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REPENSANDO O MEDIEVO: PROBLEMATIZANDO O CONCEITO DE IDADE MÉDIA NA EDUCAÇÃO BÁSICA Andrielly Karolina Duarte Braz 1 [email protected] Graduanda em História/UFRN João Fernando Barreto de Brito 1 [email protected] Graduando em História/UFRN Orientadora: Fátima Martins Lopes 2 RESUMO: O período medieval, tão distante cronologicamente e espacialmente, parece não fazer muito sentido para os alunos da educação básica, ainda mais quando ensinado de forma descontextualizada de sua realidade. Pensando nisso é que o subprojeto de História- PIBID-CAPES desenvolveu a ação que consistiu em estimular os alunos a perceberem como o medievo está presente mesmo nos dias atuais, como também nos seus espaços de convívio. Tal preocupação surgiu no momento em que, analisando a maneira como a Idade Média pejorativamente chamada de “Idade das trevas”- é retratada nos livros didáticos e na própria sala de aula, percebemos a necessidade de mostrá-la sob outra perspectiva, que não privilegiasse e/ou estimulasse a construção e legitimação de uma visão pautada sempre nos mesmos pontos: “atraso cultural”, peste, guerra, fome. Assim, nossa ação buscou repensar o estudo da Idade Média fazendo os alunos pensarem criticamente sobre como determinada visão foi construída, mas principalmente desconstruí-la a partir das contribuições daquela sociedade, sendo estas reapropriadas a partir de cada realidade, mas tendo sua origem ou disseminação legadas ao medievo. Palavras-chave: Sala de aula; Idade Média; PIBID. Por acreditar que o professor é um mediador do conhecimento, e não o único a detê-lo, e que ele deva atuar como agente dinamizador no desenvolvimento das habilidades e competências dos discentes, utilizando estratégias didáticas que favoreçam o processo de ensino-aprendizagem de todos estes ou do maior número possível deles, é que devemos pensar ações capazes de promover a participação do estudante. A construção deste conhecimento deve ser dialogada entre professor e aluno, de maneira que os dois se tornem sujeitos do processo de ensino- aprendizagem. Para isso, é preciso que saibamos que “ensinar não é transferir 1 Bolsistas do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência - PIBID/CAPES. 2 Coordenadora do subprojeto de História do PIBID/CAPES UFRN.

Repensando o Medievo Problematizando o Conceito de Idade Media Na Educacao Basica

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Repensando o Medievo Problematizando o Conceito de Idade Media Na Educação

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  • REPENSANDO O MEDIEVO: PROBLEMATIZANDO O CONCEITO DE IDADE MDIA NA EDUCAO BSICA

    Andrielly Karolina Duarte Braz 1 [email protected] Graduanda em Histria/UFRN

    Joo Fernando Barreto de Brito1

    [email protected] Graduando em Histria/UFRN

    Orientadora: Ftima Martins Lopes2

    RESUMO: O perodo medieval, to distante cronologicamente e espacialmente, parece no fazer

    muito sentido para os alunos da educao bsica, ainda mais quando ensinado de forma

    descontextualizada de sua realidade. Pensando nisso que o subprojeto de Histria- PIBID-CAPES

    desenvolveu a ao que consistiu em estimular os alunos a perceberem como o medievo est

    presente mesmo nos dias atuais, como tambm nos seus espaos de convvio. Tal preocupao

    surgiu no momento em que, analisando a maneira como a Idade Mdia pejorativamente chamada

    de Idade das trevas- retratada nos livros didticos e na prpria sala de aula, percebemos a

    necessidade de mostr-la sob outra perspectiva, que no privilegiasse e/ou estimulasse a construo

    e legitimao de uma viso pautada sempre nos mesmos pontos: atraso cultural, peste, guerra,

    fome. Assim, nossa ao buscou repensar o estudo da Idade Mdia fazendo os alunos pensarem

    criticamente sobre como determinada viso foi construda, mas principalmente desconstru-la a partir

    das contribuies daquela sociedade, sendo estas reapropriadas a partir de cada realidade, mas

    tendo sua origem ou disseminao legadas ao medievo.

    Palavras-chave: Sala de aula; Idade Mdia; PIBID.

    Por acreditar que o professor um mediador do conhecimento, e no o nico

    a det-lo, e que ele deva atuar como agente dinamizador no desenvolvimento das

    habilidades e competncias dos discentes, utilizando estratgias didticas que

    favoream o processo de ensino-aprendizagem de todos estes ou do maior nmero

    possvel deles, que devemos pensar aes capazes de promover a participao

    do estudante. A construo deste conhecimento deve ser dialogada entre professor

    e aluno, de maneira que os dois se tornem sujeitos do processo de ensino-

    aprendizagem. Para isso, preciso que saibamos que ensinar no transferir

    1 Bolsistas do Programa Institucional de Bolsa de Iniciao Docncia - PIBID/CAPES.

    2 Coordenadora do subprojeto de Histria do PIBID/CAPES UFRN.

  • conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua produo ou a sua

    construo. (FREIRE, 1996, P.12).

    Mesmo sendo a teoria da pedagogia libertadora3 h muito discutida, v-se

    que alguns docentes acabam negligenciando a prtica de desenvolver estratgias

    didticas necessrias para que o aluno consiga desenvolver competncias vitais ao

    pensamento autnomo. O tradicionalismo empregado por certos professores faz

    com que o estudante se torne um grande depsito de contedos, mas no o faz

    capaz de problematiz-los. Para a disciplina de Histria, o acmulo de contedos

    no significa que o processo de ensino-aprendizagem foi bem sucedido, mas

    contribui para a naturalizao dos eventos histricos, fixando-os de maneira

    irrefutvel.

    Partindo desse pressuposto de que a Histria uma cincia que deve ser

    investigada, interpretada e, acima de tudo, problematizada, no podemos deixar de

    lado a sua rica multiplicidade de vises, e principalmente, a importncia da

    construo e desconstruo dos conceitos para o ensino da mesma. Diante desta

    tica que pensamos o conceito de Idade Mdia a partir da temtica da Reforma

    Protestante como uma chance de discutir/problematizar com os alunos da 1 Srie

    B do ensino mdio da Escola Estadual Professor Jos Fernandes Machado (Natal-

    RN), as mltiplas interpretaes da histria, de maneira a investigar os vrios

    olhares lanados sobre ela, e que no caso, diz respeito tambm ao olhar das

    diferentes vertentes religiosas e a prpria construo do conceito e periodizao em

    questo. Encontramos nessa forma de abordagem uma oportunidade de

    dimensionar para os estudantes como relevante questionar a construo das

    verdades histricas, ao tempo em que afirmamos que no existe uma nica

    verdade, mas verdades.

    Esta experincia s foi possvel atravs das intervenes e aes pensadas e

    realizadas pelo subprojeto de Histria do PIBID/ UFRN, que tem a referida escola

    como campo de atuao e pesquisa. Tal subprojeto financiado pela CAPES e tem

    como foco principal a formao de professores. Nossa atuao se d em grande

    medida intervindo durante as aulas programadas a partir do planejamento do

    professor supervisor da escola. Tais aulas so direcionadas por meio de temticas

    3 Pedagogia idealizada por Paulo Freire que cr numa educao crtica a favor da transformao

    social.

  • escolhidas por ns, as quais so desenvolvidas juntamente com os alunos por meio

    de estratgias diferenciadas.

    Escolhemos como temas para a primeira interveno tal experincia foi

    realizada em dois momentos distintos a multiplicidade histrica e a intolerncia

    religiosa a partir da abordagem do contedo (j realizada pelo professor supervisor)

    da Reforma Protestante. Sabendo que iramos tratar de um perodo histrico que

    naturalmente se mostra to distante temporalmente dos discentes, entendemos que

    o contedo poderia se tornar relevante se suscitssemos a problematizao de uma

    questo presente no cotidiano destes. Assim, em vez de tratarmos e reafirmarmos

    as causas e consequncias desse fato histrico, mostrando-o de maneira aleatria e

    isolada, tentamos faz-los perceber de que maneira a proliferao de igrejas e

    doutrinas religiosas protestantes, to comuns atualmente, tem relao com o

    assunto. E mais ainda, tivemos o interesse de demonstrar como a prpria Reforma,

    e essa proliferao, so movidas por diferentes vises e interpretaes sobre a

    histria, contribuindo assim para a percepo da Histria enquanto processo, pois,

    segundo Jos Rivair Macedo, o professor deve proporcionar um

    ncleo gerador da conscincia histrica a respeito da Idade Mdia, pois assim o ensino de Histria cumpriria melhor o seu papel de revelar aos estudantes aspectos de nosso passado que continuam a interagir com o presente.i

    Quando tivemos de intervir a partir do contedo da Reforma Protestante,

    atentamos e discutimos sobre o quanto os discentes estavam desestimulados ao

    estudar o perodo medieval, uma vez que a maioria da classe no sabia por certo

    para qu estava estudando aquilo, no viam relao em estudar algo que no lhes

    serviria, j que tudo lhes parecia velho. Este posicionamento da turma nos levou a

    crer que precisvamos adotar uma metodologia na qual os alunos pudessem pensar

    e perceber de que maneira elementos de tal perodo estavam ligados s suas vidas,

    ao cotidiano de cada um deles.

    O grande nmero de contedos nos livros didticos e a obrigao, muitas

    vezes imposta pelas escolas aos professores, de ter que trabalhar tais contedos

    durante os dias letivos, os quais oferecem uma carga horria inadequada para o

    cumprimento destes, acaba pautando o estudo de uma Histria meramente

    contedista, privilegiando relaes de causas e consequncias. Logo, o professor

  • no tem a misso de depositar todo contedo dessas gavetas nas cabeas dos

    discentes, mas fazer com que o educando possa refletir sobre estes contedos,

    sendo o educador o elemento que facilita e estimula o pensamento problematizador.

    Tal perspectiva transpe a ideia de que os alunos so meros coadjuvantes do

    processo de ensino aprendizagem, e possibilita ao professor pensar sua prtica

    docente de maneira que suas aes estimulem a capacidade de seus alunos

    organizarem, interpretarem e problematizarem o estudo da Histria. Nesse sentido

    Paulo Freire afirma que

    A narrao, de que o educador o sujeito, conduz os educandos memorizao mecnica do contedo narrado. Mais ainda, a narrao os transforma em vasilhas, em recipientes a serem enchidos pelo educador. Quanto mais v enchendo os recipientes com seus depsitos, tanto melhor educador ser. Quanto mais se deixem docilmente encher, tanto melhores educandos sero.ii

    Esta experincia teve dois momentos distintos. O primeiro, cujas razes j

    foram explicitadas acima, foi de grande proveito, j que pudemos discutir o assunto

    de uma maneira mais dinmica e relacionada ao dia a dia dos estudantes. Mas tal

    interveno serviu tambm como base para mapearmos algumas questes sobre o

    perodo medieval, como a forte caracterizao e estereotipizao da Idade Mdia

    como a idade das trevas. Verificamos ento, a necessidade de desconstruir tal

    conceito e assim, mais uma vez, fazer os educandos pensarem a Histria. Para esse

    segundo momento, decidimos romper com o contedo programtico de tal srie e

    fomos ao Iluminismo buscar as explicaes para tal nomeao. A forma como

    direcionamos cada uma das atividades, a fim de alcanar nossos objetivos, ser

    explicitada mais a frente.

    A ao pedaggica foi executada em um encontro de 4 horas/aula em que

    utilizamos como recursos didticos uma encenao teatral, alm de uma charge

    exposta atravs do uso do datashow, mas tambm recortes de cartolina.

    Tivemos como objetivo central da primeira ao o desenvolvimento da

    capacidade reflexiva do aluno no que diz respeito problematizao do pensamento

    histrico. Mas para isso, fez-se necessrio incentiv-los a pensarem a Reforma

    Protestante como manifestao de uma nova viso de mundo, alm de promover o

    dilogo com os mesmos a respeito das interpretaes que se disseminam atravs

  • da traduo/interpretao da Bblia. Com isso, pretendamos mostrar o quanto

    importante para a construo do conhecimento histrico levar em considerao os

    lugares de fala de cada sujeito, que se manifesta por meio da comunicao, seja ela

    por vias oficiais ou no, seja feita por um historiador, poltico, estudante ou de

    qualquer outro sujeito. Alm disso, tambm foi objetivo estimular os alunos a

    perceberem as verdades histricas como (re) construes.

    Para que pudssemos discutir com eles sobre a Reforma, escolhemos como

    questo norteadora as implicaes decorrentes da traduo da Bblia do latim para

    as lnguas vernculas, tornando-a acessvel s pessoas alfabetizadas, que no

    necessitavam obrigatoriamente fazer parte de alguma instituio ou da Igreja

    Catlica.

    Adotamos assim uma metodologia diferenciada, uma forma ldica de trazer

    os estudantes para um contexto e faz-los pensar sobre ele. A partir de uma

    encenao teatral, escolhemos representar as situaes que ocorriam num ritual

    catlico, ou seja, tentar numa aula explorar prticas em que se configuravam

    aspectos da Igreja catlica por volta do sculo XVI, como a reproduo das vestes

    de um padre, interpretado por um bolsista (Figura 1); a prpria organizao espacial,

    na qual o padre ficava de costas para os fiis; e o discurso supostamente proferido

    em latim, lngua oficial das celebraes catlicas, mas que na encenao no

    passou de sons sem significados que lembravam a sonorizao do latim. As frases

    em latim eram entrecortadas com pausas para a palavra Amm, nico termo

    conhecido pelos espectadores, em razo da permanncia deste nas oraes

    religiosas atuais.

    F

    Figura 1: Bolsista encenando

    Figura 1bolsista encenando

    Figura 2: bolsista encenando

  • Em seguida, colhemos comentrios dos alunos a respeito da estranheza daquela

    celebrao, na qual os fiis no entendiam o que ouviam e ainda respondiam ao

    orador nos momentos em que eram incentivados, como nas ocasies do Amm,

    questionando tambm o motivo do padre ficar de costas para os fiis.

    Assim, a situao se tornou propcia para discutirmos com os mesmos sobre

    o que havia acontecido, e foi quando chegamos concluso, a partir das suas falas,

    que mesmo sem entender o que o orador dizia aqueles fiis acreditavam naquilo que

    era proferido pelo lder religioso. Explicamos, ento, que aps a traduo da Bblia, a

    interpretao do Livro Sagrado no dependia exclusivamente do religioso, o que

    facilitava as interpretaes autnomas dos indivduos, possibilitando um contato

    direto com a prpria religio e seu Deus.

    Posteriormente, requisitamos aos alunos a realizao de uma atividade por

    meio da interpretao de uma charge (Figura 2) que retratava Martinho Lutero, um

    dos principais precursores da Reforma Protestante, numa situao de conflito

    causada pela manifestao de pessoas de diferentes orientaes religiosas em que

    cada uma delas reclama autenticidade para viso em que creem. Nesta atividade os

    alunos teriam que produzir um texto voltado para a interpretao da charge

    atentando para elementos como a intolerncia e o respeito, tendo como objetivo o

    reconhecimento da existncia das mltiplas verdades histricas, as quais so

    construdas e reconstrudas conforme as inquietaes e interesses dos homens no

    presente, pois conforme as ideias do historiador Marc Bloch (2002), os homens se

    voltam para o passado partindo de suas preocupaes presentes, e dessa forma, as

    verdades histricas so fruto de preocupaes inerentes condio humana.

    Figura 2: Lutero e a Reforma Religiosa. Disponvel

    em:http://giulianofilosofo.blogspot.com.br/2010/06/lut

    ero-e-reforma-religiosa.html. Acessada em:

    16/04/2012

  • Como resultado desta experincia verificamos a necessidade de aprofundar o

    conceito de Idade Mdia com estes alunos, de maneira a ser pensado

    conjuntamente a outro conceito, o de Iluminismo. Logo, adotamos como estratgia

    didtica uma atividade que os fizesse interagir tanto com eles prprios quanto com

    ns professores, pois a turma apresentava grande dificuldade de participar durante

    as aulas e no respondiam bem aula expositiva. Assim, conduzimos a aula de uma

    forma que os discentes pudessem expor seus conhecimentos prvios de maneira

    autnoma, criando possibilidades de debate e reflexo sobre o assunto em sala de

    aula.

    Esta segunda interveno teve como objetivo principal estimular os alunos a

    percepo de elementos que podem influenciar na construo da Histria, na

    caracterizao (e s vezes nomeao de determinados eventos) e diviso de

    perodos. Para isso foi utilizada uma dinmica que consistiu em estimular a

    participao dos alunos em sala de aula, instigando os mesmos a quebrarem

    esteretipos relacionados Idade Mdia ao tempo que traavam caractersticas

    deste perodo relacionando certas vezes contrapondo - com elementos do

    Iluminismo. O objetivo desta dinmica no foi fazer com que os alunos

    conseguissem colar todos os elementos fichas - em seu devido lugar, mas que

    pudessem se justificar pela escolha feita de modo a estimular a argumentao e

    reflexo acerca do Medievo e do Iluminismo, construindo, consequentemente, aps

    a participao junto aos outros alunos e professores, o seu conhecimento.

    Alm desse objetivo central, tivemos como objetivos especficos possibilitar

    aos alunos o entendimento acerca da construo dos conceitos Iluminismo e Idade

    Mdia, como sendo motivados por problemas inerentes aos homens do movimento

    Iluminista; proporcionar a reflexo sobre a existncia de produo intelectual e

    cultural da Idade Mdia, como forma de quebrar esteretipos construdos pelos

    iluministas, e que ainda mantido em certos livros didticos; e incentivar a

    participao dos alunos em atividades em sala de aula, haja vista a dificuldade de

    envolvimento de alguns destes quanto participao nas atividades realizadas

    dentro ou fora da citada sala.

    Na segunda interveno tomamos como processo avaliativo a participao

    dos alunos, os quais deveriam participar da dinmica em sala de aula, de modo que

    cada um escolhesse as fichas que eles acreditassem que corresponderiam Idade

    Mdia ou ao Iluminismo. Estes dois itens foram divididos por espaos no quadro

  • negro, no qual os alunos tiveram que escolher o lado que iriam colar as fichas

    correspondentes a um ou outro conceito, explicando o motivo que os levaram a

    entender tais elementos como correspondentes ao conceito escolhido. Escolhemos

    como elementos para colocar nas fichas variadas manifestaes e acontecimentos

    de cada perodo. Para a Idade Mdia elencamos caractersticas como a existncia

    das universidades, monges copistas, escolstica, monoplio da produo cultural,

    Igreja catlica, teocentrismo, as artes liberais, Santo Agostinho, entre outros. Para o

    Iluminismo escolhemos trabalhar com elementos como o antropocentrismo,

    empirismo, liberalismo econmico, racionalidade, humanismo. Colocamos ainda

    fichas com elementos que reafirmavam o esteretipo de cada perodo, como a luz e

    a escurido. A inteno disso foi justamente a de criar possibilidades para trabalhar

    a construo de cada termo.

    Sendo assim, num primeiro momento explicamos como iria funcionar a

    dinmica dentro de sala, dividindo o quadro negro em dois espaos destinados aos

    conceitos de Idade Mdia e Iluminismo, nos quais os estudantes tiveram de afixar

    fichas contendo elementos comuns a cada um destes conceitos. Depois de

    explicado o funcionamento da dinmica os discentes comearam a afixar as fichas,

    baseados em seus conhecimentos prvios sobre os assuntos. (Figuras 3 e 4.)

    Durante a dinmica percebemos que muitos dos elementos foram colocados

    no lado ao qual correspondiam. Porm, a ficha universidades foi colocada no lado

    que correspondia ao Iluminismo. A explicao do estudante para tal escolha foi a

    assimilao que este fazia por ter sido o Iluminismo um movimento de estmulo

    racionalidade e produo do conhecimento e, portanto, a universidade estaria ligada

    a esse contexto. O restante da turma concordou com os argumentos do colega e

    para no afetar o momento de interao nem prejudicar os outros alunos que

    pudessem se sentir envergonhados ou temerosos de errar no momento de se

    justificar pela escolha, deixamos para discutir e corrigir eventuais equvocos aps a

    participao de todos.

    Propositalmente, colocamos as fichas denominadas luz e escurido, pois

    sabamos que naturalmente os discentes iriam associar ao Iluminismo e Idade

    Mdia, respectivamente. A inteno foi a de utilizar tais assimilaes para mostrar

    como elas foram construdas e de certa forma relacionar com as outras fichas. Por

    exemplo, fichas correspondentes ao perodo medieval como os monges copistas,

    escolstica, Santo Agostinho, se configuraram como exemplos importantes da

  • produo intelectual e cultural desse perodo, e dessa forma foram essenciais no

    sentido de desmistificar a ideia do medievo como poca de atraso cultural e

    intelectual, criada pelo Iluminismo.

    O terceiro momento foi destinado para a correo do quadro, ou seja,

    reposicionar as fichas que se encontravam no quadrante que no era de seu

    destino. Cada mudana feita por ns professores foi devidamente explicada, bem

    como as fichas que tiveram destino correto. Logo aps, foi feita uma breve

    concluso e contextualizao acerca da construo do termo Idade Mdia oriundo

    dos pensamentos iluministas, os quais buscavam por meio da humanidade, cincia

    e racionalidade se contrapor aos dogmas da Igreja instituio religiosa naquele

    contexto, muito influente no mbito poltico, econmico e cultural.

    O momento da correo foi de suma importncia para consolidarmos o

    objetivo central da nossa interveno, pois a partir das desconstrues daquilo que

    chegava como verdade e algo naturalizado para eles, o conhecimento histrico foi

    sendo construdo. preciso entender tambm que ao ressaltarmos as produes

    intelectuais e culturais do medievo no estaramos negligenciando as do movimento

    iluminista. A ideia foi contrapor tais elementos no sentido de entender que cada

    poca tem sua forma de pensar e entender o mundo e que esto interligadas, e que

    na verdade tudo isso faz parte de algo maior, que o processo histrico. Assim,

    Figura 3: Estudante explicando o

    motivo da sua escolha.

  • finalizamos nossas aes na certeza de que contribumos de alguma forma para que

    nossa turma possa ver a Histria com um olhar mais reflexivo.

    Acreditamos que os resultados obtidos a partir desta atividade possibilitaram

    aos alunos no s a construo de um dado conhecimento, mas tambm

    incentivaram a reflexo destes quanto a produo de um saber problematizado e

    discutido, alm da participao destes, algo que no estava sendo satisfatrio nas

    aulas anteriores e que nesta oportunidade se mostrou essencial para o desenrolar

    da atividade. Partindo destas ideias, podemos refletir tambm sobre nossa prtica

    docente que deve sempre partir da realidade da turma, tanto das dificuldades como

    das qualidades e sab-las utilizar a favor dos professores em prol da aprendizagem

    conjunta aos alunos.

    Durante as aulas percebemos a participao dos alunos nas discusses,

    contribuindo com exemplos do seu dia a dia, citando muitas vezes a presena das

    vrias igrejas que encontravam do caminho de sua casa at a escola. Mas, o maior

    retorno veio quando os mesmos conseguiram desenvolver os textos unindo as

    discusses realizadas em sala com a anlise da charge. Ao analisar as produes

    textuais dos alunos, identificamos que os mesmos conseguiam refletir que as

    diferenas doutrinrias, nas quais muitos deles estavam inseridos, eram resultantes

    de mltiplas interpretaes, que por sua vez estavam condicionadas aos interesses

    Figura 4: Estudantes participando da interveno.

  • particulares de cada um deles. Essa percepo reafirmou nossas intenes quanto

    ao papel do professor como aquele que possibilita a construo do saber histrico

    de maneira reflexiva, segundo a considerao de Maria Auxiliadora Schmidt acerca

    da atuao do profissional de Histria que

    pode ensinar o aluno a adquirir as ferramentas de trabalho necessrias; o saber-fazer, o saber-fazer-bem, lanar os germes do saber histrico. Ele o responsvel por ensinar o aluno a captar e a valorizar a diversidade dos pontos de vista. Ao professor cabe ensinar o aluno a levantar problemas e a reintegr-los num conjunto mais vasto de outros problemas em problemticas.iii

    Assim, entendemos que os exerccios foram importantes no sentido de

    despertar nos alunos a conscincia de que eles podem ser sujeitos histricos ativos,

    capazes de dar interpretaes e sentidos para a realidade da qual fazem parte.

    Neste sentido, o aluno passa a valorizar as diferentes vises de mundo,

    problematizando-as.

    A segunda interveno, em especial, teve como resultado a melhoria da

    participao dos estudantes durante a aula. A forma como a atividade foi organizada

    nos deu a possibilidade de explorar os conhecimentos prvios e aprimor-los no

    decorrer da mesma. Estas experincias foram importantes tambm para a nossa

    prtica docente, de maneira que muitas vezes acabamos ficando presos a

    determinados recursos tecnolgicos e acreditamos estar inovando somente a partir

    da utilizao destes. Escolher outros recursos dinamizadores foi para ns um

    exerccio de criatividade e atingiu plenamente um dos objetivos do PIBID, que o de

    criar metodologias e materiais didticos diferenciados para o ensino de Histria.

    Alm disso, acreditamos que a experincia docente nos possibilita refletir no

    s sobre os resultados pedaggicos, sucessos e/ou insucessos quanto s

    estratgias didticas utilizadas, mas tambm acerca do compromisso tico que o

    profissional da educao deve carregar consigo. O esforo da reflexo a respeito

    das prticas sim uma demonstrao desse compromisso e que deve fazer parte do

    cotidiano do professor.

    Por fim, entendemos que nossas aes so ainda muito pequenas diante

    das naturalizaes e estereotipizaes da Histria feitas pela mdia e outro meios de

    comunicao aos quais os estudantes constantemente tm acesso. O perodo

    medieval, em especial, sofre com essas determinaes e caracterizado fortemente

  • por elementos que tendem a constru-lo de maneira equivocada. Dessa maneira,

    sabemos que a tarefa de cuidar para que nossos alunos no recebam essas

    informaes como verdade pronta deve partir da prpria sala de aula, e inclusive,

    utilizar tais veiculaes, sejam na forma de filmes, documentrios, reportagens, no

    sentido de refletir sobre estes, utilizando-os mesmo como recursos didticos. Dessa

    forma, acreditamos estar contribuindo no nosso campo de atuao para uma efetiva

    construo do conhecimento histrico e capacitao de cidados autnomos.

    i MACEDO, Jos Rivair. Repensando a Idade Mdia no Ensino de Histria. In:KARNAL, Leandro (org.) Histria na sala de aula: conceitos, prticas e propostas. So Paulo:Contexto, 2005, p.109-125.

    ii FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia - Saberes necessria prtica educativa. So Paulo: Paz e Terra, 1996.p 116. ___________. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2005

    iii SCHMIDT, Maria Auxiliadora, A formao do professor de histria e o cotidiano da sala de aula In:

    Circe Bittencourt. O saber histrico na sala de aula, 9 ed., So Paulo, Contexto, 2004, p. 54.