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revista portuguesa de ciências do desporto Volume 1 Nº 1 Janeiro 2001

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  • revista portuguesa decincias do desporto

    Volume 1N 1

    Janeiro 2001

    revista portuguesa de cincias do desportoVol. 1, N

    1Janeiro 2001

    A Universidade face aos desafios do futuroNuno Rodrigues GrandeA Universidade do Porto e as Universidades BrasileirasAlberto AmaralDiscursos pela causa da cooperao com o BrasilJorge Olmpio Bentofrica: o outro vrtice do tringuloAntnio T. MarquesA investigao em cincias do desportoJos MC SoaresPara um ensino superior com qualidadeRui Proena GarciaA Faculdade de Cincias do Desportoe de Educao Fsica da Universidade do Portoe a prestao de servios que poltica?Fernando TavaresA casa do desportoCristiano MoreiraBiomecnica hoje: enquadramento,perspectivas didcticas e facilidades laboratoriaisJ. Paulo Vilas-BoasA anlise da performance nos jogos desportivos.Reviso acerca da anlise do jogo.Jlio Garganta

    Desenvolvimento Motor. Notas breves sobre o estadode conhecimento e propostas de pesquisa.Jos Antnio Ribeiro Maia, Vtor Pires LopesActividade Fsica Adaptada: uma viso crticaUrbano Moreno Marques, Jos Alberto Moura e Castro,Maria Adlia SilvaCaminhos e descaminhos nas Cincias do Desporto.Entre o Porto Alegre e o Porto SentidoAdroaldo GayaConceito de Gesto do Desporto.Novos desafios, diferentes soluesGustavo Manuel Vaz da Silva Pires, Jos Pedro Sarmentode Rebocho LopesBreve roteiro da investigao emprica na Pedagogia doDesporto: a investigao sobre o ensino da educao fsicaAmndio GraaA Psicologia do Desporto e a batalha da qualidadeAntnio Manuel FonsecaActividade Fsica e Lazer contextos actuais e ideias futurasJorge MotaO treino dos jovens desportistas. Actualizao dealguns temas que fazem a agenda do debate sobrea preparao dos mais jovens.Antnio T. Marques, Jos Manuel Oliveira

    Publicao semestralVol. 1, N 1, Janeiro 2001ISSN 16450523

  • revista 13.2.04, 16:171

  • DirectorJorge O. Bento [email protected] M.C. Soares [email protected] T. Marques [email protected] editorialAmndio Graa [email protected] Maria Duarte [email protected] Lebre [email protected] Paulo Vilas Boas [email protected] Mota [email protected] Alberto Duarte [email protected] Alberto Moura e Castro [email protected] Maia [email protected] Pedro Sarmento [email protected] Garganta [email protected] Costa [email protected] Garcia [email protected]

    Design grfico, paginao e fotografiasArmando Vilas Boas [email protected] de Armando Vilas Boas ([email protected]) e TeresaOliveira Lacerda ([email protected]), que integra o projectoFormas do Desporto www.fcdef.up.pt/FormasDoDesporto.Modelos: Daniela Silva e Rita Braga.Impresso e acabamentoMultitema Solues de Impressowww.multitema.ptAssinatura AnualPortugal e Europa: 3500$, Brasil e PALOP: 5000$ (USD 28),outros pases: 5500$ (USD 30)Preo deste nmeroPortugal e Europa: 2000$, Brasil e PALOP: 2750$ (USD 15),outros pases: 3000$ (USD 17)Tiragem1000 exemplaresCopyrightA reproduo de artigos, grficos ou fotografias s permitidacom autorizao escrita do Director.Endereo para correspondnciaRevista Portuguesa de Cincias do DesportoFaculdade de Cincias do Desporto e de Educao Fsica daUniversidade do PortoRua Dr. Plcido Costa, 914200.450 PortoPortugalTel: +351225074700Fax: [email protected]

    ConsultoresAdroaldo Gaya (Universidade Federal Rio Grande Sul)Alberto Amadio (Universidade So Paulo)Alfredo Faria Jnior (Universidade Estado Rio Janeiro)Almir Liberato Silva (Universidade do Amazonas)Anthony Sargeant (Universidade Manchester)Antnio Carlos Guimares (Universidade Fed. Rio Grande Sul)Antnio da Paula Brito (Universidade Tcnica Lisboa)Antnio Prista (Universidade Pedaggica Moambique)Apolnio do Carmo (Universidade Federal Uberlndia)Carlos Neto (Universidade Tcnica Lisboa)Cludio Gil Arajo (Universidade Federal Rio Janeiro)Dartagnan P. Guedes (Universidade Estadual Londrina)Eckhard Meinberg (Universidade Desporto Colnia)Eduardo Archetti (Universidade de Oslo)Francisco Carreiro da Costa (Universidade Tcnica Lisboa)Francisco Martins Silva (Universidade Federal Paraba)Gaston Beunen (Universidade Catlica Lovaina)Glria Balagu (Universidade Chicago)Go Tani (Universidade So Paulo)Gustavo Pires (Universidade Tcnica Lisboa)Hans-Joachim Appell (Universidade Desporto Colnia)Hermnio Barreto (Universidade Tcnica Lisboa)Hugo Lovisolo (Universidade Gama Filho)Ian Franks (Universidade de British Columbia)Jan Cabri (Universidade Tcnica de Lisboa)Jean Francis Grhaigne (Universidade de Besanon)Jens Bangsbo (Universidade de Copenhaga)Joo Abrantes (Universidade Tcnica Lisboa)Jos Borges Gouveia (Universidade de Aveiro)Jos Gomes Pereira (Universidade Tcnica Lisboa)Jos Manuel Constantino (Universidade Lusfona)Juarez Nascimento (Universidade Federal Santa Catarina)Jrgen Weineck (Universidade Erlangen)Lamartine Pereira da Costa (Universidade Gama Filho)Lus Sardinha (Universidade Tcnica Lisboa)Manoel Costa (Universidade de Pernambuco)Manuel Patrcio (Universidade de vora)Markus Nahas (Universidade Federal Santa Catarina)Margarida Matos (Universidade Tcnica Lisboa)Maria Jos Mosquera Gonzlez (INEF Galiza)Paulo Machado (Universidade Minho)Pilar Snchez (Universidade Mrcia)Robert Brustad (Universidade Northern Colorado)Robert Malina (Universidade Estado Michigan)Sidnio Serpa (Universidade Tcnica Lisboa)Turbio Leite (Universidade Federal So Paulo)Valdir Barbanti (Universidade So Paulo)Vctor Matsudo (UNIFEC)Vctor da Fonseca (Universidade Tcnica Lisboa)Vctor Lopes (Instituto Politcnico Bragana)

    Revista Portuguesa de Cincias do DesportoPublicao semestral da Faculdade de Cincias doDesporto e de Educao Fsica da Universidade do PortoVol. 1, N 1, Janeiro 2001, ISSN 1645-0523

    A RPCD subsidiada pelo Centro de Estudos e Formao Desportiva do Ministrio da Juventude e Desporto.

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  • Nota editorialJorge BentoA universidade face aos desafios do futuroNuno Rodrigues GrandeA Universidade do Porto e as Universidades BrasileirasAlberto AmaralDiscursos pela causa da cooperao com o BrasilJorge Olmpio Bentofrica: o outro vrtice do tringuloAntnio T. MarquesA investigao em Cincias do DesportoJos MC SoaresPara um ensino superior com qualidadeRui GarciaA Faculdade de Cincias do Desporto e de EducaoFsica da Universidade do Porto e a prestao deservios que poltica?Fernando TavaresA casa do DesportoCristiano MoreiraBiomecnica hoje: enquadramento, perspectivasdidcticas e facilidades laboratoriaisJ. Paulo Vilas-BoasA anlise da performance nos jogos desportivos.Reviso acerca da anlise do jogoJlio GargantaDesenvolvimento Motor. Notas breves sobre o estado deconhecimento e propostas de pesquisa.Jos Antnio Ribeiro Maia, Vtor Pires LopesActividade Fsica Adaptada: uma viso crticaUrbano Moreno Marques, Jos Alberto Moura eCastro, Maria Adlia SilvaCaminhos e descaminhos nas Cincias do Desporto.Entre o Porto Alegre e o Porto SentidoAdroaldo GayaConceito de Gesto do Desporto. Novos Desafios,diferentes soluesGustavo Manuel Vaz da Silva Pires, Jos PedroSarmento de Rebocho LopesBreve roteiro da investigao emprica na Pedagogia doDesporto: a investigao sobre o ensino da educao fsicaAmndio GraaA Psicologia do Desporto e a batalha da qualidadeAntnio Manuel FonsecaActividade Fsica e lazer contextos actuais e ideias futurasJorge MotaO treino dos jovens desportistas. Actualizao de algunstemas que fazem a agenda do debate sobre apreparao dos mais jovens.Antnio T. Marques, Jos Manuel Oliveira

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  • Vicissitudes de vria ordem originaram que a revistaEspao, surgida h anos atrs, no tivesse conhecidogrande tempo de vida. Porm a ideia sobreviveu epor via disso a revista est de volta, com outronome, mas para cumprir a mesma funo.Jos Saramago disse recentemente que as lnguas secercam umas s outras e que o ingls nos cerca atodos. neste aviso que se rev a nova publicao.Pensada para ser um espao de congregaodaqueles que, em lngua portuguesa, reflectem,teorizam e investigam os problemas do desporto. Epara ser um espao de divulgao e reconhecimentodesse labor.Continua, pois, a mover-nos o objectivo daconstruo de uma comunidade lusfona que, pelaqualidade da sua actividade, se imponha ao respeitono contexto internacional das Cincias do Desportoe de todos quantos cuidam deste fenmenocultural, polissmico e polimrfico.O nmero primeiro, que agora dado estampa,ostenta um tamanho que no ser habitual nofuturo. Trata-se de uma edio especial, associada evocao dos 25 anos de criao da Faculdade.Nesta conformidade os diferentes textos procuramreferenciar, inovar e balizar a misso, os desafios,os desgnios e compromissos da instituio, asaber: a cooperao, a investigao, o ensino e aprestao de servios.O quadro integra ainda um levantamento do estadoda arte em diversas reas das Cincias do Desporto.E para ficar completo mostra a casa em quedesenvolvemos o nosso trabalho. Ademais umaFaculdade do Desporto edificao de uma filosofiade exaltao do corpo.Assim comea a nova caminhada.

    Nota editorial

    Jorge Bento

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  • 5As transformaes aceleradas que caracterizam asgrandes mudanas do mundo actual esto a reflectir-sede forma determinante na identidade de todas asinstituies humanas. A Universidade, pela naturezada respectiva estrutura e objectivos, sofre asconsequncias destas transformaes, mesmo quandoas mudanas so o resultado da actividadeuniversitria.O acesso s fontes do conhecimento alarga-se de formaincontrolvel com o desenvolvimento das novastecnologias de ensino e aprendizagem.Deste modo, as relaes entre docentes e alunos estoa modificar-se, sendo que perde importncia o saberlivresco e ganha o de experincia feito.J hoje o docente mais o orientador crtico docrescimento cientfico e tcnico dos alunos e oeducador pelo exemplo e pelas atitudes do que orepetidor de contedos existentes nas diversasformas de registo a que os alunos tm fcil acesso ecom apresentaes pedaggicas altamenteimaginativas e testadas.A Universidade, por isso, ter que ser, mais do quehoje, o local onde se constri o novo conhecimentocientfico, que permuta com outras instituiesprodutoras de cincia, e difunde para a sociedadeque o utiliza.No futuro, a Universidade aumentar o dilogo comoutras instituies pblicas e privadas com o objectivode participar no estudo e nas aces relacionadas como desenvolvimento. Esta relao tornar-se- umimperativo de sobrevivncia das Universidades pois anecessidade de pertinncia das aces educativas e depesquisa ser-lhe- exigida pelos Estados para que sejustifique o custo crescente da respectiva existncia.A Universidade ter que, no futuro, manter

    mecanismos de educao permanente e contnua dosprofissionais que vier a licenciar pois no pode alhear-se da evoluo dos conhecimentos cientficos etcnicos que se faz a uma crescente velocidade.Participar, por isso, na reciclagem dos tcnicos quedesenvolvem actividades nas diversas empresas einstituies, por iniciativa prpria ou como resposta ssolicitaes externas.A globalizao da difuso do conhecimento impor sUniversidades a necessidade de se articularem em redede forma a estabelecerem-se processos de constanteinterajuda e de potencializao recproca.A possibilidade de utilizar meios de computao pararealizar ensino no presencial, ir permitir a criao dachamada Universidade Virtual, processo de se atingirgrandes massas populacionais, permitir a autoaprendizagem segundo ritmos diferentes e permutarprogramas e projectos entre Escolas com objectivosinstitucionais e educacionais semelhantes deUniversidades situadas em diversas latitudes.A Universidade responder ao desafio do futurotornando-se cada vez mais universal e participante, oque dar novo sentido responsabilidade dos docentese outro significado condio de ser aluno.A importncia da Universidade nos futuros arranjospoltico-sociais aumentar se for possvel alterar arigidez e o anacronismo de alguns dos processosorganizativos que a estruturam nos nossos dias. Se nofor, perder impacto e ser automaticamentemarginalizada e deixar de intervir no projectocolectivo dos povos a que pertencer.Tenho esperana que, no caso portugus, a gerao quecomeou j a preparar o futuro tenha o inconformismo,a lucidez e a coragem para que a Universidadepromova a mudana sem perder a identidade.

    Nuno Rodrigues GrandePr-reitor da Universidade do Porto

    A Universidade face aos desafios do futuro

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  • 6A Universidade do Porto e as Universidades Brasileiras

    Alberto AmaralReitor da Universidade do Porto no perodo de Dezembro de 1985 a Agosto de 1998

    Escrever sobre as relaes com as universidadesbrasileiras para mim simultaneamente um prazer euma dificuldade. Um prazer porque todo o percursoque a partir da primeira visita ao Pas irmoconstitui uma sucesso de recordaesextremamente gratas, aliadas ao xito que foi acampanha de promoo da Universidade do Porto noBrasil. Uma dificuldade porque difcil ser objectivoquando a razo se mistura constantemente com ocorao. Porm, estou certo que os leitoresperdoaro ao antigo reitor a mistura de algumaobjectividade com a recordao um tanto emocionalde alguns dos melhores momentos do passado.O estabelecimento de relaes privilegiadas com ospases de lngua portuguesa sempre constituiu umobjectivo da Universidade do Porto, tal comodefinido nos seus primeiros estatutos. No Plano deDesenvolvimento da Universidade do Porto, para operodo de 1994/99, recomenda-se que seja feito umgrande esforo para incrementar a cooperao comas instituies congneres dos pases de lnguaportuguesa, como um dos vectores para ganhar aaposta numa maior internacionalizao daUniversidade.Pode dizer-se que a Universidade do Porto cumpriucabalmente estes objectivos, sendo curioso notar queno que respeita ao Brasil foi uma escola recente daUniversidade, a Faculdade de Cincias do Desporto eEducao Fsica, que representou um papel deexcepcional relevo no estabelecimento de protocolose na criao de relaes estreitas com asuniversidades do Pas irmo.As realizaes foram imensas e estou certo que se astentar enumerar extensivamente cometerei oinevitvel pecado de me esquecer de algumas. Que

    me perdoem as dificuldades de memria de quemvem somando anos a uma vida cheia de recordaes;como dizia o poeta Pablo Neruda, Confesso que Vivi!Certamente foram celebrados imensos protocoloscom universidades brasileiras, alguns de carcterfolclrico-turstico nunca produziram resultadosvisveis, porm muitos resistiram ao passar dos anose produziram resultados surpreendentes.Permitam-me que recorde, por exemplo, osinmeros doutoramentos e mestrados obtidos porcidados brasileiros provenientes das mais diversasregies. Ou os cursos de Vero que o ProfessorDaniel Bessa organizou durante anos, com xitoinegvel, em cooperao estreita com a Universidadede Santa Catarina. Ou o Mestrado resultante dacooperao entre a Faculdade de Cincias doDesporto e de Educao Fsica da Universidade doPorto e a Universidade do Estado do Rio de Janeiro.Ou as iniciativas de teleconferncias entre o Porto eSanta Catarina.Se os docentes tiveram oportunidade de umapermuta importante com os seus colegas brasileiros,foram as oportunidades dadas aos alunos daUniversidade do Porto que mais me entusiasmaram.Quanto no valer em formao pessoal apossibilidade de um aluno de um curso mdico fazerum estgio em doenas tropicais no HospitalTropical de Manaus? Ou para um aluno de Biologiapoder passar alguns meses nesse territrio mticoque a Amaznia? Ou as digresses sempreacarinhadas (e recebidas com orgulho pelascomunidades portuguesas) do Orfeo daUniversidade e de algumas equipas desportivas?Tambm no sei disfarar a emoo que um reitorsente ao visitar uma universidade brasileira e ser

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    cumprimentado por um docente brasileiro que seapresenta e diz com orgulho que esteve naUniversidade do Porto, onde obteve o seudoutoramento! E o encontro com um professor daUniversidade de Cuiab, na orla desse imenso einesquecvel pantanal, entusiasta de um instrumentotpico conhecido por viola de cocho que vemagradecer o contacto com a Fundao Gulbenkianque lhe possibilitou a obteno de uma bolsa deestudos para se doutorar em Portugal?Devo, tambm, relembrar o Programa ALPHA,criado pela UE para o desenvolvimento das relaescom as universidades dos pases da Amrica Latina,o qual permitiu incrementar a ligao com asinstituies brasileiras, por meio de reunies detrabalho entre os Conselhos de Reitores dasUniversidades de Portugal e do Brasil. O ProjectoBracara, financiado por este programa, permitiu umestudo comparativo de sistemas de ensino superiorda Europa e da Amrica Latina, com particularrelevo para os casos de Portugal e do Brasil, aoabrigo do qual se realizaram 5 confernciasinternacionais onde foram debatidos os grandesproblemas das universidades.Mas para alm de todas estas realizaes devoreconhecer que o xito das iniciativas se ficou adever na aposta em relaes privilegiadas com umnmero limitado de instituies, nomeadamentecom a Universidade de Santa Catarina, aUniversidade do Estado do Rio de Janeiro, aUniversidade do Amazonas e as universidadesFederal e Estadual do Pernambuco.Aposta que s foi ganha pela criao de relaespessoais de estreita amizade e de convergncia depropsitos com alguns parceiros chave dasuniversidades brasileiras. Que me perdoem os outrose que no mo levem conta de ingratido, mas noposso esquecer a nvel universitrio o ProfessorAntnio Celso Alves Pereira (antigo reitor) e aProfessora Nilcea Freire (antiga vice-reitora e actualreitora) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro,o Professor Nelson Fraiji (antigo reitor) e o ProfessorAlmir Liberato (pr-reitor) da Universidade doAmazonas, o Professor Mozart Ramos, actual reitorda Universidade Federal de Pernambuco e o grandeamigo Professor Efrm Maranho, antigo reitor damesma universidade e actual Presidente do Conselho

    Nacional de Educao do Brasil.Fora do meio universitrio impossvel esquecer ogrande amigo Zeferino Costa ( e seu irmoAlberto), o tio Zeferino, esse verdadeiroembaixador da Universidade do Porto no Brasil, aquem tanto se fica a dever na promoo dasrelaes entre Portugal e Brasil.Porm, para mim pessoalmente, os acontecimentosmais marcantes foram a organizao das trs grandesexposies que tiveram lugar no Porto, em 1994, eem Manaus, em 1997. Para que a memria no meatraioe recorrerei a documentos que ento escrevi.Em 1994 a Universidade do Porto organizou, emcolaborao com as Universidades Federal oPernambuco e do Amazonas (Manaus) duasexposies sobre temas brasileiros, a primeira sobrea Amaznia: Memria da Amaznia: Etnicidade eTerritorialidade, centrada em torno do esplio daViagem Philosfica de Alexandre RodriguesFerreira (1782/1791) e a segunda sobre as artespopulares e eruditas do Nordeste brasileiro. Asexposies foram inauguradas em 23 de Junho, coma presena do Presidente da Repblica, Dr. MrioSoares, do Governador do Estado do Pernambuco,Dr. Joaquim de Freitas Cavalcanti, do Secretrio deEstado do Turismo do Estado do Amazonas, Dr.Charles Belchieur, do Prefeito da Cidade do Recife,Jarbas Vasconcelos, do Presidente da Cmara doPorto, Fr. Fernando Gomes e de reitores de diversasuniversidades portuguesas e brasileiras.A exposio Memria da Amaznia: Etnicidade eTerritorialidade, centrada em torno do esplio daViagem Philosphica de Alexandre RodriguesFerreira (1783-1791) culminou todo o trabalho decooperao entre as universidades do Porto e doAmazonas. Esta exposio teve um carcterinovador, ultrapassando a tradicional mostra deescritos, desenhos e artefactos produzidos erecolhidos, no sculo XVIII, pela expedio deAlexandre Rodrigues Ferreira, para desafiar osvisitantes com a busca de uma anlise crtica e deuma interpretao das transformaes que decorremdesse passado longnquo at realidade presente. Aexposio Memria da Amaznia coloca emconfronto o passado, evocado pelos escritos,desenhos e artefactos recolhidos no Sc. XVIII porAlexandre Rodrigues Ferreira, com a realidade

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  • 8ALBERTO AMARAL

    presente dos povos indgenas que sobrevivem, hoje,nas mesmas regies. E sobrevivem, apesar dascompulses do presente para que se tornemcivilizados, renunciando s suas formas tradicionaisde agir e de pensar, o que desmente a imagem sobreeles criada, de seres efmeros, em transio para acristandade, a civilizao, a assimilao, odesaparecimento.A Memria da Amaznia: Etnicidade eTerritorialidade reflectiu uma abordagemantropolgica das transformaes ocorridas nosltimos anos nas sociedades indgenas, as quais tmorigem nesse confronto que se iniciou h cincosculos entre povos que a habitavam h milharesde anos, com as suas mltiplas formas de vida, e dosque chegaram, invadiram e conquistaram, colonos,funcionrios, missionrios, militares; confronto queera documentado nos trs espaos em que seorganiza a exposio que correspondem a trs tiposde situaes de contacto intertnico na Amaznia doBrasil; e que podem estar e esto presentes desde osculo XVI aos nossos dias: CHOQUE, TUTELA eAFIRMAO DE ETNICIDADE.Mas esta Memria da Amaznia foi, tambm,testemunho da capacidade criadora dasuniversidades, da sua vocao para o estudo dasquestes sem barreiras de lnguas, culturas oupreconceitos, do seu valor como veculosprivilegiados para o aprofundamento das relaesentre pases e culturas.A exposio foi possvel graas a essa grandecumplicidade que se estabeleceu entre instituiesirmanadas no desejo de criar algo de belo e deexemplar. Foroso relembrar a contribuio dosesplios do Museu de Antropologia daUniversidade de Coimbra, da Academia de Cinciasde Lisboa, da Sociedade de Geografia de Lisboa e doMuseu Nacional de Arqueologia e Etnografia. Aoscomissrios da exposio, Fernandes Dias,Eglantina Monteiro, Paulo Providncia e ngelo deSousa, em representao de todos quantoscontriburam com o seu trabalho, ficam osagradecimentos por essa obra inesquecvel.A exposio sobre as artes populares e eruditas doNordeste brasileiro relana o debate dos limitesentre arte e artesanato, as questes da arte popular eda arte erudita. Temas caros ao Porto, cidade

    fabriqueira, herdeira de artesanatos e manufacturascom passado medieval, alfobre de mesteres. Aexposio permitiu ver obras de autores toimportantes como Bajado, Samico, Montez, Galdino,Salustino, Nuca, Cornlio, Laprovtera, Berison,Jordo, Baccaro, Mendes, Lopes, alguns ex-votos e,ainda, trabalho dos artfices do carnaval dePernambuco.Esta exposio , igualmente, uma festa de celebraodo encontro de duas cidades partilhando em comum aexistncia do rio e a presena do mar, mas cidades todiversas onde, no entanto, nos sentimos sempre emcasa, cidades irms de pases irmos, unidas pelahistria, pela lngua e pela cultura.De um lado o Porto, cidade de granito, lavada dechuvas e amaciada de nevoeiros, cidade de contrastes,orgulhosa das suas tradies e ciosa da sualiberdade, cidade de actividade fervilhante, cidadecomerciante e marinheira, cidade da cultura,debruada sobre o rio e encostada ao mar, cidade,como nos diz Helder Pacheco, de todos os fascnios,contradies e incongruncias, que permanece,inconfundvel e nica, na austera e conflituosa vocao dasua perenidade.Do outro lado o Recife, metade roubado ao mar,metade imaginao, cidade protegida do mar pelaprpria natureza de onde retira o nome, cidade daspontes e dos canais, embelezada pelos seus rios,conglomerado de gentes de todos os matizes, que semisturam a todos os instantes sem se atritarem, fruto deuma colonizao humanstica onde o homem sempre foi suamaior riqueza, cidade em jeito de criana aberta a todas ascrenas. At mesmo a crena de no ter f. A f, at de teresperana. (Edvaldo Arlego).Esta exposio teve como curadores o artista plsticoSylvia Pontual e o arquitecto Moiss Andrade,ficando a montagem a cargo dos arquitectos JaneteCosta, Mrio Santos e Pedro Gadanho. A eles, comorepresentantes desse grupo annimo e entusiastaque transformou o sonhe em realidade, so devidosos agradecimentos da Universidade do Porto.Mal eu sabia, uma vez passada a tenso de todo otrabalho que permitiu o xito destas iniciativas, queum desafio ainda maior estava para vir. O ento reitorda Universidade do Amazonas, esse homem que amacomo nenhum essa regio nica no mundo, teve osonho de levar a Manaus a exposio Memria da

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  • 9A Universidade do Porto e as Universidades Brasileiras

    Amaznia. Sonho que inicialmente pareciairrealizvel. Mais tarde, por ocasio do doutoramentohonoris causa do Presidente do Brasil, Dr. FernandoHenriques Cardoso, foi dado um passo determinante:os reitores das universidades de Porto, de Coimbra edo Amazonas assinaram um protocolo que previa adeslocao da exposio para o Brasil, protocolo quefoi assinado pelos Presidentes Henrique Cardoso eMrio Soares como testemunhas.O sonho realizou-se em 1997. Pelo caminho ficaramavanos e recuos, muitos obstculos ultrapassados,algumas incompreenses e muitas amizades. Aindame lembro das reunies com o amigo Nelson Fraijino Palcio da Presidncia em Braslia, nosMinistrios da Educao e da Cultura brasileiros,com o Governador do Estado do Amazonas, com oPrefeito de Manaus... Sei l, todas as portas foramusadas. Do meu lado sempre contei com os quesonharam comigo, em especial o Fernandes Dias e aEglantina Monteiro.Finalmente com a presena do Dr. Mrio Soares, naaltura j ex-presidente da Repblica, do Ministro daEducao de Portugal, Professor Maral Grilo, doMinistro da Cultura do Brasil, do Governador doAmazonas, de chefias ndias e da inevitvel multidode notveis foi feita a inaugurao dessa exposiorealizada no Palcio do Rio Negro, antiga sede doGoverno do Amazonas. Palcio que foi recuperadopara o efeito e que no podia ter melhor incio denovas funes. No dia seguinte, nesse edifcioesplendoroso que a pera de Manaus, aUniversidade do Amazonas selou o xito dainiciativa com a concesso do doutoramento honoriscausa ao Dr. Mrio Soares.Estas exposies foram, essencialmente, o resultadoda colaborao de trs Universidades, do Porto,Federal do Pernambuco e do Amazonas e mostramcomo estas instituies, herdeiras de uma tradiomultissecular da procura de novos conhecimentos eda transmisso do conhecimento e da cultura,

    dotadas de uma grande capacidade criativa e de uminegvel esprito de iniciativa, sempre defensoras deum grande esprito internacionalista, podem ser osveculos privilegiados para o aprofundamento dasrelaes entre pases e culturas.Os universitrios, por formao, tm o dever deestar permanentemente insatisfeitos com assituaes estticas, partindo sempre na busca denovas questes, a que no alheia a capacidade desonhar. Como dizia Fernando Pessoa Triste de quemvive em casa/ Contente com o seu lar,/ Sem que um sonho,no erguer da asa,/ Faa at mais rubra a brasa/ da lareiraa abandonar.Mas, no fundo, para ns universitrios, tal comodizia o poeta Agostinho Neto, o fundamental ser oacto de Criar, criar... no esquecendo que o artistae o universitrio devem transportar em si essamesma contaminao, o vrus do inconformismo e ainsatisfao face ao imobilismo. Sem o que no secumprir a Universidade.Para terminar terei que referir a jia da coroa. Com acomparticipao do Governo do Pernambuco, daPrefeitura do Recife, da Cmara Municipal do Portoe de empresrios do Estado do Pernambuco est aser construda, em terrenos da Universidade, a Casado Pernambuco no Porto, instituio pensada nastradies do Gabinete Portugus de Leitura doRecife, embora com ambies mais amplas; ser umcentro de difuso da cultura nordestina, um centrode negcios, um local de encontro das comunidadesdas duas cidades irms (Porto e Recife) e umaresidncia para professores visitantes e alunos deps-graduao oriundos, preferencialmente, doEstado do Pernambuco.Hoje, quando olho para trs, penso que, por vezes,corri riscos substanciais. Porm, os resultados obtidosna promoo do encontro dos dois Pases e nacontribuio do prestgio da Universidade do Portomostram que valeu a pena. E assim posso repetir coma conscincia tranquila: Confesso que Vivi!

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    Diante da carta de Pro Vaz de Caminha at me vieram aslgrimas aos olhos(Miguel Torga, Dirio XIV)

    INTRITOAndei, durante meses, s voltas e s costas com atarefa de redigir um texto sobre a cooperao com oBrasil. Esta confisso diz bem da dificuldade comque me deparei para resolver a tarefa a contento. Acontento de quem me l e, sobretudo, a contento demim mesmo.Isto parecer um paradoxo ou contradio,porquanto, desde que me doutorei, a minha carreiraacadmica tem decorrido em estreita associao cooperao com os pases lusfonos, particularmentecom o Brasil. Porm o paradoxo s o na aparncia. que esta circunstncia que torna impossvel umjulgamento racional, frio e objectivo, livre dosdevaneios da subjectividade. Realmente os caminhosque trilhei foram sempre margeados pelo cultivo dasmemrias e emoes, pela ordem dos afectos, pelapartilha e comunho do legado histrico e dos ideaisdo humanismo lusitano, pelo calor da convivncia,pelo acrescento das amizades, pela descoberta eenaltecimento das afinidades e lugares comuns.Ou seja, tenho para mim claro que sempre estiveligado cooperao, quer a ttulo pessoal, quer emrepresentao da minha Faculdade e da Universidadedo Porto, em nome de causas e de valores quetranscendem os pretextos dizveis e objectivveis.No sei dizer bem e de forma precisa que causas evalores so esses, nem tampouco sei se, sabendodiz-los, os deveria dizer. Sei to somente dizer, demodo aproximado, como tenho estado e como metenho sentido em tal empreendimento.

    Muito simplesmente tenho estado e tenho-mesentido como sempre foi, e h-de ser o portugus:um romeiro ou peregrino em errncia, em viagem eem dispora pelo mundo, guiado por umamensagem, por uma f, por um ideal, por umautopia. Num rumo que tem como referncia aconstelao Cruzeiro do Sul e que, portanto, destavez no conduz a Santiago, mas faz aguada no Brasile noutros destinos para alm dele. Mais ainda, tenhoestado e tenho-me sentido como um portugusmudado e miscegenado, como um portugusverdadeiro que substncia da partida acrescentouas circunstncias da viagem e os proventos dachegada. E, por isso, quando ouo a minha lngua,olho em redor e s vejo minha volta compatriotas eptrias que no me so nem estranhas nemindiferentes. Vejo-me, pois, como portugus entreoutros tipos de portugus; ou, se se preferir e parano deixar no ar quaisquer laivos colonialistas, vejo-me e sinto-me como um modo de ser portugusocasionado pelos modos de ser brasileiro ou africanoou asitico em portugus.Ora isto no s no fcil de dizer e escrever, comotambm para mim extremamente difcil, se nomesmo impossvel, diz-lo ou escrev-lo bem. Porisso fao minhas as palavras que Miguel Torgadirigiu a um amigo brasileiro:

    Assentemos nisto: o que frontalmente na tua ptria afligeos outros, os repele ou atemoriza, a mim atrai-me. E avalorizao que fao dos teus patrcios alicera-seprecisamente na misso que o acaso lhes reservou, eaceitaram. Proteus que, sem medo grandeza e artimanhados fantasmas, cortam, queimam, semeiam, e prosseguem.Digo-te mais: muito embora o meu sangue portugus, como

    Jorge Olmpio BentoPresidente do Conselho Directivo da Faculdade de Cincias do Desportoe de Educao Fsica da Universidade do Porto

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    natural, se sinta lisonjeado por sab-los de espigolusada, por ouvi-los falar e rezar na lngua que falo,esqueo-me disso. Desligo-os de todo o pretrito, de todasas vassalagens arcaicas. Olho-os apenas como donos esenhores da nica nao tropical conseguida, vingada, queo nosso mundo tem. E saboreio os frutos exticos de que sealimentam, oio maravilhado as msicas que criam, edescubro-me reverente diante dos deuses que aclimataram eonde corporizam a transcendncia. (1)

    2. IDEIA DE UNIVERSIDADE E COOPERAOConcordaro comigo se disser que umaUniversidade no vive da prtica das virtudescrists, nem da imitao dos santos. No vive dorecolhimento e da renncia ao mundo. Certamentetem valores prprios, embora no deva enclausurar-se neles. Carece de estar no mundo; mas no demodo passivo, calando-se e deitando-se no colo dosinteresses vigentes. A Universidade deve estar nomundo, ao lado dos outros sujeitos que oconstrem e do mesmo jeito. E, se necessrio, deveestar contra eles em nome das causas daHumanidade. No pode e no deve estar ao serviode mais ningum.No , pois, curial moldar as instituiesuniversitrias para servirem os desgnios easpiraes do mercado; trata-se sobretudo de asdesenvolver como centros comprometidos com ascausas da sociedade. Ou seja, no podem ficar aassistir passivamente configurao do mundo pelomercado e prestar alegremente servios nessesentido; imperioso que estejam no mundo comoum protagonista ao lado de outros e que participemde modo activo, responsvel e empenhado nafeitura da realidade.Este tema fornece panos para muitas mangas epoderia portanto enveredar por ele para discorreracerca da cooperao e internacionalizao. Tantomais que estes dois aspectos so intrnsecos matriz, ideia e misso da Universidade. Ou seja, ideia de Universidade imanente a obrigao dainternacionalizao. E a esta a da cooperao. Ouseja, ambas so constituintes da sua incumbncia.Pelo que a credibilidade e o reconhecimento dasUniversidades dependem, em muito, da expresso edo nvel alcanado por aquelas duas vertentes dasua misso.

    De resto a histria recente da Universidade do Portoatesta sobremaneira o postulado anterior. Porquantose inegvel que a UP atingiu, na ltima dcada, umdesenvolvimento que a guindou a uma posiocimeira no plano nacional, igualmente inegvel queo mesmo sucedeu no contexto internacional. Maisainda, foi ao abrir-se ao espao internacional que aUP assumiu desafios e atingiu desempenhos quetiveram efeitos de retroaco internamente epotenciaram a sua relevncia externamente.Pode, pois, afirmar-se, com inteira propriedade ecom base em dados objectivos, que odesenvolvimento de uma Universidade e a suaaptido e disponibilidade para a cooperaointernacional andam intimamente ligados. E que isto particularmente verdade no caso da UP, que hojesem sombra de dvida uma Universidade dereferncia tanto no espao europeu como fora dele.Por conseguinte poderia discorrer acerca daimportncia da cooperao e internacionalizao, tendoem conta o seu contributo para a configurao daUniversidade e da Faculdade luz de padresmarcantes da vanguarda internacional e defendendo, aesta luz, a continuidade e aprofundamento das relaesinternacionais, nomeadamente com o espao lusfono.Poderia mobilizar um exrcito de argumentos, quaseinesgotveis, para sustentar que sem a abertura internacionalizao e cooperao no se v comoser possvel a uma instituio universitriaascender a uma cultura da qualidade enquanto centrode formao e aprendizagem e a uma cultura deorganizao enquanto centro de recursos materiais ehumanos.Realmente todas as reflexes acerca do futuro dasinstituies de ensino superior so coincidentes napreocupao de apontarem a elevao do nvel daqualidade como a principal meta dos tempos maisprximos e como o meio mais eficaz de fazer faceaos enormes desafios que se anunciam. E todasparecem ser ainda concordantes no seguinte:

    As condies e os princpios sociais fundamentaisencontram-se em processo de mudana.

    As mudanas esto j a acontecer com um ritmo deacelerao sem precedentes. E vo continuar aindacom mais rapidez medida que se entrar noprximo sculo.

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    imprescindvel desenvolver uma grandesensibilidade para as mudanas e antecipar-se smesmas.

    Ora isto no possvel de enxergar por umainstituio incapaz de projectar o olhar e o raio daaco para alm do permetro do edifcio em que seencontra instalada e, nalguns casos, amortalhada. impossvel de entender por uma instituio que nopossua uma inteligncia ambiental, que no estejaatenta ao que acontece fora dela, que no seja capazde detectar e ler os sinais e as tendncias emergentesno contexto mais amplo. Que no perceba que umrumo correcto consiste em saber aquilo que est suafrente. Que no se sinta atrada pela vanguarda e seconforme a ser empurrada pela retaguarda.Bem sei que aquilo que vou afirmar poderporventura dar aso a uma interpretao favorvel aosintentos e proventos dos que desrespeitam afidelidade devida sua instituio. Seja como for,atrevo-me aqui a contestar a convico errada egeneralizada de que quanto mais tempo se passanuma instituio mais se produz. Ou seja, concebe-se uma instituio, nomeadamente a universitria, luz da lgica de uma fbrica e dos seus operrios.Esquecendo que aquilo que se solicita aosuniversitrios so ideias e no parafusos. E aquantidade total de ideias produzidas no , nem deperto nem de longe, directamente proporcional quantidade de horas que se passa no interior dauniversidade.Poder at ser exactamente o contrrio: quantomenos se sai da universidade e mais tempo se passatrancafiado dentro dela, como num aqurio, demanh noite, menos estmulos criativos sorecebidos. E porventura germinaro assimprocedimentos nocivos produtividade e letais paraa criatividade. (2)Acresce que a formao do homem, segundo HEGEL, incompatvel com espaos estreitos e fechados.Revela de uma permanente abertura, requerendo tantoa considerao daquilo que prximo e familiarcomo a do que alheio, estranho e distante. E istoporque a questo da definio do homem se colocade forma variada correspondente especificidadecultural. Ou seja, deve partir-se da posio de que aideia do homem e das suas instituies no se

    concretiza de modo uniforme em todo o mundo. Oprincpio da igualdade apenas tem sentido seconsubstanciar o reconhecimento igual dasdiferenas e diversidades em que o homem e ascoisas humanas se manifestam e realizam.O mesmo dizer que a alteridade, isto , os outrosso imprescindveis para a afirmao do Eu e dacultura e formao pessoais. E o que vale para aspessoas vale tambm para as instituies, tendoparticular nfase na sociedade multicultural quedesponta j um pouco por toda a parte. (3)Estas consideraes encontram um cenrio naturalno desporto, por constituir uma cultura planetria,um fenmeno universalmente difundido, muitoembora com diferentes acentuaes. Atingemconcomitantemente as instituies de formao einvestigao nesta rea.

    3. DA GLOBALIZAOA necessidade e a justificao para o reforo eaprimoramento da cooperao e internacionalizaopodem ainda decorrer do novo contexto em quedecorre a globalizao ou mundializao, tendo emconta as alteraes operadas no seu conceito.A globalizao encerra hoje um sentido muito maisamplo do que o simples fluxo de dinheiro emercadorias, porquanto subentende umainterdependncia crescente das pessoas de todo omundo, em mltiplos aspectos. Ou seja, umprocesso que integra no apenas a economia, mastambm a cultura, a tecnologia e as formas degovernao. Mais, a globalizao implica padres e oaumento dos nveis de qualidade e excelncia,pressupondo para tanto colaboraes para alm dasfronteiras nacionais e regionais.Segundo este entendimento e de acordo com aanteviso do Relatrio do Desenvolvimento Humano1999 colocam-se globalizao, nos prximos anos epara que possa funcionar para as pessoas e noapenas para o dinheiro, entre outros, os seguintesdesafios:

    tica: menos violao dos direitos humanos, nosentido de um compromisso com uma tica douniversalismo.

    Equidade: menos disparidade entre e dentro dasnaes.

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    Incluso: menos excluso ou marginalizao depessoas e pases. (4)

    Isto torna claro que se procura moldar a globalizaocom uma face mais humana. luz do princpio de queo objectivo do desenvolvimento a criao de umambiente que permita s pessoas beneficiarem deuma vida longa, saudvel e criativa. Princpio muitasvezes esquecido, quando apenas se persegue ariqueza material e financeira.Dito de outro modo, os mercados no so nem aprimeira nem a ltima palavra no desenvolvimentohumano, tanto mais que muitas actividades e bensessenciais ao desenvolvimento so fornecidos foradeles. Mais, quando as motivaes de lucro dosactores do mercado ficam fora de controlo, desafiama tica e prejudicam o respeito pela justia e pelosdireitos humanos.O progresso sem precedentes do sculo XX apelapara ideias e ideais de universalidade, para apartilha de conhecimentos e saberes, de tecnologiase experincias e de formas de aco susceptveis deenriquecerem a vida das pessoas em todo o lado,aumentando grandemente os nveis de escolha ebem-estar. Trata-se de procurar que asoportunidades e benefcios da globalizao sejammais partilhados do que nas ltimas dcadas, j quea desigualdade dentro e entre os povos temaumentado significativamente e j que amundializao vem criando novas ameaas segurana humana tanto nos pases pobres comonos ricos.Esta linha de pensamento parece ganhar corpo namedida em que a evoluo registada aps a guerrafria, nomeadamente nos anos 90, fez com que asorganizaes internacionais se voltassem cada vezmais para as questes dos direitos e valores.No se afigura difcil proceder a diversasextrapolaes para o terreno da cooperaouniversitria, a partir deste novo figurinoconceptual. Realmente so muitas as linhas deimplicao que a tangem. A globalizao abre a vidadas pessoas cultura e ao fluxo das ideias econhecimentos em todos os domnios da actividade .Como sabido, o fenmeno da globalizao acentuae agudiza o ambiente de hipercompetitividade,ditando consequncias e exigncias incontornveis, a

    que nenhuma instituio consegue escapar, seja elauma empresa ou universidade. Assim soincontornveis, por exemplo, as exigncias de:

    Alta qualidade. Inovao dos padres de trabalho. Agilidade e flexibilidade. Diversificao das ofertas de formao, atendendo

    modificao da procura e reafirmando assim asua relevncia.

    Estabelecimento de parcerias e de trabalho em rede. Mobilidade de estudantes e professores. Reforo da coeso e renovao das formas de

    gesto e liderana.

    Incontornveis so igualmente para a instituiouniversitria os desafios colocados pela era digital.Como se sabe, h mais de trinta anos McLuhan dissea propsito da sua famosa concepo da GlobalVillage: O tempo passou, o espao desapareceu.Agora vivemos numa aldeia globalumacontecimento simultneo As informaes chegamat ns num fluxo instantneo e contnuo. Logo queso obtidas, elas so rapidamente substitudas porinformaes mais novas ainda (5). certo que o triunfo dos media no fez de toda apopulao do mundo uma aldeia coesa, com osmesmos padres de qualidade de vida em toda aparte. Mas possibilitou que a populao de todo omundo se inteire daquilo que uma eliterelativamente pequena possui, cria e prope emtermos de entretenimento e bem-estar. E que,tambm por este motivo, se assista a uma subida donvel de exigncias, ambies e necessidades.O aprofundamento dos meios de comunicaomudou as nossas vidas no final deste sculo e vaimud-las ainda mais no prximo. O que traragarradas a si inmeras consequncias,nomeadamente aquilo que est implcito no livro TheDeath of Distance, de Frances Cairncross:

    A morte da distncia. A perda da influncia do local. A irrelevncia do tamanho. A derrocada das corporaes mais rgidas e

    pesadas e a afirmao concomitante de redes maispequenas e mais geis.

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    A proliferao e viagem de novas ideias einformaes para os locais mais remotos domundo, e cada vez com maior velocidade.

    A aposta na valorizao das pessoas como recursoltimo e escasso.

    A configurao das sociedades luz da cultura e doaumento da capacidade de divulgao epreservao das heranas culturais. (6)

    No dizer do Relatrio do Desenvolvimento Humano 1999do PNUD, a reduo do espao e do tempo e odesaparecimento de fronteiras esto a ligar as vidasdas pessoas mais profundamente, mais intensamentee mais directamente do que alguma vez antes. Istono apenas significa que pases pequenos eorganizaes de pequeno porte, devido suaqualidade e eficincia, podem figurar nos primeiroslugares do ranking da excelncia e da competitividade;significa sobretudo que passaram a vigorar padres ebitolas internacionais, definidoras da qualidade dascoisas e da vida em todo e qualquer lugar. Acomunicao est e vai continuar a mudar o mundo. Esignifica tambm que, no obstante as tendncias deuniformizao da globalizao, se regista hoje umacrscimo de possibilidades de defesa e afirmao dasculturas locais, nacionais e regionais. (4)Eis aqui sintetizado um conjunto de razes,portadoras de um irrecusvel sentido para justificar,entender e levar cada vez mais por diante acooperao universitria no espao da lusofonia,tendo em vista a internacionalizao e aconsolidao deste espao e da cultura lingustica,cientfica e humanista que lhe est subjacente.

    4. NOMADISMO E VIAGEMDomenico de Masi apresenta uma interessanteementa dos traos distintivos da sociedade ps-industrial ou ps-moderna. Para l do destaque queconfere globalizao e s suas mltiplas formas econsequncias, discorre em torno de umacaracterstica curiosa, qual seja a do jogo entreestes contrrios: nomadismo e sedentariedade,estabilidade e mudana. (2)Segundo De Masi, dentro de cada um de ns, umaparte sente uma espcie de horror ao domiclio fixoe deseja vagar pelo mundo, sem pouso. Uma outrasente a necessidade de ter um lugar para guardar os

    chinelos, um lugar estvel onde possa sempre viver.Portanto o desafio entre o cidado e o nmada, quej dura h muitos sculos, est por concluir.A tese curiosa e devidamente suportada porconstataes de grande solidez e fcil compreenso.Assim sendo, no decurso da histria ns fomosprimeiro nmadas e depois tornmo-nos sedentrios.As primeiras cidades, Ur e Uruk, que atingiram a cifraconsidervel de trinta mil habitantes, surgiramsomente h algumas dezenas de milhar de anos numazona pantanosa entre o Tigre e o Eufrates(Mesopotmia). A coexistncia estvel de tantaspessoas propiciou descobertas prodigiosas: amatemtica, a astronomia, a moeda, a escola, aorganizao piramidal da sociedade, a roda, a carroa.Dali para a frente os centros urbanos, ou seja, oslugares destinados sedentariedade, conheceram umsucesso crescente que, com o advento da indstria,chegou a ser triunfante. Hoje mais de metade dapopulao mundial vive em cidades e esta tendnciade urbanizao vai continuar a aumentar.A sedentariedade parece, pois, ter vencido em todasas frentes, mas o antigo nmada no morre nunca;continua vivo dentro de ns e, quando a gente menosespera, a sua inquietude neurtica desperta do sonopara nos obrigar a sair pelo mundo. A aldeia e oporto, o deslocamento e a caverna convivem e lutamdentro de ns, como necessidades biolgicas herdadasda Pr-Histria e como condies indispensveis aopercurso da civilizao. Foi nos vales e nos portos queo homem fez progressos e foi atravs das plancies edos mares que o progresso se difundiu.Os nmadas nunca construram obras-primas dearquitectura, que requerem anos de vidaestabilizada, mas construram grandes religies esistemas de valores, aperfeioaram o nossoconhecimento do universo estrelado e da terradesolada, elaboraram modelos de vida que seimprimiram para sempre no nosso imaginriocolectivo e que nos levam inquietude. A viagemrepresenta sempre ansiedade e curiosidade. De restoa raiz da palavra viagem travel a mesma detrabalho: sofrimento em funo do sustento, doparto ou de uma vida nova.Ambos o sedentrio e o nmada precisam depontos de referncia: para um o lar estvel, para ooutro um trajecto habitual. Mas o nmada, de

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    acordo com todos os testemunhos, conserva umsegredo de felicidade que o cidado perdeu, e a estesegredo sacrifica a comodidade e a segurana.Para reencontrar este segredo, os cidados sentem-seperiodicamente atiados pelo demnio da viagem.Ento usam como pretexto os negcios ou as frias,congressos, espectculos desportivos, um concertode rock ou uma peregrinao do papa: fazem asmalas e partem. Mltiplos so os motivos, os libis eas sensaes da viagem, mas uma s a profunda everdadeira causa interior que a determina: perseguiro segredo daquela remota felicidade. Realmente avida uma viagem procura da felicidade.O ano 2000 deparou com um mundo em fibrilao.Fervilham as bolsas de valores, o frenesi das viagens,a mobilidade dos postos de trabalho econsequentemente dos lugares de vivncia eresidncia, a confiana nas novas tecnologias quenos oferecero mais cio, a esperana nas novasbiologias que nos concedero maior longevidade e ooptimismo gerado pela nova informtica, que nospresenteia com a possibilidade do convvio global. Atecnologia (telemvel, email, fax) permite, por umlado, que se trabalhe sem sair de casa,economizando assim tempo que era gasto paradeslocamentos quotidianos entre casa e o escritrio.Por outro lado, as exigncias de estudoespecializado, de trabalho e de cultura impem cadavez mais frequentemente a mudana de cidade, depas e continente. Diminuem, portanto, osmicrodeslocamentos, mas multiplicam-se osdeslocamentos de maior raio de distncia e durao.Isto , o nomadismo adianta-se de novo sedentariedade.At Segunda Guerra Mundial, para a maioria doshomens, a nica coisa que causava a separao daprpria terra era o servio militar a tal ponto queos livros sobre viagens tiveram grande sucesso,exactamente por darem ao leitor, sedentrio, a ilusode acompanhar os viajantes com a sua imaginao.Hoje, o que antes sucedia aos diplomatas deslocadospara o exterior, aos funcionrios pblicos que eramtransferidos de sede ou aos emigrantes queabandonavam a sua terra e se transferiam paracidades industriais e para outros pases acontececom executivos, jornalistas, artistas, universitrios,cientistas, intelectuais e desportistas,

    particularmente jogadores de futebol. Afinal decontas, a sociedade ps-industrial fundada nodeslocamento e na reunio de pessoas, mercadoriase informaes provenientes dos lugares maisexticos e distantes.A experincia deste nomadismo gera na nossa menteuma dupla elasticidade: a elasticidade mental, necessriapara perceber e lidar com a diferena entre as pessoas,lugares e momentos, para ver a realidade de ngulosdiversos e para resolver tarefas inditas; a flexibilidadeprtica, necessria para gerir situaes que setransformam, para encontrar o fio que serve de guia aco mesmo num contexto desorganizado, paratransformar os problemas em oportunidades.A vivncia da mudana estimula por sua vez acriatividade. Desde tenra idade, Mozart no fez outracoisa a no ser girar pelo mundo. Cada viagemcontribuiu para enriquecer e refinar o seu espritomusical, at fazer dele o grande gnio que todosreconhecemos nele. Altamente eloquente nestecaptulo igualmente a experincia de viagemrelatada admiravelmente por Ferno Mendes Pintono famoso livro A Peregrinao ou por Pro Vaz deCaminha na sua famosa Carta.Mudar de lugar estimula a criatividade, at mesmoquando os lugares visitados no so muito diferentesdaqueles a que estamos habituados. De resto umsimples passeio ou uma corrida a p, feitos nasproximidades da residncia, valem para provar que odeslocamento torna mais imaginativo e mais sbioquem o realiza.Em suma, superada a secular vida sedentria dosnossos antepassados, s nos resta aproveitar e darsentido ao nosso destino de nmadas ps-industriais, que viagem fsica soubemos aindaacrescentar a viagem virtual na Internet.Mais, nos anos 1000 a Europa era uma plaga debrbaros e voltou-se para o Sul para oMediterrneo, para Bizncio e para o mundo rabe a fim de adquirir os saberes, conhecimentos einstrumentos de cultura e civilizao de que tantocarecia. Hoje toma como pontos de referncia NovaIorque ou Tquio e fecha as portas aos desejados deoutrora, considerando-os terroristas ou agentes deinstabilidade e insegurana. Porm, tal como nopassado, o cenrio actual no inexorvel; umdestino que pode ser mudado. Assim aceitar

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    acriticamente o modelo norte-americano e as suasramificaes como hegemnico e nico equivale aeximir-se obrigao de denunciar as suasperversidades e de procurar caminhos maisconsentneos com o ideal de uma sociedade maisjusta e logo mais humana. E isto no uma utopia,mas antes um dever inalienvel.Confesso que estes apontamentos de De Masi, lidosnas frias do ltimo Vero, me fizeram ver o meupapel de novo nmada. Ajudaram-me a percebermelhor o significado da cooperao universitria e ode uma vida acadmica dedicada a ela. Deram umforte empurro, mas ainda no eram suficientes paraabrir a porta de entrada na desobrigao docompromisso que tinha em mos.

    5. DO APELO DA HISTRIAContudo foi nas ltimas frias que vislumbreialguma luz na minha mente para poder corresponderao compromisso de produzir este texto. No porqueas frias sejam um tempo de cio criativo e como talpropenso a clarear as ideias que nos acompanhamsempre e para todo o lado, portanto para alm doperodo e do local do trabalho. Aconteceusimplesmente que, encontrando-me num hotel nacidade do Recife, fui surpreendido pelo DiscoveryChannel, que dedicou dois dias consecutivos viagemde Vasco da Gama e descoberta do caminhomartimo para a ndia.Pois bem, no programa no apenas vi realada aheroicidade do feito, como foi salientado o seuextraordinrio significado para a histria dahumanidade, para a configurao do mundo, para aemergncia da ideia de universalidade e para olanamento das razes da mundializao e daglobalizao, para o conhecimento e divulgao dadiversidade e riqueza de povos e culturas em que seconcretiza a geografia humana. Os autores doprograma lamentavam ainda o facto de o mundo noreconhecer a grandeza da gesta de um pequeno povoe de no contar Gama no cume da pirmide dosheris universais. E da partia para desfiar razes parao surgimento da nossa cano nacional, que o fado.Mas no se ficava por a o programa. Da boca deindianos, naturais de Cochim, brotava o orgulho deterem no seu sangue alguma colorao lusitana. Ediziam-no no por serem adeptos do colonialismo,

    mas por no poderem calar o quanto de avanosignificou para um povo retalhado em castas, querepresentavam autnticas muralhas de separao, osvalores cristos da fraternidade e igualdade trazidospelos viajantes do Ocidente. Pelo mesmo prisma eracompreendida a rpida expanso do cristianismo noJapo e a restante epopeia dos portugueses realizadapara l da ndia. baila vieram os nomes de FernoMendes Pinto, de Afonso de Albuquerque e deoutros; e aos olhos vieram imagens da sublimearquitectura fsica e humana que os portugueses deantanho ergueram por toda a parte, como o Forte deJesus em Mombaa e os luso-malaios de Malaca. Aocorao aflorou a emoo e alma ou mente ouinteligncia ou razo ou seja l aquilo que for queest dentro de ns e forma a nossa imagem interior,a aflorou o orgulho de ser portugus. De pertencer aum povo que chegou s costas da China cerca de 150anos antes do primeiro ingls. De ser produto deuma cultura que se difundiu por todo o mundo,dando e recebendo, multiplicando-se no acto de semisturar e diluir.Este sentimento no se diz. Vive-se e pratica-se. E assim que cresce e toma conta de ns e conferesentido nossa vida. Tem sido tambm ele aformatar o contedo e alcance da minha entrega causa da cooperao. Tem sido ele a configurar noessencial a minha carreira universitria, as suas nemsempre visveis vicissitudes, os seus sempre muitoagudos altos e baixos.Foi tudo isto e muito mais que senti enquanto aminha imaginao e o meu sonho dobravam oslimites daquele canal e do seu programa e seguiam oitinerrio dos Lusadas. O itinerrio de um povoesperanoso que, desde os primrdios, se aprisionoua ideais messinicos; que, passados mais de duzentosanos sobre a morte de D. Sebastio, uma parte delecontinuava espera da vinda do Rei; que tem aindahoje quem alimente e aguarde a concretizao do Mitodo Quinto Imprio. E que aprendeu com Pessoa que omito o nada que tudo.Foi esta comoo e este apelo da histria que meatiraram mais uma vez para a leitura do livro Trao deUnio, de Torga, procura de amparo e consolo:

    A nossa grandeza nacional consiste em muito, e muitopouco: na colaborao dada magnitude da causa humana,

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    sem alardes e sem desfalecimentos. Actos silenciosos queparecem nadas, e so o pesponto invisvel das civilizaes.Portugal uma presena inconfundvel na crnica domundo. Na anatomia da Europa, figura essa espcie denervo pequeno-simptico, minsculo factor de mutaestranscendentes. Procura-se, e encontra-se com dificuldade,tal a sua insignificncia. Minimiza-se-lhe o valor, e passa-se adiante. Desdenha-se. Esquece-se. E ele continua l,imprescindvel e atento, a viver a sua vida prpria e aintervir na fisiologia do corpo universal a que pertence.Mas essa interveno raramente se realiza atravs dosnotveis portugueses de que a histria universal, de resto,mal regista os nomes. feita por intermdio dum povointeiro, estico e despretensioso, colmeia que ningum querver no seu af ordeiro e sagrado. Povo que dos maispobres da terra, e a quem a terra deve parte do seutamanho e muita da sua significao. (1)

    6. PTRIA COMUMNo creio que os portugueses fossem hoje o que so,se os nossos antepassados no tivessem realizado aaventura dos Descobrimentos. E certamente que osBrasileiros e os Africanos e Asiticos Lusfonos noseriam como so, se os seus e nossos bisavs setivessem acomodado ao lugar de origem. No fundotemos a mesma pertena e provenincia epartilhamos aquilo que mais genuinamente nosdefine. Somos consanguneos no corpo e na alma.Claro que no tenho o gnio de Fernando Pessoapara dizer isto da forma lmpida e definitiva comoele o disse: A minha Ptria a lngua portuguesa.Mas tenho a coragem para dizer o que sinto. E eusinto-me tambm brasileiro. Nunca me sentiestrangeiro, nem por nada nem sequer pelopassaporte, no Brasil. Sempre senti o Brasil como aoutra face da mesma Ptria.Encontrei nele o telrico em corpo inteiro, aexpresso culminante de tudo quanto pe oshomens prova. Um meio desumano que ofereceaos humanos a oportunidade nica de medirem asua virilidade. Tropecei nele com as fragas que umtransmontano, qual Ssifo casmurro e teimoso,carrega toda a sua vida, num representriointerminvel. E que determinam a sua fisionomiafsica, esttica, tica e sentimental: as rugas da pele,o ar faanhudo do rosto angulado e terroso, o corpode ossos granticos, os apertos do corao e as

    contries da conscincia e da alma.No Brasil encontra-se plasmada a elementargeometria lusa das ruas, das casas, dos desejos, dospensamentos e tentaes. To elementar, plstica eproteica que nela todas as transgresses so possveis. tudo isto que me prende a essa terra com amarrasde ternura e paixo. Como se quisesse possuiraquele virginal e maravilhoso continente de verdura,onde vale a pena ser poeta e amante, porquanto hnele muito para cantar e desflorar.L sempre senti e compreendi como estavam certosMachado de Assis e Agostinho da Silva este quepor l andou e deixou vasta obra em filhos eactividade acadmica -, quando afirmaram: Obrasileiro o portugus solta. Como tambm nasminhas idas e vindas aprendi a identificar-meplenamente com Miguel Torga, que em Minas Geraispassou a sua adolescncia:

    H um feitio brasileiro, um modo de ser inconfundvel,como existe a fleuma inglesa ou a finura francesa. E essaqualidade pega-se, contagia, impe-se, conquista osconquistadores. Se tal Dom fruto da miscegenao,bno de Deus ou graa que vem da terra, do ar, daalimentao, pouco importa sab-lo. Segue-se que ele existe,e um poder, uma fora de coeso nacional. Nomes queparecem sados de uma torre de Babel, mas apertados pelomesmo vincilho unificador, escrevem, esculpem,arquitectam, leccionam, pintam, estudam, investigam. E ofruto do seu esforo um milagre brasileiro. esse Brasil polarizador, que tudo digere no seu imensocorpo de gibia, e tudo assimila e tudo revela depois a umaluz tctil, gostosa e macia, que Portugal precisa deconhecer. Um Brasil onde a nossa prpria alma encontradimenses imprevistas, que vo para alm da larguezaespacial das bandeiras, da altura religiosa das misses e docomprimento martimo da saudade. Dimenses do tamanhodum novo humanismo que tem a matriz no porvir.A misso dum portugus culto de hoje, alm da obrigaoconcreta de criar o futuro, compreender o sentido do quefez outrora. Realizar as faanhas que o momento exige, edar volta ao mundo com o pensamento. Ora nas estaesdesse itinerrio mental, a mais demorada deve ser o Brasil. ele o maior trofu do nosso adormecido esprito deaventura; e ele que deve ser o pendo das possveisaventuras do nosso esprito acordado. (1)

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    7. DA MISSO DOS PORTUGUESESAssumo que o grande desafio que se coloca aosportugueses o de realizarmos hoje, com forarenovada e obstinada, as faanhas que realizmosoutrora, na modalidade que o tempo agoracondiciona e permite. Ou seja, irmos s mesmasfricas, s mesmas ndias, aos mesmos Brasis e aomesmo Novo Mundo do nosso achamento edeslumbramento e da nossa transcendncia.Este um projecto que deve mobilizar tambm eparticularmente as universidades. Porque auniversidade no representa apenas uma instituiode formao; representa sobretudo os valores quenos perfazem como nao, como cultura de matrizcrist e catlica e isto no pode ser visto como desomenos importncia para a afirmao e preservaoda nossa identidade. uma configurao docompromisso de aproveitarmos o presente paraactualizar o passado e para projectar e construir ofuturo. Mantendo-se fiel grandeza das gentessimples que lanaram os caboucos do nosso Pas. Degentes que, na sua grande maioria, no sabiam ler.Nem escrever. Sabiam to somente rezar eencomendar a Deus os sonhos e ambies geradospela necessidade e alimentados pela esperana.De gentes que no tinham cincia dos cus, nem dosmares. Porm, armadas de receios e temores,disfarados em preces, promessas e oraes, econfiadas na estrela do seu fado fizeram-se aodesconhecido e ao destino. Transformaram aincerteza, o risco e o perigo em tentao e emaventura e fascnio de navegar. E assim cavadores elenhadores deram marinheiros, missionrios edescobridores. Estiveram na histria e fizeram ahistria. A sua, a do homem e a da civilizao. E,com o preo do sangue e da vida, desenharam omapa do Mundo e as fronteiras da independncia donosso Pas. E legaram aos vindouros o dever deconservarem a memria dos seus feitos e dehonrarem o exemplo da sua dignidade. De nodelapidarem esse patrimnio.Valemo-nos mais do corao do que da cincia natravessia e desenho dos oceanos. Visitamos o mundotodo e arredondamo-lo nas mentes coevas. Com asnaus e caravelas a ranger e adornar com o peso domistrio e da dvida e no tanto com o das riquezase especiarias.

    Experimentamos o medo na coragem de enfrentar oAdamastor, o perigo e o abismo do oceano. Dedobrar o Bojador e as Tormentas, de passar apertos eestreitos. Para que o grito da dor desse lugar ao hinoda alegria. O grunhido desse a vez ao sorriso. Oolhar grosso de animal evolusse para curiosidade eadmirao. E Deus espelhasse nas brumas do mar aluminosidade do cu.Vimos um povo misturar-se e prolongar-se nadiversidade de caras e cores. Como se a sua missotivesse o propsito de desvalorizar as teses racistascontra os povos miscegenados. Vimo-lo misturar-separa ser uma espcie de expresso do que ahumanidade. Traando no mar e em terra rotas dedescoberta recproca de homens e culturas. Ligandoo orbe num fluxo migratrio constante e lanando asemente da solidariedade universal.Encheram-se de sangue luso as veias dodesassossego que mandaram Fernando Pessoameditar e perguntar em todas as direces. Quantasmes choraram, quantas noivas ficaram por casar,quantas lgrimas se converteram em sal? Para que omar unisse e j no separasse. Ter valido a pena?E uma alma levantou-se a responder, adquirindo otamanho do mundo. E transpondo todos os limitesespaciais e conhecendo todas as longitudeshumanas. De olhos grandes, com o globo inteirodentro dela. Passar de atlntica a universal. Atingir aplenitude medida da inquietao infinda.Cantando, rezando e dialogando numa lngua queanda, h oitocentos anos, a dar voz ao mar, a lanarnele aumentado o apelo menor que dele vinha. E adar na poesia visibilidade ao incognoscvel, sangstias e dramas, s emoes e sentimentos, aosofrimento e esperana.Sim, da esperana fizemos a grande arma do nossoarsenal e da ternura da fala a estratgia daconvivialidade. Por isso temos idade avanada, masparecemos uma criana. Deixamos para trs apequenez e finitude do mar grego e romano eabrimos ao infinito a linha do horizonte, mas semdeixarmos crescer os plos da soberba no corao.Manuel Patrcio, ilustre pedagogo da Universidadede vora, de Portugal e do Mundo figura insigneque eu quero trazer a este texto em sinal de preitoe homenagem sustenta firmemente quenenhuma educao valiosa se no for

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    eminentemente nacional, se no conjugar namesma linha o esprito patritico e o humano.Porquanto o amor Ptria, em sendo puro, temcomo horizonte mximo o humano. (7)Do mesmo modo se a educao tem de ser situada, sesomente o universal concreto deve mobilizar osnossos esforos e energias, ento em hora histrica deintegrao europeia e de ampliao dos horizontes daglobalizao, mais se justifica que no abdiquemosde ser quem somos, que cultivemos a nossaidentidade, pacificamente mas determinadamente, eque o faamos em particular na educao. Na escolae na Universidade, acrescento eu.Ora a nossa identidade , desde sempre, a de seresmisturados, feitos pela miscegenao, abertos tolerncia e assimilao tanto daquilo que nos afimcomo daquilo que nos alheio. Foi com esta atitudeque abrimos os mares do mundo e que demos esteao conhecimento e permuta e no com umamentalidade de conquista, de subjugao e rapina.Esta identidade nacional s por si uma cultura, queexige que se eduque e actue por fidelidade a ela.Logo preciso que sejamos activos, procurando dareste sentido nossa aco e actividade. Dar estesentido ao presente e preparar e organizar, tambmsegundo ele, o futuro para alm da durao curta eapressada das nossas vidas individuais.O poeta Antnio Gedeo disse-nos que o sonhocomanda a vida. Mas viver no dormncia einaco. Por isso sonhemos, mas faamos, investindoa nossa capacidade de agir no mundo real,orientados pela nossa cultura de cidados do mundoque inventamos. Sigamos mais uma vez o conselhoavisado de Manuel Patrcio:

    O novo milnio no nos vai ser servido numa taa, ficandopara ns apenas consumi-lo. O novo milnio vai ser, emgrande parte, obra nossa; vai ser, em grande parte, o quefizermos dele, o que nele pusermos da nossa capacidadecriadora e da nossa conscincia tica e, genericamente,axiolgica. Neste sentido, o novo milnio pode ser muitascoisas, pode ter muitos contedos, pode realizar muitos ediversos valores, pode ter mais do que um e nico sentido,pode desdobrar-se em numerosas ou inmeras direces. imperativo querer. imperativo escolher. imperativonavegar e no apenas, fatalisticamente, boiar. (7)

    Tal como no passado, urge que naveguemos paradiante, para o futuro. Mas no mais segundo ocapricho dos ventos. Navegar hoje preciso, pormseguindo o curso dos afectos e do sangue, para lhesdar sentido e destinao. Porque somoshumanamente o sal da terra e poeticamente asuperpotncia do mundo.A mensagem do Quinto Imprio de Vieira e de tantosoutros ressurge a guiar-nos como um novo astrolbio.Pede que construamos novas caravelas econvoquemos todos os navegadores da lucidez e dasabedoria de sermos um em todos os dois e outrosem que nos multiplicamos. E que, crentes na Prece deFernando Pessoa (8), prossigamos a viagem at ao fim:

    Senhor, a noite veio e a alma vil.Tanta foi a tormenta e a vontade!Restam-nos hoje, no silncio hostil,O mar universal e a saudade.

    Mas a chama, que a vida em ns criou,Se ainda h vida ainda no finda.O frio morto em cinzas a ocultou:A mo do vento pode ergu-la ainda.

    D o sopro, a aragem ou desgraa ou nsia -,Com que a chama do esforo se remoa,E outra vez conquistemos a Distncia Do mar ou outra, mas que seja nossa!

    E os mares da nossa sensibilidade rejubilaro, por severem sulcados pela ternura de mos, que fazemriscos, traos e composies numa tela como quemcria olhos, beijos e sonhos na face de uma criana.Pouco a pouco, do canto da penumbra, a Lusofoniaemerge e avana para o centro dos olhares. Como belo o seu resplendor!

    8. DA CULTURA COMUMJ o disse, a nossa cultura tem a marca da abertura.Fez-se ganhando contedo e forma na dissoluo emistura. Completando-se fora de si mesma, animadamais pela apetncia da assimilao do que pela sededa destruio dos elementos alheios. Fundada nolirismo franciscano e na disposio de confraternizarcom o novo e o extico nos planos religioso, tico,social, cultural e natural, sem abandonar o familiar e

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    prosaico. Na aptido para acrescentar, ao lastrotradicional, valores indgenas de natureza africana,americana e asitica.Esta marca patente at na fisionomia inconfundveldas cidades da expanso lusitana. Nelas nopredomina a geometria da linha recta, da rgua, doesquadro e do compasso a esventrar o territrio. Aocontrrio da urbanizao castelhana, derramam-sepor encostas, ladeiras e baixadas, desenhando umacoreografia de curvas e sinuosidades casadas com osrelevos da natureza.H por isso nas paragens da nossa errncia histricaum panlusismo de sinais e sentimentos. Expresso nansia de caminhos perdidos, na procura eterna deum ponto de apoio, de uma directriz e de um idealinacessveis. Numa msica inundada de acentosnostlgicos e de saudade sem fim. Numa arte detodos os sentidos, feita de deuses humanos, deNossas Senhoras grvidas do , de santoscasamenteiros, de figuras anglicas contracenandocom o diabo. Numa culinria de petiscos, gostos esabores incomparveis. Numa vida de prazerespequenos e frugais, mas imensamente saborosos ehumanos. No desbragamento e no calo dalinguagem, na maledicncia e mordacidade dasanedotas e ditos populares que no poupam nadanem ningum. Na poesia que nos transporta para oalto, sem trair a fidelidade terra; que nos eleva oesprito para compensar as desditas do corpo.Enfim, partilhamos uma tradio religiosa muitomenos rgida e atormentadora do que a calvinista,uma relao com o trabalho e o cio que no sepauta pela dureza da tica protestante, uma culturacom inclinao para a msica, para a poesia, para orepouso, para a introspeco, para a alegria e para aconvivialidade. Est nas nossas mos aresponsabilidade de converter este patrimnioherdado do passado em fonte de riqueza e deinspirao para o futuro. Algum poder negar a estatarefa a entrada na universidade e deixar de ver agrandeza e o extraordinrio alcance que ela encerra?Dir-me-o que a existncia de um trao distintivo emarcante da nossa identidade cultural e humana nopassa de uma miragem. No sei responder por contaprpria a essa objeco. Mas tenho mo eabundantes contraposies de Pessoa, de VerglioFerreira, de Torga e muitos mais. Porm prefiro

    recolher-me proteco de Jorge Amado, a um textointitulado Fronteira Portugal X Espanha, 1976 diferenas, no qual d um testemunho deveraselucidativo:

    Vamos no rumo da Espanha, sob o sol do vero, a famliatoda. Comentamos as diferenas de carter e costumes entreos dois povos da pennsula, a melancolia portuguesa, adramaticidade espanhola.Lemos nos muros slogans ainda numerosos, restos daprofuso com que a liberdade encheu as paredes nas cidadese nos campos aps a Revoluo dos Cravos. O sol raiarpara todos, escrevera o anarquista, algum, ctico, rabiscouem baixo: E nos dias de chuva? Rimos, a polmica corts:gente amorosa a lusitana gente.Atravessamos a fronteira e logo adiante, numa aldeia, adeclarao ocupa toda a murada de um terreno plantadode hortalias: te odio, te odio y te odio! A quem serdedicado tanto dio, trs vezes repetido e ponto deexclamao? Estamos na Espanha, a violncia e o desforosubstituem a cortesia: nos slogans as diferenas de cartere de costumes. (9)

    Poderia recorrer ainda ao mesmo autor e ao seutexto Sagres, 1976 good:

    Desembarcamos da carrinha, tomo da mo de Paloma,avanamos pelo espao amplo diante do mar do InfanteDom Henrique, mar das descobertas, oceano. O resto dafamlia vem mais atrs na animao da conversa.Gordssimo, nunca estive to gordo, no vero de turismovisto bermudas, camisa do Havai, flores vermelhas e azuis,sandlias exibindo o dedo do p, bon de marinheiro,ianque em frias. No caminho uma barraca de guloseimas,frutas secas, nozes, avels, amndoas, tmaras, tanta coisade apetite. Paro a admirar, o dono do negcio me encarainteressado, na esperana de boa venda, mondrongo retaco,parrudo, meia-idade. Tiro um figo do monte, mordo,saboreio, escapa-me um suspiro. O vendedor acompanhacom os olhos a mastigao do norte-americano em suafrente: a pana e a gula. Good? pergunta-me em seu ingls comerciante. Good! repito, afirmativo.Em torno riem com o dilogo, riem ainda mais quando eleme mede de alto a baixo: Ests gordito, hem, filho da puta?O riso nos assalta, a Paloma e a mim, por pouco me

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    engasgo. Paloma, contida a gargalhada, comenta alto: Ele pensa que s americano, pai! Ai que so brasileiros! geme o vendedor.Encomendo quilos de frutas secas, figos, avels, tmaras deminha paixo. Leitores se aproximam, caneta em punho,pedem autgrafos, o dono da barraca no sabe para onde sevirar: Ai que o gajo artista de cinema! (9)

    A minha confiana na grandeza espiritual, moral ehumana do legado cultural de matriz lusfonacimenta-se ainda mais ao ler a obra prima que opoema Calabar do brasileiro Jorge de Lima:

    Domingos Fernandes Calabareu te perdo!

    Tu no sabiasdecerto o que fazias

    filho cafuzde sinh ngela do Arraial do Bom Jesus.

    Se tu vencesses, Calabar!Se em vez de portugueses, Holandeses!?Ai de ns!

    Ai de ns sem as coisas deliciosasque em ns moram:

    redes,rezas,novenas,procisses,

    e essa tristeza Calabar,e essa alegria danada, que se sentesubindo, balanando a alma da gente.

    Calabar, tu no sentisteessa alegria gostosa de ser triste!? (10)

    9. EM JEITO DE BALANOSim. Julgo que foi assim que partimos do Porto em1986 para esta nova aventura. Guiados pelo relatode Caminha e pelo esplendor da sua luz deanunciao de uma nova terra e de uma novaHumanidade. E inspirados no humanismofranciscano daquele primeiro e sempre renovadoencontro. Fizemos ancoradoiro em muitasparagens, com a convico de que no havia gniossuperiores entre ns, mas havia pessoas de modestae humana condio e de boa f, s conscincia erecta inteno. Por certo com muitas insuficinciase fraquezas, mas tambm com as virtudes doentusiasmo e generosidade transbordantes a daremflores ao presente e frutos ao futuro.No podem calcular o que vai c por dentro emtermos de comoo, de orgulho, de gratificao, dereconhecimento e gratido. Talvez percebam melhorse terminar este depoimento como o comecei ecomo iniciei e sempre me tenho sentido nacooperao com o Brasil. Fazendo minhas aspalavras de Torga e a emoo que a textura dassuas letras: Diante da carta de Pro Vaz de Caminhaat me vieram as lgrimas aos olhos.E a mim tambm, quando cheguei pela primeira vezao aeroporto do Rio de Janeiro e escutei o portugusduro e terroso de Portugal feito doce no Brasil. Eouvi ditas na nossa lngua a sublimidade do Po deAcar e as bnos do Corcovado. Ecoandoaumentadas no Pantanal e nos confins da Amaznia.Porventura lero ainda melhor o meu estado de almase confessar que hoje a minha identidade encontraconfigurao no lema do Real Hospital Portugus deBeneficincia em Pernambuco:

    Portuguscom muito orgulho

    Brasileirocom muito amor.

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    BIBLIOGRAFIA

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    PREMBULOO texto que a seguir se apresenta constituiu a lioproferida durante a cerimnia de atribuio do Graude Doutor Honoris Causa pela Universidade Pedaggicade Moambique em 5 de Novembro de 1997.Dissemos na altura, e reafirmamo-lo agora, que esteacto constituiu o reconhecimento pblico pelaUniversidade Moambicana do contributo que anossa Faculdade tem vindo a prestar cooperaocom Moambique.No seria justificado aqui o enunciado fastidioso doque tem sido a nossa cooperao com frica e emparticular com a Faculdade de Cincias da EducaoFsica e Desporto da Universidade Pedaggica deMoambique nos ltimos 15 anos. Brevemente,numa iniciativa conjunta das duas Faculdades com acolaborao do Centro de Estudos e FormaoDesportiva do Instituto Nacional dos Desportos,dar estampa um extenso volume que apresentarde forma mais circunstanciada os resultados dacooperao.Tendo a actualidade que se perceber, a lio queento proferimos permitir conhecer melhor oscontornos da poltica de cooperao da nossaFaculdade com frica que, no caso de Moambique,tem sido considerada um exemplo a seguir noutrospases africanos.Resta dizer que a cooperao s possvel quandoh interesse e empenhamento de das partes. Nunca anossa Faculdade teria levado to longe a cooperaosem a coeso de uma escola em torno de umprojecto animado pelo Doutor Antnio ManuelPrista e Silva, verdadeira alma mater da Faculdadenossa parceira neste projecto.

    Sr. ReitorSr. Ministro da EducaoSr. Ministro da Cultura, Juventude e DesportosSr. Embaixador de PortugalColegasMinhas senhoras e meus senhores

    Quero comear por agradecer UniversidadePedaggica de Moambique to elevada distino.Entendo-a como um tributo a um singelo masempenhado esforo de cooperao que a minhaFaculdade e os meus companheiros vm fazendo noapoio jovem Faculdade de Cincias da EducaoFsica e Desporto deste pas.De acordo com a tradio acadmica deve ohomenageado proferir uma lio. isso queprocurarei fazer, elegendo como tema da minhaexposio a cooperao universitria entre pasesdesenvolvidos e pases em desenvolvimento. aindaneste contexto que procurarei situar algunsproblemas da Educao Fsica e do Desporto.

    LIMITES E CONTORNOS DACOOPERAO UNIVERSITRIAA cooperao tem sido objecto das minhaspreocupaes ao longo de quase toda a minha vidaacadmica. Interesse que saiu reforado durante osoito anos em que assumi funes de director naFaculdade a que perteno.Foi neste quadro que lanmos, perfazem-se agoradez anos, conjuntamente com o Doutor Jorge Bentoe os Doutores Alfredo Faria Jnior e RobertoFerreira dos Santos da Universidade do Estado doRio de Janeiro, as bases de um importante projecto:um movimento de cooperao entre as universidades

    Antnio T. MarquesFaculdade de Cincias do Desporto e de Educao Fsica, Universidade do Porto

    frica: o outro vrtice do tringulo

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    e escolas de educao fsica e desporto dos pases deexpresso portuguesa. Projecto que encontra a suamanifestao mais visvel na realizao do Congressode Educao Fsica dos Pases de Lngua Portuguesa,que este ano teve lugar nesta cidade de Maputo.Um congresso que, agora em 6 edio, tem vindo apromover um desgnio: aproximar pessoas einstituies que tm no centro das suas preocupaeso estudo do Desporto e da Educao Fsica, afirmandouma comunidade cientfica no espao de uma lnguacomum a lngua portuguesa. (1)Uma lngua que d voz a comunidades nas setepartidas do mundo. Constituindo-se como veculo decomunicao entre um dos grupos populacionais maisnumerosos do planeta, de que Angola, Brasil, CaboVerde, Guin, Moambique, Portugal, So Tom ePrncipe so apenas os contornos mais visveis.Uma lngua de superao das barreiras daincompreenso, de abertura de um grande e vivoespao de dilogo, de cooperao, de fraternidade.Como dizia uma figura insigne da minhauniversidade, o Professor Nuno Grande, a propsitodo 2 Congresso de Educao Fsica dos Pases deLngua Portuguesa realizado na cidade do Porto em1991: Percorremos juntos largos perodos daHistria, vivendo momentos de glria e de exaltaodos valores da civilizao; sofremos tambm aamargura das imposies das foras retrgradas, quetentaram cavar entre ns os fossos de incompreensoe do dio. Sinto que aos universitrios compete opapel de ultrapassar as incompreenses e osdiferendos tornando possvel o dilogo aberto entretodos os que tm a responsabilidade de conduzir osdestinos dos povos.Este tambm o sentido substantivo das nossasmotivaes, no que constitui um desafio exaltante,estimulante, mobilizador. Melhor interpretado peloreitor da Universidade do Porto, o Professor AlbertoAmaral, que tem vindo nos ltimos anos adesenvolver um grande esforo deinternacionalizao da universidade, num estreitocomprometimento com os princpios da MagnaCarta das Universidades Europeias: Depositria datradio do humanismo europeu, mas com apreocupao constante de alcanar o saber universal,a Universidade, para assumir as suas misses, ignoraas fronteiras geogrficas ou polticas e afirma a

    necessidade imperiosa do conhecimento recproco eda interaco de culturas.E se o empenhamento na internacionalizaotranscende, em muito, o espao da lnguaportuguesa, na realizao deste desgnio notriauma clara e determinada aposta nas relaes com osjovens pases africanos de lngua portuguesa.Sem quaisquer intuitos neo-colonizadores, assim ocremos. E tambm sem quaisquer complexos decolonizados, assim se espera. imperativa anecessidade de consciencializao de uma novaatitude, volvidos os anos de maiores dificuldades ede incompreenso recprocos. Torna-se necessriosuperar as marcas de um passado de colonizaoenvergonhada, a pequenez poltica, os entravesfinanceiros e os jogos de influncia... (10, pg. 37)que tm prejudicado gravemente as relaes entreos nossos povos.Compreendemos Mia Couto quando diz que ascoisas no esto resolvidas. Que no chegamos aindaa uma relao amigvel e franca. Que ainda nopercebemos Moambique.Os prprios moambicanos no tero ainda entendidoos mundos diferentes que compem Moambique, aque Mia chama um pas sem imagem. (9)Mas devemos esforar-nos para que isso possaacontecer. E possa acontecer, como diz Craveirinha,Prmio Cames em 1991 e, no dizer de SamoraMachel, o grande poeta nacional de Moambique,sem desvalorizar o conquistado por sculos deconvvio. Antes emprestando a este novorelacionamento novos contornos no sentido de umaaceitao mtua. (9)Saibamos superar, de vez, estas barreiras ecompreender melhor os novos contornos da histria.Sem ignorarmos ou esquecermos uma vez maisMia Couto que falar em cultura comum j umdisparate e que mesmo para a lngua, criamosmiolos diferentes. (9)A relao histrica de Portugal com povos de todosos continentes determinou possibilidades de dilogoentre culturas muito diferentes e ricas. Essacomunicao faz-se na lngua portuguesa, umalngua pluricontinental, multitnica, multicultural eplurireligiosa, que se constitui como uminstrumento privilegiado de dilogo.Este o sentido maior de possuirmos uma lngua

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    comum. Uma lngua dinmica, moldvel,enriquecida com os miolos que cada povo lhe vaiacrescentando e que nos permitir estabelecer oscontornos de uma nova e diferente relao.Estamos na cooperao para cooperar, perdoem-nosa redundncia. Desde o seu incio, o nossoenvolvimento na cooperao foi no apenassolicitado, mas concertado nos mais pequenosdetalhes com quem o solicitou. claro que essa solicitao foi feita num contexto deconhecimento recproco, em relaes acadmicasanteriormente estabelecidas. claro ainda, e aqui o afirmamos, que acreditamos nadiversificao das relaes. Significando isto que noapenas entendemos ser uma prerrogativa de qualqueruniversidade escolher os companheiros de viagem, osparceiros da cooperao, como h vantagens em quediferentes parceiros influenciem o entendimentosobre a universidade e o trabalho nas universidades.Como diz Carlos Pimenta Por muito completa queseja uma universidade, (...) com especialistas emmltiplas reas do saber, seria de um provincianismocastrador admitir-se que sozinha teria forassuficientes (...) para abarcar a grande diversidade depossibilidades de cooperao. (10, pg. 40)Tambm no ignoramos as condies em que acooperao entre os pases desenvolvidos e os pasesem desenvolvimento se tem feito. As reservas,desconfianas e mal-estar que tem motivado.Partilhamos da opinio do pr-reitor daUniversidade do Porto para a Cooperao com fricaquando sustenta que (...) urgente banir aconcepo de que ns cooperamos com os PALOPpara os ajudar e que uma cooperao sria,produtiva, com efeitos multiplicadores, supe uminteresse mtuo, um interesse institucional daspartes envolvidas. (10, pg. 38)A cooperao no se far sem um suporteinstitucional. Mas, acreditamos numa coisa. Diz-nosa experincia, que resultar vantajoso para acooperao que esta possa basear-se numconhecimento slido, numa estreita ligao entre oscooperantes. Sem o que continuar, porventura, afazer-se, mas no com os mesmos resultados.H companheiros nossos de outros pases, pessoasque temos em elevada considerao, que falam, apropsito das relaes universitrias entre pases

    mais e menos desenvolvidos, em fortalecimento daideologia do internacionalismo cientfico. (4)Segundo esta perspectiva, as naes seriamavaliadas em termos de ascendncia e declnio,proeminncia ou inferioridade, independncia oudependncia cientfica. Assim, a cincia constituiriapara muitos estados um meio de assegurar prestgioe estatuto internacional. No que constituiria umasubtil mas manifesta forma de imperialismo.(ibidem, op. cit)Neste contexto, muitos pases do chamado terceiromundo seriam induzidos a seguir os modelos dospases desenvolvidos. O que relegaria para um planosecundrio outros problemas mais relevantes,desencorajando a escolha de agendas e tpicos maisteis e mais fortemente vinculados ao contexto e problemtica de cada pas. (ibidem, op. cit)Conhecemos o problema, e tambm o contexto emque estas afirmaes so produzidas. Julgamos noser essa, no entanto, a nossa forma de estar nesterelacionamento com a Universidade Pedaggica.Outros melhor do que ns, no entanto, avaliaroessa participao.Portugal no alis, como sabido, um exemploacabado de pas desenvolvido, embora a sua histriae cultura tenham uma importncia ao nvel da deoutros grandes estados e povos europeus.No vamos discutir a ideologia na cooperaouniversitria. As coisas so como so e os pases queparticipam em programas de cooperao conhecemhoje bem as circunstncias em que ela se faz, a partirde mil e um exemplos concretos.Todavia, assim como no h pases emdesenvolvimento, em abstracto, tambm no hpases desenvolvidos, no abstracto. Significandoisto que os estados no tm necessariamente ummesmo entendimento e prtica da cooperao. E,tambm, nem s dos estados vive a cooperao.Julgamos mesmo que nas relaes de cooperaocom os novos estados africanos, ex-colniasportuguesas, no ser difcil encontrar exemplos deenvolvimentos diferentes, de diferentes atitudes noprocesso de cooperao.No devemos por isso entender, apenas, ointercmbio cientfico e ou universitrio como uminstrumento de expanso cultural, penetraopacfica ou propaganda poltica. (4)

    frica: o outro vrtice do tringulo

    Revista Portuguesa de Cincias do Desporto, 2001, vol. 1, n 1, 2328