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A presente edição segue a grafia do novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa [email protected] www.marcador.pt facebook.com/marcadoreditora © 2016 Direitos da edição portuguesa reservados para Marcador Editora uma empresa Editorial Presença Estrada das Palmeiras, 59 Queluz de Baixo 2730-132 Barcarena Copyright © Ruby Wax 2013 Publicado pela primeira vez no Reino Unido em 2013 por Hodder & Stoughton, uma chancela de Hachette UK. Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste livro pode ser utilizada ou reproduzida em qualquer forma sem permissão por escrito do proprietário legal. Título original: Sane New World – Taming the Mind Título: Admirável Mundo São — Discipline a sua mente Autora: Ruby Wax Tradução: Liliana Sousa Revisão: Paula Caetano Paginação: Ana Seromenho Capa: Ideias com Peso / Marcador Editora Impressão e acabamento: Multitipo – Artes Gráficas, Lda. ISBN: 978-989-754-149-0 Depósito legal: 413 221/16 1.ª edição: setembro de 2016

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A presente edição segue a grafia do novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa

[email protected]/marcadoreditora

© 2016Direitos da edição portuguesa reservados para Marcador Editorauma empresa Editorial PresençaEstrada das Palmeiras, 59Queluz de Baixo2730-132 Barcarena

Copyright © Ruby Wax 2013 Publicado pela primeira vez no Reino Unido em 2013 por Hodder & Stoughton, uma chancela de Hachette UK. Todos os direitos reservados.Nenhuma parte deste livro pode ser utilizada ou reproduzida em qualquer forma sem permissão por escrito do proprietário legal.

Título original: Sane New World – Taming the MindTítulo: Admirável Mundo São — Discipline a sua menteAutora: Ruby Wax Tradução: Liliana SousaRevisão: Paula CaetanoPaginação: Ana SeromenhoCapa: Ideias com Peso / Marcador EditoraImpressão e acabamento: Multitipo – Artes Gráficas, Lda.

ISBN: 978-989-754-149-0Depósito legal: 413 221/16

1.ª edição: setembro de 2016

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Para o Ed, o Max, a Marina e a Maddy

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Índice

O INÍCIO .............................................................................................. 11

1.ª PARTE: O que há de errado connosco? Para os insanos-normais ................................................................... 19

2.ª PARTE: O que há de errado connosco? Para os insanos-insanos .................................................................... 57

3.ª PARTE: O que há no seu cérebro / O que está na sua mente? .... 85

4.ª PARTE: Mindfulness1 – Discipline a sua mente ............................... 131

5.ª PARTE: Sugestões alternativas para uma mente serena ............... 189

CONCLUSÃO ....................................................................................... 234

AGRADECIMENTOS ............................................................................ 237

1 Mindfulness, usualmente traduzido para português como «atenção plena», tornou-se nos últimos anos num termo reconhecido internacionalmente, o que nos leva a optar por manter a palavra original neste livro.

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O início

E ste livro é dedicado à minha mente, que a certa altura desapare- ceu, e ao resto da humanidade, que num ou noutro momento talvez também tenha perdido a sua. Embora eu tenha andado às voltas na

montanha-russa da depressão durante a maior parte da minha vida adulta, este livro não se destina exclusivamente a pessoas deprimidas. Sou uma das «uma em cada quatro» que teve um colapso mental; este livro é para as «quatro em cada quatro». É para todos, porque todos temos em comum a mesma estrutura: sofremos, rimo-nos, zangamo-nos, queixamo-nos, somos todos vulneráveis, seres delicados por detrás das muralhas que erguemos.

Neste livro, vou tentar partilhar uma espécie de guia de onde nós (hu- manidade) nos encontramos neste momento, e dar algumas sugestões que poderão tornar o nosso tempo aqui na Terra numa experiência mais alegre. Não me refiro ao tipo de alegria «todos para o jacuzzi», mas àquela sen-sação de plenitude que por vezes temos quando o tempo parece parar, quando sentimos que o nosso corpo é a nossa casa e as vozes críticas dentro da nossa mente se apaziguam. Conheço bem essas vozes e muitas outras pessoas com quem me cruzo reconhecem essas ditadoras que vivem dentro da sua mente, mantendo-as acordadas noite após noite com discursos de «Eu deveria ter..., eu poderia ter...», em gravações que se repetem incan-savelmente.

Muitos de nós sofremos com as pressões da sociedade atual, que nos levam de esgotamentos para depressões. Somos escravos da nossa «correria»,

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sempre atrás de mais dinheiro, mais fama, mais tweets – seja o que for, nós queremos. O problema é que, só nos últimos cinquenta a cem anos é que nós, humanos, temos vivido com tanta abundância. Passámos da escassez (quando éramos provavelmente normais e com desejos a condizer) para as exigências sem limites que temos hoje. Pode-se dizer que o «multitare-fas» nos levou à loucura; é como ter demasiadas janelas abertas no ecrã do computador ‒ ele acabará por bloquear. Simplesmente não estamos equipados para o século xxi. É tudo demasiado difícil, demasiado rápido, demasiado recheado de medo; nós simplesmente não temos a capacidade técnica necessária. A Evolução não nos preparou para isto. Já é suficiente-mente desafiante conseguir acompanhar quem é que anda a bombardear quem e, por isso, nem sequer temos espaço para compreender os nossos estados emocionais; os nossos corações sangram quando sabemos de mais uma baleia que deu à costa e, no minuto seguinte, estamos a clamar pelo sangue do desconhecido que roubou o último carrinho de supermercado disponível na loja.

A razão pela qual decidi dedicar-me a esta viagem interior é porque desejo encontrar um lugar onde me refugiar dos constantes furacões da depres-são, que me deixaram exausta e fragilizada. Cada novo episódio se tornou mais longo e profundo. Não quero culpar os meus pais, mas a educação não era a especialidade de nenhum deles. Os meus amigos iam visitar--me e lá estava a minha mãe, sentada no poleiro, um abutre com sotaque vienense, à espera de que alguém deixasse cair uma migalha. E, quando isso acontecia, ela sobrevoava a sala a gritar: «Quem é que traz bolachas para dentro de uma casa?» Eles fugiam todos, aterrorizados. Mais tarde, tornou-se muito, muito pior, mas não vou falar disso aqui. O que quero dizer é que este tipo de antecedentes costuma conduzir a uma carreira de humorista ou de assassino em série; eu escolhi o humor.

Por isso, depois de alguns esgotamentos nervosos graves, decidi regres-sar à escola, para estudar psicoterapia e descobrir exatamente para que é que estavam a cobrar-me 80 libras à hora. Eu costumava sair do meu

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psiquiatra sabendo exatamente quem eu era, até chegar à estação de metro e me esquecer de tudo outra vez. Além disso, como não sabia nada de psi-cologia, os terapeutas podiam dizer-me o que quer que fosse, sem que eu conseguisse perceber se eram competentes. Certa vez, quando estava no divã durante uma consulta, apanhei o psiquiatra a comer uma sandes atrás de mim, com a cara toda besuntada de mostarda.

Então, decidi ir estudar psicoterapia. Tornei-me membro da biblioteca e nunca mais conversei sobre a minha vida anterior. Pensei: «Está na altura de dar algo de volta ao mundo» (provavelmente nunca cheguei a fazê-lo, mas esta é uma boa frase). Reparei que muitas mulheres como eu escolhe-ram estudar terapia quando se confrontaram com os desafios da meno-pausa; as hormonas secam e elas apercebem-se de que a probabilidade de voltarem a ser cobiçadas é baixa, e dão consigo a querer cuidar de outras pessoas ou a pensar em abrir um lar para gatos vadios.

Alguns anos depois, decidi ir mais além e estudar o que realmente me fascinava: o cérebro. A minha teoria era que se aprendesse como funcio-nava a minha própria máquina, talvez evitasse ficar empanada no meio de nenhures, a implorar que alguém aparecesse e me consertasse; eu trataria do meu próprio pedido de assistência em viagem. Seria capaz de domar esta fera selvagem chamada cérebro, impedi-la de ruminar uma e outra vez sobre a mesma coisa, mantendo-me acordada noite após noite; preo-cupada, a remoer, arrependida e ressentida.

Após muita pesquisa, pensei que o mindfulness poderia ajudar-me, porque tinha ouvido dizer que nos confere a capacidade de disciplinar a mente. (Eu diria que me salvou a vida, mas chegarei lá mais à frente.) Decidi ir direita à fonte, o professor Mark Williams, um dos fundadores da terapia cognitiva baseada no mindfulness, que me disse que infelizmente eu teria de ser admitida na Universidade de Oxford para conseguir estudá-la a par com neurociência.

Consegui reunir alguns registos escolares antigos e encontrar uma ou duas classificações decentes que obtivera no ensino secundário, mas sobre-tudo saí-me muito bem na entrevista de acesso. E foi assim que consegui ser

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admitida no mestrado. Os outros catorze estudantes da minha turma eram alunos brilhantes e olharam-me desde o primeiro dia como se eu fosse um ser de outra espécie; mas, caramba, eu conseguira lá chegar.

Então, depois de muitas décadas de investigação trabalhosa, um mes-trado em Mindfulness, uma licenciatura em Psicoterapia e até um breve momento de fama, aqui estou eu, a escrever este guia sobre como discipli-nar a mente.

Entrarei em maior detalhe mais tarde, mas queria mencionar desde já um facto; a principal compensação é que VOCÊ PODE MUDAR A SUA MENTE E A SUA MANEIRA DE PENSAR. A isto chama-se neuroplas-ticidade. Os seus genes, hormonas, zonas do cérebro e antecedentes de aprendizagem não determinam necessariamente o seu destino.

Provas científicas têm demonstrado que os neurónios (células cerebrais) podem restabelecer ligações e mudar os seus padrões ao longo da nossa vida, de acordo com as nossas experiências e a maneira como pensamos nelas. Os nossos pensamentos influenciam a fisiologia do nosso cérebro e a fisiologia afeta os pensamentos.

Pense em sexo durante um minuto. Não se preocupe, eu espero. No momento em que você tem uma ideia vaga, uma cascata de hormonas liberta-se no seu corpo para o preparar para o que se seguiria. Por ve- zes, o processo é ao contrário; você está ocupado com tarefas rotineiras e, sem qualquer motivo aparente, uma hormona acende-se no seu cérebro e, de repente, os seus pensamentos mudam para a categoria de maiores de 18 anos.

Quando a sua mente muda, o seu cérebro muda e é por essa razão que o nosso cérebro é tão maleável; o céu é o limite. Lembro-lhe que fui admi-tida em Oxford aos 50 anos, mesmo sem ter conseguido obter o diploma da Busy Beaver Nursery School («Escola Infantil do Castor Atarefado» ‒ podem procurar, porque este era realmente o nome da escola), e isso prova que tudo é possível. Mas a alteração dos seus hábitos de raciocínio será demorada; não vai acontecer durante um seminário de fim de semana

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sobre «Como Espevitar o Seu Anjo Interior». É necessária uma concentra-ção intencional e prática constante ao longo do tempo. É possível mudar, mas apenas se se esforçar por não repetir os velhos hábitos, da mesma maneira de sempre, dia após dia. Você e a maneira como vê o mundo são os arquitetos de como o seu cérebro é mapeado. É isto o que os cientistas estão a oferecer-nos no século xxi; muito mais do que a cigana vidente pode ler na palma da sua mão.

O cérebro assemelha-se a 1,5 kg de uma plasticina maleável; você pode moldá-lo de novo, ao romper com velhos hábitos, criando maneiras de pensar novas e mais flexíveis. Gloria Gaynor estava errada quando cantou «Eu sou aquilo que sou». Ela terá de mudar a letra da música, mas não vai ser tão fácil dançá-la. O que é que rima com neuroplasticidade?

O seu «eu» interior

Se for capaz de olhar para o interior do seu cérebro e perceber vagamente onde tudo está e como funciona, talvez não consiga compreender-se comple- tamente a si mesmo, mas, com alguma prática, talvez consiga consertar-se. Aprender a autorregular-se significa que consegue pressentir os primeiros sinais de aviso antes de ter um esgotamento ou uma depressão e reagir contra isso. Existe já tanto conhecimento sobre esta ideia de autorregula-ção que, em breve, ela poderá tornar-se (e esperemos que sim) a palavra de ordem desta década. Recorrendo a algumas técnicas, como o mindfulness, podemos ter verdadeiramente algum controlo sobre os químicos existentes nos nossos cérebros que nos conduzem ao stress, à ansiedade e até à feli-cidade. Este extraordinário órgão dentro das nossas cabeças detém uma sabedoria infinita, mas muito poucos de nós sabem como usá-lo. É como se tivéssemos um Ferrari, sem que alguém nos tivesse dado as chaves.

A realidade é que a voz exigente dentro da nossa cabeça não é quem nós somos; ela representa uma pequena parte de um cenário muito maior.

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O que realmente nos move são os milhões, os triliões de gigabytes que ali-mentam o motor do cérebro, gerido pelo nosso ADN, que instrui as hor-monas, as memórias, os músculos, o sangue, os órgãos e, na verdade, tudo o resto que acontece dentro de nós, de forma a garantir que sobrevivemos, custe o que custar, e não aquele estúpido diálogo interior sobre a razão pela qual estamos demasiado gordos para usar «aquelas» calças.

O meu objetivo neste livro é mostrar-lhe como pode tornar-se senhor da sua própria mente e não seu escravo. Se aprender a autogerir os seus esta-dos de espírito, emoções e pensamentos, e focar a sua mente naquilo a que verdadeiramente quer dar atenção, em vez de se deixar arrastar para distra-ções, talvez possa alcançar aquela miragem chamada felicidade. Todos nós temos esta capacidade, só não sabemos onde está o botão «Ligar». O órgão que lhe permite entender o mundo entende muito pouco de si próprio.

(Sim, Oprah, estou disponível.)

Porque precisamos de um manual?

Qual é o significado da nossa existência na Terra? Toda a gente quer sabê--lo. Então, a pergunta não é «Ser ou não ser?» As grandes questões são: «O que é suposto estarmos a fazer enquanto existimos?» e «Como é que controlo e faço a gestão desta coisa chamada “eu”?»

O nosso primeiro problema enquanto espécie (não incluo aqui as pes-soas com crenças religiosas, pois elas têm livros próprios) é não termos um manual nem instruções que nos expliquem como viver a nossa vida. Os ele- trodomésticos trazem um manual de instruções; nós não. Nós nascemos sem informação absolutamente nenhuma, e dependemos da mamã e do papá, que ligam a sua pen USB aos nossos «discos rígidos» virgens e descar-regam em nós as suas neuroses. Penso que todos estamos de acordo quanto ao facto de nos faltar um manual e, por isso, tentei fazer uma abordagem bastante simples.

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1.ª Parte: O que há de errado connosco? Para os insanos-normaisNesta parte do guia, vou examinar porque estamos todos a seguir a linha de pensamento do «desenrasca» ou do «em cima do joelho» em relação ao modo como vivemos a nossa vida. Supomos que as pessoas que nos rodeiam sabem exatamente o que estão a fazer, mas não sabem.

2.ª Parte: O que há de errado connosco? Para os insanos-insanosPara os deprimidos, ansiosos, com ataques de pânico, obsessivos-com-pulsivos, comedores-compulsivos, bebedores-compulsivos, compradores- -compulsivos, organizadores-compulsivos, etc. A lista é interminável.

3.ª Parte: O que há no seu cérebro / O que está na sua mente?Vou familiarizá-lo com os seus ingredientes: as hormonas, os neurónios, os hemisférios, as regiões, etc. Para que, na 4.ª parte, você consiga com-preender o que acontece fisicamente no seu cérebro quando pratica o mind- fulness e como pode intensificar sentimentos positivos que, no final, trazem a felicidade.

Você é o seu próprio livro de culinária. A forma como trabalha o seu cérebro determina se irá tornar-se um bife ou uma sandes de pão duro.

4.ª Parte: Mindfulness – Discipline a sua menteEncare esta parte como Sabedoria para Totós. Irei mostrar-lhe como pode conseguir autorregular os seus pensamentos e emoções, para se tornar o senhor e não o escravo da sua mente.

5.ª Parte: Sugestões alternativas para uma mente serenaNão quero que me considerem fundamentalista; por isso, se o mindfulness não é para si, vou dar-lhe algumas práticas alternativas que podem mudar o seu cérebro.

Espero que este livro o ajude a libertar-se da imagem que tem de si mesmo, se esta estiver a impedi-lo de alcançar o que pretende; espero conseguir

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incentivá-lo a ser corajoso e a saber que nada é certo: a vida corre, muda e termina. Ultrapasse o seu medo. A única forma de encontrar paz é deixar tudo para trás e dar um salto para o desconhecido. Salte.

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1.ª PARTE

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O que nos põe loucos

Esta parte pode conter muitas observações que não têm nada a ver consi- go, mas nós apenas conseguimos ver o mundo pelos nossos próprios olhos. Sei que existem pessoas que não veem o mundo como eu o vejo, mas infe-lizmente não são elas que estão a escrever este livro. Por isso, se alguém não sofrer do que se segue, peço desculpa se parecer que estou a pintar toda a espécie humana com o mesmo pincel pessimista. Cheguei a estas conclusões só porque todas as pessoas que conheci se queixaram de que estas são as áreas da vida que as deixam loucas. E sei, do fundo do coração, que são elas que me deixam louca.

Vozes críticas

Porque somos tão malvados em relação a nós próprios? O que é que fizemos de errado? Qual é o motivo por que, se somos o melhor que a evolução pôs cá fora até aqui, somos tão cruéis para connosco? Todos nós temos um pai ou uma mãe irritantes implantados nas nossas cabeças: «Não faças isso... porque é que não o fizeste... deverias ter feito... mas não fizeste», numa gravação interminável. (A minha mãe afirmaria que só porque me amava é que me dizia que eu era um fracasso.) Se a maioria de nós alguma vez comparasse os seus dilemas interiores, iríamos processar-nos mutuamente por plágio, de tão similares que são.

Nenhuma outra espécie é tão cruel como nós somos para nós mesmos. Nunca nos passaria pela cabeça tratar os nossos animais de estimação da mesma forma como nos tratamos a nós próprios. Chicoteamo-nos para nos mantermos em movimento como o faríamos a um velho cavalo, até cair de

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exaustão, com os cascos derretidos. Perguntei a muitas pessoas se algum dia tiveram uma voz na sua cabeça a dizer-lhes: «Parabéns, fizeste um ótimo trabalho e, já agora, deixa-me dizer-te como estás com bom aspeto hoje.» Ninguém teve. Tenho a certeza de que deve haver algumas por aí que a tiveram, mas nunca conheci nenhuma.

Uma vez atacado por esta autocombustão, você começa a resvalar para um estado bastante infeliz. O seu cérebro remói e mastiga um problema como um pedaço de carne impossível de engolir. Nunca haverá uma solução para o «Eu devia» e, por isso, quem é que você censura? Exato: você mesmo. É por este motivo que um em cada quatro de nós está mentalmente doente.

A culpa de nos escravizarmos a nós mesmos não é nossa, porque biolo- gicamente todos temos este chip incorporado que nos compele a alcançar e a prosseguir. Mesmo antes de termos palavras, tínhamos um instinto impregnado em cada célula do nosso corpo para prosseguir. (Procure no Google «gene egoísta».) Todos os organismos, até as minhocas, o têm. É assim que uma célula se transforma em duas, e duas se tornam quatro (poderia continuar, mas não tenho tempo). As células continuam a multiplicar-se até aos triliões que por fim nos constituem. Nós lutamos para alcançar. O problema é que agora usamos palavras e, quando não conseguimos «corresponder às expectativas» perante os nossos próprios olhos, os diálo-gos interiores começam: «Eu devia» e «Eu poderia». Aquela velha cantiga.

Todos nós interiorizamos as vozes dos nossos pais dentro da nossa cabeça, que provavelmente eram bem-intencionadas, mas estes sentimen-tos permanecem lá durante uma vida inteira. Foi desta vontade dos pais de proteger os filhos que você obteve uma abundância de «Não devias... Tu deverias», ou, de outra forma, a criança ainda punha o dedo na tomada e ia pelos ares. Estas vozes disciplinadoras ajudaram-no a sobreviver enquanto criança; mais tarde na vida, elas poderão levá-lo à loucura, com as constantes críticas e instruções, ou poderão ajudá-lo a contornar obstá-culos com sucesso pela vida fora, facilitando-lhe o caminho.

Existem pais que incentivam os filhos com o reforço de estímulos posi-tivos e com encorajamentos asseguradores: «Isso mesmo, querido, estiveste

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muito bem. Porque é que não tentamos mais uma vez para que te saias ainda melhor?» Mais tarde na vida, estas crianças poderão cruzar-se com um amigo que não os cumprimentou, e a sua voz interior dirá: «Oh, que pena, a Fiona deve andar preocupada, e está com tão bom aspeto… Mais tarde, vou telefonar-lhe.» Aqueles que tiveram pais treinados pela «Escola da Gestapo para Educar Crianças» iriam reagir a este incidente, pensando: «A Fiona odeia-me, e é por isso que está a ignorar-me. Ela descobriu que sou uma anormal, e sou mesmo.»

A minha história

No meu caso, eu diria que as vozes foram algo duras para um

bebé; mais do que sugestões, eram ordens militares. A minha

mãe tinha medo do pó, por isso, colocava uma esponja em

cada mão e uma em cada joelho (ela era completamente

absorvente) e andava de gatas atrás de mim, a gritar: «Quem

é que enche o chão de pegadas? São loucos criminosos?» Ela

provavelmente só queria proteger-me. Do quê, não sei, mas

enquanto criança permaneci hermeticamente fechada em casa;

tudo estava forrado a plástico, incluindo o meu pai, a minha

avó e o meu cão. Os meus pais tiveram de fugir da Áustria nazi

dentro de um cesto de lavandaria, pouco antes de serem dita-

das as «últimas ordens» e de as fronteiras serem fechadas, para

que ninguém pudesse deixar a pátria-mãe. Provavelmente terá

sido isto que lhe causou tantos medos inconscientes, que, mais

tarde, ela viria a transferir para o pó. (Algo tão fácil de fazer

desaparecer com um sopro.) Seja qual for o caso, eu assimilei

o pânico na voz dela e o som nunca mais me saiu da cabeça.

Por isso, ainda que eu não esteja na Áustria nazi, as vozes na

minha cabeça estão lá. Ninguém tem culpa.

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À procura da felicidade

Todos nós andamos à procura da felicidade (a não ser, claro, que já a tenha-mos alcançado, e abençoados aqueles que o conseguiram). É por isso que existem tantos livros de autoajuda – em número suficiente para cobrir 78 vezes o perímetro do equador. Já leu O Segredo? Eu não o li, mas sei que foram vendidos 80 milhões de exemplares. Cheguei a ler a primeira pági- na, que informa o leitor de que «o segredo» nos foi deixado pelos Babilónios antigos, e é óbvio que funcionou para eles; é por isso que vemos tantos a andar por aí, é impossível mexermo-nos com tantos babilónios a viverem em Londres. Depois, a autora diz que Platão, Leonardo da Vinci, Beethoven e Einstein foram inspirados pelo livro. Eu vou usar essa ideia e oferecer a mim mesma algumas críticas de pessoas que já morreram. Aparentemente, as duzentas páginas seguintes estão repletas de conselhos que se resumem a: «Tenha pensamentos positivos e os seus sonhos tornar-se-ão realidade, tal como a Sininho prometeu.» (Que me perdoem todos os fãs d’O Segredo, mas sinto-me um bocado amarga em relação aos 80 milhões de exemplares vendidos. Vocês compreendem.)

Toda esta autoajuda foi roubada a Walt Disney; ele foi o pai da Nova Era. «Assobia uma melodia alegre; se acreditas em fadas, bate palmas.» Desta filosofia surgiram A Pequena Sereia, Branca de Neve e alguns dos primei-ros Mickey Mouse. O Walt sabia o segredo da felicidade. É uma pena que ele esteja congelado; temos de descongelá-lo e arrancar-lhe mais alguma sabedoria. O Walt sabia quando sair de cena.

Sempre ocupados

Este é um método que inventámos para nos distrairmos das questões mais importantes e profundas; temos a obsessão de manter-nos ocupados. Não há tempo para descansar nem tempo para pensar sobre o que realmente deveríamos estar a fazer durante o tempo limitado que temos na Terra.

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Não estou a criticar; sou movida da mesma forma que qualquer outra pes-soa. Cheguei ao ponto de quase entrar em trabalho de parto enquanto fazia um programa de televisão. O produtor disse-me «5-4-3-2», alguém cortou o cordão umbilical e gritou «Ação».

Gandhi disse: «Há mais na vida do que velocidade.» Infelizmente, não nos disse o quê, limitando-se a deixar-nos à espera enquanto desfilava por aí de fralda.

Para compensar esta contracorrente de inutilidade, fingimos que somos terrivelmente importantes e que temos algo para dar ao mundo. É por isso que temos o Twitter, para podermos verificar quantos seguidores temos. Queremos contá-los; 100, 1 000 pessoas que nunca conhecemos dizem-nos o que almoçaram e sabem agora que existimos. É assim que vemos que há quem se interesse por nós. Parecemos passarinhos acabados de sair do ovo e começamos a fazer «tweet, tweet, tweet», em busca de um bocadinho de atenção, de um bocadinho de amor, talvez até de uma minhoca – qualquer coisa serve desde que notem que estamos aqui.

Na verdade, somos todos tão descartáveis como figuras de cera. Assim que perdemos o emprego, a beleza ou o status, o que acabará por acontecer, alguém irá derreter-nos e usar-nos para fazer aquela que será a próxima pessoa «mais importante». Fui ao museu Madame Tussaud e lá estava o Charlie Chaplin junto à casa de banho, enquanto a Nicole Kidman fora derretida e transformada em 150 velas; um ícone num minuto, uma vela no seguinte. A Jerry Hall deve estar algures num bolo de aniversário.

Andamos sempre a correr porque não queremos olhar para dentro de nós e ver que talvez não haja lá nada e que a procura de um significado pode ser um desperdício de tempo. Mantemo-nos ocupados para não termos de pensar sobre o quão fútil é correr; como o besouro africano que constrói uma casa feita de esterco, sem parar para pensar: «Ei, aonde é que isto leva?»

Quando tenho um dia livre e acordo, salto da almofada em pânico com a possibilidade de não ter nada de importante para fazer. Talvez seja por

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isso que eu e outras pessoas parecidas comigo que conheço temos de nos manter ocupadas a compilar uma lista interminável de «coisas para fazer». Para nós, «ocupação» é o nosso Deus; veneramos a ocupação. As pessoas perguntam-me se estou ocupada, e eu digo-lhes: «Estou tão ocupada, que tive dois ataques cardíacos.» Elas felicitam-me pela proeza.

Temos grande respeito por aqueles que apresentam as agendas mais preenchidas; quanto mais ocupado você estiver, mais elevado é o seu estatuto enquanto ser humano. Quando somos vítimas deste fenómeno, arranjamos toneladas de coisas «para fazer», a ponto de ficarmos doentes, só para evitarmos olhar para dentro de nós e ver que talvez não tenhamos qualquer objetivo. Quem beneficia com tudo isto? As pessoas muito ocupa-das e que andam sempre a correr? Ou será aquela que se senta numa rocha e passa o dia a pescar, ou alguém que tem tempo para sentir o toque de uma brisa no rosto? Quem é o verdadeiro vencedor? Por favor, meu Deus, espero que não seja o tipo do peixe.

Eis algumas das respostas comuns à pergunta «Estás ocupado?»:

«Estou afogado em trabalho.»(Vamos visualizar alguém em algum lugar a afogar-se em

seco.) «Não sei para que lado hei de virar-me.»

(Uma vez, houve alguém que abriu uma porta e ficou ali parado durante os cinco anos seguintes a tentar decidir: «Entro ou saio?»)

Se já deu alguma destas respostas, provavelmente faz parte da lista VIP das pessoas que estão a «viver a vida», ainda que esteja demasiado ocupado para ter uma vida.

Em Londres, existem mulheres no meu bairro que não precisam de tra-balhar para ganhar a vida e têm a agenda a transbordar. Praticam Pilates cinco vezes por semana para fortalecerem a pélvis ao ponto de conseguirem

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levantar a carpete do chão. A Dyson1 poderia usá-las como aspiradores. Depois, vão às compras com a sua conselheira de moda (isso demora algu-mas horas), ao cabeleireiro (isso demora mais uma hora), almoçar (isso preenche mais quatro horas). A seguir, têm de ir buscar os filhos à escola e fazer os trabalhos de casa. Depois, são horas de se arranjarem para partici- parem num evento de caridade. Sabe o que é que isso significa? Vão a um hotel muito chique e pagam duas mil libras por pessoa para salvar um atum.

Nada é suficiente

Estas mulheres «Pilates» queixam-se de que os maridos trabalham até à meia- -noite e de que ficam a braços com a árdua tarefa de colocar as suas crias num infantário que apenas aceita crianças cujo QI tem seis dígitos. Tenho (em vão) tentado dizer-lhes que «casamento» é uma «negociação». Até che-guei a fazer-lhes um pequeno fluxograma para que conseguissem ter alguma perspetiva. Eu digo: «Se o seu marido ganha mais de cento e cinquenta mil libras por ano, mais extras, você, enquanto esposa, não tem quaisquer direitos. Você trata da casa e dos filhos, deve proporcionar-lhe sexo quando e como ele quiser, e deve manter-se magra e jovem até que a morte os separe»;

«Se o seu marido ganha cerca de setenta e cinco mil libras por ano, você continua a ter de cuidar da casa e dos filhos, mas pode queixar-se dele aos seus amigos até 27 horas por semana. Se ele não a ajuda ao fim de semana, pode recusar-lhe sexo»;

«Se ele ganha menos de dez mil libras, que se danem a casa e os filhos». E isto aplica-se apenas às situações em que é o marido quem ganha

todo o dinheiro. Se é a mulher que o ganha ‒ digamos que ela recebe cento e cinquenta mil libras por ano, o que equivale a quinhentas e setenta e cinco mil libras em «dinheiro masculino», ela vai ter de continuar a fazer tudo, porque a evolução não deu aos homens olhos que vejam detalhes

1 Dyson: marca de aspiradores

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como, por exemplo, uma pegada na carpete. Mas o homem tem uma fun-ção muito importante, que é ficar especado a olhar para o horizonte, de forma a garantir que não existem gnus.

Comprar é procurar amorEsta necessidade de ter mais não se restringe às esposas de futebolistas ou aos cabecilhas de grandes organizações. Todos nós, cada um à sua maneira, nunca paramos de «querer»; é por isso que precisamos de centros comer-ciais com 6 000 metros; galerias infindáveis não são suficientes para nos satisfazer; as compras nunca param; a etiqueta diz tudo. A nossa autoes-tima leva-nos a comprar uma mala de marca que custa o PIB da Croácia e é por isso que pessoas que não têm nada gastam o seu último cêntimo numa Dolce & Gabbana ou num par de ténis da Nike de trezentas libras. Se usar uma mala tatuada com «CC», pode obter um aceno respeitoso de todos com quem se cruza, mesmo que você seja um sem-abrigo. Uma vez, vi um vagabundo em Miami a empurrar todos os seus pertences num carrinho de compras roubado de um Bloomingdale’s. Ele estava vestido com jornais e tinha um boné na cabeça que dizia «Nascido para comprar».

O que penduramos nas nossas costas é a nossa nova forma de identi-dade. Pessoas que usam Prada geralmente andam com outras praderites e o mesmo se passa com todas as outras marcas; as pessoas procuram o nível equivalente ao seu, a sua própria tribo. Imagine um bando de Guccis a beber num bar e alguns Primarks a comerem a carcaça de um animal.

P. S. ‒ Uma prova da nossa insanidade está no facto de comprarmos botas Ugg. Onde, no nosso cérebro, é que sentimos a necessidade de parecer um esquimó, como se eles soubessem o que é estar na moda?

O «arranjo» da felicidade

Algumas pessoas pensam que, para se atingir um estado de alegria, é neces-sário passar uma vida inteira no topo de uma montanha, enrolado num

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lençol e usando uma marca de tinta na testa. Algumas agitam cristais, comem terra, rezam, cantam e dançam com os lobos. A satisfação pode até ser possível... Tenho a certeza de que é possível sentarmo-nos num banco e darmos de comer a um esquilo sem ficarmos com bichos-carpinteiros. O problema é que nós queremos sempre mais. Somos o top de todas as espé-cies e, por isso, almejamos o Cálice Dourado: a Felicidade. Tinha de ser um americano louco a dizer que todos temos o direito de procurar a felicidade. É por isso que os ouvimos a exigir um galão grande com caramelo todas as manhãs, com os seus dentes sorridentes, antes de desejarem: «Tenha um bom dia». Existem alguns felizardos que julgam sentir felicidade quando olham para uma nuvem ou passeiam na praia, mas há outros que só têm essa sensação boa quando compram, ganham, conquistam, conseguem ou reservam alguma coisa. Nesse momento, o nosso cérebro dá-nos uma dose de dopamina, que nos faz sentir bem. Não precisamos de outras substân-cias, pois somos os nossos próprios fornecedores de droga.

O problema é que a dose de «felicidade» normalmente dura o tempo de um cigarro; por isso, temos de procurar continuamente a próxima dose. É como se, enquanto espécie, não tivéssemos travões, só esgotamentos. Uma pequena partida que a Mãe Natureza nos pregou é que o objeto de desejo inicial perde a piada quando conseguimos obtê-lo; então, a menos que consigamos sempre aumentar a fasquia, não conseguimos sentir aquela explosão interna de fogo de artifício à qual chamamos felicidade. A maioria dos animais come apenas a sua parte e afasta-se, mas nós não; nós continuamos a empanturrar--nos mesmo que a dentada seguinte nunca saiba tão bem como a primeira.

A hierarquia das necessidades ocidentais (segundo eu):• Comida e/ou água • Colchão• Teto• Casa• Carro normal • Segunda casa

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• Piscina• Porsche • Viajar em classe económica • Classe executiva • Primeira classe • Jato privado • Jato privado com jacuzzi • Conhecer a Oprah

Este fracasso em obter o que queremos deixa-nos num estado de desejo permanente. As revistas percebem que nos fazem salivar pelo que não é possível obter; a perseguição é melhor do que a presa. Pessoas que cole-cionam arte pagam quinze milhões de libras por algum sémen em cima de uma bolacha e depois nunca mais reparam nele quando o penduram na parede. Voltam a lamber as páginas do catálogo da Sotheby’s por aquilo que desejam a seguir. Se não estamos a desejar, estamos à espera. À espera de quê, não sabemos, mas estamos à espera de alguma coisa e ela vai acon-tecer em breve. À espera de que finalmente nos comprem o nosso argu-mento para um filme sobre um palhaço que se apaixona por um esquilo e depois decide ser vendedor de automóveis. À espera de ganhar dinheiro com uma ideia de como fazer sopa em formato sólido; está tudo prestes a acontecer na próxima semana, no próximo ano; não nos importa o tempo que demorará, desde que estejamos suspensos num estado de espera.

Um novo fenómeno que surge dos nossos apetites insaciáveis é a sen-sação de se «ser merecedor»; agora, toda a gente pensa que merece ser um vencedor. É por isso que existem tantas pessoas iludidas e que, sem qual-quer vergonha, têm a ousadia de tentar o Factor X quando têm voz de sapo. Os livros de autoajuda irão dizer-lhe que a única coisa que está a impedir o seu caminho é você. «Você pode ser bonito se pensar que o é», dizem eles. É por isto que os genuínos autoiludidos aplicam nas unhas extensões vermelho-sangue incrustadas de pequenos diamantes, como se ninguém notasse que elas são do tamanho do Tibete.

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