52
Confiança expressa em uma nota Agências de classificação de risco: como funcionam e para que servem como funcionam e para que servem Confiança expressa em uma nota ECONOMIA & DESENVOLVIMENTO PARA OS NOVOS TEMPOS EDITORIAL ANO 39 – Nº 279 – Janeiro/Fevereiro de 2015

Rumos 279

Embed Size (px)

DESCRIPTION

Revista Rumos - Janeiro/Fevereiro de 2015

Citation preview

  • Confianaexpressaem uma nota

    Agncias de

    classificao de risco:

    como funcionam

    e para que servem

    como funcionam

    e para que servem

    Confianaexpressaem uma nota

    E C O N O M I A & D E S E N V O LV I M E N T O P A R A O S N O V O S T E M P O S

    EDITORIAL

    AN

    O 3

    9

    N

    27

    9

    Ja

    ne

    iro

    /Fe

    ve

    reir

    o d

    e 2

    01

    5

  • m ano comea e novas expectativas surgem. cedo para

    falar, mas 2015 j desponta com desafios na rea econmi-

    ca, o que mostram os artigos do ex-ministro Delfim Net-

    to e de Andr Perfeito, economista-chefe da Gradual

    Investimentos. Os pequenos negcios e as cooperativas tambm precisa-

    ro de criatividade e de estratgia para enfrentar os meses que prometem

    ser de restrio ao crdito, como apontam a reportagem e o artigo sobre

    o tema. Mas os ajustes econmicos no so novidade no cenrio interna-

    cional, cujas economias ainda no se recuperaram plenamente da crise de

    2008. Naquele ano, instituies que avaliam a sade financeira de bancos

    e pases pelo mundo estiveram no centro dos debates quando as notas

    que emitiam no conseguiram capturar a quebradeira que se seguiria... As

    agncias de classificao de risco, como so chamadas essas instituies,

    so o tema da reportagem de capa; entender como funcionam e para que

    servem os graus de investimento (ratings) emitidos permite compreender

    melhor o funcionamento das instituies financeiras e conhecer como

    construda a nota dada a empresas e organizaes. So anlises comple-

    xas que sinalizam para o mercado financeiro a capacidade da empresa de

    honrar ou no seus compromissos.

    O ajuste fiscal no figura sozinho na agenda do dia, a crise hdrica,

    vista em um espectro maior de preservao da natureza o tema da

    entrevista com o advogado Eduardo Felipe Matias, que mostra que o ini-

    migo a vencer nesse tema o prprio homem e sua conduta no mundo.

    Boa leitura!

    UAO LEITOR

    Seo

    RUMOS 3 Janeiro/Fevereiro 2015

    S SUMRIO

    FOMENTO46

    30

    MICRO E PEQUENAS

    12Ateno e cautela

    ECONOMIA

    Novo governo

    Superar os preconceitos10OPINIO

    Risco

    A confiana expressa

    em nmeros

    REPORTAGEM CAPA

    Edio 2014

    Incentivo criatividade42PRMIO ABDE

    Ed

    du

    Fe

    rra

    ccio

    li

    4EXPERTISE

    Economia criativa e

    cidades: reinveno

    permanente

    Ana Carla Fonseca

    22REPORTAGEM

    Gesto

    Mais integrado

    LIVROS48

    18ENTREVISTAEduardo Felipe Matias

    Engajamento para uma

    nova realidade

    28EXTREMO SUL

    Feira de oportunidades

    Agronegcio

    38REPORTAGEM

    Balano

    BDMG expande e

    diversifica atuao

    Ch

    arl

    es D

    am

    asce

    no

    No

    el Jo

    aq

    uim

    Fa

    iad

    16ARTIGO

    Novo ano

    Oportunidades do cooperativismo

    financeiro em cenrio econmico

    adverso

    40PELO MUNDO

    Organizao

    O Sistema Nacional

    de Fomento Mexicano

    25EM DIA

    A construo de uma infraestrutura

    financeira

    Andr Perfeito

    44PRMIO ABDE

    Financiamento do Desenvolvimento

    Programa Renova SP: Financiamento para renovao

    da frota de caminhes

    Avaliao do planejamento

    estratgico numa instituio

    pblica a partir do

    Balanced Scoredcard: O caso BRDE

    Excelncia em gesto

    8REPORTAGEM

    Expanso

    Complexo de sade

  • RUMOS 4 Janeiro/Fevereiro 2015 RUMOS 5 Janeiro/Fevereiro 2015

    Economia Criativa

    provavelmente um dos

    termos mais

    interessantes, charmosos

    e pouco compreendidos

    dos ltimos tempos.

    Simplificando, pode-se

    dizer que a criatividade

    um recurso econmico de

    valor inestimvel, que

    pode se converter em

    dinheiro, realizao e

    bem-estar, desde que

    sejam criadas condies

    para isso. Para saber

    como a Economia Criativa

    pode contribuir com o

    desenvolvimento das

    cidades brasileiras, Rumos

    conversou com a

    especialista Ana Carla

    Fonseca, referncia

    quando o assunto

    Economia, Cidades e

    Negcios Criativos. Dona

    de um currculo

    impressionante, Ana Carla

    foi apontada pelo jornal El

    Pas, em 2013, como uma

    das oito personalidades

    brasileiras que

    impressionam o mundo.

    Por Ana Redig

    A

    EEX

    PE

    RTIS

    EEconomia criativa e cidades: reinveno permanente

    Ana Carla Fonseca

    Ana Carla Fonseca doutora em Urbanismo pela

    Universidade de So Paulo e autora da primeira tese no

    pas sobre cidades criativas.

    Ed

    du

    Fe

    rra

    ccio

    li

    Div

    ulg

    a

    o

  • RUMOS 4 Janeiro/Fevereiro 2015 RUMOS 5 Janeiro/Fevereiro 2015

    Economia Criativa

    provavelmente um dos

    termos mais

    interessantes, charmosos

    e pouco compreendidos

    dos ltimos tempos.

    Simplificando, pode-se

    dizer que a criatividade

    um recurso econmico de

    valor inestimvel, que

    pode se converter em

    dinheiro, realizao e

    bem-estar, desde que

    sejam criadas condies

    para isso. Para saber

    como a Economia Criativa

    pode contribuir com o

    desenvolvimento das

    cidades brasileiras, Rumos

    conversou com a

    especialista Ana Carla

    Fonseca, referncia

    quando o assunto

    Economia, Cidades e

    Negcios Criativos. Dona

    de um currculo

    impressionante, Ana Carla

    foi apontada pelo jornal El

    Pas, em 2013, como uma

    das oito personalidades

    brasileiras que

    impressionam o mundo.

    Por Ana Redig

    A

    EEX

    PE

    RTIS

    E

    Economia criativa e cidades: reinveno permanente

    Ana Carla Fonseca

    Ana Carla Fonseca doutora em Urbanismo pela

    Universidade de So Paulo e autora da primeira tese no

    pas sobre cidades criativas.

    Ed

    du

    Fe

    rra

    ccio

    li

    Div

    ulg

    a

    o

  • RUMOS 6 Janeiro/Fevereiro 2015 RUMOS 7 Janeiro/Fevereiro 2015

    EX

    PE

    RTIS

    E

    No conheo nenhum

    caso bem-sucedido de

    transformao urbana

    que tenha vingado sem

    a participao do trip

    governo, setor privado

    e sociedade civil,

    j que cada um

    desempenha papis

    e tem interesses muito

    complementares.

    a essncia

    de tudo; novos produtos, servios,

    processos e olhares com valor

    percebido, resoluo de problemas e

    aproveitamento de oportunidades.

    av o on :Iexn oo :C

    entre pblico e privado, entre as

    reas da cidade, evitando bolses de

    criatividade em detrimento de uma

    considerao sistmica da cidade,

    entre sua histria e sua viso de futuro,

    entre ela e suas cidades vizinhas

    e o redor do mundo

    tul rau :C

    pelo que traz de mais identitrio,

    por seu impacto econmico e por

    ajudar a formar um ambiente propcio

    criatividade.

    CIDADE CRIATIVA

    na Carla Fonseca escreveu livros ino-

    vadores, como Marketing Cultural e Financia-

    mento da Cultura (2002), Economia da Cultura e

    Desenvolvimento Sustentvel (Prmio Jabuti

    2007) e Cidades Criativas (primeiro livro bra-

    sileiro sobre o tema e finalista do Prmio

    Jabuti 2013); e concebeu e editou livros

    digitais globais, como Economia Criativa

    como Estratgia de Desenvolvimento

    (2008) e Cidades Criativas Perspectivas

    (2009).

    Ela criou projetos de impacto em econo-

    mia e cidades, a exemplo de Criaticidades e

    Sampa CriAtiva e foi consultora do Creative

    Economy Report (ONU), em 2008 e 2013.

    Por 15 anos liderou projetos em multinacio-

    nais na Amrica Latina, em Londres e Milo,

    experincia que a capacitou para se tornar

    assessora para a ONU sobre o tema, alm de

    ser consultora e conferencista em cinco

    lnguas e 28 pases. curadora de congres-

    sos internacionais, diretora de Contedo da

    ExpoGesto e membro do Corpo Mundial

    de Peritos da Unesco, dos Repensadores,

    dos conselhos da Pgina 22, da Virada Sus-

    tentvel, da Creative Industries Develop-

    ment Agency (Inglaterra) e jurada da Creati-

    ve Business Cup (Dinamarca). Venceu o

    Prmio Claudia 2013, em Negcios.

    Criatividade A

    Ana Carla Fonseca

    Div

    ulg

    a

    o

  • RUMOS 6 Janeiro/Fevereiro 2015 RUMOS 7 Janeiro/Fevereiro 2015

    EX

    PE

    RTIS

    E

    No conheo nenhum

    caso bem-sucedido de

    transformao urbana

    que tenha vingado sem

    a participao do trip

    governo, setor privado

    e sociedade civil,

    j que cada um

    desempenha papis

    e tem interesses muito

    complementares.

    a essncia

    de tudo; novos produtos, servios,

    processos e olhares com valor

    percebido, resoluo de problemas e

    aproveitamento de oportunidades.

    av o on :Iexn oo :C

    entre pblico e privado, entre as

    reas da cidade, evitando bolses de

    criatividade em detrimento de uma

    considerao sistmica da cidade,

    entre sua histria e sua viso de futuro,

    entre ela e suas cidades vizinhas

    e o redor do mundo

    tul rau :C

    pelo que traz de mais identitrio,

    por seu impacto econmico e por

    ajudar a formar um ambiente propcio

    criatividade.

    CIDADE CRIATIVA

    na Carla Fonseca escreveu livros ino-

    vadores, como Marketing Cultural e Financia-

    mento da Cultura (2002), Economia da Cultura e

    Desenvolvimento Sustentvel (Prmio Jabuti

    2007) e Cidades Criativas (primeiro livro bra-

    sileiro sobre o tema e finalista do Prmio

    Jabuti 2013); e concebeu e editou livros

    digitais globais, como Economia Criativa

    como Estratgia de Desenvolvimento

    (2008) e Cidades Criativas Perspectivas

    (2009).

    Ela criou projetos de impacto em econo-

    mia e cidades, a exemplo de Criaticidades e

    Sampa CriAtiva e foi consultora do Creative

    Economy Report (ONU), em 2008 e 2013.

    Por 15 anos liderou projetos em multinacio-

    nais na Amrica Latina, em Londres e Milo,

    experincia que a capacitou para se tornar

    assessora para a ONU sobre o tema, alm de

    ser consultora e conferencista em cinco

    lnguas e 28 pases. curadora de congres-

    sos internacionais, diretora de Contedo da

    ExpoGesto e membro do Corpo Mundial

    de Peritos da Unesco, dos Repensadores,

    dos conselhos da Pgina 22, da Virada Sus-

    tentvel, da Creative Industries Develop-

    ment Agency (Inglaterra) e jurada da Creati-

    ve Business Cup (Dinamarca). Venceu o

    Prmio Claudia 2013, em Negcios.

    Criatividade A

    Ana Carla Fonseca

    Div

    ulg

    a

    o

  • RUMOS 8 Janeiro/Fevereiro 2015 RUMOS 9 Janeiro/Fevereiro 2015

    Por Jader Moraes

    ransformados em Institutos Nacionais em 2010,

    os centros de Infectologia Evandro Chagas (INI)

    e de Sade da Mulher, da Criana e do Adoles-

    cente Fernandes Figueira (IFF) se preparam para

    entrar em nova fase. Com um aporte de mais de

    R$ 600 milhes, a Fundao Oswaldo Cruz (Fiocruz) comea

    a erguer um grande complexo que vai abrigar as novas instala-

    es das duas unidades: o Campus dos Institutos Nacionais

    (CIN), uma imponente construo de 125 mil m em So

    Cristvo, Zona Norte do Rio de Janeiro.

    No CIN, os dois institutos continuaro a atuar de forma

    autnoma, mas compartilharo alguns equipamentos e tero

    sua capacidade de atuao ampliada de forma considervel: o

    INI, por exemplo, passar de seus atuais trinta leitos de aten-

    dimento para 120. O campus contar ainda com outros 290

    leitos do IFF (totalizando 410), 224 consultrios, 74 mdulos

    ambulatoriais e 16 salas de cirurgia geral. O CIN fortalecer o

    conceito de transversalidade entre assistncia, pesquisa e

    ensino.

    Nossas unidades cumprem papel de assistncia, pesqui-

    EXPANSO

    T

    J o Instituto Fernandes Figueira, que

    possui longa trajetria dedicada pediatria e

    ao desenvolvimento e avaliao de novas

    tecnologias, diretamente responsvel pela

    qualificao de quadros estratgicos do

    Sistema nico de Sade (SUS) na rea de

    sua competncia Sade da Mulher, Crian-

    a e Adolescente , para a melhoria dos

    cuidados e dos indicadores. Possui tradio

    de hospital de ensino e teve nos ltimos

    anos uma expanso de seus cursos de ps-

    graduao e o lanamento de um programa

    de incentivo pesquisa para seus funcion-

    rios doutores, alm de ter ampliado signifi-

    cativamente o seu portflio de cooperao

    internacional.

    Espao multiuso Muito alm de abrigar

    os institutos nacionais vinculados Fiocruz,

    a presidncia da instituio pretende trans-

    formar o futuro campus em um espao em

    sintonia com todos os demais setores da

    Fundao, ampliando inclusive suas possi-

    bilidades de funcionamento. Um exemplo

    que, como o novo imvel se encontra em

    uma regio mais central da cidade, ser

    possvel planejar cursos noturnos, o que

    hoje dicultado em funo da localizao

    do seu campus principal.

    Para isso, o local contar com trinta salas

    de aula, quatro espaos multiuso, auditrio

    para 500 lugares, refeitrio,

    entre outras reas secundrias.

    Assim como os dois institutos

    vo compartilhar espaos fsi-

    cos, tambm teremos platafor-

    mas de funcionamento para

    outras unidades da prpria

    Fiocruz, conta Lacerda.

    A previso que as obras do

    campus se encerrem no segun-

    do semestre de 2018, mas o

    espao s deve comear a funci-

    onar a partir de 2019, devido ao

    perodo de adaptao, certica-

    o, transferncia de funcion-

    rios e treinamento. Este prazo

    pode variar e os dados relativos

    ao projeto esto em constante

    atualizao. Todo processo de

    aprovao e desenvolvimento

    deste projeto bastante com-

    plexo, explicou o gerente.

    R REPORTAGEM

    Complexo de sadeFiocruz ergue campus de 125 mil m para abrigar novos institutos

    nacionais de infectologia e sade da mulher, criana e adolescente;

    espao ser dedicado assistncia, pesquisa e ensino

    sa clnica, pesquisa biomdica e ensino. So quatro perfis que

    no se dissociam. Mas, em muitos casos, uma rea acaba

    tendo peso maior que outra: no caso do IFF, o que se destaca

    a dimenso da assistncia, dada a carncia na cidade do Rio

    de Janeiro de hospitais com esse tipo de atendimento; ao

    passo que quando olhamos para o INI a pesquisa clnica,

    tambm pela carncia na rede pblica desse tipo de pesquisa.

    Elas cumprem todas as funes, mas o colorido de cada uni-

    dade acaba se dando em funo das lacunas que ela tem que

    cumprir. Um dos objetivos desse complexo justamente

    equilibrar essas quatro dimenses, explicou o gerente de

    projetos da Fiocruz, Leonardo Lacerda.

    De acordo com o gerente, desde a transformao das

    duas unidades em Institutos Nacionais, elas reforaram sua

    forma de insero na rede pblica de sade e ganharam novas

    responsabilidades e atribuies: agora tm papel de nortea-

    doras, so referncias na atuao assistencial para a rede e

    podem atuar como formuladoras de proposies e polticas

    nacionais em suas reas de atuao. Mas elas continuam

    vinculadas Fiocruz, esclarece o gerente.

    Quando o Ministrio da Sade

    estabeleceu as unidades como Institu-

    tos Nacionais deu um incremento de

    atribuies, seja no quantitativo de

    atendimento, seja em novas responsa-

    bilidades. Com essa nova realidade,

    identificamos a oportunidade de

    ampliar o escopo de atuao das duas

    unidades, que tinham limitaes, inclu-

    sive fsicas e estruturais. Na prtica, as

    duas unidades vo manter sua integri-

    dade institucional, mas vo comparti-

    lhar plataformas e reas afins, com-

    pletou.

    O Instituto Evandro Chagas foi

    planejado ainda por Oswaldo Cruz,

    em 1910, e j teve vrias denomina-

    es em sua vasta histria Hospital

    Oswaldo Cruz, Hospital de Mangui-

    nhos e Instituto de Pesquisa Clnica

    Evandro Chagas (Ipec). Desde a dca-

    da de 1980, tem sido referncia no

    atendimento e pesquisa clnica em

    doenas infecciosas e negligenciadas

    como malria, dengue, doenas de

    Chagas, HIV/Aids, dentre outras. A

    expectativa, com a transformao da

    unidade em instituto e o posterior

    projeto de construo do grande

    complexo, que o INI cumpra esse

    papel.

    Div

    ulg

    a

    o

    Projeo de como ficar o novo Campus dos Institutos Nacionais, em construo na Zona Norte do Rio de Janeiro;

    previso que obras terminem em 2018 e o espao entre em funcionamento no ano seguinte.

    Vir

    gin

    ia D

    am

    as/C

    CI/

    EN

    SP

    /Fio

    cru

    z

    Nossas unidades cumprem

    papel de assistncia, pesquisa

    clnica e biomdica e ensino.

    So quatro perfis que no se

    dissociam. Mas, em muitos

    casos, uma rea acaba tendo

    peso maior que outra. Um dos

    objetivos desse complexo

    justamente equilibrar

    essas dimenses

    Leonardo Lacerda

    Gerente de Projetos

    Div

    ulg

    a

    o

    Outro ngulo de como ficar o Campus, que abrigar os dois institutos ligados Fiocruz.

  • RUMOS 8 Janeiro/Fevereiro 2015 RUMOS 9 Janeiro/Fevereiro 2015

    Por Jader Moraes

    ransformados em Institutos Nacionais em 2010,

    os centros de Infectologia Evandro Chagas (INI)

    e de Sade da Mulher, da Criana e do Adoles-

    cente Fernandes Figueira (IFF) se preparam para

    entrar em nova fase. Com um aporte de mais de

    R$ 600 milhes, a Fundao Oswaldo Cruz (Fiocruz) comea

    a erguer um grande complexo que vai abrigar as novas instala-

    es das duas unidades: o Campus dos Institutos Nacionais

    (CIN), uma imponente construo de 125 mil m em So

    Cristvo, Zona Norte do Rio de Janeiro.

    No CIN, os dois institutos continuaro a atuar de forma

    autnoma, mas compartilharo alguns equipamentos e tero

    sua capacidade de atuao ampliada de forma considervel: o

    INI, por exemplo, passar de seus atuais trinta leitos de aten-

    dimento para 120. O campus contar ainda com outros 290

    leitos do IFF (totalizando 410), 224 consultrios, 74 mdulos

    ambulatoriais e 16 salas de cirurgia geral. O CIN fortalecer o

    conceito de transversalidade entre assistncia, pesquisa e

    ensino.

    Nossas unidades cumprem papel de assistncia, pesqui-

    EXPANSO

    T

    J o Instituto Fernandes Figueira, que

    possui longa trajetria dedicada pediatria e

    ao desenvolvimento e avaliao de novas

    tecnologias, diretamente responsvel pela

    qualificao de quadros estratgicos do

    Sistema nico de Sade (SUS) na rea de

    sua competncia Sade da Mulher, Crian-

    a e Adolescente , para a melhoria dos

    cuidados e dos indicadores. Possui tradio

    de hospital de ensino e teve nos ltimos

    anos uma expanso de seus cursos de ps-

    graduao e o lanamento de um programa

    de incentivo pesquisa para seus funcion-

    rios doutores, alm de ter ampliado signifi-

    cativamente o seu portflio de cooperao

    internacional.

    Espao multiuso Muito alm de abrigar

    os institutos nacionais vinculados Fiocruz,

    a presidncia da instituio pretende trans-

    formar o futuro campus em um espao em

    sintonia com todos os demais setores da

    Fundao, ampliando inclusive suas possi-

    bilidades de funcionamento. Um exemplo

    que, como o novo imvel se encontra em

    uma regio mais central da cidade, ser

    possvel planejar cursos noturnos, o que

    hoje dicultado em funo da localizao

    do seu campus principal.

    Para isso, o local contar com trinta salas

    de aula, quatro espaos multiuso, auditrio

    para 500 lugares, refeitrio,

    entre outras reas secundrias.

    Assim como os dois institutos

    vo compartilhar espaos fsi-

    cos, tambm teremos platafor-

    mas de funcionamento para

    outras unidades da prpria

    Fiocruz, conta Lacerda.

    A previso que as obras do

    campus se encerrem no segun-

    do semestre de 2018, mas o

    espao s deve comear a funci-

    onar a partir de 2019, devido ao

    perodo de adaptao, certica-

    o, transferncia de funcion-

    rios e treinamento. Este prazo

    pode variar e os dados relativos

    ao projeto esto em constante

    atualizao. Todo processo de

    aprovao e desenvolvimento

    deste projeto bastante com-

    plexo, explicou o gerente.

    R REPORTAGEM

    Complexo de sadeFiocruz ergue campus de 125 mil m para abrigar novos institutos

    nacionais de infectologia e sade da mulher, criana e adolescente;

    espao ser dedicado assistncia, pesquisa e ensino

    sa clnica, pesquisa biomdica e ensino. So quatro perfis que

    no se dissociam. Mas, em muitos casos, uma rea acaba

    tendo peso maior que outra: no caso do IFF, o que se destaca

    a dimenso da assistncia, dada a carncia na cidade do Rio

    de Janeiro de hospitais com esse tipo de atendimento; ao

    passo que quando olhamos para o INI a pesquisa clnica,

    tambm pela carncia na rede pblica desse tipo de pesquisa.

    Elas cumprem todas as funes, mas o colorido de cada uni-

    dade acaba se dando em funo das lacunas que ela tem que

    cumprir. Um dos objetivos desse complexo justamente

    equilibrar essas quatro dimenses, explicou o gerente de

    projetos da Fiocruz, Leonardo Lacerda.

    De acordo com o gerente, desde a transformao das

    duas unidades em Institutos Nacionais, elas reforaram sua

    forma de insero na rede pblica de sade e ganharam novas

    responsabilidades e atribuies: agora tm papel de nortea-

    doras, so referncias na atuao assistencial para a rede e

    podem atuar como formuladoras de proposies e polticas

    nacionais em suas reas de atuao. Mas elas continuam

    vinculadas Fiocruz, esclarece o gerente.

    Quando o Ministrio da Sade

    estabeleceu as unidades como Institu-

    tos Nacionais deu um incremento de

    atribuies, seja no quantitativo de

    atendimento, seja em novas responsa-

    bilidades. Com essa nova realidade,

    identificamos a oportunidade de

    ampliar o escopo de atuao das duas

    unidades, que tinham limitaes, inclu-

    sive fsicas e estruturais. Na prtica, as

    duas unidades vo manter sua integri-

    dade institucional, mas vo comparti-

    lhar plataformas e reas afins, com-

    pletou.

    O Instituto Evandro Chagas foi

    planejado ainda por Oswaldo Cruz,

    em 1910, e j teve vrias denomina-

    es em sua vasta histria Hospital

    Oswaldo Cruz, Hospital de Mangui-

    nhos e Instituto de Pesquisa Clnica

    Evandro Chagas (Ipec). Desde a dca-

    da de 1980, tem sido referncia no

    atendimento e pesquisa clnica em

    doenas infecciosas e negligenciadas

    como malria, dengue, doenas de

    Chagas, HIV/Aids, dentre outras. A

    expectativa, com a transformao da

    unidade em instituto e o posterior

    projeto de construo do grande

    complexo, que o INI cumpra esse

    papel.

    Div

    ulg

    a

    o

    Projeo de como ficar o novo Campus dos Institutos Nacionais, em construo na Zona Norte do Rio de Janeiro;

    previso que obras terminem em 2018 e o espao entre em funcionamento no ano seguinte.

    Vir

    gin

    ia D

    am

    as/C

    CI/

    EN

    SP

    /Fio

    cru

    z

    Nossas unidades cumprem

    papel de assistncia, pesquisa

    clnica e biomdica e ensino.

    So quatro perfis que no se

    dissociam. Mas, em muitos

    casos, uma rea acaba tendo

    peso maior que outra. Um dos

    objetivos desse complexo

    justamente equilibrar

    essas dimenses

    Leonardo Lacerda

    Gerente de Projetos

    Div

    ulg

    a

    o

    Outro ngulo de como ficar o Campus, que abrigar os dois institutos ligados Fiocruz.

  • o primeiro mandato da presidenta Dilma Rous-

    seff houve uma evidente deteriorao das con-

    tas pblicas pelo atraso do governo em reco-

    nhecer que: 1) a situao externa tinha se invertido; e 2) as

    intervenes voluntaristas nos projetos de infraestrutura e

    pontuais nos mercados de bens e servios eram incapazes

    de alterar a causa bsica da reduo da taxa de crescimento

    do Produto Interno Bruto (PIB): a substituio da oferta

    interna da indstria nacional pela oferta internacional (a

    importao). Nunca houve falta de demanda industrial

    interna. Os aumentos dos salrios reais, a ampliao do cr-

    dito e a reduo da taxa de juros real sempre a sustentaram.

    O que ocorreu foi uma dramtica destruio das condies

    que garantiam uma relativa isonomia competitiva da

    indstria nacional, o que a levou estagnao e arrastou

    com ela o PIB.

    Essa alterao da estrutura produtiva que est se trans-

    formando de conjuntural em estrutural torna ainda mais

    problemtica a estimativa do etreo produto potencial e,

    consequentemente, da falsa-constante, a taxa de juro real

    de equilbrio, aquela que manteria o emprego perto do seu

    mximo sem acelerar a taxa de inflao, ambas exigidas para

    o exerccio da poltica monetria tima. H pouca cin-

    cia e muito arbtrio em tudo isso, o que mostra os graus

    da sorte, conhecimento, sensibilidade, humildade, habilida-

    de e arte dos novos executores da poltica econmica, que a

    presidenta espera que, com o menor sacrifcio dos menos

    favorecidos, cumpram tarefas pouco conciliveis: 1) a recu-

    perao do equilbrio fiscal sem comprometer os investi-

    mentos pblicos; 2) a rpida reduo das intervenes no sis-

    tema de preos, principalmente na taxa de cmbio, com a

    simultnea reduo da expectativa inflacionria; e 3) que

    acordem o esprito animal do setor privado mostrando

    que o ajuste no a reduo da demanda efetiva, mas ape-

    nas a preparao para a volta ao crescimento do setor indus-

    trial e, consequentemente, do PIB.

    Alguns sinais parecem indicar a sria disposio da

    nova administrao de assegurar a reduo dos desequil-

    brios e criar as expectativas de volta do crescimento do

    investimento pblico, dos investimentos privados e do

    PIB, condies necessrias para facilitar o ajuste benig-

    no desejado.

    O primeiro sinal foi a deciso anunciada de reduzir fir-

    memente o imbrglio fiscal sem retroceder no processo

    civilizatrio, isto , com o menor desconforto para os

    menos favorecidos e na manuteno do aumento da igual-

    dade de oportunidades para que eles possam continuar a

    construir a sua cidadania com dignidade. Isso fundamen-

    tal para a coeso e justia sociais e a condio poltica de

    sustentabilidade das medidas.

    evidente que o ajuste fiscal s ser bem-sucedido se

    for capaz de despertar o esprito animal do setor privado,

    dentro de um prazo razovel. De qualquer forma, parece

    que o supervit primrio projetado de 1,2% do PIB em 2015

    um bom comeo.

    O segundo sinal veio do Relatrio do Banco Central de

    dezembro de 2014, que revela maior disposio de resistir

    dominncia fiscal e sugere a necessidade de uma ntima

    cooperao entre a poltica monetria e as polticas social,

    fiscal, salarial e cambial. Por ltimo, recente deciso do Ban-

    co Central mostra que as intervenes no mercado cambial

    destinam-se a reduzir a volatilidade e no a determinar o

    nvel da taxa de cmbio.

    H muitas dificuldades frente no segundo mandato da

    presidenta Dilma. A tragdia da Petrobras enorme, mas

    no pode e no deve congelar o governo. Esta a hora da

    grandeza e da solidariedade com a nao. hora de superar

    ridculos preconceitos ideolgicos (os selfies do atraso) e

    reconhecer que nossas instituies esto cada vez mais for-

    tes e so a garantia da nossa liberdade. No sero medocres

    arreganhos de uma direita boalizada, ou de uma es-

    querda imbecilizada que iro enfrent-las.

    hora, pois, em legtima defesa, de torcer e trabalhar

    para que o Brasil se reencontre com o caminho do cresci-

    mento econmico eficiente com ampliao da incluso

    social.

    Novo governo

    Superar os preconceitos

    RUMOS Janeiro/Fevereiro 2015 10

    Antonio Delfim Netto

    Professor Emrito da Faculdade de Economia, Administrao

    e Contabilidade (FEA-USP). Ex-ministro da Fazenda, da Agricultura

    e do Planejamento.

    Ma

    rcelo

    Corr

    ea

    O OPINIO

    N

  • Aguardem!Prmio ABDE

    de MonograasEdio 2015

  • Mudana no cenrio econmico, com maior restrio ao crdito,

    leva os pequenos negcios a rever suas estratgias e a investir com

    segurana

    Por Andr Tennitz

    RUMOS Janeiro/Fevereiro 2015 12

    pas vive um perodo de transio que exige

    cautela e ateno dos agentes econmicos. As

    medidas de ajuste fiscal e monetrio que esto

    sendo implementadas pelo governo federal para

    corrigir desequilbrios, controlar a inflao e

    recuperar, a mdio prazo, a trajetria de crescimento da

    economia criam restries que afetam todos os empreende-

    dores, independentemente do porte ou do setor de atuao.

    No segmento das micro e pequenas empresas, no entanto, a

    conjuntura marcada por conteno de demanda, custos

    fiscais mais elevados e maior seletividade no crdito, tem

    impactos diferenciados, dadas as caratersticas especficas

    desses empreendimentos. Para o Sebrae, um momento que

    exige, sobretudo, cuidado e ateno dos empresrios para

    evitar problemas que possam comprometer a sade de seus

    negcios.

    O acesso ao crdito sempre foi um dos grandes desafios

    dos empreendimentos de menor porte, e, num momento de

    ajuste, a postura dos agentes financeiros tende a ser mais

    conservadora. No se tem a dimenso exata dos efeitos que

    as medidas fiscais e monetrias em curso tero na economia

    real, mas a situao precisa ser monitorada com cautela

    pelos empreendedores, principalmente aqueles que esto

    frente de pequenos negcios, que sempre foram os elos mais

    frgeis no que diz respeito a crdito, observa a diretora

    tcnica do Sebrae, Heloisa Menezes. Normalmente, micro

    e pequenas empresas tm reservas limitadas para amortecer

    os impactos gerados por situaes de constrangimento

    financeiro.

    Para a diretora, alm de manter a ateno no cenrio

    macroeconmico, os empreendedores precisam voltar o

    foco para seu negcio e mercado especficos. hora de

    reavaliar objetivos e estratgias, aconselha. Eventualmen-

    te, acrescenta, o planejamento no pode utilizar as mes-

    mas taxas de crescimento e de vendas de anos anteriores.

    Alm disso, pondera, o momento de aprimorar a gesto de

    caixa e reforar a relao com os fornecedores.

    Pesquisas do Sebrae mostram que, dadas as dificuldades

    de oferecer garantias reais ao sistema financeiro tradicional,

    as micro e pequenas empresas tm no crdito de fornecedo-

    res sua principal fonte de capital de giro. Alm disso,

    comum o recurso a modalidades que, embora de acesso mais

    simples e rpido, impem altos custos financeiros ao empre-

    endedor, como cartes de crdito e cheque especial, cujas

    taxas mdias superam os 200% ao ano, segundo os levanta-

    mentos mais recentes do Banco Central. Se j eram extrema-

    mente onerosos, esses instrumentos tornam-se absoluta-

    mente proibitivos num cenrio de restrio de crdito e

    elevao de taxas de juros.

    Custo do crdito De maneira geral, todas as linhas de

    crdito do sistema financeiro j se tornaram mais caras com a

    RUMOS Janeiro/Fevereiro 2015 13

    poltica de aperto monetrio conduzida pelo Banco Central.

    Em dezembro de 2014, a taxa mdia de todas as linhas (pes-

    soas fsicas e jurdicas) estava em 32,4% ao ano, contra 29%

    no fim de 2013. Dentro do prprio sistema financeiro, no

    entanto, possvel encontrar alternativas de custo mais baixo,

    pondera a diretora do Sebrae. As cooperativas de crdito,

    por exemplo, tiveram um olhar diferenciado para os peque-

    nos negcios. H tambm um espao grande para que insti-

    tuies de fomento ampliem a atuao junto s pequenas e

    microempresas, afirma.

    Heloisa Menezes destaca, por exemplo, instrumentos

    como o Carto BNDES, destinado a viabilizar capital de giro

    e de investimento para empresas de pequeno porte, que

    expandiu significativamente, nos ltimos anos, tanto o volu-

    me de operaes, como a abrangncia geogrfica de sua atua-

    o, estando disponvel, hoje, em praticamente todos os muni-

    cpios do pas. Linhas de crdito amparadas em mecanismos

    de garantia tambm possuem menor custo financeiro, acres-

    centa. o caso do Fundo de Garantia de Investimento (FGI),

    do prprio BNDES, ou do Fundo de Apoio s Micro e

    Pequenas Empresas (Fampe), administrado pelo Sebrae. H

    tambm o Fundo de Garantia de Operaes (FGO), operado

    pelo Banco do Brasil, e o Funproger, pelo Ministrio do Tra-

    balho e Emprego (MTE).

    Esperamos que haja a oportunidade de discutir com

    bancos de fomento novas formas de atuao para que o cr-

    dito chegue em melhores condies s pequenas empresas,

    diz a diretora. Ela lembra, ainda, o papel importante que

    podem desempenhar as Sociedades de Garantia de Crdito

    (SGC), que precisam ganhar velocidade na sua disseminao

    pelo pas. Com atuao local, constitudas pelos prprios

    empreendedores, com apoio de entidades de classe e do

    prprio Sebrae, essas entidades atuam no fornecimento de

    garantias para recursos tomados pelos pequenos negcios

    em bancos e outros agentes de crdito, possibilitando a redu-

    o das taxas cobradas.

    Oportunidade Luiz Ajita, diretor-presidente do Sistema

    de Cooperativas de Crdito do Brasil, em Maring (Sicoob

    Metropolitano) cooperativa de crdito do Norte do Para-

    n, com 26 pontos de atendimento e cerca de 33 mil associa-

    dos , avalia que o cenrio oferece uma oportunidade para

    que essas entidades ocupem espao no mercado de maneira

    consciente. Para isso, as cooperativas devem se valer de

    suas caractersticas prprias: polticas de crditos locais ou

    regionalizadas, maior rapidez na anlise do crdito, utiliza-

    o das parcerias estabelecidas com as Sociedades de

    Garantias de Crdito, taxas diferenciadas e atendimento

    personalizado, afirma.

    Ajita observa que, depois de anos de forte expanso, o

    volume global de crdito na economia vem mostrando

    desacelerao. Em 2014, refletindo a perda de flego da

    M MICRO E PEQUENAS

    Heloisa Menezes, diretora tcnica do Sebrae, lembra que as cooperativas de crdito so uma opo em tempos de

    restrio no sistema financeiro.

    Ch

    arl

    es D

    am

    asce

    no

    ECONOMIA

    Ateno

    e cautela

    O

  • Mudana no cenrio econmico, com maior restrio ao crdito,

    leva os pequenos negcios a rever suas estratgias e a investir com

    segurana

    Por Andr Tennitz

    RUMOS Janeiro/Fevereiro 2015 12

    pas vive um perodo de transio que exige

    cautela e ateno dos agentes econmicos. As

    medidas de ajuste fiscal e monetrio que esto

    sendo implementadas pelo governo federal para

    corrigir desequilbrios, controlar a inflao e

    recuperar, a mdio prazo, a trajetria de crescimento da

    economia criam restries que afetam todos os empreende-

    dores, independentemente do porte ou do setor de atuao.

    No segmento das micro e pequenas empresas, no entanto, a

    conjuntura marcada por conteno de demanda, custos

    fiscais mais elevados e maior seletividade no crdito, tem

    impactos diferenciados, dadas as caratersticas especficas

    desses empreendimentos. Para o Sebrae, um momento que

    exige, sobretudo, cuidado e ateno dos empresrios para

    evitar problemas que possam comprometer a sade de seus

    negcios.

    O acesso ao crdito sempre foi um dos grandes desafios

    dos empreendimentos de menor porte, e, num momento de

    ajuste, a postura dos agentes financeiros tende a ser mais

    conservadora. No se tem a dimenso exata dos efeitos que

    as medidas fiscais e monetrias em curso tero na economia

    real, mas a situao precisa ser monitorada com cautela

    pelos empreendedores, principalmente aqueles que esto

    frente de pequenos negcios, que sempre foram os elos mais

    frgeis no que diz respeito a crdito, observa a diretora

    tcnica do Sebrae, Heloisa Menezes. Normalmente, micro

    e pequenas empresas tm reservas limitadas para amortecer

    os impactos gerados por situaes de constrangimento

    financeiro.

    Para a diretora, alm de manter a ateno no cenrio

    macroeconmico, os empreendedores precisam voltar o

    foco para seu negcio e mercado especficos. hora de

    reavaliar objetivos e estratgias, aconselha. Eventualmen-

    te, acrescenta, o planejamento no pode utilizar as mes-

    mas taxas de crescimento e de vendas de anos anteriores.

    Alm disso, pondera, o momento de aprimorar a gesto de

    caixa e reforar a relao com os fornecedores.

    Pesquisas do Sebrae mostram que, dadas as dificuldades

    de oferecer garantias reais ao sistema financeiro tradicional,

    as micro e pequenas empresas tm no crdito de fornecedo-

    res sua principal fonte de capital de giro. Alm disso,

    comum o recurso a modalidades que, embora de acesso mais

    simples e rpido, impem altos custos financeiros ao empre-

    endedor, como cartes de crdito e cheque especial, cujas

    taxas mdias superam os 200% ao ano, segundo os levanta-

    mentos mais recentes do Banco Central. Se j eram extrema-

    mente onerosos, esses instrumentos tornam-se absoluta-

    mente proibitivos num cenrio de restrio de crdito e

    elevao de taxas de juros.

    Custo do crdito De maneira geral, todas as linhas de

    crdito do sistema financeiro j se tornaram mais caras com a

    RUMOS Janeiro/Fevereiro 2015 13

    poltica de aperto monetrio conduzida pelo Banco Central.

    Em dezembro de 2014, a taxa mdia de todas as linhas (pes-

    soas fsicas e jurdicas) estava em 32,4% ao ano, contra 29%

    no fim de 2013. Dentro do prprio sistema financeiro, no

    entanto, possvel encontrar alternativas de custo mais baixo,

    pondera a diretora do Sebrae. As cooperativas de crdito,

    por exemplo, tiveram um olhar diferenciado para os peque-

    nos negcios. H tambm um espao grande para que insti-

    tuies de fomento ampliem a atuao junto s pequenas e

    microempresas, afirma.

    Heloisa Menezes destaca, por exemplo, instrumentos

    como o Carto BNDES, destinado a viabilizar capital de giro

    e de investimento para empresas de pequeno porte, que

    expandiu significativamente, nos ltimos anos, tanto o volu-

    me de operaes, como a abrangncia geogrfica de sua atua-

    o, estando disponvel, hoje, em praticamente todos os muni-

    cpios do pas. Linhas de crdito amparadas em mecanismos

    de garantia tambm possuem menor custo financeiro, acres-

    centa. o caso do Fundo de Garantia de Investimento (FGI),

    do prprio BNDES, ou do Fundo de Apoio s Micro e

    Pequenas Empresas (Fampe), administrado pelo Sebrae. H

    tambm o Fundo de Garantia de Operaes (FGO), operado

    pelo Banco do Brasil, e o Funproger, pelo Ministrio do Tra-

    balho e Emprego (MTE).

    Esperamos que haja a oportunidade de discutir com

    bancos de fomento novas formas de atuao para que o cr-

    dito chegue em melhores condies s pequenas empresas,

    diz a diretora. Ela lembra, ainda, o papel importante que

    podem desempenhar as Sociedades de Garantia de Crdito

    (SGC), que precisam ganhar velocidade na sua disseminao

    pelo pas. Com atuao local, constitudas pelos prprios

    empreendedores, com apoio de entidades de classe e do

    prprio Sebrae, essas entidades atuam no fornecimento de

    garantias para recursos tomados pelos pequenos negcios

    em bancos e outros agentes de crdito, possibilitando a redu-

    o das taxas cobradas.

    Oportunidade Luiz Ajita, diretor-presidente do Sistema

    de Cooperativas de Crdito do Brasil, em Maring (Sicoob

    Metropolitano) cooperativa de crdito do Norte do Para-

    n, com 26 pontos de atendimento e cerca de 33 mil associa-

    dos , avalia que o cenrio oferece uma oportunidade para

    que essas entidades ocupem espao no mercado de maneira

    consciente. Para isso, as cooperativas devem se valer de

    suas caractersticas prprias: polticas de crditos locais ou

    regionalizadas, maior rapidez na anlise do crdito, utiliza-

    o das parcerias estabelecidas com as Sociedades de

    Garantias de Crdito, taxas diferenciadas e atendimento

    personalizado, afirma.

    Ajita observa que, depois de anos de forte expanso, o

    volume global de crdito na economia vem mostrando

    desacelerao. Em 2014, refletindo a perda de flego da

    M MICRO E PEQUENAS

    Heloisa Menezes, diretora tcnica do Sebrae, lembra que as cooperativas de crdito so uma opo em tempos de

    restrio no sistema financeiro.

    Ch

    arl

    es D

    am

    asce

    no

    ECONOMIA

    Ateno

    e cautela

    O

  • atividade econmica, o aumento foi de 11%, uma taxa ainda

    significativa, mas a menor dos ltimos 10 anos. Ele nota que

    os bancos j comearam a tomar medidas mais restritivas na

    concesso de crdito e acredita que providncias mais rigo-

    rosas podero ser adotadas por instituies privadas. Infe-

    lizmente, nesse cenrio, micro e pequenas empresas tero

    que repensar seus planos de expanso e se preocupar com a

    manuteno de seus negcios, destaca.

    Para o presidente do Sicoob Metropolitano, as institui-

    es financeiras, de maneira geral, tendem a elevar o rigor na

    avaliao da situao das empresas, reforando a observao

    de elementos como restries cadastrais, pontualidade nos

    pagamentos de compromissos, faturamento, endividamento,

    estoques e garantias ofertadas. Isto tudo resultar num

    processo mais lento, difcil e oneroso para os negcios de

    menor porte, resume.

    A tendncia, alis, j vem sendo notada, observa. De um

    lado, o consumo das famlias vem caindo em virtude do alto

    grau de endividamento e do menor dinamismo do mercado

    de trabalho, com as pessoas se preocupando em saldar dvi-

    das e no contrair novos dbitos. Por outro lado, os bancos

    adotaram uma postura mais cautelosa na concesso de crdi-

    to. Essa estratgia permitiu que eles reduzissem o ndice de

    inadimplncia, que, no ano passado, caiu de 4,1% para 3,5%

    nos bancos estrangeiros, e de 4,3% para 4% no caso das insti-

    tuies nacionais. A contrapartida, porm, foi que o crdito

    tornou-se mais escasso.

    Acomodao O superintendente comercial do Banco

    Cooperativo do Brasil (Bancoob), instituio especializada

    no atendimento a cooperativas de crdito, Luciano Ribeiro

    Machado, pondera que, apesar do arrefecimento da deman-

    da e do cenrio de restrio financeira, micro e pequenas

    empresas tm um espao de acomodao maior do que as

    mdias e grandes. Os pequenos negcios tm a capacidade

    de acomodar a elevao de custo fixo de forma mais positi-

    va, afirma. A varivel decisiva, explica, ser a liquidez des-

    tas empresas, ou seja, como elas estaro preparadas para

    enfrentar um perodo de menor fluxo comercial e, at mes-

    mo, alguma inadimplncia.

    Certamente, o relacionamento com uma instituio

    financeira parceira importante nestes momentos, afirma

    Machado. Ele observa que o aumento do risco naturalmente

    tem impacto negativo nos sistemas de crdito, como redu-

    o de limites, exigncia de maiores e melhores garantias,

    reduo de prazos e aumento de taxas. Vale destacar, entre-

    tanto, que as dificuldades econmicas podem resultar em

    renegociao em detrimento da inadimplncia. Isso depen-

    de de vontade e do relacionamento entre cliente e instituio

    RUMOS Janeiro/Fevereiro 201514 RUMOS Janeiro/Fevereiro 2015 15

    M MICRO E PEQUENAS

    financeira, caso a caso.

    O sistema cooperativo, salienta Machado, tem maior pro-

    ximidade do dia a dia do cliente. H, ainda, o compromisso

    natural do associado com sua comunidade, o que gera uma

    presso adicional de adimplncia em suas operaes junto

    cooperativa.

    Isso no significa que as cooperativas financeiras devam se

    eximir de rever seus critrios de negociao. fundamental o

    alinhamento com a conjuntura econmica. Afinal, a cooperati-

    va administra os recursos de associados, o que uma enorme

    responsabilidade. Mas, via de regra, as crises econmicas

    abrem oportunidades para os sistemas financeiros cooperati-

    vos. A proximidade com a comunidade permite a manuteno

    do relacionamento comercial de produtos e servios em nveis

    superiores s instituies financeiras tradicionais. Estamos

    prontos para aproveitar, declara Machado.

    Exceo regional Embora j seja visvel nos indicadores

    macroeconmicos nacionais, o esfriamento do nvel de ativi-

    dade no se manifesta da mesma forma em todos os setores e

    regies. De acordo com o superintendente de Negcios de

    Varejo e Agronegcios do Banco do Nordeste (BNB), Luiz

    Srgio Farias Machado, as pesquisas do banco indicam que o

    consumo da chamada nova classe mdia tem se mantido

    consistente na regio, que, nos ltimos anos, vem apresentan-

    do indicadores de crescimento econmico superiores

    mdia do pas. O banco tem participado, por exemplo, de

    feiras de franquias nas principais cidades nordestinas, e os

    franqueadores continuam com demanda elevada de negcios

    na maioria dos setores, o que mostra que a expectativa ainda

    positiva para manuteno do consumo, diz ele.

    O crescimento recente da regio foi beneficiado por

    alguns fatores, particularmente pelo aumento da renda, especi-

    almente nas classes C, D e E. O Banco do Nordeste

    trabalha com projees de crescimento nos prximos

    anos acima da mdia nacional, impulsionado ainda pelo

    movimento de ascenso das classes mais baixas, que

    continuar a ser positivo, afirma Luciano Machado.

    O superintendente ressalta que a instituio tem

    compromisso com o desenvolvimento, j que adminis-

    tra recursos do Fundo Constitucional de Financiamen-

    to do Nordeste (FNE), o que possibilita instituio

    oferecer taxas de juros e condies mais atraentes s

    pequenas e microempresas. A expectativa do BNB

    contratar junto ao segmento, R$ 3,07 bilhes neste ano

    em operaes de investimento e de capital de giro,

    valor superior aos R$ 2,9 bilhes desembolados em

    2014. Desse montante, R$ 2,46 bilhes sero com

    recursos do FNE. A expectativa continuar crescendo

    cerca de 10% a cada ano.

    O banco tem aperfeioado os processos, de forma

    a se tornar mais competitivo e tambm tem produzido

    melhorias no atendimento ao cliente, a exemplo da

    dispensa de apresentao de projetos para operaes

    de investimento at R$ 3,42 milhes. Recentemente, a

    instituio lanou, em parceria com entidades do

    comrcio varejista, um carto de crdito para capital de

    giro, que pretende ampliar para outros segmentos.

    Ainda este ano, diz Machado, pode ser lanado um

    carto de crdito especfico com recursos do FNE.

    O BNB possui tambm o maior programa de

    microcrdito urbano da Amrica do Sul, o Crediami-

    go, com 1.862 mil clientes ativos. No ano passado,

    foram desembolsados R$ 7,1 bilhes no mbito do

    programa. Segundo o dirigente, o BNB j tem uma

    poltica de garantias conservadora e no se vislumbra

    alterao a curto prazo, considerando as atuais oscila-

    es do mercado. Acredito que no haver necessida-

    de de procedimentos mais cautelosos porque o Banco

    do Nordeste j observa fielmente a boa prtica banc-

    ria e os regramentos internos e externos, alm de

    atender a todas as orientaes dos rgos de fiscaliza-

    o, afirma.

    ECONOMIA

    Luciano Machado, do Bancoob, acredita que

    os pequenos negcios tm mais capacidade de ajuste

    do que as mdias empresas.

    Pesquisas j indicam uma retrao no consumo das famlias.

    Mo

    rgu

    eF

    ile

    Div

    ulg

    a

    o

  • atividade econmica, o aumento foi de 11%, uma taxa ainda

    significativa, mas a menor dos ltimos 10 anos. Ele nota que

    os bancos j comearam a tomar medidas mais restritivas na

    concesso de crdito e acredita que providncias mais rigo-

    rosas podero ser adotadas por instituies privadas. Infe-

    lizmente, nesse cenrio, micro e pequenas empresas tero

    que repensar seus planos de expanso e se preocupar com a

    manuteno de seus negcios, destaca.

    Para o presidente do Sicoob Metropolitano, as institui-

    es financeiras, de maneira geral, tendem a elevar o rigor na

    avaliao da situao das empresas, reforando a observao

    de elementos como restries cadastrais, pontualidade nos

    pagamentos de compromissos, faturamento, endividamento,

    estoques e garantias ofertadas. Isto tudo resultar num

    processo mais lento, difcil e oneroso para os negcios de

    menor porte, resume.

    A tendncia, alis, j vem sendo notada, observa. De um

    lado, o consumo das famlias vem caindo em virtude do alto

    grau de endividamento e do menor dinamismo do mercado

    de trabalho, com as pessoas se preocupando em saldar dvi-

    das e no contrair novos dbitos. Por outro lado, os bancos

    adotaram uma postura mais cautelosa na concesso de crdi-

    to. Essa estratgia permitiu que eles reduzissem o ndice de

    inadimplncia, que, no ano passado, caiu de 4,1% para 3,5%

    nos bancos estrangeiros, e de 4,3% para 4% no caso das insti-

    tuies nacionais. A contrapartida, porm, foi que o crdito

    tornou-se mais escasso.

    Acomodao O superintendente comercial do Banco

    Cooperativo do Brasil (Bancoob), instituio especializada

    no atendimento a cooperativas de crdito, Luciano Ribeiro

    Machado, pondera que, apesar do arrefecimento da deman-

    da e do cenrio de restrio financeira, micro e pequenas

    empresas tm um espao de acomodao maior do que as

    mdias e grandes. Os pequenos negcios tm a capacidade

    de acomodar a elevao de custo fixo de forma mais positi-

    va, afirma. A varivel decisiva, explica, ser a liquidez des-

    tas empresas, ou seja, como elas estaro preparadas para

    enfrentar um perodo de menor fluxo comercial e, at mes-

    mo, alguma inadimplncia.

    Certamente, o relacionamento com uma instituio

    financeira parceira importante nestes momentos, afirma

    Machado. Ele observa que o aumento do risco naturalmente

    tem impacto negativo nos sistemas de crdito, como redu-

    o de limites, exigncia de maiores e melhores garantias,

    reduo de prazos e aumento de taxas. Vale destacar, entre-

    tanto, que as dificuldades econmicas podem resultar em

    renegociao em detrimento da inadimplncia. Isso depen-

    de de vontade e do relacionamento entre cliente e instituio

    RUMOS Janeiro/Fevereiro 201514 RUMOS Janeiro/Fevereiro 2015 15

    M MICRO E PEQUENAS

    financeira, caso a caso.

    O sistema cooperativo, salienta Machado, tem maior pro-

    ximidade do dia a dia do cliente. H, ainda, o compromisso

    natural do associado com sua comunidade, o que gera uma

    presso adicional de adimplncia em suas operaes junto

    cooperativa.

    Isso no significa que as cooperativas financeiras devam se

    eximir de rever seus critrios de negociao. fundamental o

    alinhamento com a conjuntura econmica. Afinal, a cooperati-

    va administra os recursos de associados, o que uma enorme

    responsabilidade. Mas, via de regra, as crises econmicas

    abrem oportunidades para os sistemas financeiros cooperati-

    vos. A proximidade com a comunidade permite a manuteno

    do relacionamento comercial de produtos e servios em nveis

    superiores s instituies financeiras tradicionais. Estamos

    prontos para aproveitar, declara Machado.

    Exceo regional Embora j seja visvel nos indicadores

    macroeconmicos nacionais, o esfriamento do nvel de ativi-

    dade no se manifesta da mesma forma em todos os setores e

    regies. De acordo com o superintendente de Negcios de

    Varejo e Agronegcios do Banco do Nordeste (BNB), Luiz

    Srgio Farias Machado, as pesquisas do banco indicam que o

    consumo da chamada nova classe mdia tem se mantido

    consistente na regio, que, nos ltimos anos, vem apresentan-

    do indicadores de crescimento econmico superiores

    mdia do pas. O banco tem participado, por exemplo, de

    feiras de franquias nas principais cidades nordestinas, e os

    franqueadores continuam com demanda elevada de negcios

    na maioria dos setores, o que mostra que a expectativa ainda

    positiva para manuteno do consumo, diz ele.

    O crescimento recente da regio foi beneficiado por

    alguns fatores, particularmente pelo aumento da renda, especi-

    almente nas classes C, D e E. O Banco do Nordeste

    trabalha com projees de crescimento nos prximos

    anos acima da mdia nacional, impulsionado ainda pelo

    movimento de ascenso das classes mais baixas, que

    continuar a ser positivo, afirma Luciano Machado.

    O superintendente ressalta que a instituio tem

    compromisso com o desenvolvimento, j que adminis-

    tra recursos do Fundo Constitucional de Financiamen-

    to do Nordeste (FNE), o que possibilita instituio

    oferecer taxas de juros e condies mais atraentes s

    pequenas e microempresas. A expectativa do BNB

    contratar junto ao segmento, R$ 3,07 bilhes neste ano

    em operaes de investimento e de capital de giro,

    valor superior aos R$ 2,9 bilhes desembolados em

    2014. Desse montante, R$ 2,46 bilhes sero com

    recursos do FNE. A expectativa continuar crescendo

    cerca de 10% a cada ano.

    O banco tem aperfeioado os processos, de forma

    a se tornar mais competitivo e tambm tem produzido

    melhorias no atendimento ao cliente, a exemplo da

    dispensa de apresentao de projetos para operaes

    de investimento at R$ 3,42 milhes. Recentemente, a

    instituio lanou, em parceria com entidades do

    comrcio varejista, um carto de crdito para capital de

    giro, que pretende ampliar para outros segmentos.

    Ainda este ano, diz Machado, pode ser lanado um

    carto de crdito especfico com recursos do FNE.

    O BNB possui tambm o maior programa de

    microcrdito urbano da Amrica do Sul, o Crediami-

    go, com 1.862 mil clientes ativos. No ano passado,

    foram desembolsados R$ 7,1 bilhes no mbito do

    programa. Segundo o dirigente, o BNB j tem uma

    poltica de garantias conservadora e no se vislumbra

    alterao a curto prazo, considerando as atuais oscila-

    es do mercado. Acredito que no haver necessida-

    de de procedimentos mais cautelosos porque o Banco

    do Nordeste j observa fielmente a boa prtica banc-

    ria e os regramentos internos e externos, alm de

    atender a todas as orientaes dos rgos de fiscaliza-

    o, afirma.

    ECONOMIA

    Luciano Machado, do Bancoob, acredita que

    os pequenos negcios tm mais capacidade de ajuste

    do que as mdias empresas.

    Pesquisas j indicam uma retrao no consumo das famlias.

    Mo

    rgu

    eF

    ile

    Div

    ulg

    a

    o

  • RUMOS 17 Janeiro/Fevereiro 2015

    arece haver um grande consenso de que em 2015

    teremos de nos reposicionar como governo,

    cidados e empreendedores. E os ajustes para

    assegurar a travessia sero bastante sensveis

    do ponto de vista financeiro, concentrados na mxima do

    gastar menos e melhor, j que a economia parece no dar

    sinais de grande vitalidade. E como esse cenrio repercutir

    no mercado bancrio e, em particular, no cooperativismo

    financeiro?

    Por conta das expectativas nada animadoras sobre nvel

    da atividade econmica e do j elevado grau de comprometi-

    mento da renda dos brasileiros com o pagamento de dvidas

    h pouco contradas, improvvel que o sistema financeiro

    convencional sinta-se vontade para seguir emprestando

    com o apetite de outros tempos, especialmente para financi-

    ar o consumo. Isso inclui at mesmo os bancos oficiais, uma

    vez que o Tesouro j no tem o mesmo flego para bancar as

    necessidades de capital dessas instituies.

    E tem mais: porquanto tambm se prognostica a descon-

    tinuidade dos reajustes reais nos salrios (a prioridade ser

    manter o emprego), combinada com novas demisses, nota-

    damente na indstria, aumenta a preocupao com a inadim-

    plncia. Crescendo as impontualidades nos resgates das obri-

    gaes junto ao sistema financeiro, acentuam-se as provises,

    o que, por sua vez, diminui a disponibilidade de capital para

    novos emprstimos.

    Para o cooperativismo financeiro, sem que se despreze a

    ma que identifica e desafia os novos tempos da nao

    como um todo. Da que, de um lado, rever seus modelos orga-

    nizacionais de modo a, por exemplo, aproveitar adequada-

    mente as estruturas de segundo e terceiro nveis sistmicos

    (gastando menos e melhor), e avanar nos processos de aglu-

    tinaes/incorporaes (tanto para economizar como para

    ampliar os limites operacionais de forma a atender a deman-

    das de crdito mais expressivas), e, de outro, repensar o

    padro de seus investimentos, otimizando-os, sero movi-

    mentos cuja eficincia fortalecer o setor e alavancar a sua

    presena no mercado financeiro.

    AARTIGO NOVO ANO

    cautela requerida em tais circunstncias, o fato de a concor-

    rncia retrair-se no crdito gera uma grande oportunidade.

    Como as cooperativas conhecem melhor o seu associado do

    que o banco a seu cliente, devem aproveitar essa proximidade

    e antecipar-se aos concorrentes na busca do bom tomador.

    inegvel que a agilidade para atender a uma necessidade,

    muitas vezes emergente, do associado far aumentar o sen-

    timento de gratido e de pertencimento do cooperado, alm

    de impulsionar a migrao de seus negcios complementares

    (mantidos, no raro, em instituio convencional) para den-

    tro da cooperativa. Essa atmosfera, ademais, aponta para a

    possibilidade de atrao de novos cooperados, diante de sua

    insatisfao como clientes de bancos.

    Consulta a perodos recentes de semelhante adversida-

    de ou incerteza, tanto no ambiente domstico como exter-

    no (vide, por exemplo, 2008/2009), revela que as cooperati-

    vas deram saltos mais representativos em sua expanso jus-

    tamente nesses momentos, afirmando, assim, um de seus

    grandes diferenciais, que o compromisso permanente

    com o cooperado e a sua comunidade. Essa fidelidade,

    como j se disse, reproduz-se no comprometimento (fideli-

    dade recproca) do cooperado com a sua prpria instituio

    financeira.

    A conjuntura tambm sugere uma oferta mais intensiva

    do portflio de produtos e servios fora da intermediao

    financeira. Com efeito, a prudncia adicional que se impe

    em relao ao crdito (pelo alto risco envolvido) h de

    Pimpulsionar a explorao das inmeras alternativas de neg-

    cios j disponveis e ainda muito pouco ativadas no meio

    cooperativo, como seguros, cartes, consrcios, previdn-

    cia privada, cobrana, convnios e adquirncia (de cartes),

    solues essas de elevado potencial de rentabilidade e irrele-

    vante consumo de capital (pelo risco irrisrio). Neste parti-

    cular, alis, as cooperativas enfrentaro o apetite voraz dos

    bancos de varejo, que se tornaro ainda mais agressivos na

    busca de receitas novas para recompor a reduo dos

    ganhos com o crdito.

    Por fim, o cooperativismo dever tambm entrar no cli-

    A vida assim: esquenta e esfria,

    aperta e da afrouxa, sossega e depois

    desinqueta. O que ela quer da gente

    coragem (Guimares Rosa)

    Oportunidades do

    cooperativismo

    financeiro em

    cenrio econmico

    adverso

    nio Meinen advogado, ps-graduado em direito

    (FGV/RJ) e em gesto estratgica de pessoas (UFRGS)

    e autor/coautor de vrios artigos e livros sobre

    cooperativismo financeiro rea na qual milita h 31

    anos , entre eles Cooperativismo financeiro: percurso

    histrico, perspectivas e desafios. Atualmente,

    diretor de operaes do Banco Cooperativo do Brasil

    (Bancoob).

    Asco

    m/B

    an

    co

    ob

    nio Meinen

    RUMOS 16 Janeiro/Fevereiro 2015

    Para o cooperativismo

    financeiro, o fato de a

    concorrncia retrair-se

    no crdito gera uma

    grande oportunidade

    * Sistema Financeiro Cooperativo

    Data-base: Terceiro Trimestre de 2014

  • RUMOS 17 Janeiro/Fevereiro 2015

    arece haver um grande consenso de que em 2015

    teremos de nos reposicionar como governo,

    cidados e empreendedores. E os ajustes para

    assegurar a travessia sero bastante sensveis

    do ponto de vista financeiro, concentrados na mxima do

    gastar menos e melhor, j que a economia parece no dar

    sinais de grande vitalidade. E como esse cenrio repercutir

    no mercado bancrio e, em particular, no cooperativismo

    financeiro?

    Por conta das expectativas nada animadoras sobre nvel

    da atividade econmica e do j elevado grau de comprometi-

    mento da renda dos brasileiros com o pagamento de dvidas

    h pouco contradas, improvvel que o sistema financeiro

    convencional sinta-se vontade para seguir emprestando

    com o apetite de outros tempos, especialmente para financi-

    ar o consumo. Isso inclui at mesmo os bancos oficiais, uma

    vez que o Tesouro j no tem o mesmo flego para bancar as

    necessidades de capital dessas instituies.

    E tem mais: porquanto tambm se prognostica a descon-

    tinuidade dos reajustes reais nos salrios (a prioridade ser

    manter o emprego), combinada com novas demisses, nota-

    damente na indstria, aumenta a preocupao com a inadim-

    plncia. Crescendo as impontualidades nos resgates das obri-

    gaes junto ao sistema financeiro, acentuam-se as provises,

    o que, por sua vez, diminui a disponibilidade de capital para

    novos emprstimos.

    Para o cooperativismo financeiro, sem que se despreze a

    ma que identifica e desafia os novos tempos da nao

    como um todo. Da que, de um lado, rever seus modelos orga-

    nizacionais de modo a, por exemplo, aproveitar adequada-

    mente as estruturas de segundo e terceiro nveis sistmicos

    (gastando menos e melhor), e avanar nos processos de aglu-

    tinaes/incorporaes (tanto para economizar como para

    ampliar os limites operacionais de forma a atender a deman-

    das de crdito mais expressivas), e, de outro, repensar o

    padro de seus investimentos, otimizando-os, sero movi-

    mentos cuja eficincia fortalecer o setor e alavancar a sua

    presena no mercado financeiro.

    AARTIGO NOVO ANO

    cautela requerida em tais circunstncias, o fato de a concor-

    rncia retrair-se no crdito gera uma grande oportunidade.

    Como as cooperativas conhecem melhor o seu associado do

    que o banco a seu cliente, devem aproveitar essa proximidade

    e antecipar-se aos concorrentes na busca do bom tomador.

    inegvel que a agilidade para atender a uma necessidade,

    muitas vezes emergente, do associado far aumentar o sen-

    timento de gratido e de pertencimento do cooperado, alm

    de impulsionar a migrao de seus negcios complementares

    (mantidos, no raro, em instituio convencional) para den-

    tro da cooperativa. Essa atmosfera, ademais, aponta para a

    possibilidade de atrao de novos cooperados, diante de sua

    insatisfao como clientes de bancos.

    Consulta a perodos recentes de semelhante adversida-

    de ou incerteza, tanto no ambiente domstico como exter-

    no (vide, por exemplo, 2008/2009), revela que as cooperati-

    vas deram saltos mais representativos em sua expanso jus-

    tamente nesses momentos, afirmando, assim, um de seus

    grandes diferenciais, que o compromisso permanente

    com o cooperado e a sua comunidade. Essa fidelidade,

    como j se disse, reproduz-se no comprometimento (fideli-

    dade recproca) do cooperado com a sua prpria instituio

    financeira.

    A conjuntura tambm sugere uma oferta mais intensiva

    do portflio de produtos e servios fora da intermediao

    financeira. Com efeito, a prudncia adicional que se impe

    em relao ao crdito (pelo alto risco envolvido) h de

    Pimpulsionar a explorao das inmeras alternativas de neg-

    cios j disponveis e ainda muito pouco ativadas no meio

    cooperativo, como seguros, cartes, consrcios, previdn-

    cia privada, cobrana, convnios e adquirncia (de cartes),

    solues essas de elevado potencial de rentabilidade e irrele-

    vante consumo de capital (pelo risco irrisrio). Neste parti-

    cular, alis, as cooperativas enfrentaro o apetite voraz dos

    bancos de varejo, que se tornaro ainda mais agressivos na

    busca de receitas novas para recompor a reduo dos

    ganhos com o crdito.

    Por fim, o cooperativismo dever tambm entrar no cli-

    A vida assim: esquenta e esfria,

    aperta e da afrouxa, sossega e depois

    desinqueta. O que ela quer da gente

    coragem (Guimares Rosa)

    Oportunidades do

    cooperativismo

    financeiro em

    cenrio econmico

    adverso

    nio Meinen advogado, ps-graduado em direito

    (FGV/RJ) e em gesto estratgica de pessoas (UFRGS)

    e autor/coautor de vrios artigos e livros sobre

    cooperativismo financeiro rea na qual milita h 31

    anos , entre eles Cooperativismo financeiro: percurso

    histrico, perspectivas e desafios. Atualmente,

    diretor de operaes do Banco Cooperativo do Brasil

    (Bancoob).

    Asco

    m/B

    an

    co

    ob

    nio Meinen

    RUMOS 16 Janeiro/Fevereiro 2015

    Para o cooperativismo

    financeiro, o fato de a

    concorrncia retrair-se

    no crdito gera uma

    grande oportunidade

    * Sistema Financeiro Cooperativo

    Data-base: Terceiro Trimestre de 2014

  • nifica entender que existem dificuldades, pois nos coloca-

    mos numa situao muito difcil; e entender que para sair des-

    sa situao vamos precisar de um grande esforo. Realmente

    vamos precisar acionar diversos mecanismos, envolver

    diversos atores, e mesmo com todo esse esforo precisare-

    mos enxergar de uma forma realista e entender que talvez

    algum grau, por exemplo, de mudanas climticas ou de

    escassez de recursos, vamos vivenciar e precisaremos lidar

    com essa situao. Mas no fazer nada muito pior, claro,

    ento precisamos fazer alguma coisa.

    Rumos No livro, o senhor faz uma comparao entre a

    crise financeira de 2008 e a crise de 1929. No seria um

    exagero fazer essa relao ou o impacto da recente crise

    foi realmente comparvel quela grande crise mundial?

    Matias A comparao das duas crises vlida porque foi a

    maior crise global aps 1929, afetou o mundo inteiro e teve

    como epicentro os Estados Unidos, no centro nervoso do sis-

    tema econmico mundial. Ento, de fato, foi uma crise muito

    grande. Parece que ela no vai durar tanto quanto a de 1929 e

    talvez no tenha efeito to grande como foi. Mas eu acho que

    a comparao mais importante entre as duas crises atuais: a

    crise financeira, de que bem ou mal o mundo est saindo,

    alguns pases mais rpido que outros; e a crise ambiental. A

    que est o grande paralelo. A crise financeira e a crise ambien-

    tal resultam de incentivos perversos. As duas so do mesmo

    tipo de mentalidade predatria que faz com que se leve em

    conta o curto prazo em detrimento do longo prazo. A mesma

    mentalidade que leva ao desequilbrio financeiro, porque exis-

    RUMOS 18 Janeiro/Fevereiro 2015 RUMOS 19 Janeiro/Fevereiro 2015

    umos A obra possui um formato diferente,

    em que o senhor pontua algumas passagens

    com um pouco de literatura, existe um perso-

    nagem que permeia o livro. Por que a escolha dessa

    metodologia?

    Eduardo Felipe Matias Eu crio este personagem no in-

    cio do livro e ele volta a aparecer prximo ao meio e no final,

    exatamente para trazer o leitor para dentro do problema, para

    envolv-lo nessa situao. O personagem um professor e

    no tem nome, talvez seja esse o objetivo: tentar fazer com

    que as pessoas se identifiquem com este personagem e perce-

    bam que somos ns todos que estamos contra as cordas.

    Agora, o livro tem uma forma de apresentao que muito

    didtica, mas no romanceada. A pessoa se envolve com

    essa situao do professor e provavelmente vai ler o livro

    como se estivesse participando daquelas aulas, mas se envol-

    vendo com aquela realidade. Foi um objetivo de aumentar o

    envolvimento do leitor exatamente porque esse um proble-

    ma que s se soluciona com o envolvimento de todos ns.

    Como eu digo no livro, no um problema que se resolve

    com uma ao de apenas um ou outro ator, depende do crcu-

    lo virtuoso da sustentabilidade que envolve diversos atores,

    entre eles cada um de ns, cada indivduo.

    Rumos O senhor defende que a busca pela sustentabi-

    lidade no uma utopia, mas uma necessidade. Por

    qu? Ela verdadeiramente vivel?

    Matias importante ser realista na raiz do problema. Ser

    realista no significa ter posio derrotista, ao contrrio, sig-

    Por Thais Sena Schettino

    te uma preocupao em apurar lucros imediatos indepen-

    dentemente da capacidade dessas empresas de lucrar em lon-

    go prazo, leva tambm a esgotar os recursos naturais a curto

    prazo. Esse o paralelo mais importante.

    A globalizao, sobretudo no modo como encarada

    hoje, uma expanso do capitalismo, para um capitalismo de

    livre mercado, de desregulamentao da economia, e por a

    segue. E o que a gente constatou com a crise de 2008, e tem

    constatado com a crise ambiental, que esse modelo tem limi-

    MEIO AMBIENTE

    R tes muito srios e resolver ou superar essas limitaes depen-de, em grande parte, do papel do Estado, que no pode ser empresrio. uma lio que fica: o Estado no um bom

    empresrio e isso j foi assimilado, mas tambm no pode dei-

    xar de exercer uma funo de supervisionar e de criar estmu-

    los e incentivos positivos para o mercado. Essa crise veio mos-

    trar que a desregulamentao total perigosa em relao glo-

    balizao e, portanto, h de se ter cuidado. E a crise ambiental

    veio mostrar tambm que esse modelo do crescimento inces-

    sante, do crescimento que tem limite, tambm no vivel,

    no sustentvel e que por isso preciso repensar o modelo.

    Repensar o modelo, que baseado no consumo, para refor-

    mular o capitalismo para que ele possa sobreviver.

    Rumos Neste sentido, o senhor tem pontuado que

    preciso ser criativo e encontrar sadas no capitalismo, e

    no fora dele. Isso possvel?

    Matias possvel e, devo dizer mais, temos obrigao de

    tentar porque de fato o capitalismo, e mais que o capitalismo,

    a globalizao tem condies para tal. A globalizao pode

    ser vista como um inimigo, com essa nfase no crescimento e

    na produo incessantes, mas ela tambm um aliado medi-

    da que se precisa de novas tecnologias de baixo carbono para

    combater principalmente as mudanas climticas. um pode-

    roso aliado para espalhar mais rapidamente essas tecnologias,

    mas preciso tambm uma nova mentalidade, que entenda

    que esse consumismo excessivo prejudicial ao planeta. E

    como que se vai espalhar essa mentalidade? Mais uma vez,

    positivo voc ter, talvez pela primeira vez na histria, um

    E ENTREVISTA Eduardo Felipe Matias

    O advogado Eduardo Felipe Matias, especialista em direito internacional,

    ganhador do Prmio Jabuti em 2006, na categoria Economia, Negcios,

    Administrao e Direito, no esconde sua preocupao com o futuro do planeta:

    temos que mudar radicalmente a nossa forma de ser e viver. A crise ambiental

    veio mostrar que esse modelo do crescimento incessante no vivel, no

    sustentvel e que por isso preciso repensar o modelo. Em seu mais recente

    livro, A humanidade contra as cordas, o advogado apresenta dados, expem

    estudos e no deixa dvida de que estamos no caminho para o esgotamento

    dos recursos naturais. Mas sua viso no pessimista, e, sim, realista. Existem

    solues a serem buscadas, que passam pelo engajamento e pela adaptao

    das populaes aos novos tempos. Confira!

    Engajamento para uma nova realidade

    Div

    ulg

    a

    o

    A humanidade contra as

    cordas

    Eduardo Felipe P. Matias

    Paz e Terra, 364p., 2014.

  • nifica entender que existem dificuldades, pois nos coloca-

    mos numa situao muito difcil; e entender que para sair des-

    sa situao vamos precisar de um grande esforo. Realmente

    vamos precisar acionar diversos mecanismos, envolver

    diversos atores, e mesmo com todo esse esforo precisare-

    mos enxergar de uma forma realista e entender que talvez

    algum grau, por exemplo, de mudanas climticas ou de

    escassez de recursos, vamos vivenciar e precisaremos lidar

    com essa situao. Mas no fazer nada muito pior, claro,

    ento precisamos fazer alguma coisa.

    Rumos No livro, o senhor faz uma comparao entre a

    crise financeira de 2008 e a crise de 1929. No seria um

    exagero fazer essa relao ou o impacto da recente crise

    foi realmente comparvel quela grande crise mundial?

    Matias A comparao das duas crises vlida porque foi a

    maior crise global aps 1929, afetou o mundo inteiro e teve

    como epicentro os Estados Unidos, no centro nervoso do sis-

    tema econmico mundial. Ento, de fato, foi uma crise muito

    grande. Parece que ela no vai durar tanto quanto a de 1929 e

    talvez no tenha efeito to grande como foi. Mas eu acho que

    a comparao mais importante entre as duas crises atuais: a

    crise financeira, de que bem ou mal o mundo est saindo,

    alguns pases mais rpido que outros; e a crise ambiental. A

    que est o grande paralelo. A crise financeira e a crise ambien-

    tal resultam de incentivos perversos. As duas so do mesmo

    tipo de mentalidade predatria que faz com que se leve em

    conta o curto prazo em detrimento do longo prazo. A mesma

    mentalidade que leva ao desequilbrio financeiro, porque exis-

    RUMOS 18 Janeiro/Fevereiro 2015 RUMOS 19 Janeiro/Fevereiro 2015

    umos A obra possui um formato diferente,

    em que o senhor pontua algumas passagens

    com um pouco de literatura, existe um perso-

    nagem que permeia o livro. Por que a escolha dessa

    metodologia?

    Eduardo Felipe Matias Eu crio este personagem no in-

    cio do livro e ele volta a aparecer prximo ao meio e no final,

    exatamente para trazer o leitor para dentro do problema, para

    envolv-lo nessa situao. O personagem um professor e

    no tem nome, talvez seja esse o objetivo: tentar fazer com

    que as pessoas se identifiquem com este personagem e perce-

    bam que somos ns todos que estamos contra as cordas.

    Agora, o livro tem uma forma de apresentao que muito

    didtica, mas no romanceada. A pessoa se envolve com

    essa situao do professor e provavelmente vai ler o livro

    como se estivesse participando daquelas aulas, mas se envol-

    vendo com aquela realidade. Foi um objetivo de aumentar o

    envolvimento do leitor exatamente porque esse um proble-

    ma que s se soluciona com o envolvimento de todos ns.

    Como eu digo no livro, no um problema que se resolve

    com uma ao de apenas um ou outro ator, depende do crcu-

    lo virtuoso da sustentabilidade que envolve diversos atores,

    entre eles cada um de ns, cada indivduo.

    Rumos O senhor defende que a busca pela sustentabi-

    lidade no uma utopia, mas uma necessidade. Por

    qu? Ela verdadeiramente vivel?

    Matias importante ser realista na raiz do problema. Ser

    realista no significa ter posio derrotista, ao contrrio, sig-

    Por Thais Sena Schettino

    te uma preocupao em apurar lucros imediatos indepen-

    dentemente da capacidade dessas empresas de lucrar em lon-

    go prazo, leva tambm a esgotar os recursos naturais a curto

    prazo. Esse o paralelo mais importante.

    A globalizao, sobretudo no modo como encarada

    hoje, uma expanso do capitalismo, para um capitalismo de

    livre mercado, de desregulamentao da economia, e por a

    segue. E o que a gente constatou com a crise de 2008, e tem

    constatado com a crise ambiental, que esse modelo tem limi-

    MEIO AMBIENTE

    R tes muito srios e resolver ou superar essas limitaes depen-de, em grande parte, do papel do Estado, que no pode ser empresrio. uma lio que fica: o Estado no um bom

    empresrio e isso j foi assimilado, mas tambm no pode dei-

    xar de exercer uma funo de supervisionar e de criar estmu-

    los e incentivos positivos para o mercado. Essa crise veio mos-

    trar que a desregulamentao total perigosa em relao glo-

    balizao e, portanto, h de se ter cuidado. E a crise ambiental

    veio mostrar tambm que esse modelo do crescimento inces-

    sante, do crescimento que tem limite, tambm no vivel,

    no sustentvel e que por isso preciso repensar o modelo.

    Repensar o modelo, que baseado no consumo, para refor-

    mular o capitalismo para que ele possa sobreviver.

    Rumos Neste sentido, o senhor tem pontuado que

    preciso ser criativo e encontrar sadas no capitalismo, e

    no fora dele. Isso possvel?

    Matias possvel e, devo dizer mais, temos obrigao de

    tentar porque de fato o capitalismo, e mais que o capitalismo,

    a globalizao tem condies para tal. A globalizao pode

    ser vista como um inimigo, com essa nfase no crescimento e

    na produo incessantes, mas ela tambm um aliado medi-

    da que se precisa de novas tecnologias de baixo carbono para

    combater principalmente as mudanas climticas. um pode-

    roso aliado para espalhar mais rapidamente essas tecnologias,

    mas preciso tambm uma nova mentalidade, que entenda

    que esse consumismo excessivo prejudicial ao planeta. E

    como que se vai espalhar essa mentalidade? Mais uma vez,

    positivo voc ter, talvez pela primeira vez na histria, um

    E ENTREVISTA Eduardo Felipe Matias

    O advogado Eduardo Felipe Matias, especialista em direito internacional,

    ganhador do Prmio Jabuti em 2006, na categoria Economia, Negcios,

    Administrao e Direito, no esconde sua preocupao com o futuro do planeta:

    temos que mudar radicalmente a nossa forma de ser e viver. A crise ambiental

    veio mostrar que esse modelo do crescimento incessante no vivel, no

    sustentvel e que por isso preciso repensar o modelo. Em seu mais recente

    livro, A humanidade contra as cordas, o advogado apresenta dados, expem

    estudos e no deixa dvida de que estamos no caminho para o esgotamento

    dos recursos naturais. Mas sua viso no pessimista, e, sim, realista. Existem

    solues a serem buscadas, que passam pelo engajamento e pela adaptao

    das populaes aos novos tempos. Confira!

    Engajamento para uma nova realidade

    Div

    ulg

    a

    o

    A humanidade contra as

    cordas

    Eduardo Felipe P. Matias

    Paz e Terra, 364p., 2014.

  • E ENTREVISTA mundo realmente interligado, interdependente, em que cada

    vez mais a influncia cultural recproca.

    Respondendo pergunta, sobre se de fato possvel, acre-

    dito que para reverter esse quadro preciso transformar a

    nossa economia, caminhar realmente para uma economia ver-

    de e para uma sociedade mais verde, e para isso importante a

    globalizao. Ela pode ser maleada e, portanto, possvel

    sim. Agora, essa uma viso realista. possvel dentro de

    determinadas limitaes que existem, porque muitos pases

    ainda precisam crescer, muitas populaes ainda precisam ter

    acesso a bens materiais e por a vai; e isso vai ter, quase que ine-

    vitavelmente, um efeito. Energias renovveis, por exemplo,

    que sejam menos nocivas ao meio ambiente numa escala

    necessria para atender grandes populaes, algo que pode

    levar mais tempo.

    Rumos Nessa linha, o senhor sinaliza que pela primei-

    ra vez existe esse cenrio em que a humanidade tam-

    bm dispe de recursos para procurar essas solues.

    Matias isso, precisamos destravar esse potencial criativo

    e empreendedor. Da mesma forma que o Estado tem um

    papel, uma vez que ele que d a sinalizao de que as emis-

    ses de carbono e o uso excessivo de recursos deveriam ser

    penalizados de alguma forma, as empresas tambm tm que

    reagir a esses estmulos e gerar novas tecnologias. As empre-

    sas podem ser pressionadas e podem ser persuadidas; alis,

    elas devem ser pressionadas e persuadidas. Pressionadas no

    sentido de que a regulao, o consumidor mais consciente ou

    outras empresas que j adotaram modelos mais sustentveis

    pressionam para que essas empresas tambm o faam. E per-

    suadidas no sentido de que temos que mostrar para as empre-

    sas que existe um business case, a sustentabilidade pode ser um

    bom negcio. Elas provavelmente tero melhor reputao,

    maior envolvimento com os seus empregados, podero

    explorar novos nichos de mercado mais vezes, vo ter redu-

    o de custos, porque vo ser mais eficientes. Ento, existem

    sim muitos motivos para convencer as empresas que a sus-

    tentabilidade um bom negcio.

    Rumos Seguindo o ttulo da obra, o senhor coloca que

    a questo da sustentabilidade uma luta contra a huma-

    nidade, contra ns mesmos: somos nossos prprios opo-

    nentes. Isso facilita ou complica esse confronto?

    Matias Por que eu uso a imagem do boxeador? Porque

    exatamente isso, em algum momento esse personagem expli-

    ca que no final uma luta: ficamos atordoados, ficamos con-

    tra as cordas e com dificuldade de reagir, e em determinado

    momento percebemos que o boxeador que est do outro

    lado somos ns mesmos. E a dificuldade exatamente essa

    percebemos que para mudar, para superar esse problema,

    temos que mudar radicalmente a nossa forma de ser e viver, e

    existe uma inrcia muito grande, as pessoas continuam fazen-

    do as coisas da mesma forma como sempre fizeram, preciso

    romper isso. E de fato eu acho que dificulta. Dificulta porque

    se trata apenas de mudar as empresas ou s mudar os gover-

    nos, temos que mudar toda nossa forma de ser e de pensar

    como sociedade. Ento, de fato uma misso difcil, mas a

    misso do nosso tempo. a misso da nossa era.

    Rumos As campanhas globais de mobilizao, como

    Um Dia sem Automvel, podem levar a uma sada a

    essa inrcia ou ser preciso pensar em algo ainda mais

    revolucionrio para fazer as pessoas buscarem alter-

    nativas?

    Matias As campanhas ajudam, mas ser preciso haver

    todas essas aes ao mesmo tempo agora. Esse o ponto:

    preciso criar um crculo virtuoso de sustentabilidade e todas

    essas aes ajudam. Quando se estimulam as empresas a per-

    ceberem que a sustentabilidade pode ser um bom negcio e

    faz-se com que elas se movam, algo que ajuda. Quando uma

    empresa quer pressionar o seu fornecedor porque ela tam-

    bm quer ser mais sustentvel, e ento quer influenciar sua

    cadeia de suprimentos, ajuda. Tambm quando se diz que o

    governo tem que criar regulaes que obriguem as empresas

    a serem mais sustentveis e talvez nada seja mais efetivo

    hoje em dia do que criar algum tipo de precificao do carbo-

    no, ou seja, atribuir um preo s emisses de gs de efeito estu-

    fa; isso pode ser feito por meio de um tributo, por meio de

    licenas de emisso, mas tem que existir, porque daria um

    sinal muito claro para as empresas, os mercados e para a soci-

    edade de que o comportamento ao comprar um produto, ao

    fabricar um produto que tem alto grau de emisses de carbo-

    no em sua produo, prejudicial ao meio ambiente. Ento, a

    soma de todos esses pequenos mecanismos e aes que

    podem levar a reverter a situao atual.

    Rumos Em suas palavras, nos livros e aulas que minis-

    tra, parece haver certo ceticismo quanto efetivao des-

    sas mudanas...

    Matias O tom do livro realista e ao ser realista no d para

    simplesmente dizer tudo vai se resolver num passe de mgi-

    ca com a descoberta de uma nova tecnologia, ou com a cria-

    o de imposto sobre o carbono, ou o que quer que seja. Ao

    contrrio, temos que constatar que, mesmo com todas essas

    aes necessrias, ainda assim possvel que no d tempo de

    deter absolutamente as mudanas climticas, e a que entra a

    questo da adaptao. Hoje, a posio responsvel diz que

    RUMOS 20 Janeiro/Fevereiro 2015 RUMOS 21 Janeiro/Fevereiro 2015

    ns temos que fazer todo o possvel para resolver o problema

    e temos que fazer j. Agora, sendo realista, existem pases que

    ainda vo continuar a crescer, muitos deles usando energias

    que ainda no so as mais limpas e, portanto, ns temos que

    pensar em alternativas que nos garantam ou que evitem

    outros problemas que podem surgir em decorrncia das

    mudanas climticas. Estamos falando basicamente de adap-

    tao. O tom realista. No ctico no sentido de isso no

    vai acontecer; realista no sentido de que, mesmo no

    melhor cenrio... quer dizer, o melhor cenrio seria de uma

    grande descoberta de uma tecnologia nova disruptiva que

    resolvesse o problema de fornecimento de energia do mundo

    e por a vai; ou seja, isto algo que impondervel. Dentro do

    script normal,