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Ano XIX • nº 14 • 2º semestre 2006 Movimento social que alimenta 3.500 crianças chega a aldeias indígenas e inspira projetos em outros Estados Padre Luiz Facchini, idealizador das Cozinhas Comunitárias

Revista Döhler

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Em 2006 a revista Döhler publicava vários temas importantes em sua edição de número 14. O tema de capa mostra o idealizador de um projeto que alimenta perto de 3.500 crianças por dia, em zonas pobres.

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A n o X I X • n º 1 4 • 2 º s e m e s t r e 2 0 0 6

Movimento socialque alimenta 3.500crianças chega aaldeias indígenase inspira projetosem outros Estados

Padre Luiz Facchini, idealizadordas Cozinhas Comunitárias

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EDITORIAL

2o SEMESTRE 2006

A Cidade da

Solidariedade

Idealizador de um projeto que

alimenta perto de 3.500 crianças

por dia, em zonas pobres, o padre

Luiz Facchini acalenta o sonho de

transformar Joinville na “cidade da

solidariedade”, como afirma em

reportagem publicada nesta Revista

Döhler. Diversas iniciativas em curso

sugerem que, devagar, o sonho vai se

tornando realidade. É o caso das

Cozinhas Comunitárias – que acabam

de chegar a aldeias indígenas e,

graças à adesão espontânea de

dezenas de voluntários, debelaram os

chamados “focos de fome” nos quatro

cantos do município. Também é pleno

de solidariedade o verdadeiro mutirão

que vem se formando para combater

outra doença social: a violência contra

a mulher. Órgãos públicos e entidades

de variadas origens constituem, hoje,

uma teia de proteção a essas

mulheres que, além de lhes dar abrigo

nas horas mais críticas, as estimula a

não aceitar passivamente a violência

doméstica, como se fosse parte dos

relacionamentos conjugais. Esse

movimento, que coloca objetivos

coletivos acima de eventuais

diferenças de visão, conta com outro

auxílio significativo – um inédito

trabalho desencadeado pela

universidade para levantar dados

precisos sobre a violência contra a

mulher, a partir do qual se garante o

embasamento necessário para

identificar as raízes do problema. Ao

menos se deu o primeiro passo.

2

UMA CHARGE PAULO SÉRGIO

UNS & OUTROS

UM SUCESSOFestival de música instrumental em Joinville?

Teve gente que encarou a idéia com ceticismo,quatro anos atrás, às vésperas de nascer oJoinville Jazz Festival. “Não foram poucos osque tentaram nos demover”, conta CarlosAdauto Vieira, um dos idealizadores desseevento que, na versão 2006, mostrou que veio para ficar. Estiveram por aqui feras como WagnerTiso, Naná Vasconcelos e Egberto Gismonti, talvez a grande estrela até agora – junto com HermetoPaschoal, na estréia. “A vinda de Gismonti demonstrou o respeito alcançado pelo festival. Ele seapresenta quase que exclusivamente na Europa e nos EUA. Seu espetáculo foi um dos raros noBrasil”, sublinha Vieira. Neste ano, o público somou 1.500 pessoas no teatro e 3 mil nos palcosalternativos. “Pelo nível da programação e pela organização impecável, o festival se firmou comoum dos mais respeitados eventos de música instrumental do Brasil”, orgulha-se o presidente doinstituto criado para cuidar dessa iniciativa. Em 2007, adianta o advogado, o projeto é trazer“alguma atração de renome internacional”. Os fãs ficam na torcida.

LEIA REPORTAGEM NA PÁGINA 4

Mestre Gismonti foi a estrela do festival neste ano

UM SORRISOÉ célebre a história do jornalista americano

Norman Cousin, que se curou de uma doença gravegraças... ao riso. Apesar do diagnóstico ruim, eledecidiu que queria viver – e se “alimentar de bom-humor”, proibindo até que qualquer amigo ovisitasse se não tivesse uma piada para contar. Hoje,os médicos reconhecem que alto astral faz bem àsaúde, especialmente do coração. E não são raros oscasos em que personalidade e simpatia vencembarreiras. Explica-se: “Nos momentos de dificuldade,é necessário buscar, no baú da vida, todas asinformações positivas e deixar de pensar em coisastristes”, ensina a psicóloga Vivien Köning. É o quefaz o técnico em edificações Sérgio da Cunha. Famoso na vizinhança pelas gargalhadas e por suaconstante alegria de viver, ele garante que esse jeitão ajuda a abrir portas. “Levar a vida comalegria torna tudo mais fácil, num mundo em que temos que dar muito de nós, para superar tantosobstáculos”, defende, antes de confessar uma de suas maiores predileções: assistir àsvideocassetadas, ao lado da esposa Tânia.

De bem com a vida: Sérgio e Tânia não poupambom-humor para lidar melhor com o dia-a-dia

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2o SEMESTRE 2006 3

NESTA REVISTA

VOCÊ VAI LER

Endereço: Rua Arno Waldemar Döhler, 145, ☎ (47) 3441-1666

Produção: Mercado de Comunicação ☎ (47) 3455-1395

Jornalista responsável: Guilherme Diefenthaeler (reg. prof. 6207/RS)

Textos: Ana Ribas Diefenthaeler, Guilherme Diefenthaeler e Daisy

Trombetta Velho

E-mail: [email protected]

Fotografia: Peninha Machado, banco de imagens e assessorias

de imprensa

Ilustrações: Paulo Sérgio

Projeto gráfico e diagramação: Marcelo Duarte

Fotolito: Arte&Texto

Impressão: Optagraf

Tiragem: 24 mil exemplares

FILIADA À ABERJE

RE

VIS

TA

SEM MEDO DA PLATÉIA 4

QUANDO O MASCOTE É BOM PARA A SUA SAÚDE 7

MUTIRÃO PELA PAZ EM CASA 14

É DIA DE COSTELADA 18

SAI O LIVRO DO PRÊMIO 20

“A revista é uma iniciativamuito boa e a qualidade dotrabalho é excelente.”

Dietmar Lilie, de Joinville

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14

Por que vocêescolheu o MercadoMunicipal?

Juntei a gastronomia – umprazer – com meu gostopelo local, um dos maiscarentes em termos deproposta cultural para acidade. Joinville nãomerece isso. Em qualquerlugar, o mercadomunicipal é umaporta para acultura dagastronomia, doartesanato, das etnias.Infelizmente, falta muito para o de Joinvillechegar lá. É um espaço diversificado, quetem fontes de alimento, como pescados,verduras, utensílios, artesanatos, vinhos,grãos. Tem uma praça legal, para feiras.Tem parque infantil, estacionamento, e ficanuma região central com tudo para virarum grande centro gastronômico.

O que falta para isso?Apoio dos órgãos competentes. O mercadoé turismo, é cultura. O ideal seria quetodos esses órgãos se juntassem para umarevitalização. A última reforma, acho quefoi em 1982. Isso daria mais visibilidadejunto à população. O pessoal tem vontadede melhorar, mas precisa juntar adisposição do Poder Público e o interesseda comunidade em freqüentar, conhecer,cultivar as raízes.

As pessoas nãoestranham que vocêsirva um cardápiosofisticado bem aolado de uma peixaria?Sim. É uma coisa cultural.Mas ganhamos adeptossemanalmente. Nosso elocom a peixaria é muitolegal. Essa divisão deespaços proporciona umfluxo de peixes frescos e deépoca. Vantagem para nóse, principalmente, para osclientes. Muita gente nãose dá conta, mas estar

junto à peixaria proporciona o prazer decomer produtos frescos e,conseqüentemente, mais saudáveis esaborosos.

Qual é a gastronomia típica deJoinville, o seu prato tradicional?Muita gente acha que é o marreco comrepolho roxo. Isso não é característico deJoinville, vem da culinária germânica doSul. Tem a ver com a nossa cultura, masJoinville não é mais “alemã”. Há pessoasde todas as raças aqui. Se fosse eleger umprato típico, diria que é o caranguejo. Éum dos únicos que atraem gente de fora.Provavelmente, um restauranteespecializado em caranguejo não pegarianoutro lugar. É mais fácil ensinar quemnasceu com o pé no mangue, com mutucasrodeando as pernas.

UM PAPO com Therence Mir, gourmet e proprietário da Mercearia Sofia, um

restaurante diferenciado que fica no Mercado Municipal de Joinville.

Leia a entrevista completa no site www.dohler.com.br/revistadohler14

O pão de cada dia 10

“Parabenizo-os pela iniciativa de incluir um

espaço para a área cultural, com a publicação

da reportagem sobre as bandas de Joinville

(edição 13). Para informação, somos uma

banda que vem sendo apontada pela mídia

como um dos melhores trabalhos

independentes do Sul do país.”

Ronaldo Santiago, vocalista da banda Fairans

“Gostaria de dar os parabéns

pela reportagem ‘Joinville pisa

no acelerador’ (edição 13), que

aborda a TAC. O conteúdo ficou

ótimo!” Augusto Cruz, da TAC - Tecnologia

Automotiva Catarinense S.A.

“Por conta da matéria sobre o projeto A4, do qualtenho o orgulho de ser uma das acionistas, acabeimovida a ler esta revista. No início,despretensiosamente. Ao cabo da vigésima página,percebi que já tinha lido a revista toda, não apenasfolheado. Foi quando me lembrei do valor real eincalculável de uma boa publicação empresarial.Jornalista que sou, contumaz crítica às banalidades etextos insossos via de regra acumulados naspublicações empresariais, considero-me fonte segurapara dizer: podem crer que o trabalho de vocês vale apena.”Malu Salgueiro, consultora especializada em comunicação empresarial

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2O SEMESTRE 20064

VIDA PESSOAL

Jornalista ou advogado, empresário oucorretor de seguros, pipoqueiro oumecânico de automóveis, professor

ou frentista de posto de gasolina. Essasatividades tão distintas têm em comum umrequisito fundamental: a capacidade decomunicação. Mesmo quem jamais vailecionar, ministrar palestras ou comandarreuniões de negócios precisa saber seexpressar de maneira adequada para fazersucesso – seja lá no que for. Em qualquercampo, ganha pontos aquele sujeito queexpõe com clareza aquilo que pensa oudefende uma idéia com convicção. Issoexplica a procura cada vez maior peloscursos de oratória, ferramenta que já não émais restrita a políticos ou conferencistas.Até donas-de-casa querem desvendar a artede falar bem.

Querem e podem. Ao menos é o queasseguram os especialistas na matéria,empenhados em quebrar dois paradigmas: aidéia recorrente de que a fluência verbaldepende de iluminação divina – e, porconseqüência, a noção de que só osabençoados terão de soltar a língua nodecorrer da vida. “Todos nascemos comvocação de oradores”, garante o jornalistaAltamir Andrade, presidente do Clube deOratória e Liderança (COL) de Joinville.Ocorre que a própria sociedade se encarregade criar barreiras que atrofiam talhabilidade. “Afastamos a criança das‘conversas de adultos’, reprimimos as quegesticulam dizendo para ‘não falarem com

as mãos’, e vamos formandopessoas medrosas, intimidadas,que terão medo do ridículo ao seexpor em público”, observaAndrade.

Há 27 anos, o COL levanta abandeira da oratória comoinstrumento para a liderança.São seis cursos anuais – eramdois, até 2003 –, com 25 vagascada, sempre lotados. Em trêsdécadas, quase 2.300participantes receberam seusdiplomas e aprenderam asmanhas da expressão oral (vejaalgumas na página 6). Um

público heterogêneo, que vai deadolescentes interessados em eliminar agagueira ao apresentar trabalhos escolaresaté executivos cientes de que a falta delógica na argumentação pode sacrificar aassinatura de um contrato. “Em 20 horas,transformamos um tímido em um orador”,anuncia o presidente do clube, pelo qual jácruzaram o empresário Mário Zendron, ogovernador licenciado Luiz Henrique e oprefeito Marco Tebaldi, entre outraspersonalidades locais.

OBSTÁCULO À CARREIRA

Andrade, que também ministra cursosfechados para religiosos, militares e partidospolíticos, fora do COL, atribui a buscacrescente por esse tipo de conhecimento auma exigência do mercado e,paradoxalmente, à onda dosrelacionamentos virtuais. “As pessoas secomunicam muito pelos chats ou pelo Orkut.E vêm percebendo a importância dasocialização que só a fala traz”, analisa ojornalista. Tem gente que resolve tomarprovidências ao se dar conta de que a

timidez exacerbada atrapalha odesenvolvimento profissional (e comoatrapalha: segundo pesquisas, o inibidorecebe salário 10% menor, custa adeslanchar na carreira e tem maiorpropensão a alergias).

Norberto Kuchenbecker, diretor daFaculdade Cenecista de Joinville (FCJ), nãodeixou isso acontecer. Decidiu ir atrás desocorro ainda no quarto ano da faculdadede administração, quando trabalhava emuma instituição financeira. Nas reuniões daempresa, o acanhado funcionário entravamudo e saía calado. “Não me manifestava,embora tivesse idéias que poderiamcontribuir com a organização. Estavaperdendo oportunidades”, reconheceKuchenbecker. Ele investiu metade dosalário num curso de oratória, acabou eleitoo melhor orador da turma, foi estudartécnicas de apresentação e virou a mesa: noemprego seguinte, na área de recursoshumanos, tornou-se instrutor emtreinamentos sobre o assunto para colegasque padeciam da mesma dificuldade. Aexperiência abriu um horizonte: “Descobrique minha verdadeira vocação era deprofessor”, conta o ex-tímido, mestre emadministração e doutor em gestão denegócios.

Se inibição tem cura, nem todo mundoque ontem tremia as pernas na hora deencarar uma platéia vai fazer show deoratória amanhã. “Falar bem é uma arte”,compara a fonoaudióloga MonikaMonguilhott, que dá cursos de comunicaçãoeficaz. A arte exige técnica, treino e domnatural. “Sem o dom, você pode desenvolvera capacidade, mas não será um oradorexímio”, sublinha. Credenciada pela TVGlobo para treinar postura, voz, fala earticulação dos jornalistas que atuam emJoinville, Jaraguá do Sul, Blumenau e Itajaí,Monika ressalta que a comunicação é

Vencer o medo de falarem público é vital.E até os mais tímidospodem chegar lá

Norberto se soltou e descobriu vocação de professor

Altamir Andrade, do COL: orador em 20 horas

Ponha aboca notrombone

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2O SEMESTRE 2006 5

diferencial competitivo, nestes tempos emque os currículos estão parecidos demais:“Quem se comunica bem, exerce melhor asfunções de liderança porque sabe motivar aequipe, transmitindo credibilidade”.

PILAR PROFISSIONAL

Há vários canais para cultivar essaqualidade, oferecidos por escolas, empresase entidades (leia quadro abaixo). A Câmarade Dirigentes Lojistas (CDL) de Joinvilleencaixa o assunto em treinamentos sobrerelações humanas, vendas, atendimento aocliente e liderança, além de dois cursosespecíficos de oratória por ano – as 30 vagasse esgotam rápido, avisa Estela WintersSteil, responsável pela área. “Entendemosque a comunicação eficaz é um dos pilaresdo bom profissional”, reforça. A lojaMillium, de materiais de construção eutilidades domésticas, 900 funcionários e 18filiais, convocou a fonoaudióloga Monikapara aprimorar a comunicabilidade de seusorçamentistas, a equipe incumbida deconvencer o freguês a fechar uma compracotada por telefone. “Se a abordagem nãofor boa, a venda pode ser perdida aí”,admite Caroline Nicolli, RH da Millium.

Em geral, as empresas avaliam a

habilidade comunicativa já na fase derecrutamento. Não estão interessadas emtagarelas, mas em profissionais quedemonstrem firmeza ao dizer o que pensam,apontar erros, propor inovações. Ex-tímidoao ponto de “suar as mãos quando tinha quefalar para três pessoas”, Jaime Grasso,presidente da Athletic, fabricante deequipamentos de ginástica, valoriza aomáximo a fluência verbal de um candidato.“Já fiz admissões em que dispensaria até ocurriculum. O que vale é a pessoa defenderaquilo que sabe, olho no olho”, opina oempresário, que foi aluno do COL nos anos

90. Lá, aprendeu um segredo para nãoamarelar diante da platéia: elaborarpreviamente o que vai dizer – e treinarbastante. “O COL me trouxe a tranqüilidadeque tenho hoje”, agradece. AdelsonWestrupp, delegado da Polícia Civil deAraquari, fez o curso há poucos meses e,embora não seja novato em oratória,surpreendeu-se ao ouvir que é a expressãocorporal o fator que mais pesa ao falar empúblico. “Melhorei muito nisso. Observo atéos erros de apresentadores de TV, que nãosabem se comportar em pé na frente dacâmera”, orgulha-se Westrupp.

A profusão de cursos que ensinam a botar

a boca no trombone inspirao entusiasmado AltamirAndrade, do COL, aclassificar Joinville como a“capital da oratória”.Coincidência ou não, viveaqui a primeira brasileira aconquistar o título decampeã mundial dessaatividade, emcinqüentenário concurso daFederação de Jovens Líderese Empreendedores (JCI, eminglês). Lena Souza, 27

anos, arrasou na final, em Viena, aodiscursar em espanhol (idioma que haviaaprendido meses antes), durante seteminutos cravados e sem microfone – deupane no sistema de som –, para 6 milpessoas. “Tentei mostrar a alma do brasileirobatalhador”, conta ela, que descobriu aoratória ao ingressar na JCI, três anos atrás,e trabalha como instrutora em instituiçõesde ensino e empresas.

Em julho, Lena ministrou um curso paraempresários na Ajorpeme e uma oficina paraacadêmicos de Jornalismo no Ielusc. Sim,porque se a boa expressão verbal fazdiferença em qualquer categoria, os

profissionais da palavra dependem deladiariamente. “O grau de clareza e precisãoda palavra é vital para o jornalista”, frisaSamuel Lima, diretor da faculdade,argumentando que a fluência é necessária“para encarar desde um simples contatopara pedido de entrevista até uma platéiaadversa”, como também no exercício deselecionar e transmitir informações. Ajornalista Carla Lavina, inibida até amedula, conseguiu lidar bem com issoenquanto trabalhou em jornal, que elaconsidera “uma posição confortável” para ostímidos. Quando foi se especializar emmarketing, constatou que não havia jeito,

teria de se expor maisem público, sequisesse evoluir nacarreira, e recorreuaos cursos deoratória. De cadeira,Carla dá um conselhoa quem vive algosemelhante: “Astécnicas são úteis,mas, no final,depende apenas devocê para vencer onervosismo”. ■Lena, campeão mundial de oratória: sonho realizado, cursos disputados

A fonoaudióloga Monika: falar bem é uma arte

Cursos de oratória & afins

PRON

TO-S

OCOR

RO

[ Clube de Oratória e Liderança(COL) – cursos de 20 horas.Inscrição a R$ 400, descontopara professores e estudantes.S (47) 3433-1044

[ Monika Monguilhott,fonoaudióloga – novemodalidades de cursos, decomunicação eficaz, oratória,atendimento, telemarketing eoutros, além de atendimentoindividual.S (47) 3026-1556

[ Senac – cursos de dois em doismeses, aulas à noite, segundas equartas-feiras.S (47) 3431-6666.

[ Lena Souza, instrutora – cursossob encomenda, em empresas eentidades. É facilitadora da JCI edo INPG.S (47) 3425-4520.

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VIDA PESSOAL

2O SEMESTRE 20066

Manhas para encarar o público

NO G

OGÓ ✑ É por causa do medo que

muita gente fala alto ou baixodemais, fica artificial, agressivaou desarticulada perante opúblico. Mas o maior defeito énão saber ordenar opensamento – iniciar,desenvolver e concluir umaapresentação.

✑ Por isso, você deve prepararseu discurso comantecedência, dividindo a falaem formato de tópicos.

✑ Seja qual for o tema, planejetrês segmentos: introdução(“sobre o que vai falar”),desenvolvimento (apresente oassunto proposto, com seusargumentos) e conclusão (devesugerir uma reflexão sobre oque foi falado).

✑ Ensaie bastante na frente doespelho, contando o tempo ecom o roteiro a mão. Se for ocaso, chame a família paraum ensaio geral.

✑ Enxugue o roteiro quandoestiver se sentindo mais firme.

✑ No dia D, procure estar bemdisposto e controlar o sistemanervoso – respirar fundoajuda a regular a adrenalina eaparência tranqüila inspiraconfiança.

✑ Mantenha-se firme e encareaudiência.

✑ Fale com fluência, ritmo, sempressa, nem muito devagar.

✑ Atenção ao fecho do discurso.O ideal é que termine com um“clímax”, para não esfriar aplatéia. Faça um resumo doque falou, um agradecimentoou uma frase de efeito, porexemplo.

FONTES: APOSTILA COL, REINALDO POLITO

Em queaspectos a

comunicaçãoeficaz éimportantepara o

profissionalque quer

espaço nomercado?

É fundamental,uma vez que “se fazer

compreender”, paraum líder, é

característica básica, inerente àfunção. Como atingir objetivos emetas se aquele a quem cabe orientar,facilitar, estimular, dirigir nãoconsegue se fazer entender? Osmexicanos usam uma expressãointeressante nos processos decomunicação: “se me explico...”. Ouseja, colocam a responsabilidade porse fazer entender no comunicador, enão no interlocutor. O brasileiroemprega inadequadamente o “vocêentendeu?” Ou seja, coloca no outro oproblema. Cabe ao líder se fazerentender. Mesmo considerando queesse é um processo dialético, nosentido de que temos sujeitos comexperiências diferentes e percepçõesdiferentes, e que as dificuldades decompreensão são de ambos.

A empresavaloriza maisquem “falabem”? Diria que as

empresas valorizamquem “faz o quediz”, mas tambémquem fala bem, poisa comunicaçãoeficaz é necessáriaem qualquerorganização. Oentendimento entre

os profissionais deve ser uma buscaconstante. Todos devem “falar amesma língua”, ou seja, a cultura daempresa passa obrigatoriamente pelalinguagem, pela comunicação. Senão,teríamos o retorno à Torre de Babelbíblica. Falar em público é requisitobásico para os líderes de organizações.Hoje, as empresas buscam desenvolveressa habilidade em seu públicointerno, independente dos cargos dechefia. Dessa forma, tímidos eacanhados têm, na maioria dasgrandes empresas, oportunidade dedeixar de sê-lo.

Timidez sempre tem solução? Plagiando Simone de Beauvouir:

“ninguém nasce tímido, torna-se”. Ouseja, ninguém é fraco, tímido, vencedorou empreendedor desde o momentoque nasceu. Ele se torna. Tudo está emato, como diria Sartre. Dessa forma,tem solução, sim. Cabe analisar se énecessário ao tímido mudar. Quem elese torna ao mudar? Procurar umespecialista é aconselhável para aquelesque efetivamente percebem anecessidade de mudar. Curso deoratória qualificado também é umaoportunidade de desenvolver essahabilidade. O tímido pode perderoportunidades de crescimento emcargos de maior relevância dentro deuma organização eficaz.

“Ninguém nasce tímido”Gerente de Recursos Humanos da Wiest S/A, indústria de autopeças, o psicólogo

Aroldo Coelho Jr., pós-graduado em Comportamento Organizacional e Administraçãode RH, afirma que o profissional contemporâneo precisa trabalhar sua capacidade decomunicação, “para se fazer compreender”, e que os muito inibidos perdemoportunidades de ouro.

20% das pessoas nascem tímidas

Mas bem menos que isso, apenas7%da população mundial, tem fobia social, umaespécie de “hipertimidez”, tratada por psicólogos

E não mais que7%das pessoas são comunicadores natos,com talento especial para a oratória –como Silvio Santos e Fidel Castro

O psicólogo Aroldo: cultura da empresa passa pela linguagem

Leia

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Page 7: Revista Döhler

COMPORTAMENTO

2O SEMESTRE 2006 7

Não é por acaso que eles sãoconhecidos como animais deestimação. Cães, gatos, coelhos,

tartarugas, peixinhos, pássaros e atéiguanas podem trazer uma lista enormede benefícios ao ser humano. Estudosatestam que o simples contato com umbichinho desses promove sensações debem-estar, com reflexos de ordem física eemocional. Entre outros aspectos, orelacionamento com um mascote ajuda acontrolar o colesterol e o estresse, adiminuir a pressão arterial e os riscos deproblemas cardíacos. Ainda: aumenta ascélulas de defesa, tornando o organismomais tolerante a bactérias e ácaros, eeleva os níveis de endorfina, aliviandodores e minimizando os efeitos dadepressão. A medicina descobriu o santoremédio na forma da chamada TerapiaAssistida por Animais (TAA), adotada poralgumas instituições de São Paulo, e aprática já inspira programas escolares.

Uma das pioneiras no uso da TAA, apsicóloga e veterinária Hannelore Fuchs éfundadora e presidente da AssociaçãoBrasileira de Zooterapia (Abrazoo). Ela

comanda o projeto Pet Smile, que levauma “equipe” de 20 bichinhos treinadospara brincar com portadores denecessidades especiais e fazer companhiaa doentes-mirins em hospitais, creches easilos paulistanos. Em oito anos, forammais de seis mil visitas. “Os pequenos sesoltam, é possível notar uma melhorafísica e mental”, garante Hannelore.Outro especialista na matéria, ozootecnista Alexandre Rossi adestracachorros que auxiliam no tratamento decrianças e idosos. “Buscamos uma maior

integração do cão à sociedade a partir deuma relação de respeito e amizade”,explica. Vacinado e vermifugado, o cão-terapeuta deve ser dócil, confiante, gostarde receber e dar carinho – além deaprender uns truques para divertir osvisitados.

O zootecnista não tem dúvidas quantoao bem que isso traz. “Os cães nos fazemsentir entendidos, nos permitem darvazão a instintos maternos, facilitam ocontato com outras pessoas, atendem ànecessidade que temos de ser tocados e

tocar”, enumera.Hannelore Fuchsconcorda: “Cuidar decachorro é umaocupação. Tem que darbanho, comida e sairpara passear, o quefavorece o contatosocial e ajuda a sair daapatia”, observa aveterinária. Do pontode vista acadêmico, aabertura ao tema érecente no Brasil. Só

Cãezinhos,gatinhos, peixes etartarugas“educam” criançase ajudam até acombater adepressão

TToottóó ffaazz bbeemm ppaarraa aa ssaaúúddee

Alexandre Rossi adestra cães para trabalho com crianças e idosos

Page 8: Revista Döhler

2O SEMESTRE 20068

em 2005 que a Universidade de São Paulo(USP) introduziu a disciplina de zooterapiana faculdade de veterinária e, em Brasília, aUnB passou a estudar os efeitos do convíviocom cães na recuperação de doentes deAlzheimer. Pesquisadores de vários paísesforam mais longe ao relatar, por exemplo,como a TAA reduziu o consumo deanalgésicos entre crianças com câncer ouconstatar que donos de cães gastam menosem remédios e saem antes do hospital, emcasos de internação.

Totós e bichanos também podem ser bonsaliados do enfermeiro. Foi o que perceberamas paulistas Cíntia Kawakami e CyntiaNakano em trabalho de graduação na USP.Depois de um semestre de visitas a asilos ecreches, acompanhadas de simpáticosanimaizinhos, elas registraram que osmascotes ajudavam a quebrar o gelo,provocando “melhora considerável nasrelações interpessoais”, fator indispensávelpara que o profissional reconheça“sentimentos, condições e intenções dopaciente” – ou seja, as “respostas não-verbais” ao tratamento. “Vimos nas pessoasdeprimidas pela solidão um sorrisoverdadeiro e nas crianças castigadas pelotratamento a disposição de criançassaudáveis. Foi uma experiência marcante”,anotam as enfermeiras, lamentando asbarreiras que a TAA encontra para sedisseminar pelos hospitais brasileiros quenão permitem a entrada de animais –segundo as estudiosas, o tabu perdeu osentido com a comprovação de que os sereshumanos transmitem mais infecções aospacientes do que cães e gatos limpos eimunizados.

AULA DE NATUREZA

Se na saúde ainda há dilemas, no campoda educação é consenso que os bichinhos deestimação têm um papel a cumprir.

“Acredita-se que eles possam servir detreino para a vida futura, despertando osenso de responsabilidade mediante anecessidade de alimentação diária, cuidadosgerais e conhecimento do ciclo biológico”,apontaram os professores Rainiere Gaertnere Joaquim Olinto Branco em tese deMestrado em Educação, na Universidade doVale do Itajaí (Univali). Recentemente, aprefeitura de Florianópolis lançou umprograma que vai embutir lições sobre

respeito aos animais nasdisciplinas curriculares de1a a 4a série. Por meio decartilhas com textos,desenhos e exercíciosrelacionados ao tema, omunicípio pretendeconscientizar a garotadapara a idéia da posseresponsável – estima-se em10 mil os cães e gatosabandonados na capital. Oproblema também é graveem Joinville, onde a ONGAbrigo Animal batalha pelo

recolhimento e adoção de animais errantes. Autores como o francês Hubert

Montagner e a italiana Maria Montessorienfocaram o caráter pedagógico dessespequeninos seres. O contato com animais

domésticos, dizem os autores, estimula acriança a expressar a ternura, além defacilitar o equilíbrio sensorial e emocional.Em Curitiba, o Colégio Nossa Senhora deSion adota os conceitos de MariaMontessori desde o final dos anos 50. Cincocachorros, uma gata, vários peixinhos, umatartaruga, duas araras, um tucano e doispapagaios “participam” de atividadesdidáticas ao lado dos 1.200 alunos. Ainteração proporciona interessantesoportunidades de aprendizado, beneficia odesenvolvimento afetivo, aguça acuriosidade, dá segurança e ajuda até aresolver casos de timidez precoce. “Acriança precisa saber que existem outrosseres, diferentes dela, no planeta. Tendoconsideração por formas de vida maissimples, aprenderá a respeitar sua própriaespécie”, defende Agueda Thormann,bióloga e educadora do Sion.

EMOÇÃO NA TELINHA

A jaraguaense Daiane Zanghelini herdouda mãe o costume de recolher gatinhosvira-latas e recrutar interessados em adotá-los. “Tenho um gato de 11 anos que é comose fosse da família”, revela. Ela transformoua paixão por pets em objeto de estudo namonografia para graduação de Jornalismo.No trabalho, analisou os mecanismosempregados pelo programa “Late Show” – oúnico sobre a turma das quatro patas emcanal aberto, transmitido pela Rede TV –com o propósito de comover o espectador.“Queria compreender por que me sentia tãoemocionada vendo imagens de animaismaltratados ou de donos acariciando cães egatos”, conta. Encontrou respostas aocruzar teorias de massa, psicanálise,psicopedagogia e semiótica. “Ostelespectadores deslocam, para as imagens,sentimentos como angústia, revolta, tristezae rejeição. A TV capta as carências daspessoas e tenta supri-las com experiênciasque não conseguimos realizar”, observaDaiane, que continua fã do programa,mas passou a assisti-lo “mais com arazão”.

Em geral, ainda é o coração quemanda no vínculo (cada vez maisintenso) do ser humano com os bichosde estimação. Vera Neves, dona de petshop em Joinville, mantém há 10 anos atradição de promover movimentadasfeiras semanais de filhotes, nas tardes desábado. A feira virou passeio-família.“Mesmo clientes que não podem ter

COMPORTAMENTO

A voluntária Denise, no gatil do Abrigo Animal: animais errantes

Carinho universal

“Sinto uma dor muito grande quandovejo cães abandonados. Se morasse

numa casa, recolheria a maioria”, garante afuncionária pública Areli Morello, dona deuma gatinha persa e um cãozinho yorkshire.Areli faz questão de alimentar os bichinhosesfomeados que encontra e vê nocompanheirismo o benefício principal dorelacionamento com os animais de estimação:“Parece que, dando carinho para eles, estoufazendo o mesmo com todos os outrosbichinhos”.

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animais, por morar em apartamento,trazem as crianças só para ver os filhotesexpostos e tirar fotografias. É o lazer dofim-de-semana”, diz Vera, que assinala umamudança sutil no perfil dos visitantes: “Emparalelo a um aumento na procura,notamos a conscientização das pessoas, quepassaram a cuidar melhor dos animais econhecem os benefícios desserelacionamento”. Seu totó agradece – eretribui com uma lambida. ■

Benefícios de criar um mascote

SANT

O RE

MÉD

IO [ Diminui a solidão e a inibição,melhora o comportamentosocial e as relaçõesinterpessoais.

[ Trabalha a coordenação dosmovimentos, ajuda acontrolar o estresse e adiminuir a pressão arterial.

[ Durante uma enfermidade, omascote faz com que o donose sinta seguro, necessário emais próximo da natureza.

Anti-tristeza

Foucault fica

“Éo melhor amigo da gente, dá umaalegria que não tem preço”, confessa

o metalúrgico aposentado Eurípede Rocha. Eletoma conta do pequeno Luke, um poodle-toyque a filha, médica, comprou mas não temtempo de cuidar. Alimentado só com raçãobalanceada, chá de hortelã com leite uma vezpor semana (para evitar vermes), o saltitanteLuke é paparicado por toda a família. “Elevem dar bom-dia e sente quando a gente estátriste”, garante dona Rachel, esposa deEurípede.

Em tom de brincadeira, a jornalistaCarolina Neotti, que voltou a morar com

a família depois de uma temporada fora, ouviua mãe dizer que a moça até pode sair de casanovamente – mas o Foucault fica. Foucault éum yorkshire que fez dona Diva Girardi mudarde opinião sobre cachorros. Antes, ela juravaque jamais abriria a porta para um. “Foucaulté educadinho, traz harmonia, está sempresatisfeito e faz muita festinha. É um membroda família”, alegra-se Diva, na foto com a mãe.

Há cinco anos, preocupados com asuperpopulação de cães e gatoszanzando pelas ruas de Joinville,voluntários resolveram fazer algumacoisa – e fundaram o Abrigo Animal. AONG defende a proteção, a saúde e osdireitos dos animais, advogando aesterilização como a forma mais eficazde combater o sofrimento dessascriaturinhas. Mantido à base de doações,venda de produtos em feirinhas ealguma verba da prefeitura, comorçamento mensal de R$ 15 mil, oAbrigo Animal supre a ausência deórgãos públicos voltados ao tema nacidade. Diferente do que ocorre, porexemplo, em Itajaí, que mantém umcanil municipal, e Florianópolis, onde aSecretaria da Saúde criou umasubdivisão específicapara tratar do “bem-estar animal”. A ONG joinvilenserecolhe filhotesabandonados ou cãese gatos de qualqueridade que tenhamsido vítimas deatropelamento. Prestao atendimentonecessário e abriga osbichinhos em locaisapropriados,enquanto buscainteressados emadotá-los – especialmente nas feiras quepromove em supermercados. Antes,providencia a esterilização. Só não sãocastrados os cachorros machos, coisa quedificultaria a doação, segundo osintegrantes do grupo. Tudo para evitarque, em busca de solução rápida para as

doenças causadas por animais de rua, asautoridades da saúde recorram aosacrifício em massa, como se vê emalgumas cidades. “O respeito aos animaisestá ligado ao respeito dos homens peloseu semelhante”, prega a entidade. Penaque muita gente não se dá conta disso –com freqüência, os cães e gatosrecolhidos são encontrados em péssimoestado de saúde, não raro vítimas demaus tratos, esfaqueados, queimados ouenvenenados. Os números crescem semparar: em junho deste ano, contavam-se700 cães e 200 gatos abrigados pelaorganização. A maioria é vira-lata, mashá diversos exemplares de raça que seusdonos largaram de mão. “Algunscachorrinhos tosados e com fitinhasamarradas são abandonados na frente

do nosso canil e morrem de depressão”,lastima a comerciante Denise IndalêncioRogge, uma das voluntárias da ONG. Emcasa, Denise tem um verdadeiro abrigoanimal: 30 gatos e oito cãezinhos, todosde rua. “Trago para cá aqueles queninguém quer adotar”, conta.

O abrigo dos cães sem-teto

Criança “namora” filhote no canil do Abrigo Animal: superpopulação

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CIDADANIA

Cidade da solidariedade. É assimque o padre Luiz Facchiniespera que Joinville seja

conhecida, dentro em breve. Afinal,dedicou a vida à construção desseideal de atenção e amor ao próximo.Ao completar, em 2006, seus 37 anosde sacerdócio, ele comemora tambémos 12 de existência da Fundação Pauli-Madi Pró-Solidariedade e Vida – ainstituição que, de tão exemplar, serviude modelo a vários outros municípiose Estados brasileiros com seu principalprojeto, as Cozinhas Comunitárias. Jáé quase lugar-comum a frase queFacchini costuma empregar, quandoexplica as razões de sua obra: “Semorrer de fome é a maior misériahumana, deixar alguém morrer defome é a maior miséria espiritual”.

Fiel à premissa, padre Facchiniaproveitou os festejos dos 25 anos de

dedicação religiosa, em 1994, paratomar provavelmente a decisão maisimportante da vida: vendeu os benspessoais e transformou o Jardim deInfância Pauli-Madi, construído com aajuda de amigos, na organização quehoje distribui refeições diárias a quase3.500 pessoas carentes, a maioriacrianças. Em junho de 2006, otrabalho rendeu um novo e saboroso

fruto, na definição do próprio autor: afundação inaugurou a 32a cozinha, asegunda em uma aldeia indígena – aprimeira havia iniciado atividades nomês de abril, em Guaramirim. Palavrasem idioma guarani marcaram aabertura da Oca Cozinha Comunitária,na Aldeia Pindoti. A tribo é compostapor sete famílias, somando 38 índios, eestá localizada em Araquari. “Ascomunidades indígenas se encontram,ainda, muito desassistidas”, lamentaFacchini, ao sublinhar que, com essepúblico, a entidade realiza umaexperiência diferenciada, buscandorespeitar e, mais que isso, ajudando apreservar a cultura guarani.

FOCO NA CRIANÇA E NO ADOLESCENTE

No ano em que o país celebrava otetracampeonato mundial de futebol, a

instituição marcava um gol bemmais importante, ao elaborar omapa da fome em Joinville,detectando 12 graves focos – epartindo para a imediataimplantação do projeto dascozinhas criadas para alimentarcrianças necessitadas. De lá para

cá, a cidade cresceu. E a miséria,idem. “Mas acompanhamos a situaçãoe, felizmente, conseguimos estarpresentes em todas essas regiõescarentes”, sorri padre Facchini, combons motivos para isso: Joinville é oúnico lugar do país que conseguiuidentificar todos os seus focos de fomee saciá-la. Graças à fundação.

O projeto das Cozinhas Comunitárias

Crianças têm refeição completa e nutritiva graças ao projeto que já inspirou ações em outros Estados

Padre Facchini inaugura cozinha em aldeia: “Deixar alguém morrer de fome é miséria espiritual”

Fome quase zeroFundação Pauli-Madimapeia as regiõescarentes e alimentaquem precisa

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– merecedor, recentemente, de amplareportagem em rede nacional, noprograma Ação, da TV Globo – não é,porém, o único desenvolvido pelaFundação Pauli-Madi. A instituiçãotoca outros trêstrabalhos sociais,sempre voltados àfamília, à infância e àadolescência: Cidadãodo Futuro, Comitê daSolidariedade e CasaAbrigo. Sem contar asvárias ações paralelas,como as hortashidropônicas doPlantando Vida, quegarantem um bomsuprimento de verdurase legumes às refeiçõesservidas nos bairros. Eo Segundo Tempo, emparceria com o governo e a Univille,junto às comunidades das cozinhas eenvolvendo cerca de 500 crianças eadolescentes.

Os Comitês da Solidariedade,integrados por voluntários dascomunidades atendidas pela fundação,atuam no suporte às famílias sem-renda– sobretudo, as sem-emprego. Recolhemroupas, sapatos, gêneros alimentícios etoda a ajuda possível para repartir comos necessitados. Já o Cidadão do Futurocuida de 40 crianças e adolescentes,que passam períodos livres da escolaem atividades variadas, na sede daentidade, no bairro Floresta, zona sulde Joinville. Várias parceriaspossibilitam aulas de informática,artesanato, atividades esportivas elanches, para que ninguém passe seutempo ocioso nas ruas.

FALTAM VOLUNTÁRIOS

Em cada uma dascozinhas espalhadaspor vários bairros, acomunidade émotivada aparticipar: quemprepara as refeiçõese serve para acriançada são mãesvoluntárias querecebem,quinzenalmente, aprovisão dos gênerosnecessários. “A idéianão é apenas suprir

a fome física, embora seja muitoimportante, claro. Queremos ajudar aconstruir nas pessoas o espírito decidadania e solidariedade, fundamental

para a idéia dar certo”,defende Facchini. Alémde cuidar das tarefas dacozinha em si, osvoluntários também sededicam à arrecadaçãode doações para asfamílias. E atuam emparceria com afundação, sugerindosoluções para problemasdas comunidades emque estão inseridos.

Convidadas a seengajar, as mulheresretomam contato comnoções fundamentais

que, tantas vezes, o duro dia-a-dia deextrema pobreza acaba seqüestrando.Além de matar a fome delas mesmas, edas crianças da comunidade, algumasresgatam a si próprias, conscientizando-se de seus direitos de cidadã e devivências básicas: anecessidade doasseio pessoal, decuidar da saúde dosfilhos, de respeitar ooutro como serdigno e atuante.

A Pauli-Madifuncionadiariamente pelaforça da teimosaesperança de padreFacchini e pelaadesão dessaspessoas todas. “O

trabalho social beneficia quem o faz. E,claro, é vital para quem o recebe”,reconhece o religioso, antes decompartilhar um pouco de suaexperiência com as quase 500 mães quecuidam das cozinhas. Maioria absolutano universo de voluntários dainstituição, muitas mulheres quepassaram a se dedicar ao projetoredescobriram seu próprio valor comoseres humanos.

O PÃO DO CORPO E DA ALMA

De mãos para o alto, eles agradecemaos céus pela comida. Todos juntos,pedem a bênção e querem ter a certezade que o alimento nunca mais faltará.Sim. Ele já faltou. Não foram poucas asvezes em que os moradores de algumasregiões mais carentes de Joinvilleprecisaram rezar para saciar a fome.Agora, a oração tem o intuito de celebraro almoço simples e sagrado.

Os moradores sempre foram regidospela fé. Nenhuma religião ou credo emespecífico. A força para seguir a jornadavinha do alto. E foi daí, do alto de umaltar, que um padre desceu para ajudar amudar o cenário da populaçãojoinvilense. Só na unidade da CozinhaComunitária do Jardim Edilene, cerca de300 crianças almoçam, de segunda asexta-feira. Seis quilos de arroz, quatroquilos de feijão, três pacotes demacarrão, três quilos de fubá, 10 frangoscom legumes e saladas são servidostodos os dias.

Uns pratos com três divisórias e outroslisos. Isso, na verdade, pouco importa. Apreocupação está no fato de manter oprojeto, já que, “quando a cozinha fecha,muita gente passa fome”, afirma Marleneda Silva, voluntária coordenadora

Hora do almoço na comunidade indígena: trabalho atinge novos alvos

Legumes que sobram viram conservas: combate ao desperdício

Marlene é voluntária há cinco anos

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da cozinha do Jardim Edilene. Marlenebate ponto no local há cinco anos, desdeque as refeições começaram a ocupar asmesas por ali. A jornada se inicia às 8h esó acaba lá pelas 14h, quando a louçaestá limpa. No preparo dos alimentos,trabalham uma cozinheira e trêsajudantes. Após o almoço, mais quatroajudantes entram em cena.

As refeições são para crianças eadolescentes de até 15 anos. Mas MariaSalete de Carvalho garantiu o direito dealmoçar na cozinha por ajudar nastarefas, pelo menos duas vezes porsemana. Ela e os quatro filhos comemno local há três anos. “Às vezes eu davasó pão e café para meus filhos, noalmoço. Não tinha outra coisa”, lamenta.A oportunidade de almoçar na cozinhatrouxe alegria para a família. “Notei quemeus filhos cresceram e sedesenvolveram muito.”

Nem sempre a inocência da infânciapermite revelar as dificuldades. Aexistência triste faz com que as carênciasse tornem banais e sejam superadas pelaàs vezes vã esperança de um futuromelhor. “Todos os dias tinha comida láem casa”, diz Paula *, uma menina de12 anos. Cabisbaixa, ela faz a declaraçãotimidamente, com vergonha deconfessar a situação difícil. Na casa dePaula, moram nove pessoas. Só o paitrabalha. Durante o dia, são mínimas asopções para o lazer. “Fico andando narua, na casa dos meus amigos, mas seique isso não é bom”, desabafa. Carla *,outra menina, freqüenta a cozinha do

Parque Guarani desde que a unidadecomeçou a funcionar. Antes, fazia asrefeições em casa. “Nunca nos faltounada, mas a situação nunca foi boa.Hoje, eu e minhas duas irmãsalmoçamos sempre aqui”, conta agarota. Agora, a janta em famíliatambém está garantida.

Na cozinha do Parque Guarani, assimcomo em todas as outras, as doações sãobem-vindas e bem aproveitadas. Navéspera do final de semana, os legumes,que naturalmente estragariam pela açãodo tempo, viram conserva. Pimentão,cenoura e couve-flor dão o colorido aosvidros enfileirados na cozinha.

FONTES DE AJUDA

Mais que dos cofres públicos, é dainiciativa privada e de pessoas físicas

que vêm os recursos que asseguram àscrianças o pão nosso de cada dia. DosR$ 40 mil que gasta todos os meses, afundação recebe R$ 18 mil daprefeitura, via Secretaria de Bem-EstarSocial. O acerto vale até março de2007. A secretária Maria José Fettbackexplica que esse tipo de contribuiçãotem prazo definido – é regido peladisponibilidade orçamentária eprioridades da administração.“Quando o prazo expirar, vamos nosreunir com a fundação e conversarsobre o problema”, adianta asecretária, empenhada naimplantação, ano que vem, dosrestaurantes populares, que pretendemservir refeições a R$ 1,00 para famíliascarentes.

Embora os recursos financeirossejam uma preocupação, padreFacchini explica que a entidadeprocura formas de se tornarindependente de verbas públicas.“Gostaríamos de chegar a umasituação de auto-suficiência que nospermitisse dormir sossegados, semriscos de que, numa mudança degoverno ou de política, fiquemos semcondições de atender nossas crianças.”Conquistar essa independência épossível apenas se a comunidade seenvolver um pouco mais. “Estamosdivulgando o máximo possível otrabalho da fundação, buscandosensibilizar pessoas e empresas sobre aimportância de garantir ofuncionamento e – por que não? – ocrescimento dessa instituição.”Depende de todos. E de cada um. ■

CIDADANIA

2O SEMESTRE 200612

Projeto ameniza situação difícil em comunidades carentes: objetivo é buscar auto-suficiência

Maria Salete ajuda nas tarefas diárias de uma das cozinhas e almoça ali com os quatro filhos * Os nomes foram alterados para manter a privacidade das crianças.

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Ao todo, 95% dosfuncionários da rede delojas Salfer participamdo Programa SalferSolidária. Quem seengaja no projeto fazuma doação mensal,que é descontada diretona folha de pagamento.Sob o total arrecadado,a empresa colabora commais 150%. Essemontante é doado àFundação Pauli-Madi,que compra osalimentos necessários.

Mais que dardinheiro, mensalmenteos funcionários fazem uma visita àscozinhas para acompanhar oandamento do projeto. É essa aforma de monitorar o uso dosrecursos. Além disso, toda semana,quando a Salfer reúne os novosempregados para a integração naempresa, eles são convidados aintegrar o projeto. “Felizmente aadesão é bastante grande”,comemora Valdemiro Hafemann,diretor Corporativo e da Qualidadeda Salfer, explicando: “O valormínimo de doação é de R$ 7,00mensais. E o máximo depende davontade e do gesto de cada um”.

O programa foi implantado em1998. Surgiu do movimento dospróprios trabalhadores. “Vinha muitagente nas lojas pedir coisas.Acabávamos dando, só que issotornava a iniciativa pouco eficaz,porque talvez ajudássemos quem nãoprecisava”, conta. “Depois de umavisita às cozinhas, vimos adificuldade que o padre Facchinitinha para manter o projeto. Aí aempresa se posicionou oferecendouma participação adicional.”

Os benefícios são claros: “Ovoluntariado qualifica as pessoas, dáuma dimensão diferente ao trabalho.E, para os funcionários, é motivo deorgulho fazer parte de um projetodessa envergadura. É muito bomvocê ir para casa sabendo que

colaborou de alguma forma para quealguém tivesse uma vida melhor”. Aotodo, a Salfer ajuda 34 entidades: emcada cidade onde há unidades daloja, os empregados contribuem e aempresa coloca os tais 150% emcima e distribui a alguma instituição.“Nosso objetivo é que, em cada lugar

onde exista uma loja daSalfer, pelo menos umaentidade que cuide decrianças seja assistidapor nós.”

A rede tambémmantém o projetoPadrinhos do Saber.Neste, cada um dos 97participantes adotouuma criança da cozinhado Jardim Edilene. “Agente compra osmateriais escolares eacompanha os alunos. Éum forte incentivo, até orendimento escolarsubiu”, explica

Valdemiro. Isso criou um vínculomais forte ainda com as criançasassistidas. “Muitas querem conhecero local onde o ‘padrinho’ trabalha eaté se espelham e pensam emtrabalhar na Salfer, mais tarde”,comemora o executivo.

FUNCIONÁRIOS EMPOLGADOS

Humanização é a palavra quemelhor define a sensação dosfuncionários com o projeto. Não sãoos números do desconto em folha depagamento que contam para quem ésolidário. O que vale é o crescimentode caráter e a sensação do devercumprido. A analista fiscal LucemaraNarloch lembra que, quandocomeçou a ajudar as CozinhasComunitárias, a primeira impressãoboa que ficou foi o carinho dascrianças. “Algumas vêm e nosabraçam, porque sabem que a genteestá ali para passar um dia diferente,um almoço diferente”, salienta,referindo-se às visitas feitas pelosfuncionários a alguns bairros. “Ascrianças mandam cartinhas. É umacoisa que realiza tanto a gentequanto a fundação. Digo que ajudaros outros faz parte do meu projeto devida”, completa. “A importância deajudar é imensa”, emenda aassistente de marketing FernandaMartinelli.

Empresa multiplica doações de funcionários

2O SEMESTRE 2006 13

Grupo de colegas da Salfer visita cozinha: “padrinhos” incentivam estudos

RADIOGRAFIA

Com apenas

8 funcionários

e quase

500 voluntários

a Fundação Pauli-Madi mantém

32 cozinhas

espalhadas pela periferia da cidade e

arredores.

Dessas,

2 são ocas-cozinhas

e alimentam índios guaranis. No total,

quase

3,5 mil crianças e adolescentes

são atendidas pelos projetos da

fundação.

Quem quiser ser voluntário ou fazer

doações, o telefone é 3465-0165.

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2O SEMESTRE 200614

GÊNERO

Oaumento brutal da violênciacontra a mulher desperta umamobilização ímpar em Joinville.

Órgãos públicos e instituições devariados perfis começam a se unir paraencarar o problema da maneiraadequada. Nos últimos meses, essemutirão passou por dois episódiosmarcantes, com a formalização doConselho Municipal dos Direitos daMulher (CMDM) e a criação do grupode estudo que vai colocar no papel umpadrão de atendimento para as vítimasde violência sexual – instrumentofundamental para punir osresponsáveis. Também é recente, temmenos de dois anos, o programa daprefeitura voltado a amparar asmulheres agredidas, via suportepsicológico e assistência social, queconta até com uma casa para abrigaraquelas que necessitam, enquanto nãoconseguem a reintegração social.

O advento simultâneo de iniciativasconjuntas em torno do tema éaplaudido pelas entidades que militamna área. “São mecanismos capazes deresultar em ações que minimizem oproblema. Isso demonstra que asociedade está fazendo a sua parte, oque é muito positivo”, interpreta aadvogada Cynthia Pinto da Luz,dirigente do Centro de DireitosHumanos (CDH) e vice-presidente doCMDM, organismo multidisciplinarinstituído no final do ano passado, como desafio de estabelecer políticaspúblicas que assegurem o plenoexercício da cidadaniaà população

feminina. Embora reconheça queJoinville experimenta “um momentoprivilegiado de debate e avanços” sobrea questão, Cynthia lamenta justamentea carência generalizada de políticaspúblicas efetivas, citando como exemploo investimento acanhado dos governosestaduais na estrutura das delegacias deproteção à mulher. “Salvo raríssimasexceções, nenhuma prioridade é dada atais serviços. E sem aporte de recursosnão há política eficaz”, analisa aadvogada.

Exemplo de política eficazintensamente reivindicada é o padrãode atendimento às vítimas de violênciasexual. Desde maio, uma comissãointegrada por órgãos da prefeitura e dogoverno estadual, escolas superiores eoutras instituições trabalha paraformular um sistema único que possaacelerar e humanizar o atendimentodesses casos, envolvendo mulheres oucrianças, independente do local ondeelas recorrerem inicialmente.Com a medida, asresponsabilidades decada setor setornarão maisclaras – doregistrodas

ocorrências à assistência psicossocial ejurídica. “Hoje, ocorre umarevitimização: a vítima conta a mesmahistória várias vezes e chega a fazerexames mais de uma vez”, ressaltaMônica Vollrath, representante daSecretaria da Saúde na comissão. Paracompletar, nem 10% dos casos de abusosexual – aí incluídas as ocorrências comcrianças – são encaminhados paraprocessos, o que abre a porta daimpunidade.

ESTATÍSTICA REVOLTANTE

O número de crimes do gênerocometidos todos os dias, em todo oplaneta, é de embrulhar o estômago. AOrganização Mundial da Saúde (OMS)compilou 48 estudos sobre população econstatou que oscila de 10% a 69%,entre os países abrangidos, a parcela demulheres maltratadas pelos parceiros.Uma em cada cinco brasileiras relata a

mesma situação espontaneamente.Apresentadas às diferentes

modalidades de violência, elaspintam quadro ainda pior: 43%admitem maus tratos deordem sexual, 33% revelamagressões físicas e 27%,psíquicas. Quase 7 milhõesconfessam ter sido espancadasao menos uma vez na vida,conforme levantamento daFundação Perseu Abramo, deSP. Mais de 2 milhõesafirmaram que isso ocorreuao longo dos doze mesesanteriores à pesquisa, o queresulta na absurda média de

5.800 espancamentos pordia – um a cada 15

segundos.Alerta

dos

As mãos que faltavamEntidades sociais e órgãospúblicos começam a somar forças no combate àviolência contra a mulher

Page 15: Revista Döhler

2O SEMESTRE 2006 15

responsáveis pelo estudo: “Esse é umfenômeno conhecido, mas sobre o qualse fala pouco, contribuindo para que sereproduza sob sigilo e em nome de umaprivacidade criminosa”.

Em Joinville, começa a ser suprida acarência de dados precisos sobre oassunto. Projeto recente, assinado porduas professoras da Univille, rastreia asestatísticas disponíveis e se propõe asubsidiar, com elas, o trabalho dasorganizações sociais. Janine Gomes daSilva e Arselle da Fontoura percorreramnotícias de jornal, documentosfornecidos pela Delegacia da Mulher eregistros do Centro de Atendimento àVítima de Crime (Cevic) para montarum denso painel que engloba dozeanos, de 1991 a 2003. Dezenas detabelas e gráficos minuciososacompanham a evolução dasocorrências policiais relacionadas àmulher ao longo desse período, comotambém um balanço dos serviçosprestados pelo Cevic, órgão deassistência social, psicológica e jurídicaadministrado por uma ONG e ligado aogoverno estadual.

O material coletado por Janine eArselle sustenta a impressão de que, pordiversos motivos, raramente osculpados são punidos – apenas 10% dosquase 22 mil boletins de ocorrência(BOs) emitidos em seis anos, até 2003,tiveram encaminhamento. No últimoano computado, os registros maisfreqüentes foram de lesões corporais,brigas e ameaças – a principal delas, demorte. Ao contrário do que sugere osenso comum, essas coisas nãoacontecem só na periferia. Em 2003,por exemplo, o bairro campeão foi o

Boa Vista, vizinho àárea central, 100ocorrências à frentedo Jardim Paraíso,extremo-norte dacidade. Naseqüência, grudados,Centro, Aventureiroe Iririú, misturandozonas pobres comregiões de classemédia. “O problemaé mais sério do queimaginávamos. E doque conseguimos darvisibilidade”,preocupa-se Janine,

titular de um projeto de extensãoobjetivando capacitar instituições queatuam na proteção às mulheres. Naperspectiva de ir além da estatística, asduas professoras decidiram tambémreunir e analisar narrativas pessoais,tanto de vítimas de violência quanto deprofissionais da área. Esperam lançartudo em livro neste semestre.

ABRIGO E REINTEGRAÇÃO

Outra fonte de números, semprerelevantes para compreender a extensãodo drama e agir sobre ele, é o PAMVVI,sigla do Programa de Atendimento aMulheres Vítimas de Violência,vinculado à prefeitura. Desde abril de2004, o PAMVVI procura resgatar aauto-estima de quem passa por essetipo de experiência. Diretamente,oferece assistente social, psicóloga epedagoga, que providenciam médico eadvogado, de acordo com a

necessidade. Quando possível, auxiliana reintegração ao trabalho, no retornodos filhos à escola e, em alguns casos,ajuda até a conseguir emprego emoradia. “A prioridade é garantir queelas retomem a vida normal nas suascomunidades”, esclarece a assistentesocial Valquíria Backes. Caso haja riscode morte, a mulher é hospedada por atétrês meses na Casa Abrigo Viva Rosa,enquanto a equipe do PAMVVI tentasolução melhor. Com 28 vagas,endereço mantido em sigilo porsegurança, a Casa Abrigo representouum passo importante na abordagem daviolência contra a mulher. De cadacinco atendimentos feitos peloprograma, um depende dessa estrutura,o que dá idéia da gravidade dos casos.

O balanço do PAMVVI em 2005permite traçar um perfil médio damulher que é alvo de agressões pelocompanheiro: 36 a 45 anos (33%),baixa escolaridade (63% com ensinofundamental incompleto), semqualificação profissional (metade

desempregadas,grande número dediaristas ou donas-de-casa), entre doise três filhos, famíliasimples. Perto de60% andam com oboletim deocorrência na mão,confirmando aobservação positivade que, feras feridas,elas vão perdendo omedo de gritar. Adelegada MarilisaBoehm vê issodiariamente. “Asmulheres têm mais

coragem para denunciar e mais clarezasobre o que é errado nosrelacionamentos”, avalia. No comandode uma estrutura enxuta, apenas 13funcionários e quatro psicólogas,Marilisa reconhece que precisaria “nomínimo o dobro disso para dar conta dorecado”. Desabafa: “Dá uma sensaçãode impotência”. A delegada tambémpercebe um aumento da violência, cominúmeras famílias desestruturadas peloalcoolismo e pela instabilidadeeconômica.

A questão social aparece na origemdesse crescimento. O coordenador do

Cynthia, do CDH: momento privilegiado, mas faltam políticas públicas

Professora Janine, da Univille: números para compreender o problema

Page 16: Revista Döhler

Cevic, Pedro Paulo Rosa,lamenta que, na maior partedas vezes, as organizaçõesafins acabem por tratarapenas das conseqüências,deixando de lado a causa. “Deque adianta investir na auto-estima da mulher e mandá-lade volta para o lobo?”,questiona. Cynthia Pinto daLuz, do Centro de DireitosHumanos, entende que aresposta está na reavaliaçãodos valores que estruturam asociedade atual e queaprovam, passivamente, adiscriminação da mulher no trabalho oua utilização do corpo feminino comomercadoria. Não é do dia para a noiteque se chega lá – e a advogada só semostra otimista no longo prazo:“Podemos depositar nossas esperançasnos filhos e filhas das gerações futuras,pois está claro que a mulher já nãoaceita o papel de eterna sofredora econtribui na construção de uma nova

concepção de vida”. Instituição que luta por isso há longo

tempo, o CDH não faz apenas oatendimento imediato às vítimas deviolência, mas trabalha em váriasfrentes, estimulando essas pessoas atransformar a realidade ao seu redor – oque implica em cortar o mal pela raiz,jamais silenciando quando o parceirovira algoz. Na hora de discutir soluções

definitivas, porém, aspróprias mulherespreferem alternativas“curativas” em lugar daspreventivas, comocampanhas pela mídia einclusão de disciplinassobre direitos humanos nocurrículo escolar, desde asprimeiras séries. É o queinforma a pesquisa daFundação Perseu Abramo,citada acima. Osresponsáveis pelolevantamento acendem osinal vermelho: “A

dimensão do fenômeno indica que, pornecessárias e importantes que sejam, asmedidas de acolhimento das vítimas,mesmo se implementadas em largaescala, serão insuficientes se não forcombatida a base moral que legitima aviolência contra a mulher, o quedemanda uma política educacional ativade desconstrução e construção devalores”. ■

GÊNERO

2O SEMESTRE 200616

A psicóloga Valdirene Daufemback, doCentro de Diretos Humanos (CDH) deJoinville, afirma que a demanda peloatendimento de mulheres vítimas deviolência é muito maior que a oferta,apesar do grande número de organizaçõesenvolvidas.

As mulheres criaram coragempara denunciar quando sofrematos de violência?Sim, existem mais meios para viabilizar

a denúncia. Porém, a resolução doconflito que causa a violência depende detantos fatores, entre eles, o econômico, osocial e o jurídico, que muitas vezes adenúncia fica sem efeito. Estamos apenasiniciando a construção de políticaspúblicas de atendimento à mulher vítimade violência. A capacidade e a efetividadedos encaminhamentos estão muitoaquém da demanda existente.

Por quê, apesar de se avançartanto em tantas coisas, asociedade não consegue abolir aviolência contra a mulher? Essaé uma doença incurável?

O mundo do trabalho e a economiaprovocam mudanças significativas noestilo de vida das pessoas. Mas, nessanova vida informatizada, de temporarefeito, individualizada, a lógica dadominação e da desigualdade continuapresente, embora se apresente com novasmanifestações e sutilezas. Secontinuamos a considerar os diferentes(mulheres x homens, pobres x ricos,doentes x sãos) como desiguais (demenos valor), perpetuamos opreconceito, que se externaliza por meioda discriminação e, muitas vezes, chega àviolência física e psicológica.

Quais as formas clássicas deviolência contra a mulher, hoje,além da violência físicacometida pelo companheiro? Quatro mulheres são espancadas a

cada minuto no Brasil, a maioria por seumarido ou parceiro. Os maioresvioladores continuam sendo as pessoasmais próximas. Porém, a violênciapsicológica e o assédio sexual noambiente de trabalho são as facetasmodernas desse preconceito. Na

modernidade, parece não fazer maissentido segregar essa discussão aosgrupos femininos. Superação depreconceito, convivência justa, eqüidadede oportunidades, precisam seraprendidas por ambos os lados. Homense mulheres podem construir um novomodelo de relacionamento, deixando delado a vitimização que em muitassituações acomete as mulheres e asuperioridade que, por outro lado, éassumida pelos homens. Com a entradada mulher no mundo produtivo,o modelo masculino vive uma crise deidentidade, trazendo uma angústia quepode ser administrada com respeito eaprendizado.

“Estamos apenas começando”

Valdirene: segregação não tem sentido

Mônica Monich, Deise Gomes e Valquíria Backes: o trio do PAMVVI

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“Minha história renderia um livro”

“Estava de mal a pior. Não sabia a quem recorrer.No ano passado, uma amiga recomendou procurar oPAMVVI. Aquilo me abriu uma porta. Era o lugar emque deveria estar há tempo. Me senti amparada.Precisava de ajuda para saber que rumo tomar.Antes, quando registrava ocorrência, diziam que sótinha duas alternativas: sair de casa ou mereconciliar. Iria para onde? Abandonar tudo, com aroupa debaixo do braço? Meu marido só fazia memandar embora. ‘Isso aqui é meu, isso aqui é meu!’Não aceitei. Sem apoio, em qualquer lugar eu teriaproblema. Meu filho não se conforma. Lembra que, aos 7 anos, ouvia o pai dizer que,quando os filhos crescessem, iria largar de mim. Ele fica triste, acha que, se tivéssemos nosseparado daquela vez, teria refeito minha vida. Sempre foi assim, mas há 10 anos a coisadesandou. Meu marido passou a trocar o dia pela noite, começou a me maltratar, e memandava procurar meus direitos. Fiquei sofrendo humilhações. Dei duas mancadas: astentativas de reconciliação que fiz, tentando salvar a família. Meus pais viveram casados54 anos, queriam os filhos ao redor deles. Lutei até onde pude para ter isso para mim.Uma vez, o juiz recomendou que a gente se reconciliasse. Meu marido, que é um artista,disse que só Deus iria nos separar. Saindo do Fórum, riu da minha cara. Era fingimento.Ele me usou. Faz alguns meses que saiu de casa, graças a Deus. Passei anos apanhando,sofrendo. Meu marido fechou a transportadora que tinha só para não me pagar pensão.Hoje, está aposentado. Sempre fez o tipo do homem machão. Não vai bater em outrohomem. Devia ter problemas lá fora e descontava em mim. Ele freqüenta a igreja, diantede outras pessoas se mostra como um homem bom. As pessoas dizem que a minha históriarenderia um livro.”

Mulher de classe média, mãe de dois filhos adultos, que manteve o casamento por 34 anos

“Quando vim para Joinville commeu marido, a primeira coisa que fizfoi procurar serviço. Afinal, tinha quepagar aluguel – ele gastava o saláriona zona. Chegava no dia seguinte,bêbado, 10 centavos no bolso. Pediacafé. Se não tinha, me chamava devagabunda, dava pontapés e me jogavacontra a parede. Foi uma tortura. Euficava um mês, dois, no emprego e eleme tirava dizendo que quemtrabalhava era prostituta. Caí emdepressão. Uma ex-patroa me disse‘chega de sofrer’. Mas ele dizia que, seeu largasse dele, iria me matar. Daí,ela me levou ao Cevic. Um mês depois,um oficial de Justiça foi lá em casa eexigiu que ele se retirasse. Pegou abicicleta, deixou os pertences lá e ficouseis meses fora – só voltava paraquebrar coisas, maltratar as crianças,me atormentar. Muitas vezes, entrava

à noite em casa, mebatia e ia embora.Uma noite, eu estavadormindo com ascrianças e acordei derepente, quando o vise aproximando comfios de luzdesencapados, pertoda cabeça dascrianças. Voei nele.Pegou a foice,arrebentou a porta.Estamos separados hácinco anos, mas eleme persegue, diz que sou dele e maisninguém. Meu menino de 14 anosacompanhou a parte mais difícil.Assistia a tudo. Ia comer embaixo dacama, por medo. Via o pai com foice,facão, avançando na mãe... Ele játentou me matar com faca, pedra...

Veio ao meu trabalho,ameaçou os colegas.Não vai desistir, masnão vai conseguirtambém. Minhavontade é forte. Nãotenho mais medo.Consegui meudinheirinho, fiqueifirme. A vida não éfácil, mas é melhor queantes. Tinha outrosplanos com ocasamento, uma pessoado meu lado, que me

desse atenção. Meu sonho foi por águaabaixo. Agora, estou tentandoconstruir outros sonhos. Não voudesistir.”

Maria de Lourdes de Jesus, 42 anos, mãe de doisfilhos, fez questão de “mostrar a cara” neste depoimento

“A vida não é fácil. Mas é melhor que antes”

Serviços de atendimento disponíveis

O QU

E FA

ZER ✓ Programa de Atendimento a

Mulheres Vítimas de Violência(PAMVVI) – assistência social,psicológica e pedagógica.S 3239-2870

✓ Centro de Atendimento àVítima de Crime (Cevic) –atendimento social,psicológico e jurídico.S 3423-3435

✓ Centro de Direitos Humanos(CDH) – atendimento eorientação.S 3433-1261

✓ Centro de Estudos deOrientação da Família(Cenef) – oferece pronto-atendimento psicológico,cerca de 150 casos diversospor dia.S 3427-3708

✓ Instituto Consulado da Mulher– promove palestras eatividades voltadas àconscientização da mulher.S 3433-3773

Leia mais na edição virtual da Revista Döhler– www.dohler.com.br/revistadohler14

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2O SEMESTRE 200618

GASTRONOMIA

Se perguntarem a um gaúcho qual aorigem do churrasco, ele vai dizerque é um hábito surgido no pampa

sul-brasileiro, no tempo das “vacarias”,como eram conhecidos os abates derebanhos inteiros para vender o couro e osebo, valorizados nos séculos 17 e 18. Se ointerlocutor for argentino, a resposta seráoutra: o churrasco nasceu entre os gauchosdo país vizinho, que têm até uma fábulasobre o tema: “Um grande incêndio ocorreuem matas povoadas por cerdos. Os animaisacabaram assados e, depois, degustados.Assim, cada vez que queriam comerchurrasco, colocavam fogo na mata – atédescobrirem, afinal, que era mais fácilsacrificar os animais e assá-los emrecipientes apropriados”. Já alguns amantesdo tradicional prato brasileiro gostam dedizer que o homem inventou o fogo parapoder assar um bom dinossauro...

Fábulas e brincadeiras à parte, a respostaé mais direta quando se indaga queminventou um tipo de assado bemdiferenciado: a costelada joinvilense. “Fuieu!”, orgulha-se, sem cerimônia, “SeuAlírio”, nascido EucelinoVega da Costa, 71 anos,que ainda hoje lida comgastronomia, ajudando ofilho no Bar Bante,especializado emcaranguejos. De 1964 a1994, porém, a rotina deAlírio era outra: prepararcostelas para os fiéisclientes de seu restaurante,na Rua MonsenhorGercino, não por acasobatizado de Costelão.“Sempre preferi assar ascostelas inteiras, com seus

14 ou 15 quilos cada uma”, conta ele, quecomeçou em um espaço menor, no Km 2.

Não há notícias de outra cidade brasileiraque cultue hábito semelhante, com tamanhorigor: toda sexta-feira, dezenas de botequinse restaurantes espalhados pelos bairrosoferecem a costela assada, iguaria que passapelo menos cinco horas se desmanchandoem churrasqueiras abertas ou nos chamadostambores – tonéis onde a carne é distribuídasobre um braseiro, localizado na parteinferior. A técnica, porém, não érecomendada pelos “experts” do ramo:abafada, a carne pode assimilar fumaça emexcesso e até substâncias tóxicas. Alémdisso, é muito parecida com a “Costela aoBafo”, conhecido prato do interior paulista eque, consta, nasceu em Ribeirão Preto. Semcomparação.

Alírio, que chegava a assar meia toneladade costela a cada sexta-feira, “nos bonstempos”, sempre associou o tema à reuniãofamiliar. “Meu público era de casais efamílias inteiras, que apreciavam umacostelinha bem temperada.” Temperada?Pois, ao contrário dos gaúchos, quecostumam usar apenas sal grosso, Alírio fazquestão de sublinhar que a receita originaldo tempero criado por ele é feita de sal fino,vinho branco e limão. Assim, a carne ficacom bastante molho. Outro segredo, paranão secar, é controlar bem o calor: nada de

fogo; na maior parte dotempo, usa-se apenas abrasa.

Empregando umatécnica que mistura os doisestilos – o sal grosso dogaúcho, o tempo e o tipode grelha joinvilenses –,Sérgio Goedert herdou dopai, Adolfo, a missão detocar o bar e restaurantetradicional da Rua Alagoas,no bairro Anita Garibaldi.O público também édiferente: associadas acanchas de futebol, que ele

aluga, as costeladas sexta-feirinas sãofreqüentadas majoritariamente por homens –os atletas, que saem do jogo e vão repor ascalorias perdidas na batalha futebolística.Mas não é por ser diferentes que são menossaborosas. Com público cativo há mais de 30anos, a Cancha e Bar do Adolfo alcançoufama até fora da cidade. Há representantescomerciais de outras regiões que nãoperdem uma boa costela, sempre que estãoem Joinville. “Não tem segredo”, dizSérgio, que privilegia a qualidade, nahora de comprar a carne. “Não dá parapagar muito barato. A boa carne éfundamental para uma costelasaborosa”, garante.

Alírio concorda com ele. “É precisoexperiência na hora de escolher ocorte. E, de preferência, selecionar umou dois fornecedores, criando vínculocom eles, para que ofereçam sempre omelhor”, aconselha. É o que faz,também, Rubens Dudy, do Bar eMercearia Greissy, na rua Otto Boehm,um dos mais centrais dos endereços dacostela joinvilense, conhecido como Bar daDona Mausy. “Compro sempre do mesmofornecedor, porque tenho uma grandepreocupação com a qualidade”, explica.Tradicionalíssimo, o lugar existe há mais de50 anos, há seis oferece vários tipos deassados aos domingos, mas só de um anopara cá que Dudy e a sócia Rogéria Greissydecidiram apostar na costela das sextas.

DO ESCRITÓRIO PARA A CHURRASQUEIRA

Pilotando a churrasqueira ou atendendoaos freqüentadores do lugar, Dudy vivenciauma experiência nova. Profissional de

Horas e horas nagrelha, costela ésinônimo de sexta-feira

A cara e o saborde Joinville

Seu Alírio: o “pai” da receita

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finanças, trocou a roupa formal de escritóriopelo avental de churrasqueiro. Não searrependeu. “A única lembrança de minhavida relacionada à culinária foi umensinamento de minha mãe, quando eu eraainda pequeno, de que maionese se comiafria”, brinca ele, reiterando que gosta do quefaz e se dedica a inventar temperos e inovarem receitas para agradar também aosclientes do domingo.

Embora longe da vida de “costeleiro” jáhá alguns anos, seu Alírio sabe de cor arotina da profissão. “É preciso acordar cedoporque, se você quiser tudo pronto no inícioda noite, lá pelas 11 horas tem que colocara costela no fogo – e isso exige preparação,desde o tempero até o fogo”, recomenda. Éo que fazem Sérgio e Dudy, quecomeçam a servir pelas 18 horasporque, afinal, sexta-feira é dia de “happyhour” e desde cedojá tem gente prontaa degustar. Talvezpor exigir essa

dedicação toda, o prato típico joinvilenseparece cativo dos estabelecimentos menores.

“Até porque, para ser mesmo boa,ela tem que ter a marca do

assador”, acrescenta AdolfoGoedert, pai de Sérgio e um

dos mais antigosprofissionais da cidade.

Mas, se o critériofor o de quem está

há mais tempo ematividade, o troféu vaipara Osman Lohmann,

que administra com aajuda de dois de seus quatro

filhos a churrascaria com seusobrenome, no

bairro Iririú.Simpático e bem-falante –outro ponto comum entrechurrasqueiros –, admiteque ultimamente preferepassar a semana na praia evir para Joinville às quintas,para cuidar apenas dacostela. “Já estou meaposentando”, brinca, aodizer que os filhos cuidamdo empreendimento comdedicação. Com asimplicidade que lhe épeculiar, Lohmann serecorda de como tudo começou: “Éramosum grupo de amigos que se reuniam parajogar bolão e comer costela. Trabalhava emum outro lugar, até que alguém sugeriu queeu devia abrir meu próprio negócio”, contaele, que tem em seu currículo profissionalda juventude passagens pelo refeitório daMalharia Arp e como ecônomo da SociedadeAlvorada.

Do grupo de amigos, o hábito da costelaevoluiu para um pequeno restaurante, queconstruiu ao lado da residência – e ondeestá até hoje, só que com uma infra-estrutura bem maior. O conhecimento doofício veio, vejam só, do amigo Alírio, que jácultivava a fama de melhor costeleiro dacidade. “Foi ele quem começou isso tudo”,credita.

PÚBLICO MENOR

O consumo da costela caiu bastante, nosúltimos anos. Se, na década de 80, osestabelecimentos chegavam a assar até 400quilos por semana, hoje dificilmente sepassa dos 80. “Culpa”, em parte, dasmudanças de hábitos alimentares ditadaspelas campanhas educativas sobre asrelações entre a saúde e a dieta daspessoas. Afinal, a costela é um dos cortesbovinos que mais concentram a temidagordura animal, responsável pelo aumentonas taxas de colesterol e das complicaçõescardiovasculares. “Para mim, isso é ummistério. Meu pai, por exemplo, viveu até

os 98 anos, comendo costela gorda”, sorriAlírio. Todos concordam que o consumocaiu, mas acreditam que a tradição vai semanter ainda por um bom tempo. “Afinal, asexta-feira foi feita para relaxar e esqueceras preocupações”, emenda Dudy, com aanuência de seus clientes e amigos, quenão deixam de dar uma passadinha,sempre que podem. Sem arrependimentosou culpas. ■

Sérgio mistura dois estilos: “Não tem segredo”

Osman Lohmann: o mais antigo da cidade no ramo

Três boas casas do ramo

DIA

DE C

OSTE

LA Bar e Cancha do AdolfoRua Alagoas, 303 – Anita GaribaldiS 3433-0175

Bar e Mercearia GreissyRua Otto Boehm, 861 – CentroS 3422-3727

Churrascaria LohmannRua Guerra Junqueira, 209 - Iririú S 3437-1323

Dudy (ao centro),com um casal defreguesesmexicanos: doescritório para achurrasqueira

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INSTITUCIONAL

PALAVRAS PARA A POSTERIDADE

2O SEMESTRE 200620

Em dois anos de realização, oPrêmio Joinville de ExpressãoLiterária garimpou dezenas de

novos talentos na arte da palavra escrita.Mais de 500 textos (todos inéditos)chegaram às mãos da comissão julgadora,que enfrentou o saboroso desafio deapontar os melhores, para os troféus emenções honrosas. Se o prêmio era dasletras, nada mais justo que deixar impressoem papel o fruto maduro dessa iniciativa:saiu o livro “Joinville em Verso e Prosa”.Trata-se de uma coletânea com as 12poesias e os 17 textos classificados comocontos ou crônicas nas duas categorias dapremiação entre 2004 e 2005.

A obra se abre com “OLivro”, de ClariceSteil Siewert,campeã em poesiana edição deestréia do projeto.“Aí está a vida quenão finda sedesmanchando noalheio para além dodecomposto”,elabora Clarice.“Anamnese”, deClotilde Zingali quevenceu no anopassado, pode ser lidamais adiante: “Palpitaem minhas vértebras uma urgência que seesparrama”, confessa o texto. No capítulode contos/crônicas, destaques para osprimeiros lugares de 2004, Joel Forteski,com “Simbolia”, e 2005, Simone Gehrke,com “Penso, Logo Fico”.

Com 72 páginas, editado pela LetraD´Água sob a coordenação da Mercadode Comunicação, “Joinville em Verso eProsa” foi lançado durante a 3ª Feira doLivro, no início de abril. O prêmio é umainiciativa da Döhler em parceria com oPrograma Nacional de Incentivo à Leitura(Proler). Coordenadora do Núcleo Proler-Univille, a professora Taiza Mara Rauen

Moraes saúda o projeto pelavalorização que emprestaaos autores locais, “dando

visibilidade aos seus escritos de poesia eprosa”. Na orelha do livro, ela manifestauma expectativa: “Que as palavras e asidéias impressas testemunhem que oescritor, ao fazer um pacto com a palavra,também faz um pacto com a cultura,resultante em conexões reconstrutoras domundo e de sentidos”.

COM VOCÊS, CLARICE!

“Joinville em Verso e Prosa” fecha comuma rápida biografia dos autorespremiados. Por um lapso técnico, faltouregistrar ali o perfil de Clarice Steil Siewert,autora da poesia campeã de 2004 e terceira

colocada em 2005. Naturalde Joinville, Clarice, 24anos, começou a dar formaàs palavras aos 21, quandoentrou na faculdade dePsicologia. Até então, tinhaapenas o hábito demergulhar nos livros.

“Escrever exigesensibilidade, estar abertoao mundo, às pessoas e avocê mesmo”, revela.

Hoje, a autora costuma estudar muito eler – principalmente, sobre o ofício daescrita. Ela não confiava no seu potencialantes de vencer o concurso pela primeiravez, tanto que se inscreveu no último diae por insistência de um amigo. “O maisimportante para mim foi começar aacreditar no meu trabalho. Escrevia e nãomostrava para ninguém, achava queninguém iria se interessar”, salienta.

NOVIDADES NO TERCEIRO ANO

Uma nova categoria em disputa é agrande novidade para a 3a edição doprêmio. O lançamento da versão 2006 doúnico concurso voltado às letrasjoinvilenses está previsto para agosto e asinscrições devem prosseguir até outubro.Em breve, o regulamento será distribuídopela organização. Se quiser saber mais,ligue (47) 3455-1395.

Sai o livro do Prêmio de Expressão Literária

Carla Argolo, Simone Gehrke eClarice Siewert: as classificadasem contos/crônicas de 2005

Lançamento da obra foi na Feira do Livro: coletânea reúne melhores das duas primeiras edições

“Estão publicando o que geralmente ficaria escondido nas nossas gavetas.” Michelle Cristine Pahl, terceiro lugar em contos/crônicas na edição 2004