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PROJETO DE PESQUISA QUALITATIVA SOBRE COMPORTAMENTO DE GRUPOS DE USUÁRIOS DE TRÂNSITO Empresa de Transporte e Trânsito de Belo Horizonte S.A. - BHTRANS João Carvalho Pereira Maurício da Silva Santos Ronaro de Andrade Ferreira Av. Engenheiro Carlos Goulart, 900 – Buritis Belo Horizonte – MG 30455-700 Telefone: (31) 3379-5625 Fax: (31) 3379-5660 E-mails: [email protected] , [email protected] , [email protected] Introdução Os acidentes de trânsito tem especial relevância entre as causas externas de morbi- mortalidade, não somente pelo alto custo econômico mas, sobretudo, pelo sofrimento e perda de qualidade de vida que, muitas vezes acarreta às vítimas, aos familiares e à sociedade como um todo. Em Belo Horizonte, dados de mortalidade mostram um aumento do número de óbitos por causas externas. Essas foram responsáveis por 6,4% de óbitos ocorridos no município, em 1996; e por 14,4%, principalmente em razão dos homicídios, em 2003. Paralelamente, observa-se a diminuição da importância dos acidentes de trânsito, que foram responsáveis por um significativo número de óbitos e seqüelas, como a invalidez (SMSA-BH, 2003), que trazem graves prejuízos ao indivíduo (familiares, financeiros e de locomoção) e também à sociedade (gastos hospitalares, diminuição da produção e custos previdenciários). Apesar da entrada em vigor do Código de Trânsito Brasileiro - CTB , que trouxe uma maior severidade às normas de trânsito, caracterizando inclusive algumas infrações como crime, não se observou um decréscimo significativo destas infrações. Em face a esta situação, a Empresa de Transportes e Trânsito de Belo Horizonte S. A. – BHTRANS, em conjunto com a Secretaria Municipal de Saúde – SMSA, decidiram fazer uma série de ações para diminuir o número e severidade dos acidentes de trânsito. Seguindo as diretrizes da OMS (2001), que sugerem a realização de pesquisas sobre as principais causas de lesões por acidentes de trânsito e focando uma análise mais detalhada do fator humano como componente do trânsito. Foi criada uma proposta de trabalho conjunto que gerou um convênio, financiado pelo Ministério da Saúde, cujo objetivo é dar subsídios para a diminuição do número e severidade dos acidentes de trânsito em Belo Horizonte. Os principais resultados esperados deste convênio serão novos dados quantitativos sobre os acidentes (SMSA & BHTRANS, 2005), novas informações sobre o comportamento dos usuários (esta pesquisa), um cruzamento de bancos de dados com unificação dos dados sobre acidentes de trânsito e a capacitação dos técnicos que trabalharam nestas pesquisas e de um grupo de educadores de trânsito. Uma destas ações é a presente pesquisa, um estudo estratégico que pretende subsidiar a formulação de políticas públicas com vistas na redução dos acidentes de trânsito e suas conseqüências, e definindo as prioridades de investimentos. Para isto, será estudado o comportamento de grupos de usuários de trânsito em Belo Horizonte através de metodologia qualitativa. Os grupos escolhidos foram pedestres, motociclistas e infratores contumazes, procurando conhecer como e por que estes grupos se envolvem em acidentes.

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PROJETO DE PESQUISA QUALITATIVA SOBRE COMPORTAMENTO DE GRUPOS DE USUÁRIOS DE TRÂNSITO

Empresa de Transporte e Trânsito de Belo Horizonte S.A. - BHTRANS João Carvalho Pereira Maurício da Silva Santos Ronaro de Andrade Ferreira Av. Engenheiro Carlos Goulart, 900 – Buritis Belo Horizonte – MG 30455-700 Telefone: (31) 3379-5625 Fax: (31) 3379-5660 E-mails: [email protected], [email protected], [email protected]

Introdução Os acidentes de trânsito tem especial relevância entre as causas externas de morbi-mortalidade, não somente pelo alto custo econômico mas, sobretudo, pelo sofrimento e perda de qualidade de vida que, muitas vezes acarreta às vítimas, aos familiares e à sociedade como um todo. Em Belo Horizonte, dados de mortalidade mostram um aumento do número de óbitos por causas externas. Essas foram responsáveis por 6,4% de óbitos ocorridos no município, em 1996; e por 14,4%, principalmente em razão dos homicídios, em 2003. Paralelamente, observa-se a diminuição da importância dos acidentes de trânsito, que foram responsáveis por um significativo número de óbitos e seqüelas, como a invalidez (SMSA-BH, 2003), que trazem graves prejuízos ao indivíduo (familiares, financeiros e de locomoção) e também à sociedade (gastos hospitalares, diminuição da produção e custos previdenciários). Apesar da entrada em vigor do Código de Trânsito Brasileiro - CTB , que trouxe uma maior severidade às normas de trânsito, caracterizando inclusive algumas infrações como crime, não se observou um decréscimo significativo destas infrações. Em face a esta situação, a Empresa de Transportes e Trânsito de Belo Horizonte S. A. – BHTRANS, em conjunto com a Secretaria Municipal de Saúde – SMSA, decidiram fazer uma série de ações para diminuir o número e severidade dos acidentes de trânsito. Seguindo as diretrizes da OMS (2001), que sugerem a realização de pesquisas sobre as principais causas de lesões por acidentes de trânsito e focando uma análise mais detalhada do fator humano como componente do trânsito. Foi criada uma proposta de trabalho conjunto que gerou um convênio, financiado pelo Ministério da Saúde, cujo objetivo é dar subsídios para a diminuição do número e severidade dos acidentes de trânsito em Belo Horizonte. Os principais resultados esperados deste convênio serão novos dados quantitativos sobre os acidentes (SMSA & BHTRANS, 2005), novas informações sobre o comportamento dos usuários (esta pesquisa), um cruzamento de bancos de dados com unificação dos dados sobre acidentes de trânsito e a capacitação dos técnicos que trabalharam nestas pesquisas e de um grupo de educadores de trânsito. Uma destas ações é a presente pesquisa, um estudo estratégico que pretende subsidiar a formulação de políticas públicas com vistas na redução dos acidentes de trânsito e suas conseqüências, e definindo as prioridades de investimentos. Para isto, será estudado o comportamento de grupos de usuários de trânsito em Belo Horizonte através de metodologia qualitativa. Os grupos escolhidos foram pedestres, motociclistas e infratores contumazes, procurando conhecer como e por que estes grupos se envolvem em acidentes.

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Resumo da Pesquisa Quantitativa Em 2003 foi realizada a Pesquisa de Acompanhamento de Vítimas de Acidentes de Trânsito em Belo Horizonte para subsidiar a formulação de políticas públicas com vistas na redução dos acidentes de trânsito e suas conseqüências, para a definição de prioridades de investimento de modo a torná-las mais equânimes e próximas das necessidades. Seu objetivo geral foi avaliar os acidentes de trânsito através dos atendimentos nos hospitais: João XXII, Odilon Behrens e Venda Nova, no período de 10 de novembro a 14 de dezembro de 2003 segundo as características dos acidentes, das vítimas envolvidas e da gravidade das lesões. Objetivos específicos:

- Comparar os resultados encontrados com os resultados da pesquisa de 1994, uma vez que nessa época não havia sido implantado o CTB.

- Analisar o perfil das vítimas e dos acidentes de trânsito ocorridos no período do estudo;

- Estudar os fatores associados aos diferentes graus de gravidade das lesões; - Estimar o sub-registro de vítimas fatais; - Georreferenciar os endereços de ocorrência dos acidentes e de residência das

vítimas; - Validar os dados referentes a ocorrência de acidentes de trânsito no Sistema de

Informação de Internação Hospitalar (SIH-SUS) e no Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM);

- Avaliar a importância do SAMU no atendimento hospitalar. A população foi constituída por indivíduos, vítimas de acidentes de trânsito ocorridos com qualquer tipo de veículo (transporte de passageiro ou carga), atendidos nos três hospitais. Foram consideradas as diversas categorias de usuários envolvidos nos acidentes: condutores e passageiros, inclusive pedestres e ciclistas, que tenham sido internados ou não. Os indivíduos participantes que não tiveram o caso encerrado até o dia 03 de dezembro de 2003 foram acompanhados para avaliação (alta, óbito, presença de seqüela) até 03 de março de 2004 e aqueles que evoluíram para o óbito no local do acidente foram também incluídos no estudo. A equipe de investigação foi constituída por técnicos da SMSA-BH, do Hospital João XXIII / FHEMIG, da BHTRANS e 43 estagiários (acadêmicos de medicina). E a coleta de dados foi realizada através do preenchimento de questionário específico e retirados dos prontuários hospitalares dos pacientes. As variáveis analisadas foram: 1. Socio-demográficas: sexo, idade, ocupação, escolaridade, residência. 2. Relacionadas às características do acidente: tipo de acidente, local físico da vítima no

momento do acidente, hora de ocorrência, equipamento de segurança utilizado, dentre outros.

3. Clínicas: classificação/gravidade das lesões do trauma, ocorrência de internação, presença de seqüelas.

Objeto da Pesquisa Qualitativa O objeto de estudo é o comportamento de grupos de usuários de trânsito em Belo Horizonte. Especificamente, os grupos mais vulneráveis em acidentes de trânsito, que conforme pesquisa realizada (SMSA & BHTRANS, 2005), são os pedestres e motociclistas; além dos infratores contumazes que são vítimas ou causadores potenciais de acidentes. As pessoas destes grupos usualmente adotam comportamento de risco e se envolvem em situações de risco.

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Objetivo Geral da Pesquisa Aprofundar o conhecimento sobre o comportamento de grupos identificados como mais vulneráveis aos acidentes de trânsito em Belo Horizonte (pedestres, motoboys e infratores contumazes) adquirindo uma maior compreensão sobre como e por que estes grupos se envolvem em acidentes, visando desenvolver subsídios para as ações de intervenção e educação no trânsito e promoção da saúde.

Objetivos Específicos Descrever como agem no trânsito; Analisar como explicam ou justificam suas ações; Identificar como cada grupo de usuários interpreta as situações no trânsito; Levantar indícios sobre como tomam suas decisões no trânsito; Identificar quais valores orientam o comportamento destes grupos de usuários e que

valores é preciso agregar mediante campanhas educativas para alterar sua conduta; Prever algumas ações necessárias para provocar a mudança dos hábitos

inadequados/indesejáveis dos usuários; Indicar diretrizes para o planejamento do treinamento das equipes de saúde da família

ou que desenvolvem ações de promoção da saúde e educadores;

Justificativas Os acidentes de trânsito têm gerado um grande número de mortes e lesões, trazendo

uma grande preocupação com estas perdas humanas, que têm um valor incalculável e impossível de ser recuperado;

A OMS descreveu os acidentes de trânsito como uma epidemia, devido ao número e gravidade das lesões geradas, e solicitou aos órgãos da administração pública a tomarem todas as providências possíveis para diminui-los; (OMS, 2001)

Os acidentes de trânsito têm gerado um alto custo para o país, principalmente para o sistema de saúde. Um melhor gerenciamento do trânsito pode reduzir muito o número e gravidade dos acidentes e, consequentemente, estes gastos; (IPEA, 2003)

A maioria dos acidentes tem como principal causa o comportamento dos condutores1 (e não as condições das vias ou dos veículos) o que demanda estudos mais detalhados sobre o fator humano no trânsito, tendo, inclusive surgidos diversos trabalhos nesta mesma linha realizados por outros órgãos de trânsito; (DINIZ, 2003)

A pesquisa quantitativa (SMSA & BHTRANS, 2005) indicou dados que necessitam ser aprofundados para serem melhor aplicados nas ações de planejamento, operação e educação de trânsito;

Metodologia: Definiu-se pela realização das seguintes etapas metodológicas: Pesquisa quantitativa realizada nas três principais portas de entrada para atendimento

ao trauma (pronto-socorros) em Belo Horizonte; Dinâmicas de grupo com agentes de trânsito de cada uma das sete gerências

operacionais da BHTRANS, além de uma dinâmica com funcionários de outras gerências que trabalham diretamente com os usuários, para ampliação do escopo de temas a serem analisados nesta pesquisa;

Reuniões com profissionais de outros órgãos (Detran-MG, DER-MG, Fundacentro) com o mesmo objetivo do item anterior;

1 A Delegacia Especializada de Acidente de Veículos – DEAV , em Belo Horizonte, descreveu que os motivos apontados como causa de acidentes de trânsito junto à que ocasionam lesão corporal são: embriaguez, alta velocidade, avanço de sinal de trânsito e desuso de cinto de segurança; todas estas causas são conseqüências do comportamento dos usuários.

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Discussão com o Centro Latino-Americano de Estudos da Violência e Saúde – CLAVES, para definição da metodologia de pesquisa;

Observação de campo, análise bibliográfica e de dados já registrados para se obter boas descrições das situações de risco em que estes usuários de trânsito se envolvem e identificar as melhores categorias de análise a serem utilizadas nas demais metodologias;

Realização de entrevistas individuais com alguns usuários que se envolveram em acidentes (vítimas ou não), que funcionarão como breves estudos de caso para avaliar como pedestres, motoristas e passageiros (ou seus parentes), reagiram e se modificaram devido às conseqüências do acidente;

Aplicação de questionários curtos, com questões abertas e fechadas para identificar as explicações e justificativas apresentadas pelos usuários, bem como a forma como interpretam o trânsito. Para evitar o distanciamento entre o discurso e a prática dos usuários, estaremos aplicando os questionários in loco ou seja em momentos em que o usuário está no trânsito ou muito próximo a ele, como em postos de gasolina, em delegacias de registro de acidentes, em pronto-socorros;

Para conclusão, reuniões com grupos focais, ou grupos de discussão, com cada um dos grupos de usuários pesquisados, aprofundando ou detalhando as informações obtidas mediante as outras metodologias.

Após analisar as características e riscos da pesquisa, optamos por fazer uma revisão metodológica da pesquisa após a conclusão de cada etapa e pela contratação de uma empresa para coordenação da pesquisa. Sendo que é importante que esta empresa inclua no estudo profissionais com experiência nas seguintes áreas: marketing, psicologia de grupos, antropologia, sociologia, pedagogia e transporte e trânsito.

A definição dos grupos: A Pesquisa de Acompanhamento de Vítimas de Acidentes de Trânsito observou que 23% das vítimas de trânsito são pedestres e 31% são motociclistas, o que os caracterizou como os usuários mais vulneráveis no trânsito2. Com relação aos motociclistas, a dissertação de Eugênio Paceli Diniz (2003) observou que os motociclistas profissionais, aqui designados como motoboys, adotam um tipo de comportamento muito mais arriscado que os demais motociclistas, devido à pressão externa recebida que exige cada vez mais agilidade e rapidez. Por isto optamos por estar pesquisando, neste momento, somente os motoboys. Supomos que muitos acidentes são provocados pelos motoristas menos susceptíveis às ações de educação e fiscalização de trânsito, que dirigem sem se importar com a legislação de trânsito e sem respeitar os outros usuários. Muitos destes motoristas devem estar dentro do grupo de 9% de motoristas que receberam mais de 2 autuações durante um ano (dado de 2003). Estes indivíduos também são o principal desafio para a atuação da BHTRANS, pois nossas ações de educação, sensibilização para a cidadania, informação sobre os procedimentos corretos, operação de trânsito e fiscalização têm tido pouco resultado sobre seu comportamento no trânsito. Sendo esta uma primeira pesquisa qualitativa sobre o tema, decidimos estudar um número reduzido de grupos de usuários, pensando em ampliá-lo numa pesquisa subseqüente. Desta forma, foram selecionados os dois grupos mais vulneráveis e o grupo menos sensível a nossas ações.

2 “Isso não se deve só ao fato de o pedestre ser o elemento mais frágil no trânsito, mas também ao fato do nosso ambiente de circulação – adaptado para o uso de automóvel- ser hostil aos papéis mais vulneráveis como o de pedestres e ciclistas” (VASCONCELLOS, 1998).

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Perfil dos grupos A princípio definimos alguns critérios para a composição dos grupos de pesquisa, que foram: Residir e transitar em Belo Horizonte há pelo menos 5 anos; Ter 18 anos de idade ou mais;

Na composição dos grupos de pesquisa é importante observar que haja uma distribuição das características abaixo seguindo o perfil da população de cada grupo: Sexo; Idade ou tempo de habilitação (para motoristas); Escolaridade; Estrato sócio-econômico; Ter se envolvido em acidente de trânsito grave, ou não; Ter filhos dependentes;

Perfil dos Motoboys Idade entre 18 e 30 anos; Sexo masculino; Estar associado, formal ou informalmente, a alguma empresa de entregas rápidas.

Perfil dos Pedestres Definiu-se três grupos: um com idades entre 18 e 30 anos e outro com idades entre 30 e 55 anos, que correspondem às faixas etárias com maiores valores absolutos de atropelamentos, mas que possuem hábitos e condições físicas, e um terceiro grupo, com idades superiores a 55 anos, que corresponde às faixas etárias com maiores valores relativos de atropelamentos (em comparação com outros tipos de acidentes), segundo a pesquisa de Acompanhamento de Vítimas de Acidentes de Trânsito. Cada grupo de pesquisa foi composto por pessoas com as mesmas características dos pedestres, vítimas de acidentes de trânsito, nos seguintes fatores: ambos os sexos e em proporções aproximadamente iguais; com graus de escolaridade variados, com predominância de pessoas com menos

tempo de escolarização; pertencentes às classes B, C, D e E; que transitem a pé na área urbana de Belo Horizonte pelo menos 3 dias por

semana por vários quarteirões; Este conjunto de pessoas representa comportamentos típicos de caminhamentos nos bairros, nos corredores de tráfego e na área central da cidade, com predominância dos dois últimos;

Perfil dos Infratores Contumazes A identificação dos Infratores Contumazes foi feita no bancos de dados de autuações da BHTRANS e no banco de dados de prontuários de condutores de Belo Horizonte, do Detran-MG. Este procedimento também direciona a pesquisa a condutores que trafeguem usualmente em nosso município. motoristas profissionais (motoboys e taxistas, sem incluir motoristas de caminhão

e de ônibus) e motoristas particulares de automóveis; integrantes em proporções conforme idade e sexo de acordo com os dados

obtidos do banco de dados de boletins de ocorrência de acidentes de trânsito, 89% do sexo masculino e 50% entre 18 e 29 anos e outros 50% entre 30 e 59 anos;

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Com relação ao tempo de habilitação, é interessante classificar os condutores nas seguintes segmentos: data de habilitação anterior a 1997 (data de implantação do CTB); entre 1998 e 2002 e posterior a 2003 (pouco tempo de habilitação);

Foram considerados infratores contumazes aqueles que tenham sido autuados diversas vezes no último ano e com mais de dois códigos de autuação diferentes. Estes critérios tentam especificar objetivamente condutores que adotam um estilo de direção agressivo, dando pouca importância às normas e pouco respeito aos demais usuários. Entretanto, sabemos que as notificações de autuação são emitidas sempre para o proprietário do veículo, mesmo quando o condutor seja outro, e isto pode nos direcionar a pessoas que não realizaram tais infrações. Portanto, é importante que seja realizada uma entrevista para avaliar a conduta do motorista para confirmar se ele adota procedimentos característicos de direção agressiva.

Fundamentação Teórica Esta proposta de trabalho segue as diretrizes da OMS (2001) que sugerem a realização de pesquisas sobre as principais causas de lesões por acidentes de trânsito e o desenvolvimento de novos conhecimentos baseados nas intervenções que levem em conta os usuários vulneráveis e os diferentes contextos locais. Para uma análise da circulação urbana, é importante partir do pressuposto de que, conforme Eduardo Vasconcellos (1998), os conflitos são inerentes a ela, sejam conflitos físicos, várias pessoas disputando o mesmo espaço, ou os conflitos políticos, os diferentes grupos de pessoas, conforme seu papel no trânsito, têm diferentes interesses e desejam que o trânsito possua diferentes características (prioridade para velocidade ou para segurança, facilidade de estacionamento ou de tráfego, trânsito local ou de passagem, etc). Sem desconsiderar a existência de fatores ligados ao projeto das vias, ao desenvolvimento dos veículos ou à regulamentação por lei e sua fiscalização, estamos propondo uma análise mais detalhada do fator humano como componente do trânsito, ou seja, do comportamento que cada usuário adota, respeitando ou desrespeitando a legislação e as orientações sobre a segurança sua e dos demais. Este parece ser o elemento menos estudado de todo este conjunto.

Comportamento Apesar de que o comportamento de cada indivíduo, em última análise seja responsabilidade estritamente pessoal, é preciso também levar em consideração o contexto externo que estimula o comportamento dos indivíduos. (DINIZ, 2003) Pressa - Grande parte dos atos inseguros e infrações de trânsito parecem ocorrer devido à “escassez de tempo” que tem invadido a mentalidade moderna, que incentiva cada pessoa a tentar reduzir o tempo gasto em atividades não-produtivas, como transportar-se de um local a outro. Maus hábitos - Outro fator que também está associado a este comportamento indevido são os maus hábitos adquiridos pelo usuário previamente ao seu treinamento ou à alteração da legislação, ou ainda seguindo os exemplos de outros usuários. Automatismo - Os veículos tendem a ser como uma extensão de nossos membros, e, assim como ao pensar “desejo caminhar para frente”, nossas pernas realizam todas as ações necessárias para isto sem que tomemos conhecimento de quais são, o mesmo acontece com os veículos, e passamos a conduzi-los “automaticamente” sem pensar quais são as ações necessárias para tal. Com isto, muitas vezes não nos recordamos exatamente “o quê” fizemos no trânsito ou quais fatores avaliamos para decidir por aquela ação. Discurso - É facilmente perceptível que o discurso que as pessoas têm sobre o comportamento no trânsito, no momento que ela não está no trânsito, tende a aproximar-se

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mais daquilo que é considerado politicamente correto ou socialmente aceito, do que à sua prática real. Exemplos disto são os comentários sobre uso do cinto de segurança ou excesso de velocidade. Este comportamento se associa à dificuldade de reconhecimento do próprio erro observada por Adriana Costa, pois dos 40 entrevistados, 30 haviam se envolvidos em acidentes e todos afirmaram categoricamente que a culpa não fora deles. Motivação - A oportunidade e a recompensa podem levar ao comportamento infrator, sendo que a recompensa também pode ser uma vantagem pessoal que o indivíduo adquire no momento que burla as leis, como por exemplo ganhar tempo ou demonstrar-se ágil para outra pessoa (Blake e Davis,1964, in Costa, 2004).

O Espaço Público e Privado no Trânsito Segundo Alessandra Olivato, as entrevistas feitas para seu estudo qualitativo sobre o comportamento dos usuários de trânsito em São Paulo levaram a três conclusões principais: não existe uma noção clara do espaço público no trânsito, com as pessoas tratando a coisa pública como privada; expressa-se um individualismo provavelmente derivado de que a luta individual pela sobrevivência, no mundo atual, contribui para dificultar a compreensão do que é do outro; e, justificando a ausência de um sentimento de responsabilidade pelo coletivo, não há uma idéia generalizada da direção defensiva cuja premissa é prever o que acontecerá no trânsito. O espaço urbano é definido como público ou privado conforme o uso que se faz do mesmo. Respectivamente, se a atividade desenvolvida é uma atividade social de intercâmbio humano, de encontro com o outro ou uma atividade particular, da intimidade do indivíduo. Espaços públicos ou semi-públicos podem se tornar privados, quando ocorre a apropriação por um grupo de pessoas que define ou dita as regras de uso conforme seus interesses. Neste sentido os motoristas tendem a se apropriar das vias3, vendo o pedestre muitas vezes como um obstáculo, já que o trânsito é um local de passagem, que é preciso transpor o mais rápido possível.

Fatores Indutores de Comportamento O comportamento de cada um no trânsito está relacionado a uma infinidade de fatores, mas os mais importantes, aparentemente são: Sexo: os homens se arriscam mais do que as mulheres; Tempo de habilitação: segundo os dados consultados, o envolvimento dos condutores

com acidentes tende a diminuir com o aumento do tempo de habilitação, sendo que o grupo com maior incidência em acidentes se situa entre os 6 meses e os 2 anos de habilitação. Para os condutores, este fator parece ter mais preponderância que a idade na conformação do comportamento no trânsito;

Idade: o número de vítimas de acidentes varia muito segundo a faixa etária, havendo uma forte predominância nas idades entre 16 e 40 anos, que corresponde ao período em que os pedestres começam a se envolver com um trânsito mais intenso (avenidas e centro da cidade), à habilitação e direção com pouca experiência, e ao uso intenso de motocicletas (que, muitas vezes, é o primeiro veículo que os indivíduos conseguem comprar) e principalmente como instrumento de trabalho (motoboys).

Escolaridade e Estrato Sócio-econômico: com relação a estes itens, não foram observados indícios de serem fatores determinantes para a construção do comportamento dos indivíduos no trânsito, mas é interessante que os grupos pesquisados tenham representantes de todas as faixas, para que nosso estudo não exclua ou ignore nenhum grupo importante da sociedade;

3 Isto pode se dever ao fato dele ter um maior poder aquisitivo e dar maiores contribuições ao estado (impostos) e dele estar em um pseudo espaço privado portátil, seu carro.

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Experiência de Acidentes: O fato de uma pessoa, ou algum familiar próximo, ter se envolvido em algum acidente com vítima e com alto grau de gravidade das lesões, parece afetar fortemente a percepção sobre o trânsito, levando estas pessoas a considerarem o trânsito como um “local” de alto risco, que deve ser evitado ou onde devem ser adotados procedimentos extras de segurança. Devido ao “trauma” vivido, estas pessoas costumam estar muito mais tensos enquanto estão no trânsito.

O Código de Trânsito Brasileiro O CTB trouxe uma maior severidade às normas de trânsito, inclusive caracterizando algumas infrações como crime, mas, segundo Adriana Costa (2004), o maior impacto adviria da certeza da punição, que apenas 37,5% dos pesquisados afirmaram tê-la.

“Então porque ainda não houve um decréscimo considerável no número de crimes de trânsito? O que posso dizer é que, pelo estudo realizado... ...se os condutores desobedecem as regras é porque não as conhecem, ou são incapazes de seguí-las, ou não as cumpre inadvertidamente, ou ainda porque simplesmente escolhem desobedecê-las, de acordo com a oportunidade e a recompensa da ocasião. Algumas evidências indicam que alguns motoristas estão impossibilitados de obedecer às leis porque não as entendem, ou seja, as conhecem, mas não as compreendem, e porque não têm nenhuma referência a medidas objetivas, até mesmo se elas exercem um certo controle sobre o seu comportamento.” (Costa, 2004)

A entrada em vigor do Código de Trânsito Brasileiro – CTB – causou modificações no comportamento dos condutores, inclusive porque houve uma maior informação sobre as normas de trânsito e um certo grau de internalização destas normas. Mas o resultado ainda é inferior ao esperado.

Motoboys A pesquisa quantitativa apresentou como grupo mais vulnerável os motociclistas com 21 a 30 anos, do sexo masculino, cujo principal motivo de deslocamento estava relacionado ao trabalho. Entretanto os motociclistas profissionais recebem um estímulo muito maior para desenvolver estratégias de diminuição das impedâncias no trânsito, destacando-se como um grupo à parte entre os motociclistas, com maior exposição ao risco e acidentes. Baseado nas observações de Eugênio Diniz (2003), consideramos mais importante focar nosso estudo nos motociclistas profissionais, pois estes passam às vezes mais de 12 horas por dia no trânsito, sofrendo pressões para aumentar sua agilidade dentro de sua empresa, durante o trajeto, por rádio ou celular, ao chegar ao cliente, que sempre quer mais, e ao retornar à sua empresa contratante, que concorre no mercado com outras empresas de entrega. A rapidez nas entregas é o requisito fundamental na concorrência deste ramo de atividade, seja ela entre os funcionários de uma empresa ou entre diferentes empresas. Nos últimos anos têm-se observado uma expansão do número de motociclistas profissionais, que vem sendo acompanhada também da degradação das condições de trabalho e da discriminação por parte da sociedade. Isto tem levado a diversos estudos sobre os determinantes de riscos de acidentes de trabalho vivenciados por esta categoria profissional. O resultado destes estudos indicam que no transito, alguns incrementam os riscos de acidentes, despertando na sociedade um sentimento estigmatizante; outros; ao contrário; garantem para si maior segurança, contribuindo para a redução dos riscos de acidente. Entretanto, a primeira estratégia normalmente gera melhores resultados a curto prazo, levando os motoboys a uma precarização das condições de trabalho. Por exemplo: “a maioria dos motociclistas andam com o IPVA e seguro irregular” e alguns motociclistas confessam que cometem infrações de transito “para economizar caminho ... Evito fazer um

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deslocamento maior, economizo gasolina, ganho muito mais no fim do mês e economizo tempo. Por isso que eu sou rápido”. (DINIZ, 2003)

Resultados Este trabalho vem sendo desenvolvido deste 2003, e ainda não está concluído. Apresentamos acima alguns resultados da Pesquisa Quantitativa, das dinâmicas com os agentes de trânsito e profissionais de outros órgãos consultados. Porém, até o momento, não podemos publicar os resultados da observação de campo, entrevistas individuais, questionários e dos grupos focais.

Bibliografia COSTA, Adriana M. Controle Social e o Código de Trânsito Brasileiro: um estudo

sobre o crime de lesão corporal culposa na direção de veículo automotor. 2004. 100 f. Dissertação (Mestrado em Sociologia) – Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, UFMG, Belo Horizonte.

DINIZ, Eugênio Paceli H. Entre as Exigências de Tempo e os Constrangimentos do Espaço: as condições acidentogênicas e as estratégias de regulação dos motociclístas profissionais. 2003. 123 f. Dissertação (Mestrado em Engenharia de Produção) – Departamento de Engenharia de Produção, UFMG, Belo Horizonte.

IPEA. Impactos Sociais e Econômicos dos Acidentes de Trânsito nas Aglomerações Urbanas: síntese da pesquisa. Brasília, IPEA, 2003.

ORGANIZAÇÂO MUNDIAL DE SAÚDE. Estrategia Quinquenal de la OMS para la Prevención de los Traumatismos por Accidentes de Tránsito - 2001. Disponível na Internet. http://www.who.int/world-health-day/2004/infomaterials/es em 22 nov. 2004.

SECRETARIA MUNICIPAL DE SAÚDE DE BELO HORIZONTE e BHTRANS. Saúde em Trânsito: Pesquisa de Acompanhamento de Vítimas de Acidentes de Trânsito em Belo Horizonte. Belo Horizonte, SMSA, 2005. 30 p.