Revista Ufmg 19 Corpo

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Revista da UFMG sobre o tema Corpo

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    Volume 19 | Nmeros 1 e 2 | janeiro - dezembro 2012 | ISSN 2316-770X

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    Volume 19 | Nmeros 1 e 2 | janeiro - dezembro 2012 | ISSN 2316-770X

    ISSN 2316-770X

    Rev. UFMG Belo Horizonte v. 19 n. 1 e 2 p. 1242 jan. / dez. 2012

  • Cllio Campolina Dinizreitor

    Rocksane de Carvalho Nortonvice-reitora

    Ana Lcia Pimenta Starlingchefe de gabinete

    Mrcio Benedito Baptistapr-reitor de administrao

    Efignia Ferreira e Ferreirapr-reitora de extenso

    Antnia Vitria Soares Aranhapr-reitora de graduao

    Renato de Lima Santospr-reitor de pesquisa

    Joo Antonio de Paulapr-reitor de planejamento e desenvolvimento

    Ricardo Santiago Gomezpr-reitor de ps-graduao

    Roberto do Nascimento Rodriguespr-reitor de recursos humanos

    Valria de Ftima Raimundodiretora-geral do centro de comunicao

    Maurcio Alves Loureirodiretor do instituto de estudos avanados transdisciplinares

    conselho editorial: Carlos Antnio Leite Brando (EA/UFMG), Dbora dvila Reis (ICB/UFMG), Eliana de Freitas Dutra (FAFICH/UFMG), Heloisa Soares de Moura Costa (IGC/UFMG), Hugo E. A. da Gama Cerqueira (CEDEPLAR-FACE/UFMG), Ivan Domingues (FAFICH/UFMG), Jacyntho Lins Brando (FALE/UFMG), Joo Antonio de

    Paula (CEDEPLAR-FACE/UFMG), Marlia Andrs Ribeiro (C/Arte Projetos Culturais), Maurcio Jos Laguardia Campomori (EA/UFMG), Maurcio Alves Loureiro (Msica/UFMG), Ricardo Hiroshi Caldeira Takahashi (ICEX/UFMG)

    comisso editorial desta edio: Joo Antonio de Paula (CEDEPLAR-FACE/UFMG), Marlia Andrs Ribeiro (C/Arte Projetos Culturais), Maurcio Jos Laguardia Campomori (EA/UFMG), Heloisa Soares de Moura Costa (IGC/UFMG), Valria de Ftima Raimundo (FAFICH/CEDECOM)

    editor: Joo Antonio de Paula

    editor executivo: Danilo Jorge Vieira

    direo de arte: Marcelo Lustosa

    projeto grfico: Lo Ruas

    diagramao: Luciano Bata e Lo Ruas

    planejamento: Melissa Soares apoio tcnico: Lucilia Maria Zarattini Niffinegger

    reviso, normalizao dos originais e redao dos abstracts: Juliana Santos Botelho

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    Volume 19 | Nmeros 1 e 2 | janeiro - dezembro 2012 | ISSN 2316-770X

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    Volume 19 | Nmeros 1 e 2 | janeiro - dezembro 2012 | ISSN 2316-770X

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    Volume 19 | Nmeros 1 e 2 | janeiro - dezembro 2012 | ISSN 2316-770X

    ficha catalogrfica

    R 454 Revista da Universidade Federal de Minas Gerais. vol.15, 1965- Belo Horizonte : UFMG, 1965- v. : il. Anual de 1965-1969 A partir do v.19, n.1/2, 2012 passa ser semestral Ttulo anterior: Revista da Universidade de Minas Gerais,1929-1964. Inclui bibliografia. ISSN: 2316-770X 1. Ensino superior Peridicos. I. Universidade Federal de Minas Gerais.

    CDD: 378.405 CDU: 378

    Elaborada pela DITTI Setor de Tratamento da Informao Biblioteca Universitria da UFMG

  • No dia 26 de setembro, fomos colhidos pela triste notcia do falecimento de

    Affonso vila, que nos deixou, pgina 141, uma contribuio inestimvel

    de celebrao da vida. A ele tambm pertence esta revista.

  • 66

    joo antonio de paula

    A Revista da Universidade Federal de Minas Gerais

    jean-luc nancy58 Indcios sobre o Corpo

    editorialA Revista e o Corpo

    em Revista

    andr melo mendesA Transgresso do

    Corpo Nu na Fotografia

    maria ester macielCorpo, Imagem e Escrita

    marcos hillOnde est o Pnis?

    sandra regina goulart almeida

    Corpo e Escrita

    14

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    8

    sumrio

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    marco paulo rollaO Corpo da Performance

    affonso avila

    O Canto das guas

    fabiana dultra

    paola berenstein

    Corpo e Cidade

    cassio m. turra

    Os Limites do Corpo

    marlia andrs ribeiro

    Entrevista - Teresinha Soares Fiz do meu corpo minha prpria arte

    francisco csar de s barreto

    luiz paulo ribeiro vaz

    gabriel armando pellegatti franco

    O Universo Vivo

    christian jacob

    Retorno aos Lugares de Saber

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  • 9editorial

    A REVISTA E O CORPO EM REVISTA

    com grande satisfao que colocamos disposio dos leitores a mais nova edio da Revista da Universidade Federal de Minas Gerais, cuja circulao foi interrompida em 1969, deixando uma lacuna para quase duas geraes de pesqui-

    sadores e estudantes que, agora, comea a ser preenchida pela presente iniciativa de

    reiniciar a publicao deste importante veculo de divulgao cientfica e de reflexo

    terica. Resultado do trabalho de um grupo de professores da UFMG, que muito

    se beneficiou do apoio prestado pelo Instituto de Estudos Avanados Transdiscipli-

    nares (IEAT) e pelo Centro de Comunicao (Cedecom), o relanamento da revista

    representa um empreendimento que, para alm de propiciar espaos renovados

    imprescindvel atividade intelectual de anlise e de debate sobre questes premen-

    tes da atualidade, reafirma o compromisso da universidade com uma interveno

    na realidade contempornea balizada por diretrizes que rejeitam as cincias parcela-

    res em favor de uma prtica acadmica efetivamente inter e transdisciplinar a ser

    exercida nas pginas deste peridico de modo rotineiro, mediante o desenvolvimen-

    to de temticas que exigem abordagens, que articulam e fazem interagir os mais

    diversos campos do conhecimento. o caso, por exemplo, do objeto que orientou os

    textos ora apresentados: o corpo, que, dada a sua complexidade constitutiva, requer

    uma evidente narrativa multiforme, entremeada por distintas e sucessivas aproxi-

    maes que se completam mutuamente.

  • 10

    O artigo de abertura desta edio, que recria as fundaes de uma publicao to

    especial para todos ns, no poderia deixar de ser uma tentativa de empreender uma

    espcie de introspeco editorial; ou seja, de buscar conduzir o leitor por um percurso

    que lhe permita apreender a importncia (in)formativa das revistas, que se mantm

    intacta ao longo do tempo, a despeito das transformaes e da permanente adequao

    cobrada desse tipo de publicao aos contextos cambiantes que lhe circundam. O

    professor Joo Antnio de Paula realiza este esforo inicial, em um exame preciso que

    tem como ponto de partida a concepo bsica de que as revistas configuram uma

    sntese de sua prpria poca, qual servem como repositrio de todos os dilemas e

    anseios prevalecentes, deixando, assim, um testemunho perene dos dias correntes

    s geraes futuras. Diversas iniciativas so evocadas pelo autor a fim de atestar esta

    noo da revista como meio duradouro de registro do imanente: os Anais Franco-

    Alemes, que foram o suporte para a crtica inaugural economia poltica elaborada

    em bases cientficas renovadas por Marx e Engels; a LAnne Sociologique, de mile

    Durkheim, que contribuiu para a divulgao e a consolidao de um dos pilares da so-

    ciologia contempornea; a Les Temps Modernes, que colocou novas indagaes a respei-

    to da vida moderna em sociedade e contribuiu para firmar o nome de Sartre entre os

    grandes pensadores do sculo XX, so alguns exemplos ilustrativos arrolados, dentre

    outros. As experincias editoriais do Brasil, pas perifrico no qual a universidade e a

    impresso de livros e peridicos foram coibidas e apenas tardiamente estabelecidas,

    so tambm reavaliadas, compondo o pano de fundo para o resgate da origem e da

    trajetria da Revista da Universidade Federal de Minas Gerais, que circulou durante

    40 anos, entre 1929 e 1969, e acompanhou o processo de consolidao da instituio

    como centro de ensino, pesquisa e extenso de excelncia reconhecida nacional e in-

    ternacionalmente. Circunstanciado o itinerrio pretrito da Revista numa perspectiva

    histrica ampla, os textos seguintes so dedicados a desenvolver, sob prismas diversos

    e complementares, a temtica proposta aos articulistas convidados a contriburem

    com esta edio. O primeiro ensaio do filsofo francs Jean-Luc Nancy, que tenta

    inventariar alguns conceitos possveis para designar o corpo, mas consegue catalogar

    apenas provveis vestgios de noes fragmentadas porque, como ele mesmo levado

    a concluir, o corpo no possui uma totalidade nem unidade sinttica suscetvel de

    ser assimilada; algo impreciso e no identificvel, desnudando, assim, toda a sua

    mencionada complexidade e, mais do que isso, o seu inevitvel e necessrio trata-

    mento analtico inter e transdiscplinar, tal qual feito nas pginas subsequentes pelos

    demais autores.

  • 11

    Os prximos cinco artigos constituem um conjunto de grande uniformidade,

    detendo-se na anlise de como a sociedade contempornea, por meio de sua cultura

    e de seus hbitos estabelecidos, lida com essa estrutura fsica que d materialida-

    de espcie humana. Os professores Andr Melo Mendes e Maria Esther Maciel

    examinam expresses imagticas especficas para delas extrair formas alternativas

    atuais de interpretar o corpo. As obras sempre perturbadoras e polmicas dos fo-

    tgrafos Joel-Peter Witkin e Jan Saudek so avaliadas por Mendes, que sublinha o

    interesse transgressor desses dois artistas em retratar corpos que, em contraposio

    aos padres estticos dominantes, destoam em todos os sentidos. Suas fotografias

    so devotadas a expressar o abjeto, o feio, o disforme, antagonizando com as apa-

    rncias idealizadas da beleza esculpida com fatigantes exerccios fsicos, rduos

    regimes alimentares e minuciosas cirurgias plsticas. De modo contes-

    tador anlogo, situados no contrafluxo das tendncias hegemnicas, en-

    contram-se os trabalhos do cineasta Peter Greenaway, comentados

    por Esther Maciel, que demonstra como os filmes do criador brit-

    nico rejeitam o disseminado culto ao corpo como objeto de design

    e bem de consumo, seguindo uma longa tradio hertica que teve

    em suas fileiras expoentes como Sei Shonagon, uma referncia da

    literatura medieval japonesa, e Hildegard de Bingen, a santa mstica e

    visionria alem do sculo XII. Na mesma linha de sucesso rebelde

    podem ser includas as escritoras Mohja Kahf, libanesa radicada nos

    Estados Unidos; Ana Miranda, brasileira do Cear, e as indianas Arun-

    dhati Roy e Thrity Umrigar, que so revisitadas pela professora Sandra

    Regina Goulart Almeida, numa tentativa de compreender a representao

    que elas fizeram do corpo feminino em seus textos literrios, sob uma

    tica no convencional e desde um ponto de vista gendrado, nos quais

    aparece como lcus de uma resistncia muitas vezes silenciosa, mas no

    menos obstinadamente insubordinada contra condutas e comportamentos sociais

    arraigados que coisificam, idealizam, dominam e sujeitam a mulher em mltiplas

    dimenses. O professor Marcos Hill mantm a mesma entonao crtica, questio-

    nando a maneira habitual pretensamente pudica e assptica com que o corpo mas-

    culino figurado, reproduzido e cotidianamente tratado como destitudo de geni-

    tlia ou, ainda, incomodamente possuidor desse apndice, em acentuada distino

    da excessiva e costumeira erotizao do corpo feminino. Em complemento a muitos

    dos argumentos expostos, o artista plstico Marco Paulo Rolla demarca um ponto de

  • 12

    vista inapelvel na sua breve e incisiva discusso sobre a performance corporal arts-

    tica: o corpo humano e a nudez foi progressivamente desnaturalizado medida

    que a sociedade foi se complexificando tcnica e materialmente, com o que emergiu

    um sentimento difuso da imperfeio fsica, sujeita a todo tipo de reparos artificiais,

    mediante tcnicas de rejuvenescimento cada vez mais arrojadas e disseminadas.

    A apropriao do corpo pela arte, que perpassa as cinco intervenes anteriores,

    tratada, na sequncia, em seus fundamentos empricos, por assim dizer; em sua

    lgica concebida e praticada pelo prprio artista. Na entrevista feita pela historiadora

    Marlia Andrs Ribeiro, Teresinha Soares, uma ativa participante da arte contem-

    pornea brasileira nas dcadas de 1960/1970, comenta em detalhes algumas de

    suas mais importantes instalaes, objetos e happenings que tiveram o corpo como

    elemento, levando, assim, o leitor para dentro de seu laboratrio. Logo depois dessa

    reveladora conversa, a poesia de Affonso vila emerge como verdadeiro interldio,

    numa decantao da plena simbiose possvel entre a natureza e o homem, fundin-

    do o corpo e o seu entorno ambiental em algo uno e indivisvel. Este intermezzo

    lrico abre passagem para outros enfoques tericos embasados em duas categorias

    fundamentais em diversos campos do conhecimento: o espao e o tempo. Primei-

    ramente, as professoras Fabiana Dultra Britto e Paola Berenstein Jacques investi-

    gam a pouco explorada relao entre corpo e cidade. Em oposio viso vulgar da

    dinmica espacial e social urbana, que considera o corpo mero objeto subsumido,

    disposto ou inserido desarticuladamente nas cidades, elas aprofundam a ideia de

    corpografia para elucidar a existncia de mutualidades traduzidas numa cartografia

    corporal, em que cidade e corpo interagem e deixam, simultnea e reciprocamen-

    te, marcas indelveis uma no outro. Desta discusso centrada na espacialidade, o

    artigo seguinte dirige a ateno para a temporalidade finita e varivel do corpo.

    O professor Cssio Maldonado Turra se ocupa do fenmeno da longevidade, que

    ganhou flego recentemente em um grupo restrito de pases, principalmente entre

    as mulheres, com a ampliao da expectativa de vida em idades avanadas e, eviden-

    temente, com consequncias desafiadoras em termos sociais, econmicos e demo-

    grficos. Alm de atrair o interesse de pesquisadores de diversas reas disciplinares,

    a mudana veio convalidar a percepo de uma contnua e persistente elevao no

    prolongamento da vida, suscitando, assim, intenso debate a respeito dos limites

    etrios da existncia humana.

    Observado como fluxo gradativo e regular irrefrevel, o envelhecimento do cor-

    po evidencia um certo comeo e, assim, remete a um momento ancestral prvio

  • 13

    sua prpria constituio, no qual ainda se encontrava apenas latente nos elementos

    bsicos e fundamentais da vida, como explicam em mincias os professores Fran-

    cisco Csar de S Barreto, Luiz Paulo Ribeiro Vaz e Gabriel Armando Pellegatti

    Franco. Eles se ocupam desse instante longnquo e descrevem a dinmica do uni-

    verso, fornecendo subsdios para uma analogia inevitvel entre a sua evoluo e o

    corpo, ao demonstrar como o cosmos, tal como o homem, percorre uma trajetria

    processual contnua: ele tambm nasce e segue em curso expansivo; gera vidas que

    prosperam e se tornam crescentemente complexas; ou vidas que se interrompem

    e desaparecem; permanece em mudana ininterrupta, podendo entrar em desor-

    dem. Assim representado, o universo se assemelha a um corpo vivo em permanente

    mutao. Por fim, Christian Jacob, diretor da Lcole des Hautes tudes en Sciences

    Sociales (LEhess) e do Centre National de la Recherche Scientifique (CNRS), relata seu

    ambicioso e amplo programa de pesquisa dedicado a assentar as bases de uma an-

    tropologia histrica dos saberes humanos, cuja abrangncia extrapola o campo das

    cincias formais e codificadas, englobando igualmente os diferentes tipos de conhe-

    cimento: as humanidades, as tcnicas, a espiritualidade; o saber dos alfabetizados

    e tambm o dos iletrados, concebido como uma construo social de indivduos,

    comunidades e instituies; o saber inseparvel do saber-fazer, o que denota es-

    pecial importncia aos seus canais operatrios, entendidos genericamente como

    uma ordem repetida e lgica de gestos meticulosamente encadeados na produo

    de um conhecimento especfico, ou melhor, na produo de uma extensa variedade

    de artefatos objetivando os saberes. Nessa abordagem antropolgica, em que gesto

    e saber esto atados um ao outro, corpo e cincia, em sentido abrangente, apresen-

    tam-se geminados e, assim, esta ltima se torna prolongamento do primeiro: todo

    artefato, seja um texto, uma imagem, um objeto, guarda a memria e o trao das

    operaes mentais que os produziram, sentencia Christian Jacob. Aproveitamos

    essa citao para firmar nosso entendimento de que esta edio da Revista da Uni-

    versidade Federal de Minas Gerais, reinaugurando a trajetria de um importante

    veculo de reflexo e debate intelectual, uma expresso polifnica que preserva

    em si as singularidades de cada um dos autores, profissionais e instituies que se

    envolveram na sua preparao.

    Boa leitura!

    Comisso Editorial

  • Academic journals and scientific

    reviews have a long historical

    trajectory that goes way beyond

    the nineteenth centurys private

    dissemination of philosophical

    thinking and revolutionary ideals.

    Thus, this article accomplishes two

    main tasks: 1) it places the current

    retake of the Revista da UFMG

    within both a national and broader

    international historical framework;

    2) it shows how internal changes

    reflected specific aesthetic, social,

    political and moral questions in

    local scientific scenario.

    ABSTRACT

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  • 15rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.14-41, jan./dez. 2012

    joo antonio de paulaPr-Reitor de Planejamento e Desenvolvimento/Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)

    Professor Titular do Departamento de Cincias Econmicas e do Centro de Desenvolvimento e

    Planejamento Regional - Cedeplar/UFMG

    A REVISTA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS

    Introduo

    No seria possvel considerar em detalhe, neste texto, a decisiva importncia de revistas na vida poltica e cultural das sociedades. Busca-se aqui recons-tituir a histria de uma revista na vida de uma instituio universitria pblica, o

    que determina considerveis diferenas quando se a compara com as vicissitudes de

    revistas nascidas de motivaes de indivduos, grupos, partidos etc.

    De todo modo, em que pese s diferenas significativas, todas as revistas, pbli-

    cas ou no, fazem parte do complexo territrio que Jrgen Habermas chamou de

    esfera pblica. Com efeito, tanto jornais e revistas, quanto espaos pblicos e pri-

    vados abarcam a circulao de ideias, manifestaes artstico-culturais, de smbolos,

    valores, opinies, perspectivas, sensibilidades, conceitos, marcando os contextos

    nos quais surgem e so desenvolvidos (HABERMAS, 2003, p. 45).

    As revistas so snteses, aglutinaes de tendncias, de demandas, de desafios,

    de problemas. As revistas polticas e culturais so o repositrio do que cada poca

  • 16 rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.14-41, jan./dez. 2012

    vive, daquilo que ela deixa como testemunho, como especfico de sua experincia

    esttica, poltica, social e moral.

    Ainda que efmeras, no raro as revistas so manifestaes exemplares do

    quanto de novo, significativo e efetivamente marcante cada gerao, grupo e insti-

    tuio deixa como legado, como contribuio.

    Na histria do marxismo e do socialismo, tem particular importncia a revista

    Anais Franco-Alemes (Deutsch-Franzsische Jahrbcher), lanada em Paris, em 1844,

    na qual Karl Marx (1818-1883)1 e Friedrich Engels (1820-1895) iro publicar os tra-

    balhos inaugurais de uma nova concepo filosfica, terica e poltica, sintetizada

    na expresso crtica da economia poltica. Esta representava tanto uma ruptura para

    com as grandes tradies do pensamento burgus, quanto a firme adeso perspec-

    tiva da revoluo proletria (RUBEL, 1970).

    Seja no plano pessoal, no qual so fortes as idiossincrasias, seja no plano geral

    das escolhas e percepes coletivas, somos, decisivamente, marcados pelo que le-

    mos. E se o livro parece ter um compromisso com o permanente, com a continuida-

    de, a revista, sem ter a fugacidade do jornal, convoca o novo, solicita adeso, cobra

    urgncia, atualiza e desafia, reivindica, anuncia.

    Particularmente exemplar dessas caractersticas a revista russa Kolokol, palavra

    que pode ser traduzida como sino ou campainha e que d a perfeita ideia do

    que se quer defender aqui: a revista como chamada, como convocao, como aviso,

    como alerta, como mobilizao. No caso de Kolokol, a mobilizao da intelligentsia

    russa, em meados do sculo XIX, era contra a autocracia, contra o obscurantismo

    russo, reivindicando renovao esttica e cultural.

    Kolokol, fundada por Alexander Herzen (1812-1870) e Nicolai Ogarev (1813-

    1877), no foi capaz de aglutinar toda a intelligentsia russa, pois foi vista como po-

    liticamente moderada por correntes como as lideradas por Tchernichevski (1828-

    1889) e Bakunin (1814-1876). Estas iro se desdobrar nos movimentos populista e

    anarquista, que tero grande presena, a partir da segunda metade do sculo XIX,

    na vida russa (BERLIN, 1988; CARR, 1969).

    Certas revistas so decisivas representaes de seus tempos. assim que, na

    vida cultural francesa do sculo XX, fala-se de uma poca dominada pela Nouvelle

    Revue Franaise, fundada em 1909, e de sua figura central, Andr Gide (1869-1951);

    como se fala tambm da marcante presena de Les Temps Modernes, fundada em

    1945, e de seu grande nome, Jean Paul Sartre (1905-1980) (WINOCK, 2000).

    Em Portugal, a renovao, a atualizao poltico-cultural deu-se pela atuao de

    1 As datas de nascimento e falecimento de autores e editores das revistas sero indicadas quando possvel.

  • rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.14-41, jan./dez. 2012 17rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.14-41, jan./dez. 2012

    geraes que se sucederam a partir da chamada gerao de 1870, liderada por

    Antero de Quental (1842-1891); pela gerao dos chamados vencidos da vida, que

    tem Ea de Queiroz (1849-1900) como seu nome referencial; pela gerao sinteti-

    zada na figura de Antnio Srgio (1883-1969); pela gerao da revista Orpheu, cujo

    maior nome Fernando Pessoa (1888-1935).

    Estas geraes tiveram suas revistas:

    a Revista de Portugal, fundada em 1889

    por Ea de Queiroz; a revista Pela Grei,

    de 1918, dirigida por Antnio Srgio e

    precursora da revista Seara Nova, de 1921

    (SARAIVA; LOPES, s.d.). Tais publica-

    es, bem como os grupos que as edita-

    ram, so tributrios da decisiva lio de

    Antero de Quental na chamada Questo

    Coimbr, de 1865, e nas Conferncias do

    Cassino, de 1871, as quais marcaram a

    vida poltica e cultural de Portugal com

    um sopro renovador e mesmo revolu-

    cionrio (QUENTAL, 1973; REVISTA

    COLQUIOS/LETRAS, 1992; TORRES,

    1967).

    Em Portugal, o Modernismo surgiu

    com a revista Orpheu, lanada em 1915, e dirigida por Fernando Pessoa e Mrio de

    S Carneiro (1890-1916). A ela se seguiram as revistas Centauro, de 1916; Portugal

    Futurista, de 1917; Athena, de 1924; e Presena, de 1927 (PESSOA, 1960; SIMES,

    1954).

    frequente que os ttulos das revistas tenham um sentido programtico. Quan-

    do, em 1908, Endre Ady (1877-1919), o grande poeta hngaro, deu o nome de Nyu-

    gat (ocidente) revista que fundou, o que se buscava era renovar a vida intelectual

    hngara mediante uma firme abertura para a cultura ocidental. este, tambm, o

    propsito da Revista de Occidente, fundada em 1923, por Jos Ortega Y Gasset (1883-

    1955), em seu extraordinrio esforo de atualizar tanto a cultura hispnica quanto a

    hispano-americana, divulgando entre ns, no Brasil inclusive, autores decisivos da

    cultura germnica. Tm a mesma inteno programtica as revistas culturais argen-

    tinas Proa, fundada em 1922 por Jorge Luis Borges (1899-1986); a Martin Fierro,

    Se o livro parece ter um compromisso

    com o permanente, com a continuidade, a revista, sem ter a

    fugacidade do jornal, convoca o novo,

    solicita adeso, cobra urgncia, atualiza e desafia, reivindica,

    anuncia

  • 18 rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.14-41, jan./dez. 2012

    de 1924, fundada por Oliverio Girondo (1891-1967); e Sr, fundada, em 1931, por

    Victria Ocampo (1890-1979). Se Proa deu o sentido do movimento, Martin Fierro e

    Sr tambm buscaram a vanguarda, reivindicando o sul, a cultura local como funda-

    mento para a autntica renovao cultural argentina (DE TORRE, 1965).

    Essa mesma reivindicao do novo, da vanguarda literria manifestou-se em ou-

    tras revistas latino-americanas: a revista cubana Avance, de 1927, fundada por Juan

    Marinello (1898-1977); a revista mexicana Contemporneos, de 1928; a revista cuba-

    na Orgenes, de 1944-1956, dirigida por

    Jos Lezama Lima (1910-1976); as revis-

    tas mexicanas Taller, de 1938-1941, que

    teve Octavio Paz entre seus fundadores;

    Hijo Prdigo, 1943-1946; Plural, 1971;

    Vuelta, 1976. A revista peruana Amauta,

    fundada em 1926 por Jos Carlos Mari-

    tegui (1895-1930), representou o encon-

    tro das vanguardas literrias europeias

    com a cultura incaica, tomada como ins-

    trumento indispensvel para a constru-

    o de efetivo processo transformador,

    emancipatrio (MAINER BAQU, 1971;

    SCHWARTZ, 2008; PAZ, 1996).

    Na Alemanha, a revista Simplicissi-

    mus (1896-1906) foi a grande porta-voz

    da contestao ao burocratismo, militarismo, clericalismo e autoritarismo que de-

    ram a tnica do Imprio Guilhermino. A mesma disposio crtica e denunciadora

    vista nas revistas Der Sturm (A Tempestade), fundada em 1910, e Die Aktion (A

    Ao), de 1911, as quais foram veculos marcantes do movimento expressionista

    alemo (JOHANN; JUNKER, 1970).

    Cada poca, cada gerao escolhe suas revistas e os problemas que quer en-

    frentar. Assim, do ponto de vista poltico-cultural, o sculo XX foi tanto o tempo do

    Cahiers du Cinma como o da New Left Review. Foi tambm o tempo da renovao

    teolgica e filosfica representada pela revista LEsprit, fundada em 1932 por Em-

    manuel Mounier (1905-1950); e foi tambm o da revista The Criterion, fundada em

    1922 por T. S. Eliot (1888-1965). Esta ltima circulou at 1939, abrigando poetas e

    posies como as de W. H. Auden (1907-1973) e Stephen H. Spender (1909-1995),

    Cada poca, cada gerao escolhe

    suas revistas e os problemas que quer

    enfrentar. Assim, do ponto de vista

    poltico-cultural, o sculo XX foi tanto o tempo do Cahiers du Cinma como o da

    New Left Review

  • rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.14-41, jan./dez. 2012 19rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.14-41, jan./dez. 2012

    que em tudo divergiam do classicismo aristocratizante de seu fundador (CARPEAUX,

    1966, vol. VII). Outra publicao clebre a Revue des Deux Mondes, fundada em

    1829 por Franois Buloz (1803-1877), e que publicou todos os grandes nomes da

    literatura e cultura europeia por mais de cem anos.

    Como disse Perry Anderson, a influncia das revistas pouco est relacionada

    com a sua durao:

    O tempo de vida das revistas no diz nada sobre sua repercusso. Um punhado de

    nmeros e uma extino abrupta podem contar mais para a histria de uma cultura

    do que um sculo de publicao contnua. Em seus trs anos de vida, a Athenaeum

    colocou o romantismo alemo em rbita. Os fogos de artifcio da Revue Blanche, a pri-

    meira revista de uma vanguarda moderna, acenderam Paris somente por uma dca-

    da. A revista Lef fechou em Moscou depois de sete nmeros. E, no entanto, apesar de

    efmeras essas foram publicaes que estiveram no centro de renovaes estticas,

    filosficas e polticas. (ANDERSON, 2000, p. 7).

    Revistas cientficas e filosficas

    Vivemos numa poca em que o conhecimento cientfico veiculado, em gran-de parte, por revistas cientficas. tambm uma poca que valoriza, exal-tadamente, a velocidade; em que a busca do conhecimento novo, com finalidades

    utilitrias ou no, a regra e o instrumento da afirmao de prestgio e de acesso a

    recursos financeiros.

    Sobre isto, sobre a ditadura do publish or perish, tem-se escrito muito, seja para

    alertar para os inconvenientes de uma produo to hipertrofiada quantitativamente

    e irrelevante do ponto de vista qualitativo, seja para reconhecer os inegveis ganhos

    sociais decorrentes da expanso da pesquisa cientfica e tecnolgica, que vem cres-

    cendo vertiginosamente nas ltimas dcadas.

    Com efeito, desde 1665, ocorreram vrias revolues nos modos de produo e

    de difuso do conhecimento cientfico e tecnolgico, as quais resultaram na conso-

    lidao da universidade com perfil de pesquisa. Desde ento, surgiram: Le Journal

    ds Savans, na Frana; a Philosophical Transactions of the Royal Society, na Inglaterra;

    at as revistas lderes da divulgao cientfica contempornea, como a Nature, fun-

    dada em 1869 pela American Association for the Advancement of Science; e a Science,

    fundada em 1880 pelo professor Norman Lockyer, do Imperial College, na Inglaterra.

    A partir de 1810, com a fundao da Universidade de Berlim, teve incio a efetiva

  • 20 rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.14-41, jan./dez. 2012

    profissionalizao e institucionalizao da atividade cientfica e a constituio de

    sistemas nacionais de inovao. Estes ltimos foram definidos por Christopher

    Freeman como uma rede de instituies dos setores pblico e privado, cujas ati-

    vidades e interaes geram, impactam, modificam e difundem novas tecnologias

    (FREEMAN, 1987).

    Uma viso de conjunto da histria do desenvolvimento cientfico mundial aponta

    a existncia de centros e mudanas hegemnicas: da Itlia para a Inglaterra, na me-

    tade do sculo XVII, e da para a Frana na segunda metade do sculo XVIII, depois

    para a Alemanha por volta da metade do sculo XIX, e depois para os Estados Unidos,

    a partir dos fins da dcada de 1930. (BEN-DAVID, 1974, p. 257).

    O que importa destacar aqui que, desde meados do sculo XIX, a pesqui-

    luciano bata

  • rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.14-41, jan./dez. 2012 21rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.14-41, jan./dez. 2012

    sa cientfica, nas mais variadas reas, expandiu-se qualitativa e quantitativamente,

    ao mesmo tempo em que houve diversificao, especializao e fragmentao dos

    campos de conhecimento.

    So espantosos os avanos alcanados, a partir de meados do sculo XIX, pela ci-

    ncia alem no campo das cincias fsicas, agronmicas, biolgicas, da sade e das

    tecnologias: 1) em 1876, Robert Koch (1843-1910) descobriu o agente patognico do

    carbnculo, da tuberculose e do clera, transformando-se no fundador da bacteriolo-

    gia; 2) em 1890, Emil von Behring (1854-1917) desenvolveu o soro contra a difteria,

    criando, com isso, a soroterapia; 3) Paul Erlich (1854-1915) criou a quimioterapia; 4)

    Justus von Liebig (1803-1873) fundou a agroqumica moderna, impactando fortemente

    o desenvolvimento da produo agrcola; 5) em 1866, Werner von Siemens (1816-1892)

    descobriu o princpio da eletrodinmica e construiu sua mquina a dnamo; 6) em

    1913, Fritz Haber (1868-1934) e Carl Bosch (1874-1940) obtiveram amonaco a partir

    do nitrognio atmosfrico e do hidrognio, o que determinou mudana radical em toda

    a tcnica de procedimentos qumicos; 7) em 1876, Nikolaus August Otto (1832-1891),

    em Colnia, construiu uma mquina de mbolo movida por combustvel, para a qual

    introduziu, pela primeira vez, o sistema de quatro tempos, isto , o primeiro motor a

    gasolina; 8) entre 1893 e 1897, Rudolf Diesel (1858-1913) inventou e desenvolveu, em

    Augsburg, o motor que depois passou a levar o seu nome; 9) constituiu-se o ncleo

    da imagem cientfico-material do mundo do nosso tempo com os trabalhos de Max

    Planck (1858-1947), em 1900, sobre teoria quntica; os de Albert Einstein (1879-1955),

    em 1905 e 1916, sobre a teoria especial e geral da relatividade, respectivamente; bem

    como os trabalhos de teoria quntica, desenvolvidos entre 1925 e 1927 por Werner Hei-

    senberg (1901-1978); 10) em 1939, Otto Hahn (1879-1968) descobriu a fissibilidade do

    urnio (MASSOW, 1986, p. 10).

    Toda essa vigorosa produo cientfica foi vastamente veiculada em revistas cient-

    ficas, como Anais Matemticos, fundada em 1867; ou como Anais de Fsica, fundada em

    1889, a qual publicou, em 1905, os trabalhos fundamentais sobre a Teoria Especial da

    Relatividade, seguidos, em 1914-15, da Teoria Geral da Relatividade. J na revista Es-

    pao e Tempo (Raum und Zeit), editada na Universidade de Gtingen pelo matemtico

    russo Hermann Minkowsky (1864-1909), Einstein apresentou os fundamentos mate-

    mticos da teoria especial da relatividade (JOHANN; JUNKER, op. cit.).

    As impressionantes demonstraes de vitalidade da pesquisa cientfica e tecno-

    lgica contempornea so resultados concretos da vigncia de vigorosos sistemas

    nacionais de inovao que incluem, alm de universidades, institutos de pesquisa,

  • 22 rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.14-41, jan./dez. 2012

    museus, bibliotecas, centros de informao especializada e uma rede de publicaes

    cientficas.

    De fato, a expressiva liderana cientfica alem, alcanada entre a segunda me-

    tade do sculo XIX e a Primeira Guerra Mundial, no se limitou s cincias fsi-

    co-naturais. Foi tambm notvel a contribuio alem para a criao daquelas que

    Wilhelm Dilthey (1833-1911) chamou de cincias do esprito, influenciando a so-

    ciologia, a cincia poltica e a histria a

    partir de nomes como Max Weber (1864-

    1920), Werner Sombart (1863-1941) e

    Georg Simmel (1858-1918). Para estes, a

    revista Archiv fr Sozialwissenschaft und

    Sozialpolitik constituiu a grande refern-

    cia (WEBER, 1995, p. 282- 283).

    Archiv foi o veculo por excelncia da

    afirmao das cincias sociais alems,

    contempornea de esforos igualmente

    importantes das cincias sociais fran-

    cesas, representadas pela revista Anne

    Sociologique, a qual foi fundada por mi-

    le Durkheim (1858-1917) em 1896. No

    mesmo sentido, devem ser considerados

    os Annales de Gographie, fundados em

    1891 por Paul Vidal de La Blache (1845-

    1918), e que buscaram a integrao da

    geografia fsica geografia humana.

    A pesquisa histrica no sculo XIX

    teve extraordinrio florescimento, o que

    o levou a ser chamado de sculo da his-

    tria. De fato, de Leopold Von Ranke (1845-1886) a Jules Michelet (1845-1886), de

    Charles Darwin (1809-1882) a Karl Marx, a perspectiva histrica e a temporalidade

    se impuseram como dimenses inescapveis dos fenmenos naturais ou sociais.

    Na Frana, o debate terico e metodolgico sobre as especificidades da historiografia

    e do discurso sobre a histria foi travado por intermdio de trs revistas: a Revue His-

    torique, fundada em 1876 por Gabriel Monod (1844-1912), que adotou a perspectiva

    positivista na abordagem das questes histricas; a Revue de Synthse Historique,

    A vitalidade da pesquisa cientfica

    e tecnolgica contempornea

    resulta da vigncia de sistemas nacionais

    de inovao que incluem, alm de

    universidades, institutos de

    pesquisa, museus, bibliotecas, centros

    de informao especializada e uma rede de publicaes

    cientficas

  • rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.14-41, jan./dez. 2012 23rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.14-41, jan./dez. 2012

    fundada em 1900 por Henri Berr (1863-1954), que buscou articular a histria com

    outras cincias; e a revista Annales dhistoire conomique et sociale, fundada em 1929

    por Lucien Febvre (1878-1956) e Marc Bloch (1886-1944). Esta ltima revolucionou

    o fazer historiogrfico pela efetiva integrao da histria com as outras cincias so-

    ciais, pela superao da histria tomada como fenmeno essencialmente poltico

    e pela busca de uma perspectiva globalizante da histria, a qual deveria ser funda-

    mentalmente pensada a partir de problemas (NOVAIS; SILVA, 2011).

    Tambm complexo e diversificado foi o itinerrio da pesquisa em economia.

    Consolidada como disciplina especfica no final do sculo XVIII, a economia pol-

    tica experimentou, ao longo do sculo XIX, considervel diversificao com o sur-

    gimento de correntes que de modo algum caminharam para a convergncia, rivali-

    zando-se tanto terica, quanto metodolgica e ideologicamente. grande tradio

    da economia poltica clssica, protagonizada pelas obras de Adam Smith (1723-

    1790) e David Ricardo (1772-1823), sucederam-se correntes que tanto reivindicaram

    a tradio da economia poltica clssica, como os socialistas ricardianos, quanto as

    que a rejeitaram, como a chamada Escola Histrica Alem e a corrente chamada por

    Marx de Economia Vulgar. Em 1871 e 1874, W. S. Jevons (1835-1882), Karl Menger

    (1840-1921) e Lon Walras (1834-1910) criaram o que se chamou de Escola Neo-

    clssica ou Marginalista, com a importante contribuio de Alfred Marshall (1842-

    1924). Na virada do sculo XIX para o XX, a partir da obra de Thorstein Veblen

    (1857-1929), constituiu-se ainda a Escola Institucionalista. Nascida nesse contexto

    a crtica da economia poltica, desenvolvida por Marx e Engels, cujos propsitos so

    radicalmente disruptivos com relao ao prprio objeto da economia poltica, isto ,

    o modo de produo capitalista.

    Desde a segunda metade do sculo XIX, essas correntes vo experimentar ex-

    pressivos desdobramentos, transformaes e refinamentos tericos e metodol-

    gicos como resultado das transformaes do capitalismo. A Segunda Revoluo

    Industrial e a consolidao do capital monopolista, ocorrida com a expanso impe-

    rialista, iro impactar no conjunto do pensamento poltico e social e, em particular,

    na comunidade de economistas, que se expandiu e se diversificou por diversas ra-

    zes: pela exacerbao da perspectiva liberal, como o caso da chamada Escola Aus-

    traca de Economia, cujo exemplo maior a obra de Friedrich Hayek (1899-1965);

    pela consolidao da perspectiva que v a necessidade recorrente de interveno

    estatal sobre o funcionamento dos mercados capitalistas, como a posio de John

    Maynard Keynes (1883-1946); pela emergncia de variadas perspectivas, que acham

  • 24 rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.14-41, jan./dez. 2012

    indispensveis as polticas sistemticas e especficas que visam superao do de-

    senvolvimento econmico, como o caso da obra do grande economista brasileiro

    Celso Furtado (1920-2004).

    Todas essas correntes, bem como suas variantes, deram-se a conhecer e busca-

    ram afirmao por intermdio de debates travados, sobretudo, em revistas de eco-

    nomia. isso que explica, desde o sculo XIX, a expressiva quantidade e diversidade

    terica e ideolgica das revistas de economia. Uma das primeiras publicaes a se

    dedicar, especificamente, aos temas econmicos foi o Journal des conomistes. Fun-

    dado na Frana, em 1842, nele se agruparam fervorosos defensores da ordem capi-

    talista, como o caso emblemtico de Fredric Bastiat (1801-1850), conhecido como

    o terico das harmonias econmicas. Outra publicao importante no campo da

    economia, conquanto fora do mundo acadmico, a longeva porta-voz do liberalis-

    mo, The Economist, fundada em 1843 e ainda em circulao.

    Mais do que em qualquer outro campo das cincias sociais, a economia objeto

    de disputa permanente, de controvrsias e de polmicas que, por serem expresses

    de interesses e perspectivas de grupos e classes sociais, esto longe de caminharem

    para qualquer espcie de convergncia, de apaziguamento que significasse, por sua

    vez, a vitria de um paradigma e a imposio de uma poca de cincia normal,

    nos termos de Thomas Kuhn (KUHN, 1975). De fato, no campo da economia, em

    particular, e das cincias sociais, em geral, o que prevalece o conflito de perspec-

    tivas e a ausncia de consenso, o que no exclui a existncia de hegemonias. Elas

    tambm se manifestam fortemente na economia, como se pode ver, em grandes li-

    nhas, na sequncia de escolas hegemnicas que tm marcado o pensamento econ-

    mico nos ltimos 200 anos: classicismo, neoclassicismo, keynesianismo, etc.. Em

    grande medida, essas escolas tm tido os seus ncleos mais fortes na Inglaterra e

    nos Estados Unidos, no por acaso potncias lderes do desenvolvimento capitalista

    neste mesmo perodo.

    De um lado, so complexas as relaes entre a hegemonia de uma certa corrente

    de pensamento econmico e sua efetiva capacidade heurstica, isto , sua real capa-

    cidade de explicar a realidade econmica. De outro lado, a adeso ou no ao pensa-

    mento econmico hegemnico no garantia de melhor ou pior desempenho das

    economias reais dos pases, como se v no caso exemplar da Alemanha, que jamais

    absorveu nem o pensamento econmico clssico, nem o neoclssico (PARSONS,

    1967, p. 97), sem deixar de ser, contudo, a grande economia que tem sido desde a

    segunda metade do sculo XIX.

  • rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.14-41, jan./dez. 2012 25rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.14-41, jan./dez. 2012

    Para todos os efeitos, as hegemonias que se tm imposto no campo do pensamento

    econmico visam a legitimar estruturas de poder simblico, poltico, institucional e

    ideolgico, cujas manifestaes mais contundentes se expressam tanto na esmagadora

    maioria dos chamados prmios Nobel de economia, atribudos a praticantes do pensa-

    mento econmico hegemnico, como na acachapante predominncia e hipertrofia do

    prestgio das revistas acadmicas de economia ligadas a essas correntes. Este o caso da

    American Economic Review, fundada em 1911 e ligada a American Economic Association;

    do Economic Journal, fundado em 1891, ligado a Royal Economy Society; do Journal of

    Political Economy, fundado em 1892, na Universidade de Chicago; do Quarterly Journal

    of Economics, fundado em 1886, pela Harvard University Press; alm da Econometrica e

    da Review of Economic Studies, fundadas em 1933. Em um texto de 1971, John Fletcher

    (1971, p. 51) disse o seguinte: There are two outstanding prestige journals in econom-

    ics, journals in which all economists seek to have their papers published: American

    Economic Review and Economic Journal.

    Fale-se agora das revistas filosficas, destacando-se, inicialmente, duas. A pri-

    meira a Revue de Mtaphysique et Morale, fundada em 1893, que foi o grande ve-

    culo do debate filosfico na primeira metade do sculo XX. A segunda a revista

    La Crtica, dirigida por Benedetto Croce (1866-1952) a partir de 1903 e que teve a

    participao, durante certo tempo, de Giovanni Gentile (1875-1944), tendo sido um

    decisivo instrumento da luta poltico-ideolgica do ponto de vista do pensamento

    liberal europeu (DUJOVNE, 1968, p. 18).

    A produo filosfica no final do sculo XIX e incio do XX concentrou-se em

    poucos pases: Inglaterra, Estados Unidos, Alemanha, Itlia, Frana. Ela ainda era

    fortemente marcada pela filosofia escolstica e neoescolstica, a julgar pelas revis-

    tas Revue Thomiste, fundada em 1876; Revue Noscolastique de Philosophie, de 1898;

    Rivista di filosofia neoscolastica, de 1919; e Scholastik: Vierteljahresschrift fr Theologie

    und Philosophie, de 1926.

    Foram criadas revistas para acompanhar a produo filosfica corrente, como

    o Giornale Crtico della Filosofia Italiana, de 1920; o Bltter fr Deutsche Philosophie,

    de 1927; e revistas de filosofia no mbito anglo-saxo, como o Journal of Philosophy,

    de 1904; o Philosophial Review, de 1922; a Philosophy of Science, de 1934; e o Journal

    of the History of Ideas, de 1940. Registre-se ainda como importante exemplo de pers-

    pectiva cientfica interdisciplinar a revista La Pense (Revue du rationalisme moderne Arts.

    Sciences. Philosophie), fundada por Paul Langevin (1872-1946) em 1939.

    No se veja na ampla presena de revistas de pases do capitalismo central um

  • 26 rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.14-41, jan./dez. 2012

    indicador da ausncia de vida cultural significativa nos pases perifricos. De fato, a

    periferia do capitalismo foi matriz de significativo processo de atualizao poltico-

    cultural a partir do final do sculo XIX. O ponto de partida desse processo confunde-

    se com a emergncia do modernismo, palavra-movimento que nasceu do poeta

    nicaraguense Rubn Dario (1867-1916). Este influenciou, com o seu livro Azul, de

    1888, vrias correntes da renovao esttica na Amrica hispnica e na prpria Es-

    panha (ANDERSON, 1999). Essa tradio de divulgao da cultura erudita cosmo-

    polita na Amrica Latina confirmada pela colombiana Eco, Revista de cultura do

    occidente, fundada em 1957, em Bogot, e editada pela Librera Buchholz.

    As revistas no Brasil

    Sabe-se que a proibio da imprensa no Brasil, que vigorou at 1808, no impe-diu que ideias aqui circulassem, nem mesmo ideias contestadoras da ordem colonial e do Antigo Regime. De todo modo, somente aps 1830 que a vida cul-

    tural brasileira ser irrigada com a publicao regular de livros, revistas e jornais.

    No campo da literatura, a corrente que vai se reclamar fundadora de uma literatura

    nacional ser o romantismo. Seu rgo-manifesto ser a Nitheroy, Revista Brasiliense,

    impressa em Paris, em 1836, sob a direo de Francisco Sales Torres Homem (1812-

    1876), Domingos Jos Gonalves de Magalhes (1811-1882) e Manoel Jos de Arajo

    Porto Alegre (1806-1879). Do mesmo esforo de construo nacional, caracterstico

    do governo regencial, a criao, em 1838, do Instituto Histrico e Geogrfico Brasilei-

    ro. Sua revista foi lanada logo no ano seguinte, sob a direo do Cnego Janurio da

    Cunha Barbosa (1780-1846), sendo, certamente, a revista mais antiga em circulao

    no Brasil.

    A partir da segunda metade do sculo XIX so criadas, no Brasil, vrias revistas

    de entretenimento e cultura geral, dentre as quais se destacam: a Semana Illustrada,

    fundada por Henrique Fleiuss, e que circulou entre 1860 e 1876; a Revista Illustrada,

    dirigida por Angelo Agostini, com circulao entre 1876 e 1879; as revistas de Bor-

    dalo Pinheiro, O Besouro, em circulao entre 1878 e 1879, e Psit!!!, de 1877. Alm

    destas, temos a revista Rua do Ouvidor, que circulou entre 1898 e 1913; a Illustrao

    Brazileira, em circulao entre 1901 e 1959; O Malho, que circulou entre 1902 e

    1954; a Avenida, entre 1903 e 1905; o Tico-Tico, de 1905 a 1959; Fon Fon, de 1907

    a 1958. Tambm existiram Leitura para Todos, que comeou a circular em 1905; e

  • rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.14-41, jan./dez. 2012 27rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.14-41, jan./dez. 2012

    Careta, que circulou a partir de 1908, dentre muitas outras que marcaram geraes

    de leitores brasileiros (LIMA; RIBEIRO, 1992; VELLOSO, 2008).

    No campo das revistas literrias, a lista igualmente longa e diversificada. A

    Enciclopdia de Literatura Brasileira, organizada por Afrnio Coutinho e J. Galan-

    te de Souza, registra a existncia de mais de noventa revistas literrias no Brasil.

    No h propsito em listar todas elas, sendo suficiente a meno de algumas por

    seu significado para a vida cultural brasileira. Este o caso da Revista da Sociedade

    Phenix Litteraria, que circulou entre 1878 e

    1879; da Gazetta Litteraria, publicada entre

    1883 e 1884. Com o nome de Revista Bra-

    sileira foram publicadas no Brasil, desde

    1830, sete revistas, com destaque para os

    perodos de 1857-1861, 1879-1881 e 1895-

    1900. Tambm merecem registro: a Revista

    Americana, publicada entre 1909 e 1919; a

    Revista do Brasil, fundada em 1916, em suas

    diversas fases; e a Revista do Livro, rgo do

    Instituto Nacional do Livro, fundada em

    1956 (COUTINHO; SOUZA, 2001, v. 2).

    O movimento modernista buscou de-

    marcar suas diferenas com relao lite-

    ratura que lhe antecedeu graas criao de

    revistas como a Klaxon, de 1922/23, publi-

    cada pelos modernistas de So Paulo; a re-

    vista Esttica, editada no Rio de Janeiro por

    Srgio Buarque de Holanda (1902-1982) e

    Prudente de Morais Neto (1904-1977), en-

    tre 1924 e 1925; a Festa, do grupo moder-

    nista catlico, editada no Rio de Janeiro por

    Tasso da Silveira (1895-1968) e Andrade

    Murici (1895-1984) nas suas duas fases: de

    1926 a 1929; e de 1934 a 1935. Na primeira fase (1928-29), a Revista de Antropofagia,

    do grupo modernista de So Paulo, foi dirigida por Antnio de Alcntara Machado

    (1901-1935) e Raul Bopp (1898-1984). Em sua segunda dentio, conforme deno-

    minou Oswald de Andrade (1890-1954), a Revista de Antropofagia circulou como su-

    A proibio da imprensa no

    Brasil, que vigorou at 1808, no impediu que

    circulassem ideias contestadoras da ordem colonial e

    do Antigo Regime, mas somente aps 1830 que a vida cultural brasileira ser irrigada com a

    publicao regular de livros, revistas e

    jornais

  • 28 rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.14-41, jan./dez. 2012

    plemento do Dirio de So Paulo por 16 nmeros, isto , de maro a agosto de 1929.

    Tambm de primeira hora foi o modernismo mineiro e suas publicaes: A Re-

    vista, editada em Belo Horizonte entre 1925 e 1926, dirigida por Carlos Drummond

    de Andrade (1902-1987), Emlio Moura (1902-1971), Francisco Martins de Almeida e

    Gregoriano Canedo (1904-1968); a revista Verde, publicada em Cataguases, entre 1927

    e 1928, sob a direo de Enrique de Resende (1899-1973), Rosrio Fusco (1910-1977),

    Guilhermino Csar (1908-1993) e Francisco Incio Peixoto (1909-1986); a revista Elc-

    trica, editada em Itanhandu, entre 1926 e 1929,

    dirigida por Heitor Alves (1898-1935) e Heli Me-

    gale (1903-1982). Liste-se, ainda, o suplemento

    Leite Crilo, publicado pelo jornal Estado de Mi-

    nas, em 1929, dirigido por Guilhermino Csar

    (1908-1993), Joo Dornas Filho (1902-1962) e

    Aquiles Vivacqua (1900-1942) (DOYLE, 1976;

    WERNECK, 1992; RUFFATO, 2002).

    O nmero de janeiro-junho de 2008 da Re-

    vista do Arquivo Pblico Mineiro, que publicada

    desde 1896, traz um dossi sobre a histria da

    imprensa e da vida poltica e cultural de Minas

    Gerais. Nele, h um artigo sobre a primeira re-

    vista literria de Minas, o Recreador Mineiro, que

    circulou em Ouro Preto entre 1845 e 1848. Esta

    ltima abordou temas filosficos, histricos,

    de economia, direito, alm de publicar crtica

    literria, fico, poesia e divulgao cientfica

    (DRUMMOND, 2008).

    As geraes literrias mineiras que se seguiram ao modernismo tambm cria-

    ram revistas. Em 1946, foi criada a revista Edifcio cujo ttulo faz referncia a

    um poema de Carlos Drummond de Andrade , que reuniu parte considervel da

    intelectualidade de Belo Horizonte, herdeira da lio modernista, mas igualmente

    impactada pela Segunda Guerra Mundial e as transformaes e os desafios que se

    impunham ento. Edifcio foi a publicao que reuniu nomes que, mais tarde, se

    notabilizaram no cenrio cultural brasileiro, como Otto Lara Resende (1922-1992),

    Paulo Mendes Campos (1922-1991), Hlio Pellegrino (1924-1988), Fernando Sabi-

    no (1923-2004), Sbato Magaldi (1927-), Autran Dourado (1926-2012), Francisco

    As geraes literrias mineiras que se seguiram ao modernismo tambm criaram

    revistas. Em 1946, foi criada a revista Edifcio, reunindo nomes

    que, mais tarde, se notabilizaram no cenrio cultural

    brasileiro

  • rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.14-41, jan./dez. 2012 29rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.14-41, jan./dez. 2012

    Iglsias (1923-1999), Wilson de Figueiredo (1924-), entre outros nomes. De 1951

    a fundao da revista Vocao, por iniciativa de Rui Mouro (1929-), Fbio Lucas

    (1931-) e Fritz Teixeira de Sales (1917-1981). De 1956 a revista Complemento, que

    teve entre seus criadores nomes como Silviano Santiago (1936-), Ivan ngelo (1936-),

    Theotnio dos Santos (1936-), Ezequiel Neves (1935-2010). De 1957 a revista Ten-

    dncia, fundada por Affonso vila (1927-2012), Fbio Lucas (1931-), Rui Mouro, a

    qual se agregaram Maria Luiza Ramos (1926-), Las Correia de Araujo (1927-2006) e

    Affonso Romano de SantAnna (1937-). Nos anos 1960, surgiram outras importantes

    publicaes literrias em Minas Gerais, como as revistas Estria, Texto, Vereda, Ptyx,

    alm do Suplemento Literrio do Minas Gerais, lanado em 1966 (WERNECK, op. cit.).

    Registre-se ainda que, nos anos 1950, Belo Horizonte viu surgir duas revistas

    cinematogrficas: a Revista do Cinema, em 1954, publicada pelo Centro de Estudos

    Cinematogrficos e fundada por Cyro Siqueira (1930-), Guy de Almeida (1932-), Ja-

    cques do Prado Brando (1924-2007) e Jos Roberto Duque Novaes; e a Revista de

    Cultura Cinematogrfica, publicao da Unio de Propagandistas Catlicos, fundada

    em 1957 (OLIVEIRA, 2003).

    No s revistas com um apelo renovador, vanguardista foram editadas em Mi-

    nas Gerais no perodo aqui considerado, a exemplo das revistas Alterosa, lanada

    em 1939, e Acaiaca, que circulou a partir de 1948 (WERNECK, op. cit.). Lanada em

    1839, a Revista do Instituto Histrico e Geogrfico Brasileiro foi a primeira de uma srie

    de revistas que os institutos histricos regionais lanaram: o Instituto Archeolgico e

    Geographico Pernambucano lanou sua revista em 1863; o Instituto Histrico e Geo-

    graphico de So Paulo, em 1895. Em 1876, o Museu Nacional lanou a revista Archivos

    do Museu Nacional. Em 1858, apareceram os Anais da Academia Filosfica; em 1851, os

    Anais Meteorolgicos do Rio de Janeiro; em 1876, a Revista do Instituto Politcnico, do Rio

    de Janeiro; em 1881, os Annales de lObservatoire Imperial do Rio de Janeiro; tambm em

    1881, os Annaes da Escola de Minas de Ouro Preto; em 1885, a Revista das Estradas de Fer-

    ro. O Museu Paraense Emlio Goeldi lanou uma revista com o mesmo nome em 1894.

    Em 1866, foi lanada a Gazeta Mdica da Bahia, primeira publicao sobre medicina

    do Brasil. Em 1887, ligada Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, surgiu a revista

    Brazil Mdico, que publicada at hoje. Em 1909, apareceram as Memrias do Instituto

    Oswaldo Cruz, que em seu Tomo I, fascculo II, do mesmo ano publicou a extraordin-

    ria pesquisa de Carlos Chagas sobre a doena que acabou levando o seu nome. Entre as

    revistas publicadas pelas faculdades de Direito, a de Recife de 1870; a de So Paulo

    de 1893; e a de Minas Gerais, de 1894 (SCHWARCZ, 1993; LIMA; RIBEIRO, op. cit.).

  • 30 rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.14-41, jan./dez. 2012

    A partir dos anos 1930, o Brasil vai experimentar considervel intensificao dos

    processos de modernizao institucional, industrializao e urbanizao. Uma revista

    que captou pioneiramente as transformaes em curso e os desafios colocados para a

    sociedade brasileira, naquele contexto, foi a Anhembi, dirigida por Paulo Duarte (1899-

    1984) e que circulou entre os anos 1950 e 1960. Entre as pioneiras revistas cientficas

    brasileiras no campo esto o Boletim Geogrfico, editado pelo IBGE a partir de 1943; a

    Revista Brasileira de Economia (RBE), editada pela Fundao Getlio Vargas (FGV) do

    Rio de Janeiro a partir de 1948; a Revista de Histria, dirigida pelo professor Eurpedes

    Simes de Paula (1910-1977), da USP, a partir de 1950. Em 1966, apareceu a revista

    Dados, editada pelo Instituto Universitrio de Pesquisa do Rio de Janeiro (IUPERJ), vol-

    tada para os estudos de cincia poltica. Em 1988, o Centro de Pesquisa e Documen-

    tao de Histria Contempornea do Brasil/FGV-RJ passou a editar a revista Estudos

    Histricos. Em 1981, a Associao Nacional dos Professores Universitrios de Histria

    (ANPUH) passou a editar a Revista Brasileira de Histria.

    Os anos 1940/60 iro assistir ao surgimento de vrias revistas significativas no

    campo do debate cultural e das cincias sociais em geral. So revistas diferenciadas,

    sobretudo, por seus compromissos poltico-ideolgicos. Se, por um lado, Digesto Eco-

    nmico foi uma espcie de rgo oficial do pensamento empresarial paulista no campo

    cultural, particularmente no que se refere s questes econmico-sociais, por outro, a

    esquerda brasileira ir, nos anos 1950, criar revistas importantes: a Revista Brasiliense,

    dirigida por Caio Prado Jnior (1908-1991), que circulou entre 1955 e 1964; e a Estudos

    Sociais, revista ligada ao PCB que fora lanada em 1958, sob a direo de Astrogil-

    do Pereira (1890-1965). Em 1977, foi lanada a revista Temas de Cincias Humanas,

    organizada por Marco Aurlio Nogueira (1949-), Gildo Maral Brando (1949-), Jos

    Chasin (1937-1998) e Nelson Werneck Sodr (1911-1999). Em 1988, a Revista Presena

    foi lanada por um grupo de marxistas do Rio de Janeiro, liderado pelo professor Luiz

    Werneck Vianna (1935-).

    O golpe de 1964 significou, de imediato, a represso ao debate cultural brasileiro.

    Contudo, a esquerda brasileira deu resposta significativa ao criar, em 1965, a Revista

    Civilizao Brasileira, dirigida por nio Silveira (1925-1996) e, em 1966, a revista Paz

    e Terra, dirigida por Waldo A. Csar (1923-2007), que expressava o ponto de vista da

    esquerda catlica. Tambm no mbito do pensamento catlico, foi lanada, em 1974,

    a revista Sntese - Nova Fase, editada pelos jesutas. Em 1970, surge a Revista de Cultura

    Vozes, tambm ligada ao pensamento catlico.

    Igualmente significativa a Revista Tempo Brasileiro, fundada em 1963. Dirigida

  • rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.14-41, jan./dez. 2012 31rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.14-41, jan./dez. 2012

    por Eduardo Portella (1932-), ela teve entre seus colaboradores iniciais nomes como

    Igncio Rangel (1914-1994), Jesus Soares Pereira (1910-1974), Nelson Werneck So-

    dr, Maria Yedda Linhares (1921-2011), Jos Leite Lopes (1918-2006), Affonso Ro-

    mano de SantAnna (1937-), Haroldo de Campos (1929-2003), entre outros nomes

    de valor da nossa vida intelectual (REVISTA TEMPO BRASILEIRO, 2002).

    O quadro geral da cultura brasileira,

    sintonizado com o movimento pelas Re-

    formas de Base e com as transformaes

    sociais mais profundas da sociedade bra-

    sileira, foi profundamente alterado a par-

    tir de 1964. Ao clima geral de entusiasmo

    e urgncia dessas transformaes sociais,

    seguiu-se, primeiramente, a perplexidade

    e, logo depois, a convocao resistncia

    e luta contra a ditadura. Com o AI-5,

    em dezembro de 1968, houve mudana

    considervel no quadro geral, tanto no

    plano econmico, com o chamado mila-

    gre econmico, como no referente vida

    poltica e cultural, onde novas realidades

    se impuseram. Do ponto de vista de gran-

    de parte da esquerda, o AI-5 levou radicalizao da luta, com a efetiva adoo da

    luta armada. Para a direita, ncleo dirigente da ditadura, o AI-5 foi o incio de uma

    escalada repressiva brutal.

    Nos anos 1960 e 1970, iro surgir vrias iniciativas culturais importantes, do

    ponto de vista crtico e antiditatorial. Entre as iniciativas mais expressivas no campo

    editorial do perodo esto o lanamento do jornal O Pasquim, em 1969; do jornal

    Opinio, em 1972; da revista Estudos CEBRAP, tambm em 1972; da revista Debate e

    Crtica e Argumento, ambas em 1973; do jornal Movimento, em 1975; da revista Con-

    texto, em 1976; dos jornais Versus, Coojornal, O Bondinho, Em Tempo, entre outros.

    Apesar da censura, foram estas publicaes que, entre outras, promoveram o debate

    sobre as grandes questes nacionais e mundiais, funcionando tambm como ncle-

    os de aglutinao e de organizao de grupos polticos e intelectuais.

    O golpe de 1964 significou, de imediato, a

    represso ao debate cultural brasileiro.

    Contudo, a esquerda brasileira deu

    resposta significativa ao criar as revistas

    Civilizao Brasileira e Paz e Terra

  • 32 rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.14-41, jan./dez. 2012

    As revistas na UFMG

    A Revista da Universidade Federal de Minas Gerais circulou, com interrupes, entre 1929 e 1969, sendo registro importante e expressivo dos primeiros tempos da universidade e do longo, laborioso e complexo processo de sua consolida-

    o como instituio qualificada de ensino,

    pesquisa e extenso. Em suas pginas, em

    suas escolhas editoriais, nas transformaes

    que a Revista experimentou at se tornar

    efetivo veculo de difuso de produo cien-

    tfica, artstica e intelectual, possvel acom-

    panhar as vicissitudes de uma universidade

    fundada em 1927 pela aglutinao de quatro

    faculdades: Direito, Odontologia e Farm-

    cia, Medicina e Engenharia.

    Hoje, com o relanamento da Revista da

    UFMG aps uma longa hibernao, iniciada

    em 1969, oportuno, em vrios sentidos,

    reconstituir a sua histria. De fato, uma lei-

    tura criteriosa da revista permite reconsti-

    tuir momentos decisivos da consolidao da

    UFMG, da sua modernizao institucional,

    do aperfeioamento do seu projeto acad-

    mico. Este processo envolve tanto a efetiva

    implantao da pesquisa como dimenso

    essencial da universidade contempornea, como seu reiterado compromisso com

    o seu tempo, com as grandes questes que desafiam a nossa sociedade e sua plena

    emancipao.

    O nome Revista da UFMG de 1965, quando a Universidade de Minas Gerais

    (UMG), federalizada desde 1949, passou a se chamar Universidade Federal de Mi-

    nas Gerais. Criada em 1927 por iniciativa do governo do Estado de Minas Gerais, a

    UMG jamais foi uma universidade estadual, como podem fazer parecer sua origem

    e a ajuda que vrios governos estaduais lhe prestaram. De fato, a UMG nasceu como

    instituio livre, teve seus cursos equiparados aos cursos oficiais e suas faculdades

    reconhecidas, ao longo do tempo, at o momento da sua federalizao. s quatro

    A Revista da Universidade

    Federal de Minas Gerais circulou

    entre 1929 e 1969, sendo registro dos primeiros tempos da universidade e do processo de sua consolidao como instituio

    qualificada de ensino, pesquisa e

    extenso

  • rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.14-41, jan./dez. 2012 33rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.14-41, jan./dez. 2012

    faculdades iniciais, agregaram-se a Escola de Arquitetura, fundada em 1930 e incor-

    porada UMG em 02 de agosto de 1946; a Faculdade de Filosofia, fundada em 1939

    e incorporada em 30 de outubro de 1948; e a Faculdade de Cincias Econmicas,

    fundada em 1941 e incorporada em 17 de fevereiro de 1948.

    Foram incorporadas UMG, posteriormente, a Escola de Veterinria e o Con-

    servatrio Mineiro de Msica. Fundada em 1922, a Escola de Veterinria iniciou

    suas atividades em 1932, em Viosa, tendo sido transferida para Belo Horizonte,

    em 1942, para ser incorporada, respectivamente, a Universidade Rural do Estado

    de Minas Gerais, em 1948, e a UMG, em 30 de janeiro de 1961. Quanto ao Conser-

    vatrio Mineiro de Msica, ele foi fundado em 18 de maro de 1925 e incorporado

    UMG em 30 de novembro de 1962. A Escola de Enfermagem, fundada em 1933,

    foi federalizada e anexada Faculdade de Medicina da UMG, em 04 de dezembro

    de 1950. Em 1963, foram incorporados Reitoria da UMG os cursos de Belas Artes

    e Biblioteconomia e, em 1965, a Escola de Educao Fsica (BOLETIM INFORMA-

    TIVO, 1965).

    A primeira revista da UFMG anterior sua prpria criao. Fundada em 1892,

    a Faculdade Livre de Direito do Estado de Minas Gerais lanou a sua revista em 1894,

    editada sob a responsabilidade de uma comisso de redao composta por Joo Pi-

    nheiro da Silva (1860-1908), Sabino Barroso Jnior (1859-1919) e Augusto de Lima

    (1859-1934). Em seu primeiro nmero, alm do editorial, escrito pelo ento diretor

    da faculdade, Affonso Penna (1847-1909), a revista estampou os seguintes artigos:

    do poeta parnasiano Raymundo Corra (1860-1911) que estava morando em Ouro

    Preto em virtude da represso conduzida pelo Marechal Floriano Peixoto aos seus

    adversrios polticos , sobre a histria de Roma; de Bernardino de Lima (1856-1924),

    sobre a legislao de Minas; de Augusto de Lima, sobre estudos sociais; de Francisco

    Cato (1864-1926), sobre higiene e cincias sociais; de Sabino Barroso Jnior, sobre

    a liberdade; de Virglio Martins Melo Franco (1840-1922), sobre a formao da juris-

    prudncia; e de Levindo Ferreira Lopes (1844-1921), sobre o esboo de um projeto de

    cdigo de processo criminal. A ltima seo da revista chama-se Factos e Notas.

    O segundo nmero da revista saiu em 1895, sob a responsabilidade da mesma

    comisso de redao, e trouxe artigos de Gonalves Chaves (1840-1911), Affonso Pen-

    na, Camillo de Brito (1842-1924), Thomaz Brando (1854-1917), Thephilo Ribeiro

    (1843-1944), Raymundo Corra, Augusto de Lima e Affonso Arinos (1858-1916). Este

    ltimo foi responsvel por uma Memria Histrica da Faculdade Livre de Direito

    de Minas Gerais, referente aos anos letivos de 1892 e 1894. Escrito por um grande

  • 34 rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.14-41, jan./dez. 2012

    mestre da literatura , Arinos autor de Pelo Serto, obra-chave da literatura regio-

    nalista brasileira a memria da Faculdade de Direito constituiu o primeiro registro

    sistemtico da histria da UFMG.

    A revista da Faculdade de Direito foi a primeira de uma srie de revistas que as

    diversas unidades da UFMG lanaram. Em 1929, a Faculdade de Medicina lanou

    os Anais da Faculdade de Medicina. Em 1936, foi a vez dos Anais da Faculdade de

    Odontologia e Farmcia. A revista da Faculdade de Filosofia, Kriterion, foi lanada em

    1947. De 1949, so os Arquivos da Escola de Veterinria. Em 1952, apareceu a Revista

    da Faculdade de Cincias Econmicas. Em 1957, foi lanada a Revisa da Escola de Ar-

    quitetura e, em 1962, a Revista da Escola de Engenharia.

    Tanto no caso da Escola de Arquitetura quanto no caso da Escola de Engenharia,

    a publicao de artigos acadmicos relevantes nas respectivas reas deu-se, inicial-

    mente, nas revistas dos diretrios estudantis das duas escolas, constituindo veculos

    importantes na divulgao tcnica e cientfica nos anos 1940/50.

    Alm das revistas supramencionadas, que foram rgos oficiais de suas res-

    pectivas unidades acadmicas, surgiram e tiveram expressiva recepo nacional - e

    luciano bata

  • rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.14-41, jan./dez. 2012 35rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.14-41, jan./dez. 2012

    mesmo internacional - as seguintes publicaes: no mbito da Faculdade de Direito,

    a Revista Brasileira de Estudos Polticos foi lanada em 1956, sob a direo do profes-

    sor Orlando de Carvalho (1910-1998), e circula at hoje; ligada a Faculdade de Cin-

    cias Econmicas, a Revista Brasileira de Estudos Sociais, lanada em 1961 e dirigida

    pelo professor Jlio Barbosa (1920-2002).

    Registre-se, ainda, os jornais e revistas estudantis pela importncia poltica e cultu-

    ral que tiveram, sejam os editados pelo DCE, sejam os publicados pelos Diretrios Aca-

    dmicos. Impossvel reportar toda a rica produo cultural dos estudantes da UFMG.

    Entre as publicaes mais expressivas do Movimento Estudantil est a revista Mosaico,

    do DCE da UMG, lanada em 1959. Em seu primeiro nmero, publicou artigos de Sil-

    viano Santiago sobre a poesia de Carlos Drummond de Andrade; um conto de Ivan n-

    gelo; um artigo de Theotnio dos Santos Jnior sobre a Conferncia de Genebra; um

    artigo de Jos Nilo Tavares e Simon Schwartzman sobre o nacionalismo no Brasil; um

    artigo sobre teatro e sociedade de Haroldo Santiago, entre outros. O segundo nmero

    da revista Mosaico, lanado em maio de 1960, d conta de significativa radicalizao

    poltica do movimento estudantil, tendo um nmero centralmente dedicado a explici-

    tar a aliana operrio-estudantil nos seguintes termos: Na Aliana operrio-estudantil,

    realizada para o nacionalismo, o desenvolvimento e a libertao econmica do Brasil e

    das classes operrias, deveria estar a grande meta. (REVISTA MOSAICO, 1960, p. 3).

    Dentre as revistas de Diretrios Acadmicos, destaquem-se as publicaes

    do Centro Acadmico Afonso Pena. A revista Coluna, cujo primeiro nmero saiu

    em outubro de 1957, trouxe um artigo indito do grande escritor francs Georges

    Bernanos. A partir de 1961, o Centro Acadmico Afonso Pena lanou outra revista

    cultural, que se chamou Plural. O Diretrio Acadmico da Faculdade de Cincias

    Econmicas publicou, entre 1965 e 1968, dois nmeros da Revista de Estudos So-

    ciais (RES). Reunindo artigos de estudantes e professores, a revista impressiona,

    ainda hoje, pela alta qualidade de suas publicaes, a julgar pelos artigos que ela

    trouxe: de Antnio Octvio Cintra, o artigo Sociologia Cientfica Ftica, publicado

    no nmero 1, em maio de 1965; e de Vilmar Evangelista Faria, o artigo Sociologia:

    Cincia ou Ideologia?, publicado no nmero 2, maro-abril de 1968. Ambos so

    artigos importantes do debate que se travou ento no Brasil sobre aspectos terico-

    metodolgicos das cincias sociais, e que envolveu ainda outros nomes da filosofia e

    das cincias sociais brasileiras, como Jos Arthur Giannotti, Wanderley Guilherme

    dos Santos e Fbio Wanderley Reis.

    A histria da Revista da Universidade de Minas Gerais pode ser dividida em trs

  • 36 rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.14-41, jan./dez. 2012

    fases: a primeira, que vai de 1929 at 1943, a fase em que a revista funcionou

    como informativo oficial da vida da instituio, transcrevendo em sua parte geral:

    atos e decises de seus rgos deliberativos superiores; legislao e regulamentos;

    discursos de dirigentes e aulas magnas; pareceres e estudos sobre a vida universi-

    tria e alguns poucos artigos acadmicos ao lado de relatos institucionais das uni-

    dades acadmicas da universidade. A parte especial da revista era voltada para a

    crnica circunstanciada das unidades acadmicas que compunham a UMG. A se-

    gunda fase da revista, que vai de 1950 a 1955, um perodo de transio para a sua

    efetiva consolidao como revista acadmico-cientfica. Finalmente, a terceira fase,

    de 1962 a 1969, testemunha da consolidao da universidade, j consistentemen-

    te praticante de atividades de pesquisas que se desenvolviam em todas as reas de

    conhecimento. A Tabela 1 reporta o quadro geral da Revista.

    tabela 1 - A Revista da Universidade de Minas Gerais1929-1969

    volume /nmero tomos data nmero de pginas

    I 1929 519

    I II 1930 400

    III 1930 352

    II I

    II

    1932

    1933

    254

    148

    3 nico 1935 284

    4 nico 1936 176

    5 nico 1941 315

    VI nico* 1941/1942 263

    VII nico ** 1943 161

    8 nico maio 1950 166

    9 nico maio 1951 191

    10 nico *** maio 1953 261

    11 nico 1955 191

    12 nico jan. 1962 319

    13 nico jul. 1963 295

    14 nico set. 1964 209

    15 nico dez. 1965 271

    16 nico dez. 1966 328

    17 nico dez. 1967 237

    18 nico dez. 1968/69 284

    Fonte: Revistas da UMG 1929-1969

    * Circulou em 1943.

    ** Volume especial, edio comemorativa dos 50 anos

    da Faculdade de Direito

    *** Volume especial. Edio comemorativa dos 25 anos da Universidade de Minas

    Gerais.

  • rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.14-41, jan./dez. 2012 37rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.14-41, jan./dez. 2012

    A primeira comisso responsvel pela revista foi composta pelos professores

    Aurlio Pires (1862-1937), Lcio Jos dos Santos (1875-1944), Raphael Magalhes

    (1866-1928), Roberto de Almeida Cunha (1890-1958) e pelo estudante Paulo da

    Matta Machado.

    A Revista da UMG foi lanada em 1929 e seu primeiro volume, disposto em

    trs tomos, foi dividido em duas partes: Parte Geral e Parte Especial (REVISTA DA

    UNIVERSIDADE DE MINAS GERAIS, 1929). Da parte geral, tomo I, fazem parte

    cinco sees: 1) legislao e outros ofcios; 2) atas do Conselho Universitrio; 3) sole-

    nidades universitrias; 4) esboo histrico da Universidade de Minas Gerais, escrito

    pelo professor Aurlio Pires, da Faculdade de Medicina; 5) pareceres e trabalhos de

    interesse sobre o ensino superior, secundrio, normal e primrio no Brasil e em Mi-

    nas Gerais, incluindo-se a os regulamentos que disciplinavam o ensino em Minas

    nos nveis normal e primrio.

    Destaque-se, no tomo I da Revista da Universidade de Minas Gerais, lanado

    em 1929, o discurso do formando em Medicina, Pedro Nava, saudando a iniciati-

    va de criao da Universidade de Minas Gerais (REVISTA DA UNIVERSIDADE

    DE MINAS GERAIS, op. cit., p. 199-202). O tomo II, volume I, inclui, tambm,

    uma Parte Geral com seis sees e o incio da Parte Especial, trazendo: o hist-

    rico da Faculdade de Direito; a transcrio da conferncia do professor Sampaio

    Dria, intitulada O Problema Democrtico no Brasil; os discursos do paranin-

    fo e do bacharelando da turma de 1928; a memria histrica da Faculdade de

    Odontologia e Farmcia, escrita pelo professor Roberto de Almeida Cunha; e o

    artigo do professor E. de Paula Andrade, sobre tema de odontologia. Finalmente,

    o tomo III do volume I, Parte Especial, trata da histria da Escola de Engenharia

    e da Faculdade de Medicina, incluindo ainda a conferncia pronunciada pelo

    professor Eurico Villela sobre a ocorrncia da molstia de chagas nos hospitais

    de Belo Horizonte e na populao de seus arredores.

    O Tomo I do volume II da Revista foi publicado em 1932 e tem temtica mais

    variada, com artigos do professor Lcio dos Santos sobre engenharia; do professor

    Arthur Guimares, sobre vigas; do professor Otto Rotte, sobre qumica; do profes-

    sor Magalhes Drummond, sobre os rumos da sociedade brasileira; do professor

    Lcio dos Santos, reitor da UMG, sobre Goethe; dos professores Linneu Silva, Ildeu

    Duarte, C. Laborne Tavares e Dr. Paulo Elejalde, sobre a chamada Sndrome de Gar-

    cin; mais dois artigos do professor Lcio dos Santos e a traduo de um artigo de

    Paul Vanorden Shaw sobre Jos Bonifcio, o patriarca esquecido.

  • 38 rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.14-41, jan./dez. 2012

    luc

    ian

    o b

    at

    a

  • rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.14-41, jan./dez. 2012 39rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.14-41, jan./dez. 2012

    O tomo II, volume II, lanado em 1933, , novamente, uma crnica das unida-

    des acadmicas da UMG. O tomo III, publicado em 1935, volume nico, transcreve

    as Atas das Sesses do Conselho Universitrio da UMG, de 24 de novembro de 1927

    at 30 de maro de 1935; ao final, ele traz trs artigos de natureza jurdica, de autoria

    do professor Francisco Brant, e a transcrio das aulas inaugurais dos cursos de

    1933, 1934 e 1935. O volume 4, de 1936, transcreve aulas magnas universitrias e

    atas de reunies do Conselho Universitrio, do perodo de 06 de julho de 1935 a 18

    de novembro de 1936. O volume 5, lanado em 1941, reporta dados referentes aos

    corpos discente e docente das unidades acadmicas da UMG, transcrevendo aulas

    magnas, discursos e atas do Conselho Universitrio de 1 de fevereiro de 1937 a 22

    de maio de 1940.

    Os volumes VI e VII, de 1941/42 e 1943, respectivamente, no alteraram nem a

    forma nem o perfil temtico da Revista, que continuou enfatizando a publicizao

    de atos e aspectos internos da vida da instituio, com pequena presena de mat-

    rias propriamente acadmicas.

    Outro o quadro com os volumes 8, 9, 10 e 11, publicados, respectivamente,

    em 1950, 1951, 1953 e 1955. Eles correspondem ao que se chamou aqui de segunda

    fase da Revista da UMG, na qual h efetiva inflexo no sentido de sua transformao

    em rgo de divulgao cientfica. Sob a responsabilidade de uma comisso formada

    pelos professores Oscar Versiani Caldeira, Francisco de Assis Castro e pelo estudan-

    te Olavo Jardim Campos, e tendo como redator tcnico o professor Eduardo Frieiro

    (1889-1982), o volume 8 da revista, publicado em maio de 1950, apresenta mudana

    de forma e de contedo ao publicar oito artigos cientficos e mais trs textos: o dis-

    curso de posse do Reitor Octvio de Magalhes, uma saudao escritora Carolina

    Nabuco e um necrolgio do professor Alfredo Balena. Os artigos versaram temas de

    filosofia, biologia, matemtica, literatura, educao, medicina e histria. No volume

    9, de maio de 1951, h artigos de medicina, agronomia, matemtica, artes plsticas,

    histria, fsica, geologia e filologia. O volume 10, de maio de 1953, foi dedicado s

    comemoraes dos 25 anos de fundao da Universidade de Minas Gerais, com arti-

    gos retratando cada uma das unidades acadmicas e aspectos gerais da universidade.

    A parte final da revista traz quatro artigos sobre os seguintes temas: a literatura de

    Machado de Assis; a teoria do conhecimento; a desertificao de Minas Gerais; os

    cidos nucleicos. O volume 11 da Revista, de 1955, retoma a linha iniciada em 1950 de

    publicao de artigos cientficos. A Tabela 2 apresenta o quadro geral da distribuio

    temtica das matrias publicadas pela revista, de 1950 a 1969.

  • 40 rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.14-41, jan./dez. 2012

    tabela 2 - Distribuio dos artigos publicados por reas do conhecimento 1950-1969

    rea 1950 1951 1953 1955 1962 1963 1964 1965 1966 1967 1968/69 total

    1.artes plsticas 1 1 1 1 4

    2. administrao pblica 1 1

    3. agronomia 1 1

    4. arqueologia 1 1

    5. biologia 2 1 1 1 1 1 7

    6. demografia 1 1 2

    7. direito 2 1 1 4

    8. economia 2 1 3

    9. educao 2 1 1 1 2 1 1 2 11

    10. engenharia 1 2 1 4

    11. farmcia 1 1

    12. filologia 4 1 1 1 7

    13. filosofia 1 1 1 3 1 1 2 1 11

    14. fsica 1 1 1 3

    15. folclore 1 2 1 4

    16. geografia 1 1

    17. geologia 1 1

    18. histria 3 1 1 1 1 1 1 9

    19. literatura 1 1 1 2 3 2 3 2 3 18

    20. matemtica 1 1 2 1 5

    21. medicina 1 1 2 1 1 6

    22. meio ambiente 1 1

    23. minerao 1 1

    24. nutrio 1 1 2

    25. odontologia 1 1

    26. patrim. hist. art. 1 1

    27. pesq. cient. 1 1 2

    28. psicanlise 1 1

    29. psicologia 1 1 2

    30. psiquiatria 1 1 2 1 1 6

    31. sociologia 1 1

    32. teatro 1 1

    33. urbanismo 2 2

    total 11 11 5 11 16 13 11 13 10 13 10 124 Fonte: Revistas da Universidade de Minas Gerais. 1950-1969.

  • rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.14-41, jan./dez. 2012 41rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.14-41, jan./dez. 2012

    Aps nova interrupo, de 1955 a 1962, a revista voltou a circular com novo pro-

    jeto grfico e efetiva consolidao como rgo de divulgao cientfica de uma uni-

    versidade que se modernizava e se aperfeioava. O nmero 12 da revista saiu em ja-

    neiro de 1962, sob a responsabilidade de uma comisso composta pelos professores

    Jos de Faria Tavares, Marino Mendes Campos e do estudante Edilson de Almeida

    Jpiter. Entre 1962 e 1968/69, a Revista circulou regularmente, com a publicao

    de um nmero por ano. Nos dois ltimos nmeros, 17 e 18, publicados, respecti-

    vamente, em dezembro de 1967 e dezembro de 1968/69, a responsabilidade pela

    publicao passou a ser dividida entre uma Comisso da Revista, composta por

    dois professores e um estudante, e uma Comisso de Redao, composta por dois

    professores e pelo jornalista Plnio Carneiro.

    Por ser a Revista da UFMG uma revista de interesse geral, no cabia reportar os

    avanos cientficos especficos das diversas reas do conhecimento. Ainda assim,

    ela um expressivo registro do processo de amadurecimento e complexificao das

    atividades de ensino, pesquisa e extenso na UFMG, como se pode ver nos 124 arti-

    gos publicados em 33 reas do conhecimento.

    Em termos gerais, a generalizao da pesquisa nas universidades brasileiras re-

    sultado da implantao da ps-graduao a partir dos anos 1970. Contudo, antes disso,

    e em perspectiva avanada, a UFMG j vinha desenvolvendo considervel atividade de

    pesquisa em variadas reas do conhecimento, fruto do pioneirismo e da excelncia de

    alguns de seus professores e pesquisadores. Estes anteciparam a implantao da pes-

    quisa na UFMG tanto em reas consolidadas como arquitetura, engenharia, fsica, bio-

    logia, letras, filosofia, histria, economia e cincias sociais, como em reas de fronteira,

    como se v no artigo sobre meio ambiente, de 1955, e em dois artigos sobre pesquisa

    cientfica, publicados em 1963 e 1964.

  • A b odys material. A body isnt empty. Its full of other bodies. Its also full of itself. A bodys immaterial. Its a drawing, a contour, an idea. The body is also a prison for the soul. The bodys a prison, or a god. Why indices? Because theres no totality to the body, no synthetic unity. There are pieces, zones, fragments. Why 58 indices? Because 5 + 8 = the members of the body, arms, legs and head, and the the eight regions of the body: the back, the belly, the skull, the face, the buttocks, the genitals, the anus, the throat.

    ABSTRACT

    da

    nie

    l d

    e c

    ar

    valh

    o

  • 43rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.42-57, jan./dez. 2012

    jean-luc nancyProfessor de Filosofia/Universidade de Strasbourg

    Professor convidado das Universidades de Berlim e Berkeley

    Traduo de Srgio Alcides

    Professor Adjunto da Faculdade de Letras/Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)

    58 INDCIOSSOBRE O CORPO*

    1. O corpo material. denso.

    Impenetrvel. Se

    o penetram, fica

    desarticulado,

    furado, rasgado.

    Primeira verso escrita para a revista portuguesa Revista de Comunicao e Lingua-gens, n. 33, Lisboa, 2004. Texto publicado em Montreal, em 2004, pelas edies Nota Bene, jun-tamente com um texto de ginette Michaud, intitulado Appendice. [N. do A.]

    2. O corpo ma-terial. Fica parte.

    Distingue-se dos

    outros corpos.

    Um corpo comea

    e termina contra

    outro corpo. At o

    vazio uma esp-

    cie muito sutil de

    corpo.

    3. Um corpo no vazio. Est cheio

    de outros corpos,

    pedaos, rgos,

    peas, tecidos,

    rtulas, anis,

    tubos, alavancas

    e foles. Tambm

    est cheio de si

    mesmo: tudo o

    que .

    4. Um corpo longo, largo, alto

    e profundo: tudo

    isto em tamanho

    maior ou menor.

    Um corpo se

    estende. Cada lado

    seu toca outros

    corpos. Um corpo

    corpulento, mes-

    mo se for magro.

    5. Um corpo imaterial. um

    desenho, um con-

    torno, uma ideia.

    * Traduo a partir de J.-L. Nancy, 58 indices sur le corps. (In: ___. Corpus. Ed. revista e aumentada. Paris: Mtaili, 2006, p. 145-162). [N. do T.]

  • 44 rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.42-57, jan./dez. 2012

    6. A alma a forma de um corpo organizado, diz Aristte-les. Mas o corpo justamente o que desenha essa forma. a

    forma da forma, a forma da alma. 7. A alma se estende por toda parte atravs do corpo, diz Descartes, est

    inteira por toda parte, ao longo dele,

    nele mesmo, insinuada nele, deslizan-

    te, infiltrada, impregnante, tentacular,

    insufladora, modeladora, onipresente.

    8. A alma material, de uma matria toda outra, uma matria que no tem

    nem lugar nem tamanho nem peso.

    Mas material, muito sutilmente. As-

    sim ela escapa vista.

    9. O corpo visvel, a alma, no. Vemos que um paraltico no pode mexer sua perna direito. No vemos que um homem mau no pode mexer sua alma direito: mas devemos pensar que isto

    o efeito de uma paralisia da alma. E que preciso lutar contra ela e obrig-la a obedecer. Eis a o

    fundamento da tica, meu caro Nicmaco.

    10. O corpo tambm uma priso para a alma. Ela expia nele uma pena cuja natureza no fcil

    de discernir, mas que foi bem grave. por isso

    que o corpo to pesado e to incmodo para a

    alma. Precisa digerir, dormir, excretar, suar, sujar-

    se, ferir-se, adoecer.

    11. Os dentes so as grades da janela da priso. A

    alma escapa atravs da boca,

    em palavras. Mas as palavras

    ainda so eflvios do corpo,

    emanaes, leves dobraduras

    do ar que vem dos pulmes e

    aquecido pelo corpo.

  • rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.42-57, jan./dez. 2012 45rev. ufmg, belo horizonte, v.19, n.1 e 2, p.42-57, jan./dez. 2012

    12. O corpo pode se tornar falante, pensante,

    sonhante, imaginante. Sente

    o tempo todo alguma coisa.

    Sente tudo o que corpreo.

    Sente as peles e as pedras,

    os metais, as ervas, as guas

    e as chamas. No para de

    sentir.

    13. No entanto, quem sente a alma. E a alma sente, primeiro, o corpo. Ela o sente de todas as

    partes, contendo-a e retendo-a. Se ele no a reti-

    vesse, toda ela escaparia em palavras vaporosas

    que se perderiam no cu.

    14. O corpo como um puro esprito: contm-se todo a si mesmo e em si mesmo, num s ponto. Se esse ponto rompido, o corpo morre. um ponto situado entre os dois olhos, entre as costelas, no meio

    do fg