Referencial Curricular da Educação Básica para as Escolas Públicas de Alagoas

Embed Size (px)

Citation preview

GOVERNO DO ESTADO DE ALAGOAS SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAO E DO ESPORTE SEE/AL PROJETO DE COOPERAO TCNICA MEC-PNUD-SEE/AL

REFERENCIAL CURRICULAR DA EDUCAO BSICA PARA AS ESCOLAS PBLICAS DE ALAGOAS

Alagoas

2010

Teotonio Brando Vilela Filho GOVERNADOR DO ESTADO DE ALAGOAS

Jos Wanderley Neto VICE-GOVERNADOR DO ESTADO DE ALAGOAS

Rogrio Auto Tefilo SECRETRIO DE ESTADO DA EDUCAO E DO ESPORTE

Maria Ccera Pinheiro SECRETRIA DE ESTADO ADJUNTO DA EDUCAO

Luis Antonio Camargo Ribas SECRETRIO DE ESTADO ADJUNTO DO ESPORTE

Maria Cicera Pinheiro COORDENAO TCNICA OPERACIONAL Jos Fernando Santa Cruz COORDENAO DE APOIO LOGSTICO ngela Maria Costa dos Santos LDER DO EIXO Claudiane Oliveira Pimentel Fabrcio COORDENAO DA AO Adeilma Maria Claudino da Fonseca Claudiane Oliveira Pimentel Fabrcio Gelvana Almeida Costa Jos Gerson de Farias Jizelda de Lima Neto Joelina Alves Cerqueira Joo Jos Cavalcante da Silva Maria Carmlia Lopes Silva Maria Gerusa Bezerra Arajo Maria de Jesus Machado Maria do Carmo Custdio de Melo Silveira Maria Margarete Luiz de Frana Maria de Jesus Machado Maria do Carmo Custdio de Melo Silveira Mrcia Valeria Cardoso Niccio Marta Betnia Marinho Silva Marizete Maria de Melo Santos Walnyce Miranda Vasconcelos Viana EQUIPE DE DISCUSSO Claudiane Oliveira Pimentel Fabrcio Maria de Jesus Machado Maria do Carmo Custdio de Melo Silveira EQUIPE DE ELABORAO Laudo Bernardes Coordenador Geral Maria Edenise Galindo Coordenadora Local Liliane Marchiorato Consultora Local Manuel Orleilson Ferreira da Silva Consultor Local EQUIPE DE APOIO TCNICO MEC-PNUD

Caro(a) educador(a), Num mundo marcado por tantas desigualdades e processos sociais desumanizadores, muitos so os desafios enfrentados por quem se prope a trabalhar numa proposta educacional voltada formao humana e comprometida com a transformao da realidade social. Como educadores, sempre buscamos oferecer o que temos de melhor para nossos alunos. Entretanto, apesar dos esforos, constata-se que h ainda um longo caminho a ser percorrido em direo qualidade desejada e necessria formao escolar dos alunos do ensino pblico, seja na rede estadual ou nas redes municipais. Por isso, com grande satisfao que apresentamos o Referencial Curricular da Educao Bsica para as Escolas Pblicas de Alagoas RECEB, com o propsito de orientar a organizao da ao pedaggica desenvolvida pelas escolas pblicas do estado, enfatizando os princpios norteadores do processo de ensino-aprendizagem na Educao Infantil, no Ensino Fundamental e no Ensino Mdio, de modo a promover a melhoria da sua qualidade. Assim, vale ressaltar que o RECEB, por si s, no muda a realidade educacional das Escolas Pblicas de Alagoas, mas pode ser utilizado como um instrumento que venha contribuir para a reflexo das prticas pedaggicas, a construo das Propostas Curriculares das escolas, bem como a organizao dos processos pedaggicos do cotidiano escolar. Diante destes desafios necessrio o compromisso de todos os profissionais que fazem a Educao Pblica de Alagoas em todas as Instncias: Administrao Central, Coordenadorias Regionais de Educao, Escolas e a Comunidade, na luta por uma Educao de Qualidade Social para todos. As transformaes que o RECEB provocar, depende do uso que se fizer dele. Esperamos que o mesmo constitua-se uma ferramenta de discusso, reflexo, compreenso e organizao da ao pedaggica. Daqui em diante com voc, educador (a)!

SUMRIO APRESENTAO INTRODUO ....................................................................................................................7 1. EDUCAO BSICA: PRECEITOS LEGAIS ..................................................................9 1.1. Educao Infantil ..........................................................................................................12 1.2. Ensino Fundamental .....................................................................................................13 1.3. Ensino Mdio ................................................................................................................15 2. ANLISE DA ORGANIZAO CURRICULAR DE OUTRAS UNIDADES FEDERATIVAS E DAS INICIATIVAS LOCAIS..................................................................................................17 2.1. Anlise das iniciativas locais ........................................................................................17 2.2. Anlise da organizao curricular de outras unidades federativas ................................ 19 3. PRINCPIOS NORTEADORES E FUNDAMENTOS TERICO-METODOLGICOS DO PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM ..................................................................20 3.1. Princpios norteadores ..................................................................................................20 3.2. Currculo e formao humana .......................................................................................22 3.3. Desenvolvimento e aprendizagem ................................................................................23 3.4. Educao, trabalho e humanizao .............................................................................25 3.5. Educao, diversidade e diferena ...............................................................................29 3.6. Educao Ambiental e formao humana .....................................................................32 4. PRESSUPOSTOS PARA A ORGANIZAO CURRICULAR DAS ETAPAS E

MODALIDADES DA EDUCAO BSICA ..........................................................................34 4.1. Educao Infantil ..........................................................................................................34 4.2. Ensino Fundamental .....................................................................................................40 4.3. Ensino Mdio ................................................................................................................44 4.4. Educao de Jovens e Adultos .....................................................................................42 4.5. Educao Especial .......................................................................................................49 4.6. Educao Profissional e Tcnica .................................................................................51 4.7. Educao no Campo.....................................................................................................53 4.8. Educao Escolar Indgena ..........................................................................................56 4.9..Educao Quilombola ...................................................................................................58 5. PRESSUPOSTOS METODOLGICOS DO PROCESSO DE ENSINO E

APRENDIZAGEM ................................................................................................................60 5.1. A Organizao do Conhecimento .................................................................................61 5.2. A Abordagem Metodolgica ..........................................................................................62 5.3. Ensinar Exige Rigorosidade Metdica e Pesquisa ........................................................65

5.4. Avaliao da Aprendizagem..........................................................................................67 5.4. Aprendizagens bsicas esperadas na educao bsica ...............................................71 5.4.1. Aprendizagens bsicas esperadas ao final da Educao Infantil ............................... 71 5.4.2. Aprendizagens bsicas esperadas ao final do 3 ano do Ensino Fundamental ..........72 5.4.3. Aprendizagens bsicas esperadas ao final do 5 ano Ensino Fundamental ...............74 5.4.4. Aprendizagens bsicas esperadas ao final do 9 ano do Ensino Fundamental ..........76 5.4.5. Aprendizagens bsicas esperadas na Juventude 1 ao 3 ano do Ensino Mdio ....80 6. CONSIDERAES FINAIS ............................................................................................. 84 7. REFERENCIAS ...............................................................................................................86

APRESENTAO O Referencial Curricular da Educao Bsica para as Escolas Pblicas de Alagoas caracteriza-se como um dos resultados do esforo conjunto entre a Secretaria de Estado da Educao e do Esporte de Alagoas (SEE/AL), o Ministrio da Educao (MEC) e o Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), por meio de um projeto de cooperao tcnica cujo objetivo elaborar e apresentar sociedade alagoana uma proposta de educao com foco na melhoria da qualidade da aprendizagem dos alunos da educao bsica e na consequente reverso dos indicadores educacionais do estado. A construo de um referencial curricular da educao bsica para as escolas pblicas de Alagoas se justifica num conjunto integrado de aes de reestruturao, modernizao e reorganizao da educao pblica, com o intuito de promover as condies bsicas para a reverso do quadro educacional que se encontra no estado. Ao propor um referencial curricular, a SEE/AL tem como propsito nortear a ao pedaggica dos profissionais da educao, assegurando padres bsicos para a construo da qualidade da aprendizagem dos alunos. O referencial curricular ora apresentado resultado de estudos e discusses dos profissionais dos setores da SEE/AL diretamente responsveis pela execuo das polticas educacionais, no que se refere organizao curricular e ao desenvolvimento da educao bsica pelas escolas pblicas estaduais e municipais. O ponto de partida dessa construo foi a anlise de diversos documentos legais, conceituais, normativos e operacionais j existentes na SEE/AL, frutos de discusses coletivas com os profissionais das comunidades escolares, tais como o Plano Estadual de Educao, a Carta de Princpios, as propostas curriculares da Escola Normal e da Educao de Jovens e Adultos, assim como outros documentos de orientao encaminhados pelos responsveis pela educao infantil, ensino fundamental, ensino mdio, educao indgena, educao quilombola e educao no campo na Administrao Central da SEE/AL. Nesse processo, foram considerados os avanos e os limites da caminhada pedaggica j percorrida pelos profissionais da educao da SEE/AL na construo de um currculo bsico para as escolas. Com todas as limitaes inerentes a qualquer proposta educacional, este referencial curricular no pretende estabelecer dogmas e nem esgotar a discusso terica e metodolgica, mas, isto sim, almeja oferecer aos professores, diretores e coordenadores pedaggicos das escolas pblicas um instrumento orientador na construo de prticas pedaggicas transformadoras da triste realidade escolar que assombra, h muito tempo, os cidados alagoanos. Nesse sentido, entende-se que a reflexo da prtica pedaggica s tem sentido para e por aqueles que a fazem no cotidiano da escola e que, somente a partir dela, se pode

efetivar qualquer possibilidade de transformao. Isso significa dizer que a prtica pedaggica dos profissionais das escolas a principal responsvel pela materializao deste referencial e depende do compromisso de toda a equipe escolar. A escola assume, portanto, um papel estratgico nessa trajetria, refletindo criticamente a prtica pedaggica realizada, a partir das questes e orientaes apresentadas neste referencial curricular, com o intuito de avaliar suas proposies na implementao da gesto democrtica, na co-responsabilidade de todos, no fortalecimento institucional, na construo de uma aprendizagem qualitativa em que, respeitadas as diferenas e os diversos tempos dos alunos, apresente resultados educacionais positivos.

Na escola, o currculo espao em que se concretiza o processo educativo pode ser visto como o instrumento central para a promoo da qualidade na educao. por meio do currculo que as aes pedaggicas se desdobram nas escolas e nas salas de aula. por meio do currculo que se busca alcanar as metas discutidas e definidas, coletivamente, para o trabalho pedaggico. O currculo corresponde, ento, ao verdadeiro corao da escola. Da a necessidade de permanentes discusses sobre o currculo, que nos permitam avanar na compreenso do processo curricular e das relaes entre o conhecimento escolar, a sociedade, a cultura, a autoformao individual e o momento histrico em que estamos situados. (MOREIRA, 2008, p.5)

7

INTRODUO A educao bsica de Alagoas tem apresentado indicadores educacionais muito abaixo do esperado no cenrio educacional brasileiro, conforme pode ser comprovado pelos Indicadores de Desenvolvimento da Educao Bsica IDEB dos ltimos anos. Isso significa que o desempenho escolar dos alunos das escolas pblicas em Alagoas no corresponde s aprendizagens bsicas referentes a cada nvel de ensino e a cada ano escolar, conforme os padres de qualidade definidos pelo Ministrio de Educao - MEC. A reverso dessa situao requer um conjunto de mudanas estruturais de natureza tcnica, administrativa, financeira e, principalmente, pedaggica, j que a qualidade da educao est diretamente vinculada qualidade do processo de ensino-aprendizagem efetivado nas salas de aula. Dessa forma, necessrio criar as condies bsicas para superao dos atuais desafios e promover os avanos essenciais construo de uma educao pblica de qualidade. No caso de Alagoas, essas condies incluem, prioritariamente, a garantia de alfabetizao de todos os alunos matriculados nas escolas pblicas, a correo do fluxo escolar, a expanso da oferta de ensino em todos os nveis, a definio de uma base terico-metodolgica comum, o alcance das aprendizagens escolares bsicas e o aprimoramento do processo de ensino-aprendizagem, de modo a garantir a efetivao das polticas educacionais no estado. Nesse projeto, os profissionais da educao da SEE/AL, com o apoio e colaborao do Projeto de Cooperao Tcnica MEC-PNUD, so os responsveis pela elaborao das propostas de reestruturao, modernizao e reorganizao da educao pblica de Alagoas, do planejamento avaliao dos resultados. A equipe do trabalho tomou como ponto de partida as propostas curriculares j existentes, contemplando os nveis da educao bsica (infantil, fundamental e mdio), suas modalidades (Educao de Jovens e Adultos, Ensino Profissional, Educao Especial e Educao Distncia) e especificidades (Educao no Campo, Indgena e Quilombola). A construo do referencial curricular foi desenvolvida nas seguintes etapas: Estudo da legislao educacional vigente; Anlise dos documentos e propostas curriculares existentes na SEE/AL; Pesquisa e anlise das experincias de organizao curricular de outros estados; Estudos e discusses sobre as concepes filosfico-educacionais, pressupostos metodolgicos, abordagem do conhecimento em cada nvel de ensino, modalidades e especificidades, organizao dos contedos escolares e avaliao; Elaborao do documento.

Vale ainda destacar que, nesse processo, foram respeitadas as intenes e produes das diversas personagens que tm construdo a educao pblica de Alagoas e,

8

principalmente, se procurou atender as expectativas sociais com relao aprendizagem dos principais atores desse processo os alunos. Nesse sentido, o referencial curricular se consagra como uma construo coletiva que revela as intencionalidades da educao pblica no estado de Alagoas e aponta caminhos e possibilidades, sem, contudo, limitar a ao pedaggica.

9

1. EDUCAO BSICA: PRECEITOS LEGAIS As condies para o desenvolvimento da multiplicidade de aspectos e dimenses que constituem a vida humana devem ser garantidas em lei como direito cidadania, mas, para que se tornem direito de fato, devem ser efetivadas pela e na prtica social. A educao um desses direitos sociais, assegurada na legislao brasileira a todos os cidados, conforme determina a Constituio Federal de 1988, no seu art. 205: A educao, direito de todos e dever do Estado e da famlia, ser promovida e incentivada com a colaborao da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exerccio da cidadania e sua qualificao para o trabalho. No entanto, a realidade tem demonstrado que, apesar da garantia da lei, ainda h uma significativa excluso das camadas mais pobres da populao ao acesso e, principalmente, de permanncia na educao bsica. A Lei n. 9394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional LDB) e a Resoluo CNE/CEB n 4/2010 (Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais da Educao Bsica DCNGEB), retomam o principio constitucional da educao como um direito de todos, dever da famlia e do Estado:Art. 2. A educao, dever da famlia e do Estado, inspirada nos princpios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exerccio da cidadania e sua qualificao para o trabalho.(Lei n. 9394/96) Art. 4 As bases que do sustentao ao projeto nacional de educao responsabilizam o poder pblico, a famlia, a sociedade e a escola pela garantia a todos os educandos de um ensino ministrado de acordo com os princpios de: I - igualdade de condies para o acesso, incluso, permanncia e sucesso na escola; II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o pensamento, a arte e o saber; III - pluralismo de ideias e de concepes pedaggicas; IV - respeito liberdade e aos direitos; V - coexistncia de instituies pblicas e privadas de ensino; VI - gratuidade do ensino pblico em estabelecimentos oficiais; VII - valorizao do profissional da educao escolar; VIII - gesto democrtica do ensino pblico, na forma da legislao e das normas dos respectivos sistemas de ensino; IX - garantia de padro de qualidade; X - valorizao da experincia extraescolar; XI - vinculao entre a educao escolar, o trabalho e as prticas sociais. (DCNGEB, Res. n. 4/2010)

Nesse sentido, a Educao Bsica direito universal para o exerccio da cidadania, por meio da qual possibilita a conquista de outros direitos, definidos na Constituio Federal, no Estatuto da Criana e do Adolescente (ECA) e demais legislaes, considerando as

10

dimenses do educar e do cuidar como funes indissociveis, buscando recuperar, nesse nvel da educao, a centralidade do educando na sua essncia humana. 1 A educao de jovens e adultos, educao especial e educao profissional atendem s necessidades especficas das diferentes clientelas dos nveis de ensino, de modo a garantir que o processo pedaggico seja adequado s suas peculiaridades. Alm disso, na busca de garantir que todos possam ter acesso educao bsica sem qualquer tipo de preconceito, discriminao ou forma de excluso social, os nveis de ensino devem ser organizados no sentido de incorporar e respeitar as diversidades culturais, tais como: a educao escolar indgena, a educao no campo e a educao quilombola. O art. 22 da LDB ratifica o referido preceito constitucional ao afirmar que a Educao Bsica tem por finalidade desenvolver o educando, assegurandolhe a formao comum indispensvel para o exerccio da cidadania e fornecer-lhe meios para progredir no trabalho e nos estudos superiores (BRASIL, 2003, p.14). Pelo que se pode constatar nas legislaes, educao bsica atribuda uma tripla finalidade na formao do educando: promover a cidadania; qualificar para o mundo do trabalho; garantir as condies para a continuidade dos estudos. Proporcionar uma formao bsica que possibilite o cumprimento dessas trs finalidades representa um enorme desafio escola pblica brasileira e maior ainda s escolas pblicas de Alagoas, em virtude de seu distanciamento da realidade nacional. Segundo a LDB e as DCNGEB2, essa formao deve ser efetivada a partir de uma base nacional comum, a qual deve ser complementada por uma parte diversificada, conforme as necessidades e peculiaridades locais.Art. 26. Os currculos do ensino fundamental e mdio devem ter uma base nacional comum, a ser complementada, em cada sistema de ensino e estabelecimento escolar, por uma parte diversificada, exigida pelas caractersticas regionais e locais da sociedade, da cultura, da economia e da clientela. 1. Os currculos a que se refere o caput devem abranger, obrigatoriamente, o estudo da lngua portuguesa e da matemtica, o conhecimento do mundo fsico e natural e da realidade social e poltica, especialmente do Brasil. 2. O ensino da arte constituir componente curricular obrigatrio, nos diversos nveis da educao bsica, de forma a promover o desenvolvimento cultural dos alunos.

1 2

DCNGEB,2010, artigos 5 e 6 DCNGEB,2010 artigos 14, 15 e 16

11

3. A educao fsica, integrada proposta pedaggica da escola, componente curricular obrigatrio da Educao Bsica, sendo sua prtica facultativa ao aluno: I-que cumpra jornada de trabalho igual ou superior a seis horas; II-maior de trinta anos de idade; III-que estiver prestando servio militar inicial, ou que, em situao similar estiver obrigado prtica da educao fsica. IV-que tenha prole; 4. O ensino da Histria do Brasil levar em conta as contribuies das diferentes culturas e etnias para a formao do povo brasileiro, especialmente das matrizes indgena, africana e europia. 5. Na parte diversificada do currculo ser includo, obrigatoriamente, a partir da quinta srie, o ensino de pelo menos uma lngua estrangeira moderna, cuja escolha ficar a cargo da comunidade escolar, dentro das possibilidades da instituio. 6 A msica dever ser contedo obrigatrio, mas no exclusivo, do componente curricular de que trata o 2 deste artigo.(Lei n. 9394/96)

Para isso, define algumas diretrizes a serem ponderadas na seleo e organizao dos contedos nas propostas curriculares da educao bsica.Art. 27. Os contedos curriculares da educao bsica observaro, ainda, as seguintes diretrizes: I - a difuso de valores fundamentais ao interesse social, aos direitos e deveres dos cidados, de respeito ao bem comum e ordem democrtica; II - considerao das condies de escolaridade dos alunos em cada estabelecimento; III - orientao para o trabalho; IV - promoo do desporto educacional e apoio s prticas desportivas no-formais.

No que concerne s responsabilidades do Poder Pblico com relao s etapas de ensino, os pargrafos 2 e 3, do art. 211, da Constituio Federal, definem que os Municpios devem atuar prioritariamente no ensino fundamental e na educao infantil, enquanto que os Estados devem priorizar o ensino fundamental e mdio. A LDB, por sua vez, nos artigos 10 e 11, reitera essas reas de competncia, todavia, estabelece aos Estados como oferta prioritria o ensino mdio, mas tambm delega a responsabilidade de assegurar a oferta do ensino fundamental em regime de colaborao com os Municpios (incisos II e VI, art. 10):(...) II - definir, com os Municpios, formas de colaborao na oferta do ensino fundamental, as quais devem assegurar a distribuio proporcional das responsabilidades, de acordo com a populao a ser atendida e os recursos financeiros disponveis em cada uma dessas esferas do Poder Pblico;

12

(...) VI - assegurar o ensino fundamental e oferecer, com prioridade, o ensino mdio.

Da mesma forma, a LDB (inciso V, art. 11) determina a oferta do ensino fundamental como prioridade dos Municpios e tambm estabelece como sua responsabilidade o atendimento dos alunos da educao infantil.(...) V - oferecer a educao infantil em creches e pr-escolas, e, com prioridade, o ensino fundamental, permitida a atuao em outros nveis de ensino somente quando estiverem atendidas plenamente as necessidades de sua rea de competncia e com recursos acima dos percentuais mnimos vinculados pela Constituio Federal manuteno e desenvolvimento do ensino.

Apesar de responsabilidades e competncias distintas com relao educao, Unio, Estados e Municpios devem ofertar os nveis de ensino da educao bsica a toda a populao, em regime de colaborao. 1.1. Educao infantil A Constituio Federal de 1988, em seu art. 208, inciso IV, garante atendimento em creche e pr-escola s crianas de zero a seis anos de idade, sendo somente esta a referncia a respeito da educao infantil. No art. 29 da LDB, no art. 22 das DCNGEB e no art. 5 das DCNEI, a educao infantil definida como a primeira etapa da educao bsica, que tem como finalidade (...) o desenvolvimento integral da criana at seis anos de idade, em seus aspectos fsico, psicolgico, intelectual e social, complementando a ao da famlia e da comunidade. Afirma ainda, no art. 30 da LDB que as creches ou entidades equivalentes devem ofertar educao infantil para crianas de at trs anos e as pr-escolas para as crianas de quatro a seis anos de idade.3 A legislao em vigor assegura e dispe que a educao infantil rea de competncia dos Municpios, no entanto, as taxas de atendimento da demanda na faixa etria entre zero e seis anos revelam a omisso dos Municpios quanto s suas responsabilidades legais.4 Apesar de a educao infantil ser mencionada nos textos legais, sua estruturao, formas de organizao e normatizao em mbito nacional ainda no so contempladas de maneira mais efetiva, a ampliao do acesso para atendimento da demanda e as condies bsicas para permanncia das crianas nas instituies escolares.3

Pela Lei n. 11.274, de 06/02/2006, essa ltima faixa etria foi alterada para quatro at seis anos de

idade em funo do ensino fundamental de nove anos 4 LDB 9394/06, DCNEI,2009, DCNGEB, 2010

13

1.2. Ensino fundamental Segundo o artigo 32 da LDB, o ensino fundamental se constitui como etapa obrigatria da educao bsica com a durao de 9 anos, iniciando-se aos 6 anos de idade, e ter por objetivo a formao bsica do cidado. direito pblico garantido o acesso a todos na escola pblica, dever dos Municpios, assegurada a oferta, em regime de colaborao com os Estados e a assistncia da Unio. Desde 1988, Estados e Municpios vm compartilhando as responsabilidades administrativas, tcnicas e financeiras relativas ao ensino fundamental, ficando, na maioria dos casos, os anos iniciais sob a responsabilidade direta dos Municpios e os anos finais delegados aos Estados.5 De acordo com a legislao educacional, o ensino fundamental obrigatrio e responsabilidade do Poder Pblico assegurar as condies de sua oferta, ficando inclusive sujeita ao judicial a autoridade competente que no cumprir esse preceito legal.Art. 5. O acesso ao ensino fundamental direito pblico subjetivo, podendo qualquer cidado, grupo de cidados, associao comunitria, organizao sindical, entidade de classe ou outra legalmente constituda, e, ainda, o Ministrio Pblico, acionar o Poder Pblico para exigi-lo. (...) 2. Em todas as esferas administrativas, o Poder Pblico assegurar em primeiro lugar o acesso ao ensino obrigatrio, nos termos deste artigo, contemplando em seguida os demais nveis e modalidades de ensino, conforme as prioridades constitucionais e legais. 3. Qualquer das partes mencionadas no caput deste artigo tem legitimidade para peticionar no Poder Judicirio, na hiptese do 2 do Art. 208 da Constituio Federal, sendo gratuita e de rito sumrio a ao judicial correspondente. 4. Comprovada a negligncia da autoridade competente para garantir o oferecimento do ensino obrigatrio, poder ela ser imputada por crime de responsabilidade. 5. Para garantir o cumprimento da obrigatoriedade de ensino, o Poder Pblico criar formas alternativas de acesso aos diferentes nveis de ensino independente da escolarizao anterior.

A LDB define um conjunto de pressupostos para o ensino fundamental, de modo a garantir o cumprimento de sua finalidade na formao do cidado nessa etapa da educao bsica.

5

DCNGEB,2010, Art. 7.

14

Art. 32. O ensino fundamental, com durao mnima de oito anos, obrigatrio e gratuito na escola pblica, ter por objetivo a formao bsica do cidado, mediante: I O desenvolvimento da capacidade de aprender, tendo como meios bsicos o pleno desenvolvimento da leitura, da escrita e do clculo; II A compreenso do ambiente natural e social, do sistema poltico, da tecnologia, das artes e dos valores em que se fundamenta a sociedade; III O desenvolvimento da capacidade de aprendizagem, tendo em vista a aquisio do conhecimento e habilidades e a formao de atividades e valores; IV O fortalecimento dos vnculos de famlia, dos laos de solidariedade humana e de tolerncia recproca em que se assenta a vida social.

Esse conjunto de princpios revela as intenes de formao de um cidado que, instrumentalizado pelo conhecimento, possa se desenvolver como sujeito capaz de compreender as inter-relaes dos elementos que constituem sua realidade social. Revogando o artigo 32, da atual LDB, que estabelece oito anos como tempo de durao do ensino fundamental, a Lei n. 11.274/2006 vem ampliar os anos relativos ao ensino fundamental para nove anos. O objetivo dessa ampliao assegurar um tempo maior de convvio escolar, mais oportunidades de ensino e, com isso, melhores condies de construo de uma aprendizagem mais qualitativa a um nmero maior de crianas. Dessa forma, a Lei n. 11.274/06 altera a redao dos artigos 29, 30, 32 e 87 da LDB, dispondo sobre a durao de nove anos para o ensino fundamental, com matrcula obrigatria a partir dos seis anos de idade. Nesse sentido, o Conselho Nacional de Educao (Cmara de Educao Bsica), atravs da Resoluo n. 3/2005, de 03/08/05, define as normas nacionais para a ampliao do ensino fundamental para nove anos.6 O artigo 2, da referida resoluo, determina a organizao do ensino fundamental de nove anos em duas etapas: anos iniciais, de seis a dez anos de idade, com durao de cinco anos e anos finais, de 11 a 14 anos de idade, com durao de quatro anos. Alm das alteraes legais, a incluso das crianas de seis anos de idade no ensino fundamental merece ateno especial, pois requer uma adequao do processo de ensinoaprendizagem s caractersticas dessa etapa da infncia, tomando-se os devidos cuidados na seleo, organizao e abordagem metodolgica dos contedos escolares a serem trabalhados nessa faixa etria.6

As legislaes pertinentes ao tema so: Lei n. 11.274/2006, PL n. 144/2005, Lei n. 11.114/2005, Parecer CNE/CEB n. 6/2005, Resoluo CNE/CEB n. 3/2005, Parecer CNE/CEB n. 18/2005, Resoluo n.08/2007 CEE-AL.

15

1.3. Ensino mdio A LDB, ao integrar o ensino mdio educao bsica, amplia suas finalidades e destaca as necessidades essenciais formao do cidado (conforme art. 35):Art. 35. O ensino mdio, etapa final da educao bsica, com durao mnima de trs anos, ter como finalidades: I A consolidao e o aprofundamento dos conhecimentos adquiridos no ensino fundamental, possibilitando o prosseguimento de estudos; II A preparao bsica para o trabalho e a cidadania, do educando, para continuar aprendendo de modo a ser capaz de se adaptar com flexibilidade a novas condies de ocupao ou aperfeioamento posteriores; III O aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo a formao tica e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crtico; IV A compreenso dos fundamentos cientficos e tecnolgicos dos processos produtivos, relacionando a teoria com a prtica, no ensino de cada disciplina.

Nessa perspectiva, a legislao aponta caminhos para uma viso mais abrangente sobre a formao do aluno do ensino mdio, destacando, alm dos conhecimentos bsicos essenciais compreenso da realidade social e histrica e continuidade de seus estudos, a importncia da educao tecnolgica, da pesquisa cientfica, das formas contemporneas de linguagem e dos conhecimentos filosficos e sociolgicos e das formas de produo. O art. 36 da referida lei tambm dispe sobre a organizao dos contedos, as metodologias de ensino e as formas de avaliao, de modo que os alunos demonstrem maior autonomia no processo de apreenso da realidade e no domnio dos princpios cientficos e tecnolgicos. O ensino mdio pode preparar o aluno para o exerccio de profisses tcnicas, desde que assegurada sua formao geral (art. 36, 2., alnea e). A lei vai mais alm ao propor que a preparao geral para o trabalho e, facultativamente, a habilitao profissional, podero ser desenvolvidas nos prprios estabelecimentos de ensino mdio ou em cooperao com instituies especializadas em educao profissional (LDB, art. 36, 4.). A integrao entre formao propedutica e formao profissional abre novas oportunidades aos jovens brasileiros, principalmente queles pertencentes s classes menos favorecidas economicamente e que precisam trabalhar. Entretanto, alm da demanda regular advinda do ensino fundamental, hoje o ensino mdio conta com uma demanda reprimida historicamente e que tambm precisa ser atendida. Nesse caso, so duas propostas de atendimento: uma, de correo da defasagem existente entre oferta e demanda reprimida e outra, de atendimento regular.

16

Nesse sentido, a legislao estabelece como dever do Estado a progressiva extenso da obrigatoriedade do ensino mdio, inteno tambm ratificada pelo Plano Estadual de Educao de Alagoas7 que prope a garantia de acesso a todos os concluintes do ensino fundamental em idade regular, num prazo de 10 anos, a contar do ano de sua promulgao.

7

Lei 6.757/2006

17

2. ANLISE DA ORGANIZAO CURRICULAR DE OUTRAS UNIDADES FEDERATIVAS E DAS INICIATIVAS LOCAIS 2.1. Anlise das iniciativas locais Alagoas , hoje, um dos poucos estados brasileiros que ainda no possui seus prprios padres de qualidade e as diretrizes curriculares para a educao pblica. Isso no significa a inexistncia de iniciativas nesse sentido, pois, h diversos documentos relacionados organizao do processo pedaggico das escolas estaduais. No entanto, o que se constata que, historicamente, essas iniciativas foram pontuais e realizadas de forma isolada, desarticulada e sem a viso de totalidade da gesto educacional, dessa maneira, tambm no atingiram o objetivo de organizar o processo de ensino-aprendizagem da rede estadual. Algumas aes foram destacadas por sua relevncia do ponto de vista da mobilizao e da organizao curricular do processo educacional em Alagoas, as quais so analisadas na sequncia. Ao final da dcada de 90, a SEE/AL realizou um amplo movimento de mobilizao social e de participao popular na construo das bases de um processo polticoeducacional mais democrtico para garantia do direito a uma educao pblica de qualidade para todos e a construo de uma escola de excelncia com qualidade social. A I Conferncia Estadual de Educao de Alagoas (2000) deu incio a um movimento de orientao curricular, cuja intencionalidade era construir novas prticas de organizao dos espaos escolares e de garantia da aprendizagem de todos. Foram elaborados diversos documentos de organizao curricular da educao no estado, tais como a proposta pedaggica de educao infantil, proposta curricular da educao de jovens e adultos, proposta de organizao escolar em ciclos de formao e proposta de educao do campo. Das quais, foram concludas e publicadas apenas as propostas curriculares para Educao Infantil (1995), a Escola Normal (2004) e Educao de Jovens e Adultos (2002). Nos anos seguintes, a implementao dessas propostas curriculares ocorreu de forma fragilizada pela descontinuidade na gesto da SEE/AL, fragmentao dos programas e projetos, desarticulao dos setores responsveis pelos nveis de ensino. Diante de todas as adversidades vivenciadas ao longo deste perodo, promover uma reorganizao curricular em todos os nveis constitui-se a maior necessidade e um grande desafio para a SEE/AL. Para a reorganizao curricular do ensino fundamental, foram realizadas duas tentativas de elaborao do documento, nas quais foram constitudas assessorias junto s empresas e universidades para discusso e elaborao de um Plano de Trabalho para a

18

elaborao da Proposta Curricular, o qual no foi executado por uma srie de questes de ordem pedaggicas, administrativas e financeiras. Em meio a esse processo surgiram outras aes pedaggicas para serem desenvolvidas em carter emergencial, a exemplo da implantao de projetos, tais como: a organizao do ensino fundamental em ciclos de formao em quatro escolas, a implantao dos laboratrios pedaggicos e um programa (Pro-seguir) de correo do fluxo escolar. Contudo, a fragmentao e a desarticulao entre as aes desenvolvidas, alm, claro, da morosidade do andamento dos processos para liberao de recursos financeiros foram alguns dos fatores que inviabilizaram a continuidade do processo de construo da proposta curricular do ensino fundamental. Nesse perodo, foi regulamentada pelo MEC, a implantao do ensino fundamental de nove anos, o que estabeleceu novas exigncias para a organizao curricular das escolas. Nesse sentido, tambm foram elaboradas orientaes pedaggicas e diretrizes operacionais para adequao da nova estrutura do ensino fundamental, tais como: enturmao dos alunos e reorganizao dos espaos, orientaes pedaggicas, fichas descritivas de desempenho para subsidiar o planejamento das atividades curriculares e avaliativas, as quais resultaram do trabalho realizado durante os encontros de formao de professores do ensino fundamental. Paralelamente, os tcnicos responsveis pelo ensino mdio tambm iniciaram, com o apoio de uma consultoria contratada pela SEE/AL, as discusses para sistematizao de um plano de trabalho, objetivando a construo de um referencial curricular para esse nvel de ensino. Foram realizadas reunies e discusses com os tcnicos do setor na SEE/AL, oficinas de estudo para elaborao dos eixos curriculares e competncias das reas afins e sistematizao e socializao das discusses com participao de representes da comunidade escolar. Este processo de discusso no teve continuidade por conta da fragilidade e da conjuntura poltico-administrativa e do contexto vivenciado naquele momento. Como se pode perceber, ao longo desse perodo, as aes de organizao curricular da rede estadual fora conduzidas de forma desarticulada e descontnua, apesar de diversas tentativas, por falta de vontade poltica e de um eixo norteador das prticas educativas, capaz de articular o processo de ensino-aprendizagem nas escolas estaduais. Em 2008, o MEC iniciou um grande movimento de discusso e reorientao curricular no Brasil, com o lanamento dos Cadernos de Indagaes sobre Currculo, os quais contriburam e subsidiaram as discusses inerentes ao currculo no mbito estadual. A partir desse movimento, as discusses foram ampliadas com a realizao de seminrios e debates com representantes de diversos setores da SEE/AL.

19

2.2. Anlise da organizao curricular de outras unidades federativas Durante os estudos realizados para elaborao documento do referencial curricular de Alagoas, a equipe de trabalho foi orientada a fazer uma anlise da estrutura e concepes das propostas curriculares de outros Estados e Municpios, visto a importncia de se conhecer os aspectos relevantes para subsidiar o trabalho em questo. Dentre esses, foram analisados os documentos das Secretarias de Estado da Educao de Santa Catarina, do Paran, do Mato Grosso e do Cear, assim como dos municpios de Santos/SP e Porto Alegre/RS. Alm desses documentos, foram estudados os documentos oficiais publicados pelo MEC, Conselho Nacional de Educao CNE e Conselho Estadual de Educao de Alagoas. A partir dessa anlise foram destacados alguns aspectos significativos e relevantes que comungam com as concepes e prticas educativas presentes nas discusses e nas produes ora elaboradas. Nos documentos investigados, as intenes poltico-pedaggicas so fundamentalmente as mesmas, propondo a formao de sujeitos conscientes de seu papel na transformao da sociedade. No que se refere abordagem do conhecimento, observou-se que, apesar da discusso ser encaminhada por reas ou eixos temticos, os contedos escolares acabam sendo agrupados por disciplinas o que, pelos indicadores educacionais desses Estados e Municpios, no representa um retrocesso nas inovaes curriculares. Outro fato interessante diz respeito nfase na abordagem interdisciplinar dos contedos, a qual referenciada em todos os documentos analisados. A avaliao considerada um processo permanente e contnuo de acompanhamento (processo) e de efetivao da aprendizagem (resultados) tambm apresenta base conceitual comum, destacando a necessidade de se estabelecer parmetros bsicos para o processo avaliativo. Dentre os documentos analisados, as propostas de Mato Grosso, de Santa Catarina e os Cadernos de Indagaes sobre Currculo do MEC foram os que mais contriburam na construo deste referencial, visto que indicaram caminhos significativos para o aprofundamento das temticas presentes no documento, tais como: formao humana, aprendizagem e desenvolvimento humano, diversidade, avaliao, educao e trabalho, organizao do conhecimento e das prticas pedaggicas. Outras propostas e documentos de orientao curricular podem ainda contribuir como referncia e apoio para o estudo, a compreenso e a organizao do processo pedaggico de forma a promover mudanas qualitativas na prtica escolar.

20

3. PRINCPIOS E FUNDAMENTOS TERICO-METODOLGICOS NORTEADORES DO PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM Um currculo , teoricamente, a expresso das intenes poltico-pedaggicas de uma escola, construdo a partir da anlise e reflexo da realidade de uma comunidade no contexto social em que est inserida, por isso reflete uma determinada viso de mundo, de homem, de conhecimento e de sociedade. Nesta perspectiva, currculo uma produo coletiva, construda em cada realidade escolar de forma diferenciada, num processo dinmico, aberto e flexvel, sujeito a inmeras influncias. Como se pode constatar, em Alagoas, apesar das inmeras tentativas de construo de um currculo bsico para as escolas pblicas do estado, essa inteno at o momento no se efetivou. A opo pela elaborao de um referencial curricular se fundamenta pelo entendimento de que um referencial um instrumento de conduo, de direcionamento do trabalho pedaggico das escolas. Sem a inteno de ser obrigatrio, o referencial curricular se prope a atuar como elemento aglutinador das intenes poltico-pedaggicas da comunidade interna e externa das escolas, no sentido de construir uma unidade na educao das crianas, jovens e adultos do estado de Alagoas. Por sua natureza norteadora, o referencial deve guiar o processo de elaborao das propostas curriculares das escolas, considerando as necessidades pedaggicas e as caractersticas de cada comunidade. Nesse sentido, o referencial tambm contribui para a reflexo e reelaborao dos projetos poltico-pedaggicos, pois se compreende que no mbito da prtica educativa e no ambiente escolar que se processa e se revela a realidade social. 8 Portanto, pertinente que a escola busque e fundamente suas propostas curriculares a partir da anlise e questionamento da sua prpria realidade, uma vez que o papel social da escola instrumentalizar os alunos em seu processo de formao humana, de modo a participar na construo de uma sociedade em que as pessoas possam viver melhor. 3.1. Princpios norteadores da educao bsica Na perspectiva da formao humana, o currculo precisa estar orientado por princpios que possibilitem uma anlise da realidade social, compreendida como um processo contnuo e constante de mudana histrico-cultural e o reconhecimento crtico das peculiaridades do contexto em que se d o processo educativo. Considerando o atual contexto histrico, seguem alguns princpios norteadores do referencial curricular da educao bsica das escolas pblicas de Alagoas:8

DCNGEB, 2010, artigos 42, 43, 44 e 45

21

1. As aes humanas transformam a realidade, materializam as intenes e os pensamentos, portanto, isso no diferente no processo educativo, so as aes que educam e promovem o desenvolvimento humano; 2. O currculo da escola pblica tem a finalidade de promover a formao humana, de modo a propiciar as condies bsicas para o desenvolvimento humano de todos; 3. O currculo escolar deve enfatizar a importncia do acesso de todos aos bens culturais e ao conhecimento historicamente produzido no processo de formao humana; 4. O currculo precisa ser situado historicamente, no tempo e no espao, considerando que os instrumentos culturais mediadores do desenvolvimento humano se modificam com o avano tecnolgico e cientfico e criam novas reas do conhecimento; 5. O currculo escolar deve criar situaes de aprendizagens e convvio social em que as diferenas individuais, sociais e culturais sejam concebidas como tais, propondo aes e alternativas de superao de todas as formas de discriminao, preconceito e excluso social; 6. A abordagem metodolgica do currculo deve possibilitar o aprofundamento do conhecimento dos alunos e a vinculao dos contedos escolares e a prtica social, de forma a possibilitar que o aluno faa uso do conhecimento cientfico para aprimorar e ampliar sua compreenso e interveno na realidade; 7. A prtica pedaggica deve ser encaminhada para garantir o desenvolvimento da capacidade de anlise, compreenso, interpretao, explicao, associao e sntese, de modo a ampliar seu conhecimento sobre os fenmenos que compem a realidade em suas mltiplas dimenses, assim como suas implicaes nos problemas locais, nacionais e mundiais; 8. A prtica pedaggica deve incorporar ao processo de ensino e aprendizagem s diversas linguagens (verbais e no verbais, artsticas, matemticas, simblicas, musical, cartogrfica, corporal etc.) e meios tecnolgicos como instrumentos de apropriao do conhecimento e de compreenso da realidade; 9. As aprendizagens bsicas devem ser resultado dos processos psquicos, gradativamente mais complexos, que permitam aos educandos a compreenso das inter-relaes que constituem a sua realidade e uma atuao mais qualitativa em seu meio social; 10. O processo pedaggico na escola pblica deve ser organizado de maneira a propiciar contnuas e diversas situaes de aprendizagem e de desenvolvimento a todos os alunos; 11. O processo pedaggico desenvolvido pela escola pblica deve promover o estabelecimento de relaes interpessoais entre educandos (crianas, adolescentes, jovens e adultos) e educadores, que possibilitem vivncias significativas para a construo das aprendizagens bsicas e contribuam para o desenvolvimento humano de todos; 12. O processo de ensino e aprendizagem deve considerar como ponto de partida os conhecimentos j produzidos pelos alunos sobre a realidade para, a partir desses, promover a construo de novos conhecimentos;

22

13. A escola pblica tem um compromisso poltico e social com a populao, o qual se efetiva na medida em que ela cumpre a especificidade do trabalho escolar com eficincia e eficcia; 14. A escola pblica deve proporcionar as condies de formao humana dos sujeitos em suas diferentes fases da vida: infncia, adolescncia, juventude, idade adulta e velhice, no sentido de promover as necessrias adequaes curriculares a partir das peculiaridades, caractersticas e interesses de cada etapa de vida; 15. A escola pblica deve promover a incluso social, criando oportunidades de acesso e de permanncia a todos os sujeitos, independentemente de classe, gnero, etnia e orientao religiosa e/ou poltica. 3.2. Currculo e formao humana A concepo de currculo que embasa este referencial pressupe a superao da dicotomia entre formao acadmica e formao humana, formao geral e formao tcnica, teoria e prtica, reflexo e ao, pois entende que, apesar das diferenas entre eles, so processos indissociveis e necessrios formao humana e compreenso da realidade. a ideia de um currculo em que a abordagem dos contedos escolares extrapola os muros das instituies e interage no mundo social, poltico, econmico, cultural e tecnolgico, sem perder de vista a natureza humana do processo educativo. Entende-se que um currculo, ao expressar as intenes da comunidade escolar, revela o tipo de formao humana desejada para os alunos, por isso, sua construo deve levar em conta o equilbrio entre as diversas dimenses do desenvolvimento humano, de modo que determinados aspectos no se sobreponham a outros. Isto quer dizer que o currculo escolar deve pensar a formao do aluno em sua totalidade, o que significa criar as condies para seu desenvolvimento cognitivo, psquico, afetivo, fsico, social e cultural. Nesse sentido, o currculo deve propiciar ao aluno a formao de sua base conceitual, a apreenso das formas de aprender, a atualizao dos conhecimentos j aprendidos, a aquisio de novos conhecimentos, o desenvolvimento de competncias, habilidades e atitudes e a incorporao de valores que promovam seu processo de humanizao, cumprindo, assim, a finalidade primeira da educao contempornea: a formao de seres humanos preparados para um mundo dinmico e repleto de complexas transformaes e desafios. Para Moreira e Candau (2008, p.36), o que deve ser evidenciado no currculo so as necessidades histricas de apropriao e de produo do conhecimento, enquanto construo social e os rumos dados a ele pela sociedade, de modo a compreender as razes histricas e culturais que se constituem como elementos fundamentais para o desenvolvimento humano. Dessa maneira, o currculo se constitui em elemento sistematizador das intenes poltico-pedaggicas dos profissionais da educao, no qual

23

se manifestam as relaes entre sociedade e escola, saberes elaborados e prticas socialmente construdas. O currculo entendido como as experincias escolares que se desdobram em torno do conhecimento, em meio a relaes sociais, e que contribuem para a construo das identidades de nossos/as estudantes (MOREIRA; CANDAU, 2008, p.18). O currculo associa-se, assim, a um conjunto de compreenses e esforos pedaggicos desenvolvidos a partir de intenes educativas, gerando um movimento que revela outra viso e apresenta novas categorias de reflexo, como as relaes entre escola, currculo e trabalho, tendo como pano de fundo a interdisciplinaridade, a contextualizao e a diversidade. Nessa perspectiva, o currculo pode e deve ser o territrio onde se estabelece um dilogo pedaggico entre os diversos tempos de vida do educando e os tempos do conhecimento e da cultura da sociedade. Para tanto, a escola precisa organizar melhor o tempo escolar a partir do compromisso com o tempo de aprendizagem do sujeito, de modo que os processos de ensino e de aprendizagem possam se cruzar nos diferentes tempos, to diversos quanto so as formas de viver de cada fase da vida humana, em cada raa, classe, etnia, gnero, no campo ou cidade. Assim, o currculo como orientador da prtica escolar e do processo pedaggico, que se efetiva na sala de aula, deve assegurar a especificidade do trabalho escolar com a mxima eficincia e eficcia, numa perspectiva mais ampla, dinmica, contextualizada e humanizadora, pois a apropriao do conhecimento cientfico s adquire sentido social e histrico quando possibilita ao sujeito seu aprimoramento e amplia sua capacidade de transformao da realidade, enquanto ser humano. 3.3. Desenvolvimento e aprendizagem Diferente do conceito utilizado comumente para explicar o desenvolvimento humano, Lima (2007, p.24) apresenta uma nova forma de compreenso.Os perodos de desenvolvimento so, normalmente, referidos como infncia, adolescncia, maturidade e velhice. mais adequado, porm, pensarmos o processo de desenvolvimento humano em termos das transformaes sucessivas que o caracterizam, transformaes que so marcadas pela evoluo biolgica (que constante para todos os seres humanos) e pela vivncia cultural. (LIMA, 2008, p.24)

Dessa maneira, se considera o desenvolvimento humano como resultante de uma relao dialtica entre o biolgico e o cultural, pressupondo que o aprimoramento de um promove essencialmente o desenvolvimento do outro. Nesse sentido, possvel afirmar que o processo de humanizao depende diretamente do desenvolvimento do ser humano, do ponto de vista biolgico e cultural.

24

Para alguns estudiosos da Antropologia,(...) humanizar o processo pelo qual todo ser humano passa para se apropriar das formas humanas de comunicao, para adquirir e desenvolver os sistemas simblicos, para aprender a utilizar os instrumentos culturais necessrios para as prticas mais comuns da vida cotidiana at para a inveno de novos instrumentos, para se apropriar do conhecimento historicamente constitudo e das tcnicas para a criao nas artes e criao nas cincias. (LIMA, 2007, p.18)

Nessa perspectiva, o processo de humanizao implica, igualmente, em desenvolver aes psicomotoras que permitam ao ser humano a realizao de aes (das mais simples s mais complexas) que lhe garanta sua existncia no mundo. Nesse processo de desenvolvimento, o ser humano aprende as formas de ao existentes em seu meio num dado tempo histrico e num determinado espao, ou seja, as aes e os padres de interao so definidos pelas prticas culturais historicamente construdas e apreendidas. Isso significa que a cultura constitutiva dos processos de desenvolvimento e de aprendizagem, sendo assim o sujeito aprende a lngua falada por sua comunidade cultural, as atitudes e os padres de comportamento que nela so praticados etc. A criana, o adolescente e o adulto se constituem enquanto membros do seu grupo social por meio da formao de sua identidade cultural, a qual possibilita sua convivncia, interao e permanncia no grupo. Contudo, ao mesmo tempo em que se identifica como sujeito cultural, o indivduo tambm se distingue dos demais, construindo suas experincias e estabelecendo suas prprias marcas no mundo, formando, assim, sua personalidade e suas caractersticas como ser humano nico, exclusivo, mpar. De qualquer forma, os comportamentos e aes privilegiados em cada cultura so, ento, determinantes no processo de desenvolvimento de cada membro do grupo. A vida cotidiana sempre est envolvida pela cultura: as brincadeiras, o faz-de-conta, as festas, os rituais, as celebraes e o trabalho, so situaes recheadas de significados e de simbolismo. A relao entre sujeitos na escola, por exemplo, uma relao especfica e distinta das demais relaes sociais, porque o professor no simplesmente mais um adulto com quem a criana/adolescente/adulto interage ele um adulto com a tarefa especfica de utilizar o tempo de interao com o aluno para promover seu processo de humanizao, o que determina uma enorme responsabilidade atividade pedaggica. Em suma, o desenvolvimento humano mediado pelo momento histrico de cada comunidade e pelo grau de participao de cada indivduo no acervo da cultura, da tecnologia, das cincias e dos bens culturais disponveis naquele momento. Esta participao mediada pela educao e definida tambm pela insero do sujeito num mundo constitudo por segmentos sociais, etnias, gneros e diversidades culturais.

25

Subjacente elaborao do currculo, est a concepo de ser humano e o papel que se pretende que a escola tenha em seu processo de desenvolvimento. No h, portanto, currculo ingnuo: ele sempre implica em uma opo e esta opo poder ou no ser favorvel ao processo de humanizao. (LIMA, 2007, p. 25)

Um currculo pode ser considerado democrtico quando cria as condies de humanizao para todos, garantindo o acesso aos bens culturais disponveis numa dada sociedade e num determinado momento histrico, de modo a propiciar e ampliar as oportunidades de aprendizagem e de desenvolvimento humano. A educao bsica, fundamentada numa concepo de educao cuja finalidade o processo de humanizao, precisa contemplar no currculo escolar questes relativas ao desenvolvimento do conhecimento, da cultura, da cidadania, do trabalho, do respeito vida e ao planeta. Esses elementos da realidade cultural no devem ser somente o cenrio em que o processo educativo ocorre, mas devem se transformar em aprendizagens escolares. Essa realidade multiforme de fato o objeto de conhecimento dos processos educativos e se torna o contedo bsico da aprendizagem para a compreenso, interpretao, explicao e interveno na realidade, visando a transformao da existncia histrico-social dos sujeitos, no sentido de torn-la cada vez mais humana (FREIRE, 1994). Dessa maneira, formar o sujeito para situar-se no mundo, inclusive como membro de um grupo social, passa a ser objetivo de uma educao escolar voltada para a humanizao e, nesse caso, o conhecimento torna-se no somente uma aquisio individual, mas um elemento essencial para seu desenvolvimento enquanto ser humano, com reflexos na sua vida pessoal e social. Em sntese, o currculo deve refletir as intenes da comunidade escolar frente s exigncias e necessidades histricas da sociedade, no no sentido de reproduzir as relaes sociais, mas de transform-las em funo da melhoria da qualidade da existncia humana. 3.4. Educao, trabalho e humanizao O trabalho, em sua essncia, se constitui como prxis social, pois na realizao dessa atividade intencional e planejada de produo da subsistncia material que se estabelece a interdependncia dos seres humanos. Inicialmente, nas relaes sociais de trabalho que se concretiza a humanidade.Pode-se distinguir os homens dos animais pela conscincia, pela religio e por tudo o que se queira. Mas eles prprios comeam a se distinguir dos animais logo que comeam a produzir seus meios de existncia (...). Ao produzirem seus meios de existncia, os homens produzem indiretamente sua prpria vida material. (...) A maneira como os indivduos manifestam sua

26

vida reflete exatamente o que eles so. O que eles so coincide, pois, com sua produo, isto , tanto com o que eles produzem quanto com a maneira como produzem. O que os indivduos so depende, portanto, das condies materiais da sua produo. (MARX e ENGELS, 2001, p.1011)

Ao organizar as condies de produo da existncia humana, os sujeitos tambm estabelecem suas relaes polticas, sociais, jurdicas, culturais e educacionais, que podem ser modificadas ao longo da histria, da mesma forma que o modo de produo. As transformaes no modo de produo, alm de interferirem diretamente na organizao das foras produtivas tambm modificam as formas de organizao social e poltica das sociedades, redefinindo a interao entre os sujeitos e a natureza e entre seus pares. No contexto das relaes sociais de trabalho, os sujeitos produzem bens materiais (objetos, utenslios etc.) e no materiais (conceitos, valores, crenas, princpios, papis sociais etc.) que constituem, historicamente, o mundo humano, revelado na linguagem, cultura, arte, cincia, filosofia e tecnologia. A continuidade desse mundo criado pela humanidade prescinde de formas de socializao, que dependem do nvel de desenvolvimento de cada sociedade e do tempo histrico. Muito mais do que um instrumento de socializao dos bens culturais, a educao o processo pelo qual se formam homens e mulheres para uma determinada sociedade. Inicia-se no seio da organizao familiar e se estende nas diversas relaes sociais, sendo realizada por instituies criadas especificamente para cumprir essa funo social. Nesse sentido, a educao o processo contnuo e permanente pelo qual cada sujeito se humaniza, isto , se apropria e incorpora em si a produo histrica e social da humanidade. Nesse sentido, cabe afirmar que o processo educativo garante a cada sujeito as condies histricas de sua humanizao, socializao e construo de sua identidade cultural. A educao o processo que possibilita ao sujeito situar-se no mundo, enquanto indivduo particular e enquanto indivduo coletivo. Segundo Frigotto (2003, p.25), a educao, quando apreendida no mbito das determinaes e relaes sociais, se apresenta, ao mesmo tempo, constituda e constituinte dessas relaes, j que historicamente pode ser considerada como um dos campos de disputa hegemnica. Nessa perspectiva, a educao um instrumento de poder que tanto pode servir reproduo da ordem social como pode semear os caminhos para sua transformao. Portanto, no h neutralidade quando se trata de educao. Isso significa que a escola, instituio social criada para cumprir uma funo educativa, deve ter clareza de seu papel poltico na sociedade. Ao cumprir com eficincia e eficcia seu papel social promover a aprendizagem com desenvolvimento humano , a comunidade escolar demonstra suas intenes poltico-pedaggicas, j que essas se materializam nos resultados da aprendizagem dos alunos.

27

Todas essas reflexes fazem parte da construo do currculo da escola, independente da concepo e vertente a ser adotada. So as intenes polticopedaggicas da comunidade escolar que determinam a concepo filosfico-educacional a ser incorporada no trabalho escolar e no o contrrio, pois a viso de mundo e o compromisso poltico-social dos profissionais da educao que direciona o fazer pedaggico. A opo poltico-pedaggica da comunidade escolar se materializa no conjunto de aes dos profissionais, na seleo e organizao didtica dos contedos escolares, na escolha do mtodo de ensino e das atividades metodolgicas, nas prticas pedaggicas dos professores, nas diversas relaes interpessoais dentro e fora do contexto escolar, nas formas de avaliao e nos resultados da aprendizagem. Nesse sentido, a escola deve estar atenta s exigncias e necessidades histricas do mundo do trabalho, pois as transformaes que vm ocorrendo no modo de produo capitalista tm criado novas expectativas sociais sobre o papel da educao de modo geral e da educao escolar em sua especificidade. A forma de organizao do trabalho numa determinada sociedade depende de inmeros fatores, como o grau de complexidade do processo de produo, o nvel de desenvolvimento tcnico das foras produtivas, a propriedade dos meios de produo, o domnio da matria-prima, a apropriao da fora de trabalho e a organizao poltica. As relaes de trabalho so diretamente influenciadas pelas foras produtivas que, por sua vez, so alteradas pela mudana dos instrumentos de produo, ocorrendo uma mudana tambm nas relaes entre os sujeitos. Na denominada sociedade ps-moderna, o capitalismo contemporneo, em funo de sua necessidade de expanso e sobrevivncia, promove mudanas no cenrio econmico mundial com o avano tecnolgico, a reestruturao produtiva, a implantao do processo de globalizao e a transnacionalizao dos grandes grupos econmicos. Nesse contexto, se estabelece uma nova lgica na economia e no mundo do trabalho, definindo um novo perfil de trabalhador: mais dinmico, flexvel, criativo, com iniciativa prpria, capacidade de deciso sobre a execuo, mais socivel, colaborativo e multifacetrio. A implantao de uma nova lgica do mundo do trabalho tambm se reflete na educao, j que o novo perfil do trabalhador requer uma nova formao dos sujeitos nas diversas instituies educativas. No entanto, todo cuidado pouco quando se trata de atender s necessidades impostas pelo capitalismo, j que ele defende os interesses de uma minoria cujo nico objetivo a gerao e ampliao dos lucros. Contudo, as exigncias do capitalismo provocam dvidas e reflexes a respeito do tipo de ser humano que vem sendo formado pelas instituies educativas. Por exemplo, inmeros estudos, avaliaes e pesquisas realizados sobre a escola pblica brasileira tm demonstrado que a formao escolar no atende plenamente s necessidades do mercado

28

capitalista e nem instrumentaliza para a construo de outras possibilidades de produo da existncia humana. Para superar esse desafio, o currculo escolar precisa ser repensado e reorganizado a partir de uma perspectiva humanizadora, no sentido de formar sujeitos mais humanos, instrumentalizados, conscientes, crticos, atuantes, criativos, competentes e transformadores da realidade. Para isso, a escola precisa criar as oportunidades de acesso aos bens culturais produzidos e disponveis na sociedade, garantir a apropriao de um conhecimento cientfico continuamente atualizado e possibilitar situaes diversas de aprendizagem, vinculando o conhecimento compreenso da prtica social. Dessa forma, a atividade escolar deixa de ter a funo de preparar os sujeitos para compor os quadros do mercado capitalista e passa a se organizar para proporcionar a todos o acesso aos bens e servios produzidos histrica e socialmente, de modo a contribuir para a superao da viso mercadolgica dos sujeitos e do trabalho. A superao da dicotomia entre prtica social e prtica escolar, mundo do trabalho e mercado de trabalho, intelectuais e trabalhadores, educao acadmica e educao profissional, formao humana e formao tcnica, um dos grandes desafios atuais a ser enfrentado pelos profissionais da educao na construo dos currculos escolares. Essa tarefa pressupe conectar o processo de escolarizao realidade dos sujeitos e das necessidades histrico-sociais, sendo a qualificao para o mundo do trabalho um aspecto a ser contemplado no currculo. A qualificao para o mundo do trabalho deve contribuir para que os sujeitos possam ter condies intelectuais e instrumentais para criar alternativas de desenvolvimento sustentvel e solidrio para a existncia humana, gerao de renda e convivncia social. A escola deve preparar para a humanizao, entendida como garantia de preservao da dignidade dos sujeitos do fazer, seja no mercado formal ou informal e, nesse contexto, a educao passa a ser vista e organizada sob outra lgica, que no da empregabilidade e do mercantilismo trabalhista, mas da gerao de renda e da autosustentabilidade. Portanto, superar a viso dos alunos como empregveis, como mercadoria precondio para repensar os currculos (ARROYO, 2008, p.25). A formao humana, aqui, entendida enquanto busca de integrao da formao geral formao profissional, na superao das diversas dicotomias dadas como verdadeiras e absolutas. Nesse sentido, a oferta do ensino mdio integrado Educao Profissional Tcnica de Nvel Mdio, uma das alternativas oferecidas atualmente pelo MEC para a superao da dicotomia entre educao e mundo do trabalho. A realidade de Alagoas revela um nmero elevado de jovens e adultos excludos do seu direito subjetivo dignidade e ao trabalho.

29

nesse contexto que o currculo escolar deve ser pensado e construdo a partir da necessidade urgente de proporcionar a esses sujeitos os instrumentos culturais essenciais busca de novas formas de sobrevivncia, que garantam alternativas de gerao de renda. emergente a construo de um modelo de educao para crianas, adolescentes, jovens e adultos para alm das desigualdades sociais, da desqualificao profissional e da desescolarizao. Nesse processo de reflexo e avaliao do currculo da escola atual, no se pode dispensar os elementos bsicos do processo pedaggico sob pena de excluir, ainda mais, os sujeitos da escola. A educao escolar deve ter como pressuposto bsico na organizao do processo educativo a formao e a valorizao do ser humano como sujeito responsvel pelos rumos da sociedade.

1.5. Educao, diversidade e diferena O Brasil um pas rico em sua diversidade biolgica, cultural, tnica, religiosa e social. Essa diversidade,(...) se constitui das diferenas que distinguem os sujeitos uns dos outros mulheres, homens, crianas, adolescentes, jovens, adultos, idosos, pessoas com necessidades especiais, indgenas, afrodescendentes, descendentes de portugueses e de outros europeus, de asiticos, entre outros. A diversidade que constitui a sociedade brasileira abrange jeitos de ser, viver, pensar que se enfrentam. Entre tenses, entre modos distintos de construir identidades sociais e tnico-raciais e cidadania, os sujeitos da diversidade tentam dialogar entre si, ou pelo menos buscam negociar, a partir de suas diferenas, propostas polticas. Propostas que incluam a todos nas suas especificidades sem, contudo, comprometer a coeso 9 nacional, tampouco o direito garantido pela Constituio de ser diferente. (CONFINTEA, 2008, p.12)

Nessa perspectiva, o currculo escolar deve abordar a diversidade como parte integrante das temticas que constituem as relaes sociais brasileiras, caso contrrio, corre-se o risco de reforar ainda mais a discriminao, negando a diferena e desconsiderando a diversidade. A efetivao de uma sociedade democrtica em que as diferenas sejam respeitadas e os direitos dos diferentes sujeitos e grupos sociais sejam garantidos em suas representaes na organizao social, poltica, econmica e cultural do pas s possvel9

Extrado do documento base da VI Conferncia Internacional de Jovens e Adultos CONFINTEA, realizada em Braslia no ms de maro de 2008.

30

por um processo educativo que considere e respeite a diversidade das construes humanas para melhor compreenso dos seres humanos e de suas relaes. Para tanto, o currculo escolar deve incluir na abordagem dos contedos escolares as discusses sobre questes de gnero, tnico-raciais e religiosas, multiculturalismo, entre outras. necessrio que a discusso das diferenas faa parte do contexto escolar, compreendida a partir de seus determinantes histricos e sociais e das relaes que se estabelecem entre os diferentes sujeitos de uma sociedade. As mltiplas relaes sociais no Brasil diferenciam homens e mulheres, heterossexuais e homossexuais, negros, ndios e brancos, restringindo os direitos e as oportunidades entre os sujeitos em funo da discriminao e do preconceito. A cultura da discriminao e do preconceito introjetada nos sujeitos pelas interaes sociais que so estabelecidas numa sociedade num determinado tempo. Historicamente buscou-se entender as relaes sociais de gnero com base nas diferenas entre os sexos, com nfase na especificidade biolgica de mulheres e homens, caracterizada pela dominao de um sexo sobre o outro, estabelecendo uma relao hierarquizada de poder, na qual a masculinidade hegemnica seria a ideal e, portanto, superior (VELOSO, 2000). Segundo LOURO (2001), a sociedade vive mergulhada em mltiplos discursos sobre a sexualidade, um discurso homofbico e reverso em que a homossexualidade entendida como desvio e patologia. Desconstruir esse discurso implica em perturbar e subverter os termos que afirmam as oposies binrias de cada um dos plos (homem/mulher, heterossexual/homossexual). necessrio empreender uma mudana epistemolgica que efetivamente rompa com a lgica binria e construa uma abordagem que permita compreender a heterossexualidade e a homossexualidade como interdependentes, como mutuamente necessrias e integrantes de um mesmo quadro de referencia (LOURO, 2001, p. 549), questionando o processo pelo qual uma forma de sexualidade (a heterossexualidade) acabou por se tornar a norma. A problematizao das fronteiras tradicionais de gnero pe em xeque as dicotomias homem/mulher, heterossexualidade/homossexualidade, questionando as prprias categorias e sua fixidez. Esse processo de mudana nas relaes sociais nos lana para uma pedagogia que sugere o questionamento, a problematizao, a desnaturalizao10 e a incerteza como estratgias frteis e criativas para pensar qualquer dimenso da existncia e suas diferentes formas de expresso. Outra temtica que deve permear as discusses curriculares e potencializar o trabalho pedaggico diz respeito s relaes tnico-raciais. O aluno negro e/ou indgena,10

Rompimento com o conceito naturalmente posto.

31

por exemplo, precisam (re)construir sua identidade cultural e, nesse sentido, a escola pode contribuir na busca e compreenso dos referenciais que constituem sua etnicidade. Isso significa reconhecer a importncia e o legado da cultura do povo africano e indgena, construindo estratgias e diretrizes para incluso no currculo escolar de conhecimentos sobre a Histria da frica, da Cultura Afro-Brasileira e Afro-Alagoana e Indgena, a luta dos povos negros e indgenas na formao da sociedade alagoana, resgatando as suas contribuies na rea social, econmica e poltica. 11 preciso que o trabalho pedaggico respeite a tradio cultural dos diferentes sujeitos, apreendendo e compreendendo os elementos da construo histrica dessas culturas, estabelecendo as relaes entre elas e os contedos escolares, de forma interdisciplinar, a partir da anlise dos aspectos histricos, culturais, sociolgicos, antropolgicos, vistos sob a tica dos sujeitos em todos os nveis da educao bsica: infantil, fundamental e mdio. Portanto, faz-se necessrio promover mudanas curriculares que contemplem a pluralidade cultural e a diversidade tnico-racial, como elementos fundamentais para a afirmao da identidade - pluricultural e multitnica - do povo brasileiro e que combatam o racismo e as discriminaes. O currculo deve possibilitar a formao de atitudes, posturas e valores que possibilite a formao de cidados orgulhosos de seu pertencimento tnico-racial para interagir na construo de uma sociedade democrtica em que todos possam ter seus direitos garantidos e sua identidade valorizada. A diversidade religiosa outro tema da diversidade, sendo papel das escolas o respeito a todas as formas de expresso e de representao das diversas religiosidades, sejam elas matrizes religiosas europias, africanas, asiticas, indgenas, orientais, dentre outras. o reconhecimento e auto-afirmao dos sujeitos e do direito de liberdade de expresso de suas crenas e rituais religiosos12. Portanto, as prticas pedaggicas devem combater todo tipo de intolerncia religiosa13. A prtica pedaggica da escola deve estar conectada com diferentes espaos, considerando como referncia a comunidade onde se encontra inserida, no entanto, sem se limitar a ela. Deve partir da valorizao da realidade social dos sujeitos a quem se destina, sejam eles povos da cidade ou do campo. Esta prtica precisa estar vinculada cultura e s relaes mediadas pelo trabalho, entendido como produo material e cultural de existncia humana. Essas relaes11

Implementao das Leis 11.645/2006 (Nacional) e 6.814/2007 (Estadual) que tornam obrigatrio o ensino de Histria e Cultura Afro-Brasileira, Afro-Alagoana e Indgena nos estabelecimentos de ensino da educao bsica. 12 Conforme afirma o artigo 5, inciso VI da Constituio e artigo 18 da Declarao Universal dos Direitos Humanos 13 Lei N 7.028/2009

32

econmicas e sociais so vividas e construdas por sujeitos concretos, de diferentes gneros, etnias, religies, grupos sociais, movimentos populares, vinculadas a diferentes organizaes sociais e diferentes formas de produzir e viver individual e coletivamente. Faz-se necessrio desenvolver uma prtica pedaggica em que todos se sintam includos, sem ter que negar a si mesmo e adotar costumes, ideias e comportamentos adversos ao grupo tnico-racial, de gnero, classe, religio e/ou orientao sexual ao qual pertencem. preciso, pois, garantir o direito e o acesso educao a todos os cidados brasileiros, homens e mulheres, homossexuais e heterossexuais, ndios, brancos e negros, habitantes do campo e da cidade, criando formas e estratgias para que todos possam ter a oportunidade de construir sua vida escolar com respeito e sucesso.

3.6 A Educao ambiental e a Formao Humana A sociedade contempornea convive com graves problemas ambientais, decorrentes de um conjunto de fatores relacionado a questes polticas, econmicas, sociais e culturais. As atuais condies de vida no planeta apontam para grandes dificuldades a serem enfrentadas pelos seres humanos num futuro bem prximo, tais como: aquecimento global, escassez de gua potvel, processo de desertificao e poluio do ar. Esses casos demonstram alguns sinais do cenrio produzido pela ao humana sobre a natureza. Assim, a educao ambiental parte integrante da formao humana, tanto no mbito social como no mbito educacional, perpassando todos os nveis e modalidades de ensino. Portanto, necessrio garantir, no currculo das escolas, a insero da educao ambiental, fundamentada no respeito a todas as formas de vida, na construo de valores e no desenvolvimento de aes que contribuam para a preservao do ecossistema planetrio. Analisar criticamente essa questo diz respeito, entre outras coisas, ao exerccio pleno da cidadania e a perspectiva de construo de uma sociedade mais democrtica, sustentvel e solidria. Nesse contexto, a educao ambiental tem o compromisso de promover a reflexo sobre as aes praticadas cotidianamente, a incorporao de novos hbitos e valores e a mudana de prticas sociais, polticas e produtivas. Implica analisar a forma como se vive nesta sociedade, o conjunto de princpios, valores, comportamentos, hbitos e atitudes que sustentam as relaes entre os seres humanos e destes com a natureza. A Constituio Federal de 1988 atribui ao Estado, o dever de promover a Educao Ambiental em todos os nveis de ensino. Essa responsabilidade ratificada pela Lei n. 9394/96 (LDB), pela Lei n. 9.795/99 e regulamentada pelo Decreto n. 4.281/02. Tais

33

normativos asseguram o direito educao ambiental e, simultaneamente, compromete os sistemas de ensino a prov-lo no mbito da educao bsica. Nessa perspectiva, no processo ensino e de aprendizagem, a educao ambiental deve ser trabalhada de forma interdisciplinar, integrando-se aos conhecimentos especficos de cada componente curricular, de modo a oferecer ao aluno as condies necessrias para a construo de uma viso global e equilibrada do meio em que vive e uma atuao mais consciente e responsvel. Para isso necessrio o desenvolvimento de prticas curriculares que garantam: o desenvolvimento do pensamento crtico e inovador, em qualquer tempo ou lugar, em seu modo formal, no formal e informal, ou seja, no cotidiano da prxis social, promovendo a transformao e a construo de uma nova sociedade; a educao ambiental de forma individual e coletiva, contribuindo para a formao de cidados com conscincia local e planetria, que respeite a autodeterminao dos povos e a soberania das naes; o envolvimento dos educandos no debate das questes ambientais, enfocando a relao entre o ser humano, a natureza e o universo de forma interdisciplinar; a discusso das questes ambientais globais, abordando suas causas e interrelaes no contexto social e histrico, contemplando os aspectos primordiais relacionados ao desenvolvimento e ao meio ambiente tais como: populao, sade, democracia, fome, degradao da flora e da fauna; a cooperao e o dilogo entre indivduos e instituies, com a finalidade de criar novos modos de vida, baseados em atender as necessidades bsicas de vida para todos, sem distines de etnia, gnero, idade, religio, classe ou habilidades fsicas ou mentais; a democratizao dos meios de comunicao de massa e seu comprometimento com os interesses de todos os setores da sociedade, transformando-o em um canal privilegiado de educao e disseminao de informaes em bases igualitrias; a conscincia tica sobre todas as formas de vida com as quais os seres humanos compartilham esse planeta, respeitando seus ciclos vitais e impondo limites explorao dessas formas de vida.14

Sendo assim, o papel social da escola garantir um espao de reflexo contnua sobre suas prticas, contribuindo para ampliar a viso crtica da sociedade e, com isso, incentivar uma maior participao da comunidade escolar nas discusses sobre as relaes entre sociedade e natureza, objetivando um possvel modo de vida sustentvel.

14

Tratado da Educao Ambiental

34

4. PRESSUPOSTOS PARA A ORGANIZAO MODALIDADES DA EDUCAO BSICA

CURRICULAR

DAS

ETAPAS

E

A Educao Bsica est organizada em trs etapas: Educao Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Mdio. A cada etapa da Educao Bsica pode corresponder uma ou mais modalidades de ensino: Educao de Jovens e Adultos, Educao Especial, Educao Profissional e Tecnolgica, Educao do Campo, Educao Escolar Indgena, Educao Quilombola e Educao a Distncia. As etapas e as modalidades do processo de escolarizao na Educao bsica estruturam-se de modo orgnico, sequencial e articulado. A dimenso orgnica atendida como as especificidades e a diferenas de cada sistema educativo. A dimenso sequencial compreende os processos educativos que acompanham as aprendizagens definidas em cada etapa do percurso formativo da Educao Bsica. E a articulada entendida enquanto articulao das dimenses orgnica e sequencial das etapas e das modalidades da Educao Bsica.15 A transio entre as etapas da Educao Bsica e suas fases requer formas de articulao das dimenses orgnica e sequencial que assegurem aos educandos, sem tenses e rupturas, a continuidade de seus processos peculiares de aprendizagem e desenvolvimento, seus tempos mentais e os aspectos socioemocionais, culturais e identitrios como princpio orientador de toda a ao educativa.

4.1. Educao infantil A educao infantil tem como desafio uma dupla funo: cuidar e educar as crianas de zero at seis anos de idade. Essa dupla funo deve ser trabalhada de forma articulada e integrada no currculo escolar. 16 Refletir sobre a construo do currculo da educao infantil pensar o conjunto de atividades pedaggicas do ponto de vista do universo da infncia e significa conceber o mundo sob a perspectiva das crianas em suas diferentes fases de desenvolvimento. A partir da, possvel perceber o papel de interveno do adulto no processo de aprendizagem e desenvolvimento das crianas. Adentrar o universo infantil implica perceber e compreender as formas utilizadas pelas crianas para se comunicar, expressar e interagir com outras crianas, com os adultos e tambm com o mundo que as cerca. necessrio compreender que crianas pequenas esto em permanente descoberta do mundo e, por isso, as atividades curriculares devem estimular e propiciar cada vez mais essa busca de entendimento dos por qus em relao a15 16

DCNCNGEB,2010. Art.18. DCGNEB,2010 Art. 6, DCNEI,2009 Art.9 alnea a.

35

coisas, seres, objetos, fenmenos e relaes. A criana pequena est iniciando suas interaes com o mundo e a partir dessas interaes que estabelece suas anlises, hipteses, associaes, generalizaes e snteses. A interao social se constitui, portanto, em elemento direcionador na definio e organizao das atividades curriculares a serem desenvolvidas no cotidiano da sala de aula, j que as crianas aprendem na troca entre elas e com as crianas mais experientes. Interagindo, as crianas, alm de levantar e propor hipteses, discutem, negam ou afirmam conceitos, testam e constroem suas verdades. O currculo da educao infantil deve ser organizado de forma a propiciar a construo das aprendizagens bsicas essenciais criana para uma melhor compreenso e interao no mundo em suas diversas dimenses (espaciais, ecolgicas, estticas, sociais, histricas, lingsticas, matemticas, etc). Nesse processo, o ldico, presente no faz-de-conta, nas brincadeiras, nos jogos e na fantasia, pressuposto fundamental no desenvolvimento das crianas pequenas e, portanto, deve ser considerado como elemento propulsor da aprendizagem. No trabalho pedaggico da educao infantil, as interaes e as brincadeiras so o fio condutor na organizao das atividades curriculares, de maneira a contribuir no desenvolvimento das aprendizagens bsicas, construo de conceitos, incorporao de valores e construo dos conhecimentos que promovam uma melhor compreenso das inter-relaes que fazem a dinmica das relaes sociais mais prximas das crianas. 17Atravs dos jogos e brincadeiras, a criana aprende a conhecer a si prpria, as pessoas que a cercam, as relaes entre as pessoas e os papeis que elas assumem. Ela aprende sobre a natureza, os eventos sociais, a estrutura e a dinmica interna de seu grupo. atravs deles, tambm, que ela explora as caractersticas dos objetos que a rodeiam e chega a compreender seu funcionamento. (LIMA,1990, p.21)

Atravs das brincadeiras, a criana pequena representa, imita, experimenta e incorpora papis sociais, condutas, valores e atitudes observados na realidade adulta. Quando a criana brinca apresenta atitudes e comportamentos incomuns ao seu dia a dia, incorpora personagens e/ou fatos que podem ter sido observados em seu cotidiano: filmes, novelas, desenhos animados etc. Por isso, as atividades escolares devem propor dramatizaes, imitaes, vivncias e experincias significativas para o seu desenvolvimento. Pouco a pouco, as brincadeiras vo se transformando, acrescentando e/ou substituindo elementos no s exteriores, pois tambm vo promovendo novas capacidades

17

DCNEI, 2009, Artigos 6,7,8,9 e 10.

36

intelectuais (associao, classificao, seriao, generalizao, imaginao, percepo etc.) em atendimento a alguma necessidade psicolgica, afetiva, biolgica ou social. Os brinquedos diferem em seu contedo e origem. H jogos com regras tradicionais e/ou criadas pelo grupo, jogos em que as regras podem variar e o princpio permanecer inalterado, jogos de papis, jogos com objetivos, jogos de fantasia, jogos de dramatizao, jogos didticos. As crianas podem brincar das mesmas coisas em idades e formas diferentes. Desse modo, faz-se necessrio que os espaos e tempos escolares sejam cuidadosamente organizados, considerando o conjunto de atividades curriculares que se pretende realizar durante o processo de permanncia das crianas na escola. Por conseguinte, o espao escolar deve ser amplo e adequado a uma multiplicidade de atividades, com recursos diversificados que permitam a realizao de brincadeiras, construo de brinquedos e jogos, e a interao dos grupos, permitindo o acesso a atividades sistemticas de engatinhar, treinar seus primeiros passos, correr, pular, explorar objetos, jogos e brincadeiras de faz-de-conta em funo de suas necessidades e interesses. A linguagem, tambm, deve ser considerada como princpio terico-metodolgico na organizao curricular, j que tem papel fundamental no desenvolvimento da criana, pois na medida em que a utilizam como forma de interao, promove o desenvolvimento de suas funes cognitivas e psquicas. No trabalho com as crianas nas creches e pr-escolas, o uso das diversas linguagens fundamental, pois alm de auxiliar a comunicao das crianas em suas diferentes fases de desenvolvimento, contribuem para o desenvolvimento do seu processo cognitivo e ampliam as possibilidades de interao e vice-versa. primordial para o desenvolvimento das crianas que o adulto leia histrias, cante, brinque, converse com elas, mesmo com aquelas que ainda no se utilizam da linguagem verbal. Na escola, o adulto tem papel importante no desenvolvimento da linguagem oral da criana pequena, j que ele o responsvel por atribuir significados s palavras proferidas pela criana e fornecer os elementos lingusticos essenciais construo de seu vocabulrio. A linguagem permite ao ser humano simbolizar elementos (objetos e fatos) da realidade, possibilitando-lhe operar na ausncia de tais elementos, desenvolvendo cada vez mais sua capacidade de abstrao. O salto qualitativo para o pensamento verbal e tambm para a fala intelectual possvel graas interao com sujeitos que j possuem uma linguagem estruturada. O uso social da linguagem permite que a criana desenvolva seu discurso interior, dirigida ao prprio sujeito e no a um interlocutor externo, sendo um discurso sem vocalizao, voltado ao pensamento, com a funo de auxiliar as operaes lgicas do

37

indivduo. As crianas maiores se utilizam desse discurso interior como forma de organizao do pensamento e de suas aes. Inicialmente, a criana pequena se utiliza da fala egocntrica como apoio ao planejamento de seqncias a serem seguidas e tambm como auxiliar na soluo de problemas. Ela usa a fala egocntrica na execuo de tarefas simples, nas brincadeiras de faz-de-conta, nos jogos, nas imitaes etc. A fala egocntrica ajuda a criana pequena na organizao de seus pensamentos e no comando de suas aes. Por isso, importante que ela possa fazer uso desse recurso na realizao das atividades curriculares e, principalmente, que o adulto educador utilize a linguagem oral em cada momento dessas atividades, pois a transio da fala egocntrica ao discurso interior depende de processos internos do desenvolvimento, promovidos pelas condies externas do ambiente social. A linguagem (verbal e no-verbal) se constitui enquanto sistema de signos que designa coisas, aes, propriedades e relaes e atravs deste conjunto de smbolos e significados que a criana interage com o mundo e, para isso, precisa apreend-lo. na interao com os j usurios da linguagem que a criana vai poder se apropriar e fazer uso adequado. Os jogos e brincadeiras com gestos, cantigas, rimas, trava-lnguas etc. contribuem significativamente para o desenvolvimento da linguagem e so fundamentais no trabalho pedaggico com as crianas pequenas, pois so as primeiras formas de linguagem, utilizadas por elas como forma de expresso e de organizao do pensamento. No entanto, essas linguagens no so as nicas formas de representao que a criana dispe em seus primeiros anos de vida, alm dessas, a criana tambm representa graficamente a realidade atravs do desenho (LIMA, 1990). Procurando representar as coisas que v e os objetos e as pessoas com os quais se relaciona, a criana se utiliza de desenhos que, num primeiro momento, mais se parecem com rabiscos. Esses desenhos vo adquirindo caractersticas e traos mais especficos, no decorrer do processo. Nesse sentido, alm de servir criana como representao da realidade e forma de registro, o desenho impregnado de significados. Para a criana, o desenho ativo, dinmico, tridimensional, sequencial e, portanto, ele incorpora o conjunto de significaes que ela vai construindo em seu processo de desenvolvimento. A linguagem verbal e no-verbal se constitui enquanto sistema de signos que designa coisas, aes, propriedades e relaes e atravs deste sistema que a criana interage com o mundo e, para isso, precisa apreend-los. O jogo, a brincadeira e a linguagem so processos fundamentais no desenvolvimento da criana e atravs deles que se estabelece a relao com outros seres humanos e com o meio. No atendimento s crianas da educao infantil devem ser considerados alguns aspectos quanto ao desenvolvimento especifico de cada fase da infncia.

38

Por exemplo, crianas de zero a um ano tm dificuldades de sobreviver por recursos prprios, situao que deve ser compensada com uma relao de carinho e ateno da me e/ou responsvel por seus cuidados bsicos. Na creche, cabe ao professor desempenhar essa funo. Isso leva a um atendimento permanente e individualizado por parte do professor que deve, no trabalho com os bebs, observar suas reaes e progressos, j que nessa fase o desenvolvimento das crianas se d num ritmo bastante acelerado. Dessa forma, cabe ao professor, promover as situaes de aprendizagem que propiciem o desenvolvimento das habilidades psicomotoras das crianas. As crianas de um e dois anos se movimentam com mais autonomia, ficam em p, e, na maioria dos casos, j andam, deslocando-se pelo espao fsico disponvel, repetitivamente. Durante esses movimentos, tornam-se interessantes para elas, os objetos que podem ser carregados de um lado para o outro. Essas crianas esto na fase egocntrica e brincam individualmente, mesmo quando esto em grupos. Com freqncia acontecem os atropelos fsicos (mordidas, agarres, empurres), havendo a necessidade de ateno e interveno, por p