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EDSÔNIA DE SOUZA OLIVEIRA MELO PROPAGANDA IMPRESSA: PRÁTICA DE LEITURA E PRODUÇÃO TEXTUAL EM PERSPECTIVA DISCURSIVA Cuiabá 2006

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EDSÔNIA DE SOUZA OLIVEIRA MELO

PROPAGANDA IMPRESSA: PRÁTICA DE LEITURA E PRODUÇÃO TEXTUAL EM PERSPECTIVA DISCURSIVA

Cuiabá 2006

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EDSÔNIA DE SOUZA OLIVEIRA MELO

PROPAGANDA IMPRESSA: PRÁTICA DE LEITURA E PRODUÇÃO TEXTUAL EM PERSPECTIVA DISCURSIVA

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação –

Mestrado em Estudos de Linguagem da Universidade Federal

de Mato Grosso – UFMT, como requisito parcial para obtenção

do título de Mestre em Estudos de Linguagem.

Área de concentração: Estudos Lingüísticos

Orientadora: Profª. Drª. Maria Rosa Petroni

Instituto de Linguagens Cuiabá 2006

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Descobri aos 13 anos que o que me dava prazer nas

leituras não era a beleza das frases, mas a doença

delas. Comuniquei ao Padre Ezequiel, um meu

Preceptor, esse gosto esquisito.

Eu pensava que fosse um sujeito escaleno.

- Gostar de fazer defeitos na frase é muito saudável,

o Padre me disse.

Ele fez um limpamento em meus receios.

O Padre falou ainda: Manoel, isso não é doença,

pode muito que você carregue para o resto da vida

um certo gosto por nadas... E se riu.

Você não é de bugre? - ele continuou.

Que sim, eu respondi.

Veja que bugre só pega por desvios, não anda em

estradas – Pois é nos desvios que encontra as melhores

surpresas e os ariticuns maduros.

Há que apenas saber errar bem o seu idioma.

Esse Padre Ezequiel foi o meu primeiro professor de

gramática.

(Manoel de Barros)

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DEDICATÓRIA

Aos meus filhos Rafael e Guilherme que, mesmo

inconscientemente, compreenderam os momentos

de ausência.

“Mamãe, posso entrar e ficar só um pouquinho aí

com você?”

Perdoem a cara amarrada

Perdoem a falta de abraço

Perdoem a falta de espaço

Os dias eram assim...

(Ivan Lins)

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AGRADECIMENTOS

A DEUS, por ter me guiado com a luz divina: “Tudo posso naquele que me

fortalece” (Salmo 23).

À minha orientadora, Maria Rosa Petroni, sempre à disposição, pela

confiança em meu trabalho e contribuições. Só eu o sei: foi-me

interlocutora valiosa.

À Banca do Exame de Qualificação, profª Maria Inês Pagliarini Cox e

Sônia Aparecida Lopes Benites, pela leitura atenta e sugestões.

Aos professores do MeEL pelas discussões teóricas, que foram valiosas.

Aos colegas do programa pelas discussões e conversas compartilhadas,

especialmente à Paula, amiga em todos os momentos. “Bigadu” pelo

carinho.

À FAPEMAT pela bolsa de estudos que me foi concedida.

Aos professores, coordenadores, funcionários, direção e, em especial aos

alunos da Escola Dr. Hélio Palma de Arruda por me possibilitarem a

concretização desta pesquisa.

Aos meus pais e irmãos, por torcerem, verdadeiramente, pelas minhas

conquistas e realizações.

Aos meus avós, “papai” e “mãe”, pessoas nas quais eu me espelhei e

aprendi a ser humana e a ser honesta.

Ao Vander que brinda comigo o prazer da conquista.

Aos meus amigos e familiares que aqui não foram nomeados, Aquele

abraço...

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MELO, E. S. O. Propaganda impressa: prática de leitura e produção textual em

perspectiva discursiva.

RESUMO

Este trabalho apresenta os resultados de uma pesquisa realizada com alunos da 8ª

série do Ensino Fundamental de uma escola pública na cidade de Cuiabá-MT, em

que utilizamos a propaganda impressa como objeto de ensino. O nosso objetivo

geral foi desenvolver um projeto pedagógico por meio da metodologia seqüência

didática, ressaltando os aspectos lingüístico-discursivos próprios desse gênero, a fim

de propiciar ao aluno uma leitura crítica de textos diversificados e levá-lo à produção

do gênero. Para atingir tal objetivo, organizamos as atividades práticas em duas

partes: inicialmente, realizamos o trabalho de leitura com propagandas comerciais e

sociais e, posteriormente, a produção textual com o tema a preservação do meio

ambiente. Para a fundamentação teórica, utilizamos a perspectiva sócio-histórica da

linguagem desenvolvida por Bakhtin (2004, 2003), apoiando-nos, também, em

Maingueneau (2004, 2005) e Geraldi (1997, 2004, 2005), dentre outros. Esse viés

teórico nos serviu tanto para o planejamento das atividades do projeto quanto para a

sustentação da análise. O trabalho foi conduzido pela metodologia da pesquisa-

ação, no 4° bimestre do ano letivo de 2005. Dos dados obtidos, optamos por dedicar

nossa atenção às produções textuais dos alunos, resultantes do trabalho de leitura

em que realizaram diversificadas atividades para compreenderem as características

constitutivas de tal gênero. Os resultados demonstram que a prática de leitura e de

produção escrita do gênero do discurso propaganda impressa constitui-se em um

rico instrumento de ensino-aprendizagem nas aulas de Língua Portuguesa. Assim,

os professores têm a oportunidade de levar para a sala de aula um gênero de

circulação real, que faz parte do cotidiano dos alunos e de suas práticas de

linguagem e, com isso, estimular a sua criticidade.

Palavras-chave: gênero, propaganda impressa, ensino-aprendizagem.

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ABSTRACT This study presents the results of a research carried out with students from the eight

grade of Basic teaching at a public school in Cuiabá in the State of Mato Grosso

where it was used the printed propaganda texts as educational researched object. It

aimed at developing a pedagogical project by means of the didactic sequence

methodology, giving emphasis on the proper linguistic-discursive aspects of this

gender in order to propitiate the students a critical reading of diversified texts and

also offer them support for gender production. In order to reach such objective, it was

organized the practical tasks in two phases: initially, it was carried out the reading

work with commercial and social propagandas texts and later, the literal production

with the theme about the environment preservation. The theoretical bases counted

with the social historical perspective of the language developed for Bakhtin (2004,

2003), together with Maingueneau (2004, 2005) and Geraldi (1997, 2004, 2005),

amongst others. This theoretical bias gave support for the project activities planning

and also for the construction of the analysis. This research was carried out according

to the research-action methodology, during the school fourth bimonthly of year 2005.

From the obtained data, it was opted to dedicate the attention of the literal production

texts of the students, resultants of the reading process where they had carried out

diversified activities to understand the constituent characteristics of such gender. The

findings demonstrate that practical of reading and written production of the gender of

the printed propaganda discourse consists in a rich instrument of teach-learning in

the Portuguese Language classes. As a result, the teachers have the possibility to

take for the classroom a category of real circulation, that is part of the students’ daily

practical routine and also stimulate their critical sense.

Keywords: Gender, printed propaganda texts, teach-learning process.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ..........................................................................................................01 CAPÍTULO I – BALIZAS TEÓRICAS.........................................................................05

1.1 Breves considerações...............................................................................05

1.2 Gêneros do discurso: a perspectiva enunciativo-discursiva .....................08

1.3 Propaganda impressa: concepções teóricas ............................................16

1.3.1 Publicidade e/ou propaganda......................................................16

1.3.2 Estratégias persuasivas da propaganda .....................................18

1.3.3 Implícito e explícito no discurso da propaganda..........................22

1.4 Gênero discursivo em sala de aula e a seqüência didática ......................25

1.5 Formação do leitor crítico: leitura na perspectiva discursiva.....................27

CAPÍTULO II – PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS: O ENCONTRO COM OS

SUJEITOS ................................................................................................................31

2.1 Pesquisa-ação: metodologia usada na elaboração do projeto .................33

2.2 Cenário e sujeitos .....................................................................................35

2.3 Corpus da pesquisa ..................................................................................36

2.4 Categorias de análise ...............................................................................36

2.5 O encontro com os sujeitos ......................................................................37

2.5.1 Leitura de propagandas comerciais e sociais........................................39

2.5.2 Atividade diagnóstica............................................................................40

2.5.3 Identificando e (re)conhecendo as especificidades do gênero ..............46

2.5.4 Leitura de propagandas sociais.............................................................56

2.5.5 Produção de propagandas sociais ........................................................65

2.5.6 Circulação das propagandas ................................................................67

CAPÍTULO III – ANÁLISE DAS PRODUÇÕES TEXTUAIS.......................................69

3.1 Breves considerações...............................................................................69

3.2 Síntese das análises.................................................................................87

CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................................89

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..........................................................................93

ANEXOS ...................................................................................................................97

Anexo I – Fotos da visita ao laboratório de Publicidade e Propaganda ....................98

Anexo II – Cartaz e folder........................................................................................101

Anexo III – Textos complementares: reportagens ...................................................104

Anexo IV – Textos não selecionados para a análise...............................................119

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INTRODUÇÃO

O sentido é potencialmente infinito, mas pode

atualizar-se somente em contato com outro sentido

(do outro), ainda que seja com uma pergunta do

discurso interior do sujeito da compreensão. Ele

deve sempre contatar com outro sentido para

revelar os novos elementos da sua perenidade. Um

sentido atual não pertence a um (só) sentido mas

tão-somente a dois sentidos que se encontraram e

se contactaram. Não pode haver um sentido único

(um). Por isso não pode haver o primeiro nem o

último sentido, ele está sempre situado entre os

sentidos, é um elo na cadeia dos sentidos, a única

que pode existir realmente em sua totalidade. Na

vida histórica essa cadeia cresce infinitamente e por

isso cada elo seu isolado se renova mais e mais,

como que torna a nascer.

(BAKHTIN, [1952/1953] 2003, p. 382)1

Muitos estudiosos da linguagem, nos últimos anos, têm discutido a

importância e a contribuição da leitura e produção de texto no processo ensino-

aprendizagem. Há várias abordagens teóricas desenvolvidas acerca desse assunto,

mas parece haver ainda uma distância incomensurável entre as teorias acadêmicas

e sua efetivação na sala de aula. A prática de leitura acaba se restringindo às aulas

de Língua Portuguesa e, na maioria das vezes, é utilizado somente o texto verbal, o

qual ainda tem servido de pretexto para o estudo da gramática e do vocabulário ou

para sua mera decodificação, deixando à margem o exercício de interpretação.

O paradigma prescritivo de ensino de língua materna, centrado no repasse

de conteúdos gramaticais, começou a ser abalado com o advento da Lingüística

1 Apresentaremos algumas datas entre colchetes para indicar a primeira edição ou a época da escritura dos textos publicados. As datas entre parênteses indicam o ano das edições consultadas.

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moderna, em que o trato com textos tomou outros rumos. O trabalho com os

gêneros discursivos – que costuma levar em conta, durante a leitura e compreensão

de texto, fatores a ele externos, como aspectos sócio-histórico-culturais, ao contrário

do que se fazia na lingüística tradicional – mostra-se especialmente relevante, uma

vez que os sentidos se constituem pela relação homem/linguagem. Podemos dizer

que os estudos e pesquisas na perspectiva dos gêneros discursivos, na década de

90, romperam com a abordagem tradicional e linear de leitura e produção de texto

que se limitava à narração, descrição e dissertação, enfatizando apenas os aspectos

estruturais da língua. Agora, as discussões sobre a prática de leitura e escrita estão

centradas numa perspectiva discursiva, em que o aluno-leitor passa a ser

considerado autor do seu próprio discurso. Assim, tende a ser satisfatório o

resultado no ensino de Língua Portuguesa quando se põe o aluno, desde cedo, em

contato com os diferentes gêneros discursivos que circulam socialmente, em uma

verdadeira diversidade textual. Nesse sentido, o aluno não é simplesmente

preparado nas práticas lingüísticas; também seu conhecimento se amplia para atuar

nas situações concretas de participação social como cidadão ativo.

De acordo com Mikhail Bakhtin (2003), todos os textos que produzimos,

sejam orais ou escritos, apresentam um conjunto de características relativamente

estáveis, tenhamos ou não consciência delas. Essas características configuram

diferentes gêneros discursivos, que podem ser reconhecidos por três aspectos

básicos coexistentes: o conteúdo temático, a estrutura composicional e o estilo.

Assim, quando estamos em uma situação de interação, a escolha do gênero não é

completamente espontânea, pois leva em conta um conjunto de coerções impostas

pela própria situação de comunicação: quem fala, sobre o que se fala, com quem se

fala, onde se fala e com qual finalidade. Todos esses elementos condicionam as

escolhas do locutor que acaba por fazer uso do gênero mais adequado àquela

situação.

Tomando como base as reflexões acima, propusemo-nos desenvolver um

projeto com atividades práticas numa escola pública na cidade de Cuiabá, com uma

turma de 8ª série, destacando os aspectos discursivos e lingüísticos do gênero

discursivo da propaganda impressa, com o objetivo de que o aluno apreendesse as

especificidades básicas desse gênero ou, como afirma Bakhtin, suas características

relativamente estáveis, e tivesse condições de ler, o mais criticamente possível, os

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textos com que depara diariamente e de produzir textos com qualidade. Para tanto,

partimos do pressuposto de que a língua deve ser estudada em situações concretas

de interação e que os interlocutores exercem papel ativo e dinâmico, ou seja, os

sentidos do texto são constituídos numa relação entre leitor-texto. Encontramos na

perspectiva sócio-histórica da linguagem, especificamente nos fundamentos teóricos

bakhtinianos, o alicerce tanto para a elaboração das atividades práticas quanto para

a análise dos dados.

Importante ressaltar que o nosso interesse por esse tipo de trabalho justifica-

se por duas razões. Primeiramente, por ele se inserir na linha de pesquisa

Paradigmas de Ensino de Línguas, em que nos inscrevemos; em segundo lugar,

porque tivemos a oportunidade de levar para a sala de aula um gênero do discurso

de circulação social e que, infelizmente, ainda não se apresenta como prática de

leitura em grande parte das escolas. Aliás, esse aspecto foi evidenciado na

realização de uma pesquisa2 no ano de 2004, em que procuramos refletir acerca da

prática de leitura de um grupo de alunos de 7ª série de uma escola pública de

Cuiabá. Os alunos apresentaram uma visão estreita a respeito do gênero discursivo

trabalhado (propaganda). Durante a pesquisa, pudemos constatar que houve total

desconsideração da parte não-verbal do texto. Dessa forma, percebemos que a falta

de familiaridade dos alunos com o texto em questão resultou numa interpretação

fragmentada, isto é, o texto foi interpretado apenas parcialmente, dado que somente

o aspecto verbal foi considerado. O resultado dessa pesquisa, também, nos

incentivou na escolha do gênero propaganda impressa.

A realização de nossa pesquisa atual nucleou-se em três etapas:

procuramos, primeiramente, trabalhar com a leitura e análise de diversas

propagandas comerciais e sociais. Nas atividades, enfocamos os aspectos

lingüísticos, não-lingüísticos e discursivos, ressaltando as condições de produção,

circulação e recepção da propaganda impressa. Para tanto, disponibilizamos aos

alunos o suporte em que tais propagandas circulavam – revistas Veja e IstoÉ – para

que pudessem perceber como esses textos se apresentam; visitamos um laboratório

2 A pesquisa intitulada “Li, mas não compreendi”: O que tal enunciado revela acerca das condições de produção de leitura? foi realizada no ano de 2004, no curso de Especialização em Língua Portuguesa: Teoria e Prática, oferecido pelo IL/UFMT, sob a orientação da profa. Drª. Maria Inês Pagliarini Cox. Tivemos como objetivo investigar os porquês de os alunos, durante o processo de leitura de determinado texto, não conseguirem compreendê-lo e como eles o concebiam.

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de publicidade e propaganda, oportunidade em que eles viram as etapas para a

produção desse gênero. Posteriormente, propusemos a produção textual com a

propaganda social e, por último, sua circulação no saguão da escola.

Tivemos como foco, para a realização dessa pesquisa, a seguinte pergunta:

A prática de leitura de propagandas impressas, por meio de atividades organizadas

em seqüências didáticas possibilita aos alunos produzirem textos adequados ao

gênero em questão?

Assim, para o relato da experiência de pesquisa, organizamos a dissertação

em três capítulos: no primeiro, apresentamos uma síntese de nossas balizas teóricas

centrada na teoria bakhitiniana da linguagem, especificamente, nas discussões dos

gêneros do discurso. Discutimos, por igual, os conceitos de publicidade e/ou

propaganda, suas características e a relevância do trabalho com os gêneros em sala

de aula. No segundo capítulo, expomos os passos percorridos para a realização da

pesquisa: a caracterização da pesquisa qualitativa, do contexto no qual foi realizada

e dos participantes. Apresentamos, ainda, os instrumentos de coleta de dados, as

categorias de análise. Neste mesmo capítulo, mostramos cada aula dada e

descrevemos como os alunos reagiram na realização de cada atividade. No último,

são apresentadas e analisadas as produções textuais dos alunos, à luz dos

pressupostos teóricos desenvolvidos no primeiro capítulo, seguidas das

considerações finais.

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CAPÍTULO I

BALIZAS TEÓRICAS

Os indivíduos não recebem a língua pronta para ser

usada; eles penetram na corrente de comunicação

verbal; ou melhor, somente quando mergulham

nesta corrente é que sua consciência começa a

operar. [...] Os sujeitos não “adquirem” a língua

materna; é nela e por meio dela que ocorre o

primeiro despertar da consciência.

[...]

A língua penetra na vida através dos enunciados

concretos que a realizam, e é também através dos

enunciados concretos que a vida penetra na língua.

(BAKHTIN, [1929]2004, p. 108)

1.1 Breves considerações

O intuito deste capítulo é esboçar os pressupostos teóricos que serão

mobilizados na análise e discussão dos dados. Assim, daremos um olhar especial à

teoria enunciativo-discursiva de Mikhail Bakhtin, especialmente, aos gêneros do

discurso.

O ensino de língua portuguesa, por muitos anos, se manteve ancorado na

gramática tradicional, ou seja, centrado na aquisição do código e da gramática

normativa. Essa prática começou a ser repensada no final da década de 70, a partir

dos estudos realizados na área da Lingüística Aplicada, Educação e Psicologia, o

que marcou uma mudança de paradigmas: antes conceitual e normativo, baseado

em exercícios estruturais, passa a ser centrado no texto, enfocando o uso e o

funcionamento da língua(gem).

Na década de 80, o texto começa a ser visto como objeto de ensino: passa-

se a refletir acerca das reais situações de sua produção. Vale dizer: não se pretende

mais realizar atividades mecânicas e descontextualizadas no processo de ensino-

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aprendizagem da língua escrita. Nesse período, os embasamentos teóricos de João

Wanderley Geraldi, em seu livro O texto na sala de aula ([1984] 2005), apresentam

algumas reflexões sobre esse ensino e um (re)dimensionamento das atividades de

sala de aula, centrando-o em três práticas: “leitura de textos, produção de textos e

análise lingüística”. Segundo o autor (2005, p. 90), na prática escolar, as atividades

lingüísticas são instituídas de forma artificial:

- Na escola não se escrevem textos, produzem-se redações. E estas nada mais são do que a simulação do uso da língua escrita. - Na escola não se lêem textos, fazem-se exercícios de interpretação e análise de textos. E isso nada mais é do que simular leituras. - Por fim, na escola não se faz análise lingüística, aplicam-se a dados análises preexistentes. E isso é simular a prática científica da análise lingüística.

A esse respeito, Britto (2005, p. 126) reforça a falta de condições para a

produção de textos em situações reais, uma vez que a linguagem é trabalhada de

maneira descontextualizada. Desse modo, o aluno não sabe o que escrever, para

quem escrever e por que escrever. Assim, “são negadas à língua algumas de suas

características básicas, como a sua funcionalidade, a subjetividade de seus

locutores e interlocutores e o seu papel mediador da relação homem-mundo”.

Geraldi (1998, p. 22) acrescenta que o texto deve ser o ponto de partida

para o trabalho de leitura e produção escrita nas escolas, mas este deve ser

trabalhado em sua totalidade, estabelecendo relações dialógicas. Implica isso dizer

que deve ser considerada a correlação entre os textos já produzidos, observando-se

seu processo de produção, a partir do qual surgirão outros textos. A análise de

textos passa a centrar-se não numa abordagem estritamente lingüística, mas na

relação com as condições de produção:

O texto (oral ou escrito) é precisamente o lugar das correlações: construído materialmente com palavras (que portam significados), organiza estas palavras em unidades maiores para construir informações cujo sentido/orientação somente é compreensível na unidade global do texto. Este, por seu turno, dialoga com outros textos sem os quais não existiria.[...] Conceber o texto como unidade de ensino/aprendizagem é entendê-lo como um lugar de entrada para este diálogo com outros textos,

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que remetem a textos passados e que farão textos futuros. Conceber o aluno como produtor de textos é concebê-lo como participante ativo deste diálogo contínuo: com textos e com leitores.

Com a publicação dos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN – (BRASIL,

1996), na década de 90, as discussões a propósito do ensino de Língua Portuguesa

se acentuaram sobre os gêneros discursivos – ou textuais, como querem alguns

teóricos. Os PCN de Língua Portuguesa do 3º e 4º ciclos do Ensino Fundamental

(1998, p. 22) constituem-se em uma proposta pedagógica, cujo objetivo é formar um

cidadão crítico, “detentor de saberes lingüísticos necessários para o exercício da

cidadania”. Afirmam que o ensino da língua portuguesa, como prática pedagógica,

deve considerar o aluno “como sujeito da ação de aprender, aquele que age com e

sobre o objeto de conhecimento”. Assim, abandonando a dimensão restrita de ter a

palavra, oração e período como objeto de ensino, o trabalho com a língua, nessa

perspectiva, considera os gêneros materializados em textos como objeto de ensino.

O ensino de Língua Portuguesa pautado nos PCN é organizado pelo eixo

AÇÃO – REFLEXÃO, isto é, práticas de uso da linguagem (prática de escrita e de

leitura de textos e prática de produção de textos orais e escritos) e práticas de

reflexão sobre a língua e linguagem (prática de análises lingüísticas). Diante dessa

nova proposta, emergem várias pesquisas no espaço acadêmico, no sentido de

assumir os gêneros do discurso como objeto de ensino na prática de leitura e

produção textual. Como exemplo dessas pesquisas, temos as relatadas no livro

organizado por Roxane Rojo, intitulado A prática de linguagem em sala de aula –

praticando os PCNs (2000). O livro põe à mostra um conjunto de trabalhos

resultantes de pesquisas para aplicação do gênero em sala de aula. Além desse, há

outros, como Gêneros Textuais & Ensino (2005), organizado por Dionísio, Machado e

Bezerra, que reúne análises de textos da mídia; Gêneros: teorias, métodos, debates

(2005), que agrupa os trabalhos sob três abordagens na área de gêneros – sócio-

semiótica, sócio-retórica e sócio-discursiva – o qual teve como organizadores

Meurer, Bonini e Motta-Roth. Além desses livros, há também grande número de

dissertações e teses desenvolvidas com base nesse novo paradigma – o estudo da

língua como atividade social. As discussões sobre esse assunto têm-se acentuado

também em palestras, seminários, cursos, simpósios, publicação de artigos, ensaios,

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enfim, atualmente a abordagem dos gêneros do discurso é destaque nas discussões

sobre o ensino de Língua Portuguesa.

1.2 Gêneros do discurso: a perspectiva enunciativo-discursiva

Antes de tratar especificamente dos gêneros do discurso, faremos alguns

apontamentos acerca do pensamento bakhtiniano em relação à concepção de

linguagem,3 pois, dessa forma, teremos condições de compreender com mais

clareza a natureza real da língua na qualidade de fenômeno sócio-histórico e

ideológico.

Em Marxismo e Filosofia da Linguagem ([1929] 2004, p. 72)4, Bakhtin tece

críticas às duas correntes teóricas que marcaram os estudos lingüísticos em sua

época. A primeira refere-se ao subjetivismo idealista, que compreende a linguagem

como criação individual. Os adeptos dessa teoria acreditam que as formas de

manifestação da linguagem estão diretamente ligadas ao pensamento; portanto, se

uma pessoa não se expressa adequadamente é porque não pensa. Esta concepção

está relacionada com a gramática tradicional.

A segunda corrente teórica contra qual Bakhtin ([1929] 2004, p. 77) se opôs

foi o objetivismo abstrato. Nesta concepção, a língua é vista como um sistema

normativo do qual os falantes se apropriam para se comunicarem, isto é, há um

código em que o emissor transmite ao receptor uma mensagem por meio de um

canal. Em outros termos, é a linguagem como instrumento de comunicação, que

serve de apoio ao estruturalismo saussuriano. Sua principal função é a transmissão

de informações.

Contrariando as duas abordagens citadas, Mikhail Bakhtin ([1929] 2004, p.

123) afirma que

a verdadeira substância da língua não é constituída por um sistema abstrato de formas lingüísticas nem pela enunciação monológica isolada, nem pelo ato psicofisiológico de sua produção, mas pelo fenômeno social da interação verbal, realizada através da enunciação ou das enunciações. A interação verbal constitui assim a realidade fundamental da língua.

3 Para um estudo mais avançado sobre as concepções de linguagem, ver Travaglia (1997).

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Como podemos inferir, a posição teórica de Bakhtin se insere na terceira

concepção de linguagem, isto é, linguagem como forma de interação. Nessa

concepção, a língua ultrapassa o conceito de meramente transmissora de

informações e passa a ser vista como lugar de interação humana. Trata-se, como

afirma Geraldi (2005, p. 42), “de um jogo que se joga na sociedade, na interlocução.

É no interior do seu funcionamento que se pode procurar estabelecer as regras de

tal jogo”. Assim, a linguagem é um lugar de interação social em que os interlocutores

agem e interagem no momento real da comunicação. Nessa perspectiva, os

contextos sócio-histórico e ideológico são constitutivos da teoria bakhtiniana, os

quais foram negligenciados pelas teorias já citadas – subjetivismo idealista e

objetivismo abstrato. Dito de outra maneira, reduzir a língua a um sistema abstrato

de normas ou à expressão da criação individual, para Bakhtin (2004), não abarca a

complexidade dos fenômenos lingüísticos, isto é, da “realidade concreta da língua”.

Essa abordagem constitui, a nosso ver, um dos primeiros passos para a

construção do conceito de gêneros do discurso, embora não tenha sido mencionada

de forma particular, pois, ao se opor às duas concepções e afirmar que a linguagem

se manifesta pela interação verbal, o filósofo russo ([1929] 2004, p.124) acrescenta

que5

a língua vive e evolui historicamente na comunicação verbal concreta, não no sistema lingüístico abstrato das formas da língua nem no psiquismo individual dos falantes. Disso decorre que a ordem metodológica para o estudo da língua deve ser o seguinte: 1- As formas e os tipos de interação verbal em ligação com as condições concretas em que se realiza. 2- As formas das distintas enunciações, dos atos de fala isolados, em ligação estreita com a interação de que constituem os elementos, isto é, as categorias de atos de fala na vida e na criação ideológica que se prestam a uma determinação pela interação verbal. 3- A partir daí, exame das formas da língua na sua interpretação lingüística habitual.

5 Cabe aqui ressaltar as grandes contribuições proporcionadas pelo professor João Wanderley Geraldi no Curso Livre de Estudos Lingüísticos Novos Paradigmas do Ensino de Língua Materna, ministrado no primeiro semestre de 2006, no MeEL/IL/UFMT, para a compreensão desse assunto.

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Rojo (2005) afirma que, geralmente, quando se fala em gêneros do discurso, o que

se pode observar é que, na realização das pesquisas acadêmicas, no Brasil, o texto

mais citado é o capítulo Os gêneros do discurso 6, do livro Estética da Criação

Verbal, de 1953. Mas, lendo atentamente o livro Marxismo e Filosofia da Linguagem,

de 1929, podemos depreender que o filósofo russo mencionou, várias vezes, termos

que remetem a esse tema, embora não o tenha feito de maneira aprofundada e

complexa. Nesta última obra, essa menção pode ser constatada nas próprias

palavras do filósofo russo ([1929] 2004, p. 43):

Mais tarde, em conexão com o problema da enunciação e do diálogo, abordaremos também o problema dos gêneros lingüísticos. A este respeito faremos simplesmente a seguinte observação: cada época e cada grupo social têm seu repertório de formas de discurso na comunicação sócio-ideológica. A cada grupo de formas pertencentes ao mesmo gênero, isto é, a cada forma de discurso social, corresponde um grupo de temas. Entre as formas de comunicação (por exemplo, relações entre colaboradores num contexto puramente técnico), a forma de enunciação (“respostas curtas” na “linguagem de negócios”) e enfim o tema, existe uma unidade orgânica que nada poderia destruir.

O termo gênero foi usado, por muitos séculos, para remeter aos estudos no

âmbito da literatura, aliás, iniciado na Antigüidade com Aristóteles, em suas grandes

obras – Poética e Retórica. Brandão (2004, p. 96) afirma que o estudo dos gêneros

se constituiu a partir dessas duas grandes obras, mas várias classificações têm sido

feitas ao longo dos tempos: “a clássica distinção entre poesia e prosa; a distinção

entre lírico, épico e dramático, a oposição entre tragédia e comédia, além da

distinção entre os discursos deliberativo, judiciário e epidítico”. Dessa forma, pode-se

perceber que a questão dos gêneros foi, inicialmente, preocupação dos estudiosos

ligados aos estudos literários.

6 Na tradução espanhola, o título desse capítulo se apresenta como El Problema de los géneros discursivos. Barbosa (2001) considera esse título mais pertinente, uma vez que ele reflete a problemática pretendida por Bakhtin para mencionar esse assunto. Neste trabalho, manteremos o título da tradução da Martins Fontes (2003), isto é, Os gêneros do discurso.

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Com Mikhail Bakhtin, na primeira metade do século XX, esse termo passou

a apresentar um conceito mais amplo. De acordo com a visão bakhtiniana da

linguagem, os gêneros do discurso são “os tipos relativamente estáveis de

enunciados utilizados em cada esfera da atividade humana” ([1952/1953] 2003, p.

262). Nesse sentido, ao nos comunicarmos e interagirmos na sociedade, fazemos

uso, a todo o momento, dos gêneros, por isso, há uma variedade infinita deles sobre

a qual não temos controle e nem domínio em sua totalidade. O conceito de gêneros

em Bakhtin está ligado às formas de dizer sócio-historicamente constituídas, ou seja,

não há uma finitude dos gêneros, pois a sociedade muda, e cada vez vão aflorando

outras formas de uso da linguagem nas diversas esferas sociais. Segundo esse

autor ([1952/1953] 2003, p. 262),

a riqueza e a variedade dos gêneros do discurso são infinitas porque são inesgotáveis as possibilidades da multiforme atividade humana e porque em cada campo dessa atividade é integral o repertório de gêneros do discurso, que cresce e se diferencia à medida que se desenvolve e se complexifica um determinado campo.

Explicando de outra forma, para o filósofo russo, o repertório dos gêneros

amplia-se e modifica-se, à medida que as esferas de atividades se complexificam.

Importante é destacar, no entanto, que essas variações não são totalmente livres,

pois a estabilidade (relativa) é essencial para que haja uma compreensão responsiva

que, segundo Bakhtin (2003), sempre será ativa, considerando que todo ato

discursivo em situação de enunciação estimula uma resposta, mesmo que não a

esperada. A atitude responsiva é a compreensão da significação lingüística e

discursiva. Dessa forma, todo locutor visa à resposta do outro, seja uma

concordância, uma adesão ou uma objeção. Nas palavras do filósofo russo

([1952/1953] 2003, p. 271),

o ouvinte, ao perceber e compreender o significado (lingüístico) do discurso, ocupa simultaneamente em relação a ele uma ativa posição responsiva: concorda ou discorda dele (total ou parcialmente), completa-o, aplica-o, prepara-se para usá-lo, etc.; essa posição responsiva do ouvinte se forma ao longo de todo o processo de audição e compreensão desde o seu início, às vezes literalmente a partir da primeira palavra do falante. Toda compreensão da fala viva, do enunciado vivo é de natureza ativamente responsiva (embora o grau desse ativismo seja bastante

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diverso); toda compreensão é prenhe de resposta, e nessa ou naquela forma a gera obrigatoriamente: o ouvinte se torna falante.

O filósofo russo dividiu os gêneros em primários e secundários, propensos a

esclarecer a natureza do enunciado e seu processo de formação. Os primários

referem-se às situações cotidianas; são predominantemente orais, vistos como mais

“simples”. Estão mais relacionados às relações face a face. Os secundários são os

gêneros que aparecem em instâncias mais evoluídas; mais “complexos” e

predominantemente escritos. Estes formam-se com base nos primários.

No reportarmos aos gêneros do discurso, não podemos deixar de mencionar

a relação que Bakhtin estabelece entre o enunciado e a oração. Segundo esse

autor, nas obras Marxismo e Filosofia da Linguagem ([1929] 2004) e Estética da

Criação Verbal ([1952/1953] 2003), o enunciado é a unidade real da comunicação

verbal, cabendo as orações serem as unidades da língua (como sistema). Assim, o

enunciado é exatamente a realização enunciativa da oração, pois esta, como

unidade abstrata da língua, não provoca uma atitude responsiva ativa. O contexto é

fator determinante nessa relação. O enunciado concreto é dinâmico, tem vida, não é

uma unidade convencional, é real e se desenvolve no processo da interação social

através da participação dos sujeitos. Assim, os sujeitos, ao produzirem um

enunciado, estão sempre respondendo a um já-dito, a um querer-dizer; portanto, o

enunciado é, ao mesmo tempo, uma resposta e uma provocação para a construção

de outros enunciados: “cada enunciado é um elo na corrente complexamente

organizada de outros enunciados” (BAKHTIN, [1952/1953] 2003, p. 272). É esse elo

que garante o princípio dialógico constitutivo da linguagem. Para esse autor

([1952/1953] 2003, p. 282),

a língua materna – sua composição vocabular e sua estrutura gramatical – não chega ao nosso conhecimento a partir de dicionários e gramáticas, mas de enunciações concretas que nós mesmos ouvimos e nós mesmos reproduzimos na comunicação discursiva viva com as pessoas que nos rodeiam. Nós assimilamos as formas da língua somente nas formas das enunciações e justamente com essas formas. As formas da língua e as formas típicas dos enunciados, isto é, os gêneros do discurso, chegam à nossa experiência e à nossa consciência em conjunto e estreitamente vinculadas. Aprender a falar significa aprender a construir enunciados (porque falamos por enunciados e não por orações isoladas e, evidentemente, não por palavras isoladas). [...] Nós aprendemos a moldar o nosso discurso em formas de gêneros

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e, quando ouvimos o discurso alheio, já adivinhamos o seu gênero pelas primeiras palavras, adivinhamos um determinado volume, uma determinada construção composicional, prevemos o fim, isto é, desde o início temos a sensação do conjunto do discurso que em seguida apenas se diferencia no processo da fala.

Essa citação reforça a posição de Bakhtin, ao se opor à teoria do objetivismo

abstrato em Marxismo e Filosofia da Linguagem ([1929] 2004), pois, para o autor, “a

língua vive e evolui na comunicação verbal concreta”. Assim, é pela interação verbal

que os sujeitos se constituem como tais, e não pelo estudo das unidades

segmentadas da língua (fonemas, palavras, frases), vistas de maneira isolada,

descontextualizada de sua utilização. Assumir a concepção enunciativo-discursiva

como prática de ensino é considerar a linguagem como interação social em que os

interlocutores estudam a língua em reais situações de sua produção. Podemos ver,

aqui, a relação dessa citação como contribuição para os estudiosos da linguagem

repensarem o ensino de língua portuguesa. Dizendo de outra forma, a língua deve

ser estudada como prática social contextualizada no processo de interação verbal. A

nosso ver, é precisamente a partir dessa premissa que o ensino de língua

portuguesa deve se fundamentar.

Maingueneau (2004, p. 59), ao tratar dos gêneros, em sua obra Análise de

textos de comunicação, no capítulo intitulado Tipos e gêneros do discurso, afirma

que “todo texto pertence a uma categoria de discurso, a um gênero do discurso”.

Dessa forma, uma conversa, um jornal, um panfleto, um cartão, um artigo de

opinião, uma propaganda, etc. são termos utilizados pelos locutores de uma

sociedade para categorizar a imensa variedade de textos que são produzidos.

Assim, esse autor compreende os gêneros do discurso como “dispositivos de

comunicação que só podem aparecer quando certas condições sócio-históricas

estão presentes”. Ou seja, o aparecimento dos gêneros em todas as esferas da

atividade social estará diretamente condicionado a determinadas condições

históricas de uma determinada sociedade em que os enunciados são produzidos.

Nessa obra, Maingueneau trata amplamente das tipologias do discurso, pois,

para ele, a forma de categorizá-las é muito diversificada, por conta da variedade dos

tipos de textos existentes na sociedade. O autor cita as tipologias comunicacionais,

que se expressam por categorias como o discurso “polêmico”, “didático”,

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“prescritivo”, etc. Estas indicam o que se faz com o enunciado, e elas podem se

apresentar tanto por funções da linguagem (função referencial, emotiva,

metalinguagem) como por funções sociais (função lúdica, de contato religioso etc).

Nessa classificação, o discurso publicitário tem como função predominante a

conativa, pois visa a atingir diretamente o leitor por meio da persuasão.

O autor chama a atenção para a dificuldade no traçar uma fronteira entre

esses dois tipos – funções da linguagem e funções sociais. Assim, posteriormente,

ele explicita as tipologias de situações de comunicação em que apresenta os

conceitos de gêneros de discurso e tipo de discurso. Para Maingueneau (2004, p.

61), “os gêneros do discurso pertencem a diversos tipos de discursos associados a

vastos setores de atividade social”. Essa categorização, por seu caráter

historicamente variável, contrapõe-se às tipologias comunicacionais que citamos.

Outras tipologias apontadas pelo autor francês são as lingüística e discursiva. A

primeira estabelece a relação entre o enunciado e a situação de enunciação; a

segunda, por sua vez, é a ideal para a Análise do Discurso, pois não dissocia as

caracterizações ligadas às funções, aos tipos e aos gêneros do discurso.

Em consonância com Bakhtin, Maingueneau ressalta a importância do

domínio dos gêneros como fator de economia, ou seja, não precisamos ficar atentos

a todos os detalhes de todos os enunciados com que deparamos no dia-a-dia, pois,

se assim fosse, a comunicação seria impossível. Outro aspecto mencionado por

esse autor é que os saberes compartilhados entre os participantes no momento da

interação contribuem para assegurar a comunicação.

Alicerçados em Bakhtin e assumindo que a aprendizagem da língua materna

se efetiva pelas enunciações concretas que produzimos, o grupo de estudiosos de

Genebra, composto por Joaquim Dolz, Bernard Schneuwly, Auguste Pasquier, entre

outros, há quase duas décadas, vem desenvolvendo trabalhos sobre o ensino de

língua a partir de gêneros. Para Schneuwly (2004, p. 26), o gênero constitui-se como

uma ferramenta, ou seja, um (mega-)instrumento – objeto socialmente elaborado –

de que o sujeito se utiliza para interagir em situações de linguagem na sociedade.

[...] há visivelmente um sujeito, o locutor-enunciador, que age discursivamente (falar/escrever), numa situação definida por uma série de parâmetros, com a ajuda de um instrumento que aqui é um gênero, um instrumento semiótico complexo, isto é, uma forma de

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linguagem prescritiva, que permite, a um só tempo, a produção e a compreensão de textos.

Ao desenvolver esse conceito metafórico do gênero, Schneuwly acredita que

uma das particularidades desse instrumento é o fato de ele ser constitutivo da

situação comunicativa, apresentando níveis de operações que são necessárias para

a produção de um texto, os quais são organizados pela estrutura global do gênero.

Dentre as várias classificações dos gêneros vistas no decorrer do capítulo,

optaremos, neste trabalho, pelos pressupostos bakhtinianos, por acreditarmos mais

adequados aos propósitos deste estudo. Segundo Bakhtin ([1952/1953] 2003, p.

265), os gêneros do discurso são caracterizados por três elementos, fortemente

inter-relacionados.

O primeiro deles, o conteúdo temático, compreende a intenção discursiva, o

querer-dizer do locutor, ou seja, o que pode tornar-se dizível por meio dos gêneros.

“[...] interpretamos, sentimos a intenção discursiva de discurso ou a vontade

discursiva do falante, que determina o todo do enunciado, o seu volume e as suas

fronteiras”. Nesse sentido, os elementos lingüísticos e não-lingüísticos usados pelo

locutor, aplicados e adaptados a um gênero do discurso em uma situação concreta

de comunicação, possibilitam aos interlocutores uma atitude responsiva.

O segundo elemento, a estrutura composicional, é a forma como os gêneros

são organizados, estruturados, ou seja, como são apresentados. Podemos dizer que

essas formas representam o conjunto de restrições do que constitui o gênero,

marcando, assim, suas especificidades.

Por último, o terceiro elemento é o estilo, constituído pelas escolhas

gramaticais, fraseológicas e lexicais que fazemos para a construção dos gêneros.

De acordo com Bakhtin ([1952/1953] 2003, p. 266), todo estilo está ligado às formas

típicas de enunciados e pode refletir a individualidade do falante. Entretanto, nem

todos os gêneros são propícios a tal reflexo, pois em muitos deles

o estilo é indissociável de determinadas unidades temáticas e – o que é de especial importância – de determinadas unidades composicionais: de determinados tipos de construção do conjunto, de tipos do seu acabamento, de tipos da relação do falante com outros participantes da comunicação discursiva.

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Importante é frisar que essas três características – conteúdo temático,

estrutura composicional e estilo – devem ser consideradas a partir do contexto de

produção, circulação e recepção do gênero, ou seja, os enunciados pertencem à

determinada esfera de atividade humana; são, portanto, sócio-historicamente

situados. Para Bakhtin ([1952/1953] 2003, p. 262), “esses três elementos estão

indissoluvelmente ligados ao todo do enunciado e são igualmente determinados pela

especificidade de um determinado campo de comunicação”.

Partindo desses conceitos, podemos afirmar que a propaganda impressa –

objeto deste estudo – constitui-se em um gênero de discurso por apresentar o tripé

bakhtiniano, isto é, geralmente é constituído da linguagem verbal e não-verbal –

multimodalidade – e, por igual, tem como finalidade persuadir e convencer o leitor a

adquirir um produto ou a aderir a uma idéia.

Trataremos agora, especificamente, das características da propaganda

impressa no que concerne à distinção dos termos propaganda e publicidade, das

estratégias persuasivas que as constituem e dos conceitos de subentendido e

pressuposição.

1.3 Propaganda impressa: concepções teóricas

1.3.1 Publicidade e/ou propaganda

Os termos publicidade e propaganda, embora sejam usados como

sinônimos, em não poucos casos, apresentam diferenças essenciais quando usados

tecnicamente. Etimologicamente, publicidade deriva de público, palavra de origem

latina – publicus – significando o ato de vulgarizar, de tornar público um fato ou uma

idéia. No século XV, na França, tinha um sentido de ordem jurídica, publicação de

leis, mas, segundo Rabaça & Barbosa (apud PINHO,1990, p. 16), o termo

publicidade perde esse sentido jurídico e passa a ganhar um significado comercial

em meados do século XIX: “Qualquer forma de divulgação de produtos ou serviços,

através de anúncios pagos e veiculados sob a responsabilidade de um anunciante

identificado com objetivos de interesse comercial”.

Já a propaganda é definida como a propagação de princípios e teorias

relacionadas com a política, com a religião e com a ética. Tem origem no latim –

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propagare – que quer dizer propagar, difundir, estender. De acordo com Sandmann

(2003, p. 09), esse termo surgiu do nome Congregatio de propaganda fide

(Congregação da fé que deve ser propagada), criada em Roma, em 1622. Tinha

como finalidade a propagação da fé. Assim, o termo propaganda acoberta o sentido

de disseminação de idéias, princípios e doutrinas ligados aos valores religiosos.

Como podemos perceber, publicidade e propaganda são termos distintos no

que se refere à etimologia. Mas de acordo com Rabaça e Barbosa (1995, p. 481),

esses termos estão sendo usados sem muita distinção.

No Brasil e em alguns países da América Latina, as palavras propaganda e publicidade são geralmente usadas com o mesmo sentido, e esta tendência parece ser definitiva, independentemente das tentativas de definição que possamos elaborar em dicionários ou em livros acadêmicos. Em alguns aspectos, porém, é possível perceber algumas distinções no uso das duas palavras: em geral não se fala em publicidade com relação à comunicação persuasiva de idéias (neste aspecto, propaganda é mais abrangente, pois inclui objetivos ideológicos, comerciais etc.); a publicidade mostra-se mais abrangente no sentido de divulgação (tornar público, informar, sem que isso implique necessariamente persuasão).

Atualmente, no mercado de trabalho, de modo geral, esses termos se

distanciaram de suas definições próprias de origem, isto é, não há mais uma

fronteira clara entre “propaganda” e “publicidade”. Diante disso, e em decorrência do

uso das variedades de textos – tanto propagandas comerciais quanto sociais – que

utilizamos para o desenvolvimento das atividades práticas, faremos uso dos termos

propaganda e publicidade indistintamente, por considerarmos coerente com os

propósitos desta pesquisa.

Existe uma variação muito grande de classificação dos tipos de propagandas

e publicidade. Pinho (1990) apresenta a seguinte classificação: Publicidade de

produto, que se destina à divulgação de produtos em que o fabricante ou o produtor

leva o público-alvo ao conhecimento e à intenção de compra; a publicidade de

serviços geralmente apresenta anúncios que destacam vantagens e facilidades

oferecidas por bancos, financiadoras e seguradoras; publicidade de varejo (ou

comercial), que tem ligação direta com o consumidor final, anuncia produtos

fabricados por outras empresas e vendidos por empresas de varejo e, por último,

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publicidade de promoções, que são estratégias criadas para divulgar e dar apoio às

promoções de vendas. Esta se utiliza de meios maciços, como TV, revista, outdoor

e, atualmente, a Internet.

Já no referente à propaganda, Pinho (1990) esboça a seguinte classificação:

propaganda política, tem como finalidade difundir os aspectos ideológicos,

filosóficos, partidários; propaganda eleitoral, tem como objetivo a conquista de votos

para os candidatos; propaganda governamental, visa à criação ou modificação da

imagem de determinado governo; propaganda institucional, tem por finalidade

posicionar empresas para o público interno e externo e não é ligada diretamente à

venda de produtos ou serviços; finalmente, a propaganda social compreende todas

as campanhas voltadas às causas sociais e, geralmente, tem como objetivo

informar, prestar esclarecimentos sobre violência, prevenção de doenças, acidentes

de trânsito, preservação do meio ambiente, entre outras questões sociais.

Atualmente, podemos observar que, além de grupos sociais que não visam a

lucros, como instituições filantrópicas, hospitais, grupos religiosos, órgãos públicos,

há o marketing social, que ocorre quando empresas comerciais se utilizam desse

tipo de propaganda para conquistar a simpatia do público, demonstrando

preocupação com as causas sociais7.

1.3.2 Estratégias persuasivas da propaganda

Com o advento da imprensa e, simultaneamente, o desenvolvimento da

mídia, o número de propagandas e publicidades cresceu de forma incontrolável.

Hoje, esses textos estão presentes em todos os lugares: nos outdoors, televisão,

7 De acordo com Kotler e Roberto (1992, p. 25), “o termo marketing social apareceu pela primeira vez em 1971, para descrever o uso de princípios e técnicas de marketing para a promoção de uma causa, idéia ou comportamento social. Desde então, passou a significar uma tecnologia de gestão da mudança social, associada ao projeto, implantação e controle de programas voltados para o aumento da disposição de aceitação de uma idéia ou prática social em um ou mais grupos de adotantes escolhidos como alvo”.

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rádios, Internet, panfletos, revistas, jornais. Enfim, é praticamente impossível

imaginar nosso dia-a-dia sem o bombardeio de anúncios. Para Vestergaard e

Schroder (2005), a expansão da propaganda ocorreu no final do século XIX por

força da superprodução decorrente dos investimentos tecnológicos, chegando a um

nível de desenvolvimento em que as empresas lançavam mercadorias mais ou

menos iguais e a preços equivalentes. Assim, as técnicas publicitárias mudam da

informação para a persuasão, o que fez surgir, no século XIX, as primeiras agências

publicitárias. Outra novidade, segundo esses autores, foi o desabrochar da televisão

– um dos meios de comunicação mais vistos pela população. A esse respeito,

Carvalho (2003) afirma que, até o século XIX, a publicidade limitava-se a informar o

produto vendido e seu custo, mas que, nas últimas décadas, ocorreram muitas

mudanças no uso da linguagem, isto é, a sedução e a persuasão substituíram a

objetividade informativa.

O discurso da propaganda é geralmente sustentado pela combinação de

recursos icônico-lingüísticos e que de maneira consciente procura convencer o

consumidor a adquirir um produto ou a mudar de comportamentos e atitudes. Para

isso, é utilizado um conjunto de técnicas e recursos semióticos, tais como jogo de

cores e imagens; diferentes tamanhos das fontes; frases curtas, períodos compostos

por coordenação; seleção lexical cuidadosa, uso de figuras de linguagem com

termos específicos, claros e concisos; linguagem clara e objetiva. Bolinger (apud

CARVALHO, 2003, p. 18), a respeito da linguagem publicitária, pontua: “Com o uso

de simples palavras, a publicidade pode transformar um relógio em jóia, um carro em

um símbolo de prestígio e um pântano em paraíso tropical”. Ao fazer a apresentação

de um produto, a propaganda acaba por reproduzir padrões de beleza e de

comportamento de uma determinada sociedade, ou estimula a desfazê-los, isto é,

dita o que está ou não na moda, o que uma pessoa precisa para ser bem-sucedida e

feliz, além de retratar comportamentos e papéis sociais presentes na família,

trabalho, lazer. Aliás, acaba promovendo uma igualdade utópica entre as pessoas e,

ao mesmo tempo, estabelecendo um grau de superioridade que será vista e

reconhecida pela sociedade.

O produtor do texto precisa levar em conta, ao “bolar” uma propaganda, que

um leitor em potencial lê uma revista ou um jornal, por exemplo, não em função das

propagandas lá encontradas, mas pelas reportagens, matérias que esses suportes

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oferecem. A esse respeito, Vestergaard e Schroder (2005, p. 47) mencionam a

importância das imagens na produção de uma propaganda, já que estas se

diferenciam do texto verbal em relação à percepção, pois elas chamam mais a

atenção do leitor em um primeiro contato, ainda que seja de maneira rápida.

Segundo eles, o lingüístico apresenta uma dimensão temporal que não pode ser

abreviada, pois a sua unidade menor – a oração – tem começo e fim. Já o texto não-

verbal é visualizado de imediato, o que faz despertar a atenção do leitor. Uma vez

captada a atenção do leitor, o anúncio deve convencê-lo de que o produto vai

satisfazer suas necessidades ou despertar uma que até então não fora sentida. Não

basta sentir vontade de adquirir o produto. O anúncio precisa convencer o público-

alvo de que a marca anunciada é superior a qualquer outra similar e, assim, o

produto deve ser comprado.

Para ajudar a compreender os recursos não-lingüísticos empregados nos

textos utilizados nesta pesquisa, apoiamo-nos, também, na sexta hipótese8 − Uma

prática intersemiótica − desenvolvida por Maingueneau (2005, p. 145), em seu livro

Gênese dos discursos. Segundo ele,

limitar o universo discursivo unicamente aos objetos lingüísticos constitui sem dúvida alguma um meio de precaver-se contra os riscos inerentes a qualquer tentativa “intersemiótica”, mas apresenta o inconveniente de nos deixar muito aquém daquilo que todo mundo sempre soube, a saber, que os diversos suportes intersemióticos não são independentes uns dos outros, estando submetidos às mesmas escanções históricas, às mesmas restrições temáticas.

Nos textos publicitários, pode-se perceber que os recursos semióticos são

determinantes para a construção dos sentidos. O uso das cores e imagens, o

formato e a escolha da fonte são constituintes do texto publicitário. A disposição de

tais recursos não é aleatória, ou seja, quando um produtor faz sua escolha, são

levados em conta o produto anunciado, o suporte em que será veiculado, os

interlocutores, enfim, as condições de produção. Desconsiderá-las no processo de

leitura provocaria uma interpretação fragmentada. 8 No livro Gênese dos Discursos, Maingueneau (2005) apresenta sete hipóteses: primado do interdiscurso, uma competência discursiva, uma semântica global, a polêmica como interincompreensão, do discurso à pratica discursiva, uma prática intersemiótica e um esquema de correspondência. Neste trabalho, faço referência à sexta hipótese.

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A respeito dos recursos usados na construção de uma propaganda,

Sant’Anna (1999, p. 157) sustenta que um anúncio publicitário deve:

- Atrair a atenção (o anúncio deve ser visto); - Despertar o interesse (o anúncio deve ser lido); - Criar a convicção (o anúncio deve ser acreditado); - Provocar uma resposta (o anúncio deve levar à ação); - Fixar na memória (a coisa anunciada deve se lembrada).

Para que a propaganda produza o efeito explicitado, variadas são as

maneiras de elaboração desse gênero discursivo. Muitas vezes, utiliza-se de

recursos estilísticos da linguagem cotidiana e trabalha com crenças, mitos, valores

como forma de aproximação com o leitor. Nesses casos, é comum encontrarmos o

uso de provérbios, gírias, estereótipos, marcas de informalidade, formas

eufemísticas para suavizar o discurso, letras de música, enfim, uma série de

recursos para passar a idéia de um mundo perfeito em que tudo o que uma pessoa

precisa para se realizar, ser feliz, viver em harmonia, com tranqüilidade está sendo

oferecido. Nesse caso, o público-alvo é fator fundamental, isto é, uma mensagem

publicitária feita para o público masculino difere completamente da que é feita para o

feminino ou para o público infantil.

Sandmann (2003) aponta aspectos especialmente criativos presentes na

propaganda, objetivando perceber o estilo e as características gerais desses textos,

destacando aos chamados desvios gramaticais:

• Variação lingüística: trabalha com a linguagem coloquial, em que a fala

é adaptada ao contexto da situação. Há presença de gírias ou variedade de

determinada região em que o anúncio foi produzido:

Pense mais em você, sua bobona.

• Empréstimo lingüístico: ocorre quando se faz uso de termos

estrangeiros em substituição aos da língua materna. É o caso da preferência por

griffe ao invés de “marca” para atender ao estilo do leitor e para transmitir idéia de

superioridade. Ocorre também a troca apenas de letras como forma de embelezar a

palavra:

Ká Entre Nós (nome de um bar em Curitiba).

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• Aspectos (orto)gráficos: usados para provocar efeitos expressionais

especiais, mas não como desrespeito às normas ortográficas:

As praias e sua Honda esperam por você.

• Aspectos fonológicos: uso de rimas, ritmo e aliteração como forma de

brincar com as palavras e deixar aparecer um tom poético:

Aki tem Delicious Fish.

• Aspectos morfológicos: jogo com as palavras complexas, prefixação,

sufixação e cruzamento vocabular usados para compor novas palavras ou realçar a

intensidade de sentido:

O supermóvel feito para você.

• Aspectos sintáticos: uso de períodos simples, de preferência por

coordenação, paralelismo, simetria, muitas vezes fugindo da norma padrão; aliás,

esta é uma característica marcante da linguagem publicitária:

Para fazer vatapá, tutu à mineira, carreteiro e todas as comidas favoritas dos brasileiros.

• Aspectos semânticos: uso da polifonia para provocar duplicidade de

sentidos, apresentação de idéias opostas com a utilização da antonímia e

combinações estilísticas:

Um carro que diz onde você chegou antes mesmo de ter saído da garagem.

• Aspectos (con)textuais: apresentam a estrutura predominante da

propaganda: título, texto e assinatura. Importante é salientar que este aspecto é

muito variável, pois, em muitas propagandas, encontramos apenas imagens, assim

como em outras falta o título, nem por isso deixando de ser criativas.

Todos esses recursos lingüísticos e não-lingüísticos reforçam a importância

do produto ou serviço propagado, estabelecendo maior aproximação com o leitor.

Influenciam opiniões, aguçam sentimentos e, em muitos casos, provocam mudança

de atitudes no leitor. Os efeitos de significação são construídos pela interação

locutor – alocutário, este a quem se procura convencer e de quem são esperados,

como resposta, atitudes e comportamentos.

1. 3. 3 Implícito e explícito no discurso da propaganda

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Como já foi mencionado neste capítulo, o discurso da propaganda

caracteriza-se por uma linguagem econômica, rápida e marcada pela informalidade,

tendo em vista ser um gênero discursivo que não poderá ocupar muito tempo do

leitor. É interessante notar que nem todas as informações são exibidas de forma

explícita, isto é, há o não-dito que é compreendido pelo interlocutor. Ao tratar dos

conceitos de implícito e explícito, faz-se necessário discorrer sobre os de

pressuposto e subentendido. Em outros termos, os recursos argumentativos que

garantem o alcance do objetivo da propaganda – atingir o seu receptor, fazendo-o

adquirir algum produto ou aderir a alguma idéia que estão sendo propagados – são

(e talvez principalmente) os que não estão externalizados, mas sugeridos.

Ducrot (1997, p. 41), em sua teoria da argumentação, desenvolve um

trabalho, diferenciando os conceitos de subentendido e de pressuposição como

forma distinta de não dizer:

A pressuposição é [...] um elemento do sentido – se se considera o sentido como uma espécie de retrato da enunciação. Dizer que pressuponho X, é dizer que pretendo obrigar o destinatário, por minha fala, a admitir X, sem por isso dar-lhe o direito de prosseguir o diálogo a propósito de X. O subentendido, ao contrário, diz respeito à maneira pela qual esse sentido é manifestado, do processo, ao término do qual deve-se descobrir a imagem que pretendo lhe dar de minha fala.

De acordo com esse autor, esses dois conceitos se apresentam em dois

níveis semânticos: o da pressuposição está no nível da significação e o

subentendido no do sentido. Assim, o primeiro se estabelece em um contexto

conhecido e compartilhado pelos leitores. Ele mostra informações fora do enunciado,

isto é, do que é posto, do que é dito. O posto no enunciado é o que se estampa de

forma explícita, é a base da formulação. Já o pressuposto, implica um enunciado

implícito e é nesse sentido que o interlocutor necessita compartilhar do mesmo

pressuposto que o locutor. O subentendido deixa por conta do interlocutor a

responsabilidade de interpretação do que não foi dito, mas está presente nas

condições da enunciação.

Maingueneau (2004, p. 33) afirma que os subentendidos, ao contrário dos

pressupostos, são conteúdos implícitos pragmáticos (ênfase do autor), ou seja, são

as inferências extraídas do contexto pelo co-enunciador. Os pressupostos são

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também uma forma de implícito, mas estão na base lingüística e são definidos com a

ajuda do teste de negação. “O tipo de implícito que se evidencia pelo confronto do

enunciado com o contexto de enunciação, [...] é denominado subentendido. Esse se

opõe a um outro tipo de implícito, os pressupostos, que vêm inscritos no enunciado”.

Segundo Maingueneau (2004, p. 271), um enunciado como

“Pedro parou de fumar” veicula as informações seguintes: (1) “Pedro, atualmente, não fuma”: é o posto, que corresponde a “aquilo que é objeto confesso da enunciação dessa declaração”; (2) “Pedro, antigamente, fumava”: é o pressuposto, que, embora, como o posto, esteja de fato inscrito no enunciado (já que repousa sobre o marcador “cessar de”), não constitui, contudo, o verdadeiro objeto do dizer; e, eventualmente, também, (3) “Você faria bem em fazer a mesma coisa”: conteúdo subentendido que só se atualizará em circunstâncias enunciativas particulares.

Nos textos utilizados para a realização desta pesquisa, evidenciamos que o

uso dos pressupostos e subentendidos é meio altamente eficiente para garantir a

argumentação da linguagem. São recursos que possibilitam ao enunciador se eximir

da responsabilidade do dizer, pois os implícitos ficam sob a responsabilidade do

interlocutor, tendo em vista que o sentido é atribuído por sua interpretação. Isso se

dá porque há informações que não devem ser ditas por não ser convenientes dizê-

las, mas podem ser sugeridas, ditas nas entrelinhas. Esses recursos visam a atingir

o objetivo principal do discurso da propaganda: convencer e persuadir o interlocutor.

É sobre esses dois conceitos que discutiremos.

Para tratar dos conceitos de convencer e persuadir, Perelman e Olbrechts-

Tyteca (1996, p. 22), em sua obra O Tratado da Argumentação – A Nova Retórica,

afirmam que um dos aspectos a ser levado em conta quando se trata da

argumentação é a adaptação do discurso ao auditório, isto é, ao leitor a quem é

dirigida a mensagem: “a argumentação efetiva tem de conceber o auditório

presumido tão próximo quanto o possível da realidade”.

Assim, se o produtor de um texto tiver uma imagem inadequada de seu

auditório, poderá sofrer conseqüências desagradáveis quanto à recepção da

mensagem. Nesse sentido, o conhecimento daqueles que se pretende atingir e

conquistar é, portanto, condição fundamental de qualquer argumentação eficiente.

Muitas vezes ocorre de o orador ter de persuadir um auditório heterogêneo, reunindo

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pessoas diferenciadas quanto ao caráter, condição social, vínculos ou funções.

Nesse caso, serão usados argumentos múltiplos, que sejam convincentes para

atingir tal objetivo.

Para esses autores, a palavra persuadir apresenta uma dimensão maior do

que convencer, se for levado em conta o resultado final, sendo que este ato procura

atingir os desejos do interlocutor por meio de argumentos plausíveis e tem caráter

ideológico, subjetivo e temporal, dirigindo-se, assim, a um auditório particular. Já o

ato de convencer está ligado à razão por meio de pensamento lógico e racional,

sendo, dessa forma, capaz de atingir um auditório universal.

Embora os autores (1996, p. 31) estabeleçam distinções entre esses termos,

afirmam que há uma imprecisão de distinção na prática:

Propomo-nos chamar persuasiva a uma argumentação que pretende valer só para um auditório particular e chamar convincente àquela que deveria obter adesão de todo ser racional. O matiz é bastante delicado e depende, essencialmente, da idéia que o orador faz da encarnação da razão. Cada homem crê num conjunto de fatos, de verdades, que todo homem normal deve, segundo ele, aceitar, porque são válidos para todo ser racional. Mas será realmente assim? Essa pretensão a uma validade absoluta para qualquer auditório composto de seres racionais não será exorbitante? Mesmo o autor mais consciencioso tem, nesse ponto, de submeter-se à prova dos fatos, ao juízo de seus leitores. Em todo caso, ele terá feito o que depende dele para convencer, se acredita dirigir-se validamente a semelhante auditório.

Para esses autores, o objeto da teoria da argumentação apresentado na

Nova Retórica é o estudo das técnicas discursivas que permitem provocar ou

aumentar a adesão dos espíritos à tese que se lhes apresenta ao assentimento:

“Uma argumentação eficaz é a que consegue aumentar essa intensidade de adesão

de forma que se desencadeie nos ouvintes a ação pretendida ou, pelo menos, crie

neles uma disposição para a ação” (op cit., p. 50).

1. 4 Gênero discursivo em sala de aula e a seqüência didática

O ensino de Língua Portuguesa pautado na perspectiva discursiva requer

práticas pedagógicas baseadas no uso da linguagem em situações reais de

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comunicação, objetivando-se a leitura e a produção dos gêneros do discurso. Para

isso, é necessário uma redefinição do papel do professor em relação à sua

concepção de linguagem no processo de ensino-aprendizagem. Sabemos que há

dificuldade muito grande de transposição dos estudos teóricos para a prática em

sala de aula.

O lingüista Ingo Voese (2004, p. 14) questiona essa dificuldade, ou seja,

essa distância que se verifica entre o que se produz na academia e a sua aplicação

no ensino de língua portuguesa. Em seu livro Análise do Discurso e o ensino de

Língua Portuguesa, aponta possibilidades de aplicação dos conceitos para a análise

propriamente dita, visando à melhoria das aulas.

Para Lopes-Rossi (2002), ainda hoje, nas escolas, a produção de texto

ocorre de maneira inadequada: há uma artificialidade da situação de produção e dos

temas propostos, além da falta de objetivos por parte do aluno e do professor, da

falta de leitor real (exceto o professor para a leitura dos textos dos alunos), ao lado

da falta de planejamento, somada à dependência do professor ao livro didático. São

essas razões, entre outras, que contribuem para o fracasso no tocante à produção

escrita nas escolas. É necessário que o aluno possa sentir que realmente está

produzindo para um leitor (que não deve ser apenas o professor), eliminando a

exclusividade das situações artificiais de produção textual que ainda se fazem tão

presentes no cotidiano da escola. Portanto, a produção de textos deve inserir-se

num processo de interlocução, o que implica a realização de uma série de atividades

- de planejamento e de execução - que não são lineares nem estanques. A autora

(2002, p. 33) sugere os seguintes passos para realização prática do trabalho com

gêneros do discurso: - leitura do gênero para conhecimento das propriedades discursivas e lingüístico-textuais; - produção escrita do gênero (planejamento, elaboração da primeira versão e refacção) e; - divulgação ao público, de acordo com a forma típica de circulação do gênero.

“Aprender a falar significa aprender a construir enunciados (porque falamos

por enunciados e não por orações isoladas e, evidentemente, não por palavras

isoladas”. Essa posição defendida por Bakhtin ([1952/1953] 2003, p. 283) é adotada

pela maioria dos autores que tratam a língua em seus aspectos discursivos e

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enunciativos, e não em suas peculiaridades formais. Essa visão segue uma noção

de língua como atividade social e histórica. É dessa forma que os gêneros se

constituem como ações sócio-discursivas.

Dolz e Schneuwly (2004, p. 97) propõem o desenvolvimento de atividades

organizadas em seqüências didáticas, “um conjunto de atividades escolares

organizadas, de maneira sistemática, em torno de um gênero textual oral ou escrito”.

Este tipo de abordagem tem por objetivo ajudar o aluno a dominar melhor um

gênero, de maneira que ele tenha condições de utilizá-lo adequadamente em uma

situação comunicativa. Uma seqüência didática, em síntese, se estrutura da seguinte

forma:

1. A apresentação da situação – esse é o momento de expor aos alunos o

projeto que será desenvolvido, qual é o gênero que será abordado, a quem se

dirige a produção, que forma assumirá a produção, quem participará da

produção.

2. A primeira produção – a produção inicial tem papel central como reguladora

da seqüência didática, tanto para os professores como para os alunos.

3. Os módulos – nos módulos serão trabalhados os problemas evidenciados na

primeira produção de maneira que os alunos possam superá-los.

4. Produção final – nesta etapa, os alunos produzirão os textos, tendo a

oportunidade de melhorá-los, colocando em prática o que estudaram nos

módulos.

1.5 Formação do leitor crítico: concepção de leitura na perspectiva discursiva

A prática de leitura na abordagem discursiva é um processo complexo, pois

não se baseia na decifração de códigos lingüísticos ou reconhecimento de

parágrafos. O bom leitor não lê apenas linearmente. Sua leitura constrói os sentidos.

Assim, o objetivo principal na formação de um leitor crítico é criar condições para

que ele, por meio da reflexão sobre o funcionamento da língua nos textos, seja

capaz de desenvolver sua competência comunicativa de forma que interaja em

diferentes situações. A esse respeito, Maingueneau (2004, p. 43) salienta que essa

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competência “consiste essencialmente em se comportar como convém nos múltiplos

gêneros de discurso: é antes de tudo uma competência genérica”.

De acordo com Brandão (2001, p. 21), o leitor crítico

- não é apenas um decifrador de sinais, um decodificador da palavra. A palavra, para ele, é signo e não sinal (no sentido bakhtiniano). Busca uma compreensão do texto, dialogando com ele, recriando sentidos implícitos nele, fazendo inferências, estabelecendo relações e mobilizando seus conhecimentos para dar coerência às possibilidades significativas do texto; - é cooperativo, na medida em que deve ser capaz de construir o universo textual a partir das indicações que lhe são fornecidas; - é produtivo, na medida em que, refazendo o percurso do autor, trabalha o texto e se institui em um co-enunciador; - é, enfim, sujeito do processo de ler e não objeto, receptáculo de informações.

Cada um, com sua história de leitura, envolve-se e interage de modo

singular com um dado texto, e estes, com um conjunto de conhecimentos que o

leitor já possui, entre eles seus conhecimentos de mundo e lingüístico. É essa

interação que faz gerar a compreensão do texto lido. Nesse sentido, podemos

afirmar que “cada leitor tem a sua história” (ORLANDI, 2001, p. 43). A interação

leitor-texto marca a incompletude do texto que só se completa no ato da leitura.

Dessa forma, a compreensão e a interpretação de um texto nunca poderão ser

entendidas como atos passivos, pois, se quem escreve sempre pressupõe o outro,

quem lê co-enuncia. O texto é, portanto, reescrito em cada processo de leitura.

É papel da escola assumir essa postura e criar condições para que o aluno

seja leitor co-enunciador. A leitura, como prática social, exige um leitor crítico que

seja capaz de mobilizar seus conhecimentos prévios, quer lingüísticos, textuais, quer

de mundo, para preencher os vazios do texto, construir novos significados. O leitor

crítico parte do já sabido/conhecido, mas supera esse limite, incorporando, de forma

reflexiva, novos significados a seu universo de conhecimento para melhor entender a

realidade em que vive. Nas palavras de Brandão (2001, p. 22),

A concepção de leitura como um processo de enunciação se inscreve num quadro teórico mais amplo que considera como fundamental o caráter dialógico da linguagem e, conseqüentemente, sua dimensão social e histórica. A leitura como atividade de linguagem é uma prática social de alcance político. Ao promover a

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interação entre indivíduos, a leitura, compreendida não só como leitura da palavra, mas também como leitura de mundo, deve ser atividade constitutiva de sujeitos capazes de interligar o mundo e nele atuar como cidadãos.

Essa concepção revela que a atividade de leitura não deve representar

meramente o cumprimento de uma obrigação curricular, mas deve significar a

emancipação do aluno para que ele possa interagir com a sociedade em que vive de

maneira consciente, crítica e transformadora, no sentido da superação das

desigualdades sociais. As condições de produção de leitura e produção textual

tornam-se relevantes, uma vez que na perspectiva discursiva o que importa não é o

que o texto quer dizer, mas como ele diz, isto é, como o texto funciona. É na

interação leitor-texto que emergem os efeitos de sentido, a significação, além de

novas e/ou diferentes leituras, como afirma Orlandi (2004, p. 61):

A leitura aparece não mais como simples decodificação, mas como a construção de um dispositivo teórico. [...] A questão do sentido torna-se a questão da materialidade do texto, de seu funcionamento, de sua historicidade, dos mecanismos dos processos de significação. Quando o sujeito fala, ele está em plena atividade de interpretação, ele está atribuindo sentido a suas próprias palavras em condições específicas. Mas ele o faz como se os sentidos estivessem nas palavras: apagam-se suas condições de produção, desaparece o modo pelo qual a exterioridade o constitui. Em suma, a interpretação aparece para o sujeito como transparência, como sentido lá.

Nessa mesma perspectiva, Leite (2003, p.100) evidencia que “o sentido não

está no texto, mas na relação que este mantém com quem produz, com quem lê,

com outros textos (intertextualidade) e com outros discursos possíveis

(interdiscursividade)”9 .

Cabe, aqui, enfocar o conceito de dialogia em Bakhtin, pois, para ele, o

sujeito se constitui como tal por meio da linguagem e a linguagem é um ato

dialógico, ou seja, é relação com os outros. O outro, nessa perspectiva, pode ser um

livro, uma pessoa, um filme, enfim tudo com que é possível dialogar. As palavras 9 Orlandi (2001), ao discutir aspectos relacionados com o interdiscurso e intertexto, afirma que ambos mobilizam as relações de sentidos, mas há diferenças entre esses dois termos: o primeiro tem sua ordem no saber discursivo (o já-dito, memória afetada pelo esquecimento), enquanto o segundo trabalha com as relações de um texto com outros textos.

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não são auto-suficientes e independentes, elas significam nas relações sociais, isto

é, nas interações: “Por mais monológico que seja um enunciado, ele não pode

deixar de ser também, em certo grau, uma resposta ao que já foi dito sobre o mesmo

objeto, ainda que esse caráter de resposta não receba uma expressão externa bem

perceptível” (BAKHTIN, 1994, p. 317). Dessa forma, toda manifestação de

linguagem é resultante do processo dialógico e a constituição do sujeito se dá pela

relação com o outro, isto é, com o dizer do outro, com suas leituras. Logo, essa

relação está ligada aos aspectos sócio-históricos em que os sujeitos estão situados.

O texto constitui-se, nesta vertente, não em um amontoado de orações, mas

a partir de elementos discursivos e, para um trabalho prático, é necessário levar em

conta suas condições de produção, recepção e circulação. Recorrendo aos

conceitos bakhtinianos (2003, p. 287), “qualquer oração pode figurar como

enunciado acabado, mas, neste caso, é completada por uma série de elementos

muito substanciais de índole não gramatical [...]. Esse enunciado suscita resposta”.

Nesse sentido, o texto é visto como lugar de manifestação social e

discursiva que nos permite a interação verbal. No entanto, não podemos concebê-lo

somente como estrutura material, pois ele é lido e produzido por sujeitos que estão

inseridos sócio-historicamente em determinada sociedade e que, em decorrência

disso, refletem marcas dessa sociedade. Daí resulta que a leitura é prática de

interação social de linguagem.

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CAPÍTULO II

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS: O ENCONTRO COM OS SUJEITOS

O produto do trabalho de produção se oferece ao

leitor, e nele se realiza a cada leitura, num processo

dialógico cuja trama toma as pontas dos fios do

bordado tecido para tecer sempre o mesmo e outro

bordado, pois as mãos que agora tecem trazem e

traçam outras histórias. Não são mãos amarradas –

se o fossem, a leitura seria reconhecimento de

sentidos e não produção de sentidos; não são mãos

livres que produzem o seu bordado apenas com os

fios que trazem nas veias de sua história – se o

fossem, a leitura seria um outro bordado que se

sobrepõe ao bordado que se lê, ocultando-o,

apagando-o, substituindo-o.

(GERALDI, 2003, p. 166)

Neste capítulo, explicitaremos os passos percorridos para a realização desta

pesquisa: a caracterização da pesquisa qualitativa, especialmente da pesquisa-

ação, do ambiente onde foi realizada e dos participantes. Feito isso, apresentaremos

os instrumentos de coleta de dados, as categorias de análise e o projeto das

atividades práticas, seguido da descrição das aulas até a produção.

Conforme mencionamos na Introdução, nosso objetivo geral foi o de

desenvolver um projeto pedagógico por meio da metodologia seqüência didática,

com o gênero discursivo propaganda impressa, ressaltando os aspectos lingüístico-

discursivos, a fim de propiciar ao aluno uma leitura crítica de textos diversificados e

levá-lo à produção desse gênero. Para tanto, realizamos atividades de

reconhecimento e de identificação dos recursos lingüístico-discursivos e não-

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lingüísticos, para que tivessem domínio dos elementos constitutivos desse gênero.

Também analisamos os recursos persuasivos da propaganda, de maneira que os

alunos percebessem as sutilezas do discurso presentes nesse gênero. Além disso,

propusemos atividades de análise lingüística, a partir das dificuldades apresentadas

por eles. Ao final desse trabalho, solicitamo-lhes que produzissem propagandas

impressas, utilizando os recursos lingüístico-discursivos estudados. Vale ressaltar

que as atividades de análise lingüística foram feitas no decorrer das aulas, quando

os alunos demonstravam o não-conhecimento de alguns conteúdos gramaticais.

Assumindo os gêneros do discurso como objeto de ensino, portanto levando

em consideração que a perspectiva adotada nesta pesquisa é enunciativo-

discursiva, tínhamos como objetivo proporcionar a prática de leitura de propagandas

impressas para que os alunos pudessem produzir textos adequados ao gênero em

estudo.

Assim, desenvolvemos um projeto de atividades organizadas em seqüências

didáticas, com uma turma de 8ª série de uma escola pública de Cuiabá, de acordo

com as seguintes etapas:

Etapa 1: leitura de propagandas (comerciais e sociais)10. Foram feitas

atividades orais e escritas, enfocando os aspectos discursivos, como condições de

produção, recepção e circulação, e os aspectos lingüísticos e não-lingüísticos,

destacando as especificidades do gênero.

Etapa 2: produção de propagandas sociais (tema relacionado com a

preservação do meio ambiente). Nessa etapa, os alunos planejaram o texto, leram

reportagens para se informarem sobre a temática tratada – preservação do meio

ambiente –, produziram a primeira versão do texto e, após nossa leitura, análise e

discussão com eles, procederam à refacção.

Etapa 3: circulação dos textos produzidos pelos alunos por meio de uma

exposição no saguão da escola, onde foram vistos pelos demais alunos,

professores, pais e possíveis visitantes.

Passemos, agora, para a descrição da metodologia usada para a realização

do projeto.

10 A diferença entre propagandas comerciais e sociais pode ser vista no capítulo anterior, no item 1.3.1 – Publicidade e/ou propaganda.

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2.1 Pesquisa-ação: metodologia usada na elaboração do projeto

Na pesquisa-ação, confere-se ao professor-pesquisador a oportunidade de

refletir a respeito de sua própria prática. De acordo com Andaloussi (2004, p. 139),

“a participação dos atores em uma pesquisa-ação, para transformar uma situação

problemática, permite-lhes vivenciar essa transformação e compreender os

mecanismos em jogo”.

Levando em consideração a vertente bakhitiniana da linguagem assumida

neste trabalho, tivemos a preocupação de propor um projeto de atividades práticas

enfocando a leitura e produção textual com propaganda impressa, visando a atender

as condições de produção, circulação e recepção desse gênero discursivo. Dessa

forma, organizamos o projeto em seqüências didáticas, conforme proposto por Dolz,

Schneuwly e Noverraz (2004), e nos embasamos, também, em outros autores que

propõem trabalho em forma de projetos, como Lopes-Rossi (2002a, 2002b, 2003) e

Barbosa (2001). É importante pontuar, aqui, que, embora usemos o modelo proposto

pelo grupo de Genebra, fizemos uma adaptação: não propusemos a produção

textual inicial do gênero trabalhado, mas uma atividade diagnóstica de leitura, para

sabermos como os alunos compreendiam tal gênero. A partir dessa atividade,

planejamos as demais. Assim, a produção textual foi proposta após o trabalho de

leitura. A preparação das atividades, gradativamente, nos possibilitou explorar

propagandas atuais, veiculadas no momento em que o trabalho estava sendo

realizado, o que não nos impediu de utilizar textos de datas passadas.

Para melhor visibilidade do procedimento, apresentaremos o plano geral de

atividades, de acordo com Kaufman e Rodríguez (1995) e, no momento posterior,

seu detalhamento:

1- Plano Geral

Nome do projeto: Propaganda impressa: prática de leitura e produção de texto em

perspectiva discursiva

Série: 8ª

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Data de início: 20/09/2005

Data do término: 20/12/2005

Materiais utilizados: propagandas impressas, revistas, lápis, folha xerocopiadas,

retroprojetor, papel color set, tesouras, cola, régua, etc.

Etapas previstas:

Apresentação do projeto.

Visita a um laboratório de publicidade e propaganda.

Leitura e análises de propagandas comerciais e sociais.

Produção de propagandas sociais.

Exposição das propagandas.

2. Texto: produção de propagandas sociais

Situação comunicativa

Leitores: alunos, professores, pais e possíveis visitantes da escola.

Autores: alunos da 8ª série da Escola Estadual Dr. Hélio Palma de Arruda.

Caracterização do texto

Tema: Preservação do meio ambiente

São textos predominantemente multimodais.

Nos aspectos lingüísticos, podemos ressaltar: o uso de tempo verbal no presente,

modo imperativo e, muitas vezes, a modalização deôntica (dever); utilização de

operadores argumentativos, por vezes modalizadores do discurso (p.ex.: inclusive,

já, até, ainda, com certeza, facilmente, etc.); frases curtas e preferência por

períodos compostos por coordenação; seleção lexical cuidadosa, com termos

específicos, claros e concisos; linguagem clara e objetiva.

Nos aspectos não-lingüísticos, destacam-se jogo de cores e imagens; diferentes

tamanhos das fontes; distribuição dos elementos que compõem este gênero:

título, imagem, marca e o texto.

Todos esses aspectos visam a atingir o objetivo de persuadir e/ou convencer o

interlocutor à aquisição de um produto ou à mudança de comportamentos e

atitudes.

Temas para reflexão metalingüística

Aspectos gramaticais: verbo no modo imperativo, períodos compostos por

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coordenação, modalizadores como “mas”, “até”, “talvez”, “com certeza”.

Aspectos ortográficos: trabalhados de acordo com as necessidades apresentadas

pelos alunos no decorrer da realização das atividades.

Aspectos textuais: estratégias de coesão e coerência no processo de produção.

3. Conteúdos de outras áreas e/ou atividades de reflexão metalingüística

Os assuntos referentes à temática tratada nas produções serão trabalhados

também na disciplina Ciências, por meio de seminários.

2.2 Cenário e sujeitos

Os dados desta pesquisa foram coletados com alunos da 8ª série B, do

turno vespertino, da Escola Estadual Dr. Hélio Palma de Arruda. Essa escola está

localizada no bairro Planalto, na cidade de Cuiabá. A turma é composta por 22

alunos na faixa etária de 14 a 16 anos; por esse aspecto, é uma turma homogênea.

A maior parte dos alunos reside no bairro e não precisa usar meio de transporte para

locomoção. Seu poder aquisitivo é baixo, não poucos precisam ajudar os pais nas

despesas da família. Convivem uns com os outros fora do ambiente escolar, muitos

são vizinhos e mostram-se bastante próximos.

Em sala de aula, é uma turma de referência na escola. Segundo a diretora e

professores, é a melhor turma, tanto em comportamento quanto em aprendizagem.

“Você foi premiada em fazer sua pesquisa nesta sala, os alunos são os mais

interessados da escola”, ressaltou a coordenadora.

A escola Dr. Hélio Palma de Arruda oferece o Ensino Fundamental e Médio

e funciona nos três períodos. Seu espaço físico é bem pequeno e a estrutura não

condiz com as expectativas. Não possui biblioteca nem laboratório de informática,

apenas salas de aula, diretoria, secretaria e sala dos professores. Dispõe de cantina

e de quadra esportiva, local utilizado também para a realização dos eventos da

escola, a exemplo de festa junina e demais comemorações.

O terreno em que a escola foi construída é amplo e cercado de árvores,

algumas típicas da região, como mangueiras. A sala de aula é pequena e pouco

confortável. As carteiras estão em condições deploráveis de conservação, paredes

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rabiscadas. Há apenas dois ventiladores, insuficientes para aliviar o calor. A

professora de Língua Portuguesa é interina, formada em Letras, cuja prática em sala

de aula atinge, aproximadamente, dez anos. Começou a trabalhar com as séries

iniciais (1ª a 4ª) e atua no Ensino Fundamental e Médio há pouco tempo. Ela é muito

querida pelos alunos, tendo por eles sido escolhida conselheira da turma.

2.3 Corpus da pesquisa

O corpus desta pesquisa compõe-se dos textos produzidos pelos alunos,

resultante de um trabalho de leitura sobre propagandas. Durante a realização das

atividades, procuramos enfocar questões relacionadas com os diferentes recursos

que constituem as propagandas na sua materialidade lingüística e não-lingüística,

bem como os aspectos discursivos, ressaltando as condições de produção,

circulação e recepção. Durante a realização da pesquisa, usamos caderno de campo

para registro da maior parte possível das ocorrências, internas e externas à sala de

aula. É interessante destacar que as produções a ser tomadas como objeto de

análise foram feitas a partir do trabalho de leitura com propagandas sociais, e isso

ocorreu pelo fato de termos desenvolvido grande quantidade de atividades e, assim,

acreditávamos que os alunos estivessem preparados para a produção.

2.4 Categorias de análise

Serão analisados os textos dos alunos nos quais levaremos em

consideração as seguintes categorias de análise:

- aceitação da propaganda como texto,

- observação das especificidades do gênero, e

- estratégias persuasivas usadas nas produções.

Primeiramente, analisaremos se a propaganda se revelou texto passível de

leitura pelos alunos. Em seqüência, faremos a análise das produções, tomando

como base os seguintes aspectos: a) especificidades do gênero propaganda

impressa, observando se os textos dos alunos apresentam características

relativamente estáveis desse gênero, a saber, estrutura composicional, estilo e

conteúdo temático; b) estratégias persuasivas, procurando identificar como é

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marcada a argumentação nos textos dos alunos, isto é, de que recursos persuasivos

eles se utilizaram para convencer o leitor sobre o que está sendo propagado.

Veremos agora o projeto das atividades práticas seguido da descrição das

aulas.

2.5 O encontro com os sujeitos

O primeiro contato que tivemos na escola serviu como forma de

familiarização com os alunos, professores, coordenadores e direção. Ficamos, no

período de uma semana, observando o cotidiano da sala de aula e, assim, foi nos

dada a oportunidade de conhecer a prática da professora e sua relação com os

alunos. Durante essa semana de observação, ainda que rapidamente, explicamos

aos alunos o que pretendíamos realizar e que eles iriam desempenhar papel

essencial no desenvolvimento do projeto. Os alunos demonstraram interesse e

ficaram felizes por terem sido escolhidos. Esse aspecto é de fundamental

importância na pesquisa-ação, conforme Andaloussi (2004, p. 131): “Conseguir uma

parceria é uma das condições de êxito do projeto que a pesquisa-ação pretende

desenvolver”. Assim, os sujeitos de pesquisa devem tomar conhecimento de todos

os passos que o trabalho seguirá: os objetivos, procedimentos metodológicos: “[...] o

pesquisador deve cuidar da criação de um clima de confiança com base em relações

transparentes e democráticas [...]”.

Já durante esse período, a direção da escola e a professora-regente

mostraram-se bastante interessadas pela realização da pesquisa, colocando-se à

disposição para nos ajudar no que fosse necessário. Nesse encontro, ficou

combinado que iríamos utilizar duas horas/aula semanais, às sextas-feiras, durante

o 4° bimestre. Explicamos que nossa proposta se assentava em um trabalho com

leitura e produção textual de propagandas impressas. Relevante ressaltar que,

desde o início da pesquisa, a escola foi sobremodo receptiva e contribuiu de forma

decisiva para sua realização, evitando qualquer interferência em nossas aulas, tanto

no que diz respeito a atividades pedagógicas, quanto em quaisquer outras

atividades que envolvessem os alunos. Essa postura da escola facilitou o

andamento e a seqüenciação das aulas, pois, como nossos encontros ocorriam uma

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vez por semana, se houvesse interrupções em nossas aulas, isso acarretaria

prejuízos à pesquisa.

A partir desse primeiro contato, preparamos módulos de atividades

organizadas em seqüências didáticas, visando à leitura de diversas propagandas,

nas quais procuramos abarcar os aspectos discursivos, como a função social desse

gênero, suas condições de produção, circulação e recepção, bem como os

lingüísticos e não-lingüísticos. O objetivo dessas atividades era fazer com que os

alunos percebessem as características específicas constitutivas desse gênero e

passassem a ter um olhar crítico diante dele para realizar, posteriormente, a

produção escrita. De acordo com Thiollent (2003, p. 41), “com a pesquisa-ação

pretende-se alcançar realizações, ações efetivas, transformações ou mudanças no

campo social”. Este era nosso anseio: levar esse gênero discursivo para a sala de

aula como prática de leitura e produção textual. As atividades a seguir integram a

primeira etapa mencionada no capítulo anterior, isto é, leitura de propagandas

comerciais e sociais. Todas as atividades constantes deste capítulo foram entregues

aos alunos, tais como aqui transcritas.

No dia 30 de setembro de 2005, assumimos a regência da sala, conforme

combinado com a direção da escola e com a professora titular. Nessa aula, nossa

primeira atitude foi explicar aos alunos e à professora-regente todo o processo do

projeto, conforme pode ser visto neste plano, esmiuçadamente. Ressaltamos que a

participação deles seria de fundamental importância para o sucesso do nosso

trabalho.

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2.5.1 Leitura de propagandas comerciais e sociais

Apresentação do projeto

Período: 30/09 e 04/10 - 4 h.

Objetivo: Expor aos alunos o projeto que será desenvolvido, permitindo-lhes o

primeiro contato com gênero.

Procedimentos:

• Apresentação do projeto, explicando as seguintes questões: o que será

feito; qual é o gênero a ser trabalhado; como serão as aulas; qual a duração

do projeto; como será a produção textual.

• Distribuição de alguns exemplares das revistas Veja e IstoÉ, para

serem folheadas pelos alunos.

• Apresentação do contexto sócio-histórico da propaganda.

• Questionamentos sobre os textos encontrados nas revistas (destaque

para as propagandas).

• Visita a um laboratório de publicidade e propaganda.

Inicialmente, entregamos várias revistas para que os alunos pudessem

conhecer as partes internas desse suporte e localizar as propagandas, tal como elas

circulam na sociedade. Nesse momento, o objetivo foi respeitar, ao máximo, o

gênero na sua forma original, para os alunos perceberem não só um gênero, mas

também sua função social. Após observação, levantamos os seguintes

questionamentos:

Vocês já conheciam estas revistas? De que maneira vocês tiveram acesso a elas? Conseguiram localizar as propagandas? Como é o aspecto visual desse gênero? Como ele se constitui? Quem escreve esse gênero? Com qual finalidade? Como escreve, com base em quais informações? Quem lê esse gênero? Em quais outros lugares podemos encontrá-lo?

Não tínhamos o objetivo de trabalhar os aspectos conceituais com os alunos

a respeito dos gêneros do discurso. Interessava-nos, isso sim, mostrá-los na prática

para que eles percebessem as especificidades que caracterizavam as propagandas.

Em sala de aula, privilegiamos o termo texto, o que pode ser depreendido da maioria

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das atividades que eles recebiam, embora isso não exclua a ocorrência do termo

gênero, em algumas situações.

Aspecto que vale a pena destacar foi o fato de todos os alunos

estranharem a propaganda como gênero discursivo. Quando fazíamos referência à

propaganda como texto, questionavam que não se tratava de textos, justificando:

“não tem título”, “não tem parágrafos”, “e esses desenhos aí?”, “ela é muito diferente

de um texto”. Aliás, como assinalamos na Introdução, esse é um dado que já

havíamos evidenciado numa pesquisa realizada em 2004, em outra escola pública.

Entre outros aspectos, foi um dos motivos que influenciaram a escolha de realizar

um trabalho prático com esse gênero discursivo.

Para conhecimento do ambiente prático em que tais textos são produzidos,

levamos os alunos ao laboratório de publicidade e propaganda de um centro

superior de ensino, na cidade de Várzea Grande-MT, conforme anexo I. Lá, a

professora responsável explicou, passo a passo (do planejamento à impressão final),

o processo de criação de uma propaganda impressa. Além disso, mostrou

propagandas que foram feitas pelos alunos do curso de Comunicação Social. Os

alunos visitantes receberam cartazes e fôlderes de propagandas sociais, como

podem ser vistos no anexo II.

2.5.2 Atividade diagnóstica

Data: 07/10/2005 – 2h. Objetivo: identificar o conhecimento dos alunos acerca do gênero discursivo

propaganda impressa.

Entregamos aos alunos a atividade a seguir:

Hoje, é impossível imaginar as cidades sem os outdoors, a televisão, sem os

minutos destinados à propaganda; as revistas e jornais sem as páginas coloridas dos anúncios... Vivemos rodeados por anúncios que informam, incitam, convidam, seduzem... Conhecer e analisar as estratégias dos anunciantes é desenvolver nossa capacidade crítica para aprendermos a selecionar, com critério, produtos e serviços.

Estudaremos neste bimestre, o texto publicitário impresso. Suas características, seu tipo de leitor, os meios de comunicação em que esse gênero circula, os temas abordados, linguagem utilizada, estrutura, marcas lingüísticas...

Como instrumento de trabalho, usaremos, para leitura e análise, propagandas diversas. Posteriormente, trabalharemos com produções de propagandas sociais.

Espero que, através dessa proposta de estudo, você possa se deliciar com a leitura e refletir sobre esse gênero discursivo tão presente em nosso cotidiano.

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1- Leia os três textos que se seguem e responda:

a) Quais características básicas estes textos têm em comum que fazem com que os denominemos propagandas? b) Há diferenças entre eles? Quais? c) Que outras características você considera que estão presentes na maioria das propagandas? 2) Toda propaganda tem como finalidade persuadir o interlocutor, isto é, chamar sua atenção e convencê-lo a comprar um determinado produto, adquirir um serviço ou mudar um comportamento. Escolha uma das propagandas lidas e releia-a atentamente, procurando identificar que recursos o autor utilizou para persuadir o leitor. 3- Ainda em relação aos três textos lidos, responda: a) Quais são os produtos ou serviços anunciados? E quem são os anunciantes? b) Em que suporte foram veiculados? c) Qual é o público a quem se destinam?

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(Veja, dezembro, 2004)

Nesta aula, pudemos constatar a pouca familiaridade dos alunos com a

utilização desse gênero discursivo como prática de leitura. Eles estranhavam

quando fazíamos referência às propagandas como textos: “Nós vamos responder

essa atividade desse tamanho olhando pra estas propagandas?”; e “Responder

exercício com propagandas. Essa é boa!”. Durante a realização dessa primeira

atividade, percebemos que os alunos não se preocupavam muito em ler

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atentamente: davam uma olhada rápida e procuravam respostas nos textos.

Como não as encontravam, explicitamente, pediam ajuda.

A partir dessa primeira aula, decidimos trabalhar com grande número de

propagandas, mostrando a variação que esse gênero apresenta e os recursos

utilizados que o definem como tal. Apresentávamos vários textos no retroprojetor

e, após uma conversa informal com os alunos, fazíamos uma leitura global,

ressaltando os aspectos discursivos. Em seguida, eles recebiam a atividade

individual, com vista a que procedessem a uma leitura mais detalhada.

Descreveremos, agora, as aulas ocorridas no período de 11/10/2005 a

08/11/2005 – totalizando 6 encontros (12h) – nas quais procuramos trabalhar

alguns recursos lingüísticos (polissemia, argumento de autoridade, adjetivação) e

recursos semióticos (significação da cor, destaque na imagem). Indispensável é

registrar que as propagandas recebidas pelos alunos eram xerocopiadas, mas

eles tinham acesso à quase totalidade das propagandas originais nas revistas, no

momento da realização da atividade.

Paralelamente às atividades, trabalhamos dificuldades ortográficas e

gramaticais, conforme a necessidade da turma.

Com o decorrer das aulas, percebemos que os alunos não apenas se

mostravam mais atentos em relação ao não-lingüístico como constitutivo das

propagandas, mas também já conseguiam ver informações implícitas. Não mais

manifestavam o estranhamento quando nos referíamos às propagandas como

texto. Uma participação interessante foi quando apresentávamos, no retroprojetor,

a propaganda em que há a imagem do Murilo Benício. Uma aluna questionou:

“Por que será que eles não escolheram um ator que tá iniciando na TV e não é

famoso ainda?” Outra aluna mencionou a utilização de imagens de verduras para

estampar a propaganda da Nestlé. Os alunos foram percebendo as escolhas

estratégicas da propaganda para convencer o leitor. Outras observações no

tocante à reação dos alunos diante do trabalho de leitura serão feitas

paralelamente à apresentação das atividades.

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2.5.3 Identificando e (re)conhecendo as especificidades do gênero

Objetivo: Propor atividades de leitura para que os alunos percebam as

características desse gênero, isto é, compreendam como ele se organiza, quais

são os recursos lingüísticos e não-lingüísticos usados em sua construção.

Os alunos foram reunidos em grupos e receberam quatro propagandas,

acompanhadas da seguinte atividade:

Observe estes textos e identifique os indícios lingüísticos que pressupõem determinado

interlocutor, isto é, o público-alvo de cada um. Para isso, leve em consideração os

seguintes aspectos: idade, sexo, grau de escolaridade, posição sócio-econômica e

suporte em que foram veiculados.

Em seguida, faça exposição das respostas em um cartaz e apresente oralmente

à turma.

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Texto 1

(Veja, 1º de junho de 2005)

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Texto 2

VEJA, 03 de agosto, 2005.

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Texto 3

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Texto 4

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Para a realização dessa atividade, ficaram à disposição dos alunos os

seguintes recursos: cartolina, tesoura, caneta esferográfica, régua e lápis de cor.

O trabalho em grupo, no começo, causou certo tumulto, pois alguns alunos

discordavam das respostas. Havia quem não aceitasse a idéia do outro. Apesar

disso, o trabalho ficou pronto no tempo previsto e, em círculo, eles o

apresentaram para a turma. Foi escolhido de cada grupo um representante e, ao

final, eles deixaram os cartazes expostos em sala. Nessa apresentação,

percebemos que os alunos ficaram bem tímidos, diversamente de seu

comportamento quando reunidos no grupo.

Atividade 2

Observe os textos 1 e 4 para responder a esta atividade:

Em atividades anteriores, vimos que a propaganda tem como finalidade persuadir o interlocutor, ou seja, chamar sua atenção e convencê-lo a comprar um determinado produto ou mudar um comportamento. Para atingir tal objetivo, é necessário criar no leitor o desejo, a vontade de adquirir o que está sendo anunciado ou de mudar o seu comportamento. Quais são os recursos persuasivos que os publicitários utilizam para despertar nas pessoas esse desejo? É sobre este aspecto que estudaremos nestas próximas aulas. 1- Leia as propagandas e diga o que elas têm em comum em relação ao assunto tratado. Qual é a relação dessa temática com o produto anunciado? 2-Quais são os produtos anunciados? 3- O que mais lhe chamou atenção nestas propagandas? Justifique. 4- Observe a data em que estas propagandas foram publicadas e os produtos anunciados. Pensando nisso, quais são as pessoas que os anúncios pretendem atingir? Qual é o objetivo dos anunciantes ao colocar tais propagandas na revista Veja? 5) O que aparece com mais destaque nestes textos: o lingüístico (palavras) ou o não-lingüístico (imagens)? Justifique sua resposta. 6- Observe o texto 4 e responda:

O DIA DOS NAMORADOS VAI SER QUENTE. a) Veja no dicionário o que significa a palavra quente. Qual é o sentido desta palavra na propaganda? b) Qual é a cor predominante na propaganda? O que essa cor suscita no leitor? 7- Observe a imagem entre o casal e o texto: AGORA QUE VOCÊS CRESCERAM, JÁ PODEM BRINCAR COM FOGO. a) Qual é a relação entre a imagem e a frase? b) Quais são os possíveis sentidos que podemos atribuir à imagem e à frase?

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Inicialmente, pedimos que eles observassem os dois textos, tanto a parte

verbal quanto a não-verbal. Ressaltamos que todas as informações presentes no

texto eram importantes para a leitura, isto é, para a atribuição de sentido ao texto.

Mesmo assim, na realização dessa atividade, os alunos ainda denotaram

dificuldade de fazer a leitura da propaganda em sua totalidade, de relacionar a

imagem ao texto verbal. Passávamos de um em um, ajudando-os, e aos poucos

foram eles compreendendo o que estava sendo solicitado na atividade. O seu

envolvimento com a atividade foi surpreendente, pois se mostravam de fato

interessados.

Atividade 3 Para responder a esta atividade, leia o texto 2

1- Nesta propaganda, o que está em destaque: a parte verbal (escrita) ou a não-verbal (imagens)? 2- Você conhece a pessoa em destaque nesta propaganda? De que maneira você a conheceu? 3- O que significa escolher o Murilo Benício nesta propaganda? Qual é sentido que essa imagem provoca? 4- Observe a data de publicação. A quem se destina essa propaganda? Justifique. 5- Qual é a sua interpretação da expressão TECHNOS. O RELÓGIO QUE O MURILO BENÍCIO USA QUANDO É SÓ O MURILO. O que está subentendido, nesta afirmação? 6- Em que parte da propaganda, há um apelo direto ao leitor? Qual é a palavra que reforça esse apelo?

Iniciamos esta atividade perguntando sobre pessoas que eles

consideravam famosas e o que eles achavam da presença dessas pessoas nas

propagandas. Foram vários os exemplos: Xuxa, Gisele Bundchen, Ronaldinho,

Ivete Sangalo, Angélica, Luciano Huck ... Argumentavam que a escolha se deve

ao fato de essas pessoas causarem influência na opinião dos consumidores,

provocando seu interesse e simpatia. Após essa discussão, inserimos algumas

propagandas no retroprojetor, notadamente aquelas que exploravam esse

recurso. Cumprida essa tarefa, os alunos responderam à atividade escrita,

conforme segue.

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Atividade 4 Para esta atividade, leia o texto 3 1- Qual é produto anunciado? 2- Quais palavras representam as qualidades do produto anunciado? Qual é a relação destas palavras com as imagens? 4- Qual das imagens chamou mais a sua atenção? Qual é a relação das duas imagens nesta propaganda? 5- Em sua opinião, por que o produtor escolheu a imagem de um homem para ilustrar o texto que anuncia um eletrodoméstico? 6- Levando-se em conta o produto anunciado, a quem se destina esta propaganda? 7- Na parte lingüística (escrita), o que está em destaque? Comente-a, ressaltando a escolha vocabular do produtor.

No começo desta aula, merece ser reportada a pergunta feita por um

aluno: “o que teremos de novidade hoje?” Sua pergunta nos remete à

metodologia de ensino, comum na maior parte das escolas brasileiras, que se

circunscreve aos recursos de sempre: giz, caderno, lousa e livro didático. Em

suma, prática que não motiva os alunos. Revela-se, com esta indagação, um

aluno motivado, curioso pela aula que ele tinha certeza de haver sido planejada.

Em todas as aulas, era hábito nosso formar um círculo, fazendo uma

retrospectiva do que havia sido trabalhado. Assim, deixávamos claro o que

iríamos trabalhar naquela aula, sempre pondo à mostra uma continuidade.

Na seqüência do trabalho, apresentaremos uma atividade em que

exploramos o contexto situacional. Em vista disso, selecionamos propagandas do

ano de 2001 – momento em que ocorreu o racionamento de energia.

Atividade 5 1-Leia os textos 5 e 6 e responda: a) Quais são os produtos anunciados? b) Levando-se em conta a data de publicação, qual é o contexto de produção destas propagandas? Quais são as pistas presentes nestas propagandas que fizeram você chegar a tal resposta? c) Qual (quais) é (são) os interlocutor(es) destes textos? 2- Observe o texto 5 e indique o que representa a escolha da cor preta. O que sugere essa cor nesta propaganda? 3- Você já ouviu e usou a expressão “... não é assim uma Brastemp”? Em que situações? O que significa o uso de tal expressão? 4- Observando a propaganda, qual é a leitura que você faz desse título: NÃO É PORQUE VOCÊ PRECISA ECONOMIZAR ENERGIA QUE A SUA VIDA VAI DEIXAR DE SER ASSIM UMA BRASTEMP.

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5- Ainda a respeito da frase acima, a quem se referem os pronomes você e sua?

Texto 5

Veja, 30/05/2001

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Texto 6

Veja, 30/05/2001

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Feito o trabalho com os textos anteriores, com o uso do retroprojetor,

ressaltamos os seguintes aspectos:

• Como estes textos são organizados, estruturados?

• Qual é a função do texto verbal? Como ele é posicionado nas

propagandas?

• Qual é a parte do texto em que é feito um apelo direto ao leitor?

• Estes textos possuem argumentos suficientes capazes de convencer o

leitor a comprar os produtos anunciados?

• Em que posição aparece a marca/logotipo do produto anunciado?

• O que aparece com mais destaque, o lingüístico ou o não-lingüístico?

• Como é feita a distribuição dos recursos na propaganda?

Salientamos que, embora tenhamos destacado os recursos utilizados nas

propagandas trabalhadas, não podemos dizer que são os únicos, isso porque

este gênero discursivo apresenta grande variedade em sua construção. As

propagandas que lemos e discutimos apresentam características de propagandas

comerciais, conforme Pinho (1990).

Considerando nosso interesse em expor aos alunos uma variedade de

textos desse gênero, passaremos agora para o trabalho com propagandas

sociais.

2.5.4 Leitura de propagandas sociais

Objetivo: Questionar as condições de produção, circulação e recepção da

propaganda social impressa em nossa sociedade, bem como analisar a função

social e os recursos icônico-lingüísticos usados nesses textos.

Período: 11/11 a 22/12 – 4 encontros (8h)

Entregamos aos alunos a atividade abaixo.

Nesta seqüência de atividades, serão trabalhadas as propagandas sociais

impressas que foram veiculadas em revistas (Isto É, Veja e Claúdia). Faremos, assim, leitura, análises e pesquisas de propagandas que apresentam tema relacionado ao meio ambiente. Para isso, além do estudo e análises das propagandas, vocês farão também leitura de reportagem para se informarem a respeito dos problemas ambientais que vêm

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ocorrendo atualmente. O objetivo é que vocês tenham conhecimento para a produção textual – atividade prevista na finalização deste projeto.

Observem os textos 7,8,9 e 10 para responder às questões propostas:

Texto 7

REVISTA VEJA, agosto, 2005.

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Texto 8

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Texto 9

Agência Lowe Loducca, dezembro, 1999.

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Texto 10

ISTOÉ, 31 de janeiro, 2001.

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Comentamos com os alunos, em aulas anteriores, que há grande número

de empresas comerciais desenvolvem projetos sociais. Isso retrata o marketing

social (Pinho, 1990). Como exemplo dessa prática, propusemos a análise de

propagandas da Fundação O Boticário de Preservação ao Meio Ambiente e da

empresa Natura. Para tanto, pedimos que os alunos observassem os textos 7 e 8 e

endereçamos a eles o seguinte questionamento:

Na sua opinião, qual é o interesse de empresas comerciais em desenvolver

propagandas de cunho social?

Após a discussão oral, iniciamos as atividades escritas.

Nessas atividades, foram trabalhados alguns recursos usados nas

propagandas, como provérbio, modo verbal no imperativo, o uso da imagem, cores,

uso da ambigüidade. Some-se a isso a escolha de vocabulário específico e de uma

linguagem simples e objetiva.

As questões gramaticais e ortográficas foram trabalhadas com o intuito de

responder às dificuldades dos alunos, surgidas no decorrer das aulas. Atividade com base no texto 10 1- O texto se apropriou de um provérbio/ditado popular. Qual é esse provérbio e o que ele significa? 2- E na propaganda, qual é o sentido que esse provérbio provoca? 3- Quem é o anunciante? A quem se destina o anúncio? 4- O que esta imagem transmite a você? 5- Qual é sua interpretação da imagem? O que representa a mudança de cores? 6- Qual é o objetivo da propaganda?

Antes da realização da atividade acima descrita, solicitamos que os alunos

cuidassem de observar em outros suportes – jornais, outdoors e TV – propagandas

sociais, atentos sempre a estes aspectos: Em quais circunstâncias encontramos

este gênero? Qual é o público que ele pretende atingir? Que tipo de resposta é

esperado do leitor? Quais são os temas enfocados nesses textos? Qual é a

importância de tratar de tais temas em propagandas?

Nessa atividade, os alunos citaram as propagandas por eles encontradas e,

ao tratar das questões postas acima, perceberam que o suporte influencia a maneira

como elas se apresentam: as das revistas são destinadas a um público mais

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específico do que aquelas estampadas nos outdoors, ou divulgadas na TV e rádio,

dado que estas últimas são destinadas a um público mais genérico e, por isso,

menos exigente.

Sobre o tipo de respostas que se espera do leitor, os alunos opinaram que

as propagandas sempre querem fazê-lo acreditar no discurso apresentado

por elas. Já no tocante aos temas focados, a maioria dos alunos se limitou

a mencionar o anúncio de produtos ou de eventos. Foram poucos os que

conseguiram vislumbrar temas sociais.

Atividade com base no texto 7

1- Qual é o produto que está sendo anunciado nesta propaganda? E a quem se destina? Limpa suavemente as mãos Suaviza o impacto no meio ambiente 2- Qual é a leitura que você faz das frases acima? Agora observe o enunciado Use refil 3- O modo verbal no imperativo é freqüentemente usado em propagandas, uma vez esse recurso tem por objetivo influenciar o leitor, persuadi-lo, aconselhá-lo e, na maioria das vezes, fazer-lhe um apelo. Que efeito esse apelo produz ou tenta produzir?

Os alunos revelaram dificuldade em perceber o verbo no modo imperativo.

Em vista disso, foi nossa preocupação inserir esse conteúdo gramatical, para que

eles percebessem os efeitos de sentido que tal modo verbal provoca nas

propagandas. Assim, o estudo da gramática derivou de uma necessidade dos

alunos, numa real situação de uso.

Explicamos aos alunos nesta aula que, ao final do projeto, eles seriam

produtores de propagandas sociais. Os temas seriam referentes à preservação

ambiental. Pedimos que começassem a pensar sobre um aspecto dentro dessa

temática, para produção da propaganda.

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Atividade com base no texto 8 1- A linguagem da propaganda costuma ser curta e em alguns casos apresenta mais de um sentido. Observe a parte não-verbal e responda: a) O que representa a imagem? b) É possível atribuir mais de um sentido a ela? Quais? 2- Quem é o anunciante? Qual é objetivo deste anúncio? 3- Que resposta ou atitude se espera do leitor, nesta propaganda? 4- Quais são os argumentos lingüísticos e não-lingüísticos usados para obter tal resposta ou estimular tal atitude?

Nessa atividade, os alunos se maravilharam com a imagem. Revelaram-se

interessados em realizar a atividade e já conseguiam perceber com mais

facilidade a relação constitutiva entre o lingüístico e o não-lingüístico na

propaganda.

Atividade com base no texto 9 Inicialmente, propusemos uma discussão oral levantando as seguintes questões: 1. Como você realiza a leitura da imagem? Estabeleça uma relação entre a imagem apresentada e a frase “sou dono do meu nariz”.

2. Mudando a cor do não-verbal há mudança de sentido?

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Agora responda no seu caderno: 1. Qual foi a intenção do autor ao escolher a imagem que estampa a camiseta da campanha? Há marcas no texto verbal em que você possa ancorar sua resposta? Explicite-as. 2. Explique a relação que há entre as cores predominantes da campanha e a proposta da propaganda. 3. Com a leitura do texto verbal, a expectativa que você tinha sobre a imagem se modificou? Explique sua resposta. 4. A que sentido remete a expressão “sou dono do meu nariz”? A partir da leitura do texto verbal é possível estabelecer mais de um significado para essa expressão? 5. Quais os recursos utilizados no texto (verbal e não-verbal) que o caracterizam como propaganda? 7. Explique o sentido dos recursos lingüísticos sublinhados.

Tudo bem que você tenha consciência de que o efeito estufa é um problema ecológico

do qual não há como fugir. Mas isso não é motivo para se conformar.

Muito menos para ficar de braços cruzados. 8. Em que contexto a propaganda é calcada?

Os alunos, nesta segunda fase, mostraram-se bem mais familiarizados com

as propagandas como objeto de leitura. Durante a realização das atividades,

discutimos acerca das questões ambientais. Eles participaram ativamente, citando

graves problemas, não esquecidos o desmatamento, as queimadas, a poluição dos

rios, os animais em extinção, entre outros. Contextualizamos a necessidade de as

pessoas preservarem o meio ambiente e discutimos que é nesse contexto que as

propagandas sociais estão calcadas. Os alunos continuaram demonstrando

interesse na permanência do projeto. Faziam perguntas sobre o assunto e pediam

esclarecimentos quando não compreendiam as questões propostas. Em suma,

reafirmavam a necessidade de as pessoas se conscientizarem acerca das questões

ambientais.

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2.5.5 Produção de propagandas sociais

Período: 29/11 a 12/12 – 4 encontros (8h)

Planejamento e organização do texto

Buscando ensejar aos alunos a oportunidade de colherem informações

outras a respeito do tema sobre o qual iriam produzir os textos, solicitamos

que formassem grupos com quatro componentes. Em seguida,

entregamos reportagens, conforme o anexo III, que tratavam de diferentes

assuntos referentes às questões ambientais e propusemos a seguinte

atividade:

Façam a leitura das reportagens. Cada grupo deverá discutir a respeito dos seguintes aspectos: Qual é o assunto tratado no texto? Como o autor organizou suas idéias? Qual é o posicionamento do autor frente ao assunto? Será aberto o debate e cada grupo terá até 10 minutos para expor o que leu.

Cada grupo elegeu dois alunos para exporem o resultado da atividade

realizada e apresentarem os tópicos discutidos no grupo. Após a apresentação dos

alunos, foi aberto o debate para discussão do assunto. Dessa forma, todos se

inteiraram acerca dos assuntos tratados nas reportagens.

O objetivo desta aula não era um estudo aprofundado, mas que os alunos

se informassem no concernente aos assuntos que poderiam ser tratados nas

propagandas que eles iriam produzir a partir do tema escolhido. Vale informar que as

reportagens foram retiradas da revista impressa; no entanto, para sua inserção nesta

dissertação optamos pela versão online, pela facilidade de manuseio no corpo do

texto.

A escolha dessa temática deve-se a já termos trabalhado com elas nas

atividades de leitura, além de ser um assunto real, altamente relevante, e que, por

isso, merece especial atenção. Tivemos o cuidado de tornar o momento de produção

o mais próximo possível de uma autêntica situação comunicativa. Um dos aspectos

que contribuíram para isso foi o fato de os alunos saberem quem seriam os

interlocutores de seus textos, além do professor. Percebemos, no momento do

planejamento, sua preocupação quanto a esse aspecto. Outro ponto interessante é

que o tema integra sua realidade, pois, cotidianamente, vemos nos meios de

comunicação de massa, matérias e propagandas relativas à necessidade de nos

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informarmos e nos conscientizarmos sobre os problemas ambientais que se vêm

intensificando.

Foi realizado, também, um trabalho interdisciplinar pela professora de

Ciências, que desenvolveu com eles uma pesquisa com variados temas

relacionados à questão ecológica, os quais foram apresentados na Feira de Ciências

– em dezembro de 2005.

Com a colaboração dos alunos, foram enumerados temas relacionados com

meio ambiente. Anotamos na lousa os que por eles foram sugeridos, como poluição,

queimadas, racionamento de água e de energia, desmatamento, devastação da

floresta amazônica, animais em extinção, entre outros. Assim, a cada um foi dada a

oportunidade de fazer a sua escolha.

Após essa escolha, os alunos começaram, um por um, a montar o

planejamento do texto. Para isso, foram dadas as seguintes informações:

- Vocês irão produzir uma propaganda que será veiculada em cartaz. Agora, vocês

terão a oportunidade de planejar a respeito dos recursos que serão utilizados. (Qual é a cor de fundo? Que imagem será utilizada? Como será organizado o seu texto?)

Antes desta aula, buscamos recursos no setor “Educação Ambiental”, da

Secretaria de Meio Ambiente – MT. Lá obtivemos material, como cartazes

de campanhas, fôlderes, panfletos e fitas cassete. Esses foram

distribuídos para todos os alunos da escola. Embora comportasse

assuntos diversificados, lançamos mão em nossa pesquisa do material

diretamente voltado para a temática escolhida. Produção de texto

Após terem planejado o texto, deixamos à disposição dos alunos o material

necessário para a produção. A eles fizemos a seguinte proposta: Imagine que você e seus colegas foram contratados para criar um anúncio para uma campanha ecológica, destinada a promover a defesa e conservação ambiental da região onde vocês moram. Para a criação do seu texto, não se esqueça de levar em consideração os seguintes aspectos: Público a quem se destina: alunos da escola, professores, pais e possíveis visitantes. Local de publicação: Escola Estadual Dr. Hélio Palma da Arruda. Objetivo do anúncio: Chamar a atenção das pessoas em relação à necessidade de preservar o meio ambiente. Período de publicação: dezembro de 2005.

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Não se esqueça de observar: Se a imagem e o texto verbal se complementam. Se o anúncio como um todo é atraente para os leitores. Se o texto apresenta bons argumentos para convencer o leitor a mudar de comportamento/atitude. Se a linguagem está adequada ao público a quem se destina.

Na produção, os alunos revelaram-se motivados. Passávamos de mesa em

mesa, orientando-os, mas não os ensinávamos. Na verdade, nossa pretensão era

que eles exibissem a criatividade e o conhecimento para a produção das

propagandas, ancorados nas aulas que tivemos. Ao final dessa aula, mesmo antes

da proposta de refacção, alguns alunos já deduziam que, mudando a cor, por

exemplo, a propaganda ficaria mais atraente; outros pretendiam montar um pequeno

texto para reforçar o que queriam abordar. Pudemos ver que eles já externalizavam

noção de algumas especificidades do gênero. Mesmo antes da proposta de refacção, os alunos já haviam assinalado

algumas possibilidades de mudança no texto, tão logo o concluíram. Explicamos a

eles a necessidade de rever a produção, pedindo que observassem o texto e

percebessem o que poderia ser melhorado: quais pontos necessitariam ser

modificados, acrescentados, retirados. Enfim, interessava-nos saber se a

propaganda apresentava argumentos suficientes para convencer o leitor. Aos

poucos, foram fazendo algumas alterações, mudando a cor de fundo, aumentando o

tamanho da letra e acrescentando informações. Como a propaganda é um gênero

multimodal, houve muitas mudanças em relação ao não-lingüístico. Alguns alunos

acharam melhor alterar a cor, outros adicionaram informações na parte lingüística.

Esses aspectos serão analisados no próximo capítulo.

2.5.6 Circulação das propagandas Período: 16/12 a 20/12/2005

Os textos produzidos pelos alunos foram afixados na escola, durante uma

semana – de 16 a 20 de dezembro de 2005 – e lidos por colegas, professores,

funcionários, pais e demais pessoas que passaram pela instituição naquele período.

Para a análise dos dados, foram escolhidos textos de cinco alunos,

somando, assim, dez produções, sendo analisados os da primeira versão e os da

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refacção. Os critérios para escolha desses textos foram os seguintes: freqüência

desses alunos em todas as etapas do projeto e empenho na realização das

atividades. Os alunos serão identificados por nomes fictícios.

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CAPÍTULO III

ANÁLISE DAS PRODUÇÕES TEXTUAIS

Compreender o texto tal qual o próprio autor de

dado texto o compreendeu. Mas a compreensão

pode e deve ser melhor. A criação poderosa e

profunda em muitos aspectos é inconsciente e

polissêmica. [...] Assim, a compreensão completa o

texto: ela é ativa e criadora. A compreensão

criadora continua a criação, multiplica a riqueza

artística da humanidade. A co-criação dos sujeitos

da compreensão.

(BAKHTIN, 2003, p. 378)

Neste capítulo, analisaremos os textos produzidos pelos alunos após a

realização de um trabalho prático de leitura de diversas propagandas. Assim,

retomaremos, inicialmente, alguns pontos colocados na metodologia, a fim de

clarear os passos percorridos até chegar às produções. Em seguida, faremos a

análise dos textos.

3.1 Breves considerações

O corpus desta pesquisa compreende as produções textuais dos alunos

realizadas no final do projeto que, como já pontuamos, decorreram de um trabalho

de leitura desenvolvido no quarto bimestre do ano de 2005. O projeto teve duração

de três meses, com duas aulas semanais, o que somou, ao final, dezessete

encontros, cada um compreendendo duas horas. Além disso, houve a etapa de

circulação dos textos na escola, cuja duração esteve circunscrita a uma semana.

Nesta primeira parte da análise, faremos alguns apontamentos sobre como

ocorreu o trabalho de leitura, com o qual procuramos proporcionar aos alunos o

contato com o gênero do discurso propaganda impressa – a partir de atividades de

reconhecimento e identificação de seus recursos lingüístico-discursivos e não-

lingüísticos – para que tivessem domínio dos elementos constitutivos desse gênero.

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Mais que isso, foi nosso intuito analisar os recursos persuasivos da propaganda, de

maneira que percebessem as sutilezas do discurso presentes nesse gênero. Por

igual, buscamos contextualizar sócio-historicamente esse gênero discursivo, isto é,

quando e por que surgiu, em que esfera social ele circula, qual é o papel que a

propaganda impressa desempenha na sociedade e que mudanças esse gênero

sofreu no passar do tempo.

Um dos aspectos constatados no começo da pesquisa foi o fato de os

alunos não conceberem a propaganda impressa como texto. O estranhamento foi

geral, atingindo a turma por inteiro. Chegaram até a questionar, ironicamente: “mas

nós vamos trabalhar leitura aqui na escola usando propaganda?” Essa pergunta

testemunha que, em verdade, esse não é um texto presente na sala de aula. Mostra,

também, que o aluno, de modo geral, se encontra preso ao modelo tradicional de

texto. Como pôde ser visto no capítulo anterior, os alunos ainda estão presos a uma

concepção de texto seguindo a regularidade: título, texto dividido em parágrafos,

sem imagens, isto é, são considerados apenas os aspectos lingüísticos. O lingüístico

gera o único poder de significar. Qualquer outro componente ou dimensão de

significação é apagado. Esse aspecto foi evidenciado no momento da realização das

primeiras atividades, pois os alunos observavam as imagens não como constitutivas

do texto, mas apenas como ilustração.

Embora os alunos não conferissem significação à propaganda como texto,

não houve desinteresse por parte deles em participar da pesquisa. Aliás, a

participação e o comprometimento nas aulas foram bem satisfatórios no andar de

sua concretização. Demonstravam-se empolgados quando eram propostas as

atividades.

Sabemos que um trabalho como este apresenta várias possibilidades de

análise, mas, para atender aos objetivos propostos, daremos atenção às produções

escritas, considerando os aspectos indicados no item 2.4 do capítulo II.

Inicialmente, procederemos à análise da primeira produção e logo

passaremos à refacção. Nesta parte, veremos como os alunos materializaram as

especificidades do gênero, isto é, se os textos apresentam o tema (querer-dizer do

locutor), a estrutura composicional (plano de expressão, da estrutura organizacional)

e o estilo (seleção de recursos fraseológicos, lexicais e gramaticais da língua). A

partir dessa análise, passaremos a observar as estratégias persuasivas usadas

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pelos alunos na construção das propagandas. Tal observação será realizada,

preferencialmente, nos textos refeitos.

Os textos serão apresentados na seguinte ordem: será feita, de início, a

indicação da ordem numérica dos alunos pela referência Sujeito, acompanhada das

letras a e b que remetem à primeira produção e à refacção, respectivamente. Em

seguida, o nome do aluno.

Os demais textos produzidos pelos alunos, não integrantes do corpus, são

apresentados no anexo IV.

Sujeito 1a - Pedro

Essa produção mostra que o aluno Pedro compreendeu a proposta. O tema

explorado por ele é “queimadas”. Ele mostrou coerência entre a temática escolhida e

os recursos, tanto lingüísticos quanto não-lingüísticos, para a organização do texto.

Em relação à estrutura composicional, podemos ver a distribuição desses recursos

feita de forma bem adequada ao gênero em questão: um enunciado em letras

grandes e as imagens em oposição permitem a visibilidade com facilidade. Além

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disso, o fundo amarelo evoca a cor das chamas: o fogo é amarelo. Nos aspectos

estilísticos, o aluno fez a escolha de uma linguagem simples, o que possibilita

aproximação com o leitor. O enunciado Queimadas .... só se for a brincadeira se

revela muito propício para marcar a argumentação. O não-lingüístico reforça esse

argumento, ou seja, as imagens de queimadas e de crianças brincando

complementam o lingüístico. O intensificador “só” particulariza a idéia que o autor

defende. O uso polissêmico da palavra queimadas é uma forma de apelo ao leitor,

mas isso está no implícito, e não na materialidade lingüística. Há, dessa forma,

economia de informações; aliás, na elaboração da mensagem publicitária, esta é

uma maneira de envolver o leitor, isto é, ele não precisa ficar por muito tempo

concentrado na leitura. Orientado a reescrever o texto, chamamos a atenção desse aluno para ver

que informações ele poderia acrescentar, modificar ou retirar para deixar o leitor

mais convencido da importância do tema em questão, conforme a proposta de

refacção apresentada no capítulo anterior. É significativo salientar que a proposta

permitiu ao aluno rever com cuidado o que ele produziu.

Sujeito 1b - Pedro

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Pedro conseguiu tornar sua produção mais explícita, colocando ao lado das

imagens um complemento com uma parte lingüística, chamando, assim, a atenção

do leitor para o assunto tratado. Podemos observar a escolha lexical cuidadosa:

Fazendo queimadas você destrói florestas, polui o ar, prejudica a sua saúde e quem

sai perdendo esse jogo é você. O uso do pronome você refere-se diretamente ao

leitor, responsabilizando-o, caso pratique queimadas. Outro aspecto interessante é a

presença da palavra jogo, escolha altamente propícia ao enunciado em destaque,

que remete à brincadeira. No jogo, perde-se ou ganha-se. À luz da brincadeira, a

“queimada” não objetiva queimar nossas reservas, mas alcançar momentos de

felicidade, de distração e alegria. Já as “queimadas” são um jogo que não deve ser

jogado, uma “felicidade” fugaz e, assim, aquele que as pratica tem um destino

previamente traçado: será sempre derrotado, com o agravante de que atinge sempre

o “nós” ou, como diz Pedro, Quem sai perdendo é você.

Tendo em vista que esse texto foi produzido para ser veiculado no suporte

cartaz, a inserção do texto verbal é adequada, ou seja, o aluno optou por um

enunciado colocando-o em tamanho maior para chamar a atenção do leitor, o que

poderá despertar-lhe a curiosidade para ler o trecho que foi acrescentado. Caso

fosse veiculado em outdoor, a primeira versão estaria bem de acordo com o suporte,

pois este exige uma leitura rápida.

Ao lado dessas considerações, podemos enfatizar as estratégias

persuasivas utilizadas nesse texto para atrair a atenção do leitor.

Na produção de Pedro, é possível perceber que há duas imagens colocadas

em oposição: a primeira, representando as queimadas, e acima dela o enunciado,

Queimadas... Tanto a parte lingüística quanto a não-lingüística denunciam a ação do

homem. As reticências usadas sinalizam a possibilidade de que o enunciado será

complementado. Abaixo, a imagem de crianças se divertindo põe às claras a

brincadeira (queimada) acompanhada da continuação do enunciado Só se for a

brincadeira, ativando o outro significado da palavra. A inclusão dessas imagens

ligadas ao lingüístico é forte recurso argumentativo, pois a ambigüidade gerada pelo

uso da palavra queimadas (no plural, referindo-se ao ato de queimar) é notada no

momento em que lemos o enunciado em seu todo e o relacionamos ao nosso

conhecimento adquirido culturalmente (da brincadeira). Ao estabelecermos essa

relação, percebemos o querer-dizer do locutor, que é o apelo para não praticarmos

queimadas. De acordo com Carvalho (2003, p. 61), muitas vezes, a ambigüidade

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sugerida na propaganda é desfeita pela imagem ou pela própria seqüência da

mensagem. É o que sucede nesse texto, ou seja, à medida que o leitor compara as

imagens e faz a leitura da propaganda no seu conjunto, o sentido da palavra inicial

(queimadas) é (re)significado. Na parte lingüística posta no canto direito da

propaganda (resultado da refacção), esse querer-dizer é reforçado: Fazendo

queimadas você destrói florestas, polui o ar, prejudica a sua saúde e quem sai

perdendo esse jogo é você. Assim, podemos afirmar que a atitude desejada pelo

locutor é que as pessoas se conscientizem e não pratiquem queimadas; em outros

termos, essa seria a “atitude responsiva ativa” esperada, pois, como afirma Bakhtin

(2003, p. 272), “toda compreensão plena real é ativamente responsiva [...]. O próprio

falante está determinado precisamente a essa compreensão ativamente responsiva:

ele não espera uma compreensão passiva”.

Sujeito 2a - Caio

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No que diz respeito à produção do aluno Caio, vimos que ele não explora

um tema específico. Para estruturar seu texto, seleciona uma imagem de tamanho

bem grande, a ocupar quase todo o espaço da propaganda, dividindo o enunciado

em duas partes: A natureza pede socorro! Salve enquanto ela está viva. Nos

aspectos estilísticos, o aluno lança mão de uma frase curta, de fácil compreensão,

constituída por um vocabulário forte, qual seja, a utilização do verbo pedir no

presente do indicativo. No sentido expresso por essa construção está subentendido

o co-enunciador (você): A natureza pede socorro para você. Conforme Maingueneau

(2004, p. 29), esse apagamento é um caso interessante quando se trata do gênero

publicitário, que, por natureza, implica fortemente seu co-enunciador. Se fosse

alicerçada tão-somente no verbo pedir, nossa compreensão poderia ficar atada ao

sentido usual de “pedir esmola”, atitude apassivada, o sujeito-pedinte mero

dependente de outro ser. Amarrado no substantivo socorro, o verbo pedir se apossa

de autoridade. É um implorar, um pedir com insistência, imprimindo ao sujeito o

papel que dele se espera: sujeito é o ser ativo, que impõe alteração, que provoca

reação, que não aceita dependência, que não se acomoda. Em suma, é brigador, é

agente. A natureza, nesse sentido, está reagindo. Se a ela não nos associarmos,

ambos – natureza e homem – seremos sufocados.

Assim, o uso da palavra socorro expressa a necessidade e, ao mesmo

tempo, o desespero da natureza, dando a impressão de que ela está no limite. Esse

argumento é reforçado pelo uso da exclamação, que evoca o sentido da entonação

usada na interjeição Socorro!, indicando perigo, urgência, grito. Na parte abaixo, no

complemento do enunciado, o locutor dirige o discurso diretamente ao leitor (salve

você). Isso pode ser visto pelo uso do modo verbal imperativo salve. A segunda

parte do enunciado deixa claro que o homem é o responsável e, portanto, é ele

quem deve agir. A expressão enquanto ela está viva corrobora que ainda há tempo,

ou seja, o homem, conscientizando-se de que deve preservar a natureza, pode

amenizar os problemas ambientais.

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Sujeito 2b – Caio

Na reescrita, o aluno, como no exemplo anterior, achou necessário

acrescentar uma pequena parte lingüística para reforçar seu argumento: Do jeito que

estamos tratando a natureza ela não durará por muito tempo. e nós também. A

posição escolhida para essa parte lingüística – ao lado da imagem – e a letra em

tamanho bem menor estão adequados para manter a estrutura desse gênero. O

aluno se assume como ser humano participante desse processo, pois, como é

comum na publicidade, ele poderia ter optado pela segunda pessoa do singular (Do

jeito que você está tratando a natureza), mantendo assim a uniformidade com o

enunciado A natureza pede socorro! Salve enquanto ela está viva.

Como conseqüência desse ato, ele mostra o que poderá acontecer com a

natureza e com os seres humanos. Para isso, muda o tempo verbal (ela não durará

por muito tempo), ou seja, no futuro essa paisagem não vai mais existir. O aluno

finaliza o texto com a afirmação e nós também. Nesse trecho, ele prevê que o

homem também sofrerá graves conseqüências, podendo até desaparecer. É

significativo o uso do ponto final anterior à oração e nós também. Não preservada a

natureza, nossa vida corre perigo. Ela só poderá ser mantida, como também a de

nossos filhos e netos, se estiver ligada, unida à vida da natureza. O ponto final está

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presente para dissociar natureza e homem. Mais que isso: sem a natureza, o

homem acabará findando sua própria existência, conferindo-lhe um ponto final antes

do esperado.

Vale enfatizar que a mudança do enunciador nessa propaganda apresenta-

se, também, como forte recurso persuasivo. Num primeiro momento, o aluno toma o

uso do verbo na segunda pessoa Salve enquanto ela está viva (segunda parte do

título). O pronome implícito “você” individualiza responsabilidades, direcionando a

mensagem a cada um dos leitores, como é próprio do gênero e, num segundo

momento, toma o uso do pronome nós, inscrita aí uma coletividade (eu + vocês), ou

seja, o próprio enunciador se inclui no discurso, demonstrando sensibilidade pelos

problemas que estão ocorrendo com o meio ambiente. Nesse sentido, o enunciador

procura ganhar a adesão do leitor, persuadindo-o a compartilhar de seus pontos de

vista, construindo com eles a própria argumentação.

Outra mudança se deu com o não-lingüístico: o aluno reforçou a nitidez do

título, com a cor verde, passando mais uma vez a canetinha, deixando-o mais visível

para ser percebido – fator essencial nesse gênero. Foram também destacadas as

cores nas palavras Socorro (vermelha) e Natureza (verde). Essas cores assumem,

em nossa sociedade, significados já cristalizados: o vermelho indica proibição,

sangue, morte; o verde, por sua vez, aponta para esperança, natureza, vida,

liberdade. Tais significados contribuem para a construção da significação do texto,

uma vez que os relacionamos com sentidos já produzidos, acionados no momento

da leitura, isto é, a palavra socorro, a única do texto a ser pontuada com a cor

vermelha, sinaliza urgência, expressa a idéia de que a natureza está morrendo, e a

verde é a forma como a natureza deve se manter, se a preservarmos.

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Sujeito 3a - Mila

Nessa produção, Mila escolheu como tema a preservação dos animais em

extinção. A aluna optou pela cor de fundo preta; como imagem-destaque, traz-nos

uma onça pintada, aparentemente, em seu habitat – um dos animais característicos

do Pantanal Mato-grossense. Ao lado da imagem, um enunciado inscrito no mapa

do estado de Mato Grosso. As cores colocadas em destaque preto-amarelo

deixaram o cartaz bem chamativo. A organização desses recursos constitui a

estrutura composicional do gênero discursivo propaganda impressa.

No que concerne aos aspectos estilísticos, podemos ver que, para a

construção do enunciado Não prenda os animais ... Seja amigo da onça!, a aluna fez

uso do verbo no imperativo negativo (não prenda), ao passo que, na segunda

oração, recorre ao imperativo afirmativo (seja). A escolha do primeiro modo verbal

indica proibição; quanto ao segundo, afirma o que deve ser feito. Em ambos os

casos, o modo imperativo está exercendo a finalidade de induzir o interlocutor a

cumprir a ação indicada pelo verbo. De acordo com Bechara (2001, p. 222), esse

modo verbal é usado “em relação a um ato que se exige do agente”. A esse respeito

Cereja & Magalhães (2002, p. 152) afirmam que o modo imperativo “é o mais usual

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nas propagandas, uma vez que eles têm por objetivo influenciar o receptor,

persuadi-lo, aconselhá-lo ou mesmo fazer-lhe um apelo”.

Após o trabalho de reescrita, a aluna reforçou a parte visual, tornando mais

nítida a parte lingüística do enunciado em destaque, além de acrescentar um

pequeno texto abaixo da imagem: Se você continuar prendendo animais, imagem

como essa não será mais vista como motivo de orgulho; ou melhor, será vista

apenas no papel. Aqui, a aluna utiliza o pronome você, dirigindo-se aos leitores e, de

maneira cuidadosa, usa a condicional se, para dizer o que acontecerá com os

animais, caso as pessoas continuem prendendo-os. Nessa propaganda, a escolha

lexical feita de forma bem criteriosa está de acordo com a temática em foco:

prendendo animais, motivo de orgulho, amigo, animais, não prenda.

Sujeito 3b -Mila

No que diz respeito aos recursos persuasivos, podemos destacar a escolha

da imagem de uma onça pintada ao lado do desenho do mapa de Mato Grosso,

dentro do qual se lê: Não prenda animais... Seja amigo da onça! Aqui a utilização da

frase feita – “seqüência fixa menor ou maior de palavras, formando uma unidade

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sintática consagrada pelo uso” (SANDMANN, 2003, p. 92) – e a imagem do animal

provocam a ambigüidade de uma maneira bem-humorada. Isso ocorre justamente

porque usamos essa expressão com uma intenção contrária à da propaganda, ou

seja, no nosso cotidiano, falamos de amigo da onça em situações de falsidade e

para nomear pessoas sem credibilidade. Já no texto, essa expressão provoca outro

sentido: é um apelo para que as pessoas estimem os animais e não os prendem

nem os maltratem. Esse é o jogo existente entre o sentido figurado e o sentido literal.

É importante destacar que, embora tal expressão seja usada na íntegra, o sentido

produzido é outro, a atitude que se espera do interlocutor é outra. Conforme

Carvalho (2003, p. 84), “a mensagem publicitária explora sistematicamente as

chamadas fórmulas fixas – frases feitas, citações, slogans, ditos populares, [...]

esses jogos de palavras facilitam a comunicação, estabelecendo uma certa

familiaridade com o leitor”.

A respeito desse recurso, Maingueneau (1997, p. 100) afirma que são

enunciados “já conhecidos por uma coletividade, que gozam o privilégio da

intangibilidade. Por essência, não podem ser resumidos, nem reformulados,

constituem a própria palavra, captada em sua fonte”. É esse saber compartilhado

que nos ajuda a construir o novo sentido desejado pelo locutor. Temos, dessa forma,

uma economia de informações explícitas, ficando assim subentendidas.

O desenho do mapa de Mato Grosso constitui recurso de grande força

argumentativa. A sua escolha não foi feita aleatoriamente, apenas para servir de

fundo para o enunciado verbal. Ainda que seja numa leitura rápida, o leitor consegue

perceber a relação da temática tratada com um estado em que a presença de

animais é grande. É comum aparecerem, na mídia, notícias, programas ou

reportagem, somadas à discussão a respeito da riqueza e da diversidade de

espécies animais no Pantanal Mato-grossense, nunca dissociadas da necessidade

de sua preservação.

Outro aspecto que merece ênfase é o uso da cor preta como pano de fundo,

contrastando com a cor amarela. Ao fazer uso dessa cor fúnebre, a aluna demonstra

tristeza, em havendo a extinção dos animais. Isso é reforçado na parte lingüística:

Se você continuar prendendo animais, imagens como essa não será mais vista

como motivo de orgulho; ou melhor, será vista apenas no papel. Assim, se o homem

não mudar sua atitude, os animais que poderiam ser apresentados com cores vivas

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da natureza, demonstrando a sua existência real, serão ao contrário, exibidos sob

cor de luto, da escuridão, da morte.

Vale destacar que, quanto ao aspecto lingüístico, privilegiando o estudo da

língua, notadamente o conhecimento sintático, o texto comporta correção: Imagens

como essa não será mais vista. Mila não deu importância à concordância, o que não

lhe desmerece a capacidade criativa. À luz da correção, o texto deveria ficar com

esta escritura: imagens como esta não serão mais vistas. Assinalamos nesse trecho

que, mais que correção, motivo de orgulho foi a produção dessa aluna.

No âmbito da teoria bakhtiniana, podemos dizer que a compreensão desse

texto depende dos conhecimentos que os sujeitos adquiriram social e culturalmente

e das diversas linguagens que circulam nessa esfera de atividade social –

publicidade e propaganda. Assim, os sentidos são construídos na relação leitor-

texto, em determinado contexto sócio-histórico de produção e, portanto, sua

significação não pode ser estabelecida a priori.

Sujeito 4a - Sara

A produção textual de Sara se estrutura da seguinte forma: um enunciado

verbal centralizado e, ao meio, uma imagem, em formato oval, de uma cachoeira. Ao

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lado esquerdo, uma parte lingüística e, no canto direito, uma frase imperativa. Nos

aspectos estilísticos, o locutor utiliza um questionamento, chamando a atenção do

leitor: Água, até quando? O uso do modalizador até quando unido com o ponto de

interrogação geram um impacto, ou seja, exigem do interlocutor um posicionamento,

instigam-no a pensar sobre esse assunto. Segundo Sandmann (2003, p. 29), “a

frase interrogativa é uma forma muito direta de apelo ao interlocutor, de empatia, de

interesse por ele”. Nesse sentido, o autor enfatiza que a frase interrogativa é usada

quando se quer obter uma informação, ao passo que a imperativa relaciona-se a um

comportamento. Ainda na parte lingüística, a escolha lexical feita pela aluna foi bem

cuidadosa e de acordo com a temática abordada: água, cai do céu, nosso planeta,

consumo, etc. O uso da expressão quem pensa assim está muito mal informado, em

uma linguagem simples, sugere intimidade e aproximação com o leitor. Podemos ver

aqui uma linguagem bem característica do gênero do discurso propaganda

impressa: marcas da oralidade, como se estivesse falando diretamente com o

interlocutor, uso de operadores argumentativos (até quando, afinal, mas, ainda),

presença de verbos no imperativo (valorize).

Em relação ao não-lingüístico, há o uso da cor azul como pano de fundo e

uma imagem bem agradável de uma cachoeira para sensibilizar o leitor da situação

em que se encontra o planeta quanto à escassez de água.

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Sujeito 4b - Sara

É indispensável grifar que essa aluna não refez o texto, apenas reforçou as

cores para deixar a parte lingüística mais nítida e, assim, facilitar a leitura.

A respeito das estratégias persuasivas, podemos analisar algumas escolhas

feitas pelo locutor. Ao construir o enunciado com uma pergunta e, logo abaixo,

simular a resposta, traz para seu discurso a voz do outro, e nesse caso, de um leitor

desinformado sobre a questão tratada no anúncio.

Água temos e muita! Afinal coisa que encontramos em todo lado e que até

cai do céu. Mas quem pensa assim está muito mal informado e não sabe que nosso

planeta corre risco de ficar sem água boa para o consumo.

Note-se que, na primeira frase, há o ponto de exclamação para mostrar

despreocupação, tranqüilidade e, na segunda, a expressão cai do céu, expressão,

aliás, bem utilizada, remetendo a coisas adquiridas com facilidade. Isso nos lembra

situações em que pais chamam atenção de seus filhos sobre a necessidade de

economizar dinheiro: “pensa que dinheiro cai do céu”. Na propaganda, o uso é no

sentido literal mesmo, mas nos remete a esse outro discurso. A mudança do

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enunciador introduzida pelo modalizador mas causa certo tom de ironia. Essa

alternância de vozes presentes no mesmo texto é forte marca argumentativa, dado

que se revela a forma de o locutor evidenciar a presença desse leitor desinformado

e despreocupado com esse assunto. Koch (2004, p. 156), ao apresentar as

estratégias discursivas identificadas por Guimarães (1981), afirma que a palavra

mas (ênfase da autora) é “ usada para frustrar uma expectativa que se criou no

destinatário”. Na propaganda, essa estratégia é bem elaborada: primeiramente, é

apresentado um argumento; com a introdução do “mas”, o locutor surpreende o leitor

ao veicular novo argumento, negando, assim, o anterior.

A frase imperativa, no canto direito, é uma forma de apelo direto a esse

leitor: Valorize a água que ainda resta! Observe-se que a escolha do verbo valorizar

sugere o sentido de que a água é preciosa, e na expressão ainda resta está

subentendido que a água está acabando ou pode acabar-se.

Sujeito 5 a - Nádia

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Dentro da temática – A preservação do meio ambiente – a aluna elegeu um

subtema específico, mas, com as imagens selecionadas para a construção do texto,

ela convida o leitor para analisar o tema do desmatamento. Assim como os textos já

analisados, esse é um texto estruturado pela multimodalidade. Acima um enunciado

em destaque; ao meio um pequeno texto centralizado e abaixo, as imagens. A aluna

usou uma linha transversal, separando-as. Com a cor de fundo avermelhada, a parte

lingüística escrita com lápis preto não possibilita muita visibilidade.

Em relação aos aspectos estilísticos, podemos observar que Nádia

construiu o enunciado verbal pautando-se numa linguagem bem coloquial: E aí! Vai

continuar de braços cruzados. Do outro lado da linha, a expressão Só depende de

você. O uso da gíria E aí! provoca familiaridade com o leitor. Sandmann (2003)

afirma que, na mensagem publicitária, predomina o coloquial, manifestado por

diversos recursos, como as gírias e frases feitas. Na frase Vai continuar de braços

cruzados, podemos ver o uso da frase feita, continuar de braços cruzados. “Parece-

nos que o uso desses meios constitui-se em um valioso recurso para atrair o leitor,

para chamar sua simpatia, para prender sua atenção, para chocá-lo, como pode ser

no caso de certas gírias” (SANDMANN, 2003, p. 48).

Um dado interessante é que, quando essa aluna terminou o texto, não

parecia satisfeita com sua produção. De imediato, ela já havia percebido algumas

incoerências, como a inversão das imagens. O outro elemento mencionado por ela

foi a cor de fundo. Nesse mesmo dia (da produção), Nádia percebeu a falta de

clareza com relação às partes que compõem a estrutura do gênero. É importante

sinalar que, a partir dos recursos usados na construção da propaganda, percebemos

a “intenção discursiva” do falante, mas faltou o acabamento do todo do enunciado.

Por meio da proposta da reescrita, a aluna alterou, consideravelmente, seu

texto. A oposição das imagens e da parte lingüística feita, inicialmente, por uma linha

transversal desordenada foi substituída pelas cores preta e laranja. Além disso, a

aluna inverteu as imagens, colocando-as em coerência com o enunciado verbal: de

um lado, sob pano de fundo preto, E aí! Vai ficar de braços cruzados, relacionando-o

com imagens, dando a idéia dos prejuízos causados pelo desmatamento; já do outro

lado, sob pano de fundo alaranjado, a expressão Só depende de você. Abaixo, as

imagens de árvores e um rio, apresentadas de maneira bem agradável. Nádia

modificou, ainda, a legibilidade das palavras, pois, na primeira versão, a parte escrita

estava com uma aparência bem prejudicada: palavras em tamanhos diferentes,

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algumas iniciadas com letras minúsculas e terminadas com maiúsculas (brAÇOS);

além disso, a cor de fundo não era adequada às cores das letras. Na segunda

versão, a aluna digitou a parte escrita e mudou também a cor, o que melhorou

consideravelmente a aparência da propaganda. Algumas correções foram feitas: o

ponto de interrogação que estava faltando, a grafia das palavras “colaborassem” e

“consciente”.

Nádia mostrou-se bastante comprometida com o “acabamento” da

propaganda, principalmente no que diz respeito às características estruturais, visto

que ela reaproveitou toda a parte lingüística e boa parte da não-lingüística feita na

primeira versão. A sua intenção discursiva era a mesma, mas sabia que precisaria

adequá-las melhor ao gênero. Vejamos o resultado desta refacção.

Sujeito 5b - Nádia

Em relação às estratégias persuasivas, os argumentos de Nádia são

marcados, inicialmente, pela informalidade. O locutor, em tom de brincadeira, chama

a atenção do leitor, mostrando-se próximo; por isso, ao usar a frase feita Vai

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continuar de braços cruzados, pede para ele se mover, agir. É importante observar a

informação pressuposta nesta expressão, isto é, ao utilizar a locução verbal vai

continuar, está implícito, ou seja, está inscrito no enunciado que o leitor não tem se

preocupado com as questões ambientais e, assim, o locutor questiona se ele não vai

mudar essa postura.

Como já analisamos no texto da aluna Sara, a interrogação é forte

argumento nessa propaganda, pois exige do leitor uma resposta, uma atitude. Do

lado direito, em oposição, a aluna responsabiliza o leitor – Só depende de você. O

uso do modalizador só e do pronome você particulariza a atitude esperada pelo

locutor. Abaixo, centralizado, aparece o discurso: Se todos colaborassem nada disso

estaria em reportagem. Seja consciente e preserve o meio ambiente. O verbo no

subjuntivo – colaborassem – acompanhado da condicional – se – mostra que as

pessoas não estão colaborando. É interessante que os alunos fizeram leituras de

reportagens, como foi apresentado na metodologia, e uma delas tratava da questão

do desmatamento. O conhecimento compartilhado pela aluna e seus colegas, na

aula em que tratamos deste assunto, está subentendido na informação Nada disso

estaria em reportagem.

Nádia, com o uso do verbo no imperativo, encerra a parte lingüística com

um apelo ao leitor: Seja consciente e preserve o meio ambiente. A rima utilizada

nessas palavras provoca a aproximação com o leitor.

No que diz respeito ao aspecto não-lingüístico, a argumentação é marcada

pelo contraste das cores, acompanhadas das imagens. O preto evoca o sentido de

destruição e a cor laranja, em contrapartida, é viva, expressa alegria. O impacto

dessas cores complementa a parte lingüística. Dito de outra maneira, o locutor

chama a atenção do leitor para mudar de postura, para descruzar os braços e agir.

3.2 Síntese das análises

Como afirmamos, ao produzirem esses textos, os alunos já haviam tido

contato com o gênero discursivo propaganda impressa. De acordo com Bakhtin

(2003, p. 285), “quanto melhor dominamos os gêneros tanto mais livremente

empregamos, [...] realizamos de modo mais acabado o nosso livre projeto de

discurso”. Tendo em vista que esse gênero discursivo apresenta muitas variações,

são mais plásticos, não exigimos que os alunos seguissem uma padronização. No

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entanto, eles teriam que levar em conta o suporte em que os textos seriam

veiculados – cartaz – e escolher um subtema dentro da temática “preservação do

meio ambiente”. No momento da produção, eles tiveram a oportunidade de escolher

a imagem, as cores, a distribuição desses elementos no cartaz e, quando foram

orientados a reescrevê-los, não exigimos o que teria de ser modificado, alterado, ou

seja, deixamos que eles observassem o texto e vissem o que poderia ser acrescido

para torná-lo mais atraente, criativo, de forma que conseguissem a adesão do

público ao assunto propagado. Ainda de acordo com o filósofo russo (idem), “ao

falante não são dadas apenas as formas da língua nacional (a composição

vocabular e a estrutura gramatical) obrigatórias para ele, mas também as formas de

enunciado, isto é, os gêneros do discurso”.

Os textos produzidos pelos alunos evidenciam sua capacidade em relação à

apreensão do gênero do discurso propaganda impressa. Isso nos possibilita

constatar que conseguimos proporcionar-lhes o contato com um gênero de grande

circulação social, por eles desconhecido como prática de leitura e produção textual

no universo escolar.

Durante a elaboração das propagandas, percebemos sua preocupação com

as características constitutivas desse gênero, isto é, a construção dos argumentos,

considerando tanto os lingüísticos quanto os não-lingüísticos. Percebemos que eles

sabiam que não poderiam colocar apenas frases soltas e isoladas; antes, tinham de

constituir um todo significativo.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

O discurso escrito é de certa maneira parte

integrante de uma discussão ideológica em grande

escala: ele responde a alguma coisa, refuta,

confirma, antecipa as respostas e objeções

potenciais, procura apoio, etc.

(BAKHTIN, 2003, p. 123)

Toda pesquisa só tem começo depois do fim.

Dizendo melhor, é impossível saber quando e onde

começa um processo de reflexão. Porém, uma vez

terminado, é possível ressignificar o que veio antes

e tentar ver indícios no que ainda não era e que

passou a ser.

(AMORIM, 2001, p. 11)

Com este estudo, à luz da teoria bakhtiniana, procuramos refletir sobre o

percurso de um trabalho prático enfocando a leitura e a produção textual com o

gênero do discurso propaganda impressa, cujos resultados, por um lado, confirmam

a necessidade de busca de um ensino de qualidade e, por outro, comprovam a

viabilidade de aplicação dos gêneros na perspectiva enunciativo-discursiva ao

ensino dessas práticas sociais.

No considerar a linguagem um processo de interação verbal, no qual os

sentidos são produzidos a partir de uma relação dialógica entre os interlocutores, e

que, portanto, nesse viés teórico, a leitura e a produção de textos devem ser

orientadas em um contexto real de comunicação, procuramos desenvolver, nesta

pesquisa, um projeto em que a propaganda impressa fosse relacionada com seu

contexto sócio-histórico de produção, circulação e recepção. Para isso, realizamo-lo

em três etapas: leitura de propagandas comerciais e sociais, produção de

propagandas sociais e circulação destas na escola.

Inicialmente, no trabalho de leitura, evidenciamos a falta de familiaridade

dos alunos em lidar com as propagandas na qualidade de texto trabalhado na

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escola. A sua atenção, durante a realização das atividades iniciais propostas, era

voltada apenas para o lingüístico. Nessa fase, o não-lingüístico foi totalmente

desconsiderado como parte constitutiva de significação. A partir dessa evidência,

tivemos a preocupação de enfatizar, nas atividades, os elementos lingüísticos e não-

lingüísticos que constituem a propaganda impressa. Embora o foco para a análise

tenha sido as produções textuais, consideramos de fundamental importância a

realização do trabalho de leitura, conforme detalhamos no capítulo II.

Diante das análises dos textos, algumas reflexões merecem ser salientadas.

Para tanto, faremos uma retomada da pergunta norteadora dessa pesquisa: a

prática de leitura de propagandas impressas por meio de atividades organizadas em

seqüências didáticas possibilitou aos alunos produzirem textos adequados ao

gênero em questão?

Podemos afirmar que as produções textuais dos alunos apresentaram

características relativamente estáveis do gênero do discurso propaganda impressa,

por serem constituídas pelo conteúdo temático, estrutura composicional e estilo. A

apreensão das especificidades do gênero pode ser evidenciada na materialidade de

seus textos por meio das escolhas fraseológicas e lexicais, pela seleção das

imagens e das cores e, sobretudo, pela coerência com que esses recursos foram

utilizados. Foi gratificante ver o resultado e perceber sua criatividade não apenas em

relação à escolha de imagens e de frases, mas com a preocupação do todo, do

acabamento, objetivando provocar uma atitude responsiva no leitor. A esse respeito

Geraldi (2005, p. 3) afirma que, para a construção do texto, não é necessário seguir

regras, mas sim [...] “articulações entre situação, relação entre interlocutores,

temática, estilo do gênero e estilo próprio, o querer-dizer do locutor, [...]”. É dessa

forma que compreendemos o mundo, as pessoas e suas relações.

Assim, reconhecendo as limitações desta pesquisa, consideramos que os

gêneros da esfera midiática, especialmente a propaganda impressa, constitui uma

alternativa para o trabalho da leitura e produção textual, visto que, além de abarcar

tanto os recursos lingüísticos como os não-lingüísticos, isto é, a multimodalidade, é

um gênero de circulação social que faz parte da vida cotidiana dos alunos, de suas

práticas de linguagem. Portanto, levá-lo para a sala de aula e refletir acerca do

discurso presente nesses textos é contribuir para a formação de leitores críticos,

estimulando-os a interpretar o não-dito, mas constitutivo do todo da significação.

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Concordamos com Barbosa (2001, p. 58) quando defende a adoção dos

gêneros do discurso como objeto de ensino, por abarcar aspectos lingüísticos e

discursivos e, assim, contemplar, o complexo processo de produção e compreensão

de textos. A autora sustenta sua justificativa pelos seguintes aspectos:

- os gêneros do discurso permitem capturar, para além de

aspectos estruturais presentes em um texto, também aspectos

sócio-históricos e culturais, cuja consciência é fundamental para

favorecer os processos de compreensão e produção de textos;

- os gêneros do discurso nos permitem concretizar um pouco

mais a que forma de dizer em circulação social estamos nos

referindo, permitindo que o aluno tenha parâmetros mais claros para

compreender ou produzir textos [...];

- os gêneros do discurso fornecem-nos instrumentos para

pensarmos mais detalhadamente as seqüências e simultaneidades

curriculares nas práticas de uso da linguagem.

Tendo percorrido os passos desta pesquisa, ressaltamos que o trabalho na

perspectiva enunciativa com os gêneros do discurso não é tarefa simples, uma vez

que requer tempo para o estudo do seu contexto sócio-histórico de produção,

circulação, recepção e para o planejamento das atividades. Dessa forma, é

necessário que o professor-pesquisador faça um estudo da teoria bakhtiniana, para

compreender o que o filósofo russo propôs a respeito da linguagem como interação

verbal, pois, sem essa orientação, o trabalho com os gêneros pode tornar-se

superficial.

Evitar tal equívoco implica assumir a linguagem como processo de interação

verbal; significa entender que o sentido do texto depende da relação dialógica entre

os interlocutores; admitir que a língua não está pronta num sistema, mas ela é

constituída numa situação sócio-histórica concreta, no momento e no lugar onde se

dá a enunciação; é, enfim, considerar que os sujeitos se constituem na e pela

linguagem.

Dessa forma, o trabalho de leitura e produção textual será compreendido

como o processo de interlocução e de construção de significados. Consciente dessa

perspectiva teórica, o professor deverá considerar o aluno-leitor participante ativo no

processo de leitura, estabelecendo uma relação dialógica entre seu saber e outros

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saberes, inseridas aí as condições de produção, circulação e recepção do gênero.

Em outras palavras, ao levar o gênero para sala de aula, é relevante assinalar as

seguintes questões com os alunos: em que esfera social esse gênero circula, qual é

o suporte no qual foi publicado, quem são seus interlocutores, com qual finalidade

esse gênero foi produzido. Para isso, é necessária a utilização de uma variedade de

textos do mesmo gênero com vista a que os alunos possam perceber as

semelhanças lingüísticas e discursivas entre eles, isto é, as especificidades que o

caracterizam como tal.

Esperamos que, com este trabalho, possamos contribuir para o

fortalecimento desse novo paradigma de ensino-aprendizagem de língua materna.

Reconhecemos que não se revela simples a mudança, pois romper com um

paradigma cristalizado não acontece tranqüilamente. Como pontua Cox (2004, p.

126), “mas, afinal, o que muda sem agonia, essa linha tênue que separa o fim de um

tempo e o começo do outro?”.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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ANEXOS

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ANEXO I

FOTOS DA VISITA AO LABORATÓRIO DE PUBLICIDADE E PROPAGANDA

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Alguns alunos com dois técnicos do laboratório Alunos no cromakey, juntamente com a professora pesquisadora (à esquerda) e a responsável pelo estúdio (à direita).

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Aluno fazendo teste no estúdio radiofônico

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ANEXO II CARTAZ E FÔLDER

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Anúncio produzido pelos alunos do curso de Comunicação Social – habilitação: Publicidade e Propaganda – 4° semestre.

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Anúncio produzido pelos alunos do curso de Comunicação Social – habilitação: Publicidade e Propaganda – 4° semestre.

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ANEXO III TEXTOS COMPLEMENTARES: REPORTAGENS

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Especial

Perigo real e imediato

Para onde vamos com nossas agressões ao planeta? O pessimismo da resposta varia, mas há um consenso: a hora de agir é já

Vilma Gryzinski

Desde que a era das fotografias espaciais começou, há quarenta anos, uma nova e prodigiosa imagem se formou no arquivo mental da humanidade sobre o que é o planeta no qual vivemos. Do nosso ponto de vista no universo, provavelmente não existe nada que se compare à beleza desta vívida esfera azul, brilhando na imensidão do espaço, água e terra entrelaçadas num abraço eterno, envoltas num cambiante véu de nuvens. O que as fotos não mostram, mas sabemos existir mais abaixo, é igualmente de arrepiar. A luxuriante diversidade da vida espalhada por florestas, montanhas, desertos, oceanos, rios, vibrando num diapasão constante que evoca uma história de 3,5 bilhões de anos, desde as bactérias primevas até tudo o que respira, exala, anda, rasteja, suga, fotossintetiza-se, multiplica-se e replica-se, neste momento exato, em nosso planeta. Além de tudo cuja existência conhecemos, ainda há o que apenas supomos. "A totalidade da vida, conhecida como biosfera pelos cientistas e criação pelos teólogos, é uma membrana tão fina de organismos que envolvem a Terra que não pode ser vista a partir de uma nave espacial, porém internamente é tão complexa que a maior parte das espécies que a compõem está por ser descoberta", escreveu, numa tentativa de síntese da grandiosidade do fenômeno, Edward O. Wilson, o grande biólogo americano.

Wilson está entre os cientistas de vulto que clamam insistentemente pela atenção da humanidade para o perigo real e cada vez mais imediato para a sobrevivência de nós mesmos, que podemos ser arrastados num paroxismo de autodestruição, levando conosco as formas mais complexas de vida. Claro, sempre sobrarão as baratas. Nas reportagens das próximas páginas, VEJA traça um panorama das armadilhas produzidas pelos homens para si mesmos, desde a exaustão de recursos vitais como a água até os efeitos incontornáveis do aquecimento global, que podem ser amenizados, na melhor das hipóteses, ou agravados em proporções dantescas, na pior. Duas das reportagens registram também pequenas réstias de esperança que podem vir a ser a salvação do planeta.

Até recentemente, era comum falar em ameaças que poderiam afetar a vida de nossos netos – uma perspectiva bastante incômoda, mas sem a premência dos desastres iminentes. Hoje, até a palavra ameaça ficou superada. Os fenômenos deletérios estão em andamento e muitos de seus efeitos serão sentidos ainda dentro da expectativa de vida de boa parte da humanidade. Propaga-se, por exemplo, a noção de que está em curso a

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sexta extinção em massa. As cinco anteriores conhecidas pela ciência deixaram registros geológicos concretos. A maior aconteceu há 250 milhões de anos; a mais conhecida, a que extinguiu os dinossauros, há 65 milhões. Extinções, evidentemente, fazem parte da história da Terra – menos de 10% das espécies que em algum momento existiram continuam a ter um bilhete no ciclo da vida do planeta. A taxa de extinção considerada normal é de uma espécie em 1 milhão por ano; a atual gira em torno de 1.000 por ano entre espécies conhecidas e ainda não catalogadas. O aquecimento global tampouco é apenas uma hipótese no horizonte do médio prazo. Todas as grandes geleiras do planeta vêm diminuindo, os oceanos estão se tornando mais quentes, animais mudam suas rotas migratórias, a diferença de temperatura entre dia e noite cai. Os níveis de dióxido de carbono são os mais altos dos últimos 420.000 anos. Se as emissões continuarem, atingirão um estágio que ocorreu pela última vez no Eoceno, há 50 milhões de anos.

As previsões catastrofistas sobre o futuro da humanidade têm sido desacreditadas desde que Thomas Malthus escreveu seu Ensaio sobre o Princípio da População, no fim do século XVIII, prevendo uma superpopulação avassaladora. Ridicularizar os profetas do pessimismo freqüentemente se revela um exercício saudável. A capacidade de adaptação humana, somada aos vertiginosos avanços do conhecimento no último século, desmentiu mais de um cenário apocalíptico. Mas hoje pouca gente está para brincadeiras. Um levantamento recente de trabalhos científicos sobre as mudanças climáticas mostrou que 75% endossavam a hipótese do aquecimento global – os outros 25% foram considerados neutros, pois analisavam métodos e procedimentos. Quando tratam dos efeitos das transformações em curso, alguns estudiosos usam palavras que parecem saídas de obras de ficção científica. "Acredito que as chances de nossa civilização na Terra sobreviver até o fim do século presente não passam de 50%", escreve o cientista inglês Martin Rees, professor de cosmologia em Cambridge, no livro Hora Final. Mesmo quando pende para um lado mais conservador, Rees pinta um quadro de amargar: "As mudanças globais – poluição, perda de biodiversidade, aquecimento global – não têm precedentes em sua velocidade. Ainda que o aquecimento global aconteça na ponta mais lenta do espectro provável, suas conseqüências – competição por suprimentos de água e migrações em

ampla escala – podem engendrar tensões desencadeadoras de conflitos internacionais e regionais, sobretudo se eles forem excessivamente alimentados por crescimento populacional contínuo".

A capacidade humana de alterar o planeta em escala geológica atingiu tal ponto que o cientista holandês Paul Crutzen propõe que a época atual, Holoceno, iniciada há apenas 10.000 anos, já acabou. Vivemos, diz ele, em pleno antropoceno – e isso começou no fim do século XVIII, com a invenção da máquina a vapor, desencadeadora do processo que mudou a face da Terra. A vaga de alarmismo que permeia o mundo no momento é tamanha que permite perguntas altamente incômodas. Em escala cosmológica, qual seria a importância do desaparecimento dos humanos da Terra (ainda que levassem, em sua irresponsabilidade genocida, uma enormidade de espécies consigo)? Mais ainda: o mecanismo de autodestruição não está embutido na própria espécie, para barrar sua propagação virulenta e descontrolada, e entrou em ação justamente num momento crítico?

Fazer perguntas para as quais não se tem respostas é próprio da espécie humana.

Podemos, no entanto, conjeturar. Uma resposta possível à primeira pergunta é que a

importância provavelmente é nenhuma. Mesmo que o surgimento de vida inteligente e

consciente tenha resultado de uma cadeia de eventos tão improvável que tenha

acontecido uma única vez – aqui mesmo, na nossa magnífica esfera azul –, a extinção da

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espécie humana, por mais inominável que nos pareça, não significa o fim da vida. À

segunda pergunta, só podemos responder que, como não estaremos aqui para saber se a

hipótese se confirma, temos a obrigação de trabalhar com a idéia contrária: não estamos

programados para a extinção, ou pelo menos não agora. A vida começou na Terra há

cerca de 3,5 bilhões de anos e ainda há 6 bilhões pela frente antes que o sol incinere a

Terra. Cerca de 60 bilhões de seres humanos já viveram antes de nós. Seria demais

deixar um desaparecimento catastrófico acontecer justo no nosso turno.

Veja, 12 de outubro de 2005 (Versão online)

Especial O paradoxo da água

Setenta por cento da superfície do planeta é coberta por água – mas só 1% de todo esse enorme reservatório é próprio para o consumo do homem. O desafio é evitar a poluição, o desperdício e distribuir melhor esses recursos hídricos

João Gabriel de Lima

100 toneladas de peixes mortos pela poluição na Lagoa Rodrigo de Freitas, no Rio de Janeiro, em 2000: o problema não é a quantida- de de água, mas a qualidade.

Uma das visões mais espetaculares do século passado foi a primeira imagem da Terra feita do espaço, na década de 60: uma gigantesca massa azul, com 70% de sua superfície coberta por água. Neste início de século, uma preocupação recorrente – e

justificada – é a de que a água, tão abundante, se torne paradoxalmente cada vez mais escassa para uso humano. Em março deste ano, o secretário-geral da Organização das Nações Unidas, Kofi Annan, decretou os anos que vão de 2005 a 2015 como a Década da

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Água. O objetivo é que nesse prazo se reduza à metade o número de pessoas sem acesso a água encanada, cifra que ultrapassa 2 bilhões de pessoas. Mantidos os atuais níveis de consumo, estima-se que em 2050 dois quartos da humanidade viverão em regiões premidas pela falta crônica de recursos hídricos de qualidade. É um dado gravíssimo quando se leva em consideração que 60% das doenças conhecidas estão relacionadas de alguma forma com a escassez de água. Como isso é possível em um planeta com tantos recursos hídricos? O problema pode ser equacionado em dois termos: má distribuição e má gestão. O primeiro se deve à própria natureza, o segundo é culpa do homem. A água é realmente a substância mais comum na Terra. No entanto, 97% dela está nos mares, sendo assim imprópria para o uso agrícola e industrial e para o consumo humano. Outros 2% estão nas calotas polares, em forma de gelo ou neve. Resta, assim, apenas 1% de água doce, aquela disponível nos rios, lagos e lençóis freáticos. Essa água é extremamente mal distribuída. Países como o Canadá e a Finlândia têm muito mais do que precisam, enquanto o Oriente Médio praticamente nada tem.

O Brasil, dono da maior reserva hídrica do mundo – 13,7% da disponibilidade de

água doce do planeta –, expressa internamente esse paradoxo. Dois terços da água estão concentrados na região com menor densidade populacional, a Amazônia. Isso significa que um brasileiro de Roraima tem 1 000 vezes mais água à disposição do que um conterrâneo que vive no interior de Pernambuco. A água é pesada e difícil de transportar. Levá-la de um lugar a outro tem sido o grande desafio dos seres humanos desde o tempo dos romanos, que construíam aquedutos por toda parte. O segundo problema relativo à água é a má gestão – e, nessa área, há outro paradoxo. Mesmo sendo essencial para a economia, a água sempre foi dada de graça. Até recentemente, nem os industriais nem os agricultores, para não falar dos consumidores domésticos, pagavam pela água, apenas pelo serviço de distribuição. É claro que, aplicando-se à risca o princípio econômico segundo o qual não existe almoço grátis, esse raciocínio não se sustenta. No fundo, toda a sociedade paga quando o governo subsidia empresas estatais para que tratem a água que um empresário vai usar em sua fábrica, ou quando constrói uma barragem para que um rio seja colocado à disposição dos lavradores para a irrigação. Quando não se paga pelo que se consome, o resultado inevitável é o desperdício. Por isso, quando se fala em solucionar os problemas da água no mundo, uma palavra surge como um mantra: precificação. Significa que o governo, que é o dono em última análise dos mananciais naturais de um país, deve cobrar pelos recursos hídricos consumidos por seus cidadãos, revertendo o dinheiro para a cobertura dos custos de tratamento da água e preservação dos ecossistemas ligados a ela.

Isso já ocorre em países como França e Alemanha, considerados exemplares na gestão de água. No procedimento mais utilizado, o empresário ou o agricultor paga duas vezes: pela água em si e pela licença para jogar os resíduos nos rios. Com isso, ele é incentivado a gastar pouco e a tratar ele próprio a água antes de devolvê-la à natureza. "Cobrar pela água é muito mais eficaz do que estabelecer milhares de leis de preservação, quando se sabe que o Estado não vai ter como contratar gente para fiscalizar e cobrar multas", diz Benedito Braga, diretor da Agência Nacional de Águas, criada em 1997. A agência iniciou recentemente um projeto piloto de cobrança da água no Rio Paraíba do Sul, compartilhado pelos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. No ano passado, foram arrecadados lá cerca de 6 milhões de reais, os quais serão reinvestidos em estações de tratamento em doze cidades.

No futuro, os consumidores domésticos também terão de repartir a conta da água com empresários e agricultores, ainda que respondam por apenas 10% do gasto de água doce no mundo. Afinal, são os esgotos não tratados os principais responsáveis pela poluição dos rios, principalmente os das grandes metrópoles. O problema só será resolvido quando se começar a cobrar pela água em si, não apenas por seu abastecimento. Embora a idéia da precificação seja praticamente unânime, existem os

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que argumentam que ela tornaria a água mais cara para quem mais precisa dela: a população mais pobre. Existem várias maneiras de evitar que isso ocorra. Na África do Sul foi estabelecido um consumo máximo por pessoa – apenas acima disso se cobra pela água. A verdade é que o que sai caro, para a população pobre, é não ter água. Nos países onde a carência é dramática, são as mulheres as encarregadas de ir até o rio mais próximo com um vaso na cabeça – e, como ele freqüentemente fica a quilômetros de distância, às vezes se perde o dia inteiro nessa empreitada.

Há pelo menos três mitos sobre a questão da água, magnificados pela grita dos ambientalistas radicais mas que não condizem com a realidade. O primeiro reza que a água do planeta estaria acabando. Não é verdade. A água é um recurso infinitamente renovável, já que, em seu ciclo, ela cai das nuvens em forma de chuva, fertiliza a terra, vai para o mar pelos rios e evapora de volta às nuvens, novamente como água doce. O segundo diz que o consumo doméstico desmedido estaria acabando com a água do planeta. Trata-se de outro exagero. Apenas um décimo da água potável disponível é gasto para que os homens cozinhem, lavem roupa e façam a higiene pessoal, enquanto 70% são alocados para a irrigação agrícola – esta, sim, a grande vilã do desperdício. O terceiro mito, derivado desse, é o de que os recursos hídricos vão acabar porque, quanto mais o mundo se desenvolve, mais ele precisa de alimentos e, conseqüentemente, de água. Também não é exato. A modernização das técnicas agrícolas vem fazendo com que caia o consumo de água. De acordo com umaestimativa do Pacific Institute, um dos mais respeitados centros de estudos mundiais sobre o assunto, o consumo total de água nos Estados Unidos era de 600 quilômetros cúbicos por ano na década de 80. Hoje está em menos de 500. A queda se deve também à economia na indústria e no consumo doméstico. Nas fábricas, nos anos 30, gastavam-se em média 200 toneladas de água para obter 1 tonelada de aço. Hoje, usando-se os métodos modernos, esse consumo caiu para 3 toneladas. Nas casas, por exemplo, a quantidade média de água utilizada nas descargas dos banheiros caiu para um quarto do que era há vinte anos. O verdadeiro dilema é conseguir que, com uma população mundial em constante crescimento, os recursos sejam mais bem distribuídos e que sua qualidade seja mantida. A história ensina que o ser humano administra melhor aquilo que é tratado como bem econômico. A água, que está na base de todas as cadeias produtivas, faz jus a esse tratamento.

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Uso irresponsável da natureza

A natureza é uma grande prestadora de serviços para a humanidade. E é ela quem dá os elementos básicos para a vida humana e o desenvolvimento econômico. A água é o mais fundamental desses serviços, que incluem também os alimentos, as fontes de energia e os materiais usados na fabricação de todos os objetos que nos rodeiam. Nas últimas semanas, VEJA mostrou, em reportagens especiais, que esses serviços têm um custo – altíssimo, dependendo da maneira como os utilizamos. A reportagem "A cegueira das civilizações" (7 de setembro) discutiu o risco de a humanidade estar repetindo o erro de sociedades do passado que entraram em colapso porque não evitaram a destruição ambiental causada por elas próprias. Em "Seis provas do aquecimento global" (21 de setembro), VEJA demonstrou que a mudança climática da Terra, acelerada pelo homem, é um fenômeno real e que seus efeitos não podem mais ser ignorados. É hora de rever a forma como os recursos naturais são explorados.

A natureza contra-ataca O planeta começa a responder com derretimento de geleiras, secas, escassez de água e aquecimento global aos milhares de anos de agressões feitas pelo homem

Bia Barbosa

No cálculo que se tornou clássico na literatura científica popular, o astrônomo Carl

Sagan (1934-1996) propôs que se toda a história do universo pudesse ser comprimida em um único ano, os seres humanos teriam surgido na Terra há apenas sete minutos. Nesse período, o homem inventou o automóvel e o avião, viajou à Lua e voltou, criou a escrita, a música e a internet, venceu doenças, triplicou sua própria expectativa de vida. Mas foram também sete minutos em que a espécie humana agrediu a natureza mais que todos os outros seres vivos do planeta em todos os tempos. A natureza está agora cobrando a conta pelos excessos cometidos na atividade industrial, na ocupação humana dos últimos redutos selvagens e na interferência do homem na reprodução e no crescimento dos animais que domesticou.

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A começar por seus bens mais preciosos, a água e o ar, o balanço da atividade humana mostra uma tendência suicida. Com a mesma insolência de quem joga uma casca de banana ou uma lata de refrigerante pela janela do carro pensando que se está livrando da sujeira, a humanidade despeja na natureza todos os anos 30 bilhões de toneladas de lixo. Quem mais sofre com a poluição são os recursos hídricos. Embora dois terços do planeta sejam água, apenas uma fração dela se mantém potável. Como resultado, a falta aguda de água já atinge 1,2 bilhão de pessoas em todo o mundo. Quatro em cada dez seres humanos já são obrigados a racionar o líquido. Pior. Por problemas principalmente de poluição, os mananciais, que ficaram estáveis por séculos, hoje estão diminuindo de volume em todos os continentes, enquanto a população aumenta. Se a Terra fosse do tamanho de uma bola de futebol, a atmosfera teria a espessura do fio de uma lâmina de barbear. Pois bem, essa estrutura delicada vem recebendo cargas de fumaça e gases venenosos num ritmo alucinante. Segundo avaliação do Worldwatch Institute, em um único dia a humanidade e suas máquinas jogam na atmosfera mais gás carbônico que todos os seus antepassados em um século. Análises de amostras coletadas de ar encapsulado no gelo do Ártico, datadas conforme sua profundidade, confirmam essa avaliação. Centenas de espécies de peixes comestíveis foram extintas em apenas trinta anos pela pesca industrial, que usa satélites para localizar cardumes e redes tão descomunais que poderiam engolfar um prédio de quarenta andares. Pela presença de pessoas em seus habitats, animais estão sendo extintos num ritmo cinqüenta vezes mais rápido que o trabalho seletivo da evolução natural das espécies. Apenas um terço das florestas que viram a chegada dos colonizadores europeus às Américas ainda está de pé. O Brasil é quase uma vitrine da destruição tocada pelo homem. O país já perdeu 93% da Mata Atlântica, 50% do cerrado e 15% da Floresta Amazônica. E as motosserras continuam em ação.

Individualmente, as agressões acima seriam absorvidas pelo ecossistema global, acostumado a catástrofes naturais. O problema é que houve uma orquestração. Sem se dar conta, os 6 bilhões de pessoas tornaram-se um fardo pesado demais para o planeta, tanto sobre o solo quanto no mar e no ar. Agora, a natureza está mandando a conta. O efeito mais apocalíptico dessa mensagem é o aquecimento global, cuja causa mais provável é a concentração na atmosfera de gases produzidos pela queima de gasolina, óleo e outros combustíveis por fábricas e veículos. O acúmulo desses gases poluentes encapsula o calor do sol e não deixa que ele escape para o espaço sideral, transformando a atmosfera numa estufa. "Durante anos, parte da comunidade científica se enganou atribuindo o aquecimento aos ciclos naturais do planeta e às mudanças na atividade solar. Hoje existe uma quase unanimidade de que o problema é causado por nós mesmos", diz ninguém menos que Stephen Hawking, o reputado astrofísico inglês. O último relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, das Nações Unidas, foi incisivo nesse aspecto. "Já estamos e vamos continuar pagando o preço do que fazemos hoje com o planeta. Isso não é especulação. É uma constatação científica", afirma Thelma Krug, coordenadora-geral de Observação da Terra do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais. Somente no ano passado, cerca de 29 bilhões de toneladas de dióxido de carbono foram liberados na atmosfera.

Segundo especialistas, se o efeito estufa continuar a crescer no mesmo ritmo, a temperatura média da Terra pode aumentar 5,8 graus centígrados até 2100. Essa temperatura é 65% maior que o pior cenário de aquecimento global traçado há cinco anos por um grupo de cientistas. Na época, a previsão foi tachada de pessimista. Ninguém se iluda com a idéia de que a longo prazo todos estaremos mortos e, portanto, que a Terra esteja um pouco mais quente daqui a 100 anos é um problema para os netos de nossos bisnetos. Nada disso. Os primeiros sinais já estão por toda parte. São visíveis os recuos das geleiras em ambos os pólos. O Ártico perdeu 6% de sua área entre 1978 e 1996, um ritmo quatro vezes maior que o registrado por observadores do século passado. Os verões estão mais longos e os invernos mais curtos, atrapalhando o metabolismo dos pinguins, no sul, e dos ursos polares, no norte. Atribuem-se às mudanças climáticas provocadas pelo homem as inundações violentas que arrastaram bairros inteiros na Itália nos últimos anos. O efeito em cascata pode ser sentido a milhares de quilômetros de distância dos pólos. Em 1999, duas ilhas do Pacífico Sul

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desapareceram sob as ondas com o aumento do nível do mar causado pelo derretimento de geleiras.

No pior cenário, em algumas décadas o nível dos oceanos pode subir 80 centímetros. É uma catástrofe. Ilhas, deltas de rios, cidades costeiras acabariam debaixo das águas. Países baixos como a Holanda teriam suas fontes de água doce comprometidas pela salinização e a vida ficaria muito mais difícil. Cerca de 90 milhões de pessoas seriam afetadas diretamente pelo aquecimento global. Dezenas de milhões de outras sofreriam os efeitos indiretos do fenômeno. Com o calor, viriam as secas prolongadas e agudas. Em 25 anos, 5,4 bilhões de pessoas, ou 90% da população atual do planeta, teriam de racionar água. Como escapar da catástrofe anunciada ? Para alguns cientistas, a maioria, % ainda existe tempo de reverter ou anular parte dos efeitos simplesmente reduzindo drasticamente as descargas de poluentes na atmosfera. A situação fica preocupante quando se sabe que houve um retrocesso nos Estados Unidos, o maior emissor, com 26% de todas as descargas de gases que aumentam a absorção de calor pela atmosfera. O presidente George W. Bush pretende ignorar solenemente os acordos internacionais de controle do efeito estufa. "Mesmo se mantivermos as emissões de CO2 no nível em que estão hoje, a trajetória do planeta a longo prazo é extremamente preocupante", avalia Luiz Gylvan Meira Filho, presidente da Agência Espacial Brasileira, autoridade que fala internacionalmente em nome do governo brasileiro quando o assunto é aquecimento global. Fica cada vez mais claro que a humanidade precisa tratar com mais carinho sua hospedeira, a Terra. Biólogos como o inglês James Lovelock acreditam que os contra-ataques da natureza são resultado de ajustes naturais que os ecossistemas do planeta estão fazendo para manter a saúde da Terra. Essa é a chamada Hipótese Gaia. Segundo ela, a Terra é um organismo dotado da capacidade de manter-se saudável e que tem compromisso com todas as formas de vida – e não com apenas uma delas, o homem. Veja, 18 de abril de 2001. (versão online)

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Uma nuvem de poluentes do tamanho de três Brasis e com

3 quilômetros de espessura cobre uma parte da Ásia, onde vive um quinto da

humanidade

Jacarta, na Ásia, envolta pela nuvem de poluentes: reduçãode 15% na luz solar Dez anos depois da Eco 92, há pouco para comemorar. A poluição e o uso predatório dos recursos naturais aceleraram o efeito estufa e a destruição das florestas. Mas existem formas de corrigir esses erros

Daniel Hessel Teich

O perigo da degradação ambiental causada pelo homem costuma ser representado nas campanhas ambientalistas por animais ameaçados de extinção. O simpático e desajeitado urso panda, que está desaparecendo junto com seu habitat nas montanhas da China, é um dos símbolos mais utilizados pelos ecologistas. Neste momento, há um símbolo muito mais tenebroso no ar. Trata-se da formidável nuvem de poluentes que se estende do Japão ao Afeganistão, no sentido leste–oeste, e da China à

Indonésia, no sentido norte–sul, abrangendo uma região da Ásia em que vive um quinto da humanidade. De tonalidade marrom e tamanho equivalente a três Brasis, essa nuvem de venenos tem 3 quilômetros de espessura e representa 1,5% da atmosfera na região. Nuvens parecidas flutuam ocasionalmente sobre os Estados Unidos e a Europa, mas nenhuma teve igual tamanho e durabilidade. A mancha foi percebida pelos satélites em órbita sete anos atrás e desde então vem sendo estudada por uma equipe de especialistas convocada pela Organização das Nações Unidas (ONU). Na semana passada, anunciou-se a primeira conclusão: trata-se da mais densa e ampla concentração de poluentes já detectada.

Na lista das grandes catástrofes ecológicas preparada pela Associação Americana para o Avanço da Ciência, a nuvem asiática é comparada ao buraco de ozônio, o pesadelo que dominou o debate ambientalista na década passada. "O perigo é global, já que uma nuvem desse tamanho pode cruzar meio mundo em apenas uma semana", adverte o alemão Klaus Töpfer, diretor executivo do Programa de Meio Ambiente da ONU. O coquetel de partículas de carbono, sulfatos e cinzas orgânicas é resultado das emissões de gases de fábricas, usinas termelétricas e escapamentos dos automóveis. Essa é, digamos, a contribuição industrial para o fenômeno. "O crescimento econômico do sul da Ásia fez com que a poluição dobrasse nos últimos vinte anos", diz o indiano Victor Ramanathan, coordenador do estudo que desvendou os segredos da nuvem. Mas não é essa a única causa. A população pobre da região queima o que tiver à mão para cozinhar e se aquecer – de madeira a estrume, passando por garrafas de plástico e embalagens. Como no Brasil, a queimada é a principal ferramenta para abrir espaço para o plantio. Por causa da alta concentração de carbono, a nuvem de poluentes chega a

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reter 15% da luz solar. Por falta de sol, o solo está ficando mais frio e o ar, mais abafado. O ritmo das monções, o período de chuvas no sul da Ásia, foi alterado, com efeito catastrófico para a agricultura. A safra de arroz colhida no inverno na Índia foi 10% menor que em anos anteriores. Estima-se que 500.000 pessoas morram só naquele país em decorrência de problemas respiratórios causados pelo fenômeno. Um desastre ambiental provocado pelo encontro de duas realidades que se entrelaçam – o mundo industrializado de certas regiões asiáticas e a pobreza abjeta de outras – é pleno de simbolismo e não podia revelar-se em momento mais apropriado. Na próxima semana, mais de 100 chefes de Estado, à frente de um contingente de 60.000 delegados, discutirão em Johanesburgo, na África do Sul, a encruzilhada ambiental em que o planeta está metido. Chamado de Rio+10, pretende dar continuidade às discussões iniciadas na Eco 92, no Rio de Janeiro, em 1992. O balanço dos últimos dez anos contém pouca coisa que possa sugerir que o encontro vai melhorar significativamente a situação ambiental. A reunião no Rio tratou sobretudo de mudanças climáticas e biodiversidade. Os participantes concordaram com um programa ousado de combate à deterioração da terra, do ar e da água. Também decidiram buscar o crescimento econômico sem degradar o meio ambiente. Apesar das juras de amor à natureza feitas naquela época, pouca coisa saiu do papel. Dez anos transcorridos, apenas quarenta nações adotam algum tipo de estratégia preservacionista. O que chegou a ser feito foi apenas um arranhão numa realidade desastrosa. Hoje, as ameaças aos recursos naturais são ainda maiores. Florestas, peixes, água e ar limpos estão mais escassos. Duas das mais importantes fontes de biodiversidade, os recifes de coral e as florestas tropicais, foram tremendamente degradadas. As emissões de carbono, o grande responsável pelas mudanças climáticas e pelo aquecimento global, cresceram 10%. Nos Estados Unidos, que abandonaram o Protocolo de Kioto, o tratado assinado por 178 países para controlar as emissões desse gás, o salto foi de 18%.

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Quanto ao crescimento sustentado, assunto tão debatido, a coisa parece caminhar para o fiasco. Há mais de meio século, Mahatma Gandhi, o magérrimo guru da independência indiana, dizia sobre o assunto: "Que Deus jamais permita que a Índia adote a industrialização à maneira do Ocidente. A Inglaterra precisou de metade dos recursos do planeta para alcançar tal prosperidade. De quantos planetas um país grande como a Índia iria precisar?", perguntava, perplexo, aquele que o primeiro-ministro britânico Winston Churchill chamava com menosprezo de "aquele faquir indiano". Gandhi sempre foi um homem de idéias reacionárias. Queria, em todos os campos, a manutenção do estilo de vida de seu tempo. Em certas coisas, pregava o retorno ao passado. Não aceitava sequer a supervisão médica nas doenças. Mas seu aviso, por mais exótico e retrógrado que pareça, encontra eco num cálculo do Fundo Mundial para a Natureza, a organização ambientalista mais conhecida pela sigla WWF. Usando estatísticas da ONU, ela concluiu que os 15% mais ricos da humanidade (o que inclui as minorias abastadas nos países pobres) consomem energia e recursos em nível tão alto que providenciar um estilo de vida comparável para o restante do mundo iria requerer os recursos de 2,6 planetas do tamanho da Terra. Essa estatística ajuda a entender o dilema existente entre desenvolvimento e preservação ambiental. Os anos 90 foram de imenso crescimento na economia global. Perversamente, muito dessa prosperidade teve conseqüências desastrosas para o meio ambiente.

Na semana passada, como subsídio para a reunião em Johanesburgo, a ONU divulgou um relatório sobre o impacto do atual padrão de desenvolvimento na qualidade de vida e nos recursos naturais. Veja, por meio de itens selecionados do relatório, como a questão ambiental ganhou maior volume na década passada: 2,4% das florestas foram destruídas nos anos 90, uma área equivalente ao território de

Mato Grosso. O desmatamento é maior na África, que perdeu 7% de sua cobertura vegetal, e na América Latina, com 5%. A proporção de recifes de coral ameaçados saltou de 10% para 27%, apesar de

protegidos pela Convenção da Biodiversidade. O consumo global de combustíveis fósseis cresceu 10%. Apenas três países ricos, Alemanha, Inglaterra e Luxemburgo, mantiveram estáveis

suas emissões de carbono, o gás do efeito estufa. Num mundo em desequilíbrio, até a boa notícia embute riscos para o futuro. O

consumo de alimentos cresceu nas últimas três décadas. Nos países em desenvolvimento, a quantidade de calorias consumidas diariamente foi de 2.100 para 2.700. Nos ricos, passou de 3.000 para 3.400. Isso exige maior quantidade de alimentos. Hoje, 11% da superfície do planeta é usada para agricultura. A Europa, os países do sul e do leste da Ásia já usam todo o seu estoque de terras agrícolas. O norte da África e a Ásia Ocidental são desertos impróprios para a lavoura. Só a América Latina e a África Subsaariana ainda têm potencial de expansão agrícola – mas novas fronteiras agrícolas significam novos avanços sobre as florestas e sobre outras áreas intocadas. Pela presença do homem em seu habitat, animais estão sendo extintos num ritmo cinqüenta vezes mais rápido que o do trabalho seletivo da evolução natural das espécies. Metade das espécies de grandes primatas, nossos parentes mais próximos na árvore da evolução, deve desaparecer nas próximas duas décadas, se nada mais consistente for feito para salvá-los. Individualmente, as agressões citadas acima seriam absorvidas pelo ecossistema global, acostumado a desastres naturais. O problema é a orquestração. Sem

AFP

Lixo na Indonésia: 95% dos esgotos em países pobres são lançados em rios PLANETA ÁGUAA escassez de água potável atinge

2 bilhões de pessoas. Nesse ritmo, dentro de 25 anos serão4 bilhões.A água contaminada pelo descaso

ambiental mata2,2 milhões de pessoas por ano.3 milhões de mortes são causadas

anualmente pela poluição do ar.As emissões de carbono, o

principal poluidor do ar, aumentaram em 10% desde 1991.

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se dar conta, 6 bilhões de seres humanos se tornaram um fardo pesado demais para o planeta.

Um estudo do Fundo Mundial para a Natureza (WWF), divulgado no mês passado, estima que o homem ultrapassou em 20% os limites de exploração que o planeta pode suportar sem se degradar. O cálculo partiu do pressuposto de que se pode explorar até 1,9 hectare por ser humano. Qualquer avanço além dessa cota nos deixaria sujeitos a catástrofes meteorológicas, como enchentes e secas, e perda de qualidade de vida para as populações futuras. Nessa conta, já estamos no vermelho, com a dívida contraída com a Mãe Natureza crescendo de forma assustadora. A média mundial de exploração é de 2,3 hectares por pessoa, contra 1,3 hectare há quarenta anos. A distribuição é desigual. O Brasil mantém-se na média, enquanto os países africanos usam apenas 1,4 hectare. Já a Europa e os Estados Unidos superam violentamente a marca, registrando respectivamente 5 hectares e 9,6 hectares por pessoa. Significa que estão de duas a cinco vezes além da média mundial. A estimativa é que a Terra tenha 8 bilhões de habitantes em 2025, um aumento de 30% em relação à atual população mundial. Serão bilhões de bocas a mais para ser alimentadas. O efeito mais terrificante por suas implicações no cotidiano das pessoas talvez seja o aquecimento global. A década de 90 foi a mais quente desde que se fizeram as primeiras medições, no fim do século XIX. Uma conseqüência notável foram o derretimento de geleiras nos pólos e o aumento de 10 centímetros no nível do mar em um século. A Terra sempre passou por ciclos naturais de aquecimento e resfriamento, da mesma forma que períodos de intensa atividade geológica lançaram à superfície quantidades colossais de gases que formavam de tempos em tempos uma espécie de bolha gasosa sobre o planeta, criando um efeito estufa natural. Ocorre que agora a atividade industrial está afetando de forma pouco natural o clima terrestre. No ano passado, cientistas de 99 países se reuniram em Xangai, na China, e concluíram que o fator humano no aquecimento é determinante. Desde 1750, nos primórdios da Revolução Industrial, a concentração atmosférica de carbono – o gás que impede que o

calor do Sol se dissipe nas camadas mais altas da atmosfera e se perca no espaço – aumentou 31%, e mais da metade desse crescimento ocorreu de cinqüenta anos para cá. Amostras retiradas das geleiras da Antártica revelam que as concentrações atuais de carbono são as mais altas dos últimos 420.000 anos e, provavelmente, dos últimos 20 milhões de anos.

Cerca de três quartos das emissões de carbono provocadas pelo homem nos últimos vinte anos vêm da queima de combustíveis fósseis, como a gasolina. O restante provém da queimada de florestas. "Não há mais dúvida de que as mudanças ambientais são causadas pelo homem. Já não são só os ambientalistas que pensam assim", diz Lester Brown, fundador do Instituto Worldwatch e diretor do Earth Police (polícia da Terra, em inglês), baseados nos Estados Unidos. De acordo com especialistas, se o efeito estufa continuar no mesmo ritmo, a temperatura da Terra pode aumentar 5,8 graus centígrados até 2100. Algumas alterações na paisagem são atribuídas claramente ao aquecimento provocado pelo homem. Na África, a montanha das neves eternas, o Kilimanjaro, perdeu 82% da cobertura de gelo desde 1912. Em vinte anos, nesse ritmo, não restará nada exceto rocha nua. Em algumas partes da África e da Ásia as secas estão ocorrendo com maior freqüência e intensidade dobrada. A quantidade de chuvas tem aumentado no Hemisfério Norte, principalmente na forma de grandes tempestades. Os meteorologistas estão divididos sobre o assunto, mas muitos acham que as piores enchentes em 100 anos, que na semana passada invadiram as ruas de muitas cidades na

Araquém Alcântara

Queimada no cerrado brasileiro: região ameaçada pela desertificação FLORESTAS 90 milhões de hectares de

florestas – área equivalente à do

Estado de Mato Grosso – foram destruídos nos anos 90 em todo o mundo. Um em cada 4 hectares

desmatados no planeta estava na Amazônia brasileira. 10% das espécies de árvores

conhecidas correm risco de extinção.

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Alemanha e na República Checa, se encaixam perfeitamente no contexto das mudanças climáticas no continente. "Não tenho dúvida de que o efeito estufa fez aumentar as chances de maior precipitação em áreas que não estavam acostumadas a chuvas pesadas", diz o americano Gerald Meehl, cientista-chefe do Centro Nacional de Pesquisas Atmosféricas, nos Estados Unidos.

Uma pressão desabusada é exercida sobre os ecossistemas de água doce, que têm sido destruídos pela poluição e pelo uso descontrolado. Sete de cada 10 litros utilizados pelo homem são destinados à agricultura, e mais da metade dela é perdida em sistemas de irrigação ineficientes. Cerca de metade desses ecossistemas já foi arruinada, e pelo menos 20% das 10.000 espécies conhecidas de organismos aquáticos já foram ou estão sob ameaça de extinção. Estima-se que 30% das maiores bacias hidrográficas perderam mais da metade de sua cobertura vegetal, reduzindo a qualidade da água e aumentando os riscos de enchente. Cerca de 40% da população do planeta vive em regiões com escassez de água potável, o que limita o desenvolvimento econômico, a agricultura e os cuidados sanitários. "Até agora nossa prodigiosa habilidade para expandir a população e aumentar o nível de consumo material ultrapassou de longe nossa habilidade para entender e responder aos problemas que estamos criando para nós mesmos", disse a VEJA Christopher Flavin, presidente do Instituto Worldwatch.

Há dez anos, embalada pela Rio 92, a Unesco, o braço cultural da ONU, publicou o que pretendia ser o corolário do futuro: "Cada geração deve deixar os recursos da água, do solo e do ar tão puros e despoluídos como quando apareceram na Terra. Cada geração deve a seus descendentes a mesma quantidade de espécies de animais que encontrou". A realidade virou tudo isso pelo avesso. O que se viu nos anos 90 foi um avanço descontrolado sobre ecossistemas frágeis, que não suportam a exploração agrícola intensiva, como as áreas de cerrados, savanas e de vegetação semi-árida. Essas regiões correspondem a quase 40% da superfície total do planeta, ou cerca de 190 milhões de quilômetros quadrados, e respondem por 22% da produção mundial de alimentos. A superexploração leva o esgotamento do solo a seu limite, um processo conhecido como desertificação. A FAO, o órgão da ONU para a agricultura, estima que 250 milhões de pessoas em mais de 100 países são afetadas pelo esgotamento do solo. "Esse problema está criando um novo tipo de migrantes, pessoas que não têm mais nada a perder e estão dispostas a embarcar em navios de traficantes de pessoas e até mesmo nadar oceano afora, no desespero de achar um lugar melhor para viver", disse a VEJA o argelino Rajeb Boulharouf, diretor de relações externas do Secretariado das Nações Unidas da Convenção para o Combate à Desertificação (UNCCD).

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A pesca comercial, realizada com barcos-usinas equipados com redes grandes o bastante para envolver um trem do metrô, já esgotou ou está a caminho de esgotar 75% dos pesqueiros do Atlântico Norte e do Mar Báltico. Estima-se que cerca de 14,5 milhões de quilômetros quadrados do fundo dos oceanos sejam varridos por redes que chegam a profundidades de 1 500 metros. Apesar dessa sucessão de tragédias ambientais, não é hora de ficar apenas nas queixas. Assim como degrada o meio ambiente, o homem é perfeitamente capaz de consertá-lo. Na última década, os avanços foram localizados, mas significativos. A emissão de poluentes na atmosfera caiu 30% no Leste Europeu simplesmente por ter sido desmantelado o arcaico parque industrial do antigo bloco soviético. Com incentivo governamental, as florestas européias cresceram 9 milhões de hectares, área equivalente à da Áustria. Mais de 10% das florestas no mundo estão atualmente sob algum tipo de proteção legal. No Brasil, país que durante séculos devastou florestas despreocupadamente, ocorreu uma espécie de despertar ambientalista. De acordo com pesquisas, quase a totalidade dos brasileiros é favorável à manutenção intacta da Floresta Amazônica. Neste mês, o governo deve anunciar o projeto de criar 18 milhões de hectares de reservas de preservação e extrativismo sustentado. Com isso, o tamanho das áreas protegidas saltará de 3,8% para 10% do total da floresta. Levando em conta que outros 20% da região amazônica são reservas indígenas, um terço da Floresta Amazônica estará protegido da devastação – pelo menos no papel. "Pela primeira vez estamos tomando como base a riqueza e a potencialidade da floresta para escolher as áreas a ser preservadas", diz Mary Alegretti, secretária nacional de conservação da Amazônia. "Nossa idéia é garantir a preservação sem fechar as portas para o desenvolvimento da região." A idéia é correta. Afinal, temos um só planeta. É o que deixaremos para nossos filhos e netos. Com reportagem de Natasha Madov, Alessandro Greco, Flávio Sampaio e Leonardo Coutinho, de Belém

Veja, 21 de agosto de 2002 (versão online).

AP

Enchente em Praga, na República Checa: agora chove na Europa EFEITO ESTUFA O nível dos oceanos está subindo

devido ao aquecimento global.A espessura do gelo no Oceano

Ártico ficou 40 % menor nos últimos quarenta anos. Aumentou o volume de chuvas no

Hemisfério Norte, com mais tempestades e enchentes.As secas tornaram-se mais

freqüentes e intensas na África e na Ásia.

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ANEXO IV TEXTOS NÃO-SELECIONADOS PARA A ANÁLISE

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Sujeito 6 Lesi

Sujeito 7 Carol

Sujeito 8 Jonas

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121

Sujeito 9 Nanda

Sujeito 10 - Raul

Sujeito 11 - Lucas

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122

Sujeito 12 - César

Sujeito 13 - Tiago

Sujeito 14 - Roberto

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Sujeito 15 - Iara

Sujeito 16 - João

Sujeito 17 - Jéssica

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Sujeito 18 - Leo

Sujeito 19 - Lana

Sujeito 20 - Yuri

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