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RECURSOS PARA A CONSTRUÇÃO DE ESTILOS: O TÓPICO DISCURSIVO EM DUAS PRODUÇÕES ORAIS DE UM RAPPER PAULISTA 1 Rafaela Defendi MARIANO (G-UNICAMP/FAPESP) 2 Resumo: O presente trabalho traz os resultados parciais de nossa pesquisa de iniciação científica cujo objetivo foi analisar as diferenças estilísticas resultantes das manipulações estratégicas de recursos linguístico-discursivos produzidas pelo rapper Mano Brown em duas situações comunicativas: discurso de agradecimento e depoimento. Nossa hipótese é a de que o tópico discursivo é um dos principais lócus de observação da variação estilística. Com a descrição da organização hierárquica e da segmentação linear, pudemos concluir que há uma tendência de ocorrer maior descontinuidade tópica na segunda situação do que na primeira, em função tanto do tipo de audiência, como também em função dos próprios tópicos discursivos instaurados: na primeira situação, Mano Brown agradece o prêmio que está recebendo por meio da tematização das qualidades e defeitos do ser humano e, na segunda situação, o rapper está discorrendo de maneira informal sobre uma experiência sua com um determinado objeto cultural (um documentário); cada um desses tópicos discursivos parece demandar atividades de textualização específicas (comentário & narração) que podem ser compreendidas nos termos de um processo de iconização necessário para a caracterização do estilo (Irvine, 2001). Palavras-chave: Sociolinguística. Estilo. Rapper. Tópico discursivo. Introdução A escolha dos rappers como sujeitos de uma pesquisa sobre estilo justifica-se pelo fato de, na produção de linguagem destes sujeitos, observada anteriormente em um projeto- piloto, terem sido reveladas mudanças estilísticas significativas. Outra justificativa para o desenvolvimento do projeto encontra-se relacionada ao fato de que sobre essa população ainda há poucos trabalhos 3 que considerem em suas análises as relações entre o fenômeno linguístico e as práticas sociais. Sobre os integrantes da chamada “cultura hip hop”, há trabalhos 4 que enfocam suas práticas sociais e culturais, a construção de suas identidades, mas, de fato, há uma lacuna a ser preenchida na relação entre as práticas linguísticas deste grupo e suas práticas sociais. Os textos orais analisados fazem parte da seção “Extra” do DVD 100% Favela. O DVD é a gravação da festa em comemoração ao aniversário da Favela Godoy, localizada no 1 O presente artigo é resultado da pesquisa de Iniciação Científica intitulada “Recursos para a construção de estilos: tópico e marcadores discursivos na fala de um rapper paulista”, Nº do Processo Processo no. 2010/17357-0, realizada com financiamento da FAPESP e sob orientação da Profa. Dra. Anna Christina Bentes. 2 Estudante de graduação orientada e indicada pela Profa. Dra. Anna Christina Bentes da Silva (UNICAMP). Bolsista de Iniciação Científica- FAPESP. Licenciatura em Letras, IEL, UNICAMP. Campinas-SP, Brasil. [email protected] . 3 Os primeiros trabalhos sobre esse tema foram elaborados por Bentes (2005, 2006, 2009a, 2009b, 2011). 4 Souza (2004, 2009); Gessa (2007, 2011).

RECURSOS PARA A CONSTRUÇÃO DE ESTILOS: O TÓPICO …projetonoisnafita.vl1.net2.com.br/site/pdf/artigo_rafaela-mariano... · Há também detalhes da preparação da festa na favela;

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RECURSOS PARA A CONSTRUÇÃO DE ESTILOS: O TÓPICO DISCURSIVO EM

DUAS PRODUÇÕES ORAIS DE UM RAPPER PAULISTA1

Rafaela Defendi MARIANO (G-UNICAMP/FAPESP)2

Resumo: O presente trabalho traz os resultados parciais de nossa pesquisa de iniciação científica cujo objetivo foi analisar as diferenças estilísticas resultantes das manipulações estratégicas de recursos linguístico-discursivos produzidas pelo rapper Mano Brown em duas situações comunicativas: discurso de agradecimento e depoimento. Nossa hipótese é a de que o tópico discursivo é um dos principais lócus de observação da variação estilística. Com a descrição da organização hierárquica e da segmentação linear, pudemos concluir que há uma tendência de ocorrer maior descontinuidade tópica na segunda situação do que na primeira, em função tanto do tipo de audiência, como também em função dos próprios tópicos discursivos instaurados: na primeira situação, Mano Brown agradece o prêmio que está recebendo por meio da tematização das qualidades e defeitos do ser humano e, na segunda situação, o rapper está discorrendo de maneira informal sobre uma experiência sua com um determinado objeto cultural (um documentário); cada um desses tópicos discursivos parece demandar atividades de textualização específicas (comentário & narração) que podem ser compreendidas nos termos de um processo de iconização necessário para a caracterização do estilo (Irvine, 2001).

Palavras-chave: Sociolinguística. Estilo. Rapper. Tópico discursivo. Introdução

A escolha dos rappers como sujeitos de uma pesquisa sobre estilo justifica-se pelo

fato de, na produção de linguagem destes sujeitos, observada anteriormente em um projeto-

piloto, terem sido reveladas mudanças estilísticas significativas. Outra justificativa para o

desenvolvimento do projeto encontra-se relacionada ao fato de que sobre essa população

ainda há poucos trabalhos3 que considerem em suas análises as relações entre o fenômeno

linguístico e as práticas sociais. Sobre os integrantes da chamada “cultura hip hop”, há

trabalhos4 que enfocam suas práticas sociais e culturais, a construção de suas identidades,

mas, de fato, há uma lacuna a ser preenchida na relação entre as práticas linguísticas deste

grupo e suas práticas sociais.

Os textos orais analisados fazem parte da seção “Extra” do DVD 100% Favela. O

DVD é a gravação da festa em comemoração ao aniversário da Favela Godoy, localizada no 1 O presente artigo é resultado da pesquisa de Iniciação Científica intitulada “Recursos para a construção de estilos: tópico e marcadores discursivos na fala de um rapper paulista”, Nº do Processo Processo no. 2010/17357-0, realizada com financiamento da FAPESP e sob orientação da Profa. Dra. Anna Christina Bentes. 2 Estudante de graduação orientada e indicada pela Profa. Dra. Anna Christina Bentes da Silva (UNICAMP). Bolsista de Iniciação Científica- FAPESP. Licenciatura em Letras, IEL, UNICAMP. Campinas-SP, Brasil. [email protected]. 3 Os primeiros trabalhos sobre esse tema foram elaborados por Bentes (2005, 2006, 2009a, 2009b, 2011). 4 Souza (2004, 2009); Gessa (2007, 2011).

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Capão Redondo em São Paulo, em setembro de 2005. Em um considerável panorama do rap

paulista, o DVD traz apresentações de diversos grupos da capital (alguns nem tão conhecidos

no cenário nacional), além do grupo Realidade Cruel, de Hortolândia, e do rapper GOG, de

Brasília. Além dos shows, nos extras, temos depoimentos de vários rappers e também do

escritor Ferréz. Há também detalhes da preparação da festa na favela; os bastidores da

gravação do CD do grupo Negredo, com a participação de Mano Brown; e a premiação do

Prêmio Cooperifa com o posterior trajeto de carro de Mano Brown em que ele dá o

depoimento à jornalista.

Primeiramente, traremos as teorias sobre as quais se baseiam nossas análises. Em

seguida, partiremos para as análises, sem antes deixar de descrever as configurações

relacionais (Goffman, 1964) de cada uma das situações comunicativas.

Pressupostos Teóricos Gerais

Bell (2001) postula que as mudanças estilísticas podem ocorrer tanto em função do

que ele denomina de design de audiência (consideração das características do interlocutor)

como do design de referência (desejo de identificação com determinado grupo). Para o autor,

estes dois tipos de design, responsáveis pela variação estilística, não se excluem, mas se

complementam de forma a possibilitar uma melhor compreensão do cenário micro-

conversacional.

Coupland (2001, 2007) e Bell (2001) apresentam opiniões convergentes a respeito de

que a produção do estilo é uma realização situacional cujo intuito é o de alcançar

determinados propósitos comunicativos em determinadas situações sociais. Bell (2001) ao

postular que um estilo particular está normalmente associado a um grupo ou a uma situação

particular remete à discussão feita por Irvine (2001 apud Bentes, 2006) acerca da relação

entre estilo, registro e dialeto.

Para a autora, a distinção entre dialeto e registro fica mais complexa quando se analisa

o repertório de uma comunidade de fala particular, visto que há exploração criativa de

“vozes” associadas a grupos sociais. É esta exploração criativa de “vozes” que explica a chave

do estilo tanto para Bell (2001) como para Irvine (2001 apud Bentes, 2006). Ainda em relação

aos grupos sociais, pessoas típicas desses grupos são organizadas num sistema cultural-

ideológico de forma que suas imagens ficam disponíveis como um “quadro de referência”.

Então, os indivíduos manipulam essas vozes de forma a se aproximar ou não delas de acordo

com a situação e a audiência: Os estudos sobre registros sempre enfocaram variedades e padrões relativamente

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estáveis e institucionalizados, padrões estes que inclusive eram explicitamente nomeados no interior de suas comunidades de uso, conectados com determinadas situações institucionalizadas, ocupações, etc. (por exemplo, a fala de locutores esportivos). O estilo inclui isso, mas também inclui as formas mais subliminares por meio das quais os indivíduos “navegam” entre as variedades disponíveis e tentam encenar uma representação coerente de si mesmos (...). Talvez haja uma outra diferença: enquanto dialetos e registros, pelo menos como a sociolinguística os define, apontam para o fenômeno linguístico apenas, o estilo envolve princípios de distinção que podem se estender para além do sistema linguístico, para outros aspectos do comportamento que estão semioticamente organizados (Irvine, 2001 apud Bentes, 2006).

Em relação ao design de referência, ao defini-lo como uma mudança estilística feita

pelo falante com o intuito de identificar-se mais fortemente com o próprio grupo ou com um

terceiro grupo, Bell (2001) coloca a questão da identidade também em relação à audiência (e

consequentemente em relação às questões sociais), pois essa mudança “é essencialmente uma

redefinição feita pelo falante da sua própria identidade em relação a sua audiência”. Então,

não como uma dicotomia, design de audiência e design de referência funcionam como um

continuum em que: “Sim, nós estamos projetando nossa conversa para a nossa audiência. Mas

estamos também simultaneamente modelando-a em relação a outros grupos de referência

incluindo nosso próprio grupo” (Bell, 2001). Para eliminar essa dicotomia, Bell (2001)

formulou uma metodologia que não privilegiasse a análise quantitativa (para encontrar

padrões a serem explicados pelo design de audiência), deixando as exceções para serem

explicadas pelo design de referência (análise mais de cunho qualitativo). Essa metodologia

consiste em análises quantitativas e qualitativas complementares.

Jubran et al. (2002) a partir de uma perspectiva discursiva promoveram um estudo da

organização tópica de um discurso de natureza oral-dialogada a fim de melhor definir a

unidade de análise de estatuto discursivo, o tópico:

Tomado no sentido geral de “acerca de”, o tópico manifesta-se, na conversação, mediante enunciados formulados a respeito de um conjunto de referentes explícitos ou inferíveis, concernentes entre si e em relevância num determinado ponto da mensagem. (Jubran et al, 2002: 344) (grifos nossos)

A nova definição foi uma revisão dos estudos do grupo cuja primeira definição

revelou-se de difícil operacionalização devido ao caráter vago e amplo do significado de

assunto e do grau de subjetividade na compreensão da noção: “fragmentos textuais, de

extensões variadas, recobrindo determinado assunto (tema), em pauta no segmento recortado

para análise” (Koch et al, 1990 apud Jubran et al, 2002: 343).

Os pesquisadores procuraram estabelecer traços que pudessem definir a categoria

tópico com mais segurança e objetividade. A centração, que é uma das propriedades

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definidoras de tópico, abrange, além dos traços de concernência (“relação de

interdependência entre elementos textuais, firmada nos mecanismos coesivos de sequenciação

e referenciação”) e relevância (“proeminência de elementos textuais na constituição desse

conjunto referencial”), o traço de pontualização, que se caracteriza pela “localização desse

conjunto em determinado ponto do texto”.

Segundo Maynard (1990 apud Jubran et al., 2002), os estudos mais recentes

demonstram que o tópico não é mais visto apenas como uma noção de conteúdo como os

estudos anteriores, visto que “aquilo de que se fala” não pode ser desvinculado do “como se

fala” (Maynard, 1980 apud Jubran et al., 2002). Podemos afirmar que o conceito de tópico do

Grupo de Organização Textual Interativa do Projeto de Gramática do Português Falado

(PGPF) contribui para o pressuposto de Maynard, visto que os elementos coesivos de

referenciação e sequenciação nos dão pistas para a delimitação do tópico (traço de

concernência) (Marcuschi, 2008: 141).

A partir desse pressuposto do tópico como um princípio organizador do discurso,

Jubran et al. (2002) postulam a outra propriedade do tópico: a organicidade. Esta propriedade

diz respeito às relações de interdependência tópica que pode se estabelecer em dois níveis: o

hierárquico e o linear/sequencial. O primeiro se refere ao plano vertical, em que os tópicos

podem ser descritos hierarquicamente “conforme as dependências de superordenação e

subordinação entre tópicos que se implicam pelo grau de abrangência do assunto” (Jubran et

al., 2002: 345) e o segundo se refere ao plano horizontal “de acordo com as articulações

intertópicas em termo de adjacências ou interposições na linha discursiva” (Jubran et al.,

2002: 345).

A partir dessa categoria, Jubran et al. (2002) conseguem identificar e delimitar os

segmentos tópicos, ou seja, “unidades discursivas que atualizam as propriedades de tópico”

(Jubran et al., 2002: 345); observar como esses segmentos se distribuem linearmente e se

inter-relacionam hierarquicamente no texto e caracterizar estruturalmente os segmentos, ou

seja, caracterizar a estrutura intratópica que pode vir evidenciada por marcas linguísticas na

sua abertura, meio ou saída que ajudam a delimitá-los.

A partir dessa constatação, os autores propuseram a análise a partir de Quadros

Tópicos (QT), ―noção abstrata e relacional cujo estatuto concreto é determinado pelo nível

de hierarquia selecionado pelo analista (Jubran et al., 2002), caracterizados por duas

condições necessárias (a e b) e uma possível (c):

a) centração num tópico mais abrangente (Supertópico – ST);

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b) divisão interna em tópicos co-constituintes (Subtópicos – SbT);

c) subdivisões sucessivas no interior de cada tópico co-constituinte de forma que um tópico

pode vir a ser ao mesmo tempo ST e SbT.

Em relação à distribuição linear do tópico, os autores caracterizam dois fenômenos

básicos: a continuidade e a descontinuidade. A primeira se refere à abertura do tópico

subsequente com o esgotamento do anterior e a segunda à perturbação da sequência linear

seja pela suspensão de um tópico que ainda não se esgotou ou pela divisão desse tópico que

será retomado posteriormente. Segundo Jubran et al. (2002), apesar da possibilidade de

descontinuidade com a inserção de tópicos constitutivos de um quadro tópico entre tópicos de

outro quadro tópico, nos níveis hierárquicos mais elevados, há uma tendência ao

restabelecimento da linearidade. Assim, quando há dois supertópicos na conversação, um só é

iniciado quando o outro se esgota, confirmando segundo os autores a estruturação, coesão e

coerência do fenômeno conversação.

Análise da primeira situação comunicativa

Na primeira situação comunicativa, o discurso público, apesar de ter uma plateia

formada por pessoas fisicamente presentes, Mano Brown age da mesma forma como Goffman

propôs que ocorre aos comunicadores televisivos: “os comunicadores são pressionados a

modular suas falas como se fossem dirigidas a um único ouvinte” (Goffman, 1964 apud

Azanha, 2008). O termo plateia se faz adequado à fala que vem da tribuna, segundo Goffman

(1964 apud Ribeiro; Garcez, 2002: 125-26), pois as plateias escutam de uma maneira “que

lhes é peculiar”, afinal, não constituem um conjunto de companheiros de conversa e podem

ter “o direito de examinar o falante diretamente com uma franqueza que seria ofensiva numa

conversa”.

Além disso, “o papel de uma plateia é o de apreciar as observações feitas e não o de

responder de forma direta”, apesar de serem testemunhas ao vivo (“co-participantes numa

mesma ocasião social”) e de poderem dar sinais de concordância, atenção etc. No caso do

discurso proferido por Mano Brown, o principal efeito discursivo produzido é o de certo grau

de proximidade com os interlocutores, em virtude dos próprios tópicos abordados pelo

rapper. Mano Brown, por exemplo, critica a si mesmo e aos membros da sua comunidade e,

além disso, exemplifica trazendo cenas do cotidiano da periferia. Isso contribui para a

aproximação dele com a plateia e diminui possíveis apreciações negativas sobre ele em seu

discurso.

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Em termos de organização tópica de natureza hierárquica (Jubran et al., 2002; Jubran,

2006; Bentes e Rio, 2006), a primeira situação comunicativa apresenta, a nosso ver, o

supertópico Qualidades e defeitos do ser humano e dois quadros tópicos co-constituintes:

(1) Humildade x arrogância e (2) Comentários sobre si mesmo.

Essa delimitação foi possível graças a duas etapas: a primeira consistiu na

segmentação do texto em suas menores porções (segmentos tópicos), identificáveis

fundamentalmente pelo princípio de centração e a segunda no agrupamento desses segmentos

tópicos, conforme o grau de associação entre eles e o enquadramento sucessivo dos grupos em

níveis mais elevados (quadros tópicos) conforme o princípio de organicidade.A partir do

agrupamento, foi possível identificar os quadros tópicos e os seus segmentos tópicos co-

constituintes.

O quadro tópico (1) envolve cinco subtópicos: Definição de pobreza; Definição de

sabedoria; Crítica sobre a situação da favela; Crítica sobre tratar o playboy com

arrogância e Crítica sobre a ostentação de bens materiais.

O quadro tópico (2) envolve seis subtópicos: Sinceridade; Ter a proteção de Deus;

Honra de receber o prêmio; Falha de não estar sempre presente; Fama e Solidão.

A partir do segundo gráfico, podemos observar que há nesse texto oral uma tendência

à não perturbação da linearidade, ou, em outras palavras, Mano Brown introduz um novo

tópico apenas depois de concluí-lo. No texto todo, só há uma exceção: o subtópico Definição

de sabedoria que é retomado duas vezes, uma inclusive quando outro quadro tópico já havia

sido introduzido. Mano Brown retoma esse subtópico, para fazer conclusões.

Gráfico 1. Organização tópica hierárquica da primeira situação comunicativa

Qualidades e defeitos

do ser humano

Humildade x

arrogância

Comentá-rios sobre si

mesmo

Definição de pobreza

Crítica sobre tratar o playboy

com arrogância

Crítica sobre a

ostentação de bens

materiais

Sinceri-

dade

Ter a

proteção de Deus

Fama

Solidão

Crítica sobre a situação da favela

Definição

de sabedoria

Honra de receber o prêmio

Falha de não estar sempre presente

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 13 12

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1 Definição de pobreza Linhas 14-15

2 Definição de sabedoria Linhas 18-22

3 Crítica sobre a situação da favela Linhas 22-25

4 Crítica sobre tratar o playboy com arrogância Linhas 25-30

5 Definição de sabedoria Linhas 30-32

6 Crítica sobre a ostentação de bens materiais Linhas 32-35

7 Sinceridade Linhas 35-41

8 Ter a proteção de Deus Linhas 41-43

9 Honra de receber o prêmio Linhas 43-47

10 Falha de não estar sempre presente Linhas 47-50

11 Fama Linhas 52-56

12 Definição de sabedoria Linhas 56-59

13 Solidão Linhas 65-72

Gráfico 2. Organização tópica linear da primeira situação comunicativa

Em relação aos tópicos desenvolvidos pelo rapper, percebemos que Mano Brown

revela uma determinada percepção dos fatos do mundo e de suas próprias ações, ou seja, além

da reflexão sobre a realidade social presente em suas músicas, ele revela em seu discurso que

o ato de refletir sobre as qualidades e defeitos dos seres humanos e sobre suas próprias ações

faz parte constante de sua vida.

Sendo assim, podemos concluir que os dois quadros tópicos são de caráter reflexivo:

enquanto o primeiro, Humildade x arrogância, caracteriza a reflexão de Mano Brown sobre

a sociedade em geral, o segundo, Comentários sobre si mesmo, caracteriza a reflexão do

rapper sobre si mesmo. Apesar de falar sobre os defeitos da sociedade em geral, Mano Brown

os exemplifica com cenas do cotidiano da própria favela de forma a incitar em seus

interlocutores uma consciência crítica (cf. Bentes, 2009a).

Um recurso bastante marcante na fala do rapper é o uso constante de analogias

(inteligência = humildade = sabedoria; arrogância = burrice = revolta/ódio/neurose) e de

antíteses (humildade x arrogância; sabedoria x burrice) para falar das qualidades e defeitos

dos seres humanos.

O segundo quadro tópico, Comentário sobre si mesmo, caracteriza a reflexão de

Mano Brown sobre si mesmo. Em relação à burrice, por exemplo, o rapper se inclui também

no “erro de ser burro”; ou seja, o locutor procura demonstrar que não é perfeito e com isso,

aproxima-se de seu interlocutor. Após fazer as críticas a si mesmo, Mano Brown faz a

seguinte promessa: “eu vou tentar ser menos burro...daqui pa frente(...)”. O fato de o rapper

fazer promessas, revelar seus erros e desejos e também pedir a sua audiência que “não o

abandonem” mostra que Mano Brown, mais do que adequar sua linguagem à de seus

interlocutores (design de audiência), tenta se aproximar dos seus interlocutores através de

determinados tópicos, exibindo um discurso que promove a sua identificação com os

moradores da favela (design de referência).

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Em relação aos comentários, a maioria também é de caráter reflexivo, mas em relação

à sua própria linguagem: o rapper reflete sobre a fala das pessoas que discursaram e sobre sua

própria fala, ou seja, muito das suas escolhas, em termos de tópico e de estratégias

discursivas, se deve a essa reflexão sobre a linguagem. O seu discurso, resultaria, portanto,

tanto da sua reflexão sobre a realidade como da sua reflexão sobre a linguagem (Bentes,

2009a).

Análise da segunda situação comunicativa

Na segunda situação comunicativa, temos uma interação face a face com apenas um

“participante endereçado e ratificado” (Goffman, 1964 apud Ribeiro e Garcez, 2002), ou seja,

Mano Brown endereça a sua fala a apenas um interlocutor, mesmo sabendo que podem estar

presentes outros participantes, que são denominados por Goffman (1979 apud Ribeiro e

Garcez, 2002) como “circunstantes”, que apesar de ratificados, não são os diretamente

endereçados. É importante salientar ainda que os interlocutores estão bem próximos e em um

lugar conhecido e familiar para o rapper: o seu carro. Além disso, nessa situação

comunicativa, não há uma divisão dos turnos de fala nos moldes de uma conversação. Assim,

Mano Brown faz uso de todo o turno e seus interlocutores produzem apenas backchannels5, o

que caracteriza sua produção discursiva como um depoimento.

Em termos de organização tópica de natureza hierárquica, a segunda situação

comunicativa apresenta, a nosso ver, um supertópico predominante e desenvolvido:

Documentário. Esse supertópico apresenta dois quadros tópicos co-constituintes: (1)

História da vida de um ladrão e (2) Descrição do contexto. Um outro tópico não

desenvolvido é o Sonhar em estar preso, que só aparece no final quando Mano Brown faz a

seguinte revelação: “eu já sonhei eu preso várias vez/tipo...já me imaginei várias vez/cê

acredita?...várias vezes... morto nem tanto...”. A emergência desse outro tópico, considerando

que essa fala de Mano Brown é bem curta, apesar de indicar uma mudança na direção e na

natureza do tópico, relaciona-se com a sua fala anterior, que discorria sobre a História da

vida de um ladrão e a Descrição do Contexto dessa história.

Essa delimitação foi possível graças a duas etapas já citadas anteriormente, também

empreendidas na primeira situação comunicativa.

A partir do agrupamento, foi possível identificar os quadros tópicos e os seus

5 A fim de demonstrar que está prestando atenção na fala do outro, uma pessoa pode emitir o que Duncan (1972), denomina backchannel, normalmente realizadas por meio de indicações vocais, como “hum-hum”, em português, ou por meio do olhar ou de acenos com a cabeça.

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segmentos tópicos co-constituintes.

O quadro tópico (1) envolve quatro subtópicos: Gostos; Assassinatos cometidos pelo

ladrão; Fama do ladrão e Amigos do ladrão.

O quadro tópico (2) envolve quatro subtópicos: Apresentação geral; Favela; Casa de

detenção e Linguagem dos ladrões.

Assim como na primeira situação comunicativa, no depoimento, não há

desdobramento dos subtópicos para um terceiro nível inferior. Acreditamos também que isso

se deva ao menor detalhamento em decorrência do curto tempo de fala.

Em termos sequenciais, Mano Brown inicia o seu texto com um tópico de natureza

interacional:

MB vô(u) fazê(r) o seguinte... põe essas revista...daqui ó... nóis (es)tá de teto

solar mano... o negócio (es)tá foda

Gráfico 3 - Organização tópica hierárquica da segunda situação comunicativa: primeiro supertópico

1 Apresentação geral Linhas 4-9

2 Gostos Linhas 9-10

3 Assassinatos cometidos pelo ladrão Linhas 10-11

4 Fama do ladrão Linhas 13-14

5 Amigos do ladrão Linhas 14-15

6 Favela Linha 16

7 Casa de Detenção Linhas 16-18

8 Linguagem dos ladrões Linhas 21-26

9 Fama do ladrão Linhas 26-28

10 Favela Linhas 29-34

11 Gostos Linhas 34-37

Gráfico 4 - Organização tópica linear da segunda situação

Segundo Jubran et al. (2002:366), isso caracterizaria uma digressão baseada na

interação. Segundos os autores, “tais digressões, por serem baseadas sensivelmente na

interação, são perfeitamente identificáveis e demarcáveis, embora nem sempre apresentem

estruturas claras e definidas”. Nesse caso, Mano Brown começa a interação com uma

Documentário

Descrição do contexto

História da vida de um

ladrão

Apresenta-ção geral

Favela Casa de detenção

Linguagem dos ladrões

Gostos do ladrão

Assas-sinatos

cometidos pelo ladrão

Fama do ladrão

Amigos do ladrão

1 6 7 8 2 3 4 5 9 10 11

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preocupação em deixar o interlocutor mais confortável (“vô(u) fazê(r) o seguinte... põe essas

revista...daqui ó”) e depois faz um comentário sobre o carro onde estão (“nóis (es)tá de teto

solar mano... o negócio (es)tá foda”). Apesar de não constituírem digressões propriamente

ditas, pois não interrompem nenhum tópico em andamento, não podemos deixar de considerar

a importância desse início como uma espécie de convite à interação.

Em relação à linearidade, podemos dizer que ao contrário da primeira situação

comunicativa, há maior descontinuidade tópica. Mano Brown apenas inicia o primeiro quadro

tópico (Descrição do contexto) para fazer uma apresentação geral do documentário visto. Em

seguida, ele inicia outro quadro tópico (História da vida de um ladrão) e depois retoma o

quadro tópico Descrição do contexto mesmo sem ter concluído o tópico o anterior. Dessa

forma, ele volta ao quadro tópico História da vida de um ladrão com os subtópicos Fama

do ladrão e Gostos do ladrão e, entre eles, insere o subtópico do outro quadro tópico:

Favela. Podemos concluir, então, que apesar de haver continuidade em determinado ponto da

conversa, no início e no fim, há tendência para a descontinuidade, ou seja, ocorre “introdução

de um tópico, por abandono do anterior, antes que os interlocutores o dessem por encerrado.

Nessa situação, ocorre um corte do tópico que estava em pauta” (Jubran et al., 2002: 350).

Nessa situação comunicativa, não há uma divisão dos turnos de fala nos moldes

convencionais, como já foi dito, caracterizando a produção discursiva do rapper como um

depoimento, bastante próximo de uma narrativa de experiência pessoal. Concluímos, a partir

da identificação dos tópicos, que a forma como o rapper organiza os conteúdos e finaliza seu

depoimento revela que ele não apenas reconta o que viu, mas também explicita o impacto

daquele produto cultural sobre si mesmo. Isto é evidenciado também pela quantidade relativa

de comentários: linhas 15-16 (“pô achei lo(u)co pa carai”); linha 18 (“INCRÍVEL COMO

LADRÃO NÃO MUDA”); linha 39 (“eu falei pÔ::rra lo(u)co lo(u)co lo(u)co lo(u)co”).

Conclusão

A partir dos nossos estudos iniciais sobre a relação entre as atividades de estilização e

o tópico discursivo, podemos dizer que nossa hipótese - de que o tópico discursivo

contribuiria fortemente para a mudança de estilo operada por Mano Brown - encontra-se

comprovada.

A partir da análise comparativa entre as duas situações comunicativas, pudemos

observar uma tendência a maior descontinuidade tópica na segunda situação comunicativa do

que na primeira. Podemos concluir que isso ocorre tanto em função tanto do tipo de audiência,

como também em função do próprio tópico discursivo mobilizado pelo locutor: se na primeira

situação comunicativa, Mano Brown agradece o prêmio que está recebendo por meio da

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tematização das qualidades e defeitos do ser humano e se na segunda situação comunicativa o

rapper está discorrendo de maneira informal sobre uma experiência sua com um determinado

objeto cultural, então podemos dizer que a mobilização desses diferentes tópicos discursivos

demanda atividades de textualização específicas (comentário & narração) que acabam por

resultar em processos de iconização recorrentes e observáveis (Irvine, 2001 apud Bentes,

2006), necessários para a caraterização do estilo. Este trabalho é apenas o primeiro passo para

o desenvolvimento de análises desses processos de iconização presentes nas falas dos sujeitos

que estilizam seus modos de comunicação e de ser e estar no mundo.

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