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 Artigo 1. Intr odução; 2. O conceito de cultur a; 3. A qu es tão da cultur a nas organizaçõ es ; 4. Cultura e relações de trabalho em uma empres a es tata l; 5. As estórias de coragem e o nascimento dos he róis ; 6. O mito da grande fam/7ia; 7 Comentários finais. Estórias mitos heróis cultura organizacional e relações do trabalho Maria Tereza Leme Fleury Professora livre-docente na Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo Re v. Adm, Empr. 1. INTRODUÇÃ O Nos últimos anos, os trabalhos obre o campo simbólico têm-se multiplicado nas mais diversas áreas do conheci- mento, assumindo i mp ortâ nci a c res ce nte inclusive na ad- ministração.  Na p er sp ect iva mais comumente adotada por adminis- tradores, a cultura é pensada como um sistema de repre- sentações simbólicas que expressam formas comuns de apreender o mundo, possibilitando a comunicação entre os membros de um grupo. Este conceito, a nosso ver, precisaria ser mais traba- lhado em termos das múltiplas significaçõ s do universo simbólico e suas relações com outras instâncias da práti- ca social, remetendo ainda às ques ões das relações de poder internas e externas às or ganizações. Ao mediar relações e práticas sociais, o campo do s imb ól ico se afigura como uma das instâncias fu nd ame n- tais para definição das relações de trabalho. Na perspec- ti va p or n ós a do ta da, as o utr as i ns tâ nci as r esp on sá ve is pela determinação dos padrões de relações de trabalho seriam: • a instância polftica - que confere à relação o seu marco ssnutural, situando-a no jogo das forças polfticas e eco- nômicas da soci edade; a instância da organização do processo de trabalho - na qual a tecnologia e as formas de gestão do processo produtivo de fi nem as re la ções de trabalho; a instância das polfticas de recursos humanos - que mediatizam os termos da relação entre capital e trabalho. A incorporação desta dimensão simbólica prende-se à idéia de procurar desvendar o significado de certas es- tórias, mitos, rituais, de certos comportamentos e artefa- tos que perpassam a vida da organização. A proposta des e artigo é di cutir como elementos simbólicos do universo cultural de uma organização ex- pressam e definem padrões de relações de trabalh . Uma breve revisão e sistemat ização da li teratura antropológica e organizacional sobre a temática de cultura foi realizada, visando a elaborar uma proposta co nce itu al e me to dol óg i- ca que fundamenta ss e a análise empfrica. 2. O CONCEITO DE CUL TURA Na perspectiva da antropologia, a dimensão simbólica é concebida como capaz de integrar todos os aspectos da prática social. A preocupação fundamental da pesquisa etnográfica era desvendar os significados dos costumes de sociedades diferentes da ocidental; partia-se do pres- suposto da unidade entre a ação humana e sua significa- ção, descartando-se qualquer relação determinfstica de uma sobre a outra. Como o coloca Durhan, os antropólogos tenderam a conceber os padrões culturais não como um molde que Ri o de Janeiro, 27 4)7 -18 out./dez. 1987

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Artigo

1. Introdução;2. O conceito de cultura;

3 . A questão da cultura nas organizações;4. Cultura e relações de trabalho em uma

empresa estatal;5. As estórias de coragem e o nascimento

dos heróis;6. O mito da grande fam/7ia;7.Comentários finais.

Estórias,

mitos, heróis -

cultura organizacional

e relações do trabalho

Maria Tereza Leme FleuryP ro fe ss ora liv re -d oc en te n a F ac uld ad e d e E co nom ia

e A dm in is tra çã o d a U niv ers id ad e d e S ão P au lo

Rev. Adm, Empr.

1. INTRODUÇÃO

Nos últ imos anos, os trabalhos sobre o campo simbólico

têm-se mult iplicado nas mais diversas áreas do conheci-

mento, assumindo importância crescente inclusive na ad-

ministração. 1

Na perspectiva mais comumente adotada por adminis-

tradores, a cultura é pensada como um sistema de repre-

sentações simbólicas que expressam formas comuns de

apreender o mundo, possibilitando a comunicação entre

os membros de um grupo.

Este conceito, a nosso ver, precisaria ser mais traba-

lhado em termos das múlt iplas significações do universo

simbólico e suas relações com outras instâncias da prát i-

ca social, remetendo ainda às questões das relações de

poder internas e externas às organizações.

Ao mediar relações e práticas sociais, o campo do

simbólico se afigura como uma das instâncias fundamen-

tais para definição das relações de trabalho. Na perspec-

tiva por nós adotada," as outras instâncias responsáveis

pela determinação dos padrões de relações de trabalho

seriam:

• a instância polftica - que confere à relação o seu marco

ssnutura l, situando-a no jogo das forças polfticas e eco-

nômicas da sociedade;

• a instância da organização do processo de trabalho -

na qual a tecnologia e as formas de gestão do processo

produtivo definem as relações de trabalho;

• a instância das polfticas de recursos humanos - que

mediatizam os termos da relação entre capital e trabalho.

A incorporação desta dimensão simbólica prende-se

à idéia de procurar desvendar o signif icado de certas es-

tórias, mitos, rituais, de certos comportamentos e artefa-

tos que perpassam a vida da organização.

A proposta deste artigo é discutir como elementos

simbólicos do universo cultural de uma organização ex-

pressam e definem padrões de relações de trabalho. Uma

breve revisão e sistematização da literatura antropológica

e organizacional sobre a temática de cultura foi realizada,

visando a elaborar uma proposta conceitual e metodológi-

ca que fundamentasse a análise empfrica.

2. O CONCEITO DE CUL TURA

Na perspectiva da antropologia, a dimensão simbólica é

concebida como capaz de integrar todos os aspectos da

prática social. A preocupação fundamental da pesquisa

etnográfica era desvendar os signif icados dos costumes

de sociedades diferentes da ocidental; partia-se do pres-

suposto da unidade entre a ação humana e sua significa-

ção, descartando-se qualquer relação determinfst ica de

uma sobre a outra."

Como o coloca Durhan, os antropólogos tenderam a

conceber os padrões culturais não como um molde que

Rio de Janeiro, 27(4)7-18 out./dez. 1987

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produziria condutas estritamente idênticas, mas antes

como as regras de um jogo, isto é, uma estrutura que

permite atribuir significado à certas ações e em função da

qual Ise jogam infinitas partidas. Neste sentido," estiveram

sempre mais interessados nas mediações possíveis do

que nas determinações da infra-estrutura econômica so-

bre a superestrutura ideológica.

Não existe também a preocupação em se estabeiece-

rem relações entre as representações e o poder. Segun-

do ainda Ourhan, os padrões culturais não são concebi-dos como instrumentos de dominação, a não ser no senti-

do genérico de que a cultura é instrumento de domínio das

forças naturais.

nA opacidade da sociedade, a inconsciência dos ho-

mens em relação aos mecanismos de produção da vida

social nunca puderam ser vistas pelos antropólogos, nas

sociedades essencialmente igualitArias com I:!s quais se

preocuparam, como resultado do ocultamento da domina-

ção de uma classe sobre a outra. Obviamente, é possível

analisar relações de poder nas sociedades primitivas,

mas isto não é nem o fulcro nem o centro da concepção

de cultura" (Ourhan, 1984, p. 77).

Entre os sociólogos, uma corrente importante paraanálíse da cultura é a do interacionismo simbólico, cujos

autores mais conhecidos são Erving Goffrnan e Peter Ber-

gero O trabalho de Berger e Luckmann The $()(J; ia lcons-t ru c tion o f rea li ty , como o próprio trtulo indica. procura ex-

plorar o processo de elaboração do universo simbólico.

Consideramos importante recuperar certos rnqmentos de

sua trajetória, pois ele toca ( ex pl íc it a OU implicitamente)

em algumas questões centrais para a discuss~ da cultu-

ra. Um outro ponto que justifica uma análise mais detida

do pensamento deste autor decorre da influência por ele

exercida sobre os estudiosos da cultura nas organiza-

ções.

Para Berger e Luckmann (1967), a vida cotidiana seapresenta para os homens como uma realidade ordenada.

Os fenômenos estão pré-arranjados em padrões que pa-

recem ser independentes da apreensão que cada pessoa

faz deles, individualmente. Em outras palavras, a realida-

de se impõe como objetivada, isto é, constituída por urna

série de objetivos que foram designados como objetos

antes da "minha" aparição (enquanto indivíduo) em cena.

O indivíduo percebe que existe correspondência entre

os significados por ele atribuídos ao objeto e os signif ica-

dos atribuídos pelos outros, isto é, existe o' compartilhar

de um senso comum sobre a realidade.

Um elemento importante neste processo de objetiva-ção é a produção de signos, ou seja, sinais que têm signi-

ficações. A linguagem é um conjunto de signos com a ca-

pacidade de comunicar significados; ela constrói campos

semânticos, ou zonas de significados.

Quando um grupo social, . segundo os autores Berger

e Luckmann (1967), tem que transmitir a uma nova gera-

ção a sua visão do mundo, surge a necessidade de legiti-

mação. A legit imação consiste em um processo de expli-

car e justificar a ordem institucional, prescrevendo valida-

de cognitiva aos seus signi ficados objetivados; tem, por-

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tanto; elementos cognitivos e normativos e dá origem ao

universo simból ico. Isto porque no processo de legit ima-

ção se produzem novos significados atribuídos aos pro-

cessos institucionais.

A nível das" organizações é possível observar como

certos símbolos são criados e os procedimentos impllcitos

e explícitos para legitimA-los. O mito da empresa como

uma grande famHia, que analisaremos em seguida, exem-

plif ica esta criação de um mito, integrando vários signifi-

cados e os proc~ssos de sua legitimação.

Berger e í. .uckmann dedicam-se também a discutir os

processos de socialização vivenciados pelo indivk:luo,

distinguindo entre a socialização primária, em que o indiví-

duo se torna membro de uma sociedade, e o processo de

socialização secundária, a qual introduz um indivíduo já

socializado a novos setores do mundo objetivo. No primei-

ro caso, o indivíduo nasce numa estrutura social objet iva,

na qual ele encontra os seus "outros significativos" (na

maioria das vezes, os pais e parentes próximos) que se

encarregam de sua socialização. Estes "outros significati-

vos": que mediatizam o mundo para o indivíduo, apresen-

tando-o como uma realidade objetiva, modificam-no nocurso da mediação. Ou seja, selecionam aspectos que

consideram importantes de acordo com sua posição na

estrutura social e em função de suas idiossincrasias pes-

soais (Berger e Luckmann, 1967).

A socialização primária envolve mais do que simples

aprendizagem cognitiva - ela ocorre em circunstâncias

muito emocionais. A linguagem constitui o mais importante

instrumento de socialização.Se a socialização primária acontece com a grande

identificação emocional do indivk:luo com os valores

transmitidos pelos pais, na socialização secundária a

identificação acontece somente na medida necessáría pa-

ra a comunicação entre seres humanos (exemplificando: épreciso amar a mãe, não a professora). Na socialização

primária, o cunho da realidade do conhecimento é interna-

lizado quase que automaticamente pelo indivíduo; na so-

cialização secundárta, os conhecimentos podem ser ad-

quiridos numa seqüência de aprendizagem e reforçados

por técnicas pedagógicas específicas.

A extensão e o caráter da socialização secundária são

,determinados pela complexidade da divisão do trabalho e,

concomitantemente, pela distribuição social do conheci-

mento de uma dada sociedade. As idéias sobre a sociali-

zação secundária são fundamentais para a análíse do

processo de integração dos indivíduos à organização.

Para Berger e Luckmann, o universo simbólico integraum conjunto de significados, atribuindo-lhes consistência,

justificativa, legitimidade; em" outras palavras, o universo

simbólico possibilita aos membros integrantes de um gru-

po uma forma consensual de apreender a realidade, inte-

grando os significados, viabil izando a comunicação. Exis-

t iria um processo dialético entre as idéias e os processos

sociais de sustentação e legitimação.

A questão do poder e das relações de dominação em

uma dada configuração social constitui uma preocupação

secundária no pensamento destes autores. Ao discutirem,

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por exemplo, como uma determinada definição da realida-

de se torna dominante, os autores elaboram o seguinte

raciocfnio: em uma sociedade, na medida em que aumenta

a divisão do trabalho, o conhecimento vai-se tornando

mais especializado: grupos restritos pretendem deter o

conhecimento global e teorizam sobre ele. Estes grupos

ocupam posições de poder e estão sempre prontos a utili-

zá-lo para impor as suas definições da realidade àqueles

sob sua autoridade.· As conceitualizações alternativas

sobre o universo são se possfvel incorporadas, se nãodestrufdas. Quando uma definição particular de realidade

se vincula a interesses de poder concretos, é chamada de

icJeologia(Berger e Luckmann, 1967, p. 123).

Em suma, na proposta de sociologia do conhecimento

de Berger e Luckmann, a questão do poder é enfocada

como pano de fundo sobre o qual se tecem as relações

sociais, e não como eixo central da análise.

Suas idéias sobre a construção do universo simbólico,

seus processos de legitimação e socialização primária e

secundária são fundamentais a uma proposta de estudos

sobre a instância simbólica nas relações de trabalho.__

Recolocando a questão de ideologia, brevemente men-

cionada por Berger e Luckmann, observamos que a dis-tinção entre cultura e ideologia abre um veio importante a

ser explorado nesta discussão.

Analisando estes dois conceitos, Eunice Durhan

(1984) procura mostrar a relação de complementaridade

existente entre eles, apontando, entretanto, a inconve-

niência da el iminação do conceito de cultura e da investi-

gação dos fenômenos culturais em favor da análise da

ideologia ou ainda a absorção do conceito de ideologia e

da problemática que lhe é própria pelo estudo da cultura.

Recuperando a anãlise feita por Gramsci, ela mostra co-

mo para esse autor todo sistema simbólico é ideologia e

sendo ideologia é dominação. A autora propõe que se in-corpore a dimensão polrtica ao estudo dos processos

culturais, investigando como sistemas simbólicos são ela-

borados e transformados de modo a organizar uma práfíca

pÓlftica, legitimando uma situação de dominação existente

ou contestada: "É importante investigar de que modo gru-

pos, categorias ou segmentos sociais constroem e utili-

zam um referencial simbólico, que lhes permite definir

seus interesses especfficos, construir uma identidade co-

letiva, identificar inimigos e aliados, marcando as diferen-

ças em relação a uns e dissimulando-as em relação a ou-

tros. Qualquer elemento cultural pode ser assim politizado

sem, entretanto, esgotar seu signi ficado no fato de serem

instrumentos numa luta pelo poder" (Durhan, 1984, p. 87).

A autora faz, entretanto, a ressalva que uma aborda-

gem desse tipo, que parte de uma análise "de dentro" dos

grupos ou movimentos sociais, não pressupõe, necessa-

riamente, a questão do enfrentamento das classes funda-

mentais nem julga a relevância ou legit imidade dos fenô-

menos em termos de suas implicações para a repródução

do sistema capitalista.

Por outro lado, segundo ainda esta autora, o conceito

de ideologia se refere àqueles sistemas amplos, coeren-

Es t6 r i1 l s. m i t os . h e r6 i s

tes e cristalizados de idéias que fornecem uma explicação

e uma justificativa da natureza da sociedade e das rela-

ções de poder, em termos de sua legitimidade e ilegitimi-

dade. De uma perspectivagramsciana, a ideologia diz

respeito à formulação de projetoshegemônicos, isto é,

propostas polf ticas de transformação ou manutenção da

ordem social, no sentido de assegurar a dominação de

uma classe sobre as outras. A utilização do conceito de

ideologia parte necessariamente de uma perspectiva ma-

cropolrtica, referente à reprodução do modo de produção edas formas de dominação que lhe são próprias.

Na abordagem antropológica dos fenômenos culturais,

segundo Durhan (1967, p. 88) o procedimento é diverso:

parte-se das práticas sociais concretas e das representa-

ções formuladas por grupos ou categorias sociais, e sua

relevância polrtica só pode ser determinada a posteriori.

Em suma, parece-nos se possfvel distinguir duas postu-

ras teóricas básicas ao se trabalhar o conceito de cultura:

a) de um lado, aqueles que consideram a cultura, os sis-

temas simbólicos como a arte, o mito, a linguagem, em

sua qualidade de instrumentos de comunicação entre as

pessoas e os grupos sociais e elaboração de um conhe-cimento consensual sobre significado do mundo;

b) de outro lado, aqueles que consideram a cultura como

um instrumento de poder e legitimação da ordem vigente.~

. A nosso ver, estas duas posturas não são mutuamente

excludentes - é preciso perceber o universo simbólico na

sua capacidade de ordenar e atribuir significações ao

mundo natural e social, como elemento de comunicação, e

ao mesmo tempo perceber a sua função ideológica de

ocultar as relações de dominação existentes, relações

estas que passam a ser percebidas como naturais, o que,

por sua vez, contribui para a conservação simbólica. Énesta linha mais abrangente que pretendemos desenvol-

ver nossa proposta de anãlise do universo simbólico das

organizações.

3. A QUESTÃO DA CULTURA NAS ORGANIZAÇÕES

Como já mencionamos, nos últ imos cinco anos, o número

de pesquisas sobre o tema cultura organizacional au-

mentou consideravelmente, pesquisas estas conduzidas

sob os mais diversos enfoques teórico-metodológicos."

Uma tentativa de categorização destas pesquisas foi

feita por Linda Smircich (1983). A tipologia proposta por

esta autora permite sistematizar o conhecimento produzi-do na área.

Smircich distingue duas grandes linhas de pesquisa: a

primeira enfoca a cultura como uma variável, como algu-

ma coisa que a organização tem; já a segunda linha con-

cebe a cultura como raiz da própria organização, algo que

a organização é.

. Na primeira linha de estudos é possfvel distinguirem-se

ainda aqueles que definem a cultura como uma variável

independente, externa à organização (a cultura da socie-

dade em que se insere a organização e que é trazida para

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dentro por seus membros) e aqueles que definem a cultu-

ra como uma variável interna (as organizações produzem

bens, serviços e produtos culturais como lendas, ritos,

srmbolos).

O sucesso das empresas japonesas levou muitos

pesquisadores americanos a estudarem as diferenças

culturais entre os dois pefses e sua influência sobre o

contexto organizacional. Exemplos desta linha de pesqui-

sa são os trabalhos de Inzerelli e Rosen (1983) e Jaeger

(1983) que estudam como o controle organizacional varia

em função de fatores culturais, comparando organizações

japonesas, americanas e inglesas.

Por outro lado, as pesquisas realizadas partindo da

premissa da cultura como variável interna procuram enfa-

tizar a importância dos fatores culturais para definição de

estratégias organizacionais. A cultura, concebida como

um conjunto de valores e crenças compartilhados pelos

membros de uma organização, deve ser consistente com

outras variáveis organizacionais como estrutura, tecnolo-

gia, estilo de liderança. Da consistência destes vários fa-

tores depende o sucesso da organização.

Um exemplo desta linha de investigação é uma pes-

quisa recente conduzida por Robert Ernst, (1985) em 100

empresas americanas. O autor define cultura como "um

sistema de valores e crenças compartilhados que mode-

lam o estilo de administração de uma empresa e o com-

portamento cotidiano de seus empregados" (p. 50). Par-

tindo da hipótese de que a maneira mais clara de se com-

preender a cultura é examinar as práticas administrativas

da organização, o autor pesquisa 60 itens que definem

práticas administrativas. A part ir dos resultados da pes-

qi;lisa, ele constrói uma grade, com duas dimensões, que

lhe possibili ta identificar quatro tipos de cultura. A grade

cultural, segundo o autor, pode auxiliar os administradores

no planejamento estratégico da empresa, o qual tradicio-

nalmente é feito levando em consideração somente o am-

biente externo; a identif icação de novas oportunidades

deve levar em consideração fatores cul turais. Da mesma

forma, o planejamento de recursos humanos (seleção,

orientação, avaliação e compensação) deve ser consis-

tente com a cultura organizacional.

A cultura enfocada como variável parte do modelo sís-têmico de organizações; no primeiro caso, a cultura é

parte do ambiente em que se insere a organização; no se-

gundo, é' resultado do desempenho e de representações

dos indivíduos nas organizações.

É importante ressaltar que essas linhas de pesquisa

têm um objetivo claramente normativo; ou seja, elas pro-

curam realizar diagnósticos, com análises comparativas

que subsidiem a elaboração de estratégias de ação das

empresas.

A segunda linha de estudos sobre a cultura organiza ..

cional, identi ficada por Smircich (1983, p. 342), procura ir

além da visão instrumental da organização derivada da

metáfora da máquina, da visão adaptativa derivada da

metáfora do organismo, para pensar a organização como

10

forma. expressiva de manifestação da consciência huma-

na. Esta linha deriva o seu conceito de cultura da antro-

pologia, adotando a idéia de cultura como um recurso

epistemológico que permite enfocar o estudo das organi-

zações como fenômeno social, como a metáfora do orga-

nismo, segundo a qual a autora embasa a visão sistêmica

das organizações.

A autora procura diferenciar as "árias correntes antro-

pológicas - cognitivista, simbólica e estruturalista - que

embasariam as pesquisas sobre cultura organizacional.

Segundo a vertente cognit ivista, cul tura é definida co-

mo um sistema de conhecimento e crenças compartilha-

dos. A t,arefa do antropólogo nesta perspectiva, é determi-

nar quais as regras existentes em uma determinada cultu-

ra e como os seus membros vêem o mundo. A autora in-

clui nessa vertente autores como Argyris e Schon, Schri-

vastava e Mitrof, com a ressalva de que eles não usam

o termo cultura em seus estudos; o enfoque cognitivista

os leva a perceber as organizações com redes de signifi-

cados subjetivos e quadros de referência comparti lhados

que, para o observador externo, aparecem como regras.

Com relação à corrente estruturalista, Smircich reco-

nhece que as tentativas de desenvolver o enfoque teórico-

metodológico de Lévi-Strauss para o estudo da cultura or-

ganizacional são ainda bastante incipientes.

A corrente mais promissora, do ponto de vista de

Smircich (corrente.à qual se f ilia a autora), é a simbólica;

esta define cultura como um sistema de srmbolos e signi-

ficados compartilhados.

Quando a perspectiva simbólica é aplicada à análise

organizacional, a cultura é concebida como um padrão de

discursos simbólicos que necessita ser decifrado e inter-

pretado. A obra de Berger é fundamental para o embasa-

mento te6rico desta linha de pesquisas.

Um trabalho, a nosso ver bastante interessante, reali-

zado sob este enfoque é o de Van Maanen (1982) sobre o

corpo de polícia de uma cidade americana. Um dos pontos

enfocados pelo autor refere-se ao processo pelo qual as

pessoas procuram decifrar a organização em termos de

pautar e adequar o seu próprio comportamento. No caso

das academias de polícia, é estudado o processo pelo

qual os ne6fitos, recém-graduados, aprendem o sistema

de significados mantidos pelo grupo.7

Em outro artigo, Van Maanen (1978) elabora uma tipo-

logia sobre estratégias de socialização desenvolvidas

pelas organizações, muito na linha de idéia de socializa-

ção secundária desenvolvida por Berger e Luckmann;

procura mostrar como estas estratégias (em conjugação

com outras atividades de administração de recursos hu-

manos) substituem em organizações modernas o controle

realizado através dos meios tradicionais como aplicação

de punições, recompensas, supervisão. O autor identifica

vários tipos de estratégias de socialização, que podem

ser combinados em função de se adequar o mais eficien-

temente possível o indivfduo aos objet ivos e natureza da-

quela organização. a Os tipos propostos fornecem pistas

interessantes par? análise da situação empír ica pesquisa-

da.

Revista de Administração de,Empresas

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A nosso ver, um dos autores que vão mais adiante na

proposta de trabalhar a questão da cultura, conceitual e

metodologicamente, é Edgar Schein (1985). Para ele,

cultura organizacional é o conjunto de pressupostos básí-

cos (basic assumptions) que um grupo inventou, desco-

briu ou desenvolveu ao aprender como lidar com os pro-

blemas de adaptação externa e integração interna e que

funcionaram bem o suficiente para serem considerados

válidos e ensinados a novos membros como a forma cor-

reta de perceber, pensar e sentir, em relação a essesproblemas (Schein, 1984, p. 9).

A cultura de uma organização pode ser apreendida em

vários níveis, segundo este autor:

• nrvel dos artefatos visívels: o ambiente construído da

organização, arquitetura, teyou; a maneira de as pessoas

se vestirem, padrões de comportamento vlsfveis, docu-

mentos públicos: cartas, mapas. Este nrvel de análise,

segundo Schein, é muito enganador porque os dados são

fáceis de obter, mas difíceis de interpretar. É possíveldescrever como um grupo constrói o seu ambiente e

quais são os padrões de comportamento discernrveis en-tre os seus membros, mas, freqüentemente, não se con-

segue compreender a lógica subjacente ao comporta-

mento do grupo;

• nrvel dos valores que governam o comportamento das

pessoas. Como esses são difrceis de se observar direta-

mente, para identificá-los é preciso entrevistar os mem-

bros-chave de uma organização ou realizar a análise de

conteúdo de documentos formais da organização. Entre-

tanto, diz o autor, ao identificar esses valores, observa-se

que eles geralmente representam apenas os valores ma-

nifestos da cultura. Isto é, eles expressam o que as pes-

soas reportam ser a razão do seu comportamento, o quena maioria das vezes são idealizações ou racionaliza-

ções. As razões subjacentes ao seu comportamento per-

manecem, entretanto, escondidas ou inconscientes;

• nrvel dos pressupostos inconscientes: são aqueles

pressupostos que determinam como os membros de um

grupo percebem, pensam e sentem. Na medida em que

certos valores compartilhados pelo grupo conduzem a

determinados comportamentos e esses comportamentosse mostram adequados para solucionar problemas, o va-

lor é gradualmente transformado em um pressuposto in-

consciente, sobre como as coisas realmente são. Na me-

dida em que um pressuposto vai-se tornando cada vezmais taken for granted, vai passando para o nrvel do in-

consciente.

Do ponto de vistadeSchein, se a organização comoum todo vivenciou experiências comuns, pode existir uma

forte cultura organizacional que prevaleça sobre as várias

subculturas das unidades. O que se observa freqüente-

mente é que os grupos com background ocupacional se-

melhante tendem a desenvolver culturas próprias no inte-

rior das organizações: a cultura dos gerentes, dos enge-

nheiros, do sindicato.

Est6rias, mitos, 1ro6is

IEle atribui, .no entanto, a maior importância ao papél

dos fundadores da organização no processo de moldar

seus padrões culturais; os primeiros líderes, ao desenvol-

verem formas próprias de equacionar os problemas da or-

ganização, acabam por imprimir a sua visão de mundo

aos demais e também a sua visão do papel que a organi-

zação deve desempenhar no mundo. e

Ao discut ir técnicas possfvels de invest igação dos fe-

nõmenos culturais de uma organização, Schein confere

grande relevância às entrevistas com estes membrosfundadores, elementos-chave da organização. Propõe

também outras técnicas que devem ser usadas de forma

combinada: análise do processo de socialização de novos

membros; anál ise das respostas a incidentes crrt icos na

história da organização; análise, junto com uma pessoa de

dentro, das caracterfstlcas da organização observadas ou

descobertas nas entrevistas.

O grande mérito desse artigo é propor um instrumental

conceitual e metodológico para se trabalhar com cultura

organizacional (segundo a perspectiva te6rica do autor)

que procura ir além do nrvel mais aparente do universo

simbólico das organizações, tentando penetrar no domínio

dos pressupostos inconscientes. Suas idéias e técnicaspara investigação nos sugerem pistas interessantes de

pesquisa.

Em termos de técnicas de investigação sobre cultura

organizacional, outros trabalhos realizados nesta pers-

pect iva simbólica trazem contribuições interessantes. O

estudo, por exemplo, realizado por Joanne Martin e cola-

boradores (1983) uti liza como material empírico estórias

das organizações, construindo uma tipologia de estórias

bastante curiosas. 10

Com isto, os autores pretendem discutir o mito da sin-

gularidade da cultura de cada organização, mostrando

como a recorrência de certos tipos de histórias, def ine al-guns padrões culturais comuns às organizações.

Retomando a categorização proposta por Smircich pa-

ra os estudos sobre cultura organizacional, observamos

que esta permite situar a maioria das pesquisas desen-

volvidas na última década sobre esta temática. Entretanto,

apesar das fortes raízes antropológicas dos estudos

mencionados, verificamos que, em suas várias vertentes

conceituais, eles assumem os sistemas culturais en-

quanto instrumento de comunicação e visão consensual

sobre a própria organização. A dimensão do poder, intrrn-

seca aos sistemas simbólicos (pelo menos nas socieda-

des capitalistas), e o seu papel de legitimação da ordem

vigente e ocultamento das contradições das relações dedominação estão ausentes nestes estudos. Parafrasean-

do Eunice Durhan no art igo citado, seria necessãrio "poli-

tizar" o conceito de cultura, a fim de apreendê-lo como

instância definidora das relações de trabalho.

Procurando aprofundar essa discussão sobre cultura e

poder, consideramos importante introduzir conceitos de-

senvolvidos por Max Pagãs e seus colaboradores (1979).

Não pretendemos tentar recuperar a trajetória desen-

volvida por esses autores para a construção de sua obra,

por razões te6ricas e metodológicas. O objetivo do traba-

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lho é estudar o poder nas o rgan izações a partir de um 'q ua dro te óric o q ue p ro cu ra a lia r o re fe re nc ia l m arx ista ap sic an á lis e fre u dia na . O s n o ss os re d uz id o s c o nh e cim e n-to s so bre p sic an álise n os d ific ulta m m uito tra ba lh ar c om 'c erto s c onc eito s e e sq ue ma s d e a ná lise d ese nvo lvid osp elo s a uto re s. P or o utro la do , a p ro po sta m e to do ló gic a d ec on du zir o . es tu do s eg un do u m a p os tu ra "s is tê mic a d ia lé - ,tica", se b em que fasc inan te , é m uito d iffc il d e se r re pro -d uzid a e po de -se fá cilm en te ca ir 'no e rro d e e mpre sta r à

o bra ' u ma lin ea rid ad e e rn po ore ce do ra , q ue e la n ão p os-.suí."

A ssim se nd o, o pta mo s p or in co rp ora r s im ple sm en tea lg um a s id éia s d ese nv olv id as p or P ag às, q ue a brem c er-

to s c am in ho s p rom is so re s a o n o ss o t~ ab a lh o .

Segundo os au to res, o fenO meno do pode r tem sidoestudado sob d iferen tes pe rspectivas: '

• do pon to de vista m arxista , com o fenôm eno de a liena -ção e co nôm ica (a não -pro prie dad e d os m eio s d e pro du-çã o) q ue se pa ra o s tra ba lh ad ore s d os m eio s d e p ro du çã o

e d os fru to s d e se u tra ba lh o;

• com o um fenôm eno sobre tudo po lftico de im posição econ tro le sob re as dec isões e o rgan ização do traba lho(sã o in clu fd os n es ta p ersp ec tiv a a uto re s b em d ife re nte sc omo W rig ht M ills e F o uc au lt);

.• a o n (v el id eo ló gic o, c orn o u m fe nô me no d e a pro pria çã o

d e s ig nific ad o s e v alo re s;

• ao n fve l psico lóg ico , co rno um fe nôm eno d e a lie naçãop sico ló gic a, d e d ep en dê ncia , d e pro je çã o e in tro je çã o,c om o s iste m as d e d efe sa c ole tiv a in co nsc ie nte (P ag as e t

, a lii, 1 97 9, p . 8 ).

O s a uto re s p re te nd em a na lisa r o fe nô me no d o p od er esu as a rticu laçõ es n a v id a d e u ma o rg an iza çã o, a p artir d e

um en fo q ue p lu rid im e ns io n al, le va nd o em c o ns id e ra çã o a sd im e n sõ e s d e o rd em e c on ôm ic a, p o lftic a, id e oló gic a e p si-c oló gica . P ara a tin gir e ste _p bje tivo , se gu nd o u ma pe rs-

p ec tiv a d ia lé tic a, o s a uto re s in tro du zem o c on ce ito d e m e -d ia çã o, o q ua l "é in disso lu ve lm en te lig ad o a o co nc eito d ec o ntra d iç ão , n o s en tid o ma rx is ta 00 ie rrn o" (P ag as e t a lii,

1979 , p .. 27 ). O pro cesso d e m ed iação , co mo já m encio -nam os, transfo rm a a co ntrad ição bá sica e ntre cap ita l e

tra ba lh o e m u ma co ntra diçã o in te ma à s p olltic as d a o rg a- ,n ização.

O s au to res d ese nvo lve m sua pe squ isa na filia l eu ro -pé ia d e u ma e mpre sa m ultin acio nal a me ric an a, p or e le sq ua lific ad a d e em pre sa h ip erm o de rn a, a q ua l c on ju ga a ltate cn olo gia d e fa bric aç ão c om té cn ic as d e a dm in is tra çã oa s ma is s o fi st ic a da s. 12

A o rg an iz aç ão h ip e rm o d ema c ara cíe n za -s e p e lo d e se n -v olv im en to "fa ntá stic o" d os p ro ce sso s d e m ed iaçã o, e mc on so nâ nc ia c om a s tra ns fo rm aç õe s d o a pa re lh o p ro du ti-v o: a in te le ctu aliza çã o d as ta re fa s, o p ap el a lc an ça do p elac iê nc ia e pe la té cn ic a e m to do s o s e sca lõ es d a p ro du çã o,

12

a cre scen te d iv isão técn ica d o trab alho e a in te rd epe n-

d ên cia d as ta re fa s, a m ud an ça e a re no va çã o c on sta nte .O a pa re lh o p ro du tiv o e xig e tra ba lh ad ore s in stru fe lo s, c a-

paze s d e co mpre end er o s princfp lo s d e sua ação (e nãosim p le sm e nte d e re aliza r ta re fa s ro tin eira s), c ap aze s d e

in ic ia tiv a, c om p rom etid os c om s eu tra ba lh o, a da pta do s àm ud an ça . Isto p od e to rn á-lo s m ais U vre s p ara o rg an iza -

rem a p ro du çã o, p ara in te rro ga rem -se so bre o s o bje tiv osd a o rg an iz aç ão . P or s ua v ez, a o rg àn iz açã o h ip erm o dem a

d eve a sse gura r se u co ntro le so bre a s tra nsfo rm açõ es d osiste ma p ro du tiv o, m an te nd o ta mb ém o c on tro le so bre a s

tra nsfo rm açõ es p or q ue p assa m se us e mp re ga do s. Is to'reque r um a lto desenvo lv im en to do sistem a de m ed ia-

ções .O s a uto re s id e ntific am a in d a q ua tro g ra nd e s c ate g oria s

d e me d ia çõ es n as emp re sa s h ip e rm o d er na s:

1 . M e dia çõ e s d e o rd em e c onOm ic a: a lto s s alá rio s, c arre iraa be rta , c on trib u in d o p ara d e str uir o s v e stfg io s d a s oc ie d a-d e fe ud al: c as ta s, d ip lo m as , lig aç õe s fa m ilia re s q ue su b-s is tem na s ocie da de ca pit al is ta c lá s si ca .

2 . M ed ia çõ es d e o rd em p olftic a: d ese nv olv im en to d e u ms is te m a d ec is ório , q ue a ss eg ure o g ov ern O a d is tâ nc ia d ese gm en to s v asto s e c om ple xo s d a e mp re sa m atriz ; su bs-titu em -se p ara -ta nto a s o rd en s e in te rd içõe s p or re gra s ep rin c fp io s i nt er io riz a dos c onf orme a ló g ic a da o r ga n iz aç ã o.D es ap are ce a fig ura d o c he fe tra dic io na l, "p eq ue no so be -

ra no lo c al d a s emp re sa s c ap ita lis ta s c lá ss ic as ", s ub stitu f-

d o p e lo c he fe in té rp re te d a s re g ra s d a o rg an iz aç ão .

3 . M ed iaçõe s d e o rd em ide ológ ica : d ese nvo lvim en to d ao rg an iz açã o c orn o lu ga r a utô nom o d e p ro du çã o id eo ló gi-

c a, artic ula da a to da s a s p rá tic as d a e mp re sa : p olftic a d e :p e ss oa l, fin an ce ira , c ome rc ia l. A emp re sa c ap ita lis ta c lá s-

sic a é o lo ca l p riv ile gia do d as re la çõ es e co nOm ic as - "tra -b alha -se para ganhar a v id a". E la se apó ia sob re ce rto sa pa re lh os id eo ló gic os d a so cie da de g lo ba l c om o a fa m nia ,

a e sc ola , a re lig iã o, o s q ua is e la re fo rça e é p o r e le s re fo r-çada ; não produz, po rém , po r si m esm a um a ideo log ia

própria . A e mpre sa h ipe rm od erna inve ste tam bém no s

a pa re lh os id eo ló gic os d a so cie da de g lo ba l (n ota da me nte.a tra vé s d a in te rm e dia çã o d o E sta do ) p ro cu ra nd o in flu en -cia r su as o rie nta çõ es e to rn a-se e la m esm a u m d os lo ca isp or e xc elê nc ia d a p ro du çã o id eo ló gie a c on se rv ad ora . Isto '

p orq ue e la n ec es sita ju stific ar su as p rá tic as ju nto ,a s eu se mpre gad os, clie nte s e o púb lico d e um m od o ge ra l. E laam biC io na ; e e m la rga m ed id a o co nse gue , to rnar-se um

lu ga r d à prÓd u çã o d e s ig nific ad o e v alo r.

4 . M ed ia çõ es d e o rd em p sic oló gica : d ese nv olvim en to d ain flu ên cia p sic oló gic a d a o rg an iz aç ão s ob re o s tra b alh ad o -re s. A o n fv el p sic oló gico , o pa r: va nta ge ns/re striçõ es se. tra nsfo rm a n o p ar p ra ze r/a go nia . A o rg an iz açã o fu nc io na

co rno 'um a im ensa m áqu ina de praze r e angústia - a an-g ústia , p ro vo ca da pe la o nip re se nça d os c ontro le s, p eloc ará te r ilim ita d o e in atin gfv e l d a s e xig ên cia s, é c omp e ns a-d a p elo s m ú ltip lo s p ra ze re s o fe re cid os p ela o rg an iza çã o,p rin cip alm e nte o s p ra ze re s d e tip o a gre ssiv o: o p ra ze r d e

R ev is ta d e A dm in is tr aç ão d e Em pr ua s

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c on qu is ta r, d e d om in ar c lie nte s~ c ole ga s, d e v en ce r. O in -d iv rd uo in tro je ta a n (v al d o in co nsc ie nte a s re striç õe s im -po stas e o s tipo s de satis fação o fere cid os. Cria-se umm ec an ism o d e re fo rço c irc ula r, e ntre a go nia e p ra ze r, q ueasse gura a m an ute nçã o d o siste ma psico ló gico e m co n-s on ân cia c om a e stru tu ra d a o rg an iza çã o e o s re pro du z.

E vid en te me nte , as ca te go rias p ro po sta s nã o sã o e s-

tanques, m as se co nfigu ram ante s de tud o, co mo corte se piste mo lóg ic os, q ue p erm ite m inte rpre tar a re alid ad e

pe squ isad a pelos auto res. Interessa ao s ob je tivo s d on osso tra ba lh o e xp lo ra r m ais d etid am en te a s m e dia çõ esd e o rd em id eo ló gic a e s ua s a rtic ula çõ es c om a s d em ais.

O conce ito d e id eo lo gia d ese nvo lvid o pe lo s auto res

aprox im a-se do co nce ito de cultu ra o rgan izacional, ta lc orn o e ste fo i tra ba lh ad o a té a qu i. O s a uto re s d esc arta m a

d efin içã o m arxis ta trad ic io nal (o u vu lg ar, c om o q ue re mo utro s) d e id eo lo gia c orn o u m siste m a c oe re nte e m o no lfti-co de idé ias, a te nd end o aos in tere sse s da classe d om i-n an te . A id eo lo gia d ev e o fe re ce r u ma in te rp re ta çã o d o re alre la tiv am e nte c oe re nte c om a s p rá tic as s oc ia is d os m em-b ro s d a o rg an iz açã o, fo rn ec en do -Ih es u ma c on ce pçã o d emu nd o c on fo rm e s ua s a sp ir aç õe s.

S eg un do P ag ãs e c olab ora do re s (19 79. p. 80 ), na e m-p re sa p esq uisa da , o s em pre ga do s p artilh am fo rte m en ted a id eo lo gia , n a m ed id a e m q ue p artic ip am d e su a e la bo -ra çã o, n um p ro ce sso d e a uto pe rsu asã o, q ue lh es p erm itec on trib uir p ara su a p ró pria su bju ga çã o. Is to sig nific a q ue

e la nã o re sid e a pe na s n o d iscu rso d os d irige nte s, m as ée la bo ra da p elo c on ju nto d o s empre g ad o s.

O s a uto re s re ssalta m a in da qu e a co ntrib uiçã o d os in -d vfduos à pro dução depende m uito d e sua inte gra çã oid eo ló gic a. A fu nçã o e sse nc ia l d a id eo lo gia n ão é apenas

m asc ara r a s re la çõ es so cia is d e p ro du çã o, m as re fo rça r ad omin aç ão e c on se gu ir a e xp lo ra çã o d o s tra ba lh ad o re s.

E xistiria , a ssim , n a em pre sa h ip errn od ern a a e la bo ra -ção de um a nova "re lig ião ", que é co locada em prá tican os d is po sitiv os d a p oIftic a d e p es so a l.

U tiliza nd o a m e tá fo ra d a re lig iã o, o s a uto re s a na lis amo s d ogm as, o s m and am en to s d a e mp re sa (co nsu bsta n-c ia do s n os se us p rin crp io s e p oIftic as d e p esso al), o s rito s

(a co nfissão : a s e ntre vista s pa ra a va lia çã o d e pe sso al, am issa: as re un iõ es, o b atism o: o s p ro gra ma s d e in te gra -

çã o d os no vo s fu ncio ná rio s, a c ate qu ese : o s p ro gra masde t re in amen to , a l it ur gi a: a s r eg ra s) .

A o bra d e P ag ãs traz, a no sso ve r, a lgu ma s co ntrib ui-çõ es b asta nte sig nific ativ as à d is cu ss ão p ro po sta n estetexto.

A p rim eira d ela s se re fe re a o e nfo qu e te órico m eto do -lóg ico a do tad o pe lo s au to re s, q ue pro cu ram tra ba lh ar aqu estã o d o p od er n a e mp re sa cap ita lista, e m su as vá ria s

in stâ nc ia s e mú ltip la s mediações. A introdução do con-c eito d e m ed ia çã o, qu e tra nsfo rm a a c on trad içã o b ásica

e ntre c ap ita l e tra ba lh o em uma c on tra diçã o in te rn a à s p o-Iftica s .d a o rga niza ção , pa re ce -n os fu nd am en ta l pa ra aapreensão "das re la çõ es d e tra ba lh o n o in te rio r d a o rg an i-zação.

E m se gun do lu ga r, a a ná lise e mp (rica re aliza da p elo sauto res, en focando o sistem a de no rm as e as prá ticas

Est6rias, mitos, hodis

ad ministrativ as d e p esso al c om o e le me nto s e sse ncia is

m e dia tiza nd o a s c on tra diçõ es d a em pre sa , a bre in te re s-sa nte s p ista s d e in ve stig açã o. E sta p ro po sta v ai a lé m d a-

q ue la fe ita p or m u ito s a uto re s americ an os 13 qu e obse rv amna s p rá ti ca s a dm in is tr at iv as e lemen to s da cu lt ur a.

E stas p rá tica s co nstitu em -se ta nto c om o e le me nto sd efin id ores, com o m ed iado res de re lações d e po der. no '

. in terior das organ izações.

Em sum a, ao recupe rar o traba lho de cientistas so -cia is, d e p sicó lo go s e a dm inistrad ore s so bre esta te má -

tic a, p ro cu ra mo s ir a lé m d a p ro po sta c lá ssic a, q ue d efin ecultura < : o r n o re pre se nta çõ es s im b ólic as q ue e xp re ss amform as co muns d e apre ende r o m undo , po ssib ilitand o acomunicação en tre os m embros de um grupo . A nosso

ve r, é prec iso "po litiza r" o conce ito de cultu ra (na linhap ro po sta p or D urh an ), in ve stig an do é om o o u niv erso sim -b ólico expre ssa re lações de pod er, o culta-as e instru -m e nta liz a o p ólo d omin an te d a re la çã o.

. O e stu do d e ca so so bre re la çõe s d e tra ba lh o re alizad oem uma em pre sa e sta ta l p ro pic io u o m ate ria l e m píric o p a-ra re fle tirm o s so bre a s q ue stõ es p ro po sta s. N esse e stu do

de caso , a tem ática das re lações de traba lho fo i pe squ i-sada em suas vá rias instâncias de fin idoras, sob um ape rsp ectiva histórica. N ão no s é p ossfv el re cu pe ra r, n oslim ite s d e ste te xto , to d a a a ná lis e re aliz ad a; p ro cu ra rem o sa ssim p in ça r a lgu ns e le me nto s q ue n os p are ce m inte re s-s an te s à d is cu ss ão p ro po sta .

F oc arem os o p erfo do in ic ia l d a h istó ria d a em pre sa , p e-

ro oo e ste fu nd am e nta l p ara a c on stru çã o d e s ua id en tid a-d ee p ara a d efin ição d os pa drõ es d e re la çõe s d e tra ba lh o.A análise , a inda que rá pida , d e suas re lações com o Es-tad o, com o m ercado , d e suas prá ticas ad ministrativas ed as re la çõ es e ntre a s c ate go ria s d e tra ba lh ad ore s p ossi-b ilita o e nca min ha me nto d a d iscussão so bre o un iv erso

sim b ólic o, d esta ca nd o-se c erta s e stó ria s, m ito s, h eró is ,qu e e xpre ssa m e ste d up lo sig nifica do d a c ultu ra o rg an i-zacional.

4. GUL TURA E RELAÇÕES DE TRABALHO EM UMAEMPRESA ESTATAL

A empre sa p esq uisa da fo i cria da na d éca da d e 40 , se nd o-c on tem po râ ne a à p rim e ira g era çã o d as empre sa s e sta ta isbrasileiras.

O s s eu s p rim eiro s a no s d e v id a fo ra m b asta nte d itrc eis ,ma rc a dos pe la in seg ur an ça f in a nce ir a e f ra g ilid a de t écn ic a

e a dm in istra tiv a; fo ra m ta mb ém a no s d e lu ta p ara c on so li-d ar su a p osiçã o n o m e rc ad o n ac io na l e in te m ac io na l.

S up era do s o s o bs tá cu lo s d e fin an cia me nto , o pe ra çã o,

e assegurado o seu posic ionam ento no m ercado, a em -p re sa c om e ço u a a dq uirir fo rm ato em pre sa ria l p ró prio . Emfu nçã o d e c ara cte rrstic as d e s ua s a tiv id ad es p ro du tiv as(p ro du to ra , tra ns po rta do ra e e xp orta do ra d e in su mo s b á-sicos) e de sua inserção no m ercad o inte rnacio nal, co n-se gu iu d efin ir suas e stra tégias d e cresc im ento co m umce rto gra u d e au to no mia e m re la ção à s po lftica s g ov em a-menta is .10

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o cre sce r, ve nc en do se mp re d esa fio s e o bstá cu lo s,q ue s urg iu c omo me ta p rio ritá ria n a p rim e ir a d é ca d a, fo i-s e

to rn an do u m o bje tiv o p erm a ne nte , in co rp ora do à s ua p rá -tic a c otid ia na . A e fic iê nc ia em to da s a s e ta pa s d o p ro ce s-so d e pro du çã o e tra nsp orte fo i se mp re p ro ce ssad a a tra -vés das m udanças no processo de traba lho , através dain ov açã o te cn oló gic a e q ua lific açã o d e se us q ua dro s té c-n icos.

P ara le la m en te , a s p rá tic as p ara a dm in is tra çã o d e p es-s oa l e ra m sim p le s, p ou co fo rm a liz ad as , a te nd en do à s n e-c es sid ad es m a is im e dia ta s d o p ro ce sso p ro du tiv o. O p ro -cesso d e re cru tam ento e se le ção e ra fe ito d e m ane ira in -fo rm ai p ela s ch efia s in te rm ed iá ria s, a cio na nd o se mp reque po ssfve l as re de s d e pare ntesco e am izad e e ntre o sem pre ga do s. A in dic açã o c on stitu fa em p rim e iro c rité riopara se le ção d o no vo e mpre gad o; o o utro re qu isito fun -d am e nta i e ra a fo rç a ffs ic a d o tra ba lh ad or, n ec ess ária p a-ra a gü en ta r o ritm o e a s co nd içõ es d e tra ba lh o. O pro ce s-so d e q ua lifica ção e ra fe ito d e fo rm a p on tu al, se gu nd o a sn ec ess id ad es m ais im e dia ta s d e p re en ch im e nto d os p os -to s d e tra ba lh o e s eg un do c rité rio s b asta nte p ers on aliz a-

d os (o s su pe rv iso re s tra ns fe ria m s eu s em pre ga do s d e u m

po sto para o utro , facilitand o o u, e m ce rto s caso s, im pe -d in do o p ro ce sso d e q ua lific açã o). A o s e d iv ers ific arem a sta re fas, surg ia m a s fu nçõe s, o s ca rg os e sp ecia Hza do s ee sb o ça vam -s e o s p ro je to s d e c arre ira . 15

A s p rá tica s a dm in istra tiva s d e p esso al se re su miamaos proce sso s fo rm ais d e ad missão e d em issão d os tra -b alh ad ore s: o fic ha r o em pre ga do . É impo rtante ressa lt a rq ue , d o p on to d e vista d o tra ba lh ad or, se r fic had o e te r o ss eu s d ir eito s c on stitu ra um d o s p rin cip ais a tra tiv o s p ara s eem pregar na em presa . O re la to de um em pregado apo -se nta do é a e sse re sp eito sig nifica tivo : "N aq ue le te mp o,não tinha e sco lha . Era a e mpre sa o u o B anco d o B rasil. Am aio ria e ntrava para a e mpre sa , o filho d o fe rro viá rio ia

tra b alh ar n a e sta çã o , p e ga va um tr ein amen to tra b alh an d od e graça e d epo is e ra ad mitid o. O am bie nte e ra m uito fa -m i lia r: p a i e f il ho t ra bal ha vam jun to s ."

A e stru tu ra h ie rá rq uic a d a em pre sa n os se us p rim e iro s

ano s e ra m uito sim ple s, co mpo sta b asicam ente d e trêsc ate go ria s: e ng en he iro s, s up erv iso re s (o s c ha m ad os fe i-to re s) e o s trab alhad ore s (o s pe ões). A s re lações d e po -d er e ntre a s ca te go ria s e ma na vam nã o só d as p osiçõ es e

p ap éis assu mid os n o p ro ce sso d e tra ba lh o, m as ta mb émd e c ara cte rfs üc as p ess oa is e e ra m e xe rc id as d as m a is d i-v ers as fo rm a s, d esd e a s m ais c oe rc itiv as, à s rem un era ti-

v as e s im b ó lic as .

A p rim eira in stâ ncia d o p od er e ra re pre se nta da p elo se ng en he iro s, q ue a cu m ula va m fu nç õe s té cn ic as e d ire ti-va s. R ep re se nta va m a a uto rid ad e su pre ma e le gitim a p or

s eu c on he cim e n to d ife re n cia d o, a d qu ir id o n as e sc o la s s u-pe rio res. Na estra tég ia da em presa de fo rm ação de um

q ua d ro té cn ic o- ge re n cia l a ltam e nte . c ap ac ita d o, in ve stia -se n a fo rm açã o d os e ng en he iro s, v isa nd o-se a o bte r n ãosó um grupo qua lificad o, m as, tam bém co eso e co mpro -m e tid o c om a p ró pria em pre sa . A a lta c úp ula a dm in istra ti-v a, d ire to re s e p re sid en te s, e ra d es ig na da p ela P re sid ên -c ia d a R e pú b lic a, p o r um p e río o o d e lim ita d o.- E le s g ua rd a -

14

v am se me lh an ças co m o s e ng en he iro s, n o se ntid o d e q uea mb os tin ha m a po ssib ilid ad e d e im prim ir à e mpre sa a v i-sã o p ró pria d o se u vir-a -se r, d o se u e sp aço , d a su a m is-sã o. M as , p or o utro la do , o se u d is ta nc ia me nto d o c otid ia -n o d a e mp re sa , d a re la çã o d ire ta co m o s o utro s e mp re ga -d os d ife re nc ia va -o s d os e ng en he iro s. E ste s ú ltim os a s-su mia m in te gra lm en te a a mb ig üid ad e d o se u p ap el: e ra mem pre ga do s e xe rc en do a s fu nç õe s d e p atrõ es, c orp orifi-

ca nd o a se us o lh os e a os d os d em ais a p ró pria e mp re sa .

A se gund a instânc ia e ra re pre se ntad a pe las che fiasin te rmed iá ri as : o s fe it or es , a dm in is tr ado re s q u e pa ss a rama s er c ha m ad os e nc arre ga do s, s up erv is ore s. E ste s d eti-n ha m a a uto rid ad e n ec ess ária p ara d isc ip lin ar, e m c erto scaso s o rgan iza r e e xig ir p ro dução , e a té m esm o para re -

com pensar, na m ed ida em que a não-fo rm alização dosp ro ce dim e nto s d e a dm in is tra çã o d e p es so al lh e c on fe ria

p od er so bre a s p ossib ilid ad es d e ca rre ira d e se us su bo r-d in ad os. A s re la çõ es e ntre o s d ois gru po s e ra m re ve sti-

das d e fo rte d ose d e a mb ig üid ad e: o ra e le s co nstitu la mu m "n ós c ole tivo ", o ra se co lo ca va m c om o p ólo s o po sto sd a re la çã o d e tra b alh o .

A n oss a p ro po sta p ara a a ná lis e d o u niv ers o s im b ólic o·d es ta em pre sa e sta ta l p esq uisa da le va em c on sid era çã o,po rtan to , e sse s três po nto s: o pro ce sso d e de fin ição d esua id en tid ad e e mpre saria l; as co nd içõe s d e trab alho ee lab oração d e suas prá ticas ad min istra tivas; e as re la -çõ es d e p od er e ntre a s ca te go ria s d e e mp re ga do s. E ssa sd im e ns õe s sã o, a o m e sm o tem po , e le m en to s e stru tu ra n-te s e e stru tu ra d os p e lo s p ad rõ e s c ultu ra is v ig e nte s.

N a pe rspe ctiva ad otada , as vá rias ca tego rias d e e m-pre gad os partic ipam d o pro ce sso d e co nstrução d o un i-v erso s im b ólic o. A s c ate go ria s d om in an te s, d ire to re s, g e-ren tes, im prim em ,. m ais do que ou tras, a sua visão de

mundo sob re a empresa , po rém sem o peso , sem a ex-c lu siv id ad e q ue lh es é a trib ufd a p or a uto re s c orn o S ch ein(1 98 3). S eg un do e ste a uto r, o s fu nd ad ore s (n ota da me nteo s fu nd ad ore s d e e mp re sa s p riva da s) d ese mpe nh am u m

p ap el fu nd am e nta l n a c ria çã o d a c ultu ra d a o rg an iza çã o;na m ed ida em que e les têm uma visão to ta l do que deves er a o rg an iz aç ão , p ro cu ram e stru tu rá -Ia , d e se nv o lv ê-Ia ,e la bo ra nd o e lem en to s sim b ólic os c on sis te nte s (p elo m e -

nos no seu próprio pon to de vista ) com esta visão . Se ao rgan ização é b em -suce did a, o se u fundad or se nte -sere fo rça do e m se us v alo re s e p rin clp io s, im prim in do , c om

cad a ve z m ais segurança , a sua "ve rd ad e" so bre o s d es-tin os d a o rg an iza ção . N a e mp re sa e sta ta l, e m fu nçã o d e

su a e sp ec ific id ad e, e ste p ro ce sso o co rre d e fo rm a m aisd isp ersa , e a lg un s d irig en te s d ese mpe nh am e ste p ap el,

p oré m se m a c on tin uid ad e te mp ora l q ue a co nte ce n a e m-p re s a p ri va da .

P ro cu ra re mo s, p orta nto , te nta r p en etra r n o un ive rsosim bó lico d a o rg an iza çã o pe sq uisa da . O p rim eiro p assone sta d ire ção se rá o de re cupe ra r e stó rias so bre ce rto sin cid e nte s c rltic os n a v id a d a o rg an iz aç ão ; a a ná lis e d e stem a te ria l p erm ite e xp lic ita r c erto s v alo re s c aro s a os m em-b ro s d a e mp re sa , v alo re s e ste s fu nd am en ta is ao p ro ce s-s o d e c on stru çã o d os h eró is .

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o passo seguinte será no sentido de tentar desvendar

o significado dos mitos. Partimos do conceito de Lévi~

Strauss (1970, p. 140) de que "o mito é, ao mesmo tempo,

uma estória contada e um esquema l6gico que o homem

cria para resolver problemas que se apresentam sob pIa-

nos diferentes, integrando-os. numa construção sistemáti-

ca". Procuramos recuperar um mito que é bastante ca-

racterístico do período estudado: o mito da "grande famí-

lia." A tentativa de interpretar este mito é crucial para a

compreensão do papel assumido pelo sistema simbólico,tanto como elemento integrador, definidor da identidade da

empresa, como revelador dos mecanismos de poder nela

engendrados.

5.AS ESTÓRIAS DE CORAGEM E O NASCIMENTO

DOS HERÓiS

o período inicial da história da empresa pode ser caracte-

rizado como um período de sobrevivência; tanto a nível da

organização, como em termos individuais, era preciso en-

frentar uma luta cotidiana para vencer em condições ad-

versas.Neste contexto, um valor que apareceu subjacente à

maioria dos depoimentos, de forma mais explícita ou impli-

citamente, é o da coragem.

Esta coragem era percebida e trabalhada como um

valor a ser desenvolvido em todos os níveis hierárquicos

da empresa. Eram os diretores que negociavam com os

credores e compradores internacionais com coragem, as-

sumindo atitudes consideradas arriscadas, para colocar a

empresa no mapa; eram os engenheiros que realizavam

feitos considerados heróicos e arriscados para cumprir ou

superar suas metas de produção; eram os trabalhadores

que assumiam riscos até de vida para conseguir realizar

as tarefas que lhes eram propostas."Das estórias sobre os atos de coragem, nascem os

heróis, que personi ficam os valores e provêem modelos

de comportamento para os demais.

Na estatal, como não existem claramente os pais fun-

dadores da empresa, os heróis não têm existência a priori,

mas vão sendo consnuídos em momentos de conjugação

de forças significativas.

Eles são, geralmente, empregados da própria empresa

(os presidentes raramente são apresentados como heróis,

em função da sua transitoriedade no cargo - as exceções

são dadas por aqueles que realmente se destacaram por

alguma situação muito especial ou aqueles presidentes

oriundos do quadro de empregados). Ao praticar o ato"heróico", que evidencia não só a sua coragem pessoal,

mas também seu comprometimento com a organização,

eles vão-se tornando legítimos portadores de uma verda-

de sobre o destino da empresa, sobre o perfil adequado

de seus empregados, sobre os padrões de. relações de-

sejados.

Há um episódio da história da empresa pesquisada

(relatado em depoimentos, e não em documentos oficiais)

que, a nosso ver, exemplif ica bem este processo de cons-

Estôrias, mitos, her6is

t rução do herói. A empresa havia negociado um contrato

internacional vultoso com um novo comprador e necessi-

tava transportar e embarcar com urgência o produto. A li-

nha férrea estava interrompida e se fosse desobstrulda

pelos métodos normais perder-se-iam dias preciosos para

cumprir o contrato; o gerente toma, então, algumas deci-sões drásticas para desimpedi-Ia. Ele pede autorização á

diretoria no Rio de Janeiro para efetuar o desimpedimento,

mas não espera a resposta e realiza o que acha necessá-

rio ser feito. A operação toda é bem-sucedida, a empresacumpre o seu contrato e, quando a resposta negativa do

Rio chega, o produto já estava embarcado, a caminho do

comprador.

Esta estória, a nosso ver, exemplificà bem os valores

subjacentes à construção do sistema simbólico e ao nas-

cimento do herói. Um parêntese explicativo inicial sobre o

seu personagem principal é, em nossa opinião, necessá-

rio: o engenheiro em questão entrou para a empresa re-

cém-formado e teve um rápido crescimento profissional,

chegando a ocupar altos postos executivos. São inúme-

ras as biograf ias a seu respeito em documentos e jornais

da empresa e da grande imprensa, ou seja, existe um

processo de criação "oficial" do mito. Entretanto, esta es-tória, assim como outras, envolvendo a sua pessoa, foi

coletada em depoimentos verbais, o que nos parece signi-

ficativo em termos metodológicos; ou seja, a tradição oral

é um caminho fundamental para se penetrar, no universo

cultural, em valores e símbolos que, por razões éticas ou

de coerência com as práticas organizacionais, não podem

estar explicitados na história oficial.

No episódio descrito, o engenheiro revela uma certa

dose de coragem ao enfrentar os riscos de tomar uma de-

cisão difrci l que poderia ter repercussões extremamente

negativas para a sua própria carreira. Esse risco ele as-

sume para conseguir cumprir as metas propostas, solidifi-

cando a posição da empresa no mercado internacional;em outras palavras, ao assumir o risco, ele revela o seu

grau de comprometimento com a organização. corno um

herói, ele não só é repositório das qualidades desejáveis

nos empregados, como também é considerado um líder

legrtimo para imprimir o seu modelo, a sua visão do que

deve ser a empresa.

Um outro episódio: uma greve ocorrida no final dos

anos 40, que uniu feitores e peões contra a administração,

parece-nos significativa para exemplificar o nascimento

dos anti-heróis. A greve, detonada por questões salariais

e de condições de trabalho, assumiu um caráter extre-

mamente violento, tanto em termos de ação dos trabalha-dores (depredações, intimações para que todos aderis-

sem) como em termos da reação da empresa (demissões

e prisões). Os responsáveis pela eclosão do movimento

permaneceram na memória coletiva como figuras muito

controvertidas: s~ avaliados por uns como heróis que

lutaram por melhores condições para todos os emprega-

dos ("Este pessoal que está ar tem que lembrar que eles

têm ( 0 0 ' ) a mais no salário à custa do sacrifício dos ho-

mens que foram demitidos.") e por outros, como falsos Ir-

deres, sem organização, sem nada, que exigiam da em-

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presa algo que ela não podia conceder (NAempresa' não

tinha condição de atender - ela era pobre, igual a n6s").

Da mesma forma que no outro episódio, os Ifderes

desse movimento revelaram uma forte dose de coragem

pessoal, enfrentando os riscos da repressão,. da demis-

são em nome do interesse coletivo. Entretanto, corno o

seu comprometimento é com a causa dos trabalhadores,

e não com a empresa, eles são punidos e transformados

em anti-heróis; "A greve é uma coisa perigosa - todo

mundo saiu perdendo, tanto a empresa, como n6s."Os episódios analisados explicitem os valores da cul-

tura da empresa e mostram o nascimento dos heróis que

corporificam estes valores. Os heróis tornam-se her6is e

passam a ser valorizados como tal, simboficamente,

quando seus atos revelam o comprometimento com a em-

presa. Senão, eles tornam-se anti-her6is, ou heróis de um

grupo dominado que procura encontrar as brechas para

definir sua identidade.

6. O MITO DA GRANDE FAMíLIA

"A·empresa antigamente era como uma grande famOia."

Esta colocação apareceu freqüentemente nas entre-

vistas e discussões realizadas com os empregados da

empresa.Desvendar o mito da grande famOia- como ele foi sen-

do construido, que significado assumiu para cada catego-

ria de empregado - parece-nos um passo importante para

a anál ise do universo simb6lico.

Uma ressalva inicial faz-se, entretanto, necessária.

A imagem da grande famOia é freqüentemente uti lizada

pelas organizações para reforçar o clima de camarada-

gem e confiança que se pretende e o comprometimento

das pessoas com os objetivos organizacionais. Na "gran-

de famOia" da empresa, o conflito entre capi tal e trabalho ésubstitufdo pela cooperação (cooperação esta pontuada

por algumas situações de conflito interpessoal).

A imagem da grande famOianão é absolutamente uma

1magem original e exclusiva da empresa em questão." O

que nos levou a crer que ela é uma imagem significativa

para os nossos pesquisados foi a sua recorrência nos

depoimentos individuais e de grupo e o fato de ela reme-

ter-se sempre ao passado: "A empresa era como uma

grande famOia."Na tentativa de apreender o mito da grande famnia além

das explicações mais ou menos óbvias de que era uma

empresa menor, em que todo mundo se conhecia (embora

isto nunca fosse verdade, pois desde os seus prim6rdiosa empresa contava com cerca de 6 mil empregados geo-

graficamente dispersos), procuramos investigar os pres-

supostos básicos que formariam o tecido simbólico da or-

ganização.

A nosso ver, a proposta de trabalhar o mito da grande

famOia parte de dois eixos que fundamentam concepções

antagônicas, porém complementares, da idéia de famnia.

O primeiro refere-se à concepção mais clássica, vi-

sual, de famnia como célula elementar da sociedade, fun-

damentai para reprodução e sobrevivência da espécie

16

humana.18 NA ajuda mútua é um elemento caracterizador

da famnia, desde as suas origens. Essa reciprocidade é

condição da própria sobrevivência dos indivfduos (Cane-

vacci, 1984, p. 31).

A idéia de uma célula de cooperação, solidariedade,

afet ividade, numa visão a-histórica do fenômeno da famf-

lia, constitui a sua face mais evidente, mais exaltada em

todas a instâncias da vida social, das manifestações ar-

tfsticas ao discurso polrtico.

Rebatendo para o plano da empresa, é esta a imagemevocada quando se coloca: "A empresa é uma grande

famnia." E, realmente, recuperando o seu processo de

constituição, de formação de sua identidade organizacio-

nal, observados como a cooperação e a solidariedade, pa-

ra vencer condições adversas, para alcançar metas pro-

postas, para crescer, foram importantes. Ou seja, a ima-

gem da famOiatem razão histórica de ser, por partlciparern

de sua elaboração mútua todos os empregados, e não

apenas os prof issionais de recursos humanos, tentando

vender uma imagem positiva da empresa.

O outro eixo para compreensão da idéia de família fun-

damenta-se no binômio dominação-submissão. Lévi-

Strauss, ao construir o "modelo ideal" de famOia, já aten-tava para os vínculos e sentimentos que ligam os seus

membros. 1. A percepção e elaboração teórica sobre rela-

ções de dominação/submissão existentes na famOiaforam

desenvolvidas fundamentalmente pela Escola de Frank-

furt, com a proposta de aliar o conhecimento psicanalrtico

à interpretação marxista de sociedade. 20

Analisando a famnia por uma perspectiva histórica, ob-

servaram como esta desenvolve em seu interior as rela-

ções autoritárias que se articulam dialeticamente com o

autoritarismo social, além de ser reprodutora do consenso

acrftico. As relações de autoridade assumem a função

essencial de fixar, desde a infância, a necessidade objet i-va do domfnio do homem sobre o homem (Canevacci,

1984, p. 211; Horkheimer & Adorno, 1973, p.132). 21

A famnia torna-se assim a terrível matriz dos mecanis-

mos de dominação e submissão.

A imagem de grande famnia para os empregados da

empresa assume sob esta perspectiva contornos dife-

rentes. A análise do mito propicia assim o desvendar das

relações de dominação, presentes no cotidiano da empre-

sa permeando as interações entre categorias de empre-

gados.O mito da famOia revela, assim, as duas faces presen-

tes nas relações de trabalho: a face visfvel de solidarieda-

de, de cooperação, e a face oculta da dominação e sub-missão.

7. COMENTÁRIOS FINAIS

As tentativas de apreensão dos elementos simbólicos de

uma organização implicam assumir a postura do antropó-

logo, de "imersão na vida organizacional visando a des-

vendar o seu universo de significações". Segundo Schein,

(1985, p.47) "nós precisamos ser cuidadosos em não as-

sumir que a cultura se revela facilmente; em parte, porque

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raramente sabemos pelo que estamos procurando, em

parte, porque os pressupostos básicos são difíceis de

discernir e são tão ta ke n fo r g ra nte éJ que aparecem como

invisíveis para estranhos".

A adoção de uma abordagem multidisciplinar, procu-

rando articular categorias e técnicas de investigação de

diferentes áreas de conhecimento, das ciências sociais à

psicologia, à administração, possibili ta ao pesquisador

identificar e interpretar os elementos simbólicos à luz de

um referencial mais abrangente.Neste sentido, a proposta desenvolvida neste artigo,

de recuperar conceitos elaborados inicialmente pela an-

tropologia e retomados pela teoria organizacional, procu-

rou avançar em termos de apreender a instância do sim-

bólico de uma organização, não apenas em sua capaci-

dade de ordenar, atribuir significações, construir a identi-

dade organizacional, e agir como elemento de comunica-

ção e consenso, como em sua capacidade de ocultar e

instrumentalizar relações de dominação.

A análise de elementos simbólicos pesquisados em

uma empresa estatal procurou rebater esta proposta para

o plano empírico. No processo de desvendar os significa-

dos das estórias, dos mitos e heróis, este duplo caráter douniverso simbólico foi-se desvelando. E para isto foi es-

sencial recuperar a história da empresa, a sua inserção

no cenário político e econômico, o seu processo de tra-

balho, as relações de poder entre categorias de emprega-

dos, as suas prát icas de gestão de pessoal. A discussão

(ainda que muito rápida neste texto) destes pontos propi-

ciou o referencial necessário à interpretação do seu uni-

verso simbólico.

As possibilidades de trabalhar esta proposta não se

restringem apenas ao plano das análises acadêmicas,

mas podem também propiciar o embasamento necessário

à elaboração de projetos de intervenção, notadamente

aqueles que envolvem mudanças nas relações de, po-der.22 A potencialização de mudanças esbarra, muitas

vezes, em resistências advindas de valores, de padrões

culturais dominantes na organização. É preciso pesquisar

este universo cultural, desvendar suas origens, seus ele-

mentos definidores, para conseguir transformá-lo.

No campo das relações de trabalho, mais especif ica-

mente, qualquer proposta visando a potencializar novos

padrões de relaçÕes de trabalho deverá recriar e tecer

uma nova cultura organizacional.

1É interessante observar que em obras recentes sobre teoria organi-zacional, como o Livro Modem approaches to understanding andmanaging organizations (1985), de Lee Bolman e Terence Daal, oenfoque simbólico é considerado urna das quatro correntes-funda-mentais para o estudo das organizações. As outras três seriam: a es-truturai, a de relações humanas e a polftica.

2Para uma discussão mais aprofundada de cada uma destas instân-cias, ver Fleury, M. Tereza. O simbólico nas relaç6es de tratialhO-

Estôrias, mitos,her6is

um estudo sobre relações de trabalho na empresa estatal. fese de li-vre-docência, São Paulo, FEAlUSP; 1986. Mimeogr.

3Para uma discussão mais cuidadosa da posição da antropologia emface das antigas polêmicas entre os cientistas sociais, a respeito dodeterminismo do econômico sobre a instância do simbólico, das re-presentações, ver o art igo de Durhan, Eunice, Cultura e ideologia.Revista de Giéncias Sociais. Rio de Janeiro. 27(1), 1984.

4Berger e Luckmann citam o exemplo dos brâmanes. na índia, queconseguem impor a sua definição da realidade social, o s~a decastas, sobre todo o território hindu, durante séculos.

5Sergio Micell i, na introdução a uma coletânea de textos de PierreBourdiex, A economia das trocas simbólicas. ao recuperar a trajetó-ria intelectual deste autor. coloca que ele é um dos que procuram su-perar estas duas posturas em seus estudos sobre a reUgião, educa-ção.6Em 1984. foi realizada uma conferência sobre Organizational cultu-re and the meaning of li fe in the work place, en Vancouver. Canadá.Os papers apresentados e discussões realizadas foram condensadosem um volume Organizational culture. publicado em 1985, que. decerta forma. sintetiza as principais tendências do estudo nesta área,na América do Norte.

7Assumindo integralmente a postura do antropólogo. Van Maanenempregou-se durante alguns anos no corpo policial de uma cidadeamericana.

eAs análises de Van Maanen sobre esse processo tomam corno pon-to de partida a discussão do processo de socialização secundária fei-ta por Berger.

9Emoutro artigo,lSchein (1983) desenvolve mais este tema.

IDA maioria das histórias pode ser enquadrada nos seguintes tópi-cos: "Quebrando as regras - o chefe pode ser humano?" "Umjoão-ninguém pode chegar ao topo?" "Eu posso ser despedido?""Como a organização lida com obstáculos?" "Como o patrão reageaos erros?"

"Tivemos a oportunidade de ler alguns trabalhos orientados pelaequipe de Pagês. e muitos deles, apesar de se proporem o métododialético para condução de sua pesquisa e adotarem o quadro con-ceituai de Pagês desenvolvem o trabalho segundo a métodologia po-sitivista.

12Segundo Pagês e seus colaboradores (1979, p. 13), "a empresahiperrnodema e a sociedade neocapitalista em seu estado maisavançado têm por característica constuír um sistema quase perfeitode ocultamento das contradições.

13Nesteponto, a proposta de Schein di ferencia-se das demais. aoexplorar a idéia de cultura como o conjunto de pressupostos básicosque um grupo descobriu ou inventou e que vão gradualmente pas-sando para o inconsciente coletivo da organização.

14Éinteressante observar a valorização constante de seu formatoempresarial autónomo. em todos os momentos da vida da empresa.O discurso de posse de um presidente da empresa, em 1952. é. aesse respeito, significativo: "No que concerne à atual diretoria daempresa. fortemente apoiada por toda equipe de trabalho. cujo penosamento se afirma e se homogeneiza na rotina diária e nas reuniõessemanais dos diretores e chefes de serviço, para debate dos proble-mas da administração. ficou estabelecido que o remédio tlefÓico parao êxito das sociedades de economia mista e mesmo para as socie-dades estatais seria a adoção. sem nenhuma transigência. da ne-cessidade de administrá· las com mentalidade igual à que se empre-ga na direção das empresas privadas, não se permitindo que setransformem em ninho de parentes. nem cabides de emprego e muitomenos não consentindo jamais e intransigentemente que se tornemfontes de negócios particulares. "

150depoimento de um trabalhador antigo é. a esse respeito. i lustra-tivo: "O trabalho era ruim demais. não aguentei e saí . Na segundavez que eu voltei, já t inha condição. mas as condições de trabalhoainda não eram boas; a gente chegava a ficar 72 horas direto. Eu eraamigo do encarregado, uma pessoa que eu respeito e que é o me-lhor e o mais justo dos homens e ele me ajudou a me transferir para amecânica."

16M. Cecnia Minayo (1985) comenta como os trabalhadores nas mi-nas se autoclassificavam corno "homens" e "mulherzinhas", segun-do sua capacidade de produção.

17Christopher Lasch, em seu livro A cultura do narcisismo (1983),analisa como a Escola de Relações Humanas foi responsável pelacriação do mito de fábrioo como uma famaia.

17

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"C ita nd o um m anual d e antro po lo gia cultural fun cio nalista (1984, p.24) C ane vac ci e xpO e b em e sta d efin ição clá ssica d e fam Oia: "A ssimcom o o prob lem a de sobrev ivência é reso lvido m ed iante a consti-tu içã o d o siste ma pro dutivo e d os in strum ento s pa ra o trab alho e parao con fo rto e a pro teção ffsica, do m esm o m odo o prob lem a de repro -d ução e nc ontra a sua so lu ção no instituto d a fam Ria, no ole o e le me n-tar do parente sco e , portanto , da soc iedade . De fa to , com o é conhe-cido , o recém -nasc ido hum ano é quase to talm ente p rivado de do tesinstintivo s e e xige se r m od elad o d urante um lo ngufssim o pe rfo do d etem po, quando com parado com os outros anim ais, a fim de ser capazde enfrentar o s p rob lem as que a natureza e a sociedade em que e lev ive irão co locar-lhe . Para cum prir e ssa função e para em prestarum a certa regra à s re lações sexua is entre os m em bros do grupo , de

m odo que e les não constituam , pe las tens6es e rivalidades que po-dem criar no in te rio r do grupo , um e lem ento -desagregador de suas o li da ri ed a de , c o ns tit ui -s e a f amR ia e n qu an to in st it ui çã o ."

IO Lévi-S trauss d escre ve a fam Oia c om o um g rupo so cial que : 1 . te msua o rige m no casam ento ; 2. co nsiste no m arid o, m ulhe r, filho s nas-cidos de sua união , m esm o se podem os ad mitir que ou tros pare ntesse in tegrem a esse m lcleo essencial; 3. os m em bros da fam Oia sãolig ad os e ntre s i p or:a ) vrnculo s le gais; b ) vínc ulo s e co nO mico s, re lig io so s e o utro s tipo sde deve res e d ire itos; c) um a precisa rede de d ire itos e produçõesse xuais e um c onjunto variá ve l e d ife re ncia do d e se nt\m ento s psico -lógicos com o o am or, o tem or, o ód io , e tc. A pud Canevacc i, 1984.

lIDO s e studos sobre a auto ridade e fam Oia realizad os na Esco la deF rankfurt, na d éc ad a d e 30, e nv olv eram pe squisad ore s c om o M arcu-se , F ro mm , A do rn o e H orkh eim er.

21N a c ole tâne a o rganizad a po rCa ne vac ci~1984, p. 169 ), o te xto d e

E rich From m abo rda a questão da auto ridade e do superego , co lo -cand o que o pai, no pro ce sso d e inte rio rização d a e strutura auto ritá -ria, não encontra em si a base do seu pape l de auto ridade constitu i-do ra do superego , m as antes re fle te o auto ritarism o repressivo dasre la çõ es s oc ia is e d as e str atific aç õe s o bje tiv as d a c la ss e.

2 2N este m om ento , o v elho re frão "o rganizaçõ es fo rte s d eve m te r cul-turas fo rte s" pode re ve lar a sua face ne gativa, po is certo s padrõesc ultu ra is o bs ta cu liz am p ro je to s d e m u da nç a.

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