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Número 1/ Dezembro 2008 Comunidade do pantanal JANELA MOSTRA Tribuna Bancária mobiliza categoria Da Pedra para a FM Leia mais:

Revista Comunidades

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Publicação com matérias sobre comunicação comunitaria e popular

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Page 1: Revista Comunidades

Número 1/ Dezembro 2008

Comunidadedo pantanal

JANELA MOSTRA

Tribuna Bancária mobiliza categoria Da Pedra para a FM

Leia mais:

Page 2: Revista Comunidades

A Comunicação Comunitária transpassa as preocupações de qualidade

técnica e audiência, tão consagrados pelas empresas de mídia. Esses não são

os únicos objetivos perseguidos. Através de experiências de jornais alterna-

tivos e sindicais, rádios comunitárias, vídeos populares e sites de movimen-

tos sociais, busca-se criar laços de identidade no grupo, mobilizar os partici-

pantes, dar visibilidade ao movimento e promover o protagonismo cidadão.

Leitores, ouvintes, espectadores e internautas não são tratados como alvos

no qual a comunicação precisa atingir para controlar, influenciar, manipular

ou dominar. Pelo contrário, os receptores devem ser tratados como cons-

trutores do processo comunicativo que através de seu cotidiano e de suas

reações críticas resignificam as mensagens e dão novos usos às mídias.

EditorialSumárioPesquisas analisam

comunicação comu-nitária

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Da Pedra para a Frequência Modulada

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Jovens e crianças democratizam os impressos

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Comunicação e Cultura incentiva jornais estudantis

Pag. 8

Janela mostra co-munidade do Pantanal

Pag. 10

Tribuna Bancária mobiliza categoria

Pag. 12

Comunitária comu-nica em conjunto

Pag. 14

Atenta a essa conjuntura, o curso de Jornalismo da Faculdade 7 de Setem-

bro (Fa7) oferta desde 2007 a disciplina de Comunicação Comunitária. Como

resultado dessas discussões, sugiram as primeiras sementes da Revista Co-

munidades que foram cultivadas por colaboradores e alunos da disciplina de

Produção Jornalística Impressa II. Assim tem origem esse primeiro número

que apresenta experiências comunitária no Ceará: vídeo popular da Tv Janela,

a Rádio Pedra Fm, os jornais da Comunicação e Cultura, a Rádio Cultura do

José Walter e a Tribuna do Sindicato dos Bancários. A edição também possui

entrevista com Daniel Raviolo, fundador da Organização Não Governamental

Comunicação e Cultura.

Boa leitura!

Expediente A Revista Comunidades é uma publicação laboratório das disciplinas de Comunicação Comunitária e Produção Jorna-lística Impressa II do curso de Jornalismo da Fa7. As matérias assinadas não refletem necessariamente a visão da Fa7 e são de inteira responsabilidade de seus autores. Essa edição é dedicada, em memória, à aluna da disciplina Comunicação Comunitária Renata Ribeiro Maciel que colaborou com as discussões e produção dessa revista.

Diretor Geral: Edinilton Gomes de Soárez. Diretor Acadêmico: Edinilo Gomes de Soárez. Vice-Diretor Acadêmico: Adelmir de Me-nezes Jucá. Coordenador do Curso de Jornalismo: Ismael Furtado. Editor responsável: Ismar Capistrano C. Filho (Ce1063JP). Editores adjuntos: Cherlanyo Barros, Janaína Arruda, Natalie Caratti, Rafaela Sandova e Rebecca Leite. Projeto Gráfico: Raphael Lira. Reporta-gens e entrevistas: Amanda Capistrano, Denise Gurgel, Janaína Arruda, Larissa Veigas, Leilane Pascoal, Miguel Martins, Natalie Caratti, Pedro Alves, Rafaela Sandoval e Rebecca Leite.

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Por Amanda Capistrano

O estudo da Comunicação Comunitária ganha, cada vez, mais espaço na academia. Segundo a dou-tora Raquel Recuero da Universidade de Pelotas, esse fenômeno acontece dado o fortalecimento das relações de comunidade na Internet. Em seu texto “Comunidades virtuais: uma abordagem teórica”, ela sustenta que, na rede, as pessoas estão resgatando seus laços de afinidades em torno de valores, família e territórios, formando grupos sociais. No entanto, a Comunicação Comunitária não se restringe aos en-contros mediados pela Internet. Pelo contrário, as pesquisas remontam, principalmente, aos jornais alternativos e às rádios comunitárias. Em Fortale-za, a Universidade Federal do Ceará (UFC) foi pioneira na disciplina, oferta-da a partir 1985, tendo desde então a doutora Márcia Vidal como professora. Outras Instituições de Ensino Superior (IES), como a Faculdade 7 de Setembro (Fa7), também possuem a cadeira em sua grade para despertar a reflexão dos alunos por temas como mídias comunitárias e alternativas, comuni-cação horizontal e participativa, democratização das mídias e educomunicação.

Como fruto dessas discussões, pesquisadores desen-volvem no Ceará investigações sobre a Comunicação Comunitária. Nos últimos dois anos, três pesquisas destacam-se. A doutora Márcia Vidal da UFC realizou seu pós-doutorado analisando os projetos de inclusão digital desenvolvidos pelo portal Viva Favela, no Rio de Janeiro, e pelo site da Organização Não Governa-mental (ONG) Centro de Defesa da Vida Herbert de Souza (CDVHS), em Fortaleza. Sua pesquisa questio-nou como essas iniciativas estão contribuindo para o exercício da cidadania em comunidades periféricas. Márcia Vidal concluiu que o site do CDVHS e o Por-tal Viva Favela contribuem, através de seu espírito comunitário, para incluir socialmente esses grupos na grande rede, rompendo assim com o monopólio e a hegemonia exercido pelos grandes conglomerados de comunicação.

Pesquisas analisamcomunicação comunitária

O m o v i m e n t o popular precisa superar atuação mais locais e ga-nhar dimensões mais amplas.

Já a doutora Catarina de Oliveira da Universidade Estadual do Ceará (Uece) pesquisa o uso que a comu-nidade fortalezense do bairro Ellery faz da Internet, através de seu site. Ela observou que esse movimen-to popular usa a internet a partir de uma realidade específica que revela processos de desigualdade, decorrente da exclusão digital. “Constatamos que o movimento popular precisa superar atuações mais locais e ganhar dimensões mais amplas com inter-câmbios sociais e culturais em nível global, além de vencer os processos de exclusão digital”, defende ela. A professora Catarina também lançou, em 2007, o li-vro “Escuta Sonora: Recepção e Cultura Popular nas ondas das Rádios Comunitárias”. Na obra, ela estuda

os ouvintes das rádios comunitá-rias Mandacaru Fm de Fortaleza e Casagrande Fm de Nova Olinda. A pesquisadora conclui que as emis-soras, além de promover o prota-gonismo de seus organizadores, também possibilitam, através da diversidade musical, a ruptura dos monopólios do agendamento das indústrias fonográficas.

Nessa mesma perspectiva de investigar os ouvintes de uma rádio comunitária, o professor de Comunica-ção Comunitária da Fa7, Ismar Capistrano, desenvol-veu, em sua pesquisa de mestrado, um estudo sobre os ouvintes da Rádio Favela pela Internet. A emisso-ra de Belo Horizonte (Minas Gerais) tornou-se, desde a década de 80, referência no movimento de demo-cratização da comunicação por sua resistência à per-seguição sofrida e pela suas produções inovadoras. Na Internet, a rádio disponibiliza, desde 1997, seu som transmitido em tempo real. Em sua pesquisa, Ismar notou três tipos de ouvintes. O primeiro grupo são aqueles que se enquadram no perfil imaginado pela emissora: ciberouvintes de áreas que não con-seguem sintonizar a Rádio Favela e pessoas social-mente engajados na democratização da comunica-ção. Mas para a surpresa do investigador, também foram entrevistados internautas que ouvem a Favela Fm mesmo estando em seu raio de frequência.

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Da pedra para a frequência modulada

Por Larissa Viegas e Leilane Pascoal

O sonho de comunicar e entreter venceu barreiras. Depois de dez anos a Rádio Comunitária Pedra FM faz o seu papel dando voz a quem precisa.

As dificuldades de falar sobre rádio comunitária, mesmo depois de muito tempo, ainda são muitas. Vistas algumas vezes como ilegais essas rádios nas-cem da boa vontade de poucas pessoas em entreter e, principalmente, comunicar.

Em um cômodo cedido pela igreja funciona a Rádio Pedra FM. Mesmo com pouco espaço acomodam-se, uma mesa, o equipamento de som, um computador e a boa vontade dos locutores que, voluntariamente, fazem a programação.

Fomos recepcionados por Gecicleide Estevão da Silva. A estudante de fisioterapia revela ter uma paixão por rádio desde menina. Nossa conversa foi interrompida pelo menos duas vezes, para ela aten-

der aos ouvintes e continuar com o andamento de seu programa. Em meio a tudo isso, ficamos saben-do que ela está na rádio desde 2001 e que a Rádio Comunitária Pedra FM existe desde 1998. Mas quem nos contou isso não foi Gecicleide, mas Juarez Serpa Filho, um dos fundadores da rádio e quem também a coordena.

Atualmente a emissora é coordenada por Juarez Serpa Filho. “Nossa primeira dificuldade já tem sido o local. Começamos a funcionar no inicio da casa e a medida que o tempo

ia passando fomos sendo empurrados. Agora já estamos aqui, na última parede”, disse Juarez, que como todos os colaboradores, sonha com o dia em que terão uma sede própria: “No terreno aqui do lado, a gente tá querendo construir um estúdio para fazer gravações e ter uma recepção. Um local próprio para rádio. Vocês entraram pelos fundos da

As rádios comunitárias nas-cem da boa vontade de pou-cas pessoas em entreter e principalmente comunicar.

casa. Nós querermos ter uma estrutura. É claro que a gente tem como objetivo também fazer uma pro-gramação mais participativa pelas comunidades, mas essa é uma dificuldade que a gente tem que não sabemos como solucionar”, conta.

Ao longo da conversa, descobrimos um pouco da história da Pedra FM e como foi difícil mantê-la fun-cionando: “A nossa história tem três momentos. Co-meçamos com quatro radiadoras em um poste em 1998 nós entramos com um pedido de autorização junto ao Ministério. A lei que instituiu a rádio comu-nitária foi aprovada no mesmo ano pelo congresso. E aí a gente deu entrada no governo FHC, mas como demorou muito recorremos a justiça e conseguimos um liminar. Ficamos funcionando uns três anos por força dessa liminar”, disse Juarez.

Mas o que ainda causa espanto em muita gente é descobrir que, mesmo existindo uma lei que aprova a existência de rádios comunitárias, ainda há perse-guição contra aqueles que a idealizaram. “Depois que a liminar foi cassada nós fomos muito perse-guidos. Não sabíamos nada sobre o processo, não fomos avisados de nada quando a liminar foi cassa-da. Aí apareceu a Anatel dizendo que fomos cassa-dos e que tínhamos que tirar a rádio do ar. Mas nós não tiramos. Então eles vieram e levaram tudo. Isso aconteceu em 2002. Mas tem mais coisa que o pes-soal aqui não sabe. Eu fui chamado à delegacia, fui fichado na polícia, só não fui preso porque não tive resistência, mas respondi a processo, fui julgado, fui apenado”. Relata Juarez.

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A locutora Gecicleide atende os ouvintes

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Mesmo depois de passarem por tudo isso a rádio vem alcançando, na medida possível, seu objetivo maior: ajudar a comunidade da Pedra trabalhan-do de forma direta e próxima aos ouvintes. “A rádio ajuda a comunidade em vários pontos. Nós temos a parte de utilidade pública, onde divulgamos docu-mentos perdidos. As pessoas pedem, por exemplo, que a gente informe um problema que está havendo com a Cagece. Elas ligam pra cá e falam: ’Olha gente, tá acontecendo isso e isso, a gente ta precisando que vocês anunciem e peça para alguém consertar’. Nós trabalhamos muito também em parceria com posto de saúde, anunciando os eventos que acontecem lá, se tem alguma campanha, eles vêm, trazem os carta-zes, pedem para a gente divulgar e nós divulgamos. A rádio incentiva muito a comunidade nisso”, conta Gecicleide.

Apesar de trabalharem junto à comunidade tanto Juarez quanto os colaboradores da emissora, recla-mam da pouca participação da comunidade da Pe-dra. “Aqui na Pedra, as pessoas são muito acomoda-das. Elas são mais de ouvir.”, disse a locutora. Outra reclamação que os organizadores fazem é sobre as limitações das leis de rádios comunitárias. “Antes nós tínhamos um alcance maior, pois funcionáva-mos com um transmissor acima do permitido. Agora funcionamos dentro da lei e alcançamos menos pes-soas.

“Eu já tive a experiência de trabalhar com um trans-missor que ultrapassava esse limite. Eu mesmo senti assim um pouco desmotivado. Mas a rádio não é pra mim né, é para a comunidade”, diz Juarez, que acha que a rádio poderia fazer mais se pegasse além dos 9 km que sua antena alcança. A Pedra FM conseguiu sua concessão em junho de 2006 e desde então tra-balha dentro dos parâmetros impostos pela lei.

Perseguições, pouca participação, limites, localiza-ção, pouco tempo e uma lei que causa quase desis-tência a quem a lê e tem vontade de fazer uma rádio são algumas das muitas dificuldades enfrentadas por várias rádios comunitárias. Mas foram essas difi-culdades que levaram a Rádio Comunitária Pedra FM a ser o que é hoje.

Suas conquistas vão além dos problemas e dão asas aos idealizadores para que possam ter sonhos com o futuro da rádio e, ainda mais, continuar infor-mando e entretendo os seus ouvintes. A emissora, conforme Gecicleide, também promove a diversi-dade musical. “Aqui tocamos desde o Racionais Mc a Beethoven”, explica ela. Assim, músicas excluídas da lista de execução das rádios comerciais ganham espaços na Pedra Fm. A rádio possibilidade o acesso de seus ouvintes a uma pluralidade composições de-mocratizando o gosto musical.

A lei das rádios comu-nitárias causa quase desistência nas associa-ções mantenedoras.

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A Rádio Pedra tem uma programação musical que possibilita a diversidade musical

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Por Miguel Martins e Pedro Alves

A produção de notícias é um papel diário do jor-nalista. O jornal é um meio de comunicação para di-vulgação das informações, promovendo os direitos humanos e democráticos em sua extensão. Além do mais, ele tem finalidade social, portanto, não publica matérias voltadas para a promoção pessoal de quem quer que seja, políticos, comerciantes, funcionários. Acima de tudo, os textos devem ser críticos, mas sem faltar com respeito aos demais.

A ONG Comunicação e Cultura, que trabalha a éti-ca jornalística e a qualidade nos dados, é uma escola de fabricar palavras. Fundada em 1988, mas consti-tuída legalmente em 1991, está localizada em Forta-leza. Sua missão é atuar em escolas, principalmente públicas, promovendo a formação cidadã de crianças e adolescentes. Com isso, contribui para a melhoria da qualidade do ensino.

Qual a possível relação entre os parágrafos acima, trabalho jornalístico e escolas? Ensinar e construir com alunos o retrato de dados do seu dia-a-dia. Esse é o papel da ONG para desenvolver seu trabalho com comunidades. A técnica jornalística seguida de ética é aliada ao desejo dos populares em escrever sobre suas vidas e atuar como protagonistas nas linhas do jornal da comunidade. Para isso, foi unida toda a prá-tica do jornalismo e as necessidades de cada grupo de contar histórias.

Jovens e crianças democratizamos impressos

A jornada com grupos sociais começa em 1987, com a Associação de Moradores do Mucuripe, em Fortaleza. A Comunicação e Cultura recebe uma solicitação especial pedindo sua colaboração para a publicação do jornal do bairro. Este fato desencadeou prolongadas pesquisas e uma série de ações envolven-do mídia impressa popular. Para a realização do traba-lho mais de 30 grupos de editores no estado do Ceará foram estudados.

Em junho de 1991, o projeto Jornais Comunitários Associados é lançado, e tem como objetivo facilitar a publicação de jornais populares editados nos bairros da Região Metropolitana de Fortaleza. A partir desse fato é oficialmente iniciada a ONG Comunicação e Cultura.

A Comunicação e Cultura é uma escola de fabricar pa-lavra que atua em escolas promovendo a formação ci-dadã.

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A capacitação para a produção de jornais colabora para o processo educacional e para liberdade criativa

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Clube do Jornal, Primeiras Letras e Jornais Junevis As-sociados são os principais projetos da ONG.

O objetivo agora da ONG é priorizar o trabalho no contexto escolar. Considerando a comunicação e a liberdade de expressão como ferramentas importan-tes para o aprimoramento dos processos pedagó-gicos e mudança institucional da escola pública. O ano em que as prioridades ficam mais claras é 1994 quando, também surge um dos projetos de base, Clube do Jornal.

Esse projeto nasce em resposta à demanda de alunos, professores e diretores de escolas públicas. Atende a quatro estados das regiões Norte-Nordes-te: Ceará, Pernambuco, Bahia e Pará. Tem como pro-posta tornar o jovem de cada comunidade indepen-dente e ativo na formação político-social-cultural do lugar onde mora. Cada jovem é capacitado com técnicas de como produzir um jornal e recebe lições de liberdade de expressão. A leitura e a escrita são os principais estímulos de todo o ensinamento.

O sociólogo Daniel Raviolo é fundador da ONG e explica como funciona o Clube do Jornal, “a missão da nossa entidade é promover atividades e projetos junto às populações de baixa renda, em especial aos jovens utilizando os recursos da comunicação alternativa e da mobilização social”. O público, constituído por ado-lescentes, enfatiza a educação para a recepção crítica das informações veiculadas pelos órgãos de imprensa. Com isso, há crescimento no aproveitamento escolar e movimenta uma diversidade nos assuntos.

Entre entusiasmos e participação toda produção é feita pelos alunos, das idéias à publicação em folha de jornal. A instituição tem discurso democrático e ético. A cada novo trabalho o incentivo ao protagonismo ju-venil é uma forma de deixar os jovens abertos as novas experiências. Os problemas, os eventos, as discussões sociais ganham cada vez mais força e espaço no jornal. Todos os detalhes são pensados para encaixar na re-alidade das comunidades.

O segundo projeto da Comunicação e Cultura é o Primeiras Letras. Iniciado quatro depois do Clube do Jornal, em 1998, trabalha com o jornal como forma pedagógica. Os conteúdos publicados são escritos a partir do que está sendo trabalhado, pelos professo-res, em sala de aula. Os alunos, crianças do 1º ao 5º ano, decidem o que vai ou não ser publicado.

Mery Helen, responsável pelo Primeiras Letras, ex-plica, “o trabalho é feito para incentivar a leitura das crianças. Além do mais, estimular a produção delas no que vêem em sala de aula”. Atualmente 32 muni-cípios no Ceará são beneficiados pelo projeto. Outros 19 em na região do Seridó no Rio Grande do Norte, sete em Pernambuco e cinco na Bahia totalizando, em média, 87 mil alunos.

A circulação do jornal acontece dentro da escola e na casa das crianças. Além das turmas de 1º ao 5º ano, meninos da aceleração contribuem com mate-rial. Os conteúdos publicados servem como dinami-zação das aulas e valorização social da escrita.

Os resultados devido a participação, na escolha das pautas e na escrita das reportagens vêm apresentando melhorias entre educador, criança e pais. O tripé da educação ganha um maior espaço e experiências são trocadas a partir da vivência. O jornal, principalmente por ser feito pelas crianças, aproxima escola e família. “Todos querem vê os trabalhos dos filhos”, diz Mery.

Jornais Juvenis dos Associados é o filho mais novo da ONG. Com apenas um ano de existência atende 20 grupos juvenis. Trabalhando também com adolescen-tes, o projeto objetiva a criação e produção de jornais comunitários. Esses são vistos como instrumentos de expressão jovem e mobilização comunitária.

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Revista Comunidades (RC): Como começou o Clube do Jornal?

Raviolo: Em 1991, lançamos um projeto que se chamou Jornais Comunitários Associados, que publicava jornais na área comunitária. Esse projeto publicou quase um milhão de exemplares, mas há uma grande instabilidade nos gru-pos que fazem comunicação popular. Em 1994, iniciamos o projeto Jornais Escolares, com apoio do Unicef e Bec, que passou a se chamar Clube do Jornal. Esse projeto simboliza o jornalismo estudantil, não um jornalismo da escola.

RC: Como o projeto “Primeiras Letras” surgiu?

Raviolo: O Clube do Jornal gerou uma demanda das par-ticipações das crianças das séries iniciais das escolas onde eles estavam implantados. Os professores quiseram levar textos dessas crianças para os jornais, e assim criamos uma editoria dentro do Clube do Jornal só para crianças. Acaba-mos por criar outro projeto que se chama hoje “Primeiras Letras”, um jornal de sala de aula.

RC: Quem patrocina os projetos?

Raviolo: O Primeiras Letras é gratuito. Já no Clube do Jor-nal, a garotada tem que entrar com algo em torno de 20% do custo de impressão, que deve ser conseguido com comercian-tes do bairro onde moram.

RC: Quais os equipamentos gráficos utilizados por vocês?

Raviolo: Nós trabalhamos muito tempo com Offset, mas atualmente estamos trabalhando com Duplicador Digital. Temos portanto a possibilidade de publicar fotos. Continua-mos trabalhando em Preto e Branco porque não esgotamos as possibilidades oferecidas nessas cores.

RC: Em relação à equipe de trabalho, quantas pessoas fazem parte dos projetos da ONG Comunicação e Cultura?

Raviolo: Atualmente temos uma equipe de umas 25 pes-soas, contando todo mundo: estagiário e pessoas que não trabalham o tempo todo na instituição, que são contratadas;

Comunicação e Cultura incentivajornais estudantis

Daniel Raviolo é fundador da Organização Não Governamental (Ong) Comunicação e Cultura. Desde 1988, ele trabalha com comunicação popular em Fortaleza. A entidade se destaca com pro-jetos de jornais nas escolas. Nessa entrevista, realizada na aula de Comunicação Comunitária do curso de Jornalismo da Faculdade 7 de Setembro, ele fala sobre o surgimento dos projetos, as difi-culdades e avanços.

Há uma grande instabilidade nos grupos que fa-zem comunica-ção popular, por isso optamos por trabalhar priorita-riamente com jor-nais nas escolas.

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ao todo, são 25 pessoas, além do nosso conselho da adminis-tração, ou seja, pessoas da instituição.

RC: Vocês contam com ajuda de alguma jornalista?

Raviolo: Não. Acho que temos apenas uma estagiária de jornalismo dentro da instituição. Nós não fazemos um modelo industrial de comunicação. Somos educadores que ajudam a fazer comunicação.

RC: Qual a importância do trabalho realizado pela ONG Comunicação?

Raviolo: O jornal traz para a escola a oportunidade do uso social da escrita e do ambiente que ele cria na sala de aula e na predisposição individual que ele cria como escritor. Por ter sua imagem associada, porque vai para o espaço público, porque quer sair bem na foto; aquilo atinge sua auto-estima. Outra coisa é que as crianças mostram possuir percepção automática de cidadania.

RC: O que propõe o projeto Jornais Estudantis?

Raviolo: O projeto Jornais Estudantis tem o objetivo de le-var a liberdade de imprensa para dentro da escola.

RC: Qual a maior inovação do Clube do Jornal no campo da comunicação?

Raviolo: O conceito do Clube do Jornal de certa maneira é revolucionário porque os jornais circulam nas escolas sem que as direções intervenham. Não há leitura prévia na dire-ção da escola. Então os jovens exercem mais sua liberdade.

RC: Quais os principais temas abordados nos jornais es-tudantis?

Raviolo: Nos Jornais Estudantis, mais espontâneos, al-guns temas que aparecem muito são o da sexualidade, por causa da idade; o da violência e drogas; e depois são os temas da escola. Mas eu diria que o campeão de “audiência” é sexualidade.

RC: Como é trabalhada a questão da linguagem dentro dos jornais produzidos pela Comunicação e Cultura?

Raviolo: Nós inicialmente trabalhamos na forma culta da língua. Os problemas de expressão escrita vêm da oralidade no sentido de que a nossa cultura é iletrada, não no sentido pejorativo, mas no sentido do que ela é. O Cordel também é da nossa cultura, mas não tem a força da cultura oral.

RC: Quais as maiores dificuldades enfrentadas junto aos patrocinadores?

Raviolo: É necessário ter muita paciência para negociar recursos. Quase perdi o controle quando fui pedir ajuda a uma organização e obtive com resposta: “por que você vai trabalhar se tá cheio de analfabetos? Não existe maior justi-ficativa para um projeto de escrita, justamente pelo fato de termos analfabetos”.

RC: A que você atribui os altos índices de analfabetismo em países como o Brasil?

Raviolo: O analfabetismo é uma decorrência de que a es-crita não tem nenhum valor social para as pessoas. As pesso-as não lêem. Sem escrita não há cidadania. Então, o melhor argumento que nós temos para trabalhar com escrita é justa-mente isso, nós temos que dar valor social à escrita.

Entrevista realizada por alunos da disciplina de Comuni-cação Comunitária de 2008, editada por Cherlanyo Barros.

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Por Natalie Caratti e Rafaela Sandoval

O Instituto de Desenvolvimento Social (IDS), uma Organização Não Governamental, está fazendo a dife-rença para muitos jovens do bairro Pantanal, periferia de Fortaleza. A TV janela, um projeto audiovisual da ONG, capacita adolescentes de 14 a 20 anos, crian-do oportunidades de inserção no mercado de trabalho. Os jovens são responsáveis por toda a programação da TV, gravam e editam documentários sobre diversos temas da comunidade. O curso tem duração de 6 me-ses, e de dois em dois meses fazem a exibição do que produziram.

“Em 2002 conseguimos recursos para Oficina de fo-tografia, os jovens tiravam fotografias do bairro e da comunidade, fizemos uma exposição, e a população achou interessante, observemos que poderíamos tra-balhar o potencial da Comunidade. Então montamos o projeto Multiplicadores da Imagem em 2003, que bus-cava a capacitação audiovisual aos jovens”, comemo-ra o coordenador geral do Instituto Valdenor Moura.

A ONG conseguiu financiamento do Conselho Mu-nicipal de Defesa dos Direitos da Criança e do Ado-lescente (Comdica) e doação de equipamentos pelo Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Crian-ça e do Adolescente (Cedca). “ Em 2004 fizemos a primeira exibição, produzimos vários vídeos de um minuto com temas diversos, sentimos a necessidade de passar esses vídeos a comunidade, assim nasceu a TV janela.”, sintetiza Valdenor. Na apresentação é montado um telão, logo em frente à sede da TV, aos poucos estão migrando também a bairros vizinhos, já

Janela mostra comunidade o pantanal

A equipe da Tv Janela discu-te com a comunidade o que eles querem ver antes de produzir os vídeos.

apresentaram no Renascer e no Palmirim. No início e nos intervalos dos blocos apresentam-se grupos de dança, bandas e humoristas do bairro. “É super diver-tido, no inicio não veio muita gente, mas aos poucos, uns foram divulgando aos outros, hoje temos público de até 400 pessoas por exibição.”, vibra Geliene Quei-roz, administradora financeira do IDS.

Na busca de uma linguagem própria, começaram a fazer pesquisas com os moradores, queriam identificar o que gostariam de ver e discutir. Os temas variam, falam sobre violência, poluição, terceira idade, den-gue, juventude, exclusão social e crianças. Procuram incentivar o debate, como também mostrar o que a de melhor no Pantanal.

A apresentação dos vídeos dura aproximadamen-te 30 minutos, mas são divididos em blocos de 4 a 5 minutos, com temáticas variadas, como o “Obser-

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A Tv Janela tem sua sede no bairro Pantanal

O projeto capacita moradores para a produção

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A comunidade tem muito respeito pelo projeto por-que acabam sabendo o que está acontecendo no bairro.

vatório da Comunidade” onde os alunos entrevis-tam as pessoas do bairro para saber opiniões sobre temas variados, também tem o “Toca ai”, onde mos-tram uma banda ou cantor local.

Rony Erik de Castro participou da primeira turma do curso, tinha 17 anos, hoje com 22 é um dos monito-res do projeto: “Sempre quis trabalhar minha criativi-dade, a TV janela me possibilitou isso, não sabia nada sobre produção de vídeo, hoje posso ensinar, é muito gratificante. Muitos jovens que passaram pelo curso, hoje estão trabalhando em agencias de publicidade, fa-culdades ou produtoras de eventos sociais.” comenta o ex-aluno.

Os monitores do projeto recebem uma ajuda de custo, que é suprida pelo financiamento. O problema é que a cada semestre precisam de um novo financiamento, por enquanto ainda não sabem como vai ser o ano que vem.

por enquanto ainda não sabem como vai ser o ano que vem. “A comunidade tem muito respeito pelo pro-jeto, ampliamos a informação, acabam sabendo do que está acontecendo no bairro.” ressalta Rony.

O Projeto mostrou uma nova realidade da periferia que antes era discriminada. A partir das exibições, a população e a mídia puderam ver a comunidade de for-ma diferente.

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Jovens e adolescentes editam documentários vida dos moradores que são apresentados na própria comunidade

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Por Janaína Arruda e Rebecca Leite

Não existe comunicação sem a participação efetiva de outro, assim como não existe sucesso sem trabalho e dedicação. Duas características que no Sindicato dos Bancários do Ceará são realizadas todos os dias, trans-formando o cotidiano de seus associados numa tenta-tiva de esclarecer seus direitos, informando-os como agir em determinadas situações, dando a esses profis-sionais um atendimento especializado, contribuindo para uma maior mobilização da categoria.

Entre os muitos meios de comunicação usados pelos departamentos internos e externos de diversas insti-tuições, o meio impresso é o que mais se destaca no Sindicato dos Bancários do Ceará.

A Tribuna Bancária vinculada semanalmente está em circulação desde 1979. O impresso é o carro chefe na tarefa de levar informação aos

bancários, já que representa um meio alternativo de transmitir à sociedade a ótica da categoria. Atualmente com uma tiragem de 11 mil e quinhentos exemplares,

é distribuído nas agências bancárias, para os próprios associados.

O Sindicato já existe há quase 75 anos e conta com quase oito mil associados, numa tarefa diária de esfor-ço e trabalho o sindicato dos bancários do Ceará vêm se consolidando como um dos principais atuantes do estado. Portanto, consegue suprir as necessidades de seus associados, prestando serviços como os de ordem jurídica, contando com cinco advogados para que o trabalhador tenha um acompanhamento mais especia-lizado em cada caso. Além de dois auditórios que ser-ve para as reuniões sindicalistas e oficinas oferecidas pelo próprio sindicato.

O papel da comunicação é cada vez mais importan-te, como um meio eficaz de levar aos associados à voz dos sindicalistas, destacando tudo o que o movimento sindical defende. Nesse contexto o Tribuna Bancária se destaca, pois não visa questões comerciais, mas sim a formação profissional, voltado justamente para ques-tões que venham a conscientizar, discutir ou agregar valores aos profissionais da categoria.

As pautas que são abordadas geralmente retratam os interesses dos bancários, mas, no jornal também exis-tem espaços reservados para a participação de leitores que queiram manifestar sua opinião. Toda edição vem com alguma matéria de caráter político social, contan-to também com a coluna outros toques, que trata as-suntos de interesses social, abordados de forma breve. O jornal busca sempre informar a sociedade sobre as atuações do Sindicato nas lutas pelos direitos da classe dos bancários, propondo também pautas que vão além das negociações trabalhistas.

Tribuna bancária mobiliza categoria

A Tribuna Bancária se des-taca porque não objetiva interesses comerciais, mas a conscientização.

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A comunicação do Sindicato dos Bancários do Ceará fortalece a mobilização

Page 13: Revista Comunidades

A Comunicação Sindical buscar informar à sociedade sobre as lutas pelos direitos da categoria.

“Varias instituições privadas ou não, tem seus ve-ículos próprios de comunicação, na maioria das ve-zes esses veículos são de circulação interna, mais um informativo, que não tem tanta repercussão, ou ainda pouco conhecidos e duráveis. Esse é sem dúvida o destaque da comunicação entre os bancários, o jornal circula a 28 anos sendo a principal voz da categoria”, é o que afirma o diretor de ação sindical, Clécio Mor-ce. O diretor também destaca a importância do veicu-lo para o sindicato, “O papel da comunicação dentro de uma linguagem do movimento sindical vislumbra o que o movimento defende. Quero ressaltar que o que a gente defende vai de encontro, bate de frente, com o que hoje é veiculado nos veículos de comuni-cação da grande massa. Somos contra qualquer tipo de apropriação pelo estado, qualquer tipo de ditadura, mas queremos discutir a democracia nos veículos de comunicação”, declara.

Nas ondas do rádioAlém da Tribuna Bancária, a comunicação do Sin-

dicato dos Bancários também se faz presente no rádio. Ano que vem a radio que fará 18 anos, é a única de uma instituição sindical trabalhista que já esta no ar há tanto tempo sem interrupções. O projeto foi elaborado pelo Sindicato dos Bancários e pela equipe da Rádio Extra.

O radiojornalismo praticado na rádio é voltado basi-camente para os interesses dos trabalhadores da classe. O programa Rádio Bancários, é veiculado atualmente pela Rádio Universitária, FM 107,9 e vai ao ar de se-gunda a sexta, das 7h30 às 8h.

O principal diferencial do programa é o posiciona-mento critico adotado. Durante os anos em que está

sendo produzido o programa tem seu padrão e sua linha editorial fortalecidos pelas ideais das lutas sindicatos. A rádio é um canal de expressão que não se deixa levar pelo discurso comum da grande mídia, isso tem uma boa repercussão nos movimentos sindicais.

Bancariosce.org.brComo não poderia deixar de ser, o Sindicato dos

Bancários tenta ganhar cada vez mais destaque atra-vés do “novo” meio de comunicação, o Jornalismo Online. O sindicato possui uma página na internet que atualizada constantemente leva informações para os bancários e outras pessoas em geral que buscam uma informação mais rápida.

O sindicato, que possui cerca de oito mil acesso-ciados, conta diariamente com até 600 acessos a sua página na internet. O número cresce ainda mais quando há uma mobilização, como greves.

Clécio Morce diz que ainda existe uma dificuldade em relação ao site, talvez por que o site tenha um con-teúdo de formação política, posicionamento teórico, não atraia muito a atenção dos jovens ou mesmo de outras pessoas que vão à internet para passar um tem-po, o conteúdo da página do sindicato com certeza não atrairia a atenção dessas pessoas.

O site é mais acessado por pessoas que procuram uma informação mais rápida, quem não quer espe-rar pela edição impressa ou mesmo outras pequenas notícias que são postadas ao longo do dia. “Na últi-ma greve que aconteceu ficamos todos sem saber o rumo das negociações, proibidos de entrar na agên-cia, o site foi a principal ferramenta de informação”, explica Clécio.

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Segundo o diretor sindical Clécio Morce, os aces-sos ao site bancariosce.org.br aumentam nas greves

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Por Denise Gurgel

Rua L, Conjunto José Walter. Saímos da Fa7 rumo à Cultura FM, ainda confusas com o endereço desco-nhecido. Iríamos contactar o Carlão. Ou melhor, José Carlos de Souza, 43, responsável pela rádio comuni-tária.

Chegamos, quase sem dificuldades, à sede da rádio. Passava uns vinte minutos das quatorze horas quando o Carlão abriu o portão do duplex onde trabalha e re-side. Fomos recebidas com um aperto de mão e a “or-dem” para entrar. Digo ordem por que o Carlão é um cara grandão, tipo brutamontes, de voz potente e im-perativa. Entramos no estúdio, e fizemos companhia a Carlão, que no momento pilotava o programa MPB 87, no ar diariamente das duas às quatro da tarde.

No decorrer da conversa, soubemos que aquele vo-zeirão responde pelo nome artístico de Carlão do Cra-to, músico profissional e autor cds de músicas no estilo forró pé-de-serra. Com muito orgulho, ele nos convida a conhecer a discoteca, com mais de 200

títulos, e nos presenteia com uma delicada seleção musical, composta de Nara, Tom, Chico, Fagner, Ed-nardo, Belchior, Gil e Caetano.

Carlão espera terminar “Canteiros”, na voz de Fag-ner, e, disfarçadamente troca o cd, aumenta o volume do som e ’Respeita Januário” toma conta do estúdio. Rimos e cantamos, nós três, com o indicador em riste até o final da canção.

Falamos sobre a formação musical de Carlão do Crato, que teve início na região do Cariri cearense. O menino Carlim cresceu escutando no rádio as músi-cas que seu pai gostava e ensaiava, arriscando-se no teclado quando o pai se ausentava. E assim, meio que às escondidas, ousou desacorrentar-se do xote, do xa-xado e do baião. Aventurou-se com o rock, o jazz e o blues, encantou-se mais e mais com o samba e a mpb e seus ouvidos não pararam mais de exigir-lhe cardápio variado, temperado com ritmos latinos, reggae, soul music, rap...

O primeiro estúdio de rádio conheceu aos quinze anos em Lavras da Mangabeira, e conta que o cubícu-lo onde funcionava a FM pareceu-lhe enorme. Sonhou ter uma rádio, passar o tempo entre ouvintes e micro-fones, saboreando a troca de vinis, alternando delícias melódicas.

O sonho de montar uma rá-dio passou a ser insônia pelas dificuldades em obter uma concessão.

Comunitária comunica em conjunto

Passaram os anos, veio a maioridade e Carlim virou Carlão, estudante do curso de Música na Universida-de Estadual do Ceará (Uece). Afeiçoou-se então aos instrumentos de percussão, destacando profundo re-conhecimento ao multipercussionista Nilton Fiori, da banda Marajazz, com quem diz ter aprendido muito.

O sonho da rádio já não era mais o mesmo, passou a ser insônia causada pelo inacessível. Obter uma concessão, arranjar dinheiro para os equipamentos, conquistar a audiência, eram objetivos dificílimos para qualquer um que, como Carlão, não dispunha de posses nem de “padrinhos”. Graduado e com trânsito livre nas rodas musicais da capital, Carlão do Crato perseguiu e alcançou outro sonho, o de lançar seu pri-meiro disco. Quando “Beija-flor do sertão” finalmen-te saiu, Carlão pensou que o passo mais difícil tinha sido dado, e que dali pra frente viria a prazeirosa etapa de divulgação do seu trabalho. Mas os acontecimen-tos que se seguiram não tiveram nada de prazeiroso. Segundo Carlão, “divulgação de discos é trabalho de humilhação”. Ele nos conta que saía de rádio em rádio, mostrando o disco aos radialistas da capital e do interior e nunca recebeu apoio.

Na busca pela realização do sonho de uma vida in-teira, atravessam o caminho de Carlão a distribuição governamental de concessões para funcionamento de rádios comunitárias. E assim foi feito. De volta ao torrão natal e munido de documentos comproba-tórios de idoneidade e capacidade exigidos pela le-gislação, Carlão funda a FM Cariri. “Estávamos indo bem,mais os empresários das rádios comerciais não se conformavam com a nossa audiência, a população participava da rádio e isso fazia a audiência crescer

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Os programas Forró de Cabo a Rabo, o Show Popular e o MPB 87 destacam-se na Rádio Cultura.

sempre mais, por que a melhor propaganda é a de boca, não é mesmo? Veio uma enxurrada de liminares. Então eu saí de lá algemado e humilhado, em 2004, acusado de pirataria. O poder econômico e o poder político, no interior, são a mesma coisa, eles fazem a lei em benefício próprio, mandam e desmandam na polícia, na Igreja ... ”

Carlão voltou à capital. Sentindo-se pleno de experi-ência e determinado em dedicar-se ao trabalho comuni-tário voltado aos segmentos de cultura e utilidade pú-blica, investiu todo seu potencial na obtenção de mais uma concessão de rádio comunitária. E assim surgiu a FM Cultura, 87,9 . “Temos um bom repertório, e a gente aqui só olha pra dentro da comunidade, o que acontece aqui, os talentos do bairro. Prestigiamos tudo que a co-

munidade faz, do bolo de milho que a Dona Maria da Rua B acabou de fazer e está vendendo na calçada até campanhas anti-dengue, anti drogas, etc. A gente anun-cia tudo aqui na rádio. Tenho 16 pessoas trabalhando comigo aqui na rádio, e a maioria são jovens, dos 12 aos 19 anos. Falamos sobre escolas, esportes, sexo, tudo que interessa aos adolescentes ”

A FM Cultura entra no ar às seis da manhã com o Forró de Cabo a Rabo, com o apresentador J. Cid. En-cerrado o programa, às oito, seguem-se quatro horas de programas evangélicos. À tarde, o Show Popular e o MPB 87 apresentam músicas de artistas brasileiros. O espaço dos artistas internacionais, a maioria rock e baladas românticas consagradas, é o Internacional Hits, das quatro às seis.

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Carlão do Crato comanda a animação na Rádio Cultura

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