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Revista de Administração de Empresas All the contents of this journal, except where otherwise noted, is licensed under a Creative Commons Attribution License. Fonte: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034- 75901973000100003&lng=en&nrm=iso. Acesso em: 21 nov. 2017. REFERÊNCIA HOFFMANN, Helga. O planejamento e o mecanismo de preços. Revista de Administração de Empresas, São Paulo, v. 13, n. 1, p. 29-39, jan./mar. 1973. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034- 75901973000100003&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 21 nov. 2017. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0034-75901973000100003.

Revista de Administração de Empresas · 2017-12-15 · HOFFMANN, Helga. O planejamento e o mecanismo de preços. Revista de Administração de Empresas, São Paulo, v. 13, ... ção

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Revista de Administração de Empresas

All the contents of this journal, except where otherwise noted, is licensed under

a Creative Commons Attribution License. Fonte:

http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-

75901973000100003&lng=en&nrm=iso. Acesso em: 21 nov. 2017.

REFERÊNCIA

HOFFMANN, Helga. O planejamento e o mecanismo de preços. Revista de Administração de

Empresas, São Paulo, v. 13, n. 1, p. 29-39, jan./mar. 1973. Disponível em:

<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-

75901973000100003&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 21 nov. 2017. doi:

http://dx.doi.org/10.1590/S0034-75901973000100003.

Helga Hoffmann *

* Professora do Departamento de Econo-mia da Universidade de Brasília. A auto-ra agradece a Edmar Bacha e a LauroCampos a leitura e os comentários que

fizeram.

R. Adm. Emp., Rio de Janeiro,

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Existe praticamente um consenso de que o meca-nismo de preços não funciona espontaneamente empaíses subdesenvolvidos, de modo a levar à melhoralocação dos recursos disponíveis ou à mais altataxa de crescimento possível. Há quem seja atémais categórico: "Atualmente sabe-se que a. econo-mia de mercado, entregue a si mesma, fornece so-luções errôneas nos países subdesenvolvidos. Ospreços não refletem corretamente os custos alterna-tivos".l Ou seja, os preços não fornecem sinais"adequados", qualquer que seja o sentido dado aessa adequação: pela comparação com o funciona-mento ideal dos preços e do mercado no modelo deconcorrência perfeita, ou pela apresentação de me-tas de política econômica, cuja implementação esta-ria entravada pelo mau funcionamento do meca-nismo de preços.

Os argumentos têm sido apresentados com fre-qüência e vários se repetem em autores diversos.Há os que localizam as críticas ao funcionamentodos preços de mercado apenas em áreas subdesen-volvidas, enquanto outros estendem as ressalvastambém às economias desenvolvidas. Neste artigonos interessam mais os primeiros.

De modo resumido, passaremos em revista as res-trições principais, a fim de abrir caminho para aetapa seguinte, onde analisaremos alguns esquemasalternativos apresentados com o fim de "corrigir"os preços e obter uma alocação de recursos maiseficiente ou desejada. Entre eles destaca-se a posi-ção "instrumentalista" em matéria de preços e aproposta de avaliar projetos e programas de investi-mento com base em "preços de conta" que refli-tam a disponibilidade real dos recursos produtivos.

1. Os entraves ao funcionamento do mecanismode preços nos países subdesenvolvidos costumamser assinalados por comparação com o sistema idealde preços do modelo teórico de concorrência perfei-ta e suas implicações na teoria econômica do bem-estar. Na verdade, nem sempre fica bem definida aseparação entre aquilo que é crítica à própria teo-ria e o que seria registro de falhas nos mercadosreais dos subdesenvolvidos, comparadas ao mede- 29lo teórico. De qualquer modo, só tendo em mentea teoria da alocação em concorrência perfeita épossível compreender as restrições apontadas, quese referem, em resumo, às seguintes condições:a) existência de economia natural e agricultura tra-

dicional;b) desequilíbrio estrutural no mercado de fatores

produtivos;c) papel das economias externas;d) precária mobilidade dos fatores e presença de

monopólios;e) má distribuição de renda; ef) características do setor externo.

13(1) : 29-39, jan.z'mar. 1973

O planejamento e o mecanismo de preços

1 .1 Nas grandes áreas fora da economia mone-tária, produzindo para autoconsumo, não haveriaresposta a preços. As decisões sobre produção se-riam derivadas das necessidades de subsistência ea tradição é que determinaria o modo de produzir.No caso, não se afirma propriamente que são ina-dequados os "sinais" fornecidos à agricultura pelosistema de preços, e sim que essa não reage aos"sinais", constituídos pela elevação dos preços rela-tivos dos produtos agrícolas; O comportamento delatifúndios não capitalistas ou de minifundistas quemal conseguem o necessário à sobrevivência nãopoderia ser explicado a partir do critério da maxi-mização do lucro."

1 .2 O desequilíbrio estrutural no mercado defatores de produção é o obstáculo sobre o qual insis-te a maior parte dos autores. Tinbergen, por exem-plo, frisa que o planejamento nos países subdesen-volvidos precisa considerar o desequilíbrio no mer-cado de fatores de produção, a saber, o desempregogeneralizado, aparente ou disfarçado, uma taxa dejuros no mercado abaixo da que deveria refletir aescassez de capital, e um desequilíbrio estrutural nobalanço de poqomentos."

Um texto clássico a respeito desse tema é o deEckhaus, que explica o desemprego existente emmuitos países subdesenvolvidos sobretudo a partirda hipótese das limitações tecnológicas. Se a tecno-logia possível determina uma proporção no uso dosfatores, mas essa proporção não corresponde à dis-ponibilidade relativa dos mesmos, haverá excesso dealguns dos fatores em função da limitação dosoutros.'

Tal desequilíbrio no mercado de fatores é sinô-nimo e sintoma da falta de correspondência entreos preços dos fatores e a disponibilidade dos mes-mos. Nos países subdesenvolvidos é bem freqüentea existência de elevado desemprego estrutural demão-de-obra e/ou terra, ao lado da escassez deoutros recursos, sobretudo capital e divisas. Dessaforma, para os primeiros, o custo de oportunidadeseria inferior ao preço corrente de mercado, enquan-

30 to para os últimos, inversamente, o custo de opor-tunidade ou alternativa seria superior ao preço demercado. A grande diferença entre o lucro sociale o lucro privado torna pouco indicado deixar aalocação de recursos orientar-se pelos preços demercado que condicionam o lucro privado.

Por outro lado, essas maiores imperfeições nomercado de fatores resultam em distribuição menosequilibrada da renda, o que, por sua vez, terá novasrepercussões sobre o funcionamento do sistema depreços (Ver adiante, item 1.5).

1 .3 No modelo teórico da alocação de recursosorientada pelo mecanismo de preços, a hipótese im-

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plícita é a da inexistência de economias ou deseco-nomias externas. Desde Marshall se afirma que aexistência de economias externas implica uma falhana eficiência alocativa dos preços de mercado. Seocorrem, dá-se uma diferença entre os lucros sociaise os lucros privados; estes últimos já não podemservir de guia à alocação dos recursos (em nívelagregado), pois a instalação de um empreendimentopode justificar-se socialmente pelos benefícios queproporcionará a outra empresa e ao conjunto daeconomia.

No bucólico exemplo de Meade, se a produçãode mel recebe um efeito externo positivo da produ-ção de maçãs, a quantidade a produzir destas, de-terminada pelo mercado, será menor que a social-mente desejável. E isso porque não se refletirá nospreços de mercado o benefício que o uso das floresdas macieiras representa para o produtor de mel. 5

Além dessa situação em que o produtor fornecegratuitamente a outro um dos seus fatores de pro-dução (a flor de macieira de Meade), há outroexemplo de economia externa que se dá, apesarde não ocorrerem diferenças entre a lucratividadesocial e privada de cada produtor individualmenteconsiderado. ~ o caso em que a atividade de umdos produtores, ou de ambos, reciprocamente, é fa-vorecida (ou prejudicada) pela "atmosfera", am-biente ou clima - físico ou social - resultante daatividade do outro." Em suma, a eficiência alocativaé prejudicada, com a preferência dos empresáriospelas áreas e setores em que se apresentam maio-res economias externas, enquanto socialmente é pre-ferível a ampliação dos setores que proporcionameconomias externas a outros ou ao conjunto.

~ importante ficar claro que, nessa discussão daeficiência alocativa na teoria do equilíbrio geral, ainterdependência entre produtores considerada éapenas aquela que não opera através do mercado,ou seja, trata-se das chamadas "economias externastecnológicas".

Ao contrário, na literatura sobre critérios de in-vestimento em países subdesenvolvidos, o conceitoé usado num sentido bem mais amplo: as econo-mias externas são invocadas sempre que os lucrosde um produtor são afetados pelas ações de outros.Ou seja, no caso, além da interdependência que nãose reflete no mercado, o conceito abrange tambémas chamadas "economias externas pecuniárias",que se processam através dos preços de mercado.Alegando essa interdependência é que vários auto-res, que analisam problemas de desenvolvimento,defendem a necessidade de critérios de investimen-to que tendem a "deslocar o suposto de que a con-corrência perfeita, ainda que se pudesse realizar,daria por resultado a distribuição ótima dos recursos

ao longo do tempo".' Um exemplo seria a discussãosobre desenvolvimento "equilibrado" x "desequili-brado", quando defensores do primeiro invocam aseconomias externas recíprocas do investimento si-multâneo em vários setores," enquanto partidáriosdo segundo defendem concentrar investimentos numsetor por seu efeito indutor sobre outros." I: tambémsob esta rubrica das economias externas que costu-ma ser mencionado o conhecido fato de que o sis-tema não dá "sinais adequados" em certos setorescomo educação, saúde, transportes, infra-estruturaem geral.

Não vamos nos estender no exame dos dois con-ceitos de economias externas, usados, cada um emseu respectivo sistema de referência, de forma di-versa e até oposta. Scitovsky, com a preocupaçãoda coerência teórica, tratou disso num artigo emque analisa porque na teoria do investimento empaíses subdesenvolvidos "é à interdependência atra-vés do mecanismo de mercado que se atribui o fra-casso da economia de mercado em levar ao ótimosocialmente desejável, quando a teoria do equilíbriochega à conclusão oposta e confia que a interde-pendência de mercado traga uma situação de óti-mo";" O que deve ficar bem claro é que nos textossobre problemas da industrialização em países sub-desenvolvidos, quando são referidas "economias ex'"ternas", ou quando se fala em clima favorável oudesfavorável que uma dada atividade econômicapode criar para outras ou para o conjunto, trata-seinclusive (e talvez principalmente) daquela interde-pendência que se trcnsmite via preços. Pode ser obarateamento de um fator usado por outra indústriaou pela própria indústria em questão, a redução decustos de produto complementar ou substitutivo, acriação recíproca de mercado e a dlrninuiçôo dorisco pela instalação conjunta de vários remos etc.

Na verdade, a interdependência da produção,atue ou não através do mercado, não é exclusivados subdesenvolvidos. Contudo, como demonstrouScitovsky." quanto menos integradas as indústrias,tanto maior a margem de diferença entre benefíciossociais e lucros privados introduzida pelas economiasexternas pecuniárias. E as economias subdesenvol-vidas são notoriamente pouco integradas. Além dis-so, cada projeto individual representa, nos subdesen-volvidos, uma proporção maior do conjunto dos in-vestimentos e, assim, sua implementação causamaior impacto relativo e tende a provocar maioreseconomias externas pecuniárias. Dessa forma, emgeral, seriam maiores as economias externas empaíses subdesenvolvidos." Por outro lado, alega-seque nestes são maiores -também as desigualdadesentre as economias externas existentes nos váriossetores e regiões, afastando exageradamente do óti-mo as decisões emprescrícís."

1 .4 A falta de mobilidade dos fotores de pro-dução constitui mais um obstáculo ao funcionamen-to flexível do sistema de preços. Igualmente, nãoé prerrogativa de países subdesenvolvidos, mas alié maior, em virtude de ainda não estarem integra-dos os vários mercados, quer pela deficiência detransportes e comunicações em geral, quer pelobaixo nível de especialização e divisão do trabalhoentre as regiões, quer pela persistência de núcleosde economia natural. A mobilidade é restringidatambém pela inexistência de um mercado de capitaisdesenvolvido, que distribua recursos financeirosentre os diversos projetos de investimento segundosua rentabilidade relativa.

Relacionado com esse problema, menciona-seuma das características da industrialização tardia,que se defronta com mercados relativamente peque-nos, num estágio em que a tecnologia e a concen-tração de capital já avançou muito a nível interna-cional. Às vezes, o tamanho mínimo do equipamen-to a importar é comparável ao tamanho do mer-cado. Assim, muitas indústrias são instaladas desdeo início em condições de monopólio e oligopólio.Diante disso, por um lado, retoma-se o argumentoteórico de que em caso de monopólio o sistema depreços não garante que cada recurso seja aplicadosegundo o critério da igualdade do valor do produtomarginal nos diferentes usos do recurso, ou seja,não leva a que cada recurso seja empregado demodo a maximizar sua contribuição ao produto to-tal. Por outro lado, o monopólio pode dificultar aentrada de novas empresas, constituindo-se em im-pedimento à mobilidade.

À falta de mobilidade, poderíamos acrescentar amaior dificuldade de reunir informações, o que tor-na mais precária a avaliação do mercado por partedo empreendedor individual.

1 .5 Na própria teoria da alocação de recursos opapel da distribuição de renda não está suficien-temente definido e, relativamente, recebeu poucaatenção.

A construção do modelo teórico da alocação de 31recursos parte das preferências do consumidor exer-cidas no mercado. No ponto de "ótimo" da aloca-ção, o valor do produto marginal atribuível a umdado recurso deve ser igual em todos os usos desserecurso. A partir daí já é possível concluir, semmaior sofisticação analítica, que há um "ótimo" deeficiência alocativa para cada estrutura da deman-da final. De fato, se o produto de uma indústria Apassa a ser preferido, o aumento da procura A fazcom que aumente o seu preço, e, portanto, o valordo produto marginal de um dado recurso na indús-tria A. Até o ponto em que volte a se cumprir acondição da igualdade do valor do produto margi-

Planejamento e mecani8mo de preço8

nal do recurso em todos os usos, deve-se trcnsfe-rir recursos para a indústria A. Por conseguinte,haverá um outro "ótimo" de eficiência alocativacorrespondente à nova estrutura da demanda final.E a estrutura da demanda final depende, por suavez, da distribuição de renda.

Lange, num texto que se tornou um dos clássicosda economia do bem-estar, mostrou que a condiçãode maximização do bem-estar (igualdade entre ataxa marginal de substituição e a taxa marginal detransformação tecnológica) deixa arbitrária a dis-tribuição de rendo." Ou seja, para cada distribui-ção de renda haveria um "ótimo" de bem-estar."

As dificuldades que isso representa para o esta-belecimento de um ótimo social neutro, isento dejuízos de valor, revelam-se no comentário de outrosteóricos do bem-estar. Bowen, ao enumerar as con-dições para atingir o máximo de bem-estar pelo usode uma dada oferta de fatores, coloca em primeirolugar: "a produção é levada a cabo em resposta àlivre escolha dos consumidores individuais (desde'que os consumidores façam as escolhas 'corretas' ea renda seja distribuída 'corretamente')". Por esco-lhas "corretas" do consumidor entende aquelas quecumpram a condição de proporcionalidade entre ospreços e as taxas marginais de substituição; e pordistribuição de renda "correta" entende uma "dis-tribuição tal que as satisfações marginais proporcio-nadas pela renda sejam iguais, em termos de va-lores socialmente aceitos, para todas as pessoos"."Ora, se admitíssemos que a função que expressa autilidade marginal da renda é igual para todas aspessoas e se, por hipótese, os "valores socialmenteaceitos" na comunidade são igualitários e atribuema mesma "significação social marginal" a cada indi-víduo, poderíamos deduzir que todo indivíduo temque obter renda igual (ainda que isso não impliqueque a renda monetária de todo indivíduo tenha queser a mesma, já que há bens como tempo livre,segurança, prestígio social etc., aos quais tem queser atribuído uma parcela equivalente em termosda renda). 11

32 Essas formulações, se bem que contribuam paradelimitar melhor o problema, não têm significadooperacional, no sentido de não se poder dizer empi-ricamente em qual situação estão sendo cumpridasou não aquelas condições de igualdade entre a rela-ção de preços e a taxa marginal de substituição dedois bens, e de igualdade da utilidade marginal darenda para todas as pessoas. Pouco ou nada ajuda-riam aqueles que tivessem que avaliar alguma me-dida de política econômica com repercussões sobrea distribuição de renda e/ou de mercadorias entreas pessoas.

A dificuldade de determinar uma distribuiçãoótima de renda tendo como ponto de partida a ma-

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ximlzoçêo da utilidade ou satisfação subjetiva doconsumidor é um dos aspectos da controvérsia sobrea possibilidade das comparações interpessoais deutilidade. Aceita a impossibilidade da comparação,igualmente seria impossível determinar objetiva-mente qual a melhor entre duas distribuições diver-sas de renda: a mudança da primeira para a segun-da implica favorecer uns e prejudicar outros, e seriaimpossível comparar o ganho de utilidade de unscom a perda de satisfação de outros. Mais do queisso, em termos estritamente científicos e objetivos,o economista, enquanto tal, não poderia argumentarpró ou contra qualquer medida de política econô-mica que melhorasse a situação de alguns enquantotornasse pior a situação de outros.

Várias foram as propostas apresentadas para en-frentar a dificuldade e tentar devolver ao economis-ta "status científico" enquanto formulador de polí-tica econômica. Não poderemos nem ao menos re-sumir aqui todo o debate, que atingiu considerávelgrau de sofisticação formal. Entre as "soluções",registramos:a} atribuir a alguma agência representativa de co-

munidade, tipo Congresso, a tarefa de avaliar adlstribuiçõq da renda e decidir sobre redistri-buição. Lange e Kaldor seriam partidários dessaclternotlvo;"

b) adotar "algum tipo de postulado de igualdade",como sugeriram Harrod e Lerner;19 e

c) fazer recomendações exclusivamente a base deconsiderações de eficiência, pois ainda que 'Umadecisão para maximizar a eficiência traga con-sigo uma redistribuição de renda, ao fim de al-gum tempo todos os membros da comunidadeacabariam por ficar em situação melhor queantes. Esta é uma presunção bastante genera-lizada, que tem uma de suas formulações emHlcks.>' Johnson seria outro exemplo, ao afir-mar que interferências governamentais na dis-tribuição de renda prejudicam a eficiência eco-nômica do mercado, e ao optar pela eficiência"porque aq longo do tempo o crescimento rá-pido tende de vários modos a promover umadistribuição mais igualitária da riquezo";"

Depois de comentar essas "soluções", com suasamálgamas e ramificações, um dos principais estu-diosos da teoria econômica do bem-estar concluíaem 1951 que o economista, se não queria renunciarà político econômica, não tinha outro jeito senãoceder em suas pretensões de objetividade de umcientista natural e fazer suas opções e julgamentosde valor, explicitando-os em suas recomendações.A alternativa seria tornar-se um técnico que apenasinforma qual a melhor maneira de atingir objetivosque lhe são dados por outra instôncio.v

o fato é que o estado atual da teoria desalentaa pretensão de "determinação científica" de umótimo único de distribuição de renda e de um ótimode bem-estar social. Sendo assim, o próprio ótimode eficiência alocativa e o papel do sistema de pre-ços em sua determinação é relativo e condicionadopor uma dada distribuição de renda. E se o que estáem discussão é apenas a eficiência alocativa do sis-tema de preços, não há como atribuir à distribuiçãode renda falhas de funcionamento daquele sistema,pois, como vimos, a cada distribuição de rendacorresponde um ótimo alocativo.

Nem sempre os que trataram da ineficiência re-lativa do sistema de preços nos países subdesenvol-vidos se preocuparam em precisar teoricamente opapel da distribuição de renda no modelo de alo-cação de recursos. A idéia lançada foi apenas a deque, sendo "pior" a distribuição de renda, igual-mente seria "pior" o funcionamento do mecanismode preços. Para que este funcionasse, os "votos"monetários expressos no mercado pelos consumido-res deveriam poder representar, no mínimo, as ne-cessidades individuais e comunitárias mais urgentes.

Na verdade, alguns estudos indicam que é menoro índice de concentração de renda nos atuais paísesdesenvolvidos, apesar das dificuldades que envolveesse tipo de comparação internacional. Mas as dife-renças não têm suporte para sustentar a mencio-nada distinção entre o grau de eficiência relativado mecanismo de preços nos dois estágios de desen-volvimento.

1 .6 Finalmente, um setor externo flexível seriaoutra condição não cumprida para o funcionamentodos preços nos subdesenvolvidos. Possivelmente emnenhum outro flanco foi tão amplamente posta emquestão a eficiência alocativa dos preços e do livrejogo de mercado como no que se refere ao comérciointernacional dos subdesenvolvidos. Bastaria enume-rar os trabalhos sobre teoria e política de desenvol-vimento que argumentaram contra a especializaçãono comércio internacional envolvida na teoria dasvantagens comparativas.

Os principais argumentos contra a estrutura decomércio que resulta do livre funcionamento dospreços como "sinais" para a alocação referem-se àsoscilações da procura e da oferta de produtos pri-mários, especialmente agrícolas, e à baixa elastici-dade renda e preço da procura desses produtos.Essas características são utilizadas como argumentocontra a especialização em alguns produtos primá-rios e a favor de maior diversificação do comércio e,sobretudo, ênfase na industrialização. Às flutua-ções cíclicas acrescentam-se a maior sensibilidadedos preços primários à pressão depressiva, a cons-

tatação de períodos prolongados de deterioração dasrelações de troca em favor de manufaturados e aperspectiva de que tal deterioração se repita ouprossiga no futuro." Além disso, alega-se a neces-sidade de considerar as vantagens comparativas emtermos dinâmicos, já que a quantidade e a quali-dade dos fatores de produção podem variar no tem-po, inclusive como resultado do' próprio processoprodutivo. Esta a base da tese da proteção à "indús-tria nascente".

Todos esses argumentos têm implícitos critériosde investimento que deixam de lado o suposto deque os preços do modelo neoclássico (estendido àprodução a nível mundial) garantem a alocaçãoótima de recursos.

Por outro lado, sendo a teoria clássica das vanta-gens comparativas no comércio internacional um co-rolário do modelo de equilíbrio geral em concorrên-cia perfeita, ela é atingida também pelas ressalvasapontadas antes, como a discrepância entre ospreços de mercado e os custos de oportunidade dosfatores produtivos, as economias externas e de esca-la e a interdependência e complementariedade,tanto no consumo quanto na produçõo." "2. Enumerados os principais obstáculos que impedi-riam que o mecanismo de preços cumpra nos paísessubdesenvolvidos as funções que lhe são atribuídasno modelo neoclássico, podemos observar que essesobstáculos (excetuado o do item 1.1 e, talvez, 1.6)somente quanto ao grau de intensidade é que sãopeculiares àqueles países.

Vamos examinar a seguir os esquemas alterna-tivos propostos para "corrigir" a atuação perversados preços. De fato, as críticas ao funcionamentodo mecanismo de preços nos países subdesenvolvi-dos desembocam sempre numa proposta para quealgum tipo de intervenção governamental exerça,de qualquer forma, as funções esperadas e que olivre mecanismo de preço estaria deixando decumprir. "

Em última instância, a maior parte, senão o to- 33talidade, da intervenção governamental na econo-mia implica a rejeição da idéia de que a alocaçãoótima dos recursos produtivos possa ser garantidapelo livre funcionamento do mecanismo de preços.Mas é claro que seria inteiramente descabida apretensão de examinar aqui todo tipo de funçõesreguladoras dia a dia mais complexas e abrangentesque vêm sendo atribuídas ao governo, não só naseconomias socialistas, como também nas capita-listas.

Vamos limitar-nos apenas a propostas de inter-venção que se referem explicitamente à manipula-ção dos preços por parte do governo.

Planejamento e mecanismo de preços

34

E: possível agrupar os críticos do funcionamentodo mecanismo de preços nos países subdesenvolvi-dos de acordo com a alternativa "corretiva" quepropõem.

2.1 Primeiramente, poderíamos distinguir os queconcluem, em suma, que só um elevado grau dedesenvolvimento trará consigo o "bom comporta-mento" dos preços.

Assim, 8alogh, após argumentar que apenas avitória sobre a inflação não asseguraria automatica-mente a distribuição ótima de recursos e a taxaótima de desenvolvimento, manifesta-se pela neces-sidade de "medidas inteligentemente seletivas, emque se igualem os custos monetários e os sociais",além de "uma série de reformas estruturais para darelasticidade e atingir o equilíbrio competitivo naagricultura, na indústria e no mercado de capitais".25Em seu artigo visou essencialmente mostrar que ospreços funcionariam mal nos países subdesenvolvi-dos mesmo depois de eliminada a inflação e poucose deteve nas "medidas seletivas" e "reformas es-truturais", que, depois de concretizadas trariam oequilíbrio competitivo e a igualdade entre preços demercado e custos de oportunidade que ele almejava.Mas, de qualquer modo, fica quase explícita umaidéia de que só depois do desenvolvimento os preçospoderão funcionar com menor ou sem qualquer in-terferência.

Tavares (1962) é ainda mais explícita: "para che-gar a atingir aquelas condições que permitem ofuncionamento satisfatório dos mecanismos de pre-ços é necessário, antes, ter vencido as barreiras dosubdesenvolvimento't.w Para isso, os instrumentos etécnicas propostas são as mais variadas, não se li-mitando necessariamente a manipulações do siste-ma de preços.

Em ambos fica implícito que nos países desenvol-vidos os preços alocam recursos "mais corretamen-te". E fica implícita, também a idéia de que en-quanto não chega esse nível de desenvolvimentoem que os preços "se comportam bem", o governodeve manipulá-los, interferir sobre eles. Contudo,8alogh parece considerar que essa manipulação dospreços não pode ser inteiramente discricionária, demodo a se fixarem os preços apenas segundo osobjetivos de política econômica estabelecidos. Pelomenos é isso que podemos deduzir de sua referên-cia à igualdade entre "os custos monetários e ossociais", que sugere a fidelidade à concepção deque os preços que vigorarem, mesmo com interfe-rência do governo, e justamente como resultadodessa interferência, devem guardar a correspondên-cia com os custos de oportunidade que se esperados preços de equilíbrio do modelo de concorrênciaperfeita.

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2.2 Em segundo lugar, vamos examinar as propos-tas dos que poderíamos classificar de "instrumen-talistas" em matéria de preço. Creio que essa po-sição foi apresentada da maneira mais clara numdos textos recentes de Myrdal. Para ele, o sistemade preços deve e pode ser apenas um meio para apolítica econômica. Os critérios para a utilizaçãodos preços seriam estabelecidos fora do próprio sis-tema de preços, conforme os objetivos de políticaeconômica. Tais objetivos são os fixados a nível so-ciopolítico. Dados os objetivos, os preços seriam ma-nipulados pelo governo de modo a contribuir da me-lhor forma possível para a implementação dessesobjetivos. Os preços seriam apenas instrumentaisno planejamento. Nesse sentido, preço "correto" éaquele que ajuda a alcançar algum objetivo dadode política econômica. E preço "incorreto" é o queimpede o atingimento daquela meta.

Myrdal inclusive insiste longamente em que osgovernos devem fazer o maior uso possível da po-lítica de preços. Nos setores modernizados da eco-nomia, onde o mercado e o empresário reagem apreços atuais e antecipados dos produtos, dos ser-viços, e dos fatores de produção, a melhor técnicade planejamento seria a que leva as pessoas a agirsegundo 0$ objetivos do plano, explorando suas res-postas aos preços e às modificaçõeõs de preço. Ospreços seriam os melhores instrumentos mesmo nosetor tradicional, desde que a produção não seja ex-clusivamente para autoconsumo e haja algum graude monetização e mercado, ainda que se trate demercado local, compartimentalizado, imperfeito.s"

Mas o conceito de "preço correto" do "instru-mentalista" não tem absolutamente nada em co-mum com o que seria o "preço correto" no universode análise de um neoclássico. A palavra "correto"tem em cada uma dessas duas perspectivas um con-teúdo diverso.

No modelo neoclássico é "correto" o preço quereflete o "valor marginal social" da mercadoria.Alcançados os preços do equilíbrio simultâneo emtodos os mercados de bens de consumo e de ser-viços produtivos, estaria atingida, ao mesmo tempo,a olocoçõo ótima de recursos. Desse ponto de vista,quando se fala em preços "incorretos", eles são ima-ginados como uma conseqüência de imperfeiçõesde mercado. O estado teria que intervir, então, paratornar esses preços "corretos": "em muitos casos asobjeções ao mercado podem ser superadas refor-mando mercados específicos de modo a aproximá-los do tipo ideal de mercodo".>

Embora observe que em alguns casos a superaçãodas objeções ao mercado pode sair mais caro que ospróprios defeitos deste, Johnson insiste quase tãoenfaticamente quanto Myrdal para que os governosdos países subdesenvolvidos usem os mercados e os

preços no seu planejamento; e, do mesmo modoque em Myrdal, aquela insistência acompanha umavaga insinuação de que nos subdesenvolvidos seriamaior o grau de corrupção e ineficiência dos go-vernos, pelo que estariam inabilitados a usar con-troles administrativos, não automáticos. Mas emJohnson o objetivo da interferência é outro: "a ope-ração do mercado pode ser aperfeiçoada pelo usode impostos e subsídios adequados, de modo a anu-lar quaisquer divergências entre lucros sociais e pri-vcdos"."

O próprio conceito de mercado parece ter con-teúdo diverso em cada uma das perspectivas. Parauma, inclui todas as implicações da teoria da alo-cação em concorrência perfeita, enquanto na outrao mercado se imagina tão permeado de interferên-cias institucionais, acumuladas por vários séculos,que não subsiste qualquer sentido e esperança embuscar os supostos preços que prevaleceriam na ma-triz de equilíbrio perfeito isenta de toda interferênciagovernamental.

Tanto na perspectiva que denominamos "instru-mentalista", como no modelo de equilíbrio gera! re-sultante da análise marginalista, os preços funcio-nam como sinais que influem sobre o processo detomada de decisões dos consumidores e, sobretudo,dos produtores, e assim orientam a alocação de re-cursos. E, em ambas as perspectivas, os preços po-dem funcionar no período de mercado como artifí-cio para racionar entre os possíveis compradores aoferta existente. Em suma, em ambas as perspecti-vas é aplicável à economia a expressão do professorKerstenetsky de um "sistema cibernético em que ospreços funcionam como sinais".

Mas para os instrumentalistas esses sinais devemser modificados e mobilizados para induzir produ-tores e outros "agentes econômicos" a atender oosobjetivos, politicamente fixados, do planejamento.Esses objetivos é que constituem o critério para fi-xar preços, e estes últimos são "corretos" quandoimplementam o objetivo. Só eventualmente algunspreços correntes, ou então aqueles que se dariamno caso de um mercado mais perfeito, podem ser aomesmo tempo os melhores meios para atingir osfins estabelecidos de política econômica.

Ao contrário, na outra perspectiva - a que re-sulta da análise microeconômica tradicional - éo próprio preço "correto" que constitui o objetivoa atingir (e não mero instrumento a usar). Essa con-cepção implica que "o sistema de preços contém elepróprio normas que determinam fins racionais nãosó para os indivíduos. .. mas também para a co-munidade dos indivíduos, isto é, para o estado".30Por isso a meta da intervenção governamental deveser a de obter preços próximos o mais possível da-queles que seriam os preços intrínsecos aos do equi-

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Planejamento e mecanismo de preços

Iíbrio geral em concorrência perfeita, de tal modoque esses preços possam servir ao mesmo tempocomo critério de investimento a nível macroeconô-mico, e não apenas como "sinais" que, de qualquermodo, representam para as decisões dos agenteseconômicos individuais.

Poder-se-ia imaginar, à primeira vista, que o pla-nejamento nos países socialistas é exemplo típicode tratamento "instrumentalista" dos preços. Naverdade já houve período em que essa abordagempredominou, quando "os preços eram consideradossimplesmente como instrumentos arbitrários de pla-nejamento" e quando "era natural que a políticade preços fosse tratada como parte da técnica deplonejomento";" Nesta concepção, os preços eram"adaptados ad hoc para enfrentar situações parti-culares de oferto-procuro"." Não há nenhum cri-tério geral: "se está sendo usada uma quantidadeexcessiva de um dos componentes do insumo, porexemplo, um combustível escasso ou um transportede longa distância, os preços podem ser elevadospara encorajar economia e substituição: se está sen-do produzido muito pouco de certo tipo' de vestuário,seu preço de venda. .. pode ser elevado". t: evi-dente que o uso dos preços com esse caráter instru-mentai implica que preexistam metas planejadaspara cujo cumprimento possam ser cjustcdos."

O manejo discricionário dos preços por parte dogoverno apresentou, contudo, uma série de dificul-dades concretas no planejamento socialista, e sofreusucessivas objeções teóricas (com implicações prá-ticas), inclusive por parte de muitos economistas eplanejadores dos próprios países socialistas.

Uma resenha do debate sobre preços em econo-mias centralmente planificadas teria que recuar pelomenos até aos ensaios clássicos de Taylor e Longe,respectivamente de 1928 e 1938;34 deveria abran-ger a controvérsia a respeito da adoção de uma taxade juros e do "preço de produção" que saiu a pú-blico na URSS no início da década de 60,35 bemcomo examinar as idéias sobre alocação de recursosdos chamados "marginalistas soviéticos'<r" além dis-

36 so, não- poderio deixar de apresentar uma revisãode grande número de artigos recentes de economis-tas dos países socialistas sobre preços os quais vêmsendo reproduzidos algumas vezes na revista Pro-blems of Economics; e, finalmente, teria que chegarno mínimo à obra em que Dobb analisa a teoria eco-nômica do bern-estor" e, em contraponto, teorizasobre problemas de "otimização" em economiassocialistas, abrangendo evidentemente temas comoalocação de recursos, preços e mercados.

Não se apresenta aqui um quadro desse debate,que prossegue. Por ora, importa apenas salientarque ele não deixa qualquer margem a dúvida quan-to à impropriedade de se considerar a concepção

Revista de Administração de Empresas

L

teórica e a política de preços predominante nospaíses socialistas como simples variante da versão"instrumental isto".

2.3 Examinemos, finalmente, algumas das propos-tas para usar, na elaboração e avaliação de progra-mas e projetos de investimento em países subdesen-volvidos, os chamados "preços de conta".

Deliberadamente, não vamos começar com umaconceituação geral de "preços de conta", a tradu-ção mais corrente de accounting price, porque otermo tem sido usado com conteúdo algo modificadode um autor para outro. (Nos textos brasileiros eespanhóis encontraremos ainda como traduções domesmo termo as expressões "preço de cálculo" e"preço contábil".) t: parente próximo do "preço-sombra" (de shadow price, para o que também jáfoi proposta a tradução de "preço oculto"), do "pre-ço dual", do custo ou valor social e do custo deoportunidade.

As propostas de usar "preços de conta" no pla-nejamento econômico representam uma seqüênciada idéia antes referida (item 2.2) de uma interven-ção do governo para aproximar os preços de mer-cado aos custos de oportunidade. O mesmo se podedizer das propostas de uso dos "preços-sombra" as-sociados à programação linear. A idéia implícita ésempre a de que o "ótimo" alocativo pode ser de-duzido do equilíbrio geral em concorrência perfeita."A razão pela qual os preços-sombra são considera-dos importantes para o economista é o fato de quea teoria neoclássica da alocação dos recursos' nosinforma que o valor do produto nacional a preçosdados das mercadorias finais é maximizado quandoos fatores produtivos são empregados de modo aigualar o valor de sua produtividade (marginal) comsua respectiva remuneração", 38

Tinbergen, num pequeno texto escrito em 1955por encomenda do Banco Internacional para a Re-construção e o Desenvolvimento, é possivelmente opioneiro na apresentação da idéia de "preço de con-ta". "Seus preços de conta para os fatores têm omesmo significado que preços-sombra: o custo deoportunidade que implica uma dada alocação derecursos";"

Pera Tinbergen, uma das regras mais importantesdo planejamento é considerar a disponibilidade defatores escassos: "o conjunto da economia deverá,tanto quanto possível, usar exatamente as quanti-dades disponfveis";" Para consegui-lo recomenda atécnica dos preços de conta: ao apreciar projetos"deve-se ter em vista os custos intrínsecos ou comoserão chamados~' os preços contábeis e não os domerccdo".»

Os preços de conta serão os que prevalecerão se:a) o esquema de investimento for efetivamente rea-

lizado; e b) houver equilíbrio nos mercados. Noitem a estaria levado em conta o fato de que adisponibilidade relativa de fatores não é dada deuma vez para sempre; a disponibilidade futura decapital, por exemplo, na forma de bens de capital,vai depender da concretização do programa atualde investimento. Contudo, devido à dificuldade decalcular a discrepância entre os preços de mercadoe os preços de conta atribuível à realização do es-quema planejado de investimento, Tinbergen sugereque, na prática, os preços de conta reflitam apenaso desequilíbrio estrutural no mercado de cada fatorde produção, ou seja, reflitam a escassez relativapresente."

Preço de conta será o do equilíbrio hipotético queresultaria da flexibilidade de preços. Por exemplo,enquanto na realidade se pode buscar o equilíbriodo balanço de pagamento através de restrições àsimportações sem alterar taxas de câmbio, o equilí-brio hipotético seria aquele alcançado alterando-seas taxas cambiais. Mas pode suceder que não sejapossível atingir o equilíbrio de mercado através daflexibilidade de preços, como no caso da mão-de-obra desqualificada em que o preço de conta seriaquase zero."

A partir dessas considerações, admite-se em ge-rai preços de conta mais baixos que os de mercadopara a mão-de-obra (dado o desemprego estrutural)e mais altos que os de mercado para capital e divi-sas (dada a escassez relativa de capital e os deficitsno balanço de pagamentos).

Se o "preço de conta" que se busca é o custo deoportunidade "a única solução teoricamente eficien-te é uma solução de equilíbrio geral que utilize ta-belas de oferta de fatores, funções alternativas deprodução e tabelas de demanda final, para deduzirsimultaneamente todos os preços e quantidades defatores e produtos, bem como funções de produçãoconvenientes"." Contudo, sendo impossível estabe-lecer a matriz completa, adota-se a álternativa decalcular "preços de conta" em separado poro cadafator, corrigindo os preços em certos mercados par-ciais onde o desequilíbrio é mais evidente. Por issomesmo, já foi sugerida para esse tipo de estimativaa designação "preços de cálculo de equilíbrio par-cial" .46 .

Outra tentativa de estimar custos de oportuni-dade é feita no âmbito da programação linear. "Oproblema geral da programação linear é maximizaro valor de uma função-objetivo linear sujeita a res-trições lineares. Em programas de desenvolvimento,as principais restrições são as de que as demandasde bens e fatores não excedam suas ofertas; comofunção a maximizar é usualmente considerada arenda nccioncl'";" Ou seja, parte-se do problema deequilibrar oferta e procura para diferentes mercado-

rias e fatores de produção. Elabora-se um conjuntode níveis de produção consistente com a oferta dis-ponível de mão-de-obra, capital e recursos naturais,dadas a estrutura da demanda dos consumidores eas possibilidades de comércio do país. "Essa produ-ção por setor e os níveis de comércio constituem um'programa viável'. Qualquer programa desses impli-ca um conjunto único de preços de mercadorias e defatores, se a economia está em equilíbrio". Dentreos programas viáveis há um que maximiza a função-objetivo e o que interessa é encontrar os "preços-sombra" associados a essa solução. "Se se supõeque a atividade produtiva funciona a custos cons-tantes, a programação linear fornece um métodopara calcular os 'preços-sombra' correspondentes àscondições de equilíbrio, em que o preço de cadamercadoria (incluída no programa ótimo) é igual aoseu custo de produção". 47

O cálculo dos preços de conta através da proçrc-mação linear teria a vantagem de poder levar emconta restrições simultâneas nos mercados dos di-ferentes fatores, enquanto o cálculo do preço deconta em cada mercado separado só podia chegar aconsiderar a interdependência dos mercados atravésde aproximações sucessivas. Contudo, na programa-ção linear a complexidade do cálculo se torna maior,e maior ainda o volume das informações necessá-rias.

Talvez valesse a pena introduzir uma distinçãoterminológica, reservcndo o termo "preço de conta"para as estimativas no âmbito da análise de equilí-brio parcial, e deixando "preço-sombra" para indi-car as estimativas a partir de modelos de programa-ção linear. Contudo, os termos estão sendo usadosmais ou menos indistintamente nos dois tipos deabordagem.

Se bem que Q conteúdo último do "preço de con-ta" e do "preço-sombra" seja a idéia de custo deoportunidade, não sei pode reduzi-los apenas a estaidéia. Primeiro, porque são artifícios de célculo quepodem levar apenas a uma aproximação ao custode oportunidade. Segundo, porque se passou a in-cluir nos preços de conta considerações intertem- 37porais dos objetivos de programação e da disponi-bilidade de recursos em cada instante. E, terceiro,porque se admite, em geral, que os preços de contapossam ser calculados de modo a refletir, além daescassez relativa dos fatores, os objetivos de políticaeconômica do governo.

Desde Tinberçerr" foi explicitado que o uso do"preço de conta" para medir a contribuição do pro-jeto ou programa de investimento ao produto nacio-nal podia ser ampliado para levar em conta o pro-blema político da distribuição de renda ou consumoentre várias regiões ou classes da população. Noâmbito da programação linear igualmente o "preço-

Planejamento e mecanismo de preço8

sombra" poderia refletir objetivos de política eco-nômica na medida em que tais objetivos, como umnível especificado de emprego ou de equilíbrio re-gional, podiam ser incluídos na função-objetivo oucomo restrições adicionais ao programa. !: claro queseria novo o conjunto de "preços-sombra" associadoa esse novo programa com restrições.

São diversas as metodologias de cálculo apresen-tadas. Contudo, são bem poucos os cálculos con-cretamente levados a cabo, para um país e umasituação dada. Nesse sentido, tem caráter pioneiroa estimativa relativa ao Brasil, propondo "preços deconta" para capital, mão-de-obra e divisas. A esti-mativa brasileira foi feita no âmbito da análise deequilíbrio parcial e explicitamente pretende que ospreços de conta "reflitam tanto a escassez relativaem nível global dos recursos primários, quanto osobjetivos governamentais de desenvolvirnento't.:"

Essa proposta para que as agências governamen-tais que analisam projetos no Brasil façam suasopções com base em "preços de conta" tem o mé-rito de chamar a atenção para o desequilíbrio nomercado de certos fatores e para o problema do des-perdício de recursos a nível global. Contudo, a suaconcretízação parece uma hipótese bem remota.Como observou Chenery;" o desacordo sobre a mag-nitude das diferenças entre preços de mercado ecustos de oportunidade é pelo menos tão amploquanto a concordância de que essas diferenças exis-tem. !: claro que esse desacordo é multiplicado nomomento em que se introduzem no "preço de con-ta", além do custo de oportunidade, os objetivosde política econômica do governo. Passaremos todosa exegetas dos documentos oficiais, na difícil ta-refa de chegar a um consenso mínimo quanto à enu-meração dos objetivos a incluir no cálculo dos "pre-ços de conta" sua ordem de prioridade e suas pon-derações relativas.

Esta é uma restrição referente à dificuldade ouimpossibilidade atual de medida objetiva, já levan-tada por Myrdal51 a propósito do preço de contaou "valor intrínseco" de Tinbergen.

38 A outra restrição é de caráter teórico e se relacio-na com o hibridismo do atual conceito de "preçode conta". A força original da idéia de "preço deconta" provém da teoria da alocação em concor-rência perfeita e da pretensão desta em fornecercritérios objetivos para a alocação dos recursos. "Seusignificado econômico evidente não é outro senãoo do valor da produtividade marginal dos fatoresprodutivos numa situação de ótimo em que todos osusos alternativos foram levados em contc".? Nomomento em que se introduzem correções por contade objetivos de política econômica, cai por terra apretensão de objetividade do "preço de conta" comocritério de investimento. E se ele é apenas uma nova

Revista de Administração de Em'[fT"6SaB

técnica de planejamento, um instrumento a maispara atingir objetivos econômicos estabelecidos nou-tra instância, a discussão se desloca para sua maiorou menor eficiência em comparação com outrastécnicas. Assim, se o "preço de conta" não é maisque um instrumento para conseguir maior absorçãode mão-de-obra, poderá ser desvantajosamente com-parado, em termos de eficiência, com o Plano Na-cional da Habitação, por exemplo.

Em suma, os "preços de conta" - admitindo queseja possível determiná-los - podem funcionarcomo critério ou guia para estabelecer o programanacional de investimentos? Ou serão apenas um ins-trumento para obter a implementação de objetivosde política econômica preestabelecidos a nível socio-político? 6.\ls

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Ibid. p. 192.Chenery, Hollis B. Comparative advantage and development

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14 Longe, Oskar. Tbe foundations of welfare economics. In:American Economic Association. Readings in welfare economics.Homewood, IlIinois, Richard D. Irwin, 1969. p. 29-30.15 Lancaster, Kelvin. Introducción a la microeconomia mo-derna. Barcelona, Bosch, 1971. p, 305-26.16 Bowen, Howard R. The interpretation of voting in theallocation of economic resources. In: American Economic Asso-ciation. Readings in welfare economics. Homewood, 111., Ri-chard D. Irwin, 1969. p. 116.17 Lenge, O. op, cito p. 33.18 Ibid. p. 30 e Scitovsky, Tibor. The state of welfare eco-nomics. In: Scitovsky, Tibor, Papers on welfare and growth.London, ~eorge Allen & Unwin, 1965. p. 181.19 Scltovsky, T. The state of welfare economics. op, citop. 178.20 Ibid. p. 180-1.21 Johnson, Harry G. Planning and the market in economicdevelopment. In: Bornstein, Morris, org. Comparative economicsystems: models and cases. Homewood, IlIinois, Irwin, ed. rev.1969. p. 434-5.22 Scitovsky, T. The state of welfare economics. op. citop. 188.23 Balogh, Thomas. La política económica y el sistema deprecioso Boletín Económico de América Latina, Naciones Uni-das. V. 7, n. 1. p. 48-51. 1961.24 Chenery, H. B. Comparative advantage and developmentpolicy. op. cito passim.25 Balogh, T. op. cito p. 55.26 Tavares, Maria da Conceição, op. cito27 Myrdal, Gunnar. A note on "accounting prices" and therole of the price mechanism in planing for development. Apên-dice n. 5 de Asian Drama - an inquiry into 'the poverty ofnations. Middlesex, Penguin Books, V. 3. p. 2034, 1968.28 Johnson, H. G. op. cito p. 433.29 Ibid. p. 344.30 Myrdal, G. op. cito p. 2031-2.31 Dobb, Maudce. A polêmica sobre a teoria' dos preçosnos países de economia socialista. Econômica Brasileira, Rio deJaneiro, V. 6, n. 3 e 4. p. 73, 1960. Publicado originalmenteem Soviet Studies, London, V. 9, n. 2, oct. 1957.

32 Ibid. p, 75.33 Ibid. p, 75.34 Lange, Oskar & Taylor, Fred M. Sobre la teoria económicadei socialismo. Selección e introducción por Benjamin E. Lippin-cott, Barcelona, Ed. Ariel, 1969.35 Liberman, Evsey et alii. Plan y beneficio en la economiasoviética. Selección de textos e introducción de Lia Foa, Bar-celona, Ed. Ariel, 1968.36 Kantorovich, L. V. La asignación óptima de los recursoseconÓmicos. Barcelona, Ed. Ariel, 1968.37 Dobb, M. Welfare economics and the economics of socia-lism. Cambridge, Cambridge University Press, 1969.as Chakravarty, S. EI uso de los precios de cuenta en laevaluación de programas. In: Informe dei Seminário Latino-americano de Planificación, CEPAL E/CN, 12/644, feb. 1963.39 Chenery, H. B. Comparative advantage. .. op. cito p, 33.40 Tinbergen, J. op. cito p. 55-6.41 Ibid .. p. 60-1.42 Ibid. p. 64.43 Ibid. p. 114.44 Papanek, Gustav F. & Qureshi, Moeen A. The use ofaccounting prices in planning. In: Science Technology and De-velopment, US papers prepared for the United Nations Con-ference on the Application of Science and Technology for theBenefit of the Less Developed Areas, Geneva, feb. 1963(Doc. E/CONF. 39/4/81).45 Ibarra, José. Asignación de recursos, programación linealy teoria económica. Instituto Latinoamericano de PlanificaçãoEconômica e Social, 1967. p. 14. mimeogr.46 Chenery, H. B. Comparative advantage ... op. cito p. 33.47 Ibid. p, 32.48 Tinbergen, J. op. cito p, 110.49 Bocha, Edmar L. et alii. Análise governomental de pro-jetos de investimento no Brasil: procedimentos e recomenda-ções. Rio de Janeiro, IPEA/INPES, abro 1971; e A análiseda rentabilidade macroeconômica de projetos de investimentono Brasil. Pesquisa e Planejamento, Rio de Janeiro, IPEA, V. I,n. 1, jun. 1971.50 Chenery, H. B. Comporative advantage ... op. cito p. 23.

Myrdal, G. op, cito p. 2034.Chokravarty, S. op, cito

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