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Q Q u u a a l l i i d d a a d d e e e e m m C C o o n n t t e e x x t t o o d d e e C C r r e e c c h h e e : : I I d d e e i i a a s s e e P P r r á á t t i i c c a a s s Sílvia Araújo de Barros Dissertação apresentada na Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto, para obtenção do grau de Doutora em Psicologia. O estudo aqui apresentado foi subsidiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (referência BD/10721/2002). Orientadores: Professor Doutor Joaquim Bairrão e Professora Doutora Teresa Barreiros Leal 2007

Qualidade em Contexto de Creche: Ideias e Práticas · qualidade das salas de creche do que os pais e do que os responsáveis pelas salas de creche. Os resultados obtidos sugerem

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QQuuaalliiddaaddee eemm CCoonntteexxttoo ddee CCrreecchhee::

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SSííllvviiaa AArraaúújjoo ddee BBaarrrrooss

Dissertação apresentada na Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do

Porto, para obtenção do grau de Doutora em Psicologia.

O estudo aqui apresentado foi subsidiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia

(referência BD/10721/2002).

OOrriieennttaaddoorreess:: PPrrooffeessssoorr DDoouuttoorr JJooaaqquuiimm BBaaiirrrrããoo ee PPrrooffeessssoorraa DDoouuttoorraa TTeerreessaa BBaarrrreeiirrooss LLeeaall

22000077

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RESUMO

Este trabalho teve como objectivo geral contribuir para o estudo da qualidade das creches em

Portugal, tendo em conta que poucas investigações têm centrado a sua atenção neste contexto de

educação e desenvolvimento das crianças com menos de 3 anos de idade.

Participaram neste estudo 160 salas de creche do distrito do Porto, 110 responsáveis pelas

salas de creche (educador de infância ou auxiliar de educação) e 110 pais (pai ou mãe). Pretendia-se

(1) estudar as características métricas dos dados recolhidos através do instrumento de avaliação da

qualidade Escala de Avaliação do Ambiente de Creche - Edição Revista (ITERS-R), (2) descrever a

qualidade das salas de creche do distrito do Porto, (3) identificar as características da creche

valorizadas por pais e por educadores de infância/auxiliares de educação, (4) determinar a avaliação

que os pais e os educadores de infância/auxiliares de educação fazem das creches e (5) comparar a

avaliação efectuada por pais, por educadores de infância/auxiliares de educação e por observadores

externos. Para além da ITERS-R, que permite avaliar a qualidade do ambiente de creche, foram

utilizados: uma medida do envolvimento do grupo de crianças, uma grelha para registo de

características estruturais da sala, guiões de entrevistas semi-estruturadas para pais e para

educadores e questionários para pais e para educadores.

De acordo com os resultados obtidos, (1) a ITERS-R permite a obtenção de dados fidedignos

e válidos, (2) as salas observadas possuem qualidade baixa, não tendo sido observadas salas de boa

qualidade, (3) os pais e os responsáveis pelas salas de creche atribuem elevada importância aos

critérios incluídos na ITERS-R, sendo os aspectos mais valorizados pelos pais e pelos responsáveis

pelas salas de creche aqueles que se relacionam com as interacções e com as rotinas, (4) os pais e

os responsáveis pelas salas de creche avaliam positivamente a creche que os filhos frequentam ou

onde trabalham, respectivamente, e (5) os observadores externos avaliam mais negativamente a

qualidade das salas de creche do que os pais e do que os responsáveis pelas salas de creche.

Os resultados obtidos sugerem a efectiva necessidade de se investir na avaliação e promoção

da qualidade em contexto de creche, na formação dos educadores de infância e dos auxiliares de

educação no que diz respeito ao trabalho com crianças com menos de 3 anos de idade e na

(in)formação dos pais, de modo a que estes sejam capazes de recolher informações relevantes e

precisas sobre as creches, quer no momento da sua escolha, quer enquanto usufruem dos serviços.

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ABSTRACT

This work's main goal has been to contribute to the study of the quality of Portuguese child care

centers, keeping in mind that few studies have been focusing their attention on this type of educational

and developmental context for toddlers.

One hundred and sixty child care classrooms from the district of Porto, 110 classroom lead

teachers (trained or non-trained teachers) and 110 parents (mother or father) participated in this study,

which intended to (1) study the metric characteristics of the data collected using the Infant/Toddler

Environment Rating Scale - Revised Edition (ITERS-R), (2) describe the quality of child care classrooms

in the district of Porto, (3) identify the child care classroom’s characteristics which parents and teachers

value the most, (4) determine how parents and teachers perceive the quality of child care centers and

(5) compare parents’, teachers’ and external observers’ ratings of child care quality. Besides ITERS-R,

which assesses child care quality, other instruments were used: a group engagement measure, a form

to register the classroom's structural characteristics, a semi-structured interview and a questionnaire for

parents and teachers.

Results indicate that (1) the ITERS-R can be used to gather valid and reliable data, (2) the

observed classrooms show low quality, and no good quality classrooms were observed, (3) parents and

teachers give high importance scores for the criteria used in ITERS-R, with higher importance scores for

interactions and routines, (4) lead teachers, as well as parents, give high quality scores to classrooms,

and (5) parents and teachers assign substantially higher quality scores to those classrooms than the

external observers do.

These results suggest a real need to invest in the evaluation and promotion of child care quality,

in the training of teachers who work with children under 3 years of age, and in the education of parents,

so that they will be able to gather the necessary and specific information that helps them choose a child

care center and intervene while using the services.

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RÉSUMÉ

Le principal objectif de la présent recherche est de contribuer à l’étude de la qualité des

crèches au Portugal, le nombre d’études menées sur ce contexte de l´éducation et de développement

des moins de 3 ans étant assez faible.

Cent soixante salles de crèche de la région de Porto, dont 110 responsables des classes

(l’assistante maternelle ou l’aide maternelle) et 110 parents (le père ou la mère) ont participé à cette

étude. On prétendait alors (1) étudier les caractéristiques métriques des données recueillies par le biais

de l’Echelle d’Evaluation de l’Environnement de la Crèche – Edition revue (ITERS-R), (2) décrire la

qualité des classes de crèche de la région de Porto, (3) identifier les caractéristiques de la crèche, telles

que perçues comme importantes par les parents et par le personnel de la crèche (l’assistante

maternelle ou l’aide maternelle), (4) connaître l’évaluation que les parents et le personnel de la crèche

(l’assistante maternelle ou l’aide maternelle) font des crèches et (5) comparer l’évaluation faite par les

parents, le personnel des crèches et par des observateurs extérieurs. Outre l’ ITERS-R, qui permet

d’évaluer la qualité de l’environnement de la crèche, ont aussi été utilisés d’autres instruments dont une

mesure de l’engagement du groupe d’enfants, une fiche d’évaluation des caractéristiques structurelles

de la salle de classe, des guides pour les interviews semi structurées conduites auprès des parents et

du personnel de la crèche, et des questionnaires qui ont été répondus par les parents et par le

personnel de la crèche .

Les résultats indiquent que (1) l’ ITERS-R permet d’obtenir des données valables et fiables,

(2) les salles observées sont de mauvaise qualité, n’ayant pas été observées des salles de bonne

qualité, (3) les parents et les responsables des salles de crèche donnent beaucoup d’importance aux

critères évoqués dans l’ ITERS-R, les critères les plus valorisés par les parents et par les responsables

des salles de crèche étant les aspects qui concernent les interactions et les routines, (4) les parents et

les responsables des salles de crèche classent positivement la crèche où sont placés leurs enfants ou

celles où ils travaillent, respectivement et (5) les observateurs extérieurs évaluent plus négativement la

qualité des salles de crèches que les parents et les responsables des mêmes.

Les résultats obtenus suggèrent qu’il y a un besoin urgent à ce que l’on investisse dans

l’évaluation et la promotion de la qualité dans les crèches, dans la formation continue des assistantes

maternelles et des aides maternelles en ce qui concerne leur travail avec les enfants de moins de 3 ans

et dans l’information et la formation des parents pour qu’ils puissent être capables de recueillir des

informations importantes et précises à propos des crèches, soit au moment de choisir, soit quand ils

s’en servent.

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AGRADECIMENTOS

Ao Professor Doutor Joaquim Bairrão, meu orientador desde o primeiro momento, por todas as

oportunidades de aprendizagem que proporcionou quer aquém quer além-fronteiras.

À Professora Doutora Teresa Leal pelo apoio inestimável como orientadora deste trabalho já na

sua recta final.

A todos os participantes no estudo: creches, educadores, pais e crianças.

Aos investigadores da Universidade da Carolina do Norte (Chapel Hill), nomeadamente aos

Professores Doutores Thelma Harms, Richard Clifford e Debby Cryer, com quem tive

oportunidade de discutir este trabalho.

À Carla e à Mónica que tornaram a fase de recolha e introdução de dados menos penosa e,

acima de tudo, deram um novo significado à palavra patroa.

À Cecília e à Manuela pelo estímulo, pela amizade e por desde a primeira hora terem apoiado

este projecto.

Ao meu tio António Brito, à Joana Cadima, à Catarina Grande, à Carla Caetano, ao Mark Poole

e à Doutora Adelina Barbosa, que de algum modo colaboraram na revisão deste trabalho.

Aos outros colegas e amigos, companheiros de investigação no CPDEC (Cristina Nunes, Ana

Madalena Gamelas, Helena Rosário, Isabel Novais, Albino Lima, Ana Isabel Pinto, Isabel

Macedo Pinto, Maria José Alves, Patrícia Silva, Pedro Lopes dos Santos, Orlanda Cruz), pelas

oportunidades de reflexão e pelas interacções de elevada qualidade.

Aos meus pais, ao Hugo, à Sofia e à minha família em geral, por me apoiarem ao longo de todo

este percurso.

Ao Leandro, por ter respondido ao desafio de fazer a capa desta dissertação e por, nas fases

boas e, principalmente, nas menos boas, ter mantido a serenidade e ter tornado este trilho mais

agradável.

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ÍNDICE GERAL

RESUMO ................................................................................................................................................ 3

ABSTRACT ............................................................................................................................................. 5

RESUMÉ................................................................................................................................................. 7

AGRADECIMENTOS .............................................................................................................................. 9

ÍNDICE GERAL..................................................................................................................................... 11

ÍNDICE DE QUADROS......................................................................................................................... 15

ÍNDICE DE FIGURAS ........................................................................................................................... 19

INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................... 21

CAPÍTULO I: Evolução e situação actual da educação e dos cuidados para crianças com

idade inferior a 6 anos em Portugal....................................................................................................... 29

1. Evolução histórica dos serviços para a infância ................................................................................ 31

2. Situação actual dos serviços e sua organização............................................................................... 42

CAPÍTULO II: Educação e cuidados de elevada qualidade para crianças com idade inferior a 6

anos ...................................................................................................................................................... 49

1. Definição de educação e cuidados de boa qualidade ....................................................................... 51

1.1 Dimensões da qualidade: características de estrutura e características de processo ................. 56

1.2 Práticas promotoras do desenvolvimento das crianças ............................................................... 58

1.3 A promoção da qualidade ............................................................................................................ 62

2. Avaliação da qualidade dos contextos de educação e cuidados....................................................... 65

2.1 Como avaliar a qualidade ............................................................................................................ 65

2.2 Alguns resultados obtidos ............................................................................................................ 74

2.2.1 A avaliação da qualidade em Portugal ................................................................................ 74

2.2.2 As relações entre qualidade de processo e qualidade estrutural......................................... 77

3. Efeitos da qualidade dos contextos de educação e cuidados no desenvolvimento da criança ......... 84

3.1 Alguns estudos longitudinais desenvolvidos nos EUA ................................................................. 87

3.2 Alguns estudos desenvolvidos em Portugal ou outros países europeus ..................................... 97

3.3 Efeitos da qualidade dos contextos de educação e cuidados no desenvolvimento

cognitivo e socioemocional das crianças ........................................................................................... 99

4. Ideias dos pais e dos educadores sobre a qualidade dos contextos de educação e cuidados ....... 108

4.1 Ideias dos pais sobre critérios de qualidade .............................................................................. 109

4.2 Ideias dos educadores sobre critérios de qualidade .................................................................. 115

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4.3 Ideias das crianças sobre critérios de qualidade........................................................................117

4.4 Ideias da população em geral sobre critérios de qualidade .......................................................119

4.5 A avaliação da qualidade: confronto entre ideias e práticas ......................................................120

4.5.1 As ideias dos pais sobre a qualidade e as práticas observadas........................................120

4.5.2 As ideias dos educadores sobre a qualidade e as práticas observadas............................126

CAPÍTULO III: Enquadramento e objectivos do estudo.......................................................................129

CAPITULO IV: Método ........................................................................................................................141

1. Participantes....................................................................................................................................143

1.1 Caracterização das instituições e das salas...............................................................................143

1.2 Caracterização dos educadores.................................................................................................145

1.3 Caracterização dos pais.............................................................................................................146

2. Instrumentos....................................................................................................................................147

2.1 Qualidade das salas de creche avaliada por observadores externos ........................................147

2.1.1 Escala de Avaliação do Ambiente de Creche – ITERS-R..................................................147

2.1.2 Registo do Envolvimento de Grupo - Check II ...................................................................151

2.1.3 Grelha de registo de características estruturais da creche e da sala.................................152

2.2 Critérios de qualidade valorizados por pais e educadores .........................................................152

2.2.1 Entrevista semi-estruturada ...............................................................................................153

2.2.2 Questionários sobre Importância dos Itens da ITERS-R para Pais e para Educadores ....153

2.3 Qualidade das salas de creche avaliada por pais e educadores................................................155

2.3.1 Questionários de Avaliação do Ambiente de Creche para Pais e para Educadores..........155

2.4 Características sociodemográficas dos pais e dos educadores.................................................157

2.4.1 Questionário sobre características sociodemográficas......................................................157

3. Procedimento ..................................................................................................................................157

3.1 Treino e acordo interobservadores.............................................................................................157

3.1.1 Escala de Avaliação do Ambiente de Creche ....................................................................157

3.1.2 Registo do Envolvimento de Grupo ...................................................................................157

3.2 Recolha de dados ......................................................................................................................158

3.2.1 Escala de Avaliação do Ambiente de Creche ....................................................................158

3.2.2 Registo do Envolvimento de Grupo ...................................................................................159

3.2.3 Entrevistas e questionários para os pais ...........................................................................160

3.2.4 Entrevistas e questionários para os educadores ...............................................................160

3.3 Análises dos dados ....................................................................................................................161

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3.3.1 Estudo qualitativo .............................................................................................................. 161

3.3.2 Estudo quantitativo ............................................................................................................ 170

CAPÍTULO V: Estudo e adaptação do instrumento ITERS-R ............................................................. 175

1. Tradução e pilotagem...................................................................................................................... 177

2. Características métricas.................................................................................................................. 177

2.1 Dados relativos à normalidade da distribuição e à existência de outliers................................... 178

2.2 Estatísticas descritivas ao nível da escala e das subescalas..................................................... 178

2.3 Sensibilidade/poder discriminativo dos itens.............................................................................. 179

2.4 Fidelidade .................................................................................................................................. 183

2.4.1 Acordo interobservadores.................................................................................................. 183

2.4.2 Análise da consistência interna ......................................................................................... 184

2.5 Validade ..................................................................................................................................... 185

2.5.1 Estrutura factorial .............................................................................................................. 185

2.5.2 Relação com outras variáveis e comparação entre grupos ............................................... 188

CAPÍTULO VI: Resultados .................................................................................................................. 193

1. Qualidade das salas de creche avaliada por observadores externos ............................................. 197

1.1 Resultados descritivos ............................................................................................................... 197

1.2 Relação com outras variáveis e comparação entre grupos........................................................ 199

2. Critérios de qualidade valorizados pelos pais ................................................................................. 204

2.1 Estudo qualitativo....................................................................................................................... 204

2.2 Estudo quantitativo..................................................................................................................... 220

2.2.1 Resultados descritivos....................................................................................................... 220

2.2.2 Relação com outras variáveis e comparação entre grupos ............................................... 222

3. Critérios de qualidade valorizados pelos educadores ..................................................................... 226

3.1 Estudo qualitativo....................................................................................................................... 226

3.2 Estudo quantitativo..................................................................................................................... 242

3.2.1 Resultados descritivos....................................................................................................... 242

3.2.2 Relação com outras variáveis e comparação entre grupos ............................................... 244

4. Qualidade das salas de creche avaliada pelos pais........................................................................ 247

4.1 Resultados descritivos ............................................................................................................... 247

4.2 Relação com outras variáveis e comparação entre grupos........................................................ 249

5. Qualidade das salas de creche avaliada pelos educadores............................................................ 254

5.1 Resultados descritivos ............................................................................................................... 254

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5.2 Relação com outras variáveis e comparação entre grupos........................................................256

6. Comparação entre resultados dos observadores externos, dos pais e dos educadores.................261

6.1 Critérios de qualidade valorizados por pais e por educadores (estudo qualitativo)....................261

6.2 Importância atribuída aos critérios de qualidade por pais e por educadores (estudo

quantitativo)......................................................................................................................................264

6.3 Qualidade avaliada por pais, educadores e observadores externos..........................................265

6.4 Apreciação global ao nível dos itens da ITERS-R......................................................................270

CAPÍTULO VII: Discussão de resultados e conclusões ......................................................................275

1. O estudo da Escala de Avaliação do Ambiente de Creche – ITERS-R...........................................277

2. Qualidade das salas de creche avaliada por observadores externos..............................................284

2.1 Qualidade global ........................................................................................................................284

2.2 Qualidade ao nível das dimensões: Interacção-Linguagem, Actividades-Rotinas e

Espaço-Adultos ................................................................................................................................287

2.3 Qualidade ao nível dos itens ......................................................................................................288

2.4 Qualidade de processo e qualidade de estrutura.......................................................................296

2.5 Conclusão e implicações............................................................................................................302

3. Critérios de qualidade valorizados pelos pais..................................................................................306

4. Critérios de qualidade valorizados pelos educadores .....................................................................315

5. Qualidade das salas de creche avaliada pelos pais ........................................................................322

6. Qualidade das salas de creche avaliada pelos educadores............................................................327

7. Comparação entre resultados dos observadores externos, dos pais e dos educadores.................330

7.1 Critérios valorizados pelos pais e pelos educadores..................................................................330

7.2 Qualidade avaliada por pais, educadores e observadores externos..........................................336

8. Considerações finais .......................................................................................................................346

CAPÍTULO VIII: Referências bibliográficas .........................................................................................355

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ÍNDICE DE QUADROS

Quadro 1. ITERS e competências da CDA ........................................................................................... 68

Quadro 2. Correspondência entre os conteúdos dos itens da ITERS-R e da legislação/outros

documentos aplicáveis às creches ............................................................................................. 135

Quadro 3. Características estruturais das salas.................................................................................. 144

Quadro 4. Variáveis sociodemográficas dos educadores ................................................................... 145

Quadro 5. Características dos pais participantes................................................................................ 146

Quadro 6. Subescalas e itens da ITERS-R ......................................................................................... 148

Quadro 7. Coeficiente alfa de Cronbach de cada uma das subescalas .............................................. 151

Quadro 8. Coeficiente alfa de Cronbach das subescalas dos Questionários sobre Importância dos

Itens da ITERS-R ....................................................................................................................... 154

Quadro 9. Itens dos Questionários sobre Importância dos Itens da ITERS-R e de Avaliação do

Ambiente de Creche para Pais e para Educadores.................................................................... 155

Quadro 10. Sistema de categorias ...................................................................................................... 163

Quadro 11. Médias, desvios-padrão e amplitude dos dados ao nível das subescalas da ITERS-R

(N = 160) .................................................................................................................................... 179

Quadro 12. Estatísticas descritivas dos dados da ITERS-R ao nível dos itens................................... 180

Quadro 13. Percentagem de salas cotadas nos 7 pontos da escala em cada item ............................ 182

Quadro 14. Coeficiente de correlação corrigido entre os itens da ITERS-R e a escala ...................... 183

Quadro 15. Consistência interna das subescalas da ITERS-R ........................................................... 185

Quadro 16. Análise de componentes principais da ITERS-R, com rotação varimax........................... 187

Quadro 17. Teste t de Student para a qualidade média da creche, em função do tipo de creche e

do estatuto profissional do educador.......................................................................................... 189

Quadro 18. Teste t de Student para o envolvimento de grupo, em função dos resultados das salas

em três componentes da qualidade............................................................................................ 190

Quadro 19. Testes univariados para a qualidade nas 3 componentes, em função da faixa etária

das salas .................................................................................................................................... 192

Quadro 20. Consistência interna dos dados das dimensões da qualidade ......................................... 196

Quadro 21. Estatísticas descritivas dos itens da ITERS-R.................................................................. 198

Quadro 22. Coeficientes de correlação de Spearman entre a qualidade das salas e outras

variáveis ..................................................................................................................................... 200

Quadro 23. Teste t de Student para a qualidade avaliada por observadores externos, em função

do estatuto profissional, do tipo de creche e da faixa etária ....................................................... 201

Quadro 24. Número e percentagem de pais que referiram cada categoria......................................... 204

Quadro 25. Número e percentagem de pais que referiram cada subcategoria ................................... 205

Quadro 26. Estatísticas descritivas da importância atribuída pelos pais aos itens da ITERS-R ......... 222

Quadro 27. Coeficientes de correlação de Spearman entre a importância média atribuída pelos

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pais (34 itens) e variáveis sociodemográficas ............................................................................223

Quadro 28. Teste Mann-Whitney para a importância média atribuída pelos pais (34 itens), em

função do tipo de creche, da faixa etária da sala e do género do respondente..........................224

Quadro 29. Teste Mann-Whitney para a importância média atribuída pelos pais às dimensões da

qualidade, em função do tipo de creche, da faixa etária da sala e do género do respondente ..225

Quadro 30. Número e percentagem de educadoras que referiram cada categoria.............................226

Quadro 31. Número e percentagem de educadoras que referiram cada subcategoria .......................227

Quadro 32. Estatísticas descritivas da importância atribuída pelos educadores aos itens da ITERS-

R.................................................................................................................................................243

Quadro 33. Coeficientes de correlação de Spearman entre a importância atribuída pelos

educadores e variáveis sociodemográficas ...............................................................................244

Quadro 34. Teste Mann-Whitney para a importância média atribuída pelos educadores (34 itens),

em função do tipo de creche, da faixa etária da sala e do estatuto profissional do responsável

pela sala .....................................................................................................................................245

Quadro 35. Teste Mann-Whitney para a importância média atribuída pelos educadores às

dimensões de qualidade, em função do tipo de creche, da faixa etária da sala e do seu

estatuto profissional....................................................................................................................246

Quadro 36. Estatísticas descritivas da qualidade avaliada pelos pais.................................................248

Quadro 37. Coeficientes de correlação de Spearman entre a qualidade avaliada pelos pais e

variáveis de estrutura e sociodemográficas................................................................................250

Quadro 38. Coeficientes de correlação de Spearman entre a importância atribuída pelos pais aos

critérios de qualidade e a avaliação que faziam da qualidade da creche ...................................251

Quadro 39. Teste t de Student para a qualidade avaliada pelos pais, em função do tipo de creche,

da faixa etária da sala, do estatuto profissional do responsável pela sala e do sexo do

respondente................................................................................................................................251

Quadro 40. MANOVA para o efeito do tipo de creche, da faixa etária, estatuto profissional do

responsável pela sala e do género do pai participante nas dimensões da qualidade avaliada

pelos pais....................................................................................................................................253

Quadro 41. Estatísticas descritivas da qualidade avaliada pelos educadores.....................................255

Quadro 42. Coeficientes de correlação de Spearman entre a qualidade avaliada pelos educadores

e variáveis de estrutura e sociodemográficas.............................................................................257

Quadro 43. Coeficientes de correlação de Spearman entre a importância atribuída pelos

educadores aos critérios de qualidade e a avaliação que faziam da qualidade da creche.........257

Quadro 44. Teste t de Student para a qualidade avaliada pelos educadores (34 itens), em função

do tipo de creche, da faixa etária e do estatuto profissional .......................................................258

Quadro 45. MANOVA para o efeito do tipo de creche, da faixa etária e do estatuto profissional do

responsável pela sala nas dimensões da qualidade avaliada pelos educadores .......................259

Quadro 46. Número e percentagem de pais e de educadores que referiram cada subcategoria........263

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Quadro 47. MANOVA para o efeito do estatuto do respondente (pais ou educadores) na

importância atribuída às dimensões da qualidade...................................................................... 265

Quadro 48. Análise de variância univariada para medidas repetidas: qualidade das salas em

função do avaliador .................................................................................................................... 267

Quadro 49. Coeficientes de correlação entre a avaliação efectuada por observadores externos,

pais e educadores ...................................................................................................................... 269

Quadro 50. Quadro-resumo das frequências ou médias relativas à importância atribuída (pais e

educadores) e à avaliação efectuada (pais, educadores e observadores externos) para cada

item............................................................................................................................................. 271

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ÍNDICE DE FIGURAS

Figura 1. Exemplo de um item da Escala de Avaliação do Ambiente de Creche ................................. 150

Figura 2. Exemplo do Questionário da Importância dos Itens e da Avaliação do Ambiente de

Creche para Pais......................................................................................................................... 156

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INTRODUÇÃO

O número de estruturas de educação para a infância (nomeadamente creches e jardins-de-

infância) existentes em Portugal tem vindo a aumentar. Se em 1996 a taxa de cobertura de estruturas

formais para crianças entre os 4 meses e os 3 anos de idade era de 12.65% (Vasconcelos, Orey,

Homem, & Cabral, 2002), a meta definida para 2010 é de 33% (Instituto da Segurança Social, 2005a).

A expansão destas estruturas poderá estar relacionada com a crescente procura de serviços

extrafamiliares de cuidados para a infância, associada ao elevado número de mães integradas no

mundo do trabalho. Adicionalmente, o crescente número de crianças que vivem com apenas um dos

pais e o crescente número de mulheres actuando como o único ou principal responsável por cuidar e

educar as crianças, garantindo ao mesmo tempo a subsistência a nível económico, justificam também a

expansão dos serviços de educação e cuidados (Organization for Economic Co-Operation and

Development [Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económicos – OCDE], 2001). Por

outro lado, o reconhecimento da importância das experiências educacionais durante os primeiros anos

de vida (Bairrão & Tietze, 1995; Ministério da Educação, 2000) tem também contribuído para o

aumento da taxa de cobertura da rede nacional de creches.

O investimento que se tem efectuado no sentido de aumentar o número de estruturas de

atendimento às famílias com crianças com idade inferior a 6 anos deve ser acompanhado por um

esforço de se melhorar a sua qualidade, tendo em consideração que os resultados da investigação têm

demonstrado que a qualidade das creches e dos jardins-de-infância pode ter um impacto significativo

no desenvolvimento das crianças que os frequentam (e.g., Bryant et al., 2003; ECCE Study Group,

1997). Tem sido encontrado um relativo acordo entre os investigadores no que diz respeito às

condições que influenciam positivamente as crianças a curto e a longo prazo (OCDE, 2001), apesar de

as definições de qualidade não serem sempre consensuais. De facto, têm sido envidados esforços no

sentido de se definir qualidade em contexto de creche e de jardim-de-infância, sem se obter uma

posição consensual. Diversos autores salientam o carácter transitório das definições de qualidade, que

são influenciadas por factores como as crenças, as percepções sociais, os valores, os aspectos

culturais (e.g., Dahlberg, Moss, & Pence, 1999; European Commission Childcare Network, 1990; Moss,

1994). Melhuish (2001) refere que grande parte da investigação sobre educação em creche e jardim-

de-infância assume que a qualidade reflecte o que é propício ao desenvolvimento da criança. No

mesmo sentido, a NAEYC (1998) define que um programa de elevada qualidade é aquele que garante

um ambiente que promove o desenvolvimento das crianças nos vários domínios, sendo igualmente

sensível às necessidades e preferências das famílias. A designação programas desenvolvimentalmente

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Introdução

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adequados é utilizada pela NAEYC para se referir a estes programas.

A qualidade da educação e cuidados é frequentemente conceptualizada em duas grandes

dimensões: qualidade de processo e qualidade estrutural. As características estruturais referem-se aos

aspectos da estrutura da sala, incluindo o rácio adulto-criança, o tamanho do grupo, a formação e a

experiência do pessoal, o espaço por criança e outras medidas da qualidade das instalações (Cost,

Quality & Child Outcomes Study Team, 1995); a qualidade de processo refere-se às experiências que

efectivamente ocorrem nos contextos de prestação de cuidados, incluindo as interacções das crianças

com os prestadores de cuidados e com os pares e a sua participação em diferentes actividades

(Vandell & Wolfe, 2000).

Os estudos que avaliam a qualidade das creches e dos jardins-de-infância em Portugal têm

revelado que os serviços disponíveis são de qualidade pobre ou mínima (e.g., Abreu-Lima & Nunes,

2006; Aguiar, Bairrão, & Barros, 2002). Contudo, em geral, os pais com crianças a frequentar creches e

jardins-de-infância portugueses têm-se revelado satisfeitos com a qualidade dos serviços (e.g., Folque,

1995; Ojala & Opper, 1994), o que é comum a outros países (e.g., Cryer & Burchinal, 1997). Parece

haver também uma tendência para se encontrarem discrepâncias entre a avaliação efectuada por

observadores externos e por educadores de infância, acerca das suas salas (e.g., Sheridan, 2000), e

para haver pouca correspondência entre o que valorizam em termos teóricos e as suas práticas (e.g.,

McMullen, 1999a).

Tendo como objectivo principal contribuir para o estudo da qualidade das creches em Portugal,

com este trabalho pretendia-se (1) estudar a Escala de Avaliação do Ambiente de Creche – Edição

Revista (ITERS-R; Harms, Cryer, & Clifford, 2003), (2) descrever a qualidade das salas de creche do

distrito do Porto, (3) identificar as características da creche valorizadas por pais e por educadores de

infância/auxiliares de educação, (4) determinar a avaliação que os pais e os educadores de

infância/auxiliares de educação fazem das creches e (5) comparar as perspectivas de pais, de

educadores e de observadores externos. Assim, este trabalho centra-se num dos contextos onde se

processa o desenvolvimento das crianças, assumindo como referências modelos conceptuais que

encaram o desenvolvimento da criança como o resultado da interacção entre a pessoa e o contexto,

ultrapassando a velha contenda da importância da natureza vs importância do meio. Deste modo, o

modelo transaccional proposto por Sameroff e Fiese (1990, 2000) e a perspectiva

ecológica/bioecológica de Bronfenbrenner (desenvolvida desde 1979) serão referências teóricas

importantes para a realização de todo este trabalho, à semelhança do que tem acontecido noutros

estudos. Bairrão (1995) considera que se verificou, na Psicologia da Educação, uma progressiva

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Introdução

23

adesão às abordagens transaccionais e, sobretudo, a perspectivas ecológicas, na medida em que

estas fornecem modelos mais poderosos para a compreensão dos fenómenos.

Sameroff e Chandler, em 1975, expuseram as contradições existentes nos estudos que

tentavam demonstrar que era unicamente a natureza ou unicamente o meio que prediziam os

resultados desenvolvimentais, argumentando os referidos autores que a natureza e o meio eram, de

facto, indissociáveis (Sameroff & MacKenzie, 2003). Consideravam, deste modo, necessário

desenvolver um modelo mais complexo acerca do desenvolvimento e apresentaram um modelo

transaccional, que combinava influências da herança biológica da criança e da experiência de vida num

sistema dinâmico. O modelo transaccional tem sido um modelo de referência, conceptualizando,

portanto, o desenvolvimento da criança como o produto das interacções dinâmicas contínuas entre a

criança e a experiência que lhe é proporcionada pela sua família e pelo contexto social mais vasto onde

se insere. Deste modo, o contexto no qual o desenvolvimento ocorre é tão importante como as

características da criança na determinação do sucesso do desenvolvimento. De acordo com os autores

que desenvolveram este modelo de regulação desenvolvimental, o funcionamento da criança é o

produto das transacções entre o fenótipo (a criança no seu estado actual), o mesótipo (a fonte da

experiência externa) e o genótipo (a fonte da organização biológica). Ao nível do mesótipo, a

experiência da criança em desenvolvimento é determinada através de códigos: (1) código individual

dos pais (crenças, valores e personalidade dos pais), (2) código familiar (padrões de interacção da

família e história transgeracional) e (3) código cultural (crenças de socialização, controlo e apoio da

cultura) (Sameroff & Fiese, 1990, 2000). Desde a sua concepção, o indivíduo participa nas relações

com os outros, que fornecem os elementos necessários para o seu desenvolvimento físico e

psicológico. O peso relativo das regulações dos outros e das auto-regulações vai sendo alterado com o

tempo, aumentando progressivamente a importância das auto-regulações. Sameroff e Fiese (2000)

dividem as regulações desenvolvimentais em três categorias: (1) macrorregulações (mudanças

intencionais importantes na experiência, que se mantêm por longos períodos de tempo, como por

exemplo a entrada na escola), (2) minirregulações (actividades de prestação de cuidados que ocorrem

diariamente, como a alimentação e a disciplina) e (3) microrregulações (padrões quase automáticos de

interacções momentâneas).

Na mesma linha, Bronfenbrenner, em 1974, definiu a Psicologia como uma "ciência do

comportamento de crianças em situações estranhas com adultos estranhos” (Bronfenbrenner, 1974, p.

3), alertando para a importância de ter em atenção os diversos contextos nos quais as crianças se

desenvolvem. Cairns e Cairns (1995) ao efectuarem uma retrospectiva dos trabalhos de

Bronfenbrenner fazem referência à primeira série de publicações do autor, nas quais expressou muitas

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Introdução

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das ideias-chave que serviram de base para o desenvolvimento da ecologia social moderna. Apesar de

haver (ainda presentemente) quem pretenda estudar o indivíduo sem atender ao seu contexto,

Bronfenbrenner em 1942, na sua dissertação de doutoramento, especificou que o desenvolvimento dos

indivíduos não poderia ser considerado independentemente das organizações sociais das quais faz

parte e que o desenvolvimento se pode aplicar não só ao indivíduo, mas também à própria organização

social (Bronfenbrenner, 1942).

O modelo proposto por Bronfenbrenner (1979) alerta para a importância do ambiente

ecológico, concebido como um conjunto de estruturas interligadas, cada uma incluída na seguinte

como um conjunto de bonecas russas. Este autor definiu assim 4 sistemas, organizados em níveis

progressivamente mais abrangentes: o microssistema, o mesossistema, o exossistema e o

macrossistema (Bronfenbrenner, 1979). No nível mais interno encontra-se o contexto imediato que

contém a pessoa em desenvolvimento, como por exemplo a casa, a sala de aula, o laboratório ou a

sala onde decorre um teste: trata-se do microssistema. O microssistema refere-se ao padrão de

actividades, papéis, relações interpessoais e experiências vividas pela pessoa em desenvolvimento

num dado cenário, com características físicas e materiais particulares (Bronfenbrenner, 1979) e contém

outras pessoas com características de temperamento, personalidade e crenças distintas

(Bronfenbrenner, 1989). Os acontecimentos ambientais que influenciam de forma mais imediata o

desenvolvimento da pessoa são as actividades nas quais se envolve com outras pessoas ou que estas

desenvolvem na sua presença. Dito por outras palavras, o envolvimento activo em actividades ou a

exposição ao que outras pessoas fazem leva o indivíduo a desenvolver actividades semelhantes

(Bronfenbrenner, 1979).

O mesossistema inclui as interrelações e processos que ocorrem entre cenários que contêm a

pessoa em desenvolvimento. Para uma criança de 2 anos, o mesossistema poderá incluir as relações

entre a família e a creche. Em suma, um mesossistema seria um sistema de microssistemas

(Bronfenbrenner, 1977). A capacidade de um contexto, como a casa, a escola ou o local de trabalho,

funcionar como um contexto promotor do desenvolvimento depende da existência e da natureza das

ligações sociais entre contextos, incluindo a participação conjunta, a comunicação e a existência de

informação em cada contexto sobre o outro (Bronfenbrenner, 1979).

O nível seguinte, exossistema, é definido como um contexto que não contém a pessoa em

desenvolvimento – estruturas sociais, formais ou informais – mas no qual ocorrem acontecimentos que

afectam o contexto que inclui a pessoa (Bronfenbrenner, 1977, 1989). Por exemplo, para uma criança o

exossistema pode ser o local de trabalho dos pais, a escola frequentada por um irmão, a rede de

amigos dos pais, a vida familiar do professor. Os exossistemas podem ser importantes por duas

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Introdução

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razões: (1) porque incluem os “outros significativos” da vida da pessoa ou (2) porque nesses contextos

são tomadas decisões que afectam a vida da pessoa (Bronfenbrenner, 1978).

Finalmente, o macrossistema inclui os padrões mais abrangentes de estabilidade, ao nível da

subcultura ou da cultura como um todo, através da organização social e dos sistemas de crenças e

estilos de vida associados (Bronfenbrenner, 1978). O macrossistema engloba crenças, valores e

ideologias de uma dada sociedade e de uma determinada época, incluindo não só aspectos

legislativos, princípios gerais e políticas educativas, mas também as representações sociais que os

diferentes agentes de socialização têm acerca da criança e da sua socialização (Bronfenbrenner, 1977,

1989).

O modelo bioecológico, resultante da reformulação do modelo ecológico, define o

desenvolvimento como o fenómeno de continuidade e de mudança das características biopsicológicas

dos seres humanos, quer enquanto indivíduos, quer enquanto grupos. Este fenómeno estende-se ao

longo da vida, através de gerações sucessivas e ao longo do tempo histórico, quer passado, quer

futuro (Bronfenbrenner, 2001). Ao longo da vida, o desenvolvimento humano ocorre através de

processos progressivamente mais complexos de interacção entre um organismo humano

biopsicológico activo em desenvolvimento e as pessoas, objectos e símbolos do seu ambiente externo

imediato. Para serem eficazes essas formas de interacção, designadas processos proximais e

consideradas o principal motor do desenvolvimento, devem ocorrer numa base regular ao longo de

extensos períodos de tempo (Bronfenbrenner, 2001). A forma, o poder, o conteúdo e a direcção destes

processos variam em função das características da pessoa em desenvolvimento, do ambiente, da

natureza dos resultados desenvolvimentais em questão e das continuidades e mudanças no ambiente,

ao longo do tempo. Por outras palavras, o desenvolvimento é visto como produto de quatro

componentes e das relações entre elas: o processo (processos proximais), a pessoa, o contexto e o

tempo (Bronfenbrenner & Morris, 1998). O processo, mecanismo primário do desenvolvimento, inclui as

interacções entre a pessoa e o meio circundante e a sua influência depende das características das

outras três componentes: características da pessoa em desenvolvimento, características do ambiente

imediato e mais distante e os períodos de tempo, nos quais os processos proximais ocorrem.

Encarar o desenvolvimento como o resultado de processos complexos de interacção entre um

organismo humano activo e o seu ambiente externo é igualmente central nos modelos de

contextualismo do desenvolvimento (Ford & Lerner, 1992) e de interaccionismo holístico (Magnusson &

Stattin, 1998). O modelo do contextualismo do desenvolvimento salienta a influência recíproca ou

dinâmica dos processos biológicos e psicológicos (ou organismo) e das condições ambientais (ou

contextuais). Devido a esta relação recíproca, cada uma destas dimensões é transformada pela outra,

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Introdução

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isto é, como resultado da interacção quer o indivíduo quer o contexto se alteram (Ford & Lerner, 1992).

O modelo ecológico do desenvolvimento humano proposto por Bronfenbrenner fornece um meio de

representar a ideia de que a socialização bidireccional que ocorre entre a criança e as outras pessoas

(pais, pares, professores) se situa num sistema complexo de redes sociais e de influências da

sociedade, da cultura e da história (Lerner, 1997). De acordo com o modelo de interaccionismo

holístico de Magnusson e Stattin (1998) os fenómenos psicológicos reflectem aspectos de dois tipos de

processos de interacção: (1) processos contínuos de interacção bidireccional entre a pessoa e o seu

ambiente e (2) processos contínuos de interacção recíproca entre factores mentais, biológicos e

comportamentais do indivíduo. Esta perspectiva fundamenta-se em quatro proposições básicas: (1) o

indivíduo funciona e desenvolve-se de forma global e integrada; (2) o funcionamento individual e a

modificação desenvolvimental devem ser descritos como processos complexos e dinâmicos; (3) o

funcionamento e o desenvolvimento do indivíduo são orientados por processos contínuos de interacção

recíproca entre aspectos mentais, comportamentais e biológicos do funcionamento do indivíduo e

aspectos sociais, culturais e físicos do ambiente; e (4) o ambiente, que inclui o indivíduo, funciona e

muda através de processos contínuos de interacção recíproca entre factores sociais, económicos e

culturais.

Conscientes da complexidade de estudos que considerem todas as dimensões propostas por

estes modelos, não se pretende com este trabalho estudar, de facto, as transacções no verdadeiro

sentido que lhes atribui Sameroff, os quatro aspectos do modelo pessoa-processo-contexto-tempo ou

os processos contínuos de interacção recíproca entre as crianças e as características das creches.

Contudo, os pressupostos apresentados subjazem ao presente trabalho. Por limitações práticas e pelos

objectivos inerentes a este estudo empírico, não serão estudadas as questões do desenvolvimento e

do impacto da qualidade dos contextos no desenvolvimento das crianças, tendo sido efectuada todavia

uma revisão bibliográfica aprofundada sobre a temática, por constituir um dado que torna pertinente o

estudo da qualidade dos contextos. O presente estudo centra-se, portanto, na componente contexto

das perspectivas descritas, procurando contribuir para a avaliação da qualidade das estruturas formais

de educação para crianças com idades entre 1 e 3 anos.

Bronfenbrenner (2001) propõe também que as características de qualquer contexto

cientificamente relevantes para o desenvolvimento humano incluem não apenas as suas propriedades

objectivas, mas também o modo como estas propriedades são subjectivamente experienciadas pelas

pessoas que vivem naquele ambiente. A European Commission Childcare Network (1990) define que

há três perspectivas principais acerca da qualidade: a das crianças, a dos pais/famílias e a dos

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Introdução

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profissionais que cuidam directa ou indirectamente das crianças. Neste estudo serão consideradas as

ideias dos pais e dos educadores de infância relativas à qualidade da educação e cuidados, não sendo,

contudo, abrangidas as ideias das crianças, que são os receptores directos desses cuidados.

A presente dissertação organiza-se de acordo com a estrutura que, seguidamente, se

descreve.

Os capítulos I e II apresentam os principais conteúdos analisados ao longo do processo de

revisão da literatura. No primeiro capítulo é descrita a evolução dos serviços de educação e cuidados

para crianças com menos de 6 anos de idade em Portugal e a situação actual dos serviços. No capítulo

II aborda-se especificamente o tema da qualidade dos contextos de educação e cuidados de crianças,

focando: (1) a definição de educação e cuidados de boa qualidade, (2) a avaliação da qualidade dos

contextos de educação e cuidados, (3) os efeitos da educação e dos cuidados de elevada qualidade e

(4) as ideias dos pais e dos educadores sobre a qualidade.

O capítulo III enquadra a investigação empírica realizada, tendo como base a revisão de

literatura efectuada. São apresentados os objectivos, as questões e as hipóteses de investigação.

O capítulo IV é dedicado à descrição detalhada do método utilizado na presente investigação,

incluindo a caracterização dos participantes (instituições e salas de creche, educadores/auxiliares de

educação e pais), a apresentação dos instrumentos utilizados para a recolha de dados e explicitação

dos procedimentos utilizados no decurso da preparação da recolha de dados e na própria recolha de

dados. São descritos ainda, neste capítulo, os procedimentos de análise de dados utilizados.

No capítulo V são apresentadas as características métricas dos dados obtidos com a versão

portuguesa do instrumento ITERS-R, sendo apresentadas igualmente as suas potencialidades para a

avaliação da qualidade das creches em Portugal.

O capítulo VI apresenta os resultados obtidos, tendo sempre como referência as questões de

investigação formuladas para este estudo. Os resultados são apresentados em seis secções: (1)

qualidade das salas de creche avaliada por observadores externos, (2) critérios de qualidade

valorizados pelos pais, (3) critérios de qualidade valorizados pelos educadores, (4) qualidade das salas

de creche avaliada pelos pais, (5) qualidade das salas de creche avaliada pelos educadores e (6)

comparação entre resultados dos observadores externos, dos pais e dos educadores.

Finalmente, no capítulo VII procede-se à discussão dos resultados obtidos, referindo-se a

confirmação/infirmação das hipóteses definidas. São salientados os aspectos considerados mais

relevantes, tendo em conta os objectivos da investigação e os resultados de investigações anteriores.

Reflecte-se também acerca das implicações deste estudo, bem como acerca das suas limitações.

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CAPÍTULO I: Evolução e situação actual da educação e dos

cuidados para crianças com idade inferior a 6 anos em Portugal

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1. Evolução histórica dos serviços para a infância

A evolução dos serviços de educação e cuidados para crianças dos 0 aos 6 anos de idade em

Portugal está ligada à sequência de acontecimentos políticos e económicos nacionais e internacionais.

Como referem diversos autores, a história da educação pré-escolar no nosso país é semelhante à

verificada noutros países europeus, todavia com um atraso significativo no que se refere à implantação

e ao número de jardins-de-infância oficiais (Pessanha, 2005; Bairrão, Leal, Abreu-Lima, & Morgado,

1997).

O início e um maior desenvolvimento na criação de instituições para crianças pequenas

começaram por observar-se nos países mais industrializados. A Revolução Industrial acentuou a

necessidade, que já antes tinha começado a evidenciar-se, de se pensar na guarda das crianças, em

consequência da grande mobilização de mão-de-obra feminina, tendo as primeiras instituições surgido

em Inglaterra (1816) e em França (1826) (Cardona, 1997). Apesar de haver vários autores que

mencionam estas datas, Davidson e Maguin (1986) referem que a primeira creche conhecida foi criada

em 1770, em França, pelo pároco de Ban de la Roche, para ajudar as famílias que estavam ocupadas

com os trabalhos no bosque.

O impacto da Revolução Industrial em Portugal não foi tão significativo como noutros países e,

apesar de a primeira instituição ter sido criada ainda durante o período da monarquia, apenas nos anos

70, do séc. XX, foi criada uma rede pública de jardins-de-infância dependentes do Ministério da

Educação (Cardona, 1997).

A educação pré-escolar surgiu em Portugal no século XIX associada, segundo o Ministério da

Educação (2000), ao desenvolvimento de novos valores relativos à educação da criança e do cidadão e

ao progressivo processo de industrialização, que foi acompanhado pelo movimento das populações

para as zonas urbanas, pela procura de níveis de educação mais elevados, pelo acesso das mulheres

ao mundo do trabalho e por alterações da estrutura da família. Assim, a educação pré-escolar foi

adquirindo maior reconhecimento e procura. Em 1834 foi criada a primeira instituição para crianças,

integrada na Sociedade das Casas da Infância Desvalida, cuja função era sobretudo assistencial, mas

sublinhando desde sempre a importância da função educativa. Em 1870 foi definido, num projecto de

lei, que, apesar da entrada para a escola primária ser aos 7 anos, se abria a possibilidade de as

crianças a poderem frequentar a partir dos 5 anos de idade. Somente num decreto de 1878 foram

definidas as condições para a criação dos chamados “Asilos da Educação” para as crianças dos 3 aos

6 anos, em todo o país (Cardona, 1997).

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Capítulo I

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Em 1882, ano comemorativo do centenário de Froebel, foi criado em Lisboa um Jardim-de-

Infância público. Com a publicação da “Cartilha Maternal João de Deus”, em 1876, foi criada a

“Associação de Escolas Móveis”, que tinha como principal finalidade a criação de “jardins-escola” que

funcionassem segundo o método João de Deus (Cardona, 1997). Apesar de haver apenas um Jardim-

de-infância (ou talvez dois, sendo difícil ter a certeza se o segundo chegou a funcionar), já em 1893,

José Augusto Coelho mencionava um currículo para a “escola infantil”, orientado para crianças dos 3

aos 8 anos de idade, bem como os princípios em que se deveria basear um currículo deste tipo

(Bairrão, Barbosa, Borges, Cruz, & Macedo-Pinto, 1990).

Particularmente importante para o desenvolvimento de estruturas destinadas a crianças com

menos de 3 anos de idade foi a determinação em 1890, como resultado da Conferência de Berlim, da

obrigatoriedade de todas as fábricas com mais de 50 trabalhadoras criarem creches, sendo definidas

as condições mínimas de saúde e higiene para o seu funcionamento (Cardona, 1997).

Até ao fim da monarquia, foram publicados vários decretos que regulamentavam a educação

de infância, nomeadamente no que se refere à sua função e à selecção do pessoal, que deveria ser

constituído por pessoas do sexo feminino, habilitadas com o curso de formação de professoras da

escola primária. No decreto que data de 1902 houve uma maior valorização do papel da escola infantil

na promoção do desenvolvimento intelectual das crianças e na preparação para a entrada na escola

primária (Cardona, 1997).

Apesar de todas estas iniciativas, foi só após a Implantação da República (1910) que a

educação pré-escolar adquiriu um estatuto específico no sistema oficial de ensino (Ministério da

Educação, 2000). Durante o período da Primeira República (1910 – 1932) observaram-se algumas

oscilações no modo de conceber a educação de infância: por um lado, a influência do modelo escolar,

sendo definida como missão primordial a instrução e preparação para a escolarização futura; por outro,

a tendência para valorizar a especificidade a que este ensino deve obedecer, tendo em conta as

características psicológicas das crianças. No decreto de 1911, foi valorizada a ligação da escola infantil

com a educação familiar da criança (Cardona, 1997). Nesta altura, foram dadas várias orientações,

nomeadamente de tipo escolar, mas salientava-se que as lições deveriam ter uma duração reduzida e

que deviam basear-se nos interesses das crianças, valorizando as características lúdicas da escola

infantil. Também em 1911, foi criada a rede privada de Jardins-Escolas João de Deus e, paralelamente,

foi criado oficialmente o ensino infantil para crianças de ambos os sexos, com idades entre os 4 e os 7

anos (Ministério da Educação, 2000). Apesar da preocupação dos republicanos em legislar, devido ao

estado económico caótico do país, à elevada taxa de analfabetismo e à instabilidade política, entre

1910 e 1926 foram criados apenas 12 novos jardins-de-infância (Bairrão et al., 1990). Vasconcelos

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Evolução e situação actual dos serviços

33

(2000) considera importante ressaltar, dessa época, a actividade notável da pedagoga Irene Lisboa,

inspectora das classes infantis oficiais.

A qualidade da formação de professoras era muito valorizada no período da Primeira

República, de modo que, em 1916, foram enviadas professoras para o Curso Internacional de Maria

Montessori. O Estado, neste período, demonstrava atribuir elevada importância a este nível de ensino,

evidenciando-se um esforço notório em definir detalhadamente as suas normas de funcionamento. Em

1923, salientava-se a importância de a formação de todos os docentes passar a ser realizada em

Faculdades de Ciências da Educação, começando pelas “jardineiras de infância” das escolas infantis, o

que veio a acontecer apenas em 1986. Quanto ao ensino infantil, a proposta de lei de 1923 reforçava a

necessidade de serem criadas mais escolas públicas, tendo em conta que as poucas escolas

existentes, na sua grande maioria, tinham surgido de iniciativas privadas. Em 1924, numa portaria

assinada por António Sérgio, então Ministro da Instrução Pública, foi sugerido que o trabalho dos

professores fosse influenciado pelos modelos de Maria Montessori e de Decroly, quando a principal

influência que se fazia sentir era a de Froebel. A escolha destes autores reforçava a ideia de que o

conhecimento da criança se deveria basear nos estudos realizados em Psicologia e não em reflexões

filosóficas sobre a natureza humana (Cardona, 1997).

Em 1926, na altura do golpe de Estado, a taxa de crianças que frequentavam estabelecimentos

de educação infantil era de 1% (Ministério da Educação, 2000). Durante o período do Estado Novo

(1933 – 1973), a educação passou a ser valorizada como doutrinação, como forma de propaganda das

ideias do regime, devendo a instrução do povo restringir-se às noções mais básicas. A educação das

crianças mais novas era considerada uma tarefa essencialmente destinada às mães de família,

devendo as mulheres ficar em casa para cuidar dos seus filhos. Seguindo esta ideia, em 1934 foi

publicado um decreto que terminava com a obrigatoriedade de as fábricas terem creches para os filhos

das mulheres trabalhadoras (Cardona, 1997). Em 1937 o ensino infantil oficial foi extinto e a Obra

Social das Mães para a Educação Nacional passou a ser responsável pelo apoio às mães na tarefa de

educar os filhos (Ministério da Educação, 2000), agindo de acordo com as ideias do regime (Cardona,

1997). Em 1944 foi criado o Fundo de Socorro Social e novamente determinada a obrigatoriedade de

as fábricas possuírem creches para os filhos das trabalhadoras, mas as sanções em caso de

incumprimento eram irrisórias. As escolas infantis oficiais foram fechadas ou transformadas e as únicas

instituições que continuavam a funcionar sob a dependência do Estado tinham uma função

essencialmente assistencial, sendo menosprezada a sua função educativa (Cardona, 1997).

Durante este período, os cursos de formação para o ensino infantil foram alterados, passando

em 1930 a ser um complemento do curso de formação para o ensino primário e em 1932 passou a

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Capítulo I

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funcionar de forma diferenciada, mas com a duração de apenas um ano. A criação da Escola Normal

Social, em 1939, reforçou a função assistencial atribuída a estas instituições, uma vez que as

assistentes de serviço social eram formadas para poderem trabalhar em instituições de educação de

infância. A Associação João de Deus, perante a necessidade de formar educadoras para os seus

jardins-escola, criou um curso de formação, para funcionar de acordo com as orientações que

preconizava: método centrado no desenvolvimento intelectual da criança, partindo duma concepção

integradora do processo educativo, sem a interrupção entre a educação pré-escolar e a escolar

(destinava-se a crianças dos 3 aos 8 anos de idade). Apesar de várias vezes ter sido defendida a sua

adopção a nível nacional, tal não veio a acontecer, ficando as educadoras circunscritas às instituições

da Associação (Cardona, 1997).

A educação foi muito desvalorizada desde os primeiros anos do Estado Novo, mas nos anos

50 iniciou-se um processo de mudança, alentado pela adesão ao Projecto Regional do Mediterrâneo,

no qual participavam Portugal, Espanha, Grécia e Jugoslávia e que tinha, entre outros, o objectivo de

analisar a articulação entre as necessidades de mão-de-obra e a capacidade de resposta do sistema

educativo. Durante esta década o número de instituições privadas sofreu um grande aumento, o que

acarretou a criação de escolas de formação, também privadas. O Ministério da Educação manteve a

sua posição, limitando-se a fiscalizar e conceder autorização para o funcionamento das instituições

privadas (Cardona, 1997). Surgiram em 1954, em Lisboa, num contexto religioso, as duas primeiras

escolas de formação de educadoras de infância de iniciativa particular: o Instituto de Educação Infantil

e a Escola de Educadores de Infância (Bairrão et al., 1990).

Os anos 60 marcaram o início de uma nova mudança e a educação de infância foi

particularmente valorizada como forma de promover o desenvolvimento cognitivo e como ajuda

fundamental na preparação para a vida futura das crianças. Começou a falar-se da função

compensatória, sobretudo em relação às crianças mais desfavorecidas. No início dos anos 60,

começaram a organizar-se alguns grupos de trabalho de professores e educadores, inspirados pelas

ideias do Movimento da Escola Moderna, baseado na pedagogia de Freinet, e desenvolveram-se

experiências inovadoras, apesar de muito reprimidas pelo governo. Em 1963 criaram-se grupos de

trabalho, ainda na sequência da participação de Portugal no Projecto Regional do Mediterrâneo

(Cardona, 1997). No final dos anos 60, no âmbito do Ministério da Saúde e Assistência, foram criados

jardins-de-infância e creches, como consequência das mudanças ocorridas no país e com uma função

supletiva da família, substituindo-a durante o horário de trabalho dos pais ou outros impedimentos,

datando igualmente desta década o serviço de amas e a creche familiar (Ministério da Educação,

2000). Foram criados cursos para auxiliares de educação em vários locais, que foram encerrados após

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Evolução e situação actual dos serviços

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o 25 de Abril de 1974 (Cardona, 1997). Nos anos 60, foram fundadas por todo o país escolas privadas

para formação profissional de educadoras, que pertenciam maioritariamente a instituições religiosas

(Bairrão et al., 1990).

Nos anos 70, após a substituição de António de Oliveira Salazar por Marcelo Caetano, sendo

Veiga Simão o Ministro da Educação, falava-se na necessidade de reforma do sistema educativo. Em

1971 foi criada a Comissão Coordenadora da Instalação de Infantários e Jardins-de-infância. No ano

seguinte o Gabinete de Estudos e Planeamento da Acção Educativa apresentou dois relatórios: um

referente aos objectivos da educação de infância e o outro relativo à criação e organização de cursos

públicos de formação para educadores. A formação de educadores de infância passou, nessa altura, a

efectuar-se nas escolas do Magistério.

Outros relatórios foram publicados nos anos 70, incluindo recomendações para o

funcionamento das instituições. Em 1973 a Comissão Permanente Interministerial para o

Desenvolvimento Social publicou um documento no qual falava da existência de “Centros de Bem-estar

Social”, que teriam as valências de creche (para crianças dos zero aos 2 anos) e de jardim-de-infância

(dos 3 aos 5 anos). Este documento privilegiava a função social das instituições, focando a

necessidade de colaboração com as famílias, deixando a função educativa em segundo plano. Nas

creches, os grupos de crianças deveriam ser orientados por enfermeiras, sendo considerado prioritário

assegurar a qualidade dos cuidados de saúde e higiene. Contudo, no mesmo ano foi divulgado outro

relatório do Gabinete de Estudos e Planeamento do Ministério da Educação que salientava a

necessidade de coordenar as funções educativa e social (Cardona, 1998). Ainda em 1973, com a

reforma do sistema educativo de Veiga Simão, a educação de infância foi reintegrada no sistema

educativo, determinando-se que a educação pré-escolar se destinaria às crianças dos 3 aos 6 anos,

não sendo, porém, a sua frequência obrigatória. Foram também instituídas as Escolas Normais de

Educadores de Infância (Ministério da Educação, 2000). Foi atribuída à Direcção Geral do Ensino

Básico a superintendência na organização, criação e funcionamento de estabelecimentos públicos,

mas também a orientação pedagógica da educação particular com fins lucrativos ou com organização

cooperativa, em colaboração com a Inspecção-Geral do Ensino Particular (até à data responsável pela

supervisão dos estabelecimentos) (Ministério da Educação, 2000).

Na sequência do 25 de Abril de 1974 defendeu-se a necessidade de definir uma política

socioeducativa global de apoio à maternidade e à infância (Cardona, 1997), tendo o sistema educativo

pré-escolar registado alterações relevantes, nomeadamente: (1) aumento significativo do número de

jardins-de-infância e creches, escolas de formação de educadoras e estabelecimentos de ensino

especial; (2) criação de novos estabelecimentos por iniciativa das próprias comunidades e do poder

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Capítulo I

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local; e (3) tentativa de coordenação dos serviços de educação infantil, que passaram a estar

dependentes fundamentalmente de dois ministérios, o Ministério da Educação e o Ministério do

Emprego [da Solidariedade] e Segurança Social (Bairrão et al., 1997). Este desenvolvimento foi

acompanhado, segundo os mesmos autores, por uma progressiva consciencialização dos problemas

sociais e culturais com que se defrontava uma grande camada da população e da necessidade de criar

alternativas de atendimento às crianças, nomeadamente em zonas económica e socialmente

desfavorecidas. A Constituição da República Portuguesa inclui um artigo, artigo 67.º, que reconhece a

obrigação do Estado de desenvolver uma rede nacional de apoio aos cuidados de infância e atribui às

crianças, no artigo 69.º, um estatuto especial de protecção por parte da sociedade e do Estado face a

qualquer forma de discriminação (Cruz, Fontes, & Carvalho, 2003). Começou a ser dada cada vez mais

importância às características sociológicas das crianças, para além das psicológicas, valorizando-se as

suas vivências familiares e a necessidade de estas serem integradas como conteúdos fundamentais

das práticas educativas. A necessidade de se encontrar resposta para a questão da guarda dos filhos

das mulheres trabalhadoras era uma das grandes preocupações. Em 1975 a UNESCO apresentou um

relatório no qual foram apresentadas propostas para a generalização do ensino pré-escolar, pelo

menos para as crianças de 4 e 5 anos (Cardona, 1997).

Os primeiros anos após o 25 de Abril foram conturbados, em diversos sectores, incluindo o da

educação, tendo sido criados e anulados diversos organismos. Em 1977, a lei n.º 5/77 definia a criação

da rede oficial de educação pré-escolar para crianças a partir dos 3 anos de idade, sem explicitar,

contudo, as condições necessárias para o seu funcionamento e não fazendo qualquer referência às

crianças mais novas. Além da função compensatória, era preconizada a abertura das instituições à

comunidade, nomeadamente através da participação dos pais. De facto, num relatório também

apresentado em 1977, a perspectiva da educação compensatória começava até a ser criticada.

Relativamente à formação, foi criado o ensino superior de curta duração, mais tarde designado Ensino

Superior Politécnico, prevendo-se a criação das Escolas Superiores de Educação, o que veio a

acontecer apenas em 1986 (Cardona, 1997).

Em 1978, foi publicado um decreto que especificava as condições para a implementação da

rede pública de instituições e deixava de utilizar a designação de centros de educação pré-escolar,

voltando a ser utilizada a expressão jardim-de-infância (Cardona, 1997). Em Dezembro do mesmo ano

foi oficializada a criação das primeiras instituições da rede pública do Ministério da Educação,

regulamentada pela lei n.º 5/77 (Ministério da Educação, 2000). Com a criação desta rede pública de

jardins-de-infância, passaram a funcionar duas redes oficiais: uma dependente do Ministério da

Educação e outra dependente da Segurança Social (Cardona, 1997). Esta situação continua hoje a

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Evolução e situação actual dos serviços

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existir: a primeira destinada a crianças a partir dos 3 anos de idade; a segunda destinada a crianças

com menos de 3 anos de idade. Segundo Cardona (1997), a multiplicidade de serviços é um dos

factores que afectam negativamente o funcionamento da educação de infância em Portugal: há grande

diversidade de instituições, sendo diferentes as suas normas de funcionamento e as concepções

educativas subjacentes. Em 1997, Bairrão et al. alertavam igualmente para esta dificuldade,

considerando que as estruturas pré-escolares que se encontram sob tutela do Ministério do Trabalho e

Solidariedade Social se orientam segundo um modelo de tipo “assistencial”, atendendo sobretudo às

necessidades dos pais que trabalham, e que as instituições que se encontram sob tutela do Ministério

da Educação apresentam um modelo de funcionamento do tipo educacional. De facto, esta situação

traz alguns inconvenientes, podendo a mesma instituição ser tutelada por dois ministérios diferentes.

Tal como defende Coelho (2004), o primeiro obstáculo que, em Portugal, parece dificultar a

organização adequada dos programas relaciona-se com a inexistência, ao contrário do que sucede na

grande maioria dos estados membros da União Europeia, de uma política educativa que considere

globalmente a infância, pelo menos no que se refere às crianças com idade inferior à de ingresso na

escolaridade obrigatória.

Retomando a sequência histórica dos acontecimentos, em 1979 foi publicado o Estatuto dos

Jardins-de-infância (Decreto-Lei n.º 542, de 31 de Dezembro), no qual se regulamentava a educação

pré-escolar e se estabeleciam os critérios no sentido de garantir os direitos e deveres dos profissionais

e normas de funcionamento para uma educação de qualidade (Ministério da Educação, 2000).

Em 1986 foi publicada a Lei de Bases do Sistema Educativo, período em que a educação de

infância começou por ser valorizada pela sua função de pré-escolarização, considerando-se o papel

importante que poderia desempenhar no combate ao insucesso escolar. Esta perspectiva contradizia

as ideias defendidas pela maioria dos profissionais, que a consideravam redutora em relação às

finalidades mais vastas deste nível de ensino (Cardona, 1997). A Lei de Bases do Sistema Educativo

(definida, portanto, em 1986 e alterada em 1997 e 2005) define que a educação pré-escolar “é

complementar e/ou supletiva da acção educativa da família, com a qual estabelece estreita

cooperação” e tem como objectivos: a) estimular as capacidades de cada criança e favorecer a sua

formação e o desenvolvimento equilibrado de todas as suas potencialidades; b) contribuir para a

estabilidade e a segurança afectivas da criança; c) favorecer a observação e a compreensão do meio

natural e humano para melhor integração e participação da criança; d) desenvolver a formação moral

da criança e o sentido da responsabilidade, associado ao da liberdade; e) fomentar a integração da

criança em grupos sociais diversos, complementares da família, tendo em vista o desenvolvimento da

sociabilidade; f) desenvolver as capacidades de expressão e comunicação da criança, assim como a

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Capítulo I

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imaginação criativa, e estimular a actividade lúdica; g) incutir hábitos de higiene e de defesa da saúde

pessoal e colectiva; h) proceder à despistagem de inadaptações, deficiências ou precocidades e

promover a melhor orientação e encaminhamento da criança. É definida a faixa etária a que se

destinam os serviços (dos 3 anos até ao ingresso no ensino básico), é sublinhada a necessidade de

articulação com a família e é atribuída ao Estado a incumbência de assegurar a existência de uma rede

de educação pré-escolar (Lei n.º 49/2005, de 30 de Agosto).

Ainda em 1986 foi criada a Comissão de Reforma do Sistema Educativo e em 1987 foram

criadas as Direcções Regionais de Educação. Estas medidas não serviram para ampliar o número de

estruturas existentes, facto que veio a acontecer no ano lectivo 1988/89 com a criação de uma

comissão interministerial, com representantes do Ministério da Educação e do Ministério da Assistência

Social (Cardona, 1997). Na verdade, no que se refere à Reforma Educativa, e uma vez que esta incidiu

essencialmente na reestruturação dos currículos, a educação pré-escolar acabou por não ser

abrangida, devido à não existência de um currículo.

Em 1995, foi elaborado pelo Ministério da Educação o Plano de Expansão da Rede de

Estabelecimentos de Educação Pré-escolar, com o objectivo de assegurar o acesso de um maior

número de crianças a estabelecimentos que garantissem a função de educação e guarda (Ministério da

Educação, 2000). Foram disponibilizados incentivos financeiros às entidades privadas, para a abertura

de salas de educação pré-escolar. No ano seguinte, com um novo Governo, o Ministério da Educação

lançou o Programa de Expansão e Desenvolvimento da Educação Pré-escolar, em parceria com o

Ministério do Trabalho e Segurança Social e o Ministério do Equipamento, do Planeamento e da

Administração do Território, com o objectivo de concertar esforços (Ministério da Educação, 2000).

Em 1997 foi aprovada a Lei-Quadro da Educação Pré-escolar (Lei n.º 5/97, de 10 de

Fevereiro), que considera que “a educação pré-escolar é a primeira etapa da educação básica no

processo de educação ao longo da vida, sendo complementar da acção educativa da família, com a

qual deve estabelecer estreita cooperação, favorecendo a formação e o desenvolvimento equilibrado

da criança, tendo em vista a sua plena inserção na sociedade como ser autónomo, livre e solidário”. A

Lei-Quadro reforça o papel do Estado na criação da rede pública de educação pré-escolar, no apoio a

outras entidades (na medida em que as ofertas da rede pública sejam insuficientes), na definição das

normas gerais da educação pré-escolar e no apoio especial às zonas carenciadas. O Ministério da

Educação assume a tutela pedagógica de toda a rede institucional, para crianças dos 3 aos 6 anos de

idade, definindo esta lei que “as redes de educação pré-escolar são constituídas por uma rede pública

e uma rede privada, complementares entre si, visando a oferta universal e uma boa gestão dos

recursos públicos”. A Lei-Quadro define, portanto, como redes do pré-escolar a rede pública e a rede

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Evolução e situação actual dos serviços

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privada e ainda outras modalidades da educação pré-escolar: a educação de infância itinerante e a

animação infantil comunitária. À semelhança da Lei de Bases do Sistema Educativo, também esta lei

define os objectivos da educação pré-escolar: a) promover o desenvolvimento pessoal e social da

criança com base em experiências de vida democrática numa perspectiva de educação para a

cidadania; b) fomentar a inserção da criança em grupos sociais diversos, no respeito pela pluralidade

das culturas, favorecendo uma progressiva consciência do seu papel como membro da sociedade; c)

contribuir para a igualdade de oportunidades no acesso à escola e para o sucesso da aprendizagem; d)

estimular o desenvolvimento global de cada criança, no respeito pelas suas características individuais,

incutindo comportamentos que favoreçam aprendizagens significativas e diversificadas; e) desenvolver

a expressão e a comunicação através da utilização de linguagens múltiplas como meios de relação, de

informação, de sensibilização estética e de compreensão do mundo; f) despertar a curiosidade e o

espírito crítico; g) proporcionar a cada criança condições de bem-estar e de segurança,

designadamente no âmbito da saúde individual e colectiva; h) proceder à despistagem de

inadaptações, deficiências e precocidades, promovendo a melhor orientação e encaminhamento da

criança; i) incentivar a participação das famílias no processo educativo e estabelecer relações de

efectiva colaboração com a comunidade.

Na sequência da Lei-Quadro da Educação Pré-escolar, foram definidos pelo Despacho

conjunto n.º 268/97, do Ministério da Educação e do Ministério da Solidariedade e Segurança Social

(actualmente Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social), os requisitos pedagógicos e técnicos

para a instalação e funcionamento de estabelecimentos de educação pré-escolar.

Também em 1997, o Ministério da Educação publicou as Orientações Curriculares para a

Educação Pré-escolar, definidas como “um conjunto de princípios para apoiar o educador nas decisões

sobre a sua prática, ou seja, para conduzir o processo educativo a desenvolver com as crianças”

(Ministério da Educação, 1997). Este documento não é considerado um programa, nem um currículo,

trata-se apenas de “indicações para o educador” (Ministério da Educação, 1997). As orientações

curriculares têm constituído uma importante referência para a educação de infância no nosso país,

incluindo orientações relativas à organização do ambiente educativo, às áreas de conteúdo (Área de

formação pessoal e social, Área de expressão e comunicação, Área de conhecimento do mundo), à

continuidade educativa e à intencionalidade educativa.

Em 2001, foram publicados dois decretos-lei que regulamentam o perfil do educador de

infância: Decreto-Lei n.º 240/2001, que corresponde ao Perfil Geral de Desempenho Profissional do

Educador de Infância e dos Professores dos Ensinos Básico e Secundário, e o Decreto-Lei n.º

241/2001, que corresponde ao Perfil Específico de Desempenho Profissional do Educador de Infância.

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Capítulo I

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Estes documentos constituíam o quadro de orientação a que se encontravam subordinadas a

organização e a acreditação dos cursos de formação inicial. O perfil do Educador de Infância deverá

ser considerado válido para todos os serviços destinados a crianças com idade inferior a 6 anos,

especificando que a “formação do educador de infância pode, igualmente, capacitar para o

desenvolvimento de outras funções educativas, nomeadamente no quadro da educação das crianças

com idade inferior a 3 anos”, apesar de a sua formulação continuar, de algum modo, a privilegiar o

trabalho desenvolvido com crianças dos 3 aos 6 anos de idade. O Estudo Temático realizado pela

OCDE referia o seguinte: “nota-se a falta de formação específica para os que trabalham com as

crianças dos 0 aos 3 anos de idade, embora os educadores de infância, após a licenciatura, também se

ocupem delas nas creches onde trabalham” (OCDE, 2000). Os cursos de formação de educadores de

infância (a par de todos os outros cursos do Ensino Superior) encontram-se actualmente em

reformulação, com o objectivo de serem adaptados de acordo com o Processo de Bolonha, cujo

objectivo é a criação do Espaço Europeu do Ensino Superior (cf. The Bologna Declaration, 1999). O

novo regime de habilitação profissional para a docência exige que o mestrado seja o ciclo de estudos

mínimo para exercer funções de docente em qualquer nível, o que abrange os educadores de infância

(Decreto-Lei n.º 43/2007).

No que diz respeito especificamente às creches, o Ministério do Trabalho e da Solidariedade

disponibilizou, em 1996, os Guiões Técnicos para a creche, que definem as suas condições de

implantação, localização, instalação e funcionamento (Rocha, Couceiro, & Madeira, 1996). Este

documento divide-se em 10 normas, sendo que a primeira define o âmbito de aplicação do

regulamento, a segunda define os objectivos específicos das creches, a terceira define as condições

gerais de implantação, localização e instalação da creche, a quarta enumera e descreve os espaços

que a creche deve compreender (átrio de acolhimento, átrio de serviço, berçário, salas de actividades e

refeições, instalações sanitárias, cozinha e anexos, gabinetes e espaços de apoio), a quinta refere

características gerais dos materiais e equipamentos, a sexta descreve as condições ambientais que as

creches devem respeitar para a promoção do bem-estar dos utentes, a sétima norma refere algumas

características do mobiliário e equipamento pedagógico, a oitava refere a necessidade de se

cumprirem também outras recomendações técnicas (Despacho Conjunto dos Ministérios do Plano e

Obras Públicas e do Trabalho e Segurança Social, publicado no Diário da República n.º 147, de 3 de

Junho de 1986), a nona norma especifica aspectos do funcionamento (condições de admissão, critérios

de prioridade, processo de admissão, documentação, inscrições, seguro obrigatório, comparticipação

familiar, capacidade de organização de grupos, horário do estabelecimento, férias, alimentação,

condições de saúde e higiene, projecto pedagógico, recursos humanos, direcção técnica) e a décima

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Evolução e situação actual dos serviços

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norma descreve as disposições transitórias. Apesar de os Guiões Técnicos datarem de 1996, já em

1989 tinha sido publicado um Decreto-Lei (Decreto-Lei n.º 30/89, de 24 de Janeiro), válido para as

instituições com fins lucrativos, que sujeitava obrigatoriamente a licenciamento prévio a instalação e

funcionamento dos estabelecimentos que desenvolvessem actividades de apoio social, no âmbito da

acção social exercida pela Segurança Social, e previa que fossem publicadas normas que regulassem

as condições de instalação e funcionamento. Estas normas, em vários aspectos semelhantes às

posteriormente incluídas nos Guiões Técnicos, foram publicadas no anexo intitulado “Normas

reguladoras das condições de instalação e funcionamento das creches com fins lucrativos”, do

Despacho Normativo n.º 99/89. Em 2005, o Instituto da Segurança Social (2005b) divulgou um conjunto

de documentos com orientações mais específicas e que abrangem oito critérios: (1) liderança,

planeamento e estratégia, (2) gestão das pessoas (colaboradores), (3) recursos e parcerias (gestão de

parcerias, gestão de recursos financeiros, gestão da informação, gestão das instalações, materiais e

equipamentos), (4) processos da creche (generalidades; requisitos específicos dos processos de

candidatura, admissão, plano de desenvolvimento individual, recepção e entrega da criança,

planeamento e acompanhamento de actividades, cuidados pessoais, nutrição e alimentação; medição,

análise e melhoria), (5) satisfação dos clientes, (6) satisfação das pessoas, (7) impacto na sociedade e

(8) resultados de desempenho chave.

Apesar de a legislação que regulamenta especificamente as creches ser escassa, há vários

Decretos, Leis e Despachos Normativos que também se aplicam às creches, do mesmo modo que a

outro tipo de instituições. São exemplos: o Decreto-Lei n.º 123/97 e a Lei n.º 38/2004 que definem as

normas técnicas básicas de eliminação de barreiras urbanísticas e arquitectónicas em edifícios

públicos, equipamentos colectivos e via pública; o Decreto-Lei n.º 379/97 que define e regulamenta as

condições de segurança a observar na localização, implantação, concepção e organização funcional

dos espaços de jogo e de recreio, respectivo equipamento e superfícies de impacto, criando ainda um

sistema inspectivo e sancionatório adequado; o Decreto-Lei n.º 133-A/97 que substitui o Decreto-Lei n.º

30/89, estabelecendo uma nova regulamentação dos estabelecimentos e serviços privados em que

sejam exercidas actividades de apoio social no âmbito da segurança social; as regulamentações

relativas à segurança, higiene e saúde no trabalho, como o Decreto-Lei n.º109/2000 de 30 de Junho de

2000; a legislação relativa a estabelecimentos que servem e/ou confeccionam alimentos, como o

Decreto-Lei n.º 67/98 de 18 de Março e o Decreto-Lei n.º 425/99 de 21 de Outubro.

Os decretos relativos à eliminação de barreiras arquitectónicas merecem-nos particular

atenção. Em 1997 foi publicado o Decreto-Lei n.º 123/ 97, de 22 de Maio, que definiu as normas

técnicas básicas de eliminação de barreiras urbanísticas e arquitectónicas em edifícios públicos,

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Capítulo I

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equipamentos colectivos e via pública, o que incluía, entre outros, os estabelecimentos de educação

pré-escolar e de ensino básico, secundário e superior, centros de formação, residenciais e cantinas.

Neste documento foi adoptado o símbolo internacional de acessibilidade. O Decreto-Lei n.º 123/97

aprofunda e especifica as recomendações técnicas constantes do Despacho Conjunto dos Ministérios

do Plano e da Administração do Território, das Obras Públicas, Transportes e Comunicações e do

Trabalho e Segurança Social, de 30 de Junho de 1986, que, por sua vez, referia decretos do início dos

anos 80. De qualquer modo, respeitando o decreto de 1997 (DL 123/97), as instalações, edifícios e os

seus espaços circundantes deveriam estar adaptados num prazo de sete anos, ou seja, em Maio de

2004. Como podemos facilmente observar, e é frequentemente divulgado na comunicação social,

continuam a existir barreiras que limitam a participação plena na sociedade dos cidadãos com

mobilidade reduzida. Todas estas questões foram reforçadas em 2004, com a Lei n.º 38/2004, que

define como objectivos “a realização de uma política global, integrada e transversal de prevenção,

habilitação, reabilitação e participação da pessoa com deficiência, através, nomeadamente, da: a)

Promoção da igualdade de oportunidades, no sentido de que a pessoa com deficiência disponha de

condições que permitam a plena participação na sociedade; b) Promoção de oportunidades de

educação, formação e trabalho ao longo da vida; c) Promoção do acesso a serviços de apoio; d)

Promoção de uma sociedade para todos através da eliminação de barreiras e da adopção de medidas

que visem a plena participação da pessoa com deficiência”.

O Decreto-Lei n.º 123/97 foi recentemente revogado pelo Decreto-Lei n.º 163/2006, de 8 de

Agosto, que visa “numa solução de continuidade com o anterior diploma, corrigir as imperfeições nele

constatadas, melhorando os mecanismos fiscalizadores, dotando-o de uma maior eficácia

sancionatória, aumentando os níveis de comunicação e de responsabilização dos diversos agentes

envolvidos nestes procedimentos, bem como introduzir novas soluções consentâneas com a evolução

técnica, social e legislativa entretanto verificada”. Este decreto aplica-se quer aos espaços públicos

quer aos espaços privados.

2. Situação actual dos serviços e sua organização

Segundo Dahlberg e Årsén (1994), o desenvolvimento das políticas e práticas ao nível da

educação e cuidados para a infância está relacionado com o que a sociedade espera das suas

crianças, a eterna questão filosófica que deve ser levantada por cada geração. Do mesmo modo, as

ideias acerca de quem é responsável pelos cuidados e educação das crianças têm uma grande

influência nas políticas educativas nos diversos países e têm variado ao longo do tempo. Ultimamente

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Evolução e situação actual dos serviços

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tem sido adoptada a perspectiva de que os serviços formais de educação e cuidados podem ser

complementares das famílias (OCDE, 2001) e, também em Portugal, o Estado tem vindo a assumir

progressivamente maior responsabilidade na organização e financiamento de serviços de educação e

cuidados para a infância. A Lei-Quadro da Educação Pré-Escolar (n.º 5/97, de 10 de Fevereiro)

preconiza que a “educação pré-escolar é a primeira etapa da educação básica no processo de

educação ao longo da vida, sendo complementar da acção educativa da família, com a qual deve

estabelecer estreita cooperação, favorecendo a formação e o desenvolvimento equilibrado da criança,

tendo em vista a sua plena inserção na sociedade como ser autónomo, livre e solidário”. Contudo,

como foi já descrito, a educação de crianças com menos de 3 anos de idade não faz parte do sistema

educativo, sendo tutelada pelo Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social e não pelo Ministério

da Educação. O Ministério da Educação não está envolvido nos serviços prestados a crianças com

idade inferior a 3 anos, não existindo qualquer enquadramento curricular ou educativo da sua

responsabilidade (OCDE, 2000).

Em Portugal existem actualmente várias opções formais de cuidados e educação para crianças

com idade inferior a 6 anos, ou seja, antes da entrada para a escolaridade obrigatória. As crianças com

idade inferior a 3 anos podem frequentar creches (sector público e sector privado com ou sem fins

lucrativos), mini-creches (sector público), amas oficializadas (sector público) ou creches familiares

(sector público e sector privado), sob a tutela do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social

(Bairrão et al., 1990; Vasconcelos et al., 2002).

A Direcção-Geral da Segurança Social (DGSS) disponibiliza no seu sítio na Internet

(http://www.seg-social.pt/) a definição de dois tipos de resposta: creche e ama. Assim, a resposta ama

é definida como “Resposta social desenvolvida através de um serviço prestado por pessoa idónea que,

por conta própria e mediante retribuição, cuida de crianças que não sejam suas parentes ou afins na

linha recta ou no 2.º grau da linha colateral, por um período de tempo correspondente ao trabalho ou

impedimento dos pais”. Esta resposta social tem os seguintes objectivos: (1) apoiar as famílias

mediante o acolhimento de crianças, providenciando a continuidade dos cuidados a prestar; (2) manter

as crianças em condições de segurança; (3) proporcionar, num ambiente familiar, as condições

adequadas ao desenvolvimento integral das crianças. As Disposições Legais e Técnicas

Enquadradoras desta resposta são o Decreto-Lei n.º 158/84, de 17 de Maio, e o Despacho Normativo

n.º 5/85, de 18 de Janeiro. A creche é considerada a “Resposta social, desenvolvida em equipamento,

de natureza sócio-educativa, para acolher crianças até aos três anos de idade, durante o período diário

correspondente ao impedimento dos pais ou da pessoa que tenha a sua guarda de facto, vocacionado

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Capítulo I

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para o apoio à criança e à família.”. Os objectivos da creche são: (1) proporcionar o bem-estar e

desenvolvimento integral das crianças num clima de segurança afectiva e física, durante o afastamento

do seu meio familiar através de um atendimento individualizado; (2) colaborar estreitamente com a

família numa partilha de cuidados e responsabilidades em todo o processo evolutivo das crianças; (3)

colaborar de forma eficaz no despiste precoce de qualquer inadaptação ou deficiência assegurando o

seu encaminhamento adequado; (4) prevenir e compensar défices sociais e culturais do meio familiar.

As principais Disposições Legais e Técnicas Enquadradoras da Creche são o Despacho Normativo n.º

99/89, de 11 de Setembro, o Guião Técnico n.º 4, Creche, editado pela ex-DGAS, aprovado em

29/11/1996, e a Orientação Técnica, Circular n.º 11, de 24/06/2004. É importante que o investimento

que se tem efectuado no sentido de aumentar o número de estruturas de atendimento às famílias com

crianças pequenas seja acompanhado por um esforço para se melhorar a sua qualidade.

Recentemente, o Instituto da Segurança Social (2005b) divulgou um conjunto de documentos que

poderá auxiliar as creches nesse sentido.

Na Carta Social – Rede de Serviços e Equipamentos 2005 (Ministério do Trabalho e da

Solidariedade Social, 2007) é definida também a creche familiar, que corresponde a um conjunto de

amas, não inferior a 12 nem superior a 20, que residem na mesma zona geográfica e que estão

enquadradas, técnica e financeiramente, pelos centros regionais da segurança social, Santa Casa da

Misericórdia de Lisboa ou instituições particulares de solidariedade social com actividades no âmbito

das primeira e segunda infâncias. Esta resposta é legalmente enquadrada pelo Decreto-Lei n.º 158/84,

de 17 de Maio.

Finalmente, a mini-creche é definida como uma organização pequena e de ambiente

semelhante ao familiar, que acolhe cinco ou seis crianças (Ministério da Educação, 2000).

O jardim-de-infância é a opção privilegiada de educação pré-escolar e a mais frequentada

pelas crianças dos 3 aos 6 anos (Ministério da Educação, 2000), prestando serviços vocacionados para

o desenvolvimento da criança, proporcionando-lhe actividades educativas e podendo também oferecer

actividades de apoio à família. No mesmo documento do Ministério da Educação (2000) são ainda

definidas outras modalidades para crianças entre os 3 e os 6 anos de idade: (1) actividades de

animação socioeducativa, tuteladas pelo Ministério do Trabalho e da Solidariedade, dinamizando

actividades destinadas a crianças da educação pré-escolar, que suplementam o horário escolar,

cobrindo a diferença entre este e o horário laboral dos pais e que têm uma intencionalidade de guarda

das crianças; (2) animação infantil e comunitária, que se destina a crianças de 5 anos de zonas

urbanas periféricas, populosas e carenciadas, sem acesso a qualquer equipamento, com o fim de lhes

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Evolução e situação actual dos serviços

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proporcionar actividades adequadas ao seu desenvolvimento e que decorrem habitualmente em

instalações cedidas pela comunidade; (3) educação de infância itinerante, que é uma modalidade de

educação que possibilita o acesso a actividades educativas de crianças dos 3 aos 5 anos de idade,

residentes em zonas rurais onde não é possível a criação de um jardim-de-infância devido ao reduzido

número de crianças (menos de 15).

Os jardins-de-infância podem pertencer à rede pública e à rede privada (estabelecimentos que

funcionem em instituições de ensino particular ou cooperativo, Instituições Particulares de

Solidariedade Social, Misericórdias, Mutualidades ou outras instituições sem fins lucrativos),

pertencendo as tutelas ao Ministério da Educação e ao Ministério da Segurança Social e do Trabalho.

É da responsabilidade do Ministério da Educação assegurar a qualidade pedagógica do ensino

ministrado e financiar os encargos respeitantes à componente educativa, enquanto que o apoio às

famílias, designadamente o desenvolvimento de actividades de animação socioeducativa, é da

responsabilidade do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social (Ministério da Educação, 2000).

Para, de algum modo, garantir a coordenação entre as entidades envolvidas, foi criado em 1996 o

Gabinete para a Expansão e Desenvolvimento da Educação Pré-escolar, que agrega diversos serviços

do Ministério da Educação e do Ministério do Trabalho e da Solidariedade e tem representantes de

outras entidades.

O número de estruturas de educação para a infância (nomeadamente creches e jardins-de-

infância) tem vindo a aumentar. Em 1996, no nosso país, a taxa de cobertura de estruturas formais

para crianças entre os 4 meses e os 3 anos de idade era de 12.7% (Vasconcelos et al., 2002). Em

2003 era de 21.5%, ainda assim aquém da meta de 33% definida para 2010 (Instituto da Segurança

Social, 2005a). Em 2007, foi publicada a Carta Social relativa ao ano de 2005, que referia que o

número de creches aumentou 30% entre 1998 e 2005 e que a sua taxa de utilização era superior a

90% (Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, 2007).

Relativamente aos cuidados para crianças dos 3 aos 6 anos de idade, a taxa de pré-

escolarização a nível nacional passou de 57.8% em 1996 para 78.3% no ano lectivo de 2004-2005, e

para 78.4% em 2005-2006 (Gabinete de Avaliação e Informação do Sistema Educativo, 2007).

Podemos considerar que, de facto, o esforço no sentido de se aumentar a taxa de cobertura destes

serviços tem surtido os efeitos desejados, tendo sido ultrapassada claramente a fase em que, segundo

Bairrão et al. (1997), a educação pré-escolar era considerada embrionária.

Esta progressiva expansão poderá estar relacionada com a crescente procura de serviços

extra-familiares de cuidados para a infância, associada ao elevado número de mães integradas no

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Capítulo I

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mundo do trabalho. De facto, em Portugal, em 1999, cerca de 75% das mulheres entre os 25 e os 34

anos de idade estavam empregadas e trabalhavam em média 38 horas semanais, o número mais

elevado entre os países participantes no estudo (OCDE, 2001). Pelo contrário, era um dos países com

menor percentagem de mulheres a trabalhar com horários parciais (apenas 8%). Ainda de acordo com

a OCDE (2001) os países com maiores taxas de trabalho feminino são também aqueles que

apresentam uma maior taxa de fertilidade, entendida como o número médio de nascimentos por

mulher, durante o seu passado reprodutivo, avaliado aos 50 anos de idade. Assim, o trabalho feminino

aparece em conjunção com o ter filhos, o que leva à necessidade de se criarem serviços de educação

e cuidados para crianças pequenas.

A par das transformações económicas e sociais que conduziram as mulheres a terem cada vez

mais actividades fora de casa, novas responsabilidades e uma nova imagem, verificou-se a

desintegração das grandes famílias tradicionais (Portugal, 1998b). Uma tendência, que se verifica ao

nível da sociedade, é o crescente número de crianças que vivem com apenas um dos pais e o

crescente número de mulheres actuando como o único ou principal responsável por cuidar e educar as

crianças, garantindo ao mesmo tempo a subsistência a nível económico (OCDE, 2001). Apesar de no

relatório da OCDE, Portugal constar ainda como um dos países em que esta situação menos se

verifica, a par da Itália, dados do Instituto Nacional de Estatística, disponibilizados pelo Ministério da

Educação (2000), indicam que entre 1991 e 1997 houve um aumento de 58% na proporção de famílias

monoparentais. Os serviços de educação e cuidados devem ser sensíveis à crescente existência de

famílias monoparentais, tendo em consideração os seus constrangimentos a nível financeiro e mesmo

a nível de horários. Do mesmo modo, o mercado de trabalho deveria responder com maior flexibilidade

a este tipo de famílias. Em Países como a Austrália, o Reino Unido e os Países Baixos, a taxa de

emprego das mães de famílias monoparentais é mais baixa do que em famílias com ambos os pais,

devido às políticas que permitiram que este tipo de pais recebesse um apoio financeiro para cuidar das

crianças. Contudo, mesmo nestes países, os apoios têm sido restringidos, de forma a evitar a

dependência dos benefícios sociais (OCDE, 2001). Em 2004, no trabalho sobre a reconciliação do

trabalho e da vida familiar, realizado igualmente pela OCDE, esta organização continua a sugerir que

Portugal deve reduzir as barreiras ao trabalho a tempo parcial, implicando uma mudança na

mensalidade paga pelos pais nas creches e jardins-de-infância, que deviam depender do número de

horas de utilização. Sugere, ainda, que o Estado dê directamente aos pais um subsídio que lhes

permita escolher a instituição, independentemente do seu tipo (pública ou privada, com ou sem fins

lucrativos), reforce o apoio às famílias com rendimentos inferiores, reforce os empregadores que têm

políticas de trabalho que favorecem as famílias e melhore as condições relacionadas com as licenças

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Evolução e situação actual dos serviços

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de maternidade/paternidade (OCDE, 2004a).

Também a valorização da criança na sociedade e na família, com o consequente aumento de

expectativas quanto à sua educação, tem contribuído para o aumento da taxa de cobertura da rede

nacional de creches (Ministério da Educação, 2000). Segundo Bairrão e Tietze (1995), existem provas

crescentes de que a participação em programas pré-escolares de qualidade influencia positivamente a

posterior adaptação das crianças à escola e promove o sucesso escolar.

De facto, os aspectos referidos parecem estar espelhados nos objectivos das creches definidos

no sítio da Direcção-Geral da Segurança Social (DGSS), bem como nos Guiões Técnicos da Acção

Social (Rocha et al., 1996), uma vez que salientam, entre outros, os objectivos de proporcionar o bem-

estar e desenvolvimento integral das crianças, num clima de segurança afectiva e física, durante o

afastamento parcial do seu meio familiar, através de um atendimento individualizado e o de colaborar

de uma forma eficaz no despiste precoce de qualquer inadaptação ou deficiência, assegurando o seu

encaminhamento adequado.

A OCDE (2001) destaca que existem actualmente sete tendências comuns a diversos países,

ao nível da educação e cuidados de crianças pequenas: (1) expandir os serviços, através de um

acesso universal; (2) aumentar a qualidade dos serviços; (3) promover coerência e coordenação das

políticas e serviços; (4) explorar estratégias para assegurar um adequado investimento no sistema; (5)

melhorar a formação do pessoal e as suas condições de trabalho; (6) desenvolver uma apropriada

orientação pedagógica para as crianças pequenas; e (7) envolver os pais, as famílias e as

comunidades.

A equipa da OCDE que elaborou o Estudo Temático no ano 2000 considerou, relativamente ao

nosso país, que “a relutância em equacionar o envolvimento do Estado na promoção dos serviços de

apoio ao grupo etário dos 0 aos 3 anos poderia ter, por vezes, consequências negativas para as

famílias e para as crianças” (OCDE, 2000, p.206), acrescentando que uma dessas consequências se

relaciona com a identificação tardia de muitas crianças com necessidades especiais ou que vivem em

situação de risco. Em Portugal, de facto, o investimento nos serviços para crianças entre os 0 e os 3

anos deveria ser intensificado, uma vez que esta faixa etária foi descurada durante muito tempo e a

situação actual continua a não ser a mais adequada para responder às necessidades das crianças e

das suas famílias.

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CAPÍTULO II: Educação e cuidados de elevada qualidade para

crianças com idade inferior a 6 anos

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1. Definição de educação e cuidados de boa qualidade

Tal como é sugerido pela European Commission Childcare Network (1990), qualquer definição

de qualidade é de algum modo transitória. Compreender a qualidade e chegar a indicadores de

qualidade é um processo dinâmico e contínuo de reconciliação da ênfase colocada pelos diferentes

grupos envolvidos nesta área. De facto, aquilo que consideramos ser importante para crianças

pequenas é, em grande parte, influenciado pelas nossas crenças, pelas percepções sociais e por

valores (Brophy & Statham, 1994; European Commission Childcare Network, 1992). Como afirmam

Dahlberg et al. (1999), trata-se de um conceito socialmente construído e culturalmente variável, com

significados muito particulares, produzidos através do que é referido por discurso da qualidade. Deste

modo, diferentes pessoas (ou grupos de pessoas) poderão atribuir diferentes significados dependendo,

nomeadamente, como referem Bryant, Burchinal, Lau e Sparling (1994), dos aspectos em que se

baseiam para o fazer: características estáticas ou dinâmicas do ambiente (Carta, Sainato, &

Greenwood, 1988), variáveis distais ou próximas (Dunn, 1993) e dimensões estruturais ou de processo

(Phillips, Voran, Kisker, Howes, & Whitebook, 1994). É considerado também um conceito dinâmico,

uma vez que as definições de qualidade evoluem ao longo do tempo (Moss, 1994), ou transitório,

implicando um processo contínuo de identificação de indicadores de qualidade (Brophy & Statham,

1994). Jensen (1994) acrescenta, ainda, que a qualidade, aplicada às mais diversas áreas, reflecte não

apenas os padrões actuais (a forma como se vê o mundo hoje), mas também factos históricos (a forma

como se é influenciado pelas teorias, tradições e eventos do passado). Neste sentido, Pence e Moss

(1994) sugerem que se criem definições de qualidade específicas a cada contexto temporal e espacial,

capazes de evoluir através de um processo dinâmico e contínuo.

Moss (1994) identifica dois significados de qualidade, que se podem complementar. Um deles

é analítico e descritivo, usado para analisar, descrever e compreender a essência ou natureza de algo,

refere-se àquilo que faz com que algo seja o que é. Compreender a qualidade neste sentido implica

conhecer as dinâmicas subjacentes a um serviço em particular. O segundo significado de qualidade é

avaliativo e refere-se à tentativa de se avaliar em que medida um serviço cumpre os objectivos

definidos quer a nível estrutural, quer a nível processual. Segundo Moss (1994) estas características de

processo e de estrutura são normalmente seleccionadas tendo em conta a sua relação com certos

resultados ao nível do desenvolvimento da criança, a curto e longo prazo. Avaliar em que medida o

serviço atinge os objectivos pode consistir igualmente na verificação da satisfação dos pais, vistos

como clientes, se se tratar de uma abordagem orientada para o mercado. Brophy e Statham (1994)

efectuam ainda outra distinção, considerando que a qualidade deveria ser considerada a dois níveis:

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Capítulo II

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(1) a qualidade de cada serviço, individualmente, e (2) a qualidade do sistema de serviços.

Jensen (1994) refere que, no passado, a palavra qualidade era usada para designar uma

complexidade que era difícil de definir sem se usarem milhares de palavras e, mesmo que milhares de

palavras fossem usadas, o sentimento remanescente seria o de que a descrição teria apenas tocado a

superfície do que tinha sido de facto experienciado. Contudo, o autor considera que o significado foi

alterado e que o conceito de qualidade passou a ser utilizado no contexto de “gestão da qualidade” e

“controlo da qualidade” e no sentido de que a qualidade precisa de ser definida e medida

rigorosamente. Jensen questiona se esta utilização poderá servir para melhorar a qualidade, receando

que a vá prejudicar mais do que beneficiar.

A definição de educação e cuidados de elevada qualidade não é, certamente, independente

das funções definidas para as estruturas que acolhem crianças desde os primeiros anos de vida até à

idade de entrada na escolaridade obrigatória. Tradicionalmente são atribuídas três funções à educação

pré-escolar: (1) função social ou assistencial, (2) função educativa e (3) função preventiva ou função

compensatória (Bairrão et al., 1997; Scarr, 1998). A função social ou assistencial traduz-se em tomar

conta ou guardar as crianças, sendo essencial para os pais que trabalham, sendo habitualmente

associada às instituições tuteladas pelo Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social. A função

educativa surge com a valorização crescente da educação em geral, sendo reconhecido um papel

importante do sistema pré-escolar na educação da criança, na medida em que proporciona

oportunidades de aprendizagem e de desenvolvimento. De acordo com Bairrão e colaboradores (1997),

a função educativa surgiu ainda no século XIX. No século XX, em meados dos anos 60, viveu-se no

mundo ocidental um período conturbado e de grandes alterações sociais, tendo sido envidados

esforços para suprimir os efeitos negativos associados à pobreza. Neste contexto, a educação pré-

escolar começou a ser vista como um meio de lutar contra o insucesso escolar, falando-se então na

função preventiva e na função compensatória, na medida em que era considerada uma panaceia

contra as “deficiências culturais” dessas crianças (Bairrão et al., 1997).

Embora se possam distinguir estas três funções, nos países da OCDE tem havido uma

tendência crescente para assumir que os “cuidados” e a “educação” são conceitos inseparáveis e que

os serviços de boa qualidade necessariamente fornecem ambos (OCDE, 2001). Este tipo de

abordagem considera os diversos objectivos destas estruturas, incluindo a prestação dos cuidados, a

aprendizagem e o apoio a nível social. Quando os serviços se focam demasiado no objectivo de

preparação para a entrada na escola, corre-se o risco de se pressionar demasiado as crianças no

sentido de desenvolverem competências específicas, principalmente na área da literacia e numeracia,

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Educação e cuidados de elevada qualidade

53

podendo ser negligenciadas outras áreas importantes do desenvolvimento e aprendizagem (OCDE,

2001). Estas competências são importantes, mas devem ser incluídas no âmbito de um currículo mais

vasto. Como refere a OCDE (2001), mais importante do que promover aprendizagem ao nível

académico é promover experiências variadas de modo a que, no início da escolaridade obrigatória, as

crianças sejam aprendizes capazes, confiantes, flexíveis e abertos a novas possibilidades e relações.

Jalongo e colaboradores, em 2004, redigiram um documento no qual apresentavam os direitos

das crianças de frequentarem programas de elevada qualidade, explicando a importância de as

diversas nações promoverem serviços: (1) com filosofias e objectivos fortes, que assegurem a resposta

às necessidades de todas as crianças; (2) com ambientes físicos de elevada qualidade, que reflictam o

conhecimento e o respeito pela segurança, bem-estar físico, estimulação intelectual e apoio social das

crianças mais novas; (3) que implementem currículos e pedagogias eficazes e desenvolvimentalmente

adequados, necessariamente diferentes dos currículos da idade escolar; (4) que dêem atenção quer às

necessidades básicas das crianças, quer às necessidades especiais, em ambientes inclusivos; (5) que

respeitem as famílias e as comunidades, promovendo interacções consonantes com as características

individuais, culturais e étnicas; e (6) que recrutem profissionais com formação adequada e assegurem

condições de trabalho e remuneração adequadas (Jalongo et al., 2004). De acordo com estes autores,

todos os serviços de educação e cuidados deveriam ser rigorosamente avaliados, o que implicaria

aspectos que são facilmente quantificados (como o número de crianças atendidas) e aspectos

qualitativos, relacionados com o contributo para a promoção da elevada qualidade dos serviços

prestados às crianças, às famílias, às comunidades e ao país.

Apesar de não ser fácil definir qualidade, a European Commission Childcare Network (1990)

propõe que os serviços de elevada qualidade devem ter o objectivo de assegurar que as crianças têm a

oportunidade de experienciar uma vida saudável, expressão espontânea, estima enquanto indivíduos,

dignidade e autonomia, auto-confiança na aprendizagem, aprendizagem estável e ambiente afectuoso,

sociabilidade, amizade e cooperação com os outros, oportunidades equivalentes independentemente

do género, da raça e da incapacidade, diversidade cultural, apoio enquanto parte de uma família e de

uma comunidade e felicidade. A OCDE (2001) reconhece igualmente que as definições de qualidade

diferem consideravelmente entre diversos grupos envolvidos e entre países. Apesar de considerar

necessário definir orientações nacionais ao nível da qualidade, é também necessário que elas sejam

suficientemente abrangentes para permitir que as estruturas, individualmente, respondam às

necessidades das crianças ao nível do desenvolvimento e às suas capacidades de aprendizagem.

Segundo a OCDE, relativamente às estruturas que acolhem crianças de idade superior a 3 anos de

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Capítulo II

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idade, diversos países focam-se em elementos comuns nas definições de qualidade, principalmente no

que diz respeito a características como: rácio adulto-criança, tamanho do grupo, condições físicas da

instituição e formação do pessoal. Bairrão (1998) defende igualmente que existe algum consenso nos

países da Europa, nos EUA e em outros países industrializados, uma vez que têm considerado que a

qualidade se relaciona com as características físicas e sociais dos contextos onde a educação e os

cuidados ocorrem, com as características das pessoas que trabalham nesses contextos, com as

características dos programas, com as políticas educativas, com os resultados da investigação, entre

outros aspectos. Contudo, de acordo com a OCDE (2001), as concepções de qualidade na educação e

cuidados de crianças até aos 3 anos são menos consensuais. Em Portugal, o Ministério da Educação

assume a responsabilidade pela definição dos critérios de qualidade da educação pré-escolar, através

do Departamento da Educação Básica (Ministério da Educação, 2000). Estes critérios são válidos

apenas para as estruturas que se encontram sob tutela deste Ministério, ou seja, que são frequentadas

por crianças entre os 3 anos de idade e a entrada para a escolaridade obrigatória, não abrangendo as

creches. O estudo realizado pela OCDE (2001), envolvendo diversas nações, permitiu concluir que,

exceptuando os países que desenvolveram um sistema integrado de educação e cuidados, a situação

das estruturas para crianças com menos de 3 anos de idade é menos favorável do que para crianças

mais velhas, quer em termos de acesso, quer em termos de qualidade. Em muitos países, a situação

global é caracterizada por um baixo investimento público e elevados custos para os pais,

regulamentações desadequadas, falta de formação e baixo estatuto do pessoal, pouca atenção dada

às orientações pedagógicas, grande variabilidade ao nível da inspecção e da monitorização.

Admitindo, tal como a OCDE (2001), a dependência da definição de qualidade dos diversos

indivíduos, e grupos de indivíduos, envolvidos na prestação de serviços às crianças antes da

escolaridade obrigatória, Katz (1998) defende que o conceito de qualidade deve ser considerado sob

várias perspectivas: (1) perspectiva orientada de cima para baixo; (2) perspectiva orientada de baixo

para cima; (3) perspectiva orientada de fora para dentro; (4) perspectiva orientada de dentro para fora;

e (5) perspectiva exterior ao programa. Esta autora advoga que os critérios representativos das cinco

perspectivas devem merecer consideração enquanto determinantes da qualidade dos programas,

assumindo, ainda, que a avaliação da qualidade de um programa através de perspectivas múltiplas

coloca problemas complexos quanto às causas da má qualidade e à definição das responsabilidades

por esse resultado. A perspectiva orientada de cima para baixo é a abordagem mais prevalecente na

investigação sobre esta temática, consistindo na identificação de características do programa (entre as

quais o ambiente criado e o equipamento) segundo a perspectiva dos adultos encarregados de

executar ou aprovar o programa, incluindo aspectos como: a proporção adultos-crianças, as

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Educação e cuidados de elevada qualidade

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qualificações e a estabilidade dos profissionais, as características das relações entre adultos e

crianças, a qualidade e quantidade do equipamento e dos materiais, a qualidade e quantidade do

espaço por criança, aspectos das condições de trabalho dos profissionais e cuidados de saúde e

higiene, prevenção de incêndios, etc.. A perspectiva orientada de baixo para cima visa determinar

como o programa é vivido pelas crianças que nele participam, sublinhando a importância de a criança

se sentir integrada no ambiente do programa educativo, sentir que pertence ao grupo e que é

compreendida e protegida pelos adultos, bem como a necessidade de se sentir intelectualmente

envolvida e respeitada. A terceira abordagem, perspectiva orientada de fora para dentro ou perspectiva

exterior-interna ao programa, consiste na avaliação dos programas tal como são vividos pelas famílias

por eles abrangidas, ou seja, diz respeito à qualidade das características das relações pais –

educadores. A perspectiva orientada de dentro para fora ou interior ao programa considera a forma

como este é vivido pelos profissionais que o põem em prática e inclui dimensões como as relações

entre colegas, as relações entre profissionais e famílias e as relações com a instituição promotora do

programa. A quinta perspectiva, exterior ao programa ou conclusiva, considera a forma como o

programa serve a comunidade e a sociedade em geral, ou seja, tem a ver, sobretudo, com a avaliação

do programa por diferentes entidades.

Apesar de as definições de qualidade não serem sempre consensuais, tem sido encontrado um

relativo acordo entre os investigadores no que diz respeito às condições que influenciam positivamente

as crianças a curto e a longo prazo (OCDE, 2001). A um nível sistémico, essas condições incluem:

níveis adequados de investimento, políticas e regulamentações coordenadas; estruturas de gestão

eficientes e coordenadas; formação adequada do pessoal e condições de trabalho adequadas;

abordagem pedagógica; e monitorização do sistema baseada em recolha de dados fidedigna. Ao nível

da instituição, podem identificar-se aspectos como a duração e intensidade apropriadas, tamanho e

composição do grupo adequados, rácios adulto-criança favoráveis e factores relacionados com o

espaço físico, como a qualidade dos contextos interiores e exteriores. Além dos aspectos estruturais, a

qualidade também é definida em termos de processo e de resultado. A qualidade processual está

relacionada com as condições de saúde e de segurança, as interacções entre crianças e adultos, a

relação com os pais e as oportunidades sociais e de aprendizagem. As variáveis de resultado avaliam

o progresso das crianças em áreas do desenvolvimento e aprendizagem e procuram avaliar a eficácia

das abordagens (OCDE, 2001).

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Capítulo II

56

1.1 Dimensões da qualidade: características de estrutura e características de processo

A distinção entre qualidade de processo e qualidade de estrutura tem sido adoptada por vários

autores. No âmbito do Cost, Quality and Child Outcomes in Child Care Centers Study (Cost, Quality &

Child Outcomes Study Team, 1995) definem-se as características estruturais como os aspectos da

estrutura da sala, que podem ser regulamentados para melhorar a qualidade dos serviços prestados às

crianças, incluindo o rácio adulto-criança, o tamanho do grupo, a formação e experiência do pessoal, o

espaço por criança e outras medidas da qualidade das instalações. A qualidade de processo refere-se

ao ambiente em geral e às interacções sociais, representando a qualidade dos serviços directamente

prestados às crianças e às suas famílias e que não é regulamentável devido à sua natureza qualitativa.

Segundo Vandell e Wolfe (2000), os processos, na prestação de cuidados, referem-se às experiências

que efectivamente ocorrem nos contextos de prestação de cuidados, incluindo as interacções das

crianças com os prestadores de cuidados e com os pares e a sua participação em diferentes

actividades.

As características de estrutura podem ser regulamentadas e requeridas pelas entidades

competentes. Contudo, tal não significa que se traduzam numa efectiva prestação de serviços de

elevada qualidade. A qualidade dos cuidados não se relaciona com onde os cuidados são prestados,

mas com como são prestados (E. Cochran, M. Cochran, & Torp, 2000). Como referem Cochran et al.

(2000), pode ser muito difícil promover cuidados de elevada qualidade num ambiente que é sujo, no

qual o equipamento está em mau estado, onde há poucos brinquedos e o espaço está sobrelotado,

contudo a qualidade pobre pode ser encontrada em ambientes muito bonitos, com todos os brinquedos

e materiais que uma criança poderia desejar. Lamb (1998) considera que não se podem definir

universalmente os indicadores de elevada qualidade, uma vez que a tradução dos factores estruturais

em qualidade [de processo] varia em função da cultura, do contexto e das oportunidades alternativas

disponíveis para as crianças, para os prestadores de cuidados e para os pais.

De qualquer modo, o rácio adulto-criança, o número de adultos da sala e o número de crianças

da sala têm sido considerados medidas da qualidade das salas1. Apesar de não ser garantido, espera-

se que o número de crianças por adulto tenha algum efeito no ambiente da creche e no

desenvolvimento das crianças, assumindo-se que à medida que aumenta o número de crianças por

adulto diminuem as possibilidades do adulto interagir com cada criança (Howes & Hamilton, 1993).

Grupos grandes também parecem dificultar o trabalho dos profissionais de educação de infância,

1 Resultados da investigação relativos à relação entre indicadores da qualidade de processo e da qualidade de estrutura serão apresentados na secção 2.2 (Alguns resultados obtidos).

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Educação e cuidados de elevada qualidade

57

principalmente do adulto responsável pela sala (Howes & Hamilton, 1993). Frede (1995) efectuou a

revisão de estudos cujo principal objectivo era definir e avaliar os efeitos da qualidade dos serviços de

educação e cuidados para as crianças mais novas (antes da entrada na escolaridade obrigatória),

analisando programas que revelaram ser eficazes a longo prazo, tentando identificar elementos

comuns que possam ser críticos para a eficácia do pré-escolar. Este autor verificou que os diversos

estudos indicam que os programas mais eficazes são aqueles que têm uma combinação de elementos

como grupos com poucas crianças e poucas crianças por adulto, profissionais que recebem algum tipo

de apoio de modo a reflectirem sobre as suas práticas e a melhorá-las, comunicação contínua entre a

família e a escola e utilização de alguns conteúdos curriculares e de processos da sala que as crianças

encontrarão na escolaridade obrigatória (Frede, 1995). McMullen (1999b) considera que os rácios

adulto-criança e o número de crianças por grupo são muito importantes para as crianças de qualquer

idade, contudo realça a sua importância para os bebés e para as crianças de 1 e de 2 anos. Estes

factores são críticos para assegurar a saúde e a segurança dos bebés e crianças mais novas e, se

forem adequados, permitem o estabelecimento de relações que favorecem uma vinculação e cuidados

responsivos e sensíveis. Para esta autora, também a comunicação com os pais e o seu envolvimento

na instituição é ainda mais importante nas salas para bebés e crianças mais novas do que nas salas

para crianças mais velhas, devendo observar-se uma comunicação diária e detalhada entre pais e

prestadores de cuidados (McMullen, 1999b).

No mesmo sentido, reconhecendo o papel dos serviços de prestação de cuidados

extrafamiliares no desenvolvimento das crianças, Bredekamp (1989; como citada em Scarr, 1998)

sublinha a importância das interacções com adultos num ambiente seguro, saudável e estimulante, no

qual a educação e as relações de confiança se combinam para apoiar o desenvolvimento físico,

emocional, social e intelectual da criança, considerando ainda (1989; como citada em Scarr, Eisenberg,

& Deater-Deckard, 1994) que os critérios mais comuns para determinar a qualidade incluem condições

de saúde e segurança, interacções caracterizadas por capacidade de resposta e afecto entre crianças

e adultos, currículo desenvolvimentalmente adequado, tamanho do grupo limitado, rácio adulto-criança

adequado à idade, espaços interiores e exteriores adequados e formação adequada do pessoal no

domínio do desenvolvimento e da educação da criança. Assim, combinam-se características de

estrutura e características de processo, que, sendo de boa qualidade, podem contribuir para o

desenvolvimento das crianças.

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Capítulo II

58

1.2 Práticas promotoras do desenvolvimento das crianças

A National Association for the Education of Young Children (NAEYC) é uma organização norte-

americana que tem desenvolvido esforços no sentido de promover a qualidade na área da educação e

dos cuidados para as crianças, tendo Sue Bredekamp, acima referenciada, contribuído grandemente

para os trabalhos desenvolvidos por esta associação. A NAEYC (1998) define um programa de elevada

qualidade como aquele que garante um ambiente seguro e educativo que promove o desenvolvimento

das crianças nos vários domínios (físico, social, emocional, estético, intelectual e da linguagem), sendo

também sensível às necessidades e preferências das famílias.

A NAEYC (1997) utiliza a designação programas desenvolvimentalmente adequados para se

referir aos programas que contribuem para o desenvolvimento da criança, descrevendo os princípios

para a implementação de práticas desenvolvimentalmente adequadas em serviços de educação para a

infância, destinados a gestores ou técnicos da administração pública ou privada, educadores,

professores, pais, políticos, bem como todos aqueles que tomam decisões. A mesma associação

(1997) sugere linhas de orientação para a prática profissional, abordando 5 dimensões inter-

relacionadas: (1) criar uma comunidade interessada de aprendizes; (2) ensinar de modo a promover o

desenvolvimento e a aprendizagem; (3) construir um currículo adequado; (4) avaliar o desenvolvimento

e aprendizagem da criança; e (5) estabelecer relações recíprocas com as famílias.

A primeira dimensão reflecte os conhecimentos acerca da construção social do conhecimento e

da importância de se estabelecer uma comunidade inclusiva na qual as crianças se desenvolvem e

aprendem, implicando que: (a) os participantes contribuam para o bem-estar e aprendizagem uns dos

outros; (b) se verifiquem relações positivas consistentes, com um número limitado de adultos e outras

crianças, e cada criança seja valorizada; (c) as crianças tenham oportunidades para interagir com

outras crianças em pequenos grupos; (d) o ambiente de aprendizagem seja planeado para proteger a

saúde e a segurança das crianças e apoiar as suas necessidades fisiológicas de actividade

(nomeadamente no exterior), estimulação sensorial, descanso e nutrição; e (e) o ambiente seja

organizado e a rotina seja dinâmica, mas previsível, e exista variedade de materiais e oportunidades

para as crianças terem experiências significativas.

A segunda dimensão, relativa ao ensino, responsabiliza os profissionais de educação pela

criação das condições necessárias ao desenvolvimento saudável e aprendizagem das crianças. A

NAEYC (1997) conceptualiza as relações com adultos como determinantes críticos do desenvolvimento

social e emocional e como importantes mediadores do desenvolvimento intelectual e da linguagem das

crianças. Relembra, contudo, que as crianças são construtores activos do seu próprio conhecimento e

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Educação e cuidados de elevada qualidade

59

que beneficiam da oportunidade de iniciar e regular as suas próprias actividades de aprendizagem e

interacção com pares. Desta forma, os educadores devem conseguir um equilíbrio óptimo entre a

aprendizagem iniciada pelas crianças e a orientação e apoio do adulto.

No que se refere à terceira dimensão, a NAEYC considera que o conteúdo de um currículo

deve ser determinado por vários factores, nomeadamente temas de diferentes disciplinas, valores

sociais e culturais, contributos parentais, idade e experiência das crianças.

Relativamente à quarta dimensão, a avaliação do desenvolvimento e aprendizagem de cada

criança é essencial para o planeamento e implementação de um currículo adequado. A última

dimensão, relativa à necessidade de estabelecer relações recíprocas com famílias, implica um

conhecimento profundo de cada criança e do contexto em que se desenvolve e aprende. Quanto mais

nova for a criança, mais importante é a promoção de um ambiente em que pais e profissionais

trabalhem em conjunto.

Reconhecendo, assim, que um programa de elevada qualidade é aquele que contribui para o

desenvolvimento das crianças, a NAEYC (1997) apresenta os princípios do desenvolvimento e da

aprendizagem das crianças, que fundamentam as práticas desenvolvimentalmente adequadas: (1) as

áreas do desenvolvimento das crianças – físico, social, emocional e cognitivo – estão interligadas, ou

seja, o desenvolvimento de uma área influencia e é influenciado pelo desenvolvimento noutra área; (2)

o desenvolvimento ocorre de acordo com uma sequência relativamente ordenada, com as

capacidades, competências e conhecimentos a construírem-se com base nos adquiridos anteriormente;

(3) o ritmo do desenvolvimento varia de criança para criança e até de área para área, numa mesma

criança; (4) as experiências precoces têm quer um efeito cumulativo, quer um efeito retardador no

desenvolvimento das crianças e existem períodos óptimos para determinados tipos de desenvolvimento

e aprendizagem; (5) o desenvolvimento sucede numa direcção previsível, no sentido de maior

complexidade, organização e internalização; (6) o desenvolvimento e a aprendizagem ocorrem em, e

são influenciados por, múltiplos contextos sociais e culturais; (7) as crianças são aprendizes activos,

baseando-se na experiência física e social, bem como no conhecimento transmitido pela cultura, para

construir a sua compreensão do mundo envolvente; (8) o desenvolvimento e a aprendizagem resultam

da interacção da maturação biológica e do ambiente, o que inclui o mundo físico e social em que as

crianças vivem; (9) o jogo é um veículo importante para o desenvolvimento social, emocional e

cognitivo, bem como um reflexo do desenvolvimento; (10) o desenvolvimento progride quando as

crianças têm oportunidades para praticar as competências recém-adquiridas, bem como quando

experimentam um desafio de um nível imediatamente superior ao seu nível actual de mestria; (11) as

crianças demonstram diferentes modos de conhecer e de aprender e diferentes formas de representar

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Capítulo II

60

o que sabem; e (12) as crianças desenvolvem-se e aprendem melhor no contexto de uma comunidade

onde estão seguras e são valorizadas, as suas necessidades físicas são satisfeitas e se sentem

psicologicamente seguras.

Reflectindo acerca das práticas desenvolvimentalmente adequadas, Bredekamp (1999)

considera que o sistema de acreditação da NAEYC constituiu uma solução massiva para dois grandes

problemas existentes nos EUA: a falta de padrões de qualidade nacionais, uniformes e consistentes, e

a falta de programas de elevada qualidade. Bredekamp (1999) sistematiza as lições aprendidas ao

longo de 12 anos de administração do programa de acreditação da NAEYC, focando três áreas: (1)

lições para a prática, (2) lições para o desenvolvimento profissional e (3) lições para as políticas.

Relativamente às lições para a prática refere o estabelecimento de padrões de qualidade, a

interpretação dos padrões na prática e a administração de programas de boa qualidade. O

estabelecimento de padrões de qualidade tem sido importante e útil, havendo investigação que apoia o

seu impacto no desenvolvimento das crianças. Contudo, a utilização de escalas de avaliação e de listas

de verificação, apesar de necessária, torna difícil transmitir a ideia de que a qualidade é um todo, uma

globalidade, e não apenas uma soma de partes. As práticas desenvolvimentalmente adequadas,

definidas pela NAEYC, foram alvo de algumas críticas e más interpretações. O processo de revisão

permitiu responder a algumas das críticas apontadas, tendo, contudo, tornado mais exigente a

avaliação dos centros para acreditação, nomeadamente no que se refere à necessidade de se

promoverem práticas que respeitem as necessidades individuais das crianças e que se adaptem às

suas características (Bredekamp, 1999). Relativamente à administração de programas de boa

qualidade, esta autora refere que tem sido demonstrada a importância do papel do director dos centros

e do ambiente profissional, pelo que se incluiu nos novos padrões de qualidade da NAEYC o

compromisso do programa com a inovação e a melhoria da qualidade (NAEYC, 1998, como citado em

Bredekamp, 1999). As práticas desenvolvimentalmente adequadas têm contribuído, segundo

Bredekamp, para o desenvolvimento profissional, fornecendo um enquadramento para os programas

que preparam profissionais ligados à educação e cuidados das crianças mais novas e exigindo

responsabilidade ética na avaliação e cumprimento dos padrões de elevada qualidade. No que

concerne às políticas, a autora relembra que o processo de acreditação pela NAEYC ocorre num

contexto social, político e cultural, havendo por vezes incompatibilidades entre os critérios de qualidade

desta associação e os critérios de qualidade requeridos pelos diferentes estados (habitualmente menos

exigentes). Além deste aspecto, para a NAEYC foi difícil estabelecer critérios válidos a nível nacional,

quando se verificam diferenças acentuadas entre os padrões mínimos exigidos nos diversos estados. A

situação mais evidente relaciona-se com o rácio adulto-criança e com o número de crianças em cada

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Educação e cuidados de elevada qualidade

61

grupo, problema para o qual não foi encontrada solução, apesar das discussões. Bredekamp (1999)

refere ainda que o processo de acreditação seria beneficiado se houvesse um sistema de

financiamento dependente da obtenção da acreditação, sendo necessário, nessa situação, definir qual

dos sistemas de acreditação existentes seria o mais adequado.

As práticas desenvolvimentalmente adequadas resultam do processo através do qual os

profissionais tomam decisões acerca do bem-estar e educação das crianças, com base nos

conhecimentos acerca do desenvolvimento e aprendizagem das crianças, das forças, dos interesses e

das necessidades de cada criança do grupo e dos contextos sociais e culturais em que as crianças

vivem (NAEYC, 1997). Cada uma destas dimensões do conhecimento é dinâmica e desafiante,

exigindo que os educadores e outros profissionais permaneçam aprendizes ao longo das suas vidas

profissionais. Aliás, a NAEYC (1997) responsabiliza os profissionais de educação pela implementação

e promoção de padrões de elevada qualidade e profissionalismo nas instituições de educação para a

infância, devendo reflectir conhecimentos actualizados e crenças partilhadas acerca do que constitui

educação de elevada qualidade e adequação desenvolvimental.

Diversos estudos têm demonstrado a importância da formação dos prestadores de cuidados no

domínio da Educação de Infância, especificamente de crianças mais novas. Arnett (1989), num estudo

no qual participaram 59 prestadores de cuidados, verificou que os adultos que tinham completado uma

formação de quatro anos em Educação de Infância eram mais competentes no seu trabalho do que os

adultos que tinham substancialmente menos formação ou que não tinham qualquer formação na área.

Além disso, os prestadores com alguma formação, ainda que muito básica, eram menos autoritários e

mais positivos e menos distantes na sua relação com as crianças, do que os que não tinham qualquer

formação. Educação, formação e cuidados estão interligados (Portugal, 1998a), exigindo que os

educadores tenham conhecimentos acerca do desenvolvimento e dos comportamentos da criança com

menos de 3 anos de idade, sejam capazes de compreender e reflectir acerca das diferentes

necessidades de cada criança e sejam capazes de promover a exploração, as actividades de

aprendizagem e a imaginação da criança. Também a OCDE (2001) reforça a importância de se

promover a adequada formação (inicial e contínua) dos profissionais que trabalham em instituições de

educação de infância, considerando que há lacunas comuns a vários países, nomeadamente nas

áreas: trabalho com os pais, trabalho com bebés e crianças com menos de 3 anos de idade, educação

especial e bilingue/multicultural, investigação e avaliação. A OCDE verificou que em alguns países,

entre os quais Portugal, a divisão que na prática se estabelece entre cuidados e educação tem

consequências ao nível da formação dos profissionais, bem como nos salários e nas condições de

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Capítulo II

62

trabalho. Nas instituições ligadas à Segurança Social, os profissionais têm níveis inferiores de

educação formal, menos especialização na área de educação de infância e piores condições de

trabalho do que os profissionais que trabalham integrados no sistema educativo. Quando todos os

serviços se encontram sob a responsabilidade do mesmo Ministério, geralmente a qualificação do

pessoal que trabalha com todas as crianças, do nascimento aos 6 anos de idade, é superior (OCDE,

2001).

Jensen (1994) reforça a ideia da importância da formação dos profissionais, referindo que a

principal razão para o sucesso dos serviços de educação e cuidados na Dinamarca é o nível de

formação do pessoal. A formação dos profissionais de educação de infância coloca uma grande ênfase

no desenvolvimento pessoal dos alunos, encoraja o desenvolvimento de competências culturais e inclui

períodos extensos de prática. Outros autores, como Jalongo et al. (2004), definem mesmo as áreas de

competência essenciais dos profissionais de educação de infância, incluindo: história e filosofia da

educação de infância; crescimento, desenvolvimento e aprendizagem das crianças; saúde, segurança

e nutrição; desenvolvimento e implementação do currículo; práticas adequadas de avaliação e gestão

dos serviços; competências de colaboração e profissionalismo; e desempenho eficaz durante a prática

supervisionada e estágio. Cochran e colaboradores (2000) referem que a visão tradicional de que todas

as mulheres gostam de crianças e que todas têm uma habilidade natural para prestarem bons cuidados

é um mito, acrescentando que “muitas mulheres e muitos homens que gostam de crianças não têm a

paciência ou as competências para serem bons educadores de infância e bons prestadores de

cuidados” (Cochran et al., 2000, p. 1).

1.3 A promoção da qualidade

Como será exposto de seguida, a qualidade dos contextos de educação e cuidados, ainda que

não reunindo consenso, pode ter um papel importante na vida das crianças e das suas famílias. A

equipa de avaliação do projecto Smart Start, iniciado em 1993 na Carolina do Norte (EUA) com o

principal objectivo de promover a melhoria da qualidade dos contextos pré-escolares, chegou à

conclusão, com base em entrevistas realizadas em instituições participantes no projecto, que os

programas que têm como objectivo promover a qualidade dos contextos de educação e cuidados para

crianças, antes da entrada na escolaridade obrigatória, deveriam utilizar as seguintes estratégias ou

actividades: (1) assegurar uma liderança forte na promoção da melhoria da qualidade (fazer da

qualidade um assunto prioritário; utilizar as competências de liderança dos educadores e directores e

promover uma competição amigável; fornecer definições comuns de qualidade e partilhar essa visão

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Educação e cuidados de elevada qualidade

63

com a comunidade; reconhecer que será necessário haver mudanças e ser flexível para que possam

ser implementadas novas abordagens; incluir todo o tipo de centros, respeitando as suas necessidades

individuais); (2) definir um plano estratégico para os programas de melhoria da qualidade a

implementar (construir um sistema com várias actividades que, em conjunto, promovam a qualidade;

utilizar a investigação como base para a tomada de decisões; escolher objectivos que possam mostrar

as melhorias e o progresso; não financiar programas que são consistentemente incapazes de mudar);

(3) apoiar a formação e o desenvolvimento profissional do pessoal (apoiar actividades que

desenvolvam a profissão de educador, contribuindo para o seu reconhecimento na comunidade;

trabalhar em conjunto com as instituições de ensino superior no sentido de aumentar os níveis de

educação dos profissionais; ajudar os prestadores de cuidados a definir um programa gradual de

formação, com etapas que possam assegurar uma melhor formação); (4) fornecer incentivos

financeiros para os centros com pessoal mais qualificado e que mostrem melhoria na qualidade

(reconhecer e celebrar os progressos que os prestadores de cuidados e os centros fazem; utilizar um

sistema de subsídios para os serviços de elevada qualidade); (5) providenciar assistência técnica nas

próprias instituições (iniciar a focalização na qualidade e a educação para a qualidade logo no

momento de preenchimento dos formulários de candidatura ao projecto; disponibilizar apoio para todas

as instituições, mas principalmente para aquelas que mais precisam de ajuda; motivar o pessoal

mostrando como a melhoria na qualidade pode ajudar as crianças; promover uma avaliação de

necessidades inicial, como passo crucial, utilizando um instrumento de avaliação da qualidade; reunir

com o pessoal da instituição no sentido de planear o apoio; escrever um contrato, assinado por todos

os envolvidos; monitorizar os contratos; desenvolver relações apoiantes com os prestadores de

cuidados; dar tempo para que possam melhorar a qualidade); (6) estabelecer colaborações eficazes

com parceiros da comunidade (serviços sociais, serviços de saúde, ensino superior, etc.); e (7) garantir

elementos-chave para manter a qualidade (o financiamento é um factor crítico na manutenção da

qualidade; é necessário haver flexibilidade no trabalho; é crucial, e continua a ser um desafio, manter

uma equipa de profissionais com formação, experiência e remuneração adequada; o apoio do sistema

educativo é crucial; é necessário promover actividades de sensibilização da comunidade para a

importância da educação e dos cuidados de boa qualidade) (Taylor & Bryant, 2002).

Reconhecendo também a importância de se garantirem serviços de boa qualidade para todas

as crianças, a OCDE (2001) define elementos-chave passíveis de promoverem o acesso equitativo às

estruturas de educação e cuidados, que se apresentam de seguida:

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Capítulo II

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1. É necessário adoptar uma abordagem sistémica e integrada no desenvolvimento de políticas

e sua implementação. O ministério responsável deve trabalhar em cooperação com os outros

departamentos e sectores envolvidos. A ligação forte entre serviços, profissionais e pais também

promove coerência.

2. Uma parceria forte e equitativa com o sistema educativo apoia uma abordagem da

aprendizagem ao longo do ciclo de vida desde o nascimento, encoraja transições suaves para as

crianças e reconhece a educação de infância como uma parte importante do processo educativo. As

parcerias com o sistema de educação proporcionam a oportunidade de juntar diversas perspectivas e

métodos.

3. Deve garantir-se uma abordagem universal ao nível do acesso, com particular atenção para

as crianças que necessitam de apoio especial. Enquanto que o acesso é praticamente universal para

crianças com mais de 3 anos de idade, é necessário dar mais atenção às políticas e serviços para

bebés e crianças mais novas.

4. É necessário efectuar um investimento público substancial nos serviços e infra-estruturas

para suportar um sistema sustentado, que seja acessível e de boa qualidade.

5. É necessária uma abordagem participada para melhoria e garantia da qualidade: definir,

garantir e monitorizar a qualidade deveria ser um processo participado e democrático, envolvendo o

pessoal, os pais e as crianças. Uma abordagem pedagógica que foque o desenvolvimento holístico das

crianças pode assegurar práticas de boa qualidade. As regulamentações que visam assegurar práticas

de boa qualidade deveriam ser válidas para todos os tipos de instituições.

6. Devem ser garantidas formação e condições de trabalho adequadas para o pessoal: a

qualidade depende da formação do pessoal e das condições de trabalho. É necessário promover a

educação inicial e contínua do pessoal, desenvolver estratégias para recrutar e manter profissionais

qualificados e de ambos os sexos e assegurar que a carreira é satisfatória, respeitada e viável a nível

financeiro.

7. Uma atenção sistemática à monitorização e recolha de dados é essencial para melhorar a

qualidade, o que requer procedimentos para recolher e analisar os dados acerca das crianças, das

estruturas de educação e cuidados e do pessoal.

8. Uma abordagem estável e uma agenda a longo prazo a nível de investigação e avaliação,

bem como ao nível das estratégias para divulgar os resultados da investigação, devem fazer parte do

processo de melhoria dos serviços.

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Educação e cuidados de elevada qualidade

65

Para concluir, salienta-se a posição de Melhuish (2001) em relação à definição de educação e

cuidados de elevada qualidade. Este autor refere que grande parte da investigação sobre educação em

creche e jardim-de-infância adopta a perspectiva de que a qualidade reflecte o que é benéfico para o

desenvolvimento da criança. A avaliação acerca daquilo que é benéfico para a criança é, em parte,

baseada no julgamento de especialistas e, em parte, em investigação empírica sobre a relação entre

indicadores de qualidade e resultados desenvolvimentais. Segundo este autor, a avaliação da

qualidade precisa de ser mais baseada em indicadores com relação comprovada com resultados no

desenvolvimento e menos baseada em opiniões de especialistas sobre o que é melhor para as

crianças. Seguidamente, serão apresentadas diversas formas de avaliar a qualidade dos ambientes de

educação e cuidados extrafamiliares, não se pretendendo, todavia, efectuar uma listagem exaustiva.

Depois serão apresentados os efeitos da frequência de serviços de educação e cuidados no

desenvolvimento das crianças, particularmente o efeito dos serviços de elevada qualidade.

2. Avaliação da qualidade dos contextos de educação e cuidados

Segundo Scarr et al. (1994), a utilização de medidas da qualidade dos serviços de educação e

cuidados extrafamiliares serve três objectivos principais: a regulação dos programas, a melhoria dos

programas e a investigação acerca dos efeitos da qualidade dos contextos no desenvolvimento das

crianças. Estes autores consideram que, para cumprir os primeiros dois objectivos, é necessário utilizar

inventários exaustivos, que incluam muitos aspectos da qualidade, ainda que a medida seja redundante

e longa do ponto de vista das suas características métricas. No sentido de se melhorar a qualidade do

programa poderão ser utilizadas medidas do mesmo tipo, de modo a assegurar que os diversos

critérios de qualidade são cumpridos. Contudo, para fins de investigação, não são necessários

instrumentos exaustivos, mas instrumentos que assegurem fidelidade e validade dos dados recolhidos,

de forma eficiente e pouco dispendiosa.

2.1 Como avaliar a qualidade

Harms e Clifford (1993) referem várias formas de estudar os contextos de educação e

cuidados: (1) consulta de documentos e registos, (2) entrevistas e questionários à equipa técnica ou

aos pais e (3) observação. A consulta de documentos e de registos pode facilitar a recolha de

informação sobre as políticas de funcionamento, as regras e as questões administrativas. As

entrevistas e os questionários permitem perceber em que medida o programa vai ao encontro das

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Capítulo II

66

necessidades das diversas pessoas envolvidas. Através da observação é possível verificar em que

medida o currículo está a ser implementado e perceber o tipo de interacções e a adequação do espaço

físico (Harms & Clifford, 1993). Em Portugal, como é conhecido, não há um currículo para a educação

de infância (creche ou jardim-de-infância), apenas foram publicadas pelo Ministério da Educação

(1997) orientações curriculares para a educação pré-escolar. De qualquer modo, se tal for pretendido, é

possível verificar, através da complementaridade da observação, dos questionários e entrevistas e da

consulta de documentos, em que medida os projectos pedagógicos e/ou curriculares de cada

instituição ou de cada sala são definidos e implementados.

Diversos países utilizam instrumentos estandardizados para avaliar a qualidade dos serviços

de educação e cuidados para a infância, sendo que alguns deles visam avaliar a qualidade para todas

as crianças do grupo e outros focam-se na experiência de uma criança, individualmente. As escalas

desenvolvidas nos EUA pela equipa do Frank Porter Child Development Institute (FPG), da

Universidade da Carolina do Norte em Chapel Hill, que serão apresentadas de seguida, são

provavelmente os mais conhecidos e utilizados instrumentos de avaliação da qualidade global das

salas.

Outra abordagem ao nível da avaliação da qualidade da educação e cuidados, muito utilizada

nos EUA, consiste em avaliar o desempenho das crianças em áreas específicas. Estes resultados são

utilizados para avaliar a eficácia dos programas e para determinar que políticas e programas devem

receber financiamento (OCDE, 2001). Este tipo de avaliação privilegia os resultados cognitivos e

académicos, o que pode levar os educadores a investir apenas nestes objectivos.

Em alguns países, como Dinamarca, Finlândia, Noruega, Suécia e algumas partes de Itália,

verifica-se uma co-construção dos objectivos da instituição, na qual participam pais, educadores e

outros parceiros sociais orientados por conselheiros pedagógicos. Nestes casos a monitorização é um

processo contínuo e participado, sendo as discussões no grupo pedagógico constantes e sendo

mantido um registo escrito do progresso das crianças, do grupo de crianças e do trabalho do centro

(OCDE, 2001).

Instrumentos de avaliação da qualidade dos contextos

As escalas de avaliação da qualidade do ambiente, da equipa de investigadores do FPG,

permitem avaliar a qualidade experienciada por todas as crianças num grupo específico (Cryer, 1999).

Estas escalas são consideradas medidas da qualidade de processo (Vandell & Wolfe, 2000), a

dimensão da qualidade mais directamente vivida ou sentida pelas crianças (Cryer & Burchinal, 1997).

Como foi já referido, as principais características dos indicadores ou descritores da qualidade podem,

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Educação e cuidados de elevada qualidade

67

segundo vários autores (e.g., Bairrão, 1995), conceptualizar-se em duas grandes dimensões: a

estrutural e a de processo. A dimensão estrutural tem a ver com os aspectos físicos, humanos e

organizativos; e a dimensão de processo relaciona-se com as interacções ou trocas (transacções)

adulto/criança e criança/criança que ocorrem nesses programas. Apesar de se distinguirem

características de processo e características de estrutura, como refere Lamb (1998), na prática as

medidas mais populares da qualidade de processo incluem simultaneamente indicadores das

características ambientais, como a segurança, e indicadores das características de interacção.

Harms e Clifford (1993), dois dos autores destas escalas, consideram que as características

mais importantes dos contextos de educação e cuidados são: a salubridade e a segurança (existência

de critérios de licenciamento, obediência a critérios de higiene e de saúde, etc.), as interacções

(frequência de interacções adulto-criança que revelam afecto e respeito, etc.), o currículo (planificação

de actividades desenvolvimentalmente adequadas, equilíbrio entre a actividade de iniciativa do adulto e

de iniciativa da criança, etc.) e o pessoal (grupos com número limitado de crianças, rácio adulto-criança

adequado e qualificação e formação dos técnicos). As escalas de avaliação da qualidade do ambiente

têm, portanto, em consideração estes aspectos.

A primeira escala desenvolvida por esta equipa foi a Early Childhood Environment Rating Scale

(ECERS; Harms & Clifford, 1980), destinada a avaliar contextos de educação extrafamiliares para

crianças entre os 2 e os 6 anos de idade. Esta escala tem 37 itens, organizados em sete subescalas:

Rotinas e cuidados pessoais, Materiais e mobiliário para as crianças, Experiências de linguagem e

raciocínio, Actividades de motricidade global e fina, Actividades criativas, Desenvolvimento social e

Necessidades dos adultos. Cada um dos itens é cotado numa escala de 7 pontos, com descritores ou

indicadores para 1 (inadequado), 3 (mínimo), 5 (bom) e 7 (excelente).

Em 1989 foi publicada a Family Day Care Rating Scale (FDCRS; Harms & Clifford, 1989),

destinada a avaliar a qualidade de estruturas de educação e cuidados de tipo familiar. Esta escala é

constituída por 32 itens, organizados em sete subescalas: Espaço e mobília para cuidados infantis,

Cuidados básicos, Linguagem e raciocínio, Actividades de aprendizagem, Desenvolvimento social,

Necessidades do adulto (ama) e Itens suplementares: disposições para crianças excepcionais. Cada

item é cotado na mesma escala de 7 pontos.

Depois da ECERS e da FDCRS foi publicada a ITERS – Infant/Toddler Environment Rating

Scale (Harms, Cryer, & Clifford, 1990), uma escala de avaliação global da qualidade de estruturas

formais de educação destinadas a grupos de crianças com menos de 30 meses de idade. A ITERS é

constituída por 35 itens, agrupados em 7 categorias: Mobiliário e sua disposição para as crianças,

Cuidados pessoais de rotina, Escuta e conversação, Actividades de aprendizagem, Interacção,

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Capítulo II

68

Estrutura do programa e Necessidades do adulto. No processo de desenvolvimento da ITERS, foram

considerados resultados da investigação, valores profissionais e conhecimentos práticos (Harms,

Cryer, & Clifford, 1999). Os seus autores consideram-na consistente com os Critérios para Programas

de Educação para a Infância de Qualidade (Criteria for Quality Early Childhood Programs) definidos

pela NAEYC (1984, como citado em Harms et al., 1999) e com as exigências ou objectivos do

Programa Nacional de Acreditação da Child Development Associate – CDA (CDA National

Credentialing Program, 1984, como citado em Harms et al., 1999). O Quadro 1 apresenta a

correspondência entre os itens da ITERS e as competências propostas pela CDA.

A edição revista da ITERS (Infant Toddler Environment Rating Scale- Revised Edition – ITERS-

R) foi publicada em 2003 (Harms et al., 2003) e traduzida para português em 2004, no âmbito do

presente estudo, adoptando a designação Escala de Avaliação do Ambiente de Creche – Edição

Revista. Uma descrição aprofundada deste instrumento é apresentada no Capítulo IV (Métodos).

Quadro 1. ITERS e competências da CDA

Competências CDA Itens da ITERS

1. Estabelecer e manter um ambiente seguro, saudável e de aprendizagem

Segurança 13, 14, 29

Saúde 7, 8, 9, 10, 11, 12

Aprendizagem 1, 2, 3, 4, 5, 28, 29

2. Promover a competência motora e intelectual

Motricidade 17, 18, 19, 20, 21

Cognição 17, 19, 21, 23

Comunicação 15, 16

Criatividade 19, 20, 21, 22

3. Apoiar o desenvolvimento social e emocional e fornecer orientação positiva

“Self” 6, 26, 31

Social 24, 25

Orientação 25, 27

4. Estabelecer relações positivas e produtivas com famílias 6, 31, 35

5. Assegurar um programa bem conduzido, intencional, que responda às necessidades dos participantes.

28, 29, 30

6. Assumir um compromisso com o profissionalismo 30, 32, 33, 34

Fonte: Harms et al. (1999, como citados em Aguiar et al., 2002)

Antes da revisão da ITERS foi publicada a edição revista da ECERS (ECERS-R; Harms,

Clifford, & Cryer, 1998), constituída por 43 itens agrupados em 7 categorias: Espaço e mobiliário,

Rotinas/cuidados pessoais, Linguagem – raciocínio, Actividades, Interacção, Estrutura do programa e

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Educação e cuidados de elevada qualidade

69

Pais e pessoal. Sakai, Whitebook, Wishard e Howes (2003) efectuaram um estudo no sentido de

verificar (1) em que medida a ECERS e a ECERS-R eram medidas equivalentes da qualidade e (2) em

que medida a ECERS-R colmatava algumas das limitações da ECERS, nomeadamente relacionadas

com a sensibilidade cultural e a estabilidade do pessoal. Os resultados obtidos permitiram concluir que

a ECERS e a ECERS-R podem ser consideradas medidas equivalentes da qualidade: os resultados

médios apresentaram uma correlação forte e tinham distribuições semelhantes. Contudo, de acordo

com estas autoras, tal como a ECERS, a ECERS-R falha na consideração da estabilidade do pessoal e

de aspectos-chave das práticas culturalmente sensíveis, como a comunicação com as famílias na sua

língua materna (Sakai et al., 2003).

A edição revista da FDCRS foi publicada recentemente, tendo sido alterada ligeiramente a sua

designação para Family Child Care Environment Rating Scale – Revised Edition (FCCERS-R; Harms,

Cryer, & Clifford, 2007). A FCCERS-R contém 38 itens, organizados em 7 categorias: Espaço e

mobiliário, Rotinas de cuidados pessoais, Escuta e conversação, Actividades, Interacção, Estrutura do

programa e Pais e prestador de cuidados.

Sylva, Siraj-Blatchford e Taggart (2003) desenvolveram uma escala que constitui uma

extensão da ECERS, designada Early Childhood Environment Rating Scale – Extension (ECERS-E),

para avaliar especificamente aspectos curriculares da qualidade em centros de educação pré-escolar

ingleses, sujeitos ao cumprimento do currículo nacional. A ECERS-E é constituída por 15 itens

agrupados em 4 categorias: (1) Literacia, (2) Matemática, (3) Ciência e ambiente e (4) Diversidade. A

estrutura da escala e o sistema de cotação são os mesmos que nas escalas de avaliação do ambiente

desenvolvidas no FPG.

Apesar de algumas escalas serem utilizadas em diversos países, independentemente do país

onde foram desenvolvidas (o exemplo mais significativo será, provavelmente, a ECERS), vários autores

aconselham prudência na sua utilização, nomeadamente devido às diferenças culturais (e.g., Brophy &

Statham, 1994). Brophy e Statham (1994) identificaram quatro áreas que a ECERS considerava menos

prioritárias ou nas quais representava valores diferentes dos contextos de educação do Reino Unido

que as autoras observaram: (1) jogo livre, (2) envolvimento dos pais, (3) diversidades étnica, de género

ou outras e (4) relações interpessoais. Estas autoras sugerem que se tenha em consideração as

características particulares de cada centro quando se utiliza a ECERS e se interpretam os seus

resultados. Outro aspecto salientado é o facto de a ECERS constituir uma medida do ambiente, não

permitindo avaliar a qualidade da experiência de cada criança. Pode considerar-se que o ambiente cria

um potencial importante para que haja experiências individuais de boa qualidade. Contudo, não as

garante necessariamente. Uma vez que a ECERS é preenchida com base numa única visita, não

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Capítulo II

70

permite avaliar a natureza dinâmica do ambiente pré-escolar e em que medida ele oferece variedade e

novos desafios para as crianças. De acordo com Lamb (1998), em alguns países do norte da Europa,

nomeadamente na Suécia, os serviços estudados com as escalas desenvolvidas na Carolina do Norte

atingiram valores de qualidade quase perfeitos o que, associado com a baixa variabilidade encontrada,

conduziu a que se questionasse a utilidade da ITERS e da ECERS na avaliação da qualidade das

salas. Os peritos receiam também que sejam utilizados para avaliar e classificar as crianças ou o

pessoal de uma forma normativa e não-motivadora, que não veja o desenvolvimento das crianças

como dependente do seu contexto temporal e espacial (OCDE, 2001). Apesar das críticas efectuadas,

a investigação permitiu identificar vários aspectos positivos destas escalas, particularmente nos casos

em que foram adaptadas de modo a reflectir as necessidades nacionais e os contextos específicos e

quando o pessoal foi suficientemente treinado para compreender não apenas a sua forma de aplicação,

mas a teoria subjacente (OCDE, 2001).

No Brasil, Souza e Campos-de-Carvalho (2005) realizaram um estudo com o objectivo de

perceber a pertinência dos itens da ITERS para avaliar a qualidade de contextos educativos brasileiros,

recorrendo aos pareceres de duas psicólogas especialistas em educação de infância. Souza e

Campos-de-Carvalho concluíram que a ITERS é pertinente para avaliar a qualidade dos serviços para

crianças até aos 30 meses de idade no Brasil, uma vez que houve acordo das duas juízas

relativamente à permanência de 97% dos itens na escala, apesar de sugerirem algumas alterações no

conteúdo de alguns itens. Os itens da subescala Interacção foram considerados pertinentes e

adequados aos contextos brasileiros e as subescalas Rotina/Cuidados pessoais, Linguagem Oral e

Compreensão e Actividades de Aprendizagem destacaram-se pelo número de alterações sugeridas por

ambas as especialistas. Umas das psicólogas sugeriu que o item Blocos não fosse avaliado nas

creches brasileiras.

Além destas escalas de avaliação da qualidade, amplamente divulgadas, têm sido

desenvolvidos outros instrumentos que permitem avaliar a qualidade em contexto de creche e/ou

jardim-de-infância. O Ministério da Educação dos EUA publicou um guia que visa fornecer informação

acerca das características dos programas de elevada qualidade e que possibilita a sua avaliação

(Dwyer, Chait, & Mckee, 2000). São apresentadas as características dos programas que promovem o

desenvolvimento cognitivo e da linguagem, organizadas em seis áreas: (1) qualidade do envolvimento

dos pais, que inclui o desenvolvimento da relação escola-família, do ambiente de literacia familiar e das

interacções pais-crianças e a competência no trabalho com populações parentais diversas; (2)

qualidade dos ambientes de aprendizagem, que inclui o tamanho do grupo e o rácio adulto-criança, a

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Educação e cuidados de elevada qualidade

71

segurança, a riqueza do ambiente de literacia, a inclusão de crianças com necessidades especiais; (3)

qualidade da pedagogia para a infância, que inclui variedade de domínios e estruturas (promoção do

desenvolvimento em todas as áreas e variação entre actividades individuais, em grande grupo e

pequeno grupo), individualização, aprender a pensar; (4) qualidade dos currículos para a infância, que

inclui a planificação, os fundamentos da linguagem, os fundamentos da literacia emergente, os

fundamentos de matemática e ciência para a resolução de problemas; (5) qualidade do pessoal, que

inclui a formação do pessoal, as condições de trabalho para o pessoal, o desenvolvimento profissional;

e (6) a qualidade da avaliação e da melhoria contínua, incluindo orientação para a instrução (efectuar

uma avaliação contínua e efectuar registos), identificação de necessidades de serviços e intervenções

especiais e avaliação do programa. Em cada uma destas áreas são apresentados resultados da

investigação, desafios que se colocam aos programas e os indicadores da qualidade, que podem ser

avaliados de 1 (de maneira alguma descritivo do programa) a 5 (muito descritivo do programa) (Dwyer

et al., 2000). O Guia apresenta também grelhas que permitem avaliar os resultados ao nível do

desenvolvimento da linguagem das crianças, uma listagem de recursos que podem ser úteis e uma

grelha com os referidos indicadores da qualidade dos programas.

A NAEYC, no âmbito do seu sistema de acreditação, desenvolveu um instrumento, o Childhood

Classroom Observation, com 68 itens que correspondem aos critérios desta Academia, e que se

organizam em cinco categorias: interacção entre o pessoal e as crianças, currículo, ambiente físico,

saúde, segurança e alimentação (Harms & Clifford, 1993). Os critérios de qualidade para acreditação

da NAEYC foram entretanto revistos e organizam-se actualmente em 10 áreas: relações, currículo,

ensino, avaliação do progresso da criança, saúde, pessoal, famílias, relações com a comunidade,

ambiente físico, liderança e administração (NAEYC, s.d.).

A associação norte-americana Association for Childhood Education International (ACEI)

desenvolveu igualmente um instrumento de avaliação da qualidade – ACEI Global Guidelines

Assessment (GGA), com 88 itens organizados em cinco áreas: (1) Ambiente e espaço físico, (2)

Conteúdo do currículo e pedagogia, (3) Educadores de infância e prestadores de cuidados, (4)

Parcerias com as famílias e as comunidades e (5) Crianças com necessidades especiais (ACEI, 2006).

Cada um dos 88 itens pode ser classificado de inadequado a excelente, havendo a possibilidade de se

cotar também não disponível.

No âmbito do estudo desenvolvido pela National Institute of Child Health and Human

Development (NICHD) Early Child Care Research Network, conhecido por NICHD Study of Early Child

Care, foi desenvolvido um instrumento de avaliação da qualidade, designado Observational Record of

the Caregiving Environment – ORCE. Este instrumento, ao contrário de outros já descritos, foca-se nos

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Capítulo II

72

comportamentos do prestador de cuidados em relação a uma criança e não naquilo que acontece na

sala, na sua globalidade, podendo ser utilizado para avaliar as experiências da criança em diferentes

tipos de contextos de educação e cuidados (NICHD Early Child Care Research Network, 1996). O

ORCE fornece contagens de frequências (nas chamadas escalas de comportamento) e classificações

(designadas classificações qualitativas) dos comportamentos do prestador de cuidados. As escalas de

comportamento fornecem um registo da ocorrência (quantidade) de aspectos específicos e as escalas

qualitativas têm em conta a qualidade dos comportamentos, em relação aos comportamentos da

criança. Durante os períodos de observação, que são alternados com períodos para registo, os

observadores devem focar-se no comportamento e actividades da criança e nas suas interacções com

o prestador de cuidados (NICHD Early Child Care Research Network, 1996). Resultados mais elevados

obtidos nesta escala significam que os profissionais observados são sensíveis, responsivos às

necessidades da criança, calorosos, positivos, cognitivamente estimulantes e não são distantes ou

hostis (Vandell & Wolfe, 2000).

Os instrumentos descritos implicam a observação, ou seja, requerem que haja observadores

que os apliquem nas salas das estruturas de educação e cuidados. Holloway, Kagan, Fuller, Tsou e

Caroll (2001), por considerarem a observação uma forma intrusiva e dispendiosa de obter informação

pormenorizada sobre os serviços, elaboraram um guião de entrevista que pudesse ser utilizado para

recolher informação através de uma conversa via telefone – Berkeley-Yale Telephone Interview for the

Family Child-Care Providers (BYTI-F), para serviços familiares, e Berkeley-Yale Telephone Interview for

Child-Care Centers (BYTI-C), para centros de educação pré-escolar. Os protocolos de entrevista

incluem itens das mesmas áreas que os correspondentes instrumentos para observação – a FDCRS e

a ECERS-R. Porém, nem todos os itens são incluídos, tendo em conta as limitações inerentes a uma

conversa por telefone. Holloway et al. (2001) utilizaram num estudo as entrevistas e as escalas de

observação, tendo verificado que as entrevistas permitiam obter uma avaliação razoável da qualidade.

Para os serviços de tipo familiar, a entrevista, com 25 itens, permitia explicar 49% da variância das

pontuações da FDCRS e permitia predizer as classificações de 95% dos serviços nas três categorias

de qualidade derivadas da FDCRS (qualidade pobre, média e desenvolvimentalmente adequada). Para

os centros de educação pré-escolar, a entrevista, com 22 itens, permitia explicar 51% da variância da

ECERS-R e predizer adequadamente a classificação de 89% dos centros em termos das categorias de

qualidade derivadas da ECERS-R (Holloway et al., 2001). Estes autores verificaram, igualmente, que

era possível obter resultados semelhantes com versões reduzidas do guião de entrevista (12 itens para

os cuidados de tipo familiar e 13 itens para os cuidados em centros), em termos da capacidade de

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Educação e cuidados de elevada qualidade

73

predizer o nível de qualidade. A opção pela versão curta ou longa deve basear-se nos objectivos da

sua utilização, bem como a opção pela entrevista por telefone ou pela observação (Holloway et al.,

2001). Há, sem dúvida, muitos aspectos que não podem ser avaliados por telefone, competindo ao

investigador a ponderação dos custos e dos benefícios inerentes a cada procedimento.

Abbott-Shim, Neel e Sibley (1993) apresentaram um instrumento que permite avaliar quer as

características de processo, quer as características de estrutura dos serviços de educação e cuidados

extrafamiliares: o Assessment Profile for Early Childhood Programs: Research Version. Este

instrumento tem 87 itens, que reflectem as práticas desenvolvimentalmente adequadas, organizados

em 5 escalas: Ambiente de aprendizagem, Horário, Métodos curriculares, Interacção e Individualização.

Os autores elaboraram já a segunda versão deste instrumento – Assessment Profile for Early

Childhood Programs: Research Edition II, que contém 60 itens organizados nas mesmas categorias

(Abbott-Shim & Sibley, 1998, como citado em Gallagher & Lambert, 2006).

Além dos instrumentos que permitem avaliar a qualidade global dos contextos, considerando

quer a estrutura quer os processos, há também instrumentos que se centram nos profissionais desses

contextos, como a Caregiver Interaction Scale (CIS; Arnett, 1989), a Escala de Observação do

Empenhamento do Adulto (Bertram, Laevers, & Pascal, 1996, citados em Oliveira-Formosinho, 2000) e

a Teaching Styles Rating Scale (TSRS; McWilliam, Scarborough, Bagby, & Sweeney, 1998).

Muitos dos instrumentos apresentados constituem medidas da qualidade global da creche e/ou

jardim-de-infância. Contudo, Dickinson (2003) questiona se haverá realmente qualidade global, dado

que o estudo de diversos instrumentos tem revelado a existência de vários factores ou componentes da

qualidade. Assim, este autor refere que, tal como Lambert (2003) sugeriu, na avaliação dos serviços

deveria ser utilizado um kit que incluísse instrumentos habitualmente considerados de “qualidade

global” e instrumentos que permitissem avaliar áreas específicas. Em 2006, o mesmo autor prosseguia

com esta ideia, salientando que os instrumentos frequentemente utilizados para avaliar a qualidade dos

contextos pré-escolares não avaliam a medida em que promovem a aquisição de competências pré-

académicas. Assim, Dickinson considera que é necessário utilizar um conjunto de instrumentos (1) que

examinem as salas em termos do suporte que fornecem para distintos domínios do conhecimento e de

competência, (2) que, além de captarem a qualidade das relações, descrevam o conteúdo das

interacções (e.g., sobre o que conversam os educadores e as crianças), (3) que descrevam o que os

educadores ensinam, isto é, descrevam o seu esforço para ensinar explicitamente competências e

conhecimentos, reconhecendo que podem ser competências sociais e de auto-regulação e (4) que

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Capítulo II

74

forneçam informação descritiva acerca do impacto das várias experiências, em vez de presumirem que

já se conhece o impacto das características da sala no desenvolvimento da criança.

A avaliação da qualidade de contextos de educação e cuidados não tem reunido consenso de

educadores, investigadores, políticos, etc., devido, em certa medida, à falta de acordo na definição de

critérios de qualidade. Dahlberg e Årsén (1994) consideram que há um grande risco de a avaliação da

qualidade ser vista como uma actividade livre de valores e como uma questão estritamente técnica,

cujo principal objectivo é encontrar métodos para estudar efeitos. Além disso, há também o risco de os

objectivos de um serviço serem substituídos pelos objectivos constantes dos instrumentos de

avaliação. A forma como se conduz a avaliação e como a qualidade é definida na educação e cuidados

para a infância não pode ser vista isoladamente dos objectivos e dos valores sociais e culturais de cada

instituição (Dahlberg & Årsén, 1994).

2.2 Alguns resultados obtidos

2.2.1 A avaliação da qualidade em Portugal

Têm sido realizados alguns estudos em Portugal com o objectivo de apresentarem dados

relativos à qualidade da educação e dos cuidados em contexto de creche e de jardim-de-infância, tendo

a Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto, onde foi desenvolvido

o presente estudo, participado em (ou desenvolvido) diversos projectos de investigação nas últimas

décadas acerca desta temática.

Com início em 1986, uma equipa do Centro de Psicologia do Desenvolvimento e da Educação

da Criança desta faculdade participou no Projecto Pré-Primário da International Association for the

Evaluation of Educacional Achievement – IEA, que consistiu num estudo comparativo levado a cabo em

diferentes países sobre os cuidados e educação da primeira infância a nível formal e informal (Barbosa

et al., 1992). Este estudo tinha como objectivo principal obter conhecimentos que permitissem melhorar

a qualidade das experiências educativas das crianças em vários países (Bairrão, 1998), permitindo

obter informação representativa a nível nacional acerca da situação das crianças de 4 anos de idade,

nomeadamente sobre onde estavam e com quem (Abreu-Lima, 2003). Em 1989, num livro no qual

participaram todos os países envolvidos, foram publicados dados demográficos acerca da situação

portuguesa, bem como a descrição dos serviços disponíveis nessa altura (Bairrão et al., 1989).

O mesmo centro de investigação participou posteriormente no European Child Care and

Education Study (ECCE), que envolveu Portugal, Espanha, Alemanha e Áustria. Os objectivos gerais

deste projecto eram (1) descrever as características da qualidade de dois contextos – a família da

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Educação e cuidados de elevada qualidade

75

criança e o contexto de educação e cuidados extrafamiliar que a criança frequentava – nos quatro

países, (2) analisar as relações entre as diversas características de qualidade em cada contexto e (3)

relacionar as características da qualidade em ambos os contextos com os resultados da criança. A

ênfase do estudo era na comparação dos resultados dos países participantes (ECCE Study Group,

1997). Foram encontradas diferenças nos resultados da qualidade, avaliada pela ECERS, nos quatro

países, tendo as salas da Áustria e da Alemanha revelado qualidade mais elevada do que as salas de

Portugal e de Espanha. Os valores médios de qualidade situaram-se abaixo do valor 5.0, indicativo de

boa qualidade, e pelo menos 2/3 das salas, em cada país, obtiveram resultados equivalentes a

qualidade mínima ou inadequada. No que se refere à qualidade das interacções, avaliada pela

Caregiver Interaction Scale – CIS (Arnett, 1989), os resultados situaram-se num nível correspondente a

qualidade elevada, havendo pequenas diferenças entre países (ECCE Study Group, 1997). No âmbito

deste estudo, foram identificados dois factores da qualidade de processo, avaliada com a ECERS:

Ensino e interacção (inclui aspectos da qualidade directamente relacionados com as interacções dos

educadores e com a forma como o desenvolvimento das crianças é estimulado) e Espaço e materiais

(aspectos da qualidade relacionados com a disponibilidade de espaço e materiais, como pré-requisitos

para a aprendizagem e as actividades, bem como a forma como o espaço e os materiais são

utilizados). Portugal obteve pontuações médias mais elevadas no primeiro factor do que no segundo.

Não se verificaram diferenças entre os países no primeiro factor, mas no segundo factor Portugal e

Espanha obtiveram cotações inferiores à Áustria e à Alemanha (ECCE Study Group, 1997). De forma a

melhor comparar os resultados obtidos pelos quatro países, foi conduzida uma análise discriminante,

que permitiu obter duas funções (1) Disponibilidade e uso do espaço e dos materiais de jogo e (2)

Cuidados personalizados. As salas portuguesas obtiveram pontuações elevadas nos Cuidados

personalizados e pontuações moderadas na Disponibilidade e uso do espaço e dos materiais de jogo

(ECCE Study Group, 1997).

Com o intuito de consolidar este projecto (ECCE) e um estudo dos EUA (Cost, Quality, and

Child Outcomes in Child Care Centers Study) foi desenvolvido o International Child Care and Education

Project – Estudo Internacional sobre Educação e Cuidados de Crianças em Idade Pré-Escolar (ICCE),

de 1992 a 1998 (Tietze, Cryer, Bairrão, Palacios, & Wetzel, 1996). À semelhança do que foi descrito a

propósito do ECCE, o ICCE pretendia estudar a diversidade e a qualidade das experiências educativas

das crianças dos 3 aos 6 anos de idade em diferentes contextos de socialização (família e jardins-de-

infância) e analisar o efeito dessas experiências no desenvolvimento das crianças e na qualidade de

vida das famílias (Bairrão, 1998), possibilitando estudos comparativos entre os quatro países europeus

(Alemanha, Portugal, Espanha e Áustria) e quatro estados dos Estados Unidos da América (Colorado,

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Capítulo II

76

Califórnia, Carolina do Norte e Connecticut). Os resultados médios obtidos com base em 22 itens da

ECERS revelaram que as salas de jardim-de-infância dos diversos países/estados eram de qualidade

mínima (valores médios entre 3.00 e 5.00) (Tietze et al., 1996). Os contextos de prestação de cuidados

austríacos e alemães apresentavam valores mais elevados, tendo os autores considerado que estas

diferenças se podem dever ao facto de possuírem “infra-estruturas sólidas que apoiam serviços de

educação e cuidados de elevada qualidade. Adicionalmente, nestes dois países, verifica-se uma

tendência no sentido de seguir uma tradição em Educação Pré-Escolar na qual o espaço físico é

organizado de forma a permitir escolhas livres e exploração pelas crianças em detrimento das

actividades em grande grupo" (Tietze et al., 1996, p. 469). Por outro lado, consideraram que os baixos

resultados obtidos em Espanha podiam dever-se ao facto de se utilizar uma abordagem mais

tradicional, académica, com a ênfase colocada no trabalho orientado pelo adulto, que inclui o grande

grupo, enfatizando menos o jogo livre e o trabalho individualizado. As salas de jardim-de-infância

portuguesas obtiveram resultados médios na ECERS entre 3.0 e 5.6 (M = 4.26, DP = 0.51) (Tietze et

al., 1996). Relativamente aos resultados da CIS, foram encontradas diferenças estatisticamente

significativas entre os países, sendo os resultados obtidos na Áustria e em Espanha superiores aos dos

EUA (Tietze et al., 1996). De qualquer modo, os resultados obtidos com esta escala revelaram que, em

qualquer um dos cinco países, os adultos geralmente revelavam elevados níveis de sensibilidade,

aceitação e envolvimento nas suas interacções com as crianças.

Na sequência destes projectos, o Centro de Psicologia da Universidade do Porto tem vindo a

desenvolver, nos últimos anos, um projecto de investigação designado “A Qualidade das Interacções

da Criança em Contexto Familiar e de Creche e a sua Influência no Desenvolvimento Sociocognitivo da

Criança” (2000-2003), que se prolongou com o “Projecto Longitudinal do Envolvimento e Adaptação da

Criança” (2004-2007), acompanhando as crianças (e suas famílias) já durante a frequência do jardim-

de-infância. Este projecto é constituído até ao momento por duas fases, tendo sido avaliadas no âmbito

da primeira 30 salas de creche do distrito do Porto, utilizando a primeira edição da ITERS. Os

resultados revelaram uma qualidade baixa (M = 2.55, DP = 0.42) (Aguiar et al., 2002)2. Tendo em conta

as limitações desta parte do estudo, nomeadamente no que refere à reduzida dimensão da amostra, e

com o objectivo de explorar melhor resultados relativos à qualidade do ambiente de creche, foi definida

a presente investigação centrada no estudo da qualidade neste tipo de contextos, com um número de

salas participantes consideravelmente mais elevado.

2 Dados relativos à avaliação das mesmas salas de creche foram também analisados por Pessanha (2005), por Pessanha, Aguiar e Bairrão (2007) e por Pinto (2006).

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Educação e cuidados de elevada qualidade

77

Outros investigadores/equipas de investigação têm igualmente desenvolvido projectos

relacionados com a qualidade dos contextos de creche e de jardim-de-infância. Por exemplo, Gabriela

Portugal (2000)3 desenvolveu um estudo no qual se pretendia efectuar a análise comparativa de dois

grupos de crianças, com problemas de adaptação à creche e sem problemas de adaptação à creche,

caracterizando-os em termos de idade de entrada na creche, sexo, temperamento, caracterização do

ambiente familiar e da creche, relação mãe-criança, bem-estar materno e saúde familiar, e avaliando os

principais aspectos do seu desenvolvimento e bem-estar. Verificou-se que “a adaptação à creche é

globalmente função de: (1) relação mãe-criança, bem-estar materno, nível educacional e profissional

parental; (2) nível de desenvolvimento da criança, temperamento e tipo de acolhimento durante o

primeiro ano de vida da criança; (3) qualidade da creche” (Portugal, 2000, p. 32). Podendo existir

problemas de adaptação em qualquer creche, independentemente da qualidade, verificou-se contudo

que nas creches de menor qualidade se verificavam mais problemas de comportamento no início e no

decurso do ano lectivo, enquanto que nas creches de qualidade mais elevada as dificuldades se iam

dissipando com o decurso do tempo. Neste estudo, as creches foram avaliadas com recurso a uma

Grelha para observação/avaliação da creche (Portugal, 1998a).

2.2.2 As relações entre qualidade de processo e qualidade estrutural

Como foi referido anteriormente, diversos estudos têm considerado duas dimensões da

qualidade: a qualidade de processo e a qualidade estrutural (e.g., Cost, Quality & Child Outcomes

Study Team, 1995; ECCE Study Group, 1997; Vandell & Wolfe, 2000). Apesar de se considerar que os

aspectos de estrutura das creches são importantes, nem sempre o seu cumprimento é garantia de

qualidade de processo mais elevada (Cochran et al., 2000). A investigação tem tentado determinar a

associação entre as características estruturais e as características de processo, procurando verificar

igualmente em que medida as primeiras são preditoras dos resultados da avaliação da qualidade de

processo.

As características estruturais da sala

Grande parte dos estudos desenvolvidos nesta área incluem o rácio adulto-criança (i.e.,

número de crianças por adulto), o tamanho do grupo (i.e., o número de crianças da sala) e o número de

adultos da sala como principais variáveis de estrutura, que se podem relacionar com as medidas de

qualidade de processo. Um menor número de estudos inclui ainda outras características da sala, como

3 Os dados foram recolhidos no ano lectivo 1991-1992.

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Capítulo II

78

a sua dimensão ou a faixa etária das crianças que a frequentam.

Apesar de ser comum assumir-se que as três primeiras características podem predizer ou

contribuir para a qualidade global da sala, os resultados dos estudos não são unânimes. Foram

encontradas associações entre o rácio adulto-criança e a qualidade global das salas de creche e/ou

jardim-de-infância em estudos como, por exemplo, o Cost, Quality and Child Outcomes in Child Care

Centers (Cost, Quality & Child Outcomes Study Team, 1995), o estudo de Phillips, Mekos, Scarr,

McCartney e Abbott-Shim (2000), o estudo de Scarr et al. (1994), desenvolvidos nos EUA, e o estudo

ECCE/ICCE nos dados relativo a salas da Alemanha e dos EUA (Cryer, Tietze, Burchinal, Leal, &

Palacios, 1999; ECCE Study Group, 1997). Foram encontradas também associações entre o tamanho

do grupo de crianças e a qualidade média global das salas em estudos como o de Phillips et al. (2000)

e o estudo ECCE nas salas da Alemanha (ECCE Study Group, 1997). Goelman et al. (2006), no

Canadá, encontraram associações positivas entre o número de adultos da sala e a qualidade avaliada

pela ITERS-R, tendo identificado através da path analyses que o número de adultos da sala era um dos

preditores directos da qualidade das salas para bebés e para crianças de 1 e 2 anos de idade e que o

rácio adulto-criança era um dos preditores indirectos da qualidade. Na Holanda, Deynoot-Schaub e

Riksen-Walraven (2005) avaliaram salas de creche, utilizando a ITERS, com o objectivo de comparar

esses resultados com os que tinham sido obtidos num estudo que tinha avaliado salas com a ITERS e

a ECERS (van Ijzendoorn, Taveccio, Stams, Verhoeven, & Reiling, 1998). Em ambos os estudos se

verificou que não havia relação entre o rácio adulto-criança e a qualidade média das salas, mas,

contrariamente ao estudo de van Ijzendoorn e colaboradores, os resultados obtidos por Deynoot-

Schaub e Riksen-Walraven revelaram uma associação estatisticamente significativa entre o tamanho

do grupo de crianças e a qualidade média das salas.

Em Portugal, no âmbito do ECCE (ECCE Study Group, 1997) verificou-se, através dos

resultados de uma regressão hierárquica, que o rácio adulto-criança não tinha influência na qualidade

média das salas dos jardins-de-infância e Cryer et al. (1999) não encontraram uma correlação entre o

rácio adulto-criança ou o tamanho do grupo de crianças da sala e a qualidade média global.4 No estudo

mais recente, publicado por Abreu-Lima e Nunes (2006), relativo a salas de jardim-de-infância,

verificou-se igualmente que não havia associações entre o rácio adulto-criança e o tamanho do grupo e

os resultados médios da ECERS-R. Também no estudo publicado por Aguiar et al. (2002), respeitante

a salas de creche, se verificou que não havia associações estatisticamente significativas entre os

4 No estudo de Cryer et al. (1999), verificou-se que em Portugal havia uma associação positiva entre o número total de crianças da instituição e a qualidade média das salas, avaliada pela ECERS.

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Educação e cuidados de elevada qualidade

79

resultados médios da ITERS e o rácio adulto-criança, o tamanho do grupo e o número de adultos da

sala.

A dimensão da sala tem-se revelado uma característica de estrutura associada à qualidade de

processo avaliada pelas escalas ECERS e ITERS em Portugal: no âmbito do ECCE (ECCE Study

Group, 1997) verificou-se, através dos resultados de uma regressão hierárquica, que as salas de

jardins-de-infância de maior dimensão (mais espaço por criança) eram de qualidade mais elevada;

Cryer et al. (1999) relataram uma associação positiva entre a dimensão da sala e a qualidade média,

tendo os modelos de regressão testados identificado a dimensão da sala como a principal variável

preditora da qualidade dos jardins-de-infância5; no estudo publicado por Pessanha et al. (2007), relativo

a salas de creche do distrito do Porto, não foi encontrada uma associação estatisticamente significativa

entre o espaço disponível por criança e a qualidade média avaliada pela ITERS, mas a análise de

regressão hierárquica permitiu verificar que o espaço disponível por criança combinado com variáveis

relacionadas com o educador (idade e salário mensal) revelava efeitos significativos na qualidade.

Relativamente à faixa etária das crianças à qual a sala se destina, no estudo ECCE (ECCE

Study Group, 1997) verificou-se, através da regressão hierárquica, que a composição etária do grupo

não tinha influência nos resultados médios da ECERS em Portugal, na Alemanha e em Espanha. No

mesmo sentido, no estudo de Abreu-Lima e Nunes (2006), relativo à avaliação da qualidade de salas

de jardim-de-infância, não se encontraram diferenças estatisticamente significativas entre as salas para

crianças de 4 anos, de 5 anos e mistas. No estudo relativo a salas de creche (Aguiar et al., 2002) foi

encontrado um efeito moderado do grupo etário, apesar de não se terem encontrado diferenças

estatisticamente significativas, o que se pode dever ao número reduzido de salas. As salas para

crianças de 2 – 3 anos revelavam qualidade mais elevada do que as salas para crianças de 1 – 2 anos.

A qualidade mais elevada em salas para crianças de 2 – 3 anos pode dever-se a diversos factores, dos

quais se podem destacar o facto de ser menos provável encontrarem-se salas para crianças com 2

anos de idade sem educadores de infância (i.e., apenas com auxiliares) e o facto de a formação dos

educadores de infância ser predominantemente orientada para o trabalho com crianças mais velhas

(i.e., de jardim-de-infância). A ausência de diferenças entre as salas de jardim-de-infância destinadas a

crianças de diferentes faixas etárias pode estar relacionada com uma maior homogeneidade nas

características de funcionamento, como, por exemplo, o facto de todas as salas serem orientadas por

educadores de infância (i.e., profissionais com formação na área da educação de infância).

5 Na Alemanha foi verificada também uma associação entre a dimensão da sala e a qualidade global, mas nos outros países não havia um efeito desta variável na qualidade.

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Capítulo II

80

As características estruturais relacionadas com o educador

As características de estrutura relacionadas de algum modo com o educador/auxiliar de

educação habitualmente incluídas nos estudos acerca da qualidade da creche ou do jardim-de-infância

são a idade, o tempo de experiência profissional, a formação e o salário mensal auferido.

Relativamente à idade do educador, na Holanda, Deynoot-Schaub e Riksen-Walraven (2005)

verificaram que não havia relação entre a qualidade média das salas de creche (ITERS) e a idade do

prestador de cuidados, mas no estudo semelhante realizado por de van Ijzendoorn et al. (1998) em

creches e jardins-de-infância tinha sido observada qualidade mais elevada nas salas com profissionais

mais velhos.

Diversos estudos têm encontrado associações entre o tempo de experiência do educador na

área da educação de infância e os resultados da avaliação da qualidade de processo. Por exemplo, no

estudo de van IJzendoorn et al. (1998) foi observada qualidade mais elevada nas salas com

profissionais com menos anos de experiência. Contudo, nos EUA, Phillipsen, Burchinal, Howes e Cryer

(1997) verificaram que, quer em salas para crianças mais novas (bebés e crianças de 1 e de 2 anos de

idade), quer em salas do pré-escolar, a qualidade de processo era mais elevada nas que tinham

prestadores de cuidados com mais experiência e, no mesmo país, Bryant et al. (1994) não encontraram

associações estatisticamente significativas entre a experiência do educador e a qualidade avaliada

utilizando a ECERS num grupo de 32 salas de Head Start.

No que se refere à formação do pessoal, os resultados têm sido mais concordantes, sendo que

a maioria dos estudos revela uma associação positiva entre a formação dos profissionais na área da

educação de infância e a qualidade de processo. Por exemplo, nos EUA foram relatadas associações

positivas entre a qualidade das salas de creche e/ou pré-escolar e a formação do pessoal por Scarr et

al. (1994), pela Cost, Quality & Child Outcomes Study Team (1995), por Phillipsen et al. (1997), por

Phillips et al. (2000), etc.. Contudo, Bryant et al. (1994) não encontraram associações estatisticamente

significativas entre a qualidade e a formação do educador, apesar de se ter verificado que havia um

efeito moderado desta variável. Goelman et al. (2006), no Canadá, encontraram associações positivas

de pequena magnitude entre a formação do pessoal e a qualidade avaliada pela ITERS-R. A formação

dos adultos da sala era um dos preditores directos da qualidade das salas para bebés e para crianças

de 1 e 2 anos de idade. Pelo contrário, no estudo de van IJzendoorn et al. (1998), na Holanda, foi

observada qualidade mais elevada nas salas com profissionais com menos formação, tendo os autores

considerado este resultado se pode dever ao facto de os educadores com menos experiência e menos

formação serem capazes de lidar melhor com as condições de trabalho desfavoráveis e com a baixa

probabilidade de progressão na carreira, revelando um melhor desempenho. Cassidy, Buell, Pugh-

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Educação e cuidados de elevada qualidade

81

Hoese e Russell (1995) realizaram um estudo no qual verificaram o efeito da frequência pelos

profissionais de disciplinas sobre desenvolvimento e educação de crianças, durante o período em que

trabalham em salas de creche e de pré-escolar, na qualidade das suas salas e nas suas crenças. Os

resultados revelaram que entre os profissionais que participaram no curso de formação os ganhos nos

valores médios da ITERS e da ECERS foram significativamente superiores aos do grupo de controlo.

Verificaram ainda que, no grupo de controlo, havia situações de diminuição dos resultados médios da

qualidade. Os profissionais que tiveram formação revelavam, depois da formação, crenças e práticas

mais adequadas ao desenvolvimento das crianças do que os outros profissionais.

Finalmente, diversos estudos têm encontrado associações positivas, estatisticamente

significativas, entre o salário auferido pelo educador e a qualidade global (de processo) das salas de

creche e de jardim-de-infância, sendo a sua magnitude variável (e.g., Cost, Quality & Child Outcomes

Study Team, 1995; Goelman et al., 2006; Phillipsen et al., 1997; Scarr et al., 1994). O estudo de Phillips

et al. (2000) revelou que a contribuição do salário do educador para a qualidade era particularmente

relevante.

Em Portugal, no que diz respeito à idade do educador, os resultados obtidos por Pessanha

(2005), relativos à avaliação de salas de creche, permitiram verificar a existência de uma associação

negativa moderada, estatisticamente significativa, entre a qualidade média das salas e a idade do

responsável pela sala. Porém, no estudo de Abreu-Lima e Nunes (2006) verificou-se que não havia

associações entre esta variável e os resultados médios da qualidade avaliada pela ECERS-R.

No estudo ECCE (ECCE Study Group, 1997) a regressão hierárquica permitiu verificar que a

qualidade média das salas dos jardins-de-infância portugueses era mais elevada quando os

educadores tinham mais experiência, ao contrário dos jardins-de-infância alemães que revelavam

qualidade mais elevada nas salas com educadores com menos tempo de experiência. Porém, no

estudo recente de Abreu-Lima e Nunes (2006) verificou-se que não havia associações entre a

experiência dos educadores e os resultados médios da qualidade avaliada pela ECERS-R. Nas salas

de creche, Pessanha (2005) e Pinto (2006) também não encontraram uma associação estatisticamente

significativa entre a qualidade média e o tempo de experiência do educador, apesar de haver de um

efeito pequeno (negativo) que, numa amostra pequena (N = 30), pode indicar uma tendência para ser

nas salas com educadores com menos experiência que se verifica qualidade mais elevada. Note-se

que nesse estudo (Pessanha, 2005) a associação entre a idade dos educadores, que revelava

associação negativa com a qualidade, e a sua experiência era forte (r = .84). Pinto (2006) verificou

também que havia uma relação negativa moderada, estatisticamente significativa, entre a experiência

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Capítulo II

82

dos educadores especificamente em creche e a qualidade global das salas. Deste modo, parece haver

uma tendência para se observar qualidade mais elevada em salas de creche com educadores mais

novos e com menos anos de experiência profissional em geral e em contexto de creche, mas os

resultados relativos a jardim-de-infância são menos claros.

No que diz respeito à formação dos responsáveis pelas salas de creche portuguesas, foi

encontrado um efeito importante da formação do adulto responsável pela sala (educador de infância vs

auxiliar de educação), sendo a qualidade superior nas salas com educador de infância, apesar de estas

diferenças não serem estatisticamente significativas (Aguiar et al., 2002). Porém, no ECCE, a educação

geral dos educadores portugueses, ao contrário do que acontecia na Alemanha e na Espanha, não era

um preditor da qualidade de processo (ECCE Study Group, 1997). Note-se que nos jardins-de-infância

portugueses todas as salas são orientadas por um educador de infância com formação, o que pode

conduzir a uma maior homogeneidade. O mesmo não acontece nas creches, nas quais se continuam a

encontrar salas orientadas apenas por pessoal auxiliar.

Em Portugal, Pessanha et al. (2007) e Pinto (2006) relataram uma associação positiva

moderada, estatisticamente significativa, entre o salário do responsável pela sala de creche e a

qualidade média. Contudo, no estudo ICCE (Cryer et al., 1999) a associação, de pequena magnitude,

entre o salário do educador e a qualidade das salas de jardim-de-infância portuguesas não era

estatisticamente significativa, ao contrário do que se verificava em Espanha e nos EUA. A relação

positiva estatisticamente significativa encontrada nas creches pode estar a ser determinada pela

formação dos educadores dado que, habitualmente, são os educadores de infância (com formação)

que têm salários mais elevados. Como foi referido, a formação dos profissionais tem um efeito positivo

na qualidade.

Outras características estruturais

Além das características mais directamente relacionadas com as salas de creche e de jardim-

de-infância e relacionadas com o educador, a investigação tem verificado o efeito de outros factores na

qualidade de processo, nomeadamente relacionados com o tipo de instituição, com aspectos

financeiros e com características do director.

Aguiar et al. (2002) e Pessanha (2005) verificaram que havia um efeito do tipo de instituição,

IPSS ou instituição com fins lucrativos, na qualidade média das salas, apesar de, mais uma vez, não se

terem encontrado diferenças estatisticamente significativas. A qualidade era mais elevada nas salas de

IPSS. Na Holanda, Deynoot-Schaub e Riksen-Walraven (2005) compararam a qualidade média das

instituições que eram subsidiadas e das que não eram subsidiadas, tendo verificado que havia

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Educação e cuidados de elevada qualidade

83

diferenças estatisticamente significativas: as salas de creches subsidiadas tinham qualidade mais

elevada do que as de creches não subsidiadas (a diferença era de 1 ponto na escala de likert de 7

pontos). No estudo Cost, Quality and Child Outcomes in Child Care Centers verificou-se que a

qualidade média das salas era mais elevada nos estados com maiores exigências, em termos das

regulamentações para obter licença de funcionamento e que essa elevada exigência atenuava as

diferenças entre serviços de diferentes sectores (instituições com e sem fins lucrativos). Contudo, um

nível de exigência mais elevado equivalia também a menor oferta de serviços e a custos mais

elevados. Verificou-se que havia alguns centros com acesso a recursos suplementares, o que

contribuía para a qualidade mais elevada, comparativamente aos outros (Cost, Quality & Child

Outcomes Study Team, 1995).

Phillips et al. (2000), nas salas de creche, verificaram a existência de correlações

estatisticamente significativas (de magnitude pequena ou moderada) entre a mensalidade paga pelos

pais (r = .44) e a qualidade de processo. Confirmando esta associação, em salas de creche no Canadá,

Goelman et al. (2006) encontraram associações positivas moderadas entre a qualidade média avaliada

pela ITERS-R e a mensalidade e o apoio recebido pela instituição para pagar as instalações. A

qualidade média era mais elevada em creches que eram local de estágio para estudantes e que não

tinham fins lucrativos. A mensalidade paga pelos pais e a utilização do centro como local de estágio

eram, entre outros, preditores indirectos da qualidade.

Vários autores alertam para a inconsistência dos resultados ao nível da associação entre as

variáveis de estrutura e as variáveis de processo dos serviços de educação e cuidados para crianças

com idade inferior a 6 anos. Por exemplo, Scarr et al. (1994) encontraram relações moderadas entre a

qualidade global e algumas características de estrutura, considerando que com a excepção do salário

do educador, que revelava uma associação forte, as outras variáveis de estrutura (que são

regulamentadas) podem não captar suficientemente a qualidade de processo e, portanto, não podem

ser considerados indicadores substitutos das medidas da qualidade. Pode considerar-se que estas

variáveis são uma base para a existência de educação e cuidados de boa qualidade, mas não são

garantia de que tal aconteça.

Os resultados expostos nesta secção, de facto, não permitem identificar com clareza quais as

características de estrutura que mais se relacionam com a qualidade de processo. Os diversos estudos

parecem indicar uma tendência para se encontrarem associações entre a qualidade de processo e

características de estrutura (como o rácio adulto-criança, o número de adultos da sala, o número de

crianças da sala, a formação dos profissionais, o salário dos profissionais, a mensalidade paga pelos

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Capítulo II

84

pais) não sendo os resultados, todavia, unânimes. Será de salientar que, nos estudos portugueses

referidos, nem sempre se encontram associações entre as diversas variáveis semelhantes às que têm

sido encontradas em outros países, o que provavelmente se deve a factores específicos de cada país.

Relativamente às características dos educadores, em Portugal, em contexto de creche, parece

haver uma tendência para se observar qualidade mais elevada em salas com educadores mais jovens

e com menos anos de experiência profissional. Em jardim-de-infância ou não se encontram

associações entre estas variáveis ou se encontra uma associação positiva, isto é, observa-se melhor

qualidade nas salas do pré-escolar com educadoras com mais experiência profissional. A formação dos

responsáveis pelas salas de creche parece ter um efeito positivo na qualidade de processo das suas

salas, principalmente quando se comparam salas de creche orientadas por educadores de infância com

salas de creche orientadas por auxiliares de educação. Nos jardins-de-infância, em Portugal, há maior

uniformidade na formação dos responsáveis das salas de creche (todos são, de facto, educadores de

infância, isto é, todos têm formação nesta área), o que torna mais difícil captar correlações. Nos outros

países, onde não se verifica essa exigência, têm sido encontradas associações positivas entre a

formação dos profissionais e a qualidade de processo das salas.

No que se refere a outras características, os resultados dos estudos efectuados em vários

países indicam que é promovida uma qualidade de processo mais elevada nas instituições sem fins

lucrativos, que recebem mais apoios a nível financeiro e de outros recursos ou onde os pais pagam

mensalidades mais elevadas. Contudo, é interessante verificar que nos estados dos EUA com

regulamentações mais exigentes as diferenças entre instituições de diferentes sectores não são

observadas, o que pode contribuir para demonstrar o papel da legislação (e da exigência no seu

cumprimento).

3. Efeitos da qualidade dos contextos de educação e cuidados no

desenvolvimento da criança

Universalmente, tem havido uma consciencialização crescente de que os primeiros anos de

vida são um período crucial para promover o desenvolvimento físico, mental e psicossocial da criança e

para evitar deficiências e suas condições secundárias (Simeonsson, 2000). A investigação sobre o

desenvolvimento da criança determinou que o ritmo de aprendizagem e desenvolvimento humano é

mais rápido em idade pré-escolar, sendo os primeiros cinco anos de vida considerados um período de

intenso desenvolvimento cognitivo, social, emocional, motor e da linguagem (Dwyer et al., 2000).

Jalongo et al. (2004) propõem mesmo que todas as nações definam a infância como um período

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Educação e cuidados de elevada qualidade

85

altamente distinto do crescimento e do desenvolvimento humanos, que merece uma cuidadosa

intervenção educacional, social e política. Shonkoff e Phillips (2000, p. 1) consideram que nas últimas

décadas se verificou uma “explosão na investigação nas ciências neurobiológicas, comportamentais e

sociais”, que levaram a que se tivesse em consideração (1) a importância das experiências precoces,

bem como as influências interactivas e inseparáveis do ambiente e da hereditariedade, (2) o papel

fulcral das relações precoces como fonte quer de apoio e adaptação quer de risco ou disfunção, (3) as

poderosas capacidades, complexas emoções e competências sociais essenciais que se desenvolvem

durante os primeiros anos de vida e (4) a capacidade de aumentar a probabilidade de resultados

desenvolvimentais favoráveis, através de intervenções planeadas. Simultaneamente, as

transformações sociais tornaram necessário intervir de modo a garantir o desenvolvimento adequado

das crianças, especialmente das que vivem em situação de risco.

Têm sido realizados estudos, em diversos países, para determinar os efeitos da educação e

dos cuidados de boa qualidade na vida das crianças e das suas famílias, alguns dos quais com uma

dimensão longitudinal. Melhuish (2001) identifica diferentes tendências ao nível da investigação:

inicialmente a investigação tinha como objectivo verificar se as crianças que frequentavam instituições

se desenvolviam de forma diferente das crianças que não as frequentavam; trabalhos posteriores

reconheceram que a qualidade ou as características das experiências eram importantes ao considerar

os seus efeitos; e, finalmente, começou também a ser dada atenção à importância da interacção entre

a casa (família) e os cuidados prestados fora de casa. Relacionados com a primeira vaga de estudos,

podem estar os trabalhos realizados por Bowlby, Spitz e Harlow acerca da separação entre a mãe e a

criança que podem ter, segundo Portugal (2000), contribuído para que as creches fossem consideradas

um “mal necessário” e aumentou a culpabilidade de muitas mães que deixavam os filhos com outras

pessoas, para poderem trabalhar fora de casa. Contudo, os dados da investigação tendem a

demonstrar que os cuidados extrafamiliares não têm efeitos nefastos na criança, assumindo a

qualidade desses cuidados um papel relevante. Os estudos que incluíram crianças com incapacidades

verificaram igualmente que, quando se avaliava o desenvolvimento mental e motor e a vinculação aos

30 meses de idade, não se verificavam diferenças estatisticamente significativas entre crianças que

estavam em casa com a mãe e crianças que frequentavam contextos formais de educação, e que a

elevada qualidade observada nos contextos formais de educação e cuidados prognosticavam um

melhor comportamento adaptativo em crianças com incapacidades (Booth & Kelly, 2002).

As tendências apresentadas relativas à investigação relacionam-se com os objectivos definidos

para os serviços de educação e cuidados. Na maior parte dos países, as políticas da educação e

cuidados para crianças pequenas são moldadas por um conjunto de objectivos: (1) facilitar a

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Capítulo II

86

participação das mães com crianças pequenas no mundo do trabalho e a reconciliação entre o trabalho

e as responsabilidades familiares; (2) apoiar as crianças e famílias em risco, promovendo

oportunidades equitativas de educação e aprendizagem ao longo da vida; (3) apoiar os contextos que

promovem o desenvolvimento global e o bem-estar das crianças; (4) promover a prontidão para a

entrada na escolaridade obrigatória e os resultados educativos posteriores; e (5) manter a integração e

coesão sociais (OCDE, 2001). O foco em cada um destes objectivos é condicionado por aspectos

económicos, ideológicos, políticos e sociais. De qualquer modo, a maior parte dos países reconhece a

importância dos serviços de educação e cuidados no apoio que prestam aos pais integrados no mundo

do trabalho, constituindo também um local privilegiado para a socialização e aprendizagem das

crianças pequenas (OCDE, 2001). Lamb (1998) considera que embora as razões de ordem económica

dominem a oferta e a procura na área da prestação extrafamiliar de cuidados, este tipo de serviços tem

sido utilizado pelos diferentes países com objectivos diversos, alguns deles recorrentes: (1) promover o

emprego das mulheres, (2) providenciar a aculturação dos imigrantes e o doutrinamento ideológico, (3)

encorajar a auto-suficiência económica, diminuindo a dependência de sistemas de segurança social e

(4) melhorar a vida das crianças. Também é reconhecido que estes serviços constituem uma

oportunidade para se identificarem crianças com necessidades educativas especiais ou em risco, o que

permite intervir precocemente de modo a prevenir ou minimizar dificuldades futuras (OCDE, 2001).

Em Portugal, os objectivos da creche, definidos nos Guiões Técnicos da Acção Social, incluem

também a promoção do desenvolvimento das crianças e a possibilidade de despiste precoce de

qualquer inadaptação ou deficiência (Rocha et al., 1996). Como foi já referido, são tradicionalmente

definidas três funções da educação pré-escolar: (1) função social ou assistencial, (2) função educativa

e (3) função preventiva ou função compensatória (Bairrão et al., 1997).

A função compensatória dos serviços de educação e cuidados foi e continua a ser relevante

em muitos países. Assume-se que é necessário compensar as crianças das experiências deficitárias

promovidas pelo ambiente familiar, dotando-as de competências que lhes permitam ter sucesso a nível

académico, económico e profissional, de modo a evitar no futuro custos para a sociedade devido à

dependência da segurança social e ao envolvimento no crime ou outros problemas sociais (OCDE,

2001). Bairrão et al. (1997, p. 29), a propósito da educação compensatória, referem um aspecto de

extrema importância: “convém salientar que a educação pré-escolar não possui poderes mágicos que

lhe permitam compensar as crianças de todas as privações, nem pode substituir ou sobrepor-se ao

processo educativo que ocorre no seio da família, devendo antes complementar a sua acção e apoiá-la

sempre que necessário”.

No âmbito dos programas de educação compensatória, mas também em outros tipos de

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Educação e cuidados de elevada qualidade

87

programas, foram realizados estudos para determinar a eficácia das medidas desenvolvidas, incluindo

investigar os efeitos da qualidade dos contextos de educação e cuidados no desenvolvimento das

crianças. Os EUA têm sido um país profícuo no desenvolvimento de estudos deste tipo, alguns com

carácter interventivo e alguns com carácter longitudinal, que podem ajudar a compreender os efeitos da

frequência de estruturas formais de educação e cuidados e, particularmente, os efeitos da qualidade

dessas estruturas.

3.1 Alguns estudos longitudinais desenvolvidos nos EUA

Programas Head Start

O programa Head Start, um dos programas de intervenção cujo objectivo era a luta contra a

pobreza, desenvolvido nos anos 60 e implementado desde então, é, provavelmente, o melhor exemplo

da promoção da função compensatória. Farran (2000) refere que se vivia uma era de optimismo, pois

pretendia-se acabar com a pobreza através da educação. Estes programas forneciam ainda outro tipo

de recursos, como cuidados de saúde e de alimentação, que, de outro modo, não existiriam,

comprometendo a futura vida académica dos alunos, a adaptação à sociedade e a qualidade e

esperança de vida (Bairrão, 1992). Zigler e Styfco (1994, p. 127), num artigo acerca das críticas feitas

ao programa, alertam para as expectativas demasiado elevadas, que tornam os resultados obtidos

decepcionantes, como, por exemplo, achar que uma intervenção com a duração de um ou dois anos

poderia “garantir um diploma do ensino secundário ou acabar com a pobreza ou o crime”.

Os programas Head Start foram sujeitos a avaliações para se verificar o seu impacto nas

crianças, tendo sido obtidos resultados discrepantes. Os primeiros estudos foram, de algum modo

desanimadores, pois tipicamente demonstraram que o programa não tinha efeitos ao nível dos testes

de Quociente Intelectual – Q.I. (Sylva & Wiltshire, 1993) ou que os efeitos rapidamente se desvaneciam

(Haskins, 1989). Apesar de o Head Start ter objectivos muito amplos, as primeiras avaliações

centraram-se na inteligência, pois, como referem Zigler e Styfco (1994, p. 128), na altura havia a

perspectiva muito popular no âmbito da Psicologia do Desenvolvimento de que “a inteligência poderia

ser aumentada dramaticamente através de um enriquecimento breve do ambiente”.

Outras investigações, que recorreram a diferentes medidas, concluíram que tinha efeitos

imediatos e positivos nas competências cognitivas e sociais das crianças (Haskins, 1989; Sylva &

Wiltshire, 1993). Bryant et al. (1994) verificaram que as crianças que frequentavam salas de Head Start

de qualidade mais elevada tinham melhores resultados em medidas de realização e competências pré-

académicas, independentemente da qualidade do ambiente familiar. No entanto, as crianças de melhor

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Capítulo II

88

ambiente familiar pareciam beneficiar mais das áreas de resolução de problemas e raciocínio, do que

as crianças de famílias menos estimulantes. Estes autores apontam um conjunto de razões que

poderão explicar estes resultados, como: as crianças de salas de qualidade mais elevada têm

oportunidade de participarem em actividades mais variadas e interessantes, o que aumenta o seu

envolvimento e a atenção e, consequentemente, desenvolvem mais competências e aprendem mais

conceitos; nas salas adequadas ao desenvolvimento são ensinados, modelados e reforçados

conhecimentos e competências específicos, utilizando modos e formatos variados, o que promove a

sua generalização; as crianças de salas de qualidade mais elevada podem sentir-se mais felizes, em

geral, o que aumenta a sua motivação; e as interacções adulto-criança positivas aumentam os

potenciais ganhos da criança. Os programas Head Start salientam o apoio às famílias e o seu

envolvimento, o que pode promover o bem-estar dos pais e ajudar as famílias a lidar com eventos de

vida difíceis. Contudo, os dados sobre estes aspectos são limitados (Bryant & Maxwell, 1997).

Dados mais recentes confirmam os resultados positivos do programa (Head Start Family and

Child Experiences Survey [FACES], 2001), tendo sido verificado que a frequência destes programas

permitia reduzir o fosso existente à partida entre crianças em desvantagem e as outras crianças, em

componentes-chave da prontidão para a frequência escolar. Este estudo permitiu demonstrar que a

frequência do Head Start reduzia as diferenças entre as crianças em desvantagem e as outras crianças

nas competências de vocabulário e de escrita durante o ano de frequência do Head Start, melhorava as

competências sociais das crianças que frequentaram o programa e levava a melhorias continuadas no

conhecimento de palavras, no reconhecimento de letras e nas competências de matemática e de

escrita, durante o ano do kindergarten6 (Head Start FACES, 2001). Os pais revelavam-se

extremamente satisfeitos com o Head Start e, no fim da frequência do Head Start, revelavam maior

sentimento de controlo sobre as suas vidas do que no início. Este estudo verificou que 75% das salas

eram de boa qualidade, 20% eram de excelente qualidade e não havia salas de qualidade inadequada,

que as salas observadas tinham profissionais qualificados e que a qualidade observada estava

relacionada com os resultados das crianças (Head Start FACES, 2001).

Child-Parent Centers/Chicago Longitudinal Study

Com início também nos anos 60 (1967) e com função compensatória, o projecto Child-Parent

Centers, desenvolvido em Chicago, tinha como principal objectivo promover o sucesso académico das

crianças e facilitar o envolvimento dos pais na educação das crianças (Reynolds, Miedel, & Mann,

6 Nos EUA o kindergarten é o último ano da educação pré-escolar, tendo carácter obrigatório.

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Educação e cuidados de elevada qualidade

89

2000). Os centros deste projecto eram frequentados por crianças desde os 3 anos de idade até ao

segundo ou terceiro ano de escolaridade. O princípio básico, subjacente a este projecto, era o de que

os alicerces do sucesso escolar são facilitados pela presença de um ambiente de aprendizagem

estável e rico durante os primeiros anos de vida e pela participação dos pais na educação dos seus

filhos. Assim, além de investir no ambiente de aprendizagem, este projecto implementou um programa

multifacetado para envolvimento dos pais. O projecto Child-Parent Centers foi avaliado por diversos

estudos, sendo o mais conhecido o Chicago Longitudinal Study, cujos principais resultados indicaram

que as crianças que participaram neste projecto (1) começaram o kindergarten com níveis mais

elevados de prontidão em várias áreas, (2) revelavam melhores resultados na leitura e na matemática

desde os 6 aos 15 anos de idade, (3) tinham taxas inferiores de retenção e de colocação em serviços

de educação especial, (4) evidenciavam melhores resultados aos 14 anos num teste de competências

de consumidor que é necessário para a conclusão do nível de ensino equivalente ao ensino

secundário, (5) tinham uma taxa inferior de abandono escolar aos 18 anos de idade e (6) tinham pais

que se envolviam mais regularmente na sua educação formal durante e após a participação no projecto

(Reynolds et al., 2000).

High/Scope Perry Preschool Study

Outro programa de muita relevância nesta área foi o High/Scope Perry Preschool Study, tendo

consistido também num dos primeiros estudos acerca dos efeitos da educação pré-escolar em crianças

que viviam em situação de pobreza. Este estudo, com início em 1962, envolveu a colocação aleatória

de crianças que viviam em situação de pobreza e risco de insucesso escolar num grupo experimental e

num grupo de controlo (Schweinhart, 2003). As crianças do grupo experimental foram colocadas em

serviços de elevada qualidade que utilizavam o Currículo High/Scope, desenvolvido no âmbito do

projecto (Bryant & Maxwell, 1997). Além de se proporcionar às crianças (do grupo experimental) a

frequência da educação pré-escolar, eram ainda efectuadas visitas domiciliárias semanais às suas

famílias. O Perry Preschool assume a importância da prestação de cuidados de elevada qualidade,

considerando que os programas de educação e cuidados devem respeitar sete componentes: um

currículo desenvolvimentalmente adequado, baseado nas iniciativas da criança; grupos com um

máximo de 20 crianças dos 3 aos 5 anos de idade e com um mínimo de 2 adultos em cada grupo;

pessoal com formação na área do desenvolvimento das crianças mais novas; supervisão do pessoal e

formação em serviço; envolvimento dos pais, como parceiros dos profissionais; sensibilidade às

necessidades não educacionais das crianças e das famílias; e procedimentos de avaliação

desenvolvimentalmente adequados (Schweinhart & Weikart, 1988). Têm sido efectuados estudos no

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Capítulo II

90

sentido de identificar os efeitos a curto prazo e os efeitos a longo prazo destes programas educativos

de elevada qualidade, tendo concluído, nomeadamente, que no último ano do pré-escolar havia um

ganho a nível do Q.I. nas crianças que frequentaram o programa, mas a avaliação realizada durante a

escola secundária revelou que o efeito se tinha esbatido, e que havia efeitos duradouros do programa

de elevada qualidade nos participantes, nomeadamente ao nível da realização académica, do sucesso

a nível económico e da prevenção da criminalidade tanto nos jovens adultos, como nos adultos de

meia-idade (40 anos de idade) (Sylva & Wiltshire, 1993). Os resultados do Perry Preschool permitiram

demonstrar que havia um benefício público de 13 dólares por cada dólar investido no programa

(Schweinhart, 2005). Bryant e Maxwell (1997) referem que, mesmo que os resultados a nível cognitivo

não fossem relevantes, os benefícios a longo prazo na vida real eram notáveis.

Consortium para os Estudos Longitudinais

Com o intuito de estudar o impacto a longo prazo de diversos modelos educativos para a

infância, e reagindo a estudos que se centraram na avaliação dos efeitos do Head Start ao nível da

inteligência, foi organizado em 1975 o Consortium para os Estudos Longitudinais, que agrupou 11

projectos de educação de infância desenvolvidos na década de 60, até 1969 (Spodek & Clark-Brown,

1993). Haskins (1989) ressalva que estes programas foram conduzidos sob circunstâncias ideais, pois

possuíam investigadores competentes, profissionais com boa formação, amplo financiamento e

expectativas elevadas, o que dificilmente se encontra na maioria dos programas de educação pré-

escolar.

De qualquer modo é importante salientar que foram encontrados resultados positivos desses

programas no desenvolvimento intelectual e na competência social das crianças, tendo sido verificado

igualmente que havia menos crianças a serem colocadas em educação especial do que no grupo de

crianças que não tinha frequentado estes programas, e que havia um efeito positivo em diversas

medidas de sucesso (e.g., menores taxas de gravidez na adolescência, delinquência, dependência da

segurança social, etc.) (Haskins, 1989).

Carolina Abecedarian Project e CARE

O Carolina Abecedarian Project, desenvolvido na Carolina do Norte passados 10 anos do início

do High/Scope, consistiu num estudo longitudinal acerca dos benefícios da uma intervenção

educacional precoce intensiva para crianças de famílias pobres e com vários factores de risco, sendo

98% das crianças afro-americanas (Campbell, Pungello, Miller-Johnson, Burchinal, & Ramey, 2001;

Campbell, Ramey, Pungello, Sparling, & Miller-Johnson, 2002). Foram desenvolvidas para cada criança

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Educação e cuidados de elevada qualidade

91

actividades focando o desenvolvimento social, emocional e cognitivo, dando particular ênfase à

linguagem. Os resultados da avaliação das crianças aos 12 anos de idade revelaram efeitos positivos

da participação no programa ao nível do desenvolvimento cognitivo e realização académica (Campbell

& Ramey, 1994). Resultados semelhantes foram verificados na avaliação dos participantes aos 15 anos

de idade, tendo sido verificado que as crianças que frequentaram o Abecedarian Project tinham

melhores resultados do que as outras crianças ao nível da leitura e da matemática, durante a

adolescência (Ramey et al., 2000; The Carolina Abecedarian Project, 1999). A frequência do programa

pré-escolar de elevada qualidade tinha um efeito no número de retenções conferidas aos 15 anos de

idade, tendo havido menos retenções entre as crianças do Abecedarian do que entre as crianças do

grupo de controlo (Ramey et al., 2000). Verificou-se, ainda, que até aos 15 anos tinha havido menos

crianças do grupo experimental a receber serviços de educação especial, durante a frequência escolar,

apesar de haver mais crianças do grupo experimental que receberam esse tipo de serviços durante o

pré-escolar (Ramey et al., 2000). O mesmo estudo concluiu que aos 21 anos de idade os jovens

adultos do grupo experimental tinham melhores resultados a nível cognitivo, melhores resultados ao

nível da leitura e da matemática, tinham completado mais anos de educação formal/ensino superior e

eram, em média, mais velhos quando tiveram o primeiro filho (gravidez na adolescência menos

frequente) (Campbell et al., 2002). O Carolina Abecedarian Project teve também um efeito positivo nas

mães das crianças que participaram no estudo ao nível da educação formal e do emprego (Ramey et

al., 2000). Os efeitos do projecto fizeram sentir-se a longo prazo, ao contrário de outras intervenções,

cujos efeitos se desvaneceram com o tempo, considerando os autores que a persistência dos efeitos

pode dever-se, entre outros factores, ao facto de se ter começado a intervenção antes dos 3 anos de

idade ou à duração/intensidade da intervenção, superiores às de outros projectos (Campbell & Ramey,

1994; Campbell et al., 2001). Contra o argumento de que não seria possível implementar de forma mais

abrangente este projecto, devido aos custos envolvidos, Campbell e Ramey (1994, p. 696) referem que

“nada foi feito no Projecto Abecedarian que não pudesse ser feito noutro centro de educação pré-

escolar ou noutra escola”.

Na sequência do Abecedarian Project, devido ao reconhecimento do papel importante dos pais

no desenvolvimento das crianças, foi desenvolvido outro projecto, designado CARE (Wasik, Ramey,

Bryant, & Sparling, 1990). Neste projecto participaram famílias com crianças em risco de dificuldades

cognitivas, que foram seleccionadas aleatoriamente para três grupos, dois com intervenção e um para

controlo. Um dos grupos participantes na intervenção recebeu educação familiar em conjunção com a

frequência pelas crianças de centros de educação e cuidados e o outro grupo teve apenas o programa

de educação familiar. Os autores encontraram efeitos do programa, sendo que as crianças que

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Capítulo II

92

frequentaram o centro de educação e cuidados e cujas famílias participaram simultaneamente no

programa de educação parental eram as que revelavam melhores resultados nos testes de

desenvolvimento cognitivo. Contudo, não se verificaram efeitos do programa na qualidade do ambiente

familiar nem nas atitudes dos pais.

Os programas até aqui apresentados destinavam-se a famílias consideradas em risco. De

facto, tem sido demonstrado por diversos investigadores que as pessoas com nível socioeconómico

mais baixo têm, entre outros, risco mais elevado de doenças e menor esperança de vida do que

pessoas do estrato mais rico da sociedade. Estudos recentes indicaram que é o stresse psicossocial

associado à pobreza que contribui para aumentar o risco de contrair doenças diversas (Sapolsky,

2005). Nos EUA foi encontrada ainda uma associação entre o grau de desigualdade nos rendimentos

(entre os mais ricos e os mais pobres) e o nível médio de saúde na comunidade, sendo que uma

diminuição nessa desigualdade era preditora de melhor saúde tanto para as pessoas pobres como para

as mais ricas (Sapolsky, 2005). A estas consequências relacionadas com a saúde, acrescentam-se

outras, como o risco de insucesso e de abandono escolar.

Como foi referido, apenas serviços de educação e cuidados de elevada qualidade poderão

tornar as crianças de meios desfavorecidos mais resilientes e capazes de lidar com as adversidades

que a situação económico-social das suas famílias acarreta. As crianças são muito vulneráveis aos

efeitos da pobreza e o seu desempenho escolar é a área mais afectada (Farran, 2005). Farran refere

diversos estudos que concluíram que tendencialmente as crianças de famílias economicamente

desfavorecidas iniciam a escolaridade com competências académicas significativamente inferiores do

que os seus pares e que há maior risco de terem insucesso escolar, revestindo-se, deste modo, de

particular importância fornecer serviços adequados de prestação de cuidados aos bebés e crianças

mais novas. Esses serviços devem ser iniciados precocemente, deve haver continuidade e devem ser

de elevada qualidade, para que as crianças participem em experiências compensatórias no contexto de

educação e cuidados. Farran conclui que contextos de má qualidade fazem com que a opção por

cuidados em contextos formais possa ser uma má opção para crianças que precisam de cuidados

compensatórios de elevada qualidade, devido à pobreza, baixo nível educativo e stresse das suas

famílias. Estes aspectos, relacionados com a qualidade da educação e dos cuidados prestados, têm

sido preocupação de diversos estudos. Além dos que foram apresentados, que tinham uma forte

componente compensatória, foram realizados estudos com grandes amostras que incluíam crianças (e

famílias) de diferentes níveis socioeonómicos.

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Educação e cuidados de elevada qualidade

93

Cost, Quality and Child Outcomes in Child Care Centers Study

O Cost, Quality and Child Outcomes in Child Care Centers Study, realizado nos EUA a partir de

1993, foi desenvolvido para examinar a influência dos cuidados prestados em estruturas formais de

educação pré-escolar no desenvolvimento das crianças, não só durante os anos de frequência pré-

escolar, mas também à medida que as crianças transitavam para a escolaridade obrigatória (Peisner-

Feinberg et al., 1999). Este estudo permitiu encontrar uma relação positiva entre o desenvolvimento

cognitivo e social das crianças e a qualidade das suas experiências nos serviços de educação e

cuidados, independentemente do nível de educação da mãe, do género da criança e da etnia (Cost,

Quality & Child Outcomes Study Team, 1995; Peisner-Feinberg & Burchinal, 1997). Foi encontrada uma

associação positiva entre a qualidade dos centros de educação e cuidados (em cada centro foi

observada uma sala para crianças com menos de 30 meses e uma sala para crianças com mais de 30

meses de idade) e os resultados desenvolvimentais das crianças, avaliados durante a frequência

desses centros, em todos os domínios estudados: linguagem receptiva, competências pré-académicas,

comportamentos na sala do pré-escolar, atitudes em relação ao contexto de educação e cuidados e

percepção de competência (Peisner-Feinberg & Burchinal, 1997). As características da família tinham

uma influência moderadora em alguns dos resultados obtidos, que indicavam efeitos positivos mais

fortes da qualidade dos contextos educativos extrafamiliares nas crianças consideradas em risco. Não

foram encontradas evidências de que as crianças de famílias consideradas em vantagem estavam

protegidas dos efeitos prejudiciais da qualidade pobre dos cuidados extrafamiliares (Peisner-Feinberg &

Burchinal, 1997).

Os efeitos da qualidade das experiências das crianças (nos centros de educação pré-escolar)

nos resultados de desenvolvimento das crianças mantiveram-se ao longo da frequência do

kindergarten e, na maioria dos casos, até ao final do segundo ano de escolaridade, mesmo após

controlado o efeito das características do kindergarten e da escola (Peisner-Feinberg & Burchinal,

1997; Peisner-Feinberg et al., 1999; Peisner-Feinberg et al., 2000). A única medida na qual não se

mantinha o efeito da qualidade ao longo do segundo ano de escolaridade era a competência de

reconhecimento de letras e palavras (Peisner-Feinberg et al., 2000). A qualidade das experiências tinha

um maior impacto nas crianças consideradas em risco de não terem um bom desempenho na escola,

que se manifestava ainda durante o segundo ano de escolaridade (Peisner-Feinberg et al., 1999).

Foram encontradas, portanto, influências moderadoras das características das famílias, indicando

efeitos mais positivos da qualidade dos contextos em alguns dos resultados das crianças de famílias

em desvantagem (Peisner-Feinberg et al., 2001). Os resultados obtidos pelo Cost, Quality and Child

Outcomes in Child Care Centers Study evidenciaram que a qualidade das salas do pré-escolar estava

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Capítulo II

94

relacionada com o desenvolvimento cognitivo, enquanto que a proximidade da relação entre os

profissionais e as crianças influenciava mais o desenvolvimento social ao longo dos primeiros da

escolaridade (Peisner-Feinberg et al., 1999; Peisner-Feinberg et al., 2001). Os investigadores

envolvidos no Cost, Quality and Child Outcomes in Child Care Centers Study concluíram que a

qualidade da educação e cuidados é importante para todas as crianças, podendo ser especialmente

importante para crianças em risco, que os efeitos da qualidade da educação e cuidados se fazem sentir

a longo prazo e que estas duas dimensões da qualidade dos serviços (qualidade das práticas

desenvolvidas na sala e qualidade da relação adulto-criança) se associam de modo diferente aos

resultados das crianças (Peisner-Feinberg et al., 1999). Os autores deste vasto estudo referem a

importância destes resultados no âmbito do modelo bioecológico do desenvolvimento humano

(Bronfenbrenner & Morris, 1998), que considera a influência dos múltiplos contextos ambientais que a

criança experiencia (Peisner-Feinberg et al., 2001).

Apesar de ter sido demonstrado que seriam as crianças em risco que mais beneficiavam da

elevada qualidade dos serviços de educação e cuidados, o Cost, Quality and Child Outcomes in Child

Care Centers Study verificou que havia uma tendência para serem as crianças de famílias em

vantagem, isto é, com salários mais elevados e de nível educativo mais elevado, a frequentarem

contextos de educação formal de qualidade mais elevada (Peisner-Feinberg et al., 2000). Shonkoff e

Phillips (2000) alertam também para esta disparidade, referindo que nos EUA há milhares de crianças

de famílias pobres que frequentam programas de baixa qualidade.

NICHD Study of Early Child Care

O NICHD (National Institute of Child Health and Human Development) Study of Early Child

Care, iniciado em 1991, foi outro estudo longitudinal muito importante nos EUA. Participaram neste

estudo 1364 crianças e suas famílias, tendo as famílias sido contactadas ainda no hospital, após o

parto (NICHD Early Child Care Research Network, 1997). O principal objectivo do NICHD Study of

Early Child Care era determinar em que medida as experiências em serviços de prestação de cuidados

extrafamiliares se relacionavam com o desenvolvimento da criança (NICHD Early Child Care Research

Network, 2006a). Os dados foram recolhidos em três contextos diferentes: em casa, num contexto

laboratorial e no contexto extrafamiliar de prestação de cuidados. O estudo envolveu repetidas

avaliações dos seguintes aspectos: (a) qualidade do ambiente familiar, (b) qualidade do ambiente de

prestação de cuidados não familiar e (c) desenvolvimento cognitivo, da linguagem e socioemocional

(Belsky, 2006).

Do NICHD Study of Early Child Care resultaram diversas publicações e comunicações, pelo

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Educação e cuidados de elevada qualidade

95

que não se pretende apresentar exaustivamente todos os seus resultados. Contudo, algumas

conclusões revestem-se de particular pertinência para a fundamentação do presente estudo. Aos 6

meses de idade, foram observados 576 bebés em diferentes tipos de cuidados não maternos: centro,

creche familiar, ama em casa da própria família, avós e pai, tendo sido avaliados os contextos e os

prestadores de cuidados (NICHD Early Child Care Research Network, 1996). Verificou-se que os

prestadores de cuidados eram mais positivos (sensíveis, responsivos, calorosos e cognitivamente

estimulantes) quando revelavam crenças menos autoritárias acerca da educação das crianças, quando

os grupos de crianças eram pequenos, quando havia menos crianças por adulto e quando os

ambientes físicos eram seguros, limpos e estimulantes (NICHD Early Child Care Research Network,

1996). Em 1998 foram publicados resultados que demonstram a importância dos preditores familiares,

tendo sido verificado que as características da família estavam igualmente associadas aos resultados

desenvolvimentais das crianças de 2 e 3 anos de idade, quer elas frequentassem contextos

extrafamiliares de educação e cuidados, quer não frequentassem (NICHD Early Child Care Research

Network, 1998a). Dos preditores familiares considerados, apenas três tinham um efeito preditor mais

forte nas crianças que não frequentavam cuidados não maternos, ou seja, que estavam apenas com a

mãe: a personalidade da mãe, as suas atitudes acerca da educação/dos cuidados das crianças e o

estado civil da mãe (NICHD Early Child Care Research Network, 1998a). Contudo, nesta publicação

não foi feita referência à qualidade dos contextos de educação e cuidados extrafamiliares. Noutro

estudo (NICHD Early Child Care Research Network, 1998b), foram utilizados preditores mais diversos

do desenvolvimento da criança: indicadores da quantidade, qualidade, estabilidade, tipo e idade de

entrada no contexto não materno de prestação de cuidados7, características da família e características

das crianças. Os resultados revelaram que o comportamento interactivo materno era um preditor mais

forte e consistente dos resultados da criança aos 2 e aos 3 anos de idade do que os cuidados não

maternos. Assim, a família parece ser mais importante para predizer o desenvolvimento da criança do

que as características dos contextos de cuidados não maternos. Contudo, entre os preditores

relacionados com os cuidados prestados às crianças, a qualidade era o preditor mais consistente,

sendo que a elevada qualidade dos cuidados estava associada a maior competência social e

cooperação e a menos problemas de comportamento aos 2 e aos 3 anos de idade. Encontraram-se

poucos indícios de que os cuidados não maternos precoces e prolongados se relacionassem com

comportamentos da criança problemáticos, ao contrário do que foi encontrado noutros estudos, apesar

de a falta de estabilidade nos cuidados ser um preditor negativo de alguns resultados aos 2 anos de

7 Neste estudo foram considerados contextos de prestação de cuidados não maternos os cuidados prestados pelo pai, por ama, familiares, vizinhos ou estruturas formais de educação e cuidados.

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Capítulo II

96

idade (NICHD Early Child Care Research Network, 1998b).

O NICHD Study of Early Child Care verificou que o risco familiar se associava mais fortemente

aos resultados socioemocionais das crianças do que as experiências nos contextos de educação e

cuidados (NICHD Early Child Care Research Network, 2000), o que levanta questões relativamente aos

efeitos da educação compensatória. Relativamente à experiência das crianças de 2 e 3 anos de idade

nos contextos de educação e cuidados, verificou-se que, das características desses contextos, o

comportamento positivo e responsivo do prestador de cuidados era o melhor preditor das interacções

positivas e competentes das crianças com os seus pares (NICHD Early Child Care Research Network,

2001) 8.

Em 2006, foi publicado um artigo que sistematiza os resultados relativos aos efeitos dos

cuidados não maternos, obtidos no âmbito do NICHD Study of Early Child Care (NICHD Early Child

Care Research Network, 2006b): os cuidados de elevada qualidade revelaram-se associados a

resultados mais elevados a nível pré-académico, cognitivo e da linguagem em todas as idades em que

as crianças foram avaliadas (15, 24, 36 e 54 meses) e associados a resultados mais elevados a nível

socioemocional e da relação com os pares apenas em algumas idades; um maior número de horas no

contexto de cuidados não maternos predizia mais problemas de comportamento e conflito, de acordo

com a informação fornecida pelos prestadores de cuidados; e mais tempo de cuidados em centros

relacionava-se com resultados mais elevados a nível cognitivo e da linguagem, a mais problemas e

menos comportamentos pró-sociais, de acordo também com informações fornecidas pelos prestadores

de cuidados.

Burchinal e Cryer (2003), considerando que os efeitos da qualidade do pré-escolar no

desenvolvimento das crianças poderiam variar em função da etnia das crianças, analisaram os dados

dos estudos NICHD Study of Early Child Care e Cost, Quality and Child Outcomes in Child Care

Centers, de modo a verificar em que medida a qualidade se relacionava de maneira diferente com os

resultados da avaliação do desenvolvimento das crianças de diferentes etnias. As autoras verificaram

que as crianças, independentemente do grupo étnico, revelavam melhores resultados ao nível das

competências cognitivas e sociais quando os educadores eram sensíveis e estimulantes.

Programa Smart Start

Mais recentemente foi desenvolvido o programa Smart Start, já referido, que visava assegurar

que todas as crianças entrassem na escolaridade obrigatória saudáveis e preparadas, de forma a

terem sucesso (Bryant et al., 2003). Foram abrangidas salas para crianças de 3 e de 4 anos de idade.

8 Estas avaliações foram efectuadas quando as crianças tinham 24 e 36 meses de idade.

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Educação e cuidados de elevada qualidade

97

Este projecto baseou-se na evidência de que a qualidade dos contextos de educação e cuidados

poderia influenciar positivamente a aprendizagem das crianças, pelo que uma das estratégias utilizadas

no sentido de preparar as crianças para a entrada na escola foi a promoção da qualidade das

experiências das crianças nos programas de educação e cuidados. O Smart Start permitiu financiar

actividades de assistência técnica que incluiu, entre outras medidas, apoio técnico nas próprias

instituições, financiamentos para melhorar as condições físicas e adquirir materiais, subsídios para os

centros de melhor qualidade e apoio para a formação do pessoal (Bryant et al., 2003). A avaliação

deste programa permitiu verificar que a qualidade dos serviços aumentou, que o nível de qualidade

estava relacionado com a participação no projecto e que as crianças que frequentaram estes centros

tinham resultados superiores às crianças de centros de qualidade inferior em medidas de competências

consideradas importantes para o sucesso escolar. Verificou-se que havia uma associação positiva,

estatisticamente significativa, entre a qualidade das salas e os resultados das crianças, mesmo quando

eram controlados os efeitos do género, dos rendimentos e da etnia. Todas as crianças beneficiavam da

qualidade dos programas, apesar de se considerar que as crianças de famílias pobres têm maior

necessidade de experiências positivas, uma vez que são elas que revelam menor prontidão na altura

do ingresso na escolaridade obrigatória (Bryant et al., 2003).

3.2 Alguns estudos desenvolvidos em Portugal ou outros países europeus

Como se pode concluir a partir da leitura da secção anterior, são abundantes os estudos

realizados nos EUA dos quais resultou um grande número de publicações amplamente divulgadas. Em

Portugal e noutros países, além dos estudos serem em menor número, a divulgação nem sempre é tão

intensa e eficaz. De qualquer modo serão apresentados de seguida alguns estudos e seus resultados.

Boocock (1995) efectuou a revisão de estudos conduzidos em 13 nações9, que abrangiam

serviços para crianças desde o nascimento até à entrada na escolaridade obrigatória, tendo verificado

que esses estudos indicavam que a frequência dos centros de educação pré-escolar promovia o

desenvolvimento cognitivo e o sucesso escolar, contribuindo para diminuir a diferença na realização

escolar entre crianças de famílias com rendimentos económicos mais baixos e crianças em vantagem.

Os resultados dos estudos permitiram igualmente verificar que o emprego das mães e a frequência de

contextos extrafamiliares de educação e cuidados não prejudicavam as crianças e poderiam mesmo

beneficiá-las, sendo de boa qualidade (Boocock, 1995).

9 Austrália, Canadá, Colômbia, França, Alemanha, Índia, Irlanda, Japão, Singapura, Coreia do Sul, Suécia, Turquia e Reino Unido

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Capítulo II

98

Resultados do IEA publicados recentemente (Montie, Xiang, & Schweinhart, 2006), relativos a

10 países ou regiões10, revelaram a associação entre características estruturais e de processo das

salas frequentadas pelas crianças aos 4 anos de idade e os seus resultados no domínio cognitivo e da

linguagem aos 7 anos de idade. Verificou-se que os resultados das crianças ao nível da linguagem

eram mais elevados quando o número de anos de educação formal do educador era também mais

elevado e quando o tipo de actividade predominante na sala era a escolha livre. Os resultados a nível

cognitivo eram melhores quando, na sala frequentada aos 4 anos de idade, as crianças passavam

menos tempo em actividades de grande grupo e havia maior variedade e quantidade de materiais.

Estes resultados comprovam, assim, a importância de seguir as actividades iniciadas pelas crianças e

de promover actividades em pequeno grupo, o que coincide com as recomendações da NAEYC, já

referidas (Montie et al., 2006).

Também no âmbito de um estudo longitudinal, desenvolvido no Reino Unido (Effective

Provision of Pre-school Education - EPPE), Sylva et al. (2006) apresentaram dados relativos ao efeito

da qualidade dos contextos de educação pré-escolar no desenvolvimento das crianças dos 3 aos 5

anos de idade, tendo avaliado a qualidade do ambiente com base em duas escalas, a ECERS-R e a

ECERS-E. Verificaram que a qualidade de processo, tal como avaliada pela ECERS-R, estava

associada ao progresso das crianças a nível sociocomportamental durante o período pré-escolar e que

a qualidade de processo avaliada pela ECERS-E era um preditor do desenvolvimento cognitivo e social

das crianças no início da escolaridade obrigatória, após se controlarem os efeitos das características

das crianças e das características das suas famílias.

Os resultados obtidos pelo ECCE, que incluem dados portugueses, permitiram concluir que

níveis elevados de qualidade dos programas de educação pré-escolar estavam relacionados com maior

competência social das crianças com os seus pares e os adultos, maior mestria nas competências da

vida diária e melhor desenvolvimento da linguagem (Tietze & Cryer, 1999). Estes efeitos eram vistos

em adição aos amplos efeitos do ambiente familiar das crianças (Tietze & Cryer, 1999), uma vez que

era a qualidade do ambiente familiar o factor preditor mais poderoso do desenvolvimento da criança

(ECCE Study Group, 1997). No âmbito do estudo A Qualidade das Interacções da Criança em Contexto

Familiar e de Creche e a sua Influência no Desenvolvimento Sociocognitivo da Criança, Pessanha

(2005) ao estudar os efeitos que a qualidade da creche poderia ter no desenvolvimento das crianças,

efectuando análises de regressão, não encontrou efeitos estatisticamente significativos, podendo esta

ausência de efeitos ser, em parte, atribuída à baixa qualidade evidenciada pelas salas observadas e à

relativa homogeneidade dos resultados referentes à qualidade (Pessanha, 2005).

10 Finlândia, Grécia, Hong Kong, Indonésia, Irlanda, Itália, Polónia, Espanha, Tailândia e EUA

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Educação e cuidados de elevada qualidade

99

3.3 Efeitos da qualidade dos contextos de educação e cuidados no desenvolvimento

cognitivo e socioemocional das crianças

Após a revisão da investigação realizada neste âmbito, a tarefa de extrair conclusões

apresenta-se árdua, o que foi aliás sentido e relatado por diversos autores, uma vez que os resultados

nem sempre são concordantes. Já em 1978, Belsky e Steinberg efectuaram uma revisão de diversos

estudos, tendo concluído que não era possível extrair conclusões definitivas, ou seja, os resultados não

apontavam todos no mesmo sentido. Contudo, estes autores consideram que esses trabalhos

representam um passo importante no estudo do impacto dos serviços de educação e cuidados nos

sistemas ecológicos mais alargados nos quais a criança vive e cresce.

Barnett, em 1995, efectuou a revisão de 36 estudos realizados nos EUA (alguns dos quais

foram referidos neste capítulo), tendo concluído que os programas de educação para a infância podem

trazer benefícios a curto-prazo no quociente de inteligência das crianças e efeitos a longo prazo no

aproveitamento escolar, no número de retenções, na colocação em educação especial e no

ajustamento social das crianças. Contudo, verificou que nem todos os programas produziam estes

efeitos, provavelmente devido às diferenças na sua qualidade e no financiamento.

Shpancer (2006) efectuou uma reflexão acerca dos efeitos da creche, que apelidou de “The

effects of daycare: Persistent questions, elusive answers”, na qual, após identificar diversas falhas ou

dificuldades de estudos deste tipo (como, por exemplo, a impossibilidade de separar uma instituição

social do contexto em que esta se insere, a impossibilidade de experimentação pura, a confusão entre

significância estatística e tamanho dos efeitos e o seu significado real na experiência das crianças),

conclui que décadas de investigação nesta área não permitiram reunir consenso, mas mostraram a

vasta complexidade das relações entre as experiências das crianças e o seu desenvolvimento. Este

autor refere que a forma como o fenómeno em estudo se comporta depende sempre da forma como

“fenómeno” e “comportamento” são definidos, medidos e analisados e acrescenta que “diferentes tipos

de crianças sofrem efeitos diferentes de diferentes tipos de ambientes, em diferentes momentos, em

diferentes contextos” (Shpancer, 2006, p. 235). Ainda no mesmo texto, alerta para o facto de que a

comunicação de resultados é muitas vezes condicionada pelo impacto que poderá ter a nível político.

Assim, nos casos em que os resultados são negativos, ou seja, em que os resultados apontam para um

efeito negativo nas crianças dos programas de educação e cuidados extrafamiliares, os resultados são

comunicados com precaução. O mesmo não acontece quando os resultados são positivos, ou seja,

quando os resultados apontam para um efeito positivo dos cuidados extrafamiliares.

Apesar de os diversos estudos nem sempre apresentarem dados consensuais, a maior parte

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Capítulo II

100

da investigação aponta para a importância da educação e dos cuidados de elevada qualidade no

desenvolvimento da criança e no bem-estar da família, mostrando em alguns casos que os efeitos da

qualidade no desenvolvimento da criança dependem de características da família. De seguida, serão

sistematizados resultados relativos à influência da qualidade dos contextos de educação e cuidados no

desenvolvimento cognitivo e socioemocional das crianças e relativos ao papel das características da

família nessa influência. Serão fornecidos apenas alguns exemplos de estudos que verificaram este

tipo de resultados.

Desenvolvimento cognitivo

Como foi referido, as primeiras avaliações efectuadas, nomeadamente no âmbito do Head

Start, centraram-se no impacto dos programas ao nível do Q.I., tendo sido verificado que de facto havia

um efeito positivo da qualidade dos serviços, mas que era pouco duradouro (e.g., Haskins, 1989).

Também no High/Scope Perry Preschool Study se verificou que no último ano do pré-escolar havia um

ganho a nível do Q.I. nas crianças que frequentaram o programa de elevada qualidade, mas a

avaliação realizada durante a escola secundária revelou que o efeito se tinha esbatido.

Ao serem consideradas outras medidas (e.g., competências cognitivas, competências ao nível

da matemática e da linguagem, aproveitamento académico e percurso académico, etc.), os efeitos

positivos encontrados parecem ser mais duradouros. Como foi salientado anteriormente, em estudos

como o Head Start, o ECCE, o Carolina Abecedarian Project, o Cost, Quality & Child Outcomes Study,

entre outros, verificou-se que havia efeitos positivos imediatos e a longo prazo da qualidade dos

contextos nas competências cognitivas das crianças. Por exemplo, no High/Scope Perry Preschool

Study foram identificados efeitos duradouros da elevada qualidade no desenvolvimento cognitivo dos

participantes, nomeadamente ao nível da realização académica, tanto na avaliação dos participantes

efectuada quando eram jovens adultos, como quando tinham já 40 anos de idade (Sylva & Wiltshire,

1993).

Diversos estudos indicam também um efeito da qualidade dos contextos de educação e

cuidados na prontidão das crianças para a frequência da escolaridade obrigatória e nas taxas de

retenção e de abandono escolar. Dados recentes revelam que a frequência dos programas Head Start

permite reduzir as diferenças entre as crianças em desvantagem e as outras crianças ao nível da

prontidão para a frequência escolar, nomeadamente no que diz respeito às competências de

vocabulário e de escrita (verificadas durante o ano de frequência do Head Start) e ao conhecimento de

palavras, ao reconhecimento de letras e às competências de matemática e de escrita (verificadas

durante o ano do kindergarten) (Head Start FACES, 2001). No projecto Child-Parent Centers/Chicago

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Educação e cuidados de elevada qualidade

101

Longitudinal Study os resultados indicaram igualmente que as crianças participantes começaram o

kindergarten com níveis mais elevados de prontidão em várias áreas e revelaram melhores resultados

na leitura e na matemática desde os 6 aos 15 anos de idade. Também no estudo NICHD se verificou

que os cuidados de elevada qualidade estavam associados a resultados mais elevados a nível pré-

académico, cognitivo e da linguagem em todas as idades em que as crianças foram avaliadas e que

mais tempo em cuidados em centros se relacionava com resultados mais elevados a nível cognitivo e

da linguagem (NICHD Early Child Care Research Network, 2006b). Relativamente às competências

académicas avaliadas no início da frequência da escolaridade obrigatória, Magnuson, Ruhm e

Waldfogel (2007), utilizando dados do Early Childhood Longitudinal Study-Kindergarten, verificaram que

as crianças que frequentavam o pré-escolar revelavam resultados mais elevados do que os seus pares

que não o tinham frequentado. Estes autores analisaram em que circunstâncias esta vantagem

persistia ao longo da escolaridade obrigatória, tendo verificado que era eliminada rapidamente quando

as crianças eram colocadas em salas pequenas (com poucas crianças), com grande investimento no

ensino da leitura. Pelo contrário, as disparidades mantinham-se quando as crianças frequentavam

salas de aula grandes e com pouco investimento no ensino da leitura. Uma explicação apontada pelos

autores seria a de que as crianças com um nível mais baixo de realização beneficiariam mais do ensino

em grupos pequenos e com tempo suplementar dedicado à leitura. De qualquer modo, estes resultados

salientam que os efeitos a longo prazo das experiências precoces (antes da entrada na escola)

dependem em parte das experiências escolares, pelo menos durante os primeiros anos da

escolaridade.

No estudo Child-Parent Centers avaliado pelo Chicago Longitudinal Study verificou-se que as

crianças que o frequentaram tinham taxas inferiores de retenção e tinham uma taxa inferior de

abandono escolar aos 18 anos de idade (Reynolds et al., 2000). Também no Carolina Abecedarian

Project se verificou que a frequência do programa pré-escolar de elevada qualidade tinha um efeito no

número de retenções conferidas aos 15 anos de idade e aos 21 anos de idade, sendo que nesta idade

os jovens adultos do grupo experimental tinham também completado mais anos de educação formal e

ensino superior (Campbell et al., 2002).

A frequência de serviços de educação e cuidados de elevada qualidade contribui também para

a redução do número de crianças sinalizadas para apoio ao nível da educação especial. Este efeito foi

verificado em vários estudos, como, por exemplo, no Consórcio para os Estudos Longitudinais

(Haskins, 1989), no Child-Parent Centers avaliado pelo Chicago Longitudinal Study (Reynolds et al.,

2000) e no Carolina Abecedarian Project (Ramey et al., 2000). No último, numa avaliação efectuada

quando os participantes tinham 15 anos de idade, verificou-se que tinha havido menos crianças do

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Capítulo II

102

grupo experimental a receber serviços de educação especial durante a frequência escolar, apesar de

haver mais crianças do grupo experimental que receberam esse tipo de serviços durante o pré-escolar

(Ramey et al., 2000).

Rossbach (2006) distinguiu os resultados obtidos por diversos estudos, relativos aos efeitos da

qualidade no desenvolvimento cognitivo das crianças, em função da sua idade. Assim, e como foi

apresentado previamente, no que diz respeito a crianças com menos de 3 anos de idade refere, entre

outros aspectos, que na maior parte dos estudos uma qualidade de processo mais elevada aparece

associada a melhor desenvolvimento cognitivo, sendo a qualidade dos aspectos relativos à linguagem

de particular importância. Refere ainda que os efeitos da qualidade estrutural variam de estudo para

estudo e que programas de intervenção de elevada qualidade e prolongados têm um efeito positivo no

domínio cognitivo. No que diz respeito a crianças com mais de 3 anos de idade, e até à escolaridade

obrigatória, este autor refere, entre outros aspectos, que a qualidade de processo aparece positiva e

consistentemente associada com diferentes aspectos do desenvolvimento cognitivo (sendo que no

estudo EPPE os efeitos enfraqueciam com o tempo), que o tamanho do grupo, o rácio adulto-criança e,

principalmente, a formação do educador parecem ter um efeito importante e que os programas de

intervenção têm efeitos muito consistentes na inteligência, na realização académica posterior, na taxa

de retenção e na sinalização para educação especial.

Desenvolvimento socioemocional

Apesar de os primeiros estudos se centrarem no efeito da qualidade dos contextos no

desenvolvimento cognitivo, particularmente no Q.I., vários autores salientaram a necessidade de se

avaliarem os efeitos a outros níveis, o que veio a verificar-se em praticamente todos os estudos.

Relativamente a esta ideia de não se avaliarem apenas os efeitos dos programas a nível cognitivo,

Shonkoff e Phillips (2000) realçam a necessidade de se dar mais atenção ao estudo dos efeitos nas

capacidades funcionais e nos domínios social e emocional.

De um modo geral, a investigação tem demonstrado efeitos positivos da qualidade dos

contextos de educação e cuidados no desenvolvimento socioemocional, como é o caso das

competências sociais e de relacionamento com os pares. Tem sido verificado também um efeito

positivo nos resultados relacionados com indicadores de sucesso a longo prazo, como, por exemplo,

maior facilidade de emprego, menos problemas ligados a delinquência/criminalidade e menores taxas

de gravidez na adolescência.

Estudos como o Head Start, o Consortium para os Estudos Longitudinais, o IEA, o ECCE, o

Carolina Abecedarian Project, o NICHD, entre outros, demonstraram os efeitos positivos da qualidade

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Educação e cuidados de elevada qualidade

103

dos contextos para crianças com menos de 6 anos de idade no desenvolvimento das competências

sociais. No estudo NICHD, relativamente à experiência das crianças de 2 e 3 anos de idade, verificou-

se que o comportamento positivo e responsivo do prestador de cuidados era o melhor preditor das

interacções positivas e competentes das crianças com os seus pares (NICHD Early Child Care

Research Network, 2001), os cuidados de elevada qualidade revelaram-se associados a resultados

mais elevados a nível socioemocional e da relação com os pares apenas em algumas idades e um

maior número de horas no contexto de cuidados não maternos predizia mais problemas de

comportamento e conflito, de acordo com a informação fornecida pelos prestadores de cuidados.

Contudo, mais tempo por semana em cuidados prestados especificamente em centros estava

associado a mais problemas e menos comportamentos pró-sociais relatados pelo educador aos 24 e

aos 36 meses de idade (NICHD Early Child Care Research Network, 2006b). Pelo contrário, Field

(1991) estudou um grupo de crianças a frequentar a escolaridade obrigatória, que tinha frequentado o

mesmo centro de educação e cuidados, de elevada qualidade, desde a sala dos bebés até à entrada

na escola, tendo encontrado associações positivas estatisticamente significativas entre a quantidade de

tempo (meses) passado nesse contexto de elevada qualidade e o número de amigos e de actividades

extracurriculares e o bem-estar emocional, a capacidade de liderança, a popularidade, a assertividade

(associações positivas) e a agressividade (relação negativa) da criança (avaliados pelos pais). Estudou,

igualmente, um grupo de crianças que frequentou mais do que uma estrutura, também de elevada

qualidade, tendo verificado que, à semelhança do primeiro grupo, as crianças que passaram mais

tempo em estruturas de elevada qualidade eram avaliadas como mais atractivas e assertivas, recebiam

avaliações mais elevadas ao nível do bem-estar emocional (avaliadas pelos professores) e nas

interacções com os colegas demonstravam maior proximidade física afectuosa (Field, 1991).

Relativamente aos outros indicadores, no Consortium para os Estudos Longitudinais verificou-

se que havia um efeito positivo em medidas de sucesso, observando-se menos casos de gravidez na

adolescência, menos delinquência, menor dependência da segurança social, mais emprego, etc.

(Haskins, 1989). Também o Carolina Abecedarian Project verificou na avaliação efectuada aos 21 anos

de idade que os jovens adultos do grupo experimental eram, em média, mais velhos quando tiveram o

primeiro filho (gravidez na adolescência menos frequente) (Campbell et al., 2002). No programa

High/Scope Perry Preschool Study a frequência de serviços de elevada qualidade tinha efeitos

duradouros ao nível do sucesso económico e da prevenção da criminalidade tanto nos jovens adultos,

como nos adultos avaliados aos 40 anos de idade (Sylva & Wiltshire, 1993). No projecto Child-Parent

Centers/Chicago Longitudinal Study verificou-se que as crianças que participaram neste projecto

tinham aos 14 anos de idade melhores resultados num teste de competências de consumidor

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Capítulo II

104

(Reynolds et al., 2000).

Na sistematização dos resultados dos estudos, relativamente aos efeitos no desenvolvimento

de competências socioemocionais, Rossbach (2006), no que concerne às crianças com menos de 3

anos de idade, destaca que o início precoce e a longa duração dos cuidados extrafamiliares parece ter

um efeito negativo no desenvolvimento socioemocional, aumentando os problemas de comportamento.

Por exemplo, o NICHD (2006b) demonstrou que mais tempo mais tempo em cuidados prestados em

contexto de centro estava associado a mais problemas e a menos comportamentos pró-sociais (NICHD

Early Child Care Research Network, 2006b). Contudo, há estudos que revelaram o contrário (e.g.,

Field, 1991). Rossbach refere também que os efeitos da qualidade ao nível do comportamento

socioemocional e ao nível dos problemas de comportamento não existem ou são pouco duradouros,

mas que grupos pequenos, poucas crianças por adulto e boas qualificações do pessoal parecem ser

importantes, apesar de haver variações de estudo para estudo. A participação em programas com uma

vertente de intervenção contribui para diminuir os problemas de comportamento. Em relação a crianças

com mais de 3 anos de idade, Rossbach destaca que a elevada qualidade dos contextos tem efeitos

positivos que se mantêm a longo prazo nas competências socioemocionais e na redução de problemas

de comportamento, como foi já referido. O tamanho do grupo, o rácio adulto-criança e a formação dos

adultos parecem ser importantes também no que se refere a crianças de idade pré-escolar. Por fim, os

programas de intervenção de elevada qualidade parecem ter um efeito positivo (a longo prazo) na

redução da criminalidade, principalmente quando têm também uma componente de intervenção com a

família.

Efeito das características da família na influência da qualidade dos contextos no

desenvolvimento das crianças

A investigação nacional e internacional tem dedicado alguma atenção à variação dos efeitos da

qualidade dos contextos de educação e cuidados, em função das características das famílias. Assim,

Barnett (1995) salienta que os efeitos da frequência dos programas de educação e cuidados são

maiores quando há um desfasamento entre o ambiente familiar e o ambiente extrafamiliar, isto é, os

efeitos são maiores para as crianças de famílias em desvantagem. Também Melhuish (2001) concluiu

que os efeitos dos cuidados extrafamiliares são mediados pelas características familiares, ou seja, o

efeito dos cuidados extrafamiliares é maior quando a sua qualidade é superior à qualidade do ambiente

familiar. No entanto, alguns estudos têm observado efeitos que são independentes das características

das famílias. Por exemplo, no Cost, Quality & Child Outcomes Study encontrou-se uma relação positiva

entre o desenvolvimento cognitivo e social das crianças e a qualidade da sua experiência nos serviços

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Educação e cuidados de elevada qualidade

105

de educação e cuidados, independentemente do nível de educação da mãe, do género da criança e da

etnia da criança (Cost, Quality & Child Outcomes Study Team, 1995; Peisner-Feinberg & Burchinal,

1997). No mesmo sentido, Bryant et al. (1994) verificaram que as crianças que frequentavam salas de

Head Start de qualidade mais elevada tinham melhores resultados em medidas de realização e

competências pré-académicas, independentemente da qualidade do ambiente familiar, apesar de as

crianças de melhor ambiente familiar beneficiarem mais das áreas de resolução de problemas e

raciocínio do que as crianças de famílias menos estimulantes. Peisner-Feinberg et al. (2001)

encontraram influências moderadoras das características das famílias, indicando efeitos mais positivos

da qualidade dos contextos em alguns dos resultados das crianças de famílias em desvantagem.

Apesar de se poder considerar que, em geral, a qualidade dos contextos extrafamiliares de

educação e cuidados tem um efeito positivo no desenvolvimento das crianças, podendo as

características da família ter um papel moderador desses efeitos, as características das famílias

aparecem como o factor preditor mais importante do desenvolvimento das crianças. Este resultado foi

demonstrado, por exemplo, pelo ECCE que, apesar de ter encontrado uma associação positiva entre

os elevados níveis de qualidade dos programas de educação pré-escolar e as medidas do

desenvolvimento das crianças (Tietze & Cryer, 1999), verificou que era a qualidade do ambiente

familiar o factor preditor mais poderoso do desenvolvimento da criança (ECCE Study Group, 1997).

Também no âmbito do NICHD se demonstrou a importância dos preditores familiares, tendo sido

verificado que as características da família estavam igualmente associadas aos resultados

desenvolvimentais das crianças de 2 e de 3 anos de idade, quer elas frequentassem contextos

extrafamiliares de educação e cuidados, quer não frequentassem (NICHD Early Child Care Research

Network, 1998a), mas entre os preditores relacionados com os cuidados prestados às crianças, a

qualidade era o preditor mais consistente (NICHD Early Child Care Research Network, 2000). Os

autores do estudo concluíam, todavia, que os pais deveriam preocupar-se com a qualidade destes

contextos, uma vez que ela contribui para o comportamento pró-social das crianças relatado pelas

mães e pelos educadores e para os resultados ao nível da linguagem. Os resultados do estudo

sugerem também que as crianças de minorias e de famílias monoparentais se encontram em maior

risco de obter resultados pobres a nível socioemocional quando frequentam contextos de baixa

qualidade.

Implicações para a realidade portuguesa

Tendo em conta que os resultados da investigação a nível nacional e internacional

tendencialmente apontam para a importância da educação e dos cuidados de elevada qualidade no

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Capítulo II

106

desenvolvimento da criança e mesmo na qualidade de vida familiar, deveria haver um maior

investimento no nosso país, de modo não só a aumentar o número de estruturas de educação formal

disponíveis para as famílias, mas também de modo a garantir a prestação de serviços de elevada

qualidade. Montes, Hightower, Brugger e Moustafa (2005)11 realizaram um estudo que lhes permitiu

concluir que, mesmo quando as pontuações na ECERS-R já eram boas (M = 5.7), um aumento de 1

ponto nesta escala estava associado a reduções significativas na proporção de crianças com elevados

factores de risco socioemocional e com aumentos significativos na proporção de crianças com

reduzidos factores de risco socioemocional.

De acordo com os dados disponíveis mais recentes (Instituto Nacional de Estatística [INE],

2006), em 2004 a taxa de pobreza em Portugal era de cerca de 27% quando medida antes das

transferências sociais e de 21% após as transferências. Adicionalmente, nos últimos anos, o fosso

entre os mais ricos e os mais pobres tem vindo a intensificar-se. A OCDE (2004b) constatou que os

salários em Portugal eram, em 2004, os mais baixos dos 15 países que na altura faziam parte da União

Europeia, havendo, contudo, salários muito mais elevados auferidos por alguns grupos da população,

contribuindo para o elevado nível de desigualdades no nosso país. Estes factos podem provocar o

aumento do stresse psicossocial e das suas consequências, ampliando a necessidade de desenvolver

iniciativas que, de algum modo, colmatem estas dificuldades. Com base na análise da actual situação

da economia, bem como das reformas que têm vindo a ser promovidas pelo Governo, a OCDE (2006)

avança com um conjunto de quatro desafios básicos para Portugal: a promoção da sustentabilidade

das finanças públicas, a melhoria do sistema educativo, a modernização da economia e a criação de

um ambiente de negócios mais dinâmico e de um mercado de trabalho mais funcional (OCDE, 2006).

No mesmo relatório são apontados a elevada taxa de abandono escolar e os resultados pobres dos

alunos portugueses no estudo PISA, em comparação com outros países da OCDE. Além disso, é

referido que os resultados abaixo da média na área da educação não se devem a falta de investimento

financeiro, mas a uma baixa eficácia do sistema. Já em 2007 foi publicado o relatório da UNICEF

(Fundo Internacional de Emergência das Nações Unidas para as Crianças) acerca da qualidade de vida

das crianças e dos adolescentes de 21 países da OCDE, tendo sido avaliadas seis dimensões do bem-

estar das crianças: (1) bem-estar material, (2) saúde e segurança, (3) bem-estar educativo, (4) relações

com a família e com os pares, (5) comportamentos e riscos e (6) bem-estar subjectivo (UNICEF

Innocenti Research Center, 2007). Na classificação resultante das seis dimensões, Portugal ocupa o

17.º lugar. As posições correspondentes a valores mais elevados de bem-estar infantil são ocupadas

pela Holanda, Suécia, Dinamarca, Finlândia, Espanha, Suíça e Noruega. Portugal obtém uma boa

11 Este estudo foi conduzido num contexto urbano com elevados níveis de pobreza.

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Educação e cuidados de elevada qualidade

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classificação ao nível das relações com a família e os pares (2.º lugar), mas posiciona-se em 14º nas

dimensões saúde e segurança e bem-estar subjectivo, em 15º na dimensão comportamentos e riscos,

em 16º na dimensão bem-estar material e em último lugar no bem-estar educativo. A dimensão bem-

estar material inclui, entre outros indicadores, a percentagem de crianças a viver em agregados

familiares com rendimentos abaixo de 50% da mediana nacional e que é de quase 16% em Portugal.

Foram avaliados também os recursos culturais e educativos, perguntando às crianças se tinham em

casa oito itens: uma mesa/secretária para estudar, um local sossegado para trabalhar, um computador

para os trabalhos da escola, software educativo, ligação à Internet, uma calculadora, um dicionário e

manuais escolares. O relatório apresentava as percentagens de crianças que têm menos do que seis

destes itens, em 24 países. Portugal encontra-se entre os países com percentagem mais elevada,

sendo que apenas a Grécia, o Japão, a Hungria e a Polónia têm percentagens superiores. Dos 24

países que participaram neste estudo, Portugal é o país com a maior percentagem de adolescentes

com 15 anos de idade que referem ter menos de 10 livros em casa (UNICEF Innocenti Research

Center, 2007).

Atendendo à actual situação económica e social que caracteriza Portugal, que continua a

apresentar assimetrias acentuadas, em termos sociais, e aos resultados de estudos que têm

demonstrado que a qualidade dos contextos extrafamiliares de educação e cuidados frequentados

pelas crianças mais novas (até à entrada na escolaridade obrigatória) se associa positivamente aos

resultados dessas crianças em vários domínios do desenvolvimento, particularmente nas crianças de

meios desfavorecidos, revestem-se de especial pertinência estudos que possam contribuir para o

estudo da qualidade dos contextos formais de educação e cuidados no nosso país. Apesar de

Shpancer (2006) considerar que o impacto da investigação ao nível das políticas tem sido pequeno,

este deve continuar a ser um objectivo a perseguir.

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Capítulo II

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4. Ideias dos pais e dos educadores sobre a qualidade dos contextos de

educação e cuidados

Bogat e Gensheimer (1986) definiram duas categorias gerais, nas quais se poderia incluir a

maior parte da literatura sobre a educação e cuidados de crianças: (1) estudos sobre o impacto no

desenvolvimento das crianças e (2) estudos sobre os determinantes da qualidade, incluindo o

desenvolvimento de programas e as orientações para licenciamento. Incluídos na segunda categoria

proposta por estes autores encontram-se diversos estudos nos quais são profissionais externos ao

programa a efectuar a avaliação dos contextos de prestação de cuidados. Apesar de ser de nítida

importância, apenas uma pequena parte dos estudos inclui a perspectiva de pais e de educadores de

infância acerca deste assunto. Pence e Goelman (1987) afirmam mesmo que os pais são

frequentemente “parceiros silenciosos” nos estudos sobre a educação e cuidados prestados às

crianças e também Larner e Phillips (1994) se referem ao silêncio dos pais, para alertarem que eles se

mantêm silenciosos não porque não se interessam, mas porque as suas opiniões não são solicitadas.

De igual modo, Vasconcelos (1997, p. 33) considera que, “de todos os professores, os educadores de

infância são aqueles a quem a sociedade reconhece menos poder e, consequentemente, aqueles cujas

vozes têm sido menos escutadas”. No presente estudo, houve a tentativa de “dar voz” aos pais e aos

educadores, tentando conhecer as suas ideias acerca da qualidade em contexto de creche.

O conceito de qualidade difere de país para país e de acordo com as prioridades e

perspectivas dos diferentes grupos de pessoas envolvidos. Os pais frequentemente valorizam aspectos

da educação e dos cuidados que não coincidem necessariamente com os objectivos prioritários oficiais,

enquanto que os educadores por vezes têm expectativas muito diferentes acerca do que os serviços

devem proporcionar às crianças. Do mesmo modo, as crianças, se questionadas, expressarão as suas

perspectivas acerca da qualidade e, em certas idades, colocarão mais importância em fazer amigos ou

dominar uma competência própria da infância do que no tipo de preocupações educacionais

demonstradas pelos seus pais ou educadores (OCDE, 2001). Tendo em consideração estes aspectos,

Bairrão, em 1998, alertava para o facto de a qualidade dizer respeito a critérios objectivos (relacionados

com o bem-estar físico, material e social das pessoas), mas também a critérios de natureza subjectiva,

como, por exemplo, as representações que as pessoas têm acerca da qualidade, isto é, como sentem

e pensam a qualidade. Como foi referido (ver neste capítulo Definição de educação e cuidados de

elevada qualidade), também Katz (1998) propôs que se considerassem diferentes perspectivas acerca

dos serviços de educação e cuidados, incluindo os pais, o pessoal e as crianças. Concordando com

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Educação e cuidados de elevada qualidade

109

esta autora, Ceglowski e Bacigalupa (2002) efectuaram uma revisão de diversos estudos, no sentido de

se verificar em que medida têm sido abordadas as perspectivas propostas por Katz. Esta revisão

permitiu concluir que predominam os estudos conduzidos sob a perspectiva dos

profissionais/investigadores, revelando-se necessário efectuar um investimento no sentido de se

estudar a qualidade do ponto de vista dos pais, do pessoal e das crianças.

Cardoso (2006), na sua tese de mestrado acerca da qualidade do ambiente familiar e das

ideias maternas sobre educação e desenvolvimento, efectuou uma revisão sobre a diversidade

terminológica que se pode encontrar nos estudos sobre as ideias dos pais. Esta autora concluiu que a

designação ideias é aquela que os autores (e.g., Cruz, 1998; Goodnow, 1988; Goodnow & Collins,

1990) consideram mais abrangente e, simultaneamente, mais neutra. Concordando com a reflexão

efectuada pela autora, foi também opção deste trabalho utilizar a designação ideias. Apesar desta

opção, na referência a trabalhos de outros autores sobre esta temática tentar-se-á utilizar a designação

adoptada pelos respectivos autores.

4.1 Ideias dos pais sobre critérios de qualidade

Grande parte da investigação na qual os pais participam assume uma perspectiva de mercado,

isto é, considera os pais consumidores dos serviços de educação e cuidados. Por exemplo, Cryer e

Burchinal (1997) estudaram as percepções dos pais, tendo dado ao trabalho publicado em 1997 o título

Parents as child care consumers. Estas autoras referem que as políticas nos EUA partem do

pressuposto de que os pais têm os seus próprios critérios de qualidade relativos aos cuidados

prestados às crianças e podem fazer a escolha mais adequada para a sua família, seleccionando

aquele que melhor corresponde aos seus requisitos. É também assumido que, uma vez que os pais

visitam as instituições de prestação de cuidados diariamente, podem monitorizar o programa e retirar a

criança, caso não estejam satisfeitos. Mitchell, Cooperstein e Larner (1992) referem que, se é colocada

aos pais esta responsabilidade, é necessário promover a educação do consumidor, vista como o

processo de comunicar informação objectiva aos pais sobre os produtos ou serviços, que lhes permita

efectuar melhores escolhas, o que, por sua vez, promove no mercado a produção de melhores serviços

ou produtos. Os consumidores com uma boa formação a este nível, ou seja, que são capazes de

escolher apenas os melhores serviços/produtos, pressionam o mercado. Segundo Mitchell et al. (1992)

para serem promovidos programas de educação do consumidor, seria necessário conhecer como os

pais escolhem os serviços, em que medida estão satisfeitos com os serviços que utilizam e quais são

as suas preferências. Estes autores referem ainda que os pais geralmente usam fontes informais

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Capítulo II

110

(como familiares próximos e amigos) para obterem informação acerca dos serviços de educação e

cuidados e só depois procuram fontes formais de informação (como jornais e agências da

comunidade). Assim, as estratégias utilizadas são as mesmas que se utilizam quando se procura

responder a outras necessidades, como procurar emprego ou casa, isto é, baseiam-se inicialmente em

“passar a palavra”. Também Blau (1991) refere a importância das preferências dos pais, especialmente

quando se adopta a perspectiva da economia, considerando que os pais podem preocupar-se com as

características dos serviços relacionadas com o desenvolvimento das crianças (como o tamanho do

grupo ou o rácio adulto-criança), mas têm igualmente outras preocupações (como os factores de

conveniência e a partilha de valores com os prestadores de cuidados extrafamiliares). Do ponto de

vista de um economista, a escolha de uma estrutura de educação e cuidados extrafamiliar, pelos pais,

envolve (a) a qualidade desejada, (b) o preço desse tipo de estrutura e (c) os recursos da família

(Mitchell et al., 1992). Contudo, estudos realizados em diversos países revelam que esta decisão não é

assim tão simples e objectiva para os pais. Adicionalmente, os próprios resultados da investigação

neste domínio nem sempre são coincidentes, como se poderá constatar de seguida.

Estudos realizados nos EUA concluíram que, na escolha dos serviços, os pais atribuem maior

importância a factores de conveniência, como o preço e a localização, do que a outros indicadores,

como saúde e segurança, oportunidades de aprendizagem e interacções positivas (Kisker & Maynard,

1991, como citado em Cryer & Burchinal, 1997). No mesmo sentido vão os resultados encontrados pelo

IEA Preprimary Project (Ojala & Opper, 1994), indicando que razões de conveniência eram os

principais motivos para a escolha do local de prestação de cuidados para os filhos com idades

compreendidas entre 3 anos e meio e 4 anos e meio na China, na Finlândia, na Itália, na Tailândia e

em Portugal. Na Finlândia, na Alemanha e em Portugal o factor de conveniência mais referido era a

localização. Na Alemanha, na Nigéria e em Espanha as razões de conveniência tinham o mesmo valor

que outras características, como a informação positiva recebida acerca do serviço, características não-

físicas e não existência de outras alternativas. Ter informação positiva sobre o serviço era o factor

referido mais frequentemente na Nigéria e nos EUA (Ojala & Opper, 1994).

Na tentativa de perceber quais os factores mais influentes na escolha da estrutura de

educação e cuidados, Early e Burchinal (2001) pediram a pais (brancos, negros e hispânicos) de

bebés, de crianças com menos de 3 anos e de crianças com mais de 3 anos para dizerem em que

medida seis factores eram importantes na escolha do serviço de educação e cuidados: um local

próximo de casa, custo razoável, um prestador de cuidados que fale inglês com a criança, um pequeno

número de crianças na mesma sala ou grupo, um local que as crianças possam frequentar mesmo que

estejam doentes e um prestador de cuidados que tenha formação sobre os cuidados a prestar às

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Educação e cuidados de elevada qualidade

111

crianças. As características consideradas mais importantes, por ordem decrescente, foram: um

prestador de cuidados que fale inglês com a criança, um prestador de cuidados que tenha formação

sobre os cuidados a prestar às crianças e um pequeno número de crianças na mesma sala ou grupo.

Os pais de crianças com mais de 3 anos valorizavam mais do que os pais de crianças com menos de 3

anos de idade estruturas com um prestador de cuidados que falasse inglês com a criança e um

prestador de cuidados que tivesse formação sobre os cuidados a prestar às crianças. As autoras

colocam a hipótese de os pais se preocuparem mais com estes aspectos à medida que se aproxima a

entrada para a escola, devido às preocupações relacionadas com a prontidão. Neste estudo, as

características de conveniência assumiram, assim, um peso menor do que outras características. Em

1986, Bogat e Gensheimer tinham igualmente solicitado a pais que classificassem a importância de 10

características dos serviços de educação e cuidados na escolha do centro, tendo verificado que as

características mais importantes eram a saúde e segurança (99.3% dos participantes), seguida pela

interacção entre pares e interacção com o adulto. Estas características foram referidas como tendo

maior importância na escolha do serviço do que as razões de conveniência, como a localização e o

custo.

Algumas características sociodemográficas das famílias parecem estar associadas aos

factores preponderantes na escolha do serviço de educação e cuidados. Peyton, Jacobs, O’Brien e Roy

(2001) verificaram que as mães de famílias com rendimentos económicos mais elevados e que

trabalhavam menos horas escolhiam, tendencialmente, a estrutura de educação e cuidados com base

mais na sua qualidade, do que noutras preocupações como o custo, as horas de funcionamento ou a

localização. Verificaram ainda que as mães que relatavam mais preocupações e menor gratificação no

seu papel de mães escolhiam as estruturas de educação e cuidados mais com base nas questões

práticas do que as outras mães (Peyton et al., 2001). Os filhos de mães que escolhiam serviços com

base nos seus critérios de qualidade frequentavam serviços de qualidade mais elevada, avaliada por

observadores externos, do que os filhos de mães que os escolhiam com base em critérios práticos; os

filhos de mães que escolhiam a estrutura com base no tipo de cuidados que preferiam (em centro,

numa estrutura do tipo familiar ou com pessoas da família) frequentavam contextos de qualidade mais

elevada que os dois outros grupos; as mães que escolhiam os serviços com base em questões práticas

eram as que estavam menos satisfeitas (Peyton et al., 2001). Mitchell et al. (1992) referem que os pais

de nível económico mais baixo enfrentam o mesmo tipo de tomadas de decisão complexas na escolha

da estrutura de educação e cuidados e que as fontes de satisfação são as mesmas, tendo contudo

limitações devido a custos que não podem suportar. De acordo com Mitchell et al. (1992) estes pais

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Capítulo II

112

revelam-se geralmente menos satisfeitos com as escolhas efectuadas do que os pais de nível

económico superior.

No estudo de Early e Burchinal (2001) os pais de nível económico inferior colocavam maior

importância nos custos e na possibilidade de cuidarem de crianças doentes do que os pais de nível

económico mais elevado, mas a importância atribuída à formação dos profissionais não variava em

função do nível económico dos pais ou da etnia. A propósito da formação dos profissionais, Larner e

Phillips (1994) referem que os pais são cépticos em relação à importância deste factor, considerando

que não se pode ensinar alguém a amar. Acrescentam ainda que, enquanto os profissionais defendem

que a formação dá aos prestadores de cuidados as competências que facilitam continuar a amar as

crianças, mesmo que estejam com o grupo todo o dia, os pais esperam encontrar uma pessoa especial

que cuide das crianças como eles cuidariam. Contudo, estes autores afirmam que os pais atribuem

maior importância à formação dos educadores à medida que as crianças crescem, focando-se mais

nas competências académicas e sociais. Segundo Larner e Phillips, as ideias dos pais acerca dos

serviços de educação e cuidados dependem das suas crenças acerca das experiências que são mais

importantes para as crianças, das suas atitudes em relação ao trabalho e ao papel da família, da idade

da criança e dos valores culturais e étnicos da família. Os pais com crianças com menos de 3 anos de

idade geralmente vêem os cuidados extrafamiliares como substitutos dos cuidados parentais, sendo

necessários devido ao emprego ou formação dos pais. Os pais que vêem os cuidados extrafamiliares

como um mal necessário tendem a procurar contextos semelhantes ao familiar. Estes pais geralmente

dão muitas orientações ao prestador de cuidados, essencialmente relacionadas com as rotinas, como o

sono, a alimentação e a autonomia, e com a interacção (e.g., pegar ao colo quando chora). Pelo

contrário, os pais de crianças com mais de 3 anos de idade vêem as estruturas de educação e

cuidados extrafamiliares como uma oportunidade educacional para a criança, um contexto onde a

criança se pode tornar mais independente e adquirir competências sociais, verbais e académicas.

Apesar de os resultados obtidos em alguns estudos indicarem a conveniência como principal

critério utilizado pela generalidade dos pais na escolha dos serviços, outros estudos referidos por Cryer

e Burchinal (1997) indicaram que, quando as questões eram formuladas de outra forma, ou seja,

quando os pais tinham oportunidade de atribuir diferentes graus de importância a critérios de qualidade

das salas, valorizavam os mesmos aspectos que os profissionais (e.g., saúde, segurança, interacções

positivas). Cryer e Burchinal (1997) realizaram um estudo que tinha como objectivo investigar o que os

pais valorizam nos cuidados prestados às crianças e como avaliam a qualidade desses cuidados. Estas

investigadoras tentaram determinar em que medida os pais valorizam aspectos da educação e dos

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Educação e cuidados de elevada qualidade

113

cuidados que os profissionais consideram importantes (isto é, em que medida valorizam os itens da

ITERS e da ECERS) e se os pais têm um conhecimento preciso acerca do que acontece às suas

crianças nas instituições. Participaram neste estudo 2407 pais com filhos em jardim-de-infância e 727

pais com filhos em creche (instituições com fins lucrativos e sem fins lucrativos). Verificou-se neste

estudo que todos os itens das escalas, ITERS e ECERS, recebiam pontuações indicativas de elevada

importância, sendo que o item mais valorizado pelos pais de crianças em idade de creche era a

interacção criança – educadora e pelos pais das crianças do jardim-de-infância era o item que avalia a

qualidade geral ao nível das interacções. Para a análise dos dados, os itens foram agrupados em

quatro subescalas: (1) Saúde; (2) Segurança; (3) Interacções; e (4) Outros (itens relacionados com a

satisfação das necessidades do adulto e aspectos relacionados com o currículo que não se

enquadravam nas interacções). Os pais com crianças em creche valorizaram mais os aspectos de

saúde e interacção, seguidos pelas questões de segurança e pelos outros aspectos; os pais com

crianças nas salas de pré-escolar valorizavam mais os aspectos de segurança, imediatamente

seguidos pelas interacções, depois pelos aspectos de saúde e finalmente pelos outros aspectos. Na

creche os valores médios da importância atribuída pelos pais aos critérios de qualidade não variavam

em função das características demográficas; no jardim-de-infância foram encontradas diferenças em

função da idade, da etnia, de aspectos dos cuidados, e da interacção entre aspectos dos cuidados e a

educação, e interacção entre aspectos dos cuidados e da etnia. Os pais “não-brancos” davam mais

importância a aspectos relacionados com a saúde e aos outros itens do que os outros pais; com o

aumento da idade os valores atribuídos pelos pais aos aspectos da saúde diminuíam; os pais com nível

educativo mais elevado valorizavam menos os aspectos relacionados com a saúde do que os outros

pais (Cryer & Burchinal, 1997).

Um estudo semelhante ao que realizaram Cryer e Burchinal (1997) foi desenvolvido na

Alemanha (Cryer, Tietze, & Wessels, 2002), tendo como participantes apenas mães. Os resultados

revelaram que as mães atribuíam elevada importância aos aspectos incluídos no questionário

desenvolvido a partir da ECERS. Os dados recolhidos nos EUA foram comparados com os dados

recolhidos na Alemanha. Nesse estudo comparativo (Cryer et al., 2002), verificou-se que (1) os pais

dos EUA atribuíam valores mais elevados de importância do que as mães do estudo alemão; (2) havia

bastante semelhança entre as características que os pais dos dois países mais valorizavam, havendo

uma associação forte entre a importância atribuída pelos pais dos EUA e da Alemanha aos itens; e (3)

em ambos os países, os pais de nível educativo inferior atribuíam valores de importância mais elevados

do que os pais de nível educativo superior.

Na Austrália, Liu, Yeung e Farmer (2001) efectuaram um estudo, no qual participaram pais de

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Capítulo II

114

crianças com menos de 3 anos de idade e pais de crianças com 3 anos de idade ou mais, tendo como

objectivos principais investigar: (1) as perspectivas dos pais acerca do tipo de serviço que eles pensam

que as estruturas de educação e cuidados fornecem, (2) as expectativas dos pais acerca das

componentes educativas dos serviços e (3) o nível de profissionalismo que os pais esperam nos

serviços. Os autores verificaram que não havia diferenças entre as percepções dos pais de crianças

com 3 anos ou mais e com menos de 3 anos de idade, sendo que todos esperavam que os serviços

tivessem a função educativa e a função de cuidar das crianças, que promovessem a preparação para a

entrada na escola e abrangessem todas as áreas do desenvolvimento das crianças. Os pais

revelavam, ainda, expectativas elevadas relativamente ao nível de qualificações do pessoal.

Em Portugal, como foi referido, os pais de crianças com idades compreendidas entre 3 anos e

meio e 4 anos e meio que participaram no IEA Preprimary Project (Ojala & Opper, 1994) indicaram que

os principais motivos para a escolha do local de prestação de cuidados para os filhos eram razões de

conveniência. Outros estudos foram realizados no sentido de perceber melhor os critérios de qualidade

valorizados em contexto de creche e/ou jardim-de-infância.

Em 1995, Folque desenvolveu um estudo, com os principais objectivos de perceber as ideias

dos pais portugueses, com crianças entre os 2 e os 6 anos de idade, acerca dos factores de qualidade

importantes num bom serviço, de explorar as suas razões para escolherem determinados serviços e de

determinar a avaliação que os pais fazem dos serviços, bem como o seu nível de satisfação. Os dados

foram recolhidos através de questionários enviados pelo Correio, tendo sido obtida uma taxa de

resposta de 15%. Apesar de, como considera a própria autora, se tratar de uma amostra não

representativa dos pais portugueses (eram pais de nível socioeconómico elevado, com poucos filhos,

com hábitos de leitura, subscritores de uma revista para pais), foram obtidos alguns resultados

coincidentes com outros estudos. Folque verificou que quase metade dos pais apontava os factores de

conveniência como a principal razão para escolherem um serviço, sendo a segunda razão mais referida

a promoção do desenvolvimento da criança. As características de um serviço de educação e cuidados

consideradas mais importantes pelos pais, de uma lista de 18, foram: o ambiente saudável, a

estimulação intelectual, a promoção da socialização, a formação do pessoal e a segurança. Essas 18

características foram agrupadas em 6 categorias: de conveniência, educacional, subjectiva, estruturais,

desenvolvimento da criança e necessidades físicas da criança. A categoria considerada mais

importante pelos pais foi a satisfação das necessidades físicas da criança, seguida pelo

desenvolvimento da criança (Folque, 1995).

Em 2006, Nunes e Melo realizaram um estudo, com 74 pais de 4 creches do distrito de Évora,

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Educação e cuidados de elevada qualidade

115

cujo objectivo era perceber quais os aspectos da qualidade que os pais mais valorizavam e qual a

avaliação que faziam do seu funcionamento. Foi utilizado um questionário construído com base na

Escala da Avaliação do Ambiente em Educação Infantil (versão portuguesa da ECERS, de Harms &

Clifford, 1980). Estas investigadoras concluíram que os pais consideravam os itens incluídos no

questionário extremamente importantes, tendo constatado que os itens mais valorizados eram Ajudar a

criança a compreender a linguagem, Condições de higiene e Adequação para crianças com

necessidades educativas especiais. Os itens menos valorizados eram Espaço para a criança estar

sozinha, Jogos com areia e água e Actividades criativas.

4.2 Ideias dos educadores sobre critérios de qualidade

Se os estudos que abordam as ideias dos pais sobre qualidade em contexto de creche e/ou

jardim-de-infância são raros, os estudos que abrangem as ideias dos educadores são praticamente

inexistentes. Relativamente às ideias dos educadores de infância sobre a creche, Coelho (2004, p. 2)

desenvolveu um estudo em Portugal que pretendeu “explorar as conceptualizações (crenças e teorias)

que os educadores organizam através da sua experiência com crianças com menos de três anos em

contexto de creche, nomeadamente as suas crenças e teorias em relação a esse contexto, às crianças

e ao processo educativo”. Os dados recolhidos através de entrevistas a 14 educadoras de infância

permitiram definir quatro temas: (1) a agenda das educadoras, (2) desenhando o currículo, (3)

(re)definindo a profissionalidade e (4) (re)formulando as concepções acerca da creche. Coelho (2004,

p. 254) explica que a agenda das educadoras corresponde “aos princípios que as educadoras

formularam prontamente como orientações para a sua acção em creche” e que os restantes

“correspondem essencialmente aos processos através dos quais as educadoras foram, ao longo do

processo de investigação, conferindo significado às diversas dimensões da sua actuação e do contexto

em que a desenvolvem”. Relativamente aos princípios que orientam a sua acção em creche, foram

criadas quatro categorias: (1) centrar-se na afectividade, (2) individualizar a intervenção, (3)

desenvolver e socializar a criança e (4) articular com as famílias. Coelho (2004) verificou que todas as

educadoras exprimiam a convicção de que devem, antes de mais, considerar as necessidades

emocionais da criança como orientação para a sua acção, isto é, a afectividade ocupava um lugar

central. No entanto, também a promoção do desenvolvimento da criança ocupava lugar de destaque,

tendo sido referida por todas as educadoras. No estudo de Coelho foi evidenciada a falta de um

referencial que oriente as práticas em contexto de creche, sendo que a “organização de orientações de

natureza curricular, à semelhança do que foi elaborado para a educação pré-escolar, é considerada

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Capítulo II

116

como ‘bem-vinda’, não só pela instrumentalidade do documento em si mesmo, mas também porque as

educadoras veriam nessa iniciativa um indicador do reconhecimento da dimensão profissional da sua

intervenção em contexto de creche (Coelho, 2004, p. 302).

Alguns estudos debruçaram-se, simultaneamente, sobre as ideias dos pais e dos educadores

de infância acerca da qualidade deste tipo de contextos. Num estudo realizado por Pierrehumbert,

Ramstein, Karmaniola, Miljkovitch e Halfon (2002), foram definidas sete dimensões relativas aos

cuidados: disponibilidade (paciente, disponível, competente, atento), estimulação, firmeza, relações

calorosas, autonomia, desempenho e organização, a partir de entrevistas realizadas a mães,

prestadores de cuidados, investigadores, legisladores. Relativamente a estas sete dimensões, os

prestadores de cuidados extrafamiliares pareciam valorizar mais o aspecto “profissional” dos cuidados,

como a disponibilidade e a organização, enquanto que as mães valorizavam mais os aspectos

relacionais.

Um dos objectivos do estudo ECCE era também descrever as orientações educacionais

(atitudes e opiniões) dos pais e dos educadores de infância de crianças em idade pré-escolar, o que

incluía as concepções do adulto sobre a criança em desenvolvimento, as suas expectativas em relação

ao desenvolvimento das crianças, as suas crenças acerca do impacto da educação nos

comportamentos e características das crianças, os seus objectivos educativos e ideias acerca das

condições adequadas em termos da educação das crianças, bem como as ideias relativas ao papel da

família e do contexto formal na educação e cuidados da criança. Pretendia estudar-se também as

concepções de mães e de educadores sobre o que é importante em termos da qualidade de um jardim-

de-infância e quais deveriam ser as principais funções destes centros (ECCE Study Group, 1997). Este

estudo encontrou muitas semelhanças entre os resultados dos países participantes. As principais

conclusões foram: (1) os educadores e as mães dos quatro países tinham expectativas semelhantes

relativas à idade em que as crianças deveriam adquirir determinadas competências (linguagem,

autonomia, competências motoras, desenvolvimento social) e havia acordo em relação à sequência do

desenvolvimento (o que é esperado primeiro e o que se segue); (2) a maioria dos participantes partilha

uma perspectiva moderna sobre o desenvolvimento, percebendo que é a combinação da

hereditariedade e da educação que tem efeito nas diferenças individuais das crianças; (3) em geral, as

mães e os educadores consideram que os pais têm um efeito mais forte no desenvolvimento das

crianças do que têm os educadores de infância; (4) a criança é vista pelos educadores e pelas mães

como um indivíduo que deve ser educado de forma a encorajar e promover o desenvolvimento,

valorizando a iniciativa da criança e vendo a educação como um impulso para que a criança construa o

seu próprio desenvolvimento; (5) as mães e os educadores deram maior importância ao papel do

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Educação e cuidados de elevada qualidade

117

jardim-de-infância no desenvolvimento pessoal da criança, seguido pela função de socialização e

atribuíram menor importância à função de supervisão; (6) as mães e os educadores consideravam que

o facto de haver profissionais treinados e competentes era o factor mais importante de um centro,

seguido pelos materiais educativos adequados e, finalmente, pelos aspectos organizacionais

relacionados com os cuidados (e.g., horário de funcionamento) (ECCE Study Group, 1997). As mães

portuguesas tendiam a ser mais directivas nas suas abordagens à educação das crianças e esperavam

que determinadas tarefas desenvolvimentais acontecessem mais tarde do que as mães dos outros

países. As mães portuguesas e espanholas tendiam a valorizar mais do que as mães dos outros países

os aspectos relacionados com a saúde e a segurança e menos os aspectos relacionados com o bem-

estar das crianças e a adequação do programa e dos materiais. As diferenças entre países nas

respostas dos educadores eram muito ténues, o que, segundo esta equipa de investigação, se pode

dever aos efeitos da formação, que cria crenças e valores semelhantes. De qualquer modo, os

educadores de infância portugueses esperavam um desenvolvimento da criança, em geral, mais tardio,

mas esperavam o desenvolvimento da linguagem mais cedo do que os educadores da Alemanha e da

Áustria (ECCE Study Group, 1997). Comparando educadores de infância e mães, verificou-se que (1)

os educadores tendiam a considerar-se mais importantes no desenvolvimento das crianças do que as

mães os consideravam; (2) os educadores tendiam a revelar atitudes relacionadas com a educação

das crianças menos directivas e menos orientadas academicamente, dando maior ênfase ao

desenvolvimento social, do que as mães; (3) os educadores tendiam a valorizar mais, no jardim-de-

infância, as tarefas promotoras do desenvolvimento das crianças, enquanto que as mães valorizavam

mais as tarefas relacionadas com as regras sociais , com a saúde e com a segurança (ECCE Study

Group, 1997).

4.3 Ideias das crianças sobre critérios de qualidade

Os estudos apresentados focam as ideias dos pais e dos profissionais da educação de infância

acerca das estruturas de educação e cuidados. Contudo, Langsted (1994) alerta para o facto de que

raramente as crianças são ouvidas relativamente aos serviços de educação e cuidados, fornecendo

alguns exemplos da participação das crianças. Num dos projectos descritos por este autor,

desenvolvido na Dinamarca, foi pedido a dois adolescentes, de 13 e 14 anos, que observassem um

jardim-de-infância durante dois dias e que no fim dessa observação identificassem os aspectos

positivos e negativos. Essas duas crianças referiram que: (1) era pouco provável que todas as crianças

tivessem fome ao mesmo tempo e, por isso, não era razoável esperar-se que todas comessem ao

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Capítulo II

118

mesmo tempo (o momento que os adultos considerassem adequado); (2) podia ser saudável para as

crianças irem brincar para o exterior, mas as crianças só deveriam ir se quisessem e nada indicava que

elas queriam ir todas ao mesmo tempo; e (3) não era razoável que as crianças, entre refeições, apenas

pudessem beber água da torneira, quando os adultos podiam beber chá ou café sempre que

quisessem. Como resultado da participação destas crianças no projecto, foram efectuadas algumas

alterações no jardim-de-infância e, além disso, passou a dar-se mais possibilidade às crianças que o

frequentavam de tomarem algumas decisões (Hare, 1993, como citado em Langsted, 1994). Langsted

refere igualmente um projecto desenvolvido nos países nórdicos (BASUN Project) no qual crianças de

5 anos de idade foram entrevistadas no sentido de se obter a sua perspectiva acerca da qualidade dos

centros que frequentavam. Para essas crianças, o factor mais atractivo dos centros era a presença de

outras crianças. Vários factores eram mencionados como tendo importância secundária, como as

actividades, os brinquedos e os adultos.

Wiltz e Klein (2001) realizaram um estudo cujo principal objectivo era conhecer as percepções

das crianças de 4 anos de idade acerca das suas experiências em salas de elevada e de baixa

qualidade. As autoras concluíram que as crianças de salas de baixa qualidade listavam as actividades

segundo uma sequência rígida, enquanto que as crianças de estruturas de elevada qualidade

salientavam acontecimentos importantes e escolhas numerosas. Brincar era a actividade preferida de

todas as crianças, em todas as salas, e que incluía utilizar os brinquedos, os livros (ler e ouvir),

actividades de arte, jogo no exterior e blocos. Contudo, nas salas de qualidade mais elevada as

crianças tinham mais oportunidades para escolher livremente as actividades de jogo e tinham mais

tempo para brincar. As crianças descreviam o jogo como sendo livre, divertido, barulhento e

espontâneo. Comportamentos indelicados, actividades de grande grupo (roda), sesta e time-out eram

os aspectos que as crianças menos gostavam, independentemente da qualidade da sala. A razão

apontada para não gostar destes aspectos era o facto de não se poder brincar nessas situações.

Verificou-se que as actividades de grande grupo eram referidas por mais crianças das estruturas de

baixa qualidade do que das de elevada qualidade. Além disso, as observações efectuadas permitiram

verificar que essas actividades eram mais demoradas nas salas de baixa qualidade e que não estavam

relacionadas com as restantes actividades desenvolvidas na sala. As crianças referiam que as

actividades de roda eram demasiado longas e que não eram muito interessantes. As autoras

concluíram que as crianças e os adultos viam de forma diferente os aspectos relacionados com a

qualidade da educação e dos cuidados. Por exemplo, as crianças não referiram as questões de saúde

e segurança, que são cruciais para os adultos, devido às regulamentações de licenciamento. As visitas

a museus e outros locais são outro exemplo desta disparidade. De facto, enquanto que os educadores

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Educação e cuidados de elevada qualidade

119

consideram as visitas momentos educativos privilegiados, as crianças vêem-nas como “aborrecidas”,

preocupando-se essencialmente com o horário de regresso, pois querem chegar a tempo das

brincadeiras no exterior. As crianças tendiam a falar mais sobre as experiências que gostavam do que

sobre as que não gostavam, ou seja, tinham uma visão optimista das situações. As estruturas de boa

qualidade geralmente providenciam programas bem planeados, centrados nas crianças, orientados

para o jogo e adequados ao seu desenvolvimento e encorajam as crianças a efectuarem escolhas a

partir de uma base diversificada de actividades (Wiltz & Klein, 2001).

4.4 Ideias da população em geral sobre critérios de qualidade

Coelho e Neves (2000) realizaram um estudo em Lisboa e Portalegre, cujo principal objectivo

era conhecer as representações sociais acerca da creche, tendo inquirido profissionais, pais e pessoas

sem relação com a creche. Destacaram-se três dimensões: (1) Educação e Desenvolvimento, (2)

Ligação e Cuidados e (3) Aquisição de Hábitos. A dimensão Educação e Desenvolvimento corresponde

à definição da creche como contexto educativo, onde técnicos qualificados promovem o

desenvolvimento e estimulam a aprendizagem. A dimensão Ligação e Cuidados refere-se à

organização da creche como contexto relacional, onde ligação e cuidados surgem associados,

sugerindo a ideia de que só uma ligação de qualidade permitirá que os cuidados prestados ao bebé na

creche sejam também de qualidade. Inclui-se também a importância de a criança estabelecer uma

relação significativa com um adulto da creche, que deverá estar em sintonia com a família, dando

continuidade ao modo como os pais se relacionam e interagem com a criança. A alimentação aparece

ligada a esta noção de Ligação. A terceira dimensão, Aquisição de Hábitos, está associada à ideia de

regulação dos ritmos fisiológicos do bebé, equivalendo a uma função disciplinadora do comportamento

do bebé. São incluídos os hábitos alimentares, de sono e de higiene. Os resultados obtidos com base

na participação da população em geral neste estudo, ou seja, os cidadãos que não se incluem no grupo

dos educadores/auxiliares nem no grupo dos pais, revelaram que a dimensão mais valorizada era a

primeira (Educação e Desenvolvimento), seguida pela Aquisição de Hábitos. As expectativas da

população em geral relativas à capacidade da creche para promover a Ligação e Cuidados parecem

ser menores.12

12 Não foram publicados dados relativos à participação dos pais e dos educadores.

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Capítulo II

120

4.5 A avaliação da qualidade: confronto entre ideias e práticas

4.5.1 As ideias dos pais sobre a qualidade e as práticas observadas

Os pais de crianças com idade inferior a 6 anos, que frequentam estruturas formais de

educação e cuidados, têm efectuado em geral uma avaliação positiva dos serviços prestados,

revelando-se satisfeitos com os mesmos.

Fantuzzo, Perry e Childs (2006) estudaram uma escala desenvolvida para avaliar a satisfação

dos pais com vários aspectos das estruturas de educação e cuidados frequentadas pelos filhos –

Parent Satisfaction with Educational Experiences. Participaram no estudo pais com crianças a

frequentar o pré-escolar, o kindergarten e o primeiro ano de escolaridade, tendo sido identificados três

factores de satisfação dos pais: (1) experiências de contacto com o educador, (2) experiências de

contacto com a sala e (3) experiências de contacto com a instituição (centro). Verificou-se que os pais

mais satisfeitos nas três dimensões eram os que não trabalhavam a tempo inteiro e os casados. Não

foi encontrada associação entre a satisfação dos pais e a etnia, o nível educativo dos pais, o género da

criança e o número de crianças no agregado familiar.

Cryer e Burchinal (1997) verificaram que os pais de crianças que frequentavam creches e

jardins-de-infância tendiam a sobrestimar a qualidade das instituições que os filhos frequentavam,

apesar de valorizarem o mesmo tipo de características que os profissionais que avaliavam a qualidade.

As avaliações da qualidade das salas efectuadas pelos pais foram comparadas com avaliações

efectuadas por observadores externos, tendo sido verificado que os pais avaliavam a qualidade de

forma significativamente superior aos observadores treinados. As avaliações dos pais estavam

modestamente (associação positiva fraca) relacionadas com as avaliações do observador, o que pode

significar que os pais com crianças em salas de qualidade inferior (avaliada por observadores externos)

deram às salas cotações inferiores às dos pais com filhos em salas de qualidade mais elevada, apesar

de todos atribuírem cotações elevadas. Esta hipótese foi confirmada através de um teste de

comparação de grupos, verificando-se que os pais das crianças de salas de qualidade mais elevada

(quartil superior) avaliavam mais positivamente as salas do que os pais de crianças das salas de

qualidade inferior (quartil inferior). A avaliação efectuada pelos pais não variava em função do seu nível

educativo e do nível de rendimentos nas salas para bebés e crianças de 1 e 2 anos de idade, mas

variava nas salas do pré-escolar, sendo que (a) os pais do nível educativo mais baixo atribuíam

cotações mais elevadas do que os outros pais e (b) os pais do grupo de rendimentos inferior atribuíam

cotações superiores aos do grupo de nível médio, mas não havia diferenças entre os pais de nível

superior e os pais de nível médio e inferior.

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Educação e cuidados de elevada qualidade

121

Cryer e Burchinal (1997) colocaram a hipótese de que a diferença entre as avaliações dos pais

e dos observadores seria mediada pela medida em que um determinado aspecto podia ser facilmente

avaliado pelos pais, tendo dado a possibilidade de os pais responderem Não sei. As autoras supunham

que a diferença seria menor nos aspectos que se avaliam mais facilmente (e.g., mobiliário), que

reuniriam menos respostas Não sei, e maior em aspectos que não são tão facilmente avaliados (e.g.,

utilização da linguagem com a criança), que reuniriam mais respostas Não sei. Os 10 itens com maior

percentagem de respostas Não Sei foram colocados num grupo de itens considerados de mais difícil

avaliação e os 10 itens com menor percentagem foram colocados no grupo de itens considerados de

fácil avaliação. Como as autoras deste estudo esperavam, houve maior discrepância entre a avaliação

de pais e observadores no grupo de itens dificilmente avaliados. Foi também verificada a associação

entre a importância atribuída aos critérios de qualidade e a avaliação efectuada pelos pais, tendo sido

encontrada uma correlação modesta, mas estatisticamente significativa, entre a valorização e a

avaliação que os pais faziam da qualidade da sala nesses aspectos. Através de um modelo linear

hierárquico, verificou-se que a diferença entre a avaliação da qualidade efectuada por pais e por

observadores era predita pela importância que os pais atribuíam aos aspectos da qualidade: quanto

maior a importância atribuída, maior a discrepância observada. Cryer e Burchinal (1997) apresentaram

como explicação possível para o desfasamento constatado entre a avaliação feita por pais e por

observadores treinados o facto de aqueles não conhecerem bem a creche. Contudo, consideraram

também que outros factores podem estar envolvidos, como o facto de os pais poderem estar a avaliar a

qualidade das creches dos seus filhos baseando-se não na realidade, mas naquilo que esperam e

desejam que aconteça. Uma vez que não conhecem bem a realidade, pois raramente estão presentes

para se aperceberem do que se passa, os pais podem assumir que as coisas mais importantes estão a

ser proporcionadas aos seus filhos. Quando se trata de aspectos menos valorizados, pode ser mais

fácil verem as limitações da creche nessas facetas, aproximando-se das avaliações feitas pelos

observadores externos. Também pode acontecer que os pais sejam menos exigentes do que os

observadores, mesmo quando se trata de critérios altamente valorizados (Cryer & Burchinal, 1997).

No estudo equivalente desenvolvido na Alemanha (Cryer et al., 2002) verificou-se igualmente

que as mães atribuíam valores mais elevados à qualidade das salas frequentadas pelos filhos do que

observadores treinados, e que a avaliação da qualidade efectuada pelas mães era influenciada pela

importância relativa que atribuíam aos aspectos da qualidade. Os dados recolhidos nos EUA foram

comparados com os dados recolhidos na Alemanha. Nesse estudo comparativo (Cryer et al., 2002),

verificou-se que as mães do estudo alemão davam pontuações mais baixas à qualidade das salas do

que os pais do estudo dos EUA e a diferença entre a avaliação efectuada pelos pais e a avaliação

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Capítulo II

122

efectuada pelos observadores treinados era menor na Alemanha; quer os pais dos EUA quer os da

Alemanha avaliavam positivamente a qualidade, considerando que as salas que os filhos frequentavam

tinham um desempenho muito bom em cada item; e havia uma associação positiva estatisticamente

significativa entre a importância média atribuída e a avaliação da qualidade.

A disparidade entre a avaliação efectuada pelos pais e por observadores externos foi

evidenciada em vários estudos. Shinn, Galinsky e Gulcur (1990), num estudo no qual participaram 441

mães de crianças que frequentavam centros de educação e cuidados, verificaram que as mães

estavam satisfeitas com os serviços prestados, apesar de se tratar de centros considerados de baixa

qualidade. A satisfação das mães estava associada à sua percepção acerca da experiência da criança

no programa, nomeadamente as interacções com os adultos e as actividades desenvolvidas

(associação positiva), à percepção da instabilidade dos prestadores de cuidados, isto é, à falta de

continuidade (associação negativa) e à satisfação com as condições de saúde e de segurança

(associação positiva). Não foi encontrada associação entre o salário das mães e a sua satisfação com

o centro. A satisfação global das mães não estava associada à satisfação com o rácio adulto-criança e

com o tamanho do grupo. O bem-estar das mães, os conflitos entre o emprego e a vida familiar e os

atrasos para o emprego (ou saídas antecipadas) estavam associados a características dos centros

relacionadas com as necessidades das famílias. Assim, as mães mais satisfeitas com o horário de

funcionamento, os custos, a localização, as regras e as oportunidades de participarem nas decisões

dos centros (a) obtiveram resultados mais elevados ao nível do bem-estar, (b) relatavam menos

conflitos entre as responsabilidades familiares e profissionais e (c) referiam menos atrasos para o

emprego (Shinn et al., 1990).

Mitchell et al. (1992) referem que os pais, ao avaliarem as instituições, fundamentam-se numa

visão global da qualidade (como as interacções e o ambiente em geral), não em critérios de qualidade

específicos, como fazem os profissionais, o que pode levar a diferenças consideráveis. Kim e Smith

(2007) verificaram que a avaliação que os pais efectuavam acerca dos centros frequentados pelos

filhos se relacionava com a sua satisfação e confiança na organização, o que, por sua vez, afectava a

sua intenção de “passar palavra” sobre o centro. Os pais de estatuto social mais baixo avaliavam mais

positivamente os serviços e manifestavam mais intenções de recomendar a instituição a outras

pessoas do que os pais de nível superior. Estes autores consideram que os aspectos de mais difícil

avaliação para os pais são os interpessoais, como a relação que o pessoal estabelece com as crianças

e a relação entre as crianças. A dificuldade na avaliação deve-se sobretudo ao facto de não serem os

pais os receptores dos serviços, alertando ainda para a influência das expectativas criadas pelos pais

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Educação e cuidados de elevada qualidade

123

na avaliação que efectuam.

Shpancer et al. (2002) fizeram um estudo no qual entrevistaram 37 pais com crianças a

frequentar creche ou jardim-de-infância e os directores das respectivas instituições acerca de

características estruturais e processuais do centro. Em média, 45% das respostas dadas pelos pais

foram correctas, ou seja, coincidentes com as informações fornecidas pelos directores, 29% das

respostas dadas foram incorrectas e em 20% das respostas os pais alegaram desconhecimento. O

grau de conhecimento dos pais acerca das características da creche/jardim-de-infância era maior

quando as crianças frequentavam a instituição há mais tempo, mas variáveis como a educação dos

pais e o número de horas que as crianças passavam na instituição não contribuíam para prever o grau

de conhecimento dos pais. O mesmo estudo concluiu ainda que, apesar de os pais reconhecerem que

tinham falta de conhecimento acerca da instituição que os filhos frequentavam, tal não os impediu de a

classificarem como sendo de elevada qualidade. Além disso, a avaliação que faziam daquela creche

em particular era superior à avaliação que faziam da generalidade das instituições do estado onde

decorreu o estudo. Os autores consideram que os pais crêem que escolheram um centro de boa

qualidade, entre as ofertas disponíveis de qualidade mediana. Steinberg e Green, em 1978 (como

citados em Fuqua & Labensohn, 1986), concluíram que a maior parte dos americanos sabia

consideravelmente mais sobre os automóveis que conduzia do que sobre a pessoa que cuidava

diariamente dos filhos. A participação dos pais na vida da creche pode estar relacionada com a sua

satisfação com a qualidade das creches. Fuqua e Labensohn (1986) constataram que a partilha do

papel de cuidar da criança entre pais e educadores está relacionada com a satisfação dos pais.

Quando os educadores informam os pais acerca da forma como decorreu o dia para a criança,

permitindo que os pais exerçam algum tipo de controlo sobre o ambiente, e quando os educadores

ouvem e respeitam as suas sugestões e opiniões, os pais revelam-se mais satisfeitos com o contexto

de educação e cuidados que a criança frequenta. A comunicação entre pais e educadores à chegada e

na partida das crianças da creche foi analisada num estudo realizado por Endsley e Minish (1991).

Verificou-se que apenas 2⁄3 dos pais conversavam com o pessoal da creche/jardim-de-infância e que

em 43% dos casos a conversa decorria com o principal prestador de cuidados. As conversas duravam

em média 27 segundos e metade das conversas ia para além dos cumprimentos, envolvendo dar ou

pedir informações acerca do comportamento, da saúde ou da forma como decorreu o dia das crianças

na instituição. Nos casos em que não foi observada comunicação entre os pais e o pessoal, 65% dos

pais ficavam à porta do edifício e 69% dos educadores permaneciam nas suas salas. Pelo contrário,

nos casos em que se verificou haver comunicação, 88% dos pais entravam nas salas (Endsley &

Minish, 1991). Estes autores verificaram que os pais estavam mais disponíveis para conversar quando

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Capítulo II

124

iam buscar a criança, enquanto que o pessoal estava mais disponível de manhã. As conversas eram

mais frequentes e proveitosas nos programas para bebés e crianças de 1 e 2 anos do que nos

programas para crianças em idade pré-escolar.

O contacto entre pais e educadores pode contribuir para manter os pais informados acerca da

educação e cuidados prestados às crianças e, por outro lado, os pais informados apoiam mais os

serviços nos quais há uma boa comunicação (Ojala & Opper, 1994). No estudo IEA verificou-se que as

formas de contacto entre educadores e pais mais referidas pelos pais eram os contactos informais e,

seguidamente, as reuniões individuais marcadas a pedido dos pais. Os contactos menos referidos

eram a comunicação por telefone ou por escrito, as reuniões de grupo e o apoio prestado pelos pais ao

centro. Dos tipos de contactos estudados, aquele que ocorria mais frequentemente na maior parte dos

países era o contacto informal.

Como foi referido, numa lógica de mercado, os pais, enquanto consumidores, poderiam fazer

pressão no sentido de se promover a elevada qualidade dos serviços oferecidos. Se os pais

seleccionassem apenas serviços de boa ou elevada qualidade, os outros seriam forçados a melhorar

ou a encerrar. Contudo, como frisado pelo Cost, Quality & Child Outcomes in Child Care Centers Study

(Cost, Quality & Child Outcomes Study Team, 1995), para que isso aconteça, é necessário que quer os

consumidores quer as pessoas que oferecem o serviço estejam bem informados. No estudo Cost,

Quality & Child Outcomes in Child Care Centers verificou-se que os pais sobrestimavam a qualidade

dos centros que os filhos frequentavam e, por isso, não exigiam elevada qualidade, ou seja,

acreditavam que os serviços já eram de elevada qualidade. Este factor contribui para que continuem a

existir centros de baixa qualidade, mesmo que sejam dependentes do pagamento efectuado pelos pais.

Por outro lado, ainda que os pais tenham a informação adequada, poderá acontecer que demonstrem a

sua satisfação com os serviços de educação e cuidados porque (a) ter escolhido um serviço constitui

um alívio da situação fatigante de procurar estruturas de educação e cuidados, (b) precisam de

acreditar que a sua escolha é acertada, de modo a conseguirem prosseguir com os seus papéis como

profissionais ou estudantes ou (c) reconhecer que não estão satisfeitos iria ameaçar a sua sensação de

segurança (Mitchell et al., 1992). Fuqua e Labensohn (1986) concluíram que o facto de as instituições

terem licença de funcionamento fazia os pais sentirem-se seguros. Congruentes com esta conclusão,

Shlay, Tran, Weinraub e Harmon (2005), no estudo com pais afro-americanos já referido, verificaram

que a licença e a acreditação dos serviços eram aspectos muito valorizados. Bogat e Gensheimer

(1986) enumeraram também algumas razões possíveis para a satisfação dos pais com a qualidade dos

serviços e o pouco investimento na procura ou escolha dos serviços, entre as quais a escassez de

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Educação e cuidados de elevada qualidade

125

serviços de boa qualidade, o que limita as possibilidades de escolha, e a falta de tempo e de recursos

dos pais para fazerem uma procura mais extensa, especialmente porque se trata de uma situação que

é vista como limitada no tempo (1 ou 2 anos). Shlay et al. (2005) consideram que embora os pais

partilhem os valores dos profissionais, no que se refere às características de serviços de elevada

qualidade, nem sempre estes estão acessíveis na zona onde moram e nem sempre são

financeiramente comportáveis para os pais.

Em Portugal, no estudo realizado por Folque (1995), já referido, constatou-se que, na sua

generalidade, os pais estavam satisfeitos com o serviço que utilizavam, sendo, todavia, críticos em

relação a aspectos particulares da qualidade, nomeadamente as actividades, o contacto com a

comunidade, a atenção individualizada e a monitorização do desenvolvimento e progresso da criança

(Folque, 1995). Os pais avaliavam de forma mais positiva os factores relacionados com a conveniência

(excepto os custos), com a saúde e necessidades físicas e com as relações. Apesar de o factor de

conveniência ser o mais importante na escolha do serviço, os pais revelaram-se mais satisfeitos com

os serviços que promoviam o desenvolvimento das crianças, isto é, para os pais “a conveniência não

faz o bom serviço” (Folque, 1995, p. 106).

No estudo realizado por Nunes e Melo (2006), em Évora, os pais davam em geral cotações

elevadas ao funcionamento dos jardins-de-infância nos itens da ECERS. Os itens com média mais

elevada foram Refeições/merendas, Linguagem do(a) educador(a) e Ambiente da Sala e os itens com

média mais baixa foram Jogos com areia/água, Espaço para a criança estar sozinha e Área de

encontro para adultos e Formação de educadores. Os itens Espaço para a criança estar sozinha e

Jogos com areia e água foram simultaneamente considerados pelos pais menos importantes e

avaliados como tendo um pior funcionamento.

No estudo IEA, já referido, os pais identificaram três tipos de problemas dos serviços de

educação e cuidados, que estavam relacionados com (1) o serviço em geral (localização, horas de

funcionamento, exclusão de crianças doentes, custo e outros), (2) o programa (filosofia do programa,

orientação religiosa, instalações e equipamento, segurança, higiene e alimentação, atmosfera negativa,

outras crianças, falta de continuidade do pessoal e outros) e (3) o educador (características pessoais,

falta de confiança, falta de qualificações, a criança não gosta do educador e outros) (Ojala & Opper,

1994). Em todos os países participantes no estudo, entre 82 a 100% das famílias estavam algo ou

muito satisfeitas com os serviços. Em Portugal, 53% das famílias estavam muito satisfeitas, 45% algo

satisfeitas e 2% não muito satisfeitas com os serviços que escolheram (serviços organizados, pois não

foram considerados os casos em que as crianças estavam na casa da família com familiares ou amas).

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Capítulo II

126

O principal problema identificado pelos pais portugueses era o custo dos serviços. À excepção deste,

os pais pareciam encontrar poucos problemas nos serviços (Ojala & Opper, 1994).

Os estudos aqui apresentados referem-se à avaliação que os pais fazem dos serviços que

utilizam. Contudo, em Portugal, estas avaliações não têm sido confrontadas com avaliações dos

mesmos serviços efectuadas por observadores externos.

4.5.2 As ideias dos educadores sobre a qualidade e as práticas observadas

A investigação que inclui as ideias dos educadores acerca da qualidade das suas salas é

escassa, apesar de já em 1975 Verma e Peters (como citado em Cassidy & Lawrence, 2000) terem

alertado para o facto de haver pouca correspondência entre as crenças reveladas pelos educadores e

as práticas observadas. De qualquer modo, é assumido que as ideias dos educadores podem ter algum

impacto nas suas práticas, apesar de se poderem verificar igualmente discrepâncias. Como refere

Coelho (2004, p. 172) tem sido aceite a ideia de que “o modo como os professores pensam e

compreendem as suas actividades profissionais são componentes vitais dessas actividades, sendo

neste contexto aceite que as crenças dos professores jogam um papel essencial nas suas práticas

pedagógicas”, tendo a literatura vindo a revelar que “as crenças dos professores têm impacto nas suas

percepções e julgamentos, e que estes por sua vez afectam o seu comportamento na sala de aula,

podendo por essa via ter um impacto substancial nas suas práticas, nomeadamente através do

constrangimento que exercem sobre a habilidade dos professores para gerarem soluções para os

problemas educacionais com que se deparam".

Considerando os resultados de estudos que encontraram uma discrepância entre as ideias dos

educadores acerca das práticas desenvolvimentalmente adequadas e as suas práticas observáveis,

bem como o facto de haver educadores que, independentemente das barreiras institucionais,

implementam as práticas que consideram adequadas, McMullen (1999a) desenvolveu um estudo no

sentido de descrever as características e as ideias dos educadores que implementam as melhores

práticas. Esta investigadora verificou que o melhor preditor das práticas destes educadores era, de

facto, a sua crença nas práticas desenvolvimentalmente adequadas. O segundo preditor estava

relacionado com o sentido de eficácia pessoal do educador, ou seja, os seus sentimentos de mestria e

competência. Estes educadores tinham todos formação na área do desenvolvimento e educação das

crianças e os contextos pré-escolares onde trabalhavam davam-lhes liberdade na elaboração e

implementação do currículo.

No sentido de estudar esta relação entre a teoria e a prática dos educadores, Cassidy e

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Educação e cuidados de elevada qualidade

127

Lawrence (2000) efectuaram um estudo no qual filmaram as actividades e os comportamentos dos

educadores em salas de bebés e de crianças de 1 ano de idade, de 2 anos e do pré-escolar. Foi pedido

às educadoras para verem os vídeos realizados e para fornecerem um “racional” para as actividades e

acções, bem como para descreverem o que pode ter influenciado as crenças sobre o que estava a

acontecer na sala. Dos 871 “racionais” registados, 33% relacionavam-se com o desenvolvimento

socioemocional das crianças, 16% com a gestão de comportamentos, 11% com estratégias para

promover o desenvolvimento global, 10% com o desenvolvimento cognitivo, 9% com a diversão (das

crianças ou da educadora), 7% com a saúde e a segurança, 6% com o desenvolvimento da linguagem,

5% com competências motoras e 2% com aspectos estruturais. As educadoras com nível superior de

educação formal forneciam duas vezes mais racionais focados na dimensão cognitiva do que as

educadoras de um nível educativo inferior. Relativamente às influências nas práticas de ensino, as

educadoras referiam mais a influência das suas experiências pessoais e profissionais do que das

experiências da educação formal. As autoras deste estudo alertam para o facto de que a excessiva

confiança na experiência, sem teoria ou investigação, nem sempre conduz às melhores práticas.

Como foi mencionado, vários estudos demonstram a discrepância entre avaliações da

qualidade efectuadas por pais e por observadores externos. Embora existam poucos estudos sobre as

ideias dos educadores relativas à qualidade que promovem, parece verificar-se também uma tendência

para se encontrarem diferenças entre as avaliações da qualidade efectuadas por educadores e as

avaliações efectuadas por observadores externos. Sheridan (2000) realizou um estudo, na Suécia, cujo

objectivo era comparar a avaliação da qualidade de salas de jardim-de-infância efectuada pelos

educadores de cada sala e por observadores externos, tendo por base 18 itens da ECERS. Nesse

estudo os educadores deram cotações à qualidade das suas salas correspondentes a qualidade

mínima (M = 4.76), apesar de próximas da classificação correspondente a qualidade boa. Verificou-se

que havia discrepâncias entre a avaliação efectuada pelos educadores e pelos observadores externos,

não sendo sempre os educadores a avaliar as salas de forma mais positiva. De facto, nesse estudo

verificou-se que os educadores de salas de baixa qualidade observada tendiam a sobrevalorizar a

qualidade da sua sala, enquanto os educadores das salas com avaliação externa mais elevada davam

à sua sala cotações mais baixas do que o observador (Sheridan, 2000).

Em suma, vários estudos indicam que os critérios de conveniência são relevantes na escolha

dos serviços de educação e cuidados para crianças com idade inferior a 6 anos. Contudo, os critérios

de qualidade enunciados pelos pais coincidem com aqueles que são salientados por profissionais.

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Capítulo II

128

Geralmente os pais mostram-se satisfeitos com os serviços prestados, identificando poucos problemas

e efectuando uma avaliação da qualidade da sala de creche/jardim-de-infância superior a observadores

externos que avaliam as mesmas salas. Os estudos sobre as ideias dos educadores são muito

escassos, indicando contudo a investigação existente que há alguma disparidade entre as ideias

transmitidas pelos educadores acerca daquilo que valorizam ao nível das características da educação e

cuidados ou acerca das práticas que implementam e as práticas efectivamente observadas.

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CAPÍTULO III: Enquadramento e objectivos do estudo

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131

A revisão da literatura, apresentada nos capítulos anteriores, permitiu descrever o

enquadramento que serve de base a este estudo. Apesar de, em Portugal, em pleno séc. XX, durante

as décadas que corresponderam à ditadura salazarista, ter sido atribuída à mãe a responsabilidade de

cuidar e educar os seus filhos, actualmente uma grande percentagem de mães está inserida no mundo

do trabalho. Assim, a necessidade de haver instituições que colaborem com as famílias na educação e

cuidados das crianças, antes do ingresso na escolaridade obrigatória, é incontestável.

Uma percentagem considerável, e com propensão a aumentar, de crianças passa grande parte

dos seus dias em creches e jardins-de-infância (Instituto da Segurança Social, 2005a; Gabinete de

Avaliação e Informação do Sistema Educativo, 2006), sendo de grande importância o papel destas

instituições no seu desenvolvimento (e.g., Bryant et al., 1994; Burchinal, Ramey, Reid, & Jaccard, 1995;

Vandell & Wolfe, 2000). Se as crianças são colocadas desde tenra idade em creches e os resultados

da investigação mostram que a qualidade da creche está positivamente relacionada com o seu

desenvolvimento a diversos níveis (e.g., Bryant et al., 2003; ECCE Study Group, 1997), torna-se, então,

evidente a necessidade de se avaliar e promover a qualidade destes centros.

Nos últimos anos, tem sido dedicada, a nível internacional, uma atenção crescente ao estudo

dos contextos para crianças em idade pré-escolar. Todavia, os estudos desenvolvidos em contexto de

creche em Portugal são ainda escassos. Relativamente à qualidade destas instituições, resultados

encontrados no estudo publicado em 2002, relativos a 30 salas, revelaram uma qualidade baixa em

creches da área metropolitana do Porto (Aguiar et al., 2002). Este estudo constituiu um importante

impulso para a presente investigação. Tendo em mente os factores expostos anteriormente, estes

resultados ampliavam a necessidade de se avaliarem as creches em Portugal, alargando o número de

salas participantes. O estudo referido utilizou a Escala de Avaliação do Ambiente de Creche, a

tradução portuguesa da Infant/Toddler Environment Rating Scale (Harms et al., 1990). Com a

publicação da edição revista desta escala, pelos mesmos autores (Harms et al., 2003), revelou-se

oportuno utilizar essa edição, o que requereu o seu estudo e tradução no presente trabalho.

Os estudos que avaliam a qualidade das creches e jardins-de-infância em Portugal têm

revelado a ausência de serviços de boa ou excelente qualidade (e.g., Aguiar et al., 2002; Abreu-Lima &

Nunes, 2006). Contudo, em geral, os pais com crianças a frequentar creches e jardins-de-infância

portugueses têm-se revelado satisfeitos com a qualidade dos serviços e poucos identificam problemas

existentes nas instituições (e.g., Ojala & Opper, 1994; Folque, 1995). Resultados semelhantes foram

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Capítulo III

132

encontrados em estudos realizados noutros países (e.g., Cryer & Burchinal, 1997). De facto, em

diversos estudos se concluiu que os pais tendem a sobrevalorizar a qualidade das instituições,

verificando-se algo semelhante quando são profissionais das instituições a efectuar o mesmo tipo de

avaliação (e.g., Sheridan, 2000).

Tendo presente que os resultados da avaliação da qualidade das creches, em Portugal, apesar

de escassos, têm revelado a existência de uma qualidade pobre, seria pertinente determinar que

avaliação os pais fazem actualmente das creches que os filhos frequentam, mas também que avaliação

fazem as educadoras de infância/auxiliares de educação. Seria igualmente importante determinar que

critérios de qualidade são valorizados por pais e por educadores de infância/auxiliares, tentando

perceber em que medida valorizam os critérios incluídos na ITERS-R, a escala frequentemente

utilizada para avaliar a qualidade das creches e igualmente utilizada neste estudo, e analisar a relação

entre a avaliação da qualidade da creche efectuada e a importância atribuída aos critérios de

qualidade.

Uma vez que se pretendia utilizar a ITERS-R, uma escala desenvolvida nos EUA, efectuou-se

um estudo prévio no sentido de se verificar se havia alguma correspondência entre os critérios de

qualidade incluídos na escala e os critérios abrangidos pela legislação e outros documentos

orientadores considerados mais importantes, vigentes à data (ano lectivo 2002-2003).

Como foi referido, a legislação que em Portugal regulamenta especificamente as creches é

muito limitada. Embora os Guiões Técnicos para a Creche, da Direcção Geral para a Acção Social

(Rocha et al., 1996), constituam apenas “princípios orientadores”, eram, em 2002 (data de início deste

estudo), o documento a que todos os tipos de creches poderiam recorrer de modo a conhecerem os

padrões de qualidade requeridos pela Segurança Social. As creches de instituições com fins lucrativos

são reguladas, desde 1989, por um despacho – Despacho Normativo n.º 99/89, de 27 de Outubro de

1989 – que define as Normas Reguladoras das Condições de Instalação e Funcionamento das Creches

com Fins Lucrativos e que tem muitas semelhanças com os Guiões Técnicos. Estes eram os

documentos mais importantes no que diz respeito ao funcionamento das creches, existindo vários

decretos, despachos e portarias aplicáveis às creches, do mesmo modo que a outro tipo de

instituições, como: (1) o Despacho Conjunto dos Ministérios do Plano e da Administração do Território,

das Obras Públicas, Transportes e Comunicações e do Trabalho e Segurança Social, de 30 de Junho

de 1986, relativo às “recomendações técnicas para melhoria da acessibilidade dos deficientes aos

estabelecimentos que recebam público”, e o Decreto-Lei n.º 123/97, de 22 de Maio de 1997, que define

as normas técnicas para melhoria da acessibilidade dos cidadãos com mobilidade condicionada aos

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Enquadramento e objectivos

133

edifícios, estabelecimentos que recebem público e via pública; (2) o Decreto-Lei n.º 133-A/97, de 30 de

Maio de 1997, que regulamenta os estabelecimentos e serviços privados em que sejam exercidas

actividades de apoio social do âmbito da Segurança Social; (3) a Portaria 149/88, de 9 de Março de

1988, que define regras de asseio e higiene a observar pelas pessoas que, na sua actividade

profissional, entram em contacto directo com alimentos, e os Decretos-Lei n.º 67/98, de 19 de Março de

1998, e n.º 425/99, de 21 de Outubro de 1999, que definem normas gerais de higiene a que devem

estar sujeitos os géneros alimentícios; e (4) o Decreto-Lei n.º 379/97, de 27 de Dezembro de 1997, que

estabelece as condições de segurança a observar na localização, implantação, concepção e

organização funcional dos espaços de jogo e recreio, respectivo equipamento e superfícies de impacto.

No Quadro 2 pode ser verificada a correspondência encontrada entre os critérios de qualidade

incluídos na ITERS-R e os critérios abrangidos por estes documentos. Para cada item da ITERS-R é

assinalado o documento que foca aspectos semelhantes, ainda que haja uma correspondência apenas

parcial. Por exemplo, o Decreto-Lei n.º 133-A/97, que regulamenta os estabelecimentos e serviços

privados em que sejam exercidas actividades de apoio social do âmbito da Segurança Social, prevê

que as instituições afixem em local bem visível diversos documentos, entre os quais o regulamento

interno. O item Iniciativas para envolver os pais, da ITERS-R, requer, entre outros indicadores, que os

pais tenham conhecimento da filosofia e abordagens praticadas na creche e haja partilha de

informação entre o pessoal e os pais. Assim, foi assinalada a presença deste item no Decreto-Lei n.º

133-A/97, por se considerar que a afixação dos diversos documentos pode ser uma forma de

comunicar com os pais, apesar de corresponder a apenas uma parte da descrição do item.

Os Guiões Técnicos para a Creche (Rocha et al., 1996) incluem orientações que, de algum

modo, coincidem com aspectos focados igualmente em 17 dos 39 itens da ITERS-R, o que representa

43.6% dos itens da escala. O Despacho Normativo n.º 99/89 inclui aspectos relacionados com 15 dos

39 itens (38.5% dos itens). Estes dois documentos incluem orientações pormenorizadas acerca de

aspectos também focados na ITERS-R, particularmente no que se refere aos itens Espaço interior,

Mobiliário para cuidados de rotina e jogo, Refeições, Mudança de fraldas/idas à sanita, Práticas de

saúde e Práticas de segurança.

Os aspectos que podem ser encontrados na ITERS-R e não são focados pelos Guiões

Técnicos e pelo Despacho Normativo n.º 99/89 relacionam-se principalmente com a linguagem, as

actividades e as interacções. Relativamente às actividades, os Guiões Técnicos, sem darem

orientações específicas, referem que “as actividades prosseguidas (…) asseguram a satisfação das

necessidades físicas, afectivas e cognitivas (…) de modo a que os cuidados prestados respondam não

só à satisfação das suas necessidades e bem-estar, mas também favoreçam o seu desenvolvimento

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Capítulo III

134

integrado” (Rocha et al., 1996, Norma IX). O Despacho Normativo n.º 99/89, Norma XII, refere que as

“diferentes salas deverão estar equipadas, qualitativa e quantitativamente, com o material necessário à

estimulação do desenvolvimento das crianças, de acordo com a sua fase evolutiva.”

São também especificados nos Guiões Técnicos (Rocha et al., 1996) aspectos não focados ou

pouco pormenorizados pela ITERS-R, como as condições gerais de implantação, localização e

instalação, o que inclui especificidades relativas à zona onde se poderá abrir uma creche (e.g., zonas

habitacionais afastadas de área poluídas e ruidosas). É especificado o número de crianças que deveria

pertencer a cada grupo, havendo, porém, uma incongruência no documento, uma vez que a Norma IV

propõe os limites máximos de oito crianças no berçário, 10 a 12 nas salas para crianças entre a

aquisição da marcha e os 24 meses e entre 24 e 36 meses, e a Norma IX propõe os limites máximos

de oito crianças no berçário, 10 crianças na sala para crianças entre a aquisição da marcha e os 24

meses e 15 crianças na sala para crianças entre os 24 e os 36 meses. São especificadas as

dimensões mínimas das salas de actividades e da área de refeições, que dependem do número de

crianças que a frequentam ou podem frequentar (mínimo de 2m2 por criança nas salas de actividades,

sugerindo 2.5m2 para a sala dos 24 aos 36 meses e 0.70m2 por criança na área de refeições).

Relativamente ao mobiliário e equipamento para os cuidados de rotina, é definido o número de

lavatórios e de sanitas, de tamanho adequado às crianças (um lavatório para cada sete crianças e uma

sanita para cada cinco crianças, a partir dos 2 anos de idade). São especificadas, ainda, as condições

físicas da cozinha. Os Guiões Técnicos requerem a existência de uma área destinada às crianças em

situação de doença súbita. Condições semelhantes são descritas no Despacho Normativo n.º 99/89.

No que diz respeito à Chegada e partida das crianças, os Guiões Técnicos explicitam que “as crianças

só poderão ser entregues aos pais ou a alguém devidamente credenciado e registado em ficha no acto

da inscrição” (Norma IX). Descrevem a formação de base requerida para a direcção técnica e o número

de profissionais, de acordo com a sua função (um educador de infância afecto a cada grupo de

crianças, um ou dois elementos auxiliares do pessoal técnico para cada grupo de 10 crianças, um

cozinheiro, empregadas auxiliares). Neste aspecto, a diferença encontrada no Despacho Normativo n.º

99/89, em relação aos Guiões Técnicos, relaciona-se com os educadores de infância, dado que só são

exigidos nas salas para crianças a partir da aquisição da marcha. Os Guiões Técnicos focam ainda os

critérios de prioridade na admissão de crianças, o processo de admissão e a documentação

necessária, bem como outros requisitos de funcionamento, que vão para além dos objectivos da

ITERS-R.

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Enquadramento e objectivos

135

Quadro 2. Correspondência entre os conteúdos dos itens da ITERS-R e da legislação/outros

documentos aplicáveis às creches

Guiões Técnicos13

DN 99/8914

DC 30-06-8615 DL 123/9716

DL 133-A/9717

Port. 149/8818 DL 67/9819 DL 425/9920

DL 379/9721

1. Espaço interior � � � 2. Mobiliário p/ cuidados de rotina e jogo � � 3. Condições para relaxamento e conforto 4. Arranjo da sala � � � 5. Material exposto para as crianças 6. Chegada/partida � 7. Refeições/refeições ligeiras � � � � 8. Sesta � � 9. Mudança de fraldas/idas à sanita � � 10. Práticas de saúde � � � � 11. Práticas de segurança � � � � 12. Ajudar as crianças a compreender a linguagem 13. Ajudar as crianças a usar a linguagem 14. Utilizar livros 15. Motricidade fina 16. Jogo físico activo � � � 17. Arte 18. Música e movimento 19. Blocos 20. Jogo dramático 21. Jogo de areia e água � � � 22. Natureza/ciência 23. Uso de TV, vídeo e/ou computador 24. Promover a aceitação da diversidade 25. Supervisão do jogo e da aprendizagem � 26. Interacção entre pares 27. Interacção adulto-criança 28. Disciplina 29. Horário � � 30. Jogo livre 31. Actividades de grupo 32. Medidas p/ crianças c/ incapacidades � � � 33. Iniciativas para envolver os pais � � � 34. Condições p/ nec. pessoais do pessoal � � 35. Condições p/ nec. prof. do pessoal � � 36. Interacção e cooperação entre o pessoal 37. Continuidade do pessoal 38. Supervisão e avaliação do pessoal 39. Oportunidades p/ desenv. profissional � �

13 Guiões Técnicos para a Creche (Rocha et al., 1996) 14 Despacho Normativo n.º 99/89, de 22 de Outubro de 1989 15 Despacho Conjunto de 30 de Junho de 1986 16 Decreto-Lei n.º 123/97, de 22 de Maio de 1997 17 Decreto-Lei n.º 133-A/97, de 30 de Maio de 1997 18 Portaria n.º 149/88, de 9 de Março de 1988 19 Decreto-Lei n.º 67/98, de 19 de Março de 1998 20 Decreto-Lei n.º 425/99 de 21 de Outubro de 1999 21 Decreto-Lei n.º 379/97, de 27 de Dezembro de 1997

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Capítulo III

136

Tendo em consideração os documentos consultados, verificou-se que são mencionados

conteúdos de 17 itens da ITERS-R, o que corresponde a 43.6% dos itens. Os itens não incluídos são:

Condições para relaxamento e conforto, Material exposto para as crianças, Ajudar a compreender a

linguagem, Ajudar as crianças a usar a linguagem, Utilizar livros, Motricidade fina, Arte, Música e

movimento, Blocos, Jogo dramático, Natureza/ciência, Uso de TV, vídeo e/ou computador, Promover a

aceitação da diversidade, Interacção entre pares, Interacção adulto-criança, Disciplina, Jogo livre,

Actividades de grupo, Interacção e cooperação entre o pessoal, Continuidade do pessoal e Supervisão

e avaliação do pessoal.

Não foram considerados nesta análise os documentos que orientam o pré-escolar, que, em

Portugal, abrange as crianças dos 3 anos até à idade de entrada na escolaridade obrigatória, como o

Despacho conjunto n.º 268/97, do Ministério da Educação e do Ministério da Solidariedade e

Segurança Social (actualmente Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social), a Lei-Quadro da

Educação Pré-escolar (Lei n.º 5/97, de 10 de Fevereiro), as Orientações Curriculares para a Educação

Pré-escolar (Ministério da Educação, 1997) e os Decretos-Lei n.º 240/2001 de 30 de Agosto (Perfis

gerais de competência) e n.º 241/2001 de 30 de Agosto (Perfis gerais de competência dos educadores

e professores do 1º ciclo). O Decreto-Lei n.º 241/2001 refere explicitamente que se dirige aos

educadores de infância do pré-escolar, salvaguardando, contudo, que a formação em educação de

infância habilita para o desempenho de funções em instituições que acolhem crianças até aos 3 anos

de idade.

Os documentos destinados à educação pré-escolar abarcam áreas mais abrangentes e

fornecem orientações mais específicas, do que os documentos destinados à creche. Os Perfis Gerais

de Competência focam aspectos relacionados com 21 itens da ITERS-R, apesar de não fornecerem

orientações pormenorizadas em cada um desses domínios, incluindo, ao contrário dos documentos

para a creche, diversos aspectos relacionados com as actividades específicas a desenvolver, a

linguagem, a interacção, a estrutura do programa e a importância do trabalho em equipa. De salientar

que a diferença não se relaciona tanto com o número de itens abrangidos, como com o tipo de itens.

As Orientações Curriculares para a Educação Pré-escolar (Ministério da Educação, 1997)

abrangem conteúdos semelhantes a grande parte dos itens incluídos na ITERS-R. De facto, apenas

não se encontram nas Orientações Curriculares conteúdos que correspondam ao conteúdo dos itens

Condições para relaxamento e conforto, Sesta, Condições para satisfazer as necessidades pessoais do

pessoal e Condições para satisfazer as necessidades profissionais do pessoal. Nas orientações

Curriculares são dadas orientações relativas a aspectos focados também pelos itens Refeições,

Fraldas/idas à sanita e Supervisão do jogo e da aprendizagem, mas com um objectivo algo diferente,

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Enquadramento e objectivos

137

uma vez que não se trata de regulamentar as práticas desenvolvidas nestes domínios, mas de orientar

os profissionais no sentido de promoverem a autonomia das crianças e a educação para a saúde e no

sentido de observarem permanentemente as crianças de modo a poderem adequar mais eficazmente a

sua prática.

A situação descrita não será independente da valorização do jardim-de-infância pela sua

função educativa, dependente do Ministério da Educação, e da creche pela sua função de guarda,

dependente do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, como já foi referido. É de salientar a

importância atribuída, pelos documentos destinados à creche, a aspectos relacionados com o espaço e

as rotinas e, nos documentos para o pré-escolar, às actividades, interacções e linguagem.

Os dados recolhidos nesta análise prévia sugerem a existência de uma correspondência

parcial entre os conteúdos da ITERS-R e as regulamentações nacionais, fundamentando, numa

primeira abordagem, a sua utilização no contexto deste estudo.

Tendo em conta os factores enunciados, o grande objectivo desta investigação é contribuir

para o estudo da qualidade das creches em Portugal, abrangendo os seguintes objectivos específicos:

1) estudar as características métricas dos dados recolhidos através da ITERS-R e descrever a

qualidade das creches do distrito do Porto;

2) identificar as características da creche valorizadas por pais e por educadores de

infância/auxiliares de educação;

3) determinar em que medida os pais e os educadores de infância/auxiliares de educação

valorizam os critérios de qualidade incluídos na ITERS-R;

4) determinar que avaliação os pais fazem da creche que os filhos frequentam;

5) determinar que avaliação os educadores de infância/auxiliares de educação fazem da creche

onde trabalham;

6) investigar a associação entre as ideias dos pais e dos educadores de infância/auxiliares de

educação acerca da creche e características sociodemográficas;

7) investigar a associação entre os critérios valorizados pelos pais e pelos educadores de

infância/auxiliares de educação e a avaliação que efectuam da creche;

8) comparar a avaliação efectuada por pais, educadores de infância/auxiliares de educação e

observadores externos.

Para nortear o estudo empírico, no sentido de se alcançarem os objectivos definidos, foram

definidas questões de investigação, que se apresentam seguidamente:

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Capítulo III

138

1. Os dados obtidos com o instrumento ITERS-R revelam fidelidade, validade e sensibilidade?

2. Qual a qualidade das salas de creche em Portugal (distrito do Porto)?

3. Como é que os pais avaliam a qualidade da creche dos seus filhos?

3.1 Que critérios de qualidade são valorizados pelos pais de crianças em idade de creche?

3.2 Que importância atribuem aos critérios incluídos na ITERS-R?

3.3 Como avaliam a creche que os filhos frequentam, ao nível dos critérios incluídos na ITERS-R?

3.4 Que variáveis estão associadas à importância atribuída aos critérios e à avaliação que fazem

da creche?

3.5 Há alguma relação entre a importância que atribuem aos critérios e a avaliação que fazem da

qualidade da creche?

4. Como é que os educadores de infância/auxiliares de educação avaliam a qualidade da creche

onde trabalham?

4.1 Que critérios de qualidade são valorizados pelos educadores de infância/auxiliares de

educação da creche?

4.2 Que importância atribuem aos critérios incluídos na ITERS-R?

4.3 Como avaliam a creche onde trabalham, ao nível dos critérios incluídos na ITERS-R?

4.4 Que variáveis estão associadas à importância atribuída aos critérios e à avaliação que fazem

da creche?

4.5 Há alguma relação entre a importância que atribuem aos critérios e a avaliação que fazem da

qualidade da creche?

5. Os pais e os educadores valorizam os mesmos critérios de qualidade?

5.1 Pais e educadores de infância/auxiliares de educação valorizam os mesmos critérios de

qualidade e utilizam os mesmos critérios para descrever uma creche de boa/má qualidade?

5.2 Há diferenças na importância atribuída pelos pais e pelos educadores de infância/auxiliares de

educação aos critérios incluídos na ITERS-R ?

6. Em que medida os observadores externos, os pais e os educadores de infância/auxiliares de

educação avaliam ou não de forma diferente as mesmas creches?

6.1 Há diferenças na avaliação efectuada por observadores e por pais?

6.2 Há diferenças na avaliação efectuada por observadores e por educadores?

6.3 Há diferenças na avaliação efectuada por pais e por educadores de infância/auxiliares de

educação?

6.4 Há alguma associação entre a avaliação efectuada por observadores, pais e educadores de

infância/auxiliares de educação?

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Enquadramento e objectivos

139

Tendo como base os objectivos e questões de investigação definidos, bem como os resultados da

pesquisa bibliográfica efectuada, foram formuladas algumas hipóteses de investigação:

1. as salas para crianças entre 1 - 2 anos revelam qualidade inferior às salas para crianças entre

2 - 3 anos;

2. as salas com menos crianças por adulto revelam qualidade mais elevada;

3. as salas orientadas por profissionais com formação em Educação de Infância revelam

qualidade superior às salas orientadas por auxiliares de educação;

4. os critérios de qualidade que os pais e os educadores de infância/auxiliares de educação mais

valorizam são os que se relacionam com aspectos de saúde, incluindo higiene e alimentação, e

de interacção;

5. os pais e os educadores de infância/auxiliares de educação avaliam de forma positiva a

qualidade das creches;

6. os pais de nível educativo mais baixo avaliam a creche de forma mais positiva, não havendo

associação entre a avaliação da creche efectuada pelos pais e o rendimento do agregado

familiar;

7. os educadores de infância/auxiliares de educação com menos formação avaliam mais

positivamente a creche onde trabalham;

8. os pais e os educadores de infância/auxiliares de educação efectuam avaliações mais

elevadas nos itens que mais valorizam;

9. os pais e os educadores de infância/auxiliares de educação efectuam avaliações da qualidade

da creche mais elevadas do que os observadores externos;

10. os pais efectuam avaliações da qualidade da creche mais elevadas que os educadores de

infância/auxiliares de educação.

De modo a dar resposta às questões formuladas e a verificar as hipóteses definidas foi

desenvolvido o estudo empírico que seguidamente descrevemos.

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CAPITULO IV: Método

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143

1. Participantes

Participaram neste estudo 160 creches, 110 pais e 110 responsáveis por salas de creche. Em

cada creche foi observada apenas uma sala. As salas de creche observadas abrangiam, no total, 2070

crianças e 323 adultos.

1.1 Caracterização das instituições e das salas

A partir da listagem de creches do distrito do Porto, disponibilizada pela Direcção-Geral de

Estudos, Estatística e Planeamento do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, foram

seleccionadas aleatoriamente 160 creches. Foi utilizado o método de amostragem estratificada, de

forma a serem seleccionadas 80 creches de Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS) e

80 creches de instituições com fins lucrativos. Após a selecção, foram enviadas cartas aos directores

das instituições, explicando os objectivos do estudo e solicitando a sua colaboração. Seguidamente os

directores foram contactados por telefone, de forma a obter informação acerca da disponibilidade e

interesse em participar no estudo.

No sentido de se obter a participação de 80 creches de IPSS foram contactadas 83, sendo,

portanto, a taxa de participação de 96.38%. As três creches que recusaram participar apontaram como

principal motivo o facto de terem outros pedidos de colaboração. Para obter a colaboração de 80

creches com fins lucrativos foram contactadas 116, sendo a taxa de participação de 68.97%. As razões

apresentadas para não participar no estudo foram várias, entre as quais o facto de terem outros

estudos ou estágios a decorrer na instituição. Várias creches informaram apenas que não estavam

interessadas e houve uma que apresentou como justificação a recusa por parte dos pais de terem

alguém externo à instituição na sala dos filhos. O facto de ter havido recusas, principalmente no que se

refere às creches com fins lucrativos, pode ter causado algum efeito de auto-selecção. Relativamente

às creches que recusaram participar, a única informação recolhida foi o motivo para não participarem.

Tal como se referiu, em cada creche foi observada apenas uma sala, num total de 65 salas

para crianças com idades compreendidas entre 1 e 2 anos, 80 salas para crianças com idades

compreendidas entre 2 e 3 anos e 15 salas para crianças com idades compreendidas entre 1 e 3 anos.

Como pode ser verificado no Quadro 3, o número de crianças em cada sala variou entre 4 e 30 e o

número de adultos variou entre 1 e 5. O rácio adulto:criança variou entre 1:2 e 1:17.

Os directores das instituições participantes tinham diferentes níveis de formação. Cinquenta e

nove directores (36.88%) tinham licenciatura em Educação de Infância, 67 (41.88%) tinham licenciatura

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Capítulo IV

144

noutra área, 11 (6.88%) tinham concluído o ensino secundário e 21 (13.13%) tinham menos do que o

ensino secundário. Não foi possível obter esta informação acerca de dois directores. A idade dos

directores variava entre 24 e 83 anos (M = 45.97, DP = 11.97) e a experiência como director variava

entre 1 mês e 40 anos (M = 10.69, DP = 8.19).

A pessoa responsável pela sala (que designaremos por educador e que é assumida neste

estudo como o adulto que assegura todo ou a maior parte do trabalho directo realizado na sala, mesmo

que oficialmente o responsável seja outra pessoa) era educador de infância em 132 destas salas e

auxiliar de educação em 28. Os responsáveis pelas salas tinham entre 5 e 18 anos de educação formal

(M = 14.88, DP = 2.41). Os auxiliares de educação frequentaram em média 10.33 anos de escolaridade

(DP = 2.81) e os educadores de infância tinham bacharelato (n = 32), licenciatura (n = 97) ou pós-

graduação (n = 3). A idade dos profissionais variou entre 21 e 52 anos (M = 32.27, DP = 6.93) e a

experiência no trabalho com crianças variou entre 2 meses e 32 anos (M = 8.09, DP = 6.66). No

conjunto das 160 salas havia apenas uma com educador de infância do género masculino.

Quadro 3. Características estruturais das salas

n M DP Min. - Máx.

Tamanho do grupo N = 160 12.94 4.62 4-30 N = 110 12.48 4.06 4-24

N.º de adultos N = 160 2.02 0.76 1 - 5 N = 110 2.06 0.75 1 - 5

N.º de crianças por adulto

N = 160 6.97 2.82 2-17

N = 110 6.61 2.63 2-15 N.º de salas por faixa etária

N = 160 1 – 2 anos 65 2 – 3 anos 80 1 – 3 anos 15

N = 110 1 – 2 anos 56 2 – 3 anos 54 1 – 3 anos 0

As 160 salas descritas foram observadas com o objectivo de se estudarem as características

métricas dos dados obtidos com a Escala de Avaliação do Ambiente de Creche (ITERS-R). As análises

principais do estudo foram efectuadas com os dados obtidos em 110 salas, sendo 55 de instituições

com fins lucrativos e 55 de IPSS. Estas creches correspondem às primeiras 110 que foram

seleccionadas, seguindo o procedimento já relatado.

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Método

145

Relativamente aos directores destas 110 creches, 42 (38.2%) eram educadores de infância, 45

(40.9%) tinham licenciatura noutra área, 7 (6.4%) tinham completado o ensino secundário e 16 (14.5%)

tinham menos do que o ensino secundário completo. A sua idade variava entre 27 e 75 anos (M =

45.55, DP = 11.88) e a experiência como director variava entre meio ano e 40 anos (M = 10.45, DP =

7.94). Em cada tipo de instituição (IPSS ou instituição lucrativa) foram observadas 28 salas de 1 – 2

anos e 27 salas 2 – 3 anos. Assim, na primeira IPSS que concedeu autorização foi observada a sala 1

– 2 anos, na segunda creche a sala 2 – 3 anos, na terceira a sala 1 – 2 anos e assim sucessivamente.

O mesmo aconteceu relativamente às creches com fins lucrativos. Como pode ser verificado no Quadro

3, o número de crianças em cada sala variou entre 4 e 24 e o número de adultos variou entre 1 e 5. O

rácio adulto:criança variou entre 1:2 e 1:15. As 110 salas englobavam na sua totalidade 1373 crianças

e 227 adultos. Os responsáveis pelas salas observadas nestas creches participaram de forma mais

activa neste estudo e serão descritos de seguida.

1.2 Caracterização dos educadores

Participaram neste estudo 110 responsáveis pelas salas observadas. Em 89 salas os

responsáveis eram educadores de infância com bacharelato (n = 24), licenciatura (n = 63) ou pós-

graduações (n = 2) e em 21 salas eram auxiliares de educação, cuja educação formal variava entre 5 e

13 anos (M = 9.57, DP = 2.44). Das auxiliares de educação apenas uma tinha realizado um curso

profissional para auxiliares de educação. Entre os educadores de infância havia apenas um do sexo

masculino e todos os auxiliares eram do sexo feminino. As informações relativas aos 110 educadores

constam do Quadro 4.

Quadro 4. Variáveis sociodemográficas dos educadores

M DP Min. - Máx.

Anos de educação formal 14.61 2.73 5 – 18

Anos de experiência 7.42 5.77 0.16 – 23.00

Idade 31.49 6.44 21 – 48

Salário líquido mensal (euros) 716.88 227.96 300.00 – 1300.00

Apenas os educadores das primeiras 10 salas de IPSS e 10 salas de instituições com fins

lucrativos participaram na parte mais qualitativa deste estudo. Eram todos do sexo feminino. Destas

educadoras, 15 eram educadoras de infância e 5 auxiliares de educação. As educadoras de infância

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Capítulo IV

146

tinham bacharelato (n = 1), licenciatura (n = 12) ou pós-graduações (n = 2). As auxiliares de educação

tinham em média 10 anos de escolaridade (DP = 2.12), variando entre 7 e 12 anos. A idade das

educadoras variava entre 23 e 48 anos (M = 32.20 anos, DP = 7.52) e a sua experiência na área da

educação de crianças em creche ou jardim-de-infância variava entre 1 e 23 anos (M = 7.01, DP = 6.25).

O salário mensal médio era de 667.20 euros (DP = 202.97), variando entre 400 e 1025 euros.

1.3 Caracterização dos pais

Participaram neste estudo 110 pais, um de cada sala de creche. De modo a seleccionar os

pais participantes, foram utilizadas listas de números aleatórios para ordenar as crianças de cada sala.

Os pais da primeira criança seleccionada em cada sala foram contactados pelo educador no sentido de

se obter a sua colaboração. Foi-lhes dada a possibilidade de decidirem se seria a mãe ou o pai a

participar no estudo. Nos casos em que os pais da primeira criança seleccionada recusaram participar,

foram contactados os da segunda criança e assim sucessivamente. Devido às recusas de alguns pais,

de modo a obter a participação de 110 pais foram contactados 171, o que representa uma taxa de

participação de 64%.

Quadro 5. Características dos pais participantes

M DP Min. - Máx.

Idade 32.31 5.04 18 - 43

Rendimento mensal do agregado (euros) 1803.01 1048.45 0 – 7000

Educação formal (anos) 12.78 4.41 4 - 22

Dos 110 participantes, 98 (89.1%) eram mães e 12 eram pais. A idade média dos pais variava

entre 18 e 43 anos (M = 32.31, DP = 5.04). Os pais participantes tinham entre 4 e 22 anos de educação

formal (M = 12.78, DP = 4.41), sendo que 47.3% tinham o Ensino Superior ou efectuaram estudos pós-

graduados, 40% tinham entre o 7.º e o 12.º ano de escolaridade e 12.7% tinham menos do que o 7.º

ano de escolaridade. Os rendimentos mensais líquidos auferidos pelo agregado familiar variavam entre

zero e 7000 euros (M = 1803.01, DP = 1048.45). Cento e dois pais estavam casados ou em união de

facto (92.7%), 5 pais eram solteiros (4.50%) e 3 pais eram divorciados (1.9%) (ver Quadro 5).

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Método

147

Participaram no estudo qualitativo 20 pais, também das primeiras 10 IPSS e 10 instituições

com fins lucrativos seleccionadas para o estudo mais abrangente e que aceitaram participar.

Dezassete participantes eram mães e 3 eram pais. Todos eram casados ou viviam em união

de facto. Estes pais tinham em média 12.05 anos de escolaridade (DP = 4.51), variando entre 6 e 19

anos. A idade dos pais variava entre 25 e 40 anos (M = 33.40 anos, DP = 4.11). Os rendimentos

mensais do agregado familiar variavam entre 600 e 3750 euros mensais (M = 1743.00, DP = 770.02).

2. Instrumentos

2.1 Qualidade das salas de creche avaliada por observadores externos

Os observadores externos avaliaram a qualidade das salas de creche, utilizando (1) a Escala

de Avaliação do Ambiente de Creche - ITERS-R (Harms et al., 2003), (2) o Registo do Envolvimento de

Grupo - Check II (McWilliam, 1998) e (3) uma grelha de registo de características estruturais da

creche/sala.

2.1.1 Escala de Avaliação do Ambiente de Creche – ITERS-R

A ITERS-R é a versão revista da ITERS - Infant/Toddler Environment Rating Scale (Harms et

al., 1990). A primeira edição da ITERS resultou de uma adaptação da Early Childhood Environment

Rating Scale - ECERS (Harms & Clifford, 1980) e da Family Daycare Rating Scale – FDCRS (Harms &

Clifford, 1989), tendo sido concebida para permitir uma avaliação global da qualidade de centros

educativos para crianças com menos de 30 meses de idade. Foi utilizada a versão portuguesa da

escala, elaborada no âmbito deste trabalho.

Os autores da ITERS-R basearam-se em três fontes principais, para o seu desenvolvimento:

(1) evidências da investigação de várias áreas relevantes (saúde, desenvolvimento e educação), (2)

perspectivas dos profissionais acerca das melhores práticas e (3) constrangimentos da vida real nos

contextos de educação e cuidados para crianças (Harms et al., 2003). Os requisitos da ITERS-R

baseiam-se naquilo que estas fontes indicam como sendo condições importantes para obter resultados

positivos ao nível do desenvolvimento das crianças.

Esta escala é constituída por 39 itens, que se encontram agrupados em 7 áreas ou subescalas:

Espaço e mobiliário, Rotinas de cuidados pessoais, Escuta e conversação, Actividades, Interacção,

Estrutura do programa e Pais e pessoal. Os itens, distribuídos pelas respectivas subescalas,

encontram-se representados no Quadro 6.

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Capítulo IV

148

Quadro 6. Subescalas e itens da ITERS-R

Subescalas Itens

I. Espaço e mobiliário

1. Espaço interior 2. Mobiliário para cuidados de rotina e jogo 3. Condições para relaxamento e conforto 4. Arranjo da sala 5. Material exposto para as crianças

II. Rotinas de cuidados pessoais

6. Chegada/ partida 7. Refeições/ refeições ligeiras 8. Sesta 9. Mudança de fraldas/idas à sanita 10. Práticas de saúde 11. Práticas de segurança

III. Escuta e conversação

12. Ajudar as crianças a compreender a linguagem 13. Ajudar as crianças a usar a linguagem 14. Utilizar livros

IV. Actividades

15. Motricidade fina 16. Jogo físico activo 17. Arte 18. Música e movimento 19. Blocos 20. Jogo dramático 21. Jogo de areia e água 22. Natureza/ciência 23. Uso de TV, vídeo e/ou computador 24. Promover a aceitação da diversidade

V. Interacção

25. Supervisão do jogo e da aprendizagem 26. Interacção entre pares 27. Interacção adulto-criança 28. Disciplina

VI. Estrutura do programa 29. Horário 30. Jogo livre 31. Actividades de grupo 32. Medidas para crianças com incapacidades

VII. Pais e pessoal

33. Iniciativas para envolver os pais 34. Condições para satisfazer as necessidades pessoais do pessoal 35. Condições para satisfazer as necessidades profissionais do pessoal 36. Interacção e cooperação entre o pessoal 37. Continuidade do pessoal 38. Supervisão e avaliação do pessoal 39. Oportunidades para desenvolvimento profissional

Cada item (ver exemplo na Figura 1) é apresentado numa escala de 7 pontos, com descritores

ou indicadores para 1 (inadequado), 3 (mínimo), 5 (bom) e 7 (excelente). Inadequado descreve

serviços que não satisfazem as necessidades relacionadas com cuidados básicos de guarda; mínimo

descreve serviços que dão resposta a necessidades de guarda e, em pequeno grau, a necessidades

de desenvolvimento básicas; bom descreve dimensões básicas de cuidados de carácter

desenvolvimental; e excelente descreve cuidados personalizados de elevada qualidade (Pinto & Grego,

1994). As cotações de inadequado (1) e mínimo (3) geralmente correspondem à provisão de materiais

básicos e precauções de saúde e segurança; as cotações de bom (5) e excelente (7) requerem

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Método

149

interacção positiva, planeamento e cuidados personalizados, bem como bons materiais (Harms et al.,

1990). Na folha de cotação, deve ser assinalado se cada indicador se verifica ou não na sala ou creche

que está a ser observada, sendo, portanto, assinalado Sim (S) se esse indicador é verdadeiro para a

situação observada e Não (N) se o indicador não é verdadeiro. Os autores sugerem que, para cada

indicador, o observador pergunte a si mesmo: “Isto é verdadeiro ou não?” (Harms et al., 1990).

Para cotar cada item, o observador deve começar a ler e a preencher os indicadores da

cotação 1. Esta cotação é dada se qualquer um dos indicadores de 1 estiver presente, ou seja, se for

assinalado o Sim. Uma cotação de 3 é atribuída quando todos os indicadores de 1 são cotados Não, ou

seja, não estão presentes, e todos os indicadores da cotação 3 estão presentes. As cotações de 5 e 7

são dadas quando todos os requisitos destas cotações e das inferiores estão presentes e todos os

indicadores de 1 são cotados Não. As cotações 4 e 6 são aplicadas quando os indicadores da cotação

imediatamente inferior estão todos presentes, mas da pontuação imediatamente superior apenas são

preenchidos em parte (pelo menos metade dos indicadores). A partir do momento em que o observador

tem informação suficiente para cotar o item, não é necessário verificar os indicadores das cotações

superiores. Por exemplo, se houver algum indicador da cotação 1 assinalado com Sim, a cotação será

1 e, portanto, não é necessário verificar se há indicadores de 3, 5 ou 7 preenchidos pela sala ou

creche. É possível, contudo, efectuar uma cotação considerada “alternativa” pelos autores da escala

(Harms et al., 1990), continuando a cotar os indicadores para além do nível de qualidade atribuído ao

item. Dito por outras palavras, utilizando o sistema de cotação acima descrito, os indicadores apenas

são lidos e assinalados até que se atinja a cotação da qualidade para aquele item. Para fins de

investigação ou melhoria do programa, pode ser pertinente adquirir informação adicional das áreas

fortes para além da cotação do nível de qualidade e, nesse caso, o observador deve continuar a cotar

todos os indicadores do item. Quando se opta pela cotação alternativa e todos os indicadores são

cotados, o tempo de observação requerido precisa de ser consideravelmente prolongado. Para

completar todos os indicadores, serão necessários (1) uma observação de aproximadamente 3 horas e

meia ou 4 horas e (2) um período de aproximadamente 45 minutos para colocar questões à pessoa

responsável pela sala (Harms et al., 1990).

É possível atribuir a cotação NA (Não Aplicável) aos itens Jogo de areia e água (se todas as

crianças da sala tiverem menos de 18 meses de idade), Uso de TV, vídeo e/ou computador (se não são

utilizados), Actividades de grupo (se não são utilizadas actividades em grupo preparadas pelo

educador), Medidas para crianças com incapacidades (se não houver crianças com incapacidades na

sala) e Interacção e cooperação entre o pessoal (se houver apenas um adulto com o grupo de

crianças).

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Capítulo IV

150

Figura 1. Exemplo de um item da Escala de Avaliação do Ambiente de Creche

Inadequado Mínimo Bom Excelente 1 2 3 4 5 6 7

INTERACÇÃO

26. Interacção entre pares

1.1. Pouca ou nenhuma possibilidade de interacção apropriada entre pares (e.g.: crianças separadas em berços, baloiços ou cadeiras altas quando acordadas; espaços pequenos com muitas crianças e poucos brinquedos). 1.2. Interacção negativa entre pares ignorada ou encarada de uma forma rude.

3.1. A interacção entre os pares é possível em grande parte do dia (e.g.: os bebés que não andam podem brincar, com supervisão, perto dos outros; as crianças podem formar grupos naturais). 3.2. O pessoal geralmente pára as interacções negativas entre pares (e.g.: quando estão a bater, morder ou disputar brinquedos).

5.1. O pessoal facilita interacções positivas entre pares, com todas as crianças (e.g.: coloca os bebés onde eles podem observar e reagir aos outros; ajuda as crianças a encontrar brinquedos em duplicado; inclui crianças com incapacidades em brincadeiras com outros). 5.2. O pessoal modela interacção social positiva (e.g., caloroso e afectuoso; utiliza o toque suave, é delicado com as crianças e não “mandão”).

7.1. O pessoal explica as acções, as intenções e os sentimentos das crianças às outras crianças (e.g.: ajuda as crianças a reconhecer expressões faciais de alegria ou tristeza, explica que a outra criança não tinha a intenção de magoar; reforça a criança por encontrar um brinquedo duplicado). 7.2. O pessoal assinala e fala sobre exemplos de interacção social positiva entre crianças ou entre adultos e crianças (e.g.: ajuda as crianças a reparar no consolo/ conforto; sorri e fala com o bebé que repara nas outras crianças; reforça as crianças de 2 anos por trabalharem juntas).

Os autores da escala efectuaram estudos no sentido de verificarem as características de

fidelidade e validade dos dados recolhidos com o instrumento. Foram encontrados bons índices de

fidelidade, tendo sido obtidos acordos interobservadores médios de 83% ao nível dos itens (com um

ponto de diferença) e os valores do coeficiente kappa ponderado com média de .58 (Harms et al.,

2003). Ao nível da cotação global da escala e das subescalas, foram encontrados valores do

coeficiente de correlação intraclasses de .92 para a escala global e entre .67 e .92 para as subescalas

(coeficiente alfa de .73, .67, .77, .91, .78, .87, .92, .92, .92, respectivamente). Foi também analisada a

consistência interna para a escola global e para cada uma das subescalas. O valor do coeficiente alfa

de Cronbach para a escala global foi de .93 e para as subescalas variou entre .47 e .93.

Os resultados do estudo da aplicação desta escala às creches portuguesas (distrito do Porto),

considerando as observações efectuadas em 160 salas, podem ser consultados no Capítulo V (Estudo

e adaptação do instrumento ITERS-R). Relativamente às 110 salas, que constituem a amostra principal

deste estudo, foram obtidos valores adequados de consistência interna. Alguns itens da ITERS-R

podem ser cotados como Não Aplicável, o que traz algumas dificuldades ao nível da análise da

consistência interna, uma vez que constituem dados omissos. Quando se calculou o coeficiente alfa de

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Método

151

Cronbach incluindo todos os itens, o SPSS automaticamente excluiu 107 participantes da análise

(aqueles que apresentavam dados omissos em algum item). Tendo em consideração este facto, o

coeficiente alfa de Cronbach foi calculado para 38 itens, excluindo o item 32 (Medidas para crianças

com incapacidades), que era aquele que apresentava mais valores omissos, e para 34 itens, excluindo

todos os itens com valores omissos, que eram o 21 (Jogo de areia e água), o 23 (Uso de TV, vídeo

e/ou computador), o 31 (Actividades de grupo), o 32 (Medidas para crianças com incapacidades) e o 36

(Interacção e cooperação entre o pessoal). O coeficiente alfa de Cronbach foi de .80 quando calculado

para 38 itens e .82 quando calculado para os 34 itens. Estes valores indicam que a escala avalia, com

grande probabilidade, um único constructo.

Quadro 7. Coeficiente alfa de Cronbach de cada uma das subescalas

N

Número de itens

α

I. Espaço e mobiliário 110 5 .40

II. Rotinas de cuidados pessoais 110 6 .33

III. Escuta e conversação 110 3 .67 IV. Actividades 65 10 .54 Actividades sem itens 21 e 23 110 8 .55

V. Interacção 110 4 .79

VI. Estrutura do programa 8 4 .50

Estrutura do programa sem item 32 84 3 .10

Estrutura do programa sem itens 31 e 32 110 2 .35

VII. Pais e pessoal 93 7 .48

Pais e pessoal sem item 36 110 6 .53

Foi calculada ainda a consistência interna de cada uma das subescalas (Quadro 7), tendo o

coeficiente alfa de Cronbach variado entre .10 na subescala 6 (Estrutura do programa), quando

excluindo apenas o item 32, e .79 na subescala 5 (Interacção). Estes resultados suscitam a

necessidade de ter precaução quando se efectuam análises ao nível das subescalas.

2.1.2 Registo do Envolvimento de Grupo - Check II

O Registo do Envolvimento de Grupo - Engagement Check II (McWilliam, 1998) é uma

modificação do Planned Activity Check (Risley & Cataldo, 1973 como citados em Raspa, McWilliam, &

Ridley, 2001). Este instrumento é utilizado para avaliar o envolvimento de grupo, constituindo um

indicador da qualidade do programa da creche. Determina a percentagem de crianças envolvidas

durante as actividades da sala e tem sido referido como um instrumento válido de avaliação da

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Capítulo IV

152

qualidade (Ridley, McWilliam, & Oates, 2000).

O envolvimento tem sido definido como atenção a ou participação activa nas actividades da

sala, manifestando-se através do olhar fixo, da manipulação, da vocalização, da aproximação ou da

expressão afectiva (Raspa et al., 2001, pp. 215-216). É necessário que o comportamento seja

simultaneamente adequado ao desenvolvimento (adequado à idade desenvolvimental e competências

da criança) e adequado ao contexto (adequado à actividade que está a ser levada a cabo e de acordo

com as expectativas da situação). A codificação do envolvimento do grupo consiste em contar o

número de crianças visíveis numa passagem/momento e depois contar o número de crianças não

envolvidas (vagueando, chorando, lutando) numa segunda passagem. A partir daqui, é calculada a

percentagem de crianças envolvidas em cada observação. O resultado da sessão consiste na média

dos resultados das observações realizadas numa sessão. Para fins de investigação, as verificações

devem ser efectuadas a cada 15 segundos durante 15 minutos, totalizando 60 observações por

sessão. A duração de cada sessão de observação foi determinada por um estudo realizado por

McWilliam e Ware (1994). O número de sessões foi determinado com base num estudo prévio

realizado por Barros, Aguiar, Pinto, Mascarenhas e Bairrão (2005), no âmbito do projecto de

investigação “Qualidade das interacções da criança em contexto familiar e de creche e o seu impacto

no seu desenvolvimento sócio-cognitivo”, no qual se verificou que duas sessões de observação de 15

minutos seriam suficientes para se obter um coeficiente intraclasses superior a .80.

2.1.3 Grelha de registo de características estruturais da creche e da sala

Foi elaborada uma grelha para facilitar o registo das características estruturais das salas e das

creches consideradas importantes para este estudo: tamanho do grupo, número de adultos na sala,

tipo de instituição (IPSS ou lucrativo), faixa etária da sala (para crianças de 1-2 anos, 2-3 anos ou 1-3

anos) e formação (grau de ensino) do responsável pela sala.

2.2 Critérios de qualidade valorizados por pais e educadores

De forma a recolher as opiniões dos pais e dos educadores sobre os critérios de qualidade

importantes numa creche, foram elaborados (1) guiões de entrevistas semi-estruturadas para pais e

para educadores e (2) questionários para pais e para educadores.

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Método

153

2.2.1 Entrevista semi-estruturada

Foi elaborado um guião de entrevista semi-estruturada para administrar a pais e educadores,

no sentido de determinar, de uma forma exploratória, que características valorizam numa creche. Na

pilotagem destas entrevistas foram colocadas questões que permitiriam aperfeiçoar o seu guião.

Verificou-se que, mesmo nas questões que não focavam directamente a definição de uma creche de

boa ou má qualidade, como por exemplo “Que razões o levaram a escolher esta creche?”, se obtinham

informações importantes acerca daquele assunto. Portanto, decidimos manter todas as questões no

referido guião.

No guião final da entrevista para os pais, utilizado para a recolha de dados, constavam as

seguintes questões:

1. Que razões a(o) levaram a colocar o(a) seu(sua) filho(a) na creche?

2. Quais são os objectivos de uma creche?

3. Que razões o levaram a escolher esta creche?

4. Que informações tinha sobre esta creche?

5. Na sua opinião quais são as características mais importantes de uma boa creche?

6. Descreva o mais pormenorizadamente possível uma boa sala de creche.

7. Descreva o mais pormenorizadamente possível uma sala de creche de má qualidade.

8. Qual é a sua opinião acerca da qualidade desta creche?

9. O que gostaria que fosse diferente?

No guião final da entrevista para os educadores constavam as seguintes questões:

1. Quais são os objectivos de uma creche?

2. Na sua opinião quais são as características mais importantes de uma boa creche?

3. Descreva o mais pormenorizadamente possível uma boa sala de creche.

4. Descreva o mais pormenorizadamente possível uma sala de creche de má qualidade.

5. Qual é a sua opinião acerca da qualidade desta creche?

6. O que gostaria que fosse diferente?

2.2.2 Questionários sobre Importância dos Itens da ITERS-R para Pais e para

Educadores

Os Questionários sobre Importância dos Itens da ITERS-R para Pais e para Educadores foram

elaborados com base na ITERS-R, sendo constituídos por 39 itens (ver Quadro 9). O nome dos itens é

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Capítulo IV

154

semelhante ao atribuído pela ITERS-R, tendo sido seleccionados indicadores que ilustram em que

consiste cada um deles. Foram introduzidas pequenas alterações na designação dos itens, no sentido

de a linguagem ser mais acessível a todos os pais. O mesmo sucedeu em relação aos indicadores

seleccionados para ilustrar cada item.

Os pais e os educadores são convidados a indicar de 1 a 5 (1 = nada importante; 3 = mais ou

menos; 5 = muito importante) que importância atribuem a cada item, tal como se apresenta definido no

questionário (ver exemplo na Figura 2). A questão colocada aos pais é: Em que medida acha

importante para o(a) seu(sua) filho(a)? A questão colocada aos educadores é: Em que medida acha

importante para as crianças?

O valor do coeficiente alfa de Cronbach, tendo em conta os 39 itens, foi de .94 no Questionário

sobre Importância dos Itens da ITERS-R para Pais e de .88 no Questionários sobre Importância dos

Itens da ITERS-R para Educadores. Estes valores podem ser considerados adequados. Não foram

identificados itens que, sendo eliminados, alterassem o valor da consistência interna. Ao serem

considerados apenas os 34 itens, utilizados em grande parte das análises deste estudo, o valor do

coeficiente alfa de Cronbach descia para .93 no caso dos questionários efectuados aos pais e para .86

no caso dos questionários efectuados aos educadores. Os itens foram agrupados de acordo com as

categorias da ITERS-R (subescalas), sendo os valores de consistência interna apresentados no

Quadro 8.

Quadro 8. Coeficiente alfa de Cronbach das subescalas dos Questionários sobre Importância dos

Itens da ITERS-R

Pais Educadores

N Número de itens

α N Número de itens

α

I. Espaço e mobiliário 109 5 .70 109 5 .65

II. Rotinas de cuidados pessoais 107 6 .84 110 6 .48

III. Escuta e conversação 107 3 .40 110 3 .31

IV. Actividades 105 9 .82 110 9 .83

V. Interacção 109 4 .75 110 4 .55

VI. Estrutura do programa 100 4 .72 105 4 .64

VII. Pais e pessoal 108 7 .89 109 7 .71

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Método

155

2.3 Qualidade das salas de creche avaliada por pais e educadores

2.3.1 Questionários de Avaliação do Ambiente de Creche para Pais e para Educadores

Os Questionários de Avaliação do Ambiente de Creche para Pais e os Questionários de

Avaliação do Ambiente de Creche para Educadores foram elaborados com base na ITERS-R, sendo

constituídos por 39 itens (ver Quadro 9).

Quadro 9. Itens dos Questionários sobre Importância dos Itens da ITERS-R e de Avaliação do

Ambiente de Creche para Pais e para Educadores

1. Espaço interior 2. Mobiliário para cuidados de rotina e jogo 3. Condições para relaxamento e conforto 4. Arranjo da sala 5. Material exposto para as crianças 6. Chegada/ partida 7. Refeições/ refeições ligeiras 8. Sesta 9. Mudança de fraldas/idas à sanita 10. Práticas de saúde 11. Práticas de segurança 12. Ajudar as crianças a compreender a linguagem 13. Ajudar as crianças a usar a linguagem 14. Utilizar livros 15. Motricidade fina 16. Jogo físico activo 17. Arte para crianças com mais de 12 meses 18. Música e movimento 19. Blocos para fazer construções 20. Jogo dramático (faz-de-conta) 21. Jogo de areia e água para crianças com mais de 18

meses

22. Natureza/ciência 23. Uso de TV, vídeo e/ ou computador 24. Promover a aceitação da diversidade 25. Supervisão do jogo e da aprendizagem 26. Interacção entre as crianças 27. Interacção adulto-criança 28. Disciplina 29. Horário 30. Jogo livre 31. Actividades de grupo 32. Medidas para crianças com incapacidades 33. Iniciativas para envolver os pais 34. Condições para satisfazer as necessidades pessoais

dos educadores 34. Condições para satisfazer as necessidades

profissionais dos educadores 36. Interacção e cooperação entre os educadores 37. Continuidade dos educadores 38. Supervisão e avaliação dos educadores 39. Oportunidades para desenvolvimento profissional

Nos questionários, é solicitado aos pais e aos educadores que indiquem de 1 a 7 como está a

sala do(a) filho(a) ou a sala pela qual são responsáveis, respectivamente, em cada item da ITERS-R

(1= nada bem; 3= tem o básico; 5= bem; 7= muito bem). A questão colocada aos pais é: Como está a

sala do(a) seu(sua) filho(a) neste aspecto? A questão colocada aos educadores é: Como está a sua

sala neste aspecto?

A Figura 2 apresenta, como exemplo, um item do questionário para pais. Como é possível

observar, os Questionários sobre Importância dos Itens da ITERS-R para Pais e os Questionários de

Avaliação do Ambiente de Creche para Pais são, de facto, duas partes de um mesmo questionário,

verificando-se o mesmo em relação aos questionários para os educadores. No questionário, os pais e

educadores, para cada item, na primeira coluna devem indicar a importância que atribuem ao item e

seus indicadores e na segunda coluna devem indicar em que medida esses indicadores estão

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Capítulo IV

156

presentes na sala/creche que está a ser avaliada. Aos pais foi pedido, ainda, que assinalassem no

questionário os itens que lhes suscitaram dificuldades, por não conhecerem bem a sala ou a creche.

Figura 2. Exemplo do Questionário da Importância dos Itens e da Avaliação do Ambiente de

Creche para Pais

Que importância acha que tem para o(a) seu

(sua) filho(a) ?

Como está a sala do(a) seu (sua) filho(a) neste aspecto?

26. Interacção entre as crianças: - As crianças podem interagir durante a maior parte do dia (não estão separadas em berços ou cadeiras altas). - Os educadores param a interacção negativa e dão o exemplo de interacções sociais positivas: são calorosos e delicados. - Os educadores facilitam interacções sociais positivas entre todas as crianças (e.g. colocam os bebés onde podem interagir, dão brinquedos em duplicado). - Os educadores explicam às crianças as intenções e os sentimentos dos colegas. - Os educadores assinalam e falam sobre interacções positivas.

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1 2 3 4 5 6 7

Foi calculado o valor de coeficiente alfa de Cronbach para determinar a consistência interna do

Questionário de Avaliação do Ambiente de Creche para Pais e do Questionário de Avaliação do

Ambiente de Creche para Educadores. Quando o coeficiente foi calculado com 39 itens, muitos

participantes foram automaticamente eliminados devido aos valores omissos em itens que não era

possível avaliar em algumas salas. Por isso, foi calculado o valor do coeficiente alfa de Cronbach com

39 itens, com 37 itens (excluindo o item 32 e o 23, por serem os itens com maior número de valores

omissos) e com 34 itens utilizados em grande parte das análises deste estudo. O coeficiente alfa de

Cronbach indicou uma consistência interna adequada para ambos os questionários. Para o

Questionário de Avaliação da Qualidade para Pais, o coeficiente alfa foi de .96 quando considerando

37 itens e de .89 quando considerando os 39 itens. Para o Questionário de Avaliação da Qualidade

para Educadores, o coeficiente alfa foi de .96 quando considerando 37 itens e de .97 quando

considerando 39 itens. Com 34 itens, o valor da consistência interna foi de .96 para ambos os

questionários.

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Método

157

2.4 Características sociodemográficas dos pais e dos educadores

2.4.1 Questionário sobre características sociodemográficas

Através de um pequeno questionário, elaborado para o efeito, foram recolhidas informações

relativas a aspectos sociodemográficos dos pais e dos educadores.

Em relação aos pais foram recolhidas informações como: idade, estado civil, nível de

escolaridade, profissão, rendimento mensal do agregado familiar, número de filhos, posição do filho

que frequenta a creche na fratria. Relativamente aos educadores foram recolhidas informações como:

idade, estado civil, formação inicial (grau de ensino finalizado) e formação contínua, anos de

experiência como educador de infância/ auxiliar de educação, salário (mensal), acumulação de outra

função na creche (além de ser responsável pela sala).

3. Procedimento

3.1 Treino e acordo interobservadores

Serão descritos nesta secção os procedimentos relativos ao treino para utilização dos

instrumentos Escala de Avaliação do Ambiente de Creche e Registo do Envolvimento de Grupo, com a

respectiva obtenção de acordo interobservadores.

3.1.1 Escala de Avaliação do Ambiente de Creche

No que se refere à ITERS-R, um dos observadores participou num curso intensivo, organizado

pelos autores da escala, na Universidade da Carolina do Norte em Chapel Hill. Posteriormente, outros

dois observadores tiveram uma formação com o primeiro, na qual se utilizaram os materiais

recomendados e elaborados pelos autores, nomeadamente o vídeo de treino (Harms & Cryer, 2003).

Após este procedimento, foram realizadas cotações para treino em 16 salas de creche, que não

participaram no estudo, com o objectivo de se obter pelo menos 85% de acordo interobservadores. No

conjunto destas salas, foi obtida uma percentagem de acordo médio, com diferenças de um valor, de

88%.

3.1.2 Registo do Envolvimento de Grupo

O envolvimento de grupo foi avaliado pelo observador responsável pela recolha de dados na

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Capítulo IV

158

respectiva sala de creche. Após a instrução na utilização do instrumento, efectuada pelo observador

que tinha já efectuado treino e recolha de dados no âmbito do projecto de investigação ”Qualidade das

interacções da criança em contexto familiar e de creche e o seu impacto no seu desenvolvimento sócio-

cognitivo”22, os outros dois observadores foram treinados na utilização do Registo do Envolvimento de

Grupo (Check II) em salas de creche, até se obter uma percentagem de acordo superior a 90%. Foram

efectuadas 16 sessões de treino, tendo sido obtido um acordo médio de 98%.

3.2 Recolha de dados

Todos os dados foram recolhidos entre Setembro de 2004 e Outubro de 2005, tendo sido este

procedimento levado a cabo por três licenciados em Psicologia. De seguida, serão descritos os

procedimentos de recolha de dados utilizando cada um dos instrumentos/grupo de instrumentos.

3.2.1 Escala de Avaliação do Ambiente de Creche

Tal como é sugerido pelos autores da escala, o observador responsável por recolher os dados

em cada sala permaneceu com o grupo pelo menos 3 horas e meia, de forma a cotar todos os

indicadores de cada item (Opção de cotação alternativa). Foram observadas as principais rotinas e

actividades, desde a chegada até à hora da sesta (as crianças iam dormir depois do almoço em todas

as creches). Todas as salas foram observadas durante a manhã, por ser, habitualmente, o período do

dia de maior actividade nas creches. Geralmente, no fim do almoço as crianças dormem entre 2 a 3

horas e após o sono vão lanchar. Assim, no período da tarde são desenvolvidas poucas actividades e

nem sempre na sala ou orientadas pela pessoa responsável pela sala. Após a observação de cada

sala, foi efectuada uma entrevista ao educador, no sentido de se preencherem os indicadores de cada

item da ITERS-R, de mais difícil observação, tendo em conta que o observador permanece na sala

apenas algumas horas. Foram utilizadas, quando adequado, as questões sugeridas pela ITERS-R.

O acordo interobservadores foi verificado ao longo do processo de recolha de dados. Em 110

salas foram realizadas 30 observações para verificação do acordo (27.3% das salas). Para cada item

da ITERS-R foram calculados (1) a percentagem de acordo exacto, (2) a percentagem de acordo com

um valor de diferença, (3) o coeficiente kappa ponderado e (4) o coeficiente de correlação intraclasses

22 No âmbito do projecto “Qualidade das interacções da criança em contexto familiar e de creche e o seu impacto no seu desenvolvimento sócio-cognitivo” cada observador efectuou entre seis e oito sessões de treino em salas de creche previamente à recolha de dados; foram recolhidos dados em 30 salas de creche, com controlo de acordo interobservadores em 25% das sessões de observação (ver Mascarenhas, Pinto, & Bairrão, 2004).

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Método

159

(ICC). Foi obtida uma percentagem média de acordo exacto de 78.77 (DP = 15.28), tendo variado entre

43.33 e 100; a percentagem média de acordo com um ponto de diferença foi de 96.40 (DP = 4.28),

tendo variado entre 83.33 e 100; o coeficiente kappa ponderado foi em média de .72 (DP = .22), tendo

variado entre 0 e 1.00; e o ICC médio foi de .79 (DP = .23), variando entre -.06 e .79.

Foram igualmente calculados os acordos incluindo apenas 34 itens desta escala (identificados

anteriormente). Verificou-se uma percentagem média de acordo exacto de 78.55 (DP = 15.07), tendo

variado entre 43.33 e 96.67; a percentagem média de acordo com um ponto de diferença foi de 95.98

(DP = 4.40), tendo variado entre 83.33 e 100; o coeficiente kappa ponderado obtido foi em média de

.70 (DP = .23), tendo variado entre 0 e .98; e o ICC médio foi de .78 (DP = .24), variando entre -.06 e

1.00.23

3.2.2 Registo do Envolvimento de Grupo

O envolvimento de grupo, em cada sala, foi registado com base em duas sessões de

observação, realizadas em duas manhãs diferentes, em situações de jogo livre. Cada sessão de

observação teve a duração de 15 minutos. O número de crianças presentes na sala e o número de

crianças não envolvidas foram registados pelo observador a cada 15 segundos, alertado por um sinal

sonoro proveniente de um leitor de cassetes com auricular, totalizando 60 momentos de registo. Como

foi referido, o número de sessões foi determinado com base num estudo prévio realizado por Barros et

al., (2005) e a duração de cada sessão de observação foi determinada por um estudo realizado por

McWilliam e Ware (1994).

O valor do coeficiente de correlação intraclasses, calculado para o presente estudo, revelou

que a utilização de apenas uma sessão de observação permitia obter dados em que a proporção de

variância associada a diferenças entre participantes era, em média, de .55, ou seja, 45% da variância

seria devida a outros factores, que não às características das salas. A utilização da média das duas

sessões de observação originava um aumento considerável da proporção de variância associada a

diferenças entre as salas de creche (ICC = .71), isto é, 71% da variância seria explicada por diferenças

entre as salas observadas. Este valor, apesar de poder ser considerado razoável, foi inferior ao obtido

no estudo prévio que permitiu definir o número de sessões de observação, no qual o ICC para duas

sessões foi de .83 (Barros et al., 2005).

23 A informação relativa a 160 salas é apresentada no Capítulo V (Estudo e adaptação do instrumento ITERS-R).

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Capítulo IV

160

O acordo interobservadores foi verificado ao longo do processo de recolha de dados, num total

de 57 sessões de observação, o que equivale a 25.9% das sessões de registo do envolvimento. A

percentagem de acordo variou entre 90.71 e 100 (M = 98.98, DP = 1.80) e o coeficiente de correlação

intraclasses foi de .98, o que significa que 98% da variância se deve a diferenças nos grupos avaliados

e não a diferenças entre os observadores.

3.2.3 Entrevistas e questionários para os pais

Os questionários foram administrados aos pais pelo investigador responsável pela recolha de

dados na sala respectiva, em datas da conveniência de ambos, num espaço disponibilizado pela

instituição. Foi garantida aos pais a confidencialidade das informações recolhidas.

Os questionários foram administrados após a observação da sala, sendo o intervalo de tempo

entre a manhã de observação e a administração destes variável, havendo salas nas quais foi possível

realizar as duas actividades no mesmo dia e outras em que a administração do questionário só foi

possível um mês depois da observação da sala. Houve apenas um caso em que este período se

prolongou, por indisponibilidade da mãe, tendo o questionário sido administrado 3 meses após a

observação da sala.

Foram administrados no mesmo momento todos os questionários destinados ao pai/mãe, que

foram preenchidos na presença do investigador. Como foi referido, nas primeiras 20 salas

seleccionadas aleatoriamente os pais foram convidados a responder a uma entrevista e a um

questionário. Nas restantes 90 salas os pais responderam apenas ao questionário. Aos primeiros 20

pais participantes foi inicialmente efectuada a entrevista e depois foram administrados os questionários.

Este procedimento, com inclusão de entrevista, demorou em média 50 minutos. Sem as entrevistas, o

procedimento de administração dos questionários demorou em média 30 minutos. As entrevistas foram

realizadas pelo mesmo investigador aos 20 pais.

3.2.4 Entrevistas e questionários para os educadores

Os questionários foram administrados aos educadores, na creche, em dias da conveniência

dos mesmos e do investigador. Foi garantida a confidencialidade das informações recolhidas. Os

questionários para os educadores foram administrados no mesmo dia ou nos 30 dias seguintes à

observação da sala. Houve um caso em que este período se prolongou por incompatibilidade de

horários da educadora e da observadora, tendo o questionário sido administrado 3 meses após a

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Método

161

observação da sala.

Foram administrados no mesmo encontro todos os questionários destinados ao educador, os

quais foram preenchidos na presença do investigador. Aos primeiros 20 educadores participantes foi

inicialmente efectuada a entrevista, depois os dois questionários e, finalmente, foram efectuadas as

questões necessárias ao completo preenchimento da ITERS-R. Este procedimento, com inclusão de

entrevista, demorou em média 70 minutos. Com os restantes 90 educadores foram em primeiro lugar

preenchidos os questionários e depois colocadas as questões para obter as respostas necessárias ao

preenchimento da ITERS-R. Sem as entrevistas, o procedimento de administração dos questionários

demorou em média 50 minutos. As entrevistas foram todas realizadas pelo mesmo investigador, de

forma a garantir consistência.

3.3 Análises dos dados

3.3.1 Estudo qualitativo

Todas as entrevistas foram transcritas, de modo a facilitar o seu tratamento e análise. Com

base nas entrevistas e na literatura consultada, especialmente no que se refere à avaliação da

qualidade do ambiente de creche, utilizando o instrumento ITERS-R (Harms et al., 2003), foi criado o

sistema de categorias (ver Quadro 10), composto por 8 categorias e 42 subcategorias. Por se ter

constatado que grande parte das unidades de texto eram semelhantes às informações incluídas na

referida escala, as primeiras sete categorias correspondem às suas subescalas conceptuais e as

subcategorias correspondem aos itens da escala que se puderam identificar nas entrevistas às

educadoras e/ou pais. Houve quatro itens da ITERS-R (Jogo de areia e água, Promover a aceitação da

diversidade, Actividades de grupo e Condições para satisfazer as necessidades profissionais do

pessoal) que não foram focados pelos pais nem pelos educadores, pelo que não foram criadas as

subcategorias correspondentes. A última categoria (Outros Critérios) e as suas subcategorias foram

extraídas e intituladas com base unicamente na leitura das entrevistas.

A categoria Espaço e mobiliário refere-se às características enunciadas pelos pais/educadoras

que dizem respeito ao espaço interior da sala ou creche, quer em termos de quantidade, quer em

termos de qualidade; ao modo como o espaço está organizado; ao mobiliário disponível para rotinas,

conforto e actividades; e ainda à decoração dos espaços e afixação de imagens.

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Capítulo IV

162

As Rotinas de cuidados pessoais referem-se à satisfação das necessidades básicas das

crianças, incluindo os momentos de chegada e partida da creche, refeições e sesta, e referem-se a

todos os cuidados de saúde, higiene e segurança.

A categoria Escuta e conversação diz respeito a aspectos relacionados com a linguagem,

como seja o desenvolvimento da capacidade da criança para utilizar e compreender a linguagem.

Incluem-se também nesta categoria a disponibilidade de livros e sua utilização.

Inserem-se na categoria Actividades as referências dos pais e das educadoras aos seguintes

aspectos: realização de actividades com as crianças, especificando ou não o tipo de actividade;

existência de materiais adequados, especificando ou não o tipo de materiais; relação com a Natureza e

utilização do espaço exterior; e, finalmente, responsabilidade da creche ou educadora na promoção do

desenvolvimento das crianças.

A categoria Interacção inclui as referências das educadoras e dos pais às relações entre os

adultos e as crianças, às relações entre as crianças e inclui também as referências à forma como é

efectuada a supervisão das crianças. Inclui, ainda, as estratégias utilizadas pelo pessoal relacionadas

com a disciplina e com a definição e cumprimento de regras.

A categoria Estrutura do programa relaciona-se com aspectos da organização do dia-a-dia da

sala ou creche, incluindo aspectos relativos ao horário das rotinas e das actividades, bem como às

possibilidades de jogo livre, ou seja, não estruturado pelos adultos.

Todos os aspectos relacionados com as necessidades pessoais e profissionais do pessoal e a

cooperação entre os profissionais, bem como os relativos à interacção entre a creche e os pais, foram

codificados na categoria Pais e pessoal.

Os aspectos habitualmente considerados como sendo de estrutura (cf. Cryer et al., 1999),

como o tamanho do grupo de crianças, o número de adultos, a qualificação dos educadores e

auxiliares, e ainda as características pessoais dos educadores e dos directores, foram incluídos na

categoria Outros critérios.

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Método

163

Quadro 10. Sistema de categorias

Categoria Subcategoria

1. Espaço interior 2. Mobiliário para cuidados de rotina e jogo 3. Medidas para relaxamento e conforto 4. Arranjo da sala

Espaço e mobiliário

5. Material exposto para as crianças 6. Chegada/partida 7. Refeições/refeições ligeiras 8. Sesta 9. Práticas de saúde/higiene 10. Práticas de segurança

Rotinas de cuidados pessoais

11. Rotinas não especificadas 12. Ajudar as crianças a compreender e usar a linguagem Escuta e conversação 13. Utilizar livros 14. Motricidade fina 15. Jogo físico activo 16. Arte 17. Música e movimento 18. Blocos 19. Jogo dramático 20. Natureza 21. Utilização de televisão ou vídeo

Actividades

22. Materiais/actividades não especificados 23. Supervisão de jogo e aprendizagem 24. Interacção entre pares 25. Interacção adulto-criança

Interacção

26. Disciplina 27. Horário 28. Jogo livre

Estrutura do programa

29. Medidas para crianças com incapacidades 30. Iniciativas para envolver os pais 31. Condições para satisfazer as necessidades pessoais do pessoal 32. Interacção e cooperação entre o pessoal 33. Continuidade do pessoal 34. Supervisão e avaliação do pessoal

Pais e pessoal

35. Oportunidades para desenvolvimento profissional 36. Número de adultos 37. Número de crianças 38. Faixa etária 39. Qualificação da educadora 40. Características do pessoal 41. Direcção/organização

Outros critérios

42. Outros critérios não especificados

São apresentadas de seguida as definições das subcategorias.

1. Espaço interior

Esta subcategoria inclui todas as características enunciadas pelas educadoras e pelos pais

que se relacionam com o espaço físico (quantidade de espaço disponível) e suas condições (como

temperatura, iluminação, arejamento).

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Capítulo IV

164

2. Mobiliário para cuidados de rotina e jogo

Refere-se a aspectos relacionados com os materiais disponíveis para as rotinas e para as

actividades, em número suficiente, adequados ao tamanho das crianças e com localização

conveniente, nomeadamente: armários, louças da casa-de-banho, camas/colchões, mesas e cadeiras e

banca com ponto de água.

3. Medidas para relaxamento e conforto

Inclui aspectos relativos à existência de espaços na sala que permitam às crianças relaxar e

sentir-se confortáveis. Este conforto pode ser conseguido através da utilização de almofadas, mantas

ou colchões.

4. Arranjo da sala

Esta subcategoria diz respeito à organização do espaço disponível na sala e à organização dos

materiais. Os participantes referem a importância de organizar os materiais em centros de interesse, os

“cantos”, permitindo às crianças o livre acesso aos materiais e deixando também algum espaço livre.

5. Material exposto para as crianças

Diz respeito às imagens afixadas na sala, que possam ser observadas pelas crianças, bem

como à importância de se utilizarem cores vivas e de se respeitarem certos cuidados com a decoração

das paredes.

6. Chegada/partida

A categoria Chegada/partida diz respeito ao acolhimento das crianças e dos pais na chegada à

creche, bem como no momento de partida das crianças. Foi focada a necessidade de se efectuar um

bom acolhimento, que facilite a separação das crianças dos pais e a sua permanência na creche.

7. Refeições/refeições ligeiras

As Refeições/refeições ligeiras incluem os aspectos relacionados com a preparação da

alimentação em vários momentos do dia, o tipo de alimentos consumidos, a higiene das crianças,

educadoras e espaços antes e durante a alimentação e o clima emocional durante as refeições.

8. Sesta

Esta subcategoria refere-se à possibilidade de as crianças dormirem, bem como às condições

existentes na creche para que a sesta decorra num ambiente sossegado, confortável e saudável.

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Método

165

9. Práticas de saúde/higiene

Inclui os aspectos relacionados com a mudança de fraldas e treino de controlo de esfíncteres,

bem como as condições necessárias para que decorram de forma adequada. Inclui também todas as

medidas para manter um ambiente saudável, evitando a propagação de germes.

10. Práticas de segurança

Esta subcategoria refere-se aos cuidados relacionados com a segurança das crianças, desde

as características dos materiais, às condições dos espaços e aos cuidados implementados pelos

adultos para evitar que as crianças se coloquem em situações perigosas.

11. Rotinas não especificadas

Esta subcategoria foi criada de modo a incluir as referências ao bem-estar da criança e aos

cuidados de rotina, sem, contudo, ser especificado o tipo de cuidado ou o tipo de rotina. Foram

incluídas nesta dimensão as referências ao “tomar conta” das crianças.

12. Ajudar as crianças a compreender e usar a linguagem

Esta subcategoria refere-se aos aspectos relacionados com a linguagem, no que diz respeito

ao desenvolvimento da capacidade da criança para utilizar a linguagem e para a compreender. São

codificadas também as unidades relativas à forma como os adultos falam com as crianças.

13. Utilizar livros

São incluídas na subcategoria Utilizar livros as referências à existência na sala de livros

acessíveis para as crianças utilizarem, focando quer a sua quantidade quer a sua qualidade. É focada

também a variedade de livros disponíveis.

14. Motricidade fina

As actividades de motricidade fina são aquelas que encorajam o desenvolvimento da

coordenação olho-mão, requerendo a utilização dos dedos e dos olhos quando se manipulam objectos.

Nesta subcategoria são incluídas as alusões das educadoras e dos pais a este tipo de actividades, bem

como à existência de materiais que as possibilitem.

15. Jogo físico activo

Refere-se ao desenvolvimento das competências de motricidade global. As educadoras e os

pais referem a importância de se organizarem actividades que permitam o desenvolvimento desta área,

bem como a de se disponibilizarem materiais e equipamentos que as facilitem, quer no interior quer no

exterior da creche.

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Capítulo IV

166

16. Arte

Esta subcategoria inclui os aspectos relacionados com a expressão plástica, como a existência

de diversas actividades (por exemplo: desenho, pintura, colagem, moldagem) e materiais necessários

para que elas se realizem.

17. Música e movimento

São incluídas em Música e movimento as actividades relacionadas com música e utilização de

sons em geral, bem como os materiais disponíveis que permitem fazer ou ouvir música ou outros sons

(por exemplo: instrumentos musicais, brinquedos com sons de animais, etc.).

18. Blocos

São considerados blocos os materiais que permitem fazer construção, sem necessidade de

encaixar. São codificadas como Blocos as menções a materiais para construções e acessórios que

possam ser utilizados com as construções, como carrinhos, e sua utilização.

19. Jogo dramático

Esta subcategoria inclui os aspectos relacionados com actividades de jogo simbólico (fazer de

conta) e de jogo dramático24, bem como os materiais que os possibilitam. Foram referidos diversos

materiais, como fantoches, roupas, bonecas e outros materiais da “casinha”.

20. Natureza

Os aspectos focados pelas educadoras e pelos pais relacionados com a Natureza (por

exemplo, falar sobre os animais) e com a utilização do espaço exterior (jardim) foram codificados nesta

subcategoria.

21. Utilização de televisão ou vídeo

Esta subcategoria inclui a referência à forma como se utilizam os recursos televisão e vídeo em

contexto de creche.

22.. Materiais/actividades não especificados

Foram referidos pelos pais e pelas educadoras aspectos relacionados com as actividades e

materiais para as actividades, que não se enquadravam claramente numa das subcategorias

anteriores, por serem demasiado abrangentes e não especificarem o tipo de actividade ou material.

24 Note-se que as Orientações Curriculares para a Educação Pré-escolar (Ministério da Educação, 1997) consideram jogo simbólico a expressão e comunicação através do próprio corpo e jogo dramático a dramatização de situações mais complexas, implicando encadeamento de acções.

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Método

167

Assim, referências à realização de actividades, à promoção do desenvolvimento e à existência de

materiais em número suficiente e de boa qualidade, sem outras especificações, foram codificadas na

subcategoria Materiais/actividades não especificados, que pertence à categoria Actividades.

23. Supervisão

Nesta subcategoria inserem-se as informações relativas à atenção dada pelo pessoal às

crianças, no sentido de garantir a sua segurança. Foram focados aspectos como a facilidade com que

é possível observar as crianças ao longo do dia, a importância de existir proximidade permanente das

crianças e a necessidade de haver número suficiente de adultos para efectuar uma adequada

supervisão.

24. Interacção entre pares

No domínio das interacções, as educadoras e os pais evidenciaram a importância da relação

entre crianças, bem como da função da creche enquanto promotora da socialização entre pares.

25. Interacção adulto-criança

São incluídas nesta subcategoria todas as referências à interacção estabelecida entre os

adultos e as crianças, tendo sido salientada a importância de se estabelecer uma boa relação afectiva

com as crianças.

26. Disciplina

Esta subcategoria inclui as unidades que se referem à existência de regras na sala ou creche,

bem como ao modo como os adultos ajudam as crianças a comportarem-se de acordo com as regras

estabelecidas.

27. Horário

A subcategoria Horário diz respeito ao plano diário da sala ou creche, incluindo aspectos

relativos ao horário, sequência e duração das rotinas e das actividades. Também foi referida a

alternância entre actividades estruturadas e livres, bem como entre actividades no interior e no exterior.

28. Jogo livre

Esta subcategoria diz respeito à existência de tempo no dia-a-dia da creche para as crianças

brincarem livremente, sem a estruturação da educadora, bem como à disponibilidade de materiais para

utilizarem nestes períodos, quer decorram no interior quer no exterior da creche.

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Capítulo IV

168

29. Medidas para crianças com incapacidades

Os procedimentos levados a cabo pela creche para acolher crianças com incapacidades e

responder adequadamente às suas necessidades e das suas famílias são incluídos na subcategoria

Medidas para crianças com incapacidades.

30. Iniciativas para envolver os pais

As medidas implementadas pela creche para responder às necessidades dos pais e para os

envolver no dia-a-dia da creche, bem como as características da relação profissionais – pais, foram

codificadas na subcategoria Iniciativas para envolver os pais.

31. Condições para satisfazer as necessidades pessoais do pessoal

Esta subcategoria inclui a única referência efectuada pelos participantes relativamente às

medidas para satisfazer as necessidades pessoais dos profissionais, garantindo o seu bem-estar.

32. Interacção e cooperação entre o pessoal

São incluídas nesta subcategoria as referências das educadoras e dos pais à relação entre os

profissionais, nomeadamente no que diz respeito à possibilidade de planificar em conjunto as

actividades e de reflectir sobre as situações que ocorrem na creche.

33. Continuidade do pessoal

A Continuidade do pessoal refere-se à possibilidade de a mesma educadora e/ou auxiliar

acompanharem o grupo de crianças ao longo a frequência da creche/jardim-de-infância, garantindo

maior estabilidade, quer para as crianças do grupo e os seus pais, quer para os próprios profissionais.

34. Supervisão e avaliação do pessoal

Esta subcategoria inclui as medidas para garantir que os educadores, e a creche em geral,

realizem um bom trabalho, através da sua supervisão. Salienta-se a importância de uma avaliação e

feedback efectuados por pessoas externas à instituição, bem como a necessidade de alterar os

aspectos problemáticos.

35. Oportunidades para desenvolvimento profissional

Incluem-se nesta subcategoria as iniciativas da instituição para garantir que o seu pessoal

tenha oportunidades para desenvolvimento profissional, o que pode passar pela realização de reuniões

frequentes, por reflexões sobre situações pontuais ou pela realização de sessões de formação formais.

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Método

169

36. Número de adultos

As referências das educadoras e dos pais à existência de pessoal em número suficiente em

cada sala ou na creche, para garantirem cuidados de elevada qualidade, são incluídos na subcategoria

Número de adultos.

37. Número de crianças

Esta subcategoria inclui as menções das educadoras e dos pais respeitantes ao número de

crianças que frequenta cada sala da creche, salientando a importância de os grupos serem pequenos,

de modo a permitir um bom acompanhamento por parte dos adultos.

38. Faixa etária

Os pais e as educadoras referiram-se à forma como as crianças são divididas pelas salas da

creche, de acordo com a faixa etária.

39. Qualificação da educadora

Alguns participantes referiram-se à qualificação do educador, dando particular importância à

existência de um educador de infância em cada sala da creche. Esta subcategoria inclui os aspectos

relacionados com a formação inicial dos profissionais e a subcategoria Oportunidades para

desenvolvimento profissional inclui os aspectos relativos à formação contínua.

40. Características do pessoal

Os participantes referiram-se a características das educadoras como: serem sensíveis, meigas,

calmas, alegres no trabalho, gostarem de crianças e do tipo de trabalho que realizam. Foi referida

ainda a importância de se procurarem educadores do sexo masculino.

41. Direcção/organização

As referências a características da direcção e medidas para organizar o trabalho de forma

eficaz foram codificadas na subcategoria Direcção/organização.

42. Outros critérios não especificados

Além das informações inseridas nas 41 subcategorias apresentadas, os participantes

referiram-se a aspectos muito específicos como a localização da instituição, a existência de projecto

pedagógico, a possibilidade de responder a todas as necessidades das crianças (sem especificar), o

aspecto geral e imediato da creche.

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Capítulo IV

170

As categorias e subcategorias eram mutuamente exclusivas no que diz respeito às suas

definições, mas uma unidade de análise podia ser incluída em mais do que uma categoria ou

subcategoria. A unidade de análise foi o parágrafo.

No que diz respeito às entrevistas efectuadas às educadoras, com base no sistema de

categorias, foi efectuada a codificação de 820 unidades de análise, tendo sido utilizado o programa

NUD*IST (Non-numerical Unstructured Data Indexing Searching and Theorizing, versão 6.0).

Relativamente às entrevistas efectuadas aos pais foram codificadas 936 unidades de análise,

recorrendo ao mesmo programa.

Após a codificação das 20 entrevistas realizadas aos pais e 20 entrevistas realizadas às

educadoras, foram calculadas as frequências por categorias e subcategorias da totalidade das

unidades de texto e documentos. Tendo em conta os objectivos e especificidades deste estudo, os

resultados apresentados dizem respeito ao número de educadoras e ao número de pais que referiram

cada um dos temas (e não quantas vezes o tema foi referido ao longo das entrevistas).

De modo a verificar a fidelidade deste processo, dois meses após a codificação de todas as

entrevistas procedeu-se a uma nova codificação de cinco destas entrevistas, seleccionadas

aleatoriamente. Para cada categoria e subcategoria, considerou-se acordo quando um código foi

atribuído a cada um dos documentos (ou seja, entrevistas) nos dois momentos de codificação e

desacordo quando um código foi atribuído em apenas um dos momentos de codificação.

Para as entrevistas realizadas às educadoras, o valor do acordo para as oito categorias variou

entre 80% e 100% (M = 97.5%). Relativamente às subcategorias, o acordo médio foi também de

97.5%, tendo variado entre 80 e 100%. Para as entrevistas realizadas aos pais, o valor do acordo para

as oito categorias foi de 100%. Relativamente às subcategorias, o acordo médio foi de 97.5%, tendo

sido de 80% para 5 subcategorias e de 100% para as restantes.

3.3.2 Estudo quantitativo

De modo a obter resposta para as questões de investigação formuladas e a verificar as

hipóteses de investigação definidas, foram realizados vários procedimentos de análise de dados, com

recurso ao programa informático Statistical Package for the Social Sciences – SPSS (versão 13.0).

A análise de dados envolveu várias etapas, sendo os resultados obtidos apresentados em

diferentes capítulos desta dissertação. O primeiro grupo de procedimentos incluiu análises

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Método

171

exploratórias prévias no sentido de determinar a fidelidade e validade dos dados, obtidos através dos

diversos instrumentos, tendo sido os resultados destas análises apresentados no presente capítulo

(Capítulo IV). Para os dados recolhidos através do instrumento ITERS-R em 110 salas foram

calculadas as percentagens de acordo interobservadores, o coeficiente kappa ponderado, o coeficiente

de correlação intraclasses e o coeficiente alfa de Cronbach. Para os dados recolhidos através do

Registo do Envolvimento de Grupo, foram calculadas as percentagens de acordo interobservadores, o

coeficiente de correlação intraclasses para verificar a percentagem de acordo devida a diferenças entre

os observadores e o coeficiente de correlação intraclasses para verificar a proporção de variância

associada a diferenças entre salas avaliadas e não devida a outros factores, assegurada pela utilização

de duas sessões de observação.

O Capítulo V apresenta os resultados do estudo e adaptação da Escala de Avaliação do

Ambiente de Creche, dando resposta à primeira questão formulada (Os dados obtidos com o

instrumento ITERS-R revelam fidelidade, validade e sensibilidade?). Neste sentido, foram efectuadas

análises de forma a (1) determinar a normalidade das distribuições, através do teste de Kolmogorov-

Smirnov, (2) verificar a existência de outliers susceptíveis de influenciar significativamente os

resultados, (3) caracterizar as salas participantes no que diz respeito à qualidade média, qualidade ao

nível das subescalas e dos itens, através de análises estatísticas descritivas, (4) determinar a

sensibilidade/poder discriminativo dos itens, verificando os valores do coeficiente de correlação item –

total corrigido, (5) determinar a fidelidade dos dados obtidos com a ITERS-R, através do cálculo dos

acordos interobservadores e do cálculo do valor do coeficiente alfa de Cronbach e (6) determinar a

validade dos dados obtidos com a ITERS-R, através da análise de componentes principais e da

averiguação de associações com outras variáveis e comparações entre grupos.

O Capítulo VI apresenta os resultados que permitem responder às restantes questões de

investigação, sendo apresentados dados relativos (1) à qualidade das salas de creche avaliada por

observadores externos, (2) aos critérios de qualidade valorizados pelos pais, (3) aos critérios de

qualidade valorizados pelos educadores, (4) à qualidade das salas de creche avaliada pelos pais e (5)

à qualidade das salas de creche avaliada pelos educadores. No fim do capítulo são apresentados

dados relativos à comparação das ideias dos pais e dos educadores acerca dos critérios de qualidade

em contexto de creche e à comparação das avaliações da qualidade efectuada por pais, por

educadores e por observadores externos.

Foram efectuadas análises descritivas, no sentido de descrever a qualidade das salas, avaliada

por observadores externos, por pais e por educadores, e de descrever a importância atribuída pelos

pais e pelos educadores aos critérios de qualidade constantes da ITERS-R. Calcularam-se medidas de

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Capítulo IV

172

tendência central e de dispersão para as diversas variáveis.

Realizaram-se análises de correlação através das quais se procurou descrever as associações

simples existentes entre as variáveis em estudo. Foram utilizados testes paramétricos para os dados

com distribuições normais (coeficientes de correlação momento-produto de Pearson) e testes não

paramétricos para os dados com distribuição não normal (coeficientes de correlação de Spearman). O

significado prático dos resultados foi interpretado com base nas convenções propostas por Cohen

(1992), considerando-se pequeno um r de .10 (associação fraca), médio um r de .30 (associação

moderada) e grande um r de .50 (associação forte), respeitando o nível de significância de .05 (cf.

Field, 2005).

Foram utilizados, ainda, testes de comparação de grupos ou situações: (1) testes t de Student

(para amostras independentes ou para amostras dependentes) nas análises univariadas, com dois

grupos ou condições, no caso dos dados com distribuição normal, (2) testes de Mann-Whitney (para

amostras independentes) ou testes de Wilcoxon (para amostras emparelhadas) nas análises

univariadas, com dois grupos ou condições, no caso dos dados com distribuição não normal, (3)

análises de variância univariada – ANOVA (para amostras independentes e para amostras

emparelhadas) nas análises univariadas, com mais de dois grupos ou condições, no caso de dados

com distribuição normal, (3) análises de variância univariada de Friedman – ANOVA de Friedman (para

amostras emparelhadas), nas análises univariadas, com mais de dois grupos ou condições, no caso de

dados com distribuição não normal e (4) análises de variância multivariada (MANOVA), nas análises

multivariadas (análises com vista a verificar o efeito de uma variável independente em mais do que

uma variável dependente).

A interpretação da significância estatística dos resultados foi efectuada com base no valor alfa

de .05. Seguindo as recomendações da American Psychological Association – APA (2001) foram

calculados índices da magnitude dos efeitos encontrados. Para os testes t de Student, de forma a

determinar a significância prática dos resultados, os valores t foram convertidos em valores r, através

da equação r = √[t2/(t2+gl)]. Para os testes de Mann-Whitney e de Wilcoxon, os valores Z foram

convertidos em valores r (r = Z/√N; Rosenthal, 1991 como citado em Field, 2005). Para a ANOVA para

amostras independentes foi calculado o tamanho do efeito ŋ2 (ŋ2 = soma dos quadrados entre

grupos/soma total dos quadrados), que representa a proporção de variância da variável dependente

que é explicada pela variável independente (Pallant, 2001). Este valor pode ser também obtido através

do programa SPSS, utilizando o Modelo Geral Linear25. Para a ANOVA para amostras emparelhadas o

25 Em análises com um só factor (one-way ANOVA) o valor do ŋ2 parcial, fornecido pelo SPSS, é igual ao valor ŋ2 (Pierce,

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Método

173

valor ŋ2 é igualmente fornecido pelo SPSS. Para a MANOVA foi calculado o valor ω2multi,através da

fórmula ω2multi = 1 - [(N x lambda de Wilk / lambda de Wilk + (N – número de grupos)] (Kim & Olejnik,

2005). Os valores obtidos foram interpretados com base nos critérios sugeridos por Cohen (1988,

1992). Assim, um r de .10 foi considerado pequeno, um r de .30 foi considerado médio e um r de .50 foi

considerado grande; um ŋ2 ou ω2multi de .01 foi considerado pequeno, um ŋ2 ou ω2multi de .10 foi

considerado moderado e um ŋ2 ou ω2multi de .25 foi considerado grande.

Block, & Aguinis, 2004).

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CAPÍTULO V: Estudo e adaptação do instrumento ITERS-R

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177

Neste capítulo, iremos efectuar a análise das características métricas dos dados obtidos com a

versão portuguesa do instrumento ITERS-R, bem como as suas potencialidades para a avaliação da

qualidade das creches em Portugal.26

1. Tradução e pilotagem

A tradução do instrumento foi efectuada no âmbito do presente estudo, após a participação no

curso intensivo “Assessing Environments with the Infant/ Toddler Environment Rating Scales”, que

decorreu na Universidade da Carolina do Norte em Chapel Hill, de 22 a 24 de Outubro de 2003, e que

foi orientado pelos autores da escala. Este curso incluiu treinos de cotação ao vivo em duas salas de

creche, com posterior discussão das cotações efectuadas.

O passo que se seguiu à tradução do instrumento foi a realização de um estudo-piloto, em

Portugal. A escala foi utilizada para avaliar a qualidade de 16 salas de creche (8 salas de IPSS e 8

salas de Instituições com fins lucrativos; metade das salas eram para crianças de 1 a 2 anos de idade e

metade para crianças de 2 a 3 anos). Este estudo permitiu detectar aspectos menos claros da tradução

e determinar se todos os critérios poderiam ser verificados em salas de creche portuguesas, quer

através da observação, quer através do seu preenchimento com base em informações fornecidas pelos

educadores de infância e auxiliares de educação. Foram efectuadas apenas pequenas alterações na

tradução, tendo-se concluído que todos os indicadores da escala eram passíveis de serem

preenchidos, isto é, não surgiram aspectos que poderiam ser verificados nos Estados Unidos da

América (país de origem do instrumento), mas de impossível aplicação em Portugal.

2. Características métricas

No sentido de estudar as qualidades métricas dos dados da escala, foram observadas 160

salas de creche, já descritas no Capítulo IV (Método). Por razões de ordem prática, relacionadas com o

tempo necessário para a recolha de dados, o instrumento de verificação do envolvimento de grupo,

utilizado como critério externo para apreciação da validade (Validade por referência a critério; Almeida

& Freire, 1997), foi administrado apenas em 110 salas, já descritas. Os dados foram recolhidos por

observadores treinados.

26 Dados parciais e preliminares previamente apresentados por Barros, Aguiar e Bairrão (2006)

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Capítulo V

178

Os dados recolhidos através da ITERS-R foram submetidos a procedimentos de análise para

verificação das suas qualidades métricas. Serão apresentados os seguintes dados: (1) dados relativos

à normalidade da distribuição e à existência de outliers; (2) estatísticas descritivas ao nível da escala e

das subescalas; (3) análise da sensibilidade/poder discriminativo dos itens; (4) análise da fidelidade dos

dados, nomeadamente através do cálculo do acordo interobservadores e da consistência interna; (5)

apreciação da validade dos dados, através da análise da estrutura factorial (validade de conceito ou de

constructo; Almeida & Freire, 1997), de análises de correlação com outras variáveis (validade por

referência a critério; Almeida & Freire, 1997) e da comparação entre grupos.

Devido à existência de valores omissos em mais de 10% das salas participantes, permitidos

pela escala, nos itens 21 (Jogo de areia e água), 23 (Uso de TV, vídeo e/ou computador), 31

(Actividades de grupo), 32 (Medidas para crianças com incapacidades) e 36 (Interacção e cooperação

entre o pessoal), a maioria das análises foi efectuada com 34 itens.

2.1 Dados relativos à normalidade da distribuição e à existência de outliers

A análise inferencial das distribuições através do Teste de Kolmogorov-Smirnov revelou

estarem cumpridos os pressupostos da normalidade dos dados da qualidade (ITERS-R), para as 160

salas observadas. Estas características verificaram-se quando se considerou a totalidade dos itens,

mas também quando se consideraram apenas os itens sem valores omissos (34 itens).

A análise exploratória dos dados das subescalas Rotinas de cuidados pessoais, Escuta e

conversação e Estrutura do programa revelou não estarem cumpridos os pressupostos relativos à

normalidade das distribuições. Através do mesmo tipo de análises verificou-se que estavam cumpridos

os pressupostos de normalidade das distribuições ao nível das subescalas Espaço e mobiliário,

Actividades, Interacção e Pais e pessoal.

Não foram identificados outliers que alterassem as distribuições dos dados ou as médias

obtidas, quer para a média global, quer para as sete subescalas.

2.2 Estatísticas descritivas ao nível da escala e das subescalas

A média da qualidade das salas foi calculada tendo como base 34 itens. Os resultados médios

obtidos variaram entre 1.62 e 4.09 (M = 2.84, DP = 0.48).

Relativamente às subescalas, as médias variaram entre 1.67 na subescala Rotinas de

cuidados pessoais e 3.70 na subescala Interacção (ver Quadro 11). As subescalas Actividades e

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Estudo da ITERS-R

179

Rotinas de cuidados pessoais são as que apresentam menor variabilidade e a subescala Interacção é a

que apresenta maior variabilidade, permitindo, portanto, efectuar uma melhor distinção entre as

diversas salas.

Quadro 11. Médias, desvios-padrão e amplitude dos dados ao nível das subescalas da ITERS-R

(N = 160)

M DP Mín. – Max.

I - Espaço e mobiliário 3.33 0.74 1.60 – 5.60

II - Rotinas de cuidados pessoais 1.67 0.53 1.00 – 3.33

III - Escuta e conversação 3.36 0.98 1.00 – 5.67

IV - Actividades 2.26 0.49 1.10 – 3.67

Actividades sem itens 21 e 23 2.44 0.56 1.13 – 4.00

V - Interacção 3.70 1.10 1.25 – 6.50

VI - Estrutura do programa 2.58 0.67 1.00 – 5.00

Estrutura do programa sem item 32 2.56 0.65 1.00 – 5.00

Estrutura do programa sem itens 31 e 32 2.64 0.60 1.00 – 5.50

VII - Pais e pessoal 3.44 0.74 1.50 – 5.14

2.3 Sensibilidade/poder discriminativo dos itens

O Quadro 12 apresenta as estatísticas descritivas para os 39 itens da escala. Se analisarmos

apenas os 34 itens, que serão incluídos na maior parte das análises, 21 obtiveram cotação que variou

entre 1 e 7. Dos restantes 13 itens, todos apresentaram cotações cujo mínimo é 1, excepto o item

número 5 (Material exposto para as crianças). Em relação aos máximos obtidos, verificou-se uma maior

oscilação, variando entre a cotação 4 nos itens 9, 10, 11, 22 e 24 (respectivamente: Mudança de

fraldas/idas à sanita, Práticas de saúde, Práticas de segurança, Natureza/ciência e Promover a

aceitação da diversidade) e a cotação 6 nos itens 5, 12, 16, 18, 19, 20 e 26 (respectivamente: Material

exposto para as crianças, Ajudar as crianças a compreender a linguagem, Jogo físico activo, Música e

movimento, Blocos, Jogo dramático, Interacção entre pares). Os valores máximos obtidos em alguns

itens podem, de algum modo, suscitar preocupação em relação à sua sensibilidade. Contudo, parece-

nos que tal facto se deve em maior grau à pouca atenção dada nas creches aos aspectos avaliados, do

que à forma como os itens estão construídos.

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Capítulo V

180

Quadro 12. Estatísticas descritivas dos dados da ITERS-R ao nível dos itens

Mínimo - Máximo

M DP Assimetria Curtose

1. Espaço interior 1-7 3.44 1.34 0.53 1.35 2. Mobiliário para cuidados de rotina e jogo 1-7 3.16 1.61 0.07 -0.96 3. Condições para relaxamento e conforto 1-7 3.10 1.09 0.90 2.29 4. Arranjo da sala 1-7 3.16 1.31 0.19 0.56 5. Material exposto para as crianças 2-6 3.78 0.97 1.01 0.75 6. Chegada/ partida 1-7 2.37 1.98 0.96 -0.78 7. Refeições/ refeições ligeiras 1-5 1.64 1.12 1.48 0.57 8. Sesta 1-7 1.19 0.73 5.03 30.04 9. Mudança de fraldas/idas à sanita 1-4 1.06 0.31 6.58 52.73 10. Práticas de saúde 1-4 1.54 0.61 1.18 2.72 11. Práticas de segurança 1-4 2.25 1.16 0.44 -1.25 12. Ajudar as crianças a compreender a linguagem 1-6 4.24 1.33 -0.80 -0.04 13. Ajudar as crianças a usar a linguagem 1-7 4.22 1.43 0.09 -0.66 14. Utilizar livros 1-7 1.61 1.02 2.13 5.30 15. Motricidade fina 1-7 4.05 1.21 -0.05 0.41 16. Jogo físico activo 1-6 1.79 0.88 1.61 3.67 17. Arte 1-7 3.11 1.36 0.43 -0.11 18. Música e movimento 1-6 2.39 1.24 0.62 -0.64 19. Blocos 1-6 1.79 1.23 1.16 -0.04 20. Jogo dramático 1-6 3.51 1.41 -0.11 -1.20 21. Jogo de areia e água 1-3 1.11 0.34 2.96 8.54 22. Natureza/ciência 1-4 1.61 1.05 1.35 0.18 23. Uso de TV, vídeo e/ou computador 1-4 1.48 0.77 1.36 0.61 24. Promover a aceitação da diversidade 1-4 1.31 0.51 1.68 3.69 25. Supervisão do jogo e da aprendizagem 1-7 3.38 1.71 0.03 -1.06 26. Interacção entre pares 1-6 4.36 1.06 -0.76 0.78 27. Interacção adulto-criança 1-7 3.94 1.61 0.00 -0.97 28. Disciplina 1-7 3.14 1.32 -0.01 -0.66 29. Horário 1-7 3.21 0.77 -0.29 5.16 30. Jogo livre 1-7 2.08 0.77 2.77 13.10 31. Actividades de grupo 1-7 2.39 1.54 1.58 1.97 32. Medidas para crianças c/ incapacidades 1-7 3.13 2.19 0.96 -0.37 33. Iniciativas para envolver os pais 1-7 3.33 1.18 -0.41 0.27 34. Condições p/ nec. pessoais do pessoal 1-7 3.72 0.90 -0.26 3.18 35. Condições p/ nec. prof. do pessoal 1-7 4.26 1.65 0.38 -0.70 36. Interacção e cooperação entre o pessoal 1-7 4.16 1.17 -0.58 1.26 37. Continuidade do pessoal 1-7 4.41 1.77 -0.79 -0.73 38. Supervisão e avaliação do pessoal 1-7 2.41 1.28 0.21 -0.76 39. Oportunidades p/ desenv. profissional 1-7 2.04 1.14 1.59 3.33

Utilizando como critério para cumprimento do pressuposto de normalidade dos dados o

intervalo compreendido entre -2.00 e 2.00 (Pestana & Gageiro, 1998), verificou-se que os itens 8

(Sesta), 9 (Mudança de fraldas/idas à sanita), 14 (Utilizar livros), 21 (Jogo de areia e água) e 30 (Jogo

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Estudo da ITERS-R

181

livre) revelaram simultaneamente valores de assimetria e de curtose superiores ao valor considerado

adequado. Os itens 10 (Práticas de saúde), 16 (Jogo físico activo), 24 (Promover a aceitação da

diversidade), 29 (Horário), 34 (Condições para satisfazer as necessidades pessoais do pessoal) e 39

(Oportunidades para desenvolvimento profissional) apresentam valor de assimetria entre -2.00 e 2.00,

sendo, contudo os valores de curtose superiores a 2.00. O item 3 (Condições para relaxamento e

conforto), apresenta valor de curtose, superior, mas próximo de 2.00.

Parece-nos que estes resultados se devem ao facto de as cotações se concentrarem nos

valores mais baixos da escala, devido à efectiva falta de cuidados de boa qualidade nas salas

observadas. O mesmo não se pode dizer acerca dos resultados obtidos no item 34 (Condições para

satisfazer as necessidades pessoais do pessoal) e 3 (Condições para relaxamento e conforto), cujas

médias são relativamente superiores.

Foi analisada a distribuição das salas participantes pelos pontos da escala em cada item. A

análise do Quadro 13 permite identificar itens nos quais os participantes se concentram nos pontos

inferiores da escala, nomeadamente os itens da subescala Rotinas de cuidados pessoais e da

subescala Actividades. É apresentada a percentagem de salas cotada em cada ponto da escala, em

cada um dos 39 itens.

Relativamente à análise do poder discriminativo dos itens, entendido como o grau em que o

item diferencia no mesmo sentido do teste global, Almeida e Freire (2000) sugerem que se efectue o

cálculo do coeficiente de correlação corrigida entre o item e a escala, ou seja, o cálculo da correlação

entre a pontuação no item e a nota total da escala. Os resultados são apresentados no Quadro 14. O

valor do coeficiente de correlação item - total corrigido dá uma indicação acerca da medida em que

cada item se correlaciona com a cotação total da escala. Apenas se devem remover os itens com

valores baixos de correlação no caso de o valor da consistência interna da escala ser inferior a .70

(Pallant, 2001). Não se verificaram associações negativas entre os itens e o total da escala e não se

verificaram itens cuja correlação com a escala fosse inferior a .10 (critério seguido igualmente por

Tietze, Bairrão, Leal, & Rossbach, 1998). Treze itens obtêm valor de correlação inferior a .30 (Arranjo

da sala, Chegada/ partida, Sesta, Mudança de fraldas/idas à sanita, Práticas de saúde, Jogo físico

activo, Arte, Música e movimento, Jogo dramático, Promover a aceitação da diversidade, Jogo livre,

Condições para satisfazer as necessidades pessoais do pessoal e Supervisão e avaliação do pessoal).

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Capítulo V

182

Quadro 13. Percentagem de salas cotadas nos 7 pontos da escala em cada item

Percentagem em cada ponto da escala

1 2 3 4 5 6 7 N

1. Espaço interior 9.4 9.4 29.4 44.4 0 1.9 5.6 160 2. Mobiliário para cuidados de rotina e jogo 23.8 16.3 3.8 43.8 2.5 9.4 0.6 160

3. Condições para relaxamento e conforto 4.4 23.1 41.3 26.3 1.3 1.9 1.9 160

4. Arranjo da sala 13.1 20.6 12.5 50.6 0 0 3.1 160

5. Material exposto para as crianças 0 3.1 40 44.4 1.3 11.3 0 160

6. Chegada/ partida 63.1 5.0 1.3 4.4 17.5 6.3 2.4 160

7. Refeições/ refeições ligeiras 71.3 9.4 4.4 14.4 0.6 0 0 160

8. Sesta 91.3 3.8 1.9 2.5 0 0 0.6 160

9. Mudança de fraldas/idas à sanita 95 4.4 0 0.6 0 0 0 160

10. Práticas de saúde 50.6 46.9 0.6 1.9 0 0 0 160

11. Práticas de segurança 33.1 32.5 10.6 23.8 0 0 0 160

12. Ajudar as crianças a compreender a linguagem 3.8 13.1 1.9 32.5 33.8 15.0 0 160

13. Ajudar as crianças a usar a linguagem 3.1 3.8 27.5 31.3 6.3 24.4 3.8 160

14. Utilizar livros 63.1 25 1.9 9.4 0 0 0.6 160

15. Motricidade fina 3.8 3.1 20.6 46.3 10.6 14.4 1.3 160

16. Jogo físico activo 40.6 48.8 3.1 6.9 0 0.6 0 160

17. Arte 8.8 36.9 3.1 44.4 1.3 3.8 1.9 160

18. Música e movimento 26.9 39.4 5.0 26.3 1.3 1.3 0 160

19. Blocos 68.1 1.9 15 13.8 0.6 0.6 0 160

20. Jogo dramático 6.3 27.5 10.6 25.0 25.6 5.0 0 160

21. Jogo de areia e água 89.3 10.1 0.6 0 0 0 0 160

22. Natureza/ciência 72.5 3.8 14.4 9.4 0 0 0 160

23. Uso de TV, vídeo e/ou computador 67.7 17.7 13.5 1.0 0 0 0 160

24. Promover a aceitação da diversidade 71.3 27.5 0.6 0.6 0 0 0 160

25. Supervisão do jogo e da aprendizagem 21.3 14.4 9.4 29.4 13.8 10 1.9 160

26. Interacção entre pares 1.9 3.1 13.1 31.9 39.4 10.6 0 160

27. Interacção adulto-criança 4.4 21.3 13.8 19.4 23.8 12.5 5.0 160

28. Disciplina 12.5 25.0 12.5 39.4 8.1 1.9 0.6 160

29. Horário 5.6 0.6 63.1 30 0 0 0.6 160

30. Jogo livre 11.9 77.5 5.0 3.8 1.3 0 0.6 160

31. Actividades de grupo 28.3 45.7 6.3 10.2 1.6 3.9 3.9 127 32. Medidas para crianças c/ incapacidades 25.0 31.3 6.3 18.8 0 0 18.8 16 33. Iniciativas para envolver os pais 11.3 10.6 21.9 49.4 4.4 1.9 0.6 160 34. Condições p/ as nec. pessoais do pessoal 2.5 6.3 19.4 64.4 5.0 1.3 1.3 160 35. Condições p/ as necessidades prof. do pessoal 4.4 1.9 31.9 32.5 0.6 12.5 16.3 160 36. Interacção e cooperação entre o pessoal 5.1 0.6 14.7 43.4 25.7 8.8 1.5 136 37. Continuidade do pessoal 11.3 11.3 0 21.9 14.4 40.6 0.6 160 38. Supervisão e avaliação do pessoal 40.6 2.5 34.4 21.9 0 0 0.6 160 39. Oportunidades p/ desenv. profissional 36.3 40.6 11.9 8.8 0 1.9 0.6 160

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Estudo da ITERS-R

183

Quadro 14. Coeficiente de correlação corrigido entre os itens da ITERS-R e a escala

Coeficiente item X total corrigido

1. Espaço interior .31 2. Mobiliário para cuidados de rotina e jogo .48 3. Condições para relaxamento e conforto .33 4. Arranjo da sala .20 5. Material exposto para as crianças .30 6. Chegada/partida .19 7. Refeições/refeições ligeiras .30 8. Sesta .13 9. Mudança de fraldas/idas à sanita .22 10. Práticas de saúde .24 11. Práticas de segurança .42 12. Ajudar as crianças a compreender a linguagem .45 13. Ajudar as crianças a usar a linguagem .50 14. Utilizar livros .51 15. Motricidade fina .50 16. Jogo físico activo .18 17. Arte .28 18. Música e movimento .10 19. Blocos .34 20. Jogo dramático .28 22. Natureza/ciência .47 24. Promover a aceitação da diversidade .10 25. Supervisão do jogo e da aprendizagem .51 26. Interacção entre pares .40 27. Interacção adulto-criança .35 28. Disciplina .50 29. Horário .36 30. Jogo livre .25 33. Iniciativas para envolver os pais .34 34. Condições p/ as necessidades pessoais do pessoal .29 35. Condições p/ as necessidades prof. do pessoal .39 37. Continuidade do pessoal .30 38. Supervisão e avaliação do pessoal .14 39. Oportunidades p/ desenv. profissional .34

2.4 Fidelidade

2.4.1 Acordo interobservadores

O acordo interobservadores foi verificado ao longo do processo de recolha de dados, tendo

sido efectuadas 44 observações com dois observadores, na totalidade das salas participantes (27.5%

das 160 salas). Considerando os 39 itens da escala, a percentagem de acordo exacto variou entre

43.18% e 100% (M = 78.58, DP = 15.13), a percentagem de acordo com um ponto de diferença variou

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Capítulo V

184

entre 84.09% e 100% (M = 96.38, DP = 4.42), o coeficiente kappa ponderado variou entre -.03 e 1.00

(M = .72, DP = .23) e o Coeficiente de Correlação Intraclasses (ICC) variou entre -.06 e 1.00 (M = .79,

DP = .24).

Quando foram considerados 34 itens, ou seja, os itens sem valores omissos, a percentagem de

acordo exacto variou entre 43.18% e 95.45% (M = 77.32, DP = 14.82), a percentagem de acordo com

um ponto de diferença variou entre 84.09% e 100% (M = 95.87, DP = 4.55), o coeficiente kappa

ponderado variou entre -.03 e .95 (M = .69, DP = .24) e o ICC variou entre -.06 e .99 (M = .77, DP =

.24). Apesar de os valores do coeficiente kappa ponderado terem sido baixos em 3 itens, a

percentagem de acordo exacto e com 1 ponto de diferença foi adequada, de tal modo que

consideramos haver fidelidade interobservadores. Os valores baixos ao nível do coeficiente kappa

ponderado devem-se essencialmente à reduzida variabilidade dos dados, ao nível dos itens (Uebersax,

2002).

2.4.2 Análise da consistência interna

Como foi já referido, alguns itens da ITERS-R podem ser cotados como Não Aplicável, o que

acarreta alguns constrangimentos ao nível da análise da consistência interna, dado que constituem

dados omissos. De facto, quando se calculou este índice de fidelidade incluindo todos os itens, o

programa SPSS automaticamente excluiu 152 participantes da análise (aqueles que apresentam dados

omissos em algum item). Tendo em consideração este facto, calculou-se o coeficiente alfa de

Cronbach para diversas situações: para os 39 itens (N = 8); para 38 itens (N = 66), excluindo o item 32

(Medidas para crianças com incapacidades), que é aquele que mais valores omissos inclui; e para 34

itens (N = 160), excluindo todos os itens com valores omissos. O valor do coeficiente alfa de Cronbach

foi de .75 (para os 39 itens), .78 para (38 itens) e .83 (para os 34 itens). Estes valores, considerados

adequados, indicam que o mesmo conceito está a ser avaliado ao longo da escala.

De forma a manter-se a escala o mais fiel possível à versão original, e tendo em conta que o

valor da consistência interna dos dados obtidos é adequado e a baixa correlação entre o item e a

escala se pode dever ao facto de alguns itens apresentarem variabilidade reduzida, decidimos

conservar os itens, referidos no ponto 2.3 (Sensibilidade/poder discriminativo dos itens), na escala.

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Estudo da ITERS-R

185

Quadro 15. Consistência interna das subescalas da ITERS-R

N Número de itens α

I - Espaço e mobiliário 160 5 .51 II - Rotinas de cuidados pessoais 160 6 .31 III - Escuta e conversação 160 3 .66 IV - Actividades 94 10 .53

Actividades sem item 23 149 9 .55 Actividades sem itens 21 e 23 160 8 .55

V - Interacção 160 4 .76 VI - Estrutura do programa 13 4 .37 Estrutura do programa sem item 32 127 3 .18

VII - Pais e pessoal 136 7 .53

Foi calculada ainda a consistência interna de cada uma das subescalas, definidas em termos

conceptuais (Quadro 15), tendo o valor do coeficiente alfa de Cronbach variado entre .18 na subescala

VI (Estrutura do programa, excluindo o item 32) e .76 na subescala V (Interacção). O valor da

consistência interna (alfa de Cronbach) pode ser reduzido, em algumas das subescalas, devido ao

pequeno número de itens (Pallant, 2001). Ainda assim, estes resultados levam-nos a considerar que

deve haver precaução quando se efectuam análises ao nível das subescalas.

2.5 Validade

2.5.1 Estrutura factorial

Os itens da ITERS-R foram submetidos a uma análise de componentes principais, da qual

foram excluídos os itens com valores omissos em mais do que 10% das salas (itens 21, 23, 31, 32 e

36). Os itens 8 (Sesta), 9 (Fraldas e idas à sanita) e 30 (Jogo livre) revelavam valores de assimetria e

de curtose muito elevados, tendo sido submetidos a transformações na tentativa de alterar essa

situação. A transformação do item 30, através do Logaritmo de base 10, atenuou o valor da curtose e,

assim, foi incluído na análise de componentes principais. Relativamente ao item Sesta, a inversão (1/

variável Sesta) fez reduzir o valor da curtose, situando-se ainda assim em valores elevados. Após se

efectuar a análise com e sem este item, optou-se por mantê-lo, uma vez que os resultados não

justificavam a sua eliminação. O item 9 (Fraldas e idas à sanita) foi excluído, dado que as

transformações recomendadas (Pallant, 2001) não alteravam o valor da curtose e teria um impacto

pernicioso na análise de componentes principais.

Previamente à análise de componentes principais, foram analisados e confirmados os

pressupostos de adequabilidade dos dados (Pallant, 2001). Foi eliminado o item 38 (Supervisão e

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Capítulo V

186

avaliação do pessoal), uma vez que a análise dos valores Kaiser-Meyer-Olkin para cada item revelou

que este obtinha um valor inferior a .50 (Field, 2005). A análise foi repetida considerando, portanto, 32

itens. A análise da matriz de correlações revelou a presença de coeficientes de .30 e superiores. O

valor Kaiser-Meyer-Olkin para a totalidade dos itens foi de .72. O teste de esfericidade de Bartlett

revelou-se estatisticamente significativo (p < .001).

A análise de componentes principais revelou a presença de 11 componentes com valores

próprios superiores à unidade (critério de Kaiser; Pallant, 2001). Como este valor pareceu excessivo, foi

analisado também o scree plot, que sugeria a possibilidade de se extraírem três componentes.

Foi efectuada a análise de componentes principais com rotação oblíqua e com rotação

varimax, para extracção de três componentes. Uma vez que a rotação oblíqua requeria demasiadas

iterações e não permitia obter uma estrutura simples (tal como sugerido por Kline, 1994), optou-se

pelos resultados da análise de componentes principais com rotação varimax, procedimento utilizado

igualmente em estudos que analisaram a estrutura factorial deste tipo de escalas (e.g., Tietze et al.,

1998). Os autores da escalas não divulgaram resultados relativos à estrutura factorial, pelo que não

houve possibilidade de confrontar procedimentos ou resultados.

No Quadro 16 são apresentadas as saturações factoriais com valor igual ou superior a .30.

Esta solução explica 33.23% da variância total. O primeiro factor está relacionado com itens relativos à

promoção da compreensão e utilização da linguagem e com itens referentes às relações estabelecidas

na creche, designando-se Interacção-Linguagem. O segundo factor relaciona-se essencialmente com

as actividades desenvolvidas, sua organização e materiais utilizados e com alguns cuidados pessoais

de rotina (Refeições, Práticas de Saúde), tendo sido designado Actividades-Rotinas. O último factor

engloba aspectos relacionados com as condições físicas da instituição, bem como aspectos relativos

às condições para os profissionais e para os pais, tendo sido adoptada a designação Espaço-Adultos.

Foram encontrados dois itens com saturação equivalente em dois factores (itens 25 e 39).

Seguindo a sugestão de Almeida e Freire (1997) e o procedimento adoptado por outros estudos (e.g.,

NICHD Early Child Care Research Network, 2000), foram analisadas as duas possibilidades (inclusão

dos itens nos dois factores nos quais saturavam) e o seu impacto na consistência interna. Após este

procedimento, optou-se por manter estes itens no factor em que conceptualmente faziam mais sentido,

uma vez que o valor da consistência interna era adequado. Assim, o item 25 (Supervisão do jogo e da

aprendizagem) foi incluído no factor Interacção-Linguagem e o item 39 (Oportunidades para

desenvolvimento profissional) foi incluído no factor Espaço-Adultos.

Foi calculado o valor da consistência interna (coeficiente alfa de Cronbach) para cada um dos

factores, tendo sido obtidos os valores de .81 para o factor Interacção-Linguagem, .76 para o factor

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Estudo da ITERS-R

187

Actividades-Rotinas e .65 para o factor Espaço-Adultos. O valor de consistência interna da componente

Interacção-Linguagem elevava-se para .83 caso o item 18 (Música e movimento) fosse eliminado.

Quadro 16. Análise de componentes principais da ITERS-R, com rotação varimax

Factor 1

Interacção-Linguagem

Factor 2 Actividades-

Rotinas

Factor 3 Espaço-Adultos

27. Interacção adulto-criança .82

12. Ajudar as crianças a compreender a linguagem .79

13. Ajudar as crianças a usar a linguagem .74

26. Interacção entre pares .70

28. Disciplina .70

18. Música e movimento .35

15. Motricidade Fina .73

20. Jogo dramático .65

22. Natureza/ciência .53

2. Mobiliário para cuidados de rotina e jogo .52

14. Utilizar livros .48

7. Refeições/refeições ligeiras .46

5. Material exposto para as crianças .41

24. Promover a aceitação da diversidade .40

30. Jogo livre .39

17. Arte .35

10. Práticas de saúde .34

19. Blocos .33

39. Oportunidades p/ desenvolvimento profissional .32

29. Horário .33

16. Jogo físico activo .33

35. Condições p/ satisfazer necessidades profissionais do pessoal .59

1. Espaço interior .58

25. Supervisão do jogo e da aprendizagem .54

37. Continuidade do pessoal .51

34. Condições p/ satisfazer as necessidades pessoais do pessoal .49

8. Sesta .48

11. Práticas de segurança .43

3. Condições para relaxamento e conforto .43

33. Iniciativas para envolver os pais .36

4. Arranjo da sala .35

6. Chegada/partida .32

11.61% 11.59% 10.03% % de variância explicada

33.23%

A análise exploratória dos dados das três componentes identificadas revelou estarem

cumpridos os pressupostos relativos à normalidade das distribuições. Não foram identificados outliers

que alterassem a distribuição dos dados ou as médias obtidas. Os resultados obtidos na componente

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Capítulo V

188

Interacção-Linguagem variaram entre 1.43 e 6.00 (M = 3.67, DP = 0.96), na componente Actividades-

Rotinas variaram entre 1.29 e 3.93 (M = 2.44, DP = 0.53) e na componente Espaço-Adultos variaram

entre 1.55 e 4.82 (M = 3.02, DP = 0.63).

Considerando a componente Interacção-Linguagem, a percentagem de acordo exacto variou

entre 43.18% e 88.64% (M = 56.17, DP = 15.40), a percentagem de acordo com um ponto de diferença

variou entre 84.09% e 100% (M = 91.55, DP = 5.52), o coeficiente kappa ponderado variou entre .48 e

.91 (M = .61, DP = .15) e o ICC variou entre .63 e .96 (M = .75, DP = .11). Considerando a componente

Actividades-Rotinas, a percentagem de acordo exacto variou entre 61.36% e 93.18% (M = 81.94, DP =

8.71), a percentagem de acordo com um ponto de diferença variou entre 90.91% e 100% (M = 97.08,

DP = 3.39), o coeficiente kappa ponderado variou entre .00 e .95 (M = .70, DP = .24) e o ICC variou

entre -.06 e .98 (M = .77, DP = .27). Por fim, considerando a componente Espaço-Adultos, a

percentagem de acordo exacto variou entre 65.91 e 95.45% (M = 82.64, DP = 8.76), a percentagem de

acordo com um ponto de diferença variou entre 86.36% e 100% (M = 96.90, DP = 4.10), o coeficiente

kappa ponderado variou entre .48 e .95 (M = .79, DP = .15) e o ICC variou entre .49 e .99 (M = .84, DP

= .16).

2.5.2 Relação com outras variáveis e comparação entre grupos

A validade dos dados da ITERS-R foi apreciada tomando como critério externo o envolvimento

de grupo, que é um indicador de qualidade. Como foi já referido, o registo do envolvimento de grupo foi

efectuado em apenas 110 salas, pelo que todas as análises que envolvem esta variável se referem a

110 participantes. Na variável envolvimento de grupo foram identificados dois outliers (salas 11 e 33),

que, por revelarem um impacto relevante na distribuição dos dados, foram retirados das análises. A

análise inferencial das distribuições, através do Teste de Kolmogorov-Smirnov, revelou estarem

cumpridos os pressupostos da normalidade dos dados relativos ao envolvimento de grupo, quando os

dois outliers referidos eram retirados.

Foi apurada uma associação positiva fraca, estatisticamente significativa, entre a qualidade (34

itens) e o envolvimento de grupo (r = .22, p = .018).

Tendo em conta a baixa variabilidade dos dados relativos à qualidade, que pode ter impacto no

valor da correlação, e de modo a explorar melhor o efeito da qualidade das salas no envolvimento de

grupo, dividiram-se as salas em quartis, de acordo com a qualidade média verificada nos 34 itens.

Comparou-se o envolvimento de grupo no primeiro e no quarto quartis. Foram encontradas diferenças

estatisticamente significativas e um efeito moderado (t(52) = -2.77, p = .009, r = .36), tendo sido

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Estudo da ITERS-R

189

observada uma maior percentagem de crianças envolvidas nas salas de qualidade mais elevada (M =

88.26, DP = 4.85) do que nas salas de qualidade mais baixa (M = 83.66, DP = 7.40).

Foi igualmente verificada a associação entre a qualidade das salas, tal como avaliada pela

ITERS-R, e determinadas características de estrutura: tamanho do grupo de crianças; número de

adultos da sala; rácio adulto-criança; e número de anos de educação formal, idade e anos de

experiência da pessoa responsável pela sala. A análise inferencial das distribuições através do Teste

de Kolmogorov-Smirnov permitiu apurar a violação do pressuposto da normalidade nos dados relativos

às variáveis de estrutura referidas, pelo que se recorreu a análises não paramétricas. Foram

encontradas associações positivas fracas, estatisticamente significativas, com o tamanho do grupo (rs =

.23, p = .003) e com o número de anos de educação formal do educador (rs = .29, p = .000); uma

associação negativa fraca, estatisticamente significativa, com o rácio adulto-criança (rs = -.22, p = .005);

e uma associação positiva moderada, estatisticamente significativa, dos resultados da ITERS-R com o

número de adultos da sala (rs = .41, p = .000).

Foi ainda verificado se a ITERS-R permite distinguir salas, em termos de qualidade, em função

das variáveis: tipo de instituição (IPSS ou com fins lucrativos), estatuto profissional da pessoa

responsável pela sala (educador ou auxiliar de educação) e idade a que se destinam as salas (1 - 2

anos, 2 - 3 anos, 1 - 3 anos). Como se pode verificar no Quadro 17, foram encontradas diferenças

estatisticamente significativas em função do tipo de instituição, sendo que as salas das IPSS

apresentaram qualidade mais elevada que as salas das instituições com fins lucrativos. O mesmo se

verificou relativamente ao estatuto profissional, sendo que as salas cujo responsável era um educador

de infância apresentaram melhor qualidade do que as outras salas. Em função da faixa etária,

utilizando o teste de análise de variância univariada (ANOVA), não foram encontradas diferenças

estatisticamente significativas entre a qualidade das salas destinadas a crianças de 1 – 2 anos (M =

2.79, DP = 0.51), 2 – 3 anos (M = 2.91, DP = 0.44) e 1 – 3 anos (M = 2.70, DP = 0.47) (F(2,157) = 1.85, p

= .16, ŋ2 = .02).

Quadro 17. Teste t de Student para a qualidade média da creche, em função do tipo de creche e

do estatuto profissional do educador

M DP t (gl) p r IPSS n = 80 2.92 0.43 Tipo de Creche

Lucrativa n = 80 2.76 0.51

2.17 (158) .032 .17

Educador de Infância n = 132 2.89 0.44 Estatuto

profissional Auxiliar de Educação n = 28 2.62 0.57

2.31 (34.28) .027 .37

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Capítulo V

190

O mesmo tipo de análises foi efectuado para as três componentes da qualidade, resultantes da

análise de componentes principais. Foi apurada uma associação positiva moderada, estatisticamente

significativa, entre o envolvimento de grupo e a componente Actividades-Rotinas (r = .34, p = .000).

Não foram encontradas associações estatisticamente significativas entre o envolvimento de grupo e as

componentes Espaço-Adultos (r = -.051, p = .598) e Interacção-Linguagem (r = .18, p = .065).

Dividindo as salas em quartis, de acordo com a qualidade média verificada nas três

componentes, e comparando o envolvimento de grupo nas salas de qualidade mais elevada (quarto

quartil) e nas salas de qualidade inferior (primeiro quartil), verificam-se diferenças estatisticamente

significativas na componente Actividades-Rotinas e na componente Interacção-Linguagem, sendo que

a percentagem de crianças envolvidas era maior nas salas que evidenciavam qualidade mais elevada

nas referidas componentes. Não havia diferenças estatisticamente significativas ao nível da

percentagem de crianças envolvidas, em função da qualidade na componente Espaço-Adultos (ver

Quadro 18).

Quadro 18. Teste t de Student para o envolvimento de grupo, em função dos resultados das salas

em três componentes da qualidade

M DP t (gl) p r Qualidade inferior n = 24 83.12 8.55 Interacção-

Linguagem Qualidade superior n = 29 87.80 5.31

-2.34 (36.92) .025 .36

Qualidade inferior n = 23 83.07 8.73 Actividades-

Rotinas Qualidade superior n = 26 88.53 4.58

-2.69 (32.33) .011 .41

Qualidade inferior n = 24 86.13 6.61 Espaço-Adultos

Qualidade superior n = 24 84.98 6.54

0.60 (45.99) .549 .09

Foi igualmente verificada a associação entre a qualidade das salas ao nível das três

componentes e características de estrutura da sala: tamanho do grupo de crianças; número de adultos

da sala; rácio adulto-criança; e número de anos de educação formal, idade e anos de experiência da

pessoa responsável pela sala.

Para a componente Interacção-Linguagem foram encontradas apenas associações negativas

fracas, estatisticamente significativas, com o tamanho do grupo (rs = -.21, p = .009) e com o rácio

adulto-criança (rs = -.27, p = .001). Para a componente Actividades-Rotinas foram encontradas

associações positivas moderadas, estatisticamente significativas, com o tamanho do grupo de crianças

(rs = .32, p = .000), o número de adultos na sala (rs = .35, p = .000) e o número de anos de educação

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Estudo da ITERS-R

191

formal do educador (rs = .31, p = .000). Ao nível da componente Espaço-Adultos foram encontradas

associações positivas moderadas, estatisticamente significativas, com o tamanho do grupo (rs = .37, p =

.000), o número de adultos presentes na sala (rs = .49, p = .000) e o número de anos de educação

formal do educador (rs = .30, p = .000); uma associação positiva fraca, estatisticamente significativa,

com o salário do educador (rs = .24, p = .012); e uma associação negativa fraca, estatisticamente

significativa, com o rácio adulto-criança (rs = -.16, p = .049).

Foi ainda verificado se é possível distinguir salas, em termos da qualidade observada nas

componentes, em função das variáveis tipo de instituição (IPSS ou com fins lucrativos), estatuto

profissional da pessoa responsável pela sala (educador ou auxiliar de educação) e idade a que as

salas se destinam (1 – 2 anos, 2 – 3 anos, 1 – 3 anos). Foram conduzidas análises de variância

multivariada (MANOVA), tendo sido confirmados os pressupostos requeridos por este tipo de análise.

Relativamente à variável tipo de instituição, foi encontrado um efeito moderado,

estatisticamente significativo, nas três componentes da qualidade (lambda de Wilk = 0.85, F(1,158) =

9.26, p = .000, ω2multi = .14). Os testes univariados revelaram diferenças estatisticamente significativas

na componente Espaço-Adultos, verificando-se um efeito moderado (F(1,158) = 21.35, p = .000, ŋ2 = .12).

As salas de IPSS revelaram qualidade mais elevada (M = 3.24, DP = 0.55) do que as salas de

instituições com fins lucrativos (M = 2.81, DP = 0.63).

No que se refere ao estatuto profissional, foi encontrado um efeito estatisticamente

significativo, de pequena magnitude, nas três componentes da qualidade (lambda de Wilk = 0.92,

F(1,158) = 4.49, p = .005, ω2multi = .07). Os testes univariados revelaram diferenças estatisticamente

significativas, de pequena magnitude, na componente Actividades-Rotinas (F(1,158) = 13.55, p = .000, ŋ2

= .08). As salas cujo responsável era um educador de infância apresentavam melhor qualidade (M =

2.51, DP = 0.51) do que as salas orientadas por auxiliares de educação (M = 2.12, DP = 0.53).

Em função da faixa etária, apesar de os grupos terem um número diferente de participantes, foi

cumprido o pressuposto de homogeneidade da variância. Foi encontrado um efeito grande,

estatisticamente significativo, nas três componentes da qualidade (lambda de Wilk = 0.68, F(2,157) =

11.06, p = .000, ω2multi = .31). Os testes univariados (ver Quadro 19), com a correcção de Bonferroni,

revelaram diferenças estatisticamente significativas apenas na componente Actividades-Rotinas, tendo

os testes post-hoc revelado que há diferenças estatisticamente significativas entre as salas 1 – 2 anos

e as salas 2 – 3 anos (sendo a qualidade superior nas salas de 2 – 3 anos).

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Capítulo V

192

Quadro 19. Testes univariados para a qualidade nas 3 componentes, em função da faixa etária

das salas

1 - 2 anos n = 65 M

(DP)

2 - 3 anos n = 80 M

(DP)

1 - 3 anos n = 15 M

(DP)

F (2,157)

p ŋ2 1- 2 vs

2 - 3

1 - 2 vs

1 - 3

2 - 3 vs

1 - 3

Interacção-Linguagem

3.84 (1.05)

3.54 (0.86)

3.61 (0.96)

1.84 .16 .02 ns ns ns

Actividades-Rotinas 2.19

(0.46) 2.64

(0.51) 2.46

(0.51) 15.03 .00 .16 *** ns ns

Espaço-Adultos 3.07

(0.67) 3.06

(0.59) 2.61

(0.53) 3.79 .03 .05 ns * *

*** p < .001 ; **<.01 * p <.05 ; ns = não significativo

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CAPÍTULO VI: Resultados

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195

Os dados apresentados nesta secção referem-se às 110 salas, que constituem a amostra

principal deste estudo. Serão apresentados os resultados relativos à qualidade das salas de creche

avaliada por observadores externos, aos critérios de qualidade valorizados pelos pais, aos critérios de

qualidade valorizados pelos educadores, à qualidade das salas de creche avaliada pelos pais e à

qualidade das salas de creche avaliada pelos educadores. Por fim, os resultados relativos aos

observadores externos, aos pais e aos educadores serão comparados.

Serão apresentados resultados que tiveram, de algum modo, como base a Escala de Avaliação

do Ambiente de Creche – ITERS-R. Uma vez que as subescalas da ITERS-R são apenas conceptuais,

não reunindo características métricas que nos permitam utilizá-las com segurança, foram criadas novas

categorias respeitando dois critérios que considerámos imprescindíveis para o estudo: (1) possibilitar

uma boa consistência interna dos dados (coeficiente alfa de Cronbach) recolhidos pelos três

instrumentos utilizados e (2) permitir responder às questões de investigação e hipóteses formuladas.

Assim, após ter sido efectuada a análise de componentes principais para todos os dados da

ITERS-R, correspondentes a 160 salas de creche, e de se terem analisado os valores de consistência

interna para as medidas envolvidas (Quadro 20), optou-se por utilizar as seguintes dimensões: (1)

Interacção-Linguagem; (2) Actividades-Rotinas; e (3) Espaço-Adultos. As referidas medidas são: a

qualidade avaliada por observadores externos (ITERS-R), a qualidade percepcionada pelos pais, a

qualidade percepcionada pelos educadores, a importância atribuída pelos pais e a importância

atribuída pelos educadores aos itens da escala. Os valores apresentados neste quadro referem-se a

110 salas participantes.

Os itens incluídos nestas três dimensões correspondem na sua maioria aos resultados da

análise de componentes principais apresentada anteriormente. Na dimensão 2, Interacção-Linguagem,

foi eliminado o item 18 (Música e movimento) e na dimensão 3, Espaço-Adultos, foi eliminado o item 4

(Arranjo da sala). Estes itens foram eliminados das análises, por duas razões, verificadas em

simultâneo: (1) a sua relação com a média da componente em que se incluía era inferior a .30 e (2) o

valor da consistência interna aumentava quando este item era eliminado. Foram consideradas outras

soluções possíveis ao nível do agrupamento de itens sem, contudo, serem obtidos resultados

pertinentes e adequados em termos de consistência interna. Foi efectuada a análise exploratória de

dados, de modo a verificar a normalidade das distribuições. Apresentam distribuição normal, indicada

pelos testes Kolmogorov-Smirnov, as variáveis da qualidade avaliada pelo observador externo,

utilizando a ITERS-R, nas três dimensões, a variável de qualidade avaliada pelos pais na dimensão

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Capítulo VI: Resultados

196

Actividades-Rotinas e na dimensão Espaço-Adultos e as variáveis de qualidade avaliada pelos

educadores nas três dimensões. As restantes variáveis (i.e., todas as variáveis referentes à

importância atribuída pelos pais e educadores aos itens, bem como a variável de avaliação da

qualidade pelos pais na dimensão Interacção-Linguagem) apresentam distribuições não normais, pelo

que serão utilizados testes não-paramétricos quando estas variáveis estiverem envolvidas. As

tentativas de transformação dos dados não alteraram as distribuições. Não foram identificados outliers

que tivessem impacto na distribuição dos dados ou nos valores médios das variáveis.

Quadro 20. Consistência interna dos dados das dimensões da qualidade

Coeficiente alfa de Cronbach

Q. Pais Q. Educadores ITERS-R

I II I II

Interacção-Linguagem 12. Ajudar a compreender a linguagem 13. Ajudar as crianças a usar a linguagem 25. Supervisão do jogo e da aprendizagem 26. Interacção entre pares 27. Interacção adulto-criança 28. Disciplina

.86 .78 .90 .56 .91

Actividades-Rotinas 2. Mobiliário p/ cuidados de rotina e jogo 5. Material exposto para as crianças 7. Refeições/ refeições ligeiras 10. Práticas de saúde 14. Utilizar livros 15. Motricidade fina 16. Jogo físico activo 17. Arte 19. Blocos 20. Jogo dramático 22. Natureza/ciência 24. Promover a aceitação da diversidade 29. Horário 30. Jogo livre

.77 .86 .93 .82 .92

Espaço-Adultos 1. Espaço interior 3. Condições p/ relaxamento e conforto 6. Chegada/ Partida 8. Sesta 11. Práticas de segurança 33. Iniciativas para envolver os pais 34. Condições p satisfazer necessidades pessoais do pessoal 35. Condições p satisfazer necessidades profissionais do pessoal 37. Continuidade do pessoal 39. Oportunidades para desenvolvimento profissional

.62 .83 .87 .64 .88

I – Questionários sobre Importância dos Itens da ITERS-R II – Questionários de Avaliação da Qualidade do Ambiente de Creche

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Qualidade avaliada por observadores externos

197

1. Qualidade das salas de creche avaliada por observadores externos

1.1 Resultados descritivos

As salas de creche que participaram neste estudo (N = 110) revelaram uma qualidade global

que Harms, Cryer e Clifford (1990) consideram inadequada ou, em alguns casos, mínima. Para

obtenção dos resultados médios foram considerados 34 itens, tendo sido eliminados os itens com

valores omissos em mais do que 10% das salas (Jogo de areia e água, Uso de TV, vídeo e/ou

computador, Actividades de grupo, Medidas para crianças com incapacidades e Interacção e

cooperação entre o pessoal). Os resultados globais obtidos na ITERS-R variaram entre 1.62 e 4.00,

registando-se uma qualidade média de 2.83 (DP = 0.47), com 60.9% das salas a obterem resultados

médios inferiores a 3.00 (indicando possuírem uma qualidade pobre e cuidados inadequados) e 39.1%

das salas a obterem resultados entre 3.00 e 4.99, o que evidencia uma qualidade mínima. Não se

observaram salas com resultados médios iguais ou superiores a 5.00, ou seja, não foram evidenciados

cuidados de qualidade boa ou excelente. As análises exploratórias permitiram confirmar os

pressupostos de normalidade da distribuição. Não foram identificados outliers que alterassem a

distribuição dos dados ou os resultados médios obtidos.

Ao nível dos itens, quando foram considerados os 39 itens da ITERS-R (ver Quadro 21), os

resultados obtidos variaram entre 1.06 e 4.41. Quando foram analisados os 34 itens, ou seja, excluindo

os 5 itens com valores omissos, os resultados obtidos variaram igualmente entre 1.06 e 4.41.

Dos 39 itens, 19 tiveram resultado médio inferior a 3.00, revelando uma qualidade fraca ou

inadequada; 20 itens tiveram resultado médio entre 3.00 e 5.00, revelando a existência de qualidade

mínima; e não houve itens cujo resultado médio se tenha situado em valores equivalentes a qualidade

boa ou excelente (isto é, média igual ou superior a 5.00).

Os itens com resultados mais baixos relacionavam-se maioritariamente com as rotinas e com

as actividades promovidas. Os itens Refeições e refeições ligeiras, Sesta, Mudança de fraldas/idas à

sanita, Práticas de saúde, Utilizar livros, Jogo físico activo, Blocos, Jogo de areia e água,

Natureza/ciência, Uso de TV, vídeo e/ou computador e Promover a aceitação da diversidade tiveram

cotação média inferior a 2.00. Havia, ainda, outros itens com valor médio considerado inadequado, mas

situados entre 2.00 e 2.99: Chegada/partida, Práticas de segurança, Música e movimento, Jogo livre,

Actividades de grupo, Medidas para crianças com incapacidades, Supervisão e avaliação do pessoal e

Oportunidades para desenvolvimento profissional. Os itens com resultado médio mais elevado, igual ou

superior a 4.00, relacionavam-se maioritariamente com a linguagem, a interacção e as condições para

os profissionais. Tiveram cotação média igual ou superior a 4.00 os itens: Ajudar as crianças a

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Capítulo VI: Resultados

198

compreender a linguagem, Ajudar as crianças a usar a linguagem, Motricidade fina, Interacção entre

pares, Condições para satisfazer as necessidades profissionais do pessoal, Interacção e cooperação

entre o pessoal e Continuidade do pessoal.

Quadro 21. Estatísticas descritivas dos itens da ITERS-R

Mínimo - Máximo

M DP N

1. Espaço interior 1 - 7 3.58 1.34 110 2. Mobiliário para cuidados de rotina e jogo 1 - 6 3.05 1.48 110 3. Condições para relaxamento e conforto 1 - 7 3.01 0.95 110 4. Arranjo da sala 1 - 7 3.18 1.14 110 5. Material exposto para as crianças 2 - 6 3.77 1.00 110 6. Chegada/partida 1 - 7 2.35 2.06 110 7. Refeições/refeições ligeiras 1 - 4 1.62 1.12 110 8. Sesta 1 - 7 1.21 0.78 110 9. Mudança de fraldas/idas à sanita 1 - 4 1.06 0.34 110 10. Práticas de saúde 1 - 4 1.57 0.61 110 11. Práticas de segurança 1 - 4 2.32 1.17 110 12. Ajudar as crianças a compreender a linguagem 1 - 6 4.08 1.38 110 13. Ajudar as crianças a usar a linguagem 1 - 7 4.00 1.42 110 14. Utilizar livros 1 - 4 1.56 0.95 110 15. Motricidade fina 1 - 7 4.00 1.28 110 16. Jogo físico activo 1 - 6 1.91 0.96 110 17. Arte 1 - 7 3.03 1.38 110 18. Música e movimento 1 - 6 2.41 1.22 110 19. Blocos 1 - 6 1.81 1.25 110 20. Jogo dramático 1 - 6 3.36 1.45 110 21. Jogo de areia e água 1 - 3 1.08 0.31 102 22. Natureza/ciência 1 - 4 1.52 0.99 110 23. Uso de TV, vídeo e/ou computador 1 - 4 1.52 0.79 67 24. Promover a aceitação da diversidade 1 - 4 1.30 0.53 110 25. Supervisão do jogo e da aprendizagem 1 - 7 3.59 1.68 110 26. Interacção entre pares 1 - 6 4.28 1.05 110 27. Interacção adulto-criança 1 - 7 3.85 1.66 110 28. Disciplina 1 - 6 3.07 1.27 110 29. Horário 1 - 7 3.19 0.85 110 30. Jogo livre 1 - 5 2.06 0.75 110 31. Actividades de grupo 1 - 7 2.21 1.42 84 32. Medidas para crianças c/ incapacidades 1 - 7 2.70 1.89 10 33. Iniciativas para envolver os pais 1 - 7 3.51 1.06 110 34. Condições p/ nec. pessoais do pessoal 1 - 7 3.78 0.92 110 35. Condições p/ nec. prof. do pessoal 1 - 7 4.26 1.76 110 36. Interacção e cooperação entre o pessoal 1 - 7 4.14 1.24 93 37. Continuidade do pessoal 1 - 7 4.41 1.78 110 38. Supervisão e avaliação do pessoal 1 - 7 2.36 1.29 110 39. Oportunidades p/ desenv. profissional 1 - 7 2.04 1.19 110

Relativamente às três dimensões da qualidade, poderemos referir que a média mais elevada

foi obtida na dimensão Interacção-Linguagem, variando o seu valor entre 1.17 e 6.33 (M = 3.81, DP =

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Qualidade avaliada por observadores externos

199

1.09). A média mais baixa foi obtida na dimensão Actividades-Rotinas, variando a sua cotação entre

1.29 e 3.93 (M = 2.41, DP = 0.54). Esta dimensão apresentou valores médios que correspondem a

qualidade inadequada. A dimensão Interacção-Linguagem e a dimensão Espaço-Adultos, cujo valor

variou entre 1.60 e 4.50 (M = 3.05, DP = 0.65), obtiveram valores médios equivalentes a qualidade

mínima. De salientar, ainda, que foram observadas salas que ao nível da dimensão Interacção-

Linguagem reuniam condições de boa qualidade (média igual ou superior a 5.00).

Foi conduzida uma ANOVA para medidas repetidas, de forma a explorar estas diferenças. A

análise inferencial das distribuições dos dados relativos às dimensões da qualidade, através do Teste

Kolmogorov-Smirnov, revelou estarem cumpridos os pressupostos da normalidade das distribuições e

não foram identificados outliers que alterassem as distribuições dos dados ou as médias obtidas. Uma

vez que foi violado o pressuposto de esfericidade dos dados, verificado através do teste de Mauchly

(χ2(2) = 35.03, p = .000), foi utilizada a correcção de Greenhouse-Geisser. Foram encontradas

diferenças estatisticamente significativas (F(1.57, 170.72) = 117.06, p = .000, ŋ2 = .52). Os testes post-hoc,

com o ajuste de Bonferroni, revelaram a existência de diferenças estatisticamente significativas entre

todos os pares de dimensões (Interacção-Linguagem vs Actividades-Rotinas, Interacção-Linguagem vs

Espaço-Adultos e Actividades-Rotinas vs Espaço-Adultos), sendo, como foi referido, mais elevada a

média da dimensão Linguagem-Interacção, seguida pela dimensão Espaço-Adultos e, com a menor

média, a dimensão Actividades-Rotinas.

Foi verificada uma associação positiva moderada entre os resultados obtidos pelas salas na

dimensão Interacção-Linguagem e na dimensão Actividades-Rotinas (r = .34, p = .000), uma

associação positiva moderada entre os resultados obtidos na dimensão Actividades-Rotinas e na

dimensão Espaço-Adultos (r = .38, p =.000) e uma associação positiva fraca entre os resultados

obtidos na dimensão Interacção-Linguagem e na dimensão Espaço-Adultos (r = .26, p =.006).

1.2 Relação com outras variáveis e comparação entre grupos

Foram analisadas as associações entre a qualidade média das salas e outras variáveis: idade

média das crianças da sala, tamanho do grupo de crianças, número de adultos da sala, número de

crianças por adulto e número de anos de educação formal, idade, anos de experiência e salário líquido

mensal da pessoa responsável pela sala (ver Quadro 22). Foram utilizadas análises não paramétricas,

uma vez que os dados relativos a algumas destas variáveis violavam o pressuposto da normalidade

das distribuições. Verificou-se a existência de uma associação positiva moderada, estatisticamente

significativa, entre a qualidade média e o número de adultos da sala. Verificaram-se associações

Page 200: Qualidade em Contexto de Creche: Ideias e Práticas · qualidade das salas de creche do que os pais e do que os responsáveis pelas salas de creche. Os resultados obtidos sugerem

Capítulo VI: Resultados

200

positivas fracas, estatisticamente significativas, entre a qualidade média e as variáveis: tamanho do

grupo de crianças e número de anos de educação formal do adulto responsável pela sala. Verificou-se

uma associação negativa fraca, estatisticamente significativa, entre a qualidade média e o número de

crianças por adulto. Não foram encontradas associações, estatisticamente significativas, entre a

qualidade média e a idade média das crianças da sala, o número de anos de experiência do educador,

a sua idade e o salário líquido mensal. Assim, poderemos considerar que foram as salas com mais

crianças, mais adultos, menos crianças por adulto e cujo educador tem mais anos de educação formal

que revelaram qualidade global mais elevada.

Quadro 22. Coeficientes de correlação de Spearman entre a qualidade das salas e outras variáveis

Média

34 itens Interacção-Linguagem

Actividades-Rotinas

Espaço-Adultos

Idade média das crianças da sala .02 .22* .35*** -.09

Tamanho do grupo de crianças .19* -.18 .27** .35***

Número de adultos da sala .36*** .05 .32** .43***

Número de crianças por adulto -.24* -.27** -.10 -.16

Anos de educação formal do educador .29** .07 .35*** .32**

Anos de experiência do educador .03 -.05 .07 -.03

Idade do educador .04 -.06 .07 -.02

Salário do educador .14 -.03 .16 .22*

* p < .05; **p < .01; ***p < .001

Foi verificada ainda a associação entre as mesmas variáveis e as médias obtidas em cada

uma das dimensões da qualidade (ver Quadro 22). Em relação à variável Interacção-Linguagem, foi

encontrada uma associação positiva fraca, estatisticamente significativa, entre a qualidade e a idade

média das crianças da sala e uma associação negativa fraca, estatisticamente significativa, entre a

qualidade e o número de crianças por adulto. Por outras palavras, grupos com crianças mais velhas e

com menos crianças por adulto estavam associados a qualidade mais elevada das salas na Interacção-

Linguagem.

No que se refere à dimensão Actividades-Rotinas, foram encontradas associações positivas

moderadas, estatisticamente significativas, entre a qualidade e a idade média das crianças da sala, o

número de adultos e o número de anos de educação formal do educador e uma associação positiva

fraca, estatisticamente significativa entre a qualidade e o tamanho do grupo de crianças. Assim, foram

as salas com crianças mais velhas, com mais crianças, mais adultos e cujo educador tem um nível

educativo mais elevados que evidenciaram qualidade mais elevada nas Actividades-Rotinas.

Relativamente à dimensão Espaço-Adultos, foi encontrada uma associação positiva moderada,

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Qualidade avaliada por observadores externos

201

estatisticamente significativa, entre a qualidade e o tamanho do grupo de crianças, o número de adultos

da sala e a educação formal do educador e uma associação positiva fraca, estatisticamente

significativa, entre a qualidade e o salário do educador. Deste modo, foram as salas com mais crianças,

mais adultos e cujo educador tinha nível de educação formal e salário mais elevados que revelam

melhor qualidade ao nível do Espaço-Adultos.

Foi também analisado o efeito do tipo de instituição (IPSS ou com fins lucrativos), do estatuto

profissional da pessoa responsável pela sala (educador ou auxiliar de educação) e da faixa etária a que

as salas se destinam (1 - 2 anos ou 2 - 3 anos) na qualidade média das salas, conduzindo testes t de

Student (ver Quadro 23). A qualidade das salas de creche parece variar em função do estatuto

profissional ou formação do adulto responsável pela sala. Assim, a qualidade das salas orientadas por

educadores de infância é significativamente superior à qualidade das salas orientadas por auxiliares de

educação. Não se verificaram diferenças estatisticamente significativas entre as salas em função do

tipo de instituição. O índice da significância prática (magnitude do efeito) sugeriu a existência dum

efeito pequeno do tipo de instituição (r = .17). Neste grupo de salas de creche, não se verificaram

diferenças estatisticamente significativas entre as salas em função da faixa etária a que se destinavam,

tendo o cálculo do coeficiente r de Pearson indicado um efeito pequeno desta variável (r = .13).

Quadro 23. Teste t de Student para a qualidade avaliada por observadores externos, em função do

estatuto profissional, do tipo de creche e da faixa etária

M DP t (gl) p r IPSS n = 55 2.90 0.44 Tipo de Creche

Lucrativa n = 55 2.75 0.49

1.70 (108) .09 .16

1 – 2 anos n = 56 2.77 0.48 Faixa etária

2 – 3 anos n = 54 2.89 0.46

-1.37 (108) .17 .13

Educador de Infância n = 89 2.89 0.44 Estatuto

profissional Auxiliar de Educação n = 21 2.58 0.51

2.82 (108) .01 .26

Foi também analisado o efeito do tipo de instituição (IPSS ou com fins lucrativos), da faixa

etária a que as salas se destinam (1 - 2 anos ou 2 - 3 anos) e do estatuto profissional da pessoa

responsável pela sala (educador ou auxiliar de educação) nos valores médios obtidos nas três

dimensões da qualidade. Foram conduzidas análises de variância multivariada (MANOVA). Não foram

identificados outliers, verificados através do cálculo das distâncias de Mahalanobis. Foi cumprido o

Page 202: Qualidade em Contexto de Creche: Ideias e Práticas · qualidade das salas de creche do que os pais e do que os responsáveis pelas salas de creche. Os resultados obtidos sugerem

Capítulo VI: Resultados

202

pressuposto da normalidade univariada das distribuições.

Relativamente ao efeito do tipo de instituição, foram cumpridos os pressupostos necessários

para se conduzir uma MANOVA. Verificou-se que o tipo de instituição tinha um efeito significativo, de

magnitude média, na qualidade das salas nas dimensões avaliadas (lambda de Wilk = 0.87, F(1,108) =

5.30, p = .002, ω2multi = .12). Para se explorar este efeito, analisaram-se os resultados dos testes

univariados, tendo sido encontradas diferenças estatisticamente significativas, com a correcção de

Bonferroni (p = .0167), na dimensão Espaço-Adultos (F(1,108) = 9.58, p = .003, ŋ2 = .08), sendo que as

salas de IPSS revelavam qualidade mais elevada (M = 3.23, DP = 0.61) do que as salas de instituições

com fins lucrativos (M = 2.86, DP = 0.64). Na dimensão Actividades-Rotinas não foram encontradas

diferenças estatisticamente significativas entre a qualidade das salas de IPSS (M = 2.50, DP = 0.52) e

das salas de instituições com fins lucrativos (M = 2.32, DP = 0.55, F(1,108) = 3,09, p = .08, ŋ2 = .03). Na

dimensão Interacção-Linguagem não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas (F

(1,108) = 1.23, p = .27, ŋ2 = .01) entre a qualidade das salas de IPSS (M = 3.70, DP = 1.13) e das salas

de instituições com fins lucrativos (M = 3.93, DP = 1.05).

Relativamente ao efeito da faixa etária da sala, foram cumpridos os pressupostos necessários

para se conduzir a MANOVA. Verificou-se que a faixa etária tinha um efeito significativo, de grande

magnitude, na qualidade das salas nas dimensões avaliadas (lambda de Wilk = 0.65, F(1,108) = 18.67, p

= .000, ω2multi = .34). Para se explorar este efeito, analisaram-se os testes univariados. Utilizando a

correcção de Bonferroni (p = .0167), foram encontradas diferenças estatisticamente significativas na

componente Actividades-Rotinas (F(1,108) = 31.64, p = .000, ŋ2 = .23). As salas 1 – 2 anos revelaram

qualidade inferior (M = 2.16, DP = 0.42) às salas 2 – 3 anos (M = 2.67, DP = 0.53). Na dimensão

Interacção-Linguagem não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas (F(1,108) = 0.99,

p = .322, ŋ2 = .01) entre as salas 1 – 2 anos (M = .91, DP = 1.15) e as salas 2 – 3 anos (M = 3.71, DP =

1.02). Na dimensão Espaço-Adultos também não foram encontradas diferenças estatisticamente

significativas ) (F(1,108) = 0.30, p = .587, ŋ2 = .00) entre as salas 1 – 2 anos (M = 3.08, DP = 0.66) e as

salas 2 – 3 anos (M = .01, DP = 0.64).

No que se refere ao estatuto profissional da pessoa responsável pela sala, foram cumpridos os

pressupostos necessários para se conduzir a MANOVA. Foi encontrado um efeito estatisticamente

significativo, de magnitude pequena, do estatuto profissional do educador na qualidade das salas nas

dimensões da qualidade (lambda de Wilk = 0.91, F(1,108) = 3.69, p = .014, ω2 = .08). Através dos testes

univariados, utilizando a correcção de Bonferroni, foram encontradas diferenças estatisticamente

significativas na componente Actividades-Rotinas (F(1,108) = 10.57, p = .002, ŋ2 = .09). As salas cujo

responsável era um educador de infância apresentavam melhor qualidade (M = 2.49, DP = 0.52) do

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Qualidade avaliada por observadores externos

203

que as salas orientadas por auxiliares de educação (M = 2.08, DP = 0.48). Ao nível da dimensão

Espaço-Adultos, não se encontraram diferenças estatisticamente significativas (F(1,108) = 3,60, p = .061,

ŋ2 = .03) entre a qualidade das salas orientadas por educadoras de infância (M = 3.10, DP = 0.64) e as

salas orientadas por auxiliares (M = 2.81, DP = 0.62). Não foram encontradas diferenças

estatisticamente significativas na dimensão Interacção-Linguagem entre as salas que tinham

educadora de infância (M = 3.87, DP = 1.06) e as salas que tinham apenas auxiliar(es) (M = 3.59, DP =

1.22, F(1,108) = 1.10, p = .396, ŋ2 = .01).

Page 204: Qualidade em Contexto de Creche: Ideias e Práticas · qualidade das salas de creche do que os pais e do que os responsáveis pelas salas de creche. Os resultados obtidos sugerem

Capítulo VI: Resultados

204

2. Critérios de qualidade valorizados pelos pais

2.1 Estudo qualitativo

Como foi referido no Capítulo IV (Métodos), foram criadas oito categorias para codificação e

análise dos dados (ver Quadro 24). Todos os pais identificaram as Rotinas de cuidados pessoais como

tendo grande importância numa creche. As categorias Actividades (incluindo os materiais disponíveis

para a sua realização) e Interacção foram focadas por 95% dos pais, ou seja, apenas um dos pais não

referiu estas características. Noventa por cento dos pais referiram aspectos relacionados com o espaço

e mobiliário e outros critérios não incluídos na ITERS-R, percentagem que corresponde a 18

participantes. A categoria Pais e pessoal foi referida por 75% dos pais. Das oito categorias, as menos

referidas foram Escuta e conversação e Estrutura do programa.

Quadro 24. Número e percentagem de pais que referiram cada categoria

Categoria N.º de pais % de pais

I. Espaço e mobiliário 18 90 II. Rotinas de cuidados pessoais 20 100 III. Escuta e conversação 7 35 IV. Actividades 19 95 V. Interacção 19 95 VI. Estrutura do programa 11 55 VII. Pais e pessoal 15 75 VIII. Outros Critérios 18 90

O Quadro 25 apresenta o número de pais (e respectivas percentagens) que referiram cada

uma das subcategorias, e não o número de unidades de registo por subcategoria. As características

focadas por um maior número de pais (pelo menos 75% dos participantes), ao descrever creches de

boa ou má qualidade, foram a Interacção adulto-criança (95% dos pais), os Materiais ou actividades

não especificados (95%), o Espaço interior (90%), as Refeições/refeições ligeiras (80%) e a Interacção

entre pares (75%). As características mencionadas por 50 a 70% dos pais foram: Iniciativas para

envolver os pais (70%), Práticas de saúde/higiene (65%), Disciplina (60%), Jogo livre (55%) e

Características do pessoal (50%). As subcategorias Natureza, Utilização de televisão ou vídeo,

Medidas para crianças com incapacidades e Oportunidades para desenvolvimento profissional foram

focadas por apenas um dos pais. As subcategorias Condições para as necessidades pessoais do

pessoal e Supervisão e avaliação do pessoal não foram focadas por pais, apenas por educadoras. Os

itens da ITERS-R Jogo de areia e água, Promover a aceitação da diversidade, Actividades de grupo e

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Critérios valorizados pelos pais

205

Condições para satisfazer as necessidades profissionais do pessoal não foram focados pelos pais nem

pelos educadores.

Quadro 25. Número e percentagem de pais que referiram cada subcategoria

Subcategoria N.º de pais %

1. Espaço interior 18 90 2. Mobiliário para cuidados de rotina e jogo 2 10 3. Medidas para relaxamento e conforto 3 15 4. Arranjo da sala 3 15 5. Material exposto para as crianças 3 15 6. Chegada/partida 6 30 7. Refeições/refeições ligeiras 16 80 8. Sesta 4 20 9. Práticas de saúde/higiene 13 65 10. Práticas de segurança 8 40 11. Rotinas não especificadas 8 40 12. Ajudar as crianças a compreender e usar a linguagem 7 35 13. Utilizar livros 2 10 14. Motricidade fina 2 10 15. Jogo físico activo 9 45 16. Arte 5 25 17. Música e movimento 3 15 18. Blocos 2 10 19. Jogo dramático 2 10 20. Natureza 1 5 21. Utilização de televisão ou vídeo 1 5 22. Materiais/actividades não especificados 19 95 23. Supervisão do jogo e da aprendizagem 5 25 24. Interacção entre pares 15 75 25. Interacção adulto-criança 19 95 26. Disciplina 12 60 27. Horário 4 20 28. Jogo livre 11 55 29. Medidas para crianças com incapacidades 1 5 30. Iniciativas para envolver os pais 14 70 31. Condições para satisfazer as necessidades pessoais do pessoal 0 0 32. Interacção e cooperação entre o pessoal 3 15 33. Continuidade do pessoal 3 15 34. Supervisão e avaliação do pessoal 0 0 35. Oportunidades para desenvolvimento profissional 1 5 36. Número de adultos 5 25 37. Número de crianças 8 40 38. Faixa etária 3 15 39. Qualificação da educadora 7 35 40. Características do pessoal 10 50 41. Direcção/organização 4 20 42. Outros critérios não especificados 7 35

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Capítulo VI: Resultados

206

Os dados recolhidos através das entrevistas realizadas aos pais permitem caracterizar uma

creche de boa qualidade, referindo também os aspectos que fazem com que uma creche seja de má

qualidade. São apresentados de seguida excertos das entrevistas, que permitem ilustrar cada uma das

subcategorias. Cada excerto contém o número de identificação dos pais (e.g. P1) e especifica se o

entrevistado foi o pai ou a mãe.

1. Espaço interior

“(…) Ter o mínimo e fundamental pelo menos estabelecido por lei. Quando eu digo as instalações, porque às vezes é

só fachada, também não entendo que tenha que ser topo de gama, não é? Quando eu digo, lá está, pouco e bom. E

pelo menos o estabelecido por lei, desde a dimensão das salas, ter salas que… Ser, não digo um edifício criado de

raiz, mas pelo menos com as adaptações necessárias ao espaço, pronto, ao fim que se destina, não é? Acho que isso

é importante. (…) Por exemplo, pensando em meninos deficientes (…) Mas, por exemplo, um menino com 3 anos, só

se vier ao colo, não é? É uma das limitações, por acaso esta creche que eu já reparei, não tem rampas…” (P1 Mãe)

“Onde está o J. é um local pequenino, que eu acho um local muito pequenino, com divisões muito pequeninas, mas

acho que ter maiores espaços (…) e não um local pequenino onde as crianças andam a esbarrar umas nas outras.”

(P3 Mãe)

“Olhe, não gostei das instalações, numa delas as crianças estavam numa cave, numa cave com janelas altas, tinha

luz directa, mas pouca luz, eu achei horrível. (…) o espaço físico (…) Eu acho que aqui esta creche tem, as salas são

grandes, são arejadas, são iluminadas, eu acho que é essencial.” (P5 Mãe)

“A nível de, digamos, de aquecimento, por exemplo, acho que está bom. Isto é novo, tem que estar bom, antigamente

não, mas agora isto é novo, está bom.” (P6 Pai)

“[má qualidade] e já fui a muitos em que são as casas velhas, o chão, as paredes em mau estado, as louças (…)” (P7

Mãe)

2. Mobiliário para cuidados de rotina e jogo

“As louças da casa-de-banho estão apropriadas para ele (…).” (P6 Pai)

“As mesas, os armários para colocar ou jogos ou os livros, ali mesmo prateleiras mesmo para colocar os livros.” (P14

Mãe)

3. Medidas para relaxamento e conforto

“É assim, conforto mesmo para as crianças, que eu acho que eles até se sentiam em casa. Para (…) se sentirem

mesmo como se estivessem em casa, mesmo mais familiar. (…) como fui ama também, em casa, eu tentava manter o

quarto deles o mais aconchegante possível. Mesmo a parecer, que eles diziam mesmo: Onde é o meu quarto? Aqui é

o meu quarto, aqui é a minha cama. Mesmo sabendo que a casa não era deles, mas sabiam que aquele espaço que

era. Portanto, eu acho que isso é fundamental para uma criança que se está a desenvolver e que são os homens e

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Critérios valorizados pelos pais

207

mulheres de amanhã e para terem outra ideia, e para terem conforto, que eu acho que o conforto é muito importante.”

(P14 Mãe)

“(…) tem que ter um espaço calmo para ele descansar.” (P9 Mãe)

4. Arranjo da sala

“Uma das coisas que reparei foi que não tinha muitos brinquedos, mas os brinquedos que tinham eram bons

brinquedos, eram… estavam muito bem organizados, tudo era pensado.” (P1 Mãe)

“Uma boa organização. É, uma boa organização. Acho que é isso.” (P2 Mãe)

“(…) e principalmente um sítio onde qualquer pessoa possa ter acesso sem muitas restrições e que as educadoras os

possam ver e estar quase em cima deles, que não tenham muitos obstáculos…” (P9 Mãe)

5. Material exposto para as crianças

“Se calhar com muita cor, com muitos bonecos nas paredes, com mobiles pendurados no tecto (…) E há

cuidados, nota-se as coisinhas penduradas e assim, mas se calhar podia ter mais. (…) Sim, sim, sim, porque as

questões secundárias é que não são satisfeitas, que é a nível da decoração, do espaço.” (P13 Mãe)

“A parte do espaço eu gosto muito, confesso que… (…) porque eu acho que na pré-primária e nas creches deve

haver muitas paredes, porque eles põem os desenhos deles e as coisas deles e eles conseguem ter luz directa e

ter as paredes todas por ocupar sem janelas. Eu acho isto fantástico, acho uma creche muito gira.” (P18 Mãe)

6. Chegada/partida

“(…) eu entro na sala a qualquer hora, quando se justifica, e não sou avisada. Porque muitos dos infantários, os

meninos ficam à entrada, vão, portanto os pais nem conhecem o espaço, nem conhecem os brinquedos, por exemplo,

com que os meninos brincam, nem as actividades que fazem, esse tipo de… para mim não dava. Eu tinha que me

sentir segura, eu fiquei muito angustiada nos primeiros tempos, quando foi a primeira separação e mesmo da segunda

filha, não sei se foi por ser menina, custou-me na mesma, portanto, foi uma das coisas que me deu segurança foi

esse facto.” (P1 Mãe)

“De má qualidade? Uma creche onde não deixassem intervir os pais, onde os pais não pudessem visitar os filhos

quando quisessem, com prévia marcação, claro, onde os pais não pudessem ir buscar as crianças onde elas estão,

que eu acho isso importante. Ir buscá-la e levá-la ao sítio onde ela está o dia todo.” (P13 Mãe)

“A creche ideal. A amabilidade das pessoas ao receberem o R., porque isso também conta, não é? O relacionamento

que acaba por ser estreito, porque diariamente venho cá entregar o R. e venho levantar, venho buscá-lo.” (P15 Mãe)

“[má qualidade] e que eu acredito que haja dessas creches, até porque quando uma creche não é boa não nos

mandam entrar para dentro, ficamos à porta. Sim, entrar e verem, e até porque há creches que têm um horário fixo

para se ir buscar os filhos e quando nós podemos ir a qualquer hora, ir buscar ou ir levar, que eu às vezes vinha às 11

ou 11h30, porque ia ao médico, e nós sermos bem recebidos, com agrado e sabermos que o nosso filho vai comer, é

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Capítulo VI: Resultados

208

bom, isso para mim isso é fundamental.” (P16 Mãe)

7. Refeições/refeições ligeiras

“Uma boa alimentação também, que é uma coisa que eu acho que nós controlamos muito pouco ou nada, ou nada!

Eu não controlo minimamente se o G. come bem ou come mal, se a alimentação é boa ou se é uma porcaria, não

sei.” (P5 Mãe)

“A alimentação (…) Qualidade dos alimentos, não é? Prazos de validade, acho que isso é muito importante e a

qualidade em si, nada de gorduras. Acho que isso é uma boa alimentação. (…) Ensinar às crianças determinadas… o

que elas ainda não conhecem, a maneira de comer à mesa, a higiene, pronunciar algumas palavras.” (P10 Mãe)

“Mais importantes, sim. E depois vermos se têm uma boa alimentação, se estão a ser alimentadas correctamente, que

isso é também fundamental. Eu, eu, por exemplo, as minhas filhas foram sempre boas meninas a comer, digamos

assim, mas eu sei, tenho conhecimento, que havia crianças mais difíceis e elas que tinham esses cuidados todos,

mesmo a gente via porque nós vínhamos cá a qualquer hora buscar e ou nos mandavam esperar porque vínhamos à

hora do lanche, ou nos mandavam esperar porque estavam a descansar e isso nós apercebemo-nos de que as coisas

realmente estão a correr… [má qualidade] não comem a horas, porque se o pessoal é pouco vão comer uns fora de

horas, tem mesmo que acontecer; a alimentação se calhar não é a mais correcta.” (P16 Mãe)

“E acho que têm de ter alguma atenção também em relação à alimentação. Não é comer bem, pronto, é saber dar a

alimentação às crianças desta idade. Pronto, precisam de proteína, precisam de tudo, não é? E peixe, carne. E acho

que isso elas também têm. Nunca provei, confesso, não sei se é boa, se é bem confeccionada ou não, mas pelo

menos as ementas que eu vejo, pronto, agrada-me, gosto, tentam. Devem ter nutricionista, não sei se têm, mas

tentam pelo menos dar coisas que fazem bem às crianças nesta idade. Acho que é o fundamental. (…)” (P18 Mãe)

“(…) Definir regras, regras e hábitos (…) aquela questão de lavar as mãos antes de comer.” (P8 Pai)

8. Sesta

“(…) O dormir, era um dormir em catres, não eram os colchões no chão. Eu acho que dava um acolhimento melhor do

que estar a dormir em colchões, eu sei que é colchão, mas eu neste momento estou cá e vejo, eles viram-se para um

lado, viram-se para o outro, ou sai o lençol ou estão a dormir quase no chão. Eu acho que isso não é assim muito, não

posso considerar assim muito bom. Por isso mesmo já optei por mandar fazer um saco-cama, para o meter lá dentro

que acho que vai ficar muito mais aconchegado. (…)” (P14 Mãe)

9. Práticas de saúde/higiene

“Uma das coisas que eu gosto aqui é que, por exemplo, se os meninos estão com um bocadinho de febre,

temperatura, estão sempre atentos a isso e avisam-nos logo e assim… [má creche] Enfim, eu se sentisse que, por

exemplo, se sentisse as condições de higiene fracas, se sentisse que eram fracas. Até pelo aspecto das pessoas que

trabalham, ter sempre um aspecto limpo, se eu sentisse um aspecto abandalhado, acho que depois, quer dizer, podia

haver amor e tudo…. Mas acho que é importante um bocadinho de tudo.” (P2 Mãe)

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Critérios valorizados pelos pais

209

“As louças da casa-de-banho estão apropriadas para eles, para eles se habituarem também mais cedo a largar a

fralda, se calhar. Para eles terem mais gosto, ver aquilo pequenino, chegar ali e sentar-se, começam a olhar umas

para as outras.” (P6 Pai)

“Ensinar, pronto, que eles primeiro não têm regras nenhumas, não têm nada, e então têm que se começar a habituar

(…) a ir ao pote, tem que se começar a dar essas regras. (…) E eu acho que deviam vir sempre com eles à casa-de-

banho, para eles não ficarem na casa-de-banho sozinhos. Apesar de que eles às vezes, pronto, vêm, ficam em grupo,

mas outras vezes se estão a meio de uma actividade eles vêm sozinhos. Isso não acho, não devia ser. Devia vir

sempre alguém a acompanhá-los… [má qualidade] as crianças devem ser mudadas de x em x horas, nem sempre o

fazem, quando se vão buscar as crianças elas estão assadas.” (P7 Mãe)

“(…) a higiene, conta muito, não é? (…) Limpeza. (…) Do espaço em si e ensinar à própria criança as boas maneiras

para ter boa higiene. (…) Ensinar às crianças determinadas… o que elas ainda não conhecem, a maneira de comer à

mesa, a higiene, pronunciar algumas palavras.” (P10 Mãe)

“A higiene, acho muito importante a higiene, e acho que eles aqui, apesar de esta sala não estar grande coisa, mas eu

lá em baixo vejo, às vezes quando eu venho buscá-la à tarde, eles limpam isso todos os dias. Fazem às vezes

quando têm muitos vírus, muitas doenças, e tal, eles acabam por fechar e fazer aquelas desinfecções e tal (…) [má

qualidade] E depois também não gostaria de ver uma creche que estivesse toda suja, que cheirasse mal (…)” (P18

Mãe)

10. Práticas de segurança

“O recreio lá em baixo. Para já aquilo parece uma gruta e depois acho muito perigoso, o piso e tudo. Nós os pais só

vamos lá na festa de Natal, portanto eu a primeira vez que eu fui ao recreio, a minha filha já andava cá há uns 8

meses ou 9 e eu fiquei apavorada na altura.” (P4 Mãe)

“Pouco segura, portanto… Desde os materiais que cumpram as normas da CEE, que estejam… que cumpram

também… os brinquedos cumpram as limitações legais no sentido da idade, todos os tipos de riscos que possam ser

minorados, de todos os tipos, desde cortes, quedas, coisas no chão, escorregar… Há questões que uma pessoa

nunca pode verificar in loco, a questão dos brinquedos, se são adequados, se não são adequados, se cumprem as

normas de segurança.” (P8 Pai)

“E não funciona, porque no fim vê-se as coisas. É crianças todos os dias uma pisadura aqui, uma pisadura ali. Depois

acontece isto, acontece aquilo, ‘porque nós não vimos’ …” (P17 Mãe)

“(…) mete-me muita confusão ter muitas escadas, ter coisas perigosas, pronto, apesar de esta ter, mas é só para os

bebés que não saem das caminhas, portanto aqui não me mete confusão, porque as outras estão todas lá em baixo.

(…) Confesso que o espaço físico a mim me mete muita confusão, é, é. Para mim o espaço físico é muito importante:

as escadas, as janelas. Eles aqui não têm janelas, não têm acesso a janelas, não têm escadas.” (P18 Mãe)

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Capítulo VI: Resultados

210

11. Rotinas não especificadas

“O que nos levou a escolher esta creche foi o facto de ser um espaço onde os meninos não passam só o tempo, não

é? Em que os pais os deixam às 8 e os vêm buscá-los quando acabam de trabalhar. Nós queríamos um espaço para

os nossos filhos em que cuidassem deles.” (P1 Mãe)

“Dos cuidados com as crianças. E acho que aqui é uma coisa que se nota, acho que só nisso já é muito bom.” (P17

Mãe)

“Pronto, a creche para os bebés de meses, se calhar é só tomar conta deles, coitadinhos, pronto.” (P18 Mãe)

12. Ajudar as crianças a compreender e usar a linguagem

“(…) e terem correcto… correctos modos de falar e de se expressar com os miúdos, de desenvolver.” (P8 Pai)

“Ensinar às crianças determinadas… o que elas ainda não conhecem (…) pronunciar algumas palavras.” (P10 Mãe)

“Para os outros a partir do um ano eu acho que devem é ensinar as crianças a evoluir, a todos os níveis, em questão

da educação, ensiná-las a falar, a andar, até. “ (P18 Mãe)

13. Utilizar livros

“Essencialmente acho que é isso e alguns livros, mais de pano, para eles experimentarem as texturas.” (P1 Mãe)

“Depois na idade em que o G. está, que tem ano e meio, acho que é, os livros são importantes por exemplo, para eles

folhearem e manusearem.” (P5 Mãe)

14. Motricidade fina

“(…) ainda há dias li, e nem sabia, e agora tenho-lhe dado as caixas de ovos, as texturas, que eles começam a fazer a

experimentação das texturas,(…) Muitas vezes noto que a I. chega a casa cansadinha, porque ou está com as unhas

negras porque estiveram a pintar ou… E é assim, lá está, estas coisas do pintar, e eu como tenho dois filhos com

diferença de ano e meio, por muito que a gente se esforce às vezes não temos tempo para desenvolver coisas que a

gente queria, e lá está, pintam, desenvolvem a motricidade fina, não é? Coisas que a gente não consegue muitas

vezes fazer em casa. Isso é que eu acho também importante, não é?” (P1 Mãe)

“e aqueles jogos de fazer a manipulação. (…) Jogos de encaixe, ah ele está na altura dos jogos de encaixe, puzzles

de peças grandes e aqueles blocos de encaixe. Acho que é isso.” (P5 Mãe)

15. Jogo físico activo

“Por aquilo que eu tenho lido, o que é que é importante? Bonequinhos de puxar (…)” (P1 Mãe)

“(…) O único senão, o único senão é que gostava que tivesse um espaçozinho livre, para eles no intervalo... Apesar

de que é assim, é uma coisa boa, eles muitas vezes vão passear com os meninos. Quando está bom tempo vão

passear com os meninos, pronto. É assim, é uma creche um bocadinho mais antiga, que eu conheço creches hoje em

dia que têm outras condições é como tudo, o que é novo, com espaço, com paredes com vidro, essas coisas assim,

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Critérios valorizados pelos pais

211

não é? Mas de uma maneira geral gosto, é só esse senão.” (P2 Mãe)

“No caso dos bebés têm de ser as bolas (…) E quer dizer, está tudo associado, não é? Se as pessoas que põem os

meninos nas cadeirinhas altas e não os deixam andar à vontade e gatinhar, porque é uma fase em que eles têm de

gatinhar e têm de andar, por outro lado… é porque as educadoras ou as pessoas que estão com eles não têm essa

sensibilidade.” (P5 Mãe)

“[boa qualidade] Mas também têm um espaçozito bastante bom lá fora e, como está bom tempo, ajuda os miúdos a

extrapolarem um bocado as suas energias.” (P8 Pai)

“A própria área em si, do infantário, dispor de baloiços e essas coisas todas e fazerem passeios e fazerem visitas,

mas isso uma pessoa sabe que não há em todo o lado e que se calhar nem haverá, não é?” (P12 Pai)

16. Arte

“Muitas vezes noto que a I. chega a casa cansadinha, porque ou está com as unhas negras porque estiveram a pintar

ou…” (P1 Mãe)

“Tudo o que seja expressão plástica acho importante também, não tenho bem a certeza se já é nesta idade ou se é

mais para a frente, acho que é importante.” (P5 Mãe)

“(…) aprende a fazer outros trabalhos, que quando tiver o início da escola talvez vá já com uma ideia do que é pintar,

o que é fazer desenhos.” (P6 Pai)

17. Música e movimento

“(…) e depois educar. Tem que se educar e sei lá, ensinar as primeiras coisinhas, cantar (…)” (P7 Mãe)

“(…) de cantar, gosta muito de aprender as canções que leva daqui da escola. Presumo que passe por aí, mas

também estou a falar de uma área que não é a minha.” (P20 Mãe)

18. Blocos

“(…) agora aquelas rodinhas de fazer blocos, blocos de construção” (P1 Mãe)

“O G. gosta muito de carrinhos, por exemplo.” (P5 Mãe)

19. Jogo dramático

“É assim, cozinhas, por exemplo, eu gostava muito destas cozinhas modernas, eu sei que são caras, mas ainda por

cima eu moro num sítio que tem um Jardim Didáctico, não sei se conhece... Lá o que não falta é material, material

caro, mas material, que é assim, aquelas cozinhas, micro-ondas, os fogões, os frigoríficos, tudo.” (P14 Mãe)

“(…) e gosta imenso de brincar com as cozinhas e essas coisas assim.” (P20 Mãe)

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Capítulo VI: Resultados

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20. Natureza

“Lá está, é ter óptimas condições e, se calhar, ter um jardim maior; este já não é mau, mas é mais pequenino…” (P18

Mãe)

21. Utilização de TV ou vídeo

“Acho que as educadoras deviam ficar cá até mais tarde, porque os pais, que é o meu caso, eu não deixo os miúdos

cá ficarem depois das 6, mesmo com horário suplementar até às sete e meia, primeiro porque acho que é um horário

excessivo para as crianças estarem no infantário, não é? Mas às vezes dava jeito. Às vezes não tenho mais ninguém

para vir buscá-los, só que não… Faço tudo para que eles não fiquem, porque sei que estão todos em frente à

televisão, porque as educadoras já se foram todas embora.” (P4 Mãe)

22. Materiais/actividades não especificados

“(…) mas era um espaço onde de facto contribuísse para um desenvolvimento melhor dos nossos filhos.” (P1 Mãe)

“E à medida que eles crescem é importante que tenham materiais adequados à evolução deles. (…) bons materiais,

adequados à fase em que as crianças estão. (...) Depende das idades, mas devem ser materiais que os levem a

desenvolver as várias capacidades que os meninos vão tendo, não é?” (P5 Mãe)

“(…) a diversidade de actividades, tudo isso acho que é importantíssimo. (…) Uma sala, em princípio uma sala não

será uma sala, deverá ser uma sala, deverá ser várias salas em que os miúdos tenham actividades com alguma

diversidade (…)” (P8 Pai)

“Sim, isso depois, isso variava muito com as actividades que eles poderiam desenvolver. Tudo isso implica alguns

custos. Em termos de materiais, em termos de jogos (…). Aquilo que fosse indicado até por pessoas até

especializadas nisso, que soubessem quais os brinquedos e as tarefas adaptadas a cada uma das idades, para eles

também irem evoluindo” (P12 Pai)

“(…) e depois que os miúdos tivessem bastantes actividades, não estivessem só ali naquele mundinho, estar sempre

a fazer as mesmas coisas, mas tivessem outro tipo de actividades mesmo.” (P14 Mãe)

23. Supervisão

“(…) Não se sabe, porque muitas vezes nem elas próprias sabem, porque são muitas crianças, muitas vezes eu

venho buscá-lo e “ele caiu” mas ninguém sabe se ele caiu, ou se realmente lhe bateram…” (P1 Mãe)

“[boa qualidade] e com muita vigilância... A própria vigilância, ter sempre alguém com eles, não andarem a brincar

muito todos juntos sem estar ninguém por perto sempre. Os próprios ambientes externos também ajudam a que às

vezes alguns problemas possam surgir.” (P8 Pai)

“(…) e principalmente um sítio onde qualquer pessoa possa ter acesso sem muitas restrições e que as educadoras os

possam ver e estar quase em cima deles, que não tenham muitos obstáculos…” (P9 Mãe)

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Critérios valorizados pelos pais

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“E não funciona porque no fim vê-se as coisas. É crianças todos os dias uma pisadura aqui, uma pisadura ali. Depois

acontece isto, acontece aquilo, ‘porque nós não vimos’.” (P17 Mãe)

24. Interacção entre pares

“[Nós queríamos um espaço onde] e também que convivessem com outros meninos (…) E também lá está, quando eu

digo que é a base é também o grupo de amigos, o criar laços, a partilha, alguns valores de referência. (…) E também

lá está, a I. está cá este ano, mas o meu filho está há 2 anos, vão ganhando um grupinho de amigos, de referências.”

(P1 Mãe)

“Ora bem, nós decidimos colocar a nossa filha numa creche (…) e também para desenvolver mais um bocadinho do

que a outra, porque estava muito ligada afectivamente aos avós e era uma criança que… Pronto, que não convivia

muito com outros miúdos, enquanto que esta entrou com 1 ano de idade e a gente nota que é uma criança que vai

para qualquer lado e mete-se com as crianças a brincar e não é tão tímida como a outra.” (P12 Pai)

“(…) e por outro lado gostava que ela se começasse a ambientar a outras crianças. E como ela até ao 1 ano foi criada

com a minha avó, só que a minha avó já tem uma certa idade, ela estava a evoluir só que, acho que não era o

suficiente (…) É, porque ela gosta muito de crianças, ela gosta de brincar, por isso é que eu a meti aqui.” (P19 Mãe)

25. Interacção adulto-criança

“Elas [outras mães] diziam que gostavam, que notavam… Elas falavam muito até das auxiliares, porque as

educadoras, é assim eu estou muito contente, gosto muito da V., mas as educadoras é uma coisa que às vezes, ao

fim de 2 ou 3 anos às vezes mudam e as auxiliares estão aqui quase sempre. E elas diziam que até durante as férias

os filhos muitas vezes tinham saudades de vir. Notava-se que havia ali carinho entre as auxiliares e mesmo com as

educadoras (…). Eu acho que a educadora é muito importante. Ser uma educadora amiguinha deles, que seja firme.

Eu gosto muito que seja firme, porque eu acho que é muito importante haver regras. Que seja firme, mas ao mesmo

tempo amiguinha deles, não é? Que tenha jeitinho para lidar com eles. Mas firmeza, gosto de meninos com

educação.” (P2 Mãe)

“O meu grande temor foi sempre a maneira como as educadoras lidam com as crianças. Porque eu sei que é difícil

lidar com elas. E sei que os pais às vezes até apetece pegar neles e jogar contra a parede e somos pais, e contamos

até 100 e tudo o mais. E depois fico assim, será que uma educadora vai ter a mesma paciência? Eu sei que não o

faço porque sou uma pessoa equilibrada e porque só tenho três, não é? Não é a mesma coisa que ter 18 ou 20 e

porque são meus filhos e é um amor muito grande. Agora tenho medo que não se gere aquela afectividade que

permita que a educadora tenha paciência para…” (P4 Mãe)

“O pessoal é bom, é simpático, é carinhoso. (…) E quando um filho vem com meses, começa a crescer e não se

queixa de nada e gosta tanto delas como de nós, à noite nós vimos buscá-los e eles não querem ir ou choram porque

querem ficar mais um bocadinho, isso é muito bom. E esta creche tem essas condições todas.(…) Lembro-me que

nas férias, quando eles já começam a falar, o tema da conversa é este, é esta casa. Vem o Natal, gostam de…não se

esquece de nome nenhum. A C. é pequenina e ela não se esquece do nome de ninguém para lhe dar a prenda, é

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Capítulo VI: Resultados

214

verdade, nos anos elas têm… Eu acho que eles acabam, quando são bem acolhidos, quando lhes dão amor, eles

acabam por ter tanto amor a eles como a nós (…)” (P16 Mãe)

26. Disciplina

“A educação, quando eu digo a educação é a educação para os valores, que no fundo é incutir o sentido de

responsabilidade, a honestidade, esses valores que a gente tenta em casa e que de facto aqui, pelo menos do

conhecimento que a gente tem tido, faz-se isso, não é?” (P1 Mãe)

“(…) Eu gosto muito que seja firme, porque eu acho que é muito importante haver regras. Que seja firme, mas ao

mesmo tempo amiguinha deles, não é? Que tenha jeitinho para lidar com eles. Mas firmeza, gosto de meninos com

educação.” (P2 Mãe)

“Passa muito pela educação, disciplina que eles têm e que não têm em casa, porque os pais cedem sempre mais e no

infantário se eles cedessem a um tinham de ceder a todos. E portanto eu sinto que eles são muito mais disciplinados.

(…) O essencial para mim é que não batam nas crianças. (…) Isso é uma coisa visível, se as crianças estão a comer

ou se não estão a comer, enquanto que o estado psicológico delas não é. (…) [Má qualidade] Também castigos em

termos de fecharem as crianças, isolarem as crianças fechadas, que é uma coisa que eu sei que acontece muitas

vezes e que acho que ainda é pior do que castigo corporal. Só quem não conhece uma criança é que não sabe que

elas têm muitos temores, têm muitos medos. Eu posso pôr a minha filha de castigo no quarto, mas não fecho a porta

e ‘tu não sai daí’. E ela tem que não sair dali. Agora fechar a porta ela fica apavorada. E portanto eu sei que há muitas

creches que fecham as crianças. Eu para mim é a nível de castigos.” (P4 Mãe)

“Aliás, eu acho que uma creche ainda é melhor do que estar com pessoas da família, porque tem pessoas

especializadas, que é importante, há regras que são impostas e em casa muitas vezes não se faz isso. (…) Muito,

muito, porque nós em casa, há hábitos que se criam e que eles aqui não os têm e isso é bom, é bom para eles. (…)

Sim, em termos de regras, sim. Nós facilitamos, porque não damos conta que eles crescem e são sempre os nossos

bebés, e aqui não, eles já crescem com regras formadas e isso ajuda. Ajuda, facilita muito. Eu até já cheguei à

conclusão que eles em casa conseguem-nos dominar mais um bocadinho, em primeiro porque eles, como sabem que

estão pouco tempo connosco, eles começam a aprender e a ver que nós facilitamos mais um bocadinho. E aqui não,

não, porque eu vejo pelas minhas, quando elas, elas obedecem muito mais depressa quando eu entro aqui e há uma

fala mais alta de uma educadora ou de uma auxiliar do que com a mãe. Com a mãe ficam ainda, ainda batem o pé.

Acho que é importante termos os nossos filhos desde pequeninos num local destes.” (P16 Mãe)

“Acho que sei lá, no caso da educação também. (…) Aqui seguem tudo certinho e seguem aquilo tudo, mas em casa

às vezes eles fogem um bocadinho. Mas acabam sempre por se cingir àquilo que aprendem aqui. É um bom começo

para eles terem uma educação mais certinha, porque às vezes os avós e nós próprios deixamos desleixar um

bocadinho, deixamos fazer aquilo que eles querem. E aqui eles vão aprendendo que não pode ser, que têm mesmo

que se cingir àquilo. E acabam por depois sair daqui e são completamente diferentes de uma criança que seja

educada em casa com alguém.” (P17 Mãe)

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Critérios valorizados pelos pais

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27. Horário

“O único senão, o único senão é que gostava que tivesse um espaçozinho livre, para eles no intervalo... Apesar de

que é assim, é uma coisa boa, eles muitas vezes vão passear com os meninos. Quando está bom tempo vão passear

com os meninos, pronto. É assim, é uma creche um bocadinho mais antiga, que eu conheço creches hoje em dia que

têm outras condições é como tudo, o que é novo, com espaço, com paredes com vidro, essas coisas assim, não é?

Mas de uma maneira geral gosto, é só esse senão.” (P2 Mãe)

“Passear, eu sei que passeiam com eles todos os dias. Até ela não fica tão nervosa, porque noto que quando está a

chover e eles não vão dar o passeio, está a chover, não é? Noto que à noite ela está assim mais apreensiva, noto a

diferença. E ela gosta muito de andar fora de casa.” (P6 Pai)

28. Jogo livre

“(…) brincar, acho que as crianças precisam de brincar (…) Olhe, tem pessoas que sabem acolher, pessoas que

sabem brincar, pessoas que olham ao colectivo, mas que também olham ao individual.” (P11 Mãe)

“É, porque ela gosta muito de crianças, ela gosta de brincar, por isso é que eu a meti aqui.” (P19 Mãe)

29. Medidas para crianças com incapacidades

“É isso que eu considero má qualidade, não é só as instalações, espaço físico, o espaço reduzido e lá está muitos dos

infantários não são criados, nem têm condições… Por exemplo, pensando em meninos deficientes, até por exemplo

se formos a pensar neste, eu não sei se, mas eu acho que sim, pelo que eu tenho visto, que este infantário, esta

creche, creche não digo, acho que não tem nenhum menino com deficiência, não é? Mas, por exemplo, um menino

com 3 anos, só se vier ao colo, não é? É uma das limitações, por acaso esta creche que eu já reparei, não tem

rampas, por exemplo, é outro tipo de adequações na sala. Por acaso é uma das limitações que…(…) Mas a maior

parte das creches não têm e até pessoal especializado, não têm muitas vezes para tratar de meninos, meninos com

necessidades especiais, mas que nem por isso se calhar têm que estar num infantário à parte, não é?” (P1 Mãe)

30. Iniciativas para envolver os pais

“E é assim, outra das características que eu acho muito importante é solicitarem a presença dos pais e a colaboração

dos pais na educação, porque eu acho que… o dizer que os pais mandam em casa e os professores mandam na

escola, ou os educadores mandam na escola, eu não sou muito a favor disso, não é? Acho que tem que haver uma

boa relação entre a escola e a família, e também porque é assim, apesar de tudo, é uma realidade, os educadores é

que passam a maior parte do tempo com os nossos filhos, não é? É um facto. Eles também têm que nos transmitir e

que nos ajudar, enquanto pais a sermos melhores pais, acho que isso, havendo boa comunicação, acho que também

é importante numa creche haver uma boa comunicação. (…) agrada-me nesta creche uma coisa, independentemente

de uma pessoa ser engenheiro ou doutor, as pessoas são tratadas pelos nomes, tratam ou a Sandra ou a Raquel ou a

Paula, não é? É uma das coisas que me agrada. E nós também não precisamos de estar a tratar as educadoras, não

é, pronto trato a educadora da I. por P. [pelo nome] (…) Uma das coisas que na creche, por exemplo, me agradou,

deixaram-me por exemplo amamentar, vinha para aqui e quando eu estava na altura estavam mais mães e aquele

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Capítulo VI: Resultados

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espaço francamente servia para nós de alguma forma acabarmos com as nossas angústias, com as nossas dúvidas,

falar das nossas preocupações. E isso também era partilhado muitas vezes pela educadora e pela auxiliar (…) E outra

coisa que gosto é que depois já nos vamos conhecendo os pais uns aos outros e vamos partilhando informações que

os outros pais.(…)” (P1 Mãe)

“Eu acho que o mais importante é eles serem transparentes, o que não acontecia cá neste infantário, começa a

acontecer agora, que era, porque muitas educadoras sobretudo cá do infantário têm aquela posição de que a relação

é a relação entre elas e as crianças e desde que cuidem bem das crianças e de que as crianças estejam bem, os pais

não têm nada a ver com isso. E não é verdade, porque os pais têm que confiar nas pessoas que cuidam das crianças

e eu sou daquelas mães que querem saber sempre tudo e muitas vezes a receptividade não era muita. (…) E eu

pensava, ora bolas, se ela chora é porque aquilo não é bom, não é? Se ninguém me dizia se era bom ou mau eu

ficava com a ideia que não era bom. E andava sempre a vigiar e não tinha tranquilidade que precisava para trabalhar.

(…) [Creche de boa qualidade] Acho que é uma creche que faz reuniões com os pais, o que não acontece aqui.

Começou a acontecer este ano, por isso é que eu disse que este ano está melhor.” (P4 Mãe)

“E uma coisa que acontece numa das creches que eu fui visitar, em que a Associação de Pais é que coordena a

própria creche, os pais podem entrar na creche a qualquer hora, em qualquer sala, na cozinha, na sala, onde

quiserem. Isso não acontece aqui. Se o G. estiver a dormir, eu não posso ir ver, se o G. estiver a comer eu não posso

ir ver. (…) E eu sei que há situações em que enganam os pais. Tenho conhecimento de uma creche, por exemplo, sei

que assim era por uma funcionária que trabalhava lá, que a ementa não era igual àquilo que eles comiam. A ementa

que estava afixada era uma coisa, tipo panados e eles comiam fiambre panado, por exemplo. (…) É uma das minhas

preocupações, uma vez que em relação ao resto eu vejo que ele está muito bem. Eu venho-o deixar ele fica bem,

quando o venho buscar ele está sempre a brincar, portanto vejo que ele se sente bem.(…) Por um lado compreende-

se, não é? Vai desestabilizar um pouco o trabalho das pessoas... vai interferir.” (P5 Mãe)

“Por acaso aqui temos alguma facilidade, se quisermos podemos vir a qualquer hora, mesmo sem marcação e tudo,

não há problema nenhum. (…) A informação às vezes escapa um bocado na creche, e uma pessoa… (…) Acho que

devia haver mais informação sobre algumas questões. Mesmo às vezes algumas questões relativas aos miúdos, se

conseguiram fazer algum passo ou uma coisa que os marque, mais importante, acho que também era importante

sabermos isso, porque há muitas coisas que também não vamos andar todos os dias a perguntar. (…) São pequenas

coisas que podiam ser conseguidas, por exemplo se eles tivessem uma página e pudessem divulgar algumas coisas

deles, umas fotografias, uns desenhos engraçados, fazer passar as informações aos pais. Ou até uma newsletter,

uma e-newsletter, por e-mail, ser mais generalista ou mais específico sobre alguma questão, em que pudessem

mandar uma fotografiazita, um desenhito, acho que era engraçado, acho que é importante na qualidade de uma

creche. (…)” (P8 Pai)

“De má qualidade? Uma creche onde (…) os pais não pudessem ir buscar as crianças onde elas estão, que eu acho

isso importante. Ir buscá-la e levá-la ao sítio onde ela está o dia todo.” (P13 Mãe)

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Critérios valorizados pelos pais

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32. Interacção e cooperação entre o pessoal

“(…) nota-se que há um trabalho, não digo diário, por parte dos educadores e auxiliares, não é?” (P1 Mãe)

“[Boa qualidade] Acho que as educadoras deviam ficar cá até mais tarde, porque os pais, que é o meu caso, eu não

deixo os miúdos cá ficarem depois das 6 (…) Faço tudo para que eles não fiquem, porque sei que estão todos em

frente à televisão, porque as educadoras já se foram todas embora. E eu acho que não era difícil fazerem um horário

mais rotativo, não é? Por turnos. Com educadoras que ficassem, as educadoras ficavam, sempre o mesmo número

de educadoras, no infantário, quer da parte da manhã quer da parte da tarde, podiam não ser as mesmas, pelos

turnos, não é? Até porque isto é muito cansativo, e também não sei se seria assim tão bom ter uma educadora aqui

desde as 7 da manhã às sete e meia da noite, a aturar estas pestes todas, mas ter sempre o mesmo número de

educadoras ou pelo menos proporcionalmente ao número de crianças. (…)” (P4 Mãe)

33. Continuidade do pessoal

“Elas falavam muito até das auxiliares, porque as educadoras, é assim eu estou muito contente, gosto muito da V.,

mas as educadoras é uma coisa que às vezes, ao fim de 2 ou 3 anos às vezes mudam e as auxiliares estão aqui

quase sempre.” (P2 Mãe)

“Preocupa-me um bocado a transição da educadora, mas isso melhor do que ninguém eu compreendo que estas

questões são incontornáveis, não é? Preocupa-me isso, a B. não conhece a outra educadora, está muito aficionada a

esta educadora e parece-me que esta educadora é uma profissional muito capaz, que está a desenvolver um óptimo

trabalho e tenho receio. Não tenho receio pela qualidade do trabalho da outra educadora, porque foi uma das razões

pela qual eu escolhi esta instituição, mas tenho receio porque é uma mudança muito forte, muito brusca, vamos a ver

como é que corre.” (P20 Mãe)

35. Oportunidades para desenvolvimento profissional

“[Recursos humanos] e bem formados, não é? Investir-se na formação. (…) E também lá está uma das coisas que eu

tenho reparado é que esta creche investe na formação dos auxiliares.” (P1 Mãe)

36. Número de adultos

“São poucas educadoras, para muitas crianças.” (P4 Mãe)

“(…) ter mais pessoas, mais adultos, porque costumam ter uma educadora e uma auxiliar, mas penso que não chega.

Ou então se fosse a auxiliar nunca saindo da sala, nunca ter que fazer limpezas. Há infantários em que se faz

limpezas, há infantários em que não se faz, que as auxiliares estão sempre com eles. Pronto, sendo assim… Mas

aquela auxiliar que trabalha, que faz limpezas e não sei quê e que ao mesmo tempo ajuda a educadora (…) Não é

suficiente. Mas mesmo assim acho que as duas ainda é pouco. E depois… Para mim era assim, pelo menos aqui

nestas duas salas, que é aos 2 e aos 3 aninhos, havia de ter 3 pessoas, que era duas na sala e uma para as levar à

casa-de-banho, que eles muitas vezes vêm sozinhos e à casa-de-banho e assim. E, por exemplo, nos bebés, aqui eu

acho que são só 8 bebés, são duas pessoas. Por exemplo, na outra sala do aninho acho que são demais, acho em

número grande também, são pequeninos, estão a aprender a comer a comida inteira e também vão ao pote, e

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Capítulo VI: Resultados

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também só são duas pessoas, acho que deviam ser 3 permanentes, mesmo. (…) Aqui em… devido a higiene e

alimentação não há que falar (…) a única coisa que eu diria é muitas crianças se calhar só para duas pessoas, são 20

e tais e depois muitas vezes é só a educadora sozinha, que a auxiliar anda a fazer limpezas.” (P7 Mãe)

“(…) que também é importante que tenha pessoas suficientes para cuidar delas, que o pessoal não seja muito

reduzido, porque as crianças precisam de muitos cuidados, principalmente quando são pequeninas, não é? E ocupam

muito tempo e… Tirando isso, eu acho que isso são as bases fundamentais de uma boa creche. (…) Ora uma creche

de má qualidade, é fácil descrever, se calhar é mais fácil do que uma boa creche. Má qualidade é como às vezes a

gente se apercebe e ouve, pessoal muito reduzido.” (P16 Mãe)

37. Número de crianças

“E outra coisa, ter o número de crianças estabelecido por lei, que é outra coisa que eu acho fundamental, não é? Uma

coisa é ter 10, outra coisa é ter 20. (…) Mas de acordo com a minha profissão às vezes a gente observa ou

descrevem-nos e é isso que eu digo, o número de crianças excessivo.” (P1 Mãe)

“Mas o que me interessa hoje é que, portanto, eu podia ter o J. numa creche a pagar o mesmo, mas ali por exemplo

enquanto estão 30 crianças, na outra creche estavam 300.” (P3 Mãe)

“De boa qualidade? Em primeiro lugar acho que o número de crianças em cada sala, acho que isso é muito

importante, porque se temos crianças pequenas, onde tem uma grande quantidade de crianças, é evidente que as

pessoas não estão tão ligadas às crianças e há um desleixamento da…” (P17 Mãe)

38. Faixa etária

“[má qualidade] Misturadas as idades. Por exemplo isso aqui não acontece, não misturam as idades, cada sala tem a

sua idade. Mas já vi muitos infantários, que põem, por exemplo eu já trabalhei num, que punham crianças dos 4

meses aos 2 anos, tudo junto. Pronto e ter aos 12 e 13 todos juntos, as idades todas juntas, é muito confuso, não se

consegue fazer nada. Aqui por acaso nesse aspecto está muito bem, porque estão as idades todas separadinhas, não

há mistura.” (P7 Mãe)

“(…) Se calhar teria mais uma sala, porque penso que beneficiava se fossem distinguidas as crianças que estão entre

os bebés e os dois anos, não é? Pronto, acho que há uma lacuna, falta realmente uma sala para o ano, para aquelas

crianças que começam a andar, que começam a falar. Precisam de outro tipo de estimulação que os bebés não

precisam e outro espaço que os bebés não precisam.” (P13 Mãe)

“É, porque o outro era onde é a Junta agora, pequenino, também não tinha grandes crianças, eram muito menos,

estavam mais restritos do que estão aqui. Aqui cada um está na sua sala, está tudo dividido e acho que isso é muito

bom. Porque crianças dos zero aos 3 anos estar tudo junto é muito complicado. Por idades acho que é uma das boas

qualidades de uma boa creche, é estar separados.(…) Uma má creche, uma má creche é realmente como um caso,

um dos casos, um caso que eu conheço, que sei, em que dos zero aos 3 anos estão praticamente todos juntos, são à

volta de 30 crianças e têm 4 pessoas para tomar conta deles todos.” (P17 Mãe)

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Critérios valorizados pelos pais

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39. Qualificação da educadora

“Mas acima de tudo, era uma das coisas que me fez também, quando a ama da J. começou a trabalhar, no fundo é

assim, eu gostava muito da ama, mas por outro lado também é bom, também não fiquei muito triste, porque também

achava que era bom a J. começar depois a ter aquela parte didáctica, porque a educadora sempre tem outra

formação.” (P2 Mãe)

“E ter pessoas que saibam o que estão a fazer lá dentro. São pessoas que são especializadas, que nós metemos lá

os nossos filhos e nunca pedimos uma carteira… (…) Acho que tem pessoas bem formadas para olhar pelas

crianças.” (P3 Mãe)

“Porquê? Primeiro porque acho que a formação das pessoas que estão com ele na creche é uma formação indicada a

estar com ele e uma empregada geralmente não tem a formação adequada. (…) Acho que devem ter educadoras… A

mesma coisa que eu há pouco lhe disse. Nas outras creches onde eu fui ou só tinham uma educadora e depois era

uma auxiliar por sala, ou era ao contrário, cada sala tinha uma auxiliar e depois eram duas educadoras que davam

apoio. (…) Aqui todas as salas têm uma educadora e uma auxiliar, excepto a sala dos bebés que tem só uma auxiliar

e que tem o apoio da dona do infantário, não é? Mas eu também acho que à medida que… E isso também pesou

muito, porque numa das creches onde eu fui eram só auxiliares e as donas eram educadoras. E portanto davam

apoio, acho que o apoio que a dona dá nunca é o apoio de uma educadora, porque ela tem mais o que fazer e como

dona tem outras preocupações, não é? É óbvio. (…).” (P5 Mãe)

“[má qualidade] uma creche em que os miúdos estivessem muito tempo com pessoal não profissionalizado, por

melhor que tenham… por melhor preparados que estejam para estar com crianças, não é essa a intenção de um pai

ou uma mãe quando colocam um miúdo numa creche, não é? Que eles passem muito tempo com alguém que apenas

tem experiência, que tenha noção daquilo que tem à sua frente. Acho que é isso.” (P20 Mãe)

40. Características do pessoal

“Tem que ser uma pessoa com muita calma, paciência, isso acho que é muito importante. (…) A começar pela

educadora e pelo responsável, que a gente vê que a D. E. [dona e educadora] que é uma pessoa responsável, não é?

(…) as outras empregadas também são pessoas simpáticas. Agora uma má creche, se não houver assim, mas eu

também acho que pelo aspecto uma pessoa também vê. Se fosse má se calhar também ouvíamos aqui. Às vezes

nem tudo o que se ouve é verdade.” (P6 Pai)

“Acho que as pessoas são muito importantes, até antes de mais do que as instalações e… (…) mas acho que as

pessoas são muito importantes. (…) Sim, como trabalham, se estão bem, se não estão bem, se são pessoas

equilibradas, se são pessoas que gostam daquilo que fazem, acho que isso é o essencial.” (P11 Mãe)

“As mais importantes têm a ver com a questão humana, com as pessoas que estão com as crianças. Não tanto a

formação, mas a dedicação, a maneira de ser. Para já, no geral, tenho gostado. Havendo uma pessoa responsável,

não é? Que se responsabilize por todo o funcionamento, acho que de resto não têm obrigatoriamente que ter pessoas

com formação específica, mas com o mínimo de cuidados.” (P13 Mãe)

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Capítulo VI: Resultados

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41. Direcção/organização

“A direcção da creche, o que vem de cima, se o mal começar a vir de cima, que há-de ser do resto? Penso que a D.E.

é uma pessoa que até hoje não tivemos queixa, vê-se que é uma pessoa que gosta mesmo do que faz (…).” (P6 Pai)

“Porque o dinheiro, a gente sabe que as pessoas vivem muito para o dinheiro, não é? E quando é uma creche com

fins lucrativos eu acredito que aos nossos filhos vai ser tirado sempre qualquer coisa para não se gastar, não é? E

quando é uma creche destas eu acredito que já não seja assim, que funcione sempre melhor.” (P16 Mãe)

42. Outros critérios não especificados

“Por isso é que também existe um projecto educativo e que é posto em prática. Foi outra das coisas que me agradou,

foi o facto de haver um projecto educativo.” (P1 Mãe)

“[boa creche] E sentir… E sentir que os meninos chegam e gostam de ficar, acho que isso é importante, é sinal que

gostam. E a J. gosta.” (P2 Mãe)

“Não iguais, mas parecidas. Eu tenho uma opinião formada sobre as creches. Eu acho que uma creche, que não seja

particular é melhor. Exactamente, eu acho que essas serão sempre as melhores e eu se tivesse muitos mais filhos

escolheria sempre…” (P16 Mãe)

“(…) que os preços não eram demasiado elevados e… Basicamente era isso, que pais que tinham 2 filhos, que

colocavam o primeiro e depois colocavam o segundo. Acho que por si só diz tudo.” (P20 Mãe)

2.2 Estudo quantitativo

2.2.1 Resultados descritivos

Os pais que participaram neste estudo atribuíram elevada importância a todos os itens

incluídos na ITERS-R (ver Quadro 26). Numa escala de 1 a 5, equivalendo o valor 5 a Muito

importante, as médias dos itens variaram entre 3.71 no item Uso da TV, vídeo e/ou computador e 4.95

no item Ajudar as crianças a compreender a linguagem.

Os itens mais valorizados (25% de 39 itens), por ordem decrescente de importância, foram:

Ajudar as crianças a compreender a linguagem, Interacção adulto-criança, Disciplina, Mudança de

fraldas/idas à sanita e Práticas de segurança, Supervisão do jogo e da aprendizagem e Interacção

entre pares, Práticas de saúde, Chegada/partida e Refeições/refeições ligeiras.

Os itens menos valorizados (25% de 39 itens), por ordem crescente de importância, foram: Uso

de TV, vídeo e/ou computador, Jogo de areia e água, Blocos e Condições para necessidades

profissionais do pessoal, Supervisão e avaliação do pessoal, Natureza/ciência e Promover a aceitação

da diversidade, e Oportunidades para desenvolvimento profissional.

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Critérios valorizados pelos pais

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Uma vez que a questão colocada era Em que medida acha importante para o(a) seu (sua) filho

(filha)?, analisaram-se estes dados eliminando-se os itens relacionados com os pais e os profissionais.

Assim, quando foram considerados apenas os 32 itens relacionados com as crianças, os itens aos

quais os pais atribuíam menos importância (25% de 32) eram: Uso de TV, vídeo e/ou computador,

Jogo de Areia e água, Blocos, Natureza/ciência e Promover a aceitação da diversidade, Material

exposto para as crianças, Jogo dramático e Utilizar livros. Os itens mais importantes foram os mesmos

que na situação anterior, ou seja, quando se consideraram todos os itens.

Foram calculados os resultados médios da importância atribuída pelos pais a estes critérios, ou

seja, foi efectuado o cálculo da média global de importância atribuída pelos pais aos itens, como tinha

sido efectuado também para a qualidade avaliada por observadores externos. O valor médio obtido foi

de 4.65 (DP = 0.33), variando entre 3.38 e 5.00. Quando se calculou a média com base nos 34 itens, o

valor médio foi de 4.70 (DP = 0.33), variando entre 3.44 e 5.00.

A análise inferencial das distribuições através do Teste de Kolmogorov-Smirnov revelou não

estarem cumpridos os pressupostos da normalidade destes dados. Não foram identificados outliers que

alterassem a distribuição dos dados ou a média dos resultados.

Os pais atribuíram elevada importância aos itens das três dimensões da qualidade

identificadas anteriormente (ver Quadro 20). A dimensão mais valorizada pelos pais foi a Interacção-

Linguagem (M = 4.90, DP = 0.21), variando o seu valor entre 4.00 e 5.00. A média mais baixa foi

obtida na dimensão Actividades-Rotinas (M = 4.64, DP = 0.37), variando a sua cotação entre 3.57 e

5.00. Os valores da dimensão Espaço-Adultos variaram entre 2.80 e 5.00, com média de 4.66 (DP =

0.41). De forma a explorar estas diferenças, foi conduzida uma ANOVA de Friedman, uma vez que o

teste Kolmogorov-Smirnov revelou não estarem cumpridos os pressupostos da normalidade das

distribuições. Foram encontradas diferenças estatisticamente significativas (χ2(2) = 90.51, p = .000). Os

testes de Wilcoxon, com a correcção de Bonferroni (p = .0167), efectuados posteriormente, revelaram a

existência de diferenças estatisticamente significativas entre a importância atribuída aos itens da

dimensão Interacção-Linguagem e da dimensão Actividades-Rotinas (Z = -7.63, p = .000, r = -.51) e

entre a dimensão Interacção-Linguagem e a dimensão Espaço-Adultos (Z = -6.78, p = .000, r = -.46).

Não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas entre a importância atribuída à

dimensão Actividades-Rotinas e à dimensão Espaço-Adultos (Z = -0.82, p = .41, r = -.06). Em suma, os

pais atribuíram maior importância às Interacções e Linguagem do que às Actividades-Rotinas e ao

Espaço-Adultos.

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Capítulo VI: Resultados

222

Quadro 26. Estatísticas descritivas da importância atribuída pelos pais aos itens da ITERS-R

Mín. – Max. M DP

1. Espaço interior 3 – 5 4.80 0.47 2. Mobiliário para cuidados de rotina e jogo 2 – 5 4.65 0.61 3. Condições para relaxamento e conforto 3 – 5 4.66 0.61 4. Arranjo da sala 3 – 5 4.72 0.54 5. Material exposto para as crianças 1 – 5 4.51 0.74 6. Chegada/partida 2 – 5 4.85 0.49 7. Refeições/refeições ligeiras 3 – 5 4.85 0.43 8. Sesta 3 – 5 4.73 0.52 9. Mudança de fraldas/idas à sanita 3 – 5 4.88 0.35 10. Práticas de saúde 3 – 5 4.86 0.42 11. Práticas de segurança 3 – 5 4.88 0.42 12. Ajudar as crianças a compreender a linguagem 3 – 5 4.95 0.27 13. Ajudar as crianças a usar a linguagem 3 – 5 4.84 0.39 14. Utilizar livros 3 – 5 4.63 0.62 15. Motricidade fina 3 – 5 4.65 0.55 16. Jogo físico activo 3 – 5 4.73 0.52 17. Arte 3 – 5 4.72 0.56 18. Música e movimento 3 – 5 4.76 0.45 19. Blocos 3 – 5 4.36 0.73 20. Jogo dramático 1 – 5 4.52 0.73 21. Jogo de areia e água 1 – 5 3.75 1.05 22. Natureza/ciência 1 – 5 4.42 0.82 23. Uso de TV, vídeo e/ou computador 1 – 5 3.71 1.24 24. Promover a aceitação da diversidade 1 – 5 4.42 0.83 25. Supervisão do jogo e da aprendizagem 4 – 5 4.87 0.34 26. Interacção entre pares 3 – 5 4.87 0.36 27. Interacção adulto-criança 4 – 5 4.94 0.25 28. Disciplina 4 – 5 4.93 0.26 29. Horário 3 – 5 4.81 0.44 30. Jogo livre 3 – 5 4.74 0.50 31. Actividades de grupo 3 – 5 4.69 0.48 32. Medidas para crianças c/ incapacidades 2 – 5 4.79 0.54 33. Iniciativas para envolver os pais 1 – 5 4.68 0.68 34. Condições p/ nec. pessoais do pessoal 1 – 5 4.52 0.79 35. Condições p/ nec. prof. do pessoal 1 – 5 4.36 0.87 36. Interacção e cooperação entre o pessoal 1 – 5 4.50 0.74 37. Continuidade do pessoal 3 - 5 4.68 0.54 38. Supervisão e avaliação do pessoal 1 – 5 4.40 0.88 39. Oportunidades p/ desenv. profissional 1 – 5 4.47 0.91

2.2.2 Relação com outras variáveis e comparação entre grupos

Foi analisada a associação entre os valores médios da importância atribuída aos 34 itens do

questionário administrado aos pais e algumas variáveis sociodemográficas. Devido ao facto de não

estarem cumpridos os pressupostos de normalidade das distribuições, foram calculados coeficientes de

Page 223: Qualidade em Contexto de Creche: Ideias e Práticas · qualidade das salas de creche do que os pais e do que os responsáveis pelas salas de creche. Os resultados obtidos sugerem

Critérios valorizados pelos pais

223

correlação de Spearman. Os dados constantes do Quadro 27 permitiram constatar a existência de

correlações negativas fracas, estatisticamente significativas, entre a importância atribuída aos critérios

de qualidade da ITERS-R e os anos de educação formal dos pais e o rendimento mensal líquido do

agregado familiar.

Quadro 27. Coeficientes de correlação de Spearman entre a importância média atribuída pelos

pais (34 itens) e variáveis sociodemográficas

Média 34 itens

Interacção-Linguagem

Actividades-Rotinas

Espaço-Adultos

Idade dos pais -.14 -.16 -.11 -.19*

Anos de educação formal dos pais -.19* -.15 -.11 -.21*

Rendimento mensal líquido do agregado -.25** -.19* -.17 -.32** Valor mensal que pagam pela creche -.18 -.14 -.12 -.23*

Tempo de frequência da creche (meses) .11 -.06 .11 .09

* p < .05; **p < .01

Foram verificadas igualmente as associações entre os valores médios da importância atribuída

pelos pais às três dimensões da qualidade e variáveis sociodemográficas, através do cálculo dos

coeficientes de correlação de Spearman, por não estarem cumpridos os pressupostos de normalidade

das distribuições. Os dados constantes do Quadro 27 mostram a existência de uma associação

negativa fraca, estatisticamente significativa, entre a dimensão Interacção-Linguagem e o rendimento

mensal do agregado. Não foram encontradas associações estatisticamente significativas entre a

dimensão Actividades-Rotinas e as mesmas variáveis. Foram encontradas associações negativas

fracas, estatisticamente significativas, entre a dimensão Espaço-Adultos e a idade do pai que

respondeu ao questionário, a sua educação formal e o valor mensal pago pela creche e uma

associação negativa moderada, estatisticamente significativa, entre esta dimensão e o rendimento

mensal do agregado familiar. Assim, foram os pais de nível educativo e rendimento mensal mais baixos

que em média mais valorizaram os itens da ITERS-R, foram os pais com rendimentos mais baixos que

mais valorizaram os itens da dimensão Interacção-Linguagem e foram os pais mais novos, de nível

educativo inferior, com rendimentos inferiores e que pagam menos pela creche que mais valorizaram

os itens da dimensão Espaço-Adultos.

Foi analisado o efeito do tipo de instituição (IPSS ou com fins lucrativos), da faixa etária a que

as salas se destinam (1 - 2 anos ou 2 - 3 anos) e do género da pessoa que preencheu o questionário

(pai ou mãe) na importância atribuída aos itens (ver Quadro 28). Foi utilizado o teste Mann-Whitney

devido à não verificação do pressuposto de normalidade das distribuições na maioria das variáveis em

Page 224: Qualidade em Contexto de Creche: Ideias e Práticas · qualidade das salas de creche do que os pais e do que os responsáveis pelas salas de creche. Os resultados obtidos sugerem

Capítulo VI: Resultados

224

estudo. Como foi referido no Capítulo IV (Método), os valores Z foram convertidos em valores r, de

forma a determinar a significância prática destes resultados (r = Z/√N; Field, 2005). A importância

média atribuída pelos pais parece variar em função do tipo de instituição que os filhos frequentam.

Foram encontradas diferenças estatisticamente significativas e um efeito de pequena magnitude, sendo

que a média dos valores de importância atribuída pelos pais cujos filhos frequentam IPSS é

significativamente superior à dos pais cujos filhos frequentam instituições com fins lucrativos. Parece

não haver diferenças em função da faixa etária da sala que a criança frequenta e em função do género

do pai que respondeu ao questionário.

Quadro 28. Teste Mann-Whitney para a importância média atribuída pelos pais (34 itens), em

função do tipo de creche, da faixa etária da sala e do género do respondente

M DP U p r IPSS n = 55 4.76 0.29 Tipo de Creche

Lucrativa n = 55 4.63 0.35

1125.00 .02 -.22

1 – 2 anos n = 56 4.72 0.30 Faixa etária

2 – 3 anos n = 54 4.67 0.35

1442.00 .67 .04

Mãe n = 98 4.70 0.33 Mãe vs Pai

Pai n = 12 4.68 0.28

539.50 .64 .04

Foi também analisado o efeito do tipo de instituição (IPSS ou com fins lucrativos), da idade a

que as salas se destinam (1 - 2 anos, 2 - 3 anos, 1 - 3 anos) e do género do respondente (pai ou mãe)

na importância média atribuída pelos pais às três dimensões (ver Quadro 29). Por se ter verificado que

foram violados vários pressupostos requeridos pela análise de variância multivariada (MANOVA), foram

conduzidos testes univariados (testes Mann-Whitney). Foi utilizada a correcção de Bonferroni, ou seja,

as diferenças foram consideradas significativas com p ≥ .0167. Tendo em conta este valor, verifica-se

que a importância média atribuída pelos pais aos itens das dimensões Interacção-Linguagem,

Actividades-Rotinas, Espaço-Adultos não varia em função do tipo de instituição que os filhos

frequentam, em função da faixa etária da sala que a criança frequenta ou em função do género do pai

que respondeu ao questionário. Como se pode observar no quadro, os valores de significância do

efeito do tipo de creche e da faixa etária na dimensão Interacção-Linguagem são muito próximos do

valor de significância considerado com a correcção de Bonferroni (sem os arredondamentos seriam de

.020 e de .019, respectivamente). Contudo, as diferenças observadas nas médias são realmente

reduzidas.

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Critérios valorizados pelos pais

225

Quadro 29. Teste Mann-Whitney para a importância média atribuída pelos pais às dimensões da

qualidade, em função do tipo de creche, da faixa etária da sala e do género do respondente

M DP U p r

Interacção-Linguagem

Tipo de Creche

IPSS (n = 55) 4.92 0.22

Lucrativa (n = 55) 4.88 0.21 1208.50 .02 -.22

Faixa etária

1 – 2 anos (n = 56) 4.94 0.16

2 – 3 anos (n = 54) 4.85 0.25 1205.00 .02 -.22

Mãe vs Pai

Mãe (n = 98) 4.90 0.22

Pai (n = 12) 4.90 0.15 547.50 .62 -.05

Actividades-Rotinas

Tipo de Creche

IPSS (n = 55) 4.72 0.32 Lucrativa (n = 55) 4.55 0.40

1156.00 .03 -.20

Faixa etária

1 – 2 anos (n = 56) 4.66 0.36

2 – 3 anos (n = 54) 4.61 0.38 1417.00 .57 -.05

Mãe vs Pai

Mãe (n = 98) 4.64 0.37

Pai (n = 12) 4.55 0.35 495.00 .37 -.09

Espaço-Adultos

Tipo de Creche

IPSS (n = 55) 4.74 0.35 Lucrativa (n = 55) 4.59 0.45

1215.00 .07 -.17

Faixa etária

1 – 2 anos (n = 56) 4.67 0.38

2 – 3 anos (n = 54) 4.66 0.44 1490.50 .90 -.01

Mãe vs Pai

Mãe (n = 98) 4.66 0.41

Pai (n = 12) 4.70 0.39 545.00 .67 -.04

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Capítulo VI: Resultados

226

3. Critérios de qualidade valorizados pelos educadores

3.1 Estudo qualitativo

Como pode ser observado no Quadro 30, todas as educadoras consideraram importante que

uma creche dê particular atenção às Rotinas de cuidados pessoais e às Actividades, o que inclui os

materiais disponíveis para a sua realização. A terceira categoria focada por mais educadoras foi a

Interacção. De facto, apenas uma educadora não referiu aspectos relacionados com as interacções ao

descrever uma creche de boa qualidade ou de má qualidade. Oitenta e cinco por cento das educadoras

referiram aspectos relacionados com o espaço e o mobiliário e outros aspectos não incluídos na

ITERS-R. As categorias menos enunciadas foram Escuta e conversação, Estrutura do programa e Pais

e pessoal.27

Quadro 30. Número e percentagem de educadoras que referiram cada categoria

Categoria N.º de educadoras %

I. Espaço e mobiliário 17 85

II. Rotinas de cuidados pessoais 20 100

III. Escuta e conversação 13 65

IV. Actividades 20 100

V. Interacção 19 95

VI. Estrutura do programa 14 70

VII. Pais e Pessoal 11 55

VIII. Outros Critérios 17 85

Relativamente às subcategorias, e tal como pode ser observado no

Quadro 31, as características que mais educadoras (pelo menos 75% dos participantes)

focaram ao descrever creches de boa ou má qualidade foram os Materiais ou actividades não

especificados (95%), os Cuidados de saúde/higiene (90%), o Espaço interior (85%) e a Interacção

adulto - criança (75%). As características mencionadas por 50 a 75% dos educadores foram:

Refeições/refeições ligeiras (70%), Jogo físico activo (65%), Jogo livre (65%), Práticas de segurança

(55%), Motricidade fina (50%) e Características do pessoal (50%).

27 Dados parciais e preliminares previamente apresentados por Barros e Bairrão (2006)

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Critérios valorizados pelos educadores

227

Quadro 31. Número e percentagem de educadoras que referiram cada subcategoria

Subcategoria N.º de educadoras %

1. Espaço interior 17 85 2. Mobiliário para cuidados de rotina e jogo 6 30 3. Medidas para relaxamento e conforto 5 25 4. Arranjo da sala 9 45 5. Material exposto para as crianças 2 10

6. Chegada/partida 2 10 7. Refeições/refeições ligeiras 14 70 8. Sesta 6 30 9. Práticas de saúde/higiene 18 90 10. Práticas de segurança 11 55 11. Rotinas não especificadas 9 45

12. Ajudar as crianças a compreender e usar a linguagem 6 30 13. Utilizar livros 8 40

14. Motricidade fina 10 50 15. Jogo físico activo 13 65 16. Arte 2 10 17. Música e movimento 7 35 18. Blocos 4 20 19. Jogo dramático 8 40 20. Natureza 2 10 21. Utilização de televisão ou vídeo 0 0 22. Materiais/actividades não especificados 19 95

23. Supervisão do jogo e da aprendizagem 7 35 24. Interacção entre pares 5 25 25. Interacção adulto-criança 15 75 26. Disciplina 5 25

27. Horário 4 20 28. Jogo livre 13 65 29. Medidas para crianças com incapacidades 0 0 30. Iniciativas para envolver os pais 7 35 31. Condições para satisfazer as necessidades pessoais do pessoal 1 5 32. Interacção e cooperação entre o pessoal 5 25 33. Continuidade do pessoal 3 15 34. Supervisão e avaliação do pessoal 1 5 35. Oportunidades para desenvolvimento profissional 1 5

36. Número de adultos 8 40 37. Número de crianças 6 30 38. Faixa etária 3 15 39. Qualificação da educadora 5 25 40. Características do pessoal 10 50 41. Direcção/organização 2 10 42. Outros critérios não especificados 3 15

As subcategorias Condições para as necessidades pessoais do pessoal, Supervisão e

avaliação do pessoal e Oportunidades para desenvolvimento profissional foram focadas por apenas

uma educadora. As subcategorias Utilização de televisão ou vídeo e Medidas para crianças com

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Capítulo VI: Resultados

228

incapacidades não foram referidas por nenhuma educadora, apenas por pais. Os itens da ITERS-R

Jogo de areia e água, Promover a aceitação da diversidade, Actividades de grupo e Condições para

satisfazer as necessidades profissionais do pessoal não foram focados pelos educadores nem pelos

pais.

Os dados recolhidos através das entrevistas permitem caracterizar uma creche de boa

qualidade, segundo a opinião das educadoras participantes. São incluídos igualmente aspectos

próprios de uma creche de má qualidade. Apresentam-se, de seguida, excertos das respostas das

educadoras às entrevistas que permitem ilustrar cada uma das subcategorias, contendo cada excerto o

número de identificação atribuído às educadoras (e.g. Ed1) e especificando se a entrevistada era

auxiliar ou educadora de infância.

1. Espaço interior

“(…) É assim, precisam de ter boas condições a nível de espaços (…) Neste momento, precisava que fosse mais

fresquinho, que não é. Mas nós pusemos uma ventoinha, com o cuidado de não dar o vento nos meninos, para

refrescar um bocadinho o ar. (…) E temos também aquecedor, para o Inverno. É isso!” (Ed10 Educadora)

“[má qualidade] Um lugar doentio, aqueles lugares que há, que são autênticos buracos, que nem janelas têm,

infelizmente.” (Ed13 Auxiliar)

“[má qualidade] (…) que o espaço fosse muito reduzido, que as crianças nem se conseguissem deslocar, eu acho que

numa creche o mais, o essencial será espaço. Pode não haver material, mas ao menos espaço e uma creche

fechada, não sei, acho que não estou a imaginar crianças tão pequeninas num espaço assim. Não sei… penso que o

essencial seria isso, falta de espaço e arejamento, arejada, salas arejadas.” (Ed16 Educadora)

“(…) uma creche de qualidade é uma creche que tenha tanto o chão como as paredes sejam facilmente laváveis, não

haja alcatifas, não haja muitos tapetes de pêlos, acho isso porque eles vêm de estar aqueles 4 meses muito

protegidos e é muito fácil ficarem doentes.” (Ed18 Educadora)

2. Mobiliário para cuidados de rotina e jogo

“Uma boa creche, é assim… O ideal seria uma creche em que houvesse material e todo o equipamento necessário, à

altura da crianças (…) Armários, mobiliários, equipamentos e se calhar renovava o chão, as casas-de-banho,

mobiliário mais moderno. (…) Agora, poderíamos melhorar, se calhar, era a nível de materiais, não é? Mas isso não é

só ao nível da creche, nós temos esse problema ao nível da instituição, não é? As coisas já são muito antigas (…)”

(Ed12 Educadora)

“Ter um lavatório na sala, porque se a gente quiser lavar algum, tem de ir à casa-de-banho; um lavatório para se

quisermos lavar as mãos, sem termos de nos deslocar da sala. Sei lá… (…) outro tipo de camas, se calhar mais

modernas e que a instituição não quer dar. Estas camas são um bocadinho antigas já, são um bocadinho frias, são

mesmo de ferro, e os colchões também, mas pronto, a direcção gosta de poupar.” (Ed13 Auxiliar)

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Critérios valorizados pelos educadores

229

“Mais... todo o mobiliário de acordo com o tamanho das crianças, por exemplo as cadeiras, que mais?” (Ed17

Educadora)

3. Medidas para relaxamento e conforto

“Criar um espaço, um ambiente afável, um espaço acolhedor, simpático, alegre. Acho que são tudo características

que são importantes, adjectivos que são importantes para uma creche ser, ter boa qualidade.” (Ed12 Educadora)

“Mais... um espaço acolhedor onde as crianças se sintam bem, com mantas, almofadas, com colchões, um espaço...”

(Ed17 Educadora)

4. Arranjo da sala

“A nível de espaços tem de ter o cantinho, a casinha das bonecas que eu acho essencial e eu tentei pôr todos mais ou

menos, o cantinho da leitura, tenho a garagem, o cantinho dos jogos, dos legos... adaptei a sala aos cantinhos que

são mais procurados.” (Ed2 Educadora)

“Pronto, para mim uma boa creche seria uma creche de High Scope. Tudo, tudo ao nível da criança, nada de placares

em cima, aqui é só tudo em cima. ‘Porque senão eles arrancam, eles estragam’, aprendem, não é? Todo o material ao

nível da criança.” (Ed5 Educadora)

5. Material exposto para as crianças

“Criar um espaço, um ambiente afável, um espaço acolhedor, simpático, alegre. (…) Com muita cor, cores vivas.”

(Ed12 Educadora)

“Imagens, mesmo imagens sugestivas e reais, que permitam eles visualizarem de forma real o objecto.” (Ed20

Educadora)

6. Chegada/ partida

“Uma creche de boa qualidade... Para já acho que tem que ter pessoal em número suficiente para conseguirmos dar

mais apoio a cada uma, individualizadamente, porque o ideal era que nós conseguíssemos, por exemplo quando uma

criança chega de manhã, acolhê-la correctamente, estar o tempo suficiente com ela, que ela precisa para se adaptar

àquela mudança, não é? (…)” (Ed11 Educadora)

7. Refeições/ refeições ligeiras

“Na alimentação, por exemplo, também acho que deve haver higiene, na questão da alimentação.” (Ed8 Auxiliar)

“(…) E não é, nós não os obrigamos. Tenho uma menina que não come em casa e connosco come. Come, mas não é

forçada.” (Ed9 Auxiliar)

“Em termos de alimentação é tudo feito aqui na hora, portanto, não vem nada feito de fora, os legumes e a fruta vêm

todos os dias de manhã do mercado frescos, são confeccionados todos aqui, temos uma nutricionista que apoia e

fiscaliza, entre aspas, inspecciona a alimentação, todos os dias a alimentação é retirada para análise, nunca tivemos

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Capítulo VI: Resultados

230

nenhum problema. Acho que a alimentação também tem muito a ver com o bem-estar das crianças.” (Ed14

Educadora)

“Tem um refeitório em que não se juntam um grande número de crianças. Acho que para esta idade um ambiente de

confusão interfere no bem-estar deles.” (Ed17 Educadora)

“A alimentação é muito boa, é pensada, não por uma nutricionista, mas é pensada por pessoas que já estão muito

habituadas a escolher a ementa. Os alimentos em si estão bem guardados, bem conservados, são bem

confeccionados e é uma alimentação rica, com a sopa, com o prato do essencial, fruta sempre de boa qualidade.”

(Ed19 Educadora)

8. Sesta

“As crianças têm cada uma a sua caminha, os lençóis são mudados, fazemos tudo como se fosse mesmo...” (Ed9

Auxiliar)

“Ah, seria ideal ter uma sala para dormitório, seria ideal, que nós não temos, mas não acho que dormir na sala

perturbe muito porque, é assim, a sala também não ia estar a ser utilizada naqueles momentos e não mexe na sala,

se a sala fosse muito pequenina e tivéssemos que arrastar a sala, os brinquedos, não, as camas cabem perfeitamente

nos espaços vazios, por isso não…” (Ed19 Educadora)

9. Práticas de saúde/ higiene

“(…) O bem-estar da criança, por isso é que é muito importante a higiene pessoal e o sono, que nós fazemos várias

vezes ao dia.” (Ed4 Educadora)

“(…) O próprio material, que fosse o adequado. Até a própria banheira, que fosse em inox, não é? Todos estes

pormenores para que não houvesse grandes contágios, não é? (…) Os brinquedos, as próprias caminhas também

lavadas, sempre limpas, nada que possa causar alergias, o ideal mesmo.” (Ed6 Educadora)

“Sei lá, que tenham água e que facilmente se possa lavar as mãos, porque nós por exemplo ao mudarmos um ou

outro, eu passo as mãos por álcool, mas devia-se lavar as mãos e desinfectar. (…)” (Ed13 Auxiliar)

“Acho que é necessário todo o tipo de higiene. Ao nível da criança, o máximo de higiene com ela própria, quando

forem maiorzinhos lavarem as mãos e ter sempre a preocupação de lavar as mãos antes de almoçar. Para os bebés

ainda mais é necessário, porque eles não são autónomos. (…) Ah, ter cuidado com as próprias canequinhas por onde

eles bebem o leite, as louças, tudo o que inclua a alimentação e eles próprios, acho que é… ter o cuidado com a

desinfecção desses materiais, que é o que ocorre aqui, porque é o que levam para a língua. Lavarem o material, e

não estou a falar só de material, pratos e assim da alimentação deles, mas também a nível de brinquedos, os

peluches, os bonequinhos de borracha, e tudo, ser tudo…” (Ed16 Educadora)

“ (…) A creche é limpa uma vez por dia. As salas, por exemplo, são limpas com lixívia, porque não se pode utilizar

lixívia durante o dia, enquanto as crianças estão cá. Acho que se calhar a meio da manhã, enquanto nós estamos na

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Critérios valorizados pelos educadores

231

refeição, poderiam limpar as salas uma vez que nós só varremos para depois se pôr os colchões. Poderia ser limpo,

porque depois de tarde as crianças estão outra vez a brincar ali, não é? A nível das casas-de-banho eu reforçaria a

limpeza.” (Ed11 Educadora)

10. Práticas de segurança

“E os cuidados que tem que ter, porque são crianças que se magoam muito facilmente e tem de ser tudo muito bem

escolhido, com muito cuidado para não haver acidentes. (…) E aqui todos os materiais são escolhidos ao pormenor,

até as prateleiras, as… tudo, tudo, tudo. O que se põe nos aquecedores, as tomadas… Têm muito cuidado em

escolher todo o material. (…) têm as cancelas de protecção das portas, aquelas protecções para as portas não

fecharem, não sei se reparou, tem umas coisinhas para as portas não fecharem, os materiais dos brinquedos são

escolhidos de maneira a não magoarem, a não terem arestas, materiais de tecido. As cadeiras, as mesas com

aquelas protecções de lado, não sei se também reparou nas cadeirinhas, também são de madeira, acho que está tudo

direitinho.” (Ed10 Educadora)

“[materiais] com resistência e qualidade, sobretudo. As crianças na creche põem tudo à boca, é preciso ter um certo

cuidado com os materiais que se utilizam nas creches. Que duram, que tenham durabilidade e resistência, essas

coisas.” (Ed12 Educadora)

“Ter todas as condições de segurança, principalmente para estes mais pequeninos, que eles mexem em tudo, levam

tudo à boca, eles podem-se cortar em qualquer canto, em qualquer esquina.” (Ed13 Auxiliar)

“Que não haja perigos como esquinas vivas, armários com portas onde eles se possam meter lá dentro e se possam

magoar.” (Ed17 Educadora)

“[má qualidade] (…) onde haja escadas perto das crianças, onde as crianças possam chegar a escadas ou zonas que

as ponham em risco, como a cozinha…” (Ed19 Educadora)

11. Rotinas não especificadas

“Ora bem, uma creche é para nós tomarmos conta dos miúdos, não é? (…) Acho que as creches têm muita utilidade

nesse aspecto.” (Ed13 Auxiliar)

“Numa creche, o mais importante, eu acho que é… não é tanto o ensino em actividades, mas é mais, são as regras.

As crianças de 2 anos acho que necessitam muito mais de regras, o estar sentadinho, o saber estar, acho que é mais

importante. Proporcionar actividades para promover a autonomia da criança, acho que é mais isso.” (Ed16

Educadora)

12. Ajudar as crianças a compreender e usar a linguagem

“É tentar desenvolver a memória deles e os vocábulos e tentar... Eles são pequeninos, eu acho que puxo bastante por

eles. Vou tentando o que eles assimilarem, o que eles forem assimilando melhor. Que é que eu disse? Memória,

vocabulário. (Ed4 Educadora)

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Capítulo VI: Resultados

232

“Má qualidade? Olhe, fracos recursos humanos, onde as pessoas gritam mais do que outra coisa. Não quer dizer que

aqui não se grite, eu não vou dizer que este é perfeito, como é evidente, acho que toda a gente grita uma vez ou

outra, mas acho que há pessoas que gritam demais. E uma creche onde as pessoas fazem demasiado barulho, só

por si já não é uma boa creche, porque acho que a criança nesta idade não precisa de ouvir gritos, precisa é de ser

acarinhada.” (Ed14 Educadora)

“Os objectivos de uma creche são: desenvolver a criança no aspecto social, a socialização com os adultos, com

outras crianças; desenvolver a linguagem, porque ligada ao facto da socialização a linguagem também é um dos

factores que é mais desenvolvido na creche, a nível da autonomia à mesa, de autonomia pessoal, como o controlo

dos esfíncteres.” (Ed17 Educadora)

“(…) depois o segundo é a nível da linguagem e a nível motor, que comecem a andar, a dar os primeiros passos, no

primeiro ano. Nós, educadoras, não estamos nos bebés, só pegamos neles a partir da sala do 1 ano. Por isso, depois

do período da adaptação é a nível motor e a nível da linguagem.” (Ed18 Educadora)

13. Utilizar livros

“(…) livros, acho que lhes faz muito bem. Eles gostam, gostam de manusear os livros.” (Ed16 Educadora)

“(…) livros, acho muito, muito importantes os livros, também adequados, que tenham capa dura ou então

plastificados, que tenham imagens reais que sejam, que as crianças reconheçam, livros de qualidade, livros de

histórias, que também a educadora possa pegar e utilizar ela, mas em benefício das crianças.” (Ed19 Educadora)

“Livros essencialmente, de boa qualidade, livros com capa bastante dura, folha também dura, de vários materiais,

livros plásticos, livros de pano, de cartão duro, grosso, isto dentro da área da leitura.” (Ed20 Educadora)

14. Motricidade fina

“No sentido, por exemplo, todo o meu trabalho é focado no sentido da educação sensorial, porque... eu estive, como

já lhe estive a explicar, a fazer uma pesquisa na valência creche e realmente constatei que, durante os primeiros anos

de vida, a criança percepciona o mundo que a rodeia a partir dos sentidos e, então, tento focar todo o meu trabalho

nessa área. E daí toda a importância da creche tentar criar um ambiente multi-sensorial, ou seja, rico do ponto de

vista das sensações, em que a criança possa tocar, manipular determinados objectos de diferentes texturas, que eu

penso que vai conduzir a um desenvolvimento integral e holístico da criança.” (Ed2 Educadora)

“De encaixe, como os legos, aqueles com formas, apesar de que eles ainda têm alguma dificuldade.” (Ed4

Educadora)

“Jogos de encaixe, eles gostam muito dos jogos de encaixe. Principalmente jogos de encaixe, para esta faixa etária.

Principalmente esses jogos, eles adoram os legos.” (Ed16 Educadora)

15. Jogo físico activo

“Acho que era, se calhar ali não era possível, mas se houvesse uma sala à parte um ginásio, que eles pudessem ir e

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Critérios valorizados pelos educadores

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usufruir um bocadinho disso. Estou a pensar falar com os pais, à Sexta possivelmente, meto aqueles colchões que

são de dormir, meto e vamos fazer uma ginástica, mexer, eu própria mexo nas perninhas, nos bracinhos, fazer assim

coisas engraçadas, para que usufruam um bocado de coisas diferentes.” (Ed5 Educadora)

“Por exemplo, um espaço fechado que nós não temos, que fosse equivalente àquele espaço exterior, que é um dos

espaços onde eles se sentem melhor e onde podem brincar com maior liberdade. E é dificilmente, é aquilo que eles

têm menos com os pais, pelo que a gente conhece e sabe não vão muito a parques infantis e no Inverno ficamos um

pouco reduzidas à sala.” (Ed14 Educadora)

“(…) depois o segundo é a nível da linguagem e a nível motor, que comecem a andar, a dar os primeiros passos, no

primeiro ano. Nós, educadoras, não estamos nos bebés, só pegamos neles a partir da sala do 1 ano. Por isso, depois

do período da adaptação é a nível motor e a nível da linguagem.” (Ed18 Educadora)

“(…) Depois também há o escorrega, que eu tenho na sala e que podia haver lá fora, com baloiços e... Pronto, eu

acho que na minha sala o escorrega está lá e tem muito sucesso, algumas pessoas criticam, por estar um escorrega,

que não é muito adequado estar dentro de uma sala, mas eu sinceramente não vejo inconveniente nisso, porque uma

área onde eles possam subir, trepar, escorregar, virarem-se ao contrário, no fundo trabalhar a motricidade também é

importante.” (Ed19 Educadora)

16. Arte

“(…) fazem colagens, desenho, pintura.” (Ed15 Educadora)

“(…) na área da plástica vários materiais, como pastas diferentes, sobretudo que dê para eles explorarem e que

possam levar à boca. (…) A nível da plástica acho que temos bons materiais para eles. Essencialmente mudaria a

casinha.” (Ed20 Educadora)

17. Música e movimento

“Com os sons dos carrinhos...” (Ed3 Auxiliar)

“Sobretudo a música, o rádio, a alegria que eu acho... é o que se nota. A alegria, mas ao mesmo tempo a calma. Um

ambiente calmo e, por outro lado, um ambiente alegre.” (Ed6 Educadora)

“Brinquedos que eles também possam ouvir sons, que há poucos, que há muito poucos. Que eles possam tocar e

eles mexem, carregam no botão e têm sons, que possa sair algum tipo de luzes, ou de… porque há bonecos que eu

sei que há, bonecos mais específicos para a idade deles e que os cativam mais, estes é mais mexerem e ouvirem,

porque no fundo não são animados.” (Ed13 Auxiliar)

“Brinquedos com sons, sons dos animais, sons de várias coisas, coisas que estimulem o seu poder de descoberta, o

poder de experimentar, de explorar, essas coisas, brinquedos.” (Ed17 Educadora)

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Capítulo VI: Resultados

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18. Blocos

“(…) ter materiais para construções” (Ed1 Educadora)

"(…) E carrinhos, também já começam a… na sala 2 começam a gostar muito dos carrinhos, mas é preciso é ter um

bocado de cuidado, com o tipo de carrinhos e de material que se vão dar a eles.” (Ed16 Educadora)

19. Jogo dramático

“(…) fantoches, que eles também gostam muito para brincar; e assim chapéus e carteiras, também acho giro e eles

gostam muito, e põem os chapéus e andam ali a brincar. Acho que a nossa sala está bem equipada, basicamente.”

(Ed4 Educadora)

“Há uma cozinhinha que eu tenho lá em cima do armário, que também é minha, mas achei que não vou pôr lá, para

eles terem uma novidade a seguir ao Natal.” (Ed5 Educadora)

“(…) as meninas vão muito já para os bebés, para… E nós tentamos aproximar ao máximo, nós temos bebés que… é

o menino, a menina, tem o umbigo, tem…, quer dizer, tentamos aproximar ao máximo dos bebés na realidade, e elas

gostam muito.” (Ed16 Educadora)

“Brinquedos, objectos reais, que a criança lida todos os dias e que ela brinca, sei lá: caixa do cerelac, colheres,

frascos ou plásticos, fraldas… Coisas que ela reconhece e que sabe mexer e que sabe para que servem. Eu gostava

também de ter e acho importante uma, a casinha, haver uma cozinha e um quarto, porque já há alguns meninos que

nesta idade pegam no boneco, tentam embalar o boneco e tentam dar de comer (…)” (Ed19 Educadora)

20. Natureza/ciência

“Tem o jardim se nós quisermos ir lá para fora, as crianças gostam muito de ir lá para fora.” (Ed16 Educadora)

“E depois numa segunda fase, brinquedos muito a nível de desenvolvimento sensorial, o som associado à imagem,

dos animais que eles gostam muito e dos objectos conhecidos deles, do dia-a-dia, de casa.” (Ed18 Educadora)

22. Materiais/ actividades não especificados

“Daí que sempre optamos por ter educadora na sala dos bebés, exactamente desde a sala dos bebés. Em muitas

creches é só a partir da sala do 1 ano. Mas nós sempre temos educadora na sala dos bebés. Exactamente por causa

disso, por causa da organização que se dá, dos materiais que estão na sala, com vista também a proporcionar uma

estimulação do desenvolvimento à criança. (…) Mas considero importante ter materiais que estimulem todo o

desenvolvimento, de uma forma mais... completa.” (Ed1 Educadora)

“Acho que deveria haver mais material nas salas, há outras creches que eu conheço e que não dão muito valor a nível

de materiais dentro das salas de creche, só valorizam também a parte do jardim-de-infância, deve ser muito mais

enriquecida, deve ter todo o tipo de material para que a criança comece a experiência, a conhecer tudo o que a rodeia

para mais tarde realmente não ter tanta dificuldade, e tanta, como é que hei-de dizer? É dificuldade, tanta dificuldade

para as aprendizagens que irão ter mais tarde. (…) É o que eu digo, a creche para mim tem de ser tratada como se

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Critérios valorizados pelos educadores

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fosse um Jardim, tudo próprio para a idade dos 0 aos 3, mas quer dizer, a nível de material. (Ed5 Educadora)

“Uma creche como a nossa. Já teve oportunidade de ver, acho que é uma boa creche. Estagiei em muitos sítios, vi

muitas creches e nunca vi uma creche com tantos materiais como esta, com… de uma diversidade de materiais,

desde materiais para eles brincarem. (...) Têm muitos brinquedos mesmo adequados à idade, que muitos não têm,

têm poucas coisas. Basicamente é isso.” (Ed10 Educadora)

“Uma coisa, por exemplo, que eu gosto muito, é de ir mudando, mas isso quer dizer eu diria que é um bocadinho uma

utopia, porque nem em casa nem em lado nenhum isso acontece, eu acho que por exemplo os garotos aqui passam

muitas horas, não é? Passam muitas horas a brincar. Então uma coisa que eu noto é que quase que, sei lá,

mensalmente não diria, mas quase que ao mês e meio, quase que eu tinha necessidade de pegar nestes brinquedos,

pô-los fora e ter outros. Mas isso, quer dizer, não é viável.” (Ed18 Educadora)

“Acho que as pessoas que estão na creche, as educadoras, que se preocupam com as questões pedagógicas e

desenvolvimento das crianças.” (Ed19 Educadora)

23. Supervisão

“(…) uma vez que a minha sala e o berçário funcionam como uma só, por exemplo, eu da minha sala não vejo o

berçário. Devia ter uma divisória pelo menos, em vez de ser parede, em vidro, para eu observar as crianças, porque

mete-me um bocadinho de confusão o facto de eu ter de estar atenta ao choro. Ou ter de estar sempre, pelo menos a

auxiliar, eu não posso sair da sala, tem de ir vigiar. Devia ser uma divisória em vidro e a parte do dormitório, acho que

deve-se realmente separar a parte do dormitório e a parte da sala parque (…)” (Ed2 Educadora)

“Não é fácil, embora uma pessoa controle, mas vira costas porque está um amiguinho por exemplo a morder o outro

ou isto ou aquilo, há sempre aquela, é inevitável. Uma pessoa por mais que controle não está em todos os cantos.

Também não vamos ter uma pessoa para cada um, como é lógico.” (Ed8 Auxiliar)

“Estamos sempre atrás deles, estamos 100%, pronto, levamos isto mesmo a sério.” (Ed9 Auxiliar)

“Hum... Ao nível dos recursos humanos, com boa qualidade e quantidade de funcionários. Acho que requer muita

atenção e muita presença dos adultos. Por isso é que normalmente em creche deverá ter mais funcionários do que

nas outras salas.” (Ed20 Educadora)

24. Interacção entre pares

“Para eles estarem mais ambientados com os coleguinhas. É isso...” (Ed3 Auxiliar)

“ (…) Para interagirem com as outras crianças.” (Ed8 Auxiliar)

“Os objectivos de uma creche são: desenvolver a criança no aspecto social, a socialização com os adultos, com

outras crianças; desenvolver a linguagem, porque ligada ao facto da socialização a linguagem também é um dos

factores que é mais desenvolvido na creche, a nível da autonomia à mesa, de autonomia pessoal, como o controlo

dos esfíncteres.” (Ed17 Educadora)

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Capítulo VI: Resultados

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25. Interacção adulto-criança

“Hum... Considero fundamental a relação dos adultos com as crianças, em todo o percurso pré-escolar, mas

sobretudo na creche porque eles são muito pequeninos. (…) Numa creche de boa qualidade? Mais importante, mais

importante é a relação. O facto de a criança ter uma relação muito boa, com pelo menos uma das pessoas da sala,

acho fundamental, porque sem haver a relação e sem eles se sentirem seguros não se faz mais nada. Portanto,

parece-me que a relação é o fundamental. De resto é tudo importante, mas a pedra base é esta.” (Ed1 Educadora)

“E também a nível afectivo, dar carinho, muitos beijinhos, brincar com eles.” (Ed4 Educadora)

“[má qualidade] E as pessoas sempre chateadas e a resmungar com os miúdos. Uma pessoa também há momentos e

momentos, às vezes estamos mais contentes ou mais tristes, e às vezes estamos mais cansadas por muito que se

goste do trabalho. Mas não temos que ser arrogantes e “chega para lá” e isto e aquilo, temos que ser dóceis, amigos

dos nossos meninos.” (Ed8 Auxiliar)

“E acho que o principal também é nós estarmos sempre disponíveis para as crianças, tentarmos sempre compreendê-

las e estarmos sempre prontas para respondermos às necessidades delas.” (Ed11 Educadora)

“Eu acho que para além de outros que eu não acho tão importantes, é a parte afectiva, pelo menos na minha maneira

de ver, porque normalmente são crianças que vêm pela primeira vez para a creche, pelo menos no nosso caso,

porque uma vez que não temos berçário. E são crianças muito pequeninas, ainda com muita dificuldade em se

expressar e que lhes custa muito o corte, com o pai, a mãe, ou com a ama, eventualmente, e eu acho que a parte

afectiva é a que realmente, pelo menos para mim, é a mais importante.” (Ed14 Educadora)

26. Disciplina

“[má qualidade] Os castigos psicológicos e físicos (…) Não posso dizer… Sei lá, nunca… Só ouço dizer, só leio, só

pelos casos divulgados tenho noção do que às vezes se passa. No nosso em princípio não se passará, às vezes uma

chamadinha de atenção, “menino”, ou “vais de castigo”, como eu lhes digo, “vais para a cozinha”. Não é um castigo no

fundo, é para ele sentir, mas há repreensões ou chamadas de atenção que não têm nada a ver com o que às vezes

nós vemos na televisão ou nos jornais. Para mim, má qualidade é... Também, acho que também às vezes há aqueles

castigos psicológicos, que também é preocupante, há os castigos físicos, os psicológicos, fechá-los em alguns sítios

às vezes escuros, sei lá numa despensa ou num quarto escuro. Às vezes digo “vou fazer isto”, mas eles sabem muito

bem que não temos nenhum quarto escuro. Dizemos às vezes, é lógico que contra mim às vezes falo, também é

lógico que uma pessoa diga isso, porque já estamos também…mas não o faço, porque não temos no caso nenhum

quarto escuro nem nada. Má qualidade é isso, castigos severos, pancada, psicológicos (…)” (Ed8 Auxiliar)

“Numa creche, o mais importante, eu acho que é… não é tanto o ensino em actividades, mas é mais, são as regras.

As crianças de 2 anos acho que necessitam muito mais de regras, o estar sentadinho, o saber estar, acho que é mais

importante. Proporcionar actividades para promover a autonomia da criança, acho que é mais isso.” (Ed16

Educadora)

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Critérios valorizados pelos educadores

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27. Horário

“Porque noto, eu estou ali há um mês e meio mais ou menos na sala, desde 15 de Agosto ou 16 e eles cansam-se

dos brinquedos. De manhã estão ali uma hora no máximo, à tarde ponho só os legos. Estamos ali a brincar um

bocado, no encaixe, construção. Tiro os legos, vêem os livros, para eles aprenderem a estar com o livro um bocado.

Há sempre assim um processo, porque senão é tira, tira o livro e faz… e nem estão a dar…” (Ed5 Educadora)

“Por exemplo, um espaço fechado que nós não temos, que fosse equivalente àquele espaço exterior, que é um dos

espaços onde eles se sentem melhor e onde podem brincar com maior liberdade. E é dificilmente, é aquilo que eles

têm menos com os pais, pelo que a gente conhece e sabe não vão muito a parques infantis e no Inverno ficamos um

pouco reduzidas à sala. O que não é de todo bom, porque não tem o espaço exterior, exterior, neste caso ou interior,

mas fechado, onde eles pudessem brincar no género do parque exterior, lá fora. Isso é uma grande necessidade que

eu sinto.” (Ed14 Educadora)

28. Jogo livre

“(…) Estagiei em muitos sítios, vi muitas creches e nunca vi uma creche com tantos materiais como esta, com… de

uma diversidade de materiais, desde materiais para eles brincarem...” (Ed10 Educadora)

“Também. Pronto, também temos os brinquedos com que eles brincam diariamente naqueles espaços mais livres da

sala.” (Ed15 Educadora)

“Sei lá mais, a nível físico, que tenha espaço exterior, para as crianças brincarem.” (Ed17 Educadora)

“[boa qualidade] onde podem brincar isoladamente ou com os adultos (…) [má qualidade] onde as crianças tenham

que estar sentadas muito tempo, porque há creches em que as crianças são obrigadas a estar num espaço mesmo

sentadas ou presas a cadeiras.” (Ed19 Educadora)

30. Iniciativas para envolver os pais

“Eu acho sinceramente, mesmo se não trabalhasse aqui achava, que é uma creche que tem muito cuidado, porque

pensa em tudo, desde os pais, aos filhos.” (Ed10 Educadora)

“E a abertura com a família, porque nós não nos podemos esquecer que passamos muito tempo com as crianças,

mas não nos podemos esquecer que os principais agentes da educação são os pais. Por isso temos de ter uma boa

relação com os pais.” (Ed11 Educadora)

“ (…) haver muito diálogo com os pais, manter sempre essa comunicação, porque eu acho que a creche é um bocado

a continuação daquilo que há na família, quanto mais pequeninos eles são, mais cuidados eles precisam, mais

carinho.” (Ed12 Educadora)

“ (…) com as questões familiares que aqui são muito importantes, de nós nos adequarmos ao que as famílias

precisam e ao que as famílias pretendem.” (Ed19 Educadora)

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Capítulo VI: Resultados

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31. Condições para satisfazer as necessidades pessoais do pessoal

“(…) onde também os adultos se sintam bem.” (Ed19 Educadora)

32. Interacção e cooperação entre o pessoal

“Há um bom relacionamento entre as pessoas, entre a equipa, educadoras, auxiliares, estagiárias.” (Ed1 Educadora)

“Planificação, não existem planificações, lá está, uma pessoa vem, eu sou coordenadora, mas é só no papel, não

existe… Para ter alvará é preciso uma coordenadora, com 2 anos de serviço pelo menos e licenciatura e eu dei o meu

nome, mas ao nível de organização e coordenar as salas...” (Ed5 Educadora)

“É complicado, porque quem trabalha aqui há tantos anos vai-se habituando, vai-se acomodando muito às coisas e às

vezes, é assim se há uma coisa que corre diferente dos outros dias é como lhe digo, chamamos à atenção, ou até se

fala com alguém se falta material, ninguém nos nega isso. É isso…” (Ed8 Auxiliar)

33. Continuidade do pessoal

“(…) Iam educadoras embora, vinham, iam, e há 2 anos para cá tem corrido melhor e, portanto, eu felizmente já

consegui subir para dar continuidade, dos pequeninos aos grandes. Era sempre cansativo estar sempre nas mesmas

salas, nesta ou na sala ao lado, mas sempre nas mesmas faixas etárias. É muito mais agradável dar continuidade, de

pequeninos até mais velhos. Acho que isso é importante numa creche e num jardim. Devem dar continuidade, não só

o grupo. Por um lado, é bom terem sempre a mesma educadora e, por outro lado, também é bom adaptarem-se a

outras pessoas, para não haver um choque muito grande quando vão para a primeira, para a escola, para a primeira

classe, quando mudam de professores, mas por outro também acho que é saudável para o educador, dar

continuidade, cada ano estar com uma faixa etária diferente, é como os professores, quer dizer… É mais motivante,

não é tão cansativo, é como tudo.” (Ed5 Educadora)

“(…) A meu ver, eu digo isto e se calhar não devia dizer, serem acompanhadas sempre pelas pessoas, não andarem

a mudar de educadoras, auxiliares (…) Numa instituição acontece, nestas não, nestas particulares também pode

acontecer, embora estejam as pessoas mais anos, como é o caso das minhas colegas, do que nas escolas e uma

pessoa vai-se afeiçoando a elas e vai acompanhando. Porque como viu, nós há horas que nos juntamos todos,

conhecemo-nos uns aos outros, é uma família, no fundo. E uma instituição se mantiver as pessoas e vão até aos 6

anos e alguns em ATL nós conhecemos muito bem as crianças e isso é importante, e elas também nos conhecem a

nós. Acho que é um dos objectivos, é conhecê-las e lidar com elas a par e passo. Porque assim nós conhecemos as

características deles e eles também nos conhecem a nós. (…)” (Ed8 Auxiliar)

“O pessoal também é todo efectivo, não há aquele pessoal que entra 2 ou 3 meses e sai. A auxiliar vai comigo até aos

6 anos, nós acompanhamos o grupo até ir para a escola. Depois passa com o grupo um ano para o ATL de transição

e só depois é que volta aos 2 anos. Portanto, e nós sabemos que isso faz com que a criança se sinta muito melhor e a

própria família, não é? Que tem mais estabilidade. A partir do momento em que nós dizemos aos pais que vamos com

eles até aos 6 anos eles parece que ficam aliviados, até suspiram, porque o facto de mudarem todos os anos de

equipa educativa é complicado e aqui não há isso (…).” (Ed14 Educadora)

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Critérios valorizados pelos educadores

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34. Supervisão e avaliação do pessoal

“Somos fiscalizados, pela Segurança Social e também os fiscais do Jardim. Penso que se tivéssemos má qualidade

alguém nos diria, na questão do material, na questão do pessoal. Eu também, é o que eu digo, eu sou um bocadinho

suspeita, há sempre um erro, mas isso é em todo o lado, e que se emenda. É como lhe digo, sou suspeita para falar.”

(Ed8 Auxiliar)

35. Oportunidades para desenvolvimento profissional

“Mas também há uma tentativa de reflectir sobre as situações. Nós reunimos periodicamente, as educadoras, e depois

cada educadora com as estagiárias da sua sala e a auxiliar, para reflectir situações do dia-a-dia. Muitas vezes quando

se trabalha todos os dias às vezes chega-se à noite e pensa-se ‘Hoje fiz isto e não devia ter feito’. (…) Vou tentando,

por exemplo, em relação à auxiliar, em termos de posturas há uma coisa ou outra, que muitas vezes ela tem

consciência, que tenho que lhe dizer. Acho que apesar de tudo e neste momento temos investido um bocadinho na

formação das auxiliares, mas acho que um dos problemas é o facto de elas não terem grande, ou seja, começam a

trabalhar com crianças sem qualquer tipo de formação, a maior parte delas. E depois, muitas vezes, têm algumas

posturas menos correctas, do meu ponto de vista. Mas temos investido nisso, ao Sábado de manhã eles fazerem

formação e reflectirem sobre situações que vão acontecendo, que é que está correcto, o que não está correcto.” (Ed1

Educadora)

36. Número de adultos

“(…) devia haver mais pessoal, esta semana viu-se: não tenho auxiliar, está cá em baixo porque a auxiliar desta sala

pôs baixa 10 dias, acho que deve sempre haver mais pessoal do que é necessário, para realmente as coisas

estarem...” (Ed5 Educadora)

“(…) eu acho que ainda devíamos ter mais pessoal, para conseguirmos chegar a todas as crianças, porque nós temos

muitas crianças que têm muitas dificuldades em adaptar-se, mesmo nesta fase do ano ainda temos algumas com

dificuldades de adaptação e eu acho que precisávamos de mais pessoal. Mas nós estamos já para além da lei, na lei

é só uma educadora e uma auxiliar, nós já temos mais que isso.” (Ed11 Educadora)

“Eu acho que são os recursos humanos. A quantidade das pessoas que trabalha, porque nós sabemos que se

trabalhar 1 ou 2 pessoas, ou se trabalharem 3 ou 4, a qualidade é diferente, o atendimento é diferente, é tudo

diferente. Nós somos 3, no ano passado por exemplo eram 4, este ano não foi possível estar uma quarta pessoa, que

dava jeito, atendendo ao número de crianças que temos. Pronto, somos 3, vamos tentando organizar de maneira a

que esteja sempre alguém com eles, como é evidente, mas acho que os recursos humanos são das características

mais importantes para a qualidade da creche.” (Ed14 Educadora)

37. Número de crianças

“Acho que…Talvez menos algumas crianças para podermos dar mais atenção.” (Ed4 Educadora)

“É assim, eu não concordava, por exemplo que tivesse 20 crianças, acho que mesmo com os recursos suficientes e

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Capítulo VI: Resultados

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com o espaço suficiente, 20 crianças é muito numa sala de creche. Porque como acabei de dizer eles ainda são muito

pequeninos, precisam muito do adulto, ainda não têm autonomia nenhuma, e… são muitos, por muito que a gente

queira dar um tratamento individualizado torna-se-nos difícil, porque se está um no nosso colo, vem outro e quer, e

não conseguimos desdobrar-nos para todos. Eu acho que não punha mais de 14 ou 15.” (Ed14 Educadora)

“(…) respeita-se o número de crianças máximo exigido, às vezes há uma excepção de mais uma no máximo de mais

2, porque, é assim, nós somos um Centro Social e, por vezes, há crianças em situação de risco que nós aceitamos.”

(Ed19 Educadora)

38. Faixa etária

"Um bocadinho menos de crianças. A mistura de idades acho que não faz mal, é saudável até. Acho que eles são

engraçados uns com os outros, os mais velhos e os mais novos, mas realmente sinto que são muitos.” (Ed4

Educadora)

“Não devem estar todos juntos. Não concordo. Mas concordo… Não concordo com o que se faz, por exemplo, se há

poucas crianças nos bebés, ainda não vão para a sala de 1 ano. Não concordo. O S. se estivesse lá, já estava muito

mais desenvolvido a nível se calhar do andar. A F. adora, de certeza que também estaria mais, mais quer dizer, tinha

dado um passo, e não ficar ali nos bebés. Precisa, tem necessidade já de avançar na sala. Acho que ter idades

diferentes é muito complicado nos bebés. Tem de ter uma atenção redobrada a nível de carinho, a refeição.” (Ed5

Educadora)

39. Qualificação da educadora

“Daí que sempre optamos por ter educadora na sala dos bebés, exactamente desde a sala dos bebés. Em muitas

creches é só a partir da sala do 1 ano. Mas nós sempre temos educadora na sala dos bebés. Exactamente por causa

disso, por causa da organização que se dá, dos materiais que estão na sala, com vista também a proporcionar uma

estimulação do desenvolvimento à criança.” (Ed1 Educadora)

“De má qualidade? Também é difícil. Uma creche onde não tenha... Por exemplo nós aqui ainda vamos tendo a sorte

de ter 2 auxiliares e 1 educadora, não é? Porque há creches que nem educadora têm, eu acho que é necessário ter

uma educadora. Não podemos ser substituídas por uma enfermeira, porque há muitas que são substituídas, porque a

enfermeira dá mais aqueles cuidados básicos de higiene e segurança, e saúde, e uma creche é muito para além

disso. Ter que ter educadora, obrigatoriamente, por isso uma má creche é aquela que não tem educadora, que não

tem.” (Ed11 Educadora)

“Pessoal qualificado e não só! Muitas das vezes as pessoas têm qualificações, mas têm más posturas, não é?

Também passa um bocado por aí. Eu acho que as qualificações só por si não chegam. Qualificações junto com uma

boa formação em termos cívicos, eu acho que também é fundamental. Seria pessoal que não estivesse qualificado,

que pronto, em termos de imagem passasse uma má imagem.” (Ed20 Educadora)

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Critérios valorizados pelos educadores

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40. Características do pessoal

“Sim, e depois é preciso também claro, as pessoas que lá estão. É preciso terem sensibilidade para o trabalho que

estão a fazer, não é? Que é um trabalho muito complicado, não é a mesma coisa que estar num jardim-de-infância, é

muito mais complicado. É um trabalho que exige muito mais de nós.” (Ed10 Educadora)

“Tive um colega e era fantástico! (…) Mas pronto, se calhar socialmente ainda não é muito visto ou respeitado essa

situação. Acho que era agradável, acho que devia ser muito, dar valor à parte do homem. Como eu digo aos meus

meninos, aos mais velhos, eu dizia sempre “a mãe no Natal fica no sofá e o pai faz as rabanadas e tal”, brincava

muito com eles e os pais aderiam muito à brincadeira, acho que tem que ser mútuo…” (Ed5 Educadora)

“Eu acho que é também o próprio ambiente, as próprias pessoas. Eu acho que isso também ajuda, porque... Eu já tive

uma situação diferente, um jardim diferente e havia a preocupação de colocar o espaço alegre e as pessoas que lá

estão é que fazem as coisas mais sombrias ou não, não é? Fazem com que as pessoas se sintam pior, são estes

aspectos que eu acho que são importantes.” (Ed6 Educadora)

“E depois que também todos os que estivessem cá, estivessem aqui porque gostam e não porque é a única coisa que

podem encontrar, não é? Eu acho que a nível de educadoras nós ainda vamos conseguindo isso, porque se estamos

aqui é pelo menos porque, nem que seja a última opção, é porque queríamos isto, em termos de auxiliares às vezes é

porque é a única coisa que conseguem ter, não é? Acho que deviam estar aqui porque gostam. Acho que é mesmo

uma profissão que ou se gosta ou não se gosta.” (Ed11 Educadora)

41. Direcção/ organização

“Há essas falhas, falta de organização, muita falta de organização, a nível de burocracias. As pessoas… Tinha que

haver uma maior organização.” (Ed5 Educadora)

“Era eu [directora e educadora] poder ter mais tempo. Pronto, é uma das preocupações que eu irei ter com o passar

do tempo, ter alguém que não viva tanto os problemas, que procure estar aqui mais de corpo e alma na creche. Por

vezes preocupo-me muito, porque eu procuro estar presente, mas a cada momento tenho de sair... Pronto, é dos

aspectos que eu acho pior e que vou tentar mudar.” (Ed6 Educadora)

42. Outros critérios não especificados

“Tem de ter localização (…) Sobre uma boa creche, tem de ter um projecto pedagógico.” (Ed2 Educadora)

“Que tivesse assim um aspecto triste, que as crianças olhassem e não gostassem de entrar, que tivessem medo de

entrar. (Ed4 Educadora)

“Eu acho que é assim, acho que uma boa creche seria aquela que respondesse a todas as necessidades das

crianças.” (Ed16 Educadora)

Page 242: Qualidade em Contexto de Creche: Ideias e Práticas · qualidade das salas de creche do que os pais e do que os responsáveis pelas salas de creche. Os resultados obtidos sugerem

Capítulo VI: Resultados

242

3.2 Estudo quantitativo

3.2.1 Resultados descritivos

À semelhança dos pais, os educadores que participaram neste estudo atribuíram elevada

importância a todos os itens incluídos na ITERS-R, variando entre 3.69 no item Uso de TV, vídeo e/ou

computador e 4.97 nos itens Mudança de fraldas/idas à sanita e Interacção adulto-criança (ver Quadro

32).

Os itens mais valorizados (25% de 39 itens), por ordem decrescente de importância, foram:

Mudança de fraldas/idas à sanita e Interacção adulto-criança, Ajudar as crianças a compreender a

linguagem e Práticas de segurança e Interacção entre pares, Ajudar as crianças a usar a linguagem e

Arranjo da sala, Espaço Interior e Práticas de saúde e Disciplina.

Os itens menos valorizados (25% de 39 itens), por ordem crescente de importância, foram: Uso

de TV, vídeo e/ou computador, Jogo de areia e água, Promover a aceitação da diversidade,

Supervisão e avaliação do pessoal, Natureza/ciência, Blocos, Condições para necessidades

profissionais do pessoal, Condições para relaxamento e conforto, Material exposto para as crianças e

Oportunidades para desenvolvimento profissional.

Uma vez que a questão colocada era Em que medida acha importante para as crianças?,

considerou-se pertinente analisar estes dados eliminando os itens relacionados com os profissionais.

Deste modo, considerando apenas os 32 itens relacionados com as crianças, os itens aos quais os

educadores atribuíram menos importância (25% de 32) foram: Uso de TV, vídeo e/ou computador, Jogo

de areia e água, Promover a aceitação da diversidade, Natureza/ciência, Blocos, Condições para

relaxamento e conforto, Material exposto para as crianças, Sesta. Os itens com pontuações mais

elevadas foram os mesmos que na situação anterior, ou seja, quando se consideraram todos os itens.

Ao calcular uma média global de importância atribuída, o valor médio obtido foi de 4.74 (DP =

0.23), variando entre 4.15 e 5.00. Ao ser calculada uma média com base em apenas 34 itens, o valor

médio foi de 4.78 (DP = 0.22), variando entre 4.18 e 5.00. A análise inferencial das distribuições,

realizada através do Teste de Kolmogorov-Smirnov, revelou não estarem cumpridos os pressupostos

da normalidade destes dados. Não foram identificados outliers que alterassem a distribuição dos dados

ou a média dos resultados.

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Critérios valorizados pelos educadores

243

Quadro 32. Estatísticas descritivas da importância atribuída pelos educadores aos itens da

ITERS-R

Mínimo - Máximo

M DP

1. Espaço interior 3 – 5 4.91 0.35 2. Mobiliário para cuidados de rotina e jogo 3 – 5 4.78 0.48 3. Condições para relaxamento e conforto 3 – 5 4.66 0.57 4. Arranjo da sala 4 – 5 4.94 0.25 5. Material exposto para as crianças 2 – 5 4.67 0.64 6. Chegada/partida 1 – 5 4.90 0.45 7. Refeições/refeições ligeiras 3 – 5 4.89 0.34 8. Sesta 4 – 5 4.71 0.53 9. Mudança de fraldas/idas à sanita 4 – 5 4.97 0.16 10. Práticas de saúde 4 – 5 4.91 0.29 11. Práticas de segurança 4 – 5 4.95 0.21 12. Ajudar as crianças a compreender a linguagem 4 – 5 4.95 0.23 13. Ajudar as crianças a usar a linguagem 4 – 5 4.94 0.25 14. Utilizar livros 3 – 5 4.75 0.53 15. Motricidade fina 3 – 5 4.83 0.40 16. Jogo físico activo 2 – 5 4.77 0.48 17. Arte 1 – 5 4.77 0.57 18. Música e movimento 4 – 5 4.82 0.39 19. Blocos 1 – 5 4.49 0.76 20. Jogo dramático 1 – 5 4.75 0.67 21. Jogo de areia e água 1 – 5 4.15 0.97 22. Natureza/ciência 1 – 5 4.47 0.79 23. Uso de TV, vídeo e/ou computador 1 – 5 3.69 1.13 24. Promover a aceitação da diversidade 1 – 5 4.33 1.01 25. Supervisão do jogo e da aprendizagem 3 – 5 4.85 0.40 26. Interacção entre pares 4 – 5 4.95 0.23 27. Interacção adulto-criança 4 – 5 4.97 0.16 28. Disciplina 3 – 5 4.91 0.32 29. Horário 3 – 5 4.85 0.38 30. Jogo livre 3 – 5 4.83 0.41 31. Actividades de grupo 3 – 5 4.79 0.43 32. Medidas para crianças c/ incapacidades 4 – 5 4.90 0.31 33. Iniciativas para envolver os pais 1 – 5 4.74 0.60 34. Condições p/ nec. pessoais do pessoal 2 – 5 4.75 0.55 35. Condições p/ nec. prof. do pessoal 1 – 5 4.61 0.65 36. Interacção e cooperação entre o pessoal 2 – 5 4.78 0.53 37. Continuidade do pessoal 3 – 5 4.75 0.48 38. Supervisão e avaliação do pessoal 1 – 5 4.45 0.82 39. Oportunidades p/ desenv. profissional 1 – 5 4.67 0.65

Os educadores valorizaram os itens das três dimensões de qualidade identificadas. À

semelhança dos pais, a dimensão mais valorizada pelos educadores foi a Interacção-Linguagem

Page 244: Qualidade em Contexto de Creche: Ideias e Práticas · qualidade das salas de creche do que os pais e do que os responsáveis pelas salas de creche. Os resultados obtidos sugerem

Capítulo VI: Resultados

244

(M = 4.93, DP = 0.15), variando o seu valor entre 4.17 e 5.00. A média mais baixa foi obtida na

dimensão Actividades-Rotinas (M = 4.72, DP = 0.32), variando a sua cotação entre 3.57 e 5.00. Os

valores da dimensão Espaço-Adultos variaram entre 4.00 e 5.00, com média de 4.76 (DP = 0.25).

Com o objectivo de se explorarem estas diferenças, conduziu-se uma ANOVA de Friedman,

uma vez que o teste Kolmogorov-Smirnov revelou não estarem cumpridos os pressupostos da

normalidade das distribuições. Foram encontradas diferenças estatisticamente significativas (χ2(2) =

130.60, p = .000). Foram efectuados, posteriormente, testes de Wilcoxon, com a correcção de

Bonferroni (p = .0167), que revelaram a existência de diferenças estatisticamente significativas entre a

importância atribuída aos itens da dimensão Interacção-Linguagem e da dimensão Actividades-Rotinas

(Z = -6.70, p = .000, r = -.45) e entre a dimensão Interacção-Linguagem e a dimensão Espaço-Adultos

(Z = -6.67, p = .000, r = -.45). Não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas entre a

importância atribuída à dimensão Actividades-Rotinas e à dimensão Espaço-Adultos (Z = -1.07, p = .29,

r = -.07). Em suma, os educadores atribuíram mais importância à dimensão Interacção-Linguagem do

que à dimensão Espaço-Adultos e do que à dimensão Actividades-Rotinas.

3.2.2 Relação com outras variáveis e comparação entre grupos

Foi analisada a associação entre os valores médios da importância atribuída pelos educadores

aos critérios incluídos no questionário (34 itens) e algumas variáveis sociodemográficas. Devido ao

facto de não estarem cumpridos os pressupostos de normalidade das distribuições, foram calculados

coeficientes de correlação de Spearman. Os dados constantes do Quadro 33 permitiram constatar que

não se verificaram correlações estatisticamente significativas entre a importância média atribuída aos

critérios do instrumento utilizado e as variáveis: idade, anos de educação formal, anos de experiência e

salário líquido mensal do educador.

Quadro 33. Coeficientes de correlação de Spearman entre a importância atribuída pelos

educadores e variáveis sociodemográficas

Média 34 itens

Interacção-Linguagem

Actividades-Rotinas

Espaço-Adultos

Idade do educador -.08 -.05 -.08 -.01

Anos de educação formal do educador -.05 -.04 .01 -.11

Anos de experiência -.12 -.02 -.12 -.05

Salário líquido mensal -.05 -.07 .02 -.10

Page 245: Qualidade em Contexto de Creche: Ideias e Práticas · qualidade das salas de creche do que os pais e do que os responsáveis pelas salas de creche. Os resultados obtidos sugerem

Critérios valorizados pelos educadores

245

Foram analisadas também as associações (coeficientes de correlação de Spearman) entre as

variáveis sociodemográficas e as médias de importância de cada dimensão da qualidade (ver Quadro

33). Não foram encontradas correlações estatisticamente significativas entre a importância média

atribuída aos itens das três dimensões de qualidade e a idade do educador, os anos de educação

formal, os anos de experiência e o salário líquido mensal.

Foi analisado o efeito do tipo de instituição (IPSS ou com fins lucrativos), da faixa etária a que

as salas se destinam (1 - 2 anos ou 2 - 3 anos) e do estatuto profissional da pessoa responsável pela

sala (educador de infância ou auxiliar) na importância atribuída aos itens. Foi utilizado o Teste Mann-

Whitney devido à não verificação do pressuposto de normalidade das distribuições na maioria das

variáveis em estudo (ver Quadro 34). Não se verificaram diferenças estatisticamente significativas nos

resultados médios da importância atribuída pelos educadores, em função das três variáveis

apresentadas.

Quadro 34. Teste Mann-Whitney para a importância média atribuída pelos educadores (34 itens),

em função do tipo de creche, da faixa etária da sala e do estatuto profissional do responsável pela

sala

M DP U p r IPSS n = 55 4.77 0.21 Tipo de Creche

Lucrativa n = 55 4.79 0.22

1344.50 .31 -.10

1 – 2 anos n = 56 4.80 0.22 Faixa etária

2 – 3 anos n = 54 4.76 0.21

1286.00 .17 -.13

Educador de Infância n = 89 4.78 0.21 Estatuto

profissional Auxiliar de Educação n = 21 4.79 0.27

807.50 .33 -.09

Foi igualmente analisado o efeito do tipo de instituição (IPSS ou com fins lucrativos), da idade a

que as salas se destinam (1 - 2 anos, 2 - 3 anos, 1 - 3 anos) e do estatuto profissional da pessoa

responsável pela sala (educador de infância ou auxiliar) na importância média atribuída pelos

educadores às três dimensões da qualidade (ver Quadro 35). Devido à violação de vários pressupostos

requeridos pela Análise de Variância Multivariada (MANOVA), foram utilizados testes univariados

(Testes Mann-Whitney, devido à violação do pressuposto da normalidade das distribuições), com a

correcção de Bonferroni (p ≥ .0167). Não se encontraram diferenças estatisticamente significativas na

importância atribuída pelos educadores aos itens das dimensões Interacção-Linguagem, Actividades-

Page 246: Qualidade em Contexto de Creche: Ideias e Práticas · qualidade das salas de creche do que os pais e do que os responsáveis pelas salas de creche. Os resultados obtidos sugerem

Capítulo VI: Resultados

246

Rotinas e Espaço-Adultos em função do tipo de instituição, da faixa etária das crianças a que a sala se

destina e da formação do responsável pela sala (educador de infância ou auxiliar).

Quadro 35. Teste Mann-Whitney para a importância média atribuída pelos educadores às

dimensões de qualidade, em função do tipo de creche, da faixa etária da sala e do seu estatuto

profissional

M DP U p r

Interacção-Linguagem

Tipo de Creche IPSS (n = 55) 4.92 0.15 Lucrativa (n = 55) 4.94 0.16

1312.00 .11 -.15

Faixa etária 1 – 2 anos (n = 56) 4.93 0.17 2 – 3 anos (n = 54) 4.93 0.14

1411.00 .42 -.08

Estatuto profissional Educador de infância (n = 89) 4.93 0.14 Auxiliar (n = 21) 4.93 0.19

883.00 .60 -.05

Actividades-Rotinas

Tipo de Creche IPSS (n = 55) 4.72 0.30 Lucrativa (n = 55) 4.72 0.35

1405.00 .51 -.06

Faixa etária 1 – 2 anos (n = 56) 4.73 0.35 2 – 3 anos (n = 54) 4.72 0.30

1386.50 .44 -.07

Estatuto profissional Educador de infância (n = 89) 4.73 0.30 Auxiliar (n = 21) 4.68 0.42

904.50 .82 -.02

Espaço-Adultos

Tipo de Creche IPSS (n = 55) 4.75 0.25 Lucrativa (n = 55) 4.78 0.25

1367.00 .37 -.09

Faixa etária 1 – 2 anos (n = 56) 4.81 0.23 2 – 3 anos (n = 54) 4.72 0.26

1172.56 .04 -.17

Estatuto profissional Educador de infância (n = 89) 4.75 0.25

Auxiliar (n = 21) 4.82 0.26 730.00 .11 -.15

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Qualidade avaliada pelos pais

247

4. Qualidade das salas de creche avaliada pelos pais

4.1 Resultados descritivos

A avaliação efectuada pelos pais colocaria estas salas num nível correspondente a boa

qualidade, ou seja, os pais consideraram que as salas que os filhos frequentam estão Bem. De facto,

os valores médios, calculados utilizando os 34 itens, variaram entre 3.12 e 7.00 (M = 5.33, DP = 0.89).

Com base na avaliação efectuada pelos pais, com estes itens, 36.4% das salas seriam de qualidade

mínima, ou seja, Têm o básico (valores médios entre 3.00 e 4.99), 60.9% de boa qualidade (valores

médios entre 5.00 e 6.99) e 2.7% de qualidade excelente (valores médios iguais a 7.00). Utilizando a

totalidade dos itens (39 itens), as médias variaram entre 2.89 e 7.00 (M = 5.26, DP = 0.90). As análises

exploratórias permitiram confirmar os pressupostos de normalidade das distribuições, não tendo sido

identificados outliers que alterassem a distribuição dos dados ou os resultados médios obtidos.

Ao nível dos itens, os resultados obtidos variaram entre 2.98 (DP = 1.72) no item Jogo de areia

e água e 6.25 (DP = 0.88) no item Interacção adulto-criança (ver Quadro 36).

Dos 39 itens, apenas o item Jogo de areia e água teve resultado médio inferior a 3.00, o que

revela uma qualidade inadequada (i.e., os pais atribuíram cotações médias correspondentes a Nada

bem); 10 itens tiveram resultado médio entre 3.00 e 5.00, o que revela a existência de qualidade

mínima (Jogo físico activo, Blocos, Natureza/ciência, Uso de TV, vídeo e/ou computador, Promover a

aceitação da diversidade, Iniciativas para envolver os pais, Condições para satisfazer as necessidades

pessoais do pessoal, Condições para satisfazer as necessidades profissionais do pessoal, Supervisão

e avaliação do pessoal e Oportunidades para desenvolvimento profissional). Os restantes 28 itens

tiveram valores médios superiores a 5.00, o que indica que os pais avaliaram as creches como sendo

de boa qualidade nestes aspectos. Os itens com média mais elevada (25% de 39 itens) encontram-se a

sombreado mais escuro no Quadro 36 e os itens com média mais baixa a negrito e sombreado mais

claro.

Page 248: Qualidade em Contexto de Creche: Ideias e Práticas · qualidade das salas de creche do que os pais e do que os responsáveis pelas salas de creche. Os resultados obtidos sugerem

Capítulo VI: Resultados

248

Quadro 36. Estatísticas descritivas da qualidade avaliada pelos pais

Mínimo - Máximo

M DP

1. Espaço interior 1 – 7 5.17 1.43 2. Mobiliário para cuidados de rotina e jogo 2 – 7 5.24 1.35 3. Condições para relaxamento e conforto 2 – 7 5.04 1.50 4. Arranjo da sala 2 – 7 5.43 1.37 5. Material exposto para as crianças 2 – 7 5.24 1.41 6. Chegada/partida 1 – 7 6.03 1.30 7. Refeições/refeições ligeiras 1 – 7 5.73 1.23 8. Sesta 3 – 7 5.63 1.18 9. Mudança de fraldas/idas à sanita 3 – 7 5.94 1.00 10. Práticas de saúde 2 – 7 5.70 1.15 11. Práticas de segurança 1 – 7 5.38 1.33 12. Ajudar as crianças a compreender a linguagem 3 – 7 6.03 0.92 13. Ajudar as crianças a usar a linguagem 3 – 7 5.87 0.99 14. Utilizar livros 1 – 7 5.09 1.39 15. Motricidade fina 2 – 7 5.26 1.29 16. Jogo físico activo 2 – 7 4.92 1.43 17. Arte 1 – 7 5.54 1.35 18. Música e movimento 2 – 7 5.66 1.24 19. Blocos 1 – 7 4.44 1.56 20. Jogo dramático 1 – 7 5.11 1.44 21. Jogo de areia e água 1 – 7 2.98 1.72 22. Natureza/ciência 1 – 7 4.49 1.66 23. Uso de TV, vídeo e/ou computador 1 – 7 4.25 1.69 24. Promover a aceitação da diversidade 1 – 7 4.36 1.60 25. Supervisão do jogo e da aprendizagem 3 – 7 5.88 0.98 26. Interacção entre pares 3 – 7 5.94 1.00 27. Interacção adulto-criança 4 – 7 6.25 0.88 28. Disciplina 1 – 7 5.90 1.08 29. Horário 1 – 7 5.69 1.16 30. Jogo livre 2 – 7 5.55 1.21 31. Actividades de grupo 3 – 7 5.54 1.08 32. Medidas para crianças c/ incapacidades 1 – 7 5.21 1.89 33. Iniciativas para envolver os pais 1 – 7 4.79 1.77 34. Condições p/ nec. pessoais do pessoal 2 – 7 4.79 1.36 35. Condições p/ nec. prof. do pessoal 1 – 7 4.67 1.59 36. Interacção e cooperação entre o pessoal 1 – 7 5.15 1.41 37. Continuidade do pessoal 1 – 7 5.37 1.46 38. Supervisão e avaliação do pessoal 1 – 7 4.80 1.43 39. Oportunidades p/ desenv. profissional 1 – 7 4.53 1.49

Relativamente às três dimensões da qualidade, todos os pais situaram as creches num nível

de qualidade considerado bom, obtendo a dimensão Interacção-Linguagem a média mais elevada (M =

5.97, DP = 0.82), seguida pela dimensão Actividades-Rotinas (M = 5.17, DP = 0.99). A dimensão

Espaço-Adultos (M = 5.13, DP = 1.03) obteve a média mais baixa, ainda assim superior a 5.00. Os

resultados médios da qualidade avaliada pelos pais na dimensão Interacção-Linguagem variaram entre

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Qualidade avaliada pelos pais

249

3.67 e 7.00, na dimensão Actividades-Rotinas variaram entre 2.57 e 7.00 e na dimensão Espaço-

Adultos variaram entre 1.40 e 7.00.

Com o objectivo de se explorarem estas diferenças, conduziu-se uma ANOVA de Friedman,

uma vez que o teste Kolmogorov-Smirnov revelou não estarem cumpridos os pressupostos da

normalidade da distribuição dos dados da dimensão Interacção-Linguagem. Foram encontradas

diferenças estatisticamente significativas (χ2(2) = 124.36, p = .000). Foram efectuados, posteriormente,

testes de Wilcoxon, com a correcção de Bonferroni (p = .0167), que revelaram a existência de

diferenças estatisticamente significativas entre a avaliação efectuada pelos pais na dimensão

Interacção-Linguagem e na dimensão Actividades-Rotinas (Z = -9.04, p = .000, r = -.61) e entre a

dimensão Interacção-Linguagem e a dimensão Espaço-Adultos (Z = -8.73, p = .000, r = -.59), sendo

superior a média da dimensão Interacção-Linguagem nos dois casos. Para comparar a avaliação

efectuada ao nível das dimensões Actividades-Rotinas e Espaço-Adultos, foi conduzido um teste t de

Student para amostras emparelhadas, uma vez que se verificaram os pressupostos da normalidade

das distribuições. Não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas (t (109) = 0.58, p =

.56, r = -.06).

4.2 Relação com outras variáveis e comparação entre grupos

Foi verificada a associação entre a qualidade média das salas, tal como avaliada pelos pais, e

(1) características de estrutura das salas: idade média das crianças da sala, tamanho do grupo de

crianças, número de adultos da sala, número de crianças por adulto, valor da mensalidade, tempo de

frequência da creche e (2) características relativas aos pais: número de anos de educação formal e

idade do pai participante e rendimento líquido mensal do agregado familiar.

Uma vez que os dados relativos a algumas destas variáveis violavam o pressuposto da

normalidade, indicado pelo Teste de Kolmogorov-Smirnov, foram utilizadas análises não paramétricas

(coeficientes de correlação de Spearman).

Os dados apresentados no Quadro 37 permitiram verificar a existência de correlações

estatisticamente significativas entre a qualidade resultante da avaliação efectuada pelos pais e as

variáveis número de crianças por adulto e número de anos de educação formal do pai/mãe. Foram

encontradas associações negativas fracas (i.e., efeitos pequenos), estatisticamente significativas, entre

a qualidade e o número de crianças por adulto e o número de anos de educação formal do pai/mãe.

Não foram encontradas associações estatisticamente significativas entre a avaliação média efectuada

pelos pais e as restantes variáveis.

Page 250: Qualidade em Contexto de Creche: Ideias e Práticas · qualidade das salas de creche do que os pais e do que os responsáveis pelas salas de creche. Os resultados obtidos sugerem

Capítulo VI: Resultados

250

Quadro 37. Coeficientes de correlação de Spearman entre a qualidade avaliada pelos pais e

variáveis de estrutura e sociodemográficas

Média 34 itens

Interacção-Linguagem

Actividades-Rotinas

Espaço-Adultos

Idade média das crianças da sala .01 -.06 .05 -.04

Tamanho do grupo de crianças -.05 -.17 -.04 .01

Número de adultos da sala .14 .14 .12 .17

Número de crianças por adulto -.23* -.31** -.20* -.19*

Idade dos pais -.18 -.11 -.19 -.18

Anos de educação formal dos pais -.23* -.12 -.19* -.30**

Rendimento líquido mensal do agregado -.17 -.12 -.14 -.21*

Valor mensal que pagam pela creche -.03 -.03 .01 -.12

Há quantos meses a criança frequenta a creche -.05 -.03 -.03 -.10

* p < .05; **p < .01

Foi calculada a associação entre as mesmas variáveis e os resultados médios da avaliação em

cada uma das dimensões da qualidade (ver Quadro 37). Foi encontrada uma associação negativa

moderada, estatisticamente significativa, entre a avaliação da dimensão Interacção-Linguagem e o

número de crianças por adulto. No que se refere à variável Actividades-Rotinas, foram encontradas

associações negativas fracas, estatisticamente significativas, entre a qualidade avaliada pelos pais e o

número de crianças por adulto e o número de anos de educação formal dos pais. Relativamente à

dimensão Espaço-Adultos, foi encontrada uma associação negativa moderada, estatisticamente

significativa, com a educação formal dos pais e associações negativas fracas com o número de

crianças por adulto e o rendimento mensal do agregado familiar.

Em síntese, e por outras palavras, os pais que em média (34 itens) avaliavam mais

positivamente a creche eram os que tendencialmente tinham menos anos de educação formal e cujos

filhos frequentavam salas com menos crianças por adulto. Os pais tendiam a avaliar mais

positivamente a Interacção-Linguagem nas salas de creche com um menor rácio adulto-criança. Os

pais que avaliaram mais positivamente a dimensão Actividades-Rotinas foram os de nível educativo

inferior e cujas crianças frequentavam salas de creche com menos crianças por adulto. Os pais que

avaliaram mais positivamente as salas na dimensão Espaço-Adultos foram os pais com um nível

educativo e salário mais baixos e cujos filhos frequentavam salas com menos crianças por adulto.

Assim, poderemos considerar que são as variáveis número de crianças por adulto e anos de educação

formal dos pais que mais se revelaram associadas com a avaliação que os pais efectuaram das salas

de creche.

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Qualidade avaliada pelos pais

251

Quadro 38. Coeficientes de correlação de Spearman entre a importância atribuída pelos pais aos

critérios de qualidade e a avaliação que faziam da qualidade da creche

1 2 3 4 5 6 7

1. Importância média (34 itens)

2. Importância Interacção-Linguagem .65***

3. Importância Actividades-Rotinas .95*** .57***

4. Importância Espaço-Adultos .85*** .58*** .67***

5. Avaliação média (34 itens) .39*** .40*** .30** .37***

6. Avaliação Interacção-Linguagem .33*** .45*** .25** .33*** .86***

7. Avaliação Actividades-Rotinas .41*** .37*** .34*** .36*** .95*** .78***

8. Avaliação Espaço-Adultos .35*** .36*** .26** .36*** .92*** .75*** .80***

* p < .05; **p < .01; ***p < .001

Foi calculada a correlação entre a avaliação efectuada pelos pais e a importância média

atribuída aos critérios de qualidade (ver Quadro 38). Foi calculado o coeficiente de correlação de

Spearman, devido à violação do pressuposto da normalidade das variáveis relativas à importância

atribuída aos critérios de qualidade. Foram encontradas relações estatisticamente significativas, de

média magnitude, entre a importância atribuída a cada variável e a respectiva avaliação da qualidade.

Estes dados podem significar que, tendencialmente, os pais avaliavam a creche de forma mais positiva,

quando atribuíam também maior importância aos critérios de qualidade que estavam a ser avaliados ou

vice-versa.

Quadro 39. Teste t de Student para a qualidade avaliada pelos pais, em função do tipo de creche,

da faixa etária da sala, do estatuto profissional do responsável pela sala e do sexo do respondente

M DP t (gl) p r IPSS n = 55 5.40 0.89 Tipo de Creche

Lucrativa n = 55 5.26 0.89

0.80 (108) .42 .08

1 – 2 anos n = 56 5.26 0.91 Faixa etária

2 – 3 anos n = 54 5.40 0.87

-0.79 (108) .43 .08

Educador de Infância n = 89 5.35 0.89 Estatuto

profissional Auxiliar de Educação n = 21

5.28 0.92 0.33 (108) .75 .03

Mãe n = 98 5.31 0.90 Pai vs Mãe

Pai n = 12 5.49 0.84

-0.64 (108) .52 .06

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Capítulo VI: Resultados

252

Foi analisado o efeito do tipo de instituição (IPSS ou com fins lucrativos), da faixa etária a que

as salas se destinam (1 - 2 anos ou 2 - 3 anos), do estatuto profissional da pessoa responsável pela

sala (educador ou auxiliar de educação) e do género do pai que respondeu ao questionário (pai ou

mãe) na avaliação média da qualidade das salas (ver Quadro 39). Foram utilizados testes

paramétricos, uma vez que se verificaram os pressupostos da normalidade das distribuições. A

avaliação da qualidade efectuada pelos pais parece não variar em função destas quatro variáveis.

Foi igualmente analisado o efeito do tipo de instituição (IPSS ou com fins lucrativos), da faixa

etária a que as salas se destinam (1 - 2 anos ou 2 - 3 anos), do estatuto profissional da pessoa

responsável pela sala (educador ou auxiliar de educação) e do género do pai que respondeu ao

questionário (pai ou mãe) na qualidade média resultante da avaliação dos pais nas três dimensões da

qualidade (ver Quadro 40). Foram conduzidas análises de variância multivariada. Foram identificados

dois outliers multivariados (pais números 39 e 95), verificados através do cálculo das distâncias de

Mahalanobis. Retirando estes dois outliers, o pressuposto da normalidade univariada das distribuições

não é cumprido para as dimensões Interacção-Linguagem e Actividades-Rotinas.

Relativamente ao efeito do tipo de instituição, foram cumpridos os pressupostos de

homogeneidade das matrizes de variância-covariância, indicados pelos testes de Box e de Levene,

bem como os pressupostos de linearidade. Verificou-se que o tipo de instituição não tinha um efeito

significativo avaliação média da qualidade das salas efectuada pelos pais nas três dimensões (lambda

de Wilk = 0..96, F(1,106) = 1.55, p = .207, ω2multi = .03).

Relativamente ao efeito da faixa etária das crianças a que a sala se destina, foram cumpridos

os pressupostos de homogeneidade das matrizes de variância-covariância, bem como os pressupostos

de linearidade. Verificou-se que a faixa etária não tinha um efeito significativo na qualidade das salas

avaliada pelos pais nas três dimensões (lambda de Wilk = 0.98, F(1,106) = 0.872, p = .458, ω2multi = .01).

No que se refere ao estatuto do profissional responsável pela sala, foram cumpridos os

pressupostos de homogeneidade das matrizes de variância-covariância, bem como os pressupostos de

linearidade. Não foi encontrado um efeito do estatuto profissional do educador na avaliação efectuada

pelos pais nas três dimensões (lambda de Wilk = 0.99, F(1,106) = 0.32, p = .808, ω2multi = .00).

No que se refere ao género do pai participante, não foi cumprido o pressuposto de

homogeneidade das matrizes de variância-covariância, tendo sido cumprido o pressuposto de

homogeneidade das variâncias, bem como os pressupostos de linearidade. Uma vez que os dois

grupos não tinham igual número de participantes, e se verificou a violação do pressuposto de

homogeneidade das matrizes de variância-covariância, é relatado o valor do traço de Hotelling. Não foi

encontrado um efeito do género do pai participante na avaliação efectuada pelos pais nas três

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Qualidade avaliada pelos pais

253

dimensões (Hotelling = 0.05, F(1,106) = 1.58, p = .198, ω2multi = .03 [lambda de Wilk = 0.96]).

Quadro 40. MANOVA para o efeito do tipo de creche, da faixa etária, estatuto profissional do

responsável pela sala e do género do pai participante nas dimensões da qualidade avaliada pelos

pais

M DP F p ω2multi

Tipo de Creche

Interacção-Linguagem IPSS (n = 55) 6.05 0.81 Lucrativa (n = 55) 5.88 0.83

Actividades-Rotinas IPSS (n = 55) 5.17 1.02 Lucrativa (n = 55) 5.16 0.96

Espaço-Adultos IPSS (n = 55) 5.28 0.93 Lucrativa (n = 55) 4.98 1.10

1.55 .21 .03

Faixa etária

Interacção-Linguagem 1 – 2 anos (n = 56) 5.94 0.88 2 – 3 anos (n = 54) 5.99 0.76

Actividades-Rotinas 1 – 2 anos (n = 56) 5.06 1.02 2 – 3 anos (n = 54) 5.28 0.95

Espaço-Adultos 1 – 2 anos (n = 56) 5.10 1.04 2 – 3 anos (n = 54) 5.16 1.02

0.87 .46 .01

Estatuto profissional

Interacção-Linguagem Educador de infância (n = 89) 6.00 0.77 Auxiliar (n = 21) 5.85 1.00

Actividades-Rotinas Educador de infância (n = 89) 5.18 1.00 Auxiliar (n = 21) 5.10 0.98

Espaço-Adultos Educador de infância (n = 89) 5.14 1.00

Auxiliar (n = 21) 5.07 1.15

0.32 .81 .00

Género do pai participante

Interacção-Linguagem

Mãe (n = 98) 5.98 0.80 Pai (n = 12) 5.85 0.98

Actividades-Rotinas Mãe (n = 98) 5.15 1.00 Pai (n = 12) 5.33 0.87

Espaço-Adultos Mãe (n = 98) 5.10 1.04

Pai (n = 12) 5.41 0.95

1.58 .20 .03

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Capítulo VI: Resultados

254

5. Qualidade das salas de creche avaliada pelos educadores

5.1 Resultados descritivos

Os educadores avaliaram as suas salas de creche como sendo de boa qualidade, ou seja,

consideraram que as suas salas estão Bem nos aspectos avaliados. A média dos 34 itens da escala,

utilizados na maior parte das análises deste estudo, foi de 5.13 (DP = 0.09), variando entre 2.26 e 6.94.

Considerando os 39 itens da escala, a média foi de 5.06 (DP = 0.88), variando entre 2.16 e 6.87. Com

base na avaliação de 34 itens efectuada pelos educadores, 1.8% das salas seriam de qualidade

inadequada, 41.8% das salas seriam de qualidade mínima, ou seja, Têm o básico (valores médios

entre 3.00 e 4.99) e 56.4% de boa qualidade (valores médios entre 5.00 e 6.99).

As análises exploratórias permitiram confirmar os pressupostos de normalidade da distribuição.

Não foram identificados outliers que alterassem a distribuição dos dados ou os resultados médios.

As médias obtidas ao nível dos itens variaram entre 2.55 (DP = 1.52) no item Jogo de areia e

água e 6.03 (DP = 0.91) no item Interacção adulto-criança (ver Quadro 41). Dos 39 itens, apenas o item

Jogo de areia e água teve resultado médio inferior a 3.00, equivalente a qualidade inadequada (i.e., as

salas foram avaliadas com cotações correspondentes a Nada bem); 16 itens obtiveram resultado médio

entre 3.00 e 5.00, o que revela a existência de qualidade mínima (Espaço interior, Mobiliário para

cuidados de rotina e jogo, Condições para relaxamento e conforto, Material exposto para as crianças,

Utilizar livros, Motricidade fina, Jogo físico activo, Blocos, Jogo dramático, Natureza/ciência, Uso de TV,

vídeo e/ou computador, Promover a aceitação da diversidade, Iniciativas para envolver os pais,

Condições para satisfazer as necessidades pessoais do pessoal, Supervisão e avaliação do pessoal e

Oportunidades para desenvolvimento profissional). Os restantes 22 itens tiveram valores médios

superiores a 5.00, o que indica que os educadores avaliaram a creche como sendo de boa qualidade

nestes aspectos. Os itens com média mais elevada (25% de 39 itens) encontram-se a sombreado mais

escuro no Quadro 41 e os itens com médias mais baixas a negrito e sombreado mais claro.

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Qualidade avaliada pelos educadores

255

Quadro 41. Estatísticas descritivas da qualidade avaliada pelos educadores

Mínimo - Máximo

M DP

1. Espaço interior 1 – 7 4.90 1.31 2. Mobiliário para cuidados de rotina e jogo 1 – 7 4.72 1.42 3. Condições para relaxamento e conforto 1 – 7 4.28 1.62 4. Arranjo da sala 2 – 7 5.13 1.47 5. Material exposto para as crianças 1 – 7 4.89 1.47 6. Chegada/partida 1 – 7 5.68 1.29 7. Refeições/refeições ligeiras 1 – 7 5.79 1.08 8. Sesta 1 – 7 5.38 1.31 9. Mudança de fraldas/idas à sanita 2 – 7 5.79 1.13 10. Práticas de saúde 3 – 7 5.74 1.06 11. Práticas de segurança 1 – 7 5.42 1.36 12. Ajudar as crianças a compreender a linguagem 3 – 7 5.90 0.93 13. Ajudar as crianças a usar a linguagem 3 – 7 5.90 0.92 14. Utilizar livros 1 – 7 4.59 1.53 15. Motricidade fina 1 – 7 4.93 1.43 16. Jogo físico activo 1 – 7 4.71 1.55 17. Arte 1 – 7 5.47 1.38 18. Música e movimento 2 – 7 5.57 1.21 19. Blocos 1 – 7 3.84 1.52 20. Jogo dramático 1 – 7 4.70 1.73 21. Jogo de areia e água 1 – 6 2.55 1.52 22. Natureza/ciência 1 – 7 4.25 1.68 23. Uso de TV, vídeo e/ou computador 1 – 7 4.23 1.55 24. Promover a aceitação da diversidade 1 – 7 3.95 1.78 25. Supervisão do jogo e da aprendizagem 2 – 7 5.82 1.10 26. Interacção entre pares 4 – 7 5.91 0.86 27. Interacção adulto-criança 3 – 7 6.03 0.91 28. Disciplina 3 – 7 5.80 0.95 29. Horário 2 – 7 5.55 1.15 30. Jogo livre 3 – 7 5.57 1.14 31. Actividades de grupo 1 – 7 5.57 1.07 32. Medidas para crianças c/ incapacidades 1 – 7 5.09 1.77 33. Iniciativas para envolver os pais 1 – 7 4.74 1.48 34. Condições p/ nec. pessoais do pessoal 1 – 7 4.75 1.58 35. Condições p/ nec. prof. do pessoal 1 – 7 5.08 1.59 36. Interacção e cooperação entre o pessoal 1 – 7 5.20 1.36 37. Continuidade do pessoal 1 – 7 5.37 1.43 38. Supervisão e avaliação do pessoal 1 – 7 4.34 1.77 39. Oportunidades p/ desenv. profissional 1 – 7 4.03 1.71

No que se refere às três dimensões da qualidade, a avaliação das salas efectuada pelos

educadores variou entre 3.67 e 7.00 (M = 5.89, DP = 0.79) na dimensão Interacção-Linguagem, entre

1.79 e 6.93 (M = 4.91, DP = 1.01) na dimensão Actividades-Rotinas e entre 2.00 e 7.00 (M = 4.97, DP =

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Capítulo VI: Resultados

256

1.01) na dimensão Espaço-Adultos.

Com o objectivo de se explorarem estas diferenças, conduziu-se uma ANOVA para medidas

repetidas, uma vez que o teste Kolmogorov-Smirnov revelou estarem cumpridos os pressupostos da

normalidade das distribuições dos dados. Através do teste de Mauchly (χ2(2) = 4.59, p = .10) verificou-

se que estava cumprido também o pressuposto de esfericidade dos dados. Foram encontradas

diferenças estatisticamente significativas (F(2,218) = 154.57, p = .000, ŋ2 = .59). Os testes post-hoc, com

o ajuste de Bonferroni (p = .0167), revelaram a existência de diferenças estatisticamente significativas

entre a avaliação das salas na dimensão Interacção-Linguagem e na dimensão Actividades-Rotinas e

entre a avaliação na dimensão Interacção-Linguagem e na dimensão Espaço-Adultos. Não foram

encontradas diferenças estatisticamente significativas entre os resultados médios da dimensão

Actividades-Rotinas e da dimensão Espaço-Adultos. Em síntese, os educadores consideraram que as

salas tinham melhor qualidade ao nível da Interacção-Linguagem, do que ao nível das Actividades-

Rotinas e do Espaço-Adultos.

5.2 Relação com outras variáveis e comparação entre grupos

Foi verificada a associação entre a qualidade média das salas, avaliada pelos educadores, e

(1) características de estrutura da sala: idade média das crianças da sala, tamanho do grupo de

crianças, número de adultos da sala, rácio adulto-criança e (2) características relativas aos educadores:

número de anos de educação formal, anos de experiência, idade e salário mensal auferido. Foram

igualmente calculadas as associações entre estas variáveis e os resultados da avaliação da qualidade

efectuada pelos educadores ao nível das três dimensões. Uma vez que os dados relativos a algumas

destas variáveis violaram o pressuposto da normalidade, indicado pelo teste de Kolmogorov-Smirnov,

foram utilizadas análises não paramétricas. Como pode ser confirmado no Quadro 42, não foram

encontradas quaisquer correlações estatisticamente significativas. Foram verificadas as associações

entre as mesmas características de estrutura da sala e características relativas aos educadores e os

valores médios da qualidade avaliada pelos pais ao nível das três dimensões da qualidade (ver Quadro

42). Não foram encontradas quaisquer correlações estatisticamente significativas entre a avaliação

efectuada pelos educadores na dimensão Interacção-Linguagem, na dimensão Actividades-Rotinas e

na dimensão Espaço-Adultos e as variáveis de estrutura e sociodemográficas referidas.

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Qualidade avaliada pelos educadores

257

Quadro 42. Coeficientes de correlação de Spearman entre a qualidade avaliada pelos educadores

e variáveis de estrutura e sociodemográficas

Média 34 itens

Interacção-Linguagem

Actividades-Rotinas

Espaço-Adultos

Idade média das crianças da sala -.07 -.03 .02 .-16

Tamanho do grupo de crianças .01 .07 .04 -.05

Número de adultos na sala .06 .07 .05 .08

Número de crianças por adulto -.10 -.04 -.05 -.18

Idade do educador -.01 -.04 -.08 .06

Anos de educação formal -.09 -.04 .05 -.06

Anos de experiência .03 .00 -.03 .10

Salário líquido mensal .10 .07 .07 .13

Foi calculada também a correlação entre a avaliação média efectuada pelos educadores e a

importância média atribuída aos critérios de qualidade (ver Quadro 43). Foi calculado o coeficiente de

correlação de Spearman, devido à violação do pressuposto da normalidade das variáveis relacionadas

com a importância atribuída. Foram encontradas associações positivas estatisticamente significativas,

de pequena magnitude, entre a importância atribuída a cada variável e a avaliação da qualidade da

sala nesses itens. À semelhança do que acontecia na avaliação efectuada por pais, estes dados

podem significar que houve uma tendência para os educadores avaliarem a creche de forma mais

positiva, quando atribuíam também maior importância aos critérios de qualidade que estavam a ser

avaliados ou vice-versa.

Quadro 43. Coeficientes de correlação de Spearman entre a importância atribuída pelos

educadores aos critérios de qualidade e a avaliação que faziam da qualidade da creche

1 2 3 4 5 6 7

1. Importância média (34 itens) 2. Importância Interacção-Linguagem .56*** 3. Importância Actividades-Rotinas .93*** .43*** 4. Importância Espaço-Adultos .84*** .57*** .64***

5. Avaliação média (34 itens) .19* .21* .16 .19

6. Avaliação Interacção-Linguagem .18 .29** .11 .21* .84***

7. Avaliação Actividades-Rotinas .22* .16 .23** .16 .95*** .77***

8. Avaliação Espaço-Adultos .16 .23* .10 .22* .92*** .71*** .81***

* p < .05; **p < .01; ***p < .001

Foi analisado o efeito do tipo de instituição (IPSS ou com fins lucrativos), da faixa etária a que

as salas se destinam (1 - 2 anos ou 2 - 3 anos) e do estatuto profissional da pessoa responsável pela

sala (educador de infância ou auxiliar de educação) na avaliação média da qualidade das salas (ver

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Capítulo VI: Resultados

258

Quadro 44). Foram utilizados testes paramétricos, uma vez que se verificaram os pressupostos da

normalidade das distribuições. A avaliação da qualidade efectuada pelos educadores parece não variar

em função do tipo de instituição, da faixa etária a que a sala de destina ou do estatuto profissional do

responsável pela sala (educador de infância vs auxiliar).

Quadro 44. Teste t de Student para a qualidade avaliada pelos educadores (34 itens), em função

do tipo de creche, da faixa etária e do estatuto profissional

M DP t (gl) p r IPSS n = 55 5.05 0.82 Tipo de Creche

Lucrativa n = 55 5.22 0.97

-0.98 (108) 33 .09

1 – 2 anos n = 56 5.16 1.00 Faixa etária

2 – 3 anos n = 54 5.11 0.80

0.31 (108) .76 .03

Educador de Infância n = 89 5.13 0.85 Estatuto

profissional Auxiliar de Educação n = 21 5.14 1.11

-0.02 (108) .99 .00

Foi analisado igualmente o efeito do tipo de instituição (IPSS ou com fins lucrativos), do

estatuto profissional da pessoa responsável pela sala (educador ou auxiliar de educação) e da idade a

que as salas se destinavam (1 - 2 anos e 2 - 3 anos) nos valores médios da qualidade resultantes da

avaliação dos educadores nas três dimensões (ver

Quadro 45). Foram conduzidas análises de variância multivariada (MAVOVA). Foi identificado,

e eliminado, um outlier multivariado (participante número 22), verificado através do cálculo das

distâncias de Mahalanobis. Verificou-se, através do teste de Kolmogorov-Smirnov, o cumprimento do

pressuposto da normalidade univariada das distribuições.

Relativamente ao efeito do tipo de instituição, foram cumpridos os pressupostos de

homogeneidade das matrizes de variância-covariância, indicados pelos testes de Box e de Levene,

bem como os pressupostos de linearidade. Verificou-se que o tipo de instituição não tinha um efeito

significativo nos valores médios da avaliação da qualidade efectuada pelos educadores nas três

dimensões (lambda de Wilk = 0.97, F(1,107) = 1.11, p = .349, ω2multi = .02).

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Qualidade avaliada pelos educadores

259

Quadro 45. MANOVA para o efeito do tipo de creche, da faixa etária e do estatuto profissional do

responsável pela sala nas dimensões da qualidade avaliada pelos educadores

M DP F p ω2multi

Tipo de Creche

Interacção-Linguagem IPSS (n = 55) 5.90 0.71 Lucrativa (n = 55) 5.89 0.86

Actividades-Rotinas IPSS (n = 55) 4.82 0.95 Lucrativa (n = 55) 4.99 1.08

Espaço-Adultos IPSS (n = 55) 4.88 0.88 Lucrativa (n = 55) 5.05 1.13

1.11 .35 .02

Faixa etária

Interacção-Linguagem 1 – 2 anos (n = 56) 5.89 0.82 2 – 3 anos (n = 54) 5.89 0.76

Actividades-Rotinas 1 – 2 anos (n = 56) 4.85 1.12 2 – 3 anos (n = 54) 4.97 0.89

Espaço-Adultos 1 – 2 anos (n = 56) 5.13 1.09 2 – 3 anos (n = 54) 4.80 0.90

5.78 .00 .13

Estatuto profissional

Interacção-Linguagem Educador de infância (n = 89) 5.92 0.71 Auxiliar (n = 21) 5.78 1.06

Actividades-Rotinas Educador de infância (n = 89) 4.92 0.97 Auxiliar (n = 21) 4.87 1.21

Espaço-Adultos Educador de infância (n = 89) 4.95 0.97

Auxiliar (n = 21) 5.04 1.21

0.69 .56 .01

Relativamente ao efeito da faixa etária, foram cumpridos os pressupostos de homogeneidade

das matrizes de variância-covariância, indicados pelos testes de Box e de Levene, bem como os

pressupostos de linearidade. Verificou-se que a faixa etária tinha um efeito significativo na qualidade

das salas avaliada pelos educadores nas três dimensões (lambda de Wilk = 0.86, F(1,106) = 5.78, p =

.001, ω2multi = .13). Contudo, os testes univariados indicam que não há efeito da faixa etária ao nível de

cada uma das dimensões. Na dimensão Interacção-Linguagem foi encontrado um p de .885 (F(1,107) =

0.02, ŋ2 = .00), na dimensão Actividades-Rotinas o p foi de .572 (F(1,107) = 0.32, ŋ2 = .00) e na dimensão

Espaço-Adultos foi de .109 (F(1,107) = 2.61, ŋ2 = .02). Estes resultados podem indicar que os dois tipos

de salas (1 – 2 anos e 2 – 3 anos) diferem na combinação das três dimensões, mas não em cada uma

Page 260: Qualidade em Contexto de Creche: Ideias e Práticas · qualidade das salas de creche do que os pais e do que os responsáveis pelas salas de creche. Os resultados obtidos sugerem

Capítulo VI: Resultados

260

delas, quando consideradas individualmente. As salas para crianças de 1 – 2 anos obtiveram valores

médios inferiores às salas 2 – 3 anos na dimensão Actividades-Rotinas e superiores na dimensão

Espaço-Adultos. Foi conduzida uma análise discriminante, para se tentar perceber estes resultados.

Verificou-se que a função discriminante era estatisticamente significativa (lambda de Wilk = 0.86, χ2 =

16.13, p = .001), tal como indicado também pela MANOVA. A variável que mais contribuía para a

diferenciação dos grupos era a dimensão Espaço-Adultos, seguida pela dimensão Actividades-Rotinas.

A função permitiu classificar correctamente 67.9% das salas.

No que se refere ao estatuto do profissional responsável pela sala, foram cumpridos os

pressupostos de homogeneidade das matrizes de variância-covariância, indicados pelos testes de Box

e de Levene (excepto para a dimensão Interacção-Linguagem), bem como os pressupostos de

linearidade. Não foi encontrado um efeito do estatuto profissional do educador na avaliação efectuada

nas três dimensões (lambda de Wilk = 0.98, F(1,106) = 0.69, p = .559, ω2multi = .01).

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Comparação entre observadores, pais e educadores

261

6. Comparação entre resultados dos observadores externos, dos pais e dos

educadores

Um dos objectivos deste estudo era comparar as ideias dos pais e dos educadores acerca dos

critérios de qualidade em contexto de creche e comparar as avaliações das salas de creche efectuadas

por pais, educadores e observadores externos. Assim, serão apresentados de seguida resultados da

comparação: (1) dos critérios de qualidade valorizados por educadores e por pais (resultados do estudo

qualitativo); (2) da importância atribuída aos critérios da ITERS-R por pais e por educadores (estudo

quantitativo); (3) da avaliação das salas de creche efectuada por pais, por educadores e por

observadores externos.

6.1 Critérios de qualidade valorizados por pais e por educadores (estudo qualitativo)

Com base nas entrevistas efectuadas aos pais e aos educadores e na literatura consultada

foram criadas as categorias: Espaço e mobiliário, Rotinas de cuidados pessoais, Escuta e conversação,

Actividades, Interacção, Estrutura do programa, Pais e pessoal e Outros critérios. As categorias mais

referidas quer por pais (ver página 204) quer por educadores (ver página 226) foram, por ordem

decrescente, Rotinas de cuidados pessoais (20 pais e 20 educadores), Actividades (19 pais e 20

educadores), Interacção (19 pais e 19 educadores), Espaço e mobiliário (18 pais e 17 educadores) e

Outros critérios (18 pais e 17 educadores). Relativamente às outras três categorias, 15 pais referiram

Pais e pessoal, mas apenas 11 educadores; 14 educadores e 11 pais referiram a Estrutura do

programa; 13 educadores referiram Escuta e conversação, mas apenas 7 pais. A categoria referida por

menos pais foi Escuta e Conversação e a categoria referida por menos educadores foi Pais e pessoal.

O Quadro 46 apresenta o número e percentagem de pais e de educadores que referiram cada

uma das subcategorias. Em cada coluna apresentam-se a sombreado mais escuro as subcategorias

mais focadas (quartil superior) e a sombreado mais ténue e a negrito as subcategorias menos focadas

(quartil inferior).

As subcategorias referidas por um maior número de pais (pelo menos 15 participantes) foram:

Materiais/actividades não especificados, Interacção adulto-criança, Espaço interior, Refeições/refeições

ligeiras e Interacção entre pares. Os critérios de qualidade referidos por mais educadores (pelo menos

15 participantes) relacionavam-se com: Materiais/actividades não especificados, Práticas de

saúde/higiene, Espaço interior e Interacção adulto-criança. Assim, verificámos que Espaço interior,

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Capítulo VI: Resultados

262

Materiais/actividades não especificados e Interacção adulto-criança se encontravam entre os itens mais

referidos quer por educadores, quer por pais. No entanto, o critério Interacção entre pares foi referido

por 75% dos pais e por apenas 25% dos educadores. A subcategoria Refeições/refeições ligeiras foi

referida por mais de 75% dos pais e por menos de 75% de educadores, contudo a diferença é de

apenas 2 participantes, ou seja, 16 pais e 14 educadores referiram esta subcategoria. O critério

Práticas de saúde/higiene foi referido por 90% das educadoras e por apenas 65% de pais (ver Quadro

46).

As características referidas por 10 a 14 pais (entre 50 e 70%) foram: Práticas de saúde/higiene,

Disciplina, Jogo livre, Iniciativas para envolver os pais e Características do pessoal. As características

referidas por 10 a 14 educadores foram: Refeições/refeições ligeiras, Práticas de segurança,

Motricidade fina, Jogo físico activo, Jogo livre e Características do pessoal.

Dos critérios de qualidade referidos por um mínimo de 10 pais, há três que foram focados por

um reduzido número de educadores: Interacção entre pares (referido por 15 pais e apenas 5

educadores), Iniciativas para envolver os pais (referido por 14 pais e apenas 7 educadores) e Disciplina

(referido por 12 pais e apenas 5 educadores). Dos critérios de qualidade referidos por um mínimo de 10

educadores, há três que foram focados por menos de 10 pais: Práticas de segurança (referido por 11

educadores e 8 pais), Motricidade fina (referido por 10 educadores e apenas 2 pais) e Jogo físico activo

(referido por 13 educadores e 9 pais).

Os pais referiram dois aspectos que os educadores não focaram: Utilização de TV e vídeo e

Medidas para crianças com incapacidades. Os educadores referiram dois aspectos que não foram

focados pelos pais: Condições para satisfazer as necessidades pessoais do pessoal e Supervisão e

avaliação do pessoal. As subcategorias Natureza, Utilização de televisão ou vídeo, Condições para

satisfazer as necessidades pessoais do pessoal, Supervisão e avaliação do pessoal e Oportunidades

para desenvolvimento profissional encontraram-se entre as menos valorizadas simultaneamente por

pais e por educadores.

As maiores diferenças entre os pais e os educadores verificaram-se nas subcategorias 24

(Interacção entre pares), 14 (Motricidade fina), 26 (Disciplina), 30 (Iniciativas para envolver os pais), 4

(Arranjo da sala), 13 (Utilizar livros) e 19 (Jogo dramático). Nestas subcategorias, verificou-se uma

diferença de mais de 25% dos participantes, sendo que houve mais pais a referirem a Interacção entre

pares, a Disciplina e as Iniciativas para envolver os pais e mais educadores a referirem o Arranjo da

sala, Utilizar livros, Motricidade fina e Jogo dramático. Note-se que destas quatro subcategorias,

mencionadas por mais educadores do que por pais, duas referem-se às Actividades. Das três

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Comparação entre observadores, pais e educadores

263

subcategorias referidas por mais pais do que por educadores, duas incluem-se nas Interacções.

Quadro 46. Número e percentagem de pais e de educadores que referiram cada subcategoria

Subcategoria N.º de pais

N.º de educadores

Total % de pais

% de Educadores

% Total

1. Espaço interior 18 17 35 90 85 88 2. Mobiliário para cuidados de rotina e jogo 2 6 8 10 30 20 3. Medidas para relaxamento e conforto 3 5 8 15 25 20 4. Arranjo da sala 3 9 12 15 45 30 5. Material exposto para as crianças 3 2 5 15 10 13 6. Chegada/ partida 6 2 8 30 10 20 7. Refeições/refeições ligeiras 16 14 30 80 70 75 8. Sesta 4 6 10 20 30 25 9. Práticas de saúde/higiene 13 18 31 65 90 78 10. Práticas de segurança 8 11 19 40 55 48 11. Rotinas não especificadas 8 9 17 40 45 43 12. Ajudar as crianças a compreender e usar a linguagem 7 6 13 35 30 33 13. Utilizar livros 2 8 10 10 40 25 14. Motricidade fina 2 10 12 10 50 30 15. Jogo físico activo 9 13 22 45 65 55 16. Arte 5 2 7 25 10 18 17. Música e movimento 3 7 10 15 35 25 18. Blocos 2 4 6 10 20 15 19. Jogo dramático 2 8 10 10 40 25 20. Natureza 1 2 3 5 10 8 21. Utilização de televisão ou vídeo 1 0 1 5 0 3 22. Materiais/actividades não especificados 19 19 38 95 95 95 23. Supervisão do jogo e da aprendizagem 5 7 12 25 35 30 24. Interacção entre pares 15 5 20 75 25 50 25. Interacção adulto-criança 19 15 34 95 75 85 26. Disciplina 12 5 17 60 25 43 27. Horário 4 4 8 20 20 20 28. Jogo livre 11 13 24 55 65 60 29. Medidas para crianças com incapacidades 1 0 1 5 0 3 30. Iniciativas para envolver os pais 14 7 21 70 35 53 31. Condições p/ satisfazer necess. pessoais do pessoal 0 1 1 0 5 3 32. Interacção e cooperação entre o pessoal 3 5 8 15 25 20 33. Continuidade do pessoal 3 3 6 15 15 15 34. Supervisão e avaliação do pessoal 0 1 1 0 5 3 35. Oportunidades p/ desenvolvimento profissional 1 1 2 5 5 5 36. Número de adultos 5 8 13 25 40 33 37. Número de crianças 8 6 14 40 30 35 38. Faixa etária 3 3 6 15 15 15 39. Qualificação da educadora 7 5 12 35 25 30 40. Características do pessoal 10 10 20 50 50 50 41. Direcção/organização 4 2 6 20 10 15 42. Outros critérios não especificados 7 3 10 35 15 25

De forma a ser obtida uma perspectiva mais global dos critérios valorizados em contexto de

creche, por pais e por educadores, foram somadas as suas frequências, obtendo-se para cada

subcategoria o número de participantes (e respectiva percentagem) que a referiu (ver Quadro 46).

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Capítulo VI: Resultados

264

Deste modo, tendo em consideração 40 entrevistados, dos quais 20 eram pais (17 mães e 3 pais) e 20

educadoras (15 educadores de infância e 5 auxiliares), os critérios referidos por mais participantes

(pelo menos 75%) foram, por ordem decrescente: Materiais/actividades não especificados, Espaço

interior, Interacção adulto-criança, Práticas de saúde/higiene e Refeições/refeições ligeiras. Os critérios

referidos por 50 a 74% dos participantes foram: Jogo físico activo, Interacção entre pares, Jogo livre,

Iniciativas para envolver os pais e Características do pessoal. Os critérios referidos por menos

participantes foram: Utilização de TV e vídeo, Medidas para crianças com incapacidades, Condições

para satisfazer as necessidades pessoais do pessoal e Supervisão e avaliação do pessoal.

Os itens da ITERS-R Jogo de areia e água, Promover a aceitação da diversidade, Actividades

de grupo e Condições para satisfazer as necessidades profissionais do pessoal não foram focados

pelos pais nem pelos educadores.

6.2 Importância atribuída aos critérios de qualidade por pais e por educadores (estudo

quantitativo)

Como foi referido, os pais e os educadores atribuíram elevada importância aos critérios de

qualidade incluídos nos questionários e que equivalem aos itens da ITERS-R. Relativamente às três

dimensões da qualidade, quer os pais quer os educadores atribuíram maior importância à dimensão

Interacção-Linguagem, do que à dimensão Espaço-Adultos e à dimensão Actividades-Rotinas.

Considerando os resultados médios da importância atribuída aos critérios da qualidade (34

itens), foi realizado o teste de Mann-Whitney, utilizando a correcção de Bonferroni (p = .0167), para se

apurar se havia diferenças entre os resultados dos pais (M = 4.70, DP = 0.32) e dos educadores (M =

4.78, DP = 0.22). Foi utilizado este teste por se ter verificado a violação do pressuposto da normalidade

das distribuições. Os resultados obtidos permitiram verificar que não havia diferenças estatisticamente

significativas (U = 5323.00, p = .12, r = -.10).

Foram comparados os valores médios de importância atribuída pelos pais e pelos educadores

ao nível das três dimensões da qualidade (ver Quadro 47). Não foram identificados outliers univariados,

tendo sido identificados 7 outliers multivariados, que se eliminaram das análises. Verificou-se que

foram violados os pressupostos de normalidade univariada, de homogeneidade das variâncias e de

linearidade. Estava cumprido o pressuposto de normalidade multivariada, indicado pelo teste de Box.

Não foi encontrado um efeito estatisticamente significativo do estatuto do respondente (pai/mãe vs

educador/auxiliar) nas três dimensões da qualidade (lambda de Wilk = 0.98, F(1,211) = 1.61, p = .188,

ω2multi = .02). Testes univariados (teste de Mann-Whitney), com a correcção de Bonferroni (p = .0167),

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Comparação entre observadores, pais e educadores

265

permitiam obter resultado semelhante.

Quadro 47. MANOVA para o efeito do estatuto do respondente (pais ou educadores) na

importância atribuída às dimensões da qualidade

M DP F p ω2multi

Pais 4.90 0.21 Interacção-Linguagem

Educadores 4.93 0.15

Pais 4.64 0.37 Actividades-Rotinas

Educadores 4.72 0.32

Pais 4.66 0.41 Espaço-Adultos

Educadores 4.77 0.25

1.61 .19 .02

Relativamente aos itens (ver Quadro 50), neste estudo quantitativo verificou-se que os itens

Mudança de fraldas/idas à sanita, Práticas de saúde, Práticas de segurança, Ajudar as crianças a

compreender a linguagem, Interacção entre pares, Interacção adulto-criança e Disciplina se

encontravam entre os mais valorizados quer por pais quer por educadores. Os itens Material exposto

para as crianças, Blocos, Jogo de areia e água, Natureza/ciência, Uso de TV, vídeo e/ou computador,

Promover a aceitação da diversidade, Condições para satisfazer as necessidades profissionais do

pessoal, Supervisão e avaliação do pessoal e Oportunidades para desenvolvimento profissional foram

simultaneamente menos valorizados por pais e por educadores.

.

6.3 Qualidade avaliada por pais, educadores e observadores externos

Os dados médios da avaliação das salas (34 itens) efectuada pelos pais, pelos educadores e

por observadores externos foram comparados, conduzindo uma ANOVA para medidas repetidas (ver

Quadro 48). Uma vez que foi violado o pressuposto de esfericidade dos dados, verificado através do

teste de Mauchly (χ2(2) = 22.71, p = .000), foi utilizada a correcção de Greenhouse-Geisser. Foram

encontradas diferenças estatisticamente significativas, tendo os testes post-hoc, com o ajuste de

Bonferroni (p = .0167), revelado a existência de diferenças entre a avaliação efectuada pelos

observadores externos e pelos pais e entre a avaliação efectuada pelos observadores externos e pelos

educadores. Não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas entre a avaliação

efectuada por pais e por educadores. Os observadores externos avaliaram mais negativamente as

salas de creche do que os pais e os educadores.

Page 266: Qualidade em Contexto de Creche: Ideias e Práticas · qualidade das salas de creche do que os pais e do que os responsáveis pelas salas de creche. Os resultados obtidos sugerem

Capítulo VI: Resultados

266

As diferenças entre as avaliações dos observadores externos e dos pais poderiam dever-se ao

facto dos pais conhecerem mal a sala ou a creche. Para controlar este factor, foi pedido aos pais que

assinalassem, no questionário, os itens cujo preenchimento lhes suscitou dificuldade, por não

conhecerem bem a sala ou a creche. Os itens assinalados por mais pais foram, por ordem

decrescente: Supervisão e avaliação do pessoal (ƒ = 51), Oportunidades para desenvolvimento

profissional (ƒ = 51), Livros (ƒ = 39), Condições para satisfazer as necessidades pessoais do pessoal

(ƒ = 36), Blocos (ƒ = 32), Condições para satisfazer as necessidades profissionais do pessoal (ƒ = 30),

Refeições/refeições ligeiras (ƒ = 27) e Mudança de fraldas/idas à sanita e Práticas de saúde (ƒ = 18).

Os itens nos quais os pais revelaram menos dificuldade foram: Arranjo da sala e Chegada/partida (ƒ =

0), Espaço interior (ƒ = 1), Jogo físico activo e Interacção adulto-criança (ƒ = 2), Iniciativas para

envolver os pais (ƒ= 4) e Condições para relaxamento/conforto, Supervisão e Horário (ƒ = 5).

Os itens do primeiro grupo foram considerados os de mais difícil monitorização pelos pais e os

itens do segundo grupo os de mais fácil monitorização pelos pais. Cada um destes grupos inclui 25 %

dos itens (de um total de 34 itens). Utilizando o teste t de Student, verificou-se se a diferença entre as

cotações efectuadas por pais e por observadores externos variava em função da dificuldade dos itens,

ou seja, compararam-se as diferenças entre as cotações de pais e de observadores externos nos dois

grupos de itens: (1) itens de difícil monitorização e (2) itens de fácil monitorização. No primeiro grupo de

itens as diferenças entre as cotações eram em média de 2.85 (DP = 1.48) e no segundo grupo de itens

eram em média de 2.34 (DP = 0.71). Não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas

na discrepância das avaliações de pais e observadores, em função da dificuldade dos itens (t (11.53) = -

0.93, p = .37, r = .26).

Foram comparados os resultados da avaliação efectuada pelos pais, pelos educadores e por

observadores externos nas dimensões Interacção-Linguagem, Actividades-Rotinas e Espaço-Adultos.

Devido à violação do pressuposto da normalidade da distribuição da avaliação efectuada pelos pais ao

nível da dimensão Interacção-Linguagem, utilizou-se o teste não paramétrico (teste de Friedman). Nas

outras duas dimensões utilizaram-se testes paramétricos (análise de variância univariada para medidas

repetidas). Uma vez que foram utilizados vários testes univariados, foi utilizado o ajuste de Bonferroni

(p = .0167).

Relativamente à dimensão Interacção-Linguagem, foram encontradas diferenças

estatisticamente significativas, tal como revelado pelo teste de Friedman (χ2 (2) = 149.44, p = .000).

Posteriormente, foram realizados testes não paramétricos para amostras dependentes (testes de

Wilcoxon), de modo a verificar se havia diferenças entre a avaliação efectuada pelos pais (M = 5.97,

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Comparação entre observadores, pais e educadores

267

DP = 0.82) e a avaliação efectuada pelos observadores externos (M = 3.81, DP = 1.09) e pelos

educadores (M = 5.89, DP = 0.79) e testes t de Student para amostras emparelhadas para verificar se

havia diferenças entre a avaliação efectuada pelos observadores e pelos educadores nesta dimensão.

Foram encontradas diferenças estatisticamente significativas entre a avaliação efectuada por

observadores externos e por pais (Z = -8.97, p = .000, r = -.60) e entre a avaliação efectuada por

observadores externos e por educadores (t(109) = - 18.42, p = .000, r = .87). Não foram encontradas

diferenças estatisticamente significativas entre a avaliação efectuada por pais e por educadores (Z = -

0.86, p = .39, r = -.06).

O pressuposto da esfericidade dos dados foi violado nas análises relativas à dimensão

Actividades-Rotinas (χ2 (2) = 22.62, p = .000) e Espaço-Adultos (χ2 (2) = 21.90, p = .000), tendo sido

utilizada a correcção de Greenhouse-Geisser. Foram encontradas diferenças estatisticamente

significativas nas duas dimensões. Os testes post-hoc revelaram diferenças entre o observador externo

e os pais e entre o observador externo e os educadores; não foram encontradas diferenças nas

avaliações efectuadas por educadores e por pais (ver Quadro 48). Em ambas as dimensões, os

observadores externos atribuíram cotações médias inferiores às dos pais e dos educadores.

Quadro 48. Análise de variância univariada para medidas repetidas: qualidade das salas em

função do avaliador

M DP

F (gl)

p ŋ2 Observ.

vs Pais

Observ. vs

Ed.s

Pais vs

Ed.s

Qualidade média (34 itens)

Observadores externos 2.83 0.47

Pais 5.33 0.89 Educadores 5.13 0.90

433.81 (1.68, 253.73)

.00 .80 *** *** ns

Actividades-Rotinas

Observadores externos 2.41 0.54

Pais 5.17 0.99 Educadores 4.91 1.01

393.67 (1.68, 183.36)

.00 .78 *** *** ns

Espaço-Adultos

Observadores externos 3.05 0.65

Pais 5.13 1.03 Educadores 4.97 1.01

225.85 (1.69, 184.19)

.00 .67 *** *** ns

ns não há diferenças estatisticamente significativas; * p < .05; **p < .01; ***p < .001

Em síntese, foram encontradas diferenças estatisticamente significativas entre as avaliações

efectuadas por observadores externos e por pais e educadores nas três dimensões da qualidade. As

avaliações dos observadores externos foram sempre inferiores às avaliações dos pais e dos

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Capítulo VI: Resultados

268

educadores. Não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas entre as avaliações de

pais e de educadores nas três dimensões.

As diferenças existentes entre a avaliação efectuada por observadores externos e pais e entre

a avaliação efectuada por observadores externos e por educadores, bem como o facto de não haver

diferenças entre a avaliação efectuada por pais e por educadores, poderiam dever-se à diferença de

instrumentos utilizados pelos pais e educadores (Questionário) e pelos observadores externos (ITERS-

R). Para se averiguar esta situação, o questionário foi utilizado como grelha de observação em 22 salas

de creche. Assim, um observador externo, com licenciatura em Educação de Infância e sem formação

na utilização da ITERS-R, efectuou observações em simultâneo com um dos observadores

responsáveis pela cotação da ITERS-R, tendo preenchido o questionário com base nessas

observações.

Foi calculado o valor da consistência interna dos dados recolhidos. O valor do coeficiente alfa

de Cronbach foi de .84. Os resultados médios da avaliação da qualidade efectuada por este segundo

observador externo, utilizando como instrumento de avaliação o Questionário, variaram entre 2.47 e

4.06 (M = 3.21, DP = 0.45). A análise exploratória dos dados, através do teste Kolmogorov-Smirnov,

permitiu confirmar a normalidade da distribuição destes dados. Não foram identificados outliers.

Foi verificada a associação entre os valores médios (34 itens) resultantes desta avaliação e os

valores médios obtidos na ITERS-R. Através do cálculo do coeficiente de correlação de Pearson, foi

encontrada uma associação estatisticamente significativa, de grande magnitude (r = .50, p = .02). Não

houve diferenças estatisticamente significativas entre os resultados médios obtidos com a utilização da

ITERS-R (M = 3.14, DP = 0.27) e os resultados médios obtidos através da utilização do questionário

como grelha de observação (M = 3.21, DP = 0.45, t (21) = -0.85, p = .41, r = .18).

Apesar de se dispor de dados da qualidade avaliada pelos pais e pelos educadores para

apenas 8 das 22 salas avaliadas pelo segundo observador externo, as avaliações da qualidade deste

último foram também comparadas com as dos pais e com as dos educadores, recorrendo a testes não

paramétricos (teste de Wilcoxon). Foram encontradas diferenças estatisticamente significativas entre os

valores médios da avaliação efectuada pelo observador externo (M = 3.17, DP = 0.44) e pelos pais (M

= 5.68, DP = 1.09, Z = -2.52, p = .01, r = -.63) e entre os valores médios da avaliação efectuada pelo

observador externo e pelos educadores (M = 5.08, DP = 0.58, Z = -2.52, p = .01, r = -.63).

Em suma, foi encontrada uma associação entre os resultados da avaliação das salas

efectuada por observadores externos utilizando a ITERS-R e o questionário e não foram encontradas

diferenças estatisticamente significativas. Foram encontradas diferenças estatisticamente significativas

entre os resultados da avaliação efectuada pelo observador externo utilizando o questionário e da

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Comparação entre observadores, pais e educadores

269

avaliação efectuada por pais e educadores, que também preencheram o questionário.

Foram verificadas, ainda, as associações entre a avaliação efectuada por pais, por educadores

e por observadores externos ao nível da média dos 34 itens e em cada uma das dimensões. Como foi

referido anteriormente, os dados da avaliação da dimensão Interacção-Linguagem efectuada pelos pais

não revelaram uma distribuição normal, pelo que o coeficiente de correlação apresentado é o de

Spearman. Para as outras variáveis foi calculado o valor do coeficiente de correlação de Pearson. Os

valores dos coeficientes de correlação são apresentados no Quadro 49.

Quadro 49. Coeficientes de correlação entre a avaliação efectuada por observadores externos, pais

e educadores

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11

1. 34 itens Observadores

2. 34 itens Pais .25** a

3. 34 itens Educadores .34*** a .12 a

4. Interacção e Ling. Obs. .71*** a .20* a .19* a

5. Interacção e Ling. Pais .12 b .86*** b .03 b .11 b

6. Interacção e Ling. Ed. .31** a .26** a .83*** a .24* a .18 b

7. Actividd. e Rotinas Obs. .78*** a .26** a .17 a .34*** a .19* b .16 a

8. Actividd. e Rotinas Pais .24* a .96*** a .12 a .16 a .75*** b .25* a .28** a

9. Actividd. e Rotinas Ed. .36*** a .07 a .96*** a .19* a -.01 b .76*** a .24* a .08 a

10. Espaço-Adultos Obs. .72*** a .17 a .41*** a .26** a .06 b .29** a .38*** a .16 a .38*** a

11. Espaço-Adultos Pais .25** a .93*** a .14 a .21* a .75*** b .26** a .21* a .80*** a .09 a .20* a

12. Espaço-Adultos Ed. .29** a .10 a .93*** a .16 a .04 b .71*** a .05 a .09 a .82*** a .43*** a .12 a

*p < .05; **p < .01; ***p < .001 a Coeficiente de correlação de Pearson; b Coeficiente de correlação de Spearman

Foi encontrada uma associação positiva fraca, estatisticamente significativa, entre as

avaliações médias (34 itens) efectuadas por observadores externos e por pais e uma associação

positiva moderada, estatisticamente significativa, entre as avaliações médias efectuadas por

observadores externos e por educadores.

Relativamente à dimensão Interacção-Linguagem, foi encontrada uma associação positiva

fraca, estatisticamente significativa, entre as avaliações dos observadores e dos educadores. Em

relação à dimensão Actividades-Rotinas, verificaram-se apenas associações positivas fracas,

estatisticamente significativas, entre a avaliação dos observadores e as avaliações dos pais e dos

educadores. Finalmente, na dimensão Espaço-Adultos, verificou-se uma associação estatisticamente

significativa, de pequena magnitude, entre a avaliação efectuada pelos observadores externos e pelos

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Capítulo VI: Resultados

270

pais. Verificou-se uma associação positiva moderada, estatisticamente significativa, entre a avaliação

efectuada pelos observadores e pelos educadores.

Em síntese, a avaliação dos observadores externos revelou associações fracas a moderadas

com a avaliação dos educadores e com a avaliação dos pais, à excepção da dimensão Interacção-

Linguagem. Assim, verificou-se uma tendência para os pais e os educadores avaliarem mais

positivamente a sala quando o observador externo também o fazia (e vice-versa). Apesar de não se

terem verificado diferenças estatisticamente significativas entre as avaliações dos pais e dos

educadores, não foram encontradas associações estatisticamente significativas.

6.4 Apreciação global ao nível dos itens da ITERS-R

Ao nível de cada item definido pela ITERS-R, foram apresentados, ao longo deste capítulo, os

seguintes dados: (1) percentagem e frequência de pais que referiram critérios semelhantes aos de

cada item da ITERS-R, nas suas respostas à entrevista; (2) importância média atribuída pelos pais

(cotada de 1 a 5), através da resposta ao questionário; (3) percentagem e frequência de educadores

que referiram critérios semelhantes aos de cada item, nas suas respostas à entrevista; (4) importância

média atribuída pelos educadores (cotada de 1 a 5), através da resposta ao questionário; (5) avaliação

efectuada pelos pais (de 1 a 7), através da resposta ao questionário; (6) avaliação efectuada pelos

educadores (de 1 a 7), através da resposta ao questionário; (7) avaliação efectuada por observadores

externos (de 1 a 7), através da aplicação da ITERS-R.

O Quadro 50 pode ser considerado um quadro-resumo dos principais resultados obtidos ao

nível de cada item da ITERS-R. Em cada coluna do quadro, encontram-se a sombreado os itens que se

situaram no quartil superior dos resultados e a negrito e sombreado mais claro os que se situaram no

quartil inferior. A sua observação cuidada permitiu identificar algumas congruências e incongruências

nas várias medidas.

Page 271: Qualidade em Contexto de Creche: Ideias e Práticas · qualidade das salas de creche do que os pais e do que os responsáveis pelas salas de creche. Os resultados obtidos sugerem

Comparação entre observadores, pais e educadores

271

Quadro 50. Quadro-resumo das frequências ou médias relativas à importância atribuída (pais e

educadores) e à avaliação efectuada (pais, educadores e observadores externos) para cada item

%

Pais ImptPais (1 a 5)

% Eds

ImptEds (1 a 5)

Av Pais (1 a 7)

Av Eds (1 a 7)

Av Obs (1 a 7)

1. Espaço interior 90 4.80 85 4.91 5.17 4.90 3.58 2. Mobiliário p/ cuidados de rotina e jogo 10 4.65 30 4.78 5.24 4.72 3.05 3. Condições para relaxamento e conforto 15 4.66 25 4.66 5.04 4.28 3.01 4. Arranjo da sala 15 4.72 45 4.94 5.43 5.13 3.18 5. Material exposto para as crianças 15 4.51 10 4.67 5.24 4.89 3.77 6. Chegada/partida 30 4.85 10 4.90 6.03 5.68 2.35 7. Refeições/refeições ligeiras 80 4.85 70 4.89 5.73 5.79 1.62 8. Sesta 20 4.73 30 4.71 5.63 5.38 1.21 9. Mudança de fraldas/idas à sanita 4.88 4.97 5.94 5.79 1.06 10. Práticas de saúde

65 4.86

90 4.91 5.70 5.74 1.57

11. Práticas de segurança 40 4.88 55 4.95 5.38 5.42 2.32 12. Ajudar crianças compreender ling. 4.95 4.95 6.03 5.90 4.08 13. Ajudar as crianças a usar a linguagem

35 4.84

30 4.94 5.87 5.90 4.00

14. Utilizar livros 10 4.63 40 4.75 5.09 4.59 1.56 15. Motricidade fina 10 4.65 50 4.83 5.26 4.93 4.00 16. Jogo físico activo 45 4.73 65 4.77 4.92 4.71 1.91 17. Arte 25 4.72 10 4.77 5.54 5.47 3.03 18. Música e movimento 15 4.76 35 4.82 5.66 5.57 2.41 19. Blocos 10 4.36 20 4.49 4.44 3.84 1.81 20. Jogo dramático 10 4.52 40 4.75 5.11 4.70 3.36 21. Jogo de areia e água - 3.75 - 4.15 2.98 2.55 1.08 22. Natureza/ciência 5 4.42 10 4.47 4.49 4.25 1.52 23. Uso de TV, vídeo e/ou computador 5 3.71 - 3.69 4.25 4.23 1.52 24. Promover a aceitação da diversidade - 4.42 - 4.33 4.36 3.95 1.30 25. Supervisão do jogo e da aprendizagem 25 4.87 35 4.85 5.88 5.82 3.59 26. Interacção entre pares 75 4.87 25 4.95 5.94 5.91 4.28 27. Interacção adulto-criança 95 4.94 75 4.97 6.25 6.03 3.85 28. Disciplina 60 4.93 25 4.91 5.90 5.80 3.07 29. Horário 20 4.81 20 4.85 5.69 5.55 3.19 30. Jogo livre 55 4.74 65 4.83 5.55 5.57 2.06 31. Actividades de grupo - 4.69 - 4.79 5.54 5.57 2.21 32. Medidas para crianças c/ incapacidades 5 4.79 - 4.90 5.21 5.09 2.70 33. Iniciativas para envolver os pais 70 4.68 35 4.74 4.79 4.74 3.51 34. Condições p/ nec. pessoais do pessoal - 4.52 5 4.75 4.79 4.75 3.78 35. Condições p/ nec. prof. do pessoal - 4.36 - 4.61 4.67 5.08 4.26 36. Interacção e cooperação entre pessoal 15 4.50 25 4.78 5.15 5.20 4.14 37. Continuidade do pessoal 15 4.68 15 4.75 5.37 5.37 4.41 38. Supervisão e avaliação do pessoal - 4.40 5 4.45 4.80 4.34 2.36 39. Oportunidades p/ desenv. profissional 5 4.47 5 4.67 4.53 4.03 2.04

Assim, com base nos dados obtidos através do estudo qualitativo e do estudo quantitativo

relativos aos dados de importância atribuída pelos pais e pelos educadores, pode-se verificar que os

itens sobre os quais recaíram os valores mais elevados nas quatro medidas (quatro primeiras colunas

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Capítulo VI: Resultados

272

do quadro) foram o 9 e o 10 (Mudança de fraldas/idas à sanita e Práticas de saúde), que foram

agrupados no estudo qualitativo, e o 27 (Interacção Adulto-criança). Os itens 1 (Espaço interior), 7

(Refeições/refeições ligeiras), 11 (Práticas de segurança), 26 (Interacção entre pares) e 28 (Disciplina)

encontravam-se entre os itens mais valorizados em três das quatro medidas. O item 30 (Jogo livre) foi

referido nas entrevistas por mais de 50% dos pais e dos educadores e não se encontrava entre os mais

valorizados no estudo quantitativo. O item 12 (Ajudar as crianças a compreender a linguagem)

encontrava-se entre os mais valorizados por pais e por educadores no estudo quantitativo e foi pouco

referido no estudo qualitativo.

Dos itens mais valorizados por pais e por educadores, alguns encontravam-se entre os que

foram avaliados mais positivamente por pais e por educadores. Relativamente à qualidade avaliada por

pais e por educadores (quinta e sexta colunas), os 25% de itens avaliados mais positivamente foram os

mesmos no caso dos educadores e no caso dos pais: 6 (Chegada/partida), 7 (Refeições/refeições

ligeiras), 9 (Mudança de fraldas/idas à sanita), 10 (Práticas de saúde), 12 (Ajudar as crianças a

compreender a linguagem), 13 (Ajudar as crianças a usar a linguagem), 25 (Supervisão do jogo e da

aprendizagem), 26 (Interacção entre pares), 27 (Interacção adulto-criança) e 28 (Disciplina). Destes 10

itens, 6 encontravam-se entre os mais valorizados por pais e por educadores, 2 apareciam entre os

mais valorizados apenas pelos pais (os itens Chegada/partida e Supervisão do jogo e da

aprendizagem) e 2 não apareciam entre os mais valorizados (os itens Espaço interior e Práticas de

segurança).

Dos itens considerados mais importantes por pais e por educadores (Mudança de fraldas/idas

à sanita, Práticas de saúde, Interacção adulto-criança, Espaço interior, Refeições/refeições ligeiras,

Práticas de segurança, Interacção entre pares, Disciplina, Jogo Livre e Ajudar as crianças a

compreender a linguagem), na avaliação efectuada pelo observador externo (sétima coluna), através

da ITERS-R, metade apresentou qualidade inadequada e a outra metade qualidade mínima. Dos 10

itens com valores médios mais elevados na ITERS-R, 5 não se encontravam entre os mais valorizados

nem por pais, nem por educadores (itens 5, 34, 35, 36, 37), 2 encontravam-se entre os mais

valorizados em apenas uma das medidas e 3 encontravam-se entre os mais valorizados (12, 26, 27).

Relativamente aos itens menos valorizados, os itens Blocos, Jogo de areia e água,

Natureza/ciência, Uso de TV, vídeo e/ou computador e Promover a aceitação da diversidade foram

pouco valorizados por pais e por educadores e obtiveram, simultaneamente, cotações muito baixas na

avaliação efectuada pelos pais, pelos educadores e pelos observadores externos. Os itens Supervisão

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Comparação entre observadores, pais e educadores

273

e avaliação do pessoal e Oportunidades para desenvolvimento profissional encontravam-se igualmente

entre os menos valorizados e entre os que recebiam dos pais e dos educadores uma avaliação inferior

da qualidade. Na ITERS-R tinham também cotações equivalentes a qualidade inadequada, apesar de

não pertencerem aos 25% de itens de qualidade mais baixa.

Comparando a avaliação efectuada por pais, por educadores e por observadores externos,

verificou-se que a avaliação efectuada por pais e por educadores era nitidamente superior à avaliação

efectuada pelos observadores externos. Atendendo aos itens com cotações situadas nos quartis

superiores, dos 10 itens que recebiam avaliação superior dos pais e dos educadores, apenas 4 eram

também os que obtinham cotação mais elevada na ITERS-R (Ajudar as crianças a compreender a

linguagem, Ajudar as crianças a usar a linguagem, Interacção entre pares e Interacção adulto-criança).

Além disso, desses 10 itens com cotações mais elevadas dos pais e dos educadores, 6 eram avaliados

pelo observador externo como sendo de qualidade mínima (Ajudar as crianças a compreender a

linguagem, Ajudar as crianças a usar a linguagem, Supervisão do jogo e da aprendizagem, Interacção

entre pares, Interacção adulto-criança e Disciplina) e 4 de qualidade inadequada (Chegada/partida,

Refeições/refeições ligeiras, Mudança de fraldas/idas à sanita e Práticas de Saúde).

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CAPÍTULO VII: Discussão de resultados e conclusões

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277

1. O estudo da Escala de Avaliação do Ambiente de Creche – ITERS-R

A Escala de Avaliação do Ambiente de Creche tem sido amplamente utilizada em diversos

países e em diversas situações, tendo sido desenvolvida com o objectivo de se utilizar em

investigação, na melhoria dos programas de educação e cuidados e na monitorização dos mesmos

(Harms et al., 2003). Os resultados obtidos neste estudo relativos às características métricas poderão

contribuir de forma significativa para a sua utilização, com finalidades diversas, como instrumento de

avaliação da qualidade de salas de creche em Portugal.

A distribuição dos dados, as estatísticas descritivas e a sensibilidade dos itens

Os resultados médios obtidos com a ITERS-R (34 itens), nas 160 salas avaliadas, foram

bastante baixos, apresentando uma distribuição normal, com valores de simetria e de curtose

adequados. O desvio-padrão obtido (DP = 0.48) indica uma reduzida variabilidade dos dados,

semelhante à situação descrita por Aguiar et al. (2002) e pelo estudo ECCE (ECCE Study Group,

1997). Tietze et al. (1996) consideraram que a homogeneidade encontrada nos resultados de avaliação

da qualidade dos jardins-de-infância portugueses, no âmbito do estudo ECCE, se poderia dever ao

facto de haver legislação a nível nacional que abrange todo o tipo de instituições, como as

regulamentações relativas ao número de crianças por sala, e ao facto de os educadores de infância

terem uma formação de base semelhante, independentemente do tipo de instituição onde acabam por

vir a exercer funções. No que se refere ao contexto de creche, a homogeneidade verificada parece

dever-se à generalizada falta de práticas adequadas, como será abordado seguidamente.

Ao nível dos itens, os valores obtidos tendiam a centrar-se no extremo inferior da escala likert

utilizada. Dos 30 itens, 18 (46%) tiveram valor médio inferior a 3.00 e 14 (36%) tiveram valor médio que

se situava entre 3.00 e 4.00. Apenas 6 itens (Ajudar as crianças a compreender a linguagem, Ajudar as

crianças a usar a linguagem, Motricidade fina, Interacção entre pares, Interacção e cooperação entre o

pessoal e Continuidade do pessoal) obtiveram valor médio superior a 4.00, ainda assim não atingindo o

ponto 5 da escala, equivalente a qualidade boa. Estes resultados poderiam dever-se à forma como os

itens estão construídos e à elevada exigência da escala em determinados aspectos. Contudo, uma

análise mais qualitativa dos registos das observações levam-nos a crer que estes resultados equivalem

a uma efectiva prestação de cuidados de pobre qualidade. Assim, interessa salientar, nomeadamente,

que (1) foi observada uma manifesta falta de higiene em situações como a troca de fraldas e as

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Capítulo VII: Discussão

278

refeições (e.g., frequentemente não são lavadas as mãos das crianças nem dos educadores, mesmo

quando consecutivamente são trocadas as fraldas a várias crianças; as crianças não lavam as mãos

sempre que utilizam a casa-de-banho; muitas vezes os adultos não lavam as mãos antes de preparar a

refeição ou antes de dar a alimentação às crianças; em muitas creches as crianças não lavam as mãos

antes da refeição), (2) em grande parte das salas não há livros acessíveis às crianças ou os livros

acessíveis são em número reduzido e/ou estão em visível mau estado, (3) o espaço exterior é pouco

utilizado (e.g., muitos educadores só vão com as crianças ao exterior na Primavera, em dias com um

clima excepcional) e raramente são realizadas actividades de contacto com a Natureza, (4) das 160

salas, apenas 16 tinham alguma actividade com areia e/ou água, (5) as instituições não promovem a

formação em serviço do seu pessoal ou, tampouco, a sua supervisão.

Ainda relativamente aos itens, importa referir que o cálculo do coeficiente de correlação

corrigida entre o item e a escala permitiu verificar que não havia associações negativas nem

associações de valor absoluto inferior a .10. Contudo, e à semelhança dos resultados obtidos no

estudo de Tietze et al. (1998), foram identificados itens com uma associação fraca com a nota total da

escala: Arranjo da sala, Chegada/partida, Sesta, Mudança de fraldas/idas à sanita, Práticas de saúde,

Jogo físico activo, Música e movimento, Jogo dramático, Promover a aceitação da diversidade, Jogo

livre, Condições para satisfazer as necessidades pessoais do pessoal e Supervisão e avaliação do

pessoal. Neste estudo, foi seguida a sugestão de Pallant (2001), que refere que apenas se devem

remover os itens com valores baixos de correlação quando o valor da consistência interna dos dados

da escala for inferior a .70. Assim, uma possível publicação da ITERS-R em Portugal deve manter

todos os seus itens, apesar de haver algumas limitações ao nível das características métricas.

Instrumentos deste tipo podem ser utilizados, como foi referido, com diversas funções: a regulação dos

programas, a melhoria dos programas e a investigação acerca dos efeitos da qualidade dos contextos

no desenvolvimento das crianças (Harms et al., 2003; Scarr et al., 1994). Assim, quando se utiliza a

ITERS-R em investigação, poderá fazer sentido eliminar determinados itens, tendo em conta as suas

características de medida (por exemplo, neste estudo os itens Mudança de fraldas/idas à sanita e

Supervisão e avaliação do pessoal não foram incluídos na análise de componentes principais e os itens

Jogo de areia e água, Uso de TV, vídeo e/ou computador, Actividades de grupo, Medidas para crianças

com incapacidades e Interacção e cooperação entre o pessoal não foram incluídos na maior parte das

análises). Todavia, para a regulamentação, melhoria e monitorização dos programas justifica-se a

utilização de todos os itens, o que permite obter uma imagem mais completa e pormenorizada da

qualidade do ambiente de creche.

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Estudo da ITERS-R

279

A fidelidade dos dados

Os resultados que se referem à fidelidade dos dados permitem concluir que o processo de

treino, que consistiu (a) na utilização do vídeo elaborado pelos autores da escala (Harms & Cryer,

2003), (b) na discussão dos critérios de qualidade/indicadores e (c) na realização de cotações em

algumas salas de creche previamente à recolha de dados, possibilita a obtenção de níveis aceitáveis

de acordo interobservadores.

Os valores relativos à consistência interna sugerem que o resultado global da escala pode ser

utilizado como uma medida consistente da qualidade do ambiente de creche. Este resultado é

consentâneo com estudos anteriores (e.g., Aguiar et al., 2002; Harms et al., 2003). Pelo contrário, a

maior parte das subescalas da ITERS-R, definidas conceptualmente pelos autores, não revela valores

adequados de consistência interna. Apenas a subescala Interacção apresenta um alfa de Cronbach

superior a .70 e a subescala Escuta e conversação apresenta um valor superior a .60. As restantes

subescalas apresentam valores de alfa de Cronbach inferior a .60. Estes resultados são inferiores aos

relatados pelos autores da escala (Harms et al., 2003), que variavam entre .47 e .92, sendo que

apenas duas subescalas (Espaço e mobiliário e Rotinas de cuidados pessoais) tinham valores de alfa

de Cronbach inferiores a .70. Contudo, os resultados obtidos vão ao encontro dos apresentados pelo

estudo anteriormente realizado com creches do distrito do Porto (Aguiar et al., 2002), que utilizou a

primeira edição da escala, no qual a consistência interna das subescalas variava entre .25 e .76, tendo

apenas a subescala Interacção revelado um valor de alfa de Cronbach superior a .70. Vão também ao

encontro dos resultados de outros estudos, realizados internacionalmente, utilizando a primeira edição

da ITERS (e.g., Scarr et al., 1994; Weinraub, Shlay, Harmon, & Tran, 2005) e utilizando também a

primeira edição da ECERS (Tietze et al., 1998).

A validade dos dados

Os valores de consistência interna encontrados revelam, portanto, que as subescalas da

ITERS-R não são confirmadas empiricamente, devendo ser utilizadas com prudência. Este dado é

igualmente reforçado pelos resultados da análise de componentes principais, cujo critério de Kaiser

indicava a existência de 11 componentes, reduzidas para três através da análise do scree plot. As três

componentes de qualidade encontradas – Interacção-Linguagem, Actividades-Rotinas, Espaço-Adultos

– explicam 33.23% da variância total, o que poderá indicar que os itens da escala, na sua globalidade,

permitem descrever mais adequadamente a qualidade das salas do que as componentes extraídas. De

qualquer modo, as três componentes constituem indicadores da qualidade das salas que, em termos

conceptuais, constituem uma categorização clara, e com significado, dos itens da ITERS-R. A primeira

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Capítulo VII: Discussão

280

componente, Interacção-Linguagem, agrupou os itens: Interacção adulto-criança, Ajudar as crianças a

compreender a linguagem, Ajudar as crianças a usar a linguagem, Interacção entre pares, Disciplina,

Música e movimento e Supervisão do jogo e da aprendizagem. Esta componente revelava um valor

adequado de consistência interna (α = .81) (Field, 2005), que aumentava ligeiramente se fosse

eliminado o item Música e movimento (α = .83). Na segunda dimensão, Actividades-Rotinas, foram

incluídos os itens: Motricidade fina, Jogo dramático, Natureza/ciência, Mobiliário para cuidados de

rotina e jogo, Utilizar livros, Refeições/refeições ligeiras, Material exposto para as crianças, Promover a

aceitação da diversidade, Jogo livre, Arte, Práticas de saúde, Blocos, Horário e Jogo físico activo. O

valor de consistência interna desta componente (α = .76) pode ser considerado aceitável. A terceira

componente, Espaço-Adultos, agrupa os itens: Condições para satisfazer as necessidades

profissionais do pessoal, Espaço interior, Continuidade do pessoal, Condições para satisfazer as

necessidades pessoais do pessoal, Sesta, Práticas de segurança, Condições para relaxamento e

conforto, Iniciativas para envolver os pais, Arranjo da sala, Chegada/partida e Oportunidades para

desenvolvimento profissional. Esta componente revelou um valor mais baixo de consistência interna (α

= .65).

Os autores da escala não divulgaram resultados relativos à sua estrutura factorial. Contudo,

em Abril de 2005, Cassidy et al. apresentaram resultados de uma análise de componentes principais

com os itens da ITERS-R, com rotação varimax, que permitiu identificar quatro componentes: (1)

Materiais/Actividades, (2) Segurança/Organização, (3) Linguagem/Interacções e (4) Pais/Pessoal.

Estas quatro componentes explicavam 91% da variância. Os dados foram recolhidos apenas em salas

de elevada qualidade, o que pode constituir uma limitação do estudo. Comparando estes resultados

com os que foram obtidos no âmbito do presente estudo, poderemos facilmente identificar uma grande

semelhança na componente relativa à linguagem e às interacções. De facto, há uma sobreposição dos

itens Ajudar as crianças a compreender a linguagem, Ajudar as crianças a usar a linguagem,

Interacção adulto-criança, Interacção entre pares e Disciplina. Os itens Música e movimento e

Supervisão do jogo e da aprendizagem foram incluídos nas componentes Materiais/Actividades e

Segurança/Organização, respectivamente, no estudo de Cassidy e colaboradores (2005). A maior parte

dos itens que neste estudo foram incluídos na componente Actividades-Rotinas encontram-se nas

componentes Materiais/Actividades e Segurança/Organização do estudo de Cassidy et al. (2005). Três

itens da componente Espaço-Adultos encontram-se na componente Pais/Pessoal, um item (Condições

para relaxamento e conforto) na componente Materiais/Actividades e dois itens (Arranjo da sala e

Práticas de segurança) na componente Segurança/Organização.

Em estudos anteriores (e.g., Scarr et al., 1994), nos quais foram realizadas análises factoriais

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Estudo da ITERS-R

281

para os itens da ITERS (primeira edição), obteve-se apenas um factor. Especificamente no estudo de

Scarr et al. (1994) um único factor explicava 62% da variância nas salas para bebés e 63% da variância

nas salas para crianças de 1 e 2 anos de idade. No âmbito do estudo ECCE (ECCE Study Group,

1997) foi efectuada a análise de componentes principais com os itens da ECERS, tendo sido

identificados dois factores: (1) Ensino e interacção (que agrupou aspectos da qualidade directamente

relacionados com as interacções dos educadores e com a forma como o desenvolvimento das crianças

é estimulado) e (2) Espaço e materiais (que agrupou aspectos da qualidade relacionados com o espaço

disponível e com os materiais, pré-requisitos para a aprendizagem e actividades, e a forma como o

espaço e os materiais eram utilizados). Cassidy, L. L. Hestenes, S. Hestenes e Mims (2003)

efectuaram uma análise de componentes principais com os itens da ECERS-R, tendo chegado a uma

solução de duas componentes, que explicavam 51% da variância: Materiais e Actividades (com os itens

Motricidade fina, Arte, Matemática/número, Natureza/ciência, Jogo dramático, Mobiliário para relaxar,

Blocos, Espaço para privacidade, Livros e figuras e Areia/água) e Interacções (com o itens Interacções

pessoal-criança, Disciplina, Interacções entre crianças, Supervisão geral das crianças, Uso informal da

linguagem, Encorajar as crianças a comunicar e Supervisão de actividades de motricidade global). Os

autores não referiram se foram excluídos da análise os itens relacionados com os pais e o pessoal.

Contudo, nenhum desses itens aparece nestas duas componentes. Os itens da componente

Interacções do estudo de Cassidy et al. (2003) são equivalentes aos itens que, no presente estudo,

foram incluídos na componente Interacção-Linguagem, com exclusão do item Música e movimento. Os

itens da componente Materiais e Actividades, que têm itens equivalentes na ITERS-R, encontram-se

maioritariamente na componente Actividades-Rotinas deste estudo.

Perlman, Zellman e Le (2004) procederam a uma análise factorial da ECERS-R, que permitia

obter 3 factores. Contudo, o primeiro factor explicava sete vezes mais variância do que o segundo, o

que levou os autores a considerar um factor único dominante. Adicionalmente, a relação entre os três

factores era forte, indicando que avaliavam aspectos semelhantes da qualidade. Estes autores

seleccionaram, ainda, subgrupos de itens, tendo verificado que conduziam a resultados semelhantes à

utilização de todos os itens da escala. Sakai et al. (2003), num estudo comparativo entre os dados

obtidos com a ECERS e com a ECERS-R, relativos às mesmas salas, encontraram uma solução

factorial com dois factores: as Interacções e os Materiais, para as duas versões da escala, apesar de

haver algumas diferenças nos itens incluídos em cada factor. O primeiro factor correspondia às

interacções desenvolvimentalmente adequadas e o segundo às actividades e materiais

desenvolvimentalmente adequados. Os dois factores eram responsáveis por 45.43% da variância nos

dados da ECERS e por 67.10% nos dados da ECERS-R.

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Capítulo VII: Discussão

282

À semelhança do estudo realizado com a primeira edição da ITERS (Aguiar et al., 2002), os

resultados obtidos neste estudo permitiram verificar que a ITERS-R possibilita efectuar distinções ao

nível da qualidade de processo entre salas com características estruturais diferentes. Assim, como era

esperado, verificou-se que salas orientadas por educadores de infância revelavam melhor qualidade

média do que as salas orientadas por auxiliares de educação. Também se verificou que, nesta amostra

de 160 salas, as salas de IPSS revelavam qualidade significativamente mais elevada do que as salas

de instituições com fins lucrativos, apesar de o efeito calculado ser de pequena magnitude. Verificou-se

uma associação positiva moderada entre a qualidade observada e o número de adultos presentes na

sala e associações de pequena magnitude entre a qualidade observada e o tamanho do grupo

(associação positiva), o número de anos de educação formal do responsável pela sala (associação

positiva) e o rácio adulto-criança (associação negativa). Utilizando a medida do envolvimento de grupo,

verificou-se que nas salas de qualidade média mais elevada (quartil superior) havia uma percentagem

significativamente mais elevada de crianças envolvidas do que nas salas de qualidade mais baixa

(quartil inferior).

Relativamente às três componentes da qualidade, constatou-se que a componente Interacção-

Linguagem era aquela que permitia efectuar menos distinções entre salas com diferentes

características de estrutura, tendo sido encontradas apenas associações de pequena magnitude com o

tamanho do grupo e o rácio adulto-criança. A qualidade ao nível das componentes Actividades-Rotinas

e Espaço-Adultos revelou-se associada com várias características estruturais das salas. Verificou-se,

ainda, que a qualidade observada no conjunto destas três dimensões variava em função do tipo de

instituição, da faixa etária das crianças a que a sala se destina e do estatuto profissional do adulto

responsável pela sala. Finalmente, tal como apurado para a qualidade média (34 itens), nas salas com

valores mais elevados (quartil superior) de qualidade nas componentes Interacção-Linguagem e

Actividades-Rotinas havia uma percentagem significativamente mais elevada de crianças envolvidas,

do que nas salas com valores mais baixos de qualidade (quartil inferior). Não foram encontradas

diferenças estatisticamente significativas no envolvimento de grupo, em função da qualidade na

componente Espaço-Adultos.

Conclusão

Apesar de, geralmente, a ITERS permitir a obtenção de dados com qualidades métricas

adequadas e de ser relativamente fácil obter índices adequados de fidelidade, como se verificou neste

estudo, Vandell e Wolfe (2000) identificam algumas limitações deste conjunto de escalas de avaliação

do ambiente: (1) o valor global (compósito) combina características do ambiente físico, experiências

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Estudo da ITERS-R

283

sociais e condições de trabalho do pessoal, podendo algumas destas áreas ter uma maior influência no

funcionamento intelectual das crianças ou no seu bem-estar socioemocional do que outras; (2) estas

medidas são específicas de um dado contexto, ou seja, não é possível efectuar comparações entre

diferentes tipos de contextos (e.g., entre uma creche e uma creche familiar); e (3) estas medidas não

podem ser utilizadas para avaliar os cuidados prestados em casa, por exemplo por amas ou avós.

Relativamente ao primeiro ponto salientado por Vandell e Wolfe, não foram utilizadas neste estudo

medidas do desenvolvimento da criança que o possam verificar; foi utilizada apenas a medida do

envolvimento de grupo, que se foca directamente no comportamento e experiências das crianças

(Ridley et al., 2000). Verificou-se que havia uma associação positiva fraca entre a qualidade média das

salas e o envolvimento de grupo, existindo, no entanto, uma associação positiva moderada entre o

envolvimento e a qualidade na componente Actividades-Rotinas e não havendo qualquer associação

entre o envolvimento e a qualidade na componente Espaço-Adultos. Este dado pode ser um indicador

de que, como referem Vandell e Wolfe (2000), o valor global da escala pode subestimar efeitos que

outras escalas mais específicas poderiam detectar. Assim, quando se utiliza a ITERS-R, deve ter-se

em consideração todos estes factores, evitando extrair conclusões abusivas a partir dos dados obtidos.

Como referem Dahlberg e Årsén (1994), a avaliação da qualidade deve servir para apoiar o

desenvolvimento da prática pedagógica e, ao mesmo tempo, ajudar a recuperar a legitimidade da

educação e dos cuidados para a infância, que muitas vezes se relega para segundo plano, devido a

questões económicas. Lima e Bhering (2006) referem-se à utilidade da ITERS-R, alegando que,

quando a equipa de trabalho de familiariza com a ITERS-R, este instrumento desperta o interesse por

aspectos que nem sempre são pensados e considerados no trabalho com as crianças e a equipa, o

que pode ir no sentido da melhoria da prática pedagógica, como alertavam Dahlberg e Årsén (1994).

Tendo em conta os resultados obtidos é de realçar as adequadas características métricas do

instrumento para utilização em salas de creche portuguesas. A ITERS-R pode ser particularmente útil

em situações de avaliação das salas de creche que visem desenvolver programas no sentido de se

melhorar a sua qualidade, dado que permite obter, mais do que um valor médio de qualidade, uma

visão pormenorizada das características da creche em cada um dos itens, recorrendo ao

preenchimento de todos os indicadores. Em termos de valores médios de qualidade, na realidade

portuguesa, salvaguardando o facto de apenas terem sido observadas salas do distrito do Porto, a

ITERS-R revela pouca sensibilidade conduzindo a resultados muito homogéneos, que se devem

sobretudo ao não cumprimento dos critérios básicos em muitos dos itens.

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Capítulo VII: Discussão

284

2. Qualidade das salas de creche avaliada por observadores externos

2.1 Qualidade global

Um dos objectivos deste estudo era descrever a qualidade das creches do distrito do Porto,

avaliada por um observador externo, tendo sido observadas, com esse intuito, 110 salas de creche28

(uma sala em cada creche). Relativamente à qualidade global destas salas avaliadas com recurso à

ITERS-R, verificou-se que, em média, as salas não revelavam possuir condições básicas de saúde e

de segurança e não providenciavam os materiais necessários de forma a satisfazerem as

necessidades das crianças nelas integradas, no sentido de promover o seu desenvolvimento. Em

média, nestas salas, os cuidados prestados eram inadequados, podendo a qualidade do ambiente ser

considerada pobre.

Trinta e nove por cento das salas observadas, ou seja, 43 salas revelaram uma qualidade

mínima, que indica que os serviços davam resposta a necessidades de guarda e, em pequeno grau, a

necessidades de desenvolvimento básicas. As restantes 67 salas (61%) podem ser consideradas de

qualidade pobre, isto é, não satisfazem sequer as necessidades relacionadas com cuidados básicos de

guarda. Nenhuma das salas obteve valor médio correspondente a qualidade boa ou excelente, ou seja,

não foram observadas salas que, além de assegurarem as funções de guarda, revelassem interacção

positiva, planeamento e cuidados personalizados, bem como bons materiais, tal como é definido por

Harms et al. (1990).

Estes resultados vêm reforçar os que foram anteriormente obtidos, com um menor número de

salas participantes: no estudo de Aguiar et al. (2002) a qualidade média global das salas situava-se em

valores correspondentes a qualidade inadequada, com apenas 17% das salas a revelarem qualidade

mínima. Também noutros países se tem verificado a baixa frequência ou mesmo ausência de serviços

de elevada qualidade. Por exemplo, de acordo com o Cost, Quality and Child Outcomes Study (1995),

nos EUA, apenas 8.4% das salas avaliadas, para crianças com idade inferior a 3 anos, revelaram

elevada qualidade (cotação igual ou superior a 5.00), ou seja, valores compatíveis com características

desenvolvimentalmente adequadas; 40.4% das salas revelaram qualidade pobre (i.e., pontuação

inferior a 3.00); e as restantes revelaram qualidade mínima. Scarr et al. (1994) tinham encontrado

valores médios de 3.19 nas salas para bebés e de 3.38 nas salas para crianças de 1 e 2 anos de

idade. No Canadá, por exemplo, Goelman et al. (2006), no âmbito do projecto You Bet I Care,

28 Como foi descrito, apesar de ter sido avaliada a qualidade de 160 salas, o objectivo dessa parte do estudo era apenas o de estudar o instrumento ITERS-R. Assim, estas reflexões referem-se aos resultados obtidos através da avaliação da qualidade de apenas 110 salas.

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Qualidade avaliada por observadores externos

285

avaliaram 115 salas para bebés e crianças de 1 e 2 anos, tendo verificado que 29% das salas eram de

boa qualidade (média igual ou superior a 5.00), 8% eram de qualidade inadequada e as restantes de

qualidade mínima. Foi obtida uma qualidade média de 4.43 (DP = 1.17).

Nos estudos ICCE/ECCE verificou-se que as salas de jardim-de-infância portuguesas

revelavam valores médios inferiores às salas austríacas e alemãs, o que se poderia dever ao facto de

a Áustria e a Alemanha possuírem infra-estruturas sólidas, que apoiam serviços de educação e

cuidados de elevada qualidade e de seguirem uma tradição em que se estimulam escolhas livres e

exploração pelas crianças em detrimento das actividades em grande grupo, o que é valorizado pelos

instrumentos utilizados (Tietze et al., 1996). Nesse estudo, relativo a salas destinadas a crianças com

idade superior a 3 anos, os resultados foram superiores aos resultados obtidos no presente estudo

relativos à qualidade de salas de creche (Bairrão et al., 1998; Bairrão, 2001). Apesar de, segundo

Vandell e Wolfe (2000), ser prudente evitar as comparações entre diferentes tipos de contextos, é

importante salientar que cerca de 72% das salas de jardim-de-infância apresentavam uma qualidade

considerada suficiente, não se verificando salas com valores inferiores a 3, enquanto que 61% das

salas de creche observadas no presente estudo eram de qualidade pobre ou inadequada.

Recentemente, foi realizado um estudo (Abreu-Lima & Nunes, 2006), que avaliou 43 salas com a

edição revista da ECERS, que obteve igualmente valores médios superiores aos do presente estudo

(com a ITERS-R), equivalentes a qualidade mínima (M = 3.59). Nos EUA verificou-se a mesma

tendência, ou seja, os resultados das salas para crianças em idade pré-escolar foram mais elevados do

que os das salas para crianças com menos de 3 anos de idade, verificando-se que quase 25% das

salas para crianças mais velhas preenchiam os critérios de adequação ao desenvolvimento das

crianças (pontuações médias iguais ou superiores a 5.00), contra 8% das salas para crianças mais

novas (Cost, Quality & Child Outcomes Study Team, 1995). No estudo realizado por Goelman et al.

(2006) verificou-se uma tendência semelhante: enquanto que entre as salas para bebés e crianças

mais novas havia 28% com boa qualidade, entre as salas para crianças com mais de 3 anos de idade

havia 44%. Assim, parece tratar-se de uma tendência generalizada, tanto nos EUA e no Canadá como

em países europeus.

A OCDE (2000, p. 209), no Estudo Temático sobre a educação pré-escolar, considera que as

disparidades existentes na qualidade e tipo de resposta existentes em Portugal estão ligadas à

existência de uma considerável multiplicidade de promotores e à complexa divisão de funções entre

eles, acrescentando ainda que é necessário “conciliar a diversidade de interesses existentes: os do

sector público e os do sector privado, os da organização centralizada ou descentralizada, os de

controlo secular ou de controlo religioso, os de iniciativa estatal e os de iniciativa não-governamental,

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Capítulo VII: Discussão

286

os do Sindicato e os do Estado”. O grupo da OCDE que visitou Portugal considerou que o acesso aos

serviços para crianças dos 0 aos 3 anos de idade não é promovido numa base de igualdade (i.e.,

depende de factores como a zona de residência ou o estatuto socioeconómico) e que, na generalidade,

falta qualidade aos serviços. Outro aspecto focado pela OCDE (2000, p. 212) foi o estatuto e formação

dos docentes “bastante mais fraco no sector de serviços de cuidados dos 0 aos 3 anos de idade do

que nos jardins-de-infância, o que poderá ter consequências negativas na qualidade daqueles

serviços”. A OCDE (2000, p. 216) refere ainda que “há necessidade de se reconsiderar a divisão

irrealista dos serviços num sector social e num sector educativo, divisão que pode impedir a formação

de abordagens holísticas das necessidades das crianças e das famílias. (…) A segregação entre

cuidados e educação enfraquece seriamente a coerência dos sistemas, causa a divisão de

responsabilidades e impede o desenvolvimento dos serviços de apoio globais a prestar às crianças e

às famílias”. Um dos obstáculos à colaboração inter-sectorial relaciona-se com as disparidades entre

os salários dos educadores (OCDE, 2001). De facto, verifica-se que os educadores do Ministério da

Educação têm normalmente melhores salários, horários e outras regalias, o que leva os educadores de

infância a concorrerem todos os anos para o sector público. Este estudo da OCDE (2000) refere ainda

que a elevada mobilidade dos educadores pode criar problemas, não só aos educadores, como

também aos pais e às crianças. A OCDE também considerava que a idade de reforma era um

problema, uma vez que o sistema perdia, prematuramente, educadores experientes e capazes,

situação que mudou recentemente.

A OCDE (2000) aconselha Portugal a examinar o nível de qualidade dos serviços prestados

pelos diversos tipos de estabelecimento. Apesar de ser necessário legislar, Scarr et al. (1994)

concluíram, através de observações que realizaram, que os centros revelavam pouco cumprimento das

regulações impostas pelo Estado. Assim, as medidas que garantam o cumprimento das normas

definidas são essenciais. Relativamente às inspecções, a OCDE verificou que, quando existem,

tendem a incidir em questões relacionadas com os regulamentos de construção dos edifícios, para

além de considerarem as queixas apresentadas pelos pais, sendo as inspecções aos aspectos

educativos dos currículos muito raras (OCDE, 2000). Uma das sugestões dadas pela OCDE prende-se

com a responsabilização das instituições, que deveriam demonstrar que os recursos foram bem

geridos e que os objectivos definidos foram atingidos.

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Qualidade avaliada por observadores externos

287

2.2 Qualidade ao nível das dimensões: Interacção-Linguagem, Actividades-Rotinas e

Espaço-Adultos

No que se refere às três dimensões da qualidade identificadas (Interacção-Linguagem,

Actividades-Rotinas, Espaço-Adultos), aquela que obteve resultados médios superiores foi a

Interacção-Linguagem e a que obteve média inferior foi a Actividades-Rotinas. A dimensão Interacção-

Linguagem e a dimensão Espaço-Adultos obtiveram médias equivalentes a qualidade mínima e a

dimensão Actividades-Rotinas obteve valores médios equivalentes a qualidade inadequada. Como foi

referido, devido aos baixos valores de consistência interna das sete subescalas conceptuais da ITERS-

R, não foram efectuadas análises com os seus valores médios.

Este resultado mais elevado obtido na dimensão Interacção-Linguagem vai no sentido dos

resultados obtidos no âmbito dos estudos ECCE/ICCE, relativos a jardins-de-infância, que indicaram

que, em qualquer um dos países participantes, os adultos geralmente revelavam elevados níveis de

sensibilidade, aceitação e envolvimento nas suas interacções com as crianças (ECCE Study Group,

1997; Tietze et al., 1996). No que diz respeito aos factores de qualidade identificados no ECCE, os

resultados relativos à qualidade das salas portuguesas foram mais elevados no factor Ensino e

interacção (M = 4.54, DP = 0.62) do que no factor Espaço e materiais (M = 3.89, DP = 0.67) (ECCE

Study Group, 1997).

Utilizando um instrumento diferente, a Escala de Observação do Empenhamento do Adulto (de

Bertram et al., 1996), Oliveira-Formosinho (2000) efectuou um estudo com 102 educadoras de infância,

cujo objectivo era caracterizar o perfil de empenhamento das educadoras em três âmbitos de acção: a

sensibilidade do adulto para com a criança (subescala Sensibilidade), o grau de liberdade que o adulto

oferece à criança (subescala Autonomia) e o grau de estimulação que o adulto oferece à criança

(subescala Estimulação). A pontuação mais elevada foi obtida na subescala Sensibilidade e a

pontuação mais baixa na subescala Estimulação. A subescala Sensibilidade, nos indicadores relativos

ao empenhamento máximo, inclui aspectos como, por exemplo, o tom de voz positivo, o respeito e a

valorização da criança, os gestos corporais positivos e o estabelecimento de contacto visual. A

subescala Estimulação, no empenhamento máximo, requer, entre outros aspectos, que a intervenção

do educador tenha energia e vida, responda às capacidades e interesses da criança e estimule o

diálogo, a actividade e o pensamento. A subescala Autonomia requer, entre outros aspectos, que o

adulto permita à criança efectuar escolhas e apoie a sua decisão, encoraje a criança a ter ideias

próprias e encoraje a criança a resolver os conflitos (Oliveira-Formosinho, 2000). Estes resultados são

igualmente concordantes com os que se obtiveram no presente estudo, demonstrando práticas mais

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Capítulo VII: Discussão

288

adequadas dos educadores no domínio das interacções e que, neste estudo, não variam em função da

formação do adulto responsável pela sala.

2.3 Qualidade ao nível dos itens

Uma análise dos resultados ao nível dos itens permite identificar áreas fortes e áreas

deficitárias nas creches observadas, complementando a análise dos resultados médios e dos

resultados das dimensões da qualidade. Assim, reflectir-se-á acerca dos itens com valores mais baixos

na avaliação efectuada (valores médios que indicam qualidade inadequada) e, seguidamente, acerca

dos itens que obtiveram valores médios equivalentes a qualidade mínima.

Dos 39 itens, 19 (48.7% dos itens) obtiveram valores médios compatíveis com cuidados

inadequados. Encontravam-se nesta situação os itens Chegada/partida, Refeições/refeições ligeiras,

Sesta, Mudança de fraldas/idas à sanita, Práticas de saúde, Práticas de segurança, Utilizar livros, Jogo

físico activo, Música e movimento, Blocos, Jogo de areia e água, Natureza/ciência, Uso de TV, vídeo

e/ou computador, Promover a aceitação da diversidade, Jogo livre, Actividades de grupo, Medidas para

crianças com incapacidades, Supervisão e avaliação do pessoal e Oportunidades para

desenvolvimento profissional. Destes itens, apenas um – Medidas para crianças com incapacidades –

teve média superior a 2.5. Apesar de serem resultados indesejáveis, são mais animadores do que os

obtidos no estudo de Aguiar et al. (2002), no qual 63% dos itens apresentaram média inferior a 3.00.

Na subescala Espaço e mobiliário, definida conceptualmente pelos autores (Harms et al.,

2003), não se verificaram itens com resultados médios correspondentes a qualidade inadequada.

Como se pode facilmente observar, todos os itens da subescala Rotinas de cuidados pessoais

obtiveram valores médios inferiores à pontuação 3, o que corresponde a qualidade pobre, significando

que não estão a ser prestados os cuidados básicos às crianças que frequentam estas creches. Estes

valores, situados em torno das pontuações inferiores da escala, devem-se, entre outros, a aspectos

como: em muitas creches os pais não entram nas áreas destinadas aos cuidados da criança; não são

respeitados cuidados básicos de higiene antes e durante as refeições e as crianças são forçadas a

comer; os colchões para a sesta são colocados muito próximos uns dos outros e as crianças são

obrigadas a permanecer no colchão mesmo que não estejam a dormir; verificam-se problemas graves

de higiene durante a muda das fraldas e/ou utilização da casa-de-banho (e.g., os adultos e/ou as

crianças não lavam as mãos após a muda da fraldas ou utilização da casa-de-banho); faltam cuidados

básicos promotores da saúde (como limpeza adequada do nariz das crianças, lavagem frequente dos

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Qualidade avaliada por observadores externos

289

materiais, lavagem das mãos quando necessário); e existem algumas situações que podem colocar a

criança em risco físico (como alfinetes ou pioneses colocados em locais acessíveis às crianças, arestas

agressivas no interior ou no exterior, tomadas eléctricas sem protecção, radiadores ou aquecedores

não protegidos, colchão da mesa de muda de fraldas sem segurança, etc.).

Os resultados obtidos nos itens relacionados com as rotinas causam preocupação. Tal como

refere Portugal (1998a) o tipo de interacções típico do contexto de creche e a tendência das crianças

desta idade para comportamentos como, por exemplo, levar objectos à boca são excelentes meios

para propagação de agentes de doenças infecciosas. Se a este facto se acrescentam ainda cuidados

de higiene pouco eficazes, como aqueles que foram observados, será de esperar que se propaguem

com frequência doenças infecto-contagiosas nestes contextos. Na verdade, não é pouco comum

ouvirem-se queixas a este respeito, dos pais de crianças que frequentam creches. O que parece

inquietante é o relativo conformismo com que o dizem, como se se tratasse de uma situação inevitável.

De facto, é necessário ter em conta que os bebés e as crianças que não frequentam creches, e que

têm irmãos em casa, têm também doenças infecciosas, tal como adverte Portugal (1998a). Contudo,

cuidados adequados de saúde e higiene em contexto de creche poderiam evitar muitas destas

doenças. Note-se que, em muitas creches, cuidados básicos como lavar as mãos antes de almoçar ou

depois de utilizar a casa-de-banho não são respeitados. As doenças gastrointestinais, nomeadamente,

poderiam ser reduzidas substancialmente se os procedimentos básicos de saúde e higiene fossem

cumpridos (Cryer, Harms, & Riley, 2004). Os resultados obtidos são preocupantes, pelo que foi já

referido e, ainda mais, se considerarmos à semelhança da NAEYC (1990) que as crianças aprendem

melhor quando as suas necessidades físicas são satisfeitas e elas se sentem em segurança e não têm

preocupações.

Os resultados deste estudo, nos itens relacionados com as rotinas, confirmam os que tinham

sido encontrados na avaliação de apenas 30 salas de creche (Aguiar et al., 2002) e que indicavam a

existência de cuidados inadequados. Também em outros países têm sido encontrados resultados muito

baixos nesta área. Nos EUA, por exemplo, a Cost, Quality & Child Outcomes Study Team (1995)

verificou que as práticas de saúde e segurança eram geralmente problemáticas nas salas para bebés e

crianças com menos de 3 anos de idade observadas. No Canadá Goelman, Doherty, Lero, LaGrange e

Tougas (2000) constataram que entre os nove itens com resultados mais baixos encontravam-se

quatro da subescala Rotinas de cuidados pessoais, apesar de, ainda assim, terem revelado qualidade

mínima. Pelo contrário, na investigação relativa ao jardim-de-infância, os resultados nos itens

relacionados com as rotinas têm sido mais elevados (e.g., Abreu-Lima & Nunes, 2006), o que pode

dever-se ao facto de os cuidados para crianças mais velhas serem menos exigentes.

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Capítulo VII: Discussão

290

Na subescala Escuta e conversação, o item 14 (Utilizar livros) obtém uma cotação média

inferior a 3, o que significa que as salas observadas têm menos de seis livros apropriados para as

crianças acessíveis diariamente durante a maior parte do dia, os livros estão geralmente em mau

estado e/ou o pessoal (educadores de infância ou auxiliares) não costuma utilizar os livros diariamente

com as crianças. Os estudos nacionais e internacionais realizados nos últimos anos revelam que há em

Portugal baixos níveis de literacia, quer entre os adultos, quer entre as crianças e os jovens (e.g.,

Programme for Internacional Student Assessment – PISA; OCDE, 2004b). O Ministério da Educação, o

Ministério da Cultura e o Gabinete do Ministro dos Assuntos Parlamentares estão a promover no nosso

país o Plano Nacional de Leitura, cujo objectivo principal é “elevar os níveis de literacia dos

portugueses e colocar o país a par dos nossos parceiros europeus” (Alçada, Calçada, Martins,

Madureira, & Lorena, 2006). Contudo, as creches não foram incluídas neste projecto, apesar de se

poder considerar que a promoção de oportunidades para os bebés e as crianças de 1 e 2 anos de

idade desenvolverem uma relação próxima e agradável com os livros é um passo vital para preparar a

literacia de uma forma adequada, tal como propõem Cryer et al. (2004). Também a NAEYC e a

International Reading Association – IRA (1998) destacam a importância dos primeiros anos de vida

para o desenvolvimento da literacia. Apesar de as competências de leitura e escrita se desenvolverem

durante toda a vida, o período desde o nascimento até aos 8 anos de idade é o mais importante para o

desenvolvimento da literacia (NAEYC & IRA, 1998). A investigação tem demonstrado que salas com

muitos materiais escritos, jogos de linguagem e literacia, leitura de livros de histórias e actividades com

a escrita permitem à criança aprender o poder da escrita e da leitura e desenvolver conceitos básicos,

que são preditores do sucesso académico (NAEYC & IRA, 1998). Os Guiões Técnicos para a Creche

(Rocha et al., 1996) e o Despacho Normativo 99/89, de 22 de Outubro de 1989 (os documentos mais

importantes para a creche à data da recolha de dados) também não incluem qualquer referência à

utilização de livros em contexto de creche. As Orientações Curriculares para a Educação Pré-escolar

(Ministério da Educação, 1997, p. 66), não aplicáveis à creche, acentuam a importância da literacia

“enquanto competência global para a leitura no sentido de interpretação e tratamento da informação

que implica a ‘leitura’ da realidade, das ‘imagens’ e de saber para que serve a escrita, mesmo sem

saber ler formalmente”.

Dos 10 itens que constituem a subescala conceptual Actividades, apenas 3 (Motricidade fina,

Arte e Jogo dramático) tiveram média correspondente a qualidade mínima. Os baixos resultados

obtidos nos itens desta subescala, e que maioritariamente vão no sentido dos que foram obtidos por

Aguiar et al. (2002), devem-se, entre outras razões: (1) à pouca utilização do espaço exterior, apesar

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Qualidade avaliada por observadores externos

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das boas condições climáticas do nosso país; (2) à inexistência de blocos para fazer construções

(muitos dos materiais disponíveis são classificados como materiais para motricidade fina, pois exigem

encaixe); (3) à inexistência de jogos com areia e/ou água; (4) à falta de oportunidades de interacção

com a Natureza (no exterior e/ou no interior da creche); (5) ao tempo excessivo que as crianças

passam nas creches a ver televisão/vídeo, muitas vezes sem possibilidade de optarem por outras

actividades; e (6) à falta de actividades e/ou materiais que promovam a aceitação da diversidade (e.g.,

diferentes etnias, culturas, idades, competências). Relativamente à utilização do espaço exterior, será

pertinente referir o exemplo de países cujo clima é menos favorável que em Portugal e as actividades

ao ar livre são frequentes, como é o caso da Dinamarca, onde as crianças passam uma grande parte

do seu tempo no exterior (Jensen, 1994). No que diz respeito à promoção da aceitação da diversidade,

no estudo realizado por Tietze et al. (1998), em jardins-de-infância portugueses e alemães, verificou-se,

igualmente, que era dada pouca atenção à diversidade cultural nos contextos educativos. No Canadá

(Goelman et al., 2000) este item obteve também cotação correspondente a qualidade inadequada.

A maioria dos conteúdos da ITERS-R relacionados com as actividades e os materiais para as

actividades não encontram correspondência nos Guiões Técnicos para a Creche (Rocha et al., 1996) e

no Despacho Normativo 99/89, de 22 de Outubro de 1989. Apenas conteúdos semelhantes aos dos

itens Jogo físico activo e Jogo de areia e água são, explicitamente, incluídos nos dois documentos.

Além disso, esses documentos referem somente de uma forma geral a necessidade de equipar as

salas “qualitativa e quantitativamente, com o material necessário à estimulação do desenvolvimento

das crianças, de acordo com a sua fase evolutiva” (Despacho Normativo 99/89, norma XII) e de modo a

assegurar “a satisfação das suas necessidades físicas, afectivas e cognitivas” (Rocha et al., 1996,

norma IX). Os dados aqui apresentados fundamentam a necessidade de se detalharem estes aspectos

na legislação e nas orientações divulgadas, o que, em certa medida, o Instituto da Segurança Social

teve em atenção nos documentos disponibilizados recentemente no seu sítio na Internet (Instituto da

Segurança Social, s.d.).

Relativamente aos itens da subescala Estrutura do programa, observou-se que havia

oportunidades para as crianças brincarem livremente, mas o Jogo livre raramente acontecia no exterior

da creche. Apesar de haver em todas as creches momentos de jogo livre, verificou-se que havia

também momentos prolongados de actividades estruturadas, em grupos de tamanho pouco adequado,

tendo em conta a idade das crianças. De acordo com Cryer et al. (2004) para aprenderem em grupo, as

crianças precisam de desenvolver previamente um conjunto de capacidades e, se tal não acontecer,

sentam-se passivamente no grupo, agindo como se estivessem a aprender quando, de facto, não

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Capítulo VII: Discussão

292

estão. As mesmas autoras listam um conjunto de factores que tornam as actividades em grupo pouco

adequadas para os bebés e as crianças mais novas, uma vez que eles (1) requerem interacções

pessoais intensas, enquanto desenvolvem as suas capacidades de comunicação, o que impede que

beneficiem do estilo de ensino habitualmente usado em grupo, no qual o adulto fala com muitas

crianças ao mesmo tempo; (2) aprendem melhor quando exploram e experimentam os objectos ao seu

modo, o que faz com que se perca muito tempo quando se pretende que várias crianças façam a

mesma coisa, em simultâneo; (3) têm estilos de aprendizagem e necessidades desenvolvimentais

muito diferentes, o que faz com que aquilo que é apresentado apenas de uma forma não corresponda

aos requisitos de aprendizagem de muitas crianças; e (4) ainda não desenvolveram as capacidades

sociais e de controlo que lhes permitem estar num contexto de grupo, sem serem forçados (ou

constantemente encorajados), o que faz com que frequentemente recebam uma mensagem de

fracasso que pode afectar a sua noção de que são competentes e importantes. Resultados publicados

por Montie et al. (2006), relativos a 10 países, destacaram a importância das actividades iniciadas

pelas crianças e das actividades em pequeno grupo, em detrimento das actividades em grande grupo,

em salas para crianças de 4 anos de idade. Estes autores encontraram uma associação positiva entre

as possibilidades de jogo livre e os resultados das crianças ao nível da linguagem e a nível cognitivo

aos 7 anos de idade. Montie e colaboradores (2006) consideram que as actividades livres fornecem às

crianças a oportunidade de conversarem informalmente com as outras crianças, atribuindo papéis no

jogo dramático, estabelecendo regras para os jogos, fazendo planos para as construções com blocos, e

fornece aos educadores uma oportunidade para envolverem as crianças em conversas relacionadas

com as suas brincadeiras, introduzindo novo vocabulário relevante para os interesses das crianças. As

actividades em grande grupo, pelo contrário, não são definidas tendo em conta os interesses ou

competências de cada uma das crianças, podendo ser demasiado difíceis ou demasiado fáceis, o que

torna a aprendizagem menos provável. Para aprenderem, as crianças precisam de se envolver na

resolução de problemas e na exploração dos materiais (Montie et al., 2006). A NAEYC (1997) salienta,

igualmente, a importância desenvolvimental do jogo, que permite à criança: expressar e representar

ideias, pensamentos e sentimentos; aprender a lidar com as emoções, a interagir com os outros e a

resolver conflitos; desenvolver a imaginação e a criatividade; e desenvolver o sentimento de

competência pessoal. Em relação ao item 32 (Medidas para crianças com incapacidades), neste

conjunto de salas, apenas 10 eram frequentadas por crianças com incapacidades. O valor médio obtido

pelas salas neste item revela que estas creches não estão a providenciar às crianças com

incapacidades as condições adequadas à satisfação das suas necessidades e promoção do seu

desenvolvimento. Uma cotação de 3.00 na ITERS-R, equivalente a qualidade mínima, significa (1) que

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Qualidade avaliada por observadores externos

293

o pessoal da sala de creche tem informações de avaliações disponíveis, (2) que são feitas pequenas

modificações na sala para satisfazer as necessidades das crianças com deficiência/incapacidade, (3)

que há algum envolvimento dos pais e do pessoal da sala para estabelecer objectivos (e.g., os pais e a

educadora estão presentes no encontro para elaborar o Plano Individualizado de Serviços para a

Família) e (4) que há algum envolvimento das crianças com incapacidades nas actividades com as

outras crianças. A média obtida pelas salas revela que nem sequer estas condições, consideradas

apenas mínimas, estão presentes em todas elas, o que vem reforçar as preocupações manifestadas

por alguns profissionais relativamente à situação desfavorável da Educação Especial e da Intervenção

Precoce em Portugal (e.g., Bairrão, 2006).

Os resultados obtidos, relativos aos itens das subescalas Actividades e Estrutura do programa,

vão no sentido do que havia sido observado no estudo ICCE em jardins-de-infância, ou seja, uma das

diferenças existentes entre os países participantes relacionava-se com a disponibilidade de espaços e

materiais de jogo, tendo sido verificado que em Portugal e Espanha se promovia menos do que nos

outros países o jogo livre, as actividades de motricidade global, os jogos com areia e água e os jogos

com blocos (Tietze et al., 1996). Também o relatório do ECCE (ECCE Study Group, 1997) salientou

que em Portugal e em Espanha havia uma maior tendência para as actividades orientadas e

estruturadas, com menos tempo destinado ao jogo livre, do que na Alemanha e, em parte, na Áustria.

Finalmente, a baixa pontuação dos itens Supervisão e avaliação do pessoal e Oportunidades

para desenvolvimento profissional reflecte o pouco (ou nenhum) investimento feito pelas instituições no

sentido de promover a formação em serviço do seu pessoal, bem como a falta de supervisão do

trabalho realizado nas salas. No estudo anterior (Aguiar et al., 2002) também se tinha verificado que

havia pouco investimento na formação dos profissionais. A OCDE (2001) reforça a importância de se

promover a adequada formação inicial, mas também a formação contínua dos profissionais que

trabalham em instituições de educação de infância, tendo verificado que em Portugal, nas instituições

ligadas à Segurança Social, os profissionais têm níveis inferiores de educação formal, menos

especialização na área de educação de infância e piores condições de trabalho do que os profissionais

que trabalham sob tutela do Ministério da Educação. Adicionalmente deverá ser tomado em

consideração o tipo de formação dos educadores de infância, pois há necessidade de serem

preparados para trabalhar com crianças desde a sala dos bebés até à transição para a escolaridade

obrigatória. McMullen (1999b) refere que nos EUA poucos são os cursos que preparam os educadores

para trabalharem com bebés ou crianças de 1 e 2 anos de idade, o que acontece também em Portugal.

A National Association for the Education of Young Children (NAEYC) responsabiliza os profissionais de

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Capítulo VII: Discussão

294

educação pela implementação e promoção de padrões de elevada qualidade e profissionalismo nas

instituições de educação para a infância, que devem reflectir conhecimentos actualizados acercadas

práticas de elevada qualidade e sua adequação ao desenvolvimento (NAEYC, 1997). A NAEYC

considera que a forma como os conhecimentos acerca do desenvolvimento e da aprendizagem das

crianças são aplicados influencia a qualidade das instituições. A implementação de práticas adequadas

ao desenvolvimento resulta do processo através do qual os profissionais tomam decisões acerca do

bem-estar e da educação das crianças, o que exige que os educadores (ou outros profissionais de

educação) permaneçam aprendizes ao longo das suas vidas profissionais. Assim, uma creche de boa

qualidade deverá proporcionar, aos seus profissionais, possibilidades de formação, à semelhança do

que é também preconizado pelo Ministério da Educação: “Este ambiente [o contexto institucional]

deverá ainda proporcionar ocasiões de formação dos adultos que trabalham nesse contexto” (Ministério

da Educação, 1997, p. 31). Encontra-se a mesma recomendação nos Guiões Técnicos da Direcção

Geral da Segurança Social, onde é referido: “Os estabelecimentos facultarão o acesso do seu pessoal

técnico e auxiliar à frequência de acções de formação organizadas pelas entidades competentes”

(Rocha et al., 1996, norma IX).

Assim, os itens que se destacam por nem sequer cumprirem os critérios para qualidade

mínima relacionam-se maioritariamente com as rotinas, com as actividades ou materiais para as

actividades e com a estrutura do programa.

Como foi referido, a análise dos resultados ao nível dos itens permite identificar, igualmente,

aspectos nos quais as salas de creche revelam qualidade mais elevada, apesar de, na ITERS-R, se

situarem num nível considerado apenas mínimo (valores médios entre 3.00 e 4.99). Encontravam-se

nesta situação 20 dos 39 itens (51%).

Os primeiros cinco itens da escala (Espaço interior, Mobiliário para cuidados de rotina e jogo,

Condições para relaxamento e conforto, Arranjo da sala, Material exposto para as crianças), que fazem

parte da subescala Espaço e mobiliário, definida pelos autores da ITERS-R (Harms et al., 2003),

obtiveram médias situadas entre 3.01 e 3.77. Com a primeira edição do instrumento (Aguiar et al.,

2002), dos cinco itens da subescala correspondente à actual Espaço e mobiliário, dois tiveram média

superior a 3.00 e os outros três obtiveram médias inferiores a 3.00, mas que eram mais elevadas que

as dos outros itens com qualidade inadequada. Apesar de ligeiramente mais elevados, os resultados do

presente estudo confirmam, de algum modo, os que tinham sido obtidos no estudo anterior de Aguiar et

al. (2002), revelando que os itens relativos ao espaço e ao mobiliário se situam entre os que obtêm

cotação mais elevada nas salas de creche.

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Qualidade avaliada por observadores externos

295

Dois dos três itens da subescala Escuta e conversação (Ajudar as crianças a compreender a

linguagem e Ajudar as crianças a usar a linguagem) e todos os itens da subescala Interacção

(Supervisão do jogo e da aprendizagem, Interacção entre pares, Interacção adulto-criança, Disciplina)

obtiveram resultados médios compatíveis com qualidade mínima. Estes resultados são congruentes

com os que foram obtidos por Aguiar et al. (2002), em salas de creche, e pelos estudos ECCE/ICCE

(ECCE Study Group, 1997; Tietze et al., 1996), em salas de jardim-de-infância. A importância das

interacções é realçada por vários autores e entidades, entre os quais a NAEYC (1990) que refere que a

interacção social é necessária para o desenvolvimento intelectual e social da criança, requerendo

reciprocidade, respeito mútuo e cooperação.

Da subescala Actividades, apenas três itens obtiveram resultados médios correspondentes a

qualidade mínima (Motricidade fina, Arte e Jogo dramático). Este resultado é congruente com o

resultado obtido pelo estudo realizado por Abreu-Lima e Nunes (2006), em salas de jardim-de-infância,

que obteve resultados compatíveis com qualidade inadequada na subescala Actividades. No estudo

realizado em salas de creche, em 2002, por Aguiar et al., o item Coordenação olho-mão, equivalente

ao item Motricidade fina, e o item Jogo do faz-de-conta, equivalente ao item Jogo dramático, obtiveram

médias superiores a 3.00. O item Arte, que neste estudo revelou qualidade mínima (M = 3.03), no

estudo anterior revelava qualidade inadequada (M = 2.43). Aos educadores que trabalham na

educação pré-escolar são dadas diversas orientações relativas às actividades a desenvolver,

nomeadamente nas Orientações Curriculares para a Educação Pré-escolar (Ministério da Educação,

1997), o que não acontecia relativamente à creche.

Da subescala Estrutura do programa, as salas obtiveram qualidade mínima apenas no item

Horário, ainda assim com um valor bastante baixo (M = 3.19). Para se obter uma cotação

correspondente a boa qualidade (cotação de 5), este item requer um horário flexível e individualizado,

equilíbrio de actividades no interior e no exterior, variação de jogo activo e calmo e transições suaves

entre acontecimentos (sem períodos prolongados de espera), condições que não estão a ser

cumpridas pelas salas participantes. Alguns destes aspectos (utilização do espaço exterior e

actividades livres) foram já discutidos.

Mais de metade dos itens da subescala Pais e pessoal obteve média superior a 3.00

(Iniciativas para envolver os pais, Condições para satisfazer as necessidades pessoais do pessoal,

Condições para satisfazer as necessidades profissionais do pessoal, Interacção e cooperação entre o

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Capítulo VII: Discussão

296

pessoal e Continuidade do pessoal). À excepção do item Interacção e cooperação entre o pessoal, que

não foi incluído na análise de componentes principais devido ao elevado número de valores omissos,

todos se encontram na dimensão Espaço-Adultos, que obteve valor médio situado entre as outras duas

dimensões. De facto, as creches parecem estar a cumprir os requisitos mínimos no que diz respeito ao

envolvimento dos pais e às condições para o pessoal, excepto no que diz respeito à supervisão e à

formação do pessoal. Do mesmo modo, no estudo de Abreu-Lima e Nunes (2006) a subescala Pais e

pessoal obteve valor médio indicativo de qualidade mínima.

Tendo em conta estes dados, as creches demonstram estar a cumprir critérios mínimos no que

se refere a aspectos relacionados maioritariamente com o espaço e o mobiliário, com a linguagem, com

as interacções e com as condições para o pessoal e para envolver os pais. Nos aspectos relacionados

com as rotinas, com as actividades e com a estrutura do programa (i.e., Jogo livre, Actividades de

grupo e Medidas para crianças com incapacidades) revelam qualidade inadequada.

2.4 Qualidade de processo e qualidade de estrutura

As variáveis de estrutura que, neste estudo, mais se revelaram associadas com a qualidade de

processo foram o tamanho do grupo de crianças, o número de adultos da sala e o número de anos de

educação formal do adulto responsável pela sala, revelando-se relacionadas com a qualidade média e

com os valores médios da dimensão Actividades-Rotinas e da dimensão Espaço-Adultos. A idade

média das crianças estava correlacionada apenas com a qualidade ao nível da dimensão Interacção-

Linguagem e da dimensão Actividades-Rotinas. O rácio adulto-criança estava relacionado apenas com

a qualidade média e a Interacção-Linguagem. O salário do educador revelava-se associado apenas

com a qualidade na dimensão Espaço-Adultos. Os anos de experiência do educador e a idade do

educador não se revelaram correlacionados com qualquer um dos valores médios da qualidade

provenientes da utilização da ITERS-R.

Características de estrutura da sala

Como se referiu no Capítulo II, apesar de haver diversos estudos sobre as relações entre estas

variáveis e de se considerar, habitualmente, que a qualidade de estrutura pode predizer a qualidade de

processo, os resultados não são consensuais. No presente estudo, verificou-se uma associação

positiva entre o tamanho do grupo e: a qualidade média e o valor médio de qualidade nas dimensões

Actividades-Rotinas e Espaço-Adultos. Este resultado é, de algum modo, inesperado, contrariando

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Qualidade avaliada por observadores externos

297

vários estudos realizados anteriormente com a ITERS, a ECERS e a ECERS-R (e.g., Cassidy et al.,

2003; Deynoot-Schaub & Riksen-Walraven, 2005; Holloway et al., 2001; Phillips et al., 2000). Deynoot-

Schaub e Riksen-Walraven (2005) verificaram que havia uma associação negativa moderada,

estatisticamente significativa, entre a qualidade global das salas e o tamanho do grupo, tendo sido

também encontradas associações negativas estatisticamente significativas entre o tamanho do grupo e

a qualidade nas subescalas Cuidados pessoais (associação pequena) e Interacção social (associação

moderada).

Poderemos apresentar explicações diversas para a associação positiva encontrada entre a

qualidade média das salas e o tamanho do grupo de crianças. Esta associação poderá dever-se ao

facto de a Segurança Social definir o número máximo de crianças permitidas, em função das condições

da sala. Assim, poderá acontecer que são as melhores salas que obtêm licença para admitir mais

crianças. Por outro lado, e seria muito positivo que tal estivesse a acontecer, pode suceder que sejam

as salas de melhor qualidade as que admitem mais crianças, ou seja, as próprias creches poderão

estar a revelar algum cuidado na admissão das crianças, limitando o número máximo de crianças em

função das condições de que dispõem. Também pode dar-se o caso de os profissionais ou a própria

instituição estarem a efectuar um investimento superior no sentido de providenciarem serviços de

qualidade mais elevada, por haver mais crianças a frequentar a sala. Não foram recolhidos dados que

permitam verificar a associação entre a qualidade, o número de crianças que frequentam cada sala e a

verba total auferida pela instituição. Seria pertinente conferir igualmente estas associações. Finalmente,

podem ser as creches de melhor qualidade as que têm maior procura, apesar de que os resultados

obtidos acerca das ideias dos pais fornecem pouco suporte a esta hipótese.

As associações entre as medidas da qualidade de processo e o número de adultos da sala vão

no sentido que era esperado e que foi igualmente encontrado noutros estudos, bem como as

associações entre a qualidade e o rácio adulto-criança (e.g., Cassidy et al., 2003; Phillipsen et al.,

1997; Scarr et al., 1994). De facto, seria de esperar que numa sala com menos crianças por adulto

fossem providenciados serviços de qualidade mais elevada. Das três dimensões da qualidade, apenas

uma se revelou associada ao rácio adulto-criança, a dimensão Interacção-Linguagem. Se por um lado,

o número de crianças parece não estar relacionado com a qualidade das interacções e da linguagem,

por outro lado um menor número de crianças por adulto está associado a qualidade mais elevada neste

domínio. Este resultado confirma, portanto, que é possível estabelecer interacções mais adequadas e

promover mais eficazmente o desenvolvimento da linguagem das crianças quando há menos crianças

por adulto. Aguiar (2006) alertou para a importância de se promoverem interacções individualizadas

com as crianças, apesar dos constrangimentos impostos pelo trabalho num contexto destinado a

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Capítulo VII: Discussão

298

grupos de crianças, no qual “os educadores têm necessariamente que dividir a sua atenção entre

múltiplas crianças e, por vezes, entre um conjunto de tarefas concorrentes” (Aguiar, 2006, p. 173). No

estudo Cost, Quality and Child Outcomes in Child Care Centers foram também encontradas

associações entre a qualidade das salas e o rácio adulto-criança (Cost, Quality & Child Outcomes

Study Team, 1995). Esta equipa refere que os profissionais que trabalham em salas com menos

crianças por adulto têm mais oportunidades de interagir, especialmente de forma positiva, com cada

criança. Confirmando estes dados, Goelman et al. (2006) constataram que a qualidade do ambiente da

sala aumentava por cada adulto adicional nessa sala e salientam que pode haver uma grande

diferença entre uma sala com rácio adulto-criança de 1:4 com apenas um adulto para quatro crianças e

uma sala com igual rácio mas que tenha dois adultos para oito crianças. O facto de haver dois adultos

oferece vantagens a nível da supervisão das crianças, mas também fornece a possibilidade de os

adultos partilharem e discutirem desafios profissionais, podendo contribuir para a satisfação profissional

(Goelman et al., 2006).

Parece haver consenso relativamente à importância do número de adultos a trabalhar em cada

sala de creche e de jardim-de-infância. Contudo, é importante salientar que ter vários adultos por sala,

sem aumentar o número de crianças, torna os serviços muito dispendiosos. Lamb (1998) refere que na

Suécia se chegou à conclusão que seria mais barato promover políticas que incentivassem o pai ou a

mãe a permanecerem mais tempo em casa com a(s) criança(s), em regime de licença de paternidade

ou maternidade remunerada, do que assegurar cuidados extrafamiliares de elevada qualidade para

todas as crianças.

Como referido, não foi encontrado efeito da faixa etária (1 – 2 anos vs 2 – 3 anos) na qualidade

média das salas, mas foi encontrado um efeito desta variável na dimensão Actividades-Rotinas. Os

valores médios da qualidade na dimensão Actividades-Rotinas eram superiores nas salas para

crianças mais velhas (2 – 3 anos), o que pode estar relacionado com o facto de as crianças desta

idade requererem de certo modo menos cuidados, por exemplo no que se refere à mudança de fraldas,

e, simultaneamente com o facto de os educadores de infância estarem mais preparados para

desenvolver actividades com crianças mais velhas.

Características de estrutura relacionadas com o educador

Foi encontrado no presente estudo um efeito do estatuto profissional da pessoa responsável

pela sala (educador de infância vs auxiliar) na qualidade média das salas e na dimensão Actividades-

Rotinas. Como era esperado, os valores da qualidade foram superiores nas salas orientadas por

educadores de infância. Também no estudo de Aguiar et al. (2002) foi encontrado um efeito importante

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Qualidade avaliada por observadores externos

299

do estatuto profissional do adulto responsável pela sala, indicando qualidade média superior nas salas

orientadas por um educador de infância. Tietze e Cryer (1999) referem que, geralmente, os elevados

níveis de educação dos profissionais estão associados a uma qualidade global das salas mais elevada.

Mais especificamente, mencionam que foi verificado que os educadores com níveis mais elevados de

educação formal fornecem actividades desenvolvimentalmente adequadas para as crianças e

demonstram comportamentos mais positivos, como, por exemplo, respondem mais às necessidades

das crianças.

No presente estudo, foram encontradas ainda correlações positivas entre o número de anos de

educação formal dos educadores e a qualidade média e entre o número de anos de educação formal

dos educadores e os resultados médios das dimensões Actividades-Rotinas e Espaço-Adultos. No

mesmo sentido, Cassidy et al. (2003) verificaram que havia uma correlação significativa entre o nível

educativo dos profissionais e a qualidade avaliada pela ECERS, quer se considerasse a qualidade

média, quer os dois factores de qualidade identificados – Materiais/Actividades e Interacções, sendo as

diferenças maiores na primeira componente. Assim, estes autores sugerem que ou as Interacções não

permitem diferenciar entre níveis educativos ou a formação dos profissionais não tem um efeito nas

suas interacções. Também os resultados obtidos por Torquati, Raikes e Huddleston-Casas (2007)

indicaram que a formação dos profissionais predizia a qualidade global das salas, mas não a qualidade

das interacções. Estas autoras consideram que pode ser mais difícil ensinar, por exemplo, a ser

empático, caloroso e paciente do que ensinar a fornecer às crianças experiências significativas através

do jogo. Tal como no estudo de Cassidy et al. (2003), e mesmo no de Torquati et al. (2007), ficam por

explicar neste estudo as diferenças encontradas, isto é, por que razão a formação tem um efeito ao

nível das Actividades-Rotinas, mas não ao nível da Interacção-Linguagem? Será que a formação é

orientada para o desenvolvimento das Actividades-Rotinas e não para a Interacção-Linguagem? Ou

será que a formação pode ter um impacto na forma como o profissional desenvolve as actividades e as

rotinas, mas não na forma como interage? Outros estudos poderão tentar dar resposta a estas

questões, sendo importante salientar que a formação tem de facto um efeito na qualidade das salas e

que deverá ser estimulada. Todas as salas de creche beneficiariam se tivessem uma educadora de

infância e, para além disso, se houvesse investimento na formação dos auxiliares. Recorde-se que das

21 auxiliares, apenas uma tinha realizado um curso profissional para auxiliares de educação.

No presente estudo também não foi encontrada qualquer associação entre a qualidade de

processo e a idade do educador, bem como entre a qualidade e o número de anos de experiência do

adulto responsável pela sala. No estudo de Pessanha (2005) foi encontrada uma associação negativa

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Capítulo VII: Discussão

300

estatisticamente significativa entre a idade do adulto e a qualidade da sala. Relativamente à

experiência da pessoa responsável pela sala, Pessanha (2005) e Pinto (2006) também não

encontraram uma associação estatisticamente significativa, apesar de haver de um efeito pequeno

(negativo) que, tendo em conta o reduzido tamanho da amostra, poderia indicar uma tendência para

ser nas salas com educadores com menos experiência que se verifica qualidade mais elevada.

Contudo, nesta amostra de 110 salas verificou-se que é a formação dos profissionais, nomeadamente

o número de anos de educação formal, que se relaciona positivamente com a qualidade das salas e

não a idade ou o número de anos de experiência. No estudo recente de Abreu-Lima e Nunes (2006)

verificou-se igualmente que não havia associações entre a experiência ou a idade dos educadores e os

resultados médios da qualidade das salas de jardim-de-infância.

O salário do educador estava, neste estudo, relacionado apenas com os resultados médios da

qualidade na dimensão Espaço-Adultos. Uma vez que se trata de uma correlação, não se pode

estabelecer uma relação de causalidade, podendo, contudo, ser levantadas hipóteses. Esta relação

pode significar que é nas creches mais diligentes no cumprimento de critérios de qualidade

relacionados com o Espaço-Adultos ou com melhores condições, que há igualmente um maior

investimento no sentido de proporcionar aos seus educadores salários mais elevados. Aliás, é nesta

dimensão que se incluem itens relacionados com as condições para os profissionais. Vários estudos

(e.g., Goelman et al., 2000; Phillipsen et al., 1997; Scarr et al., 1994) encontraram associações entre o

salário do educador e a qualidade avaliada através da ECERS e da ITERS. A este propósito a equipa

do estudo Cost, Quality and Child Outcomes in Child Care Centers (Cost, Quality & Child Outcomes

Study Team, 1995) alertou para a relação existente entre a qualidade dos serviços e os salários dos

educadores, considerando que não é o aumento dos salários dos educadores que fará aumentar a

qualidade dos serviços, mas sim o recrutamento de educadores mais qualificados e competentes,

garantindo-lhes um salário atractivo.

Assim, relativamente às características do educador (i.e., do adulto responsável pela sala de

creche) é a sua formação que mais aparece associada à qualidade das salas. Salas orientadas por

adultos com um número de anos de educação formal mais elevado revelam qualidade mais elevada, a

um nível global e ao nível das subescalas Actividades-Rotinas e Espaço-Adultos. Quando se

comparam os valores da qualidade obtidos em salas orientadas por educadores de infância e por

auxiliares, verifica-se uma qualidade média superior nas salas com educadores de infância e uma

qualidade também superior ao nível das Actividades-Rotinas.

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Qualidade avaliada por observadores externos

301

Outras características de estrutura

A qualidade média das 110 salas, avaliada por observadores externos, parece não variar em

função do tipo de instituição (IPSS ou instituição com fins lucrativos)29. Com base na avaliação destas

salas, foi encontrado um efeito do tipo de instituição nas dimensões da qualidade, sendo que as

diferenças residiam apenas na dimensão Espaço-Adultos: as salas de IPSS revelavam resultados

médios mais elevados do que as salas de instituições com fins lucrativos. A diferença nos resultados

médios obtidos neste estudo na dimensão Espaço-Adultos pelas salas de IPSS e pelas salas de

instituições com fins lucrativos pode significar que é nesta dimensão que as questões financeiras têm

um maior impacto. Pode dever-se, por exemplo, a apoios concedidos às IPSS no sentido de

promoverem o funcionamento de serviços de educação e cuidados para crianças, nomeadamente no

que diz respeito à construção de raiz das instalações. No estudo Cost, Quality and Child Outcomes in

Child Care Centers verificou-se que na Carolina do Norte, o estado participante no estudo com menor

nível de exigência nas regulamentações, havia uma diferença entre a qualidade média das instituições

com fins lucrativos e sem fins lucrativos, sendo superior nas instituições sem fins lucrativos. Os autores

do estudo concluem que a elevada exigência em termos legais atenua as diferenças entre serviços de

diferentes sectores (Cost, Quality & Child Outcomes Study Team, 1995; Phillipsen et al., 1997). No

estudo de Tietze et al. (1998), em Portugal, não se encontraram diferenças na qualidade global

avaliada pela ECERS, em função do tipo de jardim-de-infância (público, privado sem fins lucrativos ou

privado com fins lucrativos). Não foram, igualmente, encontradas diferenças ao nível das duas

componentes de qualidade identificadas: Interacção educativa e Espaço e materiais educativos, o que

pode justificar-se com base na existência de regulamentações e orientações diversas para os jardins-

de-infância, o que os torna mais homogéneos, ao contrário do que acontece relativamente às creches.

Como foi já mencionado, há alguma discrepância entre os diversos estudos no que diz respeito

às associações entre medidas da qualidade de processo e medidas da qualidade estrutural. Cryer et al.

(1999), ao examinarem as correlações entre medidas estruturais e medidas de processo, concluíram

que não havia uma só variável estrutural que estivesse fortemente relacionada com os resultados ao

nível da qualidade de processo (avaliada pela ECERS ou pela CIS), considerando que são diversas

variáveis estruturais que, em conjunto, geram a qualidade de processo. Do mesmo modo, Scarr et al.

29 Quando foram consideradas 160 salas (Capítulo V), encontrou-se um efeito do tipo de instituição na qualidade média das salas. A diferença entre as médias das salas de IPSS e de instituições com fins lucrativos é de 0.15 quando se analisam os dados de 110 salas e de 0.16 quando se analisam os dados de 160. Os desvios-padrão são semelhantes e a magnitude dos efeitos também é semelhante, correspondendo a efeitos pequenos nas duas situações. Os valores que diferem são apenas o do t de Student e da significância estatística (p), o que se pode dever ao número de participantes, dado que com amostras grandes mesmo pequenas diferenças se podem tornar significativas (Pallant, 2001).

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Capítulo VII: Discussão

302

(1994) consideram, com base em dados empíricos, que, à excepção do salário do educador que

revelava associação forte com a qualidade, as outras variáveis de estrutura (com associações

moderadas) podem não captar suficientemente qualidade de processo e, portanto, não podem ser

consideradas indicadores substitutos das medidas da qualidade. Os resultados obtidos neste estudo

confirmam a impossibilidade de se substituir uma avaliação da qualidade de processo pela avaliação

de características de estrutura, tal como foi apresentado. Relativamente aos dados obtidos em

Portugal, teremos também de considerar a reduzida variabilidade dos valores médios da qualidade de

processo. Vandell e Wolfe (2000) recordam que a possibilidade de se detectarem efeitos da qualidade

dos contextos de educação e cuidados depende da obtenção de variabilidade suficiente nos

resultados.

2.5 Conclusão e implicações

A revisão bibliográfica efectuada no âmbito deste estudo permitiu concluir que os cuidados

extrafamiliares de elevada qualidade são benéficos para as crianças. De acordo com o Cost, Quality

and Child Outcomes in Child Care Centers Study, nos EUA, passar de uma classificação

correspondente a qualidade mínima para uma classificação correspondente a qualidade boa, ou seja,

de 4.00 para 5.00, implicaria um investimento médio anual de 18 048 dólares por centro (ou 0.13

dólares por hora, por criança). Estes valores, calculados em 1995, significam que um serviço de

qualidade boa (média de 5.0) é 10% mais caro do que um serviço de qualidade mínima (Cost, Quality &

Child Outcomes Study Team, 1995). A análise efectuada permitiu também verificar que o investimento

é maior quando se pretende melhorar a qualidade de um centro que já é relativamente elevada (Cost,

Quality & Child Outcomes Study Team, 1995). O mesmo estudo referiu que havia aspectos difíceis de

avaliar que asseguravam, igualmente, elevada qualidade, sem haver custos substancialmente mais

elevados, como o compromisso dos directores e do pessoal com a qualidade.

As principais recomendações do Cost, Quality & Child Outcomes in Child Care Centers Study,

no sentido de se aumentar a qualidade dos serviços de educação e cuidados são as seguintes: (1) os

pais precisam de melhores ferramentas para identificarem os serviços de boa qualidade, (2) os estados

deviam implementar padrões de qualidade exigentes, (3) é necessário investir na formação dos

profissionais e (4) o Governo, o mercado e os filantropos precisam de investir de forma a ajudar as

famílias com os custos relacionados com a escolha de serviços de boa qualidade e o investimento deve

servir como incentivo para a melhoria da qualidade (Cost, Quality & Child Outcomes Study Team,

1995). O estudo de Montes et al. (2005) demonstra a importância de se investir na promoção da

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Qualidade avaliada por observadores externos

303

qualidade dos contextos de educação e cuidados, mesmo daqueles que são já considerados de boa

qualidade, considerando que se trata de um “investimento sábio dos fundos públicos” (Montes et al.,

2005, p. 370).

Tendo em conta os resultados obtidos neste estudo, relativos a salas de creche para crianças

de 1 e 2 anos de idade, torna-se importante que o Governo português e outras instituições

implementem medidas adequadas, no sentido de melhorar a sua qualidade. A legislação e as

regulamentações são muito importantes, sem dúvida, não podendo contudo garantir que os serviços

sejam de boa qualidade em termos da qualidade de processo. Tal como referem Goelman et al. (2000),

as regulamentações podem estabelecer uma base para que as experiências diárias que promovem o

bem-estar e o desenvolvimento das crianças possam ocorrer. A investigação tem demonstrado quais

as características estruturais, regulamentáveis, que mais se associam à qualidade de processo. Neste

estudo podem ser salientados o número de adultos que trabalham em cada sala de creche e,

principalmente, a sua formação. Juntamente com a legislação/regulamentação, um financiamento

público adequado é essencial, apesar de ser possível melhorar alguns aspectos da qualidade de uma

creche sem haver investimento de dinheiro e, por outro lado, aspectos que não se podem garantir

apenas com um maior financiamento. Harms (2001, p. 4) refere itens das Escalas de Avaliação do

Ambiente, das quais é um dos autores, cuja melhoria não depende exclusivamente do financiamento,

dando-lhes o título de “mudanças que o dinheiro não pode comprar”: (1) implementar procedimentos de

saúde adequados, incluindo a lavagem cuidadosa das mãos dos adultos e das crianças (incluindo os

bebés) em vários momentos do dia; (2) efectuar uma adequada supervisão das crianças no interior e

no exterior para evitar que as crianças se magoem e para maximizar as suas brincadeiras; (3) interagir

com as crianças de forma calorosa, apoiando-as; (4) utilizar técnicas de disciplina positivas, que

previnam problemas e ajudem as crianças a comportarem-se de uma forma construtiva (e.g., elogiar,

redireccionar adequadamente); (5) proporcionar actividades adequadas ao desenvolvimento das

crianças (arte, música, areia e água, jogo dramático, natureza/ciência, matemática/número, livros,

actividades de linguagem); (6) organizar a sala de modo a que as actividades mais activas não

perturbem as actividades mais calmas e colocar os materiais ao alcance das crianças; (7) organizar o

horário/plano diário de modo a que as crianças possam ter acesso aos materiais durante a maior parte

do dia; e (8) promover a diversidade através dos livros, imagens e materiais, de modo a ajudar a

criança a crescer sem estereótipos.

Love (1997) efectua também várias propostas, ao nível da investigação e ao nível das políticas,

que poderão contribuir para a promoção da qualidade dos contextos educativos para as crianças mais

novas. Ao nível da investigação sugere: (a) que haja um estudo periódico, representativo, acerca das

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Capítulo VII: Discussão

304

práticas e da qualidade da educação e cuidados para as crianças mais novas; (b) que sejam

desenvolvidos estudos mais específicos que permitam identificar níveis inaceitáveis de qualidade,

abaixo dos quais o desenvolvimento das crianças pode ficar comprometido; (c) mais investigação que

permita identificar práticas específicas, especialmente importantes para o desenvolvimento da criança;

(d) estudos que acompanhem o desenvolvimento da criança longitudinalmente, para determinar de que

modo os factores como o ambiente familiar, o rendimento da família, o estilo parental, os valores da

família e as escolhas dos pais relativas aos serviços de educação e cuidados interagem com a

qualidade desses mesmos serviços, afectando o desenvolvimento da criança. Ao nível das políticas,

sugere: (a) que haja um fortalecimento dos requisitos e regulamentações para os programas de

educação e cuidados; (b) que seja exigida formação inicial e contínua aos profissionais; (c) que se

encontrem formas de recrutar e manter pessoal competente e com boa formação; (d) que os pais

sejam informados acerca da importância da qualidade e dos seus efeitos nas crianças; e (e) que

identifiquem formas de apoiar os custos inerentes à elevada qualidade.

Os resultados deste estudo levantam de facto preocupações, sendo ainda mais intensas se

pensarmos que há a possibilidade de as creches que recusaram participar no estudo serem de

qualidade ainda mais baixa. Como referem Shonkoff e Phillips (2000, p. 326) “os contextos perigosos e

os contextos que basicamente são armazéns de crianças são inerentemente intoleráveis e, na sua

maioria, recusam participar na investigação”.

Apesar do que foi referido, deveremos ser cautelosos na generalização dos resultados obtidos.

Como foi descrito, os dados foram recolhidos apenas no distrito do Porto. Assim, seria necessário

realizar um estudo com uma amostra mais abrangente para se obter uma ideia do panorama nacional.

No estudo ECCE, já apresentado, verificou-se que havia assimetrias regionais, sendo que os jardins-

de-infância da área de Lisboa tendiam a revelar qualidade mais elevada do que os jardins-de-infância

da área do Porto (ECCE Study Group, 1997). Adicionalmente, apesar das adequadas características

métricas, já comprovadas, os dados foram recolhidos com base em pouco tempo de observação. A

este propósito, Burchinal e Nelson (2000) referem que os dados recolhidos em dois dias não podem

descrever completamente a experiência da criança no contexto de educação e cuidados ao longo de

todo o ano. Contudo, não podemos negar que constituem um importante e válido indicador.

Relativamente ao tópico “A qualidade das salas de creche avaliada por observadores

externos”, tinham sido definidas as seguintes hipóteses de investigação: (1) as salas para crianças

entre 1 – 2 anos revelam qualidade inferior às salas para crianças entre 2 – 3 anos, (2) as salas com

menos crianças por adulto revelam qualidade mais elevada e (3) as salas orientadas por profissionais

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Qualidade avaliada por observadores externos

305

com formação em Educação de Infância revelam qualidade superior às salas orientadas por auxiliares

de educação. Tendo em conta os resultados apresentados, verificou-se que: (1) não havia diferenças

estatisticamente significativas entre a qualidade média das salas de creche para crianças de 1 – 2 anos

de idade ou para crianças de 2 – 3 anos, tendo sido encontradas diferenças apenas na dimensão

Actividades-Rotinas (qualidade mais elevada nas salas para crianças de 2 – 3 anos); (2) as salas com

menos crianças por adulto tendiam a apresentar qualidade mais elevada do que as salas com mais

crianças por adulto e (3) as salas orientadas por educadores de infância revelavam qualidade mais

elevada do que as salas orientadas por auxiliares.

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Capítulo VII: Discussão

306

3. Critérios de qualidade valorizados pelos pais

No estudo qualitativo todos os pais se referiram a aspectos relacionados com as Rotinas de

cuidados pessoais como aspectos importantes numa creche. As categorias que, seguidamente,

reuniram mais consenso foram, por ordem decrescente: Actividades (incluindo os materiais disponíveis)

e Interacção; Espaço e mobiliário e Outros critérios (aspectos não incluídos na ITERS-R); e Pais e

pessoal. As categorias menos referidas foram a Estrutura do programa e a Escuta e conversação.

A análise dos resultados ao nível das categorias pode ser pouco adequada, fornecendo

informação que conduza a interpretações, em certa medida, deturpadas, pois o elevado resultado ao

nível de uma categoria pode dever-se apenas a uma das subcategorias. Por exemplo, o facto de 19

pais terem focado a subcategoria Actividades/materiais não especificados leva a crer que as

Actividades se encontram entre os aspectos mais valorizados quando, de facto, as outras

subcategorias são pouco referidas. No que se refere particularmente à subcategoria

Actividades/materiais não especificados, esta incluía maioritariamente aspectos relacionados com as

actividades e os materiais para as actividades, que não se enquadravam numa actividade em

específico. Todas as referências à realização de actividades, à promoção do desenvolvimento e à

existência de materiais, sem outras especificações, foram codificadas nesta subcategoria, que pertence

à categoria Actividades. Por exemplo, respostas como “E à medida que eles crescem é importante que

tenham materiais adequados à evolução deles. (…) bons materiais, adequados à fase em que as

crianças estão. (...) Depende das idades, mas devem ser materiais que os levem a desenvolver as

várias capacidades que os meninos vão tendo, não é?” (P5 Mãe), que não especificam que actividades

deveriam ser desenvolvidas ou que materiais deviam estar disponíveis, foram incluídas nesta

subcategoria, o que aconteceu nas respostas de 19 pais. Este facto, que revela a dificuldade dos pais

em operacionalizarem os critérios de qualidade que valorizam, pode ter tornado a definição desta

subcategoria muito difusa, acabando por receber um grande número de unidades de registo e

inflacionando a valorização da referida categoria. Esta suposição é apoiada pela ausência de outros

itens relacionados com as Actividades nos dados obtidos por entrevista e pela sua menor valorização

nos dados obtidos por questionário.

Para além disso, as categorias são constituídas por um diferente número de subcategorias, o

que, à partida, leva a que haja maior probabilidade de mais pais focarem umas categorias (por

exemplo, as Rotinas e as Actividades) do que outras (por exemplo, a Escuta e conversação e a

Estrutura do programa). Assim, no estudo qualitativo, a análise dos resultados ao nível das

subcategorias acaba por se revelar mais útil e adequada do que ao nível das categorias.

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Critérios valorizados pelos pais

307

As subcategorias focadas por um maior número de pais, ao descrever creches de boa ou má

qualidade, foram a Interacção adulto-criança, os Materiais ou actividades não especificados, o Espaço

interior, as Refeições/refeições ligeiras e a Interacção entre pares. Foram também bastante referidas,

mas por um menor número de pais, as subcategorias Iniciativas para envolver os pais, Práticas de

saúde/higiene, Disciplina, Jogo livre e Características do pessoal. Assim, os aspectos evocados pelos

pais, sem qualquer imposição de um quadro de referência, relacionam-se maioritariamente com as

interacções e as características do educador, com os cuidados pessoais (rotinas), com o seu

envolvimento na creche, com o espaço da sala e as actividades livres (no interior e ao ar livre) e com

as actividades e os materiais, contudo sem concretizarem o tipo de actividades/materiais. Pelo

contrário, apenas um dos pais referiu aspectos relacionados com a Natureza, a Utilização de televisão

ou vídeo, as Medidas para crianças com incapacidades e as Oportunidades para desenvolvimento

profissional. Nenhum dos pais fez referência a aspectos relacionados com as necessidades pessoais

do pessoal e com a supervisão ou avaliação do pessoal (referidas pelos educadores), bem como a

características correspondentes aos itens da ITERS-R (que também não foram referidas por

educadores): Jogo de areia e água, Promover a aceitação da diversidade, Actividades de grupo e

Condições para satisfazer as necessidades profissionais do pessoal.

Através do preenchimento dos questionários, os pais atribuíram importância elevada aos itens

da ITERS-R, destacando-se os que se relacionam com a linguagem e as interacções (Ajudar as

crianças a compreender a linguagem, Interacção adulto-criança, Disciplina, Supervisão do jogo e da

aprendizagem, Interacção entre pares) e com as rotinas de cuidados pessoais (Mudança de

fraldas/idas à sanita, Práticas de segurança, Práticas de saúde, Chegada/partida e Refeições/refeições

ligeiras). Reforçando os dados obtidos através das entrevistas, os itens menos valorizados pelos pais

estavam relacionados com as actividades (Uso de TV, vídeo e/ou computador, Jogo de areia e água,

Blocos, Natureza/ciência, Promover a aceitação da diversidade) e com as condições para os

profissionais (Condições para satisfazer as necessidades profissionais do pessoal, Supervisão e

avaliação do pessoal e Oportunidades para desenvolvimento profissional). Os resultados médios

obtidos indicaram que os pais valorizam os critérios de qualidade da ITERS-R na sua globalidade, bem

como as três dimensões da qualidade, sendo, no entanto, a dimensão Interacção-Linguagem mais

valorizada pelos pais do que as dimensões Actividades-Rotinas e Espaço-Adultos.

Foi encontrada uma associação de pequena magnitude entre a importância média atribuída

pelos pais aos critérios da ITERS-R (dados dos questionários) e a sua educação formal e o rendimento

mensal líquido do agregado, parecendo haver uma tendência para os pais com menor nível de

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Capítulo VII: Discussão

308

escolaridade e menor rendimento mensal valorizarem mais estes critérios de qualidade. Verificou-se

que os pais com filhos em IPSS atribuíam cotações mais elevadas do que os que tinham os filhos em

instituições com fins lucrativos (efeito pequeno). A importância atribuída aos critérios da dimensão

Interacção-Linguagem revelou-se apenas associada ao rendimento mensal líquido do agregado,

valorizando mais estes critérios de qualidade os pais com menos rendimentos. Os valores de

importância da dimensão Actividades-Rotinas não estavam associados a nenhuma das características

sociodemográficas avaliadas. Os valores de importância da dimensão Espaço-Adultos eram aqueles

que se apresentavam associados a mais variáveis sociodemográficas: foram os pais mais novos, de

nível educativo inferior, com rendimentos inferiores e que pagam menos pela creche que mais

valorizaram estes itens. Das associações descritas todas eram pequenas, à excepção da correlação

entre a importância atribuída à dimensão Espaço-Adultos e o rendimento mensal líquido do agregado,

que era moderada. Ao contrário destes resultados, no estudo de Cryer e Burchinal (1997) os valores

médios de importância atribuída pelos pais com crianças em creche aos critérios de qualidade não

variavam em função de características demográficas. Foram encontradas diferenças apenas nas

respostas dos pais das crianças em idade pré-escolar: os pais mais novos e os pais com nível inferior

de educação formal tendiam a dar maior importância aos aspectos relacionados com a saúde do que

os outros pais. Esta associação vai no sentido dos dados deste estudo, indicando que há uma

tendência para serem os pais de nível educativo mais baixo e, consequentemente, com rendimentos

mais baixos a considerarem os critérios da ITERS-R mais importantes, particularmente no que se

refere às características relacionadas com o Espaço-Adultos. De qualquer modo, é importante voltar a

referir que as associações eram na sua maioria pequenas, o que indica que as características

sociodemográficas desempenham um papel pouco importante a este nível.

À semelhança do estudo de Cryer e Burchinal (1997), os pais que participaram no presente

trabalho, através do preenchimento do questionário, atribuíram elevada importância aos itens da

ITERS-R em geral, valorizando mais os itens da dimensão Interacção-Linguagem do que os itens das

dimensões Actividades-Rotinas e Espaço-Adultos. Também através das entrevistas foi possível chegar

à conclusão que as interacções se encontram entre os aspectos mais valorizados pelos pais com

crianças em creche. No estudo qualitativo, verificou-se também que todos os pais mencionaram

critérios relacionados com as Rotinas, que incluem aspectos relacionados com a saúde e com a

segurança. No estudo quantitativo, o facto de os itens relativos às actividades (em maior número) se

incluírem na mesma dimensão que os itens relativos às rotinas pode ter contribuído para um

esbatimento dos valores médios de importância da dimensão Actividades-Rotinas, quando em

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Critérios valorizados pelos pais

309

comparação com a Interacção-Linguagem. Convém referir o relevo dado pelos pais a critérios como as

Refeições/refeições ligeiras e as Práticas de saúde/higiene, podendo ser dados alguns exemplos que o

ilustram: (a) os pais referem que as creches “têm de ter alguma atenção também em relação à

alimentação. Não é comer bem, pronto, é saber dar a alimentação às crianças desta idade. Pronto,

precisam de proteína, precisam de tudo, não é? E peixe, carne. E acho que isso elas também têm.

Nunca provei, confesso, não sei se é boa, se é bem confeccionada ou não, mas pelo menos as

ementas que eu vejo, pronto, agrada-me, gosto, tentam. Devem ter nutricionista, não sei se têm, mas

tentam pelo menos dar coisas que fazem bem às crianças nesta idade. Acho que é o fundamental (…)”

(P18 Mãe); (b) consideram que é importante “Ensinar, pronto, que eles primeiro não têm regras

nenhumas, não têm nada, e então têm que se começar a habituar (…) a ir ao pote, tem que se

começar a dar essas regras. (…) E eu acho que deviam vir sempre com eles à casa-de-banho, para

eles não ficarem na casa-de-banho sozinhos. Apesar de que eles às vezes, pronto, vêm, ficam em

grupo, mas outras vezes se estão a meio de uma actividade eles vêm sozinhos. Isso não acho, não

devia ser. Devia vir sempre alguém a acompanhá-los… [má qualidade] as crianças devem ser

mudadas de x em x horas, nem sempre o fazem, quando se vão buscar as crianças elas estão

assadas” (P7 Mãe); e (c) referem-se igualmente à higiene dos espaços e dos materiais: “A higiene,

acho muito importante a higiene, e acho que eles aqui, apesar de esta sala não estar grande coisa,

mas eu lá em baixo vejo, às vezes quando eu venho buscá-la à tarde, eles limpam isso todos os dias.

Fazem às vezes quando têm muitos vírus, muitas doenças, e tal, eles acabam por fechar e fazer

aquelas desinfecções e tal (…) E depois também não gostaria de ver uma creche que estivesse toda

suja, que cheirasse mal (…)” (P18 Mãe).

Cryer e Burchinal (1997) agruparam os itens do questionário em subescalas, tendo sido

igualmente verificado que os pais com crianças mais novas (em salas que correspondem à creche)

valorizavam mais os aspectos de saúde e de interacção, seguidos pelas questões de segurança. A

comparação entre o presente estudo e o de Cryer e Burchinal não é simples, uma vez que não foram

utilizadas as mesmas subescalas. De qualquer modo, é interessante verificar que as interacções e os

aspectos relacionados com a saúde são muito valorizados pelos pais de ambos os estudos. Esta

elevada importância atribuída à categoria Interacção, nos dados recolhidos por entrevista, e à

dimensão Interacção-Linguagem, nos dados recolhidos por questionário, é concordante com outros

estudos. Por exemplo, Pierrehumbert et al. (2002) verificaram que o aspecto que os pais mais

valorizavam numa estrutura de educação e cuidados era o estabelecimento de relações calorosas. No

presente estudo, os pais demonstraram que valorizam as interacções, referindo, por exemplo: (1) em

relação à Interacção entre pares, que desejavam para os filhos um espaço onde “convivessem com

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Capítulo VII: Discussão

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outros meninos (…) E também lá está, quando eu digo que é a base é também o grupo de amigos, o

criar laços, a partilha, alguns valores de referência. (…) E também lá está, a I. está cá este ano, mas o

meu filho está há 2 anos, vão ganhando um grupinho de amigos, de referências. (P1 Mãe); (2) em

relação à Interacção adulto-criança, que havia ali carinho entre as auxiliares e mesmo com as

educadoras (…). Eu acho que a educadora é muito importante. Ser uma educadora amiguinha deles,

que seja firme. Eu gosto muito que seja firme, porque eu acho que é muito importante haver regras.

Que seja firme, mas ao mesmo tempo amiguinha deles, não é? Que tenha jeitinho para lidar com eles.

Mas firmeza, gosto de meninos com educação.” (P2 Mãe); (3) em relação à Disciplina, que “Passa

muito pela educação, disciplina que eles têm e que não têm em casa, porque os pais cedem sempre

mais e no infantário se eles cedessem a um tinham de ceder a todos. E portanto eu sinto que eles são

muito mais disciplinados. (…) O essencial para mim é que não batam nas crianças. (…) [Má qualidade]

Também castigos em termos de fecharem as crianças, isolarem as crianças fechadas, que é uma coisa

que eu sei que acontece muitas vezes e que acho que ainda é pior do que castigo corporal (…)” (P4

Mãe); e (4) em relação às características do pessoal, que o educador “Tem que ser uma pessoa com

muita calma, paciência, isso acho que é muito importante (P6 Pai) e que as características mais

importantes têm a ver com a questão humana, com as pessoas que estão com as crianças. Não tanto a

formação, mas a dedicação, a maneira de ser” (P13 Mãe).

Com base na participação de pais portugueses, Folque (1995) verificou que de seis categorias

(de conveniência, educacional, subjectiva, estruturais, desenvolvimento da criança e necessidades

físicas da criança) as características mais valorizadas eram as que se relacionavam com o bem-estar

físico da criança. Os dados recolhidos através das entrevistas realizadas neste estudo são

coincidentes, dado que, como foi referido, todos os pais abordaram características das creches

relacionadas com as rotinas de cuidados pessoais. De uma lista de 18 as características de um serviço

de educação e cuidados consideradas mais importantes pelos pais, no estudo de Folque, foram o

ambiente saudável, a estimulação intelectual, a promoção da socialização, a formação do pessoal e a

segurança. É possível encontrar-se algum paralelo com os resultados encontrados no presente estudo

(dados recolhidos por entrevista ou por questionário). Entre os aspectos mais valorizados encontravam-

se itens que podemos relacionar com um ambiente saudável (Práticas de saúde, Mudança de

fraldas/idas à sanita, Refeições), com a promoção da socialização (Interacção adulto-criança,

Interacção entre pares, Disciplina) e, ainda, com a segurança (apenas um item, Segurança). A

formação dos profissionais não estava entre os aspectos mais valorizados pelos pais do presente

estudo. Larner e Phillips (1994) verificaram que é à medida que as crianças crescem, e se aproxima a

escolaridade obrigatória, que os pais começam a valorizar a formação dos profissionais, o que se

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Critérios valorizados pelos pais

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associa a um também maior reconhecimento da importância do desenvolvimento de determinadas

actividades, que a preparem para a entrada na escolaridade obrigatória. De facto, entre os 10 itens do

questionário mais valorizados pelos pais participantes neste estudo não se encontrava qualquer item

relacionado com as actividades desenvolvidas na creche e no estudo qualitativo apenas a subcategoria

Materiais/actividades não especificados se encontrava entre as referidas por mais pais (19 pais).

Como se referiu anteriormente, a subcategoria Actividades/materiais não especificados inclui

as referências muito gerais à promoção do desenvolvimento das crianças; por exemplo, uma mãe

referiu que a creche deveria ser “um espaço onde de facto contribuísse para um desenvolvimento

melhor dos nossos filhos” (P1 Mãe). De facto, estes pais parecem valorizar iniciativas da creche que

promovem o desenvolvimento das crianças, apesar de não as especificarem, indo no mesmo sentido

da importância atribuída pela população em geral do estudo de Coelho e Neves (2000) à possibilidade

de a creche favorecer a educação e o desenvolvimento das crianças. Nesse estudo, já descrito, os

resultados obtidos com base na participação da população em geral, ou seja, pessoas que não se

incluem no grupo dos Educadores/Auxiliares nem no grupo dos Pais, revelaram que a dimensão mais

valorizada era a Educação e Desenvolvimento, seguida pela Aquisição de Hábitos, sendo menores as

expectativas da população em geral relativas à capacidade da creche para promover a Ligação e

Cuidados. No entanto, em relação à dimensão Educação e Desenvolvimento parece haver alguma

consistência de opiniões comparativamente aos pais que participaram no presente estudo.

No que diz respeito aos dados recolhidos por entrevista e por questionário, observou-se

bastante coincidência nos itens mais e menos valorizados pelos pais. Todavia, um dos itens mais

mencionados no estudo qualitativo – o item Espaço interior – não se encontrava entre os mais

valorizados no estudo quantitativo. Os pais disseram, por exemplo, que a creche deve ter “o mínimo e

fundamental pelo menos estabelecido por lei. Quando eu digo as instalações, porque às vezes é só

fachada, também não entendo que tenha que ser topo de gama, não é? Quando eu digo, lá está,

pouco e bom. E pelo menos o estabelecido por lei, desde a dimensão das salas, ter salas que… Ser,

não digo um edifício criado de raiz, mas pelo menos com as adaptações necessárias ao espaço,

pronto, ao fim que se destina, não é? Acho que isso é importante. (…) Por exemplo, pensando em

meninos deficientes (…) Mas, por exemplo, um menino com 3 anos, só se vier ao colo, não é? É uma

das limitações, por acaso esta creche que eu já reparei, não tem rampas…” (P1 Mãe). Uma mãe referiu

que visitou uma creche com condições inadequadas, descrevendo as características que considera

importantes numa sala, em termos do espaço, e que encontrou na creche que o filho frequenta: “Olhe,

não gostei das instalações, numa delas as crianças estavam numa cave, numa cave com janelas altas,

tinha luz directa, mas pouca luz, eu achei horrível. (…) O espaço físico (…) Eu acho que aqui esta

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Capítulo VII: Discussão

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creche tem, as salas são grandes, são arejadas, são iluminadas, eu acho que é essencial” (P5 Mãe).

Provavelmente os critérios de qualidade relacionados com o espaço são aqueles que se evocam mais

imediatamente, sendo, contudo, o seu valor relativizado quando são apresentadas características

diversas e, simultaneamente, mais precisas como é o caso do questionário.

Relativamente às características consideradas menos importantes pelos pais, verificou-se que

dos 10 itens menos valorizados nos questionários, os conteúdos de 4 nem sequer foram focados nas

entrevistas, o que confirma a pouca importância que os pais lhes atribuem: Jogo de areia e água,

Promover a aceitação da diversidade, Supervisão e avaliação do pessoal e Condições para satisfazer

as necessidades profissionais do pessoal.

Relativamente ao item Jogo de areia e água, também Nunes e Melo (2006), num estudo

realizado em Évora, verificaram que era dos menos valorizados por pais com filhos em jardim-de-

infância. Poder-se-ia pensar que se trata de uma diferença cultural, isto é, que seria um item

considerado pouco importante em Portugal. Contudo, também os pais que participaram nos EUA, no

estudo de Cryer e Burchinal (1997), consideraram que este item era o segundo item menos importante

de todos os do questionário elaborado com base na ITERS e o menos importante do questionário

construído com base na ECERS. Num estudo semelhante realizado na Alemanha (Cryer et al., 2002),

verificou-se igualmente que o item Jogo de areia e água era o item do questionário construído com

base na ECERS menos valorizado pelos pais.

O item Promover a aceitação da diversidade era igualmente dos menos valorizados no estudo

de Cryer e Burchinal (1997) por pais de crianças com menos de 3 anos e era o sétimo menos

valorizado pelos pais de crianças com mais de 3 anos de idade. No estudo realizado na Alemanha era

o segundo item menos valorizado (depois do Jogo de areia e água). Cryer et al. (2004) expõem a

importância deste item numa sociedade que está a tornar-se cada vez mais diversa, com pessoas de

diferentes etnias, culturas e religiões, podendo a creche ter um papel importante na promoção da

aceitação da diversidade, através da orientação dada pela educadora, dos materiais utilizados e das

imagens e fotografias expostas na sala. Apesar de nos EUA esta situação ser mais evidente, não se

pode negar que Portugal tem vindo a receber muitas famílias provenientes de outros países,

nomeadamente de países africanos e, mais recentemente, dos países de Leste e da China. Para além

disso, quando se foca a questão da diversidade no âmbito da ITERS-R, não são apenas as diferenças

culturais que se incluem, sendo abrangido também o respeito pelas diferenças relacionadas, por

exemplo, com a idade e as (in)capacidades.

O item Oportunidades para desenvolvimento profissional encontrava-se entre os menos

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Critérios valorizados pelos pais

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valorizados no questionário, tendo sido referido nas entrevistas por um dos pais, que considerava que

os recursos humanos deveriam ser “bem formados, não é? Investir-se na formação. (…) E também lá

está uma das coisas que eu tenho reparado é que esta creche investe na formação dos auxiliares” (P1

Mãe). O facto de os itens Supervisão e avaliação do pessoal, Condições para satisfazer as

necessidades profissionais do pessoal e Oportunidades para desenvolvimento profissional se

encontrarem entre os menos valorizados no questionário poderia dever-se à pergunta colocada: “Em

que medida considera importante para o seu(sua) filho(a)?”, podendo os pais ter respondido acerca da

importância directa para a criança. Apesar de tudo, deveremos igualmente ter em conta a hipótese de

os pais não considerarem a supervisão e a formação do pessoal tão importantes como outros

aspectos, o que é apoiado pela ausência ou quase ausência de referências a estes aspectos nas

entrevistas. Recorde-se que, ao contrário do questionário, as questões colocadas nas entrevistas não

focavam as características de uma creche que seriam importantes especificamente para as crianças,

isto é, as questões permitiam que se abordassem todas as características importantes numa creche.

Por exemplo, o envolvimento dos pais (que também não se relaciona directamente com as condições

para as crianças), apesar de mencionado por 14 pais nas entrevistas (com questões mais amplas), não

se encontrava entre os mais importantes do questionário (que pergunta acerca da importância para as

crianças). Através das entrevistas os pais referiram que é importante os educadores “solicitarem a

presença dos pais e a colaboração dos pais na educação, porque eu acho que… o dizer que os pais

mandam em casa e os professores mandam na escola, ou os educadores mandam na escola, eu não

sou muito a favor disso, não é? Acho que tem que haver uma boa relação entre a escola e a família”

(P1 Mãe), valorizando a comunicação entre a creche e a família: “Eu acho que o mais importante é eles

serem transparentes, o que não acontecia cá neste infantário, começa a acontecer agora, que era,

porque muitas educadoras sobretudo cá do infantário têm aquela posição de que a relação é a relação

entre elas e as crianças e desde que cuidem bem das crianças e de que as crianças estejam bem, os

pais não têm nada a ver com isso” (P4 Mãe).

Em suma, segundo as respostas da maioria dos pais (mais de 50%) às entrevistas, uma creche

deveria ter espaço interior suficiente para o número de crianças que a frequentam, com condições de

temperatura e iluminação adequadas, e em bom estado de conservação. A alimentação e as práticas

de saúde/higiene deveriam ser providenciadas de forma cuidada. Deveriam existir nas salas materiais

adequados e deveriam ser desenvolvidas actividades diversas de modo a promover o desenvolvimento

das crianças, apesar de os pais não especificarem as actividades ou os materiais. As crianças

deveriam ter oportunidade para brincarem livremente, tanto no interior como no exterior. A maioria dos

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Capítulo VII: Discussão

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pais referiu a importância da relação entre crianças e entre os adultos e as crianças, bem como a

promoção da disciplina. Mais de metade dos pais salientou a importância do seu envolvimento na

creche e metade realçou também as características que devem ter os profissionais da creche (e.g.,

responsáveis e equilibrados). A estas características os questionários vêm acrescentar que entre os

aspectos mais valorizados pelos pais se encontram igualmente as conversas estabelecidas com as

crianças, que promovem a sua compreensão da linguagem, as práticas de segurança, a supervisão

das crianças e o momento da chegada e partida das crianças.

Relativamente a esta parte do estudo, tinha sido definida apenas uma hipótese: os critérios de

qualidade que os pais e os educadores de infância/auxiliares de educação mais valorizam são os que

se relacionam com aspectos de saúde, incluindo higiene e alimentação, e de interacção. De facto,

verificou-se que entre os aspectos mais valorizados pelos pais, simultaneamente nas respostas às

entrevistas e aos questionários, se encontravam os itens Refeições/refeições ligeiras, Mudança de

fraldas/idas à sanita, Práticas de Saúde, Interacção entre pares e Interacção adulto-criança. Entre os

mais valorizados encontrava-se ainda o item Disciplina, que pertence à subescala Interacções da

ITERS-R e à dimensão Interacção-Linguagem definida neste estudo.

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Critérios valorizados pelos educadores

315

4. Critérios de qualidade valorizados pelos educadores

Sistematizando os resultados obtidos no estudo qualitativo, importa salientar que todos os

educadores referiram as Rotinas de cuidados pessoais e as Actividades (incluindo os materiais

disponíveis) como aspectos importantes numa creche. A terceira categoria que reuniu mais consenso

foi a Interacção, seguida pelas características do Espaço e mobiliário e Outros critérios. As categorias

menos enunciadas foram Escuta e conversação, Estrutura do programa e Pais e pessoal. A categoria

Outros critérios inclui, como foi explicado, critérios que não se encontram explicitados como itens no

instrumento ITERS-R (como o número de adultos, o número de crianças, etc.).

Ao nível das subcategorias que, como foi já referido, fornecem dados mais úteis, as

características que mais educadores focaram ao descrever creches de boa ou má qualidade foram os

Materiais/actividades não especificados, os Cuidados de saúde/higiene, o Espaço interior e a

Interacção adulto – criança. Foram também bastante referidas as subcategorias Refeições/refeições

ligeiras, Jogo físico activo, Jogo livre, Práticas de segurança, Motricidade fina e Características do

pessoal. Assim, os aspectos espontaneamente evocados pelos educadores relacionam-se

maioritariamente com as rotinas de cuidados pessoais, com as actividades e os materiais

(especificando dois tipos de actividades: Motricidade fina e Jogo físico activo), com as interacções e as

características do educador, com o espaço da sala e com as actividades livres (no interior e ao ar livre).

Apenas um ou dois educadores referiram as Condições para as necessidades pessoais do pessoal, a

Supervisão e avaliação do pessoal, as Oportunidades para desenvolvimento profissional, o Material

exposto para as crianças, a Chegada/partida das crianças, a Arte, a Natureza/ciência e características

relacionadas com a Direcção/organização. Não foram referidas características correspondentes aos

itens da ITERS-R: Jogos de água e areia, Uso de TV, vídeo e/ou computador, Promover a aceitação da

diversidade, Actividades de grupo, Medidas para crianças com incapacidades e Condições para

satisfazer as necessidades profissionais do pessoal.

Através do preenchimento do questionário, os educadores atribuíram valores elevados de

importância a todos os itens da ITERS-R. Os mais valorizados relacionam-se com as rotinas de

cuidados pessoais (Mudança de fraldas/idas à sanita, Práticas de segurança, Práticas de saúde), com

as interacções e a linguagem (Interacção adulto-criança, Interacção entre pares, Disciplina, Ajudar as

crianças a compreender a linguagem, Ajudar as crianças a usar a linguagem) e com o espaço (Espaço

interior e Arranjo da sala). Coincidindo com os dados obtidos através das entrevistas, os itens menos

valorizados relacionam-se com as actividades (Uso de TV, vídeo e/ou computador, Jogo de areia e

água, Promover a aceitação da diversidade, Natureza/ciência, Blocos), com as condições para os

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Capítulo VII: Discussão

316

adultos (Supervisão e avaliação do pessoal, Condições para necessidades profissionais do pessoal,

Oportunidades para desenvolvimento profissional) e também com características do espaço

(Condições para relaxamento e conforto e Material exposto para as crianças).

Os resultados médios, calculados com base na importância atribuída à globalidade dos itens,

permitiram constatar que os educadores consideram importantes os critérios da escala. Relativamente

às dimensões da qualidade, os educadores valorizaram mais a Interacção-Linguagem do que as

dimensões Actividades-Rotinas e Espaço-Adultos.

Não foram encontradas associações estatisticamente significativas entre a importância média

ou os valores médios de importância ao nível das dimensões e as variáveis sociodemográficas dos

educadores avaliadas (idade, educação formal, experiência e salário). Também não se observaram

efeitos do tipo de instituição, da faixa etária a que a sala se destinava e do estatuto profissional do

educador nos valores de importância atribuída pelos educadores. Estes resultados indicam que a

importância atribuída pelos responsáveis pelas salas de creche a estes critérios de qualidade não varia

em função da sua idade, número de anos de educação formal, experiência profissional, estatuto

profissional ou salário, nem em função do tipo de instituição ou faixa etária do grupo de crianças.

Os dados obtidos neste estudo, através da aplicação de questionários, confirmaram as

Interacções, juntamente com a Linguagem, como critérios altamente valorizados pelos educadores. No

mesmo sentido, no estudo qualitativo quase todos os educadores abordaram o tema das interacções.

Neste âmbito, a interacção adulto-criança foi um dos critérios mais valorizados nos questionários e,

simultaneamente, foi focado por quase todos os educadores nas entrevistas. Por exemplo, um dos

educadores considera fundamental “a relação dos adultos com as crianças, em todo o percurso pré-

escolar, mas sobretudo na creche porque eles são muito pequeninos. (…) Numa creche de boa

qualidade? Mais importante, mais importante é a relação. O facto de a criança ter uma relação muito

boa, com pelo menos uma das pessoas da sala, acho fundamental, porque sem haver a relação e sem

eles se sentirem seguros não se faz mais nada. Portanto, parece-me que a relação é o fundamental.

De resto é tudo importante, mas a pedra base é esta” (Ed1 Educadora).

O item Interacção entre pares encontrava-se igualmente entre os mais valorizados pelos

educadores nos questionários, apesar de apenas cinco terem referido este aspecto nas entrevistas,

considerando um dos educadores que a promoção da relação entre crianças é um dos objectivos de

uma creche: “os objectivos de uma creche são: desenvolver a criança no aspecto social, a socialização

com os adultos, com outras crianças; desenvolver a linguagem, porque ligada ao facto da socialização

a linguagem também é um dos factores que é mais desenvolvido na creche (…)” (Ed17 Educadora).

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Critérios valorizados pelos educadores

317

Relativamente à interacção entre pares, Coelho (2004, p. 384) verificou que não era comum as

educadoras de infância explicitarem que “a criança beneficia não apenas do apoio do adulto, como

pessoa mais experiente, mas também do apoio dos pares. A interacção entre as crianças, ainda que

reconhecida genericamente como um contributo para ‘a sua socialização’ (…) [é] pouco frequente que

ela seja valorizada em função das aprendizagens que resultam dos processos interactivos que se

desenvolvem entre pares e das aprendizagens apoiadas que resultam desses processos”.

No presente estudo, e relacionado ainda com as interacções, o item Disciplina situou-se

igualmente entre os mais valorizados através do questionário, apesar de ter sido referido por apenas

25% das educadoras nas entrevistas.

Também os itens relacionados com a linguagem se situaram entre os mais valorizados nos

questionários, apesar de pouco referidos nas entrevistas pelos educadores. As referências a estes

aspectos incluíram a promoção da compreensão e da utilização da linguagem pelas crianças, como

refere uma das educadoras “Os objectivos de uma creche são: (…) desenvolver a linguagem, porque

ligada ao facto da socialização a linguagem também é um dos factores que é mais desenvolvido na

creche (…)” (Ed17 Educadora), mas também é importante a forma como os adultos comunicam: “Má

qualidade? Olhe, fracos recursos humanos, onde as pessoas gritam mais do que outra coisa. Não quer

dizer que aqui não se grite, eu não vou dizer que este é perfeito, como é evidente, acho que toda a

gente grita uma vez ou outra, mas acho que há pessoas que gritam demais. E uma creche onde as

pessoas fazem demasiado barulho, só por si já não é uma boa creche, porque acho que a criança

nesta idade não precisa de ouvir gritos, precisa é de ser acarinhada” (Ed14 Educadora).

Como foi referido, os cuidados de saúde e de segurança destacaram-se quer nas entrevistas,

quer nos questionários, tendo a categoria Rotinas de cuidados pessoais obtido referências de todos os

educadores. No estudo quantitativo, como foi referido a propósito das ideias dos pais, o facto de os

itens relativos às actividades (em maior número) se incluírem na mesma dimensão que os itens

relativos às rotinas pode ter contribuído para um esbatimento dos valores médios de importância da

dimensão Actividades-Rotinas, quando comparada com a Interacção-Linguagem. No que se refere às

Práticas de saúde/higiene, os educadores referiram-se à higiene das crianças, mas também dos

materiais e dos espaços: “Acho que é necessário todo o tipo de higiene. Ao nível da criança, o máximo

de higiene com ela própria, quando forem maiorzinhos lavarem as mãos e ter sempre a preocupação

de lavar as mãos antes de almoçar. Para os bebés ainda mais é necessário, porque eles não são

autónomos. (…) Ah, ter cuidado com as próprias canequinhas por onde eles bebem o leite, as louças,

tudo o que inclua a alimentação e eles próprios, acho que é… ter o cuidado com a desinfecção desses

materiais, que é o que ocorre aqui, porque é o que levam para a língua. Lavarem o material, e não

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Capítulo VII: Discussão

318

estou a falar só de material, pratos e assim da alimentação deles, mas também a nível de brinquedos,

os peluches, os bonequinhos de borracha, e tudo, ser tudo…” (Ed16 Educadora).

No estudo realizado por Cryer e Burchinal (1997), com pais, a categoria Saúde incluía também

os itens Refeições/refeições ligeiras e Jogo físico activo que, no presente estudo, se encontravam entre

os mais valorizados através das entrevistas aos educadores (nos questionários, apesar de

considerados importantes, não se situaram entre os itens com cotação mais elevada). Relativamente

ao Jogo físico activo, uma das educadoras queixava-se da falta de espaço: “Por exemplo, um espaço

fechado que nós não temos, que fosse equivalente àquele espaço exterior, que é um dos espaços

onde eles se sentem melhor e onde podem brincar com maior liberdade. E é dificilmente, é aquilo que

eles têm menos com os pais, pelo que a gente conhece e sabe não vão muito a parques infantis e no

Inverno ficamos um pouco reduzidas à sala.” (Ed14 Educadora). Outra educadora, que valorizava a

actividade física das crianças, referiu que havia alguma oposição ao facto de ter um escorrega na sala:

“depois também há o escorrega, que eu tenho na sala e que podia haver lá fora, com baloiços e...

Pronto, eu acho que na minha sala o escorrega está lá e tem muito sucesso, algumas pessoas criticam,

por estar um escorrega, que não é muito adequado estar dentro de uma sala, mas eu sinceramente

não vejo inconveniente nisso, porque uma área onde eles possam subir, trepar, escorregar, virarem-se

ao contrário, no fundo trabalhar a motricidade também é importante” (Ed19 Educadora).

Mais de metade das educadoras referiu também a necessidade de adoptar práticas adequadas

de segurança, “porque são crianças que se magoam muito facilmente e tem de ser tudo muito bem

escolhido, com muito cuidado para não haver acidentes. (…) E aqui todos os materiais são escolhidos

ao pormenor, até as prateleiras, as… tudo, tudo, tudo. O que se põe nos aquecedores, as tomadas…

Têm muito cuidado em escolher todo o material. (…) têm as cancelas de protecção das portas, aquelas

protecções para as portas não fecharem, não sei se reparou, tem umas coisinhas para as portas não

fecharem, os materiais dos brinquedos são escolhidos de maneira a não magoarem, a não terem

arestas, materiais de tecido. As cadeiras, as mesas com aquelas protecções de lado, não sei se

também reparou nas cadeirinhas, também são de madeira, acho que está tudo direitinho” (Ed10

Educadora).

Foram referidos até aqui os aspectos valorizados pelos educadores, nos dados recolhidos por

entrevista ou por questionário, relacionados com as interacções, a linguagem, as rotinas ou as

actividades. Contudo, neste estudo, houve ainda um item que se encontrou entre os mais valorizados

simultaneamente nos dados recolhidos por entrevista e por questionário (Espaço interior) e um item

que se encontrava entre os mais valorizados apenas nos dados recolhidos por questionário (Arranjo da

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Critérios valorizados pelos educadores

319

sala), que pertencem a outra subescala ou dimensão, a subescala Espaço e mobiliário ou a dimensão

Espaço-Adultos.

Tendo em conta que os educadores por um lado não evocaram durante as entrevistas alguns

dos conteúdos da ITERS-R (incluídos na categoria Outros critérios) e, por outro lado, referiram alguns

aspectos não incluídos na escala, estes resultados deverão ser tidos em consideração quando se

avalia o trabalho realizado actualmente nas creches em Portugal, bem como na formação destes

profissionais. Do mesmo modo, será importante ter em consideração os critérios mais e menos

valorizados no estudo que teve como base os questionários. Poderá ser pertinente tentar perceber, por

exemplo, por que razão os educadores não evocam os aspectos Jogo de água e areia e Promoção da

aceitação da diversidade, atribuindo-lhes igualmente menor importância nos questionários

comparativamente a outros itens. As Orientações Curriculares para a Educação Pré-escolar (Ministério

da Educação, 1997, pp. 77 e 81), amplamente divulgadas e às quais todos os educadores podem ter

acesso, salientam a importância da utilização da água, referindo que “as brincadeiras com água

permitem introduzir as medidas de capacidade. A utilização de diferentes utensílios que se usam para

esta forma de medição na vida corrente, desde copos graduados até embalagens de água ou leite,

permitem comparar e ordenar” e ainda “brincar com água, encher e esvaziar recipientes pode ser, por

exemplo, um meio de compreender que o ar ocupa espaço, experimentar o princípio dos vasos

comunicantes, questionar porque é que há objectos que flutuam e outros que vão ao fundo”. Também o

Despacho Normativo n.º 99/89, de 27 de Outubro de 1989, e os Guiões Técnicos da Direcção Geral da

Acção Social (Rocha et al., 1996), elaborados especificamente para as creches, alertam para a

necessidade de haver “área exterior para actividades ao ar livre, que deve conter zonas de interesse

para as crianças, nomeadamente relvados, areia e água”. Nas Orientações Curriculares é igualmente

valorizada a educação multicultural, referindo que “reconhecer laços de pertença social e cultural,

respeitando outras culturas, também faz parte do desenvolvimento da identidade” (Ministério da

Educação, 1997, p. 54).

Os educadores também não referiram, nas entrevistas, aspectos relacionados com as Medidas

para crianças com incapacidades, o que pode estar relacionado com a ainda incipiente inclusão de

crianças com incapacidades em salas de creche. Destes 20 educadores, apenas 4 tinham nas suas

salas crianças com incapacidades identificadas. Contudo, nos dados obtidos por questionário, o item

Medidas para crianças com incapacidades não se encontrava entre os menos importantes, o que pode

indicar que é valorizado, apesar de não ter sido mencionado nas entrevistas.

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Capítulo VII: Discussão

320

Os resultados obtidos nas subcategorias/itens Supervisão e avaliação do pessoal e

Oportunidades para desenvolvimento profissional suscitam também alguma preocupação, uma vez que

apenas um educador focou cada um destes aspectos na entrevista e ambos se encontram entre os

menos valorizados nos dados dos questionários. A importância da formação inicial e contínua é frisada

por diversas entidades, como a OCDE (2001), a NAEYC (1997), o Ministério da Educação, através das

Orientações Curriculares (1997), e o Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social (Rocha et al.,

1996). Relacionado ainda com os adultos, também o item Condições para satisfazer as necessidades

profissionais do pessoal foi dos menos valorizados pelos educadores nos questionários e nem sequer

foi referido nas entrevistas. Os resultados obtidos no questionário, ao nível dos itens relacionados com

os adultos, podem dever-se à formulação da pergunta “Em que medida considera importante para as

crianças?”, não se podendo dizer o mesmo relativamente às entrevistas, como foi referido na secção

relativa aos critérios valorizados pelos pais.

Dos itens da ITERS-R, houve ainda outros que se encontraram entre os menos valorizados

simultaneamente nas entrevistas e nos questionários: Material exposto para as crianças e

Natureza/ciência. O Despacho Normativo n.º 99/89, de 27 de Outubro de 1989, e os Guiões Técnicos

da Direcção Geral da Acção Social (Rocha et al., 1996) também não focam critérios neste domínio, ao

contrário das Orientações Curriculares para a Educação Pré-escolar (Ministério da Educação, 1997).

Em suma, segundo as respostas da maioria dos educadores (mais de 50%) às entrevistas,

uma creche deveria ter espaço interior suficiente para o número de crianças que a frequentam, com

condições de temperatura, iluminação e arejamento adequadas. As principais rotinas, como a

alimentação e as práticas de saúde/higiene e de segurança, deveriam ser providenciadas de forma

cuidada. Deveriam existir nas salas materiais adequados e em quantidade suficiente e deveriam ser

desenvolvidas actividades de modo a promover o desenvolvimento das crianças, em específico

actividades de motricidade fina e de motricidade global (jogo físico activo) no interior e no exterior da

creche. Deveria haver também oportunidade para as crianças brincarem livremente, tanto no interior

como no exterior. Ao nível das interacções, a maioria dos educadores salientou a importância da

relação estabelecida entre os adultos e as crianças, realçando também que os profissionais da creche

deveriam ter características adequadas ao trabalho que desempenham (e.g., serem meigos, alegres,

sensíveis).

A estas características, os questionários vêm acrescentar que os educadores dão também

muita importância às conversas estabelecidas com as crianças, que promovem a sua compreensão da

linguagem, bem como as iniciativas dos adultos que promovem o desenvolvimento da linguagem

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Critérios valorizados pelos educadores

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expressiva. Os educadores consideraram, ainda, muito importantes as interacções entre pares, a forma

como a sala está organizada e as estratégias utilizadas para promover a disciplina.

No que se refere aos critérios de qualidade valorizados pelos educadores, tinha sido definida

apenas uma hipótese: os critérios de qualidade que os educadores mais valorizam são os que se

relacionam com aspectos de saúde e de interacção. Confirma-se de facto esta hipótese, tendo sido

verificado que os aspectos mais valorizados pelos educadores, simultaneamente nas respostas às

entrevistas e aos questionários, eram: Refeições/refeições ligeiras, Mudança de fraldas/idas à sanita,

Práticas de saúde e Interacção adulto-criança. Contudo, dever-se-á acrescentar que o item Práticas de

segurança se encontrava também entre os mais valorizados.

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Capítulo VII: Discussão

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5. Qualidade das salas de creche avaliada pelos pais

Os pais que participaram neste estudo deram cotações elevadas às salas de creche que os

filhos frequentavam. A qualidade média situava-se num nível correspondente a boa qualidade, sendo

que, com base na sua avaliação, não haveria salas de qualidade inadequada, 36.4% das salas seriam

de qualidade mínima, 60.9% de boa qualidade e 2.7% de qualidade excelente. Note-se que, na

avaliação efectuada por observadores externos, 60.9% das salas foram consideradas de qualidade

inadequada.

Esta avaliação positiva efectuada pelos pais acerca dos serviços de educação e cuidados tem

sido revelada por diversos estudos. Por exemplo, Fuqua e Labensohn (1986) questionaram pais com

filhos a frequentar serviços de educação e cuidados para bebés e crianças em idade pré-escolar ou

escolar, que neste caso os frequentavam fora do horário das aulas, tendo concluído que a maioria dos

pais estava muito satisfeita com os serviços, apesar de haver uma grande percentagem que preferiria

outro tipo de estrutura se houvesse possibilidade. Shpancer et al. (2002) fizeram um estudo no qual

entrevistaram pais com crianças a frequentar o equivalente a creches ou jardins-de-infância, tendo

estes pais classificado as estruturas frequentadas pelos filhos como sendo de elevada qualidade. No

estudo publicado por Cryer e Burchinal (1997) os pais atribuíam valores médios elevados à qualidade

das salas frequentadas pelos filhos, o mesmo sucedendo no estudo realizado na Alemanha (Cryer et

al., 2002). Em Portugal, no estudo IEA, 53% das famílias revelaram-se muito satisfeitas, 45% algo

satisfeitas e 2% não muito satisfeitas com os serviços de educação de infância. Os pais portugueses

pareciam encontrar poucos problemas nos serviços (jardins-de-infância). Também em Portugal, Folque

(1995) concluiu que os pais, na sua generalidade, estavam satisfeitos com o serviço que utilizavam,

apesar de serem críticos em relação a aspectos como as actividades, o contacto com a comunidade, a

atenção individualizada e a monitorização do desenvolvimento e progresso da criança. Recentemente,

o Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social (2007b) publicou resultados do inquérito à

qualidade, adequação e satisfação dos utentes com as creches, sendo que 85% dos familiares das

crianças que as frequentam revelaram-se satisfeitos, tendo cerca de 90% atribuído as classificações de

muito bom ou bom às condições de higiene, à qualidade dos recursos humanos, à qualidade da creche

e à adequação às suas necessidades e também cerca de 90% das famílias consideraram o número de

profissionais da creche suficiente.

No presente estudo, os valores médios das três dimensões, ao nível da qualidade avaliada

pelos pais, foram superiores a 5.0, o que corresponde a qualidade boa. De acordo com a avaliação dos

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Qualidade avaliada pelos pais

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pais, as salas seriam de qualidade significativamente mais elevada na dimensão Interacção-Linguagem

do que nas dimensões Actividades-Rotinas e Espaço-Adultos. A análise ao nível dos itens permite

constatar que as características relacionadas com as Rotinas se encontram entre as que recebem

cotações mais elevadas, ao contrário das Actividades, podendo assim a análise dos resultados ao nível

das dimensões ser menos precisa.

Na avaliação efectuada pelos pais, apenas um item obteve média inferior a 3.00: o item Jogo

de areia e água. Os restantes itens obtiveram cotações correspondentes a qualidade mínima (10 itens)

ou boa (28 itens). Os itens com valores médios mais elevados (25% dos itens) pertenciam às

subescalas conceptuais Rotinas de cuidados pessoais (Chegada/partida, Refeições/refeições ligeiras,

Mudança de fraldas/idas à sanita e Práticas de saúde), Escuta e conversação (Ajudar as crianças a

compreender a linguagem e Ajudar as crianças a usar a linguagem) e Interacção (Supervisão do jogo e

da aprendizagem, Interacção entre pares, Interacção adulto-criança e Disciplina). Os itens com valores

médios mais baixos (25% dos itens) pertenciam às subescalas Actividades (Blocos, Jogo de areia e

água, Natureza/ciência, Uso de TV, vídeo e/ou computador e Promover a aceitação da diversidade) e

Pais e pessoal (Iniciativas para envolver os pais, Condições para satisfazer as necessidades pessoais

do pessoal, Condições para satisfazer as necessidades profissionais do pessoal, Supervisão e

avaliação do pessoal e Oportunidades para desenvolvimento profissional).

Estes resultados podem estar relacionados de facto com a qualidade das salas nos diversos

aspectos avaliados, mas também com a importância que os pais atribuem aos itens, como será adiante

referido. Relativamente aos itens que recebem da parte dos pais uma avaliação inferior em

comparação com os outros, será ainda de considerar que os pais podem ter atribuído uma cotação

mais próxima do valor central da escala de resposta (i.e., cotações entre Tem o básico e Bem) em itens

cujo funcionamento desconhecem, como é o caso das condições para os adultos da creche

(profissionais), o que faz diminuir os seus valores médios. No que diz respeito ao item Iniciativas para

envolver os pais, uma cotação mais baixa pode relacionar-se com o facto de ser um aspecto que os

afecta directamente e que gostariam de ver funcionar de outra forma.

Tendo em conta os resultados apresentados, destaca-se a avaliação nitidamente positiva que

os pais efectuam da qualidade das creches, especialmente no que se refere a interacções, linguagem e

rotinas, o que tem sido verificado por outros autores, como, por exemplo, Folque (1995) e Nunes e

Melo (2006). Os pais que participaram no estudo de Folque (1995) avaliaram de forma mais positiva os

factores relacionados com a conveniência (excepto os custos), com a saúde e as necessidades físicas

e com as relações, sendo mais críticos em relação a aspectos como as actividades, o contacto com a

comunidade, a atenção individualizada e a monitorização do desenvolvimento e progresso da criança.

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Capítulo VII: Discussão

324

Nunes e Melo (2006) calcularam as médias da avaliação dos pais para cada subescala conceptual da

ECERS, tendo verificado que os pais avaliavam mais positivamente as salas na subescala

Experiências de linguagem e raciocínio, seguida pela subescala Rotinas/Cuidados pessoais e, depois,

pela subescala Materiais e mobiliário.

Do mesmo modo, no estudo de Cryer e Burchinal (1997) a categoria que obteve valores

médios de qualidade mais elevados, atribuídos pelos pais com crianças em idade de creche, foi a que

se refere às Interacções, seguida pela Saúde e, depois, pela Segurança. No mesmo estudo, ao nível

dos itens, os que obtiveram avaliação mais elevada da parte dos pais foram Política de saúde, Política

de segurança, Chegada/partida, Uso informal da linguagem, Interacção com os pares, Interacção

criança-educadora, Disciplina, Coordenação olho-mão, Arte e Cooperação entre o pessoal. Mais de

metade destes itens relacionam-se com interacções, linguagem e rotinas, o que coincide com os

resultados obtidos no presente estudo. No estudo comparativo entre Alemanha e EUA (Cryer et al.,

2002), referente apenas a jardins-de-infância, entre os itens com avaliação mais elevada da qualidade

aparecem mais itens relacionados com os materiais/mobiliários e as actividades, do que nos estudos

que apresentam dados relativos à creche.

No estudo de Cryer e Burchinal (1997), os itens que obtiveram valores inferiores atribuídos

pelos pais foram: Cuidados pessoais, Mobílias usadas nas actividades de aprendizagem, Arranjo da

sala, Jogos de areia e água, Mobiliário para relaxamento e conforto, Material exposto para as crianças,

Consciência cultural, Necessidades pessoais do adulto, Oportunidades para desenvolvimento pessoal

e Área de reunião de adultos. Apesar do estudo de Cryer e Burchinal utilizar uma edição diferente da

ITERS, parece haver uma tendência para os pais, quer os portugueses quer os americanos, avaliarem

mais negativamente os itens Jogo de areia e água e Promover a aceitação da diversidade e itens

relacionados com as condições para os profissionais que trabalham na creche. Verifica-se a mesma

tendência no estudo de Cryer et al. (2002) relativo a pais com crianças em jardim-de-infância na

Alemanha e nos EUA e no estudo de Nunes e Melo (2006), realizado em Portugal.

Algumas variáveis de estrutura das salas e sociodemográficas dos pais encontravam-se

associadas30 aos resultados médios da qualidade avaliada pelos pais. O número de crianças por adulto

(ou rácio adulto-criança) aparecia associado à avaliação média efectuada pelos pais e aos resultados

médios nas três dimensões da qualidade (Interacção-Linguagem, Actividades-Rotinas e Espaço-

Adultos): foi nas salas com menos crianças por adulto que se obtiveram cotações mais elevadas.

30 As associações encontradas eram pequenas, à excepção da associação entre o rácio adulto-criança e a dimensão Interacção-Linguagem e entre a educação formal dos pais e a dimensão Espaço-Adultos, embora todas fossem estatisticamente significativas.

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Qualidade avaliada pelos pais

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Assim, os pais parecem ser sensíveis ao rácio adulto-criança, avaliando mais positivamente as salas

com rácios mais favoráveis. Foram encontradas associações entre a educação formal dos pais e a

qualidade média e também entre a educação formal e os resultados médios nas dimensões

Actividades-Rotinas e Espaço-Adultos, tendo sido atribuídas cotações mais elevadas pelos pais com

menos anos de educação formal. Finalmente, foi encontrada uma associação negativa,

estatisticamente significativa, entre o rendimento mensal do agregado familiar e os resultados médios

da qualidade na dimensão Espaço-Adultos. Possivelmente, os pais de nível educativo e de nível

económico mais elevados têm um maior nível de exigência, atribuindo cotações inferiores à qualidade

das creches, pelo menos em algumas dimensões. Pelo contrário, não foram encontrados efeitos do tipo

de instituição frequentada pelo(a) filho(a), da faixa etária do grupo a que pertence, do estatuto

profissional do educador e do género do respondente (pai ou mãe) na qualidade avaliada pelos pais.

Ao contrário deste estudo, Cryer e Burchinal (1997) verificaram que a avaliação efectuada

pelos pais de bebés e de crianças de 1 e 2 anos de idade não variava em função do seu nível

educativo e, como neste estudo (à excepção da dimensão Espaço-Adultos), não variava em função do

nível de rendimentos. Contudo, no mesmo estudo, nas salas do pré-escolar os pais de nível educativo

mais baixo atribuíam cotações mais elevadas do que os outros pais. Apoiando de algum modo os

resultados aqui obtidos, Kim e Smith (2007) verificaram que os pais de estatuto social mais baixo

avaliavam mais positivamente os serviços do que os pais de nível superior.

Neste estudo, a avaliação média efectuada pelos pais encontrava-se associada à importância

que atribuíam aos critérios de qualidade, ou seja, havia uma tendência para os pais atribuírem às salas

pontuações mais elevadas quanto mais elevados os valores de importância atribuídos. Estas

associações eram moderadas e estatisticamente significativas. No estudo de Cryer e Burchinal (1997)

foi também encontrada uma correlação positiva entre a importância atribuída pelos pais e a avaliação

que faziam da qualidade da sala. No mesmo sentido, no estudo realizado com mães alemãs verificou-

se que a avaliação da qualidade que efectuavam era influenciada pela importância relativa que

atribuíam aos aspectos da qualidade (Cryer et al., 2002). Neste estudo, as características relacionadas

com a linguagem, as interacções e as rotinas de cuidados pessoais destacaram-se no que se refere às

cotações da qualidade efectuadas pelos pais. Os critérios relacionados com as interacções e com as

rotinas de cuidados pessoais eram também os que os pais mais valorizavam. Assim, estes aspectos

assumem um valor preponderante para os pais quando questionados acerca das características de

uma creche de boa qualidade, considerando igualmente que são cumpridos (com elevada qualidade)

na creche frequentada pelos seus filhos.

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Capítulo VII: Discussão

326

As hipóteses definidas relativas à qualidade das salas avaliada pelos pais foram: (1) os pais

avaliam de forma positiva a qualidade das creches, (2) os pais de nível educativo mais baixo avaliam a

creche de forma mais positiva, não havendo associação entre a avaliação da creche efectuada pelos

pais e o rendimento do agregado familiar e (3) os pais efectuam avaliações mais elevadas nos itens

que mais valorizam.

Através das análises efectuadas neste estudo, verificou-se (1) que os pais, de facto, atribuem

cotações muito elevadas à qualidade das salas que os filhos frequentam, particularmente nos itens

relacionados com as interacções, com as rotinas de cuidados pessoais e com a linguagem, (2) que os

pais com menos anos de educação formal tendencialmente avaliam de forma mais positiva as salas de

creche (à excepção da dimensão Interacção-Linguagem, na qual não foi encontrada associação) e que

não há uma associação entre o rendimento mensal dos pais e a avaliação que efectuam (à excepção

da dimensão Espaço-Adultos que foi avaliada mais positivamente pelos pais com menor rendimento

mensal) e (3) que há uma associação positiva entre a importância atribuída aos critérios de qualidade e

a avaliação efectuada pelos pais, com base nesses critérios.

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Qualidade avaliada pelos educadores

327

6. Qualidade das salas de creche avaliada pelos educadores

Os educadores atribuíram cotações elevadas à qualidade das salas de creche onde trabalham.

Os resultados médios situavam-se num nível correspondente a boa qualidade, sendo que, com base

nessa avaliação, 1.8% das salas seriam de qualidade inadequada (valores médios entre 1.00 e 2.99),

41.8% das salas seriam de qualidade mínima (valores médios entre 3.00 e 4.99) e 56.4% de boa

qualidade (valores médios entre 5.00 e 6.99). Recorde-se que na avaliação efectuada por

observadores externos, 60.9% das salas foram consideradas de qualidade inadequada, sendo os

resultados da avaliação efectuada por educadores mais concordante com a avaliação efectuada pelos

pais.

Os valores médios da dimensão Interacção-Linguagem, avaliada pelos educadores,

correspondiam a qualidade boa e os valores médios das dimensões Actividades-Rotinas e Espaço-

Adultos eram compatíveis com qualidade mínima, apesar de muito próximos de 5.0 (4.91 e 4.97,

respectivamente). Havia diferenças estatisticamente significativas entre as médias das três dimensões,

obtendo a dimensão Interacção-Linguagem valores médios mais elevados do que as dimensões

Actividades-Rotinas e Espaço-Adultos. Foi encontrada, neste trabalho, a mesma tendência nos

resultados da avaliação efectuada pelos pais. Também o estudo realizado por Sheridan (2000), em

salas de jardins-de-infância na Suécia, permitiu verificar que os educadores que participaram no estudo

efectuaram avaliações médias das suas salas muito próximas de valores correspondentes a qualidade

boa, tendo dado cotações mais elevadas ao factor Socialização e comunicação (que inclui, entre

outros, itens relacionados com as interacções e a linguagem), seguido pelos Aspectos mistos

(Chegada/partida, Envolvimento de pais, Jogo dramático e Oportunidade para desenvolvimento

profissional) e pelo factor Espaço e material (que inclui os itens Mobiliário para a aprendizagem, Arranjo

da sala, Material exposto para as crianças e Blocos).

Na avaliação efectuada pelos educadores do presente estudo, apenas um item obteve média

inferior a 3.00: o item Jogo de areia e água. Os restantes itens obtiveram cotações correspondentes a

qualidade mínima (16 itens) ou boa (22 itens). Tal como aconteceu nas avaliações efectuadas pelos

pais os itens com valores médios mais elevados pertenciam às subescalas Rotinas de cuidados

pessoais (Chegada/partida, Refeições/refeições ligeiras, Mudança de fraldas/idas à sanita e Práticas de

saúde), Escuta e conversação (Ajudar as crianças a compreender a linguagem e Ajudar as crianças a

usar a linguagem) e Interacção (Supervisão do jogo e da aprendizagem, Interacção entre pares,

Interacção adulto-criança e Disciplina). Os itens com valores médios mais baixos pertenciam às

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Capítulo VII: Discussão

328

subescalas Espaço e mobiliário (Condições para relaxamento e conforto), Escuta e conversação

(Utilizar livros), Actividades (Blocos, Jogo Dramático, Jogo de areia e água, Natureza/ciência, Uso de

TV, vídeo e/ou computador e Promover a aceitação da diversidade) e Pais e pessoal (Supervisão e

avaliação do pessoal e Oportunidades para desenvolvimento profissional). Estes resultados podem

reflectir uma efectiva qualidade mais baixa nestes itens, mas podem também estar relacionados com a

importância que os educadores atribuem aos itens, como será adiante referido.

Não foram encontradas correlações estatisticamente significativas entre a qualidade média

resultante da avaliação efectuada pelos educadores e as variáveis de estrutura das salas e

sociodemográficas dos educadores (idade média das crianças da sala, tamanho do grupo de crianças,

número de adultos da sala, número de crianças por adulto e idade, anos de educação formal, anos de

experiência e salário do educador). Também não foram encontradas associações entre os resultados

médios ao nível das dimensões e as mesmas variáveis. A qualidade média atribuída pelos educadores

não variava em função do tipo de creche, da faixa etária do grupo de crianças e do estatuto profissional

do educador. Não foram encontrados efeitos do tipo de instituição e do estatuto profissional do

educador nos resultados médios da avaliação ao nível das dimensões Interacção-Linguagem,

Actividades-Rotinas e Espaço-Adultos. Foi encontrado um efeito da faixa etária da sala no conjunto das

três dimensões, mas não em cada uma delas quando consideradas individualmente. Assim, conclui-se

que os educadores atribuem valores de qualidade elevados às salas/creches onde trabalham,

independentemente das características de estrutura e das características sociodemográficas.

A avaliação média efectuada pelos educadores encontrava-se, sim, associada à importância

que atribuíam aos critérios de qualidade, ou seja, havia uma tendência para atribuírem à qualidade

pontuações mais elevadas quanto mais elevados os valores de importância atribuídos. A associação

entre a importância média e a avaliação média foi também encontrada nos dados relativos aos pais,

quer neste estudo, quer nos estudos de Cryer e Burchinal (1997) e de Cryer et al. (2002). Do mesmo

modo, mais de metade dos itens considerados mais importantes pelos educadores foram também

aqueles que receberam cotações de qualidade mais elevadas. Assim, neste estudo os educadores

efectuaram avaliações mais elevadas ao nível das rotinas, da linguagem e das interacções, tendo

atribuído igualmente maior importância a estes aspectos (se forem considerados os dados recolhidos

por entrevista e por questionário). Assim, estas características são consideradas muito importantes

pelos educadores, quando questionados acerca das características de uma creche de boa qualidade,

considerando igualmente que a sala de creche que orientam revela boa qualidade nesses aspectos.

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Qualidade avaliada pelos educadores

329

Será de salientar que os itens relacionados com a linguagem e as interacções são também aqueles

que dependem mais directamente das características pessoais do educador.

Foram definidas três hipóteses de investigação relacionadas com a avaliação da qualidade de

creche efectuada pelos educadores: (1) os educadores de infância/auxiliares de educação avaliam de

forma positiva a creche onde trabalham, (2) os educadores de infância/auxiliares de educação com

menos formação avaliam mais positivamente a creche onde trabalham e (3) os educadores de

infância/auxiliares de educação efectuam avaliações mais elevadas nos itens que mais valorizam. Com

base nas análises efectuadas, constatou-se que (1) de facto, os educadores de infância e auxiliares

atribuem às suas salas cotações de qualidade elevadas, compatíveis com qualidade boa, (2) ao

contrário do que se esperava, os resultados médios da avaliação da qualidade pelos educadores não

variam em função da sua formação e (3) há uma associação positiva entre a importância atribuída aos

critérios de qualidade e a avaliação efectuada pelos educadores, com base nesses critérios.

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Capítulo VII: Discussão

330

7. Comparação entre resultados dos observadores externos, dos pais e dos

educadores

Foram comparados, neste estudo, os critérios de qualidade valorizados por pais e por

educadores (respostas às entrevistas e aos questionários) e a avaliação das salas de creche efectuada

por pais, por educadores e por observadores externos.

7.1 Critérios valorizados pelos pais e pelos educadores

Como foi já referido, verificou-se que quer os pais quer os educadores, que participaram neste

estudo, referiram nas respostas às entrevistas critérios que se podem encontrar nas sete subescalas

da ITERS-R e, ainda, critérios que não se encontram claramente neste instrumento e que foram

incluídos na subcategoria Outros critérios (como o número de adultos, o número de crianças, etc.). Os

aspectos incluídos na categoria Outros critérios são maioritariamente características de estrutura da

sala, que não poderiam ser formulados de modo a serem incluídos na ITERS-R, apesar de poderem

ser relacionados com a qualidade de processo das salas. De modo a facilitar a análise e discussão,

serão focados nesta secção apenas os critérios correspondentes aos 39 itens da ITERS-R.

Os dados recolhidos através dos questionários permitiram constatar que os pais e os

educadores atribuíram elevada importância aos critérios de qualidade incluídos na ITERS-R, sendo que

ambos deram maior importância à dimensão Interacção-Linguagem, do que às dimensões Espaço-

Adultos e Actividades-Rotinas. Não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas entre

os pais e os educadores no que diz respeito à importância média atribuída aos critérios da ITERS-R e

no que diz respeito aos resultados médios da importância atribuída aos itens das três dimensões da

qualidade. Como referido anteriormente, uma análise ao nível dos itens pode fornecer uma imagem

mais precisa dos resultados obtidos.

Apesar de haver algum consenso entre pais e educadores no que se refere à importância de

vários critérios, verificaram-se algumas oscilações entre os dados obtidos por entrevista e os dados

obtidos por questionário. Assim, os itens Mudança de fraldas/idas à sanita, Práticas de saúde e

Interacção adulto-criança encontravam-se entre os mais valorizados quer pelos pais, quer pelos

educadores, nos questionários e nas entrevistas31. Contudo, os itens Interacção entre pares e

Disciplina foram dos mais valorizados simultaneamente por pais e por educadores nos questionários,

31 No estudo qualitativo, os critérios relacionados com os itens Mudança de fraldas/idas à sanita e Práticas de saúde foram incluídos numa só subcategoria Práticas de saúde/higiene.

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Comparação entre observadores, pais e educadores

331

mas apenas por pais nas entrevistas, e o item Práticas de segurança foi dos mais valorizados por pais

e por mais educadores nos questionários, mas apenas pelos educadores nas entrevistas. O Espaço

interior, as Refeições/refeições ligeiras e o Jogo livre encontravam-se entre os referidos por mais pais e

educadores nas entrevistas, mas não entre os mais valorizados nos questionários, assim como o item

Ajudar as crianças a compreender a linguagem foi dos mais valorizados nos questionários e pouco

referido nas entrevistas. Adicionalmente, entre as características referidas por mais pais nas entrevistas

encontravam-se as Iniciativas para envolver os pais e entre as mais referidas pelos educadores a

Motricidade fina e o Jogo físico activo, que não foram dos itens considerados mais importantes nos

questionários.

Alguns itens da ITERS-R não foram referidos ou foram referidos por poucos participantes nas

entrevistas e encontraram-se igualmente entre os menos importantes nos questionários. Estão nesta

situação alguns itens da subescala Actividades (Blocos, Jogo de areia e água, Natureza/ciência, Uso

de TV, vídeo e/ou computador e Promover a aceitação da diversidade) e da subescala Pais e pessoal

(Condições para satisfazer as necessidades profissionais do pessoal, Supervisão e avaliação do

pessoal e Oportunidades para desenvolvimento profissional) e um item da subescala Espaço e

mobiliário (Material exposto para as crianças). Para além destes itens, nas entrevistas foram pouco

focadas as Medidas para crianças com incapacidades e as Actividades de grupo (da subescala

Estrutura do programa) e as Condições para satisfazer as necessidades pessoais do pessoal (da

subescala Pais e pessoal).

Nas entrevistas, as maiores diferenças entre o número de pais e o número de educadores que

referiram as subcategorias verificaram-se na Interacção entre pares, na Disciplina e nas Iniciativas para

envolver os pais, referidas por mais pais, e nas subcategorias Arranjo da sala, Utilizar livros,

Motricidade fina e Jogo dramático, referidas por mais educadores. Das quatro subcategorias

mencionadas por mais educadores do que por pais, duas referem-se às Actividades. Das três

subcategorias referidas por mais pais do que por educadores, duas incluem-se nas Interacções.

Desta forma, apesar de se ter verificado uma sobreposição dos itens que os pais e os

educadores mais valorizam (como nas interacções e nos cuidados pessoais) e menos valorizam (como

em determinadas actividades), tal como foi exposto verifica-se uma ligeira tendência para os

educadores, em comparação com os pais, referirem mais aspectos relacionados com as actividades

desenvolvidas em contexto de creche (Motricidade fina, Jogo dramático e Jogo físico activo). De

qualquer modo, seria de esperar que houvesse uma diferença mais substancial entre pais e

educadores, principalmente no que se refere aos responsáveis pelas salas de creche que têm

formação (i.e., educadores de infância). De facto, ao contrário do que seria de esperar, os educadores

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Capítulo VII: Discussão

332

pouco se salientaram nos aspectos relativos a domínios mais específicos da sua formação, como seria

o desenvolvimento de actividades diversas, os materiais, o material exposto para as crianças, os livros.

Tal como acontecia nas respostas dos pais, também a maior parte dos educadores se referiu à

existência de materiais e ao desenvolvimento de actividades que promovem o desenvolvimento das

crianças, sem especificarem muito os materiais, a sua organização, ou as actividades importantes [e.g.,

“considero importante ter materiais que estimulem todo o desenvolvimento, de uma forma mais...

completa” (Ed1 Educadora)], tendo havido apenas duas actividades focadas pelo menos por metade

dos educadores nas entrevistas (Motricidade fina e Jogo físico activo). Aspectos relacionados com as

expressões plástica, dramática e musical e com os materiais expostos, os livros, os blocos, a Natureza

e a diversidade foram focados por menos de metade dos educadores. Nos questionários, nenhum dos

itens da subescala Actividades foi situado entre os mais importantes. Do mesmo modo, no estudo de

Coelho (2004), no qual participaram 14 educadoras de infância, foram os afectos e o suporte emocional

dado pelos adultos às crianças que assumiram um papel central no que se refere aos princípios que as

educadoras identificam como orientadores da sua acção na creche. A autora considera que o facto de

as educadoras de infância valorizarem muito a intuição e as componentes afectivas torna-lhes difícil

discernir em que é que se distinguem profissionalmente das auxiliares e, mesmo, do exercício da

parentalidade. Adicionalmente, um aspecto que pode ser salientado no presente estudo é a relativa

superficialidade ou pobreza da informação recolhida através das entrevistas, mesmo quando

remetendo apenas para as respostas de educadores de infância (i.e., responsáveis de sala de creche

com bacharelato, licenciatura ou pós-graduações), num contexto em que os participantes poderiam

explorar livremente e de forma aprofundada todos os critérios de qualidade que considerassem

relevantes.

Por outro lado, embora os pais e os educadores valorizem itens relacionados com as

interacções, os pais destacam-se em alguns deles, como a disciplina e o estabelecimento de relações

com outras crianças, bem como no item relacionado com o seu próprio envolvimento na creche. A

possibilidade de os filhos se relacionarem com outras crianças é vista pelos pais como um ponto forte

das creches, possivelmente por proporcionarem um tipo de interacções que as crianças não têm nas

famílias, devido ao cada vez menor número de filhos por casal e também ao menor contacto com a

família alargada. Relativamente ao item Iniciativas para envolver os pais, é compreensível haver mais

pais do que educadores que lhe dão muita importância e de facto alguns dos pais foram bastante

exaustivos na descrição do que consideram importante neste domínio. Este é um aspecto abordado

pelas Orientações Curriculares para a Educação Pré-escolar (Ministério da Educação, 1997), pelos

Guiões Técnicos da Direcção Geral da Acção Social (Rocha et al., 1996) e pelo Despacho Normativo

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Comparação entre observadores, pais e educadores

333

n.º 99/89, de 27 de Outubro de 1989, pelo que se esperaria que fosse um critério partilhado pelos

profissionais. Apesar da importância da colaboração entre pais e profissionais, Larner e Phillips (1994)

referem que poucos profissionais têm formação ou estão preparados para gerir as relações com os

pais e consideram que, mesmo com formação, é difícil para os profissionais convidar os pais a

participarem como parceiros, uma vez que isso necessariamente envolve partilha de poder e perda de

estatuto. Logsdon (1998) refere que, quando questionados acerca das formas de envolver os pais, os

educadores geralmente referem a sua participação em eventos especiais, o que, segundo a autora, é

uma perspectiva limitada, uma vez que, para criar uma parceria efectiva com os pais é necessário ter

uma definição mais abrangente, que inclua aquilo que os educadores e a instituição podem fazer pelos

pais e não apenas o contrário. Para Logsdon a comunicação é um elemento essencial, devendo ser

contínua. A autora fornece alguns exemplos de estratégias que podem tornar o envolvimento mais

eficaz, como actividades que forneçam apoio emocional aos pais. À medida que os pais são mais

envolvidos, são capazes de discutir mais facilmente com o pessoal as suas ideias e os seus valores

sobre a educação. A NAEYC (1997) considera que quanto mais nova for a criança, mais importante se

torna a promoção das relações entre os profissionais e a família da criança, de modo a que se atinjam

os objectivos partilhados por ambos. O estabelecimento de relações recíprocas entre os profissionais e

as famílias implica: (a) respeito mútuo, cooperação, responsabilidade partilhada e resolução de

conflitos, para se atingirem objectivos comuns; (b) parcerias colaborativas com comunicação regular e

frequente; (c) que os pais sejam bem-vindos e participem na tomada de decisões; (d) que os

profissionais respeitem as escolhas e objectivos dos pais, sem abdicar da sua responsabilidade

profissional; (e) apoio às famílias de forma a maximizar as suas competências de tomada de decisão;

(f) o envolvimento das famílias na avaliação de cada criança e planeamento do currículo; (g) o

estabelecimento de ligações entre as famílias e um vasto conjunto de serviços, com base em recursos,

prioridades e preocupações; (h) que educadores, pais, instituições de educação, serviços sociais e de

saúde e consultores com responsabilidades educacionais pelas crianças partilhem informação acerca

do seu desenvolvimento à medida que transitam para outro nível ou instituição. Também a OCDE

(2000) considera importante os profissionais de educação de infância terem formação adequada, de

modo a desempenharem um papel activo no envolvimento dos pais, considerando-os parceiros da

escola no desenvolvimento das crianças, o que é particularmente importante para os estabelecimentos

frequentados pelas crianças mais novas, como a creche. Jensen (1994), descrevendo os sistemas de

educação e cuidados da Dinamarca, refere que o sistema encoraja a variedade, em vez da

homogeneidade, no sentido de responder às necessidades de todos, e a autonomia de cada centro,

desde que respeite as (poucas) orientações legais, sendo os pais, as crianças e o pessoal figuras

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Capítulo VII: Discussão

334

determinantes na definição das políticas e práticas do centro. Na Nova Zelândia, no final dos anos 80, o

Ministério da Educação propôs que pais, educadores e directores de cada centro definissem um

contrato, com o Ministério, designado “charter”, no qual especificavam as políticas, filosofias e

características do centro e a forma como pretendiam trabalhar de modo a atingir um nível de qualidade

superior ao nível mínimo exigido (Smith & Farquhar, 1994). A participação dos pais foi, neste caso,

exigida pelo Ministério da Educação, permitindo este procedimento obter financiamento. Contudo,

Smith e Farquhar (1994) referem que para muitos centros foi difícil envolver os pais, mesmo recorrendo

a estratégias diversificadas. Os métodos mais eficazes de consulta dos pais foram os que não exigiam

demasiado tempo aos pais, que escolhiam horários e formatos de trabalho adaptados aos pais e cujo

conteúdo do documento tinha significado para os pais, evitando uma linguagem demasiado burocrática

ou profissional. Esta medida, apesar de ter revelado um impacto positivo ao nível da qualidade dos

centros, foi alterada pelo Governo seguinte, passando a ser exigido às instituições que cumprissem

apenas os requisitos mínimos (Smith & Farquhar, 1994).

Os resultados apresentados podem contribuir para validar o uso da ITERS-R em Portugal e

ajudar a esclarecer que as diferenças culturais não são expressivas, no que se refere às características

avaliadas por esta escala. Como foi apresentado, todos os itens foram considerados importantes. Se

há aspectos menos valorizados pelos pais e educadores portugueses, como o Jogo de areia e água ou

Promover a aceitação da diversidade, estes aspectos foram também menos valorizados por pais

americanos e alemães (Cryer & Burchinal, 1997; Cryer et al., 2002). Alguns critérios podem de facto ser

considerados mais importantes por especialistas na área, como os que contribuíram para a validação

da ITERS-R nos EUA e outros investigadores, do que por pais ou educadores, independentemente da

dimensão cultural. Note-se que, de qualquer modo, a importância média atribuída ao item Jogo de areia

e água foi de 3.75 pelos pais e 4.15 pelos educadores e a importância média atribuída ao item

Promover a aceitação da diversidade foi de 4.42 pelos pais e de 4.33 pelos educadores (numa escala

de 5 pontos). Para além disso, entre os itens menos valorizados por pais e por educadores, encontram-

se conteúdos que são focados nos principais documentos que orientam o funcionamento das creches

em Portugal (como o Jogo de areia e água, Condições para satisfazer as necessidades profissionais do

pessoal e Oportunidades para desenvolvimento profissional) e, por outro lado, os pais e os educadores

valorizam itens cujos critérios não são focados por estes documentos legais (como: Ajudar as crianças

a compreender a linguagem, Interacção entre pares, Interacção adulto-criança e Disciplina).

Contudo, existem itens da ITERS-R que são simultaneamente menos valorizados pelos pais e

pelos educadores, em comparação aos outros itens, e também não são focados pelos documentos

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Comparação entre observadores, pais e educadores

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enquadradores do funcionamento da creche: Blocos, Natureza/ciência, Uso de TV, vídeo e/ou

computador, Promover a aceitação da diversidade e Supervisão e avaliação do pessoal. Em relação

aos itens relacionados com o pessoal, como foi referido, os resultados podem dever-se à formulação

das perguntas, ou seja, talvez não se encontrassem entre os menos valorizados se a pergunta fosse

Em que medida considera importante numa creche?. Porém, deve ser salientada a importância dos

itens relacionados com a resposta da creche às necessidades dos adultos. Por exemplo, Howes e

Hamilton (1993) referem que muita da investigação incide no contexto enquanto ambiente propício ao

desenvolvimento da criança, mas os contextos de atendimento da criança são também locais de

trabalho dos adultos e as características desse contexto podem influenciar os seus comportamentos.

Relativamente aos outros itens, relacionados com as actividades (e materiais necessários para as

actividades), será ainda necessário reflectir, uma vez que esta situação levanta, mais uma vez, a

questão: terá o jardim-de-infância objectivos mais educacionais e a creche objectivos mais

assistenciais? Como já foi salientado, a divisão existente em Portugal entre creches, tuteladas pelo

Ministério do Trabalho e da Solidariedade, e jardins-de-infância, tutelados pelo Ministério da Educação,

acentua as discrepâncias mesmo nas funções atribuídas aos serviços. As próprias respostas dos pais e

dos educadores às entrevistas acabam por deixar transparecer esta ideia de que os objectivos da

creche não são tão educativos, como assistenciais. Por exemplo, uma das mães referia: “(…) a creche

para os bebés de meses, se calhar é só tomar conta deles, coitadinhos, pronto.” (P18 Mãe) e uma das

educadoras (auxiliar de educação) afirmava: “Ora bem, uma creche é para nós tomarmos conta dos

miúdos, não é? Cada vez mais é necessário, porque os pais cada vez mais são mais activos e os

próprios avós também são activos. Pronto, acho que é necessário. Os pais, muito cedo têm de deixar

os meninos e se calhar nem têm apoio dos pais, ou dos avós, neste caso, porque os avós até são da

aldeia ou são muito idosos, ou ainda trabalham, também há avós ainda que trabalham. Acho que as

creches têm muita utilidade nesse aspecto.” (Ed13 Auxiliar). Porém, foi manifestado por uma mãe

descontentamento em relação a esta situação, salientando o papel educativo da creche: “A educação,

quando eu digo a educação é a educação para os valores, que no fundo é incutir o sentido de

responsabilidade, a honestidade, esses valores que a gente tenta em casa e que de facto aqui, pelo

menos do conhecimento que a gente tem tido, faz-se isso, não é? (…) Porque é assim, na nossa

sociedade dá-se muito valor é à primária, nós não entendemos isso, porque é muito importante a

creche. Uma vez que nós optamos pela creche, é base, é base de tudo, porque a instrução vai-se

aprendendo ou melhor ou pior, mas o ser pessoa e ser uma boa pessoa exige tempo, exige dedicação

e foi uma, é uma das coisas que nos preocupava. Foi uma das razões que nos levou a colocar aqui.”

(P1 Mãe).

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Capítulo VII: Discussão

336

7.2 Qualidade avaliada por pais, educadores e observadores externos

As avaliações médias dos observadores externos e dos educadores

Neste estudo foram encontradas diferenças estatisticamente significativas entre a avaliação

média da qualidade das salas efectuada pelos observadores externos e pelos educadores, tendo os

observadores externos avaliado mais negativamente as salas de creche do que os educadores. No

mesmo sentido, foram encontradas diferenças estatisticamente significativas entre as avaliações

efectuadas por observadores externos e por educadores nas três dimensões da qualidade (Interacção-

Linguagem, Actividades-Rotinas, Espaço-Adultos), sendo as avaliações dos observadores externos

sempre inferiores às avaliações dos educadores. De facto, estas diferenças são notórias, tendo 56.4%

dos educadores considerado as suas salas de boa qualidade, quando os observadores externos não

identificaram salas de boa qualidade e cotaram apenas 39.1% das salas como tendo qualidade mínima.

No que diz respeito a avaliações da qualidade das salas de creche efectuadas por educadores,

a investigação é muito escassa. No estudo realizado na Suécia por Sheridan (2000), já referido, em

três de nove salas de jardim-de-infância os resultados médios da avaliação efectuada pelo observador

externo e pelos profissionais eram muito próximos, em duas salas os resultados da avaliação dos

observadores eram superiores e em quatro salas eram inferiores (as salas com avaliação mais elevada

do educador foram aquelas que obtiveram as cotações mais baixas da parte do observador, i.e., nas

salas com qualidade observada mais baixa, os educadores davam cotações substancialmente mais

elevadas do que os observadores). No presente estudo, a avaliação do observador foi mais elevada do

que a do educador somente numa sala (M = 2.79 vs M = 2.67). As cotações elevadas atribuídas pelos

educadores às salas que são da sua responsabilidade, significativamente superiores às dos

observadores externos, podem dever-se de algum modo a um viés protector do seu desempenho

profissional, isto é, os educadores dificilmente assumiriam que a sala que orientam é de qualidade

inadequada, pois isso colocaria em causa a sua competência a nível profissional. Por outro lado, pode

existir alguma falta de conhecimento acerca dos requisitos para se educar e cuidar das crianças em

contexto de creche, tendo em conta que grande parte da formação dos educadores de infância é

orientada para o trabalho em jardim-de-infância, pelo que realmente julgam que estão a realizar um

trabalho adequado. Esta suposição encontra algum fundamento nas respostas dos educadores às

entrevistas, que, como foi referido, foram pouco aprofundadas e pouco específicas, não se

diferenciando substancialmente das respostas dos pais. Por outro lado, os educadores cotam de forma

mais elevada a qualidade das suas salas nos critérios que consideram mais importantes, o que pode

ser um indicador de que consideram que estão a proporcionar os cuidados que mais valorizam,

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Comparação entre observadores, pais e educadores

337

podendo ser difícil admitir que não o fazem adequadamente.

Apesar de haver diferenças estatisticamente significativas entre as avaliações efectuadas por

educadores e por observadores externos, foram encontradas associações positivas de média

magnitude, estatisticamente significativas, entre as avaliações médias efectuadas por ambos.

Verificaram-se igualmente associações positivas, estatisticamente significativas, entre a avaliação dos

educadores e dos observadores nas dimensões Interacção-Linguagem (pequena magnitude),

Actividades-Rotinas (pequena magnitude) e Espaço-Adultos (média magnitude). Assim, apesar das

diferenças estatisticamente significativas encontradas entre as avaliações efectuadas por observadores

externos e por educadores, verificou-se uma tendência para os educadores avaliarem mais

positivamente a sala quando o observador externo também o fazia (e vice-versa), principalmente na

dimensão Espaço-Adultos. Este resultado indica que nos itens que mais se relacionam com as

condições proporcionadas pela instituição e são menos dependentes do trabalho do educador, há uma

maior tendência para os educadores e os observadores externos avaliarem a creche no mesmo

sentido, apesar de continuarem a ser mais elevadas as cotações dos educadores. Essa tendência é

menor nos itens relacionados com a linguagem, as interacções, as rotinas de cuidados pessoais e as

actividades. Este facto pode reforçar a ideia exposta de que as elevadas cotações atribuídas pelos

educadores se podem dever a uma tentativa de protecção do desempenho profissional e do sentido de

competência pessoal, dado que acabam por constituir, em certa medida, uma auto-avaliação.

As avaliações médias dos observadores externos e dos pais

Foram também encontradas neste estudo diferenças estatisticamente significativas entre a

avaliação média da qualidade efectuada pelos observadores externos e pelos pais, tendo os

observadores externos avaliado mais negativamente as salas de creche do que os pais. Do mesmo

modo, foram encontradas diferenças estatisticamente significativas entre as avaliações efectuadas por

ambos nas três dimensões da qualidade (Interacção-Linguagem, Actividades-Rotinas, Espaço-Adultos),

sendo as avaliações dos observadores externos sempre inferiores às avaliações dos pais. Estas

diferenças têm um significado relevante, sendo de salientar que enquanto 63.6% dos pais consideram

que as salas são de boa ou de excelente qualidade, os observadores externos dão apenas cotações

correspondentes a qualidade inadequada (60.9% das salas) ou mínima (39.1%). Mesmo tendo em

conta a diferença de instrumentos utilizados, as discrepâncias são notórias e têm sido apoiadas por

vários estudos. Por exemplo, Cryer e Burchinal (1997) encontraram diferenças substanciais entre as

avaliações feitas pelos pais e pelos observadores, nos EUA, sendo que os pais efectuavam avaliações

significativamente mais elevadas do que os observadores externos. Foram obtidos resultados

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Capítulo VII: Discussão

338

semelhantes no estudo realizado na Alemanha (Cryer et al., 2002). No mesmo sentido, Shinn et al.

(1990), num estudo realizado em Atlanta (EUA), verificaram igualmente que as mães estavam muito

satisfeitas com os serviços prestados, apesar de se tratar de centros considerados de baixa qualidade

mediante avaliação externa, não cumprindo sequer os critérios mínimos relacionados com o número de

crianças, o rácio adulto-criança ou a formação dos profissionais.

Por outro lado, no presente estudo, foram encontradas associações positivas, estatisticamente

significativas, entre a avaliação média das salas efectuada pelos pais e pelos observadores externos

(pequena magnitude). Verificaram-se igualmente associações positivas fracas (pequena magnitude)

entre a avaliação dos pais e dos observadores externos nas dimensões Actividades-Rotinas e Espaço-

Adultos, mas não na dimensão Interacção-Linguagem. Apesar das diferenças estatisticamente

significativas encontradas entre as avaliações efectuadas por observadores externos e por pais,

verificou-se, portanto, uma pequena tendência para os pais avaliarem mais positivamente a sala

quando o observador externo também o fazia (e vice-versa) nos itens das dimensões Actividades-

Rotinas e Espaço-Adultos, mas não nos itens relacionados com a linguagem e com as interacções. De

qualquer modo, deve ser tida em consideração a pequena magnitude das associações encontradas. À

semelhança dos resultados deste estudo, Cryer e Burchinal (1997) encontraram associações fracas,

estatisticamente significativas, entre a avaliação efectuada por observadores externos e por pais, quer

nas salas para crianças em idade de creche, quer nas salas do pré-escolar. No estudo efectuado com

mães na Alemanha encontrou-se uma associação positiva fraca, estatisticamente significativa, entre os

valores médios de qualidade avaliada pelos observadores externos e as cotações médias das mães,

mas apenas quando se entrava com a média das avaliações das diversas mães referentes à mesma

sala (e não quando se consideravam as mães individualmente) (Cryer et al., 2002). Os autores

consideram que estes resultados indicam que, embora pais e especialistas nesta área valorizem os

mesmos critérios de qualidade, os pais parecem ter dificuldade em diferenciar entre programas de

diferente qualidade. Este facto é confirmado neste estudo pelas associações fracas encontradas e,

especialmente, pela ausência de correlação estatisticamente significativa na dimensão Interacção-

Linguagem.

Cryer et al. (2002) atribuem as diferenças encontradas entre observadores e pais a diversos

factores como: (1) os pais não passam muito tempo a observar as instituições que os filhos frequentam;

(2) os pais estão limitados em termos de escolha, não conhecendo outras instituições que constituiriam

termos de comparação; (3) os requisitos para se cuidar das crianças em centros são diferentes dos

requisitos para se cuidar das crianças em casa (e.g., fazer a supervisão de um grupo grande de

crianças no recreio é mais exigente do que a supervisão que os pais habitualmente fazem em casa), o

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Comparação entre observadores, pais e educadores

339

que pode fazer com que os pais e os observadores partam de bases de conhecimento diferentes; e (4)

os pais cotam de forma mais elevada a qualidade das salas nos aspectos que consideram mais

importantes, o que pode ser um indicador de que acreditam que a creche está a providenciar os

cuidados que eles valorizam e que seria difícil admitirem (perante os outros e perante eles mesmos)

que colocaram conscientemente os filhos numa creche que não fornece o que é importante. Shpancer

et al. (2002), no estudo já apresentado, concluíram que os pais avaliavam as instituições frequentadas

pelos filhos como sendo de elevada qualidade e que a avaliação que faziam daquela creche em

particular era superior à avaliação que faziam da generalidade das instituições do seu estado (Ohio).

Os autores consideram que os pais acreditam que foram capazes de escolher um centro de boa

qualidade, entre as ofertas disponíveis que eram de qualidade mediana. O Cost, Quality and Child

Outcomes in Child Care Centers (1995) identificou também algumas razões que podem levar os pais a

exigir pouco dos serviços de educação e cuidados, como o facto de a localização e os custos serem

tão importantes para os pais que, na realidade, não têm muitas possibilidades de escolher um serviço

de elevada qualidade, ou o facto de os pais não estarem numa boa posição para avaliarem os serviços,

dado que não são eles os verdadeiros consumidores. Uma vez escolhido o serviço, no qual confiam, os

pais podem sobrestimar a qualidade e continuar a utilizá-lo, apesar de não ser tão bom como pensam

que é (Cost, Quality & Child Outcomes Study Team, 1995).

Todas estas razões são válidas para justificar as avaliações extremamente elevadas

efectuadas pelos pais que participaram neste estudo. No que se refere, por exemplo, às possibilidades

de escolha dos serviços, basta relembrar a reduzida taxa de cobertura das estruturas formais para

crianças com menos de 3 anos de idade, que se situava em 2003 nos 21.5% (Instituto da Segurança

Social, 2005a) e a elevada taxa de utilização das creches, superior a 90% (Ministério do Trabalho e da

Solidariedade Social, 2007a). A acrescentar a esta situação, há que referir que os resultados do

inquérito à qualidade, adequação e satisfação incluído na Carta Social de 2005 (Ministério do Trabalho

e da Solidariedade Social, 2007b) revelam que a proximidade da residência foi o principal motivo para a

escolha da creche de 27.4% dos familiares dos utentes das creches e a proximidade do local de

trabalho foi a segunda razão mais referida, sendo apontada por 21.4% dos familiares dos utentes. A

qualidade dos serviços prestados e a adequação dos serviços face às necessidades dos utentes era o

terceiro motivo apontado (18%).

Considerando que os pais podem ter um papel importante enquanto consumidores dos

serviços de educação e cuidados, Mitchell et al. (1992) defendem a promoção de programas de

educação do consumidor, que lhes permita efectuar melhores escolhas e, assim, promover no mercado

a produção de melhores serviços. Estes autores consideraram que, para serem eficazes, esses

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Capítulo VII: Discussão

340

programas precisam de dar aos pais aquilo que eles precisam de saber, nos momentos em que mais

precisam (e.g., quando nasce a criança, quando a mãe consegue um emprego) e de um modo que

permita aos pais receberem, compreenderem e utilizarem a informação. A informação deve ser

fornecida aos pais de uma forma simples, mas detalhada, e se possível através de um contacto

pessoal (Mitchell et al., 1992). Relativamente às formas de tornar os pais mais conscientes da

qualidade dos centros e de os ajudar na escolha dos serviços, Bogat e Gensheimer (1986) chegaram à

conclusão que fornecer aos pais listas de verificação para os ajudar a determinar as características dos

centros não é suficiente, porque poucos pais dedicam o tempo necessário ao seu preenchimento. Cryer

et al. (2002) fornecem um conjunto de sugestões que poderiam fortalecer os pais na selecção de

programas de elevada qualidade: (1) dar aos pais informação aprofundada sobre a qualidade, pois,

apesar de os pais valorizarem os mesmos critérios que os profissionais, podem estar a defini-los de

uma forma diferente; (2) os pais deveriam ter oportunidade para observar as salas/instituições que os

filhos frequentam; e (3) deveriam ser disponibilizados aos pais resultados de avaliações externas das

instituições que os filhos frequentam ou podem vir a frequentar. De qualquer modo, os autores alertam

para a subjectividade e enviesamento emocional envolvidos numa avaliação efectuada pelos pais,

afirmando que, provavelmente, não se pode esperar que os pais avaliem de forma precisa as creches

que os filhos frequentam.

No estudo desenvolvido nos EUA, Cryer e Burchinal (1997) pensaram que as diferenças

encontradas entre observadores e pais poderiam dever-se aos instrumentos utilizados, uma vez que os

observadores avaliaram as salas com base na ITERS e na ECERS e os pais responderam com base

num questionário que, apesar de conter os itens das escalas, tinha um procedimento de cotação

diferente. Apesar de não ser apresentado nesse artigo, Cryer (1994), na sua tese de doutoramento que

lhe deu origem, descreve que em 18 das salas avaliadas houve um segundo observador (que conhecia

também as escalas de avaliação do ambiente) a cotar o questionário, como se fosse uma grelha de

observação, para verificar se conduzia a resultados semelhantes. Não foram encontradas diferenças

significativas entre as duas avaliações. Neste estudo, foi utilizado um procedimento semelhante, já

descrito (ver Capítulo VII: 6.3 Qualidade avaliada por pais, educadores e observadores externos),

optando por ter como segundo observador uma educadora de infância que não conhecia as escalas de

avaliação da qualidade, de modo a estar numa situação mais próxima dos pais e dos educadores que

também preencheram os questionários sem conhecerem a ITERS-R. Foi encontrada uma associação

positiva entre os resultados da avaliação das salas efectuada pelos observadores externos utilizando a

ITERS-R e pelo observador que utilizou o questionário, não tendo sido encontradas diferenças

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Comparação entre observadores, pais e educadores

341

estatisticamente significativas entre estas duas avaliações; foram encontradas diferenças

estatisticamente significativas entre os resultados da avaliação efectuada pelo observador externo

utilizando o questionário e da avaliação efectuada por pais e educadores, que também preencheram o

questionário. Assim, as diferenças devem-se, possivelmente, a outros factores que não o tipo de

instrumento utilizado, apesar de se reconhecer que o procedimento de cotação da ITERS-R é mais

restritivo que o do questionário.

Cryer e Burchinal (1997) colocaram também a hipótese de que a diferença encontrada entre as

avaliações dos pais e dos observadores seria mediada pela dificuldade dos itens, ou seja, a diferença

seria menor em aspectos que se avaliam mais facilmente (e.g., mobiliário) e maior em aspectos que

não são tão facilmente avaliados (e.g., utilização da linguagem com a criança). Verificaram que, de

facto, havia maior discrepância entre a avaliação de pais e de observadores no grupo de itens

dificilmente avaliados. No presente estudo, tal não se verificou. Foram criados dois grupos de itens, um

com os itens em relação aos quais maior número de pais teve dificuldade na resposta e um grupo de

itens em relação aos quais houve menos pais a apontarem dificuldade na resposta. Não foram

encontradas diferenças estatisticamente significativas na discrepância das avaliações de pais e de

observadores entre esses dois grupos de itens, ou seja, em função da dificuldade relatada pelos pais

no seu preenchimento dos itens. Este resultado indica, assim, que independentemente da dificuldade

revelada pelos pais, as diferenças entre cotações dos observadores e dos pais se mantêm. Este

resultado é, aliás, concordante com o que Shpancer et al. (2002) verificaram, ou seja, que os pais

avaliavam as instituições frequentadas pelos filhos como sendo de elevada qualidade, apesar de

reconhecerem que tinham falta de conhecimento acerca da instituição.

As avaliações médias dos pais e dos educadores

Foram ainda comparados neste estudo os dados médios da avaliação global das salas

efectuada pelos pais e pelos educadores, não tendo sido encontradas diferenças estatisticamente

significativas. Verificou-se igualmente que não havia diferenças estatisticamente significativas entre as

avaliações dos pais e dos educadores nas três dimensões da qualidade (Interacção-Linguagem,

Actividades-Rotinas, Espaço-Adultos). Quer os pais quer os educadores consideraram que as salas

tinham qualidade mínima ou boa, sendo que apenas dois educadores consideraram que as suas salas

não estavam Nada bem nos itens avaliados e 3 pais consideraram a sala frequentada pelos filhos de

excelente qualidade. Como foi apresentado, investigações realizadas anteriormente indicam que os

pais tendencialmente avaliam de forma positiva as salas que os filhos frequentam e de forma mais

elevada do que os observadores externos (e.g., Cryer & Burchinal, 1997; Cryer et al., 1999). Apesar de

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Capítulo VII: Discussão

342

se esperar que também os educadores avaliassem de forma positiva as salas onde trabalham e lhes

dessem cotações mais elevadas do que os observadores externos, esperava-se que entre educadores

e pais houvesse alguma diferença, nomeadamente pelo facto de os educadores conhecerem melhor as

suas salas do que os pais e por se assumir que seriam substancialmente mais exigentes do que os

pais. De facto, apesar de não se terem verificado diferenças estatisticamente significativas entre as

avaliações dos pais e dos educadores, não foram encontradas associações estatisticamente

significativas entre as duas avaliações, o que indica que não vão sempre no mesmo sentido (i.e.,

embora os valores médios das avaliações efectuadas pelos pais e pelos educadores não

apresentassem diferenças estatisticamente significativas, em alguns casos os educadores atribuíram

cotações elevadas e os pais atribuíram cotações baixas e em outros casos verificou-se a

situação inversa). A adicionar a este aspecto, há também a correlação mais elevada entre as

avaliações médias dos educadores e dos observadores externos (de média magnitude) do que entre as

avaliações médias dos pais e dos observadores externos (de pequena magnitude). No entanto, estes

resultados não correspondem totalmente ao que era esperado, ou seja, que haveria diferenças

estatisticamente significativas entre as cotações de educadores e as cotações de pais.

Comparação entre as avaliações de pais, observadores e educadores ao nível dos itens

Comparando a avaliação efectuada por pais, por educadores e por observadores externos ao nível

dos itens verifica-se uma tendência para os pais e os educadores atribuírem, igualmente, cotações

mais elevadas do que os observadores externos. De facto, todos os itens tiveram médias mais

elevadas na avaliação dos pais e dos educadores do que na avaliação dos observadores, tendo sido

verificado o mesmo nos estudos com pais, realizados por Cryer e Burchinal (1997) e Cryer et al. (2002).

Sheridan (2001), num estudo semelhante, mas com educadores de jardim-de-infância, verificou que em

geral era aos itens que dependiam da sua capacidade de interagir com as crianças e dos seus métodos

de trabalho que os educadores davam cotações mais elevadas. Nos itens que dependiam do espaço,

dos materiais, do mobiliário ou do arranjo da sala, as cotações dos educadores eram inferiores às do

observador. Como foi referido, também neste estudo se verificou uma tendência semelhante, tendo

sido encontrada uma associação moderada entre a avaliação de educadores e observadores na

dimensão Espaço-Adultos, mas uma associação pequena nas dimensões Interacção-Linguagem e

Actividades-Rotinas. Mesmo ao nível dos itens, há uma tendência para se encontrarem valores menos

díspares nos das subescalas conceptuais Espaço e mobiliário e Pais e pessoal.

Analisando apenas os 10 itens que obtiveram dos pais e dos educadores avaliações mais

elevadas (com médias superiores a 5.79), verifica-se que 6 foram avaliados pelo observador externo

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Comparação entre observadores, pais e educadores

343

como sendo de qualidade mínima (Ajudar as crianças a compreender a linguagem, Ajudar as crianças

a usar a linguagem, Supervisão do jogo e da aprendizagem, Interacção entre pares, Interacção adulto-

criança e Disciplina) e 4 de qualidade inadequada (Chegada/partida, Refeições/refeições ligeiras,

Mudança de fraldas/idas à sanita e Práticas de Saúde). Parece, assim, haver pouca correspondência

entre os aspectos da sala/creche que na opinião dos pais e dos educadores funcionam melhor e aquilo

que um observador externo avalia. Mesmo tendo em conta as diferenças nos instrumentos, estes

resultados exigem uma análise cuidadosa, devendo ser evitada a justificação fácil de que todas as

diferenças se devem aos instrumentos utilizados ou que a escala ITERS-R é demasiado exigente. Para

reflectir melhor acerca deste facto, será apresentado, como exemplo, o item Mudança de fraldas/idas à

sanita. Em 110 salas, 105 tiveram a cotação 1 na ITERS-R, o que significa que pelo menos uma das

seguintes condições estava presente: (1) as condições básicas de higiene raramente são mantidas

(e.g., fraldas não colocadas no lixo adequadamente; autoclismos não puxados); (2) problemas

importantes na resposta às necessidades básicas de mudança de fraldas/idas à sanita (e.g., fraldas

raramente mudadas; crianças obrigadas a ficar sentadas na sanita durante muito tempo, falta de

produtos); (3) lavagem de mãos dos adultos ou das crianças frequentemente negligenciada depois da

mudança de fraldas/idas à sanita; e (4) supervisão desadequada ou desagradável das crianças. Nos

questionários, neste item, perguntava-se como estava a sala nos seguintes aspectos: (1) fraldas

mudadas quando necessário; (2) condições de higiene mantidas (desinfecção do lavatório/banca, água

quente corrente, superfícies limpas); (3) condições adequadas e de fácil acesso; (4) educadores e

crianças lavam as mãos depois da mudança de fraldas/idas à sanita; (5) interacções agradáveis entre

educadores e crianças; (6) promoção da autonomia das crianças; e (7) os educadores acompanham as

crianças, de acordo com as suas capacidades, para que façam tudo correctamente (por exemplo, lavar

as mãos, puxar o autoclismo). Nas 105 salas que obtiveram a cotação de 1 na ITERS-R, apenas um

educador avaliou a sala como estando Nada bem neste item, enquanto que todos os outros

educadores e todos os pais consideraram que as salas tinham pelo menos o básico, sendo que 65

educadores e 59 pais deram uma cotação de 5 ou 6 (o 5 corresponde a Muito bem) e 35 educadores e

43 pais deram a cotação máxima de 7 (correspondente a Excelente). Há, assim, de facto uma

discrepância acentuada entre os dados da observação que indicam que não estão a ser cumpridos

cuidados básicos de higiene e as respostas dos pais e dos educadores que indicam um bom ou

excelente funcionamento de mais de 80% das salas de creche em indicadores semelhantes.

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Capítulo VII: Discussão

344

Apreciação global ao nível dos itens: avaliações efectuadas e importância atribuída

Como foi referido, verificou-se que havia uma associação entre os valores médios de importância

atribuída pelos pais e pelos educadores aos critérios da qualidade (nos questionários) e a avaliação

que efectuavam da qualidade das salas. Do mesmo modo, verificou-se alguma coincidência entre os

itens considerados mais importantes e os itens que recebiam melhor avaliação dos pais e dos

educadores, sendo menor a correspondência com a qualidade observada (ver

Quadro 50). Assim, no conjunto dos 39 itens, e tendo em conta os diversos resultados obtidos

no estudo, será importante identificar alguns que se evidenciam.

Os itens relacionados com as rotinas são, em geral, muito valorizados (exceptuam-se a

Chegada/partida e a Sesta), são avaliados de forma muito positiva pelos pais e pelos educadores e

obtêm valores muito baixos na avaliação do observador externo (Refeições/refeições ligeiras, Mudança

de fraldas/idas à sanita, Práticas de saúde e Práticas de segurança).

Os itens relacionados com a Linguagem (à excepção do item Livros) e as Interacções obtêm

cotações elevadas ao nível da importância atribuída pelos pais e pelos educadores nos questionários,

valores da avaliação efectuada por pais e por educadores elevados e valores também mais elevados

(apesar de ser considerada qualidade mínima) na avaliação efectuada pelo observador externo (Ajudar

as crianças a compreender a linguagem, Ajudar as crianças a usar a linguagem, Interacção entre pares

e Interacção adulto-criança).

Os itens relacionados com os adultos, subescala Pais e pessoal (com a excepção dos itens

Iniciativas para envolver os pais, Supervisão e avaliação do pessoal e Oportunidades para

desenvolvimento profissional), encontram-se entre os menos valorizados pelos pais e pelos

educadores e, simultaneamente, recebem dos mesmos cotações da qualidade mais baixas, mas

encontram-se entre os que obtiveram médias mais altas na avaliação do observador externo

(Condições para satisfazer as necessidades pessoais do pessoal, Condições para satisfazer as

necessidades profissionais do pessoal, Interacção e cooperação entre o pessoal e Continuidade do

pessoal). Os itens Supervisão e avaliação do pessoal e Oportunidades para desenvolvimento

profissional encontravam-se igualmente entre os menos valorizados e entre os que recebiam dos pais e

dos educadores uma avaliação inferior da qualidade, mas não pertenciam aos 25% de itens de

qualidade mais baixa, apesar de na ITERS-R terem cotações equivalentes a qualidade inadequada. Os

resultados destes dois itens continuam a fazer salientar a necessidade de se reflectir seriamente sobre

a formação dos profissionais, bem como sobre o seu acompanhamento. Frede (1995) numa revisão de

vários estudos, que visava identificar elementos comuns que podiam ser críticos para a eficácia do pré-

escolar, verificou que um desses elementos essenciais era exactamente o apoio oferecido aos

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Comparação entre observadores, pais e educadores

345

profissionais de modo a reflectirem sobre as suas práticas e a melhorá-las.

Os itens relacionados com as Actividades encontram-se entre os menos valorizados pelos

pais e pelos educadores, recebendo valores mais baixos ao nível da qualidade avaliada por pais e por

educadores e obtendo, simultaneamente, médias muito baixas na avaliação efectuada pelo observador

externo (Blocos, Jogo de areia e água, Natureza/ciência, Uso de TV, vídeo e/ou computador e

Promover a aceitação da diversidade). Em situação semelhante encontrava-se o item Livros da

subescala Escuta e conversação.

A elevada valorização e avaliação pelos pais e pelos educadores dos itens relacionados com

as rotinas de cuidados pessoais e com as interacções, aliada à menor valorização e avaliação dos itens

relacionados com as actividades e com as oportunidades para desenvolvimento profissional do

pessoal, reforça a ideia de que continua a associar-se ao contexto de creche essencialmente a função

social ou assistencial (i.e., a função de cuidar das crianças), enquanto que a função educativa

pertencerá ao jardim-de-infância. Relativamente às actividades e aos materiais necessários para a

realização das actividades nota-se, de facto, pouco investimento na maioria das creches. Contudo,

verifica-se que as creches evidenciam também muitas falhas no que diz respeito aos cuidados

pessoais (rotinas). Assim, além de a qualidade observada se poder relacionar com a importância

atribuída às características em causa, poderá haver também um desconhecimento generalizado acerca

das práticas adequadas em contexto de creche.

As hipóteses definidas neste estudo, relacionadas com a comparação entre resultados dos

pais, dos educadores e dos observadores externos foram: (1) os pais e os educadores de

infância/auxiliares de educação efectuam avaliações da qualidade da creche mais elevadas do que os

observadores externos e (2) os pais efectuam avaliações da qualidade da creche mais elevadas que os

educadores de infância/auxiliares de educação.

A primeira hipótese foi confirmada: quer os pais, quer os educadores avaliaram de forma mais

positiva, em média, as salas de creche do que os observadores externos. Atendendo às três

dimensões da qualidade, foram também encontradas diferenças estatisticamente significativas.

Contudo, entre educadores e pais não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas nas

avaliações médias e nas avaliações ao nível das três dimensões.

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Capítulo VII: Discussão

346

8. Considerações finais

Na conclusão deste trabalho, torna-se indispensável reflectir acerca das suas limitações e

mais-valias, contribuindo para balizar possíveis interpretações dos resultados obtidos e para a

investigação que futuramente se possa realizar neste domínio. Algumas das limitações foram já

referidas ao longo da discussão.

A amostra de creches utilizada tinha um tamanho razoável, tendo em conta a exigência do

procedimento de recolha de dados, principalmente no que se refere à observação das salas para

cotação da ITERS-R e para avaliação do Envolvimento de Grupo. Como foi descrito, nas salas em que

se avaliou o Envolvimento de Grupo foi necessário efectuar observações em dois dias diferentes,

sendo que um deles coincidiu com a observação para cotação da ITERS-R. O procedimento de recolha

de dados prolongou-se por um ano, tendo envolvido três observadores. Assim, o número de

salas/creches participantes pode ser considerado uma mais-valia, tendo em consideração a exigência

do processo de recolha de dados, bem como o reduzido número de creches que, em Portugal, têm

habitualmente os estudos que recorrem a medidas de observação. Por outro lado, o número de

creches pode ser considerado limitado se se considerar que há autores que sugerem que para uma

análise de componentes principais dever-se-ia dispor de 10 participantes por item (o que exigiria 390

salas de creche, tomando como referência os 39 itens da ITERS-R) ou, pelo menos, de um total de 300

participantes (ver Field, 2005). De qualquer modo, Field (2005) refere que grupos de 100 a 200

participantes têm-se revelado adequados, com comunalidades na ordem de .5, e que 100 participantes

podem ser suficientes, no caso de comunalidades superiores a .6. Neste estudo, mais de metade das

comunalidades eram superiores a .6, havendo contudo itens com comunalidades na ordem de .5 e um

item com valor inferior. Os factores de ordem prática e económica limitam, sem dúvida, o tamanho da

amostra, justificando a opção por utilizar 160 creches para o estudo da ITERS-R e das características

métricas dos dados que esta escala permite obter, mas apenas 110 creches para prossecução dos

restantes objectivos do estudo. Esta opção não perturbou a recolha de dados ou a sua análise, mas

dificultou a redacção desta dissertação, podendo comprometer a compreensão do trabalho realizado.

Ainda em relação às creches participantes neste estudo, é importante salientar que os dados

foram recolhidos apenas em creches do distrito do Porto, não permitindo obter uma imagem da

qualidade das salas de creche a nível nacional. Recorde-se que no estudo ECCE foram encontradas

assimetrias regionais ao nível da qualidade dos jardins-de-infância (ECCE Study Group, 1997).

Relativamente aos educadores, não foi critério de constituição da amostra obter igual número

de educadores de infância e de auxiliares de educação, responsáveis por salas de creche. De igual

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Considerações finais

347

forma, também não foi critério de amostragem ter igual número de pais e de mães ou ter representação

semelhante de diferentes níveis educativos ou de diferentes níveis de rendimentos do agregado

familiar. Esses cuidados poderiam ter tornado mais ricas e rigorosas as comparações entre grupos e as

associações entre diversas variáveis. De facto, no que diz respeito aos níveis educativo e económico

dos pais participantes, eles não são representativos dos pais com crianças em idade de creche. Note-

se que os pais foram seleccionados aleatoriamente, a partir da listagem de crianças de cada sala,

sendo metade de IPSS e metade de instituições com fins lucrativos. O nível educativo e o nível de

rendimentos dos pais com filhos em creches com fins lucrativos são muito elevados e nas IPSS

também há alguns nestas condições, o que, conjugando com o facto de poder ter havido um efeito de

auto-selecção provocado pelas recusas de alguns pais, pode inflacionar estas médias. Apesar destas

limitações, a selecção dos procedimentos de análise de dados teve sempre em consideração as

características dos dados, nomeadamente no que diz respeito à normalidade das distribuições e à

existência de outliers.

Quando este projecto foi delineado, pensou-se no envolvimento de pessoas que pudessem

contribuir para identificar as características que definem uma creche de boa qualidade. Assim, foram

convidados a participar neste estudo os pais de crianças que frequentam creches e os educadores

(educadores de infância e auxiliares) que trabalham em creches. Por se tratar do ambiente de creche,

destinado a crianças até aos 3 anos de idade, considerou-se pouco adequado tentar recolher as

opiniões das crianças que frequentavam estes contextos. Outros estudos poderão tentar focar este

aspecto, não necessariamente envolvendo as crianças que frequentam a creche, mas, por exemplo,

entrevistando crianças do jardim-de-infância acerca da creche. Recorde-se o projecto referido por

Langsted (1994) que recolheu a opinião de adolescentes acerca dos serviços para crianças mais novas

e que apresentou resultados muito interessantes.

Neste estudo tentou conjugar-se a utilização de métodos qualitativos com a utilização de

métodos quantitativos, o que representa uma mais-valia. Contudo, a utilização da entrevista poderia ter

sido mais proveitosa, por exemplo: (1) solicitando que os educadores e os pais aprofundassem mais

cada uma das ideias transmitidas, evitando a utilização de subcategorias “não especificadas”, (2) após

o preenchimento do questionário, poderiam ter sido conduzidas entrevistas de modo a obter a

clarificação ou justificação de algumas das respostas assinaladas no questionário, e (3) após a

transcrição das entrevistas, poder-se-ia “devolver” a informação aos pais e aos educadores, de modo a

esclarecer o seu conteúdo e a fortalecer a análise e discussão dos dados obtidos, procedimento que

tem sido adoptado em diversos estudos (e.g., Coelho, 2004). Evidentemente, as duas últimas

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Capítulo VII: Discussão

348

sugestões iriam tornar este estudo ainda mais exigente em termos do tempo e dos recursos

necessários para a sua realização.

Os questionários preenchidos pelos pais e pelos educadores forneceram informações

relevantes, como foi apresentado e discutido. Contudo, podem ser tecidas algumas considerações,

nomeadamente acerca da sua estrutura. Cada item apresentado aos pais e aos educadores possuía

diversos indicadores, devendo os pais assinalar a importância do item e em que medida a creche

cumpria aqueles requisitos. Portanto, as respostas referiam-se a cada item e não a cada indicador.

Este procedimento facilitou o preenchimento do questionário (mais rápido e menos fastidioso) e a

comparação dos resultados, por um lado, com os dados resultantes da cotação da ITERS-R pelo

observador externo e, por outro lado, com os resultados de estudos semelhantes. Apesar destas

vantagens, tem o inconveniente de não nos permitir saber com pormenor a que indicadores se deve a

cotação dos pais ou dos educadores. Assim, no confronto dos dados de avaliação da qualidade dos

pais e dos educadores com os do observador externo, não podemos verificar especificamente em que

indicadores há ou não acordo entre a percepção dos pais e dos educadores e aquilo que se observa.

Uma outra consideração acerca do questionário relaciona-se com as designações dos pontos da

escala de importância dos questionários. Os pais e os educadores deveriam assinalar numa escala de

5 pontos a importância que atribuíam a cada item, sendo que 1 correspondia a nada importante; 3 a

mais ou menos e 5 a muito importante. A opção pela designação mais ou menos é questionável,

apesar de não ter havido qualquer comentário ou dúvida da parte dos pais ou dos educadores. Esta

opção foi seguida tendo como base a tentativa, presente ao longo de todo o processo de preparação

dos instrumentos e de recolha de dados, de simplificar a linguagem para que todos os participantes o

pudessem facilmente compreender.

Como foi referido na Introdução, os modelos bioecológico de Bronfenbrenner e transaccional

de Sameroff e colaboradores constituem modelos conceptuais de referência para este estudo.

Contudo, não era pretensão deste trabalho considerar todas as dimensões propostas por estes

modelos. De facto, não se ambicionava estudar as transacções no sentido que lhes atribui Sameroff

(e.g., Sameroff & Fiese, 1990, 2000; Sameroff & MacKenzie, 2003) ou estudar os quatro aspectos do

modelo Pessoa-Processo-Contexto-Tempo de Bronfenbrenner (Bronfenbrenner & Morris, 1998).

Bronfenbrenner (1998) refere que deveríamos estudar o desenvolvimento no seu contexto ecológico,

interrogando se será esta uma simples questão de escolhas e reconhecendo as dificuldades com que

se depara muitas vezes a investigação. Após muitas reflexões acerca do estudo do desenvolvimento,

Bronfenbrenner concluía em 1998 que, em vez de termos demasiada investigação do desenvolvimento

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Considerações finais

349

“fora do contexto”, temos agora muita investigação do “contexto sem desenvolvimento”. Por limitações

práticas e pelos objectivos conscientemente assumidos neste estudo, não foram investigadas as

questões do desenvolvimento e do impacto da qualidade dos contextos no desenvolvimento das

crianças. Este é certamente um aspecto importante e que tem sido estudado por investigadores de

elevada reputação nacional e internacional, contribuindo para a pertinência desta investigação. Tendo

sempre presente o tipo de estudo a desenvolver, foi preocupação constante fundamentar o melhor

possível as diversas opções, sem embarcar em objectivos difíceis de cumprir, no âmbito de um

programa de doutoramento. Assim, todo o trabalho foi centrado nas características de um dos

microssistemas de crianças com idade inferior a 3 anos, onde se espera que ocorram “processos

progressivamente mais complexos de interacção entre um organismo humano biopsicológico activo,

em desenvolvimento, e as pessoas, objectos e símbolos do seu ambiente externo imediato”

(Bronfenbrenner, 2001, p. 6965). Como refere Bronfenbrenner (2001), para serem eficazes, essas

formas de interacção, designadas processos proximais e consideradas o principal motor do

desenvolvimento, devem ocorrer numa base regular ao longo de extensos períodos de tempo. Ao

centrarmo-nos nesse ambiente externo imediato, reconhecemos a importância das “interacções

dinâmicas contínuas entre a criança e a experiência que lhe é proporcionada pela sua família e pelo

contexto social” (Sameroff & McKenzie, 2003, p. 16).

No processo de investigação que conduziu a esta dissertação, e mesmo na sua redacção,

foram múltiplas as situações de incerteza e as situações cuja solução implicava pesar vantagens e

desvantagens, parecendo frequentemente não haver soluções livres de desvantagens. Algumas das

limitações apresentadas foram consideradas e assumidas aquando da tomada das decisões, por serem

menos relevantes quando comparadas com as vantagens advindas. Este balanço entre vantagens e

desvantagens de cada opção foi constante, nomeadamente durante a escolha dos procedimentos de

análise dos dados.

Com as limitações inevitavelmente inerentes a uma investigação e, particularmente, a um

doutoramento, encarado como processo de formação, este projecto contribui para o estudo da

qualidade das creches em Portugal, permitindo conhecer algumas das ideias dos pais e dos

educadores sobre a qualidade do contexto de creche.

A primeira parte do estudo permitiu verificar que a utilização da ITERS-R em salas de creche

portuguesas conduz à obtenção de dados com qualidades métricas adequadas, sendo relativamente

fácil obter índices adequados de fidelidade. Os dados obtidos relativos à importância que os pais e os

educadores atribuem aos critérios de qualidade incluídos na ITERS-R, e mesmo os que foram

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Capítulo VII: Discussão

350

recolhidos através das entrevistas, podem contribuir para se confirmar a validade facial do instrumento,

no que diz respeito à sua utilização em Portugal. Estes resultados confirmam resultados obtidos

anteriormente relativos às diversas escalas de avaliação do ambiente desenvolvidas na Universidade

da Carolina do Norte, ou seja, os peritos concordam com o conteúdo dos itens (Scarr et al., 1994),

independentemente das suas propriedades métricas. Como foi referido, a ITERS-R é um instrumento

que tem sido utilizado em diversos países e com diversas finalidades, sendo que a definição de

qualidade subjacente ao grupo de escalas a que pertence integra resultados da investigação, valores

profissionais e conhecimentos práticos (Harms et al., 2003). Esta escala serviu como base para a

constituição das categorias correspondentes aos temas que emergiram das entrevistas realizadas,

tendo a maioria dos critérios incluídos na ITERS-R sido focada pelos educadores e pelos pais. Será

importante destacar que foram enunciadas características quer de processo, quer de estrutura, e que

em geral as ideias dos educadores e dos pais coincidem com as características das creches

valorizadas internacionalmente. Contudo, nenhum educador ou pai focou os seguintes aspectos: Jogo

de água e areia, Promover a aceitação da diversidade, Actividades de grupo e Condições para

satisfazer as necessidades profissionais do pessoal. Os itens Uso de TV, vídeo e/ou computador e

Medidas para crianças com incapacidades foram referidos apenas por pais e os itens Condições para

satisfazer as necessidades pessoais do pessoal e Supervisão e avaliação do pessoal foram focados

apenas por educadores. À excepção do item Actividades de grupo, todos estes se encontravam entre

os menos valorizados por pais e por educadores nas respostas aos questionários. Por outro lado,

emergiram nas entrevistas temas relacionados com características de estrutura (como: Número de

adultos, Número de crianças, Qualificação da educadora) que não são identificados na ITERS-R de

forma explícita, dado que se pretende que seja uma medida da qualidade de processo. De qualquer

modo, as características relativas à dimensão do grupo de crianças, ao número de adultos e às

características do pessoal e da direcção perpassam a escala sob a forma de indicadores ou de uma

forma subjacente a outros critérios. Por exemplo, não será possível efectuar uma boa supervisão das

actividades e das rotinas se o número de crianças por adulto for excessivo.

Brophy e Statham (1994) consideram que a avaliação da qualidade é baseada em valores, o

que implica que uma escala de avaliação não deve ser examinada tendo como base apenas os testes

tradicionais (e.g., fidelidade interobservadores, consistência interna, opiniões de especialistas na área),

mas, adicionalmente, os valores subjacentes à avaliação devem ser claros e deve ser verificada a

adequação da escala ao serviço que está a ser avaliado. Avaliar a qualidade de um serviço pode

significar avaliar também em que medida corresponde e reflecte as necessidades da comunidade que

serve. Assim, estas autoras concluem que é necessário diversificar as medidas. O procedimento levado

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Considerações finais

351

a cabo neste estudo, ou seja, verificar em que medida os pais e os profissionais de cada instituição

valorizam os aspectos incluídos na escala de avaliação parece-nos uma estratégia razoável para aferir

a adequação entre o que está a ser avaliado e o que é considerado importante neste contexto. No

entanto, assumir uma perspectiva de que devem ser respeitados os valores de cada serviço e da

comunidade pode conduzir a uma situação arriscada, na qual, sob a justificação de que se trata de

valorizar diferentes critérios, se providenciam serviços de baixa qualidade. Neste sentido, Joseph, Lane

e Sharma (1994) consideram que uma parte da definição de qualidade deve ser comum, e não

negociável, aos diversos serviços e baseada em valores fundamentais. Neste sentido, a existência de

orientações para as instituições pode revelar-se de particular importância. Em Portugal, enquanto que

para o jardim-de-infância existem há vários anos documentos que orientam as suas práticas,

nomeadamente as Orientações Curriculares para a Educação Pré-escolar (Ministério da Educação,

1997), os documentos para a creche regulamentam apenas os aspectos de estrutura (como o número

de crianças, a dimensão das salas, as regras para admissão de crianças, etc.). Contudo, o Instituto da

Segurança Social elaborou um conjunto de documentos, recentemente disponibilizados no seu sítio na

Internet (Instituto da Segurança Social, 2005b; Instituto da Segurança Social, s.d.) que podem fornecer

orientações úteis relacionadas com a qualidade de processo e não apenas com os aspectos

estruturais. Um dos recursos utilizados para a sua construção foi a primeira edição da ITERS.

Relativamente à qualidade das salas avaliadas neste estudo, o panorama é preocupante,

mesmo nos aspectos mais valorizados pelos educadores e pelos pais. Os resultados indicam a

existência de salas de qualidade inadequada ou mínima, segundo os critérios de cotação da ITERS-R.

A cotação correspondente a inadequado descreve serviços que não satisfazem as necessidades

relacionadas com cuidados básicos de guarda e a cotação de qualidade mínima descreve serviços que

dão resposta a necessidades de guarda e, em pequeno grau, a necessidades de desenvolvimento

básicas (Pinto & Grego, 1994). De acordo com Harms et al. (1990) as cotações de inadequado e de

mínimo geralmente correspondem à provisão de materiais básicos e a precauções de saúde e

segurança. As cotações superiores, de bom e de excelente, requerem interacção positiva, planeamento

e cuidados personalizados, bem como bons materiais. Estes resultados assinalam a urgência de se

tomarem medidas que alterem esta situação. Como foi exaustivamente apresentado no Capítulo II,

diversos estudos têm encontrado uma associação entre a qualidade dos contextos extrafamiliares de

educação e cuidados frequentados pelas crianças mais novas e os resultados dessas crianças em

vários domínios do desenvolvimento (e.g., Bryant et al., 1994; Cost, Quality & Child Outcomes Study

Team, 1995; Head Start FACES, 2001; NICHD Early Child Care Research Network, 2000). Uma das

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Capítulo VII: Discussão

352

medidas a implementar, empiricamente fundamentada, poderá ser o investimento na formação

adequada dos profissionais que trabalham nestes contextos. Note-se que as salas orientadas por

educadores de infância revelaram qualidade significativamente mais elevada do que as salas

orientadas por auxiliares de educação. Recorde-se ainda que, das 21 auxiliares responsáveis por salas

de creche, apenas uma tinha frequentado um curso profissional para auxiliares de educação.

Os resultados da participação dos pais e dos educadores de infância neste estudo permitiram

perceber que a avaliação efectuada por observadores externos corresponde a valores fundamentais

comuns, como defendido por Joseph et al. (1994). Os pais e os educadores consideraram todos os

itens da ITERS-R importantes, verificando-se uma tendência para valorizarem mais (quer nas

entrevistas quer nos questionários) os aspectos relacionados com as rotinas (saúde, higiene e

alimentação) e as interacções. Apesar de os educadores e os pais reconhecerem a importância dos

itens avaliados, verifica-se uma acentuada disparidade entre a sua percepção da qualidade das salas e

a dos observadores externos. De facto, as avaliações efectuadas pelo observador externo colocam, em

média, as salas numa situação de qualidade inadequada ou mínima, enquanto que a maioria dos pais

considera as salas de boa qualidade e a maioria dos educadores considera que as salas são de

qualidade mínima ou boa. Em termos das ideias sobre a qualidade das salas, é na área da linguagem e

das interacções que parece haver maior acordo entre pais, educadores e observadores, ou seja, os

itens destas áreas são os que obtêm melhor avaliação (sendo itens muito valorizados quer pelos pais

quer pelos educadores). Na área das actividades, os itens com resultados mais baixos na avaliação do

observador são também os itens com avaliação mais baixa dos pais e dos educadores, sendo,

contudo, itens considerados menos importantes por pais e por educadores. Um contraste muito saliente

entre as avaliações ocorre na área das Rotinas de cuidados pessoais, sendo que os pais e os

educadores consideram estes aspectos muito importantes e consideram que são desempenhados nas

creches de forma adequada (qualidade média entre 5.38 e 6.03), quando os resultados da avaliação

efectuada pelo observador externo indicam qualidade inadequada (resultados médios entre 1.06 e

2.35).

Tendo em conta todos estes aspectos, este estudo poderá ser útil para entendermos melhor as

práticas de educação desenvolvidas e os cuidados prestados nas creches em Portugal, que têm sido

avaliados por observadores externos e que, na maior parte das vezes, não têm em consideração a

perspectiva dos educadores e dos pais. Para terminar, seria importante que estes resultados tivessem

um impacto ao nível das políticas nacionais relativas à Creche, contrariando o que Shpancer (2006)

observa, ou seja, que o impacto da investigação ao nível das políticas tem sido pequeno, como o

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Considerações finais

353

comprovam os resultados da investigação sobre a qualidade em contexto de creche, que continuam a

evidenciar a escassez de serviços de elevada qualidade. Concluindo com o que foi referido no início

desta dissertação, é urgente investir na avaliação e promoção da qualidade em contexto de creche, na

formação dos educadores de infância e dos auxiliares de educação e na educação e envolvimento dos

pais, de modo que estes sejam capazes de efectuar escolhas bem informadas e exijam serviços de boa

qualidade, que possam ter um impacto positivo na vida dos seus filhos.

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CAPÍTULO VIII: Referências bibliográficas

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