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XII Encontro Regional da ABEM Centro-Oeste 2012 / I Seminário de Educação Musical no DF / I Encontro Música PIBID e Prodocência do Centro-Oeste - Anais Fatores que influenciam a leitura à primeira vista do violonista Ricardo Arôxa Universidade Federal da Paraíba - [email protected] Resumo: O presente trabalho faz parte de uma pesquisa de mestrado em Educação musical e objetiva refletir sobre os fatores que interferem na fluidez da leitura à primeira vista do violonista, tais como o idiomatismo do instrumento, a habilidade em si dentre outros, relacionados à formação do violonista. Para tanto, utilizarei a partitura como padrão de escrita, e pretendo trazer para a discussão autores da literatura ligados à psicologia musical, educação musical, pedagogia do violão, e minha experiência como instrumentista e professor. Percebeu-se que algumas práticas “conservatoriais” ainda exercem influência sobre esse contexto, dificultando com isso o processo de ensino e aprendizagem da leitura à primeira vista do violonista. Palavras-chave: leitura à primeira vista, violão, preparação da performance, ensino de instrumento. 1. Introdução O contexto de ensino de instrumento tem encontrado em pesquisas científicas um meio eficaz de refletir suas práticas pedagógicas, objetivando uma melhor formação de instrumentistas com as competências necessárias às demandas do mercado de trabalho, seja em performance ou ensino. Em ambos os campos de atuação, essas pesquisas apontam para a construção de um profissional consciente e reflexivo, com ferramentas didáticas eficazes na resolução de problemas e otimização do processo de apropriação da música, concepção da interpretação e comunicação da arte. Em se tratando de violão, instrumento essencialmente solista, essa demanda pode exigir a preparação equilibrada de diversos repertórios, consciência estética e expressiva, e um bom condicionamento técnico. Todavia a crescente inserção deste em grupos de câmara tem configurado um importante campo de atuação, ao passo que exige, além destes aspectos, uma agilidade na preparação da performance. Uma importante ferramenta para otimizar essa preparação é a leitura à primeira vista, embora seja uma das habilidades menos valoradas na formação do violonista. A maioria dos professores acredita que apenas o tempo e a prática de ler grandes quantidades de música podem levar o aluno a um bom estágio de desenvolvimento da leitura, e, quando questionados, alegam que o violão naturalmente oferece peculiaridades que dificultam a fluência na tarefa da leitura. O presente trabalho faz parte de uma pesquisa de mestrado em Educação musical e objetiva refletir os fatores que influenciam a fluidez da leitura deste instrumentista neste tipo de tarefa, seja de ordem físico-idiomática do instrumento, da escrita ortocrônica (partitura), da

Ricardo Arôxa - Fatores Que Influenciam a Leitura a Primeira Vista Do Violonista

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Ricardo Arôxa - Fatores Que Influenciam a Leitura a Primeira Vista Do Violonista

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  • XII Encontro Regional da ABEM Centro-Oeste 2012 / I Seminrio de Educao Musical no DF / I Encontro Msica PIBID e Prodocncia do Centro-Oeste - Anais

    Fatores que influenciam a leitura primeira vista do violonista

    Ricardo Arxa Universidade Federal da Paraba - [email protected]

    Resumo: O presente trabalho faz parte de uma pesquisa de mestrado em Educao musical e objetiva refletir sobre os fatores que interferem na fluidez da leitura primeira vista do violonista, tais como o idiomatismo do instrumento, a habilidade em si dentre outros, relacionados formao do violonista. Para tanto, utilizarei a partitura como padro de escrita, e pretendo trazer para a discusso autores da literatura ligados psicologia musical, educao musical, pedagogia do violo, e minha experincia como instrumentista e professor. Percebeu-se que algumas prticas conservatoriais ainda exercem influncia sobre esse contexto, dificultando com isso o processo de ensino e aprendizagem da leitura primeira vista do violonista. Palavras-chave: leitura primeira vista, violo, preparao da performance, ensino de instrumento.

    1. Introduo

    O contexto de ensino de instrumento tem encontrado em pesquisas cientficas um meio eficaz de refletir suas prticas pedaggicas, objetivando uma melhor formao de instrumentistas com as competncias necessrias s demandas do mercado de trabalho, seja em performance ou ensino. Em ambos os campos de atuao, essas pesquisas apontam para a construo de um profissional consciente e reflexivo, com ferramentas didticas eficazes na resoluo de problemas e otimizao do processo de apropriao da msica, concepo da interpretao e comunicao da arte.

    Em se tratando de violo, instrumento essencialmente solista, essa demanda pode exigir a preparao equilibrada de diversos repertrios, conscincia esttica e expressiva, e um bom condicionamento tcnico. Todavia a crescente insero deste em grupos de cmara tem configurado um importante campo de atuao, ao passo que exige, alm destes aspectos, uma agilidade na preparao da performance.

    Uma importante ferramenta para otimizar essa preparao a leitura primeira vista,

    embora seja uma das habilidades menos valoradas na formao do violonista. A maioria dos professores acredita que apenas o tempo e a prtica de ler grandes quantidades de msica podem levar o aluno a um bom estgio de desenvolvimento da leitura, e, quando questionados, alegam que o violo naturalmente oferece peculiaridades que dificultam a fluncia na tarefa da leitura.

    O presente trabalho faz parte de uma pesquisa de mestrado em Educao musical e objetiva refletir os fatores que influenciam a fluidez da leitura deste instrumentista neste tipo de tarefa, seja de ordem fsico-idiomtica do instrumento, da escrita ortocrnica (partitura), da

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    habilidade em questo, ou mesmo pertinente formao do violonista. Para tanto pretendo trazer para a discusso minha experincia como instrumentista e professor, e autores da literatura ligados psicologia musical, educao musical, e pedagogia do violo.

    2. Fundamentao terica

    Imaginemos uma situao de dilogo: - O que voc faz da vida? - Eu toco violo [ou qualquer outro instrumento]. - Ah, ento voc msico? - No. Eu no sei ler partitura, apenas toco violo. Existe algo cultural que de alguma forma parece legitimar a habilidade de ler e entender uma escrita para considerar algum msico. Neste sentido John Sloboda, autor da psicologia musical, sugere:

    A habilidade de ler em uma lngua nativa , na maioria das culturas, uma quase essencial qualificao para se integrar completamente como membro da sociedade. Consequentemente, a ateno devota leitura por parte de educadores e psiclogos tem sido imensa. A habilidade de ler msica , se no essencial, um bem insubstituvel para quem pretende se entregar em uma atividade musical. (SLOBODA, 2005, p.4)

    Em outras palavras, para um msico por formao, esta habilidade to bsica quanto necessria socializao entre pares, mas o nvel de fluidez que sua leitura tem, pode indicar reconhecimento e, por sua vez, mais garantia de trabalho. No queremos dizer aqui que a leitura de msica por partitura imprescindvel para ser ou tornar-se msico profissional, porque o prprio sentido de profissionalizao em msica pode ser questionvel. Sabe-se que existem diversos contextos em que o msico atua e que o suporte de escrita constitui-se como meio de comunicao entre pares. Para boa parte dos gneros populares de cano, a cifra atende suficientemente bem proposta de abreviar os acordes do acompanhamento. Em outros casos, as habilidades de tocar de ouvido e improvisar, como em rodas de Choro, podem comunicar a arte sem suporte algum de escrita. E se levarmos em conta a utilizao da msica em outros contextos e culturas, at mesmo o seu sentido e funo mudam, mas essa discusso foge proposta do trabalho. Todavia, no contexto da formao de msicos para atuarem em salas de concerto esse suporte de escrita (partitura) de extrema importncia, e nesse palco que ocorrer a discusso.

    A leitura primeira vista ainda entendida com amplo sentido dentre os pesquisadores. Enquanto Gabrielsson (2003) a compreende como performance de uma partitura sem nenhum pratica precedente desta no instrumento, ou tocar a prima vista (p.243), porm concordo mais com a opinio de Lehmann e McArthur:

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    Poderia se limitar a descrio de leitura primeira vista em algo que requer que a msica seja fisicamente tocada (gesticulada, que soe suave ou de outra forma) em um andamento aceitvel e com expresso apropriada, assim, excluindo a mera decifrao da notao, especialmente com o tedioso e lento tatear das notas [...]. (LEHMANN; MCARTHUR, 2002, p. 135)

    Thompson e Lehmann (2004) descrevem que a leitura primeira vista enquanto processo cognitivo pode ser dividida em trs etapas consecutivas: (1) percepo da notao; (2) processamento da notao; e (3) execuo do resultado motor (p. 146). Destarte vlido investigar em qual (ou quais) delas est a questo no lhe permite que o violonista possua uma boa fluncia na leitura primeira vista (em mdia). Todavia sugiro que alguns fatores fujam simples compreenso desta habilidade.

    3. Material e mtodo

    A partir de questes oriundas de minha experincia emprica como instrumentista, discusses informais com colegas de profisso, e relatos de violonistas de carreira coletados durante a pesquisa de mestrado, listei aspectos da escrita para o instrumento e da formao do violonista que parecem dificultar a fluncia na leitura, e busquei na literatura cientfica da rea argumentos que pudessem validar algumas hipteses. Como ainda so escassos os trabalhos que se debruaram sobre o tema da leitura primeira vista no violo, ainda que estes tenham contribudo significantemente com o que acredito, visitei trabalhos em outros instrumentos. Nestes, as pesquisas majoritariamente tratam do piano, instrumento que exige destreza e segurana nessa habilidade, visto o montante de repertrio em que este se configura como camerista.

    4. Discusso

    Apesar de ser considerada por Kopiez et al (2006) uma das cinco habilidades1 fundamentais a todo msico performer (p.5), verifica-se que a necessidade de uma boa leitura primeira vista depende das atividades que desempenha o msico (FIREMAN, 2010, p. 53). Danilo Bogo sugere:

    Talvez pelo seu carter solitrio e intimista que provm do seu pouco som em relao aos instrumentos da orquestra, e pelo fato de que grande parte do repertrio

    1 Gary McPherson define em seu trabalho intitulado Five aspects of musical performance and their correlates (1995) a

    leitura primeira vista como um desses aspectos, somando-se s habilidades de tocar de memria, tocar uma msica ensaiada, tocar de ouvido, e improvisar.

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    para o instrumento composto de obras solo, a leitura musical ao violo muitas vezes deixada de lado nos mtodos para o instrumento. (BOGO, 2007, p. 1)

    A tarefa de ler primeira vista, em qualquer instrumento, demanda ateno para alguns aspectos, como, por exemplo, a relao do material com o contexto tonal (FIREMAN, 2010, p.54), a textura (WEAVER, 1943, p. 26), a compreenso do ritmo (MCPHERSON, 1994, p. 229), conhecimentos tericos, dentre outros. Todavia que outros aspectos especficos do violo agem direta e (ou) indiretamente na fluncia da leitura do violonista? Dividirei a reflexo em duas etapas, uma primeira ligada a alguns aspectos do idiomatismo e escrita, uma segunda que evidencia aspectos da formao do violonista.

    4.1 Fatores ligados ao idiomatismo e a escrita:

    Scordatura O violo declarado um instrumento harmnico. Sua versatilidade de gnero hoje

    percebida deve-se possivelmente a suas origens nos instrumentos alade, vihuela predominantemente solista, e na guitarra predominantemente acompanhante. Estes e o violo partilham praticamente da mesma scordatura2, composta predominantemente de intervalos de quartas, o que facilita a obteno de acordes. Assim possvel mensurar o montante do repertrio que o violo absorve. Como relata Luis Cesar Gontarski:

    O violo um instrumento relativamente novo, se levarmos em considerao suas ltimas alteraes estruturais, atribudas a Antonio Torres Jurado, por volta de 1856. Este instrumento abrange um repertrio de mais de cinco sculos, devido grande semelhana com instrumentos dos perodos musicais anteriores, tais como alades, vihuelas e guitarras, por exemplo. (GONTARSKI, 2008, p. 192)

    O repertrio para o alade, e a vihuela, particularmente, adaptado para o violo mediante uma mnima mudana de um semitom na terceira corda. Em se tratando de preparar uma performance de msica ensaiada e tocar de memria, a disponibilidade de tempo de reviso no trazem tantos problemas ao violonistas, mas se a tarefa ler primeira vista em uma scordatura diferente do padro, torna-se quase uma tortura tentar aferir no brao do instrumento notas que antes estariam em um lugar e que agora esto em outros. Como esse tipo de repertrio muito usado no violo, imagino que essa scordatura (3 corda = F#) aos pouco se torne um mecanismo

    2 Afinao. As cordas soltas do violo tem afinao padroniza em Mi1-L1-R2-Sol2-Si2-Mi3. Conta-se da 6 corda

    para a 1, nesta ordem.

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    automtico de transposio, mas ler primeira vista obras como Equinox de Toru Takemitsu, cuja scordatura difere do padro nas 6 (Mib) e 2 (Bb) cordas, pode se converter em uma decepo.

    Regies e posies Este padro de afinao permite localizar com facilidade o mesmo som em diferentes

    cordas sem uma distenso significativa da mo esquerda, ao passo que a mobilidade de se obter acordes tanto quanto frases meldicas, nessa scordatura, conduz a fatores dos mais relevantes fluncia da leitura: o uso de outras regies, e, por consequncia, as mudanas de posio. Por regio entendamos como cada grupo de quatro casas no brao do instrumento, aferidas cada uma por um dedo da mo direita correspondente, ento da primeira quarta casa a primeira regio, da quinta oitava a segunda e assim sucessivamente. E posio denomina-se a casa onde se posiciona o primeiro dedo (indicador da mo esquerda). Desta forma, uma mo na terceira posio estar abrangendo as primeiras e segundas regies, posicionada da terceira a sexta casas (BOGO, 2007, p. 6).

    A facilidade de encontrar um mesmo som em vrias notas se converte na no to fcil tarefa de eleger o melhor e mais fluido caminho para a leitura em tempo real. O som mi3, por exemplo, pode ser encontrado em cinco lugares diferentes do brao do violo, isso sem contar com os sons harmnicos, que estende ainda mais o leque de possibilidades. Peter Danner, autor de uma srie de Estudos voltados s mudanas de posio no desenvolvimento da leitura primeira vista, menciona que qualquer pessoa que estuda violo clssico rapidamente descobre que um dos maiores obstculos para uma leitura primeira vista eficiente est ligado duplicidade de notas no brao do instrumento (DANNER, 1982, p. 2). E esta opinio encontra eco na fala de Bogo (2007), ao trazer que [...] uma boa leitura comea com o conhecimento da escrita musical, isto , a familiaridade com padres rtmicos, meldicos e harmnicos. Mas fato tambm que a leitura ao violo dificultada pela mudana de posies (p. 5). Tonalidade

    O trabalho de Eduardo Pastorini, que investigou a leitura primeira vista de alunos de graduao, e em uma etapa do trabalho, pediu que eles fizessem uma leitura silenciosa de um trecho musical e em seguida constatou a partir de entrevistas que os investigados observaram os seguintes elementos musicais: digitao, tonalidade, dinmica, compasso, andamento, expresso ritmo e acordes. Percebeu atravs dos dados que a tonalidade demonstrou-se como uma das principais dificuldades encontradas na execuo da leitura primeira vista (PASTORINI, 2011, p. 58).

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    Aparentemente este aspecto seria de ordem geral, para todos os instrumentos, porm, mais uma vez levando em conta os instrumentos predecessores do violo, pode-se sugerir outras hipteses. Uma relacionada afinao antes do temperamento. Por se tratar de instrumentos de trastes mveis, a afinao, que precisava ser ajustada conforme a tonalidade da obra, o que limitava as possibilidades de execuo e mudanas de posio.

    A outra que o uso frequente das cordas soltas, caracterstica idiomtica dos instrumentos de cordas dedilhadas, possivelmente direcionou a escrita dos compositores, quando fazem uso delas para compor a estrutura harmnica, ou seja, o centro tonal das obras prioriza o uso das notas das cordas soltas (mi4, si3, sol3, r3, l2, e mi2). Gaspar Sanz, na sua obra Instruccion de Musica sobre la Guitarra Espaola3, j evidenciava como o modo moderno que agora se compe a pratica de tocar notas adjacentes intercalando cordas soltas e presas, denominada campanelas.

    Na prtica, as tonalidades exploradas por grande parte da obra para violo utilizam poucos acidentes, salvo as alteraes de importncia meldicas, mas em se tratando de tonalidade, a escrita composicional para este instrumento no se utiliza de tonalidades distantes do centro tonal D, possivelmente causando uma sensvel atrofia da habilidade de ler fluentemente alteraes da escala pelo violonista. Outro fator aliar a notas naturais da tonalidade ao uso das cordas soltas, para auxiliar nas mudanas de posio.

    Clave A clave padro para a escrita a de Sol com transposio de oitava (a nota escrita soa uma

    oitava mais grave), mas pouco se sabe sobre o porqu desta conveno. O que se sabe o suporte de escrita de seus antecessores era a tablatura (alade e vihuela) e a cifra (guitarra), mas quando J. S. Bach (1685-1750) escreveu as Sutes para alade, em escrita ortocrnica, ele utilizou as claves de F e de D.

    Apesar de no ter comprovao cientfica o violonista Fbio Zanon, em uma discusso no frum eletrnico Violao.org4, levanta a seguinte hiptese para a notao em clave de Sol para violo:

    A escrita em pauta foi adotada mais ou menos na poca da Revoluo Francesa, quando o ensino de msica passou por mudanas muito fortes que visavam socializao e a incluso, e a venda de msica impressa se ampliou enormemente. por isso que os instrumentos de banda so todos transpositores, para que s se

    3 Disponvel gratuitamente em: . 4 O site violo.org um frum j reconhecido pela comunidade violonstica, que coloca em pauta diversas questes

    inerentes ao violo de concerto, e recebe contribuies de violonistas amadores, estudantes e profissionais, como o Fbio Zanon e outros.

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    tenha o trabalho de se aprender uma clave, a de sol. Eu tenho o palpite de que a adoo da clave de sol oitavada pelo violo tenha uma origem similar, facilitar a vida de amadores. (FRUM VIOLAO.ORG, 2012, p. 3)

    A partir desse ponto de vista, imagina-se que houve a necessidade de uma notao tradicional, porm, que possibilitasse uma maior disseminao dessa arte. Em outras palavras, a escrita em uma nica e mais conhecida clave, facilitando, assim, o acesso de quem a buscasse. J para musiclogo Norton Dudeque:

    (...) o uso da clave de sol para a notao musical de um instrumento de registro grave, como o violo moderno, remonta guitarra na sua poca renascentista e barroca, em que o instrumento tinha um registro mdio para agudo (chitarrino), sendo esta herana preservada at hoje em dia. (DUDEQUE, 1994, p. 54)

    Apesar disso, na medida em que se tenta atrair o interesse maior do pblico, provoca-se certo "congestionamento" da leitura, com a necessidade de utilizar muitas linhas suplementares no pentagrama, ainda mais em um instrumento em que se pode tocar as duas notas mais extremas de sua tessitura em simultneo.

    A fim de evitar ou minimizar esses problemas, o violonista e compositor Leonardo Boccia empreendeu um projeto com alunos de violo do curso superior da Escola de Msica da UFBA, experimentando uma escrita em claves naturais, que resultou em duas publicaes, em uma delas, A Troca da Clave (1997), o autor motiva a converso das obras para essa escrita. De fato, at o compositor Clssico Fernando Sor (1778-1839) j fez tal experimento, na sua Fantasia para guitarra Op. 7, quando publicou, alm da escrita tradicional, uma verso em claves de f e sol, dedicado ao pianista e compositor Ignaz Pleyel, em cujo prefcio adverte que nessa escrita se tem mais preciso da altura (sem transposio) e se evita excessos de linhas suplementares. Todavia verifica-se que a escrita para o violo em clave de Sol com transposio de oitava tornou-se um paradigma pouco atrativo em discusses acadmicas, provavelmente pela resistncia das prticas conservatoriais.

    4.2 Fatores ligado formao do violonista

    Influncia conservatorial na metodologia do estudo da performance Sabe-se que o ensino de instrumento est fortemente ligado s prticas conservatoriais,

    como, por exemplo, repeties irreflexivas de trechos musicais. Existem dois importantes aspectos do desenvolvimento da leitura primeira vista que sofrem com algumas dessas prticas: o

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    reconhecimento de padres e a segurana espacial no instrumento. Visualizemos um aluno estudando escalas no violo na fala de Adriano Orellana:

    Nas passagens tcnicas de maior dificuldade, esses violonistas, em geral, praticam exaustivamente at conseguirem um resultado sonoro satisfatrio, muitas vezes desrespeitando limites fsicos e/ou inibindo a formao de suas prprias, concepes musicais. (ORELLANA, 2008, p. 304)

    A virtuosidade uma meta caracterstica dessa prtica conservatorial (JARDIM, 2002; PENNA, 1995) que incita o aluno a tentar tocar o trecho mais rpido, diminudo sua ateno com detalhes de sonoridade, expresso, sensao cinestsica do corpo durante a tarefa, dentre outras. Prtica de escalas teoricamente ajudaria no reconhecimento de padres, e a segurana espacial no brao do instrumento, mas no se percebe isso no violo, visto que a essa tarefa se dissocia do som produzido e do smbolo ao qual est ligado, restando apenas a memria mecnica.

    Pouca prtica de msica de cmara A repetio irreflexiva comentado acima torna a performance fragmentada, de modo que

    um ensaio com um grupo de cmara pode se configurar uma rdua e frustrante tarefa para seus componentes. Enquanto na prtica de repertrio possvel que o violonista pens, caso eu erre, volto, e corrijo, mas na prtica de msica de cmara, esse pensamento pode causar desconforto no grupo, e prejudicar a preparao da obra. Andreas Lehman e Victoria McArthur expem na tabela a seguir, diferenas entre comportamentos nas prticas de performance solo e ensaiada , e msica de cmara.

    Prtica de performance Prtica de leitura primeira vista

    Corrigem seus erros Mantm o ritmo e a mtrica

    Olham as mos ao tocar Evitam olhar as mos

    Os detalhes so importantes O quadro geral importante

    Evitar erros e descuidos Erros e descuidos no preocupam TABELA 1 Comparao de estratgias usadas por pianistas quando praticam uma performance ensaiada e quando leem primeira vista. Fonte: LEHMANN; MCARTHUR, 2002, p. 145.

    Essa prtica com frequncia faz o violonista criar meios cognitivos para perceber os padres e as unidades musicais significativas com mais brevidade, mas a prtica conservatorial nas vestes do professor o motivado em formar solistas (JARDIM, 2002, p. 109) o faz priorizar o repertrio solo, deixando cair em detrimento a oportunidade de treinar a leitura e se socializar com

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    outros msicos ao mesmo tempo. Consequentemente a formao do violonista comea a configurar um desequilbrio entre as habilidades de ler e memorizar msica. No obstante, Fireman (2010) observa que participantes de grupos musicais normalmente so melhores leitores (p.64).

    5. Consideraes finais e recomendaes

    O presente trabalho pretendeu demonstrar alguns dos fatores que influenciam a leitura primeira vista do violonista. Outras linhas de fatores relacionados formao, conquanto relevantes, como a idade em que se tem o primeiro contato com o instrumento, e com a escrita ortocrnica, ou o fato de ter estudado outros instrumentos (em outras claves), no puderam ser discutidos aqui, mas ratificam a fertilidade que mostra o assunto. E com isso espera-se explorar do desenvolvimento da leitura do violonista a partir de estratgias de ensino e aprendizagem deliberadamente direcionadas a estes fatores.

    Alguns hbitos que se dado a devida ateno, podem ajudar a desenvolver a leitura: (1) qualquer repetio de trecho musical deve ser regulado com ateno, seja para performance ensaiada ou prtica de leitura primeira vista; (2) exercitar trechos meldicos em vrias posies ajuda a automatizar as escolhas durante a leitura; (3) No interromper o fluxo da msica, mesmo que haja descuidos, ajudam a manter a ateno e na predio, tomar um andamento suficientemente lento para que isso seja possvel; (4) Evitar olhar para o as mos e o brao do violo para no perder o curso da msica escrita. (5) Praticar msica de cmara providencial para exercitar e otimizar os itens anteriores.

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