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101 Unidades de Conservação no Estado de Sergipe Laura Jane Gomes * Valdineide Santana ** Genésio Tâmara Ribeiro *** P ara que haja a proteção da biodiversidade, se faz necessário a criação de mecanismos de gestão, com o envolvimento de instâncias públicas e não governamentais, bem como o diá- logo entre as esferas de governo. Este artigo tem por objetivo contextualizar a importância da biodiversidade existente bem como analisar as diferentes categorias de unidade de conservação cria- das no estado de Sergipe. São quatro categorias de unidades de conservação criadas em Sergipe, nas diferentes esferas de governo. Porém, observa-se a necessidade de mecanismos mais efetivos de planejamento e gestão para que estas áreas sejam efetivamente con- solidadas e cumpram os propósitos para as quais foram criadas. PALAVRAS-CHAVE: Biodiversidade, Áreas protegidas, Desenvol- vimento Sustentável. * Professora Doutora do Departamento de Engenharia Agronômica da Universidade Federal de Sergipe. E-mail: [email protected] ** Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente/NESA/UFS-SE, analista ambiental do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis-IBAMA Sergipe. Valdineide Santana - [email protected] *** Professor Doutor do Departamento de Engenharia Agronômica da Universidade Federal de Sergipe. E-mail: [email protected] Resumo Revista da Fapese, v. 2, n. 1, p. 101-112, jan./jun. 2006

Resumo P - Fundação de Apoio à Pesquisa e Extensão de ... · neladas de frutos de aroeira para compradores do estado do Espírito Santo. Apesar de ser o menor estado do país,

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Unidades de Conservação no Estado de Sergipe

Laura Jane Gomes*

Valdineide Santana**

Genésio Tâmara Ribeiro***

Para que haja a proteção da biodiversidade, se faz necessário a

criação de mecanismos de gestão, com o envolvimento de

instâncias públicas e não governamentais, bem como o diá-

logo entre as esferas de governo. Este artigo tem por objetivo

contextualizar a importância da biodiversidade existente bem como

analisar as diferentes categorias de unidade de conservação cria-

das no estado de Sergipe. São quatro categorias de unidades de

conservação criadas em Sergipe, nas diferentes esferas de governo.

Porém, observa-se a necessidade de mecanismos mais efetivos de

planejamento e gestão para que estas áreas sejam efetivamente con-

solidadas e cumpram os propósitos para as quais foram criadas.

PALAVRAS-CHAVE: Biodiversidade, Áreas protegidas, Desenvol-

vimento Sustentável.

* Professora Doutora do Departamento de Engenharia Agronômica daUniversidade Federal de Sergipe. E-mail: [email protected]

** Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente/NESA/UFS-SE, analistaambiental do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos RecursosNaturais Renováveis-IBAMA Sergipe. Valdineide Santana [email protected]

*** Professor Doutor do Departamento de Engenharia Agronômica daUniversidade Federal de Sergipe. E-mail: [email protected]

Resum

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Laura Jane Gomes; Valdineide Santana; Genésio Tâmara Ribeiro

Introdução

No início do século XX, os ecossistemas naturaisdo Nordeste estavam em grande parte degrada-

dos, pois os remanescentes florestais já se encontra-vam na sua quase totalidade, constituídos por for-mações secundárias. Grande parte das florestas deSergipe e da Bahia é atualmente constituída de ca-poeiras em diferentes estádios sucessórios (Rêgo eHoeflich, 2001).

Um dos aspectos mais graves da retirada da co-bertura está diretamente relacionado à perda dabiodiversidade. O termo biodiversidade é atualmen-te aceito como um conceito científico amplo, queenvolve a diversidade de vida na terra. Esta diversi-dade é geralmente descrita em três níveis - diversi-dade de ecossistemas, diversidade de espécies nosecossistemas e diversidade de genes na espécie. Po-rém, biodiversidade além de um conceito científicoé um conceito político que abrange uma tríade deobjetivos globalmente envolvidos: a conservação daprópria biodiversidade, o uso sustentável de recur-sos biológicos e o compartilhamento social eqüitati-vo dos benefícios que surgem deste uso (Vorhies,1999).

Além do uso direto, deve-se considerar ainda osefeitos indiretos da manutenção da biodiversidade,como o seqüestro de carbono, produção de oxigênio,e, para o nordeste, o mais importante, a proteção dosrecursos hídricos.

Para que haja a proteção da biodiversidade, é ne-cessária a criação de mecanismos de gestão, com oenvolvimento de instâncias públicas e não governa-mentais, bem como o diálogo entre as esferas de go-verno.

O estado de Sergipe não possui uma política flo-restal apesar da grande demanda que a sociedadetem por espécies florestais, para os mais diversos fins:geração de energia, construção civil e uso cultural.Como consumidores pode-se destacar as olarias, pa-darias, casas de farinha, indústrias e as festas ema-

nadas pelas tradicionais fogueiras de “São João” e

“São Pedro”. Esta demanda é suprida por madeirade plantios, de pinos e eucalipto, procedentes de

outros estados ou dos remanescentes florestais das

localidades próximos aos estabelecimentos.

Além da lenha, verifica-se também por parte da

população o uso intenso das plantas nativas para finsmedicinal, cosmético e condimentar que são

comercializados nos mercados populares, como tam-

bém espécies que vem sendo comercializadas em

escala industrial. Exemplo é o extrativismo da aroeira

da praia (Schinus terebentifolius), na região do baixo

São Francisco. Em 2005, esta região forneceu 40 to-neladas de frutos de aroeira para compradores do

estado do Espírito Santo.

Apesar de ser o menor estado do país, com 21.994

km2, Sergipe possui seis bacias hidrográficas de sig-

nificativa importância para o desenvolvimento in-terno da agricultura e turismo: São Francisco,

Sergipe, Japaratuba, Vaza Barris, Piauí e Real.

Devido ao intenso processo de substituição

desordenada das áreas com vegetação nativa por ati-

vidades agropecuárias, cidades, estradas e indústri-as, as áreas de preservação permanente do estado

encontram-se quase que em sua totalidade

desprotegidas, o que compromete a manutenção das

nascentes e conseqüente disponibilidade de água.

Outro aspecto agravante é a ausência do tratamento

de efluentes industriais e domésticos, que são des-pejados diretamente nos cursos d’água comprome-

tendo a qualidade desse recurso.

Um dos mecanismos para a conservação da

biodiversidade é a criação de unidades de conserva-

ção. Entretanto, a consolidação destas áreas não ésimples, pois depende de inúmeros fatores nem sem-

pre favoráveis à sua implantação. Em comparação à

outras regiões brasileiras, observa-se que Sergipe é

um dos estados da federação com menor percentual

de áreas de proteção integral. Por diversas vezes de-

para-se com setores da sociedade que não compre-endem a importância da criação destas áreas e que

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desenvolvimento e conservação não são opostos e

podem ser conciliados por meio de ferramentas deplanejamento e gestão ambiental.

Este artigo se propõe a discutir a importância de

se criar Unidades de Conservação no estado de

Sergipe dentro das categorias de uso indireto ou sus-

tentável, segundo o Sistema Nacional de Unidadesde Conservação.

1. Unidades de Conservação no Brasil: da belezacênica à conservação da biodiversidade

A criação de Áreas Protegidas nos Estados Uni-

dos, como o Parque Nacional de Yellowstone (1872)

e Yosemite (1890), primeiros Parques Nacionais do

mundo, forneceram um modelo que foi reproduzido

por outros países, embora tendo sido adotado mui-

tas vezes com diferentes significados e em diferen-tes circunstâncias (Mccormick, 1992).

A primeira Unidade de Conservação no Brasil,

na forma de Parque Nacional, foi criada em 1937,

sendo coordenada e administrada pelo Serviço Flo-

restal Brasileiro, órgão criado em 1921 e regulamen-tado em 1925.

No Brasil, o conceito ortodoxo de Parque Nacional

foi criado pelo Instituto Brasileiro de Desenvolvimento

Florestal (1981): Parques Nacionais são áreas maiores

de 10 km2 com “características espetaculares ou úni-cas”, em terra ou no mar, sob controle do poder públi-

co. Eles devem conter “amostras representativas de

ecossistemas” e ser administráveis em um “estado na-

tural”. Toda atividade produtiva – ou “uso direto de re-

cursos” – é proibida nos seus limites, a cada Parque é

sujeito apenas o “uso indireto” de seus recursos. Os vi-sitantes usufruem lazer contemplativo, caminhadas,

piqueniques, acampamentos, escaladas; os pesquisado-

res científicos podem desenvolver projetos de investi-

gação, sob o controle da administração de cada Parque.

Com o passar do tempo, os critérios para seleçãode áreas a serem protegidas se sofisticaram, abando-

nando a ênfase inicial nas “paisagens espetaculares”.

As políticas de criação de Parques passaram a se guiarpor critérios “científicos”, tais como a representati-

vidade ecossistêmica, escassez relativa de paisagens,

proteção à flora, fauna e recursos hídricos, defesa da

biodiversidade e dos ciclos reprodutivos de espéci-

es vegetais e animais, e por critérios sociais como a

oferta de lazer, o desenvolvimento da pesquisa cien-tífica e a educação ambiental (Drummond, 1997). Tais

critérios científicos passaram a ser utilizados no Bra-

sil somente na década de 80 (Ferreira, 1999).

Os fatores que estabeleceram os propósitos de

criação das Unidades de Conservação apresentamuma história recente. O maior impulso foi dado na

década de 70, a partir das propostas de desenvolvi-

mento sustentável, conceito que surgiu em contra-

posição ao modelo de desenvolvimento econômico

vigente. A partir do Relatório Brundtland, passando

pela II Conferência Mundial das Nações Unidas parao Meio Ambiente (Rio92), até os dias de hoje, várias

ações têm contribuído para que a conservação da

natureza venha a ser um fato concreto.

Reconhecendo que a conservação requer alguns

enfoques mais flexíveis de gestão, muitos países co-meçaram a desenvolver meios para aumentar o le-

que dos Parques Nacionais estritamente protegidos

(McNeely, 1993). O próprio conceito de Parque pas-

sou a ser questionado com o passar do tempo e dei-

xou de ser visto como unidade auto-suficiente, para

ser tratado como parte integrante da dinâmica dapaisagem regional (Schonewald-Cox et al., 1992).

Uma cadeia de áreas protegidas deve ser vista

como um conjunto de esforços de uma nação, ou

sociedade, para manter a biodiversidade, asseguran-

do o bem das populações locais. Ela deve garantirinclusive a preservação de fontes de água, com a fi-

nalidade de manter o abastecimento de grandes ci-

dades (Phillips e Sheppard, 2000). Ao conservar a

biodiversidade as nações estarão garantindo a quali-

dade de vida das futuras gerações. Os diferentes

ecossistemas florestais contêm uma vasta quantida-de de recursos vivos, onde muitos foram transfor-

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mados, ou podem ser transformados em alimentos,

produtos medicinais e comerciais de importânciamundial (Stone et al, 1997).

O Brasil é um dos países mais ricos dentre aque-

les chamados de “países da megadiversidade”, e con-

ta com 10 a 20% do total das espécies do planeta.

Tem, a flora mais diversa, com 50 a 56 mil espéciesdescritas de plantas superiores, ou 20 a 22% do total

mundial, e a fauna dispõe de pelo menos 10% dos

anfíbios e mamíferos e 17% das aves do planeta. Tal-

vez nunca se conheça com absoluta precisão toda a

diversidade biológica brasileira, encontrável na área

continental e na plataforma marítima, tal sua exten-são e complexidade (Brasil, 1998).

As áreas protegidas transformaram-se em locais

essenciais para se garantir a conservação da

biodiversidade. Esse fato é até mesmo mencionado

no artigo 8 da Convenção da Diversidade Biológica(CDB), sendo apontado como um dos maiores desa-

fios dessa convenção, assinada na Rio 92 por 155

países, que passou a vigorar em todo território naci-

onal em fevereiro de 1994.

A falta de uma visão estratégica sobre a sua im-portância e a existência de um sistema econômico

mal adaptado são as principais causas que contribu-

em para a destruição da biodiversidade. Para Léveque

(1999) na maior parte dos países, os sistemas econô-

micos não levam em conta o meio ambiente e os re-

curso naturais. O valor econômico de muitos dos pro-dutos comestíveis, e mesmo a pesca, a caça e a cole-

ta de madeiras para lenha, madeira de lei e de plan-

tas medicinais é freqüentemente subestimado, pois

não aparece nas contas nacionais. Não há tampouco

uma política elaborada para uma utilização durável

dos recursos e, geralmente, privilegia-se o lucro acurto prazo, no contexto de uma economia de mer-

cado. Consequentemente, pode parecer economica-

mente mais interessante abater uma floresta que

conservá-la.

De qualquer forma a conservação da natureza e,portanto, da biodiversidade, não pode ser entendida

exclusivamente como a preservação de espécies e

áreas isoladas mediante listas de espécies e prote-ção de espaços. A conservação da biodiversidade

deve realizar-se também em zonas manejadas pelo

homem (Guillén e Jongman,1994), devendo-se levar

em conta que, a diversidade genética pode aumen-

tar ou reduzir através do sistema de gestão a que se

aplica (McNeely, 1993).

Diante da exposta ilustração da problemática, que

envolve a proteção da biodiversidade, vários questi-

onamentos e mecanismos têm sido criados a fim de

se estabelecer estratégias de conservação.

Apesar das áreas protegidas não se destacarem

diretamente em valores monetários, como exige o

sistema econômico vigente, ela possui uma série de

atributos e gera benefícios cujos valores podem ser

comparados ao que acontece com as escolas, corpo

policial e hospitais. Ao converter tais áreas em par-tes de planos de desenvolvimento regional é possí-

vel assegurar-se um equilíbrio adequado entre cus-

tos e benefícios de um determinado local (McNeely,

1993).

No Brasil, de acordo com o Sistema Nacional deUnidades de Conservação (SNUC, 2000), as áreas

protegidas dividem-se em dois grupos: Unidades de

Proteção Integral e Unidades de Uso Sustentável.

As Unidades de Proteção Integral tem por objeti-

vo básico preservar a natureza, sendo admitido ape-nas o uso indireto dos seus recursos naturais. Neste

grupo encontram-se: Estação Ecológica (ESEC), Re-

serva Biológica (REBIO), Parque Nacional (PARNA),

o Monumento Natural e o Refúgio de Vida Silvestre.

Já as Unidades de Uso Sustentável têm como objetivo

básico compatibilizar a conservação da natureza como uso sustentável de parcela dos seus recursos natu-

rais. Neste grupo incluem-se as seguintes categorias:

Área de Proteção Ambiental (APA), Área de Relevan-

te Interesse Ecológico (ARIE), Floresta Nacional

(FLONA), Reserva Extrativista (RESEX), Reserva de

fauna, Reserva de Desenvolvimento Sustentável eReserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN).

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Apesar de existir um número razoável de áreas

protegidas distribuídas em várias categorias de ma-nejo pelo Brasil, verifica-se sob o aspecto ecológico

que muitos ecossistemas ainda precisam ser preser-

vados, não somente pela diversidade biológica, mas

também pelas particularidades culturais das popu-

lações que neles vivem de forma sustentável, sendo

a Caatinga é um bom exemplo.

2. Unidades de Conservação no estado deSergipe

Apesar de ser o menor Estado em extensãoterritorial do Brasil, Sergipe apresenta peculiarida-

des ecossistêmicas que merecem destaque. Exemplo

é o estudo realizado pelo Ministério do Meio Ambi-

ente (Brasil, 2000; 2002; 2004), que fez um mapea-

mento estabelecendo áreas consideradas como de

prioridade para a conservação da biodiversidade noplaneta. Os estados de Sergipe e Alagoas aparecem

com grandes faixas, em vermelho e amarelo, que in-

dicam áreas extrema e alta prioridade para a conser-

vação da biodiversidade, repectivamente (Figura 1).

Os ecossistemas predominantes nestas regiões são,

mata atlântica e caatinga. A mata atlântica, foi intensa-mente explorada desde a colonização do país, e reduzi-

da, no estado de Sergipe a 0,1%. A caatinga tem sido

intensamente explorada, com substituição de espécies

vegetais nativas por cultivos e pastagens (Arruda, 2002).

Em Sergipe, as faixas com prioridade extremamen-te alta ocupam quase que toda a região dos tabuleiros

costeiros. Ao norte do estado, a faixa está em menor

proporção na foz do rio São Francisco, aumentando a

área no local onde ocupa grande parte da Reserva Bi-

ológica Santa Isabel, reforçando a importância desta

área que abriga o Projeto Tartarugas Marinhas(TAMAR). Ao sul de Aracaju, a faixa maior corres-

ponde ao Crasto, uma área particular, com ocorrência

de mata atlântica, sendo um dos poucos fragmentos

florestais de Sergipe em bom estado de conservação.

A faixa amarela, que indica área de alta priorida-de, está inserida a Serra de Itabaiana, onde na déca-

da de 90, passou a ser gerenciado pelo IBAMA, com

o objetivo de consolidar uma unidade de conserva-

ção de proteção integral na área.

Figura 1 - Áreas consideradas como de prioridade extremamente alta (vermelho) e alta prioridade(amarelo) para a conservação da biodiversidade nos estados de Alagoas e Sergipe.

Fonte: Brasil, 2002

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A Reserva Biológica Santa Isabel (REBIO) foi cri-

ada pelo Decreto n.º 96.999 de em novembro de 1988,com a finalidade de proteger espécies das tartarugas

marinhas, outrora abundantes, que procuram aque-

les sítios em intervalos regulares, na estação repro-

dutiva. A área total da Reserva é de 2.766 ha, sendo

45 km de praia limitados por duas barras dos rios

Japaratuba e Barra do Funil. As invasões, poluiçãodas praias e a perseguição às tartarugas são alguns

conflitos encontrados nessa área. Ainda que criado

desde 1988, não apresenta um Plano de Manejo e

possui apenas 04 funcionários do IBAMA. Apesar

dos conflitos, avanços já foram conquistados por

meio do Projeto TAMAR que desenvolve projetos deeducação ambiental com as comunidades do entor-

no. Segundo o Sistema Nacional de Unidades de

Conservação (SNUC, 2000), a Reserva Biológica tem

a finalidade de preservar a Biota, proíbe a presença

de pessoas residindo na área, proíbe o uso dos re-

cursos naturais e restringe as áreas para visitaçãopública.

A Estação Ecológica da Serra de Itabaiana foi

implantada em 1990, sob a administração do Insti-

tuto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos

Naturais Renováveis – IBAMA. Em decorrência des-sa intervenção, o acesso da população à Serra, que

até então acontecia sem qualquer tipo de óbice le-

gal, passou a ser proibido (Santana, 2002). Antes da

proibição, as pessoas usufruíam dos encantamentos

daquela área alimentando uma tradição que passa-

va de geração a geração. Desse modo, a Serra, maisdo que uma paisagem, sempre representou uma

motivação no imaginário da população, notadamente

dos moradores da cidade de Itabaiana e arredores,

permeando sua história e confundindo-se com ela.

É exatamente essa tradição que o governo federal

ignorou ao implantar naquela área uma Estação Eco-lógica, que, por definição, impede qualquer tipo de

visitação pública, especialmente aquela destinada ao

lazer (Santana, 2002).

Apesar de tornar-se um local proibido, esta ação

não foi suficiente para impedir a visitação à Serra,não restando outra alternativa ao IBAMA, que em

1980, reabriu a área para visitação pública. No ano

de 2003, a Serra de Itabaiana recebeu cerca de 7000visitantes procedentes de escolas de todo o Estado,

além de receber visitantes que não são cadastrados

(IBAMA, 2003).

Santana (2002), defendeu a categoria de Parque

Nacional para a área, o que veio a se consolidar emjulho de 2005, via Decreto Federal. O IBAMA local

tem estimulado a participação das populações locais

para a criação da Associação Amigos da Serra de

Itabaiana, com a finalidade de propiciar a participa-

ção e inclusão da sociedade no conselho consultivo

da área. Além da Serra de Itabaiana, a área delimita-da para o Parque Nacional abrange as Serras Com-

prida e Cajueiro, numa área total de 7.996,64 ha.

Outra área de destaque é o Horto Florestal do

Ibura, situado na sub-bacia do rio Cotinguiba que

compõe a bacia hidrográfica do rio Sergipe (Santos,2001). A vegetação é caracterizada por transição de

mata atlântica com formação associada de

manguezal, além de bosques de espécies exóticas

(Eucalyptus citriodora), foi outrora, importante cen-

tro de lazer, principalmente de Aracaju e cidades

circunvizinhas.

Deve ser ressaltada a importância desta área, en-

quanto manancial para captação d’água no abasteci-

mento da região metropolitana de Aracaju. O Ibura

gera mais de 25.000 m3/dia de água, atendendo a

demanda de parte dos municípios de Aracaju e Nos-sa Senhora do Socorro (Santos, 2001). Atualmente o

sistema Ibura é o segundo maior contribuinte para o

abastecimento de água da grande Aracaju, com apro-

ximadamente 15%, beneficiando cerca de 100 mil

pessoas. Deste modo, nota-se a importância do uso

indireto da biodiversidade, sobretudo quando con-siderada a proteção da cobertura vegetal para a ma-

nutenção dos mananciais.

O Horto do Ibura foi decretado como Floresta

Nacional em setembro de 2005. A sua ascensão a

unidade que favoreça o resgate e a valorização dosaspectos culturais, auxiliará na proteção e conserva-

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ção do patrimônio local que vem se deteriorando com

o passar dos anos. Outro aspecto importante refere-se aos usos que as populações do entorno fazem dessa

área. Em recente levantamento, realizado no povoa-

do Estiva, foi indicado que esta área possui uma for-

te interação dos moradores do entorno. Os entrevis-

tados afirmaram que utilizam a área para a obtenção

de água para abastecimento de residências, meio deacesso, coleta de lenha, frutos, sementes, galhos e

folhas para artesanato, retirada de madeira, cultivo

de roça, coleta de caranguejo, incluindo a caça, sen-

do esta atividade citada em menor proporção o que

reforça a necessidade da criação de uma unidade de

conservação de modo a garantir o uso sustentáveldos recursos pela população local (Silva et al, 2004).

Tais usos podem ter continuidade após a criação

da Floresta Nacional (FLONA), pois segundo o SNUC

(2000), esta categoria tem como objetivo básico o uso

múltiplo sustentável dos recursos florestais e a pes-quisa científica, com ênfase em métodos para explo-

ração sustentável das florestas nativas.

Além das unidades de conservação federais aci-

ma citadas, existem outras cinco unidades de con-

servação criadas pelo Governo Estadual, todas Áre-as de Proteção Ambiental (APA), a saber:

√ APA do Morro do Urubu: localizada no Mu-

nicípio de Aracaju, na área urbana, limita-se

ao Norte com o rio do Sal, ao Leste com o rio

Sergipe e, ao Sul e Oeste com as áreas urba-nas da zona Norte do município. Trata-se de

região onde originalmente predominava a

Mata Atlântica e seus ecossistemas associa-

dos, além de enclaves de Cerrado. Criada e re-

gulamentada pelos Decretos 13.713, de

14.07.93, e 15.505, de 13.07.95, a área vemsofrendo pressão urbana e se descaracterizan-

do cada vez mais. O complexo de vegetação

encontra-se hoje bastante comprometido, so-

bretudo pela invasão, construção e urbaniza-

ção das favelas na área. Possui o único Posto

Avançado do Estado – O Parque JoséRollemberg Leite, aprovado pela Reserva da

Biosfera da Mata Atlântica em outubro de

2.000. Com 68 ha de Mata Atlântica, é pro-posto para o Parque um projeto de revitalização

com recursos do Prodetur II.

√ APA da Foz do Rio Vaza-Barris – Ilha do Pa-

raíso: Criada pela Lei Estadual No 2795 de 30

de março de 1990, compreende área situadana foz do rio Vaza-Barris. A “Ilha do Paraíso”

atualmente não mais se constitui em ilha uma

vez que o depósito de sedimentos levaram a

juntar a ilha ao continente, formando vasta

planície de restinga onde predominam espé-

cies singulares de vegetação. A área vem so-frendo forte pressão antrópica.

√ APA do Litoral Sul: Transformada em Unida-

de de Conservação através do Decreto 13.468

de 22 de janeiro de 1993, define a estrutura de

ocupação da área compreendida entre a fozdo Rio Vaza Barris e a desembocadura do Rio

Real, com cerca de 55,5 km de costa e largura

variável de 10 a 12 km, do litoral para o interi-

or. Abrange os municípios de Itaporanga

d’Ajuda, Estância, Santa Luzia do Itanhy e

Indiaroba. Insere-se nesta APA as praias maishabitadas do Estado, destacando-se a Caueira,

Saco e Abais. Observa-se também as maiores

áreas de Restingas arbóreas, Manguezais e

manchas mais preservadas de Mata Atlântica.

Dispõe de Plano de Manejo.

√ APA do Litoral Norte: Foi criada em 2004. Ca-

racteriza-se por apresentar uma diversificação

de ambientes: Dunas, Restingas, Ilhas e Man-

guezais de extrema importância para a região.

Tendo em vista que é localizada em área de

pouco desenvolvimento e ocupação encontra-se em bom estado de preservação.

√ APA do Rio Sergipe: criada pela Lei Estadual

No 2.825, de julho de 1990, constitui-se como

“paisagem natural” em todo o trecho do rio

Sergipe que serve de divisa entre os municí-pios de Aracaju e Barra dos Coqueiros. Sofre

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pressão decorrente do desenvolvimento urba-

no. O Rio é ameaçado pelo lançamento de es-goto sanitário tanto de Aracaju quanto de Bar-

ra dos Coqueiros.

Segundo o Sistema Nacional de Unidades de Con-

servação (SNUC, 2000), a APA é uma área em geral

extensa, com um certo grau de ocupação humana,dotada de atributos abióticos, bióticos, estéticos ou

culturais especialmente importantes para a qualida-

de de vida e o bem-estar das populações humanas, e

tem como objetivos básicos proteger a diversidade bio-

lógica, disciplinar o processo de ocupação e assegurar

a sustentabilidade dos uso do recursos naturais.

No que se refere a criação de unidades de conser-

vação em áreas privadas, Sergipe só dispõe de uma

Reserva Particular de Patrimônio Natural (RPPN) efe-

tivamente criada, a de “Fonte da Bica”, numa área

total de 13,72 hectares com vegetação nativa, situa-da no município de Areia Branca, próximo ao Par-

que Nacional Serra de Itabaiana. As RPPNs são cria-

das mediante um termo de compromisso perante o

IBAMA, que se configura na existência de interesse

público, e averbados à margem da inscrição no Re-

gistro Publico de Imóveis.

Sabe-se da necessidade em se estabelecer estra-

tégias para a conservação do semi-árido Sergipano.

As poucas áreas protegidas nessa categoria são da

esfera municipal e abrangem pequenas áreas. Neste

sentido, vem-se trabalhado na perspectiva de criarUnidades de Conservação nas áreas remanescentes

com vegetação nativa da caatinga abrangendo os

Estados de Sergipe, Alagoas e Bahia.

Sergipe abriga também uma espécie de primata

com risco de extinção no continente americano, oguigó (Callicebus coimbrai) que vem sendo

pesquisado. A meta é adotar medidas urgentes e efe-

tivas para a proteção dessa espécie. Outras áreas es-

tão sendo estudadas no sentido de se criar novas

unidades de conservação de modo que conciliem os

propósitos de conservação com os anseios da popu-lação local.

3. Considerações finais

A criação de novas unidades de conservação em

Sergipe deve acontecer de forma a não transformar

estas áreas desconectas do planejamento e desenvol-

vimento regional. Para isso, torna-se necessário o

diálogo entre as esferas de governo. O Sistema Naci-

onal de Unidades de Conservação, criado em 2000,garante ampla participação da sociedade, desde a

criação até a gestão da área. Deste modo, o IBAMA

tem criado mecanismos de diálogo com a participa-

ção efetiva da sociedade.

Deve-se lembrar que cabe ao poder público e àcoletividade o dever de gestão dos recursos naturais

para as presentes e futuras gerações, envidando es-

forços para a preservação e restauração de processos

ecológicos, manejo das espécies e ecossistemas, pro-

teção da diversidade e da integridade do patrimônio

genético.

Nenhuma das unidades de conservação criadas

até o momento possui Plano de Manejo e parte delas

nem mesmo possui uma estrutura de gestão para a

articulação de ações sustentáveis.

Para isso, a criação de unidades de conservação

deve ser norteada por inúmeras possibilidades para

o desenvolvimento de parcerias entre institutos de

pesquisa, ensino e extensão além de Organizações

Não Governamentais e deve ocorrer nas esferas fe-

deral, estadual e municipal.

Não basta a criação de unidades de conservação

na esfera federal sem que haja uma política na esfe-

ra estadual que possa garantir a extensão florestal, a

restauração de áreas degradadas e o manejo susten-

tado dos recursos naturais (água, vegetação e solo)para dar suporte necessário ao desenvolvimento sus-

tentável regional.

A extensão rural deve acontecer de forma articu-

lada com a questão ambiental, pois hoje está mais

do que comprovado que não se pode pensar outraforma de educação que não aquela emancipadora,

109Unidades de conservação no Estado de Sergipe

Revista da Fapese, v. 2, n. 1, p. 101-112, jan./jun. 2006

onde os atores envolvidos direta e indiretamente to-

mem consciência de que desenvolvimento e conser-vação não são opostos e podem ser conciliados via

mecanismos de planejamento regional e local, via

planos diretores e roteiro turístico de forma

participativa.

A criação de políticas públicas estaduais como oICMS ecológico e a taxa de reposição florestal de

acordo com as especificidades locais, também pode-

rão contribuir para a conservação destas áreas.

Portanto, desenvolvimento e conservação só se-

rão alcançados se estabelecidos mecanismos mais

efetivos de planejamento e gestão. Só assim, estas

unidades de conservação serão efetivamente conso-

lidadas e cumprirão os propósitos para as quais fo-ram criadas.

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