18
Relações de sentido nas capas da revista Unesp Ciência: uma análise semiótica BRUNO SAMPAIO GARRIDO Doutorando – Linguística e Língua Portuguesa (FCLAr/Unesp) [email protected]

Relações de Sentido Unesp Ciência

Embed Size (px)

DESCRIPTION

Apresentação

Citation preview

Page 1: Relações de Sentido Unesp Ciência

Relações de sentido nas capas da revista Unesp Ciência: uma

análise semiótica

BRUNO SAMPAIO GARRIDODoutorando – Linguística e Língua Portuguesa (FCLAr/Unesp)

[email protected]

Page 2: Relações de Sentido Unesp Ciência

Introdução• Objetivo: investigar as relações entre os elementos textuais e

não textuais presentes em uma capa da revista Unesp Ciência, e como elas atuam na construção do sentido global das mensagens produzidas.

• Corpus: capas das edições 5 (fev. 2010), 17 (mar. 2011) e 28 (mar. 2012) da revista Unesp Ciência .

• Metodologia: análise semiótica, valendo-se do percurso gerativo de sentido elaborado por Greimas (vide GREIMAS, 1979; GREIMAS; COURTÉS, 2008) e estudo das relações semissimbólicas entre expressão e conteúdo (FLOCH, 1985; PIETROFORTE, 2004; 2011).

Page 3: Relações de Sentido Unesp Ciência

Fundamentação teórica

Semiótica: teoria desenvolvida por Greimas (1979; 1981) que visa analisar as relações existentes entre qualquer tipo de texto, de qualquer natureza, com a finalidade de descrever como tais relações produzem sentido.

Considera todas as linguagens, sejam as línguas naturais ou outros sistemas semióticos, como sistemas biplanares, em que se articulam um plano de expressão (matéria sensível, captável pelos sentidos) e um plano de conteúdo (matéria inteligível, conceitual, de apreensão cognitiva) (HJELMSLEV, 1975).

Percurso gerativo de sentido: principal instrumento da análise semiótica, que visa a mostrar como os significados se articulam por meio de operações sintáticas e semânticas que recobrem desde os elementos mais simples e abstratos até os mais complexos e concretos (GREIMAS; COURTÉS, 2008).

Semissimbolismo: articulação (homologação) entre elementos axiológicos da expressão e do conteúdo (FLOCH, 1985).

Page 4: Relações de Sentido Unesp Ciência

Análise do corpusNível discursivo•Figurativização de categoria profissional (cientistas homens e mulheres) – equilíbrio aparente.•Metáfora da corrida: evidencia a competição do ambiente acadêmico. Chegar à frente equivale ao êxito, ao sucesso na carreira.•Bebê e compras: remete ao papel triplo da mulher na sociedade (profissional, mãe e dona de casa).•Balão volumétrico: metonímia que figurativiza a profissão e a carreira científicas.•Óculos: a perda deles figurativiza uma desvantagem – desnorteio. •Texto: uso do talvez e de verbo no subjuntivo lançam a dúvida no enunciado.

Page 5: Relações de Sentido Unesp Ciência

Análise do corpusNível narrativo•Objeto-valor: atingir o êxito profissional.•Mulher: busca o equilíbrio entre as três facetas (trabalho, maternidade e lar).•Modalidades: dever-fazer (obrigação profissional), querer-fazer (desejo pessoal) e não-poder-fazer (impossibilidade de conciliação).•Sanção: positiva para o homem, negativa para a mulher – que fica em “segundo lugar”.

Page 6: Relações de Sentido Unesp Ciência

Análise do corpusNível axiológico ou fundamental•Oposição principal: feminino X masculino.•Homem: recebe valores eufóricos – competitividade, foco no trabalho, êxito, sucesso profissional.•Mulher: recebe valores disfóricos – falta de competitividade, falta de foco, frustração, fracasso profissional.•Solução para a mulher: negar sua feminilidade, agindo como os homens (não-feminino).

Page 7: Relações de Sentido Unesp Ciência

Análise do corpusRelações semissimbólicas entre expressão e conteúdo

•Valorização da mulher: evidencia os valores disfóricos e explicita a discriminação entre homens e mulheres na carreira acadêmica – fato tratado pela reportagem.

PC Feminino X Masculino

PEPolicromia X Monocromia (cromático)

Esquerda X Direita (topológico)

Page 8: Relações de Sentido Unesp Ciência

Análise do corpusNível discursivo•Figuratividade: chuva de notas de 100 reais e óleo escorrendo pelas mãos - relação metafórica com o desperdício (riqueza correndo pelas mãos, dinheiro caindo para o chão, sem direção).•Relação metonímica: riquezas nacionais – petróleo e notas de 100 reais; mãos – povo brasileiro.•Petróleo na mão é vendaval: paródia do verso Dinheiro na mão é vendaval, da música Pecado Capital.•Jeito brasileiro: traço cultural em que se driblam as leis e convenções sociais para se obter vantagens pessoais.•“Jeitinho”: na música, na novela e na política, não traz riqueza e nem felicidade, mas discórdia e problemas.

Page 9: Relações de Sentido Unesp Ciência

Análise do corpusNível narrativo•Objeto-valor: o desenvolvimento das cidades beneficiadas com os royalties.•Sujeito: não determinado, figurativizado pelas mãos unidas – exploradores de petróleo e seus beneficiários.•Antissujeito: classe política local.•Destinador – administração pública; Destinatário – cidades e população (normal), políticos (na prática); Antidestinador – “jeitinho brasileiro”.•Modalidades: dever-fazer (obrigação legal do poder público), poder-fazer (recursos dos royalties), não-querer fazer (investimento em áreas não prioritárias, desvio de verbas, corrupção).•Sanção: negativa para a cidade, que não é beneficiada pelos recursos dos royalties do petróleo, positiva para a classe política e eventuais corruptos.

Page 10: Relações de Sentido Unesp Ciência

Análise do corpusNível axiológico ou fundamental•Oposição principal: contenção X evasão.•Classe política local: é abordada disforicamente, entendida como exemplo de má gestão dos recursos públicos.•Jeito contido: correto, adequado, aplicação no que interessa.•Jeito brasileiro: não contido, dispendioso, visa o interesse privado em detrimento do público.•Constatação generalizada, aplicável aos políticos brasileiros no geral (“Jeito brasileiro de usar recursos...”)

Page 11: Relações de Sentido Unesp Ciência

Análise do corpusRelações semissimbólicas entre expressão e conteúdo

•Movimento de queda corrobora a homologação das oposições entre expressão e conteúdo, ressaltando a má gestão de recursos como empecilho ao desenvolvimento das cidades beneficiadas pelos royalties do petróleo.

PC Contenção X Evasão

PE Alto X Baixo (topológico)

Page 12: Relações de Sentido Unesp Ciência

Análise do corpusNível discursivo•Migrante: figurativização do migrante nordestino que parte de sua terra natal em busca de emprego e melhores condições de vida nas metrópoles.•Semblante alegre: A migração deixou de ser sinônimo de sofrimento, de dor, mas assume novos valores, já que a própria vida do nordestino se modificou ao longo dos anos.•Morte e vida Severina: retrata o êxodo rural nordestino, a seca, a fome, a pobreza e a dor – a luta desesperada pela sobrevivência. •Nova vida Severina: vida difícil, mas compensadora, alegre, próspera, em que há a possibilidade da volta.•Migrante moderno: figurativização do novo perfil dos nordestinos, que agora tem a chance de voltar à terra natal e viver com qualidade, ainda que precise trabalhar por um tempo nas grandes cidades.

Page 13: Relações de Sentido Unesp Ciência

Análise do corpusNível narrativo•Sujeito e destinatário: Migrante•Objeto-valor: prosperidade•Destinador: a necessidade de sobrevivência•Modalidades: não-querer fazer (resistência a sair da terra natal), dever-fazer (sobrevivência). •Performance: o retirante parte para a cidade grande, via intimidação e tentação, mesmo sem querer largar suas raízes e entes queridos,. •Sanção: positiva, pois o migrante consegue emprego e, com isso, é capaz de juntar dinheiro para sobreviver e, um dia, voltar à terra natal. Logo, ele entra em conjunção com seu objeto-valor.•Mudança do objeto-valor: retorno à terra natal. Nesse caso, o migrante é modalizado por um querer-fazer (saudade das origens) e um poder-fazer (recursos financeiros).

Page 14: Relações de Sentido Unesp Ciência

Análise do corpusNível axiológico ou fundamental•Oposições: Vida X Morte; Identidade X Alteridade•Migrante: retratado euforicamente, pois tem conseguido conciliar as variáveis emprego, renda e vida na terra natal.•Se o migrante tradicional precisava romper traumaticamente sua ligação com o local de origem e assumir valores da cidade grande (não-identidade), o novo migrante segue um percurso mais tranquilo, em que identidade e alteridade mantêm certo equilíbrio.

Page 15: Relações de Sentido Unesp Ciência

Análise do corpusRelações semissimbólicas entre expressão e conteúdo

•Tonalidade marrom (terra): associação entre a cor da terra (lado de fora do ônibus) e a cor da pele e das roupas do migrante – sertão, calor, trabalho duro.•A recorrência dessa cor compõe uma relação de integração entre o homem e sua terra, como se fossem uma única entidade.

PC Identidade X Alteridade

PE Escuro X Claro (cromático)

Page 16: Relações de Sentido Unesp Ciência

Considerações finais• Pudemos verificar o quanto os recursos expressivos utilizados pelas

mídias informativas não exercem meramente um papel estético, mas visam a chamar a atenção dos potenciais leitores e estabelecer desde já uma espécie de contrato, regulado por modalidades veridictórias baseadas na expectativa de o leitor encontrar determinados conteúdos que satisfaçam suas necessidades de consumo de informação, enquanto o produto midiático se oferece como o objeto capaz de saná-las.

• A temática retratada pela capa é figurativizada e articulada de maneira a facilitar um reconhecimento imediato por parte do leitor do assunto e motivá-lo a continuar a leitura, valendo-se de elementos mais concernentes com o repertório cognitivo-cultural médio do público-alvo.

• O conjunto complexo de valores, relações lógicas e figuras pertinentes à temática abordada na capa de Unesp Ciência tornou-se, desse modo, um objeto atraente e palatável, mais suscetível a ser consumida.

Page 17: Relações de Sentido Unesp Ciência

ReferênciasBERTRAND, D. Caminhos da semiótica literária. Bauru: EDUSC, 2003. BUENO, W. C. Jornalismo científico: revisitando o conceito. In: VICTOR, C.; CALDAS, G.; BORTOLIERO, S. (Orgs.). Jornalismo científico e desenvolvimento sustentável. São Paulo: All Print, 2009. p. 157-178. ______. Jornalismo científico: resgate de uma trajetória. Comunicação & Sociedade, São Bernardo do Campo, n. 30, p. 209-220, 1998. FLOCH, J. M. Petites mythologies de l'œil et de l'esprit: pour une sémiotique plastique. Paris: Hàdes; Amsterdam: Benjamins, 1985. GREIMAS, A. J. As aquisições e os projetos. In: COURTÉS, J. Introdução à semiótica narrativa e discursiva. Coimbra: Almedina, 1979. (Prefácio). ______. Semiótica e ciências sociais. São Paulo: Cultrix, 1981. ______.; COURTÉS, J. Dicionário de semiótica. São Paulo: Contexto: 2008. HJELMSLEV, L. Prolegômenos a uma teoria da linguagem. São Paulo: Perspectiva, 1975. LARA, G. M. P.; MATTE, A. C. F. Ensaios de semiótica: aprendendo com o texto. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2009. LEIBRUDER, A. P. O discurso de divulgação científica. In: BRANDÃO, H. H. N. Gêneros do Discurso na Escola. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2001. p. 229-269. ORLANDI, E. P. Divulgação científica e efeito leitor: uma política social urbana. In: GUIMARÃES, E. (Org.). Produção e circulação de conhecimento: Estado, mídia, sociedade. Campinas: Pontes/NJC-Unicamp, 2001. p. 21-30. PIETROFORTE, A. V. Semiótica visual: os percursos do olhar. São Paulo: Contexto, 2004. ______. Análise do texto visual: a construção da imagem. 2. ed. São Paulo: Contexto, 2011. PROPP, V. I. Morfologia do conto maravilhoso. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1984. SAUSSURE, F. Curso de linguística geral. 27. ed. São Paulo: Cultrix, 2006. ZAMBONI, L. M. S. Heterogeneidade e subjetividade no discurso da divulgação científica. 1997. Tese (Doutorado em Linguística) – Instituto de Estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Campinas, Campinas.

Page 18: Relações de Sentido Unesp Ciência

OBRIGADO!