16
CONECTAR OU NÃO SE CONECTAR Eis a questão As vacinas e os indicadores de Saúde Entrevista: Jaime Matute, chefe de Relações Internacionais e Cooperação do Ministério da Saúde da Colômbia O PrEP na região ¿ Rio de Janeiro, Fevereiro 2018 . N o 15

Rio de Janeiro, Fevereiro 2018 . No CONECTAR OU NÃO SE ...isags-unasul.org/uploads/eventos/ev[3827]ling[1]anx[956].pdf · suficiente para detectar um dos sintomas mais visíveis

Embed Size (px)

Citation preview

CONECTAR OU NÃO SE CONECTAR

Eis a questão

As vacinas e os indicadores de SaúdeEntrevista: Jaime Matute, chefe de Relações

Internacionais e Cooperação do Ministério da Saúde da ColômbiaO PrEP na região

¿

Rio de Janeiro, Fevereiro 2018 . No 15

INSTITUCIONAL

ISAGS-UNASULDiretora Executiva: Carina Vance Chefa de Administração e Recursos Humanos: Gabriela Jaramillo Coordenadora de Relações Internacionais: Luana Bermudez

GESTÃO DA INFORMAÇÃO E DA COMUNICAÇÃOCoordenadora: Flávia Bueno Editor-Chefe: Manoel Giffoni Reportagem: Carina Vance, Eduardo Hage, Flávia Bueno, Juan Francisco Bacigalupo, Manoel Giffoni, Mario CameloColaborador: Vanessa VeitimillaEquipe: Carlos de LimaContato: [email protected] Telefone: +55 21 2505 4400

INSTITUCIONAL

Esse é o informe do Instituto Sul-Americano de Governo em Saúde (ISAGS), o centro de pensamento estratégico na área de saúde da União das Nações Sul-Americanas (UNASUL) que visa contribuir para a melhoria da qualidade do governo em saúde na América do Sul por meio da formação de lideranças, gestão do conhecimento e apoio técnico aos sistemas de saúde.

CONECTAR OU NÃO SE CONECTAR? Eis a questão

Não é necessário ser um grande observador do comportamento humano para perceber que os hábitos da sociedade moderna não são os mesmos de 20 ou 30 anos atrás. A tecnologia, sem dúvidas, dominou o nosso dia a dia. Uma simples ida à esquina é mais do que suficiente para detectar um dos sintomas mais visíveis desta mudança: um exército de pessoas caminhando de cabeça baixa enquanto escrevem em seus smartphones. A União Internacional de Telecomunicações (UIT) anunciou recentemente que o número de celulares em uso no mundo passou dos 7 bilhões. Segundo a agência da ONU, no ano 2000, esse número era de 738 milhões, quase dez vezes menos.

A presença tão intensa da tecnologia em nossas vidas trouxe soluções, sim, e uma praticidade que nem sonhávamos experimentar. Pagar contas, solicitar entregas, agendar consultas médicas... Tudo ao alcance de alguns toques numa tela. No entanto, além destas facilidades, o advento das novas tecnologias trouxe outras consequências. Uma das mais graves é o surgimento de novas doenças ou transtornos motivados direta ou indiretamente pelo seu uso excessivo. A discussão sobre o assunto aumentou no começo deste ano, depois que a Organização Mundial da Saúde (OMS) divulgou que acrescentará o vício em videogames como um transtorno mental na próxima edição da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas relacionados à Saúde (CID-11).

A OMS vai classificar o vício em videogames como um transtorno mental na próxima edição da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID). A decisão despertou o interesse da opinião pública sobre o impacto das chamadas “doenças tecnológicas” na vida das pessoas e nos sistemas de saúde

3

Segundo o documento, o vício se classifica como um padrão de comportamento frequente ou persistente, tão grave que leva o indivíduo “a preferir os jogos a qualquer outro interesse na vida”. O especialista em Saúde Mental e Tecnologia, Cristiano Nabuco, do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (IPq/HCFMUSP), afirma que a decisão da OMS é muito importante por chamar a atenção sobre as novas doenças mentais, que às vezes são negligenciadas.

A decisão despertou polêmica, pois associações da indústria alegam que não existe um consenso científico sobre o assunto. “É verdade que ainda não existe um consenso. Muitos entendem que esse vício seria secundário a uma depressão, como uma comorbidade psiquiátrica, mas sabemos que não é. Este transtorno tem um marco claro, diferente dos demais. Inclusive, o vício em videogames alcança áreas do cérebro semelhantes às de quem utiliza álcool e drogas”. Para Nabuco, o vício em videogames é só a primeira de muitas “novas doenças” mentais relacionadas ao uso de aparatos tecnológicos que também poderiam estar nessa lista. Ele lembra que o próprio Manual de Diagnóstico e Estatística dos Transtornos Mentais, o DSM, já citou várias doenças no apêndice da quinta versão “que certamente serão estudadas a partir de agora”, completa.

Além de outros problemas causados pelo uso excessivo da tecnologia, como as lesões por esforço repetitivo, tendinite e artrite; a síndrome do olho seco (20 milhões de pessoas no Brasil, segundo a OMS); a perda de audição (pelo uso de fones de ouvido com um som muito alto); etc., o que não faltam são novos transtornos mentais. Conheça alguns:

NOMOPHOBIA: Abreviação em inglês para no mobile phobia ou o medo de ficar sem telefone celular.

SÍNDROME DE CHAMADAS E VIBRAÇÃO FANTASMA: Quando o cérebro faz com que o indivíduo pense que seu celular está vibrando ou tocando.

TRANSTORNO DE DEPENDÊNCIA DA INTERNET: Uma vontade constante e não saudável de acessar a Internet que acaba interferindo na vida.

O “EFEITO GOOGLE”: Tendência do cérebro de reter menos informação porque sabe que as respostas estão ao alcance de alguns cliques. “Quando adultos são alfabetizados em diferentes momentos da vida, dá para perceber diferentes morfologias cerebrais. O mesmo acontece com a nova geração em relação à grande quantidade de informação disponível. É uma grande mudança de conduta”, disse Cristiano Nabuco.

CIBERCONDRIA: A internet pode exacerbar os sentimentos existentes de hipocondria e, em alguns casos, causar novas ansiedades, também conhecidas como Hipocondria Digital.

A SÍNDROME DE FOMO (FEAR OF MISSING OUT, EM INGLÊS, OU O MEDO DE “ESTAR POR FORA”): Caracterizado por ansiedade ou estresse, no qual a pessoa sente que está perdendo alguma experiência virtual importante ou emocionante.

Além de todas as doenças já citadas, uma das mais graves é o efeito das redes sociais em casos de depressão ou inclusive a chamada “depressão de Facebook”, causada pelo excesso ou pela falta de interações sociais virtuais. Nas redes sociais, as pessoas tendem a publicar só conteúdo positivo. Muitas vezes, os que possuem a autoestima mais baixa acabam entrando em depressão ou sofrem uma piora de diagnóstico por acreditarem que os outros estão vivendo vidas mais felizes e são bem-sucedidos. “Além disso, a rede social faz com que o indivíduo e especialmente os jovens fiquem mais isolados, deixando de exercitar o pensamento criativo. O mundo dessas pessoas fica restrito a tudo o que implica interação online, reduzindo assim a capacidade de lidar com situações adversas na vida real, com o diferente, e isso causa uma espécie de despreparo emocional”, complementa Nabuco.

E que impacto estes novos transtornos estão causando nos sistemas de saúde? Em países como Japão e China, o vício dos videogames se tornou uma questão de Saúde Pública, e os jogadores agora recebem alertas do próprio aparato quando passam muito tempo jogando. Na China, uma das maiores empresas tecnológicas do mundo, a Tencent, limitou o tempo de alguns jogos a uma hora ao dia.

Outro impacto negativo que pode estar relacionado ao uso da tecnologia é o aumento dos casos de depressão e suicídio em todo o planeta. Segundo dados da OMS, mais de 300 milhões de pessoas vivem com depressão no mundo, um aumento de 18% entre 2005 e 2015. Nas Américas, esse número é de cerca de 50 milhões, o que representa um aumento de 15% no mesmo período.

A verdade é que, por ser um assunto recente cujas consequências continuam surgindo e que ainda não conhecemos totalmente, não existem dados específicos sobre seus efeitos, somente estimativas e alguns estudos. No entanto, especialistas afirmam que os impactos na Saúde Pública já podem ser notados. “É importante falar sobre o assunto, porque estas doenças causam, de verdade, um impacto nos sistemas de saúde. A inclusão no CID foi um passo nesse caminho, pois quando há um reconhecimento internacional do problema, os serviços públicos passam a investir e a ajudar essa população que necessita apoio”, conclui Nabuco.

Mar

io C

amel

om

ario

cam

elo@

isag

s-un

asur

.org

4

PALAVRAS DO ESPECIALISTASAÚDE INTERCULTURAL, UMA PROPOSTA DECOLONIALpor Juan Francisco Bacigalupo, estagiário internacional do ISAGS em Determinação Social da Saúde

Nas últimas décadas, surgiu uma nova vertente teórica na América do Sul. Acadêmicos de diversos países começaram a falar sobre um “paradigma outro”, ou um “conhecimento outro”: a decolonialidade, que significa o pensar desde o Sul, desde a nossa realidade como ex-colônias europeias e reconhecendo os efeitos de tal processo. Assim, A. Quijano, filósofo peruano, utiliza pela primeira vez o termo “colonialidade do saber”, definindo as relações sociais marcadas pelo conceito de raça e que funcionam até hoje em nossos países. Estes autores fazem uma diferença clara entre o colonialismo (uma relação política e econômica de poder na qual um povo está subordinado a outro) e a colonialidade (o resultado do colonialismo, ou seja, formas de pensar, de viver, de trabalho, de autoridade e relações que se articulam de acordo com o passado colonial e com a ideia de raça), assim como o que eles representam no nosso contexto “ao sul do mundo”.

Podemos ver bem a colonialidade na sociedade contemporânea que tenta reconhecer de forma homogênea os valores e culturas, sem deixar espaço para as singularidades de povos que têm conhecimentos e vivências diferenciadas do modo de vida dominante. Assim, encontramos diversas culturas pelo mundo, tais como os povos indígenas, os afrodescendentes, o povo cigano e os migrantes, que possuem suas próprias explicações válidas da realidade e que precisam ser consideradas na área da saúde. Nessa linha, o professor argentino W. Mignolo aponta que devemos reivindicar as particularidades latino-americanas reconhecendo a importância da criatividade, do pensamento situado e contextualizado sócio, histórico e geograficamente; potencializando um projeto cultural, político e social que permita romper com séculos de colonialidade e eurocentrismo, o que em saúde chamaríamos de “saúde intercultural”.

Desta forma, a proposta decolonial na área da saúde consiste em deixar de invisibilizar as diferenças culturais que existem na atenção à saúde de povos com conhecimentos, saberes e formas de vidas que não se enquadram no padrão ocidental. De acordo com a professora C. Walsh, a interculturalidade “se refere às relações, negociações e intercâmbios culturais, buscando desenvolver uma interação entre pessoas, conhecimentos, práticas, lógicas, racionalidades e princípios de vida culturalmente diferentes; uma interação que admite e que parte das assimetrias sociais, econômicas, políticas e de poder”.

Assim, a interculturalidade é um conceito contra hegemônico que surge nas discussões políticas dos movimentos sociais latino-americanos e que luta por uma ação de transformação dos problemas, com um olhar local e contextualizado. Tal caráter intercultural

também tem sido incluído nas definições políticas de alguns Estados inclusive em âmbito constitucional, ainda que fundamentalmente vinculado aos povos indígenas. Estas menções são indicações claras da importância da interculturalidade para as políticas de saúde na região.

Nas palavras da Organização Pan-Americana da Saúde (OPS/OMS), o enfoque intercultural em saúde promove a convivência, a relação de respeito e a mútua aceitação entre a cultura do sistema de saúde convencional e as diversas culturas por meio da colaboração entre os recursos humanos em saúde, a comunidade, a família e os líderes sociais. O enfoque intercultural faz com que a cultura institucional médica e as diversas culturas nativas, com a colaboração estreita dos atores sociais, do pessoal de saúde, família, comunidade e dos líderes comunitários convivam com respeito e aceitação mútua.

Assim, a riqueza étnico-cultural da nossa região representa ao mesmo tempo um desafio e uma oportunidade para o desenvolvimento e a implementação de políticas públicas em saúde, sobretudo em uma região na qual, de forma geral, encontramos que cerca de 31% da população se identifica como indígena ou afrodescendente (5% e 26%, respectivamente), porcentagem que não é menor na hora de estabelecer acordos e políticas sobre etnia e saúde.

Muito além de pensar em saúde para indígenas, afrodescendentes, povo cigano e outros tantos grupos culturais da nossa região, deveríamos começar a procurar mecanismos que certifiquem a atenção de saúde culturalmente adequada. Países que se auto declaram como multiculturais (Bolívia, Equador e Peru) têm avançado nessa linha de ação, promovendo políticas de saúde intercultural, que incluem indígenas e afrodescendentes. Por outro lado, quase todos os países da região levantam políticas de saúde indígena, o que é um grande avanço se pensarmos que os piores indicadores de saúde são apresentados por estres grupos.

A América do Sul avança e começa a dar voz a aqueles que foram silenciados no processo colonial de produção de conhecimento. A saúde não fica atrás: o modelo intercultural chegou para ficar e avançar na construção de sociedades mais igualitárias, justas e plurais.

O ISAGS terminou em 2017 um mapeamento das políticas de Saúde Intercultural na América do Sul, no qual a situação na região é abordada e também são apresentadas propostas para o avanço conjunto.

5

O PAPEL DA VACINAÇÃO NA MELHORIA

Uma das maiores conquistas na Saúde Pública mundial tem sido a redução da mortalidade infantil em menores de cinco anos. Nas Américas, por exemplo, foi alcançada uma redução para este indicador de 42,5 mortes/1.000 nascidos vivos (nv) para 14,7 mortes por 1.000nv, entre 1990 e 2016 (OMS, 2017). Nos países da América do Sul esta redução também foi muito relevante, alcançando 61% neste período. No entanto, ainda existe uma heterogeneidade relevante entre os países sul-americanos com uma faixa entre 8,3/1.000nv a 37/1.000nv entre eles.

Muitos fatores estão envolvidos nessa conquista da região, e incluem elementos relativos à melhoria das condições de vida, incluindo moradia (como por exemplo os indicadores de saneamento, que têm um impacto na mortalidade por diarreia), diminuição da desnutrição, aumento da amamentação, entre outros fatores sociais, econômicos e culturais.

No entanto, a melhoria do acesso a algumas tecnologias em saúde – como as vacinas – também representam um impacto na redução da mortalidade do grupo etário de menores de cinco anos, que constitui o público alvo para a maioria das vacinas incluídas nos Programas Nacionais de Imunização da região das Américas. A recente introdução de novas vacinas em muitos países sul-americanos, como as vacinas contra infecções por rotavírus, pneumococo e meningocócico C, ampliou a oferta de imunobiológicos para as crianças e também seus efeitos na redução de doenças graves causadas por estes agentes.

Quando olhamos as causas de mortes deste grupo etário, as doenças imunopreveníveis não representam mais as principais origens, como acontecia em um passado distante. Entretanto, mesmo com grandes conquistas alcançadas na redução destes problemas, como a eliminação da poliomielite e a redução da maioria de outros males deste grupo, continuam acontecendo surtos e alguns deles apresentam, hoje, níveis de incidência mais altos do que em décadas passadas. Por exemplo, os surtos de sarampo no Brasil e na Venezuela nos últimos anos, além do contínuo aumento da incidência de coqueluche. Estes processos também aconteceram nos grupos etários maiores, nos quais a ocorrência de algumas doenças (como por exemplo a meningite C em adolescentes) se manteve ou aumentou. E também continuam surgindo surtos de grande escala, como a febre amarela no Brasil.

Para alcançar uma boa eficácia da vacinação na população é fundamental atingir coberturas altas e homogêneas no público alvo, o que constitui hoje um grande desafio para os programas nacionais de imunização. Na região sul-americana, em 2015, as mais altas coberturas em crianças

menores de um ano (para a tríplice viral, que protege contra sarampo, rubéola e caxumba, calculada para um ano de idade completo), foram informadas para as seguintes vacinas (considerando uma média de cobertura maior ou igual a 90%): BCG, pólio (3ª dose), Tríplice Bacteriana ou DTP (3ª dose), Tríplice viral (1ª dose) (OPS/OMS, 2017). No entanto, quando são examinadas as coberturas por país, é identificado um número relevante de países que não alcançaram estas coberturas para cada uma das vacinas referidas: Pólio (6/12), Tríplice Bacteriana ou DTP (5/12), Tríplice viral (3/12) e BCG, pólio (2/111). As vacinas que foram introduzidas mais recentemente apresentam coberturas mais baixas: rotavírus – 3 entre 9 países que introduziram a vacina e para os quais há dados disponíveis, alcançaram 90% de cobertura ou mais; anti-pneumocócica (3ª dose, conjugada) – 6 entre 11 países alcançaram esta cobertura. Deve ser considerado também que a cobertura ideal é de 100% e para a maioria das vacinas a meta estabelecida é de 95%.

Um desafio ainda mais importante é o de garantir que as altas coberturas estejam distribuídas de forma homogênea em todo o território nacional, para que não sejam gerados “bolsões” de pessoas suscetíveis, que muitas vezes são os responsáveis pelo surgimento de surtos. Quando se analisa a porcentagem de municipalidades que alcançaram 95% ou mais de cobertura em menores de um ano para Tríplice Bacteriana ou DTP (3ª dose), somente um país da região supera o nível de 80% das municipalidades, enquanto 9 países possuem abaixo de 50% de municipalidades com níveis adequados de cobertura (OPS/OMS, 2017).

Muitos fatores estão relacionados ao alcance de coberturas vacinais2, os quais, muitas vezes, são diferentes entre eles e de acordo com cada imunobiológico analisado. Podemos, de forma resumida, identificar fatores relativos à adesão da população; acesso da população aos serviços de saúde; disponibilidade, custo e acesso às vacinas. A adesão da população, ainda que seja condicionada pela facilidade de acesso e disponibilidade, possui também outros fatores, como a percepção de que o benefício do uso da vacina supera o risco, em particular em algumas vacinas cujos efeitos adversos graves podem gerar mortes ou incapacidades, ainda que em níveis reduzidos. É o caso da vacinação contra a febre amarela e a poliomielite, por exemplo. Por outro lado, fatores culturais (como a adesão às concepções de grupos contrários à vacinação) podem ter uma forte repercussão sobre a adesão da população a esta estratégia.

1. Não há dados para um dos países da região na publicação consultada 2. Há outro conjunto de fatores, também importantes, que não serão abordados nesta análise e estão relacionados à eficácia, efetividade e segurança das vacinas

DOS INDICADORES DE SAÚDE

6

Edua

rdo

Hag

eed

uard

ohag

e@is

ags-

unas

ur.o

rg

As dificuldades de acesso da população podem contribuir para a redução da cobertura, seja por problemas de distância em relação aos serviços, período de funcionamento destes serviços e a qualidade da atenção.

Outra dimensão de fatores se refere à relação da capacidade nacional de produção, aquisição (no que se refere ao preço), distribuição e armazenamento das vacinas nos serviços de saúde. Estas capacidades envolvem também os níveis locais (ou subnacionais), organismos multilaterais e, muitas vezes, não governamentais.

A identificação de quais fatores apresentam um papel mais preponderante para alcançar coberturas adequadas e a definição e implementação de estratégias para a resolução dos problemas identificados em cada país são fundamentais para aperfeiçoar os programas nacionais de imunização e ampliar as conquistas alcançadas com estes programas na melhoria das condições de vida das populações.

Ainda que a vacinação seja uma importante estratégia de prevenção que deve ser realizada e fortalecida todos os dias, existe um chamado mundial anualmente para que se reforce esta estratégia, conhecido como a Semana Mundial de Imunização que, este ano, vai acontecer em abril. Nas Américas, existe ainda a Semana de Vacinação que será realizada entre os dias 21 e 28 desse mês.

Referências:

1. WHO. Global Health Observatory data. Disponível em: http://www.who.int/gho/child_health/en/. Acessado em 08 de fevereiro de 2018.2. Organización Panamericana de la Salud/Organización Mundial de la Salud,Enfermedades Transmisibles y Análisis de Salud/Información y Análisis de Salud: Situación de Salud en las Américas: Indicadores Básicos 2016. Washington, D.C., Estados Unidos de América, 2016. Disponível em: http://iris.paho.org/xmlui/bitstream/handle/123456789/31288/IndicadoresBasicos2016-spa.pdf?sequence=1&isAllowed=y.

Acessado em 9 de fevereiro de 2018. 7

Mortalidade infantil (<5) nos países da UNASUL (por 1000 nascidos vivos)

Menos de 15

Entre 15 e 20

Entre 20 e 25

Entre 25 e 30

Mais de 30

Fonte: Organização Mundial da Saúde

FEBRE AMARELADE ONDE VEM? PARA ONDE VAI?Se trata de uma doença infecciosa grave, causada pelo vírus da família dos Flaviviridae e do gênero Flavivirus amaril. É uma doença endêmica na região norte da América do Sul e em muitos países da África, que é prevenida sobretudo com a vacinação das pessoas que vivem ou vão viajar para as regiões afetadas pela febre amarela.

UM AssUNtO REgIONAlA notificação de casos de epizootias em estados fronteiriços do Brasil (com Guiana, Suriname, Venezuela, Bolívia, Paraguai, Argentina e Uruguai) acende o alerta para os países vizinhos. O mapa demonstra como um ciclo de transmissão que começou em 1998 no norte do Brasil, chegou à fronteira do Uruguai e da Argentina em 2003, além de efetivamente ter alcançado o Paraguai. As mudanças climáticas podem agravar o problema.

O CIClO URbANOO pior cenário quando se fala de Febre Amarela é uma situação de epidemia nas cidades, na qual o humano se transforma em hospedeiro do vírus e o vetor principal é o mosquito Aedes Aegypti, muito comum em várias cidades da América do Sul.

A última ocasião em que isso aconteceu foi em 1942.

PREVENÇÃO

Além da vacinação massiva da população nas zonas urbanas em risco, assim como no caso da dengue, Zika e Chikunguña, não se pode esperar que a população esteja a cargo de eliminar todos os criadouros do Aedes Aegypti. É fundamental uma mudança estrutural no padrão de urbanismo e nas inequidades, entre elas, a gestão incorreta dos resíduos, lares que não contam com saneamento básico ou acesso à água, etc.

Ciclo de transmissão dos últimos 20 anos

Legenda:

Área de ocorrência do evento

Amazônia LegalExtra Amazônica

Tipo de evento

Casos HumanosEpizotias de primatasCasos e epizotias

Fonte: Slide gentilmente cedido por Zouralde Guerra Costa

Foi notificado um caso em uma cidade. Se trata necessariamente do ciclo urbano?

NÃO! Só se a transmissão aconteceu nas características do ciclo urbano, ou seja, diretamente do Aedes Aegypti sem a presença de macacos. Mesmo nas cidades, é possível reproduzir o ciclo silvestre, em particular em cidades com grandes áreas de bosques.

Os Flavivirus são a causa de numerosas

doenças, algumas delas muito familiares aos

sul-americanos, como a dengue e a febre

de Zika.

O CIClO sIlVEstREAs selvas tropicais chuvosas são as zonas endêmicas da febre amarela, cujos vetores do vírus são os mosquitos Haemagogus e Sabethes. Os principais hospedeiros são os macacos, mas os humanos também são quando entram na floresta.

Os macacos não são somente inocentes, como também úteis

Por falta de informação, muitos acreditam que os macacos transmitem a febre amarela e, durante os surtos, não é incomum que eles sejam mortos. No entanto, os macacos “avisam” às autoridades de Vigilância Sanitária sobre a presença do vírus em algumas localidades.

+130É o número de animais

encontrados mortos por agressão humana

no estado do Rio de Janeiro só

no último mês

sURtO NO bRAsIlEntre 2016 e 2017, o país enfrentou um grande surto de Febre Amarela, com um número mais alto de casos em humanos do que em outros surtos.

Números da Febre Amarela no Brasil entre

julho/2017 e 14 de janeiro/2018

Fonte: Ministério da Saúde do Brasil, 2018

A OPÇÃO PELA DOSE FRACIONADA

Com o objetivo de imunizar quase 20 milhões de pessoas, deter o avanço da epidemia e evitar um surto como o de 2017, o governo brasileiro optou por usar a dose fracionada em áreas pré-selecionadas. A estratégia é recomendada pela Organização Mundial da Saúde e, de acordo com estudos do Instituto de Tecnologia de Imunobiológicos (Biomanguinhos/Fiocruz), enquanto a dose padrão (0,5ml) imuniza para toda a vida, a de 0,1ml imuniza por pelo menos 8 anos.

35 casos confirmados20 mortes

145 casos suspeitos

Entre janeiro de 2016 e dezembro de 2017, seis países da região notificaram casos confirmados. O maior número de casos humanos e epizootias em décadas.

Fonte: Organização Pan-Americana da Saúde, 2018

PrEP: UM NOVO PASSO NO COMBATE AO HIV/AIDSO Brasil é o primeiro país na América Latina a incorporar a PrEP ao seu sistema de saúde e agora compartilha a experiência com o Peru e o México

Se você perguntar a alguns dos seus amigos: “O que é a PrEP?”, certamente muitos não terão a menor ideia da resposta. Ainda que não seja muito conhecida pela população de uma maneira geral, a profilaxia pré-exposição ou PrEP, é uma estratégia cada vez mais investigada e utilizada como método complementar em todo o mundo aos já existentes para prevenir o contágio do HIV por via sexual. Desde 2010, os resultados de várias pesquisas vêm comprovando que o uso diário do comprimido comercializado com o nome de Truvada, que combina dois antirretrovirais, o tenofovir (TDF) e a emtricitabina (FTC), é altamente eficaz (próximo a 100%). Se tomado corretamente, o medicamento cria uma barreira no ciclo da multiplicação do vírus, impedindo assim a infecção do organismo.

A epidemia de AIDS é, hoje, uma das maiores preocupações globais. Dados do UNAIDS mostram que, em 2016, existiam cerca de 36,7 milhões de pessoas vivendo com a doença no mundo, o que representa duas vezes a população do Chile e toda a população do Canadá. Diante de um cenário catastrófico como esse, a Organização Mundial da Saúde (OMS), reconhecendo o potencial da PrEP para enfrentar a epidemia, recomendou, desde 2012, o desenvolvimento de estudos para avaliar como esta estratégia de prevenção pode ser utilizada, considerando as especificidades da cultura e dos sistemas de saúde de cada país, fatores que variam amplamente.

O Brasil, uma das referências mundiais no tratamento do HIV/AIDS foi o primeiro país da América Latina a desenvolver um estudo sobre o tema, que começou em 2007, no Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI/Fiocruz). A investigação chegou no surgimento do bem-sucedido projeto PrEP Brasil, iniciado em 2010. A pesquisa testou a utilização da substância nos chamados “grupos de risco”, ou as pessoas que, segundo as estatísticas do país, apresentam mais risco de contrair a doença: profissionais do sexo, homens que praticam sexo com homens sem preservativo, travestis e mulheres trans.

“Em 2010, quando iniciamos a pesquisa preliminar, já tínhamos o resultado: a intervenção com os

antirretrovirais era eficaz. A pergunta agora era: ‘Será que a população brasileira vai aceitar usar isso? Vai ter boa adesão? Será que vale a pena para incorporar no sistema de saúde?”, comenta a Dra. Valdiléa Veloso, diretora do INI/Fiocruz e pesquisadora líder do PrEP Brasil.

O fato é que o estudo, feito com cerca de 600 pessoas foi um sucesso. Após sua conclusão no ano passado, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) registrou o medicamento, e assim começou o processo para a distribuição da droga, culminando na sua incorporação ao SUS, o Sistema Único de Saúde do país no último mês de dezembro. E mais do que isso, desde o ano passado, a experiência brasileira está sendo compartilhada com mais dois países da América Latina: Peru e México. Segundo Valdiléa Veloso, os países foram escolhidos devido à semelhança no tipo de epidemia, que é concentrada em determinadas populações.

A NOVA FASE DO PROJETO

Nesta nova etapa, o projeto receberá o nome de ImPrEP e contará também com financimento da Unitaid e apoio da Fundação para o Desenvolvimento Científico e Tecnológico em Saúde (Fiotec/Fiocruz). No Brasil, serão promovidas capacitações para os funcionários dos centros de saúde, visando a expansão dos locais que distribuem a PrEP.

DADOS (Organização Mundial da Saúde – 2016)

PESSOAS VIVENDO COM HIV:

Brasil – 830 mil

Peru – 70 mil

México – 220 mil

MORTES POR HIV (EM 2016):

Brasil – 14 mil

México – 4.2 mil

Peru – 2.2 mil

Também se levará em conta a participação comunitária para ajudar na difusão da informação. “Ao todo, serão 35 centros para a distribuição da PrEP, e desses, 15 locais receberão o projeto ImPREP, que mais do que distribuir a droga, também vai monitorar e avaliar melhor os casos e os pacientes. Por exemplo, vamos ter uma tecnologia biomolecular para identificar DSTs e também vamos colher sangue para medir a quantidade de medicamento na pessoa. Essa é a forma mais precisa de identificar a adesão”, explica Valdiléa.

O programa brasileiro busca oferecer a PrEP a 54 mil pessoas nos próximos cinco anos e é possível que medicamentos genéricos estejam disponíveis em breve. Também é esperada uma queda no custo do medicamento, por meio do início da produção nacional.

Já no Peru, o estudo será desenvolvido em 10 centros, localizados em seis cidades, a maioria deles localizada em Lima/Callao - províncias que concentram 71% dos casos de AIDS do país. “Devemos começar os estudos aqui em março deste ano. Estamos terminando de realizar o estudo formativo e qualitativo e iniciando também una pesquisa online para ver alguns aspectos. Na metade de março, vamos inaugurar o primeiro centro”, afirma Carlos Cáceres Palacios, diretor do Centro de Investigação Interdisciplinar em Sexualidade, AIDS e Sociedade/CIISSS (Universidade Peruana Cayetano Heredia/Peru) e pesquisador líder do projeto no país.

O pesquisador afirma ainda que uma das metas no Peru, além da distribuição do medicamento, é difundir e informar a população de que a PrEP não substitui nenhum outro método de prevenção. Ela é complementar. “Outra questão importante é que a PrEP não é para sempre. Deve ser tomada enquanto as pessoas têm um risco alto de contágio. A PrEP não deve ser vista como um tratamento. Sua função preventiva tem que ser entendida com bastante clareza pela população”, disse.

Apesar da perspectiva promissora do ImPrEP, os pesquisadores reconhecem que ainda há um longo caminho a ser percorrido com relação à difusão de informações sobre as propriedades preventivas do medicamento. Também reconhecem que ainda falta capacitação e treinamento de pessoal nos próprios Centros de Saúde.

“A PrEP é um tema muito complexo. Em termos de conhecimento científico, o que se conhece é que teríamos ferramentas suficientes para controlar a epidemia. No entanto, por conta do estigma da discriminação, muita gente não faz os exames de teste. Além disso, às vezes as pessoas chegam a ir ao serviço de saúde, mas não são bem recebidas pelos funcionários. Se você é uma mulher trans e te chamam por um nome masculino, você não se sente confortável em voltar àquele lugar. Se você é travesti e te olham mal, é a mesma coisa”, exemplifica Valdiléa. “A ação vai muito além da distribuição do medicamento. Precisamos superar essas situações cotidianas para conseguir um verdadeiro controle da epidemia”, conclui a pesquisadora.

Mar

io C

amel

om

ario

cam

elo@

isag

s-un

asur

.org

ENTREVISTA:JAIME MATUTEChefe de Cooperação e Relações Internacionais do Ministério da Saúde da Colômbia

SURSALUD

Mestre em Estudos para o Desenvolvimento pela Universidade de Rotterdam Erasmus, está a frente do Escritório de Relações e Cooperação Internacional do Ministério da Saúde da Colômbia há 5 anos. Nessa entrevista, Matute fala sobre a sua participação como representante de seu país na última sessão do Conselho Executivo (CE) da Organização Mundial da Saúde.

Esse ano, um novo Programa Geral de Trabalho (PGT) foi proposto e o atual financiamento da OMS não é o suficiente. Quais foram as principais saídas apontadas no Conselho Executivo?

Os Estados membros apresentaram suas observações e muito se falou sobre a necessidade de independência frente a atores externos que contribuem com recursos financeiros à organização, além da necessidade de transparência sobre os processos de alocação de recursos para as regiões e os processos de prestação de contas. Nesse sentido, a região das Américas manifestou que a aplicação do PGT tem implicações estratégicas, administrativas e orçamentárias, o que faz com que o planejamento deva se basear em informação e evidência da melhor qualidade.

Dentro das propostas levantadas pelos países, posso destacar a ampliação da base de contribuintes da Organização e a promoção de contribuições voluntárias flexíveis, aplicando sempre o marco de colaboração com agentes não-Estatais da OMS. Além disso, países como Canadá e Argélia expressaram a necessidade de desenvolver estratégias e mecanismos de financiamento inovadores.

Um dos temas que receberam mais atenção dos países da UNASUL, sobretudo o Brasil e a Colômbia, foi o Acesso a Medicamentos. Alguns analistas internacionais consideraram insuficiente a proposta sobre a Estratégia Global e Plano de Ação sobre Saúde Pública, Inovação e Propriedade Intelectual (GSPoA) que, por exemplo, não abordará a transparência nos gastos de P&D. Que avanços efetivos serão discutidos na AMS em maio?

Nessa matéria foram tomadas decisões com mandatos concretos para a Secretaria, como a elaboração de planos para abordar a escassez de medicamentos e a implementação das 12

recomendações do comitê de especialistas sobre a GSPoA. No caso da GSPoA, algumas recomendações concretas ficaram para revisão, como a que se refere à transparência e a que se refere à destinação de uma percentagem do PIB dos países a um fundo para financiar a pesquisa para doenças negligenciadas. São duas recomendações muito importantes que sempre causaram muito debate e que continuarão causando. Portanto, creio que devemos continuar atuando como região e tomara que cheguemos na Assembleia com uma postura regional consolidada, como América do Sul, América Latina e também outras regiões.

É importante tomar em conta que esses temas são muito sensíveis e que chegar a duas decisões sobre acesso a medicamentos e continuar debatendo sobre esses temas é por si só um avanço significativo que não podemos negar.

No mundo atual da governança global, vemos um endurecimento dos países que, inclusive, utilizam sua posição como doadores para fazer prevalecer a sua própria agenda. Nesse cenário, qual é a importância da articulação entre os países do Sul?

De fato, estamos presenciando esse endurecimento em várias discussões, especialmente sobre alguns temas que são tradicionalmente controversos, como a abordagem das drogas ilícitas; os direitos sexuais e reprodutivos e o acesso aos medicamentos. No recente CE da OMS testemunhamos esse endurecimento. Alguns países da região não subscreveram intervenções regionais conjuntas em temas como as Doenças Não-Transmissíveis e as Mudanças Climáticas.

Nesse contexto, é ainda mais importante articular posições como UNASUL, como região, e também promover a articulação com outras. Nessa perspectiva, a Colômbia pode ter um papel chave, porque além de ser um país andino e sul-americano, somos um país mesoamericano e compartilhamos uma identidade com os países do Caribe. A título de exemplo, temos uma experiência recente em que a Colômbia teve um papel articulador num debate sobre as estimativas da mortalidade materna na OMS.

Acredito que, com a próxima Assembleia da OMS se aproximando, as Presidências dos vários mecanismos regionais deveriam começar a conversar com o objetivo de promover posições comuns sobre temas complexos.

É sabido que o cumprimento das capacidades básicas do Regulamento Sanitário Internacional não é algo fácil de alcançar, principalmente quando se trata de países de baixa renda. Além da autoavaliação e da avaliação externa, que outras estratégias a OMS pretende utilizar para que esses países consigam, de fato, fortalecer seus sistemas de vigilância para cumprir com o que exige o regulamento?

O esquema de avaliação externa que inicialmente vinha sendo proposta para determinar as capacidades básicas dos países gerou debates complexos e posições muito diferentes. Como resultado, ficou acordado que as avaliações externas aos países serão voluntárias e que os instrumentos para a avaliação serão definidos junto aos países.

Em termos de acompanhamento aos países durante o processo de fortalecimento de suas capacidades básicas, estão previstos mecanismos de cooperação técnica através dos escritórios regionais e locais. Também está previsto fortalecer a cooperação horizontal entre os países e, sobre isso, é importante continuar dinamizando essa cooperação em nossa região. Igualmente, a proposta para o novo PGT prevê fortalecer os esforços para facilitar a aplicação do RSI em escala mundial, regional e nacional.

Sobre esse tema é importante mencionar também que existem outras iniciativas que estão se desenvolvendo em paralelo para fortalecer a capacidade de resposta dos países em casos de eventos de saúde pública de importância internacional, como Global Health Security Agenda (GHSA), liderada inicialmente pelos Estados Unidos e que gerou igualmente posições muito diferentes na nossa região, e a iniciativa Pandemic Emergency Financing Facility, do Banco Mundial. É importante que a OMS consiga fortalecer e manter sua liderança e o gerenciamento no tema, incluindo em articulação com essas iniciativas.

Da agenda para a próxima Assembleia da OMS definida no Conselho Executivo, quais são as prioridades da Colômbia?

Definitivamente o acesso aos medicamentos, que tem sido uma das nossas prioridades pelo menos nos últimos 5 anos, e neste bloco temos um interesse especial no tema da biotecnologia. Sobre esta questão, temos uma resolução de 2014 liderada pela Colômbia e pela Argentina e a expectativa é de que, na próxima Assembleia, tenhamos informações sobre o progresso na sua implementação.

Por outro lado, existem as doenças não-transmissíveis e as medidas que estão sendo promovidas nos países para preveni-las, como medidas para proibir a propaganda do tabaco, rotulagem de alimentos e impostos saudáveis. Cada país tem suas particularidades e essas medidas foram e ainda são muito controversas, mas é importante trocar experiências sobre suas aplicações em diferentes contextos, de modo que cada país analise o que pode funcionar.

Além do PGT de que falamos, também há uma resolução que apresentamos por iniciativa da Costa Rica sobre a carga mundial por picadas de cobra, que busca fortalecer a nossa capacidade de resposta para responder cada vez melhor a essa problemática.

13

14

A BIOÉTICA E O DIREITO À SAÚDEO desenvolvimento de novas tecnologias sanitárias

no mundo permitiu salvar centenas de milhões de vidas. Começando por algo tão simples como lavar as mãos corretamente, passando pelo descobrimento da penicilina, o desenvolvimento de vacinas que permitiram controlar e erradicar doenças ou medicamentos antirretrovirais para tratar o HIV. A inovação e o desenvolvimento de novas tecnologias continua sendo uma prioridade na agenda da Saúde Pública. No entanto, a história do desenvolvimento de novas tecnologias também está cheia de comportamentos antiéticos e até criminosos que acabaram com a vida de milhares de pessoas. Há exemplos bestiais de experimentações com seres humanos, sem o seu consentimento informado e em condições que violam seus direitos básicos. Mesmo assim, há práticas que ainda são comuns, como os estudos clínicos experimentais em populações de países em desenvolvimento que, em muitos casos, não verão os benefícios da inovação que serão direcionados às populações de países desenvolvidos com maior poder aquisitivo. Tudo isso nos obriga a controlar de perto estes processos, para nos certificarmos que os direitos humanos sejam respeitados e promover o seu desenvolvimento em base ao interesse público.

Nunca é demais refrescar a memória sobre os casos que marcaram a história da bioética. Como bem dizem, “os que não conhecem a sua história estão

condenados a repeti-la”. Mesmo assim, os conceitos de bioética se desenvolveram muito e os contextos e pessoas que formam as Organizações mudaram até o ponto em que muitas das que aqui são mencionadas revisaram integralmente seus padrões de ação.

Para citar alguns exemplos, podemos começar na Guatemala, onde entre 1946 e 1948, centenas de pessoas foram infectadas com sífilis em um estudo clínico que procurava provar a eficácia da penicilina. O estudo foi patrocinado pelo Instituto Nacional de Higiene dos Estados Unidos e pela Oficina Sanitária Pan-Americana (hoje a Organização Pan-Americana da Saúde), com o aval do governo guatemalteco. O caso envolveu em sua maioria pessoas privadas de liberdade, soldados e pacientes psiquiátricos e os resultados nefastos do mesmo incluem efeitos comuns da sífilis como a cegueira, danos de órgãos, paralisia, demência e até morte.

O governo dos Estados Unidos pediu desculpas publicamente à Guatemala em 2010, após a revelação dos fatos por parte da acadêmica americana Susan Reverby. Ela descobriu enquanto estudava outro caso atroz conhecido como o estudo de sífilis de Tuskeegee (no estado do Alabama, EUA), feito pelo serviço de Saúde Pública dos Estados Unidos entre 1932 e 1972. Neste estudo, centenas de homens afro americanos portadores da doença foram enganados para pensarem que recebiam tratamento que, na realidade,

AO PONTOPor Carina Vance

SURSALUD

15

era placebo. O objetivo do estudo era conhecer o desenvolvimento natural da doença, tendo em vista que se contavam com evidências de que a penicilina era eficaz para o seu tratamento desde 1947. Apesar desta descoberta, transcorreram 25 anos antes de que se concluísse o estudo que causou a morte de dezenas de personas, e que se deteve não por causa de uma repentina dor na consciência dos “cientistas” a cargo do mesmo, mas sim, porque a informação sobre o estudo vazou para os meios de comunicação.

Infelizmente estes não foram fatos isolados. São muitos exemplos: os experimentos médicos em seres humanos por parte dos nazistas na década de 1940, a esterilização forçada de mulheres ao longo da história e que no caso do Peru, na década de 1990 foi financiado pela USAID e pelo Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA). E mais recentemente, em 2012, um caso na Argentina no qual a empresa farmacêutica GlaxoSmithKline foi multada por um juiz por não contar com o devido consentimento informado num estudo de uma vacina para a pneumonia feito com milhares de bebês, dos quais 14 morreram.

Como resultado destes casos, os regulamentos relacionados à bioética foram fortalecidos e milhares de comitês de bioética foram criados pelo mundo. Vários instrumentos internacionais pretendem nos certificar que os estudos em seres humanos se desenvolvam com estrito respeito aos direitos

humanos, entre eles o Código de Nuremberg, a Declaração de Genebra e a Declaração de Helsinki. Igualmente, as Boas Práticas Clínicas (BPC) fundamentam a necessidade de que todo estudo clínico se desenvolva sob os princípios de respeito às pessoas, solidariedade e justiça. Nisso, é destacada a contribuição da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) que foi a primeira organização das Nações Unidas a contar com uma instância exclusivamente dedicada ao tema. É a UNESCO que convoca anualmente o Comitê Internacional de Bioética, formado por especialistas de vários países em âmbito mundial.

Em âmbito regional, os avanços também têm sido importantes. A Rede de Comitês Nacionais de Bioética da América Latina e do Caribe, formada em 2011 com o apoio da UNESCO, conta com a participação majoritária dos países sul-americanos que, até o momento, são nove. É claro que, à medida que os países sul-americanos fortaleceram sua capacidade de inovação e desenvolvimento tecnológico em saúde, fortaleceram também sua capacidade regulatória. De uma região que levanta o objetivo de alcançar sistemas de saúde universais, com base no direito à saúde, não poderia ser de outra forma. Ainda há muito o que fazer no campo da bioética, mas estes avanços demonstram que vamos por um bom caminho.

INSTITUCIONAL

Todos os anos, com o objetivo de prestar contas aos Ministérios de Saúde da América do Sul, às instâncias da UNASUL e à cidadania em geral, o Instituto publica um informe com todas as suas atividades realizadas no ano anterior. Isso inclui os eventos que organizamos ou dos quais participamos, nossos estudos e os acordos que assinamos para fortalecer

PÍLULAS

NOVA ESTAGIÁRIA

O ISAGS tem uma nova estagiária na área de Vigilância em Saúde, sob a coordenação do especialista Eduardo Hage. Vanessa Veintimilla é graduada em Ciências Ambientais pela Pontifícia Universidade Católica do Equador, Sede Esmeraldas. Atualmente cursa mestrado de Estudos Socioambientais na FLACSO Equador e cursa uma especialização em Políticas Públicas para a Igualdade na América Latina na CLACSO. Se desenvolveu profissionalmente em organismos não governamentais como a OXFAM, a Cáritas Internationalis, a World Vision; e no setor público no Ministério da Saúde do Equador, na Secretaria de Gestão de Riscos.

SAÚDE INTERCULTURAL

Nosso estagiário em Determinação Social da Saúde, Juan Francisco Bacigalupo apresentou um trabalho sobre “Saúde para os migrantes na América do Sul: Um Olhar Intercultural” nas XXXIII Jornadas Chilenas de Saúde Pública. A reunião teve como tema: “A Saúde do Povo é Tudo” e aconteceu entre os dias 10 e 12 de janeiro nas dependências da Escola de Saúde Pública da Universidade do Chile. Em breve, a área de Determinação Social da Saúde do ISAGS também lançará um estudo sobre o tema.

REUNIÃO INTERNACIONAL SOBRE TUBERCULOSE

No marco do Programa “Fortalecimento da Rede de Laboratórios de Tuberculose na Região das Américas”, administrado pelo ORAS–CONHU, o ISAGS participou, no dia 15 de fevereiro, da “Reunião de Ministros e Secretários de Saúde – Contribuição da Integração Regional nas Américas: Rumo à Meta Fim à Tuberculose”, na sede da Comunidade Andina de Nações (CAN), juntamente a representantes de 20 países da América do Sul e da América Central. O programa tem o financiamento do “Fundo Mundial de Luta contra a AIDS, a Tuberculose e a Malária” e conta também com o acompanhamento da Organização Pan-Americana da Saúde (OPS/OMS), e do Conselho de Ministros de Saúde da América Central e República Dominicana (COMISCA-SICA).

ISAGS LANÇA INFORME ANUAL COM OS DESTAQUES DE 2017

a diplomacia da Saúde na região. Uma novidade para este ano é que redesenhamos o formato do Informe para deixá-lo mais atrativo e para facilitar a leitura, sem perder o enfoque na transparência da gestão da informação do ISAGS.

O objetivo foi apresentar os fatos de maneira simples, com enfoque na informação. Assim, nossos leitores terão dados de forma objetiva que permita encontrar o que for de seu interesse em uma consulta. Por outro lado, também optamos por publicar esta edição separada, em espanhol e em inglês (os dois idiomas de trabalho oficiais da UNASUL). A ideia é facilitar uma diagramação mais intuitiva e esquemática.

Além das atividades em destaque da Unidade de Gestão do Conhecimento e Investigação (UGECOIN), o Informe faz um resumo das novidades do ano, como o Curso de Diplomacia da Saúde no Contexto da Integração Sul-Americana, o ciclo de debates Diálogos do Sul, o Programa Internacional de Estágio do Instituto e as novas maneiras que encontramos para divulgar nosso trabalho seja por essa revista ou pelas redes sociais.

No entanto, talvez a grande novidade da publicação seja um capítulo dedicado às mudanças de gestão impulsionadas pela Unidade Administrativa, Financeira e de Talento Humano (UAFTH) que foram facilitadas sobretudo pela aprovação do nosso acordo de sede com o Brasil no ano passado. Um dos resultados disso foi, por exemplo, uma economia nos gastos operativos de 51% em relação a 2016 e de 41% nos custos de eventos, mesmo com um aumento nas atividades realizadas.

A versão impressa do Informe será enviada aos Ministros da Saúde da UNASUL e aos chefes das Oficinas de Relações Internacionais dos ministérios. A versão digital estará disponível para todos em nosso site o mais breve possível.