Psicologado_ a Atuação Do Psicólogo Hospitalar Diante Da Morte Em Unidades de Terapia Intensiva _ Psicologia Hospitalar

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  • 15/07/2015 Psicologado:AAtuaodoPsiclogoHospitalarDiantedaMorteemUnidadesdeTerapiaIntensiva|PsicologiaHospitalar

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    A Atuao do Psiclogo Hospitalar Diante da Morteem Unidades de Terapia Intensiva(/atuacao/psicologia-hospitalar/a-atuacao-do-psicologo-hospitalar-diante-da-morte-em-unidades-de-terapia-intensiva)

    Autor: Lanna Valria Silva Almeida | Publicado na Edio de:

    Fevereiro de 2015 (https://psicologado.com/edicoes/02/2015)

    Categoria: Psicologia Hospitalar (/atuacao/psicologia-hospitalar/)

    Resumo: O presente artigo aborda a atuao do Psiclogo Hospitalar diante damorte em Unidades de Terapia Intensiva. Teve-se como objetivo principal realizar olevantamento do conhecimento produzido na literatura cientfica acerca da importnciada presena e das intervenes do Psiclogo Hospitalar diante das situaes deiminncia e ocorrncia da morte nessa unidade hospitalar. Para o alcance desseobjetivo foi realizado um levantamento da produo na base de dados BVS-Psi,referente ao perodo de 2002 a 2012, na qual foram acessadas as fontes deinformaoLILACS e SCIELO. Pesquisou-se tambm na fonte eletrnica AMIB, emlivros, dissertaes e teses publicados entre o mesmo perodo. Nas buscas pelos

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    artigos, as palavras-chave utilizadas nas fontes de dados foram: morte na UTI,psiclogo hospitalar, profissionais de sade, pacientes e familiares, uma vez queelas apresentam relao com os objetivos da pesquisa. O estudo torna-se relevantepor mostrar que a iminncia e a ocorrncia da morte na UTI podem trazerconsequncias emocionais para aqueles que fazem parte desse espao: pacientes,familiares e profissionais e diante disso, insere-se a importncia das intervenes doPsiclogo com os referidos grupos. Os dados mostram que importante que agraduao em Psicologia oferea em seus currculos disciplinas que abordem mais otema morte, para melhor preparar os profissionais a lidar e trabalhar com essefenmeno no contexto de trabalho. Tambm evidenciam que ao trabalhar a morte emUTI, o psiclogo deve focar no apenas nos pacientes e familiares, mas tambm naequipe de sade. Assim, espera-se que essa pesquisa contribua para uma maiorreflexo sobre a prtica do psiclogo hospitalar em UTIs diante da morte, sobre aimportncia de serem realizadas intervenes psicolgicas com profissionais de sadee sobre a necessidade de as graduaes em Psicologia abordarem mais o tema morteem seus currculos.

    Palavras-Chave: Morte, UTI, Psiclogo Hospitalar, Atuao.

    1. Consideraes IniciaisO fenmeno morrer sempre se insere em um contexto, entre eles, o hospitalar.

    Dentro desse contexto, lidar com pacientes exige dos profissionais de sadecapacidade de suportar frustraes e dor no entrechoque constante entre a vida e amorte, que se passa no corpo e na mente dos pacientes. um dos trabalhos maisdifceis, seja do ponto de vista mdico, psicolgico, social ou familiar e na atualidade, amaioria das mortes acontece nas unidades das instituies hospitalares, dentre elas aUTI.

    A morte algo que rodeia as pessoas diariamente, quer haja conscincia disso ouno, mas no basta apenas ter conscincia dela, preciso refletir sobre o impacto queela causa durante a vida, necessrio pensar de que forma ela influencia ocomportamento do indivduo e como o profissional de Psicologia pode contribuir comseus conhecimentos e intervenes para que se passe por ela de forma menostraumtica.

    A UTI destinada a pacientes potencialmente graves ou com descompensao deum ou mais sistemas orgnicos, devido a isso, a literatura cientfica aponta que essaunidade caracteriza-se como um dos ambientes mais agressivos, tensos etraumatizantes do hospital, j que ela um espao bem claro do confronto vida versusmorte, pois o doente internado na UTI sempre um paciente grave e em risco; ofantasma da morte ou da seqela est sempre presente (AMIB, 2012).

    Os profissionais que trabalham nessa unidade so: mdicos, enfermeiros,farmacuticos, terapeutas ocupacionais, fisioterapeutas, nutricionistas, psiclogos eassistentes sociais, que podem ter sua esfera psicolgica impactada pela morte

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    podendo encar-la como fracasso pessoal. A dificuldade em lidar com a morte pode,inclusive, interferir na qualidade do cuidado e da relao desses profissionais compacientes e familiares (OLIVEIRA, 2002).

    A famlia dos pacientes potencialmente atingida pelo impacto da hospitalizao.O incio do processo marcado pela ruptura familiar em sua estrutura, caracterizadapela separao e pelo deslocamento entre os membros da famlia. Existe umaincapacidade do ente enfermo de interagir da forma como fazia antes, limitando suaparticipao na vida familiar. O doente, ainda que temporariamente, no mais dafamlia, mas sim, da equipe da UTI (MORO, 2007).

    No contexto deste processo, a famlia pode definir a UTI como sendo um lugar paramorrer. Esta definio coloca a famlia prxima questo da morte, do sentido da vida,do sofrimento insuportvel e, conseqentemente, frente a uma possvel rupturadefinitiva da unidade familiar. Diante desse ambiente, a famlia confrontada comincertezas. A possibilidade da morte causa um impacto enorme nas relaesfamiliares. Os pacientes tambm podem ter sua esfera psicolgica afetada diantedessa nova situao. Esses, alm de apresentarem um quadro clnico grave, estosubmetidos a situaes que podem gerar ansiedade, tais como: a dor, o sofrimento, asolido e o medo da morte. Eles podem apresentar humor ansioso ou deprimido emrelao ao adoecer, em virtude da ruptura ou afastamento dos vnculos afetivos(famlia e amigos), medo de perder a capacidade de trabalhar, cancelamento oususpenso de projetos pessoais, dependncia e medo da morte (LUCCHESI et al.,2008).

    A pesquisa teve como objetivo principal realizar um levantamento doconhecimento produzido na literatura cientfica acerca do trabalho do PsiclogoHospitalar diante das situaes de morte em Unidades de Terapia Intensiva. De formaespecfica, objetivou-se identificar as possveis consequncias que a permanncia naUTI traz para todos os envolvidos nesse cenrio hospitalar, caracterizar as intervenesdo psiclogo com pacientes, famlia e equipe de sade diante da iminncia eocorrncia da morte na referida unidade e pesquisar a formao acadmica dosestudantes de Psicologia para trabalharem em contextos nos quais a morte se fazpresente.

    Para o alcance dos objetivos propostos, a metodologia utilizada para a coleta dosdados foi de carter bibliogrfico, sendo baseada no levantamento de materiais jelaborados, como livros, dissertaes, teses e artigos cientficos, todos da rea dePsicologia, publicados entre os anos de 2002 e 2012. Os artigos foram pesquisados nabase de dados virtuais BVS-Psi, na qual foram acessadas as fontes deinformaoLILACS e SCIELO, pesquisando-se tambm na fonte eletrnica da AMIB. Oslivros foram pesquisados em bibliotecas de universidades pblicas e em acervospessoais, sendo encontrados e utilizados 14 ttulos. As teses e dissertaes forampesquisadas em sites de referncia na rea de pesquisa, sendo encontrados 03 ttulos.

    2. Referencial Terico

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    2.1 A morte atravs dos temposNos pases Ocidentais, as atitudes e percepes diante da morte e do sujeito em

    situao de terminalidade nem sempre foram da maneira como se observa hoje. Aolongo dos sculos, foram ocorrendo mudanas significativas na forma de lidar comeste fenmeno, mudanas muito relacionadas ao momento scio-cultural vigente e aosurgimento de novas formas de pensamento influenciadas pelas regras sociais emvoga.

    Em sua obra Histria da Morte no Ocidente (2003), Aris apresenta a histria damudana gradual das percepes sobre a morte ao longo dos tempos, a qual serdescrita a seguir.

    Na Idade Mdia, o autor afirma que as pessoas sabiam que iriam morrer eprotagonizavam todo um ritual, despedindo-se dos conhecidos, fazendo testamento,resgatando as mgoas pessoais imputadas a si ou aos outros, e todo este processoera compartilhado pela famlia e pela comunidade. Esse era o perodo da mortedomada, onde o homem sabia o momento de sua morte atravs de certos avisos,signos naturais ou por uma forte convico interna. Os homens daquela poca eramobservadores de signos e, antes de tudo, de si mesmos. Eles morriam na guerra ou dedoenas e, portanto, conheciam a trajetria de sua morte.

    A morte era esperada no leito, numa espcie de cerimnia pblica organizada peloprprio moribundo. Todos podiam entrar no quarto: parentes, amigos, vizinhos e,inclusive, as crianas. Os rituais de morte eram cumpridos com manifestaes detristeza e dor, que eram aceitas pelos membros daquela comunidade. O maior temorera morrer repentinamente sem as homenagens cabveis (ARIS, 2003, p.20).

    A morte domada remete idia bsica de que esse fenmeno fazia parte da vida,era um fenmeno coletivo e pblico, era algo que os homens no temiam como naatualidade. A morte era familiar, mas isso no oferece a certeza de que as pessoasno se angustiavam diante dela, apenas d a convico de que se sabia conviver comela.

    Ainda segundo o autor, na poca em que se morria em casa, com a participao detoda a comunidade, as pessoas ao redor do moribundo vivenciavam esse fenmeno deperto e, por estar ocorrendo com algum to prximo, era possvel a identificao como outro.

    Dessa forma, o contato e a identificao com o outro permitiriam uma preparaopara a prpria finitude e seu enfrentamento de forma mais natural, pois a morte eraalgo que estava presente no dia-a-dia da comunidade e no escondida dentro de umhospital e essa proximidade fazia com que ela no fosse um fenmeno estranho. Comessa proximidade, os homens eram obrigados a pensar nela e enfrent-la, no havia adistncia que permitiria defender-se disso.

    O aviso da proximidade da morte era o primeiro ato do ritual familiar. Aps oanncio, procedia-se cerimnia pblica das despedidas, qual o moribundo deviapresidir. Ele dizia alguma coisa, fazia seu testamento, reparava seus erros, pedia

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    perdo, exprimia suas ltimas vontades e se despedia (ARIS, 2003).

    O autor acima citado coloca que essa poca, havia uma preocupao maior emrelao despedida, pois as famlias e os amigos procuravam proporcionar ummomento em que o doente se sentisse amparado e acolhido, todos procuravam nodeix-lo sozinho. Essa hora tambm era vista como o momento certo dele se redimirdos pecados cometidos em vida e conseguir a salvao de sua alma, o que era vistocomo certo se o arrependimento fosse verdadeiro.

    Entretanto, no sculo XIII, embora a morte ainda se apresentasse comorelativamente familiar e cotidiana, ela comeava a sugerir uma relao de fracasso domorto diante da vida e, por isso, tornou-se comovente e passvel de pena. Naquelapoca, o rosto do morto passou a ser oculto aos olhares. Cobriam-lhe a face com umtecido indicando o bito. Em seguida, vivenciou-se um perodo marcado por mudanasna atitude diante da morte, quando o foco centrou-se na morte de cada um emparticular. Cada um deveria buscar sua prpria salvao no alm, lembrando que seriajulgado aps a morte do corpo por suas aes individuais (ARIS, 2003).

    Portanto, fica claro que a partir dessa poca comea a surgir o individualismo emrelao morte e o afastamento em relao finitude do prximo. Percebe-se queessas atitudes caracterizam a contemporaneidade, onde h uma preocupao maiorconsigo mesmo, enquanto o que se passa com o outro fica em segundo plano. Vive-seo lema do cada um com seus problemas. Ento, v-se que aquilo que observado naatualidade resultado de um longo processo histrico.

    De acordo com Aris (2003), o dia do juzo final, que em um primeiro momento dahistria crist equivalia ao fim dos tempos, passou a ser visto como o dia do fim decada vida em particular, no momento exato da morte. Nesse perodo, o olhar comeavaa voltar-se para a morte de si mesmo.

    Os sculos XVI e XVII foram marcados por fantasias sobre a morte, reveladas naarte e na literatura. Este deslocamento da morte para o imaginrio ocorre ao mesmotempo em que o corpo morto motivo de curiosidade cientfica. Na arte e na literatura,a morte era representada de modo ertico ou como uma exaltao do sofrimento e dosuplcio. O homem era arrancado de sua vida cotidiana e racional. J nos sculos XVIIe XVIII, Aris fala do surgimento da morte aparente, que faz surgir o grande medo deser enterrado vivo. a confuso entre a vida e a morte. O pnico passa a ser apossibilidade de despertar dentro do tmulo. Surgem vrios ritos e as cerimnias paraatrasar os enterros, como os velrios, que inicialmente podiam durar 48 horas, de modoa garantir que a morte fosse definitiva. Como se percebe, at a Idade Mdia a morte eravista como algo natural, um evento pblico e cotidiano, mas a partir da, comea asurgir o medo em relao a ela, medo que com o passar dos sculos se estende paraoutros aspectos relacionados a ela, modificando as atitudes e rituais costumeiros.

    Entre os sculos XVIII e XIX, surge a morte romntica. A morte passa a serconsiderada algo belo, sublime repouso, eternidade e possibilidade de uma reuniocom o ser amado. A morte passa a ser desejada, trazendo a possibilidade de evaso,liberao, fuga para o alm, mas, tambm, a ruptura insuportvel e a separao.

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    Representa a possibilidade de reencontro no alm de todos os que se amavam.Prevalecia ento uma crena forte na vida futura. O medo predominante, neste perodo,relaciona-se com as almas do outro mundo, que vm molestar os vivos, provocandotodo o tipo de supersties; por isso so criados rituais para afastar esses seres(ARIS, 2003).

    Durante milnios o homem foi o senhor soberano de sua morte e dascircunstncias da mesma, mas a partir do sculo XIX, durante a ascenso docapitalismo, a morte passou a ser dissimulada, escondendo-se de um doente o seuverdadeiro estado de sade. O doente no deveria saber nunca que seu fim seaproximava. O novo costume exigia que ele morresse na ignorncia de sua morte. Essesculo, portanto, trouxe a morte escondida e vergonhosa, foi o denominadodesaparecimento da morte. Houve a inverso, devendo-se morrer escondido, sem queningum soubesse, nem mesmo o prprio moribundo, que no era avisado de que iriamorrer. Foi a poca da morte interditada (ARIS, 2003).

    De acordo com o mesmo autor, at o comeo do sculo XX, a funo atribuda morte e a atitude diante dela, eram praticamente as mesmas em toda a extenso dacivilizao ocidental. Esta unidade foi rompida aps a Primeira Guerra Mundial. Asatitudes tradicionais foram abandonadas pelos Estados Unidos e pelo noroeste daEuropa industrial, sendo substitudas por um novo modelo do qual a morte foi de certaforma expulsa.

    Percebe-se ento, as primeiras tentativas explcitas de se afastar a morte doconvvio e do pensamento, camufla-se o morto e ao mesmo tempo a possibilidade derefletir sobre a prpria morte, seria como se o no enxergar a morte significasse queela no existisse.

    Atenta-se, portanto, para o surgimento, durante o sculo XX, de uma forma nova demorrer decorrente da nova ordem social vigente. A morte passou a ser indecente, suja einconveniente, pois a limpeza tornou-se um valor burgus, passou a ser vista como umtabu, deixando de ser um momento para ser um processo - a morte esperada no leitopassa a ser algo que acontece no hospital, o doente no tem mais o direito de decidirsobre sua morte e viola-se at o seu ltimo direito, o de saber quando o seu fim seaproxima (ARIS, 2003).

    O tema da morte se tornou interdito no sculo XX, sendo banido da comunicaoentre as pessoas. Paradoxalmente, nesse mesmo sculo, a morte esteve e continuaestando, no sculo XXI, cada vez mais prxima das pessoas, em funo,principalmente, do desenvolvimento das telecomunicaes. A TV introduz diariamente,em milhes de lares, cenas de morte, de violncia, de acidentes, de doenas, sem amnima possibilidade de elaborao, dado o ritmo propositalmente acelerado desseveculo. Ento, ao mesmo tempo em que interdita, a morte torna-se companheiracotidiana, invasiva e sem limites, e, embora essas mortes estejam to prximas (realou simbolicamente), reina uma conspirao do silncio (KVACS, 2003).

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    A autora supracitada afirma que a morte na sociedade ocidental atual vista comoalgo vergonhoso e no mais considerado um fenmeno natural, e sim fracasso,impotncia ou impercia, por isso deve ser ocultado.

    Atravs desse breve percurso histrico, observa-se que a sociedade convivia com amorte como com qualquer outro fenmeno natural. Entretanto, os valores mudaram e ohomem tenta defender-se da morte como pode e a sociedade atual, marcada por umritmo cada vez mais acelerado, em que todos os dias as pessoas correm contra otempo para dar conta de inmeras tarefas, parece contribuir para que se deixe de ladoo ato de pensar sobre o fato de que o ser humano finito. O homem pode ter atendncia a no refletir sobre sua finitude e a das pessoas que o rodeiam por medo ecomo forma de se proteger da angstia que isso pode causar.

    Embora a morte esteja to prxima, ocorre grave distrbio na comunicao, aconspirao do silncio; observam-se pais que no sabem se devem falar ou nosobre a morte de um parente prximo, professores que se veem s voltas comperguntas insistentes sobre mortes de dolos, de pequenos companheiros, de amigos, eprofissionais de sade que se empenham numa luta de vida e morte contra as doenas,e que, muitas vezes, veem seus empenhos frustrados. Essas so questes cotidianas(KVACS, 2003).

    A partir do exposto, percebe-se como a educao para a morte, desde a infnciaat a fase adulta mostra-se de suma importncia, visto que a morte um fenmeno topresente no cotidiano, mas ao mesmo tempo existe uma multiplicidade de sujeitos queno sabem lidar com esse tema e em virtude disso, a atmosfera de medo edesconhecimento ao redor desse fenmeno tende a aumentar, a atravessar geraes ea deixar o ser humano cada vez mais refm de seus medos e angstias.

    2.2 A transferncia da morte para o hospitalSegundo Aris (2003), o hospital como meio teraputico surge no final do sculo

    XVIII, ao mesmo tempo em que a medicina surge como cincia do indivduo. A partirdos anos 30 e 40 do sculo XX, ele passa a ser o esconderijo da morte e esse se tornaum procedimento generalizado a partir de 1950.

    O hospital se torna uma instituio administrada e controlada pelos mdicos,passando a ser referncia na rea da sade, da vida, do sofrimento e tambm damorte. Surge ento, a medicalizao social atravs dos mtodos diagnsticos eteraputicos, pela indstria farmacutica e pelos equipamentos mdicos. A medicinapassa a ser responsvel, na figura do mdico, e atravs dos progressos tcnicos, peloprolongamento da vida (ARIS, 2003).

    Os progressos da cirurgia, bem como os tratamentos mdicos prolongados eexigentes conduziram, com mais freqncia, o doente em estado grave a permanecerno hospital. Este passou a fornecer s famlias o asilo apropriado para esconder odoente inconveniente, para que elas pudessem continuar a levar suas vidasnormalmente. O hospital passou, ento, a ser o local da morte solitria. Assim, com a

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    institucionalizao das prticas teraputicas, a morte sai do espao privado (familiar)para as instituies de sade (impessoal), ficando o moribundo destitudo de seuconvvio familiar e entregue a pessoas estranhas ao seu meio (KVACS, 2003). O fatode estar doente j se configura uma vivncia difcil e nesse contexto hospitalar, estarlonge do lar e ter seu corpo submetido vontade de mdicos, enfermeiros e demaisprofissionais, pode dificultar mais ainda o estar e perceber esse lugar. No s oambiente do hospital que pode ser aversivo a quem se encontra enfermo, mas tambma forma dos profissionais cuidarem e se relacionarem com os pacientes. Assim, huma configurao de fatores que fazem o hospital ser ao mesmo tempo um local dealvio, pois l se encontra a cura para as enfermidades, mas tambm de temor.

    A autora citada anteriormente, assinala que o fato essencial no progresso doshospitais o progresso bem-conhecido das tcnicas cirrgicas e mdicas, que utilizammaterial complexo, pessoal competente e intervenes frequentes. As condies desua plena eficcia s se encontram reunidas no hospital; pelo menos assim seacreditou com convico, at os nossos dias. O hospital no tambm somente umlugar de grande saber mdico, de observao e de ensino, o lugar de concentrao deservios auxiliares, aparelhos aperfeioados, dispendiosos e raros, que do ao servioo monoplio local.

    Dessa forma, o progresso da cincia culminou no desenvolvimento demedicamentos e aparelhos cada vez mais poderosos na recuperao da sade edistanciamento da morte, e nesse cenrio, o hospital tornou-se o lugar de excelnciapara assistir aos enfermos e lutar por suas vidas, destituindo o lar, a famlia e osprprios pacientes de sua soberania e do conforto que tinham diante da morte.

    Kvacs (2003) ainda afirma que logo que a doena parece grave, os mdicostendem a mandar o doente para o hospital. O progresso da cirurgia trouxe o progressodos processos de reanimao, de atenuao ou supresso do sofrimento e dasensibilidade. Esses processos j no so aplicados apenas antes, durante e depois deuma cirurgia, estendem-se a todas as agonias, com a finalidade de aliviar o sofrimento.A morte no hospital , ao mesmo tempo, consequncia do progresso das tcnicasmdicas de abrandamento do sofrimento, e da impossibilidade material de aplic-lasem casa.

    A morte mudou de definio, deixou de ser o instante que acontecia em casa aolado de amigos e familiares para se tornar uma espera em um leito de hospital. Tornou-se realmente possvel retardar o momento fatal, as medidas tomadas para acalmar ador tm como efeito secundrio prolongar a vida. O tempo da morte alongou-se vontade do mdico: este no pode suprimir a morte, mas pode regular a sua durao apartir do domnio de suas tcnicas e com o auxlio de equipamentos poderosos(KVACS, 2005).

    Portanto, percebe-se que as mudanas na sociedade tambm foram responsveispela transferncia dos enfermos e da morte para o hospital. O afastamento cada vezmaior do lar, decorrente da necessidade de se trabalhar fora e a vida corrida do dia-a-dia contribuam na falta de tempo e at mesmo de disposio para cuidar

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    integralmente de algum familiar, caso ele adoecesse gravemente. Ento, isso levou diviso de papis entre mdicos, enfermeiros e familiares no que diz respeito aoprocesso sade-doena-morte, destituindo o sujeito do poder que antes ele tinha frenteao momento de sua morte ou de algum ente querido.

    Os novos modos de vida passaram a implicar no somente no afastamento dadoena e da morte de algum prximo, por estar o enfermo confiado responsabilidade do hospital, mas teve como consequncia tambm falta de tempopara pensar sobre a possibilidade do prprio adoecimento e morte. Isso pode serevidenciado nas falas de sujeitos que justificam a relutncia em ir ao hospital, seja pararealizar exames de rotina ou para tratar alguma doena que se inicia, que alegam faltade tempo devido ao trabalho ou a outros afazeres impostos pela contemporaneidade.

    Para Aris (2003), tanto a repulsa pela morte como os conhecimentos adquiridospara o seu adiamento indefinido por parte da medicina, legitimaram a passagem doquarto do moribundo da sua casa para o hospital. Esse passou a ser o templo da mortesolitria. Apenas os parentes mais prximos acompanham, a uma distncia segura, ofindar, no raro longo e silencioso, do ente querido. Chega ao fim a morte solene ecircunstanciada, em famlia: morre-se no hospital, smbolo da extraterritorialidade damorte. Sendo a morte considerada obscena e embaraosa, nada pode deixar devestgio.

    Consequentemente, a sociedade produziu uma fantasia de onipotncia sobre amorte, permitindo que esta crena aumentasse consideravelmente, em decorrncia dasalteraes sociais e tecnolgicas que culminaram na sade, proporcionandodiagnsticos e terapias especializadas. Nesta dimenso, essas tecnologias fizeramaumentar as expectativas tanto dos pacientes quanto dos profissionais da sade, medida que tornou possvel intervir e modificar o corpo e, at mesmo, adiar questesque se relacionam com o final da vida, determinando a hora da morte.

    De acordo o autor supracitado, nesse contexto, a morte recebe o estigma defracasso e ao paciente so negadas informaes sobre seu verdadeiro estado,potencializando o tabu. Os familiares no conversam sobre o assunto e se obrigam ademonstrar ao doente que est tudo bem, ocultando a morte.

    Observa-se, assim, o incio da obsesso em adiar a morte, concretizada noinvestimento teraputico excessivo com este objetivo. O doente no morre mais "emsua hora", mas no momento em que a equipe determina. O hospital passa a ser otemplo da morte solitria, pois a repulsa pela morte e seu adiamento indefinidoproporcionaram o deslocamento do quarto do enfermo para o leito do hospital(COMBINATO; QUEIROZ, 2006).

    Nesse cenrio, a morte, to corriqueira, foi abortada. E nesse ambiente de cura, amorte no deveria ter lugar. Na verdade, ela no poderia ocorrer neste cenrio por trsaspectos: o primeiro, por ser um ambiente de cura, e como a morte no a possui, opaciente terminal no teria lugar neste contexto; o segundo, pelo fato de o paciente noreceber o atendimento de suas necessidades em seus ltimos momentos, j que nem

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    familiares nem equipe abordam o fim da vida; e, por ltimo, h uma suposio de quemdicos e enfermeiros sintam-se constrangidos quando um paciente morre,envolvendo sensaes de fracasso e impotncia (MEDEIROS; LUSTOSA, 2011).

    Concorda-se que o hospital uma grande inveno humana, o local onde seacumulam conhecimentos capazes de curar doenas e restaurar a sade. Entretanto, oproblema quando o hospital investido no papel de soluo para tudo e acabadeixando a autonomia e a vontade dos sujeitos em segundo plano. Como exemplo,pode-se citar os casos de pacientes que se encontram em estado terminal, porm,mesmo no havendo mais o que ser feito pela equipe de sade, opta-se por deix-losno leito hospitalar, quando seu desejo poderia ser passar seus momentos finaisprximo da famlia e no lugar onde desfrutaram a vida, pois assim, se sentiriam melhor.Ento, isso e outros pontos, levam ao questionamento de at onde deve ir o poder dohospital.

    Alm disso, o desenvolvimento da medicina de alta tecnologia transformou atrajetria das doenas: prolongou-se a vida e o processo de morrer. Isso criou ummodelo mdico em que os profissionais tm de cuidar e conviver com pacientesgravemente enfermos, situao muitas vezes acompanhada de rduo sofrimento.Ento, de certa forma, a tecnologia surge como forma de camuflar esse sofrimento,pois se confia nela como meio de ajudar o homem a evitar a morte, porm a tecnologiatambm no soberana.

    Medeiros e Lustosa (2011) ainda afirmam que as medidas de preveno e controlesocial da sade e da doena passaram a desempenhar um importante fator deafastamento da figura da morte na vida cotidiana e, consequentemente, na conscinciaindividual.

    Dessa forma, os argumentos mdicos e de sade pblica deslocaram o moribundode seu leito domiciliar para um leito no hospital, levando-o a acreditar que recorrer aohospital a primeira medida a ser tomada, pois l esto os especialistas que detm opoder sobre a vida.

    A transferncia massiva dos moribundos para o hospital transformou-o no espaosocial onde a morte se far bastante presente e ele ser o terreno privilegiado paradesenhar os modelos de socializao dos profissionais de sade (MEDEIROS;LUSTOSA, 2011).

    O hospital de suma importncia, mas no se deve deixar de lado a autonomia dossujeitos diante de seu estado de sade. O hospital rene grandes saberes, entretanto, osaber muitas vezes superado pelos efeitos teraputicos que a presena, oacolhimento e as potencialidades dos indivduos trazem para quem precisa estarhospitalizado. preciso saber o limite de ao do hospital.

    2.3 A Unidade de Terapia Intensiva

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    Segundo Angerami-Camon (2006), a UTI fruto do extraordinrio avano que ascincias mdicas e suas tecnologias atingiram no sculo XX. Desde sua criao nadcada de 50, nos Estados Unidos, veio se evidenciando como unidade indispensvelaos doentes graves. No Brasil, essa unidade hospitalar surgiu na dcada de 70 dosculo XX, encontrando campo frtil no pas no auge domilagre econmico.

    A equipe multiprofissional que atua nessa unidade composta por: mdicosintensivistas, responsveis pela assistncia mdica durante a permanncia do pacientena UTI, que, juntamente com o mdico responsvel pela internao do paciente,elabora um plano para diagnstico e tratamento; enfermeiras so responsveis pelaavaliao e elaborao de um plano de cuidados de enfermagem individualizado esistematizado. A equipe multidisciplinar ainda composta por auxiliares deenfermagem, agentes de transporte, auxiliares administrativos, auxiliares de higienehospitalar, fisioterapeutas, nutricionistas, fonoaudilogos e psiclogos. O ambiente daUTI transparece na complexidade dos cuidados dispensados a gravidade, ainvasividade e o risco de morte, alm de aparentar ser hostil, negativo e distante daproduo de sade (ANGERAMI-CAMON, 2006).

    A AMIB (2012) define UTI como uma unidade hospitalar destinada ao atendimentode doentes graves e recuperveis, com assistncia mdica e de enfermagem integral eespecializada. dotada de recursos tcnicos capazes de manter a sobrevida dopaciente, exigindo de seus profissionais pacincia, habilidade e conhecimento.

    Pode existir em algumas pessoas o pensamento de que a ida do paciente para aUTI como uma sentena de morte, o que pode provocar medo e angstia, mas afinalidade do setor, como afirma Camon (2006), oferecer tratamento aos quem tmchance de recuperao. Porm, a gravidade do estado das pessoas que ocupam seusleitos, bem como as exigncias e restries mais rgidas que as de uma enfermaria,acabam tornando a morte uma probabilidade a ser encarada.

    As conceituaes e definies das funes das UTIs tambm trazem muito aquesto das tcnicas e das habilidades profissionais. Mas por trs de toda tcnica e detodos os seus objetivos h pessoas. preciso ter conscincia de que a tcnica e osconhecimentos cientficos no so soberanos.

    Essa unidade hospitalar pode acolher pacientes clnicos ou cirrgicos. As aes adesempenhadas so diuturnas, rpidas e precisas, exigindo o mximo de eficincia daequipe. Os profissionais so altamente preparados para salvar vidas e utilizar de formaeficaz os recursos que tm sua disposio. Na maioria das vezes, so reas restritas circulao de pessoas estranhas equipe multiprofissional, e onde, geralmente, osfamiliares tm pouco acesso (OLIVEIRA, 2002).

    As UTIs, de modo geral, so locais onde se internam doentes graves que ainda tmum prognstico favorvel para viver. Nesse local, so atendidos casos de pessoas quese encontram em uma situao limite (entre a vida e a morte) e necessitam derecursos tcnicos e humanos especializados para sua recuperao. Ela reconhecida

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    e legitimada pelos mdicos como um ambiente onde so utilizadas tcnicas eprocedimentos sofisticados para reverter distrbios que colocam em risco vidashumanas (OLIVEIRA, 2002).

    Segundo Silva e Andreoli (2005), o ambiente da UTI caracterizado por umaconstante expectativa de situaes de emergncia, com pacientes sujeitos amudanas sbitas no estado geral, atividades constantes, luzes, rudos e aparelhagemestranha. Esses fatores tornam o ambiente estressante para todos os que convivem etrabalham nas unidades de terapia intensiva, ou seja, pacientes, familiares eprofissionais.

    Os autores supracitados tambm afirmam que no contexto da UTI, a rotina detrabalho mais acelerada, o clima constante de apreenso e as situaes de morteiminente acabam por tornar ainda mais possveis e extremadas as interfernciasemocionais da hospitalizao no paciente e seus familiares.

    A UTI um ambiente que possui potencialidade para interferir no estado emocionaldos diversos sujeitos que compem esse espao. Essas interferncias, muitas vezes,ocorrem pontualmente, apenas nos momentos mais graves dos pacientes (OLIVEIRA,2002).

    Porm, deve ser objeto de ateno dos psiclogos a possibilidade de asconsequncias emocionais perdurarem, devido intensidade e freqncia com que osmomentos crticos mobilizam os contedos pessoais de cada um, podendo repercutirna esfera pessoal e tambm profissional dos sujeitos.

    A grande quantidade de aparelhos, a postura da equipe diante de umaintercorrncia e a prpria organizao do espao dessa unidade, a qual restringe oacesso de familiares e amigos ao paciente, podem criar nas pessoas percepesnegativas e dolorosas acerca do fato de ter que estar internado ali. Portanto, ahumanizao desse setor algo que se relaciona diretamente com as vivncias asuscitadas.

    Castro (2006) afirma que o adoecimento de um membro da famlia representa umaameaa estrutura familiar: esse sistema, como um todo, v-se abalado. E quando apessoa hospitalizada, principalmente na Unidade de Terapia Intensiva (UTI), todo oequilbrio familiar alterado.

    A autora tambm afirma que com a internao na UTI, o vnculo familiar ficainterrompido, aumentando ainda mais o descontrole emocional. A famlia passa a sesentir impotente, desolada e culpada por no poder cuidar de seu familiar, promovendo,com isso, um aumento da angstia e da ansiedade. Ao adoecer com o paciente, afamlia tambm se desestrutura em nvel biopsicossocial, interferindo diretamente naforma de enfrentamento da hospitalizao.

    Silva e Andreoli (2005), com base nos dados de pesquisa qualitativa, afirmam quea UTI talvez seja o setor que mais gere desconforto e estresse nos familiares, mas, quetambm pode ser um ambiente que favorea a recuperao e a reabilitao de

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    pacientes crticos. Os familiares apresentam sentimentos contraditrios em relao UTI, percebendo-a como um lugar que gera medo, mas, ao mesmo tempo, que oferecesegurana e esperana de recuperao para seu ente.

    Observa-se que a internao na UTI um momento difcil que tambm podeadoecer os familiares. uma situao de desgaste fsico e psquico. Fsico devido rotina diria de ter que se locomover de casa para o hospital e psquico, pela espera,pelo medo, pela quebra do equilbrio familiar, dentre outros aspectos. H uma demandapela reorganizao interna da pessoa e por uma resilincia nem sempre existente(SILVA; ANDREOLI, 2005).

    Nesse momento, a forma como a famlia tratada e acolhida pela equipe de sadepode amenizar a difcil vivncia de estar acompanhando um ente querido em umasituao delicada. Os profissionais devem manter empatia e comunicao com essaspessoas, de forma que elas possam sentir o ambiente menos ameaador. No entanto,muitas vezes, os profissionais podem ter atitudes contrrias no devido frieza ouindiferena, como comumente relata quem passa pelo espao hospitalar, mas porquepodem possuir dificuldades para lidar com o que a vivncia na UTI provoca em simesmos.

    O paciente tambm sofre impactos psicolgicos decorrentes da internao. Deacordo com Lucchesi et al (2008), o paciente, alm de apresentar um quadro clnicograve, est submetido a situaes que podem gerar ansiedade, tais como: a dor, osofrimento, a solido e o medo da morte. Outro fator gerador de angstias so asinfluncias do ambiente, com presena constante de luminosidade e rudos dosaparelhos, a falta de privacidade, alterao dos ciclos circadianos, procedimentosinvasivos, desconforto e as privaes sensrio-motoras.

    Os pacientes podem apresentar humor ansioso ou depressivo em relao aoadoecer, em virtude da ruptura ou afastamento dos vnculos afetivos (famlia eamigos), medo de perder a capacidade de trabalhar, cancelamento ou suspenso deprojetos pessoais, dependncia e medo da morte. Sinais e sintomas como desnimo,negatividade, agressividade, alteraes de sono ou apetite, merecem ateno especial,pois podem indicar a evoluo para quadros psicopatolgicos mais graves, quenecessitem de avaliao psiquitrica e uso de psicofrmacos, alm de que estascircunstncias exigem da equipe cuidadora manejos especiais (LUCCHESI et al., 2008).

    Conforme Sousa e Filho (2008), muito se tm discutido sobre o perfil dos pacientesde UTI, e percebe-se que muitos deles mantm-se lcidos e acordados neste processode internao, sofrendo males biolgicos e tambm psicolgicos/psicossociais.Muitas destas vivncias de stress, sensao de morte, sentimentos de culpa,ansiedade e depresso, entre outras, no so facilmente expressas e,conseqentemente, no so detectadas nem pelos familiares, tampouco pela equipe,podendo o psiclogo funcionar como mediador neste processo de adoecimento,evitando-o e/ou minimizando-o.

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    Percebe-se, portanto, como importante dispensar cuidados no apenasdestinados ao paciente enquanto organismo, mas enquanto pessoa. importante quea equipe mantenha comunicao com o enfermo e procure inform-lo do que aconteceno dia-a-dia, mesmo que ele esteja inconsciente. Se no for possvel por meio da fala,que seja por gestos ou pela escrita, pois a comunicao pode fazer com que o pacienteperceba que apesar de estar longe da famlia, est cercado por pessoas que lhedirigem ateno, que se preocupam com ele e que o vem como uma pessoa queapesar de estar em uma cama de hospital ainda conserva suas vontades enecessidades.

    importante o cuidado humanizado e o acolhimento ao paciente. Se mostrardisponvel, emptico, interessado e promover estratgias que amenizem a falta do larpodem contribuir para o bem-estar psicolgico do paciente e para que sintam quemesmo debilitados ou at sem noo de tempo, ainda esto vivos e tm um mundoque os espera do lado de fora do hospital.

    2.4 Profissionais diante da morte na UTIDentre todos os seres humanos que convivem com a morte, os profissionais da

    rea de sade so os que se encontram mais suscetveis a essa convivncia e aossentimentos e percepes que ela provoca, visto que no cenrio das instituieshospitalares a morte est constantemente presente.

    Segundo Lucchesi et al (2008), a equipe da UTI tambm sofre com vrias situaesestressantes nesse local, como as solicitaes constantes do paciente e da famlia, aintensa jornada de trabalho, o contato com a dor e com o processo da morte.

    O cuidar de pacientes de UTI pode trazer inmeras gratificaes psicolgicas quandose obtm a melhora do estado do paciente (sucesso), porm tambm traz anecessidade de se enfrentar as inmeras frustraes (insucessos) comrepercusses importantes na sade mental dos profissionais (LUCCHESI et al., 2008,p.23).

    Por esses profissionais estarem constantemente ou at diariamente expostos asituaes de morte pode-se pensar que esse fenmeno se tornou algo comum, com oqual se acostumaram e que enfrentam bem, mas surge a dvida se os profissionais, defato, lidam bem com o risco e a ocorrncia da morte no contexto de trabalho e seconseguem manejar essa situao, visto que isso tambm pode interferir diretamentena assistncia prestada aos pacientes e familiares.

    De acordo com Santos (2003), o cuidar de pacientes portadores de enfermidadespotencialmente fatais exige freqentemente confinamento em unidade altamenteespecializada. No trabalho de sistematizao dos cuidados intensivos, realizado emcontexto de isolamento protetor, os profissionais de sade so obrigados a convivercom situaes de alto estresse psicossocial, em decorrncia dos riscos que o pacienteapresenta, das inmeras possibilidades de complicao, das demandas de familiaresangustiados e da perspectiva iminente da morte que espreita a todo instante.

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    Os profissionais da rea de sade so preparados para se comprometerem pelavida daqueles de quem cuidam, ao sarem da academia proferem um juramentoassumindo essa responsabilidade. A sociedade os investiu no papel de especialistas edetentores do poder sobre a vida. Por conta disso, esses profissionais acabamacreditando que a possibilidade de evitar a morte encontra-se totalmente em suasmos. Como resultado, podem ter uma gama de reaes e sentimentos diante damorte, visto que isso pode ser sentido como uma falha pessoal no seu poder de mantera vida. Essa autocobrana pode gerar atitudes iatrognicas para pacientes e familiares,prejudicando o cuidado e a relao entre eles.

    Diante disso, percebe-se a importncia de trabalhar com os profissionais de sadeaquilo que se torna ameaador ao seu bem-estar psicolgico, a morte, pois osofrimento psquico sofrido por estes, alm de prejudic-los, pode interferir naqualidade dos cuidados e do relacionamento mantido com seus pacientes erespectivos familiares. Para estar bem com os outros preciso primeiro estar bemconsigo mesmo.

    Em circunstncias tensas e desafiadoras, como as de morte, os profissionaisvivem um cotidiano permeado por aflies e dor, o que aumenta sua suscetibilidade asentimentos de tristeza, solido e desamparo, assim como reaes de perda e de lutocompartilhadas com pacientes e familiares nas diferentes fases do tratamento.Experincias e sentimentos intensamente dolorosos e potencialmente traumticos somais comuns quando se mantm um contato prximo e prolongado com o paciente esua famlia (SANTOS, 2003).

    Os profissionais podem apresentar esses sentimentos diante da perda de umpaciente, no entanto, isso costuma no ser demonstrado. Isso se deve muito formao recebida na graduao, a qual ensina a neutralidade e o distanciamentoemocional das situaes e das pessoas que permeiam seu trabalho. Em decorrnciadisso, a sociedade acaba criando uma imagem estereotipada desses profissionais, quecostumam ser vistos como insensveis, desumanos, dentre outros. certo que se deveter uma postura profissional, at para dar suporte e confiana aos pacientes efamiliares, porm o problema quando no se expe esses sentimentos fora doambiente profissional nem se procura entend-los ou trabalh-los.

    Maso et al (2009) afirmam que nos momentos em que o estado do paciente seagrava e quando a morte acontece, a equipe de sade mobilizada por sentimentos dechoque, negao, fracasso, tristeza, culpa, autorrecriminao, vergonha e fantasias denaturezas e intensidades variadas. Esses sentimentos, diante da perda de um paciente,podem perdurar, se no tiverem sido bem elaborados e podem reaparecer no contatocom pacientes futuros, predispondo o profissional a um estresse agudo.

    Segundo Cassorla (2002), ao evitar tomar conscincia da morte, os profissionaisde sade tentam escapar das ansiedades conseqentes, de ter que se deparar com suaimpotncia profissional e, mais ainda, com a percepo de sua prpria limitao, paraisso, podem utilizar-se de mecanismos de defesa. Entretanto, tais estratgias podem

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    funcionar de maneira negativa caso sejam usadas de maneira exagerada ouinadequada. Tais defesas podem ser: identificao com o doente, colocando-se em seulugar; distanciamento, temendo um envolvimento muito forte, dentre outros.

    Assim, a morte como companheira de trabalho coloca os profissionais de frentecom a possibilidade da prpria finitude e isso capaz de mobilizar contedos que elestentam evitar atravs de defesas. Mas, contrrio a isso, a morte tambm pode ter apotencialidade de levar a reflexes pessoais que talvez no fossem possveis nasocasies em que ela no est to prxima, to real.

    A questo como cada um a percebe, quais as crenas e representaes que setm em relao a ela. Utilizar-se de defesas no reprovvel, pelo contrrio, elas soimportantes para se enfrentar o dia-a-dia, porm na medida certa. Os profissionais dasade costumam viver momentos de cansao, estresse e desmotivao devido rotinade trabalho, muitas vezes longa, visto que comum que tenham mais de um emprego etrabalhem em plantes. Nessas situaes, a angstia poderia ser to grande queacabaria por comprometer seu bem-estar psicolgico, ento a defesa ajuda a enfrentarisso. No entanto, diante de fatos naturais da vida, como a morte, e que no podem serevitados, visto que mais cedo ou mais tarde se passar por eles, as defesas podem serinadequadas.

    Para os mdicos, segundo Pereira e Resende (2009), a presena da morte comocaracterstica de trabalho, gera sentimentos difceis de lidar, que ficam guardados comeles mesmos, pela existncia de uma presso externa de outros colegas de profisso epelo papel social adquirido, no qual se destacam pela ordem, competncia tcnica,especificidade funcional e neutralidade afetiva.

    Neste sentido, Quirino (2007), acrescenta que as dificuldades que os mdicos tmde encarar a morte, ocorrem muitas vezes, devido a um alto grau de exigncia paraconsigo mesmos em relao a ter o controle de tudo o que vai acontecer com a sadedo paciente.

    A autora citada anteriormente concluiu que os mdicos diante da morte, muitasvezes se questionam sobre os procedimentos realizados, sentem culpa, impotncia eno h um espao para que falem sobre essas questes no ambiente de trabalho.Essas questes acabam ficando guardadas com eles. Tambm concluiu que nos casosem que os pacientes ficam internados, a morte pode causar mais impacto devido aomaior tempo de contato com os pacientes e suas famlias.

    Observa-se que a morte como um assunto proibido, no qual no se pode tocar,pois suscita sentimentos com os quais os profissionais no sabem lidar. O hospital,por ser o lugar onde mais ocorrem mortes deveria propiciar um espao para que esseassunto fosse tratado de forma mais aberta e natural, porm devido a diversos fatores,esse tema continua deixado de lado. O primeiro passo para se mudar isso estjustamente na compreenso do morrer e na desmistificao em torno da figuraprofissional.

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    Quanto vivncia da morte para psiclogos que trabalham em instituieshospitalares, encontra-se o trabalho de Melo (2009), que verificou que os psiclogosentrevistados sentiam prazer em prestar seus servios dentro do ambiente hospitalar eacolher o prximo. O convvio dirio com a morte acabava tornando-a algo habitual,passando a ser vista como um fato a mais no cotidiano dos profissionais.

    Porm, o referido estudo tambm concluiu que os psiclogos no tinham na teoriaoferecida durante a graduao o respaldo necessrio para enfrentarem o que o contatodireto com a morte provocava neles. Os sujeitos costumavam utilizar-se dacompreenso da psicologia, de terapia pessoal e de superviso, como refgio compreenso da prpria finitude, ao vivenciarem a do outro. Os profissionais relataramdificuldade em lidar com os limites impostos pela morte, comparando-a com um forteinimigo, capaz de destruir todo um trabalho realizado com o paciente.

    Assim como os demais profissionais da sade, os psiclogos tambm podemesbarrar com as dificuldades de lidar com a morte e com o desafio de no v-la comouma afronta ao seu desempenho profissional. Porm, devido prpria profisso,podem apresentar maior tendncia a procurar trabalhar seus contedos internos eresolver o que os mobiliza e angustia, mas nem todos podem ser assim. Isso algoque depende da formao acadmica e do trabalho pessoal e experincias de vida decada um.

    No estudo de Arajo (2008), os psiclogos entrevistados mencionaram sentirtristeza diante da morte do paciente, devido perda deste e ao sofrimento vivido porseus familiares, mas tambm alvio por verem que o sofrimento do paciente cessarajunto com sua morte. Alm disso, referiam sentimentos de impotncia, inconformismoe revolta, o que denuncia a importncia de um preparo emocional para lidar com amorte. Para esses psiclogos, era importante no se envolver excessivamente com osofrimento dos familiares a fim de se protegerem de uma situao capaz de evocarintensas emoes e para garantir um cuidado correspondente s necessidades detodos os envolvidos.

    Ento, percebe-se que os psiclogos podem vivenciar os mesmos sentimentos eangstias que os demais profissionais que trabalham na UTI diante da morte de umpaciente. Podem fazer uso dos mesmos mecanismos de defesa, passar a mesmaimagem de distanciamento, dentre outros. A diferena que o psiclogo investido nopapel de algum bem-resolvido consigo e com os demais e que sabe lidar com todotipo de situao. Devido a isso, a cobrana por neutralidade e tecnicismo desseprofissional pode ser maior, mas o psiclogo tambm pode passar por momentos quelhe causem fragilidade e desestabilizao.

    Portanto, se fazem importantes a preparao e o aperfeioamento de todos osprofissionais da sade para a convivncia com a morte no trabalho visando um melhorcontato com aqueles que precisam estar na UTI, pacientes ou familiares. No est seafirmando que o profissional deva desabar e jogar no ambiente de trabalho tudo o quesente quando o paciente d sinais de que no ir sobreviver ou quando morre. O que seafirma que se deve ser mais humano para com o outro e demonstrar empatia e

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    solidariedade, mas isso s possvel quando o profissional est resolvidointernamente com seus contedos emocionais e sabe compreender os significadosque os momentos crticos trazem para ele.

    Os psiclogos tm sua disposio a superviso, a literatura, e a psicoterapia paraprepar-los para lidar com o impacto e o significado da morte em sua existncia, assimcomo na existncia de seu sujeito de trabalho. importante que esses profissionaisrecorram a estes recursos bsicos para melhor prepararem-se para lidar com situaesde morte no hospital. Porm, no basta cobrar isso se durante a graduao, ospsiclogos no foram preparados para entrar em contato com a morte nem com aspossibilidades de recursos para enfrentar as dificuldades experimentadas diante dela.Essa uma questo a ser discutida posteriormente.

    2.5 Psicologia Hospitalar e possibilidades de atuaoO termo Psicologia Hospitalar tem sido usado no Brasil para designar o trabalho de

    psiclogos em hospitais, cuja funo centrada nos mbitos secundrio e tercirio deateno sade, ou seja, quando o adoecimento j est presente. O movimento parademarcar a rea como uma especialidade surgiu a partir do final da dcada de oitenta.Tal fato se concretizou em dezembro de 2000, quando o CFP promulgou a Resoluode n 014, regularizando a concesso de ttulos de especialistas, incluindo a PsicologiaHospitalar (SEBASTIANI, 2007).

    Segundo Cantarelli (2009), em meados do sculo XX, o papel do psiclogo eraestritamente clnico e quando se ampliaram as funes, no somente diagnstica,aumentaram os contatos entre mdicos e psiclogos. Desta forma, o psiclogo passoua fazer parte da equipe hospitalar. Aos poucos e ultrapassando muitas resistncias, opsiclogo com formao hospitalar, imps seu trabalho dentro dos hospitais somandoesforos junto s equipes de sade.

    Segundo Angerami-Camon et al (2004), a Psicologia Hospitalar teve seu incio em1954, com o trabalho da psicanalista Matilde Neder na Clnica Ortopdica eTraumatolgica da USP. Convidada para acompanhar psicologicamente os pacientessubmetidos a cirurgias de coluna, ela os preparava para a internao e recuperaops-cirrgica. Com a prtica, Matilde comeou a perceber que alteraes nas tcnicasutilizadas eram necessrias e modelos tericos de atendimento comearam a surgir,numa tentativa de torn-las mais geis e adequ-las realidade institucional.

    A partir dessa data, houve um grande desenvolvimento na rea, com a implantaode diversos novos servios, o lanamento de livros especficos e uma gradualestruturao e reconhecimento dos quadros emocionais presentes nas enfermidades,e da Psicologia Hospitalar como forma de trabalho extremamente rica (ANGERAMI-CAMON et al., 2004).

    No que se refere s bases terico-metodolgicas para a prtica do psiclogo nocontexto hospitalar, Angerami-Camon (2006) esclarece que os primeiros adesenvolverem a Psicologia Hospitalar no Brasil utilizaram-se de adaptaes tcnicas

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    de seus instrumentos tericos, acoplando-os realidade hospitalar prtica profissional.

    No entanto, a prtica tem mostrado aos seus adeptos que necessria umasistematizao prpria, construda por meio da prtica para contribuir na insero doprofissional s instituies hospitalares e para que a sua contribuio possa somar sdos demais profissionais da rea da sade.

    O trabalho do Psiclogo Hospitalar, portanto, exige a utilizao de conhecimentose tcnicas prprias para a atuao no mbito do hospital. Pensar que transpor omodelo clnico para esse espao a soluo para uma prtica eficaz um engano. Opaciente de hospital tem demandas especficas e exige intervenes diferentes. Ainstituio tambm exige prticas adaptadas ao seu ritmo e funcionamento.

    Para Simonetti (2004), a Psicologia Hospitalar o campo de entendimento etratamento dos aspectos psicolgicos em torno do adoecimento. Desta forma, o objetoda psicologia hospitalar se refere aos aspectos psicolgicos do adoecimento. Por isso,a psicologia hospitalar no trata apenas das doenas com causas psquicas, mas simdos aspectos psicolgicos de toda e qualquer doena.

    Para lidar com essa dimenso emocional, a Psicologia Hospitalar disponibilizapara doentes, familiares e profissionais da equipe de sade, o saber psicolgico, quevem a resgatar a singularidade dos sujeitos, suas emoes, crenas e valores(BRUSCATO et al., 2004).

    O objetivo da Psicologia Hospitalar a elaborao simblica do adoecimento, ouseja, ajudar o paciente a atravessar a experincia do adoecimento atravs de suasubjetividade (SIMONETTI, 2004).

    Mas, alm de considerar a dimenso emocional envolvida no adoecimento e nahospitalizao de suma importncia que o psiclogo tambm volte seu olhar para osfatores sociais que envolvem os pacientes. No adianta querer intervir apenas nombito emocional do sujeito se por trs do seu sofrimento esto presentes aspectossociais que estejam contribuindo para o impacto emocional diante da hospitalizao,como por exemplo, a restrio do lazer, do trabalho, dentre outros. Deve-se estar atentoa todas as dimenses da vida do sujeito que estejam relacionadas ao adoecimento,afinal de contas, a sade o bem estar biopsicossocial.

    De acordo com a definio do rgo que rege o exerccio profissional do psiclogono Brasil, o Conselho Federal de Psicologia, CFP (2007), o psiclogo especialista emPsicologia Hospitalar atua em instituies de sade, participando da prestao deservios de nvel secundrio e tercirio da ateno sade, realizando atividadescomo: atendimento psicoteraputico; grupos psicoteraputicos; grupos depsicoprofilaxia; atendimentos em ambulatrio e unidade de terapia intensiva; prontoatendimento; enfermarias em geral; psicomotricidade no contexto hospitalar; avaliaodiagnstica; psicodiagnstico; consultoria e interconsultoria.

    Ainda segundo o CFP (2007), o psiclogo oferece e desenvolve atividades emdiferentes nveis de tratamento, tendo como principal tarefa a avaliao eacompanhamento de intercorrncias psquicas dos pacientes que esto ou serosubmetidos a procedimentos mdicos, visando basicamente a promoo e/ou a

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    recuperao da sade fsica e mental. Promove intervenes direcionadas relaomdico/paciente, paciente/famlia, paciente/paciente e do paciente em relao aoprocesso do adoecer, hospitalizao e repercusses emocionais que emergem nesteprocesso.

    Moro (2007) afirma que no contexto hospitalar o psiclogo deve ser capacitado aidentificar e caracterizar as necessidades sociais, as necessidades de sua atuao, econstruir atuaes condizentes com essas necessidades. necessrio que o psiclogotenha competncia em realizar intervenes frente a diferentes contextos dentro dosistema hospitalar e frente a diferentes comportamentos que ocorrem nesse sistema.Poder avaliar as formas de interveno, bem como as possibilidades de atuao umaconstante no desempenho profissional de qualquer indivduo comprometido com o serhumano.

    O hospital um local dinmico e a todo o momento acontecem mudanas em suarotina, no existe um roteiro fixo a ser seguido. Isso exige dos profissionais constantesadaptaes e a preparao para lidar com o inesperado. O psiclogo, portanto, devesempre procurar refletir e rever suas prticas. A academia no diz como se deveintervir em cada tipo de situao. a prtica que traz as situaes e leva o profissionala procurar associar a teoria com a prtica, buscando atuar de acordo com o que cadasituao exige.

    Por meio de pesquisa qualitativa, Moro (2007) concluiu que no contexto detrabalho do psiclogo hospitalar as atuaes devem visar o bem-estar fsico epsicolgico dos pacientes e familiares e o bem-estar fsico e psicolgico da equipe desade, possibilitando a essas condies de trabalho em equipe multidisciplinar,qualidade nas relaes interpessoais e humanizao.

    Portanto, o psiclogo deve ter conscincia de que o hospital exige dele um amploleque de possibilidades de interveno. Deve-se ficar atento a todos os sujeitos quecompem esse espao e ali colocam suas subjetividades.

    De acordo com Angerami-Camon (2006), a Psicologia Hospitalar tem comoobjetivo principal a minimizao do sofrimento provocado pela hospitalizao. Opsiclogo precisa ter muito claro que sua atuao no contexto hospitalar no psicoterpica dentro dos chamados moldes do setting teraputico. E comominimizao do sofrimento provocado pela hospitalizao, tambm necessrioabranger-se no apenas a hospitalizao em si em termos especficos da patologiaque eventualmente tenha originado a hospitalizao mas principalmente as sequelase decorrncias emocionais dessa hospitalizao. muito importante que o psiclogotenha bem claros os limites de sua atuao para no se tornar ele tambm mais umdos elementos invasivos que agridem o processo de hospitalizao e que permeiamlargamente a instituio hospitalar. Ainda que o paciente em seu processo dehospitalizao esteja muito necessitado de interveno, sua opo de receber ou noas intervenes deve ser soberana e deliberar a prtica do psiclogo (ANGERAMI-CAMON, 2006).

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    Deve-se considerar sempre a autonomia e a subjetividade de quem esthospitalizado. No pelo fato de o paciente estar em uma cama, temporariamenteimpedido de fazer suas atividades rotineiras e submetido a vrios procedimentosmdicos que ele deixou de ser uma pessoa para se tornar um objeto de interveno. essa a conscincia que pode faltar em alguns profissionais. O psiclogo, pelo que aprpria formao preconiza, no pode fazer parte desse grupo e com o conhecimentoque se espera que tenha, pode contribuir para que os demais membros da equipehospitalar voltem seu olhar para o paciente no mais enquanto um corpo que precisade interveno, mas enquanto pessoa.

    O settingteraputico na realidade hospitalar peculiar: o psiclogo deve adaptarsua atuao visto que os espaos e condies hospitalares so muito diferentes dosettingda atuao clnica em consultrio. O espao fsico no privativo aoatendimento psicolgico, como o valorizado na teoria e modelo de consultrio. Oatendimento pode ser interrompido a qualquer momento por mdicos, enfermeiros etcnicos, que esto cumprindo seus deveres e suas funes (ISMAEL, 2005).

    Essas situaes de ausncia de setting e interrupo do atendimento tambmexigem que o psiclogo tenha manejo e saiba utilizar os recursos de que dispe.Portanto, a todo o momento, o profissional solicitado, direta ou indiretamente, acolocar em prtica suas habilidades e competncias no ambiente hospitalar e ele nopode abster-se disso e a experincia que se adquire com o tempo fundamental oaprimoramento dessas habilidades.

    A postura do psiclogo importante para a sua insero no hospital deve serflexvel, com o objetivo de contornar as dificuldades e reconhecer que seu trabalhosofrer interrupes, adiantamentos e cancelamentos fora de sua esfera de controle,pois a prioridade das aes mdicas tem que ser respeitada. O psiclogo ainda deveconhecer a doena do paciente a quem ele presta atendimento, alm de sua evoluo eprognstico (ISMAEL, 2005).

    De acordo com Simonetti (2004), a psicologia hospitalar define como objeto detrabalho no s a dor do paciente, mas tambm a angstia declarada da famlia, aangstia disfarada da equipe e a angstia geralmente negada dos mdicos. Alm deconsiderar essas pessoas individualmente, a psicologia hospitalar tambm se ocupadas relaes entre elas, constituindo-se em uma verdadeira psicologia de ligao, coma funo de facilitar os relacionamentos entre pacientes, familiares e equipe.

    O psiclogo deve atuar em equipe multiprofissional, medida que ele vai aoencontro de profissionais de outras reas ou chamado para auxili-los no tratamentodo paciente, deve auxiliar na comunicao e no entendimento das reaes do paciente,da famlia e da equipe de sade. Deve ajudar a identificar e a manejar reaes maladaptativas ao estresse devido hospitalizao, e poder dar suporte para a equiperesponsvel pelo paciente em relao ao equilbrio emocional e habilidade deconduzir situaes difceis (MEDEIROS; LUSTOSA, 2011).

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    Assim, o psiclogo deve estar sempre atento quelas situaes em que emergeuma demanda passvel de sua interveno profissional. Foi dito anteriormente que nose deve transferir o modelo de atendimento clnico para o hospital, porm, verdadeque a clnica proporciona uma escuta e um olhar mais qualificados e que podem ajudarna prtica hospitalar. O que cabe ao profissional saber utilizar as potencialidades quecada recurso aprendido lhe proporciona, saber relacionar os pontos positivos dediferentes prticas e transform-las em uma nova prtica, adaptada ao contextohospitalar.

    De acordo com Castro (2006), as funes do psiclogo num hospital estodirigidas melhora da qualidade dos cuidados ao paciente e sua famlia e a facilitar oentendimento por parte da equipe de sade de situaes que, dentro da cultura dadoena geralmente grave, so psicologicamente complexas.

    O psiclogo hospitalar que participa numa equipe multidisciplinar tambm podeoferecer apoio e pautas de conduta aos familiares do paciente, colaborar com mdicosno diagnstico diferencial de sintomas cuja origem pode ser psicolgica ou fsica,participar em programas de pesquisa, facilitar a adaptao emocional dos membros daequipe frente a situaes altamente estressantes de vida e morte, ajudar na tomada dedecises eticamente complexas, entre vrias outras possibilidades de atuao(CASTRO, 2006).

    Para Sebastiani (2003), o trabalho do psiclogo nessa unidade baseia-se nosseguintes objetivos: atender integralmente o paciente e sua famlia, considerando-se osparmetros da OMS; desenvolver atividades dentro de uma viso interdisciplinar(mdicos, enfermeiros, assistentes sociais, fisioterapeutas, fonoaudilogos, etc.)baseadas na integrao dos servios de sade voltados para o paciente e sua famlia epossibilitar a compreenso e tratamento dos aspectos psicolgicos nas diferentessituaes, tais como ansiedades, fantasias e angstias de morte, dentre outros.

    Mendes et al (2009), ressaltam que o psiclogo hospitalar tem como foco: auxiliarna reorganizao egoica frente ao sofrimento; facilitar e trabalhar medos, fantasias,angstias, ansiedades; enfrentamento da dor, sofrimento e medo da morte do paciente;detectar e trabalhar focos de ansiedade, dvidas; facilitar e incentivar vnculo com aequipe de sade; detectar e reforar defesas egoicas adaptativas, etc. Tambmimportante o trabalho do psiclogo na facilitao da comunicao da famlia com oprprio paciente, para que se possa, muitas vezes, auxiliar na soluo de situaesemocionais muitas vezes vividas como difceis durante a convivncia anterior aoadvento da doena terminal.

    Para Ismael (2005), apesar do aumento do nmero de profissionais nesta rea,algumas dificuldades so recorrentes. Uma delas a prpria insero do Psiclogo nasinstituies; a outra a deficincia do instrumental terico necessrio para a atuao,desde a formao universitria. A emergncia de psiclogos em hospitais, somado aocrescente interesse dos estudantes de Psicologia nessa rea acaba por gerar mo-de-obra inexperiente, a qual, na maioria dos casos, prope um trabalho semdirecionamento e sem base, contribuindo, desta forma, para um fechar de portas ou

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    at mesmo resistncia em algumas instituies. Todavia, esse aparente despreparono se restringe aos estudantes. Muitas vezes, alguns profissionais se voltam paraeste campo, como uma oportunidade de trabalho, mas sem nenhuma reflexo maiscuidadosa sobre a especificidade dessa interveno ou sobre a formao diferenciadaque ela exige.

    Portanto, h muito que fazer na prtica do psiclogo hospitalar, muitos sujeitos esubjetividades com os quais trabalhar. Por isso mesmo, no se deve ficar preso apenasao que a teoria diz e s velhas prticas enraizadas. Cada dia de trabalho um diadiferente, surgem demandas novas, ocasies com as quais o profissional no havialidado antes, reaes inesperadas por parte dos diversos protagonistas do espaohospitalar, dentre outros. Assim, com a prtica que se aprende cada vez mais, mas preciso estar aberto para isso e ter conscincia de que preciso se refazer a cada diaenquanto profissional.

    preciso sair da zona de conforto e olhar para as necessidades que compem osindivduos enquanto seres biopsicossociais, ou seja, no h como ficar preso apenasao que a teoria ensina e achar que por ser profissional j se sabe de tudo. o dia-a-diaquem traz o verdadeiro aprendizado, mesmo que se tenha anos e anos de prtica,sempre pode vir algo ou algum que abala o sentimento de j se ter conhecimentosobre tudo e com toda sua novidade, cria um novo ensinamento.

    2.5.1 Possibilidades de interveno do psiclogo hospitalar diante damorte na UTI: pacientes, familiares e profissionais

    Como algumas das funes do psiclogo na UTI, pode-se citar a assistnciapsicolgica ao paciente, a ateno a fatores que podem influenciar sua estabilidadeemocional e a avaliao de sua adaptao hospitalizao. Na avaliao do paciente,deve-se atentar para seu estado psquico (orientao, conscincia, memria,afetividade, entre outros) e sua compreenso do diagnstico, alm das reaesemocionais diante da doena (PREGNOLATTO; AGOSTINHO, 2003).

    Entre essas reaes, pode haver o medo da morte. Diante disso, Lucchesi et al(2008), consideram que a avaliao dos aspectos psicossociais do paciente e amanuteno de uma comunicao prxima e atenta constituem fatores teraputicos,favorecendo o paciente a expressar suas emoes e sentimentos, esclarecer fantasiasque possam prejudicar seu tratamento (ex: estar na UTI necessariamente no implicaem morrer), buscar recursos internos para enfrentar suas dificuldades, ter asmotivaes de sua vida fortalecidas (ex: vnculos afetivos), incentivar o vnculo deconfiana na equipe e facilitar a aceitao de situaes de dependncia (transitriasou no). No caso de pacientes que no podem se comunicar verbalmente, deve-sebuscar alternativas de comunicao atravs de leitura labial, sinalizaes, uso daescrita ou figuras, incentivando a capacidade de expresso do indivduo e acessandoseu universo subjetivo.

    Para Silva (2010), o psiclogo deve dar acolhimento, deixar a pessoa falar,desabafar, chorar etc., acolher as fantasias dos parentes como: raivas, culpas, temores,dentre outras. O importante para que isto ocorra com eficcia ter um vnculo

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    estabelecido. Ter acompanhado o paciente (e os familiares) durante o seu perodo deinternao pode auxiliar, mas, se isto no foi possvel, o simples estar presente podeser o suficiente.

    importante que o profissional de psicologia tenha conhecimentos acerca dasconsequncias emocionais que o risco da morte pode trazer para pacientes, familiarese membros da equipe de sade para que a partir disso, possa entender certas reaesapresentadas por familiares e pacientes, muitas vezes incompreendidas pelosmembros da equipe de sade e possa promover o acolhimento e as intervenesadequadas, respeitando sempre a vontade dos sujeitos.

    De acordo com Schimidt et al (2009), no atendimento aos usurios e aos seusfamiliares nos casos em que a possibilidade de cura se esgota e a morte se tornainevitvel, o processo psicoterpico deve enfatizar a expresso dos sentimentos, amelhora da qualidade de vida e a facilitao da comunicao. Beneficiam-se dessasintervenes tanto a pessoa em processo de terminalidade quanto seus familiares, oque diminui a probabilidade de ocorrncia de sintomas psicopatolgicos futuros, comodepresso e ansiedade, decorrentes da perda ou luto no elaborados.

    Os autores anteriormente citados tambm afirmam ser importante o trabalho dopsiclogo na facilitao da comunicao da famlia com o prprio paciente, para quese possa, muitas vezes, auxiliar na soluo de situaes emocionais muitas vezesvividas como difceis durante a convivncia anterior ao advento da doena. No raro, sepode proporcionar a elucidao de situaes existenciais mal resolvidas, gerando alviode culpas, ressentimentos e dores, frutos de relaes neurotizadas pela convivnciaexistencial prvia.

    Trabalhar o processo de despedida com famlias que tm um doente comprognstico irreversvel, tambm parece beneficiar a todos os envolvidos, isto , apessoa enferma, familiares e equipe de sade. possvel o trabalho de apoio pessoaenferma no enfrentamento da morte, a redefinio de relaes anteriormentecomprometidas e o fortalecimento de vnculos mais saudveis na perspectiva de umaqualidade de vida aos familiares e qualidade de morte ao doente (SCHMIDT, 2009).

    Percebe-se que diante da inevitabilidade da morte, o que pode e deve ser feito visa melhor qualidade de vida dos envolvidos nessa situao e promoo de uma boamorte, mas isso remete necessidade de se quebrar o tabu em torno do tema, pois setorna difcil falar sobre morte e viv-la de forma natural quando a sociedade a reprime ecria uma atmosfera de pavor e proibio em torno dela. Portanto, as intervenes emtorno do morrer passam por um amplo leque de aspectos que vo do coletivo aoindividual.

    Segundo Fonseca (2002), a pessoa que est na iminncia da morte, vive umprocesso de luto antecipatrio juntamente com seus familiares. O tema do lutoantecipatrio um processo bastante recorrente nos familiares atendidos quando opaciente passa por um longo perodo de internao de alto risco. O momento da

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    internao faz com que o indivduo e seus familiares passem por diversas perdas,trazendo dor e sofrimento diante da iminncia da morte, configurando o processo deluto antecipatrio.

    O luto antecipatrio pode ocorrer durante um perodo longo de cuidados, no casode doenas graves, em relao a um familiar que ainda est vivo, mas sua perda j sentida para uma srie de atividades que executava anteriormente. A pessoa ainda nomorreu, mas estas perdas j necessitam ser elaboradas, para ambos os lados.Presenciar a dor e o sofrimento da pessoa amada e sentir-se impotente frente a isso causa de muito sofrimento. A morte do doente at pode trazer algum alvio, mas ocuidador tambm pode sentir culpa, pois h a fantasia de que ele no pde trat-lo damelhor forma e assim no pde evitar sua morte (KVACS, 2003).

    Nesse contexto, o psiclogo deve buscar desfazer essas fantasias de culpa dosfamiliares, ajudar a elaborar as perdas, as quais podem ser biolgicas e sociais, epromover o fortalecimento, na medida do possvel, dessas pessoas (FONSECA, 2002).

    um momento que no fcil, importante que o psiclogo tenha empatia ecompreenso das vivncias suscitadas nesse contexto de morte, tanto para poderajudar da melhor forma possvel quanto para no desenvolver sentimentos de culpa oufracasso diante da ausncia de resposta sua atuao.

    Para Fonseca (2002), ao psiclogo cabe o assessoramento famlia, ajudando aresolver, muitas vezes, dvidas prticas a respeito da situao que a famlia vempassando, ajud-la a compartilhar os sentimentos, angstias, medos e dvidas, auxili-la a esclarecer aspectos que no foram verbalizados, bem como proporcionarimportantes despedidas. A atuao do psiclogo tambm est em facilitar o processode tomada de decises e resoluo de problemas pendentes, apoiando a famlia eproporcionando um desenvolvimento maior de habilidades ao lidar com as emoesque permeiam este processo de morte e separao.

    Segundo Mendes et al (2009), a atuao do psiclogo deve se direcionar em nvelde apoio, ateno, compreenso, suporte ao tratamento, clarificao dos sentimentos efortalecimento dos vnculos familiares.

    possvel tambm que o psiclogo d o apoio necessrio para que a equipe desade envolvida com o paciente terminal consiga lidar melhor com a frustrao esintomas de perda frente iminente morte do paciente. Alm disso, o psiclogo devecolaborar sempre para que o tratamento ao paciente em estgio terminal da doenarespeite sua dignidade e qualidade de vida. Assim, o psiclogo pode ajudar osfamiliares a no estarem to vulnerveis aos fatores de risco que podem gerar um lutocomplicado aps a perda propriamente dita (MENDES et al., 2009).

    Essas atuaes dos psiclogos so o que a literatura preconiza, porm isso podeno ocorrer na prtica de todos os profissionais devido ao desconhecimento quanto aoseu papel nesse contexto, o que dificulta sua insero e o reconhecimento de suaimportncia. Para isso, a graduao deve preparar os futuros profissionais, no apenasatravs da transmisso de teorias, mas buscando contextualiz-los com a prtica. A

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    partir do conhecimento de qual seu papel dentro do hospital e de suas unidades, cabe acada psiclogo se inserir efetivamente, conquistar seu espao, sua autonomia e fazer-se reconhecer.

    Os autores supracitados afirmam ainda que com relao aos pacientes, opsiclogo pode atuar sob a abordagem dos cuidados paliativos, aprimorando aqualidade de vida dessas pessoas que enfrentam problemas associados com doenasameaadoras de vida. A preocupao maior deste profissional deve ser facilitar acomunicao tanto do paciente consigo mesmo quanto com sua famlia e equipemdica, fazendo-o sentir-se acompanhado durante este perodo existencial solitrio, e,muitas vezes temido. Facilitar a compreenso de seus prprios sentimentos frente aomorrer, assim como aproxim-lo de relaes com as quais ele deseje se acercar, sotarefas totalmente favorveis para a qualidade de morte de um paciente terminal.

    Sobre isso, tem-se a seguinte afirmativa de Floriani (2008):

    Os cuidados paliativos fundamentam-se na busca incessante do alvio dos principaissintomas estressores do paciente; em intervenes centradas no paciente e no emsua doena, o que significa a participao autnoma do paciente nas decises quedizem respeito a intervenes sobre sua doena, em cuidados que visam a dar umavida restante com mais qualidade e um processo de morrer sem sofrimentos emprincpio evitveis; sofrimentos, estes, freqentemente agregados a prticas mdicastradicionais (FLORIANI, 2008, p.113).

    Dessa forma, esse tipo de interveno procura incluir o enfermo de formaautnoma em seu tratamento, respeitando sua dignidade e suas vontades e ao mesmotempo, pode levar maior humanizao por parte da equipe de sade, ao faz-la refletirsobre a importncia de enxergar aquela pessoa que est hospitalizada no apenascomo um organismo que necessita de procedimentos mdicos para orestabelecimento de suas funes, mas como algum dotado de subjetividade,singularidade e necessidades que vo alm das orgnicas.

    Os cuidados paliativos contrapem-se ao uso continuado, e a qualquer preo, datecnologia para a manuteno da vida em um paciente com doena incurvel eavanada, ou seja, prtica da obstinao teraputica. Por outro lado, propem umaprtica de cuidados que no teriam por meta abreviar a vida do paciente, o que, paraalguns, os colocariam como uma alternativa vivel, menos problemtica moralmente,s crescentes solicitaes de eutansia (FLORIANI, 2008).

    No h soluo para a morte, mas se pode ajudar a morrer bem, com dignidade,facilitando os processos de finalizao. O que se prope como cuidados no fim da vidaso de que no deveria haver atitudes autoritrias e paternalistas, e sim movimentos desolidariedade, compromisso e compaixo (FLORINI, 2008).

    Para Simonetti (2004), o estmulo para mecanismos de enfrentamento que opaciente pode ter desenvolvido e utilizado em outras situaes difceis em sua vida,so fundamentais para manter a auto-estima e certa estabilidade emocional. Respeitare estimular a relao que este e seus familiares tm com religio e espiritualidadepodem ser essenciais. No existe um projeto da psicologia hospitalar para que o

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    paciente morra feliz, porm existe uma priorizao para a promoo, atravs decuidados fornecidos pela equipe, para que haja uma morte digna, que pode se traduzirem morrer sem muita dor e com nveis de angstia suportveis. Assim, apesar de a UTIno ser sinnimo de morte, nos casos em que ela se torna inevitvel importanteoferecer cuidados paliativos ao paciente que se encontra no fim da vida para que eleno se sinta apenas um objeto de interveno mdica e desprovido de seus desejos,mas que sinta que continua sendo tratado e respeitado como um ser vivo e digno deautonomia, at o ltimo momento de sua existncia.

    Quando a morte acontece, surge o sentimento de luto. O luto uma reao normale esperada quando um vnculo rompido, e sua funo proporcionar a reconstruode recursos e viabilizar um processo de adaptao s mudanas ocorridas emconsequncia das perdas (MENDES et al., 2009). Para a efetivao do luto, Kbler-Ross(2005), referncia no assunto, props cinco estgios: a negao e o isolamento, a raiva,a barganha, a depresso e a aceitao, os quais sero descritos a seguir.

    No primeiro estgio, a negao e o isolamento servem como um mecanismo dedefesa temporrio, um para-choque que alivia o impacto da notcia, uma recusa aconfrontar-se com a situao. Ocorre em quem informado abruptamente a respeitoda morte; embora considerado o primeiro estgio, pode aparecer em outros momentos.

    A raiva, segundo estgio, o momento em que as pessoas externalizam a revoltaque esto sentindo. Neste caso, tornam-se por vezes agressivos. H tambm a procurade culpados e questionamentos.

    J a barganha, percebida no terceiro estgio de reao perda, uma tentativa, denegociar ou adiar os temores diante da situao; as pessoas buscam firmar acordoscom figuras que segundo suas crenas teriam poder de interveno sobre a situaode perda. Geralmente esses acordos e promessas so direcionados a Deus e mesmoaos profissionais de sade que a acompanham.

    A depresso, quarto estgio, dividida em preparatria e reativa. A depressoreativa ocorre quando surgem outras perdas devido perda por morte, por exemplo, aperda de um emprego e, consequentemente, um prejuzo financeiro, como tambm aperda de papis do mbito familiar. J a depresso preparatria o momento em quea aceitao est mais prxima, quando as pessoas ficam quietas, repensando eprocessando o que a vida fez com elas e o que elas fizeram da vida delas.

    Por fim, o ltimo estgio de reao perda o de aceitao. Quando se chega aesse estgio, as pessoas encontram-se mais serenas frente ao fato de morrer. omomento em que conseguem expressar de forma mais clara sentimentos, emoes,frustraes e dificuldades que as circundam. Quanto mais negarem, mais dificilmentechegaro a este ltimo estgio. A autora ressalta que esses estgios no so umroteiro a ser seguido e que podem sofrer alteraes de acordo com cada perspectivapessoal.

    Diante de toda essa repercusso que a morte e o luto podem acarretar parafamiliares e at mesmo para a equipe de sade, entende-se como fundamental apresena da psicologia. Muitas vezes a equipe de sade evidencia seu despreparo para

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    lidar com a dor e a angstia do outro, principalmente pelos prprios conflitos quepossui na relao com a morte ou com a iminncia desta. O psiclogo o profissionalque tem preparao para viabilizar a expresso do luto. Para se dissipar a dor psquicade uma perda, necessrio que ela seja dita, vivida, sentida, refletida e elaborada, masnunca negada (MEDEIROS; LUSTOSA, 2011).

    Segundo Moro (2007), um dos papis da psicologia hospitalar diante deintercorrncias como o luto desafiar a mentalidade da morte como tema interdito,buscando identificar as vulnerabilidades e riscos dos familiares que perderam entesqueridos. Cabe psicologia ajudar os familiares a se apropriarem da situao queesto vivendo, para posteriormente conseguirem falar e aos poucos assimilar, e bemposteriormente aceitar.

    Souza et al. (2007) ressaltam que acompanhar os familiares de pacientesinternados em UTI, permite ao psiclogo hospitalar observar o momento e a maneiramais adequada para intervir, de acordo com as caractersticas emocionais de cadafamiliar enlutado, bem como ajudar na realizao do enfrentamento desse processo,vivenciando as fases peculiares do luto. Nos casos em que, tanto a famlia como opaciente, vinham sendo assistidos ao longo da internao existe um vnculoestabelecido atravs das intervenes psicolgicas realizadas. No caso dos familiares,as observaes auxiliam no trabalho pela maior proximidade e conhecimento dascaractersticas do caso e dos perfis de personalidade.

    atribuda ao psiclogo a funo e a capacidade de facilitar o contato com a difcilrealidade e de proporcionar um espao de expresso das emoes e dos sentimentos,favorecendo assim uma maior possibilidade de elaborao do luto do familiar perdido.O atendimento imediato aos familiares influenciar na forma como iro vivenciar o lutoa partir de ento (SOUZA et al., 2007).

    Medeiros e Lustosa (2011) afirmam que necessrio que as instituies tambmtenham um espao destinado ao apoio psicolgico para os profissionais da equipe desade e que este oferea a oportunidade necessria para discutir questesconflitantes, sofrimentos pela morte de um paciente e propor sugestes.

    Os autores supracitados, tendo identificado que grande parte das dificuldades delidar com o paciente sem possibilidade de cura esto relacionadas dificuldade dasequipes de sade de se confrontarem com a morte, recomendam um preparo dasmesmas atravs de grupos de discusso baseados na metodologia de Balint, ou seja,pressupe a discusso de casos para obter um melhor entendimento das questesemocionais que os profissionais encontram na sua prtica diria como estratgia paradiminuir a ansiedade da equipe. O objetivo dessa metodologia oferecer aoprofissional, um espao onde as angstias e a dor frente situao de terminalidadede pacientes, sejam elaboradas, e assim, construir estratgias defensivas que lheofeream uma forma de trabalho em situaes como estas.

    Alm disto, a proposta do trabalho do psiclogo junto equipe de sade auxiliarna capacitao destes profissionais a lidar, de forma mais adequada, com fontes detenso interna oriundas de sua prtica profissional, possibilitando a utilizao de

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    arsenal egoico defensrio adaptativo que possibilite retorno ao equilbrio emocional,principalmente visando um estado de maior tranquilidade para lidar com situaes todifceis, como as de terminalidade de pacientes, como tambm com o prazer doexerccio de sua maravilhosa profisso. Alm desta rdua tarefa, o psiclogo tambmintenta conseguir com que os profissionais da equipe de sade possam estabeleceruma relao mais saudvel com os familiares e pacientes terminais, evitando que ossentimentos destes possam interferir, de forma negativa, em sua estrutura emocional.Afinal, a sade de sua estrutura emocional um fator preponderante do qual depende oxito de sua atividade profissional (MEDEIROS; LUSTOSA, 2011).

    Portanto, os profissionais que convive