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RAZOES PRÁTICAS: SOBRE A TEORIA DA AÇÃOCAPÍTULO II: O NOVO CAPITAL(PIERRE BOURDIEU)
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RESENHA
RAZOES PRÁTICAS: SOBRE A TEORIA DA AÇÃO
CAPÍTULO II: O NOVO CAPITAL
(PIERRE BOURDIEU)
Neste capítulo, Bourdieu apresenta as contribuições das instituições escolares para a
reprodução da estrutura do espaço social através da reprodução da distribuição do capital
cultural que, combinado com o capital econômico, tende à perpetuação da estrutura social
balizado no que ele chama modo de reprodução. A relação entre as estratégias das famílias e a
lógica institucional escolar determina a reprodução da estrutura de distribuição do capital
cultural.
Bourdieu aponta que a base das estratégias de reprodução está no esforço das famílias
- como ser social - de preservar a si, bem como seus poderes e privilégios e o investimento na
educação escolar faz parte dessas estratégias. Esse tipo de investimento vincula-se assim à
importância dada ao seu capital cultural e de seu peso relativo definido em relação a seu
capital econômico. Quanto maior o capital cultural da família maior será o investimento
escolar e essa relação também vai variar com relação ao seu capital econômico.
Esse modelo, segundo Bourdieu, permite compreender o aumento do interesse das
famílias em educação bem como a correlação existente entre crianças de categorias sociais
privilegiadas e as mais altas instituições escolares. Como o próprio Bourdieu afirma, “permite
compreender não apenas como as sociedades avançadas se perpetuam, mas também como elas
mudam sob o efeito de contradições específicas do modo de reprodução escolar” (2008, p.36).
Como elemento de reprodução social, mantenedor da ordem preexistente, o sistema
escolar realiza uma operação de triagem ao usar uma linguagem mais acessível àqueles que,
por já se encontrarem dentro dessa lógica, possuem mecanismos capazes de decodifica-la, ao
passo que àqueles que não possuem tais mecanismos de decodificação esse tipo de linguagem
causa estranheza e um sentimento de não pertencimento. Destarte, a lógica do sistema escolar
age através de um sistema de seleção que separa os detentores de capital cultural herdado e os
despossuídos de tal capital.
Segundo Bourdieu, a instituição escolar contribui para reforçar a balizagem das
fronteiras sociais ao estatuir uma diferenciação social baseada na titularização escolar,
definindo, assim, uma relação de ordem nobiliárquica que legitima a separação entre os aptos
a dominar e os “comuns mortais por uma diferença de essência” (2008, p. 38). Como ele
próprio afirma,
Os exames ou concurso falsificam em razões de divisões que não necessariamente
tem a racionalidade por princípio, e os títulos que sancionam seus resultados
apresentam como garantia de competência técnica certificados de competência
social, nisso muito próximos dos títulos de nobreza. [...] o sucesso social depende
profundamente, daqui em diante, de um ato de nominação inicial [...] que consagra,
através da escola, uma diferença social preexistente (Idem).
Além da função manifesta, técnica, de formação e seleção dos tecnicamente mais
competentes, existe uma função social latente de consagração dos detentores estatutários de
competência social, uma “nobreza escolar hereditária de dirigentes de indústria, de grandes
médicos, de altos funcionários, e até de dirigentes políticos” (Ibidem, p.39). Segundo
Bourdieu, isso se dá pelo fato de que a instituição escolar, respaldada pela pretensa
meritocracia, age de forma a legitimar a cultura de elite ao toma-la como padrão para todos os
estudantes, instaurando assim o que ele chama de “verdadeira nobreza de Estado” ao
relacionar de forma encoberta a aptidão escolar à herança cultural. Uma nobreza que inventa o
Estado para legitimar-se como detentora do poder do Estado.
Para Bourdieu, contudo, os agentes sociais não são nem totalmente compelidos pela
estrutura social a agir de tal ou qual maneira como, tampouco, são totalmente autônomos,
racionalmente conscientes agindo com pleno conhecimento de causa. Para ele
Os sujeitos são [...] agentes que atuam e que sabem, dotados de um senso prático,
[...] de um sistema adquirido depreferências, de princípios de visão e divisão [...] e
de esquemas de ação que orientam a percepção da situação e a resposta adequada. O
habitus é essa espécie de senso prático do que se deve saber em determinada
situação (Ibidem, p. 42).
Ao analisar as influências do que ele chama de estrutura do capital, ou seja, o peso
relativo entre o capital econômico e do capital cultural no sistema de preferencias em
adolescentes, pode se observar como essa estrutura “encoraja-os a se orientar [...] em direção
[ao] polo intelectual ou o polo dos negócios, e a adotar as práticas e as opiniões
correspondentes” (Ibidem, p.43).
Bourdieu aponta ainda para uma possível relação entre a delinquência escolar e a
lógica da competição obrigatória, especialmente o que ele chama de efeito de destino que o
sistema escolar exerce sobre os adolescentes não raramente com grande brutalidade
psicológica. A inadequação ao universo escolar, que é como mostrado anteriormente, de
diferenciação e exclusão e que, para tanto, toma como critério a inteligência, “critério
coletivamente reconhecido e aprovado, portanto, psicologicamente indiscutível e indiscutido”
(Ibidem, p.46), seria o elemento motivador dessa nova delinquência, ou seja, das rupturas com
a ordem escolar e social ou ainda de crises psíquicas, a doença mental ou até o suicídio.