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Afonso Maria Pereira Alceu Zoia Benedito de Oliveira BernardeteAngelina Gatti Catarina Maria Garcia de Castro Elias Januário Graciela Constantino Helena F. Barros; Dáugima M. S. Queiroz & Clacy Zan José Manuel R. Calleja Josiane Magalhães Marcelo L. G. Beck; José A. S. Pontes Neto; Josiane Magalhães & Renata Lourenço Maria Fátima Castilho Maricelia Padilha da Costa Odimar J. Peripolli Lenita Maria Körbes Zonin Faculdade de Educação/ Unemat Unemat Editora ISSN 1679-4273

Profissionais da Educação - unemat.br · Josiane Magalhães Marcelo L. G. Beck ... revista teve como critério a ordem alfabética do nome dos autores. O pri- ... seu significado,

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

Afonso Maria PereiraAlceu Zoia

Benedito de OliveiraBernardete Angelina Gatti

Catarina Maria Garcia de CastroElias Januário

Graciela ConstantinoHelena F. Barros; Dáugima M. S. Queiroz & Clacy Zan

José Manuel R. CallejaJosiane Magalhães

Marcelo L. G. Beck; José A. S. Pontes Neto; Josiane Magalhães & Renata Lourenço

Maria Fátima CastilhoMaricelia Padilha da Costa

Odimar J. PeripolliLenita Maria Körbes Zonin

Faculdade de Educação/Unemat Unemat Editora

ISSN 1679-4273

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

Revista da Faculdade de Educação: Profissionais da Educação

Revista da Faculdade de Educação/ Unemat. Ano II n.2 /Jan-Jun.2004, Cáceres-MT

Conselho EditorialAfonso Maria Pereira - UNEMATAumeri Carlos Bampi - UNEMATBeleni Salete Grando - UNEMATEliane Siqueira de Medeiros Lázari - UNEMATIlma Ferreira Machado - UNEMATJosiane Magalhães - UNEMATMaria Aparecida Morgado - UFMTMaria Izete de Oliveira (Coordenadora) - UNEMATManoel Francisco de Vasconcelos Motta - UFMTTânia Maria Maciel Guimarães - UNEMAT

RevisãoMirami Gonçalves Sá dos Reis - UNEMAT

CapaGuilherme Angerames R. Vargas

Editor ResponsávelMarilda F. Dias Pereira

Projeto Gráfico, Editoração e DiagramaçãoEduardo Melo Zinhani - UNEMAT Design

Ficha Catalográfica elaborada pela Biblioteca Central da UnematISSN 1679-4273_________________________________________________________________Revista da Faculdade de Educação/Universidade do Estado de Mato Grosso. Profissionais da Educação. Coordenação de Maria Izete de Oliveira.Cáceres-MT:FAED/Unemat Editora, 2004. 244 p. Semestral (Jan-Jun-2004) - ano II - nº 2.

1. Educação 2. Profissionais da Educação 3. Escola I. Titulo

CDU: 37 (051)

______________________________________________________________________________

Índice para catálogo sistemático1.Educação - 37(051)2.Profissionais da Educação – 377.8 (051)

3.Escola – 37 (051)

Não é permitida a reprodução total ou parcial desta obra, por quaisquer meios, sem a prévia autorização por escrito da editora.

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

Faculdade de Educação/Unemat Unemat Editora

Afonso Maria PereiraAlceu Zoia

Benedito de OliveiraBernardete Angelina Gatti

Catarina Maria Garcia de CastroElias Januário

Graciela ConstantinoHelena F. Barros; Dáugima M. S. Queiroz & Clacy Zan

José Manuel R. CallejaJosiane Magalhães

Marcelo L. G. Beck; José A. S. Pontes Neto; Josiane Magalhães &Renata Lourenço

Maria Fátima CastilhoMaricelia Padilha da Costa

Odimar J. PeripolliLenita Maria Körbes Zonin

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

ReitorProf. Taisir Mahmudo Karim

Vice ReitorProf. Almir Arantes

Pró-Reitor de Pesquisa e Pós GraduaçãoProf. Laudemir Luiz Zart

Pró-Reitor de Ensino e GraduaçãoProf. Neodir Paulo Travessini

Pró-Reitora de Extensão e CulturaProfª. Solange Kimie Ikeda Castrillon

Pró-Reitor de Administração e FinançasProf. Wilbum de Andrade Cardoso

Pró Reitor de Planejamento eDesenvolvimento InstitucionalProf. Marcos Francisco Borges

Diretora da Faculdade de EducaçãoProfª. Maria do Horto Salles Tiellet

REVISTA DA FACULDADE DEEDUCAÇÃO

Profissionais da Educação

EndereçoFaculdade de EducaçãoAv. Tancredo Neves, 1095 Cavalhada IIICáceres/MT CEP: 78.200-000Fone: 65 221 0041Fax: 65 221 0036

Conselho EditorialMaria Izete de Oliveira (Coord.) - UNEMATAfonso Maria Pereira - UNEMATAumeri Carlos Bampi - UNEMATBeleni Salete Grando - UNEMATIlma Ferreira Machado - UNEMATJosiane Magalhães - UNEMATMaria Aparecida Morgado - UFMTManoel Francisco de V. Motta - UFMTTânia Maria Maciel Guimarães - UNEMAT

[email protected]

Unemat EditoraAv. Tancredo Neves, 1095 - CavalhadaCáceres-MT – CEP: 78.200-000Fone: 65 221 0034 – Fax: 65 221 0034edi tora@unemat .br / design@unemat .brww w.unemat .br

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

APRESENTAÇÃO ............................................................................ 07Maria do Horto Salles Tiellet

ARTIGOSCONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA DA FORMAÇÃO DEPROFESSORES DOS CURSOS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORESNO BRASIL ..................................................................................... 12Afonso Maria Pereira

POR UMA EDUCAÇÃO PARA O PENSAR......................................... 29Alceu Zoia

CONTRIBUIÇÕES PIAGETIANAS À PRÁTICA PEDAGÓGICA DO(A) PROFESSSOR(A) ................................................................. 46Benedito de Oliveira

CURSO DE PEDAGOGIA EM QUESTÃO: DA FORMAÇÃO DOSEDUCADORES................................................................................ 67Bernardete Angelina Gatti

FORMAÇÃO DE PROFESSORES PARA A EDUCAÇÃO DE JOVENS EADULTOS: O PAPEL DAS FACULDADES DE EDUCAÇÃO .................. 77Catarina Maria Garcia de Castro

FORMAÇÃO DE PROFESSORES ÍNDIOS NA UNIVERSIDADE:A EXPERIÊNCIA DO 3º GRAU INDÍGENA....................................... 94Elias Januário

A INFUÊNCIA DAS EXPERIÊNCIAS PROFISSIONALIZANTES DAESCOLA DE APLICAÇÃO NAS ESCOLHAS PROFISSIONAIS DESEUS ALUNOS, VISANDO A IMPLANTAÇÃO DE UM SERVIÇO DEORIENTAÇÃO PROFISSIONAL........................................................ 108Graciela Constantino

SUMÁRIO

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

INTER-RELAÇÕES ENTRE A CONCEPÇÃO DO PROCESSO DEDEMOCRATIZAÇÃO DO ENSINO E A PRÁTICA DOCENTE ............ 120Helena F. Barros; Dáugima M. S. Queiroz & Clacy Zan

OS PROFESSORES DIANTE DOS DESAFIOS DO TERCEIROMILÊNIO ........................................................................................ 132José Manuel R. Calleja

O PROCESSO EDUCACIONAL FORMAL E A CONSTRUÇÃO DOSOCIAL DETERMINANDO A CONSTRUÇÃO DA CONSCIÊNCIA..... 153Josiane Magalhães

OS PROFESSORES E A ATRIBUIÇÃO DE CAUSALIDADE AOSUCESSO E AO FRACASSO ESCOLAR .............................................. 165Marcelo L. G. Beck; José A. S. Pontes Neto; Josiane Magalhães &Renata Lourenço

A RESSIGNIFICAÇÃO DA DOCÊNCIA: O PERFIL DO EDUCADOR .. 188Maria Fátima Castilho

PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: DA UTOPIA ÀS POSSIBILIDADES.......... 208Odimar J. Peripolli

COMUNICAÇÕESREFLEXÕES SOBRE AS CONTRIBUIÇÕES DA EDUCAÇÃOAMBIENTAL ÀS CONCLUSÕES PROVISÓRIAS: PARA ALÉM DODISCURSO TEORICAMENTE SUSTENTADO.................................... 220Lenita Maria Körbes Zonin

RESENHAJUVENTUDE E CIDADES EDUCADORAS......................................... 231Maricelia Padilha da Costa

NORMAS PARA APRESENTAÇÃO DOS TEXTOS............................... 238

SOBRE OS AUTORES....................................................................... 241

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

Nesse número, a Revista da Faculdade de Educação, além de garantir o

cumprimento dos seus objetivos e das normas gerais da ABNT, busca aten-

der aos critérios de avaliação dos periódicos científicos e um maior rigor no

cumprimento dos critérios do QUALIS.

Reafirmando com o compromisso de publicação semestral a temática

Profissionais da Educação, escolhida para esse número, é atual, e os textos

selecionados, entre as várias contribuições intelectuais dos professores da

Instituição, representam ângulos diferentes que têm sido objeto de investi-

gação de uma parcela significativa dos pesquisadores brasileiros. Assim, jun-

tam-se a estes os pesquisadores da Universidade do Estado de Mato Grosso

que tratam do tema nos mais variados enfoques.

Na sessão dos Artigos são apresentados dez textos cuja disposição na

revista teve como critério a ordem alfabética do nome dos autores. O pri-

meiro texto denominado “Contribuição histórica da formação de professo-

res do curso de pedagogia no Brasil”, de Afonso Maria Pereira, trata de “[...]

uma breve contextualização histórica da Formação de Professores forma-

dos pelo Curso de Pedagogia no Brasil abordando a educação brasileira

desde o Brasil Colônia até os dias atuais. “

Na seqüência, o artigo “Por uma educação para o pensar”, de Alceu

Zoia, traz sua contribuição para o tema discutindo “[...] o papel da filosofia

na educação da criança e do jovem, desde o início da escolarização.”

O texto “Contribuições piagetianas à prática pedagógica do/a profes-

sor/a”, de Benedito de Oliveira, se propõe, a partir da análise das obras

pedagógicas de Jean Piaget, apontar os aspectos que podem contribuir para

com o “[...] trabalho dos professores, especialmente da Educação Básica”. E

APRESENTAÇÃO

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

aspectos importantes das ref lexões de Piaget “[..] para as discussões atuais

sobre formação de professores e avaliação do processo ensino-aprendiza-

gem.”

Catarina Maria Garcia Castro contribui com o artigo “Formação de

professores para a educação de jovens e adultos: o papel das Faculdades de

Educação”, onde discute “[...] o papel das Faculdades de Educação frente aos

novos desafios que a Educação de Jovens e Adultos – EJA, coloca às Institui-

ções de Ensino Superior”. Ainda nesse texto a autora destaca “[...] as ques-

tões sobre a reconfiguração da EJA, a partir dos desafios colocados aos siste-

mas de ensino e as Universidades, cujo primeiro caminho é superar a posi-

ção marginal dessa modalidade de educação nas escolas assim como no cur-

rículo dos cursos de pedagogia, e nas pesquisas acadêmicas.”

O texto “Formação de professores índios na Universidade”, de Elias

Januário, objetiva “[...] contextualizar o movimento dos professores indíge-

nas na luta pela formação continuada centrando-se na formação específica e

diferenciada em nível superior oferecida pela Universidade do estado de

mato Grosso”. Como também aborda “[...] aspectos estruturais da educação

escolar indígena específica e diferenciada e da formação em serviço,

enfatizando as dificuldades e os avanços advindos com a formação universi-

tária dos professores indígenas”.

O artigo “A inf luência das experiências profissionalizantes da escola

de Aplicação e Valorização Humana nas escolhas profissionais de seus alu-

nos, visando à implantação de um serviço de orientação profissional”, de

Graciela Constantino, discute a relação existente entre “[...] as práticas di-

ferenciadas e os modelos pedagógicos oferecidos por esta escola” e as influ-

ências de “[...] aspiração de qualidade de vida e as condições de igualdade de

competição no mercado de trabalho” dos egressos da Escola de Aplicação e

Valorização Humana/UNEMAT.

O texto “O processo educacional formal e a construção do social de-

terminando a construção da consciência”, de Josiane Magalhães, se propõe

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

a “[...] apresentar uma breve análise sobre a ritualização cotidiana que permeia

os ambientes educacionais” e “[...] demonstrar a intencionalidade advinda

das correlações históricas e políticas presentes nos ambientes criados pela

Educação Formal”.

Marcelo Luís Grassi Beck, juntamente com outros autores, escreve o

artigo denominado “Os professores e a atribuição de causalidade ao sucesso

e ao fracasso escolar”. Nele os autores discutem a teoria da atribuição como

um “[...] interessante corpo teórico para analisar-se as explicações causais

que as pessoas elaboram a respeito dos eventos, e de como essas atribuições

causais inf luenciam as expectativas futuras, o autoconceito e a auto – esti-

ma. Aplicada à esfera da educação e à atividade profissional docente, apre-

senta-se como uma importante ferramenta para o estudo e inferências na

motivação escolar”.

Maria Fátima Castilho contribui com o artigo “ A ressignificação da

docência: o perfil do educador” onde discute os processo de mudanças “[...]

aceleradas que atinge a todas as esferas econômicas, políticas e sociais [...]”.

E que estão a exigir “[...] respostas abrangentes e globais, porém rápidas

onde as interatividades ocupam lugar de destaque nas relações humanas”.

Segundo a autora é essa complexidade que aponta para “ [...] a necessidade

da reinvenção de novas estratégias para possibilitar uma educação diferen-

te, o que implica também dar ao conhecimento uma outra configuração e ao

educar um novo sentido.” O que supõe a “[...] necessidade de se reinventar a

escola e com ela um novo perfil de educador que se ressignifica ao

ressignificar a docência”

Odimar J. Peripolli apresenta o artigo denominado “Práticas pedagó-

gicas: da utopia às possibilidades” que trata de reflexões sobre a “[...] prática

pedagógica, seu significado, caminhos e proposta”.

A Revista tem recebido contribuições de profissionais de outras insti-

tuições. Nesse número destacamos a participação de Helena Faria Barros

(UCDB), Bernadete Angelina Gatti (PUC/SP) e José Manuel Ruiz Calleja da

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

Universidad de Pinar del Rio-Cuba. O que demonstra a busca pela qualidade,

pela ampliação dos espaços de abrangência e inserção, como também, de

intercâmbio com outras instituições e pesquisadores.

Helena Faria Barros e outros no artigo “Inter-relações entre a concep-

ção do processo da democratização do ensino e a prática docente” apresen-

tam o resultado da pesquisa que “[...] procurou apreender e analisar a natu-

reza das concepções de democratização de ensino subjacentes à prática

pedagógica, dos professores do ensino fundamental da rede pública (esta-

dual) de Campo Grande – MS”. A professora inferiu a partir das respostas

dadas que “[...] a maior parte dos professores reconhece a democratização

como um valor pelos benefícios que pôde proporcionar, mas reconhece,

igualmente, que o oferecimento de vagas é, apenas, o início desse processo

democrático.” E evidencia a seguinte contradição:”[...] por um lado aceita-se

e defende-se a democratização do ensino como um valor, cuja realização

deve ser buscada e por outro, a reprovação é aceita e legitimada com muita

segurança e convicção. Embora boa parte dos professores concorde que só

vagas não é algo suficiente, não há apontamentos consistentes sobre o que

será necessário fazer numa vivência democrática dentro da escola.”

Bernadete Angelina Gatti, no seu texto “Curso de pedagogia em ques-

tão da formação dos educadores”, propõe-se a discutir sobre “[...] o

surgimento do curso de Pedagogia no Brasil e suas múltiplas facetas que

com a implantação das habi l i tações na graduação acentua-se a

descaracterização da imagem do pedagogo e do sentido mais global de sua

formação.” Constatando a “[...] necessidade de definir um perfil profissional

com maior aprofundamento intelectual, capacidade de desenvolvimento de

novas formas de utilização dos conhecimentos, condições de rompimento

das barreiras na divisão de áreas de conhecimento e trabalho, com visão

mais profunda e mais clara quanto à complexidade em vários aspectos do

mundo do trabalho e da vida.”.

O artigo “Os professores diante dos desafios do terceiro milênio”, de

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

José Manuel Ruiz Calleja, apresenta “[...] uma análise fundamentalmente

metodológica, baseada nas atuais teorias pedagógicas e didáticas sobre as

funções dos professores, refletindo as características essenciais de sua atua-

ção e algumas alternativas de solução a respeito dos problemas detectados

neste contexto. Tratam-se alguns aspectos essenciais das atividades do pro-

fessor e os alunos no processo de ensino-aprendizagem, atendendo a suas

relações e em termos de sugestões gerais para o comportamento do profes-

sor, em cujos fundamentos são argumentadas as possibilidades práticas de

aplicação. Implícita na caracterização, aprecia-se uma visão analítica do pro-

cesso de formação escolar e do importante papel da didática, baseado num

modelo teórico que atende particularmente ao mesmo.”

E finalmente a contribuição de Lenita Maria Korbes Zonin, na sessão

reservada a Comunicações, com o texto “Reflexões sobre as contribuições

da educação ambiental às conclusões provisórias: para além do discurso

teoricamente sustentado” e na sessão Resenha o trabalho “Juventudes e Cida-

des educadoras” de Maricélia Padilha da Costa (UFMT).

Os enfoques do tema Profissionais da Educação, nos artigos que com-

põem o segundo número da Revista da Faculdade de Educação, demonstram

a sua complexidade ao mesmo tempo em que colaboram para a compreen-

são e ampliação dos estudos dos leitores.

É importante anunciar a inclusão no Conselho Editorial, a partir deste

número, dos professores doutores Afonso Maria Pereira, Aumeri Carlos Bampi,

Beleni Salete Grando, Ilma Ferreira Machado, Josiane Magalhães e Tatiane

Lebre Dias, fato que contribui para a consolidação do periódico.

Maria do Horto Salles Tiellet

Diretora da Faculdade de Educação

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA DA FORMAÇÃO DE

PROFESSORES DO CURSO DE PEDAGOGIA NO BRASIL1

Afonso Maria Pereira

RESUMO: Este texto propõe uma breve contextualização histórica da Formação deProfessores formados pelo Curso de Pedagogia no Brasil, abordando a educação brasileiradesde o Brasil Colônia até os dias atuais. Comentamos, também sobre a formação deprofessores no Brasil desde o início com os jesuítas e relatamos cada período políticobrasileiro. Enfocamos, ainda, a evolução da educação no Brasil e a formação dessesprofissionais.

PALAVRAS-CHAVE: Breve histórico da escola de formação de professores no Brasil.

ABSTRACT: This text proposes a brief historical conceptualization of Formation ofProfessors by Pedagogy courses in Brazil, making an approach since Brasil Colonia (whenBrazil was a colony) up to the present days. We also make comments about teachersgraduating in Brazil since the beginning with the Jesuits and report each political Brazilianperiod. In addition we focus the evolution of education in Brazil as well as the graduationof these professionals.

KEY WORDS: School history; formation of professors in Brazil;

Na época do Brasil Colônia, o sistema educacional brasileiro era regi-

do pelas mãos da Igreja, mais precisamente sob o domínio da Ordem dos

Cavaleiros de Jesus, os “jesuítas”. Este domínio teve a duração de 1549 a

1759. Não era propriamente de educação, mas, esse regime religioso era as

únicas e poucas escolas no País inteiro. Quando os jesuítas foram expulsos

pelo Ministro Marquês de Pombal, em 1759, de todos os territórios sob o

domínio português, a partir dessa data, o que havia de educação no Brasil

deixou de existir, permanecendo apenas algumas escolas isoladas particula-

res ou vinculadas a alguma ordem religiosa. A educação como sistema só foi

mencionada na primeira Constituição do Brasil, em 1824, sob o regime im-

1Texto baseado em tese de doutorado defendida na PUC/SP.

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

perial. Esta Constituição dava como garantia a instrução primária a todos os

brasileiros, sem dizer como seria realizado tal intento. A regulamentação da

Lei só ocorreu quatro anos mais tarde, em 1827. Esta nova Lei, segundo Saviani

(1996), “ficou conhecida como a Lei de 15 de outubro de 1827, tendo sido

nossa primeira lei nacional sobre instrução pública, além de se constituir na

única lei geral sobre ensino primário até 1946”. (pp. 26 e 27).

Esta Lei não saiu do papel, ou seja, ela rezava que o povo brasileiro

tivesse os seus direitos de cidadãos garantidos, por exemplo, o de ter educa-

ção primária gratuita para todos, inclusive escolas para meninas em vilas

mais populosas, mas, na realidade, este direito não foi garantido.

É importante ressaltar que o Ato Adicional de 12 de agosto de 1834,

no período imperial, transferiu a responsabilidade da educação para as pro-

víncias. E, como o imperador não criou política financeira para que as pro-

víncias suprissem as necessidades educacionais, apenas as que possuíam mais

recursos, como Rio de Janeiro, Salvador, São Paulo e Recife investiram em

educação (embora precariamente).

Vários problemas impediram as Leis de se tornarem realidade, ou seja,

a garantia de ter escolas para todos os brasileiros. Além dos problemas físi-

cos, como, por exemplo: a não existência de instalações adequadas (salas de

aulas, banheiros, lugares para a prática de educação física etc.), a falta de

mão de obra e, o principal, que foi a falta de interesse das oligarquias.

No final do século XIX e início do século XX, muitos recursos paliati-

vos foram utilizados como forma de suprir a falta de professores. O mais

intrigante, e que fora recebido na época como a “esperança nacional” , foi

“(...) o método de Bell & Lancaster (lei 1827) que consistia na divisão da

classe em decúria (grupos de 10 alunos), dirigida por um aluno menos igno-

rante, o decurião (...)”. (Relatório de Pesquisa, p. 13)

A formação de professores teve seu início em 1835, na cidade de Niterói.

A partir daí, várias escolas foram criadas e fechadas, pois a profissão de

professor não era estimulada, as políticas não contemplavam as necessida-

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

des educacionais. Os professores eram mal remunerados e não lhes eram

asseguradas às mínimas condições de trabalho.

Tomaremos o caso de São Paulo para ilustrar como era o curso de

formação de professores. Mello (1985) relata duas fases de como era a Esco-

la Normal de São Paulo:

Na 1ª fase (1846 a 1866) o que se tem é um currículo que nãopassa do exigido à escola elementar, sem especificidade peda-gógica. Na 2ª fase, há dois momentos de um continuum: umaprimeira etapa, que se revela ainda pouco específica, mas bas-tante enriquecida do ponto de vista do número de matérias aíincluídas (especialmente, leis de 1890 a 1892) e uma segundaetapa, que cobre o ensino normal das décadas de 10 e 20desse século (XX) e que vão conduzi-lo para um caminhomaior de especificidade pedagógica, pela inclusão de discipli-nas como Pedagogia, Psicologia, Exercícios Práticos de Ensi-no e outras. (p. 25).

O que Mello comenta é o precário caminho de construção da Escola

Normal e, mais especificamente no Estado de São Paulo. Mas nos outros

estados não era diferente, Campos (1990) resume bem este período:

O ensino no período imperial não passou de experiênciasbaseadas em ensaio e erro. A formação do magistério não tevecondições de corresponder às expectativas pela falta de ver-bas, de professores, de um prédio próprio para a Escola Nor-mal, de incentivos para a profissão, e pelo entrave dos valoresvigentes, que impediam uma maior abertura no tipo de for-mação oferecida aos mestres (...). (p. 9).

A autora ressalta, ainda, que existia outro empecilho que era a

(...) centralização do poder em mãos do presidente da pro-víncia, e na troca constante desses presidentes, que eram no-meados pelo poder central, não tendo assim condições delevar avante reformas cujas proposições muitas vezes eramvetadas ou relegadas a segundo plano pelos sucessores. (CAM-POS, 1990. p. 9).

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

A educação no regime republicano teve várias inf luências idealistas;

homens que motivados pelo movimento filosófico positivista tentaram im-

primir seus ideais inovadores na forma de exercer o magistério. O Estado de

São Paulo, por ser um Estado em ascensão econômica, movido pela cultura e

exportação do café, portanto, com mais verbas, foi o que mais inovou em

todas as áreas. O novo regime político ofereceu condições políticas que faci-

litaram ao Estado de São Paulo iniciar a organização sistêmica da educação,

servindo como exemplo, de modelo e inovações, a ser seguido pelo restante

do País. É importante ressaltar que o Estado de São Paulo passa a ser o “carro

chefe” em inovações em vários segmentos do Brasil, com avanços econômi-

cos e políticos. E a educação pública também aí se expandiu, e muito, para a

época. Por este motivo, comentaremos mais sobre a formação de professo-

res no Estado de São Paulo, por haver mais registros sobre esse Estado, neste

período.

Em 1890, é nomeado para a direção da Escola Normal de São Paulo o

Senhor Caetano de Campos. Este diretor, pouco depois, baixou o Decreto nº.

971, que ficou conhecido como a Reforma do Ensino Normal, de 12 de mar-

ço de 1890. Este Decreto institui a Escola Normal como a responsável pela

formação dos professores para lecionar nas escolas primárias e secundári-

as, proíbe o exercício do magistério nas escolas públicas daqueles que não

foram formados por ela, e institui também o concurso para a contratação de

novos professores.

Caetano de Campos ainda pensou em criar uma escola superior para

formar professores para atuar na Escola Normal. Este sonho foi colocado

em prática um ano após a sua morte, ao ser sancionada a Lei nº 88 de 1892.

Esta Lei criou o curso superior anexo à Escola Normal. É importante ressal-

tar que, mais uma vez, a Lei não se tornou realidade, ou seja, não saiu do

papel. Após a morte de Caetano de Campos, vários Decretos foram

implementados, ora aumentando a carga horária da Escola Normal, ora au-

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

16

Profissionais da Educação

mentando ou diminuindo disciplinas, além de regulamentar a idade mínima

para entrar como aluno. Nestas tentativas, de acertos e erros, Sampaio Dória

cria a Lei nº 1750, em 1920. Esta Lei é a proposta de reforma da instrução

pública do Estado de São Paulo e, além de regulamentar a educação em to-

dos os níveis, ainda cria a faculdade de educação para “aperfeiçoamento

pedagógico e cultural geral”, com objetivo de formar inspetores, diretores

de escolas primárias, ginásios e grupos escolares. Mas, a educação conti-

nuou ruim, recebendo muitas críticas. Uma delas é a do Jornal Estado de São

Paulo que, em 1926, sob a coordenação de Fernando de Azevedo, lançou um

inquérito sobre a educação paulista. Evangelista (2001) salienta que: “Dentre

as críticas ao modelo de qualificação então vigente, destaca-se a formulada

no inquérito sobre a instrução pública, realizada em São Paulo, em 1926 (...)”

(p. 249).

O mesmo inquérito termina com ilustres pessoas do meio acadêmico

salientando que a formação para o exercício de professores deve acontecer

no curso superior. Evangelista nos conta que:

Denomina-se a unidade para a formação superior do magis-tério de Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, Faculdade deEducação, Faculdade de Ciências e Letras, Faculdade de Filo-sofia e Letras, Escola Normal Superior, Faculdade de Pedago-gia, e Cursos Superiores de Ciências. (p 249).

Após estas críticas, surgiu a Lei nº 2.269, datada de 1927, que tratou de

reformular o ensino público, mas que só foi regulamentada pelo Decreto nº

4.600, de 30/05/1929. No entanto, na prática, não afetava em muito a estru-

tura vigente dos cursos de formação de professores.

Em 1930, acontece a revolução comandada por Getúlio Vargas. Criado

o governo provisório, instalou-se o Ministério da Educação e Saúde Pública,

e nomeia como ministro o Senhor Francisco Campos que, ao assumir:( ...) efetiva uma série de decretos para a educação, nos quais

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

prioriza o ensino unificado, através da reorganização funda-mental do ensino: 5 anos fundamentais e 2 para o profissional.Estabelece, ainda, o regimento e traços do Estatuto das Uni-versidades do Brasil, exigindo a incorporação de pelo menostrês institutos de ensino superior - Direito, Medicina e Enge-nharia ou, ao invés de um deles, a Faculdade de Educação,Ciências e Letras (...) (BRITO, 1997. p. 29).

Ao largo dos poderes constituídos, um movimento de renovação por

uma escola pública, laica e gratuita, tomou corpo, e em 1932, após a realiza-

ção da V Conferência Nacional de Educação é lançado o:

Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, redigido porFernando de Azevedo. Embora todos os signatários do docu-mento fossem defensores da escola pública, gratuita, obriga-tória, assim como da laicidade do ensino e da co-educação dossexos nas escolas, suas opiniões políticas não eram todas con-vergentes, se bem que todos fossem liberais. (WEREBE, 1994,p. 50).

Em 1934, a nova Constituição Brasileira procurou conciliar a força

entre conservadores e renovadores - movimento dos intelectuais pela educa-

ção nova - “escolanovistas”, estabelecendo em seus capítulos, conforme rela-

ta Werebe (1994, pp. 53 -54):

(...) assegurar o estabelecimento de um plano nacional daeducação: as diretrizes ficaram a cargo do governo federal,cabendo aos estados a organização e a manutenção de seussistemas de ensino. Fixou também os recursos mínimos que aUnião deveria consagrar ao ensino (10% de seus impostos),bem como os estados e os municípios (20% de seus impos-tos). No tocante às lutas entre conservadores e renovadores,encontrou uma solução de compromisso, mantendo de umlado a gratuidade e a obrigatoriedade do ensino primário e,de outro, restabelecendo o ensino religioso nas escolas públi-cas (de freqüência facultativa).

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Profissionais da Educação

Mesmo com severas críticas dos opositores, o ano de 1934 foi um

período propício de criação e inovação dentro da concepção filosófica pro-

posta pelos escolanovistas. Como podemos observar na fala de Werebe

(1994),em 1934 foi criada a Universidade de São Paulo, reunindo osestabelecimentos de ensino superior existentes e uma Facul-dade de Ciências e Letras. Foi a primeira universidade criadadentro do espírito dos renovadores da educação. No ano se-guinte, Anísio Teixeira criou a Universidade do Distrito Fede-ral (transformada na Universidade do Brasil, em 1937), à qualfoi agregada uma Faculdade de Educação, Ciências e Letras,instalada em 1939. (p. 54).

A história nos mostra que os anos de 1930 a 1937 foram anos de

conquistas na área da educação, se considerarmos as lutas travadas no cam-

po político, na disputa de poder. Este clima propiciou o surgimento de um

novo jeito de se pensar e praticar o ensino público no País. Os intelectuais

da educação renovadora não perderam tempo e souberam aproveitar as

oportunidades para colocar em prática seus discursos. Como os inovadores

estavam ganhando muito espaço em todas as áreas políticas e sociais do

País, os conservadores, vendo ameaçada a ordem de seus valores e, com o

pretexto de combater o comunismo no Brasil, apóiam um governo autoritá-

rio, despontando Getúlio Vargas para assumir o mando de ditador. Getúlio

cria em 1937 o Estado Novo, e dá início à caça às “bruxas”, ou melhor, à

perseguição política aos “comunistas”, abrangendo todas as áreas de atua-

ção para restabelecer a ordem social.

No campo educacional, durante o Estado Novo, sob a égide da ditadu-

ra, tivemos a criação, em 1938, do Instituto Nacional de Estudos Pedagógi-

cos - INEP, com a finalidade de fazer estudos e pesquisas educacionais no

País, e ainda, subsidiar reformas no ensino. Ainda, como pontua Brito (1997),

“O ministro do governo Vargas, Gustavo Capanema, inicia, em 1942, refor-

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Profissionais da Educação

mas em alguns ramos de ensino. (...) as chamadas Leis Orgânicas do Ensino

e destinam-se: ao Ensino Industrial (1942), ao Ensino Secundário (1942), ao

Ensino Comercial (1943)...” (p. 31).

No ensino Superior, também, ocorreram reformas e, é nesta reforma

que nasce o Curso Superior de Pedagogia. Mello (1985) aponta que:

(...) em 1939, como parte da reforma do ensino superior,organiza-se a Faculdade Nacional de Filosofia da Universida-de do Brasil, através do Decreto 1.190 de 4/4/39. Por essedecreto, estabelece-se o currículo pleno de curso de pedago-gia e institui-se o “esquema 3 + 1” para a licenciatura (...) Pelo“esquema 3 + 1”, o diploma de bacharel podia ser obtido em3 anos e, através do curso de didática, com mais um ano obti-nha-se o de licenciatura. (pp. 26 - 27)

Com o fim do Estado Novo, o restabelecimento da democracia é dado

por meio da Constituição de 1946. Nesta nova Carta, a Educação é palco,

novamente, de disputas políticas: de um lado, tínhamos os liberais que, como

outrora, reivindicavam um ensino público laico e gratuito e, por outro, os

conservadores que acreditavam no ensino privado e confessional. Em conse-

qüência desta disputa política, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasi-

leira demorou treze anos para ser promulgada, devido às célebres discus-

sões promovidas pelos dois grupos que se opunham: um a favor do ensino

público e outro a favor do ensino privado.

Durante o tempo em que se discutia a LDB nº 4024/61, a educação era

regida pelas Leis Orgânicas do Primário, do Ensino Normal e do Ensino Agrí-

cola, todas de 1946, que foram concebidas ainda sob a influência do Estado

Novo.

E é uma destas Leis Orgânicas de 1946 (Ensino Normal, Nº 8.530/46)

que fixa a duração do Curso de Pedagogia, o currículo mínimo e a formação

dos professores, conforme vemos com Carvalho (1996):

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Profissionais da Educação

A finalidade dos cursos de formação de professores,especificada no Decreto - Lei nº 8.530/46, em resumoexplicitava: Preparar professores e administradores que pos-sam atender a escola primária, bem como formação adequa-da de modo que detenham técnicas e conhecimentos relati-vos à especificidade da educação infantil. (pp. 21 - 22)

Neste Decreto - Lei (nº 8.530/46), é recomendado, em seu artigo 59, a

formação do professor em ensino superior, na Faculdade de Filosofia Ciên-

cias e Letras. Esta recomendação (formação de professor em ensino superi-

or), acrescida das especificidades relatadas neste mesmo Decreto – Lei, dá

origem ao Curso de Pedagogia que temos hoje.

E enfim, a primeira Lei da Educação Brasileira teve o seu desfecho

final, com a conciliação dos dois grupos, como vemos com Werebe (1994),

“finalmente, em dezembro de 1961 foi aprovada a Lei de Diretrizes e Bases

da Educação Nacional. A campanha em defesa da escola pública só conse-

guiu reduzir os ‘estragos’. A lei aprovada constituiu ‘solução de compromis-

so’ entre os grupos liberais e conservadores”. (p. 66).

Esta Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira foi a Lei nº 4024/

61. Antes, a educação era regida por Decretos e, na época da ditadura, pas-

sou a ser regida pelas Leis Orgânicas do Ensino, constituídas no período de

1942 a 1946. A partir de 1942, com as Leis Orgânicas e a LDB nº 4.024/61, o

Brasil começa a ter uma diretriz política e sistêmica para a educação do

povo brasileiro, embora ainda bastante precária.

O novo golpe militar brasileiro, em 1964, traz novas mudanças para a

educação brasileira. A primeira é a reformulação do ensino superior e poste-

riormente da educação de primeiro e segundo graus. Ressaltamos que as

mudanças propostas por estas Leis não ocorreram passivamente, mas com

conflitos de vários segmentos.

A Lei nº 5540/68, que fixou normas de organização e funcionamento

do ensino superior, mais conhecida como “Reforma Universitária”, juntamente

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Profissionais da Educação

com a Resolução nº 2, de 9 de maio de 1969, é que organiza o Curso de

Pedagogia que oficialmente vigorou até a LDB 9.394/96.

A outra reforma na educação aconteceu em 11 de agosto de 1971,

com a promulgação da LDB 5692, também conhecida como Lei que fixa

diretrizes e bases para o ensino de 1º e 2º graus e, que foi concebida por um

grupo nomeado pelo Presidente da República, tendo 30 dias para que a lei

fosse feita. Esta Lei (feita a “toque de caixa”) substituiu a LDB nº 4024/61 e,

segundo Werebe (1994), ela teve maior aceitação que a Lei nº 5540/68:

Ao contrário do descontentamento despertado pela reformauniversitária, a lei de reforma do ensino médio (5692/71) foirecebida com certa simpatia. O golpe de 64 criara condiçõespara a implantação de uma política educacional que encara-va a educação em termos de custos e benefícios. (p. 81).

A LDB nº 5692/71 foi a primeira lei a determinar a formação mínima

para ser professor. Esta formação de professor de primeiro grau era garan-

tida nesta Lei no Capítulo V em seus artigos 29, 30, 31, 32. A LDB é direta e

taxativa, assegurando que o curso de magistério de segundo grau é que habi-

lita o professor para lecionar nas quatro primeiras séries do Ensino Funda-

mental. Esta afirmativa pode ser constatada em seu artigo 30 quando afirma:

“Exigir-se-á como formação mínima para o exercício do magistério: a) no

ensino de 1º grau, da 1ª à 4ª séries, habilitação específica de 2º grau.” (Artigo

30, inciso “a” da LDB nº 5692/71).

No entanto, esta mesma lei no Capítulo VIII (Das Disposições Transi-

tórias), abria espaço para que qualquer pessoa pudesse ser professor quan-

do houvesse necessidade e não existissem professores formados. Em seu

Artigo 77, parágrafo único, inciso “a, b e c” é observado que:

Art. 77. Quando a oferta de professores, legalmente habilita-dos, não bastar para atender às necessidades do ensino, per-

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

mitir-se-á que lecionem, em caráter suplementar e a títuloprecário:Parágrafo único: Onde e quando persistir a falta real de pro-fessores, após a aplicação dos critérios estabelecidos nesteartigo, poderão ainda lecionar:a) no ensino de 1º grau, até a 6ª série, candidatos que hajamconcluído a 8ª série e venha a ser preparados em cursos in-tensivos;b) no ensino de 1º grau, até a 5ª série, candidatos habilitadosem exames de capacitação regulados, nos vários sistemas,pelos respectivos Conselhos de Educação;c) nas demais séries do ensino de 1º grau e no de 2º grau,candidatos habilitados em exame de suficiência regulada peloConselho Federal de Educação e realizados em instituiçõesoficiais de ensino superior indicados pelo mesmo conselho.(Artigo 77, Parágrafo único da LDB nº 5692/71).

Este tipo de abertura foi necessário nas décadas de 60/70, quando a

reivindicação de quantidade de escolas públicas era feita pela população

em todo o Brasil, e as escolas de magistério ou a quantidade de professores

disponíveis para o mercado de trabalho não eram suficientes para cobrir as

vagas de professores (oferta X procura).

A formação de professores para atuar no ensino de primeiro grau,

compreendendo da primeira à quarta série, como já vimos, havia sido

estabelecida desde 1946 com a Lei Orgânica nº 8530. Esta lei estabelecia que

o futuro professor faria o Curso Normal que o habilitaria para o exercício

do magistério de primeiro grau.

Com as leis nº 4.024/61 e nº 5692/71, não ocorreram alterações no

entendimento da formação de professor para lecionar nas séries iniciais do

primeiro grau, ou seja, o profissional das quatro primeiras séries era forma-

do no segundo grau, mais conhecido como Normal. A Reforma Universitária

nº 5.540/68, juntamente com a Resolução nº 2/69, amplia o Curso de Peda-

gogia para habilitar profissionais para atuar no campo técnico pedagógico

das escolas e do sistema educacional e lecionar no magistério do Curso

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

Normal (até então, não tinha uma diretriz clara de qual curso superior teria

a responsabilidade de formar os professores para lecionar no Curso Nor-

mal de segundo grau).

Estas Leis, embora tenham sido estabelecidas de forma arbitrária e

impostas para o povo brasileiro, não foram totalmente negativas. Utilizando

as palavras de Werebe (1994), veremos que:

Desde os anos 80, várias experiências têm sido realizadas paratentar melhorar a qualidade do ensino no país. Algumas delas,ainda em andamento, visam a resolver principalmente o pro-blema do malogro escolar, com maior ou menor alcance, emtermos quantitativos e qualitativos. (p. 231)

Com a saída dos militares do cenário político brasileiro, se busca, no-

vamente, a retomada da democracia. O povo vai às urnas para eleger seus

representantes e, nesta primeira eleição, é escolhida pelo voto a assembléia

constituinte que deu origem à Constituição de 1988. Esta Constituição origi-

nou a nova LDB, que foi promulgada em 20 de dezembro de 1996, com o nº

9.394. Conforme Severino (1997),

A discussão, votação e promulgação da atual LDB se deu nummomento específico da história político-econômica do Brasil,marcado por uma tendência apresentada como inovadora ecapaz de trazer a modernidade ao país. Assim, no contexto daglobalização de todos os setores da vida social, as elites res-ponsáveis pela gestão político-administrativa do paísrearticulam suas alianças com parceiros estrangeiros, inves-tindo na inserção do Brasil na ordem mundial desenhada pelomodelo neoliberal. (in: Brzezinski, p. 57)

Depois de muitas discussões e uma manobra política no Senado Fede-

ral, entra em vigor a Lei nº 9.394/96, que demorou oito anos para ser apro-

vada.

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Profissionais da Educação

Esta Lei (9.394/96) gerou e gera até os dias de hoje, grandes contro-

vérsias quanto à formação de professores. As várias discussões que ocorrem

no País inteiro em torno da nova LDB mostram opiniões divergentes quanto

ao Capítulo de formação de professores. Pode-se notar nos Artigos nº 61, nº

62, nº 63 e nº 87 § 4º, alguns dos problemas a este respeito, no qual, discuti-

remos, agora.

A LDB nº 9394/96, em seu Título VI dos Profissionais da Educação,

sinaliza como deve ser realizada a formação dos profissionais da educação.

Listaremos os Artigos 61, 62, 63 e 64, para podermos compreender o que

está gerando polêmicas na interpretação da Lei. O Artigo nº 61, temos:

Art. 61. A formação de profissionais da educação, de modo aatender aos objetivos dos diferentes níveis e modalidades deensino e às características de cada fase do desenvolvimentodo educando, terá como fundamentos:I – a associação entre teorias e práticas, inclusive mediante acapacitação em serviço;II – aproveitamento da formação e experiências anterioresem instituições de ensino e outras atividades. (Artigo 61 e seusincisos I e II, da LDB nº 9.394/96).

No Artigo 62, vemos que:

Art. 62. A formação de docentes para atuar na educação bási-ca far-se-á em nível superior, em curso de licenciatura, de gra-duação plena, em universidades e institutos superiores deeducação, admitida, como formação mínima para o exercíciodo magistério na educação infantil e nas quatro primeirasséries do ensino fundamental, a oferecida em nível médio, namodalidade Normal. (LDB nº 9.394/96).

O Artigo 62, especificamente, orienta que a formação do professor

para atuar na educação infantil e no ensino fundamental da 1ª a 4ª séries

deve ocorrer na Escola Normal de nível médio ou no Ensino Superior. Já no

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Profissionais da Educação

Parágrafo 4º do Artigo nº 87, do Título IX, das Disposições Transitórias, le-

mos que: “Até o fim da Década da Educação somente serão admitidos profes-

sores habilitados em nível superior ou formados por treinamento em servi-

ço”. Isto tem gerado ambigüidades e polêmicas.

Ora, se no Artigo 62 reza que a formação mínima admitida é a de

ensino médio, e não determina o tempo em que esta formação será aceita,

como em outro parágrafo das Disposições Transitórias (§ 4º do Artigo nº 87,

do Título IX) podemos ter outra orientação para efeito de contratação de

novos professores?

A falta de clareza também pode ser percebida quanto ao papel do

Curso de Pedagogia, o Artigo nº 62, quando afirma que a formação de docen-

te será realizada em curso de licenciatura de graduação plena em universi-

dades ou instituto superior de educação, e o Artigo 63 que explicita qual

será o papel do instituto superior de educação, como podemos observar:

Art. 63. Os institutos superiores de educação manterão:I - cursos formadores de profissionais para a educação básica,inclusive o curso normal superior, destinado à formação dedocentes para a educação infantil e para as primeiras sériesdo ensino fundamental;II - programas de formação pedagógica para portadores dediplomas de educação superior que queiram se dedicar àeducação básica;III - programa de educação continuada para os profissionaisde educação dos diversos níveis. (Artigo 63 e seus incisos de Ia III, da LDB nº 9.394/96).

Nestes dois Artigos (62 e 63), não menciona o Curso de Pedagogia. A

Lei só faz menção ao Curso de Pedagogia, quando diz:

Art. 64. A formação de profissionais de educação para admi-nistração, planejamento, inspeção, supervisão e orientaçãoeducacional para a educação básica, será feita em cursos de

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Profissionais da Educação

graduação em pedagogia (grifo nosso) ou em nível de pós-graduação, a critério da instituição de ensino, garantida, nestaformação a base comum nacional. (LDB nº 9.394/96)

Portanto, estes Artigos não colocam a formação de professores no

Curso de Pedagogia. Isto gerou muita discórdia e essa falta de clareza só

será solucionada quando o Conselho Nacional de Educação sinalizar a nor-

ma a seguir.

O que percebemos é que ainda se tem muito a resolver na área de

formação de professores. Precisamos inovar e buscar novas veredas para a

formação profissional dos professores primários e da educação infantil, não

só quanto ao lugar de formação como quanto à dinâmica dessa formação.

Terminaremos este Capítulo, salientando e concordando com a seguin-

te afirmação de Werebe (1994):

No Brasil, as tentativas de inovação educacional, na sua maio-ria, não foram além das intenções de seus autores. Assim, porexemplo, as inúmeras reformas parciais ou globais do ensino,em seus diferentes graus e ramos, apresentadas em todos ostempos, sempre trouxeram em seu bojo propósitos inovado-res no sentido de corrigir as deficiências e insuficiências daeducação. Porém poucas foram as reformas que chegaramrealmente a concretizar seus principais propósitos... (p. 212)

Recebido: 02/04/2004

Aceite para publicação: 16/04/2004

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

POR UMA EDUCAÇÃO PARA O PENSAR

Alceu Zoia

RESUMO: O texto que aqui construímos tem como objetivo lançar um olhar sobre o papelda filosofia na educação da criança e do jovem, desde o início da escolarização, como meiopara o desenvolvimento das suas habilidades e potencialidades através do exercício dodiálogo e da comunidade de investigação implantados na sala de aula proporcionando umpensar criterioso, crítico, rigoroso e atencioso.

PALAVRAS-CHAVE: Pensar; filosofia; comunidade de investigação.

ABSTRACT: The text we are presenting here has as a main purpose to introduce a look onthe role of philosophy in children and teenagers education since the beginning of schooling,as a mean to the development of his abilities and potentialities through the practice ofdialogue and research communities in the classrooms giving them a sensible, critical, strictand respectful thinking.

KEY WORDS: thinking; philosophy; research communities;

Vivemos num momento de enorme desenvolvimento científico e

tecnológico. Este avanço, contudo, parece limitado ao acesso de poucos. São

muitos os excluídos destes avanços e existem outros tantos que nem sequer

chegam, a saber, que isso acontece. É tarefa dos educadores, empenhar-se em

fazer com que seus alunos possam participar deste processo.

Para isso, uma educação que leve à ref lexão, torna-se imprescindível

neste momento. Transformar os alunos em pensadores autônomos, que pen-

sem por si mesmos, que sejam gestores de conhecimentos e não apenas

repetidores daquilo que outras pessoas dizem ou pensam, deve ser o objeti-

vo primeiro desta educação. A Filosofia para Crianças – Educação para o

Pensar1 de Matthew Lipman é um paradigma para isso.

1Programa de educação filosófica do Centro Brasileiro de Filosofia para Crianças com marca registradano Brasil. O autor é Matthew Lipman. O programa está propagado e usado em diversos países.

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Profissionais da Educação

Refletir sobre a importância da educação filosófica nas Escolas de

Ensino Fundamental e Médio é, sem sombra de dúvidas, estar mergulhando

em uma área que está exercendo uma atração em franco crescimento e que

encontra novos seguidores em diversas instâncias da sociedade neste final

de século. Percebemos que a necessidade do conhecimento humano é

inquestionável. Mais importante, mais vital, porém, é o desenvolvimento das

habilidades cognitivo-criativas. Para isso torna-se necessário educar para

aprender a aprender. Desenvolver nas crianças o pensar crítico e criativo,

atencioso, solidário e dialógico para enfrentarmos os problemas iminentes

do novo milênio.

As dificuldades encontradas entre os professores do ensino fundamental

e médio precisam ser enfrentadas e solucionadas. Indispensável para isso, é

a necessidade de se ter uma visão clara das transformações que o mundo

vem passando. Deve estar evidente qual é o mundo que necessitamos e que-

remos e que tipo de cidadãos precisamos que habitam este mundo. Acima de

tudo, temos de buscar um modelo de educação-aprendizagem eficiente, um

novo paradigma, livre de intransigências e do autoritarismo de professores,

não somente preocupados com a mera transmissão de conhecimentos, mas

propiciando a autonomia do aluno no pensar e oferecendo uma estrutura

escolar adequada.

A Filosofia até hoje foi a disciplina que melhor desenvolveu o raciocí-

nio aperfeiçoado e a formação de conceitos. Com o programa de Filosofia

para Crianças - Educação Para o Pensar, já a partir das séries iniciais, estare-

mos contribuindo com o desenvolvimento dum pensar de qualidade nas cri-

anças. Proporciona ainda um metapensar, ou seja, pensar sobre o próprio

pensar e também um pensar sobre as nossas ações e relações entre profes-

sor-aluno-escola-família.

Para muitos educadores e cientistas da educação, a deficiência no de-

senvolvimento das habilidades cognitivas é a causa principal do fracasso da

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

educação nos nossos dias. Lipman em O Pensar na Educação, publicado em

1995, defende que “para que os alunos sejam educados não basta que eles

aprendam o conteúdo de cada disciplina. É preciso, que eles sejam capazes

de aprender a pensar, a raciocinar naquela disciplina” (p.35). É a nossa prin-

cipal preocupação, fazer com que a criança desenvolva as habilidades

cognitivo-criativas para buscar as soluções dentro de cada situação-proble-

ma que lhe seja apresentada e que estas soluções sejam apenas um passo,

um estímulo, para alcançar um objetivo ainda bem maior, sua formação inte-

gral e holística.

Quando Goethe gritou ‘mais luz’ ao morrer, deixou para todosnós uma mensagem dinâmica. Porque é o que precisamos emtodas as áreas da vida; mais inspiração, mais amor, mais tole-rância, mais compreensão, mais raciocínio. Mais luz é o objeti-vo de todos os pensadores criativos, e é absolutamente ilimita-do em termos de suas possibilidades. (PETERSON,W. A., 1991,p.107).

É na busca do caminho que leva à aquisição do conhecimento que

estamos, neste momento, gritando com Goethe por mais luz, por mais inspi-

ração, mais amor, mais criatividade, mais atenciosidade em nossas escolas,

para que possamos contribuir com o crescimento crítico-intelectual de nos-

sas crianças e jovens, tornando-os mais participativos da sociedade da qual

são partes. Mais luz precisamos em todas as situações da vida, não apenas na

educação, para que assim possamos viver e conviver com mais respeito e

dignidade. Indispensável para isso é o desenvolvimento das habilidades

cognitivo-criativas através de uma educação adequada.

Lipman em O Pensar na Educação (1995), cita Kant quando afirma

que as pessoas precisam aprender a pensar por si mesmas e considera a

possibilidade de ensiná-las a pensar enquanto ainda fossem crianças, assim

também Lipman entende que somente através do exercício do raciocínio, do

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

exercício do pensar de modo inteligente é que poderemos criar adultos ca-

pazes de compreender o mundo em que vivem e de agir e interagir nele.

Com isso, não queremos, necessariamente, que as crianças se tornem filóso-

fas, mas sim pessoas melhores, cidadãos melhores.

John Dewey na obra de Cunha, 1998, nos diz que

o dia de amanhã é uma construção que se inicia no dia de hojee que devemos ter cuidado com o presente das crianças, seudesenvolvimento e suas necessidades porque isto constituiuma garantia para a educação do homem do futuro (DEWEYapud CUNHA, M.V.,1998, contra capa)

Esta é a grande contribuição do programa de Filosofia para Crianças,

que está conquistando um espaço fundamental para a formação do cidadão

em muitas escolas de diversos países do mundo.

A filosofia deve ser compreendida como um processo de libertação da

pessoa, que além de analisar as coisas como são, procura ver como deveriam

ser e diante das injustiças, do ódio, da falsidade, pode fazer julgamentos, usar

da imaginação, ser criteriosa, crítica, ética e atenciosa, criar sugestões para

que as coisas possam ser melhoradas e que todos possam viver num mundo

melhor.

Para tornar as crianças críticas, criativas, atenciosas e democráticas,

temos que começar cedo, não se pode esperar que elas se tornem adultas.

Não se trata apenas de introduzir a Filosofia como mais uma disciplina no

currículo escolar, mas sim repensar a própria educação e descobrir a neces-

sidade do pensar sobre o próprio pensar, buscando proporcionar às crian-

ças a oportunidade de aprender a fazer bons julgamentos e inventar novas

opções de escolha.

Educar para o Pensar requer também que todos professores e alunos

aprendam a ouvir o outro, dêem oportunidades para que todos possam ex-

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

pressar suas idéias, incentivando o diálogo crítico, criativo e acima de tudo

investigativo, transformando a sala de aula no que chamamos de uma Comu-

nidade de Investigação2 que busca a construção coletiva do conhecimento.

Esta é a proposta pedagógica de Mathew Lipman: a transformação da

sala de aula em uma Comunidade de Investigação, onde cada problema ou

questão levantada é um fato que precisa ser devidamente analisado, esclare-

cido e compreendido.

Evidentemente não basta receber o conhecimento pronto, não basta

só saber. Acima de tudo faz-se necessário saber construir e reconstruir co-

nhecimentos e saber usá-los para viver melhor e escolher o melhor, não so-

mente para si próprio, mas para a coletividade. Somente assim poderemos

encontrar o caminho para a felicidade e para o bem estar.

A educação brasileira vive em um momento de crise profunda, senti-

mos a falta de uma política educacional séria e eficiente, o processo de ensi-

no-aprendizagem é falho e inconseqüente, em virtude de uma enorme confu-

são de idéias sobre a educação que acaba colocando tanto professores quan-

to alunos em meio a uma imensa disputa ideológica e que acaba por minar

de vez com o pouco que resta do tão frágil e debilitado sistema educacional

brasileiro.

Diante destas grandes dificuldades pelas quais a educação, de maneira

geral, vem passando, notamos que se faz primordial encontrar algum cami-

nho firme para que possamos vencer esta crise. Nós educadores, da Educa-

ção para o Pensar, temos a convicção de que este caminho começa a ser

trilhado aos poucos. A Filosofia para Crianças parece ser a força propulsora

que faltava para elevarmos de vez o nosso ensino através de uma educação

voltada para a ref lexão.

2Comunidade de Investigação é a metodologia utilizada pelo Programa de Filosofia para Crianças criadopelo professor Matthew Lipman, que visa transformar as salas de aula em verdadeiras comunidadesdialógicas e investigativas, despertando as crianças para a busca do conhecimento em conjunto.

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

Através do paradigma Filosofia para Crianças, de Mathew Lipmam,

muitas escolas do Brasil estão conseguindo modificar o panorama sombrio

da educação. Estou certo de que a filosofia e o desenvolvimento do processo

do filosofar nas crianças é de fundamental importância para que haja uma

“revolução” em nosso sistema de ensino.

A pesquisa que desenvolvi dentro da linha da Filosofia na Educação do

Programa de Mestrado em Educação da Universidade Federal de Mato Gros-

so buscou evidenciar a importância do desenvolvimento das habilidades fi-

losóficas na educação de crianças e jovens. Investiga, sobretudo, se os méto-

dos e a didática do programa de Filosofia para Crianças – Educação para o

Pensar são eficientes para este desenvolvimento. Partindo do fato de que em

algumas aulas esta eficiência aparece e em outras não, busquei verificar os

entraves neste processo educativo que impedem o sucesso pedagógico e a

qualidade filosófica. De outra forma dizendo: pesquisei na teoria e experiên-

cia prática como conseguir a qualidade filosófica do pensar.

Esta pesquisa foi desenvolvida em duas escolas3 da rede particular de

ensino do município de Sinop que trabalham com o programa de Filosofia

para Crianças, com a finalidade de verificar a eficiência deste programa no

desenvolvimento das habilidades cognitivas e dialogais destas crianças.

Este trabalho objetiva ainda evidenciar, a contribuição do filosofar no

desenvolvimento da criança na capacidade de raciocinar e argumentar, nas

habilidades necessárias à aquisição do conhecimento e no pensar inteligen-

te em todas as situações da vida e realimentar o processo da formação dos

professores desta educação.

Facilmente observamos que as aulas de Filosofia para Crianças são

aulas agradáveis, alegres, criativas e que as crianças dizem adorar, contudo

isso não basta. Necessário se faz que além de tudo isso, estas aulas também

3A pesquisa foi realizada nas escolas: COOPES-OESP e Regina Pacis. A escolha destas escolas deu-se pelofato de que são as únicas em Sinop que trabalhavam com o programa de filosofia para crianças.

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

possam contribuir com a formação intelectual das crianças e jovens, que

estimulem as crianças a: fazer perguntas, a ouvir os outros, estabelecer cone-

xões, fazer analogias, buscar coerência, construir inferências, identificar con-

tradições, respeitar as pessoas em seus pontos de vista, encontrar exemplos

e contra-exemplos, etc.. Estas são algumas das características que devem ser

adquiridas durante as aulas de filosofia para que se possa dizer que há real-

mente qualidade filosófica nestas aulas.

Procuro apresentar neste breve ensaio a importância do desenvolvi-

mento das habilidades filosóficas na educação de crianças e jovens, procu-

rando evidenciar a contribuição do filosofar no desenvolvimento da criança,

na capacidade de raciocinar e argumentar, nas habilidades necessárias à aqui-

sição do conhecimento e no pensar inteligente em todas as situações da

vida, buscando ainda realimentar o processo de formação dos professores

empenhados na busca de uma educação voltada para o pensar.

O propósito de desenvolver este trabalho surgiu da observação de

que as crianças ao ingressarem na escola são bastante curiosas, sedentas em

apropriar-se do saber, querer aprender a ler, escrever, descobrir coisas... e a

escola vai pondo barreiras, limitando esta curiosidade e que, com o passar

do tempo, vai deixando de existir.

A humanidade passa por um momento em que o desenvolvimento

tecnológico avança com passos de gigantes e a maioria das pessoas está

alheia a este processo. Cada vez mais a sociedade exige que as pessoas este-

jam melhor preparadas para enfrentar estes novos desafios que se apresen-

tam. Para isso tornou-se tarefa obrigatória educar as habilidades do pensar.

É no sentido de buscar compreender a importância da Educação para

o Pensar que entendemos a filosofia como um conhecimento que contribui

para a formação holística do aluno, como pessoa, como cidadão e como

agente que deve participar na construção e no desenvolvimento do país.

A necessidade de uma prática educacional que promova o desenvolvi-

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

mento do pensar bem¨ dos nossos estudantes, em todas as idades, é motivo

de grande discussão em todos os níveis educacionais. Precisamos de uma

Educação para o Pensar que propicie às crianças o desenvolvimento de ca-

pacidades que lhes possibilitem a produção do pensar por si mesmos, de

forma autônoma, crítica, criativa e cuidadosa.

A Educação para o Pensar possibilita a introdução da criança no pro-

cedimento do raciocínio lógico, de sistematização do pensamento, desper-

tando o seu espírito inquiridor que se encontra potencialmente em si, bus-

cando uma ref lexão crítica do conhecimento em todas as áreas do saber.

Jostein Gaardner em seu Livro O Mundo de Sofia nos apresenta uma

passagem em que os seres humanos são comparados, num truque de mági-

ca, a um coelho tirado da cartola que é o universo. A passagem diz o seguin-

te: [...] um coelho branco é tirado da cartola. E por que se tratade um coelho muito grande, este truque leva bilhões de anospara acontecer. Todas as crianças nascem bem na ponta dosfinos pelos do coelho. Por isso elas conseguem se encantarcom a possibilidade do número de mágica a que assistem.Mas conforme vão envelhecendo, elas vão se arrastando cadavez mais para o interior da pelagem do coelho. E ficam por lá.Lá embaixo é tão confortável que elas não ousam mais subiraté a ponta dos finos pelos, lá em cima. Só os filósofos têm aousadia de se lançar nesta jornada rumo aos limites da lingua-gem e da existência. Alguns deles não chegam a concluí-la,mas outros se agarram com força aos pelos do coelho e ber-ram para as pessoas que estão lá embaixo, no conforto dapelagem, enchendo a barriga de comida e bebida:-Senhoras e senhores – gritam eles -, estamos flutuando noespaço!- Mas nenhuma pessoa lá de baixo se interessa pela gritariados filósofos.- Deus do céu! Que caras mais barulhentos! Elas dizem.E continuam a conversar: será que você poderia me passar amanteiga? Qual o preço do tomate? Etc ( GAARDER, 1998,p.31).

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Profissionais da Educação

Com o passar do tempo vamos acostumando-nos com os aconteci-

mentos em nossas vidas e nada mais nos surpreende, vamos perdendo com

isso a capacidade de nos admirarmos com as coisas. Aos poucos tudo vai

parecendo-nos normal, natural, indiferente, nada mais desperta a nossa

curiosidade, nos acomodamos lá bem no fundo dos pelos do gigante coelho,

onde nos sentimos seguros e confortáveis. Os acontecimentos mais trágicos

são vistos de maneira fria, distante...

O filosofar é uma necessidade humana e como tal, quanto mais cedo

for trabalhada, melhor serão exploradas suas potencialidades e possibilida-

des. Kant (1996) afirma que somos orientados por interesses: por nós mes-

mos, pelos com quem convivemos e pelo bem universal. Deste modo, deve-

mos possibilitar aos nossos jovens este conhecimento para que estes objeti-

vos os orientem. Sendo assim, o desenvolvimento do filosofar desde peque-

nos contribui para toda a vida. “Isso significa preparar as pessoas desde o

mais cedo possível para participarem, com competência, de algumas defini-

ções fundamentais que se renovam ao longo da História humana” ( LORIERI,

2002, p. 44 ). A criança é um ser pensante, que pergunta, questiona, porém,

geralmente com freqüência à escola, vai perdendo esta curiosidade, vai es-

condendo-se na pelagem do grande coelho. Através do filosofar criamos uma

sala de aula viva, revigorada e que, desta forma, enriquece todos os membros

do grupo.

É através da filosofia que buscamos recuperar a curiosidade natural

do ser humano, estimulando-o a “subir até a ponta dos finos pelos e olhar

bem dentro dos olhos do grande mágico”. Através do filosofar procuramos

ver a realidade de forma dinâmica e não fragmentada. Buscamos ver o todo

como algo maior do que a soma das partes. Tudo está relacionado. Com as

informações que vamos recolhendo pelo caminho vamos construindo redes.

E com estas redes vamos capturando mais e mais informações que, conse-

qüentemente, ampliam e fortificam as redes do conhecimento. Pois o todo

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

só é apreendido se nosso pensamento estiver preparado para esta compre-

ensão.

É fundamental, que no trabalho de Filosofia para Crianças, as aulas se

desenvolvam no sentido de despertá-las para a busca do conhecimento, da

investigação, do prazer proporcionado pelo descobrir coisas novas. É neste

sentido que entendemos a presença da qualidade filosófica nas discussões

em sala de aula. É preciso manter acesa a curiosidade das crianças para que

elas construam e reconstruam conhecimentos, num clima apropriado para

novas descobertas, debates, revisão de pontos de vista, culminado no desen-

volvimento das habilidades cognitivas, criativas e dialogais, na autocorreção

e na formação de novos conceitos.

A transformação da sala de aula em uma verdadeira comunidade de

investigação é o caminho para uma educação de qualidade, capaz de criar

um ambiente democrático na escola e que busca o desenvolvimento integral

da criança, pois é neste ambiente que a criança irá sentir-se livre para ex-

pressar suas idéias, debatê-las com os demais colegas, sem medo de repreen-

são e/ou punição.

A finalidade da Educação para o Pensar não é a de ensinar teorias

filosóficas, mas sim educar o pensamento para o desenvolvimento de habili-

dades que possibilitem que esta criança que já pensa, possa ser capaz de

pensar melhor.

Para que isso aconteça, Lipman nos diz:

Um programa confiável de habilidades de pensamento deve-ria fazer mais que capacitar as crianças a lidarem de modoefetivo com as tarefas cognitivas imediatas, tais como proble-mas a serem solucionados ou decisões a serem tomadas. De-veria buscar consolidar as potencialidades cognitivas das cri-anças de modo a prepará-las a um pensar mais efetivo nofuturo. O objetivo de um programa de habilidades de pensa-mento não é transformar as crianças em filósofos, emtomadoras de decisões, mas ajudá-las a pensar mais, ajudá-las

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Profissionais da Educação

a serem indivíduos mais reflexivos, ajudá-las a terem maisconsideração e serem mais razoáveis, pessoas melhores, ca-pazes de colaborar na construção de uma sociedade maisjusta. (LIPMAN, M., OSCANYAN, F., SHARP, A. M., 1994, p. 35).

E para que isto aconteça precisamos, como o professor Peter Büttner

afirmou em seu livro, Mutação no Educar: “afiar as ferramentas intelectuais,

fazer ginástica do cérebro, exercitar o raciocínio crítico, apropriar-se do

hábito e das habilidades de questionar e investigar e de criar o necessário,

em vez de esperar e aceitar respostas prontas, obsoletas e insuficientes”.

(BÜTTNER, P., 1999, p. 39-40)

Para que o pensar bem se concretize é preciso incentivarmos, criar-

mos possibilidades para o seu desenvolvimento através do exercício de ela-

boração de perguntas com cunho investigativo, visando a busca de soluções

para as questões levantadas. Porém para que isso aconteça é primordial não

assumirmos posturas dogmáticas com relação às questões levantadas em

sala de aula, mas sim estarmos sempre abertos, criando possibilidades de

investigação e avanços nos conhecimentos e problematizando todas as situ-

ações apresentadas pelo professor e pelos próprios alunos.

Através do exercício do filosofar queremos que a criança seja capaz

de tirar suas próprias conclusões com relação às situações que lhes são

apresentadas, que seja capaz de pensar por si mesma, que ref lita sobre sua

própria situação no mundo. Sharp e Splitter (1999) afirmam que uma pes-

soa que pensa por si mesma é, num sentido importante, livre. Pensar por si

mesmo é criar seu próprio modo de olhar e de ver o mundo em que vive,

convive e sobre-vive.

O ser humano, como ser inacabado que é, está constantemente envol-

vido na procura de conhecimentos através da busca incessante de respostas

para as questões que são colocadas a todo instante. Somos seres que pergun-

tam. Temos a necessidade de respostas. A Educação para o Pensar é uma

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

oportunidade grandiosa para fazer este exercício.

Partindo do pressuposto de que todos pensam, somos levados a crer

que uns pensam melhor que os outros, que uns pensam mais outros menos.

Isto porque o pensar é uma habilidade do ser humano e como tal é passível

de ser treinada, melhorada, aperfeiçoada. Com esse exercício do pensar po-

demos passar de um pensar simples para um pensar melhor, mais crítico,

criativo, atencioso, enfim, um pensar mais razoável. O pensar bem é funda-

mental para que o ser humano possa fazer suas escolhas de modo conscien-

te.

A experiência tem nos mostrado que em salas de aulas transformadas

em comunidades de investigação filosófica, desde as séries iniciais, as crian-

ças tornam-se mais crítico-criativas, mais democráticas, ref lexivas e interes-

sadas em participar das atividades desenvolvidas na sala de aula, na escola,

na família e conseqüentemente na comunidade da qual fazem parte.

Bem, mas o que seria a qualidade filosófica na educação?

Estamos numa época em que pensar em qualidade não é apenas uma

questão de modismo, é uma questão de necessidade. Pensar sobre a qualida-

de no pensar é buscar uma melhora nas próprias condições de vida, de rela-

cionamento e de entendimento do ser humano. Num mundo fragmentado

em plena era da globalização, o homem sente-se inseguro e busca na escola

não apenas a instrumentalização do indivíduo para suprir a demanda indus-

trial e tecnológica, mas acima de tudo uma educação que o prepare para

viver e conviver bem nesta sociedade.

Quando se fala em qualidade na educação é preciso estar atento a que

tipo de qualidade queremos na educação. Com certeza não seria o progra-

ma de Qualidade Total, empregado nas empresas. Na educação não trabalha-

mos com máquinas, mas sim com seres humanos, portanto, dinâmicos, autô-

nomos, críticos, criativos, diferenciados em potenciais e vontades. Em virtu-

de disso devemos ter claro que tipo de homens e mulheres esta sociedade

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

precisa?

A escola não pode ficar alheia diante deste panorama para não correr

o risco de formar pessoas incapazes de viver e conviver em sociedade com

dignidade. O Programa de Filosofia para Crianças – Educação para o Pensar

desenvolve uma mentalidade pedagógica e um programa que procura quali-

ficar a educação, no sentido de desenvolver nos alunos não apenas uma ou

outra habilidade cognitiva, mas um leque de habilidades básicas para uma

vida competente e feliz. A Educação para o pensar procura desenvolver com

prioridade habilidades de raciocínio, tais como o discernimento, a compara-

ção, a abstração, as relações, a criatividade, seriações, entre outras. Ao mes-

mo tempo, contudo, instiga e proporciona a participação ativa, o diálogo

ordenado, autocorretivo, respeitoso, construtivo, e, ainda mais, a pesquisa

participativa, buscando desenvolver todo o potencial da criança para que

possa assim tornar-se o cidadão que o mundo moderno precisa.

Nesta condição, a Filosofia não transmite apenas a história do pensa-

mento, mas gera qualidade filosófica na educação, proporcionando o desen-

volvimento básico do raciocínio correto e razoável. Através das práticas fi-

losóficas indissociáveis da investigação e reflexão, da discussão e argumen-

tação, da pesquisa e aprendizagem investigativa em comunidade dialogal,

muito mais do que somente buscar critérios de avaliação para critérios váli-

dos e inválidos, educa para fazer pensar.

É através da atitude filosófica, da ref lexão e da busca do saber crítica,

criativa e cuidadosa que teremos uma nova compreensão de uma educação

e de um mundo livre dos discursos impostos por aqueles que detêm o poder.

O educador deve praticar e proporcionar postura e ação pedagógica cor-

respondentes em sala de aula.

A comunidade de investigação é imprescindível para a concretização

desta educação e deste pensar com qualidade filosófica, pois ela constitui

uma práxis, uma ação ref lexiva em conjunto, uma maneira de agir no mun-

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

do. É um meio de transformação pessoal e moral que inevitavelmente leva a

uma mudança nos significados e valores que afetam os juízos e ações cotidi-

anas de todos os participantes, não se esgotando em sala de aula, mas torna-

se uma prática que os alunos transportam para outras situações da vida.

Com isso o educando torna-se mais e mais aberto aos acontecimentos do

mundo e aprende a compreender a importância do tomar-se a si mesmo nas

mãos para poder assim interagir neste contexto.

Da afirmação da maioria dos professores de outras disciplinas que

após a implantação do programa de Filosofia para Crianças os alunos mu-

daram muito, são mais participativos, mais respeitosos nas aulas, sabem ou-

vir e aguardar a vez para fazer suas colocações, podemos tirar duas conclu-

sões: há mudanças relevantes e estas, percebidas e admiradas na escola intei-

ra e não somente na sala de Filosofia.

Sabemos que o caminho a percorrer é longo, que dificuldades existem,

porém o primeiro passo foi dado, o caminho começa a ser aberto. Agora é

preciso por o pé na estrada e com muita perseverança prosseguir a cami-

nhada e enfrentar todos os desafios que se apresentam.

É assim que iremos gerar a qualidade filosófica na educação, propor-

cionando o desenvolvimento básico do raciocínio, pois a Filosofia para Cri-

anças educa no sentido da afirmação de Hilton Japiassu no livro “Um Desa-

fio à Filosofia”, que diz:

O filósofo só consegue atingir o outro, com sua palavra, ex-pondo-se como sujeito falante, como sujeito público. Precisacorrer o risco de expor-se, de intervir no mundo como sujeitopensante e, quando necessário, tomar partido, sobretudo quan-do a justiça, a liberdade e a verdade estiverem ameaçadas edesrespeitadas. Como Sócrates, deve obedecer a seu “demô-nio” (daimon) e estar sempre presente onde for exigida suaintervenção de esclarecimento, de luz e partilha. Deve estarainda absolutamente convencido de que, com muita obstina-ção, precisa comunicar um pensar que congrega, que expres-

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Profissionais da Educação

sa e reparte, não se esquecendo jamais que sua vocação prin-cipal é a de, a quem quiser ouvir, “fazer pensar”. (JAPIASSU, H.,1997, p.16).

A filosofia para crianças procura desenvolver estas qualidades a par-

tir da infância, democratizando-as para todos e não somente para os profis-

sionais dos quais se exigirá evidentemente maior qualificação.

É diante da busca de uma sociedade mais justa e solidária que propo-

mos uma ação educativa que seja capaz de propiciar uma educação integral

do cidadão através do desenvolvimento de habilidades que convirjam para

um pensar melhor. A busca da qualidade filosófica na educação passa por

este caminho e requer o exercício do pensar crítico-criativo-cuidadoso, um

pensar sobre o próprio pensar e de professores que sabem com mestria

instigar seus alunos a pensar e pensar bem (inteligentemente).

Estamos cientes de que ensinar não é transmitir atos de fé¨ , mas an-

tes de tudo é construir conhecimentos juntamente com os alunos, de forma

crítica, cuidadosa e criteriosa. Abrindo possibilidades. Abrindo portas que

levarão a lugares novos, que a princípio, poderão ser até assustadores, mas

antes de tudo, lugares que geram mais e mais dúvidas, mais e mais

questionamentos, mais e mais saber.

Não existe escola sem filosofia, embora muitos ignorem isso, porque a

filosofia está subjacente a qualquer atividade educacional. Os problemas

certamente não estão restritos a esta disciplina. Eles fazem parte da nossa

realidade brasileira em todos os campos do fazer humano.

E se a filosofia é um constante indagar do homem sobre sim mesmo,

necessitamos empreender uma atitude filosófica do questionamento, do não-

conformismo, do assombro, do espanto, da admiração, pois deles nascem as

perguntas e com as perguntas, os problemas e com os problemas, a intenção

de solucioná-los. Porque não basta incluir a disciplina no currículo. Isto é

muito importante, e foi sempre a nossa bandeira de luta. Mas não é o sufici-

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

ente. Precisamos navegar neste mar revolto, fazer a nossa autocrítica, valori-

zar a nossa docência, interagir no processo juntamente com os nossos alu-

nos, buscar novos portos. Embora pareça algo distante, a filosofia está pre-

sente em nosso mundo e é sobre ele que ela nos fala. Ela busca romper com

os muros deste mundo e lançar um olhar para o infinito na busca de respos-

tas para os inquietamentos do homem concreto.

Evidentemente não se chegou ao fim do túnel, mas a nova luz que está

surgindo agrada, convence e atrai.

Recebido: 02/04/2004

Aceite para publicação: 16/04/2004

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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JAPIASSU, Hilton. Um Desafio à Filosofia. São Paulo: Letras & Letras, 1997.

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PETERSON, Wilferd A . A Arte do Pensamento Criativo. São Paulo: Best Seller,

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

CONTRIBUIÇÕES PIAGETIANAS À PRÁTICA PEDAGÓGICA DO/A

PROFESSOR/A1

Benedito de Oliveira

RESUMO: O texto faz uma análise das obras pedagógicas de Jean Piaget e aponta ascontribuições ao trabalho dos professores, especialmente da Educação Básica. Piagetdestaca, nessas obras, a importância de que a escola desenvolva um procedimento didáticoque favoreça a autonomia intelectual do/a aluno/a. Nesse sentido, é fundamental que o/aaluno/a tenha uma atuação ativa, aja sobre os conteúdos a partir dos esquemas de ações eoperações que dispõe. O texto traz, ainda, reflexões de Piaget sobre algumas áreas doconhecimento humano, bem como assinala subsídios importantes para as discussões atuaissobre formação de professores e avaliação do processo ensino-aprendizagem.

PALAVRAS-CHAVE: autonomia; prática docente; métodos; ramos de ensino; formação deprofessores.

ABSTRACT: This text makes an analysis of the literary pedagogical works of Jean Piagetand points out the contributions to the work of teachers particularly of the elementaryeducation. Piaget emphasizes in these works the importance of schools to develop didacticprocedures that sustains the intellectual autonomy of the student. Therefore, an activeparticipation of the student is fundamental in this manner working over the contents fromthe outlines of actions and operations he has available. The text still brings reflections ofPiaget about some areas of the human knowledge as well as points out important aids forthe present discussions about formation of professors and evaluation of the teaching –learning process.

KEY WORDS: autonomy; teacher practice; methods; teaching branches; formation ofprofessors;

O presente texto faz uma retomada das obras pedagógicas de Jean

Piaget com o objetivo de extrair as contribuições que podem ser aplicadas à

prática pedagógica do/a professor/a. É importante ressaltar que a prática

de sala de aula não é uma ação desvinculada do contexto maior em que o/a

1Texto elaborado como trabalho final na disciplina: Textos Pedagógicos de Jean Piaget, cursada noMestrado em Educação da UFRGS.

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

professor/a está inserido/a, porque a sua prática é a construção histórica de

sua condição de ser professor/a. A partir da abordagem piagetiana, pode-se

caracterizar os procedimentos didáticos desenvolvidos em sala de aula como

sendo de dois tipos: aqueles que favorecem a autonomia do aluno e aqueles

que não favorecem essa autonomia. A partir desta perspectiva, diferentes

metodologias podem ser concebidas para um mesmo fim, desde que levem

em consideração as estruturas que o aluno dispõe para que ocorra o proces-

so de aprendizagem.

Com base em Piaget, entende-se que todas as discussões em torno dos

procedimentos da educação mostram que as realidades que constituem o

processo educativo não são dadas a priori e nem resultam dos dados exclu-

sivamente colhidos do meio exterior, pois as mesmas se desenvolvem nas

relações interindividuais do aluno. Nesse sentido, as reações dos alunos es-

tão diretamente ligadas às relações que os mesmos estabelecem no espaço

sociocultural em que vivem, decorrendo desta conexão o seu processo

formativo.

Na obra O juízo moral na criança (1994), Piaget aborda a formulação

das regras do jogo de bolinhas que são instituídas pelas crianças; mostra

como a necessidade de estabelecer regras comuns faz com que elas incorpo-

rem o respeito à lei. Essa brincadeira, tão comum na vida da criança, traz

elementos extremamente significativos para as suas ações posteriores, pois

aí estão presentes dois grupos de fenômenos: as atividades e a consciência

dessas atividades. No estudo da construção dessas regras, observa-se em ge-

ral, que as mesmas são transmitidas pelos adultos e a criança fica impedida

de construir, ela mesma, as regras. Isso leva Piaget a se interessar pelos jogos

infantis, pois nestes as regras são construídas pelas próprias crianças.

A abordagem da construção das regras pela criança mostra que a prá-

tica pedagógica deve ser no sentido de desenvolver atividades em que os

alunos se sintam envolvidos na produção do significado de suas ações e,

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

conseqüentemente, o aprendizado se torne mais prazeroso e mais significa-

tivo. Isso exige repensar as formulações forjadas historicamente sobre o

papel do professor como transmissor de conteúdos ou facilitador do mes-

mo.

De acordo com Piaget, em seu processo de desenvolvimento, o indiví-

duo percorre três tipos de regras: a) a regra motora que nasce da inteligên-

cia pré-verbal e independente de toda relação social; b) a regra coercitiva

que é conseqüência do respeito unilateral e c) a regra racional que decorre

do respeito mútuo. Esses três tipos de regras se articulam no processo de

relações pedagógicas em sala de aula e pode tomar rumos que trarão contri-

buições ou não ao aprendizado. Se as relações se derem de forma coercitiva

em que o aluno não participa, é passivo, por conseguinte, não há contribui-

ções ao processo de conhecimento e a aprendizagem será, no máximo, uma

memorização que deve ser repetida corretamente. Se, ao contrário, predomi-

nar o tipo racional em que prevalece o respeito mútuo, as relações entre o

professor e o aluno são de busca e desafio constante diante do conhecimen-

to. Dessa forma, o conhecimento passa a ser significativo e, ao mesmo tem-

po, possibilita o envolvimento do aluno com o processo de sua construção.

Destarte, um processo em que só o professor sabe e o aluno nada

sabe, faz com que as relações pedagógicas de sala de aula sejam assimiladas

a deveres, propriamente ditos. Este procedimento faz com que o conheci-

mento se torne absoluto e sacralizado e, dessa forma, impossibilita as discus-

sões e debates em sala de aula, pois predomina a palavra do/a professor/a

como quem detém o saber e, nesse sentido, os demais devem se calar. Portan-

to, o/a professor/a não pode ser questionado e assim o dever é essencial-

mente heterônimo e as exigências operacionalizadas por meio da ação do-

cente devem ser observadas ao pé da letra, acarretando uma concepção ob-

jetiva de responsabilidade.

É necessário compreender que o pensamento verbal da criança é uma

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

tomada de consciência progressiva dos esquemas construídos pela ação. Por

isso evolui, segundo a idade com uma certa regularidade. Todavia, a escola

nem sempre acompanha este desenrolar natural da criança conduzindo o

processo de aprendizagem de forma autoritária, inibindo as iniciativas pró-

prias da infância e, conseqüentemente, impedindo o seu desenvolvimento

intelectual. Isso traz conseqüências para a vida acadêmica futura. Deve ser

feito, então, um trabalho de resgate da autonomia do aluno, envolvendo o

mesmo em atividades que propiciem a descoberta e os desafios. Por isso, o

conhecimento não pode ser “depositado” na mente do aluno pelo/a profes-

sor/a, mas deve ser construído na trama das ações e interações em que tanto

professor/a quanto alunos se sintam desafiados a desvendar a realidade.

Piaget argumenta com insistência que desde o momento em que a

criança inicia sua vida escolar, há uma relação imposta pelo/a professor/a; é

uma relação em que não há reciprocidade. Esta forma de convivência entre

professor/a e aluno, às vezes, se torna tensa, caracterizando a existência de

ações conflitantes no interior da escola, o que requer um redimensionamento

da prática educativa na perspectiva de desenvolver a reciprocidade. É preci-

so ressaltar que somente a reciprocidade possibilita a autonomia do indiví-

duo. Esta é possível quando o respeito mútuo é bastante forte para que o

aluno sinta interiormente a necessidade de tratar os outros como gostaria

de ser tratado. Isso leva à autonomia no processo de aprendizagem, pois o/

a aluno/a não precisa aceitar o modelo de organização do espaço de cons-

trução de conhecimento, se este não possibili tar o exercício do

questionamento, do debate, da busca, do desafio etc.

No espaço acadêmico, a aquisição das relações de responsabilidade,

compromisso e respeito mútuo constituem o núcleo fundamental das rela-

ções humanas. Existem dois tipos de respeito: o respeito unilateral, que se

caracteriza por uma relação de alguém que manda e outro que obedece, e o

respeito mútuo que se caracteriza por uma relação de cooperação. Somente

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

este último conduz à responsabilidade, pois o aluno, também participa e, ao

fazer isso, constrói sua autonomia. Assim, as normas podem ser melhor com-

preendidas e vivenciadas. O respeito mútuo leva à cooperação em sala de

aula que, por sua vez, conduz à responsabilidade do aluno diante do traba-

lho desenvolvido na prática escolar. Nesse sentido, Piaget ressalta “... que o

fim da educação moral é constituir personalidades autônomas aptas à coo-

peração...” (1998a, p. 32).

Esta oposição entre respeito unilateral e respeito mútuo não ajuda a

esclarecer os procedimentos metodológicos de sala de aula, por isso Piaget

aproveita as contribuições e os limites de cada um e aponta para os procedi-

mentos ativos da educação como sendo o melhor caminho para formar um

ser autônomo e livre. Para isto, é necessário falar de relações pedagógicas,

partindo das interações que o aluno estabelece com a realidade e que vão

construir seus esquemas de ação.

Dessa forma, Piaget destaca a escola ativa em que a vida do aluno deve

estar ligada a toda atividade escolar. Assim, o desenvolvimento moral é de-

corrente tanto do respeito mútuo como do respeito unilateral e a coopera-

ção no trabalho escolar se caracteriza como o procedimento mais propício

da educação escolar. Este procedimento leva o aluno a compreender que

não é único e que, juntos, podem encontrar soluções para os problemas do

dia-a-dia, tais como resolver um problema relacionado ao conteúdo, discutir

problemas relacionados às teorias epistemológicas, resolver um problema

do cotidiano, etc. Com isso, o método ativo não impõe pela autoridade aqui-

lo que o aluno pode buscar por si mesmo e, ainda mais, contribui para criar

um espaço em que o aluno possa realizar suas próprias experiências e dis-

cuti-las à luz dos conhecimentos que dispõe.

Uma prática pedagógica baseada na autoridade torna o indivíduo cada

vez menos livre, pois as ações pedagógicas são realizadas por meio da coa-

ção por parte do/a professor/a. As ações pedagógicas se manifestam nas

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

avaliações (provas), nas rotulações (não sabe, é burro, não estuda, é pregui-

çoso etc), nas ameaças (cuidado com a prova, vai reprovar, nunca vai sair da

escola, você vai ver o que vai acontecer, etc) e, enfim, na prática pedagógica

autoritária. O aluno acaba recebendo o conhecimento simultaneamente prá-

tico, efetivo e ideológico que as autoridades tanto políticas como educacio-

nais detêm. Essas práticas fazem com que o processo pedagógico torne o

indivíduo cada vez menos livre com o avanço da idade, trazendo conseqüên-

cias desastrosas para o mesmo. Essas conseqüências se manifestam nas difi-

culdades do adulto de se expressar, expor aquilo que pensa, colocar no “pa-

pel” as suas elaborações intelectuais, enfim, tem medo de encarar a realidade

em que está inserido.

Na prática pedagógica, o aluno deve ser instigado sempre a buscar o

conhecimento através da pesquisa individual e coletiva, dos trabalhos em

grupos, dos seminários, dos debates, das discussões enfim, de todos os pro-

cedimentos que possibilitem a participação ativa do aluno. O/a professor/a

não pode deixar o aluno caminhar sozinho, senão o seu papel fica sem im-

portância; pelo contrário, deve discutir com o aluno, desafiando-o sempre a

avançar em seu processo de conhecimento. Por isso deve ser um profundo

conhecedor da sua área de conhecimento. Para realizar o seu trabalho, o

professor/a pode lançar mão de todos os recursos disponíveis, pois o valor

dos recursos está nas atividades que desencadeiam, nas atividades operatóri-

as que propiciam. É necessário ressaltar que se os recursos não possibilita-

rem a realização de atividades que desafiem os alunos, permanecem apenas

no verbalismo da imagem mais refinada que a palavra e não ajudam em nada

o processo de conhecimento do aluno. Portanto, os recursos não podem

dispensar o papel do/a professor/a de provocar as atividades operatórias

em salas de aula.

Nesse sentido, a escola deve ser vista como o espaço da liberdade, que

leva o/a aluno/a ao esforço de construir para si uma representação das coi-

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

sas e, ao mesmo tempo, um projeto pessoal de vida. A esse respeito, o proces-

so educativo não pode dicotomizar a vida do aluno de sua educação intelec-

tual, pois não se forma o indivíduo apenas para a escola, mas para interagir

com as várias dimensões que compõem a vida em sociedade. Destacando a

importância de que o docente não seja dono da verdade, para que a inteli-

gência do aluno não seja submetida a sua autoridade, Piaget assim preleciona:

“... a formação do espírito é uma só, e se a inteligência do aluno for submeti-

da à autoridade de um professor no terreno dos conhecimentos, a consciên-

cia moral não conseguirá libertar-se a ponto de construir uma regra de con-

duta adaptada aos problemas atuais” (1998a, p. 165).

A educação deve conduzir o aluno para construir, por conta própria,

as soluções para os problemas enfrentados no dia-a-dia, pois somente a ação

efetiva pode construir o progresso da consciência e o amadurecimento pes-

soal para enfrentar os desafios exigidos pela vida em sociedade. Nesse as-

pecto, merecem destaque os métodos ativos para formar pessoas partici-

pantes que tragam o progresso ao futuro da sociedade. Para alcançar esta

meta, é necessário analisar o que terá mais êxito: se a transmissão de verda-

des prontas e acabadas por meio da repetição ou uma assimilação mais

ativa. Nesse sentido, Piaget mostra que as funções essenciais da inteligência

consistem em construir estruturas, estruturando o real. Esta estruturação do

real não é repetição, é ação sobre o objeto para transformá-lo; é captar os

mecanismos dessa transformação, possibilitando organizar o real em ato ou

em pensamento e não, enquanto, cópia.

O trabalho pedagógico deve desenvolver na prática de sala de aula a

vivência da solidariedade, fazendo com que a criança descubra, desafiada

pelo/a professor/a, as leis das relações sociais. Piaget diz que num primeiro

momento, a solidariedade é externa e a regra deve ser obedecida e num

segundo momento, a solidariedade se torna interna e são as próprias crian-

ças que elaboram as regras de convivência. Esses dois tipos de solidariedade

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

conduzem ou ao respeito unilateral ou ao respeito mútuo, os quais têm im-

plicações na prática pedagógica, estendendo-se ao mundo das relações soci-

ais mais amplas. O respeito unilateral conduz à obediência passiva, cercean-

do o aluno do seu direito à liberdade, enquanto o respeito mútuo conduz à

cooperação. Esta é definida por Piaget como sendo

(...) o conjunto das interações entre indivíduos iguais (poroposição às interações entre superiores e inferiores) e dife-renciados (em contraposição ao conformismo compulsório).Sociologicamente, a cooperação organizou-se em correlaçãocom a divisão do trabalho social e com a diferenciação psico-lógica dos indivíduos que dela resultou. A cooperação supõe,então, a autonomia dos indivíduos, ou seja, a liberdade de pen-samento, a liberdade moral e a liberdade política (1998a, p.153).

A solidariedade verdadeira só pode ser construída num espaço em

que exista a cooperação, possibilitando que cada um compreenda o outro.

Por isso é importante que, na de sala de aula, os alunos trabalhem juntos

para que tomem consciência da solidariedade intelectual dos indivíduos e,

ao mesmo tempo, elaborem a sua própria. Isso, segundo Piaget, passa pelo

processo de os alunos colaborarem no seu próprio trabalho. Nesse sentido,

é importante que quando a criança inicia sua vida escolar, o ambiente seja

desafiador propiciando-lhe a construção das regras de convivência humana.

Assim é possível desenvolver a perspectiva de que a verdade nunca está

pronta, é um esforço permanente de todos os que têm um espírito aberto às

novas possibilidades.

A cooperação deve ser vivida em todos os aspectos da vida escolar e

extra-escolar do aluno. Esta perspectiva constrói a autonomia a qual leva à

liberdade; o indivíduo faz uma avaliação crítica do sentido da experiência e

da necessidade de coerência lógica, pressupondo o livre jogo das funções

intelectuais. Esta liberdade decorre de um efetivo compromisso educacio-

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

nal, pois “toda pessoa tem direito à educação”. Isso leva a reconhecer clara-

mente o papel dos fatores sociais na formação do indivíduo.

Por isso, o direito à educação implica uma ambiência social específica,

pois a educação é condição formadora do próprio desenvolvimento do indi-

víduo. Nesse sentido, Piaget afirma que o direito à educação significa “...

garantir para toda criança o pleno desenvolvimento de funções mentais e a

aquisição dos conhecimentos, bem como dos valores morais que

correspondam ao exercício dessas funções, até a adaptação à vida social

atual...” (1984, p. 34).

O/a educador/a tem diante de si um grande desafio: construir um ins-

trumental que possibilite ao aluno compreender e agir diante das circuns-

tâncias em que se encontra inserido e, ao mesmo tempo, permitir-lhe relaci-

onar os fatos entre si. Para que isso aconteça são necessárias algumas condi-

ções: 1) é preciso sair do egocentrismo intelectual e moral, em que nos faz

ser o centro do mundo, em que se entende que todo o processo de conheci-

mento gira em torno do próprio sujeito, 2) livrar-nos das coerções sociais

que nos mantêm ligados às tradições, ao passado e ao grupo social ao qual

pertencemos para alargar os horizontes e ampliar nossa visão de mundo,

saindo do pequeno grupo que nos cerca, 3) promover a reciprocidade, com-

preendendo que o ponto de vista pessoal não é o único possível, embora

seja muito importante para que tanto o/a professor/a como os alunos mos-

trem as suas concepções de conhecimento, de escola, de sociedade, de apren-

dizagem, de ser humano, de vida, etc. Caracterizando esta importância, Piaget

afirma “...creio que cada um deve manter sua perspectiva particular, pois ela

é, em última instância, o único laço que existe com o real...” (1998a, p. 103).

Por isso é preciso abandonar o egocentrismo para construir outro instru-

mento: a lógica das relações, pois toda adaptação do indivíduo ao espaço ou

ao grupo implica a lógica das relações com os demais membros do grupo

social.

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

A cooperação ainda encontra muita resistência devido ao processo

educativo que se mantém de forma tradicional, pois se entende como natu-

ral coerção na escola. No entanto, os novos métodos insistem que os alunos

devem se relacionar, através das mais diversas atividades desenvolvidas tan-

to no espaço escolar como extra-escolar. Nesse sentido, somente uma peda-

gogia das relações sociais possibilita atitudes sadias e permitirá aos alunos

um avanço na compreensão da vida em sociedade, em suas mais diversas

circunstâncias. Por isso, somente uma educação que coloque em prática a

reciprocidade e a cooperação está em condições de transformar as crianças,

os adolescentes e os jovens desenvolvendo neles um espírito ativo, criativo e

que todos, na vida adulta, tomem decisões diante das exigências da vida, no

sentido de construir a sua autonomia e, conseqüentemente, a cidadania ple-

na.

Este processo pedagógico deve ser feito por meio dos métodos ativos.

Piaget destaca dois: 1) o self-government que possibilita desenvolver a per-

sonalidade e o espírito de solidariedade no aluno, levando-o à autonomia

interior. Este procedimento ensina os alunos a sairem do egocentrismo e a

realizarem ações conjuntas, submetendo-se às normas comuns. É necessário

observar que as crianças, até os 7-8 anos, não manifestam disposição para a

cooperação. A partir desta idade, há um início de cooperação, quando as

regras deixam de ser dispersas; há o começo do controle mútuo, que substi-

tui a obediência aos adultos. Somente a partir dos 11-12 anos é que a coope-

ração se manifesta de forma mais precisa gerando uma obediência às regras

como conseqüência do respeito mútuo e que deve ser aceita pelo grupo. 2)

O trabalho em grupo é muito importante para o desenvolvimento intelectu-

al, pois possibilita a organização cognitiva do indivíduo, o pensamento obje-

tivo e comunicável e, ao mesmo tempo, se descubra, aprendendo a conhecer

os outros e a desenvolver suas atividades numa perspectiva de conjunto. O

processo acontece através da discussão, da troca de idéias, debates, da cola-

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

boração no jogo e na realização da pesquisa acadêmica, etc. Este trabalho

grupal fortalece as relações de cooperação, o que é muito significativo, pois

esta (a cooperação) é uma fonte de regras para o pensamento. A cooperação

possibilita exercitar o pensamento, fazendo com que o aluno elabore análi-

ses conceituais que estejam de acordo consigo mesmo, ou seja, sendo hones-

to na organização e na conduta do pensamento. Por isso a cooperação é

condição fundamental para a formação da própria capacidade de pensar.

Os novos métodos favorecem a adaptação, ou seja, o equilíbrio a par-

tir das trocas entre o indivíduo e os objetos, pois utilizam as tendências

próprias da infância e a atividade espontânea da criança em seu desenvolvi-

mento mental. Essa adaptação é um equilíbrio entre a assimilação e a acomo-

dação, pois o pensamento é adaptado à realidade quando o indivíduo assimi-

la a seus esquemas essa realidade. Por isso

a adaptação supõe uma interação (...) entre o sujeito e o obje-to, que o primeiro possa incorporar a si o segundo levandoem conta as suas particularidades; a adaptação é tanto maiorquanto forem melhor diferenciadas e mais complementaresessa assimilação e essa acomodação. (PIAGET, 1998b, p. 157).

A forma de trabalho desenvolvido pela escola ativa mostra que o es-

forço deve vir do próprio aluno e não pode ser imposto, pois o aluno é

sujeito do processo de busca do conhecimento e, por isso, deve ter uma

atuação ativa, agir sobre os conteúdos, as informações provenientes da ex-

periência, a partir dos esquemas de ações e operações que o próprio aluno

dispõe. Esses esquemas vão sendo construídos no processo próprio de suas

atividades discentes, ou seja, de atuação sobre o que está sendo “descoberto”

no processo pedagógico da sala de aula. Esta perspectiva mostra simples-

mente que as leis da inteligência devem ser respeitadas. Estas leis indicam

que antes da linguagem, há uma inteligência prática na criança que já orga-

niza no plano da ação, um universo sólido e coerente. Esta inteligência práti-

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

ca precede a inteligência refletida.

Os métodos novos “... se inspiram todos mais ou menos na doutrina do

justo meio, dando lugar de um lado à maturação estrutural e de outro às

inf luências da experiência e do meio social e físico ...” (Ibidem, p. 173). Aqui

não se pode negar que uma mudança na prática pedagógica exige a forma-

ção do/a professor/a, pois os métodos ativos são mais difíceis de ser realiza-

dos, exigem uma nova metodologia de trabalho que conduza à participação

do aluno e, para isso, faz-se necessário um conhecimento profundo dos mé-

todos ativos por parte do/a professor/a.

O/a professor/a não pode afirmar que trabalha com um determinado

método sem conhecê-lo o suficiente para avaliar os seus resultados. Isso não

se faz do “dia para a noite”, exige estudos e muito esforço por parte do/a

professor/a. O desconhecimento e o despreparo levam muitos docentes a

confundirem métodos ativos com métodos intuitivos, fazendo com que pen-

sem que a atividade do sujeito se reduz a ações concretas, quando, na reali-

dade, o trabalho pedagógico deve levá-lo a uma ref lexão interior e abstrata

de suas próprias ações. Outra confusão é entender que as atividades que

incidem sobre objetos concretos se reduzem a um processo figurativo, em

que se forneça uma imagem mental aos objetos em questão. Isso não contri-

bui para o processo de conhecimento, pois este não é cópia em percepção

ou imagens mentais dos objetos em questão.

Reflexões de Piaget sobre alguns ramos de ensino.

Piaget traz contribuições significativas para algumas áreas específi-

cas do conhecimento humano, caracterizando o processo de aprendizagem

e mostrando o que pode e o que deve ser feito para desenvolver o ensino

ativo de forma que o aluno se sinta envolvido no processo de construção do

seu conhecimento.

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

Em relação ao ensino de história, Piaget mostra que desconhecemos

a forma como a criança se relaciona com o passado não vivido e de como

ultrapassa a memória individual. A análise desse tema deve contar com a

contribuição de pedagogos e psicólogos. Os psicólogos contribuem para

descobrir os mecanismos dos fatos e os pedagogos analisam as condições

em que os fatos foram produzidos pelo passado e que são estudados em

aulas de história. A criança pensa a partir de realidades mais conhecidas,

concebendo o passado em função do presente. Nesse sentido, só é possível

compreender o estudo das civilizações antigas e justificar sua presença nos

currículos pela relação com a civilização moderna. Além disso, esta aborda-

gem precisa ser desenvolvida numa perspectiva sociológica que permita ao

aluno uma visão mais abrangente dos diversos fatores sociais que fazem

parte da sociedade atual. Por isso é importante pesquisar com maior pro-

fundidade a psicologia das representações históricas da criança, possibili-

tando compreender suas atitudes intelectuais espontâneas, e que assim se

possa determinar o meio mais apropriado para o ensino de história.

As ciências naturais (física, química e biologia) desempenham um

papel importante na formação de uma inteligência ativa, crítica e criativa e

contribuem para a pesquisa construtiva, pois ela favorece a atividade do

aluno, ajudando-o a formar o espírito científico. Observa-se um interesse

muito grande dos alunos entre 7 e 12 anos pelas ciências naturais, pois estas

atendem ao desenvolvimento intelectual próprio dessa idade. O papel do/a

professor/a é discutir e, sobretudo, instigar a curiosidade da criança. Para

que isso aconteça, o professor deve ser um mediador que instiga o aluno à

atividade e que o leve, por meio da ação, a elaborar suas próprias operações

intelectuais, alterando a prática pedagógica de impor verdades, através da

leitura da realidade, enquanto algo dado e externo, por uma atividade de

descoberta e de invenção das próprias experiências. Este caminho aciona a

descoberta de novos problemas e leva o aluno a ser um experimentador

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

ativo, que busca soluções intelectuais. Estas ciências evoluíram significativa-

mente em suas pesquisas, e em decorrência disso, a sociedade contemporâ-

nea sofreu grandes transformações, a partir dos trabalhos desenvolvidos

pelos físicos, químicos e biólogos. Estas pesquisas requerem que a escola

trabalhe cada vez mais a capacidade hipotético-dedutiva da criança para

possibilitar uma educação do espírito experimental e que o ensino, em ge-

ral, deva insistir mais na pesquisa e na descoberta do que na repetição.

Na educação artística, Piaget destaca que ao observar o desenvolvi-

mento das funções mentais e das aptidões na criança, dois fatos merecem

uma cuidadosa atenção: o primeiro é que a criança menor parece mais dota-

da para o desenho, à expressão simbólica e à música que a mais velha, já em

relação às funções intelectuais e aos sentimentos sociais, observa-se um pro-

gresso contínuo. Já no campo da expressão artística, percebe-se um retro-

cesso, isso causa estranheza, pois parece que o espaço familiar e a escola, ao

invés de desenvolverem as formas de expressão infantil, agem de modo a

dificultar essas tendências naturais da criança. O segundo é a dificuldade de

estabelecer fases regulares de desenvolvimento das tendências artísticas na

criança. A educação artística deve ser a educação da espontaneidade da cri-

ança, por isso não pode aceitar a transmissão de uma verdade ou ideal já

elaborados. Estes só são significativos se forem recriados pelo próprio sujei-

to.

Sobre o ensino da filosofia, Piaget ressalta que com o objetivo de for-

mar o espírito, a abordagem filosófica constitui elemento essencial para to-

dos os alunos, situando os valores do conhecimento no conjunto dos outros

fins humanos, constituindo uma espécie de fé racionalizada. Por isso o ensi-

no da filosofia tem diferentes abordagens, dependendo das concepções po-

líticas presentes na administração do Estado. Esta dispersão e falta de unida-

de fizeram com que a filosofia perdesse espaço no decorrer do tempo, por

exemplo, a lógica saída da ref lexão aristotélica, passando pela possibilidade

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

de generalização por Leibniz, conquistou sua autonomia no século XIX, de

forma que hoje está muito mais próxima da matemática; poucos filósofos se

arriscam a ensiná-la. Da mesma forma, a psicologia e a sociologia constituí-

ram seu próprio campo de estudo, de investigação. Tudo isso trouxe uma

crise para a filosofia e que perdura até os dias de hoje.

Em relação ao ensino das línguas antigas, Piaget aponta que este tem

dois objetivos: um é formar o espírito histórico e conhecer as civilizações

passadas, para compreender a sociedade atual. Este objetivo é essencial, pois

destaca a importância de estudar as culturas e sua história. O outro objetivo

é a formação do espírito geral e que através do exercício intelectual o sujei-

to avança significativamente em outras atividades ligadas ao conhecimento

humano.

Em relação ao ensino de línguas, Piaget fala do conf lito entre o

gramático e o lingüista, mostrando o caráter antiquado de certas normas

gramaticais, enquanto que a lingüística tem avanços significativos constitu-

indo “... uma fonte inesgotável de cultura e permanece quase de todo ausen-

te dos programas do segundo grau...” (1998b, p. 70).

No que tange à matemática, Piaget destaca a necessidade de observar

o desenvolvimento espontâneo das operações lógico-matemáticas na crian-

ça, pois esse desenvolvimento é necessário e não pode ser simplesmente

esquecido pelos estudiosos. O ensino deve formar e, ao mesmo tempo, tra-

zer os avanços conquistados nesse campo e não passar a idéia de que conhe-

cimento matemático é pronto e estático, mas que carrega (como as demais

áreas de conhecimento) em sua formulação a sua própria dinâmica. É preci-

so que o aluno descubra e não tenha uma verdade como absoluta. O desafio

no ensino da matemática é superar os métodos arcaicos baseados na trans-

missão e no verbalismo para primar pela reinvenção ou na descoberta pelo

aluno. Desde os sete anos de idade, a criança manipula operações de conjun-

to, de espaço vetorial, etc., mas não sabe disso, pois são esquemas fundamen-

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

tais de comportamento e posteriormente de raciocínio, antes mesmo de se-

rem objeto de ref lexão. É preciso então conciliar os avanços no campo da

matemática com os conhecimentos obtidos pela psicologia, pois assim abre

um futuro promissor para o processo ensino-aprendizagem desta discipli-

na. No ensino da matemática, observa-se um paradoxo: alunos com facilida-

des em outros campos do saber, têm dificuldades em matemática, pois esta

convida para uma ref lexão sobre as estruturas, exigindo um alto grau de

abstração; esta é de natureza operatória e procede por etapas a partir das

observações mais concretas.

Formação de professores e avaliação

Em relação às dificuldades de aprendizagem, Piaget chama atenção

para o fato de que em todas as áreas existem resultados insatisfatórios. As

chamadas aptidões não significam nada mais do que a capacidade do indiví-

duo de se adaptar ao tipo de ensino que é desenvolvido. Para realizar uma

reforma profunda na prática de sala de aula, exige-se que os professores

recorram aos métodos ativos, dêem destaque à pesquisa espontânea da cri-

ança e do adolescente e orientações seguras para a pesquisa do estudante e

que o conhecimento seja reinventado ou reconstruído pelo aluno. O que se

espera é que o/a professor/a deixe de ser um transmissor de soluções pron-

tas e acabadas para reconstruí-las no espaço em que professores e alunos se

encontram inseridos. Para esse trabalho docente, os métodos ativos são fun-

damentais. Nesse sentido, a lição de Piaget é elucidativa quando afirma que

O princípio fundamental dos métodos ativos (...) assim podeser expresso: compreender é inventar, ou reconstruir atravésda reinvenção, e será preciso curvar-se ante tais necessidadesse o que se pretende, para o futuro, é moldar indivíduos capa-zes de produzir ou de criar, e não apenas de repetir. (1984,p.17).

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

Nas ações próprias do processo pedagógico deve-se ressaltar a im-

portância de se estabelecer as relações interdisciplinares, pois as estruturas

das disciplinas ou são comuns ou são solidárias entre si. Dessa forma, é pre-

ciso que o/a professor/a tenha uma visão ampla, sem esquecer a sua especi-

alidade e crie condições para que o aluno perceba as relações entre os diver-

sos campos do saber. A interdisciplinaridade provoca a necessidade de rever

as relações entre as ciências humanas e as ciências naturais de forma a supe-

rar as barreiras disciplinares; por isso é importante um trabalho que possi-

bilite aos alunos o livre trânsito para outras áreas de conhecimento, inclusi-

ve com múltiplas combinações.

Para que se possa aprofundar discussões sobre a prática pedagógica

do/a professor/a é necessário resolver o problema da formação dos profes-

sores. A questão é séria e comanda todas as outras reformas do sistema edu-

cacional, pois a desvalorização do magistério afasta muitos docentes com-

prometidos com a transformação da escola e da prática pedagógica. O pro-

blema da formação de professores pode comprometer o trabalho didático-

pedagógico da escola, pois quanto melhor os métodos, mais exigente se tor-

na o trabalho do/a professor/a, o que requer uma formação profunda, bem

como disponibilidade e envolvimento com o exercício de sua profissão.

A possível solução apontada por Piaget é a formação universitária

completa, como requisito mínimo, para todos os professores da educação

básica e a pós-graduação strictu sensu para os professores que desenvolvem

atividades no ensino superior, pois há um grande número de docentes que

desenvolvem suas atividades sem os requisitos mínimos exigidos e deseja-

dos. Porém, não basta só a formação mínima, é necessário um processo de

formação continuada de todos os professores, através de uma efetiva rela-

ção entre o ensino e a pesquisa. Para isso devem ser formados grupos de

pesquisadores de especialidades complementares e que trabalhem em cons-

tante cooperação.

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

Como parte deste processo, Piaget trata da avaliação e argumenta que

a mesma deve ser feita através da observação contínua do trabalho do aluno.

Esta observação deve ser realizada pelo professor. O grande problema é a

interferência pessoal que pode comprometer o processo avaliativo, por isso

o/a professor/a deve separar as qualidades próprias do aluno em sua ativi-

dade escolar daquelas que se referem a seu modo de ser na vida cotidiana,

ou seja, suas qualidades permanentes que fazem ser o que é. Este trabalho é

árduo para o/a professor/a, por isso somente os métodos ativos possibili-

tam acompanhar o trabalho do aluno. Estes permitem, também que o aluno

possa avaliar sua caminhada, na medida em que participa das atividades do

processo de construção do conhecimento, pois somente os métodos que

não se inspiraram na maturação estrutural, nem nas inf luências do meio

físico e social, mas no equilíbrio destas correntes epistemológicas, tiveram

sucesso no processo pedagógico da sala de aula.

Destarte, os estudos piagetianos indicam que as pesquisas psicológi-

cas no que se referem às aplicações pedagógicas progrediram significativa-

mente nos últimos tempos, porém permanecem fundamentadas em três teo-

rias:

(...) Uma delas (...) associacionismo empirista, (...). A segundase caracteriza por um retorno inesperado aos fatores deinatismo e maturação interna (...) a terceira (...) é de naturezaconstrutivista (...) sem preformação exógena (empirismo)ou endógena (inatismo) por contínuas ultrapassagens daselaborações sucessivas, o que do ponto de vista pedagógico,leva incontestavelmente a dar toda ênfase às atividades quefavoreçam a espontaneidade da criança (PIAGET, 1984, p. 10-11).

O grande desafio é superar as duas primeiras e para isso a prática

pedagógica exige novas posturas do/a professor/a: é preciso repensar as

ações, rever os métodos de ensino e desenvolver o caráter interdisciplinar.

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

Em relação aos métodos, Piaget ressalta que o processo de conhecimento

deve ser feito através da pesquisa espontânea em que o aluno deve reinventar

ou, pelo menos, reconstruir a verdade, pois esta não pode ser simplesmente

transmitida. A prioridade maior deve ser a atividade do aluno, pois somente

a ação pode levá-lo à construção das operações intelectuais. Assim, o/a pro-

fessor/a deve desenvolver uma metodologia de trabalho que estimule a pes-

quisa e não se contente em transmitir verdades prontas e acabadas. Não

pode ser um conferencista em que é dono da palavra e da verdade, por isso

o aluno deve ser concebido como alguém que constrói conhecimentos, a

partir dos seus próprios interesses e necessidades.

Para que possa realizar um bom trabalho, o/a professor/a precisa co-

nhecer bem a sua disciplina, conhecer os mecanismos das operações da inte-

ligência e, da mesma forma, as diferentes noções a ensinar. Ao mesmo tempo,

ter clareza da teoria que fundamenta as suas ações em sala de aula para que

o processo de conhecimento seja de fato construído e, conseqüentemente,

seja mais prazeroso o ato de estudar/aprender.

No processo educativo, principalmente das crianças, a manipulação

dos objetos, as interações com a realidade, o contato entre si, etc. são funda-

mentais para aperfeiçoar a curiosidade epistemológica da criança. É neces-

sário entender que o que interessa não é tanto o conhecimento dos fatos,

mas o caminho percorrido pelo sujeito na elaboração do conhecimento. Daí

a importância dos métodos ativos em que o aluno é sujeito do processo de

aprendizagem. Só os métodos ativos trazem significado ao processo educativo,

pois possibilitam uma prática pedagógica não mecânica. Caracterizando a

mecanização da função docente, Piaget (1998b) mostra que as melhores re-

ferências são as máquinas de ensinar, pois trazem uma grande contribuição

ao mostrar a função mecânica do trabalho do/a professor/a que realiza a

sua prática baseada na transmissão, na repetição e na memorização do co-

nhecimento, pois se o objetivo é repetir corretamente o que foi exposto, as

65

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

máquinas fazem isso, talvez, até melhor que o ser humano. Por isso, para a

própria valorização da função e do trabalho do/a professor/a, o ensino tra-

dicional deve ser desqualificado e o docente precisa investir toda a sua ener-

gia nos métodos ativos, pois ambos (professores e alunos) são sujeitos do

mesmo processo de busca, de descoberta etc. Mas para isso o/a professor/a

também deve ser um pesquisador, pois não tem sentido possibilitar aos

outros aquilo que ele mesmo não faz. Este não envolvimento do professor

com a pesquisa precisa ser superado para que de fato ambos (professores e

alunos) se envolvam neste desafio de conhecer a realidade.

Recebido: 02/04/2004

Aceite para publicação: 16/04/2004

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

PARRAT, Silvia; TRYPHON, Anastasia (Orgs). Jean Piaget. Sobre a Pedagogia.

São Paulo: Casa do Psicólogo, 1998a.

PIAGET, Jean. Psicologia e Epistemologia: por uma teoria do conhecimento.

2.ed, Rio de Janeiro: Forense, 1978.

___.Para onde vai a educação? 8.ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1984.

___.O nascimento da inteligência na Criança. 4.ed. Rio de Janeiro: Editora

Guanabara, 1987.

___. O juízo moral na criança. 2.ed. São Paulo: Summus, 1994.

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

___. Psicologia e pedagogia. Rio de Janeiro: Forense, 1998b.

___.Desenvolvimento e aprendizagem. Porto Alegre, s.d.(digitado).

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

CURSO DE PEDAGOGIA EM QUESTÃO: DA FORMAÇÃO DOS

EDUCADORES1

Bernardete A.Gatti

RESUMO: discute sobre o surgimento do curso de Pedagogia no Brasil e suas múltiplasfacetas que, com a implantação das habilitações na graduação, acentua-se a descaracterizaçãoda imagem do pedagogo e do sentido mais global de sua formação. Constata-se anecessidade definir um perfil profissional com maior aprofundamento intelectual,capacidade de desenvolvimento de novas formas de utilização dos conhecimentos,condições de rompimento das barreiras na divisão de áreas de conhecimento e trabalho,com visão mais profunda e mais clara quanto à complexidade em vários aspectos domundo do trabalho e da vida.

PALAVRAS-CHAVE: Curso de Pedagogia; perfil profissional; conhecimento.

ABSTRACT: It discusses about the beginning of the Pedagogy course in Brazil and itsmultiple facets that with the establishment of different qualifications in the Pedagogycourses, emphasizes the wrong characterization of the pedagogy teacher image as well asa more general meaning of his graduation. The necessity to define a professional profile isverified. One with deeper intellectual, capable of developing new ways to use his knowledgein a position to break the barriers in the division of areas of knowledge and work with amore profound and clear vision, as to the complexity in various aspects in the world ofwork and life.

KEY WORDS: Pedagogy Course; professional profile; knowledge;

O curso de Pedagogia como graduação, não encontra similar em ou-

tros países. Na verdade nasceu como uma tentativa de se montar algo seme-

lhante à Escola Normal Superior francesa, mas, entre nós assumiu caracterís-

ticas bem distintas daquelas. Nosso curso de Pedagogia objetivou, ao ser

criado, a formação de professores para atuar como docentes de nossas esco-

las normais que eram cursos em nível médio, como também para dar uma

certa formação psicopedagogia. Estruturava-se com um currículo de disci-

1Texto apresentado no Fórum Nacional de Instituição do Ensino Superior do Setor Privado, 2002, SãoPaulo.

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

plinas obrigatórias, comuns, nos três primeiros anos, com alguma diversifi-

cação quanto a optativas no quarto ano. Com a reforma do ensino superior

em 1968 há um fracionamento do curso trazido não só pelo conceito de

cursos semestrais e sistema creditíco, como pela consolidação das chama-

das habilitações específicas, que na graduação já passa a diferenciar, em

termos de disciplinas e programas, as especialidades (administração escolar,

orientação educacional, supervisão, etc.). em algumas instituições estas es-

pecialidades no início dos anos 60 eram contempladas, porém não na gradu-

ação, mas sim, em nível de especialização, de pós-graduação “latu senso”

Trazidas às habilitações para a graduação em Pedagogia, amplia-se a

descaracterização da imagem do pedagogo e do sentido mais global de sua

formação. Institucionalmente cada habilitação, em geral, passa á competên-

cia de departamentos estanques que pouco se comunicam, favorecendo, pela

especialização talvez precoce, a dissolução de uma perspectiva geral de for-

mação do pedagogo, que também socialmente passa a encontrar dificuldade

para definir-se a partir de uma certa identidade profissional.

Os cursos de Pedagogia formam, então, profissionais com habilitações

variadas: professores para o ensino médio/habilitação magistério; professo-

res de ensino fundamental (1ª a 4ª séries); professores de educação infantil;

professores para educação especial; administração escolar; supervisão esco-

lar; orientação educacional... Em algumas universidades houve a iniciativa

de centrar o curso de Pedagogia na formação de professores para o ensino

fundamental (1 a 4ª série) ou, na formação de professores para o ensino

médio/habilitação magistério, deixando como formação complementar pos-

terior as demais habilitações.

É neste contexto que devemos discutir a questão curricular deste cur-

so: Pedagogia. O que é “pedagogo”? Ou, o que deverá ser? Qual afinal o perfil

desejado do “pedagogo”? Quais competências e habilidades esperadas? Quais

conteúdos privilegiar? Estas são as questões fundamentais colocadas no Edital

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

4/97 da SESU/MEC. Como responder a isto diante das múltiplas funções

deste curso atualmente e, diante do que nos colocam, em particular, os arti-

gos 63 3 64 da nova LDB?

Na discussão sobre novas possibilidades curriculares na área do ensi-

no superior, acredito que a questão dos cursos de Pedagogia apresenta uma

faceta peculiar, dados os novos dispositivos constantes da Lei 9394/96, no

que se refere à formação dos profissionais da educação (Título VI). O que aí

é estipulado pode sugerir que há um duplo cenário para os Cursos de Peda-

gogia a se considerar. Isto porque, com a instituição dos Institutos Superio-

res de Educação, e, com a inclusão nestes institutos dos cursos normais supe-

riores há um novo “locus” desenhado para a formação de professores, parti-

cularmente os de educação infantil e ensino fundamental (1ª a 4ª séries),

ambas opções de formação existentes nos atuais cursos de Pedagogia.

O artigo 63 especifica que:

Os institutos superiores de educação manterão:I. Cursos formadores de profissionais para a educaçãobásica, inclusive o curso normal superior, destinado à forma-ção de docentes para a educação infantil e para as primeirasséries do ensino fundamental;II. Programas de formação pedagógica para portadoresde diplomas de educação superior que queiram se dedicar àeducação básica;III. Programas de educação continuada para os profissio-nais de educação dos diversos níveis;

Já o artigo 64 diz que “A formação de profissionais de educação para

administração, planejamento, inspeção, supervisão e orientação educacional

para a educação básica, será feita em cursos de graduação em pedagogia ou

em nível de pós-graduação, a critério da instituição de ensino, garantida nes-

ta formação, a base comum nacional.”

Com a especificação do artigo 64, cabe perguntar: devem, então os

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

cursos de Pedagogia formar apenas os chamados especialistas (administra-

ção, planejamento, etc.)? A formação de professores para os diferentes ní-

veis e modalidades de ensino, inclusive os de educação infantil, educação

fundamental (1ªa 4ª série), educação especial, professores para a formação

de professores em nível médio, devem ter seus currículos definidos na pers-

pectiva não de integrarem os cursos de Pedagogia, mas, de serem integrados

no âmbito dos Institutos Superiores de Educação?

Parece-nos que este cenário é o que se tem em perspectiva nos termos

da Lei 9394/96, um projeto novo.

Por outro lado, outro cenário é possível também. Seria o de pensar

pela manutenção da tradição. Neste caso, o curso de Pedagogia poderia ser

concebido como o articulador de todas essas formações. Resta saber se isto

é possível sem, ao mesmo tempo deixar de dar uma formação cultural bási-

ca suficiente, e uma formação específica de qualidade, dado que se estará

fazendo integradamente a formação de professores e a de especialistas, com

todos os problemas que hoje já vivenciamos com este tipo de fragmentação.

Claro, há a alternativa posta na Lei de se fazer a formação dos especialistas

em nível de pós-graduação. Como a Lei não define um modelo único para

essa formação parece-nos que isto será uma opção institucional, como a

própria Lei diz.

Várias configurações são possíveis, mas elas têm implicações

curriculares diferentes.

Vejamos:

1.A instituição de ensino superior não implementa o Instituto Superi-

or de Educação e mantém as Licenciaturas e o curso de Pedagogia tal como

estão, este englobando as formações de professores acima especificadas,

como também a dos especialistas. As ações relativas aos incisos I e II do art.

63/LDB não são implementadas, ou o são em formato à parte.

2.Implementa-se o Instituto Superior de Educação com todas as fun-

71

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

ções previstas na Lei 9394/96. o curso de Pedagogia, voltado à formação dos

especialistas em educação, passa a integrar também o Instituto como um de

seus cursos possíveis. No caso, as Licenciaturas em disciplinas específicas

devem se repensadas neste contexto novo.

3.Implementa-se o Instituto Superior de Educação com todas as fun-

ções a ele atribuídas na Lei, rearticulando as Licenciaturas em disciplinas

especificas. Não se oferece curso de Pedagogia como graduação e oferece-

se habilitações/especializações em administração escolar, planejamento, ins-

peção, supervisão e orientação educacional em nível de pós-graduação para

formados como professores em nível superior em qualquer modalidade.

4.Implementa-se o Instituto Superior de Educação com todas as fun-

ções previstas em Lei mas, o curso de Pedagogia, voltado à formação nas

habilitações de especialistas não integra o Instituto.

Outras configurações são possíveis a partir destas, e seriam

recombinação das possibilidades aventadas nestas quatro.

Definir um perfil profissional, competências e habilidades desejadas,

e a partir daí, uma proposta pedagógica de curso na área de formação dos

profissionais da educação demanda escolha por uma dada configuração,

especialmente se se quiser pensar em uma base comum de formação para

todos eles.

Professores e especialistas, educadores em geral, tem suas identidades

construídas a partir do empreendimento educativo (Jean Claude Forquim,

1993). Isto implica em que tem a responsabilidade de transmitir e perpetu-

ar, ou, de garantir a transmissão e a perpetuação da experiência humana, ou

seja, da cultura, entendida neste espaço não como se fora uma somatória “de

tudo o que realmente pode ser vivido, pensado, produzido pelos homens

desde o começo dos tempos, mas como aquilo que, ao longo dos tempos,

pode ascender a uma existência “pública”, virtualmente comunicável e me-

morável, cristalizando-se nos saberes cumulativos e controláveis, nos siste-

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

mas de símbolos inteligíveis, nos instrumentos aperfeiçoáveis, nas obras ad-

miráveis (Forquin, op.cit p.13/14). Os professores, e demais educadores, são

os construtores das vias pelas quais estas experiências, de modo mais forma-

lizado, podem circular interpessoas e inter-gerações. Nesta direção pode-

mos então conceber que a cultura é o conteúdo que pode dar substância a

uma concepção de identidade de professores de diferentes tipos e níveis de

ensino, bem como dos demais profissionais que atuam na educação escolar.

A cultura é a substância do seu trabalho de artesão estruturador de experi-

ências vivenciais educativas. È deste trabalho paciente e continuado que,

numa dada tradição, a cultura se transmite e se perpetua, e, por aí se renova.

A educação torna concreta a cultura “como memória viva, reativação inces-

sante e sempre ameaçada, fio precário e promessa necessária da continuida-

de humana”.(Forquin, 1993, p14)

Esta maneira de conceber a inserção de professores e outros profissi-

onais da educação no social nos ajuda a projetar características para o seu

trabalho, portanto, a pensar habilidades e competências que lhes são neces-

sárias. Estas podem nortear propostas curriculares para sua formação. Pode-

se sugerir que, primeiramente, é necessário garantir a estes profissionais

uma certa base cultural ampliada e atualizada, que lhes permita inserir-se

em seu tempo e também garantir suas possibilidades de formação continua-

da. Isto implica em dar-lhes meio de compreender antropológica e sociolo-

gicamente a sociedade onde nos movemos, de compreender psicologicamente

as pessoas humanas, de fazer integrações de natureza filosófica, mas tam-

bém, de ter compreensão dos elementos tecnológicos de nosso ambiente e

das bases de conhecimentos com que eles interagem. Estes últimos aspectos

são por demais importantes quando consideramos os ambientes sociais que

se projetam a partir da integração dessas tecnologias nas vidas cotidianas e,

quando se observa sua absorção e domínio pelas novas gerações – com as

quais os educadores devem trabalhar-, absorção e domínio que se faz inde-

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

pendentemente das escolarizações, nas próprias vivências nas famílias, gru-

pos de amigos, lazer, mídia, etc.

Inspirando-nos em Forquin (1993) poderíamos projetar um perfil des-

ses profissionais como cidadãos:

* Portadores de um projeto de comunicação formadora;

* Capazes de por em ação um modo de ref lexão sobre a questão

da cultura humana e dos elementos culturais em relação aos diferentes tipos

de escolhas educativas, o que poderia se traduzir bem por um não à superfi-

cialidade, com condições de unir teoria e prática em suas ações educativas;

* Detentores de respeito pelo passado, ou seja, por aquilo que se

consolidou na cultura humana, fundamental em seu papel se transmissores

e preservadores da cultural;

* Capazes de situar-se ante a heterogeneidade que há nos conteú-

dos da cultura, com suas variações de fontes, épocas, lógicas, etc., lidando

com o fato de que uma proposta educativa transmite elementos parciais da

cultura e não o todo;

* Com condições de lidar com as questões de valor que as mudan-

ças rápidas, as novidades, provocam, gerando rupturas no seio das próprias

ações educativas;

* Com habilidades para construir meios para a realização dos pro-

cessos de ensino e das ações educacionais no contexto da rapidez das “novi-

dades” e da disseminação volumosa e acrítica das informações, porém pre-

servando a memória, o espírito de verificação com autonomia, e dos valores

que garantem a sobrevivência social cooperativa; ou seja, um NÃO à superfi-

cialidade;

* Capazes de criar meios, instrumentos, condições para que um

projeto de comunicação formadora se consubstancie no real, ou seja, se tra-

duza em ações e relações que ao mesmo tempo em que permitem a preser-

vação de uma dada tradição cultural criam o caldo de cultura a partir do

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

qual transformações, recriações possam se processar;

* Capazes de prever/ inventar trilhas que permita à humanidade

ter memória e por isto mesmo, humanizar-se.

Em trabalho que publicamos recentemente (Gatti, 1997), colocamos

como se começa a demandar, no contexto atual e próximo futuro, que os

profissionais da educação tenham um maior aprofundamento intelectual,

capacidade de desenvolvimento de novas formas de utilização dos conheci-

mentos, condições de rompimento das barreiras na divisão de áreas de co-

nhecimento e trabalho, com visão mais profunda e mais clara quanto à com-

plexidade em vários aspectos do mundo do trabalho e da vida. Lembro ainda

que, as discussões que levam em conta os desafios sócio-econômicos-cultu-

rais da atualidade, e dos próximos anos, mostram alguns aspectos a serem

considerados pela educação em geral, e especialmente para a formação de

formadores:

* Precisa-se preparar para que se tenha condições de desenvolvi-

mento de aprendizagens durante toda a vida;

* Flexibilidade é características essencial e condição para que se

possa recolocar e redirecionar ações, meios e recursos, de modo a respon-

der a exigências emergentes e às mudanças sociais;

* Considerar e trabalhar aspectos ligados à socialização, à tole-

rância, participação, cooperação e integração;

* Aquisição de uma base de domínio especifico de conhecimento,

bem organizado, porém f lexível e com ganchos interdisciplinares;

* Desenvolvimento de domínio ampliado de fatos, símbolos,

algoritmos, conceitos e regras que são a base de alguns campos de conheci-

mentos;

* Utilização de métodos heurísticos, isto é métodos que favore-

çam o desenvolvimento da capacidade de busca autônoma do conhecimen-

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

to, da informação e da análise da informação;

* Criação e habilidade de uso de procedimentos didáticos que pro-

piciem o desenvolvimento de motivação para a retenção e busca de conheci-

mentos, de aproximação de problemas, por caminhos diversificados e varia-

dos, mas sistematizáveis para a abordagem de questões cotidianas ou de

âmbito cientifico;

* Capacidade de ref lexão sobre o próprio funcionamento

cognitivo pessoal, e, condições de auto-regulação desse funcionamento;

* Condições de lidar com componentes afetivos, integrativamente

com os cognitivos e meta-cognitivos, tais como atitudes, crenças, emoções,

ligadas tanto aos objetos de estudo como às praticas sociais;

* Desenvolvimento de disposições em relação a metas, o que en-

volve desenvolvimento de sensibilidade a situações e contextos específicos

e inclinação para agir na direção de soluções.

Com estas considerações parece-nos que a formação de educadores,

professores ou especialistas, seja em que contexto institucional for, deve

privilegiar uma base de conhecimentos gerais boa, associada ao desenvolvi-

mento de habilidades comunicativas ampliadas e a alguns conhecimentos

específicos bem selecionados que lhe propiciem uma forte condição para

aprofundamentos posteriores e especializações especificas ao longo de sua

vivência profissional.

Esta questão curricular merece um tratamento diferente daquele que

vem sendo dado até aqui e esse tratamento poderá vir através do efeito

articulador que uma proposta pedagógica, consensuada, institucional ou de

cursos venha a favorecer. Porém, algo novo, a nosso ver, só se fará ver quan-

do questões de fragmentação disciplinar, hora-aula, divisões departamentais,

e que tais, venham a ser de fato questionadas, trabalhadas e superadas numa

perspectiva de propósitos e metas.

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

Recebido: 02/04/2004

Aceite para publicação: 16/04/2004

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

FORQUIN, J.C. Escola e cultura: as bases sociais e epistemológicas do conhe-

cimento escolar. Porto Alegre Ates Médicas, 1983.

GATTI, B. A. Formação de professores e carreira: problemas e movimentos

de renovação. Campinas,SP: Autores Associados, 1997.

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

FORMAÇÃO DE PROFESSORES PARA A EDUCAÇÃO DE JOVENS EADULTOS: O PAPEL DAS FACULDADES DE

EDUCAÇÃO1

Catarina Maria Garcia Castro

RESUMO: Este artigo tem por objetivo abrir espaços para se discutir o papel das Faculdadesde Educação frente aos novos desafios que a Educação de Jovens e Adultos – EJA, coloca asInstituições de Ensino Superior. O texto sintetiza o resultado de nossa dissertação demestrado, que analisou as perspectivas de professores das séries iniciais da EJA da redepública de ensino da Cidade de Cáceres/MT, enfocando o currículo, a prática pedagógica,a avaliação, assim como as perspectivas dos alunos dessas mesmas séries quanto ao seuretorno à escola com alguns trechos de depoimentos de professores que atuam namodalidade EJA. Destacamos neste artigo as questões sobre a reconfiguração da EJA, apartir dos desafios colocados aos sistemas de ensino e as Universidades, cujo primeirocaminho é superar a posição marginal dessa modalidade de educação, nas escolas assimcomo no currículo dos cursos de pedagogia, e nas pesquisas acadêmicas.

PALAVRAS-CHAVE: Educação de Jovens e Adultos; Formação de Professores.

ABSTRACT: This article aims to open discussions on the role of education colleges inbehave of the new challenges that the program Education for Young and Adults -E.J.A.places the high school institutions. The text sums up the result of my master dissertationthat analyzed the perspectives of teachers of the elementary series of the E.J.A. of publicschools in the city of Cáceres/MT. focusing the curriculum, pedagogical practice, evaluation,as well as the perspectives of thecoming back of these students, besides the testimony ofteachers that work with the E.J.A. We emphasize in this article the matters about a newconfiguration of the program E.J.A. from the challenges found in the teaching system anduniversities whose first path is to overcome the marginal position of that kind of educationalproposition in the schools like wise the curriculum of the pedagogy courses and academicresearches.

KEY WORDS: Young and Adult education; formation of professors;

São grandes os desafios colocados ao sistema de ensino bem como às

associações, organizações e entidades que atuam na Educação de Jovens e

1 Texto apresentado no II Seminário Estadual de EJA, mesa redonda sobre o tema “A formação deprofessores para a EJA”, Cuiabá, junho 2002.

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

Adultos – EJA, educação esta que deixa de ter o princípio de uma educação

compensatória/supletiva e de caráter emergencial, instituído pela lei 5692/

71, em que as questões do ensino (currículo, metodologia e avaliação) e da

formação de professores, sempre foram relegadas a um segundo plano, para

uma educação de jovens e adultos, que, a partir da lei 9394/96, passa a se

constituir como uma das modalidades da Educação Básica nas etapas do

Ensino Fundamental e Médio, compreendendo níveis de alfabetização e

escolarização posterior, com uma especificidade própria garantida por lei.

Dentre esses desafios, está a significativa mudança no perfil do aluno

do, então, curso supletivo, clientela esta que, como nos fala Haddad (1991,

p.191), passa ser caracterizada por “um grupo significativo de adolescentes,

recém-saídos do ensino regular, expulsos por dificuldades de acompanha-

mento ou por terem sido considerados como problemáticos, fenômeno este,

que, segundo o referido professor, tem sido hoje talvez um dos mais signifi-

cativos, carecendo de estudos mais aprofundados para sua compreensão”.

Toda essa mudança criou inúmeros problemas pedagógicos, que vie-

ram confirmar ainda mais o descompromisso, por parte do sistema público

de ensino, para com essa modalidade de ensino. Um de seus maiores proble-

mas concentra-se na formação de professores para a EJA, em decorrência da

pouca, existência, de cursos de formação de professores para atuarem nessa

área. Em suas pesquisas mais recentes, Haddad (2000a) relata que são raras

as Faculdades de Educação ou Cursos de Pedagogia e/ou Cursos de Especi-

alização, que oferecem disciplinas sobre essa temática. Em decorrência dis-

so, o espaço para ref lexão sobre a prática ou a formação em serviço dos

docentes também é bastante restrito, assim como as discussões acerca dos

conteúdos curriculares e das metodologias empregadas, as quais, com algu-

mas exceções, não vêm se mostrando adequadas às necessidades dos alunos

da EJA, em sua maioria jovens ou adultos trabalhadores que, inúmeros fato-

res, alheios à sua vontade, impediram o seu acesso à escolarização em idade

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

apropriada.

O Estado da Arte das Pesquisas em Educação de Jovens e Adultos no

Brasil (HADDAD et al. 2000a), apresenta uma análise acerca das produções

acadêmicas em nível de Mestrado e Doutorado produzidas nas Universida-

des brasileiras nesses últimos 12 anos (1986-1998), e, por isso, torna-se um

importante instrumento para as pessoas que trabalham e/ou pesquisam na

área da EJA.

Dentre as principais questões conclusivas abordadas por esse docu-

mento destacamos a cobrança que se tem feito nestes últimos anos às Uni-

versidades brasileiras, para que elas venham,

garantir/ampliar os espaços para discussão da EJA, seja noscursos de graduação como na pós-graduação e na extensãosendo fundamental para isto considerar a produção já exis-tente em EJA. É preciso ultrapassar os estágios a que já chega-mos, no sentido de buscar melhor definição dos conceitos eaportes teóricos que referendam as pesquisas em EJA, assimcomo seus procedimentos metodológicos (ibid.,p.12).

Como questão para reflexão, o documento destaca que, das pesquisas

analisadas, poucas revelaram um vínculo de proximidade entre Universida-

des e Redes Públicas de Ensino.

Entendo ser um dos principais papéis da Universidade propor e agir

em parceria com a comunidade externa2 , promovendo ações que venham

realmente garantir uma melhoria na qualidade de vida das pessoas, assim

como garantir a todos nós o acesso aos conhecimentos por ela produzidos e

aos benefícios que eles podem trazer. Sendo a UNEMAT, uma universidade

que tem como uma das suas linhas básicas de atuação, a formulação e execu-

ção de ações programáticas no sentido de contribuir para a solução ou

2 Por comunidade externa abarco não somente as Instituições Públicas como as demais instituições:associações, organizações comunitárias, etc. que desenvolvem trabalhos nas diversas áreas sociais,culturais, econômicas, etc.

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

minimização da problemática educacional do estado de Mato Grosso, torna-

se necessário, ref letir e pesquisar sobre o tipo de profissional que estamos

preparando. Nossa tarefa perpassa a formação de professores nas áreas de

Educação Infantil, Ensino Fundamental e Médio, chegando à formação de

Professores Indígenas e, agora, mais um novo desafio, formação de Professo-

res para atuarem na EJA.

Por onde começar?

A Educação de Jovens e Adultos, não só no Brasil, mas em todos os

países, entra para o século XXI com dois grandes desafios educacionais,

decorrentes dessa mudança significativa em sua demanda, tendo de ampliar

seu espectro, de forma a garantir a sua clientela condições de participar

ativamente nessa sociedade do conhecimento. Assim, podemos dizer que a

EJA, neste século do conhecimento, passa a comportar duas funções:

1º) Garantir educação básica para todos: isto significa, garantir uma

escolaridade básica mínima para os 34,1% de brasileiros com mais de 20

anos, com até quatro anos de escolaridade - os analfabetos funcionais, e os

11,8% de analfabetos (IBGE/2002) a partir dos 15 anos, pois, como nos colo-

ca a professora Vera Massagão Ribeiro:

estudos atuais indicam que é preciso uma escolaridade maisprolongada para se formar usuários da linguagem escrita,capazes de fazer dela múltiplos usos, com o objetivo de ex-pressar a própria subjetividade, buscar informação, planejare controlar processos e aprender novos corpos de conheci-mento (apud DI PIERRO, 1998, p.8);

2º) Garantia de uma educação continuada, como requisito básico para

a participação plena na cidadania e na globalização: o entendimento que

temos de educação continuada parte do pressuposto de que os jovens e os

adultos são cognitivamente capazes de aprender ao longo de toda a vida e

que, como nos diz Di Pierro, já que

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

as mudanças econômicas, tecnológicas e socioculturais emcurso neste final de milênio impõem a aquisição e atualizaçãoconstante de conhecimentos pelos indivíduos de todas as ida-des, propugna-se conceber todos os sistemas formativos nosmarcos da educação continuada. Nestes marcos, os objetivosda formação de pessoas jovens e adultas não se restringem àcompensação da educação básica não adquirida no passado,mas visam a responder às múltiplas necessidades formativasque os indivíduos têm no presente e terão no futuro (1999,p.9).

Assim, diante dos desafios que esta sociedade do conhecimento apre-

senta a todos os sistemas educacionais, a Educação de Jovens e Adultos, tem

que deixar de ser entendida como idéia de compensação e filantropia, assu-

mindo o seu lugar legalmente constituído pela lei 9394/96, legitimada pelo

Parecer nº 11/2000 (CEB), e as Diretrizes Curriculares Nacionais para a EJA,

dividindo legalmente, com a Educação Infantil, o Ensino Fundamental e o

Médio, o espaço da educação oficial que lhe é garantindo por lei, tendo as-

sim uma concepção própria e específica de educação.

O propósito da EJA, como está bem claro no Parecer 11/2000, não é

de compensação, mas de reparação da realidade histórica da exclusão esco-

lar de grupos menos favorecidos, onde não basta apenas “alfabetizar”, pois,

só isso, a história nos mostrou que não foi suficiente: “isso seria perpetuar a

discriminação que resultou na negação do acesso aos bens conseqüentes à

escolarização, inclusive à possibilidade de aperfeiçoamento contínuo que

exige a sociedade do conhecimento.” (MARANHÃO,2001).

Porém, superar essa concepção compensatória da EJA não implica,

como nos coloca Di Pierro (1999, p.9),

negar que há desigualdades educativas a serem enfrentadas.A tendência histórica à ampliação e alongamento da educa-ção básica vem produzindo aquilo que os sociólogos da edu-cação denominam de “efeito desnivelador”: cada vez que seamplia a escolaridade obrigatória, um novo contingente de

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

jovens e adultos fica com uma escolaridade inferior àquela aque todo cidadão tem direito.

Isto significa que a educação básica de jovens e adultos deve garantir

o princípio da igualdade perante a lei, ou seja, o reconhecimento da “igualda-

de ontológica de todo e qualquer ser humano de acesso a um bem real,

social e simbolicamente importante”(CURY,2000, p.6), alcançado através de

uma educação mínima de qualidade e com regularidade, ou seja, o direito a

uma escola de qualidade, entendida como ponto de partida para a igualda-

de de oportunidades.

Sem negar que a EJA teve seu início, enquanto possibilidades e alterna-

tivas de educação, nos Movimentos Populares, e neles se consolidou em ter-

mos de finalidades, objetivos e características que lhe são peculiares, é de

bom alvitre a proximidade com instituições oficiais de ensino neste momen-

to, assim como as ref lexões acerca da escolarização dessa população.

Alguns esforços já foram desenvolvidos no sentido de oferecer, princi-

palmente aos jovens, o acesso e/o retorno à escolaridade obrigatória, porém

ainda há muito por se fazer, pois, o espaço da EJA, perpassou os Movimentos

Populares e as instituições públicas de ensino, juntando-se a eles, os traba-

lhos significativos de entidades civis. (destaque para as ações do Sesi, do

Senai, da Ação Educativa, Instituto Paulo Freire, e outros).

Qual, portanto, é o papel da universidade para com a EJA?

A garantia legal de oferta de uma educação regular a jovens e adultos,

que, por diversas situações, tiveram que abandonar a escola em idade esco-

lar adequada, exige um modelo pedagógico próprio, atento às especificidades

de sua clientela e com formas de organização, currículo, metodologia e ava-

liação que venham satisfazer as suas necessidades de aprendizagem. São,

portanto, mudanças significativas que vêm reforçar ainda mais o entendi-

mento de que, assegurar a escolaridade mínima comum a todos os cidadãos

é responsabilidade da qual o poder público não pode esquivar-se, ainda que

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

possa contar com a colaboração da sociedade civil organizada, para efetivá-

la.

Conseqüentemente, esse tipo de educação necessita de uma escola

que venha garantir a esse jovem e adulto trabalhador uma escolarização

mínima, ponto de partida para a igualdade de oportunidade. Maranhão (2000,

p.1) corrobora essa idéia, ao afirmar:

se é louvável o empenho em garantir educação às novas gera-ções – e de qualidade, a fim de que a escola não contribuapara aprofundar desigualdades sociais – isso não significaque, para adultos que voltam a estudar, possamos nos basearno princípio de que, para quem nunca teve nada, qualquercoisa serve.

Portanto, trabalhar com a EJA exige, de quem se propõe, assumir uma

prática pedagógica que possibilite a esse jovem e adulto analfabeto e/ou

com pouca escolaridade, desenvolver competências básicas que lhe permi-

tam avançar, de forma qualitativa na sua forma de viver, de trabalhar, de

conviver, etc.

Quando se legitima o direito de oferta de uma educação regular para

jovens e adultos, exige-se, portanto, um modelo pedagógico próprio, atento

às especificidades de sua clientela e com formas de organização, currículo,

metodologia e avaliação que venham satisfazer as necessidades de aprendi-

zagem

Esse tipo de educação exige professores adequadamente preparados,

conhecedores das características biopsíquicas, sociais, históricas e culturais

desse aluno-trabalhador, assim como exige que os mesmos tenham em consi-

deração a diversidade dos objetivos da educação para essa clientela no seu

retorno à escola.

De quem é, então, esse papel?

Nesta última década, percebe-se, nas políticas públicas, uma tentativa

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

de organização das políticas para EJA, decorrentes de manifestações, em

nível mundial, em defesa de uma pedagogia do reconhecimento das minorias3

e de proteção às diferentes identidades coletivas, em que se incluem as di-

versas práticas e iniciativas de educação para jovens e adultos (alfabetiza-

ção e escolarização).

Percebemos, nesse cenário, por parte das políticas públicas, um cha-

mamento mais articulado do setor público às entidades não governamentais

e/ou sociedade civil, para juntos traçarem caminhos para solução ou

minimização dos problemas educacionais. Esta é, sem dúvida nenhuma uma

das razões por que estamos hoje aqui. A inclusão desses novos atores é tam-

bém comentada por Cury (2000, p.7):

No século que se avizinha e que está sendo chamado de “oséculo do conhecimento”, mais e mais saberes aliados à com-petência tornar-se-ão indispensáveis para a vida cidadã e parao mundo do trabalho. E esta é uma das funções da escolademocrática que, assentada no princípio da igualdade e daliberdade, é um serviço público. Por ser um serviço público,por ser direito de todos e dever do estado, é obrigação desteúltimo interferir no campo das desigualdades e, com maiorrazão no caso brasileiro, no terreno das hierarquias sociais,por meio de políticas públicas.(...) Por isso, várias instituiçõessão chamadas à reparação desta dívida. Este serviço, funçãocogente do estado, se dá não só via complementaridade entreos poderes públicos, sob o regime de colaboração, mas tam-bém com a presença e a cooperação das instituições e setoresorganizados da sociedade civil.

Porém, este novo fenômeno deve ser analisado com muito cuidado,

como argumenta Haddad (2000):

O desenvolvimento de políticas de formação de pessoas jo-

3 Esta expressão é utilizada por Volker Lenhart, professor da Universidade de Heidelberg, Alemanha.

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

vens e adultas consoantes a esse novo paradigma de educa-ção continuada é tema polêmico, mas uma revisão da literatu-ra permite que identifiquemos algumas indicações mais oumenos consensuais.

A preocupação de Haddad é mais do que procedente para que não

cometamos os mesmos erros do passado, ou seja, quando um número signi-

ficativo de experiências na EJA, no Brasil, tanto públicas como não-oficiais,

se constituíram num conjunto muito diverso de processos e práticas for-

mais e informais de acesso e/ou ampliação dos conhecimentos básicos, onde

as questões pedagógicas (métodos, currículo, avaliação) eram pouco consi-

deradas, pois, a educação de jovens e adultos foi vista no decorrer de sua

história como uma modalidade de ensino que não requer, de seus professo-

res, estudo e nem especialização, como um campo eminentemente ligado à

boa vontade. Na verdade, parece que continua arraigada a idéia de que qual-

quer pessoa que saiba ler e escrever pode ensinar jovens e adultos, pois

ainda existem educadores leigos que trabalham nessa modalidade de ensino,

assim como a idéia de que qualquer professor é automaticamente um pro-

fessor de jovens e adultos. Com esta falsa premissa não tem se levado em

conta que para se desenvolver um ensino adequado a esta clientela exige-se

formação inicial específica e geral consistente, assim como formação conti-

nuada.

É aqui, no nosso entendimento, que entra a Universidade, mais especi-

ficamente a Faculdade de Educação e o curso de Pedagogia, entendido como

local de discussão, de análise, de estudos científicos acerca da formação de

professores para todas as modalidades de ensino da Educação Básica, de

onde, juntamente com a rede pública de ensino, deverão sair propostas

metodológicas que venham atender às especificidades de cada modalidade

de ensino.

A universidade é, portanto,

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Profissionais da Educação

o espaço na sociedade moderna, da pesquisa e do debate,fazendo dela uma instituição potencialmente crítica e, pelaprática da crítica e pelo respeito à heterogeneidade, a univer-sidade pode dar uma contribuição importante ao processode democratização do país(OLIVEN,1989, p.76) .

Repetindo as palavras de Haddad(2001), ao afirmar que, o espaço da

EJA é no campo da educação, é um trabalho de educadores, e que, portanto,

exige da nossa parte uma atenção especial, na busca de garantir à essa signi-

ficativa clientela da EJA, oportunidade de se escolarizar, é, portanto, papel

das Faculdades de Educação, e dos cursos de Pedagogia, pensar em alterna-

tivas à essa parcela significativa da população brasileira que, por inúmeros

fatores, se viu obrigada a abandonar a escola em idade adequada, mas que

ainda tem na escola uma significativa esperança de uma vida mais digna.

Não podemos também nos esquecer que essa clientela é, na sua maioria, pai

ou mãe, ou irmão de algum aluno do ensino fundamental ou médio, para o

qual nos dedicamos a formar professores.

Os desafios que a Educação nos traz devem, segundo Balsan (apud,

FRANCO et al.,2000, p.66), ultrapassar as soluções pedagógicas e levar em

conta os seus aspectos políticos, sociais e econômicos. Ele nos fala: “Sob tal

perspectiva, um dos desafios é o de ampliar o reduzido campo de atuação

do professor como agente histórico e não omitir a fugacidade dos conteú-

dos numa sociedade em constante mudança”.

Esta visão crítica sobre a Educação e o papel do professor, não impor-

ta o nível de ensino em que atua, sempre foi uma das principais contribui-

ções do nosso maior pedagogo Paulo Freire, o qual, quando questionado

sobre qual seria o papel da Pedagogia e do pedagógico na formação do

professor, chamava a atenção para termos cuidados com a concepção ingê-

nua da pedagogia:

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

Paulo Freire combate a concepção ingênua da pedagogiaque se crê motor ou alavanca da transformação social e polí-tica. Combate igualmente a concepção oposta, o pessimismosociológico que consiste em dizer que a educação reproduzmecanicamente a sociedade. Nesse terreno em que ele analisaas possibilidades e as limitações da educação, nasce um pen-samento pedagógico que leva o educador e todo profissionala se engajar social e politicamente, a perceber as possibilida-des da ação social e cultural na luta pela transformação dasestruturas opressivas da sociedade classista (GADOTTI, InFREIRE,1989, p.10).

Tendo a clareza de que o processo de formação do professor é com-

plexo, ambíguo, inacabado e como nos coloca o professor Veiga-Neto (1997,

p.161) “repleto de facetas captadas e inscritas em dimensões diversas, o

mesmo requer uma paciência pedagógica que redunde na compreensão da

totalidade em que se constituem as agências formadoras”. Desde que o cur-

so de Pedagogia da UNEMAT foi criado (1987), nós professores estamos em

constante processo de discussão sobre a identidade do referido curso, mais

especificamente, sobre a formação do professor para as séries iniciais do

Ensino Fundamental e, mais recentemente, da Educação Infantil.

Incluir a EJA como uma das modalidades na formação de professores,

nos curso de Pedagogia da UNEMAT, é mais do que uma opção é ampliar o

espaço da EJA na academia garantindo-lhe um lugar no ensino, mas, também

na pesquisa, ao tratar de suas especificidades que vão desde as suas finalida-

des à clientela, currículo, metodologia, avaliação e formação de professores;

tudo isto que está garantido na Lei nº 9.394/96:

Temos que solicitar, demandar, empurrar as universidades paraque entrem firme no trabalho de formação de professorespara a EJA. Que, pelo menos, garantam disciplinas sobre a EJAem seus programas de formação de professores e de forma-ção continuada (HADDAD,2001).

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Profissionais da Educação

A escolha da temática Educação de Jovens e Adultos como pesquisa de

mestrado, traduziu-se para mim, num profundo desejo de contribuir com

todos aqueles que apostam numa educação de jovens e adultos como direito

e não apenas como idéia de resgate de oportunidades perdidas. Ao tentar

compreender as perspectivas dos professores e dos alunos das séries inici-

ais da Educação de Jovens e Adultos, a partir da investigação sobre como se

constitui o currículo, a prática pedagógica e a avaliação desses professores,

como são estabelecidas as formas de organização da escola/sala de aula e,

como se relacionam os sujeitos (professores e alunos), a partir da conceituação

de Basil Bernstein (1986-1996) sobre o currículo, a prática pedagógica e a

avaliação, poderemos pensar as mudanças que devem ocorrer para que se

constitua uma prática pedagógica específica para a EJA.

Pensar em alternativas para uma parcela significativa da população

brasileira que, por inúmeros fatores, se viu obrigada a abandonar a escola

em idade adequada, mas que ainda tem na escola uma significativa esperan-

ça de uma vida mais digna, é, como já dissemos anteriormente, também pa-

pel das Faculdades de Educação, pois, a clientela de EJA é, na sua maioria, pai

ou mãe, ou irmão de algum aluno do ensino fundamental ou médio, para o

qual nos dedicamos a formar professores.

Para isto, a UNEMAT tem que primeiramente ter bem claro qual é o

seu entendimento acerca da EJA, quais as bases epistemológicas que dão

sustentação a essa modalidade de ensino para, então, propor uma política

de formação de professores.

Para que isto ocor ra, faz-se necessár io discut i r e analisar

problematizações presentes na prática pedagógica dos professores da EJA,

a saber: como se constitui a EJA dentro das políticas públicas de educação,

seja nas questões da alfabetização, seja na garantia de uma escolaridade bá-

sica e de uma educação continuada; uma segunda refere-se à discussão sobre

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

o que é ser analfabeto numa sociedade denominada “sociedade do conheci-

mento”; e, uma terceira questão leva à reflexão sobre a formação de profes-

sores para atuar na EJA.

Engajando-me na luta pela formação crítica do professor de EJA, acre-

dito, estar, portanto, garantindo no Curso de Pedagogia (UNEMAT) espaço

para discutirmos uma formação específica de professores para atuarem na

EJA, assim como garantir também, aos professores da rede pública de ensi-

no, que atuam nessa modalidade, o preenchimento de uma série de lacunas

na sua formação profissional, formação esta, oriunda dos cursos normais ou

de cursos de pedagogia, cujo currículo não contemplava, em nenhum com-

ponente curricular, sequer uma referência de estudo acerca dessa modalida-

de de ensino.

Para concluir, nos permitimos repetir a fala de alguns dos professores

entrevistados quando os indaguei sobre necessidade de se formar professo-

res para a EJA:

Professora E:

Já estava mais do que na hora de se mudar, de se fazer alguma coisa por

esses alunos. O que vem me angustiando nesses anos que venho trabalhan-

do com EJA é que tudo é improvisado, nossa base é o ensino de crianças,

livros de crianças .

Professora D:

Quanto ao material específico da EJA, por exemplo os Parâmetros

Curriculares da EJA, eu não conheço, e também não tenho nenhum materi-

al específico. Sei que existem esses materiais lá na Assessoria, mas, eles só

lá. Já participei de três encontros da EJA, mas confesso que não achei

nada proveitoso. Não conheço o material dos Currículos da EJA.

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

Professora B:

(...) Por isso que nós temos que conhecer a EJA como ela está sendo

pensada, o que esses parâmetros trazem na sua essência. Muitos de nós

não conhecemos em profundidade. Eu estou estudando os parâmetros

curriculares do ensino fundamental e também o da EJA e fazendo as mi-

nhas comparações para ver o que eles têm, onde são diferentes, onde são

iguais.

Professor C :

Eu vejo uma nova tendência na EJA, para a melhoria da qualidade de vida

do povo brasileiro, com professores especializados na área, como você

disse. Eu não sou especialista na área, mas sou um professor que está

caminhando para isso. Quem sabe, num outro momento, a gente possa vir

a discutir mais sobre esse tema, porque tudo é novo para mim, estou co-

meçando agora. (...) voltando um pouco na sua pergunta, eu acho que

esses parâmetros são para longo prazo, não é para agora, temos que tra-

balhar vagarosamente, sem pressa senão a coisa não funciona.

A participação mais consistente, mais direta e mais comprometida da

Universidade para com o Sistema Público de Ensino, sem dúvida, irá promo-

ver um “movimento de retroalimentação desse sistema, permitindo corre-

ções no processo de implementação das referidas propostas”, segundo a

professora Maria Helena Degani Veit (2002).

A prática pedagógica dos professores entrevistados confirma o que é

a Educação de Jovens e Adultos na maioria das escolas em nosso sistema de

ensino público, que atua com essa modalidade de ensino - eternos

experimentadores, ou seja, os professores continuam a entrar na sala de

aula sem nenhuma base específica de formação, sem materiais específicos

para isso.

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

Mas essa prática também confirma, ser o professor quem tem a res-

ponsabilidade de decidir, de dirigir as questões do ensino, garantindo sem-

pre o diálogo e a participação. Isto traduz a autonomia pedagógica da esco-

la, pois é ela, a responsável na elaboração do seu projeto pedagógico.

Esta autonomia pedagógica da escola é preconizada pelas Diretrizes

Curriculares Nacionais para a EJA, com o entendimento de que o momento

da elaboração do projeto pedagógico é que “usufrui de uma f lexibilidade

responsável em função da autonomia pedagógica”(CURY,2000:53), garan-

tindo à EJA, a sua particularidade pedagógica. Segundo Cury (ibid.,p.53)

isto se caracteriza como “o momento da recontextualização que se impõe à

transposição didática e metodológica das Diretrizes Curriculares Nacionais

do Ensino Fundamental e do Ensino Médio para a Educação de Jovens e

Adultos.

É objetivo garantir-se para a EJA um corpo docente qualificado, cons-

ciente de que lidam com trabalhadores com enorme bagagem de experiênci-

as, o domínio de um saber próprio que não pode ser desprezado no proces-

so ensino-aprendizagem. Como já dissemos: o espaço da EJA no campo da

educação, é um trabalho de educadores.

Quem forma o educador é a universidade, mais especificamente, os

cursos de formação de professores. E, portanto, nesse espaço do ensino e da

pesquisa acadêmica que vamos tentar superar esse caráter experimental da

EJA. O primeiro caminho é superar a posição marginal dessa modalidade de

educação nas pesquisas acadêmicas, assim como no currículo dos cursos de

pedagogia.

Recebimento: 02/04/2004

Aceite para publicação: 16/04/2004

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

FORMAÇÃO DE PROFESSORES ÍNDIOS NA UNIVERSIDADE:

A EXPERIÊNCIA DO 3º GRAU INDÍGENA

Elias Januário

RESUMO: Este artigo tem como objetivo contextualizar o movimento dos professoresindígenas na luta pela formação continuada, centrando-se na formação específica ediferenciada em nível superior oferecida pela Universidade do Estado de Mato Grosso.Para isso, situa historicamente o processo de criação do projeto de 3º Grau Indígena e asbases legais que ampararam a discussão e implementação da formação específica emnível superior. Aborda alguns aspectos estruturais da educação escolar indígena específicae diferenciada e da formação em serviço, enfatizando as dificuldades e os avanços advindoscom a formação em nível universitário dos professores indígenas.

PALAVRAS-CHAVE: formação de professores; índios; ensino superior específico

ABSTRACT: This article has with objective shows the indigenous teachers’ movement in thefight for the continuous formation, being centered in the specific formation anddifferentiated in superior level offered by the University of the State of Mato Grosso. Forthat, it places the process of creation of the project of Third Indigenous Degree and thelegal bases historically that aided the discussion and implementation of the specificformation in superior level. It approaches some structural aspects of the indigenous schooleducation specific and differentiated and of the formation in service, emphasizing thedifficulties and the progresses occurring with the formation in level academical of theindigenous teachers.

KEY WORDS: teachers’ formation; Indians; specific higher education

Mergulhando no mundo das crianças, aprendi que o melhormotivo para ser professor é gostar de aprender, por isso nãocanso de aprender coisas novas e ter novas experiências emfunção dos alunos, da comunidade e de meus colegas de tra-balho.

Lucas ‘Ruri’õ Xavante

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Profissionais da Educação

Apresentação

A formação de professores indígenas em nível superior era uma anti-

ga reivindicação dos professores indígenas de Mato Grosso, que tomou im-

pulso a partir da Conferência Ameríndia realizada em Cuiabá, no ano de

1997, dando início às discussões que culminaram com a elaboração do Pro-

jeto de Cursos de Licenciatura Específicos para a Formação de Professores

Indígenas – 3º Grau Indígena. Iniciar esse Projeto foi uma longa trajetória

de articulação política, de reuniões administrativas e pedagógicas, que con-

tou com a participação efetiva dos representantes indígenas. Por meio de

um vestibular específico foram aprovados 200 professores indígenas de 36

etnias e 11 estados da federação, que estão cursando três Licenciaturas: Ci-

ências Matemáticas e da Natureza, Línguas Artes e Literatura, Ciências Soci-

ais. A proposta de ensino do Projeto ancora-se numa educação específica e

diferenciada, voltada à realidade das comunidades indígenas, num constante

diálogo intercultural entre os diversos saberes, com o objetivo de formar

professores indígenas para o exercício da docência respeitando a cosmovisão

e os valores das diferentes etnias (JANUÁRIO, 2002).

Antecedentes históricos e bases legais

Em 1995 teve início em Mato Grosso a implementação de um amplo

programa de formação de professores indígenas por meio do Projeto Tucum,

seguido de outras iniciativas como o Projeto Urucum/Pedra Brilhante, O

Projeto Mebêngõkrê, o Projeto Xamã na área da Saúde e o Projeto 3º Grau

Indígena. Estes projetos têm qualificado uma considerável parcela dos índi-

os de Mato Grosso que atuam nas aldeias ministrando aula para mais de seis

mil alunos índios, possibilitando que as crianças indígenas passem a ser for-

madas por professores de suas próprias etnias, baseados nos princípios e

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

métodos próprios de aprendizagem, valorizando as manifestações artísticas

e culturais.

Os avanços verificados no Estado de Mato Grosso foram ref lexos das

mudanças ocorridas nos últimos anos na legislação brasileira, voltada para a

educação Indígena, presentes na Constituição Federal, na LDB/96, na Reso-

lução 03/99 e no Parecer 14/99.

A Constituição de 1988 representa um marco na definição das rela-

ções entre o poder público e as sociedades indígenas. Foi a partir desse

documento que o Estado Brasileiro reconheceu oficialmente a existência de

diferentes sociedades indígenas no interior da nação, garantindo aos

ameríndios o direito de ser e de viver conforme suas formas de organização

social, costumes, línguas, crenças e tradições. Reconheceu também o direito

originário sobre as terras que tradicionalmente ocupavam. Outro aspecto

importante presente neste documento encontra-se no artigo 210, que asse-

gura às sociedades indígenas o direito a uma educação escolar específica e

diferenciada, bilíngüe e intercultural, reconhecendo a utilização das línguas

nativas e dos seus processos próprios de aprendizagem. “... a Constituição

de 1988 merece especial atenção, pois foi com a sua promulgação que se

reconheceu aos índios de permanecerem índios e terem suas tradições e

modos de vida respeitados e protegidos pelos Estado brasileiro” (GRUPIONI,

2000, p.274).

A Constituição Federal foi efetivamente o primeiro texto que explicita

a relação do Estado com os povos indígenas, reconhecendo a diversidade

étnica e o respeito à diferença, afastando-se desse modo do caráter

integracionista preconizado durante vários séculos em todo o País.

Essa mudança de paradigma na relação entre o Estado Brasileiro e as

sociedades indígenas teve amplos reflexos no contexto da educação escolar,

abrindo novas possibilidades de se pensar uma nova escola indígena, longe

das doutrinas positivistas, civilizatórias e evangelizadoras que até então se

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

faziam presentes na educação ofertada às populações indígenas.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação – LDB/1996, veio reforçar a

legislação educacional disposta na Constituição Federal, acentuando a dife-

renciação da escola indígena das demais escolas do sistema de ensino brasi-

leiro, incentivando uma educação bilíngüe, intercultural, com calendários

adequados às particularidades locais e aos projetos societários de cada co-

munidade.

A Resolução 03/99, que estabelece a categoria Escola Indígena, tam-

bém reforça a garantia de uma formação específica para professores indíge-

nas, atribuindo ao Estado a responsabilidade pela oferta da educação indíge-

na, que pode ser conduzida em parceria com os municípios.

Para Grupioni, “o desafio posto neste momento é como tornar realida-

de os avanços inscritos no plano jurídico, de modo que a escola em áreas

indígenas, historicamente utilizada como meio de dominação, seja um ins-

trumento de auto-determinação...” (Idem).

Implementar programas de educação escolar indígena pautado nos

princípios da pluralidade cultural, não é tarefa fácil. Exige compromisso,

ousadia, investimento e determinação por parte dos governos estaduais, que

através de parcerias com instituições governamentais e não-governamen-

tais, juntamente com o movimento dos professores indígenas, consolidem

uma educação intercultural, bilíngüe e de qualidade, com currículos, materi-

al didático, calendários e conteúdos de caráter indígena, que respeitem as

práticas sociais e culturais de cada comunidade.

Segundo Nietta Monte (2000).

é como se as vozes das sociedades indígenas, há séculos si-lenciadas pelas políticas educacionais, finalmente pudessemformular e explicitar seu projeto de escola, fazê-lo ecoar ereproduzir, ainda que sobre intenso debate e conflito, em for-mas de novas propostas se políticas públicas a serem desen-volvidas pelo Estado Brasileiro.

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

Educação escolar indígena específica e diferenciada

A oferta de uma educação escolar específica e diferenciada para as

comunidades indígenas, não significa que se trata de uma educação de qua-

lidade inferior, de uma formação menor do que a formação presente nas

escolas dos não-índios. O que ocorre é exatamente o contrário. Ao ser volta-

da para as especificidades e as diversidades, ela se transforma em uma edu-

cação de qualidade, uma educação que atende aos anseios e expectativas de

cada grupo social. Uma educação onde se aprende “o saber do branco” sem

esquecer ou desmerecer “o saber do índio”. Essa educação diferenciada vol-

tada para as populações indígenas pressupõe uma constante ref lexão de

sua prática pedagógica, constituindo-se em um processo que tem como pon-

to de partida e de chegada a perspectiva das comunidades indígenas. Nela

busca-se a afirmação étnica da cada povo valorizando as línguas, os costu-

mes e as tradições (JANUÁRIO, 2002).

A educação específica e diferenciada postula um ensino de qualidade,

dialógico e problematizador, que concebe a educação como uma prática

para a liberdade. A sala de aula passa a ser um espaço de ref lexão e constru-

ção coletiva do conhecimento, de percepção de outras lógicas, onde as dife-

renças são respeitadas, num ambiente de troca, de compreensão das diferen-

tes concepções de ser e estar no mundo. Outro aspecto importante da edu-

cação diferenciada reside na garantia da permanência do professor indíge-

na em contato com sua comunidade de origem, fazendo com que ele desen-

volva habilidades e conhecimentos moldados nas relações com o seu povo.

Desse modo o ensino passa a ser contextualizado com amplas possibilida-

des de desenvolver as competências necessárias em cada formador (Idem).

A abertura para a inserção nos cursos dos saberes étnicos e dos pro-

cessos pedagógicos próprios de ensino e aprendizagem, tem garantido, na

prática, o exercício do diálogo intercultural, possibilitado a ressignificação

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

de conteúdos e metodologias, afastando-se assim da visão universalista e

monocultural imprimida às minorias étnicas no processo educacional

civilizatório amplamente implementado na história da educação escolar in-

dígena brasileira (GOVERNO DO ESTADO DE MT, 2001).

A partir dessa proposta intercultural na prática educativa, é que o

Projeto desenvolve estratégias que garantem as discussões dos conhecimen-

tos de caráter geral e específico de cada área de estudo, propiciando o reco-

nhecimento das diferenças, ao mesmo tempo em que estabelece uma rela-

ção crítica com os conhecimentos universais por meio da problematização

dos conteúdos e da valorização do professor indígena como sujeito nessa

relação.

O projeto não tem a pretensão de ensinar todos os conhecimentos

existentes da sociedade não-índia, nem seria possível isso, mas procura, a

partir de opções curriculares, instrumentalizar o professor índio de modo

que ele possa buscar os conhecimentos que considera importante para ele e

para seu povo, num processo de formação continuada que extrapola os es-

paços institucionais de formação.

Sendo assim, entre os objetivos encontra-se a proposição de conduzir

os professores indígenas a conhecerem os códigos simbólicos das diferen-

tes sociedades (indígena e não-indígena), colocando à disposição os instru-

mentos fundamentais que precisam para ser cidadãos, para terem autono-

mia, para decidir, analisar, planejar e pensar os projetos de futuro de seus

povos, conhecendo as diferentes relações sócio-culturais em que estão inse-

ridos. Desse modo, a proposta de educação é pensada e formulada junto

com os professores indígenas, considerando o seu saber e do seu povo como

um patrimônio, fazendo com que a ação educativa esteja em consonância

com a concepção educativa do grupo, contribuindo dessa forma para a

revitalização e manutenção das práticas culturais de cada povo.

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

100

Profissionais da Educação

A importância da educação superior indígena

A educação escolar está presente no contexto das comunidades indí-

genas brasileiras há vários séculos, seja por meio de formas evangelizadoras

e integracionistas, como foi amplamente utilizada em tempos passados, seja

na forma específica e diferenciada como se postula nos dias atuais.

Essa educação escolar tem cumprido ao longo dos anos um importan-

te papel de veículo de informação dos códigos simbólicos da sociedade

envolvente, procurando atender aos interesses das comunidades indígenas e

contribuir para a definição do projeto de futuro de cada povo.

Os avanços na legislação acerca da educação escolar indígena e a con-

siderável necessidade pela ampliação da oferta de salas de aulas nas aldeias

para atender a demanda do ensino fundamental e médio, fez surgir a neces-

sidade de abertura de cursos de formação de magistério e também em nível

superior.Apesar de tantas evidências quanto à necessidade de forma-ção docente, as iniciativas desenvolvidas no Brasil encontram-se ainda em fase embrionária, quando não, tratam-se de “cur-sos” desconexos e descontínuos. Urge, portanto, implementarprogramas extensivos a todas as sociedades indígenas quecontemplem conteúdos curriculares, metodologias de ensi-no, materiais didáticos, etc., adequados aos seus interesses. OPrograma de Formação de Professores Indígenas de MatoGrosso foi concebido e está sendo implementado a partirdesse entendimento. Busca atender a todas as demandas edu-cacionais por meio de projetos específicos e diferenciados,elaborados, implementados e avaliados por todos os segmen-tos envolvidos com a educação escolar indígena (GOVERNODO ESTADO DE MT, 2001).

A criação e implementação de cursos de superiores voltados para a

habilitação de professores indígenas para atuarem nas séries finais do ensi-

no fundamental e no ensino médio é uma necessidade emergencial, haja vis-

101

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

ta a demanda de alunos indígenas existentes nas aldeias. A formação de pro-

fessores indígenas em nível superior representa a possibilidade de propor-

cionar a essa clientela oriunda das aldeias, uma formação condizente com os

preceitos legais dos Parâmetros e Referenciais Curriculares do MEC para as

escolas indígenas.

Mesmo sendo uma antiga reivindicação das lideranças indígenas, o

acesso a cursos nas universidades acabou sendo uma demanda de caráter

individual e esporádico, mais numa perspectiva individual e pessoal do que

coletiva. A ampliação da demanda nas aldeias pelas séries finais do ensino

fundamental e básico, fez com que a procura por formação em nível superi-

or deixasse de ser uma prática individual e ganhasse contorno de política

pública, com demanda nas áreas da educação, saúde e direito.

As formas de acesso a um curso nas universidades, até então, era

conseguida por meio das seguintes modalidades: vestibulares em cursos re-

gulares, vagas residuais, programa de estudantes-convênio ou negociação

com universidades particulares principalmente de cunho confessional. Nas

situações acima, o insucesso escolar era o resultado final da maioria dos

casos em decorrência da ausência de apoio ao longo do percurso da forma-

ção, o ingresso em cursos com estrutura curricular tradicional e hegemônica,

além do distanciamento por um longo período da comunidade de origem

(idem).

Dessa forma, a criação de cursos específicos nas universidades, na mo-

dalidade de formação em serviço e com metodologias de ensino e aprendi-

zagem diferenciadas, mostrou-se um caminho para a consolidação de políti-

cas afirmativas voltadas aos povos indígenas.

Formação de professores em serviço

Mato Grosso deu um grande passo que representou um marco históri-

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

102

Profissionais da Educação

co na educação brasileira ao iniciar o Projeto 3º Grau Indígena, numa parce-

ria da UNEMAT com a SEDUC e a FUNAI, contando com o apoio da Prefeitu-

ra de Barra do Bugres, do MEC e da FUNASA. Passou a ser referência nacio-

nal ao oferecer três cursos de licenciatura específica nas áreas de Ciências

Matemática e da Natureza, Ciências Sociais e Línguas, Artes e Literatura, onde

estudam 200 professores indígenas de 36 etnias e 11 estados da federação.

Na universidade está sendo oferecida uma formação aberta, não-

excludente, pautada na interculturalidade e no respeito às diferenças étnico-

culturais e aos projetos societários dos povos indígenas. Será o primeiro

passo para a consolidação, no futuro, de uma Universidade Indígena, que

será fruto da ref lexão e da luta dos próprios professores indígenas que

estarão sendo formados por estes cursos de licenciatura e de outros que

virão na esteira deles.

O Projeto 3º Grau Indígena foi elaborado a partir das experiências

vivenciadas no contexto dos projetos de formação de professores em servi-

ço como o Inajá, o Homem-Natureza e o GerAção em meados da década 80

e projetos da década de 90 como o Programa Licenciaturas Plenas Parcela-

das, o Programa Módulos Temáticos, O Projeto Tucum, entre outros. Com as

discussões estabelecidas no decorrer das etapas do Projeto Tucum, consoli-

daram-se as diretrizes acerca da formação de professores indígenas em ní-

vel superior. Um trabalho árduo e ousado de quatro anos realizado pela

Comissão Interinstitucional e Paritária, que tinha a participação efetiva dos

professores indígenas. O vestibular indígena, o primeiro realizado no País,

nos dias 30 de março e 05 de abril de 2001, com 570 candidatos inscritos,

onde estiveram presentes índios de 14 estados brasileiros, foi sem dúvida

uma vitória da cidadania e do respeito à diferença (JANUÁRIO, 2002).

As experiências vivenciadas no Estado de projetos e programas de

formação em serviço, em particular na Universidade do Estado de Mato Grosso,

foram fundamentais para a consolidação do 3º Grau Indígena. Possibilita-

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

ram que ao longo de mais de dez anos formando professores leigos para o

exercício da docência, adquiríssemos uma considerável experiência na prá-

tica pedagógica, na estruturação e na articulação política desse modelo de

formação de professores (JANUÁRIO, 2003).

O Projeto 3º Grau Indígena encontra-se estruturado em duas etapas:

uma de Formação Geral, com duração de quatro anos e uma de Formação

Específica, com duração de um ano. A etapa de Formação Geral tem como

eixo norteador a interdisciplinaridade entre as diferentes áreas de conheci-

mentos, a partir de temáticas que possibilitam a criação de um espaço aber-

to, dinâmico, flexível, criativo, dialógico, investigativo e problematizador, onde

os conteúdos das diferentes áreas e os saberes das diversas sociedades dialo-

gam, buscando superar a fragmentação das Ciências nos nichos da química,

história, biologia, matemática, línguas, etc. Essa postura acaba rompendo com

o modelo criado pela sociedade ocidental, na medida em que são estabelecidas

pontes entre as diferentes áreas, oportunizando aos cursistas a compreen-

são dos elementos construtivos da educação escolar indígena e os conheci-

mentos necessários para a prática docente no ensino fundamental e médio.

A etapa de Formação Específica será desenvolvida no último ano do curso e

terá como enfoque principal o desenvolvimento de uma pesquisa teórica e/

ou de campo (estudo monográfico), numa das três áreas de terminalidade

do projeto (GOVERNO DO ESTADO DE MT, 2001).

Ao término de cada Etapa Intensiva, os acadêmicos levam consigo um

roteiro contendo as atividades das três Áreas de Conhecimento do Projeto,

que devem ser desenvolvidas na Etapa Intermediária, ou seja, no período em

que estão na aldeia.

As atividades contidas no roteiro são atividades compatíveis, seqüenciais

e complementares do conteúdo que foi trabalhado na Etapa Presencial, colo-

cada de maneira clara e acessível, procurando com isso conduzir o cursista

a dar continuidade nos seus estudos mesmo à distância do campus universi-

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

104

Profissionais da Educação

tário. As ações da Etapa Intermediária são pensadas e discutidas na Etapa de

Planejamento e Formação que antecede o início de cada semestre, ou seja, o

planejamento das etapas é feito em conjunto, garantindo com isso a coerên-

cia durante todo o semestre e principalmente a solicitação de atividades de

ensino e pesquisa executáveis nas condições que se tem numa escola ou

comunidade indígena.

Algumas das atividades solicitadas conduzem o professor indígena à

investigação de diferentes assuntos relacionados com o seu povo, promo-

vendo com isso o envolvimento do acadêmico com a comunidade em que

vive. Esse tem sido um dos pontos altos do trabalho desenvolvido nessa eta-

pa, particularmente nas pesquisas que necessitam da consulta aos morado-

res mais velhos da aldeia, porque acaba envolvendo a comunidade com o

projeto e com a formação do professor.

O projeto está trabalhando no sentido de fazer o professor índio bus-

car a informação, ir à procura de livros, aprender a utilizar a biblioteca,

tentar solucionar os problemas relacionados à escola, compreender o siste-

ma de ensino e as políticas públicas voltadas para a educação.

No decorrer do período de cada Etapa Intermediária, a equipe de ori-

entação pedagógica composta pelos docentes, técnicos e assessores, visita

as aldeias para verificar junto aos acadêmicos como andam a realização das

atividades, as dificuldades, as dúvidas, o trabalho do professor na escola. Os

encontros acontecem na escola, na casa do acadêmico, no pátio ou sob as

frondosas árvores da aldeia.

Em função de termos cerca de cento e vinte e oito aldeias no projeto,

situadas em locais distantes e de difícil acesso, torna-se praticamente impos-

sível visitarmos todas a cada semestre. Assim, reunimos pequenos grupos de

cursistas em aldeias centrais para realizar o acompanhamento pedagógico.

Com o tempo acabamos conhecendo todas as aldeias, conversando com as

lideranças, com as famílias, sabendo com maior propriedade a realidade dos

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

acadêmicos e como as ações implementadas no projeto estão repercutindo

na escola e na comunidade indígena. Esse tem sido outro ponto importante

para o projeto, porque possibilita discutir com as lideranças e a comunida-

de questões relacionadas à educação, conhecendo situações e problemas do

cotidiano do professor e da escola indígena.

Com isso, o projeto tem possibilidade de estar em movimento, em

direção aos interesses dos povos indígenas envolvidos, possibilitando

redimensionar as ações dos cursos, tendo como ponto de partida e de chega-

da, o que esperam e o que desejam as comunidades indígenas da educação

escolar. Essa postura é um dos eixos fundantes do projeto, que se revela

flexível e aberto às decisões e modificações advindas do embate dos grupos,

estando as equipes preparadas para responderem às questões e necessida-

des que vão surgindo no decorrer das etapas.

Considerações finais

Colocar o Projeto do 3º Grau Indígena em prática foi um longo cami-

nho. Uma trajetória de luta política, de articulação do movimento dos pro-

fessores indígenas por meio de mobilizações e reuniões apoiadas pelo Con-

selho de Educação Escolar Indígena de Mato Grosso. Enfim, foi uma luta

pela cidadania e pela busca da regulamentação dos direitos indígenas no

campo da educação.

Por meio dos cursos, os professores indígenas estão sendo formados

de modo que a partir daí eles possam buscar os conhecimentos necessários

que consideram importantes na sua vida. É preciso estar atento para que o

ensinado em sala de aula pelos professores não-índios tenha ressonância na

escola da aldeia. É fundamental fazer emergir o conhecimento de que são

portadores. Valorizar esses conhecimentos e estabelecer a relação senso co-

mum/saber científico sem perder a riqueza e a especificidade do conheci-

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

mento empírico.

Será na perspectiva da problematização e da investigação, com uma

postura dialógica de entendimento e compreensão dos modos de

inteligibilidade dos professores índios, que estaremos estabelecendo um novo

paradigma na forma de pensar a diversidade no campo da educação. As

conquistas das comunidades indígenas brasileiras no campo da educação

estarão possibilitando aos índios caminhar efetivamente em direção a sua

autonomia, a exemplo dos índios de outros países da América Latina.

Na verdade, as mudanças ocorridas em Mato Grosso constituem numa

vitória do movimento dos professores indígenas brasileiros pelo reconheci-

mento da cidadania plena, pelo respeito à diferença cultural e pela possibi-

lidade de um futuro com maiores oportunidades de igualdade social. Estamos

confiantes na proposta que iniciamos como uma política afirmativa, que

tem apresentado resultados positivos e servido de referência para novas

experiências em todo o País. Isso nos fortalece e nos faz acreditar no movi-

mento dos professores indígenas pela educação escolar de qualidade nas

diferentes regiões brasileiras.

Recebimento: 02/04/2004

Aceite para publicação: 16/04/2004

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

GOVERNO do Estado de Mato Grosso. 3º Grau Indígena: Projeto de Forma-

ção de Professores Indígenas. Barra do Bugres: UNEMAT; Brasília: DEDOC/

FUNAI, 2001.

GRUPIONI, Luis D. B. Educação e povos indígenas: construindo uma política

107

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

nacional de educação escolar indígena. In: Revista Brasileira. Brasília, v.81,

n.198, p.273-283, maio/agosto, 2000.

JANUÁRIO, Elias. Ensino Superior para Índios: Um novo paradigma na edu-

cação. In: Cadernos de Educação Escolar Indígena – 3º Grau Indígena. Barra

do Bugres: UNEMAT, v.1, n.1, 2002.

______. Formação de Professores Indígenas em Serviço: a Etapa de estudos

cooperados de Ensino e Pesquisa – Intermediária. In: Cadernos de Educação

Escolar Indígena – 3º Grau Indígena. Barra do Bugres: UNEMAT, v.2, n.1,

2003.

MONTE, Nietta L. Os Outros, Quem Somos? Formação de Professores Indíge-

nas e Identidades Interculturais. In: Cadernos de Pesquisa. n.111. São Paulo:

Editora Autores Associados, 2000.

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

A INFLUÊNCIA DAS EXPERIÊNCIAS PROFISSIONALIZANTES DAESCOLA DE APLICAÇÃO NAS ESCOLHAS PROFISSIONAIS DE SEUS

ALUNOS, VISANDO A IMPLANTAÇÃO DE UM SERVIÇO DE

ORIENTAÇÃO PROFISSIONAL

Graciela Constantino

RESUMO: Este artigo baseia-se na pesquisa que investigou em uma amostra de 20 ( vinte)aluno egressos, as relações que se estabelecem entre as experiências profissionalizantesproporcionadas aos adolescentes de classe popular e pantaneiros do contexto da Escolade Aplicação e Valorização Humana Lázara Falqueiro de Aquino da Faculdade de Educação/UNEMAT e as suas escolhas profissionais futuras. Foi possível concluir entre as diversidadesencontradas a questão da dúvida quanto às escolhas profissionais e que as práticasdiferenciadas e os modelo pedagógicos oferecidos por esta escola promovem a possibilidadede aspiração de qualidade de vida e da condição de igualdade de competição no mercadode trabalho.

PALAVRAS-CHAVE: Diversidade; orientação profissional; identidade cultural; psicodrama.

ABSTRACT: This article is based in the research of a sample of 20 (twenty) former students,the relations established between the professional experiences afforded to the teenagersof a popular class and pantaneiros (people who live in the swamp regions), in the contextof the primary school - Escola de Aplicação e Valorização Humana Lázara Falqueiro deAquino da Faculdade de Educação/UNEMAT, and their future professional choices. It waspossible to draw conclusions among the diversities founded, the matter of doubt about theprofessional choices and the differentiated practices and the pedagogical models offeredby this school, encourage the possibility to aspire a quality of life and equally be able tocompete in the work market.

KEY WORDS: Diversity; professional orientation; cultural identity; psychodrama;

Hoje a escola como um todo, atravessa uma crise paradigmática e

complexa que atinge a formação das subjetividades e há necessidade de

pensá-la no ato pedagógico. Assim, no caso especifico dos adolescentes da

Escola de Aplicação/UNEMAT, gerou uma ref lexão e conseqüente

sensibilização o fato de conviverem com um cenário de exuberantes belezas

naturais e patrimônio da humanidade e por outro lado marcados pela po-

breza, exclusão, desafetos e de poucas condições básicas necessárias às trans-

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Profissionais da Educação

formações de aspirações profissionais.

A Escola de Aplicação é um Projeto Político Pedagógico da Faculdade

de Educação, foi pensada por um grupo de professores do Instituto de Le-

tras e do Departamento de Pedagogia, e pela Direção da FAED (Faculdade

de Educação) e Reitoria, executada por meio do Ad. Referendo de Criação

n.º 015/93-UNEMAT e Autorização n.º 211/96-CEE (Conselho Estadual de

Educação) MT e trata de uma ação consorciada entre Secretaria de Estado

de Educação, UNEMAT, Prefeitura Municipal de Cáceres e Iniciativa Privada,

atendendo ao Ensino Fundamental Básico – Alfabetização à 8ª etapa, ofere-

cendo por meio de recursos de multimeios tecnológicos “de ponta”, um acesso

da população pantaneira/ribeirinha de baixa renda ou “classe popular” con-

forme teoriza Torres (2000), no mercado globalizado. Assim, garante aos

alunos que dela se utilizam, práticas pedagógicas de experiências múltiplas

e profissionalizantes promovendo no momento da escolha profissional a

oportunidade de condições mais justas de competição no mercado.

Neste contexto, o fato de a Escola de Aplicação e Valorização Humana

“Lázara Falqueiro de Aquino” já acumular uma experiência de dez anos de

trabalho, se preocupar com os princípios teóricos psicogenéticos, com a

garantia de um ensino de qualidade, com a conquista de outros critérios que

garantam o requisito “Aplicação” e finalmente com a experimentação de novas

práticas motivaram esta pesquisa.

Assim, a Escola de Aplicação ocupa um espaço físico de cerca de mil

metros quadrados do ambiente acadêmico do Campus da Universidade do

Estado de Mato Grosso - UNEMAT e compartilha com os espaços dos prédi-

os dos cursos de graduação da universidade.

Neste sentido, aproximar a realidade cultural dos alunos à cultura es-

colar é uma das formas de garantir uma melhoria na aprendizagem e na

qualidade de ensino e outra forma é oferecer outros serviços e assim, tentar

superar os desafios educacionais. Um dos desafios é o da amenização dos

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

fenômenos da repetência e da evasão escolar e o ensino por ciclos em parte

tem atendido a esta necessidade1 . Um outro desafio trata da constatação

por meio desta pesquisa da necessidade de implantar um Serviço de Orien-

tação Profissional garantindo mais um critério “Aplicação” para esta escola.

Diante da perspectiva do ensino, as práticas curriculares são

dimensionadas de acordo com os dados do PPP 98 (Projeto Político Pedagó-

gico Escola de Aplicação) o primeiro ciclo refere-se aos períodos da 1a etapa

de pré-alfabetização e alfabetização; a 2ª e 3ª etapas objetivam a organiza-

ção da identidade, dos dados da realidade, e opera na organização perceptiva

do aluno, para que possa formar “sistemas”, encontrar as relações entre as

coisas e identificar as semelhanças e as diferenças. O segundo ciclo refere-se

à 4ª, 5ª e 6ª etapas, tem o objetivo de iniciar a sistematização do conheci-

mento e de auxiliar no desenvolvimento da análise e síntese, na organização

das ações mentais por meio do estabelecimento dos nexos, dependências,

relações complexas e socialização. Finalmente, o terceiro e último ciclo com-

preende a 7ª e 8ª etapas e visa ampliar a sistematização do conhecimento

empírico para contribuir com a construção do pensamento combinatório e

hipotético-dedutivo das operações formais. A forma de avaliação dos alunos

é formativa e processual, respeitando ao princípio da interdisciplinaridade

e funciona em período integral, com atividades curriculares pela manhã e

extracurriculares à tarde, com a preocupação de manter a criança ou o ado-

lescente o maior tempo possível na escola e os professores são os mesmos

dos cursos de graduação da Universidade do Estado de Mato Grosso.

Já as práticas pedagógicas extracurriculares são diversas, dentre elas

estão as visitas a patrimônios históricos, museus, produção e divulgação de

texto pedagógico, produção de jornal com impressão gráfica e gravações

ao vivo, confecção de materiais manuais, como fantoches, dobraduras e pin-

1 Dado obtido junto à pesquisa de Dissertação de Mestrado e na Linha de pesquisa: Psicogênese eSociogênese do Conhecimento, da Faculdade de Educação da UFRGS.

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

tura em tela, confecção de mini - livros, saída a campo para pesquisas, pintu-

ra em cerâmica, atividades recreativas na cachoeira da Piraputanga, passei-

os de chalanas para reconhecimento da fauna e f lora local, festas comemo-

rativas, aulas de capoeira, leituras na escola e também uma parceria com

atendimento odontológico gratuito.

Com este diverso panorama da formação curricular e extracurricular

que promovem experiências profissionalizantes diferentes no aluno e torna

mais acessível o acesso ao mercado de trabalho, foi pesquisado o sujeito –

adolescente objetivando despertar ref lexões quanto à necessidade de orien-

tação nas escolhas profissionais que os jovens perpassam nesta fase do de-

senvolvimento humano.

Para a orientadora profissional Castanho (1988), o adolescente é “o

sujeito da escolha profissional” (p.09) e, nesta perspectiva, a adolescência é

um processo biológico, psicológico e social que se inicia a partir das mudan-

ças da puberdade que por sua vez “depende de critérios sociais e culturais

para ser definida e sua duração depende da cultura. Cada povo tem sua

forma de ser adolescente (Idem, 1988: 15)” sendo um período de

desequilíbrios na identidade.

Entretanto, para mostrar ao jovem pantaneiro e ribeirinho que é pos-

sível adequar as habilidades adquiridas no meio sociocultural com as opor-

tunidades e a oferta de mercado local faz – se necessário um Serviço de

Orientação Profissional, sendo um projeto piloto e pioneiro de base teórica

da Teoria do Psicodrama. Vale complementar que adotar a Teoria do

Psicodrama para desenvolver um serviço desta ordem significa a conivência

com o pressuposto de uma metodologia holística e o psicodramatista e pes-

quisador da Faculdade de Educação da UNICAMP (Universidade Estadual de

Campinas) Arantes (1999) pontua o seguinte: “com uma fundamentação no

Psicodrama, é viável a criação de uma metodologia capaz de desenvolver o

ser humano como um todo no contexto educacional, respeitando suas capa-

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

112

Profissionais da Educação

cidades de agir, sentir, e pensar”. (Arantes, 1999, p. 257)

Para Castanho (1988), a orientação profissional se define como um

“processo pelo qual se auxilia uma pessoa a escolher uma ocupação prepa-

rar-se, ingressar e progredir nela” (p.60) e independe de classe social, mas o

oferecimento de multimeios necessários à inclusão no mercado de forma

igualitária, pensamos que é papel da escola.

Já a escola como um todo, compactuando com as idéias do pesquisa-

dor Ferreti (1997), é uma instituição social e como tal é o instrumento para

obter a reprodução dos valores, as crenças e da ideologia de uma sociedade.

Neste sentido, auxiliar o adolescente no processo de escolha de “opções

ocupacionais adequadas” é um outro desafio, posto que a adequação se es-

barra, segundo este autor, “na organização da sociedade do mundo globalizado

atual, na complexidade do processo de produção da divisão social de técni-

ca de trabalho” (Idem, 1997: 11) e nas habilidades prévias do sujeito.

Desta forma, os jovens adolescentes da Escola de Aplicação/UNEMAT

recebem uma diversidade de teorias e de práticas, onde se prima pela apro-

ximação de ambas. Eles estão na passagem de um ciclo educativo e não

possuem a mesma possibilidade de escolhas profissionais que os sujeitos de

classe dominante. No entanto, por meio de um Serviço de Orientação Profis-

sional na Escola fica mais acessível à tomada de decisões, às realizações das

perspectivas e sonhos, visto que este serviço especializado e institucional

não se propõe a apontar os caminhos aos jovens, mas sim auxiliá–los na

busca de seus próprios caminhos, pois “a orientação profissional é um traba-

lho técnico que habilita as pessoas na superação das dificuldades e a reco-

brar sua capacidade de escolher” ( Idem, 1997: 10).

Neste sentido, ainda pontua Ferretti (1997) “o objetivo fundamental e

específico que a orientação profissional tem historicamente se proposto é o

de auxiliar o indivíduo no processo de escolha de modo que este realize

opções ocupacionais adequadas (p.15). Para este teórico as opções adequa-

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

das significam escolhas conscientes, criticas e racionais e historicamente a

orientação profissional se iniciou enquanto “uma área autônoma dos traba-

lhos de orientação profissional realizados por Parson em 1909” (Idem, 1997:

13).

Do ponto de vista do trabalho e da educação, se identifica a importân-

cia deste serviço para “a qualificação individual e coletiva” dos alunos da

Escola de Aplicação na medida em que informa as funções de cada profissão

e auxilia na decisão de uma atividade profissional. Para Ferretti (2003),no

que tange à Educação e ás novas tecnologias de mercado os grupos promo-

vem a possibilidade de um trabalho integrado com liberdade de expressão e

planejamento, gerando capacidades de decisão sem deixar de lado a respon-

sabilidade.

Com estes referenciais um serviço de apoio às escolhas profissionais

na Escola de Aplicação pretende nortear o jovem estudante desta escola “a

dispor de alternativas de escolha, estar informado, dominar alguma

metodologia de escolha” já que para Ferretti (1997:37) “o momento das es-

colhas profissionais geram nas pessoas, principalmente nos adolescentes

uma desorientação”.

Para analisar a realidade dos adolescentes, objeto de estudo desta pes-

quisa, foi feita uma investigação sistemática, mediante a observação partici-

pante e a entrevista aberta e registros fotográficos com o objetivo de obter

informações referentes às perspectivas e sonhos futuros despertados pela

Escola de Aplicação e com a hipótese de que as dificuldades nas escolhas

profissionais dos alunos da Escola de Aplicação ocorrem devido à realidade

complexa em que vivem e um Serviço de Orientação Profissional orientado

pela Teoria do Psicodrama contribuirá nas escolhas profissionais mais con-

dizentes com a cultura local e na formação de sujeitos mais espontâneos e

criativos.

Quanto aos procedimentos, inicialmente, foram realizadas a análise

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

114

Profissionais da Educação

documental da Escola de Aplicação para a identificação do endereço dos

alunos egressos desde o ano de 1998 para posteriori visitas, e o fato da

experiência enquanto profissional de Psicologia, Coordenadora desta Uni-

dade de ensino e pesquisadora desde o mesmo ano até os dias atuais auxili-

aram na identificação da necessidade que este artigo se propõe divulgar.

As visitas domiciliares aconteceram nos finais de semana ou durante a

semana no local de trabalho e possibilitaram a compreensão que os alunos

egressos residem em bairros próximos à escola especificamente, os bairros

Cavalhada I, II, III, Vila Irene, Vila Nova da cidade de Cáceres – MT. Ao todo,

a recepção foi calorosa e com demonstração de curiosidade acerca da visita

e foi possível realizar a entrevista aberta com poucas inferências externas,

considerando para as análises as freqüências dos dados e todas as ocorrênci-

as significativas conforme explicita Bardin (1977).

Para elucidar as manifestações da inf luência teórico – prática da Esco-

la de Aplicação na realidade dos alunos pesquisados utilizamos o recurso da

análise de conteúdo que “é um conjunto de técnicas de análise das comunica-

ções” conforme teoriza Idem (1977: 31), onde estão os comentários sobre as

opiniões dos grupos de alunos pesquisados, suas inter-relações, semelhan-

ças, diferenças e expectativas.

As analises foram feitas nas categorias de maiores freqüências das

respostas, neste sentido foram identificados as metodologias diferenciadas

que inf luenciam nas escolhas atuais; os modelos pedagógicos que auxiliam a

formação das identidades; as escolhas profissionais de acordo com as pers-

pectivas e sonhos.

No todo, os diversos dados obtidos nas entrevistas esclarecem a con-

tribuição da Escola de Aplicação na melhoria dos relacionamentos pessoais

dos alunos, na formação de sujeitos críticos e participativos e no acesso ao

mercado. Foram obtidos depoimentos relacionados à capacidade de comu-

nicação promovida pela Escola de Aplicação; o aprendizado da pesquisa

115

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

disciplinar e interdisciplinar; à habilidade do uso com computadores pro-

movidos por meio da Disciplina de Informática que possibilitou o ingresso

no mercado de trabalho para muitos dos entrevistados e a utilidade da Dis-

ciplina curricular de Horta para a vida cotidiana; dentre um outro aspecto

de inf luência não menos relevante, isto é, o interesse do aluno egresso em

cursar a Universidade do Estado de Mato Grosso. Entretanto, de acordo com

os depoimentos há incertezas ou dúvidas nas escolhas profissionais e princi-

palmente por esta razão, este trabalho trata de uma idéia piloto e de um

desafio conforme citado anteriormente. Ao todo, se observa a influencia das

metodologias pedagógicas utilizadas pela Escola de Aplicação, nas ativida-

des desempenhadas hoje pelos alunos egressos.

Também foi possível identificar com maior freqüência a formação crí-

tica que a concepção interacionista da Escola de Aplicação se propõe atin-

gir e que a maioria dos alunos entrevistados objetiva a formação universitá-

ria, mas tem dúvidas nas escolhas:

Um outro dado de relevância e uma última categoria de análise nesta

pesquisa inicial trata da percepção da Escola de Aplicação colaborar tam-

bém com uma perspectiva de qualidade de vida e outras perspectivas e so-

nhos.

Ao que parece, devido à freqüência com que aparece a dúvida quanto

à escolha profissional nos alunos egressos se torna salutar a divulgação dos

dados desta pesquisa para um posteriori trabalho Orientação Profissional

na Escola de Aplicação.

Assim, uma das possibilidades de contribuir com uma melhor forma-

ção dos alunos adolescentes desta escola é informando - os por meio de um

serviço especializado quanto ao leque de opções existentes no mercado for-

necendo a possibilidade de adequação do crescimento pessoal e profissio-

nal, de utilização de instrumentos precisos, por exemplo, o uso de um Inven-

tário de Interesses de Profissões, objetivando a formação de uma identidade

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

116

Profissionais da Educação

mais espontânea e criativa.

A criatividade de acordo com o Dicionário de Psicodrama e Sociodrama

(1992) trata “da disponibilidade do ser humano para o ato criador, assim

considerando qualquer ato que acarrete uma transformação integradora, no

sentido do crescimento e da maturação, naquele que o realiza e também no

meio que o rodeia” (p.65). Ela representa um aspecto central da Teoria do

Psicodrama e J.L. Moreno a relaciona com conceitos de liberdade, de espon-

taneidade e onde “quer que seja o campo com que se desenvolva buscará,

com um enfoque particulares da realidade determinados aspectos desses

valores para ilumina-los e ressalta-los” (Idem, 1992: 66).

Ainda com base nas idéias de Moreno (1993) a criatividade “opera não

só na dimensão das palavras, mas em todas as outras dimensões de expres-

sões, como atuação, a interação, a fala, a dança, o canto e o desenho” (p.37). E,

parafraseando Arantes (Apud Sisto, 1999) “a criatividade e a inventividade

são manifestações decorrentes do fator espontaneidade, mediado pela inte-

ligência e memória na sua relação estabelecida entre objetos e pessoas” (p.

253) e há uma redimensionalização da ação do sujeito promovida pela es-

pontaneidade e que visa promover respostas novas e adequadas: “a manifes-

tação espontânea é uma resposta direta a uma situação vivida, é uma respos-

ta adequada a cada nova situação, ou uma resposta inédita a uma situação

antiga, que se apresenta no aqui – agora (...)”. (ARANTES apud SISTO, 1999,p.

253)

Ainda a este respeito, segundo Moreno (1993), é relevante a compre-

ensão do papel da criatividade nas estruturações cognitivas porque permeia

as ações humanas e o desenvolvimento da inteligência: “A vinculação da es-

pontaneidade à criatividade foi um importante avanço, a mais elevada forma

de inteligência de que temos conhecimento, assim como o reconhecimento

de ambas são as forças primarias no comportamento humano”. (MORENO,

1993, p. 37)

117

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

A Teoria do Psicodrama aplicada ao adolescente contribui para a aqui-

sição de informações fundamentais na escolha profissional, como também

promove a formação holística dos alunos conforme enfatiza Arantes ( Apud

SISTO, 1999):

Sem dúvida, o objetivo final do Psicodrama aplicado na áreaprofissional é: Facilitar e desenvolver a aquisição, retenção eaplicação dos conceitos teóricos e práticos. Porém, além des-te objetivo, recupera-se a formação do aluno ( sem menos-prezar a informação) ao respeitar o aspecto afetivo, desen-volvendo o inter-relacionamento e o amadurecimento profis-sional”. (ARANTES apud SISTO, p.252)

Finalizando, a Teoria do Psicodrama trabalha o sujeito em suas diver-

sas dimensões social, psicológica e cultural, revitalizando-o, recriando-o

dialeticamente e descristalizando conservas culturais, na medida em que pode

transformar valores e costumes não mais saudáveis para o sujeito.

Conseqüentemente, um trabalho no contexto educacional em que vise

uma ref lexão das conservas sociais e dos papéis sociais2 contribuirá para a

formação de sujeitos mais ativos, não coibitivos, democráticos e criativos,

compactuando com as idéias da Escola de Aplicação de pilares teóricos

psicogenéticos, onde no que tange à educação “a questão da identidade cul-

tural de que fazem parte a identidade individual e a classe dos educandos,

cujo respeito é absolutamente fundamental na prática educativa progressis-

ta é um problema que não pode ser desprezado” (Freire,1998:46).

Finalmente, a orientação profissional por meio de instrumentos do

Psicodrama auxilia na habilitação de pessoas criativas, e na superação de

dificuldades no momento das escolhas, rompendo com barreiras históricas

oriundas de políticas globais excludentes que marginalizam os sujeitos me-

2 Os papéis são considerados “os embriões. precursores do eu e esforçam-se por agrupar eunificar”(Moreno,1993:.25).

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

nos privilegiados de“classes subalternas” (Ferretti, 1998).

Recebido: 02/04/2004

Aceite para publicação: 16/04/2004

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ARANTES, J. Valério A. Psicodrama e psicopedagogia. In: SISTO, Fermino F. et

al.. Atuação psicopedagógica e aprendizagem escolar. Petrópolis - RJ: Vozes,

1999.

BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Tradução de Luís Antônio Reto e

Augusto Pinheiro. 70. ed. Lisboa (Portugal): s.e. 1977.

CASTANHO, Gisela M. P. O adolescente e a escolha da profissão. São Paulo:

Paulinas, 1988.

FERRETI, Celso João. Uma nova proposta de orientação profissional. São

Paulo: Cortez, 1997.

______. Opção: trabalho. Trajetórias ocupacionais de trabalhadores das clas-

ses subalternas. São Paulo: Cortez, 1988.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. São Paulo: Paz e Terra, 1998.

MENEGAZZO, Carlos M; ZURETTI, Maria Mônica (orgs). Dicionário de

Psicodrama e Sociodrama. São Paulo: Agora, 1992.

119

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

MORENO. J. L. O Psicodrama. São Paulo: Cultrix, 1993.

PROJETO Político Pedagógico da Escola de Aplicação e Valorização Humana

“Lázara Falqueiro de Aquino”, Versão 1998.

TORRES, Rosa María. Itinerários pela educação latino-americana: caderno de

viagem. Porto Alegre: Artmed, 2001.

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

120

Profissionais da Educação

INTER-RELAÇÕES ENTRE A CONCEPÇÃO DO PROCESSO DE

DEMOCRATIZAÇÃO DO ENSINO E A PRÁTICA DOCENTE

Helena Faria Barros

Dáugima Maria Santos Queiroz

Clacy Zan

RESUMO: A pesquisa realizada procurou apreender e analisar a natureza das concepçõesde democratização de ensino subjacentes à prática pedagógica, dos professores do ensinofundamental da rede pública (estadual) de Campo Grande – MS. A partir das respostasdadas, pode-se inferir que a maior parte dos professores reconhece a democratizaçãocomo um valor pelos benefícios que pôde proporcionar, mas reconhece, igualmente, queo oferecimento de vagas é, apenas, o início desse processo democrático. No entanto, umacontradição se torna evidente: por um lado aceita-se e defende-se a democratização doensino como um valor, cuja realização deve ser buscada e por outro, a reprovação é aceitae legitimada com muita segurança e convicção. Embora boa parte dos professores concordeque só vagas não é algo suficiente, não há apontamentos consistentes sobre o que seránecessário fazer numa vivência democrática dentro da escola.

PALAVRAS-CHAVE: Formação de Professores; democratização do ensino; prática docente.

ABSTRACT: This research tried to apprehend and analyze the nature of democratizationconcepts of teaching underlying the pedagogical practice of elementary school teachersin public state schools in Campo Grande – MS. Using as a starting point, the answers givenby the teachers, we can infer that most of them recognize democratization as a value forthe benefits it can provide, but recognize equally, that the offering of vacancies, is only thebeginning of this democratic process. Nevertheless, a contradiction becomes evident: onone hand is accepted and defended the democratization of teaching as a value whosefulfillment should be searched, on the other, the failure is accepted and legitimated withmuch certainty and conviction. Although good part of the teachers agree that just vacanciesis not enough, there are no consistent annotations about what would be necessary to do ina democratic living inside the school grounds.

KEY WORDS: formation of professors; democratization of teaching; teacher practice;

Os pesquisadores em educação que investigam a formação do profes-

sor têm analisado a natureza das concepções subjacentes à prática pedagó-

gica e mostram que o fazer docente, enquanto profissão, implica uma práxis

121

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

que lhe é própria e que o caracteriza.

Essa práxis traz subjacente, consciente ou inconscientemente, um sa-

ber próprio que “configura uma matriz de dimensões múltiplas, uma de ca-

ráter mais aberto, genérico, outras, porém, de absoluta especificidade o que,

habitualmente, se designa como conhecimento profissional”. (SÁ CHAVES E

ALARCÃO – 2000).

A pesquisa realizada, bastante ampla, procurou apreender esse conhe-

cimento pedagógico, sua especificidade no referente:

· aos valores aceitos e praticados pelos professores, enquanto pro-

fissionais em e com o seu trabalho;

· à prática docente como um conjunto de decisões e ações que

traduzem de forma coerente ou contraditória os valores e as concepções

expressos;

· às práticas de organização e de gestão da escola e suas relações

com a qualidade do ensino e a formação de professores.

Essa investigação realizada por professores e bolsistas do Programa

de Mestrado em Educação da Universidade Católica Dom Bosco de Campo

Grande está concluída e no presente trabalho, foi selecionada e está sendo

apresentada a primeira parte, referente aos valores e em especial, as respos-

tas dadas às questões relativas à democratização na escola e ao fracasso

escolar.

Objetivos da pesquisa

A pesquisa teve como objetivo realizar um amplo diagnóstico do qua-

dro do magistério do ensino fundamental da rede pública (estadual) de Cam-

po Grande-MS, focalizando: a) os valores e as concepções relacionados à

educação escolar, ao ensino e à aprendizagem expressos pelos docentes; b)

a prática docente como um conjunto de decisões e ações que traduzem de

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

forma coerente ou contraditória os valores e as concepções expressos.

Metodologia da pesquisa

Os sujeitos da pesquisa foram os professores das escolas públicas de

Ensino Fundamental do Estado. A amostra foi constituída por sorteio a par-

tir da localização das escolas distribuídas pelas micro-regiões administrati-

vas e pelo tipo dessas escolas.

O diagnóstico (levantamento, “survey”) foi realizado por meio de ques-

tionário com questões abertas a serem respondidas livremente e com exem-

plos e desenhos a serem comentados/ interpretados pelos participantes. As

perguntas referiam-se aos valores e representações acerca da educação es-

colar, objeto deste trabalho, principalmente, sobre a democratização do en-

sino e fracasso escolar (evasão e repetência).

Questionados sobre os efeitos das mudanças ocorridas na escola nos

últimos vinte anos, na tentativa de democratização do ensino, os professores

responderam que elas foram boas (72,1%) porque: possibilitaram o acesso à

escola para a população até então marginalizada (38,2%); permitiram usu-

fruir dos bens sociais e melhoraram as condições de vida (8,5%); possibilita-

ram a construção da cidadania e promoveram a transformação social (6,7%);

atenderam ao interesse do Estado e promoveram o desenvolvimento do país

(2,4%); possibilitaram a qualificação para o trabalho (2,4%); diminuíram o

trabalho infantil e tiraram crianças da rua (1,2%); promoveram a inclusão de

deficientes, adultos, pobres (0,6%); promoveram a atualização dos professo-

res (7,3%); obrigaram a revisão do ensino/adequação à realidade (3,6%); re-

sultaram na melhoria e ampliação da rede escolar (1,2%).

Algumas respostas dos professores (21,2%) afirmaram que as medi-

das adotadas na escola foram ruins porque a qualidade do ensino deixou a

desejar (15,8%); o professor não consegue trabalhar com o novo aluno (1,8%);

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

a falta de continuidade dos projetos (mudança freqüente do governo)

inviabiliza a proposta (1,8%); as salas ficaram superlotadas, dificultando um

bom trabalho do professor (1,8%). Assim esse grupo, menor, enxerga que as

mudanças havidas foram ruins.

As respostas dos professores à questão sobre quem foi beneficiado

pelas mudanças ocorridas na escola estão sintetizadas no quadro a seguir:

Quadro nº 1: Quem foi beneficiado pelas mudanças ocorridas nas

escolas em decorrência da democratização do ensino segundo os Professo-

res da Rede Estadual de Ensino - Campo Grande – MS/2000

Verifica-se que reconhecem que foram muitos os beneficiados (alunos,

professores, pais, sociedade e democracia) e as respostas “para quem foi

bom” aparecem em número maior, 74,9% contra 21,6% que consideram que

não houve favorecidos e 3,5% dos que aceitam que, ao mesmo tempo, houve

beneficiado (o governo) e não beneficiado (o aluno).

Na questão sobre “se o oferecimento de vagas pode ser considerado

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

como garantia suficiente de democratização” foi respondida pelos professo-

res conforme os dados apresentados no quadro seguinte:

Quadro nº 2: Relação entre oferta de vagas e garantia de democratiza-

ção da educação, segundo a visão dos Professores da Rede Estadual de Ensi-

no. Campo Grande – MS/2000

As respostas “em termos” (62,8%) indicam que os docentes aceitam

que o oferecimento de vagas precisa ser complementado por outras provi-

dências. Vagas, por si só não garantem nem a permanência dos alunos na

escola e nem a aprendizagem deles. Se se agrupar as respostas “não” e “em

termos”, tem-se que 77,7% das respostas dos mestres consideram que o ofe-

recimento de vagas é insuficiente à democratização da educação escolar

que é processo bem mais amplo.

Assim, pode-se inferir, a partir das respostas dadas que a maior parte

dos professores reconhece a democratização como um valor pelos benefíci-

125

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

os que pôde proporcionar, mas reconhece, igualmente, que o oferecimento

de vagas é apenas o início desse processo democrático. Chama a atenção o

elevado número de professores que expressam essa convicção.

Embora reconheçam que abrir a escola à população é um beneficio e

um avanço democrático que muitos países não conseguiram, ainda, estender

nem mesmo a 10% da 4população, os professores têm clareza de que isto é

insuficiente. O processo democrático não se completa com o oferecimento

de vagas, mas exige ações complementares.

Esse fato lembra PERRENOUD (2000) quando mostra que a concep-

ção de democratização tem história e que é possível identificar no processo,

momentos ou modos de pensar bem demarcados.

É nos anos 50 (século XX), no pós-guerra, que se pode localizar segun-

do esse autor, a concepção do “fracasso escolar” como problema de justiça

social merecendo atenção por parte do Estado. Nos anos 60, a concepção da

democracia se caracteriza por firmar a escolarização como direito e dever

dos cidadãos e do Estado o que, como medida prática, ocasionou a

descentralização dos estabelecimentos, a ampliação do número deles e o

oferecimento de auxílio financeiro para o ingresso nas escolas. Nem todos

os países puderam conseguir esse feito, mas passou a ser intenção de todos,

passou a ser meta a atingir.

Em um segundo momento a democratização da educação escolar ca-

racterizou-se pelas reformas do ensino médio que induziu a altos índices de

escolarização, aumento do tempo de escolaridade e estímulos à obtenção de

diplomas universitários. Porém, a reforma do ensino médio, também, não

apenas consolidou a estratificação social anteriormente existente, como a

legitimou fazendo-a repousar sobre critérios aparentemente escolares e não

mais, abertamente sociais. Transformou em mérito ou incapacidade pessoal

o que se imputava, até então, aos acasos da origem social. A carga da desi-

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

gualdade na escola não incumbe mais à sociedade, mas, aos indivíduos

(PERRENOUD – 2001). O êxito ou o fracasso escolar é atribuído ao aluno e

não à sociedade que cumpre o seu papel oferecendo vagas.

Numa terceira fase, e isto está acontecendo no presente, a democrati-

zação se volta para dentro da própria sala de aula. Volta-se para o próprio

processo de ensino/aprendizagem na perspectiva da aprendizagem com-

preensiva (significativa), do ensino como intermediação e intervenção apro-

priadas; para a avaliação praticada como formativa e como regulação da

aprendizagem e para a relação intersubjetiva e intercultural julgada essenci-

al ou não no trato das desigualdades entre os indivíduos na escola.

Em síntese, a análise dos dados expostos até aqui conduz à considera-

ção de que para os professores da Rede Estadual de Ensino de Campo Gran-

de – MS:

* a democratização da educação é idéia bastante importante;

* reconhecem que as medidas democratizantes, na sua maioria, foram

benéficas, principalmente às crianças que estavam até então excluídas da

escolarização, além dos deficientes, adultos e adolescentes. Portanto, é evi-

dente a crença predominante de que a formação é direito e dever de todos;

* o oferecimento de vagas, ou seja, o acesso à escola não representa

garantia de democratização do ensino;

* os professores identificam fatores externos à escola indispensáveis à

plena democratização (34,2%) e é interessante notar que o fator mais indica-

do diz respeito ao que acontece no interior da escola (35,6%), na sala de

aula;

* observa-se uma linha dentada na concepção da democratização do

ensino, em que 35,6% dos professores expressam uma concepção progres-

sista da questão, defendendo que a democratização se faz na escola, na sala

de aula, garantindo-se a aprendizagem a todos, com o suporte das relações

127

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

interpessoais positivas; 19,7% das respostas reivindicam e reclamam políti-

cas de valorização do professor, expressas em boas condições para o ensino

e aprendizagem na escola, em salários condignos, em jornadas de trabalho

compatíveis com o estudo e desenvolvimento profissional e em programas

de capacitação. Uma porcentagem menor de respostas, 10,3%, refere-se a

fatores relacionados à família e à comunidade escolar, mediante a participa-

ção na vida da escola e o incentivo e apoio das famílias ao aluno e à escola.

Finalmente, 34,2% das respostas endossam a corrente que atribui aos fato-

res sócio-políticos e econômico-culturais, grande influência na democratiza-

ção da educação escolar. São posições ainda alinhadas com as concepções

reprodutivas de educação, já superadas pelo entendimento de que a institui-

ção escolar e os profissionais da educação possuem uma “autonomia relati-

va” que torna possível reescrever o “script” proposto para a escola, para a

educação escolar e à prática docente.

É preciso ter presente a importância da luta para que as condições

externas à escola sejam favoráveis ao acesso, permanência e sucesso dos

alunos na escola. Ao mesmo tempo é preciso ter presente também que a

escola e a sala de aula constituem o espaço de atuação dos educadores e é ali

que os professores também podem exercitar a democracia garantindo a

qualidade do ensino e relações interpessoais sadias. Portanto, uma posição

realista e conseqüente em relação a essa questão deve lutar pela democrati-

zação do ensino em duas frentes: dentro e fora da escola.

Colocados diante de situações-problema envolvendo os fenômenos da

evasão e da repetência e solicitados a opinar sobre os fatores aí envolvidos,

os professores mencionaram fatores de diferentes ordens, de acordo com o

quadro a seguir:

Quadro nº 3: Justificativas apresentadas pelos professores da Rede

Estadual de Ensino para aceitação ou não da taxa de 50% de reprovação -

Campo Grande – MS/2000

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Profissionais da Educação

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

A análise dos quadros chama a atenção para:

* todos os que dizem que o índice de reprovação não pode ser aceito,

agrupados e não importando a razão apresentada, perfazem 71,5%.

* é positivo constatar que professores (12,2%) reconhecem que cabe à

escola e ao professor adaptarem-se às possibilidades de aprendizagem do

aluno e às condições de estudo dele.

* a falta de assiduidade prejudica a aprendizagem é certo, mas, ela

merece tratamento diferente da reprovação que é inadequada, no caso. Tra-

tamento melhor deve ser procurado pela equipe da escola.

* não tem sentido tratamento didático diferenciado por se tratar ape-

nas de turno diurno (concebido comumente como de alunos mais capazes)

ou noturno. O problema a ser resolvido, novamente, é metodológico: como

atender as diferenças apresentadas pelos alunos? “A aprendizagem independe

do turno” afirmam algumas respostas dos professores (2,1%).

* uma posição intelectualista existente deve ser acrescentada quando

se diz que a reprovação é justificada pelo não domínio do conteúdo. Apren-

de-se apenas conceitos, proposições ou aprende-se e deve-se aprender, tam-

bém, habilidades (saber fazer),

* atitudes e valores (ser) e a conviver (relacionar-se)?

Merece destaque a categoria “o professor deve rever sua prática”

identificada nas respostas de 4,9% dos professores para justificar a reprova-

ção. É reveladora do real significado do ensino – esforço para ajudar a apren-

der – portanto, supõe o emprego de vários procedimentos didáticos de modo

a possibilitar que o aluno compreenda, que chegue à construção de signifi-

cados.

O índice de respostas de 29,4% é ainda um indicador de uma concep-

ção conservadora de educação, de ensino e aprendizagem e da prática

avaliativa ainda marcante entre os professores. Frente a essa posição por

eles expressa, cabem as perguntas: conteúdo de ensino é apenas conheci-

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

130

Profissionais da Educação

mento (conceitos, proposições)? Atitudes, valores, habilidades não são ensi-

nados? Não são avaliados? Não são considerados numa avaliação formativa,

mais ampla, reguladora no e do processo de aprendizagem? É correto do

ponto de vista educacional, levar-se em conta, na avaliação do aluno, apenas

o domínio (compreensão? Memorização?) de conhecimentos, informações?

À porcentagem das respostas que justificam a reprovação do aluno

por indisciplina 8,3%, caberia indagar se a reprovação corrigirá a indisciplina

ou outras medidas mereceriam ser tomadas?

O percentual de respostas dos professores que considera legítima a

reprovação quando há falta de interesse, 8,3%, evidencia que o professor

remete a questão da “falta de interesse” para o aluno e não se percebe como

parte desse problema. Afinal, cabe a ele organizar o seu ensino a partir das

experiências, dos conhecimentos, das necessidades dos seus alunos, mostran-

do-lhes o objetivo e a importância do que estudam, com o quê, provavelmen-

te, a “falta de interesse” deixaria de existir.

Uma contradição se torna evidente: por um lado aceita-se e defende-se

a democratização do ensino como um valor, cuja realização deve ser busca-

da e por outro, a reprovação é aceita e legitimada com muita segurança e

convicção. O que se entende por democratização? Tem-se dela uma visão tão

restrita e tão formal que não supõe forma de tratamento didático? Embora

boa parte dos professores concorde que só vagas não é o suficiente, não há

apontamentos consistentes sobre o que será necessário fazer numa vivência

democrática dentro da escola.

Há imprecisões no que se refere ao sentido de democratização, de

vivência da democracia na escola. Por um lado, parece ser um valor a ser

cultivado cotidianamente, em todas as instâncias da escola e em cada mo-

mento da sala de aula. No entanto, a evasão e a repetência bem como as

práticas que as alimentam não são vistas como uma forma de violação desse

valor. Não são entendidas como um problema de injustiça social praticada

131

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

contra a população, embora com ela se esteja cerceando o desenvolvimento

e a formação dos jovens no sentido da sua humanização.

Em síntese, pode-se dizer que as respostas expressam a co-existência

de posições diferentes, às vezes antagônicas, em relação aos temas propos-

tos pelo instrumento à ref lexão dos professores que participaram da pes-

quisa. Deve-se interpretar essa dualidade nas respostas obtidas como refle-

xo de um processo, que não é contínuo e que apresenta avanços e retrações.

O importante é a constatação desses estágios para que “os professores to-

mem consciência da sua própria profissionalidade e do seu poder e respon-

sabilidade em termos individuais e coletivos”. (ALARCÃO, 2001, p. 23). Como

lembra Adorno, só a tomada de consciência pela educação evita nova

Auschwitz.

Recebido: 02/04/2004

Aceite para publicação: 16/04/2004

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ADORNO, T. A educação e a emancipação. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1998.

ALARCÃO, I. Escola reflexiva e nova racionalidade. Porto Alegre: Artmed, 2001.

PERRENOUD, P. A pedagogia diferenciada. Porto Alegre: Artmed, 2000.

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

132

Profissionais da Educação

OS PROFESSORES DIANTE DOS DESAFIOS DO

TERCEIRO MILÊNIO

José Manuel Ruiz Calleja

RESUMO: Apresentamos neste trabalho, uma análise fundamentalmente metodológica,baseada nas atuais teorias pedagógicas e didáticas sobre as funções dos professores,refletindo as caraterísticas essenciais de sua atuação e algumas alternativas de solução arespeito dos problemas detectados neste contexto. Tratam-se alguns aspectos essenciaisdas atividades do professor e os alunos no processo de ensino-aprendizagem, atendendoa suas relações, e em termos de sugestões gerais para o comportamento do professor, emcujos fundamentos são argumentadas as possibilidades práticas de aplicação. Implícita nacaracterização aprecia-se uma visão analítica do processo de formação escolar e doimportante papel da didática, baseado num modelo teórico que atenda, particularmente,ao mesmo.

PALAVRAS-CHAVE: Professor, professor-aluno; pedagogia; didática; ensino-aprendizagem

ABSTRACT: In this work we show, an analysis fundamentally methodological, based onpresent pedagogical theories and didactics about the function of the teachers reflectingthe essential characteristics of their actions and some alternative solutions about theproblems detected in this context. Some essential aspects of the activities of teachers andstudents in the teaching and learning process are discussed attending their relations and interms of general suggestions, for the behavior of the teacher, of which his reasons for thepractical possibilities of application are discussed. Implicit in the characterization, an analyticvision of the process of the school formation and the important role of didactics is valued,based in a theoretical model that can, particularly, deal within itself.

KEY WORDS: Teacher; teacher-student; pedagogy; didactics; teaching-learning;

Uma interrogação principal norteou nossa inquietude e curiosidade

sobre o tema: Qual é a responsabilidade da escola e dos professores diante

dos desafios atuais da educação? Mas também poderíamos acrescentar: Nos-

sos jovens ficam preparados para enfrentar os desafios criativamente, ou

simplesmente viverão passivamente as grandes transformações, adaptando-

se de alguma maneira às novas situações?

Por quanto consideramos que vale a pena ref letir sobre os aspectos

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anteriores, abordamos neste trabalho, alguns elementos referenciais de cará-

ter teórico e prático que sustentam hoje, no fundamental, e partindo de con-

cepções diversas, o agir dos professores nas condições atuais de globalização

mundial e avanço acelerado da ciência e da tecnologia, que exigem mudan-

ças e adaptações em suas abordagens práticas dos processos educativos.

Os professores tiveram historicamente a função social de educar, em-

bora hoje, nos inícios do Terceiro Milênio, é muito discutido o papel do pro-

fessor. Uma das causas principais, mas não a única, é a deterioração acontecida

pela perda da exclusividade da educação, muitas vezes compartilhada em

desvantagem com outras instituições, organizações sociais e meios massivos

de comunicação. Assim, surgem algumas outras perguntas interessantes: que

professor devemos formar?; quais são suas funções? e como prepará-lo? Tais

interrogações obrigam hoje a redefinições globais do problema das funções

do professor e dos processos de sua formação.

Todo o âmbito social é extensão natural da atividade propriamente

educativa, na qual incluímos a atividade dos professores. É assim que além

dos discursos de autonomia, liberdade de cátedra e melhoras de condições

de trabalho e vida, que hoje se escutam em nossos contextos sociais reclama-

ções pertinentes e justos dos educadores, precisamos também consolidar

cada dia mais e melhor os vínculos estratégicos entre a educação e a socie-

dade.

Nossa intenção é de analisar, e se for possível aprofundar, no papel,

características e funções próprias dos professores de hoje, ante os desafios

da globalização mundial e as mudanças aceleradas que têm lugar nas socie-

dades contemporâneas, onde o conhecimento, a informação e a educação

têm um papel central, que impõem a estes últimos desafios tais como conse-

guir ultrapassar um paradigma de desenvolvimento econômico, para instau-

rar outro de desenvolvimento humano e sustentável. O sentido principal do

trabalho, é contribuir à discussão e intercâmbio de opiniões dentro da diver-

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sidade atual de enfoques teóricos sobre o tema.

A educação como função profissional dos professores.

Como organização social específica, qualquer sistema de educação

constitui um processo social estruturado, que estabelece os níveis de especi-

alização de seus componentes e também as relações entre eles.

Aparecem dentro do sistema de educação e ensino, outras característi-

cas que o definem como processo social encaminhado à realização de fun-

ções sociais muito específicas. Entre estas características podemos citar a

racionalidade, a regularidade, o controle do rendimento e os resultados, a

seleção dos objetos de sua ação, a elaboração de estratégias especializadas,

as condições de organização, os métodos, dentre outras. Tais características,

que distinguem o sistema de educação de outros processos sociais, se reali-

zam em um contexto social que determina tanto os objetivos como as fun-

ções que desempenham as instituições, grupos e pessoas envolvidas na edu-

cação e no ensino.

Como atividade organizada, segundo a Divisão Social do Trabalho, a

educação é uma função profissional altamente especializada, que inclui muitas

pessoas, cada uma das quais exerce uma tarefa específica que requer conhe-

cimentos e habilidades bem determinadas. Assim, por exemplo, é diferente o

trabalho dos professores de ensino fundamental e dos professores de nível

universitário, com independência de que existem aspectos gerais que permi-

tem considerá-los todos como trabalhadores da educação ou pedagogos.

Sempre a função social do professor ou pedagogo em geral, responde

às condições históricas e sociais concretas em que se desenvolve a educação,

ou seja, que a pertença a este setor profissional, confere determinada posi-

ção de classe aos indivíduos, que em seu acionar reproduzem essas condi-

ções sociais de existência, assim como o grau de desenvolvimento econômi-

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co e social da sociedade em que vivem, em última instância, define tanto os

objetivos como o conteúdo e métodos da educação e do ensino e, portanto,

as funções que desempenha este pessoal.

É preciso fazer uma diferença entre os processos educativos gerais e

os processos pedagógicos particulares, porquanto neste caso específico, ao

falar das funções específicas dos grupos e pessoas, estamos referindo-nos

aos professores, diretores, instrutores, auxiliares pedagógicos, etc., que tra-

balham no sistema de educação escolarizado, seja este público ou privado.

Os processos pedagógicos particulares se distinguem do conjunto dos pro-

cessos educativos pelas seguintes propriedades:

1.- Seguem um sistema de fins graduais, que habitualmente se definem

a partir das necessidades mais imediatas da sociedade;

2.- São processos reitores, que respondem a um programa de estraté-

gias para atuar sobre os processos de assimilação e controlam os resultados

das influências;

3.- Perseguem e conseguem a assimilação sistemática de determina-

dos conteúdos sociais considerados valiosos e, portanto, previamente seleci-

onados e

4.- Constituem inf luências exercidas sobre os processos de assimila-

ção, organizados com propósitos educativos, ou seja, formativos e de socia-

lização.

O problema da especificidade dos processos pedagógicos dentro das

influências educativas mais gerais, ainda não é assunto totalmente resolvido

entre os especialistas. Algumas posições, nem sempre acertadas ou precisas,

sobre a relação entre sociedade, educação e processo pedagógico, ressaltam

basicamente o papel preponderante da relação entre objetivo, conteúdo e

método, ou seja, os aspectos teóricos da organização dos processos peda-

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Profissionais da Educação

gógicos, desconhecendo a medição dos resultados, questão essencial para

categorizar os efeitos sociais do ensino. Outras teorias, onde apreciamos

aspectos positivos e essenciais, induzem ao erro de isolar o sujeito da educa-

ção, crianças, adolescentes e jovens, da própria existência social que com-

partilham.

A literatura pedagógica das décadas dos anos 60, 70 e 80, deu ênfase

nas questões teóricas do ensino, mas também não é difícil encontrar nela,

expressões que hoje nos parecem em excesso formais, e até dogmáticas,

quanto às funções dos componentes pessoais do processo pedagógico, ou

seja, de alunos e professores.

As concepções atuais da didática e em geral sobre o processo de ensi-

no, têm superado esta separação de funções assumindo o trabalho pedagó-

gico a partir de uma perspectiva muito mais democrática e plural, que rechaça

os conceitos de “subministro de conhecimentos” ou de diferenciação absolu-

ta entre os papéis de educador e educando, definindo uma posição ativa,

dinâmica e crítica tanto para os professores como para os alunos.

Uma das funções da educação como fator da prática social é precisa-

mente a função profissional que desempenham os professores e outras pes-

soas e grupos, como resultado da Divisão Social do Trabalho. Um dos mais

difíceis problemas da educação é delimitar com precisão as tarefas básicas e

as esferas de atuação deste pessoal especializado, mais especificamente dos

professores.

A simples vista, a contradição entre as exigências que fazem os siste-

mas nacionais de educação a seus professores e as possibilidades reais des-

tes últimos para cumpri-las, resultou até hoje insolúvel, além de ser fonte de

contínuos conflitos laborais e existenciais, devido ao incremento das exigên-

cias sem um conveniente reconhecimento econômico ou de condições de

trabalho, mas também pela insatisfação e frustração que provoca nos pro-

fessores a incapacidade de assumir todas as funções estabelecidas, o que

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conduz a um cumprimento parcial de umas funções em detrimento de ou-

tras, a perda da auto-estima e, no pior dos casos, o abandono da profissão.

Consideramos que a delimitação das tarefas básicas do professor fica

em estreita relação com a extensão que damos ao conceito de educação. No

sentido amplo, educar implica necessariamente “sair” do processo de ensino-

aprendizagem e portanto da escola, estendendo as inf luências educativas a

outros contextos e níveis de participação. Um conceito mais estreito, pelo

contrário, reduzirá o trabalho do professor ao contexto escolar e à transmis-

são de conteúdos e normas pré-elaborados, ou seja, à instrução.

Uma concepção ampla da educação nos levará obrigatoriamente à

ampliação das esferas de ação do professor, sem que por isto tenha que

assumir as funções e tarefas de outros agentes educativos, como a família, os

grupos sociais e as instituições estaduais, dentre outras. A influência educativa

do professor deve estender-se, sem interferir na de outros agentes sociais, às

famílias de seus educandos e à comunidade em que se assenta a escola, pelo

que teremos novos contextos de atuação profissional, onde o trabalho do

professor pode ser extraordinariamente útil e de um benefício social imedi-

ato.

No que se refere às tarefas básicas, a elaboração de uma lista muito

detalhada de missões ou obrigações, só conduz a uma excessiva carga do

pessoal docente, com tarefas que correspondem, na maioria dos casos, ao

pessoal administrativo ou de serviços, ou inclusive, ao pessoal dirigente das

escolas, de instâncias superiores, à família ou instituições e organizações

sociais. Um enfoque mais racional do problema, recomenda centralizar as

tarefas básicas do professor em dois grandes campos: instruir e educar.

È importante lembrar que o conceito de educar implica a formação da

personalidade do sujeito, sua preparação para a inserção no contexto social.

Assim, o professor deve ser orientador do desenvolvimento dos educandos,

contribuindo para que em cada um deles se manifestem todas as

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potencialidades positivas de sua personalidade. Para realizar sua função

educativa o professor deve ser um permanente pesquisador, estudioso in-

cansável de sua disciplina, da metodologia do ensino e dos contextos em que

desempenha seu labor profissional, o que em definitivo lhe permitirá colo-

car-se adequadamente nos diversos e complexos problemas do processo

pedagógico em particular e do educativo em geral.

Tarefas Básicas e Esferas de Atuação do Professor

No esquema apresentado, se sublinha que entre ambas funções existe

uma interdependência recíproca que não é difícil de compreender. O suces-

so das tarefas do educador reside, em primeira instância, no conhecimento

real que tenha dos problemas que afetam os seus alunos, os quais nem sem-

pre têm sua origem no processo do ensino, nem se circunscrevem estrita-

mente ao meio escolar. Assim, a pesquisa é uma tarefa imprescindível para a

projeção do trabalho educativo, tanto em grupos como individual.

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Profissionais da Educação

De outra parte, ninguém fica melhor preparado para realizar esta

pesquisa que o próprio professor que fica pessoalmente comprometido com

os problemas pedagógicos e educativos de seus alunos, de sua escola e da

comunidade. Qualquer intento de introduzir-se nessas realidades “de fora”

corre o risco de elaborar apreciações válidas no plano teórico porém de

escassa significação no aspecto prático. O professor pesquisador fica em

contato direto com o problema pelo que sofre e lhe afeta diretamente. A

motivação para encontrar soluções e alternativas surge de sua prática coti-

diana e lhe permite colocá-las em prática imediatamente.

Embora, delimitar estas tarefas básicas e contextos de atuação, seja

muito importante, o convencimento íntimo e a autopreparação para enfrentá-

las, deve iniciar-se a partir da formação do pessoal docente. Uma prática

viciada por enfoques burocráticos e esquemáticos, faz com que muitos pro-

fessores em exercício rechacem as novas concepções, justificando-se nas

deficiências de sua preparação profissional, o excesso de tarefas secundári-

as, a escassez de tempo, etc. É necessário colocar nos currículos de formação

e qualificação de professores, aqueles conteúdos que lhes permitam cum-

prir as tarefas de educador e de pesquisador com eficiência, ao mesmo tem-

po em que os centros formadores devem ser exemplos de articulação do

educativo e a pesquisa, convencendo aos professores acerca da necessidade

e possibilidade de cumprir com sucesso estas tarefas.

O papel e funções dos professores neste novo século.

Qual é o papel dos professores neste novo século, caracterizado pela

globalização e pelos vertiginosos processos de mudanças e transformações

a nível mundial? Será esta a pergunta certa que todos nos fazemos? Embora

o mais importante não é a pergunta em si mesma, senão achar a resposta

certa e agir conseqüentemente. Na realidade fica difícil abordar este assunto

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Profissionais da Educação

sem fazer uma análise breve da situação atual, herança dos tempos anterio-

res.

A situação econômica e social dos professores, na maioria dos países,

se deteriorou, o que trouxe efeitos negativos sobre a qualidade do ensino. A

profissão docente, que sempre se considerou como um modelo social de

alto prestigio, perdeu muitos atrativos. Os baixos salários, as compridas jor-

nadas de trabalho, os conf litos institucionais, as exigências da comunidade,

uma imagem deteriorada, tudo unido à crescente importância dos métodos

alternativos de ensino fora da sala de aulas, contribuiu para uma crise da

profissão docente e do papel do professor na sociedade.

Os professores reclamam melhores condições de emprego e conside-

rações sociais de reconhecimento de seus esforços. O mundialmente conhe-

cido como “Informe Delors”1 analisa estas questões e propõe facilitar aos

professores os instrumentos que necessitam para poder desempenhar me-

lhor suas diferentes funções. Como contrapartida, os alunos e a sociedade

em seu conjunto têm o direito de esperar deles que cumpram abnegadamen-

te sua missão e com um grande sentido de suas responsabilidades. A socieda-

de tem de reconhecer ao professor e outorga-lhe a autoridade necessária e

os mais adequados recursos de trabalho.

Um sentido de educação permanente, ao longo da vida, conduz direta-

mente ao conceito de sociedade educativa, ou seja, uma sociedade na qual se

oferecem múltiplas possibilidades de aprender tanto na escola como na vida

econômica, social e cultural, surgindo a necessidade de multiplicar as for-

mas de associação com o contexto social.

Em nível de América Latina e do Caribe, os Ministros de Educação 2

têm proclamado a necessidade da profissionalização dos educadores e de

1 Informe da Comissão Internacional da UNESCO sobre a Educação para o Século XXI: “A educaçãoencerra um tesouro” (Informe Delors)

2 Declaração final da Reunião de Ministros de Educação da América Latina e do Caribe. Kingston,Jamaica, maio de 1996

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ampliar sua visão, expressando que a profissionalização dos docentes impli-

ca a capacidade de atender ás necessidades de aprendizagem específica de

cada aluno e assumir a responsabilidade pelos resultados. Este é um desafio

que deve ser enfrentado nas difíceis condições em que vive e trabalha a

maior parte deles na região.

Também foi reconhecido na Reunião de Ministros de Educação da

América Latina e do Caribe, que a valorização dos docentes se alcançará

reforçando seu saber profissional específico para que sua autoridade fique

baseada em sua capacidade para resolver os problemas educativos da popu-

lação. Reforçando-se a necessidade de fomentar o desenvolvimento de uma

imagem positiva da carreira docente. Isto significa esforços de organização

e comunicação social que devem ficar respaldados por congruentes medi-

das de melhoramento de sua situação de trabalho.

A responsabilidade dos professores é, hoje, muito grande para assu-

mir seus novos e mais complexos papéis, será que ficamos preparados para

assumi-los? Considera-se assim como uma necessidade imperiosa a de me-

lhorar a qualidade e motivação dos professores, o qual nos remete a sua

formação inicial, qualificação e aperfeiçoamento permanente, além dos estí-

mulos mais adequados, tanto laborais como sociais. A tais efeitos resultam

também estratégicas as ações das organizações dos professores, chamadas

de grêmios ou sindicatos, com as quais é indispensável contar para um diálo-

go construtivo entre a escola e a sociedade, estas podem contribuir decisiva-

mente para instaurar um clima de confiança e uma atitude positiva ante as

inovações e mudanças educativas. Fica claro que melhorar a qualidade do

pessoal docente, do processo pedagógico e do conteúdo do ensino, não é

tarefa fácil, requer a cooperação de diversos fatores, incluídos os professo-

res, na solução de problemas também diversos e complexos.

Sem assumir um critério pessimista, compreendemos que o professo-

rado enfrenta hoje situações de crises de identidade, de falta de uma imagem

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coerente de si mesmos; muitas vezes a profissão docente, ainda reconhecida

como fundamental e imprescindível, fica mal remunerada e menos valoriza-

da, o que gera o abandono ou translado dos professores, não só do ensino

público para o privado, senão até para outros ramos.

Embora, fica claro que qualquer uma análise sobre o papel e responsa-

bilidade dos professores, deve confrontar-se com a realidade em que vive a

grande maioria dos poucos mais de 60 milhões de professores no mundo, os

quais vêm comprovando há muitos anos, como seu papel e sua situação se

deterioram devido aos reajustes estruturais e aos recortes de gastos, disfar-

çados de reformas educativas. Chegou o momento de muitos governos reco-

nhecerem que devem tomar-se decisões urgentes para fortalecer e melhorar

a situação dos professores, para que estes possam efetivamente cumprir as

funções que a sociedade exige e espera deles num mundo em constante e

vertiginosa transformação.

O papel dos professores deve ser repensado em função dos novos

desafios que enfrentam hoje. Os velhos métodos de ensino, a tradicional for-

mação e qualificação dos professores devem ser repensados, modificados e

atualizados. Em tais mudanças, também os mesmos professores têm de ocu-

par um papel principal.

A UNESCO chegou à conclusão de que é preciso fomentar e refazer

uma análise dos processos pedagógicos mediante os quais tem lugar o apren-

dizagem. Em muitos casos a renovação do ensino deve iniciar-se com pro-

gramas especiais destinados para formar, aperfeiçoar e motivar o pessoal

docente, assim como outros agentes educativos, mediante metodologias ino-

vadoras.

Nesta formação pedagógica se reforçarão os procedimentos didáti-

cos participativos, centrados no aluno e tomando em conta as capacidades e

características dos diversos grupos de alunos. As novas tecnologias da infor-

mação e a comunicação atiram pelo chão o monopólio do saber que, duran-

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Profissionais da Educação

te muito tempo tiveram os sistemas de ensino formal. É assim que a função

do professor deverá ser, cada vez mais, de um agente que facilite a auto-

aprendizagem e oriente a explosão da informação, e não mais aquela função

tradicional de fonte inquestionável ou única de informação.

Os professores são atores principais da transformação educativa, e a

aceleração das mudanças requer que os mesmos sejam capazes de ajudar e

orientar a seus alunos não só para adquirir conhecimentos, senão também

para que fiquem cientes de sua identidade e tolerantes, abertos aos outros e

as outras culturas, capazes de construir sua aprendizagem durante toda sua

vida, de modo que enfrentem o futuro com confiança. Para estes novos tem-

pos a UNESCO propõe o seguinte:

* Fomentar a participação ativa dos professores e do conjunto de

atores associados à educação e aos processos de mudança dos sistemas

educativos, segundo os diferentes contextos sócio-econômicos, políticos e

culturais de suas sociedades.

* Preparar e levar à prática políticas integradas que permitam

atrair e manter na profissão docente a homens e mulheres motivados e com-

petentes.

* Adotar medidas que favoreçam a inovação educativa.

* Reforçar a autonomia profissional e o sentido de responsabili-

dade dos professores e melhorar sua situação e suas condições de trabalho.

* Conceber estas políticas integradas no marco das estratégias

encaminhadas para garantir a pertinência e a equidade no aceso à educação

de qualidade.

* Promover a aprendizagem permanente e fazer da escola um dos

instrumentos fundamentais da integração social e a formação para os valo-

res democráticos e à cultura da paz.

O papel do professor não fica limitado a fazer adquirir conhecimen-

tos e desenvolver habilidades, senão que também inf lui no desenvolvimento

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Profissionais da Educação

dos valores. Na atual sociedade mundializada, os professores têm a respon-

sabilidade de promover princípios éticos universais: a justiça social, a tole-

rância e a paz, todos eles são importantes para o desenvolvimento econômi-

co, social e cultural de nossas sociedades.

Os processos de ensino-aprendizagem centrados no professor e na

transmissão esquemática de conhecimentos apreendidos nos livros, não são

de fato apropriados para as condições e exigências atuais, se impõe uma

nova relação professor-aluno. Estes processos além de não ser lineares, pre-

cisam de um acompanhamento mais que de uma atuação de monólogo dos

professores, os quais devem ajudar os alunos na construção dos conheci-

mentos, guiando suas ações de aprendizagem, porém motivando e contribu-

indo para uma aprendizagem significativa, criativa e independente, sem des-

cuidar a formação dos valores fundamentais que devem caraterizar sua atu-

ação na vida. Esta é a essência do processo pedagógico atual.

O papel dos professores como agentes de mudança, constitui uma

condição fundamental que reafirma-se neste século, onde o entendimento

mútuo e a tolerância são mais necessários e essenciais para construir nossas

sociedades sob conceitos de universalidade, pluralismo e democracia em

suas diversas manifestações. Contribuir, mudando conceitos, para um mun-

do onde, entre outros aspectos também muito importantes, a alta tecnologia

não seja um privilégio de poucos, mudar para um mundo que seja

tecnologicamente universal, estas são responsabilidades e desafios transcen-

dentes dos professores, que influem e formam o pensamento e os sentimen-

tos das novas gerações.

Os professores de hoje, mais que conhecimentos específicos e habili-

dades concretas, deverão dominar os métodos, as linguagens e desenvolver

competências que lhes permitam adaptar-se com facilidade e rapidez às atu-

ais mudanças das condições sociais. Terão de habituar-se aos avanços

tecnológicos e ao trabalho em condiciones de zonas rurais e remotas, com

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crianças que demandam recursos especiais, às negociações com pais e mães

que provavelmente resistirão às mudanças.

Os métodos deverão ser essencialmente ativos e produtivos, aplican-

do a solução de problemas, deverão superar os baseados estritamente na

memorização, porém estes métodos são complexos e demandam dos pro-

fessores estudo, elaboração de projetos, domínio de técnicas de motivação

dos alunos, experimentação e muita paciência, sobretudo para aprender dos

fracassos e dos problemas não resolvidos. Tais métodos possibilitarão alcan-

çar que os alunos aprendam a aprender.

Nas séries iniciais, uma vez que os alunos fiquem alfabetizados, pode-

se pensar na primeira etapa de problemas práticos e simples, vinculados à

vida cotidiana deles, de suas famílias e de suas comunidades, passando mais

tarde para problemas mais formais e de raciocínio em Matemática e Língua

Materna, neste caso o português, estas disciplinas constituem os núcleos

principais de comunicação e instrumentos indispensáveis para avançar no

conhecimento de outras áreas e disciplinas. A partir dos problemas mais

simples poderão solicitar-se aos alunos, sob a guia dos professores, fazer

abstração dos elementos que utilizaram para resolver os aspectos coloca-

dos, entrando na mecânica operatória e explicando como e por quê os utili-

zaram, e as formas como os combinaram para resolver ou ao menos tentar

resolver o problema.

É assim que os professores ajudam os alunos na sistematização de

suas descobertas, para entender a essência dos problemas e determinar quais

são as novas questões que devem ficar resolvidas. Os estudantes, e também

os professores, construirão novos conhecimentos e desenvolverão seus mé-

todos próprios para aprender, sem necessariamente memorizar, determinando

aquilo que é realmente importante e o que não é tão importante ou superfi-

cial.

Em conseqüência, será necessário alcançar um maior nível de aceita-

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Profissionais da Educação

ção dos instrumentos tecnológicos utilizando-os como recursos didáticos.

Os professores deverão conhecer e manejar o básico da computação: um

ambiente ou sistema operativo, um processador de textos, uma base de da-

dos e uma folha de cálculo. Em pouco tempo muitos alunos do ensino funda-

mental e básico, serão capazes de trabalhar com os computadores, colocan-

do assim os professores que não dominem esta tecnologia, numa situação

comprometedora.

Hoje se diz que os profissionais que não dominam a computação nem

falam um idioma estrangeiro são analfabetos. Saber usar o computador é

uma via que abre caminhos para o uso de outros recursos tecnológicos mais

avançados. De outra parte, falar uma língua estrangeira, especialmente o

inglês, além de outras vantagens, é um instrumento imprescindível para a

comunicação internacional; o inglês é a linguagem atual da ciência e da

tecnologia avançada.

A aprendizagem coletiva e outro aspecto relevante de hoje, que sem

muito rigor poderíamos dizer que acontece em atividades nas quais duas ou

mais pessoas trabalham juntas com o fim de criar significados, estudar um

assunto, ou melhorar habilidades de qualquer tipo.

Os professores têm de prepararem-se para um processo de ensino-

aprendizagem coletivo ou cooperativo, que promova as qualidades de soli-

dariedade e ajuda a formar hábitos de tolerância e de diálogo, onde se apren-

de a fazer juízos baseados em argumentos coletivos razoáveis, escutando e

tomando em conta as críticas e opiniões dos demais. Aliás, também é uma

característica das relações democráticas que reforça valores espirituais e

contribui a elevar a qualidade da educação.

O processo de ensino-aprendizagem já é de fato uma atividade coleti-

va, mas a aprendizagem em si mesma, acontecerá cada vez mais em equipes,

em redes de colaboração. Tal característica implica mudar a estrutura das

aulas e até mesmo a disposição das salas de aula, o planejamento, a acomo-

dação das cadeiras, a forma de preparar textos, a avaliação de tarefas indivi-

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duais e de grupo, os métodos de ensino e avaliação, criando ambientes favo-

ráveis de colaboração nas atividades. É mudar a natureza do processo e as

relações com os alunos e entre os alunos, o professor será menos uma figu-

ra de autoridade e mais uma pessoa que facilita as atividades de aprendiza-

gem do grupo de estudantes.

Os avanços tecnológicos facilitam que todos os membros de uma equi-

pe colaborem e participem da aprendizagem, as tecnologias de telecomuni-

cações resultam ótimas vantagens para que tais equipes sejam verdadeiras

redes de aprendizagem, onde seus integrantes poderiam morar em cidades

diferentes, pertencer a turmas distintas e até ter um caráter de

interdisciplinaridade nas abordagens dos trabalhos.

Tais práticas se apoiam mais na colaboração que em exercícios indivi-

duais, o que é mais democrático e participativo. Os professores e alunos se

acostumarão ao uso de tecnologias como auxiliares de seu trabalho, geran-

do mais e melhores habilidades e conhecimentos que os converterão em

pessoas socialmente mais úteis e individualmente mais competentes.

Os professores precisam ser pesquisadores, possuir ferramentas teó-

ricas, conceptuais e metodológicas para conhecer a fundo o contexto onde

desenvolvem sua atividade e também conhecer seus educandos. Devem do-

minar os campos dos conhecimentos específicos de sua disciplina e a didáti-

ca específica de seu processo de ensino-aprendizagem. Ser, principalmente,

desenhadores de métodos e ambientes de aprendizagem e trabalhar em equi-

pes junto com os estudantes.

Na era pós-industrial se necessitam novas habilidades para trabalhar e

aprender, relacionadas com a análise simbólica que incluem a abstração, o

pensamento sistêmico, a investigação experimental e a colaboração.

O Ministro de Educação de Costa Rica, Dr. Eduardo Doryan 3 , depois

de examinar os requerimentos da sociedade da informação, enumeram como

3 Ver: TÜNNERMANN, C. O educador ante o novo século. Palestra Congresso Internacional de Educação:“Patrimônio e Desafio do Terceiro Milênio” 1999

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características que precisa o educador do Século XXI, as seguintes:

* Capacidade para aprender continuamente;

* Pensamento abstrato e sistemático;

* Visão integral da sociedade e do mundo;

* Uma profunda formação humanista e ética do desenvolvimen-

to;

* Compromisso no esforço contínuo de superação;

* Capacidade de atuar na sociedade de que fazem parte;

* Capacidade para melhorar e inovar as condições de vida e de

trabalho;

* Iniciativa para a experimentação e a auto e mútua ref lexão;

* Valores de colaboração e responsabilidade cívica, produtivida-

de e qualidade;

* Capacidade de entender as transcendentais conseqüências dos

próprios atos;

* Competente para atuar como profissional, como cidadão e como

pessoa;

* Capacidade para converter-se em autêntico agente de mudan-

ça;

* Consciência do papel que desenvolve como parte de uma estru-

tura produtiva, de uma família e de uma comunidade.

A modo de conclusões:

Na atualidade, é muito importante para o professor sua disposição

para a mudança, desde uma perspectiva do desenvolvimento educacional,

porque seu trabalho, segundo as tendências pedagógicas mais avançadas,

deve realizar-se, para ser mais eficiente e eficaz, a partir de uma posição de

agente e mudança e de liderança frente a seus alunos.

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Existem muitas problemáticas que são hoje temas de debate mundial

sobre o pedagógico, além disso, o papel do professor, continua aprofundando-

se, ainda que existam sistemas educativos que se desenvolvem quase sem a

presença dos professores, tais como aqueles baseados no uso das novas

tecnologias da informação e as comunicações aplicadas à docência. No meio

de um processo em que o ensino e aprendizagem adquiram uma conotação

diferente ante o desenvolvimento científico e tecnológico, o papel do pro-

fessor segue reafirmando-se como condutor ou guia principal deste proces-

so.

É possível que ao final destas análises sobre o papel dos professores

em função dos novos desafios, como acostuma ser, fiquem mais incertezas

que certezas. As mudanças serão lentas e tortuosas, tomarão tempo e até

poderão encontrar resistências nos próprios professores. Embora, o fato de

que dedicássemos parte de nosso tempo a refletir e discutir tais aspectos, a

socializar nossos critérios, é com certeza uma referência de avanço impor-

tante, que ref lete a preocupação e intenções de mudança, as vias poderão

ser as mesmas analisadas ou outras diferentes, com certeza as melhores em

cada caso particular, aparecerão em qualquer momento oportuno, o impor-

tante é que estamos buscando-as.

Recebido: 02/02/2003

Aceite para publicação: 16/04/2004

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O PROCESSO EDUCACIONAL FORMAL E A CONSTRUÇÃO DO

SOCIAL DETERMINANDO A CONSTRUÇÃO DA CONSCIÊNCIA

Josiane Magalhães

RESUMO: Este artigo pretende apresentar uma breve análise sobre a ritualização cotidianaque permeia os ambientes educacionais e demonstrar a intencionalidade advinda dascorrelações históricas e políticas presentes nos ambientes criados pela Educação Formal.

PALAVRAS CHAVE: consciência; processo educacional forma;, construção social.

ABSTRACT: This article presents a short analysis about the daily ritual that interposeseducational environments and demonstrates the purpose coming from the historical andpolitical correlation being in the environments created by formal education.

KEY WORDS: consciousness; formal educational process; social construction;

Para podermos discutir a relação que se estabelece entre a construção

da consciência 1 e o processo educacional formal, se faz necessário estabele-

cer alguns aspectos daquilo que chamamos de processo educacional formal.

Em primeiro lugar, compreender que as implicações do processo educacio-

nal formal dependem de sua condição e inserção em um processo mais am-

plo de construção social. Em segundo lugar, considerar que o processo de

educação formal constitui-se em uma das ferramentas principais que cons-

trói e condiciona as bases de quaisquer relações que se estabeleçam entre

indivíduos e consolidam um certo modo de fazer as coisas.

O que chamamos de processo educacional deve ser compreendido de

uma maneira bastante ampla. Este processo vai desde o nascimento de cada

um, compreendendo todos os processos de descoberta do mundo e constru-

ção de sua base cognitiva e afetiva dentro do primeiro núcleo formador: o

ambiente doméstico. Seguindo seu caminho, passa pelas instituições de ensi-1 Sobre as possibilidades de interpretação acerca da consciência vide Magalhães, J. O que é consciênciacrit ica.

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no e depois ao mercado de trabalho, tendo como aportes os ambientes reli-

giosos, sindicais, entre outros.

Apesar disso, o ambiente que se pretende formador de maneira inten-

cional é aquele constituído pelas instituições de educação formal daí a dis-

tinção entre processos educacionais e processos educacionais formais.Isto

posto, o que se pode perguntar é: este ambiente onde se desenvolvem os

processos educacionais formais, forma quem e para quê?

Um primeiro aspecto é o fato de que o ambiente educacional formal

permite cruzar informações e idéias oriundas de diferentes áreas. Hoje em,

dia é possível abrir um leque de temas e possibilidades ilimitados. Não raro,

temos psicólogos, pedagogos, sociólogos, matemáticos, físicos, biólogos, lin-

güistas, isto para citar alguns dos profissionais que discutem educação e,

que, vez por outra, propõem novas perspectivas de discussão deste tema.

Um segundo aspecto importante é que esse ambiente tem agregado

novos elementos às suas ferramentas de trabalho. O trabalho do educador

ganha dimensões inesperadas com a introdução do computador e da internet.

Fala-se em Educação a distância, cursos on-line, tem-se acesso a uma gama de

informação inimaginável há dez anos. Estas ferramentas estão modificando

a relação do educador com seus educandos e, por vezes, questiona-se inclusi-

ve a necessidade da existência de um educador. Na verdade, a Educação está

sendo transformada e redefinida na mesma medida em que a sociedade se

transforma e torna-se cada vez mais globalizada, principalmente no trato

dado à relação informação e formação dos indivíduos. Uma das possibilida-

des desta nova perspectiva é tratar a informação no nível de sua utilidade e

não aos problemas enfrentados cotidianamente. Essa postura acaba sendo o

mote de relacionamento do indivíduo com a informação, ficando em segun-

do plano uma ref lexão e análise acerca das informações, o que permitiria

uma formação com vistas à construção de conhecimento e de sua consciên-

cia.

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Profissionais da Educação

Além disso, pensar a Educação hoje propõe compreender um movi-

mento de entrelaçamento de pessoas e áreas de conhecimento. Para além da

discussão sobre interdisciplinaridade e da multidisciplinaridade, a Educação

se dá em ambientes específicos onde tramitam indivíduos, em qualquer área

que seja.

É essa a perspectiva que tentaremos mapear e buscar o entendimento

do processo de construção de indivíduos, partindo do pressuposto de que

para entender os processos que envolvem a construção da consciência se

faz necessário entender como estes indivíduos estão sendo formados seja

dentro da escola, seja fora dela.. Esta perspectiva propõe uma construção

social da realidade e uma formação de indivíduos inseridos nessa realidade

que constróem e em que são construídos.

O ambiente formador diz muito sobre os indivíduos que estão se cons-

truindo. Cada um relaciona-se com sua base material e com outros indivídu-

os e esta interação determinará não só a reprodução deste ambiente, mas

também a idéia de sociedade no indivíduo. Dito de outra forma, o indivíduo

constrói sua realidade dentro e fora de si.

Sendo assim, a sociedade está longe de ser uma somatória de indivídu-

os exatamente porque ela existe dentro de cada um desses indivíduos. Mes-

mo que se torne um náufrago em uma ilha deserta.

Dentre os diferentes ambientes formadores temos um especificamen-

te que tem como intencionalidade educar, formar tais indivíduos. Este ambi-

ente encontra-se nas instituições educacionais.

Tais ambientes, contudo, são construídos sob anos de reflexões teóri-

cas colocadas “cientificamente” pela Pedagogia para a Educação. Deixando

suas marcas em uma certa maneira de organizar ambientes e relações medi-

ados por uma teoria pedagógica que deveria direcionar suas práticas. Den-

tre essas teorias temos uma vertente que se pretende emancipadora. A per-

gunta que se coloca é, será mesmo emancipadora?

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Recuperando alguns ícones da discussão pedagógica

Em primeiro lugar, devemos ter em mente que existem várias possibi-

lidades de interpretação do movimento histórico sobre a forma com que se

idealizou e concretizou aquilo que hoje chamamos Pedagogia. Em segundo

lugar, parte-se do pressuposto de que não se podem dissociar as idéias peda-

gógicas de seu contexto histórico nem tampouco desvincular o que somos

hoje dessa herança histórica.

Contudo, para a discussão da construção da consciência, nos detere-

mos mais em dois pontos: a formação para o mercado de trabalho e a forma-

ção para a cidadania.

Esses dois aspectos aparecem nos discursos pedagógicos brasileiros

com bastante força a partir do processo de redemocratização brasileira.

Principalmente nos textos dos Planos Nacionais de Educação (PNE s) para

as várias disciplinas do ensino público, em alguns momentos com maior

ênfase, em outros mais timidamente, mas permeando a discussão sobre o

ensino fundamental.

Poder-se-ia perguntar: mas por que esses dois elementos? Simplesmen-

te, porque eles parecem voltar-se para perspectivas diferentes na formação

dos indivíduos, mas na verdade são faces de um mesmo processo.

A formação para o mercado de trabalho parece colocar ênfase no

ensino de técnicas e na absorção de informações em quantidades cada vez

maiores. Tais elementos são necessários a fim de que os indivíduos estejam

minimamente preparados para lidar com as crescentes inovações

tecnológicas com que irão se deparar no mercado de trabalho.

Por outro lado, existe todo um discurso sobre ensinar para a vida,

para a cidadania, para a autonomia. Mas o que é a cidadania, senão a adequa-

ção às regras, aos direitos e deveres que medeiam as relações na sociedade

civil? A cidadania tem seu par no Estado Moderno. Assim, a autonomia pro-

posta está pautada na idéia de uma participação cidadã, o que implica estar

em conformidade com as regras do Estado. Ora, sabemos que o Estado cons-

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tituído tem, em perspectiva, as regras do Capital e os interesses da classe

capitalista. Então, tal educação para a vida tem, como perspectiva, a confor-

midade às regras da sociedade capitalista. Os seres humanos não são livres

no mundo determinado pelo Capital: a liberdade existente nessa forma

societária é a de comprar e vender no mercado.

Mesmo aqueles que se pensam inovadores não podem abrir mão des-

sa constatação. Sob o ponto de vista aqui defendido, o principal problema é

não se reconhecer dentro desse paradigma. Uma coisa é fazer sabendo as

implicações daquilo que se faz. Outra é fazer sem a efetiva consciência des-

sas implicações e ainda acreditar que essa Educação intencional poderá mudar

a sociedade capitalista!

Dessa forma, as discussões teóricas propostas nos âmbitos da Sociolo-

gia, Psicologia, Pedagogia, dentre outros, são úteis na medida em que contri-

buem para esclarecer aspectos dos processos de formação de indivíduos

inseridos na lógica de produção capitalista. Produção esta, não só de merca-

dorias, mas também de seres humanos.

Analisando os ambientes educacionais brasileiros segundo alguns de

seus elementos

Os ambientes escolares de uma maneira geral são construídos com a

perspectiva de reproduzir os padrões que são hegemônicos na sociedade

onde a escola está inserida. O caso brasileiro não é exceção. A sociedade

brasileira tem demonstrado, ao longo de sua história, que ainda está

engatinhando quando o assunto é formar indivíduos cujas rédeas de pensa-

mento são conduzidas por si mesmos.

O Brasil é um país crédulo2 , fato este que pode comprovar-se por uma

2 Sobre este ponto vale salientar que o crescimento de seitas religiosas nos últimos tempos assinalaclaramente a desesperança de mudanças na vida real, sendo o aspecto religioso aquele que coloca aalma dos seres humanos como valor essencial da vida humana e, por isso mesmo, consagrado a umoutro plano existencial.

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simples observação da multiplicidade de religiões e igrejas espalhadas pelo

seu território. Isto pode demonstrar uma certa ingenuidade da população

na análise de sua realidade, haja vista esperarem de Deus uma solução para

suas misérias e infortúnios. Sem ter esperanças no concreto, buscam no in-

tangível suas esperanças. Este aspecto pode ajudar a entender porque a es-

colaridade não é uma meta indiscutível dos cidadãos brasileiros. Torna-se

muito mais um dever do que um direito a ser conquistado. Quanto mais

miserável a população, menor é a importância da escolaridade para essas

populações, que preferem seus filhos trabalhando por salários irrisórios a

estarem na escola. 3

Este fato demonstra o descrédito, por parte dessa população, de que a

escolaridade possa melhorar suas condições de vida. Além disso, quanto mais

miseráveis, mais crédulos na salvação tornam-se os indivíduos, seja na pers-

pectiva religiosa, seja na personificação de um dirigente político que se tor-

nará o pai protetor.4

A história política brasileira está marcada pela condução política vin-

culada ao fortalecimento dos atores políticos em detrimento de partidos.5

Foi assim com Getúlio Vargas, com os generais militares, com Fernando Collor

de Mello, na eleição e reeleição do presidente Fernando Henrique Cardoso e

recentemente com a eleição de Luis Inácio Lula da Silva.

Finalmente, o Brasil é refém dos meios de comunicação. A televisão

3 Tal fato é observável tanto pelas pesquisas sobre trabalho infantil, quanto pelos projetos como o BolsaEscola, onde o governo paga para a criança estudar. Quando ocorre um atraso, essas crianças voltamquase que imediatamente aos trabalhos exercidos anteriormente. Isto se deve a uma questão emergencial:a sobrevivência, a opção de não passar fome!

4 É interessante notar que, quanto mais miserável e ignorante uma população, mais fácil a crença em umsalvador da pátria, ora personificado por um político, ora na idealização de um estado paternalista queseria o responsável pelas reformas que melhorariam as condições em que vive a maior parte dapopulação. Ignora a análise marxista que explicita o caráter do Estado burguês que defende os interes-ses do Capital.

5 A esse respeito, vide Sergio Misceli (org) Estado e Cultura no Brasil SP: Difel, 1984; Koutzii, Flavio (org)Nova República: um balanço, SP: L&PM, 1986; Jovchelovitch, Sandra. Representações sociais e esferapública. Petrópolis: Vozes, 2000.

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Profissionais da Educação

brasileira dita moda, regras de comportamento, noções de certo e errado

para a população. Elege candidatos e pode destruí-los. A população brasilei-

ra tem por hábito creditar um poder de veracidade aos meios de comunica-

ção sem maiores questionamentos.

Se isso ocorre em relação a notícias de fatos cotidianos, que dizer

então da construção de suas idéias? De seus valores? Da análise de sua reali-

dade? Da dúvida metódica em relação à explicação apresentada? Tal ambien-

te não parece propício à formação de consciências críticas! Mas será que a

consciência crítica é mais um elemento utópico? Em que ambiente podería-

mos ter indivíduos construindo suas consciências?

A escola poderia ser um espaço onde os indivíduos elaborassem suas

idéias de maneira autônoma ou relacionar os fatos cotidianos a fim de des-

cobrir novas perspectivas. Mas, tal qual a conhecemos, a escola nos propicia

um ambiente que reproduz situações que garantem a manutenção do status

quo.

Os ambientes educacionais são, em sua maioria, portadores da mensa-

gem implícita “ordem e progresso”. Tal concepção de Educação permeia as

instituições brasileiras de educação desde a sua origem. Se nos voltarmos

para a história da educação brasileira, ver-se-á que o lema “ordem e progres-

so” era apregoado como uma bandeira a ser erguida em todos os estabeleci-

mentos educacionais brasileiros, principalmente no período da Ditadura

Militar ainda que nesse período essas idéias fossem travestidas sob os desíg-

nios Segurança e Desenvolvimento.

Espaços delimitados previamente, imutáveis, concebidos através de uma

lógica de segregação de ambientes: o espaço dos alunos, o espaço dos pro-

fessores, a sala da direção, a secretaria da escola. Todos pensados arquiteto-

nicamente para serem isolados uns dos outros, com os acessos restringidos

e controlados. Não raro as entradas oficiais são separadas. Alunos de um

lado, professores, funcionários e diretores de outro. Em escolas mais antigas

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Profissionais da Educação

existem pequenas janelas de vidro, ou pequenas aberturas nas portas das

salas de aula que sugerem a vigilância, o controle do que está acontecendo

dentro da sala por alguém que está de fora sem ser notado. As carteiras

enfileiradas para frente sugerem que a atenção do aluno deverá estar volta-

da para o quadro negro, para a professora (ou professor) e para as situa-

ções que deverão ocorrer na frente do quadro negro.

O universo de contato com o outro aluno deverá ser mínimo, visto que

o colega à sua frente está de costas para ele, e ele próprio está de costas

para o seu colega atrás. As distâncias entre as filas são definidas de maneira

tal que o aluno precisará mover-se para o lado, saindo de sua postura corre-

ta na carteira, caso queira falar com o colega. Esta organização prévia do

espaço define relações muito claras entre professores, alunos, funcionários

e direção.6

O que esse ambiente escolar nos mostra? Essa rápida descrição de-

monstra que a escola, como nenhuma outra instituição, está calcada na

ritualização das atividades, que acaba por gerar as rotinas das ações dos

indivíduos no espaço escolar. Como salientam Berger e Luckman (1985), a

ritualização é um dos processos em que se fundamenta a construção da

realidade a fim de que se possa reafirmar o processo de socialização dos

indivíduos.

Fica claro que, na medida em que os indivíduos passam a maior parte

de seu tempo dentro da escola, maior será a influência que a rotina escolar

exercerá sobre a formação de sua identidade, bem como a incorporação das

fragmentações implícitas da organização da sociedade capitalista. 7

A probabilidade de ser desenvolvida uma consciência crítica entre os

indivíduos, neste ambiente, é irrisória. Isto porque os indivíduos cotidiana-

6 As relações de poder na escola estão desenvolvidas por Mauricio TRAGTENBERG. Administração, podere ideologia. S.P.: Cortez, 1989.

7 Sobre o papel da escola como agente de formação dentro do processo capitalista, vide ALTHUSSER, L.Aparelhos ideológicos de estado. RJ: Graal, 1985.

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mente são isolados, forçados a desenvolverem suas consciências dentro do

processo ritualizado. Como já vimos, os indivíduos precisam dialogar a fim

de que possam objetivar suas subjetividades tanto para si quanto para os

outros. Estes indivíduos, ao ficarem isolados, poderão diminuir as possibili-

dades de perceberem novas maneiras de compreensão dos fatos.Além disso,

a troca de posições e pontos de vista dentro da instituição é anulada pela

ritualização cristalizada nas rotinas.

Tanto para os indivíduos em formação quanto para aqueles que foram

excluídos dos processos sociais o isolamento é prejudicial8 . A possibilidade

de reunirem-se em grupos compostos por indivíduos nas mesmas condições

existenciais ou de crise, nesse sentido, colocaria uma possibilidade de rom-

per com a ritualização e com o isolamento, o que propiciaria um ambiente

estimulador de construção de consciências críticas, desde que dialogassem

entre si sobre suas existências.

Recebido: 02/04/2004

Aceite para publicação: 16/04/2004

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8 Prejudicial não somente do ponto de vista da const rução de sua consciência, mas tambémpedagogicamente. Isto porque os indivíduos diminuem as possibilidades de um desenvolvimentocognitivo através das zonas de desenvolvimento proximal vigotskiano cujo pressuposto é a troca entreos indivíduos.

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OS PROFESSORES E A ATRIBUIÇÃO DE CAUSALIDADEAO SUCESSO E AO FRACASSO ESCOLAR

Marcelo Luís Grassi Beck

José Augusto da Silva Pontes Neto

Josiane Magalhães

Renata Lourenço

RESUMO: A teoria da atribuição representa um interessante corpo teórico para analisar-seas explicações causais que as pessoas elaboram a respeito dos eventos, e de como essasatribuições causais influenciam as expectativas futuras, o autoconceito e a auto – estima.Aplicada à esfera da educação e à atividade profissional docente, apresenta-se como umaimportante ferramenta para o estudo e inferências na motivação escolar.

PALAVRAS-CHAVE: Profissão docente; teoria da atribuição; sucesso e fracasso escolar;motivação escolar.

ABSTRACT: The Theory of Attribution represents a theoretical corpus to analyze causalexplanations that people work out about events, and of how these causal attributionsinfluence future expectations: auto-concept and self esteem. Applied in the educationsphere and professional teacher activity, it is presented as an important tool for the studyand inferences in school motivation.

KEY WORDS: Teaching profession; theory of attribution; school success and failure; schoolmotivation;

A literatura em psicologia e educação atribui enorme importância ao

entendimento do fracasso escolar e suas causas. Isto porque a compreensão

dos fatores que envolvem o mesmo pode subsidiar ações educativas que

visem promover ou implementar o bom desempenho ou sucesso. Este pare-

ce obter consenso como desejável e necessário à adaptação do homem a

uma sociedade cada vez mais complexa e com sistemas de produção de

bens, serviços e conhecimento que exigem progressivamente um aparelha-

mento intelectual sofisticado.

Se mal sucedido educacionalmente, o indivíduo fica mais vulnerável

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Profissionais da Educação

ao processo competitivo típico da sociedade de economia capitalista (em

suas várias formas) e tem reduzidas suas chances de sobrevivência, ou de

uma subsistência mais digna, confortável e realizadora.

Neste contexto, parece tácito o papel do professor como agente dire-

to e fundamental no processo que resultará no adequado ou insuficiente

desempenho do aluno. Complexo como é, esse processo envolve inúmeros

atores e fenômenos. Contudo, neste artigo enfocaremos especificamente o

professor e uma faceta selecionada de sua ampla dinâmica profissional, suas

representações sobre sucesso e fracasso escolar e como essas representa-

ções afetam seu fazer pedagógico e a própria conduta de seus alunos.

Para esta análise nos utilizaremos da Teoria da Atribuição, uma teoria

que subsidia estudos que estabelecem a importância das atribuições causais

elaboradas pelos próprios alunos para seu desempenho, auto-estima,

autoconceito e expectativas futuras. Da mesma, forma analisa como as atri-

buições dos professores interferem nessa dinâmica que se retro-alimenta.

Os teóricos da Teoria da Atribuição como Heider (1958) pressupõem

que o homem é motivado para descobrir as causas dos eventos e entender

seu ambiente, presumem que as relações que estabelecemos (acreditamos),

existentes entre o indivíduo e o meio ambiente influem em nossa forma de

nos comportarmos.

Segundo essa teoria, os alunos têm suas ações influenciadas por suas

explicações causais e expectativas, gerando em muitos casos sucesso ou

fracasso. Se, por exemplo, diante de uma disciplina, o aluno considerar que

sua aprovação dependerá apenas do que fizer, sua forma de agir será consi-

deravelmente diferente do que se considerar que o professor o persegue e

tudo fará para reprová-lo.

Sob determinadas circunstâncias, o aluno (e qualquer pessoa) pode

adquirir a chamada impotência ou desamparo aprendido, que é a sensação

de que “(...) nada de lo que hago importa” (MAIER, SELIGMAN & SOLOMON,

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Profissionais da Educação

in: Enciclopédia de la Psicopedagogia, 1998, p. 399). Neste caso, o indivíduo

não visualiza uma relação controlável por ele, determinando fortemente

suas ações futuras.

Weiner (WEINER & KUKLA, 1970), é o principal teórico da vertente

educacional da Teoria da Atribuição. Ele acredita que falsas expectativas do

professor o levam a ter comportamentos que inf luem no desempenho futu-

ro do aluno.

Weiner (1984) nos coloca que, quando avaliamos os comportamentos

dos outros, damos mais importância ao esforço do que à habilidade, no caso

de determinar punição ou recompensa. Se , em caso de sucesso, atribui-se

sua causa esforço, recompensa-se mais o indivíduo do que se o sucesso for

atribuído à habilidade. Já, no fracasso, pune-se mais se for atribuído à falta de

esforço do que à falta de habilidade.

Parece, haver duas razões para a discrepância entre habilida-de e esforço como determinantes de recompensa e punição.Primeiramente, atribuições de esforço eliciam fortes sentimen-tos morais – tentar atingir um objetivo valorizado socialmen-te é algo que se “deve” fazer. Em segundo lugar, recompensare punir esforço é instrumental para mudar comportamento,visto que acredita-se que esforço é sujeito a controle volitivo.Por outro lado, habilidade é percebida como não volitiva erelativamente estável e consequentemente não deveria sersuscetível a tentativas de controle externo. (WEINER, 1984, p.13).

Afirma, também, que determinadas atribuições (de estabilidade ou ins-

tabilidade) afetam as expectativas que inf luem no desempenho. Mas, as ex-

pectativas também inf luenciam na hora de atribuirmos causas ao fracasso e

sucesso, constituindo-se um processo dinâmico.

Para Weiner (1984) as expectativas dependem da percepção de habili-

dade versus a dificuldade percebida da tarefa, mais a estimativa do esforço

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

pretendido e da sorte antecipada. Elas são fortemente determinadas pelas

experiências anteriores.

Tendenciosidade em atribuição de causalidade

Existem inúmeros fatores que parecem determinar algumas tendênci-

as no ato de atribuir causas aos fenômenos. Tendências estas também deno-

minadas erros de atribuição ou distorção de atribuição. Veremos algumas

possibilidades:

Um exemplo de tendência em atribuição, consiste na tendenciosidade

ator/observador (JONES & NISBETT, 1972 ). Eles enfocam a tendenciosidade

ao fazermos atribuições internas em relação ao comportamento de outras

pessoas, e externas ao nosso, principalmente quando visto como negativo.

Assim, ao vermos alguém tropeçar numa caixa na calçada podemos

responsabilizá-lo por ser desastrado. Se, no mesmo caso, nós tropeçássemos,

responsabilizaríamos outros por colocarem a caixa em local inadequado.

Segundo os autores, isto se daria pelo acesso diferenciado a informações.

A tendenciosidade auto - servidora ou egotismo (RODRIGUES et al.,

2000 ) seria outro exemplo. Ela representa a tendência em atribuir nossos

fracassos a causas externas ( neste aspecto coincide com a teoria ator/ ob-

servador) e nossos sucessos a internas. Ex: fui mal no exame porque não tive

tempo para estudar em função do trabalho; fui bem no exame porque sou

inteligente. Greenwald (1980) a denomina beneficiação (beneffectance),

padrão pelo qual a pessoa atribuiria um controle e responsabilidade interna

em caso de sucesso, e externa em caso de fracasso. Ela se fundamenta na

preservação da auto-estima e autoconceito, e numa certa sensação de con-

trole.

Outra posição, que sob certo aspecto, poderia reforçar essa tese é a de

Weiner (1984), que em situações de realização verificou que sujeitos que

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

obtiveram sucesso experimentaram sensações de orgulho ao fazer atribui-

ções internas. Porém, atribuições internas os fizeram relatar sensações de

vergonha quando fracassaram. Se este fracasso visto como interno, também

fosse visto como controlável, experimentavam ainda a sensação de culpa.

Apesar dessas constatações de Weiner serem apreciadas num outro enfoque,

elas reforçam a idéia de ameaça à auto-estima em auto-atribuições internas

de fracasso, e melhora da mesma em auto-atribuições de sucesso. Essa rela-

ção clara com a auto-estima poderia estar por trás das atribuições com

tendenciosidade auto-servidoras.

Outra tendenciosidade semelhante, porém não idêntica a esta, é a de

Snyder & Higgins (1988). Eles postulam que, em avaliação de responsabili-

dade por erros, para manter bom autoconceito e uma certa sensação de

controle usaríamos desculpas. Estas não chegam a mudar a atribuição de

interna para externa (como na teoria anterior ), mas diminuem a ameaça à

auto-estima.

Snyder & Higgins ( 1988 ) apresentam um interessante traba-lho vinculado não apenas às formas e os momentos em queas desculpas aparecem, mas também às funções que cum-prem para a pessoa que as dá. Definem a desculpa como umprocesso motivacional que consiste em deslocar a atribuiçãode resultados negativos de fontes consideradas pela pessoacomo mais centrais a si mesma para outras consideradasmenos centrais, mantendo assim uma boa imagem de si euma sensação de controle. A mudança na localização não pre-cisa convertê-la em totalmente externa. Alterar, por exemplo,“fracassei no exame porque sou incapaz“ por “fracassei noexame porque tive alguns inconvenientes e não pude estudaro suficiente“, implica uma localização ainda interna da atribui-ção, porém menos ameaçadora para o sentido nuclear do self.( FERREIRA & ABREU, 1998, p. 233 ).

Outro fator desencadeador de tendência atribucional seria o contexto

cultural, pois, em culturas diferentes, haveria tendência a se criar determina-

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

das categorias causais específicas para explicar sucessos e fracassos na rea-

lização. Assim, nos Estados Unidos, habilidade e esforço são percebidos como

as maiores causas para sucesso ou fracasso; paciência na Grécia e Japão; o

jeito da pessoa, seu estado de ânimo, tato e a unidade na Índia (Dela Coleta,

1986 ). Lembremos que a noção de karma na Índia atribuía causas espiritu-

ais para a existência do sistema de castas.

Diferente fonte de tendência atribucional poderia advir dos esteriótipos,

rotulações e preconceitos, conceitos amplamente estudados pela Psicologia

Social. Os esteriótipos são crenças sobre características pessoais que formu-

lamos em relação a indivíduos e grupos, e estão na base do preconceito (

atitude positiva ou negativa, e altamente afetiva, em relação a uma pessoa

ou grupo ) e da discriminação ( ação específica direcionada a eles ). Um

exemplo claro sobre a inf luência do esteriótipo nas atribuições nos é dado

por Rodrigues et al., (2000), em situação de gênero.

No caso da questão de gênero que vínhamos abordando, oprocesso de esteriotipar fica bem aparente quando o pensa-mos em termos de atribuição de causalidade...., outros psicó-logos sociais ( Deaux & Emsweiller, 1974; Eagly & Steffen,1984; Feldman-Summers & Kiesler, 1974 ) vêm demonstran-do que diante de uma situação em que, por exemplo, somosapresentados a um bem sucedido médico ou à suacontrapartida do sexo feminino, tendemos a atribuir o suces-so da mulher a uma maior motivação intrínseca, quando nãoà pura sorte..., ainda não se espera de uma mulher significati-vo sucesso profissional. E quando isto acontece, todos tendema atribuí-lo a uma capacidade fora do comum em termos demotivação ou a uma sorte, igualmente rara.( RODRIGUES etal., 2000, p. 161 ).

Os rótulos (um caso específico de esteriotipia) seriam atribuídos aos

outros para facilitar a previsão de seus comportamentos e nossa forma de

agir com eles. “Rótulos são como sirenes tronitoantes que nos tornam sur-

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

dos diante de quaisquer distinções mais finas, que de outra maneira poderí-

amos vir a perceber.”( ALLPORT In: RODRIGUES et al., 2000, p. 156 ).

A atribuição de um rótulo a uma pessoa nos predispõe apressupor comportamentos compatíveis com o rótulo im-putado; nossas percepções são distorcidas e isto pode acarre-tar uma ou duas consequências importantes: a) por um lado,em virtude de nossas tendências à consistência cognitiva (vejacapíulo 3), faz com que comportamentos que não se harmo-nizem com o rótulo imposto tendam a passar despercebidosou sejam deturpados para se adequarem ao rótulo;”(RODRIGUES et al., 2000, p. 156 ).

Parece bastante fundamentada a participação dos esteriótipos, rótu-

los e preconceito na tendenciosidade atribucional.

O último fator que gostaríamos de citar nesta longa e, com cer-

teza, incompleta, lista de fatores geradores de tendenciosidade no ato de

atribuir causas nos é descrito por Weiner (1984). Como veremos em deta-

lhes posteriormente. Weiner associa atribuições internas de sucesso ou fra-

casso às emoções de orgulho e vergonha. Se o sucesso for visto como inter-

no e controlável haverá aumento na auto-aprovação. Se o fracasso for visto

como interno e controlável haverá aparecimento de culpa. Depreende-se

disto que a auto-estima é inf luenciada pelas atribuições que fazemos após o

evento, e para Weiner, se elas forem de estabilidade ou de instabilidade, afe-

tarão as expectativas de desempenho futuro (tanto de quem faz a ação, como

de quem observa. Assim, atribuições afetam a auto-estima, o autoconceito e

as expectativas. Porém, também ocorre o inverso, as expectativas e a auto-

estima prévios ao evento tendem a também direcionar as atribuições.

Além disso, Valle e Frieze (1976) também notam que as cau-sas percebidas de sucesso e fracasso estão relacionadas à ex-pectativa inicial de sucesso. Tem sido documentado claramen-te que resultados inesperados conduzem a atribuições instá-

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

veis, particularmente sorte ( FEATHER, 1969; FEATHER &SIMON, 1971; FRIEZE & WEINER, 1971) (WEINER, 1984, p.7).Essas idéias tem implicações importantes para a manutençãodo autoconceito da pessoa e para os programas de mudançaatribucional (ver Weiner, 1974, 1976 ). Por exemplo, suponhaque um indivíduo com um autoconceito elevado de habilida-de acredite que tem uma grande probabilidade de sucessonuma tarefa. É provável, então, que um fracasso seja atribuídoa causas instáveis como sorte ou humor, que não podem re-duzir a expectativa subseqüente de sucesso e mantém umautoconceito elevado de habilidade. Por outro lado, o sucessoseria atribuído à habilidade, que aumenta a expectativa subse-qüente (certeza) de sucesso e confirma a autoconsideraçãopositiva da pessoa. Uma análise inversa tem lugar , dados umbaixo autoconceito de habilidade e uma baixa expectativa desucesso: o sucesso seria atribuído a fatores instáveis, e o fracas-so à falta de habilidade. Essas atribuições resultam na preser-vação do autoconceito inicial (ver AMES, 1978; FITCH, 1970;GILMORE & MINTON, 1974; ICKES & LAYDEN,1978)”(WEINER, 1984; p. 7).

Ainda, uma pessoa cuja esperança de sucesso é maior que o medo do

fracasso tenderia a atribuir o sucesso à habilidade e ao esforço, e o fracasso

à falta de esforço (apud HECKHAUSEN, H. & WEINER, B., 1980, p. 159).

Percebe - se então uma relação dinâmica, na qual percepções prévias

(autoconceito, auto-estima e expectativas) inf luenciam as atribuições que

fazemos.

Com certeza, muito há que se pesquisar sobre tendenciosidades no

processo atribucional, sendo de extrema importância, dada a significativa

relação existente entre atribuição e comportamento.

Weiner

Os pressupostos elaborados por Weiner, Frieze, Kukla, Reed, Rest e

Rosenbaum (1971) concluem que o empenho das pessoas na realização de

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

uma tarefa depende, em parte, das suas expectativas de sucesso ou fracasso

nesta tarefa específica. E, essas expectativas são determinadas em grande

parte, pelas atribuições causais que estabelecem para os eventos que se se-

guiram ao seu comportamento ou de outros. Portanto, as atribuições causais

inf luem nas expectativas e, por conseguinte, na motivação.

Weiner concorda com a postura de que a procura por uma explicação

é mais provável ocorrendo fracasso do que sucesso ( FOLKES, 1978, apud

WEINER, 1984 ), e de que, também, é mais provável após um evento inespe-

rado que após um evento esperado ( LAU & RUSSEL, 1978, apud WEINER,

1984 ).Afirma, ainda, que a importância subjetiva associada ao evento tam-

bém inf luenciará na busca de conhecimento causal. Lembra que, durante

desempenho de tarefas, estudantes “orientados para o fracasso” ou “desam-

parados” são os que mais tendem a fazer atribuições (DIENER & DWECK,

1978, apud WEINER, 1984).

Weiner dedica grande parte de sua obra ao estudo das atribuições

causais para sucesso e fracasso. Ele também se ocupa longamente do estudo

das implicações das atribuições causais para o sucesso e fracasso no contex-

to escolar. E, este enfoque, o modelo cognitivo atribucional de Weiner em

contexto de realização escolar, é que fundamentará a pesquisa que desenvol-

veremos.

Para Weiner (1972, 1980), a percepção das causas do sucesso ou fra-

casso escolar pelo professor e pelo aluno é um fator determinante ou co -

determinante do comportamento futuro deles. A atribuição de causalidade

inf luencia as relações interpessoais, interferindo no desempenho de apren-

dizagem do aluno. Como vimos anteriormente, um professor que atribua o

fracasso do aluno à falta de esforço o punirá mais do que se atribuir o fra-

casso à falta de capacidade, bem como, valorizará mais seu sucesso se atri-

buí-lo a esforço do que à capacidade.

Para Weiner (1984), auto-estima, autoconceito e expectativas são gran-

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

des determinantes do desempenho, e são inf luenciados pelas atribuições

causais.

A descoberta de que motivação e comportamento estão rela-cionados com atribuição de causalidade tem importantes im-plicações para estratégias de intervenção, na medida em quealterando-se o tipo de atribuição se poderá influenciar direta-mente a motivação para realização e futuro desempenho(MEDWAY & VENINO, 1982,In: PICCININI, 1988, p.54).

Weiner (1985) acredita que a teoria da atribuição causal integra o

pensamento, o sentimento e a ação (apud BORUCHOVITCH, 1994). Toda vez

que um evento positivo ou negativo ocorre, certas emoções o acompanham

(WEINER, 1984, 1985). Se o resultado do evento é mais positivo, sentimos

prazer, felicidade, bem-estar, etc. Se é negativo, sentimos tristeza, insatisfa-

ção, etc. Estas emoções dependem das características do evento, do resulta-

do, e antecedem e independem das atribuições.

Rodrigues (1984b), em pesquisa com sujeitos brasileiros, para averi-

guar a capacidade das atribuições para sucesso e fracasso em situações de

realização em mediar emoções e criar expectativas de comportamento futu-

ro, detecta resultados semelhantes.

Contudo, as atribuições às causas de sucesso e fracasso suscitam uma

gama de emoções diretamente ligadas a elas.

Weiner nos relata estudo (WEINER et al., 1978) em que se detectou

que, dado sucesso e atribuído à habilidade (capacidade), os sujeitos

vivenciaram emoções como felicidade, competência, confiança e orgulho;

dado sucesso e atribuído a esforço, vivenciaram felicidade, orgulho, compe-

tência e satisfação; dado sucesso e atribuído à sorte, vivenciaram surpresa e

culpa; sucesso atribuído à ajuda de outros suscitava gratidão. Quando ocor-

ria fracasso, e este era atribuído à falta de habilidade, os indivíduos relata-

vam emoção de incompetência; se à falta de esforço, culpa e vergonha; se à

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

sorte, surpresa; se à interferência de outros, hostilidade. O estudo incluiu

ainda outras categorias causais e emoções vivenciadas.

O estudo de Rodrigues (1984b) confirmou algumas relações entre

emoções e categorias atribucionais, como competência, confiança e orgulho

perante a atribuição de sucesso à habilidade, e felicidade, orgulho, compe-

tência e satisfação quando sucesso atribuído a esforço, embora, nem sem-

pre na mesma porcentagem do estudo de Weiner. Porém, não reconheceu

algumas relações como: culpa perante atribuição de sucesso à sorte, e in-

competência na atribuição de fracasso à habilidade. Contudo, temos que

avaliar que seu estudo diferiu nas categorias causais averiguadas e nas emo-

ções passíveis de indicação pelos sujeitos.

Parece ficar claramente estabelecido o papel mediador das atribui-

ções causais na vivência de emoções em situações de realização. Para Weiner,

essas emoções inf luenciam fortemente a auto-estima e o autoconceito do

indivíduo.

Crenças causais

Weiner postula que, em contextos relacionados com realização, as

pessoas atribuem o resultado, sucesso ou fracasso, a determinadas crenças

causais. Inicialmente (WEINER et al., 1971) consideraram como principais

causas percebidas como responsáveis pelo desempenho a habilidade, o es-

forço, a dificuldade da tarefa e a sorte. As pessoas tenderiam a explicar seus

desempenhos atribuindo-os à falta ou presença de habilidade (ou capacida-

de), à falta de esforço ou a esforço adequado, ‘a dificuldade ou facilidade da

tarefa, e à má ou boa sorte (ou destino). Em trabalhos posteriores, Weiner,

1974; Weiner et al.(1978) indicaram que fatores como humor, fadiga, enfer-

midade e viés poderiam servir como causas necessárias e/ou suficientes para

o desempenho na realização. Recentemente (GRAHAM & WEINER, 1996), os

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

autores indicam, como causas mais relevantes no desempenho a capacidade,

o esforço, a facilidade ou dificuldade da tarefa, a sorte, o humor e o auxílio

ou estorvo de parte de outros.

Weiner não considera as causas que indicam como únicos

determinantes passíveis de serem percebidos para fracasso ou sucesso. Elas

podem ser inúmeras, sendo inexata a tentativa de limitá-las rigidamente.

Weiner (1984) nos fornece um quadro com a síntese dos resultados

obtidos em alguns estudos de identificação de categorias causais, atribuídas

a sucesso e fracasso em contexto de realização escolar. Deixaremos de re-

produzir o quadro diretamente do texto de Weiner para retratá-lo conforme

reproduzido por Malluf & Marques (1984), acrescido dos resultados obtidos

em seu estudo para identificar crenças causais de estudantes de Psicologia,

sobre experiências pessoais de desempenho escolar.

Quadro 1 - Síntese dos resultados obtidos em alguns estudos de iden-

tificação das causas de sucesso e fracasso em contexto de realização esco-

lar.

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

Os estudos de Frieze (1976), Bar-Tal & Darom (1977) e Cooper &

Burger (1978) confirmam o caráter dominante das atribuições à capacidade

e ao esforço (apud MALUF & MARQUES, 1984).

O estudo de Maluf e Marques (1984) apontou a categoria causal moti-

vação como a mais citada para sucesso e fracasso na escola. As categorias

capacidade, sorte e tarefa foram as menos citadas, sendo suplantadas por

disposições internas, inf luência social, sistema educacional e professor. As

disposições internas foram significativamente relacionadas a sucesso e fra-

casso, com ênfase no fracasso. As categorias professor e sistema educacional

foram mais relacionadas ao fracasso. A capacidade foi evocada principal-

mente para sucesso. Sorte e tarefa foram as menos indicadas, e a última

surgiu determinantemente como causa de fracasso.

Este estudo com universitários explica bem a possível variabilidade

das explicações causais conforme as pessoas pesquisadas e a cultura em

que estão inseridas. Estudo de Rodrigues (1984), replicando o estudo de

Weiner et al. (1971) apontou divergências entre a importância atribuída ao

esforço e à capacidade em diferentes culturas.

Considerando o paradigma utilizado por Weiner e Kukla(1970), Rodrigues (1980a, 1980b,) encontrou que os sujeitos‘mais recompensados por bons resultados foram os esforça-dos e com aptidão para a tarefa, os quais foram também osmenos punidos por maus resultados...os menos recompen-sados por bons resultados e mais punidos por maus resulta-dos foram os não esforçados e sem aptidão para a tarefa’(RODRIGUES, 1984a, p. 11, In: DELA COLETA & GODOY, 1986,p. 150)

Conclui - se a importância da vasta réplica dos estudos e da realiza-

ção de outros, diferenciados, em nossa cultura e nos vários contextos escola-

res específicos (séries, escolas públicas e privadas, níveis sócio-econômicos

diferentes, sistemas educacionais distintos, etc).

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

Dimensões de causalidade

As crenças causais podem ser classificadas segundo fatores de seme-

lhança e diferença das mesmas. E, por ambos levando-se em conta as suas

propriedades básicas, é possível estabelecer-se dimensões.

Inicialmente, Weiner (WEINER et al, 1971) propôs um esquema

taxonômico para as causas atribuídas a desempenho positivo ou negativo

em situações de realização, estabelecendo duas dimensões: locus de controle

(interno versus externo) e estabilidade (instável versus estável). Posterior-

mente, Weiner ( 1984) sustenta que a controlabilidade deve ser considerada

a terceira dimensão de causalidade, ficando assim a primeira dimensão de-

nominada locus de causalidade ( em oposição ao locus de controle de Rotter,

1966).

Locus de causalidade

Nesta dimensão, as causas são atribuídas a fatores internos ou exter-

nos ao indivíduo. Para Weiner (1984), nela estariam incluídas causas como o

esforço típico, esforço imediato, habilidade, humor, fadiga e doença como

fatores internos; e viés do professor, dificuldade da tarefa, sorte e ajuda não

usual de outros como causa externas.

A atribuição para causas de fracasso ou sucesso a fatores internos ou

externos propiciam fortes reações emocionais, conforme já visto, com refle-

xos na auto-estima. Assim, atribuições de capacidade e esforço para sucesso

eliciam sentimentos de orgulho, competência e satisfação. Atribuições de

capacidade e esforço para fracasso eliciam sentimentos de incompetência e

vergonha. Para Weiner, a auto-estima e a expectativa de desempenho futuro

interferem no desempenho de realização.

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Profissionais da Educação

Estabilidade

Esta dimensão define as causas em estáveis (invariantes) e instáveis

(variantes), sob a forma de um continuum. Assim, habilidade, esforço típico,

viés do professor, família, dificuldade da tarefa, etc, podem ser vistos como

relativamente estáveis; esforço imediato, humor, fadiga, doenças, ajuda não

usual de outros, sorte, etc, podem ser vistos como mais instáveis.

Para Weiner (1984), essa dimensão tem especial inf luência nas altera-

ções das expectativas de desempenho futuro. Atribuições causais após su-

cesso a fatores estáveis produzem acréscimos nas expectativas de sucesso

futuro, e decréscimos nas expectativas após fracasso.

O fracasso que é atribuído à pouca habilidade ou à dificulda-de de uma tarefa diminui a expectativa de sucesso futuromais do que o fracasso que é atribuído à má sorte, humor oufalta de esforço imediato. De maneira similar, o sucesso atribu-ído à boa sorte ou ao esforço dispendido resulta em menoresacréscimos na expectativa subjetiva de sucesso futuro na ta-refa do que o sucesso atribuído à alta habilidade ou à facilida-de da tarefa”. (WEINER, 1984, p. 5).

Quanto ao aspecto afetivo, atribuição de causas estáveis para fracas-

so, como habilidade e dificuldade da tarefa (portanto, que dificilmente vari-

arão), podem suscitar emoções de falta de confiança e desalento. Atribuição

de causas estáveis como habilidade e esforço típico para sucesso podem

suscitar confiança.

Controlabilidade

Esta dimensão consiste em perceber se a causa atribuída é controlável

ou não. Causas como habilidade, dificuldade da tarefa, sorte, viés do profes-

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

sor e ajuda dos outros seriam vistas como incontroláveis pelo sujeito. Po-

rém, a ajuda dos outros e viés do professor são controláveis, só que não pelo

aluno.

Dificuldade da tarefa, sorte, habilidade, humor, fadiga e doença são

vistos como incontroláveis.

A dimensão de controlabilidade está associada a emoções como, grati-

dão em caso de sucesso atribuído à ajuda de outros, e raiva em caso de

fracasso em função de interferência externa. Esta dimensão também está

associada a emoções de vergonha e culpa em caso de fracasso. O indivíduo

vivencia ainda a emoção de orgulho se atribuir seu sucesso a causas contro-

láveis por si próprio (exemplo: esforço).

A percepção do aluno de sentir-se no controle de sua própria aprendi-

zagem parece estar relacionada à escolha de tarefas acadêmicas mais difí-

ceis, exercer mais esforço e persistir por mais tempo no trabalho escolar (

SCHEMK, 1996; WEINER, 1994a, b).

Weiner (1994a, apud WOOLFOLK, 2000) resume a seqüência de moti-

vação quando o fracasso é atribuído ‘a falta de capacidade (incontrolável) e

à falta de esforço (controlável) de forma semelhante:

Quadro 2

Esta dimensão também está relacionada às alterações na auto-estima e

autoconceito.

181

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

Implicações na atuação do professor e no desempenho do aluno das

dimensões causais segundo o modelo de Weiner

Conforme vimos, as atribuições feitas às causas de sucesso e fracasso

em contexto de realização escolar provocam reações emocionais e medei-

am alterações na auto-estima, autoconceito e expectativas de desempenho

do aluno. As atribuições também influem nas expectativas dos professores, e

ajudarão a determinar suas ações futuras em relação aos alunos.

É interessante lembrar ainda, que estabilidade inf luencia as expectati-

vas de sucesso futuro, e o locus de causalidade e controle suscitam reações

afetivas, que agem sobre auto-estima e autoconceito.

Coll (COLL et al., 2000) coloca que os padrões de atribuição que mais

favoreceriam a aprendizagem são aqueles nos quais a pessoa atribui a cau-

sas internas, instáveis e controláveis tanto o sucesso como o fracasso. Nesta

visão, o esforço pode ser modulado, tanto para manter ou aumentar o suces-

so, como para evitar futuros fracassos. A atribuição de sucessos a causas

externas, instáveis e incontroláveis – como a sorte - seriam as mais desfavo-

ráveis, por produzirem uma impressão de falta de controle, tanto para pro-

duzir o sucesso como para evitar o fracasso.

Rodrigues (1984b) afirma que o aluno que atribui o fracasso numa

prova à habilidade tende a experimentar sentimentos de desespero, frustra-

ção e desesperança. Fracassos repetidos sob esse enfoque conduzem ao aban-

dono da escola ou perda de entusiasmo por assuntos acadêmicos

(RODRIGUES et al., 2000).

Daí a importância de verificar-se como os alunos atribuemcausalidade aos resultados, sejam eles bons ou maus. Seligman(1991), .(...), mostrou inequivocamente que um estiloatribucional pessimista leva a pessoa a atribuir a seus fracas-sos causalidade interna, estável e global (generalizável a ou-tras esferas de atividade) e, a seus sucessos, causalidade exter-na, instável e específica (capaz de ocorrer apenas na situação

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

específica considerada). A conseqüência de um estiloatribuicional pessimista é a depressão, o desinteresse do alu-no pela atividade acadêmica ou - se for o caso - desportiva e,eventualmente, o abandono da escola. (RODRIGUES, et al.,2000, p. 397).

Conforme as atribuições que os alunos fizerem para seus sucessos e

fracasso, haverá ref lexos na auto-estima, autoconceito e expectativas futu-

ras deles. Isto representa maior ou menor persistência nas atividades, evitação

ou procura pelas tarefas consideradas mais difíceis e forte inf luência na

motivação para realização.

Weiner (1984) afirma que em programa de mudança de ex-pectativa ou autoconceito as causas percebidas de desempe-nho precisam ser alteradas.“Essas idéias têm muito mais queuma certa relevância passageira para as práticas educacio-nais. Muitos dos programas de mudanças de realização queestão aparecendo fazem uso direto ou indireto de princípiosatribucionais. Esses programas freqüentemente tentam indu-zir os estudantes a atribuírem seus fracassos a uma falta deesforço, que é instável e está sob controle volitivo (verANDREWS & DEBUS, 1978; CHAPIN & DYCK, 1976; DWECK,1975). Esse objetivo é estabelecido expressamente para cri-anças ‘orientadas para o fracasso’, que aparentemente atribu-em seus fracassos à falta de habilidade, que é uma causa está-vel e incontrolável ( ver DIENER & DWECK, 1978).Presumivelmente, visto que o esforço pode ser aumentadopela vontade, atribuições de não consecução de um objetivoà falta de esforço resultarão na manutenção da esperança eaumentarão a persistência em direção ao objetivo. Por outrolado, desde que a habilidade é estável e não sujeita a controlevolitivo, atribuição de não consecução de um objetivo à baixahabilidade resulta em desistência e cessação do comporta-mento orientado para o objetivo”. (WEINER, 1984, p. 8).

Forsterling (1985, apud MUSSEN et al, 1990) afirma que retreinar a

interpretação não só leva a mudanças na interpretação, mas ao aperfeiçoa-

183

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Profissionais da Educação

mento das expectativas de sucesso, percepção da auto-eficácia, persistência

e desempenho da tarefa.

Contudo, não se pode ensinar ao aluno que seus fracassos são apenas

fruto de falta de esforço se houver outras causas presentes, como professor

mal capacitado, materiais e métodos inadequados.

Mussen levanta também outro aspecto a ser observado nesse tipo de

intervenção:

Ensinar às crianças que seus fracassos são devido à falta deesforço pode ser prejudicial se elas não tiverem as atividadesapropriadas para a tarefa. Uma criança que se esforça muitoe fracassa pode concluir que o fracasso resulta de sua baixacapacidade (COVINGTON & OMELICH, 1979). Nesses casos,é melhor ensinar estratégicas de abordagem de problemas”(MUSSEN et al.., 1996, p. 314).

O papel de ajudar os alunos a fazerem atribuições internas mais favo-

ráveis à aprendizagem cabe em grande parte aos professores. Mas, eles em

muitos casos necessitariam ter seus padrões atributivos alterados, a fim de

criarem expectativas mais adequadas em relação ao desempenho futuro de

seus alunos.

Muitos fatores interferem nas expectativas dos professores e essas

expectativas direcionam em parte as atribuições que ocorrerão sobre o de-

sempenho dos discentes. Atribuições inadequadas não só inf luenciarão as

novas expectativas futuras, como também o comportamento desses profes-

sores em relação aos alunos, como recompensas, punições e estímulos.

Outro fator importante é que estudos vêm demonstrando que os pro-

fessores fazem atribuições sobre o fracasso escolar deslocando-o do âmbito

da escola e do professor, responsabilizando o aluno e a família (GAMA. &

JESUS., 1994; MALUF & BARDELLI, 1991; JUSTA NEVES. & ALMEIDA, 1996;

OLIVEIRA, 1998). Padrões de atribuição de fracasso ao aluno determinam, às

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

vezes, esquemas de recompensas e punições inócuos ou prejudiciais e a não

implementação de ações efetivas.

Adotando essas crenças causais para o mau desempenho, falta de

esforço e capacidade do aluno, desinteresse e condições socio-econômicas

da família, fica difícil esperar que esses professores avaliem adequadamente

a inf luência de seus próprios comportamentos no desempenho do aluno,

buscando assim maiores conhecimentos em sua área e métodos e técnicas

de ensino mais eficazes. A análise que esses professores farão do sistema

educacional e da escola dificilmente contribuirá para a alteração dos pa-

drões e estruturas inadequados.

Conclui-se que as atribuições que os alunos e professores fazem sobre

o sucesso ou fracasso escolar interferem significativamente no desempenho

dos alunos, gerando aumento na motivação e sucesso, ou na evasão e no

fracasso, fatos que reafirmam a importância do professor no processo edu-

cacional e a extrema relevância de apoiá-los em suas dificuldades, tão fre-

qüentes nesta profissão.

Recebido: 02/04/2004

Aceite para publicação: 16/04/2004

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Profissionais da Educação

A RESSIGNIFICAÇÃO DA DOCÊNCIA: O PERFIL DO EDUCADOR

Maria Fátima Castilho

RESUMO: Este texto foi produzido com tessituras teóricas e reflexivas que começam apensar o mundo em um processo de mudanças aceleradas que atinge a todas as esferaseconômicas, políticas e sociais, o que é inegável e o que nos permite dizer que vivemos umtempo caracterizado por transformações paradigmáticas. Ao fazer algumas consideraçõessobre essa complexidade, aponta-se a necessidade da reinvenção de novas estratégias parapossibilitar uma educação diferente, o que implica também dar ao conhecimento umaoutra configuração e ao educar um novo sentido. Tudo isso se deve à crise de valores queenvolve o homem, e porque não dizer que se deve também ao momento de transiçãoparadigmática na educação em que todos os sujeitos se acham envolvidos. A sociedade,dessa forma, afetada por duas transições importantes como o advento da sociedade doconhecimento e a globalização, nos tempos atuais, convoca a educar o homem que omundo de hoje exige. Daí a necessidade de se reinventar a escola e com ela um novo perfilde educador que se ressignifica ao ressignificar a docência. São nessas formações discursivase teóricas que as contribuições aqui apresentadas foram formuladas.

PALAVRAS-CHAVE: educação; escola; docência; saberes e competências da docência; perfildo educado.,

ABSTRACT: This text was written with theoretical and reflexive contextures that start tothink the world in a process of accelerated changes that reach all the economic, politicaland social spheres, which is undeniable. It lets us say that we live in a time characterized byparadigmatic transformations. Some considerations made about this complexity pointsout the necessity to re-invent new strategies to make possible a different education, thisalso involves give to knowledge another configuration and to teaching a new sense. All ofthis is due to the crises of values that surround man, and why not say, that it is also becauseof the moment of paradigmatic transition in education where all the “subjects” are foundinvolved. Society in this way is affected by two important transitions like the advents of thesociety of knowledge and globalization, in these days calls in to educate the man thattoday’s world requires. Therefore the need to re-invent a school, and with her, a new profileof an educator that re-signifies when he re-signifies his teaching. In this discursive andtheoretical formation that the contributions here presented were expressed.

KEY WORDS: education; school; teaching;; knowledge; educator profile.

A sociedade do conhecimento gera, aceleradamente, informações múl-

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Profissionais da Educação

tiplas, fragmentadas e parciais, dos mais diversos campos do saber. Pelas

vias da crescente informatização os sujeitos são soterrados nas permanen-

tes avalanches de novas informações. Tudo isso, aponta para a necessidade

de transformação do currículo escolar dos cursos de formação e de outros

níveis de ensino, do sujeito único padronizado e homogeneizado de concep-

ção positivista com potencial para produzir sujeitos-efeitos únicos, padroni-

zados profissionalmente. O que significa dizer, mudar os paradigmas clássi-

cos, como a visão newtoniana-cartesiana, que ao compor o todo em partes

fragmentadas, impulsionou a formação acadêmica reducionista. A sociedade

do conhecimento provoca mudanças profundas em todos os setores da ati-

vidade humana-chamada “educação continuada” pois, o que o aluno aprende

na universidade só vai servir para, no máximo um ano de atividade profissi-

onal.

As mudanças nas instituições e na educação exigem aprendizagem de

forma mais integrada, inter-relacionada, que implica em reconectar o conhe-

cimento que foi fragmentado em partes e assumir o todo.

O desafio está, portanto, na incorporação de novas tecnologias a no-

vos processos de aprendizagem que oportunizem aos discentes, atividades

que exijam não apenas o seu investimento intelectual, mas também emocio-

nal, sensitivo, intuitivo, estético, etc, tentando não simplesmente desenvolver

habilidades, mas o indivíduo em sua totalidade.

De acordo com esse marco situacional, a própria noção de conheci-

mento deve ser revista. Conhecer assume um outro sentido. É compreender

todas as dimensões da realidade, captar e expressar essa totalidade de for-

ma mais ampla e integral e não fragmentada. O conhecimento torna-se pro-

dutivo se o integramos em visão ética pessoal, transformando-o em sabedo-

ria, em saber pensar para agir certo e melhor, assim o sentido de educar

mais do que nunca evoca interpretações múltiplas e significativas.

É evocado, também, um novo homem que exige uma nova escola, no-

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

vos conceitos das instituições que gerenciam o aprender e o ensinar, novas

formas de aprender a buscar : a educação que se faz continuada.

Novo homem que surge é notado pelo seu agir inteligente; sempre

marca sua presença revelando seu agir inteligente por ser inteligente am-

plia: visão de mundo, campo de ação, agindo e interagindo com todo o uni-

verso material no qual está inserido; suas relações sociais com as outras

pessoas e por meio da interação satisfaz a necessidade social de convivência

humana.

A aprendizagem da relação, a convivência, a cultura do contexto e o

desenvolvimento da capacidade de interação, com o grupo, com a comuni-

dade são ações fundantes no processo educativo. A pluralidade do homem

encontra seu sentido não na multiplicação dos eus, mas naquilo que é o

complemento do outro. O indivíduo não é uma ilha, não é um sujeito que

desenvolve qualidades que o separam dos outros, na busca de metas indivi-

duais. No cotidiano escolar, muitas vezes se vivenciam situações e atitudes

que configuram e legitimam o individualismo entre os sujeitos que constitu-

em a instituição.

A escola da era da globalização deverá corrigir essas distorções e for-

mar cidadãos que possam exercer, na sua comunidade, uma presença

humanizadora, uma presença que implique não em competitividade, mas em

vivência coletiva, em crescimento com o outro, uma educação para a com-

preensão. O homem da era relacional dialógica é sujeito histórico social,

sujeito de intervenção. Jacques Delors (apud BEHRENS, 2000), coordenador

do Relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre Educação

para o séc. XXI, apresenta os quatro pilares nos quais deverá ser assentada a

educação:

- Aprender a conhecer : que implica no domínio dos instrumentos do

conhecimento. A utilização ética do conhecimento, não para o benefício pró-

prio, mas para o bem coletivo;

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Profissionais da Educação

- Aprender a fazer; mas buscar o fazer na criação com crítica e

autonomia;

- Aprender a viver juntos: a ter consciência das semelhanças e da

interdependência dos seres humanos, isto é, a aprendizagem de conviver

harmoniosamente com todos os seres vivos.

- Aprender a ser: que significa propiciar à pessoa a possibilidade de

desenvolvimento total: espírito e corpo, inteligência, sensibilidade, sentido

estético, responsabilidade pessoal e espiritualidade.

Nesse sentido, uma educação para a era relacional pressupõe o alcan-

ce de um novo patamar na história da evolução da humanidade no sentido

de corrigir os inúmeros desequilíbrios existentes, as injustiças e as desigual-

dades sociais, com base na compreensão de que estamos numa jornada indi-

vidual e coletiva, o que requer o desenvolvimento de uma consciência ecoló-

gica, relacional, pluralista, interdisciplinar, sistêmica, que traga maior aber-

tura, uma nova visão da realidade a ser transformada, baseada na consciên-

cia da inter-relação e da interdependência essenciais que existem entre to-

dos os fenômenos da natureza. Uma educação que favoreça a busca de dife-

rentes alternativas que ajudem as pessoas a aprender a viver e a conviver, a

criar um mundo de paz, harmonia, solidariedade e fraternidade.

Se a educação é o espaço da ref lexão, da criação e da sistematização

do saber, usando palavras de Paulo Freire ela é uma forma de intervenção no

mundo. Nessa perspectiva, é convocada, intimada a legitimar um novo ho-

mem que educa e um novo homem a ser educado. Enfim, a sociedade pela

educação clama pela redefinição do papel do educador, a busca da constru-

ção de uma nova postura: a ressignificação da docência.

Mas como traçar perspectivas de mudanças na docência, no ser pro-

fessor, sem falar de determinações da prática referindo-se às limitações ou

condicionantes que se constituem em contextos incluídos uns aos outros, e

se apresentam como práticas como diz Nóvoa, aninhadas umas nas outras?

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

Por essas filiações teórico-ref lexivas é preciso também reinventar a escola e

qualificá-la.

A escola precisa ser mais do que um lócus de apropriação do conheci-

mento científico. Precisa ser um espaço der diálogo entre diferentes lingua-

gens e saberes (científico, social, escolar, etc.) Os desafios para reinventar a

escola, preconizam: enfatizar a dinamicidade, a f lexibilidade, a diversifica-

ção, as diferentes leituras de um mesmo fenômeno, as mais diversas formas

de expressão, o debate e a construção de uma perspectiva crítica plural;

educar para a cidadania, aliando a formação ético-humanista aos desafios

tecnológicos.

Os desafios para reinventar a escola, parafraseando Candau (2000, p.

59) preconizam:

- Articulação entre igualdade e diferença no acolhimento de movi-

mentos que promovam uma educação verdadeiramente intercultural, anti-

sexista, como princípio configurador do sistema escolar como um todo e

não somente orientada a determinadas situações e grupos sociais;

- A questão da cidadania , a partir de uma abordagem que a concebe

como prática social cotidiana, que perpassa os diferentes âmbitos da vida,

articula o cotidiano, o conjuntural e o estrutural, assim como o local e o

global, numa progressiva ampliação do seu horizonte, de posse de um proje-

to diferente de sociedade e humanidade;

- A construção de um espaço de busca, de construção, diálogo e

conforto, prazer, desafio, conquista de espaço, descoberta de diferentes pos-

sibilidades de expressão e linguagens, aventura, organização cidadã, afirma-

ção da dimensão ética e política de todo processo educativo;

- Radicalizar a construção e ou promoção de ecossistemas educativos

diversificados, multiplicar o seu lócus e reinventar a escola.

- Assumir sua configuração plural, reconhecendo o conhecimento e

as práticas educativas produzidas e acumuladas no continente, fazendo da

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

escola espaço de cruzamento de saberes e linguagens, de educação

intercultural e construção de uma nova cidadania.

O que se propõe é uma escola em que o aluno se veja participante de

uma comunidade, em que ele perceba sua futura profissão como instrumen-

to de presença no mundo.

A instituição escolar deve superar os enfoques tecnológicos,

funcionalistas e burocratizantes, aproximando-se de seu caráter mais

relacional, mais dialógico, mais cultural-contextual e comunitário. Deve ain-

da deixar de ser um lugar exclusivo em que se aprende apenas o básico e se

reproduz o conhecimento dominante. Precisa ser também, uma manifesta-

ção de vida em toda sua complexidade, em toda sua rede de relações e ensi-

nar a complexidade de ser cidadão e as diversas instâncias em que se mate-

rializa: democrática, social, solidária, igualitária, intercultural e ambiental.

Precisa, assim, que outra instância social se envolva e a ajude no processo de

educar.

Essa nova prática exige ambientes que extrapolem o espaço da sala

de aula, ocupando de modo mais assíduo não apenas os laboratórios e os

espaços sociais da escola, como também os disponíveis na comunidade, rea-

lizando atividades colaborativas em que as experiências sejam vivenciadas

individualmente e em grupo, atividades que privilegiem a dinâmica de proje-

tos, que invistam o aluno de responsabilidades reais ante o seu aprendizado

e o mundo que o cerca, atividades que sejam avaliadas, mais do que por uma

avaliação de conteúdos, mas pela auto-realização que elas proporcionem.

Neste contexto, o aulismo passa a ser coisa do passado, abrindo caminho

para a pedagogia do “estar no mundo, do estar junto, da sinergia do parti-

lhar, do profissionalismo interativo”. A sala de aula deixa de ser o templo da

transmissão e da repetição do saber para sediar importantes momentos de

socialização do aprendizado individual e de experiências em grupo, do diá-

logo e do confronto entre essas experiências e a teoria, da formulação de

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

problemas e da busca de soluções.

Toda Instituição Educativa (IE) e a profissão docente devem mudar

radicalmente, tornando-se algo realmente diferente, apropriado às enormes

mudanças que sacudiram a segunda metade do século XX. A profissão do-

cente deve abandonar a concepção de mera transmissão do conhecimento

acadêmico, de onde de fato provém, e que se tornou inteiramente obsoleta

para a educação dos futuros cidadãos em uma sociedade democrática: plu-

ral, participativa, solidária, integradora. As mudanças na IE ainda não rompe-

ram as linhas diretrizes que lhe foram atribuídas: centralizada, transmissora,

selecionadora, individualista, excludente.

Se a educação se tornou mais complexa, o mesmo deverá acontecer à

profissão docente. Essa complexidade é incrementada pela mudança radical

e vertiginosa das estruturas científicas, sociais e educativas.

Insistimos na necessidade de se retomar o debate sobre qual o perfil

de professor competente que se deve tomar como referência para acelerar

a formação competente neste e no tempo futuro? Poderemos continuar ten-

do professores que ensinam na certeza do paradigma dominante, aquele

que fragmenta o conhecimento, que separa ensino e pesquisa, teoria e práti-

ca e prega a neutralidade da ciência? Ou devemos caminhar na direção apon-

tada por Imbernón (2001), ao se reportar às características dos professores

que sofrem em suas vidas, em sua condição existencial as repercussões da

condição epistemológica da ciência: mudam concepção de vida,

homem,sociedade, conhecimento como processo, onde professores e alunos

constroem o saber novo, contraditório, fruto de processos sociais, históricos

e culturais.

Antes, porém, de evocarmos sentidos sobre ser professor ou ser um

profissional competente, é fundamental ref letirmos sobre o que é docência

e o conceito de profissionalidade.

Para Imbernón (ibid), um novo conceito de profissão e de desempe-

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

nho prático pretende superar o conceito neoliberal com um conceito mais

social, multidimensional, que se funde em valores da cooperação. Esse novo

conceito considera “profissionalismo” como características e capacidades

específicas da profissão, e “profissionalismo” como o processo socializado

de aquisição de tais características.

O profissionalismo e a profissão podem ser identificados como uma

exigência de contribuição para a produção, como um meio para adquirir

maior identidade social, como um critério de redistribuição de poder.

O conceito de profissão não é neutro nem é científico, mas produto de

um determinado conteúdo ideológico e contextual. As profissões são legiti-

madas pelo contexto e pelo conceito popular. Se aceitarmos que a docência

é uma profissão, não será para assumir privilégios contra ou à frente dos

outros, mas para que mediante seu exercício se possa ressignificar o profis-

sional e a profissão.

Entendemos por profissionalidade a afirmação do que é específico na

ação docente, isto é, o conjunto de comportamento, conhecimentos, destre-

zas, atitudes e valores que constituem a especificidade de ser professor”

(SACRISTÁN,1995, p. 65).

Uma certa compreensão do profissionalismo docente implica relacioná-

lo a todos os contextos que definem a prática educativa.

A profissão docente não detém a responsabilidade exclusiva sobre a

educação. Para Imbernón(2001), um novo conceito de profissão e de desem-

penho prático pretende superar o conceito neoliberal com um conceito mais

social, multidimensional, que se funde em valores da cooperação. Esse novo

conceito considera “profissionalismo” como características e capacidades

específicas da profissão, e “profissionalização” como o processo socializado

de aquisição de tais características.

O docente não define a prática, mas o papel que aí ocupa. É através da

sua atuação que se difundem e concretizam as múltiplas determinações pro-

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

venientes dos contextos em que participa. A essência da sua profissionalidade

reside nesta relação dialética entre tudo o que, através deles pode diluir.

No XVI FORUNDIR (Fórum Nacional de Diretores de Faculdades de

Educação) realizado em agosto de 2001 em Mato Grosso (Chapada dos

Guimarães) questionou-se muito sobre a docência enquanto base da escola,

enquanto relação educativa dentro e fora da escola, concepções essas apre-

sentadas nas Diretrizes Curriculares para Formação de Professores (MEC).

No entanto, muitos questionamentos foram feitos pelos participantes: o que

é a sala de aula? O que é docência?; A docência é caracterizada como primei-

ro vínculo pedagógico dentro da escola?; Quais são os espaços escolares,

não escolares e informais em que se pode atuar? E a formação se dá num

espaço formal? Vê-se questionamentos significativos que dão sustentação ao

exercício da profissão docente O que se pode perceber também, é que essa

preocupação deve também fazer parte das ref lexões daqueles que são os

atores, entre os alunos, do processo educacional: os professores. Por isso,

que se acredita na necessidade de produzir novos sentidos para profissão e

profissionalidade a partir da ressignificação da docência.

No entanto, já desponta, pelas necessidades emergentes um novo con-

ceito de profissão e de desempenho prático que pretende superar o concei-

to neoliberal com um conceito mais social, multidimensional, que se funde

em valores da cooperação. Esse novo conceito considera “profissionalismo”

como características e capacidades específ icas da prof issão, e

“profissionalização” como o processo socializado de aquisição de tais carac-

terísticas, por isso, remodelado e legitimado sempre com novos contornos.

Sacristán (1995) diz que o conceito de profissionalidade docente está

em permanente elaboração, devendo ser analisado em função do momento

histórico concreto e da realidade social que o conhecimento escolar preten-

de legitimar. Em suma, tem de ser contextualizado. Conforme o autor, a insti-

tuição escolar e profissão docente desenvolvem-se em um contexto marca-

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Profissionais da Educação

do por:

- Um incremento acelerado e uma mudança vertiginosa nas formas

adotadas pela comunidade social, no conhecimento científico e nos produ-

tos do pensamento, a cultura e a arte;

- Uma evolução acelerada da sociedade em suas estruturas materiais,

institucionais e formas de organização da convivência. Modelos de famílias,

de produção e de distribuição, que têm ref lexos na mudança inevitável das

atuais formas de pensar, sentir e agir das novas gerações;

- Contextos sociais que condicionarão a educação e ref letirão uma

série de forças em conf litos. As enormes mudanças dos meios de comunica-

ção e da tecnologia;

- Uma educação que não é patrimônio exclusivo dos docentes e sim

de toda a comunidade. A necessária redefinição da docência como profissão:

começou-se a valorizar a importância da participação dos cidadãos, a sua

bagagem sócio-cultural (comunicação, trabalho em grupo, decisões demo-

cráticas, etc.) Amplos setores demandaram que a educação se aproximasse

mais dos aspectos éticos, coletivos, comunicativos, comportamentais, emoci-

onais...

Essa nova forma de educar requer que se redefina a profissão e se

assumam novas competências profissionais num quadro de um conhecimento

pedagógico, científico e cultural revisto. A nova era requer um profissional

da educação diferente. Mas o caminho para a profissionalização dos docen-

tes encontra- se cheio de obstáculos: profissão massificada, desvalorização

das habilitações, posição histórica da docência como forma de trabalho pró-

pria de mulheres, resistência que oferecem os pais, os cidadãos e os políti-

cos à reivindicação do controle profissional das escolas, o fato de a docência

ter demorado a se incorporar a um campo infestado de trabalhos

profissionalizados, a prévia profissionalização dos administradores das es-

colas e o excessivo poder da burocracia administrativa, a prolongada tradi-

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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ção de realizar reformas educacionais por meios burocráticos, e a diversida-

de de entornos, em que se dá a formação dos professores. Educar diferente,

hoje, significa assumir novos caminhos de trabalho docente: a práxis.

Adotar uma concepção de práxis significa que o trabalho docente se

revele focalizando os seus fins, ou seja, considerando o seu objetivo que não

é a produção de novos conhecimentos propriamente ditos, mas a constru-

ção de saberes junto com outros sujeitos que, de modo ref lexivo, aprendem

tendo acesso ao conhecimento. Trata-se de uma atividade/tarefa eminente-

mente profissional fundada numa concepção de educação como ciência,

objetivando a emancipação do ser humano.

Perrenoud (2000) insiste para que todos nós educadores nos mobili-

zemos para novas maneiras de mudar a escola. Para isso, preciso pensar

num projeto pedagógico que contemple a erradicação das desigualdades e

do fracasso de aprendizagem. Contudo, estas questões continuarão

insipientes, se não se pensar numa política de formação de professores ade-

quada a estas mudanças e ao contexto social atual, assim como num investi-

mento para a formação contínua destes profissionais. Quando ele explica a

construção das competências no aluno, mostra que isso só será possível a

partir da construção de competências profissionais do professor, compe-

tências exatas que permitam a este profissional atitudes, mais solidárias,

mais comprometidas e mais eficazes na intervenção da aprendizagem

A nova identidade do professor passa pela inventividade,responsabilização e investimento em si mesmo, como profis-sional e cidadão. Mudar de registro não se trata mais de gene-ralizar uma fórmula testada em pequena escala, mas de pôr atotalidade do sistema educativo em movimento(ibid, 75).

O docente deve ser visto na sua tripla relação com o saber: enquanto

sujeito que domina determinados saberes, que transforma esses mesmos sa-

beres produzindo novas configurações de saberes e, ao mesmo tempo, asse-

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gura a dimensão ética desses saberes no seu cotidiano de trabalho.

Imbernón (2001), sobre o conhecimento profissional docente, diz que

“a profissão docente comporta um conhecimento pedagógico específico,

um compromisso ético e moral e a necessidade de dividir a responsabilida-

de em outros agentes sociais”.

Nessa mesma linha crítico-reflexiva, Nóvoa (NÓVOA, 1995, p.18.) pon-

tua que “o novo profissionalismo docente deve basear-se na criação de re-

gras nomeadamente éticas no que diz respeito à relação com outros atores

educativos”. O autor, ainda, acrescenta que a docência não deve ser uma

profissão meramente técnica de especialistas infalíveis que transmitem uni-

camente conhecimentos acadêmicos. A profissão docente deve se mover em

um delicado equilíbrio entre as tarefas profissionais e a estrutura de partici-

pação social.

Nóvoa (ibid), ao falar que a escola e os professores não podem repro-

duzir um discurso tecnocrático, culturalmente descomprometido diz que,

na verdade, o que distingue a profissão docente de muitas outras profissões

é que ela não pode ser definida apenas por critérios técnicos ou por compe-

tências científicas. “Ser professor implica a adesão a princípios e a valores, e

a crença na possibilidade de todas as crianças terem sucesso na escola” (id).

Diz Imbernón (2001) que o professor deve ter conhecimento

polivalente que compreenda o sistema, os problemas que dão origem à cons-

trução dos conhecimentos, o pedagógico, o metodológico-curricular, o

contextual e o dos próprios sujeitos da educação.

A especificidade está no conhecimento pedagógico. Mas esse conheci-

mento não é absoluto. Esse conhecimento legitima-se na prática e reside,

mais do que no conhecimento das disciplinas, nos procedimentos de trans-

missão, reunindo características específicas como a complexidade, a acessi-

bilidade, a observabilidade, e a utilidade social. O conhecimento proposicional

prévio, o contexto, a experiência e a ref lexão sobre a prática, conforme o

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Profissionais da Educação

autor, levarão à precipitação do conhecimento profissional especializado.

Uma das mais importantes funções ou tarefas docentes é a de ser pes-

soa que propõe valores, impregnada de conteúdo moral, ético e ideológico.

A dimensão educativa da profissão docente mostra-se mais concisa se o pro-

cesso de educação for considerado em relação aos sujeitos que caracteri-

zam uma sociedade determinada no sentido de analisar em todos os proble-

mas a referência à consciência coletiva, a fim de transformá-la segundo mo-

delos de vida, na medida em que se criam valores ao educar e ser educado;

isso implica ser competente naquilo que faz e melhorar a atuação.

Assim, a atuação que engloba o conjunto de comportamentos manifes-

tos que intervêm nos efeitos do professor sobre o aluno se constitui como a

chave para melhorar a eficácia. É necessário possuir diversas habilidades

profissionais que se interiorizem no pensamento teórico e prático do pro-

fessor mediante diversos componentes, entre os quais a formação, como

desenvolvimento profissional a partir da própria experiência. E assim, a pro-

fissão de acordo com os contornos históricos e sociais vai se constituindo.

A profissão, nas próximas décadas, deverá desenvolver-se em uma so-

ciedade em mudança, com um alto nível tecnológico e um vertiginoso avan-

ço do conhecimento. Isso implica não apenas a preparação disciplinar,

curricular, mediadora, ética, institucional, coletiva, mas uma importante ba-

gagem sócio-cultural e outros elementos que, até o momento, não pertenci-

am à profissão como os intercâmbios internacionais, as relações com a co-

munidade e as relações com as outras instituições sociais. Mas, e os professo-

res? Quem são em meio a essa dialética, complexa e exigente realidade?

Sacristán (1995) concebe o professor como responsável pela modelação

da prática, que é a intersecção de diferentes contextos. O docente não define

a prática, mas sim o papel que aí ocupa; é através da sua atuação que se

difundem e concretizam as múltiplas determinações provenientes dos con-

textos em que participa. A essência da sua profissionalidade reide nesta rela-

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ção dialética entre tudo o que, através dele, se pode difundir- conhecimentos,

destrezas profissionais etc.- e os diferentes contextos práticos.

Nóvoa (1995) diz que os professores são funcionários, mas de um tipo

particular, pois a sua ação está impregnada de uma forte intencionalidade

política, devido aos projetos e às finalidades sociais de que são portadores.

São agentes culturais sim, mas são também agentes políticos.

Ainda, para esse autor, a profissionalização do professorado acompa-

nha-se de uma política de normalização e de controle estatal. Precisamos

sim redefinir nosso papel, mas as visões extremas de um professor salvador

da humanidade ou, no pólo oposto, de um professor que se limita a reprodu-

zir o que já existe não nos servem para tentarmos compreender o nosso

papel. Os professores têm de afirmar a sua profissionalidade num universo

complexo de poderes e de relações sociais, não abdicando de uma definição

ética -e, num certo sentido, militante- da sua profissão, mas não alimentando

utopias excessivas, que se viram contra eles, obrigando-os a carregar nos

ombros o peso de grande parte das injustiças sociais.

Para os professores o desafio é enorme. Eles constituem não só um

dos mais numerosos grupos profissionais, mas também um dos mais qualifi-

cados do ponto de vista acadêmico. Não podemos permitir que continuem a

nos desprezar e a menosprezar nossas capacidades de desenvolvimento. O

projeto de uma autonomia profissional, exigente e responsável, pode recri-

ar a profissão professor e preparar um novo ciclo das escolas e dos seus

atores. Tal projeto requer, por outro lado, o profissional competente.

A competência docente não é tanto uma técnica composta por uma

simples série de tese baseadas em conhecimentos concretos ou na experiên-

cia, nem uma simples descoberta pessoal. O professor não é um técnico nem

um improvisador, mas sim um profissional que pode utilizar o seu conheci-

mento e a sua experiência para se desenvolver em contextos pedagógicos

práticos preexistentes. ELLIOT (1989, p.249-250 apud SACRISTÁN, 1998)

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postula que a prática competente de um profissional ético reside, essencial-

mente, na capacidade de transferir, refletir os princípios éticos que são ade-

quados à realização de práticas concretas.

Esteves (1995), ao abordar a questão da competência e incompetência

docente entende que hoje em dia o ensino de qualidade é mais fruto do

voluntarismo dos professores do que conseqüência natural de condições de

trabalho adequadas às dificuldades reais e às múltiplas tarefas educativas.

Diz o autor:

Registre-se, por último que, nos últimos 20 anos houve umagrande fragmentação da atividade do professor; muitos pro-fissionais fazem mal os seus trabalhos, menos por incompe-tência e mais por incapacidade de cumprirem, simultanea-mente, um enorme leque de funções. (ibid, p..97)

Entretanto, apesar da diversidade de funções que de certa forma so-

brecarrega o dia-a-dia do professor, MASETTO (2000, p.78) afirma que o

professor para o exercício da profissionalidade deve ser o orientador, o

mediador:

- Intelectual: para informar, ajudar a escolher as informações mais

importantes para que o aluno possa trabalhar com elas de forma significati-

va, avaliando –as conceitual e eticamente para adaptá-las ao seu contexto

pessoal;

- Emocional : para incentivar , motivar , estimular , organizar os

limites com equilíbrio, credibilidade , autenticidade e empatia ;

- Gerencial e comunicacional: o organizador das atividades que

envolvem, principalmente, grupos ou equipes de trabalhos pedagógicos. O

professor deve ajudar a desenvolver todas as formas de expressão, de

interação, de sinergia , de troca de conteúdos e tecnologias.

- Ético: orientar o aluno a assumir e vivenciar valores construtivos ,

tanto individuais quanto socialmente, e organizar seu quadro referencial de

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valores, idéias e atitudes a partir de conceitos como liberdade, cooperação,

integração social etc.

Masetto (ibid) ainda aponta para o professor como mediador pedagó-

gico : entender que o aluno é o centro do processo; ter co-responsabilidade

e parceria no desenvolvimento da aprendizagem; levar em conta a empatia

na relação professor – aluno; criar clima de respeito entre todos os partici-

pantes; dar ênfases às estratégicas cooperativas de aprendizagem; estabele-

cer atmosfera de confiança; dominar sua área de conhecimento; estar atuali-

zado; estar sempre disponível para diálogos; ter criatividade para buscar

junto com os alunos soluções novas e muitas vezes inesperadas; usar a subje-

tividade e individualidade e expressar-se adequadamente, em função do tipo

aprendizagem, sabendo usar bem a linguagem.

Em relação à dimensão metodológica mais específica, Behrens (2000)

enfocando o processo de aprender a aprender a autora propõe ensino base-

ado em procedimentos que:

- enfoquem o conhecimento a partir da localização histórica de sua

produção e o percebam como provisório e relativo;

- estimulem a análise, a capacidade de compor e recompor dados,

informações, argumentos e idéias;

- valorizem a curiosidade, o questionamento exigente e a incerteza;

- percebam o conhecimento de forma interdisciplinar, propondo

pontes de relações entre eles e atribuindo significados próprios aos conteú-

dos, em função dos objetivos acadêmicos;

- entendam a pesquisa como instrumento do ensino e sua extensão

como ponto de partida e de chegada da apreensão da realidade. E, para tal,

integrar tecnologias , metodologias , atividades, textos escritos , comunica-

ção oral , hipertextual , multimídia

Daí a necessidade de variar a forma de dar aula, as técnicas usadas em

sala de aula e fora dela, as atividades solicitadas, as dinâmicas propostas, o

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processo de avaliação. Saber planejar e improvisar , prever e ajustar –se às

circunstancias , ao novo; valorizar a presença humana no que ela tem de

melhor e a comunicação virtual no que ela nos favorece. Isso significa inte-

grar as tecnologias de forma inovadora .Para aprendermos bem é preciso

relacionar e integrar, usando para isso todas as tecnologias: telemáticas ,

audiovisuais, textuais , orais , musicais , lúdicas e corporais.

O professor precisa saber explorar adequadamente as várias opções

metodológicas para que a comunicação se transforme em conhecimento .É

importante que cada professor encontre sua maneira de sentir-se bem, ensi-

nar bem, ajudar os alunos a aprender melhor. Esse agir do professor buscan-

do produzir novos sentidos para a ação pedagógica se constitui num movi-

mento que se incorpora sentidos afins e de uma mesma filiação de compe-

tências.

Perrenoud (2000) propõe o movimento da profissão, através das dez

grandes famílias de competências:

- Organizar e dirigir situações de aprendizagens;

- Administrar a progressão de aprendizagens;

- Conceber e fazer evoluir os dispositivos de diferenciação;

- Envolver o aluno em sua aprendizagem, em seu trabalho;

- Trabalhar em equipe;

- Participar da administração da escola;

- Informar e envolver os pais;.

- Utilizar novas tecnologias;

- Enfrentar os deveres e os dilemas éticos da profissão;

- Administrar sua própria formação contínua.

Mediante aos mais diversos entrelaces de sentidos exigidos ao “ser

professor-educador” se apresentam também as limitações, os condicionantes

que intimidam o exercício docente competente. É por meio destas várias

contradições até aqui apontadas que os professores têm de refazer uma

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identidade profissional, em nível individual e coletivo.

Nóvoa (1998) utilizando de metáforas diz sobre algumas imagens de

professores. Conforme o imaginário do autor, existe o professor escultor:

que molda a matéria, preenche de todas as possibilidades, que é a criança; o

professor piloto, conduzindo a barca da educação pelo meio das tormentas

sociais; ou professor espelho, pondo diante dos olhos dos meninos dons

originais, que eles possam imitar, e por último, o professor jardineiro. Mas,

em que consiste o trabalho do jardineiro, ou melhor do professor jardineiro,

senão

preparar para a pessoa um ambiente benéfico e rodeá-lo donecessário para que suba ao Espírito, educando-se a si pelaforça própria, pela autodisciplina da atividade espontânea,em comunidades fraternas? Por outras palavras, significa dis-por o ambiente de tal maneira que ele ajude o formando aeducar-se a si mesmo. Ninguém diz à roseira que ela deveflorir: ninguém a manda florir; se lhe derem as condições quelhe são favoráveis, os botões virão, hão de abrir à luz.

Todos esses entremeios ref lexivos aqui salientados, relevantes para a

ressignificação da docência e o emergir de um novo perfil de educador con-

voca o sujeito professor a assumir uma outra e diferente posição a partir

daquilo que precisa fazer e saber fazer: agir de forma inteligente para redefinir

o seu papel, para não consentir que outros edifiquem a profissão de profes-

sor e legitimem o perfil do educador. Se assim for, a incompetência profissi-

onal, mais do que nunca estará consolidada.

Recebimento: 02/04/2004

Aceite para publicação: 16/04/2004

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Profissionais da Educação

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PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: DA UTOPIA ÀS POSSIBILIDADES

Odimar J. Peripolli

RESUMO: Neste artigo proponho uma reflexão sobre nossa prática pedagogia, seusignificado, caminhos, propostas; mostrar que existem “fórmulas” de se fazer educação eestas são mais simples do que imaginamos. Uma delas é começar as mudanças por nósmesmos e acreditar no depois. Mas, para que exista um depois, para que existampossibilidades de mudanças, é preciso acreditar na escola, conhecer a realidade, sair, desceraté o cais e aprender com os tanoeiros e operários, pois sabemos que quanto mais nosaproximarmos da linguagem do povo, a fim de melhor compreende-la, mais seremosdesafiados por ela. Se ensinar não for uma paixão para nós, se não acreditarmos na nossaprofissão, como falarmos em mudanças? Enfim, é preciso conceber a educação brasileiracomo um esforço de clarificação da consciência crítica das massas, para que assim elaspossam perceber sua realidade.

PALAVRAS-CHAVE: educação; escola; práticas pedagógicas; conhecimento do outro.

ABSTRACT: In this article I suggest a reflection about our pedagogical practice, its meaning,procedures, proposals; point out that “formulas” to make education, exist, and these aresimpler than we can imagine. One of them is to start the changes in us, and to believe in thefuture. But in able to exist a future, to exist changes it is necessary to believe in the school,get to know the facts, get out of the school grounds, go to the docks and learn with thecanoe man and workers for we know that the nearer we get to the language of the peoplefor a better comprehension, more we shall be challenged by her. If teaching is not a passion,if we do not believe in our profession, how can we call for changes? Nevertheless, we mustconceive the Brazilian education as a clarifying struggle of the critical consciousness of themasses and in this way they can perceive their reality.

KEY WORDS: education; school; pedagogical practice; knowledge of the other;

Introdução

A consciência de que construímos um mundo com muitosproblemas está de tal modo presente que não necessita declarificação. Cada um de nós tem temores e discordâncias arespeito do mundo de hoje que vão desde pequenos ou gran-des aspectos esparsos até o todo da organização da socieda-de (GANDIN, 1995, p. 11).

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Sempre que nos debruçamos sobre o tema educação, mais especifica-

mente sobre educação escolar, nos deparamos com as mais diferentes for-

mas de problemas/ limites. Estes parecem ser, muitas vezes, quase

intransponíveis, porque, em muitos casos, fogem ao alcance da possibilidade

de solução de quem faz educação.

Embora profissionais na área, nem sempre conseguimos tomar todas

as decisões que poderiam/deveriam, acreditamos, ser as melhores para um

maior aproveitamento e resultado em nossas práticas na área. Em muitas

escolas, mais especificamente nas áreas rurais (veja o caso das escolas dos

assentamentos de reforma agrária), fica difícil até de acreditar/conceber que

aí seja possível desenvolver qualquer prática pedagógica.

No cotidiano escolar não conseguimos e/ou não sabemos transformar

determinadas situações em questões políticas. Nos sentimos como os únicos

responsáveis pela educação e transformamos a escola em um local onde

nossas práticas vão além das nossas responsabilidades. Os problemas conti-

nuam os mesmos e agravados pelo sentimento de “culpa” pelo “fracasso”...

Vivemos dentro de uma estrutura/cultura onde o enfrentamento, o

questionamento quase não fazem parte de nossas práticas educacionais, com

raras exceções. Por quê? Há que se alertar para o fato de que os politiquei-

ros de plantão, sempre ágeis, eloqüentes, estão sempre dispostos a contri-

buir..., como fazer!

Esta certa impotência frente aos repetidos índices negativos, aos cons-

tantes fracassos no processo educativo no seu conjunto, é que tem levado/

vem levando muitos profissionais ao desânimo, a desesperança e, em alguns

casos, até o abandono do magistério. E fica a pergunta: o que fazer?

Saídas existem. É preciso que nos envolvamos no processo e busque-

mos, primeiro: perceber a realidade como ela se apresenta. É nesse exato

momento que surge uma luz. Então, passamos a detectar aqui e ali, sementes

de esperança. Segundo: é hora de agir. Renascem, então, os sonhos, voltam as

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utopias. É exatamente nesse momento que passamos a acreditar que um

novo amanhã é possível. Dentro de uma postura do ver, julgar (ref letir) e

agir (MEDELLÍN In: GANDIN, 1995) é que se desencadeia o caminho das

possibilidades.

Acreditar, esperar, este parece ser o grande segredo para podermos

superar obstáculos, alçarmos novos vôos. Importa olharmos para frente e

para cima (Duc in altum). Rossa (In: AEC – nº 111/1199, p. 5 – 6) diz ser do

próprio homem esta característica, ou seja, capacidade de superar, de imagi-

nar. É do próprio ser humano esta “sede de infinito”.

Importa sublinhar mais uma vez as palavras de Rossa ao falar de edu-

cação, relacionando-a à paixão, onde afirma “não ser possível fazer educação

só com conhecimento e técnica, como muitos pensam a educação única e

exclusivamente a serviço da economia de mercado”. E acrescenta: “a educa-

ção é também política, arte, ética, encantamento, sabedoria, utopia, paixão”.

Esperar de quem as mudanças na educação? Dos outros? Quem são

estes outros se não nós mesmos? Devemos entender que as mudanças são

possíveis e de responsabilidade nossa enquanto sujeitos profissionais da área.

Temos a tarefa/compromisso de devolver a cidadania a tantos que,

como numa viagem sem volta de um vôo desastrado, tem jogado e ainda

joga fora “crianças e jovens do Brasil, longe do ponto de destino: educação,

saúde, cidadania e vida” (PASSOS, In: AEC,nº 11/1999, p. 09).

Como fazer? Às vezes, parece-nos mais uma questão de metodologia,

de como fazer. Mas cuidado! Os métodos, as técnicas nem sempre atingem o

que se deseja de fato. O que devemos ter em mente é “uma transformação

pedagógico-didática, mas em função de uma mudança social” (GANDIN, 1995,

p. 12). Ainda: “restringir-se aos limites técnicos da educação e fazer dela um

fim, sem ver que ela está aí para uma sociedade, seria trair a condição de

pessoa humana e de cidadão”. Mais: ao falarmos em transformação, em mu-

danças didático-pedagógicas, devemos pensá-las na possibilidade e que este-

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jam “aptas a contribuir para a transformação na sociedade mal construída

que temos”. Enfim, “o importante é pensar em que tipo de mudança estamos

empenhados”.

O conhecimento partilhado

Há que se perguntar: para que o conhecimento, para que o saber?

Acredito que se estes forem compartilhados, socializados, comungados, esta-

remos, não só a meio caminho andado, mas no caminho certo.

A escola ainda é o lugar onde, mais democraticamente, e de modo mais

sistematizado, se oferece aquelas condições que são próprias para uma prá-

tica educativa. Não se quer, com isso, supervalorizar a escola. “O que se quer

é vê-la como algo que existe e é buscado, especialmente na fase da infância e

da adolescência como meio de educação, e tê-la presente como um projeto

de educação, projeto incluso, que deve ser constantemente melhorado e aper-

feiçoado” (CNBB, 1986, p. 18).

Ainda: “é uma instituição que, embora fortemente questionada, adqui-

re hoje especial importância e precisa reformular-se profundamente, para

atender melhor às exigências da educação, num mundo em rápidas e amplas

mudanças” (Ibid.).

Acima de tudo, estamos falando da possibilidade de uma educação

libertadora: “aquela que transforma o educando em sujeito de seu desenvol-

vimento e que é meio-chave, para libertar os povos de toda escravidão” (ME-

DELLÍN, In: GANDIN, 1995, p. 17).

O que esperar de uma sociedade, formada por um grande número de

homens e mulheres (adultos, jovens e crianças) que, ao longo de suas vidas,

lhes foi negado o acesso ao saber? Basta que sejam verificados os números

de analfabetos que vivem no campo, principalmente nos assentamentos de

reforma agrária espalhados nos quatro cantos do País e/ou mesmo nos acam-

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pamentos à beira das estradas (BRs), os sem-terra.

Como trabalharmos com perspectivas de uma escola que busca traba-

lhar ações transformadoras em uma sociedade alicerçada sobre estruturas

injustas? Este parece ser um dos grandes desafios a ser enfrentado neste

início de um novo século, tanto para a cidade quanto para o campo.

Vale aqui ressaltar que toda ação educativa deveria propiciar às pes-

soas, aqueles que buscam a escola, tornarem-se sujeitos, artífices de sua pró-

pria história. Uma escola que abra caminhos para que os diferentes sujeitos

possam desenvolver capacidades de libertarem-se das amarras de um siste-

ma injusto. Daí a necessidade de vermos o outro como sujeito, capaz e pos-

suidor de conhecimentos.

Devemos trabalhar, sonhar, dispensar nossas energias e visualizar uma

escola que acredita no processo humanizador e de humanização da socieda-

de. Por uma escola que acredita num projeto utópico, onde haja espaço para

o “o homem novo e a nova sociedade” (CNBB).

Cuidado! Temos que ser perspicazes, pois quando o poder público

não sabe/não consegue/não lhe convém resolver um problema, como por

exemplo, o dos sem-teto, sem-terra, desemprego, miséria, analfabetismo, re-

corre sempre à educação. Ou seja, joga-se sob a responsabilidade da educa-

ção/escola esta tarefa/este desafio. Função esta que não é de responsabilida-

de da escola e/ou que está fora de seu alcance. A educação/escola não pode

assumir o ônus da incompetência dos responsáveis diretos pela criação das

políticas voltadas para a área.

Descer ao cais do rio, entre tanoeiros e operários...é preciso.

Estou me referindo à importância do outro nesse processo de cons-

trução de uma sociedade justa. O outro é aquele que “não sabe”; aquele que

sempre foi ignorado pelas elites (os que se acham “donos” do poder e do

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Profissionais da Educação

saber). Aquele que numa versão bem política, pertence a uma camada da

população que, segundo dizem, fazer parte “das bases”. Bases do quê?

Diria que é aquele que é esquecido quando a mesa está posta (traba-

lhador braçal, homem simples, operário...), mas que ajudou e ajuda a provi-

denciar o manjar. Aquele que a academia, por modismo, costuma chamar de

excluído. Que o senso comum chama de “menos favorecido”... É aquele sujei-

to produzido pela própria sociedade e do qual se envergonha, o não-cida-

dão.

Há que se perguntar: quem são os agentes deste processo de exclu-

são? Como agem? Por que agem? O que pretendem? É preciso conhecer a

realidade. Só quando conhecemos a realidade existente é que podemos falar

em mudanças, uma vez que não podemos mudar o que não sabemos como é.

Vendo este cenário onde a questão central é educação escolar, o que se

pode perceber, ao menos termos claro, é que existem sujeitos que fazem,

que agem, que se movimentam intencionalmente. Não adiante falarmos de

modo genérico, usando termos definidores apenas, escondendo-nos sob nos-

sas boas intenções; ou subestimando, tanto a capacidade, quanto a ignorân-

cia e/ou a incompetência dos fazedores de políticas educacionais; ou dos

ditos intelectuais e/ou dos pedagogistas de gabinetes fazedores de currícu-

los. Mais: não podemos perder de vista os politiqueiros de plantão sempre a

rondar as mais diferentes discussões, buscando uma parte que lhes interes-

sa, os oportunistas.

Importa aqui, até como proposta de ref lexão centrada na perspectiva

do outro (sujeitos excluídos do direito à escola, do saber), nesse processo

todo, tendo a escola como centro, as palavras de Serres:

Que é preciso freqüentar as bibliotecas, é certo; convém comcerteza, tornar-se erudito... Depois? Para que exista um de-pois, isto é, algum futuro que ultrapasse à cópia, saia das bibli-otecas e corra para o ar puro... exponha-se ao sol, à sede, ao

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Profissionais da Educação

deserto... ao anoitecer, desce ao cais do rio, entre tanoeiros eoperários... (In: MARQUES, 2001, p. 95)

Nossa prática pedagógica se dá em um espaço (dentro e/ou fora de

uma sala de aula). Enfim, em um lugar onde existem pessoas que querem e

estão sedentas por aprender. Embora se afirma que ninguém ensina nin-

guém..., importa saber que existe alguém querendo/precisando aprender.

Vivemos em uma sociedade multicultural. Não podemos ignorar isto.

Dentro dessas diferentes realidades, entre esses diferentes sujeitos, é que

nascem os novos saberes, as novas possibilidades, as possibilidades de novas

práticas.

O saber se constrói em mútua troca de experiências, de valores, enfim,

na partilha. É isso de fato que ocorre? Ao menos acreditamos e nossos esfor-

ços devem estar voltados neste sentido.

O que buscamos é o novo. Este novo acontece, na prática, quando saí-

mos de nós mesmos; quando vamos em busca de; quando nos dispomos ir

até cais em busca de saberes dos outros: do homem simples, cheio de conhe-

cimentos. São os sem-teto, os sem-terra, os operários, analfabetos, ...; Sujeitos

possuidores de saberes diferentes dos nossos e que têm muito a nos ensinar:

como e o que fazer.

O que houve com as escolas, com as universidades que já não ensi-

nam? O diferente parece nos assustar, o novo nos incomoda, o desconhecido

nos dá medo... A escola não consegue ensinar as pessoas a sobreviverem nos

espaços em que estão. A universidade não consegue fazer com que as pesso-

as envolvidas no processo consigam ocupar espaços de profissão. Alguns

dizem até que formamos para o desemprego.

Diria que nossas convicções, conceitos, práticas precisam ser expos-

tos ao sol, à sede, ao deserto, isto é, precisam serem avaliados pelos outros.

Nesta intencional exposição a que nos propomos, enquanto profissionais da

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

educação, estamos sendo avaliados e nos auto-avaliando. Um gesto nobre.

Minha modesta experiência, como professor, trabalhando/pesquisando

junto aos assentados nos projetos de reforma agrária, me fez questionar: o

que est/ou/amos fazendo intramuro (dentro da universidade)? Onde fica,

para onde vai, para que servem as teorias sem uma prática efetiva

(extramuro)?

Mato Grosso é um Estado cheio de contradições, para não dizer cheio

de injustiças. Nossas práticas docentes acorrem neste meio. Por que, então,

nossas atitudes são tão conservadoras, tão tímidas, tão...?

O norte do Estado quer tornar-se um pólo educacional. Este parece

ser um desejo bastante forte por parte das autoridades que pensam a educa-

ção como uma forma de desencadear, com mais rapidez, o processo de mo-

bilidade social, tendo a escola/educação/formação profissional como fator

desencadeante deste processo. Tanto que faculdades, escolas, estão aí, bro-

tam com todo vigor.

Por que ainda se fala, se escreve, se discute tão pouco sobre violência

no campo, migração, fronteira, assentamentos rurais, analfabetismo,

favelização das cidades... ? Não estamos preparados? Falta-nos coragem para

questionar mais, denunciar, mostrar a realidade como ela é? Ou medo? Ou

não sabemos sobre estas realidades?

A Amazônia Norte mato-grossense ainda é vista como “terra do silên-

cio” (Becker, 1998). Temos dificuldades em ouvir o grito dos excluídos: os

que reivindicam terras, teto, escola, trabalho, pão, dignidade, cidadania. Por

qual causa lutamos então?

Nascemos de um projeto mal explicado que objetivava, em tese, a re-

forma agrária: “levar homens sem terra para terra sem homens” (MÉDICI,

déc. de 70, séc. XX)). A bem da verdade, de propaganda enganosa, pautada

em mentiras de um regime que se mostrou medíocre, violento, covarde – o

regime militar (1964 – 1985).

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

Numa análise do porquê não houve um crescimento econômico conti-

nuado após o regime militar, com seus muitos “erros históricos”, reconhece-

se que “os governos militares descuidaram da educação básica” [...]. Foi aí

que nós perdemos o barco “(Veja, nº 13. 31 de março de 2004, p. 102 – 106)”.

No Brasil tem-se falado muito em reforma agrária (aliás, um dos pre-

textos usados pelos militares para o golpe, 1964). Um “projeto” que, na prá-

tica, não passa de uma grande falácia. Seus reflexos se fazem sentir quando

vemos um amontoado de trabalhadores jogados no meio do mato (CREA –

MT. março de 2002). Denúncia clara da incompetência das políticas criadas,

ao longo dos anos, para o meio rural no País.

Em nossas práticas como docentes, temos consciência disso? Nossos

acadêmicos navegam nessa área? Qual nosso papel enquanto educadores,

formadores de opinião, frente a esta realidade que nos cerca: desemprego,

miséria, analfabetismo, exploração de menores; sem- terra, sem-teto, sem-es-

cola, sem...? Qual a política de nossos campi em relação a estas diferentes

realidades (embora já tenhamos avançado bastante)?

Muitos de nossos acadêmicos exercem ou vão exercer suas atividades,

como professores, no meio desses novos sujeitos sociais. Como seria possí-

vel trabalhar com o desconhecido? Faz-se necessário pensarmos e construir-

mos uma pedagogia específica para o rural.

Falamos em perspectivas, sonhamos, falamos em utopias... Isso nos

move. Por que não falarmos a partir de realidades que se fazem tão próxi-

mas de nós?

Estamos perplexos diante das rápidas mudanças na sociedade, na eco-

nomia, na tecnologia. É o momento em que aparecem no pensamento educa-

cional diferentes possibilidades: projeto político pedagógico; pedagogia da

esperança; ideal pedagógico; a ilusão fecunda; as utopias pedagógicas; o fu-

turo com possibilidades, etc.

Que bom que ousamos falar em perspectivas, em mudanças. Meio ca-

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

minho andado. Estamos falando em possibilidades, em construção – somos

corajosos.

Nunca se falou tanto em inovação educacional diante da perplexidade

do cenário em que vivemos (cenário incerto, confuso, sem norte...). O ama-

nhã parece não mais passar pela lógica do hoje.

Paulo Freire diz que: “mudar é difícil, mas é preciso” (In: GADOTTI,

2000, p. 5).Diríamos que mudar é preciso, possível e urgente. Que mudan-

ças? Como concretizá-las?

A resposta parece vir do próprio autor. Ele mesmo nos mostra saídas

e aponta para a necessidade de “uma escola com outra cara, mais alegre,

fraterna e democrática. Uma escola com outro espírito”. Mas nos alerta: “eu

vi que era preciso conceber a educação brasileira como um esforço de clari-

ficação da consciência crítica das massas, para que assim elas pudessem

perceber sua realidade” (In: TORRES, 1994, p. 34).

Gadotti (200, p. 5), falando em mudanças, em perspectivas na área da

educação, diz, pela sua experiência, e parece nos alertar que esta tão sonha-

da mudança só ocorrerá no momento em que possamos dizer:

“Acredito na escola; sou apaixonado pelo que faço; acredito na minha

profissão; conhecer, aprender e ensinar é apaixonante”.

Porém, um novo alerta vem novamente de Freire (In: TORRES, 1994, p.

34): “eu vi que a prática pedagógica implica um trabalho efetivo para mudar

essas estruturas. Tudo isso levou muito templo”.

Aqui importa reforçar a idéia de que existe uma estreita relação entre

prática pedagógica, especialmente a escolar, e as estruturas sociais, políticas

e econômicas. Portanto, não podemos ser ingênuos em pensarmos a escola

(isolada, só, como instituição) como motor da sociedade.

Antes de finalizar, gostaria de reproduzir algumas idéias de Gandin

(1995, p. 8 – 9 ), que acredito serem importantes para uma ref lexão:

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

o sistema escolar se organiza segundo as linhas estruturais dosociedade em que se insere [...]; os esforços educacionais pro-duzidos espontaneamente, isto é, realizados sem umaprofundamento crítico suficiente, reforçam a sociedade emque se realizam [...]; não é possível fazer uma proposta edu-cacional consistente sem referi-la a um projeto social [...]; aescola é um espaço como outros (partido, sindicato, comuni-dade de base...) no acontecimento da luta social [...]; [...] amudança só irá acontecendo a partir da atenção contínua(profissional, não necessariamente heróica) e da visão globalque tenha, sempre, como horizonte, um projeto humano esocial.

Por que não juntarmos as palavras de Serres, Gadotti, Gandin e Freire

e construirmos uma resposta às perguntas feitas nos seguintes termos: para

que exista um depois, para que existam possibilidades de mudanças, é preci-

so acreditar na escola, conhecer a realidade, sair, descer até o cais e aprender

com os tanoeiros e operários, pois sabemos que quanto mais nos aproximar-

mos da linguagem do povo, a fim de melhor compreendê-la, mais seremos

desafiado por ela.

Ainda: se ensinar não for uma paixão para nós, se não acreditarmos na

nossa profissão, como falarmos em mudanças? Enfim, é preciso conceber a

educação brasileira como um esforço de clarificação da consciência crítica

das massas, para que assim elas possam perceber sua realidade.

O papel da escola hoje, da universidade, passa necessariamente pelo

compromisso de possibilitar que as pessoas possam sobreviver nos diferen-

tes espaços. Esse parece ser nossa grande e sublime tarefa. Um desafio a ser

perseguido pelos que fazem educação.

Ao trilharmos por estes caminhos vamos ter a certeza de que estamos

entre o possível de ser realizado e as utopias (também possíveis) de serem

alcançadas.

Recebimento: 02/04/2004

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

Aceite para publicação: 16/04/2004

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CNBB: para uma pastoral da educação. São Paulo: Edições Paulinas, 1996.

GANDIN, Danilo. Escola e transformação social. 3. ed. Petrópolis, RJ: Vozes,

1995.

GADOTTI, Moacir. Perspectivas atuais da educação. Porto Alegre: Artes Mé-

dicas Sul, 2000.

MARQUES, M. Osório. Escrever é preciso: o princípio da pesquisa. 4. ed. Ijuí:

Ed. Unijuí, 2001.

REVISTA DE EDUCAÇÃO AEC. E AGORA 2000. Vol. 28, nº 11, abri./ jun. 1999.

– Brasília: AEC, 1999.

REVISTA VEJA, nº 13. 31 de março de 2004, p. 102 – 106.

TORRES, Ártemis (org.). Moto Grosso em movimentos: ensaios de educação

popular. EdUFMT, 1994.

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

REFLEXÕES SOBRE AS CONTRIBUIÇÕES DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL

ÀS CONCLUSÕES PROVISÓRIAS: PARA ALÉM DO DISCURSO

TEORICAMENTE SUSTENTADO

Lenita Maria Körbes Zonin

Considerações iniciais

A Universidade do Estado de Mato Grosso , mantenedora da UNEMAT/

Campus Universitário de Sinop, define-se como uma Instituição Pública Edu-

cacional, que emerge das exigências tecnológicas, científicas e culturais da

região1 com o objetivo de participar do desenvolvimento de seus municípi-

os de inf luência, bem como do processo educativo e cultural de seus habi-

tantes, representando uma resposta aos imperativos da globalização, carac-

terística marcante da atual conjuntura mundial.

Neste sentido, o comprometimento da UNEMAT/Campus de Sinop e

do programa de Educação Ambiental com o ensino e a pesquisa na região,

vai além da simples formação de profissionais em nível de licenciatura, pois

entende que a promoção da qualidade de ensino necessita da pesquisa.

Uma das formas de incentivar a mesma é através de um programa de

Educação Ambiental, pois as contribuições são significativas e possibilitam

estudos mais aprofundados que podem tornar-se contínuos .

Entende-se por programa aquelas ações ou blocos de ações que resul-

tam de propostas concretas entre a Universidade e a Comunidade, através

de suas instituições e organizações públicas privadas e comunitárias. Estas

ações devem ser concebidas e analisadas a partir dos valores da ética, da

justiça e da verdade, num processo de retroalimentação do ensino e da pes-

quisa, garantindo a dinâmica do tripé Ensino, Pesquisa e Extensão. Um pro-

1 A área de abrangência da UNEMAT – Campus de Sinop comporta a cidade de Sinop, Cláudia,Vera, Lucas do Rio Verde, Sorriso, Juara, Colíder dentre outros municípios.

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

grama permanente de pesquisa e extensão constitui-se de vários projetos

que nascem da necessidade despertada pelo caráter envolvente e dinâmico

do processo.

A construção coletiva desse processo fará com que a Universidade e a

Comunidade Regional através da troca de conhecimentos e experiências,

possam elevar gradativamente o nível de consciência da realidade ambiental

e suas possibilidades de avanços frente às exigências da modernidade, man-

tendo o equilíbrio do ambiente natural.

Dentro deste contexto e a partir dele, é que se constitui o Projeto de

Educação Ambiental- EDUCAMBI- que em síntese pode ser assim apresenta-

do:

a) na Pesquisa: priorização de estudos teórico-práticos relaciona-

dos às concepções ambientalistas da sociedade contemporânea, visando o

desenvolvimento conjunto de mini-projetos de pesquisa direcionados à edu-

cação, história e cultura regionais a partir da mobilidade acadêmica e de

docentes, alicerçada numa prática centrada em ações interdisciplinares.

b) na Extensão: política de aproximação com a comunidade regional

promovendo parcerias entre Universidade/ Escolas Públicas da região, ofe-

recendo consultorias em formação permanente de recursos humanos para a

Educação Ambiental numa perspectiva cooperante.

c) no Ensino: o projeto de Educação Ambiental –EDUCAMBI- já vem

prestando serviços de orientação em pesquisas monográficas aos estudan-

tes dos Cursos de Graduação e Pós-Graduação do Campus de Sinop. Dentro

do programa de ensino, desde dezembro de 2000, disponibiliza um Curso de

Especialização “Lato Sensu” em Educação Ambiental.

A produção científica decorrente deste Curso e exigida na forma de

monografia de conclusão do mesmo, tem contribuído para a qualidade dos

Cursos de Graduação e Pós-Graduação para a necessária articulação com

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

os estudos ecoeducacionais , bem como, para reforçar e incentivar a inicia-

ção científica na Universidade.

O percurso da Pós-Graduação “Lato Sensu” em Educação

Ambiental

O propósito desta ref lexão é apresentar o trabalho desenvolvido a

partir da realização do Curso de Pós-Graduação “Lato Sensu” em Educação

Ambiental que teve como objetivo preparar recursos humanos em Educa-

ção Ambiental para que o desenvolvimento regional se dê, em primeiro lu-

gar, em beneficio do próprio homem/mulher Mato-grossense.

Os estudos desenvolvidos evidenciam orientações paradigmáticas im-

plícitas na trajetória acadêmica de professores e estudantes, configurando-

se em processos emergentes de idéias e ações iniciadas nos aportes de uma

abordagem sócio-histórico-cultural em direção a um processo de pesquisa,

que contempla a interdisciplinaridade e a complexidade no sentido da re-

construção teórica e prática, abrindo espaços a recontextualização para além

dos limites do discurso ambiental.

Esta forma de conceber o trabalho de pesquisa, potencializa a impor-

tância do Curso de Educação Ambiental a partir de um programa perma-

nente que emerge de duas situações de aprendizagem . A primeira é a neces-

sidade histórica de conhecer os conceitos, as metodologias e as teorias

construídas em torno da temática, problematizando-a. A segunda, é a necessi-

dade de se inaugurar um processo de reaprendizagem, isto é, reeducar-se

para superar o pensamento e ações fragmentadas e dicotomizadas. Nestes

termos, pode-se destacar que a Educação Ambiental é um vasto campo

conceitual que necessita ser absorvido e recriado nos espaços cognoscentes,

criados para a ref lexão das teorias e das práticas que englobam o universo

epistemológico do educar, reeducando-se a partir de princípios éticos e ci-

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

entíficos, impossíveis de separar-se da Educação Ambiental, cuja dimensão já

é integradora.

O estudo coletivo desse processo possibilitou ao corpo docente e

discente do Curso de Educação Ambiental, oportunidades de interferir na

realidade sócio-ambiental através da ação profissional nos aspectos políti-

co-pedagógicos e ambientais dentro da comunidade regional. De modo ge-

ral, o desempenho da maioria dos discentes e docentes no decorrer das ativi-

dades pedagógicas do Curso motivou a ref lexão-ação-reflexão, assim como,

o processo da pesquisa, ensino e aprendizagem. Os conteúdos trabalhados

despertaram nos professores e nos estudantes grande interesse para a bus-

ca de novos conhecimentos, esclarecimento teórico-prático, além da anteci-

pação de outras formas de ensinar, apreender e fazer Educação Ambiental.

Espera-se dos cursistas mesmo como estudantes de Educação Ambiental,

ao assumirem o seu papel de cidadãos ambientais, proporcionado pelo Cur-

so, que comparti lhem conhecimentos e experiências socialmente

elaboradas,viabilizadas pela mediação pedagógica, concebendo esta como

promotora da aprendizagem a partir da vida cotidiana sem perder de vista

os objetivos e as metas no caminhar de cada dia. Neste sentido, destacam-se

as colocações de Gutiérrez (1999:p. 59), sobre o fazer pedagógico, quando

afirma que: “nenhuma Educação, e menos ainda aquela orientada a trabalhar

com os setores populares, pode desentender-se do pedagógico entendido

como promoção da aprendizagem produtiva”. Assim como, nos diz que “edu-

car-se é impregnar de sentido as práticas da vida cotidiana” (GUTIÉREZ

1999,p14).

Tal possibilidade configura o que Vygotsky (1991), entende por apren-

dizagem, quando afirma que a peculiaridade distintiva da cognição humana

é essencialmente social, ou seja, os estudantes envolvem-se coletivamente

em atividades que lhes permitem a recombinação ativa de novos conheci-

mentos com base naqueles já adquiridos ao longo da vida cotidiana. Contu-

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

do, esta recombinação sócio-histórica envolve a constituição de conhecimen-

tos, valores, sentimentos, normas de atuação e procedimentos de relações e

interações sociais. Assim, a sala de aula requer uma atuação social, sendo

função do professor não só a organização das relações do conteúdo ambiental

ali estabelecido, do qual o conhecimento é um produto, mas também, orien-

tar e direcionar o processo de apropriação deste, colocando-se como medi-

ador entre as atividades dos estudantes e os conhecimentos com os quais

interagem. Daí porque, o processo de ensinar e aprender envolve a media-

ção pedagógica do professor, como aquele que puxa, provoca, sensibiliza,

promove, o desenvolvimento e a aprendizagem enfatizados em Davidóv

(1988).

Esta concepção de educação, para Davidóv (1988), favorece não só

aos estudantes, mas também aos professores quando intermediam o proces-

so de apropriação dos conhecimentos, ativam seus próprios processos

cognoscitivos. Assim, não só o ensino e a aprendizagem podem integrar-se

ao conceito de “zona de desenvolvimento proximal”, mas também a pesqui-

sa.

Nesta perspectiva, importante se faz salientar Leontiev (1984), quan-

do se refere ao estudo psicológico elaborado por Vygotsky e colaboradores,

reforça a presença dos conceitos cotidianos e a investigação científica em

sala de aula com o seguinte questionamento: “Mas o que é consciência? A

consciência é com – ciência, mas só no sentido de que a consciência indivi-

dual pode existir unicamente na presença da consciência social e da lingua-

gem, que é seu substrato real” (LEONTIEV, 1984,p.78. Os grifos são nossos).

Portanto, o autor reafirma a proposta dos pesquisadores soviéticos,

enfatizando que a passagem da consciência social para a individual só é

possível mediante a compreensão de que a estrutura da consciência humana

e, principalmente, a consciência planetária está intrinsecamente ligada à es-

trutura da atividade humana a partir da cotidianidade.

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

Desse modo, confirmamos que o Curso de Pós Graduação “Lato Sensu”

em Educação Ambiental vinculou-se positivamente com a proposta de atua-

lização e qualificação de docentes do Departamento de Pedagogia. Aqui, a

questão ambiental transformou-se em uma causa social cidadã para além do

discurso ambiental sustentado teoricamente. Essa concepção de cidadania

ambiental e de consciência planetária, requer um cidadão organizado, críti-

co e participativo e, por isso, convoca todos os setores, grupos e instituições

das sociedades organizadas, para exercer suas responsabilidades, partici-

pando efetivamente a partir dos seus saberes e fazeres diários, numa relação

pessoal e coletiva, do seu projeto econômico, político, social e ambiental

mediado pela cooperação.

Assim, a questão da participação e mobilização ambiental colocou-se

como eixo teórico-prático e foco das discussões no transcorrer do Curso,

tanto pela crescente intensidade com que foi sendo proposta a adoção de

novas atitudes ecopedagógicas, como pela constatação do quanto não tem

sido acompanhada pelas políticas públicas na definição do que realmente

ela seja, enquanto produto da riqueza culturalmente elaborada pela humani-

dade e novamente reelaborada por seus atores sociais. Ainda, importante se

faz ressaltar Alicia Bárcena quando diz que:

até o momento, a maioria das organizações sociais têm sededicado ao exercício da denúncia a partir da compreensãocoletiva dos direitos cidadãos. Isto trouxe, sem dúvida, impor-tantes avanços sociais e políticos. Contudo, é urgente avançarindo além da denúncia, defendendo e lutando pelo cumpri-mento da gestão ambiental pública, para a construção de umacidadania consciente de suas responsabilidades. (BÁRCENAIn: GUTIÉRREZ, 1999, p.14).

No âmbito da Educação Ambiental, a cidadania planetária e a cultura

de sustentabilidade requerem um espaço pedagógico em que não só sejam

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

contempladas as informações, a oportunidade de expressão e de discussão

sobre os conhecimentos ou as leis ambientais que dão sentido ao estudo,

tratando-os enquanto temas transversais, mas principalmente, a produção

científico-acadêmica com-ciência, com o universo dos sentimentos e da vida

cotidiana, dos quais o conhecimento ambientalista é constituído.Isto signifi-

ca conceber a atividade educativa como potencializadora do “ser mais”

anunciado por FREIRE (1982). Logo, torna-se necessário, levar em conta o

trabalho produtivo dos cidadãos envolvidos, das interações sociais que de-

terminam não apenas o campo de atuação educacional, como também o

recorte epistemológico dos conteúdos sócio-culturais e das contraposições

em nível teórico-prático.

Dentro desta perspectiva, a reelaboração do conhecimento ambiental

pode se tornar inédito e viável na prática educativa, pois ao longo do pro-

cesso este conhecimento teórico vai sendo reestruturado pelas ações, auto-

ref lexões, revisões e deliberações dos cidadãos participantes que estarão

vivenciando-o e implantando-o em sala de aula e nas atividades exercidas

cotidianamente. Assim, irão envolvendo-se continuamente na construção pro-

gressiva de sua (nossa) humanidade planetária, humanizando-se (nos), de-

fendido por Freire e aqui, lembramos de sua última entrevista, dizendo que:

“gostaria de ser lembrado como aquele que amou as plantas, os animais, os

homens, as mulheres, a terra” (FREIRE citado por GADOTTI, 1998, p.32.33).

Contextualização teórica e sua vinculação com a pesquisa

O referencial teórico-metodológico, adotado no Curso, enriqueceu-se

por inspirar-se em vários autores, entre alguns, destacam-se BOFF (2000),

BRANDÃO (1994), DAVÍDOV (1988-1987) DEMO (1997), FREIRE (1982-1989-

1992-1996-1998), GADOTTI (2000), GUTIÉRREZ (1999), ISAÍA (1993-1998),

LEONTIEV(1984), MORIN (2000), SANTOMÉ (1997), SATTO (1999),

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Profissionais da Educação

VYGOTSKY (1991-1998). A escolha de tais autores deveu-se ao fato de que o

centro de interesse desta proposta pedagógica partiu de um grupo de pro-

fissionais da educação que compõem o projeto EDUCAMBI e que compar-

tilha da mesma preocupação temática.

A proposta do Curso teve como objetivo principal oferecer aos pro-

fessores e estudantes subsídios para analisar sua práxis em Educação

Ambiental. Discutiu-se o papel do educador de hoje, os fundamentos e

metodologias que necessitam subsidiar a própria prática, como também os

conteúdos e conceitos que deveriam estar presentes na Educação Ambiental

da escolarização formal. Esta ref lexão sempre se deu à luz do princípio

educativo de que o eixo central consiste em olhar e penetrar no modo de ser,

estar e viver no ambiente sócio-histórico-cultural.

Durante o desenvolvimento do Curso, além da fundamentação teórica,

a discussão foi direcionada para a pesquisa. As temáticas desenvolvidas e

apresentadas pelos estudantes no primeiro e no segundo seminário de ava-

liação de monografias, foram:

· Reciclagem e reaproveitamento do lixo: uma alternativa

ambiental

· Resíduos Sólidos Urbanos e a Degradação Ambiental.

· Concepção e prática de educação ambiental, nos educandos da

escola estadual de ensino fundamental e médio.

· Educação ambiental para as séries iniciais do ensino fundamen-

tal : rumo à consciência planetária.

· Percepção ambiental e cidadania na disciplina de Geografia.

· A importância da água e a Educação Ambiental: percepção dos

alunos da Escola Estadual com relação à utilização e desperdício da água.

· Assoreamento dos rios e nascentes.

· A importância histórica e sócio-ambiental do Córrego.

· Educação Ambiental no contexto escolar.

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

· Educação ambiental como tema transversal.

· Educação Ambiental e interdisciplinaridade.

· Implantação do Projeto Político Pedagógico, do Planejamento

Participativo e da Educação Ambiental.

· Meio Ambiente e Trabalho Docente.

· Plantas Medicinais como Alternativa Econômica e de Saúde Pre-

ventiva.

· Desmatamento e degradação ambiental.

· Educação ambiental no contexto da escolarização formal.

· A Educação Ambiental e o papel pedagógico no cultivo de mi-

nhocas.

· A importância da água e a Educação Ambiental.

· Ensaio sobre controle e infestação de carrapatos no meio urba-

no de Sinop/MT.

· Saúde dos trabalhadores(as) em Educação.

Podemos constatar que os temas propostos correspondem às pers-

pectivas do Departamento de Pedagogia, oferecendo oportunidades para a

pesquisa em educação na região, garantindo não apenas o diagnóstico da

realidade, mas a possibilidade de ref lexão crítica e a construção de propos-

tas concretas de mobilização e intervenção na mesma.

Repercussão do trabalho desenvolvido e sua implicação para a exten-

são

Os estudantes do Curso tiveram a oportunidade de apropriar-se de

novos conhecimentos na área da Educação Ambiental, refletindo sobre uma

atuação mais dinâmica nas diversas áreas de atuação profissional.

De forma direta e/ou indireta, uma contribuição valiosa certamente

229

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

ocorrerá quando das suas atuações como docentes nas redes Municipal e

Estadual de Ensino, assim como foram suas apresentações dos trabalhos nos

seminários de avaliação das monografias. Estes seminários foram organiza-

dos em duas etapas: o primeiro ocorreu em 27 de abril de 2002 e o segundo

foi realizado nos dias 28 e 29 de julho de 2002. As produções monográficas

irão para o acervo da biblioteca da UNEMAT/Campus de Sinop extensivo a

toda a comunidade acadêmica.

Além destes aspectos, a vinculação deste Curso com o ensino de Gra-

duação, apresenta como resultado concreto a possibilidade dos estudantes

deste atuarem como docentes nos demais cursos de Graduação oferecidos

pela UNEMAT/Campus Universitário de Sinop, como também a contribui-

ção qualitativa para o ensino de 1º, 2º e 3º Graus nas demais instituições

educacionais.

Sendo assim, os estudantes da Pós-Graduação “Lato Sensu” em Educa-

ção Ambiental, se propõem a dar continuidade a este processo ininterrupto

de educação , assumindo o desafio de aprofundar algumas questões presen-

tes no meio educacional contemporâneo, assim como apresentar aos demais

educadores (em nível de unidade escolar e organização popular) uma pro-

posta mais consistente com relação ao tratamento que se necessita dar hoje

à construção, ao intercâmbio, à divulgação do conhecimento e, principal-

mente, da prática de se fazer Educação Ambiental.

Reflexões finais

Observou-se que o Curso de Pós-Graduação “Lato Sensu” em Educação

Ambiental, no seu desenvolvimento, através do Departamento de Pedagogia

da UNEMAT/Campus Universitário de Sinop, do Projeto EDUCAMBI e da

Coordenação, balizou-se no sentido de contribuir na busca de alternativas

educacionais que respondam melhor às necessidades e características sócio-

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

230

Profissionais da Educação

ambientais dos estudantes, professores e do grupo social Mato-grossense.

Por fim, destaca-se a importância da continuidade deste trabalho no

sentido de cumprir com o exercício da (nossa) função universitária, ofere-

cendo aos estudantes de Educação Ambiental, subsídios para que se possibi-

lite melhorar nossa prática de ensino, pesquisa e extensão universitária,

reestabelecendo uma relação mais interativa e fértil entre ciência, educação

e vida. Assim, finaliza-se com as palavras de Mead : “nunca duvide que um

pequeno grupo de cidadãos preocupados e comprometidos possam mudar

o mundo; de fato, é só isso que o tem mudado” (MEAD citada em

GUTIÉRREZ,1999, p.14).

Recebido: 02/04/2003

Aceite para publicação: 16/04/2004

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

DAVÍDOV,D. La enseñanza escolar y el desarollo psiquico. Moscú. Progres-

so,1988.

FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982.

GUTIÉRREZ, Fransisco. Ecopedagogia e cidadania planetária. São Paulo:

Cortez: Instituto Paulo Freire, 1999.

LEONTIEV, A. Actividad, conciencia y personalidad. México, Cartago, 1984.

VYGOTSKY, L. Problemas teóricos y metodológicos de la psicologia. Madrid:

Centro de Puplicaciones del MEC/Visor, 1991.(Obras Escogidas, v. 1).

231

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

RESENHA

CARRANO, Paulo César Rodrigues. Juventudes e cidades educadoras. Rio de

Janeiro: Vozes, 2003.

JUVENTUDES E CIDADES EDUCADORAS

Maricelia Padilha da Costa

A noção de Educação amplia-se para o conjunto das práticas sociais;

isto significa o reconhecimento da multiplicidade de fatores que concorre-

ram para a formação das identidades que se configuram nos sujeitos e nos

processos sociais construídos historicamente. Nesse sentido, a perspectiva

da educação se estende para além dos horizontes estritamente pedagógi-

cos.

As relações humanas que acontecem nos espaços sociais podem ser

consideradas como atos educacionais ampliados. As experiências vividas nas

atividades de lazer são exemplos de práticas sociais, que acontecem fora das

instituições concebidas para educar.

A amplitude do conceito de educação pode ser concebida pelos seto-

res que dividem-na em: formal, não-formal e informal. Como informal pode-

mos categorizar o conjunto de processos e fatores que geram efeitos

educativos sem que tenham sido expressamente configurados para esse fim;

refere-se à ação educativa, aquilo que educa e não apenas ao resultado ou

efeito educativo. Um filme ainda que não tenha sido produzido com propó-

sitos educativos, pode gerar aprendizagens.

A educação não formal também pode ser constituída por diferentes

eventos capazes de combinar formalidade e informalidade educativa. Pode-

se considerar as cidades como redes de relação e práticas que configuram

um amplo espectro de fatos sociais educativos; pois nelas acontecem práti-

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

cas sociais e culturais, formação de valores, troca de idéias que compreen-

dem a totalidade do processo educacional. Não existe relação que não se

estabeleça num contexto socioespacial produzido pelas ações dos sujeitos

históricos concretos.

Entender a noção ampliada de processo educativo requer ultrapassar

barreiras disciplinares que separam as usuais noções da educação e da cul-

tura. Entendendo a educação para além das aprendizagens institucionais,

compreendê-la também como processo social. Então se concebe a educação

como prática cultural, e não apenas como sistema institucional de ensino,

pois esta faz parte de um amplo jogo político e ideológico que atravessa a

totalidade da vida social tanto em seu aspecto simbólico como econômico.

Assim compreende-se que a cidade se tornou um todo de espaços

educativos; compreendendo espaço não como um dado, mas como uma rela-

ção social. E é nesses espaços de relações que o ser humano vai se construin-

do através da participação no desenvolvimento das cidades, nas práticas

educativas, nas ações transformadoras dos significados pessoais e culturais.

A educação que configura nos corpos dos sujeitos é em realidade o

resultado da formação social desses sujeitos. A noção de corporicidade foi

concebida como uma possibilidade para a compreensão dos movimentos

que os corpos/sujeitos estabelecem historicamente na organização social

das cidades.

Os atos humanos estão sempre relacionados com os processos

relacionais, que os indivíduos participam. As identidades sociais urbanas

devem ser analisadas na perspectiva da busca dos sentidos dos relaciona-

mentos da complexa teia da vida, tecida em todos os lugares da cidade, tanto

nos limites territoriais como simbólicos.

Homens e mulheres passam por transformações, considerando suas

circunstâncias de vida. A consciência de si e de mundo acontece pelo amplo

processo social e histórico que contribuem para a formação da sensibilida-

233

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

de humanizada.

A educação ao mesmo tempo em que se dirige aos corpos, se faz atra-

vés deles; assim como a sociedade é feita pelos sujeitos que a compõem e

também os sujeitos são socialmente elaborados. O ser humano é processo e

produto das relações sociais; historicamente a sociedade se identifica com

os processos humanos que transformam os modos de pensar, agir, sentir e

ser.

Assim também a forma como o tempo é concebido, contado, percebi-

do é construído cultural e historicamente. As concepções acerca do tempo

relacionam-se com as praticas sociais dos indivíduos e da sociedade. Marx

cita: “O tempo é tudo, o homem não é nada, na melhor das hipóteses, ele é a

carcaça do tempo. A qualidade deixa de ter importância. A quantidade deci-

de tudo sozinha: hora por hora, dia por dia”.

A moderna concepção de tempo se assenta no fato real do aumento

da capacidade humana de obter os meios de vida e de transformar a nature-

za. Nesse sentido, o trabalho humano só apresenta valor pela sua capacida-

de de produção. Na sociedade capitalista o corpo foi concebido como uma

peça a mais na engrenagem da produção. Os sentidos de mecanização do

corpo em nome do trabalho só foram possíveis devido às profundas trans-

formações sociais na concepção de ciência, de homem e de mundo.

Devido à necessidade do capitalismo criar mecanismos que garantis-

sem a disciplina corporal, atendendo as necessidades do estabelecimento de

uma adequada economia de gestos e atitudes, a medicina se apresenta como

a tecnologia capaz de prescrever os cuidados necessários para que os cor-

pos se tornassem compatíveis à ordem produtiva do capital.

À medida que a vida nas cidades tornou-se marcada pelo ritmo urbano

e separada dos relacionamentos coletivos e duradouros, as sociedades fo-

ram se articulando pelas necessidades, pelo desejo, pela busca da satisfação

através do consumo; e o indivíduo afasta-se cada vez mais dos processos

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

coletivos da vida social.

As necessidades humanas devem ser entendidas como sociais e cultu-

rais, construídas de acordo com um determinado momento histórico, neces-

sária à vida em sociedade e não naturais e individuais.

A vida cotidiana nas cidades expressa as lógicas da dominação e da

possibilidade de alternativas democráticas para a vida social. Começaram a

surgir alternativas políticas de satisfação das novas necessidades cotidianas,

a partir da consciência social do pensamento revolucionário.

Em muitos momentos a vida na cidade se dá pela busca de espaços

particulares, onde o indivíduo procura isolar-se de tudo que lhe causa medo

e constrangimento. A esfera pública orientada pelos interesses do capital

passa a ser o palco onde os agentes privados exercem sua competitividade.

Assim se produz o individualismo social, gerando a sacralização do merca-

do, a barbárie e a miséria social. Gera-se uma contradição dos sujeitos com

as entidades públicas, devido à utopia neoliberal que aponta a felicidade

privada para cada um.

O consumo de mercadorias também é concebido culturalmente, tendo

em vista que se realiza num contexto de significação social. Os significados

são relacionados com o tátil, o visual, o sentido, a projeção do corpo e seus

estímulos para os relacionamentos.

Para a juventude, os espaços de lazer se constituem como verdadeiros

espaços de socialização e formação subjetiva. Nas cidades encontram-se os

territórios privilegiados para a sociabilidade juvenil.

Entende-se por juventude uma fase que diz respeito às escolhas mui-

tas vezes decisivas para a vida em sociedade, um momento de várias tentati-

vas, de vocações ardentes, da constante busca por aprendizagens, marcadas

por uma alternância de êxitos e fracassos, passando por situações de crises

individuais e coletivas, mas também de compromissos e entusiasmo. São

momentos cruciais de formação e transformação.

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

O termo juventude refere-se à uma faixa de idade, um período de vida,

em que se completa o desenvolvimento físico do indivíduo e uma série de

mudanças psicológicas e sociais, ocorre quando este abandona a infância

para processar sua entrada no mundo adulto. Porém, a juventude é social-

mente variável. A juventude deixa de ser uma condição biológica e passa a

ser uma condição simbólica. As pessoas não são jovens apenas pela idade,

mas assumem culturalmente a característica juvenil através da mudança e

da transitoriedade.

A Organização das Nações Unidas (ONU), define a faixa etária entre

15 e 24 anos, para falar sobre juventude; como um mecanismo para verificar

situações estaticamente; porque juventude é um segmento social cultural-

mente definido.

No Estatuto da Criança e do Adolescente considera-se adolescente

aquele entre 12 e 18 anos de idade, podendo-se estender a proteção em

casos excepcionais até os 21 anos.

Definir o que é um jovem apenas situando-o numa determinada faixa

etária, é uma maneira simplista da sociedade capitalista, para o estabeleci-

mento de estatísticas ou de definição de idade de escolarização obrigatória.

A definição de juventude é o resultado das experiências sociais de um

determinado tempo histórico. As idades não possuem um caráter universal,

infância, juventude e vida adulta é resultado da história e varia segundo as

formações humanas.

Portanto, a identidade juvenil pode ser entendida como um processo

contínuo de transformação individual e coletiva, num jogo de experiências

múltiplas. E, ao se referir ao jovem hoje é necessário considerarmos a

heterogeneidade das sociedades e sua complexidade.

Grande parte da experiência que os jovens vivenciam hoje, foram so-

cialmente construídas em função das relações e significados herdados de

uma cultura de caráter global.

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

236

Profissionais da Educação

Essa vida social é para os sujeitos uma experimentação de identidades

que colocam em jogo as múltiplas personalidades, que requerem as relações

sociais. Para compreender a identidade é necessário percebê-la através do

contexto da mundialização da sociedade e a complexidade dos fenômenos

que ao articularem-se se configuram novas e mutantes identidades.

A identidade coletiva pode ser concebida como um processo de cons-

trução de um sistema de ação; nem sempre possível de negociá-la de todo no

interior do grupo, já que nos processos coletivos existem os sentidos. Para

agir coletivamente é preciso colocar em jogo emoções; amor, ódio, etc. são

sentimentos que fazem parte de um corpo individual tentando agir coletiva-

mente; como acontece nos movimentos sociais. Portanto, a dimensão coleti-

va ocorre num quadro de relações entre a auto-identificação e reconheci-

mento sociais.

A juventude na década de 20 aparece nos estudos como uma questão

de desvio social, já nas décadas de 50 e 60 a juventude passou a ser vista

como inovação social, surgem os movimentos estudantis, a contracultura,

colocando o jovem como propulsor de mudanças sociais.

A questão do jovem era pouco enfrentada e estudada; a juventude qua-

se sempre era tratada como problema e não como um campo possível de

problematização. A categoria sociológica juventude é freqüentemente asso-

ciada à possibilidade de inovação ou futuro renovado. No Brasil, começaram

a surgir políticas públicas mais específicas ao atendimento da juventude, há

menos de uma década, até então os jovens se enquadravam nas políticas

sociais que atendiam às crianças e os adultos.

Rua (1998) “propõe o entendimento de políticas públicas como o con-

junto de decisões e ações destinadas à resolução de problemas políticos”.

Percebemos que o jovem está na preocupação de muitos governos,

algumas propostas são executadas e observarmos que se limitam geralmen-

te, a ações que se resumem num conjunto de programas juvenis; constata-se

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

que às vezes não atendem aos anseios do publico ao qual se destinam. Para

Touraine (1998), “o principal objetivo de uma política de juventude é o de

incrementar nos jovens a capacidade de comportar-se como atores sociais,

ou seja, de modificar seu entorno social para realizar projetos pessoais”.E

ainda reafirma que o objetivo principal da política da juventude há de ser “o

fortalecimento do espírito de cidadania que compreende, por sua vez, a con-

fiança nas instituições e a consciência de poder fazer-se ouvir nelas”.

Por trás de toda política está implícita a noção do ou dos sujeitos a

quem se destina e suas problemáticas concretas, e dependerá dessa noção o

tipo de política e programas produzidos como respostas; evidenciar-se-á de

que forma o poder público e a sociedade caracterizam a juventude, como

problema social ou como solução para a sociedade contemporânea.

O campo educacional precisa enfrentar o desafio que é conseguir dia-

logar e compartilhar dos sentidos culturais que são elaborados nas múlti-

plas redes sociais da juventude.

A organização democrática das cidades precisa constituir-se de espa-

ços públicos que potencializem a identidade juvenil numa perspectiva de

pluralidade cultural. Transformar as cidades em cidades educadoras é tam-

bém lutar para banir a exclusão; é combater a naturalização das desigualda-

des; é uma transformação social.

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

238

Profissionais da Educação

NORMAS PARA APRESENTAÇÃO

As colaborações devem ser apresentadas em duas vias impressas em

português e em disquete (Microsoft Office) que deve trazer uma etiqueta

identificando o(s) autor(es), o título do artigo e telefone para contato. Po-

dem, ainda, serem enviadas via correio eletrônico no endereço:

[email protected] Os artigos deverão ter no mínimo, oito e, no máximo, trinta

laudas; as comunicações e resenhas até oito laudas.

Serão publicados, somente trabalhos selecionados e aprovados pelo

Conselho Editorial.

As colaborações deverão seguir as Normas da Associação Brasileira

de Normas Técnicas – ABNT de agosto de 2002. São elas:

Configuração da página: tamanho do papel (A4 – 21 cm X 29,7 cm);

margens esquerda e superior 3cm, margens direita e inferior 2cm; todas as

páginas deverão ser numeradas com algarismos arábicos no canto direito

superior.

Tipo de Letra: Times New Roman, corpo 12, exceto as citações longas,

as notas, resumo, abstract e palavras-chave que deverão ser inferior.

Espacejamento: 1,5 entre linhas no corpo do texto e simples nas cita-

ções longas, nas notas, resumo, abstract . Os títulos das seções (se houver)

devem ser separados do texto que os precedem ou sucedem por espaço

duplo.

Adentramento: parágrafos com um toque na tecla TAB, tabulação 1,5

cm. As citações com mais de três linhas com recuo 4 cm da margem esquer-

da.

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

Quadros, gráficos, mapas, etc. devem ser apresentados em folhas sepa-

radas do texto (no qual devem ser indicados os locais em que serão inseri-

dos), devendo ser numerados, titulados corretamente e apresentar indicação

das fontes que lhes correspondem. Sempre que possível, deverão estar con-

feccionados para sua reprodução direta.

Disposição do texto:

Título: centralizado, em maiúscula e negrito, com nota indicando sua

origem (se houver) no rodapé. Caso haja subtítulo, em negrito, sem

adentramento e apenas a primeira letra em maiúscula.

Nome(s) do(s) autor(es): completo(s) na ordem direta, e na segunda

linha abaixo do título com alinhamento à direita..

Resumo: deve iniciar a um espaço duplo, abaixo do(s) nome(s) do(s)

autor(es), sem adentramento, após a palavra RESUMO em maiúscula, segui-

da de dois pontos, o qual deverá ter no máximo dez linhas em itálico.

Palavras-chave: a expressão PALAVRAS-CHAVE, em maiúscula, seguida

de dois pontos, a um espaço duplo abaixo do resumo e dois espaços duplos

acima abstract. Utilizar no máximo cinco palavras-chave, em itálico, separa-

das por ponto e vírgula.

Abstract: a expressão ABSTRACT, em maiúsculo a um espaço duplo

abaixo das palavras-chave, seguindo as mesmas orientações do resumo.

Referências bibliográficas: a expressão REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFI-

CAS em letras maiúsculas, centralizada, a um espaço duplo após o final do

texto. A primeira obra deve vir a um espaço duplo abaixo da expressão

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

240

Profissionais da Educação

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS. As referências devem seguir a NBR 6023/

02 da ABNT. Exemplos:

Um autor:

QUEIROZ, E. O crime do padre amaro. 25. ed. Rio de Janeiro: Ediouro, 2000.

277p.

Dois ou três autores:

VIGOTSKY, L. S.; LURIA, A. R. Estudos sobre a história do comportamento.

Porto Alegre: Artes Médicas, 1996.

Mais de três autores:

CASTORINA, J. A. et al. Piaget-Vigotsky: novas contribuições para o debate.

São Paulo: Ática, 1995.

Serão fornecidos gratuitamente ao autor principal de cada artigo, dois

exemplares do número da Revista da Faculdade de Educação em que seu

artigo foi publicado. A Revista não se obriga a devolver os originais das

colaborações.Os trabalhos assinados são de inteira responsabilidade de seus

autores.

O(s) autor(es) deverão encaminhar uma autorização assinada para a

publicação das colaborações na Revista da Faculdade de Educação, confor-

me modelo em a seguir. Deverão, ainda, indicar sua titulação acadêmica, car-

go ou função que ocupa, instituição a que pertence e o endereço eletrôni-

co.

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Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

SOBRE OS AUTORES

José Manuel Ruiz Calleja - Doutor em Ciências Pedagógicas. Master

em Educação Superior. Professor e Pesquisador da Universidade de Pinar del

Río, Cuba. Professor Visitante do Departamento de Pedagogia no campus de

Cáceres da Universidade Estadual de Mato Grosso e Co-orientador do Minter

em Educação UNEMAT/UFRGS/CAPES.

Marcelo Luís Grassi Beck - Mestre em Educação. ; Doutorando em

Educação pela UNESP – Marília. e Professor do Depto de Pedagogia da

UNEMAT – Campus Universitário de Cáceres. Email: [email protected]

José Augusto da Silva Pontes Neto - Prof..Dr. do Depto de Psicologia

Evolutiva da Unesp de Assis; Professor do Programa de Pós-Graduação em

Educação da UNESP- Marília. Email: [email protected]

Josiane Magalhães - Doutora em Educação pela UNESP - Marília;. Pro-

fessora do Departamento de Pedagogia UNEMAT - Campus Universitário de

Cáceres. Email: [email protected]

Renata Lourenço - Graduada em Administração de Empresas. Email:

rlourenç[email protected]

Helena Faria Barros- Doutora em Educação pela Universidade Fede-

ral de Santa Maria –UFSM. Professora do Programa de Pós-Graduação –

Mestrado em Educação da UCDB. Email: [email protected]

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

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Profissionais da Educação

Dáugima Maria Santos Queiroz - Doutora em Educação pela UNESP

– Marília/SP Professora do Programa de Pós-Graduação – Mestrado em Edu-

cação da UCDB. Email: [email protected]

Clacy Zan - Doutora em Educação pela USP. Professora do Programa

de Pós-Graduação – Mestrado em Educação da UCDB. Emai l :

[email protected]

Bernardete A.Gatti – Pós-Graduação na Pensilvannia University (USA)

e na Université de Montreal (Canadá) coordenadora do Departamento de

Pesquisas Educacionais da Fundação Carlos Chagas e é docente do Progra-

ma de Pós-Graduação em Psicologia da Educação da PUC/SP. Email

[email protected]

Afonso Maria Pereira - Professor Assistente Doutor do Departamen-

to de Pedagogia - Faculdade de Educação da UNEMAT, Campus de Cáceres.

Email [email protected]

Graciela Constantino - Professora Ms. Lotada no Departamento de

Pedagogia e Coordenadora de Projeto de Pesquisa Institucional desenvolvi-

do na Escola de Aplicação LFA/UNEMAT.. Email: [email protected]

Lenita Maria Körbes Zonin - Professora do Departamento de Peda-

gogia da UNEMAT/Campus Universitário de Sinop e Coordenadora do Cur-

so de Pós-Graduação “Lato Sensu” em Educação Ambiental – Projeto

EDUCAMBI. Email:

Alceu Zoia - Mestre em Educação pela UFMT, Professor da Unemat no

Departamento de Pedagogia- Campus Universitário de Sinop, Coordenador

da Pós-Graduação stricto sensu. Email: [email protected]

243

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

Profissionais da Educação

Elias Januário - Doutor em Educação, Professor do Departamento de

Histór i a da UNEMAT e Coordenador do 3º Grau Indígena.

[email protected]

Benedito de Oliveira - Professor de Filosofia, Epistemologia da Edu-

cação e Organização da Educação Brasileira. Lotado no Departamento de

Pedagogia do Campus Universitário de Cáceres/MT - UNEMAT. Fez Curso

de Pós-graduação Lato Sensu em Metodologia do Ensino Superior, Direito

Educacional, Direito Público e Filosofia Clínica. É Mestre em Educação pela

UFRGS. Email: [email protected]

Maria Fátima Castilho – Mestre em Educação pela Universidade Fede-

ral do Rio Grande do Sul. Professora da disciplina Estágio Curricular Super-

visionado do Departamento de Pedagogia da Universidade do estado de Mato

Grosso, Campus Universitário de Sinop . Coordenadora do Projeto Pesquisa

Sentidos sobre ser professor: um recorte da formação pedagógica no PIQD.

Email: [email protected]

Catarina Maria Garcia Castro- Mestre em Educação, professora das

disciplinas Linguagem e Metodologia do Ensino e Fundamentos da Educa-

ção de Jovens e Adultos, lotada no Departamento de Pedagogia, Campus de

Cáceres/ UNEMAT. Email: [email protected]

Maria Izete de Oliveira – Doutora em Psicologia da Educação pela

PUC/SP. Professora da Faculdade de Educação da UNEMAT, campus de Cáceres,

leciona as disciplinas Fundamentos da Educação Infantil, Introdução à

Metodologia Cientifica e Pesquisa Educacional, Coordenadora da Revista da

Revista da Faculdade de Educação - Cáceres - MT - Ano II nº 2 / Jan-Jun 2004

244

Profissionais da Educação

Faculdade de Educação e Coordenadora de Avaliação e Acompanhamento

de Projetos de Extensão – PROEC. Email [email protected]

Odimar J. Peripolli - Mestre em Educação pela Universidade Federal

do Rio Grande do Sul. Professor da disciplina Pesquisa Educacional do De-

partamento de Pedagogia da Universidade do Estado de Mato Grosso do

Campus Universitário de Sinop. Email: [email protected]

Maricelia Padilha da Costa - Mestranda em Educação pela Universi-

dade Federal de Mato Grosso. E-mail [email protected]