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1 Revista da Escola de Música da UEMG Ano VII - n. 10 - Maio 2012

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Conselho Editorial

Ana Cristina Gama dos Santos Tourinho – UFBA - Salvador, BahiaAntônio Carlos Guimarães – UFSJ - São João Del Rei, Minas GeraisClovis Salgado Gontijo de Oliveira – FAJE - Belo Horizonte, Minas GeraisDenise Hortência Lopes Garcia – UNICAMP - Campinas, São PauloFelipe de Oliveira Amorim – FEA - Belo Horizonte, Minas GeraisFernando Henrique de Oliveira Iazzetta – USP - São Paulo, São PauloFlorivaldo Menezes Filho – UNESP - São Paulo, São PauloGuilherme Paoliello – UFOP - Ouro Preto, Minas GeraisJeff Perry – LSU - Baton Rouge, Louisiana, USAJosé Augusto Mannis – UNICAMP - Campinas, São PauloLucas Robatto – UFBA - Salvador, BahiaLuciana Marta Del Ben – UFRGS - Porto Alegre, Rio Grande do SulLuciana Monteiro de Castro – UFMG - Belo Horizonte, Minas GeraisLuis Carlos Justi – UNIRIO - Rio de Janeiro, Rio de JaneiroLuiz Henrique Fiaminghi – UNDESC - Florianópolis, Santa CatarinaLuiz Ricado Basso Ballestero – USP - São Paulo, São PauloMarcos Tadeu Holler – UNICAMP - Campinas, São PauloMary Angela Biason – Museu da Inconfidência - Ouro Preto, Minas Gerais Maria Betânia Parizzi Fonseca – UFMG - Belo Horizonte, Minas GeraisOilian José Lanna – UFMG - Belo Horizonte, Minas GeraisRegis Duprat – USP - São Paulo, São PauloLuiz Ricardo Basso Ballestero – USP - São Paulo, São PauloRodrigo Miranda de Queiroz – UCONN - Storrs Mansfield, Connectitut, USARonaldo Cadeu de Oliveira – UEMG - Belo Horizonte, Minas GeraisRodolfo Caesar – UFRJ - Rio de Janeiro, Rio de JaneiroSissy Veloso Fontes – UNIFESP - São Paulo, São Paulo

REVISTA MODUS – ANO VII / Nº 10ISSN: 1679-9003

Publicação da Escola de Música da Universidade do Estado de Minas Gerais - UEMGCampus de Belo Horizonte

[email protected]

Elaborada por: Marcos Antônio de Melo Silva - Bibliotecário CRB/6: 2461

Modus : revista da Escola de Música da UEMG / Universidade do Estado de Minas Gerais – Ano 7, n. 10, (maio 2012) – Barbacena MG : EdUEMG, 2012. 91 p.

Semestral. ISSN 1679-9003.

1. Música – Periódicos. I. Universidade do Estado de Minas Gerais. II. Título.

CDU: 78

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ISSN: 1679-9003

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REVISTA MODUS – ANO VII / Nº 10ISSN: 1679-9003

Editor responsávelJosé Antônio Baêta Zille

Projeto gráficoLaboratório de Design - UEMG

ESCOLA DE MÚSICA DA UEMG

Rua Riachuelo, 1.321 - Padre EustáquioBelo Horizonte - CEP: 30720-060

DiretoraGislene Marino Costa

Vice-DiretorHelder da Rocha Coelho

Coordenador do Centro de PesquisaArmon Sávio Reis de Oliveira

EdUEMGEDITORA DA UNIVERSIDADEDO ESTADO DE MINAS GERAIS

CoordenaçãoDaniele Alves Ribeiro

Preparação de Textos e RevisãoDaniele Alves Ribeiro

Capa e diagramaçãoMarco Aurélio Costa Santiago

http://[email protected](32) 3362-7385 - ramal 105

UNIVERSIDADE DO ESTADODE MINAS GERAIS

ReitorDijon Moraes Júnior

Vice-ReitoraSantuza Abras

Pró-Reitora de EnsinoRenata Nunes Vasconcelos

Pró-Reitora de Pesquisa e Pós-graduaçãoTerezinha Abreu Gontijo

Pró-Reitora de ExtensãoVânia Costa

Pró-Reitor de Planejamento, Gestão e FinançasGiovânio Aguiar

Diretor Geral do Campus de Belo HorizonteRogério Bianchi Brasil

Tiragem: 400 exemplaresRevista semestral

Linha editorial

A revista MODUS é uma publicação semestral editada pelo Centro de Pesquisas da Escola de Música da UEMG com o propósito de estimular a reflexão e a atuação crítica em contextos culturais diversos. Procura ser um agente catalisador do desenvolvimento da produção e do intercâmbio de conhecimentos relacionados à música. Dentro dessa perspectiva, abrange a produção de cunho científico, teórico ou histórico, que envolve a musicologia e as áreas que colocam a música, direta ou indiretamente, frente à educação, tecnologia, performance e outros sistemas de linguagem.

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HiStÓria da MÚSiCa: reFleXÕeS teÓriCo-MetodolÓGiCaSLoque Arcanjo Júnior

NorMaS Para PUBliCaÇÃo

SUMÁrio

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aNÁliSe MUSiCal e MUSiColoGia HiStÓriCaDomingos Sávio Lins Brandão

aNÁliSe CoMo FerraMeNta da reGÊNCia: CoNCePÇÃo, PreParaÇÃo e aPliCaÇÃoJosé Maurício Valle Brandão

ForMa e eStrUtUra Na MÚSiCa oCideNtal: UMa iNtrodUÇÃo a alGUMaS daS ForMaS MaiS reCorreNteS Na MÚSiCa eUroPeia doSSÉCUloS XVii e XViiiRonaldo Cadeu de Oliveira

iNoVaÇÃo SoNora eM NoiteS do deSerto de alMeida Prado e SUa iNterPretaÇÃo ao PiaNoJunia Canton Rocha

73 aMeriCa, tHe CitY oF God, aNd otHer iMaGiNarY PlaCeS: iVeS, rootS, aNd roCKJeffrey Perry

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A Revista MODUS está comprometida com a prática da pesquisa, associada à extensão e ao ensino. Por isso mesmo, não poderia deixar de registrar o evento do 1º Mini Seminário Internacional de Teoria e Análise Musical da Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG), que valorizou o universo dos saberes em tono da análise musical. Nesse sentido, esse evento, realizado entre 10 e 11 de abril deste ano, na Escola de Música da UEMG, ressaltou uma das mais importantes vertentes internacionais de análise musical: a Schenkeriana. Aliado a isso, e não menos importante, procurou-se apresentar elementos que justifiquem a necessidade do estudo da Análise Musical tanto para a regência, quanto para a musicologia, além de ressaltar a inter-relação desses elementos no tempo histórico.

Assim, este número da nossa revista, sempre dentro do espírito primordial de contribuir com as discussões e disseminação de novos saberes, divulga uma síntese do que o seminário apresentou à comunidade acadêmica e em geral. Loque Arcanjo Júnior aborda uma perspectiva da história que a desloca de uma história social da cultura a uma história cultural do social, para fazer uma reflexão a repeito das possibilidades que um diálogo com essa “nova história cultural” traz para o universo da pesquisa no campo da história da música. Domingos Sávio Lins Brandão, sob uma ótica da história social da música, apresenta uma discussão a respeito da análise musical, ressaltando-a como instrumento da musicologia histórica no Brasil, voltada para a recuperação de manuscritos musicais de outrora. José Maurício Brandão traz uma série de reflexões a respeito da relação entre a análise musical e a regência. Nesse contexto, evidencia uma perspectiva que coloca a análise como processo formativo e como recurso de estudo e prática dentro do universo da regência. Ronaldo Cadeu de Oliveira faz um “passeio” pelas formas musicais mais recorrentes na música europeia dos séculos XVII e XIII. Para tal, didaticamente, o autor apresenta as estruturas básicas dessas formas como elementos de compreensão analítica da música de concerto da cultura ocidental. Junia Canton Rocha apresenta uma análise da obra Noites do deserto de Almeida Prado para mostrar como o autor inova no contexto sonoro, apontando aos possíveis intérpretes, como devem proceder para

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atingir e otimizar o efeito desejado. Por fim, Jeffrey Perry parte da ideia de que há uma geografia musical em que os lugares físicos e históricos, sejam eles reais ou imaginários, podem ser evocados pela música. Sob essa perspectiva, o autor ressalta a presença de certos lugares na música dos Estados Unidos e como tais lugares se conectam uns com os outros.

Agradecemos aos colaboradores que, com suas contribuições, fizeram esse número da Modus se tornar realidade. Congratulamos o sucesso do 1º Mini Seminário Internacional de Teoria e Análise Musical da UEMG, e esperamos que o evento se repita anualmente.

José Antônio Baêta ZilleEditor

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HISTóRIA DA MÚSICA: REfLExõESTEóRICO-METODOLóGICAS

Loque Arcanjo Júnior

Graduado em História pelo Centro Universitário de Belo Horizonte, pós-graduado (lato-sensu) em História da Cultura e da Arte e mestre em História pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Atualmente, desenvolve pesquisa de doutorado no Departamento de História da UFMG na linha de pesquisa História Social da Cultura. É professor da Escola de Música da UEMG e nos cursos de História do Centro Universitário de Belo Horizonte (UNIBH) e do Centro Universitário UNA.

[email protected]

ResumoEste artigo tem como objetivo uma reflexão sobre as possibilidades de ampliação do horizonte teórico-metodológico das pesquisas no campo da história da música a partir do diálogo com a “nova história cultural”.

Palavras-chaves: Música; história; história cultural.

A partir da história dos conceitos desenvolvida pelo historiador alemão R. Koselleck é possível situar historicamente a construção do moderno significado do termo “história”. De acordo com o autor, a partir do século XVIII, a crise política e as filosofias da história formaram um só fenômeno. A Revolução Francesa construiu um novo conceito de história que se tornou universal: a história enquanto progresso. O estudo dos textos clássicos dos filósofos iluministas fez com que Koselleck percebesse uma íntima relação entre a crise política de 1789 e a criação do conceito moderno de história. Em seus termos, foi nesse cenário que “a história europeia expandiu-se em história mundial e cumpriu-se nela ao fazer com que o mundo inteiro se ingressasse num estado de crise permanente” (KOSELLECK, 1999). Essa crise pretendeu unificar num só projeto (iluminista) a noção de “história” como progresso e como unidade. Os estudos sobre a crise do Estado Absolutista que culminou em 1789 com a grande Revolução e da formação das filosofias da história tornam-se fundamentais para a compreensão da subjetividade do conceito de história fundado a partir daquele momento histórico. Conceito esse que politicamente transformou-se em “História Universal” (KOSELLECK, 1999).

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Porém, entre os séculos XIX e XX, com o advento de duas guerras mundiais (1914-1918 e 1941-1945) e com o fim da Guerra Fria, em 1989, a crise do projeto iluminista, de emancipação do homem expressa por meio do humanismo, do marxismo e do liberalismo tornou-se evidente. Essa crise deve ser interpretada como resultado da descrença nas metanarrativas que estabeleciam “um” sentido para a humanidade, fundado na noção de progresso e de civilização. Segundo Jenkins, “o final do século XIX e o início do século XX assistiram a um solapamento da razão e da história” (JENKINS, 2001). Essas transformações apontam para um cenário descrito como pós-moderno.

Para Jenkins e outros teóricos como Lyotard e Jameson, o pós-moderno é algo difícil de se definir, pois os apologistas do pós-modernismo defendem a ideia de que nada é sólido ou fixo neste mundo. Na definição de Lyotard, o contexto pós-moderno pode ser caracterizado pela “morte dos centros”, “incredulidade ante as metanarrativas”, “anglocentrismos”, “eurocentrismos”, “etnocentrismos”, “logocentrismos”, “sexismos”, que já não são considerados legítimos, naturais, reais, mas sim construções temporais, ficcionais, úteis para formular interesses que não são universais.

Ao longo do século XX, principalmente após a fundação da Revista dos Annales, por Marc Bloch e Lucien Frebvre, em 1929, a pesquisa histórica passou a se caracterizar pela multiplicação dos objetos de pesquisa, especializações cada vez mais sofisticadas e por uma produção abundante. Entre os anos de 1968 a 1989, os historiadores da terceira geração dos Annales reavaliaram tudo aquilo que sustentava o seu projeto desde a fundação em 1929: a aliança com as ciências sociais. A partir dos pressupostos dessa escola historiográfica francesa, a história passou a ser pensada numa perspectiva interdisciplinar. Os diálogos com a antropologia, com a sociologia e com a psicanálise provocou a fragmentação dos objetos e apresentou uma história-problema: ao invés de narrar os fatos cocorridos, caberia ao historiador construir uma “história-problema” que rearticularia a relação sujeito/sociedade numa perspectiva social e cultural. Foi um tempo marcado, também, pela crise dos sistemas de interpretação da sociedade como o marxismo, o estruturalismo, o funcionalismo. Dessa forma, a história teria que repensar os métodos, organizar uma nova articulação entre indivíduo e sociedade, local e global, particular e geral. A escrita da história, anteriormente caracterizada por uma narrativa cifrada, evolutiva e cronológica passaria a ser, após essa articulação, estruturada e demonstrativa. Durante a chamada terceira fase da Escola dos Annales, situada entre os anos 1968 e 1988, constata-se uma crise de interdisciplinaridade, a qual, ainda hoje, é a orientação central da chamada nouvelle histoire (REIS, 2000).

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Chartier reavaliaria essas transformações em 1989, com seu artigo Le Monde Comme Representation. Na concepção do autor, as mutações da história não seriam produtos de uma crise das ciências sociais. Para o historiador francês,

As mutações da história nos últimos anos estão ligadas a um distanciamento dos princípios de inteligibilidade que comandaram a nouvelle histoire desde a sua origem: renunciou-se à descrição da totalidade social, à história global, ao modelo braudeliano, que se tornou intimidante; renunciou-se à primazia do corte social para dar conta do cultural, passando-se de uma história social da cultura a uma história cultural do social (CHARTIER1, 1991 apud REIS, 2000, p. 128).

As relações entre história e ciências sociais tomariam, assim, uma nova direção. A “nova história cultural” não quer elaborar visões globais, sínteses, mas ampliar o campo da história e multiplicar seus objetos. A história passa a ser encarada como história-problema. Essa nova percepção do conceito de história é fruto de todas as transformações e demonstra a necessidade de valorização das subjetividades presentes nos diferentes projetos de construção das identidades. Frente a esse cenário teórico-metodológico da história enquanto disciplina e campo do conhecimento, quais seriam as relações entre história e música? Em outras palavras: o que seria “história da música” a partir dessas transformações teóricas e metodológicas? Qual seria o impacto do cenário pós-moderno descrito acima de caracterizado pela crise das metanarrativas, para o estudo da história da música? A “divisão” da história da música em “estilos” ou “períodos”, supostamente bem definidos e diferenciados, tais como “período clássico”, “romântico”, “moderno”, “neoclásssico” e “contemporâneo”, não estaria impregnada da crença em uma história universal colocada à prova pela pós-modernidade? Qual impacto da “nova história cultural” para a história da música?

Sobre essa temática, Peter Burke destaca:

É muito salutar essa reação construtivista contra uma visão simplificada, que considera as culturas ou grupos sociais como homogêneos e claramente separados do mundo externo. A crítica ao “essencialismo” feita por Amselle e outros pode ser aplicada com proveito não apenas a culturas, como os fulani, ou a classes, como a burguesia, mas também a movimentos ou períodos, como o Renascimento ou a Reforma, o Romantismo ou o Impressionismo (BURKE, 2005, p. 128).

1 CHARTIER, Roger. O mundo como representação. Revista das Revistas. Estudos Avançados. v.5, n.11. São Paulo, jan./apr. 1991.

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Ao analisar as relações entre a música de Mozart e a sociedade na qual estava inserida em relação ao que chamou de “processo civilizador”, Norbert Elias, ao se referir à periodização da história da música, afirma que:

O problema é que tais categorias não nos leva muito longe. São abstrações acadêmicas, que não fazem justiça ao caráter-processo dos dados sociais observáveis a que se referem. Subjacente a elas está a ideia de que a metódica divisão em épocas, que normalmente encontramos nos livros de História, se adapta ao curso real do desenvolvimento social (ELIAS, 1995, p. 15).

As criticas direcionadas para a história da música são frequentes na historiografia atual. Para Napolitano (2005), a escrita acadêmica sobre música se divide em áreas mais ou menos organizadas entre a musicologia histórica, a etnomusicologia e um campo pouco definido intitulado “história da música popular”. De acordo com o autor, muitas obras que se propõem a escrever uma história da música são na verdade escritas por jornalistas, aficionados e outros “diletantes” no campo da pesquisa histórica. Esses textos promovem, na maioria das vezes, uma narrativa biográfica sobre o compositor, recheada com o que se convencionou chamar “contexto histórico”. Esse contexto é descrito sem que para isso o escritor utilize uma perspectiva crítica para discutir as relações entre a produção do músico em questão e seu universo cultural.

Musica, história e biografia

Nos últimos anos, os historiadores vêm mostrando um grande interesse por atores históricos que são apanhados na tentativa de construir diferentes identidades para si ao longo de sua vida. Essa ótica vem apresentando diversas biografias de músicos que na verdade foram construídas por meio de uma memória autobiográfica. Porém, ainda persiste a crença numa “história da música universal” caracterizada pelo desfile de um grupo canonizado de compositores que supostamente a comporiam de forma objetiva: a “História da Música Universal”. O sujeito-músico-objeto pesquisado é apresentado como um sujeito centrado, único, racional, reforçado pelas biografias que expressam uma história linear, progressista e evolutiva. Essas buscam apresentar, da mesma forma, uma coerência, uma regularidade, uma originalidade identitária, deixando assim escapar o caráter construtivista dos discursos biográficos e das diferentes identidades musicais “ocultas” pela memória. Sobre essa propriedade da escrita biográfica, Bourdieu afirma que, “o sujeito e o objeto da biografia (o investigador e o investigado) têm de certa forma o mesmo interesse em aceitar o postulado do sentido da existência narrada (e, implicitamente

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de qualquer existência)” (BOURDIEU, 1998, p. 184)2.

Sobre a questão da identidade, Stuart Hall (2003) distingue três concepções: do sujeito do iluminismo; do sujeito sociológico e do sujeito pós-moderno. O sujeito do iluminismo seria aquele sujeito centrado, unificado, dotado de consciência e de ação. O sujeito que nasce dotado de uma identidade e se mantêm essencialmente o mesmo, por meio de um “eu” que se manteria idêntico do nascimento até o final da vida. Concepção individualista do sujeito e de sua identidade. A ideia de sujeito sociológico expressaria a crescente complexidade do mundo moderno e traria a ideia de que o sujeito é menos autônomo e autossuficiente, mas que se constrói em relação aos outros, à cultura e ao mundo com o qual se relaciona. Mesmo que este sujeito fosse formado, moldado e construído em relação a “outro”, o sujeito ainda teria um “eu real”, modificado em diálogo contínuo com outras identidades que o mundo oferece. Já o sujeito pós-moderno, que surge em fins do século XIX e início do XX, não possui uma identidade fixa, essencial e permanente. A identidade torna-se uma “celebração móvel”: formada, transformada em relação às formas por meio das quais os sujeitos se autorrepresentam. O sujeito pós-moderno toma formas, assume identidades diferentes em momentos e lugares diversos, não possui um “eu” coerente. Dentro desse sujeito pós-moderno existe um eterno “não ser” que se caracteriza por construir identidades contraditórias com identificações também contraditórias. Nesse sentido, se o sujeito tem uma “narrativa do eu” é por que criou uma fantasia confortante, completa, segura, coerente, mas uma fantasia, parte da imaginação, de uma autorrepresentação (HALL, 2003).

Na perspectiva da nova história, a ideia é menos recuar no tempo para reestabelecer uma grande continuidade, mas, buscar genealogicamente as diferentes identidades do biografado, no caso dos músicos, das suas identidades musicais. A tarefa da genealogia não é demonstrar que o passado ainda está lá, bem vivo no presente, mas sim demarcar os acidentes, os ínfimos desvios, as fissuras, as agitações onde se pretendia encontrar ordenamentos, pois a história “efetiva”, nos ensina Foucault, se distingue daquela dos historiadores (diríamos aqui das biografias dos compositores e/ou músicos pensadas de forma essencialista) pelo fato de que ela não se apoia em nenhuma constância. A história será efetiva na medida em que ela reintroduzir o descontínuo em nosso próprio ser. Na esteira de Nietzsche, Foucault percebe que a tomada de consciência de um “eu” remonta o “nascimento” da filosofia clássica com Sócrates de Platão (FOUCAULT, 1993).

De acordo com Foucault,

2 Para essa discussão sobre a biografia, ver também: ORIEUX, Jean. A arte do biógrafo. In: ARIÈS, P.; DUBY, G.; LADURIE, E. L. R. História e nova história. Lisboa: Editorial Teorema, 1994. p. 37-49.

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O lugar da emergência da metafísica foi a demagogia ateniense, o rancor plebeu de Sócrates, sua crença na imortalidade. Mas, Platão teria podido apoderar-se desta filosofia socrática, teria podido voltá-la contra ela mesma – e sem dúvida mais uma vez ele foi tentado a fazê-lo. Sua derrota foi ter conseguido fundá-la. É necessário desconstruir a filosofia da história por meio de um uso genealógico desta, um uso rigorosamente antiplatônico. E então que o sentido histórico libertar-se-á da história supra-histórica (FOUCAULT, 1993, p. 25-26).

As construções do sujeito sobre si mesmo e das sociedades sobre ele podem ser encaradas como uma estética do “eu”, própria do mundo contemporâneo. Ela não se caracteriza mais pela busca por uma essência definidora da natureza humana calcada nas ideias de “belo” e “bom” e, nesse sentido, constitui uma nova estética da existência que passa por uma nova leitura da própria existência: pós-essencialista, pós-metafísica, pós-cartesiana... pós-moderna. As diferentes trajetórias de músicos e compositores foram percebidas por meio de suas próprias falas e do uso positivista das fontes musicais “como se as palavras tivessem guardado seu sentido, os desejos sua direção, as idéias sua lógica, como se o mundo das coisas ditas e queridas não tivesse conhecido invasões, lutas, rapinas, disfarces, astúcias” (FOUCAULT, 1993, p. 26).

Nesse sentido, as biografias buscavam em suas pesquisas a origem, “um esforço para recolher nela [na pesquisa] a essência exata da coisa, sua identidade cuidadosamente recolhida em si mesma, sua forma imóvel, e anterior a tudo que é externo, acidental, sucessivo” (FOUCAULT, 1993, p. 26). Consiste na tentativa ilusória de encontrar o “aquilo mesmo de uma imagem exatamente adequada de si na tentativa de querer tirar todas as máscaras para desvelar uma verdade primeira”. Já o genealogista, de acordo com Foucault, tem o cuidado de escutar a história ao invés de acreditar na metafísica para descobrir que atrás das coisas há algo completamente diferente do seu “segredo essencial e sem data, mas o segredo que elas são sem essência, ou que sua essência foi construída peça por peça a partir de figuras que lhes eram estranhas” (FOUCAULT, 1993, p. 26).

A pesquisa histórica da música demonstra também que a variedade na tipologia da documentação é um ponto saudável de uma pesquisa que busca perceber uma relação mais complexa entre a música e a sociedade. Sobre essa questão, Marc Bloch afirma que

Seria uma grande ilusão imaginar que a cada problema histórico corresponde um tipo único de documentos, especifico para tal emprego. Quanto mais a pesquisa, ao contrario, se esforça por atingir os fatos profundos, menos lhe é permitido esperar a luz a não ser pelos raios convergentes de testemunhos muitos diversos em sua natureza (BLOCH, 2001, p. 80).

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As dificuldades encontradas pela historiografia e pelos musicólogos que trataram esse tema são resultado, ora da exclusão do material musical (notação musical, partituras e gravações das obras) de suas análises, ora da utilização exclusiva desses elementos musicais. Essa dificuldade está ligada ao que se pode chamar de naturalização da historia. A introdução dos parágrafos anteriores aponta para o fato de que a própria história da música deve ser tratada como uma construção historiográfica. Os documentos musicais devem ser problematizados enquanto fontes que não dizem por si só e que por isso devem ser analisada como construções com significados particulares. Esses significados devem ser buscados a partir de uma metodologia particular (LE GOFF, 1992).

Nessa nova perspectiva, explicita-se a necessidade de articular a linguagem técnico-estética das fontes audiovisuais e musicais (ou seja, seus códigos internos de funcionamento) e as representações da realidade histórica ou social nela contidas (seu conteúdo narrativo propriamente dito). Assim, Napolitano enfatiza que,

A primeira decodificação é de natureza técnico-estética: quais os mecanismos formais específicos mobilizados pela linguagem cinematográfica, televisual, ou musical? A segunda decodificação é de natureza representacional: quais os eventos, personagens e processos históricos nela representados? Na prática, estas duas decodificações não são feitas em momentos distintos, mas à medida que analisamos a estrutura específica do material audiovisual ou musical, suas formas de representação da realidade vão tornando-se mais nítidas, desvelando os fatos sociais e históricos nela encenados direta ou indiretamente (NAPOLITANO, 2005, p. 237).

Procedendo desse modo, o estudioso pode revelar, por meio das fontes musicais, os diferentes padrões estéticos de uma dada sociedade, bem como apresentar diferentes posições acerca das práticas musicais, formas de compor, das sonoridades, das orquestrações e da difusão de diversos gêneros musicais por meio de concertos e circulação de partituras. Na maioria das vezes, o que acontece é a substituição desses documentos musicais por documentos escritos, desvinculando-se assim o material musical da análise. É o que acontece com bastante frequência nos estudos de canções, quando se leva em conta apenas a letra, ou seja, o texto ou a lírica.

Perspectiva que envolve a busca por uma história cultural da música é uma “história dos significados” num sentido que tangencia a história da arte. Em outros termos, a busca por uma “história da recepção” que tem como objeto de pesquisa não apenas a obra artística em si, mas sim a mudança de seus significados de acordo

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com a sociedade que a recebe. Essa perspectiva de análise da arte, presente nas obras pioneiras de Panofvsky e Warburg, é, para Burke, uma das matrizes da chamada história cultural. Porém, é importante destacar que a noção de “cultura” presente nos trabalhos dessa tradição “clássica” da história cultural se refere à cultura “canônica”, ou seja, à arte com “A” maiúsculo. Após as transformações teórico-metodológicas pelas quais passou a pesquisa histórica, principalmente após os anos 1970 e 1980, a história cultural ampliou seus objetos de pesquisa e acompanhou as transformações exigidas pelas mudanças no próprio conceito de “cultura”3.

Outra tipologia de análise que deve ser reavaliada tornou-se muito difundida no campo da pesquisa histórico-musical, principalmente após as obras de José Ramos Tinhorão. Esse historiador, que desde a década de 1970 se transformou numa referência quase que obrigatória para os pesquisadores da chamada história da música popular brasileira, desenvolveu sua produção em torno do mapeamento dos gêneros musicais brasileiros (choro, samba, samba-canção etc.). As fontes utilizadas por ele para o desenvolvimento de seus textos são bastante variadas: documentos oficiais, textos de viajantes estrangeiros, periódicos e materiais iconográficos. Mas a desvinculação do material musical da análise, o abandono da forma e a supervalorização das fontes escritas fizeram com que Tinhorão desenvolvesse um discurso que levantou questões de ordem ideológica e sociológica, enfocando a música apenas como “gênero” e ocultando um debate histórico-cultural que privilegiasse os sons, os estilos e a produção musical propriamente dita (NAPOLITANO, 2005).

Não se trata de menosprezar as fontes escritas não musicais ou colocá-las em segundo plano, mas de destacar a importância do material musical, em forma de partitura ou fonograma. É importante perceber que o caráter polissêmico do documento musical não é um obstáculo insuperável. Na busca do significado histórico-cultural do objeto musical, é indispensável ao historiador remontar a uma “rede de escuta” que perpassa o universo cultural no qual está inserido um possível recorte temático e temporal, pois,

Qualquer que seja a problemática e a abordagem do historiador, fundamental é que ele promova o cotejamento das manifestações escritas da escuta musical (crítica, artigos de opinião, análises das obras, programas e manifestos estéticos, etc.) com as obras em sua materialidade (fonogramas, partituras, filmes). A partir desse procedimento, o historiador

3 Para as relações entre história da arte e história cultural, bem como para a trajetória da produção historiográfica no campo da Historia Cultural, ver: BURKE, Peter. Unidade e variedade na história cultural. In BURKE, P. Variedades de história cultural. Trad. Alda Porto. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005; BURKE, Peter. O que é história cultural. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2005; HUNT, L. A nova história cultural. São Paulo: Cia das Letras, 2001 e GINZBURG, C. Mitos, emblemas e sinais: morfologia e História. São Paulo: Companhia das Letras, 1989.

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HISTóRIA DA MúSICA: REFLEXõESTEóRICO-METODOLóGICAS

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pode perceber quais parâmetros foram destacados numa canção ou peça instrumental, quais foram os critérios de julgamento de uma determinada época, como foram produzidos os sentidos sociais, culturais e políticos a partir da circulação social desta obra e de sua transmissão cultural como patrimônio cultural coletivo (NAPOLITANO, 2005, p. 235).

Além da questão formal, o processo de recepção e o caráter representacional da música são, portanto, fundamentais para a pesquisa histórica. Em outros termos, é necessário ir além de uma análise que enfoque compassos, tonalidades, intensidades, grafia musical, dentre outros aspectos formais. As possibilidades de trabalho do historiador ampliam-se a partir do mapeamento das “escutas históricas: crítica, públicos e os próprios artistas que são também ouvintes [...] [e] dão sentido histórico às obras musicais” (NAPOLITANO, 2005, p. 259).

Os objetos musicais podem ser entendidos, também, como objetos sociais e, em consequência, como representações sociais. É por esta razão que “o modo como indivíduos e grupos reagem ante eles [os objetos musicais] seria influenciado pelas representações que os indivíduos têm sobre música e sobre a instituição a que estão vinculados”. Assim, “a abordagem das representações sociais é um modelo conceitual capaz de explicar os processos de criação e apreciação artísticos, integrando aspectos históricos, sociais e culturais”. Esta abordagem permite “analisar o fenômeno musical em seu duplo papel, tanto como produto da realidade social quanto como parte do processo de construção da realidade” (DUARTE, 2002, p. 123).

Tendo como objeto de pesquisa a literatura, Chartier (1991) propõe uma análise histórica que desloca a atenção, tanto para o mundo do texto quanto para o mundo da leitura, destacando a importância das práticas de leitura e das construções de sentido a partir de diversas apropriações. A construção de sentido, que se efetua no processo de leitura (ou escuta), enquanto um processo histórico varia de acordo com o tempo e os lugares. As diversas significações de um texto dependem das formas por meio das quais ele é recebido por seus leitores (ou ouvintes) (CHARTIER, 1991). Acredita-se que esta perspectiva teórico-metodológica pode ser empregada para uma análise histórica que tem a música como seu objeto de investigação.

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Loque Arcanjo Júnior

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REfERêNCIAS

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ARCANJO, Loque. O ritmo da mistura e o compasso da história: o modernismo musical nas Bachianas Brasileiras de Heitor Villa-Lobos. Rio de Janeiro: E-papers, 2008.

ARCANJO, Loque. As representações da nacionalidade nas Bachianas Brasileiras de H. Villa-Lobos. Revista Escritas, Palmas, v. 2, ano 2, p. 77-101, 2010.

ARCANJO, Loque. Francisco Curt Lange e o Modernismo Musical no Brasil; identidade nacional, política e redes sociais entre os anos 1930 e 1940. Revista e-hum, Belo Horizonte, v. 3, n. 2, p. 66-81, 2010. Disponível em: <http://www.unibh.br/revistas/ehum/>.

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ARCANJO, Loque. (Re)dimensionando as fronteiras do nacional: identidades musicais de Heitor Villa-Lobos entre o Americanismo e o Pan-americanismo. Revista Relações Internacionais no Mundo Atual, Curitiba, v. 1, n. 13, 2011.

ARIÈS, P.; DUBY, G.; LADURIE, E. L. R. História e nova história. Lisboa: Editorial Teorema, 1994.

BLOCH, Marc. Apologia da história ou o ofício de historiador. Rio de Janeiro: Joge Zahar, 2001.

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BURKE, P. Variedades de história cultural. Tradução de Alda Porto. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005;

BURKE, Peter. O que é história cultural. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2005.

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HISTóRIA DA MúSICA: REFLEXõESTEóRICO-METODOLóGICAS

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CHARTIER, Roger. O mundo como representação. Estudos Avançados, São Paulo, n.11(5), p. 173-191, 1991

DUARTE, Mônica de Almeida. Objetos musicais como objetos de representação social: produtos e processos da construção do significado em música. Revista Em Pauta, v. 13, n. 20, p. 123-142, jun. 2002.

ELIAS, N. O processo civilizador: uma história dos costumes. v. 1. Rio de Janeiro: Editora Zahar, 1990.

ELIAS, Norbert. Mozart: a sociologia de um gênio. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editores, 1995.

FOUCAULT, Michel. A microfísica do poder. Rio de Janeiro: Graal, 1993.

GINZBURG, C. Mitos, emblemas e sinais: morfologia e história. São Paulo: Companhia das Letras, 1989.

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REIS, J. C. A Escola dos Annales: a inovação na história. São Paulo: Paz & Terra, 2000.

TINHORÃO, José Ramos. História social da música popular brasileira. Lisboa: Editorial Caminho, 1990.

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Loque Arcanjo Júnior

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History of music: theoretical and methodological reflexions

Abstract: This article aims to reflect on the possibilities of expanding the theoretical horizon of methodological research in the field of music history from the dialogue with the “new cultural history”.

Keywords: Music; history; cultural history.

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ANÁLISE MUSICAL E MUSICOLOGIA HISTóRICA

Domingos Sávio Lins Brandão

Mestre em Sociologia e doutorando em História pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Professor de História da Música, Estética da Música, Flauta Doce e Musicologia na Escola de Música da Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG), coordenador do Núcleo de Acervos do Centro de Pesquisa e Diretor do Grupo de Música Antiga da UEMG da mesma escola. Em 2009 recebeu a homenagem de Personalidade

da Música Antiga em Minas Gerais, na II Semana de Música Antiga da UFMG.

[email protected]

ResumoO presente trabalho tem como objetivo discutir de que maneira a análise musical pode vir a ser um instrumento valioso para a musicologia histórica brasileira voltada para o trabalho de transcrição e edição de manuscritos musicais do passado, segundo a perspectiva da história social da música.

Palavras-chave: Análise musical; musicologia; história social da música.

Introdução

Daremos início às nossas reflexões sobre análise musical e musicologia histórica, recorrendo ao texto de Jean Molino, Análises: epistemologia/métodos/reflexão: “A análise musical existe: existem revistas de análise musical, especialistas que a ensinam e de congressos onde eles se reúnem para falar dela. Sem dúvida, esta é suficiente para a alegria dos analistas [...]” (MOLINO, 1989, p. 11). E ele lança a pergunta: “É preciso analisar?”

No ensejo desse autor, fazemos outra indagação: que tipo de análise poderia melhor atender às necessidades da musicologia histórica brasileira voltada para o trabalho de transcrição e edição de manuscritos musicais do passado?

Molino observa que, de maneira geral, o analista “isola arbitrariamente um objeto de contexto infinito no qual ele se insere, busca unidades das quais ele faz o inventário e tenta construir um modelo de objeto graças às estas unidades e às regras de combinações

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internas” (MOLINO, 1989, p. 12). Porém, mais adiante, o autor que considera a música como “um fato social total”1, enfatiza que a construção desse “inventário” não é o suficiente, pois numa análise musical se faz necessário reconhecer:

que um objeto musical, como todo objeto simbólico, tem uma tripla dimensão de existência; ele existe como resultado de uma estratégia de produção, como objeto presente no mundo [...]; ele existe enfim como fonte de estratégia de recepção tão logo os públicos mais diversos escutam a mesma música (MOLINO, 1989, p. 12).

Se considerarmos a Teoria Tripartite2 inspirada em Molino como um caminho para a musicologia histórica voltada para o trabalho de transcrição e edição de manuscritos musicais do passado, devemos procurar abordar a música “não” apenas como “objeto presente no mundo” – o nível neutro de uma obra (se for mesmo possível considerar a existência desse nível), mas relevar, acima das “regras de combinações” suas outras dimensões: a de ser objeto “poiético” e “estésico”. Deve o musicólogo histórico compreender que uma obra musical existiu num contexto e continua existindo em outros contextos, e dessa forma, representa práticas culturais, práticas essas que dão significado ao mundo. Uma partitura é, assim, representação social de práticas culturais:

Os objetos musicais podem ser entendidos como objetos sociais e, em conseqüência, como representações sociais. É por esta razão que “o modo como indivíduos e grupos reagem ante eles [os objetos musicais] seria influenciado pelas representações que os indivíduos têm sobre música e sobre a instituição a que estão vinculados” Assim, “a abordagem das representações sociais é um modelo conceitual capaz de explicar os processos de criação e apreciação artísticos, integrando aspectos históricos sociais e culturais” Esta abordagem permite analisar o fenômeno musical em seu duplo papel, tanto como produto da realidade social quanto como parte do processo de construção da realidade (DUARTE3, 2002 apud ARCANJO, 2008, p. 20).

1 Termo tomado de empréstimo de Marcel Mauss, que considera os fenômenos sociais como “fatos sociais totais”: Nesses fenômenos sociais ‘totais’, como nos propomos chamá-los, exprimem-se, de uma só vez, as mais diversas instituições: religiosas, jurídicas e morais - estas supondo formas particulares da produção e do consumo, ou melhor, do fornecimento e da distribuição -; sem contar os fenômenos estéticos em que resultam esses fatos e os fenômenos morfológicos que essas instituições manifestam (Mauss, 2003, p. 187).2 Segundo a “Teoria Tripartite” de NATTIEZ (1997) inspirado em Molino, a música é um ato de comunicação onde as três dimensões interferem nos significados das mensagens envolvidas. Ele propõe um modelo de análise musical, que contemple três níveis: nível poiético (os procedimentos para a criação da obra); nível estésico (como a obra é interpretada por quem a ouve) e o nível imanente (ou nível neutro, a obra em si).3 DUARTE, Mônica e Almeida. Objetos musicais como objetos de representação social: produtos e processos da construção em música. Revista em Pauta, Poro Alegre, v.13, n. 20, p.123-142, jun. 2002.

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Análise musical e musicologia histórica

Temos observado que em alguns poucos e tímidos trabalhos musicológicos, muito recentemente no Brasil, tem-se buscado entender o fato musical através de perspectivas que levem em consideração suas múltiplas facetas. No tocante à analise musical, “diversas abordagens têm buscado sentido na música não apenas como obra e estrutura autônoma, mas sobretudo como linguagem ou enunciado situado num contexto sócio- cultural” (VOLPE, 2012, p. 113). Em tais abordagens, a interdisciplinaridade tem sido o caminho escolhido, tendo como viés as leituras da história social da cultura, como o caso da citação acima, do historiador Loque Arcanjo.

Tendo como cenário esse contexto, onde se tem buscado ultrapassar a “tela” que “mascara” a “estrutura aparente” (LEVI-STRAUSS, 1985, p. 318) do fenômeno musical, continuamos nossas reflexões, considerando agora as fontes musicais, especialmente as partituras, como “documentos monumentos”, fazendo uso da conceituação do historiador Jacques Le Goff:

o monumento tem como características o ligar-se ao poder de perpetuação, voluntária ou involuntária, das sociedades históricas (é um legado à memória coletiva) e o reenviar a testemunhos que só numa parcela mínima são testemunhos escritos (LE GOFF, 2003, p. 538).

Um manuscrito musical considerando-o como documento-monumento

não é inócuo. É, antes de mais nada, o resultado de uma montagem, consciente ou inconsciente, das sociedades que o produziram, mas também das épocas sucessivas durantes as quais continuou a viver, talvez esquecido, durante as quais continuou a ser manipulado, ainda que pelo silêncio. O documento é uma coisa que fica, que dura, e o testemunho, o ensinamento (para evocar a etimologia) que ele traz devem ser em primeiro lugar analisados, desmitificando-lhe o seu significado aparente. O documento é monumento. Resulta do esforço das sociedades históricas para impor ao futuro – voluntária ou involuntariamente – determinada imagem de si próprias (LE GOFF, 2003, p. 538).

A musicologia deve considerar que suas fontes, seus manuscritos (objetos “estésicos/ poiéticos”) é o resultado de “esforços de sociedades históricas”, ou em outras palavras, eles são representações culturais, frutos de práticas sociais: a música “pode ser vista como expressão de projetos e lutas culturais contraditórias de uma

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determinada época” e assim, considerá-la como “historicamente produzida pelas práticas articuladas (políticas, sociais, discursivas) que constrói” (COSTA, 2010, p. 111). “Tais práticas são consideradas complexas e ajudam a construir um mundo repleto de representações” (CHARTIER4, 1990, p. 2 apud COSTA, 2010, p. 111).

Não podemos, portanto, conceber a Musicologia Histórica como um campo de conhecimento isolado das conquistas teóricas, notadamente, da História Social Cultura. Ora, Kerman observa que o musicólogo Claude V. Palisca, autor em parceria Donald J. Grout da obra de referência História da música ocidental5 salientava que “o musicólogo é, em primeiro lugar e acima de tudo um historiador” (KERMAN, 1987, p. 48). E o fato de considerar o musicólogo um historiador não se trata de capricho ou modismo, mas de uma necessidade dialógica. Fazemos das palavras do musicólogo João Berchmans de Carvalho Sobrinho as nossas: “A concepção central é a de um permanente diálogo interdisciplinar no intuito do enriquecimento da abordagem, procurando fazer uma leitura relacional entre concepção musicológica e as condições sociais e históricas de produção” (CARVALHO SOBRINHO, 2010, p. 17).

Porém, o que temos presenciado? A produção maciça musicológica, especialmente no que diz respeito à edição de obras do passado, calcada em considerações analíticas apriorísticas, que continuam ignorando as circunstâncias nas quais as obras foram criadas. De tal forma que ainda vemos, no caso da música mineira do século XVIII, por exemplo, publicações em que as “restaurações” continuam a enxergar música do barroco mineiro como mera cópia ou imitação dos cânones musicais da matriz europeia. Resultado: interferência subjetiva a partir de ferramentas e regras consideradas como dogmas, na reconstrução das obras, sem uma maior reflexão crítica a respeito das práticas culturais que mediaram essa criação musical. Consequentemente, o vislumbre de uma “paisagem” musical diferenciada, fica comprometido:

Uma realidade móvel e temporal, como é a linguagem musical, não pode ser abordada a partir de conceitos estáticos e apriorísticos. É preciso investigar a criação criativamente. As ferramentas e regras, válidas para uma obra, podem não ser úteis para outras cujo contexto seja diverso tanto ao nível da estrutura, quanto ao da história (SEICMAN,1995, p. 44).

Tal tipo de ação musicológica pouco tem contribuído para a compreensão da música como um fenômeno que não pode ser isolado de seu contexto. As abordagens que não levam em consideração que o som é um fenômeno social acreditam que os dados

4 CHARTIER, Roger. A história cultural: entre práticas e representações. Rio de Janeiro: Editora Bertrand Brasil, 1990, p. 25 GROUT, Donald J.; PALISCA, Claude V. História da música ocidental. Lisboa: Gradiva, 1994.

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musicais podem falar por si. Daí a perpetuação de se considerar a presença do que chamamos de “não-observâncias”6 aos cânones musicais de determinada época numa obra (de um ponto de vista apriorístico e etnocêntrico), aparentemente um “erro”, “falta de habilidade ou conhecimento musical de seu compositor. Tomam outro sentido quando as “não-observâncias” são analisados em sua “teia cultural”.

Maria Alice Volpe chama nossa atenção para o “artigo manifesto” de Gary Tomlison7, um dos pioneiros da Nova musicologia, publicado 1984, onde, segundo ela, já se havia proposto

um novo direcionamento teórico para a musicologia histórica, voltada para a antropologia cultural, e mais especificamente para a hermenêutica cultural de Clifford Geertz. [...] Trata-se de uma historiografia contextual que enfatiza a relação da parte com o todo em seus quadros locais de consciência, superando a relação de causa e efeito que guiou o discurso historiográfico positivista (VOLPE, 2012, p. 115).

Porém, dez anos após a publicação de Tomlison, Vanda L. B. Freire, lastimava que a história da música ainda se encontrava estruturada no tetragrama positivista “autor/data/obra/forma”:

A bibliografia sobre a História da Música, ainda que revestida de considerações sobre o contexto em que as obras foram geradas por seus autores, essencialmente continua enfatizando, na quase totalidade dos casos, a sucessão cronológica, a derivação causal dos processos estéticos, ainda que enriquecidos por exemplos obtidos da análise de obras (FREIRE, 1994, p. 113).

E apesar de algumas iniciativas, ainda no século XXI, tal situação continua prevalecente, de acordo com as observações de Myrian Chimènes:

O trabalho musicológico sério e valioso consistia, e ainda consiste, em estabelecer a biografia dos grandes músicos, descrever as influências que exerceram uns sobre os outros e traçar a história das formas e dos gêneros, geralmente relacionados ao nascimento e evolução do sistema tonal. (LESURE8, 1961 apud CHIMÈNES, 2008, p. 17).

6 Usamos esse termo para designar os procedimentos musicais utilizados pelos compositores do Barroco Mineiro considerados desviantes do cânones musicais da segunda metade do século XVIII.7 TOMLISON, Gary. The web of culture: a context for musicology, 19th-Century Musica 7/3 (1984): 350-3628 LESURE, François. Musicologia In: ______. Encyclopedie de la musique. Paris: Fasquele, 1961.

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Talvez seja por esse motivo que Stefani sublinha que “a história e análise das estruturas musicais – em relação às práticas sociais que nelas deixaram marcas mais ou menos determinantes – está praticamente por fazer” (STEFANI, 1989, p. 51).

Em nossa tarefa musicológica, particularmente no trabalho aonde concebemos fontes musicais como documentos-monumentos, incrustados de poiésis e estesia, levamos em conta as diversas abordagens que se preocupam em realizar a análise musical diante da dimensão música/sociedade. Afinal, conforme Blacking,

[...] os diferentes sistemas cognitivos subjacentes da música seriam melhor entendidos se música não for destacada de seu contexto e considerada como ‘objetos sônicos’ mas tratada como sons humanamente organizados cujos padrões estão relacionados aos processos cognitivos e sociais de uma sociedade e cultura em particular (BLACKING9 1995, p. 55 apud CARDOSO, 2003, p. 7).

O musicólogo Gerad Béhague, que tanto trabalhou pela música brasileira, também considera que:

o contexto social se define não somente como identidade sócio-cultural que corresponde a valores específicos do grupo social do compositor, mas também da posição política-ideológica do mesmo. Por política deve-se entender a visão teórica básica da ordem social em que se incluem as relações de poder entre os atores sociais de um grupo determinado e as funções destes atores na rede de interação. (BEHÁGUE10, 1992, p. 7 apud RIBEIRO, 2006, p. 1)

Como ainda sentimos a necessidade de enfatizar nossa visão, faremos diversas citações de autores que demonstram a necessidade de realizar análise musical levando em conta que tanto os compositores como os intérpretes e os ouvintes se acham condicionados por sistemas e convenções, consideração que para a musicologia histórica se faz imprescindível. Podem parecer exaustivas, no entanto, se revestem de grande significação para nossa postura epistemológica voltada para o trabalho de transcrição e edição de manuscritos musicais do passado.

Comecemos com Allan Merrian, que considera a música como um produto do

9 BLACKING, John. The problem of musical description. In: BYRON, Reginald (Ed.). Music, culture, and experience: selected papers of John Blacking. Chicago e Londres: University of Chicago Press, 1995. p. 54-72.10 BÉHAGUE, Gerard. Fundamento sócio-cultural da criação musical. Revista da Escola de Música e Artes Cênicas da UFBA. Agosto: 5-18.

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comportamento humano. Analisá-la, não podemos enxergá-la fora de seu contexto:

O som musical é o resultado de processos comportamentais humanos que são modelados pelos valores, atitudes e crenças das pessoas que compartilham uma determinada cultura. O som musical não pode ser produzido exceto por pessoas para outras pessoas, e, embora possamos separar os dois aspectos (o aspecto som e o aspecto cultural) conceitualmente, um não está realmente completo sem o outro. O comportamento humano produz música, mas o processo é contínuo; o comportamento é amoldado para produzir som musical e, assim, o estudo de um convergente para o outro (MERRIAN, 1964, p. 7).

Já Henry Raynor chama atenção para o fato de que, ao fazer uma história da música, não podemos descartar as influências que as instâncias sociais exercem sobre a produção musical.

A música só pode existir na sociedade; não pode existir, como também não o pode uma peça, meramente como página impressa, pois ambas pressupõe executantes e ouvintes. Está, pois, aberta a todas as influências que a sociedade pode exercer, bem como às mudanças nas crenças, hábitos e costumes sociais (RAYNOR, 1981, p. 9).

Quando realizamos a análise de manuscritos musicais ou música impressa do passado com a intenção de restaurá-la e torná-la possível de ser executada em nossa contemporaneidade, devemos levar em consideração que a obra musical é fruto de uma cultura e que a música existiu numa sociedade. O estudo de um manuscrito considerando esses fatores, influenciará, certamente, nas decisões de cunho formal, estrutural e estilístico para seu projeto editorial.

Já Carl Dahlhaus caminha por trilhas semelhantes e salienta que ao se fazer história da música, deve o historiador considerar os vários fatores contextuais das obras, e que a história da música é o resultado de quem a escreve, ou seja, sua produção, calcado em obras de destaque, perpassa pelas concepções, perspectivas arbitrárias do historiador:

Os fatos musicais podem ser detectados tanto nas intenções do compositor, quanto na estrutura das peças, devidamente analisadas de acordo com a história das formas e dos gêneros, e também na consciência do publico original para

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o qual a obra se tornou um evento. [...] O historiador da música é uma espécie de árbitro que define quais são as obras significativas e quais são subalternas e secundárias (DAHLHAUS, 2003, p. 34).

Embora admiremos a obra Fundamentos da história da música, de Carl Dahlhaus, a leitura desse teórico continua apresentando alguns perigos. Uma das lições da obra de E. H Carr, Que é história (2006), é que a história é um produto de seu historiador, e, antes de ler um livro de história, faria bem conhecer o historiador que o escreveu. O mesmo digo em relação à história da música: antes de ler um livro, procure conhecer o musicólogo que o escreveu, pois o seu resultado certamente estará mediatizado por sua subjetividade.

Nesse sentido, citemos, como exemplo, a seguinte abordagem preconceituosa sobre a música de Lobo de Mesquita: “As progressões harmônicas com movimento paralelo com tanta freqüência que só pode ser consideradas como falta de habilidade por parte do compositor”. (BEHAGUE, 1969, p. 148/155). Ou ainda esta outra passagem sobre o trabalho de Curt Lange: “As partituras ou partes musicais encontradas pelo musicólogo alemão e por ele restauradas, podem ser comparadas a quadros ou painéis modestos, de interesse sobretudo histórico, emoldurados brilhantemente por hábil restaurador.” (MARIZ, 1981, p. 28)

Ora, alguns compositores e suas obras têm sido considerados mais dignos de ocupar um lugar no panteão da história da música, e isto diante de critérios analíticos musicais em que não se consideram a música como representação de culturas específicas. A verdade musical não está apenas na estrutura musical em si. Inspirados nas leituras de Theodor Adorno11, afirmamos que o verdadeiro sujeito da composição não é individual, mas coletivo. A música se desdobra segundo a sua própria lei, que secretamente é social, mas não só segundo essa lei, pois é movimentada e desviada no interior do campo das forças sociais.

Analisando várias obras dos compositores do Barroco Mineiro, constata-se o uso acentuado de 5ª e 8ª seguidas ou diretas, e não só em Emerico Lobo de Mesquita como também em Manoel Dias de Oliveira. Afirma Silvo Crespo que o montante desse procedimento “é de tal vulto e tão bem distribuído em toda literatura conhecida, revelando uma prática generalizada, o que dá uma importância que não podemos deixar de levar em consideração. Consciente ou inconsciente, passa a fazer parte da gramática” (CRESPO, 1989, p. 112).

11 Ver ADORNO, Theodor. Idéias para a sociologia da Música In: ______. Textos escolhidos. Walter Benjamim, Max Horkheimer, Theodor W. Adorno, Jugen Harbemans. São Paulo: Abril Cultural, 1980. p. 260-268. (Os Pensadores).

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Pois bem, esse fenômeno tratava-se de um desconhecimento dos cânones musicais vigentes no século XVIII? Se não levarmos em consideração que a música se desdobra segundo a sua própria lei, que secretamente é social, mas não só segundo essa lei, pois é movimentada e desviada no interior do campo das forças sociais, nossos compositores não podem entrar no panteão reservada apenas aos gênios europeus. Como bem enxerga Napolitano, “a questão central é que, pese a estrutura interna da obra e as intenções subjetivas do compositor, o sentido social, ideológico e histórico de uma obra musical reside em convenções culturais [...]” (NAPOLITANO, 2006, p. 259).

Ao não considerar as “não-observâncias” dos compositores mineiros do século XVIII como póiesis representativa de determinada prática musical, talvez continuemos a ouvir outras “pérolas” como esta, que já me foi dita, de que a música dos compositores coloniais mineiros deveria ser considerada nada mais nada menos que “pré-clássica mal elaborado ou um Rossini piorado!

Neste instante, recorremos ao etnomusicólogo, Anthony Seeger, que sugere o duplo caminho para a análise das estruturas musicais:

Os estudos que focalizam a relação entre música e sociedade permanecem freqüentemente nos níveis de classificação ou valores e, ou não tratam dos sons em si, ou são severamente criticados por sua falta de acuidade musical. Inversamente, a maioria dos estudos centrados na estruturas sonoras não considera as relações entre estas estruturas e outros aspectos da sociedade cuja música se está analisando. [...] É necessário, no entanto, ir além dessas generalizações otimistas e investigar a natureza da vinculação postulada através de estudos que analisem tanto as estruturas sonoras produzidas quanto sua relação com os seres humanos que a produzem (SEEGER, 1977, p. 40).

Lançando mão das reflexões do musicólogo Carlos Kater, para fechar nossa exposição, acredito que ele, de maneira clara, expõe a importância da análise musical para o trabalho musicológico voltado para a transcrição e edição de manuscritos musicais do passado:

A análise individual de uma peça de música [...] visa desvendar seu idioleto bem como os meios técnicos específicos utilizados para sua expressão. Sabemos, no entanto que uma dada música é simultaneamente ilustração viva de um conjunto de aquisições, propriedades originais imanentes (aquilo que em evidência lhe é próprio), traços

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característicos da invenção de seu autor. [...].Nesse sentido, podemos distinguir na conformação de uma série de obras produzidas por um compositor dado suas características expressivo-compositivas – as regras particulares que acabaram por determinar seu estilo – assim como as normas mais amplas que as condicionaram - estética vigente, representada, entre outros, pelo “gosto” musical do período.” [...] A nível de estilo, escola e/ou estética objetiva trazer à tona as propriedades e tipicidades de fatura de um compositor, de uma escola de composição e/ou de uma época.” [...] Num processo de “conhecimento analítico amplo, busca criar-recuperar o significado dessa peça no conjunto da obra de seu compositor, contextualizando na vertente estética de sua época, lançando direta ou indiretamente luzes tanto sobre a linguagem musical quanto sobre os estágio de consciência humana que nela invariavelmente se refletem (KATER, 1994, p. 104, 109, 110).

E para fechar esta parte, recorremos finalmente à esclarecedora citação de Arnaldo Contier, um dos primeiros historiadores a pensar a música em sua dimensão social:

[...] a História Social da Música nem furta à arte o sentido do prazer ou do belo, nem nega-lhe uma vocação política, mas propõe uma discussão em torno da relatividade década obra, ou seja, tenta estabelecer mediações entre o nível estético e as instâncias políticas, econômicas e socais (CONTIER, 1988, p. 109).

Um estudo de caso: Minas Barroca

Através da análise de obras dos séculos XVIII e do século XIX, especialmente as pertencentes ao Acervo Chico Aniceto12 da cidade de Piranga (Minas Gerais), por nós realizadas, contatamos indícios de uma reunião de “gostos musicais” na música do Barroco Mineiro13. Verificamos, portanto, que numa sociedade barroca, de “formas abertas” (WOLFFLIN, 1988; THEODORO, 1992; 1997), e socialmente multifacetada como a mineira do século XVIII, diversos tipos de poéticas e sensibilidades musicais foram suscitados.

Observamos que, em Minas Colonial, não foram utilizadas apenas matrizes de

12 Coleção de partituras objeto de nossa pesquisa que se encontra sob a guarda do Centro de pesquisas da Escola de Música da Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG).13 Consideramos que o Barroco em Minas, notadamente em termos religiosos, não se restringiu aos limites temporais do século XVIII.

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música sacra barroca e pré-clássica, mas além disso, modelos que remontam ao arcaico moteto modal renascentista, ao modo “da prima pratica”14, e ainda cantigas modais que podem significar a presença de sinais da música negra, indígena e/ou do passado medieval ibérico15, além de elementos que revelam “não-observâncias” a moldes musicais setecentistas europeias.

Tais indícios, expressão de um intenso processo de mestiçagem cultural, se encontram presentes, por exemplo, em obras dos consagrados compositores como Manoel Dias de Oliveira, Emerico Lobo de Mesquita e João de Deus de Castro Lobo16, bem como nas obras dos desconhecidos Manoel Camelo Carlos Jorge Mendonça, Cândido José Soares Gouveia, Moura17 e Maciota18. Como exemplo do gosto arcaico citamos, os motetos reunidos no chamado Manuscrito de Piranga19 uma maneira de compor bem próximo ao chamado estilo contra-reformista, que evoca a poética do compositor português Francisco Martins (1625-1680), polifonista da Escola de Évora. Consideramos ainda as cantigas modais Para superar e Ò filhos, ò filhas, obras paralitúgicas, que nos revelam a face de uma religiosidade popular.

Não somente a música era expressão de uma “reunião de gostos”, pois conforme Santiago, em seu trabalho sobre a pintura colonial mineira, “Minas Gerais integrava esse circuito internacional, posicionando-se como centro consumidor capaz de reatualizar, tendo em vista sua cultura visual, matrizes de diversas procedências,marcadas por pendores estéticos de variados períodos” (SANTIAGO, 2009, p. 323).

Torna-se problemático, portanto, enxergar a “música barroca mineira” sob a tradicional perspectiva da divisão linear e evolucionista da histórica da música em “estilos”ou “períodos” problema que Norbert Elias chama a atenção em sua sociologia sobre Mozart:

Mozart era burguês? Sua obra foi a última manifestação de uma música pré-romântica “objetiva”, ou ela já mostra sinais do “subjetivismo” que despontava? O problema é que tais categorias não nos levam muito longe. São abstrações

14 Na concepção de Monteverdi (1567-1643) no início do Barroco a prima prática se referia a maneira antiga de se fazer música, ou seja, polifonia modal renascentista.15 Emerlinda Paz, em seu livro Modalismo na Música Brasileira, relaciona uma série de pesquisadores que consideram o modalismo no Brasil como originário de várias culturas.16 As obras aqui analisadas, do Acervo Maestro Chico Aniceto, foram editadas por nós e por bolsistas de iniciação científica: Manoel Dias de Oliveira, Popule Meus; Lobo de Mesquita, Ofício para quarta-feira de Trevas; Castro Lobo, Plorans.17 Compositores desconhecidos até então. Deles editamos e analisamos as obras , Credo, Credo, Credo e Kyrie respectivamente. 18 Segundo o MaestroAluízio Viegas da Lira Ceciliana de São João Del Rei, e o musicólogo Régis Duprat, Masciota é corruptela de Fortunato Mazzioti, Mestre de Capela no Rio de Janeiro na primeira metade do século XIX19 O Manuscrito de Piranga do início século XVIII que, podem ser as folhas de música mais antigas do Brasil.

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acadêmicas, que não fazem justiça ao caráter-processo dos dados socais observáveis a que se referem (ELIAS, 1995, p. 15 apud ARCANJO, 2008, p. 23).

Por caminhos diversificados, encontramos um verdadeiro conjunto estilístico musical sui-generis, homólogo aos vários gostos de uma sociedade barroca diversificada. Através, portanto, da análise de obras, entendemos a música barroca mineira, conforme as considerações de Theodoro:

Ao compreender a estética barroca nos damos conta de que o problema é mais complexo, ou seja, o que eu estou querendo caracterizar não são as vozes do índio e do negro, mas o momento em que damos o salto arrancando as raízes, superando os preceitos organizadores da memória, ultrapassando a simples soma das tradições, ou seja, o momento da ruptura e não do resgate de um passado supostamente autêntico. É a partir da ruptura que serão criadas as condições para fundarmos uma percepção barroca [...] (THEODORO, 1997, p. 23).

A unidade do conjunto estilístico da produção musical do período colonial mineiro pertence ao campo da estilística europeia, porém ressignificada, transmudada, variegada, reconceptualizada em função da nossa própria multiplicidade social.

Conclusão

Ao fazer uso da análise musical no trabalho musicológico não podemos deixar de considerar o “nível neutro” de uma obra musical, porém, ter sempre presente que este nível não é absoluto e imutável, pois se movimenta e desvia no campo das forças sociais: “analisar uma obra é lê-la no sentido amplo do termo, isto é, estabelecer um diálogo com ela, procurando em seu interior os elementos que nos interrogam e que nos parecem mais significativos” (PIENCIKOWSKI apud CAZNóK, 1990, p. 63).

O caminho a ser seguido, portanto é duplo, pois são necessários estudos que levem conta tanto as estruturas sonoras produzidas por uma dada sociedade quanto à relação dessas com os seres humanos que a produzem.

Acreditamos ainda que a regra válida para a análise de uma obra musical pode não ser válida para outras. No trabalho musicológico, a análise musical deve levar em consideração que uma obra musical, ou um conjunto de obras, é um caso singular, é um “documento-monumento”, produto de uma realidade social tanto quanto parte do processo de construção dessa mesma realidade. Dessa forma ela poderá vir a ser

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um instrumento de investigação e de reflexão capaz de proporcionar ao musicólogo um diálogo esclarecedor com suas fontes.

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Musical analysis and historical musicology

Abstract: This article discussed how to Musical Analysis can be a valuable tool in Historical Musicology Brazilian, especially in the work of transcription and editing of musical manuscripts from the past, from the perspective of the Social History of Music.

Keywords: Music analysis; musicology; social history of music.

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ANÁLISE COMO fERRAMENTA DAREGêNCIA: CONCEPÇÃO, PREPARAÇÃO E APLICAÇÃO

José Maurício Valle Brandão

Graduado em Instrumento, mestre e doutor em Música pela Universidade Federal da Bahia. Doutor em Música pela Louisiana State University, Estados Unidos. Tem experiência na área de Artes, com ênfase em Regência, atuando em: execução musical, regência orquestral e coral, educação musical, ópera e musicologia. Professor Adjunto na UFBA desde 2010. Atualmente é chefe do Departamento de Música e

coordenador artístico da Orquestra Sinfônica e Madrigal da UFBA.

[email protected]

ResumoO presente artigo apresenta uma reflexão acerca da análise como recurso de trabalho na área de Execução Musical, particularmente na Regência. A abordagem procura evidenciar o entendimento da análise para a área, o processo formativo corrente e a sua aplicação como recurso de estudo/trabalho.

Palavras-chave: Teoria da Música; análise; execução musical; regência.

Entende-se por análise em música o processo de “resolução de uma estrutura musical nos seus elementos constituintes relativamente mais simples, e a investigação das funções destes elementos dentro do âmbito desta estrutura” (BENT, 1980, p. 340). Tal procedimento tem por objetivo escrutinar os materiais musicais de modo a compreender sua estrutura, verificar as relações entre as suas partes constituintes, identificar procedimentos e ações, numa postura essencialmente sintática e por vezes cinética. Essa parte do estudo da música “toma como ponto de partida a música em si, em vez de fatores a ela externos” (BENT, 1980, p. 341).

Enunciada dessa forma, a análise em música é parte do corpo de conhecimentos da área da Teoria da Música1, e subtende apenas a abordagem de materiais musicais

1 Teoria [da música] é atualmente entendida fundamentalmente como o estudo da estrutura da música. Isso pode ser dividido entre melodia, rítmo, contraponto, harmonia e forma, mas esses elementos são difíceis de se distinguir um do

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intrinsecamente. Acontece, porém, que no escopo da execução musical – onde está situada a regência – a abordagem do entorno e do extrínseco à música é de paralela e fulcral importância. A Musicologia, a Educação, a Psicologia e a Sociologia da Música oferecem ao executante ferramentas cuja ausência compromete a investigação e o entendimento dos fenômenos musicais. Dessa forma, o termo análise, dentro do ambiente da execução musical, deve ter duas esferas de significado: uma delas, como enunciado acima, dentro do conceito clássico de análise em música; e outra ligada ao conceito genérico e filosófico de análise e síntese, no qual o fim último é a compreensão do fenôneno e não apenas sua decomposição.

O processo analítico, por sua natureza, enquanto procedimento teórico, é posterior à prática. O fenômeno – a obra musical no presente caso – existe, fruto do trabalho do compositor, e a análise é usada a posteriori para estudo e compreensão. Para a regência, por outro lado, a análise precede à prática. Pela análise, e todas as suas decorrências, o regente constrói sua leitura da obra, de onde será elaborada sua interpretação e execução. Nesse caso, pois, a análise é um processo dialético de desconstrução/construção, elo fundamental entre o imaginário do compositor, o registro de sua obra, o documento/tradição que a preserva, a leitura do executante e sua interpretação.

No processo de formação em música, o aprendizado da análise é muitas vezes implementado a partir do estudo dos diversos elementos estruturais de música: harmonia, contraponto, forma etc. Daí, num primeiro momento, é recorrente identificar diversas “análises”, a saber: harmônica, formal, frasal, da condução de vozes etc. De fato, para além desse nível elementar, variados métodos analíticos são de uso corrente. São relevantes: a análise da estrutura fundamental de Schenker; a análise dos processos temáticos de Réti; a análise funcional de Keller; a análise das estruturas frasais de Riemann – apenas para mencionar algumas – além das aplicações em análise dos ciclos hexatônicos, teoria dos conjuntos, classes e funções, distribuição e linearidade.

Numa abordagem exterior à Teoria da Música, situam-se: as análises históricas e estético-estilísticas, dentro do campo de estudo da Musicologia; abordagens ligadas à percepção, cognição e memória musical dentro dos campos da Educação e da Psicologia da Música; e, de maneira mais aprofundada, incursões na Sociologia e Antropologia da Música. Um estudo da história da Teoria da Música também pode se mostrar de grande utilidade.

outro e de separá-los dos seus contextos. Num nível essencialmente fundamental, a teoria da música inclui considerações sobre sistemas tonais, escalas, afinação, intervalos, consonâncias e dissonâncias, proporções métricas, notação musical e acústica dos sistemas de afinação. Um corpo de teoria existe também sobre outros aspectos da música, tais como: composição, performance, orquestração, ornamentação, improvisação e produção de sons eletrônicos (PALISCA, 1980, p. 741).

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ANÁLISE COMO FERRAMENTADA REGÊNCIA: CONCEPÇÃO,PREPARAÇÃO E APLICAÇÃO

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Diante de todo esse arcabouço de conhecimentos, porém, constata-se que não existe método analítico ou técnica de análise única e completa, aplicável a todos os casos e à totalidade da literatura e repertório. A análise como ferramenta é um conjunto de conhecimentos que precisa ser encaixado no propósito da abordagem que se necessita e do material inquirido. Daí a necessidade de uma formação plural em análise, que contemple as mais diversas abordagens. Dessa forma, o regente poderá usar o procedimento ou método – isoladamente ou em combinação – que melhor explique o fenômeno em questão.

Num senso geral, a preparação pessoal do regente pode ser resumida numa frase que encerra o objetivo desse processo: o regente deve conhecer verdadeiramente a partitura que executa, e determinar exatamente o que espera obter dela. Nesse sentido, a regência é a mais delicada das atividades de execução musical, pois a realização da ideia do compositor não é produto direto de sua vivência, mas sim do que consegue transferir aos seus executantes.

É esta a problemática de todos os intérpretes [o problema do relacionamento com a obra]; mais premente, porém, no caso da regência, pois que a convicção de regente deve ser tão profundamente vivenciada, que possa transferir-se para os músicos como se fosse produto da vivência de cada um deles (MAGNANI, 1984, p. 20-21).

Esta realidade proporciona ao regente, enquanto executante, uma vivência completamente distinta dos demais performers – instrumentistas ou cantores – uma vez que, antes de qualquer realização musical concreta, ele deve criar no seu ouvido interno todas as condições, elementos e circunstâncias da performance a ser realizada. “Esta imagem deve refletir todos os aspectos do fazer musical, dos mínimos detalhes à ampla fluência da música, do primeiro ao último compasso” (RUDOLF, 1980, p. 313). De todo modo, transposta a fase de escolha de repertório, a preparação do regente inicialmente deve ser enfocada como o estudo da partitura. Isso consiste basicamente num processo de compreensão da obra musical, fundado num procedimento de escolhas, um elenco de decisões acerca de andamentos, articulações, fraseados, dinâmicas e demais elementos da estruturação musical, que ao lado dos conceitos estético-estilísticos, do conhecimento de práticas interpretativas e de uma considerável dose de bom senso, irão compor o ideal interpretativo a ser atingido na execução. Por conseguinte, todo esse processo depende diretamente de todo background na formação do músico-regente: na determinação de um andamento, de uma articulação ou de determinado elemento do seu gestual. De fato, sua segurança na transmissão das ideias que deseja realizar aos seus executantes estará fundamentada em todo o conjunto de conhecimentos de música e das áreas mais

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diversas do conhecimento que adquirir na sua formação.

Magnani (1984) no que denomina “relacionamento regente-obra”, divide o processo de preparação do regente, no que tange ao estudo da partitura [análise], em três fases: primeira, denominada crítico-filológica; segunda, denominada estratégica; terceira, denominada tática. Na primeira fase, ele classifica a atividade do regente como filológica, linguística e crítica, no sentido da captação e extração da leitura mais “correta e autêntica” possível do texto musical. Na segunda, ele acredita que o regente deve determinar o grau de sua liberdade no que concerne aos elementos que utilizará e sua respectiva dosagem na construção do seu ideal interpretativo. Na terceira, ele define a estruturação dos procedimentos a serem utilizados em ensaio, de modo a obter dos executantes o resultado que deseja.

Para além dos processos de estudo, planejamento e organização com vistas à construção da execução musical, a análise – aqui referida no seu senso geral – pode ser definida como diretriz de eficácia para a busca da excelência. Dentre tantos aspectos que em seu uso concorrem para o incremento de qualidade dos resultados, um deles pode ser evidenciado com grande relevância: a administração e otimização do uso do tempo. Um sólido processo de análise concorrerá para um melhor equacionamento do uso do tempo de estudo e ensaios, cujo desdobramento imediato é a possibilidade de melhor concurso para obtenção dos objetivos traçados.

Sob o ponto de vista da execução musical, o regente deve dominar aquilo que pretende realizar, de modo a manipular o material musical e humano que dispõe, estando preparado para efetuar as escolhas e decisões que julga pertinente, com o intuito de obter o resultado que espera como ideal estético e interpretativo. Nesse sentido, deve eleger, através de seu estudo e pesquisa – onde a análise se insere – aquilo que determinará como “correto” e como “bonito”2, o que deve estar fundamentado em todo o conjunto de conhecimentos de arte, música, história, estética etc., cuja formação e amadurecimento não são aptidões inatas, mas sim conhecimentos construídos.

2 Em 1832 Ludwig Spohr publicou um tratado de execução do violino - Violinschule - no qual expressa, sob o seu ponto de vista o que é “correto” e o que é “bonito” na execução musical (Richter Vortrag e Schöner Vortrag, respectivamente). Uma execução “correta” inclui uma afinação apurada, ritmos exatos, uniformidade dos tempos além da observação das indicações do compositor. Uma execução “bonita” requer um refinado tratamento das dinâmicas, acentos, agógica e fraseados. Além disso, mudanças de andamento podem ser sugeridas por afetos de cada determinada passagem (RUDOLF, 1980, p. 331).

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ANÁLISE COMO FERRAMENTADA REGÊNCIA: CONCEPÇÃO,PREPARAÇÃO E APLICAÇÃO

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Musical Analysis, a toll for conducting: conception,preparation and application

Abstract: This article presents a survey about musical analysis as a work tool in performance, especially in conducting. The approach aims to point out the area’s understanding of analysis, its current learning process, and its application as study/work resource.

Keywords: Music theory; musical analysis; musical performance; conducting.

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fORMA E ESTRUTURA NA MÚSICA OCIDENTAL: UMA INTRODUÇÃO A ALGUMAS DAS fORMAS MAIS

RECORRENTES NA MÚSICA EUROPEIA DOSSéCULOS xVII E xVIII

Ronaldo Cadeu de Oliveira

Compositor, maestro e violonista; professor da Escola de Música da Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG), regente e diretor musical da Orquestra Sinfonietta Belo Horizonte. Ph. D. em Composição Musical e Regência Orquestral e Mestre em Composição Musical, ambos pela Louisiana State University (EUA). Detentor de

várias premiações nacionais nas áreas de composição musical e performance.

[email protected]

Resumo: O presente artigo apresenta de forma clara e resumida algumas das formas musicais mais recorrentes na música de concerto ocidental, a saber: sonata barroca, forma binária, forma ternária composta, ternária simples, rondó e forma sonata.

Palavras-chave: Formas musicais; análise musical; música ocidental; forma sonata.

1 Elementos formais da sonata barroca na Itália

O termo “sonata” aparece em fins da renascença para indicar de modo genérico peças instrumentais. Giovanni Gabrieli (c. 1557 - 1612) escreve peças que envolvem grupos instrumentais relativamente grandes os quais o compositor utiliza de modo antifonal criando contrastes entre grupos de cordas e metais a maior parte das vezes (EINSTEIN, 1959, p. 84; ROEDER, 1994, p. 17). Em fins do século XVI, o termo “sonata” gramaticalmente era o particípio passado feminino do verbo sonare que em italiano significa soar. Esse tipo de forma gramatical associada à música aparece diversas vezes como nos termos “cantata” do verbo cantare em peças para serem cantadas; “toccata” do verbo toccare em peças tocadas que geralmente tinha a intenção de mostrar destreza e domínio técnico, sobretudo, em instrumentos

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de teclado; e também “ballata” do verbo ballare em peças para serem dançadas. Naquele período era comum o uso de títulos longos para as peças, como o seguinte da peça do compositor Adriano Banchieri (1568 - 1634) intitulada Ecclesiastiche sinfonie dette canzoni in aria francese a 4 voci per sonare et cantare et sopra un basso seguente concertante entro l’organo op.16. O exemplo apresentado mostra com clareza um dos muitos momentos nos quais o termo “sonata” aparece em oposição ao termo “cantata”. De modo genérico, em seu momento inicial, a sonata barroca é simplesmente uma peça escrita para ser tocada em contraposições às cantatas que eram escritas para serem cantadas (TOVEY, 1959, p. 207).

Não se pode falar da sonata no barroco sem que se mencionar outros tipos de formas instrumentais daquele período, uma vez que esses estilos instrumentais geralmente influenciavam uns aos outros. Durante o início do século XVII os gêneros instrumentais mais recorrentes eram os seguintes:

1) Toccatas, fantasias e prelúdios - peças para alaúde ou teclado em estilo improvisatório que tinham como característica principal apresentar o domínio técnico do instrumentista;2) Ricercares, fantasias, capriccios e fugas - peças em contraponto imitativo contínuo;3) Canzonas e sonatas - peças com seções contrastantes, geralmente em contraponto imitativo;4) Prelúdio de corais - peças geralmente para órgão que eram arranjos de melodias já existentes;5) Variações, partitas, variações de corais - peças construídas como variações de uma melodia;6) Partita1, chaconne, pasacaglia - peças construídas como variações sobre um baixo.7) Suítes - grupo de peças construídas como estilização de padrões rítmicos comuns em danças populares principalmente na frança (BURKHOLDER; GROUT; PALISCA, 2005, p. 344).

Dos gêneros citados a “Canzona” italiana é de especial importância para nossa argumentação. De acordo com Caldwell,

a palavra ‘canzona’, em sua conotação instrumental, era geralmente o arranjo de uma canção polifônica, usualmente de uma ‘chanson’ francesa. Arranjos de canções italianas também eram comuns, porém eram geralmente chamados de ‘frottola’ ou ‘madrigale’ (CALDWELL, 1995, p. 742, tradução nossa).

1 O termo “partita” aparece em várias conotações diferentes tanto como peça que apresenta variações sobre melodias, variações sobre um baixo ou como um sinônimo para o termo “suíte”.

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Uma das características formais mais importantes das canzonas é a ocorrência de seções fortemente contrastantes (BURKHOLDER; GROUT; PALISCA, 2005, p. 348). Essas seções fortemente contrastantes serviam como um recurso instrumental expressivo importante que substituía o uso to texto, presente originalmente na chanson.

No início do período barroco a música instrumental se tornou completamente emancipada da música vocal. O ricercar e canzona, agora composições instrumentais com estilos claramente estabelecidos, não dependem mais da estrutura formal presente em sua origem como arranjos vocais. Ainda que [o ricercar e a canzona] tenham retido a estrutura multi-seccional de seus modelos [vocais], a ausência do texto fez com que o desenvolvimento de novos métodos de extensão formal se fizesse necessário (BUKOFZER, 1947, p. 48, tradução nossa).

Embora em seu início o termo sonata tenha aparecido de modo genérico para designar qualquer tipo de peça que fosse instrumental, em seu desenvolvimento seguinte o termo passou a ser usado para designar peças escritas para um ou dois instrumentos melódicos, mais comunmente violinos, com acompanhamento de baixo contínuo. No que diz respeito à forma sua estrutura era muito semelhante à da canzona sendo baseada seções fortemente contrastantes. Essa característica formal, herdada da canzona, é de fundamental importância para entendermos como a sonata mais tarde viria a se consolidar como peça instrumental em vários movimentos.

Nas primeiras sonatas, como no caso da Sonata IV per il violino per sonar a due corde, de Biagio Marini (1594 - 1663) vê-se claramente a indicação de diferentes andamentos com diferentes texturas em uma peça sem interrupção. Em outras palavras, é uma peça em um movimento porém com vários andamentos indicados. Nessa sonata, por exemplo, vê-se os seguintes andamentos indicados: lento, moderato, lento, presto, lento, moderato e lento.

Assim como a canzona, a sonata apresenta uma série de seções contrastantes, cada uma caracterizada por determinadas figuras motívicas e também às vezes por diferenças métricas, de andamento e de caráter. [...] Em sonatas compostas mais tarde no século XVII, essas seções contrastantes passaram a ser separadas de modo a formar movimentos distintos (BURKHOLDER; PALISCA, 2006, p. 509, tradução nossa).

Assim, uma das características mais comuns na música de concerto - a saber a criação de peças formadas por movimentos distintos - surge dessa estrutura formal

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que busca a expressividade na criação de forte contraste entre seções distintas. “O objetivo principal dos compositores era criar efeitos contrastantes pela mudança de tempo, textura, e conteúdo melódico” (BUKOFZER, 1947, p. 54, tradução nossa). A partir de então, com a separação das partes contrastantes da sonata de modo a se formar movimentos distintos, vê-se o aparecimentos de dois tipos de sonatas no que diz respeito à disposição dos andamentos, suas texturas e o uso de mais ou menos contraponto na escrita dos movimento:

1) Sonata da Chiesa (sonata de igreja) - lento, rápido, lento, rápido;2) Sonata da Camara (sonata de câmara) - rápido, lento rápido;

No início o aparecimento dessas duas designações era de menor importância e não tinha implicação formal, mas apenas funcional. “Da camara” denotava que aquela música era própria para ambientes camerísticos enquanto “da chiesa” denotava que aquela música era apropriada para ser executada na igreja (BUKOFZER, 1947). Já na segunda metade do século XVII, nas escolas composicionais de Módena, Veneza e Bolonha, o uso desses termos serviu para designar com clareza elementos estruturais na composição das peças:

Nas peças criadas por essas escolas [Módena, Veneza e Bolonha] a diferença entre música para dança e a estilizada e representativa música de câmara com presença mais ou menos frequente de texturas contrapontísticas foi conscientemente desenvolvida. Isto é visto com clareza no fato de que a distinção entre sonata da câmara (ou suíte) e sonata da chiesa tomou um significado formal tão importante quanto distinção entre recitativo e ária no estilo do bel-canto (BUKOFZER, 1947, p. 137, tradução nossa).

Concluindo, o aparecimento do procedimento formal/composicional de se criar forte contraste pela inclusão na mesma peça de movimentos separados com características métricas, motívicas e também com texturas distintas, foi uma das mais importantes contribuições da estrutura formal da sonata barroca para a música ocidental, uma vez que esse tipo de procedimento é largamente utilizado na música de concerto até os dias de hoje.

2 A suíte barroca na França: forma binária e ternária composta

Jean Baptiste Lully (1632 - 1687) foi um dos mais influentes compositores do período barroco, sendo isso indiscutivelmente verdade na música francesa. Sua vasta produção de ballets e sua iniciativa de incluir música de ballet nas óperas fez

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com que instrumentistas, principalmente cravistas e alaudistas, arranjassem ou escrevessem compilações de danças europeias populares para serem executadas como entretenimento pessoal ou para pequenas grupos de pessoas (BURKHOLDER; GROUT; PALISCA, 2005, p. 369).

As danças que se consolidaram como parte da suíte barroca são as seguintes e geralmente aparecem na seguinte ordem:1) Allemande; 2) Courante; 3) Sarabande; 4) Gigue2.

Essas quatro danças são quase na totalidade das vezes construídas utilizando o que teóricos mais tarde vieram a chamar de forma binária. “A suíte barroca [...] apresenta desde sarabandas em andamento lento até gigas em movimento rápido, sendo cada uma delas desenvolvida sobre a Forma Binária” (LAITZ; BARTLETTE, 2010, p. 156).

A forma binária se caracteriza pela ocorrência de duas seções, as quais designamos como A e B, respectivamente, sendo cada uma repetida com a indicação de um ritornelo.

/ :A : / /:B : /

No que diz respeito à organização temática, ou à estrutura melódica, as formas binárias podem ser simples ou cíclicas. Quando as duas partes da forma binária não apresentam nenhum material melódico em comum ela é chamada de forma binária simples. “Quando toda ou parte do material de abertura de uma peça em forma binária retorna na seção B depois de uma digressão temática então o desenho temático da forma binária é chamado Cíclico” (LAITZ, 2008, p. 589, tradução nossa).

No que diz respeito à organização tonal, quando ocorre uma cadência no fim da parte A que termina na tônica então temos uma forma binária seccional, uma vez que ambas as seções terminam na tônica. Se a parte A de uma forma binária terminar em qualquer outro tipo de cadência e em qualquer outra função harmônica (dominante, relativo maior, etc.) temos um exemplo de forma binária contínua (LAITZ, 2008, p. 588).

Combinando as possibilidades concluiremos que existem quatro tipos de forma binária:1) Forma binária simples seccional;

2 Dependendo do país e da língua os nomes das danças irão variar: Allemanda, Alman etc.

FIGURA 1 - Diagrama genérico da forma binária

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2) Forma binária simples contínua;3) Forma binária cíclica seccional;4) Forma binária cíclica contínua.

Nas formas binárias, o tamanho de cada uma das partes pode variar, mas é comum que a parte B seja de tamanho igual ou maior do que a parte A. Nas formas binárias cíclicas, no início da parte B existe a apresentação de material temático novo geralmente contrastante com o material da parte A. A apresentação desse material termina em uma cadência à dominante o que leva à repetição de parte ou da totalidade do tema da parte A.

O diagrama das formas binárias fica, então, como representado abaixo:

Forma binária seccional:

/ :A termina na tônica : / / :B termina na tônica : /Forma binária contínua:

/ :A termina fora da tônica : / / :B termina na tônica : /Forma binária simples:

/ :A tema a : / / :B tema b : /Forma binária cíclica:

/ :A tema a : / / :B tema b - cadência V3 // tema a’ : / FIGURA 2 - Diagrama das formas binárias

Além das quatro danças listadas acima, há outras danças que os compositores opcionalmente incluíam entre a Sarabanda e a Giga. Essas danças são:

1) Boureé; 2) Gavote; 3) Minuette, sendo que essa última esteve presente na tradição instrumental do período clássico até ter sido substituído pelo Scherzo na Sinfonia n. 3 de Beethoven. Muitas vezes essas danças opcionais aparecem em pares, como por exemplo “Bourée I” e “Boureé II” da Suíte para Violoncelo n. 3 em do maior de J. S. Bach. Nesse caso essas peças apresentam uma estrutura maior e mais complexa a

3 Cadência à dominante: grau harmônico expresso em algarismo romano.

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qual nós chamamos de forma ternária composta.

A forma ternária composta consiste em uma peça formada por duas formas binárias em sequencia com a indicação da capo al fine ao final da segunda forma binária indicando, assim, a repetição da primeira forma binária.

FIGURA 3 - Diagrama genérico da forma ternária composta

A primeira forma binária da estrutura funciona, assim, como um grande A, logo a segunda forma binária da estrutura funciona com um grande B. A indicação da capo que indica a repetição da primeira forma binária fecha a estrutura como um grande ABA.

No caso específico do minueto, a ocorrência da seção chamada de “trio” cria a mesma estrutura diagramada acima. A aparição de um “Minueto II” em suítes culminou na criação, no período clássico, do Minueto e Trio:

O minueto barroco é uma dança que continuou popular no período clássico. [...] O Minueto Clássico é seguido, sem pausa, por uma outra peça, de textura mais leve, chamada ‘trio’, após a qual a marcação da capo indica que o Minueto deve ser repetido. O resultado é uma grande forma ternária. [...] Como acontece no caso de várias formas compostas, a forma minueto-trio, é geralmente uma Forma Ternária Composta, criada a partir da junção de duas Formas Binárias (LAITZ, 2008, p. 715, tradução nossa).

3 A Forma ternária simples

Ao mencionarmos uma forma ternária composta isso implica necessariamente na existência de uma forma binária simples. Essa forma, que consiste simplesmente em uma estrutura ABA foi muito utilizada como estrutura de árias em cantatas, oratórios e óperas no período barroco. Tanto é assim que a forma binária simples também é chamada de Ária Da Capo por ter sido essa a forma da grande maioria das árias por muito tempo na história da música ocidental.

A B (A)/ :A : / /:B : / /:A : / /:B : /fine da capo al fine

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Formas ternárias podem ser encontradas em diversos gêneros [musicais], estilos e períodos. Temos exemplos na Sonata Clássica, na ària da capo do período barroco, no minueto-trio do período clássico e nas peças características do século XIX (LAITZ, 2008, p. 715, tradução nossa).

O princípio estrutural temático e harmônico da forma ternária é como mostrado no QUADRO 1 abaixo:

A

Material original

Tonalidade original

B

Material contrastante

Tonalidade contrastante(no modo maior: IV, vi, iv,

bVI, i)(no modo menor: III, iv, VI, I)

A ou A’

Repetição literal de A, ou repetição alterada chamada

de A’

Tonalidade original

Assim como as formas binárias, as formas ternárias simples podem ser seccionais ou contínuas, dependendo da harmonia.

4 A forma rondó

O princípio da forma rondó reside na alternância sucessiva entre repetição e variação. “Formas rondó alternam seções de material recorrente (A1, A2, A3, etc.), chamadas de refrões, com seções de material contrastante (B, C, etc.), chamadas de episódios” (LAITZ, 2008, p. 730, tradução nossa). Existem rondós com várias seções e vários tamanhos, porém as duas variantes mais comuns da forma rondó são:

1) Rondó de cinco partes: A1 B A2 C A32) Rondó de sete partes (ou rondó sonata): A1 B1 A2 C A3 B2 A4

Na música popular brasileira o choro geralmente apresenta a forma de um rondó de cinco partes. Mesmo quando em sua versão vocal, menos comum o choro apresenta a mesma estrutura do rondó de cinco partes. Como enfatiza Alvarenga, “esses choros vocais conservam de preferência a forma do choro instrumental que é em cinco partes assim distribuídas: A-B-A-C-A” (ALVARENGA, 1960, p. 299).

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QUADRO 1Princípio estrutural temático e harmônico da forma ternária

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O contraste que existe no material musical apresentado em cada um dos episódios (partes B, C etc.) e os refrões (A) é tanto de natureza temática quanto de natureza harmônica. Geralmente a estrutura harmônica das formas rondó vai se comportar da seguinte maneira:

B

(X) Região harmônica

vizinha que não seja a própria

tônica

Possíveis regiões harmônicas no modo maior: V, IV, iv, vi, i, bVI, bII;

Possíveis regiões harmônicas no

modo menor: III, V, iv, VI, I

C

(Y) Região harmônica

vizinha que não seja a própria tônica e que

seja diferente da região harmonia

de B

Possíveis regiões harmônicas no modo maior: V, IV, iv, vi, i, bVI, bII;

Possíveis regiões harmônicas no

modo menor: III, V, iv, VI, I

A

Tônica

Possíveis regiões

harmônicas: I, i

A

Tônica

Possíveis regiões

harmônicas: I, i

A

Tônica

Possíveis regiões

harmônicas: I, i

É de maior importância notar que todo tipo de diagrama é reducionista e não tem valor se não for entendido como uma maneira de se comunicar didaticamente ideias que de outra forma se tornariam difíceis de se comunicar, especialmente ao leitor que não seja profundamente familiarizado com o repertório da música de concerto. Assim, quando se fala de uma forma rondó representada por uma estrutura lógica descrita como A-B-A-C-A, estamos criando uma generalização útil para o entendimento inicial dessa estrutura. Porém, quanto mais se aprofunda no estudo de tais formas, observamos variantes e singularidades específicas em peças as quais identificamos como rondó. Uma dessas peculiaridades, que pode estar presente em uma forma rondó mas não necessariamente são importantes estruturas chamadas de transições e tetransições (LAITZ, 2008, p. 737).

Como descrito acima as diferentes partes da forma rondó acontecem em regiões

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QUADRO 2Estrutura harmônica das formas rondó

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harmônicas diferentes. De modo a criar uma aproximação entre essas regiões, compositores do século XVIII acrescentaram estruturas de caráter modulatório que ocorrem ao final de cada parte com a função de sair de uma região harmônica e chegar à outra. Seguindo essa estrutura, um possível exemplo de forma rondó que inclua essas estruturas seria diagramado assim:

A

Região harmônica:

Tônica

TRANS.

Transição harmônica:

para V

B

Região harmônica:

Hipotética4: V

RETRANS.

Retransição harmônica: para a tônica

A

Região harmônica:

Tônica

TRANS.

Transição harmônica:

para VI

C

Região harmônica:

Hipotética VI

RETRANS.

Retransição harmônica: para a tônica

A

Região harmônica:

Tônica

Outra característica importante da forma rondó é a possibilidade dela se articular como forma composta. Em outras palavras, cada uma das partes A-B-A-C-A pode ser representada por uma forma binária. Esse procedimento permite criar grandes estruturas formais. Desse modo, a forma rondó por sua maleabilidade foi usada largamente durante os séculos XVIII e início do XIV como um recorrente movimento para a finalização de sonatas e sinfonias (LAITZ, 2008, p. 732). 5 A forma sonata

5.1 Introdução

O termo “forma sonata” ou, menos comunmente, “Allegro de Sonata” são termos que designam a estrutura formal presente no primeiro movimento de sonatas, quartetos de corda, concertos clássicos e sinfonias. Do mesmo modo que formas mais simples podem se agrupar para formar estruturas maiores, o mesmo pode acontecer, mas de modo peculiar de maneira que, o termo sonata, pode se referir a uma grande estrutura formal geralmente em três movimentos (nas sonatas para instrumentos solo e na maioria dos concertos clássicos), ou em quatro movimentos (nos quartetos de corda e sinfonias clássicas). Assim o termo Forma Sonata traz em si uma ambiguidade, pois pode indicar a forma específica ao primeiro movimento ou pode designar também a forma do todo. Essa forma (allegro de sonata), porém, pode estar presente também em outros movimentos. Nas sinfonias clássicas podemos ter as seguintes possibilidades de inter-recorrência formal na grande forma sonata em quatro movimentos:

4 Esse é o exemplo de um possível rondó. Aqui chamamos de “região harmônica hipotética”, pois os episódios podem acontecer em várias regiões harmônicas possível, nesse caso escolheu-se uma para se exemplificar como as transições e retransições funcionariam levando da tônica para outra região harmônica.

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QUADRO 3Exemplo de forma rondó

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1º Movimento

2º Movimento

3º Movimento

4º Movimento

Allegro de sonata

Ternária simples, binária, ternária composta (minuetos e scherzos), tema e variações

A maior parte das vezes ternária composta (minuetos ou scherzos), também possível tema e variações

Muito frequentemente ou Allegro de sonata ou rondó, também possível, mas menos comum, tema e variações (como na

Sinfonia 3 de Beethoven) (GROVE, 1962, p. 81).

QUADRO 4Estrutura da grande forma sonata na sinfonia em quatro movimentos

Assim, como mostra o QUADRO 4, a forma sonata, em seu sentido de designar todo um trabalho musical em vários movimentos, vai apresentar várias das formas já descritas rapidamente nesse artigo, incluindo a Sonata Barroca, uma vez que, quando a sonata apresenta uma introdução, observaremos a seguinte estrutura de andamentos: introdução lenta - allegro - segundo movimento lento, minueto ou scherzo rápido, finale lento-rápido (quando existir introdução, caso contrário apenas rápido). Vemos que a estrutura de alternância de andamentos continua presente.

5.2 Estrutura formal

Dependendo do gênero instrumental, a forma sonata vai apresentar variações importantes, por exemplo, no concerto e na sinfonia. De modo que, escolhemos tratar da forma sonata na sinfonia clássica. Aqui nessa seção utilizaremos o termo “forma sonata” para designar a forma estrutural do primeiro movimento das sonatas clássicas. Quando quisermos nos referir ao todo, usaremos o termo grande forma sonata.

A forma sonata apresenta três grandes partes chamadas de exposição, desenvolvimento e re-exposição5. A exposição, no período clássico, é sempre repetida com a indicação de um ritornelo. A característica mais importante da exposição é que nessa parte dois temas contrastantes são expostos, os quais chamaremos de A e B, respectivamente. Esse contraste se dá no campo do caráter de cada tema, e no campo harmônico. Assim, se o tema A é rítmico, o tema B será mais melódico e lírico. Se o tema A for melódico e lírico, o tema B será mais rítmico. Outras características podem ser contrastadas, como, por exemplo, se o tema A apresentar o desenho melódico de um arpejo, o tema B será mais diatônico, ou com notas repetidas. Se o tema A apresentar características fortemente tonais e diatônicas, o tema B pode apresentar cromatismos.

5 Alguns autores chamam essa terceira parte de “recapitulação”.

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No que diz respeito à característica harmônica, se a peça for em tonalidade maior, o tema A será na tônica (I) e o tema B na dominante (V). Se a peça for em tonalidade menor, o tema A será na tônica (i) e o tema B no relativo maior (III), ou muito raramente na dominante (V).

Após a apresentação do tema B, existe a apresentação do tema A transformado e na região harmônica do tema B, o qual chamamos então de tema de fechamento. Assim, o diagrama da exposição da forma sonata fica da seguinte forma:

Tema A

Em modo maior Tônica (I)Em modo menor Tônica (i)

Tema B

Dominante (V)Relativo maior (III)

Tema de fechamento (A’)

Dominante (V)Relativo maior (III)

QUADRO 5Exposição da forma sonata

Assim como na forma rondó as estruturas que chamamos de transição e retransição serão especialmente importantes na forma sonata. Entre os temas A e B haverá uma parte de transição que pode variar muito em tamanho.

O tema de fechamento é caracterizado pela adaptação do tema A à nova tonalidade (dominante ou relativo maior) e pela recorrência de encadeamentos V-I na região da dominante ou na região do relativo maior dependendo se a peça for em tonalidade maior ou menor. Após o tema de fechamento, existe a indicação de um ritornelo e a exposição é repetida.

A próxima parte, chamada de desenvolvimento pode ter tamanhos muito distintos. Na sinfonia n. 29 em lá maior de Mozart, por exemplo, o desenvolvimento é muito breve, já na sinfonia n. 3 de Beethoven o desenvolvimento é muito extenso. No desenvolvimento o compositor geralmente vai apresentar um dos temas, ou fragmentos de um dos temas em várias regiões harmônicas diferentes. Geralmente o compositor desenvolve apenas um dos temas, porém isso não é regra, podendo existir a presença de ambos os temas A e B no desenvolvimento. Além da apresentação do tema em diferentes regiões harmônicas, o compositor também pode recortar e ao final transformar o tema em um novo tema derivado.

No que diz respeito ao trabalho harmônico, o conceito que melhor descreve o desenvolvimento é instabilidade harmônica. Ao escutar o desenvolvimento da Sinfonia n. 40 em sol menor de Mozart, ou o desenvolvimento da famosa Sinfonia n. 5 de Beethoven, percebemos que a harmonia caminha rapidamente de uma região a outra, com raros momentos de polarização forte que seriam alcançadas com o uso de cadências harmônicas claras. O que os compositores fazem é justamente caminhar

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por regiões harmônicas cada vez mais distantes, repetindo o tema ou recortes dele, em cada uma dessas novas regiões até que, ao fim do desenvolvimento, acontece uma cadência à dominante que prepara o início da re-exposição.

A re-exposição vai, como o nome sugere, re-expor os temas A e B com uma diferença importante. Na re-exposição tanto o tema A quanto o B acontecem na região da tônica. Isso implica em uma diferença marcante no caso de sonatas em tonalidade menor, nas quais o tema B, que é exposto no relativo maior é re-exposto na tônica que é menor. Esse é exatamente o caso da Sinfonia n. 40 de Mozart. Assim o diagrama da re-exposição da forma sonata fica da seguinte forma:

Tema A

Em modo maior Tônica (I)

Em modo menor Tônica (i)

Tema B

Tônica (I)

Tônica (i) também possível homônimo maior (I)

Tema de fechamento (A’)

Tônica (I)

Tônica (i) também possível homônimo maior (I)

QUADRO 6Re-exposição da Forma Sonata

Uma estrutura que pode apresentar grande diferença entre a sua ocorrência na exposição para sua ocorrência na re-exposição é a transição que ocorre ente os temas A e B. A transição é uma subseção mais livre do que as outras, assim pode ser bem mais extensa quando ocorrem na re-exposição.

A

Modomaior:

Tônica (I)

Modomenor:

Tônica (i)

B

Dominante (V)

Relativo maior (III)

Fechamento (A’)

Dominante (V)

Relativo maior (III)

Repetição, recorte e transformação de um dos

temas ou dos dois.

Instabilidade harmônica: passagem por várias regiões harmônicas geralmente sem que

ocorram fortes cadências.

Instabilidade harmônica: passagem por várias regiões harmônicas geralmente sem que

ocorram fortes cadências

A

Modo maior:

Tônica (I)

Tônica (i)

B

Tônica (I)

Tônica (i), ou

homônimo maior (I)

Fechamento (A’)

Tônica (I)

Tônica (i), ou

homônimo maior (I)

Exposição Re-exposiçãoDesenvolvimento

QUADRO 7Forma sonata

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Além das estruturas descritas acima, na sonata clássica pode existir antes da exposição uma introdução lenta, e após a re-exposição pode ocorrer uma coda, a qual pode apresentar tamanhos variados. Após a sinfonia n. 3 de Beethoven compositores começaram a utilizar codas cada vez mais extensas, as quais às vezes são chamadas por alguns teóricos de “segundo desenvolvimento”.

É importante ressaltar mais uma vez que os diagramas apresentados nesse artigo têm caráter didático e não podem ser encarados em absoluto como regras. Porém, caso o leitor se interesse em fazer uma escuta crítica, de preferência com a partitura em mãos, perceberá o quão útil tais diagramas podem ser ao se buscar um maior entendimento de como essas formas estruturais ocorrem no repertório da música de concerto europeia dos séculos XVII e XVIII. Também é importante ressaltar que acreditamos que toda análise deve servir ou para a construção consciente da performance de uma peça ou para o entendimento mais aprofundado de uma peça ou de toda uma tradição musical. Assim, aos estudantes reforçamos a importância de se conhecer com clareza essas formas, o modo como elas buscam o contraste e a repetição de modo que essas ideias possam ser enfatizadas ao se propor a performance de uma peça.

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FORMA E ESTRUTURA NA MúSICA OCIDENTAL: UMA INTRODUÇÃO A ALGUMAS DAS FORMAS MAIS RECORRENTES NA MúSICA EUROPEIA DOS SÉCULOS XVII E XVIII

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REfERêNCIAS

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GROVE, G. Beethoven and his nine symphonies. New York: Dover, 1962.

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TOVEY, D. F. The forms of music. New York: Meridian Books, 1959.

form and structure in western music: an introduction to some of the most recurrent forms in european music of the seventeenth

and eighteenth centuries

Abstract: This article presents an overview of the most important musical forms present in the Western Music Tradition, which are: the baroque sonata, binary form, compound ternary form, simple ternary form, rondó, and sonata form.

Keywords: Musical forms; music analysis; western music; sonata form.

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Ronaldo Cadeu de Oliveira

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INOVAÇÃO SONORA EM NOITES DO DESERTO DE ALMEIDA PRADO E SUA INTERPRETAÇÃO AO PIANO

Junia Canton Rocha

Bacharel em piano pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), especialista em Práticas Interpretativas da Música Brasileira da Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG) e mestre em Performance Musical (UFMG). Atua como solista e camerista no Brasil e exterior e como professora de piano na UEMG. É detentora de

mais de 200 prêmios em concursos nacionais e sul-americanos de piano.

[email protected]

Resumo: Este artigo faz parte de uma pesquisa maior que abrange a obra dos 16 Poesilúdios de Almeida Prado e pretende mostrar como este compositor cria um efeito sonoro inovador no Poesilúdio 13, Noites do deserto. Através da análise do levantamento de aspectos técnico-musicais e referências extra musicais, demostra-se como o intérprete pode proceder para alcançar e intensificar este efeito.

Palavras-chave: Poesilúdio 13 de Almeida Prado; inovação sonora; interpretação.

Introdução

O presente artigo é fruto da minha experiência com a performance dos Poesilúdios, meu contato com o compositor, da minha dissertação de mestrado, defendida na Universidade Federal de Minas Gerais, em 2004, intitulada: Aspectos Técnico - Pianísticos e Interpretativos do Segundo Caderno de Poesilúdios de Almeida Prado. Na dissertação proponho uma abordagem, do ponto de vista da escrita e da interpretação pianísticas, do segundo caderno de Poesilúdios (1985) para piano solo de Almeida Prado. Utilizo o conhecimento teórico, empírico e didático vivenciado por mim como instrumentista, para enumerar aspectos técnicos, tímbricos, descritivos e para subsequentes sugestões de possibilidades interpretativas e soluções técnicas. Um aspecto fundamental e prazeroso foi a possibilidade de captar muito da concepção e imagem sonora do compositor a respeito dos 16 Poesilúdios, através de palestras e comunicações pessoais como entrevistas e conversas informais. O contato mais

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próximo com Almeida Prado assumiu um valor inestimável, por revelar não só aspectos de sua formação e personalidade, mas também por auxiliar de maneira específica na leitura de detalhes da partitura que, mesmo expressos e reiterados com aparente clareza, nem sempre traduzem com precisão a ideia original do compositor.

Ao estudar os Poesilúdios e elaborar minha dissertação, concluí que, para uma interpretação musical fundamentada da escrita pianística de Almeida Prado, seria relevante, além de um estudo mais específico, uma compreensão do seu posicionamento estético no cenário da história da música brasileira e tudo que o influenciava. Na dissertação há uma entrevista com o compositor que descreve sua maneira de compor, um cd com a gravação da minha performance dos dezesseis Poesilúdios, em concerto, e as partituras do segundo caderno da coleção, editados no programa encore pela pesquisadora Adriana Moreira. No entanto, a delimitação deste artigo ao Poesilúdio13, intitulado Noites do Deserto, reside no seu caráter mais revolucionário do ponto de vista composicional e do timbre em relação aos demais Poesilúdios. No decorrer da análise deste Poesilúdio, chamo a atenção a respeito das citações extra-musicais e descrevo minhas sugestões técnico-interpretativas, por ter a convicção de que muito do resultado sonoro almejado pelo compositor, nessa peça, depende de nuanças específicas de interpretação ao tocá-la.

Almeida Prado: formação e estilo

Almeida Prado incorporou, ao longo de sua carreira, diversas influências e aliou a elas uma enorme diversidade de fontes de inspiração. Em decorrência desse processo, produziu uma obra de inestimável valor e originalidade, rica em citações extra-musicais com uso da sinestesia para evocar cores e diferentes atmosferas, estabelecendo uma ponte de comunicação com o intérprete e consequentemente com o público.

O compositor estudou com Camargo Guarnieri e, durante a primeira fase de sua carreira, manteve-se fiel à estética nacionalista, a partir, por exemplo, da utilização de temas folclóricos retirados do livro Ensaio sobre a música brasileira, de Mário de Andrade (1972). Utilizou, nesse período, grandes formas, nesse caso específico: sonata, tocata, tema e variações1. Gradativamente, porém, a temática folclórica deu lugar à religiosidade, elemento constante na linguagem musical do compositor. Em

1 Sonata n. 1, para piano, (1965), Tocata, para piano (1964), VIII Variações para piano sobre um tema do Rio Grande do Norte (1963) e XIV Variações para piano sobre um tema afro-brasileiro (1961).

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1969 partiu para Paris, onde estudou com Nadia Boulanger e Olivier Messiaen. Absorvendo a influência dessas duas personalidades e a variedade de tendências da moderna música europeia, iniciou uma busca constante no campo da timbrística e da estruturação formal, passando, pouco a pouco, a criar uma linguagem nova e pessoal, tendo sido considerado um dos melhores representantes das tendências da música brasileira do período pós-nacionalista. (NEVES, 1981)

Almeida Prado, em entrevista a Grosso, declara-se um apaixonado pelo piano, nesta frase: “Eu amo o piano, eu penso-piano [sic], como Chopin. Eu orquestro como um grande piano, por isso a presença das ressonâncias em todas as minhas obras” (PRADO apud GROSSO, 1997, p. 195). Essa postura em relação ao piano contribui para justificar sua numerosa obra para este instrumento e a intensa exploração de suas possibilidades tímbricas, bem como a criação do “Sistema Organizado de Ressonâncias”2 na época da composição de Cartas Celestes I. Sobre o aspecto da ressonância, Assis comenta que:

[...] este compositor trata o piano, de maneira geral, por sua qualidade de ressonância. Em muitos momentos, o instrumento deixa de ser apenas o veículo de apresentação da estrutura musical e passa a ter um valor estruturante ...” . ASSIS (1997, p. 2) ainda destaca o aspecto tímbrico na obra de Almeida Prado, relacionando-o diretamente à interpretação. [...] O timbre está diretamente relacionado com o ato interpretativo e, ao tomar consciência disto, o intérprete se sentirá como um pesquisador das potencialidades sonoras de seu instrumento e de si próprio, desenvolvendo assim a sua escuta e conseqüentemente, uma performance mais sensível (ASSIS, 1997, p. 3).

Almeida Prado, para compor, recorria frequentemente a cinco principais temáticas: temática mística (inspiração nos ritos judaico-cristãos), ecológica, astrológica, afro-brasileira (inspiração nas religiões afro-brasileiras) e livre, em que as peças não se unem por uma única fonte de inspiração e na qual estão inseridos os Poesilúdios. A mais recente divisão da obra de Almeida Prado realizada por Moreira (2002, p.43) aponta quatro fases, precedidas pelas obras da infância, de acordo com as técnicas composicionais utilizadas, sendo elas: infância: 1951-59; 1a fase: Nacionalista 1960 – 65; 2a fase: Pós-tonal 1965 – 73; 3a fase: Síntese 1974 - 82; 4a fase: Pós-Moderna 1983 a 2010. Segundo Almeida Prado,

A 4a fase, a Pós-Moderna [...] começou com os Poesilúdios e vai até agora, nesse instante. E uma fase de saturação de todos

2 Neste sistema o compositor trabalha com 4 zonas variáveis de densidades sonoras agrupadas em maior ou menor grau de ressonância, são elas: Zona de Ressonância Explícita, Implícita, Múltipla e Não-Ressonância .

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os mecanismos: astronômico, ecológico, afro, etc. Após a 6a Carta Celeste, composta em 1982, [...] resolvi fazer colagens, claramente visíveis nos Poesilúdios. Uma total ausência de querer ser coerente, um assumir o incoerente, é uma fase nova em relação às anteriores, embora tenha algumas coisas das outras. O que nasceu com os Poesilúdios foi uma atitude de maior liberdade (PRADO apud MOREIRA, 2002, p. 47).

A obra 16 Poesilúdios

Os 16 Poesilúdios são organizados em dois cadernos: o primeiro, composto em 1983, constitui-se de cinco peças que, segundo Almeida Prado, contêm contornos bem definidos retratando a alegria, o dia e a luz. O segundo caderno, de 1985, contém o restante da coleção, ele diz ser inspirado em noites de várias cidades ou locais, retratando sentimentos de solidão e saudade, possuindo contornos indefinidos e difusos (PRADO, 2002).

Os Poesilúdios são “como flashes, momentos; combinação de poesia e prelúdio. Peças curtas, pictóricas, evocativas de atmosferas e lugares” (GANDELMAN 1997, p. 237). O nome poesilúdio foi criado pelo próprio compositor e, segundo ele, a obra representa um microcosmos dentro da sua produção pianística, ocupando um espaço semelhante ao dos Ponteios, dentro da produção de Camargo Guarnieri. Durante o meu estudo ao piano dos 16 Poesilúdios e conforme a observação feita por Gandelman (1997), observei que o compositor utilizou diversos recursos comuns à técnica pianística tradicional como trinados, notas repetidas ou dobradas, acordes repetidos, passagens escalares e arpejadas em movimento rápido, grandes extensões, mudanças súbitas de toque na alternância entre as partes cantadas e os efeitos percussivos do instrumento. Associa a esses recursos pianísticos um amálgama de procedimentos composicionais como atonalismo, polimodalismo e politonalismo, modos de transposição limitada3, emprego de harmonia jazzística e sistema de colagem. O ritmo é altamente elaborado e em alguns momentos torna-se o fio condutor da obra. Entre os procedimentos rítmicos utilizados podemos citar: metros e subdivisões irregulares e livres, variações de compasso, ausência de fórmulas de compasso, tempo indicado pela unidade de tempo, polirritmia, características rítmicas da música brasileira e também das rítmicas de outros países. Outro aspecto importante a ser ressaltado é a utilização do pedal e variedades de toques que instigam o intérprete a uma especulação constante do “colorido”

3 Modos criados por Messiaen que são constituídos de seis a dez graus e possuem número limitado de transposição. São eles: Modo1, C-D-E-F#-G#-A#; Modo2, C-C#-D#-E-F#-G-A-A#; Modo3, C-C#-D-E-F-F#-G#-A-A#; Modo4, C#-D-D#-F#-G-G#-A; Modo5, C-C#-D-F#-G-G#; Modo6, C-C#-D-E-F#-G-G#-A#; Modo7, C-C#-D-D#-E-F#-G-G#-A-A#. (MOREIRA, 2002).

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pianístico, pois como afirmava Almeida Prado, nesta obra “[...] tudo é timbre, os Poesilúdios é uma obra em que você se diverte com o timbre o tempo todo” (PRADO, 2002).

Noites do deserto - Poesilúdio 13

Noites do deserto, assim como o Poesilúdio Noites de Manhattan, foi inspirado em “bate-papos” com amigos, diferentemente do restante da coleção inspirada em obras de arte. Esse poesilúdio é dedicado à Maria Aparecida Pacca, amiga de ascendência libanesa, com quem Almeida Prado conversava sobre possíveis viagens ao deserto (PRADO apud MOREIRA, 2002, p. 190).

Essa peça pode ser dividida em uma introdução (comp. 1), primeira parte (comp. 2 a 7), segunda parte (comp.8 a 21). É interessante notar que o 2o compasso é um macro compasso4 de 49 pulsações.

A introdução, em caráter de recitativo, é formada por um macro compasso sem métrica indicada, subdividido em linhas pontilhadas. Segundo Moreira (2002), essas linhas ajudam a direcionar a linha melódica. A melodia escrita em uníssono, na região média e aguda do piano é, conforme informações do próprio compositor, um “falso modo árabe”, que faz referência a uma flauta árabe. Apesar da dinâmica delicada, p para a mão direita e pp para a mão esquerda, é interessante crescer e diminuir como demonstrado no exemplo n. 1. Esse procedimento, associado ao rubato, confere um caráter sinuoso e de liberdade do tempo, como feito nos recitativos.

O rubato poderá ser realizado fluindo um pouco mais no meio de cada célula e retardando nas extremidades (as setas com sentido para frente indicam acelerar e sentido para traz retardar o tempo). Exemplo, FIG. 1:

4 Termo utilizado por Assis (1997) e que será empregado neste trabalho sempre que me referir a compassos acima de 30 pulsações.

FIGURA 1 - Compasso 1 do Poesilúdio 13 Noites do deserto

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5 Muitos professores utilizam este termo para designar a região do tato, ou seja, a região de maior sensibilidade dos dedos. Richermi utiliza o termo entre aspas e se refere a essa região como aquela onde há “maior quantidade de tecido carnoso entre a tecla e o osso” (RICHERMI, 1997, p. 108).

O toque deverá ser cantabile, com a “polpa”5 do dedo, abaixando a tecla devagar. Esses cuidados na maneira de tocar a introdução, aliados à sonoridade do falso modo árabe, a meu ver, criam uma atmosfera de encantamento e expectativa para o que virá a seguir. O pedal, segundo o próprio compositor declarou em entrevista, fica a critério do intérprete, podendo este utilizar mais ou menos ressonâncias.

Na primeira parte está uma das principais contribuições de Almeida Prado do ponto de vista composicional e também da exploração dos recursos tímbricos do piano nos Poesilúdios. Trata-se da reprodução, ao piano, de um “cânone acústico”. Esse efeito de cânone acústico ele observava tanto nas procissões religiosas do interior do Brasil, quanto no canto dos fiéis na esplanada das mesquitas em Israel. No caso das procissões do Brasil, ele dizia: “[...] você tem este efeito que eu chamo de cânone acústico, que não é cânone escrito, é cânone mal cantado” (PRADO, 2003).

Almeida Prado descreve as procissões do interior, em que um grupo de beatas andam e cantam desafinado um trecho da ladainha, enquanto outro grupo que vem mais atrás canta desencontrado e em outro tom. Ainda mais atrás temos a bandinha que toca mais afinado, porém, também desencontrado, tudo isso cria um efeito de cluster. O compositor comenta: “[...] este fluxo é uma coisa de Charles Ives! E que as pessoas não se dão conta de que aquilo é altamente de vanguarda e o compositor para capitar este ‘errado’ tem que ter uma técnica abismal de composição” (PRADO, 2003).

Essa parte inicia-se com uma sequência de desenhos cromáticos agrupados de quatro em quatro fusas, com indicação movido e “com muito pedal”; em seguida esse desenho é justaposto à linha da melodia e do baixo. A melodia em colcheias está localizada na região média do piano com indicação como um canto “beduíno” e o baixo segue paralelo à melodia em seqüência de 9as. O relevante é que a nota do baixo que é tocada simultaneamente com a nota da melodia é sempre um semiton abaixo em relação a ela e a segunda nota do baixo é sempre a repetição da nota da melodia. A dinâmica é em ppp. Exemplo, FIG. 2:

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Este uníssono “enviesado” associado ao pedal e à dinâmica ppp gera a sensação de oitavas desafinadas. O compositor explica a sua proposta:

[...] Noites do Deserto, [...] você tem uma melodia que ela é circuncidada; circula em torno dela uma aura de ressonância escrita, que eu chamo de uníssono, porque tem reverberação. Você ouve um uníssono que não é preciso, ele é impreciso, e isso cria uma espécie de sujeira harmônica, que é típico da música árabe. O árabe não tem harmonia, são oitavas, mas não oitavas muito afinadas, são desafinadas, desafinadas para nós, não pra eles. Isso.... Eu fiz um uníssono atrapalhado, sujo, porque quando os árabe tocam 4, 5, 6 violinos árabes, eles têm uma afinação oriental, portanto, tem comas a mais; mas no piano não posso fazer comas, então, sujo as oitavas com semitons no baixo. É movimento paralelo, porém, um paralelo sujo. Como tudo é muito pianíssimo e com muito pedal, você escuta um uníssono atrapalhado. Um uníssono que parece não ter centro, que fica no ar. Eu demorei muito para conseguir essa coisa, que é uma coisa que ninguém tem (PRADO, 2003).

As indicações presentes no início desta seção como “um canto beduíno”, movido e “com muito pedal”, conduzirão melhor o pianista às suas decisões interpretativas, como por exemplo, ao tocar a melodia, é bom lembrar as características guturais desses cantos beduínos e, assim, escolher um tipo de toque que faça essa melodia soar em destaque e um pouco mais sustentada, pois o compositor grafou uma tenuta para cada nota da

FIGURA 2 - Compasso 2 do Poesilúdio 13 Noites do deserto

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Como os trechos dos trinados são acompanhados pela indicação “tempo livre”, “muito lento” - como O canto do vento no deserto, o pianista poderá conduzir o fraseado dos trinados a vontade fazendo amplo uso do “rubato” e dos sinais de “crescendo” e “decrescendo” (exemplo n. 8). Sugiro, para uma perfeita consciência do fraseado, estudar os compassos 10, 13, 16 e 21 algumas vezes sem os trinados.

Para que a sonoridade deste Poesilúdio seja o tempo todo ondulante, sinuosa e instável como uma referência ao movimento do vento no deserto, é interessante realizar um efeito de “crescendo” e “decrescendo” nos vários desenhos musicais, inclusive nos

FIGURA 3 - Compassos 2-3 do Poesilúdio 13 Noites do deserto

mesma. Para isso é necessário que as articulações dos dedos que tocam a melodia estejam firmes e que haja uma descida rápida da tecla ao tocar, para que a sonoridade não seja excessivamente refinada, proporcionando uma característica mais primitiva a esse canto.

Os grupos de fusas da voz intermediária, além de contribuírem para o efeito de reverberação, são responsáveis pela movimentação na primeira parte, assim como sua condução à segunda parte. Para que essa condução aconteça, esses grupos de fusas se transformam em gestos musicais ascendentes, no compasso 3 (exemplo 3, FIG. 3). Esses gestos musicais por sua vez conduzem ao trecho dos trinados. É importante observar que a partir do compasso três em diante é introduzido o sinal de compasso (salvo os compassos dos trinados). Apesar disto, o compositor pede liberdade no tempo, pois associa todo este trecho ao movimento do vento: “O tempo é livre porque é o vento, tem compasso mas é livre” (PRADO, 2003).

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trinados, como demonstrado nos exemplos a seguir, (todos os sinais de “crescendo” e “decrescendo” destes exemplos, com exceção do exemplo n. 7, não são originais da partitura). Exemplo 4, 5, 6, 7 e 8, FIG. 4, 5, 6, 7 e 8:

FIGURA 4 - Compasso 1 do Poesilúdio 13 Noites do deserto

FIGURA 5 - Compasso 2 do Poesilúdio 13 Noites do deserto

FIGURA 7 - Compassos 8-9 do Poesilúdio 13 Noites do deserto

FIGURA 6 - Compasso 2 do Poesilúdio 13 Noites do deserto

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Os gestos musicais descendentes do compasso 19 conduzem à fermata do compasso 20, em que se deverá ouvir um grande acúmulo de ressonância através do emprego do pedal direito (é relevante saber que quando Almeida Prado utiliza compasso em branco com fermata, é para deixar soar a ressonância anterior indefinidamente, até quase extinguir o som). Exemplo n. 9 (FIG. 9): o intérprete, ao iniciar os trinados do último compasso, poderá utilizar um pouco dessa ressonância anterior, através de correções de meio pedal. O efeito alcançado é muito interessante, porque justapõe as ressonâncias do registro sub-grave às ressonâncias do super agudo. Exemplo n. 9, FIG. 9: a oscilante sonoridade resultante desse procedimento associada ao “decrescendo”, remete às efêmeras miragens desérticas.

FIGURA 8 - Compasso 10 do Poesilúdio 13 Noites do deserto

Figura 9. Compassos 17-21 do Poesilúdio 13 Noites do desertoREVISTA MODUS – Ano VII / Nº 10 – Belo Horizonte – Maio 2012 – p. 59-71

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Concluo que para o efeito sonoro almejado pelo compositor é imprescindível a escuta atenta do pianista , devendo este, utilizar todas as gradações possíveis de pedal como meio pedal quarto de pedal e pequenas correções, tremendo o pé em movimentos bem curtos. A dinâmica deve oscilar entre breves crescendos e diminuendos, e o pianista deve ter domínio absoluto da velocidade da descida da tecla antes de sua chegada ao fundo do teclado, para produzir várias nuances de som.

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Sound innovation in Noites do deserto de Almeida Pradoand their interpretation on the piano

Abstract: This article is part of a search covering the work of the 16 Poesilúdios by Almeida Prado. Its objective is shows how this composer creates a innovative sound effect in Poesilúdio 13, Noites do Deserto. Will be shown, by the analysis of the technical-musical aspects and extra musical references, how a interpreter can proceed to create this effects and intensify them.

Keywords: Poesilúdio 13 by Almeida Prado; sound innovation; performance.

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AMERICA, THE CITy Of GOD AND OTHER IMAGINARy PLACES: IVES, ROOTS AND ROCK

Jeffrey Perry

Professor de Teoria e Análise Musical na Universidade do Estado da Louisiana nos Estados Unidos. Ph. D. em Composição Musical pela Universidade de Princeton.

Foi aluno de Milton Babbit e Pierre Boulez.

[email protected]

1 Early american hymns1

Although the early Puritans of New England frowned on earthly pleasures of any sort, they felt that music was an essential part of their worship. The first book published in the English colonies was The Bay Psalm Book, in 1640. Its first eight editions contained only the words to the Psalms, plus notation of their meter. In 1698, however, the ninth edition included tunes to accompany some of the psalms; these tunes were composed in England. The level of musical literacy in the colonies was low; a common practice was the lining-out of hymns, in which a trained singer would sing a line of music, the congregation would repeat it, and so on. By the 1720s, a reaction against this practice occurred; so-called singing schools appeared throughout New England as a means of educating churchgoers in the proper performance of hymns and psalms in a more melodically interesting and rhythmically regular style. From the singing school movement came the practice

1 Background material for this section is taken from SOUTHERN (1971, pp.31-39); MARK (2008, pp. 13-27) and OGASAPIAN (2004, pp.29-45).

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Abstract: The topic of this essay is musical geography: certain places are conjured up by music. Such places may be based on actual, physical, historical locales, or they may be entirely imaginary. American music, in particular, is haunted by a sense of place. What follows is a discussion of several important places in American music, and of the ways in which they connect to one another.

Keywords: American Music; Charles Ives; History of American Music; Rock.

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of shape-note singing, a simplified kind of solfeggio and part-song performance that influenced the earliest composers of sacred music in New England. The folk tune “Nettleton” (“Come, Thou Fount of Ev’ry Blessing”) provides an example of a hymn of the Singing School period. Probably composed by John Wyeth, an amateur composer living in Harrisburg, Pennsylvania sometime before 1813, the tune is found in Protestant hymnals to this day.

The music of composers like Wyeth, and the prolific sacred music composer William Billings (1746-1800) went out of fashion, in turn, when musicians educated according to European standards began to influence the sacred music of the United States in the 1830s and thereafter. One hymn in the later style, by composer Lowell Mason (1792-1872), is “Watchman.” (“Watchman, tell us of the night / What its signs of promise are […]”)2 Just as lining out was discarded by relatively affluent, urban white churches in the 1700s, only to find a home in African-American worship, shape note singing and the earlier tradition of American hymnody was discarded by relatively affluent, urban white churches in the United States in the 1800s, only to find a home in the rural south and west of the country, in the African-American and poor white churches of Appalachia, the Mississippi Delta, and other peripheral areas.

The Gospel of Matthew is an obvious source of the “Watchman” text.3 But in addition, there is a special American resonance to this hymn, which evokes a quite specific imaginary place.

The city on the hill

In 1630, John Winthrop, governor of the Massachusetts Bay Colony, preached a sermon that has resonated in the American ear ever since. When he gave the sermon for which he is best known, Winthrop was still aboard the Arbella, the ship that was transporting him and the other Puritans to Massachusetts Bay. In this sermon, he borrowed an image from the Sermon on the Mount, saying,

For we must consider that we shall be as a city upon a hill. The eyes of all people are upon us. So that if we shall deal falsely with our God in this work we have undertaken, and so cause Him to withdraw His present help from us, we shall be made a story and a by-word through the world. We shall open the mouths of enemies to speak evil of the ways of God, and all professors for God’s sake. We shall shame the faces of many

2 Performances of both “Nettleton” and “Watchman” in authentic style are included on Appling ( 2001).3 Matthew, Book 5, v. 14 (King James Version): Ye are the light of the world. A city that is set on an hill cannot be hid.

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of God’s worthy servants, and cause their prayers to be turned into curses upon us till we be consumed out of the good land whither we are going (WINTHROP, 1996, p. 10).

Winthrop’s city has remained in the back of the American mind for the next three and a half centuries. Consider President Ronald Reagan’s farewell address:

The past few days...I’ve thought a bit of the “shining city upon a hill.” The phrase comes from John Winthrop, who wrote it to describe the America he imagined […].

[I]n my mind [the Shining City] was a tall proud city built on rocks stronger than oceans, wind-swept, God-blessed, and teeming with people of all kinds living in harmony and peace, a city with free ports that hummed with commerce and creativity, and if there had to be city walls, the walls had doors and the doors were open to anyone with the will and the heart to get here. That’s how I saw it and see it still (REAGAN, 2002, p. 459-460).

As the popular music critic Greil Marcus has pointed out, the city that Reagan saw as a sign of American triumph “was founded more than three hundred years before as a warning, as a prophecy of self-betrayal” (MARCUS, 2011, p. 209).

2 Charles Ives: his own private danbury [slide]

Danbury, Connecticut was first settled in 1685. In 1780, the first hat factory was established in Danbury; eventually millinery grew to be its major industry, and by the early twentieth century Danbury was known as the “Hatting Capital of the World.” The railroad came to Danbury in 1852, accelerating the transformation of this small country town into a manufacturing hub that attracted workers, many of them immigrants who eventually outnumbered the original Yankee Protestants. Danbury’s most famous native musican is the composer Charles Ives, born there in 1874. His music is, in a special sense, strongly rooted to the place of his birth. One element of Ives’s own private Danbury was the religious music of the nineteenth century. As a church organist, he knew intimately an eclectic array of hymns from Methodist, Anglican, Presbyterian, Baptist, and other sources within the Anglo-American Protestant tradition.

A hymn like “Nettleton” or “Watchman” represented several things to Ives. As a church musician, it was a staple of his repertoire, something he could play in any key, improvise on and re-harmonize as required; as an artifact of his childhood, it

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was a web of memories. As a composer, it represented certain melodic and harmonic relationships, including some that no one else had thought of before he came along.

“Nettleton” and hymn tunes like it served for Ives as portals into a distant, and basically imaginary, past. The Ives biographer Jan Swafford has pointed out that the Danbury depicted in Ives’s music and commentary is closer to the small Yankee village of his father’s pre-Civil War boyhood than to the bustling factory town of Ives’s own experience (SWAFFORD, 1996). His Danbury is an imaginary place that, by the time of his birth, had ceased to exist. This is made explicit in one of his several appropriations of the “Nettleton” tune, in a song to which he wrote his own text, called “The Things Our Fathers Loved”4.

Ives is accused of nostalgia, but his recovered memories manipulate his source materials in ways that personalize the musical narrative they are originally intended to convey, sometimes to the point of dissolving it. If the original hymn is a prayer to a benevolent deity, Ives’s re-imaginings of it move uneasily between the prayer itself, the mind of the one praying, and his experience of the social setting in which he originally encountered it.

Ives wasn’t through with “Nettleton.” He ends his Second Violin Sonata with a movement he calls “The Revival”5. It is, superficially, a musical depiction of a tent revival in New England, circa 1880; less superficially, it is “Nettleton” as a portal to the composer’s past. The movement is an example of a unique musical process invented by Ives; the Ives scholar J. Peter Burkholder calls it cumulative form (BURKHOLDER, 1995). Cumulative form basically inverts classical sonata form, which begins with a clear exposition of the main themes and then develops them through a process of fragmentation and reassembly. Instead, Ives begins with wistful scraps of his chosen theme, half-remembered and mixed in with completely extraneous thoughts. Slowly the “Nettleton” theme assembles itself, and the movement ascends to what Ives termed a “Glory trance,” the old revival hymn regaining its roots in the ecstatic tent meetings of a forgotten New England.

Where is this place “all made of tunes?” It seems to be a place conjured into being by Ives’ ability to take the parlor and the parade ground, the church and the baseball diamond, art music and heart music, and perceive them all as different facets of a single experience. At a time when highbrow and lowbrow music and culture were far more clearly delineated than they are now, Ives unapologetically blended them. In this

4 Recordings of this song include Jan DeGaetani and Gilbert Kalish, Charles Ives: Songs. Elektra Nonesuch 971325-2. New York: Nonesuch Records, 1992.5 Recordings of the complete cycle of Ives’s’ four sonatas for violin and piano include Curt Thompson and Rodney Waters, Charles Ives: Violin Sonatas Nos. 1- 4. Naxos, 2003.

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he was far closer to a literary influence, Walt Whitman, than to any other American composer. Ives was, in fact, the first American composer to speak American6.

Whitman wrote extensively about the dichotomy between “heart music” and “art music”. By “heart music” he meant music in the vernacular tradition; by “art music” he meant Eurocentric musical culture, which in the mid-nineteenth century had just established a toehold in some of the larger coastal cities of North America. When forced to choose between “heart” and “art” music, Ives chose both, mixing the high and the low, creating a musical language out of the multiplicity and cognitive dissonance that seems a truer expression of American life than either would be by itself. Ives’s music was too disturbing for traditionalists; on the other hand modernists found it too backward looking, too rural, not ironic and urban enough, the opposite of “cool”.

Ives’s music is neither traditional nor modern, but rather a work of alternate history. In his works, hymns like “Nettleton” become a sort of memory-palace for Ives, its every phrase, motive, and nuance bearing not just links to the corresponding fragments of each verse of hymn text, but also to places, people, events, and social institutions that held significance for him. The dissonances and asymmetries of Ives’s music are a way of depicting the workings of memory. In this way, Charles Ives restored magic realism to New England.

3 The old, Weird America

We have seen how certain earlier musical practices in early America began in the white, urban centers of the eastern colonies and, as they were displaced by newer practices more indicative of the colonies’ (and then the United States’) increasing affluence and improved communication, moved toward society’s margins, to the Appalachian poor, to rural areas, to the new western settlements, and to the African-American population of the southern states. Music for religious worship and music for secular entertainment developed among these marginal populations somewhat unremarked by the educated elites of America’s cities until the advent of recording technology in the early 1900s abruptly shrunk the distances between city and country.

By the mid 1920s, a small but vigorous market had developed for two specialized kinds of music: “race” records, or music performed by African-American artists, and “hillbilly” music, or music by white performers from the southern Appalachian region (KILLMEIER)7. “Race” records included black jazz, gospel, and the blues; “Hillbilly,”

6 In “Song of Myself,” Whitman famously states, “Do I contradict myself? Very well then I contradict myself, (I am large, I contain multitudes.)”. Walt Whitman, Leaves of Grass, stanza 51.7 KILLMEIER, Matthew A. Race Music. In St. James Encyclopedia of Pop Culture. <FindArticles.com>.

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“Old Time,” or “Mountain” music included ballads, dance music, and white gospel numbers, some with their origins many centuries back, in the folk music of the British Isles. Taken together, along with the music of the Cajuns in southwestern Louisiana and the music of the cowboys in the Great Plains, these different kinds of music have recently been termed “roots” music by scholars and fans (FILENE, 2000).

The heyday of “Race” and “Hillbilly” music was between roughly 1927 and 1932, between the development of electronic means of recording sound and the peaking of the Great Depression, which destroyed the last vestiges of a cash economy in the Appalachians and the Mississippi Delta region. During that brief period, however, a number of unschooled musicians made their way to New York, Chicago or other metropolitan centers to try their luck at the big time. This meant cutting two or more 78 r.p.m. record sides in the hope that their renditions of gospel standards, murder ballads, dance hall stomps, or songs of doomed love would earn them a measure of lasting fame, and perhaps a reprieve from a life of coal mining, sharecropping, day labor, or itinerant minstrelsy. The Great Depression ended the heyday of these marginal niches in the American music market; all but a handful of these “race” and “hillbilly” performers returned to their prior lives, and their music was largely forgotten by the nation as a whole8.

Enter Harry Smith, a sometime ethnomusicologist, mystic, bohemian and experimental filmmaker (MARCUS, 2011). Smith had been fascinated by the music of people on America’s margins since his teens. In 1941, at age eighteen, he was already studying the music, languages and rituals of the Native tribes of the Pacific Northwest, where he himself was born. He had already begun collecting out-of-the-way recordings, and ultimately conceived of a grand project, his Anthology of American Folk Music9. Issued in 1952, Smith’s anthology distilled the music of the various groups making up what we know as “roots” music into a sort of crash course in the musical vernacular of America. It should be noted that Smith did not record this music himself; rather, he collected commercially available recordings that he often had rescued from thrift stores and attics and reissued them, often without obtaining permission from the artists.

Smith’s Anthology immediately became a primary source for the folk music revival then taking place in Greenwich Village and elsewhere. Folk musician Dave Van Ronk said,

The Anthology was our bible. We all knew every word of every song on it, including the ones we hated. They say that in the

8 According to Marcus (2011), documents that by 1933, record sales were 7 percent of what they had been in 1929.9 Reissued on compact by Smithsonian Folkways, 1997.

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19th century British Parliament, when a member would begin to quote a classical author in Latin the entire House would rise in a body and finish the quote along with him. It was like that. (VAN RONK 10, 1991 apud MARCUS, 2011, p. 88)

The popular culture critic Greil Marcus has documented the history of the music and musicians that make up Smith’s Anthology, seeing in the collection a kind of atlas of what he terms “the old, weird, America,” the nation as it was in the imagination of those populations in which the old stories and old mythologies of America retained something close to their original forms, and were thus handed down to us in the form of recordings like those on the Smith anthology. To a large extent, the Smith recordings present us with a collection of archetypes drawn from the margins of American life.

One source of these archetypes lie far back in the American religious past, back long before the advent of sound recording. Two imaginary places lead us there. The first such place is the world of John Bunyan’s Pilgrim’s Progress. This was the single most popular book in the New England colonies from its publication in the 1680s until well into the 18th century.

Pilgrim’s Progress was an allegorical novel about the journey of its protagonist, Christian, who journeys from his home in the City of Destruction toward the Celestial City. En route he undergoes many temptations and dangers, and has encounters that are instructive of the Christian faith. There is a literal Valley of the Shadow of Death, evoking the 23rd Psalm, for example, through which Christian must travel; Pilgrim’s Progress is a kind of virtual Calvinist theme park. Many of the places and situations in the novel became common linguistic emblems and tropes in subsequent English-language literature: the expression ”staying on the straight and narrow,” for example, which is a way of describing one’s efforts to keep out of trouble, derives from the “straight and narrow” King’s Highway that Christian traverses to the Celestial City11.

A second imaginary place that is part of the American consciousness is Hell. Specifically, the Hell conjured up by the sermons of Jonathan Edwards and his successors. In the 1730s and early ‘40s the Reverend Jonathan Edwards traveled up and down the Connecticut River Valley preaching a new kind of American gospel. In his most famous sermon, “Sinners in the Hands of An Angry God,” delivered in Enfield, Connecticut, Edwards’ prose is vividly pictorial, depicting hell as a real, tangible place:

10 VAN RONK, Dave. The Folkway Years 1959-1961. Smithsonian Folkways – CD SF 40041. Washington DC: Smithsonian Folkways records. 1 CD, Compiled and Remastered. 1991. 11 Two scholars who emphasize the spatial and the geographic in Bunyan’s magnum opus are James Turner and Philip Edwards. Turner (1980): Bunyan’s Sense of Place and Edwards (1980): The Journey in The Pilgrim’s Progress.

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That world of misery, that lake of burning brimstone, is extended abroad under you. There is the dreadful pit of the glowing flames of the wrath of God; there is hell’s wide gaping mouth open; and you have nothing to stand upon, nor any thing to take hold of; there is nothing between you and hell but the air; it is only the power and mere pleasure of God that holds you up [...] (EDWARDS , 1976, p. 32)12.

Edwards was perhaps the first great salesman in North America. His description of Hell is a way of softening up the congregation for his sales pitch – he is offering eternal membership in the Shining City. You have, he continues, an extraordinary opportunity, for today “Christ has thrown the door of mercy wide open.” How awful it would be, Edwards continues, using every tool in his salesman’s arsenal, to be left behind on such a day, to “see so many others feasting, while you are pining and perishing!” Playing to the American desire to keep up with the Joneses, Edwards closes the deal by asking the people of Enfield, “Are not your souls as precious as the souls of the people at Suffield, where they are flocking from day to day to Christ?”

Making explicit the parallel he sees between contemporary New England and an infamously doomed city, Edwards ends with a final caution: “Let every one fly out of Sodom: ‘Haste and escape for your lives, look not behind you, escape to the mountain, lest you be consumed.’” In other words, are you on the road to the New Jerusalem, or to the City of Destruction?

Paradoxically, the evangelism of Edwards and the Great Awakening took root most firmly and permanently not in New England, but in two other places: First, among the restless or desperate pioneers that left the coastal settlements of English-speaking America for new lives to the west. Some of these found in the mountains of Appalachia a bleak life of subsistence farming, and then (in the late nineteenth and early twentieth centuries) of coal mining. Second, among the African-Americans who, freed from legal slavery but not yet recognized as either fully American or even fully human, created a hardscrabble way of life for themselves in the Mississippi Delta and other parts of the former slaveholding South from the 1860s onward. These two populations and others on the margins of America’s self-awareness – the cowboys of the western Plains, the Cajuns of Louisiana--were the true heirs to the dualism of Winthrop, Bunyan, and Edwards, their music the soundtrack for the latter day round-trip itinerary between the Shining City and Sodom.

The music critic Greil Marcus suggests that the Smith anthology presents a musical 12 The Biblical text on which Edwards preached his sermon was Deuteronomy 32:35: “Their foot shall slide in due time.” Edwards (1976, pp.7-12). See also commentary in Marcus, 48-51.

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map of a place he calls Smithville, which is similar in many ways to the world of Bunyan’s novel. In Smithville, there are traps and temptations galore; the subject matter of the songs includes murder, banditry, jealousy, adultery, betrayal, industrial accidents, and agricultural disasters. Presidential assassinations share space with the murder of lovers and children; there is religious music that evokes Judgment Day, Hell and Salvation, and dance music that evokes good times and drunkenness.

The performers from this world lived in a society where there were two kinds of music, the sacred and the profane, each associated with different – but connected – lifestyles. The second volume of Smith’s anthology, which he titled Social Music, expresses this duality most clearly. Volume Two Part One consists of dance music in a wide variety of styles, from mountain fiddling tunes to Cajun waltzes and jug band stomps. Volume Two Part Two is a disc of sacred music and encompasses both black and white Gospel, some in a more contemporary style and others that sound as though they must predate Emancipation.

Three examples illustrate the disc’s cope. The first is a gospel tune called “Must Be Born Again” by the Rev. J. M. Gates. Until his death in the early 1940s, Gates was the pastor of a Baptist church in Atlanta, Georgia. Many of his songs were strong warnings of the hellish punishments that awaited sinners. The second is “Present Joys” by a group calling themselves the Alabama Sacred Harp Singers. First they sing the hymn using Sacred Harp-style solfa syllables; then they sing the words of the hymn to the same tune. Finally, “I’m In the Battlefield for My Lord” by the Reverend D.C. Rice and His Sanctified Congregation. Rice was inspired by Gates, and made a few recordings in Chicago with his Sanctified (Penetcostal) congregation. He received $75 per recording, but no royalities. The style here is popular, the choir and soloist accompanied by piano, trumpet, trombone, string bass, drums, and triangle. This is an eclectic performance of a hymn that is still performed in some African-American churches.

It’s not difficult to hear the ecstatic shouts of early rock and roll in this kind of gospel vocalizing. Carl Perkins, Little Richard, Elvis Presley, and Johnny Cash all grew up in the Pentecostal church, and their early music often creates a kind of “glory trance” of its own.

What Marcus calls Smithville – the imaginary village inhabited by the people, situations, and events documented in the Smith Anthology – is, as he says, a township of masks (MARCUS, 2011). All the killers in the town – the vicious Staggerlee, who murders a man over a Stetson hat, the bandit Cole Younger, the presidential assassin Charles Guiteau – share masks with the murderers of the Elizabethan Child ballads in the Smith collection; likewise, every murdered woman, in these songs,

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becomes the same woman, wearing the mask of the murdered lover, sweetheart, or wife; and so it is with every predator, every bad trail boss and tyrannical overseer, every scorned lover or failed gambler drinking himself to death, every doomed or saved soul. America – the real or the imagined America – is a land of masks.

One musician who took in the full Smithville experience was Bob Dylan, who has borrowed from the Smith Anthology for his own songs all his life. In 1967 Bob Dylan was recovering from a motorcycle accident. He was also convalescing from a controversial world tour during which he had famously “gone electric,” thereby severing his ties to the folk music scene. He and a group of musicians who had backed him on the tour met in a house in upstate New York named Big Pink, and also in Dylan’s home nearby. In the room where Dylan did his composing a King James Bible was always open on a bookstand (HAJDU, 2001). Together, Dylan and the Band recorded a series of performances that, for various reasons, remained officially unissued until 1975. In the interim, these performances became the most famous bootleg recordings of the twentieth century.

Marcus hears these sessions, known as the Basement Tapes, as a sort of updating of Smith’s mythical America. The songs of the Basement Tapes have the same relationship to the religious and cultural themes of Smith’s collection as a Cubist portrait does to a photograph. A sense of fun but also of sorrow runs through the Basement songs, as if they were a farewell visit to the America conjured up in Smith’s earlier collection. The Basement Tapes set the tone for Dylan’s next project, the album John Wesley Harding (1967). The paired-down arrangements and parable-like quality of the songs on the album make it a distillation of all Dylan’s prior appropriations on the mountain music, Delta blues, and gospel of Smith’s anthology. One clear link is the title track, in which Dylan recasts the tale of Texas outlaw John Wesley Hardin as a kind of Robin Hood. Its model, the Carter Family’s ballad “John Hardy,” from the Smith collection, relates in old-time murder ballad fashion the story of one John Wesley Hardin, a violent outlaw from Texas who committed his first murder at the age of fifteen.

John Hardy he was a desperate little manHe carried the guns every dayShot a man on the West Virginia lineYou oughta seen John Hardy gettin’ away

Compare Dylan’s version, the title track of his 1967 album (“John Wesley Harding/Was a friend to the poor, […] But he was never known/To hurt an honest man.”)

Here, the mask that Dylan places on Hardin/Harding/Hardy’s face transforms the

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man within. Why transform a cowardly serial killer into an avenger of the weak and a protector of women? Perhaps Dylan wanted to suggest, provocatively, that the difference between psychopath and saint may lie more in who’s telling the story than in any objective historical record.

On this album Dylan reassembles bits and pieces of the City of God, the City of Destruction, and the road between them, with all its pitfalls and points of interest, to tell enigmatic tales full of troubling imagery and moral ambiguity. The Dylan scholar Bert Cartwright counts more than sixty Biblical illusions in the album as a whole (CARTWRIGHT, 1985). The best-known song from this album brings us full circle to the imagery of the walled City of God. Dylan’s “All Along The Watchtower” instantly caught the imagination of his few musical peers, and in the following year Jimi Hendrix released his own version; still more than Dylan’s original recording, his virtuoso guitar work brings out an urgency underlying the song’s imagery13.

The United States is perhaps the most mobile, and most technological, society in human history. One consequence of this technologically enhanced (and technologically-motivated) mobility is an unusually rich cross-fertilization of musical cultures. In this essay I have attempted to capture the scope and endurance of one thread of U.S. musical culture especially influenced –indeed, defined – by travel. That thread is defined by the imaginary places that dominate the deepest part of American Protestant religious thought. The music that travels Bunyan’s difficult road between the heavenly City of Winthrop and the fiery Pit of Edwards has come from many sources: from the hymnody of Watts and Mason, from the music of Ives and Dylan, from the coal towns and hardscrabble of the Southern Appalachians, from the sharecropped fields of the Mississippi delta, from churches, fields, and prairies. It is a music of haunted and holy places.

13 An obvious source of inspiration for Dylan’s “All Along The Watchtower” is Isaiah 21:11-12: “[…] He calleth to me […] Watchman, what of the night? Watchman, what of the night? The watchman said, The morning cometh, and also the night: if ye will enquire, enquire ye: return, come.”

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BURKHOLDER, J. Peter. All made of tunes: Charles Ives and the uses of musical borrowing. New Haven: Yale University Press, 1995.

CARTWRIGHT, Colbert S. The bible in the lyrics of Bob Dylan. Bury, Lancashire: Wanted Man, 1985.

EDWARDS, Jonathan. Their foot shall slide in due time. In EDWARDS, Jonathan. The works of Jonathan Edwards. v. 2. Avon: The Bath Press, 1976. pp. 7-12.

EDWARDS, Philip. The journey in the pilgrim’s progress. In: NEWEY, Vincent (Ed.). The pilgrim’s progress, critical and historical views. Liverpool: Liverpool University Press, 1980. p. 111-117.

FILENE, Benjamin. Romancing the folk: public memory & american roots music. Chapel Hill: University of North Carolina Press, 2000.

HAJDU, David. Positively fourth street: the lives and times of Joan Baez, Bob Dylan, Mimi Baez Farina and Richard Farina. New York: Farrar, Straus and Giroux, 2001.

IVES, Charles. Songs. Elektra nonesuch 9 71325-2. New York: Nonesuch Records, 1992. 1 cd.

______. Ives: Violin Sonatas Nos. 1-4. Players: Thompson Curt, violin and Rodney Waters, piano. Naxos 8.559119, 2003. Naxos.1 cd.

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OGASAPIAN, John. American history through music: music of the colonial and the revolutionary era. Westport, CT: Greenwood Press, 2004. p. 29-45.

REAGAN, Ronald. Farewell address. In: GLEAVES, Whitney. American presidents: farewell messages to the nation, 1796-2001. Lanham, MD: Lexington Books, 2002. p. 459-460.

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SWAFFORD, Jan. Charles Ives: a life with music. New York: W.W. Norton, 1996.

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TURNER, James. Bunyan’s sense of place. In: NEWEY, Vincent (Ed.). The pilgrim’s progress, critical and historical views. Liverpool: Liverpool University Press, 1980. p. 91-110.

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Estados Unidos, a Cidade de Deus e outros lugares imaginários: Charles Ives, raízes e rock and roll

REVISTA MODUS – Ano VII / Nº 10 – Belo Horizonte – Maio 2012 – p. 73-85

Jeffrey Perry

Resumo: O tópico desse artigo é uma geografia musical: Certos locais são invocados pela sua musica. Tais lugares podem ser baseados em lugares fisicamente e historicamente reais ou podem ser inteiramente imaginários. Nos Estados Unidos, particularmente, a ocorrência insistente da ideia de lugares importantes parece assombrar a música daquele país. O que se segue é uma discussão sobre vários lugares importantes para a música dos Estados Unidos e sobre a maneira como esses lugares se conectam uns com os outros.

Palavras chave: Música dos Estados Unidos; Charles Ives; história da música dos Estados Unidos; rock.

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normas para publicação

1. O Conselho Editorial da revista MODUS aceita trabalhos originais e inéditos, em português, inglês e espanhol, de autoria individual ou coletiva, obedecendo ao seguinte padrão:

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5. Os textos, digitados em Word for Windows, devem ser escritos em linguagem clara e acessível a leitores de várias categorias profissionais, evitando-se o uso desnecessário e excessivo de jargões e formulações demasiadamente prolixas e respeitando rigorosamente a metodologia científica.

6. Os artigos deverão ser remetidos em CD ou por e-mail. O artigo deverá estar assim configurado: formato A-4 (210 x 297); margens de 2,5 cm; espaço 1,5 entre linhas; fonte Times New Roman, corpo 12. As páginas deverão ser numeradas no canto superior direito, desde a primeira.

7. Considerar como extensão máxima dos textos: [a] artigos originais, de pesquisa e artigos de revisão – 15 páginas;[b] resenhas e cartas ao editor – 2 páginas, com até quatro referências.

8. Estrutura do artigo – Folha de rosto contendo título e subtítulo do artigo (apresentar também em inglês), nome do(s) autor(es) e endereço postal e eletrônico. O texto deverá apresentar os seguintes elementos: título e subtítulo do artigo; resumo; palavras-chave (até cinco); abstract; keywords; corpo do artigo; referências.

9. O título, breve e suficientemente específico e descritivo, deve ser alinhado junto à margem esquerda, em fonte maiúscula/minúscula, tamanho 14, negritado. O nome do autor deve ficar à direita, em fonte maiúscula/minúscula, tamanho 12, também negritado.

10. Os subtítulos no interior do artigo devem ser digitados em fonte maiúscula/minúscula, tamanho 12, em negrito.

11. O resumo informativo em português – entre cinco e dez linhas –, acompanhado de sua tradução para o inglês (abstract), deve anteceder o texto.

12. As credenciais acadêmico-profissionais do(s) autor(es) devem ser apresentadas ao final do texto, em até cinco linhas, seguidas de um endereço eletrônico de referência.

13. As notas, em tamanho 10, exclusivamente para comentários necessários ao desenvolvimento da exposição, e nunca para citações bibliográficas, devem ser indicadas com número ao alto, imediatamente após a frase a que diz respeito. Deverão figurar no rodapé da página, sendo numeradas sequencialmente.

14. A obtenção de permissão para reproduções de ilustrações é de responsabilidade do autor. As imagens devem ser gravadas em formato jpg, com no mínimo 300 dpi. O arquivo deve ser enviado pela internet ou em CD-ROM.

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15. Gráficos e figuras (estritamente indispensáveis à clareza do texto) deverão estar numerados. As legendas devem vir abaixo deles. Assinalar, no texto, pelo número de ordem, os locais onde devem ser inseridos.

16. Os quadros deverão ser acompanhados de cabeçalho que permita compreender o significado dos dados reunidos, sem necessidade de referência ao texto. Assinalar, no texto, pelo número de ordem, os locais onde os quadros devem ser inseridos.

17. As citações literais curtas deverão ser inseridas no texto, entre aspas, seguidas de parênteses com sobrenome do autor em caixa alta, ano da publicação e número da página de onde foram retiradas (cf. NBR 10520/2002 da ABNT). Exemplo: (MARTIN, 1988, p. 321-322). As citações com mais de três linhas deverão ser digitadas sem aspas, com um recuo de 4 cm da margem direita e corpo 11. Entre parênteses, informar o sobrenome do autor em caixa alta, o ano da publicação e o número da página de onde foram retiradas.

18. A lista com as referências bibliográficas completas, por ordem alfabética de sobrenome do autor, com apenas a inicial do nome, deve vir ao final do texto, obedecendo à NBR 6023/2002 da ABNT.

19. As colaborações devem ser enviadas para o endereço da revista MODUS.

Endereçamento editorial:

REVISTA MODUS – Escola de Música da UEMGR. Riachuelo, 1.351 – Padre Eustáquio

CEP 30720-060 – Belo Horizonte – MG.

[email protected]

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Nome do avaliador:

Tipo de artigo: Título do trabalho:

1 - O trabalho se encontra em acordo com as normas de publicação da revista?( ) Sim ( ) Não

2 - O conteúdo é adequado à revista?( ) Sim ( ) Não

3 - O título expressa o conteúdo do trabalho?( ) Sim ( ) Não

4 - O resumo apresenta os aspectos fundamentais do trabalho?( ) Sim ( ) Não

5 - O título e o resumo foram traduzidos para o inglês de modo satisfatório?( ) Sim ( ) Não

6 - As palavras-chave são adequadas?( ) Sim ( ) Não

7 - A linguagem empregada é clara e apropriada?( ) Sim ( ) Não

8 - O texto está bem organizado?( ) Sim ( ) Não

9 - Os argumentos e as conclusões estão bem justificados?( ) Sim ( ) Não ( ) Não se aplica

10 - Há coerência entre o objetivo proposto e as conclusões?( ) Sim ( ) Não ( ) Não se aplica

11 - O autor utiliza as referências necessárias e adequadas?( ) Sim ( ) Não

12 - O texto apresenta erros grosseiros de gramática ou ortografia?( ) Sim ( ) Não

Formulário de Avaliação

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13 - As figuras ou tabelas estão claras e com legendas apropriadas?( ) Sim ( ) Não ( ) Não se aplica

14 - A extensão do texto é compatível com seu conteúdo científico?( ) Sim ( ) Não

15 - Qualidade da apresentação:( ) Excelente ( ) Boa ( ) Regular ( ) Insuficiente

16 - Qualidade geral do trabalho:( ) Excelente ( ) Boa ( ) Regular ( ) Insuficiente

17 - Recomendação:

18 - Observações/comentários:

Publicar sem alteraçõesPublicar após pequenas alteraçõesReescrever e submeter novamente para avaliaçãoRecusar

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Esta revista foi composta em Belo Horizonte para aEditora da Universidade do Estado de Minas Gerais - EdUEMG

e impressa em off-set, em papel reciclado, na tipologia Adobe Garamond,corpo 9, entrelinha 9,6, capa em papel triplex 250g, em maio de 2012.