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REFORMA ADMINISTRATIVA NOS ANOS 90: O CASO DA PREFEITURA ,..., MUNICIPAL DE SAO PAULO • Tania Margarete Mezzomo Keinert Professora do Departamento de Administração Geral e Recursos Humanos da EAESP/FGV, Pesquisadora do Centro de Estudos de Administração Pública e Governo (CEAPG/EAESP/FGV). * RESUMO: A partir de um retrospecto histórico dos pro- cessos de reforma administrativa no Brasil, o estudo destaca os desafios colocados para as intervenções de mudança na esfera pública nos dias atuais, tanto de nível organizacional (eficácia e eficiência), quanto social (participação e democra- cia). É apresentado o caso da Prefeitura Municipal de São Paulo, com base no modelo organizacional atual, colocando- se, a seguir, a proposta de reforma. Sua análise é baseada no referen- cial histórico construído ante- riormente. A proposição de reforma apresentada contribui com soluções inovadoras e criativas para velhos proble- mas da gestão pública. * ABSTRACT: This study starts with a historical review of the Civil Service Reforms in Brazil. Then, it focuses on the challenges that any initiative in changing Civil Service suffers at organizational level (efficacy and efficiency) or sociallevel (participation and democracy). It is featured the case of the local authority of São Paulo with a description of its organization and the proposal to modify it. The paper concludes that the proposal contains new and imaginatives solutions for old problems of public management. * KEY WORDS: Civil service reform, decentralization, democratization, public management, local authority, São Paulo. * PALAVRAS-CHAVE: Refor- ma Administrativa, descen- tralização, democratização, gestão pública, Cidade de São Paulo. 66 Revista de Administração de Empresas São Paulo, 33(4):66-81 Jul./Ago.1993

REFORMA ADMINISTRATIVA NOS ANOS 90: O CASO DA … · cionando de acordo com os critérios culturais da estrutura anterior 10. Uma proposta de reforma administrativa baseada em uma

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REFORMA ADMINISTRATIVANOS ANOS 90:O CASO DA PREFEITURA,...,

MUNICIPAL DE SAO PAULO• Tania Margarete Mezzomo Keinert

Professora do Departamento de Administração Geral eRecursos Humanos da EAESP/FGV, Pesquisadora doCentro de Estudos de Administração Pública eGoverno (CEAPG/EAESP/FGV).

* RESUMO: A partir de um retrospecto histórico dos pro-cessos de reforma administrativa no Brasil, o estudo destacaos desafios colocados para as intervenções de mudança naesfera pública nos dias atuais, tanto de nível organizacional(eficácia e eficiência), quanto social (participação e democra-cia). É apresentado o caso da Prefeitura Municipal de SãoPaulo, com base no modelo organizacional atual, colocando-se, a seguir, a proposta de reforma.Sua análise é baseada no referen-cial histórico construído ante-riormente. A proposição dereforma apresentada contribuicom soluções inovadoras ecriativas para velhos proble-mas da gestão pública.

* ABSTRACT: This study starts with a historical review ofthe Civil Service Reforms in Brazil. Then, it focuses on thechallenges that any initiative in changing Civil Servicesuffers at organizational level (efficacy and efficiency) orsociallevel (participation and democracy). It is featured thecase of the local authority of São Paulo with a description ofits organization and the proposal to modify it. The paperconcludes that the proposal contains new and imaginativessolutions for old problems of public management.

* KEY WORDS: Civil service reform, decentralization,democratization, public management, local authority, SãoPaulo.

* PALAVRAS-CHAVE: Refor-ma Administrativa, descen-tralização, democratização,gestão pública, Cidade de SãoPaulo.

66 Revista de Administração de Empresas São Paulo, 33(4):66-81 Jul./Ago.1993

REFORMAADMINISTRATIVA NOSANOS 90...

INTRODUÇÃO

Este estudo visa a discutir os limites e as possibilidades dos pro-cessos de reforma administrativa no setor público, enquanto instru-mentos capazes de dar respostas às demandas por participação e de-mocratização, por um lado; e de eficácia e eficiência, por outro 1.

Com este objetivo, é feita, inicialmente, breve retrospectiva dasproposições de reforma administrativa no Brasil, relacionando-as aoscontextos macro (sociedade) e micro (organizacional). A análise éconduzida por um fio histórico, que vai da primeira metade do sécu-lo aos nossos dias, numa tentativa de identificar as características re-queridas aos processos de reforma atuais.

É neste contexto, os anos 90, marcado por desafios e potencialida-des específicos, que se insere o estudo do caso da Prefeitura Munici-pal de São Paulo, mais precisamente, da proposta de reforma admi-nistrativa apresentada pela gestão Luiza Erundina de Souza (1989-1992)2.

Por fim, o caso é analisado à luz do referencial emergente da con-textualização histórica antes mencionada.

REFORMA ADMINISTRATIVA E EVOLUÇÃO SOCIAL

Uma retrospectiva das proposições de reforma administrativa noBrasil revela a existência de várias experiências, em sua maioria deêxito limitado. Não obstante, é preciso ressaltar os avanços alcança-dos pelo Departamento Administrativo do Serviço Público (DASP),na década de 40; o salto qualitativo do Decreto-Lei 200,de 1967; a ex-periência do Programa Nacional de Desburocratização entre outros.Destacam-se também iniciativas recentes e até certo ponto polêmicas,como as empreendidas pelos governos José Sarney e Fernando Col-lor; especialmente no tocante à questão do funcionalismo».

É claro que as proposições de reformas refletem sempre o momen-to histórico que a sociedade, as instituições e o próprio campo de co-nhecimento em administração pública estão vivendo.

Desde a primeira metade do século, e estendendo-se até os anos70, as propostas de reforma fundamentaram-se na racionalidade téc-nica, na adequação dos planos e nos princípios" científicos" da admi-nistração. Por esta visão, a administração pública tornar-se-ia eficien-te a partir do momento em que fossem dominados e aplicados umasérie de princípios e técnicas administrativas, de uso universal.

Faziam-se presentes, neste período, elementos constituintes da di-cotomia política-administração, em parte resultado dos projetos decooperação internacional da chamada "administração para o desen-volvimento", baseada na importação de técnicos e técnicas adminis-trativas; e, por outro lado, resultante do próprio estágio evolutivoque a disciplina de Administração pública alcançava no período, noBrasil. Assim, acreditava-se que a atividade "política" de decisãoexistia separadamente da atividade "técnica" de implementação e vi-ce-versa.

A noção de que o desenvolvimento técnico-gerencial, por si só, se-ria o caminho para a superação dos problemas da sociedade brasilei-ra levou à emergência de proposições tecnicistas de reforma, à apli-cação de "modelos" inadequados à nossa realidade sócio-cultural e àdesconsideração da existência de fatores políticos.

Esta postura foi mudando, não apenas pelo fracasso constantedestas propostas de reforma (baseadas apenas na racionalização de

© 1993, Revista de Administração de Empresas / EAESP / FGV, São Paulo, Brasil.

1. Pesquisa desenvolvida juntoao Centro de Estudos de Admi-nistração Pública e Governo, daEAESP/FGV, com o apoio doNúcleo de Pesquisas e Publica-ções (da mesma instituição) edo Departamento de Economiadelle Amministrazioni Pubblicheda Universitá Bocconi (Itália).

2. Projeto de Lei nº 235 de 16de maio de 1991, publicado noD.O.M: São Paulo, v. 36, p. 161,quarta-feira, 28 de agosto de1991 (ainda não votado pela Câ-mara de Vereadores).

3. Para o leitor interessado emaprofundar o estudo da evolu-ção das propostas de reformaadministrativa no Brasil, ver:NASCIMENTO, K. Reflexões so-bre a estratégia de reforma ad-ministrativa: a experiência fede-ral brasileira, Revista de Admi-nistração Pública, Rio de Janei-ro, v. 1, n. 1. p. 11-50, 1967;KLlKSBERG,B. La reforma ad-ministrativa en america latina:una revision dei marco concep-tual. Revista Venezolana de De-saro/lo Administrativo, n. 3, p.35-57,1983; WARLICH, B. AReforma administrativa no Bra-sil: experiência anterior, situa-ção atual e perspectivas". Re-vista de Administração Pública,Rio de Janeiro, v.18 n. 1, p. 49-59, 1984; WARLICH, Beatriz.Desburocratização e Desestati-zação: novas considerações so-bre as prioridades brasileiras dereforma administrativa na déca-da de 80". Revista de Adminis-tração Pública, Rio de Janeiro,v. 18, n. 4, p. 72-87, 1984;MOnA, P. R. Modernização ad-ministrativa: propostas alterna-tivas para o Estado Latino-Ame-ricano". Revista de Administra-ção Pública, Rio de Janeiro, v.21, n. 4, p. 31-61, 1987; KLlKS-BERG, B. Nuevas fronteras tec-nologicas en materia de geren-cia em America Latina. Revistade la Cepal, Santiago, n. 31,p.179-199, 1987; SILVA,F. da.Algumas reflexões sobre a Ad-ministração Pública. Revista doServiço Público, v. 116, n. 3,p.22- 26, 1988; HOLANDA, N.Reforma Administrativa e Refor-ma do Estado. In: Anais doXXIII Encontro Anual da AN-PAD, p. 1619-1634; MARCELI-NO, G. F. A nova estratégia daReforma do Estado. Revista deAdministração Pública, Rio deJaneiro, v. 24, n. 3, p. 54-61,1990; CASTANHAR, J.C. CemDias do Governo Collor: avalia-ção da reforma Administrativa".Revista de Administração Públi-ca, Rio de Janeiro, v. 25, n. 1, p.

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iJ!JlJ CASES

35-81, 1991; COSTA, F. L.; CA-VALCANTI, B. S. Mudança Or-ganizacional no Setor Público",Revista de Administração Públi-ca, Rio de Janeiro, v. 25, n. 1, p.82-106,1991; PIMENTA, c.s.apapel da Secretaria da Adminis-tração Federal no Processo deModernização da "Função-Admi-nistração" - Brasil 1988-1992.São Paulo: EAESP/FGV, 1993(Dissertação de mestrado).

4. Para aprofundar esta questãover MEZZOMO, Tania; LAPOR-TA, Claudio. A RAP e a Evoluçãodo Campo de AdministraçãoPública no Brasil (1967-1992).In: XXVII ENANPAD, Belo Hori-zonte, 1993.

5. Para esta discussão ver CAI-DEN, Gerald. E. Como hacerlefrente a la decada de los noven-ta: retos para los gerentes deisector publico, In: XXV Asam-blea Anual de Cladea, San Jose,Costa Rica, 1990.

6. Tendência verificada na pes-quisa desenvolvida por MACHA-DO, C.; AMBONI,N.; CUNHA, V.;"Produção Acadêmica em Ad-ministração Pública: período1983/1988". In: Anais da AN-PAD, p. 1081 a 1110, Águas deSão Pedro, 1989.

7. Sobre reforma administrativaenquanto processo político-educacional ver MATOS, R. Pa-ra que modernizar a organiza-ção pública? Revista de Admi-nistração Pública, Rio de Janei-rO,v.22,n.3, p.22-26, 1988.

8. CARDOSO, Fernando H. Sócortar não resolve, Folha de SãoPaulo, 28 novo 1991.

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procedimentos, alterações na estrutura organizacional, redução donúmero de funcionários, reagrupamento de órgãos e secretarias), co-mo também pelo fortalecimento da cultura democrática na sociedadebrasileira e pela evolução paradigmática do campo teórico de admi-nistração pública no Brasil-.

Nos anos 80, inicia-se um período de intensa mobilização da socie-dade civil. Concretiza-se, na prática política, o conceito de cidadania.Começa a emergir a noção de participação na administração pública.Surgem propostas de co-gestão, conselhos de representantes, audiên-cias públicas etc. Ganha espaço a idéia de descentralização e de forta-lecimento do poder local. Multiplicam-se os canais de comunicaçãoentre a sociedade e o estado, no sentido de ampliar o controle da pri-meira sobre o segundo.

Os pactos políticos começam a dividir espaço com as decisões téc-nicas. Como conseqüência, os estudos de administração pública pas-sam a preocupar-se com a questão do poder estatal, dando menosênfase à eficiência que à eqüidade e à adequação social. Paradoxal-mente, porém, entende-se que para garantir a democratização da ad-ministração pública, certas condições operativas e organizacionaisprecisam ser asseguradass,

A administração pública passa a ser entendida como um fenôme-no cultural diferenciado relacionado à prática política. Os estudosbaseados no enfoque da "Nova Administração Pública", por exem-plo, destacando a reforma social e dando ênfase a questões comoeqüidade, organização centrada no cliente, descentralização e papéisadministrativos pró-ativos tomam-se predominantes no campo teóri-co de administração pública 6.

Desta forma, os anos 90 requerem proposições de reforma conce-bidas como verdadeiros processos de mudança social, provocandoalterações na distribuição de poder, no atendimento aos interessespúblicos (e privados), nas atitudes dos servidores e da população;além de na estrutura organizacional. Trata-se de implementar refor-mas complexas, que abranjam o próprio âmago do estado, no sentidode criar condições à prática democrática.

A reforma administrativa passa a ser entendida, assim, como umprocesso político-educacional permanente, e não apenas como umevento isolado. Ela objetiva transformar as condições de trabalhocom vistas à redução de custos, à maximização dos resultados e à de-mocratização das relações entre os participantes organizacionais eentre estes e seus interlocutores externos 7.

A nível organizacional, as propostas de reforma administrativaprecisam também responder a outros desafios colocados pela socie-dade: incrementar a produtividade, melhorar a qualidade dos servi-ços sem prejuízo da quantidade, administrar a complexidade cres-cente das tarefas, o desejo de participação dos funcionários em todosos escalões, a disseminação de novas tecnologias da informática etc.8

REFORMA ADMINISTRATIVA E APRENDIZAGEM ORGANIZACIONAL

A ênfase tradicionalmente dada às mudanças estruturais passa adividir espaço, neste contexto, com enfoques comportamentais, comdestaque a questões relacionadas com a cultura organizacional, di-mensões simbólicas e subjetivas. Entre estas, a da imagem do servi-dor público, construída com base no estereótipo da ineficiência e de-sinteresse deste, o que acabou gerando comportamentos defensivos edesmotivados.

REFORMA ADMINISTRATIVA NOS ANOS 90 ...

As propostas tradicionais de reforma não têm criado condiçõespara que se desencadeasse um verdadeiro processo de aprendiza-gem organizacional. O que ocorria era apenas um circuito simples deaprendizagem, utilizando a denominação empregada por Argyrisv.ou seja, resolviam-se apenas os problemas visíveis e imediatos. Po-rém, a questão básica do porquê da existência deles e o que deveriaser feito para deixarem de existir não era colocada em discussão (verfigura 1).

Estas proposiçõesignoravam aspectosrelevantes como a prá-tica histórica da admi-nistração pública, cris-talizada em culturaadministrativa, o queocasionava, na maiorparte das vezes, novasnormas de organiza-ção superpostas a for-mas de comportamen-to inalteradas. O que acontecia era a emergência de um novo desenhoorganizacional, sendo que, na prática, a organização continuava fun-cionando de acordo com os critérios culturais da estrutura anterior 10.

Uma proposta de reforma administrativa baseada em uma visãode mudança organizacional precisa pensar, primeiramente, em alte-rar os valores fundamentais que governam as ações. Isso significaaprender uma nova teoria aplicada e abrir mão de velhos conceitos eparadigmas. Assim, os processos de reforma administrativa preci-sam retomar a questão da eficiência do procedimento e da efetivida-de do serviço, e os colocar enquanto elementos contribuidores parauma terceira dimensão: a relação que se concretiza com o cidadão e aconstrução coletiva do Estado que ocorre na prática cotidiana n.

Significa, no dizer de Argyris, superar o circuito simples e passarpara o circuito duplo de aprendizagem organizacional (rever figura1), gerando alterações de natureza e abrangência diferenciada.

A revisão destes valores fundamentais implica também a adoçãode uma postura dialógica, participativa e democrática, o que signifi-ca criar condições a uma nova relação dos funcionários públicos e daadministração municipal com a população e vice-versa.

AçõesCIRCUITO SIMPLES DE APRENDIZAGEM

CIRCUITO DUPLO DE APRENDIZAGEM

Fonte: Argyris, Crys. Overcoming Organizational Defenses. Allyn and Bacon, 1990, p. 42.

UM REFERENCIAL PARA A ANÁLISE

Entender as proposições de reforma administrativa enquanto pro-cessos de mudança de natureza multidimensional, implica conside-rar sua abrangência organizacional e social. Significa levar em contaaspectos como os valores fundamentais, a cultura política, a comple-xidade do setor público, o papel do servidor, a estrutura organizacio-nal, o uso estratégico de novas tecnologias gerenciais e da informáti-ca entre outros.

a. Mudança nos valores fundamentais na cultura políticaO setor público precisa implantar medidas no sentido da supera-

ção do paradigma da ineficiência que acredita que a administraçãopública assim o seja por natureza. Este mito fundamentou-se em prá-ticas administrativas pouco comprometidas com o bem-estar damaioria da população e em estruturas organizacionais que impediam

9. ARGYRIS, Chris. DoubleLoop Learning in Organizations.Harvard Business Review,Sept./Oct. 1977; __ .Over-coming organizational defenses,Allyn and Bacon, 1990 (disponí-vel em português com o títulode Enfrentando defesas empre-sariais, Rio de Janeiro: Campus,1992).

10. DANIEL, C. As Administra-ções Democráticas e Popularesem Questão. Revista Espaço eDebates, n. 30, São Paulo,1990.

11. SPINK, P.K. Reforma Admi-nistrativa: modelos e processos,Colóquio dos Países Africanosde Língua Oficial Portuguesa,Praia, República de Cabo Ver-de,1989.

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jJ~/J CASES

12. O autor agradece a contri-buição de Michael Paul Zeitlin,com este propósito, durante odebate na plenária da XXVIIAsamblea Anual de CLADEA,realizada em Bogotá, Colômbia,em 1992, onde o paper Descen-tralizado e Democratizado: AProposta de Reforma Adminis-trativa da Municipalidade deSão Paulo foi apresentado. Nomesmo encontro, a plenária"Exito e Innovación en la Gerên-cia em América Latina", coorde-nada por Carlos Dvila, tambémabordou esta questão.

13. SPINK,P. op. cit.

14. METCALFE, L. Public Mana-gement: From Imitation to Inno-vation. International Institute ofAdministrative Sciences, Bruxe-las, mimeo,1992.

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a transparência na gestão e o controle por parte da população. A cren-ça de que o setor público é ineficiente fundamenta o imobilismo e geraineficiência.É preciso (contrariamente do que faz diariamente a mídiae do que fez o então candidato Fernando Collor de Mello com seu dis-curso "moralizante"), documentar experiências inovadoras de gestãopública no sentido de começar a romper com este círculo vicioso12.

O desafio consiste na adoção de valores de uma cultura democrá-tica, que permita a participação dos cidadãos e do funcionalismo naformulação das políticas e no controle de sua implementação.

b. Consciência da complexidade do setor públicoConforme colocou Spink13, o setor público nos dias atuais caracteri-

za-se por um alto grau de extensão, tamanho e complexidade. Por ex-tensão é entendido o número abrangente de assuntos diferentes naqual a área pública está envolvida. Por tamanho é reconhecido que ca-da vez mais o setor público assume uma posição de ponte entre as ma-xi-organizações da sociedade, seja em orçamento, seja em número depessoas empregadas por ele. Por complexidade entende-se a variedadee variabilidade de formas organizacionais, seus mecanismos de interco-nexão e regulação. Estas características exigem uma tarefa gerencial di-ferenciada que poucas proposições conseguem dar conta, especialmen-te quando se adiciona a obrigação de iniciar e sustentar a mudança.

Neste sentido, as administrações públicas precisam criar mecanis-mos que as tomem capazes de aprender mais umas das outras, apro-veitando a experiência gerencial acumulada pelo setor público; bas-tante distinto do setor privado. Também precisam vislumbrar asperspectivas promissoras das análises interinstitucionais, da criaçãode redes de atuação e de conselhos de gestão; considerando que é aação coletiva nos sistemas interorganizativos que diferencia a admi-nistração pública de formas de gestão mais simples>.

c. Mudança no papel dos servidores públicosAs propostas de reforma administrativa, em sua maioria, partiram

do pressuposto de que os funcionários públicos são sempre desinte-ressados, desonestos e ineficientes.Assim, investiram mais em contro-les do que em formação, reforçando o circuito simples de aprendiza-gem, ou seja, provocando burocracia, excesso de normas, estruturas rí-gidas, desmotivação, desconhecimento da sua função e importância.

A valorização do servidor público é , desta forma, outra posturainovadora a ser adotada no sentido de propiciar condições à emer-gência de gerentes capazes de administrar a escassez de recursos e oexcesso de demandas que caracterizam a administração pública bra-sileira. É preciso criar condições para o surgimento de uma verdadei-ra cidadania organizacional em substituição ao antigo conceito deineficiência, imobilismo e desinteresse.

Faz-se necessário superar a visão logística e implantar uma políti-ca efetiva de pessoal que contemple temas como motivação, partici-pação, relação entre os mercados de trabalho privado e público, de-senvolvimento planejado e contínuo dos recursos humanos etc.

d. Rompimento com estruturas rígidas e centralizadasA descentralização da estrutura administrativa constitui-se em

um imperativo para administrar a cidade contemporânea, repre-sentando uma possibilidade concreta de diminuir a distância entreas demandas populares e o cumprimento das responsabilidades ad-ministrativas. (Significa colocar em prática o equivalente à denomi-

REFORMA ADMINISTRATIVA NOS ANOS 90 ...

nação de "proxi midade ao cl iente" uh lixada atualmente nos meiosempresariais.) Este' processo deve ser enlend ido em lermos pol ií icos,territoriais (' funcionais.

A descentraliz,lç';lO política visa a fragmentar o poder entre as vá-rias e'sfcras sociais; d descentralização territorial visa il obter uma rc-prcsentacão da socicd ade a nível local nos novos organismos queirão acolher as a Iribu icõcs (' recursos c os gerenciar, com auí onom ia:e por fim, a descentralização funcional, de caráter setorial, persegue'LIma maior flexibilidade c agilidade da gesUlo pública mediante ,1

criação de org<1ni:ml0s autônomos Ic.

Outro aspecto importante é diferenciar descentralização e dcsconccntraçào. já que ('sta última retere-se apenas à criação de unidadesde gesUiu de me-nor d irncnsão. com o objetivo de Iaci litar a operacio-nalizaçào do apare-lho administrativo.F.sta distinção é importante i\medida que, no processo de descentralização pode ser necessário rcconcentrar algumds atividades antes dispersas

Assim, a gcsbo téclllClhldrninistrativil dos serviços públicos deverealizar-se a nível local e autônomo, mantendo o guverno central asfunções de integração territorial, controle c acompanhamento globaldos prograrnds '''o

e. O uso estratégico de novas tecllologiasA uliIi7a~',1() de nOV;lS tecnologias, tanto gerenciais quanto da infor

mática. prcssupóc repensar todo o funcionamento da estrutura organiz.acional. ri nCCCSSi1rio evitar a tendência imodiatista a "tornar mais cfjciente o errado" e. utilizando o termo cunhado por Michacl Harnmer.adotar um processu de ITc'ngenharia organizacional (rl'l'ngincring) quercdesenhe os fluxos de atividades em função das inovações 17.

F imperativo, também. superar a tendência ao consumisrno tecno-lógico buscando, testando e desenvolvendo alternativas gerenciais p

('Cjuiparnentos adequados.Outro ponto importante 6 o que refere-se ao sistema de informa-

çõcs. à medida que Pie constií ui-se no pilar de sustentação ían to deiniciativas relacionadas à agilização quanto à democratizd(,"ào da máquina esta ta I. A informação precisa ser amplamente disseminada ,-I

nível organizi,clOlldl l' d, sociedade como um todo, que o conhec.i-monto t' a aprendizagem constituem-se nas bases dt' qualquer rnudança nos dias atuais.

o CASO

indireta da Prefeitura.

15. MASSOL O. A. Em Direçãoàs Bases: Llescentral!7ação emunicíoio. Revist: isoeço e De-bates. Sâo Paulo. 24. 1988.

16. BOR,JA ,J . FCfjN. M. de"Pulitiuas de Europa V de lOSistarios las Ciudades"meo,

17, HAMER, M. Reengllleeringwork: don't autnmzte. delibera-te Harvard Husmess Review.Jlli/Aug.1990

18, Os dois próxíros pontosbaseram-se no docurnenlo'Proposta de Novo Modelo deí.strutura Or0311!Zacioflai" de autona da Secretaria Especial daHeforma Admirustratrva (SERA:da Prefoitura Municipa] de Silof'aulo 110 projeto de lei (la reter'na e err: oncurnentos internosda S~Hl\

71

lJ!JIJ CASES

Cabe ao governo municipal, no âmbito desta competência, ad-ministrar a complexidade, heterogeneidade e turbulência da vidaurbana, imprimindo-lhe uma direção político-administrativa quese expressa no plano de ação do governo, em suas diretrizes e me-tas, na forma como define prioridades e administra recursos.

A forma como está organizada a Prefeitura tem papel funda-mental na concretização da relação do governo municipal comseus "clientes" internos (os funcionários) c externos (a população)dado que as práticas administrativas não são neuh'as, mas trazemembutidas em si culturas e posturas políticas.

A ESTRUTURA ORGANIZACIONAL EXISTENTE (1989)

o organograma da prefeitura está estruturado com base no mo-delo ]inha-staff, na divisão setorial (ou seja, ações classificadas por"tipo") e na coordenação centralizada do prefeito e secretarias (verfigura 2).

Esta forma de estruturação, dadas suas características de centra-lização e setorialização estanque, tem se revelado excessivamenterígida e segmentada impedindo uma resposta rápida às demandase desafios impostos por uma cidade do porte e diversidade de SãoPaulo.

A rigidez é devida ao fato da estrutura organizativa ter evoluí-do através dos tempos, empurrada pelas necessidades de uma ci-dade que cresceu veloz e desordenadamente. A administraçãomunicipal foi apenas reagindo a esse crescimento, criando novassecretarias, sem levar em conta (lue os problemas da cidade nãoapenas cresciam mas tornavam-se profundamente diferentes.

Os "pedaços" de São Paulo foram diferenciando-se a tal pontode constituir "várias cidades em uma 1/. Ao longo do tempo cadabairro da cidade foi se formando de maneira diferente, construin-do uma identidade própria. Esta diferenciação pode ser observadana figura 3, que compara o tipo de ocupação do solo ( vertical, ho-

IConselho de Auxílio

e SubvençõesJunta do Serviço

MilitarSecretaria dos Negócios

ExtraordináriosSecretaria do Governo

Municipal

I) I~

Fonte: Secretaria Especial da Reforma Administrativa. O poder em São Paulo. S. Paulo: Cortez, 1992. p. 138.

72

REFORMA ADMINISTRA TlVA NOS ANOS 90 ...

rizontaJ, industrial, serviços) e na figura 4, que compara a popula-ção residente em cada área da cidade. Cada uma destas regiões de-manda serviços específicos, de acordo com suas necessidades.

Outro tipo de ilustração pode ser feita através da comparação dedois bairros da cidade (ver figura 5).

Verifica-se, por exempl.o, diferenças gritantes no crescimento po-pulacional (enquanto o bairro Capela do Socorro cresceu 4,5% noperíodo 1960-1990, o Centro manifestou um crescimento negativode 8% no mesmo período). As diferenças são consideráveis tam-bém em relação à área servida portratamento de esgoto, serviços de co-leta de lixo e rede hospitalar; bem co-mo na forma de ocupação e uso dosolo de cada bairro.

O excesso de centralização foi in-duzindo os governos a agirem comose a cidade fosse uniforme. Assim, aestrutura existente (que mais pareceum labirinto interorganizacional) fazcom que a responsabilidade se percana fragmentação e excessiva diferen-ciação de ações; distanciando, porum lado, o cidadão da lógica da suacidade e do exercício de seus direitospolíticos e sociais; de outro, O servi-dor da possibilidade de pôr em prá-tica um trabalho digno, social e tec-nicamente coerente.

A pouca flexibilidade da estruturafaz com que ela não se adapte às mu-danças do perfil e volume das de-mandas, dando origem a uma orga-nização administrativa segmentada.Esta segmentação surgiu em função

. Figura 3: Tipo de ocupação d. . .. . re.giãu da cidade

w,'"""'''' -111111111 ~~~~i~g~De

ReslCl?nciasVerticais

J..tJ.tj-ti-t ~esldênclasA:}:{j:{}{j HOrizontais

Norte Sul Centro Oeste Leste----

Fonte: Secretaria Especial da Reforma Administrativa. Subprefeíturas: oque você sonha com e/as. São Paulo, rnirneo. 1992, p. 10.

II.

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Fonte: Secretaria Especial da Reforma Administrativa. Subpreteíturas: oque você sonha com elas São Paulo. rnirneo, 1992, p. 10.

Figura 5: Comparação entre duas regiões da cidade

REGiÕES DIFERENCIADAS DE SÃO PAULO

CentroCapela doSocorro

• População19601990

22.000 (0,5%)585.000 (5,0%)

465.000 (12%)530.000 (4%)

• Ligações de esgoto45% 93%

• HospitaisParticularMunicipais

252

300• Coleta de lixo (ton) 105

• Uso so solo (% de ocupação)Hab. Horizontal 70Hab. Vertical 8Serviços 8

84535

Fonte: Secretaria Especial da Reforma Administrativa. Documento detrabalho, PMSP. São Paulo, mimeo,. 1992.

73

jJ~(JCASES

Habitação13 regiões

Saúde10 regiões

Esportes:i' reuiões

Educação10 regiões

Bem-Estar:17 regiões

AdministraçõesRegiorldlS:20 regl(]es

Cultura13 reqiões

~-- \

);~\\

'"' )\ ~;""v'/"""''''

fonte: Secretaria b:peclô: da Helnrma ,L\cllllllllstrativél. Sâo Paulo tem sOluçjo? São Pél[JIO.PMSP. i 991. D. 4.

74

que neme admínistrações

e troca deimpossibilita uma

possadireitos.

se

centrais,a que deve

de poder. No en-

I1EFORMA ADMINISTRA TlVA NOS ANOS 90 ...

tanto, é sabido que a proximidade da população .é fundamentalpara garantir a fiscalização e o controle da gestão da coisa publica.

A PROPOSTA DE REFORMA

() diagnóstico realizado pela Secretaria Especial de ReformaAdministrativa (SERA), no imo de 1989, concluiu que a estruturaexistente era arcaica e irracional, não interessando à cidade, aosservidores e aos governantes. Propôs-se então a definir os contor-nos de uma verdôdeira reforma do estado no âmbito do Municípiode São Paulo I".

i\ proposta de reforma baseou-se na experiência de cidades co-mo Barcelona (1977-1984), Berlim (1982-1984), Paris (1982) entreoutras. Da análise destas proposiçôes emergiram os pressupostosbásicos que norteariam a definição dos contornos da proposta: ademocratização do poder, a valorizôção do servidor público e amodernização da estrutura organizaciona 1.

a. A democratização do poderA proposta procura garantir este pressuposto através da des-

centralização da gestão municipal, com a criação de subprefeiturase conselhos regionais de gestão.

As subprefeiturastivas com capacidade de U<·<I.',,'"

objetivo de aproximar aa ação territorial em sua espaçosde participação.

(;ONSElHO DE?LANEJAMfNTO

E COORDE~IAÇÃODA AÇÃO

(,O'JERNAMENTAL

ApOIO ao Prefeitoe Conselho de Governo

Fonte: Secretario Especial na Reforma Administrativa Proposta de novo modelo de estrutura organizaCional ela PMSP.São Paulo, PMSP.1991, p. 15.

19. sao ['auloO Poder em histó

da admir!lstraçao pública7a Cidade. Seio Paulo Co/tez,9~12.

75

iJ~~CASES

76

As funções básicas de planejamento-conh'ole e execução-opera-ção seriam exercidas nos dois níveis: geral (prefeitura) e local (sub-prefeituras); ficando o planejamento global com o primeiro e o in-trovertido com o segundo (ver figura 7).

O corte regional das subprefeituras foi determinado numa ten-tativa de contemplar a lógica do funcionamento da cidade e desuas regiões. Para isto, foi realizada pela Empresa Metropolitanade Transportes (Metrô) uma pesquisa origem-destino (00) com ointuito de verificar os fluxos da população em diversas faixas ho-rárias, o sentido destes fluxos, tempo de permanência, bem como apopulação residente. O resultado foi a proposta de criação de 13subprefeituras, como pode ser visualizado na figura 8.

No que tange à participação, a proposta prevê a criação dosConselhos Regionais de Ação Governamental (espécie de Mini-Câ-maras de Vereadores) procurando criar espaços, junto às subpre-feituras, de envolvimento efetivo com a população (ver figura 9).

Ainda, a proposição de criação de um Sistema de InformaçõesMunicipais (colocando em prática o requerido pelo artigo 146 daLei Orgânica) de maneira a concentrar informações de interessecoletivo com a possibilidade do usuário manipular os dados emprocessadoras locais (subprefeituras) contribuiria no sentido dademocratização da informação.

b. A valorização do servidor público

A proposta de reforma posiciona-se contrária à demissão de ser-vidores e à redução de salários, optando pela realocação, desen-volvimento e formação do quadro existente. Com este objetivopropõe a introdução de uma política de recursos humanos que

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Itanhaém

Fonte: Secretaria Especial da Reforma Administrativa, Sêo Paulo tem SOlUÇa0? São Paulo. PMSP. 1991. p. 5,

REFORMA ADMINISTRA TlVA NOS ANOS 90 ...

•Gabinete do Subprefeito

Diretoria de Meio Ambiente eDesenvolvimento Urbano

SUBPREFEITURA

. ~ 1.. ~:~

Conselho Regional deAção Governamental

Diretoria deDesenvolvimento Social

ütretona deAdministração

Diretoria deAssuntos Juridicos

Fonte: Secretaria Especial da Reforma Administrativa. São Paulo tem solução? São Paulo, PMSP, 1991, p. 21

contemple demandas relativas a salários, condições de trabalho,treinamento e formação profissionaL

Com relação à remuneração, a proposta defende a elaboração deum Plano de Carreira, Cargos e Salários com o propósito de extin-guir os freqüentes desvios de função, garantir condições de pro-gressão e corrigir a curva salarial em função dos níveis de mercado.Propõe, ainda, a criação de um Plano de Capacitação Profissionalcom o objetivo de valorizar e potencializar a contribuição dos servi-dores. A proposta objetiva, desta forma, o contínuo aperfeiçoamen-to e especialização técnico-profissional, juntamente com a definiçãoclara do binômio autoridade/responsabilidade. Esta postura ba-seia-se no diagnóstico que fundamentou a proposta, onde foi iden-tificado como necessidade eminente o aumento na qualidade dosprodutos e serviços municipais, mais do que na quantidade.

A simplificação da estrutura organizacional, prevista na propos-ta, permitiria o remanejamento de funcionários que exerciam ativi-dades burocráticas para o atendimento direto à população, tornan-do seu trabalho mais gratificante e facilitando sua contribuição emprojetos de seu interesse.

A proposta de informatização da administração municipal faci-litaria, ainda, o acesso a dados e informações e a participação ativanos processos de tomada de decisão.

A Prefeitura propõe-se, ainda, a abrir caminhos no sentido dademocratização das relações com os servidores, através do reco-nhecimento de seus direitos políticos e sindicais. O objetivo, se-gundo a proposta, é proporcionar segurança e incentivo aos fun-cionários a fim de concretizar mudanças efetivas na cultura admi-nistrativa vigente.

77

jJ~lJGASES

20, (J levantamento fOI realizadoatravés da consulta Constituicàoela Hepública f-e(teratlva do llrilsil IV, art I ar Orgânicario (cios tl.ver-SIlS riÍv8ls), Decretos Municíua.s e Codigo rle Defesa cioC;OIlSIII11Ií10,'

21. flS secretarias-tirn são aqlll?.as que nao nresrarn servicnsDarCi outras secetauas massim drr etarnente ao núblico. Nanronosta em estudo ,I Secretalia de Meio Anuneute e Desenvmvunento llrnano e a ~;eCr8!8

c. A modernização da estrutura organizacionalO primeiro passo dado pela Secretaria da Reforma, neste senti-

do, foi iniciar um levantamento do rol de atribuições que são, emlei, de competência da administração local e de seus órgãos, para,posteriormente, verificar como a organização funcionava de fato eefetuar uma análise comparativa entre os dois 20.

Desta comparação, quedetectou um alto grau de segmentaçãoda estrutura organizaclonal,emergiu uma proposta de reconcen-tração das unidades setoriais (secretarias). O critério utilizado paraeste reagrupamento foi O das funções desenvolvidas por cada umadelas (e não o seu produto). Deste modo, foram obtidas cinco fun-ções: infra-estrutura, social, recursos para o funcionamento do to-do da administração, o próprio governo e o suporte legal, o quegerou a proposição de cinco secretarias, respectivamente, confor-me se observa na figura 10.

A estrutura de relação entre as secretarias e as subprcfciturasseria obtida do cruzamento de um vetor horizonta I (das secretariasàs subprefeituras)« de um vetor vertical (elas subprefeituras às se-cretarias) e vice-versa (ver figura 11).

O encontro destes vetores dar-se-ia no Conselho de Governo(integrado pelos subprefeitos, Secretários e prefeito) com o objetivode definir o plano de governo do município através da relação biu-nívoca entre nível geral e local(rever figura 7).

Tendo como objetivo subsidiar a ação do governo, a propostaprevê também a criação do Conselho de Planejamento (rever figu-ra 7), composto por um presidente e pelas secretarias-fim 21 •

SP'Crí~t2JI(I ()F

Ass.mros ·Jurídlcos

.ie nesenvoivímento Socra,enquadram-se nesta cal~~!orI0, Fonte: Secretaria Especial da Reforma Admimstratíva. São Paulo tem sotuçso? São Paulo, PMSP, 1991, ~J,2U

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Gabinete do Pretcitl: Guvcruo MIHlicipal

13 SulllJlcic!lurar Secretaria de MeleAmbiente e

Desenvolvimento Urbano

Secretaria neDCS8ílvCJlvlmenlcl

Socla

Secretaria di'Admllllstraç;iCi

REFORMA ADMINISTRA TlVA NOS ANOS 90 ...

~--_ .._--Conselho de

Planejamento eCoordenação da Ação

GovernamentalProcuradoria daFazenda Princip.al

Guarda Municipal

I

Subprefeituras

Secretarias Municioa.is: 1.--1... 1 u ,- - -~T='l N--==

A..mbient8/08se.nv.urbano_ . - ~Social _1--1 __

___---'--de.R_e~ - ----=+.- - - r--- -~tos Jurídicos -- _~ ~ .___ -=r J

Órgãos daAdministração

Indireta

----- ---- _ .._-~--- -----Fonte: Secretaria Especial da Reforma Administrativa_ proposta do novo modelo de estrutura organizacional da PMSP.São Paulo, PMSP. 1991. p. 24_

o chefe do executivo tornar-se-ia, por esta proposta, o coorde-nador das funções de planejamento, controle, execução e opera cio-nalização. Ambas seriam realizadas nos dois níveis (geral e local):quando tratar-se de atividade referente à totalidade da cidade se-ria realizada no nível geral (prefeitura); se referir-se somente auma parte, pelo nível local (subprcfeituras); como pode-se visuali-zar na figura 12.

No tocante ao modelo estrutural, a proposta prevê, ainda, acombinação do modelo linha-stfW com o modelo matricial, procu-rando reduzir, no primeiro caso, a distância entre a base e a extre-midade, garantindo, no segundo, integração das duas instâncias(geral e local) 22.

Análise da proposta de reforma administrativa daPMSPO ponto que se destaca na proposiçã() apresentada é, efetiva-

mente, a descentralização. A forma prop.osta, abrangendo tanto ()aspecto territorial quanto o político, parece propiciar condições efe-tivas de flexibilização da ostrutura organizacional e democratizaçãoda gestão.

Em relação à atual divisão da cidade em administrações regío-nais, a proposta de criação de sub prefeituras avança à medida queestas contarão com orçamento próprio e autonomia, podendo deci-dir a melhor forma de planejá-lo e executá-lo em SUélSregiões.

Dividindo a cidade em subprefeituras seriam superadas, tam-bém, as divisões setoriais estabelecidas por secretarias, permitindouma ação integrada nas microrregiões e possibilítélndo, ao mesmo

22. As estruturas matriciaisconstituem-se de grupos deservidores de diferentes áreas,os quais sem se desligar intei-ramente de seus elos verticaisna estrutura "linhastaft' e in-dependente de seu grau de hie-rarquia nesta, cooperam em pe-ríodo parcial na execução deprojetos que exigem sua partici-pação simultânea

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11~t:iCASES

PLANEJAMENTO + CONTROLE

Planejamentoe Controle

Institucional

EXECUÇÃO + OPERAÇÃO

Fonte: Secretaria Especial da Reforma Administrativa. Proposta de novo modelo de estrutura organizacional da PMSPSão Paulo, PMSP, 1991, p. 30.

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tempo, que as secretarias (através da divisão geográfica por sub-prefeituras) "conversem" entre si. Assim, poderiam ser distribuí-dos tcrritorialmente os recursos setoriais nas várias áreas da cida-de e definido um plano de operação local em sinergia coni o planode governo para a cidade; tendo em vista a integração entre a ins-tância municipal (governo), a atuação setorial (secretarias) e mi-crorrcgional (subprefeituras).

A simplificação da organização administrativa prevista na pro-posta, através da redução do número de secretarias municipais edo incremento das atribuições de planejamento e execução a nívelmicrolocal (subprefeituras) constitui-se numa forma de desburo-cratizar e flexibilizar a gestão. Esta reconcentração contribui, ain-da, no sentido da democratização, à medida que torna o aparelhoadministrativo mais claro e transparente.

Por outro lado, a proposta de criação dos diversos conselhos(intersetoriais, planejamento, ação regional e governamental) faci-litaria uma ação mais articulada e próxima da realidade; tanto C(Jl1-

siderando as diversidades regionais quanto a contribuição do cor-po técnico-gerencial das secretarias e subprcfcituras. Estes órgãoscoletivos auxiliariam, ainda, no acúmulo de experiências interor-ganizacionais e intersetoriais; facilitando o processo de aprendiza-gem ao interno da administração pública e a emergência de expe-riências alternativas de gestão.

No tocante à estrutura organizacional, a combinação do modelomatricial com o modelo linha-statJ propiciaria maior agilidade eeficiência à administração municipal. Esta modalidade de estrutu-ra - embora difícil de consolidar ante a forte presença da cultura

REFORMA ADMINISTRATIVA NOS ANOS 90...

COMENTÁRIOS

Os anos 90 parecem requerer, efetivamente, uma administração efi-ciente de cunho diferente. Como bem colocou Kliksbergv é preciso "de-mocratizar a democracia". Isto significa que não se quer uma democraciameramente eleitoral, mas sim, sistemas com mecanismos que facilitem aparticipação ativa dos cidadãos, possuam características organizacionaisbem definidas e que não apenas garantam plenamente os direitos dos ci-dadãos frente à máquina do Estado, corno lhes propiciem canais de in-tervenção na atividade estatal.

Esta mudança política exige que se efetuem avanços em termos de tec-nologia e capacitação administrativa. Ao contrário do que possa parecerà primeira vista, não se trata de um retomo aos esquemas jurídico-for-malistas que fundamentaram a dicotomia política-administração duran-te boa parte deste século, mas sim, de libertar-se dos mitos herdados dagerência tradicional e de adotar uma postura político-cultural que sejamais experimental, mais criativa, mais aberta às inovações sociais.

Talvez seja o que, no dizer de Handyss, caracteriza a época em que vi-vemos como a "idade da desrazão", uma era em que a mudança é cons-tante, aleatória e descontínua exigindo que se quebre as formas tradicio-nais de pensar a fim de responder ao desafio de criar novos tipos de or-ganização, novas abordagens para o trabalho, novas formas de aprendi-zagem e novas idéias sobre a natureza de nossa sociedade.

A proposta de reforma apresentada parece contemplar esta necessida-de de "aprender a desaprender", ou seja, de se pensar (e expor a discus-sões) formas alternativas de gestão que levem em conta aspectos geren-ciais, culturais e políticos da administração pública brasileira.

Sobretudo, trata-se de um exercício de imaginação e criatividade, comvistas a derrotar o esquema .tradicional de gestão pública e incorporar aparticipação ativa da cidadania social e organizacional. É imperativo,nos dias atuais, que os processos de reforma administrativa catalisemseu potencial de democratização e inovação no setor público. É claro queisto não se constitui em um propósito simples: mudar a máquina do es-tado provavelmente uma das tarefas mais complexas já enfrentadas pelasociedade contemporânea. O

Artigo recebido pela Redação da RAE e aprovado para publicação em junho/93.

23. KLlKSBERG, B. A Gerênciana Década de 90. Revista de Ad-ministração Pública, Rio de Ja-neiro, v. 22, n, 1, p. 59-85.

24. HANDY, G. The age ot un-reason. Penguin Books: Middle-sex, 1991.

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