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(DES)EQUILIBRIOS FAMILIARES 1 Universidade de Coimbra Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação Mestrado Integrado em Psicologia - 1ºCiclo/3ºAno/1ºSemestre Psicologia Clínica/Saúde I (Módulo Sistémica) Docente: Dr.a Maria Madelena Carvalho 2010/2011 (DES)EQUILIBRIOS FAMILIARES Maria Inês Baptista Fernandes Nº 2010115329 Ana Rita Valente Paz Moura Nº 20081935 Palavras-Chave: Evolução, Família, Sistema, Sintoma, Terapia familiar Evolução : do Dicionário da Língua Portuguesa, Evolução define-se como “s.f. (...) (2) Nova fase em que entra uma ideia, um sistema, uma ciência, etc; (3) Desenvolvimento ou transformação gradual e progressiva (operada nas ideias, etc.) (...)”. No que se refere à família, enquanto sistema em evolução, ambas as alineas citadas se adequam na medida em que se trata de um crescimento ou transformação gradual conjuntos e interactivos dos elementos e, se em terapia, com o terapeuta, no sentido de encontrarem um equilibrio saudável para o sistema.

psicologia sistemica I

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trabalho sobre psicologia I

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(DES)EQUILIBRIOS FAMILIARES 1

Universidade de CoimbraFaculdade de Psicologia e Ciências da Educação

Mestrado Integrado em Psicologia - 1ºCiclo/3ºAno/1ºSemestrePsicologia Clínica/Saúde I (Módulo Sistémica)

Docente: Dr.a Maria Madelena Carvalho 2010/2011

(DES)EQUILIBRIOS FAMILIARES

Maria Inês Baptista Fernandes Nº 2010115329

Ana Rita Valente Paz Moura Nº 20081935

Palavras-Chave: Evolução, Família, Sistema, Sintoma, Terapia familiar

Evolução : do Dicionário da Língua Portuguesa, Evolução define-se como

“s.f. (...) (2) Nova fase em que entra uma ideia, um sistema, uma ciência, etc;

(3) Desenvolvimento ou transformação gradual e progressiva (operada nas

ideias, etc.) (...)”. No que se refere à família, enquanto sistema em evolução,

ambas as alineas citadas se adequam na medida em que se trata de um

crescimento ou transformação gradual conjuntos e interactivos dos elementos

e, se em terapia, com o terapeuta, no sentido de encontrarem um equilibrio

saudável para o sistema.

Familia : do Dicionário da Língua Portuguesa, Família é definida como “ s.f

(1) Conjunto de todos os parentes de uma pessoa, e, principalmente, dos que

moram com ela; (...).” Para o presente trabalho por familia interessa

compreender o conjunto de elementos referidos pelo Paiente Identificado (P.I.

. aquele que se dirige ao terapeuta, que marca consulta ou aquele que faz

referência) pertencentes ao sistema familiar e que podem ser relevantes para a

terapia.

Sistema : no Dicionário da Lingua Portuguesa pode ler-se: “s.m (...) (2)

Combinação de partes reunidas para concorrerem para um resultado, ou de

modo a formarem um conjunto; (...)”, portanto, conjunto de individuos

interdependentes que formam um conjunto ou sistema complexo, com uma

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história e uma evolução única. O sistema não é determinado pelos estatutus e

papeis sociais mas sim pelas relações e dinâmicas entre individuos.

Sintoma : do Dicionário da Língua Portuguesa, “s.m. (1) Sinal que indica uma

doença ou mudança no curso de uma doença; (...)”. Quando aplicado à

“familia sintomática”, diz-se que é um sinal ou uma mudança na sua evolução

natural, i.é, sinal de que algo perturba o sistema e lhe confere

disfuncionamento. Não é, necessariamente o indicado pelo P.I..

Terapia Familiar: é uma abordagem terapeutica interdisciplinar que,

actualmente, assenta na ideia de que a familia é um sistema aberto no qual os

individuos são interdependentes e com papeis especificos, gerido pelos

padrões de comunicação em interação constante com o macrosistema e

possuidor de uma história única. O Processo terapêutico começa com o

Pedido de Consulta e tem como objectivo encontrar um novo equilibrio do

sistema.

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Em resposta às insuficiências do Modelo Psiquiátrico Tradicional, em particular

às respeitantes ao Modelo Psicanalítico, começa a emergir, nos anos 50, a Terapia

Familiar. Esta forma de intervenção tem como objecto central a vida familiar e as

relações interpessoais, não reduzindo a sua atenção ao indivíduo isoladamente. Assim,

como primeiro axioma sistémico, Wiener afirma que “o todo é mais do que a soma das

partes” e é com base nele que outros grandes passos foram dados.

Tendo como principal preocupação a estabilidade, ao invés de mudança, surge a

chamada cibernética de primeira ordem. A observação voltada para a família,

considerada agora um sistema, centrava-se na redundância e regras essenciais para a sua

estabilidade ao mesmo tempo que tentava compreender quais os factores potenciadores

de crise e instabilidade. Considerava-se essencial que o sistema fosse capaz de integrar a

informação chegada do exterior (o feedback), alterando as suas condições tanto quanto

possível no sentido de corrigir qualquer desvio ou perturbação, evitando mudanças

drásticas no sistema, fazendo-o retomar à sua situação inicial. Este processo ocorreria

através de retroacções negativas que conduziriam o todo à estabilidade, reintroduzindo

no sistema informação auto-correctiva. No que se refere às famílias sintomáticas,

pensava-se que estas teriam rigidificado, não aceitando a informação dada pelo

feedback. Assim, não teriam forma de reencontrar um equilíbrio homeostático, pois não

evoluíam no sentido da transformação (feedback positivo). O sintoma era visto de duas

perspectivas: como uma forma de ignorar informação ameaçadora ao geral

funcionamento homeostático do sistema, centrando o problema num único elemento

(“pedido de mudança para a não mudança”) e ao mesmo tempo, como um pedido de

ajuda indirecto feito ao meio.

No que concerne à relação terapeuta-paciente, o primeiro era visto como um

observador neutro, cuja função seria prever a forma como o sistema se poderia opor à

mudança e avaliar as probabilidades desta ser anulada. Neste período tão marcante, o

terapeuta limitava-se a descrever os sistemas. No período posterior para além de se

descrever o sistema, descreve-se também aquele que o descreve, pois o terapeuta passa

de mero observador a observador e observado. Da cibernética dos sistemas observados

passamos, então, para a dos sistemas observantes, também denominada cibernética de

segunda ordem.

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A estabilidade e a mudança são tidas em interacção mútua e não consideradas

separadamente. Os sistemas passam a ser vistos como não imutáveis, podendo mudar

sem perder a sua identidade. A estrutura do sistema adequa-se à mudança, mantendo a

sua organização prévia – sistemas autopoiético (Maturana e Varela). Assim a família,

como sistema auto-organizado, tem a capacidade de incorporar finitas transformações

que decorrem do seu normal funcionamento, utilizando estas mudanças para evoluir em

direcção à ordem ou estabilidade. As solicitações de ajuda surgem quando esta

organização se sente ameaçada e o equilíbrio não é atingindo.

Nesta cibernética a relação entre o meio e o sistema é tida como essencial.

Considerado um sistema autónomo, a família está informalmente aberta ao exterior

ainda que fechada quanto à sua operacionalização, ou seja, é o sistema que define as

perturbações permitidas não sendo estas impostas pelo meio. Estabelecem uma relação

de acoplagem para assim co-evoluirem. As perturbações não são, aqui, vistas como

totalmente prejudiciais podendo, pelo contrário, ser potencialmente renovadoras e fonte

de progresso. A ênfase colocada anteriormente nas retroacções negativas passa agora a

centrar-se na interacção destas com as positivas – “caos não significa mera desordem,

mas antes possibilidade de criar uma nova ordem”.

Reformulando a afirmação e Winer de que “o todo é mais do que a soma das

partes”, Morin vem dizer que “o todo é ao mesmo tempo mais e menos que a soma das

partes”, isto é, o todo é mais que a soma das partes porque o sistema vai mais além das

características de cada elemento. É menos, pois pertencendo a um todo, os indivíduos

podem ver as suas potencialidades inibidas.

A Terapia Familiar assume, agora, a familia como dinâmica e multidimensional.

É atribuida à familia e seus elementos a responsabilidade do que constroem e das

histórias que narram, sempre na ideia que não existe uma verdade absoluta. A verdade é

a soma dos significados temporal e espacialmente determinados e em constante

interacção que cada elemento contrói, i.é, aquilo que cada individuo ou o sistema narra

é a história que foi contruida e nuna a realidade. E quando falamos de história, não nos

referimos à história de dada familia mas desta em relação com os outros, que a

complementam e lhe dão significado também. Ora, posto isto, a História que a familia

sintomática narra pode ser causa da estagnação do sistema. Por tal, o terapeuta não pode

tomá-la como ponto de partida para a intervenção mas assim abrir-lhe portas a novas

narrações por parte da familia. Então a linha de acção é: "investigar-sugerir-reorganizar-

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sugerir de novo...". O terapeuta e o sistema estão constantemente em interação e

evolução mútua até que uma nova história seja construída.

Crítica

É agora tempo de tecer algumas considerações. Falemos, antes de mais, do

evidente reducionismo associado à cibernética de 1º ordem: o indivíduo e as

características singulares de cada elemento foram esquecidos, em prol do sistema como

um todo; a história, contínua no tempo, foi posta de parte para se enfatizar o “aqui” e

“agora”, bem como as interacções estabelecidas no momento presente, considerando

assim o desenvolvimento do sistema de forma linear pela tentativa de o manter sempre

igual, tanto quanto possível, ao seu estado anterior; a homeostasia familiar passou a ser

considerada a principal responsável pela perturbação sintomática e o terapeuta, no que à

terapia se refere, era visto como alguém neutro e a quem se exigia grande perícia e

atenção para detectar problemas e para afastar a família da crise. Estabilidade,

resistência e linearidade, serão, na nossa opinião, as palavras que mais marcam este

período que mesmo sendo algo limitador e mecanicista, não deixou de ser importante,

“provocador” e promotor de grandes avanços na área, nomeadamente no que se refere à

forma de pensar e trabalhar e família, sendo a sua relevância bem evidenciada pela

autora. Assim, teríamos de esperar pela cibernética de 2º ordem para que algumas

lacunas e falhas fossem preenchidas. As dimensões histórica e pessoal passam a ser

consideradas bem como a ideia de singularidade, de auto-organização, autonomia e

circularidade, defendendo-se um desenvolvimento feito em espiral.

Consideramos importante fazer referência ao papel que o acaso e a instabilidade,

tão evitados e sentidos como ameaçadores até então, têm no crescimento e

desenvolvimento de qualquer sistema. O desvio e o incerto são realidades e podem fazer

parte de um processo complexo de evolução. O modo como um sistema se estrutura e

organiza, para além de não ser algo estático e intocável, é apenas uma das muitas

formas de este o fazer. A família “escolhe”, de entre várias possibilidades aquela que

mais lhe apraz e convém, aliando o acaso e a necessidade como forma de encontrar uma

nova estabilidade. O equilíbrio e a “perfeição” estável deixam de ser vistos como

objectivos a atingir e a instabilidade passa, tal como os dois anteriores, a ser parte

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integrante do processo de avanço, crescimento e mudança do sistema sendo este

autónomo na forma como amplifica as suas flutuações.

Para finalizar, Morin alerta para uma cegueira holística que veio ocupar o lugar

de uma anterior cegueira, a reduccionista. Do indivíduo, todas as atenções se passam a

centrar no todo; do esquecimento das interacções para atender somente ao sujeito único,

passa-se para uma excessiva preocupação com sistema, não dando espaço aos membros

que o compõem, como se estes não existissem senão em “simbiose”.

Concluímos com a ideia de que cada família, como um todo e como colo de

indivíduos que existem para além dela, deve viver, contar diversas “fábulas”, ser parte

de vários “contos”, crescendo e evoluindo na direcção de uma grande história: a sua,

que não tem de ter finais infelizes, estando o “e foram felizes para sempre” acessível a

todos aqueles que o procuram. A função dos terapeutas é exactamente essa. É sugerir, é

abrir novas portas, é mostrar outros pontos de vistas e novas soluções, para que cada

família encontre o seu final (que nunca é final). Um final feliz.

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Bibliografia

Alarcão, M. (2000).(Des)Equilibrios Familiares. Uma visão sistémica. Coimbra:

Quarteto Editora (cap. 1).