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PREFEITURA MUNICIPAL DE PIRAQUARASECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO
CIÊNCIAS NATURAIS
ELABORAÇÃOLuciane Pereira Faria
Siderlei Tarcizo PinheiroSilvia Mara Marcos Santos
COLABORAÇÃODioneli C. dos Santos Rodrigues
Elisângela de Fátima da LuzPatrícia Conde Santos
COORDENAÇÃO PEDAGÓGICA DE CIÊNCIAS NATURAISSilvia Mara Marcos Santos
CONSULTORIASiderlei Tarcizo Pinheiro
PIRAQUARA
CIÊNCIAS NATURAIS
A proposta curricular de Ciências tem por objetivo explicitar os fundamentos
teórico-metodológicos dessa área do conhecimento integrando e articulando-os à
realidade natural e social, a fim de nortear e subsidiar as práticas pedagógicas no que
concerne às mediações e apropriações do conhecimento científico-tecnológico.
Neste contexto é oportuno ressaltar à priori que a ciência é o conhecimento
científico que se desenvolveu e se desenvolve como produção humana, histórico-social,
decorrente e determinada pelas relações e interações entre os seres humanos e a
natureza, mediadas pelo trabalho, atividade prática intencional de produção da existência
humana.
Diante disso, faz-se necessário comparar a relação dos animais com a natureza e
desta com os seres humanos, no sentido de destacar a forma diferenciada de atuação
dos animais e dos seres humanos sobre ela. Assim, as atividades dos animais são
biologicamente determinadas por processos inintencionais, instintivos, não planejados,
adaptando-se à natureza e estando subordinadas às suas leis. As ações transformadoras
humanas não são apenas determinadas biologicamente e sim um processo intencional e
planejado de permanentes e recíprocas transformações, moldando a natureza a estas
necessidades.
É importante destacar que através dessa ação o ser humano incorpora diferentes
experiências e conhecimentos acumulados historicamente os quais impulsionarão a
criação de novas necessidades. Em relação a isso, ENGELS nos diz que:
“... o animal apenas utiliza a natureza, nela produzindo modificações somente por sua presença; o homem a submete, pondo-a a serviço de seus fins determinados, imprimindo-lhe as modificações que julga necessário, isto é, domina a Natureza. E esta é a diferença essencial e decisiva entre o homem e os demais animais; e, por outro lado, é o trabalho que determina essa diferença” (ENGELS, 1979, p.223).
Sendo assim, fica evidente que a ação humana é intencional e planejada.
Portanto, com base nesta afirmação, identificamos como o ser humano determina e
condiciona a vida através da ação em função dos bens (materiais e intelectuais)
necessários à sua sobrevivência. Ou seja, ao interagir na natureza, o ser humano produz
sua existência num processo de mútua transformação. Essa ação transformadora nos
mostra que este não só deixa as marcas de sua ação sobre a natureza, mas também a
humaniza.
Assim, a Ciência é o processo e o instrumento da ação-reflexão dos seres
humanos sobre a realidade das necessidades materiais, atendendo a diferentes grupos
sociais nos limites dos interesses próprios de cada momento histórico. Com relação a isso
ANDERY nos esclarece que a Ciência é uma das formas de conhecimento, ou seja:
... A ciência também é determinada pelas necessidades materiais do homem em cada momento histórico, ao mesmo tempo em que nelas interfere. Não apenas o homem contemporâneo produz ciência: sociedades remotas a produziram. A ciência caracteriza-se por ser a tentativa do homem entender e explicar racionalmente a natureza, buscando formular leis que, em última instância, permitem a atuação humana (ANDERY, 1988, p.15).
Para compreender melhor, podemos citar como exemplo o período Paleolítico,
conhecido como a Antiga Idade da Pedra ou Idade da Pedra Lascada. Sua denominação
provém do uso da pedra lascada como um instrumento de trabalho predominante nesse
período. Estes instrumentos, embora rudimentares, representavam naquele momento
histórico um avanço tecnológico, pois o ser humano, através do seu trabalho, utilizando
sua capacidade racional, fabricava suas primeiras ferramentas.
Diante disso, o ser humano tornava-se um “criador” e começava a se distinguir
dos outros animais através do uso da razão e da ação sobre a natureza em relação a sua
produção e o uso de instrumentos.
Nesse momento, ele ainda vivia em bandos, sua vida era nômade, baseada em
uma economia coletora que consistia na caça, na pesca e na coleta, aproveitando os
recursos que a natureza lhe oferecia para garantir seu sustento através da cooperação,
da ação em conjunto e, principalmente do aprendizado social. Construíam abrigos,
utensílios e ferramentas. Seus objetos eram confeccionados primeiramente em osso e
madeira e depois em pedra e marfim. Usavam um machado de pedra para cortar e
esmagar os alimentos, para sua defesa e fazer furos.
Contudo, considera-se que a História da Ciência teve início no período em que
Galileu, Kepler, entre outros pensadores do século XVII apresentaram suas primeiras
descobertas. A partir desse período a Ciência que até então estava atrelada à Filosofia,
separa-se desta e passa a ser um conhecimento mais estruturado e prático.
A Revolução Científica do referido século teve sua origem devido há alguns
processos históricos sociais que poderão ser resumidos em:
Renascimento cultural: podemos citar como uma de suas características o
humanismo. Esta corrente de pensamento e comportamento frisava a utilização de
um senso crítico mais elevado e uma maior atenção às necessidades humanas ao
contrário do teocentrismo da Idade Média, que frisava a atenção total aos assuntos
divinos e, portanto, um senso crítico menos elevado. Este maior senso crítico
exigido pelo humanismo permitiu ao ser humano observar mais atentamente os
fenômenos naturais ao invés de relegá-los à interpretação da igreja.
Imprensa: inventada neste mesmo período, desempenhou um papel fundamental
na Revolução Científica, pois desapareceram (ou se reduziram significativamente)
os erros de interpretação e as cópias que acabavam por deturpar as traduções e
se iniciou a impressão em linguagem padrão que permite uma maior divulgação
do material se comparado aos escritos em latim, que eram compreendidos apenas
pelos estudiosos desta língua.
Reforma Religiosa: participou de modo decisivo do desencadeamento da
Revolução Científica. Os reformistas pregavam que uma forma de se apreciar a
existência de Deus era através das descobertas na ciência e por isso estas foram
incentivadas, proporcionando uma propulsão ao desenvolvimento da Revolução
Científica.
Hermetismo: selou a revolução, na medida em que representava um conjunto de
idéias que exaltavam a concepção quantitativa do universo, encorajando o uso da
matemática para relacionar grandezas e demonstrar verdades essenciais. A
difusão da matemática criou um ambiente propício para o desenvolvimento de um
método científico mais rigoroso e crítico, o que modificou a forma de fazer ciência.
Todos os grandes desenvolvimentos posteriores talvez não tivessem sido possíveis
sem a reestruturação científica.
Ligada à Revolução Científica, podemos citar também a Revolução Industrial que
teve início no século XVIII, na Inglaterra, com a mecanização dos sistemas de produção.
Enquanto que na Idade Média o artesanato era a forma de produção mais utilizada, na
Idade Moderna tudo mudou. A burguesia industrial que visava maiores lucros, menores
custos e produção acelerada, buscou alternativas para melhorar a produção de
mercadorias.
Outro ponto importante deste século foi marcado pelo grande avanço tecnológico
nos transportes e máquinas. As máquinas a vapor revolucionaram o modo de produção.
Se por um lado a máquina substituiu o ser humano, gerando desemprego para milhares
de trabalhadores, por outro baixou o preço de mercadorias e acelerou o ritmo de
produção.
Com estes meios foi possível transportar mais mercadorias e pessoas, num tempo
mais curto e com custos mais baixos.
Além disso, é possível perceber que hoje a tecnologia digital também faz parte da
vida diária de um grande número de pessoas em todo o mundo e que a Internet mudou
irreversivelmente o acesso à informação, que transformou e ainda tem transformado a
maneira dos indivíduos se relacionarem. A era do computador realizou uma grande
mudança na sociedade, transformou as relações de produção e possibilitou a ampliação
do conhecimento. Para destacar esse avanço na história das invenções, este período foi
nomeado como Revolução Digital.
A era digital elevou as comunicações à escala global com a utilização cada vez
maior da web, do e-mail e de outras vias de tráfego de informação cada vez mais rápidas.
A chamada Revolução Digital, por si só, certamente não provoca a completa
transformação da sociedade, mas contribui para esse desenvolvimento.
Por esse motivo, pode-se dizer que o avanço tecnológico e o conhecimento estão
cada vez mais evoluídos. Podemos citar como exemplo desse avanço o microchip. Este
passou por um longo processo evolutivo. Tudo começou com as válvulas, que evoluíram
para os transistores (componente eletrônico que começou a se popularizar na década de
1950), considerado a maior invenção daquele século, por ser o principal responsável pela
revolução da eletrônica da década de 1960.
A partir desse conhecimento, podemos dizer que entramos na era do microchip.
Este que era uma pequena invenção hoje é uma grande revolução. Esse diminuto
dispositivo eletrônico vem possibilitando uma série de inovações sem precedentes na
História da Ciência, podendo, sem dúvida, ser incluído na lista das mais notáveis
invenções da humanidade. O microchip e a Revolução Digital estão agora transformando
o início deste século assim como a máquina a vapor e a Revolução Industrial
transformaram o final do século retrasado.
Diante disso, podemos exemplificar alguns aparelhos e equipamentos que
possuem microchips: satélites, elevadores, carros com injeção eletrônica ou freios ABS,
aviões, instrumentos eletrônicos, calculadoras, relógios digitais, celulares, aparelhos de
fax, equipamentos médicos, robôs, videocassetes, rádio-relógios, impressoras e, claro,
computadores etc.
Além dessas descobertas, serão citadas outras que também foram revolucionárias:
concepção de um bebê por meio da fertilização artificial;
invenção de armas “inteligentes” utilizadas nas guerras do Golfo, Malvinas e Japão;
revolução da indústria de gravação (CD–COMPACTO, CD-ROM e o DVD);
descobrimento do buraco da camada de ozônio;
clonagem da ovelha Dolly;
sequenciação do genoma humano;
célula tronco;
expansão da internet etc.
A propósito, considera-se o conhecimento uma produção humana, produzido no
decorrer da história, fazendo-se necessário rever o processo que se caracteriza como
sendo a história da Ciência, o estudo do processo de elaboração do conhecimento
científico no decorrer da história faz com que os nossos alunos sejam levados a
confrontar os interesses que impulsionaram o atual desenvolvimento tecnológico.
No entanto, a inserção do ensino de Ciências no currículo do Ensino Básico
Brasileiro nos anos de 50 e 60, tinha como objetivo atender às necessidades do
desenvolvimento tecnológico do país.
Vale destacar que na década de 50 a escola era apenas para alguns, que se
pode chamar de privilegiados e as aulas eram ministradas por médicos, padres,
engenheiros, porque os professores não tinham formação pedagógica e os programas
curriculares eram rígidos. Ao final dessa década e início da outra, o impacto do
lançamento do primeiro satélite artificial, o Sputnik, pelos soviéticos, levou os países
ocidentais, sobretudo os Estados Unidos e a Inglaterra, a questionarem e repensarem
sobre a forma de ensino da área de Ciências nas escolas, resultando disso a elaboração
de novos currículos.
Pode-se dizer que, até a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional nº 4.024/61, o ensino de Ciências era considerado uma atividade neutra,
objetiva e reprodutora de uma verdade absoluta e inquestionável, sendo primordial
apenas a quantidade de conteúdos a serem aplicados em sala de aula.
No entanto, na década de 70, houve uma mudança na forma de ensino, ou seja,
passou do tradicional para um maior envolvimento do estudante em seu processo de
aprendizagem. O objetivo do ensino de Ciências passou a ser o de identificar problemas a
partir de fatos observados, construírem hipóteses, testá-las, tirar conclusões ou
abandoná-las, se fosse necessário. O estudante deveria ser capaz de redescobrir o que a
ciência já havia descoberto. O professor deveria conhecer o que o estudante pensava
para fazer com que suas idéias, a princípio “simples” e “erradas”, fossem transformadas
em conceitos mais elaborados e científicos, pois a ciência, como citada anteriormente era
considerada a detentora da verdade absoluta e inquestionável.
Com relação aos anos 80, as questões ambientais decorrentes da
industrialização desencadearam a discussão sobre as implicações sociais do
desenvolvimento científico e a escola passou a objetivar a visão da formação de um
cidadão trabalhador.
Entretanto, o que prevalece no ensino de Ciências Naturais, na maioria das
escolas de hoje, são as práticas tradicionais, com alguns retoques e inovações, ainda
insuficientes para proporcionar aos estudantes uma cultura científica, que lhes permita
compreender o funcionamento da natureza e a influência dos avanços científicos e
tecnológicos na vida social das pessoas.
Assim, pois, o ensino de Ciências na escola é essencial, pois contribui para a
formação dos alunos com a gradativa constituição do pensamento científico a respeito
das interações e transformações da matéria e energia, os dois componentes básicos do
universo, isto é, os fundamentos desta categoria - objeto de estudo de ciências naturais,
como instrumentos de integração e articulação dos seus conteúdos-forma e como
instrumentos essenciais para compreender com mais clareza as relações entre os seres
humanos e a natureza mediada por meio do trabalho, atividade produtiva
caracteristicamente humana, pois de suas interações manifestam-se múltiplas e
recíprocas transformações da realidade natural e histórico-social.
Desvelar a ciência e a tecnologia, apresentando-as como atividades humanas,
historicamente produzidas possibilita e proporciona uma visão crítica da interdependência
das mesmas e seus papéis na sociedade contemporânea, elaborando representações ou
modelos mais aproximados, ou seja, da gênese, organização e funcionamento da
totalidade, do universo, em seus recortes de espaços-tempo preenchidos pelo movimento
incessante de interações e transformações de matéria e energia.
Para tanto, o processo ensino-aprendizagem de Ciências Naturais que engloba
os campos da Biologia, Física, Química, Astronomia, Geociências entre outros, constitui-
se num amplo campo de conhecimentos científicos que podem não somente descrever,
mas explicar seu pertencimento histórico-social numa perspectiva crítica e de
discernimento sobre o conhecimento científico dos conteúdos essenciais dos conteúdos
acessórios tendo por base as interações e transformações de matéria e energia na e da
realidade natural e social, no momento de sua transposição pedagógico-didática, na
medida em que o saber científico escolar explique o fenômeno da vida, em suas múltiplas
formas de interações e transformações e, fundamentalmente a humanização da natureza
exterior e interior dos seres humanos como processo simultâneo, prático e cooperativo de
produção de sua existência material e imaterial por meio do trabalho.
Nesta perspectiva crítica, o conhecimento científico da natureza, resultante do
processo histórico-social de produção material-imaterial através dos tempos, pode ser
entendido não como sendo estático, neutro, pronto e acabado, mas ao contrário disto,
apresenta-se em constante transformação, vinculada às novas exigências de produção e
consumo impostas pela lógica da acumulação, do lucro e expansão ilimitada do
capitalismo.
Deste modo, o que se evidencia é a necessidade de pensarmos a construção do
conhecimento a partir de sua historicidade. Logo, faz-se necessário que o aluno
compreenda as Ciências Naturais vinculadas à sua realidade, não restringindo o conteúdo
apenas ao cotidiano do aluno, mas este como parte articulada à totalidade, ou seja, à
realidade natural e social. Sendo esta uma construção histórica deve-se compreender a
evolução e elaboração dos conceitos científicos vinculados às necessidades concretas da
vida dos seres humanos, tendo sempre a idéia de que a ciência é algo provisório e que
está sempre em processo de transformação.
Partindo desse princípio, vemos como a ação humana, sua atividade produtiva
está relacionada com a produção do conhecimento e como este se processa pela
incorporação das experiências, conhecimentos acumulados e transmitidos de geração a
geração. Assim, nesse processo de humanização, os seres humanos produzem sua
própria existência, ou seja, suas condições de trabalho e de vida, como também
produzem novas idéias e necessidades, mostrando-se cada vez mais diferente das
demais espécies.
Pode-se afirmar que essa construção do conhecimento ocorre do modo informal
para o formal, ou seja, do senso comum para o científico, transformando-o em concreto
pensado. Esse conhecimento que se formaliza corresponde a representações de novas
possibilidades de ações dos homens, instrumentos de transformação das formas de
ligações ou de interdependências com a realidade natural e social.
Assim, trabalhar com este tipo de conhecimento sistematizado na sala de aula
implica partir do saber que a criança já possui, ou seja, do saber que a criança constrói no
cotidiano – pela observação e por informações diversas adquiridas em seu meio social –
confrontando-os com os conhecimentos científicos já apropriados e aqueles que serão
trabalhados posteriormente.
Portanto, o conceito científico não é um conhecimento fechado em si mesmo, o
qual se transmite à criança. Para ser apreendido, este precisa ser construído com ela, por
meio de formas e ou recursos didáticos adequados aos conteúdos selecionados como
essenciais ao desvelamento gradativo das contradições que se manifestam acerca dos
componentes e processos da realidade natural e social nos limites ou estágio já atingido e
disponível do conhecimento científico sobre suas interações e transformações.
Este fato deve por sua vez, nortear a orientação da ação pedagógica, pois nem
sempre as crianças tiveram experiências de vida que lhes possibilitaram construir esses
conceitos mais simples do senso-comum. Por isso, esses experimentos relativos à
vivência dos alunos, isto é, suas interações diretas e ou indiretas com a realidade natural
e social precisam ser pedagogicamente retomados no plano individual-coletivo e com a
participação ativa dos mesmos para transformar gradativamente os conceitos
espontâneos em conceitos científicos.
Ao contrário, trata-se de elevar o nível de pensamento da criança, ou seja, não é
o senso comum ou pouca disponibilidade de exploração do pensamento ou pouca
familiaridade do professor com estratégias que as crianças utilizam para apreender que
vão nortear ou vão ser tomadas como referência do processo ensino-aprendizagem, mas,
os conteúdos-forma que devem ser trabalhados são os conteúdos-conceitos essenciais
ligados às formas apropriadas e compatíveis de sua apresentação e ou representação,
porém, sempre articulados, ou seja, como partes mutuamente dependentes que
possibilitam, devido às suas interações e transformações, o entendimento mais
aproximado e gradativo da totalidade considerada.
Sendo o professor, o mediador da transmissão desse conhecimento em sala de
aula, sua ação é fundamental nesse processo de aprendizagem. Para isso, PINHEIRO
nos diz que:
“Não se trata, simplesmente de transmissão de alguns conteúdos em dada seqüência, mas também da forma de trabalho realizado com estes conteúdos, o que pode garantir a sua apropriação na medida em que oferece aos alunos o espaço e as oportunidades para articularem e organizarem o conhecimento que já possuem da realidade e se apropriarem da ciência que explica essa realidade” (PINHEIRO, 1991, p. 3).
Por esse motivo, pode-se dizer que o professor ao ensinar Ciências Naturais deve
oferecer as condições básicas para que os alunos entrem em exercício freqüente de
pensar e agir por meio dos conteúdos inseridos e contextualizados na práxis social, de
modo a ressignificá-los frente às necessidades contemporâneas e/ou de compreender o
significado da Ciência como outro processo e produto imprescindível ao desenvolvimento
dos seres humanos. Considerando-se que para atingir esse objetivo, deverão ser
trabalhadas, basicamente, três fases as quais são chamadas de níveis de ação científica.
Estas consistem em:
1 – Iniciação Científica: Dá-se através da exploração da sua curiosidade e interesse, no desenvolvimento
do pensamento reflexivo e aquisição de uma formação de hábito (habilidades:
comportamentos observáveis) e de atitudes científicas (reações favoráveis a
determinados estímulos).
Diante disso, podemos observar um exemplo:
2 – Compreensão da Ciência:
Para isso, ele necessariamente terá que percorrer caminhos mentais (pensar) e
práticos (agir) que identifiquem a forma organizada de fazer observações, identificando e
delimitando problemas relevantes, formulando hipóteses testáveis, planejando e
executando experimentos, realizando observações experimentais, registrando os
resultados observados e concluindo em função dos mesmos.
3 – Educação Científica:Assim sendo, o professor deverá ofertar ao aluno uma educação científica que o
possibilite fazer detalhadas observações, de propor problemas resolúveis e comprováveis
relevantes e delimitados, de formular hipóteses, de realizar experimentos, de fazer
observações experimentais e registros operacionais e de concluir de acordo com os fatos.
Faz-se necessário ressaltar que nas séries iniciais do ensino fundamental é
prioritário o trabalho com o primeiro nível da ação científica, pois é nesta fase que se
inicia a apropriação e ou efetivação das bases de organização do pensamento reflexivo
em ligação com as percepções sensitivas e motoras de modo a constituírem estrutural e
dinamicamente as unidades iniciais ou primárias de abertura ao desenvolvimento
intelectual dos outros dois níveis posteriores de reflexão-ação científica.
Diante disso, fica evidente que o docente deverá utilizar-se de vários
instrumentos para o processo de ensino-aprendizagem da área de Ciências Naturais,
onde um dos fundamentais é a experimentação. A experimentação diferentemente da
experiência científica não dispõe dos recursos materiais e ou humanos para este tipo de
trabalho de investigação que ocorre em grandes laboratórios e centros de pesquisa.
Trata-se, portanto, que as experimentações, são instrumentos ou recursos de
caráter didático, onde os conteúdos têm um tratamento abstrato-empírico mais apropriado
ao possibilitar a correspondência e articulação das coisas, objetos e fenômenos como
unidades em pensamento e ação, ou seja, o exercício da experimentação estimula e
desenvolve os sentidos, subordinados e integrados à inteligência na medida em que e ao
mesmo tempo desenvolvem suas potencialidades na forma de operações mentais teórico-
práticas (pensamento conceitual, linguagem simbólica e habilidades) que possibilitam de
forma mais efetiva, racional e equilibrada apreender com mais clareza as relações entre
os seres humanos e destes com a natureza.
Porém, em se tratando da experimentação, muito se tem argumentado,
corretamente, que o ensino de ciências tem que ser eminentemente experimental.
Todavia, não se experimenta sem conceitos, toda experimentação, por mais simples que
seja, deve ser feita a partir de uma base conceitual.
Para isso, no entanto, é preciso que esses experimentos sejam executados tendo
como objetivo o desenvolvimento conceitual, pois a mera experimentação não garante a
aprendizagem de conceitos, nem tão pouco o desenvolvimento de habilidades científicas,
ou desenvolvimento de habilidades pelas habilidades, dissociadas ou vazias de conteúdo,
isto é, dos conceitos científicos, seus fundamentos reais-concretos.
Para tanto, é de fundamental importância comentar a respeito do papel da
experimentação na construção do conhecimento científico e sua relevância no processo
de ensino-aprendizagem, pois é de conhecimento dos professores o fato de que a
experimentação desperta um forte interesse entre os alunos de diversos níveis de
escolarização. Pode-se se dizer também que a experimentação atribui um caráter
motivador, lúdico, essencialmente vinculado aos sentidos e que esta também aumenta a
capacidade de aprendizado, pois funciona como meio de envolver o aluno ao conteúdo
utilizando o conceito de simulação.
Faz-se necessário, portanto, uma intencionalidade didática entre a atividade
experimental e o desenvolvimento conceitual, pois a apropriação dos conceitos científicos,
ou seja, o resultado do processo de transformação dos conceitos espontâneos e
ampliação dos conceitos científicos anteriormente apropriados constituem a base objetiva
para o desenvolvimento de habilidades científicas ou de pensamento, como: observar,
reforçar, comparar, seriar, diferenciar, descrever, interpretar, classificar, medir, usar
números, relacionar espaço-tempo, registrar materiais, dados, resultados etc, efetivando a
aprendizagem.
A escola é o cenário que possibilita as operacionalizações das interações e
transformações dos conceitos espontâneos em conceitos científicos como contribuição
específica por meio do processo ensino-aprendizagem de ciências naturais, promovendo
pelos seus fundamentos a desconfiança em nossas certezas cotidianas de forma crítica e
curiosa.
Por outro lado, por exemplo, quem duvidaria que: o Sol não se movimenta em torno
da Terra, ou que a Terra é maior que o Sol, ou ainda que a ciência não esteja restrita ao
utilitarismo dos produtos ou serviços do cotidiano?
Os conceitos espontâneos podem e devem ser usados como e com outros meios
ou recursos pedagógicos no sentido de sua transformação ou superação em conceitos
científicos que possibilitam melhor compreensão do dinamismo da realidade natural e
social. Porém, apesar de sua historicidade, os conceitos espontâneos constituem parte do
cotidiano e não podem ser focados como o centro do processo ensino-aprendizagem, na
medida em que devem ser transformados como partes em partes com maior poder
descritivo e explicativo (conceitos científicos) da totalidade e, não o inverso, ou seja, o
cotidiano e seus conceitos ditos espontâneos não podem ser tomados como totalidade,
pois se manifestam por meio do utilitarismo imediato, sem considerar, muito menos
reconhecer a relevância das articulações das partes ao todo complexo no desvelamento
de sua organização e funcionamento em nome de uma “contextualização” limitada às
descrições superficiais e isoladas da cotidianidade deformada pela alienação da lógica do
produtivismo e consumismo capitalista - determinantes das relações entre as pessoas e a
natureza.
Temos como exemplo, o conceito de “cachorro”, que construído no dia-a-dia, não é
a mesma coisa do conceito de “ser vivo”, ensinado e aprendido nas aulas de ciências.
Esta diferença diz respeito ao modo como cada conceito se desenvolve e funciona. O
conceito “ser vivo” ensinado na escola, promove intencionalmente uma percepção mais
ampla, mais abstrata que o conceito de “cachorro” construído pela e na vivência cotidiana,
este é mais restrito, menos abstrato, pois se refere exclusivamente ao objeto concreto
sensível “cachorro” sem incluí-lo num sistema conceitual de abstrações graduais. Neste
sistema, o que é o “cachorro”? Um “ser vivo” e não um “ser bruto”, é um “animal” e não
um “vegetal”, é um animal “vertebrado” e não um “invertebrado”, um “mamífero”, ou seja,
está incluído ou tem seu lugar num sistema conceitual que possibilita sua apropriação,
compreendê-lo melhor como um ser vivo integrado no contexto da totalidade complexa da
biodiversidade.
Por esta razão, a educação escolar assume um papel fundamental ao oportunizar a
apropriação dos conceitos científicos. Faz com que as crianças percebam a articulação
entre diferentes conceitos, isto é, as interações conceituais, necessárias nas relações da
totalidade ou de seus recortes, incluindo-os em um sistema gradativo de abstrações.
Desta forma, quando a criança toma consciência desse sistema conceitual e é
capaz de localizar nele o lugar de cada conceito, seu raciocínio ganha maior flexibilidade
e agilidade, ampliando seu entendimento da totalidade.
Por isso, a funcionalidade e a utilização de cada conceito dependem de que o
aluno tenha consciência dele, ou seja, é necessário que esteja incluído em sistemas
conceituais nos quais os conceitos mais abstratos englobem os menos abstratos.
Reitere-se que na escola, diferentemente das situações de experiência direta da
criança, a relação entre cada conceito e o objeto a que se refere, dar-se-á sempre
mediante outros conceitos. Por exemplo, a criança aprende na escola que a “Terra é um
planeta que gira em torno do Sol”, esta definição implica conceitos de astros (luminosos –
iluminados) “planeta” e de “movimento de translação”; ou “a Terra é um planeta que gira
sobre si mesma”, o que implica ou requer outros conceitos, como de “movimento de
rotação” e suas interações subseqüentes com outros conceitos: “dia e noite”, movimento,
repouso, referencial, força etc, ressalvando-se que certos conceitos não são providos pela
vivência imediata da criança, mas estabelecem interações com outros conceitos
científicos que permitem descer e subir no sistema conceitual, movimento que possibilita
a transformação e elevação em grau superior os conceitos espontâneos.
Neste enfoque, faz-se necessário analisar as contribuições de Vigotski sobre o
papel dos conceitos espontâneos e científicos no ensino e desenvolvimento psíquico das
crianças. Assim, os conceitos espontâneos (pensamento espontâneo) se formam no
curso da atividade prática da criança e de sua comunicação direta com os que a rodeiam
e não necessariamente na educação escolar.
Com relação a isso, Vigotski descreve sobre a importância da fala neste processo e
que este possui dois componentes: o fonético e o do significado. Estes dois componentes
irão originar os conceitos, que são classificados em espontâneos. Pode-se dizer que um
dos problemas da escola é trabalhar somente com os conceitos científicos, não
considerando os conceitos espontâneos dos alunos. É através da interação dos dois
conceitos (científico e espontâneo) que se dá à evolução real do pensamento. Entender
os conceitos prévios dos alunos possibilita que estes, através da reflexão e da atividade,
sejam reconstruídos e propiciem a interação com o conceito construído cientificamente.
Desta forma teremos uma proposta pedagógica que eleva as estratégias de
pensamento, provocando aprendizagens mais significativas e desenvolvendo a autonomia
de pensamento.
O processo de formação de conceitos inicia-se na infância, este amadurece e se
configura somente na adolescência. Durante a infância a criança adquire capacidades de
conceituação que constituem o início desse processo. A origem da formação dos
conceitos tem sido objeto de muitas investigações, principalmente quando se pensa no
papel da escola como mediadora na construção do conhecimento científico por parte de
seus alunos.
Quando Vigotski estudou esse tema, desenvolveu alguns estudos experimentais
para observar a dinâmica do processo de formação de conceitos. As principais
conclusões a que chegou foram:
a percepção e a linguagem são indispensáveis à formação de conceitos;
a percepção das diferenças ocorre mais cedo do que a das semelhanças porque esta
exige uma estrutura de generalização e de conceitualização mais avançada;
a formação de conceitos é o resultado de uma atividade complexa, em que todas as
funções intelectuais básicas (atenção deliberada, memória lógica, abstração,
capacidade para comparar e diferenciar) tomam parte;
os conceitos novos e mais elevados transformam o significado dos conceitos
inferiores.
Outro aspecto bastante relevante sobre formação de conceitos, tratado por
Vigotski, diz respeito à experiência pessoal da criança e à instrução formal, à
aprendizagem em sala de aula, levando-a desenvolver dois tipos de conceitos que se
relacionam e se influenciam constantemente. Vigotski acredita que os conceitos
espontâneos e os conceitos não-espontâneos fazem parte de um mesmo processo, ainda
que se formem e se desenvolvam sob condições externas e internas diferentes e
motivadas por problemas diferentes.
Os conceitos científicos constituem, para Vigotski, o meio no qual a consciência
reflexiva se desenvolve. A aprendizagem escolar exerce papel importante em sua
aquisição. Seus estudos confirmaram a hipótese de que os conceitos espontâneos e os
conceitos científicos, inicialmente afastados porque se desenvolvem em direções
contrárias, terminam por se encontrar. Com relação a isso, Vigotski nos diz que:
“Embora os conceitos científicos e os conceitos espontâneos desenvolvam-se em sentidos opostos, os dois processos estão intimamente relacionados. É preciso que o desenvolvimento de um conceito espontâneo tenha alcançado certo nível para que a criança possa absorver um conceito científico correlato.” (VIGOTSKI, 1998, p.92).
Diante disso, fica evidente que, considerando que o aluno traz uma riqueza de
conhecimentos sobre o mundo e seu funcionamento e que estes, na maioria das vezes,
entram em conflito com o que é imposto pela escola e tem de ser aprendido, o professor
deve agir para que os estudantes não rejeitem esses conhecimentos ou não tenham
dificuldades em assimilá-los.
Portanto, a tarefa da escola, por meio do professor, é exatamente auxiliar o aluno a
se apropriar do conceito científico e estabelecer vínculo direto com o objeto por meio de
abstrações em torno das suas propriedades e da compreensão que ele mantém com um
conhecimento mais amplo. Para os professores, esta tarefa não é fácil, porque implica
uma revisão, tanto de conteúdos quanto de metodologias.
A apropriação dos conceitos ocorre na medida em que a mente da criança registra-
os, isto é, articula as partes no e do recorte da totalidade, no sentido de promover maior
clareza de sua organização e funcionamento como concreto pensado.
A atividade também é fundamental nesse processo. As atividades propostas pelos
professores devem provocar nos alunos exercício mental constante voltado para as
operações que devem realizar sobre determinado problema, permitindo que o aluno vá
tomando consciência das suas atitudes e, consequentemente, das suas tarefas e da
resolução da questão proposta.
Para que as práticas pedagógicas sejam mais adequadas à formação de conceitos
científicos, algumas sugestões são apontadas:
As idéias que o aluno traz para a escola são necessárias para a construção de
significados. Suas experiências culturais e familiares não podem ser negadas.
Essas idéias devem ser aceitas para progressivamente evoluírem, serem
substituídas ou transformadas;
A resistência para substituir alguns conceitos, só é superada se o conceito
científico trouxer maior satisfação: for significativo, fizer sentido e for útil (porque
verdadeiro), levando em consideração as contradições;
O diálogo com os alunos possibilita o diagnóstico de suas idéias em vários
momentos da aprendizagem. Da mesma forma, a interação entre parceiros e a
observação dos diálogos travados entre eles;
Resolver problemas com um plano de atividades cognitivas deve ser estimulado,
uma vez que a simples nomeação das características essenciais e a repetição de
definições não garantem a apropriação de conceitos;
Deve-se possibilitar ao aluno retomar seu processo de trabalho, explicando suas
idéias e analisando a evolução das mesmas;
No processo de apropriação de conceitos, é desejável desenvolver ações de
indução e dedução, visando estabelecer as articulações entre as partes e o todo e
vice-versa, tomando-se por base o discernimento entre o essencial e o acessório
para o desenvolvimento intelectual;
Nem todo conceito é passível de experimentação, daí o valor de meios variados:
filmes, explorações de aulas de campo, música, etc. confrontando-os com as
contradições naturais e sociais de forma crítica e acessível;
É importante lembrar que o ensino sistemático e explícito na escola deve levar o
aluno a reconceitualizações e, principalmente, desenvolver formas de pensar que se
estendam para outras áreas e para situações que transcendem a sala de aula. A
apropriação dos conceitos ocorre pela mediação através da linguagem oral e escrita,
como também pela mediação com objetos reais. A utilização correta do concreto se faz
quando ele se revela como um instrumento para se chegar ao abstrato, ao mesmo tempo
em que nega a abstratividade no ascenso ao concreto pensado.
A aquisição de cada conceito particular é vista como um processo de (apropriação)
construção e não como um processo aditivo de recepção.
O desenvolvimento de determinadas habilidades é essencial na apropriação de
conceitos:
explicar ou desdobrar o significado das palavras;
construir e reconstruir os elementos que compõem um conceito;
usar dicionários e enciclopédias;
compreender a unidade entre essência e aparência do fato, objeto e/ou fenômeno
estudado;
definir, dizer com segurança o que é fato, objeto ou fenômeno estudado como
modelos ou aproximações do real.
Os conceitos apropriados são fundamentais para o desenvolvimento cognitivo do
indivíduo. A apropriação dos conceitos científicos possibilita a aprendizagem de princípios
e solução de problemas a eles relacionados.
Desse modo, subentende-se que o ensino desta área deve propiciar atividades
desafiadoras que estimulem os alunos ao aprendizado, realizando trabalhos
contextualizados em situações reais de forma a contemplarem os objetivos tornando a
aprendizagem mais prazerosa e significativa, quando desveladora de contradições,
problemas ou pseudoconcreticidades da realidade social e natural interdependentes.
Assim, a partir dessas reflexões, serão citados alguns procedimentos e
encaminhamentos que possibilitarão a aprendizagem significativa, ou seja, considerando
as relações das partes na e da totalidade, norteando a prática pedagógica do professor
em sala de aula, tais como: a problematização, a observação, a comparação, o
estabelecimento de relações entre fatos e idéias, a leitura e a escrita de textos, a
organização de informações por meio de tabelas, esquemas, o confronto entre
suposições, a proposição de soluções de problemas, experimentações, aulas de campo,
exposições, feiras culturais, debates, observações, pesquisas, coleta de dados,
maquetes, teatro, painel, cartaz, folder, desenho, mapa, tabela, gráficos, relatório, horta,
minhocário, elaboração de jornal, recursos (DVD/ TV/ rádio), entre outros.
Neste contexto, a intervenção na prática social com a compreensão e a
apropriação do saber sistematizado e/ou acumulado historicamente é como afirma
Saviani:
“A prática social referida no ponto de partida e no ponto de chegada é e não é a mesma. É a mesma, uma vez que é ela própria que constitui ao mesmo tempo o suporte e o contexto, o pressuposto e o alvo, o fundamento e a finalidade da prática pedagógica. E não é a mesma, se considerarmos que o modo de nos situarmos em seu interior se alterou qualitativamente pela mediação da ação pedagógica; e já que somos, enquanto agentes sociais, elementos objetivamente constitutivos da prática social, é lícito concluir que a própria prática se alterou qualitativamente. É preciso, no entanto, ressaltar que a alteração objetiva da prática só pode se dar a partir da nossa condição de agentes sociais ativos. A educação, portanto, não transforma de modo direto e imediato e sim de modo indireto e mediato.” (SAVIANI, 1987, p.76).
ENSINO-APRENDIZAGEM – CIÊNCIAS NATURAIS
OBJETO DE ESTUDO:
INTERAÇÕES E TRANSFORMAÇÕES DE MATÉRIA E ENERGIA:
CELESTE: PRODUÇÃO DO UNIVERSO
TERRESTRE: PRODUÇÃO DO ECOSSISTEMA
HISTÓRICO-SOCIAL: PRODUÇÃO DA EXISTÊNCIA HUMANA
UNIVERSO
SISTEMA SOLAR
TERRA-LUA BIOSFERA
FATORES ABIÓTICOS:
ÁGUA AR
SOLO
FATORES BIÓTICOS:
VEGETAIS ANIMAIS
SERES HUMANOS
BIOLÓGICAS – EM ESPAÇO-TEMPO:FÍSICAS E QUÍMICAS – EM ESPAÇO-TEMPO:
ENSINO-APRENDIZAGEM DE CIÊNCIAS NATURAIS
Objeto de estudo: interações e transformações de matéria e energia.
O objeto de estudo ou categoria máxima do ensino de Ciências aqui apresentado:
Interações e Transformações de matéria e energia têm sua justificativa na necessidade de
se repensar a apropriação do conhecimento científico da natureza a partir de sua
historicidade. Isto se faz necessário para refutar o atual ensino de Ciências Naturais que
de forma geral, apresenta-se apenas como matéria descritiva, com ênfase em definições
“resumidas” que tentam explicar os fatos-fenômenos científicos de forma simplista,
fragmentada, pronta e acabada, sem nenhuma contextualização.
Assim, neste cenário, o aluno é levado a pensar que o conhecimento científico
produzido pela ciência da natureza é construído fora de sua realidade, da prática
histórico-social, impregnada por um cientificismo artificial, assentado em nomenclaturas e
“conceitos”, muitas vezes incorretos, desvinculados de sua própria produção teórico-
prática.
O “o quê, o porquê, o como” este objeto de estudo ou categoria pode contribuir na
explicitação da realidade natural e histórico-social humana, tomando-se por base a
existência de matéria e energia num contexto espaço-temporal longínquo e dinâmico, isto
é, desde o início do universo em suas múltiplas e recíprocas interações e transformações,
até surgir a matéria viva e nesse processo os seres humanos participando do movimento
da matéria e energia, uma jornada exuberante de produção da realidade em suas múltiplas
formas de concretude que por sua vez pode ser transposto do conhecimento científico das
ciências da natureza produzido e acumulado historicamente tendo por base os
fundamentos deste objeto para as práticas pedagógicas do Ensino Fundamental.
Assim, se as ciências da natureza preconizam que os elementos e os processos
naturais ou tudo o que existe no universo nos limites do conhecimento científico é
formado de matéria e energia, o que é a matéria? E a energia? Como formam tudo o que
existe no universo, como as galáxias, estrelas, sistemas solares-planetas, satélites, seres
sem vida e seres vivos, diz-se que o Universo como um todo tem seu espaço-tempo
preenchido por matéria e energia.
Cientificamente, aquilo que ocupa lugar no espaço, que podemos ver e tocar,
que tem peso, massa ou inércia, é incriável, indestrutível entre outros atributos é constituído de matéria. Sabe-se que a matéria em sua grande diversidade, apresenta-se em um dos três estados físicos (fases físicas) convencionais: sólido, líquido ou gasoso, e ainda num 4º estado físico, chamado “plasma” encontrado nas estrelas, como o Sol. E que podem sofrer as ditas mudanças de estado físico dependendo de variações de temperatura e ou pressão.
Contudo, no transcorrer do espaço-tempo terrestre, as múltiplas interações e
transformações de matéria e energia produziram a matéria-viva (proto-células, células,...),
o fenômeno da vida, em sua inacabada biodiversidade (seres vivos).
Assim como a matéria, e inseparável desta, a energia é outro componente físico-
químico do universo, que se manifesta e é captada por meio dos receptores mais simples
aos mais complexos, como os órgãos dos sentidos, de forma diferenciada quando a
comparamos com a matéria, na medida em que, é um componente ou agente que
interage com a matéria, transformando-a física ou quimicamente e transformando-se em
outros tipos de energia, portanto, são incessantes as interconversões de matéria e
energia.
Diz-se, portanto, que as propriedades básicas da energia decorrentes de suas
interações com a matéria são: transformar a matéria, realizar trabalho, transformar-se em
outras formas de energia.
De forma mais imediata, pode-se dizer que não é possível pegar a energia, como
se pega ou se sente a matéria, porém, podemos senti-la. Diante disso, é oportuno
mencionar que existem alguns tipos (formas) básicos de energia: luminosa (luz), térmica
(calor), sonora (som), elétrica, mecânica (movimento), química (armazenada nas
substâncias: alimentos, combustíveis,...), atômica ou nuclear (átomo), entre outras e,
derivadas.
A matéria e a energia não estão presentes apenas naquilo ou nas coisas que
podemos tocar ou ver, constituem também aquilo que é muito pequeno ou mesmo
invisível, isto é, constituem ou formam tanto o macrocosmo como o microcosmo: físico,
químico e biológico – seres sem vida e seres vivos, ou seja, a diversidade de formas
destas dimensões estruturais ou organizacionais e funcionais do universo ou cosmo.
Pode-se dizer por outros termos que aquilo que é visível – o macrocosmo ou as partes
visíveis que o constituem, são formas de manifestação das partes invisíveis ou
microcosmos que o constitui (átomos, moléculas, células,...), organizando-o estrutural e
funcionalmente no bojo de suas incessantes e múltiplas interações e transformações.
Portanto, a macro como a micro cosmologia, plasmam-se ou se complementam na
descrição e explicação mais aproximada da origem, organização, desenvolvimento e
funcionamento do universo.
Neste contexto, cabe indagar como tudo isso se formou ou qual a origem do
universo ou de onde veio, para onde está indo, se existiu um início, o que poderia ter
ocorrido antes de sua origem, ou ainda, algum dia terá um fim? Podemos avançar ou
retroceder no espaço-tempo? As idéias de um universo inalterado que existiu desde
sempre e existirá para sempre ficaram abaladas desde o renascimento e se ainda existem
possivelmente não devem persistir por mais tempo, diante do avanço da ciência e
tecnologia oriundas das descobertas das leis fundamentais que o regem em momentos de
equilíbrios e desequilíbrios material-energéticos.
Contudo, fazem-se necessário reconhecer que estas descobertas só foram
possíveis graças ao trabalho humano para produzir instrumentos teórico-práticos, como
os métodos-científicos, a matemática e ferramentas tecnológicas como os computadores,
telescópios, microscópios, etc., de modo que, com a posse e uso desse instrumental foi
possível organizar e aproximar de forma mais eficiente as possíveis soluções às questões
mencionadas anteriormente e tantas outras produzidas ao longo do processo histórico
social e natural.
Assim, dentre as teorias cosmológicas mais aceitas para descrever e explicar a
origem do Universo está a chamada de “Big-Bang” ou a Grande Explosão, segundo a qual
o universo e seus componentes essenciais: a matéria e a energia estavam intensamente
comprimidas em uma minúscula esfera, diz-se, muitíssimo menor que a ponta de uma
agulha que acabou explodindo a cerca de 13,7 bilhões de anos atrás, resultando a partir
deste momento uma enorme expansão de matéria e energia, dispersando-as na forma de
poeira e gases desde o início e no transcorrer da produção do espaço-tempo cósmico ou
celeste.
Contudo, para evidenciar a importância deste objeto de estudo ressalte-se que no
universo, a matéria e a energia em tudo o que existe estão em interações ou ligadas em
vários processos de transformação, por outras palavras, constituem uma realidade
objetiva de múltiplas relações de interdependência, uma não existe sem a outra,
constituem a unidade do todo e das partes.
As interações são ações entre matéria e energia, isto é, atrações, repulsões,
encontros, choques, ou vibrações, determinadas por forças pertencentes à própria
matéria e energia (cientificamente, existem quatro tipos básicos de força no universo:
força da gravidade, força eletromagnética, força nuclear fraca e força nuclear forte) que
ocorrem somente e apenas entre matéria e energia, de modo que não existem interações
de matéria com matéria sem interação de energia ou interações de energia com energia
sem interação de matéria.
Das interações entre matéria e energia são produzidas as transformações ou
fenômenos que são categorizadas basicamente como físicas ou químicas, e ainda
biológicas considerando que as transformações físicas e químicas dão origem e começam
a se manifestar em dado momento do espaço-tempo terrestre em sistemas biológicos,
como as células, microorganismos, organismos, enfim nos seres vivos em geral, em sua
gênese, desenvolvimento e processo evolutivo.
Assim, as interações e transformações de matéria e energia ocorreram desde os
primórdios do universo e possibilitaram num espaço-tempo pré-biológico de
transformações físicas e químicas que os sistemas físico-químicos ao interagirem se
transformassem, efetivando as primeiras interações e transformações biológicas num
espaço-tempo protocelular e posteriormente celular ou com a presença de células em
níveis diferenciados de interações e transformações, por conseguinte, ditas biofísicas e
bioquímicas.
Analisando outros objetos ou categorias de estudo de ciências naturais, como por
exemplo, e anteriormente, o ecossistema, constatou-se que o mesmo é um recorte
importante, pois se configura como base de múltiplas relações de interdependência de
componentes abióticos (água, solo, ar, energia solar,) e bióticos (seres vivos), negando a
fragmentação ou o trabalho isolado ou não articulado das partes no todo e vice-versa,
porém, é posterior e decorrente das interações e transformações de matéria e energia no
movimento ou expansão do universo, ou seja, se posterior, sua origem e o seu
desenvolvimento não se explicam em si ou por si próprios, mas sim, pela base anterior,
qual seja: as interações e transformações de matéria energia que estão a preencher o
espaço-tempo do universo ou cosmo desde seu início e que em dado momento no
espaço-tempo da Terra produziu as condições materiais físico-químicas para a existência
da vida: componentes e processos vitais, a produção gradativa e incessante de múltiplos
e complexos sistemas (não vivos e vivos) integrados por suas relações de
interdependência - os ecossistemas, todos articulados no ecossistema planetário, a
Biosfera.
De modo que ao estudar dado conteúdo de Ciências Naturais, isto é, seja um
componente abiótico ou biótico do ecossistema, não basta apenas descrevê-lo, mas
explicá-lo, isto é, colocá-lo no seu devido lugar, em espaço-tempo estrutural e funcional
ou do dinamismo da produção do universo em termos da explicação mais aproximada da
complexidade da totalidade ou realidade natural. De modo que o significado pedagógico-
didático de dado componente, abiótico ou biótico, não se completa por si próprio, mas ao
contrário, possibilita contribuir na compreensão de que o todo e as suas partes não são
explicados de forma fragmentada e por si própria, mas na unidade de suas origens e
desenvolvimentos interativos, com permanências e mudanças, ou seja, sua estrutura,
organização-desorganização e movimento só podem ser explicados por meio daquilo que
os formam e os movimentam: na concretude das interações e transformações de matéria
e energia, e não, já pronto e acabado.
Neste cenário, é oportuno diferenciar com algumas exemplificações as
transformações ou fenômenos físicos, químicos e biológicos para dar mais clareza do
objeto de estudo em questão: interações e transformações de matéria e energia, uma
vez que este objeto é ao mesmo tempo a categoria máxima, fundante e mais abstrata a
subordinar todos os conteúdos do ensino de Ciências Naturais, porquanto possibilita
explicar os recortes (partes) da totalidade de forma articulada, considerando que matéria
e energia em suas interações e transformações constituem a unidade de essência e
aparência do todo e das partes, da realidade natural na qual se assenta e se produz por
meio do trabalho a realidade humana, histórico-social que possibilita por meio da
educação escolar realizar a transposição desta unidade do conhecimento científico da
natureza ao contexto pedagógico-didático do ensino-aprendizagem de Ciências Naturais.
Assim, para efetivar a possibilidade de ascenso do abstrato ao concreto no
movimento do pensamento, ou da análise das partes ou recortes para transformá-la
gradativamente em síntese concreta, isto não significa necessariamente que temos que
partir do todo para as partes ou das partes ao todo, significa isto sim, que as partes ou
recortes da natureza, sejam os fatores abióticos: matéria inanimada ( água, solo, ar,
energia solar:luz, calor) ou os fatores bióticos : matéria viva (seres vivos) não podem ser
estudados todos ao mesmo tempo, porém, ao se estudar um deles e querer entendê-lo
isoladamente é estudá-lo em si mesmo, tal procedimento inviabiliza o entendimento mais
aproximado da totalidade ou sobre dado recorte da mesma, ou seja, as descrições de
suas propriedades, representações, fórmulas, categorizações desligadas do todo, não se
identificam com e como fundamentos explicativos , não são a mesma coisa e não levam
ou efetivam a compreensão da real significação da parte no todo e vice-versa.
Desta forma, não se pode explicar o todo, nem as partes, sem explicar como estas se articulam no todo. O que significa isto no contexto de relações e
transformações de matéria e energia, uma vez que as coisas ou componentes do
universo estão ligadas de forma direta ou indireta e se transformam reciprocamente? Se
considerarmos como parte do todo, por exemplo, dado componente, como a água ou o
solo, o ar, seres vivos, etc., o que vai explicar suas propriedades, descrições, leis,
categorizações, fórmulas, entre outros atributos, não são estes atributos em si, mas, os
fundamentos explicativos daquilo que os formam e os dinamizam. Se retomarmos que: o
que existe no universo é formado de matéria e energia, a diversidade e a complexidade
da matéria e energia como dos respectivos fenômenos envolvidos, estes somente podem
ser compreendidos quando explicados por meio do movimento de suas interações e
transformações.
Assim, para estudar dado conteúdo ou recorte da totalidade, como por exemplo, a
água, faz-se necessário os dados empíricos ou sensoriais mais imediatos por parte dos
alunos, porém, isto apenas não basta, é necessário também o trabalho com os conceitos
mais explicativos sobre as formas como a água interage com as outras partes (matéria e
energia), como se transforma e transforma a totalidade ou o recorte considerado.
Desta forma, o conhecimento mais claro de dado recorte da realidade (componente ou processo) não é dado apenas por meio da percepção empírica, imediata dos órgãos dos sentidos, mas, faz-se necessário um dispêndio de energia na forma de trabalho intelectual, com operações de análise, síntese, comparações, reflexões, etc., utilizando-se como meio para tal ou para a apropriação do conhecimento a linguagem científica que deve possibilitar neste contexto chegar ao real conteúdo ou essência do componente e do processo natural discernindo nele o que é essencial do que é secundário, ao necessário entendimento da totalidade, uma vez que esta é ao mesmo tempo processo e produto das interações e transformações de matéria e energia.
Objetivando-se que das interações (contato, choque, atração, repulsão,
deslocamento,...) da matéria e energia em tempos-espaço do cosmo em suas dimensões
macro e micro: visível-invisível, próximo-distantes, ou além do concreto-sensível, portanto,
ausentes; meios humanos técnicos teórico-práticos são elaborados para presentificar
cientificamente as transformações ou fenômenos como manifestações, atividades ou
processos dos componentes naturais que não podem ser entendidas apenas por
representações descritivas, mas com explicações científicas sobre o movimento das
interações e transformações físicas, químicas e biológicas da matéria e energia, pois os
componentes e processos naturais somente se concretizam em pensamento quando
metodologicamente separados e novamente ligados possibilitando a rearticulação do todo
em nível mais elaborado de compreensão e de possibilidade de ação, poder ou controle
sobre o mesmo no movimento de humanização ou desumanização - de transformação
das relações entre os seres humanos e a natureza.
As múltiplas interações e transformações de matéria e energia são classificadas
basicamente como físicas ou químicas, disto decorre, por conseguinte, delimitar o objeto
de estudo das ciências: física e química, ou seja, a física estuda as transformações ou
fenômenos físicos e a química estuda as transformações ou fenômenos químicos, o que
tem sido evidentemente uma forma bastante simplista de caracterizar seus objetos de
estudo em sua transposição para o saber escolar, entretanto, do ponto de vista do ensino
de ciências da natureza, no processo de iniciação científica do ensino fundamental,
categorizar se dada transformação é física ou química constitui-se numa etapa necessária
de aprendizagem. Contudo, é oportuno considerar que apenas a constatação não basta
ao entendimento mais aproximado de dado recorte da totalidade.
As transformações físicas se caracterizam por resultarem de interações de
matéria e energia, porém, não formam novos tipos de matéria ou substâncias; são
propriamente alterações de formas da matéria e da energia, quando submetidas em seu
movimento às variações de fatores, como: temperatura, pressão, forças (gravitacional,
eletromagnética, nuclear,...). Citem-se como exemplos de transformações ou fenômenos
físicos (genéricos e ou específicos): as mudanças de estados físicos da matéria, as
misturas, as transformações de energia, o deslocamento dos corpos, etc.
A água é um tipo de matéria ou substância que muda de estado físico (liquido,
sólido e gasoso), uma transformação ou fenômeno observado cotidianamente na natureza
ou em casa (geladeira-gelo, o vapor d’água que sai do bico da chaleira etc.) e da mesma
forma com outros tipos de substância.
Ainda, as transformações físicas são reversíveis, podem voltar ao seu estado
original; neste caso de transformações de estados físicos da água, basicamente a
interação é da matéria: água com a energia: o calor, proveniente de fonte natural (sol) ou
artificial, que em dada intensidade (temperatura) promove maior ou menor agitação ou
movimento de suas moléculas determinando as mudanças de estado físico.
Porém, a água estabelece outras interações com a matéria e energia e neste
movimento, a matéria água revela ou manifesta sua essência de forma mais clara e
completa. Assim, se considerarmos a água, uma substância - um tipo de matéria que
pode ser encontrado nos estados: sólido, líquido ou gasoso, que pode mudar de estado
físico, diferenciamos a água de outras substâncias: pela cor, cheiro, gosto, etc. e que
dissolve a maioria das substâncias, apresenta fórmula química H2O, apresenta-se como
água: doce, salgada, destilada; em movimento (queda) realiza trabalho (moinho) ou
represada em barragens e liberada, sua energia cinética se transforma em energia
elétrica nos geradores das usinas hidroelétricas.
Agora, se questionarmos o porquê e o como destas constatações ou descrições,
classificações sobre a água (ou outra parte ou componente natural), conclui-se que as
mesmas são formas de exposição do conteúdo que expressam a parte em si ou como
aparência e não em sua unidade com a essência, portanto, faz-se necessário ligar ou
situá-la no todo ou recorte da totalidade, onde necessariamente esta substância se
movimenta, pois não faz isso sozinha ou não é o que é isoladamente, depende de
interações para se movimentar e movimentar (outras substâncias, componentes) e para
transformar e se transformar e poder ser no caso compreendida e reconhecida como
água por suas propriedades que nela se manifestam devido às suas interações com
outros tipos de matéria e energia e fundamentalmente ao ser integrada nas relações entre
os seres humanos e a natureza por meio do trabalho-instrumento, produto e processo de
interação e transformação da natureza e dos próprios seres humanos.
Assim, no contexto do espaço-tempo da produção da existência humana, espera-
se que a necessidade-uso parcimonioso da água (ou de outros recursos naturais) direitos-
deveres de cada um e de todos tornem-se mais claros, responsáveis e socialmente
compreendidos, porquanto a quantidade e qualidade dos recursos naturais são limitadas
considerando o descompasso ou ritmo de consumo desenfreado - o consumismo do
produtivismo capitalista.
O uso da água como de qualquer outra substância ou componente natural pelos
seres vivos, em especial pelos seres humanos, está, diz-se, de acordo com as suas
propriedades, porém, isso significa dizer que as propriedades de dado tipo de matéria
decorrem de suas interações com outros tipos de matéria e energia. O uso pelos seres
vivos seja da água ou outro tipo de matéria ou energia para a satisfação de necessidades
biológicas e de necessidades outras produzidas pelos seres humanos decorrem, em
última análise, das interações e transformações de matéria e energia.
Desta forma, para além do saber que tudo no universo é formado de matéria e
energia e que estes componentes essenciais preenchem o espaço tempo do universo,
faz-se necessário reconhecer que os mesmos coexistem em movimento de constantes e
múltiplas formas de interações e transformações categorizadas para efeito de estudo,
como: físicas, químicas e biológicas.
As transformações químicas, diferentemente das transformações físicas,
resultam de interações material-energéticas que formam novas substâncias ou novos
tipos de matéria e que dificilmente voltam ao estado original ou reconstituem as
substâncias originais. Tome-se como exemplo a queima de materiais ou substâncias
combustíveis: papel, carvão, madeira, gasolina, álcool, gás de cozinha, etc., assim ao
queimar a matéria papel, resultam basicamente cinzas, gases e energia (luz, calor), de
modo que a queima ou combustão exemplifica ou é um tipo de transformação ou
fenômeno químico ou ainda é uma reação química, onde as substâncias originais ou
reagentes são: papel e gás oxigênio do ar e as substâncias resultantes ou produtos da
reação são: cinzas, gases, água e também energia na forma de luz e calor.
Por outro lado, do ponto de vista pedagógico-didático, ressalte-se que as
interações e transformações da matéria e energia categorizadas como físicas e ou
químicas ocorrem ou podem ocorrer simultaneamente no movimento dos componentes e
processos naturais, de modo que, as interações e transformações que ocorrem nos seres
vivos, ou em sistemas biológicos (células, tecidos, órgãos, etc.,), são ditas biológicas:
biofísicas e ou bioquímicas. Cite-se como exemplo a digestão dos alimentos, os alimentos
são tipos diferentes de matéria – resultantes de interações físico-químicas e biológicas
que interagindo agora com os órgãos e sucos do sistema digestório, sofrem
transformações tanto físicas como químicas. Assim, o conceito de digestão se torna mais
claro, pois não deixa de expressar o conjunto essencial de interações químicas e físicas
dos alimentos para que possam ser assimilados pelo organismo (células).
Do ponto de vista didático, sabe-se, por exemplo, que os alimentos são importantes
para a saúde, porém, como podemos entender que existem alunos que pensam que
muitos alimentos, como por exemplo, o feijão é produzido ou originado no supermercado
e não como parte: flor-fruto-semente de uma planta, ou seja, a condição de alienação é
tal, que atingida a esfera social, a natureza é sentida na esfera da animalidade ou do
prazer imediato, da satisfação de necessidades essenciais e artificiais de forma
inconsciente, onde consumismo e utilitarismo têm mesma identidade que mascaram a
realidade social como natural e vice-versa na medida em que a explicação ou reflexão
sobre as relações entre os seres humanos e destes com a natureza são coisas isoladas,
onde as interações e transformações não são categorias ou conteúdos essenciais que
devem ser investigados para explicar as contradições, crendices, superstições, para
superar o senso comum individual-social sobre o mundo natural e social, ou seja, os seres
humanos dependem da natureza (de suas forças, de suas leis, recursos naturais), pois de
suas interações por meio do trabalho com a natureza ocorrem as interações entre os
próprios seres humanos e as decorrentes e complexas relações sociais, porém, tudo isso,
em razão da razão de que foi e é possível apreender do conhecimento científico sobre as
leis ou forças da natureza como expressão de sua essencialidade – as interações e
transformações físicas, químicas e biológicas para produzir as suas condições de
existência, evidenciando-se contudo, e criticamente as formas de controle e usos sociais
contraditórios do avanço científico-tecnológico da contemporaneidade.
Assim, no contexto do produtivismo capitalista que inverteu os significados das
coisas em função dos lucros exorbitantes, do consumismo e da descartabilidade, o que
era necessário passou a ser supérfluo e o que era supérfluo deixou de sê-lo para ser
necessário. Uma realidade dá lugar a outra, embora, coexistam de modos diferenciados,
enquanto uma é valorizada e cultuada, a outra fica subsumida ou sem importância
quando o padrão de produção e consumo em suas interações e transformações deixaram
de ser sentidas apenas no estômago e mais na possibilidade de adquirir o necessário
supérfluo do que o supérfluo necessário, pois as necessidades do mercado se fazem
parecer como essenciais, como se correspondessem às da maioria dos seres humanos.
A natureza ou parte dela (feijões, etc.) não é pensada como parte dependente e
necessária à produção dos seres vivos, da existência humana; isto se apresenta como um
dos reflexos da carência de questionamentos sobre o trabalho pedagógico, focado no
utilitarismo ou generalizações postas a serviço da produção de necessidades para
satisfazer apenas o consumismo veiculado pela mídia em geral ou satisfazer as
necessidades de minorias ou de classes privilegiadas e não às reais necessidades
individuais e sociais, base para um desenvolvimento justo e igualitário.
Por outro lado, se os alunos trabalham tal conteúdo, tome-se o caso dos feijões,
sua origem (germinação) - ciclo vital e sua importância, ou melhor, como se pode
significar tal conteúdo, senão por meio de suas interações e transformações - suas
relações de interdependência. É possível representar sua ligação no processo de
historicização humano-social da natureza por meio das interações do feijão, que é matéria
e energia, com outras formas de matéria e energia (água, solo, ar, luz, calor) para
compreender melhor essa multiplicidade ou complexidade do “movimento” do feijão,
evidenciando o seu cultivo, uso, ou seja, as interações e transformações humanas sobre
o feijão; caso similar para outros componentes e fenômenos naturais.
Desta forma, é possível verificar que cada componente ou parte da natureza está
num contexto cujas raízes ou bases são as múltiplas interações e transformações de
matéria e energia, de modo que negligenciar as bases ou ignorá-las é no mínimo servir a
ideologia dominante como instrumento de reforço da alienação. Ou negar a desalienação
para atender interesses outros, para produzir outras necessidades que não atendem as
necessidades essenciais. De modo que no contexto atual do capitalismo é pertinente
questionar quais necessidades (materiais e espirituais) estamos verdadeiramente
atendendo como consumidores de bens materiais: matéria e energia e bens imateriais,
porém, inseparáveis dos anteriores como as idéias, crenças, o conhecimento, etc.
Desse questionamento é possível ter maior clareza sobre os conteúdos-forma das
práticas pedagógicas de ciências naturais do ensino fundamental que possa repensar e
reconduzi-los ao seu pertencimento e correspondência real nas e das práticas sociais. E
da mesma forma, questionar criticamente se os conteúdos escolares se constituem em
instrumentos que possam atender ou estimular o desenvolvimento de potencialidades
humanas necessárias a uma existência individual-social justa e solidária.
Do ponto de vista didático, para além das identificações ou constatações ou outras
formas de exposição do conhecimento científico que apenas descrevem dado objeto ou
fenômeno, ou se dadas transformações são físicas ou químicas ou ainda
caracteristicamente biológicas, faz-se necessário evidenciar as leis, princípios e conceitos
básicos de forma articulada que possam explicar a estrutura e funcionamento da
totalidade em seus componentes e processos naturais nos limites do conhecimento
científico atingido historicamente na contemporaneidade.
Portanto, os alunos precisam se apropriar de outro instrumento-contribuição do
processo ensino-aprendizagem de ciências naturais para a reflexão e ação crítica sobre
realidade natural e social que possibilite e disponibilize na forma de noções básicas os
fundamentos explicativos sobre como as partes ou componentes e processos naturais se
articulam na totalidade (natureza ou seu recorte). Os fundamentos explicativos são
categorias ou conceitos derivados dos componentes básicos do universo: matéria e
energia em suas interações e transformações que determinam e são determinadas em
seu próprio movimento, ou seja, em suas interações transformam e são transformadas
constantemente.
Considerando a Ciência como produção e produto humano, portanto, histórico-
social que possibilita explicar racionalmente a produção da realidade natural e social, tem-
se como objeto de estudo ou categoria fundante desta concepção de ensino-
aprendizagem de Ciências Naturais, as interações e transformações físicas, químicas e
biológicas, porque as identificações ou constatações da existência dos componentes e
processos naturais e as consequentes descrições são frequentes, porém, não bastam e
não se bastam para explicar dada totalidade. Carecem das articulações das partes ao
todo e vice-versa, ou seja, das interações e transformações dos componentes básicos ou
essenciais do universo, na multiplicidade de formas de interações e transformações:
físicas, químicas e biológicas que dão sentido à concretude da diversidade dos
componentes e fenômenos da realidade.
As várias formas de necessidades de sobrevivência da matéria viva (seres vivos)
são funções ligadas ou relacionadas como processos de intercâmbio ou troca de matéria
e energia, como por exemplo: a alimentação, a respiração, a digestão, reprodução,
locomoção, fotossíntese, entre outras.
Desta forma, os seres humanos, como seres vivos ou como matéria-energia-viva
pensante, desde os seus primórdios satisfaz e produz novas necessidades que direta ou
indiretamente estão ligadas às interações e transformações de matéria e energia. Uma
vez que as relações entre os seres humanos e a natureza são no fundo interações de
matéria e energia por meio do trabalho que não deixa de ser uma outra forma de energia,
direcionada por sua vez de forma intencional e cooperativa para produzir interações e
transformações da matéria e energia nos e dos recursos naturais ligadas às suas
condições de sobrevivência, o processo de humanização simultânea da natureza e dos
seres humanos.
Portanto estudar a natureza antes da existência dos seres humanos possibilitou
verificar e analisar o ritmo e as formas de interações e transformações da matéria e
energia neste espaço-tempo, porém, que não deixaram de existir com a presença do ser
humano, pois muitas interações e transformações foram incrementadas por meio do
trabalho humano na medida em que ele efetivou a passagem de uma consciência
instintiva para uma consciência racional; contribuiu significativamente na produção,
organização e funcionamento da matéria-energia-viva pensante, e ao mesmo tempo e
provavelmente produziu a forma mais avançada e complexa de manifestação do
movimento da matéria e energia, seu gradativo auto-conhecimento-explicação por meio
do pensamento abstrato e de linguagens que corroboraram em representações
inteligíveis, cognoscientes a sua materialização. Porquanto é oportuno pensar que se a
própria natureza é pródiga e parcimoniosa por conta de sua fragilidade em resistir e
regenerar-se no uso multiforme de sua matéria-prima: matéria e energia, como pensar
que não produzisse, elevasse e efetivasse formas de sua própria auto-consciência, como
o processo de humanização e ou desumanização da natureza e dos próprios seres
humanos.
É o trabalho, instrumento e produto de interações e transformações humanas
diferenciadas, que sob o direcionamento do conhecimento científico-tecnológico intervêm
e controlam gradativamente as interações e transformações naturais (matéria e energia) e
históricas, pois na sociedade capitalista se permite também o controle irrestrito sobre as
relações sociais capitalistas de produção e consumo de bens materiais e imateriais, um
processo que nos seus limites possibilita a humanização, mas que simultaneamente
desumaniza a natureza e os seres humanos.
As interações dos seres humanos entre si e com a natureza por meio do trabalho
permitiram e permitem usar e conhecer ou conhecer e usar a matéria e a energia em suas
interações e transformações de modo a possibilitar a realização de atividades
caracteristicamente humanas, como: cozinhar os alimentos, produzir instrumentos-
ferramentas de trabalho, derrubar florestas, produzir vestuário, arar o solo, cultivar
plantas, domesticar e criar animais, construir habitações, cidades, embarcações para
viajar nos oceanos e no céu, armamentos que podem levá-los a autodestruição, a
destruição da vida como um todo.
Tudo isso por que ao defrontar-se com a natureza e tendo a possibilidade de, ao
produzir instintivamente suas condições de existência, passar gradativamente a produzi-
las conscientemente, suas ações passam a ser idealizadas a determinados fins, verificam
sua dependência das coisas da natureza (matéria e energia) que lhes oferecem níveis
diferenciados de resistência para serem controladas e usadas. A matéria e a energia
estão dadas naturalmente, porém, não estão disponíveis de imediato ou em formas
compatíveis com as necessidades essenciais e novas necessidades que vão sendo
produzidas gradativamente como conseqüência do conhecimento teórico-prático
produzido, acumulado, modificado e transmitido ao longo das gerações.
Assim, o trabalho, como atividade essencialmente prática, produtiva de bens
materiais se manifesta ao mesmo tempo também como atividade pensante, intencional
que pode ser planejado e modificado antes, durante e após a sua realização e por
decorrência possibilita a produção de bens imateriais, dentre eles, o conhecimento sobre
a realidade natural e social, de forma que fundamentalmente as relações entre os seres
humanos como também deles com a natureza são mediadas por meio do trabalho, uma
forma direcionada de energia que é e possibilita por sua vez interagir e transformar os
diferentes tipos de matéria e energia segundo as necessidades ou fins estabelecidos nos
limites das formas de produção que os seres humanos têm historicamente produzido suas
vidas.
Portanto, para superar este tipo de ensino que não dá ao aluno o entendimento da
construção do conhecimento, faz-se necessário levá-lo a compreender gradativamente o
processo histórico onde se dá o desenvolvimento e elaboração dos conceitos científicos,
uma vez que estes são produzidos pelo ser humano, a partir de suas necessidades e ou
condições concretas de existência, isto é, de trabalho e de vida.
Neste sentido, o método histórico dialético é o ponto fundamental que sustenta e
define os parâmetros para o entendimento dos conteúdos trabalhados. Tais conteúdos da
ciência da natureza devem ser transpostos e inseridos no ensino de ciências, como os
fatos-fenômenos (leis, princípios, teorias) da natureza que não são totalmente subtraídos
de sua lógica natural, isto é, que se concretiza nas múltiplas e recíprocas interações de
matéria e energia, porém, esta deve ser inserida na lógica da prática social (condições de
trabalho e de vida dos seres humanos) para ser entendida e apropriada concretamente.
Neste contexto é oportuno ressaltar à priori que a ciência, o conhecimento científico
se desenvolveu e se desenvolve como uma produção humana, histórico-social,
decorrente e determinada pelas relações ou interações entre os seres humanos e a
natureza, mediadas pelo trabalho, atividade prática intencional de produção por sua vez
da própria existência humana.
Diante disso, faz-se necessário comparar a relação dos animais com a natureza da
relação dos seres humanos com a natureza, no sentido de destacar a forma de atuação
diferenciada dos animais e dos seres humanos sobre a mesma. Assim, as atividades dos
animais são biologicamente determinadas, por processos inintencionais, instintivos, não
planejados, adaptam-se à natureza, estão subordinadas às leis da natureza, as
modificações provocadas são lentas e pequenas. As ações transformadoras humanas
não são somente determinadas biologicamente, mas um processo intencional e planejado
de permanentes e recíprocas transformações, moldando a natureza às necessidades
humanas. Assim, o trabalho permite a produção da existência humana consciente em
pensamento-linguagem e ação, emancipando-a em grande parte das leis da natureza ou
de suas regularidades, ganhando nessa relação, significativa autonomia, a começar pela
maior destreza das mãos, dos sentidos, como órgãos naturais de trabalho e na extensão
destes com a criação de instrumentos, ferramentas, ferramentas-máquinas, reduzindo a
resistência da natureza, facilitando o trabalho porquanto menor o dispêndio de energia.
Assim, os conteúdos estão organizados em três eixos, para oportunizar a
apropriação do conteúdo numa perspectiva de totalidade, em espaços-tempo: Celeste:
produção do Universo, Terrestre: produção do ecossistema e Histórico-Social: produção
da existência humana. Assim, organiza-se de forma mais aproximada às noções sobre o
lugar (espaço) e momento (tempo) do movimento de interações e transformações de
matéria e energia como unidades na e da organização e funcionamento da totalidade e
das partes. Sendo assim os três eixos norteadores, subordinados ao objeto de estudo:
interações e transformações físicas, químicas e biológicas de matéria e energia em
espaços-tempo abaixo destacados e explicitados constituem o suporte metodológico
desta proposta de ensino.
Celeste: Produção do Universo;
Terrestre: Produção do Ecossistema;
Histórico Social: Produção da Existência Humana.
Nessa perspectiva os conteúdos vinculados aos três eixos devem ser
desenvolvidos de modo que ocorram interações conceituais no eixo e inter-eixos.
Eixos metodológicos
Os eixos metodológicos do processo ensino-aprendizagem de ciências naturais
devem direcionar a organização dos conteúdos-conceito e suas interações, na medida em
que o movimento da matéria e energia ocorre em tempos-espaço (celeste, terrestre e
histórico-social) sempre diferenciados, consequentes de suas múltiplas e complexas
interações e transformações: físicas, químicas e biológicas, porém, possíveis de serem
apreendidas gradativa e racionalmente, e não como coisas estáticas e isoladas umas ao
lado das outras, que sempre existiram, existem e existirão.
A realidade concreta se apresenta formada por muitas coisas que captamos por
meio dos órgãos dos sentidos, na medida em que são estruturas adaptadas a receber os
vários estímulos material-energéticos e transformá-los de reflexos ou sensações em
percepções conscientes quando a atividade prática cooperativa necessária para
sobreviver, isto é, o trabalho, também como forma de energia estimulou no cérebro a
transformação da consciência instintiva em consciência racional desse e de outros
instrumentos, porém, e por meio dele, o trabalho, efetive simultânea e gradativamente a
produção da nossa existência em formas caracteristicamente humanas de interações e
transformações da realidade natural e histórico-social.
Espaço-tempo Terrestre: Produção do Ecossistema.
Falar da produção do ecossistema(s) somente é possível considerando-se a
origem da vida, diga-se, dos seres vivos, inicialmente como proto-células entre 3 a 4
bilhões de anos atrás como produto e processo de interações de matéria e energia em
condições espaços-temporais terrestres compatíveis, onde, primordialmente, sistemas
físico-químicos neles se transformaram e se transformam em partes ou componentes,
cuja existência se manifesta dinamicamente por meio de múltiplas e complexas relações
de interdependência.
Assim, um sistema (conjunto de partes articuladas) complexo, como é o caso dos
ecossistemas terrestres é constituído de matéria sem vida e de matéria viva, em outros
termos, um ecossistema é formado de componentes ou fatores abióticos, como: água,
solo, ar, energia solar, geotérmica e de componentes ou fatores bióticos: os seres vivos.
Assim, os conteúdos das ciências naturais deste eixo estão integrados na
totalidade das múltiplas relações de interdependência dos fatores abióticos e bióticos que
constituem o ecossistema e as interações entre os ecossistemas. Trata-se, portanto, em
função de sua abrangência de inter-relações, o eixo central e articulador das interações
conteúdos-conceitos com os outros dois eixos: produção do espaço-tempo celeste e
produção histórico-social da existência humana.
Objetiva-se neste movimento oportunizar aos alunos uma leitura mais clara do
dinamismo dos vários elementos que constituem os sistemas: físicos, químicos e
biológicos, tendo como pólo essencial e orientador a ação transformadora do ser humano
que interfere na natureza, humanizando-a e humanizando-se, isto é, dois amplos
processos que necessitam incorporar as leis da natureza acerca das interações e
transformações da matéria e energia (ciências da natureza) para transformarem-se
objetivamente pela mediação do trabalho em técnica e tecnologia, instrumentos que,
dependendo das formas como são utilizados socialmente, possibilitariam a superação dos
seres humanos do reino das necessidades para sobreviver (vivem para trabalhar) para o
reino da liberdade (trabalham para conviver).
Para se entender estas relações citadas, fazem-se necessário definir essa
totalidade, qual seja o ecossistema, pois desta forma pode-se compreender de forma
mais aproximada a dinâmica da natureza e sua inserção na realidade histórica social,
assim, um ecossistema é definido pelas inter-relações de dependência exercidas entre os
fatores abióticos: físicos (luminosidade, temperatura, ventos, umidade etc.,), químicos
(substâncias químicas presentes na água, no solo, no ar,) e fatores bióticos (seres vivos,
destacando o ser humano – sua significativa e diferenciada ação transformadora).
O entendimento do desenvolvimento da vida no planeta Terra, como em qualquer
micro-região que se analise, implica o conhecimento das relações que integram
dinamicamente os seus fatores abióticos e bióticos. Por exemplo, um lago é um
ecossistema quando considerado em sua totalidade, ou seja, um sistema (todo) formado
pela água, nutrientes, pressão, vento, luz, calor e todos os seres vivos nele contidos ou
que nele interferem. Não existe limite de tamanho para um ecossistema, pode-se,
portanto, representá-lo por um lago, uma floresta, um terreno baldio, um jardim, uma
cidade, um aquário auto-suficiente ou mesmo um terrário. Mas considere-se o maior
ecossistema, a Biosfera, proporcionalmente uma fina camada do planeta Terra onde há
possibilidade e condições para a manutenção e reprodução de seres vivos,
A Biosfera abriga uma biodiversidade significativa, porém, ressalte-se nesta
totalidade a presença do ser humano que deve ser analisada sobre duas dimensões em
interações: no plano biológico e no plano social que se processam de forma conjunta e
dinâmica. No plano biológico o ser humano como qualquer outro ser ou sistema vivo
depende da natureza, dos recursos naturais abióticos e bióticos, ou seja, a base material
e energética da natureza é indispensável à sua sobrevivência.
Por outro lado, no plano social, é por meio do trabalho (ação transformadora do ser
humano sobre a natureza) que se processa a intervenção na natureza, instrumento que
determina as interações e transformações do ecossistema.
Transformações estas que historicamente promoveram avanços econômicos,
políticos, sociais, científico-tecnológicos, representados pelo “progresso”, porém cujo
acesso é diferenciado, principalmente quando se foca a sociedade capitalista
contemporânea, onde os retrocessos são expressos numa profunda degradação social
(desemprego, fome, miséria,) e ambiental (poluição ambiental, efeito estufa, redução da
biodiversidade, esgotamento dos recursos naturais,) tudo isso em nome da lógica do
produtivismo-consumismo capitalista em sua corrida implacável atrás dos maiores lucros
do mercado globalizado. Quando se apregoa que tantos problemas seriam resolvidos pelo
desenvolvimento sustentável é imperioso questionar-se: para quem tal desenvolvimento é
sustentável? Na base ou lógica capitalista, sustentabilidade e competitividade significam
ecologizar o capitalismo ou criar um capitalismo “verde ou limpo”, coisas incompatíveis e
anti-democráticas que precisam ser refutadas da aceitação e justificação do senso
comum social inculcado por meio de certos ideo-ecologismos metafóricos.
A manutenção e ou transformações do modo de produzir sob as coordenadas do
capitalismo, transformam-se por sua vez em novas formas ou aparências da mesma
essência, ou seja, a exploração, que se mantém na dinâmica política de manutenção das
relações sociais de trabalho para a permanência da mercadoria.
Tal contradição que se expressa na crise da sociedade capitalista, e se mantém
até a contemporaneidade, se revela na sociedade atual que não sabe conceituar o ser
humano, porque, se não aprendeu ou é induzida a não aprender, fica mais difícil sua
organização e luta para concretizar o princípio da igualdade, que gestado idealmente
desde os primórdios do capitalismo, manifesta-se de forma contraditória na real, porém,
má distribuição da riqueza ou dos frutos desse processo coletivo de produção e consumo
de bens materiais e imateriais essencialmente necessários à existência dos seres
humanos - a riqueza da humanidade, se a isto se pode chamar de riqueza: direito ou
privilégio de uma minoria que aparente-inconsciente ou conscientemente não reconhece
ou não faz questão de reconhecê-la nestes termos, pois parece que privilégio e direito
pertence ou é de cada um e de todos ao mesmo tempo, e no transcorrer do tempo do
privilégio como direito e do direito como privilégio tudo é relativo e não carece de sentido
ou da necessidade de reflexões e ações críticas para transformar a aceitação individual-
social do incorrigível e passivo relativismo como possibilidade do confronto mais
aproximado com a verdade dos seus conteúdos.
Espaço-tempo Celeste: Produção do Universo.
O eixo acima proposto vem integrar como parte indissociável de um todo dinâmico
o encaminhamento metodológico do ensino-aprendizagem de ciências naturais na medida
em que, historicamente, a análise do processo de produção e produtos da existência
humana revela que os bens materiais necessários, as idéias, o conhecimento científico-
tecnológico, são as expressões das relações e atividades reais dos seres humanos, isto
é, daquilo que fazem, da sua maneira de viver, da forma como se relacionam com os
outros seres humanos, das suas próprias necessidades, cujo endereço na grandeza do
Universo é a Via Láctea e no Sistema Solar, o planeta Terra é ainda a nossa casa.
Segundo Hawking S e Molodinow L. (pág.16), “Os povos antigos tentaram com
afinco entender o Universo, mas eles ainda não tinham desenvolvido nossa matemática e
ciência. Hoje, temos ferramentas poderosas: ferramentas mentais como a matemática e
os métodos científicos, ferramentas tecnológicas como os computadores e os telescópios.
Com a ajuda dessas ferramentas os cientistas juntaram uma série de conhecimentos
sobre o espaço. Mas o que realmente sabemos sobre o Universo e como é que
sabemos? De onde veio o Universo? Para onde está indo? O Universo teve um início e,
em caso afirmativo, o que aconteceu antes disso? Qual a natureza do tempo? Ele algum
dia chegará a um fim? Poderemos voltar no tempo?”.
O avanço recente do conhecimento científico-tecnológico já sugere respostas a
algumas dessas questões antigas e reforçam o sentido de outras, como: quem somos
nós?, inseparável de: onde estamos? (No Universo, planeta: Terra, nossa “casa” no
sistema solar), e de: onde viemos? E para onde vamos? Somente na Terra existe vida?
Porém, no contexto da educação escolar que de certa forma negligencia ou
fragmenta tais conhecimentos-conteúdos, faz-se necessário integrá-los com esta
perspectiva, ou seja, o entendimento gradativo e crítico destes questionamentos no
movimento de humanização da natureza e ao mesmo tempo dos seres humanos
relacionados aos objetivos e finalidades dos mesmos, como linguagem, consciência e
prática dessa conscientização, inseridas na vida real da sociedade capitalista
contemporânea, onde investimentos de monta ocorrem neste campo específico, a
Astronomia. Como por exemplo: lançamento de foguetes e sondas espaciais não
tripuladas ou tripuladas, a instalação de satélites de telecomunicações conectados ao
lançamento de mísseis ou bombas teleguiadas, às previsões meteorológicas - na órbita
terrestre; estações espaciais internacionais tripuladas para pesquisas científico-
tecnológicas - de onde muitas descobertas materializaram-se em produtos e instrumentos
do nosso cotidiano.
A regularidade dos dias e noites, ou claro e escuro sempre condicionou todas as
atividades dos seres vivos na Terra. Contudo, passou muito tempo para que os seres
humanos percebessem o Sol como fonte geradora primária de energia (luz e calor), e
ainda passou mais tempo para tomarem conhecimento da presença da Lua e também das
estrelas, ou seja, a própria produção de sua existência e a consciência de existir e
coexistir natural e socialmente num lugar comparativamente ínfimo, porém, especial em
interações e transformações naturais apreendidas e criativamente transformadas por sua
vez pelo pensamento e trabalho humanos, num movimento crescente que personifica o
desenvolvimento humano na imensidão e grandeza espaço-temporal do Universo cujas
leis sobre sua gênese, estrutura e desenvolvimento estão sendo gradativamente
descobertas e transformando certas crenças e o senso comum social em conceitos
científicos que contribuem para explicar as “certezas” cotidianas ou mesmo afastar do
pensamento as aparências enganosas.
Assim, podem-se exemplificar neste contexto do senso comum, alguns conceitos
de astronomia: quem duvidaria que o Sol é menor que a Terra, ou que o Sol se
movimenta de um lado para o outro da Terra (de leste para o oeste), se diariamente
vemos o Sol nascer, percorrer o céu e se pôr?
Porém, a astronomia demonstra que o Sol é muitas vezes maior que a Terra e,
passaram-se cerca de treze séculos para que o sistema geocêntrico (a Terra: centro do
sistema solar) fosse colocado em dúvida, estava por iniciar a grande “noite” medieval que
só perceberia os primeiros clarões do Renascimento (séc.XV) de algumas idéias de
pensadores gregos da antiguidade, como Aristarco, que propusera um sistema ou modelo
com o Sol no centro: heliocentrismo. Basicamente a Terra seria o centro apenas da Lua e
tanto o movimento diário do céu como o movimento anual do Sol sobre o céu é aparente
e resultam dos movimentos da Terra (translação, rotação).
Defender as idéias do heliocentrismo custou a vida de muitos pensadores e
filósofos por serem hereges e subversivos à ordem estabelecida e, principalmente, à
religião.
Por que durante muito tempo o ser humano pensou estar e ser o centro do
universo? Durante muito tempo o ser humano olha para o céu achando que se movia, a
contradição dessa “certeza” cotidiana se parece com a de quem está dentro de um trem
em movimento, olhando a paisagem através da janela que parece estar em movimento
para trás. Foi necessário muito tempo, muita luta para substituir idéias e preconceitos que
hoje parecem óbvios para provar que não era o céu (paisagem, no caso do trem), mas
sim a Terra, (“o trem”) que se move.
O Sol forçosamente chamou a atenção do ser humano primeiramente em função
da necessidade de se proteger do calor na sombra das árvores ou se expor ao Sol nos
dias de frio, são algumas razões que se somaram ao forte condicionamento do ciclo dia e
noite.
Por outro lado, é manifesto que o homem pré-histórico voltou seu olhar para o céu
noturno, e deve tê-lo feito ao mesmo tempo com espanto e curiosidade. Os argumentos
elencados por Ronan (1987, p.19), nos evidenciam que a aparência inconstante do céu
era algo que certamente cativava a mente e a imaginação do ser humano pré-histórico:
“O lento e majestoso movimento do céu durante a noite, conduzindo as estrelas de
um lado a outro do horizonte, era uma visão extraordinária. Da mesma forma, o
movimento da Lua, que apenas não levantava e se punha como as estrelas, mas
também mudava de forma, crescendo de uma fina linha no princípio do mês até se
tornar um grande globo no céu, e depois minguar outra vez. Era também um medidor
de tempo quase ideal, pois levava apenas vinte e nove dias e meio para completar seu
ciclo de fases. Todos os calendários primitivos eram baseados na Lua.”
O nosso mês é uma “Lua”, ou seja, aproximadamente o tempo para que a Lua dê
uma volta completa ao redor da Terra, tomando por referência o Sol, sendo assim, o mês
é o número de dias inteiros mais próximos do período entre duas Luas cheias ou entre
duas Luas novas.
De fato, essas reflexões nos levam a perceber que o ser humano, desde a pré-
história, vem observando que, na natureza diferentes situações ou fenômenos
apresentam características cíclicas. Ou seja, as plantas, num determinado tempo,
produzem frutos, as folhas em decorrência das condições climáticas caem e, em outro
momento ressurgem assim como as flores novamente se transformam em frutos; os
animais se acasalam ou migram em determinados períodos do ano, identificando-se
assim certa ordem na natureza. No entanto, é preciso salientar que tais manifestações
dos seres vivos são na verdade adaptações dos mesmos às regularidades ou leis espaço-
temporal da natureza para sobreviverem.
Nesse contexto, faz-se necessário ratificar que a astronomia, como ciência da
representação dos astros, teve seu desenvolvimento no antigo Egito, na Babilônia, mais
especificamente entre os Caldeus. Os antigos pergaminhos nos mostram que eles, muitos
séculos antes de Cristo, já haviam formulado algumas idéias sobre o movimento de
alguns dos nossos planetas e, dentre eles destacamos: Mercúrio, Vênus, Marte, Júpiter e
Saturno, uma vez que, são possíveis de serem observados a olho nu; como também já
haviam identificado as constelações mais importantes. No entanto, é pertinente, devido às
circunstâncias históricas, frisar que foram os gregos os primeiros a dar forma científica a
essas observações e registros.
Assim, ao se observar a evolução do conhecimento científico relativo às
observações astronômicas, pode-se considerar estas observações dos astros-astronomia,
como a Ciência mais antiga da humanidade. De fato, esses conhecimentos,
historicamente registrados pelos seres humanos, constituem a base para o
desenvolvimento de noções de tempo e distância. Diante dessa constatação, fica evidente
que esses conhecimentos estavam diretamente relacionados ao seu cotidiano de
existência e os seres humanos os utilizaram para registrar as estações do ano, localizar o
lugar da sua moradia, elaborar calendários e até mesmo delinear o curso de navios, por
meio das estrelas.
Assim, quando se afirma que os dois componentes básicos do universo são a
matéria e energia e que dos seus processos de interações resultam os fenômenos ou
transformações dos mesmos, isto são expressões ou representações básicas das leis que
regem o universo que podem ser transpostas e gradativamente trabalhadas como parte
do processo de alfabetização científico-tecnológica, como também é básico reforçar que
não se pode ter ainda hoje uma cosmo-visão de Universo inalterado que poderia ter
existido desde sempre, e que poderia existir para sempre, mas uma concepção de
universo dinâmico, em expansão, onde matéria e energia coexistem preenchendo e
modificando reciprocamente o espaço-tempo num movimento incessante.
Espaço-tempo Histórico-social: Produção da Existência Humana
Neste contexto é oportuno ressaltar à priori que a ciência, o conhecimento científico
se desenvolveu e se desenvolve como produção humana, histórico-social, decorrente e
determinada pelas relações de interações e transformações entre os seres humanos e a
natureza, mediadas pelo trabalho, atividade prática e intencional de produção da própria
existência humana.
Portanto, o conhecimento científico da natureza estabelece uma relação histórica,
real, com os seres humanos na medida em que estão a seu serviço justamente por meio
das ferramentas, ferramentas-máquinas, enfim e progressivamente da indústria em geral.
Segundo Marx, não existe um fundamento para a indústria e outro diferente para a ciência
da natureza, isto é, não se trata de dois mundos; um prático e outro meramente
contemplativo. As ciências da natureza influem praticamente na vida humana por meio da
indústria e, como no caso da práxis material produtiva, apresentam uma dupla face:
humanizam o ser humano (o emancipam) e o desumanizam (vem completar sua
alienação).
Assim, as ciências da natureza, por estarem a serviço dos seres humanos, por sua
influência prática na vida humana e sua contribuição para a emancipação humana,
passam a ter um caráter antropológico. Contudo, com o avanço considerável do
conhecimento científico-tecnológico por meio da indústria contemporânea têm
humanizado em alto grau a natureza, permanece a divisão entre as ciências naturais e
antropológicas, isto é, contradiz seu caráter antropológico comum.
Em outras palavras, o modo de produção e organização capitalista produz também
a alienação do ser humano em relação à natureza, e por consequência, longe de ser um
meio de afirmação e objetivação de suas forças essenciais, é para o homem – como para
os animais – um simples meio de sobrevivência, algo estranho ou alheio.
Por conseguinte, o que deve ser questionado não são o domínio e controle da
natureza pelo seu conhecimento científico e tecnológico em si, mas a forma como o modo
de produção capitalista o faz contraditoriamente, ou seja, dominando e controlando a
natureza e a maioria dos seres humanos promovendo a desumanização da natureza (lixo,
poluição, efeito estufa, esgotamento dos recursos naturais, etc.), e a desumanização
social (fome, miséria,..., o não acesso à produção de bens materiais e culturais), enfim, a
degradação da saúde humana e ambiental. Tudo isto, quando o avanço do conhecimento
científico tecnológico já possibilitou a satisfação das necessidades básicas da produção e
reprodução da existência humana de forma justa e igualitária, como também mostra que a
finitude dos recursos naturais é incompatível com o produtivismo capitalista que naturaliza
as leis históricas sociais desta sociedade como ideologia da competência objetivada na
competitividade, uma sociedade que deve ser dirigida e comandada pelos que sabem
(competentes) e os demais que não sabem, devendo executar as tarefas que lhes são
ordenadas.
Diante do exposto anteriormente, faz-se necessário evidenciar que a ciência
contemporânea da natureza não se contenta em conhecer as coisas, fenômenos, mas os
constrói artificialmente e aplica seus resultados ao mundo físico, químico, biológico,
psíquico, social, político, histórico dos seres humanos. Pode-se exemplificar que a
organização do processo de trabalho nas indústrias apresenta-se como científica porque
é baseada em conceitos da física, da química, da biologia, da psicologia, da sociologia, da
economia que permitem dominar e controlar o trabalho humano sob todos os aspectos,
isto é, um controle sobre o corpo e o espírito dos trabalhadores, a fim de que a
produtividade, lucros e acumulação do capital, sejam os maiores possíveis.
Sobre a não neutralidade da ciência, é imprescindível colocar que na medida em
que a ciência vai deixando de ser uma forma de acesso aos conhecimentos verdadeiros,
para tornar-se um instrumento de dominação, poder e exploração, para que não seja
percebida como tal a classe dominante mascara tal realidade usando uma ideologia e
mitologia cientificista, ou seja, usa essa imagem idealizada para consolidar a da
neutralidade científica, a idéia que o único compromisso da ciência é o conhecimento
verdadeiro e desinteressado e a solução correta de nossos problemas práticos, técnicos.
Tal ideologia é veiculada pelos meios de comunicação de massa, escolas-práticas
pedagógicas, livros didáticos etc., de modo que o senso comum social vê a ciência
desligada do contexto das condições de sua realização e de suas finalidades.
Outra característica não menos importante da ciência é ser usada como um agente
econômico e político, ou seja, parte integrante das atividades econômicas e políticas, de
modo que, a automação, a informatização, a telecomunicação determinam formas de
poder econômico, modos de organizar o trabalho industrial e os serviços, criam profissões
e ocupações novas, destroem profissões e ocupações antigas, controlam a velocidade na
produção de mercadorias, sua distribuição e consumo, modificando padrões industriais,
comerciais e estilos de vida, com a finalidade da produção capitalista: o acúmulo do
capital, o maior lucro possível, a manutenção da propriedade e meios privados de
produção, a eternização da hegemonia da classe dominante.
A produção da existência humana está ligada direta ou indiretamente, como não
poderia deixar de sê-lo, à realidade natural e à realidade histórica social, isto é, como um
processo que possibilita a satisfação de necessidades sociais essenciais (água, comida,
habitação, vestuário, etc.,), que nunca deixaram por sua vez de estarem ligadas à
necessidade primeira ou necessidade das necessidades, qual seja, o trabalho, a
necessidade para satisfazer outras necessidades, como também para produzir novas
necessidades no processo amplo de desenvolvimento do ser individual-social humano.
Assim, pode-se dizer que a natureza é o objeto das ciências naturais, porém, não
uma natureza em si ou à margem da história, mas uma natureza integrada ou por
integrar-se no processo concomitante de humanização da natureza e dos próprios seres
humanos, determinado pela práxis material, produtiva e social, sendo o trabalho a ação
transformadora e mediadora destas relações, constituindo a unidade entre os seres
humanos e natureza, na medida em que a natureza é ser humano e o ser humano é
natureza diferenciada, pela mediação do trabalho.
Neste sentido, Marx diz que o ser humano é o objeto imediato das ciências
naturais, enquanto que a natureza é o objeto imediato do ser humano. Porém, faz-se
necessário ressaltar a distinção entre sujeito e objeto do conhecimento, no que se referem
à independência dos fatos-fenômenos reais, exteriores, penetrado progressivamente ao
longo da história, da prática, da ciência, e da filosofia em relação ao sujeito ativo cujas
imagens e idéias sobre a realidade (fato-fenômeno) constituem-se em representações dos
seus reflexos no pensamento, correspondem ao objetivo do desconhecido tornar-se
conhecido. Contudo, o ser humano no processo de conhecimento é “sujeito-objeto”, pois
age, transforma a natureza e a si próprio mediante o trabalho, um processo recíproco de
humanização.
Avaliação
A concepção de avaliação do processo ensino-aprendizagem de ciências naturais
está inserida e consubstanciada na perspectiva do materialismo histórico dialético como
concepção totalizante de sociedade e de ser humano. É inegável a contribuição da
avaliação como parte do processo, na medida em que permite diagnosticar os avanços e
possíveis correções antes, durante e após o trabalho pedagógico, para transformar
qualitativamente a apreensão do conhecimento científico-tecnológico das ciências da
natureza transposto para a educação escolar subordinado aos fundamentos teóricos da
apropriação reflexiva e crítica dos conteúdos historicamente produzidos no processo de
humanização recíproca da natureza e dos seres humanos, isto é, nas relações ser
humano-natureza e entre os seres humanos, mediadas pelo trabalho, atividade
cooperativa, diferenciada, prática e ponto de partida das transformações da natureza e
das condições de existência (vida) dos seres humanos.
Faz-se necessário ressaltar o quê, como e para quê avaliar, considerando a
iniciação científica como um momento do processo contínuo e mais amplo de
alfabetização científica e tecnológica ou iniciação científica, ou seja, de educação
científica que pode revelar sua importância e necessidade quando superar a alfabetização
“útil” porque adaptada à aceitação acrítica dos limites e ou contradições do modo de
organização e produção material e imaterial da existência humana na sociedade
capitalista contemporânea.
Avaliar o processo de alfabetização científica e tecnológica remete ao seu
objetivo, qual seja a compreensão da realidade natural e social em suas interações ou no
movimento de ação-reflexão-ação do sujeito social pautado no conhecimento científico de
seu objeto de estudo e encaminhamento metodológico (três eixos), não restrito ao senso
comum social, ou seja, faz-se necessário utilizar os conteúdos e seus respectivos
conceitos científicos integrados, na perspectiva da categoria fundante: interações e
transformações físicas, químicas e biológicas de matéria e energia em suas relações de
interdependência, uma vez que, os componentes materiais e energéticos da natureza são
inseparáveis em seu movimento, diga-se coexistem, de modo que a matéria não existe
sem energia e a energia não existe sem a matéria.
Assim, ressalte-se que o senso comum social é fonte-forma dos conceitos
espontâneos dos alunos, e estes devem ser revelados por problematizações ou
situações-problema para serem transformados com o estudo, reflexão e a mediação do
professor em conceitos científicos, que progressivamente sejam apropriados de forma
consciente e voluntária em sistemas conceituais, ou seja, recortes da totalidade natural
humanizada ou em processo de humanização como concreto pensado, em conceitos
articulados e em articulação, essenciais para o desenvolvimento conceitual e
conseqüente elevação do nível de consciência individual-social dos alunos.
O ser humano como parte da natureza e pela sua atuação diferenciada
(trabalho) em relação aos demais seres vivos, dela produziu certa autonomia pelo
conhecimento e descobertas sucessivas sobre suas forças e ou leis naturais, porém, foi
além, domina e controla a natureza, transformando o conhecimento científico em
instrumentos técnico-tecnológicos que por sua vez dominam e controlam os seres
humanos, em outras palavras, a ciência e tecnologia são transformadas em agentes de
crescente poder econômico e político na sociedade capitalista, logo não existe uma
ciência e tecnologia neutra, cujos interesses seriam apenas a busca do conhecimento
verdadeiro para resolver nossos problemas técnicos ou práticos.
Assim, o conhecimento científico é útil na medida em que é verdadeiro e, não o
contrário, verdadeiro por que é útil. Por trás dessa aparente utilidade paira o “invisível”
microcosmo ideológico dos interesses de eternização das leis do mundo capitalista que
envenenam o ambiente natural e social com o consumismo individual-social para ser feliz.
Não menos importante, é ratificar que a forma de produzir a existência humana
(condições de trabalho e de vida) na sociedade capitalista contemporânea não pode estar
dissociada dos conteúdos-forma do ensino de ciências naturais, uma vez que, o objeto
imediato que atende suas necessidades é a natureza, por outro lado, a forma de
produção, acesso, distribuição e consumo de bens não se concretizam com justiça social
e igualdade de condições, enfim, os valores estão desfocados do desenvolvimento das
potencialidades do “ser” humano, para o “ter” humano, como substituto inequívoco do ser,
que não é e não será nesta perspectiva de sociedade da mercadoria e alienação.
Nesta concepção, o trabalho pedagógico desenvolvido na escola sobre os
conteúdos de ciências naturais integrados e contextualizado na prática social é o texto no
contexto das interações recíprocas das práticas pedagógicas: professor-aluno, aluno-
aluno. Contexto onde o processo de avaliação se constitui em meio diagnóstico de dados
e informações sobre o processo mais amplo do ensino-aprendizagem de ciências
naturais, tanto para a reflexão-ação-reflexão do professor direcionando ou redirecionando
o seu trabalho como o dos alunos sobre seu desempenho.
Não menos importante, é destacar a necessidade do uso de várias formas de
avaliação, como: relatos orais, escritos (desenhos, cartazes, palavras, frases, pequenos
textos,), produzidos fundamentalmente em atividades experimentais (experimentação que
objetiva a passagem gradativa de operações com materiais ou objetos concretos,
sensíveis para operações com conceitos ou representações) ou relatos sobre filmes,
reportagens, leituras, visitas: parques, museus, estações de tratamento de água, de lixo,
construção de pequenos instrumentos, terrários, aquários, coleta de materiais,
investigação de determinadas situações-problema decorrentes do trabalho pedagógico
fundamentados nos conteúdos em questão, etc.
Desta forma, a avaliação deve se constituir em instrumento de diagnóstico do
processo ensino-aprendizagem focando a apropriação dos conteúdos-conceitos
científicos de ciências naturais como um processo contínuo de alfabetização científico-
tecnológica, onde a linguagem específica das ciências naturais possibilita e contribui para
a materialização gradativa do pensamento como representação oral, escrita dos objetos e
fenômenos da realidade natural e social em interações e transformações inseridas e
relacionadas na produção da existência humana, uma vez que, as ciências da natureza
decorrem do trabalho humano, portanto, uma produção prática, histórica e social.
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