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RENATA VELOSO DE SOUZA LPS INTRANASAL: UM MODELO CRÔNICO IN VIVO DE DOENÇA DE PARKINSON Rio de Janeiro 2019

RENATA VELOSO DE SOUZAobjdig.ufrj.br/59/teses/900175.pdfSouza, Renata Veloso. Title: Intranasal LPS: A chronic in vivo model of Parkinson's disease. Rio de Janeiro, 2019. Master's

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  • RENATA VELOSO DE SOUZA

    LPS INTRANASAL: UM MODELO CRÔNICO IN VIVO DE DOENÇA DE PARKINSON

    Rio de Janeiro

    2019

  • RENATA VELOSO DE SOUZA

    LPS INTRANASAL: UM MODELO CRÔNICO IN VIVO DE DOENÇA DE PARKINSON

    Dissertação de Mestrado apresentada ao Curso de Pós-Graduação em Ciências Farmacêuticas da Faculdade de Farmácia da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Ciências Farmacêuticas.

    Orientador: Prof. (a) Julia Helena Rosauro Clarke Coorientador: Prof. (a) Giselle Fazzioni Passos

    Rio de Janeiro

    2019

  • CIP - Catalogação na Publicação

    Elaborado pelo Sistema de Geração Automática da UFRJ com os dados fornecidospelo(a) autor(a), sob a responsabilidade de Miguel Romeu Amorim Neto - CRB-7/6283.

    S729lSouza, Renata Veloso de LPS Intranasal: um modelo crônico in vivo dedoença de Parkinson / Renata Veloso de Souza. -- Riode Janeiro, 2019. 74 f.

    Orientador: Julia Helena Rosauro Clarke. Coorientador: Giselle Fazzioni Passos. Dissertação (mestrado) - Universidade Federal doRio de Janeiro, Faculdade de Farmácia, Programa dePós-Graduação em Ciências Farmacêuticas, 2019.

    1. Doença de Parkinson. 2. Modelo crônico. 3. LPSintranasal . 4. Neurodegeneração. 5. Camundongo. I.Clarke, Julia Helena Rosauro , orient. II. Passos,Giselle Fazzioni, coorient. III. Título.

  • Dedico este trabalho ao querido Cleidson Bergami,

    que durante esses anos foi fundamental para meu

    tratamento e plena recuperação de saúde. Sem seu

    apoio, este trabalho não teria sido concluído.

  • AGRADECIMENTOS

    À minha orientadora, Professora Dra. Julia Clarke, pela orientação, por todo o

    conhecimento compartilhado, todas as correções e pela honra de me permitir trabalhar

    com uma profissional tão competente e admirável.

    À minha coorientadora, Professora Dra. Giselle Fazzioni, por ter me aceitado e recebido

    no Núcleo de Neurociências da Faculdade de Farmácia (NNeFFar), pela orientação,

    paciência, apoio, confiança e por ser para sempre o exemplo de profissional que eu busco

    me tornar.

    À toda minha família, especialmente à minha avó, Eurides Veloso, e à minha irmã,

    Susana Veloso, que compreenderam minha ausência em momentos tão delicados e

    importantes para elas.

    A todos os queridos amigos do NNeFFar e LABIME/FF/UFRJ e, especialmente, à

    Emanuelle Vasconcellos, Letícia Alves, Raquel Gomes, Suelen Guimarães e Clara

    Nogueira pelo auxílio na realização dos experimentos.

    Aos queridos amigos do Instituto Nacional de Traumato-Ortopedia - INTO, Mário Henrique

    Bravo, Wasley Bessa e Felipe Leal, por me servirem de inspiração na vida acadêmica e

    na constante busca de novos conhecimentos.

    A todos os professores e funcionários da faculdade de farmácia que contribuíram para

    minha formação e, também, à equipe de segurança do Centro de Ciências da Saúde que

    em muitos finais de semana cuidaram e protegeram minha entrada e saída do campus.

    Em especial, aos professores David Majerowicz e Heitor A. de Paula Neto, por terem

    enriquecido este trabalho com suas contribuições na banca de acompanhamento e aos

    professores Clynton Correa e Gilda Neves, por terem aceitado avaliar este trabalho, no

    momento da defesa da dissertação. Agradeço, também, à professora Yraima Cordeiro e

    por ter se disponibilizado a participar da banca. De certo que os conhecimentos de todos

    os membros avaliadores engrandecem esse trabalho.

  • "O controle é ilusório. Não importa que universidade

    você vá, não importa o grau que você alcançou, se

    seu objetivo é tornar-se mestre do seu próprio

    destino, você tem mais a aprender.”

    Michael J. Fox

  • RESUMO

    Souza, Renata Veloso. Título: LPS intranasal: Um modelo crônico in vivo de doença de Parkinson. Rio de Janeiro, 2019. Dissertação de Mestrado – Programa de Pós-Graduação em Ciências Farmacêuticas, Faculdade de Farmácia, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2019.

    A doença de Parkinson é segunda mais comum enfermidade neurodegenerativa

    relacionada à idade. É caracterizada por desordens motoras relacionadas à perda

    progressiva de neurônios dopaminérgicos na substância nigra, levando à redução de

    terminais dopaminérgicos no estriado dorsal. A causa da neurodegeneração

    característica da doença não está bem esclarecida. Os tratamentos disponíveis

    apenas atenuam os sintomas, sem impactar na velocidade de progressão da

    doença. Estudos sobre os mecanismos pelos quais a doença de Parkinson inicia e

    progride são muito importantes. Para tanto, o desenvolvimento de modelos capazes

    de reproduzir a fisiopatologia e as manifestações da doença são imprescindíveis. A

    maioria dos modelos animais utilizados são baseados em neurotoxinas

    administradas de forma aguda no cérebro. Tais modelos têm grande importância,

    contudo não reproduzem a progressão da doença em humanos. Por outro lado, a

    perda de sensibilidade olfativa (anosmia), um dos sintomas observados no início da

    doença, vem reforçando a teoria do vetor olfatório para explicar como agentes

    ambientais poderiam levar à neuroinflamação e, por conseguinte, à perda neuronal.

    Nesse sentido, estudos têm mostrado que a exposição ao lipopolissacarídeo

    bacteriano (LPS) administrado cronicamente por via intranasal é capaz de reproduzir

    sintomas motores e não motores observados na doença de Parkinson em humanos,

    assim como também a depleção de neurônios dopaminérgicos. Assim, este trabalho

    buscou caracterizar um modelo de doença de Parkinson crônico, baseado na teoria

    do vetor olfatório, através da exposição de camundongos Swiss de diferentes idades

    ao LPS de Escherichia coli, por via intranasal. A intenção foi validar o modelo

    intranasal crônico de LPS como ferramenta para reprodução das alterações

    neuropatológicas e comportamentais da doença de Parkinson e, portanto, eficaz

    para testes de novas alternativas terapêuticas. O referido modelo foi então desafiado

    com a metformina e o ácido tióctico, substâncias que possuem ação anti-

  • inflamatória, antioxidante e antienvelhecimento já evidenciadas na literatura.

    Prejuízos motores como déficit locomotor e de coordenação motora fina foram

    observados em camundongos de 4 meses tratados com LPS intranasal, sendo estes

    prejuízos possivelmente associados à diminuição da expressão de tirosina

    hidroxilase observada no estriado, sugestiva de perda neuronal dopaminérgica.

    Prejuízos não motores, principalmente relacionados ao perfil tipo-ansioso e à

    memória aversiva também foram evidenciados em animais de 4 e 12 meses de

    idade, respectivamente. Animais de 8 meses que receberam LPS intranasal

    apresentaram prejuízo olfatório e motor, sendo este último revertido após tratamento

    com ácido tióctico. Por outro lado, a metformina não apresentou efeito significativo

    em nenhum dos parâmetros analisados quando administrada à animais de 4 meses

    de idade. Em conjunto, os dados do presente estudo corroboram para o

    estabelecimento deste modelo experimental como uma ferramenta importante para a

    pesquisa dos eventos relacionados à doença de Parkinson e, consequentemente,

    para o teste de novas terapias, e sugerem que a administração de ácido tióctico

    pode ser uma estratégia terapêutica promissora.

    Palavras-chave: Doença de Parkinson, modelo crônico, LPS intranasal,

    neurodegeneração, camundongo.

  • ABSTRACT Souza, Renata Veloso. Title: Intranasal LPS: A chronic in vivo model of Parkinson's disease. Rio de Janeiro, 2019. Master's Thesis - Graduate Program in Pharmaceutical Sciences, Faculty of Pharmacy, Federal University of Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2019. Parkinson's disease is second most common age-related neurodegenerative disease. It is

    characterized by motor disorders related to the progressive loss of dopaminergic neurons

    in substance nigra, leading to the reduction of dopaminergic terminals in the dorsal

    striatum. The cause of the neurodegeneration characteristic of the disease is not well

    understood. Available treatments only attenuate the symptoms, without impacting the rate

    of disease progression. Studies of the mechanisms by which Parkinson's disease begins

    and progress are very important. Therefore, development of models capable of

    reproducing the pathophysiology and manifestations of the disease are essential. Most of

    the animal models used are based on acutely administered neurotoxins in the brain. Such

    models are of great importance, however they do not reproduce the disease's progression

    in humans. On the other hand, the loss of olfactory sensitivity (anosmia), one of the

    symptoms observed at the disease onset, has reinforced the olfactory vector theory to

    explain how environmental agents could lead to neuroinflammation and, consequently, to

    neuronal loss. In this sense, studies have shown that exposure to bacterial

    lipopolysaccharide (LPS) administered chronically intranasally is able to reproduce motor

    and non-motor symptoms observed in Parkinson's disease in humans, as well as the

    depletion of dopaminergic neurons. Thus, this work aimed to characterize a model of

    chronic Parkinson's disease, based on olfactory vector theory, through exposure Swiss

    mice of different ages to Escherichia coli LPS, intranasally. The intention was to validate

    the chronic intranasal model of LPS as a tool to reproduce the neuropathological and

    behavioral changes of Parkinson's disease and, therefore, effective for the testing of new

    therapeutic alternatives. This model was then challenged with metformin and thioctic acid,

    substances that have anti-inflammatory, anti-oxidant and anti-aging effects already

    evidenced in the literature. Motor impairments such as locomotor and fine motor

    coordination deficits were observed in 4-month-old mice treated with intranasal LPS, and

    these losses were possibly associated with the decrease in tyrosine hydroxylase

  • expression observed in the striatum, suggestive of dopaminergic neuronal loss. Non-motor

    impairments, mainly related to the anxious-type profile and aversive memory were also

    observed in animals at 4 and 12 months of age, respectively. Animals of 8 months that

    received intranasal LPS presented olfactory and motor impairment, the latter being

    reverted after treatment with thioctic acid. On the other hand, metformin had no significant

    effect on any of the parameters analyzed when administered to 4-month-old animals.

    Together, data from the present study corroborate to establishment of this experimental

    model as an important tool for research of events related to Parkinson's disease and

    consequently for testing new therapies, and suggest that thioctic acid administration may

    be a promising therapeutic strategy.

    Keywords: Parkinson's disease, chronic model, intranasal LPS, neurodegeneration,

    mouse.

  • LISTA DE ABREVIAÇÕES

    AVC Acidente Vascular Encefálico

    AMP Adenosina monofosfato

    AMPK Quinase ativada por AMP

    BHE Barreira hematoencefálica

    DP Doença de Parkinson

    EPM Erro padrão da média

    ERO Espécie(s) reativa(s) de oxigênio

    GAPDH Gliceraldeído 3-fosfato desidrogenase

    (IL)-6 Interleucina 6

    (IL)-1β Interleucina 1-Beta

    IIQ Intervalo interquartil

    LPS Lipopolissacarídeo

    LRRK2 Leucine-rich repeat serine / threonine kinase 2

    PINK1 PTEN-induced putative kinase 1

    SNC Sistema nervoso central

    TH Tirosina hidroxilase

    TNF-α Fator de necrose tumoral alfa

  • LISTA DE FIGURAS

    Figura 1 - Sintomas clínicos associados à progressão da doença de Parkinson.....16 Figura 2 - Mecanismos moleculares da doença de Parkinson…………….…………...19 Figura 3 - Desenhos experimentais de cada grupo de animais em suas diferentes idades.......………………………….......................................................…….……………....27 Figura 4 - Teste de campo aberto....................................................................................28 Figura 5 - Tarefa de reconhecimento de objetos...........................................................29 Figura 6 - Aparato para teste de discriminação olfatória.............................................30 Figura 7 - Movimentação dos animais durante o Pole teste........................................31 Figura 8 - Teste de esquiva inibitória..............................................................................32 Figura 9 - Efeito da administração intranasal de LPS (10 μg/3x semana) por 30 dias sobre o desempenho motor e locomotor de animais de 4 meses de idade......…………..……….................................................................................................36 Figura 10 - Efeito da administração intranasal de LPS (10 μg /3x semana) por 30 dias sobre alterações não motoras em animais de 4 meses de idade..…………..……….....................................................................................................37 Figura 11 - Efeito da administração intranasal de LPS (10 μg/3x semana) por 60 dias sobre o desempenho motor de animais de 4 meses de idade ...……...……………….39

  • Figura 12 - Efeito da administração intranasal de LPS (10 μg/3x semana) por 30 dias sobre o desempenho motor de animais de 12 meses de idade ...……………………..40 Figura 13 - Efeito da administração intranasal de LPS (10 μg/3x semana) por 30 dias sobre o desempenho não motor de animais de 12 meses de idade ………………................................................................................................................…...41

    Figura 14 - Impacto da idade no desempenho de testes comportamentais para avaliação motora...............................………………...............................................……....42 Figura 15 - Impacto da idade no desempenho de testes comportamentais para avaliação não motora...........................................................................................……….43 Figura 16 - Avaliação comportamental dos efeitos do tratamento com LPS ou salina em animais de 8 meses de idade....................................................................................44 Figura 17 - Efeito da administração da metformina ou ácido tióctico sobre as alterações motoras induzidas pela administração intranasal de LPS em camundongos...................................................................................................................45 Figura 18 - Efeito da administração de metformina sobre o peso dos animais tratados com LPS.....................................................................…………………………….47 Figura 19 - Efeito da administração de metformina sobre a glicemia dos animais tratados com LPS.............................................................................................................47 Figura 20 - Efeito da administração de metformina sobre o estresse oxidativo no córtex frontal de animais de 4 e 12 meses de idade que receberam LPS intranasal...........................................................................................................................48 Figura 21 - Efeito da administração de metformina sobre os níveis da proteína Tirosina Hidroxilase (TH) no estriado de camundongos tratados com LPS.....................................................................................................................................49

  • SUMÁRIO

    1. INTRODUÇÃO…….......………………………………………………………….……..15 1.1 SINTOMAS..................................................................................................................15 1.2 FISIOPATOLOGIA......................................................................................................16 1.3 TRATAMENTO............................................................................................................20 1.4 MODELOS EXPERIMENTAIS.....................................................................................21 1.5 TESTES FARMACOLÓGICOS....................................................................................23 2. OBJETIVOS...…………………………………………………………….……………...25 2.1 OBJETIVO GERAL......................................................................................................25 2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS........................................................................................25 3. MATERIAIS E MÉTODOS.……………………………………………………......…....26 3.1 ANIMAIS.......................................................................................................................26 3.2 TRATAMENTO.............................................................................................................26 3.3 TESTES DE COMPORTAMENTO...............................................................................28 3.3.1 Campo Aberto..........................................................................................................28 3.3.2 Reconhecimento de Objeto Novo..........................................................................28 3.3.3 Teste de Remoção de Adesivo...............................................................................29 3.3.4 Discriminação Olfatória..........................................................................................30 3.3.5 Pole Teste.................................................................................................................31 3.3.6 Teste de Esquiva Inibitória (Step Down Inhibitory Avoidance)...........................31 3.4 COLETA DE TECIDOS E PREPARAÇÃO DE AMOSTRAS.......................................32 3.5 ANÁLISES BIOQUÍMICAS E BIOMOLECULARES....................................................33 3.5.1 Dosagem da Glicose Sanguínea............................................................................33

  • 3.5.2 Quantificação de Espécies Reativas de Oxigênio................................................33 3.5.3 Ensaio de Imunodetecção (Western Blotting)......................................................33 3.6 ANÁLISES ESTATÍSTICAS.........................................................................................34 4. RESULTADOS....………………………………………………………………………...35 4.1 AVALIAÇÃO DE ALTERAÇÕES MOTORAS E NÃO MOTORAS INDUZIDAS PELA ADMINISTRAÇÃO INTRANASAL DE LPS POR 30 DIAS EM ANIMAIS DE 4 MESES DE IDADE.................................................................................................................................35 4.2 AVALIAÇÃO DE ALTERAÇÕES MOTORAS INDUZIDAS PELA ADMINISTRAÇÃO INTRANASAL DE LPS POR 60 DIAS EM ANIMAIS DE 4 MESES DE IDADE................38 4.3 AVALIAÇÃO DE ALTERAÇÕES MOTORAS E NÃO MOTORAS EM ANIMAIS DE 12 MESES DE IDADE TRATADOS COM LPS POR VIA INTRANASAL POR 30 DIAS.......39 4.4 COMPARAÇÃO DO DESEMPENHO DOS ANIMAIS DOS GRUPOS CONTROLE DE 4 E 12 MESES DE IDADE NOS TESTES DE COMPORTAMENTO PARA AVALIAÇÃO DA ATIVIDADE MOTORA E NÃO MOTORA....................................................................41 4.5. AVALIAÇÕES DE ALTERAÇÕES MOTORAS E NÃO MOTORAS EM ANIMAIS DE 8 MESES DE IDADE TRATADOS COM LPS INTRANASAL POR 4 E 20 SEMANAS..........................................................................................................................43 4.6 AVALIAÇÃO DOS EFEITOS DA ADMINISTRAÇÃO DE METFORMINA E ÁCIDO TIÓCTICO NAS ALTERAÇÕES COMPORTAMENTAIS INDUZIDAS PELA ADMINISTRAÇÃO DE LPS INTRANASAL.......................................................................45 4.7 AVALIAÇÃO DOS EFEITOS DA ADMINISTRAÇÃO DE METFORMINA E LPS EM PARÂMETROS METABÓLICOS.......................................................................................46 4.8 AVALIAÇÃO DOS EFEITOS DA ADMINISTRAÇÃO DE METFORMINA SOBRE ALTERAÇÕES OXIDATIVAS INDUZIDAS POR LPS NO CÉREBRO DE CAMUNDONGOS...............................................................................................................48 4.9 AVALIAÇÃO DOS EFEITOS DA ADMINISTRAÇÃO DE METFORMINA SOBRE O CONTEÚDO DOPAMINÉRGICO DO ESTRAIDO DE CAMUNDONGOS TRATADOS COM LPS............................................................................................................................49 5. DISCUSSÃO.…………………………………………..................................…..….….50 6. CONCLUSÃO..........................................................................................................59 7. REFERÊNCIAS.......................................................................................................60

  • 15

    1. INTRODUÇÃO

    Um aumento expressivo da longevidade da população vem sendo observado nas

    últimas décadas. Tal fato está associado aos avanços médicos, ações de saúde pública,

    assim como também ao desenvolvimento sócio-econômico. Segundo o National Institute

    on Aging (NIA, agência americana que agrega estudos e estabelece diretrizes para

    orientar o envelhecimento saudável da população), entre 2010 e 2050 o número de

    pessoas idosas em países menos desenvolvidos está estimado em aumentar 250%. Nos

    países desenvolvidos, o número de pessoas idosas tende a crescer 71%, sendo a

    diferença entre os números atribuída à expressiva redução da taxa de natalidade

    observada nos países mais avançados. Em consonância com os dados mundiais, o Brasil

    também constata o aumento da longevidade ao longo do tempo. A expectativa de vida do

    brasileiro ao nascer em 1950 era de 48 anos, ao passo que em 2016 este número subiu

    para 75,8 anos (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2014).

    Inobstante o lado positivo do envelhecimento da população, é importante ressaltar que

    esta circunstância também vem acompanhada de incapacidades, doenças e, muitas

    vezes, de total dependência desses idosos.

    Dentre as várias doenças ligadas ao envelhecimento, destaca-se a doença de

    Parkinson (DP) como sendo a segunda mais comum doença neurodegenerativa, menos

    prevalente apenas que a doença de Alzheimer (MAYEUX, 2003). A taxa de incidência da

    DP aumenta com a idade em ambos os sexos, entretanto os homens têm duas vezes

    mais chances de desenvolver DP que as mulheres em qualquer faixa etária na maioria

    das populações (BALDERESCHI et al., 2000). No entanto, está claro que o risco em

    desenvolver DP varia conforme etnia e genótipo, mas também pode variar de acordo com

    os hábitos e o ambiente ao qual o indivíduo está exposto (ASCHERIO;

    SCHWARZSCHILD, 2016).

    1.1 - SINTOMAS

    A DP é caracterizada por uma degeneração dopaminérgica nigroestriatal

    progressiva, cujos principais sinais clínicos são disfunções motoras como lentidão dos

    movimentos (bradicinesia), tremor em repouso, rigidez muscular e instabilidade postural.

  • 16

    No entanto, sintomas não motores também são comuns no decurso da doença, em

    especial, diminuição do sentido olfativo (hiposmia), constipação, distúrbios do sono,

    alterações cognitivas e depressão (VINGILL; CONNOR-ROBSON; WADE-MARTINS,

    2018). Observa-se que alguns dos sintomas não motores podem aparecer antes dos

    sinais motores clássicos. Assim, considera-se que os distúrbios motores que caracterizam

    a DP estão intimamente relacionados à progressão da doença no cérebro quando ocorre

    a diminuição da dopamina e degeneração da substância nigra (CHAUDHURI;

    SCHAPIRA, 2009) (Figura 1).

    Figura 1 – Sintomas clínicos associados à progressão da doença de Parkinson. (Adaptado de POEWE et al., 2017)

    1.2 - FISIOPATOLOGIA

    Os sintomas evidenciados nos estágios avançados da DP estão relacionados à

    presença no cérebro de agregados intracelulares de proteínas ubiquitinadas e α-

    sinucleína, conhecidos como corpos de Lewy, em particular, nas estruturas límbicas e no

    neocórtex. A α-sinucleína é uma proteína pré-sináptica com importância fisiológica que,

    em condições patológicas, apresenta alterações conformacionais que favorecem sua

    agregação e toxicidade neuronal (JANDA et al., 2012). Desta forma, as espécies

  • 17

    oligoméricas e fibrilares formadas a partir da α-sinucleína alterada se aglomeram no

    citoplasma dos neurônios dopaminérgicos culminando na morte dessas células,

    contribuindo assim para o desenvolvimento dos sinais motores da DP e agravamento da

    doença (WINNER et al., 2011).

    O diagnóstico é feito, geralmente, no início das manifestações motoras

    (CHAUDHURI et al., 2006). No entanto, quando a doença é clinicamente evidenciada

    estima-se que a neurodegeneração atingiu cerca de 50% dos neurônios dopaminérgicos

    do mesencéfalo e, aproximadamente, 80% do conteúdo de dopamina (DA) estriatal

    encontra-se depletada (BARRIO; HUANG; PHELPS, 1997; JELLINGER, 1991; LINDNER

    et al., 1999; RIEDERER; WUKETICH, 1976). Apesar da perda de neurônios

    dopaminérgicos na parte compacta da substância nigra e a agregação intraneuronal de α-

    sinucleína também serem observadas em outras doenças neurológicas, em conjunto

    estas duas características histopatológicas são consideradas específicas para o

    diagnóstico definitivo post mortem de DP idiopática (POEWE et al., 2017).

    O estudo das formas hereditárias da DP demonstra que outras vias moleculares

    quando afetadas desencadeiam características neuropatológicas tão semelhantes que,

    por vezes, não se distinguem da DP esporádica, sugerindo que tais eventos poderiam

    contribuir de forma relevante para a patogênese da doença. Os principais exemplos de

    vias secundárias atingidas são: a função mitocondrial, o estresse oxidativo, a homeostase

    de cálcio, transporte axonal e a neuroinflamação (POEWE et al., 2017). Há evidências

    que a disfunção mitocondrial, caracterizada pela redução da atividade do complexo I, se

    deve à aglomeração de α-sinucleína na mitocôndria, levando ao déficit da cadeia

    transportadora de elétrons e aumento de espécies reativas de oxigênio (ERO) no

    neurônio (BOSE; BEAL, 2016; DEVI et al., 2008; SCHAPIRA, 2007).

    As ERO são intermediários químicos com inúmeras funções essenciais, altamente

    reativos, que em condições fisiológicas possuem vida útil curta e, assim, são encontrados

    em baixas concentrações. As ERO estão envolvidas em diversos processos celulares que

    vão desde a proliferação e adaptação celular à hipóxia até à apoptose e carcinogênese

    (CHEN et al., 2010), contudo em condições anormais o aumento da produção de ERO

    pode aumentar a susceptibilidade ao estresse oxidativo. Na DP as ERO estão

    aumentadas no cérebro principalmente por conta do metabolismo da dopamina, disfunção

    mitocondrial e neuroinflamação (DIAS; JUNN; MOURADIAN, 2013). Por sua vez, o

    aumento do estresse oxidativo influencia na oxidação da α-sinucleína e sua capacidade

  • 18

    de formar agregados tóxicos e, em contrapartida, α-sinucleína mal enovelada favorece a

    produção de mais ERO, gerando um ciclo de toxicidade e consequente

    neurodegeneração (DEAS et al., 2016; PERFEITO; REGO, 2012).

    Algumas teorias buscam explicar a vulnerabilidade dos neurônios dopaminérgicos

    da substância nigra aos efeitos nocivos do estresse oxidativo, dentre estas a mais referida

    é que a causa seria a própria dopamina e seus metabólitos, que em altas concentrações

    na célula promove o aumento das espécies reativas (SURMEIER, 2007). Entretanto, essa

    teoria é questionada, uma vez que neurônios dopaminérgicos de outras áreas do cérebro

    não são tão sensíveis quanto os da substância nigra.

    Especula-se também que os neurônios dopaminérgicos seriam particularmente

    mais vulneráveis à oxidação por questões morfológicas, isto é, por possuírem axônios

    longos e desmielinizados, com muitas sinapses, requerendo mais energia para serem

    mantidos que outros tipos de neurônios (BOLAM; PISSADAKI, 2012; PISSADAKI;

    BOLAM, 2013). Porém, de forma mais particular, considerando diferenças fisiológicas, os

    neurônios dopaminérgicos da parte compacta da substância nigra são mais dependentes

    da homeostase de cálcio (SURMEIER; HALLIDAY; SIMUNI, 2017), a qual se encontra

    prejudicada com o estresse oxidativo, sendo certo que essas oscilações interferem na

    atividade autônoma (capacidade de gerar potencial de ação na ausência de entrada

    sináptica) restrita às células dessa região (SURMEIER, 2007; SURMEIER et al., 2017)

    (Figura 2). Estas particularidades, se confirmadas, podem justificar a razão da parte

    compacta da substância nigra ser afetada, e outras regiões adjacentes também de

    transmissão dopaminérgica no mesencéfalo permanecerem inalteradas.

  • 19

    Figura 2 - Mecanismos moleculares da doença de Parkinson. Diagrama das interações entre as principais vias moleculares implicadas na patogênese da DP (adaptado de POEWE et al., 2017).

    Evidências post mortem encontradas no cérebro de pacientes com DP revelam que

    a neuropatologia dessa doença leva à um quadro inflamatório que, apesar de não ser o

    fator desencadeante da doença, pode contribuir de maneira importante para sua

    patogênese e progressão (RANSOHOFF, 2016). A relevância da neuroinflamação na

    patogênese da DP foi inicialmente sugerida em 1988 (MCGEER et al., 1988), que

    observaram um aumento da ativação da microglia na substância nigra de cérebros de

    pacientes acometidos pela doença. A função da microgliose identificada em condições

    adversas é processar e remover patógenos, células mortas, sinapses redundantes,

    agregados proteicos e outros antígenos particulados solúveis, agindo como células

    imunes residentes do sistema nervoso central (SNC) (COLONNA; BUTOVSKY, 2017).

    Em condições normais, essas células migram a favor de sinais gerados por astrócitos e

    neurônios, promovendo uma resposta homeostática vital para a função cerebral normal, e

    uma ativação controlada tem efeitos benéficos às células cerebrais (BUTOVSKY;

    WEINER, 2018). Todavia, quando esta resposta ocorre de maneira contínua ou

  • 20

    exacerbada, as células gliais podem causar neurotoxicidade, através da produção

    excessiva de fatores citotóxicos, incluindo ERO e citocinas pró-inflamatórias como

    interleucina (IL)-1β, IL-6 e fator de necrose tumoral-α (TNFα) (BLOCK; HONG, 2007;

    MOGI et al., 1996; POPOVICH; LONGBRAKE, 2008). Ademais, existem indícios de que a

    agregação de α-sinucleína induza a neuroinflamação e o processo neuroinflamatório

    também favoreça o remodelamento da α-sinucleína, levando a um ciclo favorável ao

    agravamento da doença (GAO et al., 2008). Por sua vez, a α-sinucleína remodelada é

    capaz de se propagar e desencadear a agregação da alfa-sinucleína endógena por um

    mecanismo de transmissão célula a célula (príon like) (MELKI, 2018), amplificando mais a

    neuropatologia e promovendo o avanço da DP (Figura 2).

    1.3 - TRATAMENTO

    No que concerne às terapias farmacológicas disponíveis atualmente, estas não são

    capazes de impedir a progressão da neurodegeneração e, em sua maioria, a atenuação e

    retardamento dos sintomas é baseada na reposição da dopamina estriatal. O Levodopa é

    o fármaco precursor da dopamina que representa a terapia base da DP, tentando

    compensar a perda da função dopaminérgica. Agentes antimuscarínicos também são

    utilizados com a finalidade de atenuar os sintomas. A farmacoterapia disponível pode

    perder sua eficácia ao longo do tempo e proporcionar efeitos adversos, tais como:

    flutuações motoras, discinesia (movimentos irregulares involuntários), distúrbios do

    controle dos impulsos, sonolência ou sono de início súbito e outros sintomas decorrentes

    da desregulação dopaminérgica (CHARVIN et al., 2018).

    Adicionalmente ao tratamento medicamentoso, os pacientes com DP já têm

    disponível o dispositivo de estimulação cerebral profunda (Deep Brain Stimulation)

    recurso tecnológico dependente de procedimento cirúrgico baseado na estimulação

    elétrica do núcleo subtalâmico, promovendo melhoras na função motora dos pacientes

    apesar não de não impedir a progressão da doença (LIMOUSIN; FOLTYNIE, 2019). O

    uso dessa alternativa terapêutica, principalmente para pacientes que não respondiam às

    terapias medicamentosas, fez com que a DP se tornasse a doença neurodegenerativa

    com melhor administração da qualidade de vida dos pacientes, apesar de permanecer

    incurável (BA; JIMENEZ-SHAHED, 2019). Apesar destes avanços, a busca por novas

  • 21

    terapias capazes de impedir a perda neuronal e a consequente progressão da doença

    são de extrema importância, e modelos experimentais capazes de mimetizar a doença

    são ferramentas fundamentais para a avaliação de potenciais estratégias terapêuticas e

    para o melhor entendimento da fisiopatologia da doença.

    1.4 - MODELOS EXPERIMENTAIS

    Os modelos experimentais da DP disponíveis atualmente são baseados na

    administração de neurotoxinas ou expressão de genes contendo mutações relacionadas

    às formas familiares da doença. Dentre os modelos induzidos por neurotoxinas, os mais

    utilizados são o 1-metil 4-fenil 1,2,3,6-tetrahidropiridina (MPTP), 6-hidroxidopamina (6-

    OHDA), rotenona e paraquat. Estes modelos têm sido úteis para testar tratamentos de

    alívio dos sintomas ou para compreender os mecanismos de neurodegeneração conforme

    visto nos estágios avançados da DP (BLESA et al., 2012; DAUER; PRZEDBORSKI, 2003;

    SHIMOHAMA; HISAHARA, 2011). Apesar dos modelos agudos acima descritos

    reproduzirem muitos dos sintomas motores e não motores da doença, conforme vistos na

    clínica, eles são incapazes de reproduzir a sequência na qual esses eventos ocorrem, e

    geralmente falham na indução das características associadas à α-sinucleína, sua

    agregação e consequente formação de corpos de Lewy (FORTUNA et al., 2017).

    A descrição de formas hereditárias monogênicas da DP impulsionou o

    desenvolvimento de modelos animais transgênicos, que começaram a ser descritos em

    1997 e expressam formas mutadas de genes que codificam α-sinucleína, PARKIN, PTEN-

    induced putative kinase 1 (PINK1) ou Leucine-rich repeat serine ⁄threonine kinase 2

    (LRRK2). Ainda que úteis para o estudo de aspectos moleculares específicos da

    patogênese da doença, particularmente das formas familiares, estes modelos não são

    capazes de reproduzir eficientemente todos os sintomas motores e não motores

    característicos da doença (BLANDINI; ARMENTERO, 2012). Os modelos animais

    baseados em mutações genéticas que superexpressam a forma selvagem ou humana

    mutante de α-sinucleína (duplicatas ou triplicatas do gene SNCA), por exemplo,

    conseguem mimetizar a forma hereditária da doença em seu início, preservando a

    agregação de proteína fibrilar em uma área extensa do cérebro, entretanto não

    apresentam a típica perda neuronal dopaminérgica observada na substância nigra de

  • 22

    pacientes com DP (ANTONY; DIEDERICH; BALLING, 2011; FORTUNA et al., 2017).

    É imperioso que novos modelos de estudo sejam desenvolvidos e que estes

    consigam reproduzir a sequência de eventos neuropatológicos tais como ocorre em

    humanos para elucidar os mecanismos de início e progressão da doença. Para tanto, os

    modelos animais são importantes à medida que simulam as disfunções clínicas,

    patológicas e moleculares características da DP. Nada obstante, os modelos animais

    raramente reproduzem a etiologia, progressão e patologia completamente e, em sua

    maioria, somente nos respondem parte dos questionamentos acerca da DP

    (SHIMOHAMA; HISAHARA, 2011) necessitando, claramente, serem aprimorados.

    Neste sentido, em 2013, He e cols. desenvolveram um modelo crônico de DP, onde

    camundongos receberam doses baixas contínuas de lipopolissacarídeo (LPS) de

    Escherichia coli por via intranasal. Estudos demonstram que humanos são

    frequentemente expostos à inalação de LPS bacteriano, uma vez que o mesmo é

    encontrado na poeira doméstica, poluição ambiental ou em aerossóis gerados a partir de

    água contaminada (BLOCK; CALDERÓN-GARCIDUEÑAS, 2009; GENC et al., 2012).

    Sabe-se que o LPS é capaz de induzir neurotoxicidade de forma indireta, possivelmente

    através da ativação da microglia e consequente liberação de mediadores inflamatórios,

    uma vez que o mesmo não é diretamente tóxico para as células neuronais que não

    expressam receptores do tipo Toll 4 (TLR4) (LENHART; TROUT, 2003; QIN et al., 2007).

    A escolha da via intranasal está baseada na hipótese do vetor olfatório na

    patogênese da DP, a qual estabelece a mucosa olfatória como porta de entrada de

    agentes ambientais que catalisam as forças esporádicas da doença (PREDIGER et al.,

    2012). A referida hipótese tem como principais evidências o comprometimento das vias

    olfatórias, com lesão do núcleo olfatório anterior, e a consequente perda de olfato

    observado nos primeiros estágios da DP (BRAAK; DEL TREDICI, 2017; DOTY, 2008).

    Condições anatômicas fortalecem ainda mais a hipótese de que xenobióticos chegam ao

    cérebro através do sistema olfatório periférico e conseguem, desta forma, se disseminar

    mais facilmente para as áreas cerebrais associadas à doença, considerando que o nervo

    olfatório apresenta botões dendríticos e cílios salientes distribuídos rostralmente à

    cavidade nasal que ampliam sua superfície de exposição e são constituídos de neurônios

    que projetam seus axônios diretamente ao cérebro sem intermediários, recebendo pouca

    proteção da barreira hematoencefálica (BHE) (DOTY, 2008). Desta feita, o uso da via

    nasal no modelo sugerido por He e cols. (2013) permitiria a comunicação direta do LPS

  • 23

    de Escherichia coli administrado e o cérebro dos animais, possivelmente mimetizando o

    que ocorre em humanos, onde essas partículas exógenas encontradas na poluição são

    inaladas e poderiam acessam o cérebro após ultrapassar a BHE (HE et al., 2013).

    O modelo crônico de administração intranasal de LPS foi capaz de reproduzir a

    hipocinesia progressiva, perda seletiva de neurônios dopaminérgicos na substância nigra

    e redução dos níveis de dopamina no estriado, além de acúmulo e agregação de α-

    sinucleína na substância nigra e ativação microglial, quando induzido em camundongos

    da linhagem C57/BL6 (HE et al., 2013). De tal modo, pode-se inferir que este modelo

    constitui uma ferramenta importante tanto no estudo da patogênese da DP quanto na

    busca de novas estratégias terapêuticas capazes de reduzir os sintomas, bem como a

    progressão da doença. Neste sentido, novas estratégias terapêuticas cujos alvos sejam

    as vias secundárias responsáveis pelo agravamento da doença podem ser alternativas

    interessantes para bloquear sua progressão, dentre estas destacam-se inibidores do

    processo neuroinflamatório e do estresse oxidativo que acompanham o envelhecimento.

    1.5 - TESTES FARMACOLÓGICOS

    Considerando que a neuroinflamação pode ser um dos agravantes mais

    pronunciados na neuropatologia da DP, moléculas capazes de prevenir ou reverter esse

    quadro foram elencadas. Nesse passo, estudos recentes demonstram que a metformina,

    uma biguanida que é a principal droga utilizada no tratamento de diabetes mellitus do tipo

    2, apresenta efeitos anti-inflamatórios pronunciados tanto na periferia quanto no SNC

    (NOVELLE et al., 2016; ZHU et al., 2015). Em estudos com roedores, a administração

    crônica de metformina foi capaz de aumentar a sobrevida, evento associado

    possivelmente ao efeito anti-inflamatório e antioxidante relacionados ao aumento da

    atividade da cinase ativada por AMP (AMPK) (GARG et al., 2017; MARTIN-MONTALVO

    et al., 2013). Ademais, em um estudo de coorte recente foi observado que pacientes com

    diabetes tipo 2 tratados com metformina apresentaram risco reduzido de ocorrência de

    DP (WAHLQVIST et al., 2012). Um estudo de Hou et cols. (2015) demonstrou ainda que a

    ativação de AMPK tem efeito protetor sobre neurônios dopaminérgicos em um modelo de

    DP in vitro. Dessa forma, levando em consideração o papel da idade e da

    neuroinflamação na fisiopatologia da DP e os efeitos anti-inflamatório e anti-

  • 24

    envelhecimento da metformina, desafiamos o modelo crônico induzido por LPS intranasal

    em animais de diferentes idades a fim de verificar se a administração desta droga poderia

    apresentar efeitos neuroprotetores sobre neurônios dopaminérgicos, podendo se tornar

    uma alternativa interessante para o tratamento da doença.

    Conforme já referido acerca de fatores que colaboram para a progressão da DP, o

    estresse oxidativo gerado na substância nigra pelo aumento no metabolismo de dopamina

    armazenada nos neurônios, exposição a toxinas, inflamação, envelhecimento e

    predisposição genética constitui um dos mecanismos de degeneração neuronal na DP

    (JANDA et al., 2012). A formação de radicais livres, ERO, disfunção mitocondrial e ação

    tóxica do óxido nítrico, também têm sido cada vez mais relacionados à toxicidade que

    leva à disfunção e morte dos neurônios dopaminérgicos (ABDIN; SARHAN, 2011; YUAN

    et al., 2010). Neurônios são vulneráveis aos danos oxidativos devido a grande quantidade

    de ácidos graxos poli-insaturados presentes em suas membranas e a baixa atividade de

    enzimas antioxidantes endógenas (MILLER et al., 2009). Destarte, confrontar o modelo

    crônico de DP induzido pela administração intranasal de LPS com substâncias com

    atividades antioxidantes seletivamente direcionados para as mitocôndrias pode oferecer

    um meio de proteção contra a morte celular, retardando a neurodegeneração e

    progressão da doença (GOGVADZE; ORRENIUS; ZHIVOTOVSKY, 2009; LEV;

    MELAMED; OFFEN, 2003).

    Com esta finalidade, no presente trabalho, também foi avaliado o efeito da

    administração de ácido tióctico, um potente antioxidante utilizado no tratamento de

    sintomas da polineuropatia diabética periférica (CRUZ-ÁLVAREZ et al., 2018). O ácido

    tióctico é um cofator para as alfa-cetoácido desidrogenases mitocondriais e, portanto, tem

    um papel crítico no metabolismo energético mitocondrial (SHAY et al., 2009). Além disso,

    foram descritas atividades antioxidantes e antiapoptóticas associadas ao ácido tióctico

    (BAST; HAENEN, 2003; BITAR et al., 2010; FUJITA et al., 2008; HAGEN et al., 2002;

    MOINI; PACKER; SARIS, 2002; PACKER, 1998; PACKER; WITT; TRITSCHLER, 1995;

    PERSSON; SVENSSON; BRUNK, 2001; PRAHALATHAN; SELVAKUMAR;

    VARALAKSHMI, 2006; SMITH et al., 2004).

    Desta forma, este trabalho teve como objetivo aprimorar a caracterização do

    modelo animal crônico de LPS intranasal para DP, utilizando camundongos Swiss em

    diferentes idades, e avaliar o possível efeito terapêutico da metformina e do ácido tióctico,

    drogas capazes de reduzir a neuroinflamação e o estresse oxidativo, já empregadas

  • 25

    clinicamente no tratamento de diabetes mellitus do tipo 2 e polineuropatia diabética

    periférica, respectivamente.

    2. OBJETIVOS

    2.1 - OBJETIVO GERAL

    Caracterizar os efeitos da administração crônica intranasal de LPS em

    camundongos Swiss como modelo da DP, no que se refere às alterações

    comportamentais e fisiopatológicas induzidas, bem como avaliar se drogas o possível

    efeito terapêutico de drogas com ação anti-inflamatória, anti-oxidante e anti-

    envelhecimento.

    2.2 - OBJETIVOS ESPECÍFICOS

    ● Avaliar e comparar o efeito da administração crônica de LPS intranasal, no que se

    refere à indução de alterações motoras e não motoras em camundongos de diferentes

    idades, através do uso de testes comportamentais;

    ● Avaliar o efeito da administração crônica de LPS intranasal sobre desenvolvimento de

    alterações do conteúdo dopaminérgico no estriado de camundongos, através da

    medida dos níveis de tirosina-hidroxilase (TH);

    ● Avaliar se a administração crônica de LPS intranasal promove aumento de espécies

    reativas de oxigênio no cérebro de camundongos;

    ● Verificar o efeito da administração de metformina sobre as alterações comportamentais

    e neuropatológicas induzidas pela administração intranasal de LPS;

    ● Verificar o efeito da administração de ácido tióctico sobre as alterações

    comportamentais e neuropatológicas induzidas pela administração intranasal de LPS.

  • 26

    3. MATERIAIS E MÉTODOS

    3.1 ANIMAIS

    Os experimentos foram conduzidos utilizando camundongos Swiss fêmeas, adultos

    (4, 8 ou 12 meses), oriundos do biotério da Faculdade de Farmácia da UFRJ. Os animais

    foram mantidos em ambiente com temperatura (22 ± 2 ºC) e umidade (60-80%)

    controladas em ciclo claro-escuro de 12 horas, com livre acesso à comida e água.

    A criação e utilização dos animais foram conduzidas de acordo com as

    recomendações do Guia de Uso e Cuidado com Animais Laboratoriais do National

    Institutes of Health (NIH) dos Estados Unidos da América (Publicação do NIH No 85-23,

    revisado em 1996) e em conformidade com a Lei brasileira nº 11.794, de 8 de outubro de

    2008 e Decreto nº 6.899 de 15 de julho de 2009. Os protocolos experimentais foram

    aprovados pelo Comitê de Ética para o Uso de Animais (CEUA) da UFRJ (número de

    ordem 137/18).

    3.2 TRATAMENTO

    Os camundongos (n=8-14 por grupo) foram anestesiados com isoflurano (2,5%;

    Abbot) através de um sistema de vaporização (SurgiVet), e foram submetidos à instilação

    intranasal unilateral de 10 μg de lipopolissacarídeo (LPS) de Escherichia coli (0111:B4;

    1mg/ml; Sigma-Aldrich, St. Louis, USA) ou veículo (solução salina), 3 vezes na semana,

    durante 1, 2 ou 5 meses (GRAFF; POLLACK, 2005).

    Para avaliar o efeito da metformina sobre as alterações comportamentais e

    neuropatológicas induzidas pelo LPS em animais mais velhos, um grupo de animais (12

    meses de idade) recebeu por via oral cloridrato de metformina (EMS; 300 mg/Kg/dia) ou

    veículo (carboximetilcelulose 2%), diariamente, durante 1 mês, sendo o tratamento

    realizado de maneira concomitante à administração de LPS. Ao final do tratamento, os

    animais foram submetidos a avaliações comportamentais e eutanasiados para coleta de

    tecidos para análises bioquímicas (Figura 3). A dose, via e frequência de administração

    da metformina foram escolhidas com base na literatura (GARG et al., 2017; HE et al.,

    2016).

  • 27

    Em outro experimento, animais adultos jovens (4 meses de idade) receberam LPS

    e metformina por dois meses, sendo submetidos a avaliações comportamentais ao final

    de cada mês de tratamento. Ao fim da segunda bateria de testes comportamentais, os

    animais foram eutanasiados e foram coletados os tecidos para análises, conforme

    descrito para o grupo de 12 meses (Figura 3).

    Para a avaliação do efeito do tratamento com ácido tióctico sobre as alterações

    induzidas por LPS, camundongos Swiss de 8 meses de idade receberam LPS intranasal

    tal como descrito acima por 20 semanas (HE et al., 2016). Ao final da 16a semana de

    indução com LPS, os animais passaram a receber o tratamento com ácido tióctico

    (Thioctacid®, Merck; 100 mg/kg/dia) ou veículo (carboximetilcelulose 2%), diariamente, por

    via oral durante 4 semanas. Em seguida, os animais foram submetidos aos testes de

    comportamento que avaliam a atividade motora e, posteriormente, eutanasiados para

    coleta de tecidos para análises bioquímicas e de biologia molecular (Figura 3). A dose, via

    e frequência de administração da ácido tióctico também foram escolhidas com base em

    estudos anteriores (ABDIN; SARHAN, 2011).

    Figura 3 - Desenhos experimentais de cada grupo de animais em suas diferentes idades. Apresentação dos tempos de indução e tratamento, períodos de testes de comportamento e coletas de tecidos para análises.

  • 28

    3.3 TESTES DE COMPORTAMENTO

    3.3.1 Campo Aberto

    O teste do campo aberto foi criado originalmente por Hall em 1941, sendo um dos

    testes mais clássicos e antigos para avaliação de comportamento de roedores. Este teste

    foi utilizado para avaliar alterações na atividade locomotora, hiperatividade, ansiedade e

    comportamentos exploratórios (TREMML et al., 1998). O animal foi colocado no centro de

    uma arena circundada por paredes medindo 30x30x45 cm e o seu comportamento

    exploratório foi filmado durante dez minutos (Figura 4). Este ambiente estranho e aberto

    produz ansiedade no animal. Para reduzir esse efeito, o ambiente (sala de testes) foi

    isolado, silencioso e com iluminação reduzida. Os primeiros cinco minutos foram

    considerados habituação do animal na arena do teste e desprezados na avaliação dos

    parâmetros testados. Os 5 minutos finais foram analisados e forneceram os seguintes

    parâmetros comportamentais: distância total percorrida e o tempo passado na periferia e

    no centro da arena, o qual avalia o comportamento do tipo ansioso. Os parâmetros foram

    analisados pelo software Any-Maze Video Tracking System, versão 5.6 (Stoelting Co.).

    Figura 4 - Teste de campo aberto. A. Aparato para teste de campo aberto. B. Análise do experimento pelo software Any-Maze Video Tracking System após movimentação livre do camundongo na arena de teste. 3.3.2 Reconhecimento de Objeto Novo

    Quando roedores são apresentados a objetos familiares e novos, o comportamento

    inato esperado é que estes despendam maior parte do tempo explorando o objeto novo

    A B

  • 29

    (ENNACEUR, 1988). Considerando esse paradigma comportamental, foi utilizada a tarefa

    de reconhecimento de objeto para avaliação da formação de memórias declarativas

    (MOSES et al., 2005).

    O teste foi realizado na mesma arena utilizada para o teste de campo aberto.

    Primeiramente, foi realizada a ambientação de 5 minutos na arena de treino, onde os

    animais são deixados para explorar livremente a arena sem a presença de objetos. Em

    seguida, os animais foram individualmente colocados no campo aberto contendo 2

    objetos iguais (A e A) por cinco minutos. Após 1 hora, um dos objetos foi substituído (A e

    B) sendo-lhes permitido explorá-los novamente por mais 5 minutos (Figura 5). O tempo

    gasto explorando cada objeto foi medido e expresso como porcentagem do tempo total de

    exploração. Os pares de objetos utilizados nos testes foram previamente padronizados

    com a finalidade de prevenir comportamentos de preferência ou rejeição. O

    comportamento esperado dos animais com prejuízo de memória de reconhecimento é

    que estes explorem igualmente ambos objetos.

    Figura 5 - Tarefa de reconhecimento de objetos. Durante o treino o animal é exposto a dois objetos idênticos. Na sessão de teste, um dos objetos é trocado por um objeto novo.

    3.3.3. Teste de Remoção do Adesivo

    Para avaliar o sistema sensoriomotor e a coordenação motora fina, foi realizado o

    teste de remoção de adesivo (FLEMING; EKHATOR; GHISAYS, 2013). Os animais foram

    ambientados na sala de teste, sem o alimentador, por 1 hora. Os demais animais da caixa

    foram transferidos para uma gaiola nova, limpa, com 3/4 da maravalha usada. A gaiola

    onde estavam com o restante da maravalha usada (1/4) foi usada como arena de teste.

    Os camundongos foram testados individualmente. Um pequeno adesivo de 0,5 cm2

  • 30

    foi colado na região entre o focinho e os olhos do animal e este foi imediatamente solto na

    gaiola. Foi registrado o tempo que o animal demorou para dar o primeiro toque no adesivo

    (tempo de contato) e o tempo que o animal levou para removê-lo completamente do

    focinho (tempo de remoção). O tempo de corte foi 60 segundos e foram realizados 2

    treinos antes do teste. Animais que não realizaram a tarefa durante o tempo de teste

    foram desconsiderados nos resultados. Espera-se que os animais com prejuízo

    sensoriomotor e ou de coordenação motora fina levem mais tempo para fazer contato ou

    remover o adesivo.

    3.3.4. Discriminação Olfatória

    O aparato utilizado para avaliação da discriminação olfatória consiste em dois

    compartimentos idênticos separados por parede com uma pequena abertura, através da

    qual os animais podem se locomover livremente entre os dois compartimentos (Figura 6).

    A base de um dos compartimentos foi coberta com a maravalha retirada da gaiola na qual

    o camundongo estava alojado, enquanto o outro compartimento foi coberto com serragem

    limpa. Os animais foram colocados inicialmente no compartimento recoberto com

    maravalha nova, com a cabeça voltada para a abertura entre os dois compartimentos. A

    discriminação olfatória foi avaliada pela preferência do animal pelo compartimento

    impregnado com o seu cheiro (compartimento familiar) em relação ao compartimento com

    maravalha limpa (não familiar), durante os 5 minutos da sessão de teste. Nessa situação,

    tem sido demonstrado que roedores adultos preferem ambientes impregnados com seu

    próprio odor (PREDIGER; BATISTA; TAKAHASHI, 2005).

    Figura 6 - Aparato para teste de discriminação olfatória. O compartimento com odor não-familiar é recoberto por maravalha nova, enquanto o compartimento com odor familiar é recoberto com maravalha usada e impregnada com o cheiro do animal.

  • 31

    3.3.5. Pole Teste

    O teste da haste (do inglês Pole test) mede a lentidão dos movimentos dos animais

    (bradicinesia), um dos principais sinais motores da DP. Os camundongos foram

    colocados individualmente de cabeça para cima no topo de uma haste de madeira com

    superfície rugosa, colocada dentro de uma caixa com maravalha. Nesta condição, os

    animais orientam-se para baixo (tempo de virada) e descem toda a extensão da haste

    (tempo de descida) em direção ao fundo da caixa (Figura 7). O tempo gasto para o animal

    se orientar para baixo e o tempo de descida foram quantificados e utilizados como

    indicativo da atividade motora (FLEMING, 2004).

    O teste requer 2 dias de treino da tarefa com 5 repetições cada. No terceiro dia, os

    animais são testados 5 vezes e os 2 maiores tempos são descartados. As médias dos 3

    menores tempos de virada e de descida são consideradas para avaliação do

    desempenho de cada animal (FLEMING, 2004).

    Figura 7 - Movimentação dos animais durante o Pole teste. O animal é colocado na haste com a cabeça voltada para cima. Posteriormente o animal se orienta com a cabeça para baixo a fim de iniciar a descida. Neste ponto é marcado o tempo de virada. Por fim o animal desce a haste completamente e o tempo de descida é marcado.

    3.3.6. Teste de Esquiva Inibitória (Step Down Inhibitory Avoidance)

    Para avaliação da memória aversiva ou memória de medo foi utilizado o teste da

    esquiva inibitória. A tarefa envolve a capacidade de aprender e inibir uma resposta para

    evitar um estímulo aversivo. Os animais foram submetidos ao protocolo de medo

    condicionado ao contexto, em uma caixa de esquiva modelo EP104MC (Insight

  • 32

    Equipamentos Ltda.). A área interna de fuga possui 200 mm x 75 mm, com porta e frente

    em acrílico transparente. O assoalho é formado por uma grade de barras metálicas, as

    quais apresentam 0,1 cm de diâmetro e encontram-se separadas umas das outras por um

    espaço de 0,7 cm.

    Na sessão de treino os animais foram colocados individualmente em uma

    plataforma retangular de 10 x 8 x 2 cm e ao descer com as quatros patas no assoalho de

    grades, o experimentador dispara um choque de 0,8 mA por 2 segundos (Figura 8). O

    tempo para descer da plataforma com as 4 patas foi registrado como tempo de latência.

    Após 24 horas, os animais foram reintroduzidos no aparato e foi aferido o tempo de

    latência, isto é, o tempo que o animal demorou para descer da plataforma. No segundo

    dia o animal não recebeu choque ao descer da plataforma. Um animal naïve tende a

    evitar descer para a grade, permanecendo mais tempo na plataforma. Foi estabelecido

    tempo máximo de 300 segundos para que o animal desça ao assoalho de grades, ao fim

    deste tempo o animal foi retirado do aparato pelo experimentador. O tempo de latência é

    considerado uma medida indireta do aprendizado (WALZ et al., 1999).

    Figura 8 - Teste de esquiva inibitória. No primeiro dia o animal recebe um pequeno choque ao descer da plataforma. No dia seguinte, o animal é colocado no mesmo aparato e o tempo para descer ao assoalho de grades é medido e representa a memória aversiva. 3.4 COLETA DE TECIDOS E PREPARAÇÃO DE AMOSTRAS

    Após o término dos experimentos comportamentais, os animais tiveram sangue

    coletado para avaliação da glicemia, conforme descrito abaixo, e em seguida foram

    anestesiados com uma injeção i.p. de cetamina (100mg/kg) e xilazina (10mg/kg), sendo

    então eutanasiados por perfusão transcardíaca. A dosagem de glicemia foi realizada à

  • 33

    tarde, período em que os testes de comportamento foram realizados, e os animais não se

    encontravam em jejum, com ração e água ad libitum.

    A metade dos animais de cada grupo tiveram seus cérebros coletados e, desses,

    foram separadas as seguintes estruturas para conservação a -80°C: córtex pré-frontal e

    estriado. Para as análises bioquímicas, os extratos proteicos foram preparados conforme

    descrito abaixo.

    3.5 ANÁLISES BIOQUÍMICAS E BIOMOLECULARES

    3.5.1. Dosagem da Glicose Sanguínea

    Para avaliar se o tratamento com metformina provocou hipoglicemia nos

    animais, o que poderia comprometer o desempenho desses nos testes comportamentais,

    após o tempo de tratamento proposto para cada grupo, foi coletado sangue através de

    uma pequena incisão na cauda e a glicemia foi dosada através de um glicosímetro (One-

    Touch Ultra, Johnson & Johnson). Glicemia inferior a 63 mg/dl seria considerada

    indicativo de hipoglicemia uma vez que o Canadian Council on Animal Care estabelece

    glicemia normal entre 63-176 mg/dl para camundongos Swiss (CASTELLO BRANCO et

    al., 2011).

    3.5.2 Quantificação de Espécies Reativas de Oxigênio

    O córtex pré-frontal dos animais tratados com metformina e seus respectivos

    controles foram dissecados após os testes comportamentais e homogeneizados em

    Dulbeccos Modified Eagle’s Medium (DMEM; Invitrogen; 1:10 p/v) gelado, utilizando um

    homogeneizador para tubos (2359971-1EA - Sigma-Aldrich).

    As amostras, então diluídas 1:1 em DMEM, foram transferidas para uma placa de

    fluorescência com um volume final de 200 µl. As espécies reativas de oxigênio de cada

    amostra foram medidas adicionando 2 µM de 5-(-6)-clorometil-2',7'-

    diclorodihidrofluoresceína diacetato acetil ester (CM-H2DCFDA - Life Technologies

    C6827), seguida de incubação à 37°C por 30 minutos no escuro.

  • 34

    A fluorescência foi quantificada utilizando um leitor de microplaca (VICTOR™ X3 –

    PerkinElmer), à 492-495/517-527 nm, conforme recomendações do fabricante. Os níveis

    de fluorescência basal foram subtraídas dos valores de fluorescência final para cada

    amostra analisada, conforme descrito por DE OLIVEIRA SOUZA e cols., (2018).

    3.5.3 Ensaio de Imunodetecção (Western Blotting)

    A expressão das proteínas de interesse no estriado foi avaliada através da técnica

    de western blot da forma descrita por Clarke e cols. (2015). Os tecidos foram

    homogeneizados em tampão de lise para radioimunoensaio (RIPA buffer) suplementado

    com coquetel de inibidores de proteases e fosfatases (Pierce Thermo Scientific,

    #18612778 e #1861275) e centrifugados a 12.000rpm, por 10 minutos a 4°C, sendo os

    sobrenadantes congelados a -80oC até as análises. A concentração de proteínas de cada

    amostra foi determinada pelo método colorimétrico de Bradford (Sigma-Aldrich). Os

    extratos solúveis do estriado foram diluídos em tampão de amostra [Tris-HCl 150 mM (pH

    6,8), β-mercaptoetanol 15%, dodecil sulfato de sódio (SDS) 6%, azul de bromofenol 0,3%,

    glicerol 25%] e fervidos por 5 min. As proteínas foram separadas por eletroforese em gel

    de poliacrilamida e SDS (10%) e transferidas por eletroforese para membranas de

    nitrocelulose Hybond ECL (Sigma-Aldrich). As membranas foram então bloqueadas em

    solução de leite desnatado (5%) e tween 20 (0,1 %) em salina tamponada com Tris (TBS)

    por 1 h, sendo em seguida incubadas overnight com os anticorpos primários anti-tirosina

    hidroxilase (TH) (1:000; Chemicon, #MAB318) e anti-gliceraldeído 3-fosfato

    desidrogenase (GAPDH) (1:2000; Cell Signaling Technology, #5174). Após lavagem com

    TBS-Tween, foi feita a incubação com anticorpos secundários específicos conjugados à

    peroxidase por 2 horas. As bandas imunorreativas foram detectadas através de foto

    documentador (ChemiDoc -Bio-Rad) utilizando-se substrato de quimioluminescência

    Luminata (Merck), e sua quantificação foi realizada utilizando-se o software Image Lab

    versão 6.0.1 build 34 (Bio-Rad).

    3.6. ANÁLISES ESTATÍSTICAS

    Os dados foram expressos como a média ± erro padrão da média (EPM), exceto

  • 35

    no teste de esquiva inibitória, onde os resultados foram expressos como mediana ±

    intervalo interquartil (IIQ). A avaliação estatística foi realizada através de teste t de

    Student ou análise de variância (ANOVA) de uma ou duas vias, seguida dos testes post-

    hoc de Tukey ou Bonferroni. O teste de esquiva inibitória foi analisado através do teste de

    Mann-Whitney. Os testes de reconhecimento de objetos e de discriminação olfatória

    foram expressos como porcentagem de tempo de exploração e analisados usando teste t

    de Student de amostra única, comparando a média do tempo de exploração com um valor

    fixo de 50%. Valores de p menores do que 0,05 (p < 0,05) foram considerados como

    significativos. Todas as comparações estatísticas foram efetuadas utilizando-se o pacote

    estatístico Prism 6 for Windows (GraphPad Software Inc., versão 6.01).

    4. RESULTADOS

    Neste trabalho, estudou-se as alterações comportamentais e fisiopatológicas

    relacionadas à DP, induzidas in vivo, em camundongos fêmeas de diferentes idades,

    através da administração crônica de LPS de Escherichia coli por via intranasal. Os

    experimentos foram realizados com animais de 4, 8 ou 12 meses de idade e os resultados

    apresentados a seguir foram agrupados conforme idade dos animais, para melhor

    compreensão. Em alguns experimentos, avaliamos se a administração diária de

    metformina (animais de 4 e 12 meses de idade) ou pelo ácido tióctico (animais de 8

    meses de idade), fármacos com potenciais anti-inflamatório e antioxidante,

    respectivamente, foi capaz de reverter total ou parcialmente as alterações

    comportamentais e/ou bioquímicas associadas à administração intranasal crônica de LPS.

    4.1. AVALIAÇÃO DE ALTERAÇÕES MOTORAS E NÃO MOTORAS INDUZIDAS PELA

    ADMINISTRAÇÃO INTRANASAL DE LPS POR 30 DIAS EM ANIMAIS DE 4 MESES DE

    IDADE

    Com o objetivo de avaliar o desenvolvimento de alterações motoras induzidas pela

    administração intranasal de LPS em camundongos adultos jovens, animais de 4 meses

    de idade receberam LPS por via intranasal (10 μg/3x semana) e foram avaliados 30 dias

  • 36

    após o início do tratamento nos testes de campo aberto, remoção do adesivo e pole teste

    (Figura 9).

    O tratamento intranasal com LPS por 30 dias (10 μg/3x semana) foi capaz de

    reduzir significativamente a distância percorrida pelos animais no campo aberto, em

    comparação aos animais que receberam veículo (salina) (Figura 9A, painel da esquerda).

    No entanto, não houve diferença significativa entre os grupos na porcentagem do tempo

    de permanência no centro do aparato de campo aberto (Figura 9A, painel da direita). Por

    sua vez, no teste de remoção do adesivo, outro teste para avaliação da atividade motora,

    os animais tratados com LPS intranasal demoraram um tempo maior para promover o

    primeiro contato com o adesivo quando comparados ao grupo controle (salina) (Figura

    9B, painel da esquerda), contudo, os grupos não apresentaram diferença significativa no

    tempo decorrido para removê-lo (Figura 9B, painel da direita). Conforme demonstrado na

    Figura 9C, o tratamento com LPS não é capaz de afetar de maneira significativa o

    desempenho dos animais no pole teste, uma vez que não foram observadas diferenças

    significativas entre os grupos tanto no tempo para que os animais se orientassem para

    baixo (tempo de virada), quanto no tempo decorrido para a completa descida da haste

    (tempo de descida).

    Figura 09 - Efeito da administração intranasal de LPS (10 μg/3x semana) por 30 dias sobre o desempenho motor e locomotor de animais de 4 meses de idade. (A) Distância percorrida e tempo gasto no centro da arena pelos animais no aparato de campo aberto durante a sessão de teste. (B) Tempos

  • 37

    de contato e remoção no teste do adesivo. (C) Tempo de virada e descida da haste no pole teste. LPS: Lipopolissacarídeo. As barras representam a média ± E.P.M. Cada ponto no gráfico representa um animal diferente. *p < 0,05, **p < 0,01. comparado ao grupo controle. Teste t de Student.

    Para a verificação de possíveis alterações não motoras relacionas à administração

    de LPS, foram avaliadas as funções cognitiva e olfatória dos animais, através dos testes

    de reconhecimento de objetos e teste de esquiva inibitória do tipo step down, e

    discriminação olfatória (Figura 10). No teste de reconhecimento de objetos, ambos os

    grupos passaram uma porcentagem maior de tempo explorando o objeto novo utilizado

    na sessão de teste, comportamento esperado para animais sem prejuízo de memória

    nesta tarefa (Figura 10A). No teste da esquiva inibitória, também não houve diferença

    significativa entre os grupos quando comparados os valores de latência para descer da

    plataforma (Figura 10B). No teste de discriminação olfatória, ambos os grupos

    demonstraram preferência pelo compartimento com odor familiar, o que indica que os

    animais não apresentam déficit olfatório (Figura 10C).

    Figura 10 - Efeito da administração intranasal de LPS (10 μg /3x semana) por 30 dias sobre alterações não motoras em animais de 4 meses de idade. (A) Porcentagem do tempo de exploração do objeto familiar (Fam.) e do objeto novo (Novo) na sessão de teste de reconhecimento de objetos. (B) Tempo que os animais levam para descer da plataforma (latência) na sessão de teste de esquiva inibitória. (C) Porcentagem do tempo de exploração dos compartimentos contendo maravalha nova e com cheiro familiar (Fam.) no teste de discriminação olfatória. Os animais controle receberam veículo intranasal (salina). Os valores representam a média ± EPM (A,C) ou mediana ± IIQ (B). *p < 0,05 e **p < 0,01 comparado à porcentagem do tempo de exploração do objeto familiar, no caso do teste de reconhecimento de objetos ou comparado à porcentagem do tempo de exploração do compartimento recoberto de maravalha nova, no teste de discriminação olfatória. LPS: Lipopolissacarídeo. Fam.: Familiar. (A,C) teste t de Student de amostra única comparando a média do percentual de tempo de exploração com um valor fixo de 50%. (B) Teste de Mann-Whitney.

  • 38

    4.2. AVALIAÇÃO DE ALTERAÇÕES MOTORAS INDUZIDAS PELA ADMINISTRAÇÃO

    INTRANASAL DE LPS POR 60 DIAS EM ANIMAIS DE 4 MESES DE IDADE

    Após a realização dos testes descritos acima, os animais permaneceram em

    tratamento com LPS por mais 30 dias e, após este prazo, os testes para funções motoras

    foram repetidos com a intenção de verificar se o aumento do tempo de exposição ao LPS

    poderia manter ou agravar os prejuízos já relatados ou, ainda, provocar novas alterações

    (Figura 11).

    Os dados da Figura 11 demonstram que a continuidade do tratamento dos animais

    com LPS alterou o perfil inicialmente observado no campo aberto. Os animais tratados

    com LPS não apresentaram diferença significativa da distância percorrida no aparato em

    relação ao grupo controle (Figura 11A, painel da esquerda). Entretanto, esses animais

    passaram menos tempo no centro do aparato, indicando que desenvolveram um

    comportamento do tipo-ansioso (Figura 11A, painel da direita).

    Da mesma forma, os resultados do teste de remoção de adesivo (Figura 11B) e o

    pole teste (Figura 11C) indicam que a continuidade do tratamento com LPS intranasal nos

    animais não levou ao desenvolvimento de prejuízo motor nestas tarefas, uma vez que não

    foram observadas diferenças significativas nos resultados dos grupos que receberam

    salina ou LPS intranasal. Contudo, há de se ressaltar que no teste de remoção do adesivo

    40% dos animais que receberam LPS intranasal não foram capazes de remover o adesivo

    durante os 60 segundos da sessão teste. Este comportamento não foi observado em

    nenhum dos animais controle que receberam salina intranasal. Os animais que não foram

    capazes de executar a tarefa no teste de remoção do adesivo foram desconsiderados em

    ambos parâmetros analisados (tempo de contato e tempo de remoção).

  • 39

    Figura 11 - Efeito da administração intranasal de LPS (10 μg/3x semana) por 60 dias sobre o desempenho motor de animais de 4 meses de idade. (A) Distância percorrida e tempo gasto no centro da arena pelos animais no aparato de campo aberto. (B) Tempos de contato e remoção no teste do adesivo. (C) Tempo de virada e descida da haste no pole teste. LPS: Lipopolissacarídeo. Os valores representam a média ± EPM. *P < 0,05 comparado ao grupo controle (salina), Teste t de Student. 4.3. AVALIAÇÃO DE ALTERAÇÕES MOTORAS E NÃO MOTORAS EM ANIMAIS DE

    12 MESES DE IDADE TRATADOS COM LPS POR VIA INTRANASAL POR 30 DIAS

    Com o objetivo de avaliar o impacto do envelhecimento sobre as alterações

    induzidas pelo LPS, animais de 12 meses de idade foram submetidos aos testes

    comportamentais após 30 dias de tratamento com LPS ou salina por via intranasal (10

    μg/3x semana). No teste de campo aberto, não se observou diferença entre os grupos

    nos parâmetros de distância percorrida e tempo de permanência no centro do aparato,

    como demonstrado pelos dados da Figura 12A. De maneira semelhante, não houve

    diferença significativa entre os grupos tratados com LPS ou veículo (salina) no tocante

    aos tempos de contato e remoção no teste de remoção do adesivo (Figura 12B). Por fim,

    a administração de LPS não foi capaz de alterar o desempenho dos animais no pole test,

    quando comparado ao grupo controle (Figura 12C).

  • 40

    Figura 12 - Efeito da administração intranasal de LPS (10 μg/3x semana) por 30 dias sobre o desempenho motor de animais de 12 meses de idade. (A) Distância percorrida e tempo gasto no centro da arena pelos animais no aparato de campo aberto durante a sessão de teste. (B) Tempos de contato e remoção no teste do adesivo. (C) tempo de virada e descida da haste no pole teste. LPS: Lipopolissacarídeo. Os valores representam a média ± EPM. (A-C) Teste t de Student.

    Esses animais de 12 meses de idade foram, a seguir, avaliados quanto à indução

    de alterações cognitivas e olfatórias induzidas pela administração intranasal de LPS. Os

    dados da Figura 13A demonstram que animais controle de 12 meses de idade não foram

    capazes de distinguir o objeto familiar do objeto novo no teste de reconhecimento de

    objetos, sugerindo que estes animais apresentam déficit cognitivo, caracterizado pelo

    prejuízo de memória declarativa. De maneira contrária, os animais que receberam LPS

    por via intranasal demonstraram preferência pelo objeto novo. Já o teste da esquiva

    inibitória (step down inhibitory avoidance) demonstrou que os animais de 12 meses

    tratados com LPS demoraram menos tempo para descer da plataforma quando

    comparados aos animais do grupo controle, indicando que este grupo não conseguiu

    formar a memória aversiva ao choque elétrico recebido durante a sessão de treino (Figura

    13B). Tanto os animais controle de 12 meses quanto aqueles tratados com LPS

  • 41

    exploraram por tempo semelhante os dois compartimentos no teste de discriminação

    olfatória, indicando que os mesmos apresentam déficit olfatório (Figura 13C).

    Figura 13 - Efeito da administração intranasal de LPS (10 μg/3x semana) por 30 dias sobre o desempenho não motor de animais de 12 meses de idade. (A) Porcentagem do tempo de exploração de cada objeto no teste de reconhecimento de objeto durante a sessão de teste. (B) Tempo que os animais levam para descer da plataforma (latência) na sessão de teste de esquiva inibitória. (C) Porcentagem do tempo de exploração dos compartimentos recobertos por maravalha nova e com cheiro familiar. Os valores representam a média ± EPM (A,C) ou ou mediana ± IIQ (B). *P < 0,05 comparado ao respectivo grupo controle. LPS: Lipopolissacarídeo. (A,C) teste t de Student de amostra única comparando a média do percentual de tempo de exploração com um valor fixo de 50%. (B) Teste de Mann-Whitney. 4.4. COMPARAÇÃO DO DESEMPENHO DOS ANIMAIS DOS GRUPOS CONTROLE DE

    4 E 12 MESES DE IDADE NOS TESTES DE COMPORTAMENTO PARA AVALIAÇÃO

    DA ATIVIDADE MOTORA E NÃO MOTORA

    Com a finalidade de avaliar o impacto da idade no desempenho dos animais nos

    testes de comportamento, foram comparados os resultados dos grupos controle dos

    animais de 4 e 12 meses de idade. Os testes motores utilizados para comparação foram a

    distância percorrida no campo aberto (Figura 14A), teste do adesivo (Figura 14B) e o

    tempo de virada e descida no pole teste (Figura 14C). Não se observou diferença

    significativa entre os grupos de diferentes idades nos testes para avaliação motora.

  • 42

    Figura 14: Impacto da idade no desempenho de testes comportamentais para avaliação motora. (A, B) Animais de 4 e 12 meses de idade receberam salina (3 x semana, i.n.) por 30 dias. (A) Distância percorrida no campo aberto. (B) tempo de virada e descida da haste no pole teste. Os valores representam a média ± EPM. (A-B) Teste t de Student.

    Para avaliação do impacto da idade no desempenho dos animais em testes não

    motores, foram comparados os resultados dos animais controle de 4 e 12 meses de idade

    na tarefa de reconhecimento de objetos, discriminação olfatória e no teste da esquiva

    inibitória (step down) (Figura 15). Os animais mais velhos (12 meses) tendem a passar

    significativamente menos tempo explorando os objetos do que os animais de 4 meses de

    idade (Figura 15A painel da esquerda). Ademais, os animais de 12 meses também

    passam menos tempo explorando o objeto novo (média inferior a 50% do tempo total de

    exploração), enquanto os animais jovens (4 meses) demonstram aprender a tarefa e

    passar a maior parte do tempo explorando o objeto não familiar (Figura 15A painel da

    direita). Não se observou diferença significativa entre os grupos de 4 e 12 meses no que

    se refere ao tempo de latência para a descida da plataforma no teste de esquiva inibitória,

    uma variável que indica se houve ou não a formação de uma memória aversiva ao

    choque elétrico recebido na sessão de treino (Figura 15B). No tocante à capacidade de

    distinguir odores, observou-se que os animais mais jovens apresentam preferência por

    permanecer no compartimento contendo maravalha com cheiro familiar. Em contrapartida

    os animais mais idosos parecem não serem capazes de distinguir os odores dos dois

    compartimentos e não demonstram preferência pela maravalha impregnada pelo seu

    próprio odor, apresentando percentual de tempo de exploração da maravalha usada

    significativamente inferior ao grupo mais jovem (Figura 15C).

  • 43

    Figura 15: Impacto da idade no desempenho de testes comportamentais para avaliação não motora. (A-C) Animais de 4 e 12 meses de idade receberam salina (3 x semana, i.n.). (A) Tempo total de exploração dos objetos e porcentagem do tempo de exploração do objeto novo no teste de reconhecimento de objetos. (B) Tempo de latência para descida da plataforma no step down. (C) Porcentagem do tempo de permanência no compartimento recoberto por maravalha com odor familiar no teste de discriminação olfatória. Os valores representam a média ± EPM. *P < 0,05 comparado ao grupo 4 meses. Teste t de Student.

    4.5 AVALIAÇÕES DE ALTERAÇÕES MOTORAS E NÃO MOTORAS EM ANIMAIS DE 8

    MESES DE IDADE TRATADOS COM LPS INTRANASAL POR 4 E 20 SEMANAS

    Em outro grupo de experimentos, animais de 8 meses de idade foram submetidos

    a um protocolo de tratamento mais longo, no qual receberam LPS por via intranasal (10

    μg/3x semana) ou salina por 20 semanas. Após as primeiras 4 semanas foram realizados

    experimentos comportamentais e, posteriormente, o tratamento foi continuado até a 20ª

    semana. Ao final das 20 semanas, os animais foram submetidos novamente aos testes de

    comportamento para avaliação do desempenho motor e não motor (Figura 16).

    Após as primeiras 4 semanas de administração de LPS ou salina, não foi possível

    observar diferença significativa entre os grupos no tempo de virada no pole teste (Figura

  • 44

    16A, painel da esquerda), contudo os animais que receberam LPS intranasal demoraram

    um tempo significativamente maior para descer da haste em comparação aos animais

    controle (Figura 16A, painel da direita).

    Além de alterações motoras, a administração de LPS em animais de 8 meses

    tratados por 4 semanas resultou ainda em alterações não motoras características da

    doença de Parkinson (Figura 16B). O teste de discriminação olfatória demonstrou que os

    animais controle apresentaram preferência pelo compartimento coberto por maravalha

    com cheiro familiar, comportamento esperado de roedores com função olfatória

    preservada. De maneira interessante, os animais que receberam LPS por via intranasal

    não foram capazes de distinguir o odor de cada compartimento e permaneceram por

    tempos similares em cada um deles (Figura 16B).

    Os dados da Figura 16C indicam que quando o protocolo de administração de LPS

    intranasal foi estendido por 20 semanas, foi possível observar um aumento significativo

    do tempo de remoção do adesivo nos animais de 8 meses que receberam LPS intranasal,

    em comparação ao grupo controle tratado com solução salina, indicando que esses

    animais apresentam uma capacidade menor de iniciar movimento e um déficit de

    coordenação motora fina.

    Figura 16 - Avaliação comportamental dos efeitos do tratamento com LPS ou salina em animais de 8 meses de idade. Tratamento por 4 semanas: (A) Tempo de virada e descida da haste no pole teste. (B) Tempo de permanência no compartimento contendo maravalha nova ou usada (com cheiro familiar) no

  • 45

    decorrer do teste de discriminação olfatória. Tratamento por 20 semanas: (C) Tempo decorrido para remoção do adesivo fixado na região do focinho do animal. Os valores representam a média ± E.P.M. *P < 0,05; ***P = 0,0001 comparado ao respectivo grupo controle. LPS: Lipopolissacarídeo. Em (A) e (C) teste t de Student. Em (B) teste t de Student de amostra única comparando a média de exploração de cada compartimento com um valor fixo de 50%. 4.6. AVALIAÇÃO DOS EFEITOS DA ADMINISTRAÇÃO DE METFORMINA E ÁCIDO

    TIÓCTICO NAS ALTERAÇÕES COMPORTAMENTAIS INDUZIDAS PELA

    ADMINISTRAÇÃO DE LPS INTRANASAL

    Em alguns experimentos, para avaliar o potencial terapêutico de moléculas cujo

    alvo são alterações bioquímicas que contribuem para a progressão da DP, utilizamos a

    metformina e o ácido tióctico, que têm ações anti-inflamatória e antioxidante descritas na

    literatura, respectivamente. Com a finalidade de avaliar uma possível reversão dos

    prejuízos motores decorrentes da administração intranasal de LPS, foi administrada

    metformina ou ácido tióctico conforme metodologia apresentada e avaliado o

    desempenho dos animais tratados nos testes de comportamento cuja administração de

    LPS intranasal induziu algum prejuízo motor. Um grupo de animais de 4 meses de idade

    recebeu metformina de forma concomitante ao LPS. Os resultados da Figura 17A

    indicam que a administração de metformina não foi capaz de influenciar a distância

    percorrida pelos animais tratados com LPS no teste de campo aberto, quando

    comparados aos animais que receberam veículo. De forma semelhante, não foram

    observadas alterações no tempo de remoção do adesivo no grupo tratado com

    metformina (Figura 17B), demonstrando que a metformina não foi capaz de reverter os

    prejuízos motores induzidos pelo LPS.

    Em outro experimento, quando animais de 8 meses de idade foram tratados com

    LPS durante 5 meses e receberam ácido tióctico (100 mg/kg/dia) a partir do quarto mês

    após o início da administração de LPS, foi verificada uma redução significativa do tempo

    de remoção do adesivo, quando comparados ao grupo que recebeu veículo (Figura 17C).

  • 46

    Figura 17 - Efeito da administração da metformina ou ácido tióctico sobre as alterações motoras induzidas pela administração intranasal de LPS em camundongos. (A,B) Animais de 4 meses de idade receberam veiculo intranasal, LPS (10 μg/3 x semana, i.n.) ou LPS + metformina (300 mg/Kg/dia, v.o.) ou veículo por 30 dias. (A) Distância percorrida no aparato de campo aberto em 5 minutos de teste. (B) Tempo decorrido para remoção do adesivo fixado no focinho do animal. (C) Tempo de remoção do adesivo fixado no focinho de animais de 8 meses de idade que receberam LPS (10 μg/3 x semana, i.n.) ou veículo por 5 meses, e ácido tióctico (100 mg/Kg/dia, v.o.) ou veículo de forma concomitante a partir do 4o mês de tratamento com LPS. LPS: Lipopolissacarídeo. LPS+Met: Lipopolissacarídeo+Metformina. LPS+Thioc: Lipopolissacarídeo+Thioctacid® (ácido tióctico). Os valores representam a média ± EPM. *P < 0,05; **P < 0,01 comparado ao respectivo grupo controle. ANOVA seguida de teste de Tukey. 4.7. AVALIAÇÃO DOS EFEITOS DA ADMINISTRAÇÃO DE METFORMINA E LPS EM

    PARÂMETROS METABÓLICOS

    Com a finalidade de monitorar possíveis distúrbios metabólicos decorrentes da

    administração de metformina ou LPS, os quais pudessem comprometer a interpretação

    dos resultados obtidos nos testes comportamentais realizados anteriormente, o peso dos

    animais foi monitorado durante todo o experimento. Com mesma finalidade, a glicemia

    dos animais foi aferida ao fim dos tratamentos. Não foram observadas variações

    significativas no peso dos animais (Figuras 18) nem nos níveis de glicose sanguínea

    (Figura 19) que pudessem comprometer o desempenho dos animais nos testes de

    comportamento ou que indicassem dano metabólico grave causado pela administração de

    metformina tanto nos animais adultos jovens quanto em animais mais velhos.

  • 47

    Figura 18: Efeito da administração de metformina sobre o peso dos animais tratados com LPS. (A) Variação do peso dos animais de 4 meses de idade, tratados com metformina (300 mg/Kg/dia, v.o.) e LPS (10 μg/3 x semana, i.n.) por 60 dias. (B) Variação do peso dos animais de 12 meses de idade, tratados com metformina (300 mg/Kg/dia, v.o.) e LPS (10 μg/3 x semana, i.n.) por 30 dias. A variação de peso foi representada pela diferença entre o peso ao longo do tempo e o peso basal. ANOVA de duas vias seguida de teste de Bonferroni.

    Figura 19: Efeito da administração de metformina sobre a glicemia em animais tratados com LPS. Dosagem de glicose no sangue de animais de 4 (A) ou 12 meses (B) de idade, tratados com metf