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Projeto de Reabilitação e Reforço da Ponte da Barrinha
Helena Szortika Quadros1, Douglas F de Lemos
2
1 Finger & Sommer Engenharia e Consultoria/ [email protected] 2 Finger & Sommer Engenharia e Consultoria/ [email protected]
Resumo
A Ponte da Barrinha se localiza no centro da cidade de Ponte Nova, estado de Minas Gerais –
Brasil, sobre o Rio Piranga. É uma ponte histórica, construída durante o ano de 1929, com
84,2m de comprimento e 6,14m de largura. Ao longo das últimas décadas, a estrutura sofreu
sérios danos devido a frequentes inundações do Rio Piranga. A seção de vazão não suporta a
quantidade de água drenada, e a ponte tem trabalhado afogada algumas vezes por ano. Esse
fato causou o recalque de uma fundação e, por esta razão, ocorreu o aparecimento de outros
sérios problemas na estrutura. Como consequência, no ano de 2013, a ponte foi fechada para o
tráfego e circulação de pessoas devido à possibilidade de colapso da estrutura. Esse artigo
apresenta a metodologia usada para inspeção da ponte, os dados obtidos e a lista de problemas
encontrados. Apresenta, também, a solução adotada no projeto de recuperação e reforço da
ponte, incluindo o reforço da fundação. São apresentados comentários sobre os critérios e
justificativas técnicas que guiaram o trabalho. Como resultado, apresentam-se desenhos e
fotos que ilustram o problema e a solução adotada em cada um dos elementos estruturais.
Palavras-chave
Estruturas; Reforço; Pontes; Colapso de ponte; Reabilitação
Ponte da Barrinha
Descrição da obra
A Ponte da Barrinha (figura 1) está localizada na ligação das avenidas Arthur Bernardes e
Antônio Brant Ribeiro, no município Ponte Nova, estado de Minas Gerais. A ponte da
Barrinha foi construída no ano de 1929, em concreto armado.
Figura 1. Vista lateral da obra, face montante.
Devido a alterações à montante do rio, pelo menos uma vez ao ano a estrutura da ponte
trabalha em regime afogado. A adição da carga do empuxo de água na superestrutura,
originalmente não dimensionada, acabou gerando um recalque de 14cm em alguns dos
pilares.
Quando as estruturas não possuem capacidade de escoar o rio que transpõem, o ideal é a
construção de uma nova estrutura, dimensionada ao regime hídrico solicitante. No entanto,
devido às condicionantes do local (vias de acesso estão no mesmo nível da obra de arte), isso
não foi possível, tendo assim que se optar por um reforço da estrutura existente.
Motivo da vistoria
Na última enchente do rio Piranga, no final de 2011 e início de 2012 (Figura 3), a estrutura da
ponte sofreu dano maior, não detectado na época. Com a manutenção do fluxo de trânsito
durante o ano de 2012 – inclusive com o aumento do tráfego em virtude de obras na Av.
Arthur Bernardes, incluindo veículos de carga – a situação se agravou. No final do ano, foi
solicitado pela defesa civil e pelo corpo de bombeiros laudo de avaliação.
A partir de janeiro de 2013, a ponte passou a ser monitorada pelo serviço de topografia da
Associação dos Municípios do Vale do Piranga (Amapi). Paralelamente, foi aberto pelo
Ministério Público inquérito para saber se a ponte oferecia risco para os pedestres. No
primeiro resultado do monitoramento, foi detectado, em período de 15 dias, uma cessão de 14
centímetros no segundo pilar de sustentação da ponte.
Figura 2. Vista da Ponte da Barrinha.
Figura 3. Vista da Ponte da Barrinha
trabalhando afogada.
De forma a evitar o tráfego de pedestres na Ponte devido à possibilidade de colapso da
estrutura em caso de nova cheia, a prefeitura instalou portões nas entradas da obra de arte, que
interditaram seu uso de janeiro de 2013 a outubro de 2014 (Figura 3).
Vistoria
Procedimento para vistoria
Para realização da vistoria, devido à ausência do projeto estrutural original, a equipe de engenheiros realizou uma vistoria cadastral para posteriormente realizar um levantamento das patologias.
Vistoria cadastral Nesta etapa da vistoria, os engenheiros, com auxílio de ferramentas de medição, produziram croqui que registravam todas as medidas da estrutura (figura 4). Para o levantamento da superestrutura foi necessário o auxílio de equipamentos de escalada; para o levantamento da mesoestrutura, de botes aquáticos.
Figura 4. Seção no apoio.
Levantamento das Patologias Para o levantamento e cadastramento das patologias, utilizaram-se os mesmos equipamentos do item 2.2, além de registros visuais, vídeos, esclerometrias e ensaios. As principais patologias encontradas estão descritas a seguir.As peças da superestrutura e mesoestrutura foram numeradas considerando-se como referência o sentido Centro-Rodoviária, por exemplo: Apoio 1: apoio mais próximo do Centro; Pilar P1: pilar localizado no apoio 1; Vigas longarinas: numeradas a partir da viga localizada mais à jusante; Tramo I: primeiro tramo a partir da extremidade Centro. Superestrutura A obra apresentava deformações visíveis do tabuleiro (figura 5), pela observância de suas linhas principais, longitudinais, superiores e inferiores. O tabuleiro, no seu tramo de travessia, apresentava flechas devido ao recalque no pilar P3. As transversinas apresentavam fissuração devido à exposição de armaduras e desagregação de concreto (figura 6). As longarinas apresentavam exposição de armaduras que estavam corroídas (figura 7). Na face inferior da laje em balanço havia armadura exposta corroída (figura 8). Na superestrutura, poucas eflorescências foram encontradas, localizadas em pontos esparsos da laje do tabuleiro.
Figura 5. Desnível do tabuleiro devido ao
recalque no pilar P3.
Figura 6. Armadura exposta nas
transversinas.
Figura 7. Armadura exposta nas vigas.
Figura 8. Fissura na laje próxima ao P4 no
vão P3-P4. Mesoestrutura A mesoestrutura apresentava o recalque no pilar P3, o que gerou fissuras nas lajes adjacentes. Os pilares não apresentavam indícios de insuficiência estrutural ou problemas aparentes. Infraestrutura Recalque da fundação do pilar P3 devido à erosão do fundo da mesma (figura 9). Necessidade de estabilização através de reforço das fundações. Os demais apoios não apresentavam recalque ou indícios de problemas. No entanto, devido à cota de cheia máxima do rio, procedeu-se com o projeto de reforço das fundações para que as mesmas pudessem resistir com segurança aos esforços oriundos do empuxo da água na superestrutura.
. Figura 9: Vista à montante da ponte ressaltando o recalque no pilar P3.
Falhas de desempenho funcionais
Os danos apresentados pela pavimentação asfáltica nas aproximações eram poucos, indicando
a estabilidade dos terraplenos. Os taludes sob a projeção da obra eram protegidos
superficialmente em pedra argamassada; porém, no sentido Rodoviária-Centro, na face à
montante, havia um pequeno desabamento de terra. Não foram identificadas drenagens dos
taludes laterais aos encontros. A Pista não apesentava sinalização horizontal e sua
pavimentação é em paralelepípedo em bom estado. Nos passeios laterais, alguns guarda-
corpos estavam quebrados e com armadura exposta (figura 10). A drenagem da pista estava
com alguns drenos obstruído. Não foram encontradas pingadeiras (figura 11), o que resulta
em armaduras expostas em função dos escorrimentos de águas pluviais nas faces inferior e
lateral da laje em balanço (figura 12). Juntas de Dilatação Transversais do Tabuleiro foram
encontradas nos pilares P3 e P5, porém estas estavam obstruídas e não apresentavam
continuidade no passeio (figura 13). O gabarito fluvial (características hidráulicas) é
insuficiente, pois na época das chuvas a obra pode vir a encontrar-se afogada, conforme
histórico recente de cheias.
Figura 10. Guarda-corpos quebrados e
fissurados.
Figura 11. Ausência de pingadeira na face
inferior da laje em balanço.
Figura 12. Estrutura manchada na
superfície em contato com a queda de água dos drenos.
Figura 13. Junta com continuidade não
respeitada nos guarda-corpos.
Diagnóstico da vistoria
Condições de Exposição da Superfície de Concreto da Superestrutura: A superfície em
concreto da superestrutura foi concebida, aparente, sem revestimento; a obra está localizada
num ambiente que pode ser classificado como cidade, com nível de agressividade moderada,
com risco pequeno de deterioração da estrutura, podendo-se classificar a agressividade
ambiental como classe II, segundo a NBR 6118 / 2007.
Por outro lado, obras-de-arte especiais rodoviárias, em concreto armado, caracterizam-se por
apresentar reduzidas espessuras de concreto de cobrimento, uma vez que a engenharia de
construções da época não havia ainda atentado para o problema de durabilidade das
estruturas, sendo muito comum a concretagem de elementos estruturais sem pastilhas,
distanciadores, etc, obtendo-se peças com os estribos praticamente aflorando à superfície; esta
obra não fugiu à regra. As superfícies de concreto de vigas longarinas recebem águas pluviais,
gerando lixiviações e corrosão de armaduras. Ainda há a presença de fissuras na laje próxima
ao P2, no vão P2-P3, e no P4, no vão P3-P4. Essa fissura é devida ao recalque no pilar P3.
Concluiu-se, portanto, a necessidade de que todas as superfícies de concreto aparente recebam
revestimento protetor a fim de aumentar sua vida útil e evitar danos maiores em médio prazo.
Degradação da mesoestrutura e infraestrutura:
A mesoestrutura não apresenta indícios de dano ou insuficiência estrutural. Não foram
detectadas fissuras ou rachaduras, e acredita-se que estes sejam os elementos estruturais da
ponte em melhores condições.
A infraestrutura apresenta graves problemas. O mais evidente é o recalque do pilar P3,
condição que deixa a obra sob grave instabilidade e necessária intervenção. Contudo, este não
é o único problema:
Conforme registro de cheias do rio nos últimos 3 anos, verificou-se que a ponte tem
trabalhado afogada, ou seja, o nível do rio sobe além do nível do fundo das vigas. Quando a
água do rio atinge as vigas, laje e o guarda-corpo da ponte, ela acaba transmitindo às
fundações da ponte esforços que não foram previstos no projeto original. Estes esforços são
chamados de empuxo da água na superestrutura. Por este motivo, concluiu-se que deveria se
proceder ao reforço de todas as fundações da ponte e não somente do pilar P3, atualmente
recalcado. Esta condição foi uma medida paliativa, uma vez que as normas técnicas e comitês
de estudos de pontes e grandes estruturas recomendam que o nível do fundo das vigas seja
superior ao nível previsto para a cheia máxima em um período de retorno de 100 anos (TR =
100 anos).
Reforço estrutural
Meso e Infraestrutura
A mesoestrutura da estrutura existente é formada por pilares de pedra argamassada. Foi
proposto o reforço destes pilares para que ocorra a migração de carregamentos da
superestrutura para as novas fundações.
A infraestrutura existente é formada por sapatas apoiadas na rocha. Foi proposto o reforço das
fundações existentes para garantir a estabilidade e segurança da obra. O objetivo do reforço
foi de restaurar a segurança das fundações frente às solicitações atuais, principalmente no que
se refere ao regime de cheias do rio e às forças devido ao empuxo d’água impostas à estrutura.
As fundações existentes continuarão funcionando, mas sua parcela de contribuição será
restrita apenas ao peso próprio da superestrutura.
O projeto de reforço desta obra de arte foi idealizado visando que a estrutura continuasse
cumprindo a mesma função de antes de ser interditada, ou seja, após o reforço das fundações,
a capacidade de suportar ações decorrentes do tráfego rodoviário é conforme o trem-tipo
Classe 12. Para a nova estrutura adotou-se o uso de concreto fck = 25MPa, aço CA-50 e barras
Dywidag.
Fundações
Para a execução do reforço, adotamos o uso de estacas tipo raiz. O dimensionamento das
estacas raiz foi realizado através do método proposto pelo CEB, dimensionamento de pilares
submetidos à flexão composta.
A verificação da capacidade de carga geotécnica foi executada através das teorias propostas
por TERZAGHI (1943) e MEYERHOF (1951), além do observado por FLEMING et al.
(1992).
Premissas de cálculo
Para o cálculo da estrutura, os pilares P1 e P7 foram considerados como apoios diretos devido
a suas características geométricas. Estes apoios são muros contínuos e, devido à grande área e
inércia dos pilares, esta hipótese de cálculo pode ser admitida.
Figura 14.Esquema de cálculo da Meso e Infraestrutura.
Nos pilares P3 e P5 existem juntas físicas na superestrutura. Contudo, devido à ligação rígida
das vigas com os pilares, o cálculo dos esforços longitudinais foi executado considerando a
obra contínua. Esse critério é adequado, uma vez que a obra encontra-se confinada contra os
acessos, cabendo a estes a função de resistir aos esforços causados pela dilatação e retração da
obra. O dimensionamento dos pilares P2, P3, P4, P5 e P6 foi conduzido pelos esforços e
geometria do pilar P3, visto que este é o pior caso.
A fundação existente (sapata direta), por já estar em carga e suportando o peso próprio da
ponte, foi considerada como segurança adicional à estrutura. Todo o peso da superestrutura,
reforço da mesoestrutura, reforço da infraestrutura, carga móvel, esforços longitudinais e
esforços transversais foram dimensionados para serem resistidos pelas estacas.
Além dos critérios citados anteriormente, foi dimensionada a execução de protensão do bloco
de fundação para garantir a transmissão dos esforços para as estacas, medida essa que visou
colocar em carga as estacas frente as fundações existentes. Também foi projetada a execução
a protensão do pilar para aumentar a aderência do concreto novo com o pilar existente,
garantindo assim a transmissão de esforços da estrutura existente para a estrutura nova.
Figura 15.Vista transversal do reforço dos
pilares
Figura 16.Vista longitudinal do reforço
dos pilares
Figura 17. Protensão dos pilares com barras Dywidag.
Elementos complementares
Além do reforço dos pilares e fundações, outras medidas foram adotadas visando o aumento
da vida útil da estrutura,. São elas: reparos superficiais localizados com argamassa de reparo,
tratamento superficial de concreto aparente, tratamento superficial do concreto (estético),
injeção de fissuras com resina à base de epóxi, recuperação de taludes revestidos com pedra,
implantação de pingadeiras, metodologia para substituição dos tubos de pvc (drenagem da
pista, drenos - buzinotes) e recuperação dos guarda-corpos.
Execução do reforço
Seguem algumas fotos da fase de construção. Inicialmente foi executada a cravação das
estacas, execução do bloco e do pilar. Após a execução da primeira etapa, foram realizados os
serviços especificados nos elementos complementares.
Figura 18.Reforço dos blocos
Figura 19.Reforço dos blocos
Figura 20.Reforço dos pilares
Figura 21.Recuperação de seção das vigas
Figura 22.Vista geral da obra
Figura 23.Reinauguração da obra
Conclusões
O presente artigo apresentou um caso de reforço e recuperação de uma ponte histórica, na
cidade de Ponte Nova/MG e as condicionantes que nortearam o desenvolvimento do projeto.
A partir das premissas adotadas e da experiência dos profissionais envolvidos foi possível
garantir a segurança da estrutura prolongando a vida útil da mesma.
A ausência de material técnico orientativo para o desenvolvimento de projetos de recuperação
de Obras de Arte Especiais que sejam específicos e que tragam exemplos com clara utilização
foi a principal motivação para a publicação deste trabalho.
Os autores acreditam que somente com a ampla divulgação do que vem sendo feito por
projetistas e construtores é que a engenharia nacional crescerá e se desenvolverá nesta
importante área do conhecimento. Como futuras oportunidades de pesquisa registramos aqui a
necessidade de aprofundarmos o conhecimento na determinação da capacidade de carga de
fundações existentes, um dos principais problemas encontrados em Pontes em todo o Brasil.
Referências
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