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hoje fui demitido. não pude fazer nada. me botaram pra fora depois de trinta e três anos lá. acho que eles também não puderam fazer nada. mas isso aí já não é mais problema meu. agora eu dirijo. e percebo que perco a concentração por causa disso. de repente vejo que ainda tô dirigindo. aí tomo um susto. os quadrados da faixa amarela serrilhada passando rápido, os postes dos lados da estrada, os matos altos depois do acostamento. o sol lá em cima batendo forte no vidro do carro e fazendo com que eu serre os olhos. me demitiram depois de trinta e três anos. filhos da puta. ligo o rádio, mas o sinal tá ruim. parece que tá pegando duas estações. uma toca música, a outra, acho que é religiosa. tem um homem falando, quase gritando. esbravejando. intercalando entre isso e uma voz calma. não da pra entender direito sobre o que ele fala. a música eu não conheço. ou talvez conheço, mas não dá pra distinguir nada. ainda tem um chiado. lá no céu tá cheio de nuvens. muitas nuvens. o céu todo azul com muitas nuvens brancas. parece que não vai chover. seria melhor se chovesse. não tem carro na minha frente, por isso dá pra acelerar um pouco mais e o vento entra pelas janelas abertas e é boa a sensação. antes de ir pro trabalho, cortei o dedo abrindo o pão. eu sabia que isso ia acontecer. mas não pude evitar. esperei estancar. pensei em colocar super bonde pra fechar a ferida. mas não precisou. apertei o ferimento até que o sangue parecesse de sair. depois procurei o sangue na ponta da faca, mas não tinha. nem no pão. a pia ficou com algumas gotas vermelhas por cima. passei uma bucha. enrolei o dedo com papel higiênico e amarrei com uma fita isolante. fui trabalhar. e aí fui demitido. vi um acidente de transito no caminho. uma moto debaixo de um ônibus. uma poça de sangue escorria pelo asfalto quente. o transito ficou lento. algumas pessoas tiravam foto. o motoqueiro não tava mais lá. o motorista e o cobrador falava com alguns policiais. depois que passava do acidente, o transito voltava a fluir normal. a dengue voltou a atacar. distribuíam panfletos sobre como vencer a guerra contra o mosquito nos sinais. as ilustrações no papel eram interessantes. o mosquito sugando o sangue de um braço qualquer. essa foi a primeira e ultima vez que fui demitido de algum lugar. filhos da puta, nunca mais vão ter outra chance. o

pra que lado fica o leste?

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Page 1: pra que lado fica o leste?

hoje fui demitido. não pude fazer nada. me botaram pra fora depois de trinta e três anos lá. acho que eles também não puderam fazer nada. mas isso aí já não é mais problema meu. agora eu dirijo. e percebo que perco a concentração por causa disso. de repente vejo que ainda tô dirigindo. aí tomo um susto. os quadrados da faixa amarela serrilhada passando rápido, os postes dos lados da estrada, os matos altos depois do acostamento. o sol lá em cima batendo forte no vidro do carro e fazendo com que eu serre os olhos. me demitiram depois de trinta e três anos. filhos da puta.

ligo o rádio, mas o sinal tá ruim. parece que tá pegando duas estações. uma toca música, a outra, acho que é religiosa. tem um homem falando, quase gritando. esbravejando. intercalando entre isso e uma voz calma. não da pra entender direito sobre o que ele fala. a música eu não conheço. ou talvez conheço, mas não dá pra distinguir nada. ainda tem um chiado. lá no céu tá cheio de nuvens. muitas nuvens. o céu todo azul com muitas nuvens brancas. parece que não vai chover. seria melhor se chovesse. não tem carro na minha frente, por isso dá pra acelerar um pouco mais e o vento entra pelas janelas abertas e é boa a sensação. antes de ir pro trabalho, cortei o dedo abrindo o pão. eu sabia que isso ia acontecer. mas não pude evitar. esperei estancar. pensei em colocar super bonde pra fechar a ferida. mas não precisou. apertei o ferimento até que o sangue parecesse de sair. depois procurei o sangue na ponta da faca, mas não tinha. nem no pão. a pia ficou com algumas gotas vermelhas por cima. passei uma bucha. enrolei o dedo com papel higiênico e amarrei com uma fita isolante. fui trabalhar. e aí fui demitido. vi um acidente de transito no caminho. uma moto debaixo de um ônibus. uma poça de sangue escorria pelo asfalto quente. o transito ficou lento. algumas pessoas tiravam foto. o motoqueiro não tava mais lá. o motorista e o cobrador falava com alguns policiais. depois que passava do acidente, o transito voltava a fluir normal. a dengue voltou a atacar. distribuíam panfletos sobre como vencer a guerra contra o mosquito nos sinais. as ilustrações no papel eram interessantes. o mosquito sugando o sangue de um braço qualquer.

essa foi a primeira e ultima vez que fui demitido de algum lugar. filhos da puta, nunca mais vão ter outra chance. o que eles pensam que são pra demitir as pessoas? pra me demitir? eu nunca me atrasei. não lembro a última vez que fiquei em casa pela manhã. não lembro a última vez que fiquei doente. e mesmo assim, fui demitido. me colocaram no plano de demissão. “você não vai ser o único, fábio”. queria ter uma arma nessa hora. descarregar todas as balas na boca da morte. meu pai nunca foi demitido. o que meu pai diria se soubesse que fui demitido? provavelmente queimaria todas as minhas bermudas e sandálias e tomaria os dois pares de sapatos que me deu quando fui contratado. depois diria que eu deveria recomeçar. e que eu falhei. “um homem é o emprego, depois mais nada”. isso não é justo. isso não é justo. meus olhos ardem. vejo fumaça pra lá na frente. ela é preta. talvez seja pessoas vendendo castanha. talvez seja pessoas queimando pneus. talvez seja pessoas queimando pessoas. parece que agora o sinal no rádio tá chegando melhor. agora pelo menos só uma estação. toca uma música. uma mulher cantando e um violão acompanhando e só. ela fala sobre as pessoas que detesta. qualquer coisa sobre ódio. nunca ouvi essa música antes.

provavelmente vou assistir no jornal da noite sobre o acidente que vi mais cedo. “motoqueiro decapitado por ter se chocado com ônibus”. coitado do motorista do ônibus. vai ter que viver com uma alma nas costas. meu pai carregou três ele próprio. nunca se lamentou por isso. talvez o motorista não vá se lamentar também. talvez eu seja o único que lamentaria se assassinasse alguém. talvez o motorista de ônibus não

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tenha culpa. talvez o motoqueiro não tenha culpa. talvez ele nem estivesse bêbado. as coisas não precisam de motivos pra acontecer. elas acontecem. tem umas vacas do meu lado esquerdo pastando no mato do acostamento. tem um uns pássaros pretos e grandes voando em cima das vacas. não acho que sejam urubus. só uns pássaros que daqui eu vejo grandes. talvez nem sejam. umas crianças montadas em cavalos sem selas parece que tange as vacas. não sei pra onde. pessoas pobres sempre têm cavalos e vacas e bezerros e patos e gansos e galinhas. não sei o que acontece. na verdade só tem um menino montado no cavalo. os outros correm atrás. talvez estejam gritando. não dá pra ouvir daqui. passo rápido. tem uma curva ali. a placa anuncia. curva acentuada à 20 metros. curva acentuada logo a frente. marcas de pneu queimado por causa dos freios no asfalto. algumas pessoas já devem ter se fudido muito por esses lados, por essas curvas. leigo é foda. diminuo antes de entrar na curva. passo dela. salvo. aí volto a acelerar de novo. um caminhão carregado de cana de açúcar lá na frente. acelero e ultrapasso. será que ele também cheira cocaína como papai cheirava quando viajava? isso não é problema meu. por que eu sempre tenho que supor todas as coisas? isso não é justo com eles. o que eu sei sobre justiça? o que eu sei sobre qualquer coisa? por que eu simplesmente não me calo e dirijo essa porra de carro até que esse combustível acabe? talvez esse seja o propósito da vida. dirigir até que o combustível acaba. grande metáfora. deveriam me premiar com alguma coisa por ter descoberto o sentido da vida. dirigir. pra algum lugar. leste ou oeste. nunca aprendi pra que lado o sol nasce nem pra que lado ele morre. o que eu sei, é que o norte fica na frente e o sul atrás. mas frente e trás de onde? minha? essas coisas não podem pertencer a mim pra que fiquem ao meu redor, assim, tão fácil de serem usadas. não pode ser assim tão simples. pelo menos eu acho que não deva ser assim tão simples. mas de novo, o que eu sei sobre qualquer coisa? o ponteiro marca 110km. o carro treme. o velho gol quadrado 94 treme. a direção treme. sinto ele leve. pedindo a sexta marcha. mas não dá. eu sei e ele sabe, que não aguenta muita coisa mais. ele sabe que serviu bem o propósito até aqui. gol quadrado 94. o que meu diria se eu batesse a 110km ? o que meu pai diria se eu morresse num acidente automobilístico? aquele filho da puta nunca deveria ter queimado minhas bermudas. nunca deveria ter queimado minhas sandálias. o que ele poderia saber sobre a vida? o que ele poderia saber sobre ser um homem? eu não acho que você tenha sido um homem, seu merda. você só cheirava cocaína e fodia com as putas de estrada. seu canalha. você era um porco. nunca demonstrou amor pela mulher nem pelo filho. agora você tá morto e eu tô vivo. o que você diz sobre isso? você não tinha respostas para tudo? me diz agora, o que você acha de ter morrido? você pensou que nunca iria morrer, não é?

minha cabeça dói. sinto gosto de ferro na boca. olho pro retrovisor e meus olhos estão vermelhos. minhas mãos tremem. desacelero. o sol já tá começando a cair. tracunhaém à oito km. nazaré da mata à 18km escrito numa placa. tracunhaém. sinto sede. talvez tenha água em tracunhaém.

já era quase noite quando entrei em tracunhaém passando mal por algum motivo e procurando água potável. mesmo sem o sol o calor era quase insuportável. eu não conseguia respirar direito. os sons das coisas que ouvia, eram distorcidos e nos meus olhos, parecia que tinha alguma coisa turva colado neles. como se eu estivesse vendo através de uma cortina fina e marrom. entrei num posto de gasolina e deixei o carro estacionado numa sombra ao lado da loja de conveniências. procurei o banheiro, mas eles não tinham banheiros para os clientes. entrei na loja e comprei uma água. duas garrafas na verdade. voltei para o carro. abri as janelas, deitei o banco e sentei

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colocando as pernas na janela aberta. entrava alguma brisa de vento e comecei a me sentir um pouco melhor. bebia a água com calma. a primeira garrafa acabou. foi aí que o sol começou a cair. ouvia os grilos cantando. fiquei lá durante um tempo até que um homem que trabalhava no posto veio até mim e pra dizer que eu precisava sair dali porque eu estava estacionado na vaga do gerente. perguntei se o gerente estava e ele respondeu que não. perguntei se o gerente viria hoje e ele respondeu que o gerente já veio e já foi embora. perguntei o por que eu não poderia ficar ali então, se não incomodava ninguém e ele me respondeu que eu incomodava o gerente porque estava estacionado na vaga dele. decidi sair. fechei a porta e joguei a garrafa vazia nos pés do cara. saí de lá. precisava comer alguma coisa. procurei algum restaurante ou coisa assim, mas não conseguia encontrar. as pessoas me olhavam como se eu fosse um estranho. acho que nunca viram um gol quadrado 94 tão conservado quanto o meu. meu rosto quando olhava pelo espelho retrovisor, estava suado e brilhante. meus olhos fundos, lá dentro, quase não refletia porra nenhuma. nenhum brilho especial. nenhum brilho qualquer. só uma mancha azul que começavam a cobri a retina.

vi um bar de longe. cadeiras e mesas do lado de fora numa rua coberta de paralelepípedos. uns cachorros rodavam por perto das pessoas esperando que alguém jogasse alguma coisa. alguém sempre jogava. procurei algum lugar pra deixar o carro. quando achei, estacionei, fechei os vidros e saí. fui pro bar. me sentei em uma mesa e uma moça veio logo me atender com um cardápio. me deu boa noite. eu retribui o boa noite. olhei o cardápio e pedi um caldinho de feijão com uma cerveja. ela anotou num bloco de papel e que depois colocou dentro do bolso da frente do avental. aí recolheu o cardápio e disse que voltaria logo com meu caldinho e a cerveja. fiquei esperando. umas pessoas arrumavam os instrumentos numa espécie de palco. o bar e ao redor, estava decorado com umas luzes amarelas pequenas. como se fossem pisca-pisca mais nem tão natalinos assim. tinha uma grande arvore no meio do bar. a raiz e o tronco no meio das pessoas. os galhos e as folhas cobriam uma parte grande do telhado. a banda começou a tocar forró. eles tocavam bem, eu acho. um cara numa sanfona branca, um outro cara numa espécie tambor. outro cara segurava um triângulo e cantava. depois de muito tempo, percebi que o cara do triângulo quando parou de cantar, só tocava, fechava os olhos e depois de uns instantes os abria novamente trazendo uma expressão assustada. eu acho que ele cochilava. mas ele não parava de tocar. algumas pessoas dançavam forró. mulheres com homens, mulheres com mulheres. umas crianças brincavam do outro lado. acho que toda a cidade estava nesse bar.

a música parou e eu havia sido demitido mais cedo. me tiraram tudo. agora eu tô em tracunhaém. o bar tava quase vazio. eu e mais alguns tão fodidos quanto eu, imagino. o cara do triângulo se sentou num banco. o cara da sanfona enxuga o suor que escorre pela testa com a manga da camisa e coloca a sanfona no chão, ao lado da perna direita dele. o cara do tambor continua sem expressar nada. um rosto só. não o vi abrir o sorriso. acho até que ele não respira. acho até que ele não é humano. ele só fica lá, batendo na parte de cima do tambor com uma espécie de baqueta que na ponta é uma coisa redonda e aparentemente macia e com a outra mão, na parte de baixo do tambor, um graveto. ele fica lá, tocando, enquanto os outros já estão consumados pelo cansaço e pela falta de atenção dos que eram pra ser os ouvintes. mas o cara do tambor não desiste. ele é um resistente. um guerreiro. ele é tipo o meu pai. gostaria que meu pai visse isso. meu pai nunca olhou num espelho. ele passava a mão no cabelo, penteando ele pra traz e os fios lisos iam e obedeciam durante todo o dia. eles não eram loucos de não obedecer ao seu deus. queria que meu pai visse como é ser um animal inabalável. eu

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achei que veria meu pai chorar quando minha mãe morresse. mas não. eu nunca vi meu pai chorar. nunca vi meu pai vomitar. meu pai dizia que vomito é o resumo da fraqueza. se você vomita, você é fraco. eu tento não vomitar. ele vem até a boca e eu mando-o de volta pra dentro. porque é isso que os homens fazem. eles mandam as coisas de dentro que querem sair, de volta pra dentro. vômito. palavras. a porra toda. o que vier. os homens são feitos pra rebater tudo. como um puta jogador de basebol ou qualquer coisa assim.

eu achava que era isso. achava que era isso que significava ser um homem. meu pai, quando eu completei dezoito anos,queimou todos os meus chinelos e bermudas.ele dizia que um homem não deveria usar mais bermuda nem chinelos depois dos dezoito. ele me comprou três calcas caqui e me deu dois pares de sapatos que o avô meu, pai do meu pai, deu ao meu pai de presente de aniversário. eu deveria usar esses sapatos até ter condições de comprar os meus próprios, segundo papai. pra isso eu precisaria trabalhar duro. depois me mandou para servir o exercito ele disse que eu tinha sido libertado quando me deixou na porta do quartel. tentei entender o que ele quis dizer com eu ter sido libertado. libertado de que? mas meu coração fraco fez com que eu voltasse pra casa. meu pai me olhou em pé com as mãos na cintura enquanto minha mãe me abraçava. depois balançou a cabeça negativamente e deu as costas. acho que ele desistiu de mim nesse dia.

e eu achava que era isso. trabalhar pra ter condições de comprar os próprios sapatos. depois uma casa. depois um carro. depois una mulher. depois um filho pra que eu queime seus chinelos e suas bermudas quando ele chegasse nos dezoito. mas eles tiraram tudo de mim. falhei com meu pai. o nome do meu pai vai morrer aqui. talvez hoje. com certeza algum dia. não há muito mais coisas além de tentar. eu tentei durante todos essas anos ser alguma coisa parecida com meu pai. mas se tornar um homem de verdade vai muito além de ter um trabalho e uma casa. ser homem é morrer. pelo menos eu tive condições de comprar meus próprios sapatos. o resto não importa muito. dou um soluço. sinto o refluxo chegando. encho a boca com o líquido ácido e mando de volta de onde veio. todas as pessoas dançando parecem felizes e alegres. os sorrisos nos rostos, mostrando os dentes. alguns nem tem dentes, mas mesmo assim eles ficam com aquilo aberto. puta que pariu. paz deve ser isso. deve ser isso que eles procuram lá fora. e eu achei aqui. tracunhaém. nessa porra de cidade a uma hora e pouco de distancia de recife.

paguei a conta. precisava ir embora. meu pai que se foda. o tocador de tambor da banda de forró que se foda. minha garçonete virgem que se foda. o perfume dela ainda tá aqui, em mim, dentro da minha cabeça. quando viro a cabeça pros lados e o vento bate em mim, sinto o perfume. mas eu sei que ele não existe. como meu pai não existe mais. como eu não irei existir algum dia. ou talvez hoje. porque não hoje? hoje fui demitido. me tiraram tudo. não tenho motivos pra voltar pra casa. pra quem voltar pra casa?

paro de andar e cubro o cigarro com as mãos fazendo uma concha, pra que o vento não sopre a chama do isqueiro. ha mais mosquitos aqui sobrevoando minha cabeça, do que dentes em minha boca.acendo. dou uma grande tragada. ouço o barulho da palha do tabaco e da nicotina e da sede que cobre tudo queimar.

um vermelho intenso infla quando puxo a fumaça e o câncer pra dentro de mim. aí volto a andar. foda-se o gol quadrado ano 94. fodam-se meus pares de sapato.

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paro de andar. fico descalço. jogo na casa do caralho essas porras pretas e bem limpas. não tanto agora com todo a poeira e o barro dessa estrada fudida desse interior fudido. volto a andar. não assistirei sobre o motoqueiro que vi seu sangue debaixo do caminhão essa manhã. caminhão? era mesmo um caminhão? uma carreta? sei lá o quê? um ônibus? isso já não é mais problema meu. olho pro céu e daqui da pra ver todas as estrelas lá em cima. a Dalva, o cruzeiro do sul, as três irmãs. o vento sopra a fumaça do meu cigarro pro meu lado esquerdo. gostaria de saber pra onde fica o leste.

paro de andar de novo e agora eu to com os braços abertos, redentados, olhando pro céu, pras estrelas, pras galáxias, pra meu pai. nenhuma nuvem. só as estrelas lá brilhando com a porra. e meu cigarro na boca, esperando saber pra que lado fica o leste.

pelos meus lados e ainda de costas, vejo luzes de um farol forte. sinto o chão tremer. sinto cheiro de diesel queimando e o barulho de um motor grande. fecho os olhos. fico onde estou, esperando o supapo. um homem não deve chorar.

papai? por que me abandonaste?