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PEDRO REBELO DE SOUSA ADVOGADO E ADMINISTRADOR DA CGD "Estado devia vender 40% da Caixa" O Em entrevista, afirma que está a ter mais trabalho na CGD do que esperava © Defende que não se devia penalizar tanto as pessoas com rendimentos baixos O Diz que o seu escritório nunca foi "do regime" E2O > 'LU O I

REBELO DE SOUSA ADVOGADO E ADMINISTRADOR DA … · Não é só através ... Quer na Europa quer nos EUA há uma análise positiva sobre Portugal. ... Sendo gordo, é muito fácil

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PEDRO REBELO DE SOUSA ADVOGADO E ADMINISTRADOR DA CGD

"Estado deviavender 40%da Caixa"

O Em entrevista, afirma que está a ter mais trabalhona CGD do que esperava © Defende que não se devia

penalizar tanto as pessoas com rendimentos baixosO Diz que o seu escritório nunca foi "do regime" E2O

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O

I

Textos ISABEL VICENTEe PEDRO LIMA

Foto JOSÉ VENTURA

Pedro Rebelo de Sousa, advogado quehá 20 anos fundou a SRS Advogados eadministrador da Caixa Geral de Depó-sitos (CGD) desde julho de 2011, diz

que o programa de ajustamento acorda-do entre Portugal e a troíka primou pe-lo imediatismo e acredita que o país vaiprecisar de mais dinheiro. Sobre aCGD, defende que parte do seu capital— 40% — seja vendida pelo Estado.

? Acredita que as pesadas medidas deausteridade a que os portugueses es-tão a ser sujeitos são suficientes pararesolver a crise?

BAcho que o problema de fundo é adimensão e o perfil da dívida e isso nãoestá a ser resolvido. Não é só atravésdos programas de intervenção que o

problema se resolve, até porque não sa-bemos se estamos a dar quimioterapiaem excesso a alguns países... e de repen-te basta que um dos outros derrape pa-ra tudo cair... Por exemplo, se Espanhaentrar em derrapagem, será catastrófi-co para Portugal e para a Europa. Espa-

nha é demasiado grande para falhar.

?A Europa vai ter de avançar com aemissão de obrigações europeias, os eu-robondsi? Sou um defensor dos euwbonds. Es-tá-se a dar aos países intervenciona-dos soluções conjunturais para crisesestruturais. Não pode ser. A situaçãode Portugal é muito complicada:além de ter um endividamento eleva-do, tem um problema de falta de com-petitividade. Compreendo que o Go-verno tente cumprir o mais possívelas orientações da troika e combater

alguns excessos. Não tem grande mar-gem de manobra.? Cortar os subsídios de Natal e de fé-rias em reformas de €600 resolve os

problemas do país?? Deviam ser evitadas penalizaçõesque acabam por ser excessivas. Não sedevia penalizar tanto as pessoas comrendimentos baixos. Mas o programade ajustamento primou pelo imediatis-mo de resultados.

?A imagem do bom aluno que esta-mos a cultivar vai ser-nos favorável??É mais fácil negociar quando se de-monstrou esforço e se foi além do queera necessário. Este Governo quis criarum determinado capital para poder ne-gociar novas condições no futuro.

? Portugal precisará de mais dinheiro?? Sim. E necessária outra atitude porparte da troika. O Governo tentou ser omais intransigente possível para poderdizer que mais não pode fazer. Quer naEuropa quer nos EUA há uma análisepositiva sobre Portugal.

?A sensação que a generalidade dos

portugueses tem é a de que o país estáà venda. Não estamos a vender as nos-sas empresas a preços de saldo?

? O que foi vendido até agora, exceto o

BPN, que é um caso especial, foi bemvendido. Quer a EDP quer a REN fo-ram vendidas com um bom prémio. Po-der-se-á indagar se aquele candidatofoi o melhor ou não...

? E quanto ao facto de estarmos a ven-der os grupos nacionais de referência?BA defesa dos grupos nacionais é umconceito que tenho dificuldade em per-ceber. Adoraria que houvesse centrosde decisão, ou como prefiro chamar--lhes, de competência, que fossem por-tugueses, mas hoje em dia ou se aceitaa globalização ou não se aceita.

? O Estado deve vender parte da CGD?

? Sou defensor de que o Estado devemanter o controlo da CGD, mas pode,tal como o Banco do Brasil ou as Caixasem Espanha, vender entre 30% a 40%do seu capital e nem sequer acho queseja uma má altura. Mas é fundamentalmanter o controlo.

? E devia ter participações em empre-sas de outros sectores?? Na área energética é defensável queo Estado tenha participações mas hoje,através de regulamentação, pode exer-cer algum controlo. O que é perverso é

que as privatizações estão a ser feitasem sectores-chave da economia, comoa energia e os transportes mas em paí-ses como França, Itália, Holanda ouAlemanha, o Estado permaneceu nes-tas empresas. Privatizamos mais nós e

Espanha do que França, que continuaalegremente a controlar estes sectores.

? Como tem sido ser administradornão-executivo da CGD?? Quem fala em nome da CGD são os

presidentes da administração ou da co-missão executiva, mas tem sido umaexperiência pessoal muito rica, na me-dida em que se trata de uma empresa100% pública com um modelo de go-verno em que o presidente da adminis-tração não tem pelouros e há adminis-tradores não-executivos. Só peca porter poucos não-executivos o que acaba

por ser uma sobrecarga, porque temosa área de auditoria, estratégia etc...

? Não vê inconveniente em que Fariade Oliveira acumule a presidência doconselho da administração da CGDcom a presidência da Associação Portu-

guesa de Bancos.BNão sendo executivo, não vejo quehaja problemas. Até porque foram os

outros bancos que o convidaram e sen-tem-se confortáveis.

? Mas não prejudica as funções na

CGD? Acabou de dizer que existe umasobrecarga.

? Por definição o presidente da admi-nistração pode ter outros cargos, isso jáaconteceu na CGD e noutras empresas.

? Quando aceitou este cargo disse

que a sua sociedade de advogados atépoderia ser prejudicada pelo facto deestar na CGD, porque deixou de traba-lhar para o banco. Já houve situaçõesem que tenha sentido algum conflitode interesses?? Sou muito cioso. E sinto-me confortá-vel. Só aceitei ir para a administraçãoda CGD porque é o modelo adequado e

porque a minha sociedade não trabalhapara o banco e portanto não há incom-

patibilidade.

? A CGD tem posições em grandes em-presas: PT, BCP, ZON, Cimpor, Brisa,

Galp...? Desde que estou na Caixa ainda nãose colocou nenhum conflito de interes-

ses, mas se vier a acontecer serei o pri-meiro a dizer que não posso participarnas deliberações.

? Quantas reuniões já teve na CGD?? Muitas. E como somos apenas trêsnão-executivos.. .Temos mais trabalhodo que esperava.

?Há muito a ideia de que a CGD é

instrumentalizada pelos diferentesgovernos...B Não posso falar em nome da CGD,mas é para mim uma evidência que de-terminadas decisões foram tomadaspelo Governo. A CGD vai alienar to-das as participações que não são estra-tégicas. Não foi a Caixa que quis teressas participações, foram os diferen-tes governos. Primeiro era a Parpúbli-ca e depois houve decisão política defazer da Caixa um veículo de investi-mento de apoio ao tecido empresarialportuguês.ivicente @ expresso.impresa.pt

"60% do negóciovem do estrangeiro"Advocacia e banca andam demãos dadas no percurso de Pe-dro Rebelo de Sousa. Aos 18

anos de banca sucederam-se 20no escritório SRS Advogados,que fundou há 20 anos e que nes-te momento tem 60% da sua fa-

turação a vir do exterior.

? Que balanço faz destes 20anos de vida da SRS Advogados?EUm balanço muito positivoquer em termos pessoais querinstitucionais. A criação da so-ciedade foi uma viragem na mi-nha vida, tinha feito uma carrei-ra na banca e ao fim de quase18 anos avancei para um proje-to que gostava de fazer em Por-tugal: uma sociedade de contor-nos internacionais, mais de na-tureza anglo-saxónica. Cercade 70% dos nossos advogadosou fizeram cursos ou estágiosde longa duração em escritó-rios internacionais. E dos só-cios atuais, cerca de 80% come-çaram aqui.

? Está arrependido de ter postotermo à ligação à Simmons &Simmons?

? Não. Ficámos com uma boarelação. Há um respeito recí-

proco e com a nossa saída daSimmons crescemos. Todos os

assuntos que eles tenham são--nos passados e podemos traba-lhar com outros escritóriosconcorrentes, que passaram aconsultar-nos quando soube-ram que já não éramos exclusi-vos da Simmons. Foi uma expe-riência muito interessante e ri-ca ter sido administrador du-rante quatro anos de um gran-de escritório internacional deadvocacia.

? Porque se separaram?? Diferenças estratégicas. Em2009 concluímos que a nature-za do mercado português, a sua

ligação aos países de língua por-tuguesa, como Angola e Moçam-bique, nos obriga a ter uma ativi-dade, parcerias e alianças nes-ses países. A Simmons não consi-dera isso uma prioridade. Tematé alguma resistência em rela-ção a alguns desses países. E de-

pois sempre defendemos que de-víamos ser uma multiprática.Eles não. Fazemos todas as prá-ticas de direito, mas no crime só

fazemos o chamado crime de co-larinho branco.

B Onde estão presentes?B Temos através da Simmonsuma presença em 17 países, comos quais mantemos uma parce-ria já não integrada. E temosparcerias no Brasil, Angola, Mo-çambique e Cabo Verde.

? Qual o volume de negócios dasociedade?? O que posso dizer é que 60%da faturação vêm de clientes es-

trangeiros ou de matérias rela-cionadas com o estrangeiro.Os 50 maiores clientes repre-sentam 65% a 70% da fatura-ção. Os 100 maiores clientes re-presentam 90%. Temos pou-cos clientes, mas são grandes.O peso dos clientes do sectorpúblico não ultrapassa os 5%da faturação. Nunca, claramen-te, fomos um dos escritórios di-tos do 'regime', independente-mente da cor política no po-der. Antes pelo contrário... O

peso do sector privado, em par-ticular internacional, é umaconstante.

"Portugal só é viávelenquanto plataforma"Pedro Rebelo de Sousa diz quePortugal não fez as reformasquando devia, mas tem de procu-rar uma estratégia competitivapara a economia.

B Saiu de Portugal aos 20 anos,esteve no Brasil e nos EstadosUnidos. Quando voltou, no iníciodos anos 90, sentiu que o país es-tava a mudar?E Senti, havia a sensação de quetínhamos virado a página, com aadesão à União Europeia, um go-verno que apresentava orçamen-tos a tempo e horas, uma refor-ma fiscal e um punhado de go-vernantes que tinha peso e ofere-cia confiança. Foi por isso queachei que estava na altura de fa-zer a experiência de regressar a

Portugal. Saí porque o país ti-nha sido destruído pelas nacio-nalizações.

? Porque regressou?? Regressei porque gostava queos meus filhos tivessem raízes

portuguesas. E depois a ideiaera poder juntar a família, queestava separada, pois os meuspais tinham ido para o Brasil em1974 e os meus dois irmãos ti-nham ficado em Portugal. Masvoltei também porque nós passa-mos a vida lá fora a dizer comose podia dar a volta ao país. Daí

que tenha aceitado o convite fei-to pelo professor Cavaco Silva

para privatizar o Fonsecas e Bur-

nay, apesar de vir ganhar 10%do que ganhava nos EUA.

B Mas entretanto alguma coisacorreu mal em Portugal, porquehá um ano o país teve de voltara pedir ajuda internacional. O

que falhou?

E Várias coisas. Não houve cora-

gem de aproveitar o momentode integração europeia para rea-lizar as reformas estruturaisque já deviam ter sido feitas, emtodos os domínios — saúde, edu-

cação, justiça... fomos tentandoempurrar para a frente. Massempre fizemos ótimos diagnós-ticos. Sendo gordo, é muito fácilentender o que aconteceu. Éque o gordo rapidamente passaa obeso e começa a ter proble-mas de saúde. Portugal ficougordo e depois passou a linha.Ficou obeso e não percebeuque, não criando riqueza e ele-mentos de diferenciação, nãotendo vantagens competitivas,não conseguia desenvolver-se.Neste momento estamos nos cui-dados intermédios, todos os diaso médico vem ver se as coisasestão a correr bem, como está atensão arterial, os órgãos vi-tais... Já estivemos nos intensi-

vos... mas isto dá uma grandefrustração a quem gostaria dever uma estratégia para a nossaeconomia. Neste momento é difí-cil fazer diferente.

B Era importante crescer...E Mas se não houver uma visãomais a médio e longo prazo cor-remos o risco de tropeçar nas de-cisões de curto prazo. Estamosa fazer uma dieta mas se depoisnada for feito volta-se a engor-dar.

? Acredita que a classe políticanão vai incorrer nos mesmos er-ros do passado??A reflexão sobre o que aconte-ceu leva-nos a algumas preocu-pações quanto ao futuro: clara-mente é preciso repor os objeti-

vos coletivos acima dos pes-soais. Nos últimos 30 anos, pou-cos foram os políticos que saí-

ram dos governos com menospatrimónio do que quando en-traram, ou pelo menos com omesmo património.

? Destaca alguns exemplos posi-tivos?

? Sim, o general Ramalho Ea-nes enquanto Presidente da Re-pública. Ou o Presidente JorgeSampaio. E Cavaco Silva, en-

quanto primeiro-ministro — ago-ra não posso falar do seu manda-to de Presidente da Repúblicaporque está em curso. São exem-plos de probidade e honestida-de. Mas há casos que me deixampreocupado. Houve uns que saí-ram ricos — e esses deixam-memuito preocupado. E houve mui-tos que saíram com reformas demilhares de euros, num país quenão tem dinheiro para pagar re-formas. Não pode ser. Dizemque a lei permitia, mas permitiamal, pois a lei foi feita por eles.Está perfeitamente identificadoo divórcio entre o eleitorado eos candidatos.

? Como pode Portugal atrair in-vestimento?? Maior previsibilidade é o maisimportante para o investidor es-

trangeiro, uma fiscalidadeatraente e uma política — quecreio que está a ser agora maisdesenvolvida— de atração do in-vestimento estrangeiro. Portu-gal só é viável enquanto platafor-ma, quando viramos destino de-finhamos. Sempre que olhamos

para o umbigo definhamos. Te-mos de ser uma plataforma tec-nológica, de desenvolvimento

científico. E há outro ponto queé o mar, é um potencial de recur-sos. Valeria a pena pensarmosnisso.

Nos últimos 30 anos, poucosforam os políticos quesaíram dos governos commenos património do quequando entraram, ou pelomenos com o mesmopatrimónio

Portugal ficou obeso e nãopercebeu que, não criandoriqueza e elementos dediferenciação, não tendovantagens competitivas, nãoconseguia desenvolver-se

Nunca fomos um dosescritórios ditos do 'regime',independentemente da corpolítica no poder. Antes pelocontrário... O peso do sector

privado, em particularinternacional, é umaconstante

OUTROS ASSUNTOS

O estado da Europa"A Europa está doente porquenão tem projeto, não tem líderescredíveis e carismáticos, fortes,perdeu a fé"

Os problemas da Justiça"Tem um problema de gestãocomo tem, aliás, a saúde. Aministra, Paula Teixeira da Cruz,já percebeu isso e está a tentarseguir o bom caminho, mas não

consigo ter o juízo final sobre oresultado"

A atratividade do regime fiscal

"Hoje não é possível ter um

regime fiscal mais atrativo, mastemos de ter uma política fiscal

dirigida a determinados objetivos.A previsibilidade é importante.Criámos o offshore da Madeira eacabámos com ele. Isto não é

modelo nenhum"

Governo da sociedade avança"No Instituto Português de

Corporate Governance (IGCP)temos o anteprojeto do códigode governo das sociedades quevai a discussão pública e quepretende ser concreto face àrealidade. Além disso, estão

lançados dois grandes temas:como é que a corrupção e a

governance interagem e aproteção social e o governo dassociedades"

Gestão profissional"Profissionalmente, 75% do meu

tempo é passado no escritório,15% na CGD e o resto do tempona União Internacional de

Advogados e no IGCP"