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SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ
PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL PDE
SANDRA BARANDRESHTE FIORI
QUESTÕES ÉTNICAS E CULTURAIS – A AFRO-DANÇA NO RITMO DO CONHECIMENTO: um destaque a congada.
MARINGÁ – PR
2
2012
3
SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃOUNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ
PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL – PDE
SANDRA BARANDRESHTE FIORI
QUESTÕES ÉTNICAS E CULTURAIS – A AFRO-DANÇA NO RITMO DO CONHECIMENTO: um destaque a congada.
Artigo produzido em cumprimento das exigências do Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE do Estado do Paraná.
Orientadora: Dra. Sandra C. A. Pelegrini
MARINGÁ – PR2012
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QUESTÕES ÉTNICAS E CULTURAIS – A AFRO-DANÇA NO RITMO DO CONHECIMENTO: um destaque a congada.
Autora: Sandra Barandreshte Fiori1
Orientadora: Sandra C. A. Pelegrini2
Resumo:
O presente artigo visa discutir o papel e a valorização do negro na história brasileira a partir do repensar da abordagem da cultura africana junto aos docentes da disciplina de História. Portanto, teve como objetivo desenvolver práticas interdisciplinares por meio de leituras, apresentação e interpretação de vídeos, trabalhos em grupos, entrevistas, estudos de cartografia e danças, com a participação de alunos e professores do 2º ano do Ensino Médio do Colégio Estadual Duque de Caxias - EFM, no município de Tuneiras do Oeste – Paraná. A contribuição dos povos africanos na constituição social e cultural da sociedade brasileira é importantíssima, mas muitas vezes foi inviabilizada ou ocultada. Diante disso, é fundamental propor iniciativas que desencadeiem no espaço escolar reflexões que abordem a cultura africana e valorizem as contribuições advindas dela. Neste sentido, conclui-se que é fundamental que todos os educadores, que de certa maneira não receberam formação inicial e nem continuada para trabalhar com as questões relacionadas à África, nem a trajetória que os afrodescendentes realizaram no Brasil, sejam preparados para trabalhar essa temática, rompendo com o paradigma do folclorismo que permeia a temática.
Palavras-chave: Congada; Dança afro-brasileira; Cultura; História.
1. INTRODUÇÃO
Esse artigo é resultado da pesquisa sobre as questões étnicas e
culturais que envolvem a formação da sociedade brasileira e as atividades
desenvolvidas no Colégio Estadual Duque de Caxias – Ensino Fundamental e
Médio, com os alunos do 2º Ano do Ensino Médio e alguns professores da
escola no Programa de Desenvolvimento Educacional, da Secretaria de Estado
da Educação do Paraná (PDE/PR). Para isto, dedicou-se a desenvolver
atividades interdisciplinares com alunos e professores deste Colégio, no
1 2
5
município de Tuneiras do Oeste – Paraná, observando por meio da dança da
congada parte da contribuição dos povos africanos na constituição social e
cultural da sociedade brasileira.
A escola é um espaço adequado para o trabalho com o respeito à
diversidade, mas como instituição onde se constrói conhecimentos e como
lócus de convivência, deve privilegiar a valorização de cada grupo e cada
sujeito como um dos atores que participam da construção da sociedade. Por
muito tempo, os meios de comunicação, os livros didáticos, os filmes, as
novelas, entre outros, exibiriam imagens do negro associadas à submissão
pessoal e social.
Assim, ideias e informações equivocadas contribuíram para fomentar a
discriminação do papel do negro – enfoque que reforçou uma visão distorcida
da história e da formação da sociedade brasileira, desconsiderando o papel
que os povos africanos desempenharam na construção social, econômica e
cultural da sociedade brasileira.
De acordo com Frigotto (2004), todos devem ter acesso aos
conhecimentos produzidos pela humanidade, cabendo à escola abordá-los nos
conteúdos trabalhados, garantindo aos sujeitos da Educação Básica, crianças,
jovens e adultos, em geral, oriundos das classes assalariadas, urbanas ou
rurais, de diversas regiões e diferentes origens étnicas e culturais os seus
direitos.
Neste sentido, o trabalho se propôs a desenvolver iniciativas que
desencadeassem no espaço escolar reflexões sobre a cultura africana,
valorizando as contribuições advindas para a formação dos alunos.
A metodologia histórico-cultural proposta pelas DCEs – Paraná (2008)
considera o intento prático dos alunos no processo ensino e aprendizagem na
dinâmica de trabalho na sala de aula, para apreender melhor a realidade.
Diante disto, a aula é compreendida como um espaço intencionalmente
organizado que contribui para a apreensão, pelo aluno, do conhecimento
específico da disciplina de História, bem como dos diversos aspectos na
realidade social.
A valorização do negro na sociedade e a efetivação da legislação no
contexto social ocorrem de maneira contextualizada, quando todos que estão
na escola, independente de cor, raça, religião ou sexo, sejam valorizados e
6
apoiados, e mais ainda, quando a participação do negro na constituição da
sociedade brasileira for tratada com a dignidade a qual foi negada no passado.
De acordo com a Lei 10.639/03 é fundamental que a abordagem do
currículo nas questões étnico raciais, dos conteúdos pedagógicos e dos
procedimentos de ensino, seja repensada. Além disto, esta perspectiva deve
ser interdisciplinar, pois o tema não pertence somente ao professor ou ao
currículo de história, mas a todos os aprendizes da escola.
Assim, torna-se imprescindível discutir as práticas escolares em relação
ao tema, no qual a qualificação se dará através do aprofundamento teórico,
mas também, a partir da discussão entre os professores e alunos da escola,
levantando as dificuldades e experiências, desencadeando uma nova postura
frente a esse assunto.
Sendo assim, no trabalho com o ensino de História e Cultura Afro-
Brasileira e Africana devemos assumir outro viés, tendo como objetivo
reconhecer e valorizar a identidade social e cultural dos afro-descendentes.
Nesse contexto, surge a possibilidade de contribuir para a formação dos
professores no intuito de que eles possam desenvolver um trabalho
interdisciplinar no espaço escolar. Com tal enfoque, o objetivo norteador deste
trabalho é contribuir para a ampliação dos conhecimentos a respeito da
contribuição dos povos africanos na constituição social e cultural da sociedade
brasileira.
2. Um pouco sobre a História e a Legislação que trata dos Povos
Africanos no Brasil
O espaço do negro na constituição histórica brasileira ocupou por muito
tempo e, infelizmente, muitas vezes, ainda ocupa uma perspectiva
preconceituosa e discriminatória, que remonta o tempo da escravidão,
deixando de lado a contribuição que esses povos desempenharam na
constituição da sociedade brasileira em todas as dimensões. Vale ressaltar que
é possível perceber que nem sempre a escola valoriza os saberes e a cultura
dos afrodecentes e, mais grave ainda, é constatar que a escola em muitos
momentos foi omissa na abordagem deste assunto.
Em 13 de maio de 1888, como a história oficial relata, aconteceu a
7
libertação dos escravos, mas, apesar da relevância deste fato, ele parece ter
se limitado a uma questão política, pois não houve uma preocupação com os
negros libertos e os seus direitos socias, pois a partir deste fato, tornaram-se
cidadãos brasileiros descendentes de africanos.
O abandono das questões que envolvem os direitos do afrodecentes no
Brasil permaneceu praticamente inalterado até 1988, somente neste ano a
legislação passou a enfatizar com mais veemência os direitos dos negros a
partir da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, no Art. 5º que
declara “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza...”
enfatizando o direito à igualdade como um princípio jurídico orientador das
relações entre os cidadãos brasileiros. O Art. 3º, inciso IV, também institui a
necessidade de “promover o bem de todos, sem preconceito de origem, raça,
sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”, e no Art. 5º,
incisos 41 e 42, a prática do racismo é declarada como “crime inafiançável e
imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei” (BRASIL, 1996).
A Constituição Federal brasileira de 1988 ampliou os direitos dos
negros. Contudo, a questão cultural ainda perdura; e o espaço do negro na
sociedade, continua sendo minimizado e anulado. Isto é possível observar,
também, em outros setores da sociedade, como a televisão, o mercado de
trabalho, o livro didático, entre outros. Isso evidencia que a igualdade de
tratamento e de oportunidades entre os brasileiros, prevista na Constituição
Federal brasileira ainda está muito distante de se efetivar, principalmente, no
que se refere à população negra do Brasil.
O ano de 2004 marcou uma conquista efetiva no reconhecimento
histórico e social dos povos africanos, com a realização de Fóruns Estaduais
de Educação e Diversidade Étnico-Racial, objetivando discutir a implementação
da Lei 10.639, aprovada em 9 de janeiro de 2003, que evidencia como
obrigatório o ensino de História e “cultura Afro-brasileiras” nas escolas,
apreciando a participação do povo africano nas áreas sociais, econômicas e
políticas relacionadas à História do Brasil. A intenção foi solidificar o caminho
para a edificação de uma luta antirracista, no sentido de deslocar a visão
cultural que se construiu historicamente em relação ao negro escravo, para
aquele que participou efetivamente da construção do país.
Ampliando a importância do tema, a Resolução do CNE/CP nº 1, de 17
8
de junho de 2004 estabeleceu as Normas Complementares às Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o
ensino de História e cultura afro-brasileira e africana, assinalando, assim,
novos instrumentos para a implementação dos Artigos. 26-A e 79-B da Lei
10.639/03 da Lei de Diretrizes Bases da Educação – LDB 9394/96, tornando
obrigatória a mudança da abordagem oferecida aos conteúdos escolares
relacionados à história e trajetória da população negra brasileira, conforme
explicitado em parte abaixo:
§ 1° A Educação das Relações Étnico-Raciais tem por objetivo a divulgação e produção de conhecimentos, bem como de atitudes, posturas e valores que eduquem cidadãos quanto à pluralidade étnico-racial, tornando-os capazes de interagir e de negociar objetivos comuns que garantam, a todos, respeito aos direitos legais e valorização de identidade, na busca da consolidação da democracia brasileira.
Neste sentido, o Art. 8º da Deliberação 04/06 evidencia a necessidade
de que cada unidade escolar/instituição; componha uma equipe interdisciplinar
que encarregada da supervisão e desenvolvimento das ações que deem conta
da aplicação efetiva das diretrizes estabelecidas por esta deliberação ao longo
do período letivo, e não apenas em datas festivas, pontuais, deslocadas do
cotidiano da escola (BRASIL, 1996). Nesse contexto, este tema tem respaldo
no espaço escolar valorizando a história do negro que é retomada e abordada
com a dignidade merecida.
Diante do que está sendo apresentado, propõe-se a valorização do
negro na história brasileira a partir do repensar sobre a abordagem da cultura
africana junto aos docentes da disciplina de História. Para tanto, torna-se
necessário promover discussões junto aos docentes de várias áreas do
conhecimento, sobre os pressupostos teórico-metodológicos adequados ao
trato dessa temática, porque é fundamental a difusão e o embasamento
pautados pela prática interdisciplinar. Desse modo, visa-se a contribuir para
uma formação que valorize a igualdade dos direitos sociais, independente de
origem, raça, sexo, cor, idade ou qualquer outro fator.
Neste sentido, pretende-se desenvolver atividades interdisciplinares
através da dança, com alunos do 2º ano do Ensino Médio e professores do
Colégio Estadual Duque de Caxias - EFM, no município de Tuneiras do Oeste –
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Paraná, que permeiem toda a trajetória tecida pelos povos africanos no
contexto nacional.
Portanto, a opção por uma perspectiva interdisciplinar deu-se
intencionalmente, pois o tema não está restrito a uma disciplina escolar, mas
perpassam de forma decisiva todas as áreas do conhecimento, assim, a
“cultura afro” deve impregnar a construção do conhecimento escolar, pois esta
se encontra relacionada à formação social, cultural, econômica e política do
cidadão brasileiro e não apenas com a transmissão de conteúdos escolares.
Diante do exposto, em relação à participação do negro na constituição
da história nacional e sobre o processo discriminatório pela qual passou e
ainda passa a comunidade africana e seus descendentes. Destaca-se que a
dança do congo é uma das formas de expressão mais significativas no Brasil e
ímpares da cultura afro-brasileira, praticadas em diversas localidades e com
características regionais. Assim, optou-se neste projeto por abordar a festa que
acontece na Lapa, região metropolitana de Curitiba.
3. A Congada na Lapa
Este artigo fundamenta-se na teoria da historiadora Souza (2006), no
livro os Reis Negros no Brasil Escravista: história da festa da coroação de um
Rei Congo, que na América portuguesa, em quase todas as regiões onde a
mão-de-obra africana foi utilizada, era permitido que as comunidades negras
escolhessem reis que cumprissem papéis rituais e sociais. As quais “eram
festejadas com danças, músicas e teatralizações” (p.181).
Assim, por meio das irmandades leigas religiosas, as populações
africanas e seus descendentes do continente americano podiam constituir
laços fundamentais de solidariedade e de identidades próprias aos negros
formadores das associações (SOUZA, 2006, p.180-183).
De acordo com Lança (2011), a congada da Lapa é uma manifestação
cultural típica do Paraná e está relacionado ao culto a São Benedito, patrono
espiritual da comunidade negra Lapeana. Essa festa é um pequeno exemplo
da diversidade de culturas existentes no Paraná.
A partir de toda história afro-brasileira realizada foi necessário fazer
10
uma pesquisa de campo com um dos participantes da dança da Congada, na
região na Cidade da Lapa, região metropolitana de Curitiba, na qual se obteve
a entrevista com o Sr. Miguel Ferreira afro-descendente desta cultura. A história
da congada na Lapa existe há mais de 136 anos, tendo surgido com os
escravos que escolheram São Benedito como Santo Protetor pela cor e
posteriormente passando a ser Padroeiro da Cidade da Lapa.
Os personagens principais da congada apresentada na Lapa são o rei, a
rainha e o embaixador. Em razão da hereditariedade e tradição, só podem ser
encenados por afro-descendentes. Os demais personagens (reizinho, príncipe,
secretário do rei, duque, marques, fidalgo, porta-bandeira, ala do rei), não
precisam ser de uma mesma família, mas devem ser afro-descendentes.
Nesta comemoração, conforme relato do Sr. Miguel Ferreira3 houve dois
casos excepcionais, onde “num deles teve a participação de um branco pra
paga promessa feita ao Santo e outro caso pra pessoa não fica doente”. Esta
comemoração é inserida nos festejos de comemoração ao Santo Padroeiro da
Cidade, São Benedito, ocorrendo anualmente em vinte e seis de dezembro.
A população lapeana parece apreciar muito as apresentações da
congada. Conta-se, que o rei prende o embaixador que é ferido e preso.
Depois fazem as pazes, o embaixador se despede e vai embora para a terra de
Ginga (a rainha que manda nele).
É uma homenagem essencialmente católica a São Benedito. Nesta
apresentação, a única mulher que pode participar é a rainha. A comemoração
tem uma ligação com a tradição católica, conforme calendário litúrgico da
Igreja/São Benedito. O tempo de duração é de mais ou menos de 1 (uma) hora
e 20 (vinte) minutos. As cores das roupas servem para identificar os
personagens, com a utilização de instrumentos diferenciados como seis
tambores, rabeca, viola de dez cordas, violão, duas gaitas e três cabaças.
Conforme relato de um integrante da congada na Lapa, infelizmente, a
tendência é que “as apresentações acabem por falta de interesse dos jovens e
falta de incentivo dos órgãos públicos da cidade”.
A congada é uma forma de compreender e manter a tradição cultural
3 Entrevista feita com Miguel Ferreira, no dia 26 de dezembro de 2010, com início ás doze horas e cinco minutos e término às treze horas, em frente Mercado que ele trabalha como açougueiro.Utilizei uma câmera marca Sony – 7.0 Megapixel.
11
que foi trazida pelos afro-descendentes, sendo uma das fontes que contribuem
para ressaltar o papel do negro na constituição da sociedade brasileira.
Na atualidade, a sociedade passa por transformações rápidas e
significativas em muitos setores, inclusive, na forma de trabalhar a história.
Diante disto, o trabalho docente necessita passar por um processo reflexivo
transformador, vislumbrando uma prática pedagógica que contribua
significativamente para a construção do conhecimento e compreensão da
formação e construção de uma sociedade mais justa e igualitária, neste caso a
brasileira.
Diante deste cenário, cabe aos docentes refletirem sobre as suas ações
e, sobretudo, sobre as concepções teóricas e práticas e a forma como ensinam
os alunos. O embate a ser empreendido nesse contexto é a análise e revisão
das práticas pedagógicas conservadoras, no sentido de possibilitar um trabalho
com os conteúdos de história, como forma de exercer a cidadania, valorizando
os diferentes grupos étnicos que contribuíram para a construção da história da
sociedade brasileira.
4. O Caminho Metodológico
As atividades foram desenvolvidas envolvendo práticas interdisciplinares
por meio de leituras, apresentação e interpretação de vídeos, trabalhos em
grupos, entrevistas, estudos de cartografia e danças, com a participação de
alunos e professores do 2º ano do Ensino Médio do Colégio Estadual Duque de
Caxias - EFM, no município de Tuneiras do Oeste – Paraná, permeando a
trajetória tecida pelos povos africanos no contexto nacional.
A opção pela perspectiva interdisciplinar foi intencional, pois o tema não
está restrito a uma disciplina escolar, mas perpassa de forma decisiva todos os
conhecimentos. Assim, neste estudo, a “cultura afro” integrou a construção do
conhecimento escolar, pois esta relaciona-se com a formação do cidadão
brasileiro, e não apenas com a transmissão de conteúdos escolares.
Desta forma, foram propostas atividades diferenciadas abordando a
cultura afrodescendente em sua complexidade e abrangência, para
12
desencadear reflexões no espaço escolar, sobretudo, no que tange à
valorização das contribuições advindas para o cenário brasileiro, com destaque
na congada.
4.1 Propostas de Intervenção na Escola
Para abordar a cultura afro-brasileira inicialmente foi necessário buscar
apontamentos sobre a imagem que os alunos possuem da África e de seus
habitantes. Para conhecer a história do povo africano foi proposto um texto
para leitura e reflexão da cultura africana. Os professores partiram do
entendimento de que os discentes são sujeitos ativos e personagens principais
do processo de aprendizagem.
Nesta atividade, explicou-se que uma das heranças da inserção dos
negros na sociedade brasileira está na dança. Com base em Cabral (2010)
evidenciou-se que boa parte da população brasileira e, sobretudo, os negros
desconhecem ou “acostumaram” a ignorar o fato, talvez como forma de
apagamento cultural da contribuição dos povos africanos na constituição da
sociedade brasileira.
Com base nas leituras e reflexões do texto, os alunos foram levados a
perceber que a África é um continente que possui uma grande diversidade
cultural, pois em razão do processo de escravização dos negros no Brasil,
houve uma influência muito forte destes povos na cultura brasileira. Na África
existem grandes diferenças de raças, origens, costumes, religiões e outros.
Recorreu-se a Pelegrini (2009, p. 14) ao explicar que essa mistura étnica
é “resultante do violento processo de colonização, bem como a incorporação
dos imigrantes que vieram várias partes do mundo para cultivar a terra,
trabalhar nas indústrias e no comércio (entre outras atividades econômicas)”.
Para esta autora, os povos africanos trouxeram outros costumes e
conhecimentos, outras formas de convívio social e religiosidades serviram para
apoiar a formação de uma cultura diversificada, dando origem a práticas que
contribuíram para a formação de hábitos e costumes singulares para a
celebração da vida.
Discutiu-se que os povos africanos foram trazidos para o Brasil para
13
trabalhar, principalmente, na agricultura, mas também se dedicavam à criação
de animais, serviços domésticos e fabricação de instrumentos artesanais.
Apesar da inserção forçada do negro na sociedade brasileira escravista, a
influência africana na formação do povo brasileiro é notada até a atualidade.
Alguns relatos dos alunos mostram a compreensão deles sobre o assunto:
Estudando mais sobre a história dos povos africanos é possível perceber que eles contribuíram muito para a formação do Brasil de hoje, naquele tempo, o da escravidão, quem realmente trabalhava eram os negros, aos senhores cabia somente o papel de administrar. Nas casas, as mulheres brancas não faziam nada, nem amamentar os filhos elas queriam. Desta forma, os negros não podem ser esquecidos na história brasileira (Aluno Um).
Quanto mais a gente estuda sobre a história dos povos africanos, mais a gente aprende sobre o papel que eles tiveram na formação do Brasil, se não fosse eles a gente não teria desenvolvido tanto. Os negros foram trazidos para o Brasil a força e aqui não foram bem recebidos. Pior ainda é que mesmo depois da libertação dos escravos eles continuaram sendo discriminados, e isso precisa mudar para sempre (Aluno Dois).
Os alunos demonstraram compreender que a participação dos negros na
formação geral da sociedade brasileira ultrapassou os limites dos trabalhos no
campo e nas casas de seus senhores. Eles contribuíram na formação cultural e
de certa maneira, realizaram todos os trabalhos que os senhores (brancos)
consideravam indignos, mas que eram de suma importância para a economia
colonial.
Pelegrini (2009) reconhece a influência dos povos africanos na
constituição e formação da sociedade brasileira. Uma destas contribuições
aconteceu em relação à importância da dança nas comunidades africanas, na
qual se percebe que esta prática é uma atividade quase sempre realizada em
grupo e, em sua maioria, todos participam da dança; crianças, jovens e adultos
batem palmas ou formam círculos em volta dos bailarinos.
Muitos acontecimentos da vida africana sempre foram comemorados
com dança, como o nascimento, a morte, o plantio ou a colheita. A história
mostra que a dança funcionava como uma forma de agradecimento aos
deuses, mas sofrendo variações conforme a região e o tempo.
Após as discussões realizadas, sobre as origens africanas, uma questão
foi colocada para debate: Vocês se consideram descendentes de africanos? ,
14
Diante desta pergunta, a maioria significativa dos alunos respondeu que não
possui nenhuma descendência com os povos africanos, enfatizando sua
origem nos povos europeus.
Meus pais me disseram que nós somos todos de origem européia, meus bisavós vieram da Itália para o Brasil (Aluno cinco).
Não tenho origem africana, é só olhar para a cor da minha pele, sou branca de olhos azuis, não tem como ter sangue africano (Aluno quinze).
É possível perceber na fala dos alunos que eles compreenderam a
importância dos negros na sociedade brasileira, mas, de certa maneira, talvez
por causa da discriminação secular dos povos africanos, é possível notar
mesmo em alunos que poderiam ter alguma proximidade consanguínea de
origem africana, uma negação desta origem.
Prosseguindo com o trabalho, solicitou-se aos alunos que
apresentassem um pequeno texto com as diferenças ou semelhanças entre o
modo de vida africano e o brasileiro. Para isto, os alunos utilizaram a internet
para pesquisar o assunto. Como atividade complementa a pesquisa, solicitou-
se a elaboração de um texto coletivo, que teve a mediação contínua da
professora pesquisadora.
Quando os africanos chegaram ao Brasil, trouxeram os seus costumes, dentre eles a culinária brasileira sofreu uma grande influência, pois as comidas africanas começaram a ser feitas com produtos que eram produzidos no Brasil. O vatapá, caruru, mungunzá, acarajé, baba de moça, sarapatel, bala de coco, cocada são exemplos destas comidas africanas. Mas nenhum prato foi mais difundido como a feijoada, ela surgiu nas senzalas e era feita com a parte do porco que os senhores jogavam fora. A música, que eles trouxeram na memória ajudava a lembrar da terra deles e a agüentar os maus tratos dos seus patrões. Aqui no Brasil os fazendeiros queriam que os negros esquecessem a sua religião e passassem a ser cristãos. A música brasileira tem um pé na áfrica, pois o samba é um cartão postal do Brasil, além disto, o carnaval é uma festa mundialmente conhecida. Mas além do samba, outros ritmos têm origem africana, como o Maracatu, a Congada e a Cavalhada, sons que conquistam o povo Brasileiro e o mundo. A capoeira também tem origem africana e era usada pelos negros para a sua defesa. Os movimentos dessa luta foram incorporados às cantorias africanas, o que aproxima a luta a uma dança e permitiu que os negros escravos pudessem praticar sem levantar suspeita dos capatazes das fazendas (Produção Coletiva).
O texto elaborado pelos alunos evidenciou que os seus conhecimentos
15
a respeito da história e participação dos negros na formação da sociedade
brasileira foi ampliando-se com as discussões/reflexões realizadas e que
foram gradativamente minimizando a visão de inferioridade a qual os
afrodescentes eram relegados.
Para aprender sobre a presença de afrodescentes no município de
Tuneiras do Oeste, solicitou-se que os alunos entrevistassem duas pessoas
em uma visita realizada. Na oportunidade, os alunos foram divididos em
grupos para facilitar o desenvolvimento das atividades e possibilitar que todos
se envolvessem na conversa.
Cada grupo se responsabilizou por uma tarefa que foi esboçada pela
professora. Os grupos que foram instruídos a opinar quanto à sua tarefa, onde
alguns alunos foram encarregados de apresentar o grupo; outros para
conduzirem a entrevista; outros para registrarem os dados; outros para
agradecerem as pessoas pela contribuição; entre outros dados importantes.
Esta estratégia permitiu que cada aluno (a) assumisse diferentes papeis
na entrevista que foi norteada pelo seguinte roteiro: idade, local de residência,
data de nascimento, ano de chegada ao município de Tuneiras do oeste,
atividades laborais desenvolvidas, como se davam as relações no ambiente
escolar e no cotidiano, dentre outras.
Os dados da entrevista mostraram que o primeiro entrevistado tem 70
anos, reside em Tuneiras do Oeste desde 1953, com residência anterior em
Pernambuco, onde morava com os pais. A família chegou à cidade com o
objetivo de trabalhar na derrubava mato. Com o tempo passaram a trabalhar na
lavoura em plantações de café, algodão, arroz, feijão, etc. De início,
trabalharam somente na lavoura, labutando como meeiros e porcenteiros. O
entrevistado foi convidado a falar livremente sobre a sua história de vida e
como entendiam a sua relação com a religião, a escola, os familiares e a
comunidade. Conforme relatos:
Naquele tempo era muito difícil, pois entrava dinheiro somente uma vez por ano, quando vendiam as mercadorias. Na época eu ia pouco à igreja, por dificuldade de distância e porque os padres vinham de Cruzeiro do Oeste somente uma vez por mês. No tempo que frequentava a igreja nunca percebi nenhum tipo de discriminação e tudo era normal. Aqui eu não estudei por falta de escola rural e urbana. Mas quando eu vim do Pernambuco eu já havia estudado até quarto ano primário. Meus filhos todos estudaram ensino médio e alguns têm grau superior. Muitos moradores dos sítios mudaram-se
16
para que seus filhos pudessem estudar. Não havia dança e nem comida específica dos descendentes de africanos. Não me lembro de ter sofrido nenhum tipo de discriminação, sempre fui respeitado junto com outros nordestinos, negros ou afrodescendentes e brancos (Entrevistado Um)
O discurso do entrevistado que se autodenominou afrodescendente,
deixa evidente que não se recorda de ter vivenciado nenhuma situação
discriminatória, tendo sido bem recebido na igreja da localidade, no trabalho e
nas relações sócias com a comunidade da qual faz parte.
A segunda entrevistada deslocou-se do Rio Grande do Sul para Tuneiras
do Oeste em 20 de janeiro de 1957, tendo sido a primeira professora formada
normalista a atuar no município. Além de professora, atuou como inspetora de
alunos e diretora da escola. Ao comentar livremente sobre a sua história, foi
possível constatar em seu discurso que a relação entre os afrodescendentes e
brancos daquela época era muito respeitosa: Segundo relatos da entrevistada:
Nunca percebi nenhum tipo de discriminação étnica ou racial em meu
local de trabalho ou na cidade em relação aos afrodescendentes que ali viviam.
Com os alunos a relação era muito boa, eles trabalhavam e estudavam juntos.
Em relação ao trabalho que os negros foram bem recebidos, pois a cidade era miscigenada, em relação ao trabalho. Os homens afrodescentes trabalhavam como saqueios, carregadores de caminhão, enfardadores de algodão, amendoim e demais produtos. Por volta do ano 1999-2003, havia um padre negro na igreja católica e que o mesmo foi bem recebido e não teve nenhum problema por causa da sua descendência (Entrevistada Dois).
.
Nos relatos da entrevistada, ficou evidente que desde a sua chegada em
Tuneiras do Oeste e em sua atuação na escola do município, parece não ter
havido nenhuma situação que indique discriminação ou constrangimento aos
afrodescendentes que ali habitavam.
Embora seja possível perceber algumas diferenças nos relatos, fica
evidente o fato de nenhum dos entrevistados terem feito menção a qualquer
tipo de preconceito ou discriminação racial.
Para ampliar os conhecimentos sobre a trajetória histórica dos
afrodescendentes, as suas atividades laborais e culturais, solicitou-se que
17
realizassem uma pesquisa na internet ou em livros para responderem aos
seguintes questionamentos: Quais as atividades laborais eram desenvolvidas
pelos afrodescentes no período da escravidão e quais as manifestações
culturais, dentre elas a dança que era praticada pelos afrodescendentes?
Como resultado desta atividade os alunos apresentaram um texto
coletivo, que depois de lido, foi aprovado por todos.
Na nossa pesquisa aprendemos mais coisas sobre os negros e o que aconteceu com eles nos tempos da escravidão. Os negros foram trazidos ao Brasil século XVI, vieram para servir de mão-de-obra na produção de cana-de-açúcar e nos engenhos, principalmente do nordeste do Brasil e também nas minas de ouro. Eles foram tratados como mercadorias, como se não tivessem nem alma. Além de muito trabalho, as condições de vida dos negros eram péssimas, desde os navios que traziam eles da África até a forma a qual eram tratados nas fazendas. Eles viviam nas senzalas, que eram lugares sem nenhuma higiene, escuros, úmidos e mal ventilados, a sua alimentação era muito ruim. Eles sofriam muitos tipos de castigos, o açoite era um deles. Ao chegar ao Brasil os negros foram proibidos de praticar a sua religião, sendo obrigados pelos colonizadores a praticar o catolicismo, eles não podiam fazer as festas e os rituais que trouxeram da África. Ainda para piorar a situação dos negros, eles tinham que se comunicar em português, mas eles não sabiam. A prática das festas e rituais da África era realizada escondido. A vida das negras também não foi fácil, aquelas que não trabalhavam no cultivo da cana e produções de açúcar tinham que trabalhar na casa dos senhores de engenho, como cozinheiras, arrumadeiras ou amas de leite. Os negros não aceitaram passivamente a escravidão, prova disto são os quilombos, lugares nos quais eles podiam praticar a sua religião e falar o seu idioma. Mesmo depois do fim da escravidão no Brasil, em 1.888 a vida dos negros permaneceu difícil, pois muitos deles não tinham onde trabalhar e eles sofriam muito preconceito e discriminação racial (Texto Coletivo 1).
A partir do texto produzido pelos alunos é possível perceber que o
estudo contribuiu para que eles compreendessem melhor como se deu a
participação dos negros na formação da sociedade brasileira, bem como sobre
o papel importantíssimo na cultura brasileira, inclusive, percebendo que a
história do Brasil colonial não foi feita somente por senhores, mas também por
escravos.
Dando continuidade aos trabalhos com os alunos, foram realizadas ativi-
dades interdisciplinares realizadas. Segundo Japiassú (1976), à interdisciplina-
ridade consiste na intercomunicação entre as disciplinas e os conteúdos, de
modo que resulte uma modificação em sua forma de abordagem e no processo
ensino aprendizagem. O trabalho escolar na perspectiva interdisciplinar contri-
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bui para dar significado ao conteúdo escolar, porque rompe com a divisão en-
gessada das disciplinas.
A Lei 10.639/2003 tornou obrigatório o ensino de História e Cultura
Africanas e Afro-brasileiras em todas as escolas do Brasil. Mas para a
efetivação da lei, faz-se necessário que os professores se conscientizem da
importância do trabalho interdisciplinar, envolvendo-se com a temática. De
acordo com Walter (2012):
A Lei 10.639/03, promulgada em 9 de janeiro de 2003, e considerada um marco na luta pela superação da desigualdade racial na educação pública brasileira. Ela altera a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) e torna obrigatório o estudo da temática Historia e Cultura Africana e Afro-Brasileira nos estabelecimentos de ensino da Educação Básica das redes publica e privada de todo o país. A lei de-termina que os conteúdos relativos a historia e cultura afro-brasileiraDevem ser ministrados em todo o currículo escolar e, principalmente, nas áreas de arte, literatura e historia do Brasil (WALTER, 2012, p. 2).
No entendimento desta autora, apesar da importância institucional desta
Lei e de sua legitimidade política e histórica, ainda persiste certa resistência
para a sua efetivação. Um elemento que contribui para isto é a formação dos
professores, que não tem vivência prática com a questão.
Neste sentido, vislumbrou-se a necessidade de uma abordagem interdis-
ciplinar das seguintes áreas: Língua Portuguesa, Educação Física, Geografia e
indiretamente com outras áreas do conhecimento. A proposta foi apresentada
à escola e envolveu a participação de três professores que aceitaram envolver-
se no trabalho em conjunto com a pesquisadora para tratar da temática relativa
à História sobre a Cultura Africana e afro-descendente.
Na disciplina de Língua Portuguesa os alunos fizeram leituras de textos
e pesquisas na internet (laboratório de informática da escola), a partir de
algumas questões norteadoras: Como eram realizados os ritos na cultura
africana? Explique: Qual a diferença entre origens e costumes. Por que os
africanos criaram a capoeira? Na sala de aula, os alunos debateram sobre o
conteúdo pesquisado, demonstrando interesse pela temática. Após as
discussões os alunos se posicionaram a respeito da atividade desenvolvida:
Agora eu entendi um pouco mais sobre a cultura africana, e percebi
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como deve ter sido complicado para eles ter que praticar sua religião escondido dos senhores de engenho. A capoeira foi mais uma forma que os negros encontraram de manter suas origens e lembrar-se da sua terra, inclusive, para se defender dos abusos dos seus senhores (Aluno 1).
Eu gostei de estudar sobre a capoeira, agora eu entendi que ela não é só uma forma de luta, mas representa uma forma de resistência dos escravos contra seus senhores, porque os negros, mesmo escondido continuavam praticando sua religião e sua cultura. E li na internet que usando os instrumentos musicais, batendo palmas e fazendo as suas cantorias os negros criavam novamente a sua cultura, além de poder ter momentos alegres e se lamentar da dificuldade que a vida apresentava para eles (Aluno dois).
Eu gostei muito de estudar sobre a cultura dos africanos, agora eu posso perceber melhor como os negros foram maltratados no Brasil e que as suas danças e a própria capoeira foi uma forma que eles encontraram para continuar praticando a sua cultura, a sua religião e até mesmo, se defender da maldade dos senhores de engenho (Aluno três).
Diante dos discursos destes alunos, que não difere da maioria, percebe-
se que os alunos estão dimensionando melhor a participação do negro na
constituição da sociedade brasileira, inclusive, o longo período de exclusão e
discriminação ao qual foi submetido, fator este que precisa ser resgatado. É
uma dívida social a qual necessita ser minimizada e futuramente extirpada.
Na disciplina de Geografia, a professora trabalhou com os mapas físicos
do Brasil e da África, abordando a questão do relevo, clima, vegetação e
economia. Realizou-se uma comparação entre o contexto brasileiro e africano
no período da escravidão e na atualidade, por meio de leituras de textos e
cartografia.
A partir dos estudos realizados, os alunos compreenderam que
possivelmente há muito tempo atrás, Brasil e a África estiveram unidos em uma
única porção continental na Pangéia (entre 250 a 300 milhões de anos). Com a
deriva continental, houve a separação gradativa deste supercontinente, até
chegar à configuração atual dos dois continentes. Essa teoria baseia-se em
evidências físicas semelhantes entre a costa leste do Brasil e o litoral oeste do
continente africano em um quase perfeito “encaixe”. Além dessa, outras
semelhanças naturais se localizam nas mesmas latitudes entre as duas áreas
como: o clima e a vegetação, além do relevo.
As leituras realizadas nos textos e mapas contribuíram para a
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compreensão dos alunos sobre a existência das características geográficas
semelhantes entre a África e o Brasil.
Abordando especificamente a “Dança do Congo”, o professor de
Educação Física objetivou trabalhar as danças brasileiras que possuem origem
africana, por meio de pesquisas e leituras sobre o assunto. Sobre isto eles
disseram:
Eu achava que a influência dos negros na dança era principalmente em relação ao samba, mas estudando e pesquisando eu aprendi que eles influenciaram bastante a música e a dança no Brasil (Aluno um).
Na pesquisa que eu fiz eu aprendi que os ritmos africanos influenciaram bastante na nossa cultura, assim como o samba, o maracatu, congo, caximbó, lambada e outras (Aluno dois).
No passado as danças dos afrodescendentes eram discriminadas, principalmente no tempo da escravidão, mas atualmente existe muito respeito por essa forma de expressão cultural e social (Aluno três).
Dando continuidade, os alunos assistiram um DVD intitulado “Congada
da Lapa”. Após, debateram sobre o filme e conversaram um pouco mais sobre
a influência da dança africana nos estados brasileiros.
Essa dança é muito legal, tem um envolvimento muito grande entre as pessoas que participam, além disto, é uma manifestação cultural muito importante que precisa ser preservada (Aluno um).
Eu gostei muito das roupas que eles usam, se eu pudesse eu iria participar dessa dança e um dia eu ainda quero assistir pessoalmente (Aluno dois).
Essa é uma forma de expressão da cultura africana e da forma que é colocada mostra que os negros que vieram para o Brasil queriam manter a sua cultura viva e a muito custo foram conseguindo fazer isso (Aluno três)
Como atividade complementar, solicitou-se que realizassem uma
pesquisa junto à família para investigar o conhecimento sobre a participação
em alguma dança africana ou afro-descendente. Os alunos também foram
questionados a respeito de já terem assistido apresentações de danças
africanas ou afro-descendentes. A respeito disto, alguns alunos relataram:
Eu já assisti apresentação de capoeira e eu gostei muito, se eu pudesse iria praticar capoeira (Aluno 1).
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Aqui na nossa cidade não tem muita coisa que envolve esse assunto, eu só assisti apresentação de capoeira, mas já vi na televisão um pouco de apresentação de dança do congo, mas não foi essa da Lapa (Aluno dois).
No último dia do desenvolvimento do projeto na escola, os alunos
prepararam uma simulação para a apresentação de uma congada, como a que
assistiram no vídeo. Houve um período longo que precedeu a apresentação, a
qual envolveu os alunos na confecção das roupas, preparação do ambiente,
digitação do texto, ensaios e tantas outras atividades que contribuíram para
que a aprendizagem e o envolvimento dos alunos fossem cada vez maiores. A
atividade motivou a todos que se manifestaram positivamente a respeito:
Minha cabeça mudou muito depois deste projeto, eu aprendi muitas coisas sobre a participação dos povos africanos na construção do nosso país e hoje eu acho que eu respeito ainda mais essa cultura e os afrodescendentes (Aluno um).
Agora que eu aprendi mais sobre a cultura dos povos que vieram da África eu quero pesquisar mais sobre esse assunto, assim eu vou aprender muito mais sobre o que aconteceu com eles e como eles ajudaram na formação do Brasil (Aluno dois).
Eu acho que aquilo que a gente aprende no livro da escola não é muito bom, porque depois que a gente participou deste trabalho conheceu muita coisa que a gente não sabia sobre a cultura dos afrodescendentes e que eles foram muito importantes para ajudar na formação da sociedade brasileira (Aluno três).
Diante do que foi exposto pelos alunos, é importante refletir sobre como
as temáticas que envolvem os assuntos da formação e desenvolvimento da
sociedade brasileira, desde o seu descobrimento até a atualidade, sejam
revistos, valorizando cada povo que deu sua contribuição nesta formação. Não
é suficiente discutir essa temática somente na disciplina de história. É preciso
que esse assunto permeie as atividades desenvolvidas na escola e todas as
disciplinas, trazendo para o currículo escolar a diversidade que integra a
formação social, cultural, religiosa, política e étnica do povo brasileiro.
É importante formar sujeitos que compreendam a pluralidade étnico-
racial a qual a sociedade brasileira é formada, contribuindo para que todos
respeitem os direitos legais e individuais, valorizando o ser humano e a vida em
sociedade.
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5- Conclusão
A partir do que foi exposto e das reflexões realizadas considera-se
importante que a escola contribua para minimizar os efeitos adversos que
advém de atitudes discriminatórias e/ou preconceituosas, ainda existentes nas
relações sociais. Isso pode ser feito por meio da valorização das contribuições
dos povos africanos na formação e desenvolvimento da sociedade brasileira. A
aprovação da Lei 10.639/2003 se constitui numa grande conquista para o
trabalho com o ensino de História e Cultura Africana e Afro-brasileira na
educação brasileira, contribuindo para inserir a temática no currículo.
Neste sentido, é necessário superar a dimensão meramente teórica que
envolve a temática, realizando discussões que envolvam as relações raciais,
contribuindo para que os alunos percebam o papel social, econômico, cultura,
político, religioso, dentre outros, desempenhados pelos afrodescendentes na
história e no desenvolvimento da nação.
É necessário que os professores estejam atentos ao material que é
utilizado como recurso didático na sala de aula, o livro didático, textos, filmes e
imagens, pois eles podem se constituir como recursos que contribuem para
construir/formar ou reafirmar estereótipos, colaborando ou não para ampliar as
desigualdades na escola e na sociedade.
Para isto, é necessário que todos os educadores, que de certa maneira
não receberam formação inicial e nem continuada para trabalhar com as
questões relacionadas à África, nem a trajetória que os afrodescentes
realizaram no Brasil, sejam preparados para trabalhar essa temática, rompendo
com o paradigma do folclorismo.
O trabalho contribuiu para trazer para o cenário escolar e social da
escola, algumas questões que permearam/permeiam a cultura
afrodescendente, visando contribuir para a superação das desigualdades
étnico-raciais e quiçá, minimizando as desigualdades sociais, superando,
assim, o estigma da inferioridade a qual a maioria dos afrodescendentes está
exposta na sociedade, buscando a igualdade que é preconizada pela
Constituição brasileira.
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