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REALISMO: A SOCIEDADE NO CENTRO DA OBRA LITERÁRIA The Desesperate Man 2, Gustave Courbet (1843)

R A SOCIEDADE NO CENTRO DA OBRA LITERÁRIA · – 1859): no processo de evolução das espécies, há uma seleção natural que leva os mais fortes a derrotarem os mais fracos. -O

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REALISMO: A SOCIEDADE NO CENTRO DA

OBRA LITERÁRIA

The Desesperate Man 2, Gustave Courbet (1843)

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A poesia social de Castro Alves, o romance

nordestino de Franklin Távora, a última ficção

citadina de Alencar já diziam muito, embora em

termos românticos, de um Brasil em crise. De fato,

a partir da extinção do tráfico, em 1850, acelera-se

a decadência da economia açucareira; o deslocar-se

do eixo de prestígio para o Sul e os anseios das

classes médias urbanas compunham um quadro

novo para a nação, propício ao fermento de ideias

liberais, abolicionistas e republicanas. De 1870 a

1890 serão essas as teses esposadas pela

inteligência nacional, cada vez mais permeável ao

pensamento europeu que na época se constelava em

torno da filosofia positiva e do evolucionismo.

Alfredo Bosi, História Concisa da Literatura Brasileira

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O suporte intelectual da Geração Materialista ou Geração

de 70:

- O positivismo de Auguste Comte (Sistema de filosofia

positiva): só devem ser considerados como relevantes os

fatos positivos, ou seja, aqueles passíveis de análise

científica.

- O determinismo histórico e geográfico de Hippolyte Adolphe

Taine: o comportamento humano, a ser representado pela

obra de arte, é determinado por três fatores (meio, raça e

momento histórico).

- O evolucionismo de Charles Darwin (A origem das espécies

– 1859): no processo de evolução das espécies, há uma

seleção natural que leva os mais fortes a derrotarem os mais

fracos.

- O socialismo utópico de Pierre-Joseph Proudhon e o

socialismo científico de Karl Marx: na luta de classe , o

poder burguês tende a ser superado pela revolução

proletário.

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THE GLEANERS, MILLET (1857)

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O surgimento das Escolas Realistas

As Escolas Realistas constituem as tendências

estéticas que correspondem às novas ideias que

compreendem três estilos essencialmente

antirromânticos e antiburgueses: o Realismo, o

Naturalismo e o Parnasianismo. Embora

apresentem traços específicos que os diferenciam,

esses estilos aproximam-se por constituírem uma

reação contra o Romantismo, cujas formas foram

desgastadas.

A França, que concentrou as grandes revoluções

europeias do século XIX, foi também o palco onde

sugiram as Escolas Realistas, anunciadas desde a

fase final do Romantismo, marcadas por uma

postura de intervenção crítica, de caráter social.

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O processo de passagem do Romantismo ao

Realismo tem como fio condutor as “narrativas de

costumes burgueses”, realizadas por romancistas

como Honoré de Balzac (1799-1850), criador de A

comédia humana, e Stendhal, pseudônimo

literário de Henri Beyle (1783- 1842), que escreveu,

entre outros trabalhos, O vermelho e o negro e A

cartucha de Parma.

Em sentido estrito, Romantismo e Realismo são as

grandes correntes estético-literárias que se

desenvolveram ao longo do século XIX.

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ANGELUS, MILLET (1857-1859)

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O Romantismo se caracterizava fundamentalmente

pela ideia de liberdade, entendida como libertação

da subjetividade, dos sentimentos, da imaginação

criadora, da fantasia, e, consequentemente, de

libertação das regras clássicas que condicionavam

a criação literária.

Já o Realismo baseia-se nas ideias de racionalidade

e objetividade, propondo retratar fielmente a vida

contemporânea (a sociedade burguesa e seus

valores), para desnudá-la, criticá-la, transformá-la.

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As propostas realistas exigem um tipo de representação

fotográfica da realidade, que se dá por meio de descrições

detalhistas, baseadas nas impressões sensíveis. Por isso, a

nova escola domina, sobretudo, as artes plásticas – pintura

e escultura – e a literatura.

- Nas artes plásticas, destaca-se a pintura de Gustave

Courbet e de Edouard Manet.

- Na literatura, escandalizavam o público a prosa de

Champfleury, Gustave Flaubert, Jules e Edmond de

Gouncourt, Guy de Maupassant e Émile Zola; e a poesia

de Théophile Gautier, Charles Baudelaire, Leconte de

Lisle e Théodore Banville.

- Em 1857, Flaubert publica Madame Bovary, obra que

tematiza o adultério feminino e questiona os males do

casamento, visto como instituição burguesa. Este fato é

tido como o marco inicial do Realismo na Europa.

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A PEQUENA TRICOTEIRA, W. BOUGUEREAU (1882)

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O Realismo ficcional aprofunda a narração de

costumes contemporâneos da primeira metade do

século XVIII como Diderot (1713-1784) ou Jane

Austen (1775-1815)... Nas primeiras obras desses

grandes criadores do romance moderno já se

exibiam dons de observação e de análise, razão

pela qual não se deve cavar um fosso entre elas e

as de Flaubert (1821-1880), Maupassant (1850-

1893) e Machado (1839-1908). Entretanto, é

sempre válido dizer que as vicissitudes que

pontuaram a ascensão da burguesia durante o

século XIX foram rasgando os véus idealizantes

que ainda envolviam a ficção romântica.

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Desnudam-se as mazelas da vida pública e

os contrastes da vida íntima; e buscam-se

para ambas causas naturais (raça, clima,

temperamento) ou culturais (meio,

educação) que lhes reduzem em muito a

área da liberdade. O escritor realista

tomará a sério as suas personagens e se

sentirá no dever de descobrir-lhes a

verdade, no sentido positivista de dissecar

os móveis do seu comportamento.

Alfredo Bosi, História Concisa da

Literatura Brasileira

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O VAGÃO DA TERCEIRA CLASSE, H. DAUMIER (1860-63)

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Sob vários aspectos, o romance romântico foi cheio de

realismo, pois a ficção moderna se constituiu

justamente na medida em que visou, cada vez mais, a

comunicar o leitor o sentimento de realidade, por meio

da observação exata do mundo e dos seres. Assim foi

no século XVIII, sobretudo com os ingleses; assim foi

na primeira metade do século XIX, com autores que,

embora classificados dentro do romantismo, e alguns

deles de fato ligados visceralmente à estética

romântica, são verdadeiros fundadores do realismo na

ficção contemporânea – como Stendhal e Balzac, na

França; Gogol, na Rússia; Dickens, na Inglaterra.

Antonio Candido, Presença da Literatura Brasileira – Das Origens ao

Realismo

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O DESCANSO DA MODELO, ALMEIDA JÚNIOR (1882)

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Eça de Queirós, escritor português

realista autor do clássico O primo Basílio

(1878), afirma que “o realismo é a

anatomia do caráter. É a crítica do

homem. É a arte que nos pinta a nossos

próprios olhos – para condenar o que

houver de mau na nossa sociedade”. Assim

Eça resume os objetivos que norteiam toda

a literatura realista: uma representação

da realidade que permita compreender a

origem das práticas e comportamentos

sociais negativos.

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[...] Havia cinco anos que D. Feliciana o amava. [...]

Viam-na corada e nutrida, e não suspeitavam que aquele

sentimento concentrado, irritado semanalmente,

queimando em silêncio, a ia devastando como uma

doença e desmoralizando como um vício. [...] Sempre

tivera o gosto perverso de certas mulheres pela calva dos

homens, e aquele apetite inflamara-se com a idade.

Quando se punha a olhar para a calva do Conselheiro,

larga, redonda, polida, brilhante às luzes, uma

transpiração ansiosa umedecia-lhe as costas, os olhos

dardejavam-lhe, tinha uma vontade absurda, ávida de

lhe deitar as mãos, palpá-la, sentir-lhe as formas,

amassá-la, penetrar-se dela! [...]

O primo Basílio, Eça de Queiróz

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OS CAMPONESES DE FLAGEY VOLTANDO DA FEIRA, GUSTAVE COURBET

(1855)