Prazer e Sofrimento No Trabalho

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Prazer e Sofrimento no Trabalho:Representaes Sociais de Profissionais de Recursos HumanosResumo: Este estudo descreve as representaes sociais de profissionais da rea de Recursos Humanos do Banco do Brasil sobre prazer e sofrimento no trabalho. A pesquisa tem fundamentao terica na Psicodinmica do Trabalho e na Teoria das Representaes Sociais. A metodologia adotada de orientao qualitativa, utilizando-se a tcnica do grupo focal como principal meio de coleta dos dados. Os participantes da pesquisa reconhecem a existncia de situaes que geram prazer e sofrimento no Banco do Brasil e admitem que papel dos profissionais de Recursos Humanos intervir nas situaes de sofrimento, com o objetivo de diminu-lo e de potencializar as vivncias de prazer na Organizao. Palavras-Chave: Sofrimento e prazer no trabalho, representaes sociais, psicodinmica do trabalho. Abstract: This study describes the social representation of well-being and suffering at work built by the Human Resources professionals of Banco do Brasil. The research is based on the Work Psychodynamic Theory and Social Representation Theory. The adopted methodology is qualitative-oriented, using the focus group technique as the main form of data collection. Informers recognize the existence of well-being and suffering circunstances in the organization and assume that the Human Resources professional should take an active role in these circumstances with the purpose of minimizing suffering and maximizing wellbeing. Key Words: Suffering and well-being at work, social representation, work psychodynamic.

Roque Tadeu G u i Psiclogo Analtico (Junguiano). Psiclogo Organizacional. Especialista em Gesto de Pessoas no Banco do Brasil. Mestrando em Psicologia na Universidade de Braslia (UnB).

Sofrer ou No Sofrer, Esta a Questo?Estudos na rea de sade mental e trabalho tm abordado o tema do sofrimento psquico nas organizaes em suas mltiplas facetas. Alguns investigam a questo do sofrimento em categorias profissionais especficas e at mesmo do profissional bancrio2 . No de nosso conhecimento, contudo, a existncia de trabalhos que abordem as representaes sociais sobre prazer e sofrimento no trabalho construdas por profissionais de Recursos Humanos.

Estamos interessados em conhecer as crenas, opinies, atitudes e sentimentos sobre o prazer e o sofrimento vividos pelos funcionrios do Banco do Brasil, na perspectiva daqueles profissionais que tm exatamente por atribuio lidar com questes crticas para o bem-estar das pessoas na Organizao. Interesse de pesquisa, por um lado. Por outro, a suspeita de que os achados deste estudo possam servir para uma melhor compreenso das fontes de sofrimento do fazer bancrio e, em particular, do fazer bancrio produzido no Banco do Brasil. Pode-se imaginar que o profissional de Recursos Humanos de uma empresa como o Banco do Brasil construa representaes muito peculiares sobre o tema, seja com base em suas prprias vivncias de prazer e sofrimento - oriundas do embate entre os registros subjetivos de cada um e as caractersticas da organizao do trabalho na Unidade de Recursos Humanos - seja com base na percepo e no entendimento que constroem sobre o que se passa com seus companheiros de empresa. Embora compartilhem questes comuns com esses parceiros de profisso, os profissionais de Recursos Humanos vivenciam problemas especficos de sua posio na empresa, tais como os conflitos entre seus valores pessoais e os da organizao e os medos e ansiedades originados por um pensar que eventualmente se coloque na contramo da ortodoxia da Unidade e que nem sempre bem aceito por seus superiores... Ao quadro de angstias, agregam-se os dilemas das decises que precisam ser tomadas ou implementadas e que afetam a vida de outros, pessoas como eles. Estamos falando de profissionais que se vem diante de dramas humanos que so ao mesmo tempo os seus. Adiantemos, desde j, que no se pretende, neste estudo, encontrar racionalizaes que auxiliem a ignorar e suportar o sofrimento, nem de atribuir organizao todos os males que afligem o trabalhador. Trata-se, antes, de buscar formas de transformar o trabalho em mediador para a sade. Conforme Dejours (1996, p. 137): " O sofrimento inevitvel e ubquo. Ele tem razes na histria singular de t o d o sujeito, sem exceo. Ele repercute no teatro do trabalho ao entrar numa relao, cuja complexidade j vimos, com a organizao do trabalho". A compreenso que os profissionais de Recursos Humanos possuem a respeito do sofrimento humano nas organizaes influi nas concepes, atitudes e decises por eles tomadas e na maneira como lidam com as pessoas na empresa. Por outro lado, oferece o suporte ideolgico s estratgias e

s aes da rea de Recursos Humanos. E se, por alguma razo, a ocorre uma dissonncia, surge o conflito de valores e o sofrimento.

ObjetivosO objeto deste estudo so as representaes sociais de profissionais de Recursos Humanos do Banco do Brasil sobre prazer e sofrimento no trabalho. Para descrever o campo representacional construdo por esses profissionais, partimos das seguintes perguntas de pesquisa: Quais so as representaes sociais construdas por profissionais de Recursos Humanos do Banco do Brasil a respeito do sofrimento e prazer no trabalho? Quais so as fontes de sofrimento no trabalho, na viso desses profissionais? Como diminuir o sofrimento no trabalho, ou transform-lo em sofrimento criativo? Como potencializar o prazer no trabalho? Qual o impacto do sofrimento patognico sobre o indivduo e sobre a organizao? Qual o papel do profissional de Recursos Humanos em face do fenmeno "prazer e sofrimento"? A inteno primordial da pesquisa no demonstrar que os profissionais de Recursos Humanos sofrem; em algumas situaes, isso de fato ocorre. No nos preocupamos em distinguir, com preciso, a viso sobre o prprio sofrimento da percepo sobre o sofrimento vivenciado pelos demais profissionais do Banco do Brasil. Acolhemos ambas as perspectivas c o m o legtimas componentes do campo representacional construdo pelos profissionais de Recursos Humanos. Como se sabe, por meio dos estudos de Dejours e outros, o prazer e o sofrimento no so apangios de nenhuma categoria profissional.

10 trabalho de pesquisa ao qual se refere este relato foi desenvolvido por profissionais de Recursos Humanos do Banco do Brasil como parte dos requisitos exigidos para a obteno do grau de Especialista em Administrao de Recursos Humanos pela Universidade de So Paulo Fundao Instituto de Administrao - e Banco do Brasil.

Contribuies do EstudoO estudo foi realizado como requisito parcial para a obteno do Certificado de Especializao em Recursos Humanos outorgado pela Universidade de So Paulo - Fundao Instituto de Administrao - e pela Unidade de Recursos Humanos do Banco do Brasil. importante ressaltar que, em pesquisa dessa natureza, ou seja, realizada sob o patrocnio de uma empresa, existe uma expectativa de retorno do investimento na forma de conhecimentos aplicveis no aperfeioamento dos processos de recursos humanos da patrocinadora, no caso o Banco do Brasil.

2 Alguns ttulos que ilustram as temticas abordadas: "Sofrimento Psquico nas Organizaes: Sade Mental Trabalho", "Trabalho, Precarizao e Sofrimento Psquico", "Trabalho Bancrio de Identidade Profissional", "Trabalho e Sade Mental no Hospital Universitrio", "Trabalho e Sade Mental das Professoras Primrias: algumas questes metodolgicas", "Processo de Trabalho e Sofrimento Psquico: o caso dos pilotos do metr do Rio de Janeiro" (fonte: internet www.cnpq.br). Ver, tambm, SATO e MENDES, citados nas "Referncias Bibliogrficas".

Assim, a pesquisa contribui para uma reflexo sobre a subjetividade do profissional de Recursos Humanos do Banco do Brasil quando confrontado pelas vivncias de prazer e sofrimento no trabalho, propiciando o conhecimento sobre as vicissitudes inerentes sua atividade. Alm disso, coloca em questo o modelo de processo de trabalho prescrito e sua influncia na produo, evidenciando que a gesto coletiva da organizao do trabalho permite a emergncia do prazer ou a transformao do sofrimento em criatividade, na medida em que possibilita o engajamento do trabalhador na atividade sem maiores prejuzos sade mental. A pesquisa oferece, ainda, insumos para a formao do profissional de Recursos Humanos do Banco do Brasil e para a reflexo sobre o papel dos profissionais de Recursos Humanos em geral, no interior das organizaes.

viso geral, de tipo aproximativo, acerca de determinado fato. Esse tipo de pesquisa realizado especialmente quando o tema escolhido pouco explorado e torna-se difcil sobre ele formular hipteses precisas e operacionalizveis." Assim, o carter exploratrio deste estudo deve-se ao fato de haver poucas pesquisas sistematizadas voltadas para o tema do sofrimento e do prazer vinculados ao trabalho do profissional qualificado (Mendes, 1994). Pesquisas sobre sofrimento e prazer no trabalho tm sido desenvolvidas com algumas categorias profissionais da rea de sade e de educao. Desconhecemos a existncia de trabalhos que tenham sido realizados com profissionais de Recursos Humanos sobre a temtica. Buscamos a fundamentao terica da presente pesquisa na literatura cientfica sobre a "Psicodinmica do Trabalho" e a "Teoria das Representaes Sociais". Dada a natureza do tema - representaes sobre prazer e sofrimento - e a necessidade de contarmos com a espontaneidade nas manifestaes dos participantes, optamos por compor grupo de voluntrios, mediante convite, subdividindo-o de maneira a assegurar a maior representatividade possvel do coletivo de profissionais da Unidade de Recursos Humanos. O grupo participante totalizou 75 funcionrios, a saber: o D i r e t o r de Recursos H u m a n o s ; o Superintendente Executivo de Recursos Humanos; os Gerentes Executivos da Unidade (exceto um); os Gerentes de Diviso da Unidade; funcionrios detentores de diferentes cargos (analista snior, pleno, jnior e assistente); funcionrios das unidades regionais, ou seja, dos Centros de Desenvolvimento Profissional (CEFOR) e dos Servios de Segurana e Medicina do Trabalho (SESMT). O Diretor, o Superintendente Executivo e os Gerentes Executivos (grupo "Dirigentes") foram ouvidos por meio de entrevistas individuais, em funo da d i f i c u l d a d e de agendar suas participaes em grupos focais. Os funcionrios dos CEFOR e SESMT responderam questionrios e os demais funcionrios da Unidade participaram de seis grupos focais. Segundo Morgan (1997), a marca registrada do grupo focal a utilizao explcita da interao grupai para produzir dados e insights que seriam menos acessveis sem a interao encontrada em grupo. A principal vantagem do grupo focai a oportunidade de observar uma quantidade muito maior de interao a respeito de um tema em um

Metodologia"...o objeto das Cincias Sociais essencialmente qualitativo " (Minayo, 1998, p. 21). Procuramos fazer justia ao objeto de nossa pesquisa, considerando a natureza qualitativa da experincia humana, expressa aqui pela fala dos entrevistados. Isso implica, segundo Minayo (1998, p. 22), "considerar o sujeito de estudo [como] gente, em d e t e r m i n a d a c o n d i o social, pertencente a determinado grupo social ou classe com suas crenas, valores e significados. Implica tambm considerar que o objeto das cincias sociais complexo, contraditrio, inacabado, e em permanente transformao". Alm disso, concebendo representao social como "um processo social que envolve comunicao e discurso ao longo do qual significados e objetos sociais so construdos e elaborados" (Wagner, 1999, p. 149), consideramos a metodologia qualitativa como a mais adequada aos nossos propsitos. O estudo de natureza descritiva e de carter exploratrio. Segundo Gil (1995, p. 45), as pesquisas descritivas "... tm como objetivo primordial a descrio das caractersticas de determinada populao ou fenmeno ou o estabelecimento de relaes entre variveis". E, ainda segundo CIL (1995, pp. 44-45): "As pesquisas exploratrias tm como principal finalidade desenvolver, esclarecer e modificar conceitos e idias, com vistas formulao de problemas mais precisos ou hipteses pesquisveis para estudos posteriores. [...] Pesquisas exploratrias so desenvolvidas com o objetivo de proporcionar

perodo limitado. No grupo focal no se busca o consenso e, sim, a pluralidade de idias. Assim, a nfase est na interao dentro do grupo, em torno de tpicos oferecidos pelo pesquisador, que tipicamente assume o papel de moderador. O principal interesse que seja recriada, desse modo, uma forma de contexto ou de ambiente social onde o indivduo pode interagir com os demais, defendendo s vezes suas opinies ou contestando as dos outros. Essa abordagem possibilita tambm ao pesquisador aprofundar sua compreenso das respostas obtidas. No que se refere pesquisa de Representaes Sociais por meio do uso da tcnica de grupo focal, S (1998, p. 93) diz: "Seu interesse para o campo das Representaes Sociais reside no fato de que ela de certo modo simula as conversaes espontneas pelas quais as representaes so veiculadas na vida cotidiana. [...] Em que pese um certo grau de artificialidade, os grupos focais podem fazer emergir uma boa quantidade dos mesmos temas e argumentos que fariam parte de uma conversao sobre o assunto no ambiente natural". As questes orientadoras dos grupos focais, das entrevistas e dos questionrios foram elaboradas a partir da definio a priori de categorias, sugeridas pela literatura sobre Psicodinmica do Trabalho: Significado do Trabalho - valor atribudo ao trabalho; Conhecimento do Trabalho - valor atribudo ao conhecimento das atividades e dos objetivos do trabalho; nvel de conhecimento relatado; Controle sobre o Trabalho - valor atribudo ao poder exercido sobre as atividades; nvel de controle exercido; Relacionamento Interpessoal - valor atribudo ao relacionamento interpessoal na equipe, entre pares e entre chefia e subordinados; qualidade do relacionamento; Conceito de Prazer e de Sofrimento - concepes sobre prazer e sofrimento; associaes ideacionais e afetivas com o conceito; Existncia de Prazer e de Sofrimento na Organizao - constatao subjetiva sobre a existncia de situaes de prazer e de sofrimento no Banco do Brasil; Causas do Prazer e do Sofrimento - fatores causais ou favorecedores da emergncia de prazer e de sofrimento na situao de trabalho;

Efeitos do Prazer e do Sofrimento no Indivduo conseqncias para o indivduo atribudas s situaes de prazer e de sofrimento; Efeitos do Prazer e do Sofrimento na Organizao - conseqncias para o Banco do Brasil atribudas s situaes de prazer e de sofrimento; Formas de lidar com o Sofrimento - estratgias defensivas, individuais e coletivas, utilizadas para lidar com o sofrimento, positiva ou negativamente; e Papel do Profissional de Recursos Humanos responsabilidades relativas ao gerenciamento das situaes de prazer e de sofrimento atribudas ao profissional de Recursos Humanos.

As entrevistas individuais e as falas dos participantes dos grupos focais foram registradas em fitas cassetes, posteriormente transcritas. A leitura geral do material transcrito e das respostas aos questionrios confirmaram as categorias pr-definidas. O contedo das falas foi recortado e resumido nas 11 categorias. Utilizamos a abordagem qualitativa de anlise de contedos (Laville & Dionne, 1999, p. 226): " O pesquisador decide prender-se s nuanas de sentido que existem entre as unidades de anlise, aos elos lgicos entre essas unidades ou entre as categorias que as renem, visto que a significao de um contedo reside largamente na especifi

cidade de cada um de seus elementos e na das relaes entre eles, especificidade que escapa amide ao domnio do mensurvel." Utilizamos a estratgia de associar os dados a um modelo terico - a Psicodinmica do Trabalho com a finalidade de compar-los e melhor compreender as representaes construdas pelos participantes. Buscamos examinar as unidades de sentido, as inter-relaes entre essas unidades e entre as categorias em que elas foram reunidas. Comparamos, ainda, as representaes dos grupos pesquisados, p r o c u r a n d o semelhanas e diferenas, corroboraes e contradies. O procedimento aproxima-se da estratgia descrita por Laville & Dionne (op. cit., p. 227) denominada "construo iterativa de uma explicao" que se presta particularmente aos estudos de carter exploratrio. Frases representativas da fala dos participantes foram selecionadas, compondo o quadro de anlise das categorias. Essa estratgia - mais do que um simples recurso de ilustrao - foi utilizada com o propsito de resgatar o significado e o colorido afetivo das manifestaes dos participantes, ofuscados pelas diversas redues inevitveis no processo de tratamento dos dados e de anlise do contedo. Desde o incio da pesquisa, decidramos que seria dado um retorno dos resultados aos participantes dos grupos. Tratou-se de deciso metodolgica com vistas a envolver o grupo pesquisado no processo de avaliao dos resultados obtidos, ou seja, verificar se as anlises e interpretaes eram aderentes s suas representaes, alm de possibilitar a elaborao de propostas de ao para o ambiente da Unidade de Recursos Humanos no que concerne ao tema. A devoluo ocorreu em encontro realizado na prpria Unidade com cerca de metade dos participantes dos grupos focais.

construdas por profissionais de Recursos Humanos do Banco do Brasil e no reinvidicam qualquer pretenso de corresponder s vises de todo o quadro funcional da Instituio. Porm, antes das concluses, ouamos um pouco da fala dos participantes: "O trabalho ainda uma base para a fundamentao da identidade de cada um..." "A maioria tem o conhecimento dos detalhes operacionais do seu trabalho, mas no tem noo de onde ele se encaixa." "As pessoas s esto cumprindo rotinas; no tm capacidade de vencer desafios, de estarem trazendo a mudana para o ambiente de trabalho, gerando apatia e uma forte submisso." "Eu acho que cada vez est aumentando mais o discurso da equipe e cada vez mais se est trabalhando individualmente." "...isso se torna sofrimento: a presso pelo resultado e a realizao de um trabalho sem sentido, um trabalho montono e que no leva a nada..." "A empresa vive uma fachada muito bonita, pois falsa a gesto participativa e o funcionrio sente-se cada vez mais tolhido." "Eu no me importo de trabalhar uma ou duas horas a mais que o previsto no meu ambiente de trabalho, mas a organizao me recompensa por causa disso? Quer dizer: h justia no ambiente de trabalho? As regras so claras ? So transparentes ? Todas as pessoas tm oportunidades iguais?" "Eu acho que tem pessoas que vo guardando, guardando ... Acho que no so poucas as pessoas que so assim. Tanto que a gente v muita gente com dor de cabea. Tem gente que tem problemas de presso, de corao. Tudo vai se acumulando." "A organizao perde espao porque os funcionrios se encolhem, deixam de ousar, de serem criativos e no doam suas idias empresa." "Voc, de tanto no ter sada, comea a ridicularizar o prprio sofrimento." "Eu vejo a Unidade de Recursos Humanos como uma fbrica de emoes. Ns produzimos sempre, constantemente. Ns poderamos produzir emoes positivas, criar expectativas e cumpri-las." A existncia de prazer e sofrimento nos processos de t r a b a l h o reconhecida por todos os participantes e vincula-se diretamente qualidade

Concluses"Perceber o sofrimento alheio provoca uma experincia sensvel e uma emoo a partir das quais se associam pensamentos cujo contedo depende da histria particular do sujeito que percebe: culpa, agressividade, prazer etc. A percepo do sofrimento alheio provoca, pois, um processo afetivo. A impossibilidade de exprimir e elaborar o sofrimento no trabalho constitui importante obstculo ao reconhecimento do sofrimento dos que esto sem emprego" (Dejours, 1999, pp.45-46). Este estudo nos levou a investigar as representaes de profissionais de Recursos Humanos em torno de vrias categorias relacionadas com a temtica do prazer e do sofrimento no trabalho. Recordemos que as representaes aqui relatadas so

das relaes interpessoais, ao tipo e organizao do trabalho. Os Dirigentes reconhecem uma dualidade conflitiva entre sofrimento e prazer no trabalho e demonstram preocupao em encontrar motivos e buscar propostas que minimizem o sofrimento e potencializem o prazer. As representaes a respeito do significado do trabalho referem-se sua importncia para a sobrevivncia, principalmente para os profissionais que no ocupam posio de gerncia, como o caso dos analistas que participaram da pesquisa. Lembremos que o no-reconhecimento do significado do prprio trabalho induz ao desestmulo e o trabalho passa a ser visto como algo desinteressante (Codo, 1998). Da para o surgimento do sofrimento psquico apenas um passo: com a perda do significado do trabalho, ocorre uma ruptura entre a subjetividade e a objetividade, entre o eu e o mundo. Essa ruptura retira do indivduo o interesse e o controle sobre o trabalho. As representaes sobre o conhecimento do trabalho apontam-no como um aspecto muito deficiente: a grande maioria dos funcionrios do Banco, segundo os participantes da pesquisa, no conhece o trabalho que realiza. O conhecimento do trabalho em sua dimenso mais ampla pode favorecer a emergncia de novos significados sobre a sua importncia para a organizao e para a sociedade. O controle sobre o trabalho representado de forma bastante homognea: os funcionrios possuem pouca ingerncia sobre o prprio trabalho. Como era de se esperar, os Dirigentes atribuem grande importncia participao dos funcionrios. Admitem, contudo, que a prtica difere do discurso e que os obstculos para um maior controle do trabalho pelo prprio funcionrio ainda existem, oriundos no apenas da rigidez gerencial como tambm do anseio de alguns funcionrios de serem conduzidos. Contudo, o tema da interferncia nos processos de trabalho no questo pacfica nem mesmo para os Dirigentes e Gerentes de Diviso. Segundo eles, a organizao do trabalho estimula os comportamentos individualistas, seja atravs do excesso de trabalho, seja pela presso por resultados. A definio de senso comum para prazer e sofrimento - conceito de prazer e sofrimento - formulada em termos da descrio das situaes onde ocorrem essas vivncias: ora prazer e sofrimento so representados por meio de fatores causais, ora mediante a indicao de

conseqncias. Embora os "conceitos" de prazer no sejam homogneos entre os grupos, os Gerentes de Diviso e os Dirigentes representamno mediante associaes com o sucesso do empreendimento ("da equipe"), surgindo da certo sentimento de satisfao ("realizao pessoal"), j que pelo menos parte do reconhecimento usufrudo pelos gestores deriva da visibilidade dos resultados alcanados por suas equipes. Interesse pelo trabalho e reconhecimento so os principais elementos relacionados ao prazer pelo grupo SESMT. J para o grupo CEFOR, os principais elementos so organizao do trabalho, condies de trabalho e interesse pelo trabalho. Para esses profissionais, as representaes sobre sofrimento constroem-se em torno de situaes de carncia relacionadas com recompensa, condies de trabalho, sentido para o trabalho, anonimato, sobrecarga, poder decisrio e a percepo de situaes de injustia e sofrimento no Banco. A falta de dilogo, relacionamentos hierrquicos autoritrios, presso do processo produtivo, insegurana e sentimentos de injustia, o baixo interesse pelo trabalho resultante da precria identificao com as tarefas so reconhecidos pelos participantes dos SESMT e CEFOR como fontes de sofrimento. As representaes sobre as causas do sofrimento possuem certa homogeneidade entre os participantes da pesquisa: a falta de reconhecimento. O reconhecimento confere sentido ao sofrimento; quando no ocorre, o sofrimento torna-se absurdo, podendo levar desestabilizao da personalidade e doena mental (Dejours, 1999). Motivao, criatividade, comprometimento, cooperao, elevao da auto-estima e melhoria da qualidade de vida so os principais efeitos do prazer sobre o indivduo atribudos pelos participantes. Em contrapartida, adoecimento fsico e mental - raiva, ansiedade, depresso, angstia so claramente vinculados ao sofrimento. Destacam-se as representaes dos grupos GEDEP3 e GECAE/GETAB4 sobre o sofrimento dos profissionais de Recursos Humanos em face do sofrimento dos demais funcionrios, tendo em vista o sentimento de responsabilidade daqueles pelo bem-estar destes ltimos. O grupo GECAE/GETAB refere-se insensibilidade em relao ao sofrimento alheio como conseqncia de uma estratgia defensiva - mecanismo relatado por Dejours (1999) - de negao do prprio sofrimento. Os efeitos do prazer sobre a organizao, mencionados pelos participantes, referem-se ao

3 Gerncia de Desenvolvimento Profissional. 4 Gerncia de Contratao, Alocao e tica/Gerncia de Relaes Trabalhistas.

clima organizacional positivo, criatividade, compartilhamento e produtividade. Os efeitos do sofrimento relacionam-se com a queda da produtividade e da competitividade da organizao, inclusive com reflexos sobre o atendimento do cliente. Os grupos reportam formas no-construtivas de lidar com o sofrimento, ora ressaltando apenas a vivncia do sofrimento, ora resignando-se ou negando o sofrimento, ou buscando solues individuais. A responsabilidade nas questes relativas ao prazer e ao sofrimento parece ocupar uma posio central na representao sobre o papel do profissional de Recursos Humanos. Os participantes demonstram desejo de serem reconhecidos pela Organizao - e particularmente por seu clientes, os funcionrios do Banco - como profissionais empenhados na transformao das situaes adversas sade fsica e mental das pessoas que compem a Empresa. A esse propsito, o encontro de apresentao dos resultados da pesquisa para os participantes representou um ensaio de criao de um espao pblico (Dejours, 1996) de discusso no mbito da Unidade de Recursos Humanos. Questes relativas ao relacionamento interpessoal, existncia de prazer e de sofrimento e ao papel do profissional de Recursos Humanos foram debatidas, e propostas voltadas para o mbito da Unidade foram elaboradas. E, por fim, algumas questes crticas se destacam: o conhecimento sobre os objetivos e sobre a importncia do trabalho so aspectos que os profissionais de Recursos Humanos reconhecem como precrios na Organizao, requerendo

providncias que restituam aos profissionais da Empresa o sentido e o valor do prprio trabalho. Cuidados com o espao de convivialidade, zelo pelo clima organizacional, cultivo de valores como confiana e transparncia so medidas inferidas como necessrias e urgentes para a reduo do sofrimento e para a promoo do prazer no Banco do Brasil. Abertura participao, afirmao do prprio poder e autoridade, so aspectos que tambm no podem ser esquecidos.

Consideraes FinaisOs profissionais de Recursos Humanos do Banco do Brasil, participantes deste estudo, reconhecem a existncia de prazer e de sofrimento na Organizao. Os elementos ligados ao sofrimento, mltiplos e diversos, possuem um carter central em suas representaes, enquanto que os elementos ligados ao prazer ocupam uma posio perifrica menos clara. Esses profissionais reconhecem sua responsabilidade em lidar com o ser humano na Organizao e anseiam por atuar sobre as condies que propiciam o surgimento das vivncias de sofrimento. Contudo, certo sentimento de impotncia perpassa suas representaes a respeito do papel do profissional de Recursos Humanos diante dessas questes. A possibilidade de um espao pblico para a discusso dos fatores relacionados com o prazer e com o sofrimento no trabalho no claramente representada, indicando a necessidade de investimento no estudo e no debate do tema, contem plando-o nas aes de formao e aprimoramento desses profissionais.

Roque Tadeu Gui Edifcio Centro Clnico Norte II - SHLN - Bloco L Sala 212- Braslia (DF) - CEP: 70770-000 Tel.: 061 -3476994 - E-mail:[email protected]

Recebido 29/03/01

Aprovado

20/10/01

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Referncias bibliogrficas