços especializados, em diferentes modalidades e equipamentos, com vistas a afiançar segurança de acolhida a indivíduos e/ou famílias afastados temporariamente do núcleo familiar e/ou comunitários de origem. Para a sua oferta, deve-se assegurar proteção integral aos sujeitos atendidos, garantindo atendimento personalizado e em pequenos grupos, com respeito às diversidades (ciclos de vida, arranjos familiares, raça/ etnia, religião, gênero e orientação sexual). Tais serviços devem primar pela preservação, fortalecimento ou resgate da convivência familiar e comunitária - ou construção de novas referências, quando for o caso - adotando, para tanto, metodologias de atendimento e

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acompanhamento condizente com esta finalidade. (CREAS, 2011, p. 21).

Os serviços da PSE de média e de alta complexidade requisitam

especializações, estudos qualificados e acompanhamentos continuados, articulação

da rede, principalmente com o Sistema de Garantia de Direitos (SGD) e, para tal,

conhecimento das leis e normativas que fundamentam não só a política mas o

conjunto de defesas construídos historicamente, diante da complexidade em que as

situações se apresentam.

Alguns eixos são apontados para nortear o trabalho (ORIENTAÇÕES

TÉCNICAS: CREAS, 2011, p.26): “atenção especializada e qualificação do

atendimento; território e localização; acesso a direitos socioassistenciais;

centralidade na família; mobilização e participação social; e trabalho em rede”.

Sobre a necessidade de qualificação no atendimento ressalta aspectos

importantes:

As situações vivenciadas pelas famílias e indivíduos atendidos no CREAS podem ter repercussões diferenciadas, que podem ser agravadas ou não em função de diversos aspectos (contexto de vida, acesso à rede e direitos, ciclo de vida, deficiência, rede social de apoio, gênero, orientação sexual, deficiência, uso, abuso ou dependência de álcool ou outras drogas, condições materiais, etc). Isso implica reconhecer que, diante das situações vivenciadas, cada família/indivíduo atendido no CREAS demandará um conjunto de atenções específicas, de acordo com suas singularidades, o que deverá orientar a construção do Plano de Acompanhamento Individual e/ou Familiar. (ORIENTAÇÕES TÉCNICASCREAS, 2011, p. 26).

Ainda a centralidade da família na PSE como lócus privilegiado de atenção

calcado na matricialidade sociofamiliar “permite compreender a gênese e os

impactos das situações de risco pessoal e social, por violação de direitos, e as

dificuldades de exercício das funções de proteção, cuidado, socialização,

protagonismo e participação” (CREAS, 2011, p.19), No entanto, também vai

requerer olhar despido de preconceitos e provido de capacidade crítica para

entender a heterogeneidade das famílias, como se tratará mais à frente.

Dentro dessa ambiência de risco e violações de direitos da PSE, destacam-se

algumas questões que chamam à reflexão.

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3.2 Alguns Desafios Postos à Proteção Social Especial

Percebe-se que, a partir do redesenho da PNAS, em 2004, em dois níveis de

atenção, PSB e PSE, esta última pouco recebeu de aprofundamento e

sistematização.

Antes de mais nada, para abordar a PSE é preciso assumir como verdade

que “este nível de complexidade carece de atenção e maturação”, como afirma

Couto (2010,p.252).

Os estudos sobre a violação de direitos apresentam-se, em sua quase

totalidade, de forma segmentada em temáticas: violência, população de rua,

adolescente em medidas de abrigamento, entre outras.

Essa segmentação, reflete o que se delineou na história da política de

assistência social, já que a lógica de atendimento das demandas hoje atendidas na

PSE era pautada numa estrutura de programas por segmentos, como, por exemplo,

o Programa de Combate ao Abuso e Exploração Sexual (Sentinela) e Programa de

Erradicação do Trabalho Infantil (Peti), e por entidades privadas.

Nesse sentido, os estudos não demostram acompanhar o mesmo

amadurecimento da política, como nível de proteção social, que aglutina

especificidades, na ambiência da atenção ao risco e da violação de direitos, como é

preconizado pelo Suas.

Não foram localizados espaços de discussão e produção bibliográfica

voltados para a apreensão da função protetiva da PSE e seu papel restaurador em

face da violação de direitos, e ao risco, e suas atribuições de restauração de

vínculos, prevenção dos agravos, defesa de direitos, fortalecimento das

potencialidades e aquisições e proteção a famílias e indivíduos.

Assim como não acessamos problematizações consistentes sobre questões

como: as novas requisições da média e alta complexidade e, com isso, as novas

exigências profissionais, as dificuldades concretas do PSE e o reordenamento

institucional, dos novos serviços socioassistenciais, que constituem a única via de

acesso para os direitos socioassistenciais na PSE, as múltiplas determinações do

Paefi, e a dimensão na política e operativa da PSE na assistência social.

Tampouco sobre a herança de práticas conservadoras de serviços que foram

reordenados na PSE, de práticas ainda carregadas de assistencialismo que não

fizeram o trânsito para a política de assistência colocada hoje.

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Não encontrou-se aporte para as discussões, nesse nível de complexidade,

da articulação em rede e intersetorialidade, principalmente com a PSB, relação

com a Justiça, metodologias de trabalho com famílias na proteção especial e

ocultamento do usuário nesse nível de complexidade.

Essas questões tem nos mobilizado e convocado a uma reflexão, pois tem

sido latentes no cotidiano profissional, principalmente para quem está trabalhando

nesse nível de atenção, no âmbito do Suas, vivenciando os dilemas e desafios da

PSE.

Por outro lado, entende-se que há um tempo histórico para a maturação de

forma que se acumule conhecimento e que se criem referências, já que a PNAS tem

apenas oito anos e, a tipificação, quatro anos.

No entanto, é importante que se caracterize a PSE, decodificando quais as

seguranças sociais que devem ser afiançadas, estabelecendo mediações para

apreender qual a especificidade de sua função protetiva.

Ou seja, que conjunto de seguranças sociais, dentre as existentes como

segurança de acolhida, da segurança do convívio social, da segurança de

autonomia/rendimento, da segurança da equidade e da segurança da travessia,

devem ser dispostas para o significado de “estar protegido”, no enfrentamento ao

risco e à violação de direitos na PSE.

Concomitante a isso, o que se chama aqui de dilemas e desafios da PSE

deve ser problematizado e as questões que vêm demandado um aprofundamento na

PSE devem ser enfrentadas.

A ausência dessas mediações no cotidiano profissional tem gerado

insegurança ao trabalhadores e, muitas vezes, impedido que os serviços ganhem a

concretude necessária para atender à violação de direitos na política, dentro de um

padrão de qualidade e de diretrizes comuns, embora as bases estejam colocadas

na PNAS e na tipificação para tal.

Assim, será possível minimizar as inquietudes dos sujeitos com o “novo” da

política de assistência e garantir a incorporação dos novos preceitos e melhorar a

atenção prestada a questões tão complexas postas no cotidiano da PSE.

Uma das questões que merece destaque são os serviços, que se

constituem como a única via de acesso para os Direitos Socioassistenciais na

PSE.

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Nesse nível de proteção, não há remuneração e nem condicionalidades, já

que os benefícios que exigem o corte de renda estão na PSB.

A PSE é constituída por serviços, o que a particulariza. Assim, a discussão da

PSE passa necessariamente pelos Serviços Socioassistenciais.

Entende-se que é pelos serviços que a assistência social pode operar a sua

universalização a todos que apresentam necessidades, pois independe do corte de

renda.

No entanto, percebe-se que os serviços ainda não ganharam a importância e

visibilidade necessárias em relação aos benefícios, em face da sua representação

na política de assistência social. “A proteção social não é obtida apenas da

substituição da renda. Ela exige cuidados, restaurações e aquisições pessoais.

Esses acessos só ocorrem por meio dos serviços.” (SPOSATI, 2009, p.10 ).28

Os serviços são lócus para a garantia de direitos, na política de assistência

social, aqui tratados na sua relação com os benefícios, pelo que representam dentro

da política de assistência social e na sua importância para o usuário da política.

Parte-se da hipótese de que o motivo pelo qual a abordagem marginal dos

serviços em relação aos benefícios é porque eram, em sua maioria, até serem

tipificados, prestados por entidades não governamentais.

A conjuntura política e a necessidade histórica clamavam pelo fortalecimento

da dimensão pública estatal, e os serviços anteriormente não eram assumidos

como dever do Estado.

A partir da violação dos direitos, e do lócus que se estabelece a concretude de

sua atenção, pode-se entender que se lê a política de assistência social de forma

reducionista, quando se olha para todo um sistema somente através dos benefícios

e não dos serviços.

A violação de direitos acentua-se numa condição de desigualdade

socioeconômica mas não é só pelas privações socioeconômicas, que ela se define,

mas também por circunstâncias relacionais.

Ou seja, a violação de direitos, embora acirrada pelo recorte de classes, não

precede dele, mostrando com mais precisão que o pobre e a pobreza não definem a

política de assistência social, mais uma vez os reportando à especificidade da

assistência social.

28 Texto-base originalmente publicado na Revista Le Monde Diplomatique, janeiro de 2009. (Disponível em: <http://www.polis.org.br/utilitarios/editor2.0/UserFiles/File/12-13.aldaiza.pdf>.

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Efetivamente, o poder público tem sido reconhecido na assistência como

operador de benefícios. Isso posto, os benefícios vêm tomando uma dimensão

maior que o serviço, na compreensão do que é assistência social.

Como a PSE caracteriza-se pelos serviços, esse cenário demonstra, mais

uma vez, sua face inexplorada.

Em relação aos benefícios, críticas os consideram residuais, compensatórios.

Outro campo de análise redistributivo e necessário ao sistema de proteção social,

onde nos localizamos. Entende-se que os benefícios compõem com os serviços um

conjunto de provisões, no campo da política de assistência social.

Não se apreende os benefícios de nenhuma maneira como compensatórios

e/ou conservadores. Quando se depara com tais análises, tem-se a clareza de que

cabe à distribuição de renda superar as desigualdades socioeconômicas, e não aos

benefícios, e o erro histórico de apreensão e desqualificação do direito à assistência

social enquanto política pública.

Contudo, os benefícios não serão objeto de nosso estudo, mas vale demarcar

posição, principalmente para aqueles que tratam a política de assistência social

como secundária:

Analistas progressistas reagem negativamente a esse alargamento da proteção social taxando-o de assistencialista, sem esclarecer se tal adjetivo advém da sua vinculação com a assistência social ou pelo fato de seu acesso não ser de caráter securitário, embora indiretamente contributivo. Alguns afirmam que se trata de medida neoliberal difundida pelo Banco Mundial para fortalecer a alternativa da previdência privada. Pelo regime de capitalização individual, caberia ao Estado apenas os benefícios assistenciais voltados “aos mais pobres”. A presença de benefícios socioassistenciais pautados na proteção da cidadania, mesmo ao lado da previdência pública brasileira, seria, para esses “progressistas”, uma manifestação neoliberal de “assistencialização” da previdência social. Por esse modo restrito de entender a complexa realidade brasileira, termina por defender a máxima da formiga29. A consolidação e, consequente expansão, da política de assistência social seria uma ameaça à previdência social. (SPOSATI, 2009, p.10-11).

29 Definições do texto original publicado no Le Monde Diplomatique: “Vence a máxima da “formiga”. O trabalho com “carteira assinada” e contributivo não só é vencedor, mas é aniquilador das condições de vida da “cigarra”. A informalidade de seu trabalho, embora tivesse alegrado o ambiente com música e canto, foi considerada como “inútil” à produção de commodities. Que morra de frio ou de fome!” ( SPOSATI, 2009, p.3).

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Isso posto, não se pode deixar de apontar a contradição de compreender a

assistência social como mera expressão do conservadorismo e da manutenção de

exploração do capital, já que se propõe a proteger os cidadãos, independentemente

de sua contribuição, como preconiza o modelo bismarkiano, e não somente para

os inseridos no mercado formal - as ditas formigas.

Ainda, os rearranjos do capital recente vêm impactando sobremaneira a

classe que vive do trabalho30 e as seguranças sociais afiançadas pela assistência

social, seja pelos benefícios, ou serviços, têm provido acessos indispensáveis à

dignidade humana.

Outra questão refere-se ao lugar onde se afiançariam as seguranças sociais

necessárias a quem tem direitos violados, quando não se considera a dimensão dos

serviços?

Esse reducionismo analítico, além de desqualificar a política, pela visão

genérica de assistência através dos benefícios, vem demonstrando a dimensão que

secundariza os serviços, mesmo que sejam a grande massa de trabalho da

assistência social, onde se materializa o direito, numa perspectiva universalizante.

É nesse lócus que a assistência social explicita sua heterogeneidade, pois a

aplicabilidade dos benefícios é homogênea; é nos serviços que a assistência se

diferencia se especifica, se regionaliza e se universaliza.

Nesse sentido, é necessário trazer os holofotes para os serviços

socioassistenciais, ampliar a discussão sobre sua importância e efetiva implantação,

dirimindo e potencializando sua capacidade operativa e protetiva, sempre em face

da desproteção do estado e da violação de direitos.

Outro tema que vem chamando nossa atenção é o ocultamento do usuário

da proteção especial.

Embora seja na PSE que, de forma mais contundente, a assistência social

tem a capacidade reveladora de colocar luz em ângulos esquecidos ou que ninguém

quer ver – como da violência intrafamiliar; do abuso sexual a crianças e

adolescentes; dos idosos negligenciados por suas famílias; de crianças trabalhando

arduamente para prover sustentos; de meninos que cometem pequenos furtos; de

gente vivendo na rua, comendo lixo e sendo tratadas como tal; da intolerância por

30 Adotaremos como referencial a definição de classe-que-vive-do-trabalho trabalhada por Antunes no conjunto de sua obra, que compreende “totalidade dos assalariados, homens e mulheres que vivem da venda de sua força de trabalho e que são despossuídos dos meios de produção”.

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causa de raça ou orientação sexual; a assistência social não tem revelado quem são

esses sujeitos de direitos.

Por motivos diversos, esses sujeitos não têm se revelado: o fato é que o

usuário da especial nos parece o maior ausente do processo de construção da

política, o que certamente despolitiza a discussão da política e de seus paradigmas.

Já que essa é uma perspectiva que foi reforçada na construção da PNAS e

vem sendo valorizada e emerge de estratégias para o fortalecimento e protagonismo

dos usuários e, concomitantemente, para o controle social do poder público.

Não é de hoje a escassa presença dos usuários na política de assistência

social e a equivocada compreensão do que lhes é de direito, este parece ser um

grande desafio a ser enfrentado na consolidação do Suas.

Outra questão que trabalhamos como hipótese é o constrangimento que

permeia a violação de direito por parte do usuário. Muitas vezes, esse usuário não

quer se expor, por receio da sua condição individual. Cabe um trabalho social

consistente, reforçando o papel do usuário como sujeito coletivo31, incentivando a

participação social.

E nos remete a uma questão importante, sobre qual é o trabalho

desenvolvido na PSE em relação à participação e protagonismo dos usuários e

questionamos se esta dimensão foi incorporada no cotidiano profissional, uma vez

que o controle social constitui-se não só numa prerrogativa do Suas como num

importante instrumento para o conhecimento e a defesa coletiva de direitos e, por

conseguinte, para o exercício do protagonismo dos usuários

Como é destacado nas orientações técnicas do Creas (2011, p.36), existem

algumas possibilidades de “participarem e/ou organizarem associações, movimentos

sociais e populares, comissões locais; de participação nas instâncias de controle

social, como conselhos de direito e de políticas públicas, que são importantes

espaços de decisão e deliberação”.

Além desses, os espaços de conferências, fóruns, audiências públicas e

composição de mecanismos de vigilância social.

É preciso, ainda, que se centrem esforços na implantação das ouvidorias

públicas, o que não vem ocorrendo, como um espaço valioso de interlocução com o

31 MARTINELLI, Maria Lúcia. O serviço social e a consolidação de direitos: desafios contemporâneos. p.3.

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usuário do serviço para abarcar a voz e a vez desse usuário e que ele possa

reivindicar o direito à assistência social.

Outro aspecto importante, é romper com a prática de se “falar pelo usuário”,

tão comumente encontrada em alguns conselhos de direitos, reforçando o papel de

subalternidade dos usuários.

Ainda como temos como perspectiva romper com a velha assistência social,

ficar atento às novas formas de coronelismo e clientelismo que estão postas nos

dias atuais, combatendo práticas nas quais os usuários são feitos de fantoches de

currais eleitorais, passando ao largo da representatividade da população prevista no

Suas.

É necessário que se criem estratégias para envolver o usuário da PSE como

sujeitos políticos, assim como para aferir a qualidade dos serviços e refletir sobre

como a assistência social se configura para o usuário. “É no âmbito destas práticas

de resistência e luta que se instituem os sujeitos políticos capazes de expressarem

suas demandas e colocá-las na pauta dos debates contemporâneos.” (MARTINELLI

apud EGLI et al, 2007, p.37 ).

Outro desafio identificado na arquitetura de um sistema único que deve

funcionar integrado para garantir a proteção aos seus usuários, é a necessidade de

articulação em rede e a intersetorialidade, sobretudo nos serviços ofertados pela

PSE.

Diante da complexidade das situações postas à PSE, práticas que

obstaculizam a integralidade podem impedir que sejam afiançadas as seguranças

sociais necessárias nos casos de violação de direitos por ocorrência do risco.

Na PSE, essa articulação em rede deve se dar em diversas esferas. Citam-

se, aqui, somente alguns exemplos, para ilustrar onde ela impera necessariamente:

Em algumas situações atendidas pelo Paefi/Média Complexidade e no

acolhimento institucional de criança e adolescente/Alta Complexidade com SGD, nas

situações de violência sexual/Paefi/Média Complexidade com a política de saúde,

no serviço de proteção social a adolescentes em cumprimento de MSC/LA com

programas e projetos de preparação para o trabalho e inclusão produtiva e acesso à

educação, nas Instituições de Longa Permanência de idosos/Alta Complexidade

com a política de saúde.

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Nesse sentido, práticas fragmentadas, desarticuladas e descontínuas são

antagônicas à possibilidade de superação da violação e seus agravos e de proteção

integral.

[...] o trabalho em rede pode ser compreendido como: um processo que cria e mantém conexões entre diferentes organizações, a partir da compreensão do seu funcionamento, dinâmicas e papel desempenhado, de modo a coordenar interesses distintos e fortalecer os comuns. (MDS, 2009, p.21).

Nesse âmbito, destaca-se o distanciamento que vem ocorrendo entre a PSB e

a PSE, que muitas vezes se consolidam como práticas estanques e dissociadas de

trabalho.

[...] a instalação dos Cras e Creas é estratégica para organizar e qualificar a rede socioassistencial e potencializar os seus resultados. Nesse processo a construção de fluxos e conexões e apontada como requisitivo e como tarefa a ser desenvolvida com prioridade, de forma a construir competência e mobilidade dos usuários no sistema , sem promover encaminhamentos e esforços desnecessários de baixa resolutividade e com grande desgaste para os mesmos. (COUTO et al, 2010, p.187).

A política aponta para a integralidade entre as proteções, assim como as

orientações técnicas, aos serviços para esses níveis de complexidade, que

reforçam a necessidade de articulação para a proteção integral. A tipificação dos

serviços socioassistenciais inclusive padroniza essa necessidade de articulação:

[...] sinaliza a completude da atenção hierarquizada em serviços de vigilância social, defesa de direitos e proteção básica e especial da assistência e dos serviços de outras políticas públicas e de organizações privadas.Indica a conexão de cada serviço com outros serviços, programa, projetos e organizações do Poder Executivo e Judiciário e organizações não governamentais. (MDS,TNSS,2009)_

Muitas vezes, o que vem se estabelecendo são estruturas setorizadas, de

caráter isolado, em que a tônica da discussão de rede é apenas em qual serviço a

família deve ser referenciada, se é Cras ou Creas, se é risco ou não, como se não

houvesse a premissa na assistência de um trabalho articulado com vistas à proteção

integral.

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Por outro lado, trabalha-se com a hipótese de que um dos motivos que

restringe a discussão ao lócus de atendimento são as próprias estruturas deficitárias

dos serviços, em seus quadros mínimos, e falta de capacitação dos gestores e das

equipes, que acabam propiciando uma perversa disputa às avessas por “menos

trabalho”, onde a atenção ao usuário fica em segundo plano.

Como sistema único, aponta-se a necessidade de aprofundar o diálogo entre

os níveis de complexidade para estabelecimento de articulação, fluxo, contrafluxo,

reciprocidade entre básica e especial.

Outra possibilidade, é reforçar a articulação em rede pelos Planos Individuais

de Atendimento (PIAS) e Planos de Atendimento Familiar (PAFs), importantes

ferramentas que vêm sendo utilizadas hoje para a construção da proposta de

atendimento com o usuário, e que também pode ser utilizada para direcionar e

pactuar objetivos comuns entre a rede.

Uma questão é se as famílias que são atendidas pelo Creas, e estão em

busca de um serviço especializado, não deveriam estar todas referenciadas no Cras,

para compor um atendimento integral.

Entende-se que a complexidade do fenômeno da violação de direitos, por si

só, já evidencia a importância do desenvolvimento de ações conjuntas, fundadas na

intersetorialidade, pela articulação de saberes técnicos, da integração de agendas

coletivas e de compartilhar objetivos comuns, enfrentando os desafios para superar

a fragmentação, e a articulação das políticas públicas e de definição de fluxos e

papéis.

Outro aspecto, é a importância de “assumir coletivamente os riscos” para

consolidar a assistência social como política pública não só da porta para fora mas

entre os seus níveis hierárquicos de proteção.

Para enfrentar problemas tão complexos, na PSE, parece valer a máxima de

Simone de Beauvoir “Não há nada em meu caminho que não passe pelo caminho do

outro”.

Trabalhar na PSE pressupõe a dimensão e o conceito de multidisciplinar e de

intersetorialidade. Contudo, é necessário ter clareza do trabalho essencial para não

virar um balcão de encaminhamentos.

Sposati (2009, p. 37) nos chama a atenção para a intersetorialidade:

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A intersetorialidade é tão substantiva para a assistência social como o é para as demais políticas ao se considerar que nenhuma delas guarda resolutividade plena em si mesma. Deve ser construída uma relação de complementariedade entre as políticas. O modelo de intersetorialidade de resposta é indicado como de melhor efetividade para qualquer política social. A caracterização de setorialidade da assistência social não é nem a negação da intersetorialidade nem a onipotência da assistência social. Aliás, a versão da onipotência tende a ser segregadora. Existem aquelas que consideram que cabe à assistência social resolver toda e qualquer necessidade dos pobres ou dos mais pobres. A intersetorialidade é para além de um princípio um modelo de gestão que supõe o entendimento do princípio da convergência da ação.32

No caso de situações tão complexas, como postas no cotidiano da PSE,

agregar políticas públicas em torno de um objetivo comum deve prevalecer na

atenção ao risco e à violação de direitos pela própria incompletude institucional,

pois, como refere Sposati (2009, p.37 ), a “onipotência tende a ser segregadora”.

Constitui-se numa das articulações mais importantes na ambiência do risco e

da violação de direitos: a articulação com o SGD.

É na Proteção Especial que se dá a construção do campo jurídico social na

assistência social, uma vez que os serviços da PSE devem funcionar em estreita

articulação com o Poder Judiciário, Ministério Público, a Defensoria Pública, os

Conselhos Tutelares e outras Organizações de Defesa de Direitos, com os demais

serviços socioassistenciais e demais políticas públicas, no intuito de estruturar uma

rede efetiva de proteção social.

A estreita relação da PSE com o campo jurídico materializa-se nas Medidas

Socioeducativas de Liberdade Assistida (LA) e de Prestação de Serviços à

Comunidade (PSC); Audiências Concentradas, Acolhimento Institucional, Famílias

Acolhedoras e Famílias Guardiãs, no ciclo da violência, nos conflitos com a polícia,

com a justiça e com a família, entre outros.

Aqui se apresenta um papel de extrema importância da PSE na política de

assistência social, que é convocada a se pronunciar sobre as situações que tem

interface com o SGD, constituindo-se em mediação privilegiada na garantia de

direitos sociais.

Muitas vezes, cabe, aos serviços da PSE, o encaminhamento, ao SGD, de

relatórios sobre o atendimento e acompanhamento às famílias e aos indivíduos.

Baseados nessas comunicações e estudos, decisões judiciais são tomadas em 32 Modelo Brasileiro de Proteção Social – Concepções Fundantes.

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direção da garantia de direitos, ou não, demonstrando a amplitude do papel do

Creas na rede socioassistencial.

Nesse sentido, é importante observar a sua função protetiva que não pode ser

confundida com a de órgãos do sistema de defesa e responsabilização, a exemplo

de delegacias e órgãos do Poder Judiciário.

Chama-se a atenção para a importância do Creas no SGD como serviço

decisivo na garantia dos direitos das famílias que atende, tendo a possibilidade de

vigiar e defender e não de vigiar e punir.

Enfatiza-se ainda a função social da Justiça que, em algumas de suas

deliberações neste campo, vai na contramão de direitos sociais e dos marcos

regulatórios da Assistência Social, sendo forte a presença do conservadorismo em

alguns desses atores do SGD. Destaca-se, por exemplo, o Poder Judiciário.

Diante de tal responsabilidade, percebe-se que o profissional deve ter um

perfil qualificado, dos pontos de vista técnico-operativo, ético-político, teórico-

metodológico, que não se acovarde diante da pressão das togas e consiga criar

estratégias para garantir seus posicionamentos como possibilidade concreta de

viabilizar direitos.

A judicialização da questão social, que media a violação de direitos, pela mão

repressora, no Estado, tem sido uma realidade frequente vivenciada pelos

profissionais da PSE.

Em algumas circunstâncias, percebe-se que há uma revitimização das

famílias e indivíduos. Um exemplo é na alta complexidade, explicitados nos

processos de audiência concentrada, que em vez de garantir a capacidade protetiva

do Estado, manifestam uma visão tradicional de família, reproduzindo o discurso das

famílias desestruturadas, tratando as questões como morais e lançando mão de

decisões punitivas.

Além de vista a olhos nus, no Judiciário, em algumas situações, depara-se

com a conivência de alguns profissionais, que deveriam estar a serviço da proteção.

Embrenhar-se nessas questões parece-nos relevante, para afastar de vez as

armadilhas de uma perspectiva moralizante, psicologizante, culpabilizando o

indivíduo e responsabilizando as famílias, resignada ao tradicionalismo covarde de

práticas conservadoras.

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Outro desafio posto no cotidiano que tem nos convocado à reflexão, são as

questões que emergem da processualidade do Paefi como serviço

socioassistencial, em sua padronização e na conformação dos segmentos.

Todo Creas deve, obrigatoriamente, ofertar o Paefi, que foi tipificado como:

Serviço de apoio, orientação e acompanhamento a famílias com um ou mais de seus membros em situação de ameaça ou violação de direitos. Compreende atenções e orientações direcionadas para a promoção de direitos, a preservação e o fortalecimento de vínculos familiares, comunitários e sociais e para o fortalecimento da função protetiva das famílias diante do conjunto de condições que as vulnerabilizam e/ou as submetem a situações de risco pessoal e social. O atendimento fundamenta-se no respeito à heterogeneidade, potencialidades, valores, crenças e identidades das famílias. O serviço articula-se com as atividades e atenções prestadas às famílias nos demais serviços socioassistenciais, nas diversas políticas públicas e com os demais órgãos do Sistema de Garantia de Direitos. Deve garantir atendimento imediato e providências necessárias para a inclusão da família e seus membros em serviços socioassistenciais e/ou em programas de transferência de renda, de forma a qualificar a intervenção e restaurar o direito. (MDS. TIPIFICAÇÃO NACIONAL DOS SERVIÇOS SOCIOASSISTENCIAS, 2009).

O Paefi é o serviço do Creas que provê a atenção especializada em

situações de: Violência física, psicológica e negligência; Violência sexual: abuso

e/ou exploração sexual; Afastamento do convívio familiar devido à aplicação de

medida socioeducativa ou medida de proteção; Tráfico de pessoas; Situação de rua

e mendicância; Abandono; Vivência de trabalho infantil; Discriminação em

decorrência da orientação sexual e/ou raça/etnia; Outras formas de violação de

direitos decorrentes de discriminações/submissões a situações que provocam danos

e agravos a sua condição de vida e os impedem de usufruir autonomia e bem-estar;

Descumprimento de condicionalidades do PBF e do Peti em decorrência de violação

de direitos.

Antes de ações dispersas serem organizadas sob a configuração do Paefi, a

lógica do atendimento era pautada em programas específicos, por segmentos,

como, por exemplo, o Sentinela e o Peti, e por entidades privadas.

As práticas eram dispersas por ocorrência da violação ou pela faixa etária.

Com a tipificação conformando essas práticas no Paefi, o serviço passa a ser

padronizado para todos os indivíduos e famílias que vivenciam a ocorrência da

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violação de direitos, desvinculando da caracterização de programa por segmento,

superando o trabalho setorizado e fragmentado.

Essa lógica reforça a centralidade na família, na política, a partir da

matricialidade familiar como eixo estruturante do Suas.

Essa centralidade presente no Suas, traz em sua base, a concepção de que todas as outras necessidades e públicos da assistência social estão, de alguma maneira, vinculados à família, quer seja no momento de utilização dos programas, projetos e serviços da Assistência, quer seja, no início do ciclo que gera a necessidade do indivíduo vir a ser alvo da atenção da política. A família é o núcleo social básico de acolhida, convívio, autonomia, sustentabilidade e protagonismo social. (NOB/05, p. 17).

A família no centro da política reporta à atuação integral e não fragmentada,

visto que os processos de exclusão social e vulnerabilidade aos quais os usuários

dos programas, projetos e serviços da assistência social são submetidos, atingem

não só o indivíduo, mas toda a família.

Para isso, a PNAS propõe assumir a família na condição de sujeito de

direitos, como espaço contraditório, de diversas configurações e demandatária de

proteção social.

A operacionalização das mudanças reforça a necessidade de um

aprofundamento da discussão do impacto das leituras da matricialidade

sociofamiliar, como a possibilidade de um retorno de práticas conservadoras, com o

foco na família, no centro do reordenamento e das polêmicas. O tema merece ser

aprofundado, subsidiando críticas mais consistentes e esclarecendo que a

matricialidade famil iar não se reduz a uma perpectiva famili lsta.

Nesse caso, é necessário discutir profundamente que a responsabilidade com

o risco das famílias é estreito com o risco de responsabilização das famílias.

Com isso, estão colocados alguns desafios. Um deles diz respeito aos

serviços que anteriormente atendiam à violação de direitos de segmentos, como, por

exemplo, os Centros de Referência (de Idosos, Mulheres, LGBT, entre outros).

Alguns municípios encontraram a solução adequando-se a Creas temáticos,

outros mantiveram seus Centros de Referências e, ainda, há municípios que

incorporam serviços que atendiam demandas específicas ao Creas. O fato é que

essa discussão ainda não está esgotada e merece atenção nesse processo de

reordenamento.

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Sem contar a polêmica com os Centros de Referência que atendem violência

contra a mulher, e negam as diretrizes na assistência, assumindo como norte as

diretrizes da Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM) que não convergem

com as da política de Assistência Social pois são focalizadas somente nas

necessidades das mulheres, movimento este que merece estudo específico.

No que diz respeito ao reordenamento, está posto outro desafio, que é como

não desconsiderar as boas experiências no processo de adequação, respeitando os

processos históricos e as conquistas de movimentos sociais organizados, na

conjuntura em que os serviços foram implantados, anteriormente às normatizações

da assistência social.

É salutar que se explicitem os conflitos entre os conteúdos propostos pela

política e o que foi constituído pelos segmentos. Ressalta-se aqui a experiência dos

municípios do Grande ABC, que, através do Consórcio do Grande ABC,

organizaram-se reuniões periódicas entre o Grupo de Trabalho (GT) de Gênero e

do GT de Assistência Social, para discutir o atendimento à violência contra a mulher,

quando foram debatidas as divergências, de forma propositiva, para a

operacionalização do serviço.

Contudo, para nós, a questão central da processualidade do Paefi é como

garantir a atenção qualificada às demandas específicas, hoje reordenadas no Paefi

(como violação de direitos da mulher, do idoso, LGBT), reconhecendo suas

necessidades, fruto das diferenças, integrando-as às diretrizes do Paefi e a

centralidade da família na política?

Sobre essa questão, é possível refletir sobre múltiplas determinações: É

interessante pensar se a ruptura com o modelo anterior ao Suas foi radical: em que

medida o reordenamento do Paefi homogeneiza, se torna funcional e se moderniza

e dá a forma ilusória de que se está criando o novo?

Por outro lado, na prática, em muitos municípios continuam se reproduzindo

modelos segmentados. Assim, perguntamo-nos se a fragmentação contribui com o

avanço neoliberal, encontrando espaço em suas capilaridades.

Iamamoto (2009, p. 22-23) sinaliza:

Verifica-se a tendência de fragmentar os usuários dessas políticas segundo características de geração – jovens, idosos, crianças e adolescentes -,de gênero e étnico-culturais - mulheres, negros e índios -, abordados de forma transclassista e em sua distribuição

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territorial, o que ocorre em detrimento de sua condição comum de classe. Essas dimensões multiculturais e multiétnicas fundam efetivamente as assimetrias nas relações sociais, que potencializam as desigualdades de classes, necessitando ser consideradas como componente da política de transformação das classes trabalhadoras em sujeitos coletivos Mas a fragmentação do sujeito, descoladas de sua base comum, pode ser incorporada no âmbito do Serviço Social de forma acrítica em decorrência direta das classificações efetuadas pelas políticas publicas. É nesse contexto que a família passa a ocupar o lugar central na política social governamental, tida como célula básica da sociedade, mediando a velha relação entre “homem e meio”, típica das formulações profissionais ultra conservadoras.

Sobre estas supostas segmentação e homogenização, é importante destacar

que qualquer nova diretriz exige de nós uma reflexão e, assim, decodificar qual

forma reitera uma abordagem segmentada e o que demanda de fato uma

segmentação.

Em outras palavras, fugimos de um modelo homogeneizador, funcionalista,

que encaixa e ajusta, nesse processo de reorganização, se privilegiarmos uma visão

dialética calcada na realidade e enfrentando as contradições.

Entendemos que se pode garantir os serviços especializados para cada

segmento desde que articulados sob as diretrizes do Paefi e da política de

assistência social.

Não é propriamente no lócus, que se vai garantir, ou não, os objetivos da

política. E, sim, a direção social que se imprime ao reordenamento das ações

preexistentes ao cotidiano do serviço.

O importante é reconfigurar as práticas em serviços socioassistenciais e que

elas sejam encorpadas para atender às necessidades sociais, afiançando as

seguranças sociais, garantindo padrões de qualidade e uma identidade aos

serviços, tendo o Estado como responsável pela política.

Isso seria garantir a padronização dos serviços e o direito à diferença,

reconhecendo a diversidade e a equidade, sem negar as necessidades diferentes

oriundas das especificidades.

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CAPÍTULO IV – DILEMAS E DESAFIOS DA PROTEÇÃO SOCIAL ESPECIAL:

APROXIMAÇÃO EMPÍRICA AOS SUJEITOS DE PESQUISA

4.1 Pesquisa de Campo

A reflexão e análise, neste capítulo, tem como base a aproximação empírica

com os sujeitos de pesquisa. Buscou-se entrevistar os sujeitos com a aplicação de

questionário com múltipla escolha, com vistas à coleta de elementos e informações

a partir de caracterização valorativa já formatada previamente.

O roteiro foi aplicado pessoalmente ou por e-mail, de acordo com a

conveniência dos sujeitos de pesquisa.

Realizar essa aproximação empírica teve como objetivo captar a percepção

do sujeito pois “é no cotidiano que as determinações conjunturais se expressam e se

coloca o desafio de garantir o sentido e a intencionalidade da ação profissional

(MARTINELLI, 2009, p. 152).

A aproximação empírica envolveu 12 profissionais técnicos e coordenadores

do Creas, do Centro de Referência da Mulher Casa Beth Lobo e do Creas POP

(Tab. 3). Os sujeitos da pesquisa concordaram previamente com a divulgação de

seus nomes e foram escolhidos conforme os seguintes critérios:

1. Abarcar técnicos de todas as áreas (assistentes sociais, psicólogos e

educadores), de todos os serviços vinculados à Proteção Social Especial de

Média Complexidade e de Alta Complexidade;

2. Profissionais com funções diversificadas em atividade na PSE.

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Tabela 3 – Nome do funcionário e local de trabalho

Nome Setor de Trabalho/Segmento em que Atua

Maria Helena da Silva de Lima Abordagem Social

Valkíria Martins de Oliveira Idoso e Deficiente

Edina Aparecida Mendes Peti

Janaína Braga Domingues Corrêa Fecher Abordagem Social

Ivone Aparecida de Freitas Caetano Alta Complexidade

Tânia Machado Aires MSC

Janaína Leslao Garcia

Centro de Referência da Mulher em Situação de

Violência

Renata Palombo Paefi

Maria de Lourdes Merenda Peti

Eloísa Gabriel dos Santos Creas POP

Maria Cristina de Oliveira Idoso e Deficiente

Sueli Luzo Costa Garcia Creas POP

Quanto às funções, foram entrevistados assistentes sociais (58%),

educadores (25%), psicólogos (8%), e coordenadores (8%) (Tab. 4 e Gráfico 2).

Tabela 4 - Funções dos sujeitos de pesquisa

3. Função (assinale apenas uma alternativa) ABS %

Assistente social 7 58%

Psicólogo 1 8%

Educador 3 25%

Coordenação 1 8%

Outros 0%

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Gráfico 2 - Funções dos sujeitos de pesquisa

Após a aplicação dos questionários, as respostas foram sistematizadas.

Posteriormente, lançadas em planilhas, transformadas em tabelas, tendo em vista

a construção da análise. Os dados coletados foram organizados e tabulados,

possibilitando a análise das considerações dos sujeitos e realizada a construção

dos eixos analíticos básicos que foram:

1. As exigências de pensar o novo na PSE: novas formas de atenção e

novas exigências profissionais;

2. As expressões de ideias conservadoras na atuação dos profissionais

da PSE;

3. A tipificação como caminho concreto para avançar na política.

Outra técnica que foi utilizada é a da observação participante, tanto no

espaço institucional quanto no acadêmico, com registros feitos de forma sistemática

em caderno de campo.

A receptividade dos sujeitos da pesquisa com a pesquisadora se deu de

forma acolhedora. As pesquisas foram realizadas entre setembro e outubro de

2012.

Os sujeitos de pesquisa responderam sobre o tempo de trabalho na

Assistência Social, pois se considera dado relevante para contextualizar a

experiência na PAS na análise da apropriação dos conteúdos da assistência social

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e do conjunto de defesas que aporta o trabalho. Por se tratar de um nível de

complexidade que requer certo grau de especialização, essa também nos pareceu

questão importante.

Em relação às exigências de pensar o novo pelas novas formas de ofertar a

assistência social e as novas exigências profissionais, as questões formuladas

abrangem a percepção sobre a própria qualificação relacionada às demandas, a

capacidade de caracterizar a violação de direitos e o conhecimento sobre o conjunto

de defesas.

Em relação à questão sobre as expressões do pensamento conservador na

atuação dos profissionais da PSE, esta deveria ser respondida em relação ao

próprio respondente e aos outros profissionais, sendo ela a única de múltipla

escolha.

Para a pesquisa a respeito das expressões típicas do pensamento

conservador elencaram-se: a assistência como favor, a culpabilização do indivíduo,

leituras moralizantes da realidade, responsabilização da família, prevalência de

interesses políticos, clientelismo, fisiologismo, primeiro-damismo e filantropia.

Aos sujeitos de pesquisa, foram perguntadas se todas essas expressões

estavam claras e, posteriormente, dirimidas as eventuais dúvidas. Por último,

perguntou-se a opinião dos sujeitos entrevistados sobre a tipificação em relação ao

reordenamento dos serviços.

Optou-se por apresentar o resultado sob forma de tabela e gráficos para

melhor visualização.

4.2 Breve Caracterização de Diadema e da Estrutura da Proteção Social

Especial

Embora a implantação do Suas em Diadema não seja objeto de nosso

estudo, apresenta-se breve caracterização do município no qual atuamos na

coordenação da PSE, onde trabalham os nossos sujeitos de pesquisa e nossos

usuários são atendidos, contextualizando, na história da política de assistência

social na cidade, a estrutura da PSE nos dias de hoje (Mapa 1).

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MAPA 1 - Mapa da Exclusão/Inclusão Social – Diadema

Fonte: (SPOSATI et AL. Topografia social de Diadema. Cedest/PUC-SP, 2009)

O resgate da história da assistência social no Município de Diadema foi

possibilitado pela topografia social desenvolvida pelo Cedest/PUC-SP, em 2009, que

traz esse significativo olhar para a cidade:

Diadema, em seu processo de urbanização, particulariza a luta de um trabalhador migrante e de mais baixa capacitação profissional, para afiançar condições de reprodução social para si e sua família. A cidade nasceu em 1958 pelo desdobramento de São Bernardo do Campo onde, pelo nominado “milagre econômico brasileiro” instalaram-se filiais de indústrias automobilística estrangeiras que provocaram, ao mesmo tempo, o afluxo de trabalhadores e o fortalecimento do seu processo de sindicalização ao lado da busca de assentamento de suas famílias.

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À Diadema, localizada na periferia de São Bernardo do Campo, grande centro de acumulação do capital industrial e de densidade de oferta de empregos dos anos sessenta, estava reservado o espaço de luta pelo social. A luta pela cidadania organizava as lutas locais, quer por condições de vida, quer pela dignidade do viver. O território da cidade se adensava à medida em que crescia o parque industrial do município vizinho. Cidade-dormitório teve seu início adensado por ex-moradores da favela Vergueiro de São Paulo o que contribuiu para a condensação de forças locais na luta pela moradia e, ao mesmo tempo, pelo acesso a serviços públicos como saúde, educação, habitação, transporte e segurança. A cidade de Diadema expressa hoje, uma das maiores densidades do país, e como tal, já registrava no início dos anos 80, 207 núcleos habitacionais sem habitação digna e sem legalização. A questão da moradia estendida à condição da dignidade do lugar, enquanto parte do território, foi eixo de luta social no processo de urbanização da cidade em meio a interesses conflitantes. A participação popular no modo de governar a cidade tornou-se condição fundamental reforçada pelo exemplo do processo de negociação das lutas sindicais vivenciadas pelos trabalhadores nas fábricas de São Bernardo. Desde 1982 a este 2009, em pouco mais de 25 anos, a cidade de Diadema registra sete gestões municipais disputadas e, em cinco delas, o Partido dos Trabalhadores saiu-se vitorioso, ratificando o modelo de gestão democrático popular. O relevo social de Diadema foi sendo alterado. Foram pavimentadas cerca de 99% de suas ruas. Esse novo relevo marcado por intervenções da política pública (na verdade um processo de redistribuição de condições de vida) trouxe forte efeito na saúde, reduzindo o índice de mortalidade infantil de 82,93 por mil nascidos vivos para 12,3 em 2007. (CEDEST/PUC-SP. Topografia social de Diadema. 2009)

Em 1972, a Prefeitura de Diadema inaugura o Departamento de Promoção

Humana que conta com dois assistentes sociais e 14 estagiários, funcionando em

estreita interface com o Juizado de Menores e o Pronto-Socorro. Posteriormente, o

departamento incorpora às suas funções a distribuição de cestas básicas e

medicamentos, cursos profissionalizantes para as mulheres, provisão de

documentos e de passes, transporte para pessoas com deficiência, e creches.

Em 1989, o Departamento de Promoção Humana é extinto pelo então

prefeito José Augusto. Com a promulgação da Loas, em 1993, um grupo de

assistentes sociais pleiteia o restabelecimento de um lócus que garantisse o

atendimento das demandas da política de assistência social.

Em 1994, em atendimento a essa demanda, o Departamento de Ação Social

e Cidadania (Dasc) é estabelecido e estruturado em três áreas: criança e

adolescente, mulher, e assistência.

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A 1ª Conferência Municipal de Assistência Social ocorre em 1995 e, em 1996,

são criados o Conselho e o Fundo Municipal de Assistência Social.

No período de 1997 a 2000 foram municipalizados serviços estaduais de assistência social para a Prefeitura de Diadema e são reforçadas as práticas de convênio com entidades sociais. Não foi investido na provisão direta de serviços socioassistenciais pela gestão da Prefeitura. (SPOSATI et al, 2009, p.72 ).

Em 2002, o Dasc é transformado em Secretaria, a Sasc. Em 2005/2006, são

municipalizadas as medidas socioeducativas em meio aberto, destinadas aos

adolescentes em conflito com a lei.

Em 2007, é contratado o IEE/Cedest para construir a Topografia Social da

cidade. Este trabalho constitui-se num marco da história da assistência social,

conforme apresentação:

- ferramenta que permite hierarquizar os territórios da cidade a partir de um padrão básico de condições de vida. - Estabelece a relação comparativa das partes (os territórios) com o todo (a cidade) e permite uma nova leitura das necessidades. - Instrumento de decisão política participada que facilita pactos e negociações de gestão a partir da leitura das necessidades da cidade. - Construção de ferramentas para auxílio no planejamento da gestão da cidade . - Construção de referências para desenvolver ação integrada nos territórios da cidade pelas várias áreas de atuação da prefeitura. - Criação de referências para que a Secretaria de Assistência Social e Cidadania de Diadema pudesse melhor decidir sobre as prioridades de demandas para implantação de sua rede de Centros de Referência e de Referência Especializado de Assistência Social – Cras e Creas.

O Mapa da Exclusão-Inclusão Social permitiu:

- identificar os territórios mais suscetíveis à condições riscos frente à oferta instalada de serviços públicos e não públicos. - Permitiu verificar baixa discrepância entre os 13 territórios do OPP, o que sugere maior homogeneidade das condições de vida da população, mas também baixos índices de inclusão social, o que revela que essa homogeneidade tende a se dar mais sob condições de exclusão, do que de inclusão social. - Propiciou ainda mapear o local de moradia de famílias expostas à situações de risco e vulnerabilidades e, portanto, tidas com menores oportunidades no enfrentamento à pobreza.

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- Indicou a necessidade de implantação de 13 Cras até 2014, considerados os índices de vulnerabilidade social das famílias. - Propôs a instalação estratégica de 2 novos Cras, considerando a localização das áreas de moradia onde se concentram as famílias do Programa Bolsa: Cras Norte e Centro-Oeste. - Permitiu verificar se a rede de serviços está localizada de forma compatível com as famílias que recebem benefícios

E indicou providências básicas:

PREFEITURA MUNICIPAL DE DIADEMA 2007

- Constituir na Prefeitura uma equipe capacitada para informatizar e georreferenciar banco de dados, ter máquinas e acessar a digitalização do território da cidade. - Assessoria técnica da equipe local por consultores que transfiram a capacidade para a Prefeitura, durante o tempo definido pela própria, para constituir os bancos de dados. - Produção do Mapa da Exclusão e Inclusão Social, Construção da Topografia Social da cidade, Definição dos territórios de gestão da proteção social básica da cidade.

A consultoria do IEE/PUC-SP (CASTANHO OLIVEIRA, 2008) ainda propõe a

reorganização da secretaria em duas áreas: Departamento de Gestão do Suas com

a proteção básica e especial e o Departamento de Vigilância Social, Defesa de

Direitos de Cidadania com o trabalho de defesa dos direitos humanos e sociais e o

monitoramento e avaliação de ação. Além do Observatório Vigilante a ele agregado.

Aa PMD instalou quatro Cras e um Creas, além do que estava previsto. O

mapa não vem sendo utilizado como ferramenta de gestão na SASC. A estrutura

posta hoje na Sasc é enxuta e centralizada no gestor a quem respondem

diretamente os serviços de proteção básica e especial, assim como o monitoramento

e a avaliação, que acumula as responsabilidades de regulação de parceria. O

Departamento de Gestão do Suas e o Departamento de Vigilância Social, Defesa de

Direitos de Cidadania não foram consolidados. Em 2011, a diretoria de proteções

sociais foi extinta e as coordenações dos serviços assumiram as atividades

correlatas às suas proteções.

Em 2009, é inaugurado o Creas. Os serviços de alta complexidade, que antes

eram coordenados no gabinete, passam a ser geridos pelo Creas, em 2010. Ainda

em 2010, o Centro de Referência do Idoso (CRI) é incorporado ao Creas.

Posteriormente, em setembro de 2010, assumimos a coordenação da PSE. A

partir de maio de 2011, propusemos o reordenamento institucional da Casa Beth

Lobo para integrá-la efetivamente ao Suas. Em 2011, a atenção à população em

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situação de rua deixa de ser prestada no Creas e é inaugurado o Creas POP. Em

2012, o serviço de abordagem social passa a ter execução direta.

A PSE, hoje, é responsável pelos serviços de média e de alta complexidade:

Creas, Casa Beth Lobo, Creas POP e tem referenciada uma média de 1.100 famílias

e indivíduos em situação de violação de direitos, operando 15 convênios.

Desde então, do período de maio de 2011 a maio de 2012, acumulamos a

coordenação técnica do CR a Mulheres em Situação de Violência e, desde maio

deste ano, a coordenação técnica do Creas, escancarando um dos maiores

problema enfrentados hoje no município para consolidar a política de assistência: o

exíguo quadro de Recursos Humanos (RH).

Segue a apresentação dos serviços da PSE com breve contextualização:

Centro de Referência Especializado em Assistência Social (Creas)

O Creas hoje abarca os níveis de média e de alta complexidade, exceto

violação de direitos da mulher e serviço especializado para pessoas em situação de

rua, que são prestados em outros serviços.

Tem referenciado uma média de 800 famílias e recebe 40 novos casos por

mês, parte delas atendidas por 13 convênios. Os casos são encaminhados por rede

de atendimento, Cras, Conselho Tutelar, Vara da Infância e Juventude, Serviços de

Saúde (Unidade Básica de Saúde - UBS, Caps, Hospital Municipal - HM) ou

demanda espontânea.

Proteção e Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos (Paefi)

A prestação dos serviços do Paefi é organizada por técnicos de referência e

segmentos que nele atuam; parte é executada de forma direta e outra por

entidades.

Violação de direitos da criança e do adolescente: a equipe de referência é

constituída por uma assistente social e uma psicóloga, para operar a referência e

contrarreferência do serviço, que é prestado por duas entidades: o Centro Regional

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de Atenção aos Maus-Tratos na Infância (Crami), com previsão de atendimento

mensal de 100 família, e Acer-Soaif, com previsão de atender 100 famílias por mês.

Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti)

A equipe de referência constitui-se de uma assistente social, uma educadora

e uma estagiária, para o serviço que é prestado por meio de convênio firmado com

organizações sociais: Centro Cultural Afro-brasileiro Francisco Solano Trindade,

Associação de Apoio à Criança em Risco (Acer), ONG MAI, Sociedade Batista de

Beneficência Tabea e Lar Escola Jesue Frantz, Abenco. A previsão de atendimento

mensal é de 250 famílias.

Violação de direitos dos idosos: a equipe de referência constitui-se de três

assistentes sociais e três estagiários.

Em relação ao Paefi, aponta-se que há que se caminhar ainda para romper

com a lógica segmentada, embora os técnicos operem sob as diretrizes do trabalho

social essencial ao serviço.

Porém, pela tipificação, esses serviços deveriam ser ofertados por execução

direta. As entidades ainda não estabeleceram os padrões de qualidade tipificados.

Ainda, o número de oferta de vagas é menor do que a demanda que chega no

serviço.

Em relação à violação de direitos dos idosos, o serviço de atendimento aos

idosos com os direitos violados, no município, que era prestado pelo CRI, foi

incorporado ao Creas, o que gerou desgaste na equipe pela perda na estrutura que

poderia ter sido transformada efetivamente em Serviço de PSE para pessoas com

deficiências, idosas e suas famílias, o que não ocorreu.

Contudo, significou um avanço, do ponto de vista de articulação do Paefi, no

município. Na época, o segmento atendia uma média de 80 casos por mês e

precisava ser adequado a uma diretriz única da política de assistência social

conformada no Creas.

Hoje, o segmento atende mais de 200 casos por mês, num serviço de

execução direta, dentro de uma estrutura inadequada e insuficiente.

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Essa é uma situação discrepante, principalmente quando se compara com a

estrutura de atendimento à violação de direitos da mulher, que é prestada em outro

serviço.

Outra distorção é que o equipe de referência de violação de direitos dos

idosos acabam por operar a referência e contrarreferência com o serviço de

acolhimento institucional, já que a alta complexidade não se consolidou como um

nível hierárquico estruturado, no município.

Serviço Especializado em Abordagem Social

O serviço do Creas é ofertado sob a forma de execução direta, de maneira

continuada, desde 2012. Tem o foco em criança e adolescente e a finalidade de

assegurar o trabalho social de abordagem e busca ativa que identifique, nos

territórios, a incidência de trabalho infantil, exploração sexual de crianças e

adolescentes, em situação de rua, dentre outras.

A equipe de referência constitui-se de duas educadoras que trabalham em

estreita articulação com a equipe do Peti.

Embora tenham sido contratadas por concurso público, o que se considera

um grande avanço, a equipe passou por capacitação insuficiente, realizada pelas

coordenações do Creas/PSE e não possui estrutura adequada para o serviço

(transporte, meios de comunicação, RH, entre outras).

Serviço de Proteção Social a Adolescentes em Cumprimento de Medida

Socioeducativa de Liberdade Assistida (LA) e de Prestação de Serviços à

Comunidade (PSC)

A equipe do Creas, composta de uma educadora e uma assistente social,

atende em parceria com a entidade social Dom Décio Pereira, de forma integrada,

os adolescentes em cumprimento das medidas de PSC e LA.

A equipe da entidade social ocupa o mesmo espaço físico do Creas, o que

facilita a definição de fluxo com a Vara da Infância e Juventude e possibilita a gestão

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do Creas. A previsão de atendimento mensal é de 170 adolescentes e jovens e 150

famílias.

Serviço de Acolhimento Institucional

A equipe técnica lotada no Creas, e composta por um psicólogo, uma

assistente social e um estagiário, realiza o acompanhamento dos serviços de

acolhimento institucional para crianças e adolescentes, que é realizado por três

entidades: Lar São José, Mãos Pequenas e Raio de Luz (Tab. 5).

Como já apontado, há uma distorção aqui, já que os serviços de proteção

especial de alta complexidade deveriam ter estrutura e coordenação próprias.

De qualquer forma, esse serviço tem sido prioritário no trabalho de

reordenamento institucional, com vistas a garantir o trabalho essencial ao serviço,

pois aqui está um dos maiores desafios da PSE, hoje, não constituindo em objeto do

nosso estudo.

Tabela 5 – Recursos Humanos do Creas

Quantidade Função Carga Horária Semanal

7 Assistente Social33 30 horas

1 Auxiliar de Serviços Gerais 40 horas

1 Auxiliar Administrativo34 40 horas

1 Coordenadora35 30 horas

4 Educador Social 40 horas

1 Estagiário de Psicologia 30 horas

3 Estagiário de Serviço Social 30 horas

2 Psicólogo 30 horas

33 Uma encontra-se em licença-maternidade e a outra é comissionada. 34 Comissionada. 35 Em licença-maternidade até janeiro de 2013, motivo pelo qual a pesquisadora acumula a coordenação técnica do serviço.

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Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua

(Creas POP)

O Creas POP é a unidade pública e estatal de referência e atendimento

especializado à população adulta em situação de rua, no âmbito da Proteção Social

Especial de Média Complexidade do Suas, inaugurado em agosto de 2011.

A unidade foi alocada no mesmo prédio que o Centro de Atenção

Psicossocial para Álcool e Drogas (Caps AD), facilitando a mobilidade dos usuários.

Contudo, como o serviço tem atendido a uma média de 250 pessoas em situação de

rua e recebe 30 novos casos por mês, o espaço tornou-se inadequado.

O Creas POP dispõe parcialmente do que foi tipificado como Serviço

Especializado para população em situação de rua. Oferece apenas parte do

trabalho social previsto, não ofertando alimentação, nem espaço de convivência,

devido ao baixo investimento no serviço e ao reduzido quadro de funcionários.

O serviço conta com apenas duas assistentes sociais, e uma acumula o

cargo de coordenação, sem remuneração para tal.

O serviço opera a referência e contrarreferencia com a entidade que presta

acolhimento institucional para a população em situação de rua a Transitória Casa do

Caminho (TCC). A previsão de atendimento mensal é de 40 indivíduos.

Serviço Especializado em Abordagem Social

O serviço de abordagem social, voltado à população em situação de rua, é

lotado no Creas POP e realizado por dois educadores (Tab. 6).

Conforme apontado em relação à equipe de abordagem que é lotada no

Creas, os educadores foram contratados por concurso público, porém a equipe

passou por capacitação insuficiente, realizada pelas coordenações do Creas/PSE e

não possui estrutura adequada para o serviço (transporte, meios de comunicação,

RH, entre outras). Importante ressaltar que as equipes trabalham em estreita

articulação.

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Tabela 6 – Recursos humanos do Creas POP

Quantidade Função Carga Horária Semanal

2 Assistente Social 30 horas

2 Estagiárias 30 horas

1 Auxiliar de Serviços Gerais 40 horas

2 Educador Social 40 horas

Casa Beth Lobo

Criada em 1991, e primeira da região do ABCDMRR36, a Casa Beth Lobo é

um Centro de Referência da Mulher, que atende mulheres em situação de violência

de gênero de todo o município (Tab. 7).

Como citado anteriormente, a atenção à violação de direitos das mulheres, na

Política Nacional de Assistência Social, está dentro do escopo do Paefi. No entanto,

em alguns municípios, o atendimento às mulheres em situação de violência, através

dos Centros de Referência, antecede a tipologia da Assistência Social e

desenvolveu metodologias específicas.

A discussão desses novos formatos tem gerado grande polêmica entre

Assistência Social e movimentos feministas.

A partir de maio de 2011, a coordenação da Proteção Especial assumiu

interinamente a coordenação técnica da Casa, por falta de RH. Aproveitou-se o

ensejo para conduzir um reordenamento institucional com vistas à adequação à

política de assistência social.

Discute-se a centralidade da família da assistência social, a importância do

atendimento ser extensivo à violação de direitos de outros membros da família, da

garantia das especificidades de cada demanda, a necessidade de pactuação de

fluxos com o Creas, e entendeu-se que se avançou na garantia das seguranças

sociais previstas na assistência social com a manutenção do Centro de Referência

em espaço próprio. Porém, esse é um processo inacabado.

36 Sigla utilizada para definir as cidades do Grande ABC

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Tabela 7 – Recursos humanos da Casa Beth Lobo

Quantidade Função/Regime Carga Horária Semanal

1 Coordenação técnica 37 30 horas

1 Coordenação administrativa 38 40 horas

1 Assistente Social 30 horas

1 Estagiária 30 horas

1 Auxiliar de Serviços Gerais 40 horas

1 Educador Social 40 horas

1 Oficial Administrativo 40 horas

1 Agente Administrativo II 40 horas

Apresentados os serviços de forma sucinta, avalia-se que os principais

desafios hoje na PSE são:

• Estruturação dos Serviços de Proteção Social Especial –

principalmente do Paefi, Creas POP e Alta Complexidade.

• Garantia de equipes mínimas, conforme NOB-RH, incluindo advogado.

• Readequação da estrutura organizacional - infraestrutura e

equipamento adequados e principalmente recursos humanos, em quantidade e

qualidade, ou seja, com perfil adequado, capacitados e com vínculo permanente.

• Capacitação e supervisão técnicas das equipes.

• Regulamentação de padrões de qualidade para o atendimento da

população usuária dos serviços socioassistenciais.

• Regulamentação e estruturação dos serviços de proteção básica e

especial em rede, com definição de fluxos de referência e contrarreferência.

• Acesso aos recursos financeiros repassados a Sasc.

• Definição de papeis, organograma e comunicação institucional.

• Garantir remuneração das coordenações.

• Utilização da Topografia Social e estudos realizados pela PUC/Cedest

como ferramenta de gestão.

37 A coordenadora técnica não é remunerada pela atribuição. 38 Comissionada.

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4.3 As Exigências de Pensar o Novo na PSE: As Novas Formas de

Atendimento e as Novas Exigências Profissionais

Para iniciar a aproximação empírica aos sujeitos de pesquisa, perguntamos o

tempo de trabalho na política de assistência social (Tab. 8 e Gráfico 3).

Do universo de 12 entrevistados, com relação ao tempo de serviço, 42%

atuam há menos de um ano; seguidos de 25% que estão de 1 a 3 anos; e 33% há

mais de 3 anos. Ou seja, 77%, a maioria, conta com menos de 3 anos.

Tabela 8 - Tempo de trabalho na PAS

4. Há quanto tempo trabalha na política de

assistência social? ABS %

Menos de 1 ano 5 42%

De 1 a 3 anos 3 25%

Mais de 3 anos 4 33%

Gráfico 3 - Tempo de trabalho na PAS

Quando perguntamos se os profissionais da proteção social especial

entrevistados se sentem qualificados para atender à demanda com a qual atuam, a

pesquisa revelou que a maioria se sente insuficientemente qualificado, totalizando

58%. Já 42% dos entrevistados responderam que estão suficientemente qualificados

para a atenção que prestam (Tab. 9 e Gráfico 4).

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Tabela 9 - Qualificação profissional

5. Você se sente qualificado para atender à demanda com a qual

atua? ABS %

Superior ao necessário - 0% 0 0 %

Suficiente 5 42 %

Insuficiente 7 58 %

Muito insuficiente, comprometendo o trabalho - 0% 0 0 %

Gráfico 4 - Qualificação profissional

Os dados expressam que a maioria dos entrevistados não se sente

qualificado o suficiente para a demanda que atende.

Sobre as novas exigências aos profissionais da PSE, até que ponto os

profissionais tem o domínio da caracterização da violação de direitos e do conjunto

de defesas, a pesquisa capturou, ao perguntar sobre a caracterização da violação

de direitos que competem ao Creas-Paefi, que 75% apresentam alguma dificuldade,

seguidos de 17% que apresentam facilidade e apenas um entrevistado que sempre

consegue caracterizar a violação de direitos (Tab. 10 e Gráfico 5).

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Tabela 10 - Caracterização da violação

6. Em relação à caracterização da violação de direitos que competem

ao Creas/Paefi,você ABS %

Não consegue caracterizar - 0% 0 0%

Apresenta muito dificuldade - 0% 0 0%

Apresenta alguma dificuldade 9 75%

Apresenta facilidade 2 17%

Sempre consegue 1 8%

Gráfico 5 - Caracterização da violação

Identificou-se, quanto à apropriação do conjunto de defesas de direitos, que

58% dos entrevistados conhecem o conjunto de defesas de direitos da demanda

com a qual atua, já 42% consideram insuficiente o seu conhecimento (Tab. 11 e

Gráfico 6).

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Tabela 11 - Domínio do conjunto de defesas

7. Em relação à demanda do segmento com o qual atua, você

conhece o conjunto de defesas de direitos? ABS

%

Superior ao necessário - 0% 0 0%

Suficiente 7 58%

Insuficiente 5 42%

Muito insuficiente, comprometendo o trabalho - 0% 0 0%

Gráfico 6 - Domínio do conjunto de defesas

Dentro do desafio das exigências de se pensar o novo na PSE, quando

perguntamos o tempo de atuação na política de assistência social, os dados

apontam para a predominância de um quadro novo, em que é possível evidenciar,

além da pouca experiência na política de assistência social, a trajetória curta para

assumir as atribuições desse nível de complexidade que requer.

Por serem profissionais recentes, é possível que ainda não tenham se

apropriado de todo o arcabouço teórico que orienta a política, inclusive por não

terem sido submetidos a processos de qualificação mais duradouros. Isso posto,

ainda pode haver um desconhecimento da demanda e da oferta na política de

assistência social.

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Ao serem indagados sobre se sentem qualificados para atender à

demanda do segmento em que atuam, mais da metade se sente insuficientemente

qualificado. Esse é um aspecto significativo, pois o trabalho na assistência social

está apoiado no conhecimento dos profissionais.

Por ser uma área de prestação de serviços cuja mediação principal, é o próprio profissional, o trabalho da assistência social está estrategicamente apoiado no conhecimento e na formação teórica e técnica e política do seu quadro pessoal, e nas condições instituicionais de que dispõe para efetivar sua intervenção. (COUTO et al, 2010, p. 57).

Assim como em relação à caracterização da violação de direitos que

compete ao Creas/Paefi, é relevante assinalar que a maioria apresenta alguma

dificuldade.

Essa dificuldade pode advir tanto da inexperiência aclarada pelos dados, do

desconhecimento da demanda e da oferta da assistência, da falta de qualificação

reconhecida pelos profissionais ou da dificuldade da incorporação dos novos

preceitos da assistência social.

Interessante ressaltar que a inespecificidade dessa área sempre gerou

retardamento na sua efetivação como política pública. Atualmente, com os serviços

tipificados, ainda se aponta grande dificuldade na caracterização.

Por outro lado, aponta elementos para a vigilância socioassistencial, quanto à

dimensão coletiva da violação por ocorrência do risco que deve ser melhor

explicitado para e pelo Paefi.

Outro aspecto a ser considerado refere-se à ambiência da violação de direitos

e risco que não é exclusivo da política de assistência, podendo produzir

generalismo e confusões. Nesse sentido, a própria orientação técnica é para tratar

como violação de direitos por ocorrência do risco.

Importante salientar que é a própria política de assistência social que deve

apontar qual o seu escopo de atuação e não seus demandatários. No entanto, é

necessário assinalar a compreensão do escopo de atuação do Paefi como decisiva

para o desempenho da política.

As orientações técnicas do Creas dão algumas pistas:

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A compreensão e a delimitação das competências do Creas são

determinantes para o desempenho efetivo de seu papel no Suas, representando

elemento fundamental, ainda para:

• clarificar o papel do Creas e fortalecer sua identidade na rede; • evitar sobreposição de ações entre serviços de naturezas e até mesmo áreas distintas da rede que, evidentemente, devem se complementar no intuito de proporcionar atenção integral às famílias e aos indivíduos; • evitar a incorporação de demandas que competem a outros serviços ou unidades da rede socioassistencial, de outras políticas ou até mesmo de órgãos de defesa de direito; • qualificar o trabalho social desenvolvido

Interessante que delimitam, também, o que não cabe ao Creas:

• Ocupar lacunas provenientes da ausência de atendimentos que devem ser ofertados na rede pelas outras políticas públicas e/ou órgãos de defesa de direito; • Ter seu papel institucional confundido com o de outras políticas ou órgãos, e por conseguinte, as funções de sua equipe com as de equipes interprofissionais de outros atores da rede, como, por exemplo, da segurança pública (Delegacias Especializadas, unidades do sistema prisional, etc.), órgãos de defesa e responsabilização (Poder Judiciário, Ministério Público, Defensoria Pública e Conselho Tutelar) ou de outras políticas (saúde mental, etc.); • Assumir a atribuição de investigação para a responsabilização dos autores de violência, tendo em vista que seu papel institucional é definido pelo papel e escopo de competências do Suas

O reconhecimento do papel e da delimitação das competências do Creas

pode ser fortalecido com o mapeamento da rede e a construção de fluxos e

protocolos intersetoriais de atendimento, com definição de papéis e

responsabilidades. Essa construção pode, inclusive, contribuir para identificar

lacunas e, até mesmo, conflitos de papéis e competências na rede.

Outra questão relaciona-se com o domínio do conjunto de defesas em

relação ao segmento em que atua, onde quase a metade dos profissionais

entrevistados refere dominar o conjunto de defesas de forma insuficiente.

A bibliografia que hoje ampara a PSE apresenta-se por segmentos, tratando

da violência contra a criança e o adolescente; contra a mulher; do adolescente em

conflito com a lei; acolhimento institucional; população em situação de rua. Nesse

âmbito, importantes obras tratam dos temas do escopo da Especial.

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Ainda existem os marcos legais, construídos historicamente, que não são

legislações estanques, mas trazem consigo a história da luta por direitos sociais e

humanos.

Além das orientações técnicas e os planos nacionais, como as orientações

técnicas para o Creas, Creas POP, Peti, Sinase, Planos Nacionais.

De qualquer forma, na medida em que encontra-se à disposição todo esse

arcabouço conceitual, os dados coletados alertam para um risco de certa lógica

operativa, práticas tecnicistas e lógicas produtivistas.

Ainda, estamos nos referindo a um conjunto de categorias que fazem parte do

Suas e que devem construir um trabalho coletivo, aportados em conhecimentos que

façam avançar a assistência social no Brasil.

Chama a atenção, nesse sentido, a dimensão política do trabalho.

Não basta superar a cultura histórica do ativismo e de ações improvisadas, substituindo- as por um produtivismo quantitativo , medido pelo número de reuniões, número de visitas domiciliares, número de atendimentos, se os profissionais não detiverem o sentido e a direção social, do trabalho coletivo, se não forem garantidos espaços coletivos de estudo e reflexão, que possam por em debate concepções orientadoras e efeitos sociais e políticos das práticas desenvolvidas. (COUTO et al, 2010, p. 61).

Como apontado anteriormente, embora haja uma bibliografia que ampara a

PSE, faltam publicações sobre violação de direitos por ocorrência do risco nesse

campo e, assim, identifica-se uma lacuna que nos mobiliza a contribuir com

sistematização sobre as questões que estão postas hoje na consolidação da PSE

como nível de complexidade para efetivação do Suas.

Outro aspecto é a parcela do profissional, que deve também buscar sua

formação e qualificação para lidar com as questões do seu cotidiano profissional,

não se acomodando , embora essa não seja uma responsabilidade individual.

Não há dúvida de que é dever da gestão garantir formações continuadas e

capacitações permanentes, assim como condições institucionais adequadas.

É sabido, ainda, que, pela própria desvalorização da política por algumas

administrações, ela vem sendo executada com quadros exíguos de RH, em

estruturas improvisadas e com reduzidos investimentos.

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Também é preciso destacar que a assistência social não passa incólume pelo

processo de desregulamentação e precarização do trabalho no Brasil. Nas entidades

que compõem a rede socioassistencial, esse processo se evidencia.

Nesse contexto, pode-se deparar com profundas defasagens técnicas que

requerem formação permanente e qualificada.

Nesses termos, ter a NOB-RH é esforço significativo que deve nos amparar

nesse processo de construção.

As exigências de pensar o novo na PSE é um desafio a ser enfrentado na

política de assistência social, que foram traduzidas em inquietações importantes

trazidas pelos trabalhadores:

O momento atual é de redefinição do trabalho, das formas de organização e gestão institucional que incorporem mecanismos permanentes de formação e educação continuada, como questão estratégica para a qualificação dos recursos humanos no Suas. E finalizando, é possível afirmar: quanto mais qualificados os servidores e trabalhadores da assistência social, menos sujeitos a manipulação mais preparados para enfrentar os jogos de pressão política e de cooptação dos espaços institucionais, conferindo a qualidade e consistência teórica, técnica e política ao trabalho realizado. (COUTO et al, 2010, p. 63).

4.4 Expressões de ideias conservadoras na atuação dos profissionais da

PSE

A pergunta em questão foi de múltipla escolha, e os entrevistados puderam

marcar mais de uma alternativa. Ainda, havia a possibilidade de uma resposta

aberta que se distinguia das demais. Os dados expressaram que 75% referem

leituras moralizantes da realidade vivida pela demanda; 58% identificam, na

atuação dos profissionais da PSE, culpabilização dos indivíduos que atendem; 58%

apontam responsabilização da família; 25% revelam a presença de interesses

políticos; 17% identificam a assistência como favor; 17% destacam a filantropia;

17% o clientelismo; e 8% o fisiologismo. Somente não foi identificado primeiro-

damismo.Na especificação de outras respostas que totalizou 25%, indicam

“conformismo do profissional com alguns aspectos da realidade, sem considerar o

histórico de vida”,”fatalismo em realização a situação atendida” e

“paternalismo/assistencialismo.”

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Tabela 12 – identificação de expressões conservadoras

9. Você identifica, na atuação dos profissionais da Proteção Social Especial ABS %

A concepção de assistência como favor 2 17%

Culpabilização do indivíduo que atende 7 58%

Leituras moralizantes da realidade vivida pela demanda 9 75%

Responsabilização da família 7 58%

Prevalência de interesses políticos 3 25%

Clientelismo 2 17%

Fisiologismo 1 8%

Primeiro-damismo 0%

Filantropia 2 17%

Outras 3 25%

Gráfico 7 – identificação de expressões conservadoras

Os dados expressam condutas e posturas, a partir do olhar dos profissionais

para os próprios profissionais, que acabam reiterando traços conservadores.

Embora esses traços não estejam contidos na política e todas as bases já

estejam lançadas não só nos princípios como nas diretrizes da PNAS e também nas

normatizações, há um trânsito capacitador a percorrer.

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Na análise do que foi expresso pelos sujeitos, incide uma série de fatores. O

escopo da violação de direitos que hoje foi ordenado na PSE, principalmente através

da tipificação, não nasce com o PNAS, nem com a Loas, nem com a Constituição de

1988, mas é anterior a esses marcos regulatórios da política.

É preciso lembrar que as ações dispersas, organizadas na PSE, eram quase

em sua totalidade desenvolvidas por entidades privadas sem fins lucrativos, e as

forças conservadoras sempre estiveram presentes na assistência social, assim como

em outras políticas públicas.

Em um passado não muito distante, as práticam eram assistencialistas,

tratando o que era direito, muitas vezes, pelas primeiras-damas, como filantropia,

clientelismo e favor. Na atenção que era prestada pelos orfanatos, internatos,

educandários, asilos, é possível identificar todo o conservadorismo.

[...] deste quadro de organizações sociais repousam sobre as bases da Igreja (principalmente católica) e depois pelo Estado, passou por fases de alianças que lhes deixaram marcas difíceis de superar. Da filantropia caritativa a higiênica, disciplinadora, pedagógica profissional, vigiada e de clientela39, foi se construindo uma estratégia de intervenção no espaço urbano, de controle da pobreza e das “classes desviantes”, que reduziu indigentes, abandonados, inválidos, doente e deliquente, à categoria de “assistidos sociais”, paras os quais foram se acumulando espaços institucionais próprios.(MESTRINER, 2011, p.39).

Atualmente, ainda é possível identificar o lastro contido na PSE como

tributária de um passado histórico conservador, na atenção prestada por alguns

profissionais, conforme demonstrado na pesquisa, e há necessidade de ele se

libertar, como a PNAS já o fez.

A exemplo da orfandade, que sempre foi justificativa de assistência social, a

proteção especial é que vai absorver demandas antigas da assistência social e

continuar provendo a atenção às figuras historicamente estereotipadas dos

mendigos, pivetes, menor abandonado, trombadinhas, órfãos, bastardos e mulheres

de malandro.

Essa visão equivocada, perpetuada pelo conservadorismo, principalmente

através da mídia datenística40 continua, até os dias de hoje, escamoteando e

39 Grifos nossos. 40 Trocadilho nosso para definir alguns tipos de mídias, expoentes do pensamento conservador, que, por exemplo, negam direitos constituídos, como a vida, defendendo pena de morte; negam os

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negando, aos demandatários da função protetiva da assistência social, a condição

de sujeitos de direitos.

Tratamento, este, aos sujeitos de direitos, típico da construção do

pensamento conservador, que tem em suas bases a valorização do preconceito,

segundo Nisbet “...o preconceito é resumo, na mente individual, da autoridade e da

sabedoria contidas na tradição...” (1987, apud ESCORSIM 2010 ,p. 58).

Escorsim Netto (2010, p.16), em sua obra O Conservadorismo Clássico,

sobre o tema, por tratar-se de uma sinopse histórico-crítica do pensamento

conservador, alerta, logo em suas primeiras páginas, que o conservadorismo “não

se apresenta como conservadorismo e, portanto oculta e escatomeia sua raiz e seus

conteúdos conservadores.

Segundo a perspectiva histórico-crítica, entende-se que alguns técnicos ainda

não romperam com o passado e trazem em sua atuação a perspectiva

conservadora. Daí os dados apontarem para práticas em que ainda se identificam a

filantropia, o fisiologismo, o clientelismo e a concepção de assistência como favor.

Outra questão é que, embora a política se coloque progressista, pela

perspectiva de alguns técnicos, o lastro conservador não é erradicado, pois, em sua

essência, está o reformismo e a não subversão da ordem, escamoteando seus

conteúdos conservadores, com uma nova roupagem, recuperando valores

tradicionais, como a leitura moralizante da realidade vivida pelas famílias, a

culpabilização do individuo que atende, a concepção de assistência como favor,

entre outros.

Isso remete a um dado importante, pois se está diante de forças sociais

importantes que, se não observadas, podem usurpar da política o seu caráter

emancipador.

Cre-se que, se não houver uma direção social clara, remeteria a um processo

similar ao da “modernização conservadora”41 da década de 1970. A modernização

conservadora trazia em seu bojo “abordagens funcionalistas, estruturalistas e mais

tarde sistêmicas (matriz positivistas) [...] os recursos para alcançar esses objetivos

direitos da criança e do adolescente constituídos no ECA, defendendo a diminuição da maioridade penal; negam os direitos humanos, além de culpabilizar o indivíduo e não fazer nenhuma espécie de leitura critica dos impactos da vulnerabilidade, das expressões da questão social, ou minimamente da violação de direitos. 41 Tese defendida por Netto, em sua obra Ditadura e Serviço Social, Cortez, 2001.

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são buscados na modernização tecnológica e em processos e relacionamentos

pessoais [...]”( IAMAMOTO,2009, p.149).

Sem falar na modernização tecnológica proposta por diversos sistemas de

informação, e a influência de alguns segmentos da psicologia que compõe o campo

profissional do Suas.

A autora, na mesma obra, ao falar da psicologização das relações sociais,

refere que, sob esse prisma, as questões de desintegração e adaptação eram

tratadas com diálogos e que essa perspectiva permitia preservar um julgamento

moral da clientela, dado muito expressivo identificado na pesquisa por 75% dos

entrevistados na atuação dos profissionais da PSE.

Então, está se tratando de “um processo de mudanças permeado de lutas e

resistências entre o novo e velho, entre permanências e ruptura, que precisam ser

apreendidas na dinâmica das forças sociais e políticas que atuam historicamente no

chamado campo assistencial. (COUTO et. al., 2010, p.140).

Percebe-se a ausência de estudos, nesse sentido, embora alguns se

autoproclamem conceitualmente um perfil arrojado de análise e acabam

reproduzindo, do ponto de vista teórico, “o mais do mesmo” e, da prática, uma

atenção com traços conservadores.

É na PSE que se apresentam questões como escolhas, prazer, medo, riscos,

dinâmicas familiares complexas e contraditórias, permeadas por muita subjetividade,

o que a faz a mais complexa e desafiadora, e nos parece um terreno fecundo para a

psicologização das sequelas da questão social e despolitização nos discursos e nas

práticas.

Nesse sentido, nos deparamos, no cotidiano, com as armadilhas de uma nova

perspectiva conservadora, que sobrecarrega e culpabiliza os indivíduos, numa ação

moralizadora e disciplinadora, como reafirma a pesquisa, traços estes identificados

por 58% dos entrevistados na atuação dos profissionais da PSE.

Outra questão é o risco da matricialidade sociofamiliar mal interpretada. A

família adquiriu centralidade na PNAS por ser o foco da proteção social. Entretanto,

não foi suficientemente explicitada a concepção de família na política, permitindo

interpretações e condutas profissionais conservadoras e a retomada de modelos já

superados, como, por exemplo, supervalorizar e onerar as mulheres em seu papel

materno.

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[...] a questão de gênero e família é fundamental para o debate da Política Nacional de Assistência Social. Isso nos remete à necessidade de buscar entender a família na atualidade, visando superar aquelas concepções estereotipadas e naturalizadoras de família, visões que, muitas vezes, culpabilizam os modos de vida da população empobrecida da nossa sociedade. A compreensão que se passa, tônica das falas anteriores, é que essa instituição social é historicamente marcada. Tem sobre si reflexos da vida social mais ampla, em suas dimensões política, econômica, cultural e ideológica.

42(TAVARES, 2011, p.135).

Para avançar com o novo modelo, é preciso elucidar com o que exatamente

se quer romper e particularizar as críticas.

De forma equivocada, alguns profissionais tem sobrecarregado ainda mais

essas famílias e tornado a possibilidade cada vez mais real, através de uma ação

disciplinadora, de uma avalanche de práticas conservadoras, relacionadas às

famílias, no centro do reordenamento e das polêmicas.

Nesse caso, é necessário debater profundamente que a responsabilidade

com o risco das famílias é estreito, com o risco de responsabilização das famílias,

explicitado pela pesquisa que identificou 58% dos profissionais responsabilizam-na.

Percebe-se que não ecoa nem a discussão de como está posta a questão do

“reconhecimento do grupo familiar como referência afetiva e moral” (PNAS, p.38. ),

referindo-se à matricialidade sociofamiliar.

Deparamo-nos com linhas críticas de análise que têm apontando para o

perigo de cair numa prática conservadora através da matricialidade sociofamiliar,

preocupação esta que partilhamos. Contudo, os discursos são amplificados em

demasia e não estabelecem as mediações necessárias para o concreto; tampouco

apontam para o horizonte de um trabalho “progressista” com as famílias, que estão

no foco da atenção provida pela assistência social.

Nesse sentido, parece-nos que um dos caminhos é que se amplie a base

científica, como vem fazendo, por exemplo, a pesquisa Protege Vínculos,

coordenada pela professora Aldaíza Sposati, para definir o que compõe a

capacidade protetiva da família, e que, nesse caminho, se aprofundem as

especificidades da proteção nas situações de violação de direitos.

42 Debates Simultâneos sobre Família, Gênero e Assistência Social- sistematizados no caderno O trabalho do/a Assistente Social no Suas: seminário nacional / Conselho Federal de Serviço Social - Gestão Atitude Crítica para Avançar na Luta. –Brasília: CFESS, 2011.

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Para nós, é necessário perguntar o que efetivamente contribuirá para

emancipar essa família: A função protetiva é da família? Ou do Estado? Qual o peso

que cada uma tem?Uma está substituindo a outra?

Este tema deve ser ainda aprofundado, subsidiando críticas mais consistentes

sobre o que significa uma leitura equivocada da matricialidade sociofamiliar, e, por

outro lado, o que significa negar a dimensão da família e a discussão da

metodologia do trabalho.

Suspeita-se que a negação do conceito de família, por estar no centro das

formulações tipicamente conservadoras, tem sido o motivo para abandonar a

discussão do trabalho com famílias e não se estabelecer as mediações necessárias.

Perpetuando um discurso amplificado da crítica, colabora-se muito pouco com

análises propositivas sobre a concretude da prática.43

Nessa direção de análise, não se pode perder de vista a importância da

vinculação das questões de classe e de visão crítica de família. Netto (1996 ) já

alertava, na década de 1990, sobre “uma reação neoconservadora aberta e/ou

disfarçada em aparências que a dissimulam, apoiada no lastro da sua produção pós

moderna e sua negação da sociedade de classes”.

É importante que se anuncie quanto as questões estruturais, como a pobreza,

embora não precedam, são determinantes na violação de direitos e quanto está

presente na realidade com que nos deparamos na proteção especial, facilmente

lidas quando o risco quase sempre se apresenta imbricado com a vulnerabilidade.

A história só vem confirmando o movimento do capital de escamotear o

recorte de classes e sua antiga tentativa de impingir as responsabilidades às

famílias:

[...] a ambiência pós-moderna que caracteriza o capitalismo neoliberal na cena contemporânea alimenta a tendência de deslocamento dos conflitos e contradições que tem fortes raízes societárias, como os de classe, gênero ou etnia, para os âmbitos privados da esfera doméstica, das relações intrafamiliares. (COUTO et. al, 2010, p.55).

43 Aliás, a ausência de mediações concretas, a prevalência dos discursos amplificados, a negação de algumas reflexões, relegando ao ostracismo discussões fundamentais para a atuação profissional, dentro da perspectiva crítica, como, por exemplo, família, instrumentais, enaltecendo sempre o método e secundarizando a discussão operativa e dos caminhos possíveis a se trilhar, pela via institucional, na prática cotidiana do assistente social, demonstra dificuldade da travessia de uma análise ideológica para a concretização do trabalho e, consequentemente, essa cenário empobrece a pratica profissional e nos distanciam, contraditoriamente, do projeto ético-político, mas este tema não é objeto de nosso estudo.

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Na alternativa “outras” que possibilitou que os sujeitos se expressassem com

respostas que se distinguissem das demais, apareceram: ”fatalismo em relação a

situação atendida” , “conformismo com alguns aspecto da realidade, sem considerar

o histórico de vida” e ainda “paternalismo/assistencialismo”

Em relação ao “fatalismo” e “conformismo” diante das situações, ambas nos

alertam para uma possível resignação a respeito da complexidade apresentada, mas

também para um olhar político mais fragilizado, endógeno, que considera só as

necessidades da instituição, e um certo comodismo que pode estar havendo por

parte dos profissionais.

Onde aparece “paternalismo/assistencialismo” o sujeito de pesquisa refere-se

a uma suposta tutela dos usuários que se coloca antagônica a autonomia dos

usuários assumirem suas próprias escolhas, que igualmente merece ser olhado.

Por fim, mais uma hipótese trabalhada para analise da pequisa, advém do

encontro do lastro conservador da assistência social com a emergência do Serviço

Social que é, em sua origem, reacionária44 como estratégia do capital de controle e

amortização dos anseios dos trabalhadores, tratando de questões como a ação

missionária, a influência da Rerum Novarum, a individualização dos casos, a

abordagem moral e os ditos desajustamentos sociais.

Essa origem conservadora da assistência, em articulação com a “ilusão do

servir” de alguns profissionais do Serviço Social, a ausência de construção de uma

identidade profissional e as amarras da alienação, distanciando a assistência das

questões da luta de classe, e quanto a um “percurso alienado, alienante e

alienador”45 converge com a trajetória de alguns profissionais, na assistência, que

parecem não ter passado nem pelo ares do Congresso da Virada, negando o

projeto ético-político contemporâneo, nem pelo processo de construção da

Assistência como direito.

Não estamos aqui confundindo Serviço Social com Assistência Social, nem

tampouco reduzindo o quadro de profissionais da assistência a assistentes sociais.

Porém, é inegável, que o Serviço Social é uma demanda de

profissionalização da assistência, e, historicamente, sempre esteve à frente da

Política de Assistência, nos palcos de luta e operacionalização, na e pela política.

44 Tratados por Netto, em Ditadura e Serviço Social, e Iamamoto, em Renovação e Conservadorismo. 45 Utiliza-se, como referência, a obra Serviço Social: Identidade e Alienação, Martinelli, 2000.

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“[...] Como não há ruptura definitiva com o passado, a cada passo este se

reapresenta na cena histórica e cobra o seu preço, [...]”. (FERNANDES apud

MESTRINER, 2011, p. 55).

As questões apontadas aqui não têm a intenção, de maneira nenhuma, de

desqualificar a política por um pretenso cunho conservador, mas alertar para

questões, postas no cotidiano, que podem retardar a sua efetivação enquanto

política pública.

4.5 Tipificação como caminho concreto para avançar na política

As respostas destacam, em relação à Tipificação Nacional dos Serviços

Socioassistenciais, que 92% dos trabalhadores entrevistados entendem que ajudou

no reordenamento institucional, e apenas um profissional aponta que gerou algum

tipo de confusão (Tab. 12 e Gráfico 7).

Tabela 13 – Tipificação

8. A Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais, na sua

opinião, ABS %

Ajudou no reordenamento da política de assistência social 11 92%

Atrapalhou - 0% 0 0%

Não fez diferença - 0% 0 0%

Não consigo dimensionar - 0% 0 0%

Gerou confusão 1 8%

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Gráfico 8 – Tipificação

Do que se pode apreender, a tipificação atinge seus objetivos, uma vez que

é vista como facilitadora para quase a totalidade dos profissionais, no

reordenamento das ações preexistentes na política de assistência social.

Essa é uma avaliação muito positiva, na medida em que os profissionais não

vinculam as dificuldades e inquietudes que expressaram em relação à qualificação e

caracterização aos serviços tipificados no reordenamento.

O impacto da tipificação no reordenamento dos serviços sociossistenciais e

sua particular contribuição à PSE como um nível de complexidade da Política

Nacional de Assistência Social vem sendo de suma importância para a consolidação

do Suas.

Entre as normativas mais impactantes, do ponto de vista operativo, na política

de assistência social, está a Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais,

pois vem demarcar o campo de atuação da assistência social e definir a

padronização dos serviços oferecidos em todo o território nacional, seja por

execução direta ou unidade referenciada, já que todos devem atuar dentro dos

princípios e diretrizes do Suas.

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Fruto de uma das principais deliberações da VI Conferência Nacional de

Assistência, objetiva “tipificar e consolidar a classificação nacional de Serviços

Socioassistenciais” e, conforme o art. 23 da Loas o “caráter continuado dos serviços,

supõe atenções sistemáticas, planejadas e com qualificação profissional envolvida”,

a Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais46, publicada ao final de 2009,

vem dar a resposta da necessidade de regulamentação do escopo das proteções

sociais e da padronização os serviços em todo o território nacional.

Cada serviço foi definido quanto a nomenclatura, descrição, usuários,

objetivos, provisões, aquisições dos usuários, condições e formas de acesso,

unidade, período de funcionamento, abrangência, articulação em rede e impacto

social esperado. (BRASIL, 2009a).

Para a PSE, a tipificação organizou:

Serviços de Proteção Social Especial de Média Complexidade:

a) Serviço de Proteção e Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos (Paefi); b) Serviço Especializado em Abordagem Social; c) Serviço de Proteção Social a Adolescentes em Cumprimento de Medida Socioeducativa de Liberdade Assistida (LA), e de Prestação de Serviços à Comunidade (PSC); d) Serviço de Proteção Social Especial para Pessoas com Deficiência, Idosas e suas Famílias; e) Serviço Especializado para Pessoas em Situação de Rua.

Serviços de Proteção Social Especial de Alta Complexidade:

a) Serviço de Acolhimento Institucional, nas seguintes modalidades: - abrigo institucional; - Casa-Lar; - Casa de Passagem; - Residência Inclusiva. b) Serviço de Acolhimento em República; c) Serviço de Acolhimento em Família Acolhedora; d) Serviço de Proteção em Situações de Calamidades Públicas e de Emergências.

46 A tipificação foi instituída por meio da Resolução 109, de 11 de novembro de 2009, e aprovada pelo Conselho Nacional de Assistência Social (Cnas), previamente pactuada na Comissão Intergestores Tripartite (CIT) de Assistência Social.

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A PNAS e a recente tipificação trazem concretude ao Suas e profundas

inovações. Contudo, as mudanças devem ser incorporadas de forma crítica.

O ganho com a tipologia no processo de reordenamento dos serviços e sua

especial contribuição aos níveis de média e de alta complexidade é de extrema

relevância, como apontado pelos profissionais.

De maneira geral, a tipificação organiza um conjunto de ações preexistentes

para assegurar direitos, transformando-os, de fato, em serviços socioassistenciais.

Os serviços prestados na assistência social, outrora campo difuso e sem

identidade, ganham concretude para atender a necessidades sociais, na medida em

que cria uma identidade em nível nacional. Com essa regulamentação, o Estado,

como responsável pela política, expõe o que é de sua competência.

A tipificação aumenta a capacidade de gestão da assistência social e passa a

ser uma referência para a adequação dos serviços.

O conteúdo dessa norma técnica propicia a politização do processo e pode

mobilizar uma leitura crítica da conjuntura a partir dos serviços e ações existentes e

concretiza a atenção ao usuário, sanando inclusive algumas lacunas da política

nacional.

Com a regulamentação, os serviços de caráter misto que não asseguravam

seguranças sociais podem ser remetidos para outros ministérios de competência.

As matrizes propostas podem conduzir a critérios e indicadores que facilitam

o monitoramento por meio da construção de indicadores de padrões mínimos de

qualidade dos serviços tipificados, e facilitam ainda a produção de dados,

principalmente no que diz respeito à cobertura dos serviços.

Com os serviços tipificados, é possível mensurar o custo de serviço com os

padrões mínimos necessários. Com isso, também facilita a construção de editais

direcionados para a qualidade dos serviços socioassistenciais. Contudo, ao

mensurar um padrão mínimo de qualidade, novos custos serão exigidos e,

consequentemente, novos financiamentos serão demandados, o que vai onerar os

orçamentos previstos aos serviços.

Nesse bojo, é a PSE que abarca, quase na sua totalidade, os serviços

desenvolvidos por entidades, onde estão lotadas as experiências mais tradicionais,

organizações centenárias, em sua maioria de cunho altamente conservador, de

motivações sob diferentes matrizes, especialmente de cunho religioso, orientadas

pela lógica da caridade.

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A tipificação estabelece mediações concretas para alcançar padrões mínimos

de qualidade, ou seja, traz a concretude necessária para identificar se essas ações e

serviços estão ou não em consonância com a política de assistência social.

Tipificar colocando os Creas como polos de entrada e articuladores dos

serviços prestados, reforça a sua legitimidade e facilita a gestão sobre as entidades

e, consequentemente, o processo de integrá-las à política de assistência social.

Todo esse esforço normativo pode impulsionar a oferta de serviços

socioassistenciais na PSE que, de fato, afiance seguranças sociais de acolhida, do

convívio social, de autonomia, de equidade e de travessia.

A tipificação parece ser um esforço consistente em estabelecer parâmetros de

qualidade nos serviços, afrontando os serviços de baixa qualidade ou de qualidade

desconhecida que vinham sendo prestado. Contudo, a tipificação não é dogmática, e

não se propõe a impor padrões de qualidade descolados das necessidades e da

realidade local.

A regulamentação não garante a leitura municipalista da política nacional, daí

a necessidade de apreender os processos históricos e as conquistas de movimentos

sociais organizados no que diz respeito aos serviços e não estigmatizar as boas

experiências no processo de adequação.

Esse movimento de entender o que cabe à assistência social não pode

parecer restritivo. Não é para engessar, burocratizar, e sim organizar e aprimorar a

qualidade dos serviços prestados.

Convém ressaltar que, nesse sentido, a discussão sobre a tipificação não

acaba em sua publicação. Impõe-se a continuidade do debate sobre o

processamento da tipificação, a publicação de textos conceituais, explicitando suas

bases para não dar margem a leituras estanques do processo de reordenamento.

Pode ser que nem todos os serviços estejam suficientemente caracterizados

e que alguns possam não ter sido contemplados. Assim, paira a dúvida de como

podem ser reconhecidos legalmente. Essa resolução responde a ofertas básicas da

assistência social e a um conjunto de serviços previamente existentes sob várias

formas de prestação. Outros podem ser reconfigurados, conforme as necessidades

que assim o determinarem.

Ao tipificar os serviços, o poder público deve conduzir, de forma habilidosa, o

reordenamento das unidades que compõem o sistema. Mudanças, muitas vezes,

são encaradas com resistência e mobilizam forças políticas. Existem focos de

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resistência às novas normativas, seja por parte das entidades sociais, pelos próprios

servidores que têm diferentes compreensões da Assistência Social, muitas vezes,

descoladas das novas diretrizes da PNAS.

Detecta-se, no front de resistência, alguns grupos organizados, como

segmentos feministas e organizações que militam pelos direitos das crianças e dos

adolescentes.

É dentro dessa toada segmentada, por vezes arcaica e corporativista, que

vamos operar e criar estratégias, de modo a qualificar e organizar os serviços que

atendem a segmentos específicos sob as diretrizes do Suas e garantindo o

atendimento das necessidades oriundas das diferenças, ou seja, numa perspectiva

de equidade.

Assim, é preciso que não se finde a discussão sobre seu processamento,

para a garantia de efetivação e continuidade de correção das distorções.

Questiona-se, ainda, em que medida a tipificação perpetua a segmentação na

divisão dos serviços ou homogeneiza demais as demandas específicas, dentro dos

respectivos níveis de complexidade, como estratégia para atingir os objetivos da

política de assistência no que diz respeito à violação de direitos.

Como tratado no capítulo anterior, qualquer nova diretriz exige reflexão e,

assim, decodificar qual é a melhor forma de estruturação dos serviços

socioassistenciais, desde que articulados sob as diretrizes do Suas e da política de

assistência social, garantindo não só a centralidade na família como afastando

perspectivas focalistas, mas reconhecendo a diversidade e a equidade, sem negar

as necessidades diferentes oriundas das especificidades.

O importante é reconfigurar as práticas em serviços socioassistenciais, numa

visão dialética calcada no cotidiano, para atender a necessidades sociais,

afiançando as seguranças sociais, garantindo padrões de qualidade e uma

identidade aos serviços, tendo o Estado como responsável pela política.

Ainda sobre a PSE, o controle social aparece de forma muito tímida, na

tipificação, falando apenas em exercício de cidadania, sem citar explicitamente

algumas possibilidades, como a articulação com os movimentos sociais, já que o

seu usuário parece ser o maior ausente do processo de construção da política, o

que certamente despolitiza o processo.

Diante do exposto, fica claro que a melhoria na qualidade nos serviços

prestados ainda está muito centrada na forma em que for apropriada pelo gestor.

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É preciso caminhar agora com as formas de controle de implantação das

readequações propostas e trabalhar para a concretização da tipificação.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os dilemas e desafios na PSE trazem consigo a exigência de pensar o novo,

que foram reforçadas por inquietações importantes apresentadas pelos

trabalhadores.

A pesquisa mostrou que os estudos e reflexões sobre a PSE precisam

acompanhar o processo de amadurecimento da política, elucidando os desafios

postos no cotidiano de trabalho dos profissionais.

O próprio cotidiano de trabalho nos mostra quantas violações e violências ocorrem na vida dos sujeitos que são demandantes e/ou usuários da Assistência pela mediação das intervenções socioinstitucionais. A rigor, nenhum de nós está imune a tais violações na sociedade do capital, sejamos profissionais ou usuários das políticas. (MARTINELLI, 2011, p. 8).

Uma das estratégias é trazer os holofotes para os serviços socioassistenciais,

que particulariza a PSE, e ampliar a discussão sobre sua efetiva implantação,

reconfigurando e padronizando as práticas dispersas em serviços socioassistenciais,

porém reconhecendo a diversidade e a equidade dos segmentos em que atua,

garantindo o direito à diferença.

Dentre as questões apresentadas, reforça-se o ocultamento dos usuários da

especial nos espaços de participação e construção da política. Contribuir com o seu

protagonismo, na compreensão dos seus direitos e de seu papel enquanto sujeito

político, constitui mais um desafio para o trabalho social na PSE.

Outro aspecto levantado pelo estudo foi a importância da articulação em rede

e intersetorialidade na PSE , principalmente com a PSB e com o Judiciário.

Em relação à PSB percebe-se que os próprios espaços institucionais

deficitários em RH e qualificação, acabam contribuindo para esse distanciamento,

mas, que assumir coletivamente os riscos, deve ser imperioso, não só da porta para

fora, na assistência.

Na construção do campo jurídico social, ressalta-se a importância do Creas

como mediação privilegiada para concretizar direitos e a necessidade de um perfil

profissional qualificado para lidar com as pressões institucionais diante da presença

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forte do conservadorismo no Judiciário, que acaba por vezes revitimizando as

famílias e os indivíduos.

A aproximação empírica dos sujeitos da pesquisa mostrou que se está diante

de um quadro de profissionais recentes, na política de assistência, com pouca

experiência, e que ainda não se sentem qualificados diante da demanda que

atendem, apresentam dificuldades quanto à caracterização das especificidades do

Paefi e tem pouco domínio do conjunto de defesas que sustenta a prática

profissional na PSE.

O momento histórico que vivemos, de consolidação da PSE no Suas, nos

remete para a construção de estratégias para encarar os desafios que estão

colocados no cotidiano, principalmente nas novas formas de atendimento e nas

novas exigências profissionais.

Ressignificar a assistência social passa não só pela reconfiguração dos

serviços, mas pela compreensão de delimitações e competências na política e de

redefinições de práticas profissionais, que são decisivas para o desempenho da

política em seu papel afiançador e restaurador em face da violação de direitos.

Para isso, pensar em processos de qualificação mais duradouros, para o

preparo teórico, técnico e político dos profissionais diante dos desafios da PSE e de

garantir condições institucionais adequadas para a execução do trabalho à luz da

NOB-RH nos remete prioritariamente à responsabilidade da gestão.

Um novo modelo exige muito esforço e a PSE como nível especializado mais

ainda, contudo, percebe-se pouco empenho dos entes federativos em relação a

esse nível de complexidade.

Aqui identificamos alguns dos temas que tem nos convocado à reflexão: Em

quais espaços temos avançados nessas discussões? Que bibliografias nos

permitem avançar nessas discussões? E as capacitações promovidas pelo MDS,

têm contemplado essas questões do cotidiano da PSE? Que identidade enquanto

trabalhadores da PSE estamos construindo?

A pesquisa mostrou que existem ainda práticas conservadoras identificadas

na atuação dos profissionais, demonstrando dificuldade de incorporação dos novos

preceitos da política de assistência.

E nos coloca à frente do desafio de definir em que medida a PSE traz em

seus serviços o ranço histórico mais difícil de ser enfrentado. Ainda, se o processo

de mudança não for amplamente discutido, corre-se o risco de reproduzir

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expressões típicas do pensamento conservador, como despolitizar, moralizar,

culpabilizar o individuo, ajustar os desajustados e só mudar nomenclaturas,

colorindo a velha roupa.

Nestas quase duas décadas pós CF-88, as lutas pela transição das ações e práticas de assistência social para a condição de política pública tem apresentado inúmeros percalços, na medida em que esta direção supõe consolidar a assistência social como responsabilidade estatal distinta de sua histórica configuração enquanto prática eventual e subsidiária da sociedade, em geral, de iniciativa doutrinário-religiosa. Denomino esse processo de mudança de paradigma político na política de assistência social. (SPOSATI, 2007, p. 437).

Sendo assim, como a filantropia se apresenta hoje no campo assistencial,

especialmente na PSE? O Suas nos emancipou da filantropia? Ou temos hoje uma

filantropia escamoteada, mesmo com toda a nova organização proposta por seus

serviços? As entidades, por um âmago conservador, de fato afiançam as

seguranças sociais aos demandatários da PSE ou continuam reproduzindo um

modelo assistencialista? E os profissionais, onde se localizam nesse contexto?

Entende-se que a ruptura com modelos que não afiancem seguranças sociais

pode ser efetiva, na medida em que os gestores e os trabalhadores do Suas fizerem

a leitura e a operacionalização de forma radical, compreendendo efetivamente o que

significa a política de assistência social, examinando minuciosamente seus

fundamentos, em um processo subsidiado por estudos, socialização de experiências

e garantia do controle social.

Séculos de práticas sociais fragmentadas individualizadas tuteladoras que foram sendo designadas como de assistência social geram grande confusão no senso comum entre práticas assistencialistas e a proposição da política pública de assistência social presente na CF-88. (SPOSATI, 2007, p.436).

Toda transição impõe reflexão e a necessidade de dimensionar o significado

da mudança e coerência entre o que se quer e o que se pode, avaliando o que há de

inovação e que o novo tem de trazer consigo a crítica ao velho.

Fica a tarefa de estabelecer as mediações necessárias para entender e

conduzir esse processo de reordenamento da PSE e dos serviços

socioassistenciais.

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A pesquisa mostrou a ampla aceitação da tipificação como indutora desse

processo de reordenamento.

Arrisca-se a dizer, então, que a tipificação assume lugar central no que cabe à

assistência social como política pública de proteção social de garantir e prover,

contribuindo com a consolidação, em todo o País, dos serviços de assistência social,

que constituem a mediação privilegiada dos direitos socioassistenciais,

materializando um conjunto de seguranças; promovendo a cobertura de

necessidades sociais; e padronizando a oferta de atenções, assim possibilitando a

redução de riscos e vulnerabilidades sociais.

Num processo de reflexão crítica, pode-se afirmar que a tipificação representa

um avanço institucional de relevância para a consolidação do Suas e da política de

assistência no Brasil e de combate das práticas conservadoras, principalmente na

PSE.

Considero que são as heranças nos procedimentos da assistência social que devem ser rompidas e resignificadas sob novo paradigma, e não propriamente sua nomenclatura. (SPOSATI, 2007, p. 436).

Chamamos a atenção, ainda, para a necessidade de encampar a luta contra

a visão equivocada que se tem da assistência, a ser vista como afiançadora de

defesa dos direitos sociais, e não como é propagada por aqueles que a

desqualificam como proteção social não contributiva, com um pretenso cunho

assistencialista.

As bases estão postas nos princípios e nas diretrizes na PNAS e em sua

direção social. Cabe, agora, enfrentar os desafios e dilemas do percurso nesse

trânsito capacitador.Ajeitar aquiEsta pesquisa pretendeu reiterar conteúdos

importantes e trazer à baila discussões contemporâneas da PSE. Finalizamos com

Antonio Machado:

Caminhante, as tuas pegadas São o caminho e nada mais; Caminhante não há caminho, O caminho faz-se ao andar. Ao andar faz-se o caminho E ao olhar-se para trás, Vê-se a senda que jamais, Se há-de voltar a pisar.

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1. ANEXOS

Questionário

I- Identificação

1. Nome_____________________________________________________________

2. Setor de Trabalho:___________________________________________________

3. Função (assinale apenas uma alternativa):

( ) assistente social

( ) psicólogo

( ) educador

( ) coordenação

( ) outras. Especificar___________

4. Há quanto tempo trabalha na Política de Assistência Social: _________________

II – Em relação às novas formas de ofertar o serviço e as novas exigências de

se pensar o novo pela Política Nacional de Assistência Social, Orientações

Técnicas, Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais,entre outros:

5. Você se sente qualificado para atender a demanda com a qual atua:

( ) superior ao necessário

( ) suficiente

( ) insuficiente

( ) muito insuficiente, comprometendo o trabalho.

6. Em relação à caracterização da violação de direitos que competem ao

CREAS/PAEFI,você:

( ) não consegue caracterizar

( ) apresenta muito dificuldade

( ) apresenta alguma dificuldade

( ) apresenta facilidade

( ) sempre consegue

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7. Em relação à demanda do segmento com o qual atua, você conhece o conjunto

defesas de direitos?

( ) superior ao necessário

( ) suficiente

( ) insuficiente

( ) muito insuficiente, comprometendo o trabalho.

8. A Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais, na sua opinião:

( ) ajudou no reordenamento da política de assistência social

( ) atrapalhou

( ) não fez diferença

( ) não consigo dimensionar

( ) gerou confusão

9. Você identifica na atuação dos profissionais da Proteção Social Especial:

( ) a concepção de assistência como favor

( ) culpabilização do individuo que atende

( ) leituras moralizantes da realidade vivida pela demanda

( ) responsabilização da família

( ) prevalência de interesses políticos

( ) clientelismo

( ) fisiologismo

( ) primeiro damismo

( ) filantropia

( ) outras Especifique ________________________________________________

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TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Declaro, por meio deste termo, que concordei em responder às perguntas do questionário da pesquisa de campo referente a pesquisa intitulada “Dilemas e Desafios da Proteção Social Especial no âmbito do SUAS: uma contribuição ao debate”, desenvolvida por Joana Maria Gouveia Franco Duarte . Fui informado(a), ainda, de que a pesquisa é orientada por Maria Lúcia Martinelli e que poderei contatar a pesquisadora a qualquer momento que julgar necessário por meio do telefone nº: 11 99890-2557 ou 963721267 ou e-mail: [email protected] Afirmo que aceitei participar por minha própria vontade, sem receber qualquer incentivo financeiro e com a finalidade exclusiva de colaborar para o sucesso da pesquisa. Fui informado(a) dos objetivos estritamente acadêmicos do estudo, que, em linhas gerais é analisar os dilemas e desafios que estão postos na Proteção Social Especial. Fui também esclarecido(a) de que o uso das informações por mim oferecidas estão submetidos às normas éticas destinadas à pesquisa envolvendo seres humanos, da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP) do Conselho Nacional de Saúde, do Ministério da Saúde. Minha colaboração se fará de forma identificada , por meio de respostas assinaladas no questionário e ocorrerá a partir da assinatura desta autorização. O acesso e a análise dos dados coletados se farão apenas pela pesquisadora e sua orientadora. Estou ciente de que, caso eu tenha dúvida ou me sinta prejudicado(a), poderei contatar a pesquisadora responsável ou sua orientadora no Programa de Estudos Pós Graduados em Serviço Social da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP, situado na Rua Ministro Godoy, 969 - Perdizes CEP 05015-000- São Paulo - SP telefone (x-11) 3670-8000 A pesquisadora principal da pesquisa me ofertou uma cópia assinada deste Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, conforme recomendações da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP). Fui ainda informado(a) de que posso me retirar dessa pesquisa a qualquer momento, sem prejuízo para meu acompanhamento ou sofrer quaisquer sanções ou constrangimentos

São Paulo, ____ de _________________ de _____

Assinatura do(a) participante: ______________________________

Assinatura da pesquisadora: _______________________________