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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA INSTITUTO DE LETRAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LÍNGUA E CULTURA ROBÉLIO GUIMARÃES DOS SANTOS CARIA FILHO CONTRADIÇÕES ENTRE AS ESTRATÉGIAS COGNITIVAS PARA O ENSINO DE LE E A PRODUÇÃO DE PESQUISAS PELOS EXPERTS DA ÁREA: UM ESTUDO EM CURSOS LIVRES EM SALVADOR Salvador 2009

ROBÉLIO GUIMARÃES DOS SANTOS CARIA FILHO · 2018-05-10 · universidade federal da bahia instituto de letras programa de pÓs-graduaÇÃo em lÍngua e cultura robÉlio guimarÃes

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

INSTITUTO DE LETRAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LÍNGUA E CULTURA

ROBÉLIO GUIMARÃES DOS SANTOS CARIA FILHO

CONTRADIÇÕES ENTRE AS ESTRATÉGIAS COGNITIVAS PARA O

ENSINO DE LE E A PRODUÇÃO DE PESQUISAS PELOS EXPERTS

DA ÁREA: UM ESTUDO EM CURSOS LIVRES EM SALVADOR

Salvador

2009

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ROBÉLIO GUIMARÃES DOS SANTOS CARIA FILHO CONTRADIÇÕES ENTRE AS ESTRATÉGIAS COGNITIVAS PARA O

ENSINO DE LE E A PRODUÇÃO DE PESQUISAS PELOS EXPERTS

DA ÁREA: UM ESTUDO EM CURSOS LIVRES EM SALVADOR

Tese apresentada ao Programa de Pós Graduação em Língua e Cultura da UFBA, doutorado na área de Lingüística Aplicada ao Ensino de Língua Estrangeira, como requisito parcial para a obtenção do grau de doutor em letras.

Orientador: Prof°. Dr. Luciano Lima Rodrigues

Salvador

2009

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Sistema de Bibliotecas - UFBA

Caria Filho, Robélio Guimarães dos Santos.

Contradições entre as estratégias cognitivas para o ensino de LE e a produção de

pesquisas pelos experts da área : um estudo em cursos livres em Salvador / Robélio

Guimarães dos Santos Caria Filho. - 2010.

326 f. : il.

Inclui anexos e apêndices.

Orientador: Prof. Dr. Luciano Lima Rodrigues.

Tese (doutorado) - Universidade Federal da Bahia, Instituto de Letras, Salvador, 2009.

1. Língua inglesa - Estudo e ensino - Salvador (BA). 2. Hegemonia. 3. Cognição.

4. Subjetividade. 5. Tradução. 6. Repetição (Retórica). 7. Diferenças individuais. I.

Rodrigues, Luciano Lima. II. Universidade Federal da Bahia. Instituto de Letras. III. Título.

CDD - 428.24

CDU - 811.111(07)

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ROBÉLIO GUIMARÃES DOS SANTOS CARIA FILHO

CONTRADIÇÕES ENTRE AS ESTRATÉGIAS COGNITIVAS PARA O

ENSINO DE LE E A PRODUÇÃO DE PESQUISAS PELOS EXPERTS

DA ÁREA: UM ESTUDO EM CURSOS LIVRES EM SALVADOR.

Tese apresentada ao Programa de Pós Graduação em Língua e Cultura da UFBA, doutorado em, na área de Lingüística Aplicada ao Ensino de Língua Estrangeira, como requisito parcial para a obtenção do grau de doutor em letras.

Salvador, 19 de abril de 2010

BANCA EXAMINADORA

Profº Dr. Luciano Lima Rodrigues – Orientador Universidade Federal da Bahia _____________________________________

Profª. Drª. Stela Rodrigues

Universidade do Estado da Bahia _____________________________________ Profª. Drª Denise Zoghbi Universidade Federal da Bahia ______________________________________ Prof°. Dr. Kanavillil Rajagopalan Universidade Estadual de Campinas ______________________________________ Prof°. Dr. Gustavo Vasco da Gama Universidade Federal da Bahia ______________________________________

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A minha mãe, que sempre intuía que

algo bem feito, é algo feito.

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Agradeço a professor Luciano Lima pelas constantes instigações no meu pensar. A Alexandre Sousa pelo companheirismo. A América Cesar pelas observações textuais e metodológicas. A Cândido Fontan e Sílvia Pinheiro pelas trocas críticas sobre a prática de ensinar. A Sayonara Amaral pela identificação no processo de doutorado, dores e sabores.

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“É bem provável, entretanto, que o ensino de língua realmente eficiente não esteja preso, metodológica- mente, à nenhuma interpretação do processo de ensino ou do processo de aprendizagem. Aprender uma língua é uma tarefa exigente e complexa, que precisa ser entendida não apenas em termos psicológicos, mas também em termos sócio-culturais; esse processo não é, de forma alguma, a mesma tarefa para todos os estudantes e numa sala de trinta alunos, haverá provavelmente, trinta diferentes formas e estilos de aprender. Seria surpreendente se qualquer uma das concepções desses processos fosse igualmente válidas para todos.” (HALLIDAY, 2009, p. 305, tradução nossa) Acontece com os livros o mesmo que com os homens, um pequeno grupo desempenha um grande papel. (Voltaire)

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RESUMO

Nas últimas décadas, tem-se visto a área de EILE subalternizada por uma tendência de substituir metodologias de ensino, preferencialmente, por pacotes de abordagens e métodos, tomados como mais atraentes e utilizados sem a devida retificação de aspectos de abordagens anteriores. Esse fato levou a muitas contradições entre certas pesquisas na área e a práxis de ensino de LE. Analisamos, nesse trabalho, pesquisas da área de estratégias cognitivas feitas com alunos, algumas delas excluídas da didática de LE. Nossa hipótese foi verificar a existência de contradições entre estudos que apontam as estratégias de tradução e repetição, usadas por alunos da sala de LE e outros que as desconsideram. Procedemos entrevistas com alunos, professores e coordenadores de cursos livres de Inglês sobre essas exclusões localmente. Nosso objetivo aqui foi duplo: o primeiro foi refletir como as estratégias de tradução e repetição, ratificadas em pesquisas com alunos de LE, são excluídas da didática das aulas de LE, através de micropoderes exercidos por professores e coordenadores em alguns cursos de língua inglesa, em detrimento da escuta dos alunos e de suas estratégias de aprender. O segundo foi compor uma “microgenealogia” desse micropoder nos cursos livres, o como e o porquê essas estratégias declaradas pelos alunos são excluídas. Confirmamos muitas das nossas suspeitas nessas entrevistas conduzidas com alunos, professores e coordenadores. Nesse trabalho os alunos de LE entrevistados confirmam que as estratégias analisadas, tradução e repetição, são-lhes necessárias, observando-se uma contradição entre o que os estudos de cognição dizem e seu uso na práxis do ensino de LE. PALAVRAS-CHAVE: Necessidades subjetivas dos alunos. Poder e ensino de ELE. Tradução e repetição. A ética da diferença em TEFL. Micropoder em TEFL.

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ABSTRACT

The last few decades have seen TEFL being subjected to a tendency toward the replacement of its older methodologies, in preference to the modern, attractively packaged approaches and methods without the rectification of the former. This has led to many contradictions among researches in this field. This thesis has undertaken the analysis of cognitive strategy research conducted with students, some of them excluded from the FL didactics. Our hypothesis was to verify the existence of contradictions among studies that indicate translation and repetition, used by FL students with others that disregard them. We conducted interviews about those exclusions with students, teachers and co-ordinators of local English courses. The aim of this thesis is two-fold: the first was to reflect how the cognitive strategies of translation and repetition, ratified by researches with FL students are excluded from FL didactics through micropowers exercised by teachers and co-ordinators, in some English courses, detrimental to the listening of students‟ own learning strategies. The second was to write a microgenealogy of that micropower in these courses, the how and the why some cognitive strategies declared by students themselves, are excluded. Many of our suspicions have been confirmed from the interviews conducted with students, teachers and co-ordinators. In this thesis students have confirmed that translation and repetition are important to their learning, ratifying contradictions between what cognitive strategies studies say and their real use in praxis of FL. KEYWORDS: Students‟ subjective needs. Power and teaching EFL. Translation and repetition. The ethics of difference in TEFL. Micropower in TEFL.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

FIGURAS

1. Projeto taxonômico de Littlewood para a didática na abordagem

comunicativa

108

QUADROS

1.Estratégias cognitivas que envolvem interação com o material a ser

aprendido, manipulação mental ou física com este material ou aplicação de uma técnica específica no exercício da prática.

60

2.A Ordem de classificação das atividades de ensino de acordo com a percepção de utilidade considerada por professores no programa AMES.

101

3.Partes da aula mais significantes na percepção dos “alunos” de LE. 102 4.Comparação de atividades de aprendizagem na percepção do estudante e

do professor

105

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LISTA DE SIGLAS

AILA = Associação internacional de lingüística aplicada ALM = Audiolingual method (Método áudio lingual) ASL = Aquisição de segunda língua EASL = Estudos de aquisição de uma segunda Língua ELI = Ensino de língua inglesa EILE = Ensino de inglês como língua estrangeira ELE = Ensino de língua estrangeira ESL = Ensino de língua HA = Habilidades de aprendizagem HL = Habilidades lingüísticas ILE = Inglês como uma língua estrangeira

ISL = Inglês como uma segunda língua LA = Lingüística aplicada LAC = Lingüística aplicada crítica LE = Língua estrangeira LE‟s = Línguas estrangeiras LI = Língua inglesa L1 = Língua um. (Língua Materna) L2 = Língua dois. (Língua Meta) SL = Segunda língua

TCC = Curso de treinamento e formação de professores. TDC = Curso de desenvolvimento profissional ou de reciclagem. TEFL = EILE (Ensino de inglês como língua estrangeira)

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TESOL = Associação internacional de professores de Inglês para falantes de outras línguas BRASTEOL = Representação da TESOL no Brasil BABRASTESOL = Divisão da TESOL para o estado da Bahia

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 14

1 ALGUNS TEÓRICOS QUE PODERÃO REFINAR A COMPREENSÃO DE NOSSAS ENTREVISTAS SOBRE ENSINO E PODER

23

2 PROBLEMATIZANDO A ÉTICA DA DIFERENÇA EM PESQUISAS DE ENSINO DE LÍNGUA ESTRANGEIRA

54

2.1 CONCEITO DE PÓS-MÉTODO AUXILIA O DESCENTRAMENTO DE SABERES

72

3 CONTRIBUIÇÃO DE RENÉ RICHTERICH À PERCEPÇÃO DAS SUBJETIVIDADES NO ENSINO DE LE

77

4 AFINAL, O “ALUNO” SENDO OUVIDO. TORNANDO-SE ESTUDANTE?

92

4.1 LACUNAS ENTRE PERCEPÇÕES DIDÁTICAS DE “ALUNOS” E DE PROFESSORES

98

5 INTERPRETAÇÃO DAS CATEGORIAS COGNITIVAS EXCLUÍDAS NESSE TRABALHO

111

5.1 OUVINDO OS ALUNOS SOBRE CERTAS OMISSÕES DE ESTRATÉGIAS COGNITIVAS

114

5.2

OUVINDO OS PROFESSORES, COORDENADORES E PROPRIETÁRIOS DE CURSOS LIVRES DE LE, SOBRE OMISSÕES DE ESTRATÉGIAS COGNITIVAS

115

CONSIDERAÇÕES FINAIS 118

REFERÊNCIAS 130

GLOSSÁRIO 136

APÊNDICES 139

ANEXOS 143

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INTRODUÇÃO

Apresento o escopo da tese de Doutorado, cujo tema central é a exclusão

de determinados saberes tidos “desqualificados”, os quais são dominados e

interditados por agentes de instituições de ensino em cursos livres de língua

estrangeira. Tais saberes excluídos estão expostos em Chamot e O`Malley (1995, p.

133-150), a saber: estratégias cognitivas de repetição e tradução. A minha

inquietação tem como ponto de partida a aceitação conformista e acrítica local

dessas exclusões que provém da hegemonia das pesquisas da área do mundo

anglófono e que são adotadas pelas comunidades acadêmicas em geral e,

especificamente, pelos cursos livres de LE em Salvador. A nossa crítica não é

exatamente contra essa hegemonia que advém mesmo das necessidades históricas

da aprendizagem de inglês, mas ao fato de nos submetermos a esses

conhecimentos sem adaptações locais.

Considero que ocorre por parte do corpo docente e das coordenações

desses cursos livres uma reprodução indiscriminada do conhecimento publicado por

especialistas da área de ensino de LE. Denominarei a valorização dessas

publicações, predominantemente oriundas de especialistas anglófonos da área de

LA, usando dois termos: “novofagismo” ou “novidadorismos” metodológicos. Esses

termos configuram a ansiedade dos profissionais de educação de LE em consumir

os lançamentos importados pela indústria de ensino de língua Inglesa, numa busca

constante pelo novo.

Suspeito que esse modo de recepção “novofagista” impossibilita o rapport

didático, a relação didática, a troca de informação de estratégias cognitivas de

aprendizagem dos alunos dos cursos de LE com seus professores. Se esse

“novofagismo” implica na imposição tácita de novas formas e culturas de ensino,

desconsiderando as vozes dos estudantes em sua cultura de aprendizagem local, tal

procedimento, possivelmente resultará em prejuízo para os alunos de LE, já que

eles deverão se afastar, culturalmente, de suas formas de aprender e de “ser

ensinado.” Residiria, aqui, uma forma de exercício da exclusão e desqualificação

dos saberes desses estudantes.

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Executarei uma pesquisa com alunos e professores, para avaliar, a

princípio, a eficácia das estratégias cognitivas de tradução e repetição levantadas

por Chamot e O´Malley (1995) e sondar se elas resistiram ao tempo. Elas serão

tratadas, aqui, como categorias de análise. Traçaremos o percurso dessas duas

estratégias ou categorias cognitivas, para buscar entender qual será o motivo de sua

recusa na didática do ensino de LE para adultos em seu contexto local e

contemporâneo. Num segundo momento discutiremos os motivos de suas

exclusões.

Este trabalho se constituirá de cinco capítulos. No primeiro capítulo, farei

uma revisão teórica da epistemologia, a partir das transformações pós-física

quântica, e questionarei a exclusividade da tradição cientificista anglófona, usada na

área de educação de L2, em LA, na concepção de suas pesquisas e teorias, que

tentam “cientificizar” o campo de ELE e ASL, tornando-o quase que um campo das

ciências exatas. Essas pesquisas se caracterizam, principalmente, por um

cientificismo empírico, sem levar em consideração a ética da diferença

(PENNYCOOK, 2006, p. 14, 142) e sob cuja perspectiva examinaremos as razões

subjacentes dessas exclusões de estratégias cognitivas, anteriormente citadas.

Um lembrete antes de continuarmos: esse trabalho sempre estará

permeado de inúmeras perguntas que estão em contato com o tema. Não é minha

pretensão respondê-las e nem poderia. Mas acho minha obrigação instigá-las ao

longo de todo este escrito.

Recebemos, nos cursos de LE, de forma conformista, pesquisas de

aquisição, de cognição, de metodologias e aplicações das mesmas em livros

didáticos relacionados à educação de língua estrangeira, que se originam de

especialistas anglófonos, lingüistas e metodólogos, sobretudo. A experiência de

teorias pessoais de professores é absolutamente ignorada e as formas de aprender

dos alunos, sondadas em pesquisas com os mesmos, são desconsideradas, criando

uma dispersão nesse processo de aprendizagem diferenciado, que é a educação de

LE. Assim, traremos Gaston Bachelard que descentra a epistemologia cientificista

clássica que inspira nossa área e sugere uma pedagogia de ensino da epistemologia

que conviva com “novos padrões de empiricismo”.

Nesse sentido, farei uma interlocução da pedagogia da pesquisa

epistemológica anglófona, cientificista e newtoniana, usada majoritariamente na

nossa área, com atualizações epistemológicas de autores fora do mundo anglófono.

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Lembro que teremos que questionar essa epistemologia cientificista de forma muito

veemente, para podermos ser ouvidos e entendidos pelos profissionais de ensino de

ELI. Afinal, eles têm sido “aculturados”, em seus cursos de metodologia científica,

em um tipo de pesquisa quantitativa e empírica, onde discursos metodológicos

desconsideram a transdisciplinariedade de disciplinas afins, como a análise do

discurso, sociologia e outras, por não poderem ser validadas quantitativa e

empiricamente. Felizmente, a lingüística aplicada crítica já compartilha com alguns

autores anglófonos que persistem em ser ouvidos, diferenciando-se assim dos

cientificistas clássicos da lingüística aplicada. Não duvidamos da importância da

epistemologia quantitativa e empiricista, tradição do mundo anglófono; mas

discordamos da sua tendência predominante na área de lingüística aplicada,

sobretudo, da falta de diálogo com a cultura local de ensino-aprendizagem, embora

muitos autores já começam a dialogar com pesquisas mais qualitativas, menos

empíricas, onde não se exclui o social e o individual. Logicamente, na nossa área,

se importa muito o conhecimento comprado de países anglófonos, projetados ou

pesquisados, sobretudo para inglês como segunda língua. Esses países investem

na indústria do ensino de LE, Inglês, historicamente, desde pouco antes da Segunda

Guerra. Não é que tenha havido uma trama para essa hegemonia. Mas a hegemonia

atual não condiz mais com a idéia do World Englishes, uma língua que não pertence

aos países anglófonos, unicamente.

Diante da cultura epistemológica anglófona já referida,, que domina a

área da lingüística aplicada clássica, teremos que nos fundamentar de forma muito

coerente, para que possamos sentir, alargadamente, outros olhares menos

cientificistas, por exemplo, de pensadores, pedagogos francófonos e brasileiros, no

sentido de que nosso argumento seja respeitado e entendido por nossos

professores de língua estrangeira, coordenadores e outros. A crítica a como se

processa a pesquisa no mundo anglófono, na nossa área, justifica-se porque as

ciências, em geral, desde a microfísica, estão se transdisciplinarizando. Sentimos,

atualmente, o mundo do conhecimento mais sistêmico, no sentido de estar mais

interligado.

Usaremos conceitos de Bachelard de ruptura de conhecimentos e de

retificação dos mesmos, os quais servirão para questionar algumas pesquisas

contraditórias do mundo anglófono, cuja tendência é olhar a educação de LE,

pesquisar nessa área, usando uma epistemologia similar àquela do estudo das

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ciências naturais, contra-argumentadas nos capítulos um e dois desta tese.

Exemplificaremos essa imposição com um caso concreto de um aluno matriculado

em um programa de uma universidade, em outro estado, que teve seu trabalho de

dissertação em lingüística aplicada interrompido. O motivo disso foi a alegação do

seu professor de que seu projeto referia-se mais à educação do que à lingüística,

mesmo sendo, ambas, áreas afins, já que a lingüística do programa de seu

Mestrado é aplicada ao ensino de língua estrangeira. Examinaremos, com esse

exemplo, a total ausência da prática interdisciplinar e a rigidez cientificista que se

reflete no mundo da pesquisa, ainda, contemporaneamente.

Vamos nos fundamentar no conceito de relação dialógica na educação de

Paulo Freire, que será mencionada aqui como dialogicidade, e que obviamente não

acontece unicamente na nossa área. Assim, firmamos essa faltante relação e,

também, a ausência de mobilidade de autoridade e de dialogicidade entre os

membros da educação de LE, na nossa experiência. Não vamos explorar, em Freire,

o importante aspecto econômico do marxismo que evoca a diferença de classes e as

oportunidades dos estudantes na educação, nem a relação de poder da

superestrutura sobre a infra-estrutura, mas a necessidade e premência de negociar

participações mais democráticas no diálogo de territórios entre professores, alunos e

coordenação. Contudo, sentimos, informalmente, que os atores envolvidos na

educação de LE, ainda confundem e alguns entendem a possibilidade de dialogar a

prática didática com os alunos como perda do poder e da autoridade. Paulo Freire e

René Richterich tiveram a mesma percepção sobre a necessidade de ouvir e

dialogar com os membros do processo de educação de língua estrangeira: o

primeiro mais socialmente e o segundo mais cognitivamente.

Ainda no primeiro capítulo trataremos do poder dentro do mundo

acadêmico de ELE. Contudo, usaremos o binômio poder e saber com a

fundamentação de Michel Foucault (1999) da sua Genealogia e Poder na escrita de

uma provável genealogia na análise do micropoder da exclusão de estratégias

cognitivas. Esse autor será utilizado nas nossas interpretações da formação do

micropoder de coordenadores e professores que operacionalizam exclusões de

saberes genuinamente pesquisados em alunos, tratados no capítulo cinco, a ser

abordado na seqüência. Ele também será chamado na conclusão, onde faremos

uma breve genealogia do poder dominado, interpretados pelo autor como sepultado

e desqualificado; o primeiro deles verificando se as categorias cognitivas de

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tradução e repetição continuam excluídas do repertório de aprendizagem dos alunos

ou se isso é uma pretensão dos saberes acadêmicos sepultados pelos experts e,

por conseguinte, coordenadores, professores de cursos livres de LE. O segundo se

há a desqualificação do aluno como um dos autores da sua aprendizagem.

Gostaríamos de lembrar que fizemos dois capítulos teóricos. O capítulo

um e o capítulo três. E por quê? No capítulo um, os pensadores com quem

dialogamos serão utilizados para a compreensão do poder hierárquico, exercido

pelos professores e coordenação de cursos de língua estrangeira, um poder que

sepulta e impede uma maior independência e criticidade ao ensino de LE, no nosso

ambiente cultural, assim como alguns que atualizam a visão das disciplinas de

metodologia científica e apontam como os saberes são dominados nos ambientes

acadêmicos. Assim, repetimos, recorremos a Bachelard, Morin, Foucault e Paulo

Freire para a argumentação, na luta para compreender esse processo de forma mais

próxima ao homem, dentro do social, considerando as subjetividades do mesmo e

buscando, numa microgenealogia desse poder, as razões dos professores para

excluir da didática de cursos de língua, por exemplo, as categorias de estratégias

discutidas aqui: tradução e repetição. E esses autores estarão nas considerações

finais. O segundo capítulo teórico, o de número três, será explanado e justificado na

seqüência descritiva dos capítulos.

Morin e seu conceito de complexidade (MORIN, 2003, p.175)

possivelmente nos fundamentará nas interpretações das nossas conclusões, quando

verificaremos se a nossa área de ASL e ESL tem sido excessivamente racionalista-

empirista e como essas pesquisas da área de LA estão insensíveis às subjetividades

dos seus atores e aos problemas sociais que a aprendizagem de uma LE traz.

Morin transcende, com esse conceito acima, as idéias concebidas pelo cientificismo,

pelo determinismo, que não permite mistérios, enfim de uma compreensão de que

os assuntos humanos na educação não são tão simplificáveis como o nosso pensar

subalternizado e permissivo em relação ao mundo anglófono desejaria. Com o

conceito de complexidade, a reflexão sobre a educação se alarga, na medida em

que ele discorda e nos prova que a autonomia total, na vida humana, igualmente,

inexiste.

Enfim, nesse primeiro capítulo, questionaremos a exclusividade da quase

prioridade anglófona na pesquisa do nosso campo, ilustrando um novo olhar

bachelardiano e dos outros autores aqui mencionados sobre a pesquisa anglófona

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no ELE. Mas chamo atenção que não somos contra a importação do conhecimento

anglófono na nossa área. Criticamos a reprodução acéfala dos mesmos e a sua

implantação entre nós, sem crivos culturais locais. A presença desses teóricos é

justificada, por conta da hegemonia epistemológica introjetada na cultura de ensino

e pesquisa de cursos de LE, localmente e, certamente, no país. E isso, como

mencionado anteriormente tem razões históricas. Estamos questionando idéias

hegemônicas e, sobretudo, a nossa atitude passiva em relação às mesmas e

precisamos nos aprofundar com a idéia desses pesquisadores para nos

posicionarmos criticamente quanto ao resultado de suas pesquisas e a validade

delas entre nós.

O segundo capítulo trata de outra problemática deste trabalho, que se

constitui num importante tema, a saber, a falta local de reconhecimento das

pesquisas de estratégias cognitivas feitas com alunos, em ambiente de

aprendizagem igual ao nosso, ELE, contrariadas, contraditas ou, ainda, omitidas do

cenário de ensino e aprendizagem de ILE, diante da atitude novofágica que nos faz

assimilar os lançamentos dos experts anglófonos e que são reproduzidos

acriticamente pelos cursos de ILE locais. Não estamos falando de culpa, mas de

postura ou falta de agenciamento em pensar o conhecimento que recebemos.

Um importante questionamento nosso é o porquê dessa falta de ética da

diferença, conceito já explanado aqui, ao discutir essa exclusão e como esse

micropoder passa por cima dos desejos dos alunos, desqualificando esses atores

fundamentais para a existência de nossa profissão. Assim, revisitamos trabalhos já

realizados de estratégias cognitivas na aquisição de segunda língua de Anna

Chamot e J. M. O‟Malley (1995, p.133-150, tradução nossa), que ouvem os alunos

de LE e suas diversas estratégias utilizadas, que tentaremos reavaliar e atualizar, a

exemplo da tradução e da repetição.

O terceiro capítulo será o segundo capítulo teórico. Nele abordaremos,

inicialmente, um lingüista fundamental para a compreensão das interpretações das

entrevistas com os alunos, o suíço-francês René Richterich, pilar para a inserção do

aluno no processo de educação de LE. Além dele, serão trazidos outros anglófonos

que enveredaram por uma pesquisa mais subjetiva inspirada em Richterich, no

andamento daquilo que este autor não pôde continuar, devido a seu

desaparecimento em 1997, como consta de informação anexa a esse trabalho, um

correio eletrônico vindo de uma funcionária do Conselho da Europa. David Nunan se

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apropria do conceito de Richterich de necessidades subjetivas dos alunos,

agregando-o no seu livro, Learner Centred Curriculum, (Currículo Centrado no

Aluno), inspirado nos questionamentos de subjetividade de Richterich. Faremos um

histórico do seu pensamento e da sua participação na formação do modelo europeu

de ensino comunicativo, que ele e outros três teóricos, J. M. Trim, Jan van Ek e D. A.

Wilkins (TRIM et al., 1980) projetaram para a união Européia. Mas o que dele mais

nos interessa são os seus três princípios: a didática como fenômeno efêmero, a

escuta didática do aluno ou escuta das necessidades subjetivas dos mesmos e a

negociação dos professores e coordenadores com os alunos de uma didática onde

as demandas técnicas dos mesmos sejam ouvidas.

No capítulo quatro, reproduziremos e discutiremos as pesquisas

inspiradas nesses conceitos de Richterich (1977, 1977, 1980, 1983), citados acima,

feitas após seu desaparecimento, por alguns metodólogos e lingüistas anglófonos, a

exemplo do currículo centrado no aluno de Nunan (2000, p. 78-97, tradução nossa).

Basearemo-nos em muitos dos pesquisadores reproduzidos em Nunan, em diversas

pesquisas, nas quais os alunos são ouvidos sobre suas estratégias ou técnicas

preferidas e em outras que comparam expectativas de professores e alunos, os

resultados das mesmas, para confirmar as compatibilidades daquilo que pensa o

professor e daquilo que necessitam os alunos. Essas pesquisas servirão de

fundamento para a interpretação da fala dos alunos e dos professores, diante da

validade ou não das categorias que pesquisamos aqui. Elas serão usadas em nossa

pesquisa, no capítulo cinco, onde avaliaremos a validade das estratégias excluídas,

caso essa escuta nas entrevistas seja similar àquilo que ouvirmos desses atores.

Essas pesquisas serão norteadoras para confirmar e interpretar como professores

reagem à inserção dos alunos e como os alunos reagem à exclusão das duas

estratégias em discussão. Surpreende-nos como as concepções inspiradoras desse

lingüista francófono, Richterich, não reverberam, temporalmente, além do livro de

Nunan.

No capítulo cinco, teremos duas partes. A primeira será a transcrição de

entrevistas de inspiração etnográfica comentadas com nossas conclusões e que

serão conduzidas com alunos de cursos livres de LE. Pretendemos saber a posição

dos mesmos sobre as estratégias de tradução e repetição, possivelmente excluídas

da didática de suas aulas. Usaremos a fundamentação de Richterich do capítulo três

que trata das necessidades subjetivas dos alunos, que se relacionam também às

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suas necessidades didáticas. A segunda parte será composta das entrevistas dos

professores e coordenadores a serem comentadas, isto é, as posições dos

professores diante dessas exclusões cognitivas, mas nessa parte refletiremos com

os teóricos do primeiro capítulo teórico, Bachelard, Morin, Freire e Foucault para

entender essa exclusão. Buscaremos compor, como já mencionado, uma

microgenealogia de como esses saberes cognitivos são excluídos e quais são os

prováveis motivos e estratagemas para tal inibição desses saberes.

Nossa pesquisa de campo constará de entrevistas com alunos, na

primeira parte, e com professores e coordenadores na segunda; esta foi concebida

com um roteiro flexível; a gravação das mesmas será transcrita no capítulo cinco,

com uma legenda simplificada, pois o nosso objetivo é o conteúdo das respostas

que são contiguamente comentadas e interpretadas, destacadamente da seqüência

da entrevista, com espacejamento de um e meio. As perguntas e respostas terão

espacejamento simples. A localização dos turnos de fala será numerada e as

seqüências poderão ser recortadas, de acordo com o trecho escolhido, a ser

comentado, ou seja, os turnos que dizem respeito a nossa hipótese, a saber: se os

alunos contemporaneamente ainda validam as mesmas estratégias cognitivas, as

aqui chamadas categorias cognitivas, tradução e repetição e se existem

contradições entre teorias na área. E se assim for, pesquisas como a de Chamot e

O´Malley (1995) se contradizem com teorias de aquisição de língua, por exemplo,

com a de Krashen (1996) cujos conceitos de aquisição e aprendizagem relegam o

segundo deles para os alunos executarem em casa, desconsiderando à

compreensão de suas estratégias cognitivas na didática de suas aulas? Será que a

cultura de ensino local, ou outras culturas de ensino-aprendizagem estão

compatíveis com essa forma de aprender? Identificamos, assim, possíveis

contradições entre conhecimentos dos experts e o desejo cognitivo dos alunos.

Justificamos este trabalho na análise dessa hipótese, isto é, se essas contradições

entre pesquisas bastante díspares, consideradas circunstancialmente muitas vezes

como de ponta, podem estar em desacordo com estilos dos alunos de ELE, que têm,

dentre outras, uma especificidade absolutamente diferenciada: esses alunos não

estão imersos na cultura e língua metas.

Nossa transcrição visa obter informações dos atores envolvidos no

processo: coordenadores, professores e alunos, ora individual, ora coletivamente,

isto é, um entrevistador e um entrevistado, ou entrevistados, sem serem nomeados,

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porque nosso objetivo é enfocar o conteúdo de suas opiniões e interpretá-las e não

personalizá-las, nomeando seus autores. Lembramos que a numeração será

saltada, quando houver recortes do discurso a ser interpretado. Assim, um trecho

terminado com T32, turno de fala 32, será interrompido para comentários ou

interpretações e, após esse comentário, a ordem poderá ou não continuar com T33,

em seguimento à anterior. Não estaremos preocupados com a prosódia das

respostas ou perguntas, já que não estamos fazendo análise funcional do discurso.

Algumas partes dos textos poderão ser acrescentadas por adendos explicativos ou

suprimidas com os seguintes sinais: [ ] e [...]. O texto poderá ser corrigido e

eventualmente reescrito, mantendo o conteúdo intacto e igual ao original, mais uma

vez por uma questão de clareza, sempre buscando a fidedignidade, para melhor

entendimento do leitor. A forma do texto poderá ser eventualmente modificada,

nunca o conteúdo.

Avaliaremos, no capítulo cinco, como se constitui a exclusão das

categorias cognitivas mencionadas ao longo do texto, utilizando, sobretudo, os

conceitos de saber dominado e desqualificado, que formam um micropoder exercido

pelas coordenações e professores que incorporam em suas práticas docentes

lançamentos dos experts da área, impondo-os, sem adaptá-los, localmente. A

interpretação da fala dos alunos, dos professores e dos coordenadores será feita, no

capítulo cinco, através das entrevistas realizadas e com o suporte dos teóricos

mencionados nos capítulos um e três, conjuntamente com a minha experiência

como professor de língua estrangeira. Pretendemos entender esse complexo

emaranhado de interdições, onde se excluem duas categorias, tradução e repetição,

usando-se do poder sem negociação, mantido, possivelmente, pela conveniência de

conservar a linearidade das pesquisas da área, sem as retificações metodológicas

buscadas no passado, em detrimento do desejo e do estilo de aprendizagem do

aluno.

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1 ALGUNS TEÓRICOS QUE PODERÃO REFINAR A COMPREENSÃO

DE NOSSAS ENTREVISTAS SOBRE ENSINO E PODER

Nesse capítulo, revisitamos a epistemologia contemporânea, alguns

pensadores da pedagogia e discutimos, brevemente, a genealogia do poder na área

da LA e, especificamente, no ensino de LE. Examinaremos algumas óticas de

teóricos contemporâneos, não anglófonos, sobre esses aspectos acima

mencionados, como subsídio secundário na análise final a ser aprimorada, nas

considerações finais dessa tese. Discutiremos, após o relato da nossa pesquisa

como alguns conceitos de ciência e educação desses pensadores podem ajudar aos

professores de ELE.

Entretanto, a palavra secundário, acima usada, não significa menos

importante ou que venha em segundo plano, mas aquele conhecimento teórico que

deveremos usar num momento segundo, depois das análises das categorias que

serão usadas na pesquisa a ser relatada na problemática exposta, no capítulo dois,

e que poderão alargar nossa especulação das razões que se ocultam numa posição

pouco ética, na pesquisa de aquisição e aprendizagem de uma LE. A inserção

desses teóricos, aqui chamados secundários, neste primeiro capítulo e que estarão

presentes, sobretudo, na seção de considerações finais, é antecipada nesse

momento inicial, esclarecendo-se seus pensamentos e conceitos, antes mesmo de

citarmos os atores com que diretamente lidaremos na nossa pesquisa sobre a

manipulada exclusão de estratégias cognitivas. Nossa pesquisa será executada a

partir da fala dos sujeitos que se envolveram nesse estudo, a saber, os elementos

atuantes num curso livre de idiomas: proprietários, coordenadores, professores e

“alunos” sobre duas categorias cognitivas excluídas do meio de ensino de língua

estrangeira: a repetição e a tradução.

Discutimos aqui relações possíveis do pensamento do físico e filósofo,

mais tarde historiador da filosofia da ciência, Gaston Bachelard, com a rigidez e

manipulação de métodos no ELE; resgatamos conceitos de poder e saber da obra

de Michel Foucault sobre conservadorismo através da manutenção da ciência, do

conhecimento e poder; tratamos também da ampla compreensão do reducionismo

filosófico na epistemologia da educação, sobretudo, através do conceito de

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complexidade do educador Edgard Morin. Paulo Freire e seu conceito de relação

dialógica (BRITO et al., 2007, p. 165), aqui chamada dialogicidade, será outro

teórico que chancelará as nossas suspeitas iniciais de não existência de uma

relação dialógica didática entre professores e “alunos”. Enfim, do lugar deste aluno

na educação.

Resumiremos, então, brevemente, o que discutiremos nos próximos

capítulos. No capítulo dois, explanaremos as razões da nossa problemática de

pesquisa, a intrigante e contraditória exclusão de formas de aprender do aluno. No

capítulo três, examinaremos os principais conceitos da obra de René Richterich,

necessidades objetivas e subjetivas no ensino de LE, sobretudo esta última que

inspira um currículo baseado no aluno. No capítulo quatro, analisaremos o que já

existe investigado, aquilo que conhecemos sobre o tema, a saber, sobre a

necessidade da inclusão do aluno e suas escolhas didáticas nas aulas de LE e SL.

No quinto capítulo, relataremos e interpretaremos as entrevistas feitas nessa

pesquisa sobre duas estratégias de cognição elegidas por “alunos” e excluídas da

sala de LE e os feedbacks opiniões, de professores, coordenadores e “alunos”,

estes últimos (des)empoderados com suas vozes excluídas desse ensino. Essas

estratégias se tornam as nossas categorias de pesquisa: a repetição e a tradução,

feitas com os sujeitos envolvidos nesses cursos livres de LE. Examinaremos a

importância ou não das mesmas, com opiniões dos próprios “alunos”. No último

capítulo, apresentaremos as nossas conclusões sobre a pergunta de nossa tese.

Seguindo com o capítulo um, já explanado no primeiro parágrafo acima,

abordamos esses olhares teóricos nacionais, francófonos e de outras geografias

sobre a pesquisa em lingüística aplicada anglófona, do ponto de vista da ética da

diferença, na nossa área do conhecimento, o ensino de línguas estrangeiras, sua

epistemologia e prática.

Pensamos que o hiato existente na base de nossa forma de pensar o

conhecimento em geral e, especificamente, da área de ELE, ensino de língua

estrangeira, como pesquisador ou professor, está relacionado à dificuldade de

entendimento de uma pedagogia epistemológica que, constantemente, reflita sobre

a filosofia da ciência e do conhecimento. Seria como diz Edgard Morin, no subtítulo

de um dos seus livros, “[...] repensar a reforma e reformar o pensamento” (trata-se

do livro “A cabeça bem feita”), tarefa que deverá levar tempo e maturação. O pensar

da docência, em muitos exemplos, está aprisionado por um pensar reproducionista

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ou de manutenção de poder acadêmico, o qual se limita a um simulacro do

profissional hierárquico, que escolhe o que reproduzir do conhecimento nas

instituições, cursos de língua inglesa e outras, e seu status quo profissional dentro

delas. Um aspecto novo dessa problemática é a idéia do pós-método, que estará

presente no capítulo dois.

Aqui, argumentamos a transposição de conhecimentos da área de

filosofia, epistemologia e educação, dos autores citados, no início deste capítulo,

agregando os mesmos à lingüística aplicada crítica, um campo relativamente

recente da lingüística aplicada, trazendo este referencial para a área de ensino de

língua estrangeira, LE.

A cultura do ensino de metodologia da pesquisa e epistemologia

veiculadas nos cursos de graduação pouco informa sobre as atualizações ocorridas

nesta área, advindas das mudanças de paradigmas, no olhar científico

contemporâneo. Falamos da experiência enquanto aluno de graduação e pelos

diversos ementários nacionais, aos quais temos acesso. Num certo momento deste

capítulo, vamos comentar as razões pelas quais incluímos, criticamente, uma

pequena parte da história da filosofia das ciências, neste trabalho. Assim, veremos

mais especificamente, nos próximos dois parágrafos, o plano de abordagem deste

capítulo.

Por que e para que revisitar, no primeiro capítulo, a história da filosofia das

ciências? Senti, na minha experiência como estudante de disciplinas

epistemológicas, metodologia do trabalho científico e técnicas de pesquisa, ao longo

de minha formação acadêmica, que a pedagogia da epistemologia esteve ou tem

estado, nos nossos conteúdos programáticos, defasada. E, como dissemos

anteriormente, talvez ao revermos os descentramentos da epistemologia da física ou

da química contemporâneas, sobretudo, possamos entender melhor o que

precisamos repensar na nossa área de lingüística aplicada, LA, e justificar, quem

sabe, a premência de solidificar a lingüística aplicada crítica, LAC, sob novos pontos

de vista. Trazemos a epistemologia contemporânea neste capítulo para

examinarmos, assim, o estágio em que as pesquisas em lingüística aplicada e do

ensino de língua estrangeira, ELE, se encontram, em particular nos cursos de língua

no estado da Bahia e nos congressos e eventos nacionais e locais, da área.

Objetivamos trazer questionamentos transdisciplinares e investigar como essas

pesquisas são entendidas, epistemologicamente, nos nossos dias.

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Antes de prosseguirmos com as idéias desses autores mencionados,

queremos falar um pouco da minha experiência acadêmica com o mestrado. Fiz

uma dissertação de mestrado, ainda, metodologicamente, fundamentada na

pesquisa quantitativa e problematização estruturalista (na época inevitável), e o

projeto e seu conteúdo ainda de inspiração científica determinista, hipotetizando na

base de causa e efeito, com hipóteses a serem comprovadas ou não, reproduzindo

a tradição determinista anglófona de pesquisa. Precisávamos, então, nos restringir à

aplicação de pesquisas quantitativas, mas, já a essa altura, criticávamos a presença

de algumas contradições e cartesianismo na área. Questionávamos, por exemplo,

as exclusões de algumas estratégias cognitivas usadas pelos “alunos” na aquisição

de segunda língua e, sumariamente, expurgadas da sala de aula, como a repetição

e a tradução, nosso objetivo de análise.

Do ano 2000, quando do término do nosso mestrado, até os nossos dias,

e mesmo antes, no meado da década de noventa, houve muitas mudanças no olhar

epistemológico da pesquisa na área de LA, tardiamente recebidas por nós na

primeira década desse milênio, mas já em curso no mundo. Achamos que este novo

olhar crítico da LAC não tem sido subjetivado sem resistência pelos profissionais de

ensino de LE, porque nas nossas universidades existem alguns nichos de

acriticidade, impregnados de cientificismo empírico, que se mantêm resistentes à

transdisciplinariedade na lingüística aplicada.

Citaremos um exemplo do que afirmamos acima, que ilustra esta cultura

epistemológica continuísta, que parece resistir aos tempos céleres e mediáticos, nas

disciplinas epistemológicas, reproduzindo a forma de ensinar a pesquisar ou de

disseminar os conteúdos de pesquisa no ensino, deformando e sepultando

epistemologias mantenedoras de poder. Dessa forma, o conhecimento comum (não

se trata de senso comum), conceito de Gaston Bachelard que veremos mais

adiante, se repete ad infinitum, tornando-se um ciclo vicioso de pensar a ciência. O

exemplo, a propósito do comentário no parágrafo anterior, foi vivenciado há cerca de

um ano, aproximadamente: um colega inscrito num programa de lingüística aplicada

fora do nosso estado, em visita a Salvador, relatou-me textualmente: “O professor da

disciplina de pesquisa científica nos pediu para que lêssemos, em voz alta, os

nossos projetos de pesquisa, para feedback, trocas de opinião.” E seguiu relatando:

“Fui interditado pelo professor porque meu projeto contemplava elementos de outras

áreas, como educação e estudos da cultura, e ele classificou-o como um projeto da

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área de educação.” Finalmente, continuou ele, veio o veredicto: “Solicitou-me que o

refizesse e que esse deveria contemplar, autenticamente, a chamada área de

lingüística aplicada, sem diálogos com outras áreas, porque o meu projeto seria da

área de educação.” A propósito desta resposta, introduzo um dos nossos teóricos

neste capítulo, Bachelard (1971, p. 9, grifo nosso), resumido através de uma

passagem no prólogo de seu livro, escrito pela sua organizadora:

A realidade da epistemologia bachelardiana [...] é constituída de uma atuação aplicada, durante perto de um quarto de século, aos progressos contemporâneos das ciências físicas e químicas, por uma vigilância polêmica [...] às teorias filosóficas do conhecimento e frutos desses interesses combinados por uma retificação progressiva [grifo nosso], numa autopolêmica constante; [...] no seu recomeçar perpétuo ela exclui a forma do sistema por fazer do seu inacabamento essencial, [!] [grifo nosso] o índice de sua progressividade.

Certamente se instaura aí o reconhecimento do que questionamos

anteriormente, neste capítulo, isto é, a falta de uma pedagogia e conhecimentos

epistemológicos amplos, e a desatualização de ambos num lugar de “alta cultura”,

nichos de vanguarda, no sentido de cultura da elite, nichos de vanguardas, onde

professores deveriam se certificar dos seus pareceres e estarem atualizados sobre

os movimentos da epistemologia. Provavelmente, pela falta de diálogo inter e trans-

disciplinar, nos tornamos isolados do caminhar de outras áreas, tal como demonstra

a atitude da professora de metodologia da pesquisa. Sabemos que as universidades

funcionam como “caixas pretas” isoladas, através da individualização das crenças

aferradas de grande parte de seus professores, os quais, em geral, seguem a

mainstream, tendência mais aceita pela maioria. Seus acadêmicos preferem criar e

ensinar individualmente e os colegiados funcionam, a nosso ver, essencialmente

como órgãos administrativos, eventualmente, acadêmicos. Diferentemente disso,

fazendo um paralelo com outras áreas, os engenheiros, por exemplo, trabalham em

grupo, em dialogicidade, no sentido freiriano, transposto para essa realidade,

quando constroem, por exemplo, uma ponte. Entretanto, em sua grande maioria, nas

universidades, que são autônomas, os acadêmicos são fixistas e ficam enterrados

numa produção não transversal com outras áreas de conhecimento, aliás, posição

mais conformista, menos laboriosa e, sobretudo egóica. Sobre isso comenta

Bachelard (1971, p.103, grifo nosso):

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Não seríamos capazes de abordar um pensamento novo [...] com o espírito não preparado [...] a revolução científica, que assinala o pensamento novo, como um progresso do espírito humano, sem assumir seu eu social da cultura, [grifo nosso] [...] que o eu da cultura é a exata antítese da cultura do eu.

A “antidialogicidade”, a relação antidialógica (FREIRE, 1987, p. 77-83),

parodiando o antônimo do conceito de Paulo Freire, entre os membros de um

colegiado universitário, a omissão de conhecimento de muitos acadêmicos e

professores, seus olhares distanciados da filosofia e da epistemologia

contemporâneas, a exemplo dos filósofos da pós-modernidade, as resignificações

do conhecimento por retificações e rupturas, termos sugeridos por Bachelard,

exemplificam que a virada epistemológica nas ciências exatas, e, por conseguinte

em outros conhecimentos, como o lingüístico, mostra que essa área citada, das

exatas, considerada a “deusa” da cientificidade por Augusto Comte, tem

representado muito pouco para muitos de nós, da LA, ainda presos ao cientificismo

determinista, embora sejamos das humanidades!

Escreve Bachelard (1970, p. 18): “A ruptura com o conhecimento comum

[não senso comum] da física e da química [...] rompe com o conhecimento vulgar [da

escola] o que marca a profunda descontinuidade epistemológica.” Essa posição

marca um descentramento da epistemologia positivista, o qual, pelo exemplificado

no caso do mestrando, ainda não chegou a muitos acadêmicos e, por conseguinte,

nem às escolas e cursos livres de língua, que marcam o conhecimento comum

descrito acima.

As ciências exatas, nos parece, têm um histórico de empirismo radical; ao

mesmo tempo, no seu histórico enquanto conhecimento, foram forçadas a se

retificarem, tendo contemporaneamente, pelo menos em teoria, uma epistemologia

mais flexibilizada do que aquela ainda existente no nosso campo da lingüística

aplicada. E, por causa desta não resignificação ou falta de descentramento, nos

estudos lingüísticos, de modo generalizado, pela falta de uma pedagogia

contemporânea da epistemologia na área dos estudos lingüísticos e pela falta de

inter e transdisciplinariedade é que tentamos inserir aqui as idéias alargadas de

Bachelard e suas prováveis conseqüências na área de ensino de LE.

Examinaremos, à luz desse e dos outros pensadores contemporâneos citados, neste

capítulo, as causas da exclusão das categorias de repetição e tradução, caso sejam

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confirmadas pelos entrevistados, num último momento de interpretação e conclusão,

no último capítulo. Nossa pesquisa tem, assim, dois momentos: o primeiro,

pesquisar com os atores do ensino aprendizagem as exclusões de estratégias

cognitivas categorizadas na nossa pesquisa: tradução e repetição; o segundo

momento, após ter os resultados e feedbacks, opiniões, sobre a necessidade das

mesmas pelos seus atores, discutir com estes teóricos, Bachelard (1971), Morin

(2003, 2004) e Foucault (1999) as possíveis causas dessas exclusões, sobretudo,

como as mesmas se tornaram uma verdade, construída sócio-historicamente.

Conceitos de Bachelard que justificam a necessidade de rever como o

ensino da epistemologia clássica determinista criou e cria uma cultura homogênea e

conformista que continua se perpetuando é esse exemplo mencionado entre o

colega do projeto e seu professor de metodologia científica. Bachelard cita o seu

entendimento de ruptura e necessidade do descontinuísmo no conhecimento

humano. Um descontinuísmo da necessária retificação do passado e um

continuísmo retificador da ruptura para o novo, o que lhe dá a força de descentrar

conhecimentos do passado, recontextualizá-los no presente, retificá-los, trazê-los de

volta, sem destruir algumas fidelidades da razão do passado, isto é, conceitos do

passado que ainda vigem. Bachelard (1987, p. 77-83, grifo nosso), a propósito desta

discussão, comenta seu conceito de ruptura: ”A filosofia científica tem [...] de destruir

sistematicamente o que o limite da epistemologia tradicional tenha imposto à ciência

[conhecimento]. [...] Em resumo, a filosofia científica deve ser essencialmente uma

pedagogia científica”

Por isso inserimos esta problemática neste capítulo e retomamos

Bachelard mais adiante, cuja obra, a meu ver, deveria ser uma demanda

imprescindível na nossa cultura epistemológica. Agregamos este marco teórico, o

pensamento de Gaston Bachelard, dialogando criticamente com suas idéias na

nossa área de LAC, ao ensino de línguas estrangeiras.

O que houve, então, com este projeto do mestrando citado anteriormente?

Como essa atitude desse professor permanece no pensamento acadêmico até

nossos dias? Seria desconhecimento epistemológico, desatualização e, portanto,

falha na pedagogia científica do professor? Falta de diálogos internos entre

membros do corpo docente? Vivemos, então, ainda parcialmente, em décadas

anteriores, quando se excluía saberes, em vez de se somar? Descartes, na sua

citação emblemática, que dele herdamos e representa o auge da racionalidade

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filosófico-científica no ocidente, a conhecida conclusão, “penso, logo existo”,

organiza para os tempos vindouros a nossa visão de racionalidade. O cartesianismo

instaura filosoficamente a noção de sujeito na filosofia e, por conseguinte, de objeto

na ciência (afinal se sou sujeito pensante, penso, mas, fora de mim, existem os

objetos e estes são passíveis de minha análise). Esta divisão instaura,

indiretamente, a ciência empírica na modernidade e, pela primeira vez, diferencia,

implicitamente, o sujeito do objeto. Contudo, sabemos que se esta divisão inaugura

o sujeito racional, em princípio libertado de cânones histórico-religiosos que

aprisionavam sua razão, não obstante, por outro lado, funda com suas regras

lógicas a separação e redução do conhecimento do “objeto”, despedaçando-o.

Dentro dessa perspectiva, analisemos o ensino ministrado pelo professor

de metodologia científica do mestrado do nosso colega, que interditou seu projeto

transdisciplinar, por achar que transcende da LA para a educação. Nesse momento

ele fala de um lugar do passado, cartesiano, pois houve uma divisão e uma redução

de um campo de estudos e flagramos, nesta situação, o segundo princípio

metodológico de Descartes, dentre os quatro princípios da lógica no Discurso do

Método, que relacionamos nesta querela do mencionado projeto, representado na

subjetivação da solicitação do professor mencionado. Esse é: “o segundo [princípio],

dividir cada uma das dificuldades que examinasse em tantas parcelas quantas

fossem possível e necessário para melhor resolvê-las.” (DESCARTES, 1996, p. 23).

Desagregar ou separar em diferentes quadrantes é a ordem em Decartes neste

contexto.

Neste momento contrapomos o reducionismo da atitude deste professor

referido, com uma citação de Edgar Morin, (2004, p.14):

[...] a inteligência que só sabe separar fragmenta o complexo do mundo em pedaços separados, fraciona os problemas, unidimensionaliza o multidimensional. Atrofia as possibilidades de compreensão e de reflexão, eliminando assim as oportunidades de um julgamento corretivo, ou de uma visão de longo prazo.

Como dito, esses teóricos que chamamos de secundários e com os quais

dialogamos aqui serão utilizados nas nossas conclusões, na interpretação da

construção dessa verdade: não se pode traduzir e nem de deve repetir

mecanicamente na aprendizagem de LE Estas exclusões cognitivas no ensino serão

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problematizadas quando discutirmos as razões da nossa pesquisa, no capítulo

vindouro.

Continuamos nos perguntando como podemos dissociar, sem pensar

transdisciplinarmente, temas das ciências humanas, da educação, dos direitos

humanos, dos direitos da mulher, da etnicidade e das minorias em geral, da

cognição, essencialmente social, sem a quebra deste rigor metodológico que, como

diz Morin, acima, atrofia e determina fronteiras ao conhecimento? Como podemos

continuar fechados a outros saberes humanos numa área de humanidades,

interligada por natureza, o ensino de LE? Buscamos informação ou sabedoria?

Como Morin, também citamos T. S. Eliot: “Onde está a vida que se perdeu na vida?

Onde está o conhecimento que perdemos na informação? Onde está a sabedoria

que perdemos no conhecimento?” (ELLIOT, 1980, p. 96, tradução nossa). Morin

(2004, p. 16) continua:

[...] pensar o problema do ensino, considerando, por um lado, os efeitos mais graves da compartimentização dos saberes e da incapacidade de articulá-los, [grifo nosso] uns aos outros; por outro lado, considerando que a aptidão para contextualizar e integrar é uma qualidade do ser humano, que precisa ser desenvolvida e não atrofiada.

Colocada esta citação de Edgar Morin e, apesar dela, sentimos que por

outro lado tem havido uma evolução para uma visão mais ampla do conhecimento,

com elaboração subjetiva e atitudes mais complexas e reflexivas nos trabalhos de

pesquisa e produção científica. Isso ocorre de forma crescente e vagarosa, em

algumas instituições universitárias, na contemporaneidade com a chegada das

disciplinas críticas, a LAC com Pennycook (2001), Rajagopalan (2003), Moita Lopes

(2006), para citar os mais próximos e a Pedagogia Crítica, sobretudo com Bonny

Norton (2005), Kelleen Toohey (2005), Canagarajah (1999), dentre inúmeros outros.

A lingüística aplicada a alguma área, como ao ensino de língua, sai do autonomismo

e se abre para estudar a língua ou linguagem com um questionamento

transdisciplinar, sem reconhecer um campo, sem fechá-lo, mas objetivando o

questionamento do uso da língua na prática social. (ALMEIDA FILHO, 2005, pg23).

Assim, a LAC apresenta interesses diversificados, como relações de poder e

interferências em populações minoritárias, línguas em contato, ética da diferença,

estudos de gênero, sexo e raça, dentre inúmeros problemas do uso social da língua.

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E essa processual mudança ocorre, na nossa área, por estarmos a somar

outros campos de conhecimento aos estudos da lingüística aplicada formal. Esta

aborda, unidimensionalmente, por exemplo, a chamada aquisição de segunda língua

ou ASL, isto é, ora estudos psicológicos e racionais explicando o processo de

aquisição de uma LE, ora pesquisas empíricas do processo aquisicional para

comprovar as hipóteses racionais sobre o desenvolvimento da learner language, a

língua analisada produzida pelo aluno, objeto de uma área do estudo aquisicional.

Desta forma, a pedagogia epistemológica nos parece ignorada por este

profissional, professor de pesquisa científica, em nível de mestrado, que julgou o

projeto do mestrando mencionado, uma vez que a lingüística aplicada articulou-se,

nestes últimos dez anos ou mais, com outros conhecimentos relacionados

diretamente ou indiretamente ao seu campo. Assim, se somam a ela leituras da

filosofia contemporânea que descentram ditames da lingüística aplicada, LA,

questionando sua essencialização e fechamento no empirismo ou no racionalismo.

Por outro lado, deveríamos, então, repetir essa tendência a dicotomizar e

criar um novo binômio entre a lingüística aplicada e a lingüística aplicada crítica,

como sugere esse professor? Pensamos que a crítica à lingüística aplicada clássica

elaborada até aqui, procede; porém a LA é uma disciplina, cuja investigação, a

nosso ver, traz algumas contribuições e deve prosseguir. Precisamos, entretanto,

estar abertos às suas “descobertas”, como também legitimar as razões pelas quais

ela precisa passar por uma abertura epistemológica crítica e se relativizar.

Pensamos que é necessário questionar a lingüística aplicada, por ser

excessivamente empírica, unidimensional, com uma única metodologia e objeto de

estudo positivista e, também, por ser estéril no sentido de se dissociar do social, do

cultural, do individual, da vida e das pessoas. Afinal, ela só visa provar suas

hipóteses aquisicionais pelos corporae lingüísticos, pelas teorias psicológicas sobre

como se adquire LE e substanciar suas descobertas totalizantes, como verdades

universais no ensino de língua estrangeira.

Quanto à LAC, ela é uma evolução da LA, porque se abre para a

transdisciplinariedade dos conhecimentos humanos, além de inclusões de leituras

em filosofia contemporânea desconstrucionista e em pedagogia crítica, formando-se

inúmeros outros campos e disciplinas críticas, enfim, uma conjunção com outras

áreas do conhecimento. Assim, estudos de língua e poder em análise do discurso

crítico, formação da lingüística critica, da lingüística aplicada crítica, da pedagogia

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crítica, da sociologia e antropologia de base metodológica qualitativa, que

literalmente dialogam com a lingüística aplicada, a pedagogia transformadora, a

política de diferenças e minorias e, conseqüentemente, dos direitos civis. Nos

parece que a primeira fase dos estudos da LAC se pautou nos estudos culturais e a

segunda se detém em disciplinas críticas, advindas do pensamento pedagógico

progressista e filosófico.

Dessa forma, as pesquisas em lingüística aplicada crítica à aprendizagem

e ensino de LE começam, aqui no Brasil, desde o meado dos anos noventa, quando

ela toma uma proporção humana e histórica, movendo-se de uma lingüística

aplicada universalista, “essencializadora”, formal e asséptica ao social e à história,

para uma lingüística aplicada crítica, que é marcada pelo inverso da anterior;

preocupada com o regional e o local, as subjetividades e o social no ensino-

aprendizagem de LE, com o histórico e com o “complexizar” a pesquisa da área. Um

marco histórico para o início desse movimento é a série da editora Longman, editada

pelo lingüista Christopher N. Candlin, chamada Language in Social Life, aliás,

inaugurada com uma obra seminal para os estudos de lingüística aplicada crítica,

isto é, Language and Power de Norman Fairclough (1994, p. 259).

Sentimos esta revolução em curso na LA e temos certeza de que levará

tempo para ela coexistir pacificamente com a LAC. Entretanto, temos que

reconhecer uma transformação vagarosa em progresso. E, um exemplo disso,

dentre outros, aconteceu recentemente ao consultar a última edição do periódico da

universidade de Oxford, Applied Linguistics, Lingüística aplicada, na internet, através

do portal de periódicos da CAPES; encontramos um artigo com o título de: Applied

Linguistics Redux: A Derridean Exploration of Alzheimer Lifestories, O Redux da

Lingüística aplicada: uma exploração derridariana das estórias de vida do Alzheimer

(2008, p. 1-23, tradução nossa) escrito pela pesquisadora da Universidade da

Califórnia, ex-professora visitante no Brasil na USC. Ela não só trabalha com

lingüística aplicada, pedagogia, dentre outras áreas, como também com a lingüística

aplicada às narrativas e cognição dos pacientes com Alzheimer, a partir de conceitos

de desconstrução de Derrida. Isso serve para exemplificar a mudança da para a

LAC e a transdisciplinariedade em curso.

De volta à última citação de Edgar Morin, onde ele usa o termo

compartimentização do saber, se vê, com este exemplo acima, como já está em

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progresso a articulação, a soma e a convivência transdisciplinar com a diversidade

de conhecimentos, entre diferentes campos.

Inúmeras disciplinas críticas, como análise do discurso crítica, pedagogia

crítica e outras atuam tentando viabilizar esta ação transformadora, “reformar” a

epistemologia clássica e “formatar” uma nova pedagogia epistemológica, isto é,

“didatizarmos” com mais reflexão e atualidade nosso pensar, no conhecimento e do

conhecimento, na nossa atuação profissional como educadores, sem estigmas, na

busca de um conhecimento mais próximo do qualitativo humano.

Pensamos que todos os conhecimentos humanos precisam “se

transdisciplinar” num movimento "antideterminista", inserindo a pesquisa qualitativa.

E alguns acadêmicos, progressivamente, já empoderam seus “objetos” de estudo,

suas experiências como cidadãos, por exemplo, na sociologia, tal como na citação

abaixo de Giddens (1989, p. 20-21, tradução nossa).

Todos os membros competentes da sociedade são imensamente talentosos nas realizações práticas de atividades sociais e hábeis “sociólogos”. O conhecimento que eles possuem não é secundário para a padronização persistente da vida social, mas faz parte dela.

Mas, no ensino de LE, o empoderamento dos nossos “alunos”, esse

desejo nosso, ainda não passa de um sonho, porque agregar a voz do aluno ao

processo didático tem sido evitado e mal interpretado. A luta que todo poder suscita

é uma batalha necessária à consciência humana, e essa provocação é instilada em

Foucault (1999, p. 167-177), no seu escrito Genealogia e Poder.

Depois de admitir uma preguiça febril em relação à pesquisa que fazia

naqueles últimos cinco anos, Foucault entende que as circunstâncias históricas que

o motivaram a saltar daquelas pesquisas, para estudos do poder, na obra do Poder,

escrito em 1976, foi o momento novo que flagrava “uma criticabilidade das coisas,

das instituições, das práticas e dos discursos; uma espécie de friabilidade geral dos

solos [das certezas] e que estava acontecendo havia dez a quinze anos”.

(FOUCAULT, 1999, p. 169). Esta criticabilidade, como ele denomina, se refere,

historicamente, a um tempo por volta de 1968, talvez durante o movimento de contra

cultura em geral, isto é, a exigência de direitos civis, questionamento da moral

estabelecida, do academicismo sepultado, da liberação sexual, do feminismo, dentre

tantas outras demandas sociais; sobretudo minoritárias, como as flagradas em

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Wilhelm Reich, Martin Luther king, no existencialismo e na desilusão pós-stalinista;

demandas antitotalitaristas, antimoralistas que as culturas políticas do século XX

instalaram, deixando assim as minorias, partes da democracia, fora do seu escopo

comportamental totalitário. Esse momento é flagrado por Foucault e o inspira à

escrita sobre poder.

Ele se apropria deste período, caracterizando-o “pelo que poderia chamar

de a eficácia das ofensivas dispersas e descontínuas” (FOUCAULT, 1999, p. 168-

169), isto é, essa profusão de críticas, no ocidente, de diversos setores, como os

anteriormente mencionados. Foucault (1999, p. 169, grifo nosso) continua dizendo

que, neste período, dois fenômenos com características diferenciadas lhe chamam a

atenção. E comenta ambos:

A primeira característica [...] é o caráter local da crítica. [grifo nosso] [...] o caráter essencialmente local da crítica indica na realidade algo que seria uma espécie de produção teórica autônoma, [grifo nosso] [não universalista ou essencializadora] não centralizada, isto é, que não tem necessidade para estabelecer sua validade em um sistema comum [autonomia da opinião da alta cultura].

[...] a segunda característica do que já acontece há algum tempo: esta critica local [grifo nosso] se efetuou através do que se poderia chamar de retorno do saber. [a experiência de vida]. [...] Retorno do saber é o seguinte: é a verdade que durante estes anos encontramos freqüentemente [...] toda uma temática do tipo: não mais o saber, mas a vida, não mais o conhecimento, mas o real, [a experiência] não ao livro, mas a trip, [viagem...] [...] etc. Parece-me que sob esta temática, através dela ou nela mesma, o que se produziu é o que se poderia chamar insurreição de saberes dominados.

Entender a insurreição desses saberes dominados, no final da segunda

citação acima, é fundamental nesse trabalho, porque questionamos e sugerimos a

possibilidade de retificação de hierarquias, ou seja, empoderar “alunos” e confrontar

a totalização dos métodos, da hierarquização das estruturas dos cursos de língua e

das suas didáticas impostas aos que ensinam uma segunda língua e aos que a

aprendem, os “alunos”. Após nossa pesquisa, ao adentrarmos nas interpretações,

buscaremos entender a construção das verdades que manipulam nossa área de

cognição de LE, as razões dos poderes de coordenações de cursos livres sobre a

cognição de LE

A referência acadêmica do nosso campo ainda continua sendo a

reprodução “científica” do conhecimento dos países hegemônicos, países

anglófonos ou centrais, para o nosso país que, nesta área, “se sente”

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academicamente periférico. Mas ajustes dessa importação é um respeito cultural

aos nossos alunos, o que em nossa área não temos feito. No capítulo quatro,

entrevistamos os atores da hierarquia organizacional de poder dos cursos de LE:

proprietários, coordenadores, professores e a maioria, os beneficiários, os “alunos”.

Ouviremos como os atores envolvidos entendem e sentem a inserção dos “alunos”

de modo mais direto, em nossos currículos, especificamente na parte didática.

Informalmente, percebemos que a hierarquia organizacional tem várias reações: se

assusta, ignora o assunto considerando-o um sonho, não admite mudanças de papel

(os “alunos” se intrometendo em assunto de professor) ou acha que tudo pode virar

“anarquia”, se inverter, se transformar num “comunismo” educacional. Mas, ao

entrevistarmos nossos atores, teremos um panorama mais seguro sobre suas

perspectivas da inclusão do aluno, didaticamente. Esse trabalho deverá propor a

aproximação didático-dialógica entre esses atores, e a sua necessária compreensão

em permitirem que esta relação seja reconstruída. Nos comentários das entrevistas,

tentaremos mostrar como atuamos desta forma, no dia a dia.

Gostaríamos de fazer uma observação sobre por que grafamos “alunos”

entre aspas, desde o sumário deste trabalho; intencionamos provocar um sentido,

não necessariamente o etimológico, mas aquele lexicalmente criticado pelo

“pedagogês”: “aluno”, freqüentemente identificado como “aquele que não tem luz”,

não traz pré-conhecimento em si. Precisamos de um estudante não no sentido de

acúmulo de seu conteúdo escolar (bancário), mas a sua inserção no “como” ele vê

seu ensino, sua inserção didática no seu processo cognitivo. O que importa aqui

não é exatamente a terminologia, o léxico “aluno” ou mesmo o considerado correto,

“estudante”, por alguns pedagogos no processo didático. Esses rótulos não

importam, mas sim a atitude de empoderar estes atores nas suas aulas. No capítulo

quatro, vamos reaver pesquisas feitas com estratégias cognitivas usadas pelos

alunos de LE, largamente ignoradas na prática de ELE. Por serem ignorados

passamos a grafá-los como “alunos”. Essas aspas significam aquele aluno ou

estudante (des)empoderado da didática da sua sala. Sem voz. No quinto capítulo,

ouviremos e transcreveremos suas opiniões em nossas entrevistas sobre seu

(des)empoderamento da didática das suas aulas e do seu estilo cognitivo não

escutado e não usado nas mesmas. Intencionamos questionar as razões por que o

sistema de ensino de LE não facilita que esse “aluno” se agencie para se tornar

estudante.

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Esse capítulo está comprometido em revisar conhecimentos

desqualificados na nossa cultura epistemológica e reaver o poder dos saberes

desqualificados dos “alunos”, por serem uma construção de mais uma verdade ainda

inquestionada.

Voltando aos saberes dominados, Foucault (1999, p. 169-170) explica os

dois tipos: o primeiro seria os conteúdos históricos de qualquer área do

conhecimento que foram sepultados por um grupo profissional, acadêmico ou outro

de qualquer área do conhecimento e da educação, conservados pela conveniência

de manutenção do poder do saber em mãos de alguns; o segundo, os saberes

desqualificados, intencionalmente alijados do mainstream, tendência em vigor, pela

falta de crivo acadêmico-científico historicamente mantido. Citamos ambos a seguir:

[...] os conteúdos [conhecimentos] históricos [são] [os] que foram sepultados, [...] mascarados em coerências funcionais ou em sistemas formais. [grifo nosso] [...] porque só os conhecimentos históricos podem permitir encontrar a clivagem dos confrontos, das lutas que as organizações funcionais e sistemáticas têm como objetivo mascarar. [...] e que a crítica pode fazer reaparecer, evidentemente através de instrumento de erudição. Em segundo lugar, o saber dominado [grifo nosso] se deve entender uma coisa inteiramente diferente: uma série de saberes que tinham sido desqualificados como não competentes ou insuficientemente elaborados, saberes ingênuos, hierarquicamente inferiores, saberes abaixo no nível requerido de conhecimento e cientificidade. Foi o reaparecimento destes saberes não qualificados [...] do "psiquiatrizado", do enfermeiro, do médico paralelo e marginal em relação ao saber médico, do delinqüente etc., [do estudante] que chamarei saber das pessoas e que não é de forma alguma um saber do bom senso, mas ao contrário um saber particular, regional, local, um saber diferencial incapaz de unanimidade [grifo nosso], e que só deve sua força à dimensão que o opõe a todos aqueles que o circundam [...] (FOUCAULT, 1999, p 169-170, grifo nosso)

Os conteúdos históricos e sepultados são os conhecimentos

estabelecidos como verdade e que, convenientemente, devem estar sob controle e

não sofrer mudanças, mantendo seu poderoso status quo. Os desqualificados são

aqueles que não são diplomados ou, se forem, não têm um reconhecimento social

da maioria. Foucault exemplifica o conhecimento médico, os médicos propriamente

como detentores do saber sepultado; e os enfermeiros, os paramédicos, pacientes,

como representantes do saber desqualificado, demonstrando, assim, um exemplo

de um micropoder do primeiro sobre o segundo. E conclui que não apenas “o

primeiro” deles, mais acadêmico, aquele chamado de saber dominado ou

sepultado, o qual interdita o segundo, aquele que ele chama de saber

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desqualificado (vindo dos atores com formação não “qualificada” e possivelmente

da experiência), mas igualmente, os dois contribuem para a formação do saber

humano. E lembra que entre estas duas formas de saber, existe a memória do

combate. Possivelmente, no saber sepultado ela existe para mantê-lo e, no

segundo, o saber desqualificado, para se insurgir (FOUCAULT, 1999, p. 170). Este

autor nos apóia aqui porque nesse momento, que nos insurgimos contra as

verdades didáticas construídas e impostas pelas coordenações nos cursos livres

LE e em outros locais, debatidas no próximo capítulo.

Então como entender o que o autor chama de genealogia, sobretudo no

capítulo Genealogia e Poder? Ele usa a genealogia no sentido de interpretar e

delatar o jogo entre os poderes manipuladores, entre os dois tipos de saber

mencionados acima: aquele saber dominado, estabelecido e sepultado pelos

micropoderes da ciência, no comando acadêmico nas instituições, o qual Foucault

(1999, p. 170-171) denuncia e o saber desqualificado. Ambos dominados, o primeiro

pelo bem e interesse de seus usuários; segundo, em detrimento por falta de

chancela acadêmica e que é interditado. Ele sugere luta constante para desenterrá-

los, e este é o nosso objetivo, no capítulo quatro, onde ouviremos o saber

desqualificado dos “alunos” e, em se confirmando nossas suspeitas,

(re)empoderaremos o “aluno” nesse micropoder monitorado na hierarquia

educacional, nos cursos de LE. Segue a definição de genealogia:

Trata-se de ativar saberes locais, desqualificados, descontínuos, não legitimados contra a instância unitária que pretenderia depurá-los, hierarquizá-los [...] em nome do direito de uma ciência detida por alguns [...] Não é um empirismo nem um positivismo [grifo nosso] [...] que permeiam o projeto genealógico. As genealogias, portanto não são retornos positivistas, [...] mas anticiências. Trata-se da insurreição de saberes [!] nem tanto contra os conteúdos, os métodos e os conceitos de uma ciência, mas uma insurreição dos saberes [...] contra os efeitos de poder centralizadores que estão ligados à instituição e ao funcionamento de um discurso no interior de uma sociedade como a nossa. [grifo nosso] [...] são os efeitos de poder próprios a um discurso considerado como científico que a genealogia deve combater. (FOUCAULT, 1999, p. 170-171, grifo nosso).

Buscamos neste trabalho ouvir os saberes locais de professores e,

sobretudo, de “alunos” adultos de cursos livres de LE, massacrados pela “ciência”

lingüística aplicada cujo conteúdo formal, ahistórico e disjuntivo do social, ainda é

crença majoritária, localmente, entre esses atores e também na universidade, se

consultarmos seus programas e ementários. Toda crença é fundada e

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fundamentada em algum discurso. Buscar interpretar como certas crenças são

fundadas e fundamentadas é importante neste trabalho. Nosso enfoque aqui será

desenterrar estes saberes dominados ainda sepultados, importados do “centro”

anglófono para a nossa periferia de cursos particulares de língua inglesa e darmos

voz ao saber desqualificado dos “alunos”, emperrados ou pouco ouvidos,

empoderando suas estratégias e cultura de aprender locais. Nosso diferencial é que

trataremos com a cognição escolhida por alguns “alunos” e que é interditada, por

razões ainda escusas. Elas certamente estarão no grupo responsável pela formação

de professores.

Retornando àquele “aluno” mestrando, “genuíno” representante do saber

desqualificado, cujo projeto foi massacrado pelo seu professor numa universidade

brasileira em 2008, por tentar acoplar lingüística aplicada e pedagogia crítica,

pensamos que esse é um bom exemplo desse saber: um professor de metodologia

científica que exerce seu poder do seu “saber sepultado” sobre este “aluno”,

representante do saber desqualificado.

Lembremos que tal como acontece com este “aluno”, os professores, nos

cursos particulares de LE, podem ser massacrados pelas coordenações, por terem

sua criticidade (des)empoderada e, num ciclo “viciante”, esta atinge indiretamente os

“alunos”.

Neste caso, a relação de trabalho está em jogo? O micropoder das

coordenações em demitir ou não, joga com a subalternidade da “desqualificação” e

conseqüente poder de desempregar um profissional. Assim, estes professores de LE

poderão esconder ou não usar suas crenças de ensino e aprendizagem, não se

posicionar ou fazer qualquer crítica, omitindo algumas vezes a sua experiência.

Torna-se evidente, repetimos, que muitos pesquisadores na nossa área ainda

continuam pensando de forma positivista, como os grupos de professores de LE que

deixam se seduzir pela área de lingüística aplicada para a aquisição de segunda

língua e pelos pesquisadores que predominam nos países centrais, hegemônicos, ?,

na área “dura” de lingüística aplicada, uma apologia da ideologia do american

dream, em detrimento do próprio pensar local ou nacional. O poder da pesquisa

anglófona se faz óbvia no fato bastante esclarecedor, informado por Moita Lopes

(2006, p. 88): no congresso internacional de lingüística aplicada de 2005, as suas

plenárias só incluíram pesquisadores anglófonos, com exceção de um holandês,

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saxão, e profissionais que atuassem em universidades do mundo anglófono. O

continuísmo de um poder-saber histórico.

Concordamos, contudo, que não é a exclusão da hegemonia anglófona

que poderá resolver as diferenças entre a LA e LAC, mas como aproveitar, sem

preconceitos e adequadamente seus conteúdo, se buscando resolver os problemas

sociais da aprendizagem de uma LE. Todavia, lembremos que a aquisição de

segunda língua, área da LA, continua sem poder cientificizar (seu objetivo maior) ou

responder às inúmeras demandas lingüísticas como, por exemplo, a razão do

sotaque que varia entre “alunos” ideais pesquisados. Este fato fonológico também

não é representado em um continuum, contínuo evolutivo, tal como a área sintática,

numa seqüência aquisicional. Aquisição de uma segunda língua responde a

algumas demandas da sintaxe, ajudando o professor a entender a seqüência

temporal de aspectos da mesma, por exemplo, nas fases de desenvolvimento

aquisicional da LE do aprendiz, possibilitando ao professor aceitar os erros no

processo seqüencial em sala. Em termos práticos de ensino, esta área não

apresenta intervenções no ensino de segunda língua, ESL. Contudo, a ASL não é o

assunto na seqüência deste texto, nem seu objetivo.

Por que perseveramos em questionar, na filosofia da ciência, algumas

possíveis respostas para a tipologia de pesquisa e ensino imposta com uma enorme

carga de unidimensionalidade metodológica e didática, a professores e “alunos”?

Que concepção de currículo persiste ainda nos nossos dias, imposta no imaginário

do professor, nas suas escolhas didáticas? Por que os materiais didáticos do ensino

de língua são, muitas vezes, tão conformistas e costumizáveis em relação ao

conteúdo e à didática, nos métodos mais atuais, e não às necessidades dos

“alunos”? Por que a instituição e o professor não discutem seus saberes dominados,

sepultados, em favor dos saberes desqualificados de professores e, sobretudo, de

“alunos”, incentivando-os a se agenciarem nesta didática? Por que, entre nós,

imposição de conteúdo e didática, em geral, são aceitos sem reflexão? Suspeitamos

que não se deseja dividir o poder do saber. Por que nos encontros, como os in-

service, atualizações internas dos professores, pre-service, breves treinamentos

para novos professores pela demanda aumentada de “alunos”, nos worshops, nas

oficinas semestrais, em cursos livres de LE, não há espaço para reflexão crítica e

trocas da prática diária de sala? Por que aceitar reproduzir pesquisas didáticas sem

um aceite local e tomá-las como verdade absoluta? Estas são algumas das muitas

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perguntas com as quais, possivelmente, grande parte dos professores de língua

estrangeira convive nos cursos livres de língua, nas pesquisas de pós-graduação em

universidades e na pesquisa acadêmica subalternizada na mainstream, tendência

dominante, do momento em questão.

A transposição de conhecimentos de países centrais para muitos países

periféricos ajuda o nosso “aluno”? Por que a esta importação de conhecimento

pedagógico não são atribuídos crivos locais de ordem cultural? Por que, nem ao

menos, o reconhecimento dos estilos cognitivos subjetivos é facultado aos nossos

“alunos”? Os motivos desse (des)empoderamento é uma das discussões centrais da

nossa tese e essa problemática começa a ser questionada nesse trabalho, no

capítulo dois.

Lembrando a citação anterior de Foucault (1999, p. 170-171), que

questiona o porquê de não se ativar os saberes locais, não legitimados,

descontínuos, contra o poder de um conhecimento histórico possuído por alguns,

defendemos nesta tese a idéia de que, enquanto não houver a insurreição pacífica,

neste caso, dos saberes, o combate contra os efeitos de poderes centralizadores

ligados aos cursos livres de LE não se realizará, em detrimento do principal autor da

aprendizagem de LE, o aluno.

As reflexões de Foucault confirmam a necessidade de atualizarmos uma

pedagogia da epistemologia, tal como Bachelard, isto é, como reaprendermos a

pensar “cientificamente” e não apenas “politicamente”, não apenas

“mercadologicamente”, associando-se ao poder exógeno, vindo dos países centrais

e ao endógeno, a nossa própria permissão, no sentido de não adequarmos

localmente esse material ao nosso estilo. A pesquisa do conhecimento na nossa

área continua desatualizada e tendenciosa, ora para o empirismo, ora para o

inatismo extremista, negligenciando as demandas culturais e individuais, como se

vivêssemos num mundo asséptico ao social, ao psicológico e ao individual. Isso

ainda ocorre em várias instituições, como vimos exemplificado, anteriormente, no

caso do mestrando. Embora a filosofia do conhecimento e da ciência tenham sido

atualizadas, sobretudo por Gastón Bachelard, no século passado, ao conhecê-las,

muitos não subjetivam na prática suas principais desconstruções dos preconceitos

científicos. A lacuna entre o pensar a teoria e não incorporá-la como prática, como

crença, persiste nos nossos dias. Estuda-se ainda Metodologia da Ciência e da

Pesquisa ainda de forma positivista, determinista, como se todos os conhecimentos

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tivessem leis universais e fossem exatos e comprováveis. Obviamente que existem e

existirão procedimentos deterministas, dependendo da área e do objeto de pesquisa

e precisamos dessa posição extremista em muitos conhecimentos. Mas há de se

conviver com outras, mais descentráveis, a exemplo do materialismo racional de

Bachelard, que comentamos ainda nesse capítulo. E isso já tem acontecido. A

própria física newtoniana é assim. E muitos conhecimentos, temporariamente,

precisam se constituir positivamente, até que haja rupturas e aproveitamento de

aspectos do mesmo; ou que eles convivam, na mesma área, com “ambigüidades

científicas”, ou certezas explicadas sem evidências, como na física pós-

newtoniana. Não se contempla, nos compêndios da área, uma epistemologia

atualizada e crítica, tal qual nos legou Bachelard. O problema tem sido a versão

cientificista, de base anglófona, ainda sendo a única vertente da ciência divulgada

por muitos professores e livros da área. Localmente e grande a adesão a essa

percepção.

Se todo o cientificismo empírico se solidifica, sobretudo, no determinismo

da física mecânica newtoniana, e se a física sempre representou no nosso

imaginário “científico” o modelo perfeito de ciência, pelo empirismo e grau de

comprovação e explicação de seus fenômenos, então, para descentrarmos este

cientificismo, também ainda reinantes nas “ciências lingüísticas”, se faz urgente

atualizar as mudanças ocorridas na compreensão do entendimento da cientificidade

da física, para que, no nosso imaginário, essa metodologia de pesquisa newtoniana

transposta dessas ciências exatas possa ser resignificada e desconstruída na

pesquisa de estudos lingüísticos. Bachelard precisa ser inserido aqui, para que a

pedagogia epistemológica pós-newtoniana se atualize e seja entendida no nosso

campo lingüístico em geral, a nosso ver mais determinista e racionalista que a

própria ciência física, padrões que parecem motivar, ainda de forma determinista,

outras áreas do conhecimento humano.

É possível que na nossa área de LA, igualmente, muitos de nós ainda não

entendam ou ignorem que também a física sofreu um descentramento entre a física

newtoniana, a e a física quântica, no sentido que Derrida atribui ao termo, como

define Luciano Lima (2008, p. 1).

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O próprio termo desconstrução é um neologismo criado por Derrida para significar, diferentemente da palavra destruição, a desmontagem de um sistema, de modo a se aproveitar as suas peças, sob uma ordem construtiva. [...] A diferença é na verdade, um arquiconceito, pois nele estão contidos outros conceitos que compõem a noção de desconstrução como o descentramento (o centro podendo estar em qualquer lugar, sem precedência sobre a periferia, que deixaria assim de existir), [...]

Se esta nova concepção de epistemologia pedagógica de Bachelard, que

tem um feliz encontro com o pensamento de Derrida acima, surgida nos embates da

versus física determinista de Newton, se socializar, contagiando outros campos de

conhecimento e formando uma nova pedagogia do conhecimento humano, poderá

haver uma mudança processual na LA, como tem havido, mas, sobretudo em

discussões internas, de cognição de uma LE, afinal o que se tem visto são críticas e

pesquisas de minorias sendo atropeladas pela metodologia asséptica ás

sensibilidades individuais e de grupos. Mas, na prática, em processos de

participação de decisão didática e de cognição por parte do “aluno”, por exemplo, o

seu poder tem sido omitido da cena crítica da LAC. O fato é que, teoricamente,

muitos profissionais da área de LA sentem ter se apropriado da

transdisciplinariedade hoje existente na Lingüística Aplicada Crítica, a LAC, e

embora esteja havendo uma mudança de enfoque, ela parece substituir um enfoque

por outro e, por isso, priorizamos entender, nesse trabalho, como as instituições

lidam com o poder do saber na cognição, a ética da diferença na cognição dos

“alunos” e suas formas diferenciadas de aprender uma LE. Entender que o saber

didático é histórico, subjetivo e transitório para muitos é desconfortável, polêmico,

porque, os “alunos”, quando ouvidos, desconhecem o próprio processo individual e

social de sua aprendizagem, impossibilitando-os de se posicionarem, didaticamente.

Para negociar esse poder do saber didático, muito seria necessário reformar o

conhecimento comum sepultado: coordenadores e professores sabem tudo do

ensinar e do aprender, porque no conhecimento didático o aluno tem um saber

desqualificado; e esse movimento de reformar esse poder didático, muitos desses

não é interessante. Viver entre a ruptura e a retificação é trabalho que demanda

eterna atualização e reflexão, e não podemos idealizar que todos ajam desta forma.

Talvez esta seja uma das explicações porque não existe um entendimento geral

para se envolver o “aluno” na didática de suas aulas.

É neste momento que uma pedagogia epistemológica reflexiva deve

questionar as subjetividades de cada sujeito ensinante e os conceitos e as crenças

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de ensino dos professores de LE, porque uma coisa é saber as novidades e

posturas de um olhar novo da ciência lingüística, pedagógica e epistemológica; outra

é a subjetivação delas, até mesmo pela diversidade de formação que cada

profissional alcançou. Será possível, para a maioria dos professores de cursos de

língua, reformar conceitos tão amplos e filosóficos, passar a pensar tão

alargadamente em pouco tempo? É fácil mudar uma cultura? Será possível

subjetivar o pensar “complexo” de Morin, sem autoconhecimento? Não é mais

cômodo continuar pensando linear e excludentemente, sem desaprender a pensar

através de binômios rígidos, se mantendo com um falso saber e mantendo o mesmo

sob controle, como age o professor doutor com o projeto do mestrando? Há espaço

para se superar os dualismos inscritos no pensar ocidental, corpo-mente, sujeito-

objeto, razão-sensibilidade? Como relevar e, dentro do possível, entender o que a

filosofia Bachelardiana legou para a epistemologia das “ciências”? Como coexistir

com os descentramentos contemporâneos e o racionalismo, empirismo, numa nova

educação/pedagogia epistemológica?

Estas duas filosofias excludentes entre si, o racionalismo e o empirismo,

foram criticadas, desconstruídas por um (des)centramento “inventado”, o que

Bachelard chama materialismo racional, mais adiante explicado. Ele cria um tipo de

metafísica para o empirismo, no qual o racionalismo coexiste; será que, algum dia,

na área de L.A, poderemos acreditar em algo existente, sem demonstrá-lo, tal

acontece com as partículas subatômicas da microfísica? Seria este evento similar à

fé no criador?

Bachelard (1971, p. 122 e p. 166) comenta essa oposição e entra, assim,

em confluência com a mudança complexa do pensamento proposto por Morin,

quando faz esta citação:

Na realidade esta contradança de duas filosofias contrárias em acção no pensamento científico leva ao empenhamento de muitas outras filosofias e teremos que apresentar [precisa-se] diálogos menos complexos [entre elas], mas que alargam a psicologia do espírito científico. Ao descobrir um passado de erros, encontramos a verdade num autêntico arrependimento intelectual. [...] Muitas vezes me tenho impressionado com o fato [...] de professores [...] muito poucos [...] investigarem a psicologia do erro [não no sentido cognitivo, mas de autoconhecimento] da ignorância, da reflexão.

Estamos prontos para pensar complexa e criticamente, para nos

apropriarmos desses conceitos que dependem de autoconhecimento, a saber, de

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uma nova visão de mundo e autocrítica às crenças pessoais? Toda essa discussão

é para lembrar a existência de outras formas de agir, na pesquisa em LA, diferentes

daquelas anglófonas, onde o empirismo ou o racionalismo se revezam para

“cientificizar” a mesma.

Bachelard nos traz um conceito na explicação do invisível, através do seu

conceito de materialismo racional (leia-se materialismo igual a empirismo). Desta

forma, a ciência física deixa de ser eminentemente comprobatória do seu objeto e do

seu fenômeno, porque não se conseguiu medir e provar as partículas subatômicas:

partículas existentes, mas não vistas, não demonstradas pela visão, nem

demonstráveis enquanto fenômeno. Os dados eram existentes, mas não

comprováveis. Escândalo epistemológico? Disputa entre os físicos clássicos e os

novos acontecimentos microfísicos, da nova física? Como explicar os elementos

subatômicos? Sim, o poder-saber dominado, sepultado pelos acadêmicos estava em

jogo. Assim, Bachelard pacifica esse “caos”, fazendo-nos conviver com uma nova

pedagogia epistemológica, empírica e racionalista, inventando-lhe metáforas e um

discurso racional ficcional para o objeto empírico sem provas, fazendo uma ficção

para esta parte da ciência física que surgia: a “ciência” do novo “objeto invisível”,

mas, “objeto explicável”! Inicialmente objetos refutados por alguns “cientistas”, pela

ausência de uma epistemologia adequada para explicar o dúbio, o invisível, mas o

existente; dual e não representável: partículas não comprováveis porque não

visíveis, embora ouvidas, se transformam em “dados” racionalizados, que poderiam

ser ambivalentes, ser corpúsculos ou ondas. Como os físicos tradicionais, os

“cientistas” sociais e de outras áreas, como a LA, também insistiam em se manter na

ciência positiva.

É nossa intenção com os conceitos de ruptura e retificação em Bachelard

interpretar com mais propriedade o porquê de algumas das nossas dificuldades em

sala de aula, de nem todos os “alunos” aprenderem inglês no mesmo ritmo, mesmo

usando as mesmas estratégias, com desempenhos diferenciados, no final do curso.

Esses conceitos do autor e outros de saber sepultado e desqualificado vão nos ser

úteis, quando começarmos a interpretar os feedbacks, opiniões dos nossos “alunos”,

associando-os com suas respostas à pesquisa do nosso tema de

(des)empoderamento das estratégias de “alunos” do processo didático de sala de

aula de LE, no capítulo último.

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Com os conceitos de ruptura e retificação, o autor confrontou,

implacavelmente, o cientificismo empiricista linear que positiva tudo aquilo que era

determinado por causa e efeito. A ruptura inova e atualiza o conhecimento, e a

retificação aproveita o conhecimento anterior. Ambos contradizem a herança

positivista, que preconizava ser o conhecimento cumulativo, concebendo o

progresso de forma linear. Bachelard redimensiona essas idéias, colocando em

cheque a proposta positivista, com o surgimento da microfísica do início do século

passado. Impossível rechaçar esta releitura de Bachelard, diante das demandas dos

novos acontecimentos já mencionados. Como já citamos, a não pode representar e

comprovar as partículas subatômicas do núcleo do átomo, por exemplo, e se estas

são ondas ou corpúsculos. O princípio da incerteza se instala e a ambigüidade

passa a existir, no campo da física contemporânea. As partículas são corpúsculos e

ondas. O núcleo, composto de nêutrons, prótons e outros, e circundado pelos

elétrons, não pode ser visto nem comprovado através, do empirismo clássico. E que

isso tem a ver com nossa sala de aula de LE? Os anglófonos assim mantiveram o

conhecimento “cientifico” de aquisição de LE ou SL: positivista.

É importante ressaltar uma de muitas contradições entre pesquisas de

ASL, que nega a repetição como reforçador de acerto, por exemplo, atribuindo os

erros ao processo da interlanguage, língua específica e intermediária entre a

materna e a estrangeira, e vermos, simultaneamente, Chamot e o´Malley (1995)

pesquisarem estratégias cognitivas em aquisição de segunda língua, entre elas a

repetição e a tradução, que são ratificadas pelos alunos, mas não são aceitas na

práxis de ensino de LE, pelos cursos de LE em diversas geografias.

Entre impedimentos e contradições da prática de LE, os métodos surgem

num maniqueísmo, onde o novo tinha validade e o anterior era totalmente

inaproveitável. Essa é uma das discussões que, provavelmente, travaremos após

interpretar nossas entrevistas. O porquê o conhecimento lingüístico e metodológico

de ensino de LE não convive sem retificações, sem aproveitar técnicas de outros

métodos anteriores.

Tal como as inovações na ciência física criam um sujeito que “perde” seu

objeto de ensino e conhecimento em seu exercício profissional (física newtoniana) e

esse sujeito desconstruído passa a conviver com uma ambivalência do novo e do

antigo, uma ferida narcísica, diria Freda Indursky, se estabelece. E ela traz essa

perspectiva para nossa área da lingüística. Indursky (1998, p. 111-120), dialogando

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com o conceito freudiano de ferida narcísica, discute os descentramentos, quando o

ser-sujeito, processualmente, vai se conscientizando da sua incompletude na

história e na “ciência”, e relata as três grandes feridas narcísicas do humano, a

saber: a cosmológica (terra versus sol), a biológica (homem - Deus versus homem -

Darwin) e a psicanalítica (o consciente versus o inconsciente). E compara esses

descentramentos com as feridas dos lingüistas e suas “presunções de verdades

universalistas fracassadas” na tentativa de universalizar e essencializar seus

programas lingüísticos, tais como: Lingüística Tradicional, Teoria da Enunciação,

Lingüística Textual e Análise do Discurso. O fracasso não advém do conhecimento

das áreas, mas de como seus representantes gostariam que as mesmas fossem

reconhecidas: única verdade.

Sabemos que conhecimentos nascem também do pensar cartesiano,

claro! A abordagem é que dará um tratamento ao objeto de uma pesquisa. No caso

da física pós-newtoniana, o sujeito cartesiano perde seu objeto empírico, o seu

fenômeno, de forma ampla, porque o sujeito cartesiano não consegue elaborar,

empiricamente, a microfísica. Bachelard reflete e inventa um novo conceito para a

pedagogia científica na microfísica: ele cria o materialismo racional, a saber, a

explicação racional de um sujeito observador explicando o dado científico invisível.

Este conceito consegue alargar a pedagogia científica e nos traz uma inovação: a

explicação de que o objeto do estudo da microfísica passa a existir,

predominantemente, no discurso da razão. As partículas subatômicas são

demonstráveis, embora existentes, são incomprovadas! Passam a existir como

conseqüência de uma racionalidade discursiva. O racionalismo explicando a matéria,

o corpus. Uma ficção real. Anteriormente, o objeto empírico, a coisa, o dado, quando

comprovados, se constituíam a única fonte da verdade científica.

Contemporaneamente, contudo, as partículas subatômicas passaram a ser

comprovadas pela razão, pelo discurso e por seus efeitos. Assim, em LA, muitos dos

preconceitos em estratégias de aprendizagem, diferentemente da física,

prosseguem. E o que é pior, temos comprovações dos “alunos” que eles não tem

razão de existir. Citando Bachelard (1971, p. 16):

Mas eis que a física contemporânea nos traz mensagens do desconhecido. [...] Na tentativa de decifrar, apercebemo-nos que os sinais desconhecidos são mal interpretados no plano dos nossos hábitos psicológicos. Eles

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parecem [...] refratários à análise usual [grifo nosso] que separa uma coisa de sua acção. No mundo desconhecido que é o átomo haveria assim uma espécie de fusão entre o acto e o ser, entre a onda e o corpúsculo?

Diante da impossibilidade da de demonstrar, empiricamente, o dado

científico, as partículas não demonstráveis, via análise empírica, este passa a ser

explicável na epistemologia contemporânea de Bachelard (1971, p. 16), pela razão:

Daí uma alteração total dos princípios realistas da sintaxe do infinitamente pequeno. Não é, portanto a coisa [o fenômeno físico] que nos poderá instruir directamente como o proclamava a fé empírica. [...] Nas regiões profundas da física infinitesimal, o sábio vai dar mais importância à organização racional de suas experiências. [grifo nosso]. Está instituído o novo conceito de materialismo racional [grifo nosso] e racionalismo aplicado. [grifo nosso]

Comentam Barbosa e Bulcão (2004, p. 36):

[Em Bachelard] [...] tanto o realismo tradicional quanto a fenomenologia moderna se revelam inaptos a abordar a microfísica. A idéia revolucionária aqui é constatar a queda da primazia do empírico por impossibilidade dele racionalizar os elementos subatômicos da microfísica. O reconhecimento do racionalismo aplicado corresponde à explicação da existência, que o racional estabelece em cima dos elementos subatômicos inexplicáveis pelo empirismo.

As autoras continuam citando a idéia de noumeno em Bachelard, unidade

do empiricismo racional:

A revolução epistemológica trazida pela conduz a substituir a fenomenologia por uma Noumenologia, [grifo nosso] isto é, por uma organização de objetos do pensamento. O objeto científico resultado de [...] uma elaboração teórica, [grifo nosso] ele não é oferecido à percepção do homem como os objetos do conhecimento imediato. [...] Agora o corpúsculo se define como uma não coisa. [...] O noumeno [...] é um objeto de pensamento e o fenômeno um objeto de percepção. [grifo nosso] [...] É preciso renunciar a noção de objeto, de coisa pelo menos no estudo do mundo atômico. [grifo nosso]. [...]. Os corpúsculos não são dados, nem mesmo poder-se-ia dizer que [...] sejam dados ocultos. É preciso inventá-los e não descobri-los. (BARBOSA; BULCÃO, 2004, p. 37).

Repetindo parte da citação acima: “o noumeno é um objeto de

pensamento, [...]”, parece-nos que marca a desconstrução da primazia do olhar

epistemológico, que passa a conviver com uma explicação “ficcional real” do

racionalismo. Conseguimos esse hibridismo entre o empiricismo e o racionalismo na

física, através desse “noumeno”, mas não conseguimos esse diálogo na área de

cognição da LA. Com que tipo de ética, então, nos confrontamos nessa área, que

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consegue subverter estratégias de aprendizagem comprovadas pelos “alunos”:

tradução e repetição? Com que finalidade?

Com essa verdadeira revolução na metafísica da ciência contida nestas

citações e na obra de Bachelard (1971), refletimos a desconstrução que precisamos

continuar colocando em marcha no entendimento de nosso campo de lingüística em

geral. Por esta razão insistimos que esses autores, em princípio secundários para

nossa pesquisa específica, são de grande importância para possíveis interpretações

a serem analisadas, no último capítulo e, sobretudo, porque essas informações são

direcionadas aos colegas de profissão, professores de língua como eu, que se

frustram, se “travestindo” de novos modelos a cada novo método ou pesquisa

cognitiva, imaginando estarem sempre mais próximos de achar a fórmula para uma

aprendizagem homogênea, se estiverem atualizados com as pesquisas e teorias

empírico-racionalistas lançadas pela lingüística ou pela pedagogia. Por esta razão e

pelo tempo escasso de nossos colegas e por todas essas idealizações entre nós,

professores, temos a pretensão de tentar amarrar outros pensares não-anglófonos,

a exemplo de Bachelard (1971) e Foucault (1999), dentre outros, ao nosso metier.

Gostaríamos de comentar, mais detalhadamente, as idéias de

conhecimento contínuo e descontínuo em Bachelard, a idéia de ruptura e de

retificações.

Estes conceitos serão sempre abordados neste trabalho. A idéia atrás do

conceito de continuidade do conhecimento, seu aspecto cumulativo, “[é proveniente]

do fim do século [quando] acreditava-se no caráter empiricamente unificado do

nosso conhecimento do real.“ (BACHELARD, 1971, p. 15). Bachelard questiona esta

continuidade e instaura a ruptura ou não acumulação linear do conhecimento,

trazendo um desconforto inevitável na conformidade existente e que, muito

lentamente, começa a se dissolver. O racionalismo e o empirismo conseguem

“dialogar” e, em alguns momentos, se tornam mais complementares, mais orgânicos,

menos separatistas ou excludentes. Talvez um super-descentramento nessa nova

pedagogia científica esteja em progresso. Repetimos citação de Bachelard: “a

ruptura com o conhecimento comum [não com o senso comum] [...].” (BACHELARD,

1971, p. 18), expandindo: o conhecimento pedagógico comum e o conhecimento

científico entram desconfortavelmente em descompasso, anacronizado-se o

primeiro. Essa posição de ruptura é comum e presente na visão da LA. Mudar a

forma de pensar o conhecimento seria a nova demanda. Mas a ruptura

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descontinuísta proposta em Bachelard convive simultaneamente com a retificação

do conhecimento estabelecido no passado, e recria uma coexistência do

“continuísmo - descontinuísmo”, a saber, o convívio da “tradição e da transgressão”.

Esse conceito de retificação da epistemologia de Bachelard é muito relevante

porque ele é, praticamente, inexistente na área de LA. Nesta, se pretende,

periodicamente, impor um método, uma visão pedagógica ideal, ou ambos. E o que

suspeitamos é que, em coexistindo aspectos de métodos e pedagogias do passado

com contemporâneos, poderá haver maior proximidade da realidade cognitiva do

nosso “aluno”. O que existe, na área de LA, é a concepção de que todas as formas

de aprender individuais têm que mudar ao sabor das novidades “científicas” da área,

em detrimento de qualquer conhecimento anterior. Assim, vejamos Bachelard (1971,

p. 205, grifo nosso): “Mas existem conceitos tão indispensáveis numa cultura

científica, que é impossível que se possa [...] abandoná-los. Deixam de ser

contingentes, ocasionais, convencionais [...] A razão possui alguns temas de

fidelidade.”

Sinteticamente, Bachelard (1971, p. 205-206) propõe a ruptura da

linearidade do conhecimento, da pedagogia da ciência e a sua retificação quando

necessário. Dessa forma, admite a coexistência da física mecânica do passado, uma

retificação reconhecida e certificada no presente, e as rupturas contemporâneas da,

uma convivência inevitável. Assim, é mantido, sem relativismo, uma pedagogia

científica, onde coexistem sem radicalismo o empirismo e o racionalismo,

descentráveis à demanda da circunstância. Diante disso, ironizamos, as tumbas de

Locke e Decartes podem tremer!

Essa citação acima, em si, confirma uma concepção de um

descentramento honroso na área do conhecer, retificando, reavendo integralmente o

legado do passado e propondo uma ruptura, quando este legado, ou parte dele, tiver

sido superado. Este posicionamento ético em busca dos fatos, conhecimentos,

investigações e reflexões que nos rodeiam e que estão aí na vida, que muitos

chamam de “descoberta de verdade”, torna-se, na sua grande maioria, transitórios e

assim devem ser. Essa ética em Bachelard (1971), nesses conceitos de ruptura e

retificação, poderá ser motivo de interpretação na nossa área, nesse trabalho.

Uma tentativa deste diálogo foi feito por Immanuel Kant (AMORÓS, 1999,

p. 111-112), ao tentar conciliar racionalismo e empirismo no Iluminismo, dentro de

um momento histórico-científico tão distinto. Pela historicidade, Bachelard acaba

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realizando isso com mais evidência. Ele viveu em dois séculos e prenuncia a pós–

modernidade, a contemporaneidade. Aliás, Kant buscava um pensar autônomo e

sem dogmas, próprio de sua época iluminista. Bachelard concretiza Kant, na prática,

por motivos cronológicos, por aproximadamente um século e meio de diferença.

Esta incansável busca em desconstruir unicidades filosóficas, visando uma

compreensão de que muitos dos conhecimentos humanos podem ser transitórios,

isso é o que nos atrai no pensamento de Bachelard e que nos leva à pergunta: qual

é a ética que a lingüística aplicada, o ensino de língua e o campo da lingüística em

geral, na área da cognição, usam para suas investigações? Por isso é que o

conceito da ética da diferença (PENNYCOOK, 2006, p. 14, 142), é essencial nesse

trabalho. Inicialmente relacionada ao uso manipulativo nas traduções das culturas

dominadas, coloniais e pós-coloniais, esse conceito hoje é usado no movimento anti-

hegemônico de língua e poder em várias áreas da LAC. A cognição e a participação

de nosso aluno, com sua cultura de aprender diferenciada, são realmente

valorizadas? A citação a seguir certamente estará presente nas nossas

considerações finais.

A história da ciência só pode insistir nos erros do passado a título de elemento de comparação. A dialética dos obstáculos epistemológicos e dos actos epistemológicos [...] os segundos se opõem aos primeiros [...] Existem assim um positivo e outro negativo na história do pensamento científico [...] Quem se limitasse a viver na coerência de Ptolomeu não passaria de um historiador [...] E do ponto de vista da ciência moderna, o que é negativo depende de uma psicanálise do conhecimento. [...] Aquilo que do passado permanece positivo, continua ainda no mundo moderno. (BACHELARD, 1971, p. 205-206).

É relevante relembrar que o racionalismo em Bachelard não advém de

uma concepção de sujeito racional que vai entender a ciência como Descartes

propôs. Isso se constituiria numa contradição. Bachelard entende racionalismo como

a possibilidade do uso da razão, misturada com a “imaginação-lógica” para

entendimento do conhecimento que, embora existente, não pode se mostrar.

Precisou ser inventado. Mas o que fica flagrante no pensamento dele é o uso da

razão como instrumento de reflexão e mudança; reflexão de percepção do pensar

ético dentro da educação epistemológica; e nós relacionaríamos, mais uma vez, esta

posição com o subtítulo de outro autor, Edgar Morin (2004), na capa do livro “A

cabeça bem-feita”: “repensar a reforma, reformar o pensamento”.

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Para contextualizar os marcos teóricos, evocados aqui para alargar a

concepção de nossa pesquisa, cuja problemática será explicada no segundo

capítulo, tivemos que inserir e, às vezes, resenhar os teóricos discutidos nos

parágrafos anteriores pela falta de contato da nossa profissão, de professores de

LE, inglês, com os mesmos e pela distância de outras culturas e formas de pensar,

que não os anglófonos. Foi imprescindível para nos enriquecer com algumas

contribuições não anglófonas esquecidas sobre a pedagogia científica e, por

conseguinte, examinar questões éticas na pesquisa da LA, pesquisa essa,

obviamente, com o olhar anglófono existente em muitas instituições de ensino no

país e localmente. Possivelmente, através dessas questões epistemológicas que

temos nos feito, até então, poderão surgir prováveis interpretações nesta escritura,

sobre o poder e o saber nos institutos de ensino de Língua Inglesa. Diferentemente

da LAC, que se insere com a ética da diferença (PENNYCOOK, 2006, p. 14, 142), a

LA utiliza, unicamente, uma pesquisa cientificista, desconsiderando questões além

das empíricas racionais.

Desse final de capítulo em diante, temos que dar uma virada para o

problema de nossa pesquisa, a exclusão de duas estratégias cognitivas, a tradução

e a repetição, ainda não questionadas no campo da LAC, e que é remanescente de

pesquisas de cognição em ASL, na LA clássica. Essa questão será problematizada

no capítulo dois, a seguir. Até agora, buscamos uma atualização da formação do

conhecimento na epistemologia da pesquisa, especulando a ética na área de LA e

visando examinar o saber histórico dessa epistemologia, mascarado nas coerências

funcionais e nos sistemas formais em instituições estabelecidas e que através da

concepção da genealogia foucaultiana certamente poderão ser interpretados. Esse

diálogo com os teóricos inseridos neste capítulo e com a LA, provavelmente será de

investigação, ou melhor, de interpretação dos possíveis saberes dominados na

nossa área, que precisam, se for o caso, se insurgir contra os efeitos do poder do

saber centralizador, que estão ligados às instituições de ensino de LE, saberes

dominados, sepultados e que fomentam, em vez de examinarem, o funcionamento

de um conhecimento tradicional sepultado no discurso no interior de uma sociedade

como a nossa (FOUCAULT, 1999, p.169-171). A seguir, passamos para o capítulo

dois que tratará da problemática, propriamente dita, dessa pesquisa de exclusão de

estratégias mencionadas, a ser analisada também do ponto de vista do aluno,

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exclusão feita pelo poder do saber dominado, sepultado dos especialistas: a

repetição e a tradução.

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2 PROBLEMATIZANDO A ÉTICA DA DIFERENÇA EM PESQUISAS

DE ENSINO DE LÍNGUA ESTRANGEIRA

Os teóricos discutidos no capítulo anterior serão usados na interpretação

de nossas entrevistas na pesquisa com “alunos”, professores e coordenação,

sobretudo, e passarão a dialogar no capítulo quatro, da nossa pesquisa, com a fala

dos nossos entrevistados. Tentaremos com eles desenterrar, (des)sepultar alguns

saberes históricos omitidos e manipulados na pedagogia e na didática em cursos de

língua inglesa, suspeitas essas que são complementares ao assunto central desse

trabalho, a saber, a questionada ética da diferença no ELE, aqui enfocada, no

tratamento e uso de pesquisas de estratégias cognitivas, que se atropelam e se

contradizem com ideologias de novos métodos, e como esse descompasso aético,

pode estar em detrimento da aprendizagem de “alunos” de LE. Mais

especificamente, discutiremos a exclusão de algumas estratégias cognitivas e suas

possíveis razões, que fizeram das mesmas, uma agenda oculta da pauta de cursos

de desenvolvimento profissional, reciclagens e formação de professores.

Confrontaremos essa exclusão com a possível intenção do conformismo

reproducionista dessas instituições e suas coordenações, com idéias veiculadas

pelos novos métodos importados dos países anglófonos ou centrais da área de ELE.

Suspeitamos que essa exclusão deve ter raízes ideológicas e comerciais. Não

seríamos inocentes de pensar o contrário. Mas a produção cultural da área poderia

conviver com “intermétodos” nos seus lançamentos de publicação de livros

didáticos. Esta problematização será mais bem detalhada, ao longo das próximas

páginas.

Eventuais antecipações de conclusões poderão aparecer ao longo do

texto e elas são originadas da minha longa experiência em ensino de LE em cursos

livres e pela observação da falta do uso da ética da diferença no nosso campo. Se

ocorrerem essas antecipações serão precipitadas. As conclusões só serão validadas

nas considerações finais deste trabalho.

De volta a nossa problematização ela visa a interpretar o porquê se

“omitiu” algumas estratégias cognitivas da cena de cursos livres e as conseqüências

para o “aluno” adulto; a discutir o papel passivo deste aluno, (des)empoderado da

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agenda didática de suas aulas, desconsiderado de suas subjetividades didáticas,

diante de uma hierarquia organizacional e controle institucional, isto é, o poder

exercido por proprietários de cursos, o poder do saber dominado dos coordenadores

acadêmicos e professores. E o porquê isso acontece, já que as pesquisas de

estratégias são respeitadas na didática anglófona exportada para países periféricos,

como o nosso, no ELE e que representam a máxima proximidade com a voz do

aluno, relatando como aprende no ambiente de sala de aula.

Desta forma, teremos que reapresentar e discutir, neste capítulo, a

conhecida pesquisa de estratégias cognitivas de aprendizagem de “alunos”: sociais,

afetivas, metacognitivas e cognitivas, de Anna Chamot e J. M. O‟Malley (1995,

p.133-150, tradução nossa), autores escolhidos por nós, embora aqui iremos nos

concentrar apenas nas estratégias cognitivas, especificamente, as excluídas

tacitamente do ambiente didático da nossa cultura de ensino em cursos livres aqui

na Bahia, a tradução e a repetição, exclusão esta, nosso objeto de pesquisa.

Discutiremos essas estratégias cognitivas em contraposição à idéia de

empoderamento das necessidades didáticas subjetivas dos “alunos” de LE, através

do lingüista René Richterich(1980) e do livro Learner-centred Curriculum, Currículo

Centrado no Aluno, de David Nunan (2000), cujo tema central já tivera sido

levantado por Richterich.

Pensamos que as estratégias de aprendizagem não são categorias

estanques que bitolem e não facilitem o ensino e a aprendizagem de “alunos” de

línguas estrangeiras. Ao contrário, podem se agregar e se constituir instrumentos a

serem considerados pela pedagogia de ensino de LE. O que é importante, a nosso

ver, é examinar que critérios são considerados na escolha das estratégias, na

hierarquia dos cursos, entre coordenadores e professores, e como as crenças

desses profissionais podem tender à escolha de certas estratégias, incluí-las ou

excluí-las no lugar dos “alunos”. Embora o objetivo dessas pesquisas tenha sido

ouvir esses “alunos” para compatibilizar suas estratégias cognitivas, o que, em

princípio, deveriam ser inseridas nas didáticas das aulas, muitas dessas estratégias

na didática do dia a dia são escolhidas e usadas, de acordo com as crenças dos

coordenadores e, por conseguinte dos professores, em geral guiados pelas

novidades do mainstream, tendência dominante no mercado, das pesquisas de

aprendizagem e ensino e das metodologias “puristas” vigentes. Embora

provenientes desses “alunos”, na prática, essas estratégias tornam-se técnicas de

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ensino, procedimentos didáticos escolhidos e usados pelo professor, no seu plano

de aula, didaticamente pouco negociadas com os “alunos” e de acordo com as

crenças passadas pela coordenação. Questionamos essa possível ética desviante,

nessas escolhas oblíquas, é possível que haja um conformismo das coordenações

em função de uma linearidade do conhecimento metodológico de LE e essa visão

esteja associada a interesses da indústria editorial de livros didáticos da área, a

cada lançamento acadêmico-científico ou de um novo método, quando rupturas de

estratégias cognitivas são feitas e nenhuma retificação é mantida. Oportunamente,

instigamos: “O poder é modelado pela mercadoria”. (FOUCAULT, 1999, p. 174).

A nosso ver e como já escrito anteriormente, as estratégias em geral e as

cognitivas em especial, já que vamos tratar apenas destas, não se constituem uma

categorização reducionista. Elas são expressões do estilo cognitivo do “aluno” e

podem empoderá-lo e envolvê-lo mais, na sua aula. Para tanto, essa hierarquização,

coordenação, professores e “alunos” teria que ser reconstruída?

Na nossa experiência, quando nossos coordenadores dos cursos de LE

escolhiam aquilo que, do tema estratégias, teria que ser lido, eles pensavam em

homogeneizar, com essa atitude, os procedimentos didáticos dos professores, mas

olhando para “alunos” ideais, atores sem subjetividade e fora do social.

Despertamos, desse modo, para esse procedimento não ético: a escolha

hierarquizada e ideologizada de quais das estratégias seriam discutidas. Por certo,

as estratégias cognitivas foram alijadas. Assim, nossos coordenadores sutilmente

“impuseram”, tácita e informalmente, estratégias cognitivas “boas e ruins”, de acordo

com os ditames dos novos métodos publicados, nos restringindo, assim, a discussão

de estratégias cognitivas, como um todo. Quando a nossa coordenação enfatizava

quais as estratégias de habilidades (as cognitivas não eram discutidas) deviam ser

ensinadas e aquelas que deveriam ser ignoradas, o (des)empoderamento dos

“alunos” se tornava evidente na área cognitiva, porque suas vozes nas pesquisas de

estratégias eram desconsideradas. Didaticamente, os professores se sentiam

também (des)empoderados. Parece-nos que estes imaginavam que, se fossem

ainda negociar estratégias com os “alunos”, perderiam o poder, duplamente.

Temos a impressão que todo o nascimento do poder do saber se inicia

pelas leituras manipuladas por algumas coordenações, se construiu uma narrativa

unidimensional do ensino das estratégias, procedimentos e métodos ideais a esse

“aluno”. Parece-nos que a lógica atrás dessa atitude era: os livros didáticos inovam;

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convivemos com contradições entre essas inovações e algumas pesquisas

cognitivas. Assim sendo, como poderíamos aceitar o uso de L1 e repetição,

categorias que vamos pesquisar, muito embora estas fossem relatadas e usadas por

nossos “alunos” de LE? Esta contradição foi resolvida pela omissão sumária na

discussão das estratégias cognitivas.

Supomos que, com essa atitude, o poder hierárquico, professores e

coordenação acadêmica agem, possivelmente, em detrimento do “aluno”, quando

eles não consultam ou não incluem a escolha do “mesmo” na prática didática. Na

verdade, se as estratégias de ensino fossem menos manipuladas, se poderia incluir

e subjetivar as demandas cognitivas “costumizáveis” desse “aluno”. O verbo

“costumizar” toma, neste texto, uma acepção educacional. Costumizar,

educacionalmente, as características cognitivas dos “alunos” no planejamento

didático é contemplar a diversidade de estratégias mencionadas por “eles”,

didaticamente, em suas aulas de ELE. Elas deveriam ser sempre costumizáveis, do

ponto de vista do “aluno”. As entrevistas, nesse estudo citadas, são até confissões

dos seus pontos fracos e fortes na aprendizagem, possíveis de serem negociados e

costumizados em sala de aula. Por esta razão, vejo relevância nas pesquisas com

as estratégias cognitivas, se forem, eticamente, disponibilizadas na prática para o

“aluno”, que é nosso objetivo final. Achamos que as suas subjetividades didáticas

precisam ser respeitadas e negociadas com eles. Voltaremos a este assunto no

terceiro capítulo, com a concepção de análises das necessidades subjetivas e

objetivas historiadas através dos conceitos cunhados pelo lingüista suíço René

Richterich, no qual nos apoiamos, onde exemplificaremos o que já é conhecido da

lacuna entre expectativas didáticas de professores e de “alunos”.

Seguimos tentando questionar o que há de subalternizado e

deliberadamente oculto no uso, mau uso, ou não uso dessas estratégias. A nosso

ver, estas são dominadas pelo poder da hierarquia nos curso de LE e algumas

intenções estão nesses bastidores. Uma evidência dessa escolha subjetiva da

inclusão ou não de uma ou outra dessas estratégias pesquisadas está na produção

editorial de livros de ensino de língua nos países centrais, a partir do final da década

de oitenta. Pelo nosso conhecimento, as estratégias então utilizadas, em alguns

livros didáticos de LE, foram exclusivamente estratégias de habilidades, sobretudo,

de habilidades receptivas, de leitura e audição, sendo desnecessário lembrar que as

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estratégias de leitura são, sobretudo, intensamente treinadas no ensino de inglês

instrumental, a partir dessas pesquisas sobre estratégias de habilidades.

Mas as estratégias cognitivas não foram inseridas nos livros textos, nas

salas de LE, nem para discussão, ocultadas possivelmente com as intencionalidades

já especuladas, anteriormente. Aí está o “calcanhar de Aquiles” das

intencionalidades, marcadas pela linearidade forçada do conhecimento

metodológico, lingüístico e didático, no ensino de LE, onde contradições não são

discutidas e, em vez disso, omissões de estratégias acontecem para, linearmente,

chancelar métodos novos, com esquecimento de métodos antigos, como a tradução

e a repetição, por exemplo, que, subliminarmente, não poderiam aparecer nos novos

pacotes editoriais lançados. E aí nos perguntamos se as estratégias cognitivas, a

cognição humana em geral, não seriam atemporais e heterogêneas, em cada

sujeito? Com certeza elas serão culturais! Como podemos universalizar uma forma

de aprender atual e homogênea como a mais eficaz? Nesse micropoder de saberes

em cursos de língua, essa escolha de como se deve aprender é um simulacro do

modelo conformista e manipulador pretendido pela coordenação acadêmica, para

evitar aborrecimentos e questionamentos da linearidade determinista do ensino de

LE. No nosso exemplo, nem os “alunos” tiveram acesso às estratégias cognitivas,

nem a maioria dos professores.

Contrapondo a essa posição manipuladora, lembramos uma citação no

editorial da capa do newsletter, informativo do BRAZ-TESOL de 1996, intitulado The

art of Tesol – TESOL 1996, no trigésimo encontro anual do TESOL de 26 a 30 de

março, em Chicago, na palestra de H. Douglas Brown, A Arte do Ensino Subversivo:

“O professor não deve necessariamente se conformar com práticas pedagógicas

míticas, mas deveria se sentir bem estimulado a questionar conceitos pré-

concebidos e adaptar, criar e experimentar com práticas não ortodoxas.” (BROWN,

1996, p. 1).

Parece-nos que, num arroubo explosivo de desconstrução do seu próprio

poder de lingüista, o autor vai de encontro à rigidez metodológica e, assim, se

permite criticar duramente essa posição conformista que censuramos.

Impressionante, como posições como essa de Brown são pouco divulgadas,

silenciadas no mundo anglófono, o qual nos parece, agora, “eticamente”

(des)regulamentado, e onde posições contrárias ao mainstream, como a de Brown,

acima, são raras.

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O que há de errado com esse estudo de levantamento de estratégias

cognitivas, nos parágrafos anteriores? Nada, a princípio. Achamos que ele

entrevistou e relatou as necessidades cognitivas, dos “alunos”, em sua diversidade,

e se realmente fossem usadas com os mesmos, possivelmente poderiam empoderá-

los, caso lhes fosse dado a formação básica para adquirirem algum saber

pedagógico para compartir ou agenciar a sua inserção na didática dos planos de

aulas de seus professores. Apenas questionamos duas das estratégias, mas

supomos que outras deverão ter tido o mesmo destino: terem sido excluídas para

estar em conformidade com cada novo modismo anglófono da área, com cada

método novo lançado. Nós nos permitimos a isso. Façamos o mea culpa coletivo.

Nos parece que esse procedimento, citado nos parágrafos anteriores,

pode resultar num abandono de estratégias indispensáveis para “alunos” adultos

que, no nosso sistema educacional em cursos livres, são oprimidos para que não

usem sua língua nativa ou que seus pedidos de técnicas de repetição, de leitura em

voz alta ou de treinamento de estruturas sejam satirizados. O ocultamento, uso ou

não uso de certas estratégias cognitivas veiculadas em Anna Uhl Chamot e J. M. O‟

Malley (1995, p. 133-150) flagra a história de conhecimentos pedagógicos

fragmentados e realmente sepultados ou letargicamente omitidos, por muitos cursos

de língua, durante o início dos anos noventa, até estes dias. Vejamos o estudo de

número quatro, pesquisa das estratégias usadas por “alunos” americanos de LE,

portanto americanos aprendendo Russo e Espanhol, nos Estados Unidos, que nos

mostra a definição e o levantamento das estratégias cognitivas para este grupo,

como demonstrada no quadro a seguir:

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Estratégias cognitivas que envolvem interação com o material a ser aprendido, manipulação mental ou física com este material ou aplicação de uma técnica específica

no exercício da prática

1. Repetição: repetição de pedaços de língua (palavra ou frase) durante uma tarefa

em execução. 2. Usar fontes: usando recursos, usar fontes de referências de informação

disponíveis sobre a língua meta, incluindo dicionários, livros-texto e trabalhos anteriores.

3. Agrupar: agrupar, ordenar, classificar ou nomear o material usado numa tarefa em LE, em sala, baseado em atributos comuns; relembrar informações baseando-se nos agrupamentos.

4. Tomar notas: escrever palavras-chaves e conceitos de modo abreviado nas formas verbais, gráficas ou numéricas para ajudar no desempenho das tarefas em sala.

5. Dedução/Indução: aplicar conscientemente o que foi aprendido de regras auto-desenvolvidas ou entender a língua meta.

6. Substituição: selecionar abordagens alternativas, planos revisados ou palavras

diferentes para realizar uma tarefa [de L.E]. 7. Elaboração: relacionar informação nova com conhecimento anterior; relacionar

diferentes partes da informação nova entre si, fazer associações pessoais significativas com a informação apresentada. Isso foi codificado nos dados com a técnica de pesquisa “pensar alto”, nas seguintes formas: a. Elaboração pessoal: fazer julgamentos sobre ou reagir pessoalmente ao

material apresentado. b. Elaboração do mundo: usar conhecimento adquirido pela experiência no

mundo. c. Elaboração acadêmica: usar conhecimentos adquiridos de situações

acadêmicas. d. Elaboração entre parte: relacionar partes da tarefa entre si. e. Elaboração de questionamentos: usar uma combinação de perguntas [do

conteúdo] e do conhecimento do mundo para fazer [eliciar] com um brainstorm, soluções lógicas para uma tarefa [em sala].

f. Elaboração auto-avaliativas: julgar self [a si mesmo] em relação aos materiais. g. Elaboração criativa: escrever uma linha de uma estória ou adotar uma

perspectiva inteligente. h. Imagens: usar gravuras reais ou mentais, ou estratégias visuais para

representar a informação, codificada como uma categoria separada, mas vista como uma forma de elaboração.

8. Resumir: fazer um resumo mental ou escrito da língua e da informação apresentada numa tarefa.

9. Tradução: dar idéias de uma língua para outra de uma maneira verbatim [sentenças ou palavras, literalmente].

10. Transferência: usar conhecimento lingüístico previamente adquirido para facilitar uma tarefa [em LE].

11. Inferência: usar informação disponível para adivinhar o significado ou uso de itens lingüísticos desconhecidos associados com a tarefa de língua, para prever resultados ou para preencher palavras que estejam faltando.

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Quadro 1. Estratégias cognitivas que envolvem interação com o material a ser aprendido,

manipulação mental ou física com este material ou aplicação de uma técnica específica no exercício da prática

Fonte: Baseado em Chamot e O´Malley (1995, p.138-150).

Recordemos que, quando dessa discussão que estabelecemos aqui, a

abordagem comunicativa estava no ápice de seu prestígio. Essa referência

bibliográfica de estratégias que utilizamos nessa tese foi contemporânea a essa

abordagem. O estudo quatro compilado nesse quadro um acima é igual à nosso

ambiente de ensino, isto é, LE. Acontece que o resultado desse estudo, mencionado

no quadro um, não foi matéria de leitura socializada ou discutida reflexivamente

entre nós, professores, em nossa realidade local, nem foi disponibilizado nos planos

de aula para a parte mais baixa da hierarquia da pirâmide educacional, os “alunos”.

Contudo, todos os lançamentos de novos métodos ou de pesquisas de cognição

eram deglutidos apenas com as novidades importadas, que logo eram substituídas.

E, mesmo fora dessas instituições, constatamos a mesma falta de reflexão e

criticidade desse tema, nos diversos eventos da área: congressos de ensino de

língua inglesa, tal como o BRAS-TESOL, o BA-BRAS-TESOL, seminários e

simpósios de LA, freqüentados com regularidade por nós, ao longo dos anos

noventa e a partir do ano 2000. O professor de inglês, sobretudo aquele de cursos

livres, tem sido “domesticado” pela idealização da hegemonia econômica e cultural

anglófona e pela hegemonia metodológica, homogeneizante entre professores

pouco subversivos. Essa posição domesticada diante do conhecimento dos países

centrais tem sido cômoda e se demanda uma mudança de posição. Sempre

sentimos uma evidente subalternização a essa hegemonia cultural anglófona,

nesses ambientes de cursos livres. Subalternização permitida localmente. Também

seria desonesto desprezar as contribuições da pesquisa anglófona cientificista, mas

que seja recebida criticamente com crivos locais e sem a imposição de uma sem

linearidade cumulativa, sem reflexão. Lembramos que as estratégias que

discutiremos nesse texto, repetição e tradução, estão em negrito no quadro um.

Voltando ao livro de Chamot e O‟ Malley (1995), só lemos dele o que

interessava à nossa coordenação, de então. Nada de estratégias cognitivas

incompatibilizadoras e desestabilizantes da “ordem e bons costumes” sugeridas

pelos novos métodos e livros didáticos, que não produzimos no nosso país. Algum

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tempo se passou. Com o barateamento e facilidade de compras via internet, adquiri

o livro de Chamot e O´Malley (1995) e o li integralmente. Então, comecei a suspeitar

que as leituras escolhidas para discussão nos TDC, cursos de desenvolvimento

profissional, nessa época e ainda atualmente, em nossa realidade, se constituíam

em um simulacro dos desejos ou “conveniências” das coordenações acadêmicas: as

leituras escolhidas pelos nossos coordenadores, ao longo da nossa vivência, nos

cursos de desenvolvimento profissional sobre estratégias de ensino, como já

tínhamos aludido anteriormente, não cotejavam as estratégias cognitivas.

Relembramos que usaremos a partir desse capítulo as palavras “ética”,

“aético” e “falta de ética” e, quando mencionarmos as mesmas, nesse trabalho,

estaremos significando o conceito de “ética da diferença” de Alastair Pennycook

(2001, p. 14, 142), que aqui usaremos, tal como o mesmo propõe, o questionamento

crítico daquelas identidades culturais que ocupam posição de poder na cultura e na

política de diversas áreas da língua, localmente, cujas éticas precisam desenvolver

elementos transformadores para reformar identidades culturais. Esse conceito é um

importante pilar da LAC e o impingiremos aqui, em diversas passagens.

Vejamos qual foi a posição que não consideramos ética, nessas

coordenações, em relação a esse estudo quatro, no quadro um, nas páginas

sessenta e sessenta e um. Além delas não nos disponibilizarem o capítulo com os

estudos de estratégias cognitivas, nem discutirem conosco esse estudo, totalmente

compatível com nossa realidade de LE (por não ser uma realidade de SL), nem

socializá-lo com o “aluno” para discutir seus estilos cognitivos, informal e

subliminarmente, no discurso dessa coordenação, sobretudo duas dessas

estratégias do quadro um eram expressamente excluídas e estigmatizadas: a de

número um - repetition, (repetição) e a de número nove – translation (tradução), que

se encontram em negrito no quadro um. Além disso, na minha experiência, sentia

que os métodos “novidadoristas‟ contrariavam o que os alunos diziam nessa

pesquisa. Executava-se o novo método e esquecia-se da forma de aprender do

aluno.

Não é difícil associarmos estas estratégias a métodos “antigos”. Sendo

assim, como poderiam ou ousariam estas técnicas serem inseridas na didática de

um plano de aula na atualidade? Que incômodo ter que confrontá-las com uma

abordagem mais atual, digamos, o lexical approach, abordagem lexical que não

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incluía as mesmas. Essa atitude de omissão, sem descentramento, fixista e

“neofagista”, nos parece acrítica.

O conceito bachelardiano de retificação de conhecimentos do passado e

que podem ser cooptados no presente, como uma espécie de descentramento,

claramente definido por Luciano Lima, neste tabalho, na página quarenta e dois,

com o qual concordamos como um preceito ético na epistemologia, foi descartado,

num jogo direto de ocultamento, estigmatização, acriticidade, linearidade,

conformismo e exclusão, para evitar, certamente, questionamentos e manter

autoridade de quem estava impondo o livro texto mais atual.

Usaremos aqui o termo cunhado por nós, fragmentação intermetodológica,

para caracterizar o que escrevemos no parágrafo anterior, isto é, aquele

conhecimento “antigo”, digamos, anterior, mas eventualmente válido, não retificável,

provavelmente por interesses cientificistas da área de LA, cumulativos, ou por

conveniência. Discutimos todo tempo essa não retificação que fragmenta propostas

de métodos entre si. Esse conhecimento não é veiculador do “novo” conhecimento,

o novo passando por cima do anterior, implacavelmente, de conformidade com o

assim chamado “progresso” e, assim, se exclui esses conhecimentos anteriores, que

eram e são deslegitimados pelo modismo imposto pela autoridade dessas

coordenações. Seus conceitos novos se impregnam no imaginário e na prática dos

profissionais na área de ELE Assim, apontamos a fragmentação intermetodológica

como uma das razões para tal procedimento: descartar o “velho”, fazer apologia do

novo e nunca “retificar” algo do método que lhe antecedeu; ruptura com um método

sem retificá-lo, embora tantos procedimentos de cada um se sobreponham, de forma

às vezes disfarçada, um ao outro. Fazendo um adendo aqui, queremos dizer que a

avaliação de métodos não são o objetivo desse trabalho. Assim, se o método direto

radicalizou a retirada da língua nativa dos seus procedimentos, por outro lado trouxe

a necessidade de oralidade. O método comunicativo foi um enorme avanço para a

história da metodologia de LE, mas, em si, nenhum método, será uma solução e,

aqui, não nos dispusermos a dialogar com todos eles, nem com a opinião dos atores

que estão em sala de aula sobre os mesmos.

Outra possível razão, superficialmente discutida: o mercado de ensino de

LE como mencionado acima, precisava ser atendido. Num movimento de apologia à

ruptura em detrimento do retificável, reproduz-se a ética do mercado de ensino de

LE, que interfere na educação. Interfere porque este precisa lançar o livro-texto

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novo, a abordagem nova e vendê-los, porque se investiu muito na concepção

desses livros e, assim, passa-se por cima das necessidades dos “alunos”, mesmo

que o novo venha em detrimento do mesmo. Supomos ser possível comprovar, nas

entrevistas dessa tese, a importância da retificação de alguns conhecimentos

antigos e viáveis, examinar e sugerir se é possível elevar o “aluno” de um papel

passivo para um papel de participante de sua vida didática em sala.

O aproveitamento de técnicas de abordagens “antigas” ainda se constitui,

até hoje, em muitos institutos de ensino de Língua Inglesa, verdadeiro pecado,

mesmo sendo essas estratégias e estilos cognitivos expressamente desejados pelos

“alunos” que esperavam ser atendidos e ter suas demandas inseridas em suas

aulas. Conforme conceitos de Bachelard em citações anteriores, essas estratégias

poderiam ser retificadas, isto é, qualquer estratégia (do ponto de vista do “aluno”) ou

técnica (do ponto de vista do uso didático do professor) que fosse eleita como

eficiente, mesmo pertencendo a um método anterior, deveria ser validada sem pré-

julgamentos metodológicos tradicionais, que tanto restringem, categorizados pelo

binômio antigo-atual. Não nos colocamos contra o novo, pelo contrário! Mas nosso

discurso clama em resgatar o que ainda é válido para o “aluno”, nosso principal ator.

Assim, poderíamos reengajar o passado no contemporâneo, resignificando o que

desse passado importa nos livros e na didática atuais, negociando com as escolhas

dos “alunos”. Assim, vemos que pelo menos na nossa experiência profissional, essa

conjunção não existiu. A cultura de ensino de língua nos parece que se filiou a um

só aspecto, uma só “verdade” do real: escolheu ficar progressiva e linear com a

ruptura descontinuísta na área de ensino de língua. Pouco aproveitamos de outras

realidades metodológicas. Sendo assim, na área de estudo de ensino de LE,

epistemologicamente e pedagogicamente, estaríamos no século passado? A ciência

física, que foi a mais exata e empírica, modelo de determinismo entre todas as

demais, convive com diferentes modelos epistemológicos para entender seu “objeto”

de estudo, que hoje se tornou um potente “sujeito”: o mundo subatômico. Como

vimos no racionalismo aplicado, a subjetividade infinitesimal, na microfísica, difere

do sujeito empírico clássico newtoniano (do dado). Contudo, isso não acontece na

nossa área de LA, onde, ainda procedemos como empíricos e deterministas, numa

área que pertence às humanidades!

Exploramos a epistemologia contemporânea do filósofo do conhecimento,

Gastón Bachelard, no capítulo um, para nesse momento nos perguntar se estamos

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agindo eticamente em todo esse processo de exclusão intermetodológica de

técnicas e estratégias de aprendizagem. Se Burrhus Frederick Skinner pesquisou o

período de uma vida, por exemplo, e nos legou conceitos parciais de aprendizagem,

de estímulo-resposta, reforço e técnica de repetição, embora não sendo seu adepto,

nem concordando, ideologicamente, com grande parte da sua teoria, não haveria em

contextos de seus achados, alguma utilização contemporaneidade? Teria esta que

ser descartada e radicalmente em nada aproveitada? Não acreditamos nessa

postura, no conhecimento. Terapias cognitivas-comportamentalistas, dizem alguns

psiquiatras e psicanalistas, através da mídia, são mais eficazes em alguns

tratamentos, tal como bulimia, transtorno obsessivo-compulsivo, dentre outros. Essa

é a retificação de um conhecimento do passado, atualizado, com mais propriedade,

no presente. Esse conceito de retificação em Bachelard, certamente, urge intervir na

nossa área profissional de ELE

De volta á nossa questão contra o que é feito com as estratégias cognitivas

numeradas a seguir: um – repetition, repetição e nove – translation, tradução, no

quadro um, verificamos que essa exclusão, localmente aceita de forma conformista

persiste e empodera a editoração anglófona. Assim, abandonamos o ”aluno”: ora,

localmente, pela não reflexão acerca das estratégias cognitivas neles interditadas, ora

pela exclusão dos saberes vindos de relatos dos “mesmos”. Vê-se como nossa área

está impregnada de arrogância da “verdade” vigente, que beneficia aqueles

interessados na indústria do ensino de LE, na sua editoração para o setor, causando

um conformismo intencional pela comodidade, ao se agregar um pacote com rótulo

novo.

Notamos que eles operam na base do “novofagismo”. O termo entre aspas

é um neologismo que cunhamos aqui e que significa, na nossa "metaforização", a

ansiedade em degustar o novo (método ou livro didático); usaremos esse termo, ao

longo desse texto.

Se verificarmos, se utilizarmos e nos importarmos com cada uma dessas

estratégias cognitivas, relatadas no quadro um, nas páginas sessenta e sessenta e

um, identificando-as com a cultura de aprender dos nossos “alunos”, poderíamos

estar confrontando a poderosa indústria de ensino de inglês. Nós, “periféricos”, e

com nossa baixa auto-estima autoral, na área editorial de LE, não compilamos, no

Brasil, livro didático de ELE. Esse não confrontamento entre estratégias e

publicações “inovadoras” é mais uma possível razão ou intencionalidade não

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refletida por nós e que deforma o estudo de estratégias mencionado. Por todas

essas omissões, supomos se tratar de um poder-saber, não-qualificado,

desqualificado desses “alunos”, pela hierarquia do ELE. Ao longo de nossas

entrevistas sobre estratégias, a tradução (uso de L1) e a repetição (técnica

mecânica de base comportamentalista), ambas alijadas da sala de aula, se tornarão

as categorias de nossa análise qualitativa; através de nossas entrevistas na

pesquisa do capítulo quatro, sobre esse tema, corroboraremos ou não a importância

de se levar em conta esses “alunos” e suas estratégias ou de relegá-las, como em

parte acontece nesses cursos livres, nos nossos dias.

Se considerarmos a estratégia um, repetition, repetição, veremos que é

uma técnica fundamental do método Audiolingual e sabemos que o “pedagogês“ não

perdoa algo que lembre o behaviorismo. Mesmo considerando as duas estratégias

estigmatizadas acima, em discurso de coordenadores em cursos de LE, lembramos

como alguns “alunos” adultos, sobretudo em nível inicial, mencionam no estudo de

número quatro do quadro um, nas páginas sessenta e sessenta e um, quer

consultados, ora informalmente em sala, ora em tantas outras pesquisas, como

veremos no Capítulo três. “Alunos” adultos podem preferir estilos mais mecânicos de

aprender, talvez pela necessidade de ter mais segurança, pelo reforço da memória,

antes de partirem para a produção livre de LE. Sem memória, não aprendemos.

Existem “alunos” que preferem técnicas de aprendizagem que incluam a memória,

por exemplo, em estágios inicias da exposição do conteúdo. Mas “memorizar”

através de repetição, automatizar conteúdos, usando um tempo de aula diferente

daqueles usados nos métodos que essas categorias são oriundas, se tornou,

mesmo em quantidade e tempo menores e viáveis, técnicas aborrecidas para

professores, em cursos de língua, sendo consideradas pelos mesmos e não

necessariamente pelos alunos como uma “lavagem cerebral”. E depois da

interpretação local da aprendizagem significativa de David Ausubel (1968), com sua

versão consistente da psicologia cognitiva, na qual acreditamos, hoje, nos parece

que só “se permite” aprender em contextos cognitivos significativos, isto é, a partir

de um conhecimento pré-existente via descoberta do conhecimento pelo aluno,

embora o autor em nenhum momento tenha excluído a aprendizagem mecânica, o

rote learning (AUSUBEL, 1968, p. 26). Contudo, parece-nos que o que fica

realmente entendido de Ausubel como sendo aprendizagem significativa,

localmente, é aquilo que Moreira (2009, p. 140) reinterpreta como “significante”.

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Reavaliando a aprendizagem significativa de Rogers (1987, p. 259) ele a compara

com a de Ausubel e (re)significa como aprendizagem “significante”, relevante para a

realidade do estudante e personalizada à sua vida. Essa interpretação,

aprendizagem “significante”, é aquela que, em nosso ambiente de cursos livres, se

entende como significativa. Mais um equívoco na ansiedade novidadorista. Embora

todas as atividades em sala de aula sejam uma pretensão de autenticidade,

achamos que essa noção de aprendizagem relevante ou significativa se tornou a

única forma “possível” de aprender uma LE, sendo as atividades mecânicas,

repetição e memorização, especificamente em LE, em níveis iniciais e

intermediários, descartadas. Essa incoerência desses usos conceituais em torno do

que seja significativo nos faz cogitar que é possível que a escolha da aprendizagem

cognitiva, localmente, seja também delineada pela exclusão da mecânica. Teria

mesmo a aprendizagem ser sempre dessa forma, relevante e significativa? Mesmo

conhecendo-se pesquisas mostrando que os “alunos” pensam o contrário?

(CHAMOT, 1995, p. 133-150 ). Poderemos prescindir da memória?

A nona estratégia, translation (tradução), se usada, será julgada como

sinal de transgressão do estabelecido. No entanto, essa estratégia se sobrepõe às

de métodos anteriores, sendo um pressuposto do método direto e do Audiolingual. E

essa sobreposição ocorre sem discussão e por conveniência, sua discussão é

silenciada; é uma estratégia “arquiestigmatizada” por ser a principal técnica do

método Grammar-translation, gramática-tradução. De acordo com essa crença

excludente, traduzir não presta para nada, segundo a maioria, na área.

A tradução, então, como atividade profissional, não seria uma área

economicamente real (onde estão os tradutores e intérpretes)? E essa não refinaria o

conhecimento da primeira língua, como propõem Kecskes e Papp (2000, p. 15-36,

tradução nossa)? Tal como a repetição, o problema mal interpretado nesses cursos

livres é a duração de uso. Essas estratégias não seriam intensamente usadas, como

nos seus métodos originais, onde elas eram as prima-donas dos mesmos. Essa

dosagem, tal qual a de um veneno, faz dessa utilização na atualidade um preconceito,

quando poderia ser um remédio, porque as durações de uso e os propósitos de

utilização não têm o mesmo objetivo e crença de então. E isso não é considerado!

Nossa tese discute o prejuízo ou não desse “novidadorismo”, ou melhor,

“novofagismo”, ansiedade em devorar o novo e se centra na exclusão das duas

estratégias cognitivas citadas e no motivo de terem sido omitidas, mesmo em

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detrimento da cognição do nosso ator maior, o “aluno”, desde que Chamot e O‟

Malley (1995) publicaram seu livro sobre estratégias de aprendizagem em aquisição

de segunda língua.

Esse problema até então discutido, tema da nossa pesquisa, será

confirmado ou não através das entrevistas feitas com “alunos” e diversos elementos

da cadeia de poder do saber na hierarquia dos cursos de LE. Analisaremos, depois

das conclusões, (confirmando essas suposições ou não), a necessidade de incluir

essas estratégias no ensino de LE, no capítulo quatro. Com os especialistas e

filósofos que tomamos como um marco teórico secundário, caso se confirme os

motivos de não utilização dessas estratégias de “alunos” pelo sistema de cursos

livres, por se constituírem técnicas “antigas” não retificadas, discutiremos as

possíveis razões subliminares dessa exclusão. Sendo confirmada nossa hipótese de

verificar a existência de contradições entre a convivência desses estudos que

desconsideram estratégias escolhidas por alunos de LE e a falta de respeito a uma

ética da diferença nesse campo, através de novas entrevistas escutando o aluno, o

professor, e os coordenadores, do conformismo de nossas coordenações em não

retificar conhecimentos metodológicos e de estratégias, examinaremos também as

conseqüências dessas exclusões. É possível que o ocultamento proposital e

contraditório dessas pesquisas de estratégias cognitivas deva ser atribuído ao

possível conflito de conhecimento com os pressupostos dos novos métodos,

causando um mal-estar com o uso de estratégias de métodos anteriores, como a

repetição, por exemplo, os assim chamados, nesse texto, métodos “antigos”;

interesses em jogo, gerando ocultamentos intencionais.

Vejamos agora a primeira estratégia citada no quadro um, páginas seis e

sete, a repetição e as conexões com a anterioridade metodológica. Como já

discutimos anteriormente, a repetição está associada ao audiolingualismo. A maioria

dos professores despreza essa estratégia e não a usa “por preconceito”

metodológico, mesmo em dosagens e momentos cognitivos adequados a adultos,

sendo vista como desprezível. Na cultura de ensino de LE local, essa é introjetada

como tal, no imaginário de professores, muitos dos quais nem foram, enquanto

“alunos”, expostos à essa técnica, supondo que a mesma, eventualmente usada,

transforma o “aluno” num ser não pensante, numa tabula rasa. E a visão

tendenciosa e julgadora do poder do saber pedagógico dessas coordenações com

as quais tive contato é tão limitante, que não consegue discriminar que a integração

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de exercícios de repetição no método mais atual, digamos, a abordagem

comunicativa, em exercícios de estrutura, em práticas iniciais e controladas, não

terá, obviamente, a mesma proeminência e uso que teve no Audiolingual, onde a

repetição era um ditame do método. Integrar exercícios de repetição em áreas de

ensino de estrutura, de gramática, no método comunicativo ou, mais atualmente, nas

abordagens lexical e cultural, podem ter dosagens e efeitos didáticos totalmente

diferentes. Antes, na metodologia Audiolingual, se decorava diálogos

comunicacionais prontos, ou se condicionava seqüências estruturais gramaticais

novas; tais exercícios, hoje, se agregados a uma didática P.P.P., Presentation,

Practice and Production, apresentação, prática e produção, nas abordagens atuais,

com seqüências procedimentais controladas, menos controladas e práticas livres

mais significativas, e personalizadas em práticas de diálogos ou de estrutura, terão

diferentes dosagem e função. Se muitos acham exercícios de repetição, drills,

“venenos reais”, supomos que o problema está na quantidade e freqüência no uso

dos mesmos, haja vista o que discute Derrida (2006) sobre o uso do fármaco, por

exemplo: remédio ou veneno, remédio e veneno? Esse phármakon, essa „droga‟, ao

mesmo tempo remédio e veneno, precisa, conceitualmente, ser introduzido no

discurso de ensino de LE com toda sua ambivalência. Será que as exclusões podem

derivar da dificuldade de convivência com a ambivalência em se conviver com

técnicas oriundas de metodologias, aparentemente díspares? A busca pelo caminho

mais curto, mais fácil e possivelmente redutor, seria se implantar “um” novo método?

Sobre isso Derrida discute no seu livro, A Farmácia de Platão (2006, p. 43-62).

E a questão persiste: Por que os “alunos” afirmam usar a repetição,

segundo o quadro um, nas páginas sessenta e sessenta e um? Pelos feedbacks

informalmente relatados ao longo de nossas enquetes em sala de aula de LE, eles

usam a mesma para aperfeiçoar a pronúncia, entonação, para se ouvir na leitura em

voz alta, para memorizar ou automatizar, temporariamente, por exemplo, elementos

sintáticos segmentais de um tempo verbal, para aprender a ordem supra-segmental

de um enunciado de uma estrutura em uma sentença ou num diálogo, em diferentes

aspectos gramaticais como as formas verbais, em negações e afirmações, através

de exercício de drills, exercícios mecânicos, com treinamento intenso para se

automatizar a ordem de uma forma lingüística, num primeiro momento de sua

aprendizagem. Lembremos que o tempo de exposição na aprendizagem de ILE e a

imersão que acontece no ISL são diferentes. Segundo Brown (1994, p. 16-17,

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tradução nossa), a repetição é um dos princípios de ensino-aprendizagem: o

princípio da automaticity, ganho de “automaticidade”, pela repetição. Contudo, ainda

assim, misteriosamente, as estratégias repetição mecânica e tradução

desapareceram veladamente da sala de aula e dos livros didáticos. Serão essas

duas estratégias subalternizadas, seu saber desqualificado pela hierarquia de saber

dominado em cursos de LE pela falta de exposição dessas técnicas? Essa situação

não encoraja a possível agência do “aluno”, seu feedback, opinião, e sua

negociação com as mesmas. Ninguém é leigo inteiramente, nem o aluno. Mas na

relação pouco dialógica nas nossas salas de aula e com os novofagismos se

impondo em cursos livres, poderão esses “alunos” se agenciar, numa área tão

técnica?

Vejamos, sob outro olhar, outra estratégia escolhida para essa discussão.

A estratégia de número nove – a tradução. Transitando nos corredores de pelo

menos duas instituições, onde ensinamos, os coordenadores não podiam ouvir a

língua portuguesa, originada das salas de aula, por algum professor. Embora não

seja inteiramente tradução, o uso de L1 é vista como parte dessa estratégia. E por

quê? Se o “aluno” não entende algum vocabulário, uma instrução escrita ou mesmo

oral, como último recurso a L1, a língua nativa, terá que ser usada e esse

pressuposto, aparentemente, do método direto e Audiolingual está também

justaposto aos métodos mais atuais, comunicativo e lexical. Nesse caso, uma

retificação conveniente para a coordenação, porque essa cultura não foi

fragmentada intermetodologicamente, nesse momento são retificados do passado,

mantendo-se convenientemente na atualidade. Será que esse fato se constitui num

prazer do poder-saber do professor falar uma língua com fluência diante de um

iniciante que, espantado, se recua diante da imposição de uma língua na qual ele

começa a conhecer?

Assim, essa estratégia era “proibida”, criava ruídos didáticos e se

constituía num sinal de incompetência profissional: quem a usava não sabia ensinar

inglês, usando o inglês. Que contradição! Porque ela acontecia de qualquer forma,

sendo usada em sala de aula em freqüência e propósitos variados. Atkinson (1993,

p. 20-39, tradução nossa), assim como Rinvolucri (2001, p. 41- 44, tradução nossa);

citam algumas vantagens de uso de L1, a qual se torna importante e privilegia

sobretudo níveis iniciais, e falam da vantagem do professor poder, em uma única

língua nativa, ensinar algum ponto mais problemático que, nocionalmente, não pré-

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existe na L1 do grupo. Além disso, apresentam a importância da tradução, sugerindo

exercícios bastante criativos.

Essa mesma rigidez, especificamente, com o não uso da L1, em sala, era

um dos princípios de métodos como o Audiolingual, embora sendo uma estratégia

descartada e anterior à abordagem comunicativa, ela se sobrepõe conceitualmente

a ambos. O Audiolingual proibia a L1 e, no nosso imaginário, assim continua,

contraditoriamente, até hoje, uma imposição didática ainda vigente em muitos

cursos. A pergunta que se impõe nesse caso é: Como pode um “aluno”, sobretudo

iniciante, em ambiente de LE, entrar numa sala de inglês, num curso particular, e

deixar do lado de fora toda sua formação cultural, lingüística e social? Como pode

essa estratégia da tradução (mental, escrita ou de uso oral de L1), que é usada pelo

“aluno” para estudar inglês em casa, para revisar e estabelecer seus esquemas

cognitivos de aprendizagem, ser desencorajada em sala de aula de forma radical,

intimidando e (des)empoderando nosso “aluno”? A técnica de tradução é excluída,

mas ela refina e faz aprender requintes de uma língua, além de ser uma subárea

profissional: ser tradutor. Outro aspecto: é conhecido que os “alunos” usam

cognitivamente a chamada hypothesis testing, o testar hipóteses daquilo que ele não

sabe em inglês, tentando traduzir mentalmente e pesquisando para aprender o que

ele não sabe dizer numa língua estrangeira. Até o universalizante contínuo

aquisicional de LE considera o hypothesis testing, no seu contínuo aquisicional,

como sugere Rod Ellis (1990, p. 44, 47, 173-175). Perguntamos: Será que eventuais

traduções e uso de L1 fazem o “aluno” desaprender a LE, mesmo considerando o

longo tempo de exposição e prática usando-se a LE, durante a maior parte da aula?

Será que o aluno, a exemplo do método direto que só usava a LE, língua meta, sairá

da sala entendendo as aulas integralmente? Pensamos que a tradução e o uso da

L1 podem refinar o conhecimento da língua meta, tal como afirmam Kecskes e Papp

(2000, p. 15-36, tradução nossa). Há uma enorme controvérsia sobre o papel da

existência ou não da transfer, transferência da língua nativa, L1, para a língua meta,

LE: ela é, ora ratificada em alguns estudos de aprendizagem, ora considerada

elemento transitório nos estudos de aquisição de LE, como um traço universal de

aquisição. E o uso da L1, por não ser tema de “verdade absoluta”, continua

polêmico. Compartimos com as duas possibilidades acima, que se fundamentam,

consistentemente, em Terrence Odlin (1997, p. 1-24), que trata desse assunto

“despreconceituosamente” e com equilíbrio, sem rupturas irrefletidas, mas com

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retificações sensatas, exemplificando ambas as possibilidades como existentes. Não

prosseguiremos com este tópico, por que ele, em si, tem sido motivo de delongada

polêmica e discussões extremistas, o que não é nosso tema central, mas a sua

exclusão.

2.1 CONCEITO DE PÓS-MÉTODO AUXILIA O DESCENTRAMENTO DE SABERES

O primeiro passo para se desconstruir essa domesticação entre

intervenções conceituais das vozes dos autores de livros didáticos, criadores de

métodos, lingüistas ou acadêmicos, dentro do ELE, sobre as vozes dos professores

e suas experiências no ensino de LE, as imposições top-down, de cima para baixo,

da coordenação para eles, como exemplificado nesse texto, é incluir em nossa

discussão o conceito de pós-método.

Examinaremos, abaixo, o importante conceito de pós-método de

Kumaravadivelu (2003, p.23-43, tradução nossa), que será útil em entendermos e

resignificarmos o papel do “aluno” em aulas de ELE, que é parte central desse

trabalho. Esse conceito é discutido pelo autor de forma a denunciar a forma

tradicional de se conceber método e como isso restringe e domestica o professor e o

ensino de LE Nosso trabalho questiona, paralelamente, esse método tradicional, isto

é, essa primazia e autoridade dos grandes especialistas em compor suas grandes

narrativas metodológicas de ELE. Contudo, nosso enfoque é discutir como isso

“idealiza” a realidade dos atores envolvidos, no nosso caso de estudo, o “aluno”

(des)empoderado da sua contribuição às suas aulas e à sua aprendizagem.

Se nós discutimos a inserção e libertação da domesticação do “aluno”,

nos cursos livres de língua, Kumaravadivelu (2003, p. 6-38, tradução nossa), por

outro lado, discute duramente uma pedagogia pós-método onde o professor e não o

especialista (lingüista e pedagogo) seja empoderado por seu tirocínio e experiência

em sala de LE

O conceito de pós-método é mencionado aqui, porque ele se sobrepõe à

questão no imaginário determinista anglófono, na busca de um método ideal,

homogeneizado e implementado, representado por cada novo modismo

metodológico de ELE e nos diz respeito, na medida em que põe em cheque e

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subleva a ação dos especialistas da área que se arrogam, sem consultar as bases,

professores atuantes e outros atores, a impor tais modismos, integralmente. O

conceito de pós-método auxilia o descentramento de saberes

Essa sublevação, no sentido de empoderar o professor, diminuindo a

primazia do método, em Kumaravadivelu, é o que se pretende sugerir, caso se

confirme nas entrevistas da nossa pesquisa no capítulo IV, em relação ao “aluno”.

Citando a definição do autor sobre o assunto, “[...] o termo método, usado na

literatura de L2 e SL, não aborda o que os professores realmente fazem em sala de

aula, mas aqueles métodos estabelecidos, conceitualizados e construídos por

experts do campo.” (KUMARAVADIVELU, 2003, p. 24, tradução nossa). Nessa

mesma página, ele continua discutindo os onze métodos conhecidos em ELE e

prossegue dizendo que, em algum momento, estes se justapõem, embora isso seja

camuflado. E isso nos toca diretamente, porque aquela fragmentação

intermeodológica, termo cunhado nesse nosso texto, é uma pretensão e uma

insistência que possivelmente não pode se sustentar. Uma das limitações do

conceito e da prática de métodos no ensino de LE é flagrada pelo

(des)empoderamento do professor, segundo Kumaravadivelu. (2003, p.24-34,

tradução nossa)

Desde que as necessidades, desejos e situações [em sala de aula de ELE] são imprevisivelmente numerosas e, nenhum método idealizado pode visualizar as variáveis, previamente, para apresentar sugestões específicas para situações reais, que os professores precisam lidar, os desafios com os quais eles confrontam todos os dias nas suas vidas profissionais [...] [então] esse exercício idealizado tem sido predominantemente de cima para baixo, o conceito e a construção dos métodos têm sido largamente concebidos por uma abordagem “um cabe em todos” [...], que supõe uma clientela similar [grifo nosso], com objetivos comuns.

Usamos essa citação acima para corroborar o nível de idealização, a

“tábua de salvação” da pretendida saída ou solução, que um único método poderia

fornecer ao ensino de LE. No tocante ao nosso tema, flagramos a essencialização e

conseqüente engessamento e restrição com que os atores do processo ensino-

aprendizagem, “alunos” e professores, convivem sem liberdade para serem reais

atores das suas práticas em sala de aula de LE, em negociações mais realistas

desse processo. A voz do aluno como temos discutido até esse ponto, é pesquisada

e ouvida através de suas estratégias, mas, simultaneamente, alijada no seu

processo cognitivo. Assim, examino desde o inicio desse capítulo a exclusão de

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estratégias cognitivas dos “alunos” e agora vemos, claramente, como a parceria com

essas críticas às limitações das concepções de métodos, acima, de Kumaravadivelu

corrobora a forma como o ELE é top-down, de cima para baixo. E esse poder sobre

o saber deve ter uma conseqüência, um preço para o “aluno”, através do sucesso ou

fracasso da sua instrução homogeneizada para todos os “alunos” em sala de ELE.

Kumaravadivelu (2003, p. 28, tradução nossa) cita outra limitação:

[...] os métodos são muito inadequados e limitados para explicar a complexidade das operações de ensino de LE, em volta do mundo. Preocupações com o método [...], com as estratégias de ensino em sala de aula,[...] se ignora o fato de que, o sucesso ou fracasso em sala de aula de ELE depende muito da interação estável e não declarada de muitos fatores, como a cognição dos professores, percepção dos “alunos”, demandas sociais, contextos sociais, exigências políticas, imperativos econômicos e limitações institucionais [...] todos esses fatores ainda estão, intrinsecamente, inter-relacionados.

Discutimos na nossa pesquisa, em parte, como acima mencionado, aquilo

que não é declarado e negociado, cognitiva e didaticamente, em sala de aula, com

os “alunos” entrevistados, tal como está comentado na citação, acima. Intentamos

ouvi-lo e, ao menos aqui empoderá-lo e, com isso discutir se a inclusão desse aluno,

didaticamente, na sua aula poderá atenuar esse quadro complexo, que é o ensino

de L.E; complexidade essa que não é, nesse texto, novidade, porque é um conceito

que discutimos no capítulo I, através de citações de Edgar Morin. Antes de

defendermos a contribuição de pós-método e definí-la, vejamos como surge essa

posição em Kumaravadivelu (2003, p. 32, tradução nossa).

Emergindo, gradualmente ao longo dos anos e se acelerando na década passada (anos 90), aparecem os pensamentos críticos, que questionam a natureza e concepção de método. Tendo testemunhado como os métodos passam por ciclos intermináveis de vida, morte e ressurreição, a profissão de ensino de língua parece ter estado a um alto grau de consciência [...] que se continuarmos nessa teia de métodos, continuaremos entrelaçados, presos numa busca infinita pelo que não existe, [...] e que nada, em curto prazo, poderá quebrar esse ciclo e salvar a situação. A partir dessa consciência emergiu o que eu chamei de condição pós-método.

Para concluirmos os questionamentos que fizemos nesse capítulo, da

exclusão de necessidades de alguns “alunos”, precisamos citar a definição de pós-

método, termo inspirado na contemporaneidade e em Lyotard (2006), na pós-

modernidade, e que se impõe aqui.

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A condição pós–método significa três atributos entrelaçados. O primeiro é a busca de uma alternativa para o método e não um método alternativo. [...] A segunda a autonomia do professor, [...] subestimado pelo conceito de método. A condição pós-método reconhece o potencial [tirocínio] [...]. O terceiro atributo da condição pós-método é o pragmatismo com princípio [...] e se concentra em como a aprendizagem da sala pode ser formada e reformada pelos professores como resultante de auto-observação e auto-avaliação. [...] (KUMARAVADIVELU, 2003, p.23-35).

O autor constrói inúmeras macro-estratégias em cima de três parâmetros:

especificidade, praticabilidade e possibilidade (KUMARAVADIVELU, 2003, p. 34-38,

tradução nossa). O que nos interessa aqui é a visão de agregar alternativas para os

métodos e, assim, seus princípios incluem o sentido de respeito à cultura, à

autonomia do aluno, suas subjetividades, interação negociada, minimização dos

desencontros de percepções na aula, possibilitando a consciência lingüística e,

dessa forma, empoderar a presença do professor como partícipe autônomo e

fundamental para essa condição de uma pedagogia pós-método.

Idéias como negociação em sala, minimização dos desencontros de

percepções na aula e autonomia dos “alunos” são pontos discutidos desde 1971, por

René Richterich, quando ele inova com a inserção das necessidades subjetivas e

objetiva dos “alunos”, que será discutida no próximo capítulo. O nosso enfoque

critica o congelamento de uma ética discutível, que age em favor de uma

epistemologia linear e cumulativa, ao sabor de interesses conformistas. Nosso eixo,

entretanto, não será o embate método-professor-ensino, mas método-aluno-ensino.

No Capítulo três, a seguir, trazemos as idéias de um lingüista francófono,

contemporâneo, René Richterich, com uma obra consistente nos estudos de línguas

vivas, na formação da Comunidade Européia. Vamos nos deter com seu conceito de

necessidades subjetivas do “aluno” e avaliar certas estratégias excluídas de seu

repertório de aprendizagem. Esse tema, subjetividade didática dos “alunos”, foi

discutido de forma sistemática em Richterich (1980), que escreveu no início da

década de 1970 sobre as necessidades objetivas e subjetivas do “aluno” de LE,

numa abordagem baseada no mesmo e presumivelmente negociável, também, com

ele. Esta abordagem continua até nossos dias, (des)empoderada, embora, pelo

menos, um grande projeto tenha sido executado, na Austrália, a partir de sua obra e,

depois de sua morte, várias pesquisas aconteceram comparando as demandas

didáticas dos professores nos seus planos e as necessidades didáticas dos “alunos”

em suas aulas. Esse autor é incluído nessa tese porque ele nos inspira a avançar

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ouvindo os “alunos” sobre a consciência importância de suas escolhas didáticas em

aulas de LE, ou seja, suas opiniões sobre a importância ou não de seu

empoderamento da didática de suas aulas.

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3 CONTRIBUIÇÃO DE RENÉ RICHTERICH À PERCEPÇÃO DAS

SUBJETIVIDADES NO ENSINO DE LE

Neste capítulo, apresentamos e detalhamos os conceitos de

necessidades objetivas e subjetivas citadas no final do capítulo anterior, ampliando-

os com outros conceitos igualmente importantes criados na obra de René Richterich,

tais como: a abordagem da aprendizagem centrada no estudante, a consideração

das necessidades subjetivas dos “alunos” na didática das suas aulas e a idéia

sistêmica de um ensino consultado e negociado entre “alunos” e professores,

sobretudo. Ao mesmo tempo, vamos fazer um contraponto desses aspectos

subjetivos relacionados à aprendizagem de LE com o comportamento racionalista e

empiricista da LA, que se fundamenta, essencialmente nas teorias e pesquisas de

aquisição de uma segunda língua, que universalizam, por exemplo, um único

continuum aquisicional, o contínuo de aquisição de uma LE unificado, restringindo a

LA “aplicável” à alguma área.

Essa revisão das idéias de Richterich abriu espaço para inúmeras

pesquisas mais recentes de inclusão do “aluno” e sua subjetividade no processo de

aprendizagem de uma LE e, por isso, serão apresentadas no capítulo quatro. Suas

idéias e essas novas pesquisas serão utilizadas nos comentários de interpretação

da fala dos alunos nas entrevistas

Num segundo momento, veremos a participação de Richterich no Projeto

de Línguas Vivas do Conselho da Europa, e, conceitualmente, no projeto

subseqüente, o A.M.E.P., Adult Migrant Education Service for the Adult Migrant

Education Programme, Programa de educação ao emigrante do serviço para

emigração de adultos, de 1984, executado pelos lingüistas aplicados Geoff Brindley

e B. Bagshaw (1984). Isso nos importa, sobremaneira, não apenas para ressuscitar

um pensamento meio “engavetado” ao longo do tempo, embora apropriado por

especialistas anglófonos, como também ele corrobora a necessidade de rever a

inclusão didática do aluno a partir de entrevistas, onde ele é consultado sobre essa

possibilidade.

Antes das nossas entrevistas da pesquisa sobre essa inclusão,

analisaremos os estudos sobre percepções de “alunos” e de professores de LE,

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comparativamente, sobre demandas de técnicas e estratégias usadas por ambos, no

processo ensino/aprendizagem. Essas pesquisas estão presentes no livro de David

Nunan, que concebeu um currículo de ensino de LE centrado no “aluno” e que, na

verdade, foi uma proposta original de Richterich (1983, p. 1-13).

Qual seria a razão da importância da inserção desse autor, relativamente

desconhecido, René Richterich, na concatenação do nosso pensamento crítico, em

relação à ética na LA? Isso importa na medida em que defendemos resgatar, nesse

trabalho, o saber desqualificado do “aluno”, pretendendo trazer à superfície os

motivos do seu (des)empoderamento na didática de suas aulas, cuja participação, o

poder das instituições sempre desqualificou. E Richterich elabora este resgate,

qualificando este “aluno”, a partir da sua participação na aprendizagem de LE. Para

isso, contaremos com suas três concepções teóricas, citadas no primeiro parágrafo

acima.

No primeiro capítulo, tratamos com pensadores que funcionarão, de forma

secundária, na interpretação de nossas conclusões. Eles estarão numa análise mais

refinada sobre as causas e contradições de exclusões aéticas de estratégias,

problematizadas no capítulo dois.

No capítulo dois questionamos a contradição essencial para se avaliar

como se conserva o poder dos saberes sepultados, em ensino de LE, sobretudo em

cursos livres, ignorando-se informações e estilos pessoais de muitos “alunos”,

negando-se a consultá-los. A impraticabilidade entre a pesquisa de estratégias e sua

prática, em sala de ELE discutida no Capítulo dois, é flagrada na estigmatização de

duas estratégias cognitivas que, hoje, foram transformadas em verdadeiros

preconceitos didáticos, no ensino de LE: tradução (uso de L1) e a repetição, que

foram exaustivamente comentadas no segundo capítulo. Supomos que elas foram

estigmatizadas pela indústria de ensino de inglês, pela reprodução incontestada e

“unicista” da epistemologia da pesquisa de LA e, por conseguinte, pela didática

aplicada no ensino de LE, nos cursos livres. Essa pesquisa mencionada e que

relaciona estratégias cognitivas dos “alunos” em ambiente ILE é encontrada no

quadro um, do segundo capítulo.

Questionamos, no capítulo anterior, o porquê dessas duas estratégias

serem descritas no repertório de estilo cognitivo de “alunos”, numa pesquisa bem

creditada na área, e por que as mesmas são excluídas das práticas em sala de aula,

estigmatizadas em seminários, simpósios, congressos de ensino de LE Elas foram

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emudecidas e desqualificadas. Supomos que o poder dos setores de editoração e

de financiamento de pesquisas, no mundo anglófono, conseguiu, subliminarmente,

exterminar a opinião, a voz do “aluno” que elegeu essas estratégias, dentre outras,

nessas pesquisas oficialmente publicadas e com enorme prestígio. E isso tudo com

anuência local. Por que isso acontece? Talvez, os setores acima citados se

favoreçam entre si, através de ondas de “novidadorismos” comerciais de novos livros

textos, que desconsideram um parceiro da aprendizagem, o “aluno”, e favorecem o

mercado desses, ou porque os especialistas e acadêmicos se beneficiam de verbas

para pesquisas departamentais em LA, em diversas universidades anglófonas,

especialmente aquelas que se concentram em pesquisas de aquisição de uma

segunda língua, ASL.

A LA pode ser de base racionalista, quando busca explicar como se

adquire uma segunda língua, ou de base empirista, analisando o processo

aquisicional de uma SL, a língua produzida pelos estudantes de inglês, a chamada

learner language, a LE produzida pelo aluno, área de alto prestígio na LA, exportada

para nosso ensino de LE. Mas ela desconsidera o “aluno” no seu contexto social e

nas suas subjetividades, como se entender aquisição de língua fosse uma questão

de observar a learner language, através de pesquisas quantitativas com número

limitado de sujeitos, e como se sua análise fosse a única a diagnosticar e concluir

exaustivamente esse processo. A propósito desse determinismo da LA, acima,

lembramos de Terrence Odlin (1997, p. 4-24, tradução nossa), que comenta

pesquisas com argumentos afirmativos e exemplifica a transfer, transferência da L1

no continuum, contínuo aquisicional de uma segunda língua e que é tomado pelos

lingüistas especializados da área, como única explicação universal de empréstimos

de substrato, da L1 para a L2. Por outro lado, comprova, em algumas pesquisas,

que essa transferência não é apenas uma fase desse contínuo aquisicional, mas,

um empréstimo de substrato, isto é, a influência de outra língua. Odlin demonstra a

existência da transferência ou interferência da primeira língua, reconhece a

controvérsia do assunto, mas também mostra, com outros exemplos, que a

transferência também é um fenômeno aquisicional, mas não absoluto, ele também

pontua o aspecto laboratorial e asséptico ao social nas pesquisas em ASL, o

pequeno número de participantes em pesquisas dessa área e, no caso da

transferência, a falta de uma dimensão social para essa análise. Contudo, questiona

as razões porque os especialistas da área de ASL anulam a possibilidade da

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existência da transferência lingüística, mas permanente, como interferência real,

isolada da fase transicional, tida como universal, do contínuo aquisicional de L2. Isso

é citado aqui como contraponto à pretensão de linearidade e universalidade, nos

estudos de aquisição de segunda língua.

De volta à inclusão de fatores humanos e de atores no ambiente social,

que é a sala de aula, retomamos a inclusão de um parâmetro de Richterich, as

necessidades subjetivas dos “alunos”. E esse parâmetro se abre a múltiplos fatores

humanos, na busca do entendimento do ensino e aprendizagem de LE. Em

contraponto ao caso tão determinista da interferência da L1 pela LA, evocamos o

parâmetro de Richterich, repetindo, a consideração das necessidades subjetivas do

aluno, didaticamente, respeito a sua voz e estilo cognitivo. Examinaremos a

seqüência que comentávamos, no final do segundo capítulo, explorando com mais

detalhe as idéias do lingüísta-ensaísta, René Richterich, que traz a subjetividade do

“aluno”, permitindo que pudéssemos questionar a ausência crítica e o

(des)empoderamento do mesmo nas pesquisas de estratégias cognitivas, que se

conflituam com a implementação de novos métodos, sem levar em conta a

demanda cognitiva dos “alunos”, contradição entre essas incongruências

“estranhas”, em parte pautada em pesquisas, em parte, no comércio de novos livros

textos.

Resgatar Richterich foi uma demanda que nos inquietava para apoiar o

objetivo da nossa pesquisa, em ouvir a opinião do “aluno”, em agregar a sua voz

“cognitiva” na didática e no planejamento de aulas de LE. Para esse resgate,

precisamos fazer um breve histórico do início da pesquisa de metodologia de ensino

de Língua com a demanda de falantes de língua estrangeira na segunda guerra e, a

seguir, voltar a outro momento histórico, onde houve uma potente mudança na

percepção da metodologia de LE, uma demanda de comunicação de LE entre

países, com a demanda interna da formação do que hoje chamamos União

Européia.

A princípio temos que deixar claro que a metodologia de ELE se fortalece

com a formação do método audiolingual, na demanda, acima citada, de pessoal do

exército que fosse competente em LE´s além do Inglês. As forças armadas

americanas chamam lingüistas para rapidamente criarem um método que fosse

eficaz para tal emergência. Assim, de um casamento entre a lingüística estruturalista

e o behaviorismo, nasce o método audiolingual. Sabemos que a metodologia de

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língua não nasce exatamente nesse momento, se lembrarmos o império britânico, a

exemplo da Índia; mas digamos que esse método é um marco para a metodologia e

dele nascem as bases da LA. Assim, essa hegemonia de pesquisa persiste até hoje.

O que pode parecer uma indignação, ao longo deste texto, não é um sentimento

contrário a essa hegemonia desses países centrais, anglófonos. Mas a dificuldade

desses países em lidar com outros conhecimentos da área, convivendo com os

mesmos sem exclusivismos. Outro aspecto que precisamos esclarecer que soa anti-

anglófono é a necessária autocrítica que nós, localmente, precisamos exercer ao

recebermos conhecimentos anglófonos na nossa área como grandes narrativas, em

detrimento de um saber local que tem sido desrespeitado e conseqüentemente

domesticado e idealizado pela primazia do importado, sem selos locais.

De volta ao resgate da contribuição de Richterich à cena de ELE, façamos

uma retrospectiva ao Conselho da Europa. Criado em cinco de maio de 1949, com

dez estados-membros, o Conselho da Europa, que conta hoje com vinte e sete

membros, “criou em primeiro de janeiro de 1967 o Conselho de Cooperação Cultural

pelo comitê de ministros do Conselho da Europa, C.C., em vista de elaborar as

proposições de política cultural para esse conselho” (RICHTERICH; CHANCEREL,

1977, p.7). Assim, a abordagem comunicativa é formalizada no Projeto de Línguas

Vivas do Conselho da Europa, embora o Communicative Language Learning, C.L.L.,

ou Communicative Approach, C.A., não surja, ontologicamente, nesse momento. A

história da abordagem comunicativa data de muito antes, do meado deste século,

quando lingüistas como John Rupert Firth, num primeiro momento e, mais tarde,

Davis A. Wilkins, Michael Halliday, sócios-etnógrafos como Dell Hymes e lingüistas

da pragmática John Searle e John Langshaw Austin escrevem sobre a função da

língua e atos da fala, respectivamente, surgindo com Hymes o conceito de

competência comunicativa, em oposição ao de competência lingüística dos

estruturalistas, polarização extremista que trouxe danos separatistas e, a nosso ver,

desnecessários. Os projetos do Conselho da Europa “didatizaram”, digamos assim,

os princípios da abordagem comunicativa para a prática, pela demanda européia, na

concepção de sua união, pelo desenvolvimento de um plurilingualismo.

Muitos papers anteciparam o Projeto de Línguas Vivas do Conselho da

Europa. Uma equipe de quatro lingüistas, três deles anglófonos, foi escalada para

criar o “Sistema de Desenvolvimento de Aprendizagem de Línguas para Adultos”,

primeira publicação de 1973: J. L. M. Trim, J. A. Van Ek, D. A. Wilkins e um suíço-

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francês, René Richterich. Essa breve retomada histórica da formação da abordagem

comunicativa na Europa se justifica para localizar a obra de René Richterich, cujos

conceitos de aprendizagem de língua se constituem, como citado na introdução,

parte do referencial teórico para os possíveis benefícios da inserção didática do

“aluno”, no planejamento de suas aulas.

O Projeto de Línguas Vivas patrocinado pelo Conselho da Europa foi

dividido, tendo esses lingüistas incumbências para tentar resolver as necessidades e

objetivos de uma Europa, antes nacionalista, e que agora precisava conviver com

sua “torre de Babel”, em processo de união.

Assim, Trim (et al.,1980, p. 9-10, tradução nossa) foi o diretor do projeto,

interagindo com os outros três lingüistas, cada um com sua contribuição,

concebendo o assim chamado sistema units/credits, sistema de unidades e créditos

para a aprendizagem de língua estrangeira moderna para adultos e algumas

perguntas foram feitas, na concepção desse conceito: como promover a integração

da Europa e a mobilidade das populações, através do incremento da aprendizagem

de línguas? Como aumentar a motivação de aprendizagem de LE? Como

aperfeiçoar essas motivações diversificadas, nesses adultos, em nível vocacional e

social? Como quebrar o conceito global de língua em unidades e subunidades,

baseando-se na análise específica de grupos de adultos aprendizes, em termos de

situações de comunicação, nas quais eles estariam envolvidos? Todo esse projeto

se fundamentou nas recomendações do Conselho de Cooperação Cultural editadas

em 1968, cujas crenças estão em forma de algumas questões que serão levantadas

mais adiante. Dessa forma, o sistema de units/credits, (RICHTERICH et al., 1980, p.

89-90, tradução nossa) se concebe como sendo pequenas tarefas funcionais para a

prática comunicativa de seus usuários, unidades que proporcionavam os créditos

que seriam acumulados, para um diploma maior no futuro.

Esses quatro lingüistas formalizaram as necessidades lingüístico-

comunicativas para uma Europa plural e unificada, na publicação “Sistema de

Desenvolvimento de Aprendizagem de Línguas para Adultos”, relatada a seguir.

A parte quatro do projeto foi incumbida a D. A. Wilkins, que escreve e

identifica as noções e as funções comunicativas, para formar a competência

comunicativa necessária para uma Europa a ser unificada; enfim, os termos de

conteúdo comunicativo-funcionais associados às proposições de uma gramática

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funcional, concepção de Michael Halliday (1973), contribuíram para a formação

desse cerne comum, no sistema de unit/credit mencionado acima.

A parte três do projeto foi de responsabilidade de Jan Van Ek; ele

sistematizou o unit/credit system, sistema de unidades e créditos, em detalhes,

definindo o assim chamado Threshold Level (nível mínimo ou básico para

comunicação) em níveis operacionais, a saber, o nível básico de competência na

aprendizagem de uma língua estrangeira, abaixo do qual nenhuma comunicação

poderia ser alcançada. Ele listou vocabulário, nominal e verbal, incluiu o significado

do uso dos tempos verbais, uma lista com itens gramaticais normativos, as

habilidades listening, speaking, reading and writing (audição, fala, leitura e escrita) e,

no final, explicou como implementar todos esses aspectos.

A introdução justifica a existência do projeto feito pelo seu diretor, J. L.

Trim, e, na parte um, ele desenha um esquema geral do sistema europeu de

unidade/crédito para a aprendizagem de línguas modernas para adultos.

A parte dois é a que nos interessa, escrita pelo lingüista René Richterich,

de nacionalidade suíça – francesa e, único participante não anglófono e ex-professor

da Universidade de Lausanne. Na segunda parte do projeto, ele ressalta as

necessidades das subjetividades, no processo de ensino-aprendizagem; são

reeditadas suas principais idéias publicadas em papers anteriores, no final da

década de sessenta e início da década de setenta, reeditadas no livro “Sistema de

Desenvolvimento de Aprendizagem de Línguas para Adultos”. Seus principais

conceitos problematizadores, aqui já citados, são: a abordagem da aprendizagem

centrada no estudante, a consideração das necessidades subjetivas dos “alunos” na

didática das suas aulas e a idéia sistêmica de um ensino consultado e negociado

entre professores, coordenadores e instituição.

Na seção dois, seu trabalho foi de ordem prática, mas não menos fácil:

identificar as necessidades objetivas dos cidadãos europeus que precisavam

aprender línguas estrangeiras para negociar, quer profissional, cultural ou

socialmente. Ele compôs uma abrangente classificação sócio-profissional.

Particularmente, trabalhamos nesse capítulo com os conceitos teóricos

em educação de LE, de Richterich, porque vemos esse lingüista aplicado também

como um educador, como um pensador de ensino/aprendizagem de LE; ressaltamos

a sua sensibilidade com as subjetividades do educando, já na década de sessenta,

coincidentemente, um pensador continental, com um consistente trabalho através de

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artigos e livros acerca de educação lingüística no ensino de LE. Nesse escrito,

vamos explanar a grande contribuição, a nosso ver, que Richterich traz aos estudos

de LE. Inicialmente, gostaríamos de registrar o quanto o seu trabalho foi

negligenciado, na mídia escrita das editoras anglo-americanas e dos cursos de

desenvolvimento profissional, dentre outros ambientes. Qual(is) seria(m) o(s)

possível(is) motivo(s) desse desprestígio? René Richterich foge da visão “unicista”

de entendimento de ensino-aprendizagem de LE, descredita o método como única

verdade no processo do ensino aprendizagem de uma LE, engloba o sujeito

aprendente, que possui suas subjetividades e estilos cognitivos diferenciados, assim

como nega a racionalização explicativa e, muitas vezes, estéril dos estudos de

aquisição de SL. Através da amplitude e ambivalência que poucos pedagogos,

saudavelmente, se apropriam, Richterich, embora originalmente um lingüista,

ressaltou as necessidades subjetivas dos “alunos”.

Talvez sua preocupação tenha sofrido desconfiança, por parte da maioria

dos lingüistas anglófonos que defendiam uma visão mais cientificista da LA. Essa

valorização e inclusão pedagógica do estudante no currículo nos parecem que soa,

por exemplo, para Trim, diretor do Projeto de Línguas Vivas e organizador deste livro

citado, como transgressiva e fantasiosa. Abaixo, comenta este lingüista aplicado

britânico:

O senhor Richterich vê seu modelo [...] não apenas [...] um instrumental para informação estatística, mas atribui maior valor pedagógico direto no sistema de unidades/crédito. [...] O paper [de Richterich, segundo Trim] propõe um método que devesse ser possível ou fazer possível [!] ir dos atos lingüísticos aos atos de aprendizagem, [esses últimos, um novo conceito] [...] um método que defina o conteúdo das unidades de aprendizagem e suas estratégias pedagógicas. [...] e na análise disso tudo [...] as categorias [de necessidades objetivas] possam ser associadas de perto com as necessidades [subjetivas] de aprendizagem, [...] (RICHTERICH et al., 1980, p. 10, tradução nossa).

Trim, acima, torna-se ambivalente diante da possibilidade da inclusão das

necessidades e estratégias dos estudantes, no processo didático. Este fato fica

claro, quando ele questiona acima sobre o paper de Richterich, a viabilidade de “um

método que devesse ser possível ir dos atos lingüísticos aos atos de aprendizagem

que definissem o conteúdo das unidades de aprendizagem e suas estratégias

pedagógicas, as necessidades das categorias [sócio-profissionais] associadas com

as necessidades de aprendizagem.” (RICHTERICH et. al., 1973, p. 10, tradução

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nossa). Parece-nos que esta é a primeira incursão das necessidades subjetivas de

Richterich, no livro, e que soa transgressiva para um olhar anglófono de Trim.

Ao longo de algumas citações, nesse capítulo, vamos ver respostas

indiretas de Richterich à crítica de Trim, em sua última citação, acima, sobre essa

ambivalência, necessidades subjetivas ou didáticas dos “alunos” e as objetivas,

menos polêmicas.

Parece-nos que o incômodo para o seu parceiro anglófono é a crença de

que todos os projetos precisem ter respostas objetivas, homogêneas e definitivas,

desconsiderando a didática e metodologia de LE, como algo inacabado e que

demandava a contribuição das subjetividades dos “alunos”. A idéia do imprevisível,

no ensino de LE, em Richterich, como comentaremos mais adiante, ratifica, na área

da física, aquela impossibilidade da microfísica em mostrar os elementos

subatômicos como prova, como dado. O dado tornou-se invisível e imprevisível e,

certamente, esse impasse da microfísica se repete no impasse do imprevisível e

efêmero, na “ciência do ensino de língua”, na LA e na pedagogia em geral. Contudo,

muitos lingüistas não conseguem produzir e conviver sem os dados da língua,

exclusivamente e negligenciam o discurso do “aluno” sobre o ensino e a

aprendizagem. O sujeito “aluno” só tem valor, na área de ASL, pela learner

language, língua produzida pelo “aluno”, em diversos estágios e que se torna o

objeto ou dado empírico, nada valendo como uma produção da subjetividade e

necessidade do mesmo, sem análise do contexto social, psicológico, biológico,

cultural, fatores conjuntivos, quando este “aluno” está produzindo LE. Pensamos que

este posicionamento asséptico a esses fatores endógenos e exógenos do “aluno”,

ao produzir a learner language, língua produzida pelo aluno de LE, poderá ser a

crença de J. L. Trim, no seu comentário anterior.

Por todas as suas percepções contemporâneas, embora concebidas no

início dos anos setenta, Richterich é referência nesse capítulo: pela sua atenção à

diferença, à subjetividade no aprender e no ensinar e pela “descoisificação” do aluno

no ensino-aprendizagem de línguas vivas. Dessa forma, o lingüista centra essa

pedagogia nas necessidades do sujeito “aluno”, subjetiva e socialmente, e não na

língua a ser explicada como um corpus – um dado asséptico, mas, sim,

ontologicamente, como um todo.

Voltemos, mais detalhadamente, agora, aos conceitos problematizadores

de Richterich, já citados nesse capítulo, os quais são referência para essa

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discussão: a aprendizagem centrada no estudante, as necessidades subjetivas dos

“alunos” e a idéia de consultar e negociar a didática de aprendizagem com os

mesmos.

A idéia de uma abordagem sistêmica de aprendizagem que gire em torno

do “aluno” origina-se na posição antiautoritária de uma abordagem nele centrada,

como afirmam os autores Richterich e Jean-Chancerel (1977, p. 7, tradução nossa)

“Constatamos que o „aluno‟ tem uma posição central [...] tudo começa com ele e

tudo volta para ele. Não se trata meramente de uma relação para ele, mas com ele

[...]”. Eles criam com isso um novo tipo de abordagem pedagógica baseada nas

necessidades didáticas dos “alunos”, depois incorporada ao Projeto de Línguas

Vivas, abordagem citada a seguir:

[...] O sistema deve ser centrado no aluno. [...] Mas ele corre o risco [...] de ser considerado como uma entidade cuja personalidade, aspirações e necessidades serão apenas levadas em consideração [...] quando coincidirem com os objetivos e a imagem adotada pelos estabelecimentos de ensino [...]. Assim, o aluno pode perfeitamente parecer estar no centro, mas sem ter sido ele que se colocou lá, mas o sistema. O seu „centramento‟ não passará de uma ilusão educacional [grifo nosso], [e] pode ser apenas uma definição [teórica] [...] de participação. „O ato de aprender está com [grifo nosso] a pessoa que aprende‟ mas nunca apenas nele. [...] Para chegar a este ato de aprender [ele] passa por uma instituição de ensino, que por sua vez será dependente [...] e tudo isso é operacionalizado numa dada sociedade. [...] A interdependência acontece. [...] E se o “aluno” deseja fazer as escolhas de aprendizagem de acordo com suas fontes [...] ele só será capaz de fazê-las sob pressão, trazidas pelos estabelecimentos e instituições, e pela sociedade. Mesmo um aluno autodidata estará sujeito a essas pressões [do poder] por que ele escolhe um material estabelecido [pelo sistema]. A coisa que precisa ser definida numa abordagem sistêmica de aprendizagem de língua, que pretenda se centrar no “aluno” está na sua „liberdade‟ de escolha. [RICHTERICH et al., 1980, p.29-45, grifo nosso].

Vemos claramente a concepção de uma abordagem centrada no “aluno”,

em relação a alguns dos objetivos mencionados por Richterich e Chancerel (1977,

p.1, tradução nossa). O objetivo que ressaltamos aqui é o segundo, escrito no

parágrafo anterior, que se identifica com a idéia sistêmica de um todo, sem

desconsiderar uma parte, sua autonomia e interdependência: “mostrar que todas as

partes do sistema são interdependentes: análise dos recursos e motivações [...]

escolha de metodologia e do currículo.” (RICHTERICH et al., 1984, p.32).

Numa outra obra, o autor diferencia dois tipos de necessidades a serem

consideradas na aprendizagem e no ensino de uma LE, e que constituem as

concepções relevantes para a compreensão de nossa fundamentação teórica para

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análise de nossa pesquisa, ao lado dos dados de estratégias cognitivas levantados

por Anna Uhl Chamot e Michael O´Malley (1995), nesse trabalho. O autor distingue

duas necessidades de aprendizagem do “aluno” de L. E, que nos parecem ser

válidas para qualquer ensino-aprendizagem:

necessidades objetivas, que podem ser mais ou menos entendidas, de forma geral, como a análise dos temas gerais do dia a dia. necessidades subjetivas, que não podem ser generalizadas, dependem de eventos, circunstâncias imprevisíveis e de gente. (RICHTERIC et al., 1984, p.32)

Richterich (1973, p.32), nos subitens denominados „problemas‟, resume

algumas problematizações bastante pertinentes que explicam, indiretamente, essas

necessidades objetivas e subjetivas. O autor inquire seus conceitos, com muita

perspicácia, e desconstrói com respostas exóticas aquilo que todos tomavam como

“verdades”. Citamos aqui algumas delas, dentre inúmeras levantadas pelo autor

- Enquanto que as necessidades objetivas de aprendizagem de uma LE podem ser previstas, analisadas e definidas [...] com mais ou menos precisão, as necessidades subjetivas são bastante imprevisíveis [grifo nosso] e, portanto indefiníveis.

- Uma contradição fundamental pode ser vista (e ela talvez seja a

contradição que no presente “diaboliza” o ensino de língua) entre o desejo de definir necessidades e objetivos de modo preciso, [...]e por outro lado o uso de uma língua como meio de comunicação e ação em situações de controle social, [...] [isso] requer a capacidade de reagir adequadamente a coisas que não podem ser precisamente previstas e definidas.

- Em sendo assim, não é necessário se inventar uma teoria educacional do

imprevisível? [ ! ] - Enquanto que o que realmente é necessário seja uma teoria educacional

efêmera [grifo nosso], que inteiramente preencha as necessidades dos indivíduos, as exigências de produção [com segurança] [grifo nosso] deverão impor uma teoria educacional duradoura que corresponderá apenas às necessidades teóricas e gerais de [...] poucas pessoas. [RICHTERICH, 1984, p. 32, grifo nosso].

Comentaremos sobre essas problematizações citadas no ensaio de

Richterich. Sentimos que ele literalmente “explode” e desconstrói uma pedagogia

fixista de LE, uma pedagogia dogmática, inflexível, “unicista” (tal como nas linhas de

estudo da homeopatia), representante de uma única verdade. Identificamo-nos com

a consideração que o autor faz sobre o “efêmero” no ensino.

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Uma verdade parcial, na nossa área, poderá ser transitória e parece que

ela deve estar no ouvir o estilo de aprender dos “alunos”, as suas estratégias

cognitivas. Richterich desmistifica o essencialismo das teorias de aprendizagem

pedagógicas, tomadas como universais e válidas para cada tempo e desconstrói a

pretensão de homogeneizar, de cima para baixo, as formas de aprender. Destrói o

racional, o empírico, com a reflexão solitária sobre os “alunos”, desconstruindo a

pretensão determinista e positivista de compreender a lingüística aplicada

unicamente através do corpus lingüístico, das línguas vivas. Ataca o cientificismo da

lingüística aplicada no seu capítulo mais “científico” e “lucrativo”, o da aquisição de

segunda língua, exatamente como discutem Kumaravadivelu e Odlin sobre ASL.

Desconstrói o discurso “coisificado” da pesquisa, sem contemplar o ser humano, o

“aluno”. Indiretamente reconhece o “caos” da epistemologia empiricista que ainda

domina a área de aquisição de segunda língua da lingüística aplicada. Flagra a

idealização do ensino de língua e nos obriga, sem chance, a conviver com o

imprevisível, com a diversidade e a subjetividade dos nossos “alunos”, com respeito

aos seus estilos de cognição, e critica, implicitamente, a imitação que a lingüística

aplicada estabelece dos métodos das ciências naturais. Critica, indiretamente, o

nosso esquecimento de tudo aquilo que surge de Bachelard, no primeiro capítulo,

sobretudo do conceito de materialismo racional para a microfísica, onde o empirismo

convida o racionalismo para poder justificar a sua existência, e delata, nas

entrelinhas, a necessária convivência dessas filosofias como abordagens

epistemológicas nas ciências naturais, especificamente na física.

Todas as questões em Richterich evocam uma reflexão

anticategorizante e anti-binária. Ele se expressa como um lingüísta-filósofo, algumas

vezes de escrita econômica e com inúmeras dúvidas e muito mais perguntas que

respostas, para a aprendizagem de uma LE! Despretensioso, ele nos instiga, já em

1971, a uma lingüística aplicada crítica.

Na seção dois da obra, Richterich (1980, p. 63-88, tradução nossa)

apresenta um projeto que pretende demonstrar as necessidades objetivas, através

da identificação e classificação de categorias sócio-profissionais dos futuros

estudantes europeus da época. Essa metodologia de identificação, no projeto,

estabelece categorias de modelos vocacionais e sociais de possíveis “alunos”,

sempre consideradas incompletas por ele, informações de ordem financeira,

profissional, disposição de tempo antes, durante e depois do curso de língua,

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identificação e perfil do “aluno” e do professor, para traçar os perfis dos atos

lingüísticos e de aprendizagem dos atores sociais e vocacionais. Quem seriam estes

atores? Agentes de turismo, engenheiros de fábricas, dentre inúmeras outras

categorias profissionais (1980, p. 68-85, tradução nossa). É a chamada classificação

sócio-profissional.

A classificação das necessidades objetivas de conteúdo de LE, dos

europeus, demandando funções comunicativas em outras línguas estrangeiras por

categorias profissionais é concretizada através de uma abrangente classificação

analítica de categorias de adulto necessitando aprender línguas estrangeiras

(RICHTERICH, 1973, p. 68-85, tradução nossa), de onde citamos a relevante

observação do autor sobre a transitoriedade dos conceitos no campo e que,

certamente, começa a responder ao comentário de Trim, reproduzido na página

seis. Essa citação nos soa similar com as percepções daqueles teóricos abordados

no capítulo um, além de uma posição de desconstrução que o autor “complexiza”, ao

longo de toda sua obra.

[...] qualquer classificação é essencialmente uma tentativa de simplificar um campo específico de alguma área complexa do conhecimento, com o propósito de aperfeiçoá-la. Tal simplificação é, contudo, uma traição. [...] Conseqüentemente é essencial considerar documentos como instrumentos ou ferramentas, que sem serem perfeitos podem facilitar o entendimento da complexidade de certos fenômenos. (RICHTERICH et al., p. 63, tradução nossa).

Esta citação revela o perfil flexível do autor, enquanto lingüísta-pensador,

que permite seu posicionamento de visão de mundo bem real e que perpassa pela

parte prática de seu trabalho, a saber, a metodologia de identificação e a

classificação de categorias sócio-profissionais das necessidades objetivas.

Colocamos, a título de exemplo, algumas classificações das inúmeras categorias

mencionadas na citação numérica, no rodapé da página anterior, por Richterich,

entre os anexos desta tese.

Sentimos que o autor cita, na sua obra, filósofos contemporâneos, nos

parecendo que muitas de suas idéias antidogmáticas vêm de uma reflexão sobre os

mesmos. No Projeto de Línguas Vivas, nos fragmentos citados nesse trabalho, ele

critica, claramente, a assepsia ao social, na LA. Conhecendo sua obra, lhe

atribuímos ser um dos precursores da LAC, pelas reflexões críticas sempre

implícitas nos seus trabalhos, nos seus questionamentos e que não foram

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percebidas, na época, pela LA. De qualquer forma, ele não teria sabido da

importância de sua obra, porque faleceu nos meados dos anos noventa, e pelo fato,

a nosso ver, de não ser um lingüista anglófono.

Façamos, agora, uma conexão desse antidogmatismo no ensino de LE,

em Richterich, com os comentários de Silva e Rajagopalan (2004) sobre a lingüística

aplicada, relacionando esse tema com a lingüística aplicada crítica, dos dias atuais,

em detrimento da LA purista, que ainda vige no ensino de língua e ainda vocifera um

“estatuto científico”, de preferência ao modo das ciências naturais, em

universidades, mundo afora. Ouçamos o que nos diz a crítica sobre a questão

epistemológica da lingüística, na citação de Silva e Rajagopalan (2004, p. 33, grifo

nosso), que também comenta sobre a expressão a lingüística que nos “deixa na

mão”, quando diz que não foram os lingüistas, mas a lingüística que nos “deixaram

na mão”:

A pergunta que devemos nos fazer é: que tipo de lingüística é essa que nos deixou na mão? Em seu livro, Politics of Linguistics, Frederick Newmeyer (1986) defende o seu modo preferido de fazer lingüística. O autor a chama “autonomismo” e o distingue de dois outros modos antagônicos – “a abordagem humanista” e “a abordagem sociológica”. Em suas palavras, “os defensores da abordagem autonomista tomam a língua como um cientista naturalista estudaria um fenômeno físico, isto é, privilegiando as propriedades que existem a despeito das crenças e valores dos falantes individuais ou da natureza da sociedade onde a língua é falada.

Há muitas suspeitas contra a continuidade de uma epistemologia

positivista na pesquisa lingüística, criticadas ao longo desse texto. Confrontamos e

corroboramos, nesse momento, através da citação de Rajagopalan a forma com a

qual Newmayer, acima, concebe a pesquisa lingüística, ao modo das ciências

físicas, assépticas ao social, às variações psicológicas de cada aluno e às

subjetividades e estilos de aprender. Nessas abordagens epistemológicas definidas,

acima, vemos como o “autonomismo” e sua abstração cientificista encoraja a

lingüística como um todo, quer seja teórica ou aplicada, a nos deixar na mão, isto é,

essa abordagem está distante do seu meio circundante, estéril às necessidades

subjetivas do ser humano aprendente e, por isso, torna-se uma abordagem perigosa

e determinista. Na lingüística aplicada, na área de aquisição de segunda língua, a

abordagem autonomista é de tal importância e visibilidade, que se tornou, também,

em muitos cursos de língua, a facção mais acreditada e de prestígio. Moita Lopes

exemplifica bem esse prestígio anglófono da lingüística aplicada, através da análise

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das redes de conhecimento e das revistas científicas internacionais, através da

xenofobia no exercício de poder do conhecimento da lingüística aplicada, ao

examinar a programação do congresso da Associação Internacional de Lingüística

Aplicada de 2005, que só incluiu em suas plenárias pesquisadores anglófonos, à

exceção de um saxão, holandês. (MOITA LOPES, 2006, p. 88). Sabemos que esta

associação, AILA, é um templo da pesquisa de aquisição de língua, da lingüística

aplicada “dura”, do citado “autonomismo” na pesquisa de LA.

Usaremos o termo autonomismo, nesse capítulo, para significar a linha de

LA “dura”, cientificista, método das ciências naturais, como concebida por Newmayer

citada em Silva e Rajagopalan (2004, p.33), na página quatorze deste capítulo. Em

consonância com estas conceitualizações presentes na citação anterior e com

outras críticas mais atuais, inferimos que Richterich realmente antecipa a Lingüística

Aplicada Crítica, porque questiona a falta das dimensões humanas interdependentes

no educando e na educação de L.E, a falta da expressão das subjetividades dos

“alunos” na aprendizagem, a ausência dos aspectos sociais, culturais, psicológicos,

biológicos e outros. Parece que a inserção do “aluno” proporciona algo próximo a

uma possibilidade da conhecida Learner Autonomy, a “idealizada” autonomia do

aluno de estudar e aprender, e aprender a prender. Nada contra essa visão. Mas

entendemos autonomia do aluno como sendo o seu agenciamento didático, de ser

um ator ativo no seu ensinamento e na sua aprendizagem. E essa perspectiva que

hora propomos, é diferente da autonomia propalada pela cultura anglófona e que se

tem impor nos cursos livres de LE. Esta depende da cultura e forma de ensino de

um povo. Pensamos que não existe ensinar autonomia, mas dar alguma consciência

sobre ela, essa autonomia do “aluno” na visão anglófona. Mas pensamos ser

saudável a inserção do agenciamento do “aluno” no seu processo de aprender, na

didática de suas aulas. E lembremos Edgar Morin (2003, p. 279-290), segundo o

qual ninguém é totalmente autônomo, ou totalmente dependente. A seguir, no

capítulo quatro, examinaremos algumas dessas idéias de inclusão da voz do aluno

na didática, a partir de diversas pesquisas comparativas entre demandas didáticas

de “alunos”e professores.

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4 AFINAL, O “ALUNO” SENDO OUVIDO: TORNANDO-SE ESTUDANTE?

Começamos, a partir deste parágrafo, a situar o momento em que as

idéias das necessidades subjetivas dos “alunos”, de Richterich, começam a ser, na

prática, concretizadas. Nasceu, então, um projeto concreto, igualmente importante,

sobre Needs Analysis, análises das necessidades de “alunos” aprendendo uma LE;

um projeto educacional para estrangeiros emigrantes chegados à Austrália,

precisando aprender inglês, como SL. Examinaremos as vantagens e dificuldades

em tal empreendimento, feito pelo ministério de educação australiano e sua

contribuição prática para esse novo currículo centrado no aluno, no qual

concordamos que precisa ser ouvido.

Discutiremos pesquisas etnográficas existentes, feitas por alguns

autores com “alunos” de LE, reproduzidas em Nunan (2000, p. 78-97, tradução

nossa), para levantar a percepção didática dos mesmos e compará-las com as

expectativas dos professores, as quais, embora se atenham a procedimentos e

atividades didáticas, não se concentram, diretamente, nas estratégias cognitivas

listadas no capítulo dois. E isso serve para flagrar o descompasso do poder do saber

didático idealizado sobre o “aluno”, termo que, a pedagogia critica, demandando que

o mesmo deve ser chamado de estudante, embora de forma estruturante, não o

empoderem para tal agência.

Contudo, sem perder de vista as estratégias excluídas, cujo

(des)empoderamento será o nosso objetivo de discussão na pesquisa desta tese,

apresentaremos, posteriormente, um autor que se antecipou a esse movimento de

um currículo centrado no “aluno”. Stevick (1989, 1-137) foi o pioneiro em escutar os

“alunos”, trazendo para a cena de ESL o primeiro relato de subjetividades na

aprendizagem da área. E essa discussão da percepção do aluno sobre a didática

corrobora com uma inquietação nossa, acerca da “camisa de força” do poder

hierarquizante do método, que apaga a voz do aluno e tiraniza todo o sistema de

cursos livres de LE. Stevick (1989, p. 2-137, tradução nossa) etnografa sete

diferentes estudantes de LE e elicia suas técnicas de estudar e aprender, muitas

delas justapostas entre os estilos cognitivos desses “alunos”. Contudo, a estratégia

de prática mecânica através de drills, exercícios mecânicos de estrutura com muita

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repetição e reforço, se destaca sobre as outras por estar presente em “alunos” com

estilos tão variados. Nominalmente, os tipos descritos em Stevick são: um estudante

intuitivo, um formal, um informal, um imaginativo, um ativo, um autônomo e um

estudante autoconsciente.

Nessa pesquisa nominamos o “aluno” de estudante, pelo nível de respeito e

autonomia didática sem pré-julgamentos, como foi conduzida pelo autor.

Discordamos da idéia de sucesso no aprendizado de LE, porque, na verdade,

deveríamos buscar alternativas para agregar o entendimento da aprendizagem

nessa área, mas concordamos que essa tipologia não é binária, não congela outras

possibilidades de tipos de “alunos”, não conclui com fórmulas. Apresenta como os

estilos cognitivos são diferenciados e como temos que respeitá-los! Assim,

chamamos a atenção para estratégias de repetição muito presentes em “alunos” que

atenderiam às características de métodos que refutariam essa estratégia nos seus

pressupostos. Estudantes, entre os tipos citados, que aprendiam vocabulário com

listinha de glossário de palavras. Enfim, outros aprendiam no contexto e outros

revelavam ser “alunos” que aprendiam da formal “natural”, como descrita no Natural

Approach, abordagem natural. Essa diversidade cognitiva corrobora a falência

metodológica, universalizante, de transformar os “alunos” em “produtos

educacionais” homogêneos, advindos de uma esteira de produção “fordiana”, de

Henry Ford. E, mais uma vez, as necessidades subjetivas desses “alunos” não são

asseguradas, agregando-se à tirania dos ditames de cada método, fatos que

precisam ser questionados e alargados.

Contudo, nossa pesquisa se diferencia num ponto: indagaremos como

professores, coordenações e “alunos”, sobretudo os últimos, se sentiriam se suas

percepções e estratégias didáticas escolhidas fossem acatadas pelo sistema;

especificamente, como esse aluno em sua sala de aula se sentiria se fosse

consultado e empoderado na didática de sua aula. E veremos nos elementos

etnográficos transcritos nas entrevistas com esses atores se isso, para eles,

realmente importa. Por parte dos “alunos”, certamente teremos dificuldade dos

mesmos entenderem a forma de serem ouvidos, já que eles não detêm a

terminologia técnica didática mínima para entender o que seria a sua inserção

didática, nos planos de suas aulas, nem são expostos na prática, às estratégias de

tradução e repetição. A etnografia dessas entrevistas poderá ser mais uma

alternativa para agregarmos ao complexo fenômeno que é o ensino de LE.

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De volta à inserção didática do aluno, prosseguimos com o projeto

surgido na Austrália, no início dos anos oitenta; todo seu relatório foi publicado em

1984, tendo sido executado por dois lingüistas: Geoff Brindley (1984, p. iii, tradução

nossa) da Universidade de Macquarie, Austrália, e B. R. Bagshaw da Universidade

de Alberta, Canadá. O programa foi chamado Needs Analysis and Objective Setting

in the Adult Migrant Education Programme, Análise de Necessidades e

Determinação de Objetivos no Programa Educacional de Emigrantes Adultos. Não

vamos descrever esse projeto aqui, mas relembrar e analisar as marcas deixadas

nele, pelos principais conceitos de Richterich: as necessidades subjetivas, a

abordagem centrada no estudante e a concepção de negociação entre “alunos” e

professores sobre conteúdo e didática, como já visto anteriormente. E isso nos

importa, porque damos um passo adiante, pesquisando nos cursos livres de LE seus

feedbacks, opiniões, sobre suas sugestões cognitivas, nos planos de aula. Voltando

ao projeto prático australiano, centrado num currículo baseado nos “alunos”,

evidenciamos a presença das concepções de Richterich, as quais foram agregadas

ao mesmo:

O papel da análise de necessidades no Conselho da Europa para Línguas Modernas é explorado aqui. [no projeto australiano] [...] Uma distinção é feita entre necessidades “objetivas” e “subjetivas”. A primeira […] se refere ao que o estudante precisa saber fazer com a língua. [...] por isso aquilo [o conteúdo] eliciado dos atuais ou futuros usos da língua desse aluno. A última [...] o que eles precisam fazer para aprender: essas necessidades subjetivas estão mais relacionadas com o processo de aprendizagem [grifo nosso] e por isso eliciada das informações [...] das características individuais dos estudantes na situação de ensino [...]

Sentimos, nessa última citação de Richterich, a preocupação em escutar,

negociar e executar, dentro do possível, as sugestões do estudante: “o quê” ele

precisa, “como” ele prefere e pode aprender, de acordo com a consciência de uma

didática partilhada, consultada e negociada. Relembramos que já estabelecemos a

diferença, nesse texto, entre o que é o “aluno” (aspeado) e o estudante.

Brindley e Bagshaw, na introdução do projeto, escrevem sobre a inclusão

das necessidades subjetivas na implantação de um currículo de LE centrado no

estudante adulto. Gostaríamos de relembrar, nesta altura, que as necessidades

objetivas e subjetivas dos estudantes são entendidas por nós, aqui, como autonomia

do “aluno”, isto é, o poder de opinar, se articular, intervir e se envolver na

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aprendizagem. Giddens (1989, p. 2-14, tradução nossa) diria: “[...] tornar-se um

agente ativo na estruturação social.”

Essa citação de Giddens, acima, coincide com o abandono do poder

oculto e sepultado que Foucault nos traz em Genealogia e Poder, todo o poder do

saber travado, que coíbe a relação das esferas em interação, a saber: a instituição,

a coordenação, o professor e o “aluno” que, afinal, emergiu nesse projeto de

Brindley e Bagshaw (1984, p. iv-v, tradução nossa). E essa tentativa de desconstruir

esse modelo é a parte mais conflituosa do processo, segundo os autores: “Há uma

tendência entre os professores nesse projeto de pensar em termos dos seus

objetivos de conteúdo, em vez de relacioná-los ao comportamento dos alunos. Esta

visão de objetivos é um provável agente no obstáculo do envolvimento do aluno no

projeto do curso.

Prevíamos também que essa seria a parte mais difícil, antes de ler esse

projeto e suas conclusões: negociar e dividir o domínio do saber; conciliar, através

da negociação de um saber que, historicamente, se perpetua, favorecendo um único

lado, o lado da instituição e dos professores. Esse saber se “historiciza” e se

“sepulta”, a cada novo método lançado e, como inúmeras vezes questionado aqui, é

rapidamente apropriado por proprietários de cursos livres de língua, professores,

que não se permitem levar em conta o estudante, senão na perspectiva de “alunos”,

“sem luz”, seres idiotizados, sobretudo, no campo da didática e sua terminologia

básica, da qual poucos conhecem, porque pouco lhes é informado e exposto. Os

autores citam alguns problemas encontrados no projeto australiano:

[...] outro problema é criado pelo fato de que os “alunos” pesquisados não sabiam muito sobre A.M.E.S., [Adult Migrant Education Service] seus objetivos e seus cursos. [...]. Embora os professores coletassem as informações sobre os “alunos”, o fluxo de informações fluía essencialmente numa só direção. Então, os “alunos” não estavam numa posição de fazer escolhas informadas [grifo nosso] sobre o conteúdo e os métodos de aprendizagem. (BRINDLEY et al., 1984, p. iv-v, tradução nossa).

Esta citação corrobora nossa posição de “contra-poder” ao direito de

saber de “alunos” adultos de LE, porque nela se revela o ocultamento e controle do

conhecimento didático, resultando, assim, em “alunos” sem consciência e

informação básica, exigida para opinar, na área didática. Sugestão para isso: há de

se ter consultas com os “alunos”, através de constante exposição de técnicas ou

estratégias didáticas e solicitação de feedback, opinião, nada que nenhum deles não

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possa entender ao ser exposto e consultado. Essa ética do saber é interditada e isso

nos faz lembrar um dos questionamentos, em Lyotard (2006, p. 5), a propósito do

saber, na condição pós-moderna:

Esta relação entre fornecedores e usuários do conhecimento e o próprio conhecimento tende e tenderá a assumir a forma que os produtores e os consumidores de mercadorias têm com estas últimas, ou seja, a forma de valor. O saber é e sempre será produzido para ser vendido, e ele é e será consumido para ser valorizado numa nova produção: nos dois casos, para ser trocado. Ele deixa de ser para si mesmo seu próprio fim; perde seu valor de uso.

Dessa forma, sentimos que todo esse sedutor mundo de pesquisa e de

volumosas e belas impressões de livros-textos, essas “grandes narrativas”

lyotardianas se constituem na “perfumaria”, no produto mercadológico da indústria

do conhecimento de ensino de LE, se não forem, eticamente, reelaboradas. Há de

se ir mais fundo e “complexizar” as questões de mercado e do poder-saber

hierarquizado, entre atores de ensino de LE, porque todo esse lado acadêmico-

editorial, as pesquisas e o livro-texto da moda à venda continuam deixando o ELE

na incompletude, isto é, não agregam alternativas a um dos seus problemas

cruciais: o entendimento das subjetividades dos estilos cognitivos dos “alunos”, de

suas estratégias cognitivas, que podem ser viabilizadas e integradas a qualquer

método novo. Defendemos a necessidade de agregação de estratégias subjetivas

sondadas em cada sala de aula, e, a partir daí, de respeitar, sempre que possível,

os diferenciados estilos cognitivos levantados, implementando-os nas nossas aulas.

Há de se inserir o “aluno”, envolvê-lo nesse processo de negociar seus estilos,

respeitando suas estratégias cognitivas.

Três aspectos significantes aparecem em Brindley e Bagshaw (1984, p.

iv-v, tradução nossa): a troca de informações entre professores e “alunos”, o

conciliar das necessidades dos “alunos” através de consultas e negociação e os

mecanismos para estabelecer esses objetivos com os estudantes. Eles nos fazem

pensar na comunicação e informação do “aluno” e no empoderamento do mesmo

para que esse se agencie na quebra do poder sobre o saber entre seus principais

atores e nos mecanismos de escolha que podem, dentro do possível, ser discutidos

“com” o aluno e não impostos ao mesmo, como se tem feito, subalternizando-o.

Ao longo da nossa experiência, não experimentamos negociações entre

esses atores: “alunos”, professores e coordenadores, apenas, raramente, “alunos”

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de LE desempenhando sua criticidade, como cliente, reclamando sobre aquele

professor pouco claro ou sem rapport, relacionamento, desses com o “aluno”.

Podem ser atores passivos, mas raramente jogadores, pedagogicamente. Aliás,

pouca “roupa suja” se lava nos cursos de língua e o syllabus (conteúdo escolhido e

procedimentos) não é discutido, mas aceito sem nenhuma crítica ou crivo local, onde

constatamos a ausência da concepção de (g)localização. Em muitos poucos

momentos, as necessidades subjetivas dos “alunos” são consideradas: a atenção,

por exemplo, a “alunos” tímidos poderia ser um desses indicadores.

A cultura da abordagem centrada no “aluno” acontece, eventualmente,

apenas na consulta de algum conteúdo temático para a aula ou na solicitação de

sugestão de alguma música do hit parade, últimos sucessos musicais na mídia, isso

acontecendo, sobretudo, para as necessidades objetivas dos “alunos” em suas

aulas. Não escutamos, ao longo de nossa experiência de ensino, em workshops, em

qualquer tipo de exposição acadêmica, em algum relato de encontros da área, em

comunicações, em mesas redondas, qualquer tipo de comentário sobre a inserção

de negociações subjetivas didáticas nos currículos dos cursos, embora haja

bibliografia sobre esse assunto. Que agenda oculta é essa que faz omitir o

conhecimento desses conceitos vistos até aqui? Contudo, a maioria dos atores do

ensino, formadores de professores e coordenadores disseminam a idéia de os

“alunos” serem o centro de seu currículo. Que tipo de centro, que tipo de autonomia

é discutido? Ser centro seria um aluno agente pró-ativo na sua aprendizagem,

intervindo na negociação da didática de suas aulas? Ser autônomo significa

aprender a sê-lo, mesmo que culturas, como a nossa, latina, não favoreça a

disciplina exigida para tal autonomia, nunca absoluta? Tentamos responder o que

seria esse “centro”, essa “autonomia”, repetindo em outras palavras e com uma

pergunta: Ser o centro de uma aula, em nossa concepção, também envolve a

participação ou envolvimento do estudante, opinando sobre a mesma, solicitando o

que didaticamente mais lhe favorece, delatando o que lhe incomoda? Seria essa a

negociação que Richterich sugere, na abordagem centrada no “aluno”, com a qual

concordamos, para o ensino de LE com “alunos” adultos, no ambiente de cursos

livres?

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4.1 LACUNAS ENTRE PERCEPÇÕES DIDÁTICAS DE “ALUNOS” E DE

PROFESSORES

Como essas reflexões de Richterich, no projeto citado, na sessão anterior,

tornaram-se modelo de currículo? David Nunan (2000, p. xi-xii, tradução nossa) as

agrega num novo tipo de currículo: o currículo baseado no “aluno”, título de seu livro,

inspirado nas bases teóricas de Richterich, exaustivamente escritas ao longo desses

capítulos e no projeto de Brindley, comentado em páginas anteriores. Os

anglófonos, a nosso ver, fazem essas apropriações, dão créditos indiretos, mas,

raramente, atribuem honras de um não anglófono, no caso, René Richterich.

Nunan cita, nesse livro, pesquisas que corroboram Richterich

inteiramente; metodologicamente executadas através de entrevistas, revelam e

comparam as percepções de atividades didáticas, do ponto de vista do “aluno” e do

professor.

Essas pesquisas ratificam muito do que escrevemos até agora, ao

percebermos e interpretarmos por que se exclui ou se distancia nosso “aluno” do

momento de aprendizagem. Antes de discutirmos as pesquisas relatadas em Nunan

que corroboram esse distanciamento didático, citado ao longo desse capítulo,

lembremos que um currículo tem sido uma proposição de poder, onde a instituição e

especialistas decidem a forma de ação dos objetivos de aprendizagem para e pelos

nossos “alunos”. A princípio, Nunan define essa tradicional visão de currículo: “uma

declaração de intenções ou aquilo que deve ser um curso de estudo” (NUNAN,

2000, p.xi, tradução nossa), mas esta concepção é imediatamente substituída pelo

conceito de learner-centredness, centramento do currículo no “aluno”. O autor

ratifica, com os conceitos lingüísticos e educacionais de Richterich e através de

pesquisas de outros autores, a importância do papel do “aluno” e deste conceito

citado, no ensino-aprendizagem de LE, no seu livro.

Passando por uma crítica da influência desproporcional da lingüística

teórica e aplicada, Nunan enfatiza os objetivos das learning skills, habilidades de

aprendizagem, HA, numa época onde os languages skills, habilidades lingüísticas,

HL, prevaleciam. Citamos duas das H.A.: ajudar os estudantes a identificarem suas

formas e estilos preferidos de aprender e encorajá-los a estabelecerem seus

objetivos (curriculares). Mas isso não significa uma inversão de poder, tipo um

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dogma, como: agora as escolhas objetivas e subjetivas devem ser de baixo para

cima, pois os participantes de qualquer negociação não podem dialogar se

estiverem defensivos ou forem dogmáticos. Mas a concepção de negociação de

Richterich intervém para equilibrar essa relação de poder do saber, nessas

escolhas. (NUNAN, 2000, p. 3).

A partir deste parágrafo, passamos para as HA dos “alunos”, através de

suas escolhas e estratégias cognitivas. Mostraremos a conexão entre tudo o que

expomos e suspeitamos e que se corrobora nas diversas pesquisas reproduzidas

em Nunan, que flagra a discrepância entre necessidades subjetivas didáticas de

“alunos” e professores, encontradas nas pesquisas reproduzidas a seguir, de

diversos autores, inclusive de Brindley; enfim, os olhares diferenciados dos desejos

dos “alunos” e dos professores na condução de suas aulas ratificam toda a relação

do saber exercido sobre os nossos “alunos” de LE Vamos reproduzir, abaixo,

algumas pesquisas que flagram todo esse caminho crítico que perseguimos, desde

o primeiro capítulo, intencionando interpretar o que está por trás de todo esse

processo. Possivelmente, caso essa discrepância apareça nas nossas entrevistas,

no próximo capítulo, inseriremos o pensamento de Foucault sobre o poder do saber,

o saber dominado, que é essencial para essa releitura mais aprofundada dessas

relações de poder, na pedagogia de ensino de LE.

No capítulo seis, do livro de Nunan, onde ele apresenta “sua”

metodologia, a saber, Currículo Centrado no Estudante, encontramos essas

percepções diferenciadas dos “alunos” e dos professores no “como” a didática é, na

realidade, distanciada do “aluno”. Citamos Nunan (2000, p.88, tradução nossa):

Até agora, contudo, o ator mais importante do drama [ensino de LE], o “aluno” de língua, tem estado fora [...]. No currículo baseado no estudante, a metodologia como qualquer outro elemento deve ser informada pelas atitudes dos estudantes. O que então os estudantes realmente pensam são atividades legítimas e será que as mesmas serão comparadas com as dos professores que os ensinam?

As pesquisas sobre a percepção dos professores de “como” o “aluno”

deve aprender, caso esses se interessem pela preferência cognitiva do mesmo

estão apresentadas no nosso quadro um, mais adiante.

No quadro três, Nunan reproduz a pesquisa sobre as percepções dos

“alunos” de suas próprias preferências cognitivas, que demonstra a lacuna entre os

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estilos cognitivos idealizados para o “aluno”, por parte dos professores, e a real

escolha cognitiva apontada pelo mesmo, confirmando a nossa suposição de

exclusões de estratégias. Averiguaremos, nos resultados das nossas entrevistas, se

os “alunos” também pensam dessa forma.

As pesquisas de estratégias comparadas aqui não podem ser validadas

universalmente, mas demonstram escolhas para “alunos” daquela realidade cultural,

naquele tempo pesquisado. Trata-se de uma pesquisa local, em ESL, na Austrália, e

deve refletir a cultura dos “alunos” emigrantes em questão. O nosso ponto de

questionamento, que é um objetivo parcial para nossa análise nesta tese, é

averiguar as razões pelas quais os currículos baseados na idéia de learner

centredness, de centramento do “aluno” no currículo, foram dificultados e, para

alguns, “inviáveis”. Que aspectos percebidos ou não deste currículo inviabilizam a

sua implantação, enfraquecem o envolvimento do “aluno” e, possivelmente,

aumentam o número de drop-outs, evasões, resultando numa lacuna de concepções

disjuntivas entre as percepções de ensino e de aprendizagem, do ponto de vista de

“alunos” e professores? O escutar do processo e das demandas subjetivas dos

“alunos” é, também, a preocupação de Ivor F. Goodson, quando comenta sobre

currículo, com propriedade: (1998, p. 50, tradução nossa): “[...] uma grande pedra de

tropeço para as mudanças [curriculares] foi nas décadas de sessenta e setenta a

nossa arrogância nas primeiras reformas partindo de cima e de fora do que estava

ao nosso alcance, sem considerar o que já existia.”Mais uma vez uma citação de um

profissional de currículo corrobora a nossa discussão e nossa visão, repetidamente

exposta aqui: o privilegiar do “novofagismo” metodológico e toda a elucubração

pedagógica que vem de cima e de fora, dos saberes institucionalizados sepultados,

discutidos ao longo desse trabalho. O descartar do “aluno” e daquilo que já preexiste

em Pedagogia, em função daquela posição “novofágica”, pró-método que fragmenta

o ensino de língua, como já discutido.

As pesquisas, a seguir, convalidam nossas suspeitas da manipulação de cima

para baixo, entre as necessidades didáticas de professores e “alunos” . A primeira

delas foi feita por Eltis e Low, em 1985, demonstrada a seguir, em Nunan:

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Atividades didáticas %

“Alunos” aprendendo em pares ou em pequenos grupos 80

Role-Play 56

Jogos com a língua estrangeira 51

Leitura de artigos 48

“Alunos” fazendo apresentação oral 46

Cloze (exercícios de preenchimento de lacunas) 45

Uso de material de vídeo 40

“Alunos” repetindo palavras-dicas para operacionalizar Drills 34

Exercícios de escrita livre 27

Implementando e corrigindo exercícios 25

Audição e estratégia de tomar notas 25

Repetição e aprendizagem de diálogos 20

Estudantes lendo alto na sala 21

Exercícios de escrita monitorados 18

Quadro 2. A Ordem de classificação das atividades de ensino de acordo com a

percepção de utilidade considerada por professores no programa A.M.E.S.

Fonte: Baseado em Nunan (2000, p. 89, tradução nossa).

O que se pode comentar dessa pesquisa no quadro dois? Fica claro a

grande influência de técnicas comunicativas demandadas e preferidas,

didaticamente, pelos professores. Separadamente, a esses mesmos profissionais,

foi pedido para classificarem as atividades mais significantes, entre as citadas no

quadro. Essas foram:

- Estudantes trabalhando em pares / grupos;

- Jogos;

- Role Play (encenações funcionais na LE);

- Leitura de artigos temáticos;

- Close (exercícios de preenchimento de lacunas);

A classificação acima, após o quadro, confirma a mesma tendência do

quadro um. O que sentimos nessas escolhas e classificação de atividades nessa

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pesquisa é, inicialmente, a preferência por atividades de produção da fala, o output

de forma prematura e, conseqüentemente, a falta de uma taxonomia cognitiva que

contemple um continuum, partindo de atividades com menor dificuldade cognitiva,

mais controladas, para as de maior dificuldade, atividades mais livres de produção

de LE; mas atividades de produção nos parece não ser a única demanda principal

dos adultos. Uma arrumação mais lógica para a aprendizagem de estrutura, de

gramática, por exemplo, nos parece mais dosada para o ensino de LE. Vamos voltar

a falar sobre essa taxonomia, nas próximas páginas.

Numa outra pesquisa, sondou-se sobre as técnicas mais úteis de uma

aula, na percepção dos “alunos”. Em Alcorso e Kalantzis (NUNAN, 2000, p. 90,

tradução nossa) em 1985, observou-se:

Atividades didáticas %

Exercícios de gramática

4

40% Conversação e discussão estruturada

3

35% Cópia de material escrito, memorização, drills (exercícios de repetição e

automatização de pronúncia ou estrutura) e trabalhos de repetição

2

25% Atividades de audição usando-se cassetes [e cd] (listening, atividades de

compreensão oral)

2

20% Leitura de jornais e livros 1

15%

Escrita de estórias, poemas e descrições 112%

Jogos de língua, músicas e Role-plays (atividade de representações de

papéis sociais simulados)

12% Utilização de audiovisuais: TV, vídeo

111%

A técnica de resolução de problemas e tarefas comunicativas

110%

Excursões com a turma 7%

Quadro 3. Partes da aula mais significantes na percepção dos “alunos”

Fonte: Baseado em Nunan (2000, p. 90, tradução nossa).

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Nunan (2000, p. 90, tradução nossa) interpreta o que está claro se

compararmos esses dois quadros, isto é, os professores atribuem às atividades

comunicativas um alto uso enquanto que os aprendizes preferem atividades mais

tradicionais, excetuando as conversações estruturadas.

Tentaremos continuar a interpretar, a partir de Nunan, a discrepância

nesses dois quadros. Aqui nos importa as crenças e manipulações sobre o suposto

saber pedagógico dominado em detrimento do saber não qualificado, desqualificado,

do aluno, que trataremos nas entrevistas das nossas pesquisas, no próximo

capítulo. Mas é importante discriminar, antes, a(s) particularidade(s) que a

aprendizagem de língua estrangeira apresenta. O ELE demanda quatro habilidades,

competência comunicativa e um tempo razoável de exposição para sua

aprendizagem; os “alunos” iniciantes se prendem, a princípio, às atividades mais

simples, mecânicas e nós sabemos que algumas dessas atividades são

interpretadas pelos professores como “ultrapassadas”, por terem sido originadas de

métodos anteriores e são descartadas pela maioria deles, haja vista o seu

percentual no quadro desses professores.

Contudo, é difícil lutarmos contra preconceitos lingüístico-pedagógicos de

aprendizagem de LE, como não usar a língua nativa, principalmente em níveis

iniciais em ILE. Não pretendemos defender as estratégias excluídas e

“desimportadas” pelo establishment, saber sepultado dos especialistas, nem fazer

suas defesas. Por exemplo, para defender o uso da L1 poderíamos usar vários

autores, como David Atkinson (1993, p.6), Earl Stevick (1989, p. 21-39), Mario

Rinvolucri (2002, p. 3-5), Diane Philips, Roger Gower e Steve Walters (1995, p. 62-

64) usaremos esses autores na interpretação do texto dos nossos entrevistados em

nossa pesquisa. Mas o nosso interesse aqui é descobrir a manipulação roubada do

conhecimento dos “alunos”, que usam tradução e repetição como estratégias, o

motivo dessa exclusão e as intenções por trás disso.

Por outro lado, é difícil não partir de uma taxonomia cognitiva para

proporcionar “segurança” aos aprendizes, a saber, partindo-se do simples, do

reconhecível, de atividades controladas de fixação, para que eles se sintam

seguros para uma aprendizagem mais independente, ao produzir e se arriscar

nessa LE.

Por isso, no quadro três, percepções dos “alunos”, há uma demanda de

drills, exercícios de fixação, e memorização, conversas estruturadas, trabalho de

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repetição e exercícios gramaticais, procedimentos excluídos e tomados como

“arcaicos”. Esse resultado nem é homogêneo, nem válido para todos os “alunos”,

não é universal; mas nos parece que essas identificações de estilos cognitivos

desses “alunos” se fundamentam numa orientação de seqüência didática, sugerida

na figura um, na página vinte e nove, a seguir. Neste momento, abordando

brevemente a didática de LE, relembramos Paulo Freire e Bachelard, comentados

no capítulo um, na percepção do conhecimento anterior, do conhecimento “velho”

que pode ser eficaz e atemporal na retificação necessária de percepções antigas de

conhecimentos, os quais podem ser “reinseríveis” nas rupturas da inovação; no caso

citado, as duas técnicas excluídas e que são nossas categorias de análise,

escolhidas pelos “alunos”, tradução e repetição.

Se estes “alunos” ouvidos escolheram atividades de repetição, treino de

memória e tantas outras mais simples, numa etapa antes de se arriscarem na

habilidade da produção de fala de LE, por exemplo, estes “alunos”, seus estilos

cognitivos precisariam ser respeitados com inserção de dosagens adequadas

dessas técnicas. Há de se perguntar sobre os estilos dos “alunos” restantes. Os

demais, que apresentam outros estilos cognitivos, serão contemplados com outras

técnicas que eles negociem, aliás as técnicas mais modernas impostas pelos

professores de LE. Nada contra nenhuma dessas preferências impostas por

professores ou coordenadores, quer cronológica ou didaticamente. Visamos,

contudo, compreender o porquê a hierarquia de ensino de cursos livres de LE exclui

aleatoriamente, estratégias escolhidas por estes “alunos” adultos que foram ouvidos,

mas não respeitados. Essa questão ética nos intriga, pois, a nosso ver, a inclusão e

a negociação são palavras-chaves; esse equilíbrio negociável com o professor é a

possibilidade de inserção de necessidades subjetivas dos “alunos”, na prática.

Prosseguimos mostrando a última pesquisa do A.M.E.P., Adult Migrant

Education Programme na Austrália, realizada comparativamente com professores e

“alunos” do programa, citada em Nunan (2000, p. 92, tradução nossa):

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Atividades Estudante Professor

Prática de pronúncia Muito alta Média

Explicação [dedutivas] nas aulas Muito alta Alta

Prática de conversação Muito alta Muito alta

Correção de erros Muito alta Baixa

Desenvolvimento de vocabulário Muito alta Alta

Ouvir e usar cassetes [cd´s] Baixa Alta média

Autocorreção dos “alunos” Baixa Muito alta

Uso de fotos, filmes e vídeos Baixa Média baixa

Trabalho em pares Baixa Muito alta

Jogos com a lingua Muito baixa Baixa

Quadro 4. Comparação de atividades de aprendizagem na percepção do

estudante e do professor

Fonte: Baseado em Nunan (2000, p. 92).

Esse confronto, no quadro acima, nos mostra, o desencontro entre esses

atores, professores e “alunos”, que já era discernido nos ensaios de Richterich, do

início dos anos setenta, onde o mesmo considera as necessidades subjetivas na

aprendizagem de LE. e chama a atenção para o efêmero ideal de uma pedagogia de

ELE

Entendemos que, diferentemente do projeto australiano citado

anteriormente, as culturas de ensino, em diversos locais do globo, não conseguem

fazer a ruptura com os papéis pedagógicos dos autores do ensino-aprendizagem

nos cursos de LE. Não conseguem negociar com o saber pedagógico, dominado, na

relação de ensino-aprendizagem, em cursos de língua para adultos. Essa

autonomia e “poder saber” não são permitidos aos “alunos” de LE, os maiores

interessados. Esse desencontro e descompasso existem até hoje. Não

pretendemos, ao reproduzir essas pesquisas, fixar modelos estáticos de como as

subjetividades se comportam na aprendizagem. Essas são amostras do desencontro

entre percepções que poderiam ser amalgamadas em função de um melhor

relacionamento e clima educacional em ELE. Nosso objetivo é sentir os “alunos” e

tentar interpretar essa postura do saber dominado, na fragmentação

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intermetodológica, a favor de um “novofagismo” metodológico, possivelmente em

detrimento de mais uma alternativa para melhor compreender o ato complexo de

ensino de LE, que pode estar indo na contramão do processo de aprender de alguns

“alunos”.

Outras questões tornam-se pertinentes sobre todo o conteúdo desses

quadros: O que é ensino de inglês como língua estrangeira? Que particularidades

esta aprendizagem apresenta em relação a outras disciplinas? Enfim, estas

perguntas são parte da tarefa que precisamos cotejar: a complexidade do ensino de

LE, comentada brevemente, a seguir.

Entender o ensino de ELE demanda mais perguntas que respostas, a

nosso ver: Aprende-se inglês, por exemplo, como se aprende História, Matemática,

Física e Geografia? Trata-se de uma “alfabetização”? É muito mais um “letramento”,

embora, diferentemente do mesmo, em L1, onde já se adquiriu o código lingüístico e

comunicativo funcional da L1, na aprendizagem da LE o processo é muito mais

complexo. No ensino da LE, esse letramento não pode ser totalmente

instrumentalizado, por falta de experiência e exposição temporal à LE em questão,

não podendo ser, em níveis iniciais, totalmente instrumentalizada nela própria. O

aluno de LE, por exemplo, estudará em sua casa, na sua língua nativa. Afinal,

questionamos: É canônico, no nosso campo, aprendermos sempre uma LE, por

exemplo, inglês através do inglês, mesmo esta não sendo a língua de referência

para “alunos” em ambiente ELE? Como estudamos uma LE, em nossas casas? Por

não ser uma aprendizagem que acontece em ambiente natural e, por isso, ser

inautêntica, motivada, externamente, pelas demandas profissionais ou acadêmicas,

no caso de ILE, essa atividade difere de uma imersão. Dessa forma, perguntamos:

Deve sua didática ser repensada? Sendo aprendida fora do país, onde ela é falada,

é uma aprendizagem diferenciada. Teria o ESL uma abordagem de ensino igual ao

ELE? Existe nestas duas modalidades uma diminuição de demanda de

sobrevivência “do aluno”, em relação à língua meta? Localmente, em países

anglófonos, aprendemos imersos na língua meta! Sobre isso, Atinkson (1993, p.6,

tradução nossa) menciona, coerentemente, aprendizagens em dois ambientes: “para

muitos estudantes o ideal seria uma combinação de uma aprendizagem monolingual

e multilingual, embora tal oportunidade não exista para sua grande maioria.”

A distância geográfica da primeira situação, ILE, faz os “alunos” não

exercitarem constantemente a memória de trabalho, de menor duração e para treino

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temporário; na segunda situação, ISL, essa memória estará sempre ativada pela

sobrevivência no ambiente da cultura meta. Provavelmente a demanda do “aluno”,

em ambiente ILE, é muito maior e precisaríamos treinar a memória de curto prazo,

com mais freqüência. Muitas indagações e poucas respostas “dogmáticas”.

Diferentemente de outras matérias escolares, cujo instrumento de abordagem é a

língua nativa, a língua estrangeira constitui-se o meio e o fim no seu próprio

processo de ensino e aprendizagem.

Em qualquer dos ambientes considerados, ISL ou ILE, pensamos numa

taxonomia de aprendizagem de LE, que resgatamos e reproduzimos mais adiante.

Ela corrobora a demanda dos “alunos”, nas pesquisas acima de Nunan, presentes

nas entrevistas nas páginas anteriores. A interpretação das escolhas destes “alunos”

diz que eles precisam de atividades controladas, de memória e, num continuum,

evoluirão para atividades mais independentes, de produção. Infere-se essa

interpretação a partir da figura um, na próxima página, uma taxonomia de

procedimentos didáticos para uma aula de inglês. A nosso ver, ela é relevante,

sobretudo em ambiente ILE. Citamos essa seqüência de procedimentos porque ela

ratifica procedimentos demandados pelas necessidades didáticas de atividades e

procedimentos dos “alunos”, mostrados nos quadros em Nunan. Na próxima página,

inserimos a figura um, com procedimentos didáticos para o planejamento de aulas

em língua estrangeira de Littlewood, citados por Richards e Rodgers (1989. p. 82).

Lembramos, aqui, que essa ilustração de Littlewood a seguir é chamada de figura

de acordo com as normalização brasileira. Na fonte nada constava. Vejamos como

essa figura ratifica a seqüência didática dos estilos cognitivos dos “alunos” e como

insere estratégias mais mecânicas, antes de dar prosseguimento às atividades

comunicativas. Diferentemente do que tem sido corrente na contemporaneidade,

essa figura não sugere atividades comunicativas no início do ensino, não privilegia,

conseqüentemente, exercícios indutivos de descoberta de gramática, não torna a

aula totalmente student-centered, no sentido de que os “alunos” têm que ser

“autônomos” desde os níveis iniciais, para a aprendizagem.

A necessidade de alguma organização específica na cognição de LE,

comentada em páginas anteriores, demanda uma taxonomia que torna a instrução

de LE mais inteligível para o planejamento de aula do professor e para os “alunos”,

sobretudo iniciantes, no caso de LE. Relembremos a proposição de Littlewood,

citado por Richards e Rodgers (1989. p. 82):

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Figura 1. Projeto taxonômico de Littlewood para a didática na abordagem

comunicativa

Fonte: Richards e Rodgers (1989, p. 82).

Nessa figura acima, Littlewood se deteve em interpretar bem as etapas

que diferenciam e justificam uma taxonomia cognitiva de ensino seqüenciada para o

ELE e ESL. Aí vemos a influência das taxonomias cognitivas de Bloom (1976, p. 55-

165) que fazem uma leitura de etapas de aprendizagem de uma forma bastante

compreensiva e abrangente, influenciando a taxonomia da figura um de Littlewood, e

que nos parece de grande contribuição.

Achamos que a taxonomia cognitiva e a afetiva de Bloom é especialmente

necessária para uma disciplina como inglês, que demanda um “letramento”, no qual

a LE, inicialmente desconhecida e, simultaneamente, seu próprio instrumento de

ensino, tarefa atípica se compararmos a qualquer outra disciplina. Contudo, Bloom

se distancia do social, não criando uma taxonomia social e, assim, desconsidera

esse fator humano grupal e o agenciamento do indivíduo, que são suas ações

peculiares subjetivas, em ação. Sem as mesmas, criou-se uma grande lacuna na

tentativa de compreender os processos sociológicos da cognição humana.

Compreendemos que essas taxonomias, na figura um, não seriam válidas

para disciplinas de ciências humanas, na sua maioria ainda de natureza ideológica,

mas que não envolvem esse outro lado da aprendizagem de uma LE, como a

aquisição de um novo código lingüístico, combinações de elementos lexicais,

fonológicos e a necessidade de aquisição de habilidades específicas da

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aprendizagem e de letramento, exclusivas do ensino de LE. Essas são questões a

serem refletidas no futuro. Temos essa informação: ensinar e aprender uma LE, no

nosso caso, o inglês, não é o mesmo que ensinar e aprender História, Geografia,

Matemática ou Biologia. Coincidentemente, essa taxonomia na figura um confirma a

necessidade das estratégias cognitivas, tradução e repetição, dentre outras,

interditadas, naquela época, por algumas coordenações de cursos livres de LE.

Nesse capítulo, em ambas as seções, intencionou-se prosseguir com os

desdobramentos que as idéias de Richterich provocaram. Ele respondeu a muitas

das nossas indagações, no capítulo anterior, embora tenham levantado muitas

outras, como a “efemeridade” da pedagogia em geral e de ensino de LE, na sua

maioria, sem resposta. Richterich nos fez entender o quanto é difícil, até hoje,

educar o “aluno” para um currículo que seja negociado com o mesmo.

Examinaremos no nosso trabalho de campo, no próximo capítulo, as razões pelas

quais o mesmo não sai da posição de (des)empoderamento em que sempre se

encontra, da “sepultura” onde o puseram, sem se tornar um jogador nesse processo.

Richterich resgatou a voz do “aluno”, teoricamente. Contudo, implantar a concepção

de ensino e currículo do mesmo é uma dificuldade que não sabemos se

conseguimos vencer. Após quase quarenta anos de publicação, essas idéias não

conseguem virar realidade. O poder sobre o saber dominado continua praticamente

imutável, mesmo considerando a pequena quantidade de “alunos”, por sala, que

aprende LE, em cursos livres. Nesse capítulo quatro vimos as idéias de Richterich

serem concretizadas no projeto australiano de Brindley e Bagshaw e em outras

pesquisas retiradas de Nunan. Nessa altura, temos uma idéia de como foi difícil a

execução desse currículo diante da resistência do saber sepultado dos professores,

embora todas as pesquisas mostrem a lacuna de comunicação de necessidades

subjetivas presente nelas.

No quinto capítulo vamos transcrever entrevistas feitas com “alunos”, e

professores, coordenadores e proprietário de cursos livres de LE, utilizando nas

mesmas alguns elementos etnográficos e qualitativos. As entrevistas realizadas com

alguns “alunos”, professores, coordenadores e proprietários de cursos livres de LE,

visam compreender a diversidade de cognição, as subjetividades desses “alunos”, o

ensinar e o aprender uma LE, a percepção diferenciada ou não dos “alunos” sobre a

possibilidade de intervir didaticamente, um real feedback, opinião, sobre sua

cognição e a tentativa de compor uma microgenealogia do saber sepultado que

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(des)empodera nossos “alunos”, nessa relação de micropoder que se constitui

nessas instituições de curso livres de LE. Num momento mais reflexivo,

provavelmente nas considerações finais, tentaremos interpretar o poder do saber da

didática atual de LE, as possíveis razões da sua manutenção, e sugerir outras

prováveis alternativas para se agregar ao complexo fenômeno do ELE. Lembramos

que, a partir do próximo capítulo, o termo “aluno”, aspeado, como concebido nesse

trabalho, será libertado da conotação dada a esse, e passamos a usá-lo sem aspas

ou apenas estudante, porque, lembrando o ditado anglófono, não julguemos o livro

pela sua capa.

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5 INTERPRETAÇÃO DAS CATEGORIAS EXCLUÍDAS NESTE

TRABALHO

Antes de descrevermos a metodologia do corpus das entrevistas com

nossos atores no ensino-aprendizagem de LE, gostaríamos de discernir a nossa

abordagem em relação à interpretação das transcrições da fala dos alunos e dos

outros membros desse corpus. Não estamos aqui discutindo essas estratégias

cognitivas quanto ao seu uso ou não, os seus prós e contras nem estamos olhando

o fato crítico da ausência dessas técnicas ou estratégias de aprendizagem, mas

estamos questionando o “andar” e o “progresso” acrítico e “novofágico” de novas

abordagens, desconectado da cognição em ASL e de sua aprendizagem, apenas.

Visamos entender essas atitudes de exclusão diante de uma perspectiva mais

próxima possível da ética da pesquisa em LAC, criando um novo campo crítico de

discussão do poder-saber entre a produção científica de cognição, a produção

editorial especializada e a prática do saber considerado desqualificado, do aluno,

teoria pessoal prática que podemos eliciar do estudante, tentando explicar o que, em

ensino de LE, se direciona contra o mesmo e, não, a seu favor.

Este capítulo, dividido em duas seções, explica o objetivo das entrevistas

em cada uma delas; as primeiras com alunos de cursos livres e a segunda com

professores, coordenadores e proprietários desses cursos. As entrevistas para as

duas partes estão disponíveis na seção “anexos” deste trabalho.

Na primeira parte, interpretaremos as transcrições dos alunos, podendo

citar eventualmente alguns especialistas preocupados com vantagens e

desvantagens da tradução e repetição, excluídas; eles nos ajudarão a corroborar

essas estratégias/técnicas, em ASL, tal como no quadro um, escritas por Chamot e

O´Malley (1995), amplamente citados nesse texto, como algumas das formas

preferidas dos estudantes aprenderem LE. Repetimos, entretanto, que nosso

enfoque nessa “pequena” narrativa (Lyotard, 2006) não é só resgate dessas

estratégias, as vantagens ou desvantagens que possam trazer ao ELE, como

escrevem os especialistas que mencionarei a seguir, mas as razões pelas quais os

estudos de cognição específicos de ELE, na área de aquisição de língua

estrangeira, os lançamentos editoriais de novos métodos e as crenças pessoais

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infundadas sobre essas estratégias cognitivas andam em descompasso e se

distanciam dos alunos, de suas formas de aprender: fato incompreensível.

Em relação ao parágrafo anterior a interpretação dos professores será,

fundamentalmente, o campo de atuação da nossa defesa, a saber: como os

micropoderes dos autores, das editoras, dos especialistas, desautorizam a

dialogicidade entre estes e os professores por um lado e, por outro, entre estes e os

alunos, desqualificando-os; tentar entender e interpretar os equívocos, as

contradições na passagem das informações dos países centrais (anglófonos), quer

em aquisição de língua, quer em aprendizagem de LE, invadindo e empobrecendo a

didática dessa disciplina; saber as razões pelas quais esses micropoderes agem

sobre os professores e coordenações, com esses preconceitos e exclusões, em

detrimento da forma de aprender dos alunos, e como esses profissionais se

permitem subalternizar, reproduzindo de forma conformista esse conhecimento. Isto

é o foco central de nossa discussão. A ética da diferença encontra-se perdida nesse

processo e a compreensão desse equívoco é o objetivo de nosso trabalho.

Assim, escreveram sobre tradução: quando usá-la, vantagens e alertas do

seu uso excessivo e sugestões de técnicas alguns autores, como Atkinson (1987, p.

241, tradução nossa) e seus usos judiciosos de tradução; Costa (1988) que discute

uma concepção mais ampla, cultural e crítica dessa eficiente técnica para se

entender as diferenças entre as línguas e as culturas; Widdowson (1979, p. 61-71) e

Auerbach (1993) que recomendam alguns momentos quando a L1 deve ser usada,

Rinvolucri (2001, p.41-44, tradução nossa) e sua autocrítica pela longa exclusão do

uso da L1 e da tradução, influência do método direto e procedimento radicalmente

mantido em seu repertório de técnicas em sala de aula, faz uma mea culpa, ele e

Deller (2002, p. 3-5), com o lançamento do livro exclusivo de uso de língua materna

em ELE, prefaceado por Luke Prodromou, instrutor da British Council, Conselho

Britânico, autor de livros de TESOL e de livros didáticos. E, posteriormente, outros

autores. Temos falado sobre as contradições ou equívocos entre as pesquisas

reproduzidas localmente e estes podem ser exemplificados com a pesquisa empírica

de Chamot e O´Malley (1995, 133-150), que contradizem a nossa cultura de ELI que

os exclui. Em relação à repetição, não existe nenhum livro conhecido sobre drills, a

não ser aqueles das décadas de cinqüenta, sessenta e setenta e excepcionalmente,

uns mais atuais, das décadas de oitenta e noventa, mas que apenas editam e

atualizam tipos de drills. Nenhuma análise crítica, a favor ou contra, foi achada nem

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entre os principais jornais e revistas disponíveis nos periódicos da CAPES. Mas

citaremos especialistas e lingüistas que foram veementes em criticar o descartar

dessa técnica, sem retificá-la didaticamente. Aqui, lembramos Bachelard, já que a

ruptura do “novidadorismo” solapou essas técnicas, desrespeitando o aluno, a

exemplo da pesquisa de aquisição de língua de Chamot e O´Malley (1995, p. 133-

150).

Assim, H. D. Brown (1994, p.16-17, tradução nossa) foi o primeiro

lingüista a assumir uma posição retificadora; dentre outros princípios cognitivos de

aprendizagem de LE, ele inclui o princípio de automaticity, ganho de automaticidade,

totalmente behaviorista, e cita o uso de drills, exercícios de repetição para

aprendizagem de estrutura como uma etapa necessária à aquisição de estrutura de

língua. Se relembrarmos o movimento humanista que surge no final dos anos

setenta, em ELE, destacamos o livro seminal de Stevick (1990, p. 19-33, tradução

nossa), Humanismo no ensino de língua: uma perspectiva crítica, que, embora com

tal título, esse livro intermedia os domínios cognitivo e afetivo e resenha a obra de

Karl Popper, fundamentando-se nela, sobretudo, no princípio de Falseabilidade do

conhecimento, isto é, descrença no positivismo, sem ceticismo. A falseabilidade ou

refutabilidade implica em não tomar qualquer conhecimento como conclusivo,

admitindo que empírico pode ser atualizado através de observações vindouras, que

podem tornar o conhecimento anterior falso. Essa idéia na doutrina filosófica da

Falseabilidade é retomada, possivelmente, por Richterich, como também a

“efemeridade”, qualidade de ser efêmera, da Pedagogia, ambas provavelmente

inspiradas por Bachelard, considerando que Popper nasceu mais de cinqüenta anos

depois do mesmo. Mas o que nos importa nessa obra de Stevick é o posicionamento

crítico do mesmo, a partir do pensamento de Popper sobre o uso da repetição

mecânica, criticada por não ser significativa, e, portanto, irrelevante no aprender.

Stevick (1990, p. 20, tradução nossa) cita Brooks e Brumfit, representantes do

Audiolingual e da abordagem comunicativa, os quais delatam que não podemos

medir o uso significativo e mecânico do código lingüístico num vasto universo de

individualidades, nossos estudantes, pelo quantitativo de tal empreendimento. Bela

passagem do seu livro, cujo primeiro capítulo é dedicado a um dos mais atuantes

filósofos da ciência do século XX, Karl Popper. Coincidentemente, fazemos nesse

trabalho o mesmo com um filósofo que viveu entre o século XIX e XX, Gastón

Bachelard.

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5.1 OUVINDO OS ALUNOS SOBRE CERTAS OMISSÕES DE ESTRATÉGIAS

COGNITIVAS

No anexo A (p.144), deste trabalho, encontramos as entrevistas

transcritas com alunos e no anexo B (p. 180), com os professores. Comentamos e

interpretamos, dentre outros temas que surgiram durante as entrevistas, as

omissões de estratégias cognitivas com os alunos no ensino de LE, se são

corroboradas como necessárias pelos mesmos, o que pensam da omissão ou

“proibição” das mesmas. Analisamos a fala desses estudantes, nas entrevistas,

através de como eles realmente aprendem. Na seção cinco ponto dois, explicamos a

segunda parte das entrevistas, feitas com outros autores, professores,

coordenadores e proprietário de cursos livres, também disponíveis na seção anexos.

E nas considerações finais, voltamos a eles interpretando as possíveis

conseqüências disso para sua aprendizagem.

Fundamentamos na interpretação das entrevistas com os alunos

pesquisas que trazem, sobretudo, as percepções de Richterich sobre as

necessidades subjetivas e conceitos originados das mesmas, além das pesquisas

subseqüentes à seus conceitos, presentes no capítulo três. Na seção seguinte, cinco

ponto dois, comentamos a transcrição das entrevistas dos professores,

coordenadores e proprietários de cursos livres de LE, quando tentaremos interpretar

de forma mais alargada e refinada, juntamente com Bachelard, Foucault, Morin e

Paulo freire, teóricos citados no primeiro capítulo. Caso haja algum tema transversal

que não possa ser comentado dentro das entrevistas, abordaremos esse nas

considerações finais.

Em ambas as seções, as entrevistas com os alunos e a segunda com os

outros atores, seus textos foram mantidos integralmente, como já foi dito. As

perguntas do entrevistador, por questão de clareza, poderão ter, na transcrição,

palavras acrescentadas; algumas perguntas novas surgiram, decorrentes do fluxo da

entrevista e que estão além das já previstas no formulário de entrevistas; foram

inevitáveis, já que buscamos fazer uma breve genealogia do poder dos fatos que

levam a essa atitude alienada e conformista de exclusão das categorias cognitivas,

na nossa didática de ensino de LE. Nas transcrições, nomeamos com pseudônimos

os alunos entrevistados, no total treze alunos: seis do nível inicial, livros um e dois, e

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sete do nível intermediário, livro quatro. A ordem do turno de fala de cada ouvinte

será continuada, porém, como alguns turnos de fala serão recortados para análise, o

mesmo poderá sofrer interrupções na numeração. Como o roteiro da entrevista é

unificado, muitas respostas dos estudantes poderão ser semelhantes, assim como

nossas interpretações. Buscaremos, contudo, alternar, dentro do possível, conceitos

ou abordagens dos diferentes teóricos utilizados nos capítulo iniciais. A seguir

comentamos sobre as entrevistas com o segundo grupo, os professores,

coordenadores e proprietários.

5.2 OUVINDO OS PROFESSORES, COORDENADORES E PROPRIETÁRIOS DE

CURSOS LIVRES DE LE SOBRE AS OMISSÕES COGNITIVAS

Entrevistamos nove professores, quatro coordenadores e um proprietário

de dois cursos de inglês da nossa cidade, e elas estão transcritas no anexo B

(p.180). Os nomes dos entrevistados foram mudados para assegurá-los privacidade.

Assim, qualquer semelhança é mera coincidência. As perguntas das entrevistas e a

transcrição das mesmas estão disponíveis nos anexos, após o último capítulo, como

também outros documentos citados e que foram instruídos como apêndices ou

anexos. Os nomes dos professores foram mudados para que os mesmos se

sentissem completamente à vontade de qualquer retaliação diante das instituições,

possibilidade remota, mas no imaginário deles, não descartável. Fizemos revisão

ortográfica das transcrições, algumas feitas por mim e outras por pessoas que fazem

isso profissionalmente. O texto dos entrevistados permaneceu autêntico, contudo

adicionamos algum texto para deixar as perguntas, transcritas da oralidade, mais

claras.

Sentimos, nas entrevistas com esses sujeitos citados, uma resistência

inicial para entender a pergunta da ética sobre as pesquisas de cognição, da área

metodológica de ensino de LE e de editoração do livro didático, quando as

categorias de estratégias excluídas foram inicialmente apresentadas. A maioria dos

professores jamais pensara, nem conhecera pesquisas cognitivas com alunos dentre

aqueles que entrevistei. Foi difícil, de certa forma desconfortável para os mesmos,

admitir que elas estavam presentes em livros de teoria com crédito internacional,

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como em Chamot e O´Malley (1995). Alguns deles até já tinham senso crítico de

algumas dessas pesquisas e, pela experiência e intuitivamente, “didatizaram” suas

aulas com um olhar menos rígido em relação às estratégias de tradução e repetição,

mas nenhum deles estava isento de um sentimento de confusão em relação à

permissão ou não das mesmas em sala de aula e alguns faziam repetições tipo

drills, apenas com o enfoque e demanda de serem, exclusivamente, meaningful,

significativos. Discutimos nesse texto a relevância e “significabilidade” para

contextualizar um aprendizado, mas diferenciamos o quanto o ensino de uma LE

tem aspectos fortes de uso de memória manipulativa, a saber, a compreensão

cognitiva de regras, com posterior treino, por exemplo, de uma estrutura, na

memória mecânica manipulada na prática de LE, usando-se os drills, por exemplo.

Um dos pontos mais relevantes das entrevistas com os professores foi

quando, ao definirmos as necessidades subjetivas dos alunos no campo didático,

um(a) coordenador(a) declarou uma sentença similar a esta, em significado: “Quer

dizer, então, que agora os alunos é que vão mandar, éh?”. Refletimos essa

interpretação dela e outros comentários sobre a dificuldade de divisão de poder,

mais detalhadamente, na conclusão. Como já tinha dito, a nossa dificuldade maior

nas entrevistas nas diferentes esferas, proprietários(as), coordenadores(as),

professores e alunos foi o fato de que a exclusão da tradução e o uso de L1, por um

lado, e a repetição em leitura alta e os drills mecânicos, por outro, estão em

processo de extinção didaticamente falando. Lembramos que nossa interpretação na

seção segunda será mais referenciada nas estruturas de poder dominado do

conhecimento, sepultadas e desqualificadas, no positivismo e ausência de

complexidade na saber metodológico, desatualização geral e crítica local dos

profissionais da área de ELE, e, por tudo isso a falta de dialogicidade entre as

categorias estratégicas de cognição que o aluno afirma ter e o desabonamento

excludente dessas diante das razões ora citadas; todos esses fundamentos que

provêm da hierarquia e reprodução de conhecimento localmente, se esclarecerão ou

não ao longo das entrevistas. Trabalhamos com nossas interpretações das duas

categorias, tradução e repetição, no sistema de hierarquia acadêmica que está

acima do estudante de cursos livres de LE, esse ser aqui conceitualmente aspeado

e, no campo de LE, desqualificado ou (des)empoderado, didaticamente. Perguntas

enviesadas surgiram naturalmente, ao longo das entrevistas, ora aprofundando a

compreensão do seu tema, ora trazendo temas afins, onde poder e preconceitos

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surgem a partir de conhecimentos da área importados e acriticamente aceitos na

nossa comunidade de ensino de LE. As entrevistas estão disponíveis nos anexos

deste trabalho. Abaixo seguem os símbolos que utilizamos ao longo das

transcrições das entrevistas:

T1: Turno de fala 01 – corresponde ao momento da fala (para facilitar a identificação

das partes da entrevista);

(xxx) (00:00:00): Instante da fala que não foi compreendida. Posicionada após a

palavra ou no final do turno;

[...] Supressão de falas no texto do entrevistado ou do entrevistador;

Obs: os turnos saltados não terão um marcador específico. Apenas a numeração

saltada.

A seguir apresentamos nossas considerações finais sobre algumas

conclusões, respostas à perguntas, ratificações de respostas, confirmação de

hipótese e possíveis explicações a diversas questões levantadas ao longo deste

trabalho.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao longo desse trabalho, buscamos estabelecer um contraponto entre

algumas pesquisas de ASL e ESL, de estratégias de aprendizagem em ASL

(Chamot e O´Malley, 1995, 133-138) de um lado e de outro na área dos

“novidadorismos” metodológicos materializados em livros didáticos de inglês, os

quais, em cursos livres de língua inglesa são predominantemente importados e, no

meio desse embate, o aluno e suas estratégias, (des)empoderados. Desde algum

tempo, comecei a observar que os trabalhos de LAC tendiam para o questionamento

crítico, no sentido da pedagogia das desigualdades, das diferenças sociais, de raça

e de gênero, dentro do ensino e da aprendizagem. Na pesquisa de estratégias

cognitivas junto aos alunos, as reais formas dos mesmos aprenderem não era

consultado, sendo omitido mesmo em cursos de desenvolvimento profissional.

Minha inquietação, como já mencionada anteriormente, pairava na área

de recepção da cultura de ensino e aprendizagem anglófona no ensino de língua

inglesa e a nossa permissiva subalternidade e acriticidade em reproduzirmos a

mesma, desconsiderando as formas locais de aprendizagem. Como dito no

parágrafo anterior, esse contraponto foi meu leitmotiv, motivação, para pesquisar as

desigualdades de estilos na área de estratégias cognitivas levantadas com os

alunos. Essas estratégias mencionadas pelos alunos têm sido contrariadas por

métodos contemporâneos. A presença do aluno com suas subjetividades de

aprender uma L.E e a posição hegemônica na voz dos especialistas, ditando formas

de aprender aos cursos de LE, através de teorias de aquisição e de aprendizagem

cientificistas, “domesticam” o pessoal da área, coordenadores, proprietários e

professores, acríticos a essa importação e que não consideram os principais atores

desse processo, os alunos. Essa contradição me fez percorrer um caminho que não

poderia ser óbvio. Precisei conhecer uma cultura epistemológica mais

revolucionária, mais crítica. Comprometi-me em fazer uma “genealogia” do

micropoder dos saberes dominados, a partir da didática imposta ao ensino de língua

inglesa em cursos livres de inglês e, daí, buscar entender como esse micropoder se

operacionaliza. Fiz um movimento de leitura mais alargada, além da existente

literatura anglófona crítica da área.

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Como inúmeras vezes afirmado, Foucault foi essencial para essa

“microgenealogia” do poder desses saberes, que fiz a partir das entrevistas no

capítulo cinco; e seus conceitos de saber sepultado e saber desqualificado foram

fundamentais para desmontar e interpretar o micropoder didático sobre o aluno, na

educação de LE, em cursos livres. Confirmamos o que suspeitávamos na introdução

e esse micropoder será explanado, no final dessas considerações. O saber

sepultado dos conhecimentos anglófonos são os “novidadorismos” que se alinham e

se compatibilizam com as propostas desse saber e são reconhecidos pelo mesmo. E

tudo isso permitido por nós! Assim, utilizados como poder-saber pelos

pesquisadores e, por conseguinte, usados pela indústria editorial são finalmente

importados pelos países periféricos, criando uma cultura de ensino que contraria a

cultura de ensino local e trazendo implicações didáticas nefastas à aprendizagem.

Nesta pesquisa de campo, constatamos que o saber desqualificado – aquele das

vozes ouvidas dos “alunos”, que é corroborado por pesquisas, como a das

estratégias cognitivas de Chamot e O´Malley – continua negligenciado pelas

correntes “novofágicas”, que (des)empoderam, assim, os estudantes, nos nossos

cursos livres. Enfim, fizemos uma “microgenealogia” de como a educação em LE

exerce seus micropoderes sobre os alunos em cursos livres de língua inglesa.

Bachelard, também freqüentemente citado, alargou minha consciência

sobre a epistemologia do conhecimento na contemporaneidade e, desse autor,

essencialmente, me reporto à idéia de convivência não cumulativa do conhecimento,

isto é, o conhecimento não é linear, porque existem conhecimentos antigos

retificados e válidos, no presente, e rupturas de conhecimentos novos igualmente

válidos e importantes, para a contemporaneidade. E isso foi confirmado com as

entrevistas, isto é, a cultura de ensino de LE , infelizmente, tem sido linear.

Como lidamos com subjetividades no aprender, nossos “alunos” são e

agem de formas diferentes na sua aprendizagem; homogeneizar uma forma de

aprender ou mesmo um conjunto de princípios que atendam à diversidade de alunos

é tarefa impossível. Jamais atingiremos todos eles, a não ser se ouvirmos os

mesmos e, dentro do possível, contemplarmos suas preferências cognitivas. Essa

falta de consenso na forma de aprender dos alunos faz a atividade de ensinar

complexa; usei a definição de complexização de Morin para conviver com o ato de

aprender e de ensinar. Aliás, diferentemente do ensino e da aprendizagem de

qualquer outro conhecimento, a educação em LE tem especificidades, já discutidas

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em capítulos anteriores. Concluímos que essa complexização sugerida por Morin

está longe de acontecer. E esse texto faz essa complexização. As diferenças e as

complexidades do ato educacional. Concluímos que essa complexização do

conhecimento, conceito de Morin, está longe de acontecer, no ambiente pesquisado.

Nosso escrito, inclusive, “complexiza” essa educação de LE, isto é, discute as

diferenças e as complexidades do ato educacional na área de ELE.

O que nos trouxe Paulo Freire para essa tese foi o seu conceito de

relação dialógica, que seria a ponte entre o ensinar e o aprender. Isso só ocorre se o

professor for crítico e aberto para ouvir seus estudantes e se seu pensamento não

anula a capacidade de pensar criticamente do educando, processo que chamamos

de dialogicidade. Afinal, é com o diálogo que nos aproximamos uns dos outros.

Nosso ponto, aqui, não é só engendrar a relação dialógica para desenvolver um

pensamento crítico, diante da vida social, mas desenvolvê-la, na área didática, nos

cursos livres de língua. Dentro desse raciocínio, sentimos a falta de iniciativa na

troca de informações cognitivo-didáticas com os alunos que sabem como aprendem;

sondar sua forma de aprender nesses ambientes é um procedimento

educacionalmente viável, aliás, como vimos em diversas entrevistas com

professores e formadores de professores. Concluímos que a dialogicidade se

encontra ausente nesse ambiente de cursos livres de LI na área de necessidades

subjetivas dos alunos. Contudo, na área de necessidades objetivas, ela aparece, por

exemplo, nas escolhas de temas de aulas e para alguns procedimentos de

multimídia.

Assim, fizemos nossa base teórica para entender o poder dos

coordenadores, professores em cursos de língua inglesa de dificultarem essa

relação dialógica, na prática didática. Esses teóricos citados ajudaram na

interpretação do porquê desse micropoder do saber se estabelecer, auxiliando a

compreensão das entrevistas, quando foram ouvidas as opiniões dos professores

sobre a ética da diferença, ausente dessa exclusão e os motivos que levam os

mesmos a não usarem tais estratégias cognitivas e a não consultarem os alunos, em

relação às mesmas.

Como dissemos, escrevemos dois capítulos teóricos: o primeiro e o

terceiro. O de número um nos serviu para entender o arcabouço do micropoder dos

professores e coordenadores que (des)empodera o aluno didaticamente e, também,

para a interpretação das entrevistas sobre como esse poder do saber se constitui

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sobre o aluno, na relação didática. O de número três visou discutir teoricamente se

as categorias cognitivas de tradução e repetição ainda são validadas, localmente, na

perspectiva dos estudantes; nesse capítulo, inserimos vozes dos alunos e

professores através de pesquisas subseqüentes àquela de Chamot e O´Malley,

trazendo suas perspectivas sobre as estratégias que cada um espera em suas aulas

e incluímos alguns teóricos que defendem um currículo mais centrado no aluno. No

capítulo final concluímos que esses alunos confirmam, nessa pesquisa reproduzida

nesse trabalho, as incompatibilidades entre os procedimentos didáticos desejados

por eles e aqueles aplicados pelos professores, resultando dessas

incompatibilidades o (des)empoderamento dos primeiros.

Iremos, nesse momento, resumir as diversas conclusões que tiramos

dessas entrevistas, a partir da fala dos alunos:

- Se os alunos estiverem informados e tiverem vivenciado as estratégias de tradução

e repetição, segundo essa pesquisa, eles desejam a reinclusão de ambas;

- Certas técnicas, como ler textos em voz alta diante da sala, trazem, para os

mesmos, segurança na pronúncia, levando-os a se sentirem confiantes,

independente da irrelevância do texto;

- Os alunos não querem professores ausentes, que não os interrompam ou corrijam

quando necessário, durante as aulas, ou apenas indutores de conhecimento, mas

que esses intervenham no ato de ensinar, de forma mais espontânea;

- Os alunos confirmam que as estratégias excluídas ajudam no seu aprendizado e,

não, o contrário;

- Os alunos discordam que o uso [judicioso] da língua materna... (ATKINSON, p.

242-243, 1987) os faz desaprenderem a LE;

- Os alunos concordam que a repetição ajuda a retenção de estruturas e da

pronúncia;

- Os alunos citam adjetivos, palavras-chave e frases elogiosas sobre o uso de

repetição, na sua forma de drills: “bem produtivo... me ajuda a raciocinar e montar a

estrutura da frase... o treino com o drill me faz lembrar a estrutura como uma letra de

música”;

- Os alunos dizem que atividades de drills bilíngües que eliciam a LE, já descritos na

transcrição dos alunos, fazem os mesmos produzirem enunciados significativos,

oralmente, em LE;

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- Os alunos reclamam que a gramática é ensinada de forma frugal [possivelmente

rápida e indutivamente] e que, no entanto, a mesma é muito solicitada na prova

escrita;

- Os alunos acham que, se opinarem sobre a didática e declararem preferência por

formas de aprender variadas, independente do método a que pertençam, é criado

um ambiente de envolvimento na sua aprendizagem;

- Os alunos desconheciam as técnicas excluídas, consideradas técnicas “antigas”

pelos novidadoristas e, praticamente, extintas dos métodos contemporâneos.

Embora eles as validassem, por seu desconhecimento, precisaram ser expostos às

mesmas, para opinarem.

Diante das conclusões das entrevistas com os alunos, acima listadas,

vimos claramente que a nossa hipótese é real. Os alunos confirmam a primeira parte

dela. Eles confirmam que a tradução e a repetição são parte do seu repertório

cognitivo de aprendizagem. Portanto, a exclusão das mesmas se constitui uma

enorme contradição para a sua didática e forma de aprender, trazendo danos a sua

aprendizagem de LE. Ao mesmo tempo as pesquisas cognitivas de Chamot e

O´Malley de estratégias de aprendizagem na aquisição de segunda língua se

contradizem com muitas outras, como as de aquisição de segunda língua que

desconsideram a aprendizagem e práticas controladas, atribuindo a interlanguage

o único desenvolvimento processual natural na aquisição de LE. (RICHARDS, 1994)

e o Natural Approach, que delega a aprendizagem da língua para fora de sala de

aula e feita autonomamente pelo aluno. (KRASHEN, 1996). E ambas se contradizem

com a exclusão de estratégias cognitivas, na didática de LE, embora previstas em

Chamot e o´Malley (1995).

Resumiremos, a seguir, as diversas considerações finais que tiramos

dessas entrevistas, a partir da fala dos professores e coordenadores:

- Os professores vêem seus alunos adultos como alguns médicos vêem seus

subalternos, criando um poder sepultado, no nosso caso, sobre esses alunos e

avaliando os mesmos como desqualificados, no sentido foucaultiano;

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- Os professores temem que seu poder didático lhes seja roubado e, no seu

imaginário, ouvir e acatar as demandas cognitivas dos alunos se constitui num

movimento de oposições e, não, de descentramento;

- Os professores e coordenadores entrevistados desconheciam a pesquisa de

estratégias cognitivas de Chamot e O´Malley (1995), embora conhecessem outros

capítulos do mesmo livro, lidos em T.D.C.;

- Os professores e coordenadores entrevistados desconheciam o conceito

richteriano de necessidades subjetivas dos alunos;

- Os professores e coordenadores entrevistados desconheciam as pesquisas

comparativas de expectativas didáticas de alunos e professores;

- A maioria dos professores critica o sistema de recepção cultural dos

conhecimentos importados da área, sabem parcialmente o que ocorre nos

bastidores dos cursos, e se constituem em dois grupos: aqueles que criam uma

agenda oculta e transgridem independentes, no seu ensino, e, aqueles que acolhem,

acriticamente, a reprodução do conhecimento importado da área, para não arriscar

sua sobrevivência;

- Os coordenadores não “complexizam” (ver glossário) todo esse processo, que é,

em si, contraditório. Ser “novidadorista” ou “novofagista” lhes dá uma segurança e

eles continuam acríticos, recebendo e implementando as novidades da área. Esse

descentramento, no sentido de incluir o aluno em seus planos didáticos, é um

processo difícil, pois disso brota sempre uma ameaça.

- Os coordenadores sabem que o syllabus, conteúdo dos livros importados e sua

metodologia implícita, constitui o currículo educacional em LE;

- Os professores não têm meios para comprar livros importados por serem caros,

dependendo das coordenações para escolherem por eles o que ler;

- Os professores ainda acham que é possível se importar culturas de ensino de LE,

acriticamente, sem adequá-las, localmente;

- Os coordenadores estão, fleumaticamente, sendo, eles próprios, conformistas e

não estão passando para os professores o que suas teorias pessoais de ensino

lhes dizem;

- Alguns coordenadores entrevistados, aqui, sentem que é preciso sair do mundo

anglófono, abrindo para leituras internacionais e diálogos com outras disciplinas;

- Uma coordenadora relata um insucesso com o livro Atlas, de David Nunan, que

utiliza a didática task-based, baseada em tarefas e pequenos projetos, de base

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indutiva. Ela justifica que essa metodologia, ou melhor, essa didática importada, não

foi compatível com nossa cultura de ensino. A experiência com o mesmo teve curta

duração;

- Os professores concordam que existe uma contradição entre pesquisas cognitivas

com os alunos e a produção maciça de conhecimentos metodológicos pelos experts

da área, após terem sido expostos às nossas questões.

Vimos nas entrevistas acima com professores e coordenadores de cursos

livres que falta tirocínio aos mesmos na exclusão de estratégias cognitivas

compatíveis com estilos de alunos, na didática de suas salas de aula. E isso advém

de uma posição reproducionista de coordenadores de cursos que tomam os

conhecimentos, “novidadoristas”, majoritariamente anglófonos, como única verdade

a ser seguida, gerando uma contradição na educação de LE, com danos para os

alunos.

Compomos, a seguir, algumas conclusões sobre o caminho do

micropoder do saber nos cursos livres de LE, exercidos sobre as escolhas didáticas

dos alunos, na nossa área de ensino de LE.

Achamos que o caminho do micropoder começa pela manipulação e

indicação de textos, em cursos de treinamento e desenvolvimento de professores.

Isso criou, dentre outras deformações, como vimos com formadores de professores

nas entrevistas, uma estranha atitude contraditória: ser um formador reproducionista

dos “novidadorismos” com novos professores sendo treinados e, por outro lado,

crente em suas experiências pessoais, muitas vezes diferentes dos métodos

estabelecidos, com suas turmas, como professor; quero dizer, versátil e retificador

de técnicas excluídas. Essa cultura assim se perpetua, reproduzindo-se, a cada

novo lançamento metodológico, no ensino em cursos de LE. Afinal, o curso livre de

LE precisa apresentar-se como novo, avançado e diferente, por razões comerciais.

Seguindo na busca do caminho do micropoder, há a questão da sobrevivência

desses profissionais, que deixa muitos deles impedidos de serem críticos, quero

dizer, isso para aqueles que não são de natureza “transgressora”. Assim, a cadeia

circular reproducionista acha uma forte razão para se manter como está. O ponto de

lavagem cerebral a favor do reproducionismo é tão intenso, que, em não se aderindo

a ele, pode-se levar o título de “diferente”. Esse micropoder desse saber

reproducionista se torna, assim, perverso com aqueles que o questionam. Não

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conseguimos impor com sucesso a cultura de ensino e de aprendizagem a ninguém,

daí que compartir saberes da didática, dos estilos de cognição, democratizando-os,

resulta, possivelmente, num insucesso. Os coordenadores, dominadores de um

saber novo, que se sepulta, não se permitem sair da zona de conforto da recepção

pronta da hegemônica cultura de pesquisa, que fornece ao mercado o que eles

precisam: livros com métodos novos para seus cursos.

Continuando com essa microgenealogia do poder-saber, a estrutura

desse micropoder nos cursos livres está muito “organizada”, aparentemente; receber

e reproduzir “novidadorismos” outorga ao micropoder das coordenações e de grande

parte dos professores a acriticidade de seguir nesse conformismo. Esse é o

desenvolvimento hermético da “microgenealogia”, desse poder-saber sepultado que

não se investiga e nem se deixa ser investigado, por ser hermético com o intuito de

se perpetuar, lembrando mesmo o poder de certos acadêmicos em universidades.

Em seguida, existem outros passos dessa microgenealogia, como a

dificuldade de se agregar idéias dos elementos do poder desqualificado. Na minha

experiência, em cursos de língua inglesa, nunca vivenciei uma discussão aberta

sobre, por exemplo, a didática, com os professores, num primeiro momento e, com

alunos, num segundo. Esses poderes desqualificados são reprimidos, parcialmente,

por duas vias: novos métodos que os mesmos precisam reproduzir e os alunos que

são, até, ouvidos em algumas necessidades objetivas, pontuais e de ordem prática, ,

mas nunca em suas necessidades subjetivas, nas suas necessidades didáticas, nas

suas aulas. Um outro aspecto da formação desse micropoder sobre os alunos em

curso de LI é a existência da vaidade do poder-saber dos coordenadores, que não

dividem poder de decisão, poder do saber, vistos nas entrevistas dessa

microgenealogia.

Finalmente, gostaríamos de acrescentar que esse micropoder em cursos

de LE existe, pelo conformismo dos coordenadores, sobretudo, nos cursos locais de

LE, e, lembrando Heiddeger apud Boaventura (2007, p. 67-72), na sua crítica da

objetividade que não deve ser evidente porque afinal onde não há questionamento

não haverá pensamento e assim, no nosso caso, o inquestionável chancela a

comodidade e a certeza. Vimos ao longo desse trabalho o que denominamos aqui,

da “verdade como concordância”, vemos igualmente, nas nossas suspeitas em

entender o poder no ambiente de cursos livres o conformismo do micropoder dessas

coordenações, onde o conhecimento pensado como universal abandona o particular.

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Não podemos tomar a verdade como concordância. Ela precisa ser, sempre,

verificada. E esse conformismo universalista do “novidadorismo”, na nossa área,

raramente mescla o universal com o individual. Essa parece uma cadeia de atitudes

que forma esse micropoder entre membros e atores envolvidos na aprendizagem de

LI. Termina aqui a nossa interpretação das razões que formam esse micropoder do

saber em cursos livre de LE

Defendemos, a partir da microgenealogia dos micropoderes em cursos

livres, da interpretação das falas de professores, coordenadores e alunos e da nossa

experiência, que as duas estratégias excluídas precisam ser mais executadas e

reinseridas no ensino de LE, em ambiente de ILE, independentemente do método

que se estiver usando. A repetição e a tradução são, a nosso ver, especificidades do

ensino de LE defendidas pela maioria dos alunos adultos. Outras questões que

defendemos: essas estratégias acima são contribuições do estruturalismo e do

behaviorismo em respeito àqueles alunos que necessitam dessas formas de

aprender; os professores precisam intervir mais na aula e serem menos rígidos e

mais sensatos com um dos princípios do ensino reflexivo, que é o parco tempo de

fala dos mesmos, para deixar tempo para os alunos praticarem, com a maior

freqüência possível, entre eles. Contudo, como vimos nas pesquisas aqui

reproduzidas, muitos alunos não gostam, por exemplo, de trabalho interativo, em

pares. Esse tempo de exposição do professor, da quantidade de sua fala, em sala,

pode variar de cultura para cultura. Dentro da nossa cultura, os estudantes têm o

professor como referência; pensamos que precisa haver mais discernimento na

convivência entre a atitude local de aprendizagem e a concepção de ensino

aprendizagem “novidadorista” importada, que se quer impor. Não que muitas delas

não sejam interessantes, mas, com certeza, nunca serão universais em salas ou

grupos de alunos; nossos alunos necessitam sair de sua aula, seduzidos e

motivados para continuar seus estudos em casa e, para isso, precisa ter segurança

cognitiva ao sair da sala, isto é, entendendo o que foi apresentado; temos que

discutir esses problemas existentes dentro dos cursos livres, pois, parcialmente,

muitos dos professores entrevistados que reproduzem esse micropoder imposto pelo

método e pela instituição, tentam, mas "temem” se abrir para uma ação de soluções

dos mesmos; concluindo ainda essas observações, retomamos a coordenadora, na

entrevista que critica o syllabus do livro importado, porque ele impõe o currículo da

instituição; entretanto, ela nada faz para definir um novo currículo em cima daquele

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novo livro; precisamos ampliar mais as referências bibliográficas, para além do

mundo anglófono, descentrando-as e alternando-as com outros pensares de

instituições e autores nacionais críticos, como os citados nesse trabalho. O

descentramento ocasional da pesquisa anglófona no campo demanda uma

convivência com pensamentos do mundo não anglófono; é importante discutir o

quanto é difícil ensinar e aprender através de culturas de ensino importadas, não

que as mesmas não sejam relevantes, mas precisam ser mescladas localmente,

com a ajuda do tirocínio dos professores.

A resposta a uma importante pergunta que é o título desse trabalho, isto

é, como absorvemos acriticamente o conhecimento contraditório do nosso campo, a

exemplo de pesquisas confirmando as categorias de estratégias cognitivas, tradução

e repetição, usadas pelos alunos, mas excluídas na didática por um modismo

metodológico homogeneizante, possivelmente poderá ser interpretada e respondida

se analisarmos as razões da imposição de escolhas universais de formas de ensinar

e aprender, como por exemplo, se aprender, unicamente, por descoberta,

indutivamente, ou cooptando alguma novidade trazida por meio de um pacote

metodológico mais “atual”.

Ratificamos, aqui, que esse trabalho não é para avaliar metodologias e

procedimentos de ensino; todos eles apresentam importantes facetas que revelam

formas através das quais os estudantes aprendem. Esse trabalho sugere retificar

procedimentos de diversos métodos anteriores e colocá-los à prova dos estudantes,

amenizando a fragmentação intermetodológica tão presente na nossa área.

Antes de partir para a síntese de minhas conclusões, preciso comentar

dois fatos que me deixaram seguro quanto a onde queria chegar com esse trabalho.

O primeiro foi o último comentário da última coordenadora, nas conclusões

abstraídas acima, das entrevistas. Ela me reportou a um livro texto usado pela

instituição, sem análise anterior ao uso local do mesmo, chamado Atlas,

anteriormente descrito, metodologicamente e que se incompatibilizou com a forma

de aprender dos alunos e de ensinar dos professores, localmente. E isso justifica

toda nossa crítica sobre essa importação acrítica, para nossa realidade, de

conceitos, didática, enfim, “novidadorismos”, discutida ao longo desse texto. O outro

fato foi a frase que caracteriza o que aqui denominamos “idealização do

novidadorismo”. Um coordenador nos questionou se a novidade de se empoderar o

estudante didaticamente, de se incluir o mesmo na didática da sua aula (na

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realidade são idéias pré-existentes a esse texto, apenas relidas, criticamente, aqui).

se isso seria algo tipo, “agora é a vez do aluno mandar”, isto é, se esse

“novidadorismo” do currículo baseado no estudante, informação nova para o mesmo,

seria uma tomada do poder-saber do aluno em relação ao planejamento didático da

aula, do professor, posição extremista, logo esclarecida por nós, durante essa

entrevista.

Essas são as minhas observações sobre o que pesquisei nas entrevistas

e sobre o que comento, a partir da minha experiência, sobretudo. A seguir, saindo

dessa pequena narrativa de luta contra esse micropoder didático, faço as minhas

conclusões pessoais sobre, essa caminhada.

Diante do sentimento de alienação local dos professores, dos

coordenadores e do nosso campo de conhecimento, no qual existem inúmeras

pesquisas e interesses se contradizendo, em detrimento da participação do aluno,

nossa luta foi discutir essa contradição, nessa tese, do ponto de vista ético. Não está

existindo ética ao se desconsiderar o aluno, em diversas pesquisas discutidas aqui.

Estamos acumulando conhecimentos sem refleti-los, no nosso campo. Enquanto

não agirmos mais eticamente, convivendo com as diferenças, discutindo

criticamente toda essa oposição irrefletida de conhecimentos importados, o que ele

significa para nós, em nossa realidade e como podemos compatibilizá-lo com a

nossa cultura, estaremos prejudicando, com esse ensino exógeno, a qualidade de

nosso ensino e de seus resultados. Essa luta é contra um poder hegemônico que se

impõe, embora, do nosso lado, a nossa cultura atávica local tenha sua chancela

nesse processo de recepção, porque recebe e digere o conhecimento importado,

pronto.

Gostaríamos de mencionar a importância dos diálogos com os

profissionais da área, que foram bastante instigantes. Saímos desse trabalho com

nossas suspeitas confirmadas, um micropoder revelado, conclusões práticas do

olhar de alunos e professor e, conseqüentemente, com as sugestões vindas dessas

conclusões.

Nada temos contra as novidades dos conhecimentos anglófonos ou

contra quaisquer conhecimentos vindos de qualquer outra geografia, embora todos e

qualquer conhecimento tenham seus limites; mas, com certeza, contra aqueles que,

por uma visão cumulativa e linear do conhecimento, destroem o conhecimento

antigo validado, sem retificá-lo.

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Esse micropoder imposto e aqui interpretado precisa ser revisto. A luta

que propomos é contra a institucionalização do saber sepultado, isto é, contra

qualquer tipo de poder que sepulta saberes. Nessa tese, a luta contra um

micropoder que os especialistas criam em torno dos métodos, os atores dos cursos

livres chancelam, isto é, os especialistas exercendo o mesmo, em cima das

coordenações, essas sobre os professores, silenciando a possibilidade de

empoderar o poder do saber desqualificado do aluno nas pesquisas da área, e, por

conseguinte, na didática do dia a dia. Esse micropoder dessas entidades que

precisa de uma ética de respeito às diferenças e aos alunos; esse micropoder que

idealiza um aluno sem tirocínio e o (des)empodera pela resistência a negociar com

o mesmo.

Finalizando, se não há respeito à ética da diferença, respeito com a fala

diferenciada do aluno, o distanciamento cognitivo em sala de aula, a evasão

recorrente em cursos livres será inevitável. E sabe-se que muitos cursos de LE

locais passam por dificuldades financeiras; que a competição aumentou pouco e a

população ativa cresceu. Certamente, isso tudo discutido aqui será mais um fator

para essa evasão em progresso nos cursos livres, inferida a partir de algumas

entrevistas sintetizadas nessas últimas páginas.

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GLOSSÁRIO

Aético – acepção usada para designar tudo aquilo mencionado no texto, que desrespeita a ética da diferença, conceito de Pennycook, abaixo explicado. Complexidade - conceito concebido por Edgard Morin nas suas reflexões sobre epistemologia, que é o desafio e motivação para pensar alargadamente e que deve ser um substituto para a simplificação, a busca de colocar as obscuridades do conhecimento, em perspectiva. Aqui criou-se a forma verbal “complexizar” a aprtir desse comceito acima.

Empoderar – Permitir ou atribuir poder a alguém; ou ainda, permitir seu agenciamento. Antônimo, neologismo: (des)empoderar. Ética da diferença – Conceito de Alastair Pennycook que reflete, a princípio, sobre a ética e o engajamento tendencioso na área de tradução. O autor expande esse conceito para outros domínios da Lingüística Aplicada Crítica. Esse conceito propõe uma reforma daquelas identidades culturais que ocupam posições de autoridade na cultura doméstica, local. Ele enfoca com esse conceito as formas de poder buscando-as, na política da língua, o respeito da diferença, cuja ética precisa desenvolver um elemento transformador, que lute para reformar identidades culturais. Falseabilidade – (original Falsifiability, tradução nossa) Conceito do filósofo da ciência, Karl Popper. Seria a descrença no positivismo, sem ceticismo. A falseabilidade implica em não tomar qualquer conhecimento como conclusivo, admitindo que o empírico pode ser atualizado através de observações vindouras, que podem tornar o conhecimento anterior refutado ou falso. Também conhecido como falsificacionismo. Fragmentação intermetodológica – Termo usado, nesse trabalho, para marcar como a linearidade dos conhecimentos metodológicos impede uma retificação e manutenção de alguns conhecimentos anteriores e consistentes na área de ASL e ESL. Em outras palavras, os micropoderes do saber não fazem com que os métodos dialoguem entre si em benefício do aluno. Técnicas de métodos antigos, por exemplo, não são aproveitadas e reintegradas, eventualmente, em métodos mais contemporâneos. In-service – Oficinas de atualização metodológica, no início ou ao longo do semestre Materialismo racional – O racionalismo explicando a matéria, os elementos, os corpuses subatômicos, inexplicáveis empiricamente, torna-se uma ficção não demonstrável, mas existente. Meaningful (use) – diz-se do uso da língua, na fase de produção e em outras práticas, que devem ser sempre relevantes, significativos para a realidade em volta do aluno. Ela faz oposição ao rote learning, que é a aprendizagem mecânica.

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Micropoder – Segundo Foucault, o poder não é exclusivamente aquele poder maior representado pelo estado. Os micropoderes estão entre nós, amigos, irmãos colegas, família, religião etc. Necessidades objetivas de alunos adultos – Como concebidas por Richterich e colocadas em prática no projeto australiano de Brindley e Bagshaw, seriam as análises de aprendizagem relacionadas ao dia a dia, aos conteúdos temáticos consultados com os alunos. Necessidades subjetivas de alunos adultos – Como concebidas por Richterich e colocadas em prática no projeto australiano de Brindley e Bagshaw, seriam aquelas necessidades não gerais, subjetivas, dependentes de eventos e de circunstâncias não previsíveis e do ser humano. Brindley e Bagshaw usaram-na no sentido didático, isto é, a consulta feita ao aluno sobre suas demandas didáticas subjetivas. Noumeno – A revolução epistemológica trazida pela microfísica conduz a substituir a Fenomenologia por uma Noumenologia. Assim, o noumeno é uma não coisa que existe. Ele se refere às partículas subatômicas, incomprováveis empiricamente, que podem ser uma onda ou um corpúsculo, ambos existentes, mas que tornaram-se, até hoje, um objeto explicado pelo pensamento, incomprovável empiricamente, mas que existe.

Novofagismo – Termo cunhado e usado, nesse trabalho, para designar a aceitação e uso voraz de tudo aquilo que é novo na área de ESL ou ASL, localmente: metodologias, didáticas, teorias de aprendizagem ou teorias lingüísticas. Devora-se novas informações, excluindo-se e não retificando informações anteriores, importantes, que passam a ser tomadas como “antigas”, “ultrapassadas”. Assim, sem considerar as novidades com um olhar crítico e sem considerar a cultura de ensino e aprendizagem locais, o conhecimento anterior não é integrado a métodos atuais. Novofagista - Relativo ou sobre o “novofagismo”, conceito cunhado por nós nesse trabalho, acima mencionado nesse glossário. Novidadorismo – Termo cunhado e usado, nesse trabalho, que tem a mesma acepção de novofagismo. Novidadorista – Relativo ou sobre o “novidadorismo”, conceito cunhado por nós, nesse trabalho. Pesquisas de estratégias cognitivas – Pesquisas executadas por alguns autores para escutar as estratégias de estudar e aprender de alunos na área de LE. Utilizamos os estudos de Chamot e O‟Malley. (existem também estratégias afetivas, sociais e metacognitivas). Pedagogia epistemológica – O ensino da ciência de disciplinas de metodologia e de pesquisas científicas que reproduzem o modelo clássico das ciências, sem considerar as abordagens de conhecimentos das ciências humanas e seus procedimentos.

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Poder-saber – Conceito composto aqui, significando o poder do saber dominado, sobre o desqualificado, ou sobre qualquer área específica. Pre-service – Cursos rápidos de professores, antes do inicio de cada semestre, que não passaram por um curso regular de formação e que pela demanda institucional de profissionais, são treinados brevemente. Racionalismo aplicado – (ver Materialismo racional) Relação dialógica – Aqui também chamada dialogicidade, é a ponte entre o aprender e o ensinar e só ocorre quando o pensamento crítico do professor não anula a capacidade de pensar criticamente do educando. Ruptura do conhecimento – Definição de Bachelard que afirma e exemplifica com a microfísica, que o conhecimento não é cumulativo, mas uma alternância de mudanças, rupturas e de retificações, manutenção de conhecimentos predecessores. Saberes dominados – Conceitos de Foucault, os saberes dominados são entendidos como duas coisas: o saber dominado, conhecimentos eruditos, sepultados e mantidos convenientemente pelo exercício de um micropoder de uma classe e o saber não-qualificado, desqualificado, saberes considerados não competentes, hierarquicamente “inferiores”, considerados abaixo da demanda do conhecimento científico e assim sepultados pelos primeiros. Esse é um dos exemplos e como os micropoderes são formados no dia a dia.

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APÊNDICES

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APÊNDICE A – ROTEIRO DE ENTREVISTAS PARA OS PROFESSORES E COORDENADORES

UFBA – Programa de Pós-graduação em Letras: Literatura e Lingüística Orientador: Professor Dr. Luciano Lima Orientando: Professor Robélio G. dos S. Caria Filho

Roteiro básico de entrevistas para os professores e coordenadores:

1 O que você pensa das seguintes estratégias: Tradução e Repetição? Você usa as mesmas em sala?

2 Gostaria da(s) sua(s) definição(ões) para a Needs Analysis. 3 Segundo Richterich (1980, p. 32, tradução nossa) escrevendo sobre

Needs Analysis, análise das necessidades dos “alunos”, existe dois tipos da conhecida Needs Analysis: a objetiva, ou seja, é, a participação do aluno na escolha do conteúdo, opinando assim o que ele mais precisa na língua estrangeira; e a subjetiva, da didática, i.é., a participação do aluno na didática, mostrando suas preferências de aprender, seus hábitos e opiniões sobre técnicas e procedimentos mais ajustados ao seu processo cognitivo. Como você vê isso enquanto educador (a)?

4 Como ela se processa institucionalmente? E com você? 5 É corrente entre nós, professores de inglês em cursos livres, entendermos

Needs Analysis como sondar o conteúdo do aluno e sua performance, desempenho. Você pensa assim?

6 Segundo esses dois tipos de Needs Analysis acima citados, você acha que há “engessamento” do professor e alunos na participação curricular da ____________?

7 Como você vê o ensino de língua inglesa hoje? Ela ainda reflete e passa a cultura e ideologia dominante dos países centrais, Estados Unidos e Inglaterra, sobretudo, dos principais pesquisadores de Aquisição de segunda língua, de Métodos de aprendizagem, publicadores de livros didáticos de língua inglesa, para países periféricos como o Brasil?

8 Há adaptações da coordenação localmente do syllabus do livro importado? Se há, isto é feito com anuência da direção ou superintendência, ou a coordenação tem autonomia?

9 Novas pesquisas, novos métodos, novas culturas de ensinar e de aprender. Pesquisas de aquisição de L2, por um lado e, por outro, ensino e aprendizagem de L2. Metodologias importadas, livros importados. Você acha que somos repetidores acríticos dessa importação de conhecimento? É possível modificar a cultura de aprender de nossos alunos, a partir dessas inovações vindas dos países centrais?

10 A implementação do currículo em cursos de língua particulares, territorialmente em Salvador, são de cima para baixo? Concorda com essa visão?

11 Qual sua opinião sobre Learner Autonomy? Podemos importar culturas de aprendizagem sem colocar um crivo local nas mesmas?

12 Ao preparar sua aula de língua (estrutura), por exemplo, que estratégias cognitivas você leva em consideração? Aquelas que estão de acordo com

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o método do momento que você está utilizando ou você conhece e usa essas estratégias em negrito, pesquisadas dos alunos por O´Malley e Chamot, no livro, Estratégias de Aprendizagem na aquisição de Segunda Língua, que lhe passo agora?

13 Neste quadro que lhe entrego nesse momento, com estratégias cognitivas retiradas de uma pesquisa de ELE, americanos aprendendo língua estrangeira nos Estados Unidos, situação similar a nossa, brasileiros aprendendo inglês, que lista estratégias que os alunos escolheram e usam, você incluiria as mesmas no planejamento de suas aulas? Por que sim e por que não?

14 Você conhecia essa pesquisa de estratégias cognitivas, nesse quadro? 15 Passo, a seguir, pesquisas comparadas entre expectativas de alunos e

professores sobre procedimentos e técnicas didática, do ponto de vista do professor, e são estratégias do ponto de vista do aluno. O que você acha delas?

16 Você acha ético desconsiderar as diversas pesquisas sobre preferências cognitivas dos alunos, que são descartadas pelos lançamentos de teorias ou métodos pelos especialistas?

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APÊNDICE B – ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA ALUNOS

UFBA – Programa de Pós-graduação em Letras: Literatura e Lingüística Orientador: Professor Dr. Luciano Lima Orientando: Professor Robélio G. dos S. Caria Filho

Roteiro básico de entrevista para alunos:

1. O que você acha do uso de L1 em certos momentos da aula? Digamos, nos seguintes momentos: a. assunto que não existe na sua língua; b. problemas de expressão coletiva entre alunos, onde o professor pode intervir perguntando como se diz aquela sentença problemática para todos; c. para algum vocabulário que está tomando muito tempo da aula para ser compreendido? Esse uso eventual ajuda na sua aprendizagem, te faz desaprender o que já foi aprendido até esse momento? Se sim ou não, por quê?

2. Quando algum ponto gramatical lhe é apresentado, o que você pensa de

algum treino com exercício de repetição para ganhar automaticidade? O que você acha de ler alto algum texto da unidade ou fazer repetição alta do mesmo, para checar ou reforçar a sua pronúncia? Esses dois exemplos ajudam na sua aprendizagem? Em sendo positiva ou negativa a resposta, por quê?

3. Você é consultado sobre a forma que você prefere aprender? Se negativo, você acha que, caso você expusesse as suas estratégias preferidas de aprender, negociando as mesmas com os professores no planejamento de suas aulas, isso te envolveria mais na sua aprendizagem? Você gostaria de ter sua voz, na área didática, ouvida?

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ANEXOS

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ANEXO A- ENTREVISTAS TRANSCRITAS COM ALUNOS DE ILE

ENTREVISTA I – ALUNOS: LIDIANE, THAÍS, SOLANGE, ILZA, ADILSON, QUITA

E MARCELO. LIVRO III

T1- ENTREVISTADOR: A primeira pergunta é o que vocês acham do uso de L1, língua1, Português, em determinados momentos da aula, tais como: digamos, nos seguintes momentos: a) Assuntos de estrutura que não existem na sua língua, por exemplo, o Present Perfect Tense que nós vamos ver mais adiante, nessa lição aqui, na dezesseis. b) E problema de vocabulário, de expressão em LE, coletivamente, de expressão coletiva entre alunos onde o professor pode intervir perguntando como se diz aquela seqüência problemática para todos. Por exemplo, vocês não sabem como se diz “quanto mais”. “Eu não tenho isso, quanto mais aquilo”. Se eu entendo que todo mundo tem esse problema com “quanto mais”, eu posso perguntar: “How do you say quanto mais in English?” dentro de um contexto? Se alguém soubesse diria ou então se não soubesse eu forneceria let alone. É outra situação onde a L.M. entraria, eliciando problemas léxicos grupais. Eu perguntaria como se diz essa seqüência, tal e tal, em inglês. Esse uso eventual ajuda na aprendizagem de vocês ou prejudica o que já foi aprendido, o que já adquiriram de compreensão e uso da língua? Usar essas situações ou outras situações, eventualmente, significa desaprender a língua dois, LE, no nosso caso, o inglês? Essa é a idéia. Vamos organizar aqui para que falem, um de cada vez. Então, Lidiane, pode começar. T2- ENTREVISTADO: Eventualmente, não. Eu acho que algumas vezes é preciso que se fale Português, porque em alguns casos a gente não consegue compreender o que está falando em inglês, portanto em alguns casos a gente precisa falar, agora eu também acho que falando em inglês e gesticulando, deitando no chão, fazendo essas coisas, assim a gente consegue compreender inglês por mais que fique um pouco difícil a gente vai [...] (00:02:45)

Conforme o citado, a entrevistada precisa da L1 para entender o assunto;

seria o caso de verificação de compreensão. Atinkson (1987, p. 243-246, tradução

nossa) cita nove diferentes usos “judiciosos” da L1 em sala. Acho que ele não

poderia prever todas as demandas e por isso dependeria do tirocínio do docente e

da solicitação dos alunos. Mas confirmamos a estratégia de tradução, que consta na

pesquisa de ASL, de Chamot e O Malley (1995, p. 138-150, tradução nossa), com a

resposta da aluna.

T3- ENTREVISTADOR: Quita, por favor.

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T4- ENTREVISTADO: Eu acho muito importante principalmente quando a gente fala... T5- ENTREVISTADOR: Você acha que se desaprende a LE? T6- ENTREVISTADO: De forma alguma, isso só enriquece o nosso aprendizado, o desenvolvimento de nosso aprendizado. T7- ENTREVISTADOR: Por que enriquece? T8- ENTREVISTADO: Porque quando nós entendemos a expressão em inglês então a gente vai ter a oportunidade de entender usando a L1, no caso, a língua portuguesa. Então a gente vai aprender melhor a língua inglesa a partir daí. T9- ENTREVISTADOR: E no uso de estrutura, por exemplo, o presente perfeito, vocês não tendo uma pré-noção dela em Português, vocês acham que ela deve ser dada de forma comparada? De forma contrastada? Explicando com os correspondentes tempos verbais em Português da L1, comparados com a LE? T10- ENTREVISTADO: Eu acho que... Para que o aluno venha a entender o novo (xxx) (00:04:07) em inglês o aprendizado. Nós que estamos aprendendo inglês estamos num processo de alfabetização, melhor, nós quando estudamos a língua inglesa estamos num processo de “autoletramento”. T11- ENTREVISTADOR: Letramento, não é? No letramento. T12- ENTREVISTADO: É, letramento. Então nós temos que associar com a língua que nós conhecemos que é a nossa língua. [...] T13- ENTREVISTADO: O que a gente não conhece. Assim eu tô falando por mim. Vai falar, falar, falar e pra mim (xxx), a gente não vai entender nada daquilo ali (00:04:53) T14- ENTREVISTADOR: Certo, mas você tem que saber que você fala, fala, fala inglês, embora você não saiba tudo, também entende. Então nem todas as situações que são explicadas em inglês são entendidas; algumas não são entendidas e outras sim, é claro.... T17- ENTREVISTADO: Mas é o ultimo caso que você colocou. A gente estudar algo que não tem na língua portuguesa.

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Nesse trecho transcrito, vimos uma necessidade de inclusão do uso da L1

e da tradução, portanto, eliciar aspectos de tempos verbais e outros, inexistentes na

L1 em outras situações. Os estudantes defendem o uso adequado da L1 e

confirmam a necessidade de transitar da L1 para a L2, processualmente. Isso

confirma as pesquisas de Chamot e O´Malley (1995, p. 138-139, tradução nossa),

nas quais a tradução é declarada pelos alunos de ILE como uma estratégia usada

pelos mesmos. Lembremos que toda estratégia também é uma técnica de ensino e,

portanto, deve estar no planejamento didático, quando necessário. Reclamamos a

ética da diferença nesse desrespeito com essa pesquisa de estratégias de cognição,

diferença de formas de aprender dos estudantes; e como ela contraria e descumpre

a prática didática demandado pelos alunos. Lembramos que eliciar a produção de

LE, o que eu intuitivamente já fazia, é o primeiro uso recomendado por Atkinson

(1987, p. 243-246, tradução nossa).

T26- ENTREVISTADO: Eu acredito que se não houver uma ligação, uma comparação com a L1 a gente não vai conseguir aprender, absorver. T27- ENTREVISTADOR: Não pode ser radical. Você está querendo dizer. T28- ENTREVISTADO: Não. Não pode. Eu só consigo aprender inglês acompanhando em Português. T32- ENTREVISTADO: Eu acho que o uso do Português é importante principalmente naquelas partes que vai explicar alguns agentes. Uma palavra abstrata fica difícil pra gente conseguir entender. Às vezes a gente entende o que o contexto quis dizer, mas algumas palavras elas se tornam importantes, que não tem como ensinar em inglês então a gente precisa ter o conhecimento daquela palavra ali. Como você faz aqui, você instiga pra que a gente fale inglês o tempo todo. Pra que a gente entenda inglês. Mas eu acho que em alguns momentos é muito importante a gente falar Português. T33- ENTREVISTADOR: Para quê? T34- ENTREVISTADO: Para que a gente possa compreender T35- ENTREVISTADOR: Esclarecer?

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T36- ENTREVISTADO: Isso, sair sem dúvida nenhuma. Eu particularmente fico sem dúvida nenhuma. Quando, por exemplo, a gente pede para você explicar em Português, quando você tenta de todas as maneiras em inglês explicar a gente não entende aí a única saída é dar pelo menos uma palavra... Às vezes uma palavra numa frase e a gente consegue entender tudo, o contexto todo. Eu quando cheguei em casa não entendi um diálogo completo por causa de uma palavra só.

A expressão “sair sem dúvida” marca uma demanda cognitiva que pode

ocorrer com iniciantes adultos, necessitando o uso da L1 em sala de aula, para

oferecer, maior segurança e diminuir o seu temor, diante de ambigüidades

cognitivas. Assim eles poderão se sentir com filtro afetivo baixo, inibidos, por

exemplo, e, possivelmente, produzir LE com mais tranqüilidade. O motivo principal

desse uso eventual de L1 é a necessidade de alunos adultos entenderem o assunto,

bem antes de estudarem em casa. Contudo, se não houver um bom rapport,

relação, entre professor e alunos, sem constante feedback, opinião, sobre assuntos

praticados e dialogicidade na didática, um ambiente de confiança, então o processo

sairá fragmentado. Certamente, essa convivência intermetodológica, demanda dos

professores um equilíbrio entre as suas convicções pessoais e a realidade de como

os alunos aprendem; certamente essa postura profissional seja mais importante do

que a eleição do melhor método (CARIA FILHO, 1999, p. 91).

T38- ENTREVISTADO: E assim, em relação à repetição, eu penso que ajuda também muito porque se a gente repete a gente se familiariza com as palavras e as frases que estão ali. T39- ENTREVISTADOR: Aí é a próxima pergunta, que você antecipa sobre repetição. Adilson. T40- ENTREVISTADO: Eu sou meio suspeito [...]. Primeiro digamos você bate, ou seja, você fica insistindo no inglês, ou seja, aí bota a gente pra bater cabeça aí bota a gente pra pensar: “O que é que ele tá querendo dizer?” Aí você fica tome-lhe inglês, inglês aí fica todo mundo com a cabeça queimando, aí depois certo, você vai e pergunta o que nós entendemos de sua fala pra gente. Você gesticula, (xxx) (00:11:47) você primeiro joga, joga no vento, aí a gente vai tentando, botar a máquina pra pensar, né? T41- ENTREVISTADOR: Você desaprende com o uso eventual de L1?

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T42- ENTREVISTADO: Desaprender, não. T43- ENTREVISTADO: É muito interessante porque muitas vezes a gente... quando a gente éee tem a certeza que muita coisa que a gente achava era aquilo mesmo então (xxx) você joga o inglês primeiro, [...] na aula de inglês, aí depois quando todo mundo está meio inseguro, será que dá prá a gente aqui começar a conversar um com o outro, aí você às vezes vai e traduz. É isso, é aquilo e pronto. Devagarzinho, você joga. Até na tradução você tá jogando um pouquinho do inglês, um pouquinho do Português. Eu acho essencial. (00:12:09) T44- ENTREVISTADOR: Você acha que a tradução é uma técnica que, eventualmente, ajuda? T45- ENTREVISTADO: Agora, você não dá uma tradução também de “mão beijada”. Cê dá uma tradução também no jogo (xxx) (00:12:50). T45b- ENTREVISTADOR: Explique isso. T46- ENTREVISTADO: Primeiro... só quando a gente não consegue, né? T47- ENTREVISTADO: A questão da imagem né? Que a gente facilita (xxx) então você faz mímica. (00:13:02) T48- ENTREVISTADOR: Você estuda em casa em que língua? T49- ENTREVISTADO: Eu estudo traduzindo. T50- ENTREVISTADOR: Umas observações que você queira fazer, você faz em que língua? T51- ENTREVISTADO: Eu faço em Português. T52- ENTREVISTADO: Eu também. T53- ENTREVISTADO: Quando eu tenho algum questionamento eu já vou lendo em Português eu leio em inglês, mas o que eu vou falar em voz alta já vai saindo em Português. T54- ENTREVISTADOR:

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Mas isso aí viciou você a não falar inglês? T55- ENTREVISTADO: Isso o quê? T56- ENTREVISTADOR: Nessa atividade oral de hoje vocês falaram inglês. Então o Português, usado parcialmente na explicação, faz com que vocês na parte oral fiquem embaraçados ou tímidos? T57- ENTREVISTADO: Não. T58- ENTREVISTADO: Não porque a gente vai falar daquilo com convicção daquilo. Que a gente tá falando inglês entendendo o que a gente tá falando. T59- ENTREVISTADOR: Taís quer falar alguma coisa? T60- ENTREVISTADO: (xxx)... Com relação à atividade de hoje, assim, (xxx) a gente quer falar uma coisa não, momentâneo assim, você quer falar uma coisa, assim, que eu não sei... (00:14:00) T61- ENTREVISTADOR: E é natural que você não saiba tudo. T62- ENTREVISTADO: (xxx). Quando eu quero falar uma coisa que eu não sei. (00:14:20) T63- ENTREVISTADOR: Nesse caso eu estou ali e vocês podem me perguntar. How do you say ______________ in English? Ou então, ao colega: How do you say __________ (tarará).... in English? (14:00:33). T64- ENTREVISTADOR: Mas eu falo assim, essas intervenções em L1, elas fazem vocês falarem menos na LE, falarem menos com mais segurança, ou com menos segurança? T65- ENTREVISTADO: Eu me sinto incentivada a falar inglês porque eu estou mais segura, porque com uma palavra eu me sinto mais segura para formar uma frase completa. T66- ENTREVISTADOR: (xxx)... (00:15:14) T67- ENTREVISTADO: Eu posso me intimidar pra formar uma frase sem conhecer somente uma palavra aí eu fico tímida.

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Nesse trecho, vimos mais uma vez o quanto o aluno de ILE deseja sair da

sala de aula, entendendo bem o léxico e a sintaxe, apresentados na aula. Penso que

é uma demanda do teacher centredness, o centramento e a intervenção do

professor na aula, provavelmente, para amarrar o que foi praticado, controlada,

interacional e livremente entre pares ou grupos de alunos. Não podemos destituir o

saber do professor como sendo, obviamente, o único e nem idealizar que esses

alunos, autonomamente, irão induzir os assuntos de forma correta. Usar apenas a

língua meta pode incorrer nesse erro: o aluno sair entendendo a aula erradamente.

A idéia do ensino reflexivo, onde princípios de gerenciamento e pesquisa-ação

norteiam a atividade do professor, pode trazer insatisfação cognitiva ao aluno porque

seus princípios são racionalistas, desconsiderando culturas de aprendizagem

diferenciadas e relações de língua e poder. Isso pode “robotizar” alguns professores

mais conformistas, fazendo com que o professor reflexivo nunca questione além dos

princípios impostos pelo ensino reflexivo, de um ensino que se identifique com

aprendizagem de LE como um fenômeno e problema sociais. O T.T.T., Teacher´s

Talking Time, tempo de fala do professor, (GOWER, 1995, p. 33) acima

questionado, pode ser um exemplo desse fechamento. A exemplo de Derrida, (2006,

p. 43-62) e a sua idéia de Pharmakon, droga, remédio ou veneno, vemos o ensino

reflexivo não apenas como remédio. Pensamos na importância do ensino reflexivo

em convivência com uma visão mais alargada de ensino, onde os problemas sociais

da aprendizagem de uma LE sejam, igualmente, questionados. Localmente, a

diminuição do tempo de fala do professor, segundo as entrevistas nesse trabalho de

campo, parece não ser um desejo de nossos estudantes. Mais uma vez é preciso

poder questionar conceitos “novofagistas”, que embora sejam interessantes, não

podem ser universalizados no ensino de ILE. A forma de aprender, localmente,

poderá não ser compatível com, por exemplo, esse conceito essencializado em

alguns ambientes de ensino.

Também sentimos na fala dos entrevistados a necessidade de se

sentirem seguros antes de produzir algo na L2, o que vem de encontro a Krashen

(1996) no seu conceito de late production, ou seja, o estudante só produziria quando

se sentisse pleno de input, de ter ouvido, aprendido e armazenado a LE. Um desses

estudantes literalmente diz no turno 67, acima: “Eu posso me intimidar pra formar

uma frase sem conhecer somente uma palavra aí eu fico tímida”. Questionamos com

isso sobre essa certeza que os estudantes citam ser necessária para produzirem e

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pensamos que fatores como a repetição e a compreensão substituiriam a espera

para o aluno se sentir seguro e pleno do saber em questão, para então poderem

começar a produzir, tal como sugerido em Krashen, citado em Richards e Rodgers,

(2008, p.179-183, tradução nossa).

A idéia mais interessante que derivamos desses depoimentos é que o uso

da língua meta é essencial, mas o uso contínuo e pouco freqüente de L1 não faz o

aluno desaprender o que ele já adquiriu de compreensão da LE; e traz para o

mesmo mais segurança para falar na LE. Isso difere do senso comum entre os

professores de LE, que dizem... “os alunos, eles não podem ficar traduzindo, porque

senão eles não aprenderão a LE pelo vício de traduzir”. Concluímos que, com o

próprio tempo de exposição à L2 e ao longo dos semestres, o uso da L1 diminua em

sala e, conseqüentemente, aumente a sua exposição, compreensão e

independência do aluno de LE. Mas temos que discriminar que os níveis de

aprendizagem em ensino de LE fazem a grande diferença na forma de ensiná-los,

quando incluímos a L1.

T70- ENTREVISTADOR: Ok. Aí vem a questão da automaticidade (BROWN, 1994, p.16, tradução nossa). Quando algum ponto gramatical lhe é apresentado, o que você pensa sobre exercícios de repetição para ganhar automaticidade? Automaticidade não é decorar, mas é incorporar um hábito daquela estrutura [...]. É uma coisa bem mecânica. E também: o que você acha de ler alto, por exemplo, um texto da unidade ou, fazer repetição alta de uma leitura, sugerida pelo professor ou por vocês mesmos, para checar [...] sua pronúncia? T71- ENTREVISTADO: (xxx)... que ajuda bastante. A ver quando a gente bate, repete, aquela frase, que a gente começa a repetir, a frase a gente não (xxx)... Com a mente, porque eu começo a identificar que eu não sei a frase e aí eu... (00:17:49) (00:17:56) T72- ENTREVISTADOR: Entender o quê? A seqüência da frase? Pra entender a pergunta, aquele exercício mecânico, “me pergunte se”. Então eu pergunto como se pergunta: “Eu deveria beber mais?”. E vocês transformam para a interrogativa: “Você deveria beber mais?”, colocando o verbo na frente. [...] Então você está dizendo pra mim, que para você não é chato. (00:18:12 ) T73- ENTREVISTADO: Não. Pra mim não é chato. T74- ENTREVISTADOR: Reforça a sua aprendizagem?

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T75- ENTREVISTADO: E eu consigo aprender com a repetição. T76- ENTREVISTADOR: [...] E por que ajuda? (00:18:40) [...] T77- ENTREVISTADO: (xxx)... então, eu começo a repetir aquilo e então eu aprendo mesmo. Quando eu fico repetindo, eu consigo absorver mais rápido (00:18:44) T78- ENTREVISTADOR: Você consegue absorver? T79- ENTREVISTADO: É melhor do que ficar dentro de um contexto [significante] que eu tenho grande dificuldade, porque se eu me pegar com uma palavra num contexto, que eu não consigo interpretar, pra mim todo o texto foi perdido. Eu não saio dali.

Mais uma vez sentimos que o aluno adulto, aprendendo uma LE, precisa

fixar o que ele irá produzir e que a necessidade de memória e automatização, como

já interpretado anteriormente, essa fixação é essencial para os mesmos. O aluno

adulto evita, teme errar, portanto ele precisa aumentar a certeza e a convicção da

pronúncia, sintaxe etc. Assim, diminui a inibição diante do grupo, diante de seus

colegas. Por isso, se ele produzir sem, a princípio, treinar mecanicamente com

repetição, o nível de inibição aumentará quando tiver de produzir livremente, assim

como baixa auto-estima e a frustração.

Não aprendemos sem memória, sobretudo considerando o perfil de um

aluno adulto: ocupado, auto-exigente de desempenho e, na nossa cultura

educacional, mais exposto, no aprendizado ILE, às influências internas e externas,

tal como vimos na problematização, aqueles fatores de ordem biológica, psicológica,

lingüística e social. Parece-nos, aqui, que a quantidade de uso de uma técnica não é

discernida pelos professores, é julgada segundo um uso antigo. No caso da

repetição, esta era usada à exaustão no Audiolingual e, por isso, não se diferenciava

de como técnica usada pelo aluno e de como ela é vista pelo professor. Assim, este

equívoco dessa técnica é estar presa ao Audiolingual na perspectiva do seu uso

intenso no passado, uma superdosagem, sem integrá-la, adequadamente ao

presente, torná-la, em vez de remédio um veneno. E nos parece que os alunos

estão menos preocupados com o contexto, em certas etapas da aprendizagem. Nas

fases iniciais, precisam mais de segurança para poderem chegar à produção;

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aprendizado significante e personalizado, não importa muito. Precisam automatizar o

assunto para poderem, seguramente, transferi-lo no momento de prática e produzir

mais desinibidamente, no momento de produção. Os alunos, como a entrevistada

acima diz, precisam conhecer as palavras, até de forma verbatim, literal,

confirmando a estratégia de número nove, a tradução, no estudo quatro citado, de

Chamot e O´Malley (1995, p. 133-150, tradução nossa).

T80- ENTREVISTADOR: A repetição dá mais firmeza pra você se expressar em inglês? T81- ENTREVISTADO: Dá. Eu ficava perdida. Meu Deus, tá faltando uma coisa, algum elemento, eu queria saber como responder... mas sem firmeza..... (00:19:19) T82- ENTREVISTADOR: Alguma coisa sobre repetição e leitura alta? T83- ENTREVISTADO: Eu acho que não existe uma forma melhor de melhorar a pronúncia senão lendo em voz alta. (xxx) que a gente faz e essa questão da repetição também, porque além de estar falando alto, estar treinando como perguntar, a gente vai estar fazendo uma certa automaticidade com as perguntas e... (00:19:50) T84- ENTREVISTADOR: Com a estrutura, com seqüência da frase, com o segmento? T85- ENTREVISTADO: O que acontece comigo, por exemplo, a questão da frase interrogativa, negativa e afirmativa. É quando na qual o verbo vem na frente ou depois é... Essa questão da memorização da fala, a escuta que ta gravada na mente é que ajuda entendeu? Não é a questão... O que fica mais... T86- ENTREVISTADOR: É a regra ou é a automaticidade? T87- ENTREVISTADO: Você sabe a regra, mas às vezes a automaticidade é que te dá fundamento, te ajuda ali naquela hora que você lembra da parte que você quer falar. Você não lembra tudo, pelo menos de uma frase (xxx) (00:20:55) T88- ENTREVISTADO: É uma coisa que acontece muito comigo, é exatamente isso e... Às vezes na... Na aula aí as meninas me perguntam alguma coisa eu digo, aí me perguntam o porquê e eu digo: Eu não sei explicar muito bem, mas ficou...

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Os alunos confirmam o uso da memória de trabalho e a de médio prazo

para se elaborarem na LE. Guardar estruturas fora do seu dia de aula. Isto é que diz

Anderson sobre a cognição de L2, segundo Chamot e O‟Malley (1995, p. 20-42). O

declarative knowledge é o conhecimento da regra declarada. O procedural

knowledge, conhecimento de procedimento prático, aquilo que podemos fazer com a

língua, que está retido na nossa memória e que são confirmados pelas respostas

dos alunos acima. A automaticidade, cognitivamente, é parte do conhecimento

procedimental. (BROWN, 1994, p. 16-17). Pensamos que isso é uma etapa do

conhecimento procedimental: repetir para ganhar segurança no que vai ser dito e

assim, confiança para produzir.

T98- ENTREVISTADOR: E você acha que esse esforço que você faz, nos exercícios de repetição mecânicos, é um esforço afetado, cansativo? [...] T99- ENTREVISTADO: Afetado, como? T100- ENTREVISTADOR: Afetado no sentido de assim, ser muito veemente, muito repetitivo? Pra vocês e pra mim. T101- ENTREVISTADO: Pra mim, não. Eu acho que essa veemência me ajuda. T102- ENTREVISTADOR: Ajuda? T103- ENTREVISTADO: Eu acho que me ajuda. Porque se você ficar muito light, você relaxa... “Parece” que a gente compreendeu... Mas é quando você insiste, que você bate, que força, reforça, eu particularmente... e consigo tanto prestar mais atenção, quanto compreender o texto. T104- ENTREVISTADOR: E Quita? T105- ENTREVISTADO: Eu também. Eu acho que repetição é uma metodologia assim, eficaz. T106- ENTREVISTADOR: Uma técnica.

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T107- ENTREVISTADO: Uma técnica muito proveitosa, porque lembra. Porqueee... em algum momento a gente vai lembrar; a gente tem na memória e, naquele momento que a gente precisar, vem à tona.

A aluna do turno 103 nos traz uma curiosidade já interpretada,

anteriormente. Em ensino de língua estrangeira, o reflective teaching, ensino

reflexivo, que se concentra na eficácia didática, observa o profissionalismo apenas

do professor de ILE tem sido o modelo de aprimoramento “único” do mesmo,

descartando como princípio o teacher centredness, ensino centrado no professor,

como também sua experiência e seu tirocínio, como já comentamos com

Kuramaradivelu (2003, p. 9-10, tradução nossa), anteriormente. Sinto que, em parte

das aulas, os alunos não querem professores leves, ausentes, omissos! Mas,

eventualmente, também não os querem centralizadores, seguros, interventores e

verificadores de seu sucesso. A moda de levar o aluno a induzir, sempre, parece-

nos que, em nossa cultura de ensino, tem deixado o aluno meio solto, inseguro. O

professor está sendo proibido ou se deixando proibir, em cursos livres de língua,

sobretudo o novice, iniciante, de ser momentaneamente o centro das aulas, mesmo

que isso seja demandado. A quantidade de fala é minimizada e medida. Quanto

menos o professor intervém, afirmam eles de forma extremista, melhor será, por

possibilitar mais tempo para os alunos falarem. Isso é lógico, mas se concentra

totalmente na cognição top-down, onde os alunos também não são ouvidos. Esse

modismo é questionado aqui. Essa castração feita com o tirocínio do professor, pelo

poder do método e pela reprodução desse método pelos coordenadores é uma

reprodução exagerada, vinda dos países centrais, anglófonos, e que achamos que

tem prejudicado o ensino de LE. Sentimos isso pelo número de drop-outs, alunos

que desistem, informado por muitos cursos.

Mas de volta ao núcleo da pergunta, a repetição, ela é, em ambos os

casos: leitura alta e repetição com drills de estrutura, exercícios mecânicos ou não,

seguramente uma demanda cognitiva dos alunos. Em níveis iniciais de

aprendizagem nos parece que a repetição é a busca de ganho de confiança para a

produção de uma LE. Isso fica claro nas respostas dos estudantes. Na minha

experiência, ainda sinto grande preconceito com a repetição pela questão de não ser

meaningful significativa ou significante, no sentido de Rogers: aprendizagem que

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faça sentido para o contexto de vida do estudante. Contudo, em doses razoáveis,

esses alunos têm provado que esse conceito de significativo ou significante em

Rogers não lhes parece uma demanda incondicional. Por esses depoimentos,

podemos até dizer que pouca repetição, para absorção de estrutura, como ordem de

palavras, tempos verbais e outras, como dito pelos alunos, leva à segurança em

produzir LE, como dito acima, e, possivelmente, a exclusão dessa estratégia pode

levar alunos a abandonarem o curso, sobretudo iniciantes. Stevick (1980, p. 19-20,

tradução nossa) trata esse tema com profundidade citando duas perspectivas

diferentes em citações de Brumfit e Brooks que invalidam a essencialização de

apenas um único dos aspectos da aprendizagem considerados per si, a significativa

e a mecânica. E o autor relembra o conceito de Falseabilidade (ver glossário) de

Karl Popper, que é mais um epistemólogo que confronta verdades cognitivas

absolutas.

T112- ENTREVISTADOR: E se a gente começasse esse exercício de repetição primeiro, com manipulação mecânica indo depois, para a produção oral, na contextualização da realidade de vocês, isso ajudaria? T113- ENTREVISTADO: Para mim, talvez fosse mais fácil (xxx) (00:28:12)

Vimos aqui que as etapas da didática, sugeridas por Littlewood, na figura

um, capitulo IV, são realmente uma demanda dos alunos aqui entrevistados, ou seja,

partir de um planejamento didático num crescendo que começa com a apresentação

do assunto, continuando com atividades mais mecânicas, depois as quasi-

communicative (pré-comunicativas) e de comunicação livre. Isso nos lembra que a

didática do P.P.P., Presentation, Practice e Production, (apresentação, prática e

produção) de LE, hoje depreciada por outras mais modernas, embora fracassadas

na nossa cultura, como a task-based, didática baseada em tarefas, é aprovada por

muitos alunos que atestam a necessidade de treino acompanhado pelo professor,

também. Isso vai de encontro a conceitos já mencionados que, como Learner

Autonomy, autonomia do aluno, e o T.T.T., Teacher´s Talking Time, tempo de fala

ou intervenção do professor, que deveria ser baixo, não necessariamente

correspondem à realidade. O ensino reflexivo é também muito importante para o

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entendimento cognitivo do que está acontecendo em sala de aula. No caso citado, a

freqüência da fala do professor, tão evitada no reflective teaching, ensino reflexivo.

Mas, esse conceito, inspirado no filósofo da educação norte americano, John

Dewey, não é uma prática que gera verdades universais e nem poderia, porque o

ensino reflexivo se centra na pesquisa sobre o ensino, no ato de ensinar, no

planejar, executar a aula, e desconsidera as subjetividades sociais, culturais e

psicológicas dos alunos, sendo ele bastante top-down, de cima pra baixo, professor-

aluno, sem consultas a alunos e conseqüentes negociações. Essa lacuna entre

conceitos essências e a prática, mostra que o compasso entre a teoria e a

aprendizagem jamais será homogêneo e exato, como propõe Knowles (1986, p. 1-

10).

T114- ENTREVISTADOR: A consulta de preferências didáticas que o professor pode fazer em qualquer disciplina, ao aluno, sobre como ele aprende é benéfica? T115- ENTREVISTADO: Sim T116- ENTREVISTADOR: Por que é benéfica? [...] T117- ENTREVISTADO: Eu acho assim éee... Que eu tenho um ritmo acelerado, não é o ritmo de todo mundo aqui (xxx) (00:30:30)... então conhecendo o ritmo de cada um e a forma como um aprende, você vai diversificar as atividades T118- ENTREVISTADOR: Você acha que conhecer o ritmo ou a forma de aprender... T119- ENTREVISTADO: Eu acho que a forma.

A aluna acima inicia comentando sobre minha idéia de observar os estilos

cognitivos, defendendo a compreensão do ritmo de aprender dos alunos, mais do

que a forma. Contudo, no final, ela seleciona a forma de aprender como importante

na didática, ou seja, elege a sensibilidade do professor em relação á negociação das

estratégias cognitivas subjetivas, dentro do possível, e a possibilidade dos alunos se

agenciarem, se posicionarem em suas formas de aprender. Aí está a presença e

sensibilidade de René Richterich, constatada pelo aluno: ser ouvido didaticamente.

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ENTREVISTA II – ALUNOS HOSANA, DARLINE e ALINE (LIVRO II)

(00:00:00 ~ 00:06:00) T1- ENTREVISTADOR: (00:00:13) Então, ao longo da... da segunda unidade, a gente expôs algumas técnicas e pedimos feedback, a opinião sobre elas. Hoje nós vamos formalizá-las. Usamos no semestre duas técnicas de métodos anteriores. Preciso saber de vocês se elas são... técnicas que se encaixam no estilo de aprendizagem de vocês; se forem, gostaria de saber por que elas ajudam e como se processa essa ajuda. E então, por exemplo: leitura alta de textos do livro? [...] O que é que vocês acham disso? T2- ENTREVISTADA: Eu penso é bem interessante, por que... à medida que você vai lendo, você vai ouvindo a própria voz, e fazendo, no caso, sua leitura, sua entonação e o professor também tem a oportunidade de fazer intervenções, fazer a leitura. T3- ENTREVISTADOR: Entendi, corrigir. T4- ENTREVISTADA: ...Dá mais segurança, dá mais segurança pra falar depois, pra pronunciar determinadas... T5- ENTREVISTADOR: ...Pra falar inclusive, pra produzir língua? T6- ENTREVISTADA: Isso. T7- ENTREVISTADA: Eu também acho interessante, concordo com Hosana, a partir do momento que você lê em voz alta, e o professor corrige, você não vai mais ter aquele o mesmo erro que você cometeu, pelo menos eu sou assim, quando eu cometo um erro que uma pessoa me corrige eu não cometo mais aquele erro. T8- ENTREVISTADA: No caso de produção... de entonação, o que for corrigido... T9- ENTREVISTADOR: Ajuda bastante nessa questão, da pronúncia e da entonação. T10- ENTREVISTADA: Da entonação. T11- ENTREVISTADOR: (00:02:05) Outro procedimento que gostariam que comentassem seria o uso da L1, através de traduções orais. Eu, às vezes, fazia a seguinte técnica: How do you say tem dois meninos aqui na sala agora, in English? A partir de um problema de contraste entre L1 e LE, o contraste do ter e do haver em Português e em inglês que

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acontece freqüentemente, diagnosticava um erro geral da sala. Nestes dois últimos semestres que vocês estiveram comigo, usamos how do you say ___________________in English?”. Pergunto se esse exercício bilíngüe de fixação é positivo ou negativo, se isso aí influencia positivamente ou faz desaprender a LE. [...] Vocês são ajudados por que estão usando a L1 ou não? T12- ENTREVISTADA: (00:03:00) Não, eu acho que o aluno desaprende não, e eu acredito, apesar de ser uma visão pelo menos minha e de alguns colegas, que eu já comentei, que a gente a primeira coisa a pensar é pensar em Português. E tentar. T13- ENTREVISTADA: Transformar (xxx) (00:03:11) pensar em Português.. T14- ENTREVISTADOR: Algumas coisas não. T15- ENTREVISTADA: Não, algumas coisas não, mas algumas coisas, assim, que a gente não... T16- ENTREVISTADOR: Olhe... T17- ENTREVISTADA: Não conhece, a tendência é pensar: olha, em Português talvez eu dissesse assim,

em inglês, né, a gente vai tentando traduzir simultaneamente. Então, essas

questões... chamam a atenção pra a gente ver a diferença entre falar em Português

e falar em inglês.

Uma preocupação nossa é saber do aluno se essas técnicas ou

estratégias estigmatizadas, senso comum entre professores, é uma atitude sensata.

Assim uma pergunta recorrente nossa é como ele se sente em relação ao uso da L1

quanto à “desaprendizagem” da LE, se ele desaprende inglês quando se traduz? A

resposta das três alunas é igual. O uso da L1, em níveis iniciais, dá mais segurança

porque é assim que elas também aprendem, traduzindo. E elas fazem a hypothesis

testing, testam as hipóteses de como diriam o que não sabem em inglês, parecendo

que esse processo de tradução mental é mais presente que aquele previsto no

contínuo aquisicional.

Quanto à leitura alta, os entrevistados acham que é uma forma de

repetição necessária para treinar e aprender o som da LE e uma delas diz que

quando ouve a pronúncia e entonação certas, aprende ou memoriza. É possível que

a opinião desses alunos tenha sido muito contundente. Acreditamos que numa

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leitura alta, possivelmente, não se aprenderá ou se memorizará a pronúncia de

todas as palavras lidas, como mencionamos anteriormente, mas que deve ajudar a

pronunciar algumas. O interessante no ler alto, quando elas dizem “você se ouve,

ouve a própria voz” é que os estudantes se sentem mais seguros na LE, e essa

segurança, diz uma das alunas, facilita a produção de língua meta, isto é, a partir do

domínio da pronúncia de maior quantidade de palavras, do uso da tradução mental,

esses fatos didáticos criam nessas alunas a iniciativa de produzir a LE, língua meta,

oralmente! Essa desmistificação da didática diante de tais técnicas estigmatizadas

acontece porque não utilizamos a idéia do pós-método, mas o método na sua

definição mais estreita, impondo aos professores fórmulas para que estes imponham

aos alunos, esquecendo as suas experiências profissionais, intuições e cultura de

ensino aprendizagem. E isso ocorre mesmo, segundo as conhecidas pesquisas com

alunos ouvidos que confirmaram a tradução, o uso de L1 e a repetição estão no

repertório dos mesmos. Consideramos pretensioso e aético (da diferença), por parte

dos cursos livres de língua e da cadeia de elementos envolvida, esse desrespeito

aos alunos.

T18- ENTREVISTADOR: Aham. E você, Darline? T19- ENTREVISTADA: Eu acho também um método positivo, pelo mesmo motivo que Hosana fala. T20- ENTREVISTADOR: Uma técnica, você quer dizer. E vocês desaprendem o resto anteriormente ensinado e [...]

aprendido do passado, por estarem usando a L1?

T21- ENTREVISTADA: Pelo contrário, eu acho. T22- ENTREVISTADOR: Pelo contrário por quê? T23- ENTREVISTADA: Que assim, à medida que você fala... assim, como Hosana falou, a gente pensa no

Português, quando (xxx) (00:03:55) no primeiro semestre, eu tive que pensar no

Português pra falar o inglês.

T24- ENTREVISTADOR:

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Mas tem coisas hoje que você já fala... (xxx) T25- ENTREVISTADA: Não... hoje, sim. T26- ENTREVISTADOR: (00:05:00) Mas tem muita coisa que já está automatizada. T27- ENTREVISTADOR: Então você acha que isso aí seria, seria uma dúvida do oral então, a gente tá falando sobre a parte oral, eu identifico o problema aqui, por exemplo, „tem uma cadeira aqui, dizendo, por exemplo, have a chair here aí eu pergunto, se o uso da L1, através da pergunta how do you say tan-tan-tan in English? [...] Isso aí é ruim por um (xxx) (00:04:35) traduzindo oralmente, [...], por que está sendo usado Língua 1, que que cê acha, Kaline? T28- ENTREVISTADA: Não, eu acho que facilita o aprendizado sendo que o iniciante não tem o domínio da língua que tá aprendendo ainda T29- ENTREVISTADOR: Sim, mas também é... (xxx)... que é intermediária T30- ENTREVISTADA: Mas assim, (xxx) (00:04:59), pra mim, eu acho, inexperiente, vamos dizer assim então T31- ENTREVISTADOR: Ah. T32- ENTREVISTADOR: (00:05:00) Mas tem muita coisa que já tá automatizada. T33- ENTREVISTADA: Não... sim... mas facilita, tem gente que só tem o inglês, contato, aqui na sala, sai, não tem mais contato nenhum, português o tempo inteiro. T34- ENTREVISTADOR: Uhum. T35- ENTREVISTADA: ...Ele tinha atropelo muito no português ainda. T36- ENTREVISTADOR: Então, você reparou que ajuda em termos de memória, ajuda em termos de correção, eh... de um erro, que está já fossilizado? T37- ENTREVISTADA: É, correção do erro

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T38- ENTREVISTADOR: Que já está ali... penetrado né e aí... T39- ENTREVISTADA: Então, é a tendência é pensar em falar em Português, inicialmente. T40- ENTREVISTADOR: Você acha que é? T41- ENTREVISTADA: ...Traduzindo... T42- ENTREVISTADOR: ...Nessa tendência, né. T43- ENTREVISTADA: Aí que... essa questão chama a atenção. T44- ENTREVISTADOR: Uhum. T45- ENTREVISTADA: ...Pra se entender que é diferente. T46- ENTREVISTADOR: E, eventualmente, alguma vez, apareceu... dirigindo [ou no ônibus] (xxx) (00:05:45) quando você for pensar assim, da onde vem esse inglês? (xxx), Já apareceu isso? T47- ENTREVISTADA: (xxx) (00:05:55) Como eu diria isso, assim pra... tentar dizer na LE. Então isso é o uso da L1 para aprender a LE. ENTREVISTA III - (CONTINUAÇÃO) ALUNOS: HOSANA, DARLINE e ALINE.

LIVRO II.

(00:07:38 ~ 00:12:50) T1- ENTREVISTADOR: E o segundo item seria sobre alguns drills, aqueles exercícios mecânicos de estrutura (xxx) (00:07:43), que a gente tem feito aqui em nossa turma: Ask me if I have been here for a long time. Have you been here for a long time? Ask me if I went to the movies last night? (08:00:00) Did you go to the movies last night?. Mas nós tivemos aqui [...] essa técnica, que é uma técnica antiga e que tenta, por exemplo, neste exercício identificar e pontuar como perguntar em inglês. O que é que vocês acham dela? T2- ENTREVISTADA: Acho...

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T3- ENTREVISTADOR: Só pra gravar mesmo uma opinião pessoal... T4- ENTREVISTADA: Eu acho ela bem produtiva, por que o aluno memoriza a estrutura da fala. T5- ENTREVISTADOR: A estrutura. T6- ENTREVISTADA: (xxx) (00:08:36) A estrutura... T7- ENTREVISTADOR: ... A seqüência da estrutura T8- ENTREVISTADA: É, isso aí... facilita bastante, eu acho. T9- ENTREVISTADOR: [...] Facilita na hora da prova, na escrita, ou será que na oralidade, na fluência? Há alguma automatização, há uma incorporação da regra com a prática. Em que realmente ajuda? (00:09:00) Estão entendendo o que está sendo colocado? T10- ENTREVISTADA: Eu acho que ajuda, na questão da gente formular; até hoje eu pergunto, né... é pegar a estrutura. T11- ENTREVISTADOR: ...E transferir... T12- ENTREVISTADA: ...E transferir pra outras questões também, que não vão ficar presas àquelas questões trabalhadas ali naquele exercício. Mas, já saber a forma de como perguntar, pra outras questões, outras situações... T13- ENTREVISTADOR: Então você tá me dizendo que antes de você perguntar, uma pergunta, antes de você fazer uma pergunta, lhe vem, né, a idéia, a seqüência de que o verbo auxiliar ... T14- ENTREVISTADA: É. T15- ENTREVISTADOR: ...Vem em primeiro lugar? T16- ENTREVISTADA: Isso. T17- ENTREVISTADOR:

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... E isso vem na cabeça antes de vocês falarem, mas de forma formulada, com uma regra, uma regra gramatical ou uma coisa automatizada? T18- ENTREVISTADA: Por que... a gente tenta falar o correto, não é? Então eu acho que é uma coisa gramatical mesmo, o certo é falar assim. T19- ENTREVISTADOR: Ah, então vira uma regra? T20- ENTREVISTADA: É. T21- ENTREVISTADOR: Na pergunta, né? T22- ENTREVISTADA: É. T23- ENTREVISTADOR: Sim… E Kaline? T24- ENTREVISTADA: Eu concordo, eu gosto do exercício, acho bem produtivo, como Kaline falou que foi justamente a dificuldade de raciocinar e falar em inglês, então, me ajuda a montar a estrutura da frase. Eu acho esse decoreba, pegar o livro e ficar vendo como é que se monta isso tudo e escrevendo, pra mim, pior... T25- ENTREVISTADOR: Hum... T26- ENTREVISTADA: ...E aí faz você raciocinar, você quebra a cabeça pra montar a frase, você, não é ter nada pronto. T27- ENTREVISTADOR: Ahn... T28- ENTREVISTADA: ... Entendeu? Assim, com o livro e regras, fica meio „decoreba‟, assim, sabe? T29- ENTREVISTADOR: Mas muita gente alega, é, dizendo que „ah, isso aí não é significativo pro aluno, é um exercício mecânico, que o aluno precisa de alguma coisa significativa e personalizada pra ele se motivar; algumas pessoas falam muito isso, então essa coisa mecânica, [...] não pertencendo à realidade dele, nada vai motivá-lo a aprender… T29- ENTREVISTADA: Mas tem coisa que tem que ser mecânica...

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T30- ENTREVISTADOR: Uhum, por exemplo? T31- ENTREVISTADA: ...Pra gente aprender a falar essas questões mesmo, tem que ser mecânica pra a gente aprender, quer dizer, eu falo assim, pela minha questão, né, pela minha forma de aprender. T32- ENTREVISTADOR: Certo. T33- ENTREVISTADA: Pra mim algumas coisas eu tenho que ter ali uma regra, tem que ter uma base. Agora... T34- ENTREVISTADOR: A automatização... T35- ENTREVISTADA: Isso… quando é que a gente vai demonstrar o aprendizado? Na composição. Quando você tem que escrever, você tem que pensar, você tem que falar, né. T36- ENTREVISTADOR: ...Na escrita... T37- ENTREVISTADA: Na escrita. Aí vai surgir né, porque você pede, você sugere um tema que não tenha questões que você trabalhou em sala geralmente, a questão é sua de uma viagem que você fez, é uma questão que vai surgir, não só aquelas, necessariamente, trabalhadas em sala, e aí você pensa naquela estrutura e vai construir seu texto... a partir daquilo. T38- ENTREVISTADOR: E na oralidade? T39- ENTREVISTADA: Na oralidade também, tem coisa que... eh... se você tiver a forma de falar você sabe exatamente o que você quer falar, mas se você não tiver aquela estrutura... T40- ENTREVISTADOR: ...Arrumada... T41- ENTREVISTADA: ...Arrumada, eu acho que eu não consigo falar. T42- ENTREVISTADOR: Então... T43- ENTREVISTADA: Por que eu não tenho conhecimento teórico para falar...

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T44- ENTREVISTADOR: ...Ou prático? T45- ENTREVISTADA: Ou prático. T46- ENTREVISTADOR: Eu estava falando então, na hora da prova, imaginem que... estou escrevendo alguma coisa, e... eu tenho mais tempo de pensar e lembrar de como ela seria. [...] T47- ENTREVISTADA: É a maneira, a estrutura correta da frase. T48- ENTREVISTADOR: E aí te ajuda a dar uma corrigida? (xxx). (00:12:23). T49- ENTREVISTADA: É. T50- ENTREVISTADOR: Darline. T51- ENTREVISTADA: Concordo com o que ela falou também. T52- ENTREVISTADOR: Concorda. Você acha enfadonho, não... T53- ENTREVISTADA: Não. T54- ENTREVISTADOR: ...Por ser não-significativo para realidade geral dos alunos? T55- ENTREVISTADA: Não, eu acho que alguma coisa você tem que... usar essas técnicas de... pra você memorizar mais. T56- ENTREVISTADOR: Para? T57- ENTREVISTADA: Pra memorizar. T58- ENTREVISTADA: Pra automatizar. T59- ENTREVISTADOR: E quando você sai daqui é Português, né?

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T60- ENTREVISTADA: É, Português. T61- ENTREVISTADA: A gente tem contato com a língua inglesa, tem contato com o inglês uma vez por semana.

Reproduzo algumas sentenças, expressões e palavras-chaves desse

trecho acima sobre exercícios mecânicos de aprendizagem de estrutura, exercícios

de repetição, os drills. São elas: exercício bem produtivo; a dificuldade de raciocinar

e falar em inglês; me ajuda a montar a estrutura da frase; quebramos a cabeça para

montar a frase; pensar naquela estrutura [treinada] e vai construir seu texto; isso

vem como uma música, como uma… como um verso, como uma sentença, a

maneira, a estrutura correta da frase, você se lembra daquilo como um, um verso. E

para minha pergunta: você acha enfadonho as repetições mecânicas, por não serem

significativas? Para a realidade geral dos alunos, eles comentam que você tem

que... usar essas técnicas de... pra você memorizar mais, [...] pra automatizar; na

oralidade também, [...] se você tiver a forma de falar você sabe exatamente o que

você quer falar, mas se você não tiver aquela estrutura [...]; a dificuldade de

raciocinar e falar em inglês, então, me ajuda a montar a estrutura da frase; o aluno

memoriza a estrutura da fala, a seqüência da estrutura [...] é, isso aí... facilita

bastante, eu acho; e transferir...e transferir pra outras questões também, que não

vão ficar presas àquelas questões trabalhadas ali naquele exercício.

Os termos e idéias usadas pelos alunos nas respostas, no trecho da

entrevista com três deles, transcritos acima, tornam-se auto-explicativos. Contudo,

vamos interpretar com mais detalhe o que as exclusões das categorias em análise,

as estratégias cognitivas excluídas, se integradas ao plano de aula, consultadas e

negociadas com os alunos, podem potencializar a didática do ensino de LE,

trazendo maior segurança à aprendizagem dos alunos; o que fica de prejuízo para o

aluno quando se exclui, aleatoriamente, o que ele já tinha opinado como importante,

na pesquisa cognitiva de Chamot e O´Malley (1995, p. 138), aqui citada. Esses

alunos entrevistados confirmam que a repetição em aulas de estrutura os faz

aprender a seqüência da estrutura da língua e, assim, operam a transferência, que é

também uma estratégia cognitiva listada no mesmo estudo dos autores acima.

Defendemos esse uso de exercícios mecânicos como um exercício intermediário,

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entre a apresentação e a produção. A grande vantagem que ele oferece se

integrado a qualquer método usado com uma temporização compatível e

seqüenciado entre a apresentação e a produção, seria na etapa da prática, como

sugere Littlewood na figura um, no quarto capítulo. Aprende-se uma estrutura em LE

na prática depois da regra, tal como dispõe Anderson, segundo Chamot e O‟Malley

(1995, p.20-42) e ela é internalizada passando a ser modelo para transferir aquela

estrutura em cadeia, possibilitando criar ou formar outras. Esse é o velho

questionamento da aprendizagem indutiva e dedutiva. No quadro um, Chamot e

O´Malley revelam que os alunos usam as duas abordagens para aprender uma LE.

Não podemos essencializar que todos os alunos aprenderão de uma única forma.

Essa é a contribuição do estruturalismo e do behaviorismo para a

aprendizagem das estruturas de uma LE, segundo os alunos. Uma língua que não é

ensinada por silabação, como a L1, mas por chunks, pedaços de enunciações de

comunicação prontos, de diálogos e de narrativas comunicativas. Se a repetição, por

ser behaviorista, não é adequada para disciplinas interpretativas da área de

humanas, para aquisição de uma estrutura, em ELE, dizem os alunos, ela é eficaz.

Essa técnica não é a crença na contemporaneidade, que a desabonou. E por quê?

Como pode uma crença de um especialista, de uma coordenação, de um professor

desconsiderar a forma de aprender de alunos de LE? Isso é ético à diferença? Isso é

razoável? Por que não integrar essa técnica, também, embora de um método

anterior, em novos métodos em turmas de adultos? Não diria que são as editoras,

sozinhas, fomentadoras da manutenção dessa situação, ou que operacionalizem

essa omissão através da impressão de novos livros. Acho que a nossa repetida

acriticidade do conhecimento recebido dos países centrais nos faz reproducionistas

de discursos que precisam ser interpretados, adaptados e receberem crivos locais

de nossa cultura de ensino e aprendizagem. E nos parece que é hora de

respeitarmos mais o aluno, suas estratégias, e deixarmos de, contraditoriamente,

nós mesmos, sermos aquilo que criticamos, verdadeiras tabulas rasas, a exemplo de

muitos professores e coordenadores que criticam o condicionamento como um

princípio que considera o aluno como um ser tabula rasa, cabeça sem conteúdo

algum em LE e sem reação crítica, esquecem que suas atitudes sobre sua crença

na salvação que o novo método supostamente traz é, igualmente, uma atitude

acrítica; nós somos “behaviorizados”, condicionados pela cultura de ensino vigente.

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Libertam-se desse condicionamento aqueles que têm pensamento crítico e

“transgridem”!

Em outras palavras, almejando serem “modernosas”, nossas

coordenações acadêmicas se tornam, assim, tabulas rasas, reproduzindo em suas

atitudes condicionadas a aceitar o novo, exatamente aquilo que depreciam na

técnica de repetição, drills, do Audiolingual, imputando-se o chiste que eles mesmos

aplicam ao behaviorismo, ao Audiolingual, ou seja, se deixam dominar,

acriticamente, pelo discurso e prática de métodos e abordagens “novidadoristas”,

repetindo, na prática, um discurso idealizado e acrítico, como se nada soubessem

de ensino e tivessem começando a aprender a ensinar a partir de um novo método,

agindo, assim, como profissionais sem experiência ou conhecimento didático

anterior, “profissionais” tabulas rasas do ensino. Onde estão os coordenadores

“como intelectuais”, no sentido da Pedagogia Crítica, que Henry Giroux (1997, p.

123-144.) aplica aos professores e, onde está o discernimento da teoria pessoal de

ensino dos professores sobre o método, reclamada por Kumaravadivelu (2003, p.

17-21). Onde está o tirocínio dos professores de língua inglesa? Domesticado e

conformista como um gato, que se disponibiliza leite, água e limpeza? Ainda está

esse professor na idealização do conhecimento hegemônico e no glamour

econômico dos países anglófonos, do chamado mundo desenvolvido?

ENTREVISTA IV – ALUNOS: CINIRO E BENÉ. LIVRO IV.

(00:01:05 ~ 00:12:40)

T1- ENTREVISTADOR: Éééé... a gente fez, ao longo desse semestre, três técnicas, que não são assim muito usadas na contemporaneidade, em curso livre de língua estrangeira: primeiro a repetição de texto através de leitura alta e eu queria que vocês comentassem essa técnica com o que vier na sua cabeça... T2- ENTREVISTADO: leitura assim... que os outros, as pessoas... um colega lendo e eu escutando? T4- ENTREVISTADOR: Aham. T6- ENTREVISTADO:

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Eu acho bom por que... você vai corrigindo suas falhas principalmente de... pronúncia, tipo aquela como grow... que a gente todo mundo pronuncia errado, no passado, e você “grew” “gruuw”. (00:02:05) T13- ENTREVISTADO: Eu acho bem importante por causa da, da pronúncia, principalmente. T14- ENTREVISTADOR: E isso inibe? O ler alto, diante dos colegas, inibe? T15- ENTREVISTADO: Não, eu acho que não porque o aluno está aqui pra aprender. T16- ENTREVISTADOR: Pra aprender, né? Você ganha em errar, acertar e errar, né? (00:02:34) T17- ENTREVISTADO: Se a gente soubesse inglês não tava aqui fazendo cursinho. T18- ENTREVISTADOR: É claro. T19- ENTREVISTADO: (risos).

Nessa fala dos alunos, desmistificamos a proibição ou má recomendação

da repetição via leitura em voz alta, que parece dar mais segurança para a produção

oral e, como também, essa idéia de não expor o aluno ao grupo, ao se ler alto, para

não inibi-lo. Nem sempre se corrigir o aluno adulto ou pedir para que ele treine a

pronúncia lendo um texto conhecido em voz alta, necessariamente, o inibirá. Assim,

essa idéia deve ser consultada em cada grupo, com a percepção de como ele sente

essa exposição grupal à leitura, que a maioria dos professores diagnostica como

maléfica. Além disso, ainda há o preconceito de que ler alto não é significativo, isto

é, relevante para a realidade do aluno e, por isso, desinteressante. Como podemos

julgar que usarmos uma técnica em quantidade e freqüência adequadas, esta

poderá se tornar enfadonha para o aluno, sem perguntar ou expô-la a ele? A raiz

desse problema está no seguinte: quando um professor pensa numa técnica de um

método, ele associa como a mesma foi originalmente, usada, por ser única, então.

No ALM, por exemplo, a repetição é feita constantemente e ad nauseum, em

excesso. Trazê-la para a atualidade, seria proveitosa em doses e usos adequados.

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T20- ENTREVISTADOR: É... agora muitos especialistas falam que a repetição não é uma atividade... significativa, relevante para o uso de LE como comunicação. A leitura alta, é dito, seria uma leitura mecânica sobre uma realidade de conteúdo e vocabulário passivos, que não tem a ver com a do aluno. Segundo eles as pessoas só aprendem quando relacionam o tema com a sua vida, o que também é verdade para alguns alunos e professores, [...]... (00:02:50) T21- ENTREVISTADO: Hummm. T22- ENTREVISTADOR: Não é? Agora... nesse sentido vocês não acham, vocês não acham que é assim pouco significativa pra realidade de vocês? T23- ENTREVISTADO: É... porque... T24- ENTREVISTADOR: Mecânico demais? Não é chato? Repetido? T25- ENTREVISTADO: Não, eu não acho chato não, eu acho que, que é bom. Eu acho que qualquer coisa que, qualquer coisa que você ouve no inglês, qualquer vocabulário novo, pra mim é válido.

T26- ENTREVISTADOR: E sobre, a supervisão do professor, intimida, essa supervisão...? T27- NTREVISTADO: Não, eu nunca tive... T28- ENTREVISTADOR: Problema, né? T29- ENTREVISTADO: Pelo contrário, eu até gosto porque aí... quando o professor me chama atenção, porque aí eu prefiro voltar e pronunciar a coisa certa. T30- ENTREVISTADOR: E falar a coisa certa... T31- ENTREVISTADO: É... na hora que eu tiver falando, aí um professor, pára aí... T32- ENTREVISTADOR: Para corrigir? T33- ENTREVISTADO: Corrigir na hora.

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T34- ENTREVISTADOR: Aí você grava isso? T35- ENTREVISTADO: Eu gravo mesmo. T36- ENTREVISTADOR: Você grava mais? T37- ENTREVISTADO: É.

Parece que também nessa turma de livro IV, nível intermediário, algumas

desmistificações acontecem. Na transcrição anterior, vimos que a leitura alta de

textos do livro, embora para a maioria dos professores seja irrelevante no conteúdo,

no sentido de pouco significativo, real e personalizado, é escolhida pela técnica

como repetição, um instrumento natural de melhoria de pronúncia, de que ele

necessita, e textualmente dizendo que a mesma não é chata e que é boa para sua

aprendizagem. Assim, sentimos a necessidade do aluno de LE precisar usar mais

sua memória, não de forma “decoreba”, do conteúdo, como se estudava História,

tempos atrás, mas como uma memorização manipulada, praticada numa etapa de

procedimento manipulado pelo aparelho fonador, pela oralidade, na qual ele vai

automatizar pela repetição e adquirir a estrutura pela prática para alcançar a

produção “autônoma”.

Outro aspecto confesso surpreendente para mim, é que a correção

imediata do “erro”, para esses alunos, é eficaz e não inibe, ficando claro com as

palavras do entrevistado acima. A pergunta que se estabelece, a nosso ver, é: O

baixo filtro afetivo, como recomendado por Krashen, segundo Richards e Rodgers

(2000, p. 183, tradução nossa), isto é, evitar a correção para não se aumentar a

inibição dos “alunos” para possibilitar maior recebimento de input, informação

receptiva na L2, e conseqüente produção de L2, não se confirma na opinião desses

alunos. Assim, eles preferem o contrário do que Krashen (1996) propõe. Preferem a

intervenção do professor, através de correção imediata. O que percebemos dessas

respostas acima é que a early production, produção imediata dos alunos de L2, e a

não espera de alguns alunos que vivenciam o silent period não são fatos universais.

A produção de L2 dos alunos não depende apenas da quantidade de input,

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informação receptiva da L2, do aluno ou do respeito aos alunos com filtro afetivo

alto, ansiosos, como propõe o autor.

Diferentemente da percepção de Krashen (1996), nessas entrevistas

anteriores, os alunos de ILE, em nossa cultura de aprender, intuem que a repetição,

como já comentada anteriormente, embora descartada, tem uma importante função,

a saber: dar segurança para que o aluno produza LE, quer através da compreensão

da estrutura num contexto, após treino mecânico, quer repetição para dar mais

fixação à pronúncia. O resultado disso é que não é apenas a inibição, o filtro afetivo,

que pode silenciar o aluno, mas a falta de firmeza na pronúncia e na arrumação da

ordem das palavras na LE. Infelizmente, toda profissão forma e deforma, ao longo

de sua existência. Exemplo disso são as crenças cegas em alguns

“novidadorismos”, que impõem novas técnicas, top-down, de cima para baixo, aos

“alunos”, e em seu detrimento destes.

T38- ENTREVISTADOR:

Esse é o primeiro ponto, o segundo ponto... é aquele do... que às vezes eu falava

assim... aquele é... o uso de L1 quando, por exemplo, a gente fez aqueles drills de

tradução, bilingües, onde tradução e repetição aparecem juntos: é... como é que se

diz __________ em inglês?

- Eu fui ontem ao Pelourinho;

- Eu tenho ido ao Pelourinho ultimamente.

- E, eu já estive na Irlanda... que a gente usou a L1... né?

E aí na hora que expliquei e expus essa técnica, a gente conversou e pedi opinião sobre esse tipo de exercício, mas agora eu quero registrar formalmente. Você acha que a L1, o Português, quando usada nesses exercícios de fixação, nos quais usamos tradução e repetição, vai fazer você esquecer, desaprender o inglês que você aprendeu até agora? (00:03:55) T39- ENTREVISTADO:

De jeito nenhum, tanto que eu até comentei com você que... foi a primeira vez que eu aprendi a usar o present perfect, o presente perfeito, em inglês, que entendi realmente o sentido dele, que antes eu me confundia muito com... por que que isso é passado, por que que eu não uso o verbo no passado... por que que esse have entra aqui do nada? (00:02:34) T40- ENTREVISTADOR: Esse have auxiliar... T41- ENTREVISTADO:

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Aí eu ficava assim... por que have a gente aprende como ter. T42- ENTREVISTADOR: É. T43- ENTREVISTADO: Aí as explicações eram em inglês... aí eu ficava me batendo por que que esse have não... aí depois que eu vim entender que era por que... aí quando você deu aqueles exemplos em que... em Português eu comecei a associar mais com o inglês, entendeu? T44- ENTREVISTADOR: Humhum. T45- ENTREVISTADO: Que... quando não tem a terminação... a definição do tempo, você usa o verbo, o verbo (com o) have. (falam ao mesmo tempo): O present perfect. T46- ENTREVISTADOR: Modificando o passado. T47- ENTREVISTADO: Antes eu já (xxx). (00:05:15). E eu assim, nessa turma que eu to agora de, no intensivo, muita gente se bate ainda com esse negócio. T48- ENTREVISTADOR: Muita gente se bate. T49- ENTREVISTADO: Muita gente se bate... tanto que ela... deu até uma aula sobre isso porque muita gente tava se batendo e tudo mais. Eu até tava mais... T50- ENTREVISTADOR: Mais seguro? T51- ENTREVISTADO: É mais seguro. T52- ENTREVISTADOR: acha que... o uso da L1 é... claro que não é, indiscriminadamente, nem eu dava aula em língua 1(um) né? Eu... Claro que às vezes a gente fala um pouco de L1 mas ali eu... coloquei um contraste né... L1 ou LE... português e inglês. Você acha que desaprende... (xxx). (00:05:38) T53- ENTREVISTADO: Não, não porque... T54- ENTREVISTADOR: A fluência...

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T55- ENTREVISTADO: Não que... não desaprende não porque... assim... é até bom que desinibe a pessoa, as vezes... muitas vezes eu queria falar: Pô, como é isso em inglês? Aí eu ficava na dúvida. T56- ENTREVISTADOR: Desencana né? (xxx). (00:06:04) T57- ENTREVISTADO: É, aquele negócio de chegou mesmo, eu sempre ficava na dúvida. T58- ENTREVISTADOR: O que é? T59- ENTREVISTADO: He... he went, não, he arrive, he arrived ou he have (xxx). (00:06:08) T60- ENTREVISTADOR: Have arrived? (xxx). (00:06:16) T61- ENTREVISTADO: Have arrived. (xxx) (00:06:16) T62- ENTREVISTADO: Eu sempre me batia nisso. T63- ENTREVISTADOR: Vai vivenciar coisas novas. Porque na verdade no exemplo... é... naquela redação do... do... do... da... do job application até que poderia começar. I have...had a wonderful life (xxx). Mas logo depois que você anuncia vem o passado (xxx) Anunciar uma novidade do passado, por exemplo; Juliana has just arrived. Não é isso...não é isso que a gente vê. (00:06:22) Então é just arrived. Não disse quando exatamente, então... e isso daí vai levar a próxima pergunta. T64- ENTREVISTADO: Outra coisa também é do verbo (xxx) aquele negócio do som do cd [cd com lista de verbos regulares e irregulares, conhecidos, para memorização]. (00:06:58) T65- ENTREVISTADOR: Aquela coisa né? Você acha mecânica? T66- ENTREVISTADO: Não, não... achei, achei bom... Que é outra coisa que as pessoas também ficam se batendo lá no cursinho... (xxx) (00:07:00) pronúncia dos verbos. T67- ENTREVISTADO: E aquele... você chegou gravar a pronúncia de uma lista de verbos no cd e a botar o..., fazer o cd ou você ouve do computador mesmo?

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T68- ENTREVISTADO: Não, eu ouço do computador mesmo. T69- ENTREVISTADOR: Ouve do computador. T70- ENTREVISTADO: Boto lá e tal. T72- ENTREVISTADOR: É o walkman... é sempre ele... T73- ENTREVISTADO: Não é (xxx) que eu não tenho, mas eu acho que vou comprar um, pra... (00:07:23) T74- ENTREVISTADOR: É... e você acha que melhorou estudando e repetindo a pronúncia de verbos com esse cd? T75- ENTREVISTADO: Melhora... melhora. T76- ENTREVISTADOR: Não não... melhorou assim, no uso no contexto, quando você tá falando o inglês... ele melhorou, no caso... assim... vem mais o passado mais facilmente (xxx). (00:07:34) T77- ENTREVISTADO: Vem, vem... pra mim vem!

Nesse trecho comentaremos duas coisas: O uso de drills

simultaneamente instrumentalizados com o uso de L1, fazendo um procedimento de

prática de análise contrastiva e, através desta, automatizando estruturas de passado

simples versus presente perfeito, na prática oral mecânica. Além disso, os alunos

mencionam o treino de pronúncia das terminações dos verbos regulares: ed, ied e d,

pronunciados /d/ /t/ e + /Id/. O mais interessante disso é que nesse último trecho

alunos do livro IV, que foram expostos a essas duas estratégias, tardiamente, por

mim, e que foram meus alunos também no livro III, conseguem quase que fazer um

portfólio de atividades das estratégias excluídas, como o trabalho com o cd de

verbos, estudado para um simulado “teste oral”. A nosso ver, isso significa o quanto

eles absorveram e aprovaram essas estratégias de ensino, a ponto de falarem

delas, antecipando-se a mim. Necessidades subjetivas dos alunos sendo atendidas,

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hoje, depois deles terem sido expostos às “antigas” estratégias importantes para os

mesmos, depois de passarem a conhecê-las.

T81- ENTREVISTADOR: É e finalmente, é... aqueles drills... que a gente é... testou também, foram aqueles drills que foram bem mecânicos, que foram... fazer pergunta (xxx) (00:08:54) Lembra? T82- ENTREVISTADO: Humhum. T83- ENTREVISTADOR: Aquela coisa assim... mecânica um perguntando ao outro, toda vez que um tempo novo era dado. E isso aí é, é tomado como uma coisa de (xxx) assim mecânica, que o aluno não se interessa... porque não diz nada a realidade dele... se ele surfa, ele quer saber dos surfs, se estuda biologia, ele quer saber da biologia...se... entendeu? Então aí... ah... (xxx) metodólogos (xxx) ah coisa mecânica... [...] (00:09:13) T84- ENTREVISTADO: É, é um pouquinho chato, mas eu acho que é necessário, é tipo assim... eu acho mesmo que... verbo por mais que você tente jogar e tal, eu acho num num dá pra fugir da, do decoreba não. Tem muita coisa que... T85- ENTREVISTADOR: Decorar. T86- ENTREVISTADO: É... tem que se decorar porque, nem tudo você vai usar, entendeu? T87- ENTREVISTADOR: Humm. T88- ENTREVISTADO: Ainda mais você... vindo no caso, geralmente cursos, duas vezes, três vezes por semana no máximo. Aí a pessoa sai dali ela só vai falar português entendeu? Aí... não vai usar muito os verbos, aí não eu passei a decorar bastante mais verbos agora, acho que às vezes tem que ter um pouquinho de decoreba mesmo. T89- ENTREVISTADOR: Tem que ter um bom pouco? T90- ENTREVISTADO: Tem que ter né. T91- ENTREVISTADOR: ...(xxx) aí são as falhas da memória. (00:10:25)

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T92- ENTREVISTADO: Por que se não... porque a memória geralmente a utiliza aquela que você tá usando, constantemente. Se você não usa, ela vai acabar esquecendo. Então se você tem que... T93- ENTREVISTADOR: E vai ficar tudo? T94- ENTREVISTADO: Às vezes claro que não vai ficar tudo que é impossível, mas já te dá uma boa base. T95- ENTREVISTADOR: Pra você re, recorrer, trazer de volta. Então você acha que... essa, esse, essa coisa de (xxx) “ask me, me pergunte se eu já, já estive na Islândia” me pergunte se (xxx) que é uma forma de treinar como perguntar no present perfect diferenciando do passado simples. Vamos fazer a pergunta: Ask me if I like banana: Do you like banana? Ask me if I went to... movies last night: Did you go to the movies the last night… (xxx) você tem que dizer, relembrar, quando perguntado [se eliciado], retomando alguns tempos verbais. (00:10:47) T96- ENTREVISTADO: É bom que se aprende também outras formas de de de expressar (xxx) Ask me, ask me (xxx). Me peça, me pergunte. (00:11:16) T97- ENTREVISTADOR: Mas a própria pergunta... a própria é... formulação, da, do tempo verbal, você acha que ajuda a formular o tempo verbal? Ask me if I am here. (xxx) (00:11:25). T98- ENTREVISTADO: Acho que ajuda. T99- ENTREVISTADOR: Ajuda você a... (xxx). (00:11:40) T100- ENTREVISTADO: Ah, ta usando o se, ta usando o, o verbo.(risos) T101- ENTREVISTADOR: Em relação a... aprender a perguntar.A idéia seria essa, aprender a perguntar. T102- ENTREVISTADO: Não se (xxx). (00:11:57) (risos) T103- ENTREVISTADOR: Mas eu to... eu tô perguntando sobre a técnica (xxx) ...de uma forma geral, se... você raciocina em termos de... é... (00:12:02) T104- ENTREVISTADO: Ahhh.... entendi... se você, se você melhora.

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T105- ENTREVISTADOR: Em continuar a seqüência da pergunta. T106- ENTREVISTADO: Seqüência da pergunta. Isso (xxx). Melhora, melhora. (00:12:15) T107- ENTREVISTADOR: Você acha que automatiza um pouco? T108- ENTREVISTADO: É um pouco mecânico mesmo, mas eu acho que... não é chato não. Pelo menos eu não acho... T109- ENTREVISTADOR: Você acha que pode... melhorar. T110- ENTREVISTADO: É...

Inferimos alguns conceitos cognitivos da prática dos alunos, que os

mesmos acham mais um instrumento na sua aprendizagem e não nos referimos às

teorias dos especialistas em relação ao ensino de LE. Da prática dos alunos vem a

necessidade dos instrumentos de métodos anteriores, sem, contudo descartar os

atuais; a necessidade de decorar no sentido de fixar estruturas pela repetição, para

reter na memória de trabalho segmentos de língua com mais facilidade. Agregado a

isso, eles comentam freqüência das aulas, duas vezes por semana, isto é, eles

estão imersos na cultura brasileira, na L1, e também que esses exercícios fazem

reter as informações para a próxima aula; consideraram as técnicas de ensino de

perguntas em inglês, Ask me if..., Find someone who..., como técnicas eficientes na

aprendizagem de perguntar em LE e “uma maneira de aprender outras formas de se

expressar”. Eles querem dizer com isso que, ao se manipular a estrutura e o

vocabulário mecanicamente e em sendo a estrutura nova, eles aprendem essa

forma de arrumar os elementos da pergunta na LE e aprendem, eventualmente, na

oralidade, a pronúncia de palavras não retidas ou, ainda, novas palavras que

possam vir a aparecer nesse treino.

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ANEXO B- ENTREVISTAS TRANSCRITAS COM PROFESSORES, COORDENADORES E PROPRIETÁRIOS DE CURSOS LIVRES DE

INGLÊS

ENTREVISTA I – PROFESSORES: GEORGE E ANTONIO (00:00:00 ~ 01:10:00) T1- ENTREVISTADOR: É melhor vocês lerem a pergunta um [1] sobre tradução e aí vocês... T2- ENTREVISTADOR: Alô, Alô fazendo gravação com Antonio e George... Testando. Tá gravando. [Testando aparelho Mp5] T3- ENTREVISTADO: Com relação à tradução, eu já fui muito reticente... Eu evitava a tradução ao máximo, eu acreditava baseado no que eu tinha aprendido que a tradução deveria ser evitada ao máximo dentro da sala de aula. T4- ENTREVISTADOR: Você aprendeu com isso quem? T5- ENTREVISTADO: Olhe, eu comecei a aprender inglês com 12 anos de idade. Eu aprendi inglês em uma escola que era basicamente... um ensino... um método que não era comunicativo ainda, mas que era uma passagem para o comunicativo e a maioria dos professores da gente eram ingleses e eles evitavam muito a tradução e trabalhavam muito... T6- ENTREVISTADOR: Como era utilizado? T7- ENTREVISTADO: Não se usava. O uso da L1 um não se utilizava de jeito nenhum nem em nível inicial. Aí eu comecei a minha prática começando como você faz. Aí eu fui praticando com, como você faz; com o tempo eu fui me tornando mais flexível. Hoje em dia o que é que acontece? Eu uso a tradução na sala de aula, assim como você usa um recurso dentro da sala de aula, assim como você usa um DVD, assim como você usa um listening (exercício de compreensão auditiva), entendeu? Eu uso como uma ferramenta. Aí se eu acho que isso vai ajudar o aluno naquela hora, naquele momento eu aplico. Já com a repetição eu nunca fui muito reticente, ela é uma coisa em que eu sempre acreditei, a repetição ajuda. Então eu sempre trabalhei muito com repetição, em todos os níveis. Ensino em todos os níveis. T8- ENTREVISTADOR: Mesmo os mais adiantados?

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T9- ENTREVISTADO: Mesmo os mais adiantados. Principalmente aqueles alunos que você pega mais adiantados, e quê tem problema de fossilização, entendeu? Eu acho que a repetição das formas corretas pode ajudar esses alunos. T10- ENTREVISTADOR: Ainda nesse nível, você pega alunos para os quais ainda é difícil a produção de narração, devido à concentração de fala nos diálogos funcionais. E você pode atribuir isso, também, a uma falta de memorização e de repetição, em níveis iniciais, de modelos segmentais, ordem de elementos numa sentença e de nível supra-segmental, em diálogos? T11- ENTREVISTADO: Eu acho que sim. Eu acho que, por exemplo, uma coisa do método comunicativo, que é uma crença que era assim: que essa coisa de que você não trabalha com a repetição, você coloca a prática um pouco de lado para dar mais valor à fluência desde os níveis iniciais, eu acho que isso com o tempo fez com que a gente tivesse pouco cuidado, principalmente, com a parte de correção. E correção envolve o quê? Você tem que corrigir e você tem que repetir o modelo correto e, muitas vezes, repetir de forma até exaustiva para que tenha um efeito. Aí eu acho que o que ocorre, por exemplo, com muitos alunos quando eles chegam a um determinado grupo que tem seu estudo negligenciado, ele tem todos esses problemas, entendeu? E fica aquele... digamos a produção oral fica quebrada, não fica clara. T12- ENTREVISTADOR: O que percebemos é que a repetição do segmento ou supra- segmento também traz eficiência, em nível de estrutura, diferentemente de disciplinas como Sociologia e História que não têm um instrumento novo para se ensinar, apenas o conteúdo, já que o Português, língua-instrumento dominada, é o veículo para essas disciplinas, assim como para a Geografia e outras. No caso do inglês, você vai instrumentalizar a aprendizagem dele, você vai instrumentalizar através do ainda não dominado veículo inglês no início, e o usará ele próprio, para sua própria aprendizagem. E isso é um esforço enorme para um aluno e, a nosso ver, um verdadeiro abuso de poder, se for uma crença levada a cabo, radicalmente, sobretudo para alguns alunos. T13- ENTREVISTADO: Aí é assim, eu acho que hoje em dia a minha atitude, a meu ver, eu vejo, de uma forma mais aberta do que via antes, eu uso ambas (repetição e uso de L1) como ferramentas dentro da sala de aula e acho que tem resultados positivos. Eu lembro que essa pesquisa é para adulto e foi feita em adolescente. T14- ENTREVISTADOR: E Antonio? T15- ENTREVISTADO: Em relação à primeira pergunta também, né? Eu uso a tradução como uma ferramenta... éee que possa me auxiliar, né? Exatamente... haaa... ou como transferência, né? Algumas pessoas fazem aulas de transferência, não é Robélio? É você usar aquelas (xxx) que são positivas, que são éee... cabem ali. Éee... são as similaridades entre o Português e... (00:06:03)

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T16- ENTREVISTADOR: Análise contrastiva. T17- ENTREVISTADO: É... E o inglês. Análise... contrastiva, também, que é uma coisa do Audiolingual. Na verdade eu acho uma coisa que me incomoda um pouco é que surgem sempre novas teorias, sempre que tem novas idéias, que novas técnicas aparecem... Que cada vez que surge algo novo, as pessoas jogam tudo o que foi visto antes fora e começam a utilizar aquela coisa nova, como se aquilo fosse salvar a pátria ou fosse dar resultados mais imediatos, né? Então eu acho é que, se a gente vai trabalhar com uma coisa, vamos analisar tudo direitinho e vamos ver o que é que serve e o que não serve e agrupar... você vai construindo essas... essas técnicas. T18- ENTREVISTADOR: A estratégia acaba virando uma técnica? T19- ENTREVISTADO: É, você vai fazendo de acordo com o que... T20- ENTREVISTADOR: Uma garimpagem... T21- ENTREVISTADO: Uma garimpagem, exatamente. Enquanto a repetição eu pessoalmente acho a repetição muito positiva pelo que eu te falei, né? Eu acho que quando você repete... você... quando você faz... Eu não sei se a repetição pode ser entendida aqui como um drill também... T22- ENTREVISTADOR: Eu estou falando dela como um drill mecânico... T23- ENTREVISTADO: Como um drill mecânico, é. Então eu acho...

Como visto acima, a posição desses dois professores é bastante reflexiva

e revela que são experimentados e transgridem as bíblias didáticas dos métodos de

ensino de LE.. Não teremos muito a comentar sobre suas posições, sobre as suas

estratégias. Mas abordaremos a fala de um deles que é treinador de professores,

administra T.C.C.´s, curso de treinamento de professores, mais adiante.

T43- ENTREVISTADO: ...Olhe, eu não diria que seria inviável. Eu diria o seguinte; que existem fatores... por exemplo: Qual a realidade de trabalho da gente? A gente tem um programa a cumprir. Nós ensinamos, temos um livro didático adotado com um programa que a gente tem que cumprir. Então isso, de uma certa forma, impõe a você determinados limites. Então assim, dá pra você fazer coisas que você acredita que vão ajudar o seu aluno? Dá, eu acho que na medida em que você cresce com experiência, você

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aprende a dosar mais um pouco as coisas. Mas seria utópico dizer que você pode direcionar as coisas baseado completamente naquilo que você acredita e nas necessidades dos seus alunos, não é? Porque existem pressões institucionais, pressões de livros didáticos e na hora que você está dando a aula isso aí conta. Aí no caso de você ter que usar um drill de dez minutos para cada estrutura, é viável? É. Mas na prática pode levar... T44- ENTREVISTADOR: Cinco minutos num dia, cinco no outro e cinco no outro. T45- ENTREVISTADO: Mais na hora da prática... que você vai realmente praticar isso... T46- ENTREVISTADOR: Pode levar mais tempo? T47- ENTREVISTADO: Pode levar mais tempo, e dessa forma pode ser que você não passe por todas as estruturas, porque não vai dar tempo. T48- ENTREVISTADOR: (xxx)... (00:12:49). Mas aí é aquela eterna luta de práticas, entre as significativas e as mecânicas; o “dogma” proíbe a mecânica, então a dosagem marca a falta, quero dizer, inúmeras práticas significativas levam todo o tempo e roubam tempo para uma mecânica!

Sinto que a aprendizagem significativa ganha mais e mais espaço na

visão do ensino de LE. Parece um modismo que veio para ficar. O que vimos nessa

resposta do professor George, formador de professores, é uma pequena contradição

entre o que ele diz fazer e a incompatibilidade de tempo de inserir a repetição

mecânica. Assim, nos parece que se houvesse uma divisão mais adequada do

tempo dedicado a cada prática, a sua inserção seria viável. O privilegiar de práticas

significativas, que endossamos como imprescindível, está em descompasso com a

necessidade de outras práticas, como a mecânica, embora ele reconheça a

necessidade de sua inserção, logo abaixo, no turno T49.

T49- ENTREVISTADO: Quando eu falo todas as estruturas, são as estruturas que você tem que dar. Pode ser que uma vez ou outra isso falhe. Mas eu acho que é viável você fazer.

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T50- ENTREVISTADO: Inclusive, se não me engano, isso faz parte mesmo do Audiolingual. Eles dizem na teoria que é melhor você passar maior tempo trabalhando com esses drills para, exatamente, garantir uma performance mais legal na produção, no futuro. Eu acredito muito nisso. Eu acredito muito nessa coisa de repetir, trabalhar bastante essa... fixar a forma.

Continuamos a entrevista constatando que existe um desconhecimento,

pelos entrevistados, das Needs Analysis subjetivas, análise das necessidades

didáticas dos alunos.

T93- ENTREVISTADOR: Sobre os dois tipos de Needs Analysis, Needs Analysis objetiva e Needs Analysis subjetiva, vocês já tinham ouvido falar? (00:21:31) (00:21:42) T94- ENTREVISTADO: Não, ainda não. Já ouvi falar como um todo. Éee, a objetiva, mas a subjetiva para mim é uma coisa nova.

Discutimos as repetições mecânicas e a visão das instituições sobre as

mesmas. Veremos que posição conformista e acrítica tem o professor formador de

professores:

T99- ENTREVISTADOR: Por exemplo, eu não gosto de drills. Eu tenho a crença que drill me cansa. E realmente eu não gosto. Sei que eu dificilmente aprenderia num método como o Audiolingual, com predominância de drills, com quantidade enorme dos mesmos. Mas se meus alunos aprendem com drills, por que eu não “saio do salto” do meu “poder” e atendo essa subjetividade de aprender deles, e uso os mesmos pra que eles, potencialmente, não se tornem possíveis drop-outs, evadindo da escola? Por que eu não customizar de forma moderada, isso? T100- ENTREVISTADO: ... Mas éee... Por exemplo, eu não sei outras instituições, Robélio, mas assim... oooo... lá onde a gente trabalha eu não vejo essa predisposição conjuntiva de uma coisa e outra... essa... esse... Essa amarração... T101- ENTREVISTADOR: Mas o contrário disso, um fechamento?

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T102- ENTREVISTADO: Fechamento em relação a... Pelo menos, lá onde eu trabalho... é... [...] Você sabe o que é que ocorre em sala de aula [...] tem muita gente que tem muito preconceito. T103- ENTREVISTADO: Eu acho... eu acho... T104- ENTREVISTADO: Eu sei que tem muita gente que tem muito preconceito. T105- ENTREVISTADO: Não é pouca não. É muita... T106- ENTREVISTADO: Muita gente que tem muito preconceito com isso. T107- ENTREVISTADOR: Em que cartório está escrito que não pode? Quem disse isso? T108- ENTREVISTADO: É eu acho um absurdo. Eu acho... a partir do momento que você fecha as coisas dessa forma, não permite... T109- ENTREVISTADOR: Mas não acontece isso? T110- ENTREVISTADO: Acontece. T111- ENTREVISTADOR: Então existe, porque alguém disse e outros aceitaram. T112- ENTREVISTADO: Eu acho o seguinte. Como experiência como treinador, eu acho que de uma certa forma... é... a gente... quando a gente tá treinando as pessoas, a gente condiciona uma forma de pensamento que vai um pouco de encontro a isso que a gente tá falando. Mas eu... ou seja, a gente tem uma liberdade dentro da instituição, uma confiabilidade que... a instituição desenvolveu dentro do meu trabalho, mas isso não acontece, por exemplo, quando eu tô treinando uma pessoa nova para trabalhar na instituição. Quando você treina uma pessoa nova, você treina dentro de uma filosofia... T113- ENTREVISTADOR: Dentro de um molde. T114- ENTREVISTADO: E supostamente é aquela filosofia da escola e você faz um fosso, fazendo a pessoa que está sendo treinada acreditar que, se ela não seguir aquele molde, ela não vai ter sucesso. Entendeu? Não, eu não acho certo.

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T115- ENTREVISTADOR: Mas a escola te cobra isso? Já que o Antônio me disse que a escola é aberta? T116- ENTREVISTADO: Cobra. T117- ENTREVISTADOR: Ela cobra o quê? Um modelo fixista? T118- ENTREVISTADO: É. Ela cobra que esse modelo seja praticado. Que você passe esse modelo. T119- ENTREVISTADOR: Então vocês têm opiniões diferentes? T120- ENTREVISTADO: Não, não é que... Entenda éee. Existe um modelo que a instituição prega. É como se fosse um livro e você tem o roteiro de um livro né? E aí você tá... tá olhando, você vai seguir. Aquilo faz parte do conteúdo, né, que tem que dar. Mas, por exemplo, um professor passivo técnico. Ali ele vai ter que seguir... Mas se, por exemplo, fazendo uma análise do que você falou antes. Se, por exemplo, eu achar que aquele syllabus, conteúdo e orientação didática [presente no índice do livro] ou parte daquele syllabus não vai... sei lá, não é importante naquele momento, ou não é importante at all, mesmo, entendeu? Eu vou manter? Eu não manteria. (00:26:54) T120- ENTREVISTADO: Mas o novo professor mantém. T121- ENTREVISTADO: Mas o novo mantém. T122- ENTREVISTADO: Ah... sim, porque ele tá querendo impressionar. Mas o ponto tá exatamente aí, é que a instituição prega uma coisa. Então se ele vai querer impressionar a instituição, vai seguir o modelo e querer se manter ali. Ele vai querer mais assim... Éee tem que ter discernimento. (00:27:28)

Confirmamos nossa hipótese do reproducionismo e corroboramos o

preconceito “intermetodológico” quando instigado sobre o curso de formação de

professores, o professor que leciona os cursos de formação nos diz que existe uma

agenda da escola que lhe obriga estar na “moda”, isto é, apresentar as teorias de

aprendizagem e métodos atuais. Embora reconheça, mais adiante, ainda nesse

capítulo, que o papel do formador de professor é estimular o pensamento crítico

entre os candidatos a professores, ele não faz isso. Flagramos uma atividade entre

as teorias dos especialistas questionados por esse professor e a manutenção das

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mesmas nos seus treinamentos. Obviamente, nesse ambiente acadêmico tão

limitado e “novofagista”, não poderá haver espaço para a voz do aluno

(des)empoderado, nem uma reflexão crítica de se pensar “alargadamente”. Na base

dessa discussão, vemos Bachelard, quando constatamos que a ruptura do

conhecimento atual é acatada, mas não existe retificação de técnicas de métodos

anteriores, mesmo no contexto de agregar esses preceitos a um método ou

abordagem com cara e conteúdo novos; assim, como nesse novo contexto, essas

técnicas seriam instrumentos eventuais, mesmo considerando quantidade e tempo

de uso, diferenciados. As novidades não se deixam descentrar e agregar técnicas

“antigas”. E aí lembramos Foucault e Kumaravadivelu. O primeiro, porque

constatamos que o poder do conhecimento mais atual é sepultado por esse

formador de professores, proibindo uma dialogicidade com as demandas cognitivas

dos alunos. O segundo, quando os conhecimentos vindos dos professores, de suas

experiências, as teorias pessoais de ensino dos mesmos são sufocadas pela

importação do conhecimento metodológico “novofagista” dos especialistas. Alunos e

professores são, assim, castrados de uma relação dialógica possível sobre o

processo de ensino aprendizagem. Quanta falta de diálogo multireferencial, dentro

da própria área de ensino de LE.

T125- ENTREVISTADOR: O que é que vocês acham de crenças de ensino? T126- ENTREVISTADO: Por exemplo, faz parte da crença dele se é música ou não é... Mas e se o aluno gosta? E se música é uma coisa que ajuda o aluno a... a... T127- ENTREVISTADOR: Tem uma relação de poder. É isso? T128- ENTREVISTADO: Tem. T129- ENTREVISTADOR: Tem uma relação narcísica? T130- ENTREVISTADO: Também. T131- ENTREVISTADOR: Ego?

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T132- ENTREVISTADO: Completamente T133- ENTREVISTADO: É porque o que eu acho é que quando você: por exemplo, quando você trabalha, treina adultos, quando você vai observar um professor, você já vai observar com um modelo pronto. T134- ENTREVISTADOR: Dado por... T135- ENTREVISTADO: Dado pela... T136- ENTREVISTADOR: Pela cultura da instituição? Talvez não, exatamente, pela coordenação atual, mas até por outras coordenações anteriores, que ajudaram a criar essa cultura. T137- ENTREVISTADO: É. É assim. Mesmo que exista um discurso de flexibilidade, leva-se em conta o local onde a gente trabalha. Existe um discurso de flexibilidade? Existe, mas só que na hora que você vai... você faz um julgamento. Depois da observação de todo esse processo, embora a gente tenha todo esse discurso de não ser... de não julgar, mas na prática a gente julga, sim. Na prática a gente avalia baseado nesse modelo, a gente espera que a pessoa possa corresponder, mas quando a pessoa não corresponde a... a esse modelo, entendeu? Éee existe uma pressão pra estas pessoa ser treinada, para ser adaptada. Eu vejo isso... T138- ENTREVISTADOR: Mas não existe um conformismo de sua parte de não discutir com a coordenação sobre dar ao professor iniciante, além do que ele precisa para ensinar, também, umas opções para que ele tenha outras possibilidades? Por exemplo, algumas teorias pessoais da experiência, ou o problema é reproduzir apenas o pensamento de certas pesquisas e teorias de ASL importadas? T139- ENTREVISTADO: É... Eu acho... Eu acho... T140- ENTREVISTADOR: Que não é político? T141- ENTREVISTADO: Eu acho que eu diria... Veja bem. Eu acho que ele vem no momento em que você... éee... você faz o discurso... Da forma que ela tem que ser mais prática. Entendeu? Prática pra você. Prática pra instituição. Mas assim... éee... Eu acho que faz parte do amadurecimento profissional. T142- ENTREVISTADOR: De todos nós? Certo?

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T143- ENTREVISTADO: De quebrar determinadas práticas, né? E eu acho que isso a gente vai fazendo. T144- ENTREVISTADOR: Com o tempo. T145- ENTREVISTADO: Éee... Na minha experiência como treinador, o que eu sinto, é que você amadurece na sua prática dentro da sala de aula. Tanto como professor, ensinando o aluno ou como treinador, treinando outras pessoas, justamente a partir do momento em que você começa a quebrar esses modelos, a colocar dúvidas, você entendeu? E a se permitir experimentar outras práticas e encorajar as pessoas a ter pensamento crítico. Eu acho que é essa... Eu diria que é digamos... seria a maior missão do... T146- ENTREVISTADOR: Educador. T147- ENTREVISTADO: Do treinador. Do educador é desenvolver o pensamento crítico, entendeu? Que é uma coisa que é assim, que a gente sabe que é uma coisa que é necessário de fazer, mas que muitas vezes a gente não faz por essa coisa do conformismo, mesmo, para atender limitações de tempo, programas que você tem que cumprir. Eu diria que existe na prática da gente sempre uma... uma... éee, um paradigma. O que a gente sabe que é idealizado, mas que a gente faz e passa aquilo que é... T148- ENTREVISTADOR: Irreal? T149- ENTREVISTADO: Irreal. T150- ENTREVISTADOR: Imagina que coisa grave! Você imagina como isso funciona no professor iniciante, George, que nível de ansiedade esse professor terá, que acolhe um ideal, que nível de influência negativa quando não corresponde à experiência. E para esse aluno, para o qual apresento essa plêiade de técnicas impostas a mim, professor, distanciando-o de sua forma de aprender, esse aluno pode ser um drop out. Ele pode sair porque ele está com um professor com prática “idealizada”. T151- ENTREVISTADO: “Idealizante”. T152- ENTREVISTADOR: “Idealizante”, não é? A gente perde o aluno, né? Antonio.

Mesmo o formador de professores tem suas próprias teorias de

aprendizagem, as quais não são discutidas com outros coordenadores, porque há

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uma bíblia a seguir, a bíblia do “novidadorismo”, como aqui conceitualizamos. Como

somos condicionados ao novo, tabulas rasas diante do novo, totalmente cabeças

vazias para só acolher o “novidadorismo” metodológico-didático! Onde está a

dialogicidade nessa relação “behaviorizada” de poder top-down no nosso pensar

metodológico didático no ensino de uma LE? Acho que a palavra chave mais

adequada para essa situação fragmentária é a ausência da dialogicidade entre

esses atores envolvidos nesse processo.

T153- ENTREVISTADOR:

Um pequeno comentário não gravado, não transcrito, mas falado, exemplificando um

pequeno poder local Nós tivemos uma coordenadora, no passado, que comprava

todos os livros e lançamentos “novidadoristas” das áreas de pedagogia de LE, ASL e

de métodos. Leitora de todos os livros novos, sem dúvida, mas detinha o poder

financeiro, localmente, e assim exercia o poder pedagógico. Entendo e defino a

mesma como “pacoteira” de conhecimentos anglófonos, na área de ELE,

conhecedora de inglês mas, em meu ponto de vista, acrítica. O poder que ela tinha

vinha do poder econômico e de leitura. O poder financeiro de comprar os livros, na

nossa área, noventa e nove por cento importados e caros, empoderava a mesma

que se investia desse poder diante de profissionais que não tinham condições de

comprar... .Ou seja, eu não li as estratégias cognitivas porque eu não tinha o livro de

Chamot e O´Malley do T.D.C., Teachers´ Development Course [curso de

desenvolvimento profissional de professores] e porque, manipuladamente, essas

estratégias num dado capítulo, se públicas, iriam causar uma inquietação anti-

conformista, não sendo conveniente propagar aquela informação. E por que não me

foi dado? Vamos saber daqui a pouco (risos). Isso foi uma manipulação para reter a

sublevação e questionamentos inquietantes.

Por fim, discutiremos sobre a ética entre essa plêiade de informações

disjuntivas e possíveis conseqüências para o no nosso campo.

T291- ENTREVISTADOR: Eu tenho uma pergunta pra fechar. Vocês acham que isso é ético? Você ter informações de que o aluno é, didaticamente, subutilizado e, mesmo se tendo informações vindas dele, de suas estratégias, nós excluirmos as mesmas da nossa

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didática, do nosso planejamento, porque existe um preconceito que deve estar relacionado a não questionar o próprio livro didático ou um conformismo da reprodução de conhecimento recebido dos países centrais? O livro didático, o mercado e os especialistas estão acima da ética que essas pesquisas trazem? Ou ainda, quem escolhe o que apresentar reproduz o que julga conveniente? as pesquisas aqui para nós. Vocês acham isso ético? T292- ENTREVISTADO: Como é? T293- ENTREVISTADOR: Second Language Acquisition, que eu acho uma essencialização cientificista, um horror, se for concebida como a única verdade. Vocês acham tudo isso ético? A gente ter essa informação sobre o aluno e deixá-lo esse aluno sem a possibilidade de ser inserido, com suas estratégias estudadas por dois acadêmicos, porque as mesmas não se compatibilizam com o método comunicativo, o lexical... e aí não discutir essas estratégias porque o professor poderá questionar, legitimamente, o por quê da exclusão da tradução, o por quê da inclusão de técnicas do método Audiolingual... É ético isso? T294- ENTREVISTADO: Eu falo assim do poder que as editoras têm sobre a [publicação] (xxx) de livros. (01:09:17) T295- ENTREVISTADOR: Mas o que a gente está buscando aqui são os motivos. Essas estratégias são excluídas porque vão questionar o novo lançamento. É como se fosse assim, só querer devorar o que “presta”, o novo método. Coma o novo. Esqueça o velho. Isso é ético? T296- ENTREVISTADO: Não. Ético... não é ético. T297- ENTREVISTADOR: É só. Pronto. É isso aí, gente... Obrigado! T299- ENTREVISTADOR: É.

ENTREVISTA II – PROFESSORAS NÍVEA E JOCELMA (00:00:20 ~ 00:52:00) T1- ENTREVISTADOR: (00:00:06) Bom, a primeira pergunta é super simples, viu, viu... T2- ENTREVISTADA: Ahn...

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T3- ENTREVISTADOR: Jocelma, o que você pensa das seguintes estratégias, na perspectiva do aluno e na sua pessoal como professora de LE: tradução e repetição. T5- ENTREVISTADA: Posso ir primeiro? T6- ENTREVISTADOR: Pode. Conciso dentro do possível e profundo dentro do possível. T7- ENTREVISTADA: Ok. Tradução: eu acho que é um instrumento, também, de aprendizagem. Eu acho que às vezes a gente tem que usar na sala de aula, que não deve ser um método, mas... T8- ENTREVISTADOR: Uma técnica. T9- ENTREVISTADA: Isso é, ajuda também. T10- ENTREVISTADOR: Deve ser uma técnica eventual? T11- ENTREVISTADA: Isso. Às vezes você tem, por exemplo, uma palavra que é abstrata, muito difícil de explicar em inglês. Você vai passar horas explicando aquilo que é uma coisa que você pode resolver só traduzindo? T12- ENTREVISTADOR: Uhum. E oferece alguma segurança pro aluno? T13- ENTREVISTADA: Sim, sim. Na verdade o aluno gosta muito de tradução por que justamente ele se sente seguro. T14- ENTREVISTADOR: Uhum. Segurança. T15- ENTREVISTADA: É, porque ele tem, ele tem, ele... se baseia no Português, né... T16- ENTREVISTADOR: ...que é língua de arranque... T17- ENTREVISTADA: Isso! Isso. Ele gosta, eu não gosto da tradução como um, mas acho que um instrumento. T18- ENTREVISTADOR: Como método não, mas como um instrumento.

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T19- ENTREVISTADA: Sim, sim. T20- ENTREVISTADA: Repetição, já que ela falou... T21- ENTREVISTADOR: ...Repetição... T22- ENTREVISTADA: ...Eu concordo com a colega, tradução eu acho que em alguns momentos é necessário e repetição... é bom porque, porque a pronúncia... apura a pronúncia. Agora o aluno geralmente acha chato, né? Repetir, muita repetição... T23- ENTREVISTADOR: Você já perguntou se seus alunos acham enfadonho? T24- ENTREVISTADA: Pela expressão deles às vezes eu percebo. T25- ENTREVISTADOR: Hum... Em que tipo de repetição você está se referindo? T26- ENTREVISTADA: Não, repetir mesmo, quando você bota um cd que eles têm que repetir, por exemplo, pronúncia, verbos regulares, né, então, que eles têm que fazer aquela, aquele treino e aquela... que eles realmente têm que repetir pra poderem perceber o final de „s‟, „z‟, aqueles sons, então, que a gente... T27- ENTREVISTADOR: Mas essa fonética do livro I é muito sofisticada para a aprendizagem, para com o nível inicial? [...] mas a opinião deles é só nesses exercícios, ou acham assim, em geral? T28- ENTREVISTADA: Depende do nível, né? T29- ENTREVISTADOR: Tem a leitura alta, tem „drills‟... T30- ENTREVISTADA: É... T31- ENTREVISTADOR: Várias coisas, né? T32- ENTREVISTADA: Na leitura alta eles ficam muito inseguros, a depender do nível, também, né? Tudo depende se for um aluno avançado...

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T33- ENTREVISTADOR: Mas qual é o feedback de leitura alta? Eles... T34- ENTREVISTADA: Alunos mais avançados, eles gostam até, eu percebo que eles gostam de fazer leitura alta. T35- ENTREVISTADOR: ... Mas não é muito, (xxx) (00:02:45) muito (xxx) (00:02:47) ainda assim? T36- ENTREVISTADA: Só pra pronúncia mesmo, né? T37- ENTREVISTADA: É somente pra pronúncia, pra você corrigir algumas falhas de pronúncia, mas não é uma coisa que eu use muito leitura alta. T38- ENTREVISTADOR: É, da perspectiva do aluno, vocês acham que a leitura alta pode trazer alguma segurança pra eles? T39- ENTREVISTADA: Depende do aluno. T40- ENTREVISTADA: É, do aluno, do nível... T41- ENTREVISTADA: Se for um aluno tímido, ele vai ficar muito tenso. T42- ENTREVISTADA: É. E daí ele nem produz como poderia. T43- ENTREVISTADA: Geralmente, quando eu faço... T44- ENTREVISTADA: Sorry. Ah. [risos de todos] T45- ENTREVISTADA: Eu faço assim, se for um diálogo curto, duas pessoas, um homem e uma mulher, homens contra mulheres. Aí, fazem, aí eles fazem tranquilamente. T46- ENTREVISTADOR: Uhum. T47- ENTREVISTADA: Em relação à repetição, eles fazem também, mas também não repito exaustivamente, mas eu também uso...

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T48- ENTREVISTADOR: ...A repetição... T49- ENTREVISTADA: Isso, como eu estou trabalhando numa escola que tem que usar, então eu uso a repetição. T50- ENTREVISTADOR: Então você acha isso, e por que você acha, você acha que traz alguma segurança? T51- ENTREVISTADA: Eu achei, eu acho que é relevante da pronúncia, eu acho que o aluno fica mais seguro. T52- ENTREVISTADOR: Lembrando que... pelo modismo, né... T53- ENTREVISTADA: É,... T54- ENTREVISTADOR: Essas técnicas, sobretudo, a repetição é uma coisa que já foi jogada no lixo. T55- ENTREVISTADA: Eles têm, eu acho que eles têm que repetir, porque senão eles não pegam a pronúncia. T56- ENTREVISTADA: Eu acho que é importante, também T57- ENTREVISTADOR: ...Tem também... T58- ENTREVISTADA: Eu uso tudo que eu acho que ajude. Tudo. T59- ENTREVISTADA: É uma ferramenta, também! E pra pronúncia eu acho muito bom, eles ouvem a correta, eles repetem, agora não pode, justamente, né... T60- ENTREVISTADOR: Usar exaustivamente.

Essas duas professoras têm experiências diferentes de ensino. Uma

delas ensina apenas em escolas que usam métodos mais atuais, abordagens

comunicativa e lexical. A outra, Joelma, trabalha numa escola Audiolingual, mas ela

agrega, dentro da realidade da abordagem desse curso livre onde a entrevisto, a

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repetição em voz alta e os drills. Assim, ela vê eficiência em ambos os tipos de

repetição. A possível experiência pessoal a leva a usar com mais desenvoltura

essas técnicas, se comparada com a professora Lívia, que não tem experiência e

nem menciona usar drills, ressaltando que a repetição feita através do aparelho de

cd, ela não acha que os alunos gostem. Sentimos que ambas não pedem feedback

aos alunos sobre essa técnica.

T66- ENTREVISTADOR: Então, o que eu gostaria é que vocês dessem a sua definição de Needs Analysis. Pela leitura que vocês têm, o que vocês diriam? T67- ENTREVISTADA: De quê? T68- ENTREVISTADOR: Needs Analysis. T69- ENTREVISTADA: Needs Analysis?!? T70- ENTREVISTADOR: Needs. T71- ENTREVISTADA: Seria você investigar qual seria a necessidade dos alunos? Alguma coisa? T72- ENTREVISTADOR: Não é uma pergunta. Apenas, o que você vem na cabeça. T73- ENTREVISTADA: De Needs Analysis eu acho que é isso. T74- ENTREVISTADA: Eu não estou entendendo bem... T75- ENTREVISTADOR: No caso, assim, „Needs Analysis‟. T76- ENTREVISTADA: Needs? Por exemplo, “He Needs Analysis”, ele precisa de análise? T77- ENTREVISTADOR: Não, não, não. Essa Needs Analysis... análise da necessidade. T78- ENTREVISTADA: Ah!

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T79- ENTREVISTADA: Isso. T80- ENTREVISTADA: Ok... T81- ENTREVISTADOR: Mas como é que vocês entendem isso, qual a necessidade do aluno? Quem é... que tipo de necessidade é essa? T82- ENTREVISTADA: Eu acho que varia de aluno pra aluno, e de acordo com a turma que você tem que adequar suas... T83- ENTREVISTADA: Atender às diferentes demandas, né?... é cada um com sua necessidade, com sua demanda, então tem que ser diferente... T84- ENTREVISTADOR: Que tipo de demanda? T85- ENTREVISTADA: Alguns precisam de mais repetição. T86- ENTREVISTADA: Isso, listening, exercício de audição, outros precisam de, por exemplo, writing, praticar mais a escrita (xxx) (00:06:00) T87- ENTREVISTADOR: Uhum, e ter mais prática? T88- ENTREVISTADA: Outros precisam de uma explicação, que você explique, mais, assim, sem ser exaustivamente; outros, é... T89- ENTREVISTADOR: Exaustivamente... T92- ENTREVISTADA: Depende muito de faixa etária, de turma... T93- ENTREVISTADOR: Certo. Quando a gente fala em tradução a gente fala é, também em uso de L1. T94- ENTREVISTADA: Hum. T95- ENTREVISTADOR: O lingüista francês, René Richterich, conceitualizou dois tipos de Needs Analysis: a objetiva, que é o conteúdo interessante ao aluno, temas adequados ao mesmo, tipo

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de fala, e a subjetiva, que é a demanda didática do aluno, as estratégias do mesmo, negociáveis entre o professor e as subjetividades cognitivas do aluno. Ele diz que nenhuma pedagogia é para sempre. Todas as pedagogias são efêmeras. Você pode, como se tem visto mesmo, né? Uma vai , a outra vem... T96- ENTREVISTADA: É. aham. T97- ENTREVISTADOR: Você não pode, como era ter visto mesmo né, uma vem, outra vem, e ta-ra-ram, ta-ra-ram, ta-ra-ram. T98- ENTREVISTADA: Antes era só gramática e tradução... T99- ENTREVISTADOR: Gramática e tradução. T100- ENTREVISTADA: ...O tempo da minha mãe. Aí isso vai, passou muito pra repetição, né? T101- ENTREVISTADOR: Para repetição no ALM, (Audiolingual). T102- ENTREVISTADOR: Então, ahn, tá mostrando as preferências subjetivas, quer dizer, as preferências de aprender do aluno, dos seus hábitos, opiniões, técnicas e procedimentos, né? T103- ENTREVISTADOR: Vocês acham que o aluno deve ser considerado no class-planning, [no planejamento didático da aula]? O aluno deve ser ouvido para o class-planning? T104- ENTREVISTADA: Deve ser considerado, sim, claro! O aluno e o grupo. Você tá falando do aluno, de um aluno dentro de um grupo ou...? T105- ENTREVISTADOR: Não, assim, por exemplo, os alunos têm estratégias cognitivas, como você falou há pouco... T106- ENTREVISTADA: Aham. T108- ENTREVISTADOR: Diferenciadas. Então, você não vai contemplar só uma estratégia cognitiva. (xxx) (00:08:29) Nesse caso, é, vocês acham importante ouvir esse aluno? T109- ENTREVISTADA: Eu acho!

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T110- ENTREVISTADA: Você acha? Mas muitas vezes isso não é considerado. O aluno é considerado errado. T111- ENTREVISTADA: Se for uma turma muito grande, você não percebe. T112- ENTREVISTADOR: O que eu digo não é em relação a isso não. T113- ENTREVISTADOR: Essa é a nossa cultura de ensino de LE, centrada na crença do professor e no conhecimento importado do campo? T114- ENTREVISTADA: Exatamente o que eu quero colocar. O que eu tenho em exemplos de aula de gramática, aqui, na escola, o que acontece é reclamação do aluno recorrente: ele queria explicações de gramática dedutivas mas o professor não dava, não dava por causa da metodologia usada na escola, que é o que acontece; mas a reclamação dos alunos era muito grande, e isso não era considerado pelos professores. T115- ENTREVISTADOR: Isso é exemplo de realidade subjetiva dos alunos, não aprendida, porque o método vem, e toma a cabeça... T116- ENTREVISTADA: É T117- ENTREVISTADOR: ... Do professor. T118- ENTREVISTADA: É, como a gente viu no último seminário né, não pode ou não deve dar explicação gramatical. T119- ENTREVISTADOR: Não explicar gramática. T120- ENTREVISTADA: ...Manda o aluno estudar.

A professora fala da reclamação dos alunos sobre a omissão de explicação

dedutiva da gramática em sala de aula. Ela nos fornece a dicotomia de ensino e

aprendizagem, onde o aluno se perpetua “sem luz”, exatamente porque ele não

participa, não se agencia na sua didática. Esse aluno continua interditado, como um

ser que não tem a “maioridade”, porque é (des)empoderado como alguém que não

traz pré-conhecimentos culturais de aprendizagem. E nem deve manifestar sua

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subjetividade de aprender, suas formas de aprender, no caso, aprender

dedutivamente. Segue, abaixo, a inconsistência das razões da ausência da

explicação dedutiva da gramática.

T125- ENTREVISTADOR: Mas é o que tem estado na moda [não aprender em sala de aula, mas estar exposto a LE, desde a abordagem natural! T126- ENTREVISTADA: Principalmente aluno adulto. T127- ENTREVISTADOR: Isso. T128- ENTREVISTADA: „Teens‟ não têm tanto essa demanda de gramática não; pra eles aquilo vai. T129- ENTREVISTADOR: Aí vai... T130- ENTREVISTADA: ...Bem naturalmente. Mas adulto, ele quer... T131- ENTREVISTADOR: Mas nosso trabalho é sobre adulto mesmo, entendeu? T132- ENTREVISTADA: Ele quer... T133- ENTREVISTADOR: Mas é só pra adulto... T134- ENTREVISTADA: ... Também, é só uma referência. Só referente a adulto. T177- ENTREVISTADA: Eu vejo muito na SOS, [nesse curso livre, o SOS é um tira dúvida para os faltosos, dado em L1, que versa sobre vários assuntos, mas segundo as professoras, sobretudo gramática] os alunos chegam, assim meio desesperados, aí quando eu explico a estrutura, explico a gramática, aquilo que eles estão assim, meio desesperados... T178- ENTREVISTADOR: (xxx) (00:14:45) Para a prova? T179- ENTREVISTADA: Eles, “Ah, é isso é? Poxa!”

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T180- ENTREVISTADA: É, inclusive, Robélio, uma vez uma aluna falou uma coisa, numa aula de reforço do livro um, que eu não tive o que responder pra ela. Ela disse, que nesse curso não sai, não explica, não deixa que o professor explique gramática pra gente na sala de aula, só que ele cobra na prova. Isso não tem lógica! Não tem; você ia dizer o quê?

Nesse trecho se percebe o desconhecimento de Needs Analysis

subjetiva, a saber, o aluno sendo ouvido didaticamente. Muitos assuntos como esse

são omitidos de cursos de treinamento. Na entrevista anterior a essa, com os

formadores de professores, o professor George reconheceu o reproducionismo nos

treinamentos de novos professores e o próprio conformismo a que essa

domesticação leva. Contudo diz que essas não são coisas discutidas entre os

coordenadores, nem ele levanta essa questão nas reuniões. Embora use a L1 e faça

drills, e ache que o propósito de um treinador seja levantar o pensamento crítico nos

novos professores, ele e a coordenação continuam agindo assim. O

reproducionismo, a acriticidade e falta de reflexão num processo maior de educação

de LE são simplesmente inquestionados, como esses treinamentos irascíveis e

culturalmente dependentes. Só as rupturas de conhecimento são aceitas e nenhuma

retificação é elaborada. Estamos mais deterministas que a própria física; estamos

sepultando poderes acriticamente e desqualificando vozes que precisam ser

ouvidas.

Voltando ao trecho transcrito entre as duas professoras acima, outro

aspecto me chama a atenção: a coordenação essencializa a idéia de que a

gramática deve ser auto-explicativa e estudada pelos alunos em casa, como se

todos os alunos fossem igualmente curiosos ou autônomos para aprender qualquer

tipo de habilidade lingüística, como a gramática. Mas sente-se uma criticidade

latente das professoras diante da falta de explicação gramatical dedutiva, embora

essa não seja a demanda de muitos alunos. A professora Joelma faz uma

intervenção vinda da experiência da mesma e constata a contradição na idealização

existente de que gramática não deve ser explicada em sala, quando, acima, narra a

reclamação dos alunos diante da prova. Essa é uma posição ambígua de uma

coordenação que idealiza apenas a comunicação em sala de aula e relega a

gramática para casa. Contudo, em vez de testar só comunicação, testa igualmente a

gramática. Pedagogicamente, o aluno se sente desamparado, porque na cultura

local ele será testado naquilo que foi apresentado. Essa autonomia desejada,

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infelizmente, dentro da nossa cultura, ainda é uma demanda que, atualmente, não

pode ser atendida. Nós não temos a cultura de inferir, indutivamente, o

conhecimento formal, nem de ter coletivamente uma disciplina que os especialistas

de ensino de LE idealizam.

T181- ENTREVISTADOR: (00:17:08) Você acha que a gente reproduz criticamente o que a gente recebe? T182- ENTREVISTADA: Uhum... T183- ENTREVISTADOR: Vocês acham? T184- ENTREVISTADA: Creio que não. T185- ENTREVISTADA: O que a gente não... T186- ENTREVISTADOR: A gente reproduz acriticamente (sem crítica) ou criticamente? T187- ENTREVISTADA: Acriticamente. T188- ENTREVISTADA: Sim, a gente reproduz e não... T189- ENTREVISTADOR: Acriticamente. T190- ENTREVISTADA: Não, nessa parte, não. T191- ENTREVISTADA: Eu acho que não, nessa parte não. Porque quando se diz especialmente aqui, no curso, que o aluno é importante, a valorização do indivíduo... na prática, isso não acontece! Não acontece, porque você repete coisas que vêm de fora e você não considera nossa cultura, não é considerado, é... nossos costumes... São coisas prontas e você repete aqui, sem adaptações; que é o que acontece... T192- ENTREVISTADOR: Uma das coisas que... (xxx) (00:17:56) T193- ENTREVISTADA: ...Como se fosse a verdade absoluta.

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194- ENTREVISTADOR: E um dos temas seria a autonomia [...] será que a tendência cultural, entre nós, baianos, é de sermos culturalmente disciplinados, autônomos, no sentido de estudarmos sozinhos a gramática, em casa, como sugerido pelo workshop, anteriormente citado? T195- ENTREVISTADA: Ham, pois é. T196- ENTREVISTADOR: Não estou dizendo que a cultura baiana é melhor ou pior que nenhuma outra, mas que sinto que esse comportamento não é o seu forte. Repetindo, o que eu estou perguntando é: se essa teoria de autonomia dos alunos, anglo-saxônica, estereotipando aqui, de botar o calendário na geladeira, e que no sábado, se não for aquele jantar, não vai ter outra coisa, sem improvisação? Ela é viável para a maioria dos baianos nos cursos livres? Com essa observação, cuido também de não generalizar os povos... T197- ENTREVISTADA: Ham. T198- ENTREVISTADOR: ...Que podem se impor às pesquisas de fora pra cá? É ético? E nós as aceitar... aceitarmos sem questionamento? T199- ENTREVISTADA: Exatamente. T200- ENTREVISTADOR: É, Nívia? T201- ENTREVISTADA: Responda. T202- ENTREVISTADA: Eu falei que não é modificado, não é adaptado. T203- ENTREVISTADOR: Não é adaptado, então é uma coisa que a gente recebe, reproduz acriticamente, está na moda e é essa a concepção de aprendizagem que vamos passar adiante. T204- ENTREVISTADA: (00:19:45) Acho que esse assunto é um excelente tópico para workshops. É idéias... T205- ENTREVISTADOR: Hã? T206- ENTREVISTADA: Idéias, a pessoa tem que ter idéias, e acho que o workshop, o workshop nos in services [seminário de atualização interno] é um passo pra discussão, não é isso?

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T207- ENTREVISTADOR: Exatamente. T208- ENTREVISTADA: E, normalmente, não há discussão, porque você vê os mesmos temas, apresentados pelas mesmas pessoas... T209- ENTREVISTADA: ...Pelas mesmas pessoas sempre e com as mesmas idéias. T210- ENTREVISTADOR: [tosse] Muitos seguindo o modelo do novo método? T211- ENTREVISTADA: Inclusive... T212- ENTREVISTADA Assim... isso aqui é assim... T213- ENTREVISTADOR: ...Errado? T214- ENTREVISTADA: Ridículo! T215- ENTREVISTADA: Isso, inclusive... T216- ENTREVISTADOR: Eu acho isso incoerente.

Nas últimas sentenças, dessa última conversa, vimos claramente que

nossa entrevista leva as professoras a um momento de criticidade que julgamos

importante. Elas criticam a repetição dos in services, oficinas semestrais de

atualização, no início e final de cada semestre letivo, na maioria dos cursos livres. A

interpretação que as mesmas dão é que o reproducionismo acrítico é algo flagrante.

Isso nos remete à falta de dialogicidade freiriana na educação de LE, conceito esse

discutido no capítulo primeiro. Além disso, fica claro que, em sendo os assuntos

sempre os mesmos, o micropoder foucaultiano de sepultar saberes, mantendo-os

intocáveis, se faz presente. A professora Jocelma chega até a sugerir que um tema

nossa discussão fosse tema de um in service mostrando que ela quer desenvolver

aquilo que o professor-formador George imagina ser o certo, o pensamento crítico

nos cursos de formação, embora o micropoder institucional não lhe permita. Assim

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há uma falta de reflexão sobre a educação de LE, localmente, em princípio, pois

talvez esse seja um fenômeno maior, resultando nenhum autonomismo no pensar

metodológico. Talvez esse seja um fenômeno global. Em detrimento de quem? Dos

alunos. Uma das professoras está bem atenta que as produções culturais como a

idéia de autonomia não são transferíveis culturalmente.

T251- ENTREVISTADOR: Vamos, então vamos pro real. Chamot e O‟Malley, na década de noventa, escreveram no seu livro...sobre a teoria de cognição de Anderson e fizeram pesquisas de estratégias de aprendizagem, com quatro grupos de alunos americanos. As estratégias de aprendizagem pesquisadas foram: cognitiva, social, afetiva e metacognitiva em aquisição de segunda língua, o que me parece estranho, porém interessante, juntar aquisição e aprendizagem. O estudo que eu analisei foi o quarto, um grupo de americanos aprendendo russo e espanhol. Então eles consultaram esses alunos sobre estratégias pessoais de cognição. E aí me chama a atenção, a tradução e a repetição, já discutidas e que estão na lista em negrito. T266- ENTREVISTADA: Ah, tá. Certo. T271- ENTREVISTADOR: Vocês acham ético, uma pesquisa tipo essa, de cognição do aluno... (00:27:14) T272- ENTREVISTADA: Hum... T278- ENTREVISTADOR: Ser descreditada por causa de um método que se sobrepõe a ela? E tira essa possibilidade de aproximarmos dos alunos as suas formas de aprender, a sua... opinião. Vocês acham isso ético? Tipo, esse aqui não presta mais. T279- ENTREVISTADA: Não. Mas é assim, é como você falou no início, né? Vão as coisas aparecendo e, em vez de se agregar, se descarta completamente, como se descartou a tradução, como se está querendo descartar a gramática, a repetição, e daí o lema agora é; só isso que presta; tudo que foi feito antes... T280- ENTREVISTADA: ...Isso aqui... T281- ENTREVISTADA: Não vale mais nada; não, eu acho que tem que ser... realmente não é ético, é conveniente. T282- ENTREVISTADA:

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Robélio, só pra entender, isto aqui, [lista de estratégias cognitivas de Chamot e O‟Malley, que está estão completamente reproduzidas no capítulo dois], aqui, é sobre... T283- ENTREVISTADOR: ...É, as estratégias dos alunos... pelos alunos... Como é que eles aprendem. T285- ENTREVISTADOR: É, os autores fizeram um thinking aloud research, pesquisa onde se grava respostas espontâneas dos alunos... e aí ela lança uma estratégia e eles dizem “essa eu uso”, “essa eu não uso” e os motivos. Então nesse estudo longitudinal de um ano e meio, com classes de americanos aprendendo espanhol e russo, eles citam essas duas categorias... T288- ENTREVISTADA: Aham. T289- ENTREVISTADOR: ...Que eu vou chamar de categorias na minha tese... como é que vem um método que e desconsidera isso? T290- ENTREVISTADA: É, como eu já vi acontecer. T291- ENTREVISTADOR: Vocês acham isso ético? T292- ENTREVISTADA: É, o aluno acha importante a repetição, a gramática, o aluno precisa da tradução... T293- ENTREVISTADA: Mas é por que é (xxx) (00:29:45) T294- ENTREVISTADA: Não presta não. T295- ENTREVISTADA: Mas, gente, se dá importância apenas àquilo que está metodologicamente na moda, entendeu? Então tudo o que não é, tudo que está fora, por exemplo, é tachado por muitos professores: “Ah, isso é estruturalista!”... “Eu estou certo, tenho a verdade absoluta, no ensino da língua estrangeira!”. Eu acho que eles... são pseudo-intelectuais...[risos]. T296- ENTREVISTADA: A língua é uma coisa tão, como é o contrário de exata? Inexata né? Que a gente precisa de todas as ferramentas... T297- ENTREVISTADOR: ...Todos os mananciais possíveis...

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T298- ENTREVISTADA: É claro que a gente precisa! Na ciência exata você sabe que é aquilo vai ser aquilo, a vida toda, mas em língua, a língua muda, entendeu, então quanto mais a gente tiver...

Está bem claro, nesse trecho, que a posição dos professores se corrobora

mais, à medida que os mesmos são expostos às informações de pesquisas, como

essa de estratégias cognitivas de Chamot e O´Malley. Eles reforçam sua

compreensão crítica, porque já tinham criado teorias pessoais de ensino, vindas da

experiência usurpada pelo poder sepultado das coordenações que não estimulam o

pensamento crítico de seus professores e não refletem sobre o ato educacional. As

professoras iniciam um pensar crítico e independente e aí vimos a dominação do

chamado “progresso” linear e determinista e o conformismo, dele proveniente.

Enquanto não operacionalizarmos essa “luta”, como sugere Foucault, pela inserção

dos poderes desqualificados de alunos e professores, entre o poder das

coordenações sobre os professores, o aperfeiçoamento do processo de ensino e

aprendizagem se manterá distante do aluno que, enquanto não for qualificado como

elemento desse processo, esse aluno não poderá tornar-se estudante, um “ser com

luz”. Essa terminologia apregoada por pedagogos é uma alegoria como se

julgássemos um livro pela sua capa, no caso, pelo nome atribuído ao mesmo. Um

ponto importante é que, em diversos trechos desse último conjunto de perguntas, as

professoras sentem e exemplificam a falta de ética presente entre partes específicas

do campo, tais quais as estratégias cognitivas dos alunos versus o “novidadorismo”

metodológico.

T299- ENTREVISTADOR: E língua estrangeira? Vocês acham que o ensino de LE seja instrumental, comparado ao ensino de Língua Portuguesa, Sociologia, Matemática, Filosofia? T300- ENTREVISTADA: Instrumental em que sentido? T301- ENTREVISTADOR: Instrumental não no sentido de inglês Instrumental, que a gente conhece, mas a língua nativa é o instrumento para aprendermos uma disciplina normal, “normal” como as citadas, disciplinas conceituais, onde o código, a língua nativa já se constitui o instrumento de acesso como, por exemplo, ao estudar Sociologia, Matemática e, outras, se aprende com certa facilidade, porque o instrumento eu já possuo: a L1. Mas, no caso de inglês em cursos livres, ele é, em si, um código pra

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aprendê-lo, aprender a ele mesmo! Assim, você para aprender inglês, sobretudo em níveis iniciais, usando a língua meta [o inglês], radicalmente, você teria que ter o mínimo de compreensão na LE para poder manipular e produzir a mesma, é o mesmo que tomar uma injeção sozinho sem saber aplicá-la! T302- ENTREVISTADA: É, com certeza... T303- ENTREVISTADA: Então, tem o que, a comunicação e o código. T304- ENTREVISTADA: Certo. T305- ENTREVISTADOR: Né isso? Então, é, vocês não acham que é uma disciplina diferenciada de Matemática, de... (xxx) T306- ENTREVISTADA: Uhum, com certeza! Ah, claro! T307- ENTREVISTADA: Porque você já conhece o instrumento, quando você estuda Matemática, Matemática é o objeto de estudo e o Inglês no caso, como é trabalhado, ele não só é o objeto de estudo, mas é o instrumento que você vai usar para se apropriar de um objeto de estudo, um conteúdo a ser aprendido. T308- ENTREVISTADA: É, isso mesmo! T309- ENTREVISTADOR: Olha que dificuldade, puxa vida, então como é que o aluno vai chegar na sala de aula, vai pegar a cultura e a língua dele e deixar do lado de fora... T310- ENTREVISTADA: Não tem como... T311- ENTREVISTADOR: [...] Não tem como numa situação de ELE? Já na ESL, aprendendo lá fora, não, porque ele é obrigado e também tem a facilidade de estar ouvindo porque ele está imerso na cultura, então... [Se impor: “olha, entrou aqui, não fale Português!” “Eu não sei, eu sou livro L1 „um‟, não sei a língua ainda,...” e o professor, “English! English!”. [Eu ficaria ansioso, incomodado.]

Nesse último trecho, colocamos uma questão que pode ser motivo de

estudos mais aprofundados, futuramente. Não entendemos como colegas nossos,

pedagogos, não sentem as especificidades de cada matéria escolar e sua forma de

ensino. Como refletimos nos parágrafos anteriores, língua estrangeira é uma matéria

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que envolve habilidades sociais, psicológicas, físicas e lingüísticas (BROWN, 1994,

p.48-66). Um aluno adulto, com um ego lingüístico pronto, se aventurará no ego

lingüístico de uma segunda língua, num grupo apresentando todas as características

que um adulto apresenta ao aprender algo novo, principalmente, em geral, a

dificuldade com o medo de errar. As outras disciplinas não expõem os alunos, tão

intensamente, como LE e isso tem uma especificidade, até hoje, pouco relevada por

esses profissionais.

T393- ENTREVISTADOR: (00:38:51) Eu vou passar pra vocês, agora, quadros comparativas com pesquisas sobre expectativas didáticas de estratégias cognitivas com professores e alunos, reproduzida por David Nunan feitas por diversos pesquisadores. Aqui está. Nunan (2000, p. 88-95, tradução nossa) pega a idéia de Richterich sobre necessidades subjetivas dos alunos [as estratégias didáticas dos mesmos], cita brevemente o mesmo, reproduz pesquisas de vários lugares, inclusive de um projeto prático australiano entre a Universidade de Macquire e Ministério de Educação australiano, já descrito em capítulo anterior, em que Bagshaw e Brindley (1983) lhe dão o crédito. Esses experimentam essa idéia de Richterich de ouvir didaticamente os alunos. No quadro um, temos as atividades didáticas, de acordo com a percepção dos professores. Hum. Por favor, dêem uma olhada aí. T394- ENTREVISTADA: Ahn... T397- ENTREVISTADOR: (xxx) (00:40:16) Esse quadro indica a percepção dos professores. T398- ENTREVISTADA: Hum. T399- ENTREVISTADOR: Por favor, dêem uma olhada aí. (00:40:23) [Leitura] (xxx) A indicação bibliográfica está abaixo do quadro aí, ó. E esse quadro é a percepção do aluno, logo abaixo sobre as mesmas técnicas ou estratégias. Aqui...(xxx) T400- ENTREVISTADA: Deixa eu ver uma coisa... percepção de utilidade, tá. (xxx) (00:41:20) Exercícios de gramática, porém, (xxx) (00:41:23) uma coisa mais estruturada. Seria o que, direcionada, né, uma conversação direcionada... T401- ENTREVISTADOR: ...Direcionada... T402- ENTREVISTADOR: Para o aluno, né isso?

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T403- ENTREVISTADOR: É. Uhum... T404- ENTREVISTADA: Hum... T405- ENTREVISTADOR: Ó como ele precisa de conversação estruturada? [...] T406- ENTREVISTADA: É!... [Folheiam o livro] T407- ENTREVISTADA: É. (00:42:16) Isso aqui foi uma entrevista livre? Ou seja, o que é que você acha que é mais significante pra aprender Inglês? Aí, eles falavam gramática. Eles tinham as opções prontas? T408- ENTREVISTADOR: Eu não me lembro bem, Lívia, como foi, aí. Sim. Eram estes itens especificados. T409- ENTREVISTADA: Por que eles não citaram, nenhum citou role play, não citou, nenhum citou pair work, entendeu? T410- ENTREVISTADOR: Não. T411- ENTREVISTADA: Ele não citou. T412- ENTREVISTADOR: E essa é a pergunta, quer dizer, essa é a necessidade deles, desse grupo de alunos. T413- ENTREVISTADA: Será que isso aqui... T414- ENTREVISTADOR: É... T415- ENTREVISTADA: É o que o professor acha bonito... T416- ENTREVISTADOR: A gente apaga a voz do aluno? A coordenação apaga a nossa voz? É o conceito de Kumaravadivelu chamado, Pós-método, que é exatamente a crítica ao apagamento do professor, de suas teorias pessoais adquiridas com a experiência no processo de aprendizagem. T417- ENTREVISTADA: Interessante.

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T418- ENTREVISTADOR: E o quadro três é a comparação das atividades e a percepção de aprendizagem, do estudante versus a do professor, [...], nessa pesquisa australiana. T419- ENTREVISTADA: Ahn... T420- ENTREVISTADOR: Adult Migrant Education Programme, AMEP, e olhe que é ISL, não é ILE. T421- ENTREVISTADA: Aham. T422- ENTREVISTADOR: Está vendo a última aí, (xxx) eu acho que é... T423- ENTREVISTADA: Prática de pronúncia...[professoras lendo pesquisa] T424- ENTREVISTADOR: Por que tem também a moda da indução, o aluno descobre a regra, crença homogênea de que ele não pode traduzir nada. Tem que levar o aluno a pensar, como se todos tivessem o mesmo tipo de percepção e canais de aprendizagem iguais, aqueles citados em Reid (1995). T425- ENTREVISTADA: É. T426- ENTREVISTADA: É, isso aí eu acho bem legal a indução eu acho que fixa melhor. T427- ENTREVISTADOR: Mas, você quer dizer que a indução é universal para todos os alunos? T428- ENTREVISTADA: Não, não é mesmo! T429- ENTREVISTADOR: Você pode impor, uma técnica que você acha legal. T430- ENTREVISTADA: Depende muito também do assunto... T431- ENTREVISTADOR: (xxx) (00:44:03) Se eles são distraídos?. T432- ENTREVISTADA: (xxx) ou viajando.

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T433- ENTREVISTADOR: A nossa cultura local [atual] de ensino reforça a indução, a autonomia, ele, ela, encoraja isso? T434- ENTREVISTADA: (00:44:32) Não. Aqui aparece um aumento de vocabulário mais alto, prática de conversação, correção de erros muito alta, correção de erros! Pode? Mas tem muita gente que inibe, que não gosta de falar. Se Isso inibe? (00:44:40) T435- ENTREVISTADA: Eu corrijo, agora eu corrijo assim, de modo geral. T436- ENTREVISTADA: Outra aqui... ouvir K-7, cd. T437- ENTREVISTADOR: É o que você estava falando, ó: K-7 ou cd. Entendeu? Você falou o quê? Que eles não gostam de repetir? T438- ENTREVISTADA: É T439- ENTREVISTADOR: Talvez seja ouvir K-7. T440- ENTREVISTADA: Na correção, eles próprios se corrigem, é...? T441- ENTREVISTADOR: Baixa. T442- ENTREVISTADA: É muito baixa. T443- ENTREVISTADOR Então, o que acontece, o process writing [processo de composição auto corrigido pelo aluno por símbolos a ele sugeridos], T444- ENTREVISTADA: ...Porque você vai... T445- ENTREVISTADOR: ...Funciona? O process writing que envolve auto-correção, funciona? Diga, Nívia, vou interromper... você. T446- ENTREVISTADA: Não, de acordo com... T447- ENTREVISTADOR: Pode funcionar ou não, por algumas coisas.

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T448- ENTREVISTADA: ... Quando tem um aluno muito bom e um fraco, você pode usar muito a correção, né, um corrigir o outro. T449- ENTREVISTADOR: Claro. T450- ENTREVISTADA: ...Mas se você tem dois alunos fracos, pronúncia, como é que um vai corrigir o outro? T451- ENTREVISTADOR: Mas a auto-correção é um exercício de process writing, processo de escrita para desenvolver autonomia de auto-correção; você escreve e símbolos são dados para o aluno se auto corrigir, como vocês sabem... T452- ENTREVISTADA: Ah, tá, que você não diz logo que tá errado, induzindo a descobrir os erros? T453- ENTREVISTADOR: (xxx) (00:45:50)... Símbolos como S para spelling, ortografia, P para punctuation, pontuação, dentre outros , são abreviados ao lado do erro. T454- ENTREVISTADA: Eu nunca faço isso. T455- ENTREVISTADA: Não dá. T456- ENTREVISTADOR: Eu também deixei de fazer. T457- ENTREVISTADA: Eu sei que em outros cursos é só assim. T462- ENTREVISTADA: O que acontece é hipocrisia. Você faz feedback que, aqui na escola, eles consideram legítimo, fazer feedback. O feedback é em relação às aulas e em relação ao professor, não é em relação ao método. T463- ENTREVISTADOR: Não. T464- ENTREVISTADA: Não, o método é inquestionável. T465- ENTREVISTADOR: É inquestionável. T466- ENTREVISTADA:

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É, interessante isso. T467- ENTREVISTADA: Então, se o aluno questionar o método, nada vai ser levado em consideração, porque o método é considerado verdade absoluta. Agora, se o professor está errado, é chamado atenção... T468- ENTREVISTADOR: É. T469- ENTREVISTADOR: Bom, toda essa manipulação de informações, todo esse equívoco de pesquisas versus novos métodos e, o apagamento do papel do aluno, isso lhes soa ético, no nosso universo de ensino? T470- ENTREVISTADOR: (00:47:23) Nem ético, e precisando ser revisto. T471- ENTREVISTADA: Aético, completamente.

Diante da tabela comparativa mostrada às professoras elas constatam

que a homogeneização de formas de aprender é impossível. Ensinar indutivamente

não contemplará todos os estilos cognitivos de uma sala de aula de LE.

ENTREVISTA III - COORDENADOR: VALDER (00:02:34 ~ 00:07:57) T1- ENTREVISTADOR: Então eu queria saber dessas estratégias escolhidas pelos alunos, nesse quadro que estou entregando agora. Você usa alguma ou o método está acima dessas estratégias, na cognição desses alunos? T2- ENTREVISTADO: Olha, eu estou dando uma olhada muito superficial, certo, Robélio? T3- ENTREVISTADOR: Certo. Mas Walder, antes de começar, gostaria de saber se você conhecia essa pesquisa de estratégias cognitivas, nesse livro de Chamot e O´Malley (1995) [mostro a pesquisa e a página do livro ao coordenador]. T4- ENTREVISTADO: Quer dizer que agora vai ser assim, os alunos é que vão mandar no nosso planejamento? T5- ENTREVISTADOR:

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Não exatamente, Walder, a idéia é que eles sejam ouvidos e expostos, de forma prática, às estratégias excluídas, tradução e repetição. T6- ENTREVISTADO: Talvez se eu olhar esse quadro mais calmamente, talvez eu encontre alguma coisa aí que eu considere não, não utilizável. Quer dizer que você tem alguma estratégia que você é... não usa apenas por achar que aquilo ali não, realmente não ajuda a pessoa a, a aprender de fato. Por exemplo: fazer um drill não é o tipo de exercício que eu tenha o hábito de fazer muito, mas eu não tou vendo o drill, também não, eu estou vendo substitution. T7- ENTREVISTADOR: Aqui, na categoria repetition. T8- ENTREVISTADO: É, também substitution... substituição, que não deixa de ser uma substituição de palavras [léxico]. Tem a parte de repetition que envolve drills, envolve... Mas eu acho assim, que, que... T43- ENTREVISTADOR: E daí a pergunta sobre a incompatibilidade entre essa pesquisa cognitiva com os alunos e as abordagens da moda, dos novos métodos, que são empacotados e importamos. (00:08:53 ~ 00:11:42) T44- ENTREVISTADO: É. T45- ENTREVISTADOR: E o que é a realidade que a gente, às vezes, (xxx) (00:09:16) T46- ENTREVISTADO: Eu acho que são, eu acho que são duas coisas separadas, na verdade. Eu acho que primeiro as pessoas precisam da novidade.

A idéia da perda, divisão e negociação do poder é flagrante na fala do

coordenador, quando ele me questiona se, a partir de agora, essa novidade, a

pesquisa de cognição ouvindo os alunos, daria a eles o poder na didática das aulas

de LE - na sua formação, ele desconhecia essa pesquisa de estratégias cognitivas

assim como eu, até ler o livro integralmente. Por razões já esclarecidas aqui, a

mesma foi omitida em dois cursos livres onde ensinei. Ela poderia ir de encontro aos

princípios de novos métodos, embora, se não vista linearmente, pudesse ser

integrada aos mesmos]. Essa posição nos deixa à vontade para exemplificar e até

provar o que Foucault diz sobre os poderes sepultados e desqualificados: como é

difícil desconstruir a idéia de que o aluno não é uma tabula rasa. Na desqualificação

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do behaviorismo, coordenadores e professores acabam não vendo o aluno e suas

respostas nessas pesquisas de cognição, não divulgadas nos cursos de LE. Embora

ele desconhecesse essa pesquisa de grande credibilidade na área, ele a encara

como algo novo que ameaçaria o poder dos professores e das editoras e de seus

lançamentos. Ele nos comprova o que detidamente falamos na problemática: como

somos lineares no nosso campo. Vale o que é novo e nunca o que ameace o novo.

Assim, num primeiro momento, ele se torna um detentor do poder sepultado e

desqualifica os resultados de pesquisas dos desqualificados ouvidos, os alunos. Na

medida em que é questionado criticamente ele se move para uma adesão razoável

às razões dadas para a inclusão dos mesmos, de suas estratégias cognitivas no seu

processo de ensino-aprendizagem.

Nos bastidores conversamos que nosso enfoque seria as pesquisas

cognitivas com os alunos, atropeladas pelo “novidadorismo” dos métodos dos

approaches, abordagens e que duas estratégias excluídas seriam analisadas. O

coordenador em questão diz não ter hábito de fazer drills, embora não lhe tenha

perguntado isso. Acho que ele logo se posiciona contra a repetição e em nossa

opinião, não a exclui totalmente, para não parecer preconceituoso. O pouco uso ou

nenhum uso dessa técnica é justificado pelo receituário que inconscientemente,

nessa enunciação, é dito nas entrelinhas pelo mesmo, quando fala que as técnicas

que ele acha que não ajuda os alunos, dentre as quais os drills, são usadas com

pouca freqüência.

T60- ENTREVISTADO: É. Eu acho que essa coisa do, do novo, do mudado, de trazer uma idéia, nova mesmo que seja copiado de uma idéia mais antiga, é a necessidade de mercado.

O coordenador em questão, aceita retificações do passado, mas do ponto

de vista do poder sepultado que ele detem, posição claramente igual à que Foucault

descreve dos médicos, em relação aos paramédicos. Ele não entende a mudança,

em relação ao ouvir o aluno, ou seja, sair do lugar de poder, de coordenador ou,

repetindo Foucault, de médico e inserir o aluno como partícipe desse processo.

Como ele cita: “Eu uso qualquer coisa, basta eu notar que vai servir para

o aluno.” Mas tem coisas que só o aluno, quando exposto poderá dizer se vai servir.

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A seguir expõe a indução sutil como sua forma de ensinar. Perguntamos: e se o

aluno não for tão sutil, e se ele precisar de uma dedução, algo mais direto como as

alunas Hosana e Kaline diziam: “Eu preciso de segurança, de sair daqui entendendo

bem o que me foi exposto.” Há de se consultar o aluno e, não, se criar apenas

crenças egóicas pessoais. Ele disse: Tinha suas preferências. Perguntamos: e as

preferências dos alunos, o discernimento da forma de aprender desses, ficam

negligenciados? Mas o coordenador frisa as “suas” preferências.

T74- ENTREVISTADOR: (xxx) (00:12:57) Eu acho que você tem que usar o bom senso. T75- ENTREVISTADO: Você tem que ver o que há de bom em tudo e aproveitar. T76- ENTREVISTADOR: Com certeza. Então, então você usaria qualquer coisa, né? T77- ENTREVISTADO: Usaria sim, sem preconceito. T78- ENTREVISTADOR: Sem preconceito, né? T79- ENTREVISTADO: Sem preconceito. Se eu achar, se eu acreditar realmente que aquilo ali vai, é o que vai servir para aquele aluno, para aquele grupo de aluno, eu faço. Agora é claro que eu tenho as minhas preferências, né? T81- ENTREVISTADO: Por exemplo, eu sou muito mais, é, pegar, digamos assim, um assunto e começar a trabalhar com ele sutilmente com os alunos, de uma forma (xxx) (00:13:44) o que está acontecendo, pra mais tarde vir a analisar, compreender. Eu gosto muito dessa coisa de inverter... T82- ENTREVISTADOR: Inverter. T83- ENTREVISTADO: O processo, mas tenho preconceito, também. T84- ENTREVISTADO: Ou seja, pouca prática e muita expectativa. A verdade, o que acontece é que a correção de erro importa...

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(00:23:38 ~ 00:25:50) T85- ENTREVISTADOR: Porque veio no pacote do Natural Approach, abordagem natural, né? T86- ENTREVISTADO: É, não se deve corrigir, deixa que naturalmente ele vá, mas a gente... T87- ENTREVISTADOR: Aluno adulto... T88- ENTREVISTADO: Mas a gente sabe que não é bem assim, né, que tem coisa que tem que ser corrigida, que tem coisa que pode ser feita de outra forma, tem coisa que, né? Pra cada tipo de erro um tipo de correção, né? T89- ENTREVISTADOR: (xxx) (00:24:06) T90- ENTREVISTADO: Isso, né, momento, qual é o momento. T91- ENTREVISTADOR: Mas tem os alunos, aí eu prefiro essa sondagem, né? T92- ENTREVISTADO: Aluno espera o tempo inteiro [por correção]. T93- ENTREVISTADOR: É, tem um que sempre diz: professor, o senhor não corrige! T94- ENTREVISTADO: Na verdade ele que ser corrigido o tempo todo, em qualquer situação, quando a gente vai falando, pensando, gemendo, eles querem ser corrigidos. T95- ENTREVISTADOR: Eu perguntei isso, também, a alguns alunos, de turmas de adultos, e eles disseram que querem ser corrigidos. T96- ENTREVISTADO: Hunrum. Agora... T97- ENTREVISTADOR: (xxx) (00:24:29) T102- ENTREVISTADO: É, agora, outra pergunta do aluno que vem é... T103- ENTREVISTADOR: (xxx) (00:24:35)

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T104- ENTREVISTADO: E ao ser, e ao ser feita essa correção, será que nunca mais eu vou errar? T105- ENTREVISTADOR: Não se sabe. T106- ENTREVISTADO: (Risos) Né? T107- ENTREVISTADOR: Não se sabe, é... T108- ENTREVISTADO: Então, até que ponto... T109- ENTREVISTADOR: Eu acho que não... T110- ENTREVISTADO: Até que ponto ocorrerá... T111- ENTREVISTADOR: Eu acho que vai haver erro. Agora, eu acho que deve haver... T112- ENTREVISTADO: Você atende às expectativas dele. T113- ENTREVISTADOR: Atende às expectativas dele. Então, ele vai se sentir melhor no aprendizado. T114- ENTREVISTADO: Mas se ele, realmente, não vai errar... T115- ENTREVISTADOR: Mas também a gente não pode dizer o contrário. T116- ENTREVISTADO: Não tem como provar. T117- ENTREVISTADOR: Não tem como provar... Mas nos parece que é melhor que saia seguro da aula, entendendo o assunto corrigido [aprendizagem significativa], porque terá uma referência segura de compreensão da LE, não sei se de realização lingüística oral, mas ele pelo menos sai com a referência de alguma coisa certa. Se vai colocar isso na oralidade, por exemplo, cabe aí outra pesquisa. Pelo menos ele se depara com a forma certa. É melhor sair da sala entendendo com segurança o exposto, e depois, refinar seu conhecimento, do que sair inseguro e chegar no SOS [aulas de tira-dúvidas] de vocês desesperado, como nos contou duas professoras. E a queixa da maioria dos alunos é que a professora não explicava aspectos da língua e, por isso, eles recorriam ao SOS.

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T123- ENTREVISTADOR: [...] Alunos do livro quatro, por exemplo, me pediram: “Professor, eu escrevo com conjunções, e preciso delas para redigir.” Aí eu providenciei alguma coisa de conjunção para dar a eles (xxx) (00:38:41). (00:38:00 ~ 00:40:00) [...] que não esta no syllabus, conteúdo, do método.

Essa é uma dificuldade nos cursos de língua, localmente, em usar o livro

acriticamente e seguir o syllabus, conteúdo e orientação metodológica, sem

restrições ou adaptações. Assim, os livros ficam intocáveis, o conteúdo, “imexível” e

se há demanda de conjunções pelos alunos adultos, não se faz essas adaptações

ao livro para sanar essa falta. A seguir, a entrevista segue para os quadros

comparativas de expectativas de alunos e professores sobre estratégias e

atividades.

T130- ENTREVISTADO: Pairwork. Engraçado, eles não gostam de pairwork, né? Eles acham, eles pensam assim: “poxa, eu tou aqui conversando com o meu colega, meu colega não sabe inglês suficiente para me corrigir e eu não sei o suficiente para corrigir ele; o professor tá lá do outro lado da sala conversando com outro pair, par e nós não estamos usufruindo nada dessa atividade, detesto essa atividade”. Aí o professor: “Não, é bom deixar eles sozinhos porque, por si só eles se vão trabalhar mais, eles ficam mais à vontade, eles se sentem menos pressionados pela presença do professor, vão se soltar e falar mais. Ledo engano.” T132- ENTREVISTADOR: Aqui passo para você um quadro com as expectativas didáticas do aluno, isto é, suas preferências estratégicas. (00:42:00 ~ 00:48:53) T136- ENTREVISTADO: E... E, a partir desse quadro, você me pergunta o quê? T137- ENTREVISTADOR: Eu perguntei a você se tinha conhecimento desse quadro, e as suas impressões. T144- ENTREVISTADO: Não. Algumas batem e outras não, mas aí é compreensível, se foi aplicado na Austrália para um grupo de imigrantes, pessoas que estão lá e precisam do inglês para o dia a dia e para as suas exigências. E uma realidade diferente... T145- ENTREVISTADOR: O ponto aí não é a realidade local, mas é a dificuldade nossa, atitude de omissão em buscarmos sem preconceitos o que o aluno precisa, como naquela pesquisa, anteriormente mostrada, sobre as estratégias cognitivas dos alunos, que você desconhecia e é importantíssima para esse processo. E esse projeto australiano foi

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posto em prática. Mas você concorda que essa divergência pode existir, independendo do lugar? T146- ENTREVISTADO: Que existe a divergência entre as expectativas de professores versus alunos? T147- ENTREVISTADOR: Sim. Esse comparativo é importante? T148- ENTREVISTADO: É. T149- ENTREVISTADOR: Essa preferência do aluno, no caso a necessidade da gente não olhar para o nosso umbigo, sair desse narcisismo “professoral” e ir mais ao encontro das demandas dos alunos, né. T150- ENTREVISTADO: Isso, eu acho interessante. T151- ENTREVISTADOR: Eu acho muito importante. T152- ENTREVISTADO: Acho, acho importante. T153- ENTREVISTADOR: Quer dizer... O professor deixa a coisa fluir [...] que é que está mais em voga, então ele não vai top down, de cima para baixo, né, e, buttom up, de baixo para cima, isso aí que acho legal. E que é uma relação de poder que a gente, não está conscientizado; as coordenações com o professor e o aluno não se articulam com essa relação de poder para permitir que isso venha a acontecer, entendeu? T154- ENTREVISTADO: E agora com essa questão da interdisciplinaridade. T155- ENTREVISTADOR: É, se em nosso campo nem exercemos a multurefrencialidade de nossa bibliografia, imagina sermos transdisciplinares. T164- ENTREVISTADO: Eu acho que é importante o seguinte, Robélio, que o professor se veja profissionalmente na obrigação de conhecer, aprender. Ele pode até não aplicar, não gostar, não acreditar, mas eu acho que ele, como professor, ele tem a obrigação de saber, de conhecer. Eu, por exemplo, gostei de conhecer o seu quadro [quadro disponível Nunan, 2000]. Então eu acho que, eu acho que o professor tem que conhecer pra poder escolher. T165- ENTREVISTADOR: É, pra poder escolher, pra poder implantar (xxx) (00:45:41)

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T166- ENTREVISTADO: Pra poder até dizer que não acredita nisso, ele precisa conhecer. Se ele precisa experimentar, eu não sei, mas ele precisa conhecer. E outra coisa...] T167- ENTREVISTADOR: Mas em todos os cursos onde entrevistei profissionais da área, nenhum deles conhecia essas pesquisas de expectativas do aluno e do professor... T168- ENTREVISTADO: É, eu acho, eu acho que a própria, a própria preocupação de é, ver o ensino, a partir do, do aluno... T169- ENTREVISTADOR: Das subjetividades didáticas de cada aluno... T170- ENTREVISTADO: Eu digo que o próprio, o próprio pensamento dessa sua pesquisa... é... nortear o... aprendizado a partir dos, das expectativas, necessidades dos alunos, isso mesmo é uma vertente. T171- ENTREVISTADOR: Uhum. Vertente de... T172- ENTREVISTADO: De pensamento, de crença, entendeu? Até isso que a gente está aqui dizendo... T173- ENTREVISTADOR: Não necessariamente de crença, mas de poder, o poder das crenças que se cristalizam, o poder que não consegue ver o quanto ele, teórica e praticamente, é copiado do mundo anglófono, e o quanto ele exclui vozes, como,as vozes de alguns professores mais críticos e a voz de alunos, de como eles aprendem... alijando partícipes do seu processo de aprender... Desejo acrescentar, não essencializar. T174- ENTREVISTADO: Falando tão bem dela, não deixa de... T175- ENTREVISTADOR: Eu não sei se tão bem, mas uma coisa que, que... T176- ENTREVISTADO: Importante? T177- ENTREVISTADOR: Que poderia ser feita, né? Poderia T178- ENTREVISTADO: É, não, eu acho que é uma coisa que a gente ta aqui falando. Até isso... T179- ENTREVISTADOR: Eu não idealizo nada, eu não acho que... que...

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T180- ENTREVISTADO: Não, mas eu digo que... que a própria preocupação com o aluno... T181- ENTREVISTADOR: De ouvir esse aluno. T182- ENTREVISTADO: De ouvir o aluno para, a partir daí, estabelecer como você vai trabalhar... T183- ENTREVISTADOR: De uma forma aberta. T184- ENTREVISTADO: Até, até isso é uma maneira de encarar uma nova vertente, dentre as outras que a gente já falou aqui, entendeu? Nem isso pode ser considerado uma coisa à parte, é uma parte do todo. T185- ENTREVISTADOR: É. T186- ENTREVISTADO: Agora eu acho que é importante, muitas vezes negligenciar. As pessoas estão muito... até aqui dentro desse curso livre, mesmo, onde as pessoas pensam mais abertamente, até o próprio fato de ser uma instituição com testes, notas e todas essas limitações institucionais já torna o trabalho diferente. T187- ENTREVISTADO: A idéia do marketing como um todo é uma boa idéia, porque significa pesquisar o mercado pra saber o que o mercado precisa. (00:52:07 ~ 00:54:36) T188- ENTREVISTADOR: Satisfação de quem está aqui? T189- ENTREVISTADO: Só que isso é feito de uma forma e na hora que o produto é confeccionado, para atender essa demanda; ele não vem totalmente como o aluno quer. T190- ENTREVISTADOR: E você acha impossível (xxx) (00:52:27) T191- ENTREVISTADO: Eu acho que o aluno é enganado, na verdade. T192- ENTREVISTADOR: Enganado. T193- ENTREVISTADO: Ele é enganado. O curso vai, ouve o mercado, ah... o mercado quer isso, então vamos fazer isso, aí faz a propaganda. Propaganda confere direitinho com a vontade do aluno. Aí quando ele entra na escola, que ele começa a estudar, que ele vai

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pegar o livro, que ele pega o professor, que ele... aí nada vai combinando com o que tava na propaganda, e ele vai se desiludindo aos pouquinhos e fazendo queixas e reclamando. Se as queixas forem ouvidas e atendidas, ótimo, que daí a escola vai mudando, mas senão vai perdendo aluno, todo semestre entra... T194- ENTREVISTADOR: E se não esperasse tanto esse aluno e tentasse educar os nossos professores mais realisticamente, vendo os estilos desses seus alunos, suas preferências, isso não seria uma, uma atitude descentralizadora o que deixaria o aluno mais próximo do professor e de suas expectativas?... T195- ENTREVISTADO: Não, eu acho que teria que mudar a própria idéia da empresa, a princípio, esquecer que é empresa. T196- ENTREVISTADOR: Não, eu estou falando de coisas simples, assim, de coisas acadêmicas, da sua área mesmo, por exemplo, de levar aos professores a fazerem uma consulta como essa, expondo técnicas e perguntando se elas ajudam e o por quê, você acha isso impossível? T197- ENTREVISTADO: É, eu acho que feedback, né? É uma coisa fundamental. O professor que não trabalha com feedback, ele pisa na bola, legal! Porque chega no final do semestre (xxx) (00:53:30) aluno que não tava satisfeito, aluno que não entendeu por que perdeu, né? A própria idéia de perder, em si, já é uma coisa que, né? T198- ENTREVISTADOR: Cultural. T199- ENTREVISTADO: É, que mais? É... o professor... T200- ENTREVISTADOR: (xxx)... T201- ENTREVISTADO: O professor termina o semestre, ele acaba, ele não faz a menor, não tem a menor noção do, dos alunos que teve o semestre inteiro, ele passou o semestre inteiro destilando atividades na frente dos alunos, trazendo mil coisas, um entretenimento despreocupado com o prazer do outro. É um entreter baseado naquilo que o professor supõe que tá funcionando, que vai funcionar, mas aí se ele não pára periodicamente, constantemente para saber se funcionou ou se não funcionou, se o aluno gostou ou se não gostou, se era aquilo mesmo que ele queria, e não muda, continua sempre naquela linha, ele termina o semestre e não conhece ninguém. T202- ENTREVISTADO: Mas eu adoro ser cobaia deles, né. (00:56:00 ~ 00:56:12) T203- ENTREVISTADOR:

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É, mas eu acho que é o contrário. Precisa se criar uma “ouvidoria” com o aluno, expondo técnicas e perguntado de sua eficácia. Acho que isso é um desenvolvimento do aluno, no processo em que ele está. T204- ENTREVISTADO: Eu acho que deveríamos ser muito mais. Talvez, nós cobaias dos alunos do que os alunos cobaias, vamos deixar eles nos levarem. T205- ENTREVISTADOR: É isso que você falou aí, mas podemos ser extremistas, maniqueístas, ser tudo, nós sermos cobaias deles, nem eles serem cobaias da gente, unicamente, mas temos que combinar isso negociando, ao expor diferentes formas de aprender?

O professor, neste último trecho, acha que o que estou pesquisando e

sugerindo seria uma nova abordagem totalizante, onde os alunos seriam única

prioridade didática. Insinua que o que estou fazendo é o mesmo que luto contra: um

novofagismo.

Ele pensa que estou querendo dizer que a observância da análise

subjetiva dos alunos na didática é “a solução”; enquanto que aquilo que busco é

empoderar a voz do aluno, também, nesse processo.

ENTREVISTA IV: – COORDENADORA CONSUELO (00:03:50 ~ 0:05:20)

Antes de começar a entrevista, lemos a definição de currículo, a seguir,

para a coordenadora Consuelo e lhe perguntamos quem seriam os atores da cena e

se eles poderiam ser mais participativos e envolvidos com a forma de ensino de

suas aulas. Segundo Fleuri (2003, p. 71) o espaço educativo é perpassado por

múltiplas relações entre padrões culturais diferentes, que tecem uma gama

complexa de teias de significações. Essas teias que se estabelecem na relação

entre sujeitos com padrões culturais específicos e diferentes é a substância da

educação intercultural.

T1- ENTREVISTADOR: Como é que você se sente em relação à essa... essa definição do currículo. T2- ENTREVISTADO:

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Eu acho uma declaração bem pertinente, né? A... a... a definição, né?, do que é um currículo. Porque aí serve como um guia pra determinar os objetivos de um determinado curso, sendo que, na nossa prática de... de curso de língua, infelizmente, esse currículo, né, de intenções pra um determinado curso não tem sido desenvolvido baseado nas necessidades da escola. E se ele tem sido eh... digamos, praticado de acordo com os seus livros didáticos (xxx) ainda não chegamos no estado de excelência de ter um currículo, eh... com fundamento, né? Desde essas... eh... pensar nessa definição do que é um currículo e a partir daí... Bom, o que que a instituição entende? O que que a instituição quer a partir daí? Quais são os objetivos, quais são as... as metas. T3- ENTREVISTADOR: Que crença filosófica, por exemplo, da educação está por trás do ensino aqui? T4- ENTREVISTADO: Por trás disso. Exatamente. Então, existe aquela coisa assim, aquela escola: escola de inglês, de Espanhol, né, que vai levar o aluno a se comunicar... Esse syllabus, conteúdo e escolha de procedimentos metodológicos, não foi... criado, determinado por um currículo maior, por uma... uma... uma escolha maior.

A primazia didática do livro de inglês fica clara na fala da coordenadora,

quando diz que o livro é essencial ao curso livre, norteia sua existência e, nesse

momento, pouco se faz ou quase nada se faz para se refletir sobre essa realidade.

Assim, sentimos que a relação de dialogicidade entre método, professores e

coordenação e um total desconhecimento das necessidades subjetivas do aluno na

didática são ignoradas. Afinal, estratégias e técnicas são lados da mesma moeda.

Em resumo, não existem questionamentos sobre o lugar do aluno nesse processo

cognitivo. E, essa atitude nos deixa perplexos, confirmando nossa insistente

discussão questionando a eficácia da linearidade das seqüências dos métodos

materializadas no livro didático. Novos métodos e livros didáticos são bíblias que

fundamentam o ensino de LE em cursos livres de LE. Isso se confirma no trecho

abaixo, quando a coordenadora diz estarmos na fase do syllabus, do conteúdo, da

didática do novo método. Enfim, professores-técnicos.

T5- ENTREVISTADO: Porque eu acho assim, que nós... nó... os profe... os profissionias envolvidos na escola ainda não estão eh... maduros. Não é maduros. Ah... mas o estágio do desenvolvimento profissional ainda não chegou nessa excelência de educação. Eu acredito que as pessoas ainda estão muito lidando com a língua. Ensinar a língua, ensinar a língua. Ensinar o conteúdo lingüístico, mas não dentro de uma esfera maior. (0:05:50 ~ 0:60:21)

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T6- ENTREVISTADOR: Dentro de uma esfera maior que o currículo sugere. T7- ENTREVISTADOR: O que eu gostaria de comentar, na verdade, é se nessa... nesse processo de planejamento, de implementação esse currículo é avaliado. Então, isso não existe aqui. (0:08:32 ~ 0:08:51) T8- ENTREVISTADO: Não. Dentro da... dessa descrição que foi feita aqui, dessa definição de currículo, não. T9- ENTREVISTADOR: Por tudo isso que a gente já falou, a gente está ainda no syllabus, né? (0:10:30 ~ 0:10:39) T10- ENTREVISTADO: Imposto pelo livro didático. T11- ENTREVISTADOR: O syllabus imposto pelo livro didático. T12- ENTREVISTADO: Muitas vezes, o que o professor faz na sala de aula não bate com as expectativas do aluno. E aí, vem a frustração. Ele deixa o curso, ele... (00:13:25 ~ 00:17:41) T13- ENTREVISTADOR: Por causa das aulas?. T14- ENTREVISTADO: É. Ele na... sente que... aquela inquietação durante as aulas. Ele sente que as au... o professor não consegue atingi-lo. Mas por quê? Porque ele não entendia... não entende que, pelo menos, o que a escola espera dele é um determinado tipo de... de.. de aprendizagem, né? O que a escola dá pra ele, aliás, muitas vezes, não bate com o estilo dele. T15- ENTREVISTADOR: Então, isso é um problema institucional e “marketeiro”. T16- ENTREVISTADO: É. Eu acredito que sim, mas não há uma... eu não tenho sentido da... da... dessa instituição... não da coordenação. Mas eu digo assim, (xxx) essa preocupação em fazer com que o aluno, o cliente que chega no balcão saiba dessas coisas. T17- ENTREVISTADOR: Saiba só que o método é comunicativo, lexical? T18- ENTREVISTADO: É. Tem que ter uns jargões assim, tal, tal, tal, mas eu ainda até acho pouco. Até... isso eh... eh... baseado nessa... inspirado nessa falta de conhecimento de quem

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atende o aluno. Foi no ano de 2005, se não me engano, Professor Carlos oferecido pra os funcionários do call center, serviço de atendimento de matrícula por telefone e para o pessoal da recepção, um treinamento... T19- ENTREVISTADOR: (xxx) (00:14:50) T20- ENTREVISTADO: Um curso treinando... um treinamento pra que essas pessoas entendessem o que é aprender língua, o que é que está por trás do aprendizado de língua, pra que na hora em que fossem vender o produto, eles estivessem mais embasados. T21- ENTREVISTADOR: Hum, hum. T22- ENTREVISTADO: Então, aí tem uma semente. E poderia fazer parte desse currículo maior, né? Que é envolver quem está envolvido em matrícula... para que se tenha um discurso mais abrangente e claro. T23- ENTREVISTADOR: Certo. Isso é uma parte da história aí, interessante. Agora, o que eu... estou lembrando aqui é se esse aluno é ouvido no dia a dia. T24- ENTREVISTADO: Olha. T25- ENTREVISTADOR: Na sala de aula. T26- ENTREVISTADO: Olha, eu acho que o professor, como ainda está muito eh... eu digo pela minha própria experiência, muito... preocupado com... se o que ele planejou vai... vai acontecer se o que ele... entendeu? Então, ele não se preocupa muito... e aí... ele... ele é a questão. T27- ENTREVISTADOR: Eu estou olhando aqui, mas eu estou ouvindo, viu? T28- ENTREVISTADO: Certo. A questão de perguntar ao aluno o que ele acha da aula, né? Seria uma parte, assim, essencial pra você ter essa escuta. T29- ENTREVISTADOR: Sim. Mas o feedback, como é o feedback daqui? É o professor é bom, o que que é? T30- ENTREVISTADO: Não, não, não,não, não. T31- ENTREVISTADOR: O professor é ruim...

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T32- ENTREVISTADO: Teoricamente, o professor deve, ao final da aula, ao final de alguns blocos de aula, perguntar ao aluno como ele está indo. T33- ENTREVISTADOR: Em relação ao que foi dado. T34- ENTREVISTADO: Do que foi dado. T35- ENTREVISTADOR: Do conteúdo e do (xxx) (00:16:16) T36- ENTREVISTADO: Exatamente. Mas o que eu percebo é que, muitas vezes, essa parte é pulada, porque o profesor está muito ocupado ou preocupado em cobrir o plano. Então, nesse caso, não é uma parte essencial. É como se ele não (xxx) ele tem que planejar as aulas baseado na necessidade do aluno. Mas, na verdade, eu acho que ele planeja as aulas baseado no que o syllabus, conteúdo do livro e metodologia, impõe. T37- ENTREVISTADOR: Impõe? T38- ENTREVISTADO: (xxx) (00:16:59) Ah, meu aluno no final da aula disse que não tinha entendido tal coisa. Agora eu vou planejar a lição em cima disso. Mas se ele nem sequer perguntar, pelo tempo, ou... fica inviável essa escuta. T39- ENTREVISTADOR: Hum, hum. T40- ENTREVISTADO: Né? Eu acho... no caso da minha experiência, mesmo ensinando... que eu não tenha... mesmo que eu não tenha tempo de perguntar... de fazer a pergunta “O que foi que você entendeu da aula de hoje?”, eu... eu já consigo, assim, por outros mecanismos, identificar... T41- ENTREVISTADOR: Pela produção... pela prática? T42- ENTREVISTADO: Exatamente. Que a coisa não ocorreu. Mas pra outros professores, não. T43- ENTREVISTADOR: Por causa da tensão do conteúdo? T44- ENTREVISTADO: Do syllabus, conteúdo do livro e metodologia,

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T45- ENTREVISTADOR: E por causa da experiência de cada professor, muitas vezes também? T46- ENTREVISTADO: Exatamente. T47- ENTREVISTADOR: Por causa da sua experiência? T48- ENTREVISTADO: Exatamente.

Nesse trecho a coordenadora de novo fala de um professor “policial”,

aquele que persegue o syllabus, conteúdo do livro e metodologia. Ela confirma não

haver nenhuma dialogicidade, na experiência da mesma, do que os alunos têm

como expectativa de forma de ser ensinado com o que, realmente, é ensinado. Nos

parece que ela tem a sensibilidade de entender essa demanda, mas nos parece que

desconhece pesquisas de estratégias cognitivas dos alunos e o conceito de Needs

Analysis subjetiva, necessidades subjetivas desses alunos na didática, que é a

inserção dessas estratégias, sua escuta e consequente implementação das mesmas

. Enfim, nos parece que a mesma esteja desconectada das pesquisas que

comprovam essas estratégias, mostrando, comparativamente, a existência de uma

lacuna entre o que o professor planeja e a forma com a qual o aluno prefere

aprender. Acho que ela fala mais de um lugar freiriano teórico, o que confirma sua

sensibilidade para a escuta do aluno em curso livre de LE. Isso poderá se confirmar

ao longo dessa entrevista. A seguir, discutiremos o apagamento da voz do aluno, no

processo educacional de LE, nesse curso.

T51- ENTREVISTADOR: O currículo aqui seria o syllabus, o conteúdo programático e didático. Ele é modificado, de alguma forma, pelos docentes e discentes, pelos professores e alunos, ao chegar o livro didático? (0:17:50 ~ 0:18:07) T52- ENTREVISTADO: Pelo aluno, nunca. (risos) T53- ENTREVISTADOR: Pelo aluno, nunca?

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Parodiando as palavras do proprietário de um curso livre de LE: os

centros de atenção no ensino de língua podem ser diversos. Inclusive o aluno. E

parece que isso não ocorre, como confirmamos nesse trecho acima, com essa

coordenadora. Rupturas e implementações de novos métodos são atitudes correntes

nos cursos de LE Não existe complexização do processo educacional, como sugere

Morin, às vezes, mascarada pela falta de tempo ou pela falta de um descentramento

dos atores do processo ou por falta de conhecimentos além dos produzidos pelos

experts anglófonos da área, constituindo um falso cartesianismo de que o progresso

é necessariamente linear e nunca, circular. As mudanças são lineares. O melhor é o

mais “jovem”. Não há amadurecimento para reflexão nesses cursos. Estar atualizado

com a produção especializada da área é estar eficiente, é ser profissional. O

apagamento da opinião de estratégias cognitivas do aluno continua óbvio, neste

pequeno trecho, abaixo.

T58- ENTREVISTADOR: E o professor... não pergunta ao aluno, não sondar o aluno? (0:19:00 ~ 0:19:30) T59- ENTREVISTADO: É. Eu acho que o professor... o professor tem uma impressão do que é que... não satisfaz aquele aluno. Mas ele não necessariamente aponta o que ele já tem lá pra, tipo: “Agora eu vou trabalhar com o que você está precisando”. T60- ENTREVISTADO: [...] e fazer suas escolhas, ele também... ele... bom, quando ele não tem nada por trás, não tem um currículo que diga a ele como ele vai andar... (0:19:40 ~ 0:20:30) T61- ENTREVISTADOR: Filosofia de educação? T62- ENTREVISTADO: De educação. Então, assim, as escolhas dele são feitas de forma aleatória. Eu acredito. Entendeu? Não tem uma... uma consistência. Estou... estou deletando isso por isso e vou substituir isso por aquilo. Não. Então, é muita... é muita, tem que estar no papel (xxx) (00:20:09) nada, quem escreveu o livro didático não está sabendo de nada. Ou seja, ele tem essa fala, ou (xxx) (00:20:18) essa fala, mas não há uma segmentação dele. Uma justificativa aceitável. T63- ENTREVISTADOR: Você acha que o professor não abre para escutar o aluno... não explica pro... é tudo escondido. É um jogo meio escondido? (0:21:05 ~0:22:04) T64- ENTREVISTADO: Muito escondido.

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T65- ENTREVISTADO: Do aluno. Se eu não estou... eu não estou... eu tenho que falar pra ele: “Olha, eu não usei isso no livro. Mas você tem um referencial naquele livro... no seu livro. Você pode estudar de outra forma, assim, assim...” essas explicações, aliás, acho que muita coisa da relação professor aluno... T66- ENTREVISTADOR: As relações de poder? T67- ENTREVISTADO: É. O professor mantém... eh... essas crenças, essa escolhas... T68- ENTREVISTADOR: Relações de poder? T69- ENTREVISTADO: Mas o jogo é... é um jogo escondido. E aí... T70- ENTREVISTADOR: Jogo escondido. E é um jogo também escondido do professor pra coordenação... T71- ENTREVISTADO: Sim. Com certeza. Até porque a gente não tem como conhecer todas as aulas...

A coordenadora fala de uma agenda oculta, onde os professores se

“assujeitam” a discursos de especialistas da área se submetendo aos mesmos, para

sua de sobrevivência, para agradar as coordenações. Esse fato é freqüente nas

relações aluno com professor e este com a coordenação. Assim, isto ocorre por falta

de discussão, de reflexão e complexização no processo educacional determinista,

linear e de resultados que, afinal, constitui o ensino de LE, em cursos livres.

T72- ENTREVISTADOR: Mudando o curso dessa entrevista para Needs Analysis. Ela seria... (risos) (0:23:00 ~0:24:00) T85- ENTREVISTADO: Um ponto de partida e complexa. T86- ENTREVISTADOR: Um ponto de partida. Então... T87- ENTREVISTADO: Eu acho que, a partir do momento em que você desenha um documento tipo Needs Analysis, significa que você está levando em consideração vá... eh... eh... eh... você tem uma... um... uma agenda, digamos assim, né?

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T88- ENTREVISTADOR: Ham, ham. T89- ENTREVISTADO: Por trás… você quer ter aquelas respostas para, a partir dali, você começar a desenvolver um trabalho. Então, pra mim tem essa... essa função, né?

Seguimos com outro tema polêmico de transposição de cultura de ensino:

A chamada Needs Analysis.

T90- ENTREVISTADOR: Independência intelectual? (0:47:01 ~ 0:47:20) T91- ENTREVISTADO: Eu acho que o professor de línguas, pelo menos no nosso contexto, está muito... muito eh... ainda limitado. T92- ENTREVISTADOR: Limitado porque só está preso à didática. T93- ENTREVISTADO: Isso. Mas é porque falta... falta na construção da... da formação desse professor, esses outros referenciais.

Aqui, nos perguntamos se seria realmente faltas na formação do

professor ou conformismo de se renovar, se retificar, mesmo usando os livros

didáticos com métodos mais atuais. Questionar com eles a cadeia de aprendizagem,

usando as teorias pessoais dos professores, terminologia já citada de

Kumaravadivelu e despertando o desejo “político” de mexer com as estruturas do

“novidadorismo”.

T110- ENTREVISTADOR: Vejamos esse quadro com estratégias cognitivas, que eu desconhecia, até pouco tempo. Trabalha-se, nessa instituição, com as estratégias cognitivas ou só com as estratégias de habilidade, ambas presentes no livro de Chamot e O´Malley? (0:53:17 ~ 0:53:19) T111- ENTREVISTADO: É. Eu só... T112- ENTREVISTADOR: Nós focamos nisso aqui, a nível prático? T113- ENTREVISTADO:

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Não. Eu acho que isso aqui é parte daquela coisa escondida. T114- ENTREVISTADOR: Do currículo oculto e da relação de poder. T115- ENTREVISTADO: Tá lá. Por exemplo, vou dar um exemplo de uma aula que eu... Você pode depois apagar, que foi só uma observação (rindo). T116- ENTREVISTADOR: Sim.

Senti que nesse tópico de estratégias cognitivas havia uma falta de foco,

nas respostas da coordenadora. Pareceu-me que ela desconhecia essa pesquisa

cognitiva com alunos de LE, não deixando claro sua posição em relação à pesquisa

e mostrando pouca familiaridade com o assunto. Por isso insisto nesse tópico, no

trecho a seguir, onde teoricamente uma flexibilidade é mostrada.

T117- ENTREVISTADOR: Você já imaginou dez anos atrás, se a gente trabalhasse com essas estratégias, translation e repetition? Você acha que isso ia ser bem visto? (0:57:09 ~ 0:57:28) T118- ENTREVISTADO: Há dez anos, não. T119- ENTREVISTADOR: Com certeza, não. T120- ENTREVISTADOR: Você acha que... que a Learner Autonomy deve ser incentivada, é importante? T121- ENTREVISTADO: É. T122- ENTREVISTADOR: É uma crença que você tem? T123- ENTREVISTADO: Claro. O… T124- ENTREVISTADOR: Mesmo na nossa cultura? T125- ENTREVISTADO: Mesmo na nossa cultura. E, por exemplo, essa eh... não dando esse nome, né, Learner Autonomy, uma coisa que eu percebi com os meus alunos da escola pública é iss... essa falta de... de como você estuda, de como você faz para aprender.

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T126- ENTREVISTADOR: Cultura…se ensina? T127- ENTREVISTADO: Tudo a espera do professor. T128- ENTREVISTADO: Eu acho que você pode ir fazendo aos pouquinhos, né? Por exemplo... só pra lhe exemplificar, perguntar ao aluno “O que é que você acha? O que é que você...” (1:13:06 ~ 1:13:30) T129- ENTREVISTADOR: Mas aí... T130- ENTREVISTADO: Eu sei, eu sei. É a questão do subjeti... do currículo, né? T131- ENTREVISTADOR: Da Needs Analysis subjetiva, das necessidades subjetivas dos alunos na didática de aulas de LE T132- ENTREVISTADO: Eles estranham: “Por que você está me perguntando isso?” Né?

Embora não me responda se é possível, genericamente, se ensinar

cultura, cultura de ensino, forma de aprender, ela tem a expectativa, no início, de

que com o tempo isso pode se reverter. Depois reconsidera que a forma de

aprender desde a escola pública, é de uma cultura dependente do professor e que

assim foi, com nossos antepassados. Concordo com ela, quando diz que devemos

incentivar essa prática, mas acho que isso não será uma mudança universal, dentro

de uma cultura.

T133- ENTREVISTADOR: “Bate bola” sobre essas estratégias. Translation? Nunca? (1:19:27 ~ 1:20:06) T134- ENTREVISTADO: Não. Nunca, não. Existe. T135- ENTREVISTADOR: Repetition, repetição? T136- ENTREVISTADO: Repetition... repetição, não aquela repetition, repetição chata. Ok... repeat, repeat, repita, repita. Faço uma repetição, repetition, mais... dinâmica.

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T137- ENTREVISTADOR: Certo. Uma repetição que você chama de chata é um drill mecânico, você quer dizer? T138- ENTREVISTADO: Isso. T139- ENTREVISTADOR: Não faz. T142- ENTREVISTADO: Repetição que eu faço seria... seria uma repetição mais... meaningful, significativa para a realidade do aluno, tipo um find someone who, ache alguém que, técnica usada para treino de tempos verbais... Aluno repete meaningfully, significativamente, não mecanicamente. Mas uma coisa mais...

Mesmo tendo conhecido, ao longo dessa entrevista, as estratégias

citadas por alunos, numa pesquisa de aquisição de segunda língua, a coordenadora

parece nunca ter examinado qualquer uma das estratégias citadas, com seus

alunos. Ao longo de um percurso profissional considerável, ela ainda mantém as

mesmas excluídas, mesmo que em trechos anteriores, para parecer menos radical,

tenha dito que há dez anos elas seriam problema se usadas, mas que, hoje, ela

sugere não se constituir. Vejamos como esse é um assunto arraigado na nossa

cultura de pensar o conhecimento, isto é, a nossa dificuldade de retificar,

relembrando Bachelard. Lembramos que nenhum dos teóricos mencionados refutou

a importância da repetição mecânica. Como esse conhecimento dominado sepultado

está arraigado, esse poder dependente e exclusivamente atribuído do conhecimento

de especialistas anglófonos causa uma dificuldade em retificar conhecimentos

passados. Essa discussão precisa ser aberta, esse poder precisa ser questionado,

essa inserção do aluno precisa ser feita. A discussão sobre as práticas mecânicas

foi assunto de Karl Popper segundo Stevick (1994, p. 19-20), e de H. D. Brown

(1994, p. 16-17).

T143- ENTREVISTADOR: Após você ter lido essas pesquisas comparativas de expectativas didáticas de professores e alunos no livro de Nunan, o que você acha dessa manipulação toda, dessa dificuldade em se escutar o aluno, né? O que você acha disso ? (1:26:08 ~ 1:26:51 (26:03)) T144- ENTREVISTADO:

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Eu acho que o professor precisa estar mais... sintonizado. Ehhh... como a pesquisa que teve... foi dele ou... ele escreveu o livro? T145- ENTREVISTADOR: Ele escreveu, mas não a fez. Uma delas foi um estudo de currículo na Austrália através da AMPEP feitas por Brindley e Bagshaw (1993) conjuntamente com o ministério de educação australiano. Uma delas foi um estudo de currículo na Austrália feito por Brindley e Bagshaw, conjuntamente com o ministério de educação australiano. T146- ENTREVISTADO: Foi? T147- ENTREVISTADO: Ham, ham. T148- ENTREVISTADOR: Que não está publicado. Eu consegui uma cópia do professor Geoff Brindley. Mas Nunan se apropria da idéia de Richterich sobre necessidades subjetivas do aluno, escreve o livro Learner Centred Curriculum, mesmo nem tendo executado pesquisa sobre o assunto. Então, ele fez uma... um arremate. Mas, o que é... isso, comparar os desejos de certas atividades de cognição pelos alunos? Needs Analysis Subjetiva ou Objetiva? T149- ENTREVISTADO: Objetiva. T150- ENTREVISTADOR: Não. Subjetiva. T151- ENTREVISTADO: Subjetiva? T152- ENTREVISTADOR: Porque é técnica de sala de aula da necessidade e preferência de alunos, que são diversas e, estes, muitos. É didática do ponto de vista do aluno. ENTREVISTA V - PROPRIETÁRIO DE CURSO LIVRE: VALMOR (00:07:53 ~ 00:18:00) T1- ENTREVISTADO: É, eu brigo, eu brigo o tempo todo com... com o modismo. T2- ENTREVISTADOR: Eu também. T3- ENTREVISTADO: (xxx) (00:08:05)... é eu brincando e eu desmontando o tempo todo e eu não sei como é que as pessoas aceitam... os coordenadores acadêmicos e os professores

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aceitam de uma forma tão gratuita, certo... e ai já abraçam, como a última coca-cola gelada do verão, só tem essa, e esquecem de todos os outros e inclusive, esquecem, esquecem de que eles hoje são professores de inglês, e se são bons falantes, se não foi usando esta abordagem que eles aprenderam. Então o que teve de útil naquela abordagem que ele recebeu nessa sala de aula... por que não pegar aquilo que foi de útil, juntar com um aspecto novo agora (xxx) (00:09:08). Então, eu que procurei ao longo do tempo tentar fazer com que nosso curso não abraçasse causa nenhuma de nenhuma metodologia... T4- ENTREVISTADOR: Mas você contratou... T5- ENTREVISTADO: Ahn. T6- ENTREVISTADOR: Você contratou um(a) coordenador(a) que era “novidadorismo” puro. T13- ENTREVISTADOR: Ela é completamente... T14- ENTREVISTADO: Estreitada.

O proprietário desse curso tem uma passagem pela educação e retruca

veementemente contra modismos metodológicos, contra as rupturas sem

retificações, desde o início da entrevista. Ele age bem de acordo com os conceitos

de Bachelard, embora quando questionado diz desconhecer o autor. E um detalhe:

ele não compra fácil, sem críticas, nenhum método de ensino de LE.

T45- ENTREVISTADO: Não, não, ó, ó, eu sofri aqui muito no curso, sabe por quê? Foi no primeiro semestre do curso, eu fiz um São João, tá? T46- ENTREVISTADOR: Hum. T47- ENTREVISTADO: Eu fiz um São João com casamento... T48- ENTREVISTADOR: Tem que valorizar a cultura local. T49- ENTREVISTADOR: Claro.

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T50- ENTREVISTADO: Eu fiz um São João com casamento na roça, com recital de poesias, é, de cordel, certo, com tudo. Eu fiz o São João, aí, velho, e eu, o que eu sofri dentro dessa escola, “de paulada”, que eu ouvi, como é que uma escola de inglês, que é que uma escola de inglês quer comemorando São João, entende? T51- ENTREVISTADOR: Que subserviência! T52- ENTREVISTADO: Aí eu falei: “Quer sim, porque isso aqui é, por acaso, uma escola de idioma chamado inglês. É Baiana! T53- ENTREVISTADOR: Na Bahia, baiana, claro, claro. T54- ENTREVISTADO: (xxx) (00:13:34) Se fala oxente, né? T55- ENTREVISTADOR: É claro. T56- ENTREVISTADO: Entende? Fica mais baiana. Aí eu fiz... T57- ENTREVISTADOR: Os professores de inglês têm uma idealização pelos países centrais? T58- ENTREVISTADO: Hoje já melhorou muito.

Para um proprietário de um curso livre de LE, Valmor faz uma clara

inserção da cultura local no seu curso. Infelizmente, quanto ao lado acadêmico, ele

não conseguiu fazer tal intervenção, atribuindo e delegando poder às coordenações

que entendem o processo educacional como progresso do conhecimento da área,

apenas, como aquele escrito e pesquisado pelo especialista.

T79- ENTREVISTADO: Mas, muito influenciado, um dos grandes influenciadores de eu ter algum pensamento é... arcaico, é... sectário, brasilianista, é o próprio Paulo Freire, viu? T80- ENTREVISTADOR: Hum, é Paulo Freire, né? T81- ENTREVISTADO: O próprio Freire. Ele me influenciou muito.

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T82- ENTREVISTADOR: Educação crítica. T83- ENTREVISTADO: E eu, e eu enxergamos, de uma forma que não era aquela forma que ele tava querendo dizer. Ele dizia aquilo, mas para a gente já estava... Mas não para a gente se fechar completamente para o resto do mundo. T84- ENTREVISTADOR: Não, não... T85- ENTREVISTADO: Você não pode pensar em educação, em cultura, hoje você não pode pensar em nada... T86- ENTREVISTADOR: Com xenofobia, né? T87- ENTREVISTADO: Não, hoje você (xxx) (00:16:41) o caos, né, porque... pra administrar o... o caótico... Não pode pensar em nada com xenofobia, você não pode ser totalmente xenófobo... Certo? T88- ENTREVISTADOR e ENTREVISTADO: [Falando ao mesmo tempo]. Não; T89- ENTREVISTADOR: Não, não... T90- ENTREVISTADO: Não é você ficar aqui... Basta ser do estrangeiro que já é bom... “uma banana”. T91- ENTREVISTADOR: Exatamente. T92- ENTREVISTADO: “Uma banana, uma banana”. A gente tem muito o que aprender, mas a gente tem muito o que ensinar. T93- ENTREVISTADOR: O que ensinar, também. T94- ENTREVISTADO: Muito o que ensinar. T95- ENTREVISTADOR: Fica uma auto, uma baixa auto-estima? T96- ENTREVISTADO:

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Muito o que ensinar, muito, muito, muito. T97- ENTREVISTADOR: Uma idealização da cultura européia, que é uma, é uma... muito ruim. Então, mas o que eu estou falando é, não foi exatamente o que você explicou antes, depois a gente entrou no papo de Paulo Freire sobre a educação em geral. O que eu estou querendo falar é o “empoderamento” assim, chamando assim, desse aluno nas abordagens cognitivas. Por exemplo, eu exponho uma atividade “x”, eu faço um drill, por exemplo, aqui. Eu posso perguntar a esse aluno como é o processo dele aprender, aprofundar nessa pergunta um pouquinho, porque eu preciso compatibilizar educacionalmente o que eu ensino com o que ele diz aprender melhor, porque eu não sou médico de jogar em cima dele uma receita, sem ouvir dele se ele gosta de aprender daquela forma, sobretudo quando termina a atividade... Então, se ele ouve a L1, se usa a estratégia de tradução e eu uso processualmente a L1, se ele pede para traduzir eventualmente nos primeiros semestres, se uso repetição através dos drills [...] Eu preciso ouvir desse aluno que está aprendendo uma segunda língua e, com ela, uma cultura... então, esse aluno, ele poder se expressar... porque o que acontece agora é o professor dando fórmulas, sem escutá-lo, é isso que eu sinto, entendeu? E essa é a razão de... da minha pesquisa, de... por que esse aluno está em descompasso com esse professor, em nível de técnicas ou estratégias cognitivas, por não ser ouvido. Os alunos foram ouvidos, nos U.S.A., sobre como aprendiam e essas duas técnicas apareceram, a repetição e a tradução T98- ENTREVISTADO: Não, e essa coisa também, que... que eu acho que a gente (xxx) (00:19:39) Tá, tá, eu acho, não sei se tá muito enquadrado dentro do... do objeto que você trabalha aí, que é a questão do student centred, do teacher centred. T99- ENTREVISTADOR: Exatamente, é (xxx) (00:19:53) T100- ENTREVISTADO: Onde é, onde é que tá o centro? T101- ENTREVISTADOR: (xxx) (00:19:57) T102- ENTREVISTADO: Pra mim o centro nem tá... T103- ENTREVISTADOR: No aluno... T104- ENTREVISTADO: No aluno, nem tá... tá... tá... tem que ter um... um centro, certo? T105- ENTREVISTADOR: Boa pergunta, talvez centros e descentramentos...

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T106- ENTREVISTADO: Tem que ser o... tá... tá... tem que tá dividido, né? Mas uma das dificuldades que nós temos como professores de... de idioma é a gente enxergar isso e, principalmente, praticar... porque entender e concordar, você pode ter certeza que todos os professores com quem você falar vão concordar com isso que a gente tá dizendo aqui, aqui... Mas chegar na sala de aula e praticar, e ele abrir mão... T107- ENTREVISTADOR: Das crenças na importação do conhecimento da área. Importadas, que estão na cabeça dele e que ele acha que é certo (xxx) (00:20:55) T108- ENTREVISTADO: Inclusive o que ele viu, o que ele teve como modelo educacional na vida dele todo... toda. Então na hora que ele se coloca no papel de estar dentro da sala de aula, com o título de professor... T109- ENTREVISTADOR: Ele não consulta, né...? T110- ENTREVISTADO: Aí ele quer fazer disso uma forma de se fazer valer aquela estratégia que ele tinha internalizado como estratégia adequada para aprender, que foi a estratégia para ele aprender, não necessariamente a estratégia para ele ensinar. T111- ENTREVISTADOR: Exatamente. T112- ENTREVISTADO: Aí é onde a gente tem que se despir, soltar, buscar... T113- ENTREVISTADOR: “Sair do umbigo”. T114- ENTREVISTADO: Exato, né? T115- ENTREVISTADOR: Mas precisa também de uma relação que não seja também Top down, ou seja, que haja nessa relação tripartite aluno, professor, coordenação e proprietário, superintendente, ou o que for, uma relação que faça se compreender, que se articule negociando...

Quando acabei de fazer essa entrevista, fiquei surpreendido com essa

parte especificamente. Que lucidez desse entrevistado, sobretudo quando ele

questiona onde está o centro de ensino de língua, no professor ou no aluno... e foi

crítica sua fala, para mim, porque foi elucidativa e, sobretudo abrindo a idéia de

descentramento entre conhecimentos, poderes. Outro aspecto bem interessante foi

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dizer que a cultura do método que cada aluno aprendeu tem uma influência enorme

sobre como o professor vai ensinar. Isso mostra o quanto somos behavioristas,

como temos uma parte de nos condicionarmos socialmente pelos discursos ao longo

da vida, o discurso como prática social, o que segundo Fairclough (1994, p.22)

Foucault chama de ordens do discursos, que nos comportamentaliza e nos restringe,

em, nos restringe embora não nos impeça de sermos criativos. Nós, seres humanos,

em qualquer área, afinal, muito freqüentemente, até nas coisas que fazemos

inconscientemente, repetimos comportamentos das práticas sociais porque estão

atrelados a ordens do discurso. Expomos ao entrevistado a lista de estratégias

cognitivas exposta no Capítulo 2, a seguir:

T116- ENTREVISTADO: Deduction, ensino de estrutura via dedução,... Induction, ensino de estrutura via indução. E então... T117- ENTREVISTADOR: Esse nosso, novo livro, a partir desse semestre tem uma abordagem indutiva para a gramática e na oficina de treinamento de livro da Macmillan... T118- ENTREVISTADO: Isto aqui, esse quadro... com estratégias cognitivas dos alunos... certo... T119- ENTREVISTADOR: (xxx) (00:37:50) Aí eu perguntei à instrutora: “Ô instrutora, e o aluno dedutivo, onde é que fica?” T120- ENTREVISTADO: Isso aqui pra mim, isso aqui é Matemática, é Lógica. T121- ENTREVISTADOR: Claro, claro. T122- ENTREVISTADO: Isso aqui é Lógica. T123- ENTREVISTADOR: E o adulto quer aprender gramática. T124- ENTREVISTADO: Dedução e indução, juntinhos aqui. T125- ENTREVISTADOR: (xxx) (00:38:15) Há uma alternância de usos. Alguns alunos usam uma, outros, outra, outros ambas.

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T126- ENTREVISTADO: Você, inclusive, você fazendo isso, você faz a... capacidade de inferência, para não falar inteligência, do aluno aumentar numa velocidade fantástica, quando você estimula a indução, você mostra aqui... T127- ENTREVISTADOR: Para ele descobrir. T128- ENTREVISTADO: Para chegar à dedução, certo T129- ENTREVISTADOR Pra ele descobrir aquilo... T130- ENTREVISTADO: Pra ele ir descobrindo, aí ele vai fazendo as suas deduções... aí, tá... Por isso que eu tou falando que isso é matemático. Que você chega numa progressão geométrica de um nível tal que, de repente, você bota duas informações, você bota três informações na cabeça do aluno e ele pega aqui e faz... quatro, cinco, seis informações com essas três que eu coloquei na tua mão T131- ENTREVISTADO: Se você tiver uma dose de carisma... T132- ENTREVISTADOR: E um rapport legal... T133- ENTREVISTADO: Certo? Pra você primeiro atrair e depois você fisgar com a tua competência que a, a... a tua força de atração profissional vem através do prazer. T144- ENTREVISTADOR: Claro. T145- ENTREVISTADO: Então você gera um prazer, em cima só dessa força. Isso vale pra um amigo, pra alimento, isso vale pras relações interpessoais, tanto no ambiente de trabalho, quanto nas relações sexuais, como nas relações internacionais que envolvem as atrações mais mirabolantes possíveis, certo, nas relações no mundo no reino animal. Tá aí, tudo aí, a publicidade faz isso com maestria, né? Faz isso com maestria porque chega em trinta segundos, faz você pegar o telefone, certo, ligar e buscar mais informações, aí você diz, se tiver um atendimento bom, você vai. Você chega no balcão, se tiver um outro atendimento bom, você compra, tal. Aí se você chegar, tudo for igual, você chegar dentro da sala de aula e você não tem a retaguarda, a “atratibilidade” [competência em atrair], o que nós fizemos, tudo se perdeu. T146- ENTREVISTADOR: Com certeza.

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T147- ENTREVISTADO: Se você chega na sala de aula e o professor lhe é atraente, lhe é receptivo, convida, promove a interatividade das pessoas que, pra gente, no caso do idioma, a gente tem que promover primeiro a interatividade das pessoas, saber o nome, aquelas coisas mais simples, mais óbvias, o que você gosta, o que... é que você não gosta e, a partir daí, pá, pá, pá, pá, pá, pá, pá, pá, pá... T148- ENTREVISTADOR: (xxx) (00:45:57) Mapeia, né? T149- ENTREVISTADO: Rapaz, nós já tivemos professores, temos dois aqui, que a gente sabe que a competência deles era... T150- ENTREVISTADOR: Altíssima. T151- ENTREVISTADO: Não, mediana, não, mediana para baixa. T152- ENTREVISTADOR: Mas, no entanto... T153- ENTREVISTADO: Mas, no entanto, essa galera, o aluno aprendia bem, certo? E ele 1000% de manutenção e de retorno, certo? Aí a gente entra numas coisas que o marketing discute muito, com profundidade: o que é qualidade, que é discutível, a gente não pode, tem que ter cuidado porque... (atende ao telefone) porque é... a gente, às vezes, fala que determinada coisa tem qualidade, parece que qualidade é uma coisa que qualifica, a coisa que qualifica é o adjetivo que qualifica a qualidade, qualidade ruim, qualidade mediana e qualidade superior, né? Mas tudo tem qualidade, agora a qualidade pode ser ruim, certo? T154- ENTREVISTADOR: Hunrum. Entendi. T155- ENTREVISTADO: Então vamos ver aqui as coisas de qualidades inferiores pra o que nós estamos exigindo, certo? O nosso desejo, a nossa... certo? Quem é que estabelece o conceito de qualidade? É o fornecedor, o professor? T156- ENTREVISTADOR: O aluno. T157- ENTREVISTADO: É o vendedor de carro? Certo? É o músico? T158- ENTREVISTADOR: É o gerente da... da transportadora, do...? T159- ENTREVISTADO:

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Ou é o usuário que consome? T160- ENTREVISTADOR: O usuário, o educando, no nosso caso, e o usuário, e o usuário... comercial. O educando e o comercial. T161- ENTREVISTADO: Do que adianta eu achar que sou um excelente patrão, se os meus funcionários acharem que eu sou um péssimo patrão ou um patrão mediano, quem é que vai me dar o certificado de qualificação em inferior, médio ou superior? T162- ENTREVISTADOR: Se a opinião está formada... se você já tem uma opinião... T163- ENTREVISTADO: Né? Sou eu ou são vocês? T164- ENTREVISTADOR: Não, não, a gente. T165- ENTREVISTADO: E quem é que vai certificar a qualidade do trabalho de vocês? T166- ENTREVISTADOR: O aluno. T167- ENTREVISTADO: É você ou o aluno, pra quem é... T168- ENTREVISTADOR: O aluno, o aluno... T169- ENTREVISTADO: Pra quem é (xxx) (00:48:36). O aluno, cara. T173- ENTREVISTADO: Sobre repetição? Eu era mangado e vaiado dentro do curso, quando ainda tinha turma..., porque eu não abria mão dos meus choral repetition, repetição em grupo, tá? T174- ENTREVISTADOR: E aí? T175- ENTREVISTADO: Que aquilo era uma oportunidade que eu tinha para eu ouvir a turma. E isso fez, inclusive, eu aguçar o meu sistema auditivo. T176- ENTREVISTADOR: Seu sistema auditivo?

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T177- ENTREVISTADO: Que eu... que eu... é, que eu sou hoje capaz de conversando, aqui, ter três conversas aqui e eu acompanhar as três conversas. T178- ENTREVISTADOR: [...] Se o professor disser, você sabia que o behaviorismo... behaviorismo é uma técnica irrelevante. O que você responderia? É uma técnica irrelevante, mas a prática é compatível. O aluno odiava coral repetition, repetição grupal? T179- ENTREVISTADO: Não, e ó, e eu..., chegava um determinado momento que eu não fazia choral repetition não, eu fazia “bagunça repetition”.

Sobre a inserção de drills e as consultas ao aluno. T230- ENTREVISTADOR: “Hunrum”. Já vai ter um respeito, né, um respeito. Então você acha que [...] essa consulta das estratégias cognitivas aos alunos, expondo uma atividade como o drill e depois: “Vocês gostam de repetir para adquirir estrutura, pronúncia? Fazer um drill e sondar, um drill mecânico e perguntar: Vocês acharam chato isso, como é que vocês sentiram esse exercício oral? E as razões? Vocês aprenderam alguma coisa?” Podiam me dar um feedback e dar os motivos da aceitação ou não? Em dois minutos eu sei se eles gostaram daquela técnica. (00:59:39 ~ 01:05:10) T231- ENTREVISTADO: Se você... T232- ENTREVISTADOR: Você acha que isso é inviável? T233- ENTREVISTADO: De jeito nenhum. Se você passa para o aluno a confiança de ele dizer sim ou não, verdadeiro... Vale a pena você fazer isso. Agora... T234- ENTREVISTADOR: Hunrum. Depende...

Valmor gosta da idéia, mas aparentemente não parece desejar se

agenciar para que ela chegue aos coordenadores. Esse conformismo é intrigante, já

que ele tem total consciência que esse distanciamento didático deve causar evasão

para sua escola.

T236- ENTREVISTADOR: Mas, nesses últimos semestres, eu fiz essa exposição de drills, após a apresentação de tempos verbais. Eu tive que fazer drills, porque eles desconheciam e eu precisava comparar com o que as estratégias na pesquisa de Chamot e O´Malley

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(1995) dizia ser a estratégia usada por eles, repetição. Assim, quando apresentava estrutura nova, fazia os drills para verificar a retenção ou não da cadeia segmental de uma pergunta ou de uma sentença. Perguntava a eles: Esse exercício é chato? Ele ajuda a aprendizagem? E, se sim, por quê? Todos, ao longo desses últimos três semestres, responderam afirmativamente que, de alguma forma, dava mais segurança ou retenção da sentença, que ajudava na memória da LE, em geral; disseram que precisam por causa da memória, pra ficar: “Ó professor, ficou uma melodia da seqüência das sentenças, do diálogo”. Então só porque é behaviorista, eu vou jogar fora? T237- ENTREVISTADO: Memória auditiva. T238- ENTREVISTADOR: Memória auditiva T239- ENTREVISTADO: Todas as memórias cabem. T240- ENTREVISTADOR: Porque a gente não aprende sem memória. T241- ENTREVISTADO: Todas as memórias cabem, você não pode jogá-las no lixo não, rapaz. T242- ENTREVISTADOR: É, é... T243- ENTREVISTADO: Ó, é, marketing é uma coisa fantástica, viu? T244- ENTREVISTADOR: Marketing? (Risos). É, não sei. T245- ENTREVISTADO: Marketing é uma coisa fantástica, marketing, marketing te ensina uma série de coisas. T246- ENTREVISTADOR: Não sei, né? T247- ENTREVISTADO: O que você tá fazendo, velho, você está dando uma aula de marketing. O que você está fazendo aí, meu amigo, não é pedagogia, não. T248- ENTREVISTADOR: Que é isso... T249- ENTREVISTADO: É.

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T250- ENTREVISTADOR: Por quê? T251- ENTREVISTADO: Porque é. Porque você está preocupado é com o cliente. Enquanto educando e enquanto profissional. T252- ENTREVISTADOR: Não só como cliente, não. Não só com o cliente, assim não. Eu não estou com os clientes, não, do ponto de vista de marketing... T253- ENTREVISTADO: O cliente, o cliente para marketing... T254- ENTREVISTADOR: Só pelo dinheiro, não, eu estou olhando... T255- ENTREVISTADO: Não, não, não, mas é isso, é isso, é isso. Cliente, o conceito de cliente, certo? É o conceito da satisfação. T256- ENTREVISTADOR: Ah, sim. T257- ENTREVISTADO: É o conceito da satisfação. T258- ENTREVISTADOR: Ah sim. T259- ENTREVISTADO: O conceito de cliente é todos nós dentro no ambiente de trabalho. É tanto que o marketing chama cliente interno e cliente externo, tá? T260- ENTREVISTADOR: Hunrum. Há uma dicotomia. T261- ENTREVISTADO: Não. Cliente interno são os funcionários; cliente externo são os compradores, os usuários do serviço ou do produto que eu compro, tá? E ele ainda vai mais longe: o primeiro cliente sou eu, eu sou um cliente de mim mesmo, certo? E eu e você, que trabalhamos na mesma empresa, nós somos clientes entre nós dois. Eu sou o seu cliente e você é o meu cliente.

O ponto de vista desse dono de curso livre de língua é, inesperadamente,

bem flexível, desde o início, como comentamos, aceitando as estratégias excluídas.

Nesse segundo momento, ele explica que a visão atual de marketing é que este é

sinônimo de busca de qualidade ao cliente, no nosso caso o aluno. Ele afirma que

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eu estou fazendo, nessa pesquisa, marketing educacional, mas, também, o de

qualidade de manutenção de vendas. Fiquei surpreso, mas se considerarmos o

sentido de marketing que ele propõe, em parte, ele tem razão. Qualidade a partir do

cliente, o aluno, nesse caso, sem imaginar, ele diz que estou fazendo marketing,

embora o meu foco esteja na desarticulação dos micropoderes na educação de LE

e, assim, liberar vozes que estão emudecidas nesse processo educacional. E minha

pergunta aqui continua sendo a razão do conformismo e da omissão na agência de

mudar, porque o mesmo tem essas informações, o curso lhe pertence e, ainda

assim, ele se omite. Talvez o conformismo que o retorno financeiro lhe proporcionou.

A seguir, após analisar as pesquisas comparativas entre expectativas de alunos e

professores sobre as estratégias de ensino excluídas de sala de aula, ele conclui

abaixo, com sua visão educacional e empresarial, sobre a questão ética de escutar o

aluno.

T262- ENTREVISTADO: Essas são pesquisas de aquisição de L2, mas, simultaneamente, são pesquisas de marketing e da boa, onde a ética da qualidade é primazia. ENTREVISTA VI – PROFESSORA: DIRMA (PARTE I) T1- ENTREVISTADOR: Então, a primeira pergunta é o que você pensa, né, das estratégias de tradução e repetição? Você usa as mesmas em sala de aula? T2- ENTREVISTADO: Uso, sim. Eh... apesar da tradução ser, né, a mais antiga técnica eh... método, né? Mas ela ainda é... T3- ENTREVISTADOR: Colocada no livro... T4- ENTREVISTADO: Certamente, em algum momento, dentro da sala de aula, naquele momento ali em que você não quer perder tempo, que você quer pegar uma palavra, que você... por exemplo, uma conjunção, como é que você vai se “rebolar” pra fazer uma versão, né, de uma conjunção? Ah, traduz logo pra otimizar o tempo. Eu uso todos os métodos, na verdade. T5- ENTREVISTADOR: Você acha que o aluno desaprende se a mesma é usada?

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T6- ENTREVISTADO: Muito pelo contrário, muito pelo contrário. Eu acho que a tradução faz parte do processo de aprendizagem. Não tenho nada contra. Muito pelo contrário. Agora, eu, assim, eu não sou de estimular a tradução o tempo todo e, muito pelo... eu desestimulo o aluno a ficar traduzindo frase por frase, palavra por palavra. Porque senão, ele vai criar o vício e só vai aprender as coisas traduzindo. E não é bem esse o objetivo, né?

Não acreditamos que algum aluno possa usar a LE desde o início de sua

aprendizagem. Ele não poderá estudar, por exemplo, na LE em casa nesses níveis.

T11- ENTREVISTADOR: Eu lembro que, quando eu aprendi, eu traduzia. T12- ENTREVISTADO: Hum hum. T13- ENTREVISTADOR: Você, em casa aprendia em que língua? Português? É esse o processo. É a tradução. Você vai temporariamente mudando para a LE, fazendo um trânsito para a LE, substituindo e vai começando... até você começar a pensar na LE, que você está aprendendo.

A posição dessa professora é clara sobre o uso de L1 e de tradução. Ela

usa a L1 de acordo com seu tirocínio e acabamos por acatar os diversos usos de L1,

citados nesse capítulo, por Atinkson (1987, p. 242-246). Sabemos que nosso

objetivo como professores de LE é usá-la sempre com mais freqüência, mas não

podemos esquecer nossos comentários sobre o ensino de LE, que usa a L1 como

língua de apoio e partida, porque a LE, inicialmente, não é instrumento de partida

para a aprendizagem dela mesma. O uso de L1, em diversos momentos, até em

traduzindo instruções, inicialmente, poderá estar potencializando essa

aprendizagem.

T16- ENTREVISTADOR: Quanto á repetição... T17- ENTREVISTADO: E a repetição, também, né? Apesar de ser um método não tão antigo quanto, né? Eh... dos anos o quê? Cinqüenta, né? T18- ENTREVISTADOR:

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É . Antes da segunda guerra, ou encomendado para a segunda guerra... , né? Quando começa a área de metodologia de ensino de LE. T19- ENTREVISTADO: Exatamente. Mas, eh... é necessário o aluno pegar a pronúncia. Você vai deixar o aluno ficar falando, né, de forma errada? [...]. Isso, não deixo. Porque vai... o erro vai ficar cada vez mais profundo. [...] Eu tenho visto aí aluno de livro três, quatro falando sem a pronúncia do “th” mudo. Por quê? O professor não corrigiu no livro um. Quando é fácil começar com ela, né? A brincadeira do “toquinho de massinha com o suquinho de maçã”. Eu entro pela brincadeira, né? E... os alunos vão pegando: repeat, repeat after me, repita, repita depois de mim. Uso mesmo. Não... T20- ENTREVISTADOR: Mas não... T21- ENTREVISTADO: Não. Não. Não, não, não. T22- ENTREVISTADOR: E usa mecanicamente? T23- ENTREVISTADO: Não. Mas de forma pra eles... ouvirem e repetirem. T24- ENTREVISTADOR: Você acha que pra estrutura, num dado momento da estrutura, quando apresenta a estrutura, antes de ir pra um momento mais livre de produção e tudo mais, você acha que um drill mecânico é ruim? T25- ENTREVISTADO: Não. Não acho ruim, não. Não acho, não. Acho até que uma brincadeirinha, né? Tipo, estão aprendendo verbo To be. E ai, conjugo e elicio: HE IS, SHE IS, I AM, THEY ARE, YOU ARE. Se você faz um drill, ele vai, de repente, contextualizar aquelas frases, aquela..aquele verbo ou a... o sujeito e o verbo e ele vão observar aquilo de forma... eh... até lúdica. Por que não? Eles vão... vão brincar com essas estruturas. T26- ENTREVISTADOR: Com a... a ordem das palavras? T27- ENTREVISTADO: Exatamente. T28- ENTREVISTADOR: Verbos Do auxiliar e o Be na frente da pergunta. [fronting, topicalização]. T29- ENTREVISTADO: Exatamente. Eu acho que tudo é válido. T30- ENTREVISTADOR:

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Tudo é válido? T31- ENTREVISTADO: Na... eu acho que não é válido é você só fazer isso, né? Por exemplo, como alguns métodos mesmo fazem, né? Pega aquilo ali... pega aquilo a aula inteira. Por exemplo, eu já fiz treinamento, em cursos audiolinguais, mas eu não me encaixei nisso. T32- ENTREVISTADOR: Não. Mas lá isso é primazia, essencialmente, só é aquilo. T33- ENTREVISTADO: Só é aquilo. Eu falei não. Eu tenho uma personalidade muito criativa pra poder ficar dentro de um...

Em relação a ambas as técnicas excluídas, em análise, a professora

apresenta uma postura e agenda oculta independente. Entendemos que pela sua

faixa etária, ela deve ter sido exposta a exercícios mecânicos e, por isso, reage

assim, com mais independência. Mas ela “complexiza” a questão em dois

momentos: o primeiro, quando ela questiona o por quê não usá-las, o segundo,

quando ela afirma que a dosagem tem que ser moderada. Ela retifica conhecimentos

anteriores sem problemas, a cada momento que é demandado.

Outro ponto importante e que coincide com o dos alunos é a afirmação

dela: “Se você faz um drill, ele vai, de repente, contextualizar aquelas frases,

aquela..aquele verbo ou a... o sujeito e o verbo e ele vai observar aquilo de forma...

eh... até lúdica. Por que não? Eles vão... vão poder brincar com essas estruturas.

Mas a estrutura de uma LE é um quebra-cabeças e precisa de treino, e isso já tinha

sido declarado por alguns alunos, nas suas entrevistas.

T36- ENTREVISTADOR: Mas você acha que existe uma fragmentação “intermetodológica” nas escolas que têm, ou melhor, seguem métodos mais atuais? Uma fragmentação, no sentido de... é uma técnica do passado e deve ficar no passado. Vamos “devorar” o novo. T37- ENTREVISTADO: Não. T38- ENTREVISTADOR: Você acha que as instituições em geral, idealizam o que tem de novo, esquecem o passado; por exemplo, grande parte dos colegas no ambiente de trabalho abomina técnicas que não sejam novidadoristas?

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T39- ENTREVISTADO: Eu acho que existem casos e casos. Por exemplo, essas escolas que usam a repetição, os drills, elas só usam isso, né? Ficaram no passado.

Na nossa realidade e na constatada por Chamot e O`Malley (1995) essa

não é uma realidade do passado. Ela foi constatada no presente nessa pesquisa

onde concluímos que os alunos gostam de repetição mecânica, drills, e eles deixam

isso muito claro. Não se trata de técnica do passado ou presente, trata-se de retificá-

la e usá-la de forma judiciosa, compatível e agregada ao livro e método atuais.

T41- ENTREVISTADO: Exatamente. É, tem professores que desprezam completamente. “O quê? Tradução?” Tem gente que acha tradução um demônio, na sala de aula. T42- ENTREVISTADOR: Uso de L1... T43- ENTREVISTADO: É. Mas, gente, que absurdo é esse, né? Então, assim... se... se... T44- ENTREVISTADOR: Demonizam muito a coisa? T45- ENTREVISTADO: Exatamente. T46- ENTREVISTADOR: Fragmenta as técnicas entre os métodos. O elo é cortado e...

A professora me lembra que a fragmentação intermetodológica aparece

nos métodos mais atuais. Métodos como o Audiolingual se mantém restritos a uma

só técnica básica, a repetição. Então ela usa a palavra “demônio” e eu uso

“demonizar”, para discorrer sobre a visão “unicista” que a crença em uma única

teoria pode causar. Esse é o ponto que levanto aqui. A convivência entre rupturas e

retificações é um fato que precisa ser analisado em ensino de língua. Sabemos que

a repetição é uma estratégia do aluno de LE e, em outros tempos, para professores

de LE, tendo sido massacrada por uma nova teoria. Essa reflexão precisa ser

retomada diante da voz do aluno, uma das vozes consideradas senso comum e, por

isso, interditadas pelas idealizações autoritárias de uma área que reproduz apenas

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conhecimentos importados, impondo-se totalitária com seus novos métodos. Abaixo,

a professora se mostra transgressora, metodologicamente.

.

T47- ENTREVISTADO: Eu acho que, hoje em dia, quanto mais eclético você for, quanto mais você conhecer e puder usar a ferramenta a seu favor... T48- ENTREVISTADOR: Na hora certa. T49- ENTREVISTADO: Na hora certa. Quanto mais você varia a partir dos estilos dos alunos, mais alunos você vai atingir. Porque cada aluno tem um... uma... um estilo de aprendizagem. Eles não aprendem da mesma forma. T50- ENTREVISTADOR: Não aprendem da mesma forma [...]. Eu tive dificuldade para fazer essa pesquisa com os alunos, porque eles não foram expostos às técnicas que eu precisava analisar: tradução e uso de L1 e repetição, leitura alta e drills. Eles desconheciam isso. T51- ENTREVISTADO: Hum. ENTREVISTA VII - Professoras Dirma e Natasha (00:00:33 ~ 00:03:00) T1- ENTREVISTADOR: Então, ah… resumindo [...], você usa as estratégias de tradução e repetição? T2- ENTREVISTADA: Hum, hum. T3- ENTREVISTADOR: E repetição, você usa também em... em... repetição de estrutura, contanto que ela seja relevante, significativa. O drill pelo drill você vê sentido? T4- ENTREVISTADA: Não é que eu não veja. Eu... T5- ENTREVISTADOR: Mecanicamente. T6- ENTREVISTADA: Em determinados momentos, você pode até eh... abrir eh... usar esse recurso, né? Mas, assim, a repetição mecânica em si, né?

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T7- ENTREVISTADOR: Você acha que não dá automaticidade, não dá... não tem nenhuma relevância, né isso? T8- ENTREVISTADA: Porque os alunos, às vezes, acabam repetindo, por exemplo... se faz um drill pra... pra treinar pronúncia de determinada palavra, né, ou determinado vocábulo, substituir, né? Eles vão substituindo. Mas será que naquela substituição, mais adiante, eles ao utilizar aqueles vocabulários, aquelas substituições de uma maneira efetiva, correta? T9- ENTREVISTADOR: Vocês já perguntaram... aos alunos sobre isso? Contrario seria, então verdade absoluta? T10- ENTREVISTADO: Sobre... T11- ENTREVISTADOR: Já fizeram algum drill e perguntaram “Isso funciona, ou isso é chato? Isso é bom? Por quê?” T12- ENTREVISTADO: Eu já. T13- ENTREVISTADO: Eu tenho uma outra realidade. T14- ENTREVISTADOR: Já fez? T15- ENTREVISTADO: Perguntei, “acharam difícil. Acharam que, tipo assim... ainda fizeram uma brincadeira: “ Isso aqui é pegadinha, é professora?”(rindo) T16- ENTREVISTADOR: Hum. Difícil? Difi... T17- ENTREVISTADO: Mas gostaram. T18- ENTREVISTADOR: Deram algum por quê? Eles falaram... T19- ENTREVISTADO: Porque eles têm que pensar com o que eles vão... né? Tipo, a ordem, a posição entre a pessoa do sujeito, com o verbo, né? Eles têm que ver onde é que eles vão trocar.

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T20- ENTREVISTADOR: A gente… a gente pessoalmente que tem tendência a negligenciar essa técnica... T21- ENTREVISTADO: Eu trabalho com outro método... T22- ENTREVISTADOR: Por isso que eu tinha perguntado... T23- ENTREVISTADO: Eu fiz há pouco tempo com meus alunos de L1. Eles gostaram, eles gostaram, mas acharam difícil. T24- ENTREVISTADOR: Eu ti... só um minutinho. Ah... Eu tive dificuldade de fazer eh... essa pesquisa com os alunos, porque eles desconheciam, na maioria das vezes, os drills. T25- ENTREVISTADO: Eh... eh... se você fala assim, do nome, drills, eles.. T26- ENTREVISTADOR: Não nomeio a técnica. T27- ENTREVISTADO: Eles não sabem o que é isso. T28- ENTREVISTADOR: Não, não, não. Não o nome. A prática. Eles não conheciam. T29- ENTREVISTADO: Ah. T30- ENTREVISTADOR: Então, eu perguntava depois. E eu tive a surpresa deles dizerem, em geral, que parecia ficar na memória deles, aquela estrutura, como uma musiquinha que ficava retida na memória pro próximo sábado, por exemplo, numa turma de sábados T31- ENTREVISTADO: Eu trabalho numa outra escola em que o método é muito, eh... (00:03:18 ~00:04:46) T32- ENTREVISTADO: ...“drilático”... [referente a drills] T33- ENTREVISTADO: É. (RISOS). Porque tem muitas repetições, né? Então, os alunos, eles desde o primeiro livro, eles já estão condicionados a fazer essas repetições, substituições. Tipo: I go to school every day. Every year. I go to school every year. T34- ENTREVISTADOR: Mas só... mas qual é o método, lá?

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T35- ENTREVISTADO: É o... eu trabalho na... mistura do método direto e é um método eh... um po... T36- ENTREVISTADOR: Audiolingual, né? T37- ENTREVISTADO: É. Bastante. T38- ENTREVISTADOR: Ah, então ali... eh... tem um filósofo que fala uma coisa. Ele escreveu sobre dosagem do fármaco [me refiro aos drills]. T39- ENTREVISTADO: Hum, hum. T40- ENTREVISTADOR: Que o fármaco... pode também ser veneno... tudo depende da quantidade. Que o fármaco pode ser veneno... ou remédio, depende da dose, todo mundo conhece. T41- ENTREVISTADO: Pode ser remédio. T42- ENTREVISTADOR: Ou pode ser veneno. Então, quando a gente pensa no Audiolingual... eh... a gente pensa no Audiolingual a nível de drill (exclusivamente), aí é uma questão... quando a gente pensa na inserção de um drill no método comunicativo, apenas em aula de estrutura, pra ajudar na memória, é a mesma coisa? T43- ENTREVISTADO: Hum, hum. T44- ENTREVISTADOR: A gente está desfragmentando o que vem do passado e que pode ser aproveitado e está recolocando no presente. Sem ser (xxx) linear. Mais global. Agora, a próxima pergunta é a seguinte, David Nunan (1995)... [...] T45- ENTREVISTADOR: Então, ele pegou eh... de um lingüista suíço-francês, se apropriou da idéia das necessidades subjetivas dos alunos de René Richterich e compilou esse livro aqui, com pesquisas de estratégias cognitivas de outros autores e editou o The Learner-Centred Curriculum. (00:05:10 ~ 00:10:40) T46- ENTREVISTADO: Hum, hum. T47- ENTREVISTADOR: Bom, mas segundo Richterich, que Nunan cita, há dois tipos de necessidades dos alunos, objetiva e subjetiva. Brevemente: Objetiva seria temática e gramatical. E subjetiva seria didática. Vamos enfocar a subjetiva. Então, como vocês vêem essa inclusão do aluno enquanto educadoras? Vocês já tinham pensado que o professor pode sair do seu “pódio” e perguntar ao aluno se aquela técnica que ele está

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expondo é boa ou ruim para seu aprendizado e por quê? Se ele quer vê-la inserida na sua didática, ou seja, dar voz ao aluno didaticamente? T48- ENTREVISTADO: Eu não vejo como sair do pódio. Aliás, o professor que... T49- ENTREVISTADOR: Não. Não é sair como um todo, mas sair nesse momento. T50- ENTREVISTADO: Ah... é. Eu acho interessantíssimo. Eu faço isso com meus alunos, procura saber o que que eles mais gostaram, o que eles não gostam. T51- ENTREVISTADOR: Hum, hum. Didaticamente. T52- ENTREVISTADO: Didaticamente. O que, que eles acham que funciona, o que funcionou melhor pra eles, aquilo que você acha que é o mais chato, às vezes,... seu aluno... [pensa o contrário]. “Foi assim que eu... eu consegui enxergar e perceber as diferenças, foi com essa organização que você colocou no quadro, entendeu? T53- ENTREVISTADOR: Que, às vezes, eu estou pensando que é a coisa mais... desbaratada possível... T54- ENTREVISTADO: A gente vai... vai.. assim, de uma forma bem natural. Sem “dar nome aos bois”. Quando você chega lá e você jogou no quadro dando nome aos bois, organizou tudo bonitinho “comparativos”, eh... os adjetivos monossílabos mais XXX superlativos... você vê no quadro, escrito de cores diferentes, a aluna... “Pô, professora, agora sim, entendi. Agora... eu estou me lembrando. Agora ficou claro na minha mente.” T55- ENTREVISTADOR: Você acha que é uma coisa que tem que ser imposta a todos os alunos ? T56- ENTREVISTADO: Assim, é uma experiência minha, né? Eu sempre procuro assim, logo no começo do semestre, apresentar... vamos dizer... “Vamos apresentar a gramática de diferentes formas...” T57- ENTREVISTADO: Pra depois ter um feedback . Tipo, ah... “Como foi que eu apresentei a... a maneira como eu apresentei a gramática, ajudou a... ajudou a entender a idéia, o uso? Como foi que eu apresentei?” Aí, eles vão me dizendo “Ah, você fez isso, fez isso, fez aquilo. Então, essa maneira” T58- ENTREVISTADOR: Essa consciência didática... T59- ENTREVISTADO:

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Isso. “Essa maneira como eu apresentei... eh... em relação à apresentação... lembram quando eu trabalhei o present continous, ah... qual foi a... a melhor maneira de... que vocês... ah... conceberam a gramática, né?” Aí, eles vão me... me dizem: “Ah, eu preferi dessa forma. Porque nós fomos descobrindo a.. a regra.” T60- ENTREVISTADOR: E você inclui aí também o drill? T61- ENTREVISTADO: Não. Não. Eh... eu... T62- ENTREVISTADOR: Como uma prática... T63- ENTREVISTADO: Não. Nesse momento não. T64- ENTREVISTADOR: Em algum outro momento você pergunta sobre o drill? T65- ENTREVISTADO: Não, porque... sinceramente a... aqui no curso eu raramente trabalho com o drill. T66- ENTREVISTADOR: Hum, hum. Você concebe que todos os alunos aprendem indutivamente... T67- ENTREVISTADO: Eu, geralmente, assim... eles fazem a... eu boto assim no... no quadro I LAST WEEKEND T68- ENTREVISTADOR: Ok. T69- ENTREVISTADO: E aí... ah... cada um vai dizendo a sua frase. I traveled last weekend. Boto no quadro travel. I _______ last weekend. Eu vou colocando, né? Mas no caso, eles vão... eles... eles que vão me dar esse... essa estrutura que está faltando ali, mas não... não... no caso, não chega a ser um drill. Porque não há aquela repetição. T70- ENTREVISTADOR: Faço repetição e consulto, desde que expus a técnica para esta pesquisa, então desconhecida para esses grupos de alunos, durante dois anos da pesquisa, tanto o drill mecânico e a leitura alta, eles têm me respondido que são instrumentos que ajudam a retenção da LE. T71- ENTREVISTADO: Que eles gostam? T72- ENTREVISTADOR: Que eles gostam. Mesmo o mecânico. Claro que eu não faço à exaustão. T73- ENTREVISTADO:

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Eles gostam. T74- ENTREVISTADOR: Faço dez minutos, quinze minutos. Os erros, com o que eles não pegaram. Aí pergunto: “Gostaram?” Dizem automatizar a estrutura. Aí, eu vou pra uma produção. Jogo para exercícios comunicativos orais, para uma produção, nesse momento. T75- ENTREVISTADO: Hum, hum.

Uma das entrevistadas, embora trabalhe numa escola que use técnicas

do Audiolingual, ela não acredita nelas e não se permite colocá-las na outra

instituição, mesmo conhecendo pesquisas onde alunos dizem usá-las. Os motivos

podem ser muitos. A outra instituição trabalha com a abordagem lexical e, existe um

preconceito com a gramática e com a repetição; nela reina o modismo da

apresentação e prática do trabalho indutivo. A convivência nas aulas, agregando-se

técnicas antigas, se torna impossível, no caso dela. Contudo, ao mostrar o trabalho

de estratégias cognitivas de Chamot e O´Malley (1995) ela entende, mas não

reconhece a voz do aluno nessa pesquisa, tal é o nível de preconceito e poder de

persuasão da crença reinante nesse curso. Ela nem tentou a técnica e nunca

sondou dos alunos sobre a mesma. Acredita que a indução é a única técnica

possível e eficaz de apresentar e praticar gramática, mesmo que por sobrevivência,

precise trabalhar num outro curso que usa essa técnica, e confirmando o nosso

conceito de fragmentação intermetodológica.

T76- ENTREVISTADOR: Bom, então, essa coisa que você falou, falou eh... insti... eh... que você não faz drills aqui. Faz lá. Então, como é que se processa isso institucionalmente? Você não faz, porque você foi orientada (xxx) pra não fazer ou você não faz porque você não gosta? (00:10:43 ~ 00:20:01) T77- ENTREVISTADO: Não. Eu não faço porque, assim, como o método daqui é o Communicative, né? Você tem toda aquela... T78- ENTREVISTADOR: Bíblia. T79- ENTREVISTADO:

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É. Você tem toda aquela... (risos) aqueles steps. Como você se... deveria fazer, né? E, assim, eu fico ah... sem saber exatamente em que momento aplicar esses drills, né? Então, e... T80- ENTREVISTADOR: Isso é aplicado depois que eu apresento uma estrutura. T81- ENTREVISTADO: Hum, hum. Então, minha... a minha grande preocupação é que eles produzam, mas de uma forma ah... T82- ENTREVISTADOR: Mais autônoma, sem exercitar muito a memória .... T83- ENTREVISTADO: (xxx) (00:11:42) T84- ENTREVISTADOR: Certo. Agora, ah..., no exemplo da professora Dirma que, ela foi expor no quadro, tudo direitinho (didaticamente), e que o aluno deu o feedback... foi um aluno só, ou foram alguns alunos? T85- ENTREVISTADO: Não. Eram dois alunos. A turma estava o quê? Foram cinco alunos ou seis na... na sala de aula. Mas esses dois, assim, eu não vi, porque eu estava de costas, eu só ouvi, né? Então... e ela falou assim “Desse jeito, assim, ficou super-organizado na minha cabeça. Agora eu entendi perfeitamente. Que até então, a coisa estava muito confusa, então... né? Fragmentada. “ T86- ENTREVISTADOR: É porque isso me lembrou uma coisa, Learner Autonomy. T92- ENTREVISTADOR: Vocês acreditam que a gente pode ensinar cultura de aprender... de aprender? T93- ENTREVISTADO: Eu acho que você ensinar, não. Mas você pode eh... dar uma idéia, né, de... das diferenças culturais, né? Passar pro aluno, né? Que ah... existe essas diferenças e que pelo fato de eles estarem aprendendo a língua daquele país, eles têm que estar atentos e saberem aquelas diferenças. Né? T94- ENTREVISTADOR: Mas a Learner Autonomy não seria... seria eh... uma diferença cultural? Mas, aí ela não será aprendida. Ela será apenas conscientizada. “Olha, existe isso. Vamos tentar ir por esse caminho”. Porque essa cultura nos ensina a ensinar e a aprender dessa forma, ela está nos trazendo isso ou... quem contou que essa autonomia pode, realmente, trazer eh... pra um aluno, por exemplo, disperso, uma concentração e conseqüente autonomia? Como é que a gente pode homogeneizar, como se fosse “leite alimba nas caixinhas” as formas de aprender desses alunos? E dizer assim,... né?

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T95- ENTREVISTADO: Eu acho que a gente não pode taxar... T96- ENTREVISTADOR: Você acredita na consciência dessa autonomia. T97- ENTREVISTADO: Taxar todo mundo com uma só forma de aprender, né? Rotular. T98- ENTREVISTADOR: “Bater o carimbo.” T99- ENTREVISTADO: Exatamente. Porque “cada cabeça é um mundo”. Cada pessoa aprende de uma maneira diferente. Agora, eu acho que cultura se ensina, também. T100- ENTREVISTADOR: Se ensina cultura? T101- ENTREVISTADO: Eu acho. T102- ENTREVISTADOR: Morando lá ou morando aqui? T103- ENTREVISTADO: Morando fora [...]. T104- ENTREVISTADOR: Mas isso é um lento processo de aculturação que alguns aceitam e outros não, e isso é uma variável da aprendizagem fora do país. Aceitando-se a cultura, aprende-se mais! Mas quanto à cultura de ensino local, você vai transformar a cabeça de um baiano, dos baianos, ou melhor, de um indivíduo pouco concentrado na aprendizagem da LE e que não é tão disciplinado, em aprendiz autônomo? Você pode dar... trazer pra ele uma consciência de uma outra possibilidade de se comportar, mas mudar realmente? T105- ENTREVISTADO: Eu acredito nisso. Você abrir essa... esse leque e mostrar pra o aluno que ele tem.. ele tem esse caminho... T106- ENTREVISTADOR: Esse caminho. T107- ENTREVISTADO: Pra seguir e que esse caminho vai, de uma certa forma, fazer com que o processo de aprendizagem seja melhor, seja mais rápido, seja mais eficiente, né? Do que aquele aluno que está totalmente ale... a.. eh... T108- ENTREVISTADOR:

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Aleatório. Simplesmente estudando, sem ter nenhuma consciência de que, realmente, eh... o que favorece a ele. Quais são as... as estratégias que ele poderia ou não utilizar, para aperfeiçoar determinado skill [habilidades]? T109- ENTREVISTADOR: Como você pode garantir que esse aprendizado, em todos os casos, será efetivado? E por que nossos colegas... muitos colegas, né? Quando a gente vai para congressos da nossa área,... os colegas falam: “Ah, porque esse exercício não leva a Learner Autonomy, você tem que usar aqueles com Learner Autonomy, como se fosse uma... uma fórmula infalível..., como se fosse uma passagem cultural fácil e não dependesse de subjetividades, natureza, criação, formação, educacional e emocional...“. T110- ENTREVISTADO: O único meio pelo qual a pessoa vai aprender, né? T111- ENTREVISTADOR: Vai aprender? Tem gente que na... não sai da indução. E se o aluno for dedutivo, como a gente falou anteriormente? Aí, eu fico pensando como é que essa... que essa imposição cultural, também, da pesquisa externa dos... dos países centrais... faz? Há uma robotização? T112- ENTREVISTADO: Com certeza. Sem dúvida. T113- ENTREVISTADOR: Vocês acham. Eu... eu sinto isso. T114- ENTREVISTADO: Eu sinto. Eu sinto. E a gente não pode perder de vista aque... que tudo isso, eh... existe um mer... um.. um mercado por trás... atrás disso. Tem gente querendo vender livro. T115- ENTREVISTADOR: Claro. Claro. T116- ENTREVISTADO: Essa coisa de só... que nada! Oxente! Isso aí tem um dinheiro rolando, né? A gente não pode ser assim. T117- ENTREVISTADOR: Peneirar esse conhecimento importado, passar ele por um crivo local? T118- ENTREVISTADO: Exatamente. E aí é que entra a necessidade do aluno, né? A gente observar, né, como é que cada um aprende. Porque senão, vai ter aquele que vai “pegar o bonde errado”... T119- ENTREVISTADOR: E consultar esses alunos.

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Fui ensinado que leitura alta era a coisa mais insignificante possível para o aluno. E que eu nunca fizesse. T120- ENTREVISTADO: Também isso me foi ensinado. Mas, de vez em quando, eu faço. T121- ENTREVISTADOR: Aí eu fiz. Perguntei. E foi positivo. [...] T122- ENTREVISTADO: É. Agora você comentou isso, tem uma aluna que do... no livro quatro, que na aula passada ela me disse: “Ah... eu não vou lhe pedir sempre, mas eu gostaria que, em alguns momentos, você lesse o texto pra... pra gente. Porque eu sinto essa necessidade de ouvir.” T123- ENTREVISTADOR: Modelo do professor. E, do ponto de vista do significado, do sentido e da relevância pessoal pode até não ter, mas do ponto de vista da fonética tem e, por isso, pergunto como os teóricos podem reduzir a LE a significado apenas, a comunicação apenas, se existe um código lingüístico por trás? T124- ENTREVISTADO: “... eu sinto essa necessidade de ouvir.” Então, tem alguns exercícios assim, textozinhos, né, que ah... o que interessa na.. na... o que é importante ali é a resposta, né? Você vai direto na resposta. Questão number one, number two, number three, number four. Porque o texto em si tem algumas palavras que os alunos, provavelmente, não vão saber a pronúncia, né? T125- ENTREVISTADOR: E vão ficar algumas, como vocabulário passivo? T126- ENTREVISTADO: Então, ela me disse “Não é que eu queira que você leia todos os textos, né? Mas seria interessante que, de vez em quando, você lesse alguns textos, né, porque eu particularmente, sou muito auditiva. Então, eu sinto essa necessidade de... de ler e de... de.. e ah... de ler e de ouvir.”. Eu achei interessante o comentário dela. T127- ENTREVISTADOR: Agora... T128- ENTREVISTADO: Teve uma turma que me pediu pra ler as... T130- ENTREVISTADOR: Instruções? T131- ENTREVISTADO: Instruções do exercício: “Professora, dá uma lida XXX instrução”

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T132- ENTREVISTADOR: Que nível de interesse alto, né? T133- ENTREVISTADO: É. Falei: “Tá. Tudo bem” T134- ENTREVISTADOR: (xxx) (00:11:42) T135- ENTREVISTADO: Eu nunca ia imaginar, jamais, que aconteceria isso assim, eles pediram pronúncia de instrução de exercícios. Achei interessante. Eles gostaram. Porque... eles diziam que as palavras eram muito difíceis. T136- ENTREVISTADOR: (xxx) (00:19:10) T137- ENTREVISTADO : Eu faço isso pra... reter a atenção deles. Tipo, eles vão fazer um exercício: “open your books to page number ten”. T138- ENTREVISTADOR: (xxx) (00:19:18) T139- ENTREVISTADO: (xxx) Porque, naquele momento, eu sinto que todos estão ouvindo aquele que está lendo e aí (xxx)... aí, eles vão dizer, ah, (xxx) né, porque muitas vezes, você pede pra ler. Ok. Ah... Hum hum. Muitas vezes você pede pra ler, a instrução. Ok. (00:19:21) (xxx) Aí, tá. Todo mundo começa. Daqui a pouco tem aquele: “É pra fazer o que mesmo?” Sempre tem, né? (rindo) T140- ENTREVISTADOR: Na minha experiência peço pra cada um ler, mas verifico se entenderam. E se fica pouco claro, peço para traduzirem. T141- ENTREVISTADO: Hum, hum. T142- ENTREVISTADOR: Bom. Tem eh... eu fiz entrevistas em outros cursos, fiz aqui, etc... T143- ENTREVISTADO: Mas tem colegas nossos, tem colegas nossos que não conseguem ver o outro lado da moeda. T184- ENTREVISTADOR: Bom, eu vou entregar agora esse quadro um pra vocês. Você... vocês se lembram de ter entrado em contato... em contato com as estratégias cognitivas? Ou com estratégias de leitura, estratégias de habilidades outras, estratégias metacognitivas, como o aluno aprende, eh... vocês se lembram de algum quadro apresentado a vocês com estratégias cognitivas? (00:31:16 ~ 00:35:01)

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T185- ENTREVISTADO: Eu me lembro que eu já... já li sobre isso. Agora, no momento... T186- ENTREVISTADOR: Hum, hum. T187- ENTREVISTADO: Não tinha visto nada assim... T188- ENTREVISTADOR: Ok. Ok. Isso aqui, o nosso objetivo aqui não é saber o quanto se sabe ou não. Eu vou passar aqui esse quadro. Esse quadro foi tirado desse livro aqui de Chamot e O`Malley sobre estratégias de alunos em L2... E eles listam as estratégias em quatro estudos. Eu peguei o estudo de número quatro, porque é justamente compatível com nossa realidade, americanos aprendendo uma língua estrangeira, dentro dos U.S.A.... que é a nossa realidade. Ele foi feito num... eh... estudo longitudinal, portanto muito mais... mais fundamentado, porque foram quatro semestres. E aí, a partir da técnica de... think aloud interviews [entrevistas livres falando-se sem pensar] eles começaram a dizer como é, e por que, eles... eles aprendem. E eu quero frisar, no caso, eu quero perguntar aí o que surpreende vocês. Vocês se surpreendem com alguma deles? T189- ENTREVISTADO: Na verdade, assim, não me surpreende. Agora, mas eu... eu não sei, assim, eh... até que ponto, né? Qual dessas eh... estratégias aqui é mais assim... utilizada, vamos dizer assim ah... tem objetivos... T190- ENTREVISTADOR: (xxx) (00:34:07) T191- ENTREVISTADO: Hum, hum T192- ENTREVISTADOR: Foi um grupo de quatorze... de quatorze alunos aprendendo Russo e um menor, acho que de sete, oito, aprendendo Espanhol. T193- ENTREVISTADO: Hum, hum. T194- ENTREVISTADOR: Então, mesma situação daqui, né? (xxx) E aí, eu fiquei pensando em Translation. Translation surpreendeu? T195- ENTREVISTADO: Hum, hum T196- ENTREVISTADOR:

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Porque eh.. a tradução aí... literal, realmente... de algumas frases, palavras... Mas eu fiquei pensando uma coisa. Eu me perguntei em que língua o aluno estudava em casa. Usaria tradução? E... livro um, ele vai tentar estudar [...], em inglês, em casa? T197- ENTREVISTADO: Hum, hum. T198- ENTREVISTADOR: Está bem. Embora aqui, seja uma técnica, eles listaram usando a palavra estratégia. T199- ENTREVISTADOR: A gente com... a gente consulta o aluno sobre essas coisas? Se ele repete, se ele... vocês já viram algum workshop... solicitando para consultar o aluno se ele gosta de repetição, se ele gosta de tradução? (00:35:38 ~00:40:31) T200- ENTREVISTADO : Não. Mas assim, a gente sempre procura fazer o feedback: de que maneira você chegou... ah... vocabulário, como é que vocês aprendem o vocabulário, né? E tem sempre aquele aluno que diz: “Ah, eu ah... faço uma frase com aquela palavra nova”. Ou tem um outro que simplesmente diz assim: “Ah, eu... traduzo para o Português. O que que significa aquela palavra. Eu só aprendo quando eu faço assim (xxx)” T201- ENTREVISTADOR: O seu primeiro uso é no contexto. T202- ENTREVISTADO: Isso. Eles continuam: “Ah, eu só aprendo quando eu vou... eu faço em meu caderno e vou botando palavra em inglês, a palavra em Português”, né? Com o meu dicionário. T203- ENTREVISTADOR: A gente pode mudar isso, nesse aluno? Ou apenas sugerir? T204- ENTREVISTADO: Eu acho que o professor, ele pode, desde o começo, no... nos livros iniciais, né, do curso, chegar eh... T205- ENTREVISTADOR: Sugerindo. T206- ENTREVISTADO: Sugerindo que ele procure, ao invés de... ah... de só traduzir, ele fazer uma.. fazer... formular uma sentença com aquela... T207- ENTREVISTADOR: Com aquela palavra uma frase. Dar um contexto. Ele deverá estar bem motivado e ser aplicado.

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T208- ENTREVISTADO: Dar um contexto, né? Pra não simplesmente ficar preso à tradução, né? Porque se, desde o começo, ele... ele começa a traduzir, traduzir, nos níveis mais avançados, né, ele vai seguindo, né sempre com aquele... preso à tradução, né? T209- ENTREVISTADOR: Mas você acredita que se... aprendendo uma língua, vamos imaginar, Chinês, nós dois aprendendo essa língua, a gente vai deixar de... T210- ENTREVISTADO: Pensar na... na... T211- ENTREVISTADOR: Pensar na L1? T212- ENTREVISTADO: Não. T213- ENTREVISTADOR: Impossível. Esse equilíbrio é que achamos necessário, no ensino de língua. T214- ENTREVISTADO: Não. Eu acho que você não... não tem... eu acho, assim, quando... por exemplo, quando a gente está falando inglês. Nós que já estamos, né, fluentes. T215- ENTREVISTADOR: É, fluentes. T 216- ENTREVISTADO: Nós não pensamos mais no Português. T217- ENTREVISTADOR: É. Agora, às vezes, na leitura de livro... eh... de livro...mais formal, às vezes eu preciso parar pra traduzir uma sentença ou outra; prosódia e dispersão são meus pontos fracos. Você acredita...? Às vezes, eu me disperso... ou então, porque a pontuação do inglês é diferente, às vezes, ela leva direto... T218- ENTREVISTADO: Hum, hum. T219- ENTREVISTADOR: E, às vezes, ela não separa uma... uma preposição do que vem depois, que pode até ser outra. Então, não entendo. T220- ENTREVISTADO: Hum, hum. T221- ENTREVISTADOR: E aí, eu fico, às vezes, confuso. Não vou mentir. E aí, eu paro e, ainda hoje, eu traduzo.

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T222- ENTREVISTADO: É. Mas aí, você tem momentos, né, que você usa desse recurso, né? T223- ENTREVISTADOR: Mas, ainda assim, com toda... com todo meu caminhar na LE, em inglês, eu ainda traduzo. E não é tão incomum, entendeu? Não é uma coisa tão incomum. T224- ENTREVISTADO: Eu sempre falo pros meus alunos assim, por exemplo, eles estão no livro dois. Depois no livro três. Quando eu pergunto, What is your name? eles não vão mais... parar pra pensar... How are you? How are you? Ah, Como você está? Ah, Qual o seu nome? Porque no primeiro momento, livro um, quando você apresenta What is your name?... Eles Ah! My name is... How are you?/ how are you... oh! I am… né? Eles levam aquele tempo, né, porque aquela estrutura, né, tá… está nova pra ele, né? Livro um. Então, a partir do momento que ele vai… livro dois, outro semestre livro três. Quando chega no livro três, você faz uma pergunta dessa How are you. What is your name? T225- ENTREVISTADOR: Já está automatizado. Mas sempre terá algo pendente a adquirir, se pensarmos nessa lógica linear. T226- ENTREVISTADO: Já tá automatizado, né? Então, não tem mais associação com o Português. T227- ENTREVISTADOR: É. Concordo na maioria do tempo T228- ENTREVISTADO: Né? A partir do momento que as estruturas vão se tornando mais... T229- ENTREVISTADOR: Presentes? T230- ENTREVISTADO: Mais presentes, né? O... o uso do... do Português, né, naquele momento, ele é menor. ENTREVISTA VII – PROFESSORAS: DIRMA E NATASHA (0:03:30 ~ 0:05:22) T1- ENTREVISTADOR: Bom… o próximo passo é o seguinte... é a análise des...desses quadros. Esses quadros foram tirados desse livro compilado por Nunan (2000), cujas idéias centrais advêm de Richterich (1983) e a parte empírica, de pesquisas de estratégias cognitivas de... de outros autores (Chamot e O´Malley, 1995). Trata-se de quadros comparativos, com expectativas de alunos e professores, sobre técnicas e procedimentos de ensino.

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T2- ENTREVISTADO: Hum. T3- ENTREVISTADOR: Estão entendendo? De atividades. Aqui foram entrevistados... imigrantes admitidos na Austrália. E aqui tem uma comparação dessas expectativas dos alunos e dos professores. Por exemplo, prática de pronúncia muito alta para uns, média para outros... T4- ENTREVISTADO: Como assim, muito alta e média? T5- ENTREVISTADOR: Estão comparando as didáticas, do ponto de vista de ambos, o que o aluno espera e o que o professor espera dessas atividades didáticas. T6- ENTREVISTADO: Ah, tá. T7- ENTREVISTADOR: Então, nós estamos agora analisando... T8- ENTREVISTADO: Sei. Certo. T9- ENTREVISTADOR: Então, exemplificando, Language Games, jogos na aula de língua, a última da lista, nessa realidade considerada, está atividade é muito baixa para o aluno... T10- ENTREVISTADO: Coincidem aqui ambos. Pra o professor é também baixa. T11- ENTREVISTADOR: Por exemplo, né? T12- ENTREVISTADO: Ah. Auto-correção dos alunos é baixa para os alunos e muito alta para os professores. T13- ENTREVISTADOR: Então... aqui, nesse quadro, num lado são as atividades do ponto de vista do professor. T14- ENTREVISTADO: Sim. T15- ENTREVISTADOR: O percentual altíssimo. Aqui, é do ponto de vista do aluno. E aqui é um... outra pesquisa que compara as duas. T16- ENTREVISTADO:

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Hum. T17- ENTREVISTADOR: Outra pesquisa que compara outros dados. Entendeu? T18- ENTREVISTADO: Certo. T19- ENTREVISTADOR: Dêem uma... uma olhada aqui nesse quadro para sentirmos os resultados. T20- ENTREVISTADOR: Então, a pergunta é: Você acha ético, do ponto de vista da pesquisa ou de aquisição de segunda língua e, sobretudo, da aprendizagem, com esses dados mostrados nesse currículo baseado no aluno, a gente apagar as subjetividades dele, sua cultura de aprender, apagando a voz desse aluno? Você acha ético? (0:07:27 ~ 0:08:28) T21- ENTREVISTADO: Acho um absurdo. (rindo) Acho um absurdo. Acho que o aluno é que tem que dizer como é que ele quer aprender.

Essas duas professoras reconhecem a lacuna entre as pesquisas de

cognição citadas e os métodos que, messianicamente, pretendem trazer soluções

para a aprendizagem de LE. Assim, elas se surpreendem com a lacuna entre

expectativas de professores e de alunos e a didática muitas vezes desencontrada

com as teorias e o com que o aluno nos quadros dessas pesquisas de cognição

revela. Ao perguntar sobre esse “novidadorismo” superposto a essas pesquisas de

cognição, elas retrucam que esse fato é um absurdo. Isso mostra o

desconhecimento dos meandros de certas pesquisas omitidas de muitos

professores, para que o “novidadorismo” não seja desestabilizado e, assim, se

manter a reprodução, como sendo aquilo que é certo e provado, no mundo

anglófono. A omissão, pelo menos no nosso caso, existiu. Lembramos que a compra

de livros de teoria de aprendizagem e aquisição de L2, provenientes dos países

anglófonos, não tem custo compatível com a remuneração dos professores de LE.

Assim, os coordenadores e aqueles que têm melhor condição financeira, se

interessados, deterão o poder desse conhecimento importado. Buscar um livro da

área em universidades brasileira, como fiz, é de difícil consecução. Bibliotecas mais

atuantes são as da Unicamp e USP, embora incompletas e também desatualizadas.

E isso deixa aqueles que não podem comprar para pesquisar, de “mãos atadas”. No

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meu caso, gastei bom percentual de minha bolsa em comprar os principais livros,

mas isso não foi tarefa fácil, no sentido de garimpar os mais antigos, alguns fora de

impressão, outros, apenas disponível em uma unidade, os mais atuais, com preços

mais altos e os clássicos com preço de atuais. Portanto, sinto que para um professor

sobrevivente se atualizar com as publicações dos países anglófonos, para ter uma

atitude crítica e de resposta, isso se constitui uma empreitada, onde usar grande

parte do salário será necessário. E este fato indisponibiliza tal ação.

T23- ENTREVISTADO: Com certeza, com certeza! É, por exemplo, o meu maior problema é que eu sou uma pessoa extremamente, visual e cinestésica, né? E o meu maior problema na faculdade, como aluna, é exatamente aqueles professores que só satisfazem, quando ensinam para o aluno auditivo, então, o resto... (00:11:18 até 00:13:13) T24- ENTREVISTADO: Como você diz o “novidadorismo” em ensino de LE.., se sou um especialista nesse novo assunto que está em voga (rindo)... T25- ENTREVISTADOR: Existe um mercado aí atrás! E existe uma questão ética e contraditória com estratégias cognitivas dos alunos, então, a saber, como é que você vai desconsiderar uma pesquisa de aquisição de língua na área de cognição, tal como mostramos, anteriormente, feita com alunos universitários, opinando sobre como aprendem uma LE. [...] É ético isso? T26- ENTREVISTADO: A aprendizagem, o foco é a aprendizagem do aluno. T27- ENTREVISTADOR: Hum, hum. T28 -- ENTREVISTADO: O objetivo é fazer com que o aluno aprenda. Mas, assim, para que se... isso aconteça, eh... o professor, ele tem que ah... seguir um método, não é? Você tem um método, você tem o livro, você tem um syllabus, conteúdo e metodologia, você tem uma coordenação. Então... dentro disso tudo, tem o aluno, né? Então, o professor, ele tem que... de forma crítica, procurar atender as necessidades subjetivas do aluno, não esquecendo de todos esses fatores que eu mencionei, né? [...] Então, é, muitas vezes, difícil pra o professor atingir o aluno, né? T29- ENTREVISTADOR: Hum. T30- ENTREVISTADO: Tendo que dar conta de toda essa, vamos dizer, pressão.

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T31- ENTREVISTADOR: Cadeia de poder? T32- ENTREVISTADO: É. T33- ENTREVISTADOR: Né? T34- ENTREVISTADO: Então, o professor, ele tem consciência, mas, ao mesmo tempo, ele sabe que ele, sozinho, ele não pode ir de encontro a todo um... um sistema.

Como falta dialogicidade nessa área de ensino de língua, em cursos livres

de LE.. e temos coordenações metodologicamente reproducionistas. A professora,

de forma crítica, sente o peso do poder sepultado do conhecimento anglófono,

localmente permitido pela nossa área, agindo contra a educação. Os professores

que têm certa consciência das deformações, na área, se sentem sós e transgridem

as normas do novo método entre quatro paredes. O poder do conhecimento

sepultado, importado, recebido e implementado acriticamente faz com que os

professores expostos a essa pesquisa sintam que a área peque por falta de ética e

que o aluno precisa entrar na cadeia de decisões de suas aulas de LE

T54- ENTREVISTADOR: Quem faz toda essa cadeia de poder que a gente está discutindo, aqui? Quem é que obedece ou permite que a gente seja tão submisso? Quem manda a gente ser tão submisso? Aí, eu estou extrapolando o sistema, [...] indo “novidadorista” e (xxx) para uma questão de sociologia da educação. (00:18:50 ~ 00:20:53) T55- ENTREVISTADO: Hã, hã. T56- ENTREVISTADOR: Mas eu estou querendo deixar essa questão clara. Quem é que fez ou faz essa dicotomia entre alunos pesquisados e métodos tirânicos impondo modelos didáticos? Por que... por que na verdade, a gente se deixa, culturalmente, ser submisso? Porque a gente está vendo duas correntes completamente diferentes... uma... respeitando o aluno, outra passando por cima deste [...]. Ou quem passa... quem passou pra gente no início dessas pesquisas de estratégias cognitivas não incluiu a leitura e discussão... por exemplo, nessa época aqui [quando estratégias cognitivas], por exemplo, eu estava em outro curso. Esse capítulo com estratégias cognitivas foi ignorado. T57- ENTREVISTADO: Esse capítulo não foi dado... (rindo)

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T58- ENTREVISTADOR: Foi apresentado os capítulos de estratégias de habilidades, as estratégias de reading, leitura, writing, escrita... mas não foi dado eh... essas estratégias dos alunos de LE, buttom-up, de baixo para cima. T59- ENTREVISTADO: Hum, hum. T60- ENTREVISTADOR: Por quê? Pela grande atração da representação do novo método e o que ela poderia causar de desconforto e questionamentos e, até, de sublevação [...], tipo: “Eu não vou te dar isso, porque isso vai nos dar [a nós, coordenadores] problemas fora da linearidade e do falso conforto...”. Porque o método novo, não vai aceitar essa dicotomia. Você acha que pode acontecer assim?... T61- ENTREVISTADO: Com certeza. Não. Nem um pouquinho. Você está sendo bem realista.

Em meu caso, especificamente, conheci esse livro citado, de Chamot e

O´Malley (1995), sobre estratégias de aprendizagem, mas, na época, li somente as

estratégias de habilidade, como citamos. A rationale, as razões subjacetes, por trás

da teoria de cognição usada, engendrada nessa minha experiência, para excluir o

conhecimento de estratégias cognitivas descartadas na época, está na escolha da

“verdade” de um coordenador que sepultou e escolheu, esse livro, aquilo que não

suscitaria questionamentos dos professores. Manteve apenas o que não

incomodava ao “andar” da máquina de ensino; o que não despertava no professor

as ambigüidades criadas com as estratégias excluídas e que gerariam uma busca

da “verdade” do poder desqualificado, dos professores e, mais remotamente, como

tento atualizar agora, dos alunos. Nessa pequena genealogia do poder, sinto uma

manipulação do conhecimento pelas suas conseqüências indesejadas, pela

manutenção na desatualização de uma postura linear determinista do conhecimento

na área de ensino de LE e pelo poder financeiro que possibilita apenas a de

atualização do conhecimento anglófono, através da aquisição de livro novidadoristas

por alguns coordenadores com todo respeito às inovações. Nada temos contra o

novo, mas contra a posição acrítica e reproducionista dos profissionais da nossa

área, localmente. Enfim, esse também é um movimento de classe, de poder

financeiro, da produção cultural, que não podemos ter a inocência de imaginar que

dentro desse sistema, isso mudará na educação de LE. Ou seja, a superestrutura

alienante sem reação da infra-estrutura, refletindo assim uma característica do

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capitalismo como o nosso e que acho difícil de sofrer um revés. Mas (g)localmente

podemos fazer uma diferença, se formos crítico diante da importação cultural da

área.

ENTREVISTA IX – PROFESSORA: CAMILE (00:09:12 ~ 00:14:24) T1- ENTREVISTADOR: Bom, a segunda pergunta é: Aqui nessa instituição, por exemplo, como são planejados, implementados... implementados e avaliados os currículos? Como é que você sente isso? T2- ENTREVISTADO: São... são pacotes prontos, né? Eh... desenhados em.. em.. níveis, né? Níveis um e dois, três, quatro, cinco e seis. E... T3- ENTREVISTADOR: Divididos em... T4- ENTREVISTADO: Divididos em níveis, né? E... T5- ENTREVISTADOR: De acordo com a carga horária. Há uma preocupação com a maturidade cognitiva, também? T6- ENTREVISTADO: De acordo com a carga horária, de acordo com... com a faixa etária dos alunos, mais ou menos, de acordo com a maturidade cognitiva deles, acredito, também. T7- ENTREVISTADO: Há uma preocupação, embora, na prática, a gente perceba que isso é um pouco balela.

A imposição de cima para baixo, a “superestrutura” anglófona dita o

conteúdo e a forma de ensiná-lo. Não existe, segundo a professora, concepção de

um currículo, nesse curso livre. Também, com outros entrevistados, sentimos o

mesmo. Assim existe um estado de alienação, com o qual precisamos fazer o nosso

mea culpa, estado instalado e aceito pelo conhecimento anglófono, pouco acessível

como qualquer produto importado à classe de professores, extinguindo suas forças

produtivas e suas relações de produção nesse setor educacional.

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T41- ENTREVISTADOR: E, atualmente, qual o currículo que você segue? Segue algum currículo? Então, currículo, aí, é visto de uma forma ampla, a filosofia de educação da instituição, né? O que é currículo. Currículo é o que você escolhe como conteúdo, escolhe como você vai implementar e avaliar e isso vai revelar contar vários aspectos de uma pedagogia etc... (00:15:00 ~ 00:17:07) T42- ENTREVISTADO: Olha, eh... falando de currículo, sob essa perspectiva mais ampla, eu acredito que eu tenho meu currículo próprio, na sala de aula. Eu... eu.. meio que não diria a... eh... desprezo ou deleto o currículo da escola. T43- ENTREVISTADOR: Hum, hum. T44- ENTREVISTADO: Mas, assim, o meu currículo, ele está um pouco acima do currículo da escola. T45- ENTREVISTADOR: Ham, ham. T46- ENTREVISTADO: O que seria o meu currículo? Inverter a ordem do... syllabus, que eu tenho (xxx).

Essa professora transgride, com sua agenda oculta, aquilo que

didaticamente é passado para ela, marcando a falta de dialogicidade entre os

professores e coordenadores. Assim, os procedimentos conjuntos, relativamente

unificados, não são discutidos a partir da cognição do aluno, informada pelas

pesquisas cognitivas feitas com os mesmos e, aqui, muitas vezes, citada. Nem a

experiência dos professores é discutida, suas teorias pessoais e suas avaliações do

processo de ensino de LE. Essa professora cria um currículo oculto.

T47- ENTREVISTADOR: A próxima pergunta seria sobre esse curso livre, né? O aluno se envolve ou participa do nosso currículo? Se sim, por quê? Se não, por que não? (00:18:15 ~ 00:19:03) T48- ENTREVISTADO: Eh.. eles não participam do nosso currículo. Eu acredito que isso é uma questão cultural, né? E... eles não participam do nosso currículo. Eles não participam do currículo da escola dele, da universidade dele, não é? T49- ENTREVISTADOR: Hã, hã. T50- ENTREVISTADO:

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Porque não é... uma proposta da nossa educação de... fazer com que eles participem. Fazer com que eles construam, fazer com que eles opinem, proponham. Então, conseqüentemente, a gente dificilmente... eu acho que, talvez, isso seja uma coisa que minha filha veja... Talvez, né? É essa... é essa... T51- ENTREVISTADO: É uma relação ver... verticalizada de tudo, né? (00:19:30 ~ 00:19:45) T52- ENTREVISTADOR: Estou sem palavras... Exatamente isso. Você sintetizou bem... T53- ENTREVISTADO: Eu acho que... não existe mesmo. E se alguém disser que existe, que me explique, que me mostre. Porque eu duvido muito. Não creio.

A descrença da professora fica clara, num território macro, isto é, além do

ensino de LE, exclusivamente. Ela não acredita que, em algum momento, o poder de

uma pedagogia clássica chegue a liberar o poder de professores e alunos para que

essa dialogicidade e esses atores penetrem de forma dialógica, na didática de suas

aulas. Certamente, há um desconhecimento da professora da pedagogia crítica em

progresso que, ironicamente, nasce de Paulo Freire e que tem sido explorada,

sobretudo, por autores anglófonos da LAC ou da pedagogia crítica.

T54- ENTREVISTADOR: Então, a próxima pergunta é complementar... Aqui, na instituição , como é feita essa Needs Analysis, análise das necessidades dos alunos, a nível de sala de aula, a nível de instituição? Eh... é feita de uma forma... o professor sonda o que o aluno sabe ou não sabe, ou seja, conteúdo? (00:25:48 ~ 00:30:28) T55- ENTREVISTADO: Hum, hum. T56- ENTREVISTADOR: O professor... checa com o aluno como ele quer ou não quer aprender, ele fica preocupado com o “quê” da história ou co... o “como” da história, do aprendizado? T57- ENTREVISTADO: Acho que... T58- ENTREVISTADOR: Em geral? T59- ENTREVISTADO: Eu acho que tem um pouco das duas coisas. Mas, eu acho que o foco principal é o “como”

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T60- ENTREVISTADOR: É o “como”. T61- ENTREVISTADO: Como é que eu vou dar isso, como é que eu vou entender aquele aluno problemático, como é que eu vou atingir aquele aluno X? T62- ENTREVISTADOR: Então, em sua opinião, sobre a sua experiência profissional, ou sobre a instituição,... T63- ENTREVISTADO: Eu ajo um pouco... T64- ENTREVISTADOR: A instituição tem Needs Analysis, análise das necessidades dos alunos. T65- ENTREVISTADO: Ela vê isso... ela.. ela passa na sua for... na formação do professor essa questão, né? T66- ENTREVISTADOR: Qual? T67- ENTREVISTADO: De... ver quais são os diferentes tipos de aprendizagem, de como é que você deve lidar com aluno X ou aluno Y, de como é que você deve... T68- ENTREVISTADOR: Abordar, o “como”? T69- ENTREVISTADO: Abordar determinado conteúdo. Porém, eu acho que... T70- ENTREVISTADOR: A Needs Analysis não seria conteúdo, então? T71- ENTREVISTADO: Não. Não. Porque eu acho que Needs Analysis , ela deveria focar mais em... em preparar o professor para... T72- ENTREVISTADOR: Ham, ham. T73- ENTREVISTADO: Em preparar o professor para, não só a ní... em ní.. em... em...termos técnicos, em termos didáticos. Preparar o professor de uma forma mais subjetiva, sabe? De uma forma que o professor pudess... ter um olhar além daquilo que ele está vendo. T74- ENTREVISTADOR: Claro. Exatamente

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T75- ENTREVISTADO: Então, às vezes, eu ouço na sala de professores. T76- ENTREVISTADOR: Mas essa é a sua visão. T77- ENTREVISTADO: [...] T78- ENTREVISTADOR: Continue com sua opinião e, depois, a gente vai pra o aspecto institucional. T79- ENTREVISTADO: Certo. Tá. Às vezes, eu ouço comentários de algumas atitudes que os professores têm, em sala de aula. E eu percebo que, muitas vezes, eu faria diferente. E assim por que ele agiu daquela forma. E, imediatamente, a esse meu questionamento vem... vem uma resposta. Porque ele não foi formado para agir de uma forma diferente. Então, eu acho que tem um (xxx) aí nessa formação que eh... desprivilegia... existe essa palavra? Existe, né? Essa questão de... do como, sabe? O... o... T80- ENTREVISTADOR: O como que você quer dizer aí é a análise, a avaliação do processo. T81- ENTREVISTADO: Hum, hum. T82- ENTREVISTADOR: Da aprendizagem. Não do ponto de vista didático, mas do ponto de vista humano. T83- ENTREVISTADO: Isso. Isso. Exatamente. T84- ENTREVISTADOR: Do ponto de vista humano. Hum. T85- ENTREVISTADO: Exatamente. Exatamente. O humano, ele não é enfocado como deveria na.. na formação. E eu percebo... T86- ENTREVISTADOR: Na formação do professor. T87- ENTREVISTADO: Na formação do professor. E eu percebo que, quando se leva essa formação mais humana, né, há uma certa resistência, dos professores que estão sendo formados. Muitos se entusiasmam: “Puxa! Nunca vi isso, nunca pensei nisso. Nunca pensei por esse lado”. Mas muitos se sentem eh... eh...

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Sobre Needs Analysis, análise das necessidades dos alunos, vimos que a

professora entende essa subjetividade tal como for escrito por Richterich. Ela não

entendeu a consulta e negociação da didática como atitudes humanas. Parece-me

que esse aspecto não ficou muito claro para a mesma. Contudo, o que ela chama de

dimensão humana dos alunos, enquadramos nas Subjective Needs Analysis, a

análise das necessidades subjetivas dos alunos, “conceitualizada” por Richterich.

Como formadora de professores, ela sente a resistência da inclusão das

subjetividades desses atores nesses. O poder sepultado do conhecimento anglófono

formando a posição do professor como único player, jogador, como único decision

maker, fazedor de decisões, em sala de aula, o que mostra a indisposição a

negociar estratégias na sua didática e a escutar mais apuradamente esse aluno.

Teme-se a perda de território, do papel de autoridade e do poder hierárquico

institucional. Podemos também atribuir essa manutenção do seu poder às

continuadas faltas que a carreira de professor sofreu, ao longo desses últimos

quarenta anos em nosso país e que continua sofrendo. Assim eles buscam um

“ressarcimento de um poder roubado”, socialmente, diante de períodos recentes da

nossa história que possibilitaram um desprestígio de seu papel diante da sociedade

e de sua vida financeira.

(00:32:50 ~ 00:33:55) T88- ENTREVISTADO: A escola também tem que se desenvolver. E você também tem que ser formado dentro de uma didática, de uma técnica que tenha o seu valor. Mas o que a gente vê em curso de idiomas, e o que a gente vê, também, fora de curso de idiomas é uma formação fragmentada, onde a subjetividade do professor não é abordada, não é ouvida, né? Ah.. ah... é só o profissional que conta... é só você dar uma aula show, você dar uma aula, eh... eh, didaticamente perfeita, diante do “modelito” proposto. Você dar “macetes”, você indicar livros, você... percebe? E aí, você vê o aluno que está ali tímido, que não... que não participa e ... e não está nem aí pra ele, né? E aí, você chega na sala angustiado e não pode dividir isso com os alunos ,porque não é profissional. T89- ENTREVISTADOR: E com os colegas? Nem com os colegas? T90- ENTREVISTADO: Nem com os colegas. Então, são todas essas coisas que ficam fora. Então, eu acho que... Paulo Freire, Anísio Teixeira, eles trazem coisas fantásticas que.. que nós deveríamos refletir...

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A professora faz uma pedagogia crítica com autores brasileiros, não

anglófonos. Isso é muito bonito, porque temos condição teórica de avançar na área

de ensino da LE, mas nosso atavismo anglófono na área se constitui numa condição

reproducionista ideológica. Não acreditamos em nós mesmos. E não depuramos o

que chega para nós, desses países.

Abaixo continuamos com a Needs Analysis, análise das necessidades

dos alunos e agora podemos justificar porque a professora não interpretou a

inserção do aluno na didática, como sendo uma relação mais humana.

T91- ENTREVISTADOR [...] Richterich conceitua e divide entre essa Needs Analysis, análise das necessidades dos alunos, em: objetiva, ou seja, o aluno entrando na Needs Analysis,s no conteúdo dos syllabus e a subjetiva, a saber, o aluno sendo consultado como aprende e qualquer outro aspecto subjetivo arrolado nessa negociação. (00:37:06 ~ 00:37:48) T92- ENTREVISTADO: Sim. T93- ENTREVISTADOR: É o aluno negociando com o professor. Dizendo ao professor também, como ele prefere aprender? Como... T94- ENTREVISTADO: Como ele gostaria de aprender. T95- ENTREVISTADOR: Como ele gostaria? Então, como você vê isso como educadora, você acha que é viável? T96- ENTREVISTADO: Isso... funciona. T97- ENTREVISTADOR: E é viável? T98- ENTREVISTADO: É viável. Funciona no sentido de ser viável. T99- ENTREVISTADOR: É. T100- ENTREVISTADO: Porque na nossa realidade de sala de aula, eu acho que pouco é feito... T101- ENTREVISTADOR:

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É feito em relação a? T-102 ENTREVISTADO: É feito, em relação a essas duas necessidades. T103- ENTREVISTADOR: Veja aqui um estudo de estratégias cognitivas feito por Chamot e O´Malley, nesse livro aqui. Eu me concentrei na pesquisa de número quatro, com duas turmas: uma, com quatorze alunos americanos, aprendendo Russo, e a outra, com treze alunos aprendendo Espanhol. Ambas nos Estados Unidos. E estes alunos trazem as seguintes estratégias, no quadro um, como as usadas por eles. Por favor, leia. (00:39:37 ~ 00:39:57) T104- ENTREVISTADOR: Então, este estudo é feito nos Estados Unidos, no mesmo ambiente nosso, ILE Estes alunos, eles selecionam e escolhem várias técnicas de vários métodos, não é? E sem nenhum preconceito. E os pesquisadores registram isso. Embora impactantes, as várias técnicas ou estratégias de vários métodos diferentes dos métodos atuais não reverberaram na comunidade de ensino de LE. (00:40:17 ~ 00:40:49) T105- ENTREVISTADO: Hum, hum. T106- ENTREVISTADOR: Ou seja, me parece que as estratégias, as técnicas e as formas de aprender podem ser variadas e atreladas à cultura de ensino. Embora elas estejam além da cultura, unicamente, estão além de vários fatores, né? T107- ENTREVISTADOR: Essa pesquisa com esses alunos, nesse estudo quatro, por exemplo, não foi passado para nós. (00:41:21 ~ 00:41:38) T108- ENTREVISTADO: Nunca foi colocado. Pelo contrário. T109- ENTREVISTADOR: Por quê? Porque os capítulos escolhidos desse livro eram sobre treinamento de outras estratégias, que interessavam a quem estava no poder, né?. T110- ENTREVISTADO: Aqui, por exemplo, nessa instituição são crucificados aqueles que disserem ... T111- ENTREVISTADOR: E quanto a esses dois tipos de Needs Analysis, objetiva pra o conteúdo e subjetiva para os estilos pessoais dos alunos, essas estratégias são intencionalmente excluídas? E você acha que há um engessamento do professor e, conseqüentemente, dos alunos na participação dos syllabus, conteúdo e forma de ensino, aqui, nesse curso? (0:44:15 ~ 0:44:46)

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T112- ENTREVISTADO: Com certeza. Com certeza. T113- ENTREVISTADO: Por exemplo, o que é que um adolescente quer com a.. eh... aprender a falar no telefone. Eh... procurar um emprego. Adolescente não procura emprego. A gente vê livro de adolescente, onde uma lição tem um diálogo a ser ensinado, cuja função é: looking for a job, procurando trabalho, né? Quer dizer, eu acho que está completamente fora do que é a vida dele. A vida dele não tem esse elemento job, trabalho, ainda. Então, eh... precisa haver uma coisa mais... está faltando a palavra eh... (00:46:35 ~ 00:47:59) T114- ENTREVISTADOR: Mais crítica em relação ao livro didático? T115- ENTREVISTADO: Mais crítica, mas mais (xxx) (00:47:19). T116- ENTREVISTADOR: Ser mais útil? T117- ENTREVISTADO: Mais útil. E a.. e eu acho que aí vem a participação objetiva, do conteúdo, do aluno. “O que que eu qu.. eu preciso aprender?” T118- ENTREVISTADOR: E a intervenção do professor e a audição do acadêmico. T119- ENTREVISTADOR: Do.. do.. da coordenação acadêmica. 120- ENTREVISTADO: E a independência do professor. A autonomia dele. Um dia... “Vamos esquecer isso aqui e vamos, hoje, aprender isso aqui porque Fulano, Cicrano e Beltrano precisam disso e eu acho que isso aqui, é importante pra eles e isso aqui vai ser também, pra vocês.”Nós vamos aprender hoje isso aqui. Amanhã, Cicrano e Beltrano vão dar outra sugestão”. Entendeu? Fazer uma mescla. T121- ENTREVISTADOR: Agora, eu acho que os professores de inglês estão menos fascinados (00:51:20 ~ 00:51:50) T122- ENTREVISTADO: Isso. T123- ENTREVISTADOR: Fascinados? T124- ENTREVISTADO: Isso. Isso. Eles não.. eu acho que os professores de inglês, eles já foram mais alienados.

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T125- ENTREVISTADOR: Exemplo disso é a cultura do Learner Autonomy. (00:54:00 ~ 00:55:50) T126- ENTREVISTADO: Hum, hum. T127- ENTREVISTADOR: Culturalmente, é viável na Bahia? Learner Autonomy? T128- ENTREVISTADO: Olha, pela minha vasta experiência, não querendo ser presunçosa... é uma coisa extremamente difícil. Eu... sendo muito sincera, eu ...ah... T129- ENTREVISTADOR: É idealização? T130- ENTREVISTADO: Eu gosto da idéia, mas eu acho que é uma coisa meio utópica. T131- ENTREVISTADOR: Meio utópica? T132- ENTREVISTADO: É. Eu acho. T133- ENTREVISTADOR: Ham, ham. T134- ENTREVISTADO: Eu já tentei inúmeras vezes pôr em prática e ouço muitos colegas, né, também querendo desenvolver essa autonomia. T135- ENTREVISTADOR: Essa... teoria é importada... T136- ENTREVISTADO: Não. Não vai muito adiante. T137- ENTREVISTADOR: Pela cultura? T138- ENTREVISTADO: Eu acredito que pela nossa cultura. Pela coisa... vem desde berço, aqui na nossa... da questão familiar. De ter a mãe sempre ali, né, acolhendo... T139- ENTREVISTADOR: Provedora? T140- ENTREVISTADO:

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Provedora. O pai também ali, sabe? Você fica até trinta, quarenta anos com os pais... morando com os pais. Entendeu? O pai tá ajudando, dando mesada. Você começa a trabalhar muito tarde... T141- ENTREVISTADOR: Comprando para o filho pré-universitário... T142- ENTREVISTADO: Isso. “Se você passar no vestibular, eu te dou um carro”. Então... T143- ENTREVISTADOR: Mas esse é um ponto muito discutido e defendido por muitos professores, né,? T144- ENTREVISTADO: Eu acho que a gente deve continuar tentando, entendeu? Porque nada é de... da noite para o dia. Mas, assim... é frustrante e vo... e você fica meio estarrecido com o que vê.

Algo que não estava previsto no roteiro da nossa entrevista é a Learner

Autonomy, a autonomia do estudante, contrariando a cultura local e cultura de

aprendizagem e ensino. Esse é o questionamento sobre a dificuldade de importar e

impor idéias dos países anglófonos, sem crivo local, idealizando que nossos alunos

se comportem como os deles. Isto é, que nossos alunos sejam autônomos, ou seja,

querer que o aluno seja autônomo significa moldar esse aluno, querer ele não

hiperativo, preguiçoso, desmotivado; mas centrado, focado, ativo e motivado. É

homogeneizar a cognição humana, dos alunos, como fazemos com a técnica de

pasteurização. Isso é uma cultura que pode ser disseminada, mas seus resultados,

a meu ver, não serão nunca homogêneos, porque é teoria que não considera os

multifatores demandados, e as subjetividades e suas diferenças existirão sempre,

entre humanos, mesmo nos países anglófonos.

T145- ENTREVISTADOR: Eh... por exemplo, que estratégias cognitivas você leva em consideração? Aquelas que estão de acordo com o método do momento... que você está utilizando, ou você usa várias estratégias já levantadas no quadro um que eu mostrei há, pouco? (00:57:01 ~ 00:58:50) T146- ENTREVISTADO: Sabe que... sabe que eu planejo minha aula muito... de uma forma muito minha... muito intuitiva. T147- ENTREVISTADOR: Muito livre [...]

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T148- ENTREVISTADOR: Então, dessa lista, você usa algumas, por exemplo... T149- ENTREVISTADO: (xxx) (00:58:29) . Eu uso transferência, eu uso (xxx) (00:58:30), muito repetition, repetição, muito. (xxx) (00:58:33) substitution, por que não? T150- ENTREVISTADOR: Ham, ham. T151- ENTREVISTADO: Sabe? É uma coisa... minha aula não é referencial (rindo) pra nenhum professor.

Essa professora já desconstrói, há muito, a crença numa só forma de

ensino, seguindo uma só abordagem. Ela transgride o conhecimento metodológico,

o que se indica nos treinamentos, onde o professor George recomenda técnicas

atuais, embora ache as antigas viáveis e execute as mesmas. Contradições de um

sistema que se sustenta por um poder que faz rupturas e nunca retifica e, assim, a

professora transgride o treinamento e torna-se um verdadeiro exemplo da

epistemologia segundo Bachelard (1970).

T152- ENTREVISTADOR: O seu aluno é ouvido em relação às estratégias ou técnicas? Com o que ele mais se identifica desse quadro que você acabou de analisar? Você consulta esse aluno, quando você dá o livro um, iniciante, que está chegando? Quando você dá um drill, você pergunta se é bom ou ruim? ... (00:59:47 ~ 01:00:17) T153- ENTREVISTADO: Sim, sim. T154- ENTREVISTADOR: Então, a grande incompatibilização nessa pesquisa… mostrando as preferências didáticas dos alunos... não é apenas a dos professores, pouca identificação entre a crença desses e um certo apagamento da crença dos alunos. Isso tudo em favor da lição centrada na preferência do professor ao ensinar (xxx) (01:01:27) . Você tinha conhecimento disso? Dessa pesquisa? (01:01:05 ~ 1:02:06) T155- ENTREVISTADO: Não. T156- ENTREVISTADOR: Eu vou mostrar no quadro, a seguir, a diferenciada percepção de ambos em relação às atividades que mais interessam na aprendizagem e no ensino para ambos.

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T157- ENTREVISTADO: Hum, hum T158- ENTREVISTADOR: E eu brinco dizendo: Que incompatibilidade! (xxx) (01:01:48). E eu vou passar o quadro dessa pesquisa, pra você dar uma olhada. Aqui a expectativa do aluno em relação ao tipo de atividade que o professor impõe e aqui a expectativa do professor. A única que bateu foi essa. O resto você vai descobrir. T159- ENTREVISTADOR: Como chega a você essa pesquisa? (01:02:53 ~ 01:03:40) T160- ENTREVISTADO: Engraçado que eu me vi aqui... nesse professor. T161- ENTREVISTADOR: Você se viu? T162- ENTREVISTADO: Me vi. Me vi nesse professor e me vi um pouco, também, nesse aluno. T163- ENTREVISTADOR: Nesse aluno também... T164- ENTREVISTADO: Por exemplo, eu discordo que os alunos eh... não tenham... não desejem tanto... não... não esperem que (xxx) (01:03:22) eu acho que eles gostariam disso... tem uma expectativa de que haja na aula sempre, qualquer tipo de game, jogos. T165- ENTREVISTADOR: Hã, hã. Mas aí, a gente tem uma variação cultural. T166- ENTREVISTADO: Certo. T167- ENTREVISTADOR: Essa pesquisa é na Austrália, né? T168- ENTREVISTADO: Certo. Tá. Tudo bem. T169- ENTREVISTADOR: Entendeu? T170- ENTREVISTADO: Tudo bem. Mas, assim, eu me vi muito nesse professor. Muito. T171- ENTREVISTADOR: Que, que você sente em relação a, essa... essa pesquisa de comparação de expectativas de alunos e professores... (xxx) (01:04:57)?

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T172- ENTREVISTADO: Olha, eh... T173- ENTREVISTADOR: O que você sente, pessoalmente, e o que você sente em relação ao ensinar, ao aprender? T174- ENTREVISTADO: Eu acho que... que é mui... eh... é muito dito pra gente como deve ser a nossa prática. E isso gera uma expectativa falsa, sabe? Então, por exemplo, eu fui formada por A... por R... , por inúmeros outros formadores. T175- ENTREVISTADOR: E? T176- ENTREVISTADO: Que... eh... Error Correction, correção de erros, não deve ter sempre. Deve ter esporadicamente ou raramente. T177- ENTREVISTADOR: ... por que? T178- ENTREVISTADO: Isso me incomoda. Porque eu... eu.. eu acredito que o erro leva ao.. ao acerto. T179- ENTREVISTADOR: Ham, ham. T180- ENTREVISTADO: E o erro... T181- ENTREVISTADOR: O aluno... T182- ENTREVISTADO: E o erro deve ser sinalizado, né? E aí, eu sempre pergunto principalmente pra os alunos: “Vocês se sentiriam inibidas ao cometerem algum erro e eu consertasse ou sinalizasse pra que vocês falas sem certo ou tentassem corrigir?” Eles amam. T183- ENTREVISTADOR: Então, bate com isso aí. T184- ENTREVISTADO: Bate. Entendeu? Mas, assim... a nossa expectativa e a das teorias é que eles não esperem que nós os corrijamos. E a pesquisa diz o contrário! T185- ENTREVISTADOR: Isso. T186- ENTREVISTADO: Mas.. eles... eles querem que a gente corrija, né? Um ou outro, não. Assim, num grupo de dezessete... dois não... não desejam. Tudo bem. Respeita-se.

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T187- ENTREVISTADOR: Respeita-se a individualidade... T188- ENTREVISTADO: E tem que haver diversidade, é normal, né? E tem que haver a diferença. Mas, assim, você vê que... por que nos é falado que a gente não deve corrigir? Nas cinco hipóteses de Krashen (1996), por exemplo, na do filtro afetivo, a correção aumenta a inibição. Por que isso... sabe? Como... como se fosse um... uma verdade absoluta que os professores compram desses pacotes. (1:08:24 ~ 1:09:08) T189- ENTREVISTADO: A... a discrepância, eu acho que vem muito por conta dessa... dessa relação... T190- ENTREVISTADOR: De poder? T191- ENTREVISTADO: De poder: eu mando, você obedece. Se eu mando e você obedece, eu não escuto. Eu não preciso escutar. E você também não precisa me dizer o que você sente. T192- ENTREVISTADOR: É coação mesmo, né? T193- ENTREVISTADO: É coação. Então essa dis... discrepância, acho que vem daí. T194- ENTREVISTADOR: Um micropoder? T195- ENTREVISTADO: Hum, hum. Então, é por isso que você tem uma expectativa X e o aluno tem uma expectativa V. É... é uma outra letra que nem... nem existe. Entendeu? E isso gera sofrimento, gera frustração. É um (xxx) (01:09:04) mesmo. T196- ENTREVISTADOR: Causando evasão, saídas, perdas de aluno. (1:10:02 ~ 1:11:02) T197- ENTREVISTADOR: Mas também é uma coisa muito pouco contemporânea. T198- ENTREVISTADO: Eu estou... arrasada. T199- ENTREVISTADOR: (Rindo) T200- ENTREVISTADO:

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Juro. Juro a você. Porque é.. eh...eh... é muito... como é que eu posso dizer? É perverso. T201- ENTREVISTADOR: É perverso. T202- ENTREVISTADO: Porque isso manipula você. Enquadra você. Porque engessa, né? E aí, depois vo... a escola fica querendo um professor crítico. A escola fica querendo um professor autônomo. Reflexivo... como? Sabe? T203- ENTREVISTADOR: Concordo [...]. T204- ENTREVISTADOR: Tudo importado. E sem nenhum senso crítico, aqui. A gente recebe globalmente e localmente, nada. Zero? É isso? T205- ENTREVISTADO: [Risos]

Nesse trecho, a professora usa uma palavra significativa, quando analisa

a atitude omissa em relação às expectativas dos alunos não executadas, fato que

para a mesma é perversa. Tenho a mesma opinião, aliás essa perversão tem sido

nossa batalha, aqui. Ela, como uma profissional que pensa criticamente e não aceita

esse micropoder na relação dos professores sobre os alunos, mostra com suas

palavras que alguns profissionais da área de LE estão conscientes do que ocorre na

manipulação do conhecimento do ensino e aprendizagem de LE.

(1:18:48 ~ 1:21:00) T206- ENTREVISTADOR: O desenvolvimento... o que é o desenvolvimento profissional, aqui, no curso? T207- ENTREVISTADO: Eu particularmente acho que é você se tornar um...um bom professor... T208- ENTREVISTADOR: Técnicos... T209- ENTREVISTADO: Numa perspectiva técnica, né? Ter um bom... uma boa... competência lingüística-comunicativa-técnica, né? T210- ENTREVISTADOR:

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Hum, hum. Mas, diante do que conversamos, das estratégias dos alunos, das suas expectativas e da imposição dos professores sobre esse ensino e aprendizagem, você acha isso ético? T211- ENTREVISTADO Claro que não. É uma manipulação de informações, para atender ao poder dos professores e das coordenações. ENTREVISTA X - PROFESSORA ANA AMÉLIA (0:31:34 ~ 0:33:08) T1- ENTREVISTADOR: [Testando o MP3] T2- ENTREVISTADOR: Eu vou fazer só uma pergunta, porque você falou dos drills, né? E quando você falou dos drills, eu lembrei de tradução e lembrei de transfer. T4- ENTREVISTADOR: O aluno eh... é consultado se ele gosta dos drills? T5- ENTREVISTADO: Às vezes, a gente consulta. Sim ou não. Às vezes, eu... tenho... T6- ENTREVISTADOR: Você? T7- ENTREVISTADO : É. Ah..sim... T8- ENTREVISTADOR: Mas você não pode falar como um todo. T9- ENTREVISTADO: Assim, a maioria... porque a gente é orientada. Então, digamos, a gente tem uma orientação pra consultar algumas coisas. Mas não está oficializado. Não tem nada de direto. Mas a gente é orientado, que veja o que o aluno... então... a gente tem treinamento, a gente tem... T10- ENTREVISTADOR: Treinamento de? T11- ENTREVISTADO: São diversos treinamentos. Então, digamos que a gente já eh...eh.. questionários... Tem um oficial na pasta dos alunos. O que eles gostam, o que eles não gostam... T12- ENTREVISTADOR: Você tem um oficial. E ele diz... T13- ENTREVISTADO:

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Ele fala se ele gosta de música, se ele gosta... agora, não... não entra muito na parte... T14- ENTREVISTADOR: E aborda estratégia cognitiva, estratégias cognitivas? T15- ENTREVISTADO: Agora, a gente percebe: “Ah, professora, eu não gosto disso”, né? Apesar de que, às vezes, tem um que não gosta, o outro gosta... Um gosta de gramática, o outro não gosta. Aí, a gente tem também um pouquinho aquela... um pouquinho de obrigação de explicar que é preciso um pouquinho de cada pra ajeitar as coisas. Porque, às vezes, eles... o que eles não gostavam, eles passam a entender melhor (00:33:14) T16- ENTREVISTADOR: Então, vou só... amarrar isso. Então, é uma preocupação muito mais com o aluno, no sentido do uso de algumas técnicas que vocês acham boa. [...] A professora fa... facilita mais alguns minutos da aula, usando mais aquela estratégia cognitiva. Isso aí, não tem negociata, não existe? (0:38:18 ~ 0:38:52) T17- ENTREVISTADO: Não. A gente tenta. Tenta fazer mais jogos... T18- ENTREVISTADOR: Oficialmente não existe, no caso, né?

Senti que essa professora estava muito preocupada e tensa de não “dar

foras”, de não errar. Esse não é nosso objetivo nessa entrevista: saber o quanto ela

sabia sobre os temas conversados. Queríamos apenas saber o que acontecia em

sala, se havia negociação formas de aprender dos alunos com eles, professores, e

se ela estava ciente das estratégias cognitivas. Parece-nos que ela tentou usar uma

estratégia de convencimento inteligente, para parecer informada; tenta parecer,

nessa entrevista, crítica sobre o que falávamos, mas não conseguiu. Ela diz que ela

tenta fazer mais jogos, que os jogos em suas salas são bem aceitos e que o lúdico

seria uma demanda e uma saída para aulas com menos motivação. Mas ela não

afirma que existe uma negociação de estratégias cognitivas dos alunos com as

imposições cognitivas dos professores, talvez por desconhecer o que foi escrito

sobre essas estratégias, o que se confirma no trecho abaixo.

T24- ENTREVISTADOR: Vamos imaginar, por exemplo, você sugere: “Gente, esse texto aqui, vocês acham importante ler alto?”. Isso é feito? (0:48:00 ~ 0:49:12)

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T25- ENTREVISTADO: Não. T26- ENTREVISTADOR: “Querem ler alto?” “Vocês gostam de ler alto?” “Por que vocês gostam de ler alto?” Ou então, vamos ler alto, porque eles precisam disso. Sou eu professor que sempre devo planejar o que... meu aluno precisa, sua demanda? Entendeu? T27- ENTREVISTADO: Entendi. Eu acho que a gente, às vezes,... T28- ENTREVISTADOR: Você acha que leva muito tempo? T30- ENTREVISTADO: Não. Talvez não. Eu acho que seria uma questão de um trabalho mais... T31- ENTREVISTADOR: E o que eu estou buscando ver é... o por quê disso não ocorrer. Existem relações de poder por trás disso? (00:49:15) ENTREVISTA XI – PROFESSORA: ANA AMÉLIA (II PARTE) (00:40:00 ~ 00:40:24) T68- ENTREVISTADOR: Existem dois tipos da conhecida Needs Analysis [...]. A primeira é a Needs Analysis objetiva. O que seria a Needs Analysis objetiva? A participação do aluno na escolha do conteúdo, assim, o que ele mais precisa na língua estrangeira. Objetiva, o conteúdo. A subjetiva seria, a participação do aluno na didática da aula. (00:40:24) T79- ENTREVISTADOR: Seus hábitos e opiniões sobre técnicas e pro... e procedimentos mais ajustados a seu processo cognitivo. T80- ENTREVISTADO: Ah. Qual o nome dessa? T81- ENTREVISTADOR: A subjetiva. T82- ENTREVISTADO: A subjetiva. Ah! Objetiva e subjetiva. T83- ENTREVISTADOR: Certo. Eh.. como você vê isso, enquanto educadora? Eu quero fazer aqui um parâmetro. Eh... desde que Nunan (2000) escreveu esse livro com várias pesquisas de expectativas de alunos e professores dentre as quais a de Brindley e Bagshaw (1984), num projeto com Ministério de Educação Australiano com imigrantes

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aprendendo inglês, os executores desse projeto seguiram os conceitos de necessidades objetivas e subjetivas, do lingüista suíço René Richterich (1979, 1983), ouvindo os alunos do ponto de vista temático de suas aulas e do ponto de vista de forma de aprender. Então, essas necessidades subjetiva e objetiva, eu quero que você pense em termos relativos, que você pense na idéia, mas não pense nessa “plenitude” que eles conseguiriam lá. Entendeu? Então, qual é a pergunta? Primeiro, a pergunta é como você vê essas duas possibilidades? Por exemplo, eu vou só exemplificar, porque está muito...abstrata. Eh... uma turma de adulto, aliás, faixa etária que digamos no livro dois, e eles estão fazendo composição. Então, um aluno vira pra vocês, assim, eh “Eu acho que devia ter conjunções, né... nesse curso de vocês, porque eu escrevo com elas. Eu sou adulto. Eu escrevo cartas. Escrevo... relatório...” (00:42:02) T84- ENTREVISTADOR: Você acha que se deve prover o aluno com suas demandas, as conjunções? T85- ENTREVISTADO: Sim. T86- ENTREVISTADOR: E as estratégias vistas por você sobre as necessidades didáticas dos alunos, se isso não é atendido por uma questão de poder decisório do professor, isso é ético? T87- ENTREVISTADO: A negociação, como você citou, seria uma posição mais equilibrada e ética. ENTREVISTA XII: COORDENADORA SANDRÉA (0:07:58 ~ 0:08:40) T1- ENTREVISTADOR: Então, concluindo aqui o currículo, aqui seria o syllabus, conteúdo e método, (xxx). Mudando o curso dessa entrevista para Needs Analysis, o que você, acha dela na sua (xxx) na sua vivência? (00:07:58 - 00:08:13) T2- ENTREVISTADA: Eu diria que... Você vai trabalhar realmente a, o que a turma, o que a gente precisa, a necessidade básica dos alunos. T3- ENTREVISTADOR: E a importação da forma de ensino anglófona?

(00:20:53) T4- ENTREVISTADA: Bom, é assim mesmo... quando se fala em tecnologia... pensou em país tal; pensou em automóvel, pensou em tal país, então eu acho que é assim: pensou no ensino de língua estrangeira, pensa-se em tais e tais países, mas eu não acho que realmente a relação seja de lá pra cá.

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T5- ENTREVISTADOR: Então você acha que a gente é... recebe muita coisa do exterior, porque lá é, lá está a indústria, lá está a indústria do ensino, dos cursos de língua e das publicações de livros didáticos. Essa indústria é pesquisada porque ela é, ela é pesquisada porque é... demanda de mercado, há dinheiro [...] as (xxx) (00:21:30) estão entrando, então há dinheiro para pesquisa, aqui não há dinheiro nem prioridade pra pesquisa nessa área. Tem isso também. T6- ENTREVISTADA: É. Tem isso também, porque você tem muitos é... autores, mas eu não sei te dizer se esses autores são ingleses ou se são americanos. Então, você tem muitos autores é... estudiosos, realmente, que fazem trabalhos e, e... estão sempre divulgando trabalhos, em relação, relacionados a ensino da língua inglesa. (0:22:59 ~ 0:24:10) T7- ENTREVISTADA: Eu vejo que o ensino da língua inglesa é diferente na Inglaterra por exemplo. Eu estudei, tive a oportunidade de estudar em sala de aula e eu não vi nada do que eu faço, ou do que eu aprendi ou do que eu li, que um professor deveria fazer, eu não vi nenhum dos professores fazendo aquilo na escola. Eu não vi. T8- ENTREVISTADA: Entendeu? Eu não vi. T9- ENTREVISTADOR: Enquanto professora também ou enquanto aluna? T10- ENTREVISTADA: Enquanto... enquanto aluna, não vi. T11- ENTREVISTADOR: Então, deixe ver se eu entendi (xxx) os professores que você teve na Inglaterra faziam coisas que te surpreendiam. (00:23:29) T12- ENTREVISTADA: Não, eles não faziam, eles não faziam o que... T13- ENTREVISTADOR: O que a gente faz? T14- ENTREVISTADA: O que a gente faz ou o que a gente é di... o que nos é dito. O que deve ser feito, entendeu? T15- ENTREVISTADOR: Sei (0:30:30 ~ 0:35:00) T16- ENTREVISTADOR:

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Agora essa teoria [abordagem] de estudo, essa sugerida estratégia metacognitiva, cabe aqui na Bahia? Learner Autonomy? (00:30:30) T17- ENTREVISTADA: Difícil de dizer, porque ... eu acho que não é, não é, eu acho que vai, independe do lugar e depende muito mais do professor e do grupo de alunos que você tem, é ..., quando você... pra mim, quando você fala, do... do aluno ser responsável pelo próprio aprendizado, eu entendo que ele é responsável pelo próprio aprendizado em determinados pontos, ele tem a sua responsabilidade. A gente não pode chegar e dizer, ou entender que, porque ele é responsável, é ele somente o responsável, entendeu? Então o que me preocupa... T18- ENTREVISTADOR: (xxx) O professor deve levar o aluno a ser mais autônomo, o mais possível? (00:31:26 – 00:31:33) T19- ENTREVISTADA: Isso eu concordo, eu acho que isso é possível. T20- ENTREVISTADOR: Você concorda a nível de idéia... e eu estou perguntando a nível de prática. T21- ENTREVISTADA: Eu acho que é possível, eu acho que é possível, porque hoje em dia, não sei, talvez eu esteja até completamente errada mas, é, as escolas primárias... T22- ENTREVISTADOR: É, construtivista. T23- ENTREVISTADA: Construtivista, a idéia não é exatamente essa por trás? Não tem uma... não tem uma não tem uma... semelhança, um embasamento? T24- ENTREVISTADOR: É, mas as escolas públicas e os estilos dos alunos não são necessariamente compatíveis com as escolas construtivistas, onde livro e tempo de aprendizagem são dados subjetivos. T25- ENTREVISTADA: Sim, mas se você... T26- ENTREVISTADOR: E a gente não sabe como é isso, porque o centramento de um ser humano não depende de uma escola, é o centramento é, da educação doméstica (xxx), das relações de vizinhança, das relações com a religião, todas as relações que a cultura proporciona não se constituem fórmulas para pessoas iguais. (00:32:08 – 00:32:24) T27- ENTREVISTADA:

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(xxx) Assim, se, numa escola primária, isso é feito dentro do construtivismo, eu acredito que isso possa ser feito dentro de qualquer curso, em qualquer lugar, em qualquer curso de qualquer coisa na, verdade. (00:32:25 – 00:32:41) T28- ENTREVISTADOR: Mesmo pra adulto? (xxx) Estamos tratando de adultos, 19 anos em diante. (00:32:42 – 00:32:48) T29- ENTREVISTADA: É, adulto já é um pouquinho... T30- ENTREVISTADOR: Complicado? T31- ENTREVISTADO: É... é você pegar a pessoa e mudar completamente, quer dizer, é apresentar uma, um novo paradigma para essa pessoa e essa pessoa vai ter que quebrar paradigmas antigos, formulá-los pra poder, mas eu acho que poderia ser possível. T32- ENTREVISTADOR: Você acha que é viável? T33- ENTREVISTADO: não sei se (xxx) (00:33:15) T34- ENTREVISTADOR: Você quando, quando você jogou... jogava a concepção de Learner Autonomy para os seus alunos, os alunos faziam mais dever, mais tarefas de casa ou participavam mais? Quando você conversa sobre essa autonomia com seus alunos? (00:33:16 – 00:33:25) T35- ENTREVISTADO: Não, acho que quando você conversa com seus alunos, acho que eles entendem, por exemplo, eu converso muito isso com os meus alunos, que é, eu sozinha, ou eu lá dando a minha aula não vou conseguir fazer com que eles aprendam. Eu acho que, eu acho que... eles entendem isso. Talvez eles não... T36- ENTREVISTADOR: Mas uma coisa é entender, outra coisa é implementar. T37- ENTREVISTADA: Talvez eles não levem tão a sério, ou não... T38- ENTREVISTADOR: Você acha (xxx) da nova cultura brasileira? (00:33:59) T39- ENTREVISTADA: Pode ser, ou tam... ou, ou... T40- ENTREVISTADOR:

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Será que os americanos não são mais... T41- ENTREVISTADO: Disciplinados. T42- ENTREVISTADOR: Mais disciplinados (xxx) no geral há americanos também indisciplinados, né (xxx). (00:34:10 – 00:34:19) T43- ENTREVISTADO: É, eu não sei, nunca achei (xxx) mas nada. (xxx) por exemplo. (00:34:20 – 00:34:26) T44- ENTREVISTADOR: Cultura (xxx) ? (00:34:26) T45- ENTREVISTADO: Não, acho que cultura não muda não, cultura você se adéqua. T46- ENTREVISTADOR: Ou então faz uma, uma hibridização das culturas. T47- ENTREVISTADA: Você se adéqua ás novas culturas, mas você mantém as suas culturas, geralmente, né? T48- ENTREVISTADOR: (xxx) Penso que com o ser humano, as culturas locais impostas a ele por diversas instâncias de poder, nos discursos de autoridade social, exercem um lado muito “behaviorizado”; e, á medida que transgredimos os comportamentos incitados pelo pensamento crítico, deixamos ou questionamos essa repetição de comportamentos, o que nos foi passado. É como aquela música de Elis Regina “Como nossos pais”, nós repetimos modelos comportamentais... somos ritualizados e tabulas rasas, impotentes diante das normas comportamentais implícitas, ao longo da vida, que nos implantam. (00:34:47 – 00:35:04)

Concordamos que essa concepção de Learner Autonomy, de como se

comportar diante do estudar LE, é uma idéia que acho incompatível com nossa

cultura. Desde que passei a conhecer essa abordagem, em parte associada à

aprendizagem exclusivamente por auto-descoberta, uma das abordagens de

aprendizagem cognitiva prevista na psicologia cognitivista de David Ausubel (1968),

desconfiei que os “relacionais” brasileiros, falando-se em termos gerais, não

poderiam facilmente reproduzir esse procedimento de aprendizagem de base

individualista. Roberto da Mata compara nossas culturas, anglófona e brasileira e,

assim, “tipifica” essas culturas como respectivamente individual e relacional,

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respectivamente. Não temos aqui uma axiologia de superioridade ou inferioridade,

nem assim pretendeu o autor citado. Mas essa é uma implicação da antropologia.

Temos um exemplo utilizado na nossa problematização. Repito sobre

uma instituição, um curso livre, que investiu no Centro de Auto-estudo, na década de

noventa, incentivando a concepção de Learner Autonomy e essa não progrediu

como seus idealizadores reproducionistas desejavam e, hoje, não existe por falta de

demanda. Incluímos aqui essa concepção de Learner Autonomy, porque é um

aspecto da nossa educação local de LE que não sofre nenhuma crítica, nem

adaptação. A coordenadora diz ser possível a nível teórico e ser uma coisa boa.

Tudo que um profissional de ensino de LE idealiza, mas, no final, admite que a

realidade não responde aos seus anseios. Há de se tentar. Esclareço mais uma vez

que nada tenho contra qualquer tipo de conhecimento de outras geografias, mas

durante todo esse trabalho defendemos uma postura crítica, um crivo local para as

pedagogias anglófonas e um diálogo, uma convivência com as culturas de aprender

de cada local. Reproduzir conhecimentos didáticos por serem novidadoristas, sem

se chamar atenção aos seus limites e convivência, é a nossa questão. Passo à

coordenadora a lista de estratégias cognitivas pesquisadas dos alunos.

(0:37:00 ~ 0:38:00) T49- ENTREVISTADOR: (xxx) Quando você prepara a aula, você leva em consideração essa lista? (00:37:07) T50- ENTREVISTADO: Eu acho que não, viu? T51- ENTREVISTADOR: Não, né? T52- ENTREVISTADO: Não. T53- ENTREVISTADOR: Ahan. T54- ENTREVISTADO: Pensando aqui, assim, não. T55- ENTREVISTADOR: Essa é a forma que, por exemplo, nessa realidade (xxx) levantada, Chamot e O´Malley (1995) [mostro o quadro de estratégias cognitivas a ela] apresentam o

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estudo quatro, onde os alunos americanos aprendem Russo e Espanhol; eles aprendem dessas formas aqui, né? (00:37:27) T56- ENTREVISTADO: É, deixe eu dar um exemplo aqui, é... por exemplo, aqui repetition. É uma coisa que eu peço que os meus alunos façam, repetition, translation é.: (xxx) também (xxx) mas se eu disser pra você que na hora que eu estou planejando a aula, eu estou pensando nelas, nisso, não. (00:34:47 – 00:38:02) (0:39:48 ~ 0:43:20) T57- ENTREVISTADOR: Eu vou te entregar agora um quadro de estratégias cognitivas (xxx) (00:40:01 – 00:40:11) T58- ENTREVISTADA: Certo, eu olhei todas (xxx) (00:40:11 – 00:40:12) T59- ENTREVISTADOR: O seu aluno é perguntado em relação às estratégias, técnicas com que ele mais se identifica, ah, por exemplo, nesta lista? (xxx) Pergunta? (00:40:17 – 00:40:28) T60- ENTREVISTADA: Pergunto. T61- ENTREVISTADOR: Tipo (xxx) (00:40:33) T62- ENTREVISTADA: Só tem uma, só tem uma, ativ... é... Eu, eu não, não costumo trabalhar com repetition tanto que se meus alunos me pedirem pra trabalhar com repetition eu vou explicar para eles o porquê não trabalhar com repetition e muito provavelmente eu não irei trabalhar com repetition mas por que é uma coisa que eu não acredito.

Analisemos a posição da coordenadora e o efeito das suas crenças que

formam um micropoder por ela exercido, nesse microcosmo acadêmico, sobre o

coordenador, o professor sobre o aluno. A crença do método, introjetada no

professor, importa mais que as crenças dos alunos, nosso principal objetivo no

processo educacional. A coordenadora não acredita em repetição e, de forma

honesta, nos conta isso. Simplesmente a coordenadora tem a crença diagnóstica de

que repetição é uma estratégia que a mesma não cogita colocar em seus

planejamentos de aula e como ela é modelo do micropoder que exerce, em sendo

modelo de professora, indiscutivelmente esse é transmitido culturalmente para seus

“súditos”, os professores, e, assim, essa cadeia de cultura de ensino fica

relativamente reproducionista e o poder foucaultiano do saber modernoso fica preso,

sepultado com algumas pessoas, a partir dos “novidadorismos”, firmados nos livro

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didáticos concebidos a partir deles e o “achismo” personalista e egóico de uma

supervalorização de crenças reproducionistas, com as quais os professores e

coordenadores interditam as estratégias reais dos alunos. Essa contradição vai de

encontro a uma pesquisa de ASL aqui muito citada, desenvolvida por Chamot e

O´Malley (1995), na qual os alunos emitem o seu achar de como aprendem.

T63- ENTREVISTADOR: (xxx) Então, é uma crença sua (00:41:06) T64- ENTREVISTADA: É, eu acho que repetition não é, talvez também seja o seguinte, talvez a maneira como eu tenha visto repetition tenha sido a maneira... T65- ENTREVISTADOR: Qual foi a maneira? T66- ENTREVISTADA: De você ficar botando o aluno para repetir várias vezes a mesma coisa, repetir por repetir.. T67- ENTREVISTADOR: Mecanicamente. Você estudou com abordagem comunicativa? (xxx) (00:41:25) T68- ENTREVISTADA: Não, eu não estudei no... [curso Audiolingual] mas eu tive, é... T69- ENTREVISTADOR: Método direto no curso [um curso que usa método direto] T70- ENTREVISTADA: No curso x, eu tive um professor. T71- ENTREVISTADOR: Eu também estudei nele... (xxx) (00:41:38) T72- ENTREVISTADA: Um ou dois professores que faziam muito isso [a repetição], certo, e eu não acho que isso seja uma coisa positiva, eu tive uma experiência ruim com isso. Por exemplo, quando eu era criança, quando eu comecei a estudar inglês, eu não conseguia falar (xxx) e meu professor, uma vez, insistir tantas e tantas vezes, que eu tomei pavor a ele, porque ele me expôs na sala, eu era criança, mas eu fui exposta na sala, e cada vez que eu repetia, eu não repetia certo, porque eu realmente tinha dificuldade em falar business certo? Então, eu assim, eu tomei pavor a esse professor, não tomei pavor a inglês não, mas tomei pavor a esse, esse professor. Isso foi uma coisa que eu passei e que eu jamais fiz com um aluno, entendeu, então essa coisa de repetir, repetir, repetir, não, eu não acho, agora se

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você ta trabalhando os sons, um exercício de fonética, alguma coisa, aí você tem que fazer alguns exercícios, tudo bem, você vai estudar...(00:41:43 – 00:42:41) T73- ENTREVISTADOR: Mas, nesse caso aqui, você está vendo dessa forma, você está vendo um método que só usava repetition, repetição. A repetição enquanto uma técnica nesse método e que era basicamente a única. (00:42:43 – 00:42:59) T74- ENTREVISTADA: Então, como uma técnica, tudo bem. T75- ENTREVISTADOR: O que você viu foi um abuso num método que só acreditava nessa técnica e, depois, teve o caso do professor... (xxx) (00:43:04 – 00:43:09) T76- ENTREVISTADA:Como qualquer técnica, se você usar demais perde... T77- ENTREVISTADOR: O sentido, porque a dosagem vira veneno. O que não vemos é quando uma técnica antiga pode ser acoplada a uma nova.

O horror á técnica de repetição, na história dessa professora e para sua

subjetividade de aprender, foi quase traumático. Ela repetia ad nauseum e esse

estilo homogeneizante do Audiolingual exacerbava na dosagem dos drills, aliás

forma predominante de ensino, na época. E não é isso que discutíamos.

Obviamente não queremos uma didática apenas com drills; contudo, não queremos

a sua exclusão porque o aluno precisa e usa essa estratégia. Discutíamos a

presença da repetição em métodos ou numa cultura de ensino, na qual ela seja mais

um instrumento de ensino. Assim nos parece que, no caso dela, a experiência é

muito particularizada. Assim são os micropoderes; por falta de reflexão, eles

sepultam um saber acadêmico, radicalizando-o. Seguimos com o próximo trecho, no

qual comentamos as pesquisas em Nunan, nas quais se comparam expectativas de

professores e alunos diante de técnicas didáticas de ensino.

(0:45:00 ~ 0:47:00) T78- ENTREVISTADA: Então, assim, deixe ver se eu entendi, isso aqui é o que os alunos consideram... T79- ENTREVISTADOR: É uma das pesquisas citadas, reproduzida no livro de Nunan (2000) do currículo baseado no aluno. Uma delas, inclusive, é feita a partir do projeto de inserção de

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necessidades dos alunos, feito por Brindley e Bagshaw (1984) e o Ministério da educação australiano, com grupos de imigrantes. T80- ENTREVISTADA: É. T81- ENTREVISTADOR: Feitas na Austrália, algumas de outros autores.... T82- ENTREVISTADA: E eles consideram... T83- ENTREVISTADOR: Aí eles fizeram... só voltando a (xxx) (00:45:35) T84- ENTREVISTADA: É. T85- ENTREVISTADOR: Eles fizeram entrevistas não só com as expectativas de ambos, alunos e professores, (xxx) mas também com quais estratégias os alunos aprendiam. Expondo a cada aula, vagarosamente, cada técnica e pedindo feedback. (00:45:49) T86- ENTREVISTADA: Certo. T87- ENTREVISTADOR: (xxx) Você acha essa comparação informativa, nova para você, isso aí é bom, vocês aprendem assim, é viável? (00:45:59) T88- ENTREVISTADA: Hunrum. T89- ENTREVISTADOR: Levar o professor e o aluno a refletirem. Então, é isso aí que foi feito e o resultado é esse. Você conhecia essa pesquisa? T90- ENTREVISTADA: Não, conhecia não. T91- ENTREVISTADOR: Aí, então vamos (xxx) (00:46:20) T92- ENTREVISTADA: Vamos. Eu acho que... eu entendo, eu acho que eu entendo o porquê dos alunos é... às vezes terem opinião tão diferente do professor, porque para os alunos, para eles aprenderem uma segunda língua, eles não precisam de uma série de coisas (xxx), eles precisam de quê, eles precisam trabalhar pronúncia ...(00:46:46) T93- ENTREVISTADOR: Hunrum.

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T94- ENTREVISTADA: Ele acredita piamente nisso, ele acredita que ele vai aprender através do professor, que é o professor que vai chegar lá, e vai... pra mim, né, pela, pela experiência que eu tenho, que vai colocar as regras no quadro e... dali ele vai começar a aprender a falar uma segunda língua. Eu acho que muita gente vem com esse pensamento, talvez por isso a diferença entre a opinião dos dois, porque pairwork, pairwork é uma coisa que aluno acha que não é importante, não, “ele não sabe nada, eu também não sei nada, o que é que eu vou aprender com ele”? Né? Ele não vê o pairwork como um momento de prática, ele não...

Achamos que as pesquisas que Nunan reproduz nos quadros são feitas

em ambiente ESL. As de Chamot e O´Malley (1995) foram feitas em E.F.L. e ambas

apresentam uma discrepância com a realidade e postura local dos professores, já

que a maioria deles não concorda, por motivos variados, com a tradução e o uso de

L1, e repetição e drills. Contudo discordamos com o próximo argumento da

professora, porque no caso da pesquisa anterior de estratégias cognitivas de

Chamot e O´Malley (1995) é uma pesquisa de ILE e as estratégias de tradução e de

repetição são incompatibilizadas igualmente nesse ambiente diferenciado, ILE. O

critério de material didático para ambientes ISL e ILE é assunto importante e

desprezado por muitos cursos livres. A grande maioria dos livros didáticos previstos

para ambiente ESL nos é importada e desconsideramos aspectos de estilos de

aprendizagem e aspectos interculturais. Pouquíssimos são os livros importados de

língua inglesa que foram produzidos para Inglês como língua estrangeira.

(0:54:30 ~ 0:55:23) T95- ENTREVISTADA: Honestamente, não porque eu ache que o aluno, que eu vejo que o aluno quer exatamente isso viu. Foi feito na Austrália né? T96- ENTREVISTADOR: Foi feito na Austrália. T97- ENTREVISTADA: Mas eu diria que isso, aqui, é... se aplica de uma maneira geral a alunos. T98- ENTREVISTADOR: É mesmo, de cursos de línguas que você está falando. T99- ENTREVISTADA: De curso, é. T100- ENTREVISTADOR:

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Eu estou falando também de escola pública. T101- ENTREVISTADA: Não. Eu estou falando de curso de língua. T102- ENTREVISTADOR: Você acha que eles não gostam de pairwork? T103- ENTREVISTADA: Eles não gostam... T104- ENTREVISTADOR: (xxx) Á toa (00:55:00) T105- ENTREVISTADA: Depende... Eles gostam de correção, aluno gosta que o professor corrija. T106- ENTREVISTADOR: Sim. T107- ENTREVISTADA: Não é? Aluno gosta de... T108- ENTREVISTADOR: Mas o que você aprendeu com as teorias que vem de fora, Sandréa? T109- ENTREVISTADA: Não, não... como é? T110- ENTREVISTADOR: De não corrigir. T111- ENTREVISTADA: É, é. T112- ENTREVISTADOR: Não corrija porque o... (xxx) (00:55:18) T113- ENTREVISTADA: Mas quando você não corrige... T114- ENTREVISTADOR: Ele pede... T115- ENTREVISTADA: O aluno reclama, aqui vem aluno reclamar que o professor não tá corrigindo ele na sala. (0:58:40 ~ 1:03:20) T116- ENTREVISTADA: Mas o que eu quero... o que eu acho é assim. Como você mesmo falou aí anteriormente, existem técnicas, existem coisas, existem teorias, é, o que for, de

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métodos, de autores diversos, existe o que é bom, o que não é bom, o que você concorda e o que você não concorda, mas eu acho que você pode levar em consideração as... as coisas que você está aprendendo, ou o que você aprendeu e tentar colocar em prática, já que você me... já que a gente diz que as pessoas são diferentes e que a gente precisa ter uma atenção diferenciada. Se você precisa ter uma atenção diferenciada, você precisa buscar os recursos, se você (xxx) então você não pode chegar e dizer que isso aqui vai pro lixo, entendeu? (00:59:41) T117- ENTREVISTADOR: Hunrum. T118- ENTREVISTADA: Porque pode ser que em algum momento, aquilo ali que você jogou no lixo, com um determinado aluno, funcione super bem. T119- ENTREVISTADOR: Ou, se consultadas as técnicas antigas, quem sabe, em muitos momentos...? T120- ENTREVISTADA: Não é? T121- ENTREVISTADOR: Porque eu tenho (xxx)... desde o semestre passado, para fazer essa pesquisa, quando eu dou uma estrutura verbal nova, eu faço alguns minutos de drills e peço opinião aos alunos,... sobre a eficácia desse treino e eles respondem... porque fica (xxx)... ajuda muito (xxx)... a memória (xxx). Tenho a impressão que tem pessoas adultas que no meio desse choral repetition elas atenuam, a inibição, porque elas se escondem ali atrás do grupo, de todo mundo falando ali em grupo, onde elas não estão sendo foco de atenção, então tem vários fatores, né? (01:00:10). T122- ENTREVISTADA: Tem vários fatores, então eu não acho que tenha é, eu não acho que nada deve ser... eu não posso dizer nada, não, a não ser que você tenha trabalhado e você tenha sempre tido experiências ruins e chegou à conclusão de que aquilo não vale a pena, certo? T123- ENTREVISTADOR: Certo. T124- ENTREVISTADA: Pronto, se não for por esse motivo eu acho que você pode ter o conhecimento, a curiosidade e de vez em quando, buscar sempre uma... uma técnica nova. T125- ENTREVISTADOR: Ou não, ou antiga. T126- ENTREVISTADA: Ou não, entendeu? Nova que eu digo, nova para você, não que seja uma novidade T127- ENTREVISTADOR:

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Ah, entendi, entendi. T128- ENTREVISTADA: Tentar uma outra coisa, então a gente vê muito aqui por exemplo, alunos de mais idade, as pessoas querem aprender inglês como elas aprenderam, como elas estudaram no ginásio, na infância. Então elas querem as regras T129- ENTREVISTADOR: (xxx) (01:01:19) T130- ENTREVISTADA: (xxx) É, elas querem, então, elas querem as regras gramaticais, pá, pá, pá, pá, pá, pá. Se você vira para o aluno e explica que não é assim, assado (01:01:20) T131- ENTREVISTADOR: Só assim..., é, também, assim. T132- ENTREVISTADA: Só assim é, mas que não é só assim. T133- ENTREVISTADOR: Porque ele ... porque ele também vai buscar isso de qualquer jeito. T134- ENTREVISTADA: Que não é só assim... que isso... você tentar explicar para esse aluno o porquê de você não estar usando aquele tipo de exercício que ele quer, por exemplo, mas chega uma hora que o aluno insiste tanto, insiste tanto, que você faz o quê? Eu, eu: Você quer um exercício de gramática? Tá, eu vou providenciar um exercício de gramática. Ou então: Você quer um exercício de gramática? Compre uma gramática para você e faça os exercícios”. Porque eu preciso dar ao meu aluno também, a sensação de tranqüilidade, senão ele não vai aprender, nessa ansiedade que ele está, ele não vai aprender, então se ele tiver a gramática e ele vai lá consulta, ele aí vai ver e vai se tranqüilizar e de repente vai vir para o lado de cá. A mesma coisa com a tradução. Por mais que a gente diga aos nossos alunos: “Não faça tradução ao pé-da-letra, não traduzam, não traduzam”. Geralmente eles só deixam de traduzir quando eles passam por uma experiência, quando eles realmente vivem uma situação em que eles descobrem que traduzir ao pé-da-letra não funciona. Entendeu? T135- ENTREVISTADOR: Hunrum! T136- ENTREVISTADA: Aí você vê que ele, aí tem... Ele chega até a falar: “Ah! Então é por isso... Bem que você falou, professora!” Entendeu? “Que tradução... eu vi que like é gostar, agora eu vi like aparecer”. Entendeu? T137- ENTREVISTADOR: Hunrum. T138- ENTREVISTADA:

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Aí ele descobre. Mas tem que deixar o aluno, porque tem que permitir que o aluno também tente um pouquinho. É. Fazer as coisas do jeito que ele tá querendo, (já que), pelo menos pra diminuir a ansiedade. (01:04:20) T139- ENTREVISTADA: É, tem umas é... tem umas... não me surpreende, não me surpreende , mas , assim ,... eu não gostaria de usar algumas dessas técnicas, entendeu? Por opção, não. T140- ENTREVISTADOR: Certo. Por opção , não. T141- ENTREVISTADA: Mas, você às vezes, como eu falei, você às vezes usa... T142- ENTREVISTADOR: É, se o aluno chega e diz: “professora deixa eu fazer uma tradução de um textinho, me dá aí”. Aí eu fico pensando que quando eu aprendi inglês eu fazia (01:04:59) tradução na minha cabeça, então, como é que eu digo isso, como é que eu digo aquilo? [...]

Parece que a professora afinal entende que o que estamos querendo é

que ela pense criticamente e não que mude a sua opinião, sem argumentos. Ela,

nesse último trecho admite que o aluno precisa assistir e sair da aula de forma

tranqüila, tal como testemunharam alguns alunos, a exemplo de Bené e Ciniro e,

sobretudo, de Hosana e Kaline. Ainda assim a coordenadora diz que não usaria

algumas técnicas das listas de pesquisas comparativas disponíveis no livro de

Nunan. Mas nosso ponto aqui não é enfocar a exclusão de estratégias cognitivas,

em geral, nem as especificadas nas pesquisas apresentadas a ela. O que buscamos

comprovar é a necessidade da escuta desse aluno, como ele se articula na

aprendizagem dessa LE. Soa-me bastante dicotômicas as posições da

coordenadora, contudo, sinto uma aquiescência na possibilidade de escuta do aluno.

(1:05:25 ~ 1:08:50) T143- ENTREVISTADOR: Então, será que ele não traz nada de bom? T144- ENTREVISTADA: Eu acho que é por aí, acho que você tem que se informar pelo menos, né? T145- ENTREVISTADOR: É. Você acha que, por exemplo, os nossos professores estão preparados para (xxx)? (01:05:35) T146- ENTREVISTADA:

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Se o nosso professor está preparado para fazer isso? T147- ENTREVISTADOR: (xxx) Passeando nesse universo, expondo, educando o aluno a descobrir com ele as formas de aprender, e claro (xxx) (01:05:59) T148- ENTREVISTADA: Não sei, se eu soubesse se o nosso professor... tenho minhas dúvidas. T149- ENTREVISTADOR: Por que, por causa da cultura metodológica? T150- ENTREVISTADA: Não, não sei se é pela cultura, mas pelas pessoas, pelas pessoas que eu conheço. Pode ser também um pré-julgamento né, eu posso estar julgando as pessoas sem, não sei, realmente não, não sei, entendeu? Teria que conversar com essas pessoas para sentir. T151- ENTREVISTADOR: Mas você acha coerente a viabilidade disso aqui , na prática, isso aqui é na prática? T152- ENTREVISTADA: Eu acho ... eu vejo, eu vejo coerência nisso e não me surpreende. T153- ENTREVISTADOR: E você vê coerência também (xxx) aconselha (01:06:53) T154- ENTREVISTADA: No caso do professor T155- ENTREVISTADOR: Eles, do projeto australiano, propõem que as escolhas sejam checadas. T156- ENTREVISTADA: Certo T157- ENTREVISTADOR: Essa pesquisa, essa (xxx), não é?(01:07:09) T158- ENTREVISTADA: Não sei, aí T159- ENTREVISTADOR: As escolas e os professores... T160- ENTREVISTADA: (xxx) (01:07:16) T161- ENTREVISTADOR: (xxx) (01:07:16)

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T162- ENTREVISTADA: E eu não sei se vale a pena você fazer um tipo de pesquisa desse tipo, quando você não tem um grupo de professores preparado. Não é mudança, no senti... não é mudança porque vai deixar de fazer uma coisa para fazer outra, mas é assim, é... o professor aceitar que existe , sim, que tem gente que gosta, que tem aluno que usa, que aprende desse jeito, entendeu? Que às vezes eu percebo assim, às vezes eu vejo que o professor, isso é do ser humano, não é só, não é do professor especificamente, mas é assim, o ser humano, ele acredita numa coisa... T163- ENTREVISTADOR: Que lhe foi contado por uma autoridade. T164- ENTREVISTADA: Que foi contado, ou porque ele chegou e interpretou daquele jeito T165- ENTREVISTADOR: (xxx) (01:08:07) T166- ENTREVISTADA: É, e aí quando as pessoas o questionam. T167- ENTREVISTADOR: Isso é cultura, isso é cultura? T168- ENTREVISTADA: Ele: “Ah não, mas pra mim é isso mesmo e ponto final”. Então , um professor que pensa desse jeito, se ele chegar aqui, a gente faz uma pesquisa dessa e descobre... T169- ENTREVISTADOR: Não precisa nem pesquisa, basta que ele implemente, sondando isso em sala de aula, paulatinamente. T170- ENTREVISTADA: Aí que o aluno diga que, convers... que... pairwork, ah, paiwork para a gente não é importante. E esse professor achar que é muito importante, não vai adiantar nada os alunos terem dito que não acham, entendeu? (0:15:58 ~ 1:19:00) T171- ENTREVISTADA: (...) Quando a gente fala de repetition todo mundo que ensina pensa logo o quê? [curso de LE que usa o método Audiolingual todo mundo pensa ... T172- ENTREVISTADOR: Ou ... [cito outro curso que usa o método direto] T173- ENTREVISTADA: Exatamente, mas mais ... [no Audiolingual]. T174- ENTREVISTADOR: Mais [o curso Audiolingual], é verdade.

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T175- ENTREVISTADA: Mais [o curso Audiolingual citado e não nomeado] E... quando você vê, você pega assim alunos que foram do [o curso Audiolingual citado] que estão aqui, por exemplo, e eles falam assim: “Professor por que você não faz essa atividade assim, assim e assim?” Você vê que esses alunos vieram de [lá, desse curso] que , mesmo com a repetition, eles aprenderam. E aí, que conclusão você tira de repetition? Se cada um aprende de um jeito. T176- ENTREVISTADOR: Há de ter alunos que gostem. T177- ENTREVISTADA: Se cada um aprende de um jeito, por que é que você pode dizer que uma coisa é errada? Que um método ou uma técnica está incorreta? Eu não acho, acho, acho que pra todos os, pra todos os métodos, pra todas as técnicas você vai sempre encontrar (xxx) (01:16:54) T178- ENTREVISTADOR: Todos os referenciais teóricos, né? T179- ENTREVISTADA: Agora quando você não acredita, com certeza vai ser muito difícil você conseguir algum tipo de sucesso , utilizando essa técnica em sala de aula. T180- ENTREVISTADOR: Mas, ah, que relação de poder é essa que, onde eu acredito ou não, desconsidera se o aluno? Que a voz do aluno é apagada, o (xxx) pode acontecer... (01:17:19) T181- ENTREVISTADA: Mas é porque é difícil, né? T182- ENTREVISTADOR: Mas é uma coisa séria que a gente não questiona, mas o professor desconsiderar o aluno é uma deformação profissional, né? T183- ENTREVISTADA: É uma coisa para você se questionar. Como é que você vai trabalhar determinada técnica, se você não acredita e você não trabalha ... (xxx)? (01:17:34) T184- ENTREVISTADOR: Mas às vezes, você não acredita porque você está repetindo (xxx) (01:17:43) um discurso do novo sobre o antigo, em relação a isso, e que foi passado pela coordenação (xxx) (01:17:48). Então, toda leitura que se exclui ou se inclui, nessa instituição, por exemplo, alguns livros e capítulos de livros, essa exclusão teve um propósito. [mostro à coordenadora os capítulos de estratégias cognitivas e outros citados] (xxx) (01:17:53). Toda leitura excluída ou incluída na formação de um professor é um simulacro para uma crença ou manipulação; se eu escolho... uma uma leitura aqui, ó, ó Sandréa leia esse capítulo aqui e não aquele, isso é um modelo de imposição de poder, de manipulação?

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T185- ENTREVISTADA: Tipo, estou querendo direcionar vocês, claro. T186- ENTREVISTADOR: Entendeu? É uma relação de poder. T187- ENTREVISTADA: É. T188- ENTREVISTADOR: Talvez sejam as coordenações, é, sobretudo eu suponho, na minha experiência, imposições de coordenações do passado, eu ouvia muita coisa, muita coisa importante. Havia um conhecimento muito grande do que estava acontecendo no, no mundo. T189- ENTREVISTADA: Comigo não. (xxx) (01:18:52) T190- ENTREVISTADOR: (xxx) (01:18:53) Mas eu não acho que é uma coisa impossível, é uma coisa sensibilizante do ponto de vista do marketing educacional. (1:21:40 ~ 1:22:00) T191- ENTREVISTADOR: ... E olhar a intersubjetividade que está rolando ali naquela turma (xxx) (01:21:40). É mais ou menos sobre isso que eu tou pesquisando. Eu queria o seu feedback. T192- ENTREVISTADA: Entendi. Pra quando é? T193- ENTREVISTADA: Tá, eu acho que tá, você escolheu um tema bem... um assunto que vai ter muito o que render. T194- ENTREVISTADOR: Desdobramento? T195- ENTREVISTADA: É porque... T196- ENTREVISTADOR: Polêmico? T197- ENTREVISTADA: Não é polêmico, mas é um assunto que tem muito para se discutir, entendeu? Porque cada pessoa, você vai ver, cada pessoa pensa, óbvio, cada um pensa de um jeito, e você vai ver que dentro dessa instituição, mesmo as pessoas que trabalham juntas e que dizem trabalhar com o Communicative Approach, Abordagem Comunicativa, e que dizem isso, isso e isso, vão mostrar para você na entrevista, no decorrer da conversa, que existe uma... um pouquinho também de uma coisa aqui, uma outra coisinha dali, que não é só communicative, comunicativo, que não é, que

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nem tudo está somente certo, ou aquilo está totalmente errado, entendeu? Agora você vai ter bastante conteúdo, é... pra poder fazer o trabalho mesmo. T198- ENTREVISTADOR: É, porque o...o tema é essa, essa relação de poder nos cursos de língua, coordenação, o acadêmico, o aluno, o professor, esse aluno, como é que ele é ouvido, se ele ... (01:23:13) T199- ENTREVISTADA: Então. É mais a relação de poder, né? T200- ENTREVISTADOR: De poder.

Parece-nos que instigamos na coordenadora uma outra possibilidade que

pode ser investigada, se a instituição quiser. E parece que, embora com suas

opiniões coerentes, ela desconhecia muito do que trouxemos.

ENTREVISTA XIII: COORDENADORA DINA

(00:07:50 ~ 00:10:30) T1- ENTREVISTADOR: O que eu tenho pensado é que há formas de a gente chegar mais próximo do aluno e essas formas, às vezes, são formas não exatamente costumizadas, porque seria uma coisa muito individualizada, mais inviáveis e, portanto, difícil de execução, mas uma forma mais simples, é... onde ele, ele se coloque mais, mais no de... de uma forma mais sistemática, vamos dizer assim. T2- ENTREVISTADO: É, e a gente dentro dos princípios que nós temos os Teaching Principles aqui na instituição, que nos norteia, né, no nosso dia a dia. Um dos Teaching Principles, né? Na medida do possível... T3- ENTREVISTADOR: Teaching Principles como (xxx) (0:08:08) ou... T4- ENTREVISTADO: Exatamente, como é... um, seria também levar o aluno à autonomia T5- ENTREVISTADOR: Á autonomia. T6- ENTREVISTADO: Ahan T7- ENTREVISTADOR:

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Então, já que você tocou em... já que tocamos em Learner Autonomy, eu fico pensando, [...] Vou fazer uma pergunta se a concepção abordada que é a Learner Autonomy, é possível na Bahia? Ou é um mero produto de importação? (risos) T8- ENTREVISTADO: Olha, tem certas coisas que, realmente, nesse processo, cada um dentro de sua área né nesse processo nosso de, de educação de LE, né, com Língua inglesa, evidentemente que a gente tenta importar alguns modelos, tentamos, né. Eu que estou nessa área, há vários anos, mais de (30) trinta, então eu sei bem o que é isso, né? Então eu adentrei por vários e um dos que eu até gostaria de citar como, é... uma abordagem, né, alguns nem chamam de teoria enfim, que seria o Task Based Teaching. Realmente, como filosofia, ela nos agradou totalmente. Mas na prática do dia a dia se revelou, na nossa realidade, aí vai a sua pergunta, no nosso contexto, ele não funcionou, não se adaptou a um contexto, eu não sei, e pelos comentários que eu tenho ouvido, realmente, não fez sucesso né, é, em lugar nenhum do mundo. Eu até cheguei a pensar, em algum momento, que o problema era porque o nosso era E.F.L., poderia fazer a diferença, mas, pelo que eu tenho lido, pelo que eu tenho conversado com as pessoas, em geral, não foi e não, enfim, o resultado final não era aquele esperado, a filosofia era muito bonita, né, mas importamos o modelo né, aí, né, tentamos utilizá-lo aqui na Instituição, posso dizer isso e... T9- ENTREVISTADOR: (xxx) (00:10:21) T10- ENTREVISTADO: É, dentro do Task Based Teaching, treinamos, capacitamos os professores, enfim, é, mas a gente sentia a resistência dos alunos e dos próprios professores. E quando o professor não compra o produto, não adianta você insistir, né? Então o professor não deixa de ser também...

O Task-Based Teaching, ao contrário da didática do P.P.P.,

apresentação, prática e produção, tem sua ordem praticamente invertida e,

sutilmente, o task, a tarefa de comunicação é apresentada e produzida pelo contexto

e grupos são indutivamente levados a se envolver com a mesma, sem detalhar

gramaticamente ou com prática centrada no professor. A coordenadora dessa

instituição nos relata a experiência com o livro ATLAS, que é task-based, no qual

precisamos indução e autonomia procedimental do aluno. Assim, mais uma vez nos

questionamos o que a coordenadora claramente expões. O Task-based teaching

não foi bem aceito na nossa cultura, embora idealizado pelo staff do curso,

professores e coordenação. Como já nos perguntamos anteriormente, a idealizada

indução está bem mais na moda, muito embora por esse depoimento sentimos que

a autonomia e a indução nos parece que mais uma vez não são concepções

essencializadas na específica aprendizagem de LE. A coordenadora em questão,

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entretanto, diz que a autonomia é um dos princípios de ensino norteadores da

instituição. Mas o par indução e autonomia, concepções tão próximas, parecem que

embora similares não funcionaram bem no Task-Based Teaching, na cultura de

ensino local.

A seguir, a coordenadora faz um contraponto sobre as relações da

clientela do curso onde trabalha e a metodologia. Esse comentário é bem pertinente

porque envolve os clientes dentro de uma demanda metodológica e confirma nossas

suspeitas, quando colocamos os “novidadorismos” importados dos países centrais

em “cheque”. Veremos como uma abordagem, um método incompatível com a

cultura de aprender geograficamente traz danos e funcionará ou não. Este exemplo

é um exemplo de um “novidadorismo” que resultou em insucesso.

T12- ENTREVISTADO: Ser seu cliente né... é o aluno que é seu cliente, é o professor também que é seu cliente interno, né? Então a... 0:10:38 ~ 0:11:52 T13- ENTREVISTADOR: Já na visão aí de marketing de... T14- ENTREVISTADO: É, então, realmente, a filosofia era bonita, né, ideal, mas infelizmente, na prática, e a gente sente isso pelos novos livros que estão sendo... livros textos que estão sendo lançados e a gente tá vendo um retorno ao nosso tradicional (xxx) (0:11:12) (risos)... T15- ENTREVISTADOR: (xxx) (0:11:13) ... é, talvez isso seja pra reavaliarmos a nossa cultura de aprender, né? T16- ENTREVISTADO: É T17- ENTREVISTADOR: Você imagine que o método Audiolingual ainda é o método mais usado majoritariamente na China (xxx) (00:11:23) então por que (xxx) (00:11:25) T18- ENTREVISTADO: Exatamente, é por que levanta um tema, uma cultura tão diferenciada como a japonesa, chinesa... [...] T27- ENTREVISTADOR: Às vezes a gente olha assim o professor; eu às vezes me olho, me olhava, hoje eu estou com outra postura, mas às vezes, eu ficava até preocupado por que eu trabalho, eu trabalho num curso livre de LE e a instituição intervém na cartilha de

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procedimentos. Não há um agenciamento, não há agência nossa, dos professores, nisso, só numa agenda didática imposta. Então você tem que ir testando e combinando (xxx) (0:18:51) o que não está ali na cartilha? T28- ENTREVISTADO: Não tá. Você sabe que tá desviando né? T29- ENTREVISTADOR: E tá desviando mesmo que seja pra o melhoramento, por que você falou em costumizar, costumizar significa dar ao cliente satisfação, o que ele precisa né? (xxx) (0:19:09) T30- ENTREVISTADO: (xxx) (0:19:09) o que ele precisa é, ... T31- ENTREVISTADOR: Então aí dá uma idéia de marketing. Mas marketing também é parte do nosso trabalho? Mas através de um bom rapport com o aluno T32- ENTREVISTADO: Com certeza. T33- ENTREVISTADOR: [...] E o outro seria o marketing, não seria o marketing seria a educação mesmo, que no momento que ele se envolve, dizendo como ele aprende, claro que não vai se costumizar só a técnica que ele precisa, mas que ela seja contemplada, aí ele já vai se envolver. Isso aí acontece dessa forma: “Vocês acham que é importante ler alto?” “Drill é bom [...], não é, após expô-lo?” Drill mecânico, e nesse semestre eu me surpreendi. Drill mecânico não é não é chato para os alunos. Embora não gostasse de aprender com drills não...s... sou eu o “médico” que tem que dar a receita, né? O aluno é que, comparativamente com o “paciente”, deverá dizer como se sente o seu desconforto. Enfim, essas coisas aí. T34- ENTREVISTADO: É o ouvir o aluno, né, é que na verdade... acho que tudo isso, Robélio, pode acontecer se existe um bom rapport, relação professor-aluno, né, um bom relacionamento na sala de aula, né? Aquela, o rapport que você, de você acreditar no seu aluno, no potencial do seu aluno e seu aluno acreditar em você e você realmente ouvir, porque a gente diz que ouve, né? Mas a gente não ouve, a gente fala muito, né?

A coordenadora atribui a presença do aluno, a escuta do aluno ao rapport,

relação professor-aluno. Então, sistematicamente, ela não considera e, até aqui,

desconhece a concepção de necessidades subjetivas dos alunos, como proposta

por Richterich (1979, 1980, 1983), mas, por outro lado, ela vê a retificação de

Bachelard na idéia de que o tradicional pode estar voltando. Não diria isso, acho que

a retificação o novo, como sugerido em Bachelard, é a dica para a aprendizagem de

LE.

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T35- ENTREVISTADO: E o professor... o que eu sinto as vezes é que ele... ele começa a sentir, o que não é verdade, que ele esta perdendo espaço né, perdendo poder né, por causa do aluno. Então repentinamente o aluno virou o centro das atenções e o aluno esta, eu não to dizendo que isso é verdade (xxx) (0:20:50) que o aluno está sempre certo, né, e o professor esta sempre errado, então a gente vê que isso esta acontecendo no sistema educacional como um todo e não somente em curso de línguas. O professor esta passando por um momento difícil né, e ele quer segurar aquele poder. (00:20:40 ~ 00:21:40) T36- ENTREVISTADO: É, mas ele, o professor, ainda quer segurar aquele pequeno poder que lhe resta, o autoritarismo, aquela coisa, né?. T37- ENTREVISTADOR: Ainda tem um ranço, né? T38- ENTREVISTADO: Ainda tem aquele rançozinho, então ele (xxx) (0:21:22) T39- ENTREVISTADOR: Mas o poder, o poder da crença, o poder da teoria ou o poder da relação? T40- ENTREVISTADO: Da relação. T41- ENTREVISTADOR: Na relação. T42- ENTREVISTADO: O poder na sala de aula, o poder da sala de aula.

Com esse tema de escuta de alunos, retificações de formas antigas de

aprender de alunos, a coordenadora faz conclusões contundentes. Se abordarmos

sobre o papel do aluno que, em minha opinião, precisa ser realçado através de uma

escuta mais pormenorizada, ela imediatamente atribui que os professores estão

vivendo um momento difícil de perda de poder. Discordo dessa opinião. Acho que

ela não identifica onde e com quem essa cadeia de poder começa. Através dela

mesma, tudo isso começa. Afinal, a relevante negociação do papel do aluno num

currículo mais baseado na escuta do mesmo não significa perda de poder do

professor. Ela também atribui ao rapport, relação professor-aluno, a solução para a

possibilidade de se ouvir os alunos e possivelmente, de envolvê-los na didática. Mas

os professores teriam que tomar uma decisão informada quanto ao assunto e, ao

longo de nossas entrevistas, os coordenadores desconheciam tanto as pesquisas

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com estratégias cognitivas, quanto a idéia richterichiana de “efemeridade” das

pedagogias de LE. A desinformação de certos assuntos tabus é fato entre muitos

coordenadores e omissão para outros. Abaixo ela completa:

T46- ENTREVISTADOR: Vamos mudar de assunto, pulando da pergunta dois pra sete. Vamos agora pra Needs Analysis então ela seria o que pra você? (0:28:00 ~ 0:30:00) T47- ENTREVISTADO: Bom, quando a gente, a gente fez, a gente começou antes de começar a trabalhar com nosso currículo, nós fizemos uma sondagem com os alunos, né, em geral, né, uma coisa na escola como um todo, né, até pra servir de base para o desenvolvimento de nosso currículo, né... ele tá ali, né, porque se você, você faz também um (xxx) (0:28:34) a gente não deixa de, no começo do semestre sondar... T48- ENTREVISTADOR: (xxx) (0:28:36) T49- ENTREVISTADO: Cada semestre... de sondar, de fazer uma sondagem com seus alunos, o que não deixa de ser m Needs Analysis, não é? T50- ENTREVISTADOR: É. T51- ENTREVISTADO: De tentar conhecer o aluno, o que que ele quer (xxx) (0:28:44) então a gente sempre tem aquele formulariozinho, aquele bate papo que se preenche, que se fala de como é o processo de ensino aprendizagem, o que se espera do aluno, o que se espera da instituição, o que se espera do professor enfim, aquele bate papo de começo de semestre, e nesse momento, de tentar conhecer um pouquinho mais o aluno, né?. T52- ENTREVISTADOR: Humm. T53- ENTREVISTADO: O que ele gosta, o que ele não gosta, o que ele espera, enfim, tentar entender um pouquinho o que se passa na cabeça do aluno... pra entrar nessa parte de flexibilização. Então, no momento que eu sei, que eu acho que conheço um pouco melhor, né, a turma, eu sei também que pra atingir aquele objetivo, eu vou fazer esse trajeto, por que pra essa turma vai funcionar melhor. T54- ENTREVISTADOR: Certo. [...] T55- ENTREVISTADO: Diferente do trajeto de outra turma, né?. Então é um pouquinho dentro desse contexto, né? Agora...

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T56- ENTREVISTADO: É, assim... Agora é... vê que alguns... você há pouco falou assim... é ... da importância da tradução, da importância da repetição... T57- ENTREVISTADOR: Eu não disse a importância ... é... e sim inclusão. T58- ENTREVISTADO: A inclusão. Por que tem aluno que, realmente, só aprende assim. T59- ENTREVISTADOR: E aí? T60- ENTREVISTADO: E aí? Como é que fica, né? T61- ENTREVISTADOR: Quer dizer... é... mediar esse aluno pra que ele entenda a importância de não só usar a, mas também uma outra coisa né? (0:30:04) T62- ENTREVISTADO: Porque a tradução é uma estratégia de aprendizagem, que tem que ser utilizada. Agora, a gente pode mostrar para o aluno que ela é uma e que tem outras mil estratégias que podem ser muito bem usadas, mas você não pode de um dia para o outro fazer isso. Você tem que educar o aluno para a gente começar a... T63- ENTREVISTADOR: Educar o professor também, não? T64- ENTREVISTADO: O professor, sim, sim, sim... Mas eu estou dizendo, mas também... T65- ENTREVISTADOR: Porque o professor tem ... o professor hoje tem, a maioria dos professores entrevistados pensam que tradução, nem pensar... T66- ENTREVISTADO: Tem uns... T67- ENTREVISTADOR: Repetição, nem pensar... Sim, poucos usam. T68- ENTREVISTADO: (xxx) (0:30:38)... muito rígidos. T69- ENTREVISTADOR: Muito rígidos. T70- ENTREVISTADO: Sim.

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T71- ENTREVISTADOR: Muito arraigados.

A coordenadora reconhece que há uma rigidez dos professores, mas

como ela está na onda “novofagista”, ela se dá conta disso, embora continue

reproducionista. Isso, para mim, pedagógica e administrativamente, é intrigante,

porque é como se não houvesse agência local desses atores de reverter na prática

tal situação. Ou inocência vinda do meu idealismo?

(0:32:00 ~ 0:33:00) T72- ENTREVISTADO: Um curso de Pós-Graduação tem quantas horas? Um Mestrado deve ter o quê? T73- ENTREVISTADOR: 360, por aí. T74- ENTREVISTADO: 360... T75- ENTREVISTADOR: Pós-Graduação... T76- ENTREVISTADO: É, varia 360 a 500 horas. T77- ENTREVISTADOR: Mestrado é... T78- ENTREVISTADO: Um Mestrado são o quê? Duas mil, três mil horas? T79- ENTREVISTADOR: Não, é menos, bem menos. T80- ENTREVISTADO: É menos? T81- ENTREVISTADOR: É umas quinhentas e tal. T82- ENTREVISTADO: Então. Contrapõe a isso toda essa minha bagagem de anos e anos como aprendiz, no que eu fui consolidando e solidificando como é que se deve aprender; então, de repente, eu não posso mudar de uma hora pra outra, meus hábitos de ensinar por causa de um (xxx) (00:32:35), por causa de um Mestrado, né? Eu posso começar a questionar certas coisas, mas as crenças estão muito sólidas lá dentro e tem

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pessoas que não querem mudar suas crenças. Mas tô falando do professor né, daquele que tá se tornando um professor, né? Eu vou ser um professor. Então eu construí meus (xxx) (00:32:59) lá atrás, durante muitos anos, e não é um Mestrado em duas mil horas, né, ou uma Pós-Graduação que eu faça de 350 até 500 horas, que variam aí, enfim, que vai fazer eu, realmente, mudar meus... (xxx) (00:33:17).

Mais uma vez a questão da crença é supervalorizada. Busquemos, então,

as razões e origens da formação dessa crença.

T83- ENTREVISTADOR: Então eu não acredito que só a tradição do como você aprendeu influencia, mas como a gente é politicamente. Não dar um crivo local ao que a gente recebe é falta de uma pedagogia mais crítica. Então eu concordo de certa forma, mas discordo... (0:35:00 ~ 0:36:20) T84- ENTREVISTADO: É, o que eu quero dizer é o seguinte, que eu posso até treinar o professor e ele, na minha frente, vamos dizer eu, coordenadora, né... Então eu dou um “TTC”, curso de treinamento de professores, certo? T85- ENTREVISTADOR: Certo. T86- ENTREVISTADO: E aí, dentro daquele “TTC,” eu contrato algumas pessoas, depois eu vou observar. Eu posso acabar vendo aquele professor na hora em que eu estou presente... T87- ENTREVISTADOR: Fazendo o que você quer. T88- ENTREVISTADO: O que ele sabe que vai me agradar T89- ENTREVISTADOR: Certo. T90- ENTREVISTADO: Para me agradar, mas na hora que eu viro as costas, ele vai fazer o que ele acredita. O que eu tô dizendo é que há um confronto entre o que a escola crê, a filosofia daquele treinamento que foi passado ao professor, e as crenças internas do professor. Ele é muito forte, (xxx) (0:35:54) então, em algum momento eu, na sala, que eu tenho poder como professor, eu posso tá fazendo uma coisa que tá totalmente desalinhado com a instituição. Porque... T91- ENTREVISTADOR: Concordo com isso.

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T92- ENTREVISTADO: Porque, eu acredito (xxx) (0:36:11) não adiantou o “TTC” que você, que o meu coordenador me deu, porque eu, no fundo, no fundo, acredito que tem que fazer isso. Dessa forma.

Esse texto acima, da coordenadora, confirma a concepção de crenças

pessoais dos professores e, mais ainda, levanta criticas de Kumaravadivelu sobre as

teorias pessoais dos professores, em princípio esmagadas pelas dos especialistas e

que sobrevivem, de forma escondida em cada agência transgressora dos

professores. Será que se os professores soubessem as razões de como essa

imposição se formou...

Logo abaixo, ela entra no Reflective Teaching, tentando retomar a

didática clássica e objetiva dos aims, objetivos da aula, e mais uma vez não sugere

a possibilidade de trazer negociação com o aluno. Não estamos aqui desprezando o

ensino reflexivo, porque ele ajuda a compreender melhor seus objetivos numa aula e

de gerenciá-la melhor. Contudo, essa concepção de necessidades subjetivas de

Richterich toca exatamente nas necessidades subjetivas dos alunos e não da aula,

tendo sido pouco disseminada, possivelmente, por se concentrar nas subjetividades,

nas diferenças, na heterogeneidade dos alunos não ecoou na maioria das áreas da

LA no mundo anglófono, mais positivista, mesmo tendo sido mencionada por

Richterich desde 1971. Assim a cultura de ensino mantém, como afirma

Kumaravadivelu, uma pedagogia que privilegia, na sua visão e tipologia, professores

técnico-passivos ou professores reflexivos, em detrimento do professor intelectual-

transformador, que dá um passo crítico para o processo de ensino e aprendizagem.

Pensar uma teoria pessoal é um ato intelectual. Ou seja, a pedagogia crítica

incomodaria as relações de poder e dominação presentes na pedagogia clássica e,

lembrando Paulo Freire, esta última é usada para criar e sustentar desigualdades

sociais. Um professor intelectual transformador busca o avanço crítico da educação

e a transformação pessoal. E isso bate com nossa questão. Como Kumaravadivelu

empodera o professor no tocante a transformação pessoal isto coincide com um

aspecto que defendemos: o empoderamento do aluno no processo educacional.

T93- ENTREVISTADO: Então o que é que a gente faz, a gente tenta realmente chegar a essa reflexão, com o próprio professor, porque ele tá se vendo nos encontros de feedback sobre aulas

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assistidas. Há um distanciamento, na medida que eu vejo aquilo que foi feito, eu tou me distanciando, né, como professor, né? Aquilo foi um, uma foto. (0:41:20) T94- ENTREVISTADOR: Uma foto, né? T95- ENTREVISTADO: Radiografia da minha aula, né? Então eu tou assistindo ali sua aula, vendo ali, então eu tou distanciada, né? Então eu tenho mais condições de te observar melhor, né? Então a gente tenta fazer nessa, nessa conversa, nesses encontros com que ele chegue à conclusão por que isso foi feito assim, e o que é que você achou, né? Aí vem aquele professor... Sim, mas o que é que você achou da aula? (risos). Não, não. T96- ENTREVISTADOR: Quer manter o emprego dele, né? (Risos). T97- ENTREVISTADO: Não, não, é você, professor... T98- ENTREVISTADOR: Primeiro é você que tem que achar... T99- ENTREVISTADO: O que é que você achou, o que é que você achou?

Esse depoimento da professora corresponde a um tipo de professor

desejado na instituição: o professor reflexivo. Nada contra essa linha de formação,

mas ela resume a educação de uma LE a ações de sala de aula, a análise do

planejamento e privilegia o ensino e exclui a voz do aluno nessa didática. Por isso

pensamos como professores intelectuais transformadores, que possam gerar idéias

e teorias a partir de sua experiência. Esse tipo de professor de inspiração freriana,

desejado em Giroux (1997) e ratificado em Kumaravadivelu (2003), podem ameaçar

os micropoderes de especialistas, coordenadores e professores. Assim, esse tipo de

professor intelectual-transformador, sua atitude crítica, é um verdadeiro terremoto

para a cadeia de conhecimento e de micropoderes constituídos, “foucaultianamente”

sepultados, citados no trecho acima.

T100- ENTREVISTADO: A dificuldade, às vezes, está com o professor, com sua experiência, né, o professor muito novato, ele precisa uma coisa mais didática, né?

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T101- ENTREVISTADOR: É, precisa. T102- ENTREVISTADO: Mas aqui... seria só no começo, né, mas com os outros professores a gente tenta realmente esse processo. Aí que os (xxx) (0:42:02) aparecem, é nessa conversa que você vê a verdade né? Porque muitas... T102- ENTREVISTADOR: Às vezes... lhe aparece? (xxx) (0:42:10). T103- ENTREVISTADO: Algumas vezes escapa T104- ENTREVISTADOR: Tem gente bem teatral. T105- ENTREVISTADO: Não, eu sei, mas muita coisa escapa. T106- ENTREVISTADOR: Escapa, né? T107- ENTREVISTADO: Numa conversa dessa, muita coisa escapa, muita coisa escapa. T108- ENTREVISTADOR: Aí você descobre outro aspecto, né? T109- ENTREVISTADO: Dependendo do que... Você descobre uns mil (xxx) (0:42:23) daquela pessoa né, por que tá ali, ta ali a radiografia, tá ali... sim, sim, então o que, que a gente vê, é... você não muda uma pessoa de um dia pro outro, certo? T110- ENTREVISTADOR: Não, não. T111- ENTREVISTADO: Crença, né, você tem (xxx) (0:42:37) você não muda né? Eu acredito. T112- ENTREVISTADOR: Será? T113- ENTREVISTADO: Essa fica muito difícil né? T114- ENTREVISTADOR: Porque tá (xxx) (0:42:39) T115- ENTREVISTADO:

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A parte pedagógica lingüística você ainda pode intervir, a atitude é muito difícil, né? Então a gente é... o que é que faz, então os nossos treinadores, nos nossos treinamentos, a gente tenta, jamais a gente vai despedir o professor por causa disso, né? Então (xxx) (0:43:03) aquele longo processo, quando se vê que realmente aquele professor, não adianta, ele tá totalmente desalinhado com a instituição, não adiantou a observação, continuidade de observação, não adiantou o treinamento... T116- ENTREVISTADOR: Mas minha pergunta é por que não se coloca, desde o início, a importância do aluno, por que desde o início, não se dá a esse novato a idéia de que ele tem que ser crítico, que as teorias pessoais de ensino podem vir da experiência de ensino dele e da escuta das demandas do aluno. Isso é impossível, nos treinamentos? T117- ENTREVISTADO: A nossa parte de orientação psicopedagógica, que dá um grande apoio, porque é o que nós estamos cuidando, eu falei isso no começo e não finalizei sobre a auto-estima. A gente tá trabalhando muito com auto-estima. T118- ENTREVISTADOR: Do professor? T119- ENTREVISTADO: Do professor, por que a gente sente que isso é uma coisa que ele tá perdendo, então a gente tá tentando resgatar isso daí.

A coordenadora escapa da pergunta, quando nós questionamos o

treinamento e se este, desde o início, poderia ser mais realista, menos bíblico. Isso

facilitaria a realização de aulas menos idealizadas e mais centradas num poder que

o professor tem de criar, com sua experiência teorias, próprias de ensino, como

citado anteriormente em Kumaravadivelu (2003). Assim, talvez a auto-estima

mencionada esteja na imposição do “novidadorismo” do método imposto top-down e,

como já comentamos, uma reprodução em sala de uma didática sem crivos críticos

locais ou de agregação de teorias da experiência do professor de LE. Assim, sua

auto-estima baixa, como diz a coordenadora, está em cima do micropoder imposto e

aceito por especialistas, coordenadores e toda a cadeia já mencionada.

T120- ENTREVISTADO: O problema é o seguinte, a gente faz o possível é... pra que isso ocorra (xxx) (0:49:19) T121- ENTREVISTADOR: Veja bem. Isso a gente está conversando..., a gente está conversando quer dizer, não é uma coisa...

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T122- ENTREVISTADO: Eu sei. Não, não. A gente faz isso, tenta fazer com que isso aconteça, agora, eu fico pensando assim: será que o professor tá se expondo, tá se abrindo, tá... T123- ENTREVISTADOR: Mas, e... aí a gente tem sempre duas, duas vertentes, né? Uma é ele ficar oprimido e ficar ali se segurando... e a outra é ele se abrir e com aquilo que ele tem de opinião construir uma... fazer uma inserção disso, (0:49:53) não é? Mesmo porque qualquer crença das antigas, a gente vai ver, com a próxima ilustração delas se os alunos gostam.

A coordenadora começa a falar sobre seu ecletismo e em nossa opinião, é

uma necessidade entre alguns professores de “parecer” eclético, não radical.

Contudo, cai no relativismo e não consegue elaborar um descentramento dos

conhecimentos em questão.

T124- ENTREVISTADOR: (xxx) (0:50:00 ~ 0:56:00) T125- ENTREVISTADO: Olha, eu sou muito eclética. T126- ENTREVISTADOR: Ah é. T127- ENTREVISTADO: Eu sou eclética por natureza, então eu acho que tudo tem coisa boa né, eu sou eclética em religião, quando me perguntam qual é sua religião? T128- ENTREVISTADOR: Sua religião. T129- ENTREVISTADO: Eu fui batizada, eu sou ortodoxa (xxx) (0:50:19) fui bem escola católica, né? (xxx) (0:50:21) Espiritismo, acho que todas as religiões têm coisas interessantes, trazem coisas interessantes... T130- ENTREVISTADOR: São vários caminhos pro mesmo lugar não é? T131- ENTREVISTADO: Pro mesmo lugar. Então, nesse ponto, eu sou eclética e, também, sou eclética em termos de... de crenças. T132- ENTREVISTADOR: De crenças. T133- ENTREVISTADO: A pior coisa é a gente realmente tá...

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T134- ENTREVISTADOR: É porque talvez aí... T135- ENTREVISTADO: Essa é a verdade. T136- ENTREVISTADOR: É a verdade. T137- ENTREVISTADO: E acabou, não existe mais nada, como você acabou de dizer.(xxx) (0:50:47) Mas não é só isso... T138- ENTREVISTADOR: Não é só isso. T139- ENTREVISTADO: Não. (xxx) (0:50:50) T140- ENTREVISTADOR: O adulto, por exemplo, ele quer ver a estrutura... T141- ENTREVISTADO: Exatamente (xxx) (0:50:57) T142- ENTREVISTADO: (xxx) (0:51:05) T143- ENTREVISTADOR: (xxx) (0:51:05)... Através dos drills, por exemplo. (xxx) (0:51:07) T144- ENTREVISTADO: É. T145- ENTREVISTADOR: (xxx) (0:51:08). T146- ENTREVISTADO: (xxx) (0:51:10) tá fora da moda pelos, pelos textos que eu tenho analisado mais modernos... T147- ENTREVISTADOR: Mas alguns “gurus” dizem em T.T.C.´s que ela, a estrutura, tem que ser indutivamente descobertas, não é? T148- ENTREVISTADO: Sim, sim. T149- ENTREVISTADOR: Mas aí (xxx) (0:51:17) “gurus”. Ou “guruas”.

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T150- ENTREVISTADO: Que ditam, que ditam, né. T151- ENTREVISTADOR: Que ditam. T152- ENTREVISTADO: Exatamente, mas eu acho que em tudo a gente tem que ter discernimento, né? T153- ENTREVISTADOR: É essa a coisa, né (xxx) (0:51:28) é uma didática mais crítica, uma relação mais crítica com o professor... T154- ENTREVISTADO: Com o professor e com o aluno. T155- ENTREVISTADOR: Mais construtiva, e por conseqüência, para com o aluno, né. T156- ENTREVISTADO: Não, é... o caminho é esse. T157- ENTREVISTADOR: O caminho é esse né. T158- ENTREVISTADO: A solução só pode ser essa mesmo, né? T159- ENTREVISTADOR: É. T160- ENTREVISTADO: Agora, se você vai pra uma escola, institucionalmente pode ser (xxx) (0:51:43) é complicado, né? T161- ENTREVISTADOR: Complicado, completamente. T162- ENTREVISTADO: Que lhe entregam um manual e diz em que isso é assim e acabou. T163- ENTREVISTADOR: (xxx) (0:51:51) T164- ENTREVISTADO: Eu (xxx) (0:51:52) nós aqui acreditamos... nossa filosofia é isso, é esse desenvolvimento crítico, tanto do professor como do aluno, né? Tentar ajudá-los, né, nessa construção. T165- ENTREVISTADOR: Nessa construção.

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T166- ENTREVISTADO: Um pouquinho de conhecimento, né. T167- ENTREVISTADOR: Eu acho que a auto-estima não pode ser melhorada enquanto a pessoa não estiver inteira.

Realmente a auto-estima é um fator da nossa personalidade que nos

impulsiona em diversas áreas das nossas vidas. Contudo, sabemos que é uma

idealização buscar profissionais com autoconhecimento e “inteiros”. É mais viável

abrir-se metodologicamente, desenvolver a partir da mesma, mais pensamento

crítico sobre o que ocorre, ouvindo professores e alunos. Descobrindo-se,

ideologicamente, as razões, os micropoderes subjacentes as crenças.

T169- ENTREVISTADOR: Não se autoconhecer, não se conhecer. (xxx) (0:52:21) T170- ENTREVISTADO: (xxx) (0:52:22) meus pontos fortes, meus pontos fracos... T171- Os dois falam ao mesmo tempo: (xxx) (0:52:31) Até onde eu posso ir? T172- ENTREVISTADO: Entendeu, a gente precisa se conhecer, se conhecer muito. T173- ENTREVISTADOR: Aí entra a Psicologia também, né? Têm outras coisas também, os T.T.C.´s, não sei daqui, mas (xxx) (0:52:42) no geral são muito técnicos ... (xxx) (0:52:47). T174- ENTREVISTADO: (xxx) (0:52:50) Nenhuma lavagem de roupa.

A professora “psicologiza” e prega, nessa profissão complexa, o

autoconhecimento com muita propriedade. Mas a auto-estima de professores poderá

começar em dois momentos: num momento inicial, quando a eles for facilitado esse

ecletismo e também dito a eles que suas aulas não são bíblicas, que eles podem

trazer para a coordenação seus sentimentos e críticas sobre o método e que nem

tudo vai funcionar. Num segundo momento, para professores mais antigos, quando

for aberto espaço sistemático de discussão, de corte e implementações de

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procedimentos, antigos ou novos. Esse trânsito crítico e dinâmico entre professores

e coordenadores, e professores e alunos, traz a participação prazerosa pelo poder

que essas interferências podem ter para seu reconhecimento profissional.

Precisamos questionar o poder dos especialistas que se sepulta numa cultura de

ensino não pára de se reproduzir de forma novofágica, impedindo mudanças e

interditando vozes críticas locais.

T175- ENTREVISTADO: Eu vou lhe dizer, você tá em total sintonia com a gente, eu... eu... a gente tem trazido, de alguns anos pra cá, a linha de educação geral, nós temos esticado e promovido que nossos professores vão, até né, participem de congressos de educação (xxx) (0:55:03) T176- ENTREVISTADOR: Claro. T177- ENTREVISTADO: Entendeu? T178- ENTREVISTADOR: Abriu? T179- ENTREVISTADO: E a gente abriu muito, a gente tem aberto muito e às vezes um ou outro não entende. T180- Os dois falam ao mesmo tempo: (xxx) (0:55:12) T181- ENTREVISTADO: É, não entendia isso (xxx) (0:55:15) daqui, e a nossa luta é exatamente... eu disse gente, aqui nesse curso a gente vê vocês como educadores, nós queremos ser educadores, e educador tem que ser holístico, eu não posso só entender de métodos de ensino de língua inglesa... T182- ENTREVISTADOR: Não... T183- ENTREVISTADO: De jeito nenhum... T184- ENTREVISTADOR: Nem de livros estrangeiros, só aqueles vindos de fora, de uma linha mais atual apenas, de uma corrente de pensamento apenas anglófono, não, vamos observar outros pensadores, locais, europeus...

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A coordenadora fala de uma abertura ao conhecimento pedagógico além

da fronteira anglófona. Concordamos inteiramente com a mesma. Mas mesmo

dentro da bibliografia anglófona, a limitação de conhecimento é enorme, porque a

indústria de editoração credita o conhecimento de alguns especialistas,

empoderando-os a partir de seu olhar, de suas expectativas. Assim, o novo método

e livros didáticos lançados são a única leitura obrigatória nos cursos livres. Ela e

outros coordenadores desconheciam estratégias cognitivas, porque isso não era o

desejado, isso causava embaraço, porque contradizia o poder do método novo.

Acho interessante que tenha se aberto espaço para a multireferencialidade

bibliográfica, mas é preciso incluí-las no campo de ELE.

T185- ENTREVISTADOR: Mas você concorda que as estratégias cognitivas foram um pouco deixadas de lado, né? T186- ENTREVISTADO: Concordo com você, concordo. (01:31:00) T187- ENTREVISTADOR: Então, introduzi técnicas antigas, a exemplo de tradução e uso de L1 nas aulas com o livro que trabalho que tem um syllabus Lexical Approach. Então, quando acabei, eu perguntei assim: “Vocês deixaram de aprender inglês por causa desse pouco de Português que nós inserimos aqui?”. “Não, professor. (01:31:15). Acabou a história. T188- ENTREVISTADO: É, é bom a gente ressaltar isso né, nós estamos falando de aprendizagem de adulto. T189- ENTREVISTADOR: De adulto, é adulto, é... T190- ENTREVISTADO: Porque de criança é uma outra realidade, não é isso? T191- ENTREVISTADOR: Eu disse, no início, que era de adulto. T192- ENTREVISTADO: É verdade. Não, não eu só tou querendo reforçar. T193- ENTREVISTADOR: Ah, certo. Certo, é.

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T194- ENTREVISTADO: Como eu tou falando, tem certas coisas que não funcionam dessa forma pra criança, né? T195- ENTREVISTADOR: Agora, eu pergunto é, é... conscientizar o aluno das estratégias cognitivas, vindas dele e do professor, correspondentes a métodos antigos ou atuais, essa hibridização é uma coisa impossível em sala de aula? (xxx) (01:31:45). Não porque eu estou fazendo. T196- ENTREVISTADO: É totalmente possível. T197- ENTREVISTADOR: Possível, eu apresento um drill, e em seguida questiono esses alunos: Como é, gostaram? Por quê? T198- ENTREVISTADO: Não, porque quando você pergunta o por quê, você ajuda ele a pensar a estratégia que ele usou. Sua estratégia. T199- ENTREVISTADOR: E trago ele pra mim, porque ele...quer dizer, é uma... T200- ENTREVISTADO: E ele entende porque você fez isso. T201- ENTREVISTADOR: É uma desconstrução intermetodológica e didática, ou melhor, um descentramento. T202- ENTREVISTADO: Não, e você, você também é, tenta, você explica pra ele o por quê você fez isso, porque muitas vezes o aluno não sabe por quê. E aí você fala, aquele professor (xxx) (01:32:18). T203- ENTREVISTADOR: É, nem expliquei por que, porque foi a primeira vez que eu pratiquei o drill, por que eles desconheciam... [prática excluída] primeiro eu queria saber dele sobre sua eficácia, se era enfadonho, como todo mundo dizia. Eu não gosto muito deles, embora eu tenha feito e ainda faça mentalmente, how do you say................................ in English? É um drill com tradução, eliciando produção de língua, isso. E Atkinson (1987, p. 242, tradução nossa) diz que esse elicia a produção de L2. T204- ENTREVISTADO: Agora, tudo, eu acho que fica chato quando você faz aquele exagero. (1:32:38 ~ 1:33:00) T205- ENTREVISTADOR: Claro, é a dosagem.

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T206- ENTREVISTADO: É só isso, é só aquilo, é só aquilo. T207- ENTREVISTADOR: Quando faziam drill, né? T208- ENTREVISTADO: Por exemplo, no Audiolingual, né? T209- ENTREVISTADOR: Ah, não... T210- ENTREVISTADO: Era aquele exagero, quer dizer, era aquele (xxx) (01:32:52). T211- ENTREVISTADO: Só aquilo. T212- ENTREVISTADO: Só, só e só. Não é por aí. T213- ENTREVISTADOR: Mas eu acho... T214- ENTREVISTADO: Agora, que teve coisa boa, o Audiolingual... T215- ENTREVISTADOR: Aprenderam, aprenderam também, né?

A coordenadora entende que não é a técnica que desqualifica qualquer

prática, mas é seu abuso, sua prática, como diz Brown (1994, p. 16-17), ad

nauseum, até enjoar. Passo para a coordenadora as pesquisas comparativas de

expectativas de professores e alunos na educação de LE. Ela, a seguir, comenta

algumas expectativas.

(1:37:09 ~ 1:37:50) T216- ENTREVISTADO: Então na verdade, eu acho que isso aqui [nesse quadro] (xxx) (01:37:15) acontece também aqui né. T217- ENTREVISTADOR: Hunrum. T218- ENTREVISTADO:

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Os alunos... é... T219- ENTREVISTADOR: Valorizam a correction, a correção. (xxx) (01:37:19). T220- ENTREVISTADO: Principalmente o adulto, né? T221- ENTREVISTADOR: O adulto. T222- ENTREVISTADO: Ele quer ser corrigido, muito... T223- ENTREVISTADOR: Aí, é com o adulto... (xxx) (01:37:23). T224- ENTREVISTADO: Exatamente, ele quer ser corrigido, ele tem uma alta expectativa de seu desempenho, né, e a do professor é mais mediana. Ás vezes o professor até reclama da pronúncia do aluno, mas ele não faz tanta repetição, (xxx) (01:37:39) só fica na reclamação, né?. Ele não fala... T225- ENTREVISTADOR: O aluno fala com os professores. T226- ENTREVISTADO: Mas os professores falam... aí, eu tenho um aluno horroroso, não sei o que lá. T227- ENTREVISTADOR: Ah! Eu acho isso tão ruim! T228- ENTREVISTADO: E você faz o que, meu filho, com aquele menino? T229- ENTREVISTADOR: (xxx) (01:37:49)

Começamos a falar sobre as expectativas comparadas de professores e

alunos diante de atividades didáticas nas pesquisas Do livro de Nunan. A correção

questionada por Krashen (1996) em sala de aula, já que a sala é projetada para a

aquisição de L2 causaria inibição no aluno, parece que, para a maioria dos alunos

nessas pesquisas, quando são informalmente perguntados por nós, em sala de aula,

a resposta não corresponde à realidade pregada por Krashen. Não podemos incluir

na nossa cultura de ensino, muito embora essa realidade acolha acriticamente essa

concepção do autor.

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T230- ENTREVISTADOR: (xxx) (1:56:00 ~ 1:57:18) T231- ENTREVISTADO: Sondar do aluno: O que, que você usa? Por que que você usou essa... essa estratégia? Por que que você acha que essa estratégia é melhor? Como é que você chegou a isso? Que... que você fez? (xxx) (01:56:12) Vamos fazer um (xxx) (01:56:15)... T232- ENTREVISTADOR: (xxx) (01:56:16) T233- ENTREVISTADO: Como é que (xxx) (01:56:18) Qual foi o processo que você usou? A identificação do processo [é importante]. Eu acho que isso é (xxx) (01:56:21)... T234- ENTREVISTADOR: Eles preferem isso (xxx) (01:56:25). T235- ENTREVISTADO: Exatamente, você ta aí na aula ainda. T236- ENTREVISTADOR: Está dialogando... (xxx) (01:56:28). T237- ENTREVISTADO: É... é... não acontece, não acontece assim com... é... mas eu acredito nisso, né, e tenta-se na medida do possível (xxx) (01:56:38). T238- ENTREVISTADOR: É, por exemplo, se houver uma abertura de inclusão, isso aqui é apenas um estudo, né? T239- ENTREVISTADO: Sim. T240- ENTREVISTADOR: Como também o (xxx) (01:56:49) outros estudos, né, onde vários repertórios de estratégias cognitivas surgiram. Então, é, eu acho que falar, aqui, nisso... (xxx) (01:56:59) preferências dos alunos e tentar sensibilizar os professores, quer sejam essas preferências de aprender deles antigas ou atuais... então, sensibilizar, seria também perguntar: Isso aqui, como é? Vocês acham que eles aprendem, também, dessa forma? Tarara, tarara... T241- ENTREVISTADO: (xxx) (01:57:12) T242- ENTREVISTADOR: Agora, olhar, por exemplo, a parte do conteúdo (xxx) (01:57:14).

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(1:57:18 ~ 1:58:00) T243- ENTREVISTADO: (xxx) (01:57:18) T244- ENTREVISTADOR: Como uma conseqüência não é? T245- ENTREVISTADO: (xxx) (01:57:23) É... é porque essa negociação de currículo só pode acontecer, se o aluno chegou a um patamar. T246- ENTREVISTADOR: É. T247- ENTREVISTADO: Você não pode negociar, eu não vou chegar e negociar com um aluno que (xxx) (01:57:35) não esta em condições de... você tem que criar essas condições, a partir daí ele vai poder opinar... (xxx) (01:57:46) T248- ENTREVISTADOR: Mudando a cultura das relações e do professor. T249- ENTREVISTADO: Aí sim que você pode (xxx) (01:57:48) T250- ENTREVISTADOR: Mudando a cultura do professor, mas abrindo pra essa nova cultura, não é? T251- Os dois falam ao mesmo tempo: (xxx) (01:57:56) T252- ENTREVISTADO: Isso, você impondo ou não (xxx) (01:57:57) T253- ENTREVISTADOR: (xxx) (01:57:59). T254- ENTREVISTADOR: Bom, e eu dei a citação prá você, só pra, se você quiser, comentar alguma coisa. (02:03:54) T255- ENTREVISTADO: De quem é essa citação? T256- ENTREVISTADOR: É... não, eu coloquei aí. T257- ENTREVISTADO: Não, não?

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T258- ENTREVISTADOR: Não coloquei? T259- ENTREVISTADO: Você não quis colocar? T260- ENTREVISTADOR: Não, acho que... bom, mas eu posso dizer prá você depois. T261- ENTREVISTADO: É. “O espaço educativo é perpassado por múltiplas relações entre padrões culturais diferentes que tecem uma gama complexa de teias de significações. Essas teias que se estabelecem na relação entre sujeitos de padrões culturais específicos e diferentes, é substância, é substância da educação intercultural”. (Fleuri, 2003, p.71). Com certeza, né? [a coordenadora lê a citação, cuja bibliografia atualizei ao transcrever sua entrevista] T262- ENTREVISTADOR: É. Agora, cultura aí é vista como... não como a cultura anglófona.

T263- ENTREVISTADO:

Não, não, a cultura que ele tá falando aqui... T264- ENTREVISTADOR: Do professor. T265- ENTREVISTADO: Do professor... T266- ENTREVISTADOR: A cultura do aluno... T267- ENTREVISTADO: A cultura do aluno... então aquele aluno... T268- ENTREVISTADOR: A cultura da coordenação. Cultura... T269- ENTREVISTADO: Exatamente, as diferentes culturas, como elas se integram, como elas interagem, né? T270- ENTREVISTADOR: É. Por isso que o subjetivo tem emergido muito, né? Pra que, aí é, por isso que eu perguntei. Esse professor, no momento em que ele vomita tudo, talvez ele perca a culpa e o medo e talvez ele se abra para se integrar. É uma possibilidade que a gente não usa, né? T271- ENTREVISTADO:

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É, porque tudo que a gente... na verdade tudo que a gente diz que tem que fazer com os nossos alunos, em sala de aula, o coordenador tem que fazer com o professor. (2:04:50 ~ 2:05:12) T272- ENTREVISTADOR: O coordenador tem... é... é exatamente (xxx) (02:05:03) T273- ENTREVISTADO: Não é? O professor... não deixa de ser o seu aluno; do coor... é, o professor, né? T274- ENTREVISTADOR: É. T275- ENTREVISTADO: Então, o respeito, as suas crenças, entendê-lo melhor, ajudá-lo no seu processo de crescimento, respeitá-lo. T276- ENTREVISTADOR: É. Então lhe parece ético esse desencontro de informações, teorias e pesquisas de cognição por um lado e métodos novos por outro e, no meio disso, alunos não escutados. T277- ENTREVISTADO: Realmente, é confuso.

Chegamos à mesma conclusão que todos os outros. Termos pesquisas

cognitivas, dizendo que alunos aprendem usando variadas estratégias, inclusive

cognitivas, é uma falta de ética no tratar o ensino de LE.

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ANEXO C- EXEMPLO DE ANÁLISES QUE DEFINEM AS NECESSIDADES LINGÜÍSTICAS DE UMA PESSOA

Fonte: Richterich et al. (1973, p. 57).

Previsão Necessidades objetivas parcialmente previsíveis

Análise geral/ ocupacional Um empregado falante de Francês numa agência de viagem Inglês num país de língua francesa.

Categoria

Elementos

Necessidades

Agentes A.

1.1.4. Trabalhador burocrático 1.1.10 Agência de viagem 1.5. Feminino 3.1.6. Comprador/vendedor 3.1.7. Solicitador/fornecedor 3.2.1. Respeito 3.2.6. Simpatia 3.2.8. Neutralidade 3.2.1.5. Educação, (bons modos). 3.3.1 falante /destinatário + 1 destinatário /falante 3.3.5.1 falante / destinatário + X destinatários/falantes

- Ter uma maneira educada, acolhedora e respeitosa com clientes. - Estar confortável com pessoas ao encontrá-las pela primeira vez. - Ter um vocabulário apropriado para viajar de Genebra. - Ser capaz de usar segmentos léxicos e sintáticos apropriados a essas funções e objetos numa maneira compatível a uma empregado em uma agência de viagens. - Ser capaz de escrever cartas, preencher formulários e tomar notas. - Entender e pronunciar com facilidade. - saber a linguagem específica para telefonar. - ser capaz de ler prospectos, catálogos e correspondências

Tempo B.

1.4 Todo o dia. 2.1. 4-5 horas por dia 3.1. Primeira vez 3.2. Ocasionalmente 3.3. Regularmente

Lugar C.

1.1. Suíça 1.2. Suíça francesa

1.3 Genebra 2.3.3. Escritório 3. Profissional

4. Barulho de escritório

Funções D.

1. Expressão /Trocas 2. Descrição /

Explanação 2. Argumentação /persuasão 6. Solicitar /

Ordenar 8. Traduzir /interpretar

Objetos E.

1. Informação / Notificação 4. Idéia / Opinião 6. Contato /relação 7. Animado / inanimado

Meios F.

1. Discurso espontâneo /Audição direta 2. Discurso espontâneo / Audição indireta 5. Escrever / Ler

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ANEXO D – CLASSIFICAÇÃO SOCIOPROFISSIONAL DAS PRINCIPAIS CATEGORIAS DE TRABALHADORES

Categorias Principais 0 / 1

Trabalhadores científicos, técnicos e profissionais afins.

Categorias Secundárias 0-1: Físicos, Químicos, Biólogos e técnicos afins.

Comentários

Trabalhadores nessa categoria secundária são geralmente altamente especializados numa área de conhecimento específica das ciências, acima mencionadas. Eles executam pesquisas puras e aplicadas e desenvolvem aplicações práticas para descobertas científicas.

Entender a língua

– Participação em congressos, seminários, simpósios etc. Será exigido entender linguagem técnica. (–)

Falar

– Participação em congressos, seminários, simpósios etc. – Será exigido TSE comunicar com colegas. Necessidade de língua para a conversação do dia a dia além da linguagem técnica da área. (–)

Ler

– Será exigido ta leitura de monografias, artigos, relatórios que lidam com problemas relacionados com a ciência concernente. Necessidade de vocabulário especializado. (+)

Escrever

- Será exigido se escrever artigo, monografias e cartas sobre os assuntos relacionados com as ciências da área. Necessidade de linguagem técnica. (–)

Fonte: Richterich et al. (1973, p. 68).

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ANEXO E - EMAIL DE PHILIA THALGOTT SOBRE CONTATO COM O PROFESSOR RENÉ RICHTERICH

RE: RRichterich

De: THALGOTT Philia

25/09/2008, 06:09

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Dear Robélio

He certainly would laugh loudly of being the object of a huge research ! He was what we call in French a "bon vivant", enjoying very much good food, good wine et good company, and when he did not agree, in meetings for example, he would use a very direct style and expressions, not at all the usual soft "I am afraid I don't entirely agree with.." This made meetings with him quite lifely !

Now we don't know when he died actually. One day he simply disappeared. And this was in July

1997. Many researches were made by the police but also by friends in other countries, in particular Paris, and twice we heard people affirming that they had seen him over the street. No evidence whatsoever.

best wishes

Philia Thalgott Division des Politiques linguistiques - www.coe.int/lang/fr Language Policy Division - www.coe.int/lang Poste 2625 - AGORA - Bureau A5-V25

Querido Robélio,

Ele certamente riria bem alto se soubesse que estaria sendo objeto de uma grande pesquisa! Ele era o que chamamos em francês de bom vivant, desfrutando muito de um boa culinária, bom vinho e boas companhias, e, quando não concordava com algo, em reuniões, por exemplo, ele rebatia num estilo bastante direto e com expressões maneiristas e usuais, como: “eu lamento não poder concordar inteiramente com...” e isso fazia as reuniões com o mesmo bastantes cheias de vida!

Agora nós não sabemos quando ele realmente morreu. Um dia, ele simplesmente desapareceu. E isso foi em Julho de 1997. Muitas buscas e investigações foram feitas pela polícia e também pelos amigos em diversos países, sobretudo em Paris, e, duas vezes nós ouvimos dizer que ele tinha sido visto na rua. Contudo, sem provas. (tradução nossa)

Atenciosamente,

Philia Thalgott Divisão de políticas lingüísticas – www.coe.int/lag/fr [em francês] Divisão de políticas lingüísticas - www.coe.int/lag/fr [em inglês] Correio 2325 – AGORA – Escritório A5-V25