PUBLICAÇÕES BRASILEIRAS E O DESENVOLVIMENTO DAS CIÊNCIAS NO SÉCULO XIX

  • Upload
    luis-w

  • View
    29

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

PUBLICAES BRASILEIRAS E O DESENVOLVIMENTO DAS CINCIAS NO SCULO XIXRussel Teresinha D. da Rosa* e Joo Batista de S. Sobrinho**

RESUMO Neste trabalho examinamos as relaes entre temas de publicaes de autores brasileiros ou atuantes no Brasil, na segunda metade do sculo XIX, e processos de especializao do conhecimento e de institucionalizao da pesquisa e do ensino no pas. Para o exame empreendido empregamos os conceitos de classificao e de singularidade do socilogo Basil Bernstein para descrever reas de conhecimentos com prticas, discursos e regras que se individualizam por contraste com outras reas. Alm disso, recorremos ao trabalho de historiadores que permitem reconstruir o contexto poltico e econmico em que as publicaes ocorreram. Palavras-chave: publicaes brasileiras; histria das cincias; sculo XIX. BRAZILIAN PUBLICATIONS AND THE DEVELOPMENT OF SCIENCES IN THE XIX CENTURY Relation between publications of Brazilian authors or actuating in Brazil were made in this work, in the second half of the XIX century, and processes of specialization of knowledge and of institutionalization of research and teaching in this country. Concepts of classification and singularity, by the sociologist Basil Bernstein, were employed in order to describe areas of knowledge with practices and rules that become individualized by contrast with others areas. Besides this, some historians works were used, which allow to rebuild the political and economic context in which the publications occurred. Key words: brazilian publications; history of science; XIX century.

* Professora do Departamento de Ensino da Faculdade de Educao, e Currculo da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. E-mail: [email protected] **

Faculdade de Educao da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

Episteme, Porto Alegre, v. 11, n. 23, p. 117-149, jan./jun. 2006.

117

INTRODUO

O presente trabalho apresenta resultados de anlise de publicaes de autores brasileiros, a partir da segunda metade do sculo XIX, localizadas em bibliotecas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). A investigao ocorreu em colaborao com o projeto em desenvolvimento desde 1989, na UNICAMP, Fontes para a histria da cincia, medicina e tcnica: uma base de dados relativa a Portugal e Brasil (1400-1900), sob coordenao do Professor Roberto de Andrade Martins, do Grupo de Histria e Teoria da Cincia. Neste estudo, tentamos relacionar a classificao das obras por reas de conhecimento com processos de especializao dessas reas e com a institucionalizao da pesquisa e do ensino no Brasil. De um total de 92 publicaes registradas, 69 provieram da Biblioteca Central, 11 da Biblioteca Setorial do Instituto de Biocincias e 12 da Biblioteca Setorial do Departamento de Botnica da UFRGS. O perodo selecionado, de 1862 a 1900, foi aquele em que encontramos o maior nmero de publicaes, somando 77.1 O fato de no termos encontrado publicaes anteriores a 1862 pode estar relacionado, em parte, ao fato de a Coroa Portuguesa ter proibido o estabelecimento de casas impressoras no Brasil at 1808, quando foi instalada a Imprensa Rgia no Rio de Janeiro (SCHWARTZMAN, 2001, p. 64). Neste relato, tratamos de 65 publicaes que ocorreram no Brasil e de outras sete que, embora tenham sido feitas em Lisboa (uma), Paris (trs), Bruxelas (duas) e Nova York (uma), so de autoria de brasileiros ou de estrangeiros que viveram no Brasil tempo suficiente para influenciar a produo local. Das 65 publicaes realizadas no Brasil, 49 ocorreram no Rio de Janeiro. Destacam-se a Tipografia e a Imprensa Nacional, responsveis por dezoito publicaes, bem como a Tipografia Leuzinger que produziu oito publicaes. O Livreiro-Editor Garnier foi responsvel por uma publicao no Brasil, uma realizada na Frana (Frontispcio 1) e duas feitas simultaneamente no Rio de Janeiro e em Paris. Esse ltimo editor era scio da editora parisiense de mesmo nome (ALENCASTRO, 1998, p. 44). As demais publicaes distribuem-se entre outras 11 tipografias.

1

Localizamos tambm uma publicao do sculo XVII e nove do sculo XVIII; outras cinco publicaes so do incio do sculo XX, mas foram produzidas a partir de estudos realizados no sculo XIX.

118

Episteme, Porto Alegre, v. 11, n. 23, p. 117-149, jan./jun. 2006.

Para selecionar os autores apresentados neste artigo, consideramos aqueles dos quais localizamos mais de uma publicao; ou cujos textos repetiram-se nas bibliotecas e aqueles em que conseguimos identificar as instituies onde se formaram, atuaram, ou s quais eram filiados.

OS CAMINHOS DA INVESTIGAO

O problema de classificao de textos por rea de conhecimento surgiu no momento do registro e anlise dos dados, pois 35 publicaes agregavam temas diversos, hoje pertencentes a diferentes reas. Algumas abarcavam desde classificaes botnicas e zoolgicas at descries de populaes, estudos arqueolgicos e geolgicos, como, por exemplo, o Catlogo de Exposies de Histria do Brasil, de 1881, em que est includa a Histria Natural, a qual compreende etnografia, lingstica brazlica, zoologia, botnica, mineralogia e geologia. O mesmo foi observado no livro Historia2 Natural Popular Descripo Circumstanciada dos tres Reinos da Natureza, traduzido em 1894 por Anstett de um tratado de autoria de Martin e Rebau (Figura 1). Um outro exemplo aparece no Frontispcio 1. Frontispcio 1 Climats //3 Gologie, Faune // et // Gographie Botanique // Du Brsil // Par // Emmanuel Liais // Directeur de lObservatoire Imprial de Rio de Janeiro // Ancien astronome lObservatoire de Paris // Ouvrage // Publi par Ordre du Gouvernement Imprial du Brsil // Paris // Garnier Frres, Libraires diteurs // 6, Rue des Saints-Pres, Et Palais-Royal, 215 // 1872 // Tous droits rservs. Encontramos tambm obras que renem estudos em reas como a botnica e a zoologia aplicados medicina, farmcia, arte, indstria ou comrcio, como no Frontispcio 2.

2 3

Mantivemos a grafia das publicaes conforme aparece nas folhas de rosto. Barras duplas indicam troca de linha.

Episteme, Porto Alegre, v. 11, n. 23, p. 117-149, jan./jun. 2006.

119

FIGURA 1 HISTORIA* NATURAL POPULAR DESCRIPO CIRCUMSTANCIADA DOS TRES REINOS DA NATUREZA, TRADUZIDO EM 1894, POR ANSTETT, DE UM TRATADO DE AUTORIA DE MARTIN E REBAU.

Frontispcio 2 Botanica Brasileira // applicada // medicina, s artes e industria // Seguida de um suplemento de materia medica, inclusive as plantas // conhecidas e applicadas pelos indios em suas enfermidades // pelo // Dr Mello Moraes / / (natural da cidade das Alagas) // Ex-deputado Assembla Geral Lelislativa do Imperio do Brasil // e autor de muitas obras de medicina, // de sciencias, de historia do Brasil e de litteratura // Rio de Janeiro // Livraria de B. L. Garnier // Editor // Rua do Ouvidor // 1881.*

Mantivemos a grafia das publicaes conforme aparece nas folhas de rosto.

120

Episteme, Porto Alegre, v. 11, n. 23, p. 117-149, jan./jun. 2006.

Obteno e organizao das fontes A principal fonte de informaes sobre os autores a apresentao desses realizada na folha de rosto das obras, onde se destacam seus cargos em diferentes instituies, suas filiaes a associaes cientficas nacionais e estrangeiras, seus ttulos de nobreza e sua formao, como no exemplo a seguir: Frontispcio 3 Elementos // de // Botanica// Geral e Medica // pelo // Dr. Joaquim Monteiro CAMINHO // (da Bahia) // Professor de Botanica e Zoologia medica da faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, Membro da Sociedade Botanica de Frana, da de Sciencias naturaes de Cherburgo, e da Vellosiana do Rio de Janeiro, da Imperial Academia de Medicina do Rio de Janeiro, Membro Fundador da Associao Brasileira de Acclimao, da Sociedade abolicionista da escravido no Brasil, e de differentes Sociedades Sabias estrangeiras, // Commendador da ordem da Roza (do Brazil), Condecorado com diversas medalhas de campanha, Delegado do Governo do Brazil e Vice-presidente // da seco de quarentenas no Congresso medico internacional de Vienna dAustria, // Primeiro cirurgio da Armada Brazileira, etc., etc., etc.. // Com 1500 estampas intercaladas no texto // Obra premiada pelo Governo Imperial // Rio de Janeiro // Typographia Nacional, 1877, 560p. J com relao s instituies em que os autores atuaram, encontramos informaes em Schwartzman (1979 e 2001), em Schwarcz (1993 e 2000) e no Almanaque Mercantil e Administrativo Laemmert,4 disponibilizado pela Universidade de Chicago na internet. Nesse ltimo constam documentos que informam sobre a organizao administrativa do Estado brasileiro.

CLASSIFICAES DE CONHECIMENTOS NAS PUBLICAES

Em nossos estudos nos apoiamos nos conceitos de classificao e de singularidade propostos por Bernstein (2000), cujas definies so apresentadas a seguir.4

De acordo com Schwarcz (2000, nota 5, p. 570) o Almanak Laemmert, criado em 1844, era uma referncia para a corte e se manteve at a Primeira Repblica. At 1902, o peridico continuava a publicar a relao dos brasileiros condecorados pelas ordens honorficas do extinto Imprio.

Episteme, Porto Alegre, v. 11, n. 23, p. 117-149, jan./jun. 2006.

121

Classificao foi usada para referir-se s relaes entre categorias, sendo essas relaes dadas pelo grau de isolamento entre cada categoria. Ento um forte isolamento cria categorias com fronteiras claras, com um espao para o desenvolvimento de uma identidade especializada, enquanto que o isolamento fraco corresponde a uma categoria menos especializada. A chave para as relaes entre categorias o isolamento entre as categorias dos discursos, prticas ou agncias. A mudana no grau de isolamento muda as relaes entre categorias. Eu argumentei que as relaes de poder mantm o grau de isolamento e, portanto, o princpio da classificao. Nesse sentido, as relaes entre as categorias reproduzem as relaes de poder. A classificao pode ser forte (+C) ou fraca (-C), de acordo com o grau de isolamento. (Ibid., p. 99) (Traduo nossa)

Consideramos que a classificao das reas de conhecimento seja produzida e reproduzida nos currculos de formao inicial, em instituies de ensino e de pesquisa e tambm em publicaes de livros, revistas e documentos. Assim o conceito de classificao foi empregado para avaliar o grau de especializao desses itens. Quanto ao conceito de singularidade, Bernstein (2000, p. 9) assim o define:Um discurso como uma singularidade um discurso que se apropriou de um espao, atribuindo a ele um nome. Por exemplo, fsica, qumica, sociologia, psicologia so, para mim, singularidades. E a estrutura do conhecimento no sculo dezenove era, de fato, a de nascimento e desenvolvimento de singularidades. Essas singularidades produziram um discurso sobre elas mesmas. Esses discursos tm poucas referncias externas e eles criaram o campo da produo de conhecimento. (Traduo nossa)

E complementa (ibid., p. 52):singularidades so estruturas de conhecimento cujos criadores apropriaramse de um espao com um nome nico, um discurso especializado o qual tem seu prprio campo intelectual de textos, prticas, regras de ingresso, exames, licenas para a prtica, distribuio de prmios5 e de punies

5

Durkheim (1995 [1938], p. 122-127 e 243) apresenta a origem medieval da corporao universitria, de suas regras de ingresso, de seus graus, de suas solenidades e de seus rituais que permanecem at hoje e remonta aos colgios jesutas o sistema de premiaes como estmulo para a atividade dos estudantes.

122

Episteme, Porto Alegre, v. 11, n. 23, p. 117-149, jan./jun. 2006.

(fsica, qumica, histria, economia, psicologia, etc.). Singularidades so narcisistas, orientadas para o prprio desenvolvimento, protegidas por fronteiras fortes e por hierarquias. (Traduo nossa)

Bernstein considera o sculo XIX o perodo de nascimento e desenvolvimento de singularidades e Burke (2003, p. 86), de modo semelhante, acredita que as disciplinas seriam uma inveno de fins do sculo XVIII e princpio do XIX.6 Schwarcz (1993, p. 29 e 30), da mesma forma, defende que o sculo dezenove caracterizar-se-ia pelas especializaes, pelo surgimento de novos ramos de conhecimento e pelo estabelecimento de limites entre as reas, como por exemplo, o desmembramento das cincias naturais em geologia, botnica e zoologia. J Borralho e Fortes (2002, p. 71, 73 e 86) afirmam que especificamente a Botnica, at o sculo XVIII, integrava a Histria Natural, orientando-se por um modelo descritivo que teve origem na antiguidade clssica. Mas teria se tornado autnoma a partir da adoo da nomenclatura internacional de Lineu. Verificamos, em publicaes do sculo XIX, que a botnica, s vezes, aparecia como disciplina autnoma (como nos Frontispcios 2 e 3) e, outras vezes, como parte da histria natural (como no Frontispcio 1). Nossos dados sugerem que os processos histricos de estabelecimento e consolidao de singularidades so descontnuos, ocorrendo em ritmos diferentes em cada rea. A manuteno de temas diversos em um livro, como no Catlogo de Exposies, citado acima, exemplifica classificaes fracas entre reas de conhecimento ou singularidades em processo de constituio. Por outro lado, o livro de 1898, Plantae Mattogrossenses ou Relao de Plantas Novas Colhidas, Classificadas e Desenhadas Por Barbosa Rodrigues (Figura 2) e a monografia de 1894, de Emlio Goeldi, As Aves do Brasil, bem como a folha de rosto 7 exemplificam publicaes de singularidades com linhas de fronteira mais ntidas por tratarem de temas especficos botnica, zoologia e medicina, respectivamente. Essas publicaes sugerem a tendncia classificao forte dessas reas. Alm disso, verificamos que a essas singularidades correspondem processos de institucionalizao ou de fortalecimento de instituies de pesquisa.

6 Burke cita STICHWEH (1991). Der frhmoderne Staat und die europiscbe Universitt. Frankfurt e LENOIR (1997). Instituting Science. Stanford.

Episteme, Porto Alegre, v. 11, n. 23, p. 117-149, jan./jun. 2006.

123

FIGURA 2 1898, PLANTAE MATTOGROSSENSES OU RELAO DE PLANTAS NOVAS COLHIDAS, CLASSIFICADAS E DESENHADAS POR BARBOSA RODRIGUES (FIGURA 2).

A publicao de 1898 resulta de estudos botnicos protagonizados por Barbosa Rodrigues, ento diretor do Jardim Botnico do Rio de Janeiro,7 em um perodo de reorganizao das atividades dessa instituio (SCHWARCZ, 1993, p. 25). A publicao de 1894 de autoria de Emlio Goeldi que assumiu o cargo de diretor do Museu Paraense8 de Historia Natural e Ethnographia, em 1893 (ibid, p. 70 e 85). Verifica-se tambm conhecimentos acadmicos justapostos a saberes do cotidiano o que indicaria uma classificao ainda fraca de singularidades7 8

Criado em 1808, sob o nome Real Horto (SCHWARTZMAN, 2001, p. 66). Fundado em 1866.

124

Episteme, Porto Alegre, v. 11, n. 23, p. 117-149, jan./jun. 2006.

em desenvolvimento. Por exemplo no Diccionario de Botanica, publicado em 1873, por Joaquim de Almeida Pinto, e no Frontispcio 2 aparecem os vegetais conhecidos pelos ndios e suas aplicaes medicinais. No mesmo dicionrio de botnica e no Frontispcio 4 so apresentadas as utilidades das plantas nas artes, engenharia, indstrias, economia domstica, veterinria e medicina. No Frontispcio 5, o prprio ttulo da obra indica a proximidade do senso comum Historia das Plantas Alimentares e de Gozo do Brasil. No caso do Frontispcio 5, o autor Peckolt, graduado em Farmcia na Alemanha e responsvel pelo laboratrio de Qumica do Museu Nacional a partir de 1874 (SCHWARTZMAN, 2001, p. 192), tambm enfoca a anlise qumica de vegetais, um contedo mais especializado. Frontispcio 4 Configurao // e // Descripo de Todos os orgos fundamentaes // das principaes madeiras de cerne e brancas // da // Provincia do Rio de Janeiro // e suas // Applicaes na Engenharia, Industria, Medicina e Artes // com uma tabella de pesos especificos // Por // Jos de Saldanha da Gama Filho // Bacharel em Sciencias Mathematicas e Physicas pela Escola Central, // Em exerccio das funces de repetidor de Sciencias // physicas da mesma escola; // Socio effectivo do Instituto Polytechnico; // da Sociedade Auxiliadora da Industria Nacional; // e membro do conselho da Sociedade Propagadora das BellasArtes, // Primeiro Volume // Rio de Janeiro // Typographia Economica de J.J. Fontes // 34 Rua Gonalves Dias 34 // 1865

Frontispcio 5 Historia // das // Plantas Alimentares e de Gozo // do Brasil // Contendo // Generalidades sobre Agricultura Brasileira, A Cultura, // Uso e Composio Chimica de cada uma dellas // Por // Theodoro Peckolt // Dr. Phil. Hon. Pela Academia Leopoldino-Carolina Germania, // Pharmaceutico Honorario da Casa Imperial, Official da Imperial Ordem da Rosa, // Cavalheiro da estrela Polar da Suecia, Membro de Varias Associaes // Scientificas do Brazil e da Allemanha, etc. // I // Rio de Janeiro // Em casa dos EditoresProprietrios // Eduardo & Henrique Laemmert // 68, Rua do Ouvidor, 68 // 1871. Para analisar a classificao das publicaes, foi necessrio tambm considerar as mudanas de sentido, ao longo da histria, dos termos artes eEpisteme, Porto Alegre, v. 11, n. 23, p. 117-149, jan./jun. 2006.

125

cincias, recorrentes nos ttulos das obras. Nas publicaes essas palavras parecem significar conhecimentos prticos e tericos, respectivamente. Burke (2003, p. 20 e 79) ilustra esses significados por meio da descrio de um conflito, durante a construo da catedral de Milo, por volta de 1400, entre um arquiteto que dominava a cincia da geometria e os mestres de obras, que detinham a arte da construo. Outra distino importante, para situar as publicaes examinadas, a que existia entre conhecimento liberal e conhecimento til.O conhecimento liberal, como o dos clssicos gregos e latinos, tinha status elevado em 1450 e mesmo em 1550, enquanto o conhecimento meramente til, do comrcio, por exemplo, ou de processos de produo, tinha menor status, exatamente como os mercadores e artesos que o detinham. Seguindo uma classificao medieval ainda em voga na poca, os artesos eram vistos pelas classes altas como praticantes das sete artes mecnicas, tradicionalmente especificadas como a confeco de roupas, a construo de navios, a navegao, a agricultura, a caa, a cura e a interpretao teatral. (BURKE, 2003, p. 80-1)

Encontramos remanescentes desses conceitos em publicaes que expressam um esforo de aplicao dos conhecimentos das cincias naturais a interesses tcnicos e econmicos, como no Diccionario de Botanica que apresenta a utilidade dos vegetais nas artes, provavelmente como um resqucio do que era designado como artes mecnicas. Frontispcio 6 Synopsis de Zoologia // ou // Estudo Geral dos Animaes // Com applicaes // medicina e pharmacia, agricultura (animaes domesticos, raas, // conhecimento da edade do cavallo e do boi, cultura da abelha e do // bicho da seda, etc.), etc., tendo, alem //disso, muitas notas biographicas, bem como o additamento de um vocabulrio em que se definem nume- // rosos termos relativos anatomia, physiologia, hygiene, zootechnia, // etc., em que se d uma notcia completa cerca do darwinismo. // Por // Castro Ramalho (Manuel de Araujo) // Pharmaceutico pela Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro. // Nomina si nescis, perit et cognitio rerum. // Primeira edio // Parte Geral e (?) // Porto Alegre (Rio Grande do Sul) // Typographia da Deutsche Zeitung. Rua do (?) // 1882.

126

Episteme, Porto Alegre, v. 11, n. 23, p. 117-149, jan./jun. 2006.

Nos Frontispcios 2, 3, 4 e 6 tambm observamos o termo medicina, que substitui, o termo cura, uma das sete artes mecnicas, configurando-se como uma singularidade, mas parecendo manter, assim como a agricultura, a idia de conhecimento prtico, por ser uma rea de aplicao dos estudos botnicos9 e zoolgicos. Da arte de curar medicina No incio do sculo XIX, no Brasil, mdicos e cirurgies, egressos de cursos superiores, dividiam com prticos as responsabilidades da arte de curar.(...) o atendimento mdico na Colnia era feito por curandeiros herbalistas, herdeiros dos conhecimentos empricos indgenas ou africanos, ou por prticos que atuavam sob a instituio portuguesa do Proto-Medicato. O Proto-Medicato era uma junta perptua, que se fazia representar aqui por deputados, qual cabia fiscalizar o exerccio de qualquer atividade ligada arte de curar, alm de lavrar provises e sentenas e submeter aprovao oficial os autos de habilitao dos que desejassem obter carta de autorizao para a prtica dessas artes. Para conseguir as cartas, eram necessrios um certificado comprovando o aprendizado junto a um outro profissional por um certo perodo de tempo e um exame sumrio feito diante dos membros da junta. Os prticos eram geralmente pardos, analfabetos, e profisso no estava ligado qualquer prestgio social. (SCHWARTZMAN, 1979, p. 66)

Mas, na poca da vinda da corte portuguesa para o Brasil, em 1808, j havia uma distino hierrquica entre os que estavam habilitados a exercer a medicina, uma profisso liberal centrada na clnica, tambm designada fsica, e os que detinham os saberes prticos da cirurgia, apesar desses tambm serem desenvolvidos em curso superior (id., 2001, p. 82). O processo histrico que levou da arte de curar medicina com carter cientfico, foi marcado pela criao de instituies como a Sociedade de Medicina, em 1829, organizada nos moldes da Academia Francesa (id., 1979, p. 69). Francisco Fajardo, autor de uma publicao de 1893 (Frontispcio 7) era filiado Sociedade de Medicina e Cirurgia que talvez seja a mesma criada em 1829. Ressalta-se a manuteno da separao entre medicina e cirurgia na denominao da Sociedade ainda em 1893.9

Localizamos mais quatro publicaes botnicas aplicadas medicina.

Episteme, Porto Alegre, v. 11, n. 23, p. 117-149, jan./jun. 2006.

127

Frontispcio 7 O microbio da malaria // Memoria apresentada a // Academia Nacional de Medicina // Em dezembro de 1892 // Pelo // Dr. F. Fajardo // Assistente de Clinica Propedeutica; Ex-membro da Commisso // Medica em Berlim (1891); // Ex-interno da Maternidade; Membro da Academia // Nacional de Medicina e da Sociedade de Medicina e Cirurgia. // Rio de Janeiro // Laemmert & C. Editores // 1893. Nesse processo que torna a medicina uma profisso de prestgio, caracterizada pelos conhecimentos cientficos, tambm tem importncia o movimento conhecido como Escola Tropicalista Bahiana, responsvel por estudos de epidemias como a febre amarela, em 1849; a clera-morbo, em 1853; pela descrio de novas espcies de serpentes e por investigaes sobre ancilostomose, filariose e beribri (SCHWARTZMAN, 1979, p. 71). Localizamos uma publicao de 1872, Ensaio sobre O Beriberi no Brazil, de Silva Lima que era membro dessa escola (id., 2001, p. 84). O Frontispcio 7 tambm ilustra a tendncia da medicina em tornar-se cientfica. possvel estabelecer uma correspondncia entre essa publicao e a criao, no Rio de Janeiro, em 1889, do Instituto Soroterpico Municipal, controlado por Oswaldo Cruz. Este havia estudado no Instituto Pasteur de Paris e auxiliado no diagnstico da peste bubnica em Santos, juntamente com Adolfo Lutz e Vital Brasil. Em 1900, o Instituto passou esfera federal.10 Francisco Fajardo estava entre os pesquisadores desse Instituto (ibid., nota 39, p. 111). Encontramos oito publicaes mdicas, uma que trata de cirurgia, quatro que tratam de doenas (como nos Frontispcios 7 e 9), uma que um guia mdico em que aparecem plantas medicinais e dois relatrios que tratam de problemas de salubridade. Alm dessas, registramos duas publicaes homeopticas. O Conselho de Estado, atravs de uma lei de 1854, havia tornado livre o ensino da homeopatia no pas, existindo um estabelecimento de ensino particular a Escola de Homeopatia da Corte. Segundo Evaldo Mello (1998, p. 421), os remdios homeopticos eram difundidos em todo o Imprio. Entretanto a arte de curar j era privilgio dos egressos das Faculdades de Medicina nessa poca (CUNHA, 1980, p. 85) e, conforme Schwartzman (2001, p. 90), na Repblica,10

Em 1907, o Instituto Soroterpico Federal transformou-se no Instituto de Patologia Experimental de Manguinhos, que passava a atuar como um centro de pesquisa, fundindo as tradies francesa e alem (ibid., p. 114 e 115).

128

Episteme, Porto Alegre, v. 11, n. 23, p. 117-149, jan./jun. 2006.

a Sociedade de Medicina do Rio de Janeiro passou a combater todas as formas no-institucionalizadas de servios mdicos, incluindo a homeopatia. Nesse perodo, a medicina moderna e a pesquisa bacteriolgica estavam se desenvolvendo principalmente pela necessidade de lidar com as condies precrias da cidade de So Paulo e do porto de Santos. Essa regio cresceu, no incio da Repblica, em decorrncia da exportao do caf, havendo crescente urbanizao e adensamento demogrfico os quais favoreceram as epidemias de febre amarela e de outras doenas, principalmente entre os imigrantes (ibid., p. 108-110). O Instituto Vacinognico de So Paulo, criado em 1892, tinha por objetivos produzir vacinas e proteger a nao de epidemias de varola. O Instituto Bacteriolgico, criado em 1893 e montado por Adolfo Lutz em 1895, identificava os agentes causadores de doenas, alm de realizar atividades de rotina como anlise de sangue, produo de vacina e de soro fisiolgico. Esse instituto participou das campanhas contra a peste bubnica e reagiu com eficincia aos surtos de clera entre 1894 e 1895 (ibid., p. 108-10). Pertence ao mesmo perodo o Instituto Butant, criado em 1899, em So Paulo para produo de soro antiofdico (CUNHA, 1980, p. 193). importante mencionar que, nessa poca, ainda estava em processo de legitimao a explicao do adoecimento por agentes patognicos. A identificao do organismo causador da febre tifide por Lutz, em 1895, por exemplo, foi rejeitada pela Sociedade Mdico-Cirrgica de So Paulo, que acreditava que as epidemias eram causadas por condies ambientais como o clima idia que tinha levado ao conceito de doenas tropicais. (SCHWARTZMAN, 2001, Nota 38, p. 110).

AUTORES UNIVERSALISTAS

Entendendo que o conceito classificao possa ser aplicado anlise de agentes individuais e a suas prticas, o empregamos ao avaliar o grau de especializao dos autores.No caso de classificao forte, cada categoria tem uma identidade nica, uma nica voz, seus prprios papis especializados de relaes internas. No caso de classificao fraca, ns temos discursos menos especializados, identidades menos especializadas, vozes menos especializadas. (BERNSTEIN, 2000, p. 7) (Traduo nossa)

Episteme, Porto Alegre, v. 11, n. 23, p. 117-149, jan./jun. 2006.

129

Encontramos em 36 livros o currculo resumido dos autores na folha de rosto, ou, pelo menos, os seus cargos ou titulaes. Pelo exame dos currculos, vimos que os autores dedicavam-se a diferentes reas, o que sugere pouca especializao ou uma classificao fraca dos conhecimentos. Esse o caso de Mello Moraes, autor de um livro de Botnica Aplicada, em cujo Frontispcio (2) consta que escreveu obras de medicina, cincias, histria do Brasil e literatura. Encontramos tambm um dicionrio de Homeopatia, de 1872, escrito por ele. Alencastro (1998, p. 54) confirma a abrangncia do conhecimento de Mello Moraes, descrevendo-o como historiador, mdico, militante homeopata e polgrafo. Outro exemplo Saldanha da Gama, autor de trs das publicaes botnicas, o que indicaria ser ele um especialista. As informaes apresentadas por S (2001) de que o mesmo era lente de Botnica da Escola Politcnica e de que participou de uma comisso de avaliao do trabalho sobre orqudeas de Barbosa Rodrigues tambm nos levaram a consider-lo um especialista. Entretanto, no Frontispcio 4, verifica-se que ele era Bacharel em Cincias Matemticas e Fsicas e que foi membro da Sociedade Propagadora das Belas Artes. A Escola Politcnica do Rio de Janeiro conferiu, entre 1874 e 1896, o ttulo de Bacharel ou de Doutor em Cincias Fsicas e Matemticas ou em Cincias Fsicas e Naturais (SCHWARTZMAN, 2001, p. 78 e 79). Cunha (1980, p. 96) apresenta os currculos desses cursos, sendo que, apenas no ltimo, era estudada botnica e no naquele em que Saldanha da Gama formou-se. A formao desse autor, portanto, no oferece apoio idia de consider-lo um especialista, assim como o que informado na apresentao em um livro de botnica: seu vnculo com as Belas Artes.11 Outro exemplo Francisco Ferreira, autor na rea da geografia (Frontispcio 8), embora fosse Bacharel em Cincias Jurdicas e Sociais e atuasse na Secretaria de Estado responsvel pela agricultura, comrcio e obras pblicas. Essa publicao parece ter sido produzida exclusivamente a partir de documentos, no havendo indicao de que seu autor tenha participado de alguma comisso de explorao geogrfica no perodo imperial. De acordo com Schwartzman (2001, p. 79 e 118), desde 1875, ocorreram comisses geolgicas e geogrficas de curta existncia, chefiadas, primeiro, por gelogos norte-americanos e, depois, por graduados da Escola de Minas de Ouro Preto, tambm fundada em 1875.

11 Apresentaremos na parte sobre o IHGB, o papel das cincias e das artes na construo de um ideal romntico vinculado aos interesses monrquicos.

130

Episteme, Porto Alegre, v. 11, n. 23, p. 117-149, jan./jun. 2006.

Frontispcio 8 Diccionario Geographico // das // Minas do Brazil // Concatenao de Noticias, // Informaes e Descripes sobre as Minas, // Extrahidas de Documentos Officiaes, // Memorias, Historias, Revistas, Diccionarios, Cartas // Geographicas, Roteiros, Viagens, // Exploraes de Rios, Ditas de Estradas // de Ferro e Outras // Por // Francisco Ignacio Ferreira // Bacharel em Sciencias Juridicas e Sociaes, // Ex-Magistrado, Ex-Membro da Assembla Provincial // do Rio de Janeiro e Chefe de Seco // da Secretaria de Estado dos Negocios da Agricultura, // Commercio e Obras Publicas // Rio de Janeiro // Imprensa Nacional // 1885. Abaixo (Frontispcio 9) vemos que Jos Pereira Rego, alm de mdico, fez parte do Conselho Fiscal do Instituto de Agricultura, foi sciocorrespondente do Instituto Histrico e Geogrfico Brasileiro e participou da Sociedade Auxiliadora da Indstria Nacional, demonstrando tambm o quanto se tratava de uma pessoa com mltiplas atuaes. Alencastro (1998, p. 73 e 77) afirma que esse autor foi pioneiro da medicina tropical e do sanitarismo no Imprio, alm disso era redator-chefe da principal revista mdica do pas. A anlise desses dados parece confirmar a observao de Schwarcz (1993, p. 37):reduzida, essa elite ilustrada acabava circulando pelos diferentes centros e estabelecendo relaes de intercmbio cultural, perfil comum que lhes garantia, de um lado, certo reconhecimento, de outro, certa polivalncia, que nesse caso encobria a parca especializao, ou mesmo a frgil delimitao das reas de saber.

Frontispcio 9 Esboo Historico // das // Epidemias // que tem grassado // na // Cidade do Rio de Janeiro // desde // 1830 a 1870 // pelo Dr. Jos Pereira Rego // Do Conselho de S.M. o Imperador, Medico da Imperial Camara, Commendador das ordens de Nosso Senhor Jesus Christo // e Imperial da Rosa, Presidente da Academia Imperial de Medicina do // Rio de Janeiro e da Junta Central de Hygiene Publica, Inspetor de Saude do Porto, Membro do Conselho Fiscal do // Imperial Instituto Fluminense de Agricultura, // Socio Correspondente do Instituto Historico e Geographico Brasileiro // e da Sociedade Medico-Cirurgica de Turim, // effectivo da Sociedade

Episteme, Porto Alegre, v. 11, n. 23, p. 117-149, jan./jun. 2006.

131

Auxiliadora da Industria Nacional, etc., etc. // Publicado no Diario Official do Imperio do Brasil em // Dezembro de 1871 e Janeiro de 1872. // Rio de Janeiro. // Typographia Nacional. // 1872. Embora o exame das publicaes leve-nos a reconstruir uma imagem de autores pouco especializados na segunda metade do sculo XIX, S (2001) afirma que(...) a institucionalizao de disciplinas ligadas histria natural, como a zoologia, a botnica, a geologia e a arqueologia, na poca, contribuiu para que animosidades surgissem entre os que se consideravam cientistas profissionais e os amadores.

Segundo ela, Barbosa Rodrigues, que acabou sendo reconhecido como um dos maiores botnicos brasileiros, era, no incio de sua carreira (dcada de 1870), considerado amador, pelos que se julgavam profissionais, entre eles, Ladislau Netto. Mas justamente Barbosa Rodrigues que exemplifica o incio de um processo de especializao dos autores brasileiros, pois encontramos onze publicaes suas na rea da Botnica, embora ele tambm publicasse em outras reas. Encontramos quatro publicaes na rea da Etnografia, trs na da Arqueologia (como o Frontispcio 11) e trs na da Literatura. Sua formao tambm no chega a apoiar a idia de consider-lo um especialista em Botnica, pois ele era graduado em engenharia, curso que apresentava os contedos de cincias fsicas e naturais apenas como acessrios (CUNHA, 1980, p. 95). A afirmao de S (2001) de que Barbosa Rodrigues era um autodidata nas reas da etnografia, lingstica, arqueologia, indigenismo, qumica, farmcia e at mesmo em botnica, ilustra o quanto esse cientista que veio a ser reconhecido como um dos maiores botnicos brasileiros, viveu pessoalmente um processo de especializao a partir de um contexto de formao e atuao de cunho universalista. Arthur Montenegro tambm parece ser um autor mais especializado, apresentando no Frontispcio de sua obra, na rea de Geografia (Frontispcio 10), sua filiao a diferentes associaes cientficas, exclusivamente nas reas de Geografia, Histria e Arqueologia. Mas, nesse ltimo caso, a prpria composio das associaes incluindo trs reas indica uma classificao fraca, embora os nomes prprios dessas reas sugiram processos de delimitao de fronteiras entre elas e, portanto, de desenvolvimento de singularidades.

132

Episteme, Porto Alegre, v. 11, n. 23, p. 117-149, jan./jun. 2006.

Frontispcio 10 Notas // Para A // Carta Geographica // Do // Rio Grande do Sul // Por // J. Arthur Montenegro // Natural do Estado do Cear // Membro do Instituto Historico e Geographico Brazileiro, do Instituto Geographico // e Archeologico de Pernambuco, da Sociedade de Geographia do // Rio de Janeiro, do Instituto Geographico e Historico da Bahia, da Sociedade de Geographia de Lisboa // Rio Grande // 1895 // Officinas a vapor da Livraria Americana // Carlos Pinto & C. Successores. Em resumo, podemos afirmar que a abrangncia da atuao dos autores das publicaes estava relacionada, em parte, ao fato das prticas cientficas, ainda incipientes, estarem praticamente restritas ao pequeno crculo da corte, durante o Segundo Reinado e a uma diminuta classe mdia urbana no incio da Repblica.

AS CINCIAS NO BRASIL IMPERIAL EM TRANSIO PARA A REPBLICA

As atividades cientficas, at a independncia, em 1822, estiveram praticamente restritas s atividades de naturalistas estrangeiros que buscavam descrever a fauna, a flora, os minerais e os habitantes do pas (SCHWARTZMAN, 2001, p. 64). A segunda metade do sculo XIX foi um perodo de consolidao poltica e crescente expanso econmica e demogrfica (ibid., p. 61). A partir de 1850, com o fim do trfico de escravos, houve disponibilidade de capitais, os quais foram redirecionados para investimentos em infra-estrutura. De 1854 a 1858, foram estabelecidas estradas de ferro, linhas telegrficas e de navegao, iluminao a gs nas cidades e comeou a crescer o nmero de estabelecimentos de instruo (SCHWARCZ, 2000, p. 102). Por outro lado, em 1850 ocorreu a primeira grande epidemia de febre amarela na capital do Imprio (CARVALHO, 1988, p. 19). S (2001) acredita que a segunda metade do sculo XIX caracterizou-se pela afirmao da comunidade cientfica nacional, evidenciada pela criao, em 1850, da Sociedade Vellosiana, que tinha por objetivo desenvolver estudos na rea da histria natural, considerando os saberes indgenas. O Dicionrio de Botnica, citado no incio deste artigo, na parte intitulada Classificaes de conhecimentos nas publicaes, foi revisto por uma comisso da Sociedade Vellosiana e Caminho (Frontispcio 3) era membro dessa sociedade.Episteme, Porto Alegre, v. 11, n. 23, p. 117-149, jan./jun. 2006.

133

Entre 1859 e 1861, a primeira Comisso Cientfica de Explorao do Imprio foi organizada pelo Instituto Histrico e Geogrfico Brasileiro (IHGB) com a participao de naturalistas do Museu Nacional, tendo por objetivo inventariar as riquezas do pas (S, 2001). A partir de 1862, o Brasil passou a participar de Exposies Universais que tinham o objetivo de apresentar os feitos tecnolgicos e industriais das naes capitalistas (SCHWARCZ, 2000, p. 17 e 393). Encontramos as seguintes publicaes referentes a essas exposies: Breve noticia sobre colleo das madeiras do Brasil apresentada na Exposio Internacional de 1867, por Freire Allemo, Custodio Alves Serro, Ladislau Netto e Saldanha da Gama; Relatorio sobre a Exposio Universal de Vienna DAustria em 1873, de Saldanha da Gama e Ensaio de Indice Geral das Madeiras do Brazil, de 1877, dos engenheiros Andr e Jos Rebouas. No Frontispcio da ltima, mencionado que o Brasil foi reconhecido o pas mais rico em madeiras de construo em trs Exposies Universais. A participao brasileira nessas exposies visava construir uma imagem de nao moderna, mas apesar dos esforos para divulgar a indstria e a civilizao brasileira, o que agradava, no exterior, era o carter agrrio e extico do pas e a exuberncia das florestas, sendo os prmios limitados ao caf, madeiras, acar, fumo e cermica marajoara (SCHWARCZ, 2000, p. 395 e 398). Schwarcz (2000, p. 139 e 140) acredita que o desenvolvimento das cincias, no segundo reinado (1840-1889) esteve atrelado a uma poltica cultural palaciana protagonizada principalmente pelas elites cariocas, diferentemente do caso alemo, conforme descrito por Norbert Elias. Elias (1994, p. 29) defende que o desenvolvimento das cincias, na Alemanha, esteve associado principalmente s classes mdias burguesas que procuraram estabelecer um contraste entre suas realizaes culturais e as boas maneiras superficiais da corte dirigente.(...) o contraste entre a nobreza cortes, que usava predominantemente a lngua francesa e era civilizada segundo o modelo francs, e um estrato de intelligentsia de classe mdia que falava alemo, recrutado principalmente entre os servidores dos prncipes, burgueses ou funcionrios pblicos no sentido mais amplo, e ocasionalmente tambm em meio nobreza proprietria de terras. Esta intelligentsia constitua um estrato muito distante da atividade poltica, mal pensava em termos polticos, e apenas experimentalmente em termos nacionais; sua legitimao consistia principalmente em suas realizaes 134Episteme, Porto Alegre, v. 11, n. 23, p. 117-149, jan./jun. 2006.

intelectuais, cientficas ou artsticas. Em contraposio a ela h uma classe superior que nada realiza, no sentido em que as outras o fazem, mas para cuja auto-imagem e autojustificao a modelagem de seu comportamento caracterstico e diferente fundamental. (...) E na polmica entre o estrato de intelligentsia alem de classe mdia e a etiqueta da classe cortes, superior e governante, que se origina o contraste entre Kultur e Zivilisation na Alemanha. (ELIAS, 1994, p. 28)

No Brasil, diferentemente, o desenvolvimento das cincias foi impulsionado pelo prprio imperador Pedro II. A reduzida classe mdia urbana da poca, decorrente de uma economia agrria e extrativista, tinha como resultado a ausncia de um movimento social profundo que pudesse ver nas realizaes intelectuais instrumento de afirmao social. Assim as iniciativas que estimularam os estudos cientficos, partiram do governo com o intuito de formar indivduos qualificados para administrar os assuntos do Estado e descobrir novas riquezas (SCHWARTZMAN, 2001, p. 59 e 86). As marcas do imprio aparecem nas folhas de rosto das publicaes, por exemplo Caminho, Peckolt e Pereira Rego ostentam as insgnias da Ordem da Rosa (Frontispcios 3, 6 e 9). O ltimo tambm refere a Ordem de Cristo.12 Pereira Rego (Frontispcio 9) era membro do Conselho do Imperador e, segundo Alencastro (1998, p. 77) recebeu o ttulo de Baro13 do Lavradio. Carvalho (1988, p. 107 e 109) demonstra que os conselheiros eram escolhidos pelo Imperador, quase sempre depois de longo aprendizado em vrios postos da administrao e da representao poltica, pois o Conselho tinha grande influncia na atuao do executivo. Outro autor vinculado ao Imprio Barbosa Rodrigues que apresenta, na folha de rosto 11, seus ttulos de cavalheiro. S (2001) afirma que ele foi o primeiro naturalista brasileiro financiado pelo governo, entre 1872 e 1875, para percorrer o Vale do Amazonas, como encarregado do Ministrio da Agricultura com o compromisso de fazer levantamento taxionmico das palmeiras a fim de completar e corrigir os estudos de Martius (realizados entre12

A Ordem de Cristo era a mais forte das ordens religiosas-militares de Portugal, desempenhando papel central na reconquista do territrio aos mouros e no controle do estado durante muitos sculos. O Marques de Pombal, nomeado ministro de Portugal em 1750, teria procurado aumentar o poder e o prestgio de comerciantes introduzindo-os na Ordem de Cristo (CUNHA, 1980, p. 28-9 e nota 20, p. 74). A Ordem da Rosa foi instituda em 1829 para comemorar o casamento de D. Pedro I com D. Amlia de Leuchtenberg. D. Pedro II entregou insgnias das Ordens de Cristo e da Rosa aos artistas de maior destaque (SCHWARCZ, 2000, p. 145).13 Os ttulos de bares eram destinados aos grandes proprietrios rurais (CARVALHO, 1988, p. 20).

Episteme, Porto Alegre, v. 11, n. 23, p. 117-149, jan./jun. 2006.

135

1823-53). Encontramos dados relativos a essa viagem na Revista do Museu Botnico do Amazonas, Vellosia, em 1892, e tambm na obra Sertum Palmarum Brasiliensium, publicada em Bruxelas em 1903. Frontispcio 11 O // Muyrakyt e os Idolos Symbolicos // Estudo da Origem Asiatica da Civilizao do Amazonas nos Tempos // Prehistoricos // Por // J. Barboza Rodrigues // Director do Jardim Botanico do Rio de Janeiro // Ex- Director do Museu Botanico do Amazonas, Cavalheiro da Antiga, Nobilissima e // Esclarecida Ordem de S. Thiago da Espada e da Ordem Equestre da Cora // Da Italia, Membro do Instituto Hist. Geogr. E Ethnogr. do Brazil, do // Inst. Archeol. de Pernambuco, do Inst. Pharm. Do Rio de // Janeiro, da Academia Cearense, da Real Soc. Anthrop. E Ethnol. de Florena, da Academia Real de // Sciencias de Lisboa. Do Inst. de Coimbra, da Soc. dos Naturalistas de Freiburgo da Imp. E // Real Soc. Bot. de Vienna, da Real Soc. Bot. de Edimburgo, da Soc. Bot. de Marseille, das Soc. de Geogr, de Paris, e do Rio de Janeiro, Laureado // Pelo Inst. De Sciencias Phys. e Nat. de Florena e pela Academia Nacional de Paris, etc. // Segunda Edio Muito Augmentada // 1 Volume // Rio de Janeiro // Imprensa Nacional // 1899.

Outras marcas do Imprio aparecem, no Frontispcio 3, obra premiada14 pelo Governo. Consta tambm que o autor foi Primeiro cirurgio da Armada Brasileira, condecorado com medalhas de campanha, provavelmente no perodo de guerra com o Paraguai, entre 1864 e 1870. No Frontispcio 1, aparece que a obra foi impressa por ordem do imperador. O autor Emmanuel Liais foi nomeado diretor do Observatrio Imperial do Rio de Janeiro, em 1870, depois de participar da expedio francesa que veio observar o eclipse solar de 1858 (SCHWARTZMAN, nota 14, p. 101). Observamos tambm dedicatrias ao Imperador. Chartier (1999, p. 47) demonstra que as dedicatrias eram feitas aos protetores dos autores, de quem se esperava apoio e recompensa. Um exemplo aparece na segunda folha de rosto da obra sobre orqudeas, publicada em 1881, por Barbosa Rodrigues

14

Entre 1842 e 1844, d. Pedro II instituiu prmios destinados aos melhores trabalhos apresentados no IHGB (SCHWARCZ, 1998, p. 127).

136

Episteme, Porto Alegre, v. 11, n. 23, p. 117-149, jan./jun. 2006.

Homenagem S.M.I. O Senhor D. Pedro II Imperador constitucional e defensor perpetuo do Brasil Protetor das Sciencias, S (2001) refere que, em 1871, quando da apresentao dessa obra sociedade cientfica brasileira, o autor enviou carta ao imperador, solicitando proteo imperial e permisso para dedicar sua obra a ele. Ele era, na poca, professor de desenho do Colgio Pedro II e desconhecido dos botnicos, tendo sido essa obra, objeto de desconfianas e polmicas o que teria produzido o atraso de sua publicao. Um outro exemplo a dedicatria encontrada no Projecto de estabelecimento de uma Estrada de Ferro de Santa Catharina a Porto Alegre, editado em 1869 pelo Engenheiro Sebastio Antonio Rodrigues Braga, empresrio da iluminao a gs. At aqui exemplificamos os vnculos entre os autores e o ImperadorMecenas, mas Carvalho (1988, p. 42) demonstra que apesar do interesse do Imperador pela educao e pela cincia, os gastos nestas reas foram muito modestos. Muitas publicaes ocorreram no perodo de transio do Imprio para a Repblica, fazendo-se necessrio comentar brevemente a mudana de regime. O poder de D. Pedro II, apresentava fragilidades, no havendo um suporte administrativo capaz de atingir toda a extenso do territrio nacional. Somouse a isso a perda progressiva do apoio das elites agrrias, quando o Imprio passou a contrariar seus interesses atravs da adoo de medidas abolicionistas (ibid., p. 78-79 e 163). Assim o movimento republicano que atraa, inicialmente, a classe mdia e os estudantes das elites, passou a interessar aos cafeicultores paulistas, os quais tiveram um papel importante na queda do Imprio e durante a Primeira Repblica. Alm disso, os oficiais militares, desde o fim da guerra do Paraguai, em 1870, tambm tornaram-se republicanos (CUNHA, 1980, p. 136-7 e SCHWARTZMAN, 2001, p. 95). Das 72 publicaes examinadas para este estudo, 37 ocorreram no perodo imperial, de 1862 a 1889, e 35 aps o golpe militar que instituiu a repblica, no sendo possvel, a partir desses dados, saber se os investimentos nas cincias foram ou no ampliados com a mudana de regime.

OS MUSEUS E OS INSTITUTOS HISTRICOS E GEOGRFICOS

O Museu Nacional O Museu Real, depois Museu Imperial e, finalmente, Museu Nacional foi criado com o objetivo de instituir um espao para o estudo das cincias

Episteme, Porto Alegre, v. 11, n. 23, p. 117-149, jan./jun. 2006.

137

naturais que pudessem ser teis para o comrcio, a indstria e as artes15 (SCHWARTZMAN, 2001, Nota 13, p. 67). Depois da Independncia, o Museu passou a receber doaes de naturalistas estrangeiros, sendo que alguns deles percorreram o interior do pas comissionados por esta instituio (SCHWARTZMAN, 2001, p. 68). s a partir das administraes de Ladislau Netto (1874-93) e de Batista Lacerda (1895-1915) que o estabelecimento se estrutura segundo os moldes dos grandes centros europeus. Em 1876, o museu reorganizado, assim como criada uma revista trimestral os Archivos do Museu Nacional necessria para a comunicao e permuta com os museus do estrangeiro. (SCHWARCZ, 1993, p. 71)

A partir da dcada de 1880, o museu pela atuao forte de seu diretor, aparelhou-se e contratou profissionais, atravs de seleo rigorosa, o que o diferenciava de outras instituies de ensino e de pesquisa brasileiras. Alm disso, o Museu Nacional e os museus regionais dialogavam principalmente com as instituies estrangeiras (SCHWARCZ, 1993, p. 71). Acreditamos que o Museu Nacional fosse uma espcie de Centro de Pesquisa de cunho universalista com uma estrutura subdividida em sees que correspondiam a reas que estavam se desenvolvendo como singularidades. Processos de afirmao de singularidades podem ser inferidos, em parte, pela anlise da transformao das denominaes das sees do Museu, de 1861 para 1876, publicada no Almanak Laemmert. A primeira seo, de 1861, era assim denominada Mineralogia, geologia e cincias fsicas; j em 1876, passou a ser Cincias fsicas, mineralogia, geologia e paleontologia geral. A inverso da ordem das cincias, na nomenclatura, pode indicar uma preocupao em apresentar uma cincia geral, seguida de especializaes. J a terceira seo, que em 1861, era Botnica, agricultura e artes mecnicas e, em 1876, passou a ser Botnica geral e aplicada e paleontologia vegetal, diminuiu, aparentemente, a nfase na aplicao econmica, tornandose mais acadmica, o que evidenciado pelo desaparecimento dos termos agricultura e artes mecnicas, na segunda denominao. Em trs sees tambm se observou a incorporao da paleontologia, a partir de 1876, talvez por influncia das relaes estabelecidas com o Museu

15 Resqucio do termo artes discutido na parte Classificaes de conhecimentos nas publicaes.

138

Episteme, Porto Alegre, v. 11, n. 23, p. 117-149, jan./jun. 2006.

de Histria Natural de Buenos Aires, onde havia fsseis da Amrica (LOPES, 1997). A incluso da paleontologia pode indicar a consolidao dessa rea, mas, sua diluio em trs sees tambm sugere que ela estaria sendo considerada uma cincia auxiliar das outras, possivelmente melhor estabelecidas localmente. A segunda seo, de 1861, era Anatomia comparada e zoologia e, em 1876, passou a ser Antropologia, zoologia geral e aplicada, anatomia comparada e paleontologia animal. Nesse caso, apesar da zoologia ter sido subdividida em geral e aplicada, o que poderia nos levar a pensar na consolidao dessa singularidade, houve a incluso dos estudos sobre populaes humanas na mesma seo, o que parece indicar uma resistncia ao estabelecimento de fronteiras entre as reas de antropologia e zoologia, sugerindo uma classificao ainda fraca. Aparentemente examinava-se a paisagem natural e a humana com o mesmo olhar o que tambm pode ser verificado em publicaes de naturalistas, como, por exemplo, na folha de rosto 1 e no livro traduzido por Anstett.16 Segundo Schwarcz (1993, p. 67, 72, 81, 83 e 98), a etnografia e a antropologia, nos museus brasileiros, constituam ramos das cincias biolgicas e naturais. A autora exemplifica com a revista do Museu Paulista, dirigido pelo zologo von Inhering, onde alguns temas antropolgicos apareciam em meio a artigos sobre a flora e a fauna locais. Por fim, a quarta seo de 1861 Numismtica, artes liberais, arqueologia, usos e costumes das Naes Modernas, foi extinta em 1876, sendo restabelecida como seo anexa, em 1877, com a seguinte denominao Numismtica, Arqueologia e Etnografia. O fato de essa seo ter se tornado anexa pode indicar sua perda de importncia relativamente s demais. Observase tambm o desaparecimento das expresses artes liberais e usos e costumes... e a adoo do nome especfico Etnografia o que sugere que essa rea estava buscando consolidar-se como singularidade. Cabe ainda mencionar que, em 1880, foi criado como anexo ao Museu Nacional, o Laboratrio de Fisiologia Experimental (SCHWARTZMAN, 2001, p. 70), o que tambm pode ser indicador do surgimento de uma singularidade. Parece que a pesquisa esteve durante um certo perodo praticamente restrita ao Museu Nacional ou fortemente centralizada nessa instituio, de onde alguns personagens saram para fundar ou ocupar cargos em outras instituies. Esse foi o caso de Custdio Alves Serro que ocupou os cargos de

16

Ver nos Caminhos da Investigao.

Episteme, Porto Alegre, v. 11, n. 23, p. 117-149, jan./jun. 2006.

139

Diretor do Museu Nacional (de 1821 a 184717) e da Seo de Mineralogia, Geologia e Cincias Fsicas, de acordo com documento de 1844 do Almanak Laemmert, antes de ser Diretor do Jardim Botnico do Rio de Janeiro, de 1859 a 1861.18 O mesmo ocorreu com Herman von Ihering e Emlio Goeldi que foram naturalistas do Museu Nacional antes de assumirem, em 1893, os cargos de diretores do Museu de So Paulo e do Museu do Par, respectivamente (SCHWARCZ, 1993, p. 79 e 85). A criao de instituies ligadas s cincias estava associada no s aos interesses da corte imperial, mas tambm aos das elites agrrias regionais. Assim, o Museu Paulista teria sido criado tendo entre seus objetivos o de destacar a elite cafeeira local e o Museu Paraense seria um dos smbolos da pujana da borracha tambm para exaltao da elite local (ibid., p. 90). Encontramos, at 1901, quatro nmeros do Boletim do Museu Paraense de Historia Natural e Ethnographia, incluindo o primeiro, de 1897. O IHGB, a histria oficial e os temas indgenas O Instituto Histrico e Geogrfico Brasileiro (o IHGB) tambm acolheu iniciativas ligadas s cincias, a partir dos anos 1850. Encontramos quatro autores filiados a esse Instituto: Barbosa Rodrigues; Pereira Rego; Arthur Montenegro e o Baro de Santa-Anna Nery. O IHGB foi criado, em 1838, tendo como modelo o Institut Historique, fundado em Paris em 1834, e a Academia Real de Cincias,19 fundada em Lisboa, em 1779 (SCHWARCZ, 2000, p. 126 e Nota 3, p. 575). A fundao do IHGB foi uma iniciativa de integrantes da Sociedade Auxiliadora da Industria Nacional, criada em 1827. No Instituto, dos 27 scios-fundadores, 22 ocupavam posies de destaque na hierarquia interna do Estado brasileiro: conselheiros, senadores, procuradores, desembargadores (id., 1993, p. 101-2). Em um contexto de consolidao do estado nacional, marcado por disputas regionais, o IHGB tinha por funo:(...) construir uma histria da nao, recriar um passado, solidificar mitos de fundao, ordenar fatos buscando homogeneidade em personagens e eventos at ento dispersos. (SCHWARCZ, 1993, p. 99)

17 18 19

SCHWARCZ (1993, Nota 5, p. 258). Fonte: www.jbrj.gov.br Localizamos as Memorias da Academia Real das Sciencias de Lisboa, de 1797 a 1881.

140

Episteme, Porto Alegre, v. 11, n. 23, p. 117-149, jan./jun. 2006.

Mas apesar do compromisso do IHGB com a produo de uma histria oficial, ligada aos interesses da elite dominante, sua produo inaugurou uma preocupao com o rigor documental.O incentivo e o financiamento para a coleta de documentos da histria nacional, a realizao de concursos, a promoo de congressos e organizao de expedies pelo interior do pas e no estrangeiro especialmente nos arquivos espanhis e portugueses so alguns exemplos. (Ibid., p. 108)

O Instituto era um estabelecimento dedicado s letras brasileiras as quais pareciam incluir literatura, histria, etnografia, arqueologia, pintura e cincias naturais, demonstrando o quanto a classificao dessas reas era fraca nessa instituio. No IHGB no havia diviso apurada do trabalho intelectual, sendo a cincia e as artes igualmente importantes para o ideal romntico construdo a partir da independncia do pas. Buscava-se afirmar a universalidade da cultura brasileira, mas tambm o seu particularismo, criando uma identidade nacional, em contraste com a metrpole, mais associada tradio clssica. Para tanto, recorria-se natureza exuberante e ao ndio (SCHWARCZ, 1993, p. 102-3 e 2000, p. 128).Por oposio ao negro que lembrava a escravido, o indgena permitia indicar uma origem mtica e unificadora. A natureza brasileira tambm cumpriu funo paralela. Se no tnhamos castelos medievais, templos da Antigidade ou batalhas hericas para lembrar, possuamos o maior dos rios, a mais bela vegetao. (Id., 2000, p. 140)

O indianismo seria, sobretudo, uma forma de obscurecer a escravido20 no pas. O comrcio de escravos colocava o Brasil entre as naes brbaras imagem inadequada feio civilizada que o imprio brasileiro procurava passar (ibid., p. 101, 126, 137 e 142).(...) os grupos indgenas, to afastados da corte e dizimados de forma bastante sistemtica, eram convertidos, porm, em smbolo da monarquia.

Entre 1841 e 1850, 83% do total de africanos transportados para a Amrica viriam para o Brasil (SCHWARCZ, 2000, p. 102).

20

Episteme, Porto Alegre, v. 11, n. 23, p. 117-149, jan./jun. 2006.

141

Distantes enquanto realidade, ganhavam vida na representao: nos quadros e alegorias, nas esculturas e nos ttulos de nobreza. (SCHWARCZ, 2000, p. 13)

O tema indgena tambm esteve presente nas cincias. Encontramos21 publicaes que tratam de antropologia, etnografia, arqueologia e lngua indgena e quatro que apresentam plantas medicinais conhecidas pelos ndios (como no Frontispcio 2). No livro traduzido por Anstett, por exemplo, consta um trabalho de Martius sobre o passado e o futuro da Raa Americana, outro exemplo consta na folha de rosto 11. Encontramos tambm uma reedio do Vocabulrio das Palavras Guaranis Usadas pelo Traductor da Conquista Espiritual, Padre Ruiz Montoya, e a produo de um vocabulrio indgena, por Barbosa Rodrigues, ambos publicados nos Annaes da Bibliotheca Nacional, em 1879 e 1894, respectivamente. Os antigos dicionrios de nossas lnguas nativas feitos pelos jesutas passaram a ser estimados pelos intelectuais que desejavam selecionar termos a serem includos em seus poemas (ibid., p. 131). Localizamos na Biblioteca Central uma edio de 1908 da Revista do IHGB, que inclua o primeiro nmero de 1839 (63 tomos at 1900). Nessa revista constam informaes sobre populaes indgenas e fundaes de cidades. Encontramos tambm peridicos vinculados a alguns dos institutos regionais como a Revista da Sociedade de Geographia do Rio de Janeiro21 (13 tomos de 1885 a 1901), na qual aparecem textos sobre extenso territorial, limites e hidrografia. Na Revista do Instituto Archeologico e Geographico de Pernambucano (32 nmeros de 1886 a 1900) so encontradas descries de capitanias, rios, ilhas, fortes, conventos, igrejas, tribunais, riquezas, costumes indgenas (tapuias) e relatos sobre a presena holandesa no sculo XVII. Barbosa Rodrigues e Arthur Montenegro faziam parte dessas duas associaes. Encontramos 14 tomos, de 1887 a 1899, da Revista Trimensal do Instituto do Cear. Nessa revista aparecem os objetivos de conhecer a histria e a geografia da provncia e concorrer para o desenvolvimento das letras e das cincias. Constam, nesse veculo de informao, atas e trabalhos dos scios, por exemplo Origens Americanas Inmigraes Prehistoricas, de J. Catunda; Vocabulario Indigena de Paulino Nogueira com descries de plantas e indicaes teraputicas; As evolues do clima de J. Catunda. Por fim,

21

Criada em 1883.

142

Episteme, Porto Alegre, v. 11, n. 23, p. 117-149, jan./jun. 2006.

localizamos seis volumes (at o nmero 19), de 1894 a 1899, da Revista Trimensal do Instituto Geographico e Historico da Bahia, a qual abarca, como as demais, temas ligados geografia, histria, arqueologia, etnografia e lnguas indgenas. De acordo com Schwarcz (1993, p. 100-1, 110, 118-9, 124, 128 e 132), nos Institutos Histricos e Geogrficos, os critrios de seleo de seus membros no seguia padres de produo intelectual, cientfica ou acadmica, mas principalmente determinantes sociais e relaes pessoais. Nas revistas desses Institutos predominariam os artigos de Histria (quase 50%), havendo uma repetio de temas principalmente do perodo colonial, como a Invaso Holandesa, no caso de Pernambuco, e o Mito Bandeirante, no caso de So Paulo. Os textos de geografia, segundo ela, perfaziam aproximadamente 18% do total de artigos das revistas, tratando de questes territoriais e de limites. Alm disso, uma parte dos textos das revistas (aproximadamente 16%) seria destinada s biografias no s de vultos da histria brasileira, mas tambm dos prprios scios dos Institutos. Nos institutos regionais, tanto a histria quanto a geografia seriam locais, visando a reificar a imagem das elites agrrias nos contextos da poltica imperial e da repblica Velha. Cada instituto defenderia a sua viso provincial da histria oficial.

A ORGANIZAO HISTRICA DO ENSINO

Antes de apresentar a situao do ensino superior, no sculo dezenove, caracterizaremos brevemente a situao anterior, buscando compreender tendncias de longo prazo. No perodo colonial, o ensino brasileiro seguia o padro da metrpole portuguesa dominada pela ordem dos jesutas. Durkheim (1995 [1938], p. 224-225) mostra que em 1584, quando os jesutas j educavam h 30 anos na Europa, foi concebido o plano de reunir, coordenar e fixar os resultados da experincia adquirida em um regulamento para todos os colgios: a Ratio studiorum. Esse regulamento foi definitivamente adotado em 1599, sendo observado, sem grandes variaes, at 1832, quando foram feitas alteraes principalmente em relao filosofia. O ensino jesuta tratava o homem e a histria antiga como universais e abstratos (ibid., p. 255). E essa uma das possveis origens da tendncia ao universalismo dos autores das publicaes, no Brasil, ainda no final do sculo XIX. Schwartzman (2001, p. 64) afirma que at a segunda metade do sculo XIX, a educao brasileira ainda no ultrapassava o equivalente escolaEpisteme, Porto Alegre, v. 11, n. 23, p. 117-149, jan./jun. 2006.

143

secundria porque a Coroa Portuguesa proibia a instalao de universidades. Entretanto, para Cunha (1980, p. 13 e 14), o ensino de filosofia, teologia e matemtica no Colgio da Bahia, e em outros estabelecimentos jesutas coloniais poderiam ser considerados superiores.Nos colgios jesutas do Brasil havia quatro graus de ensino, sucessivos e propeduticos: o curso elementar, o curso de humanidades, o curso de artes e o curso de teologia. Todos os 17 colgios fundados pelos jesutas no Brasil colnia tinham cursos elementares; um nmero menor oferecia cursos de humanidades e apenas oito tinham cursos de artes, oferecendo, tambm total ou parcialmente, cursos de teologia. No curso de artes, tambm chamado de curso de cincias naturais ou curso de filosofia, ensinava-se, durante trs anos, lgica, fsica, matemtica, tica e metafsica. Aristteles era como em todos os colgios, o principal autor estudado. Esse curso conferia os graus de bacharel e licenciado. (Ibid., p. 27-8)

A Faculdade de Artes, nas universidades europias, era um rgo de cultura geral e, na perspectiva de Durkheim (op. cit., p. 100), exerceria um papel semelhante ao do ensino secundrio, sendo uma espcie de escola preparatria para as principais profisses da poca: Medicina e Direito e tambm para o sacerdcio (SCHWARTZMAN, 2001, p. 35). O lugar das cincias nos currculos Durkheim (1995 [1938], p. 51-53) em sua anlise sobre o sistema educacional francs, explica que o ensino jesuta estava organizado conforme o trivium e o quadrivium, as sete artes liberais, classificao que remonta aos ltimos tempos da Antigidade Clssica. O trivium (gramtica, retrica e dialtica) ensinava a pensar e a expressar-se corretamente, orientava-se para o homem. Era um ensino formal, relacionado ao raciocnio e linguagem, tambm chamado lgico. O quadrivium (geometria, aritmtica, astronomia e msica) estava relacionado s coisas, seu papel era dar a conhecer a realidade externa, o mundo. Eram as artes reales ou physica. Este ltimo era um ensino no obrigatrio, reservado a uma pequena elite de especialistas, em parte por ser considerado misterioso e mgico. O trivium e o quadrivium seriam, respectivamente, a origem das humanidades (histria e lnguas) e das cincias da natureza (matemtica, fsica, qumica e histria natural) (DURKHEIM, op. cit., p. 7, p. 52-3).144Episteme, Porto Alegre, v. 11, n. 23, p. 117-149, jan./jun. 2006.

O ensino clssico francs, seguindo o padro jesuta, foi resistente em incluir as cincias em seus planos de estudos, ainda no sculo XVIII, as quais continuavam restritas ao segundo ano de Filosofia. Ensinava-se somente matemtica e um pouco de fsica, mas nada de histria natural e de qumica (ibid., p. 250-1, 274 e 278). Provavelmente o mesmo ocorresse no ensino brasileiro colonial, uma vez que a Frana era um modelo cultural para Portugal, em meados do sculo XVIII (CUNHA, 1980, p. 119, 121 e 124). Em Portugal e tambm no Brasil, a organizao do ensino s passou por uma transformao a partir da Reforma Pombalina, na dcada de 1770.A reforma da Universidade de Coimbra, de 1770, a mais conhecida medida de reforma educacional de Pombal. s suas quatro faculdades maiores, de Teologia, Cnones, Direito e Medicina, foram acrescentadas as de Matemtica e de Filosofia, destinada esta ao ensino das cincias naturais. O conhecimento da natureza, baseado na observao, em vez de deduzido do pensamento dos sbios antigos, transformou-se na principal atividade no s da Faculdade de Filosofia, mas tambm das de Direito e de Medicina. (Ibid., p. 49-50)

Com a reforma, buscou-se adotar um novo estilo pedaggico imbudo do esprito cientfico. A Filosofia Natural deveria tratar das leis de Newton, fsica, matemtica, qumica, botnica, farmacologia e anatomia, enfocando a aplicao dos conhecimentos s indstrias, agricultura e minerao (SCHWARTZMAN, 2001, p. 49 e nota 25). Nesse contexto, entre 1783 e 1792, Alexandre Rodrigues Ferreira foi enviado ao Brasil para a sua Viagem Filosfica, com a finalidade de coletar informaes sobre os trs reinos da natureza, para uma melhor explorao dos recursos da Colnia. Localizamos uma publicao que, embora seja de 1972, refere-se Viagem Filosfica pelas Capitanias do Gro Par, Rio Negro, Mato Grosso e Cuiab no sculo XVIII. No Rio de Janeiro, entre 1776 e 1805, tambm havia ensino superior estruturado nos moldes da Reforma Pombalina, por iniciativa dos franciscanos. Havia dois cursos: Filosofia e Teologia e, em 1798, foram elaborados os estatutos do Seminrio de Olinda que tambm oferecia o curso de Filosofia. Em Olinda, os estudos de cincias naturais teriam o objetivo de preparar, principalmente os sacerdotes para serem agentes da modernizao econmica na agricultura e na minerao (CUNHA, 1980, p. 51-3; 57-8 e 60). No Brasil, a partir de 1808, os estudos de matemtica, fsica, qumica, histria natural, botnica, zoologia e mineralogia se deslocaram dos cursos deEpisteme, Porto Alegre, v. 11, n. 23, p. 117-149, jan./jun. 2006.

145

Filosofia, controlados pela Igreja, para os cursos mdicos e para a Academia Militar, e, muito mais tarde, em 1874, para a Escola Politcnica que dela se separou (ibid., p. 63, 92, 99 e 100). Caminho (Frontispcio 3), por exemplo, era professor de Botnica e Zoologia Mdica na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro quando publicou sua obra em 1877 (Frontispcio 3). Em 1808, foram criadas as cadeiras de anatomia e cirurgia no Rio de Janeiro e na Bahia (ibid., p. 91). Em 1832, os cursos transformaram-se em Faculdades de Medicina (SCHWARTZMAN, 1979, p. 69), observando-se progressivamente a transformao da medicina prtica e sintomatolgica em uma medicina mais cientfica (id., 2001, p. 84). As engenharias tiveram origem na Academia Real de Marinha (1808) e na Academia Real Militar (1810). Em 1874, os cursos de Engenharia Civil e Militar foram separados, sendo criada a Escola Politcnica do Rio de Janeiro, em conformidade com o modelo francs. Cabe destacar que essa Escola oferecia um curso denominado Artes e Manufaturas (CUNHA, 1980, p. 94 e 97 e SCHWARTZMAN, 2001, p. 76-8), provavelmente o termo artes, aqui, mantenha o sentido de saberes prticos. As cincias naturais como singularidades a partir da Filosofia Segundo Manuel Morente (1930, p. 26-8) a palavra Filosofia, a partir de Aristteles, designaria a totalidade dos conhecimentos humanos, todo o saber racional, sendo composta pela Lgica, Fsica, Metafsica e tica. A Fsica abarcaria os saberes sobre as coisas. Da Idade Mdia at o sculo XVII, a palavra Filosofia teria permanecido com o mesmo sentido do tempo de Aristteles, tendo ocorrido apenas a sua separao da Teologia. Mas, a partir de ento,(...) o campo imenso da filosofia comea a partir-se. Comeam a sair do seio da filosofia as cincias particulares, no somente porque essas cincias vo-se constituindo com seu objeto prprio, seus mtodos prprios e seus progressos prprios, como tambm porque, pouco a pouco, os cultivadores vo igualmente se especializando. (...) a partir do sculo XVIII (...) foram desprendendo-se as matemticas por um lado, a fsica por outro, a qumica, a astronomia, etc. (...) uma cincia se desprendeu do velho tronco da filosofia quando conseguiu circunscrever um pedao no imenso mbito da realidade, definilo perfeitamente e dedicar exclusivamente sua ateno a essa parte, a esse aspecto da realidade. (MORENTE, 1930, p. 29-30)

146

Episteme, Porto Alegre, v. 11, n. 23, p. 117-149, jan./jun. 2006.

Chama a ateno a proximidade dessa explicao de Morente sobre o processo de fragmentao do conhecimento, a partir da Filosofia, e o conceito de singularidade proposto por Bernstein. Portanto, poderamos resumir, empregando a conceituao de Bernstein, que as cincias desenvolveram-se como singularidades a partir da Filosofia. Mas nesse processo verificam-se permanncias como, ainda na dcada de 1920, o Departamento de Qumica pertencer Faculdade de Filosofia da Universidade de So Paulo e a Fsica Moderna ter tido incio na Faculdade de Filosofia, Cincias e Letras da mesma Universidade (SCHWARTZMAN, 2001, p. 195 e 200).

CONCLUSO

Este estudo fornece indicaes sobre o processo descontnuo de estabelecimento de singularidades, reas de conhecimentos especializadas que se individualizam por contraste com outras reas, a partir de uma origem comum, a Filosofia. As publicaes e sua relao com instituies de pesquisa e de ensino evidenciam tanto a manuteno de reas do conhecimento inespecficas que indicariam a existncia de uma classificao fraca entre elas, quanto movimentos de demarcao de fronteiras que indicariam o estabelecimento de classificaes mais fortes e, portanto, de afirmao ou consolidao de singularidades. A relao entre algumas publicaes e a criao e consolidao de instituies de pesquisa e de ensino esteve associada a interesses polticos nacionais de conhecimento do ambiente natural e das populaes nativas, explorao, ocupao, unificao e controle do territrio, durante o Imprio, e necessidade de legitimao de elites agrrias regionais, na Primeira Repblica.

AGRADECIMENTOS

Agradecemos Professora Maria Helena Degani Veit pela indicao das obras de Bernstein, Durkheim e Morente e pela leitura atenta, Profa. Anna Carolina Regner pela leitura crtica do texto e pelo incentivo, ao Prof. Roberto Martins que orientou o incio de nossas pesquisas; s bibliotecrias da UFRGS que nos facilitaram o acesso e ao CNPq, pelo apoio.

Episteme, Porto Alegre, v. 11, n. 23, p. 117-149, jan./jun. 2006.

147

REFERNCIAS BIBLIOGRFICASALENCASTRO, Luiz Felipe de. Vida Privada e Ordem Privada no Imprio. In: Histria da vida privada no Brasil: Imprio. Coordenador geral da coleo: Fernando A. Novais. Organizador do volume: Luiz Felipe Alencastro. So Paulo: Companhia das Letras, 1998. v. 2. BERNSTEIN, Basil. Pedagogy, symbolic control and identity: Theory, Research, Critique. New York: Lanham, Boulder, Oxford: Rowman & Littlefield Publishers, 2000. 229p. BORRALHO, Lusa; FORTES, Mrio. Do Jardim do den s terras de vera Cruz. Episteme, Porto Alegre, v. 11, n. 15, p. 71-93, ago./dez., 2002. BURKE, Peter. Uma histria social do conhecimento: de Gutemberg a Diderot. Traduo de Plnio Dentzien. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2003. 241p. (Ttulo Original: A Social History of Knowledge From Gutemberg to Diderot. Oxford: Polity Press em associao com Blackwell Publishers, 2000) CARVALHO, Jos Murilo de. Teatro de sombras: a poltica imperial. So Paulo: Vrtice, Editora Revista dos Tribunais; Rio de Janeiro: Instituto Universitrio de Pesquisa do Rio de Janeiro, 1988. 196p. (Formao do Brasil; 4). CHARTIER, Roger. A ordem dos livros: leitores, autores e bibliotecas na Europa entre os sculos XIV e XVIII. Traduo Mary Del Priori. 2. ed. Braslia: Editora Universidade de Braslia, 1999. 111p. (Coleo Tempos direo de Emanuel Arajo) (Ttulo Original: Lordre des livres: lecteurs, auteurs, bibliothques en Europe entre XIVe et XVIIIe sicle) CUNHA, Luiz Antnio. A universidade tempor: o ensino superior da colnia era de Vargas. Rio de Janeiro: Civilizao Brasileira, 1980. 295p. (Educao e Transformao 1). DURKHEIM, Emile. A evoluo pedaggica. Traduo: Bruno Charles Magne. Porto Alegre: Artes Mdicas, 1995. 325p. ELIAS, Norbert. O processo civilizador: uma histria dos costumes. Traduo de Ruy Jungman; reviso e apresentao, Renato Janine Ribeiro. Rio de Janeiro: Zahar Editor, 1994. 2v. v. 1. LOPES, M. M. A mesma f e o mesmo empenho em suas misses cientficas e civilizadoras: os museus brasileiros e argentinos do sculo XIX. Revista Brasileira de Histria, So Paulo, v. 21, n. 41, p. 55-76, 2001. MELLO, Evaldo Cabral. O Fim das casas-Grandes. In: Histria da vida privada no Brasil: Imprio. Coordenador geral da coleo: Fernando A. Novais. Organizador do volume: Luiz Felipe Alencastro. So Paulo: Companhia das Letras, 1998. v. 2. MORENTE, Manuel Garca. Fundamentos de filosofia I: lies preliminares. Traduo e prlogo de Guilhermo de la Cruz Coronado. 8. ed. So Paulo: Mestre Jou, 1930. 324p. (Ttulo Original: Fundamentos de Filosofia publicada em espanhol por Espasa-Calpe em Madri). S, Magali Romero. O botnico e o mecenas: Joo Barbosa Rodrigues e a cincia no Brasil na segunda metade do sculo XIX. Histria, Cincias, Sade-Manguinhos, Rio de Janeiro, v. 8 suppl., p. 899-924, 2001.

148

Episteme, Porto Alegre, v. 11, n. 23, p. 117-149, jan./jun. 2006.

SCHWARCZ, Lilia Mortitz. O espetculo das raas: cientistas, instituies e questo racial no Brasil- 1870-1930. So Paulo: Companhia das Letras, 1993. 287p. ___________. As barbas do imperador: D. Pedro II, um monarca nos trpicos. 2. ed. So Paulo: Companhia das Letras, 2000. 623p. SCHWARTZMAN, Simon. Formao da comunidade cientfica no Brasil. So Paulo: Ed. Nacional Financiadora de Estudos e Projetos, 1979. ___________. Um espao para a cincia: a formao da comunidade cientfica no Brasil. Traduo de Srgio Bath e Oswaldo Biato. Braslia: Ministrio da Cincia e Tecnologia, Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico, Centro de Estudos Estratgicos, 2001. 357p. (Brasil, Cincia e Tecnologia; 1) Dados obtidos atravs de consultas via internet: http://www.crl.edu/content/almanak2.htm Brazilian Government Document Digitization Project Almanak Laemmert (1844-1889) www.jbrj.gov.br Site do Jardim Botnico do Rio de Janeiro

Episteme, Porto Alegre, v. 11, n. 23, p. 117-149, jan./jun. 2006.

149

150