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POR QUE AINDA NÃO DEU CERTO? IGOR OLIVEIRA

POR QUE AINDA NÃO DEU CERTO - static-files.folhadirigida ... · buscando algo que na verdade não sabem o que é. Não vejo problema nisso em relação ... Não é disso que estou

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POR QUE AINDA NÃO DEU CERTO?

IGOR OLIVEIRA

Copyright ..........................................................................................................................3Dedicatória .......................................................................................................................4Sobre o livro .....................................................................................................................5Sobre o autor ....................................................................................................................6Porque você ainda não passou - e talvez nunca passe .....................................................7Minha definição de sacrifício .........................................................................................12O seu maior erro .............................................................................................................14Como criar passarinhos me ajudou a passar num concurso público ............................16Abrace o desconforto ......................................................................................................18O único dia fácil foi ontem .............................................................................................20Princípios básicos da motivação ....................................................................................22O local onde a aprovação acontece ................................................................................26Domine sua ansiedade ...................................................................................................29Elegância .........................................................................................................................31Fé na missão ...................................................................................................................33Você se comporta como gostaria? ..................................................................................35O caminho fácil do extremismo .....................................................................................39Lave o queijo cottage ......................................................................................................41O dia em que falhei miseravelmente .............................................................................44Votos de sacrifício ..........................................................................................................48Quando você é seu pior inimigo ....................................................................................52A fórmula definitiva para passar num concurso público ..............................................56O fluxo do momento ......................................................................................................58Como mergulhar no rio do momento ............................................................................61Engatinhe, ande e corra .................................................................................................65Cegueira sistêmica .........................................................................................................70Use seu cérebro para passar ..........................................................................................73Como ser mais eficiente, parte 1 - o conto do enrolador ...............................................77Como ser mais eficiente, parte 2 - Parkinson, o implacável .........................................81Como ser mais eficiente, parte 3 - Pareto, o sagaz ........................................................85Como ser mais eficiente, parte final - quando Joseph conhece Richard ......................89

SUMÁRIO

i

O otimismo realista (O Paradoxo de Stockdale) ...........................................................93Você ainda tem mais 20% ..............................................................................................96O pior não é tão ruim .....................................................................................................98

ii

Copyright©Igor Oliveira 2015. Todos os direitos reservados.Este e-Book é gratuito e sua comercialização é vedada.A reprodução de partes ou do todo é permitida apenas se citada a fonte.Revisão textual Isabela Oliveira Corrêa.

COPYRIGHT

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Para meus pais, Maria do Carmo e Osmar, que ensinaram a um menino agitado e bagunceiro que sambar num ritmo diferente não é necessariamente ruim. Minha visão otimista do mundo e tudo que sou hoje devo a vocês. Tento honrar todos os

dias o esforço que vocês fizeram por mim.

A meu irmão, Italo "Baxim", que divide comigo divagações sobre o sentido da vida, operações especiais no Afeganistão e viagens espaciais. No final das contas, é bom

demais ouvir você. Ainda mais quando você paga o almoço.

Amo todos vocês!

DEDICATÓRIA

iv

De tanto lidar com pessoas, você acaba descobrindo umas coisas bem curiosas. Uma delas é que a maioria das pessoas é confusa com relação a quase tudo. Passam a vida buscando algo que na verdade não sabem o que é. Não vejo problema nisso em relação a situações corriqueiras. Mas quando é preciso um esforço disciplinado, como na pre-paração para um concurso público, por exemplo, essa indefinição se torna um grande problema. Digo isso porque percebi que apenas pensamentos disciplinados geram ações disciplinadas. Já pensamentos confusos geram ações inócuas, que servem ape-nas para nos cansar.

Outra constatação interessante é que a maioria dos alunos com os quais lidei sabi-am estudar, porém não conseguiam fazê-lo. Não era a falta de uma técnica de estudo reveladora que impedia a prática de uma rotina eficiente de preparação. Para a minha surpresa, quase todos os alunos conheciam as técnicas, porém não conseguiam aplicá-las. É como uma pessoa que sabe que necessita se alimentar bem e fazer atividade físi-ca para emagrecer, no entanto não consegue aplicar a teoria à prática.

Os artigos deste modesto trabalho foram escritos no ano de 2015 e se originaram da minha curiosidade em buscar soluções práticas para aperfeiçoar as habilidades ne-cessárias à implementação de uma rotina disciplinada, seja ela qual for.

Quase todos eles partem de um princípio básico: é o comportamento, não o pen-samento, que define quem você é e o resultado de suas ações. A maioria de nós espera uma motivação externa ou interna para começar a malhar, estudar ou fazer qualquer outra atividade que exija esforço disciplinado. Isso foi o que aprendemos ao longo da vida. No entanto, é uma noção incompleta do processo. Pelo menos foi o que eu perce-bi observando alunos e soldados, quando era oficial das Forças Armadas.

A lógica proposta no contexto deste livro é outra: primeiro você faz, depois você pensa. E de tanto fazer, o comportamento irá modular os pensamentos, transforman-do você em um exímio executor. E é basicamente disto que você precisa para passar num concurso público: executar.

Espero que o livro lhe seja útil! Forte abraço!Igor Oliveira.Madre de Deus de Minas-MG, dezembro de 2015.

SOBRE O LIVRO

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Igor Nascimento Oliveira foi piloto de helicóptero da Marinha do Brasil, onde serviu por quinze anos. Formou-se na Escola Naval em 2002 como oficial Fuzileiro Naval. Trabalhou ainda na Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) e atualmente é servidor da Superintendência de Seguros Privados (SUSEP). Atua como coach para concursos públicos no Ponto dos Concursos. Escreve por hobby e para organizar seus pensamentos.

SOBRE O AUTOR

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Neste exato momento milhões de pessoas estão estudando para concurso público no Brasil.

E uma coisa é fato. A maioria não irá passar.Há pessoas que estão estudando agora que nunca chegarão perto de tomar posse

num cargo público. Não estou fazendo terrorismo, mas me baseando em dados concre-tos. Como sei? Ora, é simples. Não há vagas para todos. A oferta de vagas quase sem-pre é esmagadoramente menor que o número dos candidatos. Ou seja, sempre haverá candidatos “sobrando”.

Apesar de ser assustadora, a relação candidatos versus vagas não é, em si, o moti-vo das pessoas não lograrem êxito no concurso de seus sonhos. A formação acadêmi-ca, apesar de ajudar indiretamente, também não é a principal responsável pelas desis-tências ao longo do processo. São fatores relacionados à personalidade do indivíduo que mais contribuem para o sucesso ou fracasso dos candidatos.

PORQUE VOCÊ AINDA NÃO PASSOU - E TALVEZ NUNCA PASSE

“Se você não está disposto a arriscar, esteja disposto a uma vida comum”

~ Jim Rohn

CAPÍTULO 1

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De fato, quase sempre, é a própria pessoa que se autossabota durante a jornada. A maior parte dos que iniciam a marcha desiste por motivos aparentemente “inexplicá-veis”, totalmente “alheios” à sua vontade.

Antes de mais nada, que fique claro que quem passa em concurso não é melhor que ninguém, nem mais inteligente. Há pessoas de má índole e babacas em todos os círculos sociais e econômicos. A aprovação não vai transformar você em algo que você já é.

No entanto, a pessoa que passa em concurso público apenas se comportou de uma forma que favoreceu sua própria aprovação. Veja que eu disse “comportou”, não disse “nasceu”. Comportamento é escolha e para você passar você deve fazer as esco-lhas certas.

Simplificando, nesse meio, há dois tipos de candidatos: os que desejam passar e os que querem passar. Se você estuda há algum tempo sem lograr êxito, muito prova-velmente você apenas deseja passar. Não quer de verdade.

As pessoas que desejam passar e melhorar de vida representam a maioria dos candidatos. Elas desejam ter uma casa melhor, um carro mais bacana, usar roupas de marca, viajar, conhecer a Disney, enfim fariam de tudo para ter uma vida mais plena. Não há nada de errado em querer melhorar de vida e realizar sonhos materiais legiti-mamente. Não é disso que estou falando. As pessoas que querem também tem seus so-nhos, assim como as pessoas que desejam. Entretanto, há diferenças básicas entre elas. E justamente são essas diferenças de comportamento que definem quem vai con-seguir derrubar o muro e quem vai ficar chorando pelos cantos.

Tome nota:– Quem deseja passar não acredita de fato que vai passar. A pessoa que desejaria

melhorar de vida estuda com o pensamento de que “quem sabe dá certo um dia”. Quem quer de verdade estuda com “sangue nozói e o coração cabiludu” (ou seja, muita vontade). A pessoa que quer senta para estudar e age de uma maneira que aquele seu esforço vai, de alguma forma, produzir algum efeito positivo em sua vida. Quem dese-ja passar é um jogador. Quem quer passar é um soldado. E, de uma forma geral, nós validamos com atitudes aquilo que acreditamos. Se você se nutre com pensamentos po-sitivos de esperança, você irá agir de forma a validar esses pensamentos. Quem não acredita que vai passar, não estará disposto a fazer o que for preciso, o tempo que for necessário e criará uma série de restrições ao seu avanço. Vou dar um exemplo pessoal para você entender melhor o que é querer de verdade. Quando eu estudava, meu supe-rior na Marinha me chamou para comunicar que minha casa na vila dos oficiais havia sido liberada, me deu os parabéns e perguntou quando eu iria me mudar. Agradeci e

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disse que não iria me mudar, pois iria fazer apenas uma mudança naquele ano, depois que eu fosse aprovado num concurso público (não havia nem edital na praça). Preferi pagar aluguel até o final do ano que me mudar para a vila dos oficiais. Acabou que foi justamente naquele ano que passei e me mudei definitivamente. Endossei com ações aquilo que eu acreditava.

– A vida dos que desejam é baseada no “mas”. “Eu adoraria passar para Auditor da Receita Federal, mas eu não gosto de Contabilidade”. “Eu queria tanto passar no concurso do BACEN, mas é tão difícil”. “Eu estou estudando, mas vai levar muito tem-po, a concorrência é grande”. “Eu desejaria tanto passar para o TCU, mas nossa, é mui-to complicado”. A vida dos que querem passar é guiada por uma espécie de cegueira. Na verdade, o foco dos que querem passar é muito estreito. Eles veem a missão e nada mais. O restante (respeitando o bom senso natural) é obstáculo que deve ser ultrapas-sado. “Matemática? Eu aprendo. Uma hora eu aprendo”. “Concorrência? Tô nem aí, deixa eu estudar”. A pessoa que deseja passar dá ênfase aos obstáculos. A pessoa que quer passar dá ênfase na sua capacidade de continuar de alguma forma.

– Os que desejam adoram se fazer de vítimas. “A culpa é do CESPE, que tem esse estilo canibal”. “A culpa é do material que escolhi, professor ruim”. “A culpa é dos meus pais ou do meu marido/esposa, que não me dão força”. Agora eu pergunto a você: quem escolhe estudar ou não? Você. Quem decide se vai ver NETFLIX ou sentar na escrivaninha? Você. Quem escolhe agir ou não? Você. A culpa, quase sempre, é sua. Não quero dizer sempre, pois não conheço a vida de todo mundo. Mas, pelo que eu já vi, a responsabilidade pelo fracasso ou sucesso da jornada é da própria pessoa. Quem passa cria sua preparação e se sente responsável por ela. Não existem vítimas aprova-das.

- Quem deseja melhorar de vida e não quer de verdade arruma desculpa para tudo. Os “desejadores” são os mestres da racionalização. “Hoje não deu, porque meu trabalho, sabe como é, foi puxado”. “Hoje não deu, porque, nossa, esse friozinho dá uma vontade de comer uma pizza, né”? “Ah, preferi nem estudar, porque eu só tinha uma hora”. Quem deseja é mestre em apontar dificuldades. Quem quer é mestre em ignorar o drama. Ignorar a dor, o desconforto e as pequenas distrações pelo caminho. Como disse, foco estreito, foco na missão.

– Quem deseja vive com culpa do passado e do futuro. Quem não estuda, mas de-seja melhorar de vida vive com culpa. Culpa de não ter estudado quando podia, claro. Mas culpa também com relação aos dias futuros que ele não estudará, pois quem dese-ja e não quer sabe que não vai estudar, tamanha a falta de fé em si mesmo. A única cul-pa que a pessoa que quer de verdade carrega é a de não ter estudado mais ontem, pois

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foi vencido pelo cansaço físico. Mas é uma culpa que nem é culpa direito. É apenas um sentimento de que poderia sempre um pouco mais. É o que impulsiona a pessoa que quer: querer melhorar sempre.

– Os que desejam passar sentem inveja de quem passa. Costumo escutar às vezes “não estudei hoje, porque fiquei sabendo que meu amigo de infância passou e ele era mais burro que eu na escola. Isso me abalou”. Esse sentimento, na verdade, chama-se inveja e é muito feio. Observe as pessoas que passaram e deseje estar ali também. Sin-ta-se merecedor de servir ao lado das pessoas que você admira. Muitos deles serão seus colegas de trabalho daqui uns dias. Veja quais comportamentos as pessoas que passaram tiveram em suas preparações e tome para você os bons exemplos. Sentimen-tos mesquinhos de inveja e revanchismo nunca, na história da humanidade, levaram alguém a algum lugar. Não se compare e adote uma postura mais grata com relação à sua vida.

– Quem deseja se arrasta. Para quem não quer de verdade o momento do estudo é como uma tortura. Não estou dizendo que estudar para concurso é a coisa mais legal do mundo. Mas é o que precisa ser feito para ser aprovado. E se precisa ser feito, que tentemos encontrar prazer na jornada por dois motivos: (i) você não sabe quando vai passar e, portanto, estudar será a sua realidade por tempo indefinido e (ii) seu rendi-mento será muito melhor se estudar com vontade. Como disse, endossamos com ações aquilo que acreditamos. Se você acha estudar chato, você não validará sua crença atra-vés de seu comportamento. Repita com você mesmo: “estudar é massa! Vou aprender coisas novas, por meio das quais melhorarei de vida”! Pare de se arrastar e viva sua preparação. Se você não viver o processo, muito provavelmente não obterá o sucesso.

– A pessoa que deseja adora reclamar. Você já viu uma pessoa aprovada num bom concurso reclamando de tudo o tempo todo? “A matéria é chata, detesto estudar, o processo é injusto”. Talvez você tenha visto, mas eu nunca vi. Ao invés de reclamar, seja grato pela oportunidade que está tendo de se aperfeiçoar com seu próprio esforço. Você acaba atraindo o que emana. Se você reclama o tempo todo, você atrairá até você um monte de obstáculos. Você já notou como é sofrida a vida de quem reclama? Seja positivo e pare de reclamar!

– O pior de todos: falta de humildade. Às vezes recebo uns e-mails do seguinte tipo: “estou te escrevendo, pois quero ver como é esse negócio de coaching para con-cursos. Tô precisando passar num concurso logo”. Desse jeito mesmo, sem nem “bom dia”. Aí eu pergunto: “você estuda como”? A pessoa diz: “eu faço assim”. Eu digo: “tal-vez seja por isso que você não tenha passado. Isso é algo a ser corrigido”. A pessoa, quando responde, diz assim: “mas é assim que eu faço, são esses os livros que eu gos-

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to, então é assim que vou fazer”. Então tá, né? Abra mão da necessidade de estar sem-pre certo e veja o que as pessoas aprovadas tem a lhe oferecer. Não precisa contratar um coaching. Não estou dizendo isso. Estou dizendo para você se abrir para novas pos-sibilidades. Quando estava endividado e olhava para aqueles livrinhos de educação fi-nanceira na estante da livraria pensava comigo: “que chatice”! Mas o universo tem um mecanismo lindo para lidar com a falta de humildade e egos inflados: sofrimento. Quem não tem humildade de aprender, assim como eu não tive naqueles tempos som-brios, sofre até se ver numa posição em que a única saída é pedir ajuda. Isso é lindo! Imagine se não houvesse essas engrenagens invisíveis por aí? Quantas pessoas com po-tencial ficariam anos batendo a cabeça na parede por falta de humildade. O sofrimen-to é uma oportunidade de crescimento.

Ninguém nasce com o direito legal de ser bem sucedido. Você tem que brigar pelo sucesso. Os cargos vagos não são tronos esperando por herdeiros, mas por guer-reiros.

Quem quer passar de verdade entra para ganhar. Nós só conseguimos aquilo que realmente queremos. Querer é com o coração. Desejar é com a cabeça, com a razão. Você sabe que passar é o melhor para você, mas você não quer de verdade. Quem quer assume o compromisso firme de ser aprovado. Quem deseja, gostaria de ser aprovado.

Estudar para concurso não é um encontro de jovens. É preciso sacrifício com res-ponsabilidade, comprometimento, estratégia e profissionalismo.

A partir disso, faça-se a seguinte pergunta: que tipo de vida eu quero levar? Vou abandonar meus sonhos? Vou perder a briga invisível que se desenrola na minha men-te? Lute por aquilo que acredita! E endosse sua crença com ações.

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Michael Monsoor, um elemento de operações especiais da Marinha Americana, estava em um telhado no Iraque lutando contra insurgentes, quando um dos inimigos lançou uma granada em direção a sua equipe. A granada ricocheteou em seu peito e caiu no chão.

Monsoor não pensou duas vezes. Pulou em cima da granada para absorver o im-pacto da explosão. Monsoor faleceu 30 minutos após o evento, longe de casa, em 29 de setembro de 2006. Todos os outros integrantes da equipe sobreviveram.

Um detalhe importante é que Monsoor era o único no telhado que tinha acesso direto a uma rota de fuga. Era o único que tinha chances reais de sobreviver. Mas esco-lheu o sacrifício. Com certeza, naquele momento, ele não pensou que deixaria de ir na Disney com seus filhos ou que não poderia quitar a hipoteca de sua casa. Ele agiu con-duzido por um propósito grande. E é justamente isso que as pessoas que estão dispos-tas a se sacrificar fazem: elas são guiadas por sentimentos nobres de honra e dever. Pessoas que pensam apenas em dinheiro ou em glória, raramente conseguem susten-tar, por grandes períodos de tempo, a paixão necessária para dar cabimento à tarefa.

MINHA DEFINIÇÃO DE SACRIFÍCIO

“Seja o que for que você faça, você tem que sustentar uma posição, quer pela excelência, quer pela mediocridade”

~ Brandon Webb

CAPÍTULO 2

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Quando estudava para um concurso público e me sentia pequeno diante do desa-fio, eu sempre trazia à tona meus propósitos, como, por exemplo, ter mais tempo para minha família e permitir que minha esposa dormisse em paz sem a incerteza de despe-dir do marido todos os dias e não saber se ele iria voltar ou não. Jamais pensava que a aprovação em um bom concurso permitiria ter uma casa com piso importado ou usar a roupa da moda. A nobreza dos meus sentimentos impulsionou minha vontade e anes-tesiou a dor oriunda dos sacrifícios.

E foram muitos.Era preciso sacrificar meu lazer particular para garantir que meu filho tivesse

uma boa lembrança de sua infância, mesmo durante minha preparação.Era preciso sacrificar minha carreira para dar paz a minha esposa.Ninguém que se sacrifica de verdade o faz por motivos pequenos ou mesquinhos.

Monsoor não pulou na granada por vingança, para aparecer ou dar autógrafos. Ele não deu chilique e nem reclamou que era a “sua vez”. A missão estava clara em sua mente: ele fez porque tinha que que ser feito.

Michael Monsoor foi condecorado, postumamente, em uma cerimônia na Casa Branca, com a mais alta homenagem das Forças Armadas Americanas, a Medalha de Honra, por sua bravura e patriotismo. No seu túmulo está escrito NO REGRETS (sem arrependimentos).

Essa é a minha noção de sacrifício. Relacionada ao cumprimento altruísta do de-ver. A fazer o que precisa ser feito, com amor e devoção, sem esperar nada em troca. Se não for assim, o desconforto vai falar mais alto e você vai abandonar sua missão. É preciso um propósito nobre para se sacrificar.

Se você está achando contabilidade ou matemática difícil demais, ou que o mun-do não conspira a seu favor e que sua aprovação está demorando, sugiro que reveja sua definição de sacrifício. Pode estar precisando.

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Sob o ponto de vista da evolução, as regiões mais interiores do cérebro são aquelas mais antigas, que se formaram primeiro. Elas são responsáveis por uma série de roti-nas automáticas que polvilham seu dia, muitas das vezes sem você perceber. Escovar os dentes é um exemplo dessas rotinas que executamos “sem pensar”.

Já a parte superior do cérebro foi a última a se formar e está relacionada à nossa capacidade analítica.

Quando repetimos, inúmeras vezes, uma determinada tarefa utilizando as regi-ões superiores, o cérebro internaliza esse comportamento e o aloca nas regiões inferio-res. É uma forma de economizar energia, pois imagine se tivéssemos que analisar mi-nuciosamente cada pequeno procedimento que envolve as tarefas simples do cotidia-no. Seria um grande desgaste viver assim.

No entanto, essa região mais primitiva não está destinada apenas a tarefas peque-nas. Todo comportamento que exige um grau de automação é executado por essa par-te do cérebro. Voar um helicóptero, por exemplo, demanda uma série de pequenos mo-

O SEU MAIOR ERRO

“O coração não se conforma com o que o cérebro tenta impor”

~ Albert Einstein

CAPÍTULO 3

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vimentos coordenados para decolar e pousar a aeronave. Outro exemplo. Um atleta de futebol não analisa cada drible que faz. É uma reação automática do cérebro.

Quando você tenta analisar aquilo que você precisa apenas fazer é como se o Neymar entregasse o controle dos seus dribles a um cientista esportivo. A parte superi-or do cérebro sabe analisar, mas não sabe cumprir.

Esse é o seu maior erro.Quando chega o momento do seu estudo e você começa a analisar se vai ou não

passar, se o que está estudando é certo ou suficiente, é como se você tentasse driblar utilizando o cientista. O correto aqui seria confiar na parte inferior do seu cérebro e ir imediatamente para escrivaninha “sem pensar”.

As minhas melhores performances de voo durante o curso de pilotos foram aque-las em que confiei nos meus instintos e deixei a parte de baixo do cérebro trabalhar. Já os meus piores rendimentos foram aqueles em que eu decidi analisar, durante o voo, se iria me sair bem naquele dia.

Toda vez que você tenta analisar aquilo que você necessita apenas cumprir, você não tem um bom rendimento na atividade proposta.

Quando um determinado edital é publicado e você não está se preparando para o mesmo, a parte de cima do seu cérebro começa a analisar as alternativas disponíveis para você desempenhar bem aquela tarefa. O certo aqui seria você apenas cumprir os critérios estabelecidos por você durante a fase de planejamento.

O que mais pode ser feito?O jogador de futebol tem ciúmes do cientista e vice-versa. Para agradar a ambos,

basta reservar um período para atender as duas entidades. Faça sala tanto para o joga-dor de futebol quanto para o cientista. Ou seja, reserve um momento para pensar, que seja diferente do momento de estudar. A hora do estudo não deve ser utilizada para traçar planos ou duvidar de sua capacidade. Faça isso em outro momento.

Entender como esses mecanismos mentais funcionam e utilizar isso a seu favor é uma forma de se frustrar menos e dar cabimento aos seus projetos.

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Quando eu era criança adorava criar passarinhos. Hoje já não gosto mais de vê-los pre-sos. São mais bonitos soltos. Mas na década de oitenta essa era uma prática comum no interior de Minas. Eu tinha muitas gaiolas, cerca de dez. Além disso tinha um cachor-ro, o Rex.

Eu era extremamente zeloso com as aves. Gostava de ver as gaiolas limpas e os animais muito bem tratados, com água e comida fresca todos os dias. Ter essa respon-sabilidade me obrigava acordar uma hora mais cedo que meus colegas de escola. Eu tinha um planejamento de pegar gaiola a gaiola, limpar o chão, jogar areia, trocar a água, soprar o alpiste, colocar vitamina para cada um dos pássaros. Havia ainda algu-mas idiossincrasias, como a alimentação dos canários, em que era necessário cozinhar um ovo todos os dias pela manhã como reforço à alimentação.

Constantemente saía com minha bicicleta e o Rex pela cidade em busca de exem-plares raros que adquiria simplesmente à base troca e geralmente com pessoas bem mais velhas.

Analisando hoje, observo que eu tinha uma pequena empresa de aves.

COMO CRIAR PASSARINHOS ME AJU-DOU A PASSAR NUM CONCURSO

PÚBLICO

“Todas as pessoas grandes foram crianças um dia, mas poucas se lembram

disso”

~ O Pequeno Príncipe

CAPÍTULO 4

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A essa altura você pode estar se perguntando: o que isso tem a ver com concurso público?

Ora, tudo. Nessa época eu tinha nove anos de idade e uma responsabilidade que meus amigos não tinham. Por diversas vezes abandonei o pique na praça para levar uma ave ao veterinário local. Ao criar pássaros, sem ninguém me mandar, desenvolvi habilidades de autorregulação e planejamento, fundamentais a qualquer empreitada na vida. Desde novo eu aprendi a postergar um prazer imediato (pique) em prol de um objetivo futuro (pássaros bem cuidados).

Há estudos interessantes nesse sentido na área da psicologia. Existe até um bem famoso que coloca crianças de quatro anos em frente a um doce com a seguinte propos-ta: se você não comer esse doce por quinze minutos você receberá dois. O grupo de cri-anças que se saiu bem no teste aos quatro anos de idade teve menos incidência de gra-videz na adolescência, uso de drogas e álcool. Além disso, tinha empregos melhores e era menos endividado quando adultos que o grupo que detonou o doce na hora.

A capacidade de autodisciplina, como a que eu adquiri ao criar meus pássaros, foi fundamental no sucesso dessas crianças. Até mais que o passado econômico.

No coaching, os meus melhores alunos são aqueles que conseguem evitar o Whatsapp para estudar naquele dia. Eles são capazes de visualizar antecipadamente o resultado de suas escolhas e agir visando a algo melhor no futuro. Alunos que tiveram uma infância pobre e encararam as dificuldades como desafios, não como motivo de autopiedade, treinaram, desde novos, a enfrentar os estudos com alegria e seriedade.

Uma boa notícia? Autorregulação é uma habilidade que é possível desenvolver. Práticas esportivas são bom vetores. No esporte você é obrigado a fazer um grande es-forço para atingir melhores resultados. Você, ao invés de ver TV até tarde da noite, tem que dormir cedo. No lugar do hambúrguer, uma salada. Toda prática em que é pre-ciso trocar um prazer imediato em prol de um benefício futuro, ali você está treinando sua autorregulação. E, como acontece com todas as nossas habilidades sutis, a prática em uma área transborda seus efeitos para outras áreas, inclusive estudar para um con-curso público.

Ler é moleza. Todo mundo sabe, afinal. Conseguir ignorar os prazeres imediatos (ou os problemas) e sentar todos os dias para estudar que é o grande desafio.

Se seu filho lhe pedir um animalzinho ou então para entrar na aula de futebol, o que você faria? Quando meu filho me pediu um coelho, não pensei duas vezes, fui lá correndo e comprei um pra ele.

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Esses dias acordei às 05h da manhã, como sempre faço, para meditar, responder aos alunos e fazer minha atividade física diária. Estava frio e a cama muito convidativa. Imediatamente minha mente se encheu de pensamentos sabotadores e eu fiquei me questionando o motivo dos meus esforços.

“Pra quê fazer isso agora? Por que não deixar para mais tarde? Eu preciso real-mente passar por isso? Gostaria tanto que fosse diferente”?

Consciente de que estava perdendo a guerra pra mim mesmo, decidi abraçar de vez o desconforto. Ao invés de negar a realidade (fria, por sinal), passei a aceitá-la e, com menos esforço que o usual, levantei-me e fui para o meu banho.

Tenho certeza que você, por diversas vezes, ao sentar para estudar, já passou por situação semelhante. Você se dirigiu para a escrivaninha, mas duvidou de sua capaci-dade ou de que todo aquele esforço renderia algum fruto. Você rotulou a matéria como difícil ou chata e ao, invés de abraçar o desconforto, você o negou, fugiu e procurou por algo mais fácil para fazer, como mexer no celular ou ver sua série de TV favorita.

ABRACE O DESCONFORTO

“Qualquer mudança, mesmo uma mudança para melhor, é sempre

acompanhada de inconvenientes e desconfortos”

~ Arnold Bennett

CAPÍTULO 5

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No dia seguinte, sofreu com a ressaca da indisciplina e tentou justificar para você mes-mo porque não conseguiu.

Eu também já fiz isso e me senti mal, assim como você. Mas aprendi que a indis-ciplina surge do nosso julgamento. Você foge de situações “ruins” e tende a se aproxi-mar de situações “boas”. Mas não há bom ou ruim. Não há matéria difícil ou fácil. Há apenas a matéria. O julgamento é por sua conta. E esse julgamento é a ruína da sua dis-ciplina, pois, ao rotular fatos e objetos, você se vê obrigado a escolher entre duas reali-dades: a dura, representada pelos estudos, ou a boa, representada pelo sofá, pelo smartphone ou, no meu caso, pela cama quentinha.

Quando você não julga, você não nega, pois a negação é o produto de um julga-mento parcial. E toda negação da realidade gera sofrimento. Eu neguei o frio e você, provavelmente, os livros. Ao julgar e negar, fomos obrigados a escolher. E se escolher-mos errado, sofremos por isso.

Quando estiver estudando, ao invés de negar a realidade, tente isso por alguns se-gundos. Pare o que está fazendo, retome a consciência e preste atenção aos objetos ou pessoas ao seu redor. Não julgue, nem imagine como você gostaria que fosse. Apenas faça um esforço para enxergar a realidade como ela realmente é. Não rotule a matéria, o livro ou a banca. Apenas presencie o momento. E leia. E respire. De forma vigilante e disciplinada. Não há esforço em suas ações. Há apenas a ação. Quando você menos no-tar, você terá cumprido sua meta. E terá orgulho de si mesmo. E irá querer sentir isso amanhã novamente. Porque é bom e traz uma paz verdadeira, que somente os verda-deiros guerreiros sentem ao sair do campo de batalha. A paz do dever cumprido.

Essa é a verdadeira disciplina. De fazer o que preciso ser feito, mas sem tortura mental.

Em momentos de desespero, as pessoas tendem a confundir disciplina com eufo-ria. Mas essa não é a verdadeira disciplina. Pois a euforia passa e para de alimentar sua vontade. A verdadeira disciplina é calma, serena, constante e uma exclusividade dos que abraçam o desconforto, porque não o julgam.

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Um dos tipos de mensagem que eu mais recebo é de candidatos agoniados, relatando que não conseguem se manter presos ao planejamento traçado em face de eventos inesperados na rotina. É o famoso: “só porque eu comecei a estudar tudo de ruim está acontecendo comigo professor”.

O que você deve entender é que, para cumprir sua missão, o dia não precisa ama-nhecer ensolarado, com nuvens de algodão doce no céu e fadas cantando no jardim. As pessoas tem mania de condicionar seu comportamento às circunstâncias e não li-dam bem com os estudos quando as coisas fogem do controle.

Quando eu estudava para concurso, praticamente todos os dias eram complica-dos. Toda sorte de dificuldades povoava minha rotina: minha esposa de TPM aborreci-da com alguma coisa, meu filho de dois anos clamando por minha presença, meu co-mandante me ligando de madrugada para voltar imediatamente para o esquadrão para o resgate de algum ferido, meu “amigo” de todos os meses vindo me visitar (che-que especial), entre outros. Isso quando tudo não acontecia de uma vez ou eu era man-dado para uma missão de duas semanas no meio do Pantanal , o que me impossibilita-

O ÚNICO DIA FÁCIL FOI ONTEM

“Não tente ser uma pessoa de sucesso. Em vez disso, seja uma pessoa de valor”

~ Albert Einstein

CAPÍTULO 6

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va de estudar. A impressão que eu tinha era que sempre piorava e o único dia fácil na verdade havia sido ontem, fazendo alusão a uma famosa frase militar.

Não vou dizer que esses acontecimentos nunca me influenciavam ou que estuda-va bem todos os dias, mas eu ansiava por guerra. Tinha um sonho e estava disposto a me doar por ele, mesmo que eu tivesse que estudar atolado de trabalho, endividado, brigado com a patroa ou tendo que administrar o furor de uma criança de dois anos.

Quase nunca estudava o tanto que julgava suficiente. Cansei de estudar por trin-ta minutos, uma hora por dia. No entanto, eu sempre ficava agradecido com a oportu-nidade de estar estudando e alegre por não desistir. Além da gratidão, a autossugestão positiva era minha companheira e uma frase que sempre guiava meus esforços era “você pode não ter tempo ou condições, mas raça não se vende em prateleira, ninguém pode comprar e isso você tem de sobra”.

O que está em jogo aqui não é a qualidade de seus estudos ou a beleza de sua pla-nilha de horas líquidas, mas sua autoconfiança. Isso porque, se você consegue, mesmo “sob fogos”, cumprir suas tarefas, o músculo da sua autoestima vai ficando cada vez mais forte. Consequentemente, a sua força para enfrentar seus medos aumenta. O con-trário também é verdadeiro: se a cada pequeno problema você ceder, dentro em breve você desistirá, antes mesmo de começar, tudo porque não confia na sua capacidade de sustentar o esforço. Assim eu lhe digo que se tem algo que você deve proteger é sua au-toconfiança.

A vida de todos nós tem altos e baixos. Ter problemas não é uma exclusividade sua. Mas há aqueles que focam nos problemas e outros que direcionam sua atenção em cultivar o pouco que tem, tanto em termos de tempo, quanto em termos de cora-gem.

Há certas rotinas que devem ser executadas, mesmo quando não queremos. Se seu filho brigasse para não escovar os dentes, o que você faria? Iria deixar que os den-tes dele apodrecessem? Não! Ele TEM que escovar e pronto. Se você quiser passar num concurso, faça o mesmo: estude e pronto! Não condicione o seu rendimento e aprenda a se tornar imune ao tempo e ao cansaço. Sem se esquecer que a maior imuni-dade deve ser contra seus próprios pensamentos. Com efeito, a maioria das vezes que um aluno não cumpre suas metas é por problemas autofabricados. Não existem no mundo real. Ele inventou e se deixou levar.

Não viva sob o lema do “se eu acordar bem disposto, concentrado, motivado eu vou render muito nos estudos”. Desenvolva a habilidade de fazer o que deve ser feito, independentemente de como você se sente a respeito. Ajuda a cuidar da saúde bucal e a passar no concurso público também.

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Não há dúvidas de que a motivação é uma espécie de combustível que nos mantém em movimento, rumo ao nosso objetivo. Muitas pessoas encontram dificuldades para se manter motivadas, seja por motivos externos (trabalho) ou internos (falta de fé na mis-são). Parece difícil estar motivado o tempo todo, mas não é. Respeitadas as característi-cas individuais, há certos princípios que podem ser empregados, independentemente se você está com vontade ou não de fazer o que precisa ser feito, como estudar, por exemplo. Não são regras imutáveis, mas que gozam de algum fundamento prático. Elas são especialmente úteis quando não sabemos o que fazer ou não temos ânimo para tanto. Algumas são conceitos, outras são dicas mais práticas. Tome nota:

- O que você faz em uma área da vida transborda em outras. Se você é uma pes-soa disciplinada nos esportes, com algum ajuste você consegue empregar essa discipli-na nos estudos. Se você vive esbaforido, correndo de um lado para outro, talvez você se sinta agitado no momento em que está lendo. Se você tenta se concentrar lavando louça, muito provavelmente você vai se concentrar nos estudos.

PRINCÍPIOS BÁSICOS DA MOTIVAÇÃO

“Métodos, pode haver milhões, mas princípios são poucos. O homem que se

guia por seus princípios pode ter sucesso ao escolher seus métodos. O homem que

tenta métodos, ignorando princípios, certamente encontrará problemas”

~ Ralph Waldo Emerson

CAPÍTULO 7

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- Habilidades sutis podem ser melhoradas. A maioria das pessoas acredita firme-mente que habilidades como disciplina, concentração, comprometimento e lidar com pressão são capacidades fixas, como rótulos que recebemos quando nascemos. Na ver-dade, essas habilidades são como músculos, pois podem ser marombadas ou adapta-das à necessidade imposta pela tarefa. Ninguém nasce ansioso ou indisciplinado. O problema é que as pessoas acreditam que não podem melhorar e, por isso, não ten-tam. Toda vez, por exemplo, que você consegue trazer seu foco de volta aos livros após uma divagação é como se você estivesse levantando um peso na academia. Seu foco fica mais forte. Voltemos para a louça. Lavar louça é uma ótima oportunidade de trei-nar concentração e disciplina. Disciplina porque, lavar louça, é algo que, comumente, as pessoas não gostam de fazer e, concentração, porque geralmente nossa mente viaja quando estamos executando essa tarefa.

- Suas capacidades diárias são limitadas. Em que pese a propriedade de serem aperfeiçoadas, as nossas habilidades sutis tem um estoque diário limitado. Se você des-perdiça seus recursos de atenção com redes sociais e joguinhos, não vai sobrar muito para os estudos. Quando você se mete em briguinhas no trânsito ou no trabalho, sua capacidade de autorregulação diminui. Utilize com sabedoria seus recursos de foco, disciplina, comprometimento e paciência.

- Busque ser equilibrado. Mesmo estudando, trabalhando, sempre arrumei tem-po para me exercitar e ficar com minha família. Noto que é mais uma questão de orga-nização que falta de tempo. Costumamos dar muito atenção a atividades pequenas de nossa rotina e abandonamos o que é importante. Na verdade, deveria ser o contrário. Deveríamos dar atenção ao que é importante, como estudar, exercitar-se e ficar com quem amamos, e tentar remanejar o restante. Acho que o pragmatismo que herdei da caserna me ajudou a enxergar o que é essencial e remanejar o supérfluo.

- Não sabe o que fazer, organize-se. Se não sabe o que estudar ou se não está com disposição para tanto, organize-se. O quê? Tudo! Desde suas gavetas até sua caixa de e-mails. O modo como você emprega seu espaço diz muito sua personalidade. No tra-balho, por exemplo, pessoas com a mesa mais limpa costumam ser mais eficientes. Não estou dizendo que elas produzem mais. Mas sim que produzem igual, num tempo menor (eficiência). Ambientes organizados nos deixam menos agitados e permitem que foquemos mais intensamente na tarefa, uma vez que nossa atenção não é dividida com o excesso de estímulos. Todas as vezes que eu me sentia perdido, como num cur-so ou assumindo uma chefia, eu sempre me agarrava à necessidade de organizar. Eti-quetava, limpava, excluía o que não era preciso até que a cinemática do processo passa-va a fazer sentido.

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- Não busque dinheiro, mas sim experiências para se aperfeiçoar. Dinheiro não é motivação. Ele pode ser a chama inicial, que dá ignição ao processo. Mas para manter a caldeira acesa, é preciso um motivo maior. Acho interessante focar em “aprender”. Quando eu decidi estudar para um concurso público, claro que pensava em ganhar mais. No entanto, passado um tempo, percebi que aquela motivação inicial não era su-ficiente especialmente em face dos enormes obstáculos de se manter uma rigorosa roti-na de estudos. Decidi encarar tudo como um processo de aprendizado. Ao invés de fi-car irritado com minha rotina apertada, tentava aprender habilidades de organização, que poderiam me ser úteis em qualquer fase da vida. Sempre é possível aprender. Se você come ou gasta demais, você pode utilizar isso para aprender a lidar com seus im-pulsos. Quando aprender passa a ser seu norte, o foco deixa de ser o produto dos seus esforços e passa a ser o processo. A ansiedade de querer chegar logo ao fim se abranda e a qualidade da execução aumenta. O dinheiro acaba chegando mais rápido.

- Não tenha pressa de evoluir. Explorando mais um pouco o conceito, quando co-meçamos uma jornada que nos exige a troca de nosso momento de lazer por trabalho, costumamos implorar para que tudo passe o mais rápido possível. Todos têm pressa de passar. Alguns mais que outros. Mas ao direcionar seu foco para a linha de chega-da, seu desejo de estar lá, materializado em ansiedade, vai aumentar. Quando estuda-va, eu tinha um lema que me ajudava bastante. Eu sempre repetia: “este é meu ritmo. Levará o tempo que for preciso”. Ao jogar minha atenção na qualidade dos meus pas-sos, tive uma evolução célere nas disciplinas e fui aprovado mais rápido que imagina-va. Ao focar na linha de chegada, seu desejo de estar lá vai minar a sua capacidade de executar com qualidade a jornada, atrasando sua aprovação.

- Seja otimista. Se você não conseguiu estudar mais que trinta minutos hoje, você tem duas opções: reclamar que não estudou mais ou agradecer, pois, pelo menos, con-seguiu estudar. O otimismo tem ligação direta com sua pré-disposição para agradecer. Se você é aquele tipo que sempre reclama é como se você estivesse alimentando um pa-drão negativo de conduta. Você está se autossabotando. É incrível como há pessoas que possuem medo de serem felizes. Parece que andam com o freio de mão puxado e têm o dom de enxergar o copo sempre meio vazio. Essa habilidade permite você se manter no jogo, mesmo quando as coisas não saem como planejado.

- Não aceite o mais ou menos. Em tudo que fizer sempre se questione se está fa-zendo seu melhor. Aquilo que você entrega diz muito sobre você. Eu costumo receber muitos e-mails de alunos me questionando sobre técnicas de estudo ou algo do gênero e vejo que há alguns que não se preocupam nem em formatar minimamente o e-mail. Já recebi mensagens sem pontuação, caixa alta ou parágrafo, mas que, pelo contexto,

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entendi que se tratava de uma dúvida. Quando for produzir algo, tenha orgulho de sua criação, por menor que seja.

- Seja curioso e procure saber o real motivo de tudo. Nunca se contente com res-postas prontas do tipo: “você é assim desde criança”. Pesquise para aprender sobre os motivos que levam você a não render como gostaria. Por exemplo: já vimos (capítulo: O seu maior erro) que nosso cérebro possui uma região mais primitiva, responsável por ações rápidas e impulsivas. Sabemos ainda que nosso cérebro possui outra região responsável por nosso comportamento mais analítico. Se você come um doce durante sua dieta, sua área primitiva venceu. Só de conhecer o mecanismo básico do gerencia-mento dos impulsos, tiramos a nossa perspectiva do plano emocional e jogamos para o técnico. O que isso pode ajudar? Ora, tudo! Ao invés de você se sentir culpado, achan-do que é indisciplinado ou incompetente, você pesquisa sobre maneiras de brincar com as engrenagens que compõem o mecanismo. Não se contentar com respostas prontas tem isso de bom: você passa a se culpar menos e a ter um entendimento mais técnico daquilo que sabota você.

Veja que essas dicas podem ser aplicadas como técnicas. Não é preciso um talen-to nato. Como sugestão, cole bilhetes pela casa, lembrando você de aplicar o que foi su-gerido. Lembretes visuais são ótimos para nos resgatar quando ingressamos em algum comportamento compulsivo, como reclamar demais ou comer sem parar.

Ao aplicar o que foi proposto, mesmo que de forma mecanizada, você estará cons-truindo uma estrutura que respalda a criação de um ambiente propício ao afloramento natural do otimismo. É como se você estivesse plantando boa vontade com técnica e colhendo motivação.

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Conheci Anne em uma viagem que fiz aos EUA com minha família. Anne é garçonete num restaurante que costumávamos tomar café da manhã. Sorriso largo e olhar meio triste, Anne aparentava ser bem mais velha que seus trinta e cinco anos. Também pu-dera.

Na sua plaqueta estava escrito seu nome e origem (Anne - Haiti). Curioso que sou, puxei assunto para saber as razões dela estar ali. Anne me contou que foi para os EUA havia cinco anos, logo após o terremoto que destruiu seu país, por meio de um programa de ajuda humanitária do governo americano. Uma espécie de “loteria”, dis-se ela. Na ocasião, foi uma escolha difícil, pois ela teria que abandonar o convívio de seu marido e três filhos e ir sozinha para um país estrangeiro, sem expectativas de quando seria possível levar sua família consigo.

Anne ficou três anos sem ver seus filhos, quando foi finalmente autorizada a imi-gração dos mesmos com a respectiva concessão de visto pelo governo americano. Per-guntei pelo restante de sua família. Anne abaixou a cabeça, sacudiu e disse: “God can do everything Mr. Igor”.

O LOCAL ONDE A APROVAÇÃO ACONTECE

“A dor é temporária, mas as memórias irão durar pelo resto de sua vida”

~ John Collins

CAPÍTULO 8

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Anne teve a chance de fazer uma escolha, como você e eu temos todos os dias. Ela poderia permanecer em sua casa, onde foi criada e acostumada a viver, ou então migrar para um país estranho, sozinha, mas com perspectivas de uma melhora na sua situação de vida.

Anne escolheu ultrapassar a barreira do comodismo e transportar seus sonhos para o local onde as coisas acontecem: fora de sua zona de conforto. Ora, ponha-se no lugar de Anne. Três anos sem ver os filhos não são três dias nobre colega!

Para romper a barreira da zona de conforto é preciso uma vontade grande. No caso de Anne era uma questão de sobrevivência e talvez a única oportunidade de sua vida de oferecer uma melhora significativa para sua família.

Fazendo um paralelo com nosso mundo de concurso público, podemos destacar dois tipos de pessoas:

- Aquelas cuja aprovação em concurso público vem de uma motivação muito grande. Seus esforços são guiados por motivos muito sérios, como tirar a família da po-breza ou de um local de risco. É o caso de Anne.

- O outro grupo, representado pela maioria, creio eu, quer melhorar de vida, mas não depende da aprovação para satisfazer uma necessidade séria e urgente.

É no segundo grupo que reside a maior parte dos "dramas" relacionados à prepa-ração para um concurso público, pois no primeiro grupo a necessidade é gritante e ser-ve como motivo óbvio para romper a zona de conforto. Aliás, conforto, para quem pre-cisa realmente, não costuma nem constar na lista de prioridades.

Se a necessidade não é iminente, quando o conforto bate à porta, a disciplina cos-tuma pular pela janela. As pessoas inventam todo tipo de desculpas para não estudar. Racionalizam, assumem a posição de vítimas, criam obstáculos que só existem em su-as cabeças. É muita vontade de emagrecer, para pouca vontade de parar de comer. Fan-tasiam cenários impossíveis, tudo para não se submeterem à desconfortável sensação de sair da zona de conforto. Pessoas então que nunca passaram por um processo de su-peração na vida e agora necessitam de um emprego, sofrem muito.

Alguns chamam isso de falta de vergonha na cara. Eu prefiro um nome mais ele-gante e costumo chamar de falta de autoconsciência. Com efeito, pessoas que não pre-cisam realmente de uma aprovação para resolverem um problema muito sério, necessi-tam de um elevado nível de autoconsciência, maturidade e disciplina para encarar a processo.

O concurso público é diferente da faculdade ou do ensino médio, onde o objetivo é sua formação. Aqui parceiro, o objetivo é eliminar você. A banca não liga a mínima se você acha ela injusta ou se você prefere ver novela e jogar no celular. Ela quer os me-

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lhores. Não estou romantizando o simples, mas é fato: nem todo mundo vai passar. A maioria vai desistir pelo caminho. Quem persiste, passa. É meio clichê, mas é a mais pura verdade. Como sei disso? Ora, não há vagas disponíveis para todos, como sempre digo.

Eu já estive nos dois grupos e sei bem do que estou falando. Quando estava na Marinha eu não precisava realmente de uma aprovação. Eu só queria melhorar de vida. Nesse caso, utilizei técnicas que me ajudaram a migrar gradualmente para fora de minha zona de conforto. Alguns exemplos:

- Começar devagar. Estudar é um hábito, assim como fazer atividade física. E, como todo hábito novo, começar devagar e ir aumentando o ritmo é sempre uma boa opção, pois você nunca se decepciona e aduba sua autoestima ao observar sua evolu-ção.

- Antecipar a recompensa. Sempre que me pegava racionalizando, tentava anteci-par mentalmente os efeitos de minha aprovação. Era como uma injeção de ânimo.

- Sessão de feedback. Costumava conversar muito com minha esposa e amigos so-bre os estudos, fato que ajudava no envolvimento com o processo.

Assim que fui aprovado no meu primeiro concurso público (ANAC) me encontra-va numa situação financeira terrível e me vi obrigado a mudar sozinho para Brasília. Fiz as contas e cheguei à conclusão de que somente uma aprovação em um concurso melhor me possibilitaria voltar a viver com minha esposa e filho. Aqui a motivação era gigante. Não tinha tempo ruim. Cansei de acordar de madrugada para estudar. A mis-são era clara. A disciplina estava transbordando. Foram tempos difíceis, mas que servi-ram como inspiração para minha aprovação definitiva.

Inteligente é aquele que tem condições para melhorar e, ao invés de se encostar, luta para dar um passo adiante. Não acho que você precise de um terremoto para im-pulsionar seu movimento, assim como fez a Anne. Basta que você adote técnicas como ferramentas para cultivar sua disciplina. Um pouco de vergonha na cara ajuda tam-bém…ops…autoconsciência.

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O tempo todo queremos estar no controle sobre tudo o que ocorre em nossas vidas. Es-tabelecemos padrões elevados, com base em fórmulas prontas, geralmente idealizadas por terceiros, e nos frustramos quando não atingimos esses ideais.

Queremos ter a certeza de que, ao estudar quatro horas por dia, durante um ano e meio, passaremos no concurso de nossos sonhos. Quando precisamos ir a um médi-co ou tratar de assuntos que tiram a atenção de nosso planejamento, batemos o pé no chão, indignados com a falta de sorte. Muitos desistem ou, no desespero, tentam dar um "boot" na vida, no planejamento, como se iniciar novamente fosse a garantia de uma nova trajetória perfeita.

Ideais e controles são úteis, mas podem gerar uma ansiedade desmedida na ob-sessão por atingi-los. Por quê? A vida é caótica e não obedece a uma equação matemá-tica. Eventos inesperados que nos tiram do rumo acontecem o tempo todo. O sucesso de longe é uma linha reta. Há dias bons e ruins em todas as trajetórias vitoriosas. Ven-cedores tem de diferente a capacidade de ignorar os dias ruins e focar no simples fato de continuar caminhando.

DOMINE SUA ANSIEDADE

“A ansiedade é semelhante a uma cadeira de balanço: exige que você faça alguma coisa, mas não o conduzirá a nenhum

lugar”

~ Vance Havner

CAPÍTULO 9

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A verdade é que não temos o controle sobre tudo que acontece e depositar todas as nossas fichas em fatos mutáveis é a certeza de que ficaremos ansiosos.

Quando comecei a estudar para concurso público, ficava preocupado quando ter-minaria os materiais, se minhas horas diárias de estudo eram suficientes ou quando seria aprovado e em quê. Essa postura me deixava ansioso, pois havia estabelecido ide-ais que fugiam ao meu controle.

O mesmo aconteceu quando comecei a escrever. Ficava preocupado se seria reco-nhecido ou se meus textos seriam lidos. Em todas essas situações, eu desviei meu foco para condutas que estavam totalmente sob meu controle e, acreditem, a ansiedade re-duziu quase a zero!

Ao invés de focar em terminar os materiais ou tentar adivinhar quando passaria, eu foquei na qualidade do meu estudo e em me tornar uma pessoa mais disciplinada. A qualidade e a disciplina, naquele momento, era algo que dependia apenas de mim. Talvez você não tenha controle total sobre suas horas de estudo. No entanto, indepen-dentemente daquilo que possa acontecer, você pode, nas horas que tem, estudar. E com qualidade.

Você não vai saber exatamente quando vai passar. Você não tem o controle sobre os outros candidatos, quando o edital será lançado ou o dia exato em que será profici-ente em direito, contabilidade ou matemática. Mas está ao seu alcance aperfeiçoar su-as habilidades de concentração e disciplina. Isso é imutável e certamente deixará você um pouco mais próximo da vitória.

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Um dos tipos de e-mails que mais recebo é me pedindo para escrever algo sobre como lidar com pressão. Ou seja, como conseguir manter o autocontrole e desempenhar su-as tarefas, com qualidade, em momentos de tensão. Exemplos: como conservar a tran-quilidade após a abertura do edital ou mesmo durante seu estudo regular enquanto de-vendo cheque especial ou tentando conciliar os estudos com filho pequeno e trabalho puxado.

Eu chamo essa habilidade única de “elegância”.É difícil definir elegância. Para tanto, vou utilizar de um exemplo real, que acon-

teceu comigo.Ano passado meu avô realizou a grande passagem após lutar por dois anos con-

tra um câncer agressivo.Todas as vezes que eu entrava no quarto do meu avô, ele, já acamado, tentava se

levantar em vão e me dizia: “ô Igu, repara não eu não poder levantar para te dar um abraço”.

ELEGÂNCIA

“Se você está atravessando um inferno, continue atravessando”

~ Winston Churchill

CAPÍTULO 10

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Pensava comigo quanta doçura havia no coração de meu avô. Quanta coragem. Tomando morfina o dia todo, fazendo caretas de dor, impossibilitado de andar, ainda pedia desculpas por não poder ficar de pé e me dar um abraço.

Nunca vi ele reclamar de nada. Quando perguntava como ele estava, sempre res-pondia: “está tudo ótimo”! E completava: “tenho uma família maravilhosa” ou então “está fresquinho hoje”. Frase clássica do meu avô: “tá ruim, mas tá bom, né”? Meu avô sempre mantinha esse tom cerimonioso e calmo nas palavras.

Ele não julgou a doença, nem o estado em que se encontrava. Ele ignorou a dor e focou naquilo de bom que ele tinha. Em resumo: ele cumpriu sua missão com elegân-cia.

Assim são as pessoas elegantes. Elas não se preocupam em vencer ou perder, mas em apenas fazer o que precisa ser feito. Como elas não julgam, não há fácil, nem difícil. Há apenas a missão. Matemática não é difícil. Nem fácil. É apenas matemática. Alunos elegantes rapidamente se recuperam depois de uma reprovação, pois enten-dem que reprovações e erros, quando bem aproveitados, os tornam mais fortes.

Elegância é esse estado pacífico e nobre de fazer o que precisa ser feito, com orgu-lho e disciplina, sem julgamentos. Não é um conceito que possa ser entendido intelec-tualmente. É uma habilidade para ser aprendida com o exemplo e aperfeiçoada com a própria experiência. Por isso que é difícil de explicar.

E essa foi a grande lição que meu avô me ensinou: “mesmo diante do perigo mai-or, de perder sua vida sem poder lutar, mantenha o bom humor, a calma, a elegância”. No enterro do meu avô fiquei triste, mas mantive a elegância, em homenagem às li-ções aprendidas.

Há pessoas que, com muito menos, como um corte no pé ou uma questão de con-tabilidade, por exemplo, dão showzinho, fazem chilique. Julgam-se ansiosas, incapa-zes, impacientes, que não podem esperar. Desistem na primeira derrapada. Tem medo de não serem reconhecidas ou não serem bem vistas ao falhar. Esperam aplausos o tempo todo e imploram aos céus para ver rapidamente o resultado de seus esforços.

Para passar num cargo grande, você tem que ser grande, maior que o cargo. Não é uma questão de estudar apenas, pois isso você aprendeu (ou não) durante sua vida escolar. É uma questão de atitude. Ou de elegância, como preferir.

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Muitos de nós, ao sentarem para estudar, não desejam estar ali de fato. Intelectual-mente, sabem que estudar é o certo a se fazer, que é a atividade que vai render bons frutos futuros. No entanto, quando abrem o livro, todas as células do corpo começam a gritar para sair da escrivaninha. Desejam o cargo mais que tudo na vida, mas não conseguem ter a mesma vontade para os estudos.

Agindo dessa forma, com vontade fraca, não conseguimos aplicar todos os nos-sos recursos de atenção na tarefa. Confundido e sem controle de seus pensamentos, o candidato se vê encurralado por suas próprias dúvidas. A memória de trabalho, de ca-pacidade de gerenciamento limitada, precisa dividir o foco nos estudos com pensamen-tos sabotadores de ordem diversa. É óbvio que o rendimento é péssimo e a sensação pós sessão de estudos é de decepção. Temos a impressão que não memorizamos nada e o tempo todo duvidamos se “concurso público é realmente pra gente”.

Numa situação extrema, o candidato, seja por autopunição ou autopiedade, não consegue nem estudar, nem ter paz para descansar e se entrega derrotado no sofá. Mais extremo ainda são os que buscam conforto em comida, bebida ou drogas.

FÉ NA MISSÃO

“Faça o que você pode, com o que você tem, no lugar onde você está”

~ Theodore Roosevelt

CAPÍTULO 11

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Imagine agora a situação inversa. Se você sentasse para estudar e, ao abrir o li-vro, tivesse certeza absoluta de que, ao dar cabimento àquela tarefa, seus objetivos seri-am conquistados e seus sonhos se tornariam realidade. Sua postura, por conta dessa certeza, é a de se entregar à missão, aos estudos. O sentimento no final do dia é de de-ver cumprido e satisfação.

O nome da força que impulsiona esse comportamento você já conhece: fé.Fé na missão é a capacidade de acreditar em si mesmo. É agir como se já tivesse

dado certo. É ter como meta a própria ação em si. É abrir mão do perfeccionismo doen-tio e focar na qualidade, não importa o tempo disponível para o estudo.

Não é ser soberbo, mas agir com convicção e profissionalismo.Guerreiro de verdade, ao amolar sua faca de combate e preparar seu equipamen-

to, o faz com devoção. Ele cria uma espécie de conexão com a batalha e luta no fluxo do momento. Ele não faz por dinheiro, glória ou reconhecimento. Ele faz porque tem que ser feito. Ele nasceu para a guerra e acredita na sua missão. Suas células desejam estar ali, combatendo. Ele luta com alegria e a vitória é apenas uma consequência.

Há pessoas que, naturalmente, possuem o dom de acreditar em si mesmas. Mas ainda assim é possível aperfeiçoar o seu nível de autoconfiança. Só de você não recla-mar daquilo que você deve fazer já é um bom começo, pois reclamações constantes ali-mentam um padrão negativo de conduta e nos aproximam da mediocridade.

Não deixe que seus pensamentos tenham poder sobre você sem sua permissão. Não deixe de acreditar que você merece e que, com esforço, é possível chegar aonde você quer chegar. Se sua fé é pequena, proteja-a. Estime-a. Não a desperdice. Cultive-a. Agarre-se aquilo que você já tem dentro de você e lute para aprimorar.

Ter fé em si mesmo, na sua missão, é o que vai fazer com que você estude todos os dias até passar. Se você não acredita em você, qualquer obstáculo, por menor que seja, será motivo suficiente para impedir seu avanço.

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A maioria de nós acredita que já nasceu com capacidades fixas e imutáveis de concen-tração, disciplina e comprometimento.

E mais: atribuem a responsabilidade de suas atitudes a eventos internos e exter-nos. Por exemplo: “eu sou ruim em matemática, porque nunca entendi essa matéria”. Ou ainda: “eu não consigo estudar, pois sou viciado no smartphone”. Mais outro: “eu sou estúpido com minha esposa, porque meu pai me batia quando era criança”. Por fim: “eu vou tratar meu filho bem quando ele me tratar bem”.

No extremo da cegueira estão as pessoas que decidem ignorar o problema, como se não fizessem parte dele, como, por exemplo, os pais que pedem ao psicólogo dar um jeito em seu filho, quando na verdade a culpa é dos próprios.

Na verdade, todos esses freios mentais são autofabricados. Disciplina e compro-metimento são comportamentos, não sentimentos, e, como todo comportamento, par-tem de uma escolha.

Em que pese a influência do meio, no fim do dia a capacidade de escolha ainda continua na mão da própria pessoa. De fato, muitas vezes nós não temos controle so-

VOCÊ SE COMPORTA COMO GOSTARIA?

“Descobri que, quanto mais eu trabalho, mais sorte eu pareço ter”

~ Thomas Jefferson

CAPÍTULO 12

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bre o que chega até nós como estímulo interno ou externo. No entanto, nós temos con-trole sobre a resposta que damos a esse estímulo. Essa habilidade de se comportar de maneira diferente do que pensamos possui muitos nomes: sabedoria, honra, lidar com pressão, atitude. Enfim, o nome não importa. A essência aqui é que você quebre essa noção fixa de que nossos sentimentos e pensamentos sempre regulam nosso comporta-mento.

O que você acredita influencia sim seu comportamento, mas o contrário também é verdadeiro. Nas forças armadas, por exemplo, você é obrigado a sempre agir com dis-ciplina. Você não é obrigado a “pensar” com disciplina, mas sim a “agir”. Com o passar do tempo, o comportamento, de maneira bem sutil, regula a emoção e você passa a acreditar que é a pessoa mais capaz, disciplinada e comprometida do mundo.

Não há desculpas para mau comportamento. A não ser que você tenha três anos de idade e não possua maturidade para lidar com todo esse processo.

O sentimento não é o comportamento

Quando aplicamos nossos esforços para estudar de forma disciplinada por um tempo, mesmo indo contra ao que sentimos ou pensamos, passamos, aos poucos, a desenvolver uma ligação com os estudos.

Através de seu comportamento, você consegue moldar seus pensamentos. Você “finge” ser disciplinado para se tornar disciplinado. No início é difícil, claro. É como se existissem duas entidades: uma que não quer fazer e outra que está fazendo. Você age de forma estranha à que está acostumado ou que acredita ser verdade. No entanto, é bem semelhante ao processo de aquisição de preparo físico. Comece devagar que, quando menos notar, estará bem.

À medida que você pratica aquilo que você não gosta, tal comportamento, com a repetição sistemática, vai se tornar um hábito. Olhando hoje eu vejo o quanto meu es-tudo era arrastado, até meio chato, monótono, no início. Depois de um tempo me com-portando com disciplina, fui me tornando experiente e adquirindo certo traquejo. In-sisti até que o hábito estava totalmente consolidado e eu, estudando “no automático”.

Sendo assim, se você quiser mudar seu comportamento, tornar-se uma pessoa mais disciplinada, mais comprometida, menos ansiosa, mais calma, basta que você co-mece a agir como você gostaria de ser! Durante seus estudos, sintonize sua força de vontade que, aos poucos, você passará a ter bons sentimentos quanto à atividade.

É o que chamo de “sacrifício consciente”, por meio do qual você se torna uma pes-soa melhor a partir de sua ação, não de sua emoção.

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É preciso muita força de vontade para quebrar um pensamento antigo, já instala-do. Mas é muito recompensador. Abaixo algumas dicas para ajudar você a mudar seu comportamento:

- Nunca reclame. Tanto mentalmente, quanto verbalmente, não caia na tentação de reclamar dos estudos. Quando você reclama é como se você estivesse alimentando um padrão mental negativo, que vai contra ao que você está querendo se tornar. Ou seja, você está se autossabotando.

- Abrace o desconforto. Não julgue os estudos como algo chato ou mais uma tare-fa a ser cumprida no seu dia. Assuma que é um momento bom, que você irá aprender coisas novas. Nos fuzileiros, quando submetidos a uma situação de desconforto, é co-mum gritarmos juntos: “adoramos”! Assumindo que aquela é a nossa realidade a par-tir de agora e que estamos contentes de estar ali, a despeito do desconforto.

- Bote seu filho na jogada. Mesmo que você não tenha um filho, imagine, caso ti-vesse, como você gostaria que ele agisse na mesma situação? Reclamando? Com pre-guiça? Indisciplina? Tenho certeza que não. E como você gostaria que ele enxergasse seu comportamento? Com orgulho? Sempre que o desânimo bater à sua porta, pense: “como eu gostaria de ser visto pelo meu filho”? Essa frase tem um efeito poderoso, pois, naturalmente, todos queremos ser exemplos para nossa prole.

- Não vai cair do céu. Todos os alunos indisciplinados que atendi desejavam ser mais disciplinados. Quando perguntados o que estavam fazendo para serem mais dis-ciplinados respondiam: “nada, mas um dia eu serei”. Ora, o dia é hoje! Se você acha que você vai mudar com o tempo sem agir no momento presente você está se enga-nando! O momento de agir é agora. Não vai cair do céu uma pílula mágica que vai tor-nar você a pessoa comprometida que você gostaria de ser. Lembre-se: não espere um estímulo externo ou interno guiar sua ação. Aja!

Um resumo de tudo

- Assuma a responsabilidade pela sua vida.- Pare de dar desculpas por mau comportamento. Comportar-se é uma escolha,

não um sentimento.- Aja da maneira que você gostaria de ser. O pensamento não é o comportamen-

to. Você nem precisa gostar de estudar, basta que você estude.- Se você agir como um Cavaleiro da Távola Redonda, você será um Cavaleiro da

Távola Redonda.

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- Se você agir com disciplina e comprometimento, você será disciplinado e com-prometido.

- Como toda habilidade nova, tenha paciência para os resultados aparecerem.

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Todo processo de superação tem o condão de potencializar nossos piores defeitos e nossas melhores qualidades. Em cursos operativos nas forças armadas, por exemplo, é comum você ver colegas seus quebrando paradigmas. Vi pessoas, aparentemente “for-tes” em sala de aula, chorando em campo, vomitando de nervoso e entrando em deses-pero. Há ainda aquelas surpresas boas. Colegas que você não “dá nada”, mas que se transformam em leões durante a ação. É algo lindo de se ver na prática.

É por meio de situações extremas que conhecemos verdadeiramente quem so-mos, pois a pressão do momento desnuda todos os nossos medos, angústias, forças, fraquezas e virtudes.

A preparação para um concurso público é mais um exemplo de um desses proces-sos de superação.

Muitos de nós não tem a maturidade necessária para lidar com todo esse cardá-pio de sentimentos intensos. Com a intenção de encontrar um caminho, a maioria bus-ca conforto no extremismo. Ser extremista é bem fácil, afinal. Difícil mesmo é ser equi-librado.

O CAMINHO FÁCIL DO EXTREMISMO

“Todo extremismo destrói aquilo que afirma”

~ Maria Zambrano

CAPÍTULO 13

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Dizer que vai “parar de viver” para estudar é moleza. Complicado é ser bom pai, mãe, marido, esposa, funcionário, amigo, filho, filha e ainda assim estudar com quali-dade e cadência. Dar conta de tudo é desafiador. Exige disciplina, sabedoria, técnica correta e maturação no processo. É um jogo diário de tentativa e erro. Muitos, como eu, necessitam ser equilibrados por força da vida que levam. Mas é muito gratificante conseguir balancear tudo.

Os extremistas, da mesma forma que começam, terminam. Vivem em impulsos de empolgação. São permanentemente carentes de motivação, pois, quando a empolga-ção termina, precisam de mais motivação para prosseguirem. Se não encontram moti-vação, desistem. Extremista é viver no extremo: ou estuda até morrer ou não estuda coisa alguma. Ser equilibrado não é ser morno, sem graça, mas atribuir o mesmo peso a tudo na balança de atividades.

O equilibrado encontra razões maduras e sinceras pelas quais lutar. Ele vê moti-vos de se sacrificar diariamente por aquilo que acredita. Estudar para concurso nunca será mais importante que sua família. Tudo é importante. E tudo deve ser feito com a intensidade devida. Nada pode ser desperdiçado, especialmente seu tempo livre. Por isso, o equilibrado não se permite procrastinar. Ele é um guerreiro romântico, apaixo-nado pela jornada.

Tropas de elite, durante a história militar da humanidade, utilizavam dessa filoso-fia de vida em seus doutrinamentos. Espartanos e Samurais lutavam quando era preci-so lutar. Eram pais, maridos e trabalhadores que, quando chamados ao dever, não pre-cisavam de maiores “empolgações” para cumprirem com suas missões. Ao desembai-nhar suas espadas, havia motivo. Assim como havia motivo para estarem em casa cui-dando de seus afazeres.

Mas fique tranquilo. Tanto o extremista, quanto o equilibrado passam em concur-so público. Se você optou por “parar de viver”, você vai passar também. Só que, depois da aprovação, pode ser que você não encontre o mundo que deixou enquanto ainda vi-via.

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Dave Scott é um atleta americano que ganhou seis vezes o Ironman no Havaí. Pra quem não sabe, o Ironman é a prova de triatlo mais difícil do mundo. O competidor deve nadar 3,8 Km, pedalar por 180 Km e correr 42 Km, isso tudo em sequência e sem parar!

Dave acreditava que uma dieta rica em carboidratos e pobre em gorduras lhe da-ria uma vantagem competitiva frente aos seus concorrentes. Dessa forma, Dave lavava o queijo cottage para tirar o excesso de gordura! Você consegue imaginar alguém la-vando o queijo cottage para tirar o excesso de gordura?! Que já não tem quase nada de gordura?!

Não acredito que Dave tenha ganhado o Ironman seis vezes apenas por lavar o queijo cottage. Dave treinava muito e não tinha problemas com peso, afinal. Mas as ati-tudes diárias que Dave tomava (lavar o queijo cottage!), representadas por suas esco-lhas, é que levaram Dave à excelência.

LAVE O QUEIJO COTTAGE

“Se você definir uma meta para si mesmo e for capaz de alcançá-la, você ganhou a

sua corrida. Seu objetivo pode ser o de vir em primeiro lugar, melhorar o seu

desempenho ou simplesmente terminar a corrida; você decide”

~ Dave Scott

CAPÍTULO 14

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Nas forças armadas classificávamos essas atitudes como sendo a diferença entre o “bom” e o “excelente”. Um instrutor meu nos fuzileiros navais dizia que o oficial bom se preocupa com seu fardamento, com o corte de seu cabelo, tem uma boa postura e aparenta estar bem vestido. O excelente, além daquilo que o bom faz, se preocupa em alinhar os botões de sua farda de gala. Pra você entender, os botões da farda de gala da Marinha possui âncoras desenhadas e esse instrutor dizia que era preciso apontar as pontas das âncoras todas para o chão para ser excelente (acredite em mim, um leigo JAMAIS iria conseguir perceber que nos botões há âncoras desenhadas).

Assim como aconteceu com Dave, não era apenas o fato de apontar os desenhos das âncoras para o chão que tornava o oficial excelente, mas, sim, a vontade de ser me-lhor, retratada aqui com a preocupação obsessiva com os detalhes e com a qualidade.

Verdade seja dita, para você passar num concurso TOP, você tem que ser excelen-te. Se você for muito bom, você vai ficar no “quase”.

O candidato bom estuda bastante, com constância e qualidade. O excelente, além disso, ataca ferozmente suas deficiências, faz redações, lê normas de maneira constan-te, faz simulados. Quando ele não entende um assunto, ele sente uma espécie de cocei-ra, típica das pessoas excelentes. Ele não reclama, é proativo e busca, por si próprio, as respostas.

Três diferenças primordiais entre os bons e os excelentes:1) os excelentes devem, ao contrário dos bons, se esforçar para desistir. A palavra

“desistir” incomoda muito as pessoas excelentes. Elas têm pesadelos com isso.2) o excelente acredita (ainda que não fale) que é excelente. Ele tem uma autoi-

magem positiva de si mesmo, é coerente e defende com atitudes suas crenças. Logo, fará o que for preciso (lavar o queijo cottage!) para sustentar a qualidade de suas ações.

3) o bom tem um limite e se justifica quando atinge esse limite: “ah, eu mereço me encostar aqui um pouquinho”. O limite do excelente é o cumprimento da missão. O excelente só vai abaixar a guarda quando a missão estiver cumprida.

Ser excelente não é um dom, mas uma filosofia de vida. É ser o próprio vigilante de suas ações e não aceitar que seu nome seja associado a algo mais ou menos (uma re-dação ou um parecer, por exemplo). Ser excelente é encontrar paixão na jornada e lu-tar, até as últimas consequências, para entregar o melhor resultado possível.

O cérebro é como um circuito. Quando você estuda ou faz o que for preciso, na-quele dia, a despeito do cansaço ou das críticas, você cria uma trilha no seu cérebro, um padrão neural. A cada vez que você diz "não" à mediocridade ou aos sabotadores, esse padrão será reforçado até que chegará um dia em que ser excelente será sua reali-

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dade. Você mudará seu modo de pensar e agir. As pessoas vão procurar você para tare-fas difíceis, confiarão em você, pois sabem que você cumprirá a missão de um jeito ou de outro (lembre-se, excelentes tem que se esforçar para desistir).

Recebi muitos e-mails me perguntando sobre o futuro dos concursos, corte no or-çamento, impeachment e essas coisas. Confesso que sei pouco sobre o que está aconte-cendo, pois quase não vejo TV. Mas uma coisa eu sei. Os excelentes estão por aí, em si-lêncio, lavando o queijo cottage e alinhando os botões de suas fardas. Os excelentes es-tão comendo os livros com farofa e pólvora. Os excelentes fazem isso, pois, além de se-rem excelentes, sabem que a vitória é construída na constância, nas escolhas diárias e na disciplina genuína, sem bravatas ou afobação. E sabem que a maioria vai desistir, pois a maioria é composta pelos bons, que não precisam se esforçar para desistir.

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O primeiro concurso público que tentei estudar foi para o Concurso de Admissão à Car-reira Diplomática (CACD). Na verdade, era o único que de fato me despertava interes-se. Eu tinha um certo fascínio pela carreira diplomática (confesso, ainda tenho). A oportunidade de viver em qualquer local do mundo e servir diretamente ao meu país tinha tudo a ver com minha personalidade e com o espírito aventureiro que cultiva-mos em nossa família.

Eu me imaginava o tempo todo trabalhando em algum posto no estrangeiro, dan-do gargalhadas de terno em algum coquetel bacana falando alguma língua desconheci-da com um “local”. Tinha dias que eu me imaginava Embaixador do Brasil na Turquia, resolvendo questões delicadas referentes à relação entre os dois países (não me per-gunte o motivo de Turquia. A cabeça da gente é uma coisa de doido).

O sonho era doce demais e me impulsionou a começar estudar imediatamente.Mas, como quase sempre acontece com esses processos, o esforço de sonhar não

era, de longe, igual ao esforço de fazer. O concurso para diplomata, sabidamente, é um dos mais difíceis do Brasil. A título de exemplo, na época em que decidi estudar eram

O DIA EM QUE FALHEI MISERAVELMENTE

“Motivo de arrependimento é não aprender com os próprios erros”

~ Renato Russo

CAPÍTULO 15

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cobradas três línguas estrangeiras: inglês, espanhol e francês. Sendo que havia prova oral de inglês (hoje não mais). Meu nível de espanhol era o de todo brasileiro: acha que sabe, mas não sabe nada. Francês nunca vi. E o meu inglês, de zero a onze, sendo onze o nível da prova, era um. Estamos falando aqui apenas das línguas estrangeiras. Não estou nem entrando no mérito das outras matérias. Em resumo: uma pedreira do tamanho do morro do Corcovado no Rio de Janeiro.

Entretanto, não me deixei abater. “Eu, um fuzileiro, ser barrado por uma provi-nha dessas” (sim, meu caro, faltava-me MUITA humildade naqueles tempos). Come-cei em ritmo frenético, estudando o meu máximo, quase todas as disciplinas simulta-neamente, com exceção das línguas estrangeiras, que optei por “matar” primeiro in-glês.

Que desespero.Chegava do trabalho exausto para outra rotina exaustiva e monótona. Não me

respeitava, não ficava com minha família direito e tentei levar tudo no peito e na raça. Quando chegava o momento de estudar sofria muito. Uma verdadeira briga homérica se passava dentro da minha cabeça. O tico dizendo para eu continuar e o teco dizendo para eu parar. Naquela época não havia opções viáveis para o estudo de inglês na inter-net como há hoje. Era literalmente quebrando pedra com periódicos em inglês e dicio-nário do lado. Se você não manja de inglês você entende o tamanho do meu sofrimen-to. De cada dez palavras eu procurava umas oito, sem exagero. De forma que, para che-gar ao nível elevadíssimo do concurso, eu teria que viver aquela rotina infernal por no mínimo uns quatro anos. Só o inglês eu iria levar uns dois anos para fechar, sendo bru-talmente otimista. E isso acabou se mostrando verdade no final, pois foi justamente o tempo que levei para me formar no cursinho, já num passado mais recente.

A impressão que tinha era que eu movimentava uma tonelada de pedras por dia e o rendimento era quase nulo. Faltava-me tudo, não apenas humildade, mas também paciência para aprender aquele extenso material e concentração para ficar horas e ho-ras analisando textos em inglês.

A falta de compatibilidade entre o sonho e a execução do planejamento para atin-gir esse sonho gera uma coisa bem chata: frustração.

E era assim que me sentia. Frustrado o tempo todo. Atribulado com tanta coisa para fazer e com o orgulho ferido demais para reconhecer que, realmente, naquele mo-mento de vida, estudar para aquele concurso não era pra mim. Até que, depois de qua-se seis meses, minha esposa disse assim: “Igor, posso te ser sincera? Pare”. Acho que foi a única vez que ela disse isso pra mim na vida. Não que eu não conseguisse. Acho que iria acabar conseguindo. Mas o preço seria alto demais. Meu mau humor estava

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afetando tudo que me rodeava, inclusive o meu trabalho na Marinha e, obviamente, minha família.

Depois de tanto sofrer, gastar dinheiro e tempo, decidi parar. E vejo hoje que foi uma das melhores decisões da minha vida. Na época foi difícil chegar a essa conclu-são, pois, afinal de contas, ninguém quer se ver feio no espelho ou se admitir incapaz. Mas enfim, não apenas parei, como decidi não fazer coisa alguma. Dediquei-me a mim mesmo, à minha família e ao meu Esquadrão de Helicópteros. Passei a ser bem visto em minha organização e reconquistei a paz em minha casa.

Com os pensamentos no lugar, investido de sobriedade, comecei um novo plane-jamento, desta vez para estudar para concursos públicos mais “padrões”. O final você já conhece. Acabei passando, etc, etc…

Nós somos uma sociedade voltada para resultados e é normal sonhar com esses resultados. Esse sonho é excelente para impulsionar você a começar sua jornada, mas, passado algum tempo, e na maioria dos casos, quase sempre não há o encaixe entre o sonho e a realidade maçante de estudar todos os dias.

O meu estudo posterior, para concursos que não o de diplomata, se mostrou mui-to eficiente, calmo, constante e disciplinado. Tudo resultado do aprendizado que tive com os erros do passado. Aliás, aprender com os erros foi um dos mecanismos mais poderosos e úteis que já vi. Você simplesmente sente que se aperfeiçoou. É como se você fosse imunizado contra o euforismo da massa e o comportamento errático, típico dos desesperados.

Foi nesses dias que aprendi lições valiosas, muitas delas transformadas em arti-gos, como o valor de focar na ação e esquecer dos resultados, pois eles virão de uma forma ou de outra. Decidi ainda parar de pensar no futuro e focar na jornada, pois é no momento presente que as coisas acontecem. Passei a me contentar em cumprir a missão diária de estudar com qualidade e transformei a própria tarefa em recompen-sa. Além disso, compreendi que começar devagar e aumentar paulatinamente de for-ma constante as metas de estudo era uma prática eficiente e natural. Descobri ainda o valor de uma vida organizada e de como se manter em equilíbrio ajuda a criar uma ro-tina sustentável de estudos (ninguém sabe quando vai passar ao certo, afinal).

Agora, a lição suprema: humildade para aprender. Ao contrário do estudo decore-ba e forçado do meu passado como candidato à carreira diplomática, meu estudo para concursos regulares foi regido pelo interesse, pelo respeito e pela curiosidade, fruto de uma postura ultra humilde de aprendiz. Eu via as disciplinas com devoção, não com ódio.

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O dia em que falhei miseravelmente foi-me muito útil na vida, tudo porque acei-tei que errei e que aquele ali não era o meu caminho. E é justamente essa a lição de hoje. Se você, assim como eu naqueles tempos, sofre para fazer o que precisa ser feito, talvez seja uma boa dar um passo atrás, voltar para a prancheta e desenhar um outro planejamento para você, mais pragmático, disciplinado, evolutivo e focado na jornada. Pode ser esse tipo de postura, talvez, o casamento entre o seu sonho e a realidade.

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Por hábito entendemos um comportamento que se repete de maneira automatizada logo após um gatilho ou deixa. Imagine por exemplo uma pessoa viciada em chocolate. A cada vez que ela senta no sofá de sua casa (gatilho, deixa) ela sente uma compulsão por comer um pedacinho de chocolate. Se ela obedece ao impulso, será recompensada com o prazer do açúcar misturado ao cacau entrando em seu organismo. Quando isso ocorre, nosso cérebro associa o prazer ao gatilho, gerando um anseio ou desejo de co-mer chocolate toda vez que a pessoa senta no sofá. É como se fosse criada uma peque-na linha nas profundezas do seu sistema nervoso central. No início, essa linha é bem fraca, quase apagada. Mas a cada vez que você repete o comportamento de sentar no sofá e comer um chocolate, essa linha é reforçada. Some à equação agora o seguinte fato: se você não come o chocolate você sofre. Ou seja, se você come, você sente pra-zer. Se você não come o danado do chocolate, você sofre. Você está literalmente cerca-do por um processo de retroalimentação chamado loop do hábito.

Quanto maior a recompensa e o sofrimento da abstenção, mais forte é a relação entre essas engrenagens mentais. Mais poderoso é o processo de retroalimentação do

VOTOS DE SACRÍFICIO

“Não tenha medo de desistir do bom para perseguir o ótimo”

~ John D. Rockefeller

CAPÍTULO 16

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cérebro, a ponto de a pessoa não ter controle sobre seu comportamento e ser guiada exclusivamente pelo desejo de recompensa. É o que acontece com viciados em drogas, por exemplo. A dualidade recompensa versus sofrimento é poderosíssima neste caso.

Implementar hábitos com recompensas fortes é bem fácil e óbvio. E hábitos que não possuem uma recompensa assim tão óbvia? Ou melhor, que, em sua atual perspec-tiva de vida, não há recompensa alguma. Um exemplo? Fazer atividade física diária. Outro? Estudar para concurso público todos os dias. Nesses exemplos, quando chega o momento de executar o hábito você sofre e depois que você termina a atividade, você também não consegue palpar uma recompensa concreta. O processo do loop é fraco e a tal linha, aquela das profundezas do seu cérebro, não consegue sequer se formar. O mecanismo de automatização do comportamento, característica de qualquer hábito (bom ou ruim), não se implementa.

Além dos componentes citados, há um outro muito importante, que compõe as engrenagens da formação ou quebra de hábitos: a força de vontade.

A força de vontade é o vetor que coloca você dentro ou fora de um loop de hábito. Quanto maior sua força de vontade ou seus motivos, maior sua capacidade de gerencia-mento e autocontrole. Isso ocorre tanto para os hábitos bons (estudar, malhar), quan-to para os hábitos ruins (comer uma barra de chocolate todo dia na hora do almoço, salvo melhor juízo). No primeiro caso, para você conseguir ligar o gatilho ao comporta-mento, você precisará usar sua força de vontade. No segundo caso, você precisa de sua força de vontade para quebrar a relação entre gatilho e recompensa. Em ambos os ca-sos, vale ressaltar que a SUA atuação deve ser DELIBERADA. Dito de outra forma, você tem que querer de verdade. Estar ali, lutando contra seu cérebro de maneira vo-luntária e consciente. E é justamente neste ponto que entra o tema deste artigo.

Faça seu voto!

Votos de sacrifício são como o espinafre do personagem de desenho animado Po-peye. Eles reforçam sua capacidade de autocontrole e gerenciamento do hábito. É um super poder! Se você estuda para um concurso público porque simplesmente acha le-galzinho ter uma carreira estável, muito provavelmente está com dificuldades de im-plementar o hábito de sentar todos os dias na mesma hora e estudar. Na verdade, achar maneirinho não é suficiente para vencer as forças invisíveis que atuam no senti-do contrário ao da não implementação do hábito.

É preciso mais espinafre. É preciso um motivo grande.

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Eu aprendi que votos feitos em público são ótimos nessas situações. E gostaria de compartilhar com você um pouco da minha experiência.

Dizer que você estuda para concurso público no âmbito das forças armadas é qua-se como se você estivesse dizendo para seu cônjuge que está o(a) traindo. É uma verda-deira comoção. E foi justamente o que eu fiz. Disse pra todo mundo, em alto e bom som: “eu, Capitão-Tenente, Fuzileiro Naval, Oliveira estudo para concurso público”. Este foi um dos meus votos de sacrifício.

Depois de ter dito aquilo eu não poderia voltar atrás. O preço era alto demais. Se-ria visto como uma verdadeira chacota. Alguém sem palavra ou moral. Além disso, sa-bia que ali, naquele pronunciamento, minha carreira como oficial estava virtualmente encerrada. A Marinha não iria dar, para um demissionário declarado, as oportunida-des de ouro. Se eu não passasse ou desistisse estaria condenado a uma vida profissio-nal medíocre. Simples assim.

O meu voto de sacrifício foi um motor nuclear. Toda vez que eu pensava em desis-tir, antecipava mentalmente as gargalhadas das pessoas em face da minha fraqueza e voltava para a minha escrivaninha. Por pior que fosse a matéria ou o dia, eu estava ali, honrando minha palavra. Não sou mais forte que ninguém. Posso ser apenas mais ma-luco. Mas o fato é que funcionou lindamente! Em pouco tempo, motivado por meu voto, consegui implementar o hábito de estudar com qualidade.

Utilizei esse poderoso mecanismo algumas outras vezes quando, por exemplo, quis (e precisava) emagrecer. A balança da nutricionista não mentiu quando a procu-rei. Eu estava muito acima do peso. Cheguei a me assustar. Se eu não cumprisse o pla-nejamento proposto, iria ter que enfrentar novamente a tirânica balança e me decepci-onar. Toda vez que olhava um doce lembrava do raio da balança. Resultado: emagreci pra caramba. 

Experimente você agora. Comente com seus parentes ou amigos chatos que você vai passar num concurso público ou emagrecer. Sua força de vontade para implemen-tar o comportamento relacionado à atividade será enorme. O mais importante: isso deve ser feito de maneira consciente. Você DEVE honrar sua palavra. Sem justificati-vas ou plano B.

Mas…

Há pessoas que não lidam bem com esse tipo de técnica. O compromisso público, ao invés de reforçar a força de vontade, funciona como um paralisador. A pessoa con-gela de medo. Se você é desse tipo pense bem antes de sair dizendo no Facebook que

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está estudando para concurso público. Você terá que estudar ou será visto como um derrotado. Nessa situação, você pode contar apenas para sua mãe, esposa, marido ou um amigo mais chegado que também estuda para concurso público. Melhor ainda! Você pode disputar com esse amigo quem passará primeiro! Imaginou? Viu como fun-ciona?

Em resumo, para sair ou entrar no loop do hábito você deve querer. E a expres-são de sua “querência” é a sua força de vontade. Dizer que é legalzinho ou que você “gostariiiaaaa de ter um emprego melhor” não é suficiente para mover a roda mental que reforça ou quebra a relação entre gatilho e comportamento. É preciso mais espina-fre. Utilize conscientemente (e com uma dose de loucura) compromissos públicos por meio de votos de sacrifício para bombar sua força de vontade.

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Há muito tempo não acredito nesse “negócio” de concorrência. As pessoas não passam em concurso público não porque a relação candidatos/vagas aumentou de duzentas para trezentas pessoas, mas por conta de erros que elas mesmas cometeram.

Muitos de nós não conseguem estudar com constância mesmo tendo todas as condições para tanto. Há pessoas que possuem tempo e recursos financeiros que per-mitem uma rotina de estudos adequada, mas não conseguem sequer começar a estu-dar. No mundo real não está acontecendo nada, mas internamente a confusão mental é tanta que impede que essas pessoas desempenhem suas tarefas. Cada um de nós, através de nossos pensamentos, produz sua própria realidade. Pessoas bem sucedidas criam um espécie de mundo paralelo, mais otimista e focado que o da maioria das pes-soas. Como de costume, essas habilidades não são natas, mas aprendidas ao longo de nossa vida. Se são aprendidas, podem ser aperfeiçoadas.

Abaixo alguns dos dramas que acompanham esses candidatos e dicas práticas que funcionaram muito bem pra mim:

QUANDO VOCÊ É SEU PIOR INIMIGO

“Eu gosto do impossível, porque lá a concorrência é menor”

~ Walt Disney

CAPÍTULO 17

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- Confusão quanto ao foco. Alguns candidatos não começam a estudar porque não sabem muito bem o que querem. Na verdade, você não precisa saber exatamente o que você quer para iniciar seus estudos. Você pode começar com disciplinas comuns a todos os concursos e, durante sua jornada, tomar as decisões que julga convenientes. Quando iniciei meus estudos eu comecei assim, com disciplinas básicas e, durante mi-nha preparação, fui conhecendo melhor os cargos e órgãos para tomar uma decisão. O que você não pode fazer é perder um tempo precioso de estudos porque está encurrala-do pelas dúvidas.

- Procrastinação/preguiça. Quando vamos aprender um assunto novo ativamos em nosso cérebro áreas relacionadas à dor. O seu cérebro, para proteger você, direcio-na sua atenção para algo menos “doloroso”, como redes sociais ou vídeos inúteis da in-ternet. O que você pode fazer para driblar essa sensação de preguiça/procrastinação? Ora, enganar o cérebro! Faça de sua sessão de estudos a mais convidativa possível. Di-vida seus horários em períodos curtos de concentração ao invés dos tradicionais lon-gos períodos estudando. Você pode, por exemplo, estudar 30 minutos, descansar 5 mi-nutos e repetir esse bloco quantas vezes você conseguir em seu dia. Você pode ainda iniciar com disciplinas que mais gosta ou mesmo adotar uma nova perspectiva, de que sua sessão diária de estudos é um momento agradável do seu dia e não mais um qua-dradinho chato a ser marcado na sua lista de tarefas.

- Imediatismo. Há pessoas que tem uma necessidade compulsiva de receberem gratificações imediatas por seus esforços. No entanto, em termos de concurso público, isso pode detonar seu rendimento, pois estudar um grande edital é algo que leva tem-po. Os resultados costumam demorar a aparecer. O candidato impaciente logicamente desiste, pois não consegue se manter estudando o tempo necessário até que ocorra um amadurecimento nas disciplinas. Traga seu horizonte temporal para mais próximo de você e contente-se em cumprir sua meta diária de estudos. Alegre-se em aprender algo novo e foque em estudar com qualidade hoje. Você vai notar que seu desempenho vai melhorar consideravelmente quando você alterar sua visão do produto para o proces-so.

- Medo de fracassar (ou de ser bem sucedido). O medo tem origem nas expectati-vas que alimentamos com relação ao nosso próprio desempenho. Temos receio de nos decepcionarmos com nós mesmos e acabamos travando antes mesmo de começarmos. Acredite ou não alguns tem medo inclusive de serem bem sucedidos. Faça uma experi-ência. Imagine-se aprovado em um excelente concurso, dando uma entrevista, onde você relata sua experiência. Imagine-se servindo de exemplo para milhares de pesso-as. Se você acha que esse cenário futuro não pertence a você, muito provavelmente

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você está travado, com medo de ser bem sucedido. Corte as expectativas, não se com-pare com outros candidatos e alimente-se de bons pensamentos. Faça seu melhor e de-sapegue dos resultados que seus medos sumirão. Você será extremamente bem sucedi-do quando aprender a trabalhar sem expectativas.

- Falta de apoio. Existem pessoas que precisam da aprovação de outras pessoas para darem cabimento aos seus projetos. Estabelecem relações tóxicas com pessoas próximas e se veem dependentes do aval de outros para executarem seus planos. Você é um ser autônomo. Por mais que seja legal o apoio de outras pessoas, você pode exer-cer sua vontade para realizar seus sonhos independentemente do que os outros pen-sam de você. Pela minha experiência, quando temos objetivos bem definidos, ainda que as outras pessoas não nos apoiem inicialmente, a tendência é que nossos esforços acabem as convencendo e as trazendo para nosso lado. Assim, ao invés de esperar por aprovação, primeiramente aja e tenha paciência de esperar o apoio que gostaria.

- Rotina. A prática me mostrou que as pessoas tendem a se perder facilmente em meio uma multidão de pequenas tarefas que em nada agregam valor à sua vida. Exem-plos: joguinhos de celular, novelas, redes sociais, discussões no trabalho, etc. Uma boa maneira de colocar no eixo a sua rotina é começar o dia focando naquilo que tem o con-dão de lhe trazer maiores benefícios. Se você trabalha o dia todo, por exemplo, você pode acordar de madrugada para estudar e garantir que sua meta diária de estudos seja cumprida independentemente do que vá acontecer durante seu dia. Estabeleça su-as prioridades e remaneje o restante de suas tarefas.

- Lidar com pressão. Alguns candidatos não lidam bem com a insegurança de não ter um edital na praça ou mesmo com notícias sobre a proximidade de algum con-curso. Ou seja, não conseguem gerenciar bem seus comportamentos mediante um evento que desencadeie uma descarga de adrenalina. Não é tão complicado quanto pa-rece. Sempre que acontecer uma situação real que gele sua barriga ou aumente o ritmo dos seus batimentos cardíacos, foque em procedimentos simples que amarrem sua atenção ao cumprimento de sua missão. Lidar com pressão é uma habilidade que é aperfeiçoada quando confrontamos situações reais. Assim, não perca a oportunidade de focar na missão quando se encontrar em uma situação de desconforto. A cada vez que você pelo menos tentar se controlar, você dará um passo importante rumo a uma versão melhor de si mesmo.

Resumo de tudo: esqueça o drama da vida e foque no cumprimento da missão.Nós somos regidos por diferentes tipos de força. A força da gravidade, por exem-

plo, tem determinada intensidade, direção e sentido e afeta todo ser vivo deste plane-ta. A força de vontade, como qualquer outra força, também tem direção, sentido e in-

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tensidade e não é monopólio de uma minoria. Sábio é quem utiliza sua força para seu próprio benefício e crescimento. A diferença entre as pessoas que passam e as que não passam é que as pessoas que passam utilizam sua força de vontade no sentido de com-baterem os dramas e se aperfeiçoarem. As que não passam desperdiçam sua força de vontade com bobagens ou a aplicam no local errado. Simples assim.

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Um dia desses estava procurando artigos sobre como aprender a investir. Foi então que vi o seguinte título na página de pesquisa do Google: “O guia definitivo sobre como ganhar muito dinheiro na bolsa”. Apesar do título sensacionalista, como sou do tipo que sempre dá uma chance, cliquei no link. Nessas de dar uma chance já me depa-rei com muita porcaria, mas também muita coisa boa.

Na ocasião, o artigo era curtinho, tinha apenas umas cinco linhas. E a ideia cen-tral desenvolvida pelo autor era: para ganhar muito dinheiro na bolsa não existe mila-gre. Você deve investir muito dinheiro!

Brilhante!Se você possui R$ 10,00 e consegue, por exemplo, um fantástico retorno de

100% no que foi aplicado, você terá aumentado seu capital para R$ 20,00. Nenhuma fortuna, em que pese o fabuloso rendimento conquistado.

Na verdade, muitos de nós, por medo do desconforto, não querem acreditar que, para conquistar o que desejam, devem fazer um esforço deliberado, ordinariamente no médio prazo. Tendem a esperar que milagres aconteçam em suas vidas, geralmente

A FÓRMULA DEFINITIVA PARA PASSAR EM UM CONCURSO PÚBLICO

“Oportunidades não surgem. É você que as cria”

~ Chris Grosser

CAPÍTULO 18

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precedidos de atitudes extremas e definitivas, como aqueles que tomam anabolizantes esperando ficarem fortes em uma semana. Há vários outros exemplos por aí, como “emagreça em cinco dias com a dieta da sopa” ou “ganhe R$ 10.000,00 de renda extra com seu blog”.

Na era da gratificação imediata, tudo que as pessoas querem escutar é que elas vão passar num concurso ou emagrecer como num passe de mágica. Sinto muito, mas se você acredita nisso, sugiro que reveja sua opinião antes que maiores frustrações sur-jam em sua vida.

Encontro muitas, centenas de pessoas que dizem fazer de tudo para passar num bom concurso público. Fazem de tudo, menos estudar. E se desesperam quando não veem o prêmio aparecendo rapidamente em suas mãos. O desespero, nessas situações, é fruto, infelizmente, do despreparo, não da necessidade legítima. Porque quem leva a sério, com coragem e disciplina, não se desespera, mesmo com a corda no pescoço, pois a disciplina tem isso de bom: ela traz um sentimento gostoso de dever cumprido, ainda que na derrota.

Fazendo uma analogia com o mundo financeiro, não adianta também ser um mi-lionário e não saber como gerenciar seus recursos. Igualmente, nossos estudos são re-gidos pelas mesmas leis. O ideal é encontrar o equilíbrio entre tempo e qualidade ou entre montante e rendimento. Não serve ter muito tempo e não aproveitar, não estu-dar com qualidade. Mas também não adianta dizer que estuda com qualidade, mas cin-co minutos por dia.

A fórmula definitiva para passar em um bom concurso é a mesma utilizada para emagrecer, desenvolver bons hábitos e formar uma boa poupança. Não é uma fórmula mágica ou complicada. Pelo contrário. Uma simples soma da disciplina com a calma.

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Se você visse minha avó fazendo biscoito de polvilho no forno à lenha, você iria presen-ciar a própria concentração em ação. Ela caminhava atentamente de um lado para o outro carregando ingredientes, lenha, tirando tabuleiros do forno, guardando os biscoi-tos, tudo de forma calma e disciplinada.

Ela não titubeava, não parava para fazer outras tarefas e pouco falava. Vez ou ou-tra via a mim e meu irmão, roubando uns biscoitos, e sorria. Minha avó passava horas naquele trabalho exaustivo, sem reclamar, em silêncio. Ela estava imersa no trabalho, totalmente possuída pelas tarefas. Fazia o que tinha que ser feito, exercendo a discipli-na mais genuína que existe: a do fluxo do momento.

Quer ver outro exemplo? Imagine um tigre caçando sua presa. O tigre está lá, na floresta, caminhando lentamente, focado em sua presa. Ele não se importa com baru-lhos ou mosquitos. Ele não fica pensando: “nossa, deveria ter estudado mais ontem, pois certamente tinha vários tigres japoneses formados no ITA estudando também”. Ou então: “tenho que pegar essa presa, pois ela tem muita proteína. Tenho que aumen-tar meus músculos para chamar a atenção daquelas tigresas iradas”. O tigre não pen-

O FLUXO DO MOMENTO

“Onde você está? Aqui.

Que horas são? Agora.

O que é você? Este momento”

~ Do filme Poder Além da Vida

CAPÍTULO 19

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sa. Ele também faz o que precisa ser feito, suportando o desconforto e mantendo no seu campo de visada apenas o objeto de sua ação.

O fluxo do momento é como um rio em que em uma das margens está escrito fu-turo e na outra, passado. Quem trabalha no fluxo do momento não alimenta expectati-vas quanto ao resultado de suas ações, não tem medo, ansiedade, pressa ou autopieda-de. O fluxo do momento é um estado vigilante e sereno da mente, em que você conse-gue exercer seu potencial pleno. Há uma espécie de torpeza dos sentidos e a realidade é exatamente aquilo que está no seu campo de visada, assim como o tigre. No fluxo do momento você é seu melhor, pois canaliza toda sua energia, seus recursos de atenção na tarefa a ser executada. Você faz o que precisa ser feito, mas a partir de um ambiente de paz, não de cobrança obsessiva ou sofrimento.

Você provavelmente já pulou nesse rio e nem se deu conta. Mas a sensação é óti-ma e tenho certeza que você a guardou contigo. É quando você se emocionou com um filme, uma música ou ficou ao lado de uma pessoa especial. Não há passado ou futuro. Alunos que conseguem captar a mensagem me reportam que estudam como se estives-sem “levitando, sem ver o tempo passar”. Não sofrem, não se importam com a concor-rência, nem se julgam.

Crianças são mestres em acessar o fluxo do momento. Observe um grupo de cri-anças brincando. Ali também não há passado, futuro, expectativas ou sofrimento. Há apenas o momento em ação e nada mais.

O que nos impede de acessar o fluxo do momento?

Pensamentos.Ao contrário do tigre ou da minha avó, a maioria das pessoas gera, espontanea-

mente, um fluxo gigantesco de pensamentos inúteis enquanto exerce suas tarefas. Es-ses pensamentos, em sua maioria, trazem uma carga de informações repetidas ou ne-gativas que distorcem a noção que temos da realidade. De fato, cada pessoa cria sua própria realidade, com base nos pensamentos que produz. Coloque, por exemplo, du-as pessoas em uma sala. Imagine que essas duas pessoas tenham a mesma idade, con-dição social, nacionalidade e religião. Apesar de as duas serem semelhantes e estarem inseridas no mesmo ambiente, ainda assim cada uma criará sua própria noção de mun-do. Há aqueles que irão ver o mundo com raiva, cheio de problemas ou obstáculos. Há aqueles que irão criar uma realidade diferente, focada e alegre.

Esse fluxo de pensamentos involuntários é como se fosse uma espécie de véu, que nos impede de exercer nosso potencial pleno. Você já deve ter notado a dificulda-

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de que é estudar quando estamos pensando demais. Dependendo do volume de pensa-mentos inúteis, é praticamente impossível se concentrar nos livros. Isso porque, nossa memória de trabalho, essa que você utiliza para estudar, tem uma capacidade limitada de processamento. É como se fosse um cesto cheio de laranjas. Se você colocar mais uma laranja, outra vai cair. No caso, essa que cai geralmente é relacionada aos estu-dos.

Atletas de alto nível trabalham muito seu lado psicológico para conseguirem atin-gir esse estado mental do tigre, pois sabem que é na ausência de pensamentos que con-seguimos ser o nosso melhor. Tudo que foi criado de belo no mundo, as artes, a músi-ca, foi através desse estado de excelência.

Quando você atinge esse nível, você se sente naturalmente automotivado. É como se você rasgasse o véu e passasse a ter acesso a uma nova noção da realidade. As tarefas se desenrolam de forma natural e autêntica, sem esforço, como agora que es-tou escrevendo para você. Você sente que há emoção em meus artigos, pois as palavras fluem naturalmente pelos meus dedos, vindas diretamente do meu coração. Eu não penso para escrever. Eu apenas escrevo, não me importando com o resultado de mi-nhas ações, se meus artigos serão lidos, julgados ruins ou comentados.

Certa vez escutei que reconhecemos a verdade quando vemos uma, pois ela nos toca o coração. Foi o que aconteceu comigo quando entrei em contato com essa verda-de. Fiquei encantado. Senti que havia descoberto algo surpreendente. Juntamente com a humildade para aprender, trabalhar no fluxo do momento é uma dessas verda-des imutáveis do desempenho humano. É uma prática poderosa. Se você conseguir aplicá-la de forma organizada e disciplinada, você será um concorrente temido, ainda que isso não faça a menor diferença pra você.

No próximo capítulo aprenderemos técnicas simples que permitirão você a pular no rio do momento e ativar seu potencial pleno.

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No capítulo passado, vimos como é eficiente exercer suas tarefas no fluxo do momen-to. Agora, veremos técnicas que podem ajudar você a atingir esse estado sereno e disci-plinado.

No entanto, antes de começarmos, cumpre esclarecer que eu não sou um mestre em meditação, nem vivo o dia todo no fluxo do momento. Estou longe disso. Sou um aprendiz muito, mas muito iniciante. Utilizo a técnica para cumprir tarefas específi-cas, como escrever um artigo, analisar um processo no trabalho ou até mesmo falar em público. Mas se me permitir, gostaria de compartilhar com você o que aprendi e o que vem funcionando pra mim.

Para aprender a trabalhar ou estudar no fluxo do momento, você não precisa de um talento nato. Como todas as habilidades sutis divulgadas neste livro, ela pode ser aperfeiçoada com treino.

COMO MERGULHAR NO RIO DO MOMENTO

“Esvazie sua mente de modelos, formas, seja amorfo como a água. Você coloca a água em um copo, ela se torna o copo.

Você coloca a água em uma garrafa, ela se torna a garrafa. Você coloca ela em uma chaleira, ela se torna a chaleira. A água pode fluir, a água pode destruir.

Seja água meu amigo”

~ Bruce Lee

CAPÍTULO 20

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Em tese, qualquer pessoa pode conseguir. No entanto, a prática me mostrou que há dois grupos de pessoas: aquelas que conseguirão (a maioria). E aquelas que não conseguirão, não por não terem talento ou capacidade, mas porque o ego é tão grande que não se permitirão nenhum tipo de ajuda ou tentativa.

Algumas dicas úteis:- Observe-se. Praticamente todas as práticas meditativas trazem um princípio bá-

sico: você deve aprender a observar seus pensamentos. Quando você observa um obje-to, uma almofada, por exemplo, você não é o objeto, pois ele está fora de você. Com os pensamentos é a mesma coisa. Se você os observa, você quebra a identificação que tem com eles. É simples, mas exige treino. Toda vez que começar a pensar demais, não reaja. Apenas observe. “Nossa, estou pensando em desistir de estudar. Que interessan-te”! Você vai notar que o fluxo de pensamentos irá, com o tempo, diminuir bastante. Sem pensamentos incomodando, obviamente conseguirá fazer o que precisa ser feito. Na verdade, cientistas descobriram que, quando você dá esse flagrante nos pensamen-tos, a área do cérebro relacionada à divagação mental diminui sua atividade.

- O erro mais grave. A pior atitude que você pode tomar é combater pensamentos com pensamentos. É como se você intensificasse o processo. Lembre-se: estamos que-rendo pensar menos para trabalhar no fluxo do momento. E, quando você, deliberada-mente, começa a dialogar com sua mente, você só está alimentando o fogo. Nunca faça isso. A mente (local que produz pensamentos) é uma máquina de resolver problemas. A cada vez que você se encontra numa situação difícil, ela vai começar a disparar pen-samentos em lotes para tentar resolver seus problemas. Isso é bom! Mas quando ocor-re de forma descontrolada é como se o seu sistema inundasse e, em alguns casos, po-dendo levar a um colapso total. Nesses casos, você perde a capacidade de se autorregu-lar e não exerce a disciplina para cumprir seus deveres.

- Permaneça consciente. No início, pode parecer meio estranho ou complicado observar seus pensamentos, mas não se cobre tanto. A maioria de nós divaga muito. Divaga tanto que nem nota. É como se vivesse em uma espécie de matrix mental. São pessoas totalmente identificadas com seus pensamentos. Surge um pensamento de rai-va, ficam com raiva. Surge um pensamento de inveja, sentem inveja. A matrix é isso: uma ilusão. Entre você e o mundo real há a matrix de pensamentos. Na verdade, você não é seus pensamentos. Quando surge um pensamento de raiva, inveja ou desprezo não necessariamente você precisa sentir raiva, inveja ou desprezo. Um exemplo para ficar claro. Imagine que alguém bata no seu carro. Você sentirá uma sensação de raiva brotar naturalmente dentro de você. O que você vai fazer? Se você estiver inconscien-te, ou seja vivendo na matrix, você partirá para a briga ou a ofensa. Se você saiu da ma-

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trix você observará essa sensação surgir dentro de você, notará como ela cresce, como ela o afeta e não reagirá. Irá esperar ela se esvair. Fazendo isso, você se tornará um ser consciente e passará a mandar nos seus pensamentos. Outro exemplo comum. Você está no sofá na maior preguiça do mundo e chegou a hora de estudar. Surgirá dentro de você espontaneamente uma sensação de preguiça. Se você está inconsciente, preso na matrix, você continuará deitado no sofá. Se você está consciente, você observará a sensação de preguiça, não reagirá, se levantará e irá para escrivaninha. Pessoas incons-cientes vivem à mercê de seus pensamentos. São obedientes ao diálogo mental. Assu-ma o controle. Observe seus pensamentos. Permaneça consciente.

- O que vale é a guerra. Em matéria de controle do fluxo de pensamentos, o que conta são suas horas de voo em combate real. Você pode ser a pessoa mais bem inten-cionada do mundo. No entanto, se você não exercer sua intenção em situações des-confortáveis do cotidiano, você não irá melhorar. Tomemos o exemplo novamente da batida de carro. Se você sair do carro brigando, você perdeu uma chance incrível de observar como a sensação de raiva tem o poder de influenciar suas ações. As sensa-ções são os pensamentos manifestados no plano físico. Toda vez que você sentir pre-guiça de estudar, nojo de algo, raiva de alguém, desprezo por alguma situação, apro-veite o gancho para treinar sua capacidade de permanecer consciente. Se sua esposa/marido iniciar uma discussão, observe como as palavras dela/dele estão influencian-do você. Não altere seu semblante e tente permanecer relaxado(a). Note, surgindo dentro de você, uma vontade quase irresistível de atacar verbalmente a outra pessoa. Espere essa sensação se esvair.

Outro exemplo bem comum. Sabe aquela pessoa chata e tagarela que vem falar contigo? Então, preste atenção total ao que ela diz e tente não ficar pensando. Escute ativamente e não fique imaginando a resposta que vai dar. Doe sua atenção a ela. Em resumo: situações desconfortáveis são ótimas oportunidades para aprimorar sua capa-cidade de permanecer consciente e exercer seu foco no momento. Não adianta saber intelectualmente o que fazer se você não faz. A cada situação dessa, se você se esforçar para não reagir, fazer o que precisa ser feito e não se deixar dominar pelos pensamen-tos, você sairá cada vez mais mentalmente forte.

- Traga-a de volta! Depois de notar a mente vagar ou as sensações querendo to-mar conta de você, traga seu foco de volta ao objeto da ação (os estudos, por exemplo). Em aulas de meditação, é comum o professor falar “quando notar a mente vagar, tra-ga-a de volta”. Na verdade, toda vez que você exerce sua força de vontade deliberada para trazer o foco para o momento é como se você estivesse em uma academia de gi-nástica. Só que, ao invés de fortalecer músculos, você está fortalecendo o foco, a capaci-

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dade de tirar sua atenção de uma distração e alocá-la onde deseja. E eu vou contar uma coisa. Se tem uma habilidade que você deveria treinar é a capacidade de se con-centrar. Não há técnica de estudo melhor que permanecer focado na leitura.

- Uma coisa de cada vez na vida e na mente. Tudo, simplesmente tudo, que for fa-zer tente focar completamente na ação que está sendo executada. Ao entrar na cozinha para beber água, não abra a geladeira simultaneamente. Apenas beba água. Quando você ficar com seu filho, dê atenção plena a ele. Quando alguém vier falar com você, pare o que está fazendo e escute ativamente. Ao caminhar, ande devagar e preste aten-ção nos seus passos, nas coisas ao seu redor. Tente estabelecer uma conexão com a rea-lidade. Há um princípio psicológico básico: o que você faz em uma área de sua vida transborda para outras. Se você vive agitado, correndo de um lado para o outro, tentan-do resolver as pequenas urgências do cotidiano, muito provavelmente você se sentirá agitado ao estudar. Sua mente vagará mais.

- Não se iluda com o tempo. Se você parar para analisar, não existe passado ou futuro. São noções de tempo criadas por você. No momento que você está lendo um li-vro, aquele instante é o que verdadeiramente existe. O restante são resquícios de mo-mentos que se fazem presentes, mas que já passaram, ou expectativas quanto a futu-ros, idealizadas no momento presente. Cultivar essa perspectiva ajuda a desenvolver a habilidade de trabalhar no fluxo do momento.

- Paciência. Exercer o foco, permanecer no momento, são habilidades que você leva uma vida para aprender. No entanto, só de você fazer um esforço verdadeiramen-te sincero, notará melhora. Contente-se em aprender. Em se interessar pelo tema e co-locar em prática o que aprendeu.

Trabalhar no fluxo do momento é a verdadeira disciplina. Calma, constante, sem cobranças ou desespero. O fluxo do momento é silencioso, intenso e preciso como o ataque do tigre. Não há necessidade de dizer algo ou entender com fórmulas comple-xas. Você faz e pronto. Não há julgamentos, agitação ou pedidos de socorro. Há ape-nas certeza e paz.

No fluxo do momento você conseguirá tomar decisões mais conscientes e pensar com maior clareza. Com gentileza, insistência e as técnicas ensinadas, você pode utili-zar esse poder magnífico para melhorar o rendimento nos seus estudos. 

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Na primeira semana que comecei a estudar para concurso público, eu tive um insight muito importante. Tão importante que eu atribuo parcela considerável da minha apro-vação a ele. Aliás, não só minha aprovação num concurso público, mas de quase todos os projetos em que fui bem sucedido.

Nas primeiras páginas de cada livro eu pensava: “gente, isso é chato demais! Se eu estou achando isso chato, a maioria deve estar achando também. Poucas devem ser as pessoas que aguentam ficar estudando isso por mais de um ano”.

Bingo!A revelação estava clara em minha mente. Se eu mantivesse meus esforços, iria

amadurecer nas disciplinas, superar a concorrência e ser aprovado. Era apenas uma questão de manter a “pegada”.

Para tanto, escolhi uma estratégia bem simples. Iria começar a estudar pouco tempo por dia e aumentar gradativamente à medida que meu “preparo físico” fosse melhorando. E, para garantir meu amadurecimento nas disciplinas, eu escolhi um combo de matérias que sempre caiam nos concursos que desejava fazer.

ENGATINHE, ANDE E CORRA

“É preciso começar devagar, para ser verdadeiro e duradouro”

~ Manarte Renan

CAPÍTULO 21

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Militares adoram dar nomes significativos aos seus planos. Chamei minha estra-tégia de “engatinhe, ande e corra”. Na verdade, poderia começar com “arraste-se” ao invés de “engatinhe”. Isso porque eu comecei estudando 30 minutos por dia. E manti-ve esse ritmo por seis meses, quando finalmente estava mais resistente para alçar voos mais longos.

E assim fui. Engatinhei, andei e, finalmente, corri rumo à vitória.Para você ter uma ideia do efeito de minha estratégia, no início dos meus estu-

dos, eu me lembro que levei cerca de duas horas para resolver seis questões de licita-ções em contratos, assunto da disciplina Direito Administrativo. Quando fiz o concur-so público da SUSEP, no último mês de preparação, resolvi duas mil questões de direi-to administrativo (fora as outras disciplinas). Isso aconteceu mais ou menos um ano e meio depois de ter começado a estudar.

Não foi apenas a estratégia em si que me levou à aprovação, mas ter me mantido fiel a ela. Eu tinha princípios sólidos, que escolhi de maneira consciente, e estava certo de que seria aprovado caso os seguisse. Dentre todos os princípios, abaixo os mais im-portantes:

- Manter o foco dos meus esforços em uma área. Poderia abrir o melhor concurso do mundo em outra área. Eu não faria. E de fato abriu. E não foram poucos. No ano em que comecei a estudar abriram milhares (isso mesmo, milhares) de vagas para ou-tras áreas. Tive muita vontade de abandonar meu foco para me arriscar em outros con-cursos. Mas me lembrei dos meus princípios e sabia que princípios são como o norte de uma bússola. Se você abandoná-los, você se perde. Manter o estudo das mesmas disciplinas possibilitou com que eu amadurecesse muito rapidamente nessas discipli-nas, o que me levou a uma aprovação mais rápida que esperava.

- Aumentar gradativamente a velocidade de meus estudos. Como comecei peque-no e fui galgando conhecimento com o passar do tempo, a evolução ocorreu de manei-ra natural e paulatina. Tive tempo para adequar minha rotina e participar da infância do meu filho. Olhando de uma posição no futuro, vejo que realmente foi tudo muito natural. Houve esforço, mas como ocorreu de maneira distribuída no tempo, respeitan-do os limites, não houve sofrimento ou desespero.

- Aperfeiçoar habilidades sutis e amadurecer nas matérias ao invés de me preocu-par se o edital está próximo. Confesso que nem me preocupava muito se o concurso X, Y ou Z estava próximo ou se iria ocorrer. Foquei toda minha energia em melhorar o meu conhecimento no conteúdo e me aperfeiçoar como um todo. Sabia que se me tor-nasse mais organizado, disciplinado e calmo, meu rendimento seria melhor. Além dis-so, sabia também que a prova do concurso é uma prova de conhecimentos. Ou seja, eu

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teria que ficar bom no conteúdo das disciplinas e nada mais. Essa mudança de perspec-tiva praticamente anulou minha ansiedade, pois o foco passou a ser o processo, não o produto. Minha missão era me tornar um pouquinho melhor a cada dia, não passar num bom concurso público (o que acabaria acontecendo como consequência). Passar na Receita Federal, no TCU ou em qualquer concurso bom pode parecer algo distante demais. E é difícil arrumar motivação quando nem sequer enxergamos o horizonte. Mas se tornar uma pessoa mais disciplinada e ler com atenção aquele capítulo é algo que está ao seu alcance. Pode ser feito hoje.

Ter poucos princípios sólidos ajudará que você mantenha o rumo de sua embar-cação e evitará que você caia em armadilhas pelo caminho. Cumpre reforçar que tudo foi feito de maneira consciente. Não comecei meus estudos devagar, pois estava com preguiça. Mas sim porque tinha plena consciência de que um período de acomodação é necessário em toda nova empreitada.

Miopia das entrevistas

A pessoa míope consegue ver objetos próximos com nitidez, mas os distantes são vistos de maneira embaçada. Quando lemos a história de alguém vitorioso e não nos aprofundamos em suas causas, é como se fôssemos míopes. Não conseguimos enxer-gar o processo como um todo, apenas aquele ponto próximo.

Ao tomar conhecimento da aprovação de alguém, somos influenciados pelo nos-so julgamento. Tendemos a acreditar que aquela vitória ocorreu de forma abrupta, num processo revolucionário de mudança. A pessoa começou a estudar ontem e pas-sou hoje. Tentamos imitar e acabamos nos transformando em cópias mal feitas daque-le aprovado. Quando notamos que não conseguimos estudar o mesmo tanto ou aplicar as técnicas com a mesma perfeição, a gente se sente mal e acha que aquilo não nos per-tence.

Não se engane. Todos, em maior ou menor grau, construíram suas aprovações no silêncio diário de suas respectivas escrivaninhas. Não veio um raio laser do céu e trans-formou aquela pessoa num ciborgue. A cada página lida, a cada questão respondida, o impulso foi ganhando força, acumulando energia, até que o rompimento ocorresse.

Nesse processo de superação, a aceleração constante e gradual é a marca dos bem sucedidos. Ninguém saltou do zero até a aprovação sem antes ter passado por um processo lento de construção de conhecimento.

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O caminho do desespero

Ainda que você precise passar logo num concurso público, você não conseguirá pular o estágio maçante de sentar e estudar todos os dias. Caso você tente correr antes de engatinhar, vai acabar desanimando, por não receber, tão rápido como deseja, os louros dos seus esforços.

Infelizmente, por motivos diversos, a maioria dos candidatos não entende isso. Querem voar, sem antes estarem preparados. É como se você treinasse uma semana para uma maratona e alimentasse uma expectativa monstruosa de que sairá vencedor. A decepção é certa. A maior parte inverte a lógica do processo. Começa correndo e aca-ba se arrastando.

No intuito de alimentar o ego, que clama por reconhecimento e vitória, o candida-to deprimido começa a fazer todos os concursos que aparecem, na esperança de aca-bar logo com o sofrimento de ter que estudar todos os dias. Afinal de contas, o seriado, o futebol, o vídeo game e a saidinha com os amigos, gritam por atenção. Se o candida-to já tem um bom padrão de vida, aí já era. O conforto é como uma amante capricho-sa. Um “motivo mais que legítimo” para abandonar os estudos naquele dia.

Aquele sonho de ver seu nome como aprovado no Diário Oficial da União vai atormentar você por um bom tempo e, periodicamente, após as cicatrizes se fecharem, você voltará a estudar.

No entanto, se você não mudar o seu padrão de comportamento, você começará, novamente, a trilhar o árduo caminho do desespero.

Como saber se estou no caminho correto?

Não há um gabarito. Esse é o problema. Mas, se você, de certa forma, consegue identificar esses pontos em sua preparação, muito provavelmente está no caminho cor-reto:

- Você sabe o que quer. Você tem um foco muito bem definido e não fica corren-do que nem um doido rumo a cada edital sedutor.

- Você não segue modismos sem critério.- Você não espera que um momento mágico ocorra, depois do qual você será uma

pessoa super disciplinada, proativa e conhecedora de todo conteúdo. Você tem consci-ência de que leva um tempo de esforço disciplinado para amadurecer nas disciplinas.

- O esforço mental de sentar e estudar diminui com o passar do tempo. Estudar passa a fazer parte de sua rotina cada dia um pouco mais.

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- Seu rendimento nos estudos estão a cada mês um pouco melhor. Você se alegra quando acerta uma questão difícil ou entende um assunto que antes era grego pra você.

Golden Wings

Todo piloto da Marinha ostenta com orgulho, em sua farda, o brevê de uma asa. Não é uma asa qualquer parceiro, é uma asa dourada. Os pilotos da Marinha America-na enchem a boca para falar sobre suas Golden Wings, afinal de contas, na terra do tio Sam, ser piloto da Marinha é ser logo associado a Tom Cruise, no filme TOP GUN – Ases Indomáveis.

Na minha formatura de piloto, todos, sem exceção, choramos muito. Não só os alunos, mas também os familiares. Também pudera. Costumávamos brincar que cada pena da asa equivaleu a dezenas de litros de suor deixados nas cabines das aeronaves e simuladores. Foram horas e horas de dedicação exclusiva e abnegação. Interminá-veis sessões de estudo tentando decorar emergências e procedimentos. Minha esposa me “tomou” tantas vezes as emergências que ela acabou decorando algumas também.

Assim como no concurso público, cada pena da asa foi conquistada no silêncio di-ário e disciplinado. Não havia glamour, aplausos ou reconhecimento. Era apenas esfor-ço bruto. E nada mais.

A única mágica que existiu foi advinda da consistência, que funciona como um efeito reforçador, em que a totalidade dos esforços é maior que a soma individual de cada um.

Percebo que há alunos que começam bem, mas se deixam levar pela euforia da massa ou por desejos impulsivos de verem logo a recompensa de seus esforços. Decida mudar de vida a partir deste minuto, mas faça isso de forma sábia, contínua e utilize a disciplina para impulsionar seu avanço. Conquiste uma pena de sua asa por vez.

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Nosso cérebro foi programado, desde os primórdios de nossa evolução, para reagir ra-pidamente a perigos próximos e imediatos. Escapar do ataque de um predador e conse-guir comida para o dia de hoje eram uma realidade recorrente. Com efeito, no contex-to em que o cérebro humano evoluiu, não fazia sentido falarmos em estudar para con-curso público ou economizar para aposentadoria. Era muito mais interessante termos capacidade de reação rápida que consciência sobre o resultado futuro de nossas ações presentes.

Quando pegamos esse cérebro “pré-histórico” e inserimos em um mundo repleto de estímulos e necessidades de escolha temos um cérebro que reage exageradamente a situações triviais do cotidiano como o recebimento de uma mensagem no celular, o erro em uma questão de direito administrativo ou mesmo um esbarrão de alguém no transporte público. É como se nos faltasse a capacidade de avaliar a realidade dos fa-tos ou ter noção do contexto em que estamos inseridos.

CEGUEIRA SISTÊMICA

“Se vamos sobreviver, precisamos de um novo tipo de soldado. Um que não pense da forma que pensamos. Que não tema o que tememos. Um que o inimigo nunca

esperaria”

~ Do filme Ender’s Game

CAPÍTULO 22

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Neste sentido, a atenção humana pode ser vista sob diversas perspectivas. Há aquela atenção mais pontual, que você utiliza para escrever uma redação, por exem-plo, e também há aquela atenção utilizada para planejar ações num contexto macro. Pessoas bem sucedidas, em maior ou menor grau, conseguem aproximar e afastar sua atenção dependendo da situação. São trabalhadores focados e excelentes planejado-res. Steve Jobs, por exemplo, conseguia se preocupar com a estética dos componentes internos dos computadores da Apple e rapidamente chavear para estabelecer uma dire-triz de longo prazo, que iria mudar totalmente a forma como utilizamos a tecnologia.

O contrário também é verdadeiro. Pessoas que se frustram exageradamente em determinadas situações pontuais podem possuir uma espécie de cegueira sistêmica. Ou seja, não conseguem se afastar do problema para ter noção do todo. É como se des-sem autorização apenas para o lado pré-histórico do cérebro funcionar.

Vou dar um exemplo prático para você entender melhor o que estou dizendo. Imagine que você nunca tenha estudado contabilidade geral na vida. Quem já estudou sabe que é uma disciplina enjoada de aprender. A matéria é grande e, em alguns pon-tos, complexa. Você estuda essa matéria há um mês e resolve pegar a prova da Receita Federal para responder as questões. Se você não tem noção sistêmica do que está fa-zendo e apenas utiliza sua atenção focada, aposto com você que, certamente, irá se frustrar. Você vai se julgar a pessoa mais incompetente do mundo e estará arriscando a continuidade de seus estudos por uma inabilidade de conseguir ver o todo.

Toda semana eu respondo literalmente dezenas de mensagens cuja a causa é a mesma: cegueira sistêmica. Alunos que querem resolver seus problemas pra ontem e não conseguem ter a noção do processo como um todo. É o típico caso do aluno que es-tuda há pouco tempo e diz que “a memória é ruim, que não lembra de TUDO que estu-dou e que, desse jeito, NUNCA passará no concurso”. Outro caso comum é do aluno que erra meia dúzia de questões e fica DESESPERADO (assim mesmo, tudo maiúscu-lo) porque não sabe NADA da matéria. Mais um exemplo (o último, prometo): o aluno que diz que seu sonho de infância é ser Auditor Fiscal da RFB, mas também não estu-da. Quando abre o edital inventa de botar sua vida naqueles dois meses que antece-dem a prova na esperança de passar num concurso super complexo em um tempo re-corde de estudo. Falta noção do todo. Cegueira sistêmica.

Ter a noção do todo já me salvou muitas vezes. Quando minha esposa estava aborrecida com algo sem motivo (vulgo TPM) ou meu trabalho me exigia além do devi-do, é claro que tais fatores influenciavam negativamente meu rendimento. No entanto, por diversas vezes, eu conseguia estudar um pouco por utilizar uma visão mais ampla do processo. Eu me perguntava: “ela vai se separar de mim por causa disso”? Respos-

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ta: “não. Então vamos estudar”. Idem para meu trabalho: “o mundo vai acabar se eu não fizer isso agora”? Resposta: “não. Então deixa eu estudar”.

Uma forma prática de ter visão sistêmica é brincar de general. Bem fácil (eu ado-ro fazer isso). Imagine-se olhando por cima de um grande mapa povoado de unidades militares e você ordenando o movimento dessas tropas, estabelecendo o ritmo, crian-do soluções para ultrapassar obstáculos ou dando mais atenção a determinadas unida-des que estão em apuros. Cada unidade dessas pode ser uma disciplina do concurso, um problema a ser resolvido na sua vida ou uma tarefa que está envolvido. Ao invés de você viver para apagar focos de incêndio, você se preocupa em se organizar de manei-ra que os incêndios não mais ocorram. É por aí.

Quando afastamos nossa atenção, entendemos que errar meia dúzia de questões não é o fim do mundo. E que também guardar TUDO o TEMPO TODO é humanamen-te impossível. Ao suspender sua atenção e ter noção do todo, você muda o discurso e a mentalidade, pois você sabe que está num processo de aprendizado e que esquecer de detalhes é normal, assim como aprender contabilidade geral leva um tempinho. Você passa a agir de maneira menos reativa e mais coordenada. Fica menos ansioso e não interrompe o seu avanço por conta de problemas menores. Você lida melhor com os obstáculos do cotidiano, pois sabe que a vida é assim e que errar e aprender são faces de uma mesma moeda.

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Há aproximadamente 10.000 anos, alguns indivíduos, muito semelhantes a mim e a você, iniciaram, com simples gestos pensados, uma revolução que moldou a forma como conhecemos a nossa civilização. Eles pegaram algumas sementes e plantaram. O que hoje parece ser algo simples, na época foi uma verdadeira quebra de paradigma. A partir dessa atitude, o homem, que até então era nômade, passou a fixar residência em um local. Domesticou animais ao invés de simplesmente caçá-los. E, com isso, aumen-tou a produtividade através da seleção e preservação das espécies mais produtivas. Co-meçou a produzir mais do que consumia e inaugurou o comércio.

Milhares de anos mais tarde, por volta do ano 1700, um astrônomo e físico britâ-nico, Edmond Halley, observou cometas e calculou algumas de suas órbitas, inclusive prevendo que alguns deles estavam passando não pela primeira vez no nosso sistema solar (um deles é o cometa Halley). Qual a importância disso? Antigamente os come-tas eram vistos, por várias civilizações, como prelúdios de morte, peste, guerra e ou-tras catástrofes. Havia um “quê” de misticismo envolvendo esses astros. Halley, com

USE SEU CÉREBRO PARA PASSAR

“Um raciocínio lógico leva você de A a B. A imaginação leva você a qualquer lugar

que você quiser”

~ Albert Einstein

CAPÍTULO 23

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seu pensamento, quebrou esse paradigma e, juntamente com outros pensadores, inici-ou o pensamento científico contemporâneo.

Halley não parou por aí. Mapeou o campo magnético da Terra, fez avanços signi-ficativos na meteorologia e desenvolveu a primeira tábua de mortalidade com base em preceitos científicos. Agora sugiro que os nerds se segurem nos seus assentos. Halley ajudou Isaac Newton (sujeito sistemático) a publicar sua obra Princípios Matemáticos da Filosofia Natural. Reza a lenda que se não fosse Halley com sua teimosia a obra de Newton nunca teria sido publicada. Se isso não tivesse acontecido, talvez hoje não terí-amos conhecimento sobre as leis do movimento de Newton, da gravidade e da mecâni-ca.

Por volta de 1830 o Dr. Robert Darwin chegou a dizer que seu filho, o jovem Char-les Darwin era “uma vergonha para si e para toda sua família”. O pobre pai tinha suas razões. Darwin não se interessou pela medicina e foi obrigado a cursar teologia pelo pai. Ainda na faculdade de teologia gostava mais de caçar e colecionar besouros que es-tudar. Posteriormente, numa viagem de aproximadamente cinco anos, Charles Darwin, a partir da observação de seres vivos e fósseis, desenvolveu a teoria que deu origem ao livro “A Origem das Espécies”.

Em 1928, Alexander Fleming, ao voltar de férias notou que havia esquecido algu-mas placas com microrganismos em seu laboratório. Ele viu que em volta das colônias havia um bolor que não se contaminava com as bactérias. Posteriormente, ele e um amigo mostraram que esse fungo produzia uma substância com efeitos bactericidas (penicilina). Estava descoberto o antibiótico. Pense em quantas vidas esses dois sujei-tos salvaram.

Em 1997 dois garotos americanos mapearam a internet através de um mecanis-mo de pesquisa revolucionário. Os inventores do Google (Larry Page e Sergei Brin) mu-daram a forma como nós nos relacionaríamos com a rede mundial de computadores. Além de terem facilitado muito nossa vida.

Em 2012 eu e minha esposa descobrimos, após observar nossas contas, como di-vidir gastos no cartão de crédito estava nos prejudicando. O fato é que, ao dividir uma compra em seis vezes, no terceiro mês você nem se lembra do que comprou e o conjun-to daquelas divisões se somam e formam um passivo gigante no início do mês. Em re-sumo: você começa o mês devendo sem nem saber o motivo direito. A partir dessa sim-ples percepção, aprofundamos o debate financeiro, ajeitamos nossas contas e passa-mos a poupar para nossas aposentadorias.

Ainda que ficção (até quando?), vale pontuar que, em 2015, no filme Perdido em Marte, o astronauta Mark Watney utilizou seu cérebro para viver em Marte até ser res-

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gatado. Ele calculou quantas calorias necessitava para sobreviver e plantou batatas dentro do módulo de sobrevivência no intuito de complementar sua dieta. Criou água a partir da queima da hidrazina e conseguiu comunicação com a NASA por meio de uma sonda abandonada.

O que isso tudo tem em comum? E qual a relação com concurso público?Ora, tudo.Os homens do neolítico, Halley, Newton, Darwin, Fleming, os garotos do Google,

o astronauta, minha esposa e eu somos todos humanos e utilizamos, cada qual em seu nível, nossos cérebros para resolver os problemas que nos afligiam. Em todas essas corridas, a partida foi uma só: a observação sistemática. Em todos esses exemplos, os protagonistas pararam o que estavam fazendo para observar de perto aquilo que os in-comodava. E, a partir dessa observação, desenvolveram, por meio de tentativa e erro, soluções para seus problemas. Atitudes disciplinadas e pensadas levaram gerações de seres humanos a encontrar respostas para suas questões.

Com compaixão, digo que muitas pessoas, ao ingressarem na jornada por um car-go público, o fazem sem parar para pensar no que estão fazendo. E, durante o proces-so em si, se frustram e perdem o juízo por conta de fatos muito óbvios, como a necessi-dade de se errar e praticar para aprender.

É como se reagissem a cometas e morressem de febre por falta de antibióticos hoje facilmente comprados na farmácia da esquina. Respondem a qualquer estímulo externo sem o menor senso crítico. E se desesperam com isso. Não procuram ter um entendimento completo do processo. Simplesmente reagem, como os homens do neolí-tico que mudavam de local para buscar comida ou minha esposa e eu, comprando ale-gres no cartão de crédito, sem nos darmos conta do que estávamos fazendo.

Todos somos dotados de um capacidade incrível de raciocínio e me entristece ver pessoas com saúde se aborrecendo com problemas simples e na prática resolvidos, como a incapacidade de estudar um edital gigante em dois meses que antecedem a pro-va. Reagir a editais sem pensar ou dar chiliques porque não sabe fazer uma redação não é a postura de um ser dotado de uma máquina magnífica como nosso cérebro.

Não negligencie seu poder de raciocínio e sua habilidade de resolver problemas. Você é incrível! Se você se interessar de verdade e parar para observar com calma o processo irá descobrir soluções criativas e inusitadas para seu problema de “passar em um concurso público”. Ainda que leve tempo ou você erre bastante, entenda que isso faz parte do grande processo de experimentação. Darwin demorou cinco anos para es-crever seu livro e minha família levou dois para equilibrar as contas. Nenhuma mudan-ça significativa na história de ninguém aconteceu do dia pra noite e foi isenta de erros,

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acertos e reviravoltas. Bem como não passou pelo esforço intelectual e apaixonado de descobrir a verdade por si mesmo.

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Joseph e Richard possuem vidas aparentemente semelhantes. Ambos são pais, traba-lham o dia todo e estudam para concurso público. Joseph diz que gostaria de aumen-tar sua renda para poder viajar com sua família nas férias. Além disso, reclama do seu atual emprego, pois tem um chefe chato que adora inventar serviços pequenos, sem sentido, tudo para parecer que está ocupado. Já Richard sonha em quitar seu aparta-mento financiado e guardar algum dinheiro para sua aposentadoria. Richard tem um chefe legal, mas o trabalho em si, pelas suas próprias características, é muito puxado.

Apesar de terem intenções semelhantes, é bem diferente a forma como Joseph e Richard conduzem suas atividades e rotinas.

Joseph acorda por volta das 07:30, ao passo que Richard acorda às 05:50. Ri-chard leva cerca de 30 minutos para se arrumar, pois deixa sua roupa, mochila e lan-ches da manhã previamente preparados na véspera. Joseph deixa para arrumar tudo pela manhã e demora 60 minutos para sair de casa.

Richard malha pela manhã. Quando chega na academia não quer saber de papo furado. Dá bom dia a todos, pega sua ficha e vai direto para o que interessa: o treino.

COMO SER MAIS EFICIENTE, PARTE 1 - O CONTO DO ENROLADOR

“Corte sua própria lenha. Assim, ela aquecerá você duas vezes”

~ Henry Ford

CAPÍTULO 24

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Depois de 40 minutos, sem interrupções, Richard completa sua sequência de exercí-cios. Richard está exausto e tira 10 minutinhos para se socializar com o pessoal da aca-demia e o professor gente boa. Após os 50 minutos de treino + conversa, Richard vai para o vestiário da academia. Toma banho e, 20 minutos depois, vai para o trabalho, onde toma seu café da manhã. Richard percebeu que, se tomasse banho na academia e café no trabalho, economizaria cerca de 30 minutos do seu dia, que é o tempo que ele levaria para voltar em casa e executar todas essas tarefas. Já tendo feito sua atividade física, com o organismo cheio de endorfina, Richard vai feliz para seu trabalho. Acade-mia, treino e banho = 70 minutos.

Joseph, depois de se levantar e arrumar, vai direto para o trabalho e deixa a aca-demia para depois do expediente. Para facilitar nossas contas, vamos considerar que tanto Joseph quanto Richard levam o mesmo tempo de deslocamento (casa/trabalho/academia), cerca de 30 minutos. Sendo assim, como Joseph chega ao trabalho às 9h, ele sai às 17h, considerando 8h corridas de trabalho. Às 17h30min Joseph está na aca-demia. Cansado de um dia exaustivo de trabalho, Joseph conversa muito durante o treino, além de ficar se poupando nos exercícios (se enganando). Depois de conversa e treino, Joseph sai da academia 19h10min, exatamente 100 minutos após ter entrado.

Richard chega ao trabalho por volta de 08h. Considerando 8 horas corridas de trabalho, Richard sai do trabalho às 16h, uma hora antes de Joseph. Às 16h30min Ri-chard está em casa. Ele toma banho tranquilamente e espera seu filho chegar da escola às 17h. Fica com seu filho por 60 min e, às 18h, janta com sua família na mesa, jogan-do conversa fora. Vez ou outra eles jogam UNO ou dominó. Mas às 19h em ponto Ri-chard senta para estudar. A família dele vê TV, mas apenas depois dele entrar no quar-to para estudar.

Joseph chega em casa e vai direto para o banho. Seu filho já está em casa lhe es-perando. Depois do banho, Joseph fala que está muito cansado e que precisa relaxar. Reclama com a esposa que estudar pra concurso é muito difícil quando se tem filho. Mas Joseph não reserva um tempo para seu filho. Diz que está brincando com ele, mas na verdade está prestando mais atenção ao smartphone/TV que ao filho. Joseph sabe disso, mas não gosta de admitir. Joseph adora ver aqueles filminhos bobos de gatos se esborrachando no chão. Às 20h30min, Joseph, depois de ter lanchado em frente à TV, vai para a escrivaninha.

O estudo reflete a vida, já dizia o poeta. Richard, como sempre faz com suas tare-fas, é focado. Ao sentar para estudar, desliga o celular e, naqueles minutos que está ali, sabe que concentração é o que interessa. Combinou previamente com sua esposa que só fosse interrompido em uma situação de emergência real. Para evitar que parentes

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ou amigos ficassem ligando, Richard tira o telefone do gancho. Richard não é médico, nem bombeiro, não há uma emergência que possa realmente esperar algumas horas. Como Richard deu atenção exclusiva ao seu filho (60 min) e à sua família (60 min na hora do jantar), seus entes não reclamam muito do momento de ausência. Seu filho, depois de algumas semanas, já se acostumou à rotina de estudos do pai. A cada 50 mi-nutos Richard faz um intervalo de 10 minutos. Assim, após exatos 150 min de estudo, às 21h50min, Richard encerra suas atividades. Verifica o celular pra ver se tem alguma mensagem. Nada demais. Fofocas, como sempre. Toma um chá (a esposa já deixa o chá pronto), conversa com a família, arruma suas coisas e às 22:40 Richard está na cama. Richard pega seu livro de ficção (A Máquina do Tempo, de HG Wells) e lê por 10 min até apagar.

Joseph, ao sentar para estudar (20h30min), não desliga o celular. Fica preocupa-do com a possibilidade de alguma emergência. Na verdade, Joseph usa isso como des-culpa para ele mesmo, só para ficar vendo a sua rede social favorita "paralelamente" aos estudos. Joseph enrola para ler. Às 21h seu filho o chama seguidamente para mos-trar como conseguiu passar de fase no vídeo game. Joseph não tem argumentos para falar “não”. Ele sabe que, no fundo, não deu atenção pra ninguém e só jogou tempo fora. Às 21h10min Joseph volta para a escrivaninha. Entre mexer no celular e tentar ler, Joseph leva cerca de 20min para recobrar sua atenção. Às 21h30min Joseph está lá, decidido de que será Auditor, pois quando for Auditor terá tempo para sua família. Às 23h30min, Joseph, após uma série de pequenas interrupções, é vencido pelo cansa-ço. Tempo total de estudo = 80 min. Joseph deveria ir para a cama o quanto antes. Mas...está passando uma série incrível! E Joseph fica surfando nos canais da TV até cerca de 1h da manhã, quando apaga no sofá e vai se arrastando para a cama.

Tempo de estudo/sonoRichard - 150 min/7 horas.Joseph – 80 min de concentração ruim (muitas interrupções)/6h30min.Eficiência nos estudosNote que Joseph alocou 3 horas de sua rotina para estudar, mas aproveitou ape-

nas 1h20min. Ou seja, aproveitou 44,44% do tempo para estudar efetivamente.Já Richard foi efetivo em 83,33% do período que alocou para estudar. Fora que

entre academia e rotina matutina ganhou 1h, se comparado a Joseph, o que acaba re-fletindo um efeito positivo na sua rotina como um todo.

Se considerarmos que ambos leem uma página a cada quatro minutos, temos que Joseph leu 20 páginas ao passo que Richard leu 37,5 páginas numa mesma sessão de estudos. Considerando que ambos estudaram 300 dias num ano, Joseph terá lido

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6.000 páginas e Richard, 11.250 páginas. É como se, num mesmo período de tempo, Richard tivesse estudado praticamente o dobro que Joseph!

E isso porque nem consideramos que Richard, certamente, é mais focado e, por consequência, lê mais páginas que Joseph.

Ainda temos outros fatores envolvidos, pois Richard está vendo seu estudo deco-lar. Joseph, não. A chance de Joseph desistir será bem maior que a de Richard, sem sombra de dúvidas.

No final das contas, Richard estudou mais, com mais qualidade, ficou mais com sua família e ainda dormiu por mais 30 minutos/dia. Apesar de possuírem rotinas se-melhantes, Richard é muito mais eficiente.

Infelizmente, há muito mais Joseph’s que Richard’s. De fato, é muito mais fácil desperdiçar tempo e se justificar por não tê-lo. Eu sei disso, pois já fui um Joseph, mas acordei a tempo de me salvar e me tornar um Richard.

“Ah...mas é complicado”!Será? Tenha suas certezas bem formadas antes de se julgar e se condenar a uma

vida medíocre. Não faça tanto drama.Vamos começar com o básico. Richard é implacável. E ser implacável é a primei-

ra coisa que você deve aprender para ser mais eficiente.

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Não existe banco de tempo. Você pode ser a pessoa mais rica do mundo, mas o seu dia ainda terá 24 horas e sua semana, 7 dias. Não há como comprar tempo. É possível ape-nas administrá-lo.

De fato, tempo é o recurso mais valioso que temos. Ou o único verdadeiro. Você troca seu tempo por dinheiro quando trabalha. Você troca seu tempo hoje estudando para ter mais estabilidade e recursos financeiros no futuro, após sua aprovação.

No final das contas, nos últimos segundos de vida, todos nós iremos desejar ter mais dinheiro? Duvido. Desejaremos mais tempo, mais uma semana, mais alguns di-as, para podermos aproveitar o que a vida nos oferece de melhor.

Ainda assim, as pessoas o desperdiçam, como se ele nada valesse. A maioria das pessoas que conheço não tem coragem de pegar uma nota de R$ 100,00 e rasgá-la, mas tem coragem de se sentar no sofá e perder um dia todo vendo qualquer coisa ao invés de dar atenção ao que é devido.

Apesar de ser um recurso limitado, o tempo pode ser manipulado a nosso favor no sentido de melhor aproveitá-lo. Ou seja, é possível produzir mais em um mesmo pe-

COMO SER MAIS EFICIENTE, PARTE 2 - PARKINSON, O IMPLACÁVEL

“Quem sabe concentrar-se numa coisa e insistir nela como único objetivo, obtém, ao fim e ao cabo, a capacidade de fazer

qualquer coisa.”

~ Mahatma Gandhi

CAPÍTULO 25

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ríodo de tempo ou mesmo fazer uma atividade em menor tempo. É fácil. Só exige um pouco de esforço e organização. Com as ferramentas corretas, seu tempo vai se "multi-plicar" de uma maneira que você vai até estranhar.

E a primeira ferramenta que você deve colocar no seu inventário é a Lei de Parkinson (que não tem nada a ver com a doença).

Segundo essa lei, o tempo é desperdiçado na proporção de sua abundância. Dito de outra forma, o trabalho se expande de modo a preencher o tempo disponível para sua realização.

Em termos práticos, podemos pensar assim:- você diz que tem 2 horas por dia para estudar determinada matéria.- você consegue ler, de maneira bem intensa e focada, sem distrações, 10 páginas

por hora.- mas como você alocou 2 horas, você ficará enrolando e suas 10 páginas, que seri-

am lidas em 1 hora, vão ser lidas em 2 horas.Esse fenômeno pode ser facilmente visto em escritórios também. Vai me dizer

que você trabalha sem parar de 09:00 às 17:00? Na verdade, as pessoas ficam preen-chendo seu tempo com internet, cafezinhos e conversas. O trabalho mesmo provavel-mente deve ser feito em 4 horas (no máximo).

Como o tempo se expande e é desperdiçado? Ora, distrações. Tanto internas, quanto externas. Quer exemplos concretos? A lista é imensa, mas abaixo acredito que estejam os itens mais comuns à nossa realidade.

Distrações internas:- Autoquestionamentos inúteis de serem feitos no momento do estudo como, por

exemplo, "quando vou passar, se é que vou passar"?- Preocupações acerca de fatos que não podem ser resolvidos naquele momento,

como e-mails a serem respondidos na hora do trabalho, por exemplo.- Orgulho ferido a respeito de um acontecimento passado como uma briga no

trânsito ou com a namorada.Distrações externas:- TV.- Redes sociais.- Gente batendo na porta do quarto.- Telefone.- Joguinhos de smartphone.Para aplicar a Lei de Parkinson e eliminar essas distrações, é preciso que você

adote uma regra bem simples. Aliás, você já deve ter usado a Lei de Parkinson alguma

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vez na vida, mesmo sem saber o nome, muito provavelmente para entregar aquele tra-balho de escola que você deixou para fazer na última hora. Você tinha um mês para fa-zer o trabalho, mas conseguiu fazê-lo em 12 horas de trabalho intenso.

A regra é a seguinte: no momento em que você estiver fazendo uma tarefa, você deve ser implacável, impiedoso. Por exemplo, no momento em que estiver estudando você só levantará a cabeça em três situações: para não fazer xixi nas calças, para aten-der a uma emergência do tipo "tá pegando fogo na sala" ou quando sua concentração naturalmente se esvair, sendo que, no último caso, você irá parar apenas o suficiente para reestabelecer seus recursos de atenção.

Para ajudar com a aplicação da regra, você pode se policiar, fazendo a seguinte pergunta quando estiver estudando: "eu realmente estou atento, vigilante, produtivo, ou estou enrolando para passar o tempo"? Ou ainda: "eu estou inventando tarefas sem importância apenas para não fazer aquilo que interessa"?

Outro macete interessante é imaginar que sua vida realmente depende daquilo. Se você estivesse com a faca no pescoço (literalmente), sendo obrigado a executar aquela tarefa da maneira mais focada e interessada possível, como você iria reagir? Te-nho certeza que você não iria ficar enrolando.

Aplicações práticas contra distrações internas ou externas

Internas - você não tem que se meter em processos decisórios infinitos no mo-mento do estudo. Se você estudar focado, você notará que lhe sobrará tempo para filo-sofar sobre a sua vida em outros momentos. Ao dar atenção aos estudos, você sentirá uma espécie de sensação de dever cumprido. De que, em que pese sua confusão men-tal, você está fazendo algo de concreto para sua vida.

Externas - desligue o smartphone, suma com ele e pare de inventar coisinhas para preencher seu tempo. Tire o telefone do gancho, coloque um abafador de ruídos na orelha. Sobre sua família, converse com eles, solicite apoio e diga que você não con-seguirá fazer isso sozinho. Coloque uma placa na porta do quarto pedindo silêncio. Você encontrará resistência. É natural. Não ligue. Aos poucos eles vão se acostumar.

Essa é a essência do jogo: seja implacável e faça o que precisa ser feito. Não ex-panda o tempo apenas para preenchê-lo. Se você focar na tarefa, ela será concluída de maneira mais rápida e lhe sobrará tempo para fuçar na internet ou ver TV.

Agora que já sabe, pratique. Mas alerto que você ficará mais cansado que o natu-ral. Isso já é esperado. Você viverá seus estudos de maneira mais intensa e fará em 2 horas aquilo que fazia em 4 horas. Se chegar a um ponto em que sua concentração está

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naturalmente ruim, pare por hoje. Insista em aumentar aos poucos que, em breve, es-tará novamente estudando 4 horas, mas desta vez estudando mesmo.

Outro ponto importante. Não entenda ser focado e eliminar distrações com ler correndo. Não é isso. Você irá ler seu material de forma tranquila, presente. Só não irá tentar fazer várias tarefas ao mesmo tempo.

No próximo capítulo, iremos aprender outra ferramenta muito importante, que atuará conjuntamente com a Lei de Parkinson para potencializar suas ações.

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Vilfredo Pareto foi um economista italiano que viveu entre 1848 e 1923. Em 1897 reali-zou um estudo onde concluiu que 80% da riqueza mundial se concentrava nas mãos de 20% da população. A partir de então, a Lei de Pareto (ou 80/20) tem sido aplicada a outras áreas e atividades, especialmente como ferramenta de gestão. Por exemplo, deduz-se que, em uma livraria, uma pequena parcela de títulos (20%) é responsável pela maior parte do faturamento (80%). Numa simples análise, fica claro que a livra-ria hipotética, para maximizar seus esforços, deve focá-los na divulgação/gerenciamen-to da parcela de títulos que mais vende.

Sendo assim, reescrevendo o princípio e adequando-o ao nosso propósito, pode-mos afirmar que 20% de nossos esforços correspondem a 80% dos resultados alcança-dos. Alguns autores derivados costumam ser mais audazes que o próprio Pareto, como o escritor americano Sturgeon que afirma que “90% de qualquer coisa é lixo”.

Em termos objetivos, podemos afirmar que a maior parte de nossos esforços são inócuos, ou seja não produzem quase nada de concreto em termos de resultado. Para comprovar a teoria, basta você observar como perde tempo com tarefas que apenas

COMO SER MAIS EFICIENTE, PARTE 3 - PARETO, O SAGAZ

“Foco é dizer não”

~ Steve Jobs

CAPÍTULO 26

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ocupam seu tempo, mas não agregam valor de fato como, por exemplo, conversas espe-culativas nos corredores do trabalho e redes sociais.

Uma aplicação prática do Princípio de Pareto é que devemos dar atenção ao que é importante primeiro e depois, se sobrar tempo, fazermos o restante. Dessa maneira, conseguimos garantir que ao menos uma parte de nosso dia será alocado a tarefas que, potencialmente, tem o condão de aperfeiçoar nossa vida, como estudar para um concurso público, por exemplo.

Nessa ótica, estudar é importante. TV não é importante. Dar atenção à família é importante. Joguinhos no celular não são importantes. Trabalhar é importante. Ver notícias no trabalho não é importante.

“A Coceira”, arqui-inimiga de Pareto

Quando começamos a dar atenção ao que realmente importa, sentimos uma von-tade louca de migrar nosso foco para outro objeto. É uma espécie de coceira, uma sen-sação de impulso, que nos atiça a fazer algo não importante.

Muito provavelmente você já deve ter notado essa sensação antes. É aquela vonta-de de pegar o celular e ver a mensagem recebida quando você está lendo seu material de concurso.

Quando sucumbimos à coceira, geralmente inventamos desculpas para endossar o fato de não estarmos atuando de maneira consciente naquilo que interessa. Exemplo de desculpa é aquela de que uma emergência pode acontecer no momento dos seus es-tudos. Ora, convenhamos, a não ser que você seja médico ou bombeiro (Richard não era, tampouco Joseph), a maioria das situações ditas “emergenciais” podem esperar algumas horas. Além disso, quando não damos atenção a e-mails ou mensagens “ur-gentes”, muitas delas costumam se resolver sozinhas. Experimente não responder ime-diatamente um e-mail/mensagem e me conte. O próprio remetente costuma já resol-ver o problema.

“A Pausa”, o antídoto da coceira

Toda vez que você sentir necessidade de mudar de atividade quando estiver estu-dando ou realizando qualquer tarefa importante, basta que você tome uma atitude: nada. Isso mesmo que você escutou: nada.

Simplesmente não reaja ao impulso de sair da escrivaninha. Note o impulso, tome consciência dele e estabeleça uma pequena pausa sem fazer coisa alguma. O im-

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pulso vai passar. Aos poucos, aquela força invisível que quer tirar você da cadeira vai perdendo forças e deixará você em paz.

No início, como todo início, o impulso de fazer algo diferente ou sem importân-cia será grande. Mas com a prática metódica, o intervalo necessário da pausa será cada vez menor.

Pareto nas disciplinas

Comprovadamente, há certos tópicos dentro das disciplinas que se repetem mui-to em provas de concurso. Para notá-los, basta você ter um pouco de sagacidade, as-sim como Pareto teve. Ao realizar as questões, perceba como certos blocos de informa-ção se repetem. Quer ver um exemplo? Leia a frase abaixo extraída do documento cha-mado Tabela de Eventos, disciplina Contabilidade Pública:

O SIAFI somente validará os documentos de entrada de dados, em termos con-tábeis, se eles se apresentarem com os eventos que, no todo, completem partidas do-bradas (total dos débitos igual ao total dos créditos).

Em que pese o fato de o Manual do SIAFI ser gigantesco, você só precisa saber os blocos de frases chaves que mais se repetem, assim como esse acima.

Com isso, você estudaria apenas uma pequena parcela da matéria (20%) visando a acertar a maior parte das questões que historicamente aparecem (80%). Na frase aci-ma, você nem precisaria ter um entendimento profundo do seu significado. Basta ape-nas que você se acostume com a sonoridade e marque a resposta na prova. Veja:

(CESPE/TCU 2015) Para o fim de registro contábil, o SIAFI somente validará os documentos de entrada de dados que apresentarem eventos que, no todo, comple-tem as partidas dobradas. Como forma de monitorar ações danosas ou fraudulen-tas, o usuário que ingressar no sistema terá registrado seu cadastro de pessoa física bem como o horário e o terminal de acesso.

(ESAF/DNIT 2013) O SIAFI somente valida os documentos de entrada dos da-dos contábeis que contiverem os eventos de que resulte a igualdade entre os totais dos débitos e dos créditos.

(FUNIVERSA/SEPLAG-DF 2010) O SIAFI validará os efeitos contábeis dos do-cumentos de entrada independentemente de eles se apresentarem com os eventos.

(CESPE/CEHAP 2008) O SIAFI só validará os documentos de entrada de da-dos, em termos contábeis, se eles se apresentarem com os eventos que, no todo, com-pletem as partidas dobradas.

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(CESPE/TCU 2007) O SIAFI somente validará, do ponto de vista contábil, os do-cumentos de entrada de dados, se eles se apresentarem com os eventos que, no todo, completem partidas dobradas.

É importante ainda que você seja pragmático e não fique inventando moda. Você não vai ler o manual do SIAFI todo só porque é “legal saber isso” ou por “medo de que possa ser cobrado qualquer coisa”. Se você entrar nessa, além de você ficar doido, você acabará não acertando aquelas questões que são, estatisticamente, cartas marcadas em provas de concurso.

Uma dica? Baseie-se nas questões. Leia a teoria, mas entenda que o seu esforço de compreensão do conteúdo deve levar em conta o que é cobrado, não o que parece ser uma boa estudar.

Recordando

Se juntarmos o Princípio de Pareto e o de Parkinson, criamos duas regras funda-mentais da eficiência:

Regra 1 - dar atenção ao que é importante e fazer o que sobrar no tempo que so-brar (Pareto).

Regra 2 - ser implacável com as distrações quando estiver fazendo o que é im-portante (Parkinson).

Exemplo prático: deixar a TV e a rede social para o final de semana e alocar parte de seu tempo livre para estudar (Pareto). No momento em que sentar na escrivaninha para estudar se investir de uma determinação implacável para aprender o conteúdo, a ponto de desligar o celular para evitar distrações (Parkinson).

No início você sentirá dificuldades. É normal. Não se sinta frustrado. Todas as bo-as pessoas passam por essas dificuldades. Faz parte de todo o processo de experimen-tação.

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Era feriado e Joseph decidiu ir à academia pela manhã. Foi nesse dia que Joseph come-çou a virar o jogo em sua vida.

Depois de terminar seu treino, Joseph se sentou no chão e começou a conversar com o pessoal que também havia terminado o treino. Richard estava ali.

Conversa vai, conversa vem, Richard disse que estava estudando para concurso público e aquele comentário despertou a curiosidade imediata de Joseph, que logo se pronunciou no sentido de que "assim como você Richard, eu também sofro". Richard, direto que só, logo pescou o que estava acontecendo e, no intuito de ajudar, disse: "so-fre, porque gosta de sofrer".

Joseph, enfurecido com o comentário "maldoso" daquela pessoa que nunca vira antes, ressaltou que "ninguém gosta de sofrer e que esse comentário o ofende".

Foi quando Richard disse: "eu já fui como você, pois também sofria com aquilo que precisava ser feito. Naqueles tempos, eu me alimentava do meu próprio sofrimen-to, compadecia comigo mesmo, como uma forma de racionalizar o fato de que não es-

COMO SER MAIS EFICIENTE, PARTE FI-NAL - QUANDO JOSEPH CONHECE

RICHARD

“Sabedoria não é o mesmo que conhecimento, a sabedoria está em fazer”

~ Do filme Poder Além da Vida

CAPÍTULO 27

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tava conseguindo estudar e gerenciar minha vida. Se quiser, posso explicar pra você o que eu fiz para botar a casa em ordem".

Joseph, orgulhoso, mas cansado de sofrer, preferiu o caminho da resignação e aceitou o conselho do estranho, afinal de contas a vida é assim mesmo, a gente sempre encontra um estranho na jornada que nos ajuda a enxergar o mundo com outros olhos.

Richard colocou a mão no ombro de Joseph e disse: sei exatamente o que está acontecendo contigo, pois eu também fugia das minhas obrigações para "aproveitar a vida", mas me sentia mal quando pensava nelas. É assim mesmo Joseph. Nós temos a tendência de correr de nossos medos, do resultado no simulado, de saber a relação can-didato/vaga, mas somente quando você passa a encarar seus medos, isento de julga-mentos sobre si mesmo, é que você conseguirá melhorar. Nessa altura do campeonato Joseph já estava com o olho cheio d'água.

Percebendo o que estava acontecendo, Richard disse: não ligue para o que aconte-ceu Joseph. Acontece com os melhores de nós de tempos em tempos. Todos erramos, afinal. Eu erro muito todo dia. Só passei a encarar esses erros como oportunidades de melhora. Eles fazem parte de mim agora e sou grato por eles. Depois que comecei a ver dessa forma, esses deslizes pararam de me incomodar e os uso a meu favor. Para previnir de decepções futuras, vou anotar pra você um passo-a-passo sobre como fazer da eficiência um dos pilares de sua vida. Falando em pilares, encarar o processo de ma-neira realista é importante, pois otimismo sem fundamento gera frustração Joseph.

Segue abaixo a lista que Richard anotou para Joseph:- Simplifique sua vida ao máximo. Seja minimalista em todos os aspectos. Por

exemplo, eu possuo apenas um par de sapatos e um cinto para ir trabalhar. Dessa ma-neira, não perco meu tempo escolhendo minha roupa. É fora de moda, mas funciona. Coloque suas contas no automático, utilize aplicativos de gerenciamento de tarefas para que você não precise ficar se lembrando o tempo todo daquilo que precisa ser fei-to. Vasculhe os mínimos detalhes de sua vida e veja aquilo que faz você perder tempo. E o mais importante: aprenda a dizer "não" para tudo aquilo que pode consumir sua energia ou tempo. Às vezes não é tão simples, pois distrações podem vir disfarçadas de oportunidades. Recentemente pedi para sair do meu cargo de chefia só porque ele esta-va consumindo meus neurônios com preocupações estranhas aquilo que julgo impor-tante. Eu disse "não" e simplifiquei minha vida. Quando eliminamos o supérfluo, fica-mos com o essencial.

- Depois de extrair aquilo que apenas ocupa espaço, foque nas atividades que tor-nam seu dia produtivo como estudar, malhar e ficar com sua família, por exemplo. Dei-

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xe para o tempo que sobrar aquelas pequenas tarefas que apenas consomem tempo, como TV e redes sociais. Se for o caso, delegue tarefas que precisam ser feitas para membros de sua família. Em resumo: não microgerencie sua vida e dê atenção àquelas poucas coisas que tem o condão de alterar definitivamente sua vida para melhor (Pare-to ou 80/20).

- Ao fazer o que precisa ser feito, finja que está vivendo em uma bolha de concen-tração e não deixe que nada entre em sua bolha. Você notará que seu tempo vai se mul-tiplicar com essa prática, pois você levará menos tempo para executar suas tarefas. É como se você passasse a ver a vida em "modo tela cheia". Ou seja, não há distrações la-terais. Na sua frente, há o que importa e nada mais (Parkinson).

Observação do Igor: note que o foco de Richard é em resultados. Se não funcio-na, não dura com Richard. Continuando...

- Paralelamente, busque apoio daquelas pessoas que vivem com você. Veja bem, elas não precisam pular de alegria com o fato de você estar estudando. As pessoas são diferentes e têm seus próprios interesses particulares. Elas precisam apenas respeitar seu tempo. Nesse caso, eu já vinha conversando com minha esposa há algum tempo e a acostumando, aos poucos, à nova rotina que teríamos que enfrentar juntos. Na últi-ma semana de "folga", antes de começar os estudos, optei por envolvê-la definitiva-mente no processo e escolhi mandar um e-mail, como forma de marcar bem este mo-mento. Veja o e-mail que enviei:

"Querida Angelina Jolie,Semana que vem, começamos a grande jornada em direção a uma vida melhor.

Como já venho dizendo, não consigo fazer isso sem você. Seu apoio é mais que legal, é fundamental. Ficarei ausente algumas horas do dia, mas isso não diminui o fato que a amo. Além disso, tentarei compensar com qualidade os momentos especiais que passaremos juntos.

Com amor,Seu Richard".Observação do Igor: Richard não é calculista. É apenas romântico à moda anti-

ga. Continuando...Essas são as regras de ouro da eficiência Joseph:- encare seus medos.- aprenda com seus próprios erros.- simplifique, automatize e diga "não".- foque no que interessa. Delegue.

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- seja implacável ao fazer suas tarefas. Não dê mole para as distrações. Modo tela cheia.

- construa uma base de apoio. Você precisará.Joseph estava tão empolgado quanto uma criança que acabou descobrir o que é

chocolate, substância proveniente do cacau de sabor inigualável."Só isso"? Perguntou Joseph. Richard disse: ser eficiente é meio óbvio, mas as

pessoas gostam de ser complicadas na maioria das vezes. Ah...mas não seja tolo - conti-nuou Richard -, isso tudo é como emagrecer: simples, mas difícil. Haverá dias em que você não conseguirá fazer nada do que lhe disse. Mas entenda que é normal e que al-tos e baixos fazem parte da vida de qualquer pessoa.

Um ano se passou e Richard, aprovado no concurso da Receita Federal, após to-mar posse, foi caminhando para casa escutando a música ICE ICE BABY, do Vanila Ice.

Observação do Igor: experimente andar na rua balançando os braços e escutan-do essa música. Você vai se sentir muito "fodão".

A música foi interrompida por uma ligação de Joseph, parabenizando Richard pelo feito e agradecendo pelas lições aprendidas.

Joseph estava firme nos estudos e conseguindo equilibrar os diversos papéis de sua vida. Depois daquele dia na academia, Joseph decidiu que não havia mais tempo a perder. Era hora de agir. Ele botou a casa em ordem, passou a levar os estudos mais a sério e não vê a hora de andar na rua empossado, se achando, escutando ICE ICE BABY.

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O Almirante Stockdale foi um piloto da Marinha Americana que teve sua aeronave aba-tida na guerra do Vietnã. Ele foi capturado pelos seus inimigos e viveu como cativo num campo de prisioneiros por oito anos. Foi torturado inúmeras vezes sem saber se voltaria para casa e reencontraria sua família. Ele foi tão torturado que chegou a per-der o movimento em uma de suas pernas.

Depois que voltou para casa, ao ser perguntado sobre sua experiência no campo de prisioneiros, disse:

“Jamais perdi a fé no final da história. Nunca duvidei - não apenas de que sairia vivo, mas que também venceria no final e transformaria aquela experiência num divi-sor de águas da minha vida - experiência que, em retrospectiva, eu não trocaria por nada”.

Quando questionado sobre quem não conseguiu sobreviver, respondeu:“Ah, isso é fácil: os otimistas”.O entrevistador, perplexo diante da resposta, indagou o motivo.

O OTIMISMO REALISTA (O PARADOXO DE STOCKDALE)

“A disciplina é a melhor amiga do homem, porque ela leva a realizar os

desejos mais profundos de seu coração”

~ Madre Teresa de Calcutá

CAPÍTULO 28

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Stockdale afirmou que os otimistas eram aqueles que diziam: “Estaremos fora da-qui na época do Natal”. O Natal chegava, o Natal ia embora e os otimistas diziam “esta-remos fora daqui depois da Páscoa”. A Páscoa chegava, ia embora e nada acontecia. Vá-rias Páscoas, vários Natais e os otimistas morriam com o coração partido.

Stockdale dizia que você nunca deve confundir a fé de que irá triunfar no final com a disciplina de enfrentar a mais dura realidade dos fatos (que às vezes não é nada boa).

De fato, Stockdale não apenas ficava contando os dias em sua cela. Ele atuou ati-vamente para criar uma condição mínima de sobrevivência para seus soldados a fim de que a maioria pudesse voltar sem danos para a casa. Instituiu um sistema de comu-nicação entre os prisioneiros para que eles não se sentissem sozinhos. Trocou informa-ções de inteligência com sua esposa, ainda que isso pudesse acarretar sua execução. Criou regras que ajudavam os soldados a lidarem com a tortura (como ninguém resis-te muito tempo à tortura, depois de X minutos você poderia dizer certas informações, o que aumentaria suas chances de sobreviver).

Num momento memorável, os prisioneiros, durante um silêncio imposto, escre-veram, com panos e esfregões, no pátio central do campo de concentração um “Nós te amamos” para Stockdale, no seu aniversário de terceiro ano de captura.

Ainda que a realidade fosse dura (brutal, na verdade), ainda que Stockdale tenha passado frio, fome ou dor, ele não ficou de braços cruzados e chamou para si a respon-sabilidade do conforto de seus homens.

Ao término de tudo, ele ainda escreveu um livro com sua esposa (In Love and War), em capítulos alternados, com crônicas de suas respectivas experiências durante aqueles oito anos.

O Paradoxo de Stockdale é uma poderosa dualidade psicológica. Ao mesmo tem-po que você deve ter a fé inabalável de que irá passar num concurso público, você deve aplicar de maneira incansável a disciplina para enfrentar sua atual situação, seja ela qual for.

Todos aqueles que conseguem atuar em ambos os lados da equação (fé e discipli-na) criam a excelência em suas vidas, projetos e empresas.

Construa sua experiência com disciplina

O que diferencia as pessoas não são as dificuldades a que são submetidas. Mas a forma como elas lidam com essas dificuldades. Verdade seja dita, candidatos ruins não sabem lidar nem com o excesso, nem com a escassez de concursos públicos. No ex-

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cesso são encurralados pela dúvida, confusão e falta de planejamento. É como se esti-vessem numa pizzaria com duzentos sabores de pizza e ficassem um ano escolhendo qual seria a melhor opção. Na escassez rogam aos céus um motivo para continuarem estudando.

A vida nem sempre é o que gostaríamos. Você pode ser capturado num campo de prisioneiros, passar por sufocos financeiros, de relacionamentos, saúde ou não ter to-dos os concursos do mundo com edital aberto.

No entanto, se você mantiver a fé inabalável de que irá passar e ainda aplicar a disciplina diária para fazer sua parte, talvez você não passe até o Natal ou a Páscoa, mas certamente não apenas sairá vitorioso ao final, como também terá orgulho de si mesmo ao olhar para trás e ver que teve a coragem de manter sua posição, ainda que o cenário não fosse favorável. Assim como Stockdale, você viverá seu processo de prepa-ração de maneira pragmática e memorável e, em retrospectiva, conseguirá tirar trans-formadoras lições disso tudo para sua vida.

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O fuzileiro inaugura sua vida operativa na Marinha do Brasil com um treinamento cha-mado “batismo”. O evento dura aproximadamente 24 horas e tem o único objetivo de levar você à exaustão. Nada mais. É realmente seu batismo de fogo e um aperitivo do estilo de vida que você escolheu.

Sabedor de que iria ser fustigado ao extremo, tratei de me preparar tanto física quanto psicologicamente nos meses que antecederam meu batismo. Não apenas eu, mas todos os outros meus colegas fuzileiros. Pelo menos os mais ajuizados.

Uma hora após o treinamento ter iniciado eu já estava exausto. E aquilo ainda iria durar mais 23 horas! Sem dormir, comer ou beber água direito.

Num certo momento estava fazendo flexões de braço com cerca de 25 Kg de equi-pamento preso ao meu corpo, suando, sujo, com sede e um calor infernal. Vez ou ou-tra dava com a cara no barro e desejava loucamente não estar ali. Eu tentava ancorar meus pensamentos no fluxo do momento, olhava o solo à minha frente, o céu, o mato, mas nada dava certo. Eu perguntava pra mim mesmo: “Deus, por que escolhi isso, que

VOCÊ AINDA TEM MAIS 20%

“Dai-me, Senhor meu Deus, o que Vos resta; Aquilo que ninguém Vos pede. Não Vos peço o repouso nem a tranqüilidade,

Nem da alma nem do corpo”

~ Trecho da Oração do Paraquedista

CAPÍTULO 29

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loucura”! Olhava meus colegas e todos estavam com aquela cara de derrota, assim como eu.

Foi neste momento que um dos instrutores falou uma máxima que caiu como um singelo bálsamo sobre todos nós: “quando você acha que não dá, que sua energia foi a zero, você ainda tem mais 20% para oferecer”. Essa súmula vinculante dos fuzileiros me foi útil em vários aspectos da vida.

Nos treinamentos seguintes, em momentos de exaustão, eu sempre me lembrava da voz do velho instrutor berrando na minha cabeça: “você ainda tem mais 20%”! No curso de piloto, quando me foi dada uma última chance para ser aprovado na fase de voo em formatura, eu, já cansado de toda aquela cobrança, lembrei-me mais uma vez do instrutor sussurrando no meu ouvido: “mais 20%”!

Quando comecei a estudar para concurso público, por diversas vezes, pensei em desistir. DI-VER-SAS. Toda a lógica se mostrava contra. Nada colaborava. Parece que só porque eu havia começado a estudar toda sorte de problemas começou a brotar do chão. Olhava para o livro de Direito Constitucional e a impressão que tinha era que le-varia uma vida pra ler aquilo. O mesmo aconteceu em quase todas as disciplinas. Em todas elas, lia a teoria e quando tentava fazer as questões era como se eu estivesse estu-dando alemão e fazendo prova de russo. Não entendia nada. Era tudo muito frustrante e demorado.

Mas dia após dia, mesmo que cheio daquele processo, pensava: “mais 20%. Você ainda tem mais 20%”.

Os dias foram passando e aquelas matérias, que se mostravam inicialmente intra-gáveis, começaram a fazer sentido pra mim. Eu acreditei (e ainda acredito) que 20% era o que eu precisava para cruzar a linha de chegada. E, por acreditar firmemente nis-so, continuei em marcha como se obedecendo ao meu instrutor naquele batismo.

Se você estiver pensando em desistir, as matérias não fazem sentido, as pessoas duvidam de você, seu índice de acerto é baixo, você se sente pequeno diante do cami-nho que tem que trilhar, eu digo a você: “você ainda tem mais 20%”. E se você acredi-tar nisso, esses 20% vão durar até você passar, assim como duraram para mim.

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Certa vez, li a história de um americano que, na década de 80, foi voluntário para uma missão de paz em Gana, na África. O que ele viu, quando chegou, foi marcante demais para não se comover. O país estava em guerra e vivendo a pior seca da história. Itens como pão e água potável eram artigos de luxo. O único tipo de alimento de que dispu-nha era uma espécie de angu de milho misturado com espinafre. Isso no café, almoço e jantar. Num ambiente totalmente hostil, longe do mundo que conhecia, privado do conforto a que estava habituado, ele ficou desesperado. E sabia que ficaria ali ainda por mais quatro longos meses. No entanto, contra todas as apostas, em duas semanas, ele começou a se adaptar e não sentia falta de sua antiga rotina. Aconteceu algo que se mostrou a maior contra-dição de sua vida. Ali, no meio do nada, guerra, seca, escassez de alimentos, ele conse-guiu encontrar alguma felicidade. Fez novos amigos, ajudou quem precisava de ajuda e comia angu perto de pessoas sinceras, sentado de frente para uma fogueira. E viu que isso era o bastante. A conclusão que ele chegou foi surpreendente: o pior não é tão ruim assim.

O PIOR NÃO É TÃO RUIM

“O homem mais rico é aquele cujos prazeres são mais baratos”

~ Henry David Thoreau

CAPÍTULO 30

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Hoje, duas décadas depois de sua experiência, nosso amigo é um homem de clas-se média alta e vive num casarão nos EUA com sua família. Apesar da vida confortá-vel, ele tem muitas lembranças tenras da época do angu. Hoje, ele tem dinheiro, é bem sucedido, mas sabe que se ficar pobre amanhã, o máximo que vai acontecer é voltar a comer angu em frente a uma fogueira com as pessoas que ama.

Você pode não estar vivendo o melhor momento de sua vida, mas se você diminu-ir suas expectativas materiais e afetivas ao mínimo, e se concentrar em dar o duro, tudo que acontecer com você será mágico. Um dia de estudo bem cumprido, uma men-sagem de um amigo, uma caneca de café ou um pedaço de angu assumirão a forma de lembranças de dias em que você lutou para estar acima da necessidade de autopromo-ção, de estar sempre certo ou da infantilidade de querer tudo pra ontem, sem esforço, tão comum nos dias de hoje.

Quando escrevo este capítulo final, nosso país está vivendo uma grave crise eco-nômica. Não sei qual será o final disso e qual o verdadeiro impacto futuro nos concur-sos públicos. Espero mesmo que tudo dê certo, da forma como cada pessoa entende o que é certo. No entanto, está claro pra mim qual é minha missão: fazer a minha parte, com os recursos que tenho, sejam eles papel, caneta ou fubá para angu.

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