Promessas de sustentabilidade

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    Sistemas Agroflorestais de Várzea e de Terra Firme naCalha do Rio Madeira,Sul do Amazonas

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    Sistemas Agroflorestaisde Várzea e de

    Terra Firme na Calhado Rio Madeira,

    Sul do Amazonas

    Humaitá/AM – 2013

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    Publicação realizada no âmbito do Projeto Fronteiras Florestais 

    Elaboração de texto: Aurélio Diaz Herraiz e Patrício Neto Teles Ribeiro

    Revisão técnica: Philippe Sablayrolles e Alvori Cristo dos Santos

    Edição: Tereza Moreira 

    Projeto gráfico: Luiz Daré

    Diagramação: Renato Palet

    Fotos: Acervo IPA e IEB

    Esta publicação foi produzida graças ao apoio do povo americano por meio da Agência dos Estados Uni-dos para o Desenvolvimento Internacional (USAID). O conteúdo é de responsabilidade do Instituto Pac-to Amazônico e não necessariamente reflete as opiniões da USAID ou do Governo dos Estados Unidos.

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     A migo agricultor, essa publicação foi pensada especialmente para você. Iremos tratar de um temamuito importante para a agricultura familiar sustentável. Abordaremos conceitos, técnicas eexperiências que adquirimos ao longo de quatro anos junto a pequenos grupos comunitárioscom os quais experimentamos consórcios arbóreos nos denominados sistemas agroforestais

    (SAFs).

    Essas experiências foram desenvolvidas em comunidades da calha do rio Madeira e da rodovia BR-230,Km 45, no município de Humaitá, sul do Estado do Amazonas. Seis comunidades participaram do pro- jeto Fronteiras Florestais nessa região: Paraisinho, Flexal, Santa Rosa, Pacoval, Lago do Antônio e Maici--mirim.

    Em especial, queremos agradecer aos moradores da comunidade do São Francisco, do Lago do Antônio,onde a vontade superou todas as dificuldades na hora de implantar um experimento que consorciassepresente, passado e futuro.

    Durante esse período realizamos seis experimentos com base na agricultura familiar, que foram desenvol- vidos aproveitando áreas que as famílias participantes já haviam aberto para a prática de agricultura con- vencional. Os experimentos foram realizados com base em atividades já tradicionalmente reconhecidascomo geradoras de renda na região e escolhidas pelos próprios comunitários, como açaí e cacau.

    Por meio de consórcios entre essas e outras culturas, trabalhamos com os seguintes sistemas consorciados:açaí e cacau; mandioca, açaí e cacau; cacau e banana. Nossa intenção é criar alternativas para as áreas sejamaproveitadas ao máximo, implementando outras culturas e espécies florestais.

    O objetivo é que as famílias agricultoras possam ter segurança alimentar, diversificando seu cardápio com vários produtos, colhidos em diferentes épocas do ano e que o excedente da produção possa ser comercia-lizado, melhorando sua renda com produtos vindos dos SAFs.

     Vale mencionar também algumas instituições parceiras, que vêm construindo alternativas junto à socie-dade local e regional, em busca do desenvolvimento sustentável. Em especial, citamos o Instituto ChicoMendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), o Núcleo Universitário de Pesquisa e Extensão em Agroecologia e Sociologia (NUPEAS), da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), e o Instituto deDesenvolvimento Agropecuário e Florestal Sustentável do Estado do Amazonas (IDAM).

     Agradecimentos

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    Sumário

    APRESENTAÇÃO .............................................................................9INTRODUÇÃO ..............................................................................11

    O que são sistemas agroforestais? ......................................... 11

    SAF: um conhecimento ancestral na Amazônia ........................ 12

    SAFs como opção para a população rural amazônica ............. 13

    Metodologia adotada no projeto Fronteiras Florestais ............ 14

    SUCESSÃO OU REGENERAÇÃO VEGETATIVA DOS SAFS .............16Alguns tipos de sistemas agroforestais ....................................18

    Diferentes modalidades de implantação nas parcelas de SAFs .. 19

    ANÁLISE DA ECONOMIA DE UM SISTEMA AGROFLORESTAL .... 22Elementos a serem considerados para a escolha do SAF .......... 24

    IMPORTÂNCIA DA SITUAÇÃO FUNDIÁRIA .................................. 25ESCOLHA DA ÁREA E DAS ESPÉCIES PARA IMPLANTAR SAFs ...... 28

    Escolha das espécies para compor o SAF ................................29

    Exemplo de arranjos .............................................................. 31

    AVALIAÇÃO: VANTAGENS E DESVANTAGENS DOS SAFs ............ 33EXEMPLO DE CONSORCIAMENTO: LAGO DO ANTÔNIO ........... 35

    Dados dos custos de implantação ...........................................37

    Lições aprendidas, resultados e conclusões .............................38

    CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................... 39REFERÊNCIAS ............................................................................. 40

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     Apresentação O projeto Fronteiras Florestais   foi cria-do em 2009 com o intuito de for-talecer as entidades locais frente aoavanço do desmatamento em duas

    regiões da Amazônia: no sul do Estado do Amazo-nas, na calha do rio Madeira, mais especificamen-te no município de Humaitá, e no sul do Pará, nomunicípio de São Félix do Xingu.

    O projeto soma-se a outras iniciativas que desde

    os anos 1990 têm proposto discutir e defendermodelos sustentáveis, economicamente rentáveise socioambientalmente consolidados pelas e paraas populações locais. Para realizá-lo, formou-seum consórcio de instituições, composto pelo Ins-tituto Internacional de Educação do Brasil (IEB),pelo Instituto do Homem e do Meio Ambiente da Amazônia (IMAZON), pelo Groupe de Rechercheet d’ Échanges Technologiques   (GRET), pelo Ins-tituto Pacto Amazônico (IPA) e pela Associaçãopara o Desenvolvimento da Agricultura Familiar

    no Alto Xingu (ADAFAX), com o apoio financei-ro da Comunidade Europeia.

    Durante quatro anos, essas entidades trabalharamcom o objetivo de “promover a inclusão socioam-biental das populações em zonas de ocupação da Amazônia por meio da gestão territorial e da ado-ção de práticas de manejo sustentável dos recursosflorestais, visando à redução do ritmo de devasta-ção em duas regiões do Arco do Desmatamentona Amazônia brasileira”.

     A presente publicação representa a experiência de-senvolvida em Humaitá com o desenvolvimentode sistemas agroflorestais. Este município situa-sena fronteira do desmatamento, no ponto ondese encontram dois modelos, duas culturas e duasconcepções de desenvolvimento. De um lado, omodelo do agroextrativismo, defendido pelos po- vos da floresta. De outro, o modelo do agronegó-cio, com ênfase na pecuária extensiva, na extraçãode madeira e na monocultura de grãos.

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    Quando começamos a trabalhar nas temáticasamplamente difundidas nas comunidades da re-gião do sul do Amazonas, nos deparamos com afalta de informações e dados que nos ajudassema avançar com as comunidades. Existe um vaziode informações que respondam às principais pro-blemáticas que envolvem o açaí na região.

    Partindo do contexto regional, esta publicaçãopretende subsidiar técnicos extensionistas e pro-

    dutores sobre o manejo e a comercialização deprodutos nativos como o açaí e o cacau, por meiode sua combinação em sistemas agroflorestais. Asinformações apresentadas constituem um apa-nhado das experiências vividas durante os quatro

    anos de projeto com os grupos experimentado-res, parceiros e instituições envolvidas. Não setrata de material embasado em dados estatísticosou técnico-científicos. Mas de informações ex-traídas da prática dos produtores e dos aprendi-zados dos técnicos que os acompanharam.

    Tais práticas estão consolidando o modelo agro-extrativista como economicamente rentável,ambientalmente correto e culturalmente acei-

    to pelas populações da região. Esperamos quesirvam como base para discutir e dialogar comoutros estudos e informações técnicas produzi-dos em âmbito acadêmico e dos institutos depesquisa.

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    O que são sistemasagroflorestais?

    Também conhecidos como SAFs, esses sistemas são formas de uso e manejo do solo em que ár- vores e arbustos são utilizados em associação comculturas semiperenes, com cultivos anuais e/oucom a criação de animais, em uma mesma área,de maneira simultânea ou em sequência temporal.Ou seja, um sistema agroflorestal não é mais do

    que uma imitação de como a floresta se forma e serecupera de maneira natural, ao longo do tempo,quando é desmatada.

     A diferença está no modo como os seres huma-nos conseguem guiar este processo, implantandoas espécies que lhes interessam. Assim, conseguemregenerar e proteger a fertilidade da terra para ob-ter benefícios não só econômicos, mas tambémsociais e ambientais. Um sistema agroflorestalconsegue diversificar, em um mesmo espaço, a

    produção de bens e, portanto, gerar retorno eco-nômico para o agricultor.

    Para ser considerada um SAF, a associação entreplantas deve possuir, pelo menos, uma espécie ar-bórea ou arbustiva. As espécies arbóreas, além defornecerem produtos úteis para o agricultor, comofrutas, sementes, látex, óleos, resinas e forragens,desempenham importante papel na reciclagem denutrientes do solo. Portanto, uma associação deplantas, como mandioca, feijão, maracujá e aba-caxi, não é considerado um sistema  agroflorestal,

    mas simplesmente um consórcio.

    Os sistemas agroflorestais significam melhor apro- veitamento do solo, diversificação do número de es-pécies cultivadas, as quais produzem em diferentesépocas do ano, criando um leque de possibilidades.Isso faz com que as famílias agricultoras tenhamsempre a possibilidade de se alimentar e, ao mesmotempo, comercializar os excedentes, gerando renda.

    Introdução

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    Os SAFs desempenham outras importantes fun-ções: melhoram a qualidade e a fertilidade do solomantendo e controlando sua umidade; reduzemos problemas da erosão no solo evitando a lixi- viação e a perda de nutrientes; contribuem aindapara a manutenção da biodiversidade de animais,que passam a frequentar esses locais em busca dealimentos e abrigos.

    Os agricultores que desenvolvem esse tipo de

    sistemas sustentáveis também estão contribuin-do para a geração de serviços ambientais. Afinal,deixam de desmatar, fixam carbono atmosf érico,contribuem com o ciclo das águas e trazem ani-mais silvestres para essas áreas, auxiliando na re-composição da biodiversidade.

    SAF: um conhecimento an-cestral na Amazônia

     Alguns estudiosos acreditam que os SAFs tenhamsido desenvolvidos na Amazônia por comunidadesindígenas, caboclas e ribeirinhas, principalmentepara fins de subsistência, como parte da sua inte-

    ração com a floresta. Em muitas regiões, a compo-sição de grandes extensões de mata foi modifica-da pelas populações nativas ao longo dos séculos. Vários povos indígenas possuíam – e alguns delesainda possuem – técnicas que lhes permitiam, porexemplo, transformar florestas primárias em cas-tanhais silvestres ou converter os latossolos   tropi-cais nas famosas terras pretas de índio, de grandefertilidade. Palmeiras úteis, como tucumã, açaí,pupunha, bacaba e babaçu, cujas concentrações

    ocorrem com frequência em florestas secundárias,podem ter sido formadas e até domesticadas coma intervenção desses povos.

    O saber tradicional aplicado em muitos dessessistemas de produção nunca foi suficientementedescrito ou estudado e corre o risco de se perder,apagando importantes conhecimentos sobre aforma de interação dos seres humanos nos am-bientes florestais. Hoje, o desenvolvimento dossistemas agroflorestais, mais comumente chama-

    dos de SAFs, resgata o extrativismo das comuni-dades tradicionais e acrescenta novas tecnologias,criando o conceito de agricultura sustentável.

    Outra das iniciativas genuínas, desafiadoras einovadoras para a Amazônia é o manejo florestalcomunitário. Esta prática representa a possibili-dade de manejo da floresta tanto para produtosmadeireiros como não madeireiros medianteadensamentos, podas, controle da luminosidadee consorciamento de espécies.

    Referências e experiências que utilizam SAFs emanejo florestal comunitário devem ser forta-lecidas e potencializadas mediante a criação deredes sociais com as comunidades amazônicas.Isso se mostra ainda mais relevante diante docrescimento de populações que migram para aregião trazendo formas de manejo do solo quenão se aplicam à região, causando danos am-bientais.

    SAFs prestam grandes serviços ao ambiente

    e contribuem com a geração de renda.

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    SAFs como opção para apopulação rural amazônica

    O uso de SAFs em Humaitá e nas várzeas e terrafirme do rio Madeira segue a trilha do manejo dasmatas, partindo dos conhecimentos tradicionaisdo extrativismo mantido pelas populações e co-munidades.

    Na comunidade de São Francisco, a leste do Lago

    do Antônio (figura a seguir), entre os meses denovembro e março, as famílias percorrem diaria-mente os castanhais e açaizais por distâncias deaté 10 km para a coleta desses frutos. Adentramas margens dos lagos, igarapés e rios, para depoisdistanciarem-se da água, na terra firme, em suasáreas de extrativismo. O dia de trabalho tem iní-cio às 4:00 horas da manhã e termina às 17:00horas, antes de escurecer. As famílias, em grupo detrês a quanto pessoas, retornam com até 12 lataspor dia de castanha e açaí, de duas a três vezes por

    semana. A área de cada grupo de família é definidapor mais de um caminho em uma área de 15 km2.

     

    Experiências participativas, como o adensamentodo açaí, o manejo do cacau nativo na várzea, oconsorciamento de espécies agrícolas e florestais,a estruturação de viveiros comunitários de mudas,estão criando referências locais e regionais de pro-dução baseadas no diálogo social vindo das comu-nidades da região. Tais práticas representam umaopção que se contrapõe às crescentes formas dedesmatamento da região, especialmente nos assen-tamentos de colonos recém-chegados à Amazônia,

    que se utilizam das técnicas de corte e queima.

    Os seis grupos comunitários do projeto FronteirasFlorestais  instalaram áreas de experimentação comcultivos de cacau e de açaí. Tais cultivos ocorre-ram tanto de forma individual como em sistemasagroflorestais, ao se introduzir espécies florestaismesclando os conhecimentos do extrativismo tra-dicional com o manejo do consórcio de espéciesagrícolas e florestais.

    Nessas áreas são consorciadas macaxeira, banana,

    cacau, andiroba, cedro, açaí e pupunha. Talvez osistema mais interessante na terra firme seja a com-binação da macaxeira com o cacau e o açaí, com aprimeira cultura protegendo as demais na estiagemdo verão amazônico durante o primeiro ano deplantio. No segundo ano, com a saída da mandioca(ou outro tipo de pioneira), o açaí e o cacau já esta-belecidos podem aceitar outras espécies.

    Do mesmo modo, o sistema mais seguido na vár-zea é a combinação entre banana, cacau, açaí e

    cedro, sendo a bananeira a espécie pioneira, quepode aceitar outras culturas de ciclo curto, como omilho, a melancia, o feijão ou o jerimum. Depois,o cacau e o açaí entram no sistema como espéciessecundárias, as quais recebem o sombreamento dabananeira. Em seguida, o cedro é introduzido nosistema,  combinando-se com a andiroba, ambascomo espécies florestais de ciclo longo.

    Na atualidade existem algumas experiências de re-

     Áreas de extrativismo e implantaçãode SAFs em Humaitá.

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    ferência, como os plantios de SAFs que utilizamgrande número de elementos arbóreos e são condu-zidos por produtores e agricultores familiares vincu-lados a movimentos ou cooperativas. Destacam-seiniciativas como a da Cooperativa Agrícola Mistade Tomé Açu (CAMTA), que se desenvolve emTomé Açu, no Pará, e a do Projeto RECA (Reflo-restamento Econômico Consorciado e Adensado),existente em Nova Califórnia, Rondônia. Trata-sede projetos que, que partindo da observação na

    natureza e do seu funcionamento, visam à rentabi-lidade e à sustentabilidade socioeconômica dos pe-quenos agricultores familiares amazônicos. Tornamos SAFs uma base produtiva de grande importânciapara a região, que proporciona grandes vantagensem comparação à monocultura convencional.

     As características amazônicas desta agricultura fa-zem com que seja importante formular políticaspúblicas sustentáveis e específicas para a região.Isso representa um desafio para as instituições

    tanto governamentais como não governamentais,assim como para a sociedade como um todo. Taispolíticas devem convidar e inserir em seu desenhoos povos da floresta na condição de protagonistas,fortalecendo os conhecimentos tradicionais acu-mulados ao longo da história dos povos na região.

    Metodologia adotada noprojeto Fronteiras Florestais

    O trabalho desenvolvido com as comunidades du-rante a realização do projeto Fronteiras Florestais  atendeu ao que pode ser chamado de AssistênciaTécnica e Extensão Rural (ATER) participativa.Tem como base metodologias cuja finalidade é fa- vorecer o aprendizado e a difusão de novas formasde cultivo e manejo do açaí para e com as própriascomunidades. Nesse sentido, foram as famílias egrupos de produtores que, na condição de prota-

    gonistas, discutiram, planejaram e avaliaram todasas decisões tomadas.

    Com base numa metodologia participativa co-nhecida como campesino a campesino ocorreramencontros, seminários, intercâmbios e visitas como objetivo de fortalecer as experiências e os conhe-cimentos construídos. O papel das instituições deapoio envolvidas na execução do projeto não foi ode tomar o espaço dos serviços da ATER, mas sim

    de potencializar novas metodologias que ajudem adifundir os conhecimentos já existentes sobre cul-tivo e manejo de açaí.

    Equipe de agricultores experimentadores em visia outras comunidades para conhecer práticasdiferenciadas de manejo e cultivo de açaí.

    Dia de campo para manejo doconsórcio de mandioca com açaí

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    Os trabalhos tiveram várias frentes ou estratégias. A primeira delas foi a de fomentar, junto aos pro-dutores, a ideia de experimentar em grupo, semprepartindo da realidade local e de suas potencialida-des. Isso envolveu o estímulo a que os produtoresaprendessem a se planejar, levantar gastos e dividir

    tarefas em grupo. Monitorando e avaliando os tra-balhos desenvolvidos em grupo, tornou-se possível,partindo do aprendizado obtido, replicá-lo indivi-dualmente e difundi-lo com outros produtores ecomunidades vizinhas. O esquema abaixo refleteessa linha de trabalho adotado pelo projeto.

     Já a segunda estratégia baseou-se em atividades, taiscomo visitas a produtores de referência e participa-ção em seminários. Foram realizados também inter-câmbios em locais com trajetórias muito mais avan-

    çadas, mas que possuíam pontos em comum com asexperiências vivenciadas pelos produtores vinculadosao projeto. Buscou-se criar uma rede para potenciali-zar e divulgar as temáticas escolhidas, assim como osresultados parciais obtidos nos experimentos.

    Isso ainda está sendo construído graças a uma redelocal junto a comunidades vizinhas que, convida-das a participar, começam a se interessar pelos ex-perimentos. Parceiros como o IDAM e a UFAM

    participaram das atividades, fortalecendo as discus-sões, que se estendem também a outros produtorescomo forma de enriquecer os experimentos.

     Ao mesclarem o extrativismo manejado com prá-ticas de SAFs, as comunidades experimentadoraspodem ser capazes de gerar orientações importan-tes na perspectiva de ampliar as formas de pro-dução em áreas de floresta estabelecida. Implan-tando áreas coletivas para geração de referências,essas famílias inovam em termos de construção doconhecimento, compondo uma rede de registro,acompanhamento e sistematização de experiên-cias relevantes.

    Síntese da metodologia adotada no projeto Fronteiras Florestais

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    Sucessão ouregeneraçãovegetativados SAFs

     A  sucessão vegetativa é a sequência dodesenvolvimento natural dos seres vivos dentro de um determinadoecossistema. No ambiente de flores-

    ta, por exemplo, uma espécie prepara o terrenopara que outra possa se desenvolver e assim pordiante. Isso ocorre até que o ambiente possaatingir o chamado clímax, estabelecendo-se oequilíbrio, que se dá por meio das intera çõesdinâmicas entre as espécies.

    Em uma sucessão ecológica, diversos tipos deplantas vão se sucedendo no tempo e no espaço,ocupando o lugar das anteriores. Essas plantas or-ganizam-se, umas em relação às outras, ocupandodiferentes estratos na floresta, ou seja, adquirem variados níveis de altura e de acesso à luminosi-dade.

    Nos sistemas em regeneração, as primeiras es-pécies a surgir são as chamadas pioneiras. Oscapins e ervas tomam conta da área desmatada,

    cobrindo o chão e evitando a perda de água edos solos. Criam as condições para a chegadadas espécies secundárias, que são arbustos e ár- vores de médio e longo ciclos, mais exigentesem termos de necessidade de água e nutrien-tes, bem como em qualidade solo. Essas plan-tas crescem, começando a concorrer pela luz.Suas raízes deixam os solos mais permeáveis,fixando mais nutrientes e funcionando comoreservatórios de água. Quando as condições setornam propícias, entram as espécies primárias,

    bem mais exigentes em termos de condiçõespara sobreviver, que sobem ainda mais alto, dis-putando a luminosidade com as demais espéciesno sistema.

    Essa dinâmica faz com que os sistemas naturais vivam em constante renovação, o que aumentaa sua produtividade e biodiversidade. Quedasnaturais de árvores são muito frequentes mesmo

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    em áreas florestais pequenas, com em um sistemaagroflorestal, o que proporciona uma constanterenovação dos ciclos de crescimento e a sucessãodas espécies.

    O esquema a seguir mostra as diversas espéciesutilizadas comercialmente, que podem ser utiliza-das na formação de SAFs, e a ordem de sua en-trada no sistema.

    Sucessão de espécies de uso comercial utilizadas em SAFs

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     Alguns tipos de sistemasagroflorestais

    Os SAFs combinam elementos agrícolas, complantas de ciclo curto, médio e longo, com es-pécies florestais madeireiras e não madeireiras, eainda com animais domésticos. De acordo comos componentes utilizados na associação, os SAFspodem ser agrupados em três categorias básicas:

     Sistemas agrossilviculturais,• Sistemas silvipastoris,

    • Sistemas agrossilvipastoris.

    Sistemas agrossilviculturais

    Caracterizam-se pela combinação de árvores e ar-bustos agrícolas e/ou florestais com espécies semi-perenes agrícolas e/ou com culturas anuais. Na re-gião amazônica, os sistemas agrossilviculturais sãoutilizados em capoeiras enriquecidas, cultivos emfaixas, combinações de cultivos industriais, poma-

    res caseiros e barreiras quebra vento. Um exemplode cultivo comum na região poderia ser a com-binação de milho/mandioca/cacau/açaí/andiroba/castanha em uma mesma área.

    Sistemas Silvipastoris

    Combinam árvores ou arbustos florestais (ma-deireiros e não madeireiros) com pastagense criação de animais. Exemplos desse tipo desistema podem ser árvores plantadas no pasto,banco de proteína e cultivos industriais compastagens e animais. Na região amazônica, essesistema pode ser observado em pastos que re-únem gramíneas com leguminosas, como ingá

    e paliteira, palmeiras como babaçu, e árvoresde grande porte, como andiroba e castanheira.Essa combinação forma um sistema que fornecenutrientes e sombra para o gado e ao mesmotempo aumenta o retorno econômico dos pro-dutores com outros produtos.

    Sistemas Agrossilvipastoris

    Caracterizam-se pela criação ou manejo de ani-mais em sistemas em que espécies agrícolas secombinam com as florestais. É a modalidademais completa e complexa de um sistema agro-florestal. Exemplos desse tipo de SAF são ospomares caseiros com animais, faixas de espé-cies lenhosas de múltiplo uso, entomofloresta

    Pastagem comum, sobretudo na Amazônia, causa estresse no gadodevido à falta de sombra.

    Espécies agrícolas combinam-se narecuperação de áreas degradadas.

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    (plantas associadas com a criação de abelhas,sejam mediante apicultura ou meliponicultura,para produção de mel), aquafloresta (árvores aoredor de barragem para alimentação de peixes),e parcelas com árvores de multiuso. Na regiãoamazônica são comuns as experiências de cul-tivos que reúnem milho, banana, cacau, casta-nha, suínos e bovinos.

    Diferentes modalidades deimplantação nas parcelasde SAFs

     Árvores dispersas de forma irregularEsse tipo de sistema normalmente é praticado empequenas propriedades rurais que utilizam corte equeima em suas atividades agrícolas. Consiste namanutenção das espécies florestais de valor econô-mico, que se regeneram na área utilizada (comono fundo de quintal, por exemplo). O plantio dasespécies agrícolas é efetuado entre as florestais,com o auxílio de plantadeiras manuais.

     Árvores Intercaladas

    Trata-se de uma variação do sistema anterior. Nes-te caso, as plantas introduzidas no sistema são dis-postas de forma regular e em maior número, uma vez que, deliberadamente, a espécie, o espaçamen-

    to e as técnicas de poda e desbaste são indicados eadotados pelo produtor.

    Gado criado em meio às pastagensconsorciadas com palmeiras.

    Sistema em regeneração, utilizando-seplantas de valor comercial.

    Cacau intercalado com outras espéciesagrícolas e florestais.

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     Árvores para sombreamento inicial e permanente

     Alguns cultivos, como os de cacau, café e cupu-açu, requerem nível adequado de sombra na faseinicial de crescimento. Nesse caso, tem-se dadoprioridade ao plantio de espécies agrícolas ouflorestais pioneiras, por serem de crescimento rá-pido, com ciclo de vida curto. Banana, mandio-ca, milho ou mamão são normalmente utilizadaspara isso. Algumas leguminosas lenhosas, como

    os diferentes tipos de ingá, a paliteira e a gliricí-dia, também são úteis, pois fixam nitrogênio econtribuem com a ciclagem de nutrientes para osdemais elementos que formam o sistema.

     Árvores em cultivo sequencialEsse sistema tem como objetivo a rápida restau-ração do solo, favorecendo a sua fertilidade, bemcomo a produção de madeira, lenha e postes.Normalmente as espécies leguminosas iniciamtais sistemas para fixar nitrogênio e assim fornecernutrientes às demais espécies florestais que serãoplantadas posteriormente.

    Plantio em linhas

    Consiste no uso de espécies agrícolas e/ou flores-tais distanciadas com espaçamentos em linhas,em função das espécies. Assim, espécies florestais,como a andiroba, deverão ter espaçamentos de 10

    m, umas das outras, e nas agrícolas, como o cacau,de 3 metros entre fileiras por 4 m entre linhas.

    Cultivo em linha

    Pupunha ou Açaí/mandioca

    Pupunha Pupunha

    Mandioca Mandioca

    Pupunha Pupunha

    Combinação de cacau com açaí.

    Paricá compõe o extrato maisalto do sistema.

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    Cultivos em aleias

    Mais conhecidos como alley croppig , esses SAFsrepresentam uma variação do plantio em linha.Consistem na mistura de árvores de pequenoporte ou arbustos, podados frequentemente. Oobjetivo principal é a produção de nutrientes pormeio do mulch, ou biomassa, proveniente das po-das periódicas, que podem variar de duas a quatropor ano, dependendo da região e da espécie usada.

     

     Árvores com tutores vivos

     Algumas culturas agrícolas, como tomate, pe-pino e pimenta-do-reino, necessitam de tutoresindividuais. Esses tutores podem ser elementos

    que interagem com o sistema, produzindo al-gum tipo de benefício ou produto. Algumas le-guminosas cumprem esse papel e fornecem bio-massa e nutrientes, como a gliricídia. Espéciesmadeireiras, como o ipê, podem ser aproveita-das como tutores para as pioneiras e culturasagrícolas de ciclo curto ou médio.

    Cultivo em aleias

    Leguminosas Leguminosas Leguminosas

    Leguminosas Leguminosas Leguminosas

    Leguminosas Leguminosas Leguminosas

    Leguminosas Leguminosas Leguminosas

    Culturas anuais

    Culturas anuais

     Algumas espécies são usadas comotutores vivos de plantas trepadeiras.

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    22

     Análise daeconomia deum sistema

    agroflorestal

    Um sistema agroflorestal não é uma es-colha simples. O consorciamento de várias espécies traz benefícios para oprodutor que muitas vezes não po-

    dem ser quantificados ou valorados. Ao mesmotempo, introduzem ferramentas e fatores que atéagora não eram avaliados em profundidade, comoo espaço, o tempo, a mão de obra e os recursosdisponíveis para investir. Apesar de suas vanta-gens, existem pontos a ter em conta na hora de

    implantar SAFs, que podem exigir maior reflexão.

     Analisando superficialmente a combinação e suasconsequências dos seguintes fatores do seguintesistema: milho/mandioca/cacau/açaí nativo/andi-roba/castanha.

     

    Mão de obra diminui com o tempo,enquanto a renda da produção das

    espécies consorciadas aumenta.

    1º ano:

    Implantaçãode todas as

    culturas

    Produção ou

    compra das mudas.

    Abertura e limpeza da

    área. Gasto elevado

    com mão de obra.

    Colheita das

    espécies de ciclo curto.

    Retorno econômico

     do milho.

    2º ano:

    Manutenção ecolheita

    Limpeza e

    manutenção da

    área. Gasto

    mediano com

    mão de obra.

    Colheita das

    espécies de

    ciclo curto. Retorno

    econômico damandioca.

    3º ano em

    diante: Entradaem produção

    do cacau

    Limpeza e

    manutenção da

    área. Gasto

    pequeno com

    mão de obra.

    Colheita da

    espécie de ciclo

    médio/longo.

    Retorno econômicodo cacau.

    4º ano em

    diante: Entradaem produção

    do açaí 

    Limpeza e

    manutenção da área.

    Gasto

    pequeno com

    mão de obra.

    Colheita das espé-

    cies de ciclo médio/ 

    longo. Retorno

    econômico do cacau e açaí .

    10º ano em

    diante: Entradaem produção dasespécies florestais

    Limpeza e

    manutenção.

    Gasto pequeno

    com mão

    de obra.

    Colheita das espécies

    de ciclo médio/longo.

    Retorno econômico

    da andiroba e dacastanha.

    Esquema de implantação de áreacom espécies diversificadas

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    Na implantação da área, os gastos iniciais com amão de obra são elevados, pois as mudas devemser produzidas (ou compradas) e implantadas. Otempo e os gastos também são maiores. Com opassar do tempo, porém, o retorno econômico dasespécies começa a aparecer, além de diminuíremos gastos com mão de obra, principalmente paraas limpezas de manutenção e com a colheita daprodução. A conversão das áreas já abertas ajudaa otimizar o trabalho e os recursos usados para a

    abertura dos roçados e obter renda no mesmo lo-cal de uma forma contínua no tempo.

     Já no sistema convencional de agricultura de cortee queima, as mesmas operações se repetem todosos anos, exigindo mais tempo, área disponível, re-cursos e trabalho. As ações são sempre as mesmas:derrubada, queima, abertura da área, plantio, co-lheita. No ano seguinte, é necessário abandonar oterreno usado originalmente e realizar as mesmasoperações em outro. Após cinco anos, o antigo ci-

    clo recomeça na mesma área.

    Comparando os dois sistemas, em termos de gas-tos e recursos necessários:

    1º ano:Implantaçãoda cultura

    2º ano:Repetição do

    sistema. Implantaçãode nova área

    Limpeza e manuten-

    ção da área plantada.

    Abertura de nova

    área. Gasto elevadocom mão de obra.

    Colheita da espécie

    de ciclo curto.

    Retorno econômico

    da mandioca.

    3º ano: Repetiçãodo sistema

    Implantaçãode nova área

    Limpeza e manuten-

    ção da área plantada.

    Abertura de nova

    área. Gasto elevadocom mão de obra.

    Colheita da espécie

    de ciclo curto.

    Retorno econômico

    da mandioca.

    4º ano: Repetiçãodo sistema.

    Implantação denova área

    Limpeza e manuten-

    ção da área plantada.

    Abertura de nova

    área. Gasto elevadocom mão de obra.

    Colheita da espécie

    de ciclo curto.

    Retorno econômico

    da mandioca.

    5º ano: Volta àárea inicial, ciclo

    recomeça namesma área

    Limpeza e manuten-

    ção da área plantada.

    Abertura de nova

    área. Gasto elevadocom mão de obra.

    Colheita da espécie

    de ciclo curto.

    Retorno econômico

    da mandioca.

    Implantação do

    sistema.

    Abertura e limpeza

    da área.Gasto

    inicial elevado com

    mão de obra.

    Sistema de produção

     tradicional de corte

    e queima.

    Sistema de produção em

    consórcio, combinando espécies

    agrícolas e florestais.

    E l e v a d o  i nv e s t i me nt o  e m mã o  d e  o b r a  na  a b e r t u r a  d o  r o ç a d o .

    F o r t e  d e p e nd ê nc i a  d e  d i s p o ni b i l i d a d e  d e  t e r r a  p a r a  c u l t i v a r .

    R e t o r no  e c o nô mi c o  a nu a l  e  d e  c u r t o  p r a z o . F o r t e  d e p e nd ê nc i a  d e  u m ú ni c o  p r o d u t o . 

    E l e v a d o  i nv e s t i me nt o  e m mã o  d e  o b r a  naa b e r t u r a  d o  r o ç a d o  e  no  p l a nt i o  d a s  mu d a s

    Ind e p e nd ê nc i a  e m r e l a ç ã o  a  t e r  no v a s  á r e a s  p a r a  a b r i r  no v o s  r o ç a d o s .

    Ma i o r  nú me r o  d e  e s p é c i e s  e nv o l v i d a s  , ma i s  b e ne f i c i o s  p a r a  o  p r o d u t o r .

    Inv e s t i me nt o  d e  l o ngo  p r a z o  , r e t o r no  e c o nô mi c o  t o d o s  o s  a no s . D i v e r s i f i c a ç a o  no s  c u l t i v o s  e  na s  f o nt e s  d e  r e nd a .

    Esquema de implantação de monocultivo pelo sistema de corte e queima

    Comparação entre sistema convencional e SA

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    Elementos a serem consi-derados para a escolha doSAF

     Alguns aspectos devem ser considerados para aimplantação dos sistemas agroflorestais. Deve-separtir de um diagnóstico da comunidade, do localou da região onde serão implementados para:

    • Analisar e entender a situação existente (os

    problemas, ameaças, potencialidades e opor-tunidades);

    • Identificar as mudanças possí veis e desejáveisem curto, médio e longo prazo;

    • Definir os instrumentos ao alcance (políti-cos, econômicos, de infraestrutura, etc.);

    • Definir a combinação dos componentes dosistema, de maneira a interagirem positiva-mente, evitando concorrer em termos demão de obra;

    • Realizar um planejamento considerandocurto, médio e longo prazo.

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     A o longo da história de ocupação da Amazônia existem contínuas dispu-tas entre os denominados povos dafloresta e os que se dizem donos de

    grandes áreas. Nessa região são comuns os con-flitos devido ao uso da terra e dos recursos na-turais. Nos últimos anos, as disputas constantespelo controle de lagos e castanhais estão prestesa se repetir em torno da exploração dos açaizais.

     Várias comunidades situadas na área de influ-ência da FLONA de Humaitá e nas proximida-des de açaizais nativos, como Paraizinho, Para-íso Grande, Flexal e Buiuçu, começam a sentiressa pressão. Isso ocorre tanto no âmbito dascomunidades que disputam os recursos entre si,como com as comunidades vizinhas ou até comos próprios moradores da cidade de Humaitá.

     Antes de se iniciar o plantio de um sistemaagroflorestal deve-se, portanto, estudar e carac-terizar os direitos atuais das famílias e comu-

    nidades sobre o uso da área. Taisdireitos estão condicionados a di-ferentes realidades na região ama-zônica e podem evoluir de formadiferente conforme o projeto dacomunidade.

    Para ordenar e evitar possíveisconflitos e disputas se faz neces-sário ficar atento à titulação fun-diária (ou concessão de uso), que

    está sob responsabilidade do ges-tor público da área considerada.Depois disso é importante realizaro mapeamento do uso do recur-so, relacionando e normatizando,mesmo que de maneira informal,os direitos das famílias e das co-munidades.

    Importância dasituação fundiária

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    O esquema a seguir mostra as diferentes categoriasfundiárias e os órgãos responsáveis:

    Pode-se diferenciar as formas de acesso de acordocom o tipo de área e os direitos de uso que estapermite, considerando-se a instituição a que sedeve recorrer:

    • Assentamento Federal da Reforma Agrária,seja Projeto de Assentamento Agroextrati- vista (PAE), Assentamento Federal (PA) ouProjeto de Desenvolvimento Sustentável

    (PDS): área de competência do InstitutoNacional de Colonização e Reforma Agrária(INCRA).

    • Unidade de Conservação Federal de Uso Sus-tentável, como Reserva de DesenvolvimentoSustentável (RDS), Reserva Extrativista (RESEX) e Floresta Nacional (FLONA): área decompetência do Instituto Chico Mendes de

    Conservação da Biodiversidade (ICMBio).

    • Unidade de Conservação Estadual de UsoSustentável como Floresta Estadual (FLO-TA): área de competência do governo doEstado (SDS/CEUC). Em Humaitá, essasáreas não existem.

    • Área de várzea de rios federais ou estaduaissituadas fora de unidades de conservação eassentamentos: competência da Secretaria de

    Patrimônio da União (SPU) ou do Institutode Terras do Estado do Amazonas (ITEAM).

    • Área de Terra Firme (glebas federais ou esta-duais) fora de UCs e assentamentos: compe-tência do INCRA e ITEAM.

    •  Área pertencente a terra indígena: compe-tência da Fundação Nacional do Índio (FU-NAI).

    Durante a execução do projeto Fronteiras Flo-restais, vários experimentos foram realizados emrealidades fundiárias distintas. Os trabalhos rea-lizados nas comunidades do Paraizinho e do Fle-xal, por exemplo, ocorreram em áreas de várzea. Apesar de se encontrarem no entorno da Flonade Humaitá, uma unidade de conservação federalsob competência do ICMBio, é a SPU que tem jurisdição sobre a área.

     Ainda que exista legislação clara regulamentandoo uso dos solo em várzeas de rios federais, este ór-gão não tem se pronunciado sobre direito de uso

    nem emitido documento fundiário válido. Dessaforma, as comunidades vivem em grande insegu-rança, sujeitas às vontades daqueles que se dizemdonos de terras da União.

    Por esse motivo, muitas vezes moradores e comu-nitários resistem à ideia de investir em iniciativasmais duradouras, pois isso representa riscos deperder tanto as benfeitorias conquistadas quantoo direito de continuarem a viver na região.

    Direitogarantido deposse e uso

    da terra

    Glebas da União e

    Assentamentos: União

    e Estado: INCRA

    e ITEAM.

     Terra de várzea

    de rios federais e

     estaduais. União e

    Estado: SPU

    e ITEAM.

     Terras Indígenas:

    Governo Federal:

    FUNAI.

    Unidades de

    Conservação Federais e

    Estaduais. ICMBio (fede-

    ral) e CEUC (estadual).

     Titulação definitiva

    pelo Estado ou

    Governo Federal.

    Categorias fundiáriase órgãos responsáveis

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    do pelo INCRA, que possui competência sobre a área.

    O diagrama a seguir mostra a importância e as vanta-gens da regularização fundiária no fortalecimento deiniciativas produtivas, na segurança econômica dasfamílias e no desenvolvimento local sustentável.

    Outras áreas, como a da comunidade do São Fran-cisco, no Lago do Antônio, possuem titulação regularem nome dos próprios moradores. Na comunidadedo Itá, que se situa dentro do PAE São Joaquim, o di-reito de uso e posse de seus moradores está resguarda-

    É importante observar e dialogar com a comunidadede moradores sobre o direito de uso informal, tradi-cional das parcelas de terra onde se pretende implan-tar o SAF. Ocorre que a tal implantação constitui um

    benefício e pode fundamentar uma reivindicação dedireito sobre a terra. Neste caso, convém verificar se apotencial reivindicação não colide com direitos ante-riormente estabelecidos, sob pena de gerar conflitos

    Presença dos orgãosfundiários e de gestão.

    Regularização fundiária.INCRA/ITEAM/SPU/

    ICMBio/CEUC/FUNAI

    Direito de posse e usodos recursos pelas

    populações tradicionais e futuras gerações.

    Segurança para investir emlongo prazo por parte dascomunidades. Construçãode benfeitorias e plantios.

    Maior acesso a créditose benefícios federais.Maior circulação dos

    recursos no município.

    Maior diversificação

    nas fontes de renda,fortalecendo a economiafamiliar em curto, médio

    e longo prazo.

    Os “mapas falados”, construídos junto com a comunidade,podem indicar a situação fundiária das áreas.

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    Escolha da áreae das espécies

    para implantar SAFs

    Existem diversos locais em uma pro-priedade ou comunidade onde se re-comenda implantar os SAFs. Vale sa-lientar que se trata de uma estratégia

    muito importante para a recomposição de áreasdegradadas, que pode auxiliar a reconstituir oambiente das florestas com espécies que tragamtambém benefícios econômicos. Dentre estes, osSAFs podem ser criados:

     A partir de uma roça ocupada com cultivosanuais. Trata-se de uma forma de aproveitaro tempo e o trabalho investidos na aberturado roçado, enriquecendo-o com outras cul-turas de médio e longo prazos.

    • A partir de uma capoeira melhorada. Pode--se aproveitar uma mata mais rala e em for-ma ção para introduzir e consorciar elemen-tos agroflorestais.

    • A partir de uma floresta danificada porexploração madeireira desordenada ou apartir de uma capoeira velha abandonada.Essas condições exigem mais domínio dasespécies a serem introduzidas e suas condi-ções de produção. Trata-se de uma opçãointeressante para se reintroduzir espéciesflorestais que possuem valor comercial.

    • A partir de uma pastagem. Em geral, essaáreas encontram-se compactadas e degrada-das, sem árvores ou arbustos. O manejo ini-cial exige a introdução de espécies pioneiras

    (leguminosas) que recuperem aos poucos afertilidade do solo, e posteriormente plan-tas de vegetação secundária.

    • A partir de uma área degradada para finsde recuperação, como acontece com áreasde preservação permanente (APP) ou dereserva legal. Do mesmo jeito que no casoanterior, deve-se reforçar o uso de legumi-nosas herbáceas ou lenhosas para melhorar

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    a fertilidade no solo. Posteriormente, sãointroduzidas espécies secundárias de ciclomédio e longo, capazes de proteger o solo efavorecer a ciclagem dos nutrientes.

    Escolha das espécies paracompor o SAFUm bom sistema agroflorestal deve fornecer benefí-cios e produtos para a alimentação e para a comercia-lização de forma constante. É interessante, portanto,que reúna espécies capazes de produzir em diferentesépocas do ano.

    Na escolha do que plantar, o agricultor deve consi-derar a importância das espécies para a subsistênciada sua família e as perspectivas de comercializaçãodos produtos no mercado local e regional. A escolhadas espécies é, portanto, a primeira decisão e talvez amais importante para estruturar o SAF.

    O consórcio das espécies escolhidas deve respeitaralgumas regras técnicas, de forma que as espéciesnão concorram entre si por água, luminosidade enutrientes. A experiência dos próprios agricultores,e em certos casos dos órgãos de pesquisa e assistênciatécnica, permite identificar os espaçamentos reco-mendados em função do tipo de solo. Caso o sistematenha excesso de plantas, com o tempo estas deverãoser eliminadas, diminuindo-se o adensamento.

     Além disso, o agricultor deve ter conhecimento so-bre o manejo do conjunto de espécies que ele vaiintroduzir no sistema, de forma que seja possívelrealizar as diferentes operações ao longo do calendá-rio agrícola (colheitas, controle de invasoras, podas,adubação, etc).

    O sistema deve ser manejado como um todo, pen-sando na ciclagem de nutrientes, na entrada de luzatravés dos diferentes níveis ou estratos, nos riscosde propagação de doenças e pragas, na produção dasdiferentes espécies ao longo do ano. A combinaçãodesses fatores é algo que as comunidades conseguementender com o tempo e a prática, observando ocomportamento da floresta e seguindo o exemplo.

    Implantação de umSAF pouco diversificado.

     Área recém abertapor meio de corte e queima.

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    NOME COMUM NOME CIENTÍFICO FAMÍLIACulturas anuais e semiperenes

    Abacaxi  Ananas sava  Bromeliaceae

    Banana Musa spp.  Musaceae

    Cubiu Solanum sesseliorum Solanaceae

    Maracujá Passiora edulis Passioraceae

    Mamão Carica papaya Caricaceae

    Pimenta-do-reino Piper nigrum  Piperaceae

    Culturas perenes (fruteiras, palmeiras e madeireiras)

    Abacate Persea grassima  Lauraceae

    Açaí  Euterpe precatoria e Euterpe olerácea  Arecaceae

    Acerola (cereja-das-anlhas) Malpighia glabra Malpighiaceae

    Andiroba Carapa guianensis Meliaceae

    Araçá-boi Eugenia spitata Myrtaceae

    Biribá Rollinia mucosa Annonaceae

    Buri (miri) Mauria exuosa ArecaceaeCacau Theobroma cacao Sterculiaceae

    Café Coea arabica  Rubiaceae

    Cajá (taperebá) Spondias lutea  Anacardiaceae

    Caju  Anacardium occidentale  Anacardiaceae

    Camu-camu Myrciaria dubia  Myrtaceae

    Castanha-do-Brasil Berthollea excelsa  Lecydaceae

    Coco Cocos nucifera  Arecaceae

    Cupuaçu Theobroma grandiorum Sterculiaceae

    Dendê Elaeis guineensis  Arecaceae

    Freijó Cordia goeldiana Borraginaceae

    Fruta-pão  Astocarpus incisa Moraceae

    Goiaba Pisidium guajava Myrtaceae

    Graviola  Annona muricata  Annonaceae

    Guaraná Paullinia cupana var.sorbilis Sapindaceae

    Ingá Inga edulis  Mimosaceae

    Jenipapo Genipa americana  Rubiaceae

    Mangostão Garcinia mangostana  Clusiaceae

    Paricá Schizolobium spp. Caesalpinoideae

    Espécies de interesse paraa região amazônica

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    Pupunha Bactris gasipaes Arecaceae

    Rambutan Nephelium lappaceum Sapindaceae

    Samaúma Ceiba pentandra  Bombacaceae

    Teca Tectona grandis  Verbenaceae

    Urucum Bixa orellana Bixaceae

    Culturas perenes (leguminosas de uso múlplo)

    Acácia  Acacia albida  Mimosaceae

    Albízia  Albizia amara  Mimosaceae

    Guandú (feijão-andú) Cajanus cajan  Papilionaceae

    Calliandra Calliandra calothyrsus  MimosaceaeCassia Cassia siamea Cassia spectabilis  Caesalpiniaceae

    Erithrina Erythrina abyssinica  Papelionaceae

    Flemíngia Flemingia macrophylla  Papelionaceae

    Gliricídia Gliricidia sepium Papelionaceae

    Leucena Leucaena leucocephala Mimosaceae

    Sesbania Sesbania sesban Papilionaceae

    Tamarindo Tamarindus indica  Caesalpiniaceae

    Exemplo de arranjosOs arranjos dos sistemas agroflorestais variam deacordo com as regiões e as espécies disponí veis.Não existe um sistema agroflorestal padrão, ge-ral, que possa ser aplicado de forma in-discriminada. São pensados paraatender às necessidadesde cada local e dasfamílias agricultoras,que podem e devemfazer seus próprios

    arranjos, aprimoran-do em seu nível deconhecimento como passar do tempo.Os sistemas agroflo-restais são dinâmicose devem atender àsnecessidades do pro-dutor.

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     Avaliação:vantagens e

    desvantagens dos SAFs

    Como todo sistema de produção,os sistemas agroflorestais possuempontos favoráveis e desfavoráveis.Esses pontos devem ser levados em

    conta, discutidos e planejados para um bom de-senvolvimento dos sistemas. De fato, a adoçãode um SAF é uma aposta de investimento de médio e longo prazo, que deve ser monitoradadesde o início.

     Vantagens• Os custos de implantação e manutenção dos

    SAFs podem ser mantidos dentro de lim-ites aceitáveis para o pequeno agricultor. Sãomais elevados na implantação e vão se amor-tizando com o tempo, a partir da comercial-ização das diferentes espécies implantadas nosistema.

    • A consorciação de culturas permite rendaem curto, médio e longo prazo. Dessa for-ma, evitam-se longos períodos de investi-mentos sem retornos financeiros.

    • Apesar de necessitar elevada mão de obrainicial, o trabalho nos SAFs possibilitauma melhor distribuição do trabalho aolongo do ano.

    • A implantação desses sistemas implica in-diretamente redução significativa de gastos

    com fertilizantes e controle de plantas in- vasoras, pragas e doenças.

    • Acumulando matéria orgânica, os SAFsajudam a manter e a melhorar a fertilida-de do solo, pois facilitam a ciclagem denutrientes e evitam a lixiviação destes. Aomesmo tempo, impedem a compactação ea erosão, aumentando sua capacidade pro-dutiva.

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    • Os SAFs diversificam a produção e melho-ram a produtividade e a renda familiar, alémde contribuír em para a segurança alimentardas populações rurais. Com isso, facilitam afixação dos produtores à propriedade, redu-zindo o êxodo rural, tornando mais confor-tável o trabalho na roça.

    • A implantação de agroflorestas permanentescontribui com a redução do desmatamento

    e da queima de novas áreas. Além disso, de-sempenha papel significativo na recuperaçãode áreas degradadas, de forma rentável e comdiversificação das espécies.

    • Os SAFs conseguem diversificar a produçãofrente ao mercado e assim reduzir o risco domonocultivo para os agricultores.

    • Podem contribuir para a proteção do meioambiente, constituindo um agroecossistemaarbustivo e florestal, que pode ser computa-do como reserva legal da propriedade rural,de acordo com o Novo Código Florestal.

    • A diversidade de espécies confere maioreficiência no aproveitamento dos insumos enutrientes, além de possibilitar melhor uti-lização dos recursos disponíveis (solo, água,luminosidade).

    •  Os SAFs contribuem para a regulação domicroclima, diminuindo a radiação solar di-reta e a temperatura do solo, o que permitemaior movimentação da fauna que vive nosolo, produzindo serviços ambientais e ecos-sistêmicos.

    Desvantagens: orientações importantes A implantação de um sistema agroflorestal tam-bém traz consigo uma série de implicações, quedevem ser consideradas na hora do planejamento.

    •  Os conhecimentos dos agricultores e atémesmo dos técnicos e pesquisadores sobre

    SAFs ainda são muito limitados. O con-sórcio de v árias espécies requer maior pla-nejamento e conhecimento do comporta-mento de cada planta a ser introduzida nosistema, bem como da interação desta comas demais. Espaçamentos inadequadospodem provocar maior concorrência pornutrientes e pela insolação entre espécies,reduzindo a produtividade e aumentandoo tempo de entrada em produção.

    • De modo geral, o manejo dos SAFs é maiscomplexo que o cultivo de cada espécieindividualmente, seja anual ou de ciclolongo. A combinação de diferentes plantasno tempo e espaço influi nos diferentes fa-tores que interagem no sistema.

    • O custo da implantação total e o manejodos SAFs por hectare é  mais elevado doque o de monocultivos. O momento ini-cial representa mais mão de obra e trabalhopara o agricultor. Um consórcio de v árias

    espécies requer monitoramento constanteda área.

    •  Um sistema agroflorestal exige mudas dequalidade, seja por meio de produção pró-pria ou pelo investimento na sua compra.

    • Os SAFs não permitem o emprego de altosníveis de mecanização, ferramentas e maqui-nários, já que estes não satisfazem as neces-sidades de um sítio de agroflorestal.

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    Exemplo deconsorciamento:Lago do Antônio

     A  região do Lago do Antônio compre-ende 10 comunidades e localiza-se namargem esquerda do rio Madeira, a 10horas de barco da cidade de Humai-

    tá. V árias dessas comunidades estão situadas noProjeto de Assentamento Agroextrativista São Jo-aquim, cujas famílias possuem titulação definitivada terra, emitida pelo INCRA.

     As comunidades fazem parte da Associação de

    Desenvolvimento Comunitário do Produtoresdo Lago do Antônio (ADCPLA), através da qualfoi conseguido um barco comunitário, graças aoapoio do Instituto Pacto Amazônico (IPA) me-diante edital de projetos para aquisição de recur-sos do Ministério do Meio Ambiente.

    Dentre as comunidades do Lago do Antônio, ade São Francisco é constituída por 11 famílias e vive essencialmente da agricultura familiar, espe-cialmente do cultivo de mandioca e da pecuáriafamiliar durante todo ano. No inverno, as famí-

    lias dedicam-se ao extrativismo de castanha, açaíe óleos. No verão, constroem pequenas embarca-ções, realizam pesca artesanal e garimpam no rioMadeira.

     A criação do Grupo de Experimentadores do Lagodo Antônio na comunidade de São Francisco tevecomo finalidade principal estabelecer um modelode produção sustentável como referência para aregião. A ideia original era proporcionar aos agri-cultores familiares dessas comunidades subsídios

    agroecológicos para a realização de boas práticasde agricultura local, partindo-se do que a própriacomunidade possui de potencial produtivo e ex-periência acumulada, introduzindo-se, a partir dadiscussão e da decisão dos próprios agricultores,novos elementos e técnicas.

    O experimento se baseou nos saberes acumula-dos pelas famílias com o cultivo e o manejo deaçaí, cacau e mandioca. Aproveitando as roças de

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    mandioca, foram introduzidas essas duas espécies,ampliando-se o sistema com outras frutíferas e

    madeireiras

    O Lago do Antônio possui alto potencial para aexploração de a çaí devido à existência de extensosaçaizais nativos, tanto na várzea quanto na terra--firme. Todas as comunidades da região exploramesses açaizais para consumo próprio, visto que o

     Área selecionada para realizaro experimento com SAF.

    açaí faz parte da alimentação básica das famílias.Há também uma crescente exploração do açaípara venda, possibilitando a geração de renda.

    O experimento com o grupo teve início em 2010,após discussões e participação dos comunitáriosem eventos que animaram as famílias a definiremos elementos básicos da experiência. Após visitade intercâmbio a Manicoré, conhecendo algunsexemplos de SAFs, o grupo resolveu aproveitar

    uma área de 1 hectare, aberta em floresta de terrafirme, para a implantação de um sistema consor-ciando de mandioca com outras espécies agroflo-restais como o açaí e o cacau. Os passos para im-plantação do sistema foram:

     Junho a Setembro de 2010: Derrubada e abertu-ra da área pelos comunitários.

    Outubro de 2010: Plantio de mandioca no roçado.

    Novembro de 2010: Plantio de cacau na áreacom espaçamento de 5 m x 4 m. O cacau foi in-

    troduzido quando a mandioca já estava com 2 a 3meses de desenvolvimento. Foram plantados trêstipos de cacau: de várzea, de terra firme e cacauhíbrido da CEPLAC. As mudas vieram de dife-rentes lugares.

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     Janeiro 2011: Implanta ção do açaí nativo, sele-cionando-se as mudas diretamente da floresta nosarredores da comunidade. As mudas foram tira-das com todo solo, protegendo-se as raízes. Essaprática é reconhecida por  adiantar a entrada emprodução do aça í em pelo menos dois anos, quan-do comparada com a produção de mudas em se-menteiras. Foi obedecido o mesmo espaçamentona entrelinha usado com o cacau: 5m x 4m.

    2012: Visitas de intercâmbio dos produtores àsexperiências com SAFs realizadas pela Coopera-tiva Agrícola Mista de Tomé-Açu (CAMTA), noPará, e pelo Projeto RECA (Reflorestamento Eco-nômico Consorciado e Adensado), em Nova Cali-fórnia, Rondônia.

    Dados dos custosde implantação

    Mês do ano 1 hectare Dias Pessoas Diárias Gastos (R$)Junho e Julho 2010 Roçar e derrubar 5 2 10 75,00 de diári

    de motosserra

    Agosto 2010 Queimada 0,5 2 1

    Outubro 2010 Coivara e plano de maniva 3 10 30

    Junho TF, Novembro

    Vr, Dezembro Hbr

    Preparação das mudas de ca-cau

    2 2 4

    Novembro 2011 Plano das mudas cacau da TF 1,5 5 7,5

    Fevereiro/Março 2011 Plano das mudas de açaí 1 10 10

    Julho 2011 Capina 2 5 10

    Novembro 2011 Arrancar roça 2 10 20

    Junho 2012 Revisão/acompanhamento 17 46 92,5TF = Terra Firme

    Vr = Várzea

    Hbr = Híbrido

    Como se pode ver na tabela, o número de diáriasno início do experimento foi elevado, devido àduplicação do serviço de mão de obra para im-

    Grupo de experimentação do SAFque implantou cacau e açaí naroça de mandioca.

    plantação, num primeiro momento, do cultivoda mandioca, para só depois implantar o cacau eo açaí. A limpeza da área se fez menos necessária

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    devido ao sombreamento da mandioca no local,protegendo ao mesmo tempo as mudas de cacau ede açaí da estiagem do verão.

    Se um produtor tivesse que investir 93 diárias aum preço de R$35,00, gastaria R$3.255,00 naimplantação da roça. Acrescentando o gasto commotosserra, poderíamos estimar o investimentoinicial em R$ 3.400,00.

    Sem entrar na análise mais aprofundada, com o le-

     vantamento dos gastos que a produção de mandiocaimplica, chega-se a uma renda obtida no primeiroano de implantação do sistema. Considerando-seuma produção média de 70 sacas de farinha porhectare, a um preço de R$120,00/saca, estima-seuma renda de R$ 8.400,00. Assim, conclui-se quea implantação do sistema se paga unicamente coma produção de mandioca no primeiro ano.

    Lições aprendidas,resultados e conclusões

     Varias lições foram aprendidas e discutidas partin-do do trabalho do grupo. Eis algumas delas:

    • O consórcio demonstrou ser interessante nacombinação de cultivos de curto, médio elongo prazo, apesar de não se ter tido temposuficiente para obter dados de produção. A

    mandioca conseguiu sombrear e proteger asmudas de cacau e açaí no verão, com umamortalidade praticamente nula.

    • As mudas extraídas da mata foram colhidas etransplantadas em ótimas condições, evitan-do-se ferir as raízes. O trabalho de transplanteocorreu em dias nublados. Esses dois fatoresajudaram a conseguir bons resultados.

    • Observando-se a tabela ca evidente que

    os custos da implantação do sistema forammínimos. Os investimentos se concentraramprincipalmente na mão de obra durante a ab-ertura da área. Como a mão de obra baseou-se no trabalho voluntário, com exceção dadiária de operador de motosserra, não houvecusto de nenhuma outra natureza.

    • O tempo de trabalho, assim como a mãode obra empregada, foram maiores na im-

    plantação do sistema. Pode-se concluir quedurante o ano de implantação foram usadasaproximadamente 93 diárias destinadas à ab-ertura da roça e ao plantio da mandioca. Ouseja, o consórcio aproveitou a mão de obra eo espaço aberto.

    • É conclusivo armar que diante de uma co-munidade organizada, em que os comuni-tários se entendem e se ajudam, é possívelcriar sistemas agroflorestais de forma orga-nizada com o mínimo de custos possível.

    • Com os SAFs, além de diversicar a produção,o objetivo foi também ampliar ainda mais asáreas de cultivo de açaí e cacau, que são o car-ro-chefe do extrativismo na região.

    • Os comunitários adquiriram novos conheci-mentos na combinação das espécies e na apli-cação das novas técnicas agroecológicas. Como manejo e os tratos culturais adequados, re-alizaram limpezas e podas, conseguindo con-trolar a luminosidade e as plantas invasoras.

     As experiências realizadas encorajam a apostarem um modelo de sistema mais integrado com omeio, criando condições de melhorar a renda dasfamílias agricultoras. Para aqueles que se dispõema apostar em investimento de longo prazo, repli-cando o sistema de produção, é possível melhoraras condições de vida, evitar desmatamento e con-sorciar espécies amazônicas produtivas, manejan-do-as de forma correta.

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    Como forma de uso da terra, os SAFstornam produtivas as áreas de pasta-gens abandonadas, capoeiras melho-radas, capoeiras velhas, roças abando-

    nadas e áreas degradadas. Melhoram, portanto, afunção social e econômica da terra.

    Com os SAF, os pequenos agricultores familiarestêm uma forma de melhorar sua renda, mediantea venda do excedente de uma maior variedade de

    produtos. Com isso, melhoram sua qualidade de vida no campo, em harmonia com o meio am-biente e de acordo com a legislação vigente.

    Os sistemas agroflorestais representam uma apos-ta na diversificação de espécies e de produtos notempo e no espaço, associando cultivos de cicloscurto, médio e de longo prazo. Com os sistemasagroflorestais o agricultor tem uma melhor dis-tribuição de espécies no terreno, disponibilidadepara comercializar diferentes produtos durante oano inteiro, evitando possíveis riscos de perda na

    produção e também aqueles relacionados à varia-ção de preço na comercialização.

    Os sistemas agroflorestais promovem a seguran-ça alimentar e são uma forma de baratear o custode implantação de lavouras perenes (açaí, cacau,cupuaçu, café, mamão, etc.). Sem dú vida, é omelhor sistema de agricultura sustentável para aspopulações tradicionais e ribeirinhos da região dorio Madeira, em Humaitá, no Sul do Amazonas. 

    Consideraçõesfinais

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    Referências

     ARMANDO, M. S. et al . Agrofloresta para agricultura familiar . Brasília: Embrapa Recursos Genéticos eBiotecnologia, 2002.

    CAVALCANTE, P.B. Frutas comestíveis da Amazônia . Belém: Museu Paraense Emílio Goeldi, 1991.

    DUBOIS, J. C. L. Manual agroflorestal para a Amazônia . v. 1. Rio de Janeiro: REBRAF, 1996.

    GALVÃO, A. P. (Org.). Reflorestamento de propriedades rurais para fins produtivos e ambientais : um guiapara ações municipais e regionais. Colombo/PR: Embrapa Florestas, 2000.

    MOLLISON, B. Introduction to permacuture. 2a. ed. Canberra: National Library of Australia, 1994.

    MORROW, R. Permacultura passo a passo. Pirenópolis/GO: Calango, 2005.

    SHANLEY, P.; CYMERYS, M., GALVÃO, J. Frutíferas da mata na vida amazônica . Belém: Editora Su-percores, 1997.

    SHANLEY , P.; LUZ, L.; SWINGLAND, I. A frágil promessa de um mercado distante: um evantamentosobre o comércio de produtos florestais não madeireiros em Belém. Belém: CIFOR, 2002.

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    Parceiros do Projeto Fronteiras Florestais

    Instituto Pacto Amazônico (IPA) - Fundado em 2003, em Humaitá-AM, esta organização surgiu danecessidade de se implementar um modelo de desenvolvimento socioeconômico alternativo e sustentável para aspopulações amazônicas de baixa renda do sul do Amazonas. Promove a organização social por meio de associativ-ismo, cooperativismo, formação de conselhos, planejamento participativo, promoção de educação e informação am-biental, economia rural participativa, saúde da família, geração de trabalho e renda, entre outras atividades. Atendea cerca de 80 comunidades de moradores no interior e no entorno das unidades de conservação existentes na região:

    Floresta Nacional (Flona) de Humaitá, Flona Balata Tufari, Parque Nacional (Parna) Campos Amazônicos, assimcomo assentamentos e comunidades às margens do rio Madeira e das BR-230 e BR-319.

     Associação para o Desenvolvimento da Agricultura Familiar do Alto Xingu(ADAFAX) - Esta entidade coordena, com seus parceiros, uma estratégia regional de redução do desmatamentoe de fortalecimento da agricultura familiar em bases sustentáveis no sul do Pará. Tem como proposta dinamizar aatuação das famílias agricultoras, formular projetos e propiciar o debate sobre políticas públicas para a região, con-solidando as organizações locais vinculadas à agricultura familiar. A ADAFAX nasceu, em 2004, da articulação detrês entidades do Alto Xingu: a Comissão Pastoral da Terra (CPT), a Cooperativa Alternativa dos Pequenos Produ-tores Rurais e Urbanos (CAPPRU) e a Casa Familiar Rural (CFR) de São Félix do Xingu. A base social da entidadeé composta por mil famílias beneficiárias diretas e 6.900 famílias beneficiárias indiretas nos municípios de São Félixdo Xingu, Ourilândia do Norte, Tucumã e parte de Altamira (APA Triunfo do Xingu).

    Instituto Internacional de Educação do Brasil (IEB) - Criado em 1998, o IEB é uma institu-ição brasileira do terceiro setor dedicada a formar e capacitar pessoas, bem como fortalecer organizações nas áreas demanejo dos recursos naturais, gestão ambiental e territorial e outros temas relacionados à sustentabilidade. O IEBatua em rede, busca parcerias e promove situações de interação e intercâmbio entre organizações da sociedade civil,associações comunitárias, instâncias de governo e do setor privado. Como uma organização de ações educativas,incorpora os saberes de parceiros, as diferentes culturas e as técnicas populares. A organização tem sede em Brasília-DF e está presente na Amazônia por meio de escritórios regionais instalados em Belém-PA, e nos municípios deHumaitá, Lábrea, Manicoré e Boca do Acre, no Amazonas.

    Groupe de Recherche et d’Échanges Technologiques (GRET) - É uma organização decooperação internacional, criada em 1970, com o objetivo de desenvolver solidariedade profissional e redução da

    pobreza nos países da Ásia, África, Europa e América Latina. Suas atividades incluem a implementação de projetos decampo, experiência, estudos, pesquisas, informações e execução de redes de intercâmbio. Tendo como uma das suasprincipais esferas de atuação a agricultura e a alimentação sustentável, o GRET prestou apoio técnico e metodológicoos trabalhos desenvolvidos pelo Projeto Fronteiras Florestais nas duas regiões da Amazônia em que este foi realizado.

    Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (IMAZON) - Instituto de pesquisacuja missão é promover o desenvolvimento sustentável na Amazônia por meio de estudos, apoio à formulação depolíticas públicas, disseminação ampla de informações e formação profissional. O Instituto foi fundado em 1990, esua sede fica em Belém, Pará. Em 22 anos de existência, o IMAZON publicou mais de 500 trabalhos técnicos, dosquais cerca de 212 foram veiculados como artigos em revistas científicas internacionais ou como capítulos de livros.

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    Parceiros do Projeto Fronteiras Florestais

     Apoio

    Realização

    Contrapartida