19
DIREITOS HUMANOS, GÊNERO E DIVERSIDADE NA ESCOL SABERES PLURAIS interdisciplinaridade e diversidades na cultura escolar e no cotidiano Ana Lucia Camargo Ferraz Andrea Paula dos Santos Oliveira Kamensky Carla Adriana Menegotto Débora Cristina Stela Denise de Oliveira Moreira Eliana Sodré Mendes Graciela de Souza Oliver João Reynaldo Pires Junior Kelly Durval Simplício Barbosa Leticia Santiago Barbosa Lindinalva Cavalcante A. Morales Luana Leite Silva Souza Maria Luiza Rovaris Cidade Marta Gouveia de Oliveira Rovai Monique Hulshof Patricia Cristina Poiatti Ponchio Pedro Paulo Gastalho de Bicalho Rosana Alvim Yamanaka Rodrigo Garcez (fotos # VOTELGBT) Suzana Lopes Salgado Ribeiro Wanderley Francisco Santana da Silva

SABERES PLURAIS - … · de Relações Étnico-Raciais e, a partir daí, refletir sobre como chegam às escolas e como se articulam ao currículo na prática pedagógica dos professores

  • Upload
    buique

  • View
    212

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

DIREITOS HUMANOS, GÊNERO E DIVERSIDADE NA ESCOLA

O projeto Gênero e Diversi-dade na Escola, criado em uma parceria entre o Ministério da Educa-ção, a Universidade Federal do ABC, a Secretaria de Direitos Humanos e Cidadania e a Secretaria de Edu-cação da Prefeitura de São Paulo, desenvolveu um curso de aperfeiço-amento voltado para educadoras/es e pessoas da comunidade escolar dispostas a construir novos conheci-mentos e autoconhecimento por meio de quatro eixos temáticos:

1. Diversidades

2. Gênero

3. Sexualidades

4. Relações Étnico-Raciais

A metodologia foi desenvolvida a partir da elaboração de escritos autobiográficos em diários, cons-tituindo um memorial em que cada cursista pode relacionar sua própria história de vida e experiências pes-soais com essas temáticas, reunindo elementos de suas vivências e apren-dizados para a construção de um projeto de intervenção.

Nosso objetivo é sensibilizar a comunidade escolar para esses sabe-res, cruzando categorias de análise da realidade social para produção de novos conhecimentos em práticas educativas e culturais, transformado-ras do cotidiano escolar. Buscamos favorecer uma formação humana in-tegral, voltada para o aprendizado, a compreensão e o convívio com as

diferenças, não permitindo que estas sejam transformadas em desigualda-des, combatendo assim todo tipo de preconceito e promovendo uma cul-tura de paz, o reconhecimento das diversidades culturais com garantia de direitos humanos.

Neste volume temos uma coletâ-nea de variados artigos de pesqui-sadores de universidades de todo o Brasil, com diversos olhares e per-cepções, em torno das temáticas de diversidades e relações étnico-ra-ciais em diferentes espaços, gênero e representatividade e gênero e diver-sidade no espaço escolar.

Esperamos que o conjunto des-sas contribuições ajudem a construir saberes plurais e inspirem práticas inter e transdisciplinares pautadas pelo projeto Gênero e Diversidade na Escola na UFABC e por todo o Brasil, provocando novas pesquisas e estudos de diversas áreas de co-nhecimento sobre os Eixos Temáticos interseccionalizados do curso GDE UFABC, a saber: Diversidades, Gê-nero, Sexualidades e Relações Étni-co-Raciais.

A Série Direitos Humanos, Gênero e Diversidade na Escola é composta por livros impressos e digitais, com financiamento do Ministério da Educação - MEC em parceria com a Secretaria de Direitos Humanos e Cidadania da Prefeitura de São Paulo e a Universidade Federal do ABC. Os livros apresentam boa parte da produção colaborativa de conhecimentos realizada por cursistas, professores/as e pesquisadores/as do Curso de Aperfeiçoamento Gênero e Diversidade na Escola (GDE UFABC). A formação docente continuada em Educação a Distância (EaD, modalidade semi-presencial) foi desenvolvida entre os anos de 2015 e 2016, em oito polos da Rede UniCEU (Centros Educacionais Unificados - CEUs - Azul da Cor do Mar, Butantã, Navegantes, Paraisópolis, Perus, São Mateus, São Rafael e Vila do Sol).

A Série traz, em seu primeiro volume, um panorama histórico geral e algumas experiências locais e regionais de abrangência nacional, com ampla reflexão acerca das políticas públicas educacionais em Direitos Humanos, Gênero e Diversidade na Escola desenvolvidas pelo MEC e por inúmeras universidades na última década, com formação docente continuada de milhares de pessoas em todo Brasil.

Em seis volumes, apresenta também a reunião da produção individual e coletiva de escritos autobiográficos e projetos de educadores/as das periferias de São Paulo e das regiões metropolitanas, em diálogo com quatro Eixos Temáticos: Diversidade; Gênero; Sexualidade e Relações Étnico-Raciais. Outros quatro volumes trazem resul-tados de pesquisas e práticas metodológicas sobre Danças Circulares e Diversidades Culturais: Educação para uma Cultura de Paz; Gênero e Diversidades Sexuais; Sa-beres Interdisciplinares sobre Gênero e Relações Étnico-Raciais no Cotidiano e na Cultura Escolar; e História Oral e Audiovisual e as Experiências e Protagonismos nas Entrevistas Autobiográficas de Educadoras/es da Periferia de São Paulo.

Todos esses onze volumes da Série também são disponibilizados em formato impresso e em e-books, com mais um livro-bônus, apenas em formato digital, conten-do diversos artigos e outros materiais didáticos, totalizando doze volumes disponibili-zados numa plataforma colaborativa na internet, a DigitalPlural.

SAB

ERES

PLU

RA

IS

SABERES PLURAIS

interdisciplinaridade e diversidades na cultura escolar e no cotidiano

Ana Lucia Camargo Ferraz Andrea Paula dos Santos Oliveira Kamensky Carla Adriana Menegotto Débora Cristina Stela Denise de Oliveira Moreira Eliana Sodré Mendes Graciela de Souza Oliver João Reynaldo Pires Junior Kelly Durval Simplício Barbosa Leticia Santiago Barbosa Lindinalva Cavalcante A. Morales Luana Leite Silva Souza Maria Luiza Rovaris Cidade Marta Gouveia de Oliveira Rovai Monique Hulshof Patricia Cristina Poiatti Ponchio Pedro Paulo Gastalho de Bicalho Rosana Alvim Yamanaka Rodrigo Garcez (fotos # VOTELGBT) Suzana Lopes Salgado Ribeiro Wanderley Francisco Santana da Silva

GDE UFABC

DIRE I TOS HUMANOS, GÊNERO E D IVERS IDADE NA ESCOLA

SABERES PLURAIS

Baixe gratuitamente todos os livros da Editora Pontocom no site

www.editorapontocom.com.br

SABERES PLURAIS

interdisciplinaridade e diversidades na cultura escolar e no cotidiano

DIREITOS HUMANOS, GÊNERO E DIVERSIDADE NA ESCOLA

Ana Lucia Camargo Ferraz Andrea Paula dos Santos Oliveira Kamensky Carla Adriana Menegotto Débora Cristina Stela Denise de Oliveira Moreira Eliana Sodré Mendes Graciela de Souza Oliver João Reynaldo Pires Junior Kelly Durval Simplício Barbosa Leticia Santiago Barbosa Lindinalva Cavalcante A. Morales Luana Leite Silva Souza Maria Luiza Rovaris Cidade Marta Gouveia de Oliveira Rovai Monique Hulshof Patricia Cristina Poiatti Ponchio Pedro Paulo Gastalho de Bicalho Rosana Alvim Yamanaka Rodrigo Garcez (fotos # VOTELGBT) Suzana Lopes Salgado Ribeiro Wanderley Francisco Santana da Silva

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)Bibliotecária responsável: Aline Graziele Benitez CRB-1/3129

S119

1.ed.

Saberes plurais: interdisciplinaridade e diversidades na cultura es-colar e no cotidiano / Ana Lucia Camargo Ferraz... [et al.]. – 1.ed. – São Paulo: Editora Pontocom, 2016.Recurso digital

Formato: pdfRequisitos do sistema: adobe digital editionsModo de acesso: Word wide webISBN: 978-85-66048-84-1

1. Direitos humanos. 2. Relação étnico-racial. 3. Gênero. 4. Diversidade cultural. I. Stela, Débora Cristina ... [et al.]. II. Título.

CDD 323

Índice para catálogo sistemático:

1. Direitos humanos 323

Projeto gráfico e capa: Isabela A. T. Veras

Preparação de conteúdo: Marcia Borges

Revisão: Nora Augusta Correa

Diagramação: Fabricando Ideias

Produção de E-pub / Mobi: HM Editorial e Digital: Guilherme Henrique Martins Salvador

Este trabalho está licenciado sob uma Licença Creative Commons Atribuição--NãoComercial 4.0 Internacional. Para ver uma cópia desta licença, visite http://creativecommons.org/licenses/by-nc/4.0

GDE UFABC

Problematizando a questão da educação das relações étnico- -raciais: panorama de pesquisas sobre política educacional

para a educação das relações étnico-raciais no Brasil

Suzana Lopes Salgado Ribeiro1

Eliana Sodré Mendes2

Com objetivo de compreender as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de Relações Étnico-Raciais e, a partir daí, refletir sobre como chegam às escolas e como se articulam ao currículo na prática pedagógica dos professores no cotidiano escolar, sele-cionamos uma série de trabalhos sobre tal temática para reflexão.

A seguir apresentaremos o percurso desde a seleção de descritores no processo de busca até a constituição de uma “plataforma possibilitadora” (referencial possibilitador) de questionamentos – perguntas e respostas que geraram outras reflexões em relação ao tema proposto.

A revisão bibliográfica aqui apresentada é parte de uma pesquisa em andamento que objetiva analisar narrativas de professores do ensino fundamental acerca de como a temá-tica raça e etnia é tratada no cotidiano escolar após mais de uma década passada, desde a implementação da Lei 10.639/03.

Metodologia

A seleção de trabalhos para a problematização da temática inclusão e diversidade pelo viés da Lei 10.639/03 centrou-se nos descritores política educacional; raça; etnia; lei 10.639 e educação de relações étnico-raciais. Recorremos a teses de mestrado e de douto-rado da Universidade Estadual Paulista (UNESP), Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e Universidade de São Paulo (USP). Num segundo momento partimos para a seleção de artigos publicados em revistas e periódicos referenciados.

1 Graduada em História pela Universidade de São Paulo, onde também concluiu mestrado e doutorado em História Social. Professora da UNITAU na graduação e nos programas de Mestrado em Desenvolvimento Humano e Mestrado Profissional em Educação.

2 Estudante do Mestrado Profissional em Educação da Universidade de Taubaté (UNITAU)

Como critério de seleção optou-se por publicações entre os anos de 2004 e 2014. À medida que avançamos na leitura, outros temas foram surgindo com necessidade de pes-quisa e leitura crítica, dentre eles estudos culturais e multiculturalismo; os conceitos de identidade e diferença e política de direitos sociais.

A leitura fomentou a necessidade de revisitação, sob análise crítica e mais detalhada, da história acerca do processo de escravidão e do abolicionismo no Brasil e, ainda, sobre o projeto de construção de uma identidade nacional.

Nesse caminhar, nove trabalhos foram selecionados num primeiro momento, segui-dos pela seleção de um artigo de 2015, cujo foco constitui apresentar a cronologia da le-gislação e de ações afirmativas de inclusão para o negro (SOUZA e RIBEIRO, 2015).

Apresentaremos adiante a análise das leituras realizadas demarcando o desenvolvi-mento da temática, a metodologia e os instrumentos utilizados nas respectivas pesquisas e as contribuições sinalizadas pelos autores.

Para uma apresentação mais didática distribuímos os trabalhos selecionados, organi-zados pelos temas em que mais contribuíram como repertório de problematização, com-preensão e direcionamento teórico metodológico enquanto objetos de pesquisa no campo educacional, sobre os quais pretendemos trabalhar na dissertação de mestrado em Profis-sional em Educação.

Apresentaremos o fichamento da leitura realizada contemplando a descrição do títu-lo de cada trabalho, os temas desenvolvidos, a metodologia que sustentou a prática de pesquisa e as contribuições segundo a ótica dos respectivos autores. Em seguida apresen-taremos uma análise por meio do diálogo entre os textos dos respectivos grupos constituí-dos como segue abaixo.

No primeiro grupo, nomeado Períodos Históricos: do pós-abolição às políticas de cotas, organizamos três artigos e uma dissertação de doutorado, cuja contribuição foi, de ime-diato, tratar do como os autores discorreram sobre o contexto histórico da formação da nação brasileira, o papel dos negros africanos e o ensino deste tema ao longo desses anos. Contudo, a maior contribuição foi a possibilidade de nos depararmos com os diferentes posicionamentos dos autores acerca da compreensão das atuais políticas de cotas.

O segundo tópico, Prática docente e o ensino de cidadania e de relações étnico-raciais, está organizado a partir de dois artigos que contribuíram para compor um referencial acerca de pesquisa sobre a relação entre o ensino de disciplinas como História e Ciências Natu-rais na educação básica e o ensino de Cidadania e de Relações Étnico-Raciais – conteúdo que contribui para pensarmos na análise das práticas docentes, conhecimento didático--pedagógico e práticas de ensino.

Por último, no item denominado Identidades Étnico-Raciais: multiculturalismo, currí-culo e sujeito, destacamos dois artigos, uma tese de doutorado e uma dissertação de mes-trado que nos lançaram a pensar nas abordagens analíticas, na escolha do método e dos

38 • Direitos Humanos, Gênero e Diversidade na Escola

aportes teóricos para análise dos dados. Dentre eles, podemos visualizar análises nortea-das pela Análise de Discurso, pelas Representações Sociais, por Ciclos de Políticas e pela Centralidade da Cultura no Currículo-Multiculturalismo.

Períodos históricos: do pós-abolição às políticas de cotas

Os trabalhos a seguir têm como destaques por nós assinalados como os autores, cada um a seu estilo, documentou por diferentes vieses o recorte sócio-histórico desde o perío-do pós-abolição até os movimentos que deflagraram as consultas realizadas pelos Conse-lhos de Educação de Municípios, Estados e Federação quanto ao anseio da população negra de reconhecimento e valorização de sua participação e de sua cultura no contexto nacional.

Contribuíram ainda com importantes reflexões sobre direitos e o tratamento didático do tema racismo no decorrer do processo de construção de políticas educacionais no Brasil, além de fornecerem elementos para se pensar em metodologias de trabalho em pesquisa educacional.

Em As relações étnico-raciais e a implementação da Lei 10.639/03 em Fortaleza-CE, Ma-deira e Costa, num artigo de 2012, por meio de uma pesquisa qualitativa desenvolveram a temática colhendo dados junto a professores, alunos e funcionários de duas escolas e ao realizarem oficina temática, a partir da análise do filme “Vista Minha Pele”.

Dentre os temas desenvolvidos o destaque fica para a discussão sobre sistema edu-cacional e desigualdade racial; ideologia de igualdade na escola; racismo e ações valora-tivas; complexidade na e para a implementação da Lei 10.639/03; culminando com a discussão sobre o enfrentamento do racismo num país que não se reconhece racista, segundo as autoras.

Como contribuição o destaque fica para a possibilidade de pesquisas sob outro foco, pois as autoras concluem que:

A pesquisa explicitou que ao tematizar a discriminação racial, os entrevistados, em sua maioria, associavam as práticas discriminatórias raciais à homofobia, sexismo, machismo, não centrando na particularidade racial, de modo a diluir em meio às demais (MADEIRA e COSTA, 2012, p. 336).

A tese de doutorado em Serviço Social de Silva (2013) intitulada Escola e questão ra-cial: avaliação dos estudantes foi desenvolvida por meio de análise bibliográfica, entrevistas semiestruturadas e análise de conteúdo. Os temas abordados trabalharam sobre a questão racial nas escolas, currículo, prática docente e formação de professores. O foco principal esteve no posicionamento dos alunos revelado nas entrevistas.

Como contribuição a autora conclui que:

Saberes Plurais • 39

[...] nos programas escolares conhecidos, ou mesmo nos programas de curso de univer-sidades, não há um estudo sistemático sobre o surgimento do preconceito racial. Essa pe-dagogia se estrutura apenas no fato de negros terem sido escravizados no passado e no presente terem como consequência a ocupação de posições subalternas ou marginais na sociedade. Questões relativas ao ideal de branqueamento e propaganda negativa a respeito do negro são estudadas a fundo somente por especialistas (SILVA, 2013, p.164).

Silva e Ronco (2012), no artigo intitulado Relações étnico-raciais e cidadania: história e cultura afro-brasileira como fatores fundamentais para construção do cidadão afrodescendente a partir da pós-abolição revisitaram o histórico das Constituições Brasileiras e discutiram sobre cotas étnico-raciais como política afirmativa. As autoras recorreram à análise crítica dos documentos legais e das ações do Supremo Tribunal Federal. Assim expressaram a contribuição do trabalho:

[...] só poderá existir uma total supremacia da Constituição, em seu sentido genuíno, colocando lado a lado, em um mesmo patamar de igualdade, a soberania e a garantia dos mesmos direitos a todos sem exceção ou distinção, quando esta mesma luz, a do seu exer-cício, sobreviver sobrepondo e opondo permanentemente a desigualdade política, econô-mica, social e cultural presente na sociedade brasileira. Garantir a cidadania do brasileiro e, principalmente, a dos afrodescendentes é mais do que uma obrigação ou privilégio do Estado e da Constituição brasileira. [...] o princípio da igualdade jurídica em seu conteúdo democrático se encontra perfeitamente em harmonia com os preceitos estabelecidos pela Constituição, tornando-se evidente nas ações afirmativas (SILVA e RONCO, 2012, p. 48).

Souza e Ribeiro (2015), no artigo intitulado Legislação e Ações Afirmativas de Inclusão para o Negro também percorrem o percurso das legislações que sustentaram a política pública em educação que culminou com a Lei 10.639/03 atualizada em 2008. As autoras desenvolveram análise documental referente ao tema e pesquisa bibliográfica junto a au-tores que trabalham nessa área.

O destaque fica para o desenvolvimento do tema a partir da descrição do cenário em que se deu a elaboração da legislação estudada e o diálogo com os intelectuais contempo-râneos que produziram e produzem estudos sobre a temática étnico-racial.

A contribuição destacada para nosso trabalho em particular fica para o papel da esco-la. Para as autoras, “a legislação aqui apresentada aponta para a universalização dos direi-tos humanos, embora a escola ainda precise consolidar as suas ações para a igualdade de direitos em seus espaços” (SOUZA e RIBEIRO, 2015, p. 5).

Vejamos a seguir o esboço de um diálogo dentre os trabalhos acima apresentados, com intuito de nos referenciar quanto à problematização acerca da temática exposta.

As autoras Silva (2013) e Madeira e Costa (2012) desenvolveram trabalhos seguindo roteiros bem semelhantes. Contextualizam a história da construção do racismo no Brasil.

40 • Direitos Humanos, Gênero e Diversidade na Escola

Discorrem sobre ações legais e educacionais ao longo dos anos, fazem referência ao mito da democracia racial como um importante marco que ainda permeia as relações entre os cidadãos brasileiros. Identificam ações didáticas trabalhadas em espaços de formação docente para o ensino das relações étnico-raciais influenciadas pelas diretri-zes curriculares no sentido de desconstrução de estereótipos e desnaturalização de si-tuações preconceituosas de cunho racista. Percebem a escola como local propício para a formação e afirmação de identidades. Reconhecem ações políticas e práticas docentes na direção do ensino de relações calcadas na justiça e igualdade de direitos, porém di-luídas em contextos socioeconômicos ou reduzidas a uma dimensão individual e não coletiva, naturalizando, ou mantendo a invisibilidade de preconceitos e estereótipos como encontramos nos excertos a seguir:

[As ações afirmativas] auxiliam no processo de desconstrução porque têm como obje-tivo primordial oferecer aos negros as mesmas oportunidades de instrução e emprego ofe-recidas aos brancos (SILVA, 2013, p. 166).

Essas impressões levam a crer que a realidade brasileira, no momento atual, reconhece as desigualdades, dado o papel da mídia, a força do movimento negro e de outras práticas antirracistas (MADEIRA e COSTA, 2012, p. 335).

No entanto os trabalhos apontam para contribuições diferentes no que diz respeito ao posicionamento frente à avaliação das políticas educacionais. Consequentemente, abrem novas possibilidades de condução de pesquisas acerca da temática proposta.

Silva (2013) aponta para o fato de que, por desconhecimento da história da diversida-de e consciência política brasileira, brancos também podem se sentir injustiçados perante ações afirmativas na tentativa de reparo aos atos de racismo e discriminação ao longo da história:

Por outro lado, essas ações constituem um elemento fomentador do preconceito racial porque aguçam a competitividade entre negros e brancos, uma das principais situações que desencadeiam reações preconceituosas. [...] A culminância disso é a criação de uma rivali-dade em que ambos os grupos se veem injustiçados: negros por um passado de opressão e brancos por um presente de perda de espaço social (SILVA, 2013, p. 166).

Madeira e Costa (2012) se deparam com a autoidentificação dos alunos negros calca-da em situações de desvalorização apesar da força da mídia com ações condenando o preconceito, a discriminação e a referência aos estereótipos negativos frente à figura da pessoa negra.

Essas impressões levam a crer que a realidade brasileira, no momento atual, reconhece as desigualdades, dado o papel da mídia, a força do movimento negro e de outras práticas antirracistas. Contudo, incentivar a autoidentificação dos sujeitos e a construção de imple-

Saberes Plurais • 41

mentação de medidas de combate ao racismo e fortalecimento ao perfil identitário negro ainda se faz distante (MADEIRA e COSTA, 2012, p. 335).

Silva e Ronco (2012), seguindo o padrão de mapear historicamente o contexto das relações raciais no Brasil, nos apresentam análise das Constituições Brasileiras e o trato das questões de direito e cidadania. Nesse contexto, desenvolvem o tema negri-tude no período pós-abolição e o correlacionam com as atuais políticas afirmativas, tendo como eixo a Lei 10.639/03. O trecho a seguir conta o caminho escolhido para construção da análise.

Dentro desta perspectiva, busca-se abordar pontos que perpassam pela discussão das cotas étnico-raciais como política afirmativa e por aspectos da história africana e da cultu-ra afro-brasileira, instituída como obrigatória no ensino brasileiro por meio da Lei 10.639, servindo de aporte para contrapor a suposta negatividade do negro apresentada por meio das teorias racistas, conceito de raça e mito da democracia racial num contexto de moder-nização, cujo objetivo era o progresso, o desenvolvimento e a civilização de um Brasil considerado culturalmente atrasado (SILVA e RONCO, 2012, p. 32).

Os autores consideram a obrigatoriedade do ensino da história e da cultura afro--brasileira um importante mecanismo da democracia e de “transformação social para a construção de um novo Brasil” (SILVA e RONCO, 2012, p. 49), sem necessariamente considerar tal política como um fomento ao racismo ou algo que tenha acirrado a bipola-rização racial na nação, como conclui Silva (2013).

Para Souza e Ribeiro a Constituição Brasileira de 1988, ao estabelecer a prática de racismo como crime, inaugura novos tempos e contribui para o fomento a “legislações a favor da causa da inclusão, assim como o estabelecimento e regulamentações de pena-lidades para ações consideradas discriminatórias e preconceituosas” (SOUZA e RI-BEIRO, 2015, p. 3).

A partir desse contexto histórico – social e político – destacado nos trabalhos analisa-dos, vejamos a seguir o que outro conjunto de pesquisas traz acerca da prática docente em relação à temática étnico-racial.

Prática docente e o ensino de cidadania e de relações étnico-raciais

O ensino de relações étnico-raciais, ainda que primeiramente pensado para a discipli-na de História, diz muito do tema cidadania. Este, por sua vez, há muito é referendado dentre os planos de ensino de docentes de toda a parte e contexto sociocultural brasileiro.

Para os trabalhos a seguir, destaca-se, dentre suas inúmeras contribuições, o estudo de como o tema pode ser abordado por conteúdos de diferentes componentes curriculares, e sob quais óticas ou posicionamentos pode o professor atuar: de forma reflexiva crítica ou

42 • Direitos Humanos, Gênero e Diversidade na Escola

de transmissão tida como “neutra”, de conteúdos previamente selecionados por um ou outro programa de ensino, por todas as etapas da educação básica.

No artigo intitulado Educação para as relações étnico-raciais e ensino de história na Edu-cação Básica, de 2012, Azevedo, por meio de análise bibliográfica de fontes normativas da educação básica com ênfase nas relações entre o ensino de História e a educação das re-lações étnico-raciais, aborda a didática no ensino da disciplina História. Eis aí sua grande contribuição.

A pesquisa de caráter propositivo se desenvolve a partir da análise das influências pedagógicas no processo de ensino e de aprendizagem e das possíveis contribuições e ações didáticas como promotoras e valorizadoras de identidades dos alunos de diversos níveis da escolarização básica.

Azevedo centra a pesquisa no ensino das relações étnico-raciais e ensino de História na educação básica chamando a atenção para a necessidade dos docentes conhecerem e terem clareza e coerência no trato com a escolarização e a “atenção para os cuidados que se deve ter com crianças afrodescendentes em prol de um processo educativo marcado pelo respeito à diferença étnico-racial e, portanto antirracista” (AZEVEDO, 2011, p. 177).

A autora discorre sobre as possibilidades de trabalho pedagógico, desde a educação infantil, calcado nos princípios do ensino da História, visando ao ensino das relações ét-nico-raciais não discriminatórias, bem como a valorização das contribuições de afrodes-cendentes, promovendo assim situações de aprendizagem e de formação identitária desde a tenra infância.

A percepção sobre as mudanças e permanências, diferenças e semelhanças no decorrer da história da humanidade é o caminho propício para a percepção, reconhecimento e res-peito dos alunos à diversidade e consequente favorecimento à promoção da autoestima dos discentes, uma vez que inseridos em um processo ensino-aprendizagem valorizador das diferenças individuais (AZEVEDO, 2011, p. 181).

Verrangia e Silva (2010), autores do artigo intitulado Cidadania. Relações étnico-raciais e educação: desafios e potencialidades do ensino de Ciências focam a discussão na educação das relações étnico-raciais e no papel da educação escolar voltada para a cidadania, distan-ciando-se assim da análise do tema sob a ótica voltada estritamente à disciplina de His-tória e encaminhando-a a área das Ciências Naturais.

Os autores tomaram por base a análise da Lei de Diretrizes e Bases 9.394/96, os PCN/2008 e o Parecer CNE/CP003/04 com foco no contexto teórico-metodológico e entendimentos centrais relativos à cidadania, ensino de ciências e às relações étnico-ra-ciais na sociedade brasileira.

Tal como os demais, os autores perpassam a análise pela necessidade de investimentos nos cursos de formação de professores e, nesse caso apontam:

Saberes Plurais • 43

Cabe ainda mencionar a necessidade de que os cursos de formação de professores de Ciências ajudem a questionar processos de seleção de conteúdos [...] Para educar relações étnico-raciais é necessário definir de antemão valores e posturas a serem desenvolvidos pelos estudantes, para depois selecionar conteúdos conceituais e procedimentais de ensino adequados a tal propósito (VERRANGIA & SILVA, 2010 p. 716).

A pesquisa revelou aos autores Verrangia e Silva, no trabalho em grupos de forma-ção de professores, que estes não conseguem visualizar como, em suas aulas, os conteú-dos da disciplina de Ciências podem promover relações étnico-raciais positivas, ainda que afirmem combater situações de discriminação e preconceitos em sala de aula. “Não são poucos os professores que relatam receio de trabalhar com valores”, afirmam os pesquisadores, e “justificam não fazê-lo por temerem piorar a situação” (VERRANGIA e SILVA, 2010, p. 711). Dentre as dificuldades que colaboram para esse temor, desta-cam a divisão das áreas/disciplinas e a distância entre os conceitos científicos e o coti-diano para a vida das pessoas.

A revisão literária até aqui oportunizou refletir sobre o contexto histórico no qual emergem as políticas educacionais em torno da questão étnico-racial, bem como alguns dos tratamentos didático-pedagógicos dispensados por docentes e gestores da educação.

Para além dos conteúdos didático-pedagógicos, há que se compreender a base filosó-fica que sustenta os princípios que norteiam as diretrizes para a educação brasileira. A seguir destacamos conceitos que se tornam inerentes à política educacional proposta na implementação da Lei 10.639/03.

Identidades Étnico-Raciais: multiculturalismo, currículo e sujeitos

Dos trabalhos a seguir destacamos referenciais para desenvolvimento de diferentes tipos de análise, ou seja, do tratamento de dados coletados, com destaque para o desen-volvimento de conceitos como multiculturalismo, currículo e sujeitos no e do processo educacional como política pública.

Dentre os diferentes referenciais para análise pudemos visualizar análises norteadas pela análise de discurso, pelas representações sociais, por ciclos de políticas e pela centra-lidade da cultura no currículo – multiculturalismo.

Oliveira e Miranda (2004), por meio do artigo Multiculturalismo crítico, relações raciais e política curricular: a questão do hibridismo na escola Sarã, analisaram as marcas de uma abordagem curricular multiculturalista no currículo da escola da cidade de Cuiabá. Nele identificaram presenças e ausências da centralidade da cultura no currículo, diretrizes con-flitantes entre a Lei 9.394/96 e os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) e os interes-ses e desejos expressos pela Secretaria Municipal de Educação e comunidade escolar e concluíram que:

44 • Direitos Humanos, Gênero e Diversidade na Escola

[...] ou as agências políticas (SME, comunidade escolar, sindicato dos professores) que possuem uma postura política multicultural perderam a disputa política por espaço no texto (currículo) da Escola Sarã, ou, certamente pelos condicionantes históricos, não só o multiculturalismo crítico como avanço teórico nas abordagens curriculares, como também o racismo e o etnocentrismo permanecem, na melhor das hipóteses, invisíveis para as agên-cias que definiram o texto político da Escola Sarã (OLVEIRA e MIRANDA, 2004, p. 80).

As autoras reportaram-se ao modelo analítico baseado em análise de políticas edu-cacionais sob o contexto de influência, contexto de produção do texto político e o con-texto da prática – aporte teórico de Bowe e Ball (1992) e, dentre as várias contribuições concluíram que “uma política curricular pode ser multicultural sem, necessariamente, assumir os pressupostos teóricos do multiculturalismo crítico.” (OLIVEIRA e MI-RANDA, 2003, p. 79).

Em Há algo novo a se dizer sobre as relações étnico-raciais no Brasil contemporâneo, Silvé-rio e Trinidad (2012) realizam um resgate das produções acadêmicas dos últimos 20 anos abordando o debate entre educação e raça e a mudança da forma de atuação do Estado frente às reivindicações do Movimento Negro.

Os autores analisaram o Parecer CNE/CP06/02 e as Diretrizes Curriculares (2004) para o Ensino das Relações Étnico-Raciais com base no conceito de diáspora, discutido por Hall ao longo de sua trajetória. Partindo do pressuposto de que os textos legais cons-tituem um marco histórico da educação brasileira e que as diretrizes representam uma nova maneira da sociedade expressar-se, pois surgiu de movimentos sociais, mais especi-ficamente do Movimento Negro em luta por reconhecimento e valorização, creem que uma política educacional com esse teor abre novas maneiras de se compreender a consti-tuição da nação por meio da contribuição das culturas africanas e o sentimento de perten-ça às mesmas com adesão do prefixo afro à autodefinição ou autoidentificação, seja como afrodescendente ou afro-brasileiro, ainda que tenha se acirrado o debate sobre bipolariza-ção racial na nação, fruto da ideologia do Estado Nacional.

A identidade negra, produto político do apagamento da multiplicidade cultural de povos que aportaram no país, segundo os autores, passa a dar lugar ao prefixo afro como possibilidade de novas identificações e recriações dos brasileiros descendentes de africa-nos (SILVÉRIO e TRINIDAD, 2012, p. 891).

Os autores trazem uma contribuição para a construção de conhecimento acerca da ideia de raça e “racialização” e sobre o uso da produção discursiva acerca do processo de identificação social.

A ideia de “racialização” ou “formação de raça” se baseia no argumento de que a raça é uma construção social e categoria não universal ou essencial da biologia. Raças não existem fora da representação. Em vez disso, elas são formadas na e pela simbolização em um processo de luta pelo poder social e político. O conceito de “racialização” refere-se aos

Saberes Plurais • 45

casos em que as relações sociais entre as pessoas foram estruturadas pela significação de características biológicas humanas, de tal modo a definir e construir coletividades sociais diferenciadas (SILVÉRIO e TRINIDAD, 2012).

Os autores tecem uma ampla discussão sobre a ideologia e produções acadêmicas, desde o ideal de Estado Nacional, passando pela Constituição de 1988 até as Diretrizes Curriculares de 2013, analisando como a narrativa da cultura nacional é contada. Dessa maneira, respondendo a pergunta que intitula o artigo Há algo novo a se dizer sobre as re-lações raciais no Brasil contemporâneo?, afirmam que:

[...] sim, à medida que a política educacional representa para o movimento negro um local de luta por educação formal de qualidade, enquanto direito, e meio de mobilidade ocupacional e social, além de fomentar o resgate da contribuição das culturas africanas (SILVÉRIO e TRINIDAD, 2012, p. 907).

Concluem por reconhecer que surge no país uma oportunidade para recontar sua história incluindo o “outro”, no caso, as diferentes culturas africanas, e veem nisso a neces-sidade de toda uma reconfiguração do currículo escolar, inclusive da formação de profes-sores. Destacam, por exemplo, o projeto da Organização das Nações Unidas para Educa-ção, Ciência e Cultura (UNESCO), Brasil-África: Histórias Cruzadas, como tentativa de novos rumos à formação de docentes visando implementar as diretrizes curriculares.

Gonçalves (2011), em sua tese de dissertação de doutorado em Educação, Representa-ções sociais sobre educação étnico-racial de professores de Ituiutaba - MG e suas contribuições para a formação docente, propõe uma nova forma de fazer pesquisa e assim a justifica:

Da mesma forma como a formação e atuação vêm sendo incitadas a atender demandas por muito tempo ignoradas, a pesquisa também se vê na mesma situação. As provocações relativas à pedagogia que abarcaria a diferença e que fosse utilizada tanto na formação docente quanto na atuação dos profissionais da educação no cotidiano escolar incitaram ao questionamento acerca do tipo de pesquisa que poderia ser sensível à diversidade (GON-ÇALVES, 2011, p. 50).

Assim, a autora busca aporte teórico na teoria de afrocentricidade, cuja prioridade é a busca de uma nova tradição acadêmica pela qual se percebe os africanos como sujeitos e agentes de fenômenos atuando sobre sua própria imagem cultural, e o expande para ou-tros autores na mesma linha de pensamento e investigação, reportando-se, principalmen-te, a estudos desenvolvidos no Caribe e nos Estados Unidos.

Após sistematização das observações realizadas e coletadas as narrativas pelo método de história oral de Meihy e Ribeiro (2011), a autora procede à análise utilizando-se da teoria das representações sociais (processos de ancoragem e objetivação) na busca por compreender a constituição de redes de significações em torno da obrigatoriedade do ensino de relações étnico-raciais, ao fim da qual, percebe que tal materialização “se viabi-

46 • Direitos Humanos, Gênero e Diversidade na Escola

liza pelo compromisso dos professores, mais que pela normatização jurídica” (GONÇAL-VES, 2011, p. 147). Esclarece que o grupo estudado foi indicado pela comunidade sob o título de “professores exitosos” na implementação da educação das relações étnico-raciais por meio dos pressupostos da Pedagogia Culturalmente Relevante.

A opção da autora por trabalhar o contexto escolar como campo de conflitos e de representações sociais enquanto terreno em que o negro é “outro”, ao mesmo tempo em que se constrói a identidade negra, tornou a leitura do trabalho muito atrativa e instigan-te. Suas inferências e os resultados da pesquisa também o são: salienta a importância e a diferença que faz a identidade étnica do professor em relação à sua prática no ensino das relações étnico-raciais e marca a necessidade de um salto docente do reconhecimento da diversidade para a efetivação de atividades que rompam com preconceitos por meio de estratégias pedagógicas que problematizem o racismo e, para tal, aposta na Pedagogia Culturalmente Relevante como um caminho.

A dissertação de mestrado em Educação de Portella (2014) sob o título Relações ra-ciais e políticas educacionais em São Paulo, possibilidades e impasses do artigo 26 da LDB, também aponta para a necessidade de estudo e ações de revisitação ao currículo e às refle-xões sobre prática docente e encaminhamentos de políticas públicas. Sua análise de cunho sociológico sobre a Educação nos reportou a vários aportes teóricos a serem consultados, assim como sua descrição e problematização dos dados coletados.

A autora desenvolveu análise sociológica recorrendo a Norbert Elias (relações de po-der), Nancy Fraser (representação) e Stephen Ball (política educacional) para expor sobre a identificação das ações realizadas pela Secretaria Municipal de Educação, por meio do Núcleo de Diversidade e Educação Étnico-Racial. Descreveu e problematizou a imple-mentação da Lei 10.639/03 no município, além de descrever o perfil das gestoras do Núcleo, das parcerias estabelecidas e dos atores envolvidos.

Como contribuição, a autora nos deixou a constatação de que:

[...] é longo o processo que se leva para a implementação de uma política pública e que até que isso aconteça o que temos são políticas de ações e pensamos que para que isso aconteça é preciso se atravessar os meandros que envolvem a revisão não apenas do con-teúdo curricular, mas também da sociedade e de suas hierarquizações de valores e poder, afinal é disso que falamos quando se trata da Educação para as Relações Raciais Brasileiras (PORTELLA, 2014, p. 147).

A análise e o fichamento dos textos dos autores acima visitados, com a finalidade de nossa aproximação à temática raça e etnia no âmbito educacional, ainda que inicial-mente, nos repertoriaram para a escuta dos professores acerca de como narram sobre, e como as diretrizes nacionais para a educação em relações étnico-raciais chegam ao co-tidiano escolar.

Saberes Plurais • 47

As Diretrizes para a Educação de Relações Étnico-Raciais (2004), tal como propostas pelo Ministério da Educação (MEC), são expostas como ações efetivas no combate a discriminações, especialmente as de ordem étnico-racial. Ainda que não seja creditada tal tarefa apenas ao contexto escolar, o discurso põe para o campo educacional uma respon-sabilidade para além do fazer pedagógico do profissional docente. Como política pública, visa promover reparações socioeconômicas voltadas para o reconhecimento e valorização da história da formação da nação brasileira e, dessa maneira, respondem ao “por quê” e “para quê” da inclusão dos temas propostos.

O fortalecimento de identidades e de direitos, um dos princípios que sustentam as Di-retrizes, necessariamente pressupõem atenção às diferenças constantemente produzidas e reproduzidas nas relações, e, ao como, a partir daí, as relações se (re)estabelecem. A reivindicação do Movimento Negro pela inclusão de políticas de valorização e repara-ção fomentou, e ainda fomenta, uma ampla discussão em torno de como os temas per-tinentes à pertença étnico-cultural, às condições de igualdade de direito, à inserção no mercado de trabalho e ao acesso à educação de qualidade se tornarão base de discussão no cotidiano escolar.

Tais temas, dentre outros, precisam necessariamente compor o conteúdo de forma-ção do corpo docente para a inserção dos mesmos no quadro curricular. O ensino de História da África e a valorização da cultura afro-brasileira e africana, em si e nos do-mínios da educação básica, podem, ou não, promover ou resultar em relações democrá-ticas com base em princípios do bem comum, ou seja, em princípios sustentados pela equidade dentre as diferenças.

O Conselho Nacional de Educação (CNE), ao propor uma política curricular com vistas ao combate do racismo e das discriminações, a qualifica como de dimensões históricas, sociais, antropológicas e visa fomentar a educação das relações étnico-raciais, consideran-do que, para tal, torna-se importante sua valorização e ensino com vista à:

[...] divulgação e produção de conhecimentos, a formação de atitudes, posturas e valo-res que eduquem cidadãos orgulhosos de seu pertencimento étnico-racial – descendentes de africanos, de povos indígenas, descendentes de europeus e asiáticos – para interagirem na construção de uma nação democrática (BRASIL, 2013, p. 498).

A política educacional disseminada nas diretrizes curriculares para a educação de relações étnico-raciais qualifica estereótipos depreciativos dirigidos à população negra como desrespeito a direitos sociais e civis construídos e alimentados ao longo da histó-ria brasileira.

Dessa maneira, considera necessárias ações políticas dirigidas à correção de desi-gualdades raciais e sociais e um forte investimento na formação docente para o cumpri-mento desse intuito.

48 • Direitos Humanos, Gênero e Diversidade na Escola

Contudo, diante do quadro exposto pelos pesquisadores acima, ainda há muito a se promover, como oportunidade de reflexão sobre a prática docente, o conhecimento construído acerca da temática raça e etnia e o posicionamento docente frente às situa-ções de discriminação e preconceitos banalmente naturalizados. Além desses aspectos, acrescentamos ainda a necessidade de se dar visibilidade às necessidades do corpo do-cente e gestores de escolas. Estes carecem perceber, compreender e trabalhar as ques-tões étnico-raciais como princípio da educação e não como mero conteúdo de uma ou outra disciplina escolar.

Referências Bibliográficas

AZEVEDO, C. B. Educação para as relações étnico-raciais e ensino de História na Edu-cação Básica. Saberes, Natal, v. 2, n. especial, jun. 2011.

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Secretaria de Edu-cação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão. Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica. Conselho Nacional de Educação. Câmara Nacional de Educação Básica. Diretrizes Nacionais Curriculares da Educação Básica. Brasília, 2013.

GONÇALVES, L. R. D. Representações sociais sobre educação étnico-racial de profes-sores de Ituiutaba-MG e suas contribuições para a formação docente. 2011. 130 f. Tese (Doutorado em Educação)- Universidade Estadual de Campinas, 2011.

ISSN 1984-3879, Saberes, Natal – RN, v. 2, n. esp., jun. 2011.MADEIRA, M. Z. de A. e COSTA, R. G. As relações étnico-raciais e a implementa-

ção da lei 10.639/03. Revista Políticas Publicas, São Luiz, v. 16, n. 2, p. 329-339, jul./dez. 2012.

OLIVEIRA, O. V.; MIRANDA, C. Multiculturalismo Crítico, relações raciais e política curricular: a questão do hibridismo na escola Sarã. Revista Brasileira de Educação, v. 25, p. 67-81, jan./fev./mar./abr. 2004.

PORTELLA, T. P. Relações raciais e políticas educacionais em São Paulo, possibilidades e impasses do Art. 26 A da LDB: Ações e visão das gestoras do Núcleo Educação Ét-nico-Racial da SME. 2014. Tese (Mestrado em Educação) – Faculdade de Educa-ção da Universidade de São Paulo, 2014.

RIBEIRO, S. L. S. e PINHO, H. Um estudo sobre a legislação recente: negro, direitos, diversidade e educação. Revista Ciências Humanas: Educação e Desenvolvimento Humano - UNITAU, v. 8, n. 2, ed.15, p. 3-38, 2015.

SILVA, L. S. e RONCO, A. P. Relações étnico-raciais e cidadania: História e cultura afro-brasileira como fatores fundamentais para construção do cidadão afrodes-

49 • Direitos Humanos, Gênero e Diversidade na Escola

cendente a partir do pós-abolição. Revista Augustus, Rio de Janeiro, v. 17, n. 34, jul. 2012.

SILVA, R. C. M. Escola e questão racial: a avaliação dos estudantes. 2013. 198 f. Tese (Doutorado em Serviço Social) – Faculdade de Ciências Humanas e Sociais. Uni-versidade “Julio de Mesquita Filho”, Franca- SP, 2013.

SILVÉRIO, V. R.; TRINIDAD, C. T. Há algo novo a se dizer sobre as relações étnico--raciais no Brasil contemporâneo? Educação & Sociedade, Campinas, vol. 33, n. 120, jul./set. 2012.

VERRANGIA, D. e SILVA, P. B. G. Cidadania, relações étnico-raciais e educação: desa-fios e potencialidades do ensino de Ciências. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 36, n.3, p. 705-718, set./dez. 2010.