125
1 MIRNA POLIANA FURTADO DE OLIVEIRA SEGUIMENTO FARMACOTERAPÊUTICO A IDOSOS EM UM AMBULATÓRIO PÚBLICO DE BRASÍLIA Brasília, 2015

SEGUIMENTO FARMACOTERAPÊUTICO A IDOSOS EM UM …repositorio.unb.br/.../18793/1/2015_MirnaPolianaFurtadodeOliveira.pdf · À equipe de Geriatria da Unidade Mista de Saúde de Taguatinga

  • Upload
    lamthu

  • View
    220

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

1

MIRNA POLIANA FURTADO DE OLIVEIRA

SEGUIMENTO FARMACOTERAPUTICO A IDOSOS EM UM AMBULATRIO

PBLICO DE BRASLIA

Braslia, 2015

2

UNIVERSIDADE DE BRASLIA

FACULDADE DE CINCIAS DA SADE

PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM CINCIAS DA SADE

MIRNA POLIANA FURTADO DE OLIVEIRA

SEGUIMENTO FARMACOTERAPUTICO A IDOSOS EM UM AMBULATRIO

PBLICO DE BRASLIA

Tese apresentada como requisito parcial para a obteno

do ttulo de Doutor em Cincias da Sade pelo Programa

de Ps-Graduao em Cincias da Sade da

Universidade de Braslia.

Orientadora: Profa. Dra. Maria Rita Carvalho Garbi Novaes

Braslia, DF

2015

3

MIRNA POLIANA FURTADO DE OLIVEIRA

SEGUIMENTO FARMACOTERAPUTICO A IDOSOS EM UM AMBULATRIO

PBLICO DE BRASLIA

Tese apresentada como requisito parcial para a

obteno do Ttulo de Doutor em Cincias da

Sade pelo Programa de Ps-Graduao em

Cincias da Sade da Universidade de Braslia.

Aprovado em ___ de ____________ 20____.

BANCA EXAMINADORA

Dra Maria Rita Carvalho Garbi Novaes

Universidade de Braslia

Dra Marg Gomes de Oliveira Karnikowski

Universidade de Braslia

Dra Renata Costa Fortes

Escola Superior em Cincias da Sade

Dra Emlia Vitria da Silva

Universidade de Braslia

Dra Dirce Bellezi Guilhem

Universidade de Braslia

4

Dedico este trabalho, aos idosos que tanto me ensinaram com suas histrias,

com gestos, olhares e atitudes...

O verdadeiro conhecimento vem de dentro.

(Scrates)

5

AGRADECIMENTOS

Eu nada seria... Eu nada teria... Eu no chegaria a lugar algum se no fosse o

amor incondicional e supremo dos meus pais, Maria das Dores e Presdio. A eles

quaisquer palavras no seriam suficientes para agradecer esse amor maior, o apoio,

os conselhos, os ensinamentos, o exemplo... porque foi de exemplo que me fiz!

Por isso, Me e Pai, s o Pai capaz de retribuir o que fizeram por mim!

Agradeo ainda:

Ao Kelb, companheiro em grande parte dessa caminhada. Esse ttulo tambm

seu porque voc sonhou comigo e me ajudou a concretiz-lo.

Maria Rita, muito alm de orientadora; uma verdadeira amiga, uma me...

Que me abriu portas, que compreendeu pacientemente minhas dificuldades e

permitiu que no meu tempo esse sonho se tornasse realidade.

equipe de Geriatria da Unidade Mista de Sade de Taguatinga (Policlnica)

em especial, aos mdicos Carla Maria Ribeiro de Souza Azevedo, Paulo Marsiglio

Neto e Beatriz Fortuna e Oliveira, Enfermeira Isabel Borges dos Santos e Equipe

do Acolhimento, pelo apoio realizao deste trabalho.

adorvel amiga farmacutica Mrcia Cristina Reis pelos socorros na

metodologia e estatstica.

Ao engenheiro amigo e querido Prof. Leonel Leonardo Delgado Morales pela

anlise estatstica, pelo carinho e apoio incondicionais. Pelas boas vibraes que

me transmite enchendo meu caminho de luz. Pelas palavras doces nos momentos

de aflio principalmente, na reta final.

Aos muitos amigos que fiz ao longo dessa jornada que me encorajaram e me

incentivaram. Alguns muito prximos que dividiram e compreenderam meus anseios.

Outros mais distantes, mas, no menos importante.

Ao Laboratrio Sabin, que por meio do Ncleo de Apoio Pesquisa (NAP),

financiou os exames laboratoriais dos pacientes.

Ao Pai Celestial... Por permitir a realizao de mais um sonho.

Pela oportunidade que recebo todos os dias de recomear e ser melhor!

6

No final de nossas vidas no seremos julgados pelos muitos

diplomas que recebemos, por quanto dinheiro ganhamos ou por

quantas grandes coisas realizamos. Seremos julgados pelo 'Eu tive

fome e voc Me deu de comer.

Estava nu e voc Me vestiu.

Eu no tinha casa e voc Me abrigou

(Madre Teresa de Calcut)

7

RESUMO

Introduo: O processo de envelhecimento acompanhado pelo aumento do

nmero de doenas crnicas, pelo uso de polifarmcia e por conseguinte, maior

prevalncia de problemas relacionados a medicamentos (PRM). O cuidado sade

do idoso pelo farmacutico inclui monitoramento do uso de medicamentos com

reduo dos impactos associados a esse processo como os resultados negativos

associados medicao (RNM). O Seguimento Farmacoteraputico (SF) inclui

avaliao do estado de sade e da farmacoterapia, identificao de PRM e de RNM

e por meio de intervenes farmacuticas tem como objetivo promover mudanas na

situao do paciente.

Objetivo: Este trabalho teve como objetivo principal avaliar os efeitos do SF na

sade e na qualidade da farmacoterapia de pacientes idosos.

Mtodo: Trata-se de uma coorte prospectiva com 45 idosos de ambos os sexos e

atendidos numa Unidade Mista de Sade de Braslia-DF (Brasil). Os dados foram

coletados por meio de um questionrio adaptado do Mtodo Dder de Seguimento

Farmacoteraputico (2009). Foram avaliados os perfis socioeconmico, de sade e

farmacoteraputico dos idosos. De acordo com as necessidades teraputicas,

identificadas durante as consultas farmacuticas, foram aplicadas intervenes

buscando alterar o estado de situao do paciente. Os idosos foram acompanhados

por um perodo de 12 meses por um farmacutico clnico. Ao final do estudo,

algumas variveis clnicas e laboratoriais foram comparadas com os valores basais

para determinar o impacto do SF.

Resultados: A amostra foi composta predominantemente por mulheres com mdia

de idade de 71 anos, com baixa renda mensal e nvel de escolaridade. Os

problemas de sade mais prevalentes foram hipertenso, osteoporose, problemas

cardacos, hipotireoidismo, diabetes mellitus e artrose. Os medicamentos mais

consumidos foram os agentes cardiovasculares seguidos pelos antidiabticos e

antiinflamatrios. Os principais PRM encontrados foram relacionados adeso

(82,2%), reaes adversas a medicamentos (RAM), hbitos de vida, condies de

sade e desconhecimento a respeito do tratamento farmacolgico (48,6%). As RAM

mais comuns foram distrbios gastrintestinais e distrbios do sono. Foi encontrada

uma mdia de 5,0 RNM/paciente sendo que a maioria foi do tipo segurana no

quantitativo. Os exames laboratoriais apresentavam-se em sua maioria, em nveis

8

normais porm, 91,1% dos idosos apresentaram algum exame alterado no incio do

estudo. Depois de 12 meses de SF, foi constatada melhora da adeso (21,3% x

52,4%), diminuio das RAM, RNM e das interaes medicamentosas, bem como

melhora da presso arterial sistlica, dos nveis glicmicos, de lipoprotenas

plasmticas, hormnios tireoidianos (TSH e t4 livre) e vitamina D e reduo de peso

corporal com discreta reduo do IMC mdio dos idosos.

Concluso: Esses achados evidenciam a importncia do SF como uma estratgia

de cuidado primrio de sade melhorando a qualidade da farmacoterapia e

consequente, de vida dos usurios de medicamentos.

Palavras-chaves: Idoso; Envelhecimento; Terapia Farmacolgica; Adeso;

Cuidados Farmacuticos; Ateno Farmacutica; Cuidados Primrios de Sade;

Servios Farmacuticos; Farmacutico.

9

ABSTRACT

Background: The aging process is followed by an increase in the number of chronic

diseases and, thus, the use of polypharmacy and prevalence of drug-related

problems (DRP). The health care of the elderly by the pharmacist includes monitoring

the use of medicines to reduce the impacts associated with this process as the

negative outcomes associated with medication (NOM). The Pharmacotherapy

Follow-up (PF) includes assessment of health status and pharmacotherapy, DRP

and NOM identification and through pharmaceutical interventions aims to promote

changes in the patient's situation.

Objective: This project aims to identify the PF impacts in the health and quality of

pharmacotherapy of elderly patients.

Methods: A prospective cohort study with 45 elderly of both sexes was done. Data

were collected through a questionnaire adapted from the Dader Method (2009).

Socioeconomic and pharmacotherapy data was collected at the first pharmaceutical

appointment. According to the pharmacotherapeutic needs of each case were

applied interventions for four appointments as blood pressure and blood glucose

monitoring, schedule control medicine use and prescription changes by the letter to

prescriber. Some variables as blood pressure, blood glucose, body weight, adverse

drug reactions, negative outcomes associated with medication, drug-drug

interactions and adherence were compared after 3, 6 and 12 months of follow-up

during baseline in order to evaluate the impact of the study.

Results: Sample included elderly with a mean age of 71 years old, mainly low

income and low education women. The most consumed drugs were cardiovascular

agents followed by anti-diabetic and anti-inflammatory. The main DRP found were

related to adherence (82.2%), adverse drug reactions (ADR), lifestyle, health and

ignorance about the pharmacological treatment (48.6%). The most common ADR

were gastrointestinal disturbances and sleep disorders. An average of 5.0

NOM/patient and most it was the non-quantitative security type was found. Lab tests

showed up mostly at normal levels however, 91.1 % of the elderly had some

changed examination at baseline. After 12 months of PF, pharmacotherapy

adherence has shown an improvement (21.3 vs 52.4%), as well as a decrease in the

number of adverse drug reactions (-1.61), drug-drug interactions (-1.17) and negative

outcomes associated with medication (-2.49). Besides, there was better control of

10

systolic blood pressure (-5.89 mmHg), body mass index (-2.01) and blood glucose (-

12.51 mg/dL) besides plasmatic levels of lipoproteins, vitamin D and thyroid

hormones.

Conclusion: These findings show the importance of PF as a primary health care

strategy by improving the quality of pharmacotherapy. Hence, better health for

medication users.

Keywords: Elderly, Aged; Drug Therapy; Patient Adherence; Pharmaceutical Care;

Primary Health Care; Pharmaceutical Service; Medication Therapy Management;

Pharmacist.

11

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Esquema terico da evoluo das taxas de mortalidade, fecundidade e de

crescimento demogrfico do Brasil .......................................................................... 21

Figura 2 - Pirmide populacional, Brasil (1991-2010) ............................................... 22

Figura 3 - Estrutura relativa, por sexo e idade Brasil 1940-2050 .......................... 23

Figura 4 - Evoluo da razo de dependncia da populao brasileira e ndice de

envelhecimento 1940-2015 ...................................................................................... 23

Figura 5 - Evoluo da expectativa de vida de idosos 1999-2003............................ 24

Figura 6 - Proporo de idosos acometidos por doenas crnicas segundo PNAD

2008 ......................................................................................................................... 25

Figura 7 - Avaliao da situao de sade dos idosos segundo auto relato da PNAD

2003 ......................................................................................................................... 26

Figura 8 - Avaliao da percepo do estado de sade por idosos de acordo com

algumas caractersticas segundo a PNAD 2008 ...................................................... 26

Figura 9 - Relao entre renda familiar e condio de sade em idosos segundo

auto relato da PNAD 2003 ....................................................................................... 27

Figura 10 - Custo da internao por habitante ........................................................ 28

Figura 11 - Despesa federal com aes e servios pblicos de sade e despesa do

SUS com Assistncia Farmacutica: 2005-2008 (em bilhes de reais) .................... 30

Figura 12 - Despesa federal com aquisio de medicamentos: 2005-2008 (em R$

mil) ............................................................................................................................ 30

Figura 13 - Representao de PRM e RNM segundo o III Consenso de Granada . 42

Figura 14 - Avaliao dos hbitos de vida de idosos ambulatoriais em Seguimento

Farmacoteraputico em Braslia-DF (Brasil) (n=45) ................................................. 59

Figura 15 - Problemas de sade prevalentes entre idosos ambulatoriais em

Seguimento Farmacoteraputico em Braslia-DF (Brasil) (n=45) .............................. 59

Figura 16 - PRM prevalentes em idosos ambulatoriais em Seguimento

Farmacoteraputico em Braslia-DF (Brasil) (n=45) ................................................. 64

Figura 17 - Prtica de automedicao entre idosos ambulatoriais em Seguimento

Farmacoteraputico em Braslia-DF (Brasil) (n=45) ................................................. 64

Figura 18 - Principais RAM em idosos ambulatoriais em Seguimento

Farmacoteraputico em Braslia-DF (Brasil) (n=45) .................................................. 65

12

Figura 19 - Classificao das interaes medicamentosas quanto ao risco (A) e

gravidade (B) presentes nas prescries de idosos ambulatoriais em Seguimento

Farmacoteraputico em Braslia-DF (Brasil) (n=45) .................................................. 67

Figura 20 - Interaes medicamentosas de risco D e gravidade maior encontradas

nas prescries de idosos ambulatoriais em Seguimento Farmacoteraputico em

Braslia-DF (Brasil) (n=45) ......................................................................................... 70

Figura 21 - Percentual de aceitao das Intervenes Farmacuticas aplicadas a

idosos ambulatoriais em Seguimento Farmacoteraputico em Braslia-DF (Brasil)

(n=45) ........................................................................................................................ 70

Figura 22 - Aceitao ou no das principais Intervenes Farmacuticas aplicadas a

idosos ambulatoriais em Seguimento Farmacoteraputico em Braslia-DF (Brasil)

(n=45) ........................................................................................................................ 71

Figura 23 - Evoluo do nmero de queixas, RNM, RAM e IM ao longo de 12 meses

de Seguimento Farmacoteraputico em idosos ambulatoriais de Braslia-DF (Brasil)

.................................................................................................................................. 74

Figura 24 - Evoluo do valor mdio de glicemia em jejum, colesterol, triglicerdeos,

IMC e presso arterial sistlica e diastlica ao longo de 12 meses de Seguimento

Farmacoteraputico com idosos ambulatoriais em Braslia (Brasil) .......................... 77

Figura 25 - Evoluo das taxas de glicemia em jejum (A), glicemia ps-prandial (B),

colesterol total CT (C), triglicerdeos-TG (D), LDL (E), HDL (F), TSH (G), T4 livre

(H), vitamina D (I), ndice de massa corporal IMC (J), presso arterial diastlica

PAD (K) e presso arterial sistlica PAS (L) em idosos ambulatoriais aps 12

meses de Seguimento Farmacoteraputico em Braslia-DF (Brasil) ......................... 84

Figura 26 - Fluxograma de Atendimento Farmacutico em um servio pblico de

sade de Braslia-DF (Brasil) .................................................................................... 88

13

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - Valores mdios e desvio padro da glicemia em jejum utilizados para

clculo do tamanho da amostra ............................................................................... 50

Tabela 2 - Valores de referncia dos exames laboratoriais ...................................... 52

Tabela 3 - Nmero total de idosos e desistncia em cada fase do estudo ............... 56

Tabela 4 - Perfil socioeconmico de idosos ambulatoriais em Seguimento

Farmacoteraputico em Braslia-DF (Brasil) ............................................................ 57

Tabela 5 - Principais frmacos utilizados por idosos ambulatoriais em Seguimento

Farmacoteraputico em Braslia-DF (Brasil) (n=45) ................................................. 60

Tabela 6 - Medicamentos inapropriados ou no recomendados para idosos segundo

os critrios de Beers (2012) utilizados por idosos ambulatoriais em Seguimento

Farmacoteraputico em Braslia-DF (Brasil) ............................................................. 61

Tabela 7 - Queixas referidas por idosos ambulatoriais em Seguimento

Farmacoteraputico em Braslia-DF (Brasil) (n=45) ................................................. 63

Tabela 8 - Principais resultados negativos associados a medicao em idosos

ambulatoriais em Seguimento Farmacoteraputico em Braslia-DF (Brasil) (n=45) . 65

Tabela 9 - Principais interaes medicamentosas nas prescries de idosos

ambulatoriais em Seguimento Farmacoteraputico em Braslia-DF (Brasil) (n=45) . 66

Tabela 10 - Interaes medicamentosas de risco D encontradas em prescries de

idosos ambulatoriais em Seguimento Farmacoteraputico em Braslia-DF (Brasil)

(n=45) ....................................................................................................................... 68

Tabela 11 - Interaes medicamentosas de gravidade maior encontradas em

prescries de idosos ambulatoriais em Seguimento Farmacoteraputico em

Braslia-DF (Brasil) (n=45) ......................................................................................... 69

Tabela 12 - Intervenes Farmacuticas aplicadas a idosos ambulatoriais em

Seguimento Farmacoteraputico em Braslia-DF (Brasil) (n=45) .............................. 72

Tabela 13 - Comparao do perfil de adeso ao tratamento farmacolgico no incio

(basal) e aps 12 meses de Seguimento Farmacoteraputico em idosos

ambulatoriais de Braslia (Brasil) ............................................................................... 73

Tabela 14 - Evoluo do nmero de queixas, RNM, RAM e IM em 12 meses de

Seguimento Farmacoteraputico em idosos ambulatoriais de Braslia-DF (Brasil) ... 75

Tabela 15 - Resultados dos exames laboratoriais no estado basal em idosos

ambulatoriais em Seguimento Farmacoteraputico em Braslia-DF (Brasil) ............. 76

14

Tabela 16 - Evoluo dos parmetros laboratoriais e clnicos aps 12 meses de

Seguimento Farmacoteraputico em idosos ambulatoriais de Braslia-DF (Brasil) .. 78

Tabela 17 - Resultados dos exames laboratoriais e clnicos aps 12 meses de

Seguimento Farmacoteraputico em idosos ambulatoriais de Braslia-DF (Brasil) ... 81

Tabela 18 - Resultados dos exames laboratoriais e clnicos aps 12 meses de

Seguimento Farmacoteraputico em idosos ambulatoriais de Braslia-DF (Brasil) ... 85

15

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

A1C: hemoglobina glicada ou glicosilada

AAS: cido acetilsaliclico

AF: Ateno Farmacutica

AIDES: Assessment, Individualization, Documentation, Education, and Supervision

AIDS: sndrome da imunodeficincia adquirida (acquired immunodeficiency

syndrome)

AINE: antiinflamatrios no esteroidais

AL: Alagoas

APS: Ateno Primria Sade

BB: beta-bloquadores

BBC: bloqueadores de canais de clcio

BMQ: Brief Medication Questionnaire

Ca: clcio

CFF: Conselho Federal de Farmcia

Cl: cloreto

CODEPLAN: Companhia de Planejamento do Distrito Federal

CPK: creatinofosfoquinase

CT: colesterol total

CYP: citocromo P

DDD: doses dirias definidas

DF: Distrito Federal

DM: diabetes mellitus

DMO: densidade mineral ssea

DP: desvio padro

EUA: Estados Unidos da Amrica

GO: Gois

HAS: hipertenso arterial sistmica

HDL: high density lipoprotein

HIV: human imunodeficiency virus

IBGE: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica

IF: intervenes farmacuticas

IM: Interaes medicamentosas

16

IMC: ndice de massa corporal

INR: International Normalized Ratio

IPEA: Instituto de Pesquisa Econmica Aplicada

IRA: insuficincia renal aguda

K: potssio

LDL: low density lipoprotein

MEMS: Medication Events Monitoring System

Mg: magnsio

MG: Minas Gerais

MIP: medicamento isento de prescrio

MPR: Medication Possession Ratio

Na: sdio

OMS: Organizao Mundial de Sade

OPAS: Organizao Pan-Americana da Sade

PA: Presso arterial

PAD: presso arterial diastlica

PAS: presso arterial sistlica

PE: Pernambuco

PG: prostaglandinas

PNAD: Pesquisa Nacional por Amostra de Domiclios

PNAF: Poltica Nacional de Assistncia Farmacutica

PNM: Poltica Nacional de Medicamentos

PNSPI: Poltica Nacional de Sade da Pessoa Idosa

PR: Paran

PRM: Problemas relacionados a medicamentos

PSF: Programa Sade da Famlia

PTH: paratormnio

PWDT: Pharmaceuticals Workup of Drug Therapy

RAM: Reaes Adversas a Medicamentos

RAS: Redes de Ateno Sade

RENAME: Relao Nacional de Medicamentos Essenciais

RNM: Resultados associados medicao

RS: Rio Grande do Sul

SABE: Sade, Bem Estar e Envelhecimento

17

SAF: Servio de Ateno Farmacutica

SC: Santa Catarina

SES/DF: Secretaria de Estado de Sade do Distrito Federal

SF: Seguimento Farmacoteraputico

SM: salrio mnimo

SUS: Sistema nico de Sade

TG: triglicerdeos

TGI: trato gastrintestinal

TGO: transaminase glutmico-oxalactica

TGP: transaminase glutmico-pirvica

TMG: Teste de Morisky-Green

TSH: hormnio tireoestimulante

UBS: Unidades Bsicas de Sade

UMST: Unidade Mista de Sade de Taguatinga

VLDL: very low density lipoprotein

18

SUMRIO

1 INTRODUO ............................................................................................... 19

2 REVISO BIBLIOGRFICA .......................................................................... 21

2.1 PERFIL SCIODEMOGRFICO E DE SADE DA POPULAO

IDOSA....................................................................................................... 21

2.2 PERFIL FARMACOTERAPUTICO NO IDOSO ...................................... 31

2.3 CUIDADO FARMACUTICO: UMA NOVA PROPOSTA ......................... 35

2.4 SEGUIMENTO FARMACOTERAPUTICO COMO

INTERVENO EM SADE ................................................................... 41

3 OBJETIVOS ................................................................................................... 48

3.1 OBJETIVO GERAL .................................................................................. 48

3.2 OBJETIVOS ESPECFICOS .................................................................... 48

4 MTODO ........................................................................................................ 49

4.1 CARACTERIZAO ................................................................................ 49

4.1.1 Tipo de Estudo ........................................................................... 49

4.1.2 Local de Estudo .......................................................................... 49

4.2 CASUSTICA ........................................................................................... 50

4.2.1 Delineamento e tamanho da amostra ........................................ 50

4.2.2 Seleo da amostra ................................................................... 50

4.2.3 Critrios de incluso ................................................................... 50

4.2.4 Critrios de excluso .................................................................. 51

4.3 COLETA DE DADOS ................................................................................ 51

4.4 ALOCAO E ANLISE DOS DADOS ................................................... 54

4.5 ASPECTOS TICOS ............................................................................... 55

5 RESULTADOS ............................................................................................... 56

5.1 AVALIAO DOS RESULTADOS .......................................................... 56

5.2 AVALIAO DA ESTRUTURA ................................................................ 85

5.3 AVALIAO DO PROCESSO ................................................................. 87

5.4 PERCEPES E EXPERINCIAS PROFISSIONAIS ............................ 89

6 DISCUSSO ................................................................................................. 91

7 CONCLUSO ............................................................................................. 104

8 REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS ........................................................... 106

APNDICES ..................................................................................................... 118

19

1 INTRODUO

O envelhecimento populacional uma realidade das sociedades modernas,

tanto em pases desenvolvidos como em desenvolvimento. O aumento do nmero

de idosos numa populao provoca mudanas epidemiolgicas, sociais e

econmicas importantes (1-8).

Do ponto de vista epidemiolgico, verifica-se um aumento das doenas

crnicas com maior demanda por servios de sade, consultas, exames,

medicamentos e assistncia sade. Do ponto de vista social, o envelhecimento

aumenta os gastos da previdncia social e altera a dinmica das famlias exigindo a

criao de polticas pblicas mais centradas nas necessidades sociais desse grupo.

Economicamente, os gastos pblicos e privados so aumentados como

consequncia de maiores demandas por servios e produtos (8-18).

No cuidado sade, o processo de uso de medicamentos merece destaque

por seus nmeros elevados e, conseguinte, aumento dos riscos associados. A

polifarmcia aliada s alteraes fsicas, fisiolgicas, bioqumicas, farmacocinticas

e farmacodinmicas, comuns do processo de envelhecimento, tornam os idosos um

grupo vulnervel aos efeitos negativos dos medicamentos (10,11,19-24).

Vrios estudos tm mostrado que essa situao pode ser modificada quando

o trabalho de uma equipe multidisciplinar inserido no atendimento ao idoso nos

diferentes nveis de ateno sade. Entretanto, os sistemas de sade, os servios

bem como o exerccio profissional devem passar por mudanas profundas para que

consigam acompanhar a expanso da populao idosa cujas demandas so bem

especficas (11,21).

Nesse contexto, a profisso farmacutica sai de uma viso totalmente

tecnicista e administrativa e passa a exercer uma atuao mais assistencialista com

foco no cuidado ao usurio de medicamentos. Assim, o Cuidado Farmacutico e

seus diferentes componentes, em especial o Seguimento Farmacoteraputico (SF),

tem apresentado benefcios sade individual, representados por reduo dos

problemas relacionados a medicamentos (PRM), melhora da adeso e menores

riscos; bem como sade pblica, com idosos mais saudveis, mais ativos e

independentes com consequente economia de gastos e contribuio relevante para

a construo de uma sociedade mais justa para todas as idades (21).

20

Sabendo disso, esse estudo prope avaliar os efeitos do Seguimento

Farmacoteraputico a idosos portadores de doenas crnicas no transmissveis

atendidos em um ambulatrio pblico de Braslia DF (Brasil).

tambm objetivo deste trabalho, analisar a viabilidade de implantao da

Ateno Farmacutica na Unidade de Sade de estudo.

21

2 REVISO BIBLIOGRFICA

2.1 PERFIL SCIODEMOGRFICO E DE SADE DA POPULAO IDOSA

O envelhecimento da populao um fenmeno mundial. Estudos tm

mostrado um processo de transio demogrfica representado pela reduo das

taxas de natalidade, mortalidade e de crescimento com consequente aumento da

populao idosa (Figura 1) (1,2).

Figura 1 Esquema terico da evoluo das taxas de mortalidade, fecundidade

e de crescimento demogrfico do Brasil.

Fonte: IBGE, 2015. (2)

O censo demogrfico de 2010 mostrou que entre os quase 191 milhes de

brasileiros, 10,8% (mais de 20 milhes) da populao brasileira estava acima dos 60

anos de idade (1). Dados atualizados mostram que o Brasil possui hoje, mais de 204

milhes de habitantes com 7,9% acima dos 65 anos (3).

Essa mudana demogrfica produziu alterao no formato das pirmides

populacionais representada por um alargamento do topo nos ltimos 20 anos (Figura

2) (1).

22

Figura 2 Pirmide populacional, Brasil (1991-2010)

Fonte: Censo Demogrfico 2010 IBGE (1)

O Distrito Federal (DF) est entre as regies que mais cresceu nos ltimos

dez anos (2,28%) (2). Desde o ano 2000 a taxa de crescimento da regio

permanece maior que a do pas sendo que em 2011 foi de 2,4% (3). A tendncia

desde ento decrescer sendo que a estimativa que chegue a 1,33% em 2030

permanecendo ainda maior que a do Brasil que ser de 0,38% (3).

Braslia a quarta cidade mais populosa do Brasil com mais de 2,5 milhes

de habitantes e a segunda regio com maior grau de urbanizao (96,6%) (1). Em

2012, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domiclios (PNAD) mostrou que o DF

possua mais de 10% da sua populao acima dos 60 anos de idade (4). Neste ano

(2015), o DF j possui 2,9 milhes de habitantes com 6,17% de idosos (3).

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica (IBGE), se as taxas

de mortalidade, fecundidade, natalidade e de crescimento mantiverem com o mesmo

comportamento nos prximos anos, o envelhecimento populacional continuar a ser

uma tendncia da populao brasileira (1,2). Espera-se 41,5 milhes de idosos em

2030 e 73,5 milhes em 2060 (2). Nos prximos 10 anos, espera-se um incremento

de um milho de idosos por ano na populao brasileira (Figura 3) (2).

23

Figura 3 Estrutura relativa, por sexo e idade Brasil 1940-2050

Fonte: IBGE, 2009 (5)

O ndice de envelhecimento da populao brasileira tem aumentado

consideravelmente desde o ano 2000 sendo que em 2050 estima-se que seja de

226,3, ou seja, haver 226 idosos para cada 100 crianas e adolescentes (Figura 4)

(5).

Figura 4 Evoluo da razo de dependncia da populao brasileira e ndice

de envelhecimento 1940-2015

Fonte: IBGE, 2009 (5)

24

Alm disso, observa-se tambm um aumento das mulheres entre os idosos

com uma razo entre os sexos de 0,8. Isso significa que para cada 80 homens h

100 mulheres na populao brasileira (1,2). No censo de 2010, elas representavam

55,5% dos idosos (1).

Outro fenmeno observado o envelhecimento da prpria populao idosa

produzido pelo aumento da expectativa de vida sendo que a das mulheres superior

a dos homens, explicando a maior proporo do sexo feminino na populao idosa

(Figura 5) (5).

Figura 5 Evoluo da expectativa de vida de idosos 1999-2003

Fonte: IBGE, 2009 (5)

A PNAD 2009 mostrou ainda que a maioria da populao idosa brasileira era

aposentada (57,9%), com renda domiciliar per capita de at um salrio mnimo

(43,2%), com menos de quatro anos de estudo (50,2%) e 64,1% dos idosos eram a

pessoa de referencia da famlia. Em relao ao arranjo familiar, a maioria dos idosos

morava famlias constitudas por casais sem filhos ou com filhos maiores de 25 anos

(6).

Esse aumento rpido e crescente do nmero de idosos na populao

brasileira acompanhado por mudanas sociais significativas representando um

desafio para as polticas pblicas, sobretudo de seguridade social, assistncia social

e sade. Tamanha a relevncia desse tema que se tornou pauta da agenda

pblica do Governo Federal e vrias polticas pblicas tm sido criadas e adaptadas

nos ltimos anos como forma de garantir proteo e cuidado pessoa idosa (7).

25

As mudanas demogrficas trazem impactos significativos, principalmente aos

sistemas de sade (8-10). Dados da PNAD 2008 mostraram que apenas 22,6% dos

idosos declararam no sofrer nenhuma doena crnica (Figura 6).

Figura 6 Proporo de idosos acometidos por doenas crnicas segundo

PNAD 2008

Fonte: IBGE, 2010 (6)

O envelhecimento acompanhado de maior prevalncia de doenas crnicas

no transmissveis como hipertenso arterial sistmica (HAS), problemas

cardiovasculares, diabetes mellitus (DM), osteoporose, problemas osteoarticulares e

respiratrios alm de doenas degenerativas como Parkinson e Alzheimer (6, 10-

12). Como consequncia, o aumento das doenas crnicas implica em maior

demanda pelos servios de sade com impacto econmico significativo para a

administrao pblica e para as famlias brasileiras (8-10).

Dados do IBGE ainda mostram que o envelhecimento encarado pelo idoso

como perda progressiva da sade e piores condies de vida (Figura 7) (5,11,12).

26

Figura 7 Avaliao da situao de sade dos idosos segundo auto relato da

PNAD 2003

Fonte: IBGE, 2009 (5)

A PNAD 2008 apontou dados semelhantes sendo que foi demonstrado que

piores condies de sade esto relacionadas ao aumento da idade, cor negra e

baixa renda familiar (Figura 8) (6).

Figura 8 Avaliao da percepo do estado de sade por idosos de acordo

com algumas caractersticas segundo a PNAD 2008

Fonte: IBGE, 2010 (6)

27

Resultados do estudo publicado por Vagetti et al.(2013) mostraram que a

presena de problemas crnicos de sade em idosos tem relao direta e

independente com menores escores de qualidade de vida, tanto nos domnios gerais

quanto nos aspectos especficos da qualidade de vida (13).

Pesquisa realizada pelo IBGE sobre a sade do idoso mostrou que essa

percepo de piores condies de sade est diretamente relacionada renda

familiar (Figura 9) (5).

Figura 9 Relao entre renda familiar e condio de sade em idosos

segundo auto relato da PNAD 2003

Fonte: IBGE, 2009 (5)

A PNAD de 2003 mostrou que 71,2% dos homens e 83,4% das mulheres

procuraram o mdico nos ltimos 12 meses que antecederam a pesquisa (5). Foi

verificado aumento dos gastos com sade incluindo as despesas com internaes

que tendem a crescer com o avano da idade. Em 2006, a internao no sistema

pblico de sade de um idoso de 60 a 69 anos custava em torno de R$ 93,05

enquanto esse valor subia para R$ 178,95 para idosos acima de 80 anos (Figura 10)

(5).

28

Figura 10 Custo da internao por habitante

Fonte: IBGE, 2009 (5)

Segundo a Organizao Mundial de Sade (OMS), em um relatrio divulgado

em 2006, nos pases em que esto ocorrendo essa transio demogrfica, fazem-se

necessrias estratgias para melhorar a ateno primria da sade, prevenindo,

sobretudo, os problemas crnicos de sade e sobrecarga do sistema pblico (9).

Vagetti et al (2013) afirmam que o combate a problemas crnicos de sade nos

idosos promove alm de reduo da mortalidade, uma melhora significativa da

qualidade de vida dessa populao (13).

Nesse contexto, polticas pblicas voltadas para a promoo sade foram

priorizadas nos ltimos anos no Brasil. A Poltica Nacional de Sade da Pessoa

Idosa (PNSPI) instituda por meio da Portaria n 2.528 de 19 de outubro de 2006 tem

como objetivo primordial a recuperao, manuteno e promoo da autonomia e da

independncia dos indivduos idosos, direcionando medidas coletivas e individuais

de sade para esse fim, em consonncia com os princpios e diretrizes do Sistema

nico de Sade (SUS). A PNSPI foi uma estratgia encontrada para organizar o

sistema de sade brasileiro diante da realidade do envelhecimento populacional

(14).

A Portaria n 252, de 19 de fevereiro de 2013, instituiu a Rede de Ateno

Sade das Pessoas com Doenas Crnicas no mbito do SUS com o intuito de

realizar a ateno de forma integral aos usurios portadores de doenas crnicas,

em todos os pontos de ateno, com realizao de aes e servios de promoo e

proteo da sade, preveno de agravos, diagnstico, tratamento, reabilitao,

reduo de danos e manuteno da sade (15).

29

Segundo o trabalho de Silva et al (2011), a maioria da populao brasileira

utiliza os servios do SUS sendo que as mulheres (17% x 12% dos homens), os

mais velhos (23% para os maiores de 60 anos x 12% para faixa etria de 0-14 anos),

os que esto nos extremos de escolaridades e os de maior rendimento familiar so

os principais usurios (16). A PNAD de 1998 j havia mostrado que 95% das

consultas mdicas e 93% das internaes das pessoas que pertenciam aos 20%

mais pobres da populao brasileira eram arcados pelo SUS (17).

Uma das mudanas mais impactantes no sistema pblico de sade a

necessidade maiores investimentos na Assistncia Farmacutica (10). O aumento

do consumo de medicamentos como consequncia do maior nmero de doenas

crnicas no transmissveis uma realidade desafiadora (10,11,19,20).

Estudo farmacoepidemiolgico realizado por Baldoni et al (2010) mostrou que

os idosos brasileiros utilizam em mdia sete medicamentos variando de um a 21

medicamentos por indivduo incluindo os prescritos e os no prescritos (20). No DF,

a realidade no diferente do restante do pas. Oliveira (2008) mostrou um consumo

mdio de quatro a cinco medicamentos em idosos institucionalizados (19) e

Medeiros et al (2011) encontraram mdia semelhante em estudo realizado com

idosas ambulatoriais (21). Valores prximos foram encontrados em idosos de Porto

Alegre (RS), de Tubaro (SC), Goinia (GO) e So Paulo (22-24).

Silveira et al (2002) mostraram que entre as 90% das famlias brasileiras

consideradas mais pobres, os maiores gastos com sade so com a compra de

medicamentos (17). Lima et al (2007) mostraram que o gasto mensal mdio

individual entre aposentados e pensionistas de Belo Horizonte (MG) equivalia a 51%

do salrio mnimo da poca da pesquisa (2003/2004) (18).

Diante disso, conclui-se que os gastos privados e pblicos com aquisio de

medicamentos no Brasil tm crescido exponencialmente. De acordo com o trabalho

de Vieira e Zucchi (2013), de 2005 a 2009 houve um aumento de 65,3% dos

recursos financeiros da Unio para aquisio de medicamentos. Nos Estados e DF

houve um aumento de 112,4%. Dados do Ministrio da Sade mostraram que em

2009 foram gastos mais de 8,9 bilhes de reais para a compra de medicamentos

representando 7,8% dos gastos totais com sade no ano anterior (25). Relatrio

produzido pelo Instituto de Pesquisa Econmica Aplicada (IPEA) mostrou

estabilizao desses gastos de 2005 a 2009 (Figuras 11 e 12) (26).

30

Figura 11 Despesa federal com aes e servios pblicos de sade e

despesa do SUS com Assistncia Farmacutica: 2005-2008 (em bilhes de

reais)

Fonte: IPEA, 2009 (26).

Figura 12 Despesa federal com aquisio de medicamentos: 2005-2008 (em

R$ mil)

Fonte: IPEA, 2009 (26).

Dados recentes mostram um salto de recursos investidos na compra de

medicamentos pelo Governo Federal de trs bilhes de reais em 2003 para 12,4

bilhes de reais em 2014 (27).

Embora os dados mostrem investimentos na Assistncia Farmacutica,

sobretudo com aquisio de medicamentos, com especial destaque para o

31

Programa Farmcia Popular, acredita-se que ainda so insuficientes para a

populao em crescimento e com demandas crescentes (8,10).

Nesse contexto, Baldoni & Pereira (2011) defendem que so necessrios

mais estudos farmacoepidemiolgicos com a populao idosa a fim de subsidiar as

polticas pblicas de sade e as aes da Assistncia Farmacutica no pas (10).

Sabe-se que conhecer o perfil de sade e doena, os medicamentos mais utilizados

e a efetividade e segurana desses na populao idosa, essencial para uma

seleo, programao, aquisio e distribuio mais adequadas alm de permitir

melhor planejamento das aes que promovam o uso e a prescrio racionais.

2.2 PERFIL FARMACOTERAPUTICO NO IDOSO

O uso contnuo de medicamentos, como consequncia da cronicidade de

problemas de sade na populao idosa, representa um dos aspectos mais crticos

no cuidado sade do idoso.

No idoso, a prevalncia de doenas crnicas est associada diretamente

polifarmcia (24). A definio de polifarmcia controversa, porm, atribui-se em

geral como o uso de mais de um medicamento. Alguns autores consideram-na como

o uso concomitante de mais de cinco agentes teraputicos (28). No entanto, a

utilizao de mltiplos medicamentos tem sido relacionada maior incidncia de

interaes medicamentosas (IM) e ao agravo das reaes adversas a medicamentos

(RAM) com conseguinte aumento da morbimortalidade (24,28).

Pesquisas tm mostrado que os efeitos negativos da polifarmcia bem como

a complexidade dos regimes teraputicos promovem dificuldade de adeso sendo

um dos problemas mais comuns envolvendo a farmacoterapia no idoso (19,20,22-

25, 28-36). Aliadas a esses problemas, as alteraes fisiolgicas, bioqumicas,

farmacocinticas e farmacodinmicas produzidas pelo processo de envelhecimento,

tornam os idosos, vulnerveis toxicidade dos medicamentos reduzindo ainda a

capacidade funcional e piorando a qualidade de vida (11,13,20,24,29,34,36).

Vagetti et al. (2013) mostraram em um estudo realizado com idosas em

Curitiba (PR) que h uma forte relao entre uso de medicamentos e o domnio

fsico da qualidade de vida (13). Nogueira et al (2010) mostraram tambm

associao entre uso de medicamentos e a capacidade funcional dos idosos

evidenciando que pior capacidade funcional em idosos longevos est associada ao

uso de cinco ou mais medicamentos (37).

32

O consumo de medicamentos em idosos pode estar associado, por exemplo,

ao risco de quedas e fraturas principalmente no caso de frmacos que produzem

sedao, sonolncia, hipotenso, tontura e hipoglicemia (38-40). Alguns desses

medicamentos so considerados inapropriados para idosos necessitando por isso,

de monitoramento da prescrio e uso. Alm de aumentar o risco de quedas e

fraturas, elevam a ocorrncia de RAM, o nmero de hospitalizaes e as taxas de

morbimortalidade (29-31,34,35,41).

Esses medicamentos, notadamente benzodiazepnicos, antidepressivos

tricclicos, alguns anti-hipertensivos, relaxantes musculares e antipsicticos so

considerados inapropriados ou no recomendados para idosos por causarem

reaes adversas que podem agravar a capacidade cognitiva, a concentrao, a

reatividade emocional ou ainda provocar alteraes de presso arterial (PA) (29-31).

O projeto SABE (Sade, Bem Estar e Envelhecimento) conduzido na cidade

de So Paulo mostrou que entre os 1.258 idosos participantes, 28% utilizavam

algum medicamento inapropriado apresentando relao direta com idade, sexo,

polifarmcia e comorbidades (29,35). Proporo maior foi encontrada pelo estudo de

Vieira et al. (2013) no qual 82,6% de idosos institucionalizados na cidade de So

Paulo, utilizavam algum medicamento inapropriado (25).

Igualmente, a automedicao constitui outra prtica teraputica comum na

populao idosa. Bortolon et al. (2008) mostraram que 26% das idosas

acompanhadas em um ambulatrio de Braslia praticavam automedicao (26).

Santos et al. (2013) encontraram percentual de 35,7% entre idosos de Goinia (23),

enquanto Oliveira et al. (2012) mostraram prevalncia de 80,4% em idosos de

Campinas (SP) (43).

Fatores como idade, sexo feminino, escolaridade, renda familiar, acesso a

servios de sade, doenas crnicas e filiao a plano de sade apresentam

associao com automedicao (42-45). De acordo com Loyola Filho et al (2002) a

prevalncia de automedicao no Brasil semelhante a pases desenvolvidos

podendo entender que esta prtica substitui a ateno formal sade em

determinadas situaes (45).

Um dos fatores mais relevantes quando se trata de uso de medicamentos na

Terceira Idade a adeso ao tratamento farmacolgico. A baixa adeso est

relacionada, por exemplo, ao agravo dos problemas de sade e reduo da

33

qualidade de vida do paciente com maiores taxas de hospitalizaes e de despesas

com sade (30).

Vrios fatores interferem em menor ou maior proporo na adeso terapia

medicamentosa. Segundo Steiner (2012), a adeso multifatorial e determinada

por um conjunto de comportamentos de natureza individual, social e ambiental.

Assim, as aes para promoo de adeso devem ser generalizadas e no

centradas em pequenos grupos especficos de pacientes envolvendo uma equipe

multiprofissional e gestores (47). Aslani e Schneider (2014) e Rash et al (2014)

defendem a multiplicidade de fatores que definem a adeso (48,49).

A complexidade do esquema teraputico de um paciente representa, por

exemplo, um fator importante para adeso farmacoterapia. Estima-se que de 40 a

75% dos idosos no cumprem adequadamente seus regimes teraputicos

adequadamente devido s limitaes fsicas, dficit cognitivo ou pela diminuio da

capacidade de compreenso das instrues que acompanham o avano da idade

alm de falta de comunicao, ausncia de um cuidador e pela complexidade do

tratamento (50).

Vries et al (2014) demonstraram em seu estudo com diabticos tipo 2 a

relao entre complexidade do regime teraputico e no adeso concluindo que

regimes mais simples devem ser priorizados como estratgia para melhorar a

adeso (51). Lalibert et al (2012) por exemplo, mostrou que a adeso 26% maior

em pacientes em uso de regimes teraputicos mais simples (uma vez ao dia) que

mais complexos (trs vezes/dia) (52).

De acordo com Acurcio et al. (2009) a complexidade de um esquema

teraputico no pode ser definida apenas pelo nmero de medicamentos mas

tambm pela frequncia e tipo de aes requeridas para a autoadministrao (50).

Seu estudo incluindo idosos residentes em Belo Horizonte (MG) mostrou um ndice

de complexidade teraputica variando de 1 a 24 com tendncia a aumentar

medida que mais medicamentos so includos no tratamento. A complexidade do

esquema teraputico influenciada pelo nvel de escolaridade, renda,

autopercepo do estado de sade, nmero de problemas de sade e nmero de

medicamentos prescritos (50).

A relao entre adeso e complexidade do tratamento refora a importncia

da prescrio de esquemas mais simplificados com menor nmero de medicamentos

34

e de administraes dirias e, por conseguinte, menos IM e RAM favorecendo assim

o cumprimento da prescrio.

Em pacientes portadores de doenas crnicas como HAS, a no adeso

teraputica est associada ao difcil controle da PA (46,48,53,54). Oliveira-Filho et al.

mostraram que a prevalncia de adeso ao tratamento em hipertensos

acompanhados pelo Programa Sade da Famlia (PSF) em Macei (AL) foi de

apenas 19,7% e que apenas 34% dos pesquisados apresentaram PA controlada.

80,6% dos pacientes sem controle da PA apresentaram baixa adeso ao tratamento

prescrito (53).

Dificuldades de adeso tambm tm sido relatadas em grupos de pacientes

diabticos, portadores de dislipidemias e de osteoporose estando essa condio

associada ao agravo das doenas e surgimento de complicaes (54-57).

Observa-se que as RAM esto entre os principais motivos de baixa adeso ao

tratamento farmacolgico. Isso foi constatado no estudo de Devold et al. (2012) com

portadores de osteoporose em uso de bifosfonatos que reconheceram tambm que

o esquecimento ou a falta de acompanhamento profissional contribuem para

problemas de adeso (56). Hiligsmann et al (2012) mostraram que a no adeso ao

tratamento com bifosfonatos promove reduo da efetividade dos frmacos e

aumento da incidncia de fraturas em pacientes de 55 a 85 anos de idade na

Blgica (57). Dados semelhantes tambm foram mostrados por Yu et al (2012) que

concluram que a incidncia de fraturas foi menor em pacientes com maior adeso

ao tratamento com teriparatida acompanhados por 24 meses nos Estados Unidos

(58).

Outro fato importante que a no adeso tem impacto significativo nos custos

da farmacoterapia e nos anos de vida ajustados por qualidade (AVAQ). Segundo o

estudo de Hiligsmann et al (2012), a cada 20 euros gastos com o tratamento com

bifosfonatos, 1,95 anos de vida seriam poupados e a plena adeso poderia poupar

at 5,12 anos de vida com perfeito estado de sade (57).

Alm disso, observa-se tambm que hbitos e crenas, o estado cognitivo,

mental e psicolgico e o comportamento do paciente diante das doenas e dos

medicamentos, conhecimento sobre doenas e tratamento, questes

socioeconmicas (rendimento, escolaridade e nvel social) e relacionadas ao sistema

de sade (acessibilidade) bem como as caractersticas do prprio tratamento e dos

35

frmacos (quantidade, complexidade, RAM, posologia, forma farmacutica, durao)

exercem forte influencia na adeso (48,49).

Em alguns grupos especficos de pacientes, notadamente, nos portadores de

HIV/AIDS, a presena de um companheiro (a) favorece a adeso ao tratamento

antirretroviral e aumenta a sobrevida dos doentes evidenciando a influencia das

relaes sociais e do status emocional no uso de medicamentos (59).

Mais recentemente, a adeso tem sido avaliada sob o aspecto

comportamental, motivacional e psicolgico. A teoria da Perspectiva Temporal ou

Perspectiva de Tempo (no ingls Zimbardo Time Perspective Inventory) que avalia o

modo do indivduo de ver o futuro e seu passado tem sido utilizada para

compreender a adeso. Trabalho conduzido por Sansburry et al (2014) mostrou

uma relao entre o time perspective e a motivao para a adeso ao tratamento

farmacolgico em portadores de HAS e DM de Washington (EUA) (60).

As consequncias da no adeso e do uso irracional de medicamentos so

to relevantes que vrios estudos tm sido realizados no Brasil e no mundo nas

ltimas dcadas na tentativa de determinar fatores que os influenciam e estratgias

para garantir uma farmacoterapia segura e efetiva, independente do usurio. Nesse

sentido, tem sido mostrado que o acompanhamento do processo de utilizao de

medicamentos por profissionais de sade favorece o uso correto e o cumprimento da

prescrio de medicamentos (56). Dentre esses profissionais, a atuao do

farmacutico, como profissional do cuidado, tem ganhado destaque.

2.3 CUIDADO FARMACUTICO: UMA NOVA PROPOSTA

O farmacutico foi visto pela primeira vez como profissional do cuidado por

volta de 1975 por Mikeal e colaboradores num estudo com pacientes hospitalizados

nos EUA. Naquela ocasio, o cuidado foi entendido como o servio prestado ao

paciente internado, considerando a estrutura e os processos da Farmcia Hospitalar

e a participao total ou parcial do farmacutico com benefcios ao paciente (61).

Em seguida, o termo Cuidado Farmacutico, do ingls Pharmaceutical Care,

ganhou mais evidencia com o trabalho de Brodie et al (1980) que ampliou o papel do

farmacutico. Segundo os pesquisadores, o cuidado farmacutico deveria incluir a

determinao das necessidades de produtos e servios para garantir um tratamento

seguro e eficaz (62).

36

No final dos anos 80, Hepler dando um sentido mais filosfico discusso

definiu o termo como uma relao contratual entre o paciente e o farmacutico em

que esse ltimo responsvel pelo uso dos medicamentos do primeiro (63).

Em 1990, Hepler, com essa viso filosfica e Strand com uma viso mais

tcnica, porm, inovadora voltada para as atividades clnicas da profisso

farmacutica; se uniram e deram uma nova definio ao termo cuidado

farmacutico. Assim, ficaram conhecidos como os criadores desse novo modelo de

prtica farmacutica definida por eles como proviso responsvel da

farmacoterapia, com o objetivo de alcanar resultados teraputicos definidos na

sade e na melhoria da qualidade de vida" (64). Hepler e Strand ainda determinaram

que o cuidado farmacutico deveria envolver duas atividades principais: identificao

das necessidades teraputicas envolvendo medicamentos e doenas e depois,

compromisso com a continuidade do tratamento (63).

Embora esse conceito tenha sido aceito desde os anos 90 pela classe

farmacutica, as aes para transformar o exerccio profissional, com foco no

usurio e no apenas no produto, s aconteceram aps 1992 quando Strand, Cipolle

e Morley iniciaram o Projeto Minnesota (Minnesota Pharmaceutical Care Project).

Esse projeto, desenvolvido por mais de trs anos com mais de cinco mil pacientes,

20 farmcias e 54 farmacuticos, teve como objetivo avaliar a viabilidade da

implantao do cuidado farmacutico no contexto da farmcia comunitria nos EUA

(63).

Os pesquisadores desenvolveram ao final, uma ferramenta intelectual que

sistematizava o raciocnio clnico permitindo ao farmacutico avaliar o uso de

medicamentos, reconhecer os problemas e as necessidades relacionadas ao

tratamento farmacolgico e aos problemas de sade e tomar decises para mudar a

situao inicialmente identificada. Tal ferramenta ficou conhecida como PWDT

(Pharmaceuticals Workup of Drug Therapy) - Anlise da Farmacoterapia pelo

Farmacutico, desenvolvida em 1988 e adaptada aps os trabalhos sobre o tema e

realidade da farmcia comunitria sendo conhecido atualmente como

Pharmacotherapy Workup (63,65,66).

Os trabalhos desenvolvidos individualmente e em parcerias por Strand,

Cipolle e Morley permitiram definir as responsabilidades do farmacutico como: 1)

garantir que toda a teraputica farmacolgica do paciente fosse correta, efetiva,

segura e conveniente para ser administrada conforme indicao; 2) identificar,

37

resolver e prevenir qualquer tipo de problema relacionado com o medicamento (67).

Essas responsabilidades foram avaliadas como exequveis aps os resultados do

Projeto Minnesota.

O Projeto Minnesota mostrou que o cuidado farmacutico permite identificar,

resolver e prevenir os problemas relacionados farmacoterapia, categorizados

inicialmente como de necessidade, efetividade, segurana e adeso; aumentando o

nmero de pacientes que alcanam seus propsitos teraputicos e diminuindo os

custos com despesas de sade (63).

Assim, entende-se como Cuidado Farmacutico a prestao de um servio

profissional voltado para o uso racional de medicamentos. o exerccio em que o

profissional assume a responsabilidade das necessidades de um paciente em

relao ao medicamento e adquire um compromisso com este paciente (63). Ou

seja, envolve responsabilidades e compromisso por parte do profissional com

participao ativa do paciente no contexto do autocuidado.

O grande diferencial desse novo modelo de prtica farmacutica foi dado por

Hepler que o enxergou sob a concepo da filosofia do exerccio profissional. A

filosofia define as regras, funes e responsabilidades do profissional. Segundo Rios

(2008), as competncias de um profissional abriga um conjunto de propriedades de

carter tcnico, esttico, poltico e tico (68). Na dimenso esttica esto includas a

subjetividade, a sensibilidade e afetividade do profissional. Na dimenso tica, o

respeito, a justia e a solidariedade (68).

A filosofia do exerccio profissional ajuda o indivduo a tomar decises,

priorizar aes e resolver dilemas presentes em sua rotina sob todas essas

dimenses. Ela permite definir o que deve ser feito. A filosofia do exerccio

especfica para a profisso e no para o profissional (68).

A filosofia do cuidado farmacutico inclui vrios elementos das dimenses

citadas. Ela se inicia com a identificao de uma necessidade teraputica (dimenso

tcnica), centrada no paciente (dimenso esttica), tem como eixo central o

cuidado com e para o paciente ao se estabelecer uma relao teraputica

(dimenso esttica) e finalmente, descreve as responsabilidades especficas do

profissional (dimenso tica) com impactos no apenas na vida e na sade do

paciente, mas, da sociedade em geral (dimenso poltica/social).

Adicionalmente, o conceito de cuidado amplo e vago, mas, envolve ateno,

preocupao, responsabilidade, compromisso para com alguma coisa ou algum.

38

Nesse sentido, entende-se cuidado farmacutico como um modelo de exerccio

profissional fundamentado no paciente e no seu bem estar e no apenas nos

medicamentos ou doenas que o acometem. Para isso faz-se necessrio

estabelecer laos, de diferentes naturezas, com o paciente. Hepler e Strand

definiram como uma aliana que pode ser traduzida como uma relao teraputica

fundamentada no compromisso e no dilogo (63).

Uma relao teraputica uma relao entre um profissional e um paciente

sendo formada com o propsito de suprir as necessidades de cuidado de sade do

paciente (63). uma relao que envolve amor, carinho e ateno ao outro.

Para exercer o Cuidado Farmacutico, o profissional deve desenvolver uma

srie de caractersticas, habilidades, atitudes e valores que o permitem estabelecer

essa relao teraputica com seus pacientes. A lista ampla e inclui respeito,

honestidade, comunicao, seriedade, cooperao, colaborao mtua, empatia,

sensibilidade, promoo do autocuidado e independncia, pacincia, confiana,

prioridade ao paciente, confidencialidade e disposio (63).

Sendo o Cuidado Farmacutico um novo modelo de exerccio profissional ele

deve acompanhar a tendncia do novo modelo de sistema de sade, voltado para a

promoo de sade, preveno de agravos e oferta de cuidados de sade.

No Brasil, o sistema de sade est, atualmente, organizado em redes de

ateno sade (RAS) como forma de garantir a integralidade, universalidade e

equidade da populao usuria do SUS. As RAS tm como objetivo promover a

integrao de aes e servios de sade para prover uma ateno sade de forma

contnua, integral, de qualidade, responsvel, humanizada, com vistas

consolidao dos princpios e diretrizes do SUS (69).

As RAS foram institudas a partir da Portaria GM n 4.279 de 30 dezembro de

2010 que as define como arranjos organizativos de aes e servios de sade, de

diferentes densidades tecnolgicas, que integradas por meio de sistemas de apoio

tcnico, logstico e de gesto, buscam garantir a integralidade do cuidado (70).

As RAS foram conceitualmente planejadas fundamentadas em seis

caractersticas: 1) formar relaes horizontais entre os diferentes pontos de ateno;

2) ter a ateno primria como centro de comunicao (incio da cadeia); 3) Planejar

e organizar as aes segundo as necessidades de sade de uma populao

especfica; 4) Ofertar ateno contnua e integral; 5) Cuidado multiprofissional; 6)

39

Compartilhar objetivos e compromissos com os resultados, em termos sanitrios e

econmicos (69).

A Ateno Primria Sade (APS) um dos elementos da estrutura

operacional de uma RAS sendo o centro comunicador e coordenador do cuidado.

Tem o papel mais importante dentro de uma RAS uma vez que responsvel por

fazer a ponte entre os diferentes nveis e pontos de ateno, assim como integrar ao

processo os sistemas logsticos e de apoio, garantindo, assim, a integralidade da

ateno aos usurios do sistema de sade (69). Dessa forma, a APS

multiprofissional e voltada promoo de sade, preveno e educao em sade.

Assim como o sistema de sade, os cuidados profissionais tambm foram

sistematizados em cuidados primrios, secundrios e tercirios considerando o nvel

de ateno sade.

O cuidado primrio de sade baseado na centralidade do paciente e no na

doena ou no sistema de rgos, como no caso de um especialista. Os cuidados

primrios de sade foram introduzidos na Sade Pblica pela Declarao de Alma-

Ata (ex Unio Sovitica) de 12 de setembro de 1978 (71). um tipo de cuidado

voltado para o enfermo, mas, tambm para o sadio. As intervenes so definidas

de acordo com o paciente e sua evoluo (assistncia individualizada) considerando

o grupo social em que est inserido (assistncia coletiva) (72).

No cuidado primrio, as necessidades do paciente definem os servios

requeridos. O paciente primeiro analisado em sua integralidade e depois, caso

necessrio, cuidados especializados so aplicados. Com essa viso entende-se que

o cuidado farmacutico uma forma de cuidado primrio sade por ser uma

prtica generalista em sua concepo.

O Cuidado Farmacutico tem sido amplamente estudado nos ltimos anos. A

maioria dos estudos foi realizada na Amrica do Norte e Europa envolvendo as

farmcias comunitrias (73,74). Na Europa, a Espanha desenvolveu a partir da

segunda metade da dcada de 90, estudos voltados ao cuidado farmacutico e o

termo Atencin Farmacutica surgiu junto com a sistematizao de um modelo de

seguimento farmacoteraputico denominado Mtodo Dder criado pelo Grupo de

Investigao em Ateno Farmacutica da Universidade de Granada (75). Esse

mesmo grupo em 1998 padronizou o conceito de problemas relacionados a

medicamentos (PRM) e mais tarde, em 2007, de resultados negativos associados

medicao (RNM) no III Consenso de Granada (76).

40

No Brasil, o termo cuidado farmacutico foi traduzido como Ateno

Farmacutica (AF) entendida como um sub-elemento da Assistncia Farmacutica.

Discusses sobre os temas foram fomentadas aps publicao da Poltica Nacional

de Medicamentos (PNM) de 1998 que previa a reestruturao da Assistncia

Farmacutica como forma de garantir acesso e uso racional de medicamentos.

Ressalta-se que o conceito de AF no Brasil, foi desenvolvido considerando o

contexto em relao ao sistema de sade e prtica farmacutica da poca. O

sistema de sade estava em fase de implantao a pouco mais de uma dcada

(desde 1990) e a Assistncia Farmacutica ainda estava sendo estruturada. Tanto

que a Poltica Nacional de Assistncia Farmacutica (PNAF) posterior definio

de AF refletindo atualmente, uma necessidade de adequao do termo.

A prtica farmacutica, poca, enfrentava vrias dificuldades: 1) uma grave

crise de identidade profissional pela falta de reconhecimento da sociedade do

trabalho do farmacutico; 2) problemas na formao acadmica do profissional

altamente tecnicista e incipiente na rea clnica; 3) predomnio dos interesses

econmicos frente aos de sade coletiva resultando na caracterizao da farmcia

como estabelecimento comercial e do medicamento como um bem de consumo,

desvinculados do processo de ateno sade; 4) prtica profissional desconectada

das polticas de sade e de medicamentos com priorizao das atividades

administrativas; 5) inequidade no acesso aos medicamentos; 6) problemas na

implantao efetiva da poltica de medicamentos no pas; 7) falta de unio da classe

farmacutica de diferentes segmentos (77).

O conceito de AF no Brasil foi oficializado por meio do Consenso Brasileiro de

Ateno Farmacutica (2002) aps discusses lideradas pela Organizao Mundial

de Sade (OMS), Organizao Pan-Americana da Sade (OPAS), Ministrio da

Sade e representantes da comunidade acadmica (77).

Foi definida, portanto, como:

um modelo de prtica farmacutica, desenvolvida no contexto da Assistncia Farmacutica. Compreende atitudes, valores ticos, comportamentos, habilidades, compromissos e corresponsabilidades na preveno de doenas, promoo e recuperao da sade, de forma integrada equipe de sade. a interao direta do farmacutico com o usurio, visando uma farmacoterapia racional e a obteno de resultados definidos e mensurveis, voltados para a melhoria da qualidade de vida. Esta interao tambm deve envolver as concepes dos seus sujeitos, respeitadas as suas especificidades biopsicossociais, sob a tica da integralidade das aes de sade (77).

41

Numa viso mais prtica, o Cuidado Farmacutico pode ser entendido como

um modelo de exerccio farmacutico voltado para as necessidades teraputicas do

paciente que inclui aes de educao em sade, orientao farmacutica,

dispensao, atendimento farmacutico incluindo consultas farmacuticas,

acompanhamento ou seguimento farmacoteraputico com intervenes

farmacuticas e registro sistemtico das atividades (77).

O Cuidado Farmacutico pressupe condutas do farmacutico que

correspondem s intervenes em sade. As intervenes farmacuticas (IF) podem

ser consideradas um produto do Acompanhamento/Seguimento Farmacoteraputico

(77).

2.4 SEGUIMENTO FARMACOTERAPUTICO COMO INTERVENO EM SADE

O Seguimento ou Acompanhamento Farmacoteraputico (SF) uma das

etapas mais importantes e efetivas da AF, pois, envolve o contato direto do

farmacutico com o paciente por meio de consultas farmacuticas visando

acompanhar o uso de medicamentos por um determinado perodo de tempo. Nessa

etapa, o farmacutico identifica potenciais e reais PRM e define estratgias de

interveno para resolv-los.

O III Consenso de Granada define Seguimento

Farmacoteraputico como a

Prtica profissional em que o farmacutico se responsabiliza pelas necessidades do paciente relacionadas aos medicamentos. Realiza-se mediante a deteco de PRM para preveno e resoluo de RNM. Este servio implica um compromisso e deve prover-se de forma continuada, sistematizada e documentada em colaborao com o prprio paciente e com os demais profissionais do sistema de sade com a finalidade de alcanar resultados concretos que melhorem a qualidade de vida do paciente (76).

Assim, entende-se que o SF constitui uma atividade clnica do farmacutico

em que o profissional assume responsabilidades diante das necessidades

teraputicas do paciente. Para isso faz-se necessrio monitorizao e avaliao

contnua dos efeitos dos medicamentos utilizados a fim de identificar alteraes, por

meio da avaliao de variveis clnicas, no estado de sade do doente. uma

atividade que exige colaborao e integrao com os demais profissionais da equipe

de sade e deve ser realizado de modo sistematizado com documentao das

aes (75-77).

42

O termo PRM foi tratado conceitualmente pela primeira vez em 1990 por

Strand e colaboradores e uma traduo do termo drug-related problems (67).

Inicialmente, os PRM eram classificados em categorias e entendido com as

consequncias do processo de uso de medicamentos. Ao longo do tempo, o

conceito foi sendo ampliado e atualmente considerado como as causas de

resultados negativos de sade ou RNM (76).

Sucintamente, os PRM so os elementos do processo de uso enquanto os

RNM so os resultados na sade do paciente devido ao processo de uso/no uso de

medicamentos. Os RNM so classificados considerando as caractersticas bsicas

de qualquer medicamento: necessidade, efetividade e segurana (Figura 13) (76).

Os PRM e RNM podem ser reais, quando manifestados, ou potenciais quando

possveis de ocorrerem (77).

Figura 13 Representao de PRM e RNM segundo o III Consenso de Granada

Fonte: Mtodo Dder, 2009 (75).

A correlao incerta entre uso de medicamentos e resultado na sade do

usurio exige, portanto, um acompanhamento profissional desse processo de forma

a garantir os resultados esperados e minimizar os impactos negativos. Por isso, os

conceitos de AF, SF, PRM e RNM tm sido estudados nos ltimos anos

evidenciando a importncia das pesquisas relacionadas ao assunto.

Chua et al (2012) concluram que os principais problemas em 477 pacientes

portadores de HAS, DM e dislipidemia da Malsia esto relacionados ao uso de

medicamentos. No adeso, administrao incorreta e desconhecimento sobre a

doena e tratamento farmacolgico so os PRM mais prevalentes no grupo e 87,3%

43

deles foram resolvidos aps seis meses de acompanhamento farmacoteraputico

(74).

Silva et al (2013) apontaram problemas relacionados segurana dos

medicamentos como os mais prevalentes em idosos portadores de dislipidemias em

Recife (PE) e as intervenes farmacuticas resolveram 82,2% dos PRM

identificados com conseguinte melhora dos nveis de lipoprotenas aterognicas e da

PA (78).

Todavia, o principal benefcio do seguimento farmacoteraputico inclui

melhora da adeso do paciente teraputica. Para tanto, o farmacutico atua

provendo o paciente de informaes referentes doena, aos medicamentos e

esquema teraputico, acesso aos medicamentos prescritos, importncia do

cumprimento da prescrio, organizao dos horrios de administrao dos

medicamentos e uma dispensao seguida de orientao individualizada.

Um estudo clnico randomizado conduzido nos EUA avaliou a adeso ao

tratamento farmacolgico em pacientes hipertensos e portadores de dislipidemias

com mdia de idade de 78 anos acompanhados por farmacuticos por um perodo

de 12 meses. Os resultados mostraram um aumento da adeso farmacoterapia de

61,2% para 96,9% nos seis primeiros meses de acompanhamento e 95,5% em doze

meses. O grupo controle apresentou adeso de 69,1% (79).

Vrios so os mtodos utilizados para avaliao da adeso em uma

populao. Estes incluem desde autorrelato e contagem manual ou eletrnica de

comprimidos administrados em um determinado perodo avaliao de parmetros

laboratoriais e clnicos e aplicao de questionrios. Os questionrios mais utilizados

so o Teste de Morisky-Green (TMG) e o Brief Medication Questionnaire (BMQ). Os

mtodos de contagem de medicamentos mais empregados so a Taxa de Posse do

Medicamento, do ingls, Medication Possession Ratio (MPR) e o Medication Events

Monitoring System (MEMS) que realiza uma contagem eletrnica dos medicamentos

utilizados pelo paciente. Apesar da baixa acurcia, os questionrios so os mtodos

mais empregados pelo baixo custo e factibilidade em diversas populaes.

O TMG foi criado nos EUA para avaliar adeso em hipertensos e foi validado

no Brasil por Ben et al (2012) (80). O BMQ foi validado em ingls tambm para

pacientes hipertensos usando o MEMS como instrumento para determinar a adeso

terapia farmacolgica (80). Segundo Ben et al (2012), o TMG apresenta baixa

44

sensibilidade (43,6%) e razovel especificidade (81%) enquanto o BMQ foi muito

superior em relao a esses parmetros, 80% e 100%, respectivamente (80).

No Brasil, a validao em pacientes hipertensos de uma farmcia comunitria

em Porto Alegre (RS) mostrou bom desempenho dos dois testes com sensibilidade

de 77% e especificidade de 58% para o BMQ e 61% e 36% para o TMG (78).

O desempenho desses testes importante para definir a confiabilidade de

seus resultados em diversas populaes permitindo identificar problemas com uso

inadequado ou esquema teraputico insuficiente (80). O TMG j foi utilizado em

vrios estudos no Brasil e nos EUA mostrando-se capaz de identificar problemas

relacionados adeso em pacientes hipertensos e em idosos (22,51,81,82).

O MPR ou no portugus, a taxa de posse do medicamento, determinado

pelo produto da diviso entre o total de doses dirias definidas (DDD) e o nmero

total de dias de tratamento. O paciente considerado aderente ao tratamento

quando o MPR maior que 80% (53). O MPR tem sido usado em estudos em vrios

pases do mundo incluindo crianas, adultos e idosos para avaliar a adeso ao

tratamento de osteoporose com bifosfonatos e teriparatida e com antiabticos

(48,53,83-85).

A maioria dos estudos, entretanto, avalia a adeso por meio de

acompanhamento de parmetros clnicos e laboratoriais como PA, densidade

mineral ssea (DMO), INR (International Normalized Ratio). perfil glicmico ou

lipdico ou nveis plasmticos de hormnios como PTH e vitamina D (74,86-89).

Alguns estudos associam os mtodos para obter resultados mais confiveis (90).

Independente do mtodo utilizado, o que se observa uma crescente

preocupao entre os profissionais de sade com a adeso terapia farmacolgica

em virtude dos riscos sade do paciente.

Um grupo americano de profissionais de sade incluindo enfermeiros props

um mtodo de avaliao e interveno denominado AIDES (Assessment,

Individualization, Documentation, Education, and Supervision) para promover a

adeso em idosos. Esse mtodo prope a avaliao mental, cognitiva e de aspectos

que interferem na adeso ao tratamento farmacolgico como custo, individualizao

do regime teraputico considerando a peculiaridades de cada paciente, registro das

informaes obtidas, educao e acompanhamento ou superviso das intervenes

(91).

45

A adeso terapia farmacolgica promove melhor controle de doenas

crnicas como HAS e DM com reduo do risco cardiovascular e de osteoporose

com reduo do risco de fraturas em mulheres. O SF, como um tipo de cuidado de

sade, promove aumento da adeso com resultados positivos na sade do paciente

(58,79,92-95).

Ademais, alguns estudos desenvolvidos principalmente nos EUA, mostraram

benefcios econmicos com esse modelo de prtica farmacutica como reduo dos

custos com internao e com complicaes de doenas como epilepsia, infeces,

AIDS, DM, HAS, dislipidemias, insuficincia cardaca, asma e em usurios de

anticoagulantes orais (96,97). Borges et al (2011) ainda mostraram menor procura

pelos servios de emergncia e maior busca pelos servios de ateno primria em

pacientes acompanhados por um farmacutico clnico mensalmente no Brasil num

perodo de 10 meses (97).

Os estudos mostrando os benefcios do SF so numerosos. Ainda assim,

esse modelo de exerccio profissional permanece desconhecido por muitos usurios

de medicamentos. Trata-se de um modelo novo para algumas comunidades,

sobretudo, para os pases em desenvolvimento ou mais pobres, porm, bem

consolidado em outros lugares como nos EUA e parte da Europa. Reviso da

literatura feita por Pereira e Freitas (2008) mostrou que at o final de 2007, os

pases desenvolvidos lideravam as pesquisas no assunto (73).

Uma coorte realizada em Hong Kong com 1104 pessoas em 2009 evidenciou

o grau de desinformao da comunidade chinesa em relao atividade clnica e

importncia do farmacutico no processo de uso de medicamentos. Nesse estudo,

94,6% dos entrevistados admitiram a prtica de automedicao sendo que 32,9%

utilizavam pelo menos um medicamento isento de prescrio (MIP). Apenas 68,3%

consultaram-se com um farmacutico antes da utilizao desses medicamentos e

45% reconheceram a importncia desse profissional no processo de autocuidado e

de automedicao. Alm disso, 31,7% disseram desconhecer o papel do

farmacutico na promoo do uso racional de MIP, no confiavam ou no aceitavam

a atuao desse profissional na assistncia sade (44).

Outro estudo conduzido no Paquisto que avaliou a aceitao da AF em

farmcias comunitrias mostrou baixa adeso ao programa oferecido nos servios

(22%) evidenciando a falta de conhecimento, aceitao e credibilidade da

comunidade em relao a esse modelo de exerccio farmacutico (98).

46

Resultados como esses mostram que embora a AF venha sendo discutida h

quase trs dcadas no mundo todo, a sociedade moderna ainda carece de estudos

que demonstrem e convenam sobre seus benefcios principalmente, os

econmicos. Igualmente, a maioria dos pases carece de polticas pblicas que

regulamentem e favoream a prtica desse exerccio profissional do farmacutico.

Gholami e Najmeddin (2013) afirmam que para a implantao da AF nos

servios de sade do Ir muitos desafios devem ser superados como ausncia de

sistemas e softwares que permitam o acompanhamento farmacoteraputico,

indefinio de regras e instrues nos servios de sade para atuao do

farmacutico clnico, despreparo dos farmacuticos para atuar na rea por

deficincia na formao desses profissionais e falta do apoio de gestores dos

servios de sade (99).

Parece que no Brasil essa realidade no muito diferente. Seguindo a

tendncia mundial, o pas passa por uma reestruturao na rea de sade (73)

marcada por foco na ateno primria de sade, nos cuidados primrios, na

promoo e preveno e na atuao multiprofissional com oferta de assistncia

integral ao usurio do SUS. Na Assistncia Farmacutica, ampliao do acesso a

medicamentos e promoo do uso racional tm sido prioridades. Farmacuticos tm

sido inseridos em servios at ento predominantemente de mdicos e enfermeiros

como as Unidades Bsicas de Sade (UBS) e as equipes do PSF. O modelo de

ateno sade centrado no mdico com uso de tecnologias de ponta para

diagnstico e tratamento tem sido rejeitado pelos prprios pacientes, que buscam

agora, tratamentos holsticos com profissionais diferentes e que se comunicam entre

si.

Esse novo contexto social com pacientes providos de mais informaes

demanda tambm profissionais de sade mais capacitados. As diretrizes curriculares

dos cursos de graduao da rea de sade tm sido revisadas buscando garantir a

formao de profissionais de sade mais preocupados com o bem estar do outro,

verdadeiros profissionais do cuidado. Dessa forma, a AF e seus componentes,

ganham a oportunidade de se consolidarem.

Como resposta a essa nova demanda o Conselho Federal de Farmcia (CFF)

junto com entidades profissionais, aprovou a Resoluo n 585 de 29 de agosto de

2013 que regulamenta as atribuies clnicas do farmacutico entre elas a

realizao de consultas farmacuticas, intervenes de sade e acompanhamento

47

farmacoteraputico alm de aes de educao em sade (100). Outra medida foi a

aprovao da Resoluo n 586 de 29 de agosto de 2013 que regulamentou a

prescrio farmacutica no Brasil para medicamentos isentos de prescrio mdica

(MIP) (101).

Acredita-se que para consolidao da AF como modelo de prtica profissional

outras mudanas so necessrias tais como a aceitao no apenas pelo paciente,

mas, principalmente pela classe mdica; investimentos em capacitao, contratao

de profissionais, recursos financeiros e materiais que a possibilitem alm do

desenvolvimento de competncias e habilidades profissionais por meio da

reestruturao do processo da formao dos profissionais. Pereira e Freitas (2008)

ainda defendem que a criao e validao, social e econmica, de um modelo

tecnolgico de AF fazem-se necessrios (73).

48

3 OBJETIVOS

3.1 OBJETIVO GERAL

Avaliar os efeitos do Seguimento Farmacoteraputico na sade e na

qualidade da farmacoterapia de idosos portadores de doenas crnicas no

transmissveis atendidos em um servio de referencia do Sistema nico de Sade

do Distrito Federal.

3.2 OBJETIVOS ESPECFICOS

1. Identificar a influencia do SF na prevalncia PRM;

Hiptese: Silva et al (2013) identificaram problemas relacionados segurana

dos medicamentos como os mais prevalentes em idosos portadores de dislipidemias

em Recife (PE) e as intervenes farmacuticas resolveram 82,2% dos PRM

identificados (78).

2. Avaliar a influencia do SF na adeso farmacoterapia;

Hiptese: Estudo conduzido por Lee et al (2006) mostrou melhora do perfil de

adeso farmacoterapia em idosos portadores de hipertenso e dislipidemias aps

12 meses de acompanhamento farmacutico (79).

3. Identificar a influencia do SF no controle da PA, dos nveis glicmicos e de

outros exames laboratoriais;

Hiptese: Silva et al (2013) mostraram que idosos pernambucanos portadores

de dislipidemias apresentaram melhores nveis de lipoprotenas aterognicas e da

presso arterial aps intervenes farmacuticas (78).

4. Identificar a importncia do farmacutico clnico na assistncia sade do

idoso;

Hiptese: Uma coorte realizada em Hong Kong com 1104 pessoas em 2009

demonstrou que apenas 45% reconheciam a importncia da atuao do

farmacutico no processo de autocuidado e na automedicao (44).

5. Analisar a viabilidade de implantao do Servio de Ateno Farmacutica

(SAF) no local de estudo.

Hiptese: Gholami e Najmeddin (2013) afirmam que para a implantao da

Ateno Farmacutica nos servios de sade do Ir muitos so os desafios a serem

enfrentados (99).

49

4. MTODO

4.1 CARACTERIZAO

4.1.1 Tipo de Estudo

Estudo epidemiolgico, analtico, de interveno, do tipo coorte prospectiva.

4.1.2 Local de Estudo

A pesquisa foi realizada no Servio de Geriatria da Unidade Mista de Sade

de Taguatinga (UMST) por constituir-se referencia na especialidade, possuir grande

rea de cobertura no Distrito Federal abrangendo usurios do Sistema nico de

Sade (SUS) das regies de Samambaia, Ceilndia, Taguatinga, guas Claras,

Areal e Vicente Pires alm de interesse da equipe em participar do estudo.

As Unidades Mistas de Sade (UMS) so servios de sade destinados

prestao de atendimentos em ateno bsica e integral sade nas especialidades

bsicas (103). A Unidade Mista de Sade de Taguatinga (UMST) embora receba

esta denominao, funciona como uma policlnica. As policlnicas prestam

atendimento ambulatorial em vrias especialidades, incluindo ou no, as

especialidades bsicas e especialidades no mdicas.

A UMST localizada na regio sudoeste do Distrito Federal atendeu 30.670

pacientes de janeiro a agosto/2014 nas diferentes especialidades sendo que a

Geriatria realizou 1.330 atendimentos. O setor possui uma equipe constituda por

dois mdicos geriatras, trs clnicos mdicos, duas enfermeiras, uma nutricionista,

uma psicloga, uma terapeuta ocupacional e uma assistente social. No h

farmacuticos clnicos integrando essa equipe (104).

Na UMST, o farmacutico participa apenas da dispensao de medicamentos

no desenvolvendo qualquer atividade clnica. No h consultrios especficos, nem

profissionais destinados a tal atividade.

A Farmcia da UMST considerada uma farmcia ambulatorial e conta com

trs farmacuticos de 40h/semanais para gerenciar e supervisionar a dispensao

de antirretroviariais e de medicamentos de mdia complexidade como insulinas

glargina, detemir e LisPro, montelucaste de sdio, salmeterol, tiotrpio e hialorunato

de sdio.

50

4.2 CASUSTICA

4.2.1 Delineamento e tamanho da amostra

A amostra inicial foi calculada em 135 pacientes. Para o clculo do tamanho

da amostra foi utilizado um estudo clnico randomizado conduzido por Borges et al

(2010) com caractersticas semelhantes ao presente estudo, em que valores de

mdia e desvio padro da glicemia em jejum foram obtidos em dois grupos

(cuidados farmacuticos e controle) e em dois momentos distintos (inicial e aps 12

meses), conforme valores descritos na tabela abaixo. Considerou-se ainda, um nvel

de significncia de 5%, um poder de teste de 80% e uma correlao, entre os dois

momentos de 0,80. Das informaes obtidas foi possvel estimar, empregando-se o

programa GPower verso 3.0.5, sendo o tamanho do efeito de deteco de

diferena entre os dois grupos igual a 0,28 (102).

Tabela 1 Valores mdios e desvio padro da glicemia em jejum utilizados

para clculo do tamanho da amostra

Mdia (DP) Momento

Grupo Inicial Aps 12

meses

Mdia da

Diferena

Cuidados

Farmacuticos

181,7 (85,2) 133,6 (40,6) -36,8 (92,1)

Controle 186,8 (79,9) 166,1 (61,3) -20,7 (89,1)

Fonte: Borges et al (2010) (102)

4.2.2 Seleo da amostra

A amostra foi obtida por convenincia constituda de 105 idosos portadores de

doenas crnicas no transmissveis encaminhados pela equipe mdica e de

Enfermagem do local de estudo.

Os pacientes foram recrutados de junho a agosto de 2013 no local de estudo.

4.2.4 Critrios de incluso

Foram includos na pesquisa, indivduos de ambos os sexos, com idade igual

ou superior a 60 anos, portadores de doenas crnicas no transmissveis como

hipertenso arterial sistmica, diabetes mellitus, hipotireoidismo e osteoporose

acompanhados pelo Servio de Geriatria; identificados pela equipe mdica ou de

51

Enfermagem do local com problemas de adeso ao tratamento farmacolgico ou em

uso de polifarmcia; os considerados capazes de responder a entrevista e de

receber orientaes dos pesquisadores (ditos com discernimento), que aceitarem

participar voluntariamente da pesquisa e que estiverem em uso de pelo menos um

medicamento contnuo.

4.2.5 Critrios de excluso

Foram excludos da pesquisa os portadores de doenas infecciosas

transmissveis, de demncia, deficientes visuais e auditivos, os considerados sem

discernimento e os sem uso de tratamento farmacolgico contnuo.

Os pacientes que deixaram de comparecer a pelo menos uma das consultas

agendadas ou no realizou os exames solicitados foram excludos do estudo.

4.3. COLETA DE DADOS

Os dados foram coletados no perodo de setembro de 2013 a outubro de

2014 por meio de um questionrio semiestruturado e adaptado do Mtodo Dder de

Acompanhamento Farmacoteraputico (2009) (75) e validado por Oliveira (2008)

(11).

As variveis analisadas foram: dados socioeconmicos (idade, sexo,

naturalidade, renda, escolaridade, estado civil e estrutura familiar); hbitos de vida

(tabagismo, etilismo, dieta e atividade fsica); perfil de sade (problemas de sade,

queixas de sade, resultados dos principais exames laboratoriais), perfil

farmacoteraputico (medicamentos utilizados, PRM, RNM, IM) e intervenes

farmacuticas (necessrias, aplicadas, aceitas ou no).

O questionrio foi aplicado durante consultas farmacuticas individuais

previamente agendadas pela equipe de Enfermagem no prprio local de estudo.

Cada paciente foi atendido cinco vezes sendo por um nico farmacutico clnico. Por

questes prticas, essas consultas foram definidas como t0 (1 consulta realizada

assim que o idoso foi includo no estu