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INSTITUTO DOCTUM DE EDUCAÇÃO E TECNOLOGIA LTDA. Faculdades Unificadas Doctum de Serra Curso: DIREITO Curso autorizado pela portaria No. 3.687 de 09.12.2003 Publicado no Diário Oficial da União em 10.12.2003 Av. Jones dos Santos Neves, 3535 – Muquiçaba- Guarapari - ES Pós-Positivismo e Teoria Geral do Processo É comum nos dias de hoje em nossa comunidade jurídica a afirmativa de que nosso Direito se encontra na fase “pós-positivista”. O significado da expressão “pós- positivismo” é de difícil — se não impossível — definição. Em verdade, ela busca representar o atual momento em que, sem fugir do princípio da legalidade, se deseja superar alguns excessos do positivismo radical que imperou em nossos tribunais no século XX. Segundo o jusfilósofo espanhol ALBERT CALSAMIGLIA, “os adeptos do pós- positivismo não defendem um anti-positivismo (ou direito alternativo)”. O que ocorre é um deslocamento do enfoque das questões abordadas e, em alguns casos, o distanciamento de certas teses sustentadas pela maior parte da doutrina positivista. De forma sintética, segundo o referido autor, são dois os pontos em que o pós- positivismo busca dar este novo enfoque: (a) Os limites do direito. No pós-positivismo, as normas jurídicas não possuem somente elementos descritivos para tratar de fatos passados, mas também elementos prescritivos, com o objetivo de oferecer elementos adequados para resolver problemas práticos. Existe uma preocupação relacionada aos elementos de completude do ordenamento para solucionar hard cases. Uma das tendências mais importantes da teoria jurídica contemporânea é sua insistência nos problemas relativos à indeterminação do direito, pois as tradicionais fontes normativas não podem resolver todas as questões. Ademais, o pós-positivista coloca o julgamento (a aplicação do direito), e não a legislação, como feito pelos positivistas, no centro da análise da ciência jurídica. (b) A relação entre direito e moral. Para o positivista, a moral só tem importância na medida em que ela é reconhecida pelo ordenamento jurídico (o direito não perde sua coercitividade por ser injusto). Na realidade, ao contrário do que comumente se afirma, a moral possui curial importância para o direito, ora na interpretação de conceitos jurídicos indeterminados, de princípios jurídicos, ora em outros momentos que o magistrado se encontra diante de lacunas do ordenamento. Assim, conclui CALSAMIGLIA, as ferramentas oferecidas pelo legislador são insuficientes para construir uma forma de julgamento aplicável a todo e qualquer caso.

Pós-Positivismo e Teoria Geral do Processo

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Faculdades Unificadas Doctum de Serra Curso: DIREITO

Curso autorizado pela portaria No. 3.687 de 09.12.2003 Publicado no Diário Oficial da União em 10.12.2003

Av. Jones dos Santos Neves, 3535 – Muquiçaba- Guarapari - ES

Pós-Positivismo e Teoria Geral do Processo

É comum nos dias de hoje em nossa comunidade jurídica a afirmativa de que nosso

Direito se encontra na fase “pós-positivista” . O significado da expressão “pós-

positivismo” é de difícil — se não impossível — definição. Em verdade, ela busca

representar o atual momento em que, sem fugir do princípio da legalidade, se deseja

superar alguns excessos do positivismo radical que imperou em nossos tribunais no

século XX.

Segundo o jusfilósofo espanhol ALBERT CALSAMIGLIA , “os adeptos do pós-

positivismo não defendem um anti-positivismo (ou direito alternativo)”.

O que ocorre é um deslocamento do enfoque das questões abordadas e, em alguns casos,

o distanciamento de certas teses sustentadas pela maior parte da doutrina positivista.

De forma sintética, segundo o referido autor, são dois os pontos em que o pós-

positivismo busca dar este novo enfoque:

(a) Os limites do direito. No pós-positivismo, as normas jurídicas não possuem

somente elementos descritivos para tratar de fatos passados, mas também elementos

prescritivos, com o objetivo de oferecer elementos adequados para resolver problemas

práticos. Existe uma preocupação relacionada aos elementos de completude do

ordenamento para solucionar hard cases. Uma das tendências mais importantes da

teoria jurídica contemporânea é sua insistência nos problemas relativos à

indeterminação do direito, pois as tradicionais fontes normativas não podem resolver

todas as questões. Ademais, o pós-positivista coloca o julgamento (a aplicação do

direito), e não a legislação, como feito pelos positivistas, no centro da análise da ciência

jurídica.

(b) A relação entre direito e moral. Para o positivista, a moral só tem importância na

medida em que ela é reconhecida pelo ordenamento jurídico (o direito não perde sua

coercitividade por ser injusto).

Na realidade, ao contrário do que comumente se afirma, a moral possui curial

importância para o direito, ora na interpretação de conceitos jurídicos indeterminados,

de princípios jurídicos, ora em outros momentos que o magistrado se encontra diante de

lacunas do ordenamento. Assim, conclui CALSAMIGLIA, as ferramentas oferecidas

pelo legislador são insuficientes para construir uma forma de julgamento aplicável a

todo e qualquer caso.

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Dentro dessa perspectiva, é natural que seja ultrapassada a antiga concepção que a

atividade jurisdicional seria uma atividade meramente declaratória de direitos. Contudo,

até hoje, a maioria dos “cursos de direito processual” adotados no Brasil ainda partem

daquela velha premissa, consagrada na lição de Montesquieu, de que o Juiz seria a mera

boca que pronuncia as palavras da lei.

Recentemente, Luiz Guilherme Marinoni, Professor Titular de Direito Processual Civil

da Universidade Federal do Paraná, publicou sua obra de Teoria Geral do Processo em

que busca superar a clássica visão apontada no parágrafo anterior. Baseado nas lições de

ilustres autores alienígenas — tais como Hans Kelsen, Owen Fiss e Mauro Cappelleti

—, Marinoni defende a possibilidade da construção de novos direitos através da

prestação da tutela jurisdicional.

Como se sabe, o surgimento de normas jurídicas relacionadas à implementação de

direitos sociais, no decorrer do século XX, acarretou a gradual transformação do

Welfare State (Estado de Bem-Estar Social) em um imenso Estado administrativo,

sobrecarregado de funções a desempenhar, bem diferente de seu antecessor, o Estado

Liberal. A implementação desses direitos sociais exige ações por parte do Estado. Nesse

passo, importantíssimas implicações são impostas aos juízes.

O Judiciário de nossos dias não realiza mais apenas a tutela de direitos civis e penais

relativos ao cidadão, mas, também, o controle dos poderes políticos do Estado. À guisa

de exemplo, vale apontar as recentes discussões sobre a sindicabilidade ou não do ato

administrativo pelo Estado-juiz e sobre a possibilidade ou não do controle jurisdicional

sobre as omissões administrativas.

Ademais, com o reconhecimento da existência de uma terceira geração de direitos

humanos, os interesses de grupo, ficou ainda mais evidenciado esse caráter de

discricionariedade existente na atividade jurisdicional, bem como a necessidade de

repensar toda a Teoria Geral do Processo.

Tutela Jurisdicional de Interesse disponíveis e indisponíveis. Interesse de Grupo.

Inexiste critério objetivo no direito positivo brasileiro para determinar se estamos diante

de interesses disponíveis ou indisponíveis. Nossa doutrina também não chegou a um

consenso sobre quais direitos são ou não indisponíveis e quais os parâmetros para tal

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classificação. Há casos, como por exemplo, no direito de família e nos direitos da

personalidade, em que é difícil apontar se determinado interesse é ou não disponível.

De qualquer modo, há hipóteses em que não encontramos dúvidas de que estamos

diante de tutela de determinado interesse que não se está na esfera de disponibilidade

das partes que litigam em juízo. É o caso, por exemplo, da tutela do meio-ambiente

realizada por intermédio de uma ação civil pública.

Nessa hipótese, os legitimados pelo art. 5º da Lei nº 7.347/84 atuam em nome de toda a

sociedade e, por essa razão, não podem “abrir mão” de um interesse que não lhes

pertence.

A ação civil pública é hoje o principal instrumento de tutela de direitos coletivos em

nosso País e possui previsão constitucional no artigo 129, inciso III e § 1º, da

Constituição Federal, sendo regulamentada pelas Leis nº 7.347, de 24 de julho de 1985

(Lei da Ação Civil Pública), e nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 (Código de Defesa

do Consumidor). Sua criação e desenvolvimento é atribuída à constatação da

insuficiência dos mecanismos processuais existentes para proteger direitos que

transcendem o indivíduo, seja em razão da dificuldade de identificar sua titularidade, de

dividir seu objeto ou, ainda, de tutelá-los de maneira individual.

De fato, é na tutela do interesse de grupo que fica mais evidente a necessidade de

repensar a Teoria Geral do Processo para que seus institutos se adaptem à chamada

Jurisdição Coletiva. A necessidade de adequar o processo às exigências de uma

sociedade massificada, ditada pelos avanços tecnológicos e culturais e, bem assim, por

suas implicações em diversos setores, tais como o meio ambiente, as relações

trabalhistas e de consumo, as políticas públicas e os direitos das minorias, trouxe à tona

o debate acerca da reformulação dos institutos e princípios tradicionais do direito

processual, de conotação meramente individualística.

Como se verá ao longo do curso, institutos tradicionais da Teoria Geral do Processo,

tais como legitimidade e coisa julgada, tiveram que ser adaptados para que esse ramo do

Direito pudesse tratar, também, de interesses de grupo.

De igual modo, os princípios constitucionais do processo adquirem uma nova dimensão

na tutela de direitos indisponíveis.

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Breve Conclusão

Conforme ressaltado, são dois os principais motivos que levam à necessidade de

reformulação da Teoria Geral do Processo:

(a) superação da clássica concepção da Jurisdição como atividade meramente

declaratória de direitos;

(b) necessidade de adaptar seus tradicionais institutos à tutela coletiva de direitos.