9
RELATÓRIO FINAL RESUMIDO DOS RESULTADOS CIENTÍFICOS DO PROJECTO CALYPSOS O Projeto “Calypsus”, de apoio à inclusão social, às necessidades específicas e da melhoria das competências básicas para pessoas recluídas na Europa (2016-1-ES01-KA204-025656), desenvolve-se como uma ação estratégica em que intervêm quatro Universidades europeias (Universidade de Almeria, Universidade do Minho, Universidade de Roma “La Sapienza” e Universidade de La Laguna), duas ONGs (Plena Inclusion Canarias e Meridianos, a Secretaria Geral das Instituições Penitenciárias espanhola, e uma entidade pública italiana, o Instituto degli Innocenti. A coordenação do projeto cabe ao Centro de Educación para Personas Adultas de Tenerife. A prioridade da Associação estratégica CALYPSUS é o enfoque na educação dentro das prisões tendo em conta a diversidade e a luta contra a discriminação da generalidade das pessoas recluídas, de acordo com os princípios europeus da aprendizagem ao longo da vida. Na realidade, as taxas de insucesso escolar e os baixos níveis de habilitações educacionais presentes nas pessoas recluídas, repercutem-se na sua exclusão social e numa reinserção cada vez mais difícil na sociedade atual. Deste modo, CALYPSUS considera que a população penitenciária é, em grande parte, caracterizada por possuir necessidades específicas de apoio educativo (NEAE), que são mediadoras do seu rendimento académico. Estas NEAE incluem défices cognitivos relacionados com a atenção, a planificação, a memória, a solução de problemas e o autocontrole, entre outras. Como estes défices estão relacionados com o pensamento executivo, CALYPSUS defende que a melhoria das taxas de insucesso e de qualificação académica atuais, passa pela deteção das falhas específicas ao nível das funções executivas dos reclusos, que frequentam os cursos de educação para pessoas adultas em meio prisional. Tendo em conta este objetivo, foram propostos inicialmente oito produtos intelectuais, tendo-se obtido financiamento para dois deles, que se centram especificamente na avaliação das funções executivas que subjazem às NEAS dos reclusos, com e sem antecedentes de delinquência juvenil, em comparação com adultos normais sem antecedentes penais. | Estudo Output 1 No início do projeto a equipa da Universidade de Almería constatou através de uma meta-análise a existência de défices em funções executivas nas pessoas recluídas em comparação com sujeitos normais emparelhados, de acordo com diferentes grupos de reclusos. Este resultado, identificado como Output 1, embora não fosse diretamente financiado pelo Projeto, foi, todavia, incluído nele. Foram analisados 58 estudos (30 com grupos de comparação com sujeitos normais e 28 com grupos de comparação constituídos também por reclusos), num total de 3210 participantes dos quais 3093 homens e 117 mulheres. Os défices encontrados podem agrupar-se em quatro lotes: memória de trabalho, planificação, flexibilidade cognitiva e atenção, obtendo-se um efeito médio na relação entre comportamentos criminosos e défices nas funções executivas (r = .33), que diminuía quando se comparavam grupos de presos com diferentes características entre si (r = .19), o que demonstra uma maior generalização de tais défices na totalidade da população recluída.

RELATÓRIO FINAL RESUMIDO DOS RESULTADOS CIENTÍFICOS … · relação entre funções executivas e a matemática, as ciências, a leitura e a escrita). | Estudos output 2 e 3 Partindo

  • Upload
    others

  • View
    5

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: RELATÓRIO FINAL RESUMIDO DOS RESULTADOS CIENTÍFICOS … · relação entre funções executivas e a matemática, as ciências, a leitura e a escrita). | Estudos output 2 e 3 Partindo

RELATÓRIO FINAL RESUMIDO DOS RESULTADOS CIENTÍFICOS DO PROJECTO CALYPSOS

O Projeto “Calypsus”, de apoio à inclusão social, às necessidades específicas e da melhoria das

competências básicas para pessoas recluídas na Europa (2016-1-ES01-KA204-025656), desenvolve-se como uma ação estratégica em que intervêm quatro Universidades europeias (Universidade de Almeria, Universidade do Minho, Universidade de Roma “La Sapienza” e Universidade de La Laguna), duas ONGs (Plena Inclusion Canarias e Meridianos, a Secretaria Geral das Instituições Penitenciárias espanhola, e uma entidade pública italiana, o

Instituto degli Innocenti. A coordenação do projeto cabe ao Centro de Educación para Personas Adultas de Tenerife.

A prioridade da Associação estratégica CALYPSUS é o enfoque na educação dentro das prisões tendo em conta a diversidade e a luta contra a discriminação da generalidade das pessoas recluídas, de acordo com os princípios europeus da aprendizagem ao longo da vida. Na realidade, as taxas de insucesso escolar e os baixos níveis de habilitações educacionais presentes nas pessoas recluídas, repercutem-se na sua exclusão social e

numa reinserção cada vez mais difícil na sociedade atual. Deste modo, CALYPSUS considera que a população penitenciária é, em grande parte, caracterizada por possuir necessidades específicas de apoio educativo (NEAE), que são mediadoras do seu rendimento académico. Estas NEAE incluem défices cognitivos relacionados com a atenção, a planificação, a memória, a solução de problemas e o autocontrole, entre outras. Como estes défices

estão relacionados com o pensamento executivo, CALYPSUS defende que a melhoria das taxas de insucesso e de qualificação académica atuais, passa pela deteção das falhas específicas ao nível das funções executivas dos reclusos, que frequentam os cursos de educação para pessoas adultas em meio prisional.

Tendo em conta este objetivo, foram propostos inicialmente oito produtos intelectuais, tendo-se obtido financiamento para dois deles, que se centram especificamente na avaliação das funções executivas que subjazem às NEAS dos reclusos, com e sem antecedentes de delinquência juvenil, em comparação com adultos

normais sem antecedentes penais.

| Estudo Output 1 No início do projeto a equipa da Universidade de Almería constatou através de uma meta-análise a

existência de défices em funções executivas nas pessoas recluídas em comparação com sujeitos normais emparelhados, de acordo com diferentes grupos de reclusos. Este resultado, identificado como Output 1, embora não fosse diretamente financiado pelo Projeto, foi, todavia, incluído nele. Foram analisados 58 estudos (30 com grupos de comparação com sujeitos normais e 28 com grupos de comparação constituídos também por reclusos),

num total de 3210 participantes dos quais 3093 homens e 117 mulheres. Os défices encontrados podem agrupar-se em quatro lotes: memória de trabalho, planificação, flexibilidade cognitiva e atenção, obtendo-se um efeito médio na relação entre comportamentos criminosos e défices nas funções executivas (r = .33), que diminuía quando se comparavam grupos de presos com diferentes características entre si (r = .19), o que demonstra uma

maior generalização de tais défices na totalidade da população recluída.

Page 2: RELATÓRIO FINAL RESUMIDO DOS RESULTADOS CIENTÍFICOS … · relação entre funções executivas e a matemática, as ciências, a leitura e a escrita). | Estudos output 2 e 3 Partindo

Os défices assinalados foram relacionados com uma maior impulsividade, uma menor capacidade para

antecipar as consequências do comportamento e uma redução da sensibilidade face às recompensas ou as punições o que, por sua vez, aumenta o risco de comportamentos antissociais e criminosos. Além disso, esses défices influenciam atividades quotidianas, já que afetam a organização do tempo e das tarefas a realizar em simultâneo, a planificação das mesmas e a capacidade utilização da memória de trabalho, levando a que se

produzam menos recordações de novas aprendizagens, maior lentidão no processamento da informação e uma diminuição da capacidade de raciocínio e de tomada de decisões. Estas dificuldades traduzem-se em diferentes âmbitos da vida diária (quando, como e que fazer em cada momento) e, no âmbito académico, originam um baixo rendimento ao nível de conteúdos de aprendizagem e procedimentos, de tal modo que a organização da

informação, a planificação, a flexibilidade cognitiva, a aprendizagem e a memorização, que são elementos-chave de uma aprendizagem adequada, resultam indelevelmente afetados (estudos anteriores demonstraram já a relação entre funções executivas e a matemática, as ciências, a leitura e a escrita).

| Estudos output 2 e 3 Partindo dos resultados obtidos em estudos anteriores relacionados com a importância do treino de

competências necessárias à consecução dos objetivos, a associação CALYPSOS desenhou, adaptou e aplicou um protocolo de avaliação de funções executivas que permitiu recolher dados em cinco prisões dos três países participantes (duas espanholas, duas italianas e uma portuguesa), assim como os correspondentes grupos de

comparação normalizados da comunidade.

| Participantes A amostra final compõe-se de 415 participantes (301 presos e 114 normais) de 5 prisões europeias.

85 % são do sexo masculino (63 Mulheres). Em 19% dos casos existem antecedentes de delinquência juvenil e a média de idades situa-se nos 37,7 anos (DP = 12.7). 62% dos reclusos procede de 2 prisões espanholas, sendo a percentagem das duas prisões italianas e da de Portugal 19%, em cada caso. Os reclusos foram divididos em dois

grupos consoante tinham ou não antecedentes de condenações enquanto jovens, uma vez que o projeto dá uma especial atenção a pessoas que iniciam a sua carreira criminal na adolescência, analisando para tal os sistemas educativos associados à Justiça Juvenil dos países participantes. Deste modo, efetuaram-se comparações entre três grupos de participantes: presos sem antecedentes de justiça juvenil, presos com antecedentes de justiça

juvenil e pessoas da comunidade sem atividade criminosa, com características demográficas e educativas semelhantes aos outros dois grupos.

| Variáveis As variáveis analisadas incluem a memória de trabalho, memória espacial, atenção, controle da

interferência, planificação, flexibilidade cognitiva, inteligência geral e fluidez verbal. Adicionalmente, foi medida a desejabilidade social, a impulsividade, a psicopatia, sintomatologia psicopatológica, sintomatologia pré-frontal,

sensibilidade ao reforço e à punição e rendimento em tarefas de cálculo e compreensão da leitura. Para medir estas variáveis utilizaram-se instrumentos de avaliação neuropsicológica, administrados em sessões individuais, e provas de papel e lápis, que foram administradas em sessões individuais ou de grupo, dependendo do nível de literacia do participante. As provas incluídas no protocolo foram: Controlled Oral Word Association Test

(COWAT), Teste de cores e palavras (STROOP), Torre de Londres (TOL), Trail Making Test (TMT), Teste dos

Page 3: RELATÓRIO FINAL RESUMIDO DOS RESULTADOS CIENTÍFICOS … · relação entre funções executivas e a matemática, as ciências, a leitura e a escrita). | Estudos output 2 e 3 Partindo

Labirintos de Porteus, WAIS-IV (Dígitos, Vocabulário e Matrizes), Continuous Performance Test (CPT), Inventário de

Sintomas Prefontales (ISP), Symptom Assessment-45 Questionnaire (SA-45), Levenson´s Self-Report Psychopathy Scale, Escala de Desejabilidade Social e a Barrat impulsivity scale (BIS-11).

Resultados Realizou-se uma primeira análise para estimar o nível pré-mórbido e o contraste das variáveis

demográficas. Observa-se uma diferença descritiva no género e na idade que é mais elevada no grupo dos presos que no de comparação, não existindo diferenças estatisticamente significativas entre os presos com e sem

antecedentes de justiça juvenil. Embora existente, aquela diferença não é relevante para explicar os resultados já que os sujeitos são todos adultos. Observam-se diferenças estatisticamente significativas no Vocabulário e nas Matrizes, com uma pontuação maior por parte do grupo de comparação (Ver figura 1).

Figura.1. Pontuações médias e 95% de IC no

vocabulário e matrizes nos grupos de comparação e da prisão. Efetuando uma análise por domínios cognitivos pode-se observar:

a) No domínio da atenção, que inclui as pontuações do teste Stroop (palavra, cor e interferência), o TMT e os TR e erros de CPT, regista-se una pior execução no grupo dos prisioneiros no tempo de execução do TMTB (ver figura 2) e no número de erros não-perseverativos (ver figura 3).

Page 4: RELATÓRIO FINAL RESUMIDO DOS RESULTADOS CIENTÍFICOS … · relação entre funções executivas e a matemática, as ciências, a leitura e a escrita). | Estudos output 2 e 3 Partindo

Figura.2. Pontuações médias e IC de 95% para o tempo na execução do TMT-B

Figura.3. Pontuações médias e IC de 95%

relativamente aos erros perseverativos na execução do TMT-B

b) Relativamente à planificação, os reclusos apresentaram um desempenho pior na tarefa de labirintos (ver figura

4); para além de necessitarem de mais tempo e mais movimentos para realizar a tarefa de planificação da torre de Londres (ver figuras 5 e 6). A pontuação Q dos labirintos de Porteus revela correlação (magnitude de média de 0.3) com a escala de execução da ISP.

Figura.4. Pontuações médias e IC de 95% para a pontuação Q da tarefa do labirinto de

Porteus

Figura.5. Pontuações médias (IC 95%) do tempo de execução da tarefa da TOL

Figura.6. Pontuações médias (95% IC)

relativamente ao número de movimentos da TOL

Page 5: RELATÓRIO FINAL RESUMIDO DOS RESULTADOS CIENTÍFICOS … · relação entre funções executivas e a matemática, as ciências, a leitura e a escrita). | Estudos output 2 e 3 Partindo

c) No que respeita à flexibilidade cognitiva, não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas entre os grupos, embora tenha sido observada uma diferença significativa no grupo de reclusos comparativamente com o grupo de pessoas da comunidade na tarefa de fluência verbal semântica e fonética (ver figura 7).

Figura 7. Pontuações médias (IC 95%) na tarefa de FAS e tarefa de animais

d) Observaram-se diferenças estatisticamente significativas na capacidade de memória de trabalho, sendo que os reclusos apresentaram pior desempenho, apesar de os resultados deste grupo se encontrarem dentro dos valores normativos (ver figura 8). Não se encontraram diferenças significativas no spam de memória.

Figura 8. Pontuações médias (95%) da tarefa de dígitos em sentido inverso

Page 6: RELATÓRIO FINAL RESUMIDO DOS RESULTADOS CIENTÍFICOS … · relação entre funções executivas e a matemática, as ciências, a leitura e a escrita). | Estudos output 2 e 3 Partindo

Analisámos ainda, separadamente, o desempenho dos reclusos com antecedentes tendo sido observado

um padrão diferente relativamente aos demais reclusos. Os reclusos com historial de contacto com o sistema de justiça juvenil não diferiram do grupo de comparação nas tarefas de vocabulário, memória de trabalho (WADI), fluência fonética (FAS média) e planificação (TOL, Q de Porteus, CPT). Foram encontradas diferenças significativas em comparação com o grupo de reclusos sem antecedentes na execução dos labirintos e na tarefa de Stroop.

Por outro lado, quando aplicada a uma parte da amostra, uma medida indireta do funcionamento do lobo frontal (Inventário de Sintomas Pré-frontais), são encontradas diferenças estatisticamente significativas entre o grupo de comparação, o grupo de reclusos em geral e o grupo de reclusos com antecedentes no sistema de justiça juvenil, nas subescalas de execução (motivacional, controlo executivo e problemas de atenção); não se

verificaram diferenças nas restantes escalas (problemas de comportamento social e emocional). Maiores pontuações foram encontradas no grupo de comparação. Não obstante, estes resultados devem ser interpretados com cautela, uma vez que as subescalas mencionadas correlacionaram positivamente com a escala de desejabilidade social, particularmente no grupo de comparação.

e) Para uma parte da amostra foram utilizados modelos de regressão para testar a relação entre um teste de leitura e cálculos com as variáveis referidas nos pontos anteriores. As variáveis que melhor predizem o desempenho na tarefa de leitura são os erros perseverativos do TMT-B e do PC’ da tarefa de Stroop (R2 = 0.15). Relativamente à prova de cálculo, o melhor modelo inclui as variáveis matrizes, dígitos em sentido inverso e

pontuação Q dos labirintos de Porteus (R2 = 0.29).

Por fim, a partir da análise ao perfil psicossocial e psicopatológico, podemos afirmar que, para a nossa amostra, em termos de escala de sintomas, apenas as subescalas de hostilidade e psicoticismo geram diferenças

estatisticamente significativas entre o grupo de comparação e os reclusos, sendo a subescala de hostilidade a que diferencia entre reclusos com e sem antecedentes no sistema de justiça juvenil. Em relação à psicopatia, foram encontradas diferenças estatisticamente significativas entre os grupos na psicopatia primária e total, mas não na psicopatia secundária. Finalmente, foram também encontradas diferenças estatisticamente significativas na escala

de impulsividade, bem como nas escalas de sensibilidade à punição e recompensa, embora esses resultados devam ser interpretados no mesmo sentido da escala de desejabilidade social, i.e., no caso de sensibilidade à punição e recompensa foram encontrados valores elevados para todos os grupos em análise.

| Conclusões 1.- Embora sem carácter clínico, o perfil de funcionamento executivo dos reclusos revela-se inferior ao grupo de

comparação. Embora se observe um perfil mais baixo este não apresenta um carácter clínico. Estes dados parecem indicar o desenvolvimento deficitário da área dorso-lateral pré-frontal, possivelmente justificado pelo facto de estes indivíduos poderem ter crescido em ambientes cognitivamente empobrecidos.

2.- No geral, observa-se défice na velocidade de processamento visuo-motor e na velocidade de leitura, sem comprometimento na execução, o que pode ser explicado pelo facto de os reclusos investirem mais tempo para produzirem a resposta correta.

3.- Nas tarefas de raciocínio, verifica-se um desempenho inferior dos reclusos, o que poderá dificultar os processos de aprendizagem. Atendendo às repercussões na vida académica (por exemplo, matemática, línguas, etc) estes processos beneficiariam de um treino apropriado com material verbal e não-verbal.

Page 7: RELATÓRIO FINAL RESUMIDO DOS RESULTADOS CIENTÍFICOS … · relação entre funções executivas e a matemática, as ciências, a leitura e a escrita). | Estudos output 2 e 3 Partindo

4.- Em relação à pontuação na memória de trabalho, os reclusos obtiveram resultados inferiores ao grupo de

comparação, embora dentro dos níveis normais, enquanto que o spam de memória está correto. Isto poderá refletir a capacidade dos reclusos em memorizar dados a curto prazo, todavia com dificuldade na gestão dos mesmos para chegar a uma solução. Esta informação é importante devido às repercussões académicas que pode acarretar.

5.- Em relação ao nível pré-mórbido dos reclusos, este é também inferior ao grupo de comparação, embora próximo deste grupo, uma vez que reclusos e pessoas da comunidade pontuaram abaixo da média normalizada, o que indica que as diferenças encontradas em outras áreas não podem ser atribuídas a essas pontuações.

6.- Os reclusos revelaram ainda baixa fluência no vocabulário e no acesso ao léxico, possivelmente explicado pelo nível cultural e os problemas de velocidade mencionados acima (e que também estão relacionados com o desenvolvimento da matéria branca em idades precoces).

7.- Quando os resultados dos reclusos com antecedentes juvenis são incluídos na análise observamos, por exemplo, que os reclusos com um historial de institucionalização quando menores têm uma velocidade de processamento semelhante à do grupo de comparação, executam melhor as tarefas de planeamento e têm maior

Fluência verbal. De igual modo, nas tarefas de memória de trabalho, tanto em capacidade quanto em spam, o desempenho dos reclusos é semelhante ao desempenho do grupo de comparação, destacando-se resultados aceitáveis dos reclusos. Estes resultados, encontrados no grupo de reclusos com antecedentes no sistema de justiça juvenil, podem estar associados a um efeito de treino e prática em idades mais jovens. Contudo, deve ter-

se cautela e não generalizar estes dados, devido a uma alta variabilidade das respostas. 8.- Um facto relevante é a possível existência de anosognosia nos reclusos, independentemente da história de contacto com o sistema de justiça juvenil, em relação à sintomatologia frontal (medida por um questionário de

autoavaliação). Ou seja, os reclusos poderão não ter consciência da existência de défice ou disfunção, que podem ser motivacionais, atencionais ou de controlo executivo. Além disso, esse resultado está correlacionado com o número de erros nas tarefas de planeamento sendo relevante para a estratégia de abordagem à intervenção, uma

vez que não há aprendizagem sem motivação e sem consciência do défice ou das dificuldades. 9.- Quanto ao relacionamento com o desempenho académico, os dados indicam que o desempenho de leitura está relacionado com a capacidade de evitar a interferência e dividir a atenção sem cometer erros, ou seja,

verificou-se uma relação entre a capacidade de leitura e processos de controlo atencional. Este dado é relevante, uma vez que os reclusos demonstram um desempenho inferior ao grupo de comparação, pelo que estes domínios deveriam integrar os programas de treino e controlo atencional na população reclusa.

10.- De igual modo, no que respeita ao rendimento em matemática, observamos que as tarefas que melhor predizem a execução neste domínio são aquelas relacionadas com a capacidade de planificação, memória de trabalho e raciocínio. Estes dados revelam a importância da necessidade de manipular informação e ordenar de forma lógica a sequência de ações que acarreta a realização ou aprendizagem da matemática. Tal como no ponto

anterior, é desejável a inclusão do treino das habilidades de raciocínio, memória de trabalho e planificação nos programas e adaptações curriculares da população.

Page 8: RELATÓRIO FINAL RESUMIDO DOS RESULTADOS CIENTÍFICOS … · relação entre funções executivas e a matemática, as ciências, a leitura e a escrita). | Estudos output 2 e 3 Partindo

11.- O perfil psicossocial das pessoas recluídas da nossa amostra corresponde ao esperado. O facto de não

termos encontrado prevalência de sintomas clínicos em comparação ao grupo controlo reforça a importância dos resultados em relação às funções executivas. 12.- Entre as limitações do estudo referimos a heterogeneidade da amostra, tanto do grupo de reclusos e do

subgrupo de reclusos com antecedentes no sistema de justiça juvenil, como do grupo de comparação. Estudos futuros, avaliações e intervenções devem ter em conta essas diferenças individuais.

| Recomendações 1. Trabalhar a anosognosia dos défices, focando e consciencializando para a importância de trabalhar essas

competências.

2. Trabalhar em aprendizagens por problemas. Deste modo poderemos treinar competências de planificação, tendo em conta a adequação dos níveis de flexibilidade e memória.

3. Trabalhar com conceitos práticos, que potenciem a capacidade de raciocínio ampliando a memória de trabalho.

4. Detetar e treinar as áreas com maior défice.

5. Iniciar este tipo de medidas em indivíduos mais jovens.

Page 9: RELATÓRIO FINAL RESUMIDO DOS RESULTADOS CIENTÍFICOS … · relação entre funções executivas e a matemática, as ciências, a leitura e a escrita). | Estudos output 2 e 3 Partindo

A área escolar e académica para jovens com medidas tutelares de internamento em centros para jovens

Os centros específicos para o cumprimento das medidas de justiça juvenil incluem grupos de menores e jovens que cometeram um crime entre 14 e 18 anos de idade, sendo estas as margens marcadas pela Lei dos Menores 5/2000 para estabelecer a responsabilidade criminal de menores. na Espanha. Nesse sentido, é importante esclarecer que os jovens com mais de 18 anos, com medidas de internamento fechadas, semiabertas ou abertas,

e que tenham começado a cumprir as medidas quando são menores ou que tenham adiado o início do cumprimento até que cheguem à idade própria, podem continuar a cumprir essas sentenças de internamento nos centros destinados à execução de medidas específicas para menores. Nesses centros, jovens internos são inseridos num programa de intervenção socio-educacional complexo e específico

No desenvolvimento de programas de intervenção específicos, as características pessoais de cada um dos jovens (contexto sociofamiliar, traços de personalidade, doenças e/ou patologias físicas e/ou psicológicas, hábitos, capacidades, nível académico, competências profissionais, etc.) devem ser examinados pelos diferentes

profissionais que compõem as equipes de intervenção. A intervenção socioeducativa deve ser estabelecida de acordo com a análise detalhada das diferentes áreas, estabelecendo objetivos concretos que possam ser avaliados e compartilhados com os menores/jovens.

Nesse contexto, a formação académica adquire um papel fundamental, assumindo-se como um elemento-chave para o correto cumprimento das medidas judiciais, o alcance dos objetivos estabelecidos nos programas de intervenção e uma reinserção bem-sucedida. Essa importância da atividade escolar e académica nos centros deve-se às seguintes razões:

• No cumprimento das medidas judiciais, a formação académica é obrigatória, independentemente da idade dos jovens exceder a estabelecida pela Lei da Educação como obrigatória para a escolaridade (até 16 anos na

Espanha), desde que tal fique claro e prescrito no programa de intervenção individualizada aprovado pelo tribunal que executa a sua medida. Os jovens devem frequentar a escola como uma atividade diária obrigatória, estabelecida como uma das atividades que devem ser realizadas diariamente, como espaço necessário para sua formação como pessoa e elemento fundamental do desenvolvimento intelectual.

• A importância da obtenção de qualificações básicas obrigatórias é o requisito fundamental para o início de uma carreira profissional ou académica, uma vez terminado o período de internamento num grupo marcado pela falta de motivação para a formação, abandono escolar e insucesso terminou.

• Em resumo, as atividades académicas são um elemento-chave do desenvolvimento cognitivo e pessoal. Atividades académicas com carácter regular proporcionam aos jovens a oportunidade de retomar uma atividade, que não só lhes permite obter um diploma, mas também os ajuda a pensar, facilitando a possibilidade de romper

a sua resistência à mudança de hábitos e comportamentos negativos, e tornando-os pessoas mais autónomas, abertas a novas possibilidades para os seus planos de vida e com autoestima recuperada, num meio em que tradicionalmente o insucesso campeia.