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Textos Design Gráfico
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PRIMEIRO VOLUME
Pedro Reis
TÍTULO Primeiro Volume
PESQUISA Pedro Reis
DESIGN Pedro Reis
1a EDIÇÃO Abril, 2010
PUBLICAÇÃO U.Porto Editorial
MORADA Praça Gomes Teixeira 4099-002 Porto
SITE http://editorial.up.pt
EMAIL [email protected]
IMPRESSÃO Norcópia
TIRAGEM 1 exemplar
ANO 2010
PRIMEIROVOLUME
1ª edição
VINTE E DUAS DICAS ACERCA DE TIPOGRAFIA
52
DESIGN TRANSDISCIPLINARE COLABORAÇÃO
78
MODINHAS 88
O DESIGNER COMO AUTOR, EDITOR, PRODUTOR, ADMINISTRADOR,
EMPRESÁRIO 66
HISTÓRIA (MUITO ABREVIADA) DO DESIGN
94
LINGUAGEM & DESIGN 100
Alice Twemlow
Alice Twemlow
Mário Moura
Mário Moura
Enric Jardí
Mário Moura
ALGUNS PRINCÍPIOS ÚTEIS46
PARA QUE SERVE O DESIGN GRÁFICO?
14
ESTAR PRESENTE: TENDÊNCIASLOCAIS DO DESIGN GRÁFICO
22
PREFÁCIO11
OBEDECER ÀS REGRAS 32
ELEMENTARE TYPOGRAPHIE 40
INCOMPLETE MANIFESTOFOR GROUTH
58
Pedro Reis
Alice Twemlow
Alice Twemlow
Jan Tschichold
Jan Tschichold
Bruce Mau
Rob Carter
UM ANO ZERO PARA O DESIGN 164
MÚSICA E DESIGN: ALGUNS CRUZAMENTOS
140
O ESTADO DO DESIGN: REFLEXÕES SOBRE TEORIA DO DESIGN EM PORTUGAL
148
DESIGN INCÓMODO 134
GATEWAYS 108
INFLUÊNCIAS E CONTINUIDADEDA OBRA DE SEBASTIÃO RODRIGUES
126
Andrew Howard
Aurelindo Jaime Ceia
Aurelindo Jaime Ceia
José Bártolo
Aurelindo Jaime Ceia
Heitor Alvelos
DINO DOS SANTOS220
FRANCISCO PROVIDÊNCIA226
ANDREW HOWARD200
A IMAGEM 172
O GESTO DE FOTOGRAFAR 180
A FOTOGRAFIA 190
ANDREW ASHTON 238
Vilem Flusser
Vilem Flusser
Vilem Flusser
José Bártolo
Alice Twemlow
Susana Correia
Autor desconhecido
PREFÁCIO
Compre este livro, se faz favor. Pegue nele e leve-o. Leve-o daqui para fora.
Não perca tempo com este prefácio. Quando chegar o fim do parágrafo,
pare de ler. Dirija-se à caixa. Não olhe para os outros livros. Nem pense
neles. Não digo que não haja livros melhores que o meu. Digo é que todos
os livros são bons. (...) Porquê perder tempo? Não tem mais que fazer?
Este livro já deveria estar comprado. Não compreendo a sua relutância.
Nem consigo prolongar indefinidamente o prefácio, à espera que se deci-
da. Não quer comprá-lo e levá-lo consigo para casa? Até quando resistirá?
Este tom cabotino e peremptório não o irrita? Não sou pago para escre-
ver prefácios. Ninguém ganha com os prefácios – nem eu, nem o editor,
nem o público. Miguel Esteves Cardoso ¶ Tal como diz Miguel Esteves
Cardoso “Não perca tempo com este prefácio.” Este prefácio está a ser
escrito por uma pessoa que não sabe escrever, que não percebe nada
de escrita bem escrita, e que não quer escrever, mas que embora gos-
tasse de saber escrever algo bem escrito. O melhor mesmo (conselho
de amigo) é passar à frente este bloco de texto e passar para os seguin-
tes, esses sim com profundo interesse (espero eu) para quem está na
área do Design. ¶ Mas já que tenho mesmo de o escrever aproveito
então para apresentar o livro. Primeiro Volume é um livro que reúne
8
um leque de textos, escritos por prestigiadas figuras do design (e não
só), e que abrangem vários campos desta discplina, sendo o seu tema
capital Design e Identidade. ¶ Perder mais tempo para quê? O melhor
mesmo é virar a página. Passar para a parte que realmente interessa. O
livro já está apresentado, o tema que ele trata já é conhecido. Não sei
mais o que escrever. Se calhar é melhor mesmo ficar por aqui e passar
para a parte dos textos bem escritos, esses sim têm muito a ensinar.
¶ Bem, vou acabar com isto que já está na hora. Parece mentira, mas
não. Chegámos mesmo ao último parágrafo do primeiro (e espero sin-
ceramente que seja o último) prefácio que fui incumbido de escrever.
Acabei agora mesmo de perceber (alias, já sabia, apenas confirmei) que
o meu futuro não passará, para a sorte de muita gente, pela escrita. ¶
Finalmente o prefácio está feito. Não ocupa muitas páginas mas o que
foi dito foi sentido. O livro está acabado. Espero sinceramente, e esta
é a parte séria do prefácio, que gostem do livro, que vos seja útil e que
ajude. Espero que não seja mais um livro na estante. Espero que não
seja mais um livro para ocupar espaço.
Alice Twemlow
Podemos começar por analisar a questão em termos latos. O design
gráfico é um tipo de linguagem usada para comunicar. Usamo-la para
falar às pessoas sobre coisas que elas querem ou pensam que querem
ou que outra pessoa pensa que querem. Mas as coisas não tardam
em entrar numa espiral de complexidade. ¶ É uma questão interes-
sante mas, em última análise, bastante estranha. Podemos lançar na
conversa a expressão “de todo o modo” e a conversa pára abrupta-
mente, ou podemos tentar enumerar cada um dos elementos e efeitos
que são gerados pelo design gráfico, para acabarmos com um projec-
to de catálogo nas mãos, que mais parece saído de uma história de
Jorge Luís Borges. ¶ Poderíamos fazer uma listagem mais específica
de assuntos, por exemplo: serve para vender coisas e ideias para ga-
nhar dinheiro ou para ampliar agendas políticas. Mas, nesta altura,
podemos tomar consciência de que também serve para criticar esses
mesmos comportamentos. Serve para esclarecer as coisas – inclusive
para salvar vidas – mas também serve para enriquecer a nossa vida
quotidiana pela adição de camadas de complexidade, matiz e subtile-
za. Serve para ajudar as pessoas a orientarem-se e a compreenderem
dados, mas também para as ajudar a perderem-se em ideias novas,
PARA QUE SERVE O DESIGN GRÁFICO?
Alice Twemlow
14
narrativas fantásticas ou paisagens e para questionar e contestar as
informações que são apresentadas. O design gráfico está enredado em
todos os aspectos da vida social. Desde os sinais que mandam parar
os condutores das viaturas nos cruzamentos e da etiqueta com os da-
dos nutricionais que mostram claramente ao consumidor a quantidade
de colesterol contido em determinados alimentos até à sequência de
título que capta graficamente a atmosfera e os temas de um filme para
acelerar a suspensão da crença do espectador – é a pura diversidade e
penetração dos produtos e resultados do design gráfico – bem como
as suas contradições inerentes – que resiste a que fiquem presos numa
lista para análise. ¶ A própria ideia de que o design tem um objectivo
ou serve para alguma coisa no contexto da sociedade no início do sé-
culo XXI é, em certa medida, anacrónica. Parece pertencer a uma era
em que a ideologia e as verdades fundamentais eram possíveis e em
que se proclamavam manifestos. Nas primeiras décadas do século XX,
muitos designers de toda a Europa e mais tarde dos Estados Unidos
abraçaram os princípios do modernismo. Sentiam que era sua obriga-
ção – o dever moral – colocar a força do design atrás do impulso para
o progresso social e político. Criaram sistemas de comunicação como
por exemplo os alfabetos Sans Serif de caixa baixa, na esperança de
que fossem universalmente compreendidos, melhorando, por isso, as
relações internacionais. Exprimiam-se usando uma linguagem gráfica
orientada para o futuro que incluía a fotomontagem, tipofotografias e
composição assimétrica, não pela atracção estética destes elementos
mas porque estas opções decorriam directamente de um espírito de
missão profundamente sentido. Os manifestos, os escritos e a obra
destes modernistas definiram um novo e duradouro papel para o de-
sign gráfico como medium cuja formação estava ligada às revoluções
políticas das primeiras décadas do século XX e como uma ferramenta,
15
cuja finalidade era o progresso social. ¶ Durante a Segunda Guerra
e o pós-guerra, o design gráfico na Europa e nos E.U.A., pelo menos,
tinha um papel claro e premeditado: proporcionar, em benefício dos
governos, design para propaganda, camuflagem e informação às for-
ças armadas e aos civis. Na Grã-Bretanha, muitos designers estiveram
envolvidos nos vários esforços da nação para reconstruir serviços pú-
blicos e melhorar a qualidade de vida. Tom Eckersley, por exemplo - de-
signer britânico de cartazes que desenhou mapas para a RAF durante
a Segunda Guerra – produziu, durante as décadas de 1940 e 1950, nu-
merosos cartazes para a promoção do bem-estar e da segurança dos
trabalhadores. F.H.K. Henrion, um designer alemão que emigrou para
a Grã-Bretanha em 1939, foi o autor de campanhas sobre a saúde e
o racionamento para o Ministério da Informação britânico. E Abram
Games, que mais tarde criaria identidades definidoras de uma era para
0 Festival da Grã-Bretanha e para a BBC, desenvolveu a sua capacida-
de como designer enquanto trabalhava para o Ministério da Guerra,
produzindo cartazes para o Auxiliary Training Service (ATS – “Serviço
de Treino de Auxiliares”). Entre os mais memoráveis desses cartazes
encontra-se Your Talk May Kill Your Comrades (“A Tua Conversa Pode
Matar Camaradas Teus”), que representa a transformação das palavras
de um soldado que saem em espiral da sua boca aberta para termina-
rem numa baioneta sangrenta que perfura os corpos de três outros sol-
dados seus camaradas. ¶ Nos E.U.A., Charles Coiner criou o símbolo da
Águia Azul para a National Recovery Administration (“Administração
da Recuperação Nacional”), a agência federal criada durante o man-
dato do presidente Franklin D. Roosevelt para incentivar a recupera-
ção industrial e combater o desemprego e, durante a Segunda Guerra,
criou cartazes através da Office of War Information (“Informação do
Ministério da Guerra”) destinados a aumentar a produtividade laboral
16
e incentivar as poupanças. Esta relação intima entre o design e as po-
líticas socialmente progressivas de governos, serviços públicos e ate
das principais empresas da época continuou ate muito depois do fim
da guerra. ¶ Na actual sociedade descentralizada, a responsabilidade
das mudanças sociais e do progresso passou, contudo, a recair sobre
os indivíduos e pequenos grupos, entidades sem intuitos lucrativos e
publicações. Por conseguinte, as mensagens são mais numerosas e
mais complexas. Como é evidente, muitos designers são politicamente
motivados e trabalham sob controlo para uma diversidade de causas
sociais, mas, como salientou o crítico de design Rick Poynor, “Os desig-
ners exprimem inevitavelmente os valores do seu tempo. E os valores
actuais não tratam essencialmente de responsabilidade social.” ¶ As
questões que preocupam os profissionais contemporâneos incluem:
manter uma distância desapaixonada e irónica do tema em análise; a
celebração de fenómenos como o quotidiano, a ambiguidade, a com-
plexidade e mesmo a ausência. Também é evidente o questionamento
espalhafatoso de um modelo de comunicação tradicionalmente reve-
renciado, no qual o designer assume a posição de autor, disseminador
ou gerador de mensagens, sendo a audiência um receptor ou um con-
sumidor passivo de mensagens. O objectivo do design gráfico e co-
municar com pessoas: audiências, espectadores, leitores, utilizadores,
receptores, visitantes, participantes, interagentes, actores, transeuntes,
experimentadores, elementos do público, comunidades, habitantes,
consumidores, assinantes e clientes. Deparamo-nos com design grá-
fico como grupos – pequenos, como comunidades locais ou grupos
com interesses especiais, ou grandes, como populações e consumido-
res globais. A extensão da interacção dos designers com estas pessoas
– as suas audiências – varia de forma impressionante. Alguns não dão a
menor importância à audiência e criam o design para si próprios. Uns
17
criam o design para outros designers. Alguns criam o design para ser-
vir a concepção que um cliente tem da audiência. Outros descobrem
por si próprios quem serão os destinatários do seu trabalho, o que
os atrai e por vezes vão mesmo buscar a sua fonte de inspiração e
incorporaram-na na obra.
Alice Twemlow
Numa era de globalização, um número crescente de designers está a
descobrir que ser-se de um local específico e fazer design do trabalho
que parece ter vindo de um local particular – mais do que de qualquer
lado e, em último caso, de nenhum sítio – nunca foi tão importante
como agora. ¶ Os designers actuais actuam numa economia orientada
globalmente. Uma vez que a globalização abre novos mercados, os de-
signers têm de estar com frequência na vanguarda, adaptando uma
marca ou um produto a várias novas culturas. Os clientes, colaborado-
res, impressores, programadores e audiências que contribuem para
uma parte de um design gráfico estão dispersos pelo Mundo e as reu-
niões presenciais entre eles são cada vez mais raras. O globalismo e o
designer global nómada foram abrangidos e apoiados pela cultura de
design contemporânea. A crença partilhada e que com um portátil de
titânio, uma ligação wi-fi e alguma bagagem Mandarina Duck, a prática
do design pode ser tão peripatético como você. Espalham-se novas
ideias pelas zonas intermédias das salas de espera dos aeroportos e
durante os voos de longo curso que incluem dois nasceres-do-sol eté-
reos Mais ainda, ligar-se as preocupações das pessoas de um modo
que ultrapasse o ambiente de trabalho concreto de cada um de nós e
ESTAR PRESENTE: TENDÊNCIAS LOCAIS DO DESIGN GRÁFICO
Alice Twemlow
22
essencial para a abertura de espírito que distingue o design a nível
mundial. É como se a comunidade de design tivesse finalmente atingi-
do as ambições universalistas do movimento International Tipography
Style do sec. XX. ¶ Muitos designers aceitaram bem as suas novas res-
ponsabilidades globais. Uma vez que a base dos clientes se dispersou,
abriram escritórios em diferentes fusos horários, penduraram relógios
sobre os balcões de recepção acertados para mostrar a hora actual em
Xangai, Cidade do Cabo e Buenos Aires, juntando expressões como
“alcance global” à descrição das suas agências. Vince Frost, por exem-
plo – o designer global consumado – tem estúdios de design em Lon-
dres e Sydney, e está neste momento a trabalhar com clientes em Lon-
dres, Beijing, Dubai e Hong-Kong. Dirige com sabedoria a revista
literária Zembla de Sydney, publicada em Londres e depois distribuída
globalmente. “Hoje pode estar-se em qualquer parte do mundo a fazer
design”, diz Frost. “Houve um tempo há poucos anos, em que grandes
companhias contratavam grandes empresas de design das suas pró-
prias cidades. Hoje, já não e assim. Aprenderam que organizações
mais pequenas são muito mais bem sucedidas e únicas no seu pensa-
mento e que, graças a boas ligações através do correio electrónico, não
é necessário estar-se no mesmo país do projecto.” ¶ Base, um estúdio
de design com sede originalmente em Bruxelas, tem agora escritórios
adicionais em Barcelona, Nova Iorque, Madrid e Paris. “Estou todos os
dias em contacto com trabalhos em diferentes partes do mundo atra-
vés do telefone ou iChat” diz Dimitri Jeurissen, socia de Berna. Jeuris-
sen consegue coordenar o resultado do intercâmbio dos cinco estú-
dios: “No fim do trabalho, nao se sabe quem fez o quê, uma vez que
todos deram a sua contribuição” refere. Jeurissen viaja bastante e o seu
trabalho é influenciado pelo que encontra nas viagens. ¶ Jeurissen, con-
tudo, também está consciente das conotações negativas da globalida-
23
de. Não gosta do facto de “Haver um certo tipo de loja ou hotel em que
não sabemos em que cidade nos encontramos”, e o website de Base
brinca com a situação, dizendo que a empresa planeia “Abrir um novo
estúdio algures no mundo a cada três minutos, à semelhança do
McDonalds.” ¶ O risco é que se o design se torna demasiado interna-
cional, acessível e adaptável, fica estéril e perde a especificidade e as
referências locais que permitem saber que ele e de um local específico.
Rudy Vanderlans, co-fundador, produtor e editor da Revista Emigre,
considera que o facto de muito do design gráfico existente parecer des-
ligado do que o rodeia é “um empobrecimento da cultura.” E acrescen-
ta “Gosto muito quando alguém consegue adaptar-se ao ambiente que
o rodeia. Hoje, a força da globalização é tanta, levando tudo a parecer
o mesmo em todo o lado, que penso ser responsabilidade de todos,
incluindo os designers, salientar e manter as nossas respectivas carac-
terísticas culturais. Os designers podem faze-lo através do seu trabalho,
procurando inspiração em fontes que lhes são próximas.” ¶ Também
desiludido com o design que é “generico, desenraizado e redutor” está
a designer e educadora Denise Gonzales Crisp. Diz ela: “Neste preciso
momento, o design está a espelhar-se, neutralizando sementes, por
todo o mundo, como missionários promíscuos. Mas ao contrário dos
missionários, de cujas crenças podemos ter alguma percepção, a lin-
guagem do design dominante parece não ter princípios nem politica. E,
numa palavra, “globaliciosa”. O designer gráfico, designer de tipos e ti-
pógrafo Jonathan Barnbrook resume o que sente sobre o assunto com a
palavra “globalinização” e exprime visualmente a ideia através de uma
série de trabalhos que criticam o alcance penetrante das multinacionais.
Numa análise mais pormenorizada, descobre-se, por exemplo, que uma
série de mandalas tibetanas de oração é construída a partir da incorpora-
ção de milhares de minúsculos logótipos. ¶ À luz do que foi dito, um
24
número crescente de designers está a descobrir a importância da liga-
ção a um local e a uma região, para efeitos de identidade e como fonte
de inspiração, como forma de ligação aos consumidores que se sen-
tem alienados e desligados pela sua experiência com a sociedade glo-
balizada. Paula Scher, designer e sócia da Pentagram, por exemplo,
descreve a sua relação com a cidade e as ruas de Nova Iorque como
sendo “Intelectual, emocional e espiritual”. O seu gráfico ambiental
para os novos estúdios da 42nd Street, um edifício que integra espaços
para ensaios e um pequeno teatro, e os seus cartazes do Teatro Público
captam o nível de ruído visual e verbal da cidade, a sua configuração
em grelha e a inclinação vertiginosa dos seus arranha-céus. ¶ Também
ligado à estrutura e ruído da cidade – neste caso Berlim –, está o estú-
dio de estúdio de Cyan. Cyan, uma força bem estabelecida mas em
contínua inovação na comunidade de design de Berlim, foi fundado em
1992 por Daniela Haufe e Detlef Fiedler e centra-se quase em exclusivo
em encomendas culturais. Encontrar soluções criativas com orçamen-
tos baixos é um aspecto consistente do trabalho de Cyan, muito do qual
demonstra um manuseamento experiente da impressão a duas cores,
um legado anterior a 1989, altura em que o design era um indústria con-
trolada por Berlim Leste. O trabalho deles é vibrante, arrojado, até despo-
jado, e dialoga directamente com o (seu) ambiente urbano. Eles dizem
que são sensíveis às formas pelas quais o ruído e o caos do espaço edifi-
cado que os envolve se intrometem e influenciam o seu “espaço interior
edificado”. Nas suas palavras, “a partir do material existente à nossa
volta numa confusão informe, algo de novo aparece, de que o som e
parte integrante. Nunca nada foi construído silenciosamente.” ¶ O tipo
de letra Gotham, desenhado por Tobias Frere-Jones, foi escolhido para
inscrição na laje de vinte toneladas na esquina da Freedom Tower, o
edifício actualmente a ser erigido no local do World Trade Center em
25
Nova lorque. ¶ A escolha do Gotham para um edifício tão proeminente
representa o fecho de um círculo engenhoso, porque o Gotham foi ins-
pirado nas inscrições Sans Serif que se encontram em muitos edifícios
de escritórios de meados do século XX, e nas letras de néon usadas em
lojas de vinhos e parques de estacionamento de Nova Iorque. Neste
caso, aparece renovado e novamente contextualizado no símbolo mais
notório do orgulho cívico da cidade. O embrião do tipo de letra foi a
sinalização do terminal de autocarros Port Authority e, a fim de encon-
trar algumas fontes acessórias que ajudassem a preencher o conjunto
de caracteres, Frere-Jones centrou-se nas fachadas dos edifícios de es-
critórios do centro de Manhattan. “Neste processo, comecei a notar
algum outro material na rua, que embora não se relacionasse de todo
com o Gotham, merecia uma fotografia.” O material que começou a
fotografar era o que ele chama, “inscrições não-topográficas” (evitou
cuidadosamente usar a palavra “vernáculo”) e inclui tipos pintados à
mão, dourados e gravados. A sua colecção de inscrições de sinalização
das ruas de Nova Iorque ascende actualmente a cerca de 4.000. ¶ Do
ponto de vista do consumidor, há também um anseio por produtos que
sejam genuínos e locais - mesmo que estejam presentes em metade do
mundo e em última análise afastados do local. A ironia é que, quanto
mais conscientes estivermos de tudo o que acontece em todo o lado,
mais nos queremos ligar a alguma coisa, em algum lugar. A Base, por
exemplo, tem a seu cargo a direcção criativa de uma revista chamada
BEople, que se debruça sobre a cultura belga e, como tal, teria aparen-
temente o seu mercado definido em termos geográficos, “o nosso pon-
to de partida foi muito localizado”, relembra Jeurissen, “mas rapida-
mente estávamos a trabalhar com uma equipa internacional de
colaboradores. A seguir, e apesar do interesse cultural regional, havia
pessoas a compra-la em Nova Iorque e Tóquio.” ¶ Re-Magazine, revista
26
criada pelo designer holandês Jop van Bennekom, é outro exemplo des-
ta inesperada tendência. Apesar da especificidade e carácter regional
do seu conteúdo (edições inteiras dedicadas a indivíduos solteiros - os
hábitos alimentares de Marcel, um vendedor de 44 anos representante
da Wavrin, uma vila nos subúrbios de Lille; ou de Hester, uma mulher
deprimida de Londres) os seus leitores são definidos não por local,
mas sim por um conjunto de vários hábitos que transcendem a geogra-
fia. ¶ O nosso potencial de ligação a um nível transnacional, através de
conferências, competições, festivais, exposições, visitas de professora-
dos, publicações em linha e impressas, sites ftp e mensagens de texto
pode ser consumidor e desorientador. Num esforço para encontrar o
ponto central e, em última análise, a identidade, os leitores de publica-
ções como BEople ou Re-Magazine procuram ecos que sejam tanto
quanto possível locais, mesmo que venham do outro lado do mundo.
28
29
Rob Carter
#1 Para uma legibilidade máxima, escolha tipos clássicos e testados
ao longo do tempo, com um cadastro comprovado. ¶ Os designers
tipográficos experimentados podem, normalmente, contar os seus ti-
pos favoritos com os dedos de uma mão. Muitas vezes, tratam-se dos
tipos desenhados e reali zados com consistência entre os caracteres e
os que apresentam proporções de grande legibilidade. #2 Tenha o bom
senso de não utilizar demasiados tipos diferentes ao mesmo tempo.
¶ O principal objectivo de se utilizar mais do que um tipo é realçar ou
separar uma parte do texto de outra. Quando se utilizam demasiados
tipos, a página parece um circo e o leitor fica incapaz de distinguir o
que é e o que não é importante. #3 Evite combinar tipos que têm um
aspecto muito semelhante. ¶ Se a razão para se combinar tipos é real-
çar, é importante evitar a ambiguidade provocada pela combinação de
tipos demasiado idênticos em termos de aspecto. Quando isso acon-
tece, parece normalmente um erro, porque não há contraste suficiente
entre os tipos. #4 O texto em caixa alta atrasa muito a leitura. Utilize
caixa alta e baixa para obter a melhor legibilidade possível. ¶ As caixas
baixas proporcionam os sinais visuais necessários que tornam mais
legível um texto. Este facto deve-se à presença de hastes ascen dentes,
OBEDECER ÀS REGRASRob Carter
32
descendentes e padrões internos varia dos das caixas baixas. A utiliza-
ção de caixas altas e baixas é o modo mais comum de com posição
de um texto e a convenção a que os leitores estão mais acostumados.
Todavia, as caixas baixas podem ser utilizadas com muito êxito para o
tipo display. #5 Para tipos de texto, utilize tamanhos que, de acordo
com estudos de legibilidade, sejam mais legíveis. ¶ Estes tamanhos
variam normalmente entre 8 e 12 pontos (incluindo todos os pontos
entre aqueles) para um texto lido a uma distância média entre 30,5cm e
35,6cm. No entanto, é importante ter presente o facto de os tipos com
o mesmo tamanho poderem, na realidade, parecer diferentes, depen-
dendo da altura x das letras (a distância entre a linha da base e a linha
central). #6 Evite utilizar demasiados tamanhos e pesos diferentes de
tipos ao mesmo tempo. ¶ O número de tamanhos e pesos diferentes
corresponde à necessidade de estabelecer uma hierarquia clara entre
as diversas partes de informação. Josef Müller-Brockmann defende a
utilização de um máximo de dois tamanhos, um para os títulos e outro
para o texto. A contenção no número de tamanhos utilizados propor-
ciona páginas funcionais e atraentes. #7 Utilize tipos de texto com peso
para livro. Evite tipos com um aspecto demasiado pesado ou demasiado
leve. ¶ O peso dos tipos determina-se pela espessura das linhas das
letras. Os tipos de texto demasiado leves distinguem-se dificilmente dos
fundos. Relativamente aos tipos demasiado pesados, as contra-formas
diminuem de tamanho, tornando-os menos legíveis. Os pesos para livro
resultam num meio positivo e são ideais para o texto. #8 Utilize tipos de
largura média. Evite tipos que pareçam extremamente largos ou estrei-
tos. ¶ A distorção do texto para alargar ou estreitar as letras, alongan-
do-as ou encolhendo-as com um computador, impede o processo de
leitura. As proporções dessas letras deixam de ser familiares. As famí-
lias de tipos bem desenhadas incluem tipos condensados e prolonga-
33
dos que são englobados em normas proporcionais aceites. #9 Utilize
um espaceja mento consistente de letras e palavras de modo a conse-
guir uma textura sem interrupções. ¶ As letras devem fluir elegante e
naturalmente nas palavras e as palavras nas linhas. Isto significa que
o espacejamento de palavras deve aumentar proporcionalmente ao au-
mento do espacejamento de letras. #10 Utilize comprimentos de linha
adequados. As linhas demasiado curtas ou compridas prejudicam o
processo de leitura. ¶ Quando as linhas de tipo são demasiado compri-
das ou curtas, o processo de leitura toma-se enfadonho e aborrecido. À
medida que os olhos percorrem linhas demasiado compridas, é difícil
fazer a passagem para a linha seguinte. A leitura de linhas demasiado
curtas provoca movimentos sincopados dos olhos que cansam e abor-
recem o leitor. #11 Para tipo de texto, utilize um espacejamento entre
linhas que transporte facilmente os olhos de uma linha para outra. ¶ As
linhas de tipo com um espaço demasiado pequeno entre elas tornam o
processo de leitura mais lento; os olhos são obrigados a absorver várias
linhas ao mesmo tempo. Ao acrescentar-se entre um e quatro pontos
de espaço entre linhas de tipo – dependendo da natureza específica do
tipo – pode melhorar-se a legibilidade. #12 Para uma legibilidade máxima,
utilize alinha mento à esquerda e desalinhamento à direita. ¶ Embora
em casos especiais, sejam aceitáveis outros métodos de alinhamento
(alinhamento à direita, desalinhamento à esquerda, centrado e justifica-
do), a legibilidade perde sempre com a troca. #13 Procure terminações
consistentes e rítmicas. ¶ Evite terminações de linha que originem for-
mas estranhas e difíceis. Evite ainda terminações que provoquem um
padrão repetitivo e previsível para os fins das linhas. #14 Fique clara-
mente os parágrafos, não prejudicando a integridade e a consistência
visual do texto. ¶ Os dois meios mais comuns de se fazer a marcação
de parágrafos são o avanço e a introdução de espaço suplementar en-
34
tre eles. O primeiro parágrafo de uma coluna de texto não precisa de
ser avançado. #15 Sempre que possível, evite viúvas e órfãos. ¶ Uma
viúva é uma palavra ou uma linha muito curta no início ou no final de
um parágrafo. Um órfão é uma única sílaba no final de um parágrafo.
Estas duas condições devem ser evitadas sempre que possível porque
destroem a continuidade de blocos de texto, criam páginas desiguais
e interferem na concentração na leitura. #16 Realce os elementos no
texto com descrição e sem perturbar o fluxo da leitura. ¶ Nunca exceda
os limites. Recorra ao menor número de limites para obter os melhores
resultados. O objectivo último do realce dos elementos de um texto é
clarificar o conteúdo e distinguir partes de informações.
36
37
Jan Tschichold
Os dez mandamentos tipográficos de 1925, escritos por Jan Tschichold,
definiram em síntese os princípios da «nova tipografia» e do design
editorial do Funcionalismo. A seguinte tradução é a primeira publicada
em português.
#1 A nova tipografia tem cariz funcional (zweckbetont). #2 A função
de qualquer tipografia é a comunicação [disponibilizando os meios
que lhe são próprios]. A comunicação deve aparecer na forma mais
breve, simples e incisiva possível. #3 Para que a tipografia possa ser
meio de comunicação social, requer tanto a organização interna da sua
matéria-prima [ordenando os conteúdos] como a organização externa
[dos distintos meios da tipografia, em jogo uns com os outros]. #4 A
organização interna é limitada pelos meios elementares da tipografia:
letras, números, signos e barras da caixa de tipos ou da máquina de
composição. No mundo actual, voltado para o visual, a imagem exacta,
a fotografia, também pertence aos meios elementares da tipografia. ¶
A forma elementar da letra é a grotesca ou sem serifa, em todas as suas
variantes: fina, medium e negrito; desde a condensada até à expandida.
[...] Pode-se fazer uma grande economia usando exclusivamente letras
ELEMENTARE TYPOGRAPHIEJan Tschichold
40
minúsculas, eliminando todas as maiúsculas. ¶ A nossa escrita não
perde nada se for articulada só em caixa baixa; pelo contrário: torna-se
mais legível, mais fácil de aprender, mais económica. Para que há-de
um fonema, por exemplo o «a», ter duas representações – «a» e «A»?
¶ Para que devemos ter disponível o dobro dos caracteres necessários?
A melhor solução é: um som = um carácter. [...] A estrutura lógica do
texto impresso deve visualizar-se através do uso bem diferenciado dos
tamanhos e cortes dos tipos, e sem qualquer consideração por estéti-
cas previamentedefinidas. As áreas livres (não impressas) do papel são
elementos de comunicação de importância igual à das partes impres-
sas. #5 A organização externa (a macro-tipografia, diríamos hoje) é a
composição feita com os contrastes mais intensos [simultaneidade],
logrados através de formas, tamanhos e pesos diferenciados [os quais,
logicamente, devem corresponder à importância dos vários elementos
do conteúdo] e com a criação de relações/ tensões entre os valores
formais positivos [a cor da mancha de texto] e os valores negativos
[o papel branco]. #6 Um desenho elementar tipográfico consiste na
criação da relação lógica e visual entre as letras, as palavras e o texto
a serem compostos num layout, com a relação determinada pelas ca-
racterísticas específicas de cada trabalho. #7 Com o fim de incrementar
a incisão e o carácter sensacionalista da neue typographie, podem utili-
zar-se linhas (barras) de orientação vertical e diagonal, como meios de
organização interna. #8 A prática do diagramação elementar (elemen-
tare Gestaltung) exclui o uso de qualquer tipo de ornamento. O uso de
barras e de outras formas elementares inerentes [quadrados, círculos,
triângulos] deve estar convincentemente fundamentado na construção
geral. O uso decorativo, pseudo-artístico e especulativo destes elemen-
tos não está em consonância com a prática do «desenho elementar».
#9 A ordem dos elementos na nova tipografia deverá basear-se no futuro
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na estandardização do formato dos papéis segundo normas DIN (Deuts-
che Industrie Norm). Em particular, o DIN A4 [210 x 297 mm] deveria ser
o formato básico para papel de carta e outros impressos comerciais. #10
Quer na tipografia, quer em outros campos, o desenho elementar não
é absoluto ou definitivo. Certos elementos variam a partir de novas des-
cobertas, por exemplo, da fotografia; pelo que o conceito de «desenho
elementar» mudará necessária e continuamente.
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Jan Tschichold
Tschichold publicou em 1925 Elementare Typographie e em 1928, Die
Neue Typographie, textos que constituíram a principal base teórica da
chamada Nova Tipografia. A recusa do ornamento, o elogio da forma
simples e inovadora como resposta às necessidades dos leitores da-
quele tempo eram alguns dos seus postulados. A clareza deveria so-
brepor-se à beleza e nos seus escritos expunha a forma de aplicar este
princípio: pela assimetria, pelo dinamismo da composição, recusando
todas as grelhas rígidas e tradicionais, recusando os tipos serifados,
entre outras fórmulas. Mas, se por um lado estas obras marcaram os
movimentos modernistas do design gráfico como o Estilo Tipográfico
Internacional, por outro, revelaram-se tão dogmáticas quanto as regras
que contestavam. De tal forma que o próprio Tschichold reavaliou es-
ses princípios da Nova Tipografia como fundamentalistas, aproximan-
do-se, numa fase posterior, de uma forma conservadora baseada na
experiência: “A opinião de Tschichold mudou no sentido de que os de-
signers gráficos deveriam trabalhar dentro de uma tradição humanis-
ta, que continuasse os tempos e se alicerçasse nos conhecimentos e
realizações dos mestres tipógrafos do passado” (Meggs, 1998, p.323).
Tschichold é o primeiro a reconhecer as imperfeições da Nova Tipografia,
ALGUNS PRINCÍPIOS ÚTEISJan Tschichold
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tais como a utilização de tipos sem serifas em texto corrido. Nas suas
palavras, uma “genuína tortura” para o leitor. Assim, Tschichold mani-
festava-se contra as experiências tipográficas avant-garde mais excessi-
vas, defendendo as formas da tipografia confirmadas pela história.
#1 Não se deve espacejar minúsculas, nem com um conceito, nem em
casos excepcionais. #2 As maiúsculas devem sempre ser espacejadas
ligeiramente e o espaço entre letras deve ser compensado. Há que evi-
tar os espaços demasiado abertos e aqueles menores que um ponto e
meio. #3 O uso das versais deve ser limitado. #4 Um espacejamento
impecável é um indicador da qualidade de um trabalho de composi-
ção. #5 O número de tipos utilizados num trabalho, num anúncio ou
num folheto pequeno deve ser o menor possível. E devem bastar entre
três (ou inclusivamente dois) a corpos de letra. #6 Ao trabalhar com
palavras da mesma natureza, não podemos espacejar algumas e dei-
xar outras por espacejar. Todas devem figurar da mesma forma. #7 A
composição simétrica não deve misturar-se com a assimétrica. #8 A
composição assimétrica não é melhor que a simétrica; É simplesmente
diferente. #9 A composição deve estar organizada; três é o número
mais adequado para os grupos. #10 A disposição espacial de todas
as partes, sobretudo das linhas principais, é algo sobre o qual se deve
reflectir profundamente. #11 As proporções dos tipos de letra utilizados
devem ser belas e claras. #12 Deve-se concentrar no uso da letra base,
não devendo utilizar-se todos os tipos de letra possíveis num mesmo
trabalho. #13 No momento de misturar letras, deve encontrar-se um
contraste efectivo e conveniente e utilizar o menor número de letras
estranhas. #14 Uma segunda cor deve ser pouco frequente.
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