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SPAGESP - Sociedade de Psicoterapias Analíticas Grupais do Estado de São Paulo Revista da SPAGESP, 13(2), 86-101. Ferreira, H. G.; Lima, D. M. X. S.; R. Zerbinatti. Atendimento psicoterapêutico cognitivo-comportamental em grupo para idosos depressivos: um relato de experiência. 86 ATENDIMENTO PSICOTERAPÊUTICO COGNITIVO-COMPORTAMENTAL EM GRUPO PARA IDOSOS DEPRESSIVOS: UM RELATO DE EXPERIÊNCIA Heloísa Gonçalves Ferreira Daniela Maria Xavier de Souza e Lima Régia Zerbinatti Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, Brasil RESUMO Objetiva-se relatar uma experiência de estágio em atendimento psicoterapêutico grupal cognitivo-comportamental para idosos depressivos. Participaram da intervenção três mulheres e um homem, com idade entre 60 e 64 anos. Aplicou-se o Inventário de Depressão de Beck e Inventário de Ansiedade de Beck para avaliar estados de humor dos participantes antes, durante, ao final da intervenção e num período de dois meses de follow-up. O atendimento foi estruturado em 16 sessões, composto por blocos que objetivavam: (1) criar condições para aumento da prática de atividades prazerosas; (2) promoção de repertório social; (3) ensino de técnicas para manejo da ansiedade; (4) ensino de técnicas para manejo do estresse; (5) aplicação e avaliação dos resultados do BDI e BAI. Médias do grupo nas pontuações do BDI nos momentos “antes” (M = 20,25; DP = 11,38) e “fim” (M = 13,75; DP = 12,41) da intervenção indicaram ocorrer diminuição dos sintomas de depressão dos participantes ao término do tratamento. Entretanto, dois participantes não atingiram nível de depressão considerado baixo, sendo encaminhados para continuar o tratamento psicoterapêutico em grupo. Conclui-se que o contexto grupal é adequado para tratar depressão em idosos. Palavras-chave: depressão; idosos; terapia cognitivo-comportametal; grupos. COGNITIVE BEHAVIORAL THERAPY GROUP FOR DEPRESSED OLDER PEOPLE: REPORT ON AN EXPERIENCE ABSTRACT This paper aims to describe an experience of a cognitive-behavioral therapy internship program to treat a group of depressed elderly. Participants were 3 women and 1 man, aged 60-64. The Beck Anxiety Inventory and The Beck Depression Inventory were conducted to assess the participants’ humour states before, during, and in the end of the intervention during a 2-month follow-up period. The intervention was structured in 16 sessions, with parts that aimed: (1) creating conditions to increase the frequency of

Relato de Experiência

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Relato de Experiência

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  • SPAGESP - Sociedade de Psicoterapias Analticas Grupais do Estado de So Paulo

    Revista da SPAGESP, 13(2), 86-101.

    Ferreira, H. G.; Lima, D. M. X. S.; R. Zerbinatti. Atendimento psicoteraputico cognitivo-comportamental em grupo

    para idosos depressivos: um relato de experincia.

    86

    ATENDIMENTO PSICOTERAPUTICO

    COGNITIVO-COMPORTAMENTAL EM GRUPO PARA

    IDOSOS DEPRESSIVOS: UM RELATO DE EXPERINCIA

    Helosa Gonalves Ferreira

    Daniela Maria Xavier de Souza e Lima

    Rgia Zerbinatti Universidade Federal de So Carlos, So Carlos, Brasil

    RESUMO

    Objetiva-se relatar uma experincia de estgio em atendimento psicoteraputico grupal

    cognitivo-comportamental para idosos depressivos. Participaram da interveno trs

    mulheres e um homem, com idade entre 60 e 64 anos. Aplicou-se o Inventrio de

    Depresso de Beck e Inventrio de Ansiedade de Beck para avaliar estados de humor

    dos participantes antes, durante, ao final da interveno e num perodo de dois meses de

    follow-up. O atendimento foi estruturado em 16 sesses, composto por blocos que

    objetivavam: (1) criar condies para aumento da prtica de atividades prazerosas; (2)

    promoo de repertrio social; (3) ensino de tcnicas para manejo da ansiedade; (4)

    ensino de tcnicas para manejo do estresse; (5) aplicao e avaliao dos resultados do

    BDI e BAI. Mdias do grupo nas pontuaes do BDI nos momentos antes (M = 20,25; DP = 11,38) e fim (M = 13,75; DP = 12,41) da interveno indicaram ocorrer diminuio dos sintomas de depresso dos participantes ao trmino do tratamento. Entretanto, dois participantes no atingiram nvel de depresso considerado baixo,

    sendo encaminhados para continuar o tratamento psicoteraputico em grupo. Conclui-se

    que o contexto grupal adequado para tratar depresso em idosos.

    Palavras-chave: depresso; idosos; terapia cognitivo-comportametal; grupos.

    COGNITIVE BEHAVIORAL THERAPY GROUP FOR DEPRESSED OLDER PEOPLE: REPORT

    ON AN EXPERIENCE

    ABSTRACT

    This paper aims to describe an experience of a cognitive-behavioral therapy internship

    program to treat a group of depressed elderly. Participants were 3 women and 1 man,

    aged 60-64. The Beck Anxiety Inventory and The Beck Depression Inventory were

    conducted to assess the participants humour states before, during, and in the end of the intervention during a 2-month follow-up period. The intervention was structured in 16

    sessions, with parts that aimed: (1) creating conditions to increase the frequency of

  • SPAGESP - Sociedade de Psicoterapias Analticas Grupais do Estado de So Paulo

    Revista da SPAGESP, 13(2), 86-101.

    Ferreira, H. G.; Lima, D. M. X. S.; R. Zerbinatti. Atendimento psicoteraputico cognitivo-comportamental em grupo

    para idosos depressivos: um relato de experincia.

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    pleasant activities; (2) promotion of social skills; (3) teaching techniques for anxiety

    management; (4) teaching techniques for stress management; and (5) evaluation of

    BDIs and BAIs scores. The groups BDI means before (M = 20,25; SD = 11,38) and after (M = 13,75; SD = 12,41) the intervention indicate that depression symptoms

    decreased after the treatment. However, two participants did not reach a low level of

    depression in the end of the treatment, and were referred to continue in the

    psychotherapy group intervention. It was concluded that the group context is

    appropriate to treat depressed elderly.

    Key-words: depression; elderly; cognitive-behavioral therapy; groups.

    TERAPIA COGNITIVO CONDUCTUAL DE GRUPO PARA ANCIANOS CON DEPRESIN: UN

    RELATO DE EXPERIENCIA

    RESUMEN

    El presente documento informa sobre la residencia en un grupo de servicio de

    psicoterapia cognitiva-comportamental para los ancianos con depresin. Los

    participantes fueron 3 mujeres y 1 hombre, con edad media entre 60 y 64 aos. Se les

    administr la Escala de Ansiedad de Beck (BAI) y la Escala de Depresin de Beck

    (BDI) para evaluar el estado de nimo de los participantes en cuatro ocasiones: antes,

    durante, al final y despus de un perodo de dos meses para el final de la intervencin.

    La intervencin se estructur en 16 sesiones, que consisten en grupos que tenan como

    objetivo: (1) crear condiciones para incrementar la prctica de actividades placenteras;

    (2) la promocin de habilidades sociales; (3) tcnicas de enseanza para el manejo de la

    ansiedad; (4) las tcnicas de enseanza para el manejo del estrs; (5) la implementacin

    y la evaluacin de los resultados de la BDI y BAI. Las pontuaciones medias del grupo

    en el BDI a veces antes (M = 20,25; DP = 11,38) y final (M = 13,75; DP = 12,41), indic que la intervenciones redujeron los sntomas de la depresin de los participantes

    al final del tratamiento. Sin embargo, al final del grupo dos de los participantes no

    alcanzaron un nivel considerado bajo de la depresin, y fueron dirigidos a continuar con

    el tratamiento. Se concluye que el contexto del grupo es adecuado para el tratamiento de

    la depresin en los ancianos.

    Palabras-clave: depresin; tercera edad; la terapia cognitivo-conductual; grupos.

    A depresso um dos problemas psiquitricos mais comuns entre idosos.

    Caracteriza-se por um distrbio de humor que exerce grande impacto funcional em

    qualquer faixa etria. Trata-se de um distrbio multifatorial que envolve aspectos

    biolgicos, psicolgicos e sociais (Irigaray & Schneider, 2007). Baptista, Morais,

    Rodrigues e Costa Silva (2006) afirmam que a depresso o transtorno psiquitrico

    mais frequente entre indivduos com idade avanada e, entre os transtornos

    psiconeurolgicos presentes em idosos, aquele com maiores chances de ser tratvel.

    De acordo com Snowdon (2002), as desordens mentais comprometem 20% da

    populao idosa, entre as quais se destaca a depresso. Desta forma, estima-se que, no

    Brasil, aproximadamente dez milhes de idosos sofrem de depresso. Numa reviso de

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    para idosos depressivos: um relato de experincia.

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    literatura de pesquisas internacionais (Pinho, Custdio, & Makdisse, 2009), foi

    constatado que a incidncia de depresso em idosos residentes na comunidade era de

    13,23%, em mdia. J no Brasil, resultados de um estudo de coorte realizado na

    populao urbana da cidade de So Paulo, com 1167 idosos de 65 anos ou mais,

    indicaram que 21,1% da amostra apresentava sintomas depressivos no ano de 1991.

    Estes idosos foram reavaliados periodicamente ao longo de um perodo de seguimento

    de 15 anos. Os pesquisadores observaram uma tendncia crescente na proporo de

    deprimidos medida que os idosos se tornavam mais dependentes fisicamente (Lima,

    Silva, & Ramos, 2009).

    Embora a depresso possa surgir entre pessoas de qualquer idade, os fatores

    mais fortemente associados ao incio de um episdio depressivo apresentam algumas

    variaes entre pessoas em diferentes faixas etrias. Estudos mostram que os principais

    fatores associados a episdios depressivos na velhice so: sexo feminino, idade

    avanada, condies socioeconmicas desfavorveis, baixa escolaridade, doenas

    somticas, declnio cognitivo, histria prvia de depresso, co-morbidades psiquitricas,

    distrbios do sono, institucionalizao, diminuio do contato social, insatisfao com o

    suporte social, morte (do cnjuge, familiares ou amigos) e mudana de papis (por

    exemplo, decorrente da aposentadoria ou da necessidade de assumir o papel de cuidador

    de um familiar) (Djernes, 2006; Pinho, Custdio, & Makdisse, 2009; Thompson et al.,

    2003).

    H uma ampla literatura que demonstra existir associao significativa entre

    sintomas depressivos em idosos e baixo envolvimento em atividades que geram prazer

    (Bouman & Luteijn, 1986; Ferreira & Barham, 2011; Lewinsohn & Libet, 1972; Meeks,

    Young, & Looney, 2007; Rider, Gallagher-Thompson, & Thompson, 2004). Existe uma

    teoria comportamental que busca compreender especificamente a relao entre a prtica

    de atividades prazerosas e a depresso (Lewinsohn & Libet, 1972). De acordo com o

    modelo comportamental, a depresso causada por uma baixa taxa de respostas capazes

    de gerar reforadores positivos, ou seja, indivduos depressivos no produzem respostas

    suficientes em seu ambiente para gerar reforos positivos em grau ou frequncia

    adequados para suprir suas necessidades (Meeks, Young, & Looney, 2007). No caso,

    reforadores positivos so definidos como eventos positivos experienciados de forma

    subjetiva, ou seja, eventos que o indivduo avalia como sendo prazerosos (Meeks,

    Young, & Looney, 2007).

    A depresso tambm pode ser explicada por meio de um modelo cognitivo

    descrito por Beck, Rush, Shaw e Emery (1997). De acordo com este modelo, a

    depresso consiste em trs padres de distoro dos pensamentos que levam o indivduo

    a ver a si mesmo, o mundo e o futuro de um modo negativo, na chamada trade

    cognitiva da depresso. Essas distores afetam a viso que a pessoa deprimida

    apresenta sobre si mesma, sobre suas experincias e relacionamentos e sobre o

    desenrolar de sua vida. A ativao destes padres cognitivos negativos resultaria nos

    sinais e sintomas tpicos da depresso. Dessa forma, ao pensar ser incompetente para

    fazer alguma atividade, por exemplo, a pessoa pode deixar de realiz-la. Quando o

    indivduo acredita que suas interaes sociais sero desagradveis ou que ele ser

    rejeitado nos relacionamentos, ele pode passar a evit-los; essa evitao, por sua vez,

    pode trazer isolamento e resultar em sentimentos de solido, que podem ser

    interpretados pela pessoa como evidncia de rejeio por parte das demais pessoas com

    quem interage.

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    Lima, Silva e Ramos (2009) afirmam que a presena ou no de depresso deve

    ser considerada um importante parmetro de sade em idosos. Os autores tambm

    afirmam que medidas para manter o idoso ativo e inserido na sociedade so de extrema

    importncia para prevenir sintomas de depresso. Alguns estudos (Baptista et al., 2006;

    Irigaray & Schneider, 2005, 2007) sugerem a importncia da prtica de atividades

    sociais como fator de proteo para o desenvolvimento de depresso em idosos. De

    acordo com Irigaray e Schneider (2005), as atividades grupais com pessoas da mesma

    gerao parecem favorecer a qualidade de vida, pois possibilitam a vivncia e a

    construo de significados comuns, a conquista de novas amizades e a obteno de

    suporte social, o que auxilia o idoso em condies normais e sob estresse.

    Entre as formas de tratamento das desordens depressivas, esto as psicoterapias

    comportamentais e as cognitivas (Gallagher & Thompson, 1982; Thompson et al.,

    2003). Rider, Gallagher-Thompson e Thompson (2004) afirmam que as psicoterapias

    comportamentais para depresso costumam ter como objetivo encorajar os pacientes a

    engajar-se com maior frequncia em atividades prazerosas, enquanto as psicoterapias

    cognitivas procuram ajudar o indivduo a identificar pensamentos destorcidos que

    podem contribuir para a ausncia de prazer e consequente humor deprimido.

    Esses modelos so baseados nos princpios da psicoterapia breve por serem intervenes psicoteraputicas estruturadas em um nmero pr-definido de sesses. Os

    terapeutas utilizam tcnicas tais como: definio de objetivos, monitoramento do

    humor, reorganizao do ambiente (visando um aumento do envolvimento em

    atividades prazerosas), reestruturao cognitiva, modelao, modelagem, reforo

    positivo, registro de pensamentos automticos e tarefas de casa (Satre, Knight, & David,

    2006).

    O tratamento para a depresso no modelo cognitivo-comportamental em grupo

    especialmente adequado para pessoas na terceira idade, uma vez que idosos com

    frequncia passam por uma diminuio do contato social (Thompson et al., 2003).

    Alm disso, os idosos podem se sentir menos estigmatizados por terem seus problemas

    abordados no contexto de grupo e com nfase em formas de enfrentamento mais

    positivas. Quando o local da interveno no representa uma barreira para acessar

    servios, intervenes grupais oferecem diversas vantagens importantes em comparao

    a atendimentos individuais. Alm da oportunidade para obter informaes novas,

    grupos permitem que o participante (a) compare sua situao com a de outras pessoas

    para melhor avaliar a gravidade dos seus problemas; (b) receba apoio emocional de

    pessoas lidando com dificuldades similares; (c) receba apoio prtico destas pessoas; e

    (d) saia da rotina domstica por um tempo, podendo se distrair um pouco na interao

    com outras pessoas (Rodrigues, Jablonski, & Assamar, 1999). Intervenes com grupos

    tambm permitem que os servios de apoio alcancem um nmero muito maior de

    pessoas do que possvel por meio de atendimentos individuais. Enfim, o atendimento

    de idosos em grupos pode ampliar alguns dos benefcios psicossociais inerentes ao

    processo psicoteraputico.

    Snowdon (2002) afirma que o desenvolvimento e a avaliao de intervenes

    clnicas para idosos depressivos seriam aes de extrema importncia no contexto

    brasileiro. Igualmente necessria seria a alocao de recursos adequados para treinar

    profissionais na avaliao e no manejo desses pacientes, bem como para desenvolver

    estratgias de interveno dirigidas aos sentimentos de desalento e baixa autoestima

    desta populao.

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    Logo, o presente trabalho tem por objetivo trazer um relato de experincia de um

    estgio em atendimento psicoteraputico grupal cognitivo-comportamental para idosos

    depressivos. Os objetivos da interveno foram: (1) oferecer atendimento

    psicoteraputico cognitivo-comportamental em grupo para idosos com sintomas

    depressivos; (2) amenizar ou at mesmo eliminar tais sintomas; (3) melhorar o estado de

    humor dos idosos; (4) oferecer apoio e acolhimento por meio da escuta e conversa

    teraputica.

    PLANEJAMENTO E INTERVENO

    EQUIPE

    Realizaram o estgio uma aluna do quarto e outra aluna do quinto ano do curso

    de Psicologia, sob superviso de uma psicloga com experincia em atendimento

    psicoteraputico cognitivo-comportamental para idosos.

    PARTICIPANTES

    Idosos com suspeita de depresso eram encaminhados ao Programa do Idoso da

    Unidade Sade Escola (USE) de uma universidade pblica localizada no interior do

    Estado de So Paulo. Esses idosos eram avaliados por meio de entrevistas individuais

    realizadas pelas estagirias. O objetivo principal dessas entrevistas era verificar se o

    idoso apresentava o perfil necessrio para participar de uma interveno

    psicoteraputica em grupo para idosos com depresso. Os pr-requisitos para participar

    do atendimento psicoteraputico eram os seguintes: (1) preencher pontuao mnima em

    instrumento psicodiagnstico que indicasse a presena de sintomas depressivos

    (avaliados pelo Inventrio de Depresso de Beck BDI); (2) ausncia de comprometimento cognitivo (avaliado pelo Mini Exame do Estado Mental MEEM); (3) ter interesse em participar de um atendimento psicoteraputico grupal. Caso o

    avaliado no preenchesse os critrios para participar do grupo, ele era encaminhado para

    outros servios disponveis na USE que fossem adequados ao seu perfil.

    Na entrevista inicial para triagem, os usurios da USE assinavam um Termo de

    Consentimento Livre e Esclarecido, autorizando que os dados referentes aos tratamentos

    desenvolvidos na USE poderiam, eventualmente, ser utilizados em publicaes ou

    eventos cientficos, desde que resguardado o anonimato.

    INSTRUMENTOS

    Inventrio de Depresso de Beck (BDI) Desenvolvida por Beck, Rush, Shaw e Emery (1979) e validada para o Brasil por Gorestein e Andrade (1998). Escala para

    detectar sintomas depressivos e aferir nvel de depresso. composta por 21 grupos de

    afirmaes em que o respondente tem que assinalar a afirmao que julgue melhor

    descrever a maneira como tem se sentido durante a ltima semana. Os escores presentes

    no manual da verso em portugus do BDI (Cunha, 2001) para pacientes psiquitricos

    de zero a 11 pontos para nvel mnimo de depresso, de 12 a 19 pontos para nvel leve

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    de depresso, 20 a 35, nvel de depresso moderado, e 36 a 63, nvel grave de

    depresso.

    Inventrio de Ansiedade de Beck (BAI) Desenvolvido por Beck, Brown, Epstein e Steer (1988) e validado para o Brasil por Cunha (2001). Escala de

    autoaplicao, utilizada para detectar sintomas e aferir nvel de ansiedade. composta

    por 21 sintomas de ansiedade (fisiolgicos e psicolgicos), que so avaliados por sua

    presena e intensidade de efeitos na vida da pessoa na ltima semana. Os nveis dos

    escores do BAI da verso em portugus, para pacientes psiquitricos: escores de zero a

    dez sugerem nvel mnimo de ansiedade, de 11 a 19, nvel leve, de 20 a 30, nvel

    moderado e de 31 a 63, nvel grave de ansiedade (aplicao semanal). Os autores

    sugerem que os pontos de corte devem ser considerados conforme a amostra e os

    objetivos de uso.

    LOCAL

    O atendimento psicolgico foi realizado em sala prpria para atendimento em

    grupo, com materiais disponveis para aplicaes de sesses de relaxamento

    (colchonetes, rdio, CDs), cadeiras suficientes ao nmero de pessoas e local privativo onde o sigilo pudesse ser garantido.

    PROCEDIMENTO

    Houve 13 encontros de preparao com as estagirias e a supervisora,

    envolvendo leituras e discusses para a elaborao do planejamento prvio das sesses e

    dos materiais. As principais bibliografias utilizadas nesta etapa podem ser visualizadas

    na Tabela 1.

    Tabela 1.

    Bibliografia de apoio para planejamento da interveno

    Bibliografia de apoio Feldman, C., & Miranda, M. L. (2002). Construindo a relao de ajuda. Belo Horizonte:

    Crescer.

    Lima, C. V. O., & Derdyck, P.R. (2001). Terapia cognitivo-comportamental em grupo para

    pessoas com depresso. In B. Rang (Org.), Psicoterapias cognitivo-comportamentais: Um

    dilogo com a psiquiatria (pp. 491-498). Porto Alegre: Artmed.

    Rodrigues, A., Assmar, E. M. L., & Jablonski, B. (1999). Influncia social. In Psicologia

    Social (pp. 179-198). Petrpolis, RJ: Vozes.

    Thompson, L. W., Powers D. V., Coon, D. W., Takagi, K., McKibbin C., & Gallagher-

    Thompson, D. (2003). Terceira Idade. In J. R. White, & A. S. Freeman, Terapia cognitivo-

    comportamental em grupo para populaes e problemas especficos (pp. 31-69). So Paulo:

    Roca

    White J. R. (2003). Introduo. In J. R. White, & A. S. Freeman, Terapia cognitivo-

    comportamental em grupo para populaes e problemas especficos (pp. 3-29). So Paulo:

    Roca.

    White J. R. (2003). Depresso. In J. R. White, & A. S. Freeman, Terapia cognitivo-

    comportamental em grupo para populaes e problemas especficos (pp. 31-69). So Paulo:

    Roca.

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    para idosos depressivos: um relato de experincia.

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    O atendimento em grupo foi estruturado em 16 sesses, sendo dez sesses com

    durao de uma hora e meia e seis sesses com durao de duas horas. Para cada sesso,

    ocorria superviso anterior com durao mdia de uma hora.

    Durante as sesses de superviso, eram definidas as alteraes nas tcnicas

    cognitivo-comportamentais a serem empregadas na sesso seguinte previamente

    planejada, a depender das demandas apresentadas pelos clientes ao longo da

    interveno. O planejamento prvio das sesses encontra-se na Tabela 2.

    Tabela 2.

    Planejamento prvio das sesses psicoteraputicas do grupo

    Sesso Objetivos principais Tcnicas cognitivo-comportamentais

    1 1. Apresentao dos participantes ao grupo

    2. Explicao das regras e das condies

    do atendimento psicoteraputico em grupo

    3. Levantamento das queixas que

    trouxeram ao grupo

    1. Contrato teraputico

    2. Explicao racional da Terapia Cognitivo-

    Comportamental para depresso

    3. Entrevista com o participante, utilizando

    perguntas abertas ou fechadas, levantando as

    razes para a participao no grupo, seus

    principais problemas e suas condies atuais de

    vida (fsico e social)

    4. Tarefa de casa: estabelecimento de objetivos a

    serem alcanados com o tratamento

    2 9 1. Levantamento de dados para a anlise funcional dos problemas

    2. Incio de intervenes referentes s

    dificuldades relacionadas depresso

    3. Implementar tcnicas de interveno

    compatveis com os problemas e

    prioridades levantados com os clientes

    1. Entrevista com os participantes, utilizando

    perguntas abertas ou fechadas, levantando as

    razes de seus principais problemas e suas

    condies atuais de vida (fsico e social)

    2. Reflexes sobre os problemas endereados.

    Fortalecer as decises na direo de desconstruir

    crenas irracionais, ampliar reforadores

    positivos e melhorar a qualidade de vida

    10 11 1.Aplicao de instrumentos de avaliao 2. Avaliar resultados da 1 e 2 aplicao

    do BAI e BDI

    1. Reaplicao do BAI e BDI

    2. Discusso dos resultados

    12 15 1. Implementar tcnicas de interveno compatveis com os problemas e

    prioridades levantados com os clientes

    1. Reflexes sobre os problemas endereados.

    Fortalecer as decises na direo de desconstruir

    crenas irracionais, ampliar reforadores

    positivos e melhorar a qualidade de vida

    16 1.Aplicao de instrumentos de avaliao

    2. Avaliao da interveno em grupo

    3. Encerramento da interveno

    1. Reaplicao do BAI e BDI.

    2. Avaliao dos resultados das trs aplicaes do

    BAI e BDI

    3. Discusses sobre as impresses dos

    participantes com relao sua participao e

    evoluo no grupo psicoteraputico

    Na 10 sesso e na 16 sesso foram reaplicados o Inventrio de Depresso de

    Beck (BDI) e o Inventrio de Ansiedade de Beck (BAI), com o objetivo de obter

    medidas comparativas ao longo do tratamento. Na 16a sesso foi realizada uma

    discusso com os participantes para que eles pudessem relatar sua percepo sobre a

    evoluo ao longo do tratamento, bem como sua opinio sobre a interveno e sua

    participao no grupo. Aps dois meses do trmino da interveno em grupo, foram

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    realizadas sesses individuais com cada participante com os objetivos de: (1) reaplicar o

    BAI e o BDI para obter uma medida de follow-up; (2) verificar necessidade e interesse

    em continuar o acompanhamento psicolgico (em grupo ou individual).

    RESULTADOS E DISCUSSO

    Foram participantes do atendimento psicoteraputico grupal trs mulheres e um

    homem. Na triagem, os participantes atingiram pontuao igual ou superior a dez

    pontos no BDI, indicando a presena de sintomas depressivos. A mdia de idade dos

    participantes foi de 62 anos (DP = 3,01), com as idades variando entre 60 e 64 anos. Os

    participantes no apresentavam comprometimento cognitivo, bem como eram

    independentes para realizar atividades bsicas e instrumentais da vida diria. A

    identificao dos participantes do grupo, juntamente com algumas informaes scio-

    demogrficas, encontra-se na Tabela 3. Os nomes apresentados neste trabalho foram

    alterados visando preservao da identidade dos envolvidos.

    Tabela 3.

    Identificao dos participantes da interveno

    Participante Idade Estado Civil Profisso

    Marta 60 Divorciada Aposentada

    Joo 64 Casado Aposentado

    Mara 64 Viva Aposentada

    Vnia 60 Casada Trabalhadora informal

    As pontuaes obtidas por cada participante nas aplicaes do BDI, bem como

    as mdias dessas pontuaes podem ser visualizados na Tabela 4.

    Tabela 4. Pontuaes de cada participante, mdias e desvios padres dos escores no BDI

    Participantes Antes

    interveno

    Durante

    interveno

    Fim interveno Follow-up

    Marta 11 18 0 14

    Joo 10 10 7 No coletada

    Mara 28 34 27 25

    Vnia 32 16 21 28

    M 20,2 19,5 13,7 22,3

    DP 11,38 10,28 12,41 7,37

    Nota-se que o nvel de depresso de trs participantes (Marta, Joo e Vnia) foi

    diminudo comparando-se os momentos antes e fim da interveno. No caso de Mara, o nvel de depresso se manteve o mesmo nesses dois momentos.

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    Ao observarmos a mdia das pontuaes nos momentos antes e fim da interveno, observa-se que a mdia do BDI antes da interveno (M = 20,25; DP =

    11,38) caracterizava depresso moderada, ao passo que a mdia da pontuao no BDI obtida ao final da interveno (M = 13,75; DP = 12,41) caracterizava depresso leve. Esse resultado indica, de forma geral, que houve diminuio dos sintomas depressivos

    no grupo aps o encerramento da interveno. Ao trmino da interveno todos os

    participantes diminuram ou mantiveram o mesmo nvel de depresso.

    Observando-se as medidas de follow-up, constata-se que Mara e Vnia se

    mantiveram com o mesmo nvel de depresso dois meses aps o trmino do grupo.

    Tanto Mara quanto Vnia preencheram pontuao que indicava depresso moderada ao fim da interveno e tambm no follow-up. No caso de Marta, ao analisarmos a

    medida de follow-up, observa-se que houve um aumento da pontuao no BDI

    indicando uma mudana no nvel de depresso (ausncia de depresso para depresso

    leve). No foi possvel coletar a medida de follow-up de Joo, uma vez que o

    participante foi contatado para a sesso individual no follow-up, mas no pode

    comparecer. Por fim, nota-se que os maiores escores na pontuao do BDI nos quatro

    momentos de medida foram atingidos ora por Mara, ora por Vnia.

    Na Tabela 5 podem ser visualizadas as pontuaes obtidas por cada participante

    nas aplicaes do BAI, bem como as mdias dessas pontuaes.

    Tabela 5.

    Pontuaes de cada participante, mdias e desvios padres dos escores no BAI

    Participantes Antes

    interveno

    Durante

    interveno

    Fim interveno Follow-up

    Marta 1 16 2 6

    Joo 4 1 4 No coletada

    Mara 16 26 14 22

    Vnia 24 4 9 29

    M 11,25 11,75 7,25 19

    DP 10,68 11,5 5,37 11,78

    Constata-se que Joo e Marta mantiveram-se com o mesmo nvel de ansiedade

    (ansiedade mnima) antes e no fim da interveno. Mara apresentou pontuao no BAI que indicava ansiedade leve tambm nos momentos antes e fim da interveno. Vnia obteve uma diminuio do grau de ansiedade comparando-se os

    momentos antes e fim da interveno, passando de uma pontuao que indicava ansiedade moderada para uma pontuao que indicava ansiedade mnima. As mdias do grupo indicam que houve, de forma geral, diminuio dos sintomas de

    ansiedade ao final da interveno, uma vez que a mdia de pontuao antes da

    interveno (M = 11,25; DP = 10,68) caracterizava ansiedade leve, ao passo que a mdia do grupo ao fim da interveno (M = 7,25; DP = 5,37) caracterizava ansiedade mnima.

    Observando-se as medidas de follow-up, nota-se que apenas Marta manteve o

    nvel de ansiedade (ansiedade mnima) observado ao final da interveno. Mara passou de ansiedade leve para ansiedade moderada, e Vnia passou de ansiedade

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    mnima para ansiedade moderada. Observa-se que Marta e Joo pontuaram os menores escores no BAI nas quatro medidas, ao passo que Vnia e Mara pontuaram

    escores maiores.

    As principais queixas trazidas por cada participante, bem como as principais

    dificuldades e crenas irracionais observadas ao longo da interveno, esto resumidas

    na Tabela 6.

    Tabela 6.

    Principais queixas, crenas irracionais e dificuldades dos participantes do grupo

    Cliente Queixas principais Exemplos de crenas irracionais Principais dificuldades

    observadas

    Marta Falta de nimo para

    realizar atividades

    Conflito interpessoal

    com o ex-marido

    Se eu sair de casa sozinha com o carro, algo de ruim pode

    acontecer. Tenho que resolver sempre os problemas das outras pessoas.

    Dficit de repertrio social:

    padro inassertivo

    predominante

    Joo Conflitos com o sogro

    e cunhados

    Se me reno com minha famlia numa lanchonete, ningum ir

    conversar comigo. Meu sogro e meus cunhados so autoritrios e estpidos e, por

    isso, no devo conversar com

    eles.

    Dficit de repertrio social:

    padro agressivo/inassertivo

    Mara Perda do cnjuge

    Conflitos interpessoais

    com a filha

    No posso praticar atividades que gosto, tais como tocar

    sanfona, pois incomodo minha

    filha. No conseguirei superar a morte do meu marido.

    Lidar com perdas

    relacionadas morte do

    cnjuge

    Dficit de repertrio social:

    padro inassertivo

    predominante

    Vnia Problemas financeiros

    Conflitos interpessoais

    com a sogra, marido,

    cunhados e filhos

    Preciso comprar presentes para as pessoas para que elas gostem

    de mim Eu no sei nada e no entendo nada, pois no tive oportunidade

    de estudar quando era jovem.

    Dificuldades para tomada de

    deciso

    Falas excessivas e

    descontextualizadas no grupo

    Comprar excessivo

    Dficit de repertrio social:

    padro agressivo

    predominante

    Observa-se que todos os participantes apresentavam dficit no repertrio social,

    com padres de comportamento inassertivo e/ou agressivo. Nota-se tambm que todos

    os participantes apresentavam queixas ou dificuldades nos relacionamentos

    interpessoais com familiares. Constata-se tambm a presena de alguns dos padres de

    distoro de pensamentos definidos por Beck et al. (1997) em seu modelo cognitivo de

    depresso. Por exemplo, Vnia apresentava um padro de pensamento que avaliava a si

    mesma de maneira negativa, quando julgava no ser capaz de entender coisa alguma por

    no ter cursado ensino formal quando era jovem. Esse mesmo padro de pensamento

    tambm foi identificado em Mara, que acreditava no ser capaz de superar a morte do

    marido. J Marta apresentava crenas irracionais direcionadas ao futuro, temendo que

    algo ruim pudesse acontecer caso ela se engajasse em alguma atividade (por exemplo,

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    dirigir um carro). No caso de Joo, podemos notar que um dos padres de pensamento

    apresentado pelo cliente consistia em avaliar seus familiares de maneira negativa, o que

    poderia contribuir para um provvel isolamento social, uma vez que a avaliao

    negativa sobre outras pessoas pode levar o indivduo a evitar interaes sociais.

    As principais tcnicas cognitivo-comportamentais definidas em superviso, de

    acordo com as demandas apresentadas pelos clientes ao longo da interveno, esto

    resumidas na Tabela 7. Note que no foram includas informaes sobre a 1 e a 16

    sesses, pois estas seguiram o planejamento inicial descrito na Tabela 2.

    Tabela 7.

    Principais objetivos e tcnicas cognitivo-comportamentais adaptadas s necessidades

    de cada sesso

    Sesso Objetivos principais Principais tcnicas cognitivo-comportamentais utilizadas

    2 5 1. Fazer levantamento de atividades prazerosas

    2. Planejar condies para que os

    clientes aumentem a frequncia

    de prtica de atividades

    prazerosas em seu ambiente

    natural

    1. Tarefa de casa: preencher quadro com atividades que

    gosta e no faz; atividades que gosta e faz; atividades

    que no gosta e no faz; atividades que no gosta e faz

    2. Tarefa de casa: praticar trs atividades que gosta, mas

    no faz, e classificar o prazer experimentado de zero a

    dez

    3. Tarefa de casa: monitoramento do humor ao longo

    dos dias da semana

    6 9 1. Promover repertrio adequado para lidar com conflitos

    interpessoais

    1. Explicao e exemplos de reao

    passiva/agressiva/assertiva

    2. Ensaio Comportamental

    3. Feedback

    4. Discusso do conceito de Empatia

    5. Tarefa de casa: auto-observao do comportamento

    no ambiente natural em situaes de crtica e conflitos

    interpessoais

    6. Tarefa de casa: Leitura de texto sobre o tema Empatia

    e Habilidades Sociais

    10-11 1. Aplicao de instrumentos de

    avaliao

    2. Avaliar resultados da 1 e 2

    aplicao do BAI e BDI

    1. Reaplicao do BAI e BDI

    2. Treino de discriminao dos sintomas de ansiedade e

    depresso

    12 13 1. Fornecer informaes tericas sobre os transtornos de ansiedade

    2. Ensino de tcnicas para manejo

    de ansiedade

    1. Explicao do conceito de Ansiedade

    2. Aplicao do Relaxamento Progressivo de Jacobson

    (Vera & Vila, 1996)

    3. Treino de respirao para manejo de ansiedade

    3. Tarefas de casa: praticar em casa o relaxamento

    progressivo de Jacobson, leitura do roteiro

    A.C.A.L.M.E.S.E (Rang, 1995).

    14 15 1. Fornecer informaes tericas sobre o Estresse

    2. Ensino de tcnicas para manejo

    do estresse

    1. Psicoeducao do Estresse

    2. Tomada de decises

    3. Tarefa de casa: leitura de roteiro com dicas sobre

    estratgias de manejo do estresse

    Observa-se que a interveno foi composta, basicamente, por cinco blocos: (1)

    sesses destinadas a criar condies para o aumento da prtica de atividades prazerosas;

    (2) sesses destinadas promoo de repertrio social; (3) sesses destinadas ao ensino

    de tcnicas para manejo da ansiedade; (4) sesses destinadas ao ensino de tcnicas para

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    manejo do estresse; e (5) sesses destinadas aplicao e avaliao dos resultados de

    instrumentos psicodiagnsticos (BDI e BAI). O bloco que contou com um maior

    nmero de sesses foi o bloco 1 (quatro sesses destinadas a criar condies para o

    aumento da prtica de atividades prazerosas) e bloco 2 (quatro sesses destinadas

    promoo de repertrio social). Esses dois blocos totalizam a metade das sesses da

    interveno (oito sesses).

    Nota-se na Tabela 5 que as queixas relacionadas a conflitos interpessoais

    familiares e dficit de repertrio social foram comuns a todos os clientes. Desta forma,

    observou-se uma demanda grande para o emprego de tcnicas psicoteraputicas com o

    objetivo de promover repertrio social, o que explicaria um maior nmero de sesses

    destinadas a este objetivo. Existe um estudo brasileiro (Carneiro, Falcone, Clark, Del

    Prette, & Del Prette, 2006) que demonstra existir relao entre depresso e repertrio de

    habilidades sociais deficitrio em idosos. Logo, torna-se relevante atentar para esta

    relao quando se planeja uma interveno para tratar idosos depressivos.

    Uma possvel justificativa para um maior nmero de sesses no bloco que tinha

    por objetivo identificar e aumentar o envolvimento dos participantes em atividades

    prazerosas, seria o fato de que a depresso associada a uma baixa frequncia em

    atividades prazerosas (Bouman & Luteijn, 1986; Lewinsohn & Libet, 1972; Meeks,

    Young, & Looney, 2007; Rider, Gallagher-Thompson, & Thompson, 2004). Logo, seria

    esperado que um tempo maior da interveno fosse destinado a criar condies para que

    a frequncia de prtica de atividades prazerosas pelos participantes aumentasse.

    Com relao s opinies dos participantes sobre sua evoluo no grupo,

    importante ressaltar que todos relataram observar algum tipo de melhora ao trmino da

    interveno. De forma geral, por meio dos relatos e dos comportamentos emitidos pelos

    participantes ao longo da interveno, observou-se que estes foram capazes de: (1)

    apresentar melhora no repertrio para resoluo de conflitos interpessoais; (2) modificar

    crenas irracionais; (3) aumentar frequncia de prtica de atividades prazerosas; (4)

    discriminar sintomas de ansiedade e depresso; e (5) fortalecer sentimentos e

    comportamentos de autoestima e autoconfiana.

    Adicionalmente, os participantes relataram sentirem-se satisfeitos com a

    experincia de fazer parte do grupo psicoteraputico. De fato, foi observado o

    estabelecimento de uma aliana teraputica satisfatria, bem como grande coeso e

    empatia entre os membros do grupo. Essas variveis tornam-se relevantes para discutir

    os resultados de melhora observados. Indivduos depressivos normalmente esto em

    privao de contato com reforadores e, ao terem oportunidade de fazer parte de um

    grupo psicoteraputico, passam tambm a ter oportunidades de entrar em contato com

    estmulos reforadores aos quais estavam em privao (ateno, contato social, suporte

    social, etc.). Logo, o contexto grupal pode ser visto como um ambiente provedor de

    estmulos reforadores naturais para os membros do grupo, o que pode contribuir para o

    tratamento da depresso.

    O contexto grupal tambm se mostrou eficiente para a desconstruo de algumas

    crenas irracionais apresentadas pelos participantes, uma vez que o grupo

    psicoteraputico cria condies de o indivduo expor suas crenas e gerar reflexes

    sobre as mesmas, a partir dos feedbacks emitidos pelo terapeuta e pelos prprios

    membros do grupo. Desta forma, as situaes produzidas no ambiente grupal auxiliam

    na aquisio de repertrio e modificao de crenas irracionais que, por sua vez, podem

    ser generalizadas para o ambiente natural do participante.

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    Nas sesses individuais realizadas aps dois meses da interveno, foram

    estabelecidos os encaminhamentos para cada participante. Esses encaminhamentos

    foram realizados tendo por base os resultados observados nas pontuaes do BDI e

    BAI, as observaes clnicas realizadas pelas terapeutas e os relatos de cada participante

    sobre interesse em continuar ou no em atendimento grupal. Foi estabelecido que Vnia

    e Mara continuariam a fazer parte do atendimento psicoteraputico grupal, uma vez que

    essas duas participantes obtiveram aumento no nvel de ansiedade nas medidas de

    follow-up e permaneciam ainda com um nvel de depresso moderado aps o

    encerramento da interveno e no follow-up, o que indicava necessidade de dar

    continuidade ao tratamento. No caso de Joo e Marta, as pontuaes do BAI colhidas

    em diferentes momentos indicavam nveis baixos de ansiedade, e observou-se que

    ambos os participantes tambm atingiram nveis mais baixos de depresso aps a

    interveno e tambm na medida de follow-up. Logo, Marta e Joo foram

    encaminhados para participar de um grupo da Terceira Idade de carter informativo,

    porm sem funo psicoteraputica.

    CONSIDERAES FINAIS

    Conclui-se que aps o trmino da interveno foram observadas diminuies no

    nvel de depresso em trs participantes (Marta, Joo e Vnia), o que indica que a

    interveno pode ter contribudo para a remisso dos sintomas depressivos nesses

    indivduos. Entretanto, duas participantes (Mara e Vnia) no atingiram um nvel de

    depresso considerado baixo aps o encerramento do grupo, sendo necessrio realizar

    encaminhamento para que essas participantes pudessem dar continuidade ao

    atendimento psicoteraputico grupal.

    Levanta-se a hiptese de que um atendimento psicoteraputico cognitivo-

    comportamental estruturado num nmero maior de sesses pode ser til para

    observarmos diminuio dos sintomas depressivos que indicassem nveis mais baixos

    de depresso em todos os participantes, bem como manuteno desta diminuio no

    follow-up. Seria importante, em investigaes futuras, estruturar um atendimento num

    nmero maior de sesses (superior a 16 sesses) e avaliar novamente o impacto do

    tratamento por meio das pontuaes obtidas no BDI.

    importante ressaltar que este estudo conta com algumas limitaes. O objetivo

    principal deste estudo foi fazer um relato de experincia de um atendimento

    psicoteraputico cognitivo-comportamental para idosos depressivos. Portanto, no se

    tratou de um estudo cujo objetivo fosse avaliar a eficcia de uma interveno grupal

    psicoteraputica cognitivo-comportamental no tratamento de depresso em idosos, uma

    vez que o presente estudo no contou com um delineamento prprio para este tipo de

    inferncia. Logo, possvel apenas descrever as tcnicas e procedimentos utilizados e

    os resultados obtidos aps a interveno, sendo possvel somente inferir que esses

    resultados foram efeitos desta interveno. Para obter dados sobre o efeito de

    intervenes grupais psicoteraputicas cognitivo-comportamentais em idosos

    depressivos, seria importante realizar investigaes futuras com delineamento

    experimental com grupo controle.

    Neste estudo tambm no foram realizadas medies de construtos que seriam

    pertinentes para avaliar de forma mais acurada a evoluo dos participantes ao longo da

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    interveno, como, por exemplo, avaliao do repertrio de habilidades sociais,

    frequncia de prtica em atividades prazerosas e nvel de estresse dos participantes.

    Seria importante que em estudos futuros fossem tambm aplicados outros instrumentos

    de psicodiagnstico para aferir esses construtos e investigar as relaes existentes entre

    esses construtos e depresso em idosos.

    Por fim, constatou-se que os objetivos da interveno foram atingidos, uma vez

    que foram observadas melhoras nos sintomas depressivos dos participantes ao final da

    interveno. Entretanto, so necessrios estudos futuros com maior rigor experimental,

    para avaliar o impacto de intervenes cognitivo-comportamentais grupais em idosos

    depressivos.

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    Revista da SPAGESP, 13(2), 86-101.

    Ferreira, H. G.; Lima, D. M. X. S.; R. Zerbinatti. Atendimento psicoteraputico cognitivo-comportamental em grupo

    para idosos depressivos: um relato de experincia.

    101

    Sobre as autoras

    Helosa Gonalves Ferreira psicloga, Mestre e Doutoranda em Psicologia pela

    Universidade Federal de So Carlos (UFSCar). Especialista em Psicoterapia

    Comportamental.

    Daniela Maria Xavier de Souza e Lima psicloga na Unidade Sade-Escola da

    Universidade Federal de So Carlos (UFSCar).

    Rgia Zerbinatti psicloga pela Universidade Federal de So Carlos (UFSCar).

    E-mail para correspondncia com as autoras: [email protected]

    Recebido: 10/05/2012

    1 reviso: 02/07/2012

    Aceite final: 15/08/2012