Redes e Mediações Nos Movimentos Populares

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Movimentos Sociais

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  • Redes e Mediaes nos Movimentos Populares

    (imi breve resumo)

    lbw Shdverer- Warren

    Sobre o Autor

    Use Scherer-Warren gacha. Mestre em Sociologia Rural pela UFRGS e Doutora em Sociologia pela Universidade de Paris. Foi professora da 1UFRJ e desde 1981 trabalha na UFSC. Autora de vrios trabalhos sobre movimentos sociais, publicou pela Editors da UFSC os livros: Movimentos Sociais - um ensaio de interpretaao sociolgica e Crise PoUtica, Movimentos Sociais e Cidadania em colab.) e pela Ed. Brasiliense, Uma Revoluao no Cotidiano (em comb.). Alm disso, teve artigos publicados em outras obras e em revistas nacionais e internacionais. Sua mais recente publicaaio foi na International Sociology (maro de 1990), com o titulo 'Rediscovering our dignity' - An appraisal of the utopia of liberation in Latin America.

    Rera:stx de CeeZICI:OLF HUMAITAW Vol. 6, No.9, 1990 36

  • Summary

    This exposure aims the setting up of elemets for the comprehension of underlying political action in the network orgenizatins which have been stabushed between popular organizations and other cultural and political movements. It assumes the hypothesis that from the second half of the 80's on, it is through these networks that a true popular movement in Brazil has being constituted. It emphasizes the participation of non-governmental organizations (ONGs), together with sindical unions and political parties, in the formation of movements networks. In relation to the characteristics of these networks, we mention the search for articulation of popular movements (among movements and intraregionaly), the subject of organizational and ideological pluralism and its transnational character. Finally, it emphasizes the existence of universalizing ethical principles at the base of these movements.

    Resumo

    Esta exposian visa encaminhar

    elementos para a com.preensao da aao politica subjacente is redes (network organizations) que vim se estabelecendo entre organizaes populares e outros movimentos culturais e politicos. Parte da

    hiptese de que a partir da segunda

    metade da dcada de 80 atravs destas redes que vem se constituindo um verdadeiro movimento popular no Brasil. Destaca a participaao das organizaes no governamentais (ONGs), ao lado das Centrais Sindicais e de partidos politicos, na formaao das redes de movimentos. Quanto its caracteristicas destas redes, sito mencionadas a busca de articulaito do movimento popular (entre movimentos e intraregional), a questao do pluralismo ideolgico e organizacional e seu cariew transnacional. Finaliza destacando a existncia de principios ticos universalizantes nas bases destes movimentos.

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  • O principal objetivo desta interveno sera encaminhar alguns elementos para a reflexo sobre a dinAmica da ao politica subjacente its redes (network organizations) que vem se estabelecendo entre organizaes populares e outros movimentos culturais e politicos. Parte-se da hiptese que nas articulaes entre organizaes e atores politicos e nas subsequentes criaes de redes que vem se constituindo um movimento social, no sentido dado por Alain Touraine. Segundo esta noo temos um movimento social quando se tratar de 'um conflito social que ope formas sociais contrairias de utilizao dos recursos e dos valores culturais, sejam estes da ordem do conliecimento, da economia ou da tica" (Palavra e Sangue, 1989, p.182). Portanto, refere-se aqui a aes coletivas que vo alm da defesa de interesses particulares e que buscam "intervir na formao das politicas gerais de organizao ou de transformao da vida social" (Ibid).

    O que tem sido comumente denominado de movimento social, no Brasil, trata-se de aes coletivas, realizadas por organizaes populares localizadas e especificas, com alcance limitado de sua ao poltica (por exemplo, associaes de bairro, movimento de mulheres, organizaes de defesa ambiental, etc). Estas organizaes que proliferaram da dcada de 70 aos meados da dcada de 80, tiveram sua relevncia durante o regime autoritrio, pois eram o espao de expresso poltica possvel para novos atores sociais. Questes do cotidiano transformaram-se em demandas polticas e em instrumento de defesa dos direitos de cidadania ou de contestao do autoritarismo. Todavia, com a abertura poltica dos anos 80, estas organizaes mostraram ter um alcance politico limitado. Priusa alguns isto foi atribuido a aparente fragmentao destes grupos de presso especifica, demonstrando dificuldade na formao de alianas, para atuarem de acordo com as regras do jogo democrtico. Para outros, a crise dos grupos de reivindicaes especificas ou das organizaes moleculares expressava a fragilidade da sociedade civil face aos aparelhos politicos tradicionais institudos (os sindicatos, os partidos e o prprio governo), num cenrio ern que a ordem institucional passa a ter maior legitimidade.

    Porm, na segunda metade da dcada de 80, muitas destas organizaes da sociedade civil se reorientarn e passam a participar de redes mais amplas de presso e resistncia. No ha dvida que sindicato e partido politico (principalmente via CUT e PT) tm desempenhado um papel importante nestas novas formas de articulaes. E necessrio, todavia, ser examinado se de fato um movimento popular mais amplo vem se formando como resultado destas articulaes e intercmbios.

    Na base deste movimento popular em constituio ha um trabalho de mediao que no deve ser esquecido. Refiro-me aquele realizado por um conjunto de entidades de mediao, os quais passaram a ser conhecidos por "ONGs" (Organizaes No-Governamentais). Esto ai

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  • incluidos os "Centros de Educao Popular", "Centros de Promoo" e "Centros de Assessoria". As "ONGs" so entidades que se apresentam como estando 'a servio de determinados 'movimentos socias' de camadas da populao 'oprimidas', ou 'exploradas', ou l excluidas', dentro de perspectivas de 'transformao social,' (Cf. Landim, 1988, p. 27). Todavia, as ONGs que vinham se formando no Brasil desde o fim da dcada de 60, da mesma forma que as organizaes populares de defesa de interesses

    especficos, tambm realizavam um trabalho

    molecular, localizado, ainda que com o objetivo de formao da conscincia

    num sentido mais amplo. Na dcada de 80, a complexificao do quadro partidatio e o en.sar sobre a atuao ao ravel da

    poltica institucional, levou a urn questionamento sobre o

    antigo estilo de trabalho. Como nos coloca Landim (1988, p. 49), as "ONGs" brasileiras vm-se moviment do, mais recentemente, no sentido de articulaes, trocas de idias, trabalhos em cooperao de diferentes tipos, costurando-se no seu interior algumas redes temticas mais permanentes, outras funcionais e imediatas, para atender a objetivos conjunturais diversos". Ao

    nvel das mediaes

    passam tambm a se preocupar com a formao de redes de movimentos ou de areas de movimentos.

    Algumas das caractersticas destas redes de movimentos que vm se formando no Brasil podem ser assim sintetizadas:

    a) Articulao do Movimento Popul , Esta articulao pode

    ocorrer entre entidades do mesmo tipo, num espao regional ou nacional, como as unies de associaes de bairros (p. ex., UAMPA Unio das Associaes de Moradores de Porto Alegre). Em funo de uma dem;

    i da mais especfica, como a questo da terra (MST - Movimento dos Sem Terra ou ANSLTR - Articulao Nacional do Solo Urbano). Em funo de questes regionais (Aliana dos Povos da Floresta). Ou mesmo visando articular o movimento popular como um todo (ANAMPOS - Articulao Nacional dos Movimentos Populares e Sindicais). E por

    ltimo , mas no menos relevantes, as articulaes informais que se realizam em funo de lutas conjunturais como, por exemplo, durante os

    trabalhos da

    constituinte para o encaminhamento de emendas populares.

    b) Pluralismo organizacional e ideolgico. Manifesta-se pelo fato de os mesmos atores sociais participarem de vrias organizaes ou pelo fato da mesma organizao incorporar atores com concepes ideolgicas ou filiaes partidrias mltiplas. Todavia, h uma utopia minima quanto transformao que os une, baseada em

    princpios ticos

    universaLizantes de combate misria, explorao, discriminao, ao autoritarismo, violncia, etc.

    c) Transnacionalidade. Este - -iecto apresenta-se com diferente intensidade nas diversas redes. Nas ONGs, frequentemente, as

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  • suas possibilidades de sustentaito material encontram-se nas cedes de financiamento internacionais. A tran.snacionalidade dos movimentos de direitos humanos e ecolgicos tambm mais estimulada do que entre os movimentos populares propriamente ditos. Tadavia, para o caso brasileiro, redes politicamente significativas vem sendo estabelecidas, como por exemplo, entre os movimentos ecolgicos e pelos direitos humanos internacionais e movimentos sociais rurais do Brasil. Neste sentido, trs exemplos merecem ser citados: Movimento Contra Barragens, Movimento Indgena e Movimento dos Seringueiros.

    No caso do Movimento Contra as Barrage= houve a participao do Brasil na Rede de Ao Internacional pelos Rios (International Rivers Network), de cujo seio nasceu uma rede especifica para a proteo dos rios da America Latina, com sede na UPAN (Unio Protetora do Ambiente Natural/RS). A CRAB (Comisso Regional dos Atingidos pelas Barragens - do Rio Uruguai) tem tido um papel importante na articulao nacional dos trabalhadores atingidos por barragens (Vide CUT/CRAB, 1989).

    O movimento indgena na luta em defesa de seus territrios e de sua identidade cultural, constantemente ameaados por grandes projetos de vrias naturezas (minerao, siderurgia, hidroeltricas, agropecuria, rodovias e militar - como o Calha Norte), tem contado com redes de apoio internacionais, tais como Friends of the Earth, Survival Internacional, Greenpeace, Gaya Foundation (Inglaterra), World Wildlife Fund (EUA) e Agir-Ici (Frana)

    O Movimento dos Seringueiros, e em particular a morte de seu lder Chico Mendes, teve tamanha repercusso graas as suas articulaes com os movimentos ecolgicos nacionais e internacionais. Este movimento vem buscando tambm novas articulaes entre movimentos e intraregionais, tais como a Aliana dos Povos da Floresta, que conta com a participao do

    Conselho Nacional dos Seringueiros (CNS), da Unio das Naes

    Indgenas (UNI) e do Centro Ecumnico de Documentao (CEDI).

    No caso dos tries movimentos mencionados (Barragens, Indgenas

    e Seringueiros), as redes de apoio transnacionais fundamentam-se numa dimenso tica. Articula-se ai a valorizao da natureza (expressa na luta ambientalista e ecolgica) com a valorizao de princpios humanitrios (expressa na luta pela

    sobrevivncia ou de preservao de um modo de vida) (Para maiores detalhes ver Scherer-Warren, 1990).

    De uma forma geral, pode-se afirmar que as redes de movimentos se constituem em torno de problemas

    especficos, mas que so

    definidos a partir de uma dimenso tica universalizante. Se os

    movimentos sociais da dcada de 70 e inicio dos anos 80 tiveram sua relevincia na constituio de novos atores sociais e na redefinio dos

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  • espaos de cidadania (social e poltica), as redes de movimentos

    podero trazer contribuies na formao de novos sistemas de valores, sobretudo em relao ao binmio Liberdade (e democracia) e Sobrevivencia (com direito a uma vida digna). Esta dimenso tica expressa-se atravs do apelo a uma sensibilidade coletiva (am nome da paz, da democracia e da vida e contra a fome, a misria, a discriminao, etc) e por uma responsabilidade pessoal em relao ao futuro coletivo ao

    nvel local, nacional e planetrio (Cf. Hegedus,

    1989). Todavia, a atuao destas redes de movimentos no se restringem a sua atuao no

    nvel simblico. Atuam, por um lado, tendo em vista a transformao da opinio pblica, mas, por outro lado, almejam se constituir em

    fora de presso ao sistema institucional e aos padres dominantes contrrios a estes princpios. Desta maneira as redes se caracterizam como fontes de presso no campo cultural e no

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